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Processo Penal II 1 Cometiment o do delito de menor potencial ofensivo Elaboração do termo circunstanc iado de ocorrência Audiência preliminar Composição civil dos danos, para crimes de ação privada ou pública condicionada à representação (artigo 74); Transação penal, para crimes de ação penal pública (artigo 76); Oferecimento de denúncia ou Audiência de instrução e julgamento (artigo 81) Resposta preliminar; Possibilidade de suspensão condicional do processo (artigo 89); Decisão sobre recebimento da denúncia ou queixa; Oitiva da vítima; Oitiva das testemunhas de acusação; Oitiva das testemunhas de defesa; Interrogatório;

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Processo Penal II

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Cometimento do delito de

menor potencial ofensivo

Elaboração do termo

circunstanciado de ocorrência

Audiência preliminar

Composição civil dos danos, para crimes de ação privada ou pública condicionada à representação (artigo 74);

Transação penal, para crimes de ação penal pública (artigo 76);

Oferecimento de denúncia ou queixa, se frustradas as medidas despenalizadoras.

Audiência de instrução e julgamento (artigo 81)

Resposta preliminar; Possibilidade de suspensão condicional do processo (artigo 89); Decisão sobre recebimento da denúncia ou queixa; Oitiva da vítima; Oitiva das testemunhas de acusação; Oitiva das testemunhas de defesa; Interrogatório; Debates orais; Sentença oral.

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1. Termo circunstanciado de ocorrência

O termo circunstanciado é um substitutivo do inquérito policial nos delitos de menor potencial ofensivo, sendo, basicamente, um registro de ocorrência um tanto mais detalhado.

Em regra, é incumbência da polícia civil, na figura do delegado, elaborar o termo circunstanciado, mas há estados da federação em que se tem a elaboração do termo circunstanciado – doravante TCO – pela polícia militar. Isto porque as funções destas polícias não são tão delimitadas pela CRFB, o que abre margem a esta possibilidade.

Se o crime exigir a representação da vítima, o ideal é que ela seja colhida neste momento de elaboração do TCO. O Fonaje, Fórum Nacional de Juizados Especiais, emitiu o enunciado 25, que dispõe que:

“Enunciado 25, Fonaje: O início do prazo para o exercício da representação do ofendido começa a contar do dia do conhecimento da autoria do fato, observado o disposto no Código de Processo Penal ou legislação específica. Qualquer manifestação da vítima que denote intenção de representar vale como tal para os fins do art. 88 da Lei 9.099/95.”

Ora, daí conclui-se que o mero comparecimento espontâneo da vítima à delegacia de polícia deve ser entendido como representação.

Para além disso, o STF, no informativo 456, fez público o julgado do HC 86.058, deixando claro que o simples fato de que a vítima não tenha se oposto ao fato da persecução, faz depreendido que ela representou. Veja:

“HC 86058/RJ. EMENTA:(...)V - Ausência de representação: suficiência da demonstração inequívoca do interesse na persecução criminal.1.A satisfazer a exigência da representação é suficiente a demonstração inequívoca do interesse na persecução criminal: precedentes.2.Tratando-se de notícia crime coercitiva, qual a prisão em flagrante, basta a ausência de oposição expressa ou implícita da vítima ou de seus representantes, de tal modo que se verifique, que a intenção sempre foi a de que se prosseguisse na persecução criminal do fato, propósito que se reforça, no caso, com a superveniente habilitação do menor como assistente de acusação.VI. Habeas corpus indeferido.”

2. Audiência preliminar

2.1. Composição civil dos danos

O primeiro ato da audiência preliminar é a tentativa de composição civil dos danos. A composição é cabível em qualquer crime, mas só terá o condão de extinguir a punibilidade em crimes de ação penal privada e ação penal pública condicionada à representação. Na ação penal pública incondicionada, não há efeitos (mesmo que já tenha existido entendimento, hoje inexistente, de que a composição civil dos danos, em crime de ação penal pública, retirava do MP o interesse de propor a ação penal).

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A composição civil dos danos é um requisito para a transação penal? RESPOSTA: Em regra, não será, pois são institutos apartados, mas há uma exceção, nos crimes ambientais: o artigo 27 da Lei 9.605/98 condiciona a transação à prévia composição dos danos ambientais. Veja:

“Art. 27. Nos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, a proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa, prevista no art. 76 da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, somente poderá ser formulada desde que tenha havido a prévia composição do dano ambiental, de que trata o art. 74 da mesma lei, salvo em caso de comprovada impossibilidade.”

De acordo com o enunciado 37 do Fonaje, o objeto da composição pode versar sobre qualquer valor ou matéria, tendo havido precedentes em que até pensionamento foi adotado como meio de composição. Veja:

“Enunciado 37, Fonaje: O acordo civil de que trata o art. 74 da Lei nº 9.099/1995 poderá versar sobre qualquer valor ou matéria (Nova Redação aprovada no XXI Encontro – Vitória/ES).”

A composição civil dos danos importa em renúncia ao direito de queixa ou representação1, na forma do artigo 74, parágrafo único, da Lei 9.099/95:

“Art. 74. A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.”

Pode haver a composição parcial dos danos?imagine-se que há três réus, e dois deles realizam a composição na medida de seu quinhão, enquanto o terceiro não adimple sua cota. Os dois que compuseram suas partes terão sobre si renunciada a queixa ou representação; e quanto ao terceiro?

RESPOSTA:O problema é que o artigo 49 do CPP estabelece que a renúncia a um dos concorrentes se estende aos demais co-autores do crime. Veja:

“Art. 49.  A renúncia ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do crime, a todos se estenderá.”

Mas a vítima ficará no prejuízo? Por isso, há dois entendimentos:

1º ENTD) o primeiro defende que, de acordo com o CPP, a renúncia é uma causa de extinção da punibilidade comunicável, e como não há nenhum dispositivo excepcionando esta regra, assim será: haverá a extinção da punibilidade para todos os co-réus.

1 Esta é a única oportunidade, na legislação processual, em que se vê o legislador falando em renúncia da representação, pois normalmente o que é cabível é a retratação da representação, e não a renúncia.

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Mas veja que a representação é destinada ao fato, e não ao autor do crime: representa-se contra o fato, e quem quer que esteja implicado será perseguido. Mas há um enunciado do Fonaje que subverte um pouco esta lógica. É o enunciado 33:

“Enunciado 33, Fonaje: Aplica-se, por analogia, o artigo 49 do Código de Processo Penal no caso da vítima não representar contra um dos autores do fato.”

A regra do CPP é que a representação seja direcionada ao fato criminoso, e não para os autores do fato. Porém, em sede de JECrim, este enunciado 33 determina que se aplique o artigo 49 do CPP, a fim de tornar comunicável a representação contra um só co-autor do crime, ou seja, haverá renúncia tácita, que extinguirá a punibilidade de todos.

2º ENTD) O segundo posicionamento, de Grandinetti, defende que a renúncia na Lei 9.099/95 tem como requisito básico a prévia composição dos danos da vítima; logo, sem composição, não há renúncia – não se estendendo, portanto, ao que não cumpriu sua parte na composição. Ademais, o artigo 75 da Lei 9.099/95 determina que se a vítima ainda não o fez, poderá representar assim que não for alcançada a composição civil dos danos:

“Art. 75. Não obtida a composição dos danos civis, será dada imediatamente ao ofendido a oportunidade de exercer o direito de representação verbal, que será reduzida a termo.Parágrafo único. O não oferecimento da representação na audiência preliminar não implica decadência do direito, que poderá ser exercido no prazo previsto em lei.”

3. Transação penal

A transação é uma proposta feita pelo MP, de cumprimento imediato, de pena não privativa de liberdade, em troca da não submissão a uma ação penal.

A fonte de inspiração da transação penal, no Brasil, veio do plea bargain, do direito norte-americano. No direito estadunidense, a defesa pode adotar uma de três linhas de atuação: alegar-se culpado (guilty), quando então espera benefícios por sua assunção, à discricionariedade do promotor público; alegar-se não culpado (not guilty), pretendendo combater e provar sua inocência; ou valer-se da nolo contendere plea, que é quando não se declara culpado, mas também não se declara inocente, pretendendo com isso não contender com a promotoria, ou seja, negociar uma solução, sendo que lá o promotor tem discricionariedade para até mesmo negociar a pena a ser aplicada. É deste nolo contendere plea, também chamado plea bargain, que surge a transação penal. Por isso, por estas origens, há corrente que entende que a imposição resultante da transação penal teria natureza de pena.

A questão, então, é delimitar qual seja o objeto da transação penal: esta resulta em cumprimento de pena, ou tem outra natureza?

Há duas correntes:

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1º ENTD) Geraldo Prado defende que não é pena, eis que não é admissível se cogitar da aplicação de uma pena sem o devido processo legal – pelo que seria uma medida administrativa.

2º ENTD) Ada e Bittencourt, de seu lado, defendem que é, sim, uma pena, sem que isso implique em qualquer inconstitucionalidade, na medida que esta proposta prestigia a ampla defesa constitucional: o acusado aceita se quiser, e sua aceitação não gera qualquer presunção de culpabilidade.

Vale mencionar, aqui, uma praxe corriqueira nos juizados brasileiros: a exigência de cestas-básicas como meio de transação penal. CESTA BÁSICA COMO OBJETO DA TRANSAÇÃO PENAL? É CABÍVEL?

1º ENTD) Damásio e Bittencourt entendem que não é cabível, pois, mesmo que seja uma medida de relevante aspecto social, o objeto da transação penal deve ser pena restritiva de direitos, e cesta-básica não é pena restritiva de direitos.

2º ENTD) Ada Pellegrini defende que, assim como dita o artigo 45, § 2º, do CP, é uma medida perfeitamente admissível. Isso é, para Ada, as cestas-básicas são um tipo de pena restritiva de direito:

“Conversão das penas restritivas de direitosArt. 45. Na aplicação da substituição prevista no artigo anterior, proceder-se-á na forma deste e dos arts. 46, 47 e 48. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)§ 1o A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)§ 2o No caso do parágrafo anterior, se houver aceitação do beneficiário, a prestação pecuniária pode consistir em prestação de outra natureza. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)(...)”

Mas vale dizer que boa parte da doutrina reputa inconstitucional este § 2º do artigo 45 do CP, porque comina pena absolutamente aberta, ao declarar a expressão “prestação de outra natureza”, sem qualquer restrição. Seria uma ofensa à reserva legal, lex stricta.

3º ENTD) Tecnicamente, a transação penal não envolve cumprimento de pena, razão pela qual o seu objeto não sofre a incidência da reserva legal, sendo lícito ao juiz admitir propostas que tenham como objeto não só a cesta-básica, como a doação de sangue, ou qualquer medida que repute de valor. Ademais, o artigo 5º, XLVI, “d”, da CRFB, faz menção expressa à prestação social alternativa, na qual se encaixaria a cesta-básica.

“(...)XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:(...)

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d) prestação social alternativa; Caberia transação penal em crime de ação penal privada? Há dois

entendimentos:

1º ENTD) o primeiro, do STJ, TJ/RJ, e do Fonaje, defende que é possível, pois se o querelante pode perdoar, e se pode renunciar, pode também transacionar, pois quem pode o mais, pode o menos. Ademais, haveria ofensa à isonomia, pois o réu pobre, que não possa realizar a composição civil dos danos, não terá chance de transacionar. Veja o enunciado 90 do Fonaje:

“Enunciado 90 (Substitui o Enunciado 49), Fonaje: Na ação penal de iniciativa privada, cabem a transação penal e a suspensão condicional do processo (Aprovado no XXI Encontro - Vitória/ES).”

Se o querelante não fizer a proposta de transação?

1) há quem defenda que o MP poderá fazê-lo, na condição de custos legis, mas isto desvirtuaria um pouco a situação, porque a transação é feita entre partes, e o MP, na ação privada, não é parte.

2) E há quem diga que o juiz poderá oferecer a transação, se o querelante não o faz, porque se trata de um direito subjetivo do acusado.

2º ENTD) O segundo posicionamento, de Geraldo Prado, Polastri, e Bittencourt, apregoa que todos os institutos que dão ao querelante a possibilidade de dispor da ação são de direito processual, como a renúncia, o perdão e a perempção; nunca foi dado ao querelante a possibilidade de dispor do direito material, ou seja, negociar pena, pois isso ofenderia a dignidade da pessoa humana – seria um par impondo pena a outro. Além disso, a lei é literal em trazer este instituto apenas para ações penais públicas.

A natureza jurídica da transação penal também conta com duas correntes a explicá-la.

1º ENTD) A primeira, majoritária, entende que seja um direito subjetivo do acusado, se preenchidos os requisitos legais para seu merecimento.

2º ENTD) Há corrente minoritária, porém, que defende que tem natureza de poder discricionário do parquet. Entende que esta discricionariedade sempre existiu nas ações penais privadas, e nem por isso havia direito subjetivo do querelado ao perdão, à renúncia, ou à perempção, ou seja, sempre ficou a critério do querelante – e a discricionariedade que existia nesta ação agora é possível na ação pública, por meio da transação.

A transação penal seria uma mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal? Há, novamente, dois entendimentos:

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1º ENTD) Ada Pellegrini chama-a de discricionariedade regrada, pelo que há, sim, uma mitigação, ou seja, o MP tem duas alternativas a seguir, mas não é o dono da escolha, na medida que é direito subjetivo do réu.

2º ENTD) Afrânio Silva Jardim defende que não houve mitigação alguma, pois quando o MP faz a proposta de transação, ele nada mais faz do que exercer a ação penal, mas diferente da persecução usual, pois que ele faz uma imputação: há análise de tipicidade, e proposta de pena, tudo perante o Judiciário – há ação penal, portanto.

Problema surge quando o MP não realiza a proposta de transação, que seria devida. A questão é tão debatida que surgem cinco entendimentos bem definidos na doutrina (que servem também para a ausência de proposta de sursis processual).

1º ENTD) A primeira corrente defende que, como é direito subjetivo do réu, o juiz fará a proposta de ofício. A crítica a esta corrente é que como a transação penal é um acordo entre partes, esta atitude feriria a inércia e o sistema acusatório.

2º ENTD) A segunda corrente, de Damásio, diz que para que não haja ofensa à inércia da jurisdição, o juiz fará a proposta a pedido da defesa, e não de ofício.

3º ENTD) Terceira corrente, forte no TJ/SP, defende que é poder discricionário do MP, e assim sendo, se este opta por não oferecer, nada há que se fazer.

4º ENTD) Bittencourt, na quarta leitura, entende que não é possível aplicar-se o artigo 28 do CPP, remetendo o feito ao Procurador-Geral de Justiça para dirimir a divergência, pois este dispositivo se destina a proteger interesses do Estado, e não do réu – e a transação não oferecida é interesse deste. Logo, a solução seria impetrar um habeas corpus contra o membro do MP.

5º ENTD) A quinta e última corrente defende a aplicação analógica da súmula 696 do STF, e o feito será, sim, remetido ao Procurador-Geral de Justiça, nos termos do artigo 28 do CPP. Este é o entendimento que prevalece. Veja a súmula:

“Súmula 696, STF: Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o promotor de justiça a propô-la, o juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal.”

Quando o acordo de transação, homologado, não for cumprido, há também severa divergência.

1º ENTD) A primeira corrente, do Fonaje, defende que não há nada a ser feito, pois a homologação do acordo extingue a punibilidade. Veja o enunciado 79 do Fonaje:

“Enunciado 79 (Substitui o Enunciado 14), Fonaje: É incabível o oferecimento de denúncia após sentença homologatória de transação penal em que não haja cláusula resolutiva expressa, podendo constar da proposta que a sua homologação fica condicionada ao prévio cumprimento do avençado. O descumprimento, no caso de não homologação, poderá ensejar o prosseguimento do feito (Aprovado no XIX Encontro – Aracaju/SE)”

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2º ENTD) O STF, de seu lado, defende que o acordo homologado e descumprido equivale a um acordo inexistente. Logo, o promotor deverá denunciar, neste caso.

3º ENTD) Um terceiro posicionamento, mas que também se depreende do enunciado 79 do Fonaje, defende que a homologação do acordo deve estar condicionada ao seu prévio e integral cumprimento, para que assim seja possível o oferecimento da denúncia.

RECURSOS: Da decisão que homologa transação penal cabe apelação, na forma do artigo 82 da Lei 9.099/95:

“Art. 82. Da decisão de rejeição da denúncia ou queixa e da sentença caberá apelação, que poderá ser julgada por turma composta de três Juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição, reunidos na sede do Juizado.”

O interesse em recorrer desta decisão só existe pela possibilidade que há de o juiz promover ajustes nos termos do acordo, e se uma das partes não concordar com o ajuste, poderá contra ele se insurgir.

Não cabe, porém, revisão criminal da decisão que homologa a transação. Primeiramente, porque não houve condenação; segundo, porque, tecnicamente, este ato não é uma sentença, pois não houve encerramento do processo com resolução do mérito. A solução seria aplicar-se o CPC, analogicamente, valendo-se de uma ação anulatória.

REQUISITOS DA TRANSAÇÃO PENAL : O artigo 76 da Lei 9.099/95 trata dos requisitos da transação penal:

“Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta.§ 1º Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade.§ 2º Não se admitirá a proposta se ficar comprovado:I - ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva;II - ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos deste artigo;III - não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida.§ 3º Aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será submetida à apreciação do Juiz.§ 4º Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos.§ 5º Da sentença prevista no parágrafo anterior caberá a apelação referida no art. 82 desta Lei.§ 6º A imposição da sanção de que trata o § 4º deste artigo não constará de certidão de antecedentes criminais, salvo para os fins previstos no mesmo dispositivo, e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível.”

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Em suma, o réu não pode ter sido condenado pela prática de crime em que tenha sido punido com pena privativa de liberdade, em decisão transitada em julgado. As decisões que não geram mais o efeito de reincidência, aquelas que se extenuaram há ao menos cinco anos, para Ada Pellegrini e Bittencourt, não impedem a transação penal ou a suspensão do processo, pois deve ser realizada uma interpretação sistemática com o artigo 64 o CP:

“Art. 64 - Para efeito de reincidência: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)I - não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)II - não se consideram os crimes militares próprios e políticos.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

Também não pode obter transação o agente que já a tenha obtido em processo anterior, nos últimos cinco anos, na forma do inciso II do artigo 76 em comento.

E, no inciso III deste dispositivo, vem a mais problemática das circunstâncias impeditivas da transação, que é demasiadamente ampla e subjetiva: a critério do MP, se os antecedentes do acusado pesarem contra ele, este pode não fazer jus à transação.

O § 4º do artigo 76 deixa claro que a transação penal acolhida não gera presunção de culpabilidade, pois que não traz nenhum efeito de uma condenação, a não ser impedir que haja nova transação penal pelo agente em cinco anos. E o § 6º deste artigo complementa este raciocínio.

3.3. Aplicabilidade dos institutos à lesão corporal culposa de trânsito

O artigo 291 do Código de Trânsito Brasileiro dispõe, no artigo 291, que, em regra, a lesão corporal culposa de trânsito admite a composição civil e a transação penal, e a ação penal é condicionada à representação. Todavia, nas hipóteses dos incisos do § 1º deste artigo, há exceções, em que não se aplicam os institutos e a ação penal é pública incondicionada. Veja:

“Art. 291. Aos crimes cometidos na direção de veículos automotores, previstos neste Código, aplicam-se as normas gerais do Código Penal e do Código de Processo Penal, se este Capítulo não dispuser de modo diverso, bem como a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, no que couber.§ 1o  Aplica-se aos crimes de trânsito de lesão corporal culposa o disposto nos arts. 74, 76 e 88 da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, exceto se o agente estiver:   (Renumerado do parágrafo único pela Lei nº 11.705, de 2008)I - sob a influência de álcool ou qualquer outra substância psicoativa que determine dependência; (Incluído pela Lei nº 11.705, de 2008)

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II - participando, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística, de exibição ou demonstração de perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente; (Incluído pela Lei nº 11.705, de 2008)III - transitando em velocidade superior à máxima permitida para a via em 50 km/h (cinqüenta quilômetros por hora). (Incluído pela Lei nº 11.705, de 2008)§ 2o  Nas hipóteses previstas no § 1o deste artigo, deverá ser instaurado inquérito policial para a investigação da infração penal. (Incluído pela Lei nº 11.705, de 2008)”

Vale tratar aqui de uma alteração recente na concepção da situação penal daquele que causa lesão corporal de trânsito sob influência de substâncias psicoativas. Antes da Lei 11.705/08, a situação era clara: responderia pela lesão com a pena aumentada, porque o inciso V do artigo 302 do CTB assim dispunha, mas hoje este dispositivo foi revogado. Veja:

“Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente:(...)V- estiver sob a influência de álcool ou substância tóxica ou entorpecente de efeitos análogos. (Incluído pela Lei nº 11.275, de 2006)  (Revogado pela Lei nº 11.705, de 2008)”

Hoje, há três entendimentos sobre a situação do agente que assim se conduz. Polastri defende que, sempre que em um crime de perigo ocorre o dano, o agente responde apenas pelo crime de dano; desta forma, responde somente pela lesão, absorvida a embriaguez. Segunda corrente entende que haja dois crimes praticados pela mesma conduta, havendo concurso formal. E a terceira corrente defende que há duas condutas distintas, implicando na prática de dois crimes distintos, havendo concurso material.

4. Audiência de instrução e julgamento

Ao fim da audiência preliminar, não tendo havido composição ou transação penal, o MP oferece a denúncia verbal. Veja que ali se dá apenas o oferecimento da denúncia, e não sua recepção pelo juiz, mas o acusado já é citado para a realização da AIJ.

A AIJ, tecnicamente, seria incindível, somente sendo possível a cisão em hipóteses extremamente excepcionais, vez que compromete a celeridade, podendo repercutir também na identidade física do juiz.

A audiência tem por primeiro ato a possibilidade de oferecimento de resposta preliminar pelo acusado. Nesta resposta, a defesa deverá alegar todas as teses possíveis para que a denúncia não seja recebida.

Recebida a denúncia, deve ser avaliado se cabe ou não a suspensão condicional do processo.

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O sursis processual é a proposta feita pelo MP, para paralisar o andamento do processo por um período variável entre dois e quatro anos, enquanto o réu cumpre condições impostas.

Na suspensão condicional do processo o feito existe, já em curso, mas fica suspenso ≠ ao contrário da transação penal, que é um substitutivo da ação!!!!

O critério para cabimento do sursis processual é diferente do critério para definir infração de menor potencial ofensivo: a suspensão analisa-se pela pena mínima, que deve ser não superior a um ano. Assim, vários crimes que escapam à Lei 9.099/95, por terem pena máxima superior a dois anos, merecem aplicação deste instituto, pois a mínima é inferior a um.

Seria possível a aplicação deste instituto no crime de tráfico de drogas? Veja uma hipótese: se o indivíduo fora denunciado nos moldes do artigo 12 da Lei 6.368/90, pois em janeiro de 2006 foi surpreendido vendendo drogas. Condenado em primeiro grau, seria possível aplicar-se a causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, § 4º, da nova lei de drogas?

“Art. 33.  Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.§ 1o  Nas mesmas penas incorre quem:I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas;II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.§ 2o  Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga:Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) dias-multa.§ 3o  Oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos a consumirem:Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa, sem prejuízo das penas previstas no art. 28.§ 4o  Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.”

Na vigência da Lei 6.368/90, este delito tinha pena de três a quinze anos; agora, a escala é de cinco a quinze anos, mas há esta atenuante do § 4º do artigo 33 da nova lei,

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que não existia antes. O TJ/RJ vem permitindo a aplicação do § 4º do artigo 33 àqueles que foram condenados por tráfico de drogas, nos moldes do artigo 12 da Lei 6.368/90. A justificativa é que, neste aspecto, a nova lei é mais favorável, e então apenas este aspecto deve ser feito retroagir. Desta forma, se o condenado a pena de três anos de reclusão tiver sua pena reduzida em dois terços, restando apenas um ano, será possível suspensão condicional do processo. Mas há quem critique esta combinação de leis, a formação de uma lex tertia, por entender que é atividade legislativa positiva sendo feita pelo Judiciário, violando a separação de poderes.

Superada a fase de avaliação da suspensão condicional do processo, adentra-se na fase instrutória do processo, iniciando-se pela oitiva da vítima, e seguindo-se às oitivas das testemunhas de acusação e de defesa. Esta ordem não pode ser invertida, havendo dúvida apenas quanto à natureza da nulidade, se absoluta ou relativa, com correntes para os dois lados. Em seguida, passa-se ao interrogatório, aos debates orais, alegações finais e sentença.

5. Sentença

RELATÓRIO? Há peculiaridades na sentença da Lei 9.099/95. Primeiro, ela dispensa relatório, conforme artigo 81, § 3º, desta Lei:

“Art. 81. Aberta a audiência, será dada a palavra ao defensor para responder à acusação, após o que o Juiz receberá, ou não, a denúncia ou queixa; havendo recebimento, serão ouvidas a vítima e as testemunhas de acusação e defesa, interrogando-se a seguir o acusado, se presente,(...)§ 3º A sentença, dispensado o relatório, mencionará os elementos de convicção do Juiz.”

RECURSO: A sentença, é claro, desafia apelação, na forma do artigo 82 da Lei 9.099/95, com a peculiaridade de ser interposta no prazo de dez dias:

“Art. 82. Da decisão de rejeição da denúncia ou queixa e da sentença caberá apelação, que poderá ser julgada por turma composta de três Juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição, reunidos na sede do Juizado.§ 1º A apelação será interposta no prazo de dez dias, contados da ciência da sentença pelo Ministério Público, pelo réu e seu defensor, por petição escrita, da qual constarão as razões e o pedido do recorrente.§ 2º O recorrido será intimado para oferecer resposta escrita no prazo de dez dias.§ 3º As partes poderão requerer a transcrição da gravação da fita magnética a que alude o § 3º do art. 65 desta Lei.§ 4º As partes serão intimadas da data da sessão de julgamento pela imprensa.§ 5º Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.”

O prazo é superior ao da apelação do CPP porque aqui as razões são interpostas juntamente com a peça de interposição, enquanto na apelação do CPP as razões seguem em separado da peça de interposição, a qual conta com prazo de cinco dias.

Em respeito à celeridade, a intimação da seção de julgamento de eventual apelação será feita por meio de publicação em diário oficial, na forma do § 4º

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deste artigo 82 – inclusive a defensoria pública, em razão da especialidade da Lei 9.099/95. Sobre isso, veja o julgado no habeas corpus 81.446-8, do STF:

“EMENTA: Habeas corpus. Juizados Especiais Criminais. Lei nº 9.099/95. Questão relativa ao art. 77, § 1º de tal lei não apreciada pelo acórdão impugnado. Inexistência de ofensa ao art. 93, IX da CF pela sucinta decisão que apreciou os embargos de declaração, por estar de acordo com os princípios que norteiam os Juizados Especiais. Pretendida deficiência do edital de intimação da sentença afastada pela interposição de apelação pela defensora pública, fato que elide eventual prejuízo, cuja demonstração, ademais, faz-se sempre necessária para dar azo à anulação do processo, por força do que dispõe o art. 65, § 1º da Lei nº 9.099/95. Alegação de falta de ciência da pauta de julgamento do apelo que encontra óbice na jurisprudência desta Casa, cujo Plenário, ao apreciar o HC nº 76.915/RS (rel. o Min. Marco Aurélio), firmou o entendimento de que "o critério da especialidade é conducente a concluir-se pela inaplicabilidade, nos juizados especiais, da intimação pessoal prevista nos artigos 370, § 4º, do Código de Processo Penal (com redação dada pelo artigo 1º da Lei nº 9.271, de 17 de abril de 1996) e 5º, § 5º, da Lei nº 1.060/50 (com a redação introduzida pela Lei nº 7.871/89)", tendo-se consagrado, nessa oportunidade, a regra especial disposta no parágrafo 4º do art. 82 da Lei nº 9.099/95, de intimação das partes, pela imprensa, da data da sessão de julgamento. Habeas corpus conhecido em parte e, nessa parte, indeferido.”

Há três casos de apelação no JECrim: o primeiro, da sentença, na AIJ; o segundo, da decisão que homologa a transação; e o terceiro, da decisão que rejeita a denúncia. Não cabe recurso em sentido estrito em sede de JECrim, como explicita o enunciado 48 do Fonaje:

“Enunciado 48, Fonaje: O recurso em sentido estrito é incabível em sede de Juizados Especiais Criminais.”

Caberiam embargos infringentes e de nulidade? Há duas correntes: a primeira, de Grandinetti, defende que não cabem, pois a composição das turmas recursais é incompatível com este recurso, pois que não há como se identificar o conteúdo do voto vencido. Polastri, por sua vez, defende que a própria Lei 9.099/95, no artigo 92, determina a aplicação do CPP, e como não há nada proibindo a utilização deste recurso, ele é possível.

“Art. 92. Aplicam-se subsidiariamente as disposições dos Códigos Penal e de Processo Penal, no que não forem incompatíveis com esta Lei.”

O recurso especial não é cabível, porque a CRFB exige que este recurso seja usado para impugnar decisão de tribunal, e as turmas recursais não são tribunais. Esta é a razão da súmula 203 do STJ:

“Súmula 203, STJ: Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais.”

O recurso extraordinário, por sua vez, não encontra este óbice, sendo perfeitamente cabível para argüir discussão constitucional.

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5.1. Habeas corpus em sede de JECrim

Quando a autoridade coatora for o delegado, em processo de curso no JECrim, o HC será julgado pelo juiz do JECrim.

Quando for o juiz do JECrim a autoridade coatora, há dois entendimentos sobre quem julgará este HC.

1º ENTD) O primeiro entendimento, que prevalece na doutrina, defende que é o Tribunal de Justiça, porque o HC é uma ação constitucional, e não há previsão, na Lei 9.099/95, das turmas recursais julgarem este HC.

2º ENTD) O segundo posicionamento, amplamente majoritário na jurisprudência, defende que são as turmas recursais competentes para tal julgamento, eis que fazem às vezes de segundo grau de jurisdição nos crimes de menor potencial ofensivo.

Quando a própria turma recursal for a autoridade coatora, quem julga o HC contra ato desta, segundo o STF, na súmula 690, é o próprio STF:

“Súmula 690, STF: Compete originariamente ao Supremo Tribunal Federal o julgamento de habeas corpus contra decisão de turma recursal de juizados especiais criminais.”

Ocorre que, mesmo esta súmula não tendo sido cancelada, o pleno do STF tem julgado em desacordo com seu teor, fixando a competência do respectivo Tribunal de Justiça, ao argumento de que quando o próprio Tribunal de Justiça é a autoridade coatora, quem julga este HC é o STJ, não fazendo sentido o HC de turma recursal acessar diretamente o STF.

5.2. Revisão criminal das decisões do JECrim

1º ENTD) O primeiro entendimento, majoritário na doutrina, entende que a competência é do Tribunal de Justiça, e o CPP exige que esta ação seja proposta no tribunal – e turma recursal não é tribunal.

2º ENTD) O posicionamento majoritário na jurisprudência, porém, é o que defende que a competência é da turma recursal, que é o segundo grau em sede de JECrim.

6. Suspensão condicional do processo

Apesar de ser um instituto apresentado pela Lei 9.099/95, a suspensão condicional do processo não é parte do rito sumaríssimo. É uma medida despenalizadora que pode ser aplicada tanto no JECrim quanto em qualquer procedimento ou juízo em que se vejam preenchidos os seus requisitos.

Os crimes que despertam aplicação deste instituto não são apenas aqueles de menor potencial ofensivo, mas sim também aqueles chamados pela doutrina de

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infrações de médio potencial ofensivo. É desta categoria a infração que tem pena mínima não superior a um ano. Vejamos o artigo 89 da Lei 9.099/95:

“Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).§ 1º Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do Juiz, este, recebendo a denúncia, poderá suspender o processo, submetendo o acusado a período de prova, sob as seguintes condições:I - reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo;II - proibição de freqüentar determinados lugares;III - proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do Juiz;IV - comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades.§ 2º O Juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado.§ 3º A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano.§ 4º A suspensão poderá ser revogada se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por contravenção, ou descumprir qualquer outra condição imposta.§ 5º Expirado o prazo sem revogação, o Juiz declarará extinta a punibilidade.§ 6º Não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão do processo.§ 7º Se o acusado não aceitar a proposta prevista neste artigo, o processo prosseguirá em seus ulteriores termos.”

A natureza jurídica da suspensão condicional do processo é de sursis processual. Trata-se de um sobrestamento do processo, que, iniciado com a denúncia, imediatamente será suspenso pela proposta do MP e aceitação do réu. Há quem chame a suspensão condicional do processo também, por conta desta necessária aceitação, de transação processual .

O proponente deste sobrestamento é o parquet. O sursis processual, então, tem sede natural em infrações perseguidas em ação penal pública. Surge então a pergunta: caberia a suspensão condicional do processo em infrações de ação penal privada?

Veja que o artigo 89, supra, fala apenas em denúncia, e apenas no MP. Literalmente, então, somente em infrações de ação penal pública seria cabível este benefício. Surgem duas correntes sobre o tema, porém.

1º ENTD) o primeiro, Ada, Pacelli, Tourinho, STJ, TJ/RJ, e do Fonaje, defende que é possível, pois se o querelante pode perdoar, e se pode renunciar, pode também ser aplicada a suspensão condicional do processo, pois quem pode o mais, pode o menos. Esta tese também se fundamenta na razoabilidade: se nos delitos mais graves, perseguidos em ação pública, há cabimento, não há lógica em impedir que caiba em crimes perseguidos em ação privada, menos relevantes ao Estado.Veja o enunciado 90 do Fonaje:

“Enunciado 90 (Substitui o Enunciado 49), Fonaje: Na ação penal de iniciativa privada, cabem a transação penal e a suspensão condicional do processo (Aprovado no XXI Encontro - Vitória/ES).”

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2º ENTD) A segunda corrente, dominante, do STF, Polastri, dentre outros, defende o descabimento do sursis processual em ações penais privadas, porque nestas ações, ao contrário das públicas, vige o princípio da disponibilidade da queixa, e se o querelante quer suspender o processo para beneficiar o querelado, basta perdoar ou incidir em perempção, não sendo necessário o sursis processual.

Veja o HC 83.412, do STF, em que defende esta tese:

“EMENTA: I. STF - HC - Competência originária. 1. O recurso à Turma Recursal contra sentença definitiva de Juizado Especial tem a amplitude devolutiva da apelação e, assim, no julgamento dele, é dado ao juízo ad quem conhecer, em favor do acusado apelante, de nulidades absolutas - que, no caso, o impetrante pretende ocorrentes - ainda quando não alegadas. 2. Não o fazendo, o órgão recursal faz-se responsável pela coação, como é da jurisprudência consolidada do Tribunal, relativamente à apelação da defesa: precedentes. II. Crime contra a honra: decadência: C.Pr.Penal, art. 44. 1. O defeito da procuração outorgada pelo querelante ao seu advogado, para requerer abertura de inquérito policial, sem qualquer menção ao objeto da acusação a formular, constitui hipótese de ilegitimidade do representante da parte, que, a teor do art. 568 C.Pr.Pen., "poderá ser a todo o tempo sanada, mediante ratificação dos atos processuais" (RHC 65.879, Célio Borja); 2. Presente à audiência preliminar de transação penal, a querelante, pessoalmente, descartou o acordo, e manifestou a vontade de levar a cabo a persecução penal, o que basta a suprir o defeito da procuração, como também vale por rejeição peremptória da conciliação prevista no art. 520 do C.Pr.Penal. III. Inocorrência de ofensa à indivisibilidade da ação penal privada pela não inclusão do marido da querelante no pólo passivo da queixa, nela apenas referido como destinatário da propalação por terceiros da atribuição à querelante de fatos danosos à sua reputação. IV. Suspensão condicional do processo: inadmissibilidade. Prevalece na jurisprudência a impertinência à ação penal privada do instituto da suspensão condicional do processo. De qualquer sorte, a proposta haveria de partir da querelante, que, ao contrário, se manifestou pessoal e enfaticamente pela sua continuidade.”

Na ação penal privada subsidiária da pública caberia o instituto?

RESPOSTA: Veja que esta ação mantém em essência a natureza pública, mas tem por dominus litis o querelante, porque o MP quedou-se inerte. Ocorre que nesta ação ainda vigem os princípios das ações penais públicas, porque ela ainda é essencialmente pública, ou seja: não vigendo o princípio da disponibilidade, o argumento da tese majoritária quanto às ações penais privadas não tem valor, e por isso o sursis processual é perfeitamente cabível, sem embargos.

Mas como se opera esta suspensão condicional do processo na ação penal privada subsidiária? O proponente desta suspensão é o querelante, ou é o MP, que seria o titular original?

A questão é pacífica: compete ao MP propor ou não a suspensão condicional do processo nas ações penais privadas subsidiárias, porque há um mecanismo de controle pelo juiz desta que só é atinente ao MP, qual seja, a divergência que abre caminho à aplicação analógica do artigo 28 do CPP , que determina remetimento dos autos ao Procurador-Geral de Justiça – o que não faz o menor sentido em relação à vítima, querelante. Veja a súmula 696 do STF:

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“Súmula 696, STF: Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o promotor de justiça a propô-la, o juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal.”

Problema surge quando da ausência de proposta de sursis processual pelo MP.

1º ENTD) A primeira corrente defende que, como é direito subjetivo do réu, o juiz fará a proposta de ofício. A crítica a esta corrente é que como a transação penal é um acordo entre partes, esta atitude feriria a inércia e o sistema acusatório.

2º ENTD) A segunda corrente, de Damásio, diz que para que não haja ofensa à inércia da jurisdição, o juiz fará a proposta a pedido da defesa, e não de ofício.

3º ENTD) Terceira corrente, forte no TJ/SP, defende que é poder discricionário do MP, e assim sendo, se este opta por não oferecer, nada há que se fazer.

4º ENTD) Bittencourt, na quarta leitura, entende que não é possível aplicar-se o artigo 28 do CPP, remetendo o feito ao Procurador-Geral de Justiça para dirimir a divergência, pois este dispositivo se destina a proteger interesses do Estado, e não do réu – e a transação não oferecida é interesse deste. Logo, a solução seria impetrar um habeas corpus contra o membro do MP.

5º ENTD) STF - súmula 696 do STF, e o feito será, sim, remetido ao Procurador-Geral de Justiça, nos termos do artigo 28 do CPP. Este é o entendimento que prevalece. Veja a súmula:

“Súmula 696, STF: Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o promotor de justiça a propô-la, o juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal.”

DUPLA ACEITAÇÃO: Como dito, é necessário que haja aceitação do benefício para que o processo seja suspenso. Repare que o artigo 89 supra, no seu § 1º, fala em aceitação pelo acusado e pelo defensor, ou seja, impõe uma dupla aceitação como requisitos – divergindo o acusado e seu defensor, o processo não será suspenso, como estabelece o § 7º do mesmo artigo 89.

RÉU REVEL: Mesmo por isso, o réu revel não terá direito ao sursis processual, eis que não estará presente para compor a dupla aceitação que se faz necessária.

JUIZ É QUEM SUSPENDE O PROCESSO: Por óbvio, quem suspende o processo é o juiz: havendo proposta e aceitação, é o juiz quem suspenderá condicionalmente o processo. E esta suspensão é uma decisão judicial, que mesmo sendo homologatória, comporta recurso. Isto poderia soar estranho, eis que se houve aceitação de ambas as partes, não haveria interesse em recorrer, mas há que se atentar para a seguinte peculiaridade: pode ocorrer que tenha

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havido vício de vontade na formulação da proposta ou da aceitação, fazendo necessário o recurso. Pode, por exemplo, o promotor ter sido induzido em erro ao propor a medida, ou o réu ter sido coagido a aceitar a proposta, casos em que só o recurso poderá levantar a questão.

Há que se consignar uma peculiar situação, corriqueira na praxe, que é o sursis processual condicionado à folha de antecedentes criminais. Consiste na proposta do sursis processual que é realizada, mas só é homologada quando for juntada esta folha de antecedentes criminais, isenta de registros desabonadores, ou com a devida explicação das anotações ali contidas, sob pena de não homologação da suspensão.

6.1. Pressupostos do sursis processual

Os pressupostos são analisados pelo proponente, e se encontram no já transcrito artigo 89, caput, da Lei 9.099/95. Este artigo faz expressa remissão ao artigo 77 do CP, que trata da suspensão da pena, o sursis penal. O artigo 89, então, traz quatro pressupostos bem definidos para se fazer jus ao sursis processual:

1) a existência de infração penal de médio potencial ofensivo, daquelas punidas com pena não superior a um ano;2) não estar o réu sendo processado penalmente;3) não ser o réu reincidente; 4) e respeitar os demais requisitos estabelecidos no artigo 77 do CP.

VEJAMOS UM A UM:

1) No cálculo da pena mínima não superior a um ano devem ser incluídas as causas de aumento e de diminuição de pena (não agravantes e atenuantes, mas sim as majorantes e minorantes, e qualificadoras ou privilegiadoras). Da mesma forma, deve ser levado em conta o estado de crime tentado para estabelecer a medida da pena mínima. Vejamos um exemplo: no furto simples, o cabimento é claro, pois a pena mínima é de um ano; no furto qualificado, não há cabimento, pois a escala penal sobe para de dois a oito anos. Mas veja que se se tratar de furto qualificado tentado, o cômputo da maior fração reducente da pena, de dois terços, prevista no artigo 14, parágrafo único, do CP, faz a pena mínima em abstrato cair para oito meses, permitindo a aplicação do sursis processual. Veja os artigos:

O artigo 302 do CTB oferece outro bom exemplo:

“Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.(...)”

O homicídio culposo de trânsito é punido com dois a quatro anos de pena. Sendo assim, não comporta sursis processual. Ocorre que se o autor deste crime imediatamente

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tentar amenizar os danos causados por sua conduta, terá o benefício do arrependimento posterior, do artigo 16 do CP, causa de diminuição de pena que a reduz de um a dois terços. Destarte, aplicando-se a causa de diminuição, ter-se-á como pena mínima exatamente oito meses, permitindo a suspensão condicional do processo. Veja:

“Arrependimento posterior (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)Art. 16 - Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

Outra questão a ser enfrentada é quando há concurso de crimes, material, formal, ou em continuidade delitiva. Como é sabido, no concurso material as penas são somadas; no formal ou na continuidade delitiva, leva-se em consideração a pena de um só dos crimes e se a aumenta, até a metade, no concurso formal, ou até dois terços, no crime continuado. Como se computar a pena mínima? Leva-se em consideração as penas isoladas, ou a pena final, após o somatório ou acréscimo (dependendo do tipo de concurso)?

1º ENTD) A corrente majoritária, contando com súmulas do STF e do STJ a ampará-la, leva em consideração a pena final, já computados o aumento ou soma. Veja as súmulas 243 do STJ, e 723 do STF:

“Súmula 243, STJ: O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.”

“Súmula 723, STF: Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a um ano.”

2º ENTD) Ada Pellegrini e Tourinho Filho defendem, minoritariamente, que a pena individual de cada crime seja levada em conta, e não a soma ou pena acrescida, ao argumento de que se para o cálculo da prescrição dos crimes concorrentes é levada em consideração a pena isolada, como determina o artigo 119 do CP, esta lógica deveria ser a mesma para a suspensão condicional do processo.

“RehabilitaçãoArt. 119 - No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente.  (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

2) O segundo requisito, como dito, é o de que o réu não esteja sendo processado. É de se questionar a constitucionalidade deste requisito, eis que se pode entender como uma ofensa ao princípio da não-culpabilidade, porque réu processado não é réu condenado, culpado – assim se posicionando Ada Pellegrini. Todavia, o STF vem entendendo perfeitamente constitucional este requisito, nas decisões setoriais da Casa. Vale dizer que esta questão ainda está pendente em plenário, no julgamento do HC 84.660, ainda sem julgado.

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Veja que estar sendo processado significa que já houve recebimento da denúncia, e não mero oferecimento da inicial acusatória. Se há apenas oferecimento, não há processo, e o requisito negativo está cumprido.

3) Terceiro requisito é o de não ter sido condenado, ou seja, o réu não pode ser reincidente. A reincidência só existe no curso de cinco anos desde a última condenação, na forma do artigo 64 do CP:

“Art. 64 - Para efeito de reincidência: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)I - não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)(...)”

Após este prazo, a reincidência prescreve, e não é mais óbice à concessão do sursis processual.REQUISITO TEMPORAL:

Parte da doutrina, como Polastri, Ada Pellegrini e Luis Flávio Gomes, entendem que a suspensão condicional do processo conta ainda com um requisito temporal, que é o curso mínimo de cinco anos entre a concessão do último sursis processual para aquele indivíduo. Invocam, por analogia, o requisito temporal da transação penal, que somente assim pode ser concedida. Argumentam que, se assim não for, estar-se-ia favorecendo a impunibilidade daquele que comete o crime passível de sursis com freqüência, tal como o estelionatário “profissional”. Polastri ainda justifica que este nosso instituto do sursis processual veio inspirado do modelo argentino, e lá este requisito é expresso (sendo de oito anos, porém).

4) O último requisito é a remissão aos pressupostos do sursis penal, do artigo 77 do CP:

“Art. 77 - A execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)I - o condenado não seja reincidente em crime doloso; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)III - Não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art. 44 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)§ 1º - A condenação anterior a pena de multa não impede a concessão do benefício.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)§ 2o A execução da pena privativa de liberdade, não superior a quatro anos, poderá ser suspensa, por quatro a seis anos, desde que o condenado seja maior de setenta anos de idade, ou razões de saúde justifiquem a suspensão. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)”

A reincidência, que já é requisito expresso do sursis processual, como visto, deve ser reinterpretada à luz deste artigo 77 do CP, porque aqui se impõe que não seja reincidente em crime doloso . Esta peculiaridade deve ser transportada para o sursis processual, sendo então possível o sursis processual para o reincidente em crime culposo.

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O inciso II do artigo supra traz os requisitos subjetivos para a suspensão. Tais condições são analisadas pelo MP, e se o juiz dissentir do juízo feito pelo parquet, poderá remeter os autos ao Procurador-Geral, para que este re-analise a questão.

6. 2. Condições da suspensão

Cumpridos os requisitos, os §§ 1º e 2º do artigo 89 da Lei 9.099/95 impõem algumas obrigações ao réu, a fim de considerar cumprida com correção a suspensão. Vale rever os dispositivos:

“(...)§ 1º Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do Juiz, este, recebendo a denúncia, poderá suspender o processo, submetendo o acusado a período de prova, sob as seguintes condições:I - reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo;II - proibição de freqüentar determinados lugares;III - proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do Juiz;IV - comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades.§ 2º O Juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado.(...)”

CONTRAVENÇÃO PENAL : No § 1º estão as condições obrigatórias, obrigações de cumprimento obrigatório no curso do período de provas. Vale salientar que para o cometimento de contravenção penal, o prazo para sursis não é de dois a quatro anos, como o é para crimes: nas contravenções, o sursis tem período de provas de um a três anos, como dispõe o artigo 11 da Lei das Contravenções Penal, Decreto-Lei 3.668/41, e da mesma forma o terá o sursis processual.

“Art. 11. Desde que reunidas as condições legais, o juiz pode suspender por tempo não inferior a um ano nem superior a três, a execução da pena de prisão simples, bem como conceder livramento condicional. (Redação dada pela Lei nº 6.416, de 24.5.1977)”

1) REPARAÇÃO DO DANO: Quanto à reparação do dano, primeira condição, ressalte-se que esta deve ser cumprida dentro do período de provas, e não de imediato, quando da concessão do sursis processual. E esta reparação deve ser interessante à vítima: se não o for, o réu que não reparar não poderá ser prejudicado. Se a vítima não quiser aceitar a reparação, não se pode entender que o réu tenha descumprido a obrigação.

2)A segunda condição, “proibição de freqüentar determinados lugares”, é violentamente criticada pela doutrina, unanimemente. Isto porque é tão aberta e lacônica, que se exige que o MP indique exatamente quais locais não poderão ser freqüentados pelo réu beneficiado, sequer sendo admissível a proibição genérica de “freqüentar locais de reputação duvidosa”.

3) Outra condição é que o réu não se ausente da comarca sem autorização judicial. É pacífica a possibilidade de flexibilização desta

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condição, diante de casuísticas que a tornem inviável. Como exemplo, o réu que trabalha em comarca próxima, e precisa diariamente ausentar-se da comarca em que presta contas ao juízo.

4) Quarta condição é o comparecimento mensal em juízo, para informar das suas atividades durante o período probatório. É uma prestação de contas mensal, mas na prática esta periodicidade é flexibilizada, sendo bimensal, trimestral, ou na periodicidade que o juiz bem entender. A princípio, também, este comparecimento é feito perante o juízo competente, onde foi processado o réu, mas nada impede que o juiz competente possa permitir que, por meio de precatória, o réu compareça ao juízo de sua residência, se foi processado em local diverso. Vale dizer que, se o réu descumpre condições no juízo deprecado, este deverá informar ao deprecante, que é o competente, a fim de que tome as providências que entender cabíveis, inclusive eventual revogação da suspensão.

Ao lado destas condições obrigatórias, o § 2º do artigo 89, supra, autoriza a imposição de condições facultativas. Polastri dá um bom exemplo: se há uma briga entre vizinhos, por conta de som alto que um deles ouvia, levando a lesões corporais leves, nada impede que o juiz, para suspender o processo, condicione à vedação à colocação de som elevado após determinada hora do dia, sob pena de revogação do benefício.

6. 3. Revogação do sursis processual

Pode haver revogação deste benefício, sendo retomado o curso do processo, por causa que assim imponha ou faculte, ou seja, há revogação facultativa ou obrigatória. A revogação obrigatória do sursis processual vem no § 3º do artigo 89 da Lei 9.099/95, e a facultativa no § 4º. Revejamos:

“(...)§ 3º A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano. (OBRIGATÓRIA)§ 4º A suspensão poderá ser revogada se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por contravenção, ou descumprir qualquer outra condição imposta.(FACULTATIVA)(...)”

Os dispositivos são bem literais, dispensando maiores comentários. Entretanto, há que se consignar que o descumprimento mais comum, na prática, é a falta ao comparecimento mensal em cartório, causa facultativa que na prática não tem levado à revogação. O que ocorre, quando o réu falta ao comparecimento, é a prorrogação do prazo de suspensão, do período de provas, pelo prazo correspondente à falta. Aplica-se por analogia o artigo 81, § 3º, do CP:

“Art. 81 - A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário:  (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)(...)Prorrogação do período de prova

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§ 3º - Quando facultativa a revogação, o juiz pode, ao invés de decretá-la, prorrogar o período de prova até o máximo, se este não foi o fixado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

6.4. Extinção da punibilidade pelo cumprimento do período probatório

Se o réu cumprir religiosamente as condições impostas, findando o prazo de provas sem revogação, o § 5º do artigo 89 da Lei 9099/95 determina a extinção da punibilidade do réu. Reveja:

“(...)§ 5º Expirado o prazo sem revogação, o Juiz declarará extinta a punibilidade.(...)”

Veja que pode acontecer de, encerrado o período probatório sem revogação, ou seja, tendo sido extinta a punibilidade do réu, o juízo tome conhecimento de que o réu praticara alguma falta às condições do sursis processual. Poderá o juiz retroagir, neste caso, quer para prorrogar, quer para revogar a suspensão?

1º ENTD) A polêmica é severa. O STF é extremamente rigoroso, entendendo que, mesmo findo o prazo, o juiz poderá tomar a medida cabível retroativamente, ou seja, poderá revogar o benefício e retomar o curso do processo, ou prorrogar o período de provas. A respeito, veja o HC 80.747 do STF:

“EMENTA: I. Habeas corpus: impetração contra decisão do STJ que não conheceu de um dos seus fundamentos, porque não ventilado no Tribunal local, razão de ordem processual que o impetrante não impugna no presente HC, requerido ao STF, no qual se adstringe a insistir no mérito da alegação: descabimento, nessas circunstâncias, do exame originário da questão pelo STF, salvo quando seja o caso de concessão de ofício da ordem. II. Suspensão condicional do processo. 1. Suspenso condicionalmente o processo, não cabe ao juiz, ainda no curso do período respectivo, declarar parceladamente cumpridas - com força decisória de sentença definitiva - cada uma das condições a cuja satisfação integral ficou subordinada a extinção da punibilidade: se antes não adveio revogação por motivo devidamente apurado, é que incumbe ao Juiz, findo o período da suspensão do processo, declarar extinta a punibilidade - aí, sim, por sentença - ou, caso contrário, se verifica não satisfeitas as condições, determinar a retomada do curso dele. 2. A decisão que revoga a suspensão condicional pode ser proferida após o termo final do seu prazo, embora haja de fundar-se em fatos ocorridos até o termo final dele.”

2º ENTD) O TJ/RJ não comunga desta tese. Aqui, há que se diferenciar se a causa de revogação percebida tardiamente for obrigatória ou facultativa: se for obrigatória, o juiz poderá, de fato, revogar o sursis processual retroativamente; se for facultativa, a retroação não é possível, mesmo porque se a descoberta da falta fosse tempestiva, o juízo não seria obrigado a revogar. A respeito, veja a apelação criminal 2007.050.06123, do TJ/RJ:

“APELAÇÃO. DES. NILDSON ARAUJO DA CRUZ - Julgamento: 10/07/2008 - PRIMEIRA CAMARA CRIMINALFURTO SIMPLES. SENTENÇA CONDENATÓRIA. REVOGAÇÃO, PELO MAGISTRADO DE PRIMEIRO GRAU, DE SURSIS PROCESSUAL JÁ HOMOLOGADO, EM RAZÃO DA NOTÍCIA DE SER O RÉU REINCIDENTE. A PRELIMINAR SUSCITADA DE OFÍCIO PELO

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RELATOR, SUSTENTANDO A IMPOSSIBILIDADE DA REVOGAÇÃO FOI REJEITADA PELA MAIORIA. NO MÉRITO, FOI PROVIDO O APELO POR UNANIMIDADE PARA AFASTAR A REINCIDÊNCIA. Homologada a suspensão condicional do processual, chegou aos autos notícia de que o réu era reincidente e, por isso, o sursis processual foi revogado pelo próprio magistrado de primeiro grau. Nas circunstâncias, em preliminar de ofício, sustentou o relator que foi ferido o princípio proibitivo da revisão a favor da sociedade, uma vez que, configurada a preclusão, a suspensão condicional só poderia ter sido revogada se suas condições não tivessem sido cumpridas, o que não aconteceu. Ademais, o réu não é reincidente, porque foi declarada a extinção da punibilidade, por força da prescrição retroativa da pretensão de puni-lo. Por isso, deveria ser declarada a nulidade da decisão revogadora, considerada cumprida a suspensão condicional do processo e julgada extinta a punibilidade, tendo em vista que, levando-se em conta o tempo decorrido, o simples restabelecimento do sursis não seria nem justo nem legal. Preliminar rejeitada por maioria, ao entendimento de que é possível a revogação em tal contexto. No mérito e por unanimidade, afastada a reincidência, foi provido o apelo defensivo para fixar as penas no mínimo legal, o regime inicial aberto e substituir a pena privativa de liberdade por outra de natureza alternativa.”

Cumprido o período de provas sem falhas, como dito, estará extinta a punibilidade, arquivando-se o processo que estava suspenso.

6.5. Fase processual adequada para implemento da suspensão

A fase correta para oferecimento do benefício, como se vê no próprio artigo 89 da Lei 9.099/95, é juntamente com o oferecimento da denúncia. A jurisprudência, contudo, sempre defendeu que o sursis processual poderá ser oferecido em qualquer momento até a sentença de primeira instância. Veja a súmula 337 do STJ:

“Súmula 337, STJ: É cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva.”

Veja o exemplo, então, da desclassificação de um crime: o indivíduo denunciado por furto qualificado, desmerecedor do sursis processual, vem a comprovar que a qualificadora do furto não existiu, fazendo o crime definir-se como furto simples. Neste caso, a suspensão poderá ser oferecida, porque o erro do MP em qualificar o crime não pode prejudicar o réu. O juiz deverá abrir vista para que o MP ofereça o benefício, e se não o fizer, pode remeter o feito ao Procurador-Geral.

A defensoria pública defende que pode ser oferecido o benefício até mesmo após a sentença, só deixando de ser cabível quando houver o trânsito em julgado. É posição isolada, porém, e Pacelli assim explica o porque é entendimento equivocado: se assim fosse possível, não só a sentença de primeiro grau seria ignorada, como a revogação não poderá ser efetivada, por não ter a menor lógica.

A reforma do CPP contemplou, no artigo 383, § 1º deste diploma, este raciocínio da súmula 337 do STJ:

“Art. 383.  O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).§ 1o  Se, em conseqüência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo, o juiz

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procederá de acordo com o disposto na lei.   (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).(...)”

6.6 Prescrição

O artigo 89, § 6º, da Lei 9.099/95 assim estabelece:

“(...)§ 6º Não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão do processo.(...)”

Se assim não fosse, a retomada do processo poderia ser impossível, porque poderia, no curso do período de provas, haver a prescrição do crime, e se o réu cometesse alguma falha que ensejasse revogação, esta seria despicienda, vez que se a prescrição se operou houve extinção da punibilidade. Por isso, esta prescrição suspende-se assim como o processo.

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