Livro - Teoria Geral Dos Contratos - Marcia Carla Ribeiro (6)

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Livro de Teoria Geral Dos Contratos

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  • THOMSON REUTERS

    REVISTA DOS TRIBUNAIS '

    THOMSON REUTERS

    REVISTA DOS TRIBUNAIS

    MARCIA CARLA PEREIRA RIBEIRO 1RINEU GALESKI JUNIOR

    MARCIA CARLA PEREIRA RIBEIRO Ps-Doutorado pela Fundao Getlio Vargas (FGV-SP) e pela Universidade de Lisboa. Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Paran (UFPR). Professora Titular de Direito Empresarial da Pontifcia Universidade Catlica do Paran (PUC-PR) e Professora-Associada da UFPR. Membro da Comisso de Direi-to Econmico da Ordem dos Advogados do Brasil, Seo do Paran (OAB-PR), da Associao Brasileira de Direito e Econo-mia (ABDE) e da Associao Paranaense de Direito e Economia (Adepar). Procu-radora do Estado, advogada e rbitro.

    IRINEU GALESKI JUNIOR

    2 edio revista, dtualizada e ampliada

    Doutor e Mestre em Direito Econmico e Socioambiental pela Pontificia Univer-sidade Catlica do Paran (PUC-PR). Professor do Centro Universitrio Curitiba (UniCuritiba). Membro da Associao Brasileira de Direito e Economia (ABDE) e da Associao Paranaense de Direito e. Economia (Adepar). Advogado.

    CONTRATOS EMPRESARIAIS E ANLISE ECONMICA

  • MARCIA CARLA PEREIRA RIBEIRO IRINW GAtesx+, JUNIOR

    TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

    A proposta da obra de reviso da Teoria Geral dos Contra-tos em relao aos contatos firmados entre empresas, sob a tica da Anlise Econmica, propondo-se que os efeitos pro-duzidos pelos contratos empresariais sejam analisados para alm das partes contratantes. Aborda a extenso da unifica-o parcial da disciplina das obrigaes operada a partir da vigncia do Cdigo Civil brasileiro, com nfase nas caracte-rsticas prprias das relaes empresariais e, em especial, dos contratos manejados pelos empresrios. Perpassa pelos prin-cpios gerais do direito contratual, inclusive no que se refere s hipteses de vcios de consentimento. O livro apresenta um captulo sobre Anlise Econmica do Direito, explicitan-do o histrico e as principais bases tericas dessa corrente. Apresenta elementos que podem auxiliar na compreenso e interpretao dos contratos empresariais, sob o paradigma da eficincia e da justia, para, ao final, propor uma reclassi-ficao dos contratos a partir das novas premissas adotadas pelos autores. Por toda extenso da obra h referncias dou-trinrias e jurisprudenciais que podem interessar a todo aque-le que estuda, opera ou interpreta contratos empresariais.

    ISBN 978-85-203-5916-7

    9 788520 359167 THOMSON REUTERS

  • THOMSON REUTERS

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    7C9-156-UELS-2ESS-7EUL

    THOMSON REUTERS

  • MARCIA CARLA PEREIRA RIBEIRO IRINEU GALESKI JUNIOR

    Diretora Responsvel MARISA HARMS

    Diretora de Operaes de Contedo JULIANA MAYUMI ONO

    Editores: Andria Regina Schneider Nunes, Cristiane Gonzalez Basile de Faria, Danielle Oliveira, lvi A. M. Loureiro Gomes e Luciana Felix

    Produo Editorial Coordenao JULIANA DE CICLO &ARCO

    Analistas Editoriais: Amanda Queiroz de Oliveira, Danielle Rondon Castro de Morais, Flvia Campos Marcelino Martines, George Silva Melo, Luara Coentro dos Santos, Luciano Mazzolenis J. Cavalheiro e Rodrigo Domiciano de Oliveira

    Analistas de Qualidade Editorial: Cintia Mesojedovas Nogueira, Maria Anglica Leite, Rafaella de Almeida Vasconcellos, Samanta Fernandes Silva e Victor Bonifcio

    Capa: Chrisley Figueiredo

    Administrativo e Produo Grfica Coordenao CAIO HENRIQUE ANDRADE

    Analista Administrativo: Antonia Pereira

    Assistente Administrativo: Francisca Luclia Carvalho de Sena

    Analista de Produo Grfica: Rafael da Costa Brito

    TEORIA GERAL DOS

    CONTRATOS CONTRATOS EMPRESARIAIS E ANLISE ECONMICA

    2 edio revista, atualizada e ampliada

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Ribeiro, Marcia Carla Pereira Teoria geral dos contratos : contratos empresariais e anlise econmica

    / Marcia Carla Pereira Ribeiro, Irineu Galcski Junior. 2. ed. rev., atual. e ampl. -- So Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2015.

    Bibliografia. ISBN 978-85.203-5916-7

    1. Direito comercial 2. Direito comercial - Legislao - Brasil I. Caleski Junior, Irineu. II. Ttulo.

    14-12658 CDU-347.7(811(094)

    ndices para catlogo sistemtico: 1. Brasil : Leis : Direito comercial 347.7(81)(094)

    THOMSON REUTERS

    REVISTA DOS TRIBUNAIS"

  • TEORIA GERAL DOS CONTRATOS Contratos empresariais e anlise econmica

    edio revista, atualizada e ampliada

    MARCIA CARLA PEREIRA RIBEIRO

    IRINEU GALESKI JUNIOR

    I' edio: 2009 (Editora Campus-Elsevier)

    Diagramao eletrnica: TCS -Tata Consultancy Services - CNPJ 04.266.331/0001-29 Impresso e encadernao: Orgrafic Grfica e Editora Ltda., CNPJ 08.738.805/0001-49.

    INCLUI VERSO ELETRNICA DO LIVRO

    O desta edio [2015]

    EDITORA REVISTA DOS TRIBUNAIS LTDA. MARISA HARMS

    Diretora responsvel

    Rua do Bosque, 820 Barra Funda Tel. 11 3613-8400 Fax 11 3613-8450 CEP 01136-000 So Paulo, SP, Brasil

    Todos os direitos reservados. Proibida a reproduo total ou parcial, por qualquer meio ou pro-cesso, especialmente por sistemas grficos, microflmicos, fotogrficos, reprogrficos, fonogrficos,

    videogrficos. Vedada a memorizao e/ou a recuperao total ou parcial, bem como a incluso de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibies aplicam-se tambm s caractersticas grficas da obra e sua editorao. A violao dos direitos autorais punvel como crime (art. 184 e pargrafos, do Cdigo Penal), com pena de priso e multe, conjuntamente com busca e apreenso e indenizaes diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de

    19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais).

    CENTRAL DE RELACIONAMENTO RT (atendimento, em dias Citeis, das 8 s 17 horas)

    Tel. 0800-702-2433 e-mail de atendimento ao consumidor: [email protected]

    Visite nosso size: www.rt.com.br

    Impresso no Brasil 101-2015J

    Profissional

    [12-12-2014]

    ZONTORA AMADA

    ISBN 978-85-203-5916-7

    Para GIOVANI

  • "Quiz, se le deba permitir al economista uma dosis moderada de bondad, com tal que em

    sus modelos econmicos mantengan las motivaciones de los seres humanos puras, sencillas y realistas,

    y no las eche a perder com cosas tales como la buena voluntad o los sentimentos Morales."

    Essa edio foi atualizada pelos autores com o auxlio

    da pesquisadora RAFAELLE KRASINSKI ALVES PEREIRA.

    AMARTYA SEN

  • APRESENTAO

    Propor-se a uma anlise econmica do Direito, num pas cujos fun-damentos jurdicos sofrem a influncia do Direito Romano (Civil Law) significa expor-se a uma metodologia de anlise que corajosamente re-conhece que a cincia do direito no est isenta influncia dos aspectos econmicos, que por sua vez tema aptido para produzir efeitos sociais.

    Analisar os contratos empresariais sob a tica econmica significa pens-los a partir de seus efeitos. Significa aceitar que especialmente os contratos utilizados na lide empresarial so capazes de produzir resultados que transcendem o universo de interesse das partes.

    A tica econmica de anlise do Direito no significa, por outro lado, que as opes do jurista devam se restringir busca do melhor resultado econmico considerado em sua matemtica pura.

    Significa, isto sim, que o impacto econmico de uma Lei ou de um julgado no deve ser desconhecido do agente que produz ou aplica o direito. Para prevalecer ou para no prevalecer, porm, tal impacto deve ser sempre considerado.

    H uma metodologia j bastante desenvolvida em outros pases, especialmente aqueles de base da Common Law, a qual estabelece cri-trios e contornos para a anlise econmica do Direito. Alguns pases europeus, assim como o Direito Canadense, caminham para uma maior explorao da sistemtica proposta. No Brasil, como ser dito no livro, as experincias de produo e pesquisa em Anlise Econmica do Direito ainda so escassas.

    A proposta da obra de reviso da Teoria Geral dos Contratos em relao aos contatos firmados entre empresas, sob a tica da Anlise Econmica, propondo-se, inclusive, que os efeitos produzidos pelos contratos empresariais sejam analisados para alm das partes contra-tantes e apresentando-se, ao final, uma proposta de reclassificao dos contratos a partir das novas premissas adotadas pelos autores.

    OS AUTORES

  • SUMRIO PARTE 1

    INTRODUO

    1. Atividade empresarial e o contrato 19

    1.1 O sujeito empresrio 19 1.2 Unificao do Direito Privado e empresariedade 24

    1.3 Especialidade desde a origem do Direito Comercial 26 1.4 Contratos e a unificao do Direito Privado 29

    1.5 Contratos na atividade empresarial 29

    1.6 Contratos empresariais e contratos nominados 31

    PARTE II PRINCPIOS GERAIS DO DIREITO CONTRATUAL

    I. Funo social e boa-f objetiva 37 2. Funo e funo social 38

    3. Vcios do consentimento e a impreviso 40

    4. Partes do contrato, terceiros e funo social 54

    5. Lei e contedo do contrato 56

    5.1 Contrato obrigatrio 57

    5.2 Contratos de adeso 58

    5.3 Contratos educacionais 59

    5.4 Enfraquecimento da vontade 61 6. Clusulas nulas e a formao do contrato 62

    7. Atipicidade 65

  • 14 I TEORIA GERAL DOS CONTRAI-OS SUMRIO I 15

    PARTE III A ANLISE ECONMICA COMO MTODO

    DE INTERPRETAO DO DIREITO EMPRESARIAL 1. A anlise econmica do direito: desenvolvimento histrico

    e conceito

    1.1 Precursores

    1.2 Desenvolvimento

    1.2.1 Do incio do movimento: a Universidade de Chi- cago

    1.2.2 A proposio do paradigma: a obra de Coase e Calabresi

    1.2.3 Da aceitao do paradigma

    1.2.4 Do questionamento do paradigma 75 1.2.5 Da reformulao do movimento

    77 1.3 Da adoo do movimento em outros pases 79 1.4 O conceito da Anlise Econmica do Direito

    2. Breves apontamentos sobre a cincia econmica: conceito e princpios

    2.1 Conceito

    2.2 Os princpios da Economia

    3. As premissas fundamentais para a aplicao da anlise eco-nmica ao direito 91

    3.1 A escolha racional 95

    3.2 A eficincia 1 00

    3.3 As falhas de mercado

    107 3.3.1 A assimetria de informao

    109 3.3.2 O poder econmico e das estruturas de merca-

    do 111 3.3.3 As externalidades

    116 3.4 A teoria dos custos de transao

    122 3.5 A teoria dos jogos 126

    4. A aplicao da anlise econmica do direito 132

    4.1 Um breve esclarecimento: as crticas ao movimento .. 132 4.2 A Anlise Econmica do Direito de propriedade

    135 4.3 A Anlise Econmica do Direito e a Responsabilidade

    Civil Extracontratual 141

    4.4 A Anlise Econmica do Direito e os contratos

    146

    1. A anlise econmica do direito e os contratos

    151 1.1 Os Contratos que devem ser tutelados

    151 1.2 O inadimplemento dos contratos

    152

    67

    68 70

    PARTE IV 71 A INTERPRETAO DO CONTRATO EMPRESARIAL

    E DE SUA FUNO A PARTIR DA ANLISE 72 ECONMICA DO DIREITO 74

    82 2. A questo da funo social no direito empresarial e no con- trato empresarial

    159

    8 2.1 Funo social e a relativizao do papel do Estado 159

    85 2.2 Funo social no Direito Empresarial 162 88 2.2.1 Funo social da sociedade annima 163

    2.2.2 Funo social da sociedade limitada e seu as- pecto contratual

    164 2.2.3 Resoluo do contrato social em relao a um

    scio por deciso majoritria 165

    2.2.4 Funo social dos contratos nas empresas em recuperao judicial

    166 2.2.5 Funo social dos contratos nas empresas em

    recuperao extrajudicial 170

    2.2.6 Funo social dos contratos na falncia 171

    2.2.7 Funo social dos contratos e a defesa da concor- rncia

    173 2.3 Funo social e a previso normativa

    174

  • 16

    2.4

    I TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

    Funo nos contratos entre empresas 175

    SUMRIO

    PARTE V

    I 17

    2.4.1 Retomando a ideia geral de funcionalizao e CLASSIFICAO COMO CRITRIO DE INTERPRETAO valor 175

    2.4.2 O contedo da funo social 180 1. Importncia da classificao 239

    2.4.3 Risco no contrato empresarial 182 2. Contratos negociados, formulrio e de adeso 240

    2.4.3.1 Risco como essncia do negcio 184 3. Contratos de subordinao e contratos empresariais 242

    2.5 A constitucionalizao da funo social: at os limites 4. Externalidades significativas e no significativas 243

    da natureza do contrato empresarial 186 5. Contratos associativos, contratos bilaterais e contratos

    3. Interesses institucionais nos contratos empresariais 188 I unilaterais 247

    4. Uma proposta de interpretao dos contratos empresariais 6. Classificao e interpretao 248

    de acordo com a funo social 190

    4.1 As externalidades como premissas para a interpreta- REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 249

    o e interveno dos contratos empresariais

    5. O contrato empresarial como fruto da racionalidade limi- 190

    tada 201

    6. Retomando o conceito de instituio 205

    7. Instrumentos de adequao dos contratos s externalidades

    211 7.1 Acordos particulares

    213 7.2 Imputao de responsabilidade objetiva

    218 7.3 Imputao de responsabilidade subjetiva

    221 7.4 Penalidades administrativas e penais

    223 7.5 Incentivo 224

    7.6 Na busca da legitimao 225

    8. A aplicao do Cdigo de Defesa do Consumidor ns con- tratos empresariais: uma interpretao econmica

    226 8.1 A vulnerabilidade como sinnimo da assimetria de in-

    formao e poderio econmico 226

    8.2 A questo da vulnerabilidade nos contratos empresa-riais, a aplicao do Cdigo de Defesa do Consumidor e a funo social 231

    8.3 O Cdigo de Defesa do Consumidor e o Oportunismo

    235

  • PARTE I INTRODUO

    1. ATIVIDADE EMPRESARIAL E O CONTRATO

    A unificao do Direito Privado foi uma das aspiraes do atual Cdigo Civil como uma tentativa de afastamento da dualidade de tratamento com relao a institutos jurdicos derivados do mesmo ramo vocacionado disciplina das relaes privadas.2 A pretenso de unidade de tratamento desdobra-se na adoo do conceito de empresa em substituio de comerciante, definida no Cdigo Comercial de 1850, e na revogao da dubiedade de disciplina dos contratos privados pela revogao do Cdigo Comercial em seus arts. 121 a 286.

    1.1 O sujeito empresrio Sobre a unificao pela adoo do conceito de empresa, o C-

    digo Civil acatou um conceito que no aparecia na codificao civil anterior nem no parcialmente revogado Cdigo Comercial, ainda que no fosse indita no Direito Brasileiro.2

    Mais do que a incluso de um novo vocbulo, a alocao da empresa como sujeito por excelncia do Direito Comercial significa que a ciso aceita anteriormente e que permitia enquadrar o agente econmico como sendo comerciante ou no a partir do objeto da sua atividade, no mais seria mantida.

    Por outro lado, ainda que empresa encontre sua disciplina e con-ceito no Cdigo Civil, nem a dualidade de tratamento foi totalmente afastada, nem a especificidade do Direito Comercial renegada.

    1. LEES,Luiz Gasto Paes de Barros. A disciplina do Direito de Empresa no novo Cdigo Civil Brasileiro. Revista de Direito Mercantil, vol. 128, p. 7-14. So Paulo: Malheiros, 2002.

    2. Para citar: Lei Antitruste, LeiAmbiental, Cdigo de Defesa do Consumidor...

  • 20 i TEORIA GERAL DOS CONTRATOS PARTE 1- INTRODUO 21

    Quanto dualidade de tratamento, no sistema anterior aquele que exercia profissionalmente atividade de mercancia era conside-rado comerciante, e regular, caso cumprisse os requisitos formais de registro.' Pelo fato de ser considerado comerciante estaria submetido disciplina do Cdigo Comercial. Como a atividade econmica no se resume atividade de comrcio, a atividade de prestao de servio, operaes com bens imveis e atividade de produo estavam fora do conceito de comerciante, e, por consequncia, no estariam sujeitos disciplina das Leis Comerciais.

    O sistema dual proporcionava tambm a existncia de sociedades comerciais e sociedades civis, com o j mencionado enquadramento quanto sujeio ou no s normas comerciais, com importantes consequncia quanto incidncia ou no do regime falimentar e re-gistrai comercial.

    Ainda que uma pessoa ou sociedade, um agente econmico, fosse enquadrado na noo de comercialidade e outro no, ambos conti-nuariam a ser agentes econmicos, vale dizer, atuariam empresarial e profissionalmente para a produo de bens ou servios que seria ofertados comunidade. A dualidade de tratamento se mostrava mui mais fruto de uma tradio histrica do direito comercial do que e basada num critrio cientfico de distino de tratamento.

    O art. 966 do CC/2002 conceitua empresrio como sendo aquele que "exerce profissionalmente atividade econmica organizada para a produo ou a circulao de bens ou de servios". A noo de empres rio corporificada na ordem jurdica civil, diferentemente da proposta anterior ao regime atual, no distingue o tipo de atividade econmic como condicionante ao enquadramento na categoria empresa pelo menos no no caput do dispositivo. A mercancia, ou comrcio, ou intermediao na troca, por si s no englobam todo o universo das atividades econmicas, no havendo como negar a relevncia tambm da atividade de prestao de servio ou de produo, e a inexistncia de motivao para o tratamento dual.

    O pargrafo nico do artigo, no entanto, excetua da empresarieda-de o exerccio de profisso intelectual, de natureza cientfica, literria

    3. Art. 4. do Cdigo Comercial de 1850, hoje derrogado.

    ou artstica, salvo se "o exerccio da profisso constituir elemento de empresa". Se a dualidade de tratamento parecia ultrapassada pelo tratamento atribudo atividade econmica pelo caput do art. 966, ela reaparece na previso de seu pargrafo nico.

    O pargrafo nico refere-se ao caput, que prev o exerccio de atividade econmica organizada de produo ou circulao, de bens ou servios; logo, o pargrafo excetua da noo de empresariedade a atividade econmica organizada de prestao de servios que tenha natureza cientfica, literria ou artstica, e, nesta primeira aproximao do pargrafo, por mais que seja exercida com colaboradores, de forma organizada e profissional. No o carter econmico do empreendi-mento, nem sua maior ou menor vocao a gerar lucros que conduz distino de tratamento, mas sim o fato da atividade ser considerada intelectual.

    A origem do tratamento legal especial pode ser identificada na referncia distino no Cdigo Civil Italiano de 1942, base da legis-lao do direito de empresa do Cdigo Civil Brasileiro, como tambm na pessoalidade de que normalmente se revestem as atividades inte-lectuais. As duas motivaes se encontram ao se ter em mente que no Direito Italiano as atividades intelectuais regulamentadas encontram alguns impedimentos em termos de organizao empresarial, j que no podero os seus profissionais organizarem-se em sociedades personi-ficadas.4

    Tal restrio no a regra no Direito Brasileiro, fazendo com que o profissional intelectual a incluindo-se mdicos, advogados, inventores, artistas possam adotar uma das formas de organizao societria personificada. A pessoalidade, ao afastar a empresariedade, tambm afasta a possibilidade de aplicao de certas normas empre-sariais como as que regulam a Recuperao Judicial, Extrajudicial, e Falncia das Empresas.5

    Alm da atividade empresarial, o Cdigo Civil tambm exclui da empresariedade a sociedade cooperativa e o

    4. GALGANO, Francesco. Derecho Comercial Las sociedades. Trad. Jorge Guerrero. Bogot: Temis, 1999. vol. II, p. 10. A definio da excluso do carter de empresariedade das atividades dos profissionais intelectuais est no 1. do art. 2.238 do Cdigo Civil Italiano.

    5. Lei 11.101/2005.

  • 22 TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

    empresrio rural, caso deixe de optar pela organizao de uma socie-dade empresria.

    O desmembramento trazido pela Lei quanto ao exerccio de ati-vidade econmica organizada justifica a adoo pelo ordenamento de mais uma categoria societria, antes inexistente no regime brasileiro, a sociedade simples. Mas assim como pelo tratamento atribudo no Direito Italiano onde voltada aos profissionais intelectuais exclu idos da empresariedade , atribuda responsabilidade subsidiri aos scios. E, mais ainda, tais profissionais podero se valer de outra organizao societria, dotada de personalidade jurdica e com limita-o de responsabilidade dos seus scios, o que em muito prejudicar a efetiva adoo do modelo de sociedade simples.

    O final do pargrafo nico do art. 966 introduz uma exceo exceo outorgada aos profissionais intelectuais: sua atividade ser empresria se o seu exerccio for considerado elemento de empresa. Neste caso, se elemento de empresa, a atividade perderia a condio d pessoalidade ao ser assimilada pela organizao, afastando-se o regi de exceo quanto ao car ter empresarial de seu exerccio. A sistem-tica legal pode ser considerada imperfeita nesta exceo exceo, ao se tornar perceptvel que, pelo fato do sistema brasileiro no reservar, para as atividades intelectuais uma categoria societria especial de, forma exclusiva, ao adotar uma organizao de sociedade limitada, por exemplo, o profissional intelectual estar protegido pela personifica societria da mesma forma como os demais agentes econmicos qu atuem na produo de bens e servios. Por consequncia, aparecer p'

    rante terceiros sem qualquer elemento de distino com relao ao q considerado pela Lei uma sociedade empresria, podendo, na situa concreta, invocar ou no o nvel de organizao do enipreendiment como excludente ou reafirmao de seu carter empresrio, geran uma situao de incerteza quanto s normas aplicveis, especialmen s destinadas empresa em dificuldade.

    Conclui-se, quanto empresariedade, que o Cdigo Civil, ao mesmo tempo em que fez um movimento de aproximao dos agentes econmicos para aplicao de um sistema jurdico nico, afastando distino entre as sociedades comerciais e civis, acabou promovendo outra categoria de distino entre tais agentes: exercentes de atividade

    PARTE I - INTRODUO I 23

    econmica organizada de prestao de servio empresrios e agentes no empresrios.

    Para ilustrar o estgio atual do Direito Brasileiro relacionado ao enquadramento empresarial, e o acerto quanto busca de uma nor-malizao unitria, observe-se o que j foi comentado em relao ao agente econmico representante comercial. O representante comercial atua "em carter no eventual e sem vnculos de dependncia", na promoo da realizao de negcios conta do proponente. , sem dvida, uma atividade de prestao de servio cuja categoria, a partir da vigncia do atual Cdigo Civil foi equiparada circulao de bens, que no sistema anterior caracterizava-se como atividade comercial e que agora est contemplada na noo de atividade empresarial.

    Mesmo no sistema anterior, para ilustrar o descompasso perpetra-do pelo no acolhimento do prestador de servio como equiparado ao comerciante, a chamada comercialidade da atividade do representante j se consagrara,' com fundamento na Lei 4.886/1965, portanto h mais de 40 anos. Requio8

    identifica no art. 1. da Lei do Representante Comercial, ao apresentar uma definio de sua atividade, o enunciado que contempla o representante como a pessoa jurdica ou pessoa fsica, sem relao de emprego, que desempenha profissionalmente uma ati-vidade de mediao para a realizao de negcios mercantis por conta de uma ou mais pessoas. A Lei j define claramente que a representao comercial est a servio somente dos negcios mercantis, excluindo da atividade os negcios civis. Por coerncia, a atividade de representao comercial no poderia continuar sendo vista como uma atividade civil. Para reforar a inadequao da qualificao da atividade de prestao de

    6. Art. 710 do CC/2002. 7. Sobre a natureza do contrato de representao mercantil a autora escreveu

    um artigo intitulado A funo do contrato de representao comercial e a aplicabilidade do art. 421 do Cdigo Civil Brasileiro, indito e que faz parte de um livro a ser publicado em homenagem ao professor Rubens Requido, ainda no primeiro semestre de 2006.

    8. REQUI, Rubens. Do representante comercial: comentrios Lei 4.886, de 9 de dezembro de 1965, Lei 8.420, de 8 de maio de 1992, e ao Cdigo Civil de 2002. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 28.

  • 24 I TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

    servio como no comercial, o art. 4. exclui do exerccio da atividade aquele que no pode ser comerciante.

    Partindo-se da considerao de Requio, ainda que a doutrinl tenha por algum tempo relutado em aceitar o carter comerciai da atividade do representante, quando a prestao de servio era considerada uma atividade civil, aos contratos intermediados pelqi profissional era reconhecido carter negociai e empresarial, j qui a relao do representante no se estabelece com os consumidores, mas sim com o preponente/empresrio e interessados, igualmente empresrios, que faro chegar os bens negociados aos consumidor ou a outros empresrios. Assim como em relao a outros profissio nais de prestao de servios, v.g. construtores e incorporadores foram sendo equiparados aos comerciantes e sujeitos a um mesm regime jurdico.

    O Cdigo Civil, ao estabelecer um conceito unitrio, ainda qu imperfeito em sua unidade, acompanhou a evoluo do Direito C mercial no que se refere distino entre o tratamento atribudo a comerciante tradicional e ao prestador de servio.

    No presente trabalho, a abordagem relacionada aos contratos e presariais j se aproveita da nova situao do Direito ptrio, incluind contratos que tenham como seus sujeitos tanto o prestador de servi quanto o comerciante e, diferentemente da distino de tratamen provocada pelo pargrafo nico do art. 966, tambm considera com sujeitos de contratos empresariais aqueles que, muito embora exclu, dos do conceito de empresariedade atribudo pela Lei, atuam de forni profissional no exerccio de atividade econmica.

    1.2 Unificao do Direito Privado e empresariedade

    Ainda sobre a unificao do Direito Privado protagonizada pelo Cdigo Civil, a especialidade no tratamento atribudo atividade ne gociai empresarial permanece. Relativamente disciplina da empresa, esta aparece de forma destacada no Cdigo Civil, inserida na disciplina dos negcios jurdicos, ainda que a Lei tenha pretendido a unificao

    R

    9. Lei 4.591/1964.

    PARTE I - INTRODUO I 25

    do Direito das Obrigaes. So as caractersticas indissociavelmente ligadas ao exerccio da atividade econmica que no permitem o es-tabelecimento de um regime unitrio global disciplina do Direito das Obrigaes. Somente aquele que exerce a atividade econmica estar sujeito disciplina da empresa, e no os demais sujeitos contemplados na disciplina civil. H peculiaridades que decorrem do exerccio da atividade econmica organizada que justificam a manuteno da especialidade de tratamento. Um deles, decorrente da empresariedade, a sujeio ao regime especfico para situaes de dificuldade; outro, a aceitao da organizao do empresrio sob a forma societria.

    A opo pela prtica da atividade econmica sob uma organizao societria significa no apenas a escolha pela conjugao de habilidades e capital que viabilize a pretendida prtica, como tambm a possibili-dade de opo por um sistema de organizao que permita a limitao da responsabilidade dos scios. Os modelos de organizao societria se inspiram nas aspiraes dos interessados em participar ou investir na atividade econmica com a finalidade de partilha de resultados, conferindo, via legislao, direitos e prerrogativas compatveis com as finalidades pretendidas a partir da prtica da atividade empresarial.

    O estmulo prtica empresarial, decorrente da disciplina especfica que lhe conferida pelo Cdigo Civil, no tratamento da empresa, da sociedade e do contrato, encontra seu fundamento maior na Constituio Federal, a partir da opo pelo sistema de liberdade de mercado e de iniciativa do agente privado. Esse agente privado quem poder atuar isoladamente, como um empresrio individual, ou de forma associada, por meio de uma sociedade, e que ser o destinatrio da maior parte das aspiraes da sociedade humana, quando esta demanda bens e servios de seu interesse e que sero preponderantemente oferecidos pelo empresrio. ele o vocacionado prtica econmica, em razo da opo constitu-cional, especialmente pela associao das normas estabelecidas no art. 170 e 173 da CF/1988.

    Se, na sociedade de mercado e de consumo, o agente privado co-manda a prtica produtiva, bastante natural que a disciplina de sua atividade encontre na legislao uma ordem jurdica apta a criar um

  • 2 6 TEORIA GERAL DOS CONTRATOS PARTE I - INTRODUO I 2 7

    sistema compatvel com formas de estmulo atuao econmica, justi-ficado pelo que a sociedade humana espera de sua atuao profissional) organizada: a disponibilizao de bens e servios que lhes so caros.

    1.3 Especialidade desde a origem do Direito Comercial

    Mais ainda, a especificidade da prtica empresarial se apoia n prprio histrico do Direito Comercial, nas condies que corro boraram para a criao do novo ramo do Direito Privado, fruto d enfraquecimento do estado organizado, da fora dos usos e costumes da capacidade de organizao dos comerciantes e da carncia de legis lao estatal adaptvel s necessidades do Direito dos Comerciantes. direito do comrcio j nasce especial, primeiro porque destinado na disciplina geral do cidado, como o Direito Civil, mas discipli de uma categoria especial de profissionais; segundo, porque de bas notoriamente histrica e consuetudinria; terceiro, porque j nas com caractersticas de no territorialidade.

    Galgano avoca a especialidade do Direito Comercial, assi como sua origem pouco influenciada pela poltica e muito pelo usos e costumes, ao explicar o sentido do ius mercatorum. O ius me catorum foi diretamente criado pela classe dos comerciantes, sem mediao da sociedade poltica. Foi ento, criado por uma class mas imposto a todos. A peculiaridade salientada por Galgano ganh ainda maior importncia quanto se considera que a classe mercanti era a classe dirigente. Vale dizer, poderia, teoricamente, se valer da situao de poder e estatizar o direito, impondo uma intermediao poltica. A opo pela no intermediao possibilitou ao Direito Comercial ultrapassar o limite territorial das comunas, como regras profissionais de uma classe mercantil, sem mediao da sociedade poltica, imposto a todos em nome de uma classe, e que se estendiam por onde houvesse mercado. 'c'

    10. GALGANO, Francesco. Lex Mercatoria. Trad. de Erasmo Vallado A. e N Frana. Revista de Direito Mercantil. vol. 129, p. 224. So Paulo: Malheiros, 2003. GALGANO, Francesco. Lex Mercatoria. Bologna: Societ eclitnee 11 Mulino, 2001. p. 9.

    Assim como o surgimento se deu pela especialidade, a impos-sibilidade de unificao total do Direito Privado continua apoiada nesta mesma especialidade, tanto na disciplina da empresa como dos contratos. Pode-se unificar a codificao, mas no se consegue uni-ficar a disciplina. Tal constatao est firmada na existncia real de caractersticas peculiares prtica da atividade econmica organizada e de demandas igualmente da ordem do real e no decorrentes de um pensamento meramente terico.

    As transformaes pelas quais passa o Direito Europeu, por exemplo, na busca do estabelecimento de uma legislao unitria para o desenvolvimento da atividade econmica representam um novo captulo na confirmao da especialidade. o direito comercial que desponta com a redescoberta do particularismo e de sua importncia histrica, e, outra vez, um direito dissociado da mediao poltica, que no est ligado s configuraes dos Estados, mas unidade que decorre da ideia de mercado."

    A unificao legislativa europeia estar calcada na transcendncia caracterstica das atividades empresariais, corroborada pela tendn-cia existncia de empresas polinacionais, descentralizadas em seus nveis de comando, de produo e de gesto, valendo-se das melhores condies de funcionamento, hoje numa escala mundial. Por outro, a pretenso de torn-lo homogneo, significa tambm a possibilidade de se destacar o que materialmente Direito Comercial do contedo dos demais ramos do direito privado, pois a proposta est relacionada s normas necessrias ao funcionamento do mercado comum europeu e no ao universo das normas que regulam a atividade privada.

    O Direito que surge como uma resposta s necessidades sociais, que em determinadas pocas da histria dos pases (como aconteceu na Itlia e no Brasil), passa a ter uma disciplina codificada parcialmente unitria, novamente conclamado a se valer de sua especificidade num processo de harmonizao das legislaes da comunidade dos pases europeus, mostrando-se, mais uma vez, um direito de tendncia no estatal epeculiar.

    11. GALGANO, Lex Mercatoria cit., p. 226.

  • 28 I TEORIA GERAL DOS CONTRATOS PARTE I - INTRODUO i 29

    1.4 Contratos e a unificao do Direito Privado

    Na disciplina das obrigaes, a especialidade da atividade empre-sarial, como se viu, acabou por impedir no apenas o enquadrament da empresa condio de mera parcela do direito dos negcios com tambm qualquer aspirao de disciplina num s cdigo de todas a matrias jurdicas a ela relacionadas.

    No campo do direito dos contratos, por exemplo, ao ser revoga a disciplina disposta no Cdigo Comercial de 1850, contratos que era duplamente disciplinados no Cdigo Comercial e no Cdigo Civil d 1916 passaram a receber uma s disciplina, ainda que nem todos o contratos sejam contemplados no Cdigo Civil atual. Observa-se, e to, o que j foi comentado quanto s empresas: remanesce disciplin extravagante, v.g., disciplina do contrato de franquia, de representa de concesso mercantil e outros.

    Quanto disciplina unitria atribuda aos contratos empresarial e civis, sem dvida se firma como unidade parcial em termos de codi ficao, mas no uma unidade perfeita quando se considera a causa a funo de tais contratos.

    O Cdigo Comercial, derrogado nesta parte, apresentava em seu Ttulo V alguns dispositivos de teoria geral dos contratos, para logo depois disciplin-los em espcie, nas modalidades mercan ti do Mandato, Comisso, Compra e Venda, Troca, Locao, Mtuo Fiana, Hipoteca, Penhor e Depsito. Os dispositivos do Ttulo demonstram o propsito de estabelecimento de regramento jurd

    .

    co no apenas para os contratos ditos mercantis como tambm d ofertar o instrumental necessrio disciplina de contratos en tr no comerciantes, diante da inexistncia de disciplina atualizad especfica em 1850 e da necessidade crescente de regramento e razo do desenvolvimento do comrcio a partir da declarao d independncia do pas.

    Assim como na origem do Direito Comercial, a carncia de disci-plina estatal voltada ao Direito Comum fez por permitir a extenso da disciplina especial s relaes comuns, tambm o Cdigo Comercial Brasileiro de 1850 ocupou, por um certo perodo, as lacunas do Direito Civil contratual.

    Em termos de Cdigo Civil, o revogado, a partir de sua vigncia, em 1917, apresentou uma teoria para os contratos em geral, no Livro III, Ttulo IV, seguido do Ttulo V, que apresentava as modalidades contratuais de Compra e Venda, Troca, Doao, Locao, Empreita-da, Depsito, Mandato, Gesto de Negcios, Edio e Representao Dramtica, Seguro, Jogo e Fiana.

    O atual Cdigo Civil revogou a disciplina especial conferida aos contratos mercantis no Cdigo Comercial, apresentando na Parte Es-pecial, Livro I, Ttulo V uma proposta de disciplina geral dos contratos, seguida do regramento dos contratos de Compra e Venda, Troca, Es-timatrio, Locao, Emprstimo, Prestao de Servios, Empreitada, Depsito, Mandato, Comisso, Agncia e Distribuio, Corretagem, Transporte, Seguro, Jogo e Fiana.

    Os contratos no contemplados, inteira ou parcialmente, pelas normas do Cdigo Civil, continuam sujeitos disciplina especfica, anterior vigncia do Cdigo, caso do contrato da j mencionada franquia e, ao menos em parte, do contrato de representao comercial.

    Comparando-se a disciplina contratual do antigo e do vigente Cdigo Civil, acompanhada da revogao da disciplina peculiar aos contratos mercantis, que hoje so normalmente denominados de contratos empresariais, demonstram de plano que a legislao mais recente no inovou de forma significativa na escolha dos contratos disciplinados em espcie, com algumas excees, como a incluso da tipificao do contrato de representao, que, no entanto, mantm tambm sob disciplina de sua Lei Especfica.

    As alteraes da disciplina geral dos contratos que mais efeitos produziro em termos de uma proposta de questionamento da aplicabi-lidade das normas gerais previstas para os contratos, s peculiaridades dos contratos de ordem negocial, especialmente aqueles de carter duradouro e diretamente ligados ao exerccio da atividade empresarial.

    1.5 Contratos na atividade empresarial

    O empresrio lana mo de inmeras obrigaes, operando no sistema de constituio de negcios jurdicos indispensveis prtica econmica. Negcios que so identificveis na escolha e aquisio da

  • 3 0 I TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

    matria prima, na escolha e contratao de empregados e prestadores de servio, na escolha dos parceiros e no transpasse dos produtos e servios aos consumidores. Na instrumentalizao destes negcios despontam os contratos, especialmente aqueles relacionados vin-culao dos empresrios entre si, seja na compra e venda de insumos, ou no estabelecimento de uma parceria.

    Tais contratos indissociveis da prtica empresarial, associado figura do empresrio, para permanecerem compatibilizados com a especialidade de a quem so destinados, precisam igualmente ser tratados de forma especial. Especialmente o contrato de sociedade, como instrumento de organizao da empresa, somente encontrar sua utilidade na medida da harmonizao de seu grau de especialidade com aquele das relaes jurdicas a que servem.

    Salomo Filho trata da moderna teoria contratual, com destaq para a importncia das relaes contratuais, no contrato organizao. O contrato de sociedade voltado tarefa de organizao indispensv prtica empresarial, diferentemente dos contratos tradicionais que visam especialmente o estabelecimento de direitos e deveres entre a partes. Os contratos associativos existem para criao de uma organ zao que o que se pode chamar de empresa.

    Portanto, as peculiaridades dos contratos empresariais decorrero no apenas das caractersticas das negociaes jurdicas que imple mentaro como tambm estaro na funo que se lhe reconhecer Podem existir, no universo de tais contratos, situaes distintas, co possibilidades de interpretao tambm diferenciadas, como p exemplo, diante de um contrato de fornecimento de matria prim entre dois empresrios e um contrato de sociedade firmado entre o mesmos. Na segunda hiptese, aspectos como a possibilidade de co tinuidade da atividade empresarial interferiro na interpretao das condies pactuadas no contrato de sociedade, enquanto no contrato de fornecimento esta circunstncia no interferir.

    Lembre-se que a unificao do Direito Privado no resistiu s es pecificidades do Direito de Empresa, assim como o Direito de Empresa

    12. SALOMO FILHO, Calixto. O novo direito societrio. 2. ed. So Paulo Malheiros, 2002. p. 43.

    PARTE I INTRODUO 1 31

    no se encontra limitado disciplina do Cdigo Civil. As disciplinas da concorrncia, do consumidor, das empresas em dificuldade e dos re-gistros pblicos exemplificam a diversidade de fatores e circunstncias relacionados prtica empresarial, respectivamente pela disciplina da liberdade e equilbrio do mercado; a segunda, as relaes contratuais com os destinatrios finais dos bens e servios; a terceira, o acertamento de interesses relacionados ao potencial afastamento do empresrio da prtica da atividade econmica como resultado de um insucesso momentneo ou definitivo; a quarta, na disciplina da formalizao e publicidade de atos relacionados empresa. So fatores e circunstn-cias que inviabilizariam qualquer tentativa de codificao unitria do universo da empresa, incluindo-se os contratos.

    1.6 Contratos empresariais e contratos nominados

    Contratos nominados podem ser compreendidos como aqueles reconhecidos pela ordem jurdica como dotados de uma especificidade e disciplinados em seu contedo, forma, direitos e deveres que estabe-lecem. Aparecem no Cdigo Civil e tambm em Leis especiais, como j comentado. Os contratos nominados so normalmente tambm tpicos, ou seja, tm caractersticas previamente estabelecidas em sua previso normativa ou uso. '3 Por consequncia, contratos inominados so aqueles cuja denominao no foi incorporada pelas fontes do direito e atpicos so os contratos cujos efeitos pretendidos exigem a reunio de caractersticas de vrios outros contratos.

    Outra proposta de classificao pode ter como elemento de apro-ximao os sujeitos dos contratos. Nessa situao pode se falar em contratos empresariais, contratos de consumo, contratos de trabalho.

    A classificao pelo sujeito decorre da aceitao da existncia de condies especiais do sujeito que justificam disciplina normativa

    13. Duarte aponta para a utilizao do termo contrato atpico como sinnimo de inominado, optando pela utilizao da locuo contrato tpico para aquele que corresponde a uma espcie para a qual a lei dita alguma disciplina, e atpico, para designar o contrrio (DUARTE, Rui Pinto. Tipicidade e atipi-cidade dos contratos. Coimbra: Almedina, 2000. p. 39).

  • 32 TEORIA GERAL DOS CONTRATOS PARTE 1- INTRODUO 1 33

    e interpretao especiais. Nos contratos de consumo e de trabalho possvel o destaque da disparidade intelectual, econmica ou de acess informao, de forma a sustentar a necessidade de interferncia Lei na tentativa de reequilibrar os interesses, desequilibrados em raz da referida disparidade. Uma interveno do Estado na elaborao da condies de contratao, uma limitao autonomia privada calcad na especificidade das condies do sujeito e no princpio da autonomia

    Admitir-se a interveno legislativa, num primeiro moment jurisprudencial, num segundo momento sempre com a possibilidad de interferncia da produo doutrinria tanto na elaborao da norm como na sua aplicao, significa uma limitao ao princpio da auto nomia privada num esforo de nfase ao princpio da igualdade. D forma mais especfica, o tratamento desigual oferecido modalida contratual, na qual o desequilbrio entre os sujeitos na verdade exclu a autonomia privada premidos pela necessidade prpria ou for do outro contratante revela a busca da implementao da igualda material na sociedade de consumo.'4

    o que ocorre no sistema ju dico brasileiro relativamente aos contratos que tenham como parte trabalhador e o consumidor.

    Adotar-se uma proposta de classificao pelo sujeito report igualmente ao acolhimento da categoria dos contratos empresarias.

    Contratos empresariais so aqueles cujos contratantes so emp srios no exerccio de sua atividade profissional. Contratos vocacion dos execuo continuada e que renem elementos de distino e relao aos demais contratos em razo de seus sujeitos, de sua hist

    14. A alterao nas condies sociais que influencia a conformao dos contrai decorre, dentre outros fatores, da exploso demogrfica, da expanso d classe mdia e seu acesso aos bens do consumo, dos novos padres cultura e da vida urbana. MARTINS-COSTA, Judith. Crise e modificao da id de contrato no Direito Brasileiro. Revista de Direito do Consumidor. vol. 3 p. 136. So Paulo: Ed. RT, 1992. Macedo Jr. aponta para a modificao na forma de organizao da produo industrial e seu papel na conformao e estabilizao do paradigma contratual hegemnico. (MACEDO JR., Ronaldo Porto. Contratos relacionais e defesa do consumido?: So Paulo: Max Limonad, 1998. p. 49).

    e sua funo. Em princpio, seus contratantes, por serem empresrios, apresentam condies similares de acesso informao e anlise dos riscos que permeiam toda negociao empresarial. O risco seu ele-mento essencial, ainda que eventualmente no seja simples distinguir a frustrao que pode advir de uma situao de risco e a existncia de fatores excepcionais capazes de afastar a fora vinculante do contrato.

    Sobre a histria, os contratos vinculados prtica empresarial sempre estiveram mais sujeitos aos usos e costumes e s necessidades da prtica empresarial do que as demais categorias contratuais.'5 Tambm histrica a caracterstica no territorial dos contratos empresariais. Sua vocao em regular negcios que transcendero os limites terri-toriais de um determinado Estado, com a possibilidade de submisso a vrios ordenamentos jurdicos e, portanto, sujeitos tambm s normas de Direito Internacional Pblico e Privado.

    No campo da funo, os contratos empresariais instrumentalizam a circulao de riquezas indispensvel prtica empresarial, ou seja, possibilitam-na. Atividade empresarial que precisar ser assegurada, otimizada e viabilizada pelo contrato e, consequentemente, pelo siste-ma jurdico aplicvel aos contratos. Logo, a funo direta dos contratos empresariais est associada aos negcios ali disciplinados, ao acerta-mento dos interesses envolvidos nos contratos, de modo a colaborar para que a atividade empresarial se desenvolva eficazmente. So, ao menos nesta primeira aproximao, interesses privados e disponveis, negociados dentro dos limites da lei, do mercado e da prtica corrente. Interesses cujo carter de disponibilidade permitem, por exemplo, sempre a opo pela mediao para a soluo de conflitos, na busca de

    15. Galgano destaca no Direito Italiano os usos como fonte do Direito Priva-do, desde que utilizados com a conscincia de sua obrigatoriedade. Como exemplo, expe o segredo bancrio, indicando que os Bancos se recusam sistematicamente a fornecer administrao pblica, particularmente ao fisco, dados sobre seus prprios clientes na convico, em razo da falta de Lei em tal sentido, de que sua conduta juridicamente respaldada (GALGA-NO, Francesco. Diritto civile e commerciale. 2. ed. Villanova di Castenaso: Casa Editrice Dott. Antonio Milani, 1993. vol. 1, p. 64. No Brasil, tradi-cionalmente citado o exemplo do chamado cheque pr-datado e tambm dos contratos no normatizados, caso do contrato de faturizao).

  • 34 i TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

    uma maior especializao dos julgadores e de uma desejvel celeridad na soluo de conflitos, numa busca de julgamento pelos pares, o qu mais uma vez remete origem classista do Direito Comercial.

    Diferentemente dos contratos de consumo e do trabalho, nos con,

    tratos empresariais o esperado que os sujeitos estejam em condies d discusso e acertamento de interesses de forma aproximadamente equili brada e, por estarem as partes em posies equivalentes, estariam tamb aptas a exercer com liberdade sua autonomia privada. Por evidente, es presuno de equilbrio entre as partes do contrato pode ser desfeita com consequncia do mesmo fator que levou necessidade de tratament desigual dos contratantes de uma relao de consumo ou de trabalho: diversidade de poder das partes. O poder econmico ou de conheciment de uma ou de outra parte do contrato pode forjaruma situao de apare igualdade e, por consequncia, liberdade perfeita dos contratantes, ma da autonomia da vontade. Quando revelada a ruptura entre igualdad liberdade, at mesmo nos contratos empresariais abre-se espao par situaes de desatendimento ou modificao de condies estabeleci no contrato podendo chegar ao desfazimento do mesmo.

    Porm, ao se cotejar contratos empresariais, contratos de co sumo e de trabalho, as medidas a serem adotadas para o reequilbrio por fora externa, do contrato, no sero necessariamente as mesm assim como os critrios e a razo da modificao no sero nece riamente coincidentes.

    Neste quadro, a funcionalizao do contrato, por exemplo, det minada expressamente pelo art. 421 do CC/2002, de forma indistiri a todos os contratos, no aparecer na mesma medida para as menci nadas categorias contratuais. Alis, a prpria ideia de categoriz aa dos contratos s encontra razo de ser no reconhecimento das esp cificidades de cada uma delas que conduziro eventual necessida de interpretao e normatizao diferentes.

    Vrios contratos empresariais so recepcionados pela Lei de to expressa, no entanto, pela sistemtica da Lei Civil, em suas categori gerais e no qualificados como empresariais. Nesta situao esto co tratos como o de compra e venda (mercantil); representao (mercant e mandato (mercantil). So contratos recepcionados pela legislao e sua nomenclatura e contedo, portanto nominados e tpicos, tratados e

    PARTE I - INTRODUO I 35

    sua qualificao geral, mas que ainda assim no podero ser considerados como destitudos de especificidades que, estas sim, exigiro sua poste-rior qualificao (na elaborao do contrato ou na sua interpretao).

    Tambm o contrato de sociedade pode ser considerado nominado e tpico, tratado de forma especfica a partir do art. 981 do CC/2002. O carter tpico, alis, reforado pela natureza inderrogvel dos direitos e obrigaes caractersticos das diversas modalidades contratuais, e da taxativa deter-minao legal de adoo pelo empresrio, afora o exerccio individual da atividade, de uma das modalidades societrias previstas na Lei.

    Alm dos contratos nominados absorvidos pela legislao, h outros, como o de faturizao, contrato de shopping center e contrato de joint venture que so reconhecidos pela prtica empresarial, fruto dos costumes. A acessibilidade aos meios de comunicao e locomoo tende a fazer acrescer a adoo de contratos desenvolvidos em outros pases, assim como de negcios que acabam sendo importados, por exemplo, a securitizao de crditos.

    O contrato de faturizao, por sua vez, pode ser enquadrado na categoria de contrato nominado, porm de contedo atpico poiso seu objeto pode englobar atividades que vo desde a simples antecipao de valores representados pelos ttulos negociados at as mais complexas relaes de fomento.

    No coincidncia perceber que, ao se realizar um esforo de iden-tificao de contratos atpicos e inominados, se recorra a contratos rela-cionados atividade empresarial. a mobilidade, a sujeio s alteraes tecnolgicas e relacionais que exigem do agente econmico implementar constantes modificaes em suas negociaes e, por consequncia, em sua instrumentalizao pelo contrato, de forma mais frequente do que ocorreria com relao a contratos no ligados prtica econmica.

    Os contratos empresariais, alm de representarem uma categoria especial de contratos, tambm podem ser enquadrados nas categoriza-es gerais utilizadas na teoria geral dos contratos, como podendo ser contratos tpicos, atpicos, nominados ou inominados, e outras categori-zaes como de execuo continuada ou, ainda, comutativos e aleatrios.

    Aspectos como seu carter duradouro e relacional, a existncia ou no de disciplina especfica, interferiro na identificao de sua funo.

  • PARTE II PRINCPIOS GERAIS DO DIREITO CONTRATUAL

    1. FUNO SOCIAL E BOA-F OBJETIVA O reconhecimento da atribuio de uma funo ao contrato pode

    cingir-se ao contedo jurdico que lhe originariamente atribudo pelas partes. Uma funo interna do contrato com relao ao negcio jurdico nele previsto e o interesse das partes em realiz-lo. Mas, tomada neste sentido, a funo aproxima-se da noo de causa contratual.

    Outra forma de entender a funo social do contrato assegurada no Cdigo Civil relaciona-se boa-f objetiva, qual seja, ao resultado habitualmente associado realizao de um determinado contrato, a justa expectativa em relao aos seus efeitos. Porm, a forma pela qual o contrato socialmente aceito e recepcionado pela ordem jurdica no precisaria de uma nova nomenclatura, pois a boa-f objetiva tambm aparece contemplada como princpio geral aplicvel.' Todavia, no raro encontrar-se na jurisprudncia a sua utilizao associada ao exerccio regular do contrato.2

    O Tribunal de Justia de Minas Gerais, por exemplo, j relacionou o pagamento de uma carteia premiada de loteria sobre a qualpairava dvida quanto existncia de fraude funo social.3 A deciso conclui que ao se desconsiderar os termos do contrato firmado com o adquirente da carteia,

    1. Por exemplo, no mencionado art. 422 do CC/2002. 2. "Quanto aplicao dos princpios da boa-f e probidade e ainda da funo

    social do contrato, no se conclui pela sua inobservncia, visto que o apelado agiu no modo como lhe permite a lei" (TJMG, ApCiv 1.0261.03.017492-2/001, rel. Des. Vanessa Verdolim Hudson Andrade, pie 26.11.2004).

    3. Ementa: "Contrato. Loteria `azulzinha'. Carteia premiada. Ocorrncia de fraude. No comprovao. Dever de cumprimento do pacto avenado. De-vem as partes cumprir os contratos pactuados, respeitando os.princpios da

  • estariam comprometidos os princpios da boa-f objetiva e da funo socia A aluso funo social do contrato limita-se a expressar a preocupa do julgador relativamente expectativa daquele que contrata, com rela estabilidade da relao jurdica, nada acrescentado boa-f objetiva.

    A boa-f, ao menos no campo dos negcios, est relacionada a desenvolvimento do mercado, pois "essa viso faz que a boa-f dispa -se de tantos aspectos morais que a revestem em outros contextos exsurgindo objetivada, ou seja, segundo os padres de comportament normalmente aceitos em determinado mercado (ou em determinad praa)" e a sua garantia conduzir minimizao dos riscos com consequente possibilidade de otimizao dos resultados.4

    A interpretao do princpio da funo social nos moldes do (lu se conhece como boa-f objetiva, por si s, representa uma mudan de postura em relao ao conceito tradicional de contrato. Possibili o afastamento da supremacia da representao do subjetivismo colgico dos contratantes, substituindo-a por valores associados aos usos e costumes da praa, sem desvelar seu sentido original.

    Em ltima anlise, caso se insista na associao entre fun social e boa-f, o adequado reconhecimento da importncia da boa-f objetiva, pelo intrprete do contrato e da lei, mostrar-se- um im portante instrumento de preservao do mercado e da concorrncia, garantindo, por exemplo, a lealdade de competio, sem a qual no; existe a prpria noo do primeiro. Se funo social for tomada no sentido de exigir-se da conduta individual que atue de forma a pre-servar a liberdade de concorrncia e o mercado, encontrar-se- um trao de semelhana entre boa-f objetiva e funo social do contrato.

    2. FUNO E FUNO SOCIAL A Lei Civil foi alm do aspecto interno do interesse das partes

    pelos efeitos reconhecidos aos contratos, pois apresenta a palavra

    boa-f objetiva e da funo social dos contratos" (TJMG, rel. Des. Carreira Machado, ApCiv 1.0313.02.038348-2/002, DJe 21.06.2005).

    4. FORGIONI, Paula A. A interpretao dos negcios empresariais no novo Cdigo Civil brasileiro. Revista de Direito Mercantil, Industrial Econmico e Financeiro. vol. 130. p. 28. So Paulo: Malheiros, 2003.

    funo no isoladamente, mas ligada a um adjetivo, social. com esta objetivao que o art. 421 faz meno ao elemento de limitao da liberdade contratual, no como simples funo do instituto, mas prevendo-a e qualificando-a como funo social, como j o fizera, para citar, a Constituio Federal em seu art. 170,111, ao consagr-la relati-vamente propriedade dos bens de produo, ou a Lei das Sociedades Annimas, Lei 6.404/1976, no art. 116, pargrafo nico, de forma a moldar a atuao do acionista controlador a interesses plurais, que no exclusivamente os seus ou do grupo por ele integrado.

    Funo social ento permite a transio entre os interesses das partes contratualmente envolvidas e terceiros, estranhos ao contrato, mas que de alguma forma encontram-se significativamente a ele atrelados. Compara-to define a funo social, pensando o Direito de Propriedade, mas o que tambm pode ser aplicado aos contratos, como um poder de vincular um objeto ou um direito a certo objetivo, previsto pela ordem jurdica, que esteja relacionado ao interesse coletivo e no quele prprio das partes. Porm, o reconhecimento deste objetivo no impossibilita a existncia de uma harmonizao entre este e o interesse particular das partes.5

    No universo dos que exercem atividade econmica, pode optar-se por uma reflexo sobre a funo da forma como prevista na Lei das So-ciedades Annimas. No sentido do art. 116, pargrafo nico, e tambm do art. 154 daquela lei, pode-se localizar parmetros para a definio do que o ordenamento jurdico considera funo social nas relaes empresariais. A mesma lei considera a funo social, em relao conduo atribuda pelo acionista controladora uma empresa, como os deveres deste para com os demais acionistas da empresa, para com os seus trabalhadores e para com a comunidade em que a sociedade empresria atua, cujos interesses devem ser atendidos e respeitados, como prev o art. 116, pargrafo nico; ou como os deveres dos administradores da companhia em relao aos interesses da companhia que representam, de todas as categorias de acio-nistas, e de outros interesses que estejam de alguma forma vinculados ao exerccio da atividade empresarial, conforme disposto no art. 154.

    Num e noutro dispositivo, e tambm da forma estabelecida na Constituio Federal, funo social representa um elemento externo,

    5. COMPARATO, Fbio Konder. Direito empresarial. So Paulo: Saraiva,1995. p. 32.

    38 I TEORIA GERAL DOS CONTRATOS PARTE II - PRINCPIOS GERAIS DO DIREITO CONTRATUAL I 39

  • 40 I TEORIA GERAL DOS CONTRATOS PARTE II - PRINCPIOS GERAIS DO DIREITO CONTRATUAL I 41

    1

    e, portanto, vai alm do interesse do titular da posio societria ou da propriedade, que valorado e equiparado ao interesse interno e que dever condicionar a conduta do agente.

    No campo contratual, agora na disciplina geral, mais uma vez retomada pelo legislador a ideia de funo social, como elemento de cerceamento da liberdade de contratar derivada da liberdade de atuao econmica. Tal cerceamento pode aparecer j na ateno dada quando da elaborao de contratos tpicos ou atpicos, mas, igualmente, no momento da eficcia contratual, possibilitando a reviso de condies contratadas ou colocando em risco a manuteno do contrato.

    3. VCIOS DO CONSENTIMENTO E A IMPREVISO A funo social foi vista tpicos acima como elemento limitador da

    liberdade privada na elaborao de contratos. Outra forma de analis -la com relao execuo contratual, surgindo a a necessidade d compar-la a outros institutos que interferem na execuo do contrato

    A possibilidade de modificao das condies contratuais no s resume invocao dos princpios gerais de Direito Contratual relacio nados boa-f, equidade e funo social. H situaes contempladas na lei de forma especfica e que podem ser invocadas pelas partes no sentido de amparar a pretenso de alterao. Todas elas pautam-se na modificao das condies relacionadas s partes da realizao do contrato at a sua execuo, quer seja quanto capacidade de expressar livremente a vontade ou equivalncia entre prestao e contrapresta-o, com ou sem enriquecimento injustificado da contraparte.

    A busca da fundamentao para a alterabilidade ou resciso dos contratos conflita, em princpio, com o ideal de fora vinculativa do contrato, ainda mais sob a tica voluntaris ta que durante muito tempo prevaleceu na anlise jurdica contratual. A construo terica desen-volvida pelo Direito no sc. XX partiu da imprecisa noo de equidade para elaboraes mais aperfeioadas.

    Gomes6 destaca como as trs teorias principais construdas para

    fundamentar a reviso dos contratos: a teoria da pressuposio tpica;

    6. GOMES, Orlando. Reflexes sobre a leso. Transformaes gerais do direi to das obrigaes. 2. ed. So Paulo: Ed. RT, 1981. p. 96.

    a teoria da condio implcita e a teoria das bases do negcio jurdico. Identifica na teoria da pressuposio tpica a existncia de uma situao de fato, igual para todas as pessoas que, em dado momento, querem obrigar-se mediante contrato do mesmo tipo, e cuja alterao da situao de fato conduz ao desaparecimento da comutatividade do contrato. A teoria da condio implcita mantm a exigibilidade das obrigaes somente se o fim tpico puder ser alcanado e independe da anlise da inteno das partes. J a teoria da base do negcio parte de uma base subjetiva, calcada na mudana da situao de fato contempornea formao do contrato, revelia das partes que agiram sob o pressuposto de sua manuteno, para uma tentativa de objetivao pela substituio da relevncia da representao mental das partes, por uma alterao nas circunstncias necessrias para que sua finalidade fosse alcanada.

    H, portanto, como se justificar a possibilidade de reviso dos contratos a partir da teoria das bases do negcio. Pela teoria, quando h alteraes nas condies do negcio que venham a impedir que as finalidades do contrato sejam realizadas, estar justificada a sua revi-so. Sabe-se que no contrato as partes visam garantir a troca de valores jurdicos de forma a satisfazer o interesse de cada uma delas; sabe-se ainda que a fixao das prestaes devidas a cada uma livre, salvo por aplicao de alguma norma especfica, limitadora de tal liberdade, ou dos princpios gerais aplicveis.

    Uma forma de impor-se restrio s partes pela cominao de nulidade ou anulabilidade a clusulas ou a contratos que contrariem a valorao legal de defesa do bem comum, como por exemplo, a nu-lidade do contrato de sociedade que no contenha as clusulas obriga-trias expressas no art. 997 do CC/2002, pois tais informaes sobre a sociedade seriam sonegadas aos terceiros que porventura tivessem interesse em com ela contratar, contrariando um bem comum. Porm, nas situaes de nulidade e de anulabilidade no se est interpretando um contrato, mas analisando a prpria existncia, a potencialidade de produo de efeitos, deste ou de uma clusula nele prevista.

    A operao de reviso de um contrato parte de uma situao jurdica diversa, na qual a sua vocao potencial ou da clusula pro-duzirem efeitos no contestada, questionando-se a pertinncia desta produo numa dada situao jurdica previamente valorada pela lei como justificadora de ser considerada.

  • 42 I TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

    PARTE II - PRINCPIOS GERAIS DO DIREITO CONTRATUAL 143

    Para a reviso do contratual, questes como a causa ou o motivo do contrato normalmente no so relevantes, pois dizem respeito fatores concomitantes realizao do contrato, enquanto a reviso est relacionada a fatores supervenientes. A relao que se estabelece part da disparidade de condies de fato relacionadas s partes no perodo de tempo transcorrido entre a realizao do contrato e a sua execuo

    O Cdigo Civil brasileiro trata dentre outros institutos que pode estar vinculados eficcia do contrato: o erro, o dolo, a coao e o estad de perigo relacionados aos vcios do consentimento e, a impreviso

    Os institutos vinculados aos vcios do consentimento so condi es de anulabilidade dos negcios e esto relacionados aos motivo e causas do negcio ou do contrato. Logo, defeitos na formao dele No entanto sob alguns aspectos merecem ser apreciados na anlise da hipteses de reviso dos contratos.

    O instituto da leso tem uma conotao histrica interessante, quan do associada usura em sua concepo no Direito Cannico,' com um sentido bastante ampliado de proteo da explorao de uma parte pela outra num contrato comutativo. Todavia, esta viso ampla da leso no foi assimilada pelas legislaes posteriores, especialmente por influncia do Cdigo Civil francs que reduziu a leso possibilidade de invocao pelo vendedor, na defesa de seus interesses na venda de imveis.8

    O Cdigo Civil brasileiro, no art. 157, prev a ocorrncia de le-so quando uma pessoa, fruto de uma necessidade ou inexperincia, assume obrigao que contenha prestao manifestamente despro-porcional contraprestao. Encontra-se na disciplina dos vcios do consentimento, sendo, portanto, assim como erro, o dolo, a coao e a fraude contra credores uma condio de anulabilidade do contrato, de base subjetiva. A sua invocao sugere a existncia de uma disparidade entre as partes que teria induzido uma delas a contratar em termos que

    no aceitaria no fosse a condio de necessidade ou inexperincia. Porm, ainda que enquadrada entre os vcios, a leso poder conduzir reviso do contrato, pois admite a manuteno do negcio se a parte prejudicada receber suplemento suficiente ou a parte beneficiada concordar em reduzir seu proveito, segundo a norma do art. 157, 2.. nesta hiptese que a leso possui um significado na anlise das condies de reviso das clusulas contratuais, pois a suplementao ou a reduo do proveito representam alteraes possveis que permi-tiro a manuteno do contrato, com modificao de suas condies.

    O erro aparece no art. 138, e, quando inescusvel, poder servir de fundamento anulao do contrato. Todavia a lei autoriza que este seja convalidado se o erro tiver natureza de erro de clculo (art. 143) ou se for conformada a manifestao de vontade declarada real (art. 144). Portanto, o erro, ainda que essencial, poder ser superado, me-diante reviso das condies do contrato.

    Os vcios de dolo e coao no conduziro reviso do contrato, podendo ser mantido e associado ao ressarcimento da parte lesada pela via da responsabilidade civil, nos termos da legislao civil.9

    Sobre o estado de perigo, a Lei Civil define-o como situao de necessidade de salvamento da pessoa ou de uma pessoa de sua famlia, em relao a um grave dano conhecido pelo outro contratante, que induz a parte a assumir uma obrigao excessivamente onerosa, nos termos do art. 156. Os contratos gerados em tal situao podem ser anulados, porm, a Lei Civil deixa de estabelecer alternativas, como o faz em relao aos demais vcios do consentimento, seja prevendo a possibilidade da continuidade do contrato estar associada a perdas e danos, seja estabe-lecendo condies para reviso do contrato. Ao se considerar a natureza dispositiva dos direitos envolvidos, pode-se concluir pela possibilidade de manuteno do contrato desde que ultrapassada a condio de ex-cessiva onerosidade, mediante alterao de suas condies.

    Com relao aos contratos empresariais e suas especificidades, os vcios do consentimento que puderem ser superados, mediante equalizao dos interesses das partes, devero ser alterados e man-tidos se relacionados ao exerccio da atividade empresarial. As suas

    7. GOMES, Orlando. Op. cit., p. 29. 8. Art. 1.674 do Cdigo francs: "Si le vendeur a t ls de plus de sept dou-

    zimes dans le prix d'un immeuble, il a le droit de demander la rescision de la vente, quand mme il aurait expressment renonc dans dans le contrat la facult de demander cette rescision, et qu'il aurait dclar donner la plus-value. 1131: L'obligation sans cause, ou sur une fausse cause, ou sur une cause illicite, ne peut avoir aucun effet."

    9. Arts. 145 a 155 do CC/2002.

  • PARTE II - PRINCPIOS GERAIS DO DIREITO CONTRATUAL I 45 44 TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

    peculiaridade vm valoradas pelo legislador inclusive na hiptes de vcio por fraude contra credores, pois a lei permite a manuten de contratos realizados sob tal condio se realizados de boa-f, d carter ordinrio e indispensveis manuteno do estabeleciment empresarial. u) Assim, um contrato empresarial firmado com erro, po exemplo, quanto ao valor unitrio de um determinado insumo, ser preferencialmente mantido, desde que o contratante beneficiado fa a adequao das condies estabelecidas e que haja interesse do em presrio em mant-lo. O incentivo manuteno do contrato estar ligado ao princpio da manuteno da empresa.

    Quanto impreviso como condio de relativizao dos efeito do contrato, h a previso do art. 317 e aquela do art. 478 do CC/2002 A primeira est inserida no tratamento do objeto do pagamento, segunda na resoluo do contrato por onerosidade excessiva.

    Pelo primeiro dispositivo quando, por motivos imprevisveis, incorrer uma clara desproporo no valor da prestao, por ocasio d sua execuo, em relao ao valor inicialmente previsto, o juiz poder corrigi-lo atendendo, se possvel, o valor real da prestao. A colocao do artigo junto ao tratamento do objeto do pagamento demonstra que a regra no sentido de ser respeitado o objeto do negcio, nos termos em que foi pactuado, sendo justificada a aplicao de uma regra d exceo apenas quando incidentes as condies estabelecidas na Lei Tais condies incluem a supervenincia de motivos imprevisveis e a desproporo das prestaes. A regra prestigia a manuteno do contrato, com a expressa autorizao legal para que o Juiz restabelea o equilbrio entre as prestaes. Esta uma tpica situao de reviso de contrato que pode ser aplicada aos contratos empresariais.

    Por se tratar de reviso de contrato em decorrncia de condies que alteraram o estado de equilbrio que motivou os seus termos, afeta--se o objeto do contrato que era instrumentalizar uma troca julgada satisfatria pelos contratantes no momento da realizao do contrato. Nos contratos empresariais h um elemento adicional de complexidade com relao previsibilidade ou no da ocorrncia de fatores que inter-

    10. An. 164 clo CC/2002.

    ferem na pretenso das partes, porque, por serem de natureza negocial, esto naturalmente sujeitos s questes do mercado, como alterao de preos provocada pelo excesso ou carncia de oferta e que pode estar relacionada s condies do mercado nacional e at internacional. Ainda, pelo fato da atividade empresarial depender em muito de contratos que pressupem pagamento a prazo, associam-se facilmente a vnculos de natureza repetitiva ou continuada, ampliando a possibilidade potencial de invocao da desproporo valorada pelo art. 317 e tambm a extenso de seus efeitos em relao s partes, como tambm em relao a terceiros. Na hiptese do artigo no necessria a configurao da onerosidade excessiva, bastando a desproporo, vale dizer, a desproporcionalidade no precisa estar ligada a um empobrecimento inesperado de uma das partes, assim como no est atrelada regularidade ou no do contrato em relao fixao de preos no mercado. Basta que esteja caracterizada a desproporo entre os comportamentos estabelecidos como prestao e contraprestao para as partes.

    No campo negocial, tome-se o exemplo de um contrato de presta-o de servio de limpeza a ser realizado por uma empresa em benefcio de outra, no qual est estabelecido que o material ser fornecido pela beneficiria. No entanto entre a lavratura do contrato e a realizao do servio h um inesperado aumento no preo dos produtos de limpeza, acompanhando um processo comum ao mercado daquele produto, mas que no havia como ser sondado quando da realizao do contrato, fruto da alterao anormal do preo do petrleo, material do qual de-riva o produto. A empresa beneficiria da prestao de servio poderia pagar o preo, o preo acompanha o mercado, a empresa prestadora no sai beneficiada diretamente pelo aumento do preo, porm, o valor atual do produto afasta o interesse na realizao do servio, pois estaria acima at do preo que ser pago para a prestadora. O servio como um todo est gerando um nus desproporcional com relao ao benefcio que se pretendia pela sua realizao.

    Se o servio foi pactuado com um no empresrio fica facilitada a invocao do dispositivo com a finalidade de reviso das condies contratadas. Mas, tendo sido firmado entre duas empresas, cabe ana-lisar as condies da empresa beneficiria conhecer da possibilidade de oscilao do preo do produto necessrio e da avaliao dos riscos ao contratar o servio. Imagine-se ainda que o contrato de forneci-

  • 46 i TEORIA GERAL DOS CONTRATOS PARTE II - PRINCPIOS GERAIS DO DIREITO CONTRATUAL I 47

    mento do servio seja de carter continuado ou repetitivo, e que empresa fornecedora tenha aquela prestao de servio como essencia manuteno de sua atividade. Outra ordem de investigao se fa necessria para a anlise do hipottico pedido de reviso por se trata de um contrato empresarial.

    O art. 478, previsto na disciplina da resoluo contratual por onerosidade excessiva, trata de forma especfica dos contratos de exe-cuo continuada ou diferida, de especial interesse para as atividades negociais. Pela Lei, se a prestao se torna excessivamente onerosa para uma das partes, com extrema vantagem para a outra, em decorrncia de acontecimentos extraordinrios e imprevisveis, assiste ao devedor direito de pedir a resoluo do contrato, ou, para evit-la, aceitar um modificao em suas condies, proposta pelo ru.

    Portanto, a invocao da onerosidade excessiva pode conduzir o ao desfazimento do contrato ou sua reviso. Da mesma forma como pensado anteriormente, com relao aos contratos empresariais, a pre ferncia deve estar na reviso do contrato com sua manuteno tanto mais quanto esteja relacionado ao exerccio da atividade profissiona das partes, prestigiando-se a continuidade da empresa.

    Assim como no art. 317, aqui tambm aparece o pressuposto da ocorrncia de fatores imprevisveis. Mas, acrescenta-se o seu carte extraordinrio e o estabelecimento de uma situao de excessiva one rosidade para uma das partes com a consequente extrema vantage para a outra.

    Evento imprevisvel e extraordinrio significa uma situao d fato estabelecida quando da execuo do contrato que no teria como ter sido levada em considerao pelas partes no momento de sua re-alizao imprevisvel e que foge normalidade extraordinrio. Ento, no basta que as partes no tivessem conhecimento da po tencialidade da alterao das condies, como tambm se tratar d alterao provocada por uma condio extraordinria, incomu Para contratos realizados com base nos preos de commodities previsvel que haja variao na sua cotao, assim como ordinrio que ocorra; Todavia se os preos disparam em razo da deflagra de uma grave crise poltica num determinado pas, provocada p uma sucesso de ataques terroristas, configura-se a um aument

    imprevisvel pois fora das oscilaes dos ltimos anos e um fato extraordinrio. A mera alterao da cotao do produto no pode ser considerada um fato extraordinrio, e, dentro de certos patama-res, nem ao menos imprevisvel para o empresrio que opera com tais contratos indexados.

    Alm da imprevisibilidade e do carter extraordinrio, a alterao deve provocar concomitantemente uma onerosidade excessiva para uma das partes e uma vantagem injustificada para a outra. Nesta parte, a lei quer evitar um enriquecimento sem causa de uma das partes custa do empobrecimento injustificado da outra. Especialmente no contrato empresarial, preciso se estar atendo ao ideal de preservao da ativi-dade econmica dos dois polos da relao jurdica, especialmente ao se trabalhar com a perspectiva de produo de efeitos externos em tais contratos, visvel na cadeia de negcios deles decorrente.

    Mais uma vez o critrio de interpretao do contrato empresarial no deve ser o mesmo utilizado para outros contratos na aplicao das hipteses de impreviso.

    No novo na jurisprudncia nacional relacionar-se a funo social teoria da impreviso, quando os contratantes buscam no Poder Judicirio a alterao de clusulas do contrato, ou at mesmo sua desvinculao, invocando um desequilbrio na relao jurdica durante a sua execuo. Existe um precedente j de 1935, na forma de um acrdo do Supremo Tribunal Federal que acolheu, em detri-mento da previso normativa expressa, a teoria da impreviso como fundamento da inexecuo de um contrato de importao bens, cuja impossibilidade teria decorrido da Revoluo de 1930, especialmente em razo de medidas administrativas adotadas."

    O acrdo acolhe a teoria da impreviso ao reconhecer a impossi-bilidade, ainda que relativa, de cumprimento do contrato como fruto da Revoluo de 1930. Os debates havidos na sesso de julgamento esto impregnados de posicionamentos ora em favor da alterabilidade de condies por aplicao analgica dos dispositivos legais aplicveis

    11. STF, RE 2.675, j. 22.11.1935, rel. Min. Laudo de Camargo. Archivo Judicirio de 05.08.1936, p.178 a 185.

  • PARTE II - PRINCPIOS GERAIS DO DIREITO CONTRATUAL I 49 48 TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

    ao caso fortuito e fora maior, ou pela invocao do princpio rebus si stantibus e impossibilidade relativa de cumprimento da obrigao; or em desfavor de tal acolhimento.

    A sentena de primeira instncia ento proferida, citada n acrdo, e que ao final prevaleceu, entendera que foi um moviment provocado pela Primeira Grande Guerra que consagrou mundialment a teoria da impreviso, admitindo que fossem considerados na aplica e execuo dos contratos, acontecimentos que possam ser consid rados inesperados, e, por consequncia, circunstncias no previst contratualmente porque surgidas posteriormente a sua elaborao.'

    Retira-se do voto do relator designado, Min. Costa Manso, um interessante reflexo sobre a segurana nos contratos: "A seguran dos contractos reside na boa f das partes. A regra em questo no n destroe, pois as circunstancias que rodeavam o ajuste modificaram-s de tal sorte, que a boa f reclama a sua resciso"."

    O exemplo histrico mencionado corrobora o entendimento que ideia de desequilbrio contratual parte da condio subjetiva das part ou da ocorrncia de fatos posteriores elaborao do contrato que aca baram modificando de forma significativa as condies da contratao

    Os arts. 317 e 478 do CC/2002 consagram a teoria da impreviso como fator de alterao de condies contratuais, quando, em sntese por motivos imprevisveis, sobrevier desproporo manifesta entre o valor da prestao devida e o do momento de sua execuo admitin do ao juiz corrigi--lo, de forma a assegurar o valor real da presta e o equilbrio da prestao e contraprestao. Como pressupostos d.

    aplicao do dispositivo, pode-se destacar a ocorrncia de motivo imprevisveis que acarretam desproporo entre as prestaes devidas no contrato. O requisito da imprevisibilidade relaciona-se boa-f, ou seja, ao grau de conhecimento das partes no que se refere s condies relacionadas ao tempo de execuo do contrato e o que normalmente poder-se-ia esperar em tais circunstncias, considerando-se os dados disponveis e atendendo-se qualificao dos sujeitos. A desproporo,

    12. GOMES, Orlando. Op. cit., p. 181. 13. Idem, p. 182.

    por sua vez, materializa um desequilbrio que prejudica excessivamente uma das partes.

    Ou seja, o reequilbrio do contrato, custa da modificao de seus termos pode ser associado ao princpio da isonomia material, e da constatao da posterior quebra daquela condio a partir de fatos novos que sucederam a elaborao do contrato.

    Se um dos aspectos para a configurao da impreviso valorada pela lei como justificativa da referida alterao a condio subjetiva das partes, as relaes jurdicas entre empresrios, por exemplo, no podem estar sujeitas a uma norma de interpretao baseada nos prin-cpios aplicveis numa relao de consumo, sobretudo em razo da situao de hipossuficincia que permeou toda elaborao das normas especiais aplicveis em benefcio do consumidor, com o propsito de forjar legalmente remdios s consequncias da desigualdade material.

    A possibilidade de invocao da teoria da impreviso nos contra-tos entre empresas especial em razo da lea normal dos contratos relacionados prtica econmica. Nos contratos de compra e venda de soja h julgados que refutam o intento de modificao de clusulas previamente pactuadas e que se mostram comercialmente desinteres-santes em razo da flutuao do preo do produto no mercado" e outros

    14. Ementa: "Direito empresarial. Contratos. Compra e venda de coisa futura (soja). Teoria da impreviso. Onerosidade excessiva. Inaplicabilidade. 1. Contratos empresariais no devem ser tratados da mesma forma que contratos cveis em geral ou contratos de consumo. Nestes admite-se o dirigismo contratual. Naqueles devem prevalecer os princpios da autono-mia da vontade e da fora obrigatria das avenas. 2. Direito Civil e Direito Empresarial, ainda que ramos do Direito Privado, submetem-se a regras e princpios prprios. O fato de o Cdigo Civil de 2002 ter submetido os contratos cveis e empresariais s mesmas regras gerais no significa que estes contratos sejam essencialmente iguais. 3.0 caso dos autos tem pecu-liaridades que impedem a aplicao da teoria da impreviso, de que trata o art. 478 do CC/2002: (i) os contratos em discusso no so de execuo continuada ou diferida, mas contratos de compra e venda de coisa futura, a preo fixo, (ii) a alta do preo da soja no tornou a prestao de uma das partes excessivamente onerosa, mas apenas reduziu o lucro esperado pelo produtor rural e (iii) a variao cambial que alterou a cotao da soja no configurou um acontecimento extraordinrio e imprevisvel, porque ambas

  • 50 f TEORIA GERAL DOS CONTRATOS PARTE II - PRINCPIOS GERAIS DO DIREITO CONTRATUAL 51

    que admitem o rompimento do vnculo contratual, desobrigando-se parte pelo mesmo motivo.

    as partes contratantes conhecem o mercado em que atuam, pois so profis sionais do ramo e sabem que tais flutuaes so possveis. 4. Recurso especia conhecido e provido". (STJ, REsp 936.741/GO, 4.' T., j. 03.11.2011, rel Min. Antonio Carlos Ferreira, DJe 08.03.2012). Tambm do STJ: Ementa "Direito civil e comercial. Compra de safra futura de soja. Elevao do pre do produto. Teoria da impreviso. Inaplicabilidade. Onerosidade excessiva Inocorrncia. 1. A clusula rebus sic stantibus permite a inexecuo de con trato comutativo de trato sucessivo ou de execuo diferida se as bas fticas sobre as quais se ergueu a avena alterarem-se, posteriormente, e razo de acontecimentos extraordinrios, desconexos com os riscos nsito prestao subjacente. 2. Nesse passo, em regra, inaplicvel a contrato d compra futura de soja a teoria da impreviso, porquanto o produto vendido cuja entrega foi diferida a um curto espao de tempo, possui cotao em bols de valores e a flutuao diria do preo inerente ao negcio entabulado. 3 A variao do preo da saca da soja ocorrida aps a celebrao do contrat no se consubstancia acontecimento extraordinrio e imprevisvel, inapto portanto, reviso da obrigao com fundamento em alterao das bas contratuais. 4. Ademais, a venda antecipada da soja garante a aferio d lucros razoveis, previamente identificveis, tomando o contrato infenso a quedas abruptas no preo do produto. Em realidade, no se pode fala em onerosidade excessiva, tampouco em prejuzo para o vendedor, mas t somente em percepo de um lucro aqum daquele que teria, caso a ven se aperfeioasse em momento futuro. 5. Recurso especial conhecido e pr vido". (STJ, REsp 849.228/GO, 4.' T., j. 03.08.2010, rel. Min. Luis Felip Salomo, DJe 12.08.2010).

    15. Ementa: "Apelao cvel. Reviso de clusulas contratuais com pedido de antecipao dos efeitos da tutela. Contrato de compra e venda. Soja Alegao de desequilbrio entre as partes. Preo pr-estabelecido. Entrega futura. Substancial elevao do preo. Prejuzo insuportvel por parte d devedor. Reviso do reajuste. Possibilidade. Pacta sunt servanda. Funo social. Boa-f. 1. Nos contratos de execuo continuada ou diferida, s a prestao de uma das partes se torna excessivamente onerosas, com extrema vantagem para outra, em virtude de acontecimentos extraordi-nrio e imprevisveis, poder o devedor pedir a resoluo do contrato, os defeitos da sentena que o decretar retroagiro a data da citao. 2. O princpio pacta sunt servanda deve ser interpretado em consonncia com a realidade socioecon mica, de sorte a evitar desequilbrio econmico entre os contratantes. 3. Em contrato de compra e venda de soja para entrega futura, acontecendo substancial aumento do preo e do produto,

    Todavia, as alteraes que venham a se processar assim como po-dem derivar de diversas causas, tambm podero produzir diferentes efeitos. A destruio da base objetiva do negcio pode acarretar duas consequncias principais, uma relacionada equivalncia e a outra impossibilidade de alcanar-se o fim do contrato.

    No entanto, no que se refere aos contratos empresariais em espe-cial, a relao de equivalncia entre prestao e contraprestao ser considerada quebrada quando conduzir perda do sentido comutativo do contrato: uma verdadeira alterao econmica do contedo da prestao, extraordinria e que altere as condies previstas quando da celebrao do contrato; uma simples alta ou baixa de preos no seria necessariamente um fator de justificativa para a alterao." Todo contratante est sujeito a riscos, especialmente nos contratos empresa-riais, e, somente um excesso em relao ao limite admitido, imprevisto e imprevisvel, adequar-se-ia s condies para modificao. Por essa linha de pensamento, no se enquadraria nas condies de reviso do contrato aquelas situaes previamente aceitas em razo da conscincia dos riscos de uma futura alterao da situao econmica.18

    De todo modo, em tais circunstncias, quando houver a possibi-lidade de reviso judicial dos contratos, pela perda da comutatividade das prestaes, art. 317, ou diante da caracterizao da onerosidade excessiva prevista como requisito aplicao da teoria da impreviso do art. 478 do CC/2002, no h que se fazer apelo ao princpio da funo social do contrato.

    Sobre a possibilidade de frustrao do fim do contrato, estar con-figurada se a prestao, ainda que possvel, deixar de ser interessante, e este desaparecimento da base do negcio que justifica a sua extino.

    no pode prevalecer a clausula contratual entre as partes. 4. Os contra-tantes so obrigados a guardar, assim na concluso do contrato como em sua execuo os princpios de probidade de boa-f. Recurso conhecido e parcialmente provido". (TJ GO , ApCiv 77487/188, rel. Des. Vtor Barboza Lenza, 19.1e 21.06.2005).

    16. GOMES, Orlando. Op. cit., p. 102. 17. Idem, p. 105. 18. Idem, p. 106.

  • 52 I TEORIA GERAL DOS CONTRATOS PARTE It - PRINCPIOS GERAIS DO DIREITO CONTRATUAL 153

    Empresarialmente tal circunstncia dever ser considerada de forma mais restrita do que em relao a outros contratos e negcios, como uma forma de reconhecimento dos interesses externos aos contratos que devero ser considerados quando da prestao judicial e tambm pela considerao do princpio da preservao da empresa.

    Com relao funo social do contrato associada teoria da impreviso, pode-se entender que no cabe s partes invoc-la, pela absoluta falta de parmetro prtico que sustente a opo que venh a ser tomada pelo intrprete para o reconhecimento da funo socia em relao a um indivduo (o que prometera vender ou comprar) o a um grupo de indivduos (a classe dos vendedores ou a classe do compradores) em detrimento do outro, sem ofensa ao princpio d isonomia. Como se fosse possvel uma indagao quanto ao titular d interesse privado que pudesse melhor corresponder ao adjetivo socia

    Nas relaes de consumo, por fora da previso do art. 6., V, d CDC, o direito de alterao das condies do contrato independe d comprovao da imprevisibilidade do fato superveniente a sua elabo-rao, bastando a configurao da excessiva onerosidade da obrigao a que se sujeita uma das partes. A boa-f do consumidor , portanto, presumida. No entanto, tambm j apareceu jurisprudencialment associada ao princpio da funo social do contrato, por exemplo, na modificao do critrio de fixao de ndices de remunerao de financiamento em contratos bancrios relacionados a mtuos e finan-ciamentos. A funo social invocada para adequar a remunerao do capital da instituio financeira capacidade de pagamento do devedor, estando atrelada ao reconhecimento da submisso das instituies financeiras s normas de proteo do consumidor.19

    19. Ementa: "Administrativo. Sistema financeiro da habitao. FCVS. Cesso de obrigaes e direitos. 'contrato de gaveta'. Transferncia de financiamento Necessidade de concordncia da instituio financeira mutuante. Lei 10.1 50 de 2000 (Art. 20). 1. A cesso de mtuo hipotecrio carece da anuncia d instituio financeira mutuante, mediante comprovao de que o cessionri atende aos requisitos estabelecidos pelo Sistema Financeiro de Habitao SFH. Precedente da Corte Especial: REsp 783.389/RO, Corte Especial, j. 21.05.2008, rel. Min. Ari Pargendler, Dl 30.10.2008.2. Consectariamente, o cessionrio de mtuo habitacional, cuja transferncia se deu sem a interveno

    O fundamento para o estabelecimento de relao entre a modi-ficao do contrato e o Cdigo de Defesa do Consumidor estar no direito bsico que lhe atribudo de ver alteradas as condies do contrato quando presentes os fatos modificativos e a excessiva onero-sidade. A invocao da funo social no indispensvel obteno

    do agente financeiro, no possui legitimidade ad causam para demandar em juzo questes pertinentes s obrigaes assumidas no contrato ab origine. 3. Ressalva do ponto de vista do Relator no sentido de que, a despeito de a jurisprudncia d