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LE CORBUSIER: TRAÇOS DE ARQUITETURA, DESENHOS DA CIDADE. BAUM, AMANDA ELIS (1); MULLER, CAMILA SOUZA (2); POKOMAIER, NATÁLIA BORGES (3); ROCHA, LUIZA D’ARRIGO (4); DORFMAN, BEATRIZ REGINA (5) Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Av. Ipiranga, 6681 Partenon - Porto Alegre / RS CEP: 90619-900 [email protected] 1. [email protected] 2. [email protected] 3. [email protected] 4. [email protected] 5. [email protected] RESUMO Este artigo aborda o desenho livre, como uma extensão natural do pensamento visual e propõe uma investigação sobre o uso do traço, ou do desenho feito à mão, nos processos de análise da paisagem, de pesquisa e projeto de arquitetura e urbanismo. Um dos objetivos é demonstrar que a representação gráfica contemporânea, com os desenvolvimentos da tecnologia digital vem somar possibilidades de representação cada vez mais sofisticadas, mas, no entanto, não substitui os recursos da expressão pelo desenho a mão livre. Analisa croquis de Le Corbusier, arquiteto que teve uma extensa produção em desenhos, que está amplamente documentada na bibliografia. A elaboração dos cadernos de desenhos de viagens teve parte decisiva, na formação profissional deste, que foi um dos nomes mais importantes arquitetos da história moderna. Desenhos que registram, analisam, descrevem e propõem representações, que desenham o imaginário urbano e compõem a diversidade das paisagens culturais. Palavras chave: desenho, arquitetura, paisagem, projeto, Le Corbusier

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LE CORBUSIER: TRAÇOS DE ARQUITETURA, DESENHOS DA CIDADE.

BAUM, AMANDA ELIS (1); MULLER, CAMILA SOUZA (2); POKOMAIER,

NATÁLIA BORGES (3); ROCHA, LUIZA D’ARRIGO (4); DORFMAN, BEATRIZ

REGINA (5)

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

Faculdade de Arquitetura e Urbanismo

Av. Ipiranga, 6681 Partenon - Porto Alegre / RS CEP: 90619-900

[email protected]

1. [email protected]

2. [email protected]

3. [email protected]

4. [email protected]

5. [email protected]

RESUMO

Este artigo aborda o desenho livre, como uma extensão natural do pensamento visual e propõe uma

investigação sobre o uso do traço, ou do desenho feito à mão, nos processos de análise da paisagem,

de pesquisa e projeto de arquitetura e urbanismo. Um dos objetivos é demonstrar que a representação

gráfica contemporânea, com os desenvolvimentos da tecnologia digital vem somar possibilidades de

representação cada vez mais sofisticadas, mas, no entanto, não substitui os recursos da expressão

pelo desenho a mão livre. Analisa croquis de Le Corbusier, arquiteto que teve uma extensa produção

em desenhos, que está amplamente documentada na bibliografia. A elaboração dos cadernos de

desenhos de viagens teve parte decisiva, na formação profissional deste, que foi um dos nomes mais

importantes arquitetos da história moderna. Desenhos que registram, analisam, descrevem e propõem

representações, que desenham o imaginário urbano e compõem a diversidade das paisagens culturais.

Palavras chave: desenho, arquitetura, paisagem, projeto, Le Corbusier

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INTRODUÇÃO

Este artigo é parte do trabalho do Grupo de Pesquisa “Arquitetura e Cultura”, dentro da linha

de pesquisa “Desenhos de arquitetos” e está em andamento na Faculdade de Arquitetura e

Urbanismo da PUCRS. Inicia com um breve relato sobre a vida e a obra de Le Corbusier. A

seguir, estuda o desenho, dentro do processo de pesquisa e de projeto. Por fim, analisa

alguns desenhos de observação, dos cadernos de viagem do arquiteto, comparando-os com

alguns croquis de projetos urbanos para as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. Assim,

sintetiza conclusões que apontam para a importância da valorização do desenho a mão livre,

mesmo dentro do contexto atual, na era da comunicação digital, e propõe estimular o

desenvolvimento da expressão gráfica manual entre arquitetos, urbanistas e estudantes.

A pesquisa “Traços de arquitetura, desenhos da cidade” aborda o desenho livre, como uma

extensão natural do pensamento visual e propõe uma investigação sobre o uso do traço e do

desenho feito à mão, nos processos de análise da paisagem, de pesquisa e projeto de

arquitetura e urbanismo. Deste modo, os objetivos da presente pesquisa são o estudo do

desenho livre como forma de expressão, abordando as especificidades dos recursos do

desenho de observação e do traço gestual, dentro dos processos de projeto e análise da

paisagem, principalmente no que compete à arquitetura e ao urbanismo.

O desenvolvimento da tecnologia digital vem somar possibilidades de representação cada vez

mais sofisticadas, no entanto, não substitui os recursos da expressão pelo desenho a mão

livre. Pretende-se então, incentivar a adoção dessa técnica, a fim de ressaltar a importância

do traço, bem como a mistura das técnicas, diversificando as formas de representação.

Para compreender o modo de utilização de técnicas de desenho, buscou-se embasamento na

análise da vida, carreira e envolvimento com o desenho de arquitetos modernos e

contemporâneos, a fim de comprovar a harmonia que a arquitetura e o desenho possuem e

como podem transcender a folha de papel. A escolha do Arquiteto Le Corbusier se dá a partir

do seu método diferenciado de formação: através de viagens, nas quais analisava a paisagem

para a realização de desenhos de obras e cidades ao redor do mundo. Le Corbusier se tornou

um dos maiores e mais reconhecidos arquitetos da história, demonstrando que o desenho é

um dos principais pilares da formação de um arquiteto.

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2. A VIDA

Charles Edouard Jeanneret (Le Corbusier) nasceu em 6 de outubro de 1887, em La Chaux de

Fonds (Suíça – a alguns quilômetros da fronteira francesa). Sua mãe era uma pianista e seu

pai um relojoeiro. Seu sonho era pintar e escrever, a arquitetura ainda não lhe interessava.

Com a virada do século, Le Corbusier entra para a escola de arte, e é ali que se encontra com

Charles L’Eplattenier, um professor da escola que acreditava que Le Corbusier seria um

grande arquiteto. Foi ele quem conseguiu para o estudante um trabalho com um arquiteto

local.

Ainda com pouco dinheiro, Le Corbusier fez a sua primeira longa viagem, levando a mala

cheia de cadernos de desenhos, nos quais as folhas se esgotavam rapidamente, e um

manuscrito em que ia escrevendo para seu professor. Percorreu a Toscana, Bolonha,

Budapeste, Viena, Estrasburgo e Paris. Nesta última cidade, Le Corbusier conheceu Tony

Garnier, Auguste Perret e Gustave Perret, em cujo escritório iniciavam-se trabalhos em

concreto armado, o que alterou a sua visão da arquitetura.

Após três anos de viagem, voltou para a Suíça, e projetou duas vilas, onde aplicou os

conhecimentos adquiridos na viagem. Não demorou muito para que ele voltasse a viajar, com

destino à Alemanha, agora para trabalhar com Peter Behrens, professor de Gropius e Mies

van der Rohe, a quem admirava muito por seu interesse pela indústria e pela qualidade de sua

organização. Para Le Corbusier, Behrens, um artista, era o complemento ideal para Perret,

um construtor.

No ano de 1911, ele seguiu viagem para o Oriente, passando pela Ásia menor, Atenas,

România, Bulgária e novamente pela Itália. Foi nessa viagem, que teve contato, ao mesmo

tempo, com a arquitetura popular e o refinamento cultural da Acrópole. Ali percebeu que os

volumes estavam governados por uma geometria simples: quadrado, cubo e esfera.

De volta à sua cidade, agora fica por cinco anos construindo vilas, que ficavam a meio

caminho entre a Suíça e o Mediterrâneo, entre o passado e o futuro. A vila que mais se

destaca nesse período é a Schwob com influência de Frank Lloyd Wright, realizada em

concreto. Nestes anos, também surgiu o seu interesse por habitações sociais, por

construções em série, e pela reconstrução. Em 1914 surge a ideia do DOMINO, um módulo de

três pisos com 6 colunas e uma escada construída com elementos pré-fabricados, que

permitia flexibilidade total da superfície.

Em 1917, Le Corbusier parte para Paris e abre seu primeiro escritório com seu primo Pierre,

onde fará projetos até 1940. Com o pintor Amadeé Ozefant e o poeta Paul Dermeé, em 1920,

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coloca em andamento uma revista que se transformará em um órgão de expressão da

vanguarda pós-cubista intitulada L’Esprit Nouveau. E em 1923 reuniu 23 artigos que deram

origem ao livro Por uma Arquitetura. (CORBUSIER, 2006)

Dois anos depois do aparecimento do livro que lhe deu fama, o arquiteto projetou o pavilhão

de L’Espirit Nouveau para a Exposição Internacional de Artes Decorativas em Paris. Foram

anos brilhantes para Le Corbusier. Nesse tempo, construiu dezesseis vilas nos arredores de

Paris, das quais os maiores exemplos são a vila Jeanneret (construída para o seu irmão), a

vila Roche (para um colecionador de pintura cubista) e, talvez mais importante, a Vila Savoy,

projetada em 1929 para um agente de seguros. Foi nessa obra que o arquiteto aplicou os

cinco pontos da nova arquitetura: “os pilotis, o terraço jardim, a janela em fita, a planta livre e

fachada livre”. (ZABALBEASCOA, 1998, p 201)

Mesmo com tanto sucesso, também houve derrotas na vida de Le Corbusier, como, por

exemplo, a casa que ele fez para sua família em Corseaux, que foi considerada pelo governo

local como um crime contra a natureza, ou ainda o projeto de dois palácios que também foram

mal sucedidos.

Com a guerra nas portas da Europa, no final dos anos 30, acabam-se os anos de êxito e, em

1940, Le Corbusier fecha seu estúdio em Paris, e parte para Ozon. É ali que se dedica

novamente à pintura e à escritura. Nesta época, surge uma lei na Europa, que obrigava os

arquitetos a ter um título reconhecido pela associação profissional, mas mesmo Le Corbusier

não tendo qualificações acadêmicas para obter o título, suas obras puderam ser admitidas em

1944.

Interessou-se pela pré-fabricação e esses estudos tratavam de responder a uma pergunta:

“Como construir com rapidez moradias para uma população que cresce de maneira

explosiva?” Le Corbusier buscou respostas para tal pergunta a partir da inspiração e da

matemática. Após muito tempo de estudo, propôs um denominador comum das proporções

do homem e da geometria tradicional: as relações das medidas de um homem em pé, com o

braço levantado, combinadas com as leis da proporção áurea dariam como resultado as

dimensões ideais para uma habitação. A partir desse esquema, estabelece uma progressão

de medidas: o Modulor. (BOESINGER, 1971)

Nos anos seguintes, ele explica a sua teoria a Albert Einstein, do qual recebe uma nota de

aprovação. Em 1945, Le Corbusier é encarregado de construir um bloco de moradias (mais de

trezentas) em Marsella. Surge então a oportunidade de aplicar as teorias do Modulor, dando

origem a “unidades de vivendas de proporções humanas” (Unité d’habitation). O uso de

elementos pré-fabricados, a estrutura de concreto, a circulação interior, um espaço comum de

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um terraço com creche, tiveram como resultado um projeto tão cheio de novidades para sua

época que os atrasos das obras vieram acompanhados de uma inevitável polêmica.

Ao longo de suas viagens, Le Corbusier, foi tomando nota das suas visões e entendimentos

em um grande volume de cadernos que desde então passaram a ser um costume. Devido ao

conhecimento adquirido, ele construiu na Argentina, Japão, Alemanha e Estados Unidos. O

arquiteto não deixou de viajar nem de aprender em suas viagens.

Le Corbusier adquiriu grande parte de sua experiência arquitetônica através do estudo de

obras já executadas em diferentes locais do mundo. Viajou para as mais diversas partes do

globo e conheceu, nestes lugares, obras de tempos passados, que foram objeto de estudo e

que forneceram repertório ao arquiteto.

2.1. OBRA E PENSAMENTO

Além dos projetos de construídos, Le Corbusier publicou textos importantes, nos quais definiu

diversos dos fundamentos da teoria da arquitetura moderna. Antes do surgimento do

movimento moderno, ele criticara a forma de habitar dos tempos em que viviam. Era o

pós-guerra e muito se tinha evoluído nas engenharias em geral, os aviões e os transatlânticos

já haviam sido criados, enquanto a arquitetura continuava estagnada. A casa ainda era um

lugar insalubre, e seus moradores saiam para se reunir em locais com melhores condições.

Nas casas, a planta era antiquada e desordenada com muitos ambientes desnecessários e

com um excesso de móveis que dificultavam a circulação. Havia muitos elementos de

decoração, o que atrapalhava a permanência das pessoas no ambiente, já que toda essa arte

decorativa era cansativa aos olhos. As janelas eram meros buracos nas paredes, que não

traziam luz suficiente para o interior. As paredes eram demasiadamente grossas, mesmo com

a chegada das tecnologias que poderiam mudar essa realidade. Não se sabia projetar como

os engenheiros. “Os engenheiros americanos esmagam com seus cálculos a arquitetura

agonizante” (Corbusier, 1921, p.17)

Le Corbusier critica também a Escola de Belas Artes, que continuava a passar lições antigas

para os estudantes de arquitetura e a formar arquitetos que projetavam como no século

passado, pois não adotavam as formas puras que podem ser identificadas com um lance de

vista, e que estão vendados para as novas tecnologias.

Os arquitetos deste tempo, perdidos nos “esboços” estéreis de seus planos, nos arabescos, nas pilastras ou nas cumeeiras de chumbo, não adquiriram a

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concepção dos volumes primários. Nunca ninguém lhes ensinou isso na Escola de Belas Artes. (Corbusier, 2006, p.17)

Para Le Corbusier, a geometria e a matemática deveriam agora, como em outras épocas,

reger as formas arquitetônicas, a modulação e a proporção deveriam fazer parte dos projetos,

o ritmo e o equilíbrio seriam também responsáveis pela concepção de beleza da obra

arquitetônica, que é identificada através da harmonia entre o todo e as partes. A

funcionalidade da “máquina de morar” era o ideal a ser alcançado pela arquitetura moderna, e

este poderia ser atingido através da produção industrial e da construção em série. Segundo

Le Corbusier, os grandes problemas da construção moderna seriam resolvidos pela

geometria. (LE CORBUSIER, 2006, p.19)

O arquiteto, em um de seus textos, explica o significado do volume, da superfície e da planta,

o que cada um destes itens representa e como devem ser projetados a fim de transformar a

arquitetura em algo realmente moderno. E ainda afirma: “O volume e a superfície são os

elementos através dos quais se manifesta a arquitetura. O volume e a superfície são

determinados pela planta. É a planta que é a geradora. Pior para aqueles a quem falta

imaginação” (LE CORBUSIER, 2006, p. 13)

Baseado em estudos de Tony Garnier, Le Corbusier também defende o planejamento de uma

cidade que seja mais que um amontoado de casas, que seja pensada para trazer benefícios

para as pessoas, que afaste as suas casas da poluição das ruas e que ofereça aos residentes

lugares ao ar livre. Deseja que as torres sejam adotadas, já que o cimento armado e o aço

permitem tal façanha, deixando livre a disposição do solo, ganhando em altura aquilo que se

estendia em superfície.

Le Corbusier cria um ideal do que viria a ser o urbanismo moderno e dá soluções para as

cidades nas questões arquitetônicas e urbanísticas. Imagina as cidades-pilotis, onde o solo da

cidade é elevado de 4 a 5 metros, como se fosse uma plataforma, abaixo da qual estariam

todas as instalações necessárias para uma vida na cidade, como água, gás, eletricidade,

telefone e esgoto, facilitando o acesso a estas. Apoiou também o plano de Auguste Perret

para as cidades-torres, onde as moradias estariam localizadas em grandes torres, bem

espaçadas entre si, e o chão da cidade seria um imenso parque.

Outro pensamento de Le Corbusier para a cidade moderna seria utilizar os terraços dos

prédios, já que o concreto permitia que assim fosse feito ao invés dos grandes e velhos

telhados, para comportar lojas e cafés, pois o alto das torres seria um local muito mais

propício para estes ambientes do que as ruas.

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Le Corbusier enxergava o avanço tecnológico como a oportunidade de criar uma arquitetura

com a cara da época em que viviam e com o poder de solucionar os problemas da construção

que se tinha nesse tempo. Para ele, era muito mais fácil construir em série e muito mais

seguro trabalhar com materiais industrializados, que foram testados, então acreditava que a

melhor solução para o problema da construção era adotar estas técnicas. No ano de 1914,

Corbusier tenta resolver os problemas da reconstrução das cidades do pós-guerra, com a

proposta da estrutura DOMINÓ. (BOESINGER, 1971)

3. O DESENHO

A história da humanidade e a história do desenho estão diretamente ligadas. O desenho

surgiu na pré-história, como forma de expressão e de comunicação, através de processos ou

técnicas de representações das atividades cotidianas e de elementos da natureza e, ao longo

do tempo, tornou-se uma linguagem visual.

Na essência de todos os desenhos, existe um processo interativo de ver, imaginar e representar imagens. A ação de ver cria as imagens da realidade externa que percebemos de olhos abertos, o que possibilita nossa descoberta do mundo. Com os olhos fechados, a mente apresenta imagens de realidade interior – memórias visuais de eventos passados ou projeções de um futuro imaginário. A partir daí, existem imagens que criamos no papel – os desenhos que usamos para expressar e comunicar nossos pensamentos e percepções. (CHING, 2001, p.3)

Como a linguagem escrita possui as letras, palavras e assim sucessivamente, a linguagem

visual também expressa-se através dos elementos que a compoem e são os geradores da

forma. O ponto é o mais simples destes elementos, estabelece uma posição no espaço, sem

dimensão, é estático, centralizado, sem direção, sem formato nem forma.

Conforme o ponto se move pela superfície, ele traça o caminho de uma linha que possui

características como comprimento, direção e posição. É unidimensional e um dos elementos

essenciais para a construção de qualquer tipo de desenho, pois une, conecta, sustenta,

circunda ou intersecciona outros elementos.

O plano é a extensão de uma reta em uma direção que não a sua de origem, é bidimensional

e possui características como comprimento e largura, formato, superfície, orientação, posição.

Algumas das propriedades dos planos, tais como sua cor, padrão e textura superficiais afetam

o peso e a estabilidade visual do plano.

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O volume é a extensão de um plano com propriedades de comprimento, largura e

profundidade, forma e espaço, superfície, orientação, posição. É tridimensional e composto

por: planos e vértices, linhas ou arestas. A principal característica do volume é a presença da

forma, que é composta pelo formato (contorno), textura (qualidade visual), cor (fenômeno de

luz), tamanho (dimensões físicas). A proporção dos elementos se dá através dessas

dimensões físicas, entretanto a escala é determinada pelo tamanho relativo a outras formas

de seu contexto. A cor é atributo que mais claramente distingue uma forma de seu ambiente.

Há diversos tipos de desenhos que se aplicam aos mais variados contextos. Os mais comuns,

no campo da arquitetura, são os que auxiliam na elaboração dos projetos, desde a primeira

ideia até a sua finalização. Os desenhos de estudo se destinam a registrar o que já existe,

como as ideias e especulações. Tais desenhos são croquis rápidos, gestuais. Os esboços

também são muito importantes na etapa de projeto, pois auxiliam a testar as soluções

encontradas.

Qualquer que seja a forma do desenho, representa o princípio com base no qual

organizamos e expressamos pensamentos e percepções visuais. Portanto, devemos

olhar o desenho não só como expresssão artística, mas também como ferramenta

prática para formular e trabalhar em questões de representação gráfica. (CHING,

2001, p.1)

Os desenhos de observação são muito importantes na formação do arquiteto, pois utilizam a

percepção visual, através da qual estes dados são processados para então serem

representados. Já os desenhos técnicos de projeto têm a função de instruir e comunicar para

a construção dos mesmos. Esse modelo é imprescindível para a criação do projeto, pois

contém uma linguagem de desenho e registra informações técnicas importantes.

3.1. O DESENHO NO PROCESSO DE PROJETO

A profissão de arquiteto atende às necessidades da hierarquização do trabalho e da demanda

da construção. Conforme a classificação de Silva (1998), isso ocorreu a partir do

desenvolvimento da sociedade organizada e o conceito de projeto é sempre relacionado à

profissão. Ao se ramificar e se especializar, o arquiteto começa a atender ao sistema de

intermediação, o usuário expõe suas necessidades e preferências ao arquiteto, que sintetiza e

organiza através do projeto, uma descrição ou modelo a ser construído, atendendo a suas

demandas.

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Os principais desenhos a serem desenvolvidos em um projeto arquitetônico, na qual o

conceito é representado, além dos esboços, são: a implantação, plantas baixas, cortes,

elevações e as perspectivas.

O projeto, fundamental para a carreira de um arquiteto, necessita da percepção do todo, como

o ambiente, as necessidades, as formas, o lugar, e o orçamento. A partir da demanda,

determina a execução do projeto, de acordo com normas e convenções, criadas para o seu

entendimento, sendo a linguagem gráfica e o desenho arquitetônico. Por este motivo, o

desenho é, segundo Filho (2005), uma importante forma gráfica de comunicação universal em

todos os tempos: prática, versátil e objetiva que permite a transmissão de forma, grandeza e

locação, do conhecimento técnico e artístico. Fazendo-se essencial no dia-a-dia dos

profissionais da construção:

O projetista inventa o objeto no ato mesmo de representá-lo. Isto é, desenha um objeto inexistente, cada vez com maior precisão. Tal precisão é um aumento de detalhes dentro do sistema de regras da própria representação. Assim, o desenho é a descrição progressiva de um objeto que não existe no começo da descrição. (MARTÍNEZ, 2000, p.12)

Com isso, o autor descreve o ato da criação, que no início não há nada além da ideia e que

conforme progridem os traços, através do desenho, o projeto se torna realidade. O desenho

coloca em prática as ideias, assim diversos autores o trazem em suas metodologias como

ponto principal. Silva (1998), em sua abordagem teórica, definiu seis categorias que podem

ser examinadas no projeto arquitetônico, para estabelecer seu nível de qualidade enquanto

proposta de solução para um problema particular de organização do entorno humano. A

última seria a exemplificação da importância que a expressão gráfica possui para a

compreensão. Neste tópico, como sugere o autor, a descrição deve ser completa, abordando

a totalidade do objeto descrito, de modo a refletir a abrangência obtida. Sendo necessário o

uso, tanto do desenho, quanto do texto, com o objetivo de informar, compondo assim uma boa

comunicação.

Já Ching (2013), propõe um panorama de elementos, sistemas e organizações básicos que

compõem uma obra de arquitetura. Elementos dominantes e coadjuvantes, mas que se

relacionam entre si para formarem um todo integrado com uma estrutura unificada ou

coerente. Parte destes, que são separadas entre físicos, perceptivos e conceituais, um único

tópico traz toda a parte gráfica, enfatizando novamente a importância do desenho. O último

item é descrito como a “compreensão das relações ordenadas e desordenadas entre os

elementos e sistemas de uma edificação e resposta aos significados que evocam”.

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Os autores descrevem o projeto com algumas particularidades e, em ambos, o desenho é um

fator imprescindível para um projeto de qualidade. Essa importância e abrangência podem ser

percebidas nas faculdades de arquitetura e urbanismo e engenharias, nas quais a disciplina

de desenho sempre está presente nos currículos, apenas com diferenciações nas

nomenclaturas.

Além disso, as formas com que a linguagem gráfica se faz presente variam de manual a

digital, cada uma com suas particularidades. A primeira como a forma mais primitiva, através

da caneta e do papel e a segunda mais atual, que se desenvolve cada vez mais,

principalmente com a tecnologia presente oferecendo agilidade e praticidade através dos

programas e softwares. Contudo, as técnicas são complementares e devem ser utilizadas em

conjunto, trazendo os benefícios de cada uma para a formação de profissionais cada vez mais

capacitados.

O desenho em um projeto arquitetônico é a comunicação com os intervenientes, é a

“materialização” de uma ideia, é a forma de visualizar o objeto que não existe. Através do

desenho, o arquiteto conversa com o cliente, que é capaz de compreender o projeto como

solução para os seus desejos e necessidades.

4. OS CROQUIS DE VIAGEM

Ao viajar, além de conhecer e contemplar os lugares e obras que percorria, Le Corbusier

retratou as paisagens urbanas com seu traçado, fazendo surgir seus desenhos de estudo,

objetos dessa pesquisa. Com seus desenhos, em sua maioria croquis rápidos, é possível

compreender a natureza, incentivando que a inserção das obras no ambiente seja feita de

maneira a respeitar as pré-existências e assim formar um conjunto harmônico: A paisagem

cultural.

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Figura 1 - Propileus, Acrópole, Atenas. Fonte: BOESIGER, W, STONOROV, O. (1929). Le Corbusier et

Pierre Jeanneret: oeuvre complete, 1910-1929. 15ª edição. Berlim: Birkhäuser, 1999, v. 1. Pág. 19.

Um de seus destinos foi Atenas, onde a arquitetura clássica se faz presente, que inspirou

tantos outros períodos da nossa história e que ainda influencia. Lá, dentre várias de suas

análises, o desenho do Propileus chama atenção: um croqui rápido, sem tanta técnica, mas

que consegue transmitir o que ocorre no local através de sua expressão. Linhas horizontais e

a perspectiva conduzem a vista para a cidade ao fundo. Começando pelas linhas, as

diferentes espessuras de traçado estruturam o Propileus, um dos antigos templos de Atenas,

local onde a economia foi palavra chave para sua construção é refletida, agora, em seu croqui;

economia não prejudicial, mas que unifica, insere leveza e relaciona seus elementos com o

contexto. O entorno, composto da mistura de grafites, permite a sensação de profundidade

com seu ponto de fuga, de uma linda paisagem que cerca as ruínas. Ao mesmo tempo, as

pedras das ruínas espalham-se por todo o terreno. O desenho do templo, com seus traços

expressivos, faz reconstruir a imagem real e apresenta tantas informações quanto uma

fotografia, com a vantagem de ser uma maneira de estudar as formas. Colunas desenhadas

por linhas finas contrastam com a sombra, o coroamento, constituído de apenas duas faixas,

remete à ornamentação e marca a horizontalidade do local.

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Figura 2 - Propileus, Acrópole, Atenas. Fonte: BOESIGER, W, STONOROV, O. (1929). Le Corbusier et

Pierre Jeanneret: oeuvre complete, 1910-1929. 15ª edição. Berlim: Birkhäuser, 1999, v. 1. Pág. 19.

Continuando o percurso, a outra face do Propileus é retratada acima, seguindo o mesmo estilo

de traço rápido, porém com mais detalhes, permitindo a ideia da construção no terreno e parte

da vista para a cidade. Ao lado, parte do Templo da Vitória Áptera coberto por traços

indefinidos que compõem sua sombra, assim como no Propileus, com seus traços diagonais

permitindo uma maior ambientação do lugar. Nesse croqui, o relevo se acentua e é marcante

chamando atenção por estar em primeiro plano, fato que se assemelha ao primeiro. O

Propileus se encontra em um plano mais ao fundo, porém ainda em posição de destaque

compondo uma paisagem histórica e elegante. As duas imagens se diferenciam na

quantidade de traços, sendo o primeiro mais contido principalmente por não haver um

desnível. O segundo passa a sensação de ser mais detalhado, apesar de ainda simples e

rápido, um vislumbre da construção, mas sem descaracterizá-la. Detalhes como a espessura

do traço ou as ordens mostram a minúcia do arquiteto, que muitas vezes passam

despercebidos e que fazem a diferença no final.

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Figura 3 - Pisa. Fonte: BOESIGER, W, STONOROV, O. (1929). Le Corbusier et Pierre Jeanneret: oeuvre complete, 1910-1929. 15ª edição. Berlim: Birkhäuser, 1999, v. 1. Pág. 19.

Em sua viagem pela Itália, Le Corbusier chega a Pisa, onde realiza mais alguns croquis de

observação. Nestes croquis, ele representa o Campo dei Miracoli, que integra a Catedral, o

Batistério e a Torre Sineira, desenhando o conjunto e não cada um dos edifícios em separado.

O primeiro, onde estão representadas a torre sineira e a catedral, fornece a ideia da relação

de escala entre eles. Neste croqui, o que prevalece são as texturas e sombras, enquanto os

elementos como janelas e colunas possuem menor ênfase. A perspectiva, nesse desenho, é

marcada pelas linhas horizontais que contrastam com o desenho vertical da torre, além das

linhas curvas usadas na representação e que lhe dão profundidade.

Já no segundo desenho, mesmo estando presente um trecho da catedral e do camposanto, o

foco é o batistério. Se, no anterior, a perspectiva é insinuada por algumas linhas, neste, é

possível identificar o ponto de fuga utilizado para estruturar o desenho. É então um croqui que

mostra a visão do próprio Le Corbusier ao caminhar pela praça e se aproximar do batistério,

conseguindo transmitir essa ideia de trajeto a ser percorrido. Como no desenho analisado

anteriormente, o que predomina é o contraste de luz e sombras junto com a textura forte de

lápis. Mesmo sendo um croqui sintético, ele consegue transmitir a essência do lugar.

Comparando com uma foto do mesmo local, percebe-se a economia de detalhes no croqui.

Ele realiza, portanto, croquis rápidos, gestuais, com o traço solto e leve. Esses croquis de Pisa

possuem uma expressão muito forte, são intensos, utilizam-se de jogos de luz e sombra,

características que intensificam a força dos edifícios representados.

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Figura 4 – Oriente. Fonte: BOESIGER, W, STONOROV, O. (1929). Le Corbusier et Pierre Jeanneret:

oeuvre complete, 1910-1929. 15ª edição. Berlim: Birkhäuser, 1999, v. 1. Pág. 18.

O croqui acima é uma cena onde o foco está no nível do observador. Há uma árvore um pouco

mais à frente do que vem adiante, um volume, como uma casa, que possui esquadrias nas

janelas e um esquema para ser adaptado à topografia sinuosa. Ao fundo, se observam outros

volumes que possuem chaminés que se sobressaem sobre o restante. Ao lado, uma torre

bem alta e que aparenta estar mais distante do observador do que os demais volumes. À

frente e ao lado desta última, há diferentes tipos de vegetação.

Neste croqui, Le Corbusier representa uma paisagem urbana, onde há casas, torres e

vegetações. É possível diferenciar estes objetos não apenas por suas formas, mas também

pelo investimento no tratamento das retículas e hachuras utilizadas, que também

caracterizam os diversos materiais de construção e criam a percepção de luz e sombra, que

permite definir o que está em cada plano do desenho da cidade. As espessuras das linhas do

croqui, também ajudam na percepção do que está mais próximo ao observador e o que está

mais distante do mesmo. A maneira como ele trata as saliências e reentrâncias dos volumes,

juntamente com as sombras, permite o entendimento da topografia do terreno.

Em seu repertório de croquis de estudo, Le Corbusier apresenta vários desenhos de cenas

urbanas e silhuetas das cidades e em cada um deles é possível perceber uma característica

importante. Assim como no descrito acima, as texturas, sombras e a espessura das linhas são

marcantes. Em outros, esses mesmos elementos são abandonados, mas nem por isso os

desenhos perdem sua importância.

O desenho abaixo é um contraponto ao analisado anteriormente, porém não menos

expressivo. Neste desenho, com linhas finas, os edifícios são amarrados criando um perfil

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para a cidade. Sem a anterior preocupação com a definição dos planos de fundo, que trazem

a sensação de algo que está mais perto ou mais longe, e também sem a definição dos

diferentes materiais e dos jogos de luz e sombra, mas com a intenção de gravar a imagem da

cidade com o foco no horizonte.

Figura 5 – Impressões das viagens de Le Corbusier. Fonte: BOESIGER, W, STONOROV, O. (1929). Le

Corbusier et Pierre Jeanneret: oeuvre complete, 1910-1929. 15ª edição. Berlim: Birkhäuser, 1999, v. 1.

Pág.17.

Ao analisar esse croqui, em primeiro momento, percebe-se o desenho de parte de uma cidade

vista de longe. Trata-se de um croqui rápido, apenas para registrar o desenho da paisagem

sem incluir nenhum detalhe e nem mesmo o contorno de cada elemento visto. Esse desenho

faz parecer uma passagem rápida e relativamente distante desse lugar. É como se Le

Corbusier estivesse passando a caneta, sem nem mesmo olhar para o papel, apenas

observando a paisagem a sua frente e traçando o que via.

O croqui apresenta pouquíssimos traços, e é o que mais chama atenção neste desenho, já

que com praticamente uma linha, o desenho da paisagem observada por ele consegue ser

expresso claramente. Os traços utilizados por Le Corbusier neste croqui são muito gestuais e

apesar do croqui não apresentar sombras e hachuras, ainda assim ele é muito expressivo. As

linhas são extremamente soltas e finas, a parte branca que acontece em praticamente todo o

desenho, parece desaparecer, já que ficamos tão concentrados no perfil da cidade.

4.1 VIAGENS À AMÉRICA LATINA

Le Corbusier, quando já arquiteto reconhecido, fez viagens para a America Latina e, nos

paises por onde passou, fez estudos para a urbanização de cidades como Buenos Aires,

Montevideu, São Paulo e Rio de Janeiro.

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Tais croquis podem ser relacionados com o conceito de Paisagem Cultural, pois representam

a visão de Le Corbusier a respeito da paisagem de cidades latinoamericanas. Estes desenhos

também evidenciam aspectos contraditórios de suas concepções urbanísticas já que insere

seus projetos nos desenhos de paisagens naturais. Propõem transformações radicais, que

abalam o crescimento espontâneo das cidades, através de propostas de estruturas viárias

gigantescas. São propostas que demonstram o que hoje percebemos como uma visão

superada a respeito das intervenções urbanas, mas muito própria da arquitetura moderna da

década de 1930 e principalmente de Le Corbusier. São Paulo, Rio de Janeiro, Montevideo

foram alguns lugares da América Latina que ele representou, com uma clara percepção de

traços morfológicos. Nestes croquis, foram inseridas propostas utópicas de urbanização

agredindo o ambiente. Não muito diferente dos projetos para Paris, nos quais Le Corbusier

representou a ideia de substituição do antigo pelo novo, inserindo enormes blocos

residenciais e grandes espaços ajardinados, destruindo a paisagem histórica da cidade.

Figura 6 - Propostas urbanísticas para São Paulo e Rio de Janeiro. Fonte: HARRIS, E. D. Le Corbusier: riscos brasileiros. São Paulo: Nobel, 1987.

Na visão contemporânea, o objetivo está em preservar a paisagem cultural. De acordo com

Castriota (2013): “Paisagens culturais representam o trabalho combinado da natureza e do

homem.”, ou seja, é modificar pensando que o projeto não deve ser um objeto solto no

espaço, mas sim concordar com o seu entorno, trazendo uma arquitetura coesa com o

ambiente em que está. E os croquis são os instrumentos adequados para perceber o pré

existente ao permitir a interação e formulação de estratégias para o tratamento da Paisagem

Cultural.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Le Corbusier viajou o mundo explorando diversos lugares e ambientes. Entre seus itens na

bagagem, estavam os instrumentos de desenho, que permitiam um olhar diferenciado de suas

visitas. Estes croquis de viagem, muitas vezes simples, mas sempre com um olhar minucioso,

permitem viajar através de seus olhos, amplificando assim os conhecimentos acerca de

arquitetura.

O estudo dos exemplos dos croquis de Le Corbusier vem confirmar a importância do desenho

de observação a mão livre em todos os âmbitos da arquitetura e do urbanismo. O desenho

auxilia no estudo de obras arquitetônicas e das soluções de projeto, na medida em que,

através dele, as informações são absorvidas com mais eficiência do que com a simples

observação. O croqui pode ser executado com a velocidade do pensamento e é

imprescindível durante os processos de estudo e de projeto de arquitetura e urbanismo. Deve

ser muito bem estudado e explorado pelos os estudantes deste curso, porque o desenho é

parte fundamental para o pleno entendimento do projeto e para o estudo da paisagem.

REFERÊNCIAS

BOESIGER, W, GIRSBERGER, H. Le Corbusier 1910-65. Barcelona: Editora Gustavo Gili,

1971.

BOESIGER, W, STONOROV, O. (1929). Le Corbusier et Pierre Jeanneret: oeuvre complete,

1910-1929. 15ª edição. Berlim: Birkhäuser, 1999, v. 1.

CASTRIOTA, Leonardo. Paisagem cultural: novas perspectivas para o patrimônio. Arquitextos

n. 162.02, ano 14, nov. 2013.

CHING, D. K. Francis. Arquitetura: forma, espaço e ordem. 3ª edição. Porto Alegre: Bookman,

2013.

CHING, D. K. Francis. Representação gráfica para desenho e projeto. 1ª edição. Barcelona:

Editora Gustavo Gili, 2001.

FILHO, J. B. Arlindo. Desenhos de projeto I-CVL51. Universidade federal da Uberlândia;

Faculdade de Engenharia Civil – FECIV, 2005. Disponível em:

<http://www.daciv.feciv.ufu.br/arquivos/ApostilaVolume1.pdf> Acessado em 20/07/2016

HARRIS, E. D. Le Corbusier: riscos brasileiros. São Paulo: Nobel, 1987.

LE CORBUSIER. Por uma arquitetura. 6ª edição. São Paulo: Editora Perspectiva S. A., 2006.

MARTINEZ, C. Afonso. Ensaio sobre o projeto. Brasília: Universidade de Brasília: 2000.

PEREIRA, C. S. Margareth, e outros. Le Corbusier e o Brasil. São Paulo: Tessela: Projeto

Editora, 1987.

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SCHULER, Denise; MUKAY, Hitomi. Apostila da Disciplina de Desenho Técnico I. Curso de

Arquitetura da Faculdade Assis Gurgacz – FAC. Cascavel. Disponível em:

/http://pt.slideshare.net/WanderleyMartins/apostila-desenho-arquitetura-fag-1/ Acessado em

20/07/2016.

SILVA, Elvan. Uma introdução ao projeto arquitetônico. 2ª edição. Porto Alegre: Editora da

Universidade/UFRGS, 1998.