Livro 1 - Vila Rica Populacao 1719-1826 - Parte 2

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    SEGUNDA PARTEVILA RICA: O CENSO DE 1804.

    I - VILA RICA NO ALVORECER DO SCULO XIX.

    Antes de passarmos anlise do levantamento populacional em epgrafe esboaremos operfil de Vila Rica como se apresentava no incio do sculo passado. Para tanto, servir-nos-emos das crnicas de quatro viajantes europeus: Auguste de Saint-Hilaire, visitouOuro Preto em dezembro de 1816; John Mawe, ali esteve pelos anos 1809-1810; JooMaurcio Rugendas,a conheceu nos primeiros anos do segundo quartel do sculo XIX e,finalmente, W. L. Eschwege -- chegou a Minas em 1811, residiu por vrios anos em VilaRica deixando-a, em abril de 1821, a encetar viagem de retorno Europa. (1)

    O quadro desta rea mineira ao abrir-se o sculo XIX revelava-se desolador. Superada a'febre" do ouro, a economia estagnara-se e apresentava-se franca recessopopulacional. Nos arredores de Vila Rica descortinavam-se campos desertos, sem

    lavouras ou rebanhos. Dos morros, esgaravatados at a rocha, havia-se eliminado a vidavegetal; neles restavam montes de cascalho e casas, na maioria , em runas.

    A pobreza dos habitantes remanescentes e a existncia de ruas inteiras quaseabandonadas provocava imediata admirao nos visitantes que passavam por Vila Rica.Das duas mil casas, quantidade considervel no estava ocupada, o aluguel mostrava-secadente; a queda dos preos alcanou 50% nas transaes imobilirias. A populao,que alcanara, como atesta Saint-Hilaire, vinte mil pessoas, reduzira-se a oito milhares;tal quebra no nmero de habitantes teria sido ainda maior no fosse Vila Rica a capitalda capitania, centro administrativo e residncia de um regimento.

    A acompanhar a decadncia geral deteriorava-se, tambm, a assistncia educacional e

    hospitalar. O Seminrio de Mariana, fundado por mineiros ricos para educar seus filhossem que fosse necessrio envi-los Europa, no conseguia sobreviver crise, asterras que a entidade possua esgotaram-se, os escravos morreram; os mineradores,cuja riqueza minguara, no mais podiam sustentar o educandrio. Segundo Saint-Hilaire"era o momento de as autoridades eclesisticas e civis se reunirem para vir em socorrode um estabelecimento to til provncia... porm... achou-se mais cmodo fechar oseminrio". (2)

    O mesmo autor deplorava, ainda, que -- numa capital onde despendera-se grande somade dinheiro na ereo de templos religiosos -- o nico hospital fosse mantido pelaIrmandade da Misericrdia, sem contar com apoio governamental. (3)

    A atividade manufatureira, proibida durante largo espao de tempo, revelava-se tmida.Existiam na vila e suas proximidades, to-somente, a manufatura de plvora,pertencente ao governo, e uma fbrica de loua, estabelecida a pequena distncia deVila Rica.

    Ao que parece, o comrcio e atividades artesanais compunham os elementos desustentao econmica da urbe. Conforme John Mawe, poucos habitantes, excetuadosos lojistas, tinham de que se ocupar; as casas comerciais voltadas para a venda dosprodutos da rea revelavam-se pobres e em pequeno nmero. Existia, como j referimos

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    e ficar patenteado no correr deste trabalho, quantidade substancial de artesos:alfaiates, costureiras, sapateiros, latoeiros, seleiros etc.

    Por outro lado, a lavoura, atividade a ressurgir, no se desenvolveu, em decorrncia, aoque parece, do despreparo e mentalidade do colonizador. No devemos afastar, aqui, opossvel europocentrismo que informava as opinies dos viajantes estrangeiros no

    referente s crticas tecidas aos coloniais. (4)

    Segundo os aludidos visitantes o desemprego, em Vila Rica, decorria do desprezo doshabitantes pela "bela regio que os cerca"; as terras, se devidamente cultivadas,compensariam com generosidade o esforo despendido. Conforme diagnosticaram, aeducao, hbitos e preconceitos hereditrios, tornaram os coloniais inaptos para avida ativa. A perspectiva do enriquecimento sbito, devido ao acaso, operaria no sentidode afrouxar a capacidade produtiva. Por outro lado, mostrar-se-ia generalizada aincapacidade gerencial dos donos de escravos. Escrevia John Mawe: "os negrosconstituem sua principal propriedade e ele os dirige to mal que os lucros do trabalhodele raramente compensam as despesas de sua manuteno; com o decorrer do tempotornam-se velhos e incapazes de trabalhar; ainda assim o senhor continua a viver na

    mesma negligncia e na ociosidade [...] Esta degenerao deplorvel constitui o traocaracterstico da maior parte dos descendentes dos primeiros colonos; todas asespcies de indstria esto nas mos ou dos mulatos ou dos negros; estas duas classesde homens parecem exceder em inteligncia a seus senhores, porque fazem melhor usodessa faculdade". (5)

    Conforme o autor citado, a rea oferecia condies favorveis a varias culturas: pereira,oliveira, amoreira, vinha, milho e trigo. O gado, por sua vez, se bem tratado e fornido dealimentao adequada, propiciaria o estabelecimento de promissora industria delaticnios.

    * * *

    Nosso propsito, como j avanamos no inicio deste tpico, no apresentar o balanopormenorizado das causas da decadncia econmica da rea mineratria. No entanto,permitimo-nos, como mera conjectura, arrolar os principais condicionantes do aludidorecesso. A nosso ver o empobrecimento da regio em apreo deveu-se a um conjunto defatores. exausto dos depsitos mais ricos de ouro (6) somam-se o meio fsicorelativamente adverso; inexistncia de mercados significativos e boas vias detransporte (7); despreparo no que se refere a tcnicas mais sofisticadas para trabalhar osolo, bem como a mentalidade do colonizador que desprezava o trabalho manual erotineiro em geral, e a faina agrcola, em particular (caso tpico dos mineradores).

    Neste quadro movimentava-se, ao fim do sculo XVIII e incio da dcima nona centria, a

    populao ouro-pretense da qual, a seguir, analisaremos a estrutura, com base no censolevado a efeito em 1804.

    II - OS DADOS EMPRICOS.

    Utilizamos, aqui, os dados empricos revelados por Herculano Gomes Mathias (8)relativos ao levantamento populacional efetuado em Minas Gerais no ano de 1804; oautor deu a pblico as listas referentes rea que corresponderia, na atualidade, ao

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    permetro urbano de Ouro Preto. (9) Na obra em pauta observou-se rigorosamente ocontedo e a disposio formal correspondente aos cdices que lhe deram origem. Oautor restringiu-se a algumas observaes qualitativas e a apresentar dadosquantitativos genricos, sem tratamento estatstico minucioso. Relacionou os distritosde Antnio Dias, Ouro Preto, Alto da Cruz, Padre Faria, Cabeas e Morro. (10)

    O recenseamento realizou-se sob responsabilidade dos Capites de Distrito, diretamentesubordinados ao Capito-Mor de Vila Rica. Como bem anotou H. G. Mathias: "embora asinstrues dadas pelo Ouvidor Geral da Comarca e pelo prprio Governador daCapitania devam ter sido uniformes, os resultados e a apresentao dos mesmosrevelou-se variada. Nota-se, contudo, que o trabalho em conjunto resultou minucioso --at com algumas repeties -- e, ao que tudo indica, completo". (11)

    Segundo o autor as razoes determinantes do censo em estudo "residiram nanecessidade urgente de recolher fundos -- proporcionados situao individual de cadamorador -- destinados a aliviar as pesadas despesas de Portugal durante os primeirosanos do sculo XIX, s voltas com a inquieta situao gerada pelos conflitos militarescom a Espanha e s constantes e insuportveis presses napolenicas." (12)

    Conforme as normas vigentes naquela poca, efetuou-se o levantamento em nvel deresidncia; apesar de as informaes variarem de acordo com os responsveis pelorecenseamento, a nota acrescentada pelo Capito de Distrito Lus Jos Maciel -- oprimeiro a encerrar o arrolamento -- d-nos idia clara dos dados ora analisados: "Emcada uma das casas que vai separadamente com duas linhas vai primeiro o cabea decasal e depois toda a mais famlia com as idades, pouco mais ou menos que pudealcanar e ofcios, e ocupaes que tudo vai declarado nas suas competentes casas. Nomeu Distrito no h negociantes nem agricultores que faam extraes de gneros, atas vendas que l se acham so as chamadas dos gneros da terra. Os mineiros, efaiscadores vo anotados nas suas casas aonde ai se v a escravatura, que cada umpossui, suas qualidades e idades. Isto o que a minha diligncia pde alcanar que

    pessoalmente andei correndo o Distrito na forma da Ordem." (13)

    Cumpre-nos -- antes de descrevermos o tratamento metodolgico dispensado, noestudo vertente, aos dados empricos acima referidos -- advertir que as discrepnciasentre os resultados apresentados por H. G. Mathias e os deste trabalho devem-se,somente, a diferenas de interpretao.

    TRATAMENTO DISPENSADO AOS DADOS.

    Como dissemos acima, o censo em epgrafe realizou-se em termos de Residncia, ouseja: edificao considerada como unidade fsica habitacional" por aqueles que

    elaboraram o levantamento censitrio. Em nvel residencial indicou-se, via de regra, oprenome ou nome completo do cabea de casal seguido dos prenomes ou nomescompletos dos familiares e subordinados (entendidos aqui como escravos ouagregados). Segue-se, ainda, a idade das pessoas, seu estado conjugal, cor,posicionamento na estrutura social, condio de militar ou eclesistico e, para nmeroconsidervel de indivduos, a atividade profissional ou econmica desempenhada. Emalguns casos, grupos de pessoas ou famlias, totalmente independentes com refernciaa laos de sangue, parentesco ou subordinao --, coabitavam. Tal evento parece-nosinsignificante se relacionado com o nmero total de residncias: 56 sobre 1.753 ou 3,2%

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    (14). Dez destes casos, por tratar-se de coabitantes sem liames aparentes de parentescoou subordinao, foram enquadrados -- no referente ao estudo domiciliar -- na categoria2.c, abaixo discriminada. Subdividimos as demais 46 residncias em domiclios (videdefinies subseqentes) estudados juntamente com as demais residncias que sepode, sem restrio, assimilar ao conceito de Domicilio, ou seja: conjunto de pessoascoabitantes que mantm laos de parentesco e/ou subordinao e vivem sob a

    autoridade do Chefe de Domiclio (indivduo a encabear a lista nominativacorrespondente ao domicilio e que podia ou no ser chefe de famlia).

    Depois desta fase classificatria, passou-se a transcrever, em cartes prprios paraanlise computacional, os dados relativos a cada indivduo. (15) Integramos as pessoasem grupos correspondentes a cada domiclio; baseados neste arquivo analisamos aestrutura da populao, das famlias e domiclios e, por fim, a estrutura populacionalsegundo setores produtivos e profisses.

    Fato lamentvel, ao qual nos reportamos desde logo, refere-se cor e condio de"forro". Conforme pudemos verificar -- baseados no confronto entre os dadoscensitrios e os registrados nos cdices da Parquia de Antnio Dias -- houve, por parte

    dos responsveis pelo levantamento populacional, nmero impondervel de omissesrelativas tanto cor como situao de "forro". Destarte, encontramos quantidadesubstancial de africanos para os quais no se registrou o posicionamento de forros(explicitado nos cdices aludidos). Por outro lado, para os "crioulos" (negros nascidosno Brasil) verificamos faltar tanto este qualificativo como o relativo condio delibertos. Tais eventos impediram a elaborao de anlises correspondentes cor e aosforros.

    III - ESTRUTURA POPULACIONAL.

    Os habitantes de Vila Rica somavam 8.867 indivduos em 1804. (16) Predominavam,

    numericamente, os livres e forros (68,61%) enquanto os escravos e quartados (cativosque estavam a comprar a liberdade) representavam pouco menos de um tero dapopulao total (31,39%). Os agregados correspondiam a 16,14% dos livres.

    Quanto ao sexo, preponderava o feminino: 51,13% contra 48,87% de elementos do sexomasculino. Fato significativo refere-se discrepncia do peso relativo dos sexos entreescravos e livres. Para os primeiros dominavam os homens -- 57,99% -- contra apenas44,69% dentre os segundos. A razo de masculinidade concernente aos escravos (138,07homens para cada grupo de 100,00 cativas) explica-se pelas prprias caractersticas dodestino precpuo que se lhes dava -- o trabalho mineratrio -- a exigir, preferencialmente,mo-de-obra masculina. Para os livres, a razo de masculinidade correspondeu, apenas,a 80,80 -- vale dizer, contavam-se 80,8 homens para cada grupo de 100 mulheres. Estes

    resultados rompem o relativo equilbrio existente entre os sexos se considerada apopulao total -- nela computamos 95,56 homens para 100 indivduos do sexo oposto.

    Infere-se, do acima exposto, ser predominante, no processo de exciso populacional porque passava a rea, o elemento masculino. No correr deste captulo voltaremos a estetema, qualificando-o pormenorizadamente

    * * *

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    Os ouro-pretanos distribuam-se pelos seis distritos j mencionados. Nos dois maispopulosos -- Ouro Preto e Antnio Dias -- concentrava-se 50,77% da populao -- 48,13%dos livres e 56.56% dos cativos. (17) Neste ncleo principal centralizava-se, ademais, avida administrativa, militar e religiosa da urbe. Assemelhavam-se, ainda, pela

    estratificao de seus moradores e com respeito ao peso relativo dos sexos. Destarte,68,20% dos residentes em Antnio Dias tratava-se de livres enquanto no Ouro Pretocontvamos com 63,81% de indivduos de igual estrato. Neste ltimo distrito a razo demasculinidade dos livres alcanava 84,68, muito prxima da prevalecente em AntnioDias: 84,20. (18)

    Com respeito ao posicionamento social encontramos maior parcela de livres no Alto daCruz (77,85%), Padre Paria (73,35%) e Morro (73,20%). Fato a merecer realce diz respeito razo de masculinidade dos livres verificada nestes distritos: 70,27, 67,53 e 81,73,respectivamente. Neles apresentaram significativo peso relativo ocupaes emdecadncia ou tradicionais -- faiscadores, mineradores e roceiros -- o que, a nosso ver,pode-se tomar como um dos elementos explicativos das relaes acima anotadas.

    Outra observao pertinente diz respeito aos distritos do Padre Faria e Morro. Estasunidades apresentaram as mais altas razes de masculinidade para os escravos (217,31e 188,33, respectivamente). No Morro predominavam os mineradores e faiscadores. Taisatividades, como avanado acima, exigiam, prioritariamente, mo-de-obra masculina,fato que, a nosso ver, aparece como poderoso elemento explicativo da alta razo demasculinidade observada para os escravos. Quanto ao Padre Faria, verificou-se aexistncia de um conjunto de senhores, ao que parece, composto de indivduos demedianas posses. Por outro lado, conquanto ai residissem muitos mineiros efaiscadores, a parcela deles que possua escravos, revelou-se nfima. Possivelmente aelevada razo de masculinidade dos escravos a prevalecente (217,31 -- a maior de VilaRica), devia-se ao fato de que os cativos destinavam-se, predominantemente, a fainasprodutivas vinculadas ao setor secundrio, sendo reduzido o nmero de escravas

    ocupadas no servio caseiro.

    Por fim, a ocupar posicionamento intermedirio em relao s demais unidadesanalisadas, aparece o distrito das Cabeas. Nele residiam 15,82% dos habitantes de VilaRica; 66,86% dos seus moradores compunha-se de livres, a razo de masculinidadecorrespondia a 85,37. Estes indicadores, cuos valores aproximam-se muito dosverificados em Antnio Dias e Ouro Preto, parecem condicionar-se pela dominncia deatividades artesanais, das quais decorria o relativo "equilbrio" populacional. No correrdo estudo vertente ocupar-nos-emos das profisses e atividades econmicas eaduziremos novos argumentos para complementar as idias aqui expendidas

    Parece-nos lcito, vista do exposto, avanar as seguintes concluses:

    i) No processo emigratrio, claramente identificado, predominava o elemento masculinodo estrato correspondente aos livres.

    ii) O ncleo principal da urbe, acompanhado pelo distrito denominado Cabeas,apresentou-se menos erodido pelo movimento de expulso populacional decorrente dadecadncia da atividade exploratria.

    Por outro lado, nos distritos em que predominavam as atividades tradicionais, em

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    recesso, verificou-se maior porcentual de livres e se apresentou mais significativa aexciso da parcela masculina dos habitantes, a demandar novas reas do territriocolonial. Nota-se, ainda, que, para os escravos, as mais altas razes de masculinidadecorresponderam aos distritos nos quais prevaleciam faiscadores e mineradores, ou emque predominavam proprietrios de parcas posses, voltados para atividades artesanais.

    ESTRUTURA POPULACIONAL SEGUNDO SEXO, FAIXAS ETRIAS E ESTADOCONJUGAL.

    Conforme consideraes e evidncias j apresentadas neste trabalho, os estudosdemogrficos relativos ao perodo colonial brasileiro devem levar em conta a existnciade distintos segmentos populacionais; em particular demos realce aos gruposcorrespondentes a livres, forros e escravos. Nesta seco de nossa pesquisa -- pelasponderaes expostas na abertura desta parte -- restringir-nos-emos a apreciar, emseparado, somente livres e escravos.

    A viso de conjunto dos habitantes de Vila Rica, no ano de 1804, distribudos segundo

    sexo, faixas etrias e estado conjugal, considerado ainda o posicionamento social, nos proporcionada pelas tabelas do Apndice Estatstico. Vejamos as evidnciasalcanadas.

    ESTRUTURA POR SEXOS.

    De acordo com o levantamento populacional relativo ao ano de 1776 (19),predominavam -- na Capitania de Minas Gerais, bem como na Comarca de Vila Rica -- oshomens. Assim, a razo de masculinidade igualava 166 para a Capitania e 172 naComarca. No ano de 1786 (20) esta relao seria da ordem de 138 para a Capitania. Em1805 (21) igualaria, ainda para a Capitania, 135; em 1808 -- conforme dados revelados por

    Eschwege (22) -- a cifra teria cado para 120.

    Apesar do desequilbrio favorvel ao sexo masculino, nota-se, perfeitamente, atendncia cadente da relao em apreo. Tal movimento, certamente, apresentava-secondicionado pelo exaurir-se dos mananciais aurferos. No nos causa estranheza, vista do exposto, verificarmos -- no ano de 1804 -- uma razo de masculinidade igual a95,56 para Vila Rica -- um dos mais antigos ncleos mineratrios do Brasil. (23)

    O desequilbrio em favor do sexo feminino acentua-se quando seccionamos a populaoa populao em estratos correspondentes a livres e escravos. Como j colocamos emitem precedente, a razo de masculinidade dos cativos sobrepujava a dos livres: 138,07e 80,80, respectivamente.

    Nos Grficos subseqentes apresentamos a razo de masculinidade por grupos deidades. Note-se que, para os livres, o valor mnimo corresponde faixa etria relativaaos indivduos com idades a variar dos 20 aos 29 anos. Ademais, a observao dosdados constantes do Apndice Estatstico sugere-nos que as pessoas entre 15 e 34 anosapresentavam maior tendncia para migrar.

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    Grficos 1 (Livres) e 2 (Escravos)Razo de Masculinidade por Grupos de Idades, Segundo a Condio Social

    (Vila Rica - 1804)

    Ainda com o objetivo de ilustrar o problema em pauta, indicamos na tabela abaixo a

    razo de masculinidade para o grupo dos solteiros livres. Infere-se dela, claramente, ainferioridade numrica dos homens no conjunto dos solteiros adultos.

    Tabela 1RAZO DE MASCULINIDADE PARA OS SOLTEIROS LIVRES

    (Vila Rica - 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    FAIXAS ETRIAS RAZO DE MASCULINIDADE-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    0 - 4 104,975 - 9 93,94

    10 - 19 99,4420 - 29 61,8730 - 39 68,9740 - 49 62,2850 - 59 69,2760 - 69 61,9670 - 79 61,4480 e mais 102,50

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    ESTRUTURA ETRIA.

    Neste tpico observamos a estrutura populacional segundo grandes faixas etrias;estudamos as pirmides de idades de livres e cativos, com exame adicional concernente origem dos escravos africanos e correspondente distribuio segundo grupos etrios

    e, por fim, apresentamos anlise relativa filiao das crianas com quatorze ou menosanos.

    REPARTIO DOS HABITANTES POR GRANDES GRUPOS ETRIOS.

    Consideramos os segmentos populacionais relativos a escravos e livres, repartimo-lossegundo dois critrios de grandes faixas de idade. O primeiro leva em conta as crianas(0-14 anos), os indivduos em idade ativa (15-64 anos) e os ancios (65 e mais anos). Deconformidade com o segundo critrio consideramos as seguintes faixas etrias: jovens(0-19 anos) , adultos (20-59 anos) e idosos (60 e mais anos). (24)

    Embora os critrios aludidos sejam substitutivos quanto s possveis inferncias queproporcionam, resolvemos trabalhar com ambos a fim de qualificar pormenorizadamenteas concluses abaixo arroladas. Destarte, o primeiro critrio parece-nos altamenterelevante para o estabelecimento das taxas de dependncia (peso relativo de crianase/ou ancios com respeito aos indivduos em idade ativa) concernentes sociedadecolonial brasileira na qual os indivduos integravam-se precocemente atividadeprodutiva. Por outro lado, o segundo critrio adotado possibilita-nos verificar o pesorelativo dos jovens e idosos no corpo populacional em estudo.

    Atenhamo-nos, por ora, aos dados referentes populao como um todo. Verificou-seum ndice de dependncia concernente s crianas (0-14 anos) igual a 452 -- vale dizer,contvamos 452 crianas para cada grupo de 1.000 indivduos em idade ativa --, a taxa

    de dependncia respeitante aos ancios igualou 81; assim, o ndice de dependnciatotal correspondia a 533 (452 + 81).

    Por outro lado, deparamo-nos, indubitavelmente, com uma populao jovem, pois,apenas 9,3% dos habitantes de Vila Rica tinham 60 ou mais anos de idade.

    Como seria de se esperar tais indicadores assumem valores distintos quandoconsiderados os segmentos populacionais relativos a livres e escravos. A taxa dedependncia total para estes ltimos apresentava-se inferior a correspondente aoslivres: 355 e 632, respectivamente.

    Quanto ao peso relativo dos idosos verifica-se maior ndice para os livres -- 10,2% -- vis-

    -vis escravos -- 7,2%.

    Tais discrepncias devem-se a trs fatores principais: taxa de mortalidade infantil maiselevada para escravos, ocorrncia da entrada de escravos africanos j crescidos e, porltimo, menor esperana de vida dos cativos. Destarte, 40,7% dos livres contavam 19ou menos anos contra apenas 30,2% de escravos em idntica condio. Por outro lado,os cativos na faixa etria dos 20 aos 59 anos compunham 62,6% da massa escrava,enquanto para os livres do mesmo intervalo etrio o porcentual alcanava, apenas, 49,1.

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    PIRMIDES DE IDADES.

    A analise da pirmide de idades referente populao como um todo refora a afirmativade que estamos a nos defrontar com uma populao jovem, fato evidenciado pelaamplitude relativamente larga dos degraus inferiores da pirmide etria.

    Por outro lado, patenteia-se o predomnio do sexo feminino. Assim, depois do relativoequilbrio verificado nas faixas etrias referentes aos dois primeiros degraus (at os 19anos) acentua-se, na faixa etria dos 20 aos 39 anos, a discrepncia favorvel smulheres; j para idades acima dos 40 anos volta a balancear-se a participao relativados sexos.

    Grfico 3Pirmide de Idades: Populao Total

    (Vila Rica, 1804)

    Os fenmenos acima relatados assumem caractersticas distintas quando dividimos oshabitantes em escravos e livres. A dominncia do sexo feminino, para os livres, mostra-se muito acentuada -- o equilbrio rompe-se aos 20 anos estendendo-se at os 69. Poroutro lado, amplia-se significativamente a base da pirmide, a reforar o carter de"populao jovem'".

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    Grfico 4Pirmide de Idades: Populao Livre

    (Vila Rica, 1804)

    Para os escravos encontramos uma base estreita a se ampliar paulatinamente at a faixados 15 aos 19 anos, o degrau correspondente ao estrato dos 20 aos 29 anos apresentabrusco aumento; a seguir, estreitam-se os degraus. Ademais, os homens aparecemcomo elemento dominante em todas faixas etrias (excluda a primeira).

    Grfico 5Pirmide de Idades: Populao Escrava

    (Vila Rica, 1804)

    Os condicionantes explicativos do perfil da pirmide etria dos escravos j foramapontados em item anterior, cabem, no entanto, algumas qualificaes adicionais. Elasdizem respeito ao parcelamento dos escravos em grupos correspondentes a "coloniais"(vale dizer cativos nascidos no Brasil) e a africanos. (25) Para os primeiros, adistribuio segundo faixas etrias apresenta caractersticas indicadoras de populao

    jovem. (26) Por outro lado, verifica-se significativa "quebra" na faixa etria dos 40 aos 49anos vis--vis os estratos etrios inferiores, fenmeno idntico registra-se entre asfaixas dos 50 aos 59 anos e a dos 40 aos 49; tais "rupturas" poderiam decorrer do

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    eventual acrscimo na taxa de alforrias para indivduos com idade relativamenteavanada. Para os africanos, evidentemente, a base da figura apresenta nfimamagnitude e se alarga significativamente nos estratos correspondentes ao intervaloetrio dos 10 aos 29 anos (Cf. Grficos 6 e 7).

    GRFICO 6FAIXAS DE IDADES: ESCRAVOS COLONIAIS (CRIOULOS E PARDOS)

    (Vila Rica - 1804)

    GRFICO 7FAIXAS DE IDADES: ESCRAVOS AFRICANOS (SUDANESES E BANTOS)

    (Vila Rica - 1804)

    ORIGEM DOS ESCRAVOS AFRICANOS.

    Para a massa de cativos africanos, aspecto de grande importncia diz respeito distribuio, segundo faixas etrias, dos indivduos identificados com os grupos tnicose/ou lingsticos dos Bantos e Sudaneses. Verifica-se o predomnio dos primeiros at afaixa dos 30 aos 39 anos, j os Sudaneses aparecem com peso relativo maior para asidades mais avanadas (vide Grfico 7). Certamente os Sudaneses, ainda que preferidospelos mineradores, passaram a entrar segundo taxas decrescentes. Os Bantos,vendidos a preos inferiores (27), apareciam no mercado de escravos como elementosubstitutivo frente os aos Sudaneses. Este fenmeno acarretou o "envelhecimento" da

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    massa de cativos Sudaneses, o que implicou a desproporo no peso relativo de ambosos grupos no conjunto dos vivos, por um lado, e entre os mortos, por outro. Assim, em1804, os escravos africanos distribuam-se em Bantos e Sudaneses segundo asporcentagens: 84,67 e 15,24, respectivamente. Quanto aos bitos, a participaoapresenta-se significativamente diversa -- para o mesmo ano, o peso relativo dos Bantoscorrespondeu a 71,88% e o dos Sudaneses alcanou 28,12%.

    A causa desta desproporo, j apontada, evidencia-se na Tabela 2 -- 30,23% dosSudaneses contavam 60 ou mais anos enquanto apenas 8,35% dos Bantos colocavam-seem igual faixa etria.

    Tabela 2REPARTIO PORCENTUAL DOS ESCRAVOS AFRICANOS,

    SEGUNDO GRANDES GRUPOS ETRIOS(Vila Rica, 1804)

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------FAIXAS ETRIAS SUDANESES BANTOS-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    0 - 19 anos 2,91 10,3320 - 59 anos 66,86 81,3260 e mais anos 30,23 8,35

    Total 100,00 100,00-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------OBS. : Os nmeros absolutos encontram-se no Apndice Estatstico.

    SOBRE A FILIAO DOS MENORES DE 14 ANOS.

    Dado o grande peso relativo assumido, na sociedade colonial brasileira, pela parcela de

    filhos ilegtimos torna-se obrigatrio o estudo quantitativo referente filiao doscontingentes populacionais analisados. Deve-se notar, desde logo, que a existncia deelevado porcentual de filhos naturais e expostos, alm de se apresentar como umproblema em si, condicionava a configurao da estrutura populacional quandoanalisada segundo o estado conjugal ou vista sob a perspectiva das unidades familiares.Por outro lado, como j salientamos em captulo precedente, a regular a freqnciarelativa de filhos naturais e, sobretudo, a de crianas enjeitadas estava, ao lado deoutros fatores, a situao econmica defrontada pelas comunidades pretritas.

    No estudo vertente consideramos a filiao das crianas de at quatorze anos de idade.Fomos obrigados a limitar a faixa etria a analisar porque no censo em apreo a filiaoindicou-se, apenas, para indivduos de baixa idade; por outro lado, pareceu-nos

    conveniente o limite superior quatorze anos porque, assim, selecionamos o grupo aquiidentificado como o correspondente s "crianas". Tal conjunto somou 2.575 indivduos.Desconsideramos 44 por serem escravos africanos e 70 outros por serem casados,morarem ss ou com irmos -- nesses casos os recenseadores, sistematicamente,omitiram qualquer referncia a filiao.

    Restaram, portanto, 2.461 crianas; destas, 904 (36,73%) apareceram como legtimas e1.557 (63,27%) indicou-se como bastardas; entre estas ltimas computamos 126expostos e 1.431 filhos naturais.

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    Quando consideramos a condio social, revelaram-se significativos diferenciais. Assim,apenas 0,70% dos escravos aparecem como filhos legtimos contra 47,82% entre oslivres. Como era de se esperar a condio de legitimidade estava associada aoposicionamento social dos indivduos.

    Tabela 3FILIAO (EM PORCENTAGENS) DAS CRIANAS COM 14 OU MENOS ANOS,

    SEGUNDO A CONDIO SOCIAL(Vila Rica, 1804)

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------FILIAO LIVRES ESCRAVOS TOTAL-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Legtimos 47,82 0,70 36,73Naturais 52,18 99,30 63,27

    Total 100,00 100,00 100,00

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------OBS. : Os nmeros absolutos constam do Apndice Estatstico.

    Por outro lado, mesmo entre os livres podemos distinguir dois grupos: um relativo aosagregados, outro referente aos "independentes" (entendidos aqui como livres noagregados). A maioria (56,02%) destes ltimos compunha-se de filhos legtimos contraapenas 9,12% dos agregados. V-se pois, que a condio de legitimidade condicionava-se, tambm, pelo status econmico dos pais, pois os agregados, via de regra, erammenos abonados.

    Tabela 4

    FILIAO (EM PORCENTAGENS) DAS CRIANAS LIVRES, COM 14 OU MENOS ANOS,REPARTIDAS EM "INDEPENDENTES" E AGREGADAS(Vila Rica, 1804)

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------CONDIO SOCIAL "INDEPENDENTES" AGREGADAS TOTAL-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Legtimos 56,02 9,12 47,82Naturais 43,98 90,88 52,18

    Total 100,00 100,00 100,00-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------OBS.: Os nmeros absolutos constam do Apndice Estatstico.

    ESTRUTURA SEGUNDO O ESTADO CONJUGAL.

    Como indicamos acima, vrios fatores afetam a distribuio populacional segundo oestado conjugal. Alm do sexo e idade aparecem variveis de carter econmico ecultural. As diferenas mais significativas inferem-se do simples confronto das tabelasdo Apndice Estatstico nas quais apresentamos a distribuio dos habitantes de VilaRica segundo o sexo, faixa etria e estado conjugal considerados os estratos relativos

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    aos escravos e aos livres. O nmero de indivduos casados entre os escravos no chegaa 1% da massa dos cativos; contamos apenas uma viva em 2.783 pessoas.

    Mesmo entre os livres -- para os quais encontramos 15,56% de casados e 2,50% devivos de ambos os sexos -- podemos distinguir grupos distintos. Apreciamos aqui doisagrupamentos, um relativo aos agregados, outro referente aos ''independentes'' (livres

    exclusive agregados e forros) (28); para os livres "independentes", como aquiconceituados, computamos 18,33% de casados e 2,79% de vivos de ambos os sexos;para os agregados os porcentuais atingiram 4,89% e 1,53%, respectivamente.

    Entre os sexos revelaram-se, igualmente, marcadas diferenas. Atenhamo-nos parcelados livres. Verifica-se que os homens casados apresentam, em termos relativos, pesomaior do que as mulheres em igual condio. Assim, 16,6% dos homens eram casadosenquanto para as mulheres a relao alcanava 14,6%. Lembrem-se aqui, comoelementos explicativos, a predominncia das mulheres entre os solteiros com filhos e asignificativa emigrao de homens solteiros.

    J para os vivos o peso relativo apresentou-se maior entre as mulheres -- 3,7% -- do

    que entre os homens -- 1,0%. Fato devido, em parte, esperana de vida mais baixa dosexo masculino.

    A apreciao da pirmide de idades na qual indica-se o estado conjugal -- Grfico 8 --permite-nos visualizar outras discrepncias existentes entre os sexos. Evidencia-se ocasamento relativamente tardio dos homens -- na faixa dos 20 aos 29 anos o pesorelativo dos homens casados ou vivos sobre o total de indivduos do sexo masculinoera de 14,40% enquanto que, a mesma relao, para as mulheres, apontava 22,58%.Note-se que estes porcentuais minimizam a discrepncia apontada, pois, era justamentea partir da adolescncia -- como j indicamos -- que se verificava significativa emigraode elementos do sexo masculino. Por outro lado, o fato de contarmos com pesosrelativamente mais elevados para os homens casados -- vis--vis mulheres em mesma

    situao --, a partir da faixa dos 40-49 anos, aparece como indicador de que os homensque emigravam deveriam estar, em sua maioria, na faixa etria dos 20 aos 40 anos eeram, predominantemente, solteiros. No nos esquecemos aqui de outro fatorexplicativo desta desproporo: o grande nmero de mes solteiras.

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    Grfico 8Pirmide de Idades: Populao Livre

    (Vila Rica, 1804)

    As mesmas concluses decorrem da tabela abaixo na qual indicamos a proporo desolteiros sobre o total da populao masculina e feminina, respectivamente.

    Tabela 5PORCENTAGEM DE SOLTEIROS LIVRES,SEGUNDO SEXO E FAIXA ETRIA

    (Vila Rica, 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------FAIXA ETRIA HOMENS MULHERES

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------10 - 19 99,63 95,2420 - 29 85,59 77,4230 - 39 64,51 68,8840 - 49 52,50 63,6150 - 59 64,25 72,1860 - 69 67,78 73,7170 - 79 64,56 76,1580 e mais 90,25 85,00-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Como se v, a porcentagem de mulheres solteiras apresenta-se, a partir da faixa dos 30aos 39 anos, superior dos homens solteiros

    IV - ESTRUTURA DAS FAMLIAS E DOMICLIOS.

    Para o Brasil, o estudo da estrutura familiar vincula-se, necessariamente, quele relativoaos domiclios, pois, sistematicamente, encontramos vrias famlias coabitantes aguardar vnculos de subordinao ou dependncia; vale dizer, podiam viver num mesmo

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    domiclio famlias "independentes" (29), de agregados e de escravos. Indubitavelmente,tal fato influa na composio das famlias, no seu relacionamento com o corpo social e,ainda, na diviso do trabalho e da renda. Assim, tanto do ponto de vista econmicocomo do social, parece-nos altamente relevante distinguirmos estes trs tipos bsicosde famlias. Destarte, o estudo da unidade familiar dever referir-se, sempre, suaposio relativa no domiclio.

    AS FAMLIAS.

    Para efeito deste estudo consideraremos trs categorias de famlia: independentes, deagregados e de escravos. PorFamlia (30) entenderemos o casal (unido ou no perante aIgreja) com seus filhos, caso existam; os solteiros (homem ou mulher) com filhos e osvivos e vivas com filhos. Em qualquer dos casos os filhos devero ser solteiros, semprole e coabitar com os pais. Por Chefe de Famlia entende-se o "cabea de casal".Destarte, teremos tantas famlias quantos forem os "cabeas de casal".

    Para as famlias independentes, como explicita o quadro abaixo, admitimos trs sub-

    categorias: a) famlia do chefe de domiclio; b) famlias de filhos do chefe de domiclio; c)famlias de parentes do chefe de domiclio. Como categorias distintas aparecem as dosagregados e escravos. Os vivos ou vivas solitrios bem como aqueles a viver comfilho(s) com prole, no constituem, de per si, uma famlia, e enquadram-se no grupo"Pseudo Famlias" subdividido em trs sub-categorias: uma relativa aos vivos a viverss, outra referente aos moravam com filho(s) e respectiva prole e a terceira compostade vivos ou vivas -- agregados ou escravos -- que no constitussem famlia.

    Para as duas primeiras categorias tomadas conjuntamente e para a terceira elaboramostabelas nas quais relacionamos a idade do chefe de famlia com o nmero de filhosmenores de vinte anos a viver com seu(s) progenitor(es).

    Quadro 1FAMLIAS: POR CATEGORIAS E SUB-CATEGORIAS

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------CATEGORIA SUB-CATEGORIAS-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------1. Independentes a. do chefe de domiclio (C.D.);

    b. de filhos do C.D.;c. de parentes do C.D.

    2. De Agregados3. De Escravos

    4. Pseudo Famlias a. vivos ou vivas solitrios;b. vivos ou vivas em vivncia com filho(s)que constitussem famlia;

    c. vivos ou vivas, agregados ou escravos,que no constitussem famlia.

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

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    FAMLIAS: EVIDNCIAS EMPRICAS.

    Os resultados numricos (vide Tabela 6) indicam a larga predominncia das famliasindependentes, em geral, e das de chefes de domiclio, em particular. (31) Taisevidncias parecem indicar que a famlia nuclear tendia a estabelecer-se em domicliosprprios, fato que estaria, em parte, condicionado pela ampla oferta de residncias

    decorrente da decadncia da atividade exploratria.

    Como se verifica, o peso relativo das famlias de agregados equilibra-se com o referentes de filhos e de parentes do chefe de domiclio. O porcentual modesto explica-se pelofator acima posto, aliado ao fato de predominarem, entre os agregados, indivduos queno constituam famlia.

    Quanto aos escravos, a prpria precariedade das informaes (32) aliada aos bicescolocados ao estabelecimento de famlias regulares de cativos aparecem comoelementos explicativos do baixo peso relativo observado.

    Tabela 6FAMLIAS: POR CATEGORIAS E SUB-CATEGORIAS

    (Vila Rica, 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------CATEGORIAS ESUB-CATEGORIAS No. ABSOLUTO PORCENTAGEM %POR CATEGORIA-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------1.a 891 78,501.b 70 6,181.c 13 1,14 85,822 82 7,22 7,223 34 3,00 3,00

    4.a 37 3,264.b 4 0,354.c 4 0,35 3,96

    Total 1.135 100% 100%-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    * * *

    Com referncia ao nmero mdio de filhos com 20 ou menos anos, levada em conta afaixa etria do chefe de famlia, verificou-se existir pequena discrepncia entre famlias

    independentes e de agregados. O mesmo no ocorreu com respeito s famlias deescravos que apresentaram marcada divergncia vis--vis as duas categorias acimaaludidas. As diferenas observadas devem-se, certamente, taxa de mortalidade maiselevada para os filhos de cativos, mais baixa esperana de vida para escravos em gerale, talvez, ao fato de separarem-se pais e filhos por motivo de transaes a envolvercativos. Por outro lado, relativamente aos chefes de famlia com menos de 25 anos,verificou-se mdia mais elevada para cativos do que para livres; este diferencial explicar-se-ia pelo mais livre intercurso sexual entre os escravos

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    Tabela 7NMERO MDIO DE FILHOS COM 20 OU MENOS ANOS,

    SEGUNDO A FAIXA ETRIA DO CHEFE DE FAMLIA(Vila Rica, 1804)

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    FAIXA ETRIA DO NMERO MDIO DE FILHOS .CHEFE DE FAMLIA INDEPENDENTES AGREGADOS LIVRES ESCRAVOS-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------menos de 25 anos 1,36 1,33 1,35 1,40

    25-34 1,89 1,31 1,83 1,1935-44 2,41 2,13 2,39 1,4445-54 2,42 2,00 2,40 0,6755-64 1,36 0,80 1,34 --

    65 e mais anos 0,55 0,28 0,54 -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------OBS. : Computados os filhos sobreviventes a viver com os pais.

    * * *

    Na Tabela 8 reunimos as famlias de agregados e independentes, consideramos a faixaetria do chefe de famlia e apresentamos o nmero de famlias com filhos vivos (nmeroa variar de zero a sete e mais) a viver com o progenitor ou progenitores; note-se,ademais, que computamos os filhos com 20 ou menos anos de idade. Para efeito deanlise, os nmeros absolutos de cada linha foram transformados -- Tabela 9 -- emnmeros proporcionais com total igualado a 1.000.

    Tabela 8LIVRES: NMERO DE FAMLIAS A CONTAR COM FILHOS VIVOS E PRESENTES,COM 20 OU MENOS ANOS DE IDADE

    (nmero de filhos a variar de zero a sete e mais)(Vila Rica, 1804)

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Faixa Etria do Nmero de Famlias (a) Nmero totalChefe de Famlia 0 1 2 3 4 5 6 7e+ Total dos filhos-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Menos de 25 anos 7 41 20 5 1 -- -- -- 74 10025-34 42 73 57 30 24 7 3 1 237 43335-44 46 73 45 22 42 18 8 14 268 641

    45-54 57 43 36 21 24 9 6 21 217 52155-64 65 27 17 9 6 7 5 1 137 18465 ou mais anos 84 22 10 5 1 1 -- -- 123 66Total 301 279 185 92 98 42 22 37 1.056 1.945-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

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    Tabela 9LIVRES: NMERO PROPORCIONAL DE FAMLIAS A CONTAR COM FILHOS

    VIVOS E PRESENTES, COM 20 OU MENOS ANOS DE IDADE(nmero de filhos a variar de zero a sete e mais)

    (Vila Rica, 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Faixa Etria do Nmero Proporcional de Famlias (a) .Chefe de Famlia 0 1 2 3 4 5 6 7e+ Total-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------menos de 25 anos 94 554 271 68 13 -- -- -- 1.00025-34 177 309 241 126 101 29 13 4 1.00035-44 172 272 168 82 157 67 30 52 1.00045-54 263 198 166 97 110 41 28 97 1.00055-64 474 197 124 66 44 51 37 7 1.00065 ou mais anos 683 179 81 41 8 8 -- -- 1.000-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Obs.: (a) Nmero de filhos variando de 0 a 7 e mais.

    Teoricamente, poder-se-ia esperar que a coluna concernente s famlias sem filhosapresentasse um ponto de mnimo intermedirio (via de regra situado na faixa etria dos35 aos 44 anos). Este movimento explica-se, de um lado, porque grande parcela de pais

    jovens no pode contar sequer com um filho e, por outro, pelo fato de que osprogenitores mais idosos j no contam com a presena dos filhos com vinte ou menosanos; observe-se que o mnimo esperado situar-se-ia na faixa de idade correspondenteaos pais que j contariam um ou mais filhos. Conforme se observa nas tabelas em foco,os dados empricos no confirmaram esta expectativa. Este fato no parece decorrerexclusivamente de casamentos celebrados em idade relativamente baixa, mas,sobretudo, da substancial quantidade de mes solteiras que, ainda bem jovens, jtinham um ou mais filhos.

    Estes mesmos fatores explicariam os elevados nmeros proporcionais relativos scolunas referentes s famlias com um e dois filhos para a faixa etria dos chefes defamlia com menos de 25 anos. J para as famlias com trs ou mais filhos verificam-sepontos de mximo bem marcados, nestes casos valem razes explicativas anlogas aosfatores tericos acima anotados.

    Os mesmos argumentos expendidos com respeito s famlias de livres valem para as deescravos conforme se infere das tabelas 10 e 11.

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    TABELA 10ESCRAVOS: NMERO DE FAMLIAS A CONTAR COM FILHOS VIVOS E PRESENTES,

    COM 20 OU MENOS ANOS DE IDADE(nmero de filhos a variar de zero a trs e mais)

    (Vila Rica, 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Faixa etria do Nmero de Famlias (a) Nmero total dechefe de famlia 0 1 2 3 e + Total Filhos-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------menos de 25 anos -- 3 2 -- 5 7

    25 - 34 3 8 4 1 16 1935 - 44 2 2 2 3 9 1345 - 54 1 2 -- -- 3 2

    55 ou mais anos 1 -- -- -- 1 0

    Total 7 15 8 4 34 41-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Obs.: Nmero de filhos variando de 0 a 3 e mais.

    TABELA 11

    ESCRAVOS: NMERO PROPORCIONAL DE FAMLIAS A CONTAR COM FILHOSVIVOS E PRESENTES, COM 20 OU MENOS ANOS DE IDADE

    (nmero de filhos a variar de zero a trs e mais)(Vila Rica, 1804)

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Faixa etria do Nmero Proporcional de Famlias (a) .chefe de famlia 0 1 2 3 e + Total

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------menos 25 anos -- 600 400 -- 1.00025 - 34 188 500 250 62 1.00035 - 44 222 222 222 334 1.00045 - 54 333 667 -- -- 1.000

    55 ou mais anos 1.000 -- -- -- 1.000-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Obs.: Nmero de filhos variando de 0 a 3 e mais.

    OS DOMICLIOS.

    Em tpico precedente j colocamos a definio de Domiclio adotada neste estudo;resta-nos, agora, caracterizar a entidade em tela quanto a categorias e sub-categorias. Apartir do quadro conceitual de Peter Laslett e Jean-Claude Peyronnet (33) cujasqualificaes ao esquema proposto por Laslett endossamos plenamente -- compusemosum universo categrico apropriado s condies sociais e econmicas do perodocolonial brasileiro. Destarte, realamos os domiclios nos quais aparecem escravos e/ouagregados a constituir ou no famlias -- e evitamos tom-los como simplesdesdobramento de categorias a envolver indivduos sem os laos de subordinao oudependncia apontados.

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    Por outro lado, adicionamos ao esquema original, sub-categorias relativas aoscelibatrios com filhos; este modus faciendi, nos impe a realidade social brasileira doperodo em anlise, no qual era majoritrio, como j ficou com provado neste trabalho, ogrupo dos filhos naturais.

    Alterao relevante -- com respeito ao quadro de Laslett -- refere-se classificao dosdomiclios -- bem como das famlias que os compunham -- em funo do chefe dedomiclio, fosse ou no chefe de famlia, vivesse ou no junto com seus progenitores oucom apenas um ascendente em linha direta. (34)

    Quanto s categorias e sub-categorias adotadas, furtamo-nos de descriopormenorizada por entendermos ser auto-explicativo o quadro (Cf. Quadro 2) em que asdispusemos. (35)

    DOMICLIOS: EVIDNCIAS EMPRICAS.

    As evidncias observadas (vide Apndice Estatstico) indicam a predominncia dosdomiclios do tipo simples (categorias 1, 2 e 3) sobre os domiclios complexos (grupos 4e 5).

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    Do total de domiclios considerados, 5,53% corresponderam categoria 4 ("domicliofamiliar ampliado") e 3,54% 5 (relativa aos "domiclios mltiplos"), destarte, menos deum dcimo (exatamente 9,07%) dos domiclios enquadrar-se-iam no grupo caracterizadocomo complexo.

    Dentre as categorias entendidas como do tipo simples, realce especial cabe scategorias 1 ("domiclios singulares") e 3 ("domiclios simples"). A esta ltimacorrespondeu 43,87% do total de domiclios computados, enquanto os "domicliossingulares" compreenderam 39,30%. Aos "domiclios sem estrutura familiar" (categoria2) coube porcentual bem modesto: 7,13%.

    Por fim, a categoria 6 ("domiclios com estrutura indeterminada, comportando algumlao de parentesco entre seus componentes") coube peso relativo insignificante: 0,63%.

    * * *

    Outra perspectiva analtica para caracterizao da maior ou menor complexidade dasunidades domiciliares refere-se presena de escravos e/ou agregados.

    Quanto aos escravos, registramo-los em 40,9% dos domiclios. Acima desta cifracolocaram-se as categorias domiciliares 3, 4 e 5 que apresentam como caractersticacomum a existncia de famlias de chefes de domiclios ou de seus parentes. Comporcentuais menos significativos aparecem os domiclios sem estrutura familiarimediatamente vinculada aos chefes de domiclios. (36)

    Verificou-se, por outro lado, que em 29,61% dos domiclios apareciam agregados.Destacou-se neste caso o grupo relativo aos domiclios familiares ampliados -- 42,3%deles contavam com agregados; para as demais categorias encontra mos porcentuais

    bem inferiores e com pequena discrepncia em torno de 29,0%. (37) Exceo deve serfeita com referncia categoria 2, colocada em ntida inferioridade relativa.Computados domiclios com escravos ou agregados chega-se cifra de 54,42%. Valedizer, mais da metade dos domiclios contavam com escravos ou agregados -- 13,52%apenas com agregados, 24,81% s com escravos e 16,09 com ambos grupos em foco.

    Neste caso aparece com significativa importncia relativa a categoria 4 (domicliofamiliar ampliado), como ocorreu na situao acima analisada. Em posicionamentorelativamente inferior situou-se a categoria 2: domiclios sem estrutura familiar. Para asdemais, a discrepncia apresentou-se de pequena monta com cifras pouco superiores a50%. (38)

    Em concluso: pode-se afirmar que -- de acordo com o critrio alternativoconsubstanciado na presena de escravos e/ou agregados -- a maioria dos domicliosem anlise teria composio complexa. O grau de complexidade apresentar-se-ia maismarcado se considerados escravos e agregados; altamente significativo quandocomputados apenas os escravos (39) e menos relevante se considerados to-somenteos agregados.

    * * *

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    Tomadas as categorias de domiclios e considerados os distritos que compunham VilaRica, no se verificaram discrepncias de monta com referencia ao peso relativo de cadacategoria no conjunto de unidades domiciliares dos seis distritos em pauta (Cf.Apndice Estatstico).

    Quanto ao nmero mdio de pessoas por domiclio, no se observam, igualmente,grandes divergncias entre os distritos. Em media 5 pessoas por domiclio, numero emtorno do qual pouco variaram as cifras distritais.

    Note-se serem as mdias mais elevadas referentes aos distritos que apresentavammenor exciso populacional, conforme tivemos oportunidade de observar na aberturadesta parte de nosso trabalho.

    Tabela 12

    NMERO MDIO DE PESSOAS POR DOMICLIO(Vila Rica, 1804)

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------DISTRITOS MDIA----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Antnio Dias 5,31Ouro Preto 5,19Alto da Cruz 4,53Padre Faria 4,33Morro 5,06Cabeas 5,33

    Vila Rica (Total) 5,06-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    V - ESTRUTURA POPULACIONAL SEGUNDO PROFISSES E ATIVIDADESPRODUTIVAS.

    A anlise das atividades produtivas e da estrutura profissional aparece como elementodo mais alto interesse para o entendimento das caractersticas econmicas de uma dadacomunidade.

    A distribuio dos indivduos em termos de sexo, posicionamento social, cor e porsetores produtivos revela-se como subsdio indispensvel ao conhecimento dosprocessos de integrao econmica e diviso do trabalho; nos permite, igualmente,

    estabelecer o delineamento do quadro da vida material das sociedades estudadas

    Por outro lado, o papel desempenhado pelos indivduos e grupos populacionais mostra-se fundamental para o entendimento da histria das comunidades, pois, alm de permitira viso do momento pesquisado d-nos elementos do processo pretrito que oestruturou e sugere-nos as linhas bsicas explicativas do desenvolvimento ulterior docorpo social.

    Esta ordem de razes fundamenta a analise ora empreendida, com referncia qual

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    fazem-se necessrias algumas qualificaes preliminares. Coloca-se, desde logo, oproblema representado pela massa escrava. (40) Entendemos ser errneo desconsider-la no estudo das atividades produtivas; no entanto, imperioso o fato de aparecer, nocenso em pauta, numeroso contingente de cativos cuja nica qualificao era a deprestarem-se aos "servios domsticos". (41) A prpria ambigidade do termo, comrespeito s possveis tarefas que cabiam a estas pessoas, levou-nos a exclu-las de

    nossa anlise. Por outro lado, a simples indicao "escravo" sem qualquer outroqualificativo impede-nos, como evidente, a inferncia de que tais elementosdesempenhassem atividades homogneas no largo espectro de atribuies produtivasda sociedade mineira.

    Tais consideraes nos levaram a considerar, no estudo vertente, apenas os escravospara os quais explicitou-se atividades concretas. Destarte, computamos somente oscativos para os quais indicou-se, inequivocamente, ocupao especfica. (42)

    Lembramos ainda, com o objetivo de evitar qualquer mal-entendido quanto sconcluses deste trabalho, que da massa total da populao de Vila Rica, em 1804,pouco menos de um tero (31,39%) constitua-se de escravos. Estes cativos, certamente,

    suportavam o peso maior das atividades econmicas da urbe, no entanto, apenastomamos em conta 171 deles, ou seja, 6,14% do total de escravos. (43) Em contraposioconsideramos 25,21% dos livres, vale dizer, 1.534 indivduos livres para os quaisconstou a ocupao. Caso tomssemos os porcentuais em relao aos indivduos emidade ativa (faixa etria dos 15 aos 64 anos) as cifras alterar-se-iam insignificantemente:6,19% para escravos e 25,70% relativamente aos livres

    Estamos, portanto, a tomar apenas parte dos membros ativos da comunidade. A lacunamaior, evidentemente, refere-se aos cativos que em sua maioria esmagadora (comexcluso apenas daqueles de tenra idade, dos incapazes e dos que apresentavam idadeprovecta) deveriam estar integrados ao processo produtivo.

    Cabe-nos notar, ainda, que algumas das atividades econmicas acusadas no censo de1804 no puderam merecer maiores cuidados de nossa parte, dada a ambigidade daterminologia utilizada pelos recenseadores. Deste rol figuram atividades como: "vive desua agncia" e "homem particular", por ns qualificadas como "indeterminadas".Tambm computamos parte -- por no se referirem a atividades produtivaspropriamente ditas -- as seguintes atribuies: "estudantes", "vive do aluguel de suascasas", "do jornal de seus escravos".

    Reservamos tpico especial para o estudo dos mendigos e daquelas pessoas ditas"pobres" ou qualificadas como a ''viver de esmolas".

    Por ltimo, cabe notar que as atividades foram enquadradas nos trs setores

    econmicos bsicos classicamente distinguidos pelos economistas: primrio,secundrio e tercirio. (44)

    Temos conscincia da artificialidade envolvida na aplicao deste procedimentotaxionmico, ideado para sociedades industriais amadurecidas, economia colonialbrasileira. O pecado maior parece consistir no enquadramento, no setor secundrio, deatividades caracteristicamente artesanais -- como sabido faltavam-nos tanto asmanufaturas como as indstrias, tpicas de estgios econmicos mais avanados. Poroutro lado, a baixa integrao da economia colonial brasileira; a diviso do trabalho --

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    minerao."O carter urbano da formao mineira mesmo outra nota distintiva da Capitania.Enquanto em regies como o Rio, Bahia ou Pernambuco a explorao de certo produtoformava pequeno grupo em torno da fazenda, grupo que crescia lentamente, em Minasos agrupamentos humanos apresentavam logo certa densidade. Se a lavoura impunha olatifndio, a pecuria exigia espaos bem amplos para a sua expanso. No impunham a

    existncia da cidade ... Em regies de economia essencialmente rural, sob o domnio deum senhor quase verdadeiro patriarca, corpo e alma das fazendas que se mantinhamindependentes, o Estado foi presena menos absorvente, s vezes at mesmo entidadevaga. A cidade era secundria, pobre e destituda de luxo ou de conforto, cheia deperigos e sem relativa fartura dos ncleos rurais ... Senhores e escravos viviam noscampos, e os grupos mdios, caractersticos das cidades, eram reduzidos. Assim foipara todo o pas, com raras excees, at avanado o sculo XIX. J em Minas aurbanizao foi nota distintiva. O comum no era o senhor todo-poderoso, mas o ncleourbano, com a mquina administrativa bem instalada..."Apesar do alto nmero de escravos, haver ponderveis grupas mdios, constitudosde funcionrios, comerciantes, oficiais mecnicos" (49)

    A corresponder ao carter tipicamente urbano de Vila Rica cabia papel poucosignificativo ao setor primrio -- absorvia, apenas, 7,04% dos indivduos.Correlatamente, as atividades vinculadas aos demais setores revelavam grande pesorelativo.

    O secundrio aparecia com preeminncia -- nele colocavam-se 53,61% das pessoas --, asatividades relacionadas ao setor tercirio, tambm em concordncia com ascaractersticas citadinas da urbe, ocupavam posio de realce -- a ele correspondiam39,35% dos elementos computados.

    * * *

    Quanto distribuio segundo o sexo, evidenciou-se a predominncia dos homens --78,41% em face de 21,59% do sexo oposto.

    Tomadas, isoladamente, verificou-se no haver disparidade muito acentuada (exclusivepara o setor primrio) nas distribuies de homens e mulheres segundo os setores aquiconsiderados. Assim, do total dos homens 5,16% vinculava-se ao primrio, 54,60% aosecundrio e 40,24% ao tercirio para o sexo oposto as cifras correspondentes foram:13,86%, 50,00% e 36,14%.

    Tabela 13

    DISTRIBUIO PORCENTUAL DE HOMENS E MULHERES, SEGUNDO SETORES(Vila Rica, 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------SETORES HOMENS MULHERES-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Primrio 5,16 13,86Secundrio 54,60 50,00Tercirio 40,24 36,14

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    Total 100,00 100,00-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Evidentemente, estas cifras no permitem a inferncia de que as mesmas atribuiescoubessem a homens e mulheres; como veremos adiante -- ao estudarmos as vrias

    atividades afetas a cada setor -- existiam marcadas diferenas de natureza nasocupaes correspondentes a cada sexo.

    Por outro lado, como se depreende das Tabelas 14 e 15, observavam-se significativasdiscrepncias quanto participao de homens e mulheres, nos setores aludidos,quando computados, em conjunto, ambos os sexos.

    Tabela 14DISTRIBUIO PORCENTUAL DOS INDIVDUOS POR SETORES, SEGUNDO O SEXO

    (Vila Rica, 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    SETORES HOMENS MULHERES HOMENS+MULHERES-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Primrio 4,04 3,00 7,04Secundrio 42,82 10,79 53,61Tercirio 31,55 7,80 39,35

    Total 78,41 21,59 100,00-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Tabela 15DISTRIBUIO PORCENTUAL, POR SETORES, DE HOMENS E MULHERES

    (Vila Rica, 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------SETORES HOMENS MULHERES TOTAL-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Primrio 57,50 42,50 100,00Secundrio 79,87 20,13 100,00Tercirio 80,17 19,83 100,00-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Assim, enquanto no primrio ocorria relativo equilbrio entre os sexos -- 57,50% dehomens contra 42,50% de elementos do sexo oposto --, no secundrio a discrepncia

    revelava-se de grande monta -- 79,87% de indivduos do sexo masculino em face de20,13% de mulheres. Com respeito ao tercirio verificou-se divergncia igualmenteacentuada: 80,17% de homens versus 19,83% de mulheres. Evidentemente, osdiferenciais apontados devem-se, sobretudo, aos nmeros absolutos de indivduos decada sexo, vale dizer, o contingente masculino apresentava-se muito mais elevado doque o relativo s mulheres.

    * * *

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    O parcelamento da populao segundo o posicionamento social -- livres e escravos --permite-nos verificar que, tomadas as duas categorias isoladamente, existia francodesequilbrio nos setores primrio e tercirio. Assim, 20,47% dos cativos vinculava-se aoprimrio enquanto apenas 5,54% dos livres a se colocavam; por outro lado, enquanto40,74% de livres enquadravam-se no tercirio, apenas 26,90% dos escravos ocupavamposio idntica. Quanto ao secundrio, o equilbrio mostra-se patente. (50)

    Tabela 16DISTRIBUIO PORCENTUAL DE LIVRES E ESCRAVOS, SEGUNDO SETORES

    (Vila Rica, 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------SETORES LIVRES ESCRAVOS-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Primrio 5,54 20,47Secundrio 53,72 52,63Tercirio 40,74 26,90

    Total 100,00 100,00-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Analogamente ao caso anterior, em que distribumos a populao segundo o sexo, asdiscrepncias -- devidas ao maior contingente de livres em face do nmero de escravos-- revelam-se altamente significativas quando computamos, conjuntamente, os doisestratos sociais.

    Tabela 17

    DISTRIBUIO PORCENTUAL, POR SETORES, DE LIVRES E ESCRAVOS

    (Vila Rica, 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------SETORES LIVRES ESCRAVOS TOTAL-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Primrio 70,83 29,17 100,00Secundrio 90,15 9,85 100,00Tercirio 93,14 6,86 100,00-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Destarte, os livres -- com larga maioria no primrio -- praticamente monopolizavam osecundrio e o tercirio, independentemente, como j notamos, da natureza das funes

    desempenhadas.

    Na tabela abaixo v-se claramente a predominncia dos livres e as divergnciasapontadas acima.

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    Tabela 18DISTRIBUIO PORCENTUAL DOS INDIVDUOS POR SETORES,

    SEGUNDO O POSICIONAMENTO SOCIAL(Vila Rica - 1804)

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------SETORES LIVRES ESCRAVOS ESCRAVOS+LIVRES-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Primrio 4,99 2,05 7,04Secundrio 48,33 5,28 53,61Tercirio 36,65 2,70 39,35

    Total 89,97 10,03 100,00-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    * * *

    Passemos ao estudo, em termos de condio social e sexo, das atividades pertinentes acada setor.

    No primrio, encontramos as mulheres a predominar entre os roceiros, lavradores ehortels -- 51 mulheres contra 27 homens. Entre os lenheiros, por outro lado,encontramos apenas indivduos do sexo masculino. Com respeito distribuiosegundo o posicionamento social verificou-se que os livres compunham maioriaesmagadora dos lavradores, roceiros e hortelos -- em 78 indivduos a enquadradosencontramos apenas 1 cativo. Quanto aos lenheiros a situao inverte-se -- neste casopredominavam os escravos na razo de 5 para 1.

    Com referncia ao secundrio, em termos de sexo, verificou-se ampla especializao --as mulheres ocupavam-se de reduzido nmero de atividades. Ao mesmo tempo,algumas atribuies cabiam exclusivamente s pessoas do sexo feminino. Destarte,pouco menos de dois teros das mulheres vinculadas ao setor em tela apareciam comocostureiras e fiandeiras, mais da metade delas eram costureiras. Exerciam de maneiraexclusiva as seguintes atividades: costureiras, doceiras, fiandeiras e rendeiras. Quantos atribuies que partilhavam com os homens podemos distinguir dois grupos. Oprimeiro englobava atividades nas quais as mulheres predominavam: padeiros etecedeiras. No outro cabia preeminncia aos homens: tintureiros, mineiros efaiscadores. Quanto s duas ltimas, cabem algumas consideraes. Em primeiro, deve-se observar seu grande peso relativo -- cerca de um quarto (24,94%) dos indivduos de

    ambos os sexos (vinculados ao setor em anlise) nelas enquadrava-se. Ainda em termosrelativos, havia predomnio das mulheres -- 30,43% (ou seja, 56 em 184) -- sobreelementos do sexo oposto --23,57% (172 em 730). Com respeito ao nmero absoluto apreeminncia estava com os homens (172 versus 56) segundo a razo de 3,33relativamente aos faiscadores e de 2,47 com respeito aos mineradores.

    Outro fato marcante diz respeito maior presena de faiscadores (169) vis--vis osmineradores: 59. Estas cifras, por si mesmas -- como anotado por Caio Prado Jnior--atestam a decadncia da explorao aurfera em Vila Rica.

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    Restavam, por fim, as ocupaes exercidas exclusivamente pelos homens -- em nmerode 33. Esta cifra representa a maioria das atividades do setor (vide Tabela 19).Caracterizavam-se pela especializao exigida para seu desempenho -- armeiros,funileiros, fundidores etc. -- e/ou pelo maior esforo fsico requerido -- capineiros,ferradores etc. -- e/ou pelo tradicional relacionamento estabelecido entre algumas

    atividades e o sexo -- por exemplo, alfaiates de um lado, costureiras por outro. (51)

    Tabela 19DISTRIBUIO DAS ATIVIDADES DO SECUNDRIO, SEGUNDO O SEXO

    (Vila Rica, 1804)-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Atividades exercidas exclusivamente por homens 33Atividades desempenhadas por homens e mulheres 5Atividades exclusivamente atribudas s mulheres 4

    Nmero total de atividades computadas 42

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Como se verifica em tabela do Apndice Estatstico, havia larga diversidade deocupaes. Dentre elas ocupavam papel de realce os alfaiates (113), carpinteiros (69),ferreiros (48), latoeiros (51) e sapateiros (145); conjuntamente, as ocupaes acimaenumeradas, absorviam mais da metade (58,36%) dos homens relacionados nosecundrio.

    Com respeito ao posicionamento social observou-se apenas uma atribuio exercidaexclusivamente por escravo (esteireiro). Predominaram as atividades exclusivas delivres (em numero de 28), enquanto 13, desempenhavam-nas, tanto livres como cativos.

    Estes ltimos, em termos absolutos, apenas exerciam majoritariamente a funo decapineiros -- certamente das mais rduas. Por outro lado, vemo-los representados entreos alfaiates, carpinteiros, faiscadores, ferreiros, latoeiros, pedreiros, sapateiros, seleiros,serralheiros e relojoeiros. A simples enunciao destas atividades expressaeloqentemente a variedade das tarefas desenvolvidas pelos escravos e, tambm,mostra-nos os cativos a exercerem atividades que exigiam razovel nvel deespecializao ( Cf. Apndice Estatstico).

    No tercirio encontramos maiores discrepncias tanto com respeito ao sexo como noreferente ao posicionamento social (vide tabela 20).

    Tabela 20DISTRIBUIO DAS ATIVIDADES DO TERCIRIO, SEGUNDO O SEXO(Vila Rica, 1804)

    -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ATIVIDADES EXERCIDAS PROFISSES IGREJA ADMINSTRA- COMRCIO TRANSPORTE OUTROS TOTAL LIBERAIS O CIVIL SERVIOS-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------S por homens 7 2 9 4 3 6 31Por homens e mulheres 1 -- -- 3 1 3 8S por mulheres 1 -- -- -- -- 1 2

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    Relativamente cor, predominaram os pretos e pardos (170 sobre 220 -- 77,27%), osbrancos apareceram minoritariamente (18 em 220 -- 8,18%), enquanto para 14,55% foiimpossvel determinar a cor.

    Em termos de estado conjugal dominaram os solteiros (ou aqueles que assim

    consideramos) com peso relativo correspondente a quatro quintos (80,45%) do total; aeles seguiram-se os vivos (10,45%) e, por fim, os casados (9,10%).

    * * *

    Os elementos informativos coletados permitem a caracterizao dos seis distritoscomponentes de Vila Rica (vide Apndice Estatstico).

    Assim, em Antnio Dias e Ouro Preto concentrava-se a vida administrativa, militar ereligiosa. Com pouco mais de metade (50,77%) da populao da urbe, estes distritoscontavam com quatro quintos dos militares (79,20%) e 85,52% dos demais integrantes da

    administrao civil. Neles residiam trinta e trs dos quarenta eclesisticos (82,50%) e76,31% dos profissionais liberais. Quatro quintos dos comerciantes (80,62%) e 78,98%das pessoas relacionadas em "outros servios". Por outro lado, neles congregava-se49,76% da massa vinculada ao secundrio e, apenas, 39,17% dos elementosenquadrados no setor primrio.

    O distrito do Padre Faria, com apenas 6,98% da populao total, contribua com a maissignificativa parcela de roceiros, hortelos e lavradores: 53,85% do total. No secundriopredominavam faiscadores e mineiros -- mais da metade (53,77%) dos moradores doPadre Faria, enquadrados no secundrio, exerciam estas atividades.

    No distrito do Morro, que contava 14,56% da populao ouro-pretana, dominavam os

    faiscadores (em maior numero do que nos demais distritos) seguidos pelosmineradores. Este distrito -- vis--vis os demais, tomados isoladamente -- apresentava omaior nmero de pessoas relacionadas s duas atividades aludidas. Com respeito aototal de mineiros e faiscadores representava, a quantidade encontrada no Morro, 36,40%.Com respeito aos indivduos deste distrito, enquadrados no secundrio, o porcentualalcanava 79,80%.

    No Alto da Cruz residia 11,87% da populao ouro-pretense. Contava com setor terciriomais desenvolvido do que os dois precedentemente analisados; o secundrioapresentava-se mais diversificado, embora no se aproximasse da riqueza qualitativa edos nmeros relativos mais significantes encontrados no Ouro Preto e Antnio Dias. Osfaiscadores e mineradores representavam 29,35% das pessoas vinculadas ao

    secundrio.

    Finalmente, o distrito das Cabeas -- com 15,82% dos habitantes da urbe -- revelava-se,proporcionalmente, menos rico do que o Alto da Cruz com respeito ao tercirio. Noentanto, no secundrio, era mais significativo o peso das atividades artesanais.Enquanto no Alto da Cruz, alfaiates, carpinteiros, ferreiros, latoeiros e sapateiroscorrespondiam a 55,96%; no distrito das Cabeas a cifra respectiva alcanava 70,58%.Por outro lado, os faiscadores e mineradores representavam, apenas, 11,76% daspessoas adstritas ao secundrio.

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    CONSIDERAES FINAIS

    Pudssemos, em cincia, idear circunstncias timas para o estudo das populaes

    pretritas, seduzir-nos-iam, indubitavelmente, as pequenas comunidades, pacatas eensimesmadas, nas quais a atonia dominasse o bulcio das transformaes rpidas eviolentas, nas quais o discreto e morno evolver populacional no se visse violentadopelas intempries dos movimentos imigratrios dominados pelo esprito de aventureirosirrequietos a demandar riquezas, por vezes, quimricas

    Ideais, seriam as aglomeraes acanhadas a evoluir, sem traumas, ao desfilar serenodos anos.

    Vila Rica, objeto deste trabalho, no , ao que parece, o prottipo de comunidade aapresentar evolver "normal", pois, injetou-se nela grande contingente de imigrantes --tanto livres como escravos -- durante o perodo de ascenso exploratria e ocorreram

    profundas sangrias com as emigraes provocadas pela decadncia da atividademineradora. Alis, as circunstncias ideais acima alinhavadas mostram-se,possivelmente, inatingveis desde que, em todo o cenrio da rea de minerao,assistimos vivncia de sociedades tumultuadas pelo afluxo e evulso de levashumanas impelidas pelo fascnio dos achados aurferos e presas da nostalgia quando doesgotamento dos depsitos mais facilmente explorveis. Sociedades que, somente aoraiar do sculo XIX, estariam a encontrar outra dinmica -- a do curso mais calmo, queparece coadunar-se com a sedentariedade dos grupos humanos dedicados s fainas daatividade agrcola.

    Superado o perodo estrdio, as urbes viram-se cristalizadas; as velhas cidades --construdas enquanto cresciam os mananciais de riqueza, com suas belas igrejas

    barrocas, seus sobrades debruados diretamente sobre as ruas estreitas, as praasapertadas, seus chafarizes outrora borbulhantes -- l esto hoje, preservadas no tempocomo mensagem histrica a documentar a realidade febricitante vivida no passado. Adecadncia econmica muito rpida e a excelncia dos materiais no deram margem deteriorao, fruto de paulatino apoucar de recursos.

    Do burburinho da sociedade mineira do setecentos captamos, nesta monografia, aslinhas demogrficas gerais, mais evidentes e, qui por isto mesmo, mais relevantes.Faltaram-nos, verdade, hipteses arrojadas bem como concluses exaustivas. Adesaconselh-las est, alm do nosso noviciado -- a recomendar antes a cautela que oarroubo estrugidor dos pouco avisados --, o estado atual da demografia histricabrasileira, ainda tateante; a este respeito lembre-se ser nosso trabalho, ao que nos

    consta, o primeiro relativo rea mineira.

    Sem pretender sumariar exaustivamente o trabalho ora apresentado permitimo-nosindicar seus marcos mais significativos que merecem, a nosso ver, cotejo com estudosfuturos.

    Ressalta, desde logo, o carter da ocupao e povoamento da rea estudada, Oprocesso pelo qual o homem fixou-se terra e o desenvolvimento da urbe,condicionados estreitamente pela forma de recolhimento dos minerais e pelo meio fsico

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    envolvente. No parece ter havido o implementar de um plano empresarial definido edefinitivo. O colonizador, simplesmente, curvou-se ao ambiente geogrfico, adaptou-semais ou menos passivamente, parecendo-nos antes dominado que dominador criativo; oprprio desalinho do traado de Vila Rica parece comprovar esta nossa presuno.

    Por outro lado, o esprito aparentemente linear do minerador -- dominado

    permanentemente pela nsia do ouro -- aliado relativa pobreza dos solos circundantesimpediu-lhe vislumbrar as potencialidades econmicas oferecidas pelas paragens emque ocorreram os achados aurferos. Estaria ai um dos principais fatores a impelir paranovos domnios as populaes desencantadas com o exaurir dos depsitos minerais.

    As consideraes acima arroladas evidenciam-se, de imediato, na estreita correlaoentre as mudanas nas quantidades extradas de ouro e nas variveis demogrficas --casamentos, batismos e bitos -- consideradas na primeira parte deste estudo.

    Nossa anlise revelou uma sociedade altamente estratificada, em que pese sua maiorflexibilidade vis--vis as condies prevalecentes em outras reas econmicas dacolnia. Pudemos identificar, em termos de parmetros demogrficos, trs segmentos

    populacionais bsicos, alis, comuns ao Brasil -- livres, forros e cativos.

    Os livres, em geral, e os brancos, em particular, como esperado, compunham a camadaprivilegiada da populao. A pobreza, presente em larga escala, abatia-se,principalmente, sobre os forros, excludos aqui, evidentemente, os escravos para osquais o destino reservara as maiores dores -- ceifados, na lida rdua em que se osempregava, segundo taxa que, se vlida para a espcie, a anularia da face do planeta.

    A pobreza alcanava seu aspecto mais pungente ao avolumar-se dramaticamente, noperodo de recesso, a quantidade de expostos -- crianas, as mais sujeitas morteprematura.

    O intercurso sexual -- duramente criticado pelos coevos por entenderem-nodesmedidamente permissivo -- por um lado, gerou uma sociedade na qualpredominavam os filhos naturais e, por outro -- j no plano das unies sacramentadaspela Igreja -- propiciou, embora perfunctoriamente, relativa mobilidade social;lembramos, a este respeito, os consrcios entre brancos e forras (pretas ou mulatas) eos casamentos de libertos com cativos.

    Quanto origem tnica e/ou lingstica da massa de africanos evidenciou-se a marcantepresena de Sudaneses em face dos Bantos.

    Esboou-se, relativamente ao crescimento vegetativo da populao, no fim do perodoestudado, o equilbrio entre nascimentos e defunes, prenncio de significativa

    alterao no diferencial em foco que, de negativo passou a mostrar sinal oposto.

    Com respeito ao aspecto econmico demonstrou-se prodigamente, na segunda partedeste trabalho, o carter citadino de Ouro Preto. Referimo-nos, particularmente, presena altamente significativa das atividades vinculadas aos setores secundrio etercirio, ressaltando, daquele, o grande peso relativo e amplo espectro coberto pelasocupaes artesanais.

    Revelou-se, em Vila Rica -- por mais provinciana que a quisssemos --, um horizonte

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    social, econmico e cultural mais ancho do que nas demais economias da colnia.

    Por fim, acreditamos que nosso trabalho evidencia a urgncia de estudos referentes prpria sociedade mineira e s demais economias vigentes no perodo colonialbrasileiro. O confronto entre os resultados de nossa pesquisa e aqueles oferecidos porfuturos trabalhos sobre a poca do ouro e dos diamantes possibilitar-nos- avaliar as

    similitudes e dessemelhanas dos movimentos demogrficos dos inmeros ncleos darea em apreo, oferecendo-nos, ademais, o balizamento necessrio formulao dehipteses abrangentes, capazes de compor quadro terico explicativo docomportamento populacional da sociedade mineira.

    Por outro lado, o conhecimento mais profundo das populaes das vrias economias doBrasil colnia daro embasamento emprico indispensvel ao estabelecimento deeventual teoria demogrfica original, apta a abarcar a formao populacional ptria.

    * *

    *

    APNDICE METODOLGICO REFERENTE PRIMEIRA PARTE

    I - OS DADOS EMPRICOS.

    Os dados empricos deste estudo provm, essencialmente (1) de cdices da freguesia deNossa Senhora da Conceio de Antnio Dias; nestes manuscritos constam os assentosde batismos, bitos e casamentos da parquia em pauta. (2)

    A maior ou menor riqueza de informaes, contidas nas vrias categorias de assentos,apresentou-se como resultante de dois elementos. Em primeiro, observam-se diferenasdevidas ao arbtrio dos eclesisticos responsveis pela feitura dos registros; assim,cada proco ou coadjutor revelou-se mais ou menos rico em pormenores ao descreveros eventos em apreo. Tambm, a depender da idiossincrasia de cada clrigo, aparece orealce deste ou daquele aspecto particular: cor, condio social, idade, causa da morteetc.

    O segundo fator a determinar a conciso ou prolixidade dos vrios registradores refere-se ao posicionamento social e/ou faixa etria das pessoas envolvidas no sucessoassinalado. Destarte, escravos, forros e inocentes, via de regra, receberam tratamentosucinto. Por outro lado, os dignitrios da Igreja ou da vida administrativa colonial, bem

    como as pessoas de posses -- ainda que alforriadas -- tiveram seus privilgiosconsubstanciados em assentos minuciosos; evidentemente, no se trata aqui deprejuzos -- a prpria condio de escravo, forro e/ou inocente tinha como corolrio umaexistncia sem acontecimentos marcantes os quais, em ltima instncia, davamembasamento aos assentos pormenorizados.

    Cada categoria de assento -- batizados, bitos e casamentos -- apresenta-se em cdicesdistintos; em apenas um dos livros de bitos (MSS. - Cd. 1RO - Livro de Assento debitos, 1723/1735) consta suplemento de registro de batizados referente ao perodo

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    1813/1856.

    Em dois livros de registros de bitos (MSS. - Cd. 2RO - Livros A e B) aparece, alm dosassentos, cpia dos respectivos testamentos -- tal prtica foi abolida por se ter adotado,na segunda metade do sculo XVIII, livro especfico para lanamento das disposiestestamentrias. At o meado do sculo XVIII havia livros de bitos especiais para livres e

    escravos. A partir de ento os registros foram lanados em cdices comuns a cativos elivres.

    Em relao aos livros de casamentos e batizados aparecem, lado a lado, assentosreferentes a livres e a escravos .(3) Ressalte-se que, para estes ltimos, constamassentos de batismos tanto de inocentes como de adultos. Por inocentes entendiam-seas crianas -- via de regra com menos de sete anos -- que ainda no comungavam;adultos, consideravam-se, em geral, os negros africanos -- com mais de sete anos --aqui chegados sem terem recebido o batismo na frica.

    A seguir, analisamos o contedo de cada tipo de registro e indicamos as lacunasverificadas nos cdices estudados.

    REGISTROS DE BATISMOS.

    Utilizamo-nos dos seguintes cdices:

    MSS. - Cd. 1RB - Livro de Assento de Batizados da Matriz de Nossa Senhora daConceio do Bairro de Antnio Dias - 1710/1739. Com 129 folhas das quais foramperdidas as de nmeros 4, 40, 79, 80, 81, 82 e 83.MSS. - Cd. 2RB - Livro de Assento de Batizados da Matriz de Nossa Senhora daConceio de Vila Rica (escravos e filhos de escravos) - 1727/1740. Sem lacunas, com

    185 folhas.

    MSS. - Cd. 3RB - Livro de Assento de Batizados da Freguesia de Nossa Senhora daConceio 1740/1773. Faltam as folhas 426 e 427 das 518 que compem o cdice.

    MSS. - Cd. 4RB - Livro de Assento de Batizados e Crismas da Freguesia de NossaSenhora da Conceio de Antnio Dias - 1773/1780. Completo, com 149 folhas.

    MSS. - Cd. 5RB - Livro de Assento de Batizados - 1780/ 1792. Com 238 folhas, das quaisfaltam as de nmeros: 108, 111, 115 e 166.

    MSS. - Cd. 6RB - Livro de Assento de Batizados- 1793/1798. D continuidade ao livro

    anterior; a numerao das folhas vai de 239 a 321, apresenta como lacuna uma nicafolha: a de nmero 311 ou 312. Trata-se, obviamente, da continuao do Cd. 5RBindicado acima.

    MSS. - Cd. 7RB - Livro 6o. de Batizados - 1798/1819. Completo, com 322 folhas.

    A par das lacunas apontadas -- de pequena monta, alis -- encontramos ainda duasoutras fontes de perdas. Em primeiro aparece o fato de nem todos os livrosapresentarem termo de encerramento, o que nos indica a existncia de lacunas

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    correspondentes ao extravio das ltimas folhas dos cdices em questo. Estapossibilidade confirma-se pelo espao de tempo, relativamente amplo, que separa oltimo assento de um livro do primeiro registro do cdice sucessivo, fato por nsobservado em todos os livros passveis desta anlise.

    Outra fonte de provveis lacunas infere-se do aparecimento, repetido em todo o perodo

    analisado, de reabertura de assentos, a pedido de interessados, com base najustificativa de que o registro original no fora localizado nos livros paroquiais. Ao quetudo indica os batismos no eram, necessariamente, registrados imediatamente antes oudepois de ministrado o sacramento; talvez os padres anotassem os dados em um papelqualquer para depois efetuarem os lanamentos definitivos -- em um dos cdicesencontramos, apensada, uma tira de papel na qual constavam anotaes relativas a umassento, fato que parece confirmar a hiptese aqui aventada.

    Os assentos de batismo apresentam variegada tipologia. Os registros relativos a adultostrazem:

    - local e data do batismo;

    - prenome do escravo a receber batismo;- nome do senhor e, por vezes, um ou mais dos seguintes elementos: sua condiosocial (escravo ou forro), estado conjugal, local de moradia, cor;- prenome dos padrinhos, quando escravos, ou os nomes completos em caso contrrio.A condio social, estado conjugal, cor e local de residncia dos padrinhos nem sempreforam indicados; a origem dos escravos africanos vem, via de regra, anotada;- a origem -- "nao" -- do batizado constou em nmero substancial de registros;- a assinatura e qualificao do padre que ministrou o batismo fizeram-se semprepresentes.

    Vejamos dois desses registros, aqui transcritos como aparecem nos livros:

    "PedroadultoAos quatorze dias do ms de fevereiro de mil setecentos e trinta nesta Matriz batizei epus os Santos leos a Pedro escravo de Joo Gonalves Batista foram padrinhosFrancisco mina e Ana forra de que fiz este assento dia ut Sa.O Pe. Coadjutor Nicolau Barreto de Gusmo." (4)Este primeiro exemplar foi tomado do Cd. 2RB (1727-1740), o segundo, buscamos emponto mais avanado no tempo -- Cd. 4RB (1773/1780):

    "JoanaAdulta

    Aos vinte e oito de Janeiro de mil setecentos e setenta e seis nesta Matriz batizei e pusos Santos leos a Joana mina escrava de Jos da Cunha casado com Severina Pereirada Silva moradores junto ponte: foram padrinhos Felis Moreira preto forro, e Tereza deJesus preta forra. E para constar fiz este assento.O Coadjutor Bento Mel. Pereira." (5)

    * * *

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    Com respeito aos inocentes apresentou-se variao mais larga do que a verificada entreos adultos. Assim, registros concernentes a filhos de escravos trazem parcasinformaes. Vejamos um espcime:

    "Vicente

    Aos 14 dias do ms de Dezembro (de 1712) nesta Igreja Matriz de