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Linhas, Livro 2

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Trecho da continuação do livro Linhas

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Linhas é uma série!

Leia um pouquinho do que vem por aí....

N unca tinha visto Crow com uma cara tão assustada. E

dessa vez, ela tem motivos.

Estamos diante da matriz da Miss Teen, na Oxford Street.

É um espaço enorme, reluzente, praticamente vazio. Por en-

quanto. Você poderia até pensar: nossa, uma oportunidade

perfeita para fazer compras. Nada disso. Não estamos fazen-

do compras, estamos esperando. E não somos as únicas. Há

apenas uma imensa vidraça entre nós e a maior e mais baru-

lhenta multidão que eu já vi. Ela vem aumentando há horas.

As pessoas conseguem nos ver. Berram nossos nomes e fazem

uma contagem regressiva para o momento em que poderão

nos alcançar.

Aliás, há apenas uma vidraça e uma supermodelo.

Svetlana Russinova faz poses na vitrine. Ela está com um

dos vestidinhos com corpetes bordados com fi os dourados

de Crow e uma saia sedutora que exibe suas pernas. Lem-

bro-me de Crow desenhando aquele vestido na primavera

passada.

De vez em quando, Svetlana olha para trás, para nós três,

as meninas encolhidas na loja, e diz alguma coisa muito útil

como: “São milhares delas. Sério. A Oxford Street está lotada.

Vocês têm certeza de que vão todas caber aí dentro?”

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Não, para falar a verdade, não temos certeza. Não temos

certeza sequer se vamos conseguir receber metade delas aqui

dentro. Ou se vamos conseguir sobreviver. Ou melhor, se

vamos ter peças sufi cientes da nova coleção prêt-à-porter de

Crow para vender a todas, quando chegarem até aqui.

Andy Elat é a única pessoa que parece estar remotamen-

te relaxado. É o dono da Miss Teen. Ele disse: “Vamos fazer

o grande lançamento da nova coleção antes do Natal. Todo

mundo está falando do assunto. Vai ser um grande aconteci-

mento. Vocês vão adorar.”

Se ele tivesse dito “Vai ser como estar no meio de uma ca-

tástrofe natural coberta de lantejoulas”, nós saberíamos o que

esperar. Mas ele não disse. E aqui estamos nós.

Crow parece a mais apavorada de todas, mas conta com

o apoio do irmão, Henry. Ela está agarrada a ele como se sua

vida dependesse disso. Tenho minha amiga Jenny e estou mais

ou menos agarrada a ela, mas para ser sincera, ela parece estar

me agarrando mais.

— Parecem furiosas — ela cochicha. — Você tem certeza

de que devemos deixá-las entrar, Sr. Elat?

— Estão só empolgadas — diz Andy, com calma. — Tudo

bem, Svetlana. É melhor descer daí. Obrigada, querida. Dois

minutos, rapazes.

Os seguranças fazem um sinal com a cabeça. São gran-

des, de aparência assustadora, e provavelmente vão ficar

bem. Somos pequenas, adolescentes e desarmadas. Estou

tentando me lembrar porque resolvi trabalhar com Crow.

Ou por que achei que lançar uma coleção de prêt-à-porter

seria uma ideia legal. Ou por que não decidi fazer isso quan-

do me encontrasse a um milhão de quilômetros de dis-

tância.

— Três. Dois. Um. Abram as portas, rapazes.

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Grito grito grito grito. E a próxima coisa que a gente se dá

conta e que estão vindo na nossa direção.

É isso aí. Minha amiga Crow virou ofi cialmente uma esti-

lista do prêt-à-porter. Stella McCartney já fez isso. Christopher

Kane já fez isso. É a nossa vez.

Observo a multidão nos atropelar e passar por cima de

nós, ansiosa para pôr as mãos em suas peças favoritas antes que

desapareçam. Ainda bem que Andy rejeitou minha ideia so-

bre Jenny. Como administradora ofi cial dos negócios de Crow

(sim, é verdade!), a princípio eu queria que Jenny fosse a pes-

soa a fi car na vitrine, fazendo poses com as roupas de Crow,

parecendo maravilhosa. Jenny é ruiva, curvilínea e engraçada,

e deixaria claro para todo mundo o fato de que os vestidos de

Crow fi cam ótimos em qualquer pessoa. Além do mais, Jenny

foi a primeira pessoa mais ou menos famosa a usar as coisas de

Crow em público, antes mesmo de ela se tornar uma marca.

Mas Andy achou que seria melhor contar, nesta ocasião,

com uma supermodelo de fama internacional, no lugar de uma

garota de 16 anos, ligeiramente rechonchuda, que apareceu em

um fi lme. E olhando para Jenny neste momento, em seu vestido

“clássico” (do ano passado) criado por Crow, tremendo da ca-

beça aos pés, preciso admitir que ele estava com a razão.

Svetlana vem se juntar a nós. Ela trocou a roupa por calças

jeans sequinhas, desbotadas, e um casaco com capuz, cobrin-

do a cabeça com o capuz para fi car parecida com qualquer

outra loura alta, magra e deslumbrante, e não ser identifi cada

por gente demais da multidão.

— Está indo bem — diz ela. — Estão amando. Olhem só!

Se “amando” signifi ca para ela jogar peças no ar, agarrá-las

e montar grandes pilhas, brigar e chorar, então ela tem razão.

As saias de pétalas são as que desaparecem mais rápido.

São feitas de seda suave, com tons de pedras preciosas, que

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capturam o olhar na mesma hora. E, quando você as veste,

elas balançam e estremecem ao caminhar. É como usar um

pedacinho de uma escultura de seda que tem movimentos.

Os suéteres vão levar um pouco mais de tempo para fazer su-

cesso, porque é preciso experimentá-los para perceber como

são incríveis. Parecem um tanto sem forma no cabide, mas

no corpo transformam até uma adolescente baixinha e meio

retangular, como eu, em uma gatinha sexy.

As camisetas fazem um sucesso surpreendente. São apenas

camisetas, afi nal de contas. Embora Crow tenha passado se-

manas e semanas até acertar a forma para que fi zessem qual-

quer garota parecer linda e cheia de curvas. É o lado bom de

ter como melhores amigas um poste, um violão e uma anã.

Você fi ca esperto ao cortar os moldes, e aprende a fazer com

que todo mundo fi que bem. Crow faz com que tudo pareça fá-

cil, mas não é. As camisetas têm cristais bordados que reluzem

com as luzes da loja. Crow é mais conhecida por fazer vestidos

de alta costura usados por atrizes famosas — como costuma

acontecer com todo mundo que está prestes a completar 14

anos — e aqueles trajes para o tapete vermelho costumam

estar salpicados de cristais Swarovski. Por isso, as camisetas

também estão assim. É dezembro e acho que vão aparecer

muitas camisetas com cristais e saias de pétalas nas festas de

Natal deste ano.

As fábricas fi caram ocupadas por semanas, preparando

essas coisas. Fiquei horrorizada quando vi tudo chegar. Caixas

e caixas e caixas, da Índia e das Filipinas. Não podia imaginar

como seria possível vender tudo aquilo, e agora me pergunto

se vieram peças em número sufi ciente.

Procuro por Crow, para ver como ela está, mas ela desapare-

ceu. Ai, ai. Faço um sinal com a cabeça para Jenny e formamos

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uma equipe de busca. Acabamos encontrando-a refugiada na

seção de sapatos, no alto de uma vertiginosa escadaria, que

está completamente vazia, a não ser por ela e o irmão.

Henry, como sempre, está lendo. Parece ter confundido

a loja mais quente de londres com uma biblioteca públi-

ca, mas Crow parece feliz em fi car encolhida sob um de seus

braços, quietinha, sentada. É estranho pensar que há alguns

anos, ele estava em Uganda, segurando uma metralhadora,

em vez de se sentar aqui, segurando a irmã e uma antologia

de poesia. Não que ele quisesse ter alguma coisa a ver com

aquela história de metralhadora. Ele fi ca bem mais à vontade

com o livro.

Ele sorri para Crow e os grandes olhos dela retribuem, va-

cilantes. Me parece uma crueldade obrigá-la a encarar o fu-

racão lá embaixo. Afi nal de contas, ela não pode fazer muita

coisa a essa altura. Não é como se ela estivesse fazendo falta no

caixa ou coisa parecida.

Nos últimos tempos, ela cresceu bastante. Está com a mi-

nha altura (o que eu acho que não quer dizer muita coisa,

mesmo parecendo muito para mim), com pernas e braços

compridos e que lembram as imagens dos potrinhos que lu-

tam para fi car de pé em suas longas patas, e talvez seja por isso

que eu sinta esta necessidade de tomar conta dela. Isso e os

olhos castanhos sonhadores, os dedos esguios, que sugerem

que ela é uma criatura frágil e delicada. Embora eu suspeite

que, na verdade, seja tão resistente quanto botas Doc Martens.

— Quinze minutos — digo, apontando o relógio de pulso

e os elevadores que conduzem às salas lá em cima. Henry me

vê e assente. Ele sabe da programação.

Jenny e eu respiramos fundo, e nos preparamos para mer-

gulhar de volta naquele tsunami humano.

— Aliás, o que aconteceu com Edie? — indaga.

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Boa pergunta. Edie é nossa outra melhor amiga, um com-

pleto geniozinho, que deveria ter chegado aqui uma hora

atrás. Estou a ponto de responder quando meu telefone toca.

É uma surpresa. Esqueci de recarregá-lo na noite passada e

achei que a bateria tinha morrido. O nome de Edie aparece

na tela.

— Nonie? Estou a caminho. Mas invadiram meu site na

internet. Estão dizendo que sou uma mentirosa e tem tudo a

ver com Crow. Estão dizendo...

Bem, não sei o que estão dizendo porque a bateria decide

acabar de vez neste momento. Edie é cortada, a tela fi ca escu-

ra, para que não haja dúvidas.

Por trás de hordas de consumidoras superexcitadas, Andy

Elat dá uma olhada em meu rosto e obviamente não gosta do

que está vendo.

— Está tudo bem, Nonie? — balbucia.

— Tudo bem — respondo, fazendo um sinal positivo com

o polegar, para tranquilizá-lo mais ainda.

Estou acostumada a mentir para os adultos. É um velho

hábito. Simplifi ca as coisas.

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