Ivair Reinaldim - Arte e Critica de Arte Na Decada de 1980 - Vinculos Possiveis Entre o Debate Teorico Internacional e Os Discursos Crit

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    IVAIR JUNIOR REINALDIM

    Arte e crtica de arte na dcada de 1980vnculos possveis entre o debate terico internacional e os discursos crticos no Brasil

    Tese apresentada ao Programa de Ps-graduaoem Artes Visuais da Escola de Belas Artes daUniversidade Federal do Rio de Janeiro, PPGAV-EBA/UFRJ, como parte dos requisitos necessrios obteno do ttulo de Doutor em Artes Visuais,

    com nfase em Histria e Crtica de Arte.Orientadora: Prof. Dr. Maria da Glria de AraujoFerreira

    RIO DE JANEIRO

    2012

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    Arte e crtica de arte na dcada de 1980vnculos possveis entre o debate terico internacional e os discursos crticos no Brasil

    IVAIR JUNIOR REINALDIM

    Tese apresentada ao Programa de Ps-graduaoem Artes Visuais da Escola de Belas Artes daUniversidade Federal do Rio de Janeiro, PPGAV-EBA/UFRJ, como parte dos requisitos necessrios obteno do ttulo de Doutor em Artes Visuais,com nfase em Histria e Crtica de Arte.

    Orientadora: Prof. Dr. Maria da Glria de AraujoFerreira

    RIO DE JANEIRO2012

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    REINALDIM, Ivair Junior.

    Arte e crtica de arte na dcada de 1980 : vnculos possveis entre o debate tericointernacional e os discursos crticos no Brasil / Ivair Junior Reinaldim. Rio de Janeiro,2012.

    xvi. 269 f.: 71 il.

    Tese: Doutorado em Artes Visuais, com nfase em Histria e Crtica de Arte Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Programa de Ps-graduao em ArtesVisuais da Escola de Belas Artes, PPGAV-EBA, 2012.

    Orientadora: Prof. Dr. Maria da Glria de Araujo Ferreira.

    1. crtica de arte 2. discursos crticos 3. debate terico4. dcada de 1980 5. arte contempornea

    II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Programa de Ps-graduao em ArtesVisuais da Escola de Belas Artes. III. Ttulo.

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    FOLHA DE APROVAO

    Arte e crtica de arte na dcada de 1980vnculos possveis entre o debate terico internacional e os discursos crticos no Brasil

    IVAIR JUNIOR REINALDIM

    Tese submetida ao Programa de Ps-graduao em Artes Visuais da Escola de BelasArtes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, PPGAV-EBA/UFRJ, como parte dosrequisitos necessrios obteno do ttulo de Doutor em Artes Visuais, com nfase emHistria e Crtica de Arte.

    ___________________________________________________Prof. Dr. Maria da Glria de Araujo Ferreira, orientadora

    Escola de Belas Artes Universidade Federal do Rio de Janeiro (EBA/UFRJ)

    ___________________________________________________Prof. Dr. Maria Luisa Luz Tavora

    Escola de Belas Artes Universidade Federal do Rio de Janeiro (EBA/UFRJ)

    ___________________________________________________Prof. Dr. Milton Machado da Silva

    Escola de Belas Artes Universidade Federal do Rio de Janeiro (EBA/UFRJ)

    ___________________________________________________Prof. Dr. Ricardo Roclaw BasbaumInstituto de Artes Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iartes/Uerj)

    ___________________________________________________Prof. Dr. Fernando Frana Cocchiarale

    Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)

    Rio de Janeiro

    2012

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    SUPLENTES

    ___________________________________________________Prof. Dr. Paulo Venancio Filho

    Escola de Belas Artes Universidade Federal do Rio de Janeiro (EBA/UFRJ)

    ___________________________________________________Prof. Dr. Marcelo Gustavo Lima de Campos

    Instituto de Artes Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iartes/Uerj)

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    AGRADECIMENTOS

    Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior - Capes, queme distinguiu com uma Bolsa de pesquisa durante praticamente todo o perodo derealizao do curso de Doutorado, intercalada por outra Bolsa, referente ao Programa deDoutorado no Pas com Estgio no Exterior - PDEE, por meio da qual foi possvel meusjour pelo perodo de 12 meses em Paris, Frana.

    Ao Programa de Ps-graduao em Artes Visuais da Escola de Belas Artes daUniversidade Federal do Rio de Janeiro - PPGAV-EBA/UFRJ, na figura de suacoordenadora Dr. Maria Cristina Volpi Nacif (gesto 2010-2012), extensvel a todos os professores e colegas com quem convivi durante esse longo perodo. Agradeo, em particular, s professoras doutoras Ana Maria Tavares Cavalcanti (coordenadora doPPGAV, gesto 2008-2010) e Maria Luisa Tavora, com as quais realizei um intensotrabalho colaborativo na equipe editorial da revista Arte & Ensaios , entre 2008 e 2010.

    cole Doctorale dArts plastiques, esthtique & sciences de lart da UniversitParis I - Panthon Sorbonne / Centre St. Charles, e, em especial, ao Dr. Jacinto Lageira,que gentilmente me recebeu em Paris e supervisionou meu Estgio PDEE. Bibliothque Kandinsky - Centre Georges Pompidou e ao Institute national de histoirede lart - INHA, em Paris, cujas bibliotecas foram de suma importncia para arealizao desta pesquisa. Enfatizo o mesmo em relao aos Archives de la critiquedart, em Rennes, onde estive pelo perodo de 5 dias e fui atenciosamente acolhido porEmmanuelle Rossignol, responsvel pela biblioteca, Laurence Le Poupon, arquivista, eSylvie Mokhtari, pesquisadora local.

    Ao Centro de Pesquisa e Documentao do Museu de Arte Moderna do Rio deJaneiro, na pessoa do ex-funcionrio Mrio Marques, que na poca da realizao demeu Mestrado ajudou-me com todo o material que utilizei nesta e em muitas outras pesquisas, Biblioteca do Museu de Arte Moderna de So Paulo, na pessoa da bibliotecria Lia Carmen Cassoni, e, por fim, ao artista Daniel Senise, que cedeu seurico arquivo pessoal quando trabalhei na cronologia crtica do livroVai que ns levamosas partes que te faltam , publicado em 2011.

    minha orientadora, professora Dr. Maria da Glria de Araujo Ferreira, que,com sua integridade tica e generosidade intelectual, acompanhou esse longo trabalho,contribuindo para que encontrasse um lugar de fala em meio a tantas vozes do passado edo presente. Mais do que uma relao entre orientador e orientando, em muitosmomentos tive o privilgio de ser tratado como pesquisador e parceiro.

    Aos membros da banca, professores doutores Maria Luisa Luz Tavora, MiltonMachado, Ricardo Basbaum e Fernando Cocchiarale, por gentilmente haverem aceitadoo convite para participar da defesa de minha tese de doutorado. Igualmente agradeo aos

    professores doutores Ceclia Cotrim e Paulo Venancio Filho, por participarem de minha

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    banca de qualificao, muito contribuindo para o desenvolvimento posterior de minhasanlises. Aos professores doutores Felipe Scovino, Guilherme Bueno e Luiz CamilloOsorio, que, na poca, tambm leram meu projeto de qualificao. A Marcelo Campos

    por gentilmente haver aceito o convite para suplente e em especial professora LisetteLagnado.

    minha famlia, pelo apoio incondicional, e, em especial, aos meus pais, IvairAntonio Reinaldim e Maria Glaci Reinaldim, que formaram meu carter eacompanharam, mesmo distncia, todo processo para concluso desta etapaimportante de minha formao.

    Em especial, a Paulo Roberto Stolz, companheiro incondicional nessa grandeaventura, que a cada dia tem contribudo com sua calma e perseverana para meucrescimento pessoal e profissional.

    sempre gentil Fernanda Lopes, no s por todo auxlio durante a redao datese, mas, acima de tudo, pelo incentivo, compreenso e parceria intelectual. Agradeoigualmente aos importantes comentrios dos crticos (e amigos) Fernando Cocchiarale ePaulo Reis, interlocuo privilegiada, no Rio e em Paris, de Ins de Arajo, assimcomo ao apoio afetuoso e amizade de todas as horas de Ana Beatriz Vieira, DorotiJablonski, Rebeca Rasel, Laercio Redondo e Birger Lipinski (Billy).

    Aos parceiros do Centro Cultural do Instituto Brasil-Estados Unidos - Ibeu, comquem tenho convivido intensamente nos ltimos anos, em particular, ao Dr. CezarAntonio Elias e gerente, Renata Pinheiro Machado, bem como aos companheiros deComisso Cultural, Bernardo Mosqueira, Fernanda Pequeno, Humberto Farias, Marcos Nogueira e Toyoko Lepesqueur, e aos membros da equipe, Alexandre Faccin, AnaPaula Alves e Rebeca Rasel.

    Finalmente, aos amigos que partilharam, colaboraram (em alguma medida) ousimplesmente cruzaram de modo afetuoso meu caminho nesses quatro intensos anos:Adelaide de Souza, Alberto Saraiva, Alessandra Porto, Ana Lcia Vasquez, Ana PaulaCarneiro da Silva, Ana Paula Darriba, Analu Cunha, Andreas Valentin, Anna Corina,Beatriz Moraes, Bianca Bernardo, Carolina Martinez, Cezar Bartholomeu, ClaudiaSaldanha, Claudio Floriano, Dalila Cerqueira Pinto, Danielle Carcav, Denize Bruno,Douglas Cortes, Elizabeth Varela, Elisa Castro, Elo de Carvalho, Fabiano Devide,Gisele Camargo, Giselle Macedo, Isabelle Dria Reis, Katia Chavarry, Leila Danziger,Leo Ayres, Leonardo Motta Campos (AoLeo), Luane Aires, Luiz Cludio da Costa,Manoel Novello, Marcela Antunes, Marcelo Diego, Marcelo Zanchetta, Maria Carlotade Carvalho, Maria Helena Hermes, Maria Mattos, Maria Paula van Biene, NelsonRicardo Martins, Patrizia DAngello, Raul Leal, Ricardo Dias, Rodrigo Krul, RonaldDuarte, Rosangela Malucelli Andersen, Slvia Borges, Suzana Queiroga, Tania Queiroz,Tathyane Hfke, Thierry Renaudin, Vera Lins, Viviane Matesco e Viviane Teixeira.

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    A questo dos historiadores, por exemplo;tenho por eles todo respeito, mas eles

    mentem muito, deixam o testemunho deuma poca que no verdadeiro.

    Paulo Bruscky, Em outra vida acho que fuiarquivista,Arte & Ensaios, n. 19, 2009.

    Mentiras sinceras me interessam

    Cazuza e Frejat,Maior abandonado, 1984.

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    RESUMO

    REINALDIM, Ivair.Arte e crtica de arte na dcada de 1980: vnculos possveisentre o debate terico internacional e os discursos crticos no Brasil. Orientadora: Prof.Dr. Maria da Glria de Araujo Ferreira. Rio de Janeiro: UFRJ/PPGAV-EBA, 2012.Tese (Doutorado em Artes Visuais, com nfase em Histria e Crtica de Arte).

    Este estudo apresenta uma anlise dos discursos crticos da dcada de 1980, procurandoinvestigar os vnculos entre o debate crtico internacional centrado, sobretudo, emduas posies dialticas, assumidas, por um lado, pelos defensores da retomada da produo pictrica, e por outro, pelos crticos que condenavam essa mesma produo, a partir do projeto crtico-historiogrfico da revistaOctober e o argumento discursivodos crticos brasileiros cujas particularidades relacionavam-se, em especial, com a problemtica em torno do termo Gerao 80 e com o modo como este veio a serconsiderado pela histria da arte nacional.

    Levando-se em considerao o argumento corrente de que imagens migraram de umcanto a outro do planeta, a partir da reprodutibilidade tcnica e da expanso alcanada pelos meios de comunicao, refora-se que fenmeno similar pode ser averiguado noque tange abrangncia dos discursos crticos. Vistos de modo amplo, sobretudo seseus posicionamentos ideolgicos puderem ser localizados, esses discursos constituemum corpus terico capaz de fornecer indcios mais precisos do modo como tentaramdelinear certo nmero de projetos, voltados, de modo geral, para a construo de umaidentidade temporal, focada no presente, tanto quanto, uma preocupao em constituir parmetros para uma operatividade artstica, a partir do confronto com o reservatrioimagtico da histria e da cultura de massa.

    Com a modificao do ponto de vista sobre o objeto, este estudo apresenta um novoolhar para a dcada de 1980, seja pela abordagem de aspectos pouco conhecidos, muitas

    vezes deficitariamente considerados ou mesmo recalcados por completo pela histria daarte, seja pelo redimensionamento de leituras amplamente reproduzidas pelahistoriografia. O simples fato de clarificar um vasto conjunto de discursos, (re)criandouma rede de vnculos, referncias, tenses, reaes, etc., contextualiza esta anlise nombito das reavaliaes recentes do perodo.

    Palavras-chave: crtica de arte; discursos crticos; debate terico; dcada de 1980; artecontempornea.

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    RESUM

    REINALDIM, Ivair.L'Art et la critique d'art dans les annes 1980 : les liens possibles entre le dbat thorique international et les discours critiques au Brsil.Directrice de thse: Dr. Maria da Glria de Araujo Ferreira. Rio de Janeiro:UFRJ/PPGAV-EBA, 2012. Thse (Doctorat en arts visuels, avec une spcialisation enhistoire de l'art et la critique d'art).

    Cette tude prsente une analyse des discours critiques des annes 1980, en essayantd'enquter sur les liens entre le dbat critique internationale - centr, principalement,dans deux positions dialectiques, supposes, d'une part, par les partisans de la reprise dela production picturale, par les partisans de la reprise de la production picturale, et del'autre par les critiques qui ont condamn cette mme production a partir du projetcritique historiographique de la revue Octobre- et de l'argument discursive de lescritiques brsiliens - dont les caractristiques sont lis, en particulier, des questionsautour du terme 'Generation 80' et avec la faon comme ce terme a t consider parl'histoire de l'art national.

    En tenant compte l'argument courant que les images ont migr d'un coin l'autre de la plante, a partir de la reproductibilit technique et de l'expansion ralise par les mdias,

    on renforce quun phnomne similaire peut tre verifi en ce qui concerne lacouverture des discours critiques. Considre de faon gnrale, surtout si ses positionsidologiques peuvent tre situs, ces discours sont une base thorique capable de fournirune indication plus prcise de la faon dont on a essay de tracer un certain nombre de projets, dirigs gnralement la construction d'une identit temporel, concentr sur le prsent, aussi tant quune proccupation dans la mise en place des paramtres pour uneoprabilit de l'art, a partir de la confrontation avec le rservoir de l'imagerie del'histoire et de la culture de masse.

    En modifiant le point de vue de l'objet, cette tude prsenteun nouveau regard sur lesannes 1980, soit pour l'approche des aspects peu connus, souvent considrs dunefaon deficitaire ou mme compltement rprime par l'histoire de l'art, soit par leredimensionnement des lectures reproduite par l'historiographie. Le simple fait declarifier une large gamme de discours en (re) crant un rseau de liens, de rfrences,des tensions, des ractions, etc., contextualise cette analyse dans le contexte dervaluations rcentes de la priode.

    Mots-cls: la critique d'art ; des discours critiques ; le dbat thorique ; les annes1980 ; l'art contemporain.

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    ABSTRACT

    REINALDIM, Ivair.Art and art criticism in the 1980s: possible bonds between theinternational theoretical discussion and critical discourses in Brazil. Orientation: Dr.Maria da Glria de Araujo Ferreira. Rio de Janeiro: UFRJ/PPGAV-EBA, 2012. Thesis(Doctorate in Visual Arts with emphasis in Art History and Criticism).

    This study presents an analysis of the critical discourses of the 1980s, attempting toinvestigate the links between international critical debate focused mainly on twodialectical positions, taken on one hand, by the defenders of resumption of pictorial production, and on the other hand, by critics who condemned this same production,from the critical-historiography project of the journalOctober and the discursiveargument of Brazilian critics whose characteristics were related in particular to the problems surrounding the term Gerao 80 [Generation 80] and the way how thiswas regarded by the history of national art.

    Taking into account the current argument that images migrated from one corner toanother around the planet, from the technical reproducibility and expansion achieved by

    the media, one may reinforce that similar phenomenon can be verified regarding thecoverage of the critics speeches. Seen broadly, especially if its ideological positions can be located, these statements are a theoretical base capable of providing more accurateindication of how they tried to outline a certain number of projects directed generally tothe construction of a temporal identity, focused on the present as much as a concern insetting up parameters for an operability of art, from the confrontation with the imageryreservoir of history and of mass culture.

    By modifying the point of view of the object, this study presentsa new look to the1980s, either for the approach of the less known aspects often considered withdeficiency or even completely repressed by the history of art, or by resizing readingswidely reproduced by historiography. Simply clarifying a wide range of discourses(re)creating a network of links, references, tensions, reactions, etc., contextualizes thisanalysis within the recent reevaluations of the period.

    Key-words: art criticism; critical discourses; theoretical discussion; the 1980s;contemporary art.

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    LISTA DE ILUSTRAES

    Il. 1 Capa da edio especial da revistaARTFORUM International, 40thAnniversary Special Issue, The 1980s: Part One, XLI, n. 7, March 2003.

    Il. 2 Capa da edio especial da revistaARTFORUM International, 40thAnniversary Special Issue, The 1980s: Part Two, XLI, n. 8, April 2003.

    Il. 3 Pgina inicial do debate The Mourning After [Depois do luto].ARTFORUMInternational, 40th Anniversary Special Issue, The 1980s: Part One, XLI, n. 7, March2003.

    Il. 4 Capa do catlogoFlashback: Eine Revision der Kunst der 80er Jahre /Revisiting the Art of the 80s.

    Il. 5 Registro da mesa-redonda realizada em 18 de junho de 2005, Basel/Sua,referente exposioFlashback: Eine Revision der Kunst der 80er Jahre /Revisiting the Art of the 80s.

    Il. 6 Capa do catlogoAnos 80: Uma Topologia.

    Il. 7 Imagem do projeto expogrfico de Ulrich Loock paraAnos 80: Uma Topologia.

    Il. 8 Capa do catlogoEspces dEspace: Les Annes 1980.

    Il. 9 Capa do catlogoImages et (Re)Prsentations: Les Annes 1980.

    Il. 10 Capa do catlogo2080.

    Il. 11 Vista com a referncia curatorial s quatro exposies histricas da dcada de1980 para a mostra2080.

    Il. 12 Capa do catlogoOnde Est Voc, Gerao 80?.

    Il. 13 Capa do material de apoio do Programa Educativo do CCBB-RJ, referente exposioOnde Est Voc, Gerao 80?.

    Il. 14 Capa do catlogo80/90, Modernos, Ps-Modernos, Etc..

    Il. 15 Imagem da pgina do catlogo80/90, Modernos, Ps-Modernos, Etc., comregistro da expografia.

    Il. 16 Cartaz daDocumenta 7.

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    Il. 17 Fachada do Fridericianum, com o trabalho7000 Oaks , de Joseph Beuys, durantea Documenta 7.

    Il. 18 a 21 Annunciation after Titian (Verkndigung nach Tizian ), Gerhard Richter,1973, leo sobre tela, 150cm x 200cm (cada), Hirshhorn Museum and SculptureGarden, Washington D.C./USA. Presentes na mostraA New Spirit in Painting, naRoyal Academy of Arts, Londres/Reino Unido, 1981.

    Il. 22 Catlogo deZeitgeist.

    Il. 23 Vista geral do ptio central do Martin-Gropius Bau, durante a exposioZeitgeist, Berlim/Alemanha,1982. Destaques para o trabalho Man With Briefcase , deJonathan Borofsky, e para a instalao Hirschdenkmler, de Joseph Beuys. Visualizaro vdeo: http://vimeo.com/10394534.

    Il. 24 Pgina deArtforum,com texto de Max Wolfgang Faust.

    Il. 25 a Il. 30 Registros da montagem e da exposioGrande Tela 18 BienalInternacional de So Paulo, 1985. Projeto expogrfico de Haron Cohen, a partir daconcepo curatorial de Sheila Leirner.

    Il. 31 Untitled , Willem de Kooning, 1979, leo sobre tela, 195,5cm x 223,5cm, Col.Xavier Fourcade Inc., Nova York/EUA.

    Il. 32 St. Francis in Ecstasy , Julian Schnabel, 1980, leo e pratos sobre madeira, 244 x213,5cm, Col. Mary Boone, Nova York/EUA.

    Il. 33 Galicneo galhardeado , Jorge Guinle Filho, 1982, leo sobre tela, 160cm x140cm, Col. Particular.

    Il. 34 Registro fotogrfico da Campanha das Diretas J! , Avenida Presidente Vargas eCandelria, Rio de Janeiro-RJ.

    Il. 35 Registro fotogrfico da Campanha das Diretas J! , Praa da S, So Paulo-SP.

    Il. 36 e Il. 37 Registros fotogrficos da Campanha das Diretas J! .Il. 38 Cartaz da exposio-evento Como Vai Voc, Gerao 80?.

    Il. 39 Registro fotogrfico da abertura da exposio-eventoComo Vai Voc, Gerao80?, Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro, 14 de julho de 1984. Vero registro videogrfico (Anexos I)

    Il. 40 Capa da edio especial da revista Mdulo, Rio de Janeiro, edio especial, julho/agosto 1984, Catlogo da exposio-eventoComo Vai Voc, Gerao 80?.

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    Il. 41 Capa do livro Explode Gerao! , do crtico Roberto Pontual, lanado durante aabertura da exposio-eventoComo Vai Voc, Gerao 80?.

    Il. 42 Thira , Brice Marden, 1979-1980, leo e cera sobre tela, 244cm x 460cm, Muse National dart moderne, Paris/Frana.

    Il. 43 Die Mdchen von Olmo II , Georg Baselitz, 1981, leo sobre tela, 259cm x249cm, Muse National dart moderne, Paris/Frana.

    Il. 44 Registro fotogrfico da abertura de exposioEsculturas e Desenhos, deTunga, no Espao ABC - Funarte , Rio de Janeiro, 7 de novembro de 1980. Ver ostextos de Ronaldo Brito e de Frederico Moraes sobre os trabalhos expostos (Anexos I)

    Il. 45 Untitled, from Lieber Maler, male mir (Querido pintor, pinte para mim...),Martin Kippenberger, 1983, acrlica sobre tela, 200 x 130cm.Il. 46 Capa e pgina da revistaFlash Art International , com o ensaioTransvanguarda Italiana, de Achille Bonito Oliva, n. 92-93, October-November1979.

    Il. 46 (b) Capa do livroThe Italian Trans-avantgarde/La TransavanguardiaItaliana, 1980, de Achille Bonito Oliva.

    Il. 47 Capa do livroTrans-avantgarde International, 1982, de Achille Bonito Oliva.

    Il. 48 Capa do livroThe Anti-Aesthetic: essays on postmodern culture, 1983,organizado por Hal Foster.

    Il. 49 Capa da primeira edio da revistaOctober, Spring 1976.

    Il. 50 Registro fotogrfico da exposioPictures, organizada por Douglas Crimp, em1977, Artists Space, Nova York/EUA.

    Il. 51 Capa do catlogo da exposioPictures, organizada por Douglas Crimp, em1977, Artists Space, Nova York/EUA.

    Il. 52 Untitled Film Still #21 , Cindy Sherman, 1978, fotografia, The Museum ofModern Art Nova York/EUA.

    Il. 53 Pollock and Tureen, Arranged by Mr. and Mrs. Burton Tremaine, Connecticut ,Louise Lawler, 1984, cibachrome, 71cm x 99cm, The Horace W. Goldsmith Foundation Nova York/EUA.

    Il. 54 The Exile , Julian Schnabel, 1980, leo, galhadas, folhas de ouro e tcnica mista,sobre madeira, 228,6cm x 304,8cm.

    Il. 55 Capa do Caderno especial do peridico Arte em Revista n. 7, 1983

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    Il. 56 Rabbit for Dinner , Sandro Chia, 1981, leo sobre tela, 205,5cm x 339cm,Stedelijk Museum Amsterdam/Holanda.

    Il. 57 Midnight Sun II , Francesco Clemente, 1982, leo sobre tela, 201cm x 250,7cm,Tate Gallery Londres/Inglaterra.

    Il. 58 Registro fotogrfico do evento do coletivoA Moreninha, realizado na Ilha dePaquet, em 1 de fevereiro de 1987 (foto de Mrcia Costa Dias, publicada no Jornal do

    Brasil ).

    Il. 59 Registro fotogrfico do evento do coletivoA Moreninha, realizado na Ilha dePaquet, em 1 de fevereiro de 1987 (foto de Ricardo Leoni, publicada noO Globo ).

    Il. 60 Panfleto (frente e verso), com composio daDupla Especializada (Alexandre Dacosta e Ricardo Basbaum).Il. 61 Panfleto daDupla Especializada(Alexandre Dacosta e Ricardo Basbaum).

    Il. 62 Panfleto de lanamento do vdeo Egotrip , de Sandra Kogut e Andra Falco(sobre trabalhos de Alexandre Dacosta e Ricardo Basbaum).

    Il. 63 Sem ttulo , Eduardo Kac, performance de telepresena. Abertura da exposioBrasil High-Tech, Galeria de Arte do Centro Empresarial Rio, Rio de Janeiro, 1986.

    Il. 64 Satori Three Inches within Your Heart , David Salle, acrlica e leo sobre tela,1988, 214,2cm x 291cm, Tate Gallery Londres/Inglaterra.

    Il. 65 Nuremberg , Anselm Kiefer, acrlica, emulso e palha sobre tela, 1982,280cm x 380cm, Eli and Edythe Broad Collection Los Angeles/EUA.

    Il. 66 Untitled (Skull) , Jean-Michel Basquiat, acrlica e pastel oleoso sobre tela, 1981,206cm x 176cm, Eli and Edythe Broad Collection Los Angeles/EUA.

    Il. 67 Registro fotogrfico da projeo sobre o edifcio AT&T, Tribeca, NovaYork/EUA, Krzysztof Wodiczko, em 2 de novembro de 1984, entre 21h30 e meia-noite.

    Il. 68 Untitled (After Walker Evans #3) , Sherrie Levine, 1981, fotografia.

    Il. 69 Ona Pintada I (Jaguar I) , Leda Catunda, 1984, acrlica sobre cobertor, 185cmx 150cm, MAC-USP.

    Il. 70 Sem Ttulo , Ricardo Basbaum, 1985, interveno urbana com adesivos,dimenses variadas. Registro fotogrfico de Pedro Tebyria.

    Il. 71 Os Cem , Jac Leirner, 1986, dinheiro com estrutura de poliuretano, 7cm x 15cmx 300cm (cada mdulo), Reproduo fotogrfica de Romulo Fialdini.

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    SUMRIO

    Introduo .......................................................................................................... 1

    1 A construo de uma conscincia histrica na produo terica da artedurante os anos 1980: em busca da especificidade de uma gerao ................ 34

    1.1 A identidade histrica proclamada da dcada: o sentimento de Zeitgeist ................................................................................................................. 39

    1.1.1 O papel das grandes exposies internacionais do incio dadcada na constituio de um esprito da poca ............................... 411.1.2 O projeto poltico-esttico de Zeitgeist ...................................... 481.1.3 Reverberaes no meio artstico brasileiro e a contribuionacional para o debate em torno do esprito da poca ..................... 54

    1.2 A auto-referencialidade de um perodo: em torno da Gerao 80 ......... 62

    1.2.1 A questo geracional nas exposies europeias do incio dadcada .................................................................................................... 641.2.2 Variaes no uso do conceito de gerao, a partir das exposiesreferentes produo pictrica brasileira, entre 1982 e 1983 ............. 671.2.3 A exposio-marco Como vai voc, Gerao 80? e o surgimentode um conceito-sntese ........................................................................... 74

    1.3 A dialtica entre as dcadas: conceito versus expresso ........................ 81

    1.3.1 Estratgicas tericas, ideolgicas e polticas, a partir da produo pictrica da dcada de 1980 .................................................. 831.3.2 Dialtica entre as dcadas na crtica de arte brasileira dos anos1980 . ....................................................................................................... 881.3.3 Anlises posteriori da dcada de 1980 e a oposio ideolgica

    entre conceito e expresso ..................................................................... 96

    2 A teoria crtica da dcada de 1980 frente ao arquivo imagtico da histria: anoo de apropriao como operatividade e prtica artstica .......................... 101

    2.1 O debate em torno da teoria ps-modernista: o fim da vanguarda? ..... 107

    2.1.1 A transvanguarda como nica vanguarda possvel ............. 1092.1.2 O debate acerca do ps-modernismo ....................................... 1152.1.3 O projeto poltico de October e as relaes estabelecidas com o

    pensamento ps-modernista ................................................................. 123

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    2.1.4 A morte da vanguarda e a dimenso institucional da artecontempornea como preocupaes crticas no Brasil ....................... 134

    2.2 A abordagem historicista da arte: prs e contras do pluralismo .......... 1422.2.1 Nomadismo cultural e ecletismo estilstico como princpiosartsticos frente ao reservatrio imagtico dos anos 1980 .................. 1442.2.2 Reverberaes discursivas e prticas artsticas no contextobrasileiro .............................................................................................. 1532.2.3 Apropriao e alegoria como prticas artsticas na dcada de1980 ...................................................................................................... 173

    Consideraes Finais ..................................................................................... 187

    Anexos I Textos........................................................................................... 206

    Anexos II Tabelas ........................................................................................ 241

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    Introduo

    O passado , tambm, fico do presente. 1

    A escrita da histria consiste em uma relao temporal que se institui entre um

    passado a ser analisado e o presente que suscita a investigao (estando implcita a umainstncia futura em latncia). Sendo assim, se for correto afirmar que cada poca elegeo(s) passado(s) que lhe conv()m, evidente est que a prtica da histria permite no sconhecer aquilo que ocorreu num dado momento, como tambmrefletir sobre o queest acontecendo , no instante mesmo em que essa relao se estabelece. Ou seja, tal prtica no s tece, estrutura, constri um discurso sobre o passado, mas igualmenterefora umlugar , um ponto de vista, o presente que sequer possvel. No seria um

    acaso, ento, que entre as inumerveis (re)avaliaes artsticas ocorridas nos ltimosanos, muitas delas tenham sido dedicadas exclusivamente arte produzida na dcada de1980, seja nos Estados Unidos, na Europa, ou no Brasil. Exposies, catlogos,monografias, reedio de textos, revistas especiais, mesas-redondas, teses; mais do que

    1 CERTEAU, Michel de.A escrita da histria [1975]. Traduo de Maria de Lourdes Menezes.2 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2008, p. 21.

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    nunca, tornou-se necessrio e urgente o propsito (projeto) historiogrfico de repensar o perodo.

    Pode-se logo constatar que se trata de um daqueles momentos diante dos quais difcil permanecer indiferente. Tanto as pessoas que viveram aqueles anos, quanto asmais jovens, que apenas tardiamente tomaram conhecimento daquilo que se pensou, produziu ou transcorreu na dcada de 1980, apresentam uma tendncia a assumir

    posicionamentos claramente parciais sempre que a ela se referem, muitas vezes a partirde leituras e interpretaes pr-concebidas, que se estabeleceram de modo determinante,seja na histria, seja na memria coletiva. As nuanas de opinio, assim, transitam da

    negao compulsria, aludindo-se dcada como uma poca a ser esquecida, atmesmo a certa fascinao, sendo percebida com grande nostalgia, em relao quilo quese viveu e igualmente ao no vivido. Esses sentimentos contraditrios manifestam-se e podem ser identificados em diferentes esferas: poltica, economia, filosofia, moda,teatro, msica, cinema, televiso, literatura, artes visuais, comportamento, etc. A ttulode exemplo, pode-se citar o epteto de dcada perdida a ela particularmente atribudono Brasil, devido ao fato de compreender um perodo histrico marcado por estagnao

    econmica, elevados ndices de inflao e desemprego, alm de perda do poder deconsumo da populao, enquanto na Europa e Estados Unidos ocorria processo inverso,tendo-se o acelerado crescimento econmico das naes capitalistas como uma dascaractersticas mais marcantes do decnio. Por isso, igualmente considerada, atmesmo no complexo contexto econmico brasileiro, como uma poca em que a arteesteve fortemente submetida aos interesses do mercado, a partir do retorno generalizado(e comemorado) da pintura, cujos preos e vendas atingiram patamares mundialmente

    inditos, tanto em relao aos trabalhos de artistas chamados emergentes quanto nosleiles de pinturas dosmestres impressionistas e ps-impressionistas.

    Outro aspecto a se ponderar que o afastamento histrico tem favorecido, emalguns casos, o desenvolvimento de uma compreenso distinta de fatos e posicionamentos que, no calor da hora, foram apreendidos a partir de uma perspectivamais localizada, na maior parte das vezes, matizados por forte impulsividade,entusiasmo generalizado por mudanas (mais do que desejadas), alm de considervel

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    radicalidade nas posies tericas adotadas isso sem esquecer-se da peculiar ironiaque marcou, em geral, aqueles anos. Desse modo, tem sido importante a diferenciao

    entre aidentificao da historicidade dos discursos de poca por meio da consulta sfontes primrias e suaanlise crtica distanciada atravs da construo histrica propriamente dita , evitando-se assim que a histria constitua-se apenas como simplesrepetio daquilo que representou o debate ideolgico (explcito) de um perodo dado.A partir desse posicionamento revisionista o que constitui para ns uma primeirahiptese de trabalho , tem sido corrente o argumento de que certas conjunturas polticas e econmicas atuais, bem como transformaes na ordem do sistema das artes,tiveram sua origem num processo de mdia e longa durao iniciado na dcada de 1970, processo este que teria adquirido corpo e gerado grande repercusso durante os anos1980, para s recentemente, nas duas ltimas dcadas, constituir, em efetivo, diretrizes easpectos de grande representatividade no cenrio mundial. Ao que parece, enfim, adcada de 1980 passou a ser compreendida como um problemtico perodo de transio,em que questes essenciais, trazidas tona durante os anos 1960 e 1970 em termos polticos, sociais, econmicos e culturais , teriam sido reelaboradas e confrontadas comformas especficas de apreenso do passado histrico e com as novas exigncias de umcontexto cada vez mais globalizado.

    So essas perspectivas atuais, em especial, que inicialmente nos interessam, seja pelo modo como abordam e iluminam novos aspectos identificados na arte produzida eno contexto mais amplo da dcada de 1980, seja pela constatao de que em certosmomentos apresentam diferenciaes em relao ao debate crtico da poca, enquantoem outros continuam a reforar algumas leituras historicamente estabelecidas.

    Acreditamos que o contato com essas iniciativas nos permite assumir como objetivo oconfronto investigativo-reflexivo tanto com a estrutura e o ncleo ideolgico em tornoda diversidade de discursos provenientes do perodo em questo, no mbito expandidoda crtica de arte e da prtica curatorial (a importncia devoltar-se efetivamente para as

    fontes primrias ), quanto com o modo como esses discursos tm sido interpretados eredimensionados (ou no) medida que sua historicidade vem sendo estruturada atravsde uma pluralidade de estratgias metodolgicas e posicionamentos crticos. Nesse

    sentido, partiremos de um levantamento prvio de algumas dessas abordagens recentes,

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    separando-as entre as propostas ocorridas em mbito internacional e aquelasdesenvolvidas no Brasil, para averiguar a relao por elas assumida frente arte e

    teoria da dcada de 1980. Em ltima instncia e de modo sucinto, pretendemos tambmexaminar de que modo a produo artstica brasileira, a partir do recorte especfico proposto, foi e vem sendo considerada em relao ao contexto global de apreenso ecirculao da arte contempornea, seja c (olhar de dentro para fora) ou l (de fora paradentro).

    Assim, na primeira dcada do sculo XXI ocorreram importantes propostas de(re)avaliao da produo artstica e do contexto da dcada de 1980, motivadas por

    questes atuais do sistema de arte, que, passados mais de vinte (ou trinta) anos, pareceagora reivindicar uma necessria retomada do perodo. Por isso, todas as principaisiniciativas aqui analisadas insistem, nas mais diferentes modulaes, eminstituir umaviso histrica para os anos 1980 , rearticulando alguns aspectos que nortearam odebate crtico e a produo curatorial do decnio. E embora haja pontos de contato entretais aes, cabe reforar que segue prevalecendo a condio histrica de que(re)avaliaes ocorridas no Brasil concentram-se apenas na arte nacional, enquanto as

    propostas internacionais procuram abordar uma noo de arte Ocidental centralizadana produo norte-americana e europeia, desconsiderando completamente a arte brasileira (exceto pela mostra realizada no Porto, Portugal, mas que em si, sobcircunstncias mais amplas, no representa uma mudana realmente expressiva dessasituao), bem como a produo em geral do que na poca chamou-se Terceiro Mundo.

    A partir desses aspectos, entre 2003 e 2009, quatro foram as principais proposies internacionais voltadas para a avaliao crtica dos anos 1980. A primeiradelas, e mais importante, por claramente haver motivado a realizao das demais,ocorreu com o lanamento de duas edies especiais da revista Artforum International ,em maro e abril de 2003, em celebrao ao 40 aniversrio da publicao, sob osintomtico ttulo The 1980s/Now theyre History [Anos 80/Agora eles soHistria]. O conjunto das duas edies compreendeu um amplo dossi sobre aqueladcada: ensaios a respeito de suas principais etapas e caractersticas histricas,realizao de entrevistas com artistas que adquiriram destaque na poca, conjuntamente

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    a comentrios de outros, pertencentes a geraes posteriores, e que reconheciam ainfluncia do perodo sobre suas respectivas produes, cronologia histrica detalhada e

    a realizao de duas mesas-redondas com crticos e artistas. Apesar de assumir a cenanorte-americana como parmetro, dedicando-se quase que exclusivamente a ela, ainiciativa representou o primeiro e mais amplo saldo disponvel sobre o assunto,debruando-se sobre a diversidade de ferramentas crticas e estticas da poca.

    Il. 1 e Il. 2 Capas das edies especiais da revistaARTFORUM International , 40th AnniversarySpecial Issue, The 1980s: Part One, XLI, n. 7, March 2003; The 1980s: Part Two, XLI, n. 8, April 2003.

    Para o editor da revista, Jack Bankowsky (no cargo de 1992 a 2003),reconhecendo que a proposta de Artforum constitua uma espcie de rascunho parauma histria ainda a ser escrita,

    A verdade maior que os anos 80 permanecem uma espcie de ferida aberta e noapenas em termos do resduo txico da ganncia e do glamour (o excesso do clich jornalstico), mas simplesmente devido proximidade da dcada: h um aspectotraumtico, para o processo de entrar em acordo com um perodo cujosdesenvolvimentos, como observou [Jeff] Wall, esto ainda em desenvolvimento.2

    2 BANKOWSKY, Jack. Editors Note. In:ARTFORUM International , 40th AnniversarySpecial Issue, The 1980s: Part One, XLI, n. 7, p. 27, March 2003. Traduo livre, a partir do original emlngua inglesa.

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    Il. 3 Pginas iniciais do debate The Mourning After [Depois do luto],ARTFORUM International ,40th Anniversary Special Issue, The 1980s: Part One, XLI, n. 7, March 2003.

    Na mesa-redonda intituladaThe Mourning After [Depois do luto] talvez amaior contribuio dessas duas edies , um grupo expressivo de crticos avaliou odebate sobre a morte da pintura e como o mesmo tornou-se recorrente ao longo dadcada. Partindo do diagnstico de Douglas Crimp (1944-), no textoThe End ofPainting [O fim da pintura, 1981], o filsofo e crtico norte-americano Arthur C. Danto

    (1924-), mediador do debate, afirmoava que a morte da pintura foi uma teseexcessivamente postulada, tendo muito menos a ver com o estado da arte em torno de1980 (...) do que com uma pesada atmosfera da teoria ps-moderna.3 Desse modo,sugeria que o debate suscitado por Crimp no incidia sobre trabalhos propriamenteditos, mas, mais acentuadamente, consistia numa tomada de posio terica, uma vezque o crtico, um dos editores da representativa revistaOctober , era fortemente

    3 Introduo mesa-redonda, por Arthur C. Danto. In: DANTO, Arthur C.; BOIS, Yve-Alain;DUVE, Thierry de; GRAW, Isabelle; REED, David; JOSELIT, David; SUSSMAN, Elisabeth. TheMourning After [Depois do luto. Livre traduo de Clia Euvaldo (com reviso de Isabel Lfgren ecolaborao de Carlos Zilio), ainda indita].ARTFORUM International , Op. cit., p. 207, March 2003.Essa era uma concluso comum entre todos os participantes da mesa-redonda e, apesar de discordaremem diferentes aspectos levantados no debate, no havia nenhuma posio realmente contrria produo pictrica. Deve-se considerar, nesse sentido, a ausncia de crticos ligados October que questionassem aqualidade daquela produo, como Douglas Crimp e Benjamin H. D. Buchloh embora Yve-Alain Boisestivesse presente, acabou assumindo uma posio muito mais pessoal nesse sentido (ou acabou seeximindo). O confronto mais direto permitiria avaliar em que medida os argumentos de Crimp tomadoscomo ponto de partida para o debate modificaram-se (ou no), a partir do distanciamento histrico.

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    influenciado pelas ideias do artista Marcel Duchamp (em seu desprezo pelo olho e pelamo do artista) e pelo filsofo alemo Walter Benjamin (com suas ruminaes sobre a

    arte e a reproduo mecnica). Era preciso tambm considerar, segundo Danto, queCrimp estava engajado na promoo do fenmeno da fotografia (em detrimento da pintura), pois acreditava que artistas que trabalhavam a partir dessemedium apresentavam uma forte implicao poltica em suas propostas, sobretudo em relao crtica s instituies do mundo da arte, como o museu.4 O curador David Joselit, partindo de alguns aspectos desenvolvidos pelo crtico Yve-Alain Bois (1952-), no texto para a mostra Endgame: Reference and Simulation in Recent Painting and Sculpture [Jogo Final: Referncia e Simulao na Pintura e Escultura Recentes], realizada em1986 (ver Anexos II), da qual Joselit foi o curador, e igualmente do ensaio A morte doautor , do filsofo francs Roland Barthes (1915-1980), questionava o argumento deCrimp, indagando-se:

    Se a morte da pintura da dcada de 1980 correspondeu morte do jogo chamadopintura moderna (e isso no de forma alguma evidente por si mesmo), essa morteseria ento tambm potencialmente um nascimento de um tipo diferente de jogo?5

    Some-se a essa considerao o adendo de Danto, ao alegar que a morte da pintura teria dado acesso vontade de poder irrestrita do crtico, e liberdade deinterpretao que a acompanhava.6 Assim, tanto quanto o reconhecimento de que a

    4 Cf.: CRIMP, Douglas.Sobre as runas do museu [1993]. Traduo de Fernando Santos. SoPaulo: Martins Fontes, 2005.

    5 In. DANTO, Arthur C.; BOIS, Yve-Alain; DUVE, Thierry de; GRAW, Isabelle; REED, David;JOSELIT, David; SUSSMAN, Elisabeth. The Mourning After, Op. cit., p. 208. Para Joselit, as tticas deapropriao poderiam evidenciar um deslocamento do descritvel [writerly ] para o legvel[leaderly ], constituindo novas regras para o jogo pintura, levando-se em conta ao mesmo tempo ainfluncia exercida pelas ideias do filsofo francs Jean Baudrillard (1929-2007), pois a noo desimulao fora um dos aspectos mais caractersticos da dcada de 1980. Contudo, essa no era umaconcluso comum entre os debatedores, considerando-se o argumento do historiador belga Thierry deDuve (1944-), como resposta imediata colocao de Joselit, ao afirmar quea expectativa de mudar asregras do jogo no necessariamente representa a mudana por completo desse mesmo jogo.

    6 Segundo Danto, a declarao O pintor est morto. Viva o crtico! encerra muito bem ainverso que foi anunciada pela teoria ps-estruturalista. J para Thierry de Duve, os crticos inclurama questo [da morte da pintura] na agenda porque ela fomentou sua vontade de poder o que hoje ainda um grande problema, argumentando que os pintores da dcada de 80 foram vtimas colaterais dos

    ataques a Greenberg que era o dogma reinante e ainda para muitos, reforando, por exemplo, que um mistrio intolervel para [Benjamin H. D.] Buchloh o fato de [Gerhard] Richter ser um grande artista

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    teoria adquiriu certa celebridade na dcada de 1980, houve uma maneira quasemonoltica de se referir ao perodo, seja desconsiderando sua pluralidade artstica, seja

    reduzindo a produo de arte aoreflexo dos desenvolvimentos polticos gerais, como se,em resumo, a pintura figurativa de carter expressivo da dcada fosse simplesmentefruto da era Reagan. A concluso geral do debate pode ser sintetizada nas falas deArthur C. Danto, para quem a verdadeira histria da arte da dcada de 80 ainda nocomeou a ser abordada, assim como, em sentido mais profundo, na afirmao deThierry de Duve de que o que permanecer da pintura, ou da arte, da dcada de 80ser, em longo prazo, produto da jurisprudncia esttica, no da teoria, argumentandoque bem possvel que o pr-requisito para lidar com uma histria da arte dos anos 80seja uma mudana de teoria que abra espao para o conceito de jurisprudncia esttica.A partir dessas consideraes, Yve-Alain Bois acentuou a urgncia em iniciar umacrtica muito necessria dessa recusa deliberada de julgar.7

    Em resposta provocao que concluiu o debate realizado por Artforum , nosanos seguintes possvel identificar um conjunto de exposies revisionistas realizadasna Europa (e no nos Estados Unidos, o que tambm sintomtico). A primeira delas

    ocorreu em Bale, Sua, sob o ttuloFlashback: Eine Revision der Kunst der 80er Jahre [Flashback: Revisitando a Arte dos Anos 80], em 2005 (ver Anexos II), tendo como principal mote a considerao de que todo aprofundamento em relao arte produzidanos anos 1980 s pode revelar que a mesma teria sido inconcebvel sem as experinciasseminais das dcadas anteriores, tanto quanto a constatao de que muitos projetosartsticos atuais constroem-se em constante dilogo com as realizaes artsticas daqueladcada. Segundo o curador suo Philipp Kaiser (1972-), a exposio foi concebida

    como um ensaio, uma instalao experimental aberta, com o propsito principal deassumir um olhar crtico em relao ao passado e, assim, traar uma imagem da

    sendo um grande pintor, e noa despeito do fato de ele pintar. Do ponto de vista neo-adorniano deBuchloh, a pintura devia estar morta, e ele exige do entrevistado de forma repetida e quase agressiva que justifique sua contradio. In. Ibid., pp. 208 e 268. [Grifos no original]

    7 Ibid., p. 270.

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    dcada de 1980 que, em certo sentido, representativa da arte do perodo, evitando o pluralismo sem causas do vale tudo.8

    Il. 4 e Il. 5 Capa do catlogoFlashback : Eine Revision der Kunst der 80er Jahre / Revisiting the Art ofthe 80s e Registro da mesa-redonda realizada em 18 de junho de 2005, Basel/Sua.

    Partindo de documentos da poca, a proposta levou em considerao a frmula binria, dialtica, que caracterizou o perodo, entre, por um lado, a pintura figurativaexpressiva, predominante em movimentos como a Transvanguarda e os Novos Fauvese, por outro, o crculo de crticos da revistaOctober , cuja repulsa em relao pinturaregressiva vinha ao encontro da defesa e promoo de artistas mais prximos ideia deuma continuidade das prticas conceitualistas. Porm, vistas em retrospecto, ambas astendncias, de uma forma ou de outra, fundamentaram-se na prtica de apropriao edesconstruo de imagens provenientes domass-media , o que, para o curador,

    evidenciava o fato de que as duas abordagens nada mais seriam que dois lados damesma moeda9, ou mesmo, que a forte oposio entre elas, em verdade, representaria

    8 Sendo uma tcnica de montagem cinematogrfica, flashback implica um ponto de observaoentre o aqui e o agora, a partir do qual ocorre a investigao das influncias artsticas. KAISER, Philipp.Introduction. In: KAISER, Philipp (cur.).Flashback : Eine Revision der Kunst der 80er Jahre / Revisitingthe Art of the 80s. Basel: Kunstmuseum Basel, Museum fr Gegenwartskunst, Hatje Cantz Verlag, 2005, p. 15. Traduo livre, a partir do original em lngua inglesa.

    9 Ibid., p. 17. Traduo livre, a partir do original em lngua inglesa.

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    uma manobra crtica para reforar a posio de Nova York como centro das pesquisasmais avanadas naquele momento, em detrimento da arte que era produzida na Europa

    Ocidental. O argumento principal da exposio, ento, concentrou-se na afirmao deque prticas pop-conceituais, como a apropriao, respeitando-se as ambiguidades edescontinuidades histricas, nunca foram abandonadas, nem nos Estados Unidos nemna Europa, passando a ser continuamente reformuladas no decorrer das dcadas, o que,em suma, colocava em xeque o argumento de uma regressividade dos anos 1980.

    Em consonncia com o argumento curatorial, uma mesa-redonda com crticos eartistas do mesmo modo que ocorreu nas edies especiais de Artforum evidenciou

    como certas caractersticas dos discursos crticos dos anos 1980 permanecem constantesnos dias de hoje. A crtica alem Isabelle Graw (1962-), por exemplo, questionava o pensamento oposicionista entre as dcadas de 1970 e 1980, enquanto seu conterrneo,radicado nos Estados Unidos, Benjamin H. D. Buchloh (1941-), reforava que no setratava de um problema de dcadas, mas de um grupo ou formao geracional, o que justificava a ideia de uma oposio.10 Desse modo, as falas de Graw e de Buchlohreferem-se, por um lado, ao questionamento frente reproduo de uma historiografia

    caracterizada pela polarizao entre arte conceitual e neoexpressionismo e, por outro, defesa da manuteno dessas mesmas abordagens (elaboradas h trinta anos). EnquantoBuchloh defendia que a prtica artstica conceitual era mais radical em suasconsequncias do que a pintura da dcada de 1980, Graw afirmava que a problemticano devia recair sobre omedium em si, mas em seus usos e abordagens. A discussoque se segue, refora as diferentes posies adotadas:

    John M. Armleider: (...) Certos artistas representam determinadas conquistas, mas vinteou cem anos depois, um aspecto diferente de seu trabalho pode, de repente, tornar-serelevante. A descrio linear da histria apenas uma forma de leitura. A realidade dosanos 1980 nada tem a ver com a forma como pensamos aquela dcada. E isso queestamos debatendo hoje. Ns no estamos reconstruindo a dcada de 1980, mastentando descobrir o que ela pode representar na atualidade. bizarro acreditar que adcada de 1980 consistia apenas em pintura. Havia tantas prticas diferentes, basta

    10 ARMLEDER, John M.; BUCHLOH, Benjamin H. D.; BTTNER, Werner; GRAW, Isabelle;KNIG, Kasper; KOETHER, Jutta; RUFF, Thomas; KAISER, Philipp (moderator). The 80s Are in OurMidst. In: Ibid., p. 23. Traduo livre, a partir do original em lngua inglesa.

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    pensar oboom da fotografia ou de artistas como Peter Halley. No curto perodo detempo de uma exposio, pode-se ativar todas essas lembranas e apresent-las, a partirde certa perspectiva.Isabelle Graw: Desenvolvo frequentemente um jogo com amigos em Nova York, queconsiste em lembrar nomes de artistas que eram ubquos nos anos 1980, mas que agoraesto completamente esquecidos. A construo retrospectiva da dcada brutal, porqueest baseada em excluso.John M. Armleder: H duas maneiras diferentes de determinar perodos. Tendemossempre a querer saber como era antes para que possamos ver como mudou depois. Como objetivo de desenvolver uma ideia sobre os anos oitenta, talvez fosse melhor perguntar sobre a dcada de noventa. Vamos tomar Daniel Buren para ilustrar o quequero dizer. Nos anos setenta, ele no o mesmo que nas dcadas de oitenta ounoventa. Se se segue uma construo linear, ento preciso perguntar como seutrabalho mudou.Benjamin H. D. Buchloh: Buren em 1970 como Picasso em 1912, e em 1980, como

    Picasso em 1930. Na dcada de 1990, Buren como Picasso nas dcadas de 1950 e1960. Se eu penso que Buren melhor artista? Sim, com certeza. Absolutamente, at1975.John M. Armleder: Meu objetivo no foi estabelecer um valor moral. H umatransformao no trabalho que acho interessante.Benjamin H. D. Buchloh: No uma questo moral, mas de esttica. O que me interessa o que uma prtica esttica significa naquela poca.Isabelle Graw: Mas, para alm da reconstruo sempre aproximada de certas condies,critrios estticos mudam com o tempo, em referncia a situaes cambiantes.11

    Desse modo, percebe-se que a mesma problemtica explicitada na mesa-redonda

    de Artforum reaparece na realizada porFlashback , reforando que a questo comohistoricizar a dcada de 1980? , intimamente atrelada condio da jurisprudnciaesttica no contexto contemporneo, apresenta-se como dado crucial para qualquer pesquisa que se prope a abordar o perodo. Em 2006 esse ponto de vista centro-europeu (alemo-suo) expresso emFlashback foi ressaltado ainda mais com arealizao da mostra Anos 80: Uma Topologia , no Museu Serralves, no Porto, Portugal(ver Anexos II), organizada pelo curador alemo Ulrich Loock (1953-), que estudou naKunstakademie de Dsseldorf e foi diretor da Kunsthalle de Berna durante a dcada de1980. Com a exposio, o curador props-se no s a delinear uma topologia, mas aapresentar um ponto de vista singular sobre o perodo, sem que o recorte se pretendesserepresentativo da dcada como um todo. Por isso, optou por excluir paradigmaticamentetodas asestratgias de legitimao reconhecidas e consagradas na dcada de 1980, oque vale dizer, a maior parte dos pintores atuantes no perodo, sobretudo aqueles ligados

    11 Ibid., pp. 54-57. Traduo livre, a partir do original em lngua inglesa.

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    transvanguarda, ao neoexpressionismo e cena norte-americana, o que em suma, maisdo que constituir um ponto de vista singular, encobria a reproduo do discurso

    crtico de alguns tericos ligados revistaOctober .12

    Il. 6 e Il. 7 Capa do catlogoAnos 80: Uma Topologia e Imagem do projeto expogrfico de UlrichLoock

    Embora tenha recusado abordar certos movimentos e tendncias mais prximos

    do mercado de arte, Loock acreditava, paradoxalmente, que o interesse cada vezmaior sobre a dcada de 1980 recaia sobre o fato de ter sido um perodo de euforiaeconmica, prximo ao que se denomina atualmente comomundo globalizado da arte ,onde as especificidades da criao artstica e da reflexo por ela suscitada muitas vezesse dissolvem nos momentos de apresentao e representao social dos eventos(influncia do mercado, do colecionismo, do aparecimento constante de novos artistas,

    12 Problemtico que, numa reao anti-moderna, um importante conjunto de artistas tenhatomado, em finais da dcada de 70 e incio da de 80, a deciso de opor certezas recm-adquiridas a umasituao poltica e cultural de ausncia de evidncia. Problemticas so as tentativas de reconquistar terrafirme atravs de movimentos violentos visando um regresso a paradigmas locais e regionais, a adoo de padres de figurao, a reintroduo de solidez tctil e visual (cor e matria), a reanimao de umamitologia do artista (masculino) e a confiana em categorias estabelecidas da arte, em especial a pintura.Igualmente problemticas, e em boa verdade no muito diferentes das anteriores, so as prticas de umacnica ou provocadora, seno apenas visceral, revolta contra verses do moderno que tinham sidoestabelecidas nos anos 60 e 70. LOOCK, Ulrich. Introduo: a evidncia da arte. Traduo, a partir doingls, de Rui Parada-Cascais. In: LOOCK, Ulrich (ed.).Anos 80 : uma topologia. Porto: Fundao deSerralves, 2006, p. 12. Cabe ressaltar que o nico artista brasileiro participante dessa exposio foi Tunga(1952-).

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    da profuso de feiras de arte, bienais e grandes exposies coletivas). Desse modo, osanos 80 so particularmente privilegiados, uma vez que anunciam uma significativa

    viragem no curso da histria, vindo inquestionavelmente a pr em questo a validade predominante das constelaes polticas, sociais e culturais do Ocidente.13 Propondo-se a considerar as obras no como documentos histricos, mas realidades queatravessam a histria, Loock acreditava, ento, que a apropriao poderia ser vistacomo uma das caractersticas mais marcantes da dcada, por esta prtica ter encontradoformas de recuperar a imagem depois da anterior viragem lingustica da arteconceitual, reconhecendo ser esse o contributo mais importante dos artistas dagerao (americana) Pictures.14

    Por fim, nos anos de 2008 e 2009, em Grenoble, Frana, desenvolveu-se a quarta proposio revisionista, atravs da realizao de duas exposies (acompanhadas dedois catlogos, contendo uma representativa antologia crtica da dcada de 1980),intituladas Espces dEspace: Les Annes 1980 [Espcies de Espao: Os Anos 1980] e

    Images et (Re)Prsentations: Les Annes 1980 [Imagens e (Re)Presentaes: Os Anos1980], ambas tendo Yves Aupetitallot (1955-) como curador (ver Anexos II).

    Recusando, assim como suas antecessoras, uma concepo curatorial que tivesse pororigem uma seleo de artistas e obras a partir de critrios de excelncia erepresentatividade atribudos pelo mercado de arte e pelas instituies, ou mesmo, poroutro lado, a preocupao de resgatar artistas ignorados ou rejeitados pela histria,Aupetitallot optou por uma pesquisa que encontrasse as razes nas questes tericas da

    13 A histria no um espao fechado sujeito ao presente como seu antecedente. Antesencontramos na histria obras e momentos que superam distncias temporais para alcanar o nosso prprio tempo e que desse tempo retiram o seu real significado. Contemporneo no , ento, tudoaquilo que ocorre no nosso prprio tempo, mas antesaquilo que faz sentido no nosso tempo . Trata-se dealcanar um presente no nosso prprio tempo. Ibid., p. 11. [Grifo nosso]

    14 A imagem na arte dos anos 80 j no a imagem contra a qual a arte minimal e conceitual seinsurgiu. No a imagem da representao. reproduo (de novo o que j est a) ou reorganizao(tudo menos o que j est a). Ao recusar a representao, ao reclamar a realidade, duas distantesconcepes artsticas encontram-se. Ibid., p. 14. Ulrich Loock assumia, desse modo, uma posioclaramente americanista, em concordncia com os argumentos dos crticos ligados October , como jressaltado.

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    poca e que pudesse permitir tornar inelegvel o conjunto considerado15, chegando,enfim, a duas temticas principais: as relaes entre espao pblico e espao privado

    ou comunitrio e as questes referentes a imagens e representaes .

    Il. 8 e Il. 9 Capas dos catlogosEspces dEspace: Les Annes 1980 e Images et (Re)Prsentations:Les Annes 1980

    Durante a dcada de 1980, frente ao discurso ps-modernista e ao proeminentefim das narrativas, muitos artistas esforaram-se em enfatizar a necessidade dereativao da esfera pblica, reduzida ao privado e ao domstico. Para Aupetitallot, hno perodo uma modificao, ou mesmo uma exausto, da dialtica entre pblico eprivado, uma vez que a dcada marcada pela emergncia de umespao miditicoonipresente , que conduziria apario e ascenso da internet. Em decorrncia, graasao fluxo contnuo de imagens e representaes investidas num crescente processogeneralizado de espetacularizao da sociedade, surgiria um terceiro espao,estimulando o deslocamento dos limites formais e perceptuais da produo artstica emdireo a uma afiliao mais prxima da indstria cultural e dos chamados novos

    15 AUPETITALLOT, Yves. Avant-propos. In: AUPETITALLOT, Yves (ed.).Espces despace :les annes 1980, premire partie. Grenoble: Magasin, Les presses du rel, 2008, p. 9. Traduo livre, a partir do original em lngua francesa. Ver tambm: Id.Images et (re)prsentations : les annes 1980,seconde partie. Grenoble: Magasin, Les presses du rel, 2009.

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    media. As imagens so ento confiscadas e submetidas a modos e ferramentas de produo diversificadas, o que reforaria a ideia da apropriao como a mais

    importante prtica artstica do perodo, uma vez que essas imagens midiatizadas passavam a ser reproduzidas, copiadas, transformadas, simuladas, mediante arecorrncia a procedimentos comuns s vanguardas histricas, como a colagem, afotomontagem, a assemblagem, etc. A abordagem francesa, desse modo, ao considerartextos de poca (e discursos neles contidos) como parmetro investigativo, veiosintetizar, afinal, as principais questes temticas da dcada de 1980. Junto s outrastrs iniciativas anteriores, constituiu umcorpus representativo para o entendimento maisamplo da arte daquele perodo, nas suas mais variadas dimenses (crtica, esttica,institucional, poltica, social, filosfica, histrica, etc.).

    Em relao s (re)avaliaes da arte brasileira dos anos 1980 ocorridas na ltimadcada, por sua vez, ressaltam-se trs propostas principais: a exposio2080 , sobcuradoria de Felipe Chaimovich (1968-), realizada no Museu de Arte Moderna de SoPaulo, em 2003, mesmo ano da edio especial de Artforum (ver Anexos II);Onde EstVoc, Gerao 80? , sob curadoria de Marcus de Lontra Costa (1954-), ocorrida no ano

    seguinte, no Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro (ver Anexos II); e, em2007, a mostra80/90, Modernos, Ps-modernos, Etc. , sob curadoria de Agnaldo Farias(1955-), no Instituto Tomie Ohtake, So Paulo, a partir do ciclo de exposies MeioSculo de Arte Brasileira (ver Anexos II).

    Il. 10 e Il. 11 Capa do catlogo2080 e Vista com a referncia curatorial s quatro exposies histricas

    da dcada de 1980

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    Ao mesmo tempo em que propunha estabelecer um olhar retrospectivo para adcada de 1980, o curador de2080 tinha como objetivo organizar uma ao conjunta

    com o setor educativo do museu, argumentando que a mostra deveria, por natureza, serdemocrtica (era o ano em que o presidente Luiz Incio Lula da Silva assumia seu primeiro mandado), isto , voltar-se para um pblico socialmente heterogneo(retomando o discurso de que a arte brasileira dos anos 1980 estava atrelada noo dedemocracia, devido reabertura poltica ocorrida naquele momento). Assim, desde asua concepo, a mostra apresentou um carter didtico que concorria com a prpriainiciativa de avaliao do perodo. Na pesquisa que realizou, Felipe Chaimovich procurou logo de incio compreender o sentido do termo Gerao 80, para, a partirdele, definir uma abordagem historiogrfica para a dcada, o que o levou a considerarcomo paradigma curatorial a importncia de quatro exposies histricas:PinturaComo Meio (So Paulo, 1983),Como Vai Voc, Gerao 80? (Rio de Janeiro, 1984),

    Grande Tela (So Paulo, 1985) e Imagens de Segunda Gerao (So Paulo, 1987). A partir do cruzamento das principais questes suscitadas e do levantamento dos artistas brasileiros que participaram das mesmas (reforando o papel desempenhado pelasmostras coletivas na divulgao de tendncias e no desenvolvimento de abordagenstericas), o curador evidenciou a compreenso de Gerao 80 como um termo que

    designa uma agenda de questes num debate amplo: nacionalidade federativa brasileiraversus globalizao no Fim da Guerra Fria, incluso de todas as mdias e estilosexperimentais na categoria de arte contempornea, exerccio programtico da pinturacontra qualquer tipo de excluso.16

    Por ter sido uma mostra encomendada pelo MAM-SP, a seleo de obras pretendeu explicitar a representao da histria da arte em colees consagradas, entre

    elas a do prprio museu paulistano e a Coleo Gilberto Chateaubriand, em comodatono MAM-RJ, o que, em ltima instncia, objetivava demonstrar a importncia dascolees pblicas para a produo da histria da arte nacional.17 Entendendo que a

    16 CHAIMOVICH, Felipe (cur.).2080 . So Paulo: Museu de Arte Moderna, 2003, p. 12.

    17 Segundo o curador, o modelo de Gerao 80 baseado nas quatro coletivas mostrou-secoerente com as aquisies de arte brasileira dos anos 80 em duas colees dereconhecido mrito .

    Corresponde imagem pblica representada por ambos museus. Complementaria ainda que a seleode 2080 democrtica no sentido de evidenciar a imagem de Gerao 80 formada porinstituies

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    exibio pblica de patrimnios artsticos reflete os poderes polticos a que os museusservem, Chaimovich afirmava, sem de fato problematizar tal considerao, que o

    curador deve auxiliar o pblico a buscar em sua histria os termos de comparao paraa experincia da arte como continuidade e ruptura.18 O nmero de crticas endereadasa esses critrios, falta de qualidade esttica de muitos dos trabalhos expostos (emdetrimento de outros, em posse de colecionadores particulares), reproduo dediscursos de poca (reforando certas abordagens histricas), contribuiu para que2080 reabilitasse no Brasil o debate pblico acerca do contexto e da arte produzida nos anos1980. A realizao de uma mesa-redonda, com artistas e curadores atuantes na dcada, pareceu ter sido uma tentativa de conferir outro status exposio. Rebatendo as crticasendereadas curadoria, Marcus de Lontra Costa argumentaria que

    A dcada de 80 foi perdida para quem no soube viver. (...) foi uma poca em que o pascomeou a se redescobrir. Foi uma luta intensa de reconquista democrtica. Havia umcerto romantismo, uma certa expectativa de que passado o grande pai repressor daditadura, o pas fosse maravilhoso. Aprendemos que no . Existia um pai repressor eesse pai impedia que vssemos nossos prprios defeitos. Nesse sentido, a dcada de 80foi uma dcada de conscincia brasileira. Aprendemos o que no , aprendemos comnossos erros. Demoramos trs eleies para perdermos o medo. Tivemos fracassos edecepes com a classe poltica. (...)

    Na questo das artes plsticas, h uma terrvel m vontade com o estabelecimentoterico, dito supostamente vanguarda, dos anos 80. Li algumas vezes que o discurso dosanos 80 no legitimado, no competente. O discurso produzido por uma crtica. Oque acontece que talvez a produo dos anos 80 no estivesse interessada naquelediscurso legitimado. Estaria interessada em outro tipo de discurso, que hoje ainda achovlido.19

    consagradas . Ibid., pp. 13 e 14. [Grifos nossos]. Essa relao entre arte dos anos 1980 einstitucionalizao de discursos crticos uma das principais problemticas da mostra 2080.

    18 A curadoria de uma exposio coletiva numainstituio oficial da cultura transforma umconjunto selecionado de obras de arte em representao de uma poca, assim como a aquisio deacervos pblicos permanentes cria parmetros interpretativos sobre o valor do passado. Ibid., pp. 10 e15. [Grifos nossos]

    19 COSTA, Marcus de Lontra. Transcrio da fala realizada em 13 de maro de 2003.CHAIMOVICH, Felipe (mediador); QUILA, Luiz; COSTA, Marcus de Lontra; ROMAGNOLO,Sergio; CHIARELLI, Tadeu. In:2080 [mesa-redonda]. Publicao complementar ao catlogo. So Paulo:Museu de Arte Moderna, 2003, p. 5. Esse debate tambm pareceu reforarcerta viso da arte da dcadade 1980, a partir da escolha dos integrantes da mesa-redonda.

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    Embora os critrios metodolgicos adotados pelo curador e pela instituiofossem foco principal das crticas a que menciona Marcus de Lontra Costa, questes

    pertinentes abordagem historiogrfica do perodo, como a levantada pela crticaLisette Lagnado (1961-) Como historicizar o passado recente, sobretudo quando o perodo escolhido careceu de uma slida elaborao terica?20 procuravamredimensionar a discusso, aproximando-a do enfoque dado nos debates internacionais. fato que muitas crticas assumiam uma clara averso ao perodo, condenando osucesso ocasional, assim como a suposta falta de qualidade esttica daquela produo:

    Hoje, 20 anos depois daquela primeira exposio-exaltao, o que restou muito pouco,

    ainda mais se considerado relativamente. A maioria daqueles pintores ento endeusadosdesapareceu, e sua pintura aparece nos livros como um captulo de histria, no comoum exemplo de grande arte. As caractersticas de suas obras grandes dimenses, pinceladas gestuais, colorido berrante tm mais a ver com o esprito de poca do quecom a trajetria da tcnica. E os poucos que restaram, que seguiram em busca de umaobra consistente (alm de alguns como Leonilson, j morto), mudaram o estilo para umaclave bem mais contida e sria.21

    Contudo, para o artista Ricardo Basbaum (1961-) o problema era outro, no s pelo fato da proposta no fazer justia efervescncia e diversidade do perodo, mastambm porque haveria uma persistente influncia do mercado de arte na (re)afirmaode certos discursos de poca, salientando que, agindo-se desse modo,

    Cai-se na armadilha de acreditar que a verdade da produo artstica de um perodo daarte se d atravs do mercado, como se o mercado, em suas decises, fosse sempre umelemento referencial absoluto (argumento neoliberal que se faz presente na arte brasileira a partir dos anos 80, sobretudo, mas que, devido s condies locais de um

    20 LAGNADO, Lisette. 2080: o futuro da Histria. Intuito educativo predomina em exposio doMAM-SP sobre a arte brasileira dos anos 80. In:Trpico [publicao eletrnica]. Disponvel em:http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/1585,1.shl;2080 [mesa-redonda]. Op. cit., p. 25.

    21 De qualquer forma, no h unidade na gerao e o nico modo de reavali-la optando porcorte de contedo. A histria do surgimento dessa gerao respondia muito mais s circunstncias do que esttica. A Gerao 80 foi um fenmeno do campo dos costumes, uma moda lanada por galeristas e professores vinculados ao Parque Lage no Rio e Faap em So Paulo e amplificada por certa parcela daimprensa, naqueles anos em que os cadernos culturais dos grandes jornais tinham sido criados e procuraram tendncias para nomear em suas manchetes. PIZA, Daniel. Depois da festa. Os (poucos)sobreviventes da Gerao 80. In:Bravo! , n. 64, ano 6, janeiro 2003;2080 [mesa-redonda]. Op. cit., p. 18.

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    capitalismo e uma economia de mercado bastante problemticos, deve ser semprerelativizado).22

    esse debate ocasional e a conversa boca pequena ento, que parece defato promover uma anlise mais efetiva da dcada de 1980. Se a nfase sobre aspectoscomo retorno da pintura, prazer de pintar, retomada da democracia persistiam emmuitos desses discursos, a avaliao recorrente de que a maior parte dos jovens artistasque surgiram naquele momento desapareceram antes mesmo da dcada ter chegado aofim pode ser vista como a provocao principal para as duas outras exposies ocorridasem 2004 e 2007.

    Il. 12 e Il. 13 Capa do catlogoOnde Est Voc, Gerao 80? e Capa do material de apoio doPrograma Educativo do CCBB-RJ

    22 Do mesmo modo, Basbaum questionava a evidncia de que a exposio2080 j nascediscutida e comentada, quase que concluda, em forma de pacoto em revista de circulao nacional.Trata-se de uma estratgia de construo do evento, regularmente praticada, que deixa muito poucoespao para pens-lo, uma vez que, frente a tantas potncias da comunicao (patrocinador, museu,revista), a conversa que se quer mais intensa sobrevive apenas boca pequena entre aqueles que se posicionam como mais interessados no debate crtico, movimentao que no se expande com a mesma propulso. [comentrio referente ao fato da revista Bravo! publicar um conjunto de anlises, antesmesmo de a exposio ter sido inaugurada]. BASBAUM, Ricardo. 2080: muito mercado e pouca arte.A exposio do Museu de Arte Moderna de SP no faz justia aos trabalhos da Gerao 80. In:Trpico [publicao eletrnica]. Disponvel em: http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/1590,1.shl;2080 [mesa-redonda]. Op. cit., pp. 27-28.

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    Exatos vinte anos aps a inaugurao do paradigmtico evento ocorrido naEscola de Artes Visuais do Parque Lage, Marcus de Lontra Costa props-se a fazer o

    resgate histrico de um movimento cultural, a partir da realizao de outra mostra decarter explicitamente comemorativo, cujo ttulo tambm era uma pergunta retrica:Onde Est Voc, Gerao 80? . Ao faz-la, o curador pretendia ressaltar o argumento deque muitos dos jovens artistas participantes do evento realizado em 1984, com o passardas dcadas, tornaram-se presenas afirmativas, representantes inquestionveis nomeio artstico contemporneo brasileiro.23 Ao procurar validar a trajetria de um grupode artistas, Lontra Costa pretendia, em ltima instncia, tambm legitimar um discurso(que no era considerado por certos agentes do meio de arte comoverdadeiro comentrio crtico), tanto quanto validar sua prpria capacidade de ter apostado nosartistas certos, promovendo, portanto, a ampla manuteno dos discursos da poca.Dos anos 1980 para c, praticamente pouco mudou na sua abordagem crtica do perodo, como fica explcito no trecho seguinte:

    Entre o barroco e a pop, entre o drama e a comdia, essa nova gerao de artistassonhava com a rua, com o sucesso popular: o Brasil era a fonte de inspirao e dilogo ese a influncia dos movimentos artsticos internacionais do momento, como a

    transvanguarda italiana e o neoexpressionismo alemo, j se fizessem presente nas obrasdos artistas brasileiros, a verdade que aqui no se pintava a tradio e nas telas pintadas no transparecia em momento algum tensas relaes entre o Eu e o Mundo.Pintava-se pelo prazer, com a suave inocncia da infncia, um pouconaif e prenhe deromantismo e coragem. O momento era de extroverso e era preciso ocupar as ruas, osespaos, arte por toda parte, festa do olhar. Para isso era necessrio, antes de tudo,seduzir o espectador, envolv-lo na realidade da arte, fazer-se entender. Em consonnciacom os tempos atuais, com a sociedade ps-industrial e pela regncia da informao, osartistas incorporaram imagens domass media e a elas aliam cones da histria da arte,numa espcie de citao histrica onde os aspectos de comunicabilidade da obra de arteso mais valorizados do que os seus valores essencialmente plsticos.24

    23 Contudo, incluiu na mostra de 2004 artistas que faziam parte do coletivoCasa 7 CarlitoCarvalhosa (1961-), Fbio Miguez (1962-), Nuno Ramos (1960-), Paulo Monteiro (1961-) e RodrigoAndrade (1962-) , assim como o escultor Angelo Venosa (1954-), que no haviam participadooriginalmente do eventoComo Vai Voc, Gerao 80? .

    24 Nas artes, perpassava um sentimento de liberdade, um desejo de ser feliz, de pintar a vidacom cores fortes e vibrantes, valorizando o gesto, a ao. (...) um desejo de fazer da arte um local dasemoes, um caldeiro borbulhante de odores, prazeres e sensaes. Esse compromisso hedonista, essa

    nsia de ser feliz vai encontrar suas razes no desejo coletivo de participar, de integrar a coletividadedemocrtica que se sonhava. COSTA, Marcus de Lontra. Os anos 80: uma experincia brasileira. In:

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    Esse posicionamento acarretaria um nmero menor de crticas, se comparado aoconjunto de questes suscitadas por2080 , destacando-se a avaliao do crtico Luiz

    Camillo Osorio (1963-), ao afirmar que h uma reincidncia em enxergar aquelemomento apenas sob a tica da volta pintura, e esta como mera reao a um supostohermetismo da arte experimental. Comentaria, ento:

    Por que no mostrar artistas importantes que apareceram naquele mesmo contexto alguns participando inclusive da exposio do Parque Lage e que fugiram, nas suasobras individuais, do que se convencionou como um estilo gerao 80? Poderia citar, por exemplo, Eduardo Kac, Joo Mod, Jac Leirner, Nelson Felix, Ricardo Basbaum,Paulo Pasta, Mrio Ramiro, Beth Jobim, entre outros. No so estes nomes mais pertinentes para se pensar hoje a histria dos anos 80 do que uma srie de artistas

    escolhidos cujas obras ficaram presas ao passado e no fizeram nada de interessantedesde ento? Ser que o caso, ento, de se separar a gerao 80 dos anos 80, ecomear a pensar na dcada como algo mais plural e frtil para a histria da arte?25

    J na mostra organizada por Agnaldo Farias, com um aprofundamento terico ehistrico mais evidente (pelo menos no texto do catlogo, publicado posteriormente), ofoco da exposio recaiu principalmente sobre a seleo dos trabalhos, uma vez que ocrtico procurou tomar cuidado com a recorrente tendncia de associar a movimentaocultural desencadeada na passagem dos anos 1970 para os anos 1980 com a abertura

    poltica, evitando, assim, incorrer no equvoco de supor que a arte [dos anos 1980]seja um simples desdobramento do quadro poltico-social.26 Preocupou-se, ento, emevidenciar como um grupo de artistas surgidos na dcada de 1980 apresentou umdesenvolvimento considervel em sua produo artstica, ampliando a compreenso e adiversidade da arte contempornea brasileira. Farias considerou esse processo daseguinte forma:

    COSTA, Marcus de Lontra (cur.).Onde Est Voc, Gerao 80? . Rio de Janeiro: Centro Cultural Bancodo Brasil, 2004, p. 7.

    25 OSORIO, Luiz Camillo. Viso restrita de uma gerao. Exposio no CCBB no abre novas perspectivas de compreenso sobre a arte brasileira daquele perodo. In:O Globo , Rio de Janeiro, 26 julho 2004; FERREIRA, Glria (org.). Daniel Senise: cronologia crtica. In:Vai que ns levamos aspartes que te faltam : Daniel Senise. So Paulo: Pinacoteca do Estado de So Paulo: Imprensa Oficial doEstado de So Paulo, 2011, pp. 264-265.

    26 FARIAS, Agnaldo. Anos 80/90: um retrato em 3x4, a cores. In: FARIAS, Agnaldo (ed.).80/90, Modernos, Ps-Modernos, Etc . So Paulo: Instituto Tomie Ohtake, 2009, p. 17.

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    Uma avaliao da contribuio dessa gerao passa, em primeiro lugar, peloreconhecimento de que se a princpio a produo desse grupo, como j foi dito, eraoscilante, caudatria de tendncias internacionais, num segundo momento, quando adcada de 1980 j ia longe, ela operou uma efetiva mudana de qualidade da artecontempornea produzida no Brasil.27

    Il. 14 e Il. 15 Capa do catlogo80/90, Modernos, Ps-Modernos, Etc. e Imagem da pgina docatlogo, com registro da expografia

    Em suma, o crtico pretendeu destacar como um conjunto de artistas da dcadade 1980 passou de uma obra qualquer, secundria, derivativa, de eventual valordocumental para o momento em que se afirmava como detentor de uma linguagem particular28, questionando o modo como as duas exposies ocorridas anteriormentefizeram sua seleo de trabalhos29. Nisso, procuroudefinir uma leitura da dcada de1980, a partir da experincia dos anos 1990, optando por enfatizar apenas aqueles

    27 Talvez em razo do espao e da divulgao propiciados aos jovens artistas, a 18 Bienal, em1985, reconhecida como o momento da virada, ponto de inflexo a partir do qual os nossos artistas,colocados em confronto com colegas internacionais mais maduros, intensificaram a reflexo sobre seus prprios caminhos. Ibid., p. 57 e 59.

    28 Ibid., 87.

    29 Ver a detalhada anlise que Agnaldo Farias faz dessas exposies na nota 62 de seu texto.Ibid., pp. 123 e 125.

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    artistas que apresentaram um amadurecimento de sua produo ou, aqueles queforam legitimados institucionalmente, quase sempre em detrimento do reconhecimento

    alcanado por suas experincias iniciais na dcada de 1980. Para o jornalista FabioCypriano,

    O ponto central da mostra est justamente na seleo refinada do curador, queconseguiu provocar uma nova viso sobre a produo dessa gerao. surpreendente aquantidade de obras pouco conhecidas e, ao mesmo tempo, extremamente pertinentes aodesenvolvimento da potica de cada criador.30

    De uma exposio em que a seleo das obras apresentou-se bastantequestionvel, outra em que a qualidade esttica passou a ser a principal caracterstica,entre uma, que suscitou um intenso debate crtico seja por quais motivos forem , eoutra, em que pareceu predominar o silncio concordante, refora-se a pergunta: Hainda uma histria da arte da dcada de 1980 (no Brasil) por se fazer?

    Fica evidente, levando-se em conta os aspectos explicitados por tais propostasrevisionistas, o fato de que toda pesquisa que se propuser a abordar a arte produzida nadcada de 1980 deva necessariamente confrontar-se com o amplo e denso arcabouo

    terico do perodo, sobretudo no que diz respeito diversidade de discursos crticos preocupados com a legitimao de determinadas manifestaes artsticas. No entanto,ao faz-lo, preciso que se considere o lugar de fala daqueles por meio dos quais osdiscursos assumem uma dimenso pblica: o que est em jogo, em ltima instncia,mais do que apoiar ou recalcar certas tendncias estticas, miditicas ou mesmomercadolgicas, a capacidade de legitimao, a prpria autoridade do crtico em julgare estabelecer parmetros de diferenciao, na medida em que, segundo nossa segunda

    hiptese de trabalho, o julgamento desloca-se gradualmente da dimenso mais imediatada obra de arte como ocorria no contexto do modernismo para o campo mais amplodas prticas culturais na conjuntura cada vez mais globalizada da arte contempornea.

    30 Possivelmente, as falhas das mostras anteriores [2080 e Onde Est Voc, Gerao 80? ]serviram de auxlio para a realizao de80/90, Modernos, Ps-Modernos, Etc. (...), pois finalmente agerao 80 vista, de fato, sem os clichs costumeiros, com as mesmas obras de sempre. CYPRIANO,Fabio. Boa seleo resulta na melhor mostra sobre a Gerao 80. In:Folha de S. Paulo , Ilustrada, SoPaulo, 5 junho 2007; FERREIRA, Glria (org.). Daniel Senise: cronologia crtica. In:Vai que nslevamos as partes que te faltam : Daniel Senise. Op. cit., p. 276.

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    Desse modo, o papel e o imperativo do crtico tornam-se problemticos, uma vez queat mesmo sua prtica foi posta em crise.

    Neste contexto, em que a esfera de atuao do crtico apresenta-se em constantetransformao, uma das principais mudanas que poderiam ser evidenciadas nos anos1980 ocorreu no campo mais imediato onde esse profissional costumava exercer seu

    mtier o jornal , sobretudo com a ampliao dos suportes/canais de veiculao detextos. Se outrora a crtica de arte encontrou no jornal seulugar por excelncia o queconstitui, na opinio de alguns tericos, um verdadeiro paradigma (moderno) para aatividade , nas ltimas dcadas do sculo XX, esse tipo de produo de discurso

    gradativamente perdeu espao para o chamado jornalismo cultural, fenmeno este queno pode ser visto de modo isolado, mas como uma das muitas consequncias do processo de reformulao do meio jornalstico como um todo, frente s exigncias deum novo pblico leitor e concorrncia acarretada por outros meios de comunicao,em especial a televiso. Por isso, pode-se considerar a dcada de 1980 como um perodode transio, em que ainda possvel identificar a presena dos crticos de arte nascolunas semanais dos jornais, mas tambm atuando em outros peridicos, tais como

    revistas especializadas, sejam elas comerciais e/ou universitrias (acadmicas),catlogos de exposio e livros de artista. Mais do que um simples deslocamento desuporte, a emergncia desses novos espaos editoriais estimulou mudanas profundasna relao existente entre o crtico e o objeto de sua escrita, assim como frente ao perfilmais segmentado e em alguns casos, cada vez mais especializado de seu pblicoleitor.

    Mediante a disjuno dessas duas instncias crtica e jornal ocorridas nasltimas dcadas, a convico de que o exerccio da crtica estaria incondicionalmenteatrelado ao espao do jornal poderia induzir-nos a concluir que aguardamos, comalguma nostalgia, eminente extino da crtica de arte (de certo modo, em consonnciacom a declarao de tantos outros esgotamentos propagados durante os anos 1980).31

    31 Desde o final dos anos 1950, a produo contempornea de artes visuais despertou inmeros

    questionamentos entre os tericos, mas foi durante a dcada de 1980, em particular, que algumasreflexes comearam a ser delineadas, tanto no campo da teoria da arte, a partir da retomada da tese

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    Contudo, entendemos que a atividade crtica no se caracteriza, em essncia, por umsuporte, mas sim enquanto prtica de mediao. Se antes assumiam explicitamente o

    tom judicativo em seus textos, incitando um debate pblico acerca das obras de arte oque no necessariamente deixou de ser uma possibilidade , no contexto das ltimasdcadas, como j dito, acreditamos que muitos crticos atuantes na dcada de 1980voltaram-se para oexerccio da crtica enquanto prtica cultural . Desse modo, emcorrespondncia atuao de grande parte dos artistas contemporneos, esses tericosassumiram conscientemente a necessidade de pensar sua prtica como atividade hbrida,construda no cruzamento entre diversas esferas e campos do saber histria, filosofia,esttica, antropologia, sociologia, psicanlise, comunicao, etc. , redimensionando (e,muitas vezes, renegando) os parmetros fixos anteriormente desenvolvidos pela crticamodernista. Delinear com preciso as fronteiras entre crtica, histria e filosofia da artena contemporaneidade, enfim, passaria a ser uma tarefa cada vez mais rdua o que no nosso propsito aqui.