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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM SOCIOLOGIA POLIacuteTICA
LUCIANA BUTZKE
IMPASSES DA GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS E DA
DEMOCRACIA NO BRASIL O CASO DO CARVAtildeO MINERAL
NO SUL DE SANTA CATARINA
FLORIANOacutePOLIS
2014
LUCIANA BUTZKE
IMPASSES DA GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS E DA
DEMOCRACIA NO BRASIL O CASO DO CARVAtildeO MINERAL
NO SUL DE SANTA CATARINA
Tese de doutorado apresentada ao
Programa de Poacutes-graduaccedilatildeo em
Sociologia Poliacutetica do Centro de
Filosofia e Ciecircncias Humanas da
Universidade Federal de Santa
Catarina como requisito para a
obtenccedilatildeo do grau de doutor em
Sociologia Poliacutetica
Orientador Prof Dr Paulo Henrique
Freire Vieira
FLORIANOacutePOLIS
2014
Aos meus pais Marilda e Hermes que
com seus exemplos me inspiram a
tentar ser uma pessoa melhor
AGRADECIMENTOS
O doutoramento foi muito mais abertura de caminhos e encontros que
pontos de chegada E nesses caminhos e encontros pude conhecer
pessoas e estreitar laccedilos que foram muito importantes ao longo desse
processo Aproveito para deixar registrado aqui os meus
agradecimentos
Ao meu orientador Prof Paulo Freire Vieira que me acompanha desde
o mestrado Eacute muito importante ter algueacutem que com equanimidade nos
faccedila perceber os nossos limites e nos estimule a ir aleacutem com humildade
e sem ilusotildees
Aos professores que gentilmente participaram da qualificaccedilatildeo e da
defesa e trouxeram valiosas contribuiccedilotildees ao texto aqui apresentado
Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes da UNESC Profordf Drordf Cristiane
Mansur de Moraes Souza da FURB Prof Dr Luiz Fernando Scheibe do
Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Geografia da UFSC Profordf Drordf Janice
Pontes Tirelli e Marcia Grisotti do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em
Sociologia Poliacutetica da UFSC
Agrave coordenaccedilatildeo e aos professores e professoras do Programa de Poacutes-
Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica importantiacutessimos nesse processo de
formaccedilatildeo
Agrave Albertina Buss Volkmann e agrave Maria de Faacutetima Xavier da Silva pelo
carinho e pela ajuda junto agrave Secretaria do PPGSP
Ao CNPq pelo auxiacutelio financeiro por meio da bolsa de estudos
Agraves amigas e amigos do Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio Ambiente e
Desenvolvimento do Grupo de Educaccedilatildeo para o Ecodesenvolvimento e
do Nuacutecleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional Nossas
vivecircncias e convivecircncias foram fundamentais para o meu processo
formativo Foi muito bom poder contar com o carinho e apoio de vocecircs
Agrave Juliana Adriano Marina Fravrim Gasparini Melissa Vivacqua
Tatiane Viega Vargas e Tadeu Santos (da ONG Soacutecios da Natureza) que
gentilmente compartilharam suas impressotildees sobre partes da tese
Agrave Mariana Thibes pela agradaacutevel parceria ao longo desse percurso e ao
Juliano Giassi Goularti pela sugestatildeo dos dados do quinto capiacutetulo
Aos colegas da rede TransForMar pela acolhida e pela oportunidade de
compartilhar e dialogar sobre nossos projetos
Aos amigos Andresa Graciela Wagner Joaquim Hoepers Silvana Maria
Bittencourt e Vanessa Juliana da Silva Santos
Agraves amigas Katia Parizoto e Laurete Coleti que me inspiraram com a sua
coragem
Agraves minhas tias Lizete e Dalila eacute muito bom tecirc-las por perto
Ao Ivo cuja presenccedila tornou minha caminhada mais leve Com carinho e
paciecircncia nas nossas incontaacuteveis conversas sobre a tese ajudou e falou
o essencial quando eu mais precisava e permaneceu em silecircncio quando
isso significava me compreender e respeitar
Agrave minha famiacutelia Marilda Hermes Viviana Susana Lucas Hermes
Carlos Dora Dara e Bruna presenccedilas constantes em minha vida O
amor carinho e apoio de vocecircs foi e sempre seraacute fundamental
Agrave minha querida oma Leonida tio Flaacutevio tio Irineu minha prima
Valeacuteria e minha cachorrinha Nicole que partiram no periacuteodo de
doutorado e deixaram muitas saudades
Meus mais sinceros agradecimentos a todas e todos pois naquilo que
faccedilo sou e me torno a cada dia levo um pouquinho de cada um de
vocecircs
A terra natildeo eacute soacute um espaccedilo onde vivemos Eacute um
mundo que produz e condiciona nossa proacutepria
existecircncia que antecede e se prolonga em nossa
vida em todas as suas dimensotildees Somos seres
terrestres A democracia natildeo eacute soacute um espaccedilo
institucional da poliacutetica Ela para existir deve
tambeacutem realizar-se e estar presente em todas as
dimensotildees de nossas vidas Talvez por isso haja
uma relaccedilatildeo histoacuterica tatildeo estreita entre terra e
democracia Quando a terra eacute apropriada usada
monopolizada por uns poucos a democracia natildeo
existe Quando a democracia natildeo existe a terra se
transforma em um mundo de poucos contra a
maioria (Herbert de Souza ndash Betinho 1991 p
108-9)
RESUMO
Esta tese focaliza os dilemas que continuam bloqueando quatro deacutecadas
apoacutes a Conferecircncia de Estocolmo o funcionamento do sistema de gestatildeo
de recursos naturais natildeo renovaacuteveis no Brasil Mais especificamente o
texto conteacutem uma anaacutelise dos bastidores do processo de licenciamento
ambiental voltado para a implantaccedilatildeo de uma nova usina termeleacutetrica na
regiatildeo sul do estado de Santa Catarina O enfoque analiacutetico utilizado foi
construiacutedo mediante uma hibridizaccedilatildeo de duas linhas de pesquisa
sistecircmica sobre o binocircmio meio ambiente amp desenvolvimento ainda
pouco conhecidas em nosso Paiacutes a saber gestatildeo de recursos comuns
(ldquocommonsrdquo) para o ecodesenvolvimento e justiccedila ambiental e ecoloacutegica Aleacutem da introduccedilatildeo e de uma siacutentese da revisatildeo de literatura
sobre a atualidade dos princiacutepios de ecodesenvolvimento no debate
sobre modos de apropriaccedilatildeo e sistemas de gestatildeo de ldquocommonsrdquo o texto
oferece inicialmente um resgate historiograacutefico das modalidades e das
implicaccedilotildees socioecoloacutegicas do aproveitamento de jazidas de carvatildeo
mineral no Brasil e em Santa Catarina Na sequecircncia coloca em
primeiro plano uma anaacutelise dos padrotildees de interaccedilatildeo dos segmentos
sociais envolvidos no projeto de implantaccedilatildeo da Usina Termeleacutetrica Sul-
Catarinense (USITESC) no municiacutepio de Treviso Os dados coletados
permitiram validar a hipoacutetese segundo a qual a decisatildeo de implantar esta
usina constitui um indicador suplementar de crise do sistema poliacutetico
implantado no Paiacutes relativamente ao agravamento tendencial da
problemaacutetica socioecoloacutegica A linha de criacutetica adotada incide nas
implicaccedilotildees da reproduccedilatildeo de falhas estruturais nos processos de
construccedilatildeo da cidadania ambiental e de promoccedilatildeo da justiccedila ambiental
e ecoloacutegica em todos os niacuteveis de governo ndash do local ao nacional
Argumenta-se que a despeito dos avanccedilos obtidos no debate social
contemporacircneo sobre a urgecircncia de uma transiccedilatildeo ecoloacutegica
consequente para aleacutem de uma ldquoeconomia verderdquo ou do ideaacuterio de um
ldquodesenvolvimento sustentaacutevelrdquo que natildeo rompe com o imaginaacuterio
ocidental de um crescimento material ilimitado a intenccedilatildeo de ampliar a
utilizaccedilatildeo do carvatildeo como fonte de energia estaacute diretamente associada agrave
formaccedilatildeo de redes de influecircncia envolvendo empresaacuterios e agentes
governamentais Buscando elucidar os condicionantes desse cenaacuterio de
mercantilizaccedilatildeo intensiva e indiscriminada de ldquocommonsrdquo o trabalho
reuacutene tambeacutem evidecircncias de iniciativas de resistecircncia que vecircm sendo
gestadas na regiatildeo estudada por de grupos sociais portadores de uma
visatildeo ecoloacutegica da economia da cultura e da poliacutetica
Palavras-chave Ecodesenvolvimento Gestatildeo de recursos comuns
Justiccedila ambiental Justiccedila Ecoloacutegica Democracia Energia Termeleacutetrica
Carvatildeo Mineral Santa Catarina
ABSTRACT
This thesis focuses on the dilemmas that continue blocking four
decades after the Stockholm Conference the functioning of the
management system based on non-renewable natural resources in Brazil
More specifically the text contains an analysis of the backstage of the
licensing process focused on the deployment of a new thermal power
plant in the southern state of Santa Catarina The analytical approach
used was built by a hybridization of two lines of systemic research on
the binomial environment amp development still little known in our
country namely management of common resources (commons) for
the ecodevelopment and environmental and ecological justice Besides
the introduction and a summary of the literature review on the actuality
of the principles of ecodevelopment in the current debate on modes of
ownership and management of commons systems the text initially
provides a historiographical rescuing of the terms and socio-ecological
implications of utilizing coal mines in Brazil and in Santa Catarina
State Following it foregrounds an analysis of the patterns of interaction
of social groups involved in the deployment project Thermoelectric
Plant of South of the Santa Catarina (USITESC) in the city of Treviso
The collected data allow to validate the hypothesis that the decision to
deploy this Plant is a further indicator of the political system deployed
crisis in the country regarding the trend towards worsening of socio-
ecological problems The adopted line of criticism focuses on the
implications of reproducing structural flaws in the processes of
construction of environmental citizenship and promotion of
environmental and ecological justice at all levels of government - from
local to national It is argued that despite the progress achieved in the
contemporary social debate on the urgency of a consequent ecological
transition beyond a green economy or the ideas of sustainable
development that does not break the Western imagination of a growing
unlimited material intention of expanding nowadays the use of coal as
an energy source is directly associated with the formation of powerful
lobbies involving businessmen and government officials Trying to
elucidate the determinants of this intensive and indiscriminate
commodification of commons scenario the paper also gathers
evidence of resistance initiatives that have been gestated in the study
area for social groups suffering from an ecological view of the
economy culture and policy
Keywords Ecodevelopment Management of common resources
Environmental justice Ecological justice Democracy Thermoelectric
energy Coal Santa Catarina
LISTA DE FIGURAS
Figura 1ndash Tipologia das formas de expressatildeo do cidadatildeo numa
democracia 56 Figura 2 - Modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns ajustado a
co-gestatildeo adaptativa 69 Figura 3 - Primeira adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa 72 Figura 4 - Segunda adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa 75 Figura 5 - Tipos de carvatildeo e uso 87 Figura 6 - Etapas da avaliaccedilatildeo de impacto ambiental 95 Figura 7 ndash Mapa de localizaccedilatildeo da Bacia Carboniacutefera Santa Catarina
114 Figura 8- Brasatildeo do municiacutepio de Treviso 158 Figura 9 ndash Mapa de localizaccedilatildeo do municiacutepio de Treviso 159 Figura 10 - Aacuterea prevista para a implantaccedilatildeo da USITESC 163
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 ndash Divisatildeo dos envolvidos na gestatildeo por segmentos 55 Quadro 2 - Quadro de anaacutelise do sistema democraacutetico agrave luz da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica 57 Quadro 3 ndash O enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento e as
dimensotildees baacutesicas do conceito sistecircmico de meio ambiente 64 Quadro 4 - Aspectos das atividades de mineraccedilatildeo e processamento do
carvatildeo mineral 91 Quadro 5 - Siacutentese dos pontos que favorecem e questionam a
amplicaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral
por macro variaacutevel 104 Quadro 6 ndash Limites e oportunidades do sistema democraacutetico no Brasil
106 Quadro 7 ndash Aspectos que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral Santa Catarina
130 Quadro 8 ndash Limites e possibilidades do sistema democraacutetico em Santa
Catarina 132 Quadro 9 - Principais caracteriacutesticas fiacutesicas e bioacuteticas da aacuterea de
influecircncia indireta do projeto USITESC 160 Quadro 10- Impactos sobre o Meio Fiacutesico Bioacutetico e Antroacutepico e accedilotildees
geradoras 165 Quadro 11 - Siacutentese dos Programas da USITESC e alvos principais 168 Quadro 12 - Procedimento para conduccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas
FATMA 175
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral em operaccedilatildeo
em 2013 Brasil 88 Tabela 2 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral com outorga
de 1998 a 2013 Brasil 88 Tabela 3 - Faturamento do Segmento do Carvatildeo Mineral 2012 118 Tabela 4 - Produccedilatildeo de carvatildeo bruto (ROM) de 2009 a 2012 119 Tabela 5 - Distribuiccedilatildeo de passivos ambientais em relaccedilatildeo agraves empresas
120 Tabela 6 - Cronograma de recuperaccedilatildeo dos passivos ambientais 120 Tabela 7 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2002 141 Tabela 8 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2002 que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral 142 Tabela 9 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2002 142 Tabela 10 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2006 143 Tabela 11 - Candidatosas que receberam doaccedilotildees das empresas ligadas
ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2006 144 Tabela 12 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2006 145 Tabela 13 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2010 145 Tabela 14 - Candidatosas receberam doaccedilotildees das empresas ligadas ao
carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2010 146 Tabela 15 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2010 147 Tabela 16 - Doadores eleiccedilotildees de 2004 148 Tabela 17 - Comitecircs e candidatos que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2004 149 Tabela 18 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2004 149 Tabela 19 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2008 150 Tabela 20 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2008 que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 151 Tabela 21 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2008 151 Tabela 22 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2012 152 Tabela 23 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2012 que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 152 Tabela 24 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2012 153 Tabela 25 - Siacutentese dos doadores Eleiccedilotildees de 2002 e 2012 154 Tabela 26 - Candidatos que receberam maiores doaccedilotildees Eleiccedilotildees de
2002 a 2012 155 Tabela 27 - Doaccedilotildees por Partido Poliacutetico Eleiccedilotildees de 2002 a 2012 155 Tabela 28 ndash Principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo com a construccedilatildeo da
USITESC 179
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABCM Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo Mineral
ACARESC
Associaccedilatildeo de Creacutedito e Assistecircncia Rural de Santa
Catarina
ACARIMO Associaccedilatildeo Comunitaacuteria do Alto do Rio Molha
AIA Avaliaccedilatildeo de Impacto Ambiental
ALESC Assembleacuteia Legislativa do Estado de Santa Catarina
AMESC Associaccedilatildeo dos Municiacutepios do Extremo Sul Catarinense
AMREC Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera
AMUREL Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo de Laguna
ANEEL Agecircncia Nacional de Energia Eleacutetrica
ANSDNPM Associaccedilatildeo Nacional de Servidores do Departamento
Nacional de Produccedilatildeo Mineral
APC Associaccedilatildeo Proacute-Carvatildeo
APIB Articulaccedilatildeo dos Povos Indiacutegenas do Brasil
APINE
Associaccedilatildeo Brasileira dos Produtores Independentes de
Energia Eleacutetrica
APP Agraverea de Preservaccedilatildeo Permanente
ASMURC
Associaccedilatildeo de Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera do
Rio Grande do Sul
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento
CAPES
Coordenadoria de Aperfeiccediloamento de Pessoal de Niacutevel
Superior
CASA Centro de Apoio Socioambiental
CBCA Companhia Carboniacutefera de Araranguaacute
CCEE Cacircmara de Comercializaccedilatildeo de Energia Eleacutetrica
CEPCAN Comissatildeo Executiva do Plano do Carvatildeo Nacional
CETEM Centro de Tecnologia Mineral
CETMA Conselho Estadual de Tecnologia e Meio ambiente
CFEM
Compensaccedilatildeo Finaceira pela Exploraccedilatildeo de Recursos
Minerais
CFM Comitecircs Financeiros Municipais
CGBHRA
Comitecirc de Gerenciamento da Bacia Hidrograacutefica do Rio
Araranguaacute
CGTEE Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica
CNBB Conferecircncia Nacional dos Bispos do Brasil
CNPE Conselho Nacional de Poliacutetica Energeacutetica
CNPq
Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientiacutefico e
Tecnoloacutegico
CO2 Dioacutexido de Carbono
COCALIT Coque Catarinense Ltda
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
CONDEMA Conselho Municipal de Defesa Ambiental
COPEL Companhia Paranaense de Energia
CPRM Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
CSN Companhia Sideruacutergica Nacional
DEM Democratas
DNPM Departamento Nacional de Produccedilatildeo Mineral
EIA Estudo de Impacto Ambiental
EPE Empresa de Pesquisa Energeacutetica
FASE
Federaccedilatildeo de oacutergatildeos para Assistecircncia Social e
Educacional
FATMA Fundaccedilatildeo do Meio Ambiente
FBOMS Foacuterum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais
FBOMS
Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento
FDESC Foacuterum de Desenvolvimento do Extremo Sul Catarinense
FEEC Federaccedilatildeo de Entidades Ecologistas Catarinenses
FELC Foacuterum de Ecodesenvolvimento do Litoral Catarinense
FURB Universidade Regional de Blumenau
GAPLAN Gabinete de Planejamento
GEE Gases de Efeito Estufa
GWH Gigawatt-hora
IAD Institutional Framework for Policy Analysis and Design IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renovaacuteveis
IBASE Instituto Brasileiro de Anaacutelises Sociais e Econocircmicas
IBRAM Instituto Brasileiro de Mineraccedilatildeo
ICA Instituto da Cidadania de Araranguaacute
ICC Induacutestria Carboquiacutemica Catarinense
ICMS
Imposto sobre Circulaccedilatildeo de Mercadorias e Prestaccedilatildeo de
Serviccedilos
IEA Agecircncia Internacional de Energia
INESC Instituto de Estudos Socioeconocircmicos
IPAT Instituto de Pesquisas Ambientais e Tecnoloacutegicas
JICA Agecircncia de Cooperaccedilatildeo internacional do Japatildeo
KWh QuiloWatt hora
LI Licenccedila de Instalaccedilatildeo
LO Licenccedila de Operaccedilatildeo
LP Licenccedila Preacutevia
MAM Movimento Popular frente agrave Mineraccedilatildeo
MEcircS Movimento Ecoloacutegico de Sideroacutepolis
MMA Ministeacuterio do Meio Ambiente
MME Ministeacuterio das Minas e Energia
MOVET Movimento Ecoloacutegico Tubaronense
MPA Movimento Proacute-Araranguaacute
MST Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
MW Megawatt
N Nitrogecircnio
NMD
Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio Ambiente e
Desenvolvimento
NPDR Nuacutecleo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional
OCDE
Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento
Econocircmico
ONG Organizaccedilatildeo Natildeo Governamental
ONU Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas
PAC Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento
PFL Partido da Frente Liberal
PL Projeto de Lei
PMA Prefeitura Municipal de Araranguaacute
PMDB Partido do Movimento Democraacutetico Brasileiro
PNMA Poliacutetica Nacional de Meio Ambiente
PNUMA Programa das Naccedilotildees Unidas para o Meio Ambiente
PP Partido Progressista
PPB Partido Progressista Brasileiro
PPS Partido Popular Socialista
PR Partido da Repuacuteblica
PSD Partido Social Democraacutetico
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira
PT Partido dos Trabalhadores
PTB Partido Trabalhista Brasileiro
RBJA Rede Brasileira de Justiccedila Ambiental
RIMA Relatoacuterio de Impacto Ambiental
ROM Run of Mine
SATC
Associaccedilatildeo Beneficente da Induacutestria Carboniacutefera de
Santa Catarina
SDR Secretaria de Desenvolvimento Regional
SETMA Secretaria de Tecnologia e Meio Ambiente
SIESESC
Sindicato da Induacutestria da Extraccedilatildeo de Carvatildeo do Estado
de Santa Catarina
SISNAMA Sistema Nacional do Meio Ambiente
SNIEC Sindicato Nacional da Induacutestria de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
SOLTECA Sociedade Termoeleacutetrica de Capivari SA
TWH Tera Watt Hora
UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina
UNESC Universidade do Extremo Sul Catarinense
USITESC Usina Termeleacutetrica Sul-Catarinense
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO39
2 A ATUALIDADE DO ECODESENVOLVIMENTO NO ESTUDO
CONTEMPORAcircNEO SOBRE GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS59
21 RESGATE DO ENFOQUE ldquoCLAacuteSSICOrdquo DE
ECODESENVOLVIMENTO 61
22 AS CONTRIBUICcedilOtildeES DE DIFERENTES ENFOQUES 63
221 Gestatildeo de recursos comuns a importacircncia da
aprendizagem social adaptativa 66
222 Ecodesenvolvimento territorial os recursos comuns no
contexto do desenvolvimento 71
223 Justiccedila ambiental e justiccedila ecoloacutegica os caminhos da
democracia 73
23 LIMITES E POSSIBILIDADES DO
ECODESENVOLVIMENTO REVISITADO 77
3 GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS NO BRASIL O CARVAtildeO
MINERAL EM QUESTAtildeO79
31 DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO GESTAtildeO DE
RECURSOS COMUNS E ENERGIA 81
32 CARACTERIZACcedilAtildeO E USOS DO CARVAtildeO MINERAL NO
BRASIL 86
33 TECNOLOGIAS DISPONIacuteVEIS E IMPACTOS
SOCIOAMBIENTAIS 89
34 REGRAS EM USO NUMA PERSPECTIVA HISTOacuteRICA
INTERFACE ENTRE DIREITOS AMBIENTAIS E DIREITOS
HUMANOS 92
35 ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO 98
351 Segmentos poliacuteticos 98
352 Segmentos econocircmicos 100
353 Segmentos sociais 102
36 SITUACcedilAtildeO ATUAL E DESAFIOS 103
4 CARVAtildeO MINERAL EM SANTA
CATARINA109
41 ldquoCombinandordquo crescimento econocircmico e proteccedilatildeo ambiental 110
42 O sul catarinense uma trajetoacuteria (de desenvolvimento) marcada
pelo carvatildeo mineral 114
43 Da extraccedilatildeo manual agrave mecanizaccedilatildeo das minas 121
44 Regras em uso 122
45 Envolvidos na gestatildeo 124
451 Segmentos poliacuteticos 124
452 Segmentos econocircmicos 124
453 Segmentos sociais 126
46 Situaccedilatildeo atual e desafios 129
5 CARVAtildeO MINERAL E POLIacuteTICA EM SANTA CATARINA
ELEICcedilOtildeES E FINANCIAMENTO PRIVADO133
51 Os argumentos presentes no discurso dos poliacuteticos 134
52 Panorama das eleiccedilotildees e doaccedilotildees de campanha de 2002 a 2012
139
521 Eleiccedilotildees gerais 140
522 Eleiccedilotildees municipais 148
53 Os fatos ausentes do discurso dos poliacuteticos 153
6 CARVAtildeO MINERAL E AMPLIACcedilAtildeO DA ENERGIA
TERMELEacuteTRICA EM SANTA CATARINA157
61 O municiacutepio de Treviso 157
62 O processo de licenciamento os documentos escritos 162
621 O EIARIMA da USITESC 163
622 Das audiecircncias puacuteblicas e licenccedilas 169
623 Pressotildees dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos no
processo de licenciamento 170
624 A posiccedilatildeo dos segmentos sociais 173
63 Relaccedilotildees de poder e desigualdade nas audiecircncias puacuteblicas os
documentos falados 175
631 A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica 177
632 As mudanccedilas climaacuteticas natildeo vecircm ao caso 183
633 Quem defende quem E quem defende os
afetadosatingidosameaccedilados 188
634 O papel da FATMA em questatildeo 192
635 O IPAT e a neutralidade da ciecircncia 195
636 Audiecircncias puacuteblicas como espaccedilos democraacuteticos 200
64 Democracias possiacuteveis e aprendizagem social 202
7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS205
REFEREcircNCIAS211
1 INTRODUCcedilAtildeO
O crescimento e as transformaccedilotildees da economia mundial ao
longo do seacuteculo XX foram impulsionados pela oferta de energia tendo
como fonte principal os combustiacuteveis foacutesseis petroacuteleo e carvatildeo mineral
O uso da energia eacute essencial agrave cultura consumista moderna presente em
todas as regiotildees do mundo Os processos de produccedilatildeo e consumo satildeo
responsaacuteveis por inuacutemeros riscos e danos ecoloacutegicos (TOUCHEacute 2004)
A geopoliacutetica mundial dos recursos naturais faz da energia aacutegua
mineacuterio e espaccedilo territorial elementos do comeacutercio internacional Esse
movimento global afeta as localidades atraveacutes da implantaccedilatildeo de redes
de infraestrutura reconversatildeo de atividades alteraccedilatildeo das formas de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo e satildeo geradores de injusticcedila ambiental Aiacute surgem
conflitos entre a exploraccedilatildeo dos recursos orientada por interesses
presentes em vaacuterias escalas espaciais (ACSELRAD BEZERRA 2010
ZHOURI 2008)
A partir da deacutecada de 1990 depois de mais de cinquenta anos de
controle estatal o sistema energeacutetico brasileiro passou por um periacuteodo
de liberalizaccedilatildeo Duas mudanccedilas consideraacuteveis podem ser apontadas A
privatizaccedilatildeo das companhias operadoras iniciando com a Lei nordm 9427
de dezembro de 1996 que instituiu a Agecircncia Nacional de Energia
Eleacutetrica (ANEEL) e determinou que o potencial energeacutetico seria
concedido via leilatildeo A segunda mudanccedila ocorreu em 2004 com o Novo
Modelo do Setor Eleacutetrico marcando a retomada do planejamento nesse
setor pelo Estado garantindo a seguranccedila no suprimento modicidade
tarifaacuteria e inserccedilatildeo social (atraveacutes do Programa Luz para Todos)
(ANEEL 2008a) Essa deacutecada marcou tambeacutem a desregulamentaccedilatildeo do
setor carboniacutefero que perdeu o mercado metaluacutergico e enfrentou seacuterias
dificuldades vindo a se recuperar somente com a possibilidade de
ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica (JFSC 2008)
Muitas poliacuteticas puacuteblicas incluindo as do setor energeacutetico tecircm
como efeitos colaterais grandes impactos socioambientais (PINHEIRO
2006 RAULINO 2009 SAacuteNCHEZ 2008a VIEacuteGAS 2007) O
Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento (PAC) reforccedilou a velha loacutegica
de grandes projetos de infraestrutura e a atuaccedilatildeo do Estado ainda eacute
bastante controversa (VIEIRA 2009 ZHOURI LASCHEFSKI 2010)
Dentre as controveacutersias presentes na atuaccedilatildeo do Estado uma refere-se
ao compromisso assumido pelo Brasil no Plano Nacional sobre
40
Mudanccedila do Clima de reduzir as desigualdades sociais a partir de uma
dinacircmica econocircmica que natildeo repita a trajetoacuteria dos paiacuteses
industrializados em termos de emissotildees de Gases de Efeito Estufa
(GEE) (BRASIL 2008) Esse discurso parece caminhar na contramatildeo
do PAC que prevecirc a construccedilatildeo de mais cinco termeleacutetricas movidas a
carvatildeo mineral sendo uma em Santa Catarina (MONTEIRO 2008)
A Poliacutetica Estadual sobre Mudanccedilas Climaacuteticas e
Desenvolvimento Sustentaacutevel de Santa Catarina foi instituiacuteda em 2009
Esta pretende compatibilizar desenvolvimento social econocircmico e
tecnoloacutegico com a proteccedilatildeo do sistema climaacutetico e do meio ambiente
com ecircnfase especial agrave minimizaccedilatildeo das atividades geradoras de gases de
efeito estufa (SANTA CATARINA 2009a) Entretanto o Coacutedigo
Estadual do Meio Ambiente aprovado em 2009 (SANTA CATARINA
2009b) e alterado em 2013 abre a possibilidade de regularizaccedilatildeo
fundiaacuteria em Aacutereas de Preservaccedilatildeo Permanente (APP) e do
licenciamento por decurso de prazo (FEEC 2008 SANTA
CATARINA 2014a) Estes e outros aspectos causam grande impacto
nas relaccedilotildees sociedade e meio ambiente no geral e na questatildeo
energeacutetica em particular
O desenvolvimento de Santa Catarina foi durante muito tempo
considerado bem sucedido por ter reduzido grau de desigualdade
socioeconocircmica amparada no predomiacutenio da pequena propriedade e da
produccedilatildeo diversificada (LISBOA THEIS 1993) Todavia com o passar
do tempo observa-se a elevaccedilatildeo do ecircxodo rural o aumento dos
problemas urbanos e da degradaccedilatildeo ecossistecircmica (VIEIRA et al
2010 VIEIRA CUNHA 2002) A crise socioecoloacutegica catarinense estaacute
intimamente ligada agrave civilizaccedilatildeo dos negoacutecios (LENZI 2000) e o
sistema energeacutetico que a sustenta contribui em alguma medida para o
agravamento deste quadro (LISBOA THEIS 1993) O aumento da
produccedilatildeo e consumo de energia em Santa Catarina relaciona-se ao
crescimento da atividade econocircmica e ao crescimento dos impactos
ambientais (THEIS 1988)
Dentre as regiotildees mais afetadas estaacute o Sul de Santa Catarina A
regiatildeo concentra 1041 das reservas de carvatildeo mineral do Brasil
(MONTEIRO 2008) Desde a descoberta do carvatildeo catarinense pelos
tropeiros em 1822 ateacute os dias atuais muitas coisas mudaram em termos
de incentivos ao uso do carvatildeo mineral tecnologias utilizadas
agravamento da problemaacutetica socioambiental global e desenvolvimento
de mecanismos institucionais para lidar com esta problemaacutetica Todavia
41
apesar de existirem avanccedilos intensificaram-se tambeacutem processos de
degradaccedilatildeo ambiental (MENEZES WATERKEMPER 2009 SANTA
CATARINA 1990)
A Agecircncia de Cooperaccedilatildeo Internacional do Japatildeo (JICA)
identificou 4700 hectares degradados no Sul de Santa Catarina mas
estima-se que seriam 6000 hectares (NASCIMENTO BURSZTYN
2010) Do mineacuterio extraiacutedo 25 eacute aproveitado e 75 torna-se rejeito
piritoso (MILIOLI 2009) Na regiatildeo carboniacutefera apesar da
mecanizaccedilatildeo da extraccedilatildeo do carvatildeo ainda existem precaacuterias condiccedilotildees
de trabalho e peacutessimas condiccedilotildees de vida (moradia sauacutede saneamento)
(MONTIBELLER FILHO 2004) Haacute na regiatildeo um gradativo
comprometimento do setor agriacutecola As aacutereas proacuteximas agraves lavras de
subsolo sofrem com rachaduras desabamentos e rebaixamentos do solo
Ocorrem tambeacutem infiltraccedilotildees secagem de cursos de aacutegua accediludes e
poccedilos Dois terccedilos do sistema hidrograacutefico da regiatildeo estatildeo
comprometidos Existem tambeacutem impactos na flora e fauna e decliacutenio
do potencial pesqueiro (MILIOLI 2009)
Em 1993 o Ministeacuterio Puacuteblico Federal propocircs uma Accedilatildeo Civil
Puacuteblica contra as empresas carboniacuteferas diretores soacutecios majoritaacuterios o
Estado de Santa Catarina e a Uniatildeo Federal visando agrave recuperaccedilatildeo do
passivo ambiental resultante da mineraccedilatildeo do carvatildeo Em 2000
aconteceu a condenaccedilatildeo dos reacuteus agrave recuperaccedilatildeo de 619159 hectares de
aacutereas degradadas trecircs bacias hidrograacuteficas (bacias dos rios Araranguaacute
Tubaratildeo e Urussanga) e 768 minas de boca abandonadas (TSJ 2007)
A regiatildeo eacute palco de muitos conflitos No que diz respeito agrave
extraccedilatildeo do carvatildeo destacam-se em 1988 o conflito entre a Companhia
Sideruacutergica Nacional (CSN) e moradores da comunidade rural de
Montanhatildeo em 1994 entre a Companhia Carboniacutefera Belluno e 200
agricultores em 1995 envolvendo a Associaccedilatildeo Comunitaacuteria do Alto do
Rio Molha (ACARIMO) em Urussanga em 1996 o conflito entre
mineradores e agricultores no ldquoMorrordquo do Albino e Estevatildeo em
Criciuacutema (SILVA SCHEIBE 2005) em 1999 o conflito com a
Carboniacutefera Rio Deserto em Sideroacutepolis e em Iccedilara entre agricultores e
a Carboniacutefera Rio Deserto (NASCIMENTO BURSZTYN 2010) Em
2004 com a ocorrecircncia do furacatildeo Catarina o primeiro do Atlacircntico
Sul inaugura-se uma mobilizaccedilatildeo social que une a discussatildeo sobre a
mineraccedilatildeo do carvatildeo com a discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas e
justiccedila ambiental (SOacuteCIOS DA NATUREZA 2009 e 2005)
Historicamente na regiatildeo aqueles que tecircm o benefiacutecio econocircmico
42
geralmente natildeo arcam com os impactos negativos resultantes da
mineraccedilatildeo (MILIOLI 2009 NASCIMENTO BURSZTYN 2010)
Todavia os impactos natildeo necessariamente afetam apenas as populaccedilotildees
mais vulneraacuteveis do ponto de vista socioeconocircmico
O iacutendice meacutedio de mortalidade por neoplasias e doenccedilas
respiratoacuterias eacute superior ao resto do territoacuterio catarinense e ultrapassa a
meacutedia nacional Chama atenccedilatildeo tambeacutem o iacutendice de mortalidade de
menores de um ano por doenccedilas respiratoacuterias anomalias congecircnitas
notadamente no sistema nervoso incluindo anencefalia tambeacutem
superiores ao resto do paiacutes (MPF 2009) Os municiacutepios de Imbituba
Tubaratildeo Criciuacutema e Urussanga lideram os piores iacutendices de qualidade
do ar do Estado Existem tambeacutem muitos prejuiacutezos relacionados agrave sauacutede
da populaccedilatildeo De 1980 a 2004 foram 846 mortes causadas por doenccedilas
do aparelho respiratoacuterio nos municiacutepios de Criciuacutema Iccedilara Lauro
Muumlller Morro da Fumaccedila Sideroacutepolis Nova Veneza Urussanga
(MILIOLI 2009)
A mineraccedilatildeo no Sul em 2010 contava com 12 induacutestrias e
aproximadamente 4136 empregos diretos O principal destino do carvatildeo
(95) era o Complexo Termeleacutetrico Jorge Lacerda localizado no
municiacutepio de Capivari de Baixo administrado pela Tractebel
(SIECESC 2010) A Usina Termeleacutetrica Jorge Lacerda foi inaugurada
em 1965 entrando em operaccedilatildeo em 1966 com potecircncia instalada de 50
MW atualmente 856 MW com a incorporaccedilatildeo de mais unidades e
ampliaccedilatildeo da produccedilatildeo de energia eleacutetrica Em 1998 como parte dos
processos de privatizaccedilatildeo o Complexo Jorge Lacerda foi vendido para o
Grupo SuezTractebel (Beacutelgica) (GOULARTI FILHO MORAES
2004)
O Complexo Jorge Lacerda tem o compromisso da compra de
200 mil toneladas mensais de carvatildeo mineral A cadeia produtiva do
carvatildeo gera mais de seis mil empregos (na mineraccedilatildeo do carvatildeo
transporte e abastecimento do carvatildeo geraccedilatildeo de energia eleacutetrica e
extraccedilatildeo e transporte de cinzas) e eacute responsaacutevel por 70 da arrecadaccedilatildeo
de tributos municipais e por 75 da economia de Capivari de Baixo
(TRACTEBEL 2008)
A ampliaccedilatildeo de energia termeleacutetrica tornou-se uma possibilidade
atraveacutes da construccedilatildeo da Usina Termeleacutetrica Sul-Catarinense
(USITESC) Ela faz parte de uma realidade diferente se comparada ao
Complexo Termeleacutetrico Jorge Lacerda Enquanto o Complexo
Termeleacutetrico Jorge Lacerda foi construiacutedo num periacuteodo em que a
43
questatildeo da energia passava pela intervenccedilatildeo federal e estadual
(GOULARTI FILHO MORAES 2004) a USITESC vai ser construiacuteda
num periacuteodo de liberalizaccedilatildeo e privatizaccedilatildeo do setor eleacutetrico Ocorrem
ainda nesse intervalo de tempo a democratizaccedilatildeo e a criaccedilatildeo de espaccedilos
legais e institucionais motivados pela crescente preocupaccedilatildeo com
questotildees socioambientais (VAINER 2007) Todavia existem
dificuldades na articulaccedilatildeo entre os niacuteveis de planejamento e gestatildeo
(federal estadual regional municipal) especificidades da cultura
poliacutetica brasileira a degeneraccedilatildeo das instituiccedilotildees poliacuteticas e o vieacutes
tecno-burocraacutetico das poliacuteticas ambientais (VIEIRA 2006) Ao liberar
as forccedilas do capital das regulamentaccedilotildees do Estado o controle social
sobre os efeitos nocivos do uso exacerbado do meio ambiente pelos
interesses privados pode ser inviabilizado (ACSELRAD 1992b)
No que se refere agrave geraccedilatildeo de energia do Complexo Jorge
Lacerda a Tractebel natildeo sofre nenhum tipo de fiscalizaccedilatildeo O
Complexo Jorge Lacerda emite 42 milhotildees de toneladas de Dioacutexido de
Carbono (CO2) por ano (MONTEIRO 2008) A Fundaccedilatildeo do Meio
Ambiente (FATMA) autorizou a Tractebel a emitir 15667117
toneladasano de dioacutexido de enxofre Essa e as demais emissotildees
ultrapassam em muito os limites da Resoluccedilatildeo do Conselho Nacional do
Meio Ambiente (CONAMA) nordm 0890 e violam tambeacutem a Convenccedilatildeo da
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre a Mudanccedila do Clima da
qual o Brasil eacute signataacuterio Em 2009 o Ministeacuterio Puacuteblico Federal
determinou que a Tractebel Energia SA realize uma auditoria
ambiental uma vez que sua atuaccedilatildeo tem como base um estudo de
impacto ambiental feito em 1986 (MPF 2009)
Jaacute o relatoacuterio de impacto ambiental da USITESC foi questionado
pela sociedade civil organizada e em alguns pontos pelo Ministeacuterio
Puacuteblico (SANTOS 2011 DIAS 2011) Segundo Dias (2011) o estudo
de impacto ambientalrelatoacuterio de impacto ambiental considerou apenas
os impactos da implantaccedilatildeo da usina termeleacutetrica desconsiderando os
empreendimentos acessoacuterios (reservatoacuterio de aacutegua ramal da Ferrovia
Tereza Cristina linha de transmissatildeo e terminal de amocircnia no porto de
ImbitubaSC) Foram feitos estudos complementares e o Ministeacuterio
Puacuteblico corroborou o licenciamento ambiental emitido pela FATMA
Se os estudos de impacto ambiental e relatoacuterios de impacto
ambiental satildeo a base para as tomadas de decisatildeo aleacutem da qualidade
documental a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo em associaccedilotildees locais eacute uma
conquista democraacutetica importante mas a praacutetica permanece precaacuteria
44
(SAacuteNCHEZ 2008b AGRA FILHO 2010) na medida em que o campo
ambiental eacute ldquoconstituiacutedo por posiccedilotildees hieraacuterquicas e relaccedilotildees de poder
muito desiguaisrdquo (ZHOURI 2008 p 99) Os empresaacuterios enaltecem os
benefiacutecios sociais dos empreendimentos e o governo tem demonstrado
atitudes controvertidas nos espaccedilos de negociaccedilatildeo e decisatildeo As
audiecircncias puacuteblicas passam de ldquo() um instrumento de avaliaccedilatildeo da
sustentabilidade socioambiental das obras para ser mero instrumento
viabilizador de um projeto de sociedade que tem no meio ambiente um
recurso material a ser explorado economicamenterdquo (ZHOURI 2008 p
101) Outro risco que se corre para aleacutem da negociaccedilatildeo caso a caso eacute
lidar ldquoapenas com a manifestaccedilatildeo superficial de questotildees mais
fundamentais e enraizadas ndash os conflitos de valores e princiacutepios baacutesicos
relativos agrave gestatildeo dos recursosrdquo (ACSELRAD BEZERRA 2010 p
52) Ou seja a preocupaccedilatildeo socioambiental acaba muitas vezes
limitada ao processo de avaliaccedilatildeo de impacto ambiental de casos
isolados sem levar em conta uma discussatildeo ampla e bem informada
sobre alternativas ao estilo de desenvolvimento hegemocircnico
A regiatildeo Sul catarinense convive com um problema socioambiental
considerado grave a saber os impactos negativos decorrentes da
mineraccedilatildeo e do uso do carvatildeo mineral e a construccedilatildeo da USITESC
demonstram a insistecircncia nesse estilo de desenvolvimento Levando em
conta a situaccedilatildeo-problema aqui descrita a questatildeo norteadora dessa tese
foi assim formulada Por que apesar da evoluccedilatildeo do debate sobre os
impactos socioambientais da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral e dos avanccedilos institucionais relacionados agrave questatildeo ambiental o sistema de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral vem sendo
ampliado em Santa Catarina
Partindo dessa questatildeo norteadora satildeo apresentados a seguir o enfoque
analiacutetico e os principais conceitos que ajudaram a delimitar essa tese
Enfoque analiacutetico
Desde a emergecircncia social e cientiacutefica da problemaacutetica
socioambiental a partir da deacutecada de 1960 podemos destacar avanccedilos
conceituais que se somam a progressos no conhecimento empiacuterico
sobre os problemas e ameaccedilas socioambientais e avanccedilos institucionais
da questatildeo ambiental Apesar dos avanccedilos os desafios da problemaacutetica
45
socioambiental satildeo ineacuteditos e possuem implicaccedilotildees epistemoloacutegicas
eacuteticas e poliacuteticas
O ecodesenvolvimento tem sido o ponto de confluecircncia dessa
reflexatildeo Mencionado pela primeira vez no acircmbito da Conferecircncia de
Estocolmo foi utilizado no decorrer da deacutecada de 1970 sendo
progressivamente marginalizado na deacutecada seguinte considerado como
um enfoque demasiadamente criacutetico e radical pela ideologia neoliberal
(SACHS 1986 VIEIRA 2006) O enfoque analiacutetico aqui apresentado
resgata o enfoque ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento enfatizando suas
trecircs dimensotildees (i) recursos naturais (ii) espaccedilo-territoacuterio e (iii) habitat
(compreendido como qualidade de vida)
No que se refere agrave primeira dimensatildeo satildeo consideradas as
contribuiccedilotildees do enfoque da gestatildeo de recursos comuns que vecircm
permeando o debate sobre os modos de apropriaccedilatildeo e gestatildeo No que diz
respeito agrave segunda dimensatildeo traz-se o enfoque do ecodesenvolvimento
territorial como uma possibilidade de operacionalizar o enfoque de
ecodesenvolvimento Por fim as contribuiccedilotildees agrave dimensatildeo do haacutebitat a
partir do enfoque de justiccedila ambiental e ecoloacutegica entendido como
capaz de contribuir na avaliaccedilatildeo da distribuiccedilatildeo dos benefiacutecios dos
riscos e danos ambientais assim como na reflexatildeo sobre redistribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo nas relaccedilotildees entre os seres humanos
destes com o meio ambiente com as futuras geraccedilotildees espeacutecies natildeo
humanas e processos ecossistecircmicos
O enfoque da gestatildeo de recursos comuns atraveacutes do Institutional Framework for Policy Analysis and Design (IAD) adaptado por
Oakerson (1992) oferece atraveacutes de quatro macro variaacuteveis uma forma
de descrever a gestatildeo de um dado recurso os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso as regras em uso que orientam a interaccedilatildeo dos
envolvidos na gestatildeo a arena de accedilatildeo que compreendem os espaccedilo nos
quais os envolvidos se relacionam e os resultados e consequecircncias da
gestatildeo A relaccedilatildeo entre essas macro variaacuteveis eacute dinacircmica e as mudanccedilas
da gestatildeo envolvem o aprendizado social adaptativo que se incorpora
ao modelo a partir das contribuiccedilotildees recentes do enfoque da cogestatildeo
adaptativa (ARMITAGE et al 2009 PLUMMER 2009 HOLLING
2001 BERKES 2009 CUNDILL 2010) Esse enfoque eacute importante
para o problema desta tese porque a descriccedilatildeo e anaacutelise das macro
variaacuteveis possibilita um diagnoacutestico e uma compreensatildeo mais ampla do
problema bem como um prognoacutestico avaliando estrateacutegias passiacuteveis de
serem colocadas em accedilatildeo visando a resoluccedilatildeo do problema inicial
46
A fim de complementar o enfoque da gestatildeo de recursos comuns
o enfoque do ecodesenvolvimento territorial reforccedila a ideia de que a
gestatildeo de recursos comuns deve ser analisada junto ao estilo de
desenvolvimento Para aleacutem da situaccedilatildeo especiacutefica do recurso
encontram-se as opccedilotildees de desenvolvimento que influenciam as macro
variaacuteveis acima listadas em todas as escalas espaciais do local ao global
(VIEIRA 2006)
Os enfoques da justiccedila ambiental e da justiccedila ecoloacutegica por sua
vez trazem a indissociabilidade da questatildeo ambiental e da questatildeo
democraacutetica enfatizando o fortalecimento do sistema democraacutetico como
condiccedilatildeo para a aprendizagem social adaptativa e como um caminho
para a reflexatildeo-accedilatildeo criacutetica em relaccedilatildeo agrave gestatildeo de recursos comuns e agraves
opccedilotildees de desenvolvimento A democracia (representativa e
participativa) eacute um ldquoelemento dardquo e uma ldquocondiccedilatildeo parardquo a justiccedila
ambiental e ecoloacutegica (SCHLOSBERG 2009)
No sistema democraacutetico eacute preciso identificar os mecanismos de
produccedilatildeo da injusticcedila ambiental entendida como distribuiccedilatildeo
desproporcional dos riscos e danos ambientais proteccedilatildeo ambiental
desigual e acesso desigual aos recursos naturais A justiccedila ambiental
centraliza sua anaacutelise na redistribuiccedilatildeo (que remete a aspectos
econocircmicos) e a justiccedila ecoloacutegica complementa com outras duas
dimensotildees o reconhecimento (que remete a aspectos culturais) e a
representaccedilatildeo (que remete a aspectos poliacuteticos) (FRASER 2009 2007
SCHLOSBERG 2009) A ampliaccedilatildeo da democracia e
consequentemente do aprendizado social adaptativo envolve estrateacutegias
dos segmentos sociais que considerem essas duas dimensotildees
Dessa forma o enfoque central utilizado nessa tese o
ecodesenvolvimento conta com as contribuiccedilotildees da gestatildeo de recursos
comuns do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila ambiental e da
justiccedila ecoloacutegica Mesmo diante da situaccedilatildeo-problema apresentada na
qual os problemas tendem a se acirrar com a ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica a combinaccedilatildeo dos enfoques permite aleacutem de um
diagnoacutestico visando compreender o problema a possibilidade de
atraveacutes do exame das dinacircmicas de desenvolvimento do sistema
democraacutetico e da aprendizagem social adaptativa identificar avanccedilos e
margens de manobra junto aos segmentos sociais que possibilitem o
questionamento da situaccedilatildeo e seu enfrentamento
47
Questotildees norteadoras
Por que apesar da evoluccedilatildeo do debate sobre os impactos
socioambientais da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral e dos avanccedilos
institucionais relacionados agrave questatildeo ambiental o sistema de geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral vem sendo ampliado em
Santa Catarina
Para auxiliar a questatildeo norteadora constam ainda as seguintes questotildees auxiliares
Quais condicionantes levam agrave ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica no Brasil e em Santa Catarina
Como as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento influenciam
as accedilotildees coletivas dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais
De que maneira os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais se
articulam para que a atividade carboniacutefera se mantenha e se
amplie
Como se deu o processo de licenciamento da Usitesc
Como se manifestam os problemas de reconhecimento e
representaccedilatildeo no processo de licenciamento
As accedilotildees coletivas estudadas tecircm gerado oportunidades para
processos de aprendizagem social adaptativa
Haacute indiacutecios de uma possiacutevel rota para uma democracia que
permita que os segmentos sociais intervenham efetivamente em
debates cada vez mais mediados por uma ciecircncia e tecnologia a
serviccedilo dos projetos dos segmentos econocircmicos e respaldados
pelos segmentos poliacuteticos
Hipoacuteteses
Partindo do pressuposto de que a democracia representativa e
participativa eacute um ldquoelemento dardquo e uma ldquocondiccedilatildeo parardquo a
justiccedila social ambiental e ecoloacutegica a falta de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e de representaccedilatildeo nos processos democraacuteticos
seria uma condiccedilatildeo favoraacutevel agrave produccedilatildeo de injusticcedila ambiental
48
e ecoloacutegica Dessa forma a hipoacutetese sustentada aqui eacute de que o
processo poliacutetico que resulta na ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica envolve problemas de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo nos processos democraacuteticos em
todas as escalas espaciais (nacional estadual regional e local)
tanto na modalidade representativa quanto na modalidade
participativa
A tomada de consciecircncia dos limites da democracia
representativa e da democracia participativa faz com que os
segmentos sociais passem a investir em accedilotildees autocircnomas
favorecendo a aprendizagem social adaptativa
Objetivos
Compreender as contradiccedilotildees inerentes agrave ampliaccedilatildeo do sistema de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral no Sul de
Santa Catarina agrave luz do enfoque hiacutebrido envolvendo gestatildeo de recursos
comuns ecodesenvolvimento territorial e justiccedila ambiental e ecoloacutegica
Como objetivos especiacuteficos destacam-se
Apontar as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento que
influenciam as accedilotildees coletivas dos segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais envolvidos na gestatildeo do carvatildeo mineral
Descrever a gestatildeo de recursos comuns no Brasil e em Santa
Catarina com ecircnfase no carvatildeo mineral
Compreender a maneira como os segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais envolvidos na gestatildeo se articulam em
relaccedilatildeo agrave gestatildeo de recursos comuns
Descrever o processo de licenciamento da Usitesc
Reconhecer os problemas de distribuiccedilatildeo reconhecimento e
representaccedilatildeo no processo de licenciamento e nas audiecircncias
puacuteblicas
Verificar ldquoserdquo e ldquocomordquo as accedilotildees coletivas estudadas tecircm
gerado oportunidades para processos de aprendizagem social
adaptativa e
49
Reconhecer indiacutecios de uma possiacutevel rota para uma democracia
que permita que os segmentos sociais intervenham efetivamente
em debates cada vez mais mediados por uma ciecircncia e
tecnologia a serviccedilo dos projetos dos segmentos econocircmicos e
respaldados pelos segmentos poliacuteticos
Justificativa
Satildeo muitos os caminhos que levam ateacute o tema e o problema da
tese Desde a apresentaccedilatildeo do projeto na ocasiatildeo do processo seletivo
da qualificaccedilatildeo agrave defesa e depois O permanente refletir duvidar
reconstruir o que se cristaliza no papel e vai aleacutem dele A aacuterdua tarefa de
tentar traduzir em palavras a dinacircmica complexa da qual todas e todos
satildeo parte
O tema do planejamento do desenvolvimento me acompanha
desde o mestrado e na ocasiatildeo da seleccedilatildeo do doutorado apresentei um
projeto cujo tema era planejamento e aquecimento global Nos anos
subsequentes nas oportunidades que tive para debater o projeto fui
desafiada a trazer o tema para a realidade do estado de Santa Catarina
E seguindo essa intuiccedilatildeo a partir da pesquisa exploratoacuteria entrei em
contato com o Manifesto por Justiccedila Climaacutetica formulado por
movimentos sociais do Sul de Santa Catarina que trazia a reflexatildeo sobre
as mudanccedilas climaacuteticas e a exploraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral para
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica no Sul de Santa Catarina Tive tambeacutem a
oportunidade de participar de uma saiacuteda de campo na bacia carboniacutefera
e ter contato direto com os impactos causados pela mineraccedilatildeo Essas
experiecircncias e as leituras foram gradativamente me ajudando a definir
o tema e o problema desta tese
Existe muito material jaacute produzido sobre a trajetoacuteria de
desenvolvimento e os impactos decorrentes da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo
mineral no Sul de Santa Catarina Aqui se objetivou uma breve siacutentese
de dados e de parte do material jaacute produzido pois a ecircnfase desta tese
recaiu sobre a identificaccedilatildeo de incoerecircncias na relaccedilatildeo entre as questotildees ambientais e o sistema democraacutetico mostrando que o funcionamento do
sistema poliacutetico eacute parte do problema e que as margens de manobra
existentes podem ser mais bem exploradas pelos movimentos sociais
que atuam na regiatildeo Como jaacute foi assinalado anteriormente apesar da
possibilidade de ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a
50
carvatildeo mineral no Sul de Santa Catarina o cenaacuterio atual eacute de
aguccedilamento dos conflitos bem maior do que nas deacutecadas anteriores
Nesse sentido a construccedilatildeo da USITESC eacute mais um elo de um
segmento que tem historicamente um caraacuteter eminentemente destrutivo
do ponto de vista socioecoloacutegico Resta confirmar se isto eacute um destino
inexoraacutevel em funccedilatildeo das caracteriacutesticas especiacuteficas da regiatildeo ou se
pode ser mudado num contexto de questionamento da loacutegica subjacente
agraves dinacircmicas do sistema democraacutetico que envolvem decisotildees sobre as
poliacuteticas ambientais energeacuteticas e poliacuteticas de desenvolvimento
No plano teoacuterico a contribuiccedilatildeo desta tese inscreve-se no
aprofundamento teoacuterico do enfoque ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento
agregando as contribuiccedilotildees dos enfoques da gestatildeo de recursos comuns
do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila ambiental e da justiccedila
ecoloacutegica O esforccedilo de juntar enfoques se justificou na medida em que
se um dos condicionantes da problemaacutetica socioambiental eacute a
fragmentaccedilatildeo do problema e a dificuldade de concebecirc-lo como
problema complexo (GARCIacuteA 1994) religar as perspectivas segundo
as quais observamos e analisamos a realidade faz parte tambeacutem das
estrateacutegias para o enfrentamento do problema
Dessa forma o diaacutelogo entre enfoques trouxe pontos de reflexatildeo
diferentes que enriqueceram a anaacutelise ao enfoque da gestatildeo de recursos
comuns a questatildeo das dinacircmicas de desenvolvimento e do sistema
poliacutetico ao ecodesenvolvimento territorial a preocupaccedilatildeo com a gestatildeo
de recursos comuns e com a desigualdade ambiental e agrave justiccedila
ambiental e ecoloacutegica a atenccedilatildeo agraves dinacircmicas de desenvolvimento e agrave
gestatildeo de recursos comuns Um ponto que merece destaque eacute o esforccedilo
recente das pesquisas sobre gestatildeo de recursos comuns e justiccedila
ambiental e ecoloacutegica de aplicar os enfoques para tratar as
especificidades do caso brasileiro Esta tese se inscreve como parte
desse esforccedilo
Outro ponto importante eacute a junccedilatildeo dos temas democracia e meio
ambiente no Brasil A democracia foi e eacute sem duacutevida um tema muito
caro agrave Sociologia brasileira e a inclusatildeo de um tema mais recente (o
meio ambiente) tambeacutem eacute considerada uma contribuiccedilatildeo possiacutevel dessa tese
Vale a pena ressaltar ainda que essa tese se insere nas atividades
realizadas pelos integrantes do Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio
Ambiente e Desenvolvimento (NMD) vinculado ao Programa de Poacutes-
51
Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica O Nuacutecleo atua no litoral Centro Sul
de Santa Catarina haacute mais de dez anos Dentre as atividades
desenvolvidas pelo NMD inclui-se a participaccedilatildeo no Observatoacuterio do
Litoral Catarinense que tem como objetivo
Organizar e coordenar uma rede de apoio teacutecnico-
cientiacutefico ao Ministeacuterio Puacuteblico Federal e
Estadual tendo em vista a promoccedilatildeo de um estilo
de gestatildeo democraacutetico-participativa de conflitos
relacionados agrave apropriaccedilatildeo dos recursos
ambientais existentes na zona costeira e o
consequente fortalecimento da cidadania
ambiental no Paiacutes (OBSERVATOacuteRIO DO
LITORAL 2010)
Como parte das atividades do Observatoacuterio do Litoral
Catarinense a realizaccedilatildeo de pesquisas sobre meio ambiente e
desenvolvimento auxilia na elaboraccedilatildeo de diagnoacutesticos e prognoacutesticos e
pode favorecer a mobilizaccedilatildeo jaacute que a visibilidade dos problemas
existentes pode estimular a criaccedilatildeo de redes visando a criaccedilatildeo de
estrateacutegias integradas para enfrentamento dos problemas
Essa tese tambeacutem faz parte de um esforccedilo mais amplo de
pesquisa articulado pelo edital da Coordenadoria de Aperfeiccediloamento de
Pessoal de Niacutevel Superior (CAPES) Ciecircncias do Mar tendo como tema
a Gestatildeo Integrada e Compartilhada de Territoacuterios Marinho-Costeiros O projeto possibilitou o compartilhamento do objeto de estudo do
marco conceitual e epistecircmico e a articulaccedilatildeo dos estudos entre os
membros da equipe
Em siacutentese dentre os possiacuteveis aspectos inovativos do trabalho
destacam-se do ponto de vista praacutetico o olhar sobre a questatildeo da
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral a partir do
funcionamento do sistema democraacutetico a identificaccedilatildeo dos
condicionantes da ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica em
diferentes escalas e consequentemente o reconhecimento de limites e
das possibilidades do sistema democraacutetico e da aprendizagem social
adaptativa Do ponto de vista teoacuterico destacam-se o diaacutelogo entre os
enfoques e a aplicaccedilatildeo dos enfoques agraves especificidades brasileiras
Metodologia
52
O agravamento dos problemas socioambientais tem povoado o
debate nos campos de especializaccedilatildeo cientiacutefica seja para a criaccedilatildeo de
novas disciplinas seja para ir aleacutem da fragmentaccedilatildeo disciplinar ldquoA
problemaacutetica socioambiental constituiacute um vigoroso instrumento de
integraccedilatildeo de conceitos teorias e meacutetodos desenvolvidos em
praticamente todas as especialidades cientiacuteficasrdquo (VIEIRA 1993 p
26) A epistemologia das ciecircncias ambientais entra como uma
importante contribuiccedilatildeo para a pesquisa ambiental Ela considera a
complexidade inerente agrave crise socioambiental privilegiando uma visatildeo
integrada do problema socioecoloacutegico e da ciecircncia no acircmbito do novo
paradigma sistecircmico Neste sentido a busca de integraccedilatildeo inter e
transdisciplinar do conhecimento emerge como um elemento essencial
no enfrentamento da crise (GARCIacuteA 1994 JOLLIVET PAVEacute 2000
MORIN 2002)
A tese aqui apresentada se insere nesse esforccedilo de pesquisa Para
tanto a construccedilatildeo da tese considerou sete etapas (a pergunta de partida
a exploraccedilatildeo a problemaacutetica a construccedilatildeo do modelo de anaacutelise a
observaccedilatildeo a anaacutelise das informaccedilotildees e as conclusotildees) segundo os trecircs
princiacutepios do procedimento cientiacutefico em ciecircncias sociais (ruptura
construccedilatildeo e verificaccedilatildeo) (BOURDIEU CHAMBOREDON
PASSERON 2004 QUIVY CAMPENHOUDT 1998)
Apesar de haver uma sequecircncia loacutegica as etapas subsequentes
influenciaram a reelaboraccedilatildeo das etapas precedentes As etapas
estiveram ao longo do processo em permanente interaccedilatildeo (QUIVY
CAMPENHOUDT 1998)
Se eacute evidente que os automatismos adquiridos
podem permitir a economia de uma invenccedilatildeo
permanente devemos nos abster de deixar crer
que o sujeito da invenccedilatildeo cientiacutefica eacute um
automaton spirituale obedecendo aos
mecanismos bem ajustados de uma programaccedilatildeo
metodoloacutegica constituiacuteda uma vez por todas e
confinar dessa forma o pesquisador na submissatildeo
cega ao programa que exclui o retorno reflexivo
ao mesmo condiccedilatildeo da invenccedilatildeo de novos
programas (BOURDIEU CHAMBOREDON
PASSERON 2004 p 15)
53
Dessa forma a evoluccedilatildeo dessa tese natildeo foi linear As quatro
primeiras etapas (a pergunta de partida a exploraccedilatildeo a problemaacutetica e a
construccedilatildeo do modelo de anaacutelise) jaacute apresentadas nessa introduccedilatildeo satildeo
tratadas a seguir de forma a indicar como se deu o processo de sua
construccedilatildeo
1ordf etapa (A pergunta de partida) Foi sendo elaborada e
reelaborada ao longo das vaacuterias etapas da pesquisa
2ordf etapa (A exploraccedilatildeo) Essa etapa compreendeu conversas com
o orientador leituras e entrevistas exploratoacuterias Nessa etapa destacou-se
uma saiacuteda de campo no ano de 2010 agrave Bacia do Rio Araranguaacute
supervisionada pelo Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes e Profordf Drordf
Vanilde Citadini Zanette da Universidade do Extremo Sul Catarinense
(UNESC) Essa saiacuteda de campo foi fundamental para despertar o
interesse pelo problema da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral no Sul do
Estado
Foi feita uma entrevista exploratoacuteria com Tadeu Santos da
Organizaccedilatildeo Natildeo Governamental (ONG) Soacutecios da Natureza com sede
em Araranguaacute e conversas informais com estudantes da Poacutes-Graduaccedilatildeo
em Auditoria e Periacutecia Ambiental da UNESC em 2010 e 2012
Etapa 3 (A problemaacutetica) e Etapa 4 (A construccedilatildeo do modelo de
anaacutelise) Destacam-se tambeacutem nessa fase aleacutem das conversas com o
orientador as leituras e o esforccedilo de preparaccedilatildeo do projeto para
qualificaccedilatildeo que ocorreu em 2011 contando com as contribuiccedilotildees do
Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes da UNESC do Prof Dr Luiz
Fernando Scheibe do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Geografia da
Universidade Federal de Santa Catarina e da Profordf Drordf Janice Pontes
Tirelli do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica da UFSC
O projeto foi tambeacutem discutido no acircmbito do NMD em alguns
seminaacuterios de pesquisa na disciplina de Ecologia Humana (ministrada
pela ProfordfDrordf Marcia Grisotti e pelo Prof Dr Fernando Dias Aacutevila
Pires) em 2010 nas duas disciplinas de seminaacuterio de pesquisa uma
ministrada pela Profordf Drordf Elizabeth Farias da Silva (na qual o projeto
foi debatido pelo Prof Dr Daniel Silva) e outra ministrada pelo Prof
Dr Raul Burgos no ano de 2011 O projeto tambeacutem foi apresentado e debatido no Nuacutecleo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional (NPDR)
da Universidade Regional de Blumenau (FURB) coordenado pelo Prof
Dr Ivo Marcos Theis e em dois eventos do Projeto Gestatildeo Integrada e Compartilhada de Territoacuterios Marinho-Costeiros em 2011 e 2012
54
Etapa 5 ndash A observaccedilatildeo Nessa etapa o modelo de anaacutelise foi
submetido aos fatos e confrontado com os dados observaacuteveis Aqui satildeo
respondidas as questotildees baacutesicas o que foi observado Em que observou-se E como observou-se
O procedimento da pesquisa foi bibliograacutefico e documental Na
pesquisa bibliograacutefica foram selecionadas fontes secundaacuterias (obras e
artigos) que tratavam do tema de estudo jaacute reconhecidas no domiacutenio
cientiacutefico e na pesquisa documental foram priorizadas fontes primaacuterias
(escritas e audiovisuais) que ateacute entatildeo natildeo haviam recebido tratamento
cientiacutefico (SAacute-SILVA ALMEIDA GUIDANI 2009)
Os discursos da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo
Mineral foram acessados atraveacutes de consulta agrave Cacircmara de Deputados
pelo correio eletrocircnico Os dados sobre prestaccedilatildeo de contas eleitorais
foram acessados atraveacutes do banco de dados online do TSE O processo
de licenciamento da USITESC arquivado na FATMA conta com oito
volumes e 1617 paacuteginas e com arquivos audiovisuais de duas das quatro
audiecircncias puacuteblicas (FATMA 2013) Das quatro audiecircncias puacuteblicas
realizadas soacute foram disponibilizadas as gravaccedilotildees da terceira e da quarta
audiecircncia (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006 2007) Segundo informaccedilatildeo
da FATMA a primeira e a segunda audiecircncia puacuteblica foram gravadas em
VHS e foram danificadas pela accedilatildeo do tempo
A descriccedilatildeo das macro variaacuteveis (as dinacircmicas de
desenvolvimento os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos as regras em uso a
arena de accedilatildeo e os resultadosconsequecircncias) foi feita atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica a fontes secundaacuterias (obras e artigos) Jaacute a
variaacutevel do sistema democraacutetico contou com fontes primaacuterias os
discursos da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral na
Cacircmara dados sobre prestaccedilatildeo de contas eleitoral do Tribunal Superior
Eleitoral e os documentos referentes ao processo de licenciamento
ambiental da USITESC arquivados na FATMA
Na arena de accedilatildeo um primeiro passo foi descrever os envolvidos
na gestatildeo Para tanto os envolvidos foram divididos em segmentos
poliacuteticos econocircmicos e sociais que por sua vez foram subdivididos Os
segmentos poliacuteticos em executivo parlamento e autocircnomo os segmentos econocircmicos em associaccedilotildees empresariais e mistas e empresas
e cooperativas e os segmentos sociais em trabalhadores
afetadosatingidosameaccedilados ONG e academia (Quadro 1) Os
segmentos natildeo apresentam um posicionamento homogecircneo em relaccedilatildeo
ao tema da tese Ao longo do texto a preocupaccedilatildeo eacute tambeacutem de
55
explicitar os diferentes posicionamentos entre e no interior de cada
segmento
Quadro 1 ndash Divisatildeo dos envolvidos na gestatildeo por segmentos SEGMENTOS ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO
Poliacuteticos Executivo
Parlamento
Autocircnomo
Econocircmicos Associaccedilotildees empresariais e mistas
Empresas
Cooperativas
Sociais Trabalhadores
AfetadosAtingidosAmeaccedilados
Organizaccedilotildees Natildeo Governamentais
Academia
Fonte baseada em Oliveira (2013)
A existecircncia de afetados atingidos e ameaccedilados se inscreve no
reconhecimento e legitimaccedilatildeo de direitos A legislaccedilatildeo ambiental faz
com que os impactos passem a ser considerados e se existem impactos
existem seres humanos que satildeo afetados atingidos e ameaccedilados
(VAINER 2008) A distinccedilatildeo entre os termos afetados atingidos e
ameaccedilados remete agrave proximidade dos seres humanos em relaccedilatildeo aos
impactos Nos afetados o impacto fica num limiar tecircnue entre o direto e
indireto nos atingidos o impacto eacute direto e nos ameaccedilados o impacto eacute
potencialmente indireto
Uma variaacutevel importante na arena de accedilatildeo eacute a democracia que
por sua vez envolve a questatildeo da representaccedilatildeo e da participaccedilatildeo A
expressatildeo cidadatilde atraveacutes da representaccedilatildeo se daacute principalmente nas
eleiccedilotildees plebiscitos e conselhos Jaacute a expressatildeo mediante participaccedilatildeo
pode ser accedilatildeo sob convite (planejamento participativo consulta puacuteblica
e mediaccedilatildeo) e accedilatildeo autocircnoma (lobby peticcedilotildees manifestaccedilotildees
campanhas na imprensa outros) (Figura 1) (SAacuteNCHEZ 2008b)
56
Figura 1ndash Tipologia das formas de expressatildeo do cidadatildeo numa
democracia
Fonte Adaptado de Sagravenchez (2008b p 409)
Na anaacutelise do sistema democraacutetico foi importante identificar as
dimensotildees da justiccedila ambiental (redistribuiccedilatildeo) e da justiccedila ecoloacutegica
(reconhecimento e representaccedilatildeo) ldquoO natildeo reconhecimento eacute uma
questatildeo de impedimentos externamente manifestados e publicamente
verificaacuteveis a que certos indiviacuteduos sejam membros integrais da
sociedaderdquo (FRASER 2007 p 114) O centro normativo da concepccedilatildeo
de Fraser (2007) eacute a paridade de participaccedilatildeo que demanda uma
condiccedilatildeo objetiva e outra intersubjetiva A condiccedilatildeo objetiva ldquoexclui formas e niacuteveis de desigualdade material e dependecircncia econocircmica que
impedem a paridade de participaccedilatildeordquo (FRASER 2007 p 119) A
condiccedilatildeo intersubjetiva ldquoexclui normas institucionalizadas que
sistematicamente depreciam algumas categorias de pessoas e as
caracteriacutesticas associadas a elasrdquo (FRASER 2007 p 120)
57
Quadro 2 - Quadro de anaacutelise do sistema democraacutetico agrave luz da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica
DIMENSOtildeES DO SISTEMA
DEMOCRAacuteTICO
ESTRATEacuteGIAS DA JUSTICcedilA
AMBIENTAL E ECOLOacuteGICA
- Redistribuiccedilatildeo
- Reconhecimento e
- Representaccedilatildeo
- Produccedilatildeo do conhecimento proacuteprio
- Pressatildeo pela aplicaccedilatildeo universal das
leis
- Pressatildeo pelo aperfeiccediloamento da
legislaccedilatildeo de ambiental
- Pressatildeo por novas racionalidades no
exerciacutecio do poder estatal
- Introduccedilatildeo de procedimentos de
avaliaccedilatildeo de equidade ambiental
- Accedilatildeo direta e difusatildeo espacial do
movimento
Fonte Adaptado de Acselrad Mello Bezerra (2009) e Fraser (2009
2007)
As dimensotildees e estrateacutegias da justiccedila ambiental e ecoloacutegica
presentes no Quadro acima entraram no modelo de anaacutelise dessa tese
como indicadores da aprendizagem social adaptativa
Quanto aos meacutetodos de anaacutelise priorizou-se a anaacutelise estatiacutestica e
a anaacutelise do discurso Anaacutelise estatiacutestica privilegiou a interpretaccedilatildeo dos
dados atraveacutes do modelo de anaacutelise buscando ir aleacutem da mera exposiccedilatildeo
de resultados A anaacutelise do discurso aqui proposta ficou num limiar
entre essa modalidade e a anaacutelise de conteuacutedo As categorias utilizadas
estatildeo dispostas no quadro da paacutegina 56 Elas orientaram a seleccedilatildeo de
passagens relevantes nas audiecircncias puacuteblicas analisadas com o
propoacutesito de revelar aspectos da atividade cognitiva do locutor dos
significados sociais e poliacuteticos do discurso (GILL 2002 QUIVY
CAMPENHOUDT 1998 RESENDE RAMALHO 2006)
O processo da tese aqui descrito natildeo foi linear Para Quivy e
Campenhoudt (1998 p 236) ldquoum processo de diaacutelogo e de vaiveacutens
permanentes entre teoria e empirismo mas tambeacutem entre construccedilatildeo e
intuiccedilatildeo que estatildeo mais imbricadasrdquo
As etapas 6 e 7 (Anaacutelise de informaccedilotildees e Conclusotildees)
correspondem ao ldquocorpordquo da tese apresentado na sequecircncia
58
Estrutura da tese
Essa tese foi dividida em sete capiacutetulos O primeiro capiacutetulo eacute
esta introduccedilatildeo dedicada agrave siacutentese dos principais pontos que nortearam a
tese O segundo capiacutetulo busca resgatar a contribuiccedilatildeo do enfoque
ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento agregando com o enfoque da gestatildeo
de recursos comuns do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica elementos que satildeo incorporados no modelo de
anaacutelise e que conferem uma atualidade maior agrave discussatildeo No terceiro
capiacutetulo e quarto capiacutetulo eacute feita uma descriccedilatildeo da gestatildeo de recursos
comuns do Brasil e de Santa Catarina enfatizando as particularidades do
carvatildeo mineral A preocupaccedilatildeo presente nos dois capiacutetulos eacute de realizar
um balanccedilo dos fatores que estimulam a ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral e os fatores que podem favorecer
o questionamento da ampliaccedilatildeo bem como tratar dos limites e
possibilidades do sistema democraacutetico e possibilidades de aprendizagem
social adaptativa O quinto capiacutetulo trata da rede de influecircncia entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos no campo da democracia
representativa tratando a relaccedilatildeo entre doaccedilotildees de campanha e apoio
poliacutetico a causa do carvatildeo mineral O sexto capiacutetulo trata da ampliaccedilatildeo
da energia termeleacutetrica atraveacutes do caso da USITESC no Sul de Santa
Catarina buscando atraveacutes da anaacutelise do processo de licenciamento
compreender os condicionantes locais da ampliaccedilatildeo O seacutetimo e uacuteltimo
capiacutetulo faz uma siacutentese dos principais pontos discutidos na tese
2 A ATUALIDADE DO ECODESENVOLVIMENTO NO ESTUDO
CONTEMPORAcircNEO SOBRE GESTAtildeO DE RECURSOS
COMUNS
O surgimento de uma problemaacutetica de pesquisa envolve o
amadurecimento dos olhares com os quais se observa analisa e
empreende esforccedilos para transformar a realidade A problemaacutetica
socioambiental natildeo surge em um lugar especiacutefico e num tempo
determinado Surge em paiacuteses diferentes em eacutepocas diferentes As
formas variadas de delimitaccedilatildeo da situaccedilatildeo-problema e da construccedilatildeo da
problemaacutetica correspondente envolvem as diferentes percepccedilotildees dos
cidadatildeos bem como o protagonismo dos foacuteruns locais e movimentos
sociais o envolvimento da comunidade cientiacutefica e a busca de respostas
poliacuteticas agrave altura dos desafios identificados
No final da deacutecada de 1960 a problemaacutetica socioambiental
assume um perfil de crise global ensejando a realizaccedilatildeo de vaacuterios
eventos sobre o tema Numa visatildeo retrospectiva e criacutetica do surgimento
do Clube de Roma em 1968 agrave realizaccedilatildeo da Rio +20 em 2012 muitos
avanccedilos e retrocessos podem ser apontados no espectro que se estende
do questionamento radical do estilo de desenvolvimento hegemocircnico
visto como condicionante da crise socioambiental agrave incorporaccedilatildeo da
crise soacutecio ecoloacutegica na reproduccedilatildeo da loacutegica economicista no campo do
planejamento e da gestatildeo das experiecircncias de gestatildeo dos recursos
comuns agrave caracterizaccedilatildeo da Trageacutedia dos Comuns (HARDIN 1980)
das denuacutencias de injusticcedila ambiental e ecoloacutegica agrave constataccedilatildeo da
violecircncia estrutural embutida na persistecircncia das assimetrias de riqueza
e poder envolvendo os dois hemisfeacuterios (ESTEVA 2001 FENNY et
al 2001 SACHS 1993)
Desde sua origem um desafio que acompanha essa problemaacutetica
refere-se agrave dificuldade de se lidar (na pesquisa cientiacutefica e nos espaccedilos
de tomada de decisatildeo poliacutetica) com dinacircmicas natildeo lineares de
dinamizaccedilatildeo socioeconocircmica e recriaccedilatildeo cultural envolvendo para tanto
a coordenaccedilatildeo de processos transescalares num horizonte de
planejamento de longo prazo Neste contexto vem se tornando cada vez mais evidente a capacidade ainda bastante restrita de cientistas gestores
e agentes governamentais de compreender e tratar a complexidade
inerente agrave teia de interdependecircncias que configura a coordenaccedilatildeo da
dinacircmica de sistemas socioecoloacutegicos que envolve diferentes niacuteveis e
escalas espaciais (BERKES FOLKE 1998 CASHet al 2006)
60
Levando em conta essas consideraccedilotildees gerais o objetivo deste
capiacutetulo eacute discutir a atualidade do enfoque de ecodesenvolvimento e por
implicaccedilatildeo da necessidade de dotaacute-lo da capacidade de assegurar a
coerecircncia das regras que norteiam a gestatildeo dos modos de apropriaccedilatildeo
dos recursos comuns nas diferentes escalas espaciais Parte-se assim da
premissa segundo a qual a efetividade de experiecircncias compatiacuteveis com
os fundamentos deste enfoque dependeraacute de uma consideraccedilatildeo mais
precisa do papel da democracia e da aprendizagem social adaptativa nos
processos de gestatildeo de recursos comuns Para tanto leva-se em conta o
lento processo de elaboraccedilatildeo do enfoque ldquoclaacutessicordquo de
ecodesenvolvimento com a incorporaccedilatildeo sucessiva dos debates sobre (i)
gestatildeo de recursos comuns (ii) ecodesenvolvimento territorial e (iii)
justiccedila ambiental e ecoloacutegica
Em siacutentese defende-se o ponto de vista segundo o qual a gestatildeo
de recursos comuns internaliza os criteacuterios de promoccedilatildeo da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica na produccedilatildeo-reproduccedilatildeo-superaccedilatildeo da siacutendrome
de violecircncia estrutural que caracteriza a dinacircmica de globalizaccedilatildeo
assimeacutetrica Por sua vez o enfoque de ecodesenvolvimento territorial
focaliza este debate de uma perspectiva mais ampla insistindo na
complexidade envolvida na construccedilatildeo de dinacircmicas territoriais de
desenvolvimento ecologicamente prudente no atual cenaacuterio ldquopoacutes-
fordistardquo
O capiacutetulo estaacute dividido em quatro seccedilotildees contando com essa
introduccedilatildeo A seccedilatildeo seguinte delineia o contexto de emergecircncia da
problemaacutetica socioambiental e do enfoque de ecodesenvolvimento Na
sequecircncia satildeo apresentadas as dimensotildees do conceito sistecircmico de meio
ambiente assumidas pelos estudiosos do ecodesenvolvimento
relacionando-as com as maneiras pelas quais as linhas de reflexatildeo sobre
gestatildeo de recursos comuns ecodesenvolvimento territorial e justiccedila
ambiental e ecoloacutegica focalizam suas anaacutelises Finalmente na quarta
seccedilatildeo avaliam-se as possibilidades e os limites de um esforccedilo de
hibridizaccedilatildeo dessas vaacuterias linhas de reflexatildeo tendo em vista uma
caracterizaccedilatildeo mais rigorosa do conceito de co-gestatildeo adaptativa face agraves
novas configuraccedilotildees do processo de globalizaccedilatildeo econocircmica e cultural
61
21 RESGATE DO ENFOQUE ldquoCLAacuteSSICOrdquo DE
ECODESENVOLVIMENTO
Mar que se encontra na beira do mar congelado do
Norte No inverno todas as palavras e sons da
regiatildeo satildeo congelados na primavera comeccedilam a
degelar e podem ser claramente ouvidos Os
viajantes podem apanhar as palavras congeladas
que se parecem com doces cristalizados de vaacuterias
cores (Franccedilois Rabelais 1991)
A percepccedilatildeo de que a crise socioambiental decorre
fundamentalmente da reproduccedilatildeo de um estilo de desenvolvimento que
hipertrofia a dimensatildeo do crescimento econocircmico ilimitado e eacute
insensiacutevel a uma avaliaccedilatildeo multidimensional de custos sociais e
ecoloacutegicos passou a ser discutida em vaacuterios encontros internacionais
desde o final da deacutecada de 1960 Vaacuterios termos foram sendo criados nos
debates que vecircm sendo conduzidos desde entatildeo Alguns deles foram
esquecidos e outros foram ressignificados visando pontuar as criacuteticas
mais ou menos radicais ao modelo neoliberal hegemocircnico O resgate
dessa polissemia contribui para alimentar a reflexatildeo contemporacircnea e o
aprendizado obtido ao longo das quatro uacuteltimas deacutecadas na concepccedilatildeo
de estrateacutegias de superaccedilatildeo deste modelo Alguns termos atualizam o
modelo de desenvolvimento hegemocircnico incorporando marginalmente
a questatildeo socioecoloacutegica outros se abrem a experimentaccedilotildees criativas
com projetos que subvertem o mainstream da economia do
desenvolvimento O ecodesenvolvimento e o desenvolvimento
sustentaacutevel tratados nessa seccedilatildeo representam dois contrapontos desse
movimento sem duacutevida incerto e controvertido
Maurice Strong utilizou pela primeira vez o conceito de
ecodesenvolvimento no contexto da Conferecircncia de Estocolmo
organizada pela ONU em 1972 A ideia foi reelaborada e sistematizada
de forma pioneira num artigo publicado por Ignacy Sachs em 19741 na
eacutepoca atuando como coordenador do primeiro coletivo interdisciplinar
de pesquisa sistecircmica voltada para a internalizaccedilatildeo da variaacutevel
socioecoloacutegica no campo das teorias do desenvolvimento Deste ponto
1 Em um estudo que foi realizado no acircmbito do Programa das Naccedilotildees Unidas
para o Meio Ambiente (PNUMA) no ano referido e reproduzido em Sachs
(1986 2007)
62
de vista a noccedilatildeo de ecodesenvolvimento foi veiculada como uma
resposta possiacutevel de caraacuteter experimental agrave ideologia que identifica o
desenvolvimento com a supervalorizaccedilatildeo do crescimento econocircmico
sobre o pano de fundo de uma visatildeo tecnocraacutetica dos sistemas de
planejamento e gestatildeo Na contramatildeo do modelo de desenvolvimento
hegemocircnico o enfoque de ecodesenvolvimento foi desenhado com base
numa plataforma normativa composta pelos seguintes criteacuterios
interdependentes (i) satisfaccedilatildeo de necessidades baacutesicas (materiais e
intangiacuteveis) (ii) autonomia local (ou self reliance) (iii) prudecircncia
ecoloacutegica e (iv) eficiecircncia econocircmica a ser reavaliada com base no
debate sobre limites do crescimento material e da prospectiva ecoloacutegica
(SACHS 1986)
O Coloacutequio de Cocoyoc realizado no Meacutexico em 1974
significou uma tentativa bem sucedida de reenfatizar a importacircncia da
dimensatildeo geopoliacutetica na estruturaccedilatildeo do arcabouccedilo metodoloacutegico do
enfoque de ecodesenvolvimento Acreditava-se assim que ldquouma luta
efetiva contra o subdesenvolvimento demandaria o questionamento do
sobredesenvolvimento dos ricosrdquo (SACHS 2009 p 243) Naquela
eacutepoca falar em contracultura e natildeo-crescimento em natildeo repetir nos
paiacuteses do Sul o mesmo caminho percorrido pelos paiacuteses
industrializados num cenaacuterio marcado pela Guerra Fria parecia no
miacutenimo um gesto inconsequente e provocativo Desde entatildeo o conceito
foi eclipsado no acircmbito do sistema onusiano Mas ressurgiu com novas
roupagens vinte anos depois por ocasiatildeo da Cuacutepula da Terra Os
conceitos de desenvolvimento sustentaacutevel e Agenda 21 passaram a
representar os dois principais pontos de referecircncia do debate social
voltado para o enfrentamento da crise global (SACHS 2009 SACHS
2007 VIEIRA 2005)
Seria importante salientar que o Relatoacuterio Nosso Futuro Comum
publicado pela Comissatildeo Brundtland em1987 contribuiu para
aprofundar a discussatildeo em torno do conceito de sustentabilidade Este
texto enfatiza a necessidade de se colocar em primeiro plano nas
agendas governamentais a busca de satisfaccedilatildeo das necessidades da
geraccedilatildeo atual mas sem desconsiderar as geraccedilotildees futuras (CMMAD
1988)
Existem certamente semelhanccedilas entre os conceitos de
ecodesenvolvimento e desenvolvimento sustentaacutevel na medida em que
ambos colocam em primeiro plano a adoccedilatildeo de uma visatildeo de longo
prazo na busca de enfrentamento da crise socioecoloacutegica e de uma
63
incorporaccedilatildeo sistemaacutetica dos atores locais nos processos de tomada de
decisatildeo sobre dinacircmicas alternativas de desenvolvimento Mas apesar
das semelhanccedilas existem diferenccedilas marcantes que tecircm sido objeto de
um volume crescente de contribuiccedilotildees acadecircmicas As mais importantes
referem-se ao contraste entre a radicalidade embutida na cosmovisatildeo
sistecircmico-complexa assumida pelos adeptos do ecodesenvolvimento e o
vieacutes de ldquoeconomicizaccedilatildeo da ecologiardquo que continua a nortear as
propostas dos arquitetos de uma ldquoeconomia verderdquo Satildeo evidentes os
reflexos desse debate na maneira de se levar em conta as assimetrias
Norte-Sul a promoccedilatildeo da equidade inter e transgeracional os riscos
embutidos nas inovaccedilotildees tecnoloacutegicas inspiradas na siacutendrome de
mercantilizaccedilatildeo indiscriminada de todas as dimensotildees da vida em
sociedade e a hipertrofia da economia de mercado na dinacircmica de
mundializaccedilatildeo
A experimentaccedilatildeo de estrateacutegias de ecodesenvolvimento vem sendo
associada ao questionamento dos fundamentos epistemoloacutegicos eacuteticos e
poliacuteticos do modelo de desenvolvimento que se tornou hegemocircnico nos
dois hemisfeacuterios para aleacutem da ldquooacutetica simplificadora e alienada dos
paradigmas culturais dominantesrdquo (VIEIRA 2005 p 357) Dessa
forma contesta o efeito de imitaccedilatildeo deste modelo pelos paiacuteses do Sul
apostando na fecundidade da pesquisa de um novo projeto civilizador
inspirado numa nova cosmologia e nos princiacutepios de ecossocioeconomia
e convivialidade (LAYRARGUES 1997 SACHS 2007 KAPP 1987
ILLICH 1973)
22 AS CONTRIBUICcedilOtildeES DE DIFERENTES ENFOQUES
Como foi sugerido o ecodesenvolvimento pode ser encarado
como ponto de partida para a reflexatildeo-elaboraccedilatildeo-implementaccedilatildeo de
novos projetos de sociedade e como ponto de convergecircncia das linhas
de reflexatildeo centradas nas noccedilotildees de gestatildeo de recursos comuns
territorializaccedilatildeo das dinacircmicas de desenvolvimento e justiccedila ambientalecoloacutegica O desenho e a concretizaccedilatildeo de estrateacutegias de
gestatildeo levam em conta as dimensotildees essenciais do conceito sistecircmico de meio ambiente incorporado ao modelo de anaacutelise de alternativas de
desenvolvimento territorializado a saber a base de recursos naturais o
espaccedilo-territoacuterio e a qualidade dos haacutebitats (GODARD SACHS 1975
SACHS 1993 1986 VIEIRA 2005 1993) Dessa forma
64
() o ambiente eacute concebido como um fornecedor
de recursos naturais e um receptor de dejetos da
accedilatildeo antroacutepica um espaccedilo-territoacuterio onde
ocorrem as interaccedilotildees entre processos sociais e
ecoloacutegicos e um haacutebitat pensado em sentido
amplo integrando a dimensatildeo da qualidade de
vida das populaccedilotildees (VIEIRA 2006 p 346)
No quadro abaixo essas dimensotildees encontram-se relacionadas
com as trecircs linhas de reflexatildeo que aqui foram incorporadas ao enfoque
de ecodesenvolvimento
Quadro 3 ndash O enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento e as
dimensotildees baacutesicas do conceito sistecircmico de meio ambiente Enfoque central Ecodesenvolvimento
Dimensotildees do
conceito de meio
ambiente
Recursos
naturais Espaccedilo-territoacuterio
Haacutebitat-
qualidade de
vida
Enfoques
complementares
Gestatildeo de
recursos comuns
Desenvolvimento
territorial
Justiccedila ambiental
e ecoloacutegica
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na perspectiva do enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento a
dimensatildeo dos recursos naturais refere-se agrave busca de preservaccedilatildeo e
economia de recursos renovaacuteveis e natildeo renovaacuteveis de valorizaccedilatildeo de
recursos locais subutilizados eou ainda desconhecidos e de promoccedilatildeo
da soberania alimentar e energeacutetica O enfoque de gestatildeo de recursos
comuns ao oferecer uma nova perspectiva de abordagem dos desafios
colocados pela regulaccedilatildeo das modalidades de acesso e uso da base de
recursos naturais pode ser tomado como um ponto de referecircncia Nessa
perspectiva o termo recurso comum avanccedila em relaccedilatildeo aos termos
recurso natural renovaacutevel e recurso natural natildeo renovaacutevel O fato de
serem renovaacuteveis ou natildeo tem relaccedilatildeo com a disponibilidade e
reprodutibilidade dos recursos O termo recurso comum envolve duas
caracteriacutesticas baacutesicas a exclusatildeo ou controle do acesso que eacute
problemaacutetica e o uso que se faz do recurso subtrai aquilo que pertence a todos que tambeacutem coloca em questatildeo o uso compartilhado (BERKES
2005a) As pesquisas em curso ressaltam a importacircncia da participaccedilatildeo
das populaccedilotildees nas tomadas de decisatildeo e da consideraccedilatildeo da
65
complexidade envolvida nas interaccedilotildees transescalares nas dinacircmicas de
planejamento e gestatildeo (VIEIRA 2005)
Por sua vez na internalizaccedilatildeo da dimensatildeo do espaccedilo-territoacuterio a
ecircnfase eacute colocada na organizaccedilatildeo territorial das atividades produtivas
tendo em vista a minimizaccedilatildeo dos desequiliacutebrios nas configuraccedilotildees
rural-urbanas ndash a exemplo do ecircxodo rural e da hiperurbanizaccedilatildeo O
ecodesenvolvimento territorial sensiacutevel agrave variaacutevel socioecoloacutegica acena
com a inclusatildeo da dimensatildeo territorial no planejamento de novas
estrateacutegias de desenvolvimento favorecendo assim o enfrentamento dos
problemas de compatibilidade entre diferentes tipos de atividades
econocircmicas e os demais aspectos que compotildeem a dinacircmica de
coordenaccedilatildeo das interaccedilotildees sociais (GODARD SACHS 1975
VIEIRA et al 2010 VIEIRA 2005)
Finalmente a dimensatildeo do haacutebitat refere-se agrave gestatildeo da qualidade
de vida das populaccedilotildees Converge para os estudos da ecologia humana e
justiccedila ambiental e ecoloacutegica que demonstram ser necessaacuterio considerar
as condiccedilotildees ambientais de existecircncia direitos sociais e trabalhistas
direitos de seguranccedila e integridade fiacutesica direitos de informaccedilatildeo
educaccedilatildeo e auto-realizaccedilatildeo direitos de participaccedilatildeo democraacutetica e
cidadania poliacutetica Neste contexto as noccedilotildees de justiccedila ambiental e
ecoloacutegica alimentam um novo tipo de questionamento da
produccedilatildeoreproduccedilatildeo das relaccedilotildees desiguais entre os seres humanos e
destes com o meio ambiente assim como dos seres humanos com as
futuras geraccedilotildees espeacutecies natildeo humanas e processos ecossistecircmicos
(DANSEREAU 1999 LEROY et al 2002 LOW GLEESON 1998
SCHLOSBERG 2009) ldquoA noccedilatildeo de justiccedila ambiental implica pois o
direito a um meio ambiente seguro sadio e produtivo para todos onde o
lsquomeio ambientersquo eacute considerado em sua totalidade incluindo suas
dimensotildees ecoloacutegicas fiacutesicas construiacutedas sociais poliacuteticas esteacuteticas e
econocircmicasrdquo (ACSELRAD MELLO BEZERRA 2009 p 16)
Em siacutentese o resgate do processo de complexificaccedilatildeo progressiva
do enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento permite a obtenccedilatildeo de
uma imagem mais niacutetida das contribuiccedilotildees oferecidas por outras linhas
de teorizaccedilatildeo sobre o planejamento de dinacircmicas alternativas de
desenvolvimento que corporificam diferentes olhares sobre a crise
socioambiental As trecircs dimensotildees do conceito de meio ambiente
mencionadas acima trazem agrave tona as inter-relaccedilotildees entre processos
naturais e sociais e a escolha de ldquofuturos possiacuteveisrdquo no campo das
dinacircmicas de desenvolvimento Mas resta incorporar agrave linha de
66
argumentaccedilatildeo os subitens correspondentes a contribuiccedilatildeo dos trecircs
enfoques ao ecodesenvolvimento
221 Gestatildeo de recursos comuns a importacircncia da aprendizagem
social adaptativa
O presente enfoque da gestatildeo de recursos comuns tem como
ponto de partida um artigo publicado por Garrett Hardin em 1968 a
Trageacutedia dos Comuns Os recursos comuns satildeo aqueles cuja exclusatildeo de
possiacuteveis usuaacuterios e cujo controle do acesso satildeo geralmente
problemaacuteticos e seu uso envolve subtraccedilatildeo eou rivalidade - que coloca
o problema do uso compartilhado Natildeo haacute um consenso na literatura dos
comuns sobre quais recursos podem ser considerados recursos comuns
Para Berkes (2005) incluem-se entre os recursos comuns peixes
animais selvagens florestas pastagens comunitaacuterias sistemas de
irrigaccedilatildeo aacutegua subterracircnea selvas parques espaccedilos puacuteblicos e
excluem-se as terras agricultaacuteveis e a mineraccedilatildeo Jaacute Oakerson (1992)
afirma que os comuns podem ter uma locaccedilatildeo fixa (mineacuterios) ou pode
ser moacuteveis (como peixes e animais selvagens) Em alguns casos
(oceanos atmosfera) satildeo indivisiacuteveis e natildeo podem ser apropriados de
forma privada e em outros casos (pasto) satildeo organizados como
recursos comuns de acordo com a opccedilatildeo social Os padrotildees de
organizaccedilatildeo variam conforme o lugar e a cultura
A modernidade ocidental transformou a natureza
em ldquoambienterdquo simples cenaacuterio no centro do qual
reina o homem que se autoproclama ldquodono e
senhorrdquo Esse ambiente cedo perderaacute toda a
consistecircncia ontoloacutegica sendo desde logo
reduzido a um simples conservatoacuterio de recursos
antes de se tornar depoacutesito de resiacuteduos (OST
1995 p 10)
O enfoque eacute aqui considerado na perspectiva da gestatildeo integrada
de recursos naturais pois um recurso comum natildeo pode ser gerido
independentemente de outras partes do sistema e de outros recursos
(BERKES 2005a VIEIRA BERKES SEIXAS 2005 VIEIRA
67
WEBER 1997)2 Esse posicionamento converge para o enfoque
patrimonial de recursos naturais desenvolvido na Franccedila Dessa forma
ldquoa qualidade da natureza deve se tornar o lsquobem comumrsquo do conjunto da
sociedaderdquo (OLLAGNON 1997 p 172) No enfoque patrimonial os
recursos satildeo considerados na perspectiva da gestatildeo integrada
Evidecircncias de maacute gestatildeo e prescriccedilotildees de soluccedilotildees convencionais
na gestatildeo de recursos comuns tecircm se avolumado no periacuteodo recente Haacute
falhas em reconhecer a importacircncia das interaccedilotildees entre niacuteveis e escalas
persistecircncia na fragmentaccedilatildeo dos sistemas socioambientais e omissatildeo
em reconhecer a heterogeneidade da percepccedilatildeo das escalas pelos
diferentes atores sociais envolvidos na gestatildeo Isso pode resultar em
poliacuteticas amplas que constrangem poliacuteticas locais accedilotildees locais
desvinculadas de problemas mais amplos soluccedilotildees de curto prazo que
acirram problemas de longo prazo pesquisas cientiacuteficas que enfatizam
apenas um niacutevel e raramente analisam as interaccedilotildees sociais e ecoloacutegicas
do fenocircmeno entre niacuteveis (CASH et al 2006 FENNY et al 2001
HOLLING BERKES FOLKE 1998)
O enfoque da gestatildeo de recursos comuns vem evoluindo atraveacutes
do enfoque da co-gestatildeo e da gestatildeo adaptativa A co-gestatildeo enfatiza a
partilha do poder e responsabilidade entre governo e usuaacuterios e a gestatildeo
adaptativa enfatiza a aprendizagem Ambos vecircm evoluindo em direccedilatildeo agrave
co-gestatildeo adaptativa (BERKES 2009)
Como parte do esforccedilo coletivo dos pesquisadores alinhados com
o enfoque dos comuns vem se desenvolvendo o Institutional Framework for Policy Analysis and Design (IAD) desde a deacutecada de 1970
Inicialmente o modelo de anaacutelise IAD foi utilizado no estudo de
poliacuteticas puacuteblicas em aacutereas metropolitanas e em 1985 Ronald Oakerson
adaptou o IAD aos recursos comuns apresentando o modelo num painel
da Academia Nacional de Ciecircncias (HESS OSTROM 2005)
Oakerson (1992) distingue quatro atributos ou variaacuteveis que
podem ser usadas para descrever os recursos comuns atributos fiacutesicos e
tecnoloacutegicos as regras em uso que governam as relaccedilotildees entre usuaacuterios
a arena de accedilatildeo que envolve a escolha de estrateacutegias e a interaccedilatildeo entre
os envolvidos na gestatildeo e os resultados e consequecircncias O quadro
2 Aqui eacute feita a opccedilatildeo pelo enfoque da gestatildeo de recursos comuns mas outra
possibilidade seria via teoria da regulaccedilatildeo explorada por Drummond e Marsden
(1995)
68
conceitual eacute uma ferramenta heuriacutestica para pensar a loacutegica da situaccedilatildeo e
considerar possibilidades alternativas
Com base em Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992) segue uma breve descriccedilatildeo do modelo de anaacutelise
adaptado a co-gestatildeo adaptativa3
Atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos A natureza fiacutesica e tecnoloacutegica
determinam as limitaccedilotildees e possibilidades de uso do recurso comum
Esses atributos compreendem o tamanho localizaccedilatildeo limites
capacidade e abundacircncia do recurso A tecnologia determina a forma
como se lida com o recurso e com os demais fatores relacionados
Regras em uso O segundo conjunto de atributos no modelo de
anaacutelise consiste nas regras que estruturam as escolhas individuais e
coletivas em relaccedilatildeo aos recursos comuns
Arena de accedilatildeo As regras natildeo satildeo garantia da emergecircncia de
novos padrotildees de comportamento Entre as regras e os comportamentos
observados existe uma distacircncia A arena de accedilatildeo eacute um espaccedilo
conceitual no qual os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais se
informam consideram cursos de accedilatildeo alternativos tomam decisotildees
agem e experienciam as consequecircncias de suas accedilotildees A arena de accedilatildeo
conta com dois aspectos interligados a situaccedilatildeo de accedilatildeo e os segmentos
que interagem na situaccedilatildeo de accedilatildeo A situaccedilatildeo de accedilatildeo enfatiza como as
pessoas cooperam ou natildeo cooperam entre si em vaacuterias circunstacircncias Agrave
anaacutelise da situaccedilatildeo da accedilatildeo eacute necessaacuteria a identificaccedilatildeo dos envolvidos e
os papeacuteis que desempenham na gestatildeo do recurso comum
Resultados eou consequecircncias A observacircncia dos resultados
eou consequecircncias eacute fundamental para avaliar o sistema de gestatildeo
encorajando a inovaccedilatildeo e a aprendizagem adaptativa
As relaccedilotildees entre essas macro variaacuteveis satildeo o principal foco dos
estudos A Figura 2 traz modelo de anaacutelise e como as macro variaacuteveis se
relacionam umas com as outras Os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos e as
regras em uso afetam a arena de accedilatildeo e os resultados e consequecircncias
As linhas soacutelidas a e b representam fortes conexotildees causais
compreendendo que o comportamento individual eacute constrangido mas
natildeo determinado pelo mundo biofiacutesico e pelas regras As linhas soacutelidas
3 Outra opccedilatildeo seria utilizar o modelo de anaacutelise dos ciclos adaptativos descrito
no artigo de Holling (2001) e na coletacircnea organizada por Gunderson e Holling
(2002)
69
c e d representam fortes relaccedilotildees Os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos
afetam os recursos comuns de duas formas afetam a arena de accedilatildeo e
caso natildeo sejam considerados na arena de accedilatildeo podem afetar diretamente
os resultados As regras em uso por sua vez natildeo tecircm efeito nos
resultados independente da escolha humana No longo prazo a interaccedilatildeo
entre as macro variaacuteveis eacute marcada pelas linhas tracejadas Dessa forma
o movimento eacute incorporado no modelo na forma de aprendizagem social
adaptativa
Figura 2 - Modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns ajustado
a co-gestatildeo adaptativa
Fonte Baseado em Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
A aprendizagem social adaptativa marcada principalmente pela
retroalimentaccedilatildeo (linhas tracejadas) presente no modelo de anaacutelise da
gestatildeo de recursos comuns eacute um processo interativo e contiacutenuo No
entanto por ser um processo coletivo a cooperaccedilatildeo entre os envolvidos
na gestatildeo pode ser difiacutecil devido agrave distribuiccedilatildeo de poder tanto nos
segmentos sociais quanto nos segmentos poliacuteticos e entre eles
(BERKES 2009) A expectativa eacute que a aprendizagem leve a accedilatildeo
coletiva agrave mudanccedila institucional na forma de regras leis costumes e
normas As abordagens do aprendizado social visam encontrar formas
70
nas quais as pessoas possam transcender as normas sociais valores e
formas tradicionais de pensar os problemas convergindo para mudanccedilas
socioecoloacutegicas e desempenhando um papel direto no estiacutemulo da
inovaccedilatildeo institucional (CUNDILL 2010)
No campo da co-gestatildeo adaptativa a aprendizagem eacute definida
como a reflexatildeo e accedilatildeo coletiva que tem lugar entre indiviacuteduos e grupos
quanto trabalham para melhorar a gestatildeo das relaccedilotildees entre sistemas
sociais e ecoloacutegicos Aiacute entram em cena os niacuteveis de aprendizagem
aprendizagem em circuito simples duplo e triplo A aprendizagem em
circuito simples se refere a melhorar as accedilotildees estrateacutegias e praacuteticas que
ocorrem num grupo envolvido num projeto de gestatildeo de recursos
comuns A aprendizagem em circuito duplo envolve o questionamento
dos pressupostos e dos modelos mentais que apoiam a seleccedilatildeo de
estrateacutegias particulares e accedilotildees Isto eacute particularmente importante nos
processos colaborativos onde diferentes formas de conhecimento e
modelos mentais estatildeo juntos Na aprendizagem em circuito triplo a
aprendizagem ocorre quando os valores e normas que sustentam as
hipoacuteteses satildeo questionados e refletidos Isto leva a um entendimento
mais profundo do contexto dinacircmicas de poder valores que influenciam
a capacidade de gerir os recursos comuns (CUNDILL 2010)4
A ecircnfase da gestatildeo de recursos comuns eacute na anaacutelise dos modos de
apropriaccedilatildeo e dos sistemas de gestatildeo e neste sentido a cooperaccedilatildeo entre
instituiccedilotildees situadas em diversas escalas e niacuteveis torna-se um elemento
fundamental Inuacutemeras atividades humanas tecircm causas e consequecircncias
que podem ser medidas em niacuteveis diferentes ao longo de muacuteltiplas
escalas Os multi-niacuteveis e as multi-escalas e a transescalaridade dos
problemas relacionados com as dimensotildees humanas das mudanccedilas
globais demandam que pesquisadores abordem questotildees-chave de
escalas e niacuteveis em suas anaacutelises Se a arena de accedilatildeo compreende
tambeacutem as relaccedilotildees que se estabelecem entre os vaacuterios niacuteveis de uma
mesma escala a gestatildeo refere-se a arranjos por meio dos quais o poder
decisoacuterio e as responsabilidades decorrentes satildeo compartilhados entre os
atores envolvidos nas vaacuterias escalas espaciais (CASH et al 2006
BERKES 2005b DIETZ et al 2002 GIBSON OSTROM AHN
2000)
4 A aprendizagem em circuito triplo converge para o engajamento reflexivo e a
reflexividade ecoloacutegica (SCHLOSBERG 2009)
71
222 Ecodesenvolvimento territorial os recursos comuns no
contexto do desenvolvimento
Na tentativa de incorporar ao presente o que o passado nos traz
como bagagem vaacuterios autores vecircm descortinando novas vias de anaacutelise
criacutetica das limitaccedilotildees do conceito de desenvolvimento sustentaacutevel que
tem sido apropriado pelos arautos da globalizaccedilatildeo neoliberal desde o
iniacutecio dos anos 1990
Ignacy Sachs escreve sobre desenvolvimento e meio ambiente haacute
vaacuterias deacutecadas e tem acompanhado as mudanccedilas que aconteceram ao
longo da histoacuteria Para unir os enfoques do ecodesenvolvimento e do
desenvolvimento sustentaacutevel ele distingue no ecodesenvolvimento as
cinco dimensotildees da sustentabilidade sustentabilidade social
sustentabilidade econocircmica sustentabilidade ecoloacutegica sustentabilidade
espacial e sustentabilidade cultural Mais recentemente tem utilizado os
termos desenvolvimento territorial integrado e sustentaacutevel ou ainda
desenvolvimento includente sustentaacutevel sustentado (RIBEIRO 2005
SACHS 2004 2002 1993)
Nos uacuteltimos anos Paulo Freire Vieira tem utilizado o termo
desenvolvimento territorial sustentaacutevel e mais recentemente
ecodesenvolvimento territorial tendo como ideia central o
ecodesenvolvimento agregando tambeacutem o enfoque da gestatildeo de
recursos comuns e os estudos territoriais Nas palavras de Pierre
Dansereau (2005 p 523) Paulo Freire Vieira deu ldquoum novo tom agrave
Sociologia um desembaraccedilo maior agrave experiecircncia em quadros teoacutericos
ampliadosrdquo Nessa linha o conceito emergente de ecodesenvolvimento
territorial leva em conta os riscos de desvio economicista e tecnocraacutetico
nos estudos sobre dinacircmicas territoriais de desenvolvimento
enfatizando a criaccedilatildeo de sistemas de gestatildeo compartilhada e adaptativa
de recursos comuns e a governanccedila territorial Deste ponto de vista
ainda em construccedilatildeo trata-se de favorecer ao maacuteximo possiacutevel a gestatildeo
das conexotildees institucionais transescalares evitando soluccedilotildees
reducionistas e uniformizadoras aleacutem de escalas fixas (GODARD
1997 SACHS 2002 VIEIRA 2010 2009 2005 2006 VIEIRA CAZELLA CERDAN 2006)
A noccedilatildeo de territoacuterio incorporada recentemente ao debate sobre
desenvolvimento amp ambiente designa processos de criaccedilatildeo coletiva e
institucional e as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento
72
ecologicamente prudente pressupotildeem o resgate dos criteacuterios de
endogeneidade descentralizaccedilatildeo e autonomia local (pensada
sistemicamente) assumidos como elementos constitutivos do enfoque
ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento (VIEIRA et al 2010 VIEIRA
2006)
O ecodesenvolvimento territorial traz agrave gestatildeo de recursos
comuns a preocupaccedilatildeo com o estilo de desenvolvimento conforme
demonstrado na Figura 3 Mas partindo do pressuposto que a gestatildeo de
recursos comuns eacute um dos principais componentes na interaccedilatildeo
sociedade e natureza capaz de assegurar seu bom funcionamento seu
melhor rendimento sua perenidade e desenvolvimento ela deveria estar
a montante e natildeo a jusante das principais opccedilotildees de desenvolvimento
(GODARD 1997) Todavia seraacute mantido o estilo de desenvolvimento
como mais amplo para reforccedilar a ideia de que a gestatildeo de recursos
comuns precisa considerar o estilo de desenvolvimento assumindo cada
vez mais a responsabilidade da criacutetica e da mudanccedila
Figura 3 - Primeira adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa
Fonte Adaptado de Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
73
A anaacutelise do contexto e do discurso presente na gestatildeo de
recursos comuns explicita os fatores endoacutegenos e exoacutegenos das
dinacircmicas de desenvolvimento demonstrando seus limites e margens de
manobra
O problema natildeo se identifica tanto com a
preocupaccedilatildeo em se especificar o niacutevel de
responsabilidade ideal mas antes com o
entendimento daquelas formas de interaccedilatildeo entre
os diversos niacuteveis territoriais que tornariam
possiacutevel uma decisatildeo que levasse em conta ao
mesmo tempo os interesses e objetivos locais
regionais e nacionais ou mesmo internacionais
(GODARD 1997 p 237)
Para colocar em praacutetica estrateacutegias alternativas de
desenvolvimento eacute importante reequilibrar a transferecircncia de poder e a
comunicaccedilatildeo entre o local o regional e o nacional e integrar as vaacuterias
dimensotildees das estrateacutegias de desenvolvimento (social econocircmica
ecoloacutegica espacial e cultural) ldquoAgrave luz do princiacutepio da co-gestatildeo
adaptativa os sistemas de planejamento e gestatildeo deveratildeo se abrir cada
vez mais a um padratildeo de envolvimento autecircntico da sociedade civilrdquo
(VIEIRA 2005 p 366)
223 Justiccedila ambiental e justiccedila ecoloacutegica os caminhos da
democracia
O movimento por justiccedila ambiental teve origem nos Estados
Unidos em 1982 com um conflito em Afton na Carolina do Norte Na
iminecircncia de instalaccedilatildeo de um depoacutesito de bifenilpoliclorinato que
contaminaria a aacutegua que abastecia a cidade a populaccedilatildeo organizou
protestos Como a populaccedilatildeo de Afton era composta de 84 de negros e
negras o movimento se desenvolveu como uma reaccedilatildeo expliacutecita agrave
atenccedilatildeo inadequada dos movimentos ambientalistas agrave questatildeo da raccedila e
da classe social Os princiacutepios da justiccedila ambiental ofereceram ao ambientalismo possibilidades de pensar classe social e raccedila junto com
questotildees ambientais combatendo o abuso de corporaccedilotildees poluentes e o
abuso do proacuteprio Estado (ACSELRAD 2009 ACSELRAD MELLO
BEZERRA 2009 SZE LONDON 2008)
74
Desde entatildeo as pesquisas sobre justiccedila ambiental contribuiacuteram
para ampliar a discussatildeo sobre a necessidade de um enfoque consistente
de anaacutelise deste fenocircmeno Aleacutem de vaacuterias aacutereas de conhecimento
(geografia radical geografia criacutetica e economia poliacutetica entre outras)
passaram a ser mobilizados dados relacionados a diferentes grupos
raciais e eacutetnicos aleacutem de disparidades associadas a gecircnero e idade Mais
recentemente as reflexotildees sobre justiccedila ecoloacutegica conduziram o
enfoque a um niacutevel cada vez mais alto de abrangecircncia e abstraccedilatildeo
(BYRNE MARTINEZ GLOVER 2002 HOLIFIELD PORTER
WALKER 2009 SZE LONDON 2008)
O conceito de injusticcedila ambiental designa uma distribuiccedilatildeo
desproporcional dos riscos e danos ambientais devido agrave implantaccedilatildeo de
projetos industriais homogeneizadores do espaccedilo bem como de
poliacuteticas globais que impactam negativamente as camadas mais
vulneraacuteveis da sociedade Trata-se de uma siacutendrome recorrente que
transcende a simples distribuiccedilatildeo de riscos ambientais delimitados
localmente refletindo tambeacutem o reconhecimento de que as poliacuteticas
ambientais tecircm consequecircncias que atravessam as fronteiras nacionais
afetam muacuteltiplas escalas e se estendem agraves redes globais As iniciativas
que geram espaccedilos de desigualdade e injusticcedila ambiental satildeo histoacuterica e
geograficamente muito mais complexas do que parecem (ACSELRAD
MELLO BEZERRA 2009 HOLIFIELD PORTER WALKER 2009
ZHOURI 2008)
A ampliaccedilatildeo dos temas tratados pela justiccedila ambiental e o uso da
pesquisa sistecircmica refletem a percepccedilatildeo da complexidade intriacutenseca aos
problemas estudados inclusive das conexotildees transescalares - do local ao
global Alguns autores passaram a adotar o termo justiccedila ecoloacutegica entendida como aquela que afeta natildeo apenas os seres humanos mais
vulneraacuteveis mas todos os seres humanos as geraccedilotildees futuras espeacutecies
natildeo humanas e processos ecossistecircmicos (BYRNE MARTINEZ
GLOVER 2002 HOLIFIELD PORTER WALKER 2009 LOW e
GLEESON 1998 MAacuteRMORA 1992 PENtildeA 2003 SCHLOSBERG
2009 e 2004 SZE LONDON 2008 TOUCHEacute 2004)
Partindo do pressuposto de que a desigualdade socioambiental se
relaciona ao sistema poliacutetico aquela eacute apenas um sintoma de um
processo que envolve a redistribuiccedilatildeo o reconhecimento e a
representaccedilatildeo (SCHLOSBERG 2009 e 2004) A redistribuiccedilatildeo envolve
minimizar a desigualdade ambiental Jaacute o reconhecimento envolve a
consideraccedilatildeo de distintas perspectivas (das minorias eacutetnicas ldquoraciaisrdquo e
75
sexuais) O reconhecimento objetiva tambeacutem ldquodesinstitucionalizar
padrotildees de valoraccedilatildeo cultural que impedem a paridade de participaccedilatildeo
e substituiacute-los por padrotildees que a promovamrdquo (FRASER 2007 p 109)
A representaccedilatildeo torna-se central nas lutas pela redistribuiccedilatildeo e
pelo reconhecimento natildeo haacute redistribuiccedilatildeo e reconhecimento sem
representaccedilatildeo Logo os problemas na representaccedilatildeo satildeo condicionantes
da injusticcedila ambiental e ecoloacutegica (FRASER 2010 2009)
A representaccedilatildeo juntamente com a redistribuiccedilatildeo e
reconhecimento satildeo fundamentais para o fortalecimento e recriaccedilatildeo do
sistema democraacutetico e aprendizagem social adaptativa Na Figura 4
insere-se no modelo de anaacutelise a variaacutevel do fortalecimento do sistema
democraacutetico
Figura 4 - Segunda adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa
Fonte Adaptado de Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
Satildeo os mesmos caminhos que levam ao restabelecimento do
equiliacutebrio na natureza e agrave construccedilatildeo da democracia na sociedade ldquoO
pensamento democraacutetico estaacute desafiado a pensar o desenvolvimento de
toda a humanidade em harmonia com a naturezardquo (SOUZA 1992 p
76
13) Cabe questionar ldquosob que condiccedilotildees eacute de se esperar que a
democracia produza resultados poliacuteticos justosrdquo (VITA 2003 p 111)
A democracia representativa vem sendo alvo de inuacutemeras
criacuteticas economicizaccedilatildeo do poliacutetico incapacidade de cumprir com suas
promessas fundamentais (governo do povo igualdade poliacutetica
participaccedilatildeo dos cidadatildeos na tomada de decisatildeo) a falta de controle da
representaccedilatildeo e a crescente desconfianccedila dos cidadatildeos na democracia
(MANIN et al 2006 MIGUEL 2005 ROSANVALLON 2006
SCHUMPETER1984)
Jaacute a democracia participativa pretende alcanccedilar uma democracia
digna de seu nome (MIGUEL 2005) A consciecircncia do custo do
crescimento econocircmico da produccedilatildeo das desigualdades e da apatia
poliacutetica podem ser consideradas brechas para a democracia participativa
e a expansatildeo e aprofundamento da participaccedilatildeo pode ser uma estrateacutegia
promissora para desafiar as desigualdades as assimetrias de interesses e
as hierarquias sociais e poliacuteticas tradicionais (FUNG COHEN 2007
PATEMAN 1992) Todavia ldquo() o principal problema quanto agrave
democracia participativa natildeo eacute quanto a fazecirc-la funcionar mas como
atingi-lardquo (MACPHERSON 1978 p 101)
A ecologia e a democracia se determinam mutuamente ldquo() seja
pela accedilatildeo dos condicionantes soacutecio-poliacuteticos da degradaccedilatildeo ambiental
seja pela prevalecircncia das bases ambientais da desigualdade socialrdquo
(ACSELRAD 1992a p 10) Para compreender essa relaccedilatildeo eacute preciso
identificar e entender a origem das contradiccedilotildees na incorporaccedilatildeo da
questatildeo ambiental pelo Estado e a correlaccedilatildeo de forccedilas sociais em
confronto pelo controle dos recursos
Os estudos sobre justiccedila ambiental identificam como causas da
injusticcedila ambiental as redes de influecircncia (baseadas em alianccedilas entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos) a desinformaccedilatildeo e a neutralizaccedilatildeo
da criacutetica potencial Na linha de questionamento entre as accedilotildees que
buscam reverter quadros de injusticcedilas ambientais estatildeo a produccedilatildeo do
conhecimento proacuteprio a pressatildeo pela aplicaccedilatildeo universal das leis a
pressatildeo pelo aperfeiccediloamento da legislaccedilatildeo de proteccedilatildeo ambiental a
pressatildeo por novas racionalidades no exerciacutecio do poder estatal a introduccedilatildeo de procedimentos de avaliaccedilatildeo de equidade ambiental e a
accedilatildeo direta e difusatildeo espacial do movimento (ACSELRAD MELLO
BEZERRA 2009 GRAZIANO 1997) A base de um modelo mais
justo envolveria a democratizaccedilatildeo do controle dos recursos naturais a
77
desprivatizaccedilatildeo do meio ambiente assegurando o caraacuteter puacuteblico do
patrimocircnio comum (ACSELRAD 1992a)
O desafio consiste em identificar os limites da representaccedilatildeo e da
participaccedilatildeo identificando experiecircncias que caminhem na direccedilatildeo de
uma recuperaccedilatildeo da autonomia (CASTORIADIS COHN-BENDIT
PUacuteBLICO DE LOUVAIN-LA-NEUVE 1981 ILLICH 1973) da
construccedilatildeo de uma democracia cognitiva (MORIN 2002 THEYS
1997) de uma cidadania terrestre (MORIN KERN 2000) de uma
cidadania ecoloacutegica (DOBSON 2003) de uma ecologia da
transformaccedilatildeolibertaccedilatildeo (HATHAWAY BOFF 2012) A direccedilatildeo
apontada a partir dos termos indicados eacute exigente e implica reconhecer
o caraacuteter indissociaacutevel da natureza e da comunidade seres humanos natildeo
humanos e a Terra em uma concepccedilatildeo alargada de justiccedila
(SCHLOSBERG 2009)
23 LIMITES E POSSIBILIDADES DO ECODESENVOLVIMENTO
REVISITADO
De todos os objetos os que mais amo satildeo os
usados () Impregnado do uso de muitos a
miuacuteda transformados foram aperfeiccediloando suas
formas e se fizeram preciosos porque tecircm sido
apreciados muitas vezes (Bertolt Brecht
Antologia Poeacutetica 1982 p 58)
A procura da harmonizaccedilatildeo entre desenvolvimento e gestatildeo de
longo prazo do meio ambiente natildeo pode ser feita de maneira isolada
pois se trata de uma reflexatildeo global sobre a viabilidade de novos estilos
de desenvolvimento baseados no pensamento sistecircmico-complexo
(GODARD SACHS 1975 VIEIRA 2006) Este capiacutetulo insere-se
nessa linha de reflexatildeo ao tratar a atualidade do ecodesenvolvimento
aplicado agrave gestatildeo de recursos comuns
O ecodesenvolvimento eacute o eixo central do modelo de anaacutelise
trazendo em si a criacutetica do modelo hegemocircnico de desenvolvimento e a
preocupaccedilatildeo com a criaccedilatildeo de novos projetos civilizatoacuterios Para tanto eacute preciso considerar o meio ambiente como relaccedilatildeo e natildeo como objeto
Suas dimensotildees os recursos naturais o espaccedilo-territoacuterio e o haacutebitat
colocam no centro as relaccedilotildees que os seres humanos estabelecem entre
si e com o meio Os conceitos de co-gestatildeo adaptativa
78
ecodesenvolvimento territorial e justiccedila ambiental e ecoloacutegica vecircm
sendo incorporados ao modelo de anaacutelise ldquoclaacutessicordquo ampliando o seu
potencial heuriacutestico no enfrentamento da crise socioecoloacutegica global
O enfrentamento envolve mais adaptaccedilatildeo que controle poliacuteticas
flexiacuteveis integradas e adaptativas gestatildeo e planejamento voltados agrave
aprendizagem acompanhamento concebido como uma parte de
intervenccedilotildees ativas para conseguir compreender e identificar respostas
aos problemas natildeo a vigilacircncia pela vigilacircncia investimentos ecleacuteticos
em ciecircncia participaccedilatildeo dos cidadatildeos e parceria na construccedilatildeo de uma
ciecircncia mais cidadatilde evitando a informaccedilatildeo passiva (HOLLING 1995)
O desenvolvimento de uma democracia cognitiva
soacute eacute possiacutevel com uma reorganizaccedilatildeo do saber e
esta pede uma reforma do pensamento que
permita natildeo apenas isolar para conhecer mas
tambeacutem ligar o que estaacute isolado e nela
renasceriam de uma nova maneira as noccedilotildees
pulverizadas pelo esmagamento disciplinar o ser
humano a natureza o cosmo a realidade
(MORIN 2002 p 104)
O ecodesenvolvimento e os enfoques complementares ajudam a
compreender a gestatildeo de recursos comuns em relaccedilatildeo agrave sustentabilidade
dos recursos naturais as dinacircmicas de desenvolvimento e a
desigualdade ecoloacutegica A pesquisa sobre gestatildeo de recursos comuns
nessa perspectiva incorpora uma perspectiva mais ampla sobre seu
papel no modelo de desenvolvimento hegemocircnico e ao mesmo tempo
seu potencial de mudanccedila como parte integrante e importante na
proposta do ecodesenvolvimento O fundamental eacute a compreensatildeo de
que nenhum enfoque eacute completo e que para aleacutem da fragmentaccedilatildeo da
ciecircncia o diaacutelogo entre os enfoques pode oferecer insights para uma
melhor compreensatildeo dos problemas e para a construccedilatildeo de alternativas
capazes de fazer frente agrave crise sistecircmica do meio ambiente
3 GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS NO BRASIL O CARVAtildeO
MINERAL EM QUESTAtildeO
Tudo se aniquilava no fundo desconhecido das
noites obscuras soacute percebia muito ao longe os
altos-fornos e as fornalhas de coque () Era uma
tristeza de incecircndio natildeo havia no horizonte
ameaccedilador outros astros elevando-se a natildeo ser
esses fogos noturnos dos paiacuteses da hulha e do
ferro (Eacutemile Zola 1981 p 14)
O uso do carvatildeo mineral em larga escala estaacute intrinsecamente
ligada agrave Revoluccedilatildeo Industrial e com a origem do movimento dos
trabalhadores na Inglaterra como bem ilustrou Emile Zola em seu livro
Germinal e nos Estados Unidos Ele continua sendo a fonte mais
utilizada para geraccedilatildeo de energia eleacutetrica no mundo correspondendo em
meacutedia a 40 da produccedilatildeo total mundial no periacuteodo de 1973 a 2006
Segundo a Agecircncia Internacional de Energia (IEA) a posiccedilatildeo seraacute
mantida nos proacuteximos trinta anos e a discussatildeo sobre reconversatildeo da
mineraccedilatildeo do carvatildeo ainda permanece incipiente5(ANEEL 2008a
FERREIRA 2002)
No debate sobre mudanccedila ambiental global os recursos naturais
natildeo renovaacuteveis satildeo centrais Embora o petroacuteleo ocupe posiccedilatildeo
privilegiada os impactos ambientais do processo produtivo do carvatildeo
mineral eacute um ponto importante a ser considerado Os combustiacuteveis
foacutesseis continuam a dominar a matriz energeacutetica mundial apoiados por
523 mil milhotildees de doacutelares de subsiacutedios em 2011 quase 30 a mais que
em 2010 e seis vezes mais do que as fontes renovaacuteveis (OCDE IEA
2012) O carvatildeo mineral representou em 2012 195 da matriz
energeacutetica dos paiacuteses que compotildeem a Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e
Desenvolvimento Econocircmico (OCDE) e 282 da matriz mundial Em
relaccedilatildeo agrave oferta de energia eleacutetrica o carvatildeo mineral representou em
2012 14 da oferta brasileira e 417 da oferta mundial Se
consideradas as dimensotildees de sustentabilidade seguranccedila energeacutetica
equidade social e mitigaccedilatildeo dos impactos ambientais o Brasil aparece
como 53ordm lugar em 2012 Se tomadas separadamente o Brasil assume o
5 Destaca-se aqui a iniciativa da Comissatildeo das Comunidades Europeias que
teve iniacutecio em 1989 de proporcionar assistecircncia as Comunidades que queiram
adotar uma reconversatildeo econocircmica das aacutereas de mineraccedilatildeo do carvatildeo atraveacutes de
empreacutestimos e subsiacutedios (COMISSAtildeO DAS COMUNIDADES EUROPEacuteIAS
1990)
80
77ordm lugar em seguranccedila energeacutetica 65ordm em equidade social e 21ordm em
mitigaccedilatildeo dos impactos ambientais (WORLD ENERGY COUNCIL
2012)
A matriz energeacutetica brasileira teve em sua composiccedilatildeo no ano de
2012 424 de oferta de energia de fontes renovaacuteveis (biomassa da
cana hidraacuteulica e eletricidade lenha e carvatildeo vegetal e lixiacutevia dentre
outras) e 576 de fontes de energia natildeo renovaacuteveis (petroacuteleo e
derivados gaacutes natural carvatildeo mineral e uracircnio) da qual o carvatildeo
mineral tem uma participaccedilatildeo de 54 (BRASIL EPE 2013) A
presenccedila de combustiacuteveis foacutesseis na matriz energeacutetica brasileira tende a
aumentar com a exploraccedilatildeo do petroacuteleo do preacute-sal com a possiacutevel
exploraccedilatildeo do gaacutes de xisto e com o retorno do carvatildeo mineral nos leilatildeo
A-56 de 2013 Eacute urgente lidar com a questatildeo das emissotildees de gases de
efeito estufa devido agraves altas emissotildees dos combustiacuteveis foacutesseis O
carvatildeo mineral eacute o mais abundante combustiacutevel foacutessil do mundo e
tambeacutem o que mais produz gases de efeito estufa (BRASIL MME
2007 YAMAOKA et al 2013)
O Brasil no cenaacuterio mundial desponta como fornecedor global
de commodities minerais energeacuteticas e agriacutecolas Esse papel justifica a
abertura de minas de fosfato a mineraccedilatildeo de uracircnio do ferro e de outros
mineacuterios Apesar do carvatildeo mineral brasileiro ser o ldquoprimo pobrerdquo dos
mineacuterios voltado ao mercado interno eacute preciso considerar tambeacutem a
mineraccedilatildeo no geral O marco legal da mineraccedilatildeo estaacute mudando com a
regulamentaccedilatildeo da mineraccedilatildeo em terras indiacutegenas quilombolas e
ribeirinhas e a expansatildeo das mineradoras brasileiras para outros paiacuteses
A conjuntura brasileira eacute de desregulamentaccedilatildeo e de flexibilizaccedilatildeo da
normativa ambiental sem um questionamento profundo sobre as
desigualdades socioambientais existentes no territoacuterio (MALERBA
2012 MILANEZ et al 2013)
O objetivo deste capiacutetulo foi descrever as macro variaacuteveis
presentes no modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns (HESS
6 Os leilotildees foram instituiacutedos em 2005 e satildeo processos licitatoacuterios com o
objetivo de contratar energia eleacutetrica para assegurar o pleno atendimento da
demanda futura no Ambiente de Regulaccedilatildeo Controlada Os leilotildees satildeo divididos
em A-1 A-3 e A-5 Os nuacutemeros 1 3 e 5 correspondem aos anos de
antecedecircncia do iniacutecio do suprimento O Leilatildeo A-5 por exemplo envolve a
licitaccedilatildeo para contrataccedilatildeo de energia eleacutetrica de novos empreendimentos
realizado com cinco anos de antecedecircncia do iniacutecio do suprimento (MME
2014)
81
OSTROM 2005 OAKERSON 1992 POLSKI OSTROM 1992)
abordando o tema no Brasil com destaque agrave gestatildeo do carvatildeo mineral
Para tanto aleacutem de uma breve introduccedilatildeo sobre desenvolvimento
econocircmico gestatildeo de recursos comuns e energia no Brasil o capiacutetulo
traz uma caracterizaccedilatildeo dos atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso
em termos de disponibilidade usos tecnologias disponiacuteveis e impactos
As regras em uso tratam das principais leis que afetam o recurso bem
como das interfaces entre direitos ambientais e direitos humanos Em
relaccedilatildeo agrave arena de accedilatildeo eacute feita uma breve descriccedilatildeo dos envolvidos na
gestatildeo no niacutevel nacional O balanccedilo da gestatildeo de recursos comuns no
Brasil em especial do carvatildeo mineral revela ao longo desse capiacutetulo
importantes pontos a serem considerados na compreensatildeo da ampliaccedilatildeo
da geraccedilatildeo de energia eleacutetrica movida a carvatildeo mineral no Sul de Santa
Catarina e da possibilidade de surgirem caminhos alternativos para a
questatildeo energeacutetica
31 DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO GESTAtildeO DE RECURSOS
COMUNS E ENERGIA
A gestatildeo de recursos comuns em particular do carvatildeo mineral
traz agrave tona questotildees relacionadas ao desenvolvimento econocircmico e a
questatildeo energeacutetica que envolvem a atuaccedilatildeo de segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais O desafio de tratar a gestatildeo de recursos comuns
reside justamente na complexidade existente nessas inter-relaccedilotildees A
tentativa dessa seccedilatildeo eacute tratar a gestatildeo contextualizada para na
sequecircncia abordar as especificidades do carvatildeo mineral
Na eacutepoca da Repuacuteblica Velha (1889-1930) o governo era
controlado pela oligarquia rural (SCARDUA BURSZTYN 2003) Se
ateacute 1930 a teoria econocircmica pregava o livre funcionamento do mercado
com a crise mundial passou a aceitar um papel mais atuante do Estado e
tambeacutem do planejamento Os recursos comuns acompanharam essa
mesma linha de atuaccedilatildeo federal sendo marcada pelo controle federal na
disputa com elites locais Isso justificou a criaccedilatildeo de poderes setoriais e
deu lugar a burocracias especializadas (NEDER 2002) O setor eleacutetrico que antes era resultado de investimentos privados e locais sofreu
intervenccedilatildeo estatal e de empresas estrangeiras (MALAGUTI 2009)
A Ditadura Vargas (1930-1945) foi centralizada no presidente
com a dissoluccedilatildeo das representaccedilotildees poliacuteticas e baseada numa poliacutetica
82
voltada ao desenvolvimento urbano industrial e nacionalista
(SCARDUA BURSZTYN 2003) Nesse periacuteodo houve pouca
demanda por energia baseada principalmente na geraccedilatildeo de energia a
partir de fontes vegetais indicando um reduzido grau de expansatildeo das
forccedilas produtivas De 1939 em diante ocorreu a consolidaccedilatildeo da
industrializaccedilatildeo com o crescimento da atividade econocircmica e uma
participaccedilatildeo maior no uso de combustiacuteveis foacutesseis (THEIS 1990)
Durante o periacuteodo democraacutetico (1945-1964) teve lugar a
reorganizaccedilatildeo dos partidos poliacuteticos e das representaccedilotildees favorecendo a
descentralizaccedilatildeo sem uma poliacutetica especiacutefica para esse fim Na Ditadura
Militar (1964-1985) a centralidade federal voltou a ser realidade e nesse
contexto o crescimento econocircmico aconteceu a despeito dos custos
sociais e ambientais (EGLER 1997 SCARDUA BURSZTYN 2003)
A questatildeo ambiental era tratada como gestatildeo de recursos naturais com a
criaccedilatildeo de parques e reservas bioloacutegicas Com vieacutes claramente
conservacionista natildeo havia uma preocupaccedilatildeo com os impactos do
crescimento econocircmico da eacutepoca (NEDER 2002) ldquoA ideia de
desenvolvimento econocircmico penetrava a consciecircncia da cidadania
justificando cada ato de governo e ateacute de ditadura e de extinccedilatildeo da
naturezardquo (DEAN 1996 p 281)
O processo de crise na economia mundial deflagrado na deacutecada
de 1970 contou com trecircs marcos poliacuteticos o rompimento dos Estados
Unidos aos acordos de Bretton Woods em 1971 que trouxe a crise aos
paiacuteses membros da OCDE a inclusatildeo das questotildees ambientais no debate
sobre desenvolvimento estimulada pelo relatoacuterio do Clube de Roma e
pela Conferecircncia de Estocolmo em 1972 e a elevaccedilatildeo do preccedilo do
petroacuteleo em 1973 que trouxe a preocupaccedilatildeo com a questatildeo energeacutetica
Esses eventos dentre outros colocaram tambeacutem em questatildeo a regulaccedilatildeo
das relaccedilotildees econocircmicas internacionais e os mecanismos internos de
promoccedilatildeo do desenvolvimento (EGLER 1997)
Na deacutecada de 1970 aumentou a preocupaccedilatildeo com a poluiccedilatildeo
industrial todavia natildeo se alterou a relaccedilatildeo Estado-empresa (NEDER
2002) O movimento ambientalista em sua fase fundacional (1971-86)
foi dominado por uma compreensatildeo estreita da problemaacutetica ambiental
tendo como principais preocupaccedilotildees a poluiccedilatildeo industrial e a
preservaccedilatildeo dos ecossistemas naturais A conexatildeo entre a problemaacutetica
ambiental e o desenvolvimento econocircmico natildeo era percebida pelo
movimento ambientalista nessa fase (VIOLA 1992)
83
Na deacutecada de 1980 a crise do Estado e o processo de
redemocratizaccedilatildeo do paiacutes somou-se agrave discussatildeo do ldquodesenvolvimento
sustentaacutevelrdquo que se inseriu no discurso e na definiccedilatildeo de poliacuteticas Poacutes
1980 outro padratildeo de regulaccedilatildeo puacuteblica socioambiental veio se
desenvolvendo no Brasil ldquoele desloca a dicotomia estado versus capital
privado para um patamar mais complexo que amplia os dois modos
claacutessicos de coordenaccedilatildeo a ordem estatal e mercantil para incluir novas
arenas de conflitosrdquo (NEDER 2009 p 8)
Com a crise econocircmica dos anos 1980 o movimento
ambientalista passou a considerar a dimensatildeo econocircmica como
condicionante e parte da crise socioambiental Nessa mesma deacutecada
formaram-se grupos cientiacuteficos que passaram a tratar da questatildeo
ambiental Em 1981 com a aprovaccedilatildeo da Poliacutetica Nacional de Meio
Ambiente (PNMA) constituiu-se segundo o artigo 6ordm o Sistema
Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) e o CONAMA O movimento
ambientalista de 1987 a 1991 passou por uma fase de institucionalizaccedilatildeo
que envolveu uma organizaccedilatildeo maior do movimento ambientalista em
relaccedilatildeo a recursos financeiros especializaccedilatildeo dos envolvidos e com o
envolvimento com movimentos socioambientais (como o Movimento de
Atingidos por Barragens Movimento dos Seringueiros Movimentos
Indiacutegenas etc) (VIOLA 1992) Somado a isso o fim da Ditadura
Militar em 1985 e a Constituiccedilatildeo de 1988 acenavam com a volta da
democracia representativa e com novos mecanismos participativos
O governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) realizou
uma grande reforma no setor eleacutetrico marcando a transiccedilatildeo entre um
modelo de crescimento impulsionado pelo Estado para um modelo de
crescimento impulsionado pelo mercado A reforma teve como objetivos
a separaccedilatildeo das atividades de geraccedilatildeo transmissatildeo distribuiccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo privatizaccedilatildeo competiccedilatildeo na geraccedilatildeo e na
comercializaccedilatildeo e livre acesso agraves redes de transmissatildeo e distribuiccedilatildeo
(GOLDENBERG PRADO 2003) ldquoO processo de privatizaccedilatildeo do setor
eleacutetrico representou um gigantesco processo de transferecircncia de rendas
utilizando-se de dinheiro puacuteblico para beneficiar grupos empresariais e
garantir o propalado lsquosucessorsquo das privatizaccedilotildeesrdquo (BERMANN 2003
p 47) O ano de 2001 foi conhecido como o ano do ldquoapagatildeordquo Houve
falta de energia eleacutetrica causada pelo desabastecimento de aacutegua e por
uma privatizaccedilatildeo parcial na qual as estatais perderam sua capacidade de
planejamento mediante reduccedilatildeo de investimentos e o setor privado ainda
natildeo havia tomado o seu lugar (GOLDENBERG 2012a)
84
Com a vitoacuteria de Luis Inaacutecio Lula da Silva em 2002 do Partido
dos Trabalhadores (PT) para a presidecircncia da repuacuteblica houve uma
grande expectativa por parte dos movimentos sociais que possuiacuteam uma
ligaccedilatildeo histoacuterica com os partidos de esquerda especialmente o PT Lula
permaneceu na presidecircncia de 2003 a 2010 rompendo com uma
tradiccedilatildeo de eleiccedilotildees que mantinham na presidecircncia a elite tradicional
(LOSEKANN 2012) O fato de ter tido como ministra do meio
ambiente Marina Silva ligada agrave luta dos seringueiros fez com que
muitos acreditassem que o governo Lula seria um marco na poliacutetica
ambiental brasileira Mas contrariando as expectativas houve a
legalizaccedilatildeo dos transgecircnicos a transposiccedilatildeo do Rio Satildeo Francisco e a
anistia aos desmatadores O Ministeacuterio das Minas e Energia (MME) na
eacutepoca liderado por Dilma Russef atual presidenta do Brasil ressuscitou
projetos hidreleacutetricos na Amazocircnia e retomou o programa da energia
nuclear Se durante a sua histoacuteria o PT esteve receptivo agraves demandas
dos movimentos socioambientais uma vez no poder a praacutetica foi
restritiva no CONAMA a participaccedilatildeo dos movimentos sociais foi
diminuiacuteda resultando numa injusticcedila poliacutetica em relaccedilatildeo aos segmentos
poliacuteticos e empresariais A poliacutetica de desenvolvimento empreendida
pelo Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) priorizou a
pecuaacuteria mineraccedilatildeo geraccedilatildeo de energia soja cimento e celulose
causadores de impactos socioambientais e injusticcedilas ambientais e
ecoloacutegicas (LISBOA 2011)
Na Rio+20 que aconteceu em 2012 o tema central da Cuacutepula
dos Povos foi a justiccedila social e ambiental Para a Cuacutepula dos Povos natildeo
houve um balanccedilo das dificuldades e conquistas poacutes Rio-92 e a ecircnfase
na ldquoeconomia verderdquo foi uma forma de reforccedilar a acumulaccedilatildeo
capitalista que natildeo questiona ou substitui a economia baseada no uso de
combustiacuteveis foacutesseis nem nos padrotildees de produccedilatildeo industrial e
consumo crescente (CUacutePULA DOS POVOS 2012)
No governo Dilma (2011- atual) foi aprovada a mudanccedila no
Coacutedigo Florestal que estava tramitando desde 1996 ateacute ser totalmente
reformulado em 2012 Tramita tambeacutem a mudanccedila do Coacutedigo da
Mineraccedilatildeo que vai reduzir radicalmente as conquistas de grupos eacutetnicos
e comunidades tradicionais Com essas mudanccedilas instaura-se a
dominaccedilatildeo poliacutetica empresarial na qual o territoacuterio passa a ser objeto da
accedilatildeo de empresas preocupadas com as proacuteprias metas e apoiadas pela
accedilatildeo do Estado Confunde-se aiacute capitalismo com democracia e liberdade
poliacutetica com liberdade para explorar e investir (SEVAacute FILHO 2013)
No que se refere agrave matriz energeacutetica antes se pensava no que era melhor
85
para o Estado e atualmente a poliacutetica energeacutetica eacute pensada para os
empreiteiros (GOLDENBERG 2012b)
O planejamento energeacutetico no Brasil apoacutes as reformas passou a
ter uma visatildeo ldquoofertistardquo natildeo se baseia em previsotildees de demandas
Existe um emaranhado de interesses e o ldquoplanejamentordquo se eacute que pode
ser assim chamado serve aos que querem vender energia e aos que
querem comprar As empresas por sua vez aperfeiccediloam sua influecircncia
poliacutetica nos espaccedilos de poder do Estado atuando sobre os
licenciamentos ambientais mecanismos de financiamento
influenciando ateacute propostas de reforma do Estado (BERMANN 2012)
No final da deacutecada de 1980 apoacutes momentos de crescimento
econocircmico e crise houve um reposicionamento da economia da gestatildeo
de recursos comuns e da energia do fim da deacutecada de 1980 em diante
Se a PNMA de 1986 e a Constituiccedilatildeo de 1988 pareciam acenar com a
garantia aos direitos humanos e ambientais e uma preocupaccedilatildeo maior
com a participaccedilatildeo das pessoas nos processos de tomada de decisatildeo as
recentes alteraccedilotildees nas leis ambientais parecem um grande retrocesso e
a participaccedilatildeo das pessoas restrita agrave democracia representativa e a
instacircncias participativas controladas
O Estado passou a reforccedilar seu papel como indutor do
desenvolvimento capitalista direcionando investimentos em alguns
setores econocircmicos aos quais se destina financiamento subsiacutedios e
infraestrutura logiacutestica (transporte e energia) Acabou criando tambeacutem
mecanismos que asseguram o aumento no ritmo da exploraccedilatildeo de
recursos naturais e da despossessatildeo de grupos sociais com a desculpa de
gerar divisas para reduzir a pobreza e a desigualdade social ldquoEm nome
da superaccedilatildeo da desigualdade e da pobreza governos progressistas
impulsionam a expansatildeo de atividades extrativas ndash notadamente o
petroacuteleo e os mineacuterios ndash cujos custos sociais e ambientais tecircm gerado
exclusatildeo e desigualdaderdquo (MALERBA 2012 p 12-3)
O carvatildeo mineral acompanha esse movimento mais amplo com
suas especificidades que satildeo tratadas a seguir
86
32 CARACTERIZACcedilAtildeO E USOS DO CARVAtildeO MINERAL7 NO
BRASIL
A histoacuteria do carvatildeo mineral no Brasil teve iniacutecio em 1795 no Rio
Grande do Sul Ele foi descoberto por teacutecnicos ingleses que construiacuteam
ferrovias na regiatildeo do baixo Jacuiacute Durante muito tempo sua exploraccedilatildeo
foi manual passando agrave etapa da mecanizaccedilatildeo somente apoacutes a Segunda
Guerra Mundial (CHAVES 2008 GOMES et al 1998)
A mineraccedilatildeo eacute uma atividade intensiva em recursos naturais
principalmente do solo e da aacutegua competindo com outros usos dos
recursos naturais locais principalmente aqueles que dependem do meio
ambiente tais como pesca turismo agricultura etc Dentre os principais
usos do carvatildeo mineral destacam-se a produccedilatildeo de energia eleacutetrica e uso
industrial principalmente sideruacutergico O uso tem relaccedilatildeo com a
qualidade do carvatildeo medida pela capacidade de produccedilatildeo de calor
Capacidade essa que eacute favorecida pela existecircncia de carbono e
prejudicada pela quantidade de impurezas normalmente material
orgacircnico (macerais do carvatildeo) e inorgacircnicos (argilas pirita e
carbonatos) (ANEEL 2008a SAMPAIO 2002)
O Brasil natildeo tem uma cultura de uso do carvatildeo mineral como em
outros paiacuteses sua exploraccedilatildeo eacute restrita ao Sul do paiacutes outras regiotildees natildeo
convivem com a questatildeo A qualidade do carvatildeo mineral brasileiro eacute
inferior dado resultante dos altos teores de cinza e enxofre (carvatildeo de
SC e PR) e o passivo ambiental de uma exploraccedilatildeo predatoacuteria e sem
compromisso com o meio ambiente fez com que essa atividade natildeo
contasse com boa fama (CHAVES 2008)
O carvatildeo mineral de acordo com o poder caloriacutefico e a incidecircncia
de impurezas se subdivide em carvatildeo de baixa qualidade (linhito e sub-
betuminoso) e hulha (Betuminoso e Antracito) As reservas brasileiras
satildeo compostas pelo carvatildeo dos tipos linhito e sub-betuminoso que pode
ser utilizado na produccedilatildeo de energia eleacutetrica e usado industrialmente
(ANEEL 2008a) (Figura 5)
7 O carvatildeo mineral natildeo eacute um mineral no sentido estrito sendo mais correto
chamaacute-lo de carvatildeo foacutessil A opccedilatildeo pelo carvatildeo mineral se justifica na medida
em que a maior parte dos documentos e referecircncias consultadas utilizam o
termo (CHAVES 2008)
87
Figura 5 - Tipos de carvatildeo e uso
Fonte Adaptado de Aneel (2008a p 133)
A produccedilatildeo do carvatildeo mineral bruto no Brasil em 1970 foi de 55
milhotildees de toneladas chegando ao pico em 1985 com 249 milhotildees de
toneladas (MILIOLI 2009) Ateacute final da deacutecada de 1980 as sideruacutergicas
brasileiras eram obrigadas a comprar carvatildeo coqueificaacutevel nacional para
misturar com o importado Os empresaacuterios do setor contaram com as
benesses do governo federal que obrigava as sideruacutergicas a utilizarem o
carvatildeo mineral brasileiro e os consumidores do carvatildeo mineral eram
empresas governamentais Como natildeo havia diferenccedila entre o preccedilo e a
qualidade do produto as carboniacuteferas natildeo eram estimuladas a melhorar
a qualidade nem buscar tecnologia para isso
O Governo Collor rompeu com a obrigatoriedade do consumo do
carvatildeo mineral pelas metaluacutergicas e muitas mineradoras enfrentaram
problemas (CHAVES 2008) O pano de fundo para o debate eleacutetrico
dos anos 1990 principalmente durante o governo de Fernando Henrique
Cardoso era a liberalizaccedilatildeo dos preccedilos do comeacutercio e do investimento
estrangeiro a desregulamentaccedilatildeo e a privatizaccedilatildeo em grande escala
(GOLDENBERG PRADO 2003)
O carvatildeo energeacutetico passou a ser uma opccedilatildeo para a crise
enfrentada pelas carboniacuteferas As termeleacutetricas estatais foram
privatizadas ou tiveram o seu capital aberto na deacutecada de 1990 exceto a
Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica (CGTEE) Em 2013
estavam em operaccedilatildeo treze usinas termeleacutetricas em seis estados
brasileiros somando um total de 2711 Megawatts (MW) (Tabela 1)
Destaca-se nessas usinas a participaccedilatildeo de empresas estrangeiras
88
Tractebel CITIC Group (estatal chinesa em parceria com a Companhia
de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica) o Consoacutercio Alumar (formado
pelas empresas Alcoa BHP Billiton e Rio Tinto Alcan) e a ENEVA
Tabela 1 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral em
operaccedilatildeo em 2013 Brasil
Fonte ANEEL 2013
Natildeo havia nenhum empreendimento movido a carvatildeo mineral em
construccedilatildeo no ano de 2013 Existem quatro empreendimentos com
outorga no periacuteodo de 1998 a 2013 somando um total de 1445 MW
localizados nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul (Tabela
2)
Tabela 2 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral com
outorga de 1998 a 2013 Brasil
Fonte ANEEL 2013
USINAPOTEcircNCIA
(MW)MUNICIacutePIO UF PROPRIETAacuteRIO
Charqueadas 72 Charqueadas RS Tractebel
Presidente Meacutedici A B 446 Candiota RS CGTEE
Satildeo Jerocircnimo 20 Satildeo Jerocircnimo RS CGTEE
Figueira 20 Figueira PR Copel
Jorge Lacerda I e II 232 Capivari de Baixo SC Tractebel
Jorge Lacerda III 262 Capivari de Baixo SC Tractebel
Jorge Lacerda IV 363 Capivari de Baixo SC Tractebel
Alunorte 103 Nossa Senhora do Socorro SE Alumina Norte do Brasil SA
Alumar 75 Satildeo Luiacutes MA Consoacutercio Alumar
Porto do Itaqui 360 Satildeo Luiacutes MA UTE Porto do Itaqui Geraccedilatildeo de Energia SA
Porto do Peceacutem I 381 Satildeo Gonccedilalo do Amarante CE Porto do Peceacutem Geraccedilatildeo de Energia SA
Candiota III 12 Candiota RS CGTEE
Porto do Peceacutem II 365 Satildeo Gonccedilalo do Amarante CE MPX Peceacutem II Geraccedilatildeo de Energia SA
TOTAL 2711
USINAPOTEcircNCIA
(MW)MUNICIacutePIO UF PROPRIETAacuteRIO
Jacuiacute 350 Charqueadas RS Eleacutetrica Jacuiacute SA
Sul Catarinense 440 Treviso SC UTE Sul Catarinense
Concoacuterdia 5 Concoacuterdia SC Sadia
CTSUL 650 Cachoeira do Sul RS Central Termoeleacutetrica Sul SA
TOTAL 1445
89
As reservas de carvatildeo no Brasil totalizam sete bilhotildees de
toneladas ocupando o 10ordm lugar no ranking mundial podendo gerar 17
mil mw (ANEEL 2008B) Conveacutem ressaltar tambeacutem que o Brasil
produz mais energia eleacutetrica do que consome em 2011 foram
disponibilizados 5676 TeraWattshora (TWh) e consumidos 4801TWh
e em 2012 foram disponibilizados 5928TWh e consumidos 4984 TWh
A oferta de energia eleacutetrica a base de carvatildeo mineral tende a aumentar
em 53 se as usinas termeleacutetricas com outorga forem construiacutedas Com
a inclusatildeo do carvatildeo mineral nos leilotildees em 2013 parece ser uma
questatildeo de tempo para que as termeleacutetricas listadas na tabela 22 entrem
no leilatildeo e comecem a ser construiacutedas (BRASIL EPE 2013b)
33 TECNOLOGIAS DISPONIacuteVEIS E IMPACTOS
SOCIOAMBIENTAIS
Da extraccedilatildeo do carvatildeo mineral ateacute a geraccedilatildeo de energia eleacutetrica
existem diferentes processos a serem considerados a extraccedilatildeo o
beneficiamento o transporte o uso do carvatildeo mineral para geraccedilatildeo de
energia eleacutetrica e a disposiccedilatildeo dos rejeitos Cada um desses processos
envolve escolhas tecnoloacutegicas e seus impactos Nesta seccedilatildeo faz-se uma
breve exposiccedilatildeo dos meacutetodos utilizados nos processos compreendendo
que a escolha entre os meacutetodos e impactos decorrentes eacute mais
condicionada pelas leis existentes do que pelo tipo de tecnologia
disponiacutevel A escolha tem a ver com a opccedilatildeo do desenvolvimento
(BRITO 1981)
No que se refere agrave extraccedilatildeo do carvatildeo mineral os meacutetodos
utilizados satildeo a lavra a ceacuteu aberto e subterracircnea dependendo das
caracteriacutesticas geoloacutegicas No iniacutecio as lavras eram essencialmente
manuais depois passaram para uma fase semi-mecanizada e depois
mecanizada Na fase manual o impacto ambiental e a produtividade
eram menores O processo de mecanizaccedilatildeo aumentou a produccedilatildeo e com
ela uma maior destruiccedilatildeo ambiental e problemas de sauacutede (MENEZES
CAROLA 2011)
As lavras a ceacuteu aberto utilizam os seguintes meacutetodos meacutetodo de
lavras em tiras (strip mining) lavra de descobertura com escavadeiras de
arrasto (dragline stripping method) lavra em bancadasescavadeira Os
trecircs meacutetodos de formas diferentes retiram as camadas de solo e outras
formaccedilotildees sedimentares que cobrem as camadas de carvatildeo Satildeo meacutetodos
90
de baixo custo comparados aos de lavra subterracircnea mas foram as
lavras a ceacuteu aberto que causaram entre 1960 e 1970 os maiores danos
ambientais do Sul de Santa Catarina (KOPPE COSTA 2008
MENEZES CAROLA 2011 MONTEIRO 2008)
Dentre os meacutetodos de lavra subterracircnea destacam-se o meacutetodo de
cacircmaras e pilares e de frente larga No primeiro meacutetodo o carvatildeo eacute
extraiacutedo e os pilares satildeo formados pelo proacuteprio carvatildeo que sustenta a
cobertura e facilita o fluxo de ar Na medida em que a mineraccedilatildeo
avanccedila os pilares satildeo retirados e a cobertura tomba Jaacute o meacutetodo da
frente larga envolve a remoccedilatildeo total do carvatildeo e a sustentaccedilatildeo eacute feita por
macacos hidraacuteulicos O meacutetodo precisa estar adequado agrave geologia da
mina e o custo do maquinaacuterio eacute cerca de dez vezes maior que do outro
meacutetodo A lavra subterracircnea causa menos impacto visual mas os
impactos ambientais tambeacutem satildeo significativos Torna-se necessaacuterio o
descarte da aacutegua subterracircnea alterando o regime hiacutedrico e inviabiliza
outros usos do solo (KOPPE COSTA 2008 MONTEIRO 2008)
Dentre os principais impactos resultantes das lavras estatildeo as
mudanccedilas na vida da populaccedilatildeo nos recursos hiacutedricos na fauna e flora
Jaacute o processo de beneficiamento que compreende a separaccedilatildeo dos
materiais desejaacuteveis e indesejaacuteveis tem como principal causador de
impacto o rejeito (ANEEL 2008a) O Quadro 4 apresenta alguns
aspectos ambientais associados agrave atividade de mineraccedilatildeo e
processamento mineral
91
Quadro 4 - Aspectos das atividades de mineraccedilatildeo e processamento
do carvatildeo mineral Mineraccedilatildeo e
processamento
Ar Dispersatildeo de partiacuteculas
Variaccedilatildeo da composiccedilatildeo da poeira do
ar
Poeira
Solo Fontes pontuais de contaminaccedilatildeo
Geraccedilatildeo de resiacuteduos
Alteraccedilatildeo na vegetaccedilatildeo
Instabilidade de taludes
Variaccedilatildeo na morfologia do terreno
Cavidades subterracircneas
Aacutegua
superficial
Contaminaccedilatildeo quiacutemica (drenagem
aacutecida etc)
Soacutelidos em suspensatildeo
Desestabilizaccedilatildeo das margens
Alteraccedilatildeo dos cursos de aacutegua
Criaccedilatildeo de novos corpos hiacutedricos
Aacutegua
subterracircnea
Contaminaccedilatildeo quiacutemica
Alteraccedilatildeo na profundidade do niacutevel
drsquoaacutegua
Variaccedilatildeo nas propriedades dos
aquiacuteferos
Fonte CETEM (2000 p 16)
No meacutetodo mais tradicional de geraccedilatildeo de energia eleacutetrica o
carvatildeo mineral eacute queimado a altas temperaturas transformando a aacutegua da
caldeira em vapor capaz de mover a turbina gerando eletricidade Em
meacutedia as teacutermicas movidas a carvatildeo mineral produzem 700g de CO2
por Quilowatt-hora (KWh) sendo responsaacuteveis por 30 a 35 do total de
emissotildees de CO2 no mundo Aleacutem do CO2 tambeacutem emitem Nitrogecircnio
(N) (ANEEL 2008a YAMAOKA et al 2013)
As chamadas tecnologias limpas compreendem a combustatildeo
pulverizada supercriacutetica a combustatildeo em leito fluidizado e a
gaseificaccedilatildeo integrada a ciclo combinado segundo a IEA Na
combustatildeo pulverizada supercriacutetica o carvatildeo eacute queimado como partiacuteculas pulverizadas o que aumenta substancialmente a eficiecircncia da
combustatildeo e conversatildeo No processo de combustatildeo em leito fluidizado
haacute uma reduccedilatildeo de Enxofre (ateacute 90) e de Nitrogecircnio (7080) pelo
emprego de partiacuteculas calcaacuterias e de temperaturas inferiores ao processo
convencional de pulverizaccedilatildeo Jaacute a gaseificaccedilatildeo integrada a ciclo
92
combinado consiste na reaccedilatildeo do carvatildeo com vapor de alta temperatura
e um oxidante (processo de gaseificaccedilatildeo) o que daacute origem a um gaacutes
combustiacutevel sinteacutetico de meacutedio poder caloriacutefico Esse gaacutes pode ser
queimado em turbinas a gaacutes e recuperado por meio de uma turbina a
vapor (ciclo combinado) o que possibilita a remoccedilatildeo de cerca de 95
do Enxofre e a captura de 90 do Nitrogecircnio Apesar da reduccedilatildeo de
Enxofre e Nitrogecircnio as tecnologias do chamado ldquocarvatildeo limpordquo natildeo
representam uma soluccedilatildeo para a emissatildeo de gases de efeito estufa
(ANEEL 2008a MONTEIRO 2008)
Cada tecnologia tem o seu impacto Na escolha por uma
tecnologia ou outra um impacto menor natildeo eacute considerado o motivador
inicial Atender os requisitos miacutenimos da legislaccedilatildeo e ser viaacutevel do
ponto de vista econocircmico satildeo os motivadores principais das escolhas
Os interesses dos segmentos econocircmicos natildeo raro prevalecem sobre os
interesses dos segmentos sociais ldquoO planejamento pauta-se em acordos
setoriais natildeo necessariamente fruto de uma compilaccedilatildeo e mediaccedilatildeo de
interesses mais amplos da sociedaderdquo (BERMANN 2012 p 21)
O raciociacutenio eacute produzir mais e natildeo pensar em eficiecircncia
energeacutetica O paiacutes perde cerca de 20 de energia na transmissatildeo e
distribuiccedilatildeo Antes de investir em novas tecnologias e ampliar o sistema
seria interessante resolver a perda na transmissatildeo e distribuiccedilatildeo de
energia (BERMANN 2012)
34 REGRAS EM USO NUMA PERSPECTIVA HISTOacuteRICA
INTERFACE ENTRE DIREITOS AMBIENTAIS E DIREITOS
HUMANOS
O marco regulatoacuterio do carvatildeo mineral se relaciona com o modo
como a questatildeo ambiental foi sendo incorporada nas leis e numa
perspectiva mais ampla sobre como os direitos ambientais e os direitos
humanos foram sendo constituiacutedos no Brasil O desafio da justiccedila em
sua relaccedilatildeo com as poliacuteticas ambientais tem dois aspectos relacionais a
justiccedila da distribuiccedilatildeo de ambientes entre pessoas e a justiccedila da relaccedilatildeo
entre humanos e o resto do mundo natural a justiccedila ambiental e justiccedila
ecoloacutegica respectivamente A justiccedila eacute uma qualidade da conduta
humana e envolve tanto a reflexatildeo sobre si mesmo e o estar no mundo
quanto a conduta coordenada com os outros a conduta social e poliacutetica
(LOW GLEESON 1998)
93
Durante muito tempo na histoacuteria recente do brasil os recursos
naturais natildeo renovaacuteveis foram tratados como recursos a serem
explorados natildeo havia uma preocupaccedilatildeo com sua preservaccedilatildeo e com os
impactos socioambientais decorrentes das atividades econocircmicas A
Constituiccedilatildeo de 1934 mencionou pela primeira vez a competecircncia
privativa da Uniatildeo para legislar sobre o subsolo mineraccedilatildeo metalurgia
aacuteguas energia hidreleacutetrica florestas caccedila e pesca Do ponto de vista das
competecircncias a Constituiccedilatildeo de 1937 manteacutem a competecircncia privativa
da Uniatildeo sobre os recursos naturais e seus usos considerando a
competecircncia supletiva dos Estados As Constituiccedilotildees de 1946 1967-69
reproduzem com poucas atualizaccedilotildees as mesmas competecircncias
(SCARDUA BURSZTYN 2003)
A despeito do Coacutedigo das Aacuteguas de 1934 que lograva proteger
os recursos hiacutedricos e imputava ao poluidor os custos com a
recuperaccedilatildeo o setor carboniacutefero seguiu intensificando a poluiccedilatildeo das
aacuteguas e dos solos O mesmo aconteceu com as condiccedilotildees miacutenimas de
trabalho presentes no Coacutedigo de Mineraccedilatildeo e no Coacutedigo de Higiene e
Seguranccedila no Trabalho que foram sistematicamente desconsideradas
impondo condiccedilotildees muitas vezes incompatiacuteveis com a vida humana
(MENEZES CAROLA 2011)
O avanccedilo do segmento do carvatildeo mineral contou com incentivos
e proteccedilatildeo do governo federal a partir de 1931 atraveacutes do Decreto
20089 em 1940 com o Decreto 2667e o Decreto 1828 de 1937 Aleacutem
de regular o aproveitamento do carvatildeo mineral iniciou nesse momento a
obrigatoriedade de compra do carvatildeo nacional em 10 em 1931 e 20
em 1937 do montante das importaccedilotildees (BRASIL 1931 1937 1940) As
medidas tomadas nesse periacuteodo incluindo aiacute o Plano do Carvatildeo
Nacional Lei nordm 1886 de 1953 fortaleceram muito o setor (BRASIL
1953) Inclui-se nessa lista o Coacutedigo de Mineraccedilatildeo de 1967 Decreto-Lei
nordm 227 (BRASIL 1967) Junto com o Plano do Carvatildeo Mineral eacute criada
a Comissatildeo Executiva do Plano do Carvatildeo Nacional (CEPCAN) ligada
inicialmente ao Presidente da Repuacuteblica e depois ao MME A
CEPCAN foi responsaacutevel pela consolidaccedilatildeo da modernizaccedilatildeo e dos
subsiacutedios para o setor carboniacutefero (MENEZES CAROLA 2011)
A Avaliaccedilatildeo de Impacto Ambiental (AIA) apareceu no Brasil
pela primeira vez na deacutecada de 1970 no projeto da hidroeleacutetrica de
Sobradinho por pressatildeo do Banco Mundial e na Lei nordm 6803 de 1980
que dispotildee sobre zoneamento industrial Mas soacute se efetivou na Lei nordm
6938 de 1981 que dispotildee sobre a PNMA que coloca a avaliaccedilatildeo de
94
impacto ambiental como instrumento da Poliacutetica Com o Decreto nordm
88351 ela se tornou parte do licenciamento de atividades e
empreendimentos potencialmente poluidores ou causadores de
degradaccedilatildeo ambiental (BARBIERI 1995)
O CONAMA atraveacutes da Resoluccedilatildeo nordm 1 de 1986 trouxe os
criteacuterios baacutesicos e diretrizes para o uso e implementaccedilatildeo da AIA A
resoluccedilatildeo define impacto ambiental como ldquoqualquer alteraccedilatildeo das
propriedades fiacutesicas quiacutemicas e bioloacutegicas do meio ambiente causada por qualquer forma de mateacuteria ou energia resultante das atividades
humanas que direta ou indiretamente afetam I) a sauacutede e bem-estar da
populaccedilatildeo II) as atividades sociais e econocircmicas III) a biota IV) as condiccedilotildees esteacuteticas e sanitaacuterias do meio ambiente V) a qualidade dos
recursos ambientaisrdquo Os processos que envolvem o carvatildeo mineral
extraccedilatildeo beneficiamento transporte uso para geraccedilatildeo de energia satildeo
considerados passiacuteveis de causar impacto e por isso a exigecircncia da
avaliaccedilatildeo de impacto ambiental para seus licenciamentos (BARBIERI
1995)
O Decreto nordm 9927490 conta com a seguinte redaccedilatildeo
Art 19 O Poder Puacuteblico no exerciacutecio de sua
competecircncia de controle expediraacute as seguintes
licenccedilas
I - Licenccedila Preacutevia (LP) na fase preliminar do
planejamento de atividade contendo requisitos
baacutesicos a serem atendidos nas fases de
localizaccedilatildeo instalaccedilatildeo e operaccedilatildeo observados os
planos municipais estaduais ou federais de uso do
solo
II - Licenccedila de Instalaccedilatildeo (LI) autorizando o
iniacutecio da implantaccedilatildeo de acordo com as
especificaccedilotildees constantes do Projeto Executivo
aprovado e
III - Licenccedila de Operaccedilatildeo (LO) autorizando
apoacutes as verificaccedilotildees necessaacuterias o iniacutecio da
atividade licenciada e o funcionamento de seus
equipamentos de controle de poluiccedilatildeo de acordo
com o previsto nas Licenccedilas Preacutevia e de
Instalaccedilatildeo (BRASIL 1990)
Uma exigecircncia no processo de licenciamento eacute a elaboraccedilatildeo do
Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatoacuterio de Impacto
Ambiental (RIMA) A avaliaccedilatildeo de impacto ambiental conforme consta
95
na Figura 6 compreende segundo orientaccedilotildees internacionalmente
aceitas uma etapa inicial de triagem [na qual o estudo de impacto
ambiental eacute solicitado ou natildeo de acordo com o grau de possiacuteveis
impactos ambientais] uma etapa de anaacutelise detalhada [que inclui a
delimitaccedilatildeo do escopo do estudo a elaboraccedilatildeo do estudo de impacto
ambiental e do relatoacuterio de impacto ambiental a anaacutelise teacutecnica e a
consulta puacuteblica] e a etapa poacutes-aprovaccedilatildeo [que prevecirc o monitoramento
e gestatildeo ambiental e o acompanhamento] (SAacuteNCHEZ 2008a)
Figura 6 - Etapas da avaliaccedilatildeo de impacto ambiental
Fonte Adaptado de Saacutenchez (2008 p 96)
96
A audiecircncia puacuteblica no processo de licenciamento ambiental eacute
uma forma de consulta puacuteblica (consta na anaacutelise detalhada na Figura 6)
um instrumento de participaccedilatildeo de caraacuteter consultivo e informativo
segundo resoluccedilatildeo do CONAMA Nordm 009 de 03 de dezembro de 1987
A audiecircncia pode ser solicitada pelo oacutergatildeo ambiental responsaacutevel pelo
licenciamento por uma entidade civil pelo ministeacuterio puacuteblico ou por
um grupo de pelo menos 50 cidadatildeos (CONAMA 1987) Todavia a
decisatildeo no processo de licenciamento cabe aos oacutergatildeos ambientais
competentes No acircmbito federal ao IBAMA e no acircmbito estadual os
oacutergatildeos ambientais estaduais (SAacuteNCHEZ 2008a)
A Avaliaccedilatildeo Ambiental Estrateacutegica (AAE) surge dos limites da
AIA Entre esses limites estatildeo a dificuldade ldquode analisar com
profundidade alternativas tecnoloacutegicas e de localizaccedilatildeo de levar em
conta satisfatoriamente os impactos cumulativos e os impactos indiretos
satildeo inerentes a esta forma de avaliaccedilatildeo de impacto ambientalrdquo
(SAacuteNCHEZ 2008 p 4)
A Constituiccedilatildeo de 1988 traz um capiacutetulo sobre o meio ambiente e
pela primeira vez na histoacuteria do Brasil coloca o meio ambiente como
direito ldquoTodos tecircm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado bem de uso comum do povo e essencial agrave sadia qualidade de vida impondo-se ao Poder Puacuteblico e agrave coletividade o dever de
defendecirc-lo e preservaacute-lo para as presentes e futuras geraccedilotildeesrdquo (Art
225 BRASIL 1988) Cabe aos Estados Distrito Federal e Municiacutepios
acrescentar normas especiacuteficas desde que natildeo colidam com a norma
federal (BARBIERI 1995)
A descentralizaccedilatildeo estimulada pela Constituiccedilatildeo de 1988 foi
inovadora ao contemplar mecanismos de democracia participativa
complementando os mecanismos da democracia representativa todavia
essa ainda natildeo ocorreu em niacutevel satisfatoacuterio e efetivo Desde 1996 todos
os estados brasileiros contam com poliacuteticas ambientais estaduais e
oacutergatildeos responsaacuteveis pela sua implementaccedilatildeo Os municiacutepios caminham
devagar 117 contam com algum oacutergatildeo para tratar do meio ambiente e
213 possuem Conselho Municipal de Meio Ambiente (SCARDUA BURSZTYN 2003)
Outro ponto tratado na Constituiccedilatildeo de 1988 que diz respeito agrave
atividade mineradora eacute a Compensaccedilatildeo Financeira pela Exploraccedilatildeo de
Recursos Minerais (CFEM) O valor da CFEM eacute aplicado sobre o
97
faturamento liacutequido e varia de acordo com a substacircncia mineral Para o
carvatildeo aplica-se a aliacutequota de 2 O valor eacute pago mensalmente e 12
dele vai para a Uniatildeo 23 para o Estado e 65 para o municiacutepio
produtor Os recursos devem ser aplicados em projetos que direta ou
indiretamente melhorem a infra-estrutura qualidade ambiental sauacutede e
educaccedilatildeo da comunidade local (DNPM 2013) Um desafio colocado por
algumas pesquisas eacute o uso adequado da CFEM pela gestatildeo puacuteblica jaacute
que natildeo haacute uma regulamentaccedilatildeo legal para o uso do recurso (AARAtildeO
2011 ENRIacuteQUEZ 2007)
No Governo Fernando Henrique Cardoso foi aprovado o Decreto
nordm 3371 de 24 de fevereiro de 2000 que instituiu o Programa
Prioritaacuterio de Termeletricidade (BRASIL 2000) Com o apagatildeo de 2001
ressurgiu a ideia de que a seguranccedila energeacutetica do paiacutes estaria garantida
com a construccedilatildeo de mais usinas termeleacutetricas (GOLDENBERG
2012a)
Em 2010 comeccedilou a ser articulado um novo marco regulatoacuterio
para a mineraccedilatildeo no Brasil sendo lanccedilado o Projeto de Lei (PL) em
junho de 2013 Em 2014 o Congresso analisaraacute o PL 58072013
(BRASIL 2013a) fruto da Frente Parlamentar da Mineraccedilatildeo Brasileira
da qual fazem parte Celso Maldaner (PMDB) Deacutecio Lima (PT)
Jorginho Mello (Partido da Repuacuteblica - PR) Onofre Santo Agostini
(Partido Social Democraacutetico - PSD) todos eleitos por Santa Catarina
(BRASIL 2013b)
Um dos pontos polecircmicos eacute a regulamentaccedilatildeo da mineraccedilatildeo em
terras indiacutegenas quilombolas e ribeirinhas questatildeo que se situa na
interface entre direitos ambientais e direitos humanos A Constituiccedilatildeo de
1891 vinculava a propriedade do subsolo agrave do solo sendo alterada pela
Constituiccedilatildeo de 1934 ateacute os dias atuais permanecendo a natildeo existecircncia
de viacutenculo entre propriedade do solo e subsolo que pertence agrave Uniatildeo
Todavia conveacutem ressaltar que apesar do domiacutenio puacuteblico dos recursos
minerais eacute possiacutevel a apropriaccedilatildeo privada mediante concessatildeo
(BRASIL MME 2013) A principal criacutetica do novo marco regulatoacuterio eacute
a de que ldquoeacute necessaacuterio reafirmar que o lsquopuacuteblicorsquo e a lsquonaccedilatildeorsquo vivem e
ocorrem sobre o solo e natildeo no subsolo Dessa forma eacute o uso do solo que
deve definir a possibilidade da exploraccedilatildeo do subsolo e natildeo o contraacuteriordquo
(MILANEZ 2012 p 82)
O crescimento da consciecircncia ambiental relaciona-se agrave discussatildeo
histoacuterica sobre direitos humanos e do exerciacutecio desigual de direitos O
movimento ambientalista eacute fruto dessa tradiccedilatildeo de lutas por direitos
98
individuais e coletivos (GONCcedilALVES 1992) Todavia o desafio eacute
superar a visatildeo de que o natildeo-humano eacute de interesse apenas na medida
em que afeta os seres humanos A democracia a justiccedila social e os
direitos humanos satildeo condiccedilatildeo importante para enfrentar a crise mas
natildeo satildeo suficientes Eacute preciso superar tambeacutem o antropocentrismo
caminhando da justiccedila ambiental para a justiccedila ecoloacutegica (DELUCA
2007)
35 ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO
Nesta seccedilatildeo satildeo destacados os envolvidos na gestatildeo do carvatildeo
mineral no Brasil que atuam numa escala mais ampla que a estadual Os
envolvidos na gestatildeo de recursos comuns de Santa Catarina sediados no
estado seratildeo destacados no capiacutetulo quatro Os que foram aqui citados
aparecem nos documentos consultados Dessa forma conveacutem ressaltar
que pode haver outros envolvidos que natildeo estejam citados nesse
capiacutetulo
351 Segmentos poliacuteticos
A atual presidente da repuacuteblica Dilma Rousseff eleita pelo PT
tem mandato de 2011 a 2014 Em sua campanha mais de 90 da receita
foi proveniente de doaccedilotildees ao Comitecirc Financeiro Nacional Do total de
R$ 137 milhotildees e meio o setor mineral contribuiu com 10 desse
valor A Tractebel empresa geradora de energia eleacutetrica doou um
milhatildeo de reais para o Comitecirc Financeiro Nacional para Presidente da
Repuacuteblica do PT o que correspondeu a 07 da receita (OLIVEIRA
2013 TSE 2013) Do setor carboniacutefero natildeo foram identificadas
doaccedilotildees
O Ministeacuterio das Minas e Energia (MME) eacute chave tambeacutem no
processo de gestatildeo Ele foi criado em 1960 e tem como competecircncias a
formulaccedilatildeo e supervisatildeo das poliacuteticas puacuteblicas nos seguintes segmentos geologia recursos minerais e energeacuteticos aproveitamento da energia
hidraacuteulica mineraccedilatildeo e metalurgia e petroacuteleo combustiacutevel e energia
eleacutetrica inclusive nuclear Tem como ministro Edison Lobatildeo e congrega
as secretarias de Petroacuteleo Gaacutes Natural e Combustiacuteveis Renovaacuteveis a
99
Secretaria de Energia Eleacutetrica a Secretaria de Planejamento e
Desenvolvimento Energeacutetico Estatildeo vinculados ao MME o
Departamento Nacional de Produccedilatildeo Mineral (DNPM) (Criado em
1934) a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM)
(Criada em 1969 e iniciando suas atividades em 1970) a ANEEL
(Criada em 1996) o Conselho Nacional de Poliacutetica Energeacutetica (CNPE)
(Criado em 1997)
No Brasil apesar de haverem espaccedilos institucionais o debate
sobre a poliacutetica energeacutetica permanece restrito O Conselho Nacional de
Poliacutetica Energeacutetica (CNPE) criado em 1997 e regulamentado em 2000
eacute um oacutergatildeo de assessoramento da Presidecircncia da Repuacuteblica Ele tem em
sua composiccedilatildeo sete Ministros um representante dos estados e do
Distrito Federal um cidadatildeo brasileiro especialista em energia
designado pelo Presidente da Repuacuteblica e um representante de
universidade brasileira especialista em energia O CNPE eacute influente nos
rumos da poliacutetica energeacutetica nacional todavia pouco democraacutetica em
sua composiccedilatildeo A ANEEL por sua vez ao inveacutes de ser autocircnoma e
independente estaacute formalmente vinculada ao MME como autarquia e
na praacutetica demostra subordinaccedilatildeo ao governo federal (BERMANN
2001)
O Ministeacuterio do Meio Ambiente (MMA) foi criado em 1992
tendo como missatildeo ldquopromover a adoccedilatildeo de princiacutepios e estrateacutegias para
o conhecimento a proteccedilatildeo e a recuperaccedilatildeo do meio ambiente o uso
sustentaacutevel dos recursos naturais a valorizaccedilatildeo dos serviccedilos ambientais
e a inserccedilatildeo do desenvolvimento sustentaacutevel na formulaccedilatildeo e
implementaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas de forma transversal e
compartilhada participativa e democraacutetica em todos os niacuteveis e
instacircncias de governo e sociedaderdquo (MMA 2013) O CONAMA eacute o
oacutergatildeo consultivo e deliberativo do SISNAMA ambos criados em 1981
como instrumentos participativos da PNMA O CONAMA eacute o uacutenico
conselho com poder de legislar Os recursos naturais renovaacuteveis ficam
sob a tutela do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renovaacuteveis (IBAMA) criado em 1989 vinculado
posteriormente ao MMA Jaacute os recursos natildeo renovaacuteveis ficam sob tutela
do MME
O Parlamento eacute composto pelos representantes eleitos pelo povo
Ele se divide entre o Senado Federal (Senadores) e a Cacircmara dos
Deputados (Deputados Federais) e exerce o poder legislativo e
fiscalizador no Congresso Nacional Atuam tambeacutem no Parlamento a
100
Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral criada em 2005
e a Frente Parlamentar da Mineraccedilatildeo Brasileira criada em 2011 As
relaccedilotildees entre o parlamento e os segmentos econocircmicos junto agrave questatildeo
do carvatildeo mineral satildeo analisadas no capiacutetulo cinco dessa tese
(OLIVEIRA 2013)
Jaacute o Ministeacuterio Puacuteblico tem autonomia na estrutura do Estado em
relaccedilatildeo ao executivo legislativo e judiciaacuterio Cabe ao Ministeacuterio Puacuteblico
a defesa da ordem juriacutedica do regime democraacutetico dos interesses
sociais e dos interesses individuais indisponiacuteveis O Ministeacuterio Puacuteblico
da Uniatildeo divide-se em Ministeacuterio Puacuteblico Federal e os Ministeacuterios
Puacuteblicos de cada Estado da Federaccedilatildeo (BRASIL 1993 MPSC 2013)
Os segmentos poliacuteticos aqui apresentados atuam com limitaccedilotildees
mas tambeacutem oferecem brechas A sociedade deveria aproveitaacute-las para
debater os rumos da poliacutetica energeacutetica e as opccedilotildees de desenvolvimento
Contudo o contexto de energia privada e de consequente concentraccedilatildeo
de poder econocircmico se mostra prejudicial agraves questotildees ecoloacutegicas e
democraacuteticas (BERMANN 2001)
352 Segmentos econocircmicos
Os segmentos econocircmicos estatildeo organizados em associaccedilotildees
empresariais e mistas O Instituto Brasileiro de Mineraccedilatildeo (IBRAM) foi
criado em 1976 eacute uma associaccedilatildeo privada sem fins lucrativos que tem
por objetivo congregar representar promover e divulgar a induacutestria
mineral brasileira contribuindo para a sua competitividade nacional e
internacional A mineraccedilatildeo tambeacutem conta com o Consoacutercio Alumar
inaugurado em 1984 eacute um dos maiores complexos de produccedilatildeo de
alumiacutenio do mundo localiza-se no Maranhatildeo e eacute formado pelas
empresas Alcoa BHP Biliton e Rio Tinto Alcan
Os segmentos econocircmicos ligados ao carvatildeo mineral organizam-
se junto ao Sindicato Nacional da Induacutestria de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
(SNIEC) e a Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo Mineral (ABCM) O
SNIEC foi criado em 1989 em Santa Catarina reuacutene as empresas de
mineraccedilatildeo A ABCM foi constituiacuteda em 2006 e reuacutene agentes da cadeia
produtiva do carvatildeo mineradoras geradoras e transportadores O
principal objetivo da Associaccedilatildeo eacute integrar a cadeia produtiva visando o
desenvolvimento sustentaacutevel Conta com 20 empresas associadas
101
Como o tema de tese relaciona-se com a geraccedilatildeo de energia
eleacutetrica conveacutem ressaltar o papel da Cacircmara de Comercializaccedilatildeo de
Energia Eleacutetrica (CCEE) A CCEE foi criada em 2004 ela viabiliza a
compra e venda de energia em todo o paiacutes Ela reuacutene empresas de
geraccedilatildeo de serviccedilo puacuteblico produtores independentes autoprodutores
distribuidoras comercializadoras importadoras e exportadoras de
energia aleacutem de consumidores livres e especiais de todo o paiacutes
Existem empresas e cooperativas bastante influentes a niacutevel
nacional
- A Tractebel do grupo franco-belga GDF-Suez eacute a segunda
maior geradora de energia eleacutetrica privada do Brasil e maior produtora
independente de energia do mundo
- A CITIC Group estatal Chinesa eacute parceira da Eletrobraacutes no
acordo promulgado pelo Decreto nordm 6009 de 3 de janeiro de 2007
(BRASIL 2007)
- A Alunorte Alumina do Norte do Brasil SA criada em 1973
num acordo entre Brasil e Japatildeo pertencia a Vale e localiza-se no estado
do Paraacute A Vale foi privatizada em 1997 e em 2011 negociou as accedilotildees
da Alunorte com a Norsk Hydro ASA
- A ENEVA antiga MPX tendo como principais acionistas a
empresa alematilde EON com 362 e o empresaacuterio brasileiro Eike Batista
com 285 Eacute a maior geradora de energia eleacutetrica privada do Brasil
- A Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica
(CGTEE) constituiacuteda em 1997 pela Uniatildeo tornou-se uma empresa do
Sistema Eletrobraacutes em 2000 Em 2009 assinou um contrato com as
empresas Alstom Power Systems SA ndash France e com a Alstom Brasil
Energia e Transporte Ltda para recuperaccedilatildeo de caldeiras
- A estatal Companhia Paranaense de Energia (COPEL) foi criada
em 1954 abrindo seu capital em abril de 1994
- A Empresa de Pesquisa Energeacutetica (EPE) eacute uma empresa
puacuteblica criada em 2004 e tem por finalidade prestar serviccedilos na aacuterea de
estudos e pesquisas destinadas a subsidiar o planejamento do setor energeacutetico
Destaca-se nas empresas citadas um nuacutemero consideraacutevel de
empresas estrangeiras Conveacutem ressaltar aqui que as mineradoras
102
beneficiadoras e transportadoras natildeo constam nesse item por terem
influecircncia principalmente nos estados e regiotildees produtoras
353 Segmentos sociais
Os trabalhadores do setor mineral encontram-se organizados na
Associaccedilatildeo Nacional de Servidores do Departamento Nacional de
Produccedilatildeo Mineral (ANSDNPM) nos Sindicatos Metabase dentre
outros Jaacute os trabalhadores ligados ao carvatildeo mineral natildeo contam com
uma associaccedilatildeo especiacutefica em niacutevel nacional mas estatildeo organizados em
sindicatos estaduais A posiccedilatildeo dos trabalhadores em relaccedilatildeo ao carvatildeo
mineral eacute de apoio atuando em parceria com os segmentos econocircmicos
O que estaacute em jogo para os trabalhadores eacute a manutenccedilatildeo dos postos de
trabalho e seu sustento (MILANEZ et al 2013)
Os afetadosatingidosameaccedilados enfrentam dificuldades de
vaacuterias ordens no acesso agrave informaccedilatildeo falta de conhecimento teacutecnico-
cientiacutefico espaccedilo de debate restrito etc Na maioria das vezes as
decisotildees sobre empreendimentos de geraccedilatildeo de energia satildeo alimentadas
pela siacutendrome do ldquoapagatildeordquo e os direitos das populaccedilotildees atingidas
parecem ferir o ldquodireitordquo da maioria que precisa de energia
(BERMANN 2001) Mas apesar de todas as dificuldades os
afetadosatingidosameaccedilados pelo setor da mineraccedilatildeo se organizam em
frentes de defesa apoiadas por vaacuterias entidades sediadas em vaacuterias
escalas do local ao global Somam-se aiacute entidades religiosas sindicais
movimentos ambientais movimentos em defesa dos direitos humanos
movimentos indiacutegenas dentre outros Em 2012 surgiu o Movimento
Popular frente agrave Mineraccedilatildeo (MAM) e em 2013 surgiu o Comitecirc
Nacional em Defesa dos Territoacuterios Frente agrave Mineraccedilatildeo Faz parte do
Comitecirc a Federaccedilatildeo de Oacutergatildeos para a Assistecircncia Social e Educacional
(FASE) que atua desde 1961 pela democracia o Instituto de Estudos
Socioeconocircmicos (INESC) criado em 1979 e tem como principal frente
agrave questatildeo da cidadania a Conferecircncia Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB) o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) a
Articulaccedilatildeo dos Povos Indiacutegenas do Brasil (APIB) o Instituto Brasileiro de Anaacutelises Sociais e Econocircmicas (IBASE) entre outros (OLIVEIRA
2013) No caso especiacutefico do carvatildeo mineral natildeo haacute um movimento
popular ou comitecirc em acircmbito nacional embora tenha relaccedilatildeo com o
movimento e comitecirc acima referidos
103
As ONGs e representantes da comunidade acadecircmica tecircm um
papel de parceria com esses movimentos Vaacuterias publicaccedilotildees
demonstram a preocupaccedilatildeo com a questatildeo do carvatildeo mineral o
Greenpeace reprova o chamado ldquocarvatildeo limpordquo e os investimentos feitos
nesse setor (YAMAOKA et al 2013) Amigos da Terra Brasil publicou
Carvatildeo combustiacutevel de ontem com dados atualizados sobre os impactos
do carvatildeo mineral no Brasil (MONTEIRO 2008) A FASE apoiada
pela Fundaccedilatildeo Ford e pela Heinrich Boumlll Stiftung publicou em 2012 o
livro Novo marco legal da mineraccedilatildeo no Brasil Para quecirc Para
Quem (MARLERBA 2012) O IBASE com o apoio da Fundaccedilatildeo Ford
lanccedilou em 2013 Quem eacute quem nas discussotildees do novo coacutedigo da mineraccedilatildeo (OLIVEIRA 2013) Com um caraacuteter mais articulador
aparece o Foacuterum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio
Ambiente e o Desenvolvimento (FBOMS) desde 1990 e a Rede
Brasileira de Justiccedila Ambiental a partir de 2001
Os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais natildeo tecircm um
posicionamento homogecircneo em relaccedilatildeo a criacutetica ou continuidade da
exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral diferente da posiccedilatildeo dos segmentos
econocircmicos todos contam com contradiccedilotildees internas e externas As
relaccedilotildees estabelecidas nos segmentos e os diferentes posicionamentos de
segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais seratildeo examinados ao longo
dos proacuteximos capiacutetulos
36 SITUACcedilAtildeO ATUAL E DESAFIOS
O objetivo do capiacutetulo foi o de tratar a gestatildeo de recursos
comuns colocando ecircnfase no carvatildeo mineral Pela importacircncia
geopoliacutetica e econocircmica os recursos natildeo renovaacuteveis satildeo de competecircncia
do Ministeacuterio das Minas e Energia mesmo apoacutes a criaccedilatildeo do Ministeacuterio
do Meio Ambiente Dessa forma se a gestatildeo dos recursos naturais no
Brasil se pautou durante um longo periacuteodo pela preservaccedilatildeo e pela
conservaccedilatildeo os recursos naturais natildeo renovaacuteveis natildeo participaram desse
movimento A apropriaccedilatildeo e uso dos recursos naturais natildeo renovaacuteveis
passaram ao largo da regulaccedilatildeo dos recursos comuns
O segmento do carvatildeo mineral aleacutem da preocupaccedilatildeo com os
impactos socioambientais sofreu na deacutecada de 1990 com o corte dos
subsiacutedios e reorientou sua produccedilatildeo para a geraccedilatildeo de energia
termeleacutetrica Tambeacutem na geraccedilatildeo de energia eleacutetrica os novos
104
empreendimentos movidos a carvatildeo mineral passaram por um periacuteodo
sem entrar nos leilotildees de energia sendo incluiacutedos novamente em 2013
A inclusatildeo do carvatildeo mineral nos leilotildees e a reforma do Coacutedigo
de Mineraccedilatildeo demonstram a forte articulaccedilatildeo entre parte dos segmentos
poliacuteticos e econocircmicos Os segmentos sociais tecircm aiacute um grande desafio
Uma possibilidade jaacute explorada pelo movimento ambiental eacute a
interface entre direitos ambientais e direitos humanos Eacute preciso cada
vez mais politizar o tema da mineraccedilatildeo do carvatildeo mineral e da energia
Mineraccedilatildeo por quecirc Como Para quem Energia por quecirc Como Para
quem Natildeo existem respostas uacutenicas mas se parte dos segmentos
poliacuteticos e econocircmicos fazem valer seus interesses como ficam os
interesses dos segmentos sociais
Com a Poliacutetica Nacional de Meio Ambiente atraveacutes da avaliaccedilatildeo
de impacto ambiental e a Constituiccedilatildeo de 1988 surgiram novos espaccedilos
de participaccedilatildeo vistos como uma grande conquista pelo movimento
ambiental Um ponto chave para a questatildeo ambiental eacute o avanccedilo das
praacuteticas democraacuteticas E o campo de lutas por direitos envolve todas as
escalas
No Quadro 5 a seguir foi feita uma siacutentese dos principais
aspectos tratados ao longo do capiacutetulo que favorecem e questionam a
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral
Quadro 5 - Siacutentese dos pontos que favorecem e questionam a
amplicaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo
mineral por macro variaacutevel
MACRO
VARIAacuteVEIS
ASPECTOS QUE
FAVORECEM A
AMPLIACcedilAtildeO
ASPECTOS QUE
QUESTIONAM A
AMPLIACcedilAtildeO
Dinacircmicas de
desenvolvimento
- Papel central do Estado
em assegurar os interesses
privados na gestatildeo de
recursos comuns e na
poliacutetica energeacutetica
- Fragmentaccedilatildeo da gestatildeo
de recursos comuns os
recursos renovaacuteveis satildeo da
competecircncia do MMA e os
recursos natildeo renovaacuteveis satildeo
da competecircncia do MME
- Discussatildeo mundial sobre
mudanccedila ambiental global
- Brasil como fornecedor
de commodities minerais
energeacuteticas e agriacutecolas e
- Atuaccedilatildeo do movimento
ambiental
105
- Privatizaccedilatildeo do setor
eleacutetrico
- subsiacutedios aos combustiacuteveis
foacutesseis
- Matriz energeacutetica
brasileira considerada limpa
em relaccedilatildeo a outros paiacuteses
justifica a ampliaccedilatildeo do uso
de combustiacuteveis foacutesseis e
- Visatildeo do planejamento
energeacutetico eacute aumentar a
oferta de energia eleacutetrica
Atributos fiacutesicos
e tecnoloacutegicos
- Disponibilidade do
recurso
- Evoluccedilatildeo tecnoloacutegica
- Neutralidade ldquodardquo e
confianccedila ldquonardquo tecnologia
- Ecircnfase na produccedilatildeo e natildeo
na eficiecircncia energeacutetica
- O Brasil natildeo tem uma
cultura do carvatildeo mineral a
atividade estaacute restrita ao sul
do paiacutes
- Mineraccedilatildeo impede outros
usos do solo
- Evoluccedilatildeo tecnoloacutegica natildeo
garante minimizaccedilatildeo dos
impactos socioambientais
- Escolhas teacutecnicas satildeo
escolhas poliacuteticas natildeo satildeo
neutras
- Necessidade de aumento
da eficiecircncia energeacutetica
Regras em uso - Desregulamentaccedilatildeo e
flexibilizaccedilatildeo das leis
(Coacutedigo de Mineraccedilatildeo)
- A CFEM faz com que o
governo em todos os seus
niacuteveis administrativos
ganhe com a exploraccedilatildeo
mineral
- Participaccedilatildeo tutelada
- Avanccedilo nas leis
(Exigecircncia da AIA nos
licenciamentos)
- Ampliaccedilatildeo da
participaccedilatildeo via audiecircncia
puacuteblica accedilatildeo civil puacuteblica
etc
- Relaccedilatildeo entre direitos
ambientais e direitos
humanos
Arena de accedilatildeo
(Caracterizaccedilatildeo
dos envolvidos
na gestatildeo)
- Parte dos segmentos
poliacuteticos tecircm parcerias com
os segmentos econocircmicos
atraveacutes de doaccedilotildees de
campanha e atraveacutes da
atuaccedilatildeo de parlamentares na
Frente Parlamentar Mista
em Defesa do Carvatildeo
Mineral
- Parte dos segmentos
poliacuteticos possuem
instacircncias participativas e
destaca-se tambeacutem a
atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico
- Os segmentos sociais
exceto o movimento
sindical estatildeo organizados
106
- Os segmentos econocircmicos
estatildeo organizados de vaacuterias
formas (sindicato
associaccedilatildeo instituto
cacircmara consoacutercio) e as
empresas exceto a COPEL
e a EPE satildeo
majoritariamente de capital
estrangeiro
- Nos segmentos sociais
destaca-se o apoio dos
sindicatos agrave causa do carvatildeo
mineral
e atuantes no
questionamento da
ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica movida a
carvatildeo mineral
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na macro variaacutevel arena de accedilatildeo a variaacutevel da democracia
apresenta limites relacionadas aos problemas da democracia
representativa e a reduccedilatildeo da participaccedilatildeo aos espaccedilos existentes Nas
oportunidades destacam-se a organizaccedilatildeo dos segmentos sociais (no
MAM e no Comitecirc Nacional em Defesa dos Territoacuterios Frente agrave
Mineraccedilatildeo) nas redes que unem ONGs academia e
afetadosatingidosameaccedilados e as publicaccedilotildees (Quadro 6)
Quadro 6 ndash Limites e oportunidades do sistema democraacutetico no
Brasil VARIAacuteVEL LIMITES OPORTUNIDADES
Fortalecimento do
sistema
democraacutetico
- Democracia
representativa
- Reduccedilatildeo da
participaccedilatildeo aos
espaccedilos existentes
- Organizaccedilatildeo dos Segmentos
sociais
- Redes unindo ONGs
academia e
afetadosatingidos
ameaccedilados
- Publicaccedilotildees
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Se a aprendizagem social adaptativa eacute chave nesse processo para
que ela ocorra defende-se a hipoacutetese de que o fortalecimento do sistema
democraacutetico se faz necessaacuterio A compreensatildeo da ampliaccedilatildeo da energia
107
termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral aleacutem das evidecircncias descritas
nesse capiacutetulo depende tambeacutem da investigaccedilatildeo dos processos do
ponto de vista do exerciacutecio da democracia em todas as escalas espaciais
e entre os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais A questatildeo passa
pelo modo como os recursos satildeo explorados mas coloca tambeacutem em
questatildeo os objetivos e a direccedilatildeo do desenvolvimento (MELUCCI
2001)
4 CARVAtildeO MINERAL EM SANTA CATARINA
Eacute o duplo resultado da extraccedilatildeo do carvatildeo bens e
riquezas de um lado pirita e restos de homens de
outro (VOLPATO 1984 p 16)
A gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina foi marcada pela
apropriaccedilatildeo privada dos recursos e seu uso serviu principalmente ao
crescimento econocircmico As poliacuteticas ambientais por sua vez foram
condicionadas e limitadas pelos interesses poliacuteticos e econocircmicos e o
oacutergatildeo responsaacutevel a FATMA adotou uma postura de defesa das causas
ambientais sem desestruturar o crescimento econocircmico Nesse contexto
o discurso do carvatildeo foi habilmente sustentado do ponto de vista
material cultural psicoloacutegico e simboacutelico (CAROLA 2004)
O segmento do carvatildeo mineral alternou desde as primeiras
deacutecadas do seacuteculo XX periacuteodos de crescimento e periacuteodos de crise Os
periacuteodos de crescimento amparados por incentivos do governo federal
e os momentos de crise associados a momentos de crise na esfera
governamental Isso levou os segmentos econocircmicos da regiatildeo sul
catarinense a se articularem cada vez mais com os segmentos poliacuteticos
visando a proteccedilatildeo do segmento e a continuidade da mineraccedilatildeo do
carvatildeo no Sul de Santa Catarina Uma das estrateacutegias mais recentes eacute a
construccedilatildeo da USITESC
Cerca de 95 do carvatildeo mineral extraiacutedo na regiatildeo tem como
destino a geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica Se observados os dados sobre
geraccedilatildeo e consumo de energia eleacutetrica em Santa Catarina o estado natildeo eacute
autossuficiente Em 2012 o estado produziu 16963 Gigawatt-hora
(GWh) consumiu 21601 GWh O consumo industrial ficou em 9312
GWh 431 do total consumido no estado e o consumo residencial foi
de 4699 GWh 218 do total consumido (ANEEL 2014 EPE 2013)
O carvatildeo mineral foi responsaacutevel pelo equivalente a 35 da eletricidade
gerada em Santa Catarina (ALESC 2013)
Existem fortes argumentos para que a geraccedilatildeo de energia
termeleacutetrica se amplie contudo o histoacuterico de impactos socioambientais
poderia ser impeditivo Buscando aprofundar a reflexatildeo sobre os
argumento proacute e contra a ampliaccedilatildeo o objetivo deste capiacutetulo eacute tratar da
gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina com destaque agrave gestatildeo do
carvatildeo mineral considerando as macro variaacuteveis presentes no modelo de
110
anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns (HESS OSTROM 2005
OAKERSON 1992 POLSKI OSTROM 1992)
Inicialmente eacute apresentada uma breve siacutentese de como foi se
organizando a gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina tendo
como eixo central o oacutergatildeo responsaacutevel pelas questotildees ambientais no
estado a FATMA Na sequecircncia as seccedilotildees contextualizam o carvatildeo
mineral na trajetoacuteria de desenvolvimento do Sul de Santa Catarina e
tratam das mudanccedilas ocorridas na extraccedilatildeo do carvatildeo mineral bem
como de seus impactos na regiatildeo Satildeo ainda discutidas as regras em uso
incorporando as alteraccedilotildees recentes do Coacutedigo Estadual do Meio
Ambiente de Santa Catarina e eacute feita uma breve caracterizaccedilatildeo da arena
de accedilatildeo com uma descriccedilatildeo dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais envolvidos na gestatildeo do recurso A forma como a gestatildeo de
recursos comuns se organiza em Santa Catarina revela aspectos
importantes para a compreensatildeo da ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica
bem como aspectos que ldquocoloquem em chequerdquo a continuidade da
atividade carboniacutefera
41 ldquoCombinandordquo crescimento econocircmico e proteccedilatildeo ambiental
Santa Catarina fez parte da histoacuteria do Brasil num primeiro
momento como territoacuterio de passagem para o gado gauacutecho e gerava
produtos primaacuterios para satisfazer as necessidades locais Na segunda
metade do seacuteculo XIX foram implantadas as primeiras induacutestrias do
estado A industrializaccedilatildeo catarinense teve em seu iniacutecio uma estreita
ligaccedilatildeo com os movimentos migratoacuterios da Alemanha e Itaacutelia jaacute que os
imigrantes tinham formaccedilatildeo intelectual e profissional e viveram a
modernizaccedilatildeo provocada pela Revoluccedilatildeo Industrial Destacaram-se
nesse periacuteodo a induacutestria tecircxtil alimentar e madeireira e o uso
energeacutetico do carvatildeo vegetal (THEIS 1988)
No final do seacuteculo XIX o estado ainda tinha uma economia
predominantemente agriacutecola e foram os produtos primaacuterios que
possibilitaram a geraccedilatildeo de capital para o investimento na induacutestria Na
histoacuteria de Santa Catarina dois marcos se destacaram na disputa pela
hegemonia na apropriaccedilatildeo dos recursos comuns o Genociacutedio Indiacutegena e
a Guerra do Contestado A desobstruccedilatildeo das aacutereas contestadas e
daquelas ocupadas pelos Carijoacute Xokleng e Kaingang foram
fundamentais para ampliar a apropriaccedilatildeo privada dos recursos naturais
111
(BORINELLI 1998) Aleacutem disso para sustentar o processo de
industrializaccedilatildeo em Santa Catarina no iniacutecio do seacuteculo XX ocorreu a
instalaccedilatildeo de pequenas usinas hidraacuteulicas e o aumento no uso do carvatildeo
mineral Na Primeira Guerra Mundial o carvatildeo mineral passou a ter
destaque possibilitando o surgimento da induacutestria carboniacutefera (THEIS
1988)
Ateacute a deacutecada de 1960 a regulaccedilatildeo dos recursos comuns foi
marcada pelo poder federal Todavia no campo econocircmico o estado
catarinense assumiu para si diversas funccedilotildees na promoccedilatildeo do
desenvolvimento econocircmico Data dessa eacutepoca a criaccedilatildeo do Banco
Estadual de Santa Catarina a Caixa Estadual de Santa Catarina do
Fundo de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina da
Universidade para o Desenvolvimento de Santa Catarina e a instalaccedilatildeo
de 46 escritoacuterios locais da Associaccedilatildeo de Creacutedito e Assistecircncia Rural de
Santa Catarina (ACARESC) e a Companhia Telefocircnica de Santa
Catarina (BORINELLI 1998) O sistema poliacutetico por sua vez teve um
predomiacutenio conservador relacionado principalmente com a dominaccedilatildeo
oligaacuterquica As lideranccedilas empresariais encontravam-se acomodadas nos
grandes partidos (CARREIRAtildeO 1990)
O crescimento econocircmico somado a uma regulaccedilatildeo dos recursos
naturais que privilegiava o acesso privado deu forma agrave crise ambiental
que teve lugar em Santa Catarina apoacutes a deacutecada de 1970 O consumo de
energia eleacutetrica com o processo de industrializaccedilatildeo catarinense
aumentou sensivelmente O consumo final de energia do setor industrial
ficou numa meacutedia de 60 O modelo de desenvolvimento
industrializante de Santa Catarina implicou natildeo apenas num elevado
consumo de energia mas tambeacutem numa exploraccedilatildeo inadequada da
natureza (THEIS 1988)
No Governo Konder Reis em 1975 foi criada a Secretaria de
Tecnologia e Meio Ambiente (SETMA) o Conselho Estadual de
Tecnologia e Meio ambiente (CETMA) e a FATMA na eacutepoca
Fundaccedilatildeo de Amparo agrave Tecnologia e Meio Ambiente A FATMA esteve
vinculada a SETMA ateacute sua extinccedilatildeo em 1977 Para o Governo Konder
Reis a finalidade baacutesica da SETMA era ldquoservir numa primeira fase ao
desenvolvimento do Estadordquo Dentre as principais preocupaccedilotildees
ambientais estavam os serviccedilos de aacutegua e esgoto e contraditoriamente o
aumento da produccedilatildeo mineral e da oferta de madeira (BORINELLI
1998)
112
Todas as unidades de conservaccedilatildeo estaduais foram criadas no
periacuteodo de 1975 a 1983 sob a influecircncia direta de Raulino Reitz Parque
Estadual da Serra Tabuleiro (1975) Reserva Bioloacutegica Estadual de
Sassafraacutes (1977) Parque Estadual da Serra Furada e Reserva Bioloacutegica
da Canela Preta (1980) e Reserva Bioloacutegica Estadual de Aguaiacute (1983)
(BORINELLI 1998 MASSIGNAN 1995)
O primeiro secretaacuterio da SETMA foi Augusto Batista Pereira
empresaacuterio do setor carboniacutefero A preocupaccedilatildeo principal da SETMA no
primeiro ano foi de implantar uma Usina Sideruacutergica no Sul do Estado
Nessa eacutepoca foi construiacuteda a Usina Teacutermica Jorge Lacerda a Induacutestria
Carboquiacutemica Catarinense (ICC) e a proposta da Sideruacutergica
Catarinense Havia tambeacutem uma preocupaccedilatildeo com a poluiccedilatildeo industrial
com a balneabilidade e com os recursos hiacutedricos no geral (BORINELLI
1998 MASSIGNAN 1995)
Da segunda parte da deacutecada de 1970 ateacute meados da deacutecada de
1980 a agenda ambiental foi se ampliando passando a exigir da
FATMA respostas mais consistentes (BORINELLI 1998) O intervalo
de tempo compreendido entre 1979 a 1982 marcou o fim do periacuteodo de
maior crescimento econocircmico de Santa Catarina Durante o periacuteodo
conservador do Governo Estadual e no novo contexto democraacutetico a
poliacutetica ambiental sofreu um grande desgaste com a crise econocircmica e
fiscal
As forccedilas conservadoras continuaram atuantes com a eleiccedilatildeo de
Esperidiatildeo Amin para governador (1983-1987) e os problemas
ambientais continuaram divorciados de outras poliacuteticas setoriais
(econocircmicas de ciecircncia e tecnologia minerais) O licenciamento
ambiental entrou como atividade inovadora e a FATMA na condiccedilatildeo
de fundaccedilatildeo passava a imagem de independecircncia em relaccedilatildeo ao estado
o que na praacutetica natildeo acontecia e tornava difusa a responsabilidade sobre
a poliacutetica ambiental (BORINELLI 1998) Entre os anos de 1983 e 1987
o oacutergatildeo diretamente envolvido com o Planejamento Ambiental no
Estado de Santa Catarina era o Gabinete de Planejamento (GAPLAN)
(SDS 2014)
Mesmo sendo baseada na pequena propriedade rural Santa Catarina sofreu com o enfraquecimento da pequena produccedilatildeo rural
aumentando o ecircxodo rural e consequentemente os problemas urbanos
Em termos socioambientais intensificaram-se os processos de
degradaccedilatildeo ecossistecircmica mau uso do solo falta de saneamento
impacto do turismo nas zonas costeiras etc (VIEIRA CUNHA 2002)
113
A incapacidade de resolver a contento estas tensotildees inaugurava o
reconhecimento de uma crise ambiental em Santa Catarina e uma crise
institucional da FATMA Nos municiacutepios foram criados os Conselhos
Municipais de Defesa Ambiental (CONDEMA) oacutergatildeos consultivos de
assessoramento das Prefeituras Os membros do CONDEMA eram
escolhidos pelos Prefeitos Em 1983 foram criados trecircs escritoacuterios
regionais da FATMA em Joinville Chapecoacute e Joaccedilaba totalizando
quatro com o escritoacuterio de Criciuacutema criado em 1979 Apesar disso as
poliacuteticas ambientais continuaram condicionadas e limitadas pelos
interesses poliacuteticos e econocircmicos (BORINELLI 1998)
Na linha da natildeo responsabilizaccedilatildeo durante muito tempo os
empresaacuterios do segmento do carvatildeo mineral atuaram livremente na
regiatildeo Sul de Santa Catarina gerando o maior passivo ambiental do
estado Em 1983 a FATMA foi incumbida de licenciar e fiscalizar essa
atividade fazendo um acordo com as empresas que assumiram o
compromisso de instalar equipamentos e modificar processos visando a
diminuiccedilatildeo dos impactos Mesmo assim treze anos depois em 1996 o
diretor da FATMA veio a puacuteblico declarar que natildeo era possiacutevel
identificar os responsaacuteveis pelos impactos na regiatildeo e que a sociedade
pagaria o custo da recuperaccedilatildeo cerca de 70 milhotildees de doacutelares
(BORINELLI 1998)
Nos anos 1990 proliferaram denuncias de corrupccedilatildeo envolvendo
oacutergatildeos ambientais federais e estaduais em processos de licenciamento
apontando para a crise do Estado a fragilidade da democracia e dos
mecanismos de controle puacuteblico das instituiccedilotildees O aumento da procura
por licenciamento ambiental trouxe agrave FATMA uma posiccedilatildeo mais
influente entre os segmentos econocircmicos e poliacuteticos e aumentou
tambeacutem sua autonomia financeira atraveacutes dos licenciamentos
ambientais Apesar disso sua trajetoacuteria estaacute marcada por uma atuaccedilatildeo na
defesa das causas ambientais sem desestruturar o desenvolvimento
econocircmico (BORINELLI 2013 2007)
114
42 O sul catarinense uma trajetoacuteria marcada pelo carvatildeo mineral
A regiatildeo Sul Catarinense eacute formada por 46 municiacutepios agrupados
em trecircs microrregiotildees Araranguaacute8 Criciuacutema
9 e Tubaratildeo
10 Tem como
limites o Oceano Atlacircntico a Leste a mesorregiatildeo da Grande
Florianoacutepolis e Serrana no estado de Santa Catarina e a Mesorregiatildeo
Metropolitana de Porto Alegre e Nordeste Rio-Grandense no estado do
Rio Grande do Sul
Figura 7 ndash Mapa de localizaccedilatildeo da Bacia Carboniacutefera Santa
Catarina
Fonte Concepccedilatildeo de Luciana Butzke Elaborado por Ruy Lucas de
Souza
8 Municiacutepios Araranguaacute Balneaacuterio Arroio do Silva Balneaacuterio Gaivota Ermo
Jacinto Machado Maracajaacute Meleiro Morro Grande Passo de Torres Praia
Grande Santa Rosa do Sul Satildeo Joatildeo do Sul Sombrio Timbeacute do Sul e Turvo 9 Municiacutepios Balneaacuterio Rincatildeo Cocal do Sul Criciuacutema Forquilhinha Iccedilara
Lauro Muller Morro da Fumaccedila Nova Veneza Sideroacutepolis Treviso e
Urussanga 10
Municiacutepios Armazeacutem Braccedilo do Norte Capivari de Baixo Garopaba Gratildeo
Paraacute Gravatal Imaruiacute Imbituba Jaguaruna Lagura Orleans Pedras Grandes
Pescaria Brava Rio Fortuna Sangatildeo Santa Rosa de Lima Satildeo Ludgero Satildeo
Martinho Treze de Maio e Tubaratildeo
115
Os municiacutepios da regiatildeo se dividem em trecircs associaccedilotildees de
municiacutepios a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios do Extremo Sul Catarinense
(AMESC)11
a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera
(AMREC)12
e a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo de Laguna
(AMUREL)13
(FECAM 2014) (Figura 7) A regiatildeo possui tambeacutem
quatro Secretarias de Desenvolvimento Regional (SDR) SDR de
Laguna SDR de Tubaratildeo SDR de Criciuacutema e SDR de Araranguaacute
(SANTA CATARINA 2014a)
Na aacuterea existem quatro feiccedilotildees geoloacutegicas as rochas
cristalinas e metamoacuterficas mais antigas do ldquoembasamento cristalinordquo a
sucessatildeo de rochas sedimentares gondwacircnicas que contecircm as camadas
de carvatildeo os derrames baacutesicos aacutecidos e intermediaacuterios da Formaccedilatildeo
Serra Geral e os sedimentos litoracircneos recentes (SCHEIBE 2000)
Na regiatildeo sul localizam-se duas regiotildees hidrograacuteficas
pertencentes agrave Vertente Atlacircntica a Regiatildeo Hidrograacutefica Sul
Catarinense que tem como bacias hidrograacuteficas a Bacia Hidrograacutefica do
Rio Tubaratildeo e a Bacia Hidrograacutefica do Rio drsquoUna contando com 5733
km2 e a Regiatildeo Hidrograacutefica do Extremo Sul Catarinense tendo como
bacias hidrograacuteficas a Bacia do Rio Urussanga a Bacia Hidrograacutefica do
Rio Araranguaacute e a Bacia Hidrograacutefica do Rio Mambituba contando com
5052 km2 (SANTA CATARINA 2006)
O relevo predominante eacute o forte ondulado e montanhoso com
ocorrecircncia de plano e suave ondulado na planiacutecie costeira Jaacute os solos
predominantes na Regiatildeo Hidrograacutefica Sul Catarinense satildeo os
mediamente profundos de origem graniacutetica pouco feacuterteis e aacutecidos
apresentando pedregosidade Na Regiatildeo Hidrograacutefica Extremo Sul
Catarinense predominam os solos mediamente profundos cascalhentos
11
Municiacutepios filiados Araranguaacute Balneaacuterio Arroio do Silva Balneaacuterio
Gaivota Ermo Jacinto Machado Maracajaacute Meleiro Morro Grande Passo de
Torres Praia Grande Santa Rosa do Sul Satildeo Joatildeo do Sul Sombrio Timbeacute do
Sul e Turvo 12
Municiacutepios filiados Balneaacuterio Rincatildeo Cocal do Sul Criciuacutema Forquilhinha
Iccedilara Lauro Muller Morro da Fumaccedila Nova Veneza Orleans Sideroacutepolis
Treviso e Urussanga 13
Municiacutepios filiados Armazeacutem Braccedilo do Norte Capivari de Baixo Gratildeo
Paraacute Gravatal Imaruiacute Imbituba Jaguaruna Laguna Pedras Grandes Pescaria
Brava Rio Fortuna Sangatildeo Santa Rosa de Lima Satildeo Ludgero Satildeo Martinho
Treze de Maio e Tubaratildeo
116
com baixa fertilidade de origem graniacutetica e sedimentar (SANTA
CATARINA 2006)
Na regiatildeo predomina a Floresta Tropical Atlacircntica e a Vegetaccedilatildeo
Litoracircnea contando com trecircs Unidades de Conservaccedilatildeo estaduais o
Parque Estadual da Serra do Tabuleiro (criado em 1975) o Parque
Estadual da Serra Furada (1980) e a Reserva Bioloacutegica Estadual do
Aguaiacute (1983) e duas Unidades de Conservaccedilatildeo Federais o Parque
Nacional de Satildeo Joaquim (1961) e a Aacuterea de Proteccedilatildeo Integral da Baleia
Franca (2000) (SANTA CATARINA 2006)
Em 2010 a regiatildeo contava com uma populaccedilatildeo de 906927
habitantes e uma densidade populacional de 944 habkm2 Em 2009 a
movimentaccedilatildeo econocircmica segundo a composiccedilatildeo do PIB foi de R$ 147
bilhotildees que equivale a 113 do PIB estadual ocupando a quinta
posiccedilatildeo no ranking estadual entre as nove macrorregiotildees (SEBRAE
2013a)
A ocupaccedilatildeo do sul do Brasil contou com a presenccedila de grupos
caccediladores-coletores (aproximadamente 8000 anos) pescadores-
coletores (6000 e 4000 anos) ceramistas TaquaraItarareacute e Guarani e
horticultores (1000 anos) (CAMPOS et al 2013) Em 1877 chegaram
os italianos seguidos de poloneses e alematildees Os primeiros nuacutecleos
coloniais foram Azambuja (1877) Urussanga (1878) Satildeo Joseacute de
Cresciuacutema (1880) Cocal (1885) Nova Veneza (1890) Nova Belluno
(1891) dentre outros As lavras de carvatildeo surgiram em Santa Catarina
no final do seacuteculo XIX por iniciativa de uma empresa britacircnica Ateacute
entatildeo a economia da regiatildeo era agriacutecola A transformaccedilatildeo urbano-
industrial foi estimulada pelo carvatildeo que vinculava-se a ideia de
progresso Eacute marcante a presenccedila do carvatildeo nos hinos das cidades
monumentos festas de Santa Baacuterbara (Protetora dos Mineiros) houve
uma fusatildeo entre a memoacuteria da imigraccedilatildeo e a memoacuteria do carvatildeo
(CAROLA 2004 GOULARTI FILHO LIVRAMENTO 2004a)
A Primeira Guerra Mundial marcou o aumento da produccedilatildeo do
carvatildeo mineral destacando-se a Companhia Carboniacutefera de Araranguaacute
(CBCA) (1917) a Companhia Carboniacutefera Urussanga (1918) e a
Companhia Carboniacutefera Proacutespera (1921) Em 1920 Santa Catarina jaacute contava com alguns elementos importantes para um complexo
carboniacutefero minas ferrovia e porto Em 1924 com a Lei nordm 4801
abordou-se pela primeira vez a possibilidade de construccedilatildeo de uma usina
sideruacutergica no estado Isso se concretizou em 1941 no Governo Getuacutelio
117
Vargas com a fundaccedilatildeo da Companhia Sideruacutergica Nacional (CSN)
(KOPPE COSTA 2008 MORAES 2003)
Nos periacuteodos referentes ao Plano de Metas (1956-1960) e Plano
Nacional do Desenvolvimento (1974 a 1978) o clima estava propiacutecio
para o aumento da produccedilatildeo do carvatildeo mineral No Plano de Metas
surgiu a Sociedade Termoeleacutetrica de Capivari SA (SOLTECA)
passando depois a se chamar Complexo Termoeleacutetrico Jorge Lacerda
constituiacuteda em 1957 entrou em operaccedilatildeo em 1965 No periacuteodo do Plano
Nacional do Desenvolvimento foi construiacuteda a ICC e o Complexo Jorge
Lacerda foi ampliado (KOPPE COSTA 2008 MORAES 2003)
O primeiro boom do setor foi na ocasiatildeo da Primeira Guerra
Mundial e depois durante a Segunda Guerra Mundial com a produccedilatildeo
aumentando em 300 Com o fim da Segunda Guerra o governo
acabou com as cotas e o setor entrou em crise A reaccedilatildeo do segmento do
carvatildeo mineral foi a ldquobatalha do carvatildeordquo14
e o governo reagiu criando a
CEPCAM e retornando agraves cotas Em 1973 com a crise do petroacuteleo o
setor passou novamente por um boom O auge da mineraccedilatildeo foi entre
1982 a 1985 No periacuteodo aacuteureo do carvatildeo poucas vozes denunciavam as
peacutessimas condiccedilotildees de trabalho tudo em nome do progresso pois o
carvatildeo mineral representava a consolidaccedilatildeo da induacutestria de base no
Brasil De 1970 em diante onze empresas pertencentes a empresaacuterios
locais passaram a explorar o carvatildeo mineral (CAROLA 2004
GOULARTI FILHO 2002)
Ateacute 1990 o Sul de Santa Catarina tinha a primazia em termos de
volume de produccedilatildeo nuacutemero e mecanizaccedilatildeo de minas trabalhadores
empregados e valores econocircmicos entrando em crise a partir daiacute com
sua desregulamentaccedilatildeo no Governo Collor O que precisa ser destacado
eacute que a crise da deacutecada de 1990 natildeo foi a ldquocrise do carvatildeordquo As
induacutestrias de ceracircmica vestuaacuterio e plaacutestico localizadas no Sul tambeacutem
sofreram com a recessatildeo de 1990 a 1992 (BEacuteRZIN 2005 GOULARTI
FILHO 2002 MORAES 2003)
A deacutecada de 1990 foi marcada pelo fechamento e desestatizaccedilatildeo
das induacutestrias do complexo carboniacutefero e eliminaccedilatildeo dos benefiacutecios
governamentais O lavador de Capivari foi fechado em 1992 a ICC
14
A ldquobatalha do carvatildeordquo compreende a adoccedilatildeo de estrateacutegias por parte dos
segmentos econocircmicos envolvidos com o carvatildeo mineral visando pressionar e
convencer o governo federal a apoiar a continuidade da atividade (CAROLA
2010)
118
passou para o controle da Petrobraacutes em 1993 A CSN foi privatizada em
1993 e a Companhia Proacutespera propriedade da CSN foi vendida para a
Nova Proacutespera A Ferrovia Teresa Cristina foi privatizada em 1996 e o
Complexo Jorge Lacerda em 1998 (BEacuteRZIN 2005 GOULARTI
FILHO 2002 MORAES 2003)
O setor carboniacutefero foi cedendo espaccedilo para a induacutestria de
revestimento ceracircmico de plaacutesticos e descartaacuteveis do vestuaacuterio de
calccedilados e metal-mecacircnica Em 1985 a atividade do carvatildeo era a que
mais empregava na regiatildeo sul com 10536 trabalhadores Em 2000
passou para a quinta posiccedilatildeo com 2752 trabalhadores empregados
(GOULARTI FILHO 2005) Em 2010 as atividades econocircmicas que
mais se destacaram foram Induacutestria de transformaccedilatildeo com 3395
estabelecimentos e 58652 trabalhadores seguida por serviccedilos com
16971 estabelecimentos e 47956 trabalhadores em terceiro Comeacutercio
com 7062 estabelecimentos e 34467 trabalhadores construccedilatildeo civil
com 828 estabelecimentos e 6641 trabalhadores induacutestria extrativa
mineral com 78 estabelecimentos e 4083 trabalhadores As atividades
que mais empregavam vestuaacuterio minerais natildeo metaacutelicos (ceracircmica)
alimentar e plaacutestico (FIESC 2012)
Em 2012 as mineradoras empregavam em Santa Catarina 4042
trabalhadores no Paranaacute 358 e no Rio Grande do Sul 734 trabalhadores
Jaacute o faturamento para o mesmo ano foi de R$ 49231200000 (Tabela 3)
(SATC 2012)
Tabela 3 - Faturamento do Segmento do Carvatildeo Mineral 2012
Estado Total (R$)
Paranaacute 2602336257
RG Sul 29354141523
S Catarina 49231200000
Total de R$ 81187677780
Fonte SATC (2012 p 11)
Jaacute a arrecadaccedilatildeo da CFEM para o ano de 2013 ficou em R$
358664403 contando os municiacutepios de Treviso (R$ 356903710)
Lauro Muller (R$ 1570791) e Urussanga (R$ 189902) para um total de R$ 18589306884 (DNPM 2014)
Aleacutem de ocupar o primeiro lugar em faturamento e na
arrecadaccedilatildeo da CFEM Santa Catarina tambeacutem ocupa o primeiro lugar
na produccedilatildeo de carvatildeo bruto considerando os trecircs estados do Sul do
Brasil conforme dados da Tabela 4
119
Tabela 4 - Produccedilatildeo de carvatildeo bruto (ROM) de 2009 a 2012
ESTADOS PRODUCcedilAtildeO ROM (t)
2009 2010 2011 2012
Santa Catarina 8208063 6278327 6570292 6097496
Rio Grande do Sul 4585050 5010779 5153199 5134217
Paranaacute 351930 293329 344161 315131
Brasil 13145043 11582435 12067652 11546844
SCBrasil () 6244 5421 5445 5281
Ranking de SC 1ordm 1ordm 1ordm 1ordm
Fonte Fiesc (2012 p 68) SATC (2012)
O segmento do carvatildeo mineral no Sul de Santa Catarina apesar
do destaque na produccedilatildeo do carvatildeo bruto teve ao longo dos uacuteltimos
anos sua participaccedilatildeo diminuiacuteda em nuacutemero de empregos Isso
demonstra uma maior diversificaccedilatildeo econocircmica e poderia representar a
possibilidade de reconversatildeo da atividade Contudo as accedilotildees do
segmento do carvatildeo mineral e dos segmentos poliacuteticos caminham para a
continuidade e ampliaccedilatildeo da atividade e natildeo para sua reconversatildeo
Um importante passo para o questionamento da atividade
carboniacutefera foi dado em 1993 O passivo ambiental resultante da
atividade carboniacutefera foi alvo de uma accedilatildeo civil puacuteblica (processo
938000533-4) Os reacuteus da accedilatildeo foram as empresas carboniacuteferas seus
diretores e soacutecios majoritaacuterios do Estado de Santa Catarina e da Uniatildeo
totalizando 24 reacuteus (MPF 2012)
A sentenccedila foi declarada em 05012000 tendo como resultado a
condenaccedilatildeo dos reacuteus A eles foi solicitado a elaboraccedilatildeo de ldquoum projeto
de recuperaccedilatildeo da regiatildeo que compotildee a Bacia Carboniacutefera do Sul do Estadordquo contemplando ldquoas aacutereas de depoacutesitos de rejeitos aacutereas
mineradas a ceacuteu aberto e minas abandonadas bem como o
desassoreamento fixaccedilatildeo de barrancas descontaminaccedilatildeo e retificaccedilatildeo dos cursos drsquoaacutegua aleacutem de outras obras que visem amenizar os danos
sofridos principalmente pela populaccedilatildeo dos municiacutepios-sede da extraccedilatildeo e do beneficiamentordquo (MPF 2012)
Apoacutes os acordos e imposiccedilotildees judiciais os passivos ambientais
foram distribuiacutedos de acordo com a responsabilidade das empresas
(Tabela 5)
120
Tabela 5 - Distribuiccedilatildeo de passivos ambientais em relaccedilatildeo agraves
empresas
RESPONSAacuteVEL HECTARES
CSN 1336 26
Uniatildeo 1215 24
Rio Deserto 571 11
Catarinense 522 10
Criciuacutema 457 9
Cocalit 181 4
Outras empresas 807 16
Fonte MPF (2012)
As aacutereas terrestres a recuperar totalizam 5094 hectares em 217
diferentes aacutereas da Bacia Carboniacutefera O cronograma de recuperaccedilatildeo
compreende o periacuteodo de 2012 a 2020 e um total de 3726 hectares
(Tabela 6) (MPF 2012)
Tabela 6 - Cronograma de recuperaccedilatildeo dos passivos ambientais
Ano conclusatildeo Hectares a serem
recuperadas
Acumulado da
recuperaccedilatildeo
Obras jaacute concluiacutedas e assim
consideradas apoacutes vistorias
526 526
2012 1142 1667
2013 205 1872
2014 528 2400
2015 141 2542
2016 560 3102
2017 84 3186
2018 71 3257
2019 382 3639
2020 87 3726
3726
Fonte MPF (2012)
121
Os 1365 hectares restantes natildeo dispotildeem de cronogramas
definidos e representam aacutereas cuja recuperaccedilatildeo eacute de incumbecircncia da
Uniatildeo (89 deles) (MPF 2012)
A trajetoacuteria do Sul eacute marcada pelo carvatildeo mineral mas para aleacutem
da ldquocultura do carvatildeordquo nascem possibilidades ligadas agrave diversificaccedilatildeo
econocircmica que rompem com a dependecircncia econocircmica do carvatildeo
43 Da extraccedilatildeo manual agrave mecanizaccedilatildeo das minas
A mecanizaccedilatildeo das minas comeccedilou na deacutecada de 1970 e com
ela o fim do ldquovelho mineirordquo que dominava todo o processo de
produccedilatildeo Com a mecanizaccedilatildeo iniciou-se a divisatildeo teacutecnica do trabalho e
aumentou a poluiccedilatildeo Na extraccedilatildeo manual do carvatildeo a pneumoconiose
afetava 5 a 8 passando a 10 a 12 com a mecanizaccedilatildeo das minas
Somadas a pneumoconiose bronquites crocircnicas doenccedilas de pele e
ansiedade (CHOINACKI 1992) A tecnologia dessa forma foi ldquo()
implantada na induacutestria natildeo como serva dos trabalhadores mas como
instrumento que tecircm como fim a acumulaccedilatildeo de capitalrdquo (VOLPATO
1984 p 43)
Volpato (2001) destaca trecircs momentos distintos um primeiro
momento que compreende o periacuteodo de 1913 a 1976 no qual a extraccedilatildeo
de carvatildeo era artesanal sem agregar maiores recursos tecnoloacutegicos um
segundo periacuteodo de 1976 a 1981 no qual procurou-se agregar recursos
tecnoloacutegicos para aumentar a produccedilatildeo e um terceiro periacuteodo de 1981 a
1988 no qual verificaram-se os malefiacutecios da tecnologia para o meio
ambiente sauacutede e seguranccedila do trabalhador ldquoAos poucos os operadores
foram sentindo alguns efeitos prejudiciais das novas maacutequinas - A
desagregaccedilatildeo das praacuteticas nas frentes de trabalho pela agilidade e
domiacutenio da maacutequina sobre o processordquo (VOLPATO 2001 p 34)
A mecanizaccedilatildeo por um lado facilitou as praacuteticas de trabalho
poupando a forccedila fiacutesica do mineiro mas por outro com a intensificaccedilatildeo do processo aumentaram os impactos na sauacutede do trabalhador e no meio
ambiente A pneumoconiose natildeo era reconhecida como doenccedila
profissional o que fazia com que os mineiros escondessem os sintomas
e prejudicassem ainda mais sua sauacutede (VOLPATO 2001) Aleacutem das
doenccedilas pulmonares acontecem tambeacutem acidentes de trabalho Em
122
outubro de 2013 os mineiros fizeram uma paralisaccedilatildeo apoacutes a morte de
um colega na mina Fontanella em Treviso Foi o segundo acidente com
morte em menos de trecircs meses e o nono nos uacuteltimos cinco anos (G1SC
2013)
44 Regras em uso
Em grande medida as leis estaduais se articulam agraves leis federais
Nessa seccedilatildeo satildeo apresentados alguns casos em que a lei estadual difere
da lei federal Um primeiro exemplo eacute o Projeto de Lei nordm 026632005
de autoria do Deputado Estadual Julio Garcia que entrou em tramitaccedilatildeo
em 2005 O Projeto defendia a dispensa do Estudo de Impacto
Ambiental e Relatoacuterio de Impacto Ambiental para a atividade de
pequeno porte de extraccedilatildeo de carvatildeo mineral em aacutereas de ateacute dois
hectares e meio Para tanto contava com a seguinte fundamentaccedilatildeo
O art 12 sectsect 1ordm a 3ordm da Resoluccedilatildeo CONAMA n
237 de 19 de dezembro 1997 permite que o
oacutergatildeo ambiental competente no caso a FATMA
se necessaacuterio estabeleccedila procedimentos
especiacuteficos e simplificados para o licenciamento
de atividades cujas caracteriacutesticas e peculiaridades
importem em pequeno potencial de impacto
ambiental ou ainda o licenciamento uacutenico e
simplificado para atividades integrantes de planos
e programas voluntaacuterios de gestatildeo ambiental
(SANTA CATARINA 2005 p 2)
Como os impactos do carvatildeo foram considerados de ldquopequeno
potencialrdquo pelos membros da Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina
(ALESC) o Projeto de Lei foi transformado na Lei nordm 18052 de 26 de
janeiro de 2007 (SANTA CATARINA 2007)
Outro exemplo foi a assinatura do Decreto em 2013 que reduziu
o Imposto sobre Circulaccedilatildeo de Mercadoria (ICMS) de 25 para 3 na
venda de energia eleacutetrica para novos empreendimentos beneficiando
principalmente as termeleacutetricas a carvatildeo O Decreto tem como objetivo favorecer a competitividade do carvatildeo mineral catarinense nos proacuteximos
leilotildees de energia eleacutetrica A-5 (ALESC 2013)
Um uacuteltimo exemplo eacute o Coacutedigo Estadual do Meio Ambiente de
Santa Catarina que continua cercado de muitos pontos polecircmicos
123
(SALVADOR 2009 SANTOS 2014) No Coacutedigo aprovado em 2009 o
Governador em exerciacutecio Luiz Henrique da Silveira fez severas criacuteticas
ao Coacutedigo Ambiental Brasileiro que resulta de uma medida provisoacuteria
que ele chamou de ldquofilha bastarda dos Decretos-Lei da Ditadurardquo
(SILVEIRA 2009 p 9) concebido sem amplitude democraacutetica
Segundo ele o Coacutedigo Ambiental Catarinense levou cinco anos para ser
elaborado e envolveu debates e audiecircncias puacuteblicas
Nosso Coacutedigo foi alvo de poucas mas barulhentas
reaccedilotildees e incompreensotildees contraacuterias ao
desenvolvimento sustentaacutevel Houve quem
ameaccedilasse mandar prender os honestos e
indefesos agricultores que lavrassem suas terras a
menos de trinta metros da mata ciliar
(SILVEIRA 2009 p 9)
A alusatildeo aos agricultores se justifica na medida em que um dos
pontos mais polecircmicos do Coacutedigo eacute a reduccedilatildeo da mata ciliar de 30
metros como prevecirc o Coacutedigo Florestal para 5 metros em propriedades
de menos de cinco hectares
O Coacutedigo natildeo trata de forma especiacutefica o carvatildeo mineral mas
traz novidades em relaccedilatildeo a flexibilizaccedilatildeo e simplificaccedilatildeo do processo
de licenciamento A Seccedilatildeo II do Coacutedigo estabelece prazos para a
concessatildeo das licenccedilas trecircs meses para a LAP e nos casos em que
houver EIARIMA e audiecircncia puacuteblica o prazo seraacute de quatro meses
trecircs meses para a LI e dois meses para a LO Quanto aos prazos de
validade das licenccedilas cinco anos para a LP seis anos para a LI e de
quatro a dez anos para a LAO (SANTA CATARINA 2009b)
Em 2013 entrou em tramitaccedilatildeo o Projeto de Lei 030542013 que
trouxe mudanccedilas ao Coacutedigo Ambiental de Santa Catarina (SANTA
CATARINA 2013) O Projeto foi transformado na Lei nordm 16342 de 21
de janeiro de 2014 A principal mudanccedila eacute a possibilidade de
regularizaccedilatildeo fundiaacuteria em aacuterea rural e urbana de edificaccedilotildees atividades
e demais formas de ocupaccedilatildeo em Aacutereas de Preservaccedilatildeo Permanente
desde que aprovadas pelo Municiacutepio (SANTA CATARINA 2014b) Conveacutem ressaltar que a revisatildeo do Coacutedigo Ambiental de SC e a defesa
do carvatildeo mineral na produccedilatildeo termeleacutetrica foram as duas principais
bandeiras da Assembleia Legislativa de Santa Catarina em 2013
124
45 Envolvidos na gestatildeo
Na sequecircncia faz-se uma breve descriccedilatildeo dos envolvidos na
gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina lembrando que aparecem
aqui os envolvidos que constam nos documentos e publicaccedilotildees
consultadas
451 Segmentos poliacuteticos
O governador em exerciacutecio Raimundo Colombo investiu em sua
campanha de 2010 R$ 323669211 Natildeo houve nenhuma doaccedilatildeo de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral diretamente ao candidato Mas o
Comitecirc Financeiro Uacutenico do Democratas (DEM) que tambeacutem repassou
recursos ao candidato recebeu R$ 6000000 da Carboniacutefera Nossa
Senhora do Caravagio Ltda (TSE 2013) Jaacute os representantes eleitos se
dividem na Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina (Deputados
Estaduais) e nas Cacircmaras Municipais (Vereadores) As relaccedilotildees entre
carvatildeo mineral e poliacutetica seratildeo aprofundadas no proacuteximo capiacutetulo
A FATMA tambeacutem faz parte dos segmentos poliacuteticos Aleacutem do
seu papel descrito na seccedilatildeo 41 um outro ponto merece ser destacado
De 2000 ateacute 2014 periacuteodo que compreende o licenciamento da
USITESC passaram pela FATMA na funccedilatildeo de presidente Suzana
Maria Cordeiro Trebien Seacutergio Joseacute Grando Jacircnio Wagner Constante
Carlos L Kreuz Murilo Xavier Flores e Gean Loureiro Desses Seacutergio
Joseacute Grando recebeu na eleiccedilatildeo de 2006 quando concorreu a Deputado
Estadual R$ 200000 da Sul Catarinense Mineraccedilatildeo e R$ 3000000 da
Tractebel e Jean Marques Loureiro recebeu R$ 10000000 da
Tractebel quando concorreu a prefeito do municiacutepio de Florianoacutepolis
(TSE 2013)
Inclui-se tambeacutem nos segmentos poliacuteticos o Ministeacuterio Puacuteblico
Estadual que atua em parceria com o Ministeacuterio Puacuteblico Federal no
acompanhamento da accedilatildeo civil puacuteblica do carvatildeo (MPF 2012) e no
acompanhamento dos processos de licenciamento
452 Segmentos econocircmicos
Os segmentos econocircmicos se organizam no Sindicato da Induacutestria
da Extraccedilatildeo de Carvatildeo do Estado de Santa Catarina (SIESESC) criado
125
em 1989 em Criciuacutema e na Associaccedilatildeo Beneficente da Induacutestria
Carboniacutefera de Santa Catarina (SATC)15
As principais empresas que atuam no segmento tecircm origem na
proacutepria regiatildeo A Carboniacutefera Metropolitana SA iniciou suas atividades
em 1890 em Nova Veneza A empresa tem sede em Criciuacutema eacute
detentora das maiores reservas de carvatildeo mineral do paiacutes e explora trecircs
minas no municiacutepio de Treviso Outra empresa que atua na regiatildeo haacute
mais de noventa anos criada em 1918 eacute a Carboniacutefera Rio Deserto
Ltda administrada pela famiacutelia Zanette hoje na terceira geraccedilatildeo A
Carboniacutefera conta com minas nos municiacutepios de Lauro Muller Treviso
Criciuacutema e Iccedilara A Carboniacutefera Criciuacutema SA tecircm origem na fusatildeo da
Carboniacutefera Caeteacute Ltda e Carboniacutefera Cocal Ltda em 1943 Com sede
em Criciuacutema a carboniacutefera explora o carvatildeo no municiacutepio de
Forquilhinha A Comin amp Cia atua no rebeneficiamento de rejeitos
antigos Suas atividades iniciaram em 1984 e sua unidade de
beneficiamento localiza-se em Criciuacutema Na deacutecada de 1980 foi criada
tambeacutem a Cooperminas a partir da falecircncia da CBCA A Cooperminas eacute
uma cooperativa de trabalhadores da mineraccedilatildeo que explora o carvatildeo em
Forquilhinha A Carboniacutefera Belluno Ltda iniciou suas atividades em
1991 tem sede em Sideroacutepolis e aleacutem de trabalhar na extraccedilatildeo e
beneficiamento do Carvatildeo atua tambeacutem no transporte e na
comunicaccedilatildeo A empresa eacute administrada pelo Grupo Salvaro e conta
com reservas de 140 milhotildees de toneladas de carvatildeo mineral e minas em
Treviso e Sideroacutepolis Em 1999 a Carboniacutefera Catarinense Ltda passou
a explorar e beneficiar o carvatildeo em duas minas localizadas em Lauro
Muller A Carboniacutefera Sideroacutepolis Ltda opera a Usina de
Beneficiamento Lageado no municiacutepio de Urussanga A Companhia
Energeacutetica Meridional pertence agrave Tractebel Energia SA e tem sede em
Florianoacutepolis A Gabriella Mineraccedilatildeo foi fundada em 2004 a partir da
dissoluccedilatildeo da empresa Coque Catarinense Ltda (COCALIT) A
Minageo atua desde 1986 em sondagens e obras subterracircneas entrando
para a extraccedilatildeo do carvatildeo em 1997 Em 2000 assinou um contrato de
fornecimento de carvatildeo para a Tractebel Energia neste ano mudando
seu nome para Mineraccedilatildeo Santa Augusta em (SIESESC 2008)
15
A SATC foi criada em 1959 como Sociedade de Assistecircncia aos
Trabalhadores do Carvatildeo e tinha como objetivo a preparaccedilatildeo de matildeo-de-obra
qualificada e assistecircncia social As carboniacuteferas contribuem com 1 de seu
faturamento para a manutenccedilatildeo da instituiccedilatildeo (SATC 2014)
126
453 Segmentos sociais
O movimento mineiro teve iniacutecio em 1920 com uma greve na
CBCA Em 1944 surgiu em Criciuacutema a Associaccedilatildeo dos Trabalhadores
na Induacutestria Extrativa do Carvatildeo Em 1945 a associaccedilatildeo passou a ser
sindicato Nos anos 1950 foram fundados sindicatos mineiros em Lauro
Muller (1951) TubaratildeoCapivari (1953) Urussanga (1957) e Rio Maina
(1961) A primeira greve apoacutes o surgimento dos sindicatos aconteceu
em 1958 seguida de outras em 1959 1960 1961 e 1963 (GOULARTI
FILHO LIVRAMENTO 2004b)
Aleacutem das muitas greves um dos maiores feitos do movimento
sindical mineiro foi a ocupaccedilatildeo da CSN e o gerenciamento da massa
falida da CBCA e da Mineraccedilatildeo Barro Branco De 1945 a 1957 os
mineiros natildeo encontraram no sindicato um espaccedilo de luta De 1957 a
1964 formou-se um sindicalismo baseado na luta e na resistecircncia O
sindicato denunciou as condiccedilotildees precaacuterias de trabalho a exploraccedilatildeo
sofrida pela categoria e a falta de seguranccedila nas minas Passando por
momentos difiacuteceis durante a ditadura militar de 1964 a 1978 o
sindicalismo passou por uma letargia vindo a se reorganizar em 1988
apoiando quatro greves da CBCA e da Proacutespera (CHOINACKI 1992
VOLPATO 2001)
Os mineiros apoiam a causa do carvatildeo mineral e as mineradoras
se o assunto for a questatildeo ambiental A categoria natildeo se envolve em
movimentos ambientais
A negaccedilatildeo ou o silecircncio e a passividade dos
mineiros em relaccedilatildeo agrave degradaccedilatildeo ambiental
resultante da induacutestria carboniacutefera eacute a expressatildeo
de um mecanismo de defesa reforccedilando a
seguranccedila dos trabalhadores na manutenccedilatildeo do
emprego e da sobrevivecircncia como objetivo mais
imediato e realista (VOLPATO 2001 p 132)
Essas ideias aleacutem de serem defendidas pelos mineiros satildeo
apoiadas por poliacuteticos ligados ao movimento sindical e agrave luta histoacuterica dos trabalhadores Destacam-se Luci Choinacki Joseacute Paulo Serafim e
Milton Mendes de Oliveira que adotam um discurso de apoio ao carvatildeo
mineral em funccedilatildeo de sua importacircncia social (CHOINACKI 1992)
127
A regiatildeo sul de Santa Catarina contou com vaacuterios movimentos
sociais que atuaram e atuam contra a mineraccedilatildeo ao longo da sua
histoacuteria Em 1986 em Sideroacutepolis surgiu o Movimento Ecoloacutegico de
Sideroacutepolis (MES) que atuou ateacute 1989 Tambeacutem em 1986 em Tubaratildeo
surgiu o Movimento Ecoloacutegico Tubaronense (MOVET) que atuou ateacute
1996 Havia um grande envolvimento da igreja catoacutelica que se
consolidou atraveacutes da criaccedilatildeo da Pastoral da Ecologia ligada agrave Diocese
de Tubaratildeo O objetivo da Pastoral da Ecologia era ldquodespertar uma
consciecircncia ecoloacutegica no homem do sul de Santa Catarina destacando a
importacircncia da preservaccedilatildeo da natureza dom de Deus para todos para
que possa atuar comunitariamente na recuperaccedilatildeo do meio ambienterdquo
(Diocese de Tubaratildeo citada por SANTOS 2008 p 81-2) A Pastoral da
Ecologia organizou romarias ecoloacutegicas a primeira aconteceu em
Criciuacutema em 1986 com o tema ldquoNatureza a ganacircncia te destruiu Noacutes te
reconstruiremosrdquo a segunda em Sideroacutepolis em 1988 com o tema ldquoPela
vida pela paz Contra a induacutestria da morterdquo e a terceira em Tubaratildeo em
1991 com o tema ldquoA Matildee Natureza pede socorro O povo exige a
recuperaccedilatildeo da vida na regiatildeo sulrdquo
Uma iniciativa mais recente de mobilizaccedilatildeo e discussatildeo
aconteceu apoacutes o Furacatildeo Catarina em 2004 Exatamente um ano
depois em 2005 aconteceu o 1ordm Encontro da Regiatildeo Sul sobre fenocircmenos naturais adversidades e mudanccedilas climaacuteticas suas causas
efeitos e necessidades de adaptaccedilatildeo que deu origem ao Manifesto por
Justiccedila Climaacutetica O 2ordm Encontro sobre fenocircmenos naturais adversidades e mudanccedilas climaacuteticas da regiatildeo Sul foi realizado em 6 a
8 de outubro de 2009 A realizaccedilatildeo dos dois eventos coube agrave Cacircmara
Temaacutetica do Meio Ambiente do Foacuterum de Desenvolvimento do Extremo
Sul Catarinense (FDESC) sob a Coordenaccedilatildeo da ONG Soacutecios da
Natureza da AMESC do Nuacutecleo Amigos da TerraBrasil Secretaria de
Desenvolvimento Regional (22ordf SDR) da Prefeitura Municipal de
Araranguaacute (PMA) e do Comitecirc de Gerenciamento da Bacia Hidrograacutefica
do Rio Araranguaacute (CGBHRA) Os eventos tambeacutem receberam apoio das
seguintes organizaccedilotildees e coletivos Assembleia Legislativa do Estado de
Santa Catarina (ALESC) Centro de Apoio Socioambiental (CASA)
Rede Brasileira de Justiccedila Ambiental (RBJA) Amigos da Terra
Internacional Defesa Civil de Santa Catarina Movimento Proacute-
Araranguaacute (MPA) Instituto da Cidadania de Araranguaacute (ICA) Proacute-
Comitecirc da Bacia do Mampituba e Federaccedilatildeo de Entidades Ecologistas
Catarinenses (FEEC) (SOacuteCIOS DA NATUREZA 2009 2005) Os dois
encontros demonstram o interesse e a organizaccedilatildeo socioinstitucional da
128
aacuterea afetada em torno da discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas
relacionada ao mesmo tempo com problemas jaacute existentes no territoacuterio
O Manifesto por justiccedila climaacutetica elaborado em 2005 eacute um ponto de
partida para a discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas e justiccedila ambiental
em Santa Catarina Trata-se de uma discussatildeo local que se conecta com
o global sobre um problema atual que se conecta com problemas jaacute
existentes na regiatildeo (MALUF ROSA 2009)
Outra iniciativa importante eacute a dos Foacuteruns Sul Ambiental que
tecircm como objetivo fortalecer um espaccedilo democraacutetico juntando pessoas
instituiccedilotildees e organizaccedilotildees populares na discussatildeo sobre os problemas
socioambientais do Sul Destaca-se aiacute a participaccedilatildeo de professores e
professoras da UNESC e UFSC aleacutem de convidados e convidadas de
outras universidades sediadas em outros estados brasileiros (SANTOS
2008)
A regiatildeo tambeacutem eacute palco de conflitos Dois casos emblemaacuteticos
envolvendo a resistecircncia dos agricultores aconteceram em 1996 em
Criciuacutema na localidade chamada Morro do Estevatildeo e Albino e em
2003 em Iccedilara na localidade de Santa Cruz e Esperanccedila Neste segundo
conflito havia 300 famiacutelias envolvidas aproximadamente mil pessoas
Essas pessoas sobreviviam da agricultura habitavam o local haacute mais de
cem anos e o tamanho de suas propriedades era na meacutedia de vinte
hectares O conflito era de natureza econocircmica (mineraccedilatildeo versus
agricultura) social (envolvimento e mobilizaccedilatildeo social regional) e
ambiental (degradaccedilatildeo) (NASCIMENTO BURSZTYN 2010 p 79)
Nesses conflitos e nas discussotildees regionais destacam-se
- A ONG Soacutecios da Natureza que surgiu em 1980 em
Araranguaacute e se institucionalizou em 1996 tendo uma atuaccedilatildeo regional
(SANTOS 2008)
A ONG trabalha no sentido de buscar em suas
vaacuterias fontes de accedilatildeo a preservaccedilatildeo da natureza e
uma melhor qualidade de vida para a regiatildeo sul de
Santa Catarina o que assinala sua performance de
conotaccedilatildeo socioambiental No entanto por estar
do mesmo modo voltada a accedilotildees que
constantemente envolvem o papel do Estado
tambeacutem pode ser caracterizada por suas
suposiccedilotildees poliacuteticas contra o poder estabelecido
(SANTOS 2008 p 124)
129
- A FEEC que surgiu em 1989 tendo como objetivo unificar e
fortalecer a luta ecoloacutegica catarinense (SANTOS 2008)
- A atuaccedilatildeo de pesquisadores da UNESC e UFSC bem como
pesquisadores sediados em outras universidades do Brasil
- O Grupo de Pesquisa ldquoMemoacuteria e Cultura do Carvatildeo em Santa
Catarinardquo que foi formado em 2000 e inscrito no CNPq em 2002 Ele
reuacutene professores e alunos da UNESC Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS) e CETEM do Rio de Janeiro que estudam
temas relacionados agraves atividades carboniacuteferas O objetivo principal do
Grupo eacute discutir criticamente a cultura a histoacuteria e a economia do
carvatildeo
Ainda nos segmentos sociais incluem-se
- O IPAT vinculado agrave UNESC responsaacutevel pela confecccedilatildeo de
EIARIMA para muitas mineradoras da regiatildeo
- Os meios de comunicaccedilatildeo locais e regionais que natildeo publicam
informaccedilotildees que prejudiquem o segmento carboniacutefero jaacute que muitos satildeo
de propriedade de mineradores e outros recebem valores na forma
patrociacutenio (SANTOS 2008)
46 Situaccedilatildeo atual e desafios
As poucas mudanccedilas ocorridas ateacute o momento satildeo
frutos da pressatildeo exercida pelo movimento
ambiental como um todo na qual seus integrantes
protagonizam um conflito que revela o quanto a
voz do lsquoinimigorsquo fala mais alto (SANTOS 2008
p 160)
A intenccedilatildeo do capiacutetulo foi tratar da gestatildeo de recursos comuns em
Santa Catarina com ecircnfase no carvatildeo mineral O resgate agrave trajetoacuteria do
desenvolvimento catarinense mostra uma ecircnfase na apropriaccedilatildeo privada
dos recursos comuns subordinada ao crescimento econocircmico A
preocupaccedilatildeo ambiental por muito tempo foi considerada marginal
curiosamente ateacute mesmo pelo oacutergatildeo ambiental estadual que incentivou
a expansatildeo da atividade carboniacutefera Essa condiccedilatildeo marginal tambeacutem se
mostra nas regras em uso O Coacutedigo Ambiental de Santa Catarina eacute um
exemplo disso Vaacuterios pontos flexibilizaram a lei ambiental federal para
beneficiar os segmentos econocircmicos
130
O Sul de Santa Catarina tem disponibilidade de carvatildeo mineral e
ao longo de sua trajetoacuteria de desenvolvimento o vem explorando a
despeito dos impactos socioambientais causados pela atividade Nas
uacuteltimas deacutecadas a centralidade desta vem cedendo lugar a outra
atividades econocircmicas Todavia o viacutenculo cultural eacute muito forte Mas
tambeacutem satildeo fortes as vozes contraacuterias agrave exploraccedilatildeo do carvatildeo Os
segmentos sociais se organizam regionalmente e satildeo responsaacuteveis por
movimentos eventos e por uma articulaccedilatildeo em rede com organizaccedilotildees
sediadas em outros estados do Brasil
No Quadro 7 eacute feita uma siacutentese dos principais pontos abordados
ao longo do capiacutetulo que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
energia termeleacutetrica
Quadro 7 ndash Aspectos que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral Santa
Catarina
MACRO
VARIAacuteVEIS
ASPECTOS QUE
FAVORECEM A
AMPLIACcedilAtildeO
ASPECTOS QUE
QUESTIONAM A
AMPLIACcedilAtildeO
Dinacircmicas de
desenvolvimento
- Fragilidade institucional da
FATMA
- Dependecircncia da matriz
energeacutetica catarinense ndash 35
da energia eleacutetrica
consumida no estado vem do
carvatildeo mineral
- Possibilidade de
conexatildeo do carvatildeo
com discussotildees mais
amplas
Atributos fiacutesicos e
tecnoloacutegicos
- Cultura do carvatildeo no Sul
de Santa Catarina
- Disponibilidade do recurso
- Bom faturamento do
segmento do carvatildeo mineral
- Aumento da produccedilatildeo com
a mecanizaccedilatildeo do processo
de trabalho
- Recuperaccedilatildeo do passivo
ambiental como ponto
positivo para a continuidade
da exploraccedilatildeo do recurso
- Aumento da
produccedilatildeo associado a
degradaccedilatildeo
socioambiental
- Diversificaccedilatildeo
econocircmica da regiatildeo
Sul de Santa
Catarina
Regras em uso - Coacutedigo Estadual do Meio
Ambiente estabelece prazos
para as licenccedilas ambientais
131
- Dispensa do EIARIMA
para a atividade de extraccedilatildeo
do carvatildeo mineral de
pequeno porte
- Reduccedilatildeo do ICMS de 25
para 3
Arena de accedilatildeo
(Caracterizaccedilatildeo dos
envolvidos na gestatildeo)
- Parceria de parte dos
segmentos poliacuteticos com os
segmentos econocircmicos
- Parte dos segmentos
sociais os trabalhadores
costumam apoiar a causa do
carvatildeo
- A UNESC que tambeacutem faz
parte dos segmentos sociais
elaborou o EIARIMA
- Miacutedia (segmentos sociais)
natildeo divulga notiacutecias que
prejudiquem o segmento
carboniacutefero
- Parte dos segmentos
sociais ocupam
espaccedilos de
participaccedilatildeo
instituiacutedos
- Existecircncia de
movimentos sociais
regionais
- Parcerias com
ONGs e
Universidades
- Observatoacuterio do
Carvatildeo
- Foacuteruns de
discussatildeo
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na macro variaacutevel arena de accedilatildeo a variaacutevel da democracia
apresenta limites relacionados ao apoio dos segmentos poliacuteticos
(Governo Estadual e FATMA) e de parte dos segmentos sociais
(Movimento Sindical IPATUNESC e miacutedia) agrave causa do carvatildeo
mineral Nas possibilidades destacam-se a atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico a organizaccedilatildeo dos segmentos sociais nas redes que unem
ONGs academia e afetadosatingidosameaccedilados e as publicaccedilotildees
(Quadro 8)
132
Quadro 8 ndash Limites e possibilidades do sistema democraacutetico em
Santa Catarina VARIAacuteVEL LIMITES POSSIBILIDADES
Fortalecimento
do sistema
democraacutetico
- Parte dos segmentos
poliacuteticos (Governo
estadual e FATMA)
apoiam a atividade
- Parte dos segmentos
sociais (Movimento
sindical e o
IPATUNESC) apoiam a
causa do carvatildeo mineral
- Miacutedia apoia o segmento
carboniacutefero
- Atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico
- Organizaccedilatildeo de parte dos
segmentos sociais
- Redes unindo ONGs
academia e
afetadosatingidosameaccedilados
- Publicaccedilotildees
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Apesar do forte viacutenculo entre parte dos segmentos poliacuteticos
segmentos econocircmicos e parte dos segmentos sociais em defesa do
carvatildeo mineral outra parte dos segmentos sociais demonstra
aprendizado social adaptativo ao coordenar suas accedilotildees no niacutevel regional
Em uma regiatildeo na qual a atividade estaacute tatildeo arraigada e muitos
municiacutepios e pessoas dependem dela para o seu sustento a mobilizaccedilatildeo
regional eacute uma forma criativa e articulada de enfrentar um problema que
eacute histoacuterico e que se perpetua nas relaccedilotildees poliacuteticas existentes Estas
seratildeo tratadas nos capiacutetulos cinco e seis tanto na democracia
representativa (via eleiccedilotildees) quanto na democracia participativa
(audiecircncias puacuteblicas no processo de licenciamento) para elucidar ainda
mais os limites e as margens de manobra colocadas nos capiacutetulos trecircs e
quatro fundamentais no delineamento de alternativas ao carvatildeo mineral
5 CARVAtildeO MINERAL E POLIacuteTICA EM SANTA CATARINA
ELEICcedilOtildeES E FINANCIAMENTO PRIVADO
Como montanhas de rejeitos soacutelidos compostos de
pirita e enxofre permanece a mesma poliacutetica do
passado patrimonial (TEIXEIRA 1996 p 95)
A histoacuteria do Sul de Santa Catarina estaacute intimamente ligada ao
carvatildeo mineral Dos tempos aacuteureos entre as deacutecadas de 1930 e 1980 agrave
crise dos anos 1990 e do seu ressurgimento no Governo Fernando
Henrique Cardoso com o anuacutencio da construccedilatildeo de novas termeleacutetricas
movidas a carvatildeo mineral Agora em 2013 no Governo Dilma o carvatildeo
nos leilotildees de energia em 2013 As decisotildees nacionais que ora
incentivam o carvatildeo mineral ora dificultam sua exploraccedilatildeo e uso
impactam sensivelmente as regiotildees que tecircm em seu subsolo esse
recurso natural natildeo renovaacutevel Cabe a essas regiotildees se adaptar
preferencialmente influenciando esses contextos mais amplos
No livro Os donos da cidade Joseacute Paulo Teixeira (1996 p 16)
afirma que o complexo carboniacutefero do Sul de Santa Catarina ldquofoi
constituiacutedo a partir de uma ligaccedilatildeo poliacutetico-estrutural entre a esfera
puacuteblica e privadardquo Tendo essa ideia como referecircncia o objetivo do
capiacutetulo eacute identificar relaccedilotildees entre a poliacutetica catarinense e as empresas
que exploram e utilizam o carvatildeo mineral
Para aleacutem dos discursos sobre desenvolvimento econocircmico
seguranccedila energeacutetica e tecnologias natildeo poluentes a hipoacutetese de que se
parte eacute que existe uma reciprocidade entre os interesses dos poliacuteticos ao
receberem doaccedilotildees para suas campanhas eleitorais e os interesses dos
doadores ligados ao carvatildeo mineral Nesse sentido as injusticcedilas
ecoloacutegicas se referem natildeo apenas agrave distribuiccedilatildeo de riscos ambientais
delimitados localmente Elas satildeo condicionadas tambeacutem poliacuteticas e
praacuteticas cujas consequecircncias atravessam fronteiras instituiacutedas e afetam
muacuteltiplas escalas Como jaacute foi ressaltado anteriormente o conceito de
injusticcedila ecoloacutegica designa um sintoma de um processo que envolve a
distribuiccedilatildeo o reconhecimento e a representaccedilatildeo poliacutetica e determina a
distribuiccedilatildeo desigual dos riscos e danos ambientais (HOLIFIELD et al
2009 SCHLOSBERG 2009 e 2004)
Para tanto foram analisados os pronunciamentos da Frente
Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral e as prestaccedilotildees de
contas das eleiccedilotildees de 2002 2004 2006 2008 2010 e 2012 As eleiccedilotildees
de 2004 2008 e 2012 foram eleiccedilotildees municipais e as eleiccedilotildees de 2002
134
2006 e 2010 foram gerais O recorte temporal utilizado se deve a duas
razotildees principais acompanhar as doaccedilotildees durante o periacuteodo em que se
deu o processo de licenciamento da USITESC e o acesso agraves prestaccedilotildees
de contas que teve iniacutecio na eleiccedilatildeo de 2002
O capiacutetulo eacute dividido em trecircs seccedilotildees principais aleacutem dessa
introduccedilatildeo A primeira seccedilatildeo trata dos argumentos presentes nos
discursos poliacuteticos A segunda apresenta os dados sobre doaccedilotildees de
empresas nas eleiccedilotildees gerais e municipais A terceira e uacuteltima seccedilatildeo traz
uma siacutentese dos fatos ausentes dos discursos Os dados apresentados
sugerem um apoio muacutetuo entre os interesses poliacuteticos e privados Os
candidatos de Santa Catarina que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral em suas campanhas satildeo os mesmos que
apoiam a causa do carvatildeo mineral Nesse caso o apoio envolve a
construccedilatildeo de mais uma termeleacutetrica a USITESC a inclusatildeo do carvatildeo
mineral nos leilotildees de 2013 e a reduccedilatildeo de Imposto sobre o ICMS de
25 para 3 na venda de energia eleacutetrica visando melhorar a
competitividade do carvatildeo mineral de Santa Catarina frente a outros
recursos energeacuteticos
51 Os argumentos presentes no discurso dos poliacuteticos
A Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral foi
constituiacuteda no Congresso Nacional em 2005 tendo como principal
objetivo a expansatildeo do uso do carvatildeo mineral na matriz energeacutetica
nacional Datam desse ano quatro pronunciamentos na Cacircmara dos
Deputados Afonso Hamm (Partido Progressista - PPRS) no dia 19 de
outubro Leodegar Tiscoski (PPSC) no dia 2 de novembro Marcus
Vicente (Partido Trabalhista Brasileiro - PTBES) no dia 9 de
novembro e Edinho Bez (PMDBSC) no dia 18 de novembro
As frentes satildeo constituiacutedas por parlamentares que de forma
suprapartidaacuteria se reuacutenem para tratar de uma questatildeo especiacutefica O que
estaacute em jogo eacute a defesa de interesses econocircmicos ou empresariais
corporativos setoriais ou profissionais regionais e ideoloacutegicos dentre
outros No periacuteodo de 2003 a 2007 havia 148 frentes no parlamento
brasileiro (CORADINI 2010)
Em 19 de outubro de 2005 Afonso Hamm (PPRS) em seu
pronunciamento na Cacircmara dos Deputados reforccedilou a importacircncia do
setor para a seguranccedila energeacutetica e para a geraccedilatildeo de empregos em
Santa Catarina e no Rio Grande do Sul Natildeo houve qualquer menccedilatildeo agrave
135
questatildeo socioambiental exceto para falar do carvatildeo mineral como
ldquoreserva de energiardquo O carvatildeo foi colocado como ldquotema de grande
relevacircnciardquo ressaltando-se a importacircncia de buscar a ldquocompetitividade
do setorrdquo atraveacutes de novos projetos para gerar ldquoem torno de 10 mil
empregos na regiatildeo atualmente deprimida econocircmica e socialmenterdquo
(HAMM 2005 p 50549) Os argumentos em defesa do carvatildeo mineral
enaltecem a seguranccedila e a auto-suficiecircncia energeacutetica do Sul e do Brasil
juntamente com outros argumentos de cunho econocircmico
Por sua vez o pronunciamento de Leodegard Tiscoski traz um
histoacuterico do carvatildeo mineral desafios e medidas reinvindicadas pela
Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral Sobre a
questatildeo ambiental a uacutenica menccedilatildeo aparece no seguinte trecho
Principal insumo energeacutetico no iniacutecio do seacuteculo
XX o carvatildeo foi gradualmente perdendo
importacircncia ateacute transformar-se no patinho feio das
nossas fontes energeacuteticas natildeo soacute pelas suas
deficiecircncias naturais mas principalmente pelos
danos ambientais causados pela sua exploraccedilatildeo
(TISCOSKI 2005 p 52894)
Os problemas enfrentados pelo carvatildeo mineral satildeo imputados ao
governo federal como sugere o trecho a seguir ldquoA histoacuteria do carvatildeo
em Santa Catarina eacute uma sucessatildeo de altos e baixos determinados
sempre pela vontade do Governo Federal independentemente de que tal
vontade fosse beneacutefica ou maleacutefica aos interesses estaduaisrdquo
(TISCOSKI 2005 p 52895) Ao Governo Federal eacute atribuiacuteda tambeacutem a
responsabilidade pela estabilidade de empregos retorno de
investimentos e recuperaccedilatildeo do ambiente natural ldquoRelegado agrave proacutepria
sorte o carvatildeo em Santa Catarina passou a conviver com a incerteza do
emprego e mais que tudo com a anguacutestia da perda de renda de milhares
e milhares de famiacutelias da regiatildeo sul de Santa Catarinardquo (TISCOSKI
2005 p 52895)
Somados aos argumentos sobre a importacircncia econocircmica
ressalta-se o carvatildeo mineral como alternativa ao petroacuteleo e agrave
hidroeletricidade A Frente Parlamentar reivindica a isonomia das regras do leilatildeo de energia nova regulamentaccedilatildeo do artigo 13 da Lei nordm
10438 retomada das pesquisas geoloacutegicas e implementaccedilatildeo de projetos
de pesquisa visando um melhor aproveitamento do carvatildeo ldquoO carvatildeo
136
mineral do Brasil natildeo pode ser objeto de atenccedilatildeo por parte do Governo
Federal apenas nos momentos de criserdquo (TISCOSKI 2005 p 52896)
Em seu pronunciamento Marcus Vicente (PTBES) (2005 p
53630) trata o carvatildeo mineral como ldquoitem de alto significado
estrateacutegicordquo ldquofonte energeacutetica segura e confiaacutevelrdquo que ldquosempre foi
colocado em plano secundaacuteriordquo O discurso reforccedila a geraccedilatildeo de
empregos e a seguranccedila energeacutetica Quanto agrave questatildeo ambiental ela eacute
ldquocolocada em duacutevida quando se fala em maior aproveitamento do
carvatildeordquo (VICENTE 2005 p 53630) Haacute uma aposta na pesquisa e no
desenvolvimento tecnoloacutegico que coloca a mineraccedilatildeo como uma
atividade que pode ser feita ldquosem degradaccedilatildeo ambiental nem
comprometimento da sauacutede dos trabalhadoresrdquo Afirma-se que em
1520 anos a energia seraacute gerada com emissatildeo zero e que as aacutereas
degradadas no Brasil jaacute estatildeo sendo recuperadas (VICENTE 2005 p
53631) Segundo este parlamentar o Brasil precisa acompanhar o curso
da histoacuteria
Jaacute Edinho Bez (PMDBSC) fundamenta seus argumentos em uma
reuniatildeo do G-8 na qual se assume que ldquosuprimentos de energia
confiaacuteveis e baratos satildeo essenciais para um forte crescimento
econocircmicordquo (BEZ 2005 p 55746) Ele afirma que o carvatildeo mineral
tem um papel ldquovitalrdquo a desempenhar face ao contingente de pessoas que
ainda natildeo dispotildeem de acesso a energia comercial por ser uma energia
barata O petroacuteleo e o gaacutes natural seriam fontes energeacuteticas inseguras se
comparadas ao carvatildeo mineral A questatildeo ambiental aparece como
desafio que estaacute sendo equacionado pelo investimento em
desenvolvimento tecnoloacutegico Segundo Bez (2005 p 55746) o objetivo
da Frente Parlamentar eacute o de colocar o carvatildeo mineral ldquodefinitivamente
na agenda do Governo Federal com isso induzindo ao desenvolvimento
regional gerando renda e trabalho e aumentando a seguranccedila energeacutetica
vital para o crescimento do Paiacutesrdquo
No intervalo de tempo compreendido entre dezembro de 2005 e
maio de 2011 natildeo houve pronunciamentos da Frente Parlamentar em
Defesa do Carvatildeo Mineral Todavia nesse periacuteodo a Frente manteve a
articulaccedilatildeo natildeo soacute com o segmento produtivo do carvatildeo mineral mas
tambeacutem com o Ministeacuterio das Minas e Energia e o Ministeacuterio da Ciecircncia
e Tecnologia resultando em accedilotildees programas e projetos importantes
para o segmento (AMARAL 2011)
Em 2011 ocorreram apenas dois pronunciamentos um de Edinho
Bez e outro de Delciacutedio do Amaral O pronunciamento de Edinho Bez
137
(PMDBSC) primeiro secretaacuterio da Frente Parlamentar refere-se agrave
posse da Comissatildeo Executiva da referida Frente Ele fala no carvatildeo
mineral como ldquoenergia do futurordquo ldquoresponsaacutevel pela boa qualidade de
vida de centenas de pessoas nas economias mais desenvolvidasrdquo (BEZ
2011 p 20895) Menciona apenas aspectos econocircmicos da induacutestria
carboniacutefera entendida como base do desenvolvimento socioeconocircmico
do Sul de Santa Catarina Ele finaliza o pronunciamento afirmando que
natildeo se poderia abrir matildeo de nenhuma alternativa energeacutetica
Em novembro de 2011 ocorreu a reinstalaccedilatildeo da Frente formada
por 203 deputados federais e 12 senadores e integrada por ex-
parlamentares do Congresso Nacional Deputados Estaduais Prefeitos
Municipais Vereadores Sindicalistas O principal objetivo da Frente em
2011 era a participaccedilatildeo nos leilotildees A-5
A Frente Parlamentar tem como presidentes de honra o Senador
Joseacute Sarney (PMDBAP) e o Deputado Marco Maia (PTRS) Na
Comissatildeo Executiva o Presidente eacute o Senador Delciacutedio do Amaral
(PTMG) Primeiro Vice-Presidente Deputado Afonso Hamm (PPRS)
Segundo Vice-Presidente Senador Paulo Bauer (Partido da Social
Democracia Brasileira - PSDBSC) Primeiro Secretaacuterio Deputado
Edinho Bez (PMDBSC) Segundo Secretaacuterio Deputado Henrique
Fontanta (PTRS) Terceiro Secretaacuterio Deputado Eduardo Sciarra
(DEMPR) e Quarto Secretaacuterio Deputado Ronaldo Zulke (PTRS)
(AMARAL 2011)
Fazem parte do Conselho Consultivo da Frente como Presidente
o Senador Luiz Henrique da Silveira (PMDBSC) e Vice-Presidente
Deputado Ronaldo Benedet (PMDBSC) como membros cooperadores
Fernando Luiz Zancan (Presidente da ABCM) Cesar Weinschenck de
Faria (Presidente do SNIEC) Ruy Hulse (Presidente do SIECESC)
Sereno Chaise (Diretor da CGTEE) Manoel Arlindo Zaroni Torres
(Diretor-Presidente da Tractebel Energia SA) Paulo Monteiro (Diretor
de Sustentabilidade da EBX representando a MPX Energia SA)
Benony Schmitz Filho (Diretor-Presidente da Ferrovia Tereza Cristina
SA ndash FTC) Paulo Camillo Vargas Penna (Presidente do IBRAM) Luiz
Fernando Leone Vianna (Presidente do Conselho de Administraccedilatildeo da
Associaccedilatildeo Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Eleacutetrica
ndash APINE) Heacutelio Bunn (Presidente da AMREC e prefeito do municiacutepio
de Lauro Muller) Paulo Roberto Felix Machado (Presidente da
Associaccedilatildeo de Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera do Rio Grande do Sul
ndash ASMURC e prefeito de Butiaacute) Genoir Joseacute dos Santos (Presidente da
138
Federaccedilatildeo Interestadual dos Trabalhadores na Induacutestria da Extraccedilatildeo de
Carvatildeo) e Oniro da Silva Camilo (Presidente do Sindicato
Intermunicipal dos Trabalhadores nas Induacutestrias de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
Ouro Calcaacuterio Cal e Barro da Regiatildeo Centro-Sul do Estado do Rio
Grande do Sul) (AMARAL 2011) A composiccedilatildeo do conselho
consultivo demonstra que a Frente Parlamentar Mista em Defesa do
Carvatildeo Mineral se assenta em interesses setoriais e empresariais
regionalmente e nacionalmente representados (CORADINI 2010)
Em agosto de 2012 Afonso Hamm fez um pronunciamento cujo
tema era a sustentabilidade da matriz energeacutetica do Brasil e a criaccedilatildeo da
Associaccedilatildeo Proacute-Carvatildeo (APC) Na sua opiniatildeo ldquoa associaccedilatildeo tem como
propoacutesito estabelecer estrateacutegias de reivindicaccedilatildeo tendo como principal
finalidade a inclusatildeo das usinas termeleacutetricas a carvatildeo mineral nos
leilotildees de energia A-5rdquo (HAMM 2012 p 28704) Mais adiante
esclarece que ldquofalei pessoalmente com a Presidenta Dilma haacute
aproximadamente um ano em Esteio tratando dessa Agendardquo (HAMM
2012 p 28704) Natildeo se fala da questatildeo ambiental a natildeo ser quando eacute
colocada em pauta a inclusatildeo no leilatildeo dos empreendimentos jaacute
instalados e daqueles cuja licenccedila ambiental encontra-se em andamento
Em marccedilo de 2013 Edinho Bez fez seu pronunciamento sobre a
inclusatildeo do carvatildeo mineral no leilatildeo
Sr Presidente meus colegas Parlamentares falo
com satisfaccedilatildeo envaidecido com esta casa e o
proacuteprio Paiacutes pela notiacutecia dada pelo Ministro
Edison Lobatildeo de Minas e Energia com a
autorizaccedilatildeo da Presidente Dilma de que seraacute
incluiacutedo nos proacuteximos leilotildees o carvatildeo mineral
uma fonte de energia uma fonte que garante o
fornecimento de energia natildeo dependeraacute de Satildeo
Pedro natildeo dependeraacute das chuvas natildeo dependeraacute
sequer de uma nem duas ou trecircs Noacutes teremos
mais uma alternativa (BEZ 2013 p 06320)
Bez (2013) ressaltou ainda que o preccedilo do carvatildeo nacional
precisa baixar e para tanto torna-se necessaacuterio reduzir a carga
tributaacuteria Segundo ele o Vice-Governador do Estado de Santa Catarina
Eduardo Moreira jaacute manifestou a disposiccedilatildeo de avanccedilar nessa direccedilatildeo O
resultado dessa disposiccedilatildeo foi a reduccedilatildeo via Decreto em 2013 do ICMS
de 25 para 3 na venda de energia eleacutetrica para novos
empreendimentos beneficiando principalmente as termeleacutetricas a carvatildeo
(ALESC 2013)
139
Ao comentar sobre a posse da nova diretoria da Frente
Parlamentar composta por 182 deputados e senadores presidida pelo
Deputado Federal Afonso Hamm Bez (2013 p 06321) comenta que a
abertura ficou a cargo do presidente da Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo
Mineral o ldquoamigordquo Fernando Zancan
Nos pronunciamentos transparece a ecircnfase colocada na promoccedilatildeo
da seguranccedila energeacutetica do Sul e do Paiacutes mediante o aproveitamento do
carvatildeo mineral visto como uma alternativa viaacutevel se comparada agrave
hidroeletricidade ao gaacutes natural e ao petroacuteleo Como argumentos de
defesa o desenvolvimento econocircmico das regiotildees carboniacuteferas de Santa
Catarina e do Rio Grande do Sul parece depender desta atividade
Aspectos socioambientais satildeo apenas tangenciados reconhecendo-se em
alguns momentos que a atividade carboniacutefera causou impactos mas
tambeacutem se admitindo que os mesmos jaacute foram ou estatildeo sendo
resolvidos natildeo devendo se repetir em decorrecircncia dos avanccedilos
tecnoloacutegicos do segmento
52 Panorama das eleiccedilotildees e doaccedilotildees de campanha de 2002 a 2012
Ateacute 1992 a legislaccedilatildeo em vigor proibia a oferta de doaccedilotildees por
parte das empresas Mas as reformas na legislaccedilatildeo apoacutes 1992 tornaram o
sistema mais tolerante apostando na prestaccedilatildeo de contas como forma de
controle puacuteblico Em 1994 o TSE passou a divulgar dados sobre as
candidaturas e contas de campanha Os dados satildeo de responsabilidade
dos candidatos e questiona-se a veracidade dos mesmos vaacuterios satildeo os
casos de financiamentos ilegais corrupccedilatildeo traacutefico de influecircncias
envolvimento com crime organizado que passam a contribuir para a
criacutetica ao financiamento privado Em funccedilatildeo desses problemas o tema
do financiamento poliacutetico tornou-se central no debate recente sobre a
reforma poliacutetica (LEMOS MARCELINO PEDERIVA 2010 SPECK
2005)
Os resultados das eleiccedilotildees indicam fortes viacutenculos com doaccedilotildees e
gastos de campanha quanto maiores as doaccedilotildees e gastos maiores as
chances de o candidato se eleger Os doadores se tornaram tatildeo
fundamentais nas campanhas que tecircm determinado muitas vezes a
proacutepria escolha do candidato A reeleiccedilatildeo apresenta-se como um trunfo
aos candidatos jaacute que o risco do doador eacute menor do que se este
escolhesse um iniciante (LEMOS MARCELINO PEDERIVA 2010)
140
Em contrapartida candidatos tendem a compensar tais investimentos se
e quando eleitos ldquoEacute grande a lista de entidades que satildeo potencialmente
beneficiadas por decisotildees ou medidas administrativas do governo entre
estes os bancosrdquo (SPECK 2005 p 148)
No Brasil satildeo permitidas doaccedilotildees de empresas que possuem
relaccedilotildees contratuais com o Estado natildeo existindo regra que limite a
dependecircncia entre candidato e doador Dados sobre as prestaccedilotildees de
contas demonstram um problema de dependecircncia entre os candidatos e
seus principais financiadores (SPECK 2005)
Na sequecircncia satildeo examinadas as doaccedilotildees das eleiccedilotildees de 2002 a
2012 divididas em eleiccedilotildees gerais e eleiccedilotildees municipais A ecircnfase recai
nas doaccedilotildees realizadas por empresas ligadas ao carvatildeo mineral e sua
relaccedilatildeo com os candidatos de Santa Catarina As doaccedilotildees para
candidatos de outros estados natildeo satildeo tratadas neste capiacutetulo
521 Eleiccedilotildees gerais
No periacuteodo compreendido entre os anos de 2002 e 2012
ocorreram trecircs eleiccedilotildees gerais Constam nos registros do Tribunal
Superior Eleitoral nove empresas relacionadas ao carvatildeo mineral em
Santa Catarina como doadoras
O Complexo Jorge Lacerda que utiliza carvatildeo mineral para
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica pertence agrave Tractebel que tambeacutem eacute
proprietaacuteria das Usinas Hidreleacutetricas de Itaacute Machadinho e Co-geraccedilatildeo
de biomassa em Lages todos situados em Santa Catarina A Carboniacutefera
Metropolitana SA tem 123 anos de existecircncia estaacute sediada em
Criciuacutema e possui parte da USITESC A Carboniacutefera Belluno Ltda foi
fundada em 1991 apoacutes a compra de parte da Companhia Sideruacutergica
Nacional pelo Grupo Salvaro e localiza-se em Sideroacutepolis Aleacutem de
trabalhar na extraccedilatildeo e beneficiamento do Carvatildeo a Carboniacutefera
Belluno tambeacutem atua no transporte e na comunicaccedilatildeo A Mineraccedilatildeo
Castelo Branco Ltda localiza-se em Lauro Muller A Carboniacutefera
Criciuacutema foi fundada em 1943 e tem sede em Criciuacutema A Induacutestria
Carboniacutefera Rio Deserto foi criada em 1918 e localiza-se em Criciuacutema
bem como a Coque Catarinense a Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos e a
Mineraccedilatildeo Santa Augusta
141
A eleiccedilatildeo de 2002 teve como principais doadores a Tractebel
(5007) a Carboniacutefera Metropolitana (1488) e a Carboniacutefera
Belluno (1320) A empresa que mais apoiou candidatos dez no total
foi a Carboniacutefera Metropolitana As demais empresas apoiaram cinco
candidatos ou menos conforme consta na Tabela 7
Tabela 7 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2002
Fonte TSE 2013
Quanto ao montante de doaccedilotildees por candidato em 2002
destacou-se o candidato a governador Esperidiatildeo Amin que recebeu de
quatro empresas 4138 do total de doaccedilotildees O candidato Paulo Roberto
Bauer recebeu de quatro empresas o equivalente a 1182 das doaccedilotildees
Cleacutesio Salvaro recebeu apenas 673 Aleacutem dos trecircs candidatos citados
outros dezesseis candidatos ficaram com 4007 das doaccedilotildees conforme
dados da Tabela 8 As duas uacuteltimas colunas da Tabela 8 relacionam as
doaccedilotildees com a receita total dos candidatos Em quatro dos 19 candidatos
as doaccedilotildees das empresas ligadas ao carvatildeo mineral representam mais de
50 de sua respectiva receita
Nordm
CANDIDATOS
Tractebel Egi South America Ltda 5 PFL PP PPB PSDB 53000000 5007
Carboniacutefera Metropolitana SA 10 PP PMDB PSDB PT PPB PFL 15750000 1488
Carboniacutefera Belluno Ltda 3 PMDB PFL PT 13970000 1320
Mineraccedilatildeo Castelo Branco Ltda 5 PFL PMDB PP PPB PSDB 8467400 800
Carboniacutefera Criciuacutema Ltda 5 PFL PT PSDB PMDB PT 6450000 609
Induacutestria Carboniacutefera Rio Deserto Ltda 5 PFL PMDB PSDB 4050000 383
Coque Catarinense Ltda 2 PFL PMDB 2434000 230
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos Ltda 4 PFL PMDB PP 927000 088
Mineraccedilatildeo Santa Augusta Ltda 1 PP 800000 076
TOTAL 105848400 10000
DOADOR PARTIDOS VALOR R$
142
Tabela 8 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2002 que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees de 2002 o PP recebeu 46 das doaccedilotildees o Partido
da Frente Liberal (PFL) 2147 o PSDB 1352 o PMDB 1027
o PT 477 e o Partido Progressista Brasileiro (PPB) 397
Tabela 9 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2002
Fonte TSE 2013
NO ME PARTIDO CANDIDATURA VALO R R$ RECEITA TO TAL R$
Esperidiatildeo Amin PP Governador 43798600 4138 373920269 1171
Paulo R Bauer PSDB Deputado Federal 12510800 1182 49994468 2502
Clesio Salvaro PFL Deputado Estadual 7120000 673 11296000 6303
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 5266200 498 27320200 1928
Paulo R Bornhausen PFL Senador 4900000 463 198753494 247
Leodegar da C Tiscoski PP Deputado Federal 4892000 462 20432951 2394
Joseacute P Serafim PT Deputado Estadual 4500000 425 7303000 6162
Luiz H da Silveira PMDB Governador 4000000 378 240099527 167
Ivan C Ranzolin PFL Deputado Federal 3000000 283 26017099 1153
Pedro Bittencourt Neto PFL Deputado Federal 2860800 27 13469800 2124
Vanio de Oliveira PPB Deputado Federal 2200000 208 3110990 7072
Celestino RSecco PPB Deputado Estadual 2000000 189 21164000 945
Joatildeo P K Kleinubing PFL Deputado Estadual 2000000 189 10710330 1867
Julio Cesar Garcia PFL Deputado Estadual 2000000 189 4449450 4495
Cezar P de Luca PSDB Deputado Federal 1800000 17 3925683 4585
Ronaldo J Benedet PMDB Deputado Estadual 1350000 128 12097324 1116
Arleu R da Silveira PFL Deputado Estadual 850000 08 890370 9547
Edson C Rodrigues PT Deputado Federal 550000 052 8653600 636
Aceacutelio Casagrande PMDB Deputado Federal 250000 024 1512694 1653
TOTAL 105848400 100
PARTIDO VALOR R$
PP 48690600 46
PFL 22730800 2147
PSDB 14310800 1352
PMDB 10866200 1027
PT 5050000 477
PPB 4200000 397
TOTAL 105848400 100
143
Nas Eleiccedilotildees de 2006 entraram em cena as seguintes empresas
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasileira que atua na regiatildeo Companhia
Energeacutetica Meridional que eacute subsidiaacuteria da empresa Tractebel A
Mendes Terraplanagem Construccedilatildeo e Extraccedilatildeo de Minerais Ltda que
atua na regiatildeo Minageo Ltda de Criciuacutema Sulcatarinense Mineraccedilatildeo e
Artefatos Ltda com sede em Biguaccedilu Carboniacutefera Sideroacutepolis de
Criciuacutema Gabriella Mineraccedilatildeo de Sideroacutepolis Carboniacutefera Catarinense
Ltda de Lauro Muller Nas eleiccedilotildees de 2006 a Tractebel doou 4038
para onze candidatos a Carboniacutefera Metropolitana 1226 para quatro
candidatos e a Carboniacutefera Criciuacutema 1136 (Tabela 10) O montante
de doaccedilotildees aumentou de R$ 105848400 em 2002 para R$
158506900 em 2006
Tabela 10 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2006
Fonte TSE 2013
Dos 22 candidatos apoiados pelas empresas em 2006 Edson Bez
de Oliveira recebeu 1325 dos recursos de seis empresas Ada Lili
Faraco de Luca recebeu 1262 de duas empresas Luiz Henrique da
Silveira recebeu 1262 de uma empresa e Paulo Roberto Bauer
recebeu 946 de quatro empresas (Tabela 11) Constata-se uma
distribuiccedilatildeo maior das doaccedilotildees jaacute que na Eleiccedilatildeo de 2002 um uacutenico
candidato Esperidiatildeo Amim recebeu 4138 das doaccedilotildees
DOADOR NordmCANDIDATOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora 11 PFL PMDB PP PPS PSDB PT 64000000 4038
Carboniacutefera Metropolitana SA 4 PMDB PP PSDB 19432000 1226
Carboniacutefera Criciuacutema SA 2 PMDB PSDB 18000000 1136
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasil Ltda 7 PFL PMDB PP PPS PT 15555000 981
Cia Energeacutetica Meridional 3 PFL PP PT 14000000 883
Carboniacutefera Catarinense Ltda 2 PFL PP 8183000 516
Carboniacutefera Belluno Ltda 2 PMDB PSDB 6776000 427
A Mendes TerConstr E Extr De
Minerais Ltda 1 PMDB 4000000 252
Minageo Ltda 2 PMDB PT 3288000 207
Sul Catarinense Mineraccedilatildeo e Art 4 PP PPS PSDB 2400000 151
Carboniacutefera Sideroacutepolis Ltda 1 PP 1186500 075
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda 1 PP 1186400 075
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos 1 PMDB 500000 032
TOTAL 158506900 10000
144
Tabela 11 - Candidatosas que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2006
Fonte TSE 2013
Em 2006 o PMDB recebeu o maior montante de doaccedilotildees
4104 enquanto na eleiccedilatildeo de 2002 o maior montante foi destinado ao
PP 46 O PSDB aumentou suas captaccedilotildees junto ao lobby do carvatildeo de
1352 em 2002 para 1640 em 2006 O PT de 477 em 2002
para 807 em 2006 O PFL diminuiu de 2147 para 1577 no
periacuteodo Aleacutem do PMDB apareceu na lista tambeacutem o Partido Popular
Socialista (PPS) com 265 (Tabela 12)
NOME PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 21000000 1325 44379023 4732
Ada Lili Faraco de Luca PMDB Deputado Estadual 20000000 1262 62976575 3176
Luiz Henrique da Silveira PMDB Governador 20000000 1262 725548795 276
Paulo Roberto Bauer PSDB Deputado Federal 15000000 946 63272293 2371
Leodegar da Cunha Tiscoski PP Deputado Federal 12263900 774 16487006 7439
Geraldo Cesar Althoff PFL Deputado Federal 11000000 694 113398356 97
Angela Regina Heinzen Amin Helou PP Deputado Federal 10000000 631 25349000 3945
Djalma Vando Berger PSDB Deputado Federal 5000000 315 107978844 463
Gervaacutesio Joseacute da Silva PFL Deputado Federal 5000000 315 95845710 522
Giancarlo Tomelin PSDB Deputado Estadual 5000000 315 14028277 3564
Jorge Catalino Leonardelli Boeira PT Deputado Federal 5000000 315 47519555 1052
Paulo Roberto Barreto Bornhausen PFL Deputado Federal 5000000 315 132260292 378
Ivan Cesar Ranzolin PFL Deputado Federal 4000000 252 23237183 1721
Milton Mendes de Oliveira PT Deputado Federal 4000000 252 18603010 215
Joseacute Paulo Serafim PT Deputado Estadual 3788000 239 19238000 1969
Sergio Joseacute Grando PPS Deputado Estadual 3200000 202 16206665 1974
Antonio Carlos Vieira PP Deputado Estadual 3000000 189 15931786 1883
Acelio Casagrande PMDB Deputado Federal 2055000 13 14020875 1466
Ronaldo Joseacute Benedet PMDB Deputado Estadual 2000000 126 42694345 468
Altair Guidi PPS Deputado Estadual 1000000 063 10547730 948
Joseacute Natal Pereira PSDB Deputado Estadual 1000000 063 13659460 732
Licio Mauro Ferreira da Silveira PP Deputado Estadual 200000 013 10092456 198
158506900 100
145
Tabela 12 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2006
Fonte TSE 2013
Na Eleiccedilatildeo de 2010 cinco empresas aparecem como doadoras A
Tractebel assim como na Eleiccedilatildeo de 2002 e 2006 doou a maior parte
dos recursos 7483 para 27 candidatos de vaacuterios partidos As outras
quatro empresas dividem os 2517 restantes conforme dados
apresentados na Tabela 13
Tabela 13 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2010
Fonte TSE 2013
Os candidatos que receberam o maior montante de doaccedilotildees foram
Angela Amin com 1515 Paulo Roberto Bauer com 1082 e Edson
Bez de Oliveira com 884 (Tabela 14) O nuacutemero de candidatos
apoiados por doaccedilotildees aumentou de 19 candidatos em 2002 para 22 em
2006 e 30 em 2010 Diminuiu tambeacutem a concentraccedilatildeo dos recursos em
relaccedilatildeo ao nuacutemero de candidatos em 2002 os trecircs primeiros candidatos
receberam 5993 das doaccedilotildees em 2006 receberam 3849 e em
2010 3481 Isso demonstra que as empresas passaram a investir em
um nuacutemero maior de candidatos concentrando menos as doaccedilotildees
PARTIDO VALOR [R$]
PMDB 65055000 4104
PSDB 26000000 164
PP 25463900 1606
PFL 25000000 1577
PT 12788000 807
PPS 4200000 265
TOTAL 158506900 100
DOADOR NordmCANDIDATOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora
Ltda
27 PMDB PP
PPS PR
PSDB e PT
123500000 7483
Industria Carboniacutefera Rio Deserto
Ltda
4 PMDB e
PSDB
12548100 760
Carboniacutefera Metropolitana SA 5 PMDB
PSDB
11700000 709
Carboniacutefera Belluno Ltda 2 PSDB 10600000 642
Carboniacutefera Criciuacutema Ltda 3 PMDB 6700600 406
TOTAL 165048700 10000
146
Tabela 14 - Candidatosas receberam doaccedilotildees das empresas ligadas
ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2010
Fonte TSE 2013
Em 2010 o mesmo natildeo aconteceu com os partidos poliacuteticos As
doaccedilotildees concentraram-se em trecircs partidos PMDB com 3641 PT com
3393 e PSDB com 1784 conforme dados apresentados na Tabela
15 A concentraccedilatildeo de doaccedilotildees no PMDB diminuiu de 4104 em 2006
para 3641 em 2010 e aumentou para o PT (de 807 em 2006 para
3393 em 2010) e o PSDB (de 1640 em 2006 para 1784 em
2010)
NOME PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Angela R H Amin Helou PP Governador 25000000 1515 285235728 876
Paulo Roberto Bauer PSDB Senador 17859100 1082 215018697 831
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 14589500 884 76475776 1908
Ronaldo Joseacute Benedet PMDB Deputado Federal 10037000 608 62224076 1613
Claudio Antocircnio Vignatti PT Senador 10000000 606 225944994 443
Luiz Henrique da Silveira PMDB Senador 7463100 452 316150000 236
Thatiane Ferro Teixeira PSDB Deputado Estadual 5600000 339 21357586 2622
Ada Lili Faraco de Luca PMDB Deputado Estadual 5000000 303 66479091 752
Jorge C Leonardeli Boeira PT Deputado Federal 5000000 303 51226181 976
Celso Maldaner PMDB Deputado Federal 4000000 242 56183406 712
Deacutecio Nery de Lima PT Deputado Federal 4000000 242 94602191 423
Gean Marques Loureiro PMDB Deputado Federal 4000000 242 47666076 839
Gervaacutesio Joseacute da Silva PSDB Deputado Federal 4000000 242 68162276 587
Luci T K Choinacki PT Deputado Federal 4000000 242 53638737 746
Paulo R B Bornhausen DEM Deputado Federal 4000000 242 132193682 303
Pedro Francisco Uczai PT Deputado Federal 4000000 242 45421410 881
Vanio dos Santos PT Deputado Federal 4000000 242 68945421 580
Aceacutelio Casagrande PMDB Deputado Estadual 2500000 151 19129380 1307
Alexandre Santos Moraes PMDB Deputado Estadual 2500000 151 11717054 2134
Ana Paulo de Souza Lima PT Deputado Estadual 2500000 151 19360800 1291
Antonio M R de Aguiar PMDB Deputado Estadual 2500000 151 57962102 431
Carlos Joseacute Stupp PSDB Deputado Estadual 2500000 151 41555975 602
Edison A A de Oliveira PMDB Deputado Estadual 2500000 151 44778059 558
Giancarlo Tomelin PSDB Deputado Estadual 2500000 151 26041812 960
Joatildeo Batista Nunes PR Deputado Estadual 2500000 151 28970265 863
Joatildeo Olavio Falchetti PT Deputado Estadual 2500000 151 6753000 3702
Joares Carlos Ponticelli PP Deputado Estadual 2500000 151 45669621 547
Luciano Formighieri PPS Deputado Estadual 2500000 151 17351190 1441
Marcos Luiz Vieira PSDB Deputado Estadual 2500000 151 79902729 313
Rosemeacuteri Bartucheski PMDB Deputado Estadual 2500000 151 30045075 832
TOTAL 165048700 10000
147
Tabela 15 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2010
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees gerais de 2002 2006 e 2010 foram registradas
doaccedilotildees de 16 empresas ligadas ao carvatildeo mineral somando um total de
R$ 429404000 A Tractebel doou 5601 do total (R$ 240500000)
seguida pela Carboniacutefera Metropolitana SA com 1092 (R$
46882000) e pela Carboniacutefera Belluno com 730 (R$ 31346000) As
doaccedilotildees tecircm aumentado a cada eleiccedilatildeo em 2002 foram R$
105848400 em 2006 foram R$ 158506900 e em 2010 foram R$
165048700
O candidato Paulo Roberto Bauer recebeu um total de R$
45369900 em doaccedilotildees representando 1057 do total de doaccedilotildees Jaacute
Esperidiatildeo Amin recebeu R$ 43798600 (1020) e Edson Bez de
Oliveira foi agraciado com R$ 40855700 (951) Todos os candidatos
eleitos que receberam doaccedilotildees de campanha das empresas ligadas ao
carvatildeo mineral participam da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral confirmando a hipoacutetese da relaccedilatildeo estreita entre doaccedilotildees e
apoio agrave causa do carvatildeo mineral
No que se refere agrave relaccedilatildeo entre doaccedilotildees e os partidos poliacuteticos
constatou-se que o PMDB recebeu 3168 das doaccedilotildees no periacuteodo de
2002 a 2010 (R$ 136017900) Quanto ao PP este recebeu 1937 (R$
83154500) O PT levou 1720 (R$ 73838000) O PMDB aumentou
de R$ 10866200 em 2002 para R$ 60096700 em 2010 O PT
aumentou de R$ 5050000 em 2002 para R$ 56000000 em 2010 Jaacute
o PP diminuiu de R$ 48690600 em 2002 para R$ 9000000 em
2010 O aumento das doaccedilotildees para o PMDB e o PT pode ser explicado
se considerarmos a reeleiccedilatildeo e ascensatildeo de alguns candidatos inclusive
pela reeleiccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Lula da Silva do PT para a presidecircncia da
Repuacuteblica Jaacute as doaccedilotildees concedidas ao PP diminuiacuteram apoacutes a aposta
frustrada na eleiccedilatildeo de Esperidiatildeo Amin para governador
PARTIDO VALOR R$
PMDB 60096700 3641
PT 56000000 3393
PSDB 29452000 1784
PP 9000000 545
DEM 4000000 242
PR 4000000 242
PPS 2500000 151
TOTAL 165048700 10000
148
522 Eleiccedilotildees municipais
Nas eleiccedilotildees municipais de 2004 cinco empresas foram
doadoras Carboniacutefera Belluno (6383) Carboniacutefera Criciuacutema
(1558) Carboniacutefera Metropolitana (895) Carboniacutefera Catarinense
(823) e Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos (341) conforme dados da
Tabela 16 Foram doados R$ 41232300 para sete municiacutepios
Tabela 16 - Doadores eleiccedilotildees de 2004
Fonte TSE 2013
O municiacutepio de Criciuacutema recebeu 852 das doaccedilotildees Dentre os
candidatos estatildeo o candidato a vereador do municiacutepio de Criciuacutema
Edson do Nascimento do PMDB com 728 das doaccedilotildees o candidato
a prefeito de Criciuacutema Deacutecio Gomes Goacutees do PT com 606 e Carlos
Joseacute Stupp candidato a prefeito no municiacutepio de Tubaratildeo pelo PSDB
com 485 Aleacutem dos Comitecircs Financeiros Municipais (CFM) de
Criciuacutema Sideroacutepolis Treviso Lauro Muller e Iccedilara quatorze
candidatos a prefeito e vereador foram apoiados por doaccedilotildees (Tabela
17) Dos quatorze candidatos seis se mostram mais dependentes das
doaccedilotildees representando mais de 50 de sua receita total
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Carboniacutefera Criciuacutema Criciuacutema e Tubaratildeo PFL PMDB PSDB 6425000 3791
Carboniacutefera Metropolitana Criciuacutema Iccedilara e Tubaratildeo PFL PMDB e PT 3688500 2176
Caboniacutefera Catarinense Criciuacutema Lauro Muller Sideroacutepolis
Tubaratildeo
PFL PP PT 3391500 2001
Carboniacutefera Belluno Criciuacutema e Treviso PSDB 2034300 1200
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos Criciuacutema Lauro Muller Urussanga
PMDB PP PSDB e
PT 1408000 831
TOTAL 16947300 10000
149
Tabela 17 - Comitecircs e candidatos que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
2004
Fonte TSE 2013
Em 2004 dos cinco partidos que estatildeo entre os receptores o
PSDB recebeu 6798 das doaccedilotildees o PMDB recebeu 1823 o PT
recebeu 657 o PP recebeu 402 e o PFL recebeu 319 (Tabela
18)
Tabela 18 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2004
Fonte TSE 2013
CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$
RECEITA
TOTAL
R
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Criciuacutema PSDB - 29431300 7138 37042800 7945
Edson Do Nascimento Criciuacutema PMDB Vereador 3000000 728 3777163 7942
Deacutecio Gomes Goacutees Criciuacutema PT Prefeito 2500000 606 41391000 604
Carlos Jose Stupp Tubaratildeo PSDB Prefeito 2000000 485 66861662 299
Comitecirc Financeiro
Municipal Uacutenico
Sideroacutepolis PP - 791500 192 916500 8636
Luiz Carlos Zen Urussanga PP Prefeito 668000 162 4418000 1512
Felipe Felisbino Tubaratildeo PFL Vereador 500000 121 641145 7799
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Treviso PMDB - 388000 094 1004554 3862
Nestor Spricigo Lauro Muller PMDB Prefeito 330000 080 830752 3972
Elemar Nunes Tubaratildeo PFL Vereador 264000 064 404248 6531
Dalton Luiz Marcon Tubaratildeo PFL Vereador 202500 049 342514 5912
Manoel Duarte Porto Tubaratildeo PFL Vereador 202500 049 529725 3823
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Lauro Muller PP - 200000 049 600000 3333
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Iccedilara PMDB - 200000 049 6610000 303
Rudemar Silveira Da
Cunha
Tubaratildeo PFL Vereador 144500 035 242894 5949
Paulo Gonccedilalves Filho Lauro Muller PT Prefeito 110000 027 535000 2056
Antonio Alves Elias Lauro Muller PT Vereador 100000 024 166828 5994
Lauro Pirolla Criciuacutema PSDB Vereador 100000 024 279420 3579
Vanderlei Joseacute Zilli Criciuacutema PMDB Vereador 100000 024 1007126 993
41232300 10000
PARTIDO VALOR R$
PSDB 28031300 6798
PMDB 7518000 1823
PT 2710000 657
PP 1659500 402
PFL 1313500 319
TOTAL 41232300 10000
150
Nas eleiccedilotildees de 2008 seis empresas doaram um total de R$
22918311 A Carboniacutefera Criciuacutema doou 4132 a Mineraccedilatildeo e
Pesquisa Brasileira doou 2313 e a Tractebel doou 2182 (Tabela
19) O montante de doaccedilotildees de 2008 se comparado ao de 2004
diminuiu 4442
Tabela 19 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2008
Fonte TSE 2013
As doaccedilotildees de 2008 se concentraram em trecircs candidatos O
candidato a prefeito de Tubaratildeo Joatildeo Falchetti do PT recebeu 4363
das doaccedilotildees Edison do Nascimento do PMDB candidato a vereador
por Criciuacutema recebeu 2396 e Joseacute Claudio Gonccedilalves do DEM
candidato a prefeito de Forquilhinha recebeu 1091 das doaccedilotildees
Conforme dados apresentados na Tabela 20 receberam doaccedilotildees
candidatos dos municiacutepios de Criciuacutema Tubaratildeo Forquilhinha Iccedilara
Meleiro Timbeacute do Sul Sideroacutepolis e Lauro Muller Se consideradas as
receitas totais dos dezesseis candidatos cinco candidatos satildeo muito
dependentes das doaccedilotildees jaacute que elas representam mais de 50 da
receita total
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Carbonifera Criciuma SA Criciuacutema Forquilhinha Lauro Muller
Meleiro Timbeacute do Sul
PMDB DEM 9468944 4132
Mineraccedilatildeo E Pesquisa Brasileira Criciuacutema Tubaratildeo PMDB PT 5300000 2313
Tractebel Energia Tubaratildeo PT 5000000 2182
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda Criciuacutema Iccedilara DEM PP PSDB 1679175 733
Carboniacutefera Belluno Ltda Criciuacutema PSDB 1120192 489
Carbonifera Metropolitana SA Criciuacutema Sideroacutepolis Timbeacute do Sul PMDB 350000 153
TOTAL 22918311 10000
151
Tabela 20 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2008 que receberam doaccedilotildees
das empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
Fonte TSE 2013
As doaccedilotildees entre os partidos nas eleiccedilotildees de 2008 foram
distribuiacutedas da seguinte forma o PT recebeu 4363 das doaccedilotildees o
PMDB recebeu 3181 o DEM recebeu 1158 o PSDB recebeu
774 e o PP recebeu 524 (Tabela 21)
Tabela 21 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2008
Fonte TSE 2013
Nas Eleiccedilotildees de 2012 cinco empresas doaram R$ 22700000
para candidatos de trecircs municiacutepios Criciuacutema Iccedilara e Tubaratildeo Os
maiores montantes de doaccedilatildeo tiveram origem na Tractebel (6608) Carboniacutefera Metropolitana (1762) e Carboniacutefera Criciuacutema (1101)
conforme dados apresentados na Tabela 22
NOME DO CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Joatildeo Olavio Falchetti Tubaratildeo PT Prefeito 10000000 4363 18223525 5487
Edison Do Nascimento Criciuacutema PMDB Vereador 5490944 2396 10054122 5461
Joseacute Claudio Gonccedilalves Forquilhinha DEM Prefeito 2500000 1091 10147880 2464
Darlan Bitencourt Carpes Iccedilara PP Vereador 1200000 524 3761519 3190
Antoninho Dal Molin Netto Meleiro PMDB Prefeito 1000000 436 1997000 5008
Clesio Salvaro Criciuacutema PSDB Prefeito 842992 368 72173591 117
Andre M Jucoski Iccedilara PSDB Vereador 454175 198 1245875 3645
Luiz Fernando Cardoso Criciuacutema PMDB Vereador 400000 175 8071771 496
Jose Daminelli Criciuacutema PSDB Vereador 277200 121 1227765 2258
Arleu Ronaldo Da Silveira Criciuacutema PSDB Vereador 200000 087 1649455 1213
Heacutelio Roberto Cesa Sideroacutepolis PMDB Prefeito 150000 065 9963963 151
Wersmberg Laureano Lauro Muumlller DEM Vereador 128000 056 385903 3317
Loraci Davila Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 100000 044 163000 6135
Gislael Floriano Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 100000 044 195000 5128
Joao Batista Mandelli Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 50000 022 255800 1955
Romanna G C L Remor Criciuacutema DEM Vereador 25000 011 10166479 025
22918311 10000
152
Tabela 22 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2012
Fonte TSE 2013
Os candidatos a prefeito de Tubaratildeo do PSDB PMDB PSD e
PT receberam 8812 das doaccedilotildees (Tabela 23) O municiacutepio de Tubaratildeo
recebeu 8944 do total de doaccedilotildees Se consideradas as receitas totais
natildeo haacute evidecircncias de uma maior dependecircncia grande das doaccedilotildees
Tabela 23 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2012 que receberam doaccedilotildees
das empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
Fonte TSE 2013
Em 2012 o PSDB recebeu 2996 das doaccedilotildees o PMDB o PSD
e o PT receberam 2203 respectivamente e o PP recebeu 396
(Tabela 24) As doaccedilotildees da Eleiccedilatildeo de 2012 se comparadas agraves eleiccedilotildees
de 2004 e 2008 foram distribuiacutedas de forma mais equilibrada entre os
partidos
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora
Ltda
Tubaratildeo PSD PSDB
PT
15000000 6608
Carboniacutefera Metropolitana SA Iccedilara Tubaratildeo PSDB 4000000 1762
Carboniacutefera Criciuacutema SA Iccedilara Tubaratildeo PMDB PSDB 2500000 1101
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasileira Ltda Criciuacutema PP 900000 396
Minageo Ltda Tubaratildeo PSDB 300000 132
TOTAL 22700000 10000
CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Carlos Joseacute Stupp Tubaratildeo PSDB Prefeito 5000000 2203 36245503 1379
Edson Bez de
Oliveira
Tubaratildeo PMDB Prefeito 5000000 2203 129287720 387
Felippe Luiz Collaccedilo Tubaratildeo PSD Prefeito 5000000 2203 34140000 1465
Joatildeo Olavio falchetti Tubaratildeo PT Prefeito 5000000 2203 42272000 1183
Andreacute Mazzuchello
Jucoski
Iccedilara PSDB Vereador 1500000 661 4995950 3002
Daniel Costa de
Freitas
Criciuacutema PP Vereador 900000 396 6319977 1424
Felipe Felisbino Tubaratildeo PSDB Vereador 300000 132 4119158 728
22700000 10000
153
Tabela 24 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2012
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees municipais de 2004 2008 e 2012 nove empresas
doaram R$ 86850611 para os candidatos a prefeito e vereador As
doaccedilotildees direcionadas agraves eleiccedilotildees municipais apresentam uma reduccedilatildeo
significativa foram R$ 41232300 em 2004 R$ 22918311 em 2008 e
R$ 22700000 em 2012 A Carboniacutefera Belluno lidera as doaccedilotildees com
3159 seguida da Tractebel com 2303 e da Carboniacutefera Criciuacutema
com 2118 Os trecircs partidos que mais recebem doaccedilotildees nas eleiccedilotildees
municipais satildeo PSDB com 4215 PMDB com 2281 e PT com
2039
53 Os fatos ausentes do discurso dos poliacuteticos
No Brasil a degradaccedilatildeo do meio ambiente
e da sociedade das pessoas e da natureza
constitui cara e coroa de uma mesma
moeda de um mesmo estilo de
desenvolvimento e da ausecircncia de
democracia (SOUZA 1992 p 16)
As empresas ligadas ao carvatildeo mineral em Santa Catarina
doaram no intervalo de dez anos R$ 516254611 para candidatos a
eleiccedilotildees gerais e municipais Das dezessete empresas que aparecem
como doadoras a Tractebel foi responsaacutevel por 5046 das doaccedilotildees
seguida pela Carboniacutefera Belluno com 1139 e pela Carboniacutefera
Metropolitana com 1064 As demais quatorze empresas somam
2751 das doaccedilotildees (Tabela 25) O aumento nas doaccedilotildees para eleiccedilotildees
gerais e a diminuiccedilatildeo das doaccedilotildees para eleiccedilotildees municipais mostra que cresce nas empresas o interesse em apoiar candidatos a eleiccedilotildees gerais
que possam participar da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral
PARTIDO VALOR R$
PSDB 6800000 2996
PMDB 5000000 2203
PSD 5000000 2203
PT 5000000 2203
PP 900000 396
TOTAL 22700000 10000
154
Tabela 25 - Siacutentese dos doadores Eleiccedilotildees de 2002 e 2012
Fonte TSE 2013
Os dez candidatos que receberam maiores doaccedilotildees entre 2002 e
2012 foram candidatos a eleiccedilotildees gerais exceto Joatildeo Olavio Falchetti
que foi candidato em duas eleiccedilotildees municipais em 2008 e 2012 (Tabela
26) Todos os candidatos a eleiccedilotildees gerais que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e foram eleitos fazem parte
atualmente da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral
ANO ELEICcedilAtildeO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
DOADOR VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$
Tractebel Egi South
America Ltda 53000000 0 64000000 5000000 123500000 15000000 260500000 5046
Carboniacutefera Belluno Ltda 13970000 26319300 6776000 1120192 10600000 0 58785492 1139
Carboniacutefera
Metropolitana SA 15750000 3688500 19432000 350000 11700000 4000000 54920500 1064
Carboniacutefera Criciuacutema 6450000 6425000 18000000 9468944 6700600 2500000 49544544 96
Mineraccedilatildeo e Pesquisa
Brasil Ltda 0 0 15555000 5300000 0 900000 21755000 421
Induacutestria Carboniacutefera Rio
Deserto 4050000 0 0 0 12548100 0 16598100 322
Cia Energeacutetica Meridional 0 0 14000000 0 0 0 14000000 271
Mineraccedilatildeo Castelo
Branco Ltda 8467400 0 0 0 0 0 8467400 164
Carboniacutefera Catarinense
Ltda 0 0 8183000 0 0 0 8183000 159
Coque Catarinense Ltda 2434000 3391500 0 0 0 0 5825500 113
A Mendes TC e E de
Minerais Ltda 0 0 4000000 0 0 0 4000000 077
Minageo Ltda 0 0 3288000 0 0 300000 3588000 07
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda 0 0 1186400 1679175 0 0 2865575 056
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos
Ltda 927000 1408000 500000 0 0 0 2835000 055
Sul Catarinense
Mineraccedilatildeo e Art 0 0 2400000 0 0 0 2400000 046
Carboniacutefera Sideroacutepolis
Ltda 0 0 1186500 0 0 0 1186500 023
Mineraccedilatildeo Santa Augusta
Ltda 800000 0 0 0 0 0 800000 015
TOTAL 105848400 41232300 158506900 22918311 165048700 22700000 516254611 100
TOTAL
155
Tabela 26 - Candidatos que receberam maiores doaccedilotildees Eleiccedilotildees de
2002 a 2012
Fonte TSE 2013
Os partidos poliacuteticos que se destacam como maiores
receptores das doaccedilotildees satildeo PMDB com 3018 PSDB com 2060
PT com 1773 e PP com 1684 (Tabela 27)
Tabela 27 - Doaccedilotildees por Partido Poliacutetico Eleiccedilotildees de 2002 a 2012
Fonte TSE 2013
Os dados apresentados corroboram a hipoacutetese de que na defesa da causa do carvatildeo mineral se aliam poliacuteticos e empresas pelas doaccedilotildees
de campanha Trazer os fatos ausentes do discurso coloca em questatildeo o
reconhecimento e a representaccedilatildeo poliacutetica condiccedilotildees fundamentais para
assegurar a justiccedila ecoloacutegica e consequentemente para favorecer a
ANO ELEICcedilAtildeO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
NOME VALOR R$ VALOR R$VALOR R$ VALOR R$VALOR R$VALOR R$ TOTAL R$
Edson Bez de
Oliveira 5266200 0 21000000 0 14589500 5000000 45855700 89
Paulo Roberto
Bauer 12510800 0 15000000 0 17859100 0 45369900 88
Esperidiatildeo Amin
Helou Filho 43798600 0 0 0 0 0 43798600 85
Angela R H Amin
Helou 0 0 10000000 0 25000000 0 35000000 68
Luiz Henrique da
Silveira 4000000 0 20000000 0 7463100 0 31463100 61
Ada Lili Faraco de
Luca 0 0 20000000 0 5000000 0 25000000 48
Leodegar da Cunha
Tiscoski 4892000 0 12263900 0 0 0 17155900 33
Joatildeo Olavio
Falchetti 0 0 0 10000000 2500000 1500000 14000000 27
Paulo R B
Bornhausen 4900000 0 5000000 0 4000000 0 13900000 27
Ronaldo Joseacute
Benedet 1350000 0 2000000 0 10037000 0 13387000 26
ANO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
PARTIDO VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ TOTAL
PMDB 10866200 7518000 65055000 7290944 60096700 5000000 155826844 3018
PSDB 14310800 28031300 26000000 1774367 29452000 6800000 106368467 206
PT 5050000 2710000 12788000 10000000 56000000 5000000 91548000 1773
PP 48690600 1659500 25463900 1200000 9000000 900000 86914000 1684
PFL 22730800 1313500 25000000 0 0 0 49044300 95
PPB 4200000 0 4200000 0 2500000 0 10900000 211
DEM 0 0 0 2653000 4000000 0 6653000 129
PR 0 0 0 0 4000000 0 4000000 077
PSD 0 0 0 0 0 5000000 5000000 097
TOTAL 516254611 100
156
aplicaccedilatildeo do enfoque do ecodesenvolvimento Os candidatos eleitos natildeo
representam os interesses da maioria que os elegeu e sim daqueles
poucos que investiram em suas campanhas por meio de doaccedilotildees Vecircm se
consolidando assim um cenaacuterio no qual a injusticcedila poliacutetica alimenta a
reproduccedilatildeo da injusticcedila ambiental e ecoloacutegica
6 CARVAtildeO MINERAL E AMPLIACcedilAtildeO DA ENERGIA
TERMELEacuteTRICA EM SANTA CATARINA
A trajetoacuteria do carvatildeo mineral no Brasil e em Santa Catarina eacute
acompanhada de periacuteodos de crise e recuperaccedilatildeo do segmento A
construccedilatildeo da USITESC eacute uma forma de garantir a continuidade da
exploraccedilatildeo e do consumo do carvatildeo Aleacutem da crise do carvatildeo o que
aparece nos discursos de parlamentares presentes no capiacutetulo anterior eacute
o carvatildeo como seguranccedila energeacutetica
O objetivo desse capiacutetulo eacute compreender a ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo
de energia eleacutetrica movida a carvatildeo mineral atraveacutes da anaacutelise do
processo de licenciamento ambiental da USITESC Nos capiacutetulos dois e
trecircs foram tratados condicionantes mais amplos que incidem sobre a
ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo No capiacutetulo quatro foi examinada a relaccedilatildeo das
redes de influecircncia entre segmentos poliacuteticos e econocircmicos em vaacuterias
escalas Neste capiacutetulo a ideia eacute verificar os condicionantes que atuam
localmente
Para tanto o capiacutetulo estaacute dividido em quatro seccedilotildees aleacutem dessa
introduccedilatildeo A primeira seccedilatildeo trata das principais caracteriacutesticas do
municiacutepio de Treviso A segunda seccedilatildeo traz informaccedilotildees sobre os
documentos escritos da USITESC o EIARIMA o processo de
licenciamento e audiecircncias as correspondecircncias e articulaccedilotildees entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos e a posiccedilatildeo dos segmentos sociais Na
terceira seccedilatildeo entram os documentos falados do processo de
licenciamento os discursos nas audiecircncias puacuteblicas A anaacutelise dos
discursos torna expliacutecitas as relaccedilotildees de poder e desigualdade nas
audiecircncias puacuteblicas A quarta seccedilatildeo faz uma siacutentese das limitaccedilotildees e
possibilidades da democracia e do aprendizado social no caso do
licenciamento da USITESC
61 O municiacutepio de Treviso
A chegada dos primeiros imigrantes italianos no Sul de Santa
Catarina data de 1891 oriundas das proviacutencias de Treviso Beacutergamo
158
Cremona e Ferrara O povoado de Treviso tornou-se distrito de
Urussanga em 1933 Em 1958 o controle do distrito passou para
Sideroacutepolis emancipado de Urussanga Em 1995 o distrito de Treviso eacute
desmembrado de Sideroacutepolis formando um novo municiacutepio (IBGE
2013 PMT 2014)
No brasatildeo do municiacutepio a alusatildeo ao navio que trouxe os
primeiros imigrantes as duas atividades econocircmicas principais (extraccedilatildeo
do carvatildeo e o cultivo da banana) e as datas de colonizaccedilatildeo e
emancipaccedilatildeo (Figura 8)
Figura 8- Brasatildeo do municiacutepio de Treviso
Fonte PMT (2014) Autora Daniela Losso Redesenhado por Edson
Cesconetto
O municiacutepio de Treviso localiza-se na Bacia Carboniacutefera (Figura
9) entre Sideroacutepolis Lauro Muumlller e Urussanga a 220 km da capital
Florianoacutepolis a 35 km da BR 101 e a 25 km da cidade de Criciuacutema
(PMT 2014)
159
Figura 9 ndash Mapa de localizaccedilatildeo do municiacutepio de Treviso
Fonte Concepccedilatildeo de Luciana Butzke Elaborado por Ruy Lucas de
Souza
O clima geral da regiatildeo segundo a classificaccedilatildeo climaacutetica de
Koumleppen eacute do tipo Cfa (mesoteacutermico uacutemido e com veratildeo quente) A
temperatura meacutedia anual varia de 170 a 193ordmC maacuteximas de 234 a
259ordmC e miacutenimas entre 120 e 151ordmC A meacutedia anual pluviomeacutetrica fica
em torno de 1220 a 1660mm e a umidade relativa do ar varia de 814
a 822 (UNESC PLURAL 2006)
A regiatildeo conta com grandes variaccedilotildees de relevo clima tipos de
solo fauna e flora A geomorfologia da regiatildeo conta com seis domiacutenios
ambientais Planalto dos Campos Gerais Serra Geral Patamares da
Serra Geral Depressatildeo da Zona Carboniacutefera Sudeste Catarinense
Embasamento em estilos complexos e Planiacutecie Coluacutevio-aluvionar (Quadro 9)
160
Quadro 9 - Principais caracteriacutesticas fiacutesicas e bioacuteticas da aacuterea de
influecircncia indireta do projeto USITESC DOMIacuteNIOS
AMBIENTAIS
SIacuteNTESE DAS CARACTERIacuteSTICAS
1 Planalto dos
Campos Gerais
Corresponde agrave regiatildeo mais elevada com relevo pouco
ondulado e altitudes superiores a 1000 metros Neste
domiacutenio prevalecem rochas de origem vulcacircnicasub-
vulcacircnica com solos pouco desenvolvidos normalmente
utilizados para produccedilatildeo de maccedilatilde reflorestamento e
pastagem Esse domiacutenio abriga algumas nascentes de rios
da bacia do Araranguaacute e da bacia do Tubaratildeo com
cobertura vegetal representada pelas matas de araucaacuteria
matinha nebular e campos de cima da serra tendo fauna
diversificada Aacuterea impactada pela derrubada das matas
de araucaacuteria plantio de pinus e queimadas nos campos
2 Serra Geral Corresponde agraves aacutereas de encosta com altitudes entre
500m e 1000m onde os desniacuteveis satildeo acentuados e os
vales satildeo fechados e profundos Satildeo formadas
principalmente por rochas arenosas e basaacutelticas e solos
rasos normalmente susceptiacuteveis agrave erosatildeo e a movimentos
de massa Abriga grande parte das nascentes dos rios das
bacias do Araranguaacute e do Tubaratildeo As florestas
encontram-se entre as mais preservadas da regiatildeo sul do
Estado atuando como reguladoras do clima do ciclo e da
distribuiccedilatildeo de chuvas servindo de centro de dispersatildeo e
conexatildeo de espeacutecies Caracteriza-se pela ampla
biodiversidade representando um dos ambientes mais
complexos fraacutegeis e ameaccedilados da regiatildeo que deve ser
preservado Neste domiacutenio se insere a Reserva Bioloacutegica
Estadual do Aguaiacute
3 Patamares da
Serra Geral
Os patamares da Serra Geral representam o
prolongamento da escarpa da Serra Geral que avanccedila
sobre a Depressatildeo Carboniacutefera e a Planiacutecie Coluacutevio-
Aluvionar constituindo morros-testemunhos como o
Montanhatildeo sustentados principalmente por basaltos e
diabaacutesicos Os solos tecircm normalmente baixa fertilidade e
satildeo utilizados nas aacutereas planas para pastagens plantio de
eucalipto e lavouras de subsistecircncia Nos terrenos
iacutengremes o solo eacute usado para o cultivo de banana No
alto do Montanhatildeo encontra-se uma das aacutereas mais
preservadas deste domiacutenio correspondente agrave APA do rio
Ferreira
4 Depressatildeo da
Zona Carboniacutefera
Regiatildeo de relevo mais suave em que predominam vales
abertos e pouco profundos Constitui-se principalmente
161
do Sudeste
Catarinense
de rochas sedimentares como arenitos folhelhos siltitos
e camadas de carvatildeo Os solos satildeo variados utilizados
principalmente para pastagens culturas de subsistecircncia e
reflorestamento de eucalipto Os recursos hiacutedricos
encontram-se comprometidos principalmente pela
exploraccedilatildeo de carvatildeo mas tambeacutem pelas atividades
industriais agriacutecolas e esgotamento sanitaacuterio A regiatildeo eacute
fortemente impactada com vaacuterias aacutereas degradadas pela
exploraccedilatildeo do carvatildeo paisagens fortemente
descaracterizadas e reduzida biodiversidade em alguns
locais
5 Embasamento
em estilos
complexos
Corresponde aos relevos ondulados formados por rochas
granitoacuteides e gnaacuteissicas onde os solos normalmente satildeo
pouco desenvolvidos e de baixa fertilidade
6 Planiacutecie Coluacutevio-
Aluvionar
Aacuterea de relevo plano (cotas inferiores a 100m) com solos
do tipo hidromoacuterficos com elevado teor de mateacuteria
orgacircnica Os solos satildeo empregados no cultivo de arroz
irrigado produccedilatildeo de hortaliccedilas uva e cana-de-accediluacutecar
Em regiotildees menos inundadas satildeo utilizados tambeacutem para
reflorestamento e pastagem
Fonte UNESC Plural (2006 p 24)
Eacute destaque em Treviso a Reserva Bioloacutegica Estadual do Aguaiacute e
a Aacuterea de Preservaccedilatildeo Permanente do Rio Ferreira A Reserva Bioloacutegica
Estadual do Aguaiacute conta com aacuterea de 7762 hectares que se estende
entre os municiacutepios de Treviso Sideroacutepolis e Nova Veneza nos beirais
da Serra Geral A reserva abriga cachoeiras fauna e flora diversificadas
que constituem grande riqueza natural (UNESC PLURAL 2006)
O municiacutepio contava em 2010 com 3527 habitantes em
157084 km2 com uma densidade demograacutefica de 2245 habitantes por
quilocircmetro quadrado Desses 1789 eram homens e 1738 eram
mulheres 1833 habitavam o espaccedilo urbano e 1694 o espaccedilo rural A
Populaccedilatildeo Economicamente Ativa (PEA) correspondia a 487 da
populaccedilatildeo (SEBRAE 2013b)
O Produto Interno Bruto (PIB) de Treviso corresponde a 008
da composiccedilatildeo do PIB catarinense Jaacute em relaccedilatildeo ao PIB per capita
Treviso encontra-se em 2009 na 17ordf posiccedilatildeo no ranking estadual O
Valor Adicionado Bruto (VAB) que representa a soma de todos os bens
e serviccedilos produzidos num determinado territoacuterio econocircmico ficou
assim distribuiacutedo 61 na induacutestria 24 no setor de serviccedilos e 9 na
administraccedilatildeo puacuteblica Em relaccedilatildeo ao Valor Adicionado Fiscal (VAF)
162
indicador econocircmico contaacutebil utilizado para calcular a participaccedilatildeo
municipal no repasse de impostos a extraccedilatildeo de carvatildeo mineral era
responsaacutevel por 66 da participaccedilatildeo do VAF no ano de 2010
(SEBRAE 2013b) Esses dados demonstram uma forte dependecircncia do
municiacutepio agrave atividade carboniacutefera
Dos 1093 domiciacutelios existentes no municiacutepio 853 eram
proacuteprios 91 alugados 55 cedidos e 01 em outra condiccedilatildeo No
que se refere agrave renda familiar 04 da populaccedilatildeo contava com renda
familiar per capita de ateacute R$ 7000 16 com renda familiar per capita
de ateacute frac12 salaacuterio miacutenimo e 103 com ateacute frac14 do salaacuterio miacutenimo A meacutedia
salarial da induacutestria extrativa era de R$ 185480 inferior apenas a
atividades relacionadas agrave eletricidade e gaacutes com uma meacutedia de R$
277460 Nesse mesmo ano o municiacutepio contava com 1629 postos de
trabalho com carteira assinada dos quais 1132 eram vinculados agrave
atividade carboniacutefera em cinco empresas (SEBRAE 2013b) Quando
69 dos postos de trabalho com carteira assinada tecircm origem na
atividade carboniacutefera que na localidade apresenta tambeacutem uma das
melhores meacutedias salariais a populaccedilatildeo fica numa posiccedilatildeo de
vulnerabilidade jaacute que depende dessa atividade para o seu sustento
Na lavoura temporaacuteria destacam-se a produccedilatildeo do arroz batata-
doce batata inglesa feijatildeo (gratildeo) fumo mandioca milho (gratildeo) Na
lavoura permanente tem se destacado a banana No municiacutepio tambeacutem
satildeo criadas aves (galos galinhas frangos e pintos) que em 2010
somavam 500000 cabeccedilas (SEBRAE 2013b)
Treviso conta com trecircs aacutereas inclusas na Accedilatildeo Civil Puacuteblica nordm
938000533-4 que determina a recuperaccedilatildeo das aacutereas degradas pela
mineraccedilatildeo Aacuterea III Rio Pio que tem 11781 hectares Campo Morosini
com 22100 hectares e UM IV Volta Redonda com 5797 hectares A
primeira aacuterea natildeo foi iniciada a segunda estaacute em andamento e a terceira
jaacute estaacute finalizada O processo de recuperaccedilatildeo foi orccedilado em 319 milhotildees
de reais (ACP DO CARVAtildeO 2014)
62 O processo de licenciamento os documentos escritos
A primeira solicitaccedilatildeo de parecer da USITESC referente ao
Licenciamento Preacutevio (LP) data do dia 2 de maio de 2000 Segundo a
solicitaccedilatildeo o parecer se fazia necessaacuterio para que a Usina fosse
163
implantada dentro do prazo previsto pelo Governo e pelo Programa
Prioritaacuterio de Termeleacutetricas que se colocava para dezembro de 2003
(FATMA 2013a fl 1) A contrataccedilatildeo do EIARIMA foi em 2001 e a
entrega aconteceu em 18 de agosto de 2003 (FATMA 2013a fl 49)
621 O EIARIMA da USITESC
A equipe responsaacutevel pelo projeto da USITESC foi composta por
consoacutercio formado pela Carboniacutefera Criciuacutema SA e pela Companhia
Carboniacutefera Metropolitana SA O projeto foi desenvolvido com o apoio
da Parsons Energy amp Chemicals Group Main Engenharia amp Consultoria
Ltda e Taylor DeJongh E o EIARIMA foi realizado pelo IPAT
vinculado agrave UNESC e Plural
A previsatildeo de construccedilatildeo da USITESC eacute de 40 meses A aacuterea a
ser ocupada pela usina localiza-se na margem direita do rio Matildee Luzia
tem aproximadamente 500000m2 e pertence agrave Carboniacutefera
Metropolitana sendo utilizada como depoacutesito de rejeitos (Figura 10)
(UNESC PLURAL 2006)
Figura 10 - Aacuterea prevista para a implantaccedilatildeo da USITESC
Fonte UNESC Plural 2006 p 5
164
Para a produccedilatildeo de energia termeleacutetrica a usina vai utilizar carvatildeo
bruto da camada Bonito (70) e rejeitos da camada Barro Branco
(30) que seratildeo fornecidos pelas duas empresas que compotildeem o
consoacutercio O consumo meacutedio anual previsto eacute de 1900000 toneladas de
carvatildeo e 820000 toneladas de rejeito A USITESC teraacute potecircncia
instalada de 440 MW e segundo a descriccedilatildeo do empreendimento vai
gerar 180 empregos diretos (FATMA 2013a fl 34)
Na justificativa do EIARIMA destacou-se a importacircncia
estrateacutegica do carvatildeo dada a dependecircncia hidroenergeacutetica e a
inseguranccedila quanto agrave importaccedilatildeo do gaacutes natural e o uso de tecnologias
limpas de queima de carvatildeo Natildeo satildeo citados dados sobre consumo e
demanda A USITESC adquire importacircncia na recuperaccedilatildeo ambiental do
Sul jaacute que vai consumir os rejeitos (UNESC PLURAL 2006)
Para gerar energia termeleacutetrica a USITESC vai utilizar o ciclo
teacutermico regenerativo com uso de caldeira de leito fluidizado que
recupera calor exigindo um consumo menor de combustiacutevel A
combustatildeo em leito fluidizado circulante reduz a produccedilatildeo de oacutexidos de
nitrogecircnio O controle das emissotildees atmosfeacutericas seraacute feito atraveacutes da
injeccedilatildeo de calcaacuterio na caldeira (Consumo meacutedio anual de 150000
toneladas) e de um sistema de filtragem que utilizaraacute amocircnia (consumo
meacutedio anual entre 72000 a 80000 toneladas Como resultado seratildeo
obtidas aproximadamente 300000 toneladas de sulfato de amocircnia que
seratildeo utilizadas na produccedilatildeo de fertilizantes quiacutemicos Quanto ao
consumo de aacutegua prevecirc-se um consumo meacutedio de 32 ls (115m3h) no
processo e 2361 ls (848m3h) no resfriamento Soacute a tiacutetulo de
comparaccedilatildeo para o abastecimento de Criciuacutema e municiacutepios vizinhos
satildeo utilizados 800ls do rio Satildeo Bento localizado na sub-bacia do Rio
Matildee Luzia (UNESC PLURAL 2006)16
Na avaliaccedilatildeo de impactos constam no RIMA oito impactos no
meio fiacutesico seis impactos no meio bioacutetico e 11 no meio antroacutepico
(Quadro 10) Dentre os impactos listados os de maior expressatildeo satildeo
16
O alto consumo de aacutegua e a construccedilatildeo de uma barragem no Rio
Matildee Luzia foram desde o iniacutecio do processo de licenciamento
pontos polecircmicos do projeto Devido a esses pontos o projeto foi
alterado de torre uacutemida para torre seca diminuindo o consumo de
aacutegua para 115m3h em todo o processo
165
reduccedilatildeo na geraccedilatildeo de drenagem aacutecida (considerado um impacto
positivo) alteraccedilatildeo da qualidade do ar (principalmente durante a
construccedilatildeo da Usina com a movimentaccedilatildeo de veiacuteculos pesados o
dioacutexido de enxofre pode elevar-se) reduccedilatildeo da disponibilidade de aacutegua
(com as torres de resfriamento uacutemidas) e impacto sobre aacutereas
protegidas
Quadro 10- Impactos sobre o Meio Fiacutesico Bioacutetico e Antroacutepico e
accedilotildees geradoras IMPACTOS SOBRE O
MEIO FIacuteSICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Solo Intensificaccedilatildeo de
processos erosivos e
de assoreamento
Obras de corte e aterro necessaacuterias agrave
implantaccedilatildeo do empreendimento
Contaminaccedilatildeo do solo
pela disposiccedilatildeo de
resiacuteduos soacutelidos e
efluentes
Operaccedilatildeo da usina resiacuteduos produzidos
durante as fases de construccedilatildeo e operaccedilatildeo da
usina
Reduccedilatildeo da geraccedilatildeo
de drenagem aacutecida
Consumo de rejeito do beneficiamento de
carvatildeo e recuperaccedilatildeo de aacutereas degradadas
pela mineraccedilatildeo
Aacutegua
Alteraccedilatildeo na
qualidade das aacuteguas
superficiais
Construccedilatildeo da usina efluentes oleosos
como oacuteleos e graxas advindos da
manutenccedilatildeo de maacutequinas e caminhotildees
ligados agraves obras eou do armazenamento
temporaacuterio de combustiacuteveis e lubrificantes
Efluentes a serem descartados pelo
empreendimento durante a fase de operaccedilatildeo
Alteraccedilatildeo na
qualidade das aacuteguas
subterracircneas
Disposiccedilatildeo inadequada de resiacuteduos soacutelidos
efluentes sanitaacuterios efluentes industriais
Reduccedilatildeo da
disponibilidade de
aacutegua
Operaccedilatildeo da usina captaccedilatildeo de aacutegua para
torre de resfriamento da usina
Ar e
ruiacutedo
Alteraccedilatildeo da
qualidade do ar
Aumento do traacutefego de veiacuteculos pesados
movimentaccedilatildeo de veiacuteculos em aacutereas natildeo
pavimentadas operaccedilatildeo da usina manuseio
do combustiacutevel
Alteraccedilatildeo das
condiccedilotildees de ruiacutedo de
fundo
Traacutefego e operaccedilatildeo de veiacuteculos pesados
operaccedilatildeo de equipamentos como
compressores britadores sondas etc
operaccedilatildeo dos equipamentos da usina
166
IMPACTOS SOBRE O
MEIO BIOacuteTICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Fauna
e
Flora
Reduccedilatildeo de habitats
para a fauna local
Preparaccedilatildeo da aacuterea de implantaccedilatildeo da usina
obras de terraplenagem e retirada da
cobertura vegetal
Evasatildeo da fauna Ruiacutedos produzidos durante a fase de
implantaccedilatildeo e construccedilatildeo da usina alteraccedilatildeo
da qualidade do ar e perda de habitats devido
agraves obras de terraplenagem
Impacto sobre a
avifauna
Operaccedilatildeo da usina
Impacto sobre a fauna
de peixes e
organismos aquaacuteticos
Construccedilatildeo da usina operaccedilatildeo da usina
manutenccedilatildeo de equipamentos transporte e
armazenamento de reagentes e outros
insumos natildeo inertes
Impacto sobre a
vegetaccedilatildeo
remanescente e
culturas
Traacutefego de veiacuteculos movidos a oacuteleo diesel
operaccedilatildeo da usina (queima de carvatildeo)
Impacto sobre as aacutereas
protegidas
Periacuteodo de construccedilatildeo da usina contingente
de trabalhadores e operaccedilatildeo da usina
IMPACTOS SOBRE O
MEIO ANTROacutePICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Geraccedilatildeo de conflitos Contrataccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
instalaccedilatildeo do canteiro de obras
Geraccedilatildeo de
expectativa e
mobilizaccedilatildeo da
comunidade
Estudos e projetos contrataccedilatildeo e
mobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
Sobrecarga da infra-
estrutura social
existente
Obras da usina contrataccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo
da matildeo-de-obra
Geraccedilatildeo de emprego Construccedilatildeo da usina operaccedilatildeo da usina
mineraccedilatildeo do carvatildeo serviccedilos terceirizados
Geraccedilatildeo de renda e
ampliaccedilatildeo da oferta de
serviccedilos
Construccedilatildeo e operaccedilatildeo da usina
Atraccedilatildeo de matildeo-de-
obra de outras aacutereas
Construccedilatildeo da usina contrataccedilatildeo e
desmobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
Incremento do
desenvolvimento
econocircmico
Operaccedilatildeo da usina
Mudanccedila no cotidiano
da comunidade
Obras da usina contrataccedilatildeo de matildeo-de-obra
de outras regiotildees demanda por serviccedilos e
167
sobrecarga da infra-estrutura social
alteraccedilatildeo do padratildeo de traacutefego dos veiacuteculos
Alteraccedilatildeo das
condiccedilotildees de sauacutede da
populaccedilatildeo
Implantaccedilatildeo da usina fase das obras e
operaccedilatildeo da usina emissatildeo de gases ruiacutedo
disposiccedilatildeo das cinzas e depoacutesito temporaacuterio
de carvatildeo e reagentes
Aumento do traacutefego
de veiacuteculos e pressatildeo
sobre a infra-estrutura
viaacuteria
Obras da usina obras complementares
operaccedilatildeo da usina transporte de insumos de
subprodutos e de resiacuteduos
Aumento do risco de
acidentes de tracircnsito
Obras da usina transporte de pessoas e
insumos
Impacto na paisagem
local e perda de
referecircncias histoacuterico-
culturais
Obras da usina e complementares
Interferecircncia em siacutetios
arqueoloacutegicos
Obras complementares da usina barragem e
reservatoacuterio estradas e vias de acesso linha
de transmissatildeo
Fonte UNESC Plural (2006 p 34-5)
No EIARIMA natildeo haacute nenhuma referecircncia aos empreendimentos
acessoacuterios a saber o reservatoacuterio de aacutegua a ser construiacutedo no rio Matildee
Luzia a extensatildeo da ferrovia entre Sideroacutepolis e a Mina Esperanccedila e
Fontanella a linha de transmissatildeo que vai conectar a subestaccedilatildeo da
ELETROSUL em Sideroacutepolis com a Usina e o terminal de recebimento
e estocagem de amocircnia no Porto de Imbituba Os empreendimentos
acessoacuterios seratildeo tratados na sessatildeo 63 deste capiacutetulo Faltou tambeacutem
mencionar nos impactos sobre o meio antroacutepico da desarticulaccedilatildeo da
estrutura econocircmica existente o pequeno comeacutercio a lavoura de
subsistecircncia a pesca artesanal as atividades domeacutesticas etc
Tendo como referecircncia os impactos listados no Quadro 10 foram
propostas 59 medidas mitigatoacuterias sendo 25 preventivas duas
corretivas trecircs preventivas e corretivas 17 compensatoacuterias nove de
acompanhamento e trecircs de controle
Dentre os programas ambientais propostos para a USITESC
destacam-se programa de monitoramento ambiental programa de
conservaccedilatildeo da fauna e flora programa de preservaccedilatildeo do patrimocircnio
arqueoloacutegico programa de comunicaccedilatildeo social programa de
gerenciamento de risco programa de reabilitaccedilatildeo de aacutereas degradadas
168
programa de gestatildeo ambiental e programa de fomento ao
desenvolvimento sustentaacutevel No Quadro 11 uma siacutentese dos programas
e seus alvos principais
Quadro 11 - Siacutentese dos Programas da USITESC e alvos principais PROGRAMA ALVO
Monitoramento ambiental Qualidade do ar solo e aacutegua
Adequaccedilatildeo da infraestrutura baacutesica Rodovias sauacutede educaccedilatildeo e
abastecimento de aacutegua
Controle ambiental Qualidade do ar solo e aacutegua na aacuterea
do empreendimento
Conservaccedilatildeo da fauna e flora Fauna e flora no entorno do
empreendimento
Preservaccedilatildeo do patrimocircnio
arqueoloacutegico
Patrimocircnio arqueoloacutegico da regiatildeo
Comunicaccedilatildeo social Informaccedilotildees atualizadas sobre o
empreendimento para a comunidade
Gerenciamento de risco Armazenamento de produtos
perigosos
Reabilitaccedilatildeo de aacutereas degradadas Entorno do empreendimento
Gestatildeo ambiental Processo decisoacuterio da Usina e relaccedilatildeo
com os colaboradores
Fomento ao desenvolvimento
sustentaacutevel
Criaccedilatildeo de um fundo de fomento agrave
atividades de recuperaccedilatildeo ambiental
melhoria da qualidade de vida e
desenvolvimento sustentaacutevel
Fonte Baseado em UNESC Plural (2006)
Quando analisadas as perspectivas para a regiatildeo com e sem a
implantaccedilatildeo do empreendimento alguns aspectos podem ser destacados
Sem o empreendimento natildeo haveria pressatildeo antroacutepica e a regiatildeo seguiria
as atuais tendecircncias de desconcentraccedilatildeo crescimento moderado da
atividade agropecuaacuteria continuidade da atividade carboniacutefera num
cenaacuterio de suposta estagnaccedilatildeo econocircmica Com o empreendimento
haveria uma dinamizaccedilatildeo da economia municipal geraccedilatildeo de emprego e
renda o consumo do rejeito para geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica e a pressatildeo antroacutepica na aacuterea de influecircncia da USITESC inclusive aacutereas
preservadas (UNESC PLURAL 2006)
169
622 Das audiecircncias puacuteblicas e licenccedilas
O processo de licenciamento da USITESC contou com a
realizaccedilatildeo de quatro audiecircncias puacuteblicas que ocorreram de acordo com
a resoluccedilatildeo do CONAMA nordm 00987 As audiecircncias aconteceram no
municiacutepio de Treviso A primeira ocorreu em 19 de fevereiro de 2004 a
segunda em oito de julho de 2004 a terceira em 16 de maio de 2006 e a
quarta em 8 de novembro de 2007 A realizaccedilatildeo das quatro audiecircncias
puacuteblicas se deve ao fato de que vaacuterias informaccedilotildees natildeo constavam do
EIARIMA tendo sido solicitados estudos complementares que
incluiacuteam tambeacutem os empreendimentos acessoacuterios
Apoacutes a terceira audiecircncia puacuteblica em trecircs de julho de 2006
Darlan Aiacuterton Dias Procurador da Repuacuteblica enviou uma
correspondecircncia para o entatildeo presidente da FATMA Jacircnio Wagner
Constante informando que o licenciamento da USITESC e do
reservatoacuterio de aacutegua precisam ser conjuntos sob pena de fracionar o
licenciamento (FATMA 2013d fl 687) O procurador da repuacuteblica
recomendou que ldquonatildeo seja concedida LP para a USITESC sem que
antes seja apresentado EIARIMA relativo agrave construccedilatildeo do reservatoacuterio
no rio Matildee Luzia o qual deveraacute ser publicado e submetido a audiecircncia
puacuteblica conforme determina a legislaccedilatildeo vigenterdquo (FATMA 2013d fl
687)
Em seis de marccedilo de 2007 Alfredo Flavio Gazzolla informou ao
novo presidente da FATMA Carlos L Kreuz que diante da situaccedilatildeo
colocada a USITESC estava alterando seu projeto original mudando o
sistema de resfriamento da usina e reduzindo o consumo de aacutegua a 10
do previsto anteriormente (FATMA 2013e fl 831)
Com a alteraccedilatildeo do projeto o Procurador da Repuacuteblica Darlan
Airton Dias em oito de maio de 2007 informou a necessidade da
realizaccedilatildeo de uma nova audiecircncia puacuteblica ldquoConsiderando a mudanccedila
conceitual no projeto eventual concessatildeo de Licenccedila Ambiental Preacutevia
ndash LAP depende da realizaccedilatildeo de nova audiecircncia puacuteblicardquo (FATMA
2013e fl 842-3) Apoacutes a realizaccedilatildeo da quarta audiecircncia puacuteblica em 8 de novembro de 2007 a LP foi concedida em 14 de dezembro de 2007
(LAP nordm 1482007) (FATMA 2013f fl 1065)
Em 31 de marccedilo de 2008 foi comunicada a Alteraccedilatildeo da
composiccedilatildeo acionaacuteria da USITESC 95 do capital foi assumido pela
170
Linear Participaccedilotildees e Incorporaccedilotildees Ltda e os 5 restantes ficam com
as Carboniacuteferas Criciuacutema e Metropolitana A comunicaccedilatildeo remetida por
Kaioaacute Gomes diretor teacutecnico da Linear foi endereccedilada ao novo
presidente da FATMA Murilo Xavier Flores (FATMA 2013f fl
1111)
Em dois de marccedilo de 2010 foi concedida a LI (LAI nordm 06GELUR
2010) (FATMA 2013h fl 1540) Ainda em 2010 foi estabelecido o
Termo de Compromisso de Compensaccedilatildeo Ambiental R$ 670800000 a
serem aplicados na Reserva Bioloacutegica Estadual do Aguaiacute (FATMA
2013h fl 1549-1554)
Em 15 de fevereiro de 2013 Kaioaacute Gomes solicitou a
prorrogaccedilatildeo da LI (FATMA 2013h fl 1607-08) Em resposta Ivana
Becker concluiu ser viaacutevel a prorrogaccedilatildeo da LI pelo prazo de 36 meses
(FATMA 2013h fl 1603-5)
A solicitaccedilatildeo de estudos complementares e as quatro audiecircncias
puacuteblicas parecem demonstrar uma estrateacutegia de desinformaccedilatildeo por parte
dos segmentos econocircmicos O papel do Ministeacuterio Puacuteblico foi chave no
questionamento e equacionamento dessa questatildeo
623 Pressotildees dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos no processo de
licenciamento
Um aspecto interessante na anaacutelise do discurso dos documentos
do processo de licenciamento foi a pressatildeo exercida pela USITESC e
pelo Governo do Estado sobre a FATMA Em janeiro de 2005 o entatildeo
presidente da USITESC enviou uma carta ao governo do estado
questionando o tratamento dado pela FATMA ao processo de
licenciamento ambiental destacando a importacircncia da USITESC e
sugerindo uma falta de sintonia entre FATMA e poder executivo
conforme trecho da carta a seguir
Esta empresa gostaria de registrar seu protesto e
indignaccedilatildeo pelo peacutessimo tratamento dado por esta
Fundaccedilatildeo ao processo de licenciamento ambiental
da USITESC embora tenhamos sempre procurado
dar o maacuteximo de suporte e pautado nossa postura
171
no sentido da maacutexima cooperaccedilatildeo e pronto
atendimento a qualquer solicitaccedilatildeo da FATMA
Nossa paciecircncia esgota-se no momento em que
percebemos o descaso com que eacute tratado um
projeto da magnitude da Usina Termeleacutetrica Sul
Catarinense ndash USITESC cujo conceito de
desenvolvimento vem desde o iniacutecio de seus
estudos buscando a melhor integraccedilatildeo do projeto
com sua aacuterea de influecircncia e geraccedilatildeo de resultados
positivos para o meio ambiente em que se insere
()
Este fato contrasta com as manifestaccedilotildees puacuteblicas
de apoio ao Projeto USITESC recebidas do
Governo Estadual pelos empreendedores e revela
falta de sintonia entre a Fatma e o poder executivo
do Estado de Santa Catarina (Alfredo Flaacutevio
Gazzolla presidente da USITESC FATMA
2013c fl 357 e 359)
Em marccedilo de 2005 o vice-governador em exerciacutecio Eduardo
Pinho Moreira cobrou um posicionamento do diretor geral da FATMA
Janio Wagner Constante
Pela inegaacutevel importacircncia da instalaccedilatildeo da Usina
para o Estado de Santa Catarina e tendo em vista
ter a mesma cumprido com todas as
recomendaccedilotildees ministeriais solicito-lhe urgecircncia
na anaacutelise teacutecnica do projeto pelo que agradeccedilo
antecipadamente (FATMA 2013b fl 352)
Em dezembro de 2005 novamente Alfredo Flaacutevio Gazzolla
enviou carta ao governador do estado Luiz Henrique da Silveira
pedindo a determinaccedilatildeo de um ldquomelhor estudordquo para a emissatildeo da LP
Assim em respeito ao vosso honrado nome e na
defesa do maior empreendimento em estudo no
estado de Santa Catarina solicito seus preacutestimos
no sentido de determinar um melhor estudo
quanto agrave emissatildeo da LAP sem a qual estaremos
impossibilitados de participar do proacuteximo leilatildeo
de energia no semestre vindouro (FATMA
2013c fl 388)
172
Na mesma carta o presidente da USITESC solicitou a licenccedila
preacutevia independente da conclusatildeo do Estudo Suplementar solicitado
pela FATMA
Solicita-se ao Governo do Estado que emita a
Licenccedila Preacutevia para a USITESC
independentemente da conclusatildeo do Estudo
Suplementar solicitado pela FATMA jaacute que nada
impede a FATMA de emitir esta licenccedila uma vez
que o empreendedor cumpriu todas as exigecircncias
legais cabiacuteveis para sua obtenccedilatildeo e que a FATMA
poderaacute nela colocar todos os condicionantes que
considerar pertinentes tendo em vista assegurar a
viabilidade da continuidade do processo de
licenciamento ambiental da USITESC (FATMA
2013c fl 390)
Em resposta Luiz Antocircnio Garcia Correcirca Diretor de controle
ambiental da FATMA em 19 de dezembro de 2005 repreendeu a
USITESC quanto agraves manifestaccedilotildees da miacutedia que relacionavam o natildeo
licenciamento da USITESC e a natildeo participaccedilatildeo no leilatildeo da ANEEL a
uma decisatildeo da FATMA
Temos observado manifestaccedilotildees equivocadas na
miacutedia provenientes de representante do SIECESC
relativa ao processo de licenciamento ambiental
reputado inclusive a FATMA a natildeo participaccedilatildeo
da USITESC no leilatildeo da ANEEL o que natildeo
condiz com a realidade Tais fatos em nada
contribuem ao processo de licenciamento
ambiental (FATMA 2013c fl 641-642)
O conteuacutedo das correspondecircncias demonstra as articulaccedilotildees entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos Depois de 2005 natildeo constam mais
correspondecircncias relacionadas Eacute importante frisar que eacute em 2005 que
surgiu a Frente Parlamentar Mista em defesa do Carvatildeo Mineral e
aumentaram as doaccedilotildees das carboniacuteferas aos poliacuteticos Dessa forma
sugere-se que se ateacute 2005 a pressatildeo sobre o oacutergatildeo ambiental era
173
exercida diretamente apoacutes 2005 com uma maior articulaccedilatildeo a pressatildeo
pode ser exercida de outras formas natildeo passando necessariamente pelo
oacutergatildeo ambiental
624 A posiccedilatildeo dos segmentos sociais
Os segmentos sociais se posicionaram contra a ampliaccedilatildeo da
energia termeleacutetrica ao longo do processo de licenciamento Na ocasiatildeo
da primeira audiecircncia puacuteblica em 19 de fevereiro de 2004 a ONG
Amigos da Terra Brasil enviou a seguinte mensagem
Amigos da Terra se solidariza com as entidades da
regiatildeo sul de Santa Catarina e acredita que as lutas
locais satildeo responsaacuteveis pela resistecircncia agraves
injusticcedilas socioambientais e pela promoccedilatildeo das
mudanccedilas necessaacuterias para um futuro sustentaacutevel
Um futuro onde as energias renovaacuteveis podem
promover descentralizaccedilatildeo universalizaccedilatildeo do
acesso controle social e empregos sem a
contaminaccedilatildeo local e o aquecimento global
decorrentes do uso do carvatildeo mineral (FATMA
2013c Fl 463)
O Grupo de Trabalho Energia do FBOMS tambeacutem enviou uma
mensagem
As organizaccedilotildees do GT Energia do Foacuterum
Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o
Meio Ambiente e o Desenvolvimento expressam
sua solidariedade agraves populaccedilotildees direta ou
indiretamente afetadas pelos impactos da
mineraccedilatildeo e queima do carvatildeo mineral para a
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica na regiatildeo sul de
Santa Catarina () Conhecendo os graves
impactos jaacute causados pelas atividades carboniacuteferas
no Sul de Santa Catarina temos a certeza do
equiacutevoco que representa a instalaccedilatildeo de mais uma
174
usina a carvatildeo na regiatildeo (FATMA 2013c fl
464)
O Movimento pela Vida de Iccedilara tambeacutem registrou sua posiccedilatildeo
ldquoA regiatildeo natildeo suporta mais impactos ambientais eacute preciso mais
seriedade quando se discute qualquer accedilatildeo que interfira na natureza e na
qualidade de vida das crianccedilas dos jovens das mulheres e dos homens
que vivem na regiatildeordquo (FATMA 2013c fl 466)
Na ocasiatildeo da segunda audiecircncia puacuteblica 8 de julho de 2004 natildeo
constaram manifestaccedilotildees escritas Na terceira audiecircncia puacuteblica 16 de
maio de 2006 em carta da ONG Soacutecios da Natureza assinada por Tadeu
Santos agrave Direccedilatildeo da FATMA ficou registrado que havia uma
solicitaccedilatildeo ldquo() agrave FATMA que realizasse a terceira AP em Criciuacutema ou
mesmo em Araranguaacute jaacute que se trata de um empreendimento que
comprovadamente promove impactos ambientais em toda regiatildeordquo E
mais a frente ao falar sobre o processo de licenciamento afirmou que
ldquosomos atores num circo montado para apresentar uma peccedila com o final
desejado pelo empreendedorrdquo (FATMA 2013c fl 538-542)
Na quarta audiecircncia puacuteblica 8 de novembro de 2007 tambeacutem
natildeo constam manifestaccedilotildees escritas Em 19 de maio de 2011 a Diocese
de Criciuacutema enviou um manifesto para o entatildeo presidente da FATMA
Murilo Xavier Flores contra a instalaccedilatildeo da USITESC (FATMA
2013h fl 1601)
A articulaccedilatildeo dos segmentos sociais apresenta estrateacutegias
importantes que convergem com o enfoque da justiccedila ambiental A
difusatildeo espacial do movimento torna-se vital quando aleacutem dos impactos
regionais a populaccedilatildeo diretamente afetada pelo empreendimento tem
uma forte dependecircncia do segmento em questatildeo Conforme jaacute
mencionamos neste capiacutetulo 69 dos empregos com carteira assinada
satildeo oferecidos pelo segmento do carvatildeo mineral e boa parte da
arrecadaccedilatildeo da prefeitura local vem desta atividade Dessa forma natildeo se
verifica uma resistecircncia local ao empreendimento daiacute porque os
segmentos sociais sediados em outros municiacutepios regiotildees estados
brasileiros desempenham um papel fundamental no questionamento do
empreendimento
175
63 Relaccedilotildees de poder e desigualdade nas audiecircncias puacuteblicas os
documentos falados
No estado de Santa Catarina o procedimento adotado durante
uma audiecircncia puacuteblica eacute descrito resumidamente no Quadro 12 A
coordenaccedilatildeo dos trabalhos eacute feita pela FATMA e o tempo de duraccedilatildeo
maacuteximo da audiecircncia puacuteblica eacute de quatro horas Eacute feita uma abertura da
sessatildeo na qual o presidente da mesa esclarece os objetivos e transmite
as regras gerais Na sequecircncia o empreendedor apresenta o projeto e a
consultoria apresenta o EIARIMA Um intervalo de 15 minutos eacute feito
para que os presentes possam se inscrever Os questionamentos satildeo
feitos por ordem de inscriccedilatildeo e podem ser orais ou escritos Os escritos
satildeo lidos pelo coordenador da sessatildeo e os orais devem ser formulados
em trecircs minutos O empreendedor e a consultoria tecircm cinco minutos
para responder e ainda constam dois minutos para reacuteplica e trecircs minutos
para treacuteplica O encerramento eacute feito pelo coordenador da sessatildeo
Quadro 12 - Procedimento para conduccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas
FATMA ETAPAS DA AUDIEcircNCIA TEMPO
Abertura FATMA (10min)
Exposiccedilotildees Proponente do projeto (20min)
Consultoria responsaacutevel pelo
EIARIMA (45min)
Manifestaccedilatildeo da plenaacuteria e debates Intervalo para inscriccedilotildees (15min)
Questionamento (3min)
Resposta (5min)
Reacuteplica (2min)
Treacuteplica (3min)
Encerramento FATMA (sem tempo definido)
Fonte Adaptado de FATMA (2013a fl 101-2)
A elaboraccedilatildeo do projeto da USITESC iniciou em 1999 (Luis
Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007) Em 19 de
fevereiro de 2004 foi realizada a primeira audiecircncia puacuteblica Na
abertura foi lido um ofiacutecio do Ministeacuterio Puacuteblico Federal avisando que
seria requerida uma segunda audiecircncia puacuteblica dado que o EIA
precisava da anaacutelise dos peritos da quarta cacircmara de Brasiacutelia A segunda
audiecircncia puacuteblica foi realizada no dia 8 de julho de 2004 por solicitaccedilatildeo
da FATMA para discutir o projeto da USITESC com o Comitecirc Gestor
176
da Bacia do Rio Araranguaacute porque havia uma preocupaccedilatildeo com o
consumo de aacutegua Motivado pela recomendaccedilatildeo nordm 14 foi contratado
entatildeo um estudo de suplementaccedilatildeo Esse estudo foi apresentado na
terceira audiecircncia puacuteblica em 16 de maio de 2006 tratando dos
empreendimentos acessoacuterios da USITESC (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
As duas audiecircncias puacuteblicas analisadas neste capiacutetulo a terceira e
quarta audiecircncia de 16 de maio de 2006 e 8 de novembro de 2007
respectivamente seguiram o procedimento acima apresentado Em
ambas constatou-se um rigor maior no controle do tempo dos
participantes que apresentaram seus questionamentos que com os
respondentes (empreendedor IPAT Ministeacuterio Puacuteblico Federal e
FATMA) Foram convidados para tomar assento na mesa representantes
da FATMA Ministeacuterio Puacuteblico Federal empreendedor IPAT
prefeitura e SIESESC Diante disso cabe questionar Por que somente
representantes dos segmentos poliacuteticos e econocircmicos tiveram assento na
mesa de trabalho Por que os representantes dos segmentos sociais natildeo
tiveram assento
Na quarta audiecircncia mediada por Adhiles Bortot da FATMA foi
utilizada uma sequecircncia diferente nos questionamentos orais e escritos
natildeo foi respeitada a ordem de chegada Os questionamentos escritos
foram lidos primeiro Em muitos momentos nos questionamentos orais
diante de colocaccedilotildees polecircmicas Adhiles Bortot passava para a pergunta
seguinte como se o questionamento natildeo precisasse ser respondido Por
vaacuterias vezes ele foi interrompido pelo IPAT e Ministeacuterio Puacuteblico
Federal que queriam comentar as intervenccedilotildees do puacuteblico Outro ponto
que merece ser destacado eacute que ele interrompia repetidamente o
questionador pedindo que o tempo fosse respeitado Logo as pessoas
que faziam questionamentos resumiam sua fala sobrando mais tempo
para os respondentes
Nas proacuteximas seccedilotildees desse capiacutetulo a partir da transcriccedilatildeo e
anaacutelise das audiecircncias puacuteblicas encontram-se trechos selecionados de
temas Fragmentos dos discursos dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais foram destacados e comentados a partir dos pontos mais
controvertidos
177
631 A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica
Os discursos das audiecircncias puacuteblicas proacute USITESC tenderam a
minimizar os impactos causados pelo empreendimento ressaltando seus
aspectos positivos Os segmentos econocircmicos representados pelo
empreendedor situaram a USITESC num contexto mundial no qual o
carvatildeo mineral eacute base da matriz energeacutetica O uso de novas tecnologias
e a situaccedilatildeo do Brasil colocaria as emissotildees de gases de efeito estufa
como insignificantes na matriz energeacutetica brasileira
() os estudos energeacuteticos mostram que o carvatildeo
ainda seraacute a base da matriz energeacutetica mundial ateacute
o ano de 2050 no miacutenimo O incremento de
novos projetos a carvatildeo vem paulatinamente
recebendo tratamento tecnoloacutegico para minimizar
a formaccedilatildeo de gases de efeito estufa Isso eacute uma
verdade () a contribuiccedilatildeo do Brasil para o efeito
estufa com novas usinas a carvatildeo eacute insignificante
perante o quadro mundial Soacute para citar um
exemplo esse ano soacute na Alemanha foram
contratados mais de oito mil novos megawatts a
carvatildeo O Brasil todo tem pouco mais de mil
megawatts a carvatildeo instalados A USITESC estaacute
propondo colocar uma potecircncia bruta de 200440
dos quais vai gerar em meacutedia 280 a 300
Alemanha tem 70 mil megawatts de carvatildeo
instalados O nordeste dos Estados Unidos tem
350 mil soacute o nordeste dos Estados Unidos 350
mil megawatts de carvatildeo instalados (Luis Carlos
Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
A ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral eacute
ldquonecessaacuteriardquo para o Brasil e a USITESC eacute um empreendimento
economicamente viaacutevel
() o sistema eleacutetrico brasileiro necessita da
geraccedilatildeo teacutermica e para isso o carvatildeo mineral eacute
sem duacutevida o nosso melhor potencial a USITESC
utilizaraacute um combustiacutevel de baixo custo os niacuteveis
tarifaacuterios sinalizados para o horizonte de
contrataccedilatildeo da energia da Usina indicam boa
rentabilidade para o Projeto adicional pela venda
178
do sulfato de amocircnia 320000 toneladas por ano
(Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Os impactos ambientais e riscos foram minimizados nas
colocaccedilotildees garantindo-se que os investidores internacionais natildeo
participam de empreendimentos que contrariem a legislaccedilatildeo e possuam
risco ambiental A atuaccedilatildeo fiscalizadora do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
tambeacutem foi citada Natildeo foi destacada em nenhum momento a
importacircncia da FATMA
() a USITESC significa um investimento global
da ordem de 750 milhotildees de doacutelares Esse
dinheiro natildeo vai ser buscado em algum fundo de
quintal Esse dinheiro tem investidores
internacionais e ningueacutem arrasta dinheiro
ningueacutem bota dinheiro em empreendimento que
possui risco ambiental A maior garantia que vocecirc
tem que um projeto vai ser implantado com a
qualidade ambiental que estaacute sendo anunciada eacute
que hoje os auditores internacionais natildeo aprovam
os financiamentos se o projeto natildeo estiver de
acordo com aquela disposiccedilatildeo feita no papel
(Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
O que noacutes estamos querendo implantar aqui na
regiatildeo natildeo eacute nada de coisa anormal que vai
prejudicar algueacutem Mesmo porque () o
Ministeacuterio Puacuteblico natildeo vai deixar noacutes cometermos
barbaridade () Eu digo a todos vocecircs o seguinte
como o proacuteprio Banco Mundial me disse laacute em
Washington ldquose vocecircs tiverem algum problema de
poluiccedilatildeo ao implantar o projeto noacutes natildeo daremos
um centavo sequer (Alfredo Flaacutevio Gazzolla
USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
A importacircncia do empreendimento para a regiatildeo e para o municiacutepio tambeacutem foi destacada Ele vai trazer desenvolvimento para
Treviso e regiatildeo com geraccedilatildeo de emprego e renda E quanto agrave
dependecircncia do municiacutepio em relaccedilatildeo ao carvatildeo Luis Carlos Cunha
garantiu que o municiacutepio diversificaraacute sua economia
179
Ora cinquenta anos eacute um prazo bastante grande
pra pra pra um desenvolvimento de outras
atividades no municiacutepio Natildeo vai o municiacutepio natildeo
vai ficar estagnado somente na mina e numa
Usina E a Usina eacute multiplicadora na medida em
que ela vai proporcionar com os seus subprodutos
o sulfato de amocircnia e a proacutepria cinza que eacute uma
mateacuteria prima importante para a construccedilatildeo civil
etc a implantaccedilatildeo de outros empreendimentos na
regiatildeo ou no proacuteprio municiacutepio pra
aproveitamento industrial desses subprodutos e
presumo ao longo de cinquenta anos outras
oportunidades apareceratildeo para o municiacutepio dentro
das suas vocaccedilotildees (Luis Carlos Cunha USITESC
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A usina foi colocada pelo empreendedor como uma forma de
recuperaccedilatildeo ambiental jaacute que vai ser construiacuteda em aacuterea degradada e
utilizar 30 de rejeito como mateacuteria prima para geraccedilatildeo de energia ldquoA
rigor a instalaccedilatildeo da Usina nessa localizaccedilatildeo significa uma accedilatildeo de
recuperaccedilatildeo ambientalrdquo (Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
O maior impacto ambiental segundo o representante do
empreendedor eacute a pressatildeo sobre a infraestrutura urbana de Treviso que
seraacute devidamente minimizada com investimentos nessa aacuterea Como
principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo foi destacada a geraccedilatildeo de emprego e
renda apresentada ao puacuteblico da audiecircncia atraveacutes da Tabela 28
Tabela 28 ndash Principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo com a construccedilatildeo da
USITESC SETOR DA
ECONOMIA
EMPREGOS
DIRETOS
EMPREGOS
INDIRETOS
Mineraccedilatildeo de carvatildeo 400-500
Mineraccedilatildeo de calcaacuterio ~60
Geraccedilatildeo de energia ~150
Amocircnia e sulfato de
amocircnia
~60
Transportes diversos ~140
Restante da economia
associada
4500
Fonte Luis Carlos Cunha USITESC Audiecircncia Puacuteblica (2007)
180
Os segmentos poliacuteticos tambeacutem se posicionaram em relaccedilatildeo agrave
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica O representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal ressaltou a necessidade da ampliaccedilatildeo da oferta de
energia eleacutetrica resguardando seu posicionamento teacutecnico-legal
E aiacute o Brasil estaacute numa encruzilhada no meu
ponto de vista e aqui isso que noacutes estamos
vivendo em Treviso eacute um microcosmo do que taacute
acontecendo no paiacutes Porque o paiacutes estaacute diante de
uma crise energeacutetica noacutes tivemos um apagatildeo
daqui a um tempo vamos ter outro aqui noacutes
estamos discutindo USITESC mas tem problema
de usina hidreleacutetrica em Itaacute em Anita Garibaldi
em Belo Monte laacute na Amazocircnia e natildeo sei mais
aonde e noacutes estamos refeacutem do gasoduto do Evo
Morales Entatildeo Esse eacute um questionamento pra
noacutes brasileiros como um todo Claro que natildeo
somos noacutes aqui que vamos resolver isso mas
temos que ter isso em mente E isso passa pelo
presidente da repuacuteblica pelo Congresso a
sociedade tem que ter uma resposta pra isso
porque noacutes queremos luz eleacutetrica queremos o
desenvolvimento econocircmico Entatildeo daonde vai
sair a energia Algum impacto ambiental em
algum lugar vai ter que ter Eacute claro que noacutes
queremos o mais longe possiacutevel do nosso quintal
E o papel do Ministeacuterio Puacuteblico nesse processo eacute
um oacutergatildeo independente que fiscaliza E noacutes
estamos fiscalizando esse processo da USITESC
com base olhando duas coisas o cumprimento da
legislaccedilatildeo e os aspectos teacutecnicos Vocecircs viram
aqui que tem uma equipe teacutecnica trabalhando
temos outros profissionais que estatildeo trabalhando
nisso () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico
Federal AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A prefeita Lucia Simolin enfatizou a situaccedilatildeo de dependecircncia do municiacutepio em relaccedilatildeo agrave atividade carboniacutefera
Eacute verdade tambeacutem que Treviso hoje tem a
seguinte realidade incontestaacutevel feliz ou
infelizmente 80 da nossa economia faltando
alguns poucos deacutecimos praticamente
181
arredondando para 80 depende da economia da
extraccedilatildeo do carvatildeo mineral nos seus diversos tipos
de exploraccedilatildeo e usos Em torno de 20 gira em
torno da produccedilatildeo agropecuaacuteria embora a gente
tenha 168km2 de aacuterea Entatildeo senhores a
exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral para Treviso ela eacute
equivalente agrave monocultura do arroz para Turvo e
Meleiro Essa eacute uma realidade teacutecnica e
administrativa que natildeo eacute do dia pra noite que a
gente pode alterar (Lucia Simolin prefeita
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
() noacutes temos a consciecircncia dos problemas que
podem advir uns mais visiacuteveis e comprovados
outros que o tempo vai nos dizer e a natureza de
que um empreendimento desse porte ele vai nos
afetar Mas vejamos bem como vamos
sobreviver a uma condiccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos
municipais se praticamente a receita do
municiacutepio hoje estaacute diretamente vinculada a
extraccedilatildeo de um foacutessil (Lucia Simolin prefeita
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Apesar de demonstrar uma certa inseguranccedila em relaccedilatildeo aos
impactos o empreendimento natildeo foi questionado A prefeita inclusive
enfatizou a ldquocultura do carvatildeordquo e a ideia da construccedilatildeo do museu do
carvatildeo como algo positivo para a cidade
noacutes temos a nossa cultura eacute o carvatildeo Aiacute a natildeo
exploraacute-lo ou a transformaacute-lo em energia eacute uma
discussatildeo que noacutes estamos presentes e portanto
natildeo fugindo () A gente tem que ver a melhor
saiacuteda pra todas as situaccedilotildees E noacutes do poder
puacuteblico estamos aqui pra isso Estamos aqui para
contribuir Entatildeo esse eacute o meu depoimento a
respeito do empreendimento essa eacute a realidade do
municiacutepio e que natildeo pode ser negada Eacute a nossa
realidade Eacute a nossa verdade A verdade que eacute
uma verdade econocircmico-financeira mas eacute a nossa
verdade (Lucia Simolin AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
182
O crescimento econocircmico do municiacutepio e regiatildeo foi um
argumento forte de convencimento
Noacutes temos que ter consciecircncia de que o projeto
USITESC quando implantado ele seraacute a mola
propulsora de uma nova fase de desenvolvimento
para toda a regiatildeo carboniacutefera Natildeo eacute soacute mineiro
que quer emprego Toda a populaccedilatildeo quer
emprego Quer investimento em sauacutede educaccedilatildeo
e a USITESC eacute investimento eacute sinal de
investimento () Eu acho que a regiatildeo toda tem
muito a ganhar com esse grande projeto que vai
alavancar o progresso e o desenvolvimento de
uma nova fase () (Marcos Antocircnio Cesconetto
Vereador AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
O que fica expliacutecito nos discursos de alguns poliacuteticos locais eacute
uma confianccedila no processo de licenciamento e nas empresas
carboniacuteferas
Noacutes temos que discutir aqui assuntos pertinentes
agrave populaccedilatildeo ou seja a instalaccedilatildeo da Usina E
dizer Dr Darlan que noacutes confiamos na atuaccedilatildeo do
Ministeacuterio Puacuteblico Federal confiamos na atuaccedilatildeo
do Ministeacuterio Puacuteblico Estadual na atuaccedilatildeo da
Fatma e de tantos oacutergatildeos como o Ibama que satildeo
realmente quem tem condiccedilotildees de fiscalizar aquilo
que vai acontecer no empreendimento Natildeo satildeo
afirmaccedilotildees infundadas que foram levantadas aqui
e que muitas delas natildeo tem a ver com o
empreendimento Noacutes queremos dizer que noacutes
confiamos na Carboniacutefera Metropolitana e na
Carboniacutefera Criciuacutema uma delas aqui a mais de
vinte anos outra jaacute explorou carvatildeo aqui na volta
redonda e nas reservas que eles tecircm aqui E noacutes
temos consciecircncia de que o empreendimento eacute
viaacutevel e eacute viaacutevel porque ele pode viabilizar a
exploraccedilatildeo de carvatildeo e a grande maioria das
pessoas eu posso dizer que quase a totalidade das
pessoas que estatildeo aqui ou satildeo mineiros ou algueacutem
da famiacutelia vive do carvatildeo nos mais diversos
municiacutepios (Marcos Antocircnio Cesconetto
Vereador AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
183
A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica fica evidente
nos discursos aqui apresentados O empreendimento se justifica na
medida em que paiacuteses ldquodesenvolvidosrdquo utilizam o carvatildeo para geraccedilatildeo
de energia e o Brasil por ter uma matriz energeacutetica considerada
ldquolimpardquo pode usaacute-lo sem maiores problemas Os impactos ambientais
do empreendimento seratildeo miacutenimos jaacute que os investidores internacionais
assim o exigem e o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute fiscalizando Afinal a
concessatildeo do licenciamento estaacute condicionada ao respeito agraves leis e a
criteacuterios teacutecnicos
Os poliacuteticos municipais dada a dependecircncia econocircmica da
atividade carboniacutefera veem o empreendimento com ldquobons olhosrdquo pois
apesar dos impactos negativos ele traraacute tambeacutem o crescimento ao
municiacutepio e agrave regiatildeo Segundo eles a cultura do carvatildeo precisa ser
mantida
632 As mudanccedilas climaacuteticas natildeo vecircm ao caso
Os segmentos sociais presentes nas audiecircncia puacuteblicas (Amigos
da Terra Movimento Iccedilara pela Vida Soacutecios da Natureza UNESC
dentre outros) demonstraram preocupaccedilatildeo com as mudanccedilas climaacuteticas
com o aquecimento global com o impacto regional do empreendimento
e a continuidade da atividade carboniacutefera que jaacute causou muitos impactos
na regiatildeo
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionou a
continuidade de uma atividade que se mostrou e se mostra inviaacutevel do
ponto de vista socioambiental
Porque a nossa preocupaccedilatildeo do Movimento pela
Vida aleacutem de todo o efeito estufa aleacutem de toda a
poluiccedilatildeo que vai gerar aqui na regiatildeo que natildeo eacute
soacute o CO2 que vai largar O gaacutes que vai ser largado
aqui mas toda uma poluiccedilatildeo que vai ser gerada
aqui proacuteximo do Aquiacutefero Guarani da Serra todo
esse ecossistema que existe que essa usina estaacute
colocando em perigo E tambeacutem vai a meacutedio e
longo prazo trazer problemas para as famiacutelias da
regiatildeo onde existe carvatildeo no subsolo porque
assim como laacute na Iccedilara eles tatildeo tentando tirar
carvatildeo eles vatildeo tentar continuar tirando de outros
184
lugares (Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela
Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Carlyle professor da UNESC fez a seguinte pergunta
ldquoConsiderando as implicaccedilotildees das emissotildees de CO2 Dioacutexido de Carbono
para o aquecimento global quais as razotildees pelas quais esse poluente natildeo
foi analisado17
tendo em vista os recentes relatoacuterios do Painel sobre
Mudanccedilas Climaacuteticasrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Em resposta Luiz Nogueira Palma deixou claro que a questatildeo
das mudanccedilas climaacuteticas natildeo dizia respeito ao conteuacutedo da audiecircncia
puacuteblica
Eu vou responder isso aiacute eu acho que o Carlyle
estaacute colocando uma pergunta muito interessante
mas que no meu entendimento ela foge
totalmente ao objeto dessa audiecircncia Eacute todo
mundo sabe que uma usina termeleacutetrica que
queima carvatildeo ou qualquer outro combustiacutevel
emite CO2 Existem necessidades de gerar energia
e o que estaacute se discutindo aqui eacute a necessidade de
um empreendimento que foi colocado junto ao
cenaacuterio nacional Eacute eu natildeo vou mentir para vocecircs
essa usina emite CO2 como o carro de cada um de
noacutes emite CO2 e o que o que o Carlyle taacute
colocando eacute uma preocupaccedilatildeo mundial de emissatildeo
de CO2 Mas nem por isso nenhum paiacutes estaacute
deixando de implantar usina as necessaacuterias como
todos os controles necessaacuterios [ele interrompe
momentaneamente a fala por conta do burburinho]
Entatildeo eu acho que essa pergunta que trata de uma
mateacuteria global A usina trata os poluentes
atmosfeacutericos de forma exemplar com elementos
de controle extremamente sofisticados
encarecendo o preccedilo da energia gerada e por isso
estaacute se chamando usina da energia verde neacute
Porque a teacutermica que usa um combustiacutevel natildeo tatildeo
nobre como o gaacutes que eacute o carvatildeo nacional ela taiacute
para produzir mostrando que as emissotildees tatildeo
muito abaixo dos padrotildees nacionais Natildeo existe
um padratildeo nacional para CO2 em lugar nenhum
17
Nos estudos complementares que haviam sido apresentados na audiecircncia
puacuteblica
185
do mundo Entatildeo essa eacute outra questatildeo () O
contraponto dessa pergunta e de que se noacutes
estamos ou natildeo colaborando com o Protocolo de
Quioto O Brasil colabora porque a nossa matriz
energeacutetica mais de 90 da energia gerada no paiacutes
eacute hidraacuteulica (Luiz Nogueira Palma IPAT
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida fez a leitura de
uma moccedilatildeo que foi aprovada na etapa regional da Conferecircncia do Meio
Ambiente A Conferecircncia aconteceu na UNESC e foi promovida pela
Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econocircmico Sustentaacutevel pelo
IBAMA Secretaria de Estado da Educaccedilatildeo EPAGRI CIRAM
FECAM ANAMA FLORAM FEEC FIESC ALESC FETAESC
Poliacutecia Militar Ambiental e ACAFE Aconteceram sete delas em Santa
Catarina O objetivo das Conferecircncias foi traccedilar poliacuteticas puacuteblicas sobre
meio ambiente no paiacutes em relaccedilatildeo ao aquecimento global ldquoE qual foi a
decisatildeo que a Conferecircncia Regional aqui tomou em relaccedilatildeo ao carvatildeo
Em resumo ldquoa substituiccedilatildeo da matriz energeacutetica baseada no carvatildeo para
outras alternativas de modo gradativordquo Moccedilatildeo que foi aprovada por
unanimidade Ele aproveitou para ler um trecho da moccedilatildeo
() em face da comprovada participaccedilatildeo da
queima de carvatildeo mineral no aumento do
aquecimento global e na intensa degradaccedilatildeo do
solo e aacuteguas provocadas pela sua extraccedilatildeo a
Conferecircncia Regional do Meio Ambiente de
Criciuacutema solicita o cancelamento de todo o
processo de licenciamento da Termeleacutetrica
USITESC em Santa Catarina bem como outras da
regiatildeo sul do Estado dado o elevado passivo
ambiental associado aos empreendimentos
especialmente em termos de degradaccedilatildeo dos
ecossistemas costeiros e da perda da qualidade de
vida das populaccedilotildees que ocupam o sul do estadordquo
Ele completou sua intervenccedilatildeo fazendo o seguinte comentaacuterio
Algueacutem estaacute indo na contramatildeo da histoacuteria ()
Ou noacutes nos damos conta que esse
empreendimento vai contra taacute indo contra tudo o
que estaacute se vendo nesse paiacutes nesse planeta ou
entatildeo a gente estaacute assinando nossa sentenccedila de
morte Chegamos ao absurdo de escutar dos
186
teacutecnicos do IPAT que essa questatildeo do CO2 eacute uma
questatildeo irrelevante natildeo vem ao caso Gente essa
eacute a maior questatildeo E que foi deixada de lado E o
IPAT estaacute indo contra a missatildeo da UNESC
(Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Diante do comentaacuterio o representante do IPAT Marcos Back
fez as seguintes consideraccedilotildees
Em primeiro lugar eu gostaria de esclarecer
algumas questotildees por aqui que natildeo estatildeo muito
claras Primeiro existe um posicionamento
equivocado aqui Noacutes temos que entender
exatamente o que noacutes estamos colocando
Primeiro noacutes estamos discutindo o EIARIMA
que se refere a uma usina termeleacutetrica que queima
carvatildeo e que emite CO2 Quando o Engenheiro
Palma coloca que a questatildeo do CO2 natildeo deve ser
discutida aqui natildeo eacute que ele estaacute querendo dizer
que a questatildeo do CO2 eacute irrelevante Natildeo eacute que ele
quer dizer que o problema do CO2 do
aquecimento global natildeo sejam questotildees
importantes a serem discutidas Pelo contraacuterio a
questatildeo do aquecimento global e da emissatildeo de
CO2 eacute uma questatildeo muito importante a ser
discutida Que a sociedade tem que pensar
seriamente nas consequecircncias da emissatildeo de CO2
que natildeo vem soacute do carvatildeo taacute Entatildeo noacutes temos
que pensar nisso que o aquecimento global estaacute
mostrando seus efeitos e jaacute vaacuterios cientistas
demonstraram mostraram esses efeitos Entatildeo noacutes
temos que pensar nisso sim Quando o IPAT taacute
colocando aqui que noacutes estamos discutindo o
EIARIMA da USITESC noacutes estamos colocando
que discutir licenciamento ambiental eacute um
procedimento legal vocecirc segue o tracircmite as
normas de um procedimento legal () Natildeo eacute da
competecircncia do IPAT julgar a matriz energeacutetica
brasileira Quem estabeleceu isso foram as leis
federais o Congresso Nacional e o Presidente
Lula Satildeo eles que estabelecem se pode ou natildeo
pode produzir carvatildeo se pode ou natildeo pode ter
187
energia movida a carvatildeo Entatildeo natildeo compete ao
IPAT nesse estudo NESSE ESTUDO de usina
termeleacutetrica conduzir uma discussatildeo sobre
aquecimento global porque natildeo eacute isso que estaacute
em discussatildeo aqui O que taacute em discussatildeo aqui eacute
se pode ou natildeo implantar a usina termeleacutetrica
dentro dos tracircmites da lei atual (Marcos Back
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Um representante dos segmentos poliacuteticos Joatildeo Luiacutes presidente
da Cacircmara de Vereadores de Trevisto tambeacutem fez um questionamento
sobre o assunto
Eu gostaria de fazer uma pergunta aos oacutergatildeos
ambientais Noacutes vimos na televisatildeo todos os dias
que os Estados Unidos eacute o maior produtor desse
planeta e foi superado pela China Exatamente nas
suas termeleacutetricas que queimam carvatildeo mineral
87 da energia produzida pela China eacute da queima
do carvatildeo mineral Entatildeo noacutes vemos aiacute o mundo
todo criticando brigando contra isso agora eu
gostaria que vocecircs respondessem a todos noacutes que
satildeo pessoas entendidas Noacutes podemos implantar
um projeto como esse em Treviso Ele eacute viaacutevel
Noacutes podemos pagar esse preccedilo E por que (Joatildeo
Luis Presidente da Cacircmara de Vereadores de
Treviso AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
A resposta do representante da FATMA tambeacutem natildeo contemplou
a preocupaccedilatildeo com questotildees mais amplas
Algumas questotildees que jaacute foram hoje objeto de
abordagem aqui ele foge do escopo do processo
de licenciamento Noacutes tratarmos de mudanccedilas
climaacuteticas natildeo eacute uma questatildeo que estaacute inserida no
projeto que hoje estaacute sendo objeto dessa audiecircncia
puacuteblica A garantia que eu posso dar aos senhores
em relaccedilatildeo ao projeto que estaacute sendo avaliado pela
FATMA e logicamente que noacutes temos natildeo eacute uma
parceria mas um papel fiscalizador do Ministeacuterio
Puacuteblico que tem auxiliado e tem contribuiacutedo de
uma maneira positiva pra que noacutes ao longo desses
dois trecircs anos desse processo de licenciamento
noacutes tenhamos tido avanccedilos significativos em
188
termos de ganhos ambientais () (Luis Antocircnio
Garcia FATMA AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Jaacute o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal Darlan Aiacutelton
Dias contemplou a preocupaccedilatildeo dos presentes afirmando que ldquoeu acho
sim que o aquecimento global faz parte da discussatildeo da USITESC Deve
ser discutida mas a decisatildeo do licenciamento eacute verificar a adequaccedilatildeo
teacutecnica e o atendimento agrave legislaccedilatildeordquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Apesar do parecer favoraacutevel do representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal fica claro que para os que compotildeem a mesa de
trabalho na audiecircncia puacuteblica o tema natildeo tem relaccedilatildeo com o
licenciamento Aos representantes dos segmentos sociais e poliacuteticos aqui
citados foi permitida a manifestaccedilatildeo quanto ao tema mas ela natildeo
encontrou eco Isso aconteceu tambeacutem para a tentativa de discutir o
empreendimento regionalmente
633 Quem defende quem E quem defende os
afetadosatingidosameaccedilados
Nas audiecircncias puacuteblicas foram colocadas duacutevidas em relaccedilatildeo agrave
participaccedilatildeo da populaccedilatildeo de Treviso O vereador Joatildeo Luis Brunel fez a
seguinte colocaccedilatildeo seguida de uma pergunta
() Eu quero dizer que sou a favor do progresso e
quero que a nossa gente tenha emprego mas que
noacutes temos que pagar um preccedilo justo Eu gostaria
de fazer uma pergunta aqui Falou-se sobre muita
coisa mas eu gostaria de saber sobre todas essas
famiacutelias que seratildeo desapropriadas Eu cito aqui a
comunidade da Brasiacutelia Eu vejo aqui a
comunidade satildeo famiacutelias centenaacuterias de gente que
desbravaram essa terra que ajudaram a construir
esse municiacutepio Entatildeo eu faccedilo a seguinte pergunta
como que eles tem o direito de se defender Eles
simplesmente vatildeo ser notificados vatildeo ser
desapropriados Satildeo pessoas que estatildeo aiacute haacute mais
de um seacuteculo Eu gostaria de saber onde estatildeo os
direitos humanos Quais satildeo os direitos que eles
189
tecircm (Joatildeo Luis Brunel AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
Joaquim Teixeira Neto estudante da UNESC fez seu comentaacuterio
sobre a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo na audiecircncia puacuteblica
Entatildeo o seguinte eu gostaria que a populaccedilatildeo de
Treviso que natildeo estaacute aqui presente por motivos
que a gente desconhece precisa A populaccedilatildeo de
Treviso precisa se manifestar em audiecircncia
exclusiva Porque esse empreendimento apesar de
ser regional vai atingir primeiramente essa
comunidade e eles natildeo estatildeo sendo ouvidos Eles
estatildeo sendo calados e todos sabemos (Joaquim
Teixeira Neto AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Lucia Ortiz da Amigos da Terra fez um relato de um processo
de licenciamento que aconteceu no Rio Grande do Sul no qual mesmo
depois de emitida a licenccedila foi feito um plebiscito na regiatildeo
() mesmo depois que a Fepam liberou a licenccedila
preacutevia pra instalaccedilatildeo dessa usina o pessoal
conseguiu realizar a realizaccedilatildeo de um plebiscito
na regiatildeo que vai ser agora esse saacutebado pra que a
populaccedilatildeo de fato possa decidir se quer ou natildeo
esse empreendimento A minha pergunta eu tenho
duas perguntas uma eu acho que seria saber se
tem resposta pra populaccedilatildeo dos municiacutepios aqui
da regiatildeo que eacute se as pessoas aqui estatildeo mesmo
dispostas a abrirem matildeo das suas reservas de
aacutegua pro seu abastecimento proacuteprio ou dos seus
filhos ou dos seus netos tendo em vista que essa
usina vai consumir muito mais que a populaccedilatildeo da
regiatildeo de aacutegua a aacutegua do Rio Matildee Luzia aquilo
que ainda resta de aacutegua natildeo contaminada nessa
bacia (Lucia Ortiz Amigos da Terra
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A prefeita de Treviso Lucia Simolin na quarta Audiecircncia
Puacuteblica comentou que foi realizada uma pesquisa e que 70 da
populaccedilatildeo de Treviso concorda com o empreendimento Duas criacuteticas
feitas merecem destaque
190
A primeira feita pelo estudante da UNESC Joaquim Teixeira
chamou a atenccedilatildeo para o fato de que a USITESC eacute um empreendimento
que afetaraacute a regiatildeo e ouvir apenas a populaccedilatildeo de Treviso natildeo seria
uma medida adequada Segundo ele ldquoa termeleacutetrica natildeo eacute soacute um
problema de Treviso Fazer pesquisa de opiniatildeo soacute em Treviso eacute
desprezar uma questatildeo que eacute regionalrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
A segunda criacutetica questionou a pesquisa citada pela prefeita com
base em uma pesquisa feita no municiacutepio de Iccedilara
O IPAT quando fala que eacute imparcial ele estaacute
numa situaccedilatildeo que eu passei pelo conjunto do
Movimento pela Vida em Iccedilara Foi feita uma
pesquisa na Iccedilara pelo IPAT perguntando o
seguinte se a mina natildeo degradar natildeo poluir natildeo
fazer isso natildeo fazer aquilo nanana nananan vocecirc
vai ser a favor da mina Ai o pessoal ateacute eu
responderia que sim Aiacute fizeram uma publicaccedilatildeo
ldquoO IPAT confirma que 80 da populaccedilatildeo de Iccedilara
eacute a favor da mina Fomos laacute saber qual era a
pergunta que foi feita era desse jeito Noacutes
queremos contratar o IPAT para fazer a seguinte
pesquisa se levar em conta toda a degradaccedilatildeo que
a mina provoca os caimentos as casas rachadas a
aacutegua poluiacuteda o aquecimento global papapaacute vocecircs
seriam a favor da mina ou natildeo Ah isso noacutes natildeo
podemos fazer Pra noacutes podiam fazer uma
pesquisa desde fugiu a palavra aqui () mas pra
eles sim Eu questiono sim o IPAT mas
parabenizo grande parte da UNESC professores e
alunos que estatildeo buscando realmente uma defesa
do meio ambiente (Gilmar Bonifaacutecio Movimento
Iccedilara pela Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Nos discursos das duas audiecircncias puacuteblicas constatou-se que
apenas uma pessoa se colocou como representante de uma comunidade
de Treviso Gerson Hanne A intervenccedilatildeo seguinte de Sivio Saad
sintetiza a preocupaccedilatildeo de quem assistiu as duas audiecircncias puacuteblicas
Noacutes temos uma cidade pacata com 3500
habitantes e algueacutem resolve colocar um
empreendimento dentro dessa cidade Os
moradores claro devem saber o que estaacute
191
acontecendo Vimos a exposiccedilatildeo do
empreendedor vimos a exposiccedilatildeo da universidade
e o poder de julgar de saber se aceitam ou natildeo o
empreendimento agrave medida que eles foram
convincentes neacute os empreendedores satildeo
convincentes tatildeo preparados tem audiovisual satildeo
convincentes Mas eu gostaria de saber se a
populaccedilatildeo decide que natildeo quer quem defende os
interesses da populaccedilatildeo Quem eacute que taacute aqui
sentado (ele mostra os integrantes da mesa) que
representa os interesses dessa populaccedilatildeo Que
possa pelo menos equilibrar esse jogo Seria o
empreendedor Claro que natildeo Ele taacute defendendo
os seus interesses Ele eacute capaz de dizer aqui que
os oacutergatildeos internacionais soacute aprovam o dinheiro se
tiver cuidado com o meio ambiente Acredite se
quiser Temos aqui o pessoal da FATMA Eu jaacute vi
a FATMA aprovar coisas absurdas () Agora
depois que ela aprovou ela fiscaliza () Aiacute eles
respondem ldquonatildeo temos quem fiscalizerdquo Quem
seria a Universidade A UNESC () A prefeita
() eu ouvi uma entrevista dela hoje cedo dizendo
que se der dinheiro para a cidade ela aprova
Quem mais O governador que vem aqui diz que
vai dar emprego Vocecircs querem emprego Vocecircs
querem colocar mais duas mil pessoas aqui
dentro () Se a populaccedilatildeo quer oacutetimo Se a
populaccedilatildeo natildeo quer precisa ter algueacutem aqui que
defende () Soacute tem uma pessoa que defende os
interesses da populaccedilatildeo o Dr Darlan Esse
defende Dentro da lei esse defende Agora
precisava mais algueacutem () Se for confiar em
quem taacute aqui na mesa vocecircs tatildeo perdidos Se a
populaccedilatildeo chega agrave conclusatildeo que natildeo quer e
confia nesses que tatildeo aqui vocecircs estatildeo perdidos
A minha pergunta eacute quem defende os interesses
da populaccedilatildeo (Silvio Saad AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Diante dessa fala o apresentador Adhiles Bortot da FATMA
passou para a proacutexima pergunta sem que ningueacutem da mesa se
pronunciasse Essa atitude refletiu o clima das duas audiecircncias
analisadas Quando o assunto se referia aos
192
atingidosafetadosameaccedilados muitas respostas evasivas eram dadas
ressaltando sempre o respeito pelas leis e pelos criteacuterios teacutecnicos
As interveccedilotildees apresentadas demonstram a injusticcedila poliacutetica Se a
mineraccedilatildeo respeita as leis e os criteacuterios teacutecnicos ela eacute liacutecita O que passa
ao largo eacute uma discussatildeo mais ampla sobre gestatildeo de recursos comuns
opccedilotildees de desenvolvimento direitos humanos e justiccedila ecoloacutegica
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida falou da importacircncia
de uma discussatildeo sobre os direitos do cidadatildeo ldquo() concordamos
tambeacutem com o direito constitucional que todo cidadatildeo tem o direito a
um ambiente saudaacutevel () Essa tambeacutem eacute uma questatildeo legal Entatildeo noacutes
devemos comeccedilar a discutir questotildees legaisrdquo (Gilmar Bonifaacutecio
Movimento Iccedilara pela Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007) Mas as
evidecircncias demonstram que as audiecircncias se propunham a ser espaccedilo de
discussatildeo apenas de assuntos referentes ao licenciamento Todas as
discussotildees mais amplas foram desconsideradas
634 O papel da FATMA em questatildeo
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionou o
Ministeacuterio Puacuteblico e a FATMA que na segunda audiecircncia afirmaram
que a licenccedila natildeo seria emitida sem estudos conclusivos Ele citou o
exemplo de Iccedilara que haacute trecircs anos vinha se mobilizando para a natildeo
instalaccedilatildeo de uma mina de carvatildeo Ele destacou o papel do Ministeacuterio
Puacuteblico e questionou o papel da FATMA No caso da USITESC a
preocupaccedilatildeo dele foi que se a LP fosse dada e os empreendedores
participassem do leilatildeo haveria uma pressatildeo para a aprovaccedilatildeo dos
processos de licenciamento dos empreendimentos acessoacuterios
(AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Joatildeo Luis Brunel tambeacutem questionou os criteacuterios da FATMA na
concessatildeo da licenccedila
() noacutes vemos aiacute todos os dias uma campanha
mundial de preservaccedilatildeo da natureza
principalmente das aacuteguas aacuteguas do nosso planeta
que estatildeo quase que totalmente poluiacutedas entatildeo eu
faccedilo a pergunta noacutes vamos construir essa usina ao
lado de uma reserva ambiental e vamos captar a
maior fonte de aacutegua potaacutevel do nosso municiacutepio
193
uma aacutegua que jaacute estaacute mapeada pela Casan pra
abastecimento futuro em cidades vizinhas E onde
vatildeo passar a linha do trem e a linha de transmissatildeo
vatildeo atingir terrenos cobertos por floresta nativa
Entatildeo eu gostaria de saber quais satildeo os criteacuterios
que a Fatma os oacutergatildeos ambientais adotam pra dar
a licenccedila ou natildeo para a construccedilatildeo de um projeto
como esse (Joatildeo Luis Brunel AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Luis Antocircnio Garcia da FATMA respondeu ldquoA Fatma atraveacutes
de seu corpo teacutecnico e seus consultores vai avaliar os estudos como os
demais e leva em consideraccedilatildeo criteacuterios teacutecnicos e aspectos legais Se
houver viabilidade pelo licenciamento assim seraacute feito Se natildeo houver
viabilidade a licenccedila natildeo seraacute concedidardquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
O representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal na defesa da
FATMA fez as seguintes consideraccedilotildees
Mas posso dizer que na maioria dos casos
inclusive envolvendo o carvatildeo a Fatma tem
atuado em bastante sintonia com o Ministeacuterio
Puacuteblico Eacute claro que a Fatma eacute um oacutergatildeo do poder
executivo e noacutes conhecemos a tradiccedilatildeo do nosso
estado poliacutetica inclusive tudo eacute muito politizado
noacutes sabemos que a Fatma sofre pressotildees poliacuteticas
de toda ordem Mas eu sou testemunha pelo que
vivo aqui em Criciuacutema que os teacutecnicos tem se
esforccedilado e a direccedilatildeo tambeacutem pra resistir agraves
pressotildees e fazer um trabalho teacutecnico (Darlan
Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Na quarta audiecircncia puacuteblica a legitimidade da FATMA nos
processos de licenciamento tambeacutem foi colocada vaacuterias vezes em
duacutevida A jornalista Ana Echevenguaacute de Florianoacutepolis fez o seguinte
questionamento
() eu gostaria de perguntar para o Dr Darlan de
acordo com aquela decisatildeo liminar proferida pelo
Dr Germano juiz federal onde ele dizia que
enquanto a FATMA natildeo tiver o corpo teacutecnico
194
capaz de apreciar EIARIMA ela estaacute proibida e o
IBAMA assumiria essa responsabilidade eu
entendo que nem essa audiecircncia deveria estar
acontecendo (Ana Echevenguaacute AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Em resposta o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
enfatizou o caraacuteter fiscalizador do Ministeacuterio Puacuteblico e que o IBAMA
natildeo seria a soluccedilatildeo para os problemas de licenciamento em Santa
Catarina
Aquela decisatildeo do juiz que disse que o
licenciamento das minas e dos PRADES de
recuperaccedilatildeo de aacutereas degradadas natildeo poderia ser
feito pela FATMA se natildeo fosse embasada em
pareceres teacutecnicos aiacute o juiz lista uma seacuterie de
empreendedores perdatildeo de profissionais
geoacutelogos engenheiro de minas bioacutelogo
agrocircnomo e tal tal tal natildeo me lembro de cabeccedila
mas se a FATMA tiver um parecer teacutecnico
embasado por esses profissionais ela pode emitir a
licenccedila Quando o juiz disse que o licenciamento
tem que ser passado para o IBAMA o Ministeacuterio
Puacuteblico entende que isso eacute um equiacutevoco do juiz e
noacutes recorremos contra essa parte da decisatildeo Por
que Primeiro que isso natildeo foi pedido entatildeo o
juiz natildeo pode julgar extra petita18
e ele fez isso
nesse caso Segundo o IBAMA natildeo eacute a soluccedilatildeo
A FATMA tem problemas Tem seacuterios e vaacuterios
problemas Noacutes estamos fiscalizando e atuando
para que isso se altere Mas o IBAMA natildeo eacute a
soluccedilatildeo Porque o IBAMA eacute totalmente ausente
da regiatildeo Sul de Santa Catarina O estado de Santa
Catarina inteiro a equipe do IBAMA eacute
precariacutessima Entatildeo com respeito ao Leonir aqui
que taacute por aiacute que agora eacute do Chico Mendes O
IBAMA aqui na regiatildeo sul natildeo existe Entatildeo
passar o licenciamento de qualquer coisa pro
IBAMA aqui na regiatildeo eacute um equiacutevoco (Darlan
Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico Federal
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
18
Decisotildees extra petita satildeo aquelas que o juiz toma concedendo ao
autor coisa diversa da que foi requerida em sua peticcedilatildeo inicial
195
O representante da FATMA Luis Antocircnio Garcia por sua vez
insistiu que a FATMA tem melhorado seu quadro teacutecnico e conta com
consultores externos Ele ressaltou tambeacutem que a decisatildeo do
licenciamento eacute baseada nos criteacuterios legais e teacutecnicos
Dos segmentos sociais que participaram das audiecircncias
percebeu-se uma desconfianccedila em relaccedilatildeo agrave conduta da FATMA nos
processos de licenciamento A FATMA por sua vez reconhece as
dificuldades existentes e faz uma aposta na atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico Segundo o representante da FATMA ldquoo licenciamento com
todas as dificuldades que temos mas noacutes temos hoje uma cooperaccedilatildeo
uma parceria extremamente sadia e participativa e com resultados
extremamente beneacuteficos a sociedade que eacute junto com o Ministeacuterio
Puacuteblico ()rdquo (Luis Antocircnio Garcia FATMA AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Nos discursos dos segmentos sociais e poliacuteticos transparece a
fragilidade do oacutergatildeo ambiental E aiacute a responsabilidade que seria do
oacutergatildeo ambiental eacute passada para o Ministeacuterio Puacuteblico Isso pode ser bom
por um lado uma vez que existe fiscalizaccedilatildeo do oacutergatildeo ambiental mas
por outro lado pode fazer com que as fragilidades do oacutergatildeo ambiental se
perpetuem
635 O IPAT e a neutralidade da ciecircncia
A linguagem teacutecnica do IPAT foi questionada na terceira
audiecircncia puacuteblica ldquo() a maioria de noacutes cidadatildeos mortais e comuns
natildeo temos conhecimento suficiente para traduzir as informaccedilotildees que
foram passadasrdquo (Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida
AUDIEcircNCIA 2006) Mauricio Luis Camara questionou sobre a
apresentaccedilatildeo do IPAT para que fizessem um resumo de forma que
todos entendessem (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Outro ponto que merece destaque eacute o fato de o IPAT natildeo ter
deixado clara a viabilidade do empreendimento Abaixo a intervenccedilatildeo
de Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionando esse
ponto
196
[] eacute nesse sentido que eu gostaria de saber []
quais satildeo os pontos positivos e quais satildeo os
pontos negativos para que a populaccedilatildeo tambeacutem
tenha condiccedilatildeo de por si soacute analisar e tomar uma
posiccedilatildeo e natildeo simplesmente tomar uma posiccedilatildeo
porque algueacutem ou um chefe poliacutetico tipo um
empreendedor taacute dizendo que eacute assim [] na
minha opiniatildeo ficou faltando isso do IPAT uma
posiccedilatildeo clara de quais satildeo os pontos positivos e
negativos porque aiacute se coloca na balanccedila Porque
eacute isso que a gente tem que ver [] (AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Em resposta Fabiano Luzi Neris representante do IPAT
afirmou que ldquoo IPAT natildeo tem posicionamento se a Usina eacute viaacutevel ou
natildeo eacute viaacutevel se ele eacute a favor ou contra a Usina () Soacute o oacutergatildeo
ambiental tem competecircncia para viabilizar ou natildeo a Usinardquo (Fabiano
Luiz Neris IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A Universidade apresentou os resultados teacutecnicos
que estatildeo aqui e foram apresentados e estatildeo nos
documentos entregues ao empreendedor e ao
oacutergatildeo ambiental A Universidade natildeo tem o papel
de emitir o parecer favoraacutevel ou contraacuterio agrave
liberaccedilatildeo da licenccedila da Usina A Universidade tem
o papel de apresentar os estudos realizados Se
tiver algum conflito em relaccedilatildeo aos estudos a
gente estaacute a disposiccedilatildeo para discutir tecnicamente
(Fabiano Luiz Neris IPAT AUDIEcircNCIA 2006)
A representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal questionou a
resposta dada pelo IPAT ldquose o EIA natildeo vai dizer se eacute viaacutevel ou natildeo
quem de noacutes diraacute issordquo (Denise Cristina de Resende Nicolaitz
Ministeacuterio Puacuteblico Federal AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Na sequecircncia manifesta-se um posicionamento que parece
contraacuterio ao anterior
Todas as consideraccedilotildees positivas ou negativas
estatildeo e fazem parte de uma matriz de anaacutelise de
impacto Elas constam tanto do estudo da
USITESC quanto dos estudos dos
empreendimentos acessoacuterios E a equipe embora
tenha optado por natildeo fazer nenhuma manifestaccedilatildeo
197
proacute ou contra a USITESC ela nos estudos nas
suas conclusotildees ela deixa bem claro se eacute viaacutevel
ou natildeo dentro do estudo que foi feito Eu soacute queria
dizer isso e que a populaccedilatildeo tivesse ciecircncia e os
nossos colegas ecologistas que Que noacutes
apresentamos os trabalhos e noacutes temos
consciecircncia Noacutes temos nossa responsabilidade
social tambeacutem Noacutes natildeo somos levianos noacutes natildeo
queremos aprovar absolutamente nada Noacutes
estamos fazendo um estudo que demonstra a
possibilidade ou natildeo do empreendimento (Luiz
Nogueira Palma IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
O IPAT enfatizou em muitas intervenccedilotildees o ldquocaraacuteter teacutecnicordquo das
informaccedilotildees prestadas Alguns exemplos de explicaccedilotildees duvidosas
foram extraiacutedos das duas audiecircncias puacuteblicas e satildeo apresentados na
sequecircncia Na audiecircncia puacuteblica de 2006 o IPAT afirmou que uma
barragem no Rio Matildee Luzia preservaria a aacutegua
() quando vocecirc constroacutei um barramento ele
isola ou seja vocecirc taacute preservando a aacutegua boa a
aacutegua de boa qualidade Vocecirc taacute reservando vocecirc
taacute evitando que aquela aacutegua polua neacute pelo menos
pelos outros motivos que mineraccedilatildeo a gente sabe
que o ph nesses frac34 de trecho do Rio Matildee Luzia o
ph da aacutegua eacute 3 E laacute em cima na foz onde natildeo
tem onde natildeo ocorre ou seja a aacutegua eacute de boa
qualidade Entatildeo vocecirc taacute isolando vocecirc taacute
isolando vocecirc taacute preservando (Naacutedia e Andreacuteia
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Quanto agrave existecircncia de risco na construccedilatildeo da barragem e na
possibilidade de caimento de mina o IPAT tambeacutem manifestou sua
posiccedilatildeo
Teoricamente eu natildeo vou te dizer que natildeo eacute
possiacutevel ocorrer um problema na construccedilatildeo da
barragem mas isso aiacute eacute uma coisa que eacute pouco
provaacutevel E quanto aos caimentos de mina cai em
vaacuterios locais e esse caimento que ocorreu
recentemente natildeo tem absolutamente nada a ver
vamos dizer assim com a eventual construccedilatildeo de
198
um barramento neacute Natildeo tem realmente natildeo tem
nada a ver e foi uma coisa improvaacutevel daquelas
coisas que natildeo se pode dizer que estava por
acontecer A mina onde caiu era um lugar
conhecido claro tinha falha geoloacutegica neacute Mas
ela tava sendo vamos dizer assim toda eacute toda
minerada de uma maneira muito teacutecnica com um
fator de seguranccedila muito alto e aconteceu Quer
dizer eacute a natureza neacute Eu com toda sinceridade
natildeo vou lhe enganar pra dizer que eacute impossiacutevel de
ocorrer um caimento laacute () Se for minerado de
uma maneira teacutecnica eacute pouco provaacutevel que
aconteccedila Agora dizer que natildeo tem caimento eu
acho que teacutecnico nenhum diria isso (Cleacutevis
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Na quarta audiecircncia puacuteblica mais duas explicaccedilotildees chamaram a
atenccedilatildeo uma do IPAT outra do empreendedor A primeira foi dada por
Marcos Back do IPAT ldquoSegundo as pesquisas natildeo haacute uma correlaccedilatildeo
entre a usina e a sauacutede da populaccedilatildeo entre a Usina Termeleacutetrica Jorge
Lacerda e as doenccedilas respiratoacuteriasrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Em contraposiccedilatildeo a essa informaccedilatildeo Joseacute Dagostin do Movimento
Iccedilara pela Vida trouxe informaccedilotildees atualizadas dados do Datasus
questionando o IPAT sobre os dados defasados do estudo sobre sauacutede e
tambeacutem sobre acidentes com amocircnia Dois anos depois o proacuteprio
Ministeacuterio Puacuteblico coletou e analisou dados confirmando a relaccedilatildeo
entre diversos problemas de sauacutede e o funcionamento do Complexo
Jorge Lacerda (MPF 2009)
A outra fala do empreendedor sugeriu que ldquoa estocagem de
amocircnia eacute mais segura que o botijatildeo de gaacutes que vocecircs tecircm em suas casas
Muitos dos senhores tecircm mangueiras inadequadas para conectar o
botijatildeo de gaacutes Quantas vezes passam perto do botijatildeo de gaacutesrdquo (Luis
Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Essa eacute uma amostra pequena das explicaccedilotildees dadas em resposta
aos questionamentos Muitas pessoas tambeacutem natildeo se sentiram
contempladas com as respostas As evasivas contemplavam encaminhar questionamentos por escrito agrave FATMA e ao IPAT desconsiderar as
perguntas com base no fato de que as informaccedilotildees jaacute haviam sido
apresentadas nas outras audiecircncias ou que as informaccedilotildees seriam
tratadas posteriormente na anaacutelise de risco
199
Nas duas audiecircncias puacuteblicas analisadas o IPAT foi questionado
ao fazer o EIARIMA da USITESC quanto ao seu posicionamento
O estudante da UNESC Joaquim Teixeira fez a seguinte
intervenccedilatildeo
ldquoA USITESC eacute a nova Marion do seacuteculo XXIrdquo Eacute
preciso separar a UNESC eacute nossa o IPAT eacute de
quem paga () o empreendimento pode ser feito
ou natildeo feito tem essa possibilidade taacute na lei Tem
alternativas ao empreendimento () Eacute preciso
mudar de paradigma () Vocecircs podem virar a
paacutegina da histoacuteria Treviso natildeo precisa de mina
Ou melhor termeleacutetrica (Joaquim Teixeira
estudante da UNESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Em resposta Marcos Back do IPAT reclamou dessa e de outras
intervenccedilotildees como ldquoataque gratuito agrave Universidaderdquo E completou
() Eu quero dizer o seguinte que eacute muito faacutecil
muito faacutecil a gente vir para uma audiecircncia e
quando a gente natildeo tem mais argumento vocecirc
desqualifica quem produziu Quem dizer eu tocirc
numa discussatildeo eu natildeo sei mais o que dizer eu
desqualifico o outro eu falo que o outro natildeo sabe
nada E na hora que eu desqualifico a pessoa
comeccedilo a desqualificar todo o estudo que foi feito
() natildeo adianta dizer que o IPAT natildeo eacute
Universidade porque a decisatildeo de implantaccedilatildeo
que o IPAT participasse desse estudo partiu da
eacutepoca que o reitor era Edson Rodrigues que fez
uma reuniatildeo com a Universidade inteira e decidiu
que a Universidade ia participar desse processo
porque eacute muito grande para a regiatildeo inteira esse
empreendimento e era preciso que a Universidade
se envolvesse no projeto para fazer a avaliaccedilatildeo
desses impactos ambientais (Marcos Back IPAT
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Percebe-se nos posicionamentos do IPAT que existe a confianccedila
de que o documento produzido eacute neutro Dessa forma os segmentos
sociais natildeo teriam que questionar quem produz o documento apenas as
informaccedilotildees que o documento traz
200
636 Audiecircncias puacuteblicas como espaccedilos democraacuteticos
Somente o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal Darlan
Aiacutelton Dias e os segmentos sociais fizeram menccedilatildeo agrave questatildeo
democraacutetica nas audiecircncias puacuteblicas Na terceira audiecircncia puacuteblica o
representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal fez a seguinte intervenccedilatildeo
A audiecircncia puacuteblica eacute um ambiente democraacutetico
bonito agraves vezes a gente fica [pausa] vem com
uma preacute-concepccedilatildeo e fica irritado quando algueacutem
fala o contraacuterio mas isso eacute o processo
democraacutetico uma sociedade democraacutetica Em
outros tempos da nossa histoacuteria recente era
inimaginaacutevel um empreendedor ter que se
submeter a esse tipo de [pausa] situaccedilatildeo Mas eacute a
realidade da nossa sociedade democraacutetica graccedilas
a deus neacute E a Constituiccedilatildeo nos daacute esse recado do
desenvolvimento sustentaacutevel noacutes queremos
desenvolver o paiacutes mas queremos preservar o
meio ambiente (Darlan Aiacutelton Dias
AUDIEcircNCIA 2006)
Todavia o elogio agrave democracia contrasta com o processo da
audiecircncia puacuteblica Tadeu Santos da ONG Soacutecios da Natureza colocou
em questatildeo o caraacuteter democraacutetico da audiecircncia puacuteblica depois de ter
sido lembrado do limite de tempo quatro vezes Segundo ele
As audiecircncias puacuteblicas anteriores foram mais
democraacuteticas a coisa taacute ficando fechada Taacute se
percebendo que o grande lobby das mineradoras
estaacute funcionando Eacute possiacutevel que realmente a
FATMA venha a dar o licenciamento Eacute possiacutevel
natildeo vai dar Porque deu para a mineradora em
Treviso (Tadeu Santos AUDIEcircNCIA 2006)
E continua referindo-se a Luis Antocircnio Garcia da FATMA ldquoSr
diretor eu gostaria que o Sr fosse mais maleaacutevel que conduzisse a
assembleia de forma mais democraacutetica porque afinal estamos
discutindo uma coisa muito seacuteriardquo (Tadeu Santos AUDIEcircNCIA 2006)
201
Na quarta audiecircncia puacuteblica o representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal novamente enaltece o caraacuteter democraacutetico da audiecircncia
() a audiecircncia puacuteblica eacute o instrumento que estaacute
previsto na lei e noacutes vivemos num estado
democraacutetico de direito e que a publicidade dos
licenciamentos ambientais eacute um princiacutepio
fundamental previsto na poliacutetica nacional do meio
ambiente Entatildeo um processo de licenciamento
tem que ser puacuteblico as pessoas tem que ter o
direito de se manifestar desde que haja claro
respeito muacutetuo Mas por outro lado eu percebo
que muita gente veio aqui hoje com a cabeccedila feita
a favor ou contra o empreendimento sem querer
ouvir qualquer coisa Isso ficou muito claro jaacute
nano niacutevel de conversa durante as apresentaccedilotildees
As pessoas tem o direito de ser contra ou a favor
do empreendimento Aleacutem disso disse a prefeita
aqui que os estudos ficaram agrave disposiccedilatildeo da
populaccedilatildeo por 45 dias como manda a lei mas soacute
duas pessoas consultaram os estudos na prefeitura
Entatildeo eu peccedilo que se respeite as opiniotildees e que
todos tem direito a fazer uso da palavra E isso eacute
democraacutetico () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio
Puacuteblico Federal AUDIEcircNCIA 2007)
O reflexo dessa democracia foi o rigoroso controle do tempo de
questionamento o despeito pela ordem de chegada dos questionamentos
(orais e escritos) e a inexistecircncia de reacuteplica Gilmar Bonifaacutecio do
Movimento Iccedilara pela Vida criticou a forma como foram conduzidos os
debates jaacute que natildeo foi respeitado o direito agrave reacuteplica
A intervenccedilatildeo do representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
trouxe alguma esperanccedila para os segmentos sociais
Na verdade toda essa discussatildeo que hoje se trava
aqui eacute uma discussatildeo se a gente for pensar aqui
do ponto de vista histoacuterico bonita e importante e
acho que essa luta pode mudar o rumo dessa
legislaccedilatildeo Mas vamos colocar ela num contexto
maior que precisa ser colocado Na verdade eacute
uma discussatildeo que se trava no Brasil inteiro e no
mundo inteiro que eacute a discussatildeo de que modelo
de sociedade e desenvolvimento noacutes queremos
202
Pela questatildeo do efeito estufa e toda a questatildeo de
sobrevivecircncia da espeacutecie E eu como ser humano
como pai eu quero tambeacutem que o mundo pros
meus filhos pros meus netos seja viaacutevel No
entanto diante desse debate e assim como aqui
natildeo se quer uma usina termeleacutetrica laacute em Belo
Monte natildeo se quer uma hidreleacutetrica laacute em
Campos Novos natildeo se quer uma hidreleacutetrica laacute no
Rio Madeira e assim por diante Mas de algum
lugar tem que sair energia E o Ministeacuterio Puacuteblico
nessa discussatildeo tem que se pautar no equiliacutebrio e
ter como paracircmetro o que A Constituiccedilatildeo e as
leis E eacute assim que eu procuro agir Entatildeo essa
discussatildeo eacute legiacutetima essa oposiccedilatildeo a qualquer
empreendimento desse tipo eacute legiacutetima e esse eacute o
espaccedilo para falar Mas noacutes vamos nos pautar pela
lei () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico
Federal Federal AUDIEcircNCIA 2007)
O representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal reconhece a
possibilidade de mudanccedila na legislaccedilatildeo mas reconhece que sua atuaccedilatildeo
se restringe ao que eacute legal O Ministeacuterio Puacuteblico Federal produziu em
2004 um dossiecirc sobre as Deficiecircncias em estudos de impacto ambiental
mas natildeo tocou na questatildeo das audiecircncias puacuteblicas (MPF 2004) Apesar
das audiecircncias puacuteblicas natildeo serem deliberativas a observacircncia do
processo democraacutetico eacute algo necessaacuterio e deveria entrar nos estudos do
Ministeacuterio Puacuteblico
64 Democracias possiacuteveis e aprendizagem social
A avaliaccedilatildeo de impacto ambiental compreende processos que
envolvem muacuteltiplos segmentos que recolhem analisam sintetizam e
comunicam informaccedilotildees sobre as condiccedilotildees ambientais tendecircncias
direccedilotildees impactos e futuros possiacuteveis com o objetivo de sensibilizar
para uma questatildeo especiacutefica ou apoiar processos de regulaccedilatildeo ambiental
Essas avaliaccedilotildees satildeo processos sociais de comunicaccedilatildeo e interaccedilatildeo que
envolvem muito mais do que a mera produccedilatildeo de relatoacuterios Todavia os
limites estruturais e conjunturais das avaliaccedilotildees natildeo garantem o
questionamento do estilo de desenvolvimento de planos poliacuteticas e
203
programas que estariam sendo elaborados avaliados e implementados
(SACHS 1986 VIEIRA 2005)
O licenciamento ambiental estaacute envolto numa suposta
neutralidade em relaccedilatildeo aos criteacuterios juriacutedicos e teacutecnicos que o
sustentam e os condicionantes e interesses intriacutensecos ao processo
acabam passando para segundo plano ldquoNatildeo eacute porque a mineradora
cumpre com as exigecircncias que o oacutergatildeo licenciador pode liberar a
atividade Eacute preciso considerar a aceitaccedilatildeo do empreendimento pela
comunidade que poderaacute ser afetadardquo (Soacutecios da Natureza citado por
SANTOS 2008 p 103)
No caso especiacutefico da USITESC os segmentos poliacuteticos
(representados pelos poliacuteticos estaduais e municipais Ministeacuterio Puacuteblico
e FATMA) apresentaram em seus discursos algumas peculiaridades Os
poliacuteticos estaduais e municipais apoiam o empreendimento porque
querem estimular o desenvolvimento econocircmico A FATMA sofre
pressotildees poliacuteticas e tem dificuldades teacutecnicas mas garante que o
licenciamento eacute concedido considerando a anaacutelise teacutecnico-legal O
Ministeacuterio Puacuteblico aparece nos discursos dos segmentos econocircmicos
poliacuteticos e sociais como confiaacutevel Ele se mostra receptivo as colocaccedilotildees
dos segmentos sociais mas se move dentro do que considera legal Pode
questionar os dados do EIARIMA mas dificilmente questionaria a
questatildeo democraacutetica no processo da audiecircncia puacuteblica
Os segmentos econocircmicos como tratado na seccedilatildeo 623 fazem
pressatildeo sobre os segmentos poliacuteticos Nas audiecircncias puacuteblicas sua
participaccedilatildeo se limita a responder agrave perguntas e fazer a defesa do
empreendimento quando necessaacuterio O fato eacute que a USITESC tem a LI e
pode participar dos leilotildees de energia O iniacutecio da construccedilatildeo vai
depender dos interesses econocircmicos e poliacuteticos envolvidos O ponto
importante nesse capiacutetulo era tornar mais expliacutecitas as redes de
influecircncia e os mecanismos que satildeo utilizados nas audiecircncias puacuteblicas
para neutralizar as criacuteticas (aqui entra a injusticcedila poliacutetica nos tempos e
nas intervenccedilotildees) e a desinformaccedilatildeo Ao mesmo tempo tornam-se
tambeacutem mais expliacutecitas as formas de atuaccedilatildeo dos segmentos sociais
(afetadosatingidosameaccedilados ONGs e parte da academia)
A histoacuteria dos segmentos sociais no Sul de Santa Catarina traz
evidecircncias de aprendizagem social adaptativa Eles contam com uma
atuaccedilatildeo regional articulada fazem a relaccedilatildeo dos problemas globais e
locais questionam os segmentos poliacuteticos e os segmentos econocircmicos e
reivindicam que as audiecircncias puacuteblicas sejam mais democraacuteticas Isso
204
demonstra na discussatildeo especiacutefica da USITESC que se vem travando
uma luta histoacuterica na regiatildeo
7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta tese buscamos compreender as contradiccedilotildees inerentes agrave
proposta de ampliaccedilatildeo do sistema de geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica na
regiatildeo sul de Santa Catarina Para tanto adotamos um modelo de anaacutelise
que combina os enfoques de gestatildeo de ldquocommonsrdquo para o
ecodesenvolvimento e de justiccedila ambiental e ecoloacutegica Na estrutura
deste modelo hiacutebrido comparecem os conceitos de trajetoacuteria de
desenvolvimento local de atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso em
questatildeo de padrotildees de interaccedilatildeo entre os atores sociais envolvidos no
sistema de gestatildeo de regras em uso de arena de accedilatildeo e de resultados
eou consequecircncias das tomadas de decisatildeo
Caracterizamos inicialmente a especificidade das dinacircmicas de
desenvolvimento que tecircm influenciado as accedilotildees coletivas dos segmentos
poliacuteticos econocircmicos e sociais envolvidos nos modos de apropriaccedilatildeo e
gestatildeo do carvatildeo mineral na regiatildeo em pauta Neste sentido destacamos
o papel hegemocircnico exercido pelos agentes governamentais na
centralizaccedilatildeo dos processos decisoacuterios e na oferta de subsiacutedios agrave
utilizaccedilatildeo de combustiacuteveis foacutesseis natildeo obstante o apelo agrave necessidade
de se promover uma ldquomatriz energeacutetica limpardquo no Paiacutes
No resgate da dinacircmica de exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral
buscamos caracterizar os fatores relacionados agrave disponibilidade do
recurso agrave rentabilidade econocircmica deste segmento atualmente aos
criteacuterios de tomada de decisatildeo na pesquisa de inovaccedilotildees na busca de
alternativas de mecanizaccedilatildeo dos processos de extraccedilatildeo agraves praacuteticas de
recuperaccedilatildeo do passivo ambiental e ao perfil dominante das poliacuteticas de
suprimento energeacutetico no bojo do modelo de desenvolvimento adotado
Com base nas evidecircncias coletadas foi possiacutevel constatar que o nosso
Paiacutes natildeo conta ainda hoje com uma ldquocultura do carvatildeordquo e que na
regiatildeo estudada as atividades de mineraccedilatildeo dificultam ou mesmo
impedem outros usos possiacuteveis do solo aleacutem de responderem pela
geraccedilatildeo de riscos e de impactos socioambientais cujos custos
geralmente muito elevados continuam a ser distribuiacutedos de forma
socialmente desigual Aleacutem disso reforccedilamos o ponto de vista segundo
o qual as escolhas tecnoloacutegicas satildeo essencialmente tributaacuterias de
orientaccedilotildees poliacuteticas As anaacutelises mostraram tambeacutem que uma parcela
significativa da populaccedilatildeo catarinense jaacute percebe natildeo soacute uma relaccedilatildeo
causal direta entre o aumento da exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral e o
comprometimento da resiliecircncia ecossistecircmica e da qualidade de vida
das comunidades locais Ao mesmo tempo vem se impondo
206
gradualmente a impressatildeo de que os processos de diversificaccedilatildeo da
economia regional vecircm legitimando a adoccedilatildeo de uma poliacutetica mais firme
de reconversatildeo do segmento de exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral
No que diz respeito agrave adequaccedilatildeo dos arranjos institucionais em
vigor na dinacircmica de gestatildeo deste segmento correlacionamos a
iniciativa de ampliaccedilatildeo do sistema de geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica
movida a carvatildeo mineral agrave desregulamentaccedilatildeo e flexibilizaccedilatildeo da
legislaccedilatildeo ambiental - especialmente do Coacutedigo de Mineraccedilatildeo e do
Coacutedigo Estadual do Meio Ambiente em Santa Catarina No segundo
caso o Coacutedigo estabeleceu prazos para as licenccedilas ambientais e a
Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina dispensou o EIARIMA para
atividade de extraccedilatildeo de pequeno porte A CFEM e a reduccedilatildeo do ICMS
de 15 para 3 no estado contribuiacuteram fortemente para legitimar o
projeto de uma nova usina junto agrave opiniatildeo puacuteblica Mas outros aspectos
relevantes foram destacados a exemplo da evoluccedilatildeo progressiva das leis
ambientais favorecendo a percepccedilatildeo de que o direito a um meio
ambiente saudaacutevel integra o coacutedigo universal dos direitos humanos
fundamentais Todavia o balanccedilo entre os aspectos que favorecem a
ampliaccedilatildeo e os que questionam eacute bastante desigual A
desregulamentaccedilatildeo e a flexibilizaccedilatildeo dos coacutedigos juriacutedicos promovidas
nos uacuteltimos anos representam da perspectiva adotada na tese um
evidente e preocupante retrocesso em relaccedilatildeo aos avanccedilos alcanccedilados
anteriormente Finalmente acreditamos que a dimensatildeo da participaccedilatildeo
autecircntica da sociedade civil organizada nas tomadas de decisatildeo uma das
bandeiras da deacutecada de 1980 continua ainda hoje muito aqueacutem das
expectativas ndash sobretudo pelo fato de permanecer tutelada pelo jogo de
alianccedilas formadas pelos representantes dos setores econocircmico e
governamental
A reflexatildeo centrada no aprofundamento deste uacuteltimo toacutepico
mostrou que o sistema de gestatildeo de recursos comuns no Brasil continua
atrelado a um modelo de desenvolvimento que faz do apelo agrave
sustentabilidade uma retoacuterica que natildeo ataca as raiacutezes do problema
Trata-se de evitar as mudanccedilas estruturais que se tornaram emergenciais
face ao agravamento da crise em escala global Nesse contexto o
componente democraacutetico-representativo do sistema poliacutetico que tende a
reforccedilar e a legitimar a formaccedilatildeo de lobbies envolvendo os segmentos
poliacuteticos e econocircmicos contrasta com o componente democraacutetico-
participativo que responde pela abertura de espaccedilos ainda incipientes e
restritos de participaccedilatildeo aos setores majoritaacuterios da populaccedilatildeo A
existecircncia da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral eacute
207
um indiacutecio da existecircncia dessas articulaccedilotildees entre segmentos
econocircmicos e poliacuteticos E os dados apresentados no capiacutetulo 5
confirmam a hipoacutetese de que no bojo do processo de licenciamento da
USITESC no periacuteodo de 2002 a 2012 as doaccedilotildees de empresaacuterios para o
financiamento de campanhas eleitorais (nos niacuteveis municipal estadual e
nacional) tornaram-se um fenocircmeno recorrente
Em outras palavras consideramos que a gestatildeo de recursos
comuns em Santa Catarina segue as tendecircncias nacionais
Historicamente a questatildeo ambiental vem sendo apropriada de forma
marginal no estado permanecendo subordinada agrave hegemonia dos
interesses dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos Um dos principais
indicadores dessa tendecircncia pode ser encontrado na dinacircmica de
organizaccedilatildeo e funcionamento da FATMA abrigando a formaccedilatildeo de
lobbies ativos no setor da exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral - seja
estimulando sua expansatildeo seja dificultando sua fiscalizaccedilatildeo em
coerecircncia com os avanccedilos da legislaccedilatildeo ambiental Todavia ressaltamos
ainda que se uma parte dos segmentos poliacuteticos e dos segmentos sociais
apoia a tendecircncia de ampliaccedilatildeo deste setor os posicionamentos natildeo satildeo
homogecircneos e o fortalecimento do sistema democraacutetico vem se dando
por meio da organizaccedilatildeo dos segmentos sociais (ONGs academia
afetadosatingidosameaccedilados) e da atuaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico No
que diz respeito agrave organizaccedilatildeo dos segmentos sociais as iniciativas
extrapolam os espaccedilos de participaccedilatildeo previstos constitucionalmente
envolvendo tambeacutem accedilotildees autocircnomas de produccedilatildeo e difusatildeo de
conhecimentos aleacutem da promoccedilatildeo de campanhas e manifestaccedilotildees
Na consideraccedilatildeo do processo de licenciamento da USITESC
constatamos que no processo de licenciamento as audiecircncias puacuteblicas
realizadas no municiacutepio de Treviso foram coordenadas pela FATMA e
natildeo contaram com estrateacutegias de distribuiccedilatildeo (minimizando a
desigualdade) reconhecimento (considerando as distintas perspectivas)
e a representaccedilatildeo (paridade de participaccedilatildeo) As evidecircncias obtidas
indicam que essas reuniotildees foram organizadas visando reproduzir a
loacutegica que bloqueia na base a concretizaccedilatildeo desses anseios
Os principais temas tratados nas audiecircncias puacuteblicas foram
tratados no capiacutetulo 6 mostrando as contradiccedilotildees existentes ldquoentrerdquo e
ldquodentrordquo dos segmentos sociais principalmente A ampliaccedilatildeo de energia
termeleacutetrica eacute inevitaacutevel do ponto de vista dos segmentos econocircmicos
sendo respaldada por uma parcela dos agentes governamentais locais e
dos representantes da sociedade civil A discussatildeo sobre a relaccedilatildeo entre
208
a construccedilatildeo da USITESC e as mudanccedilas climaacuteticas proposta pela rede
de ONGs movimentos sociais e parte da UNESC foi categoricamente
colocada de lado como um aspecto natildeo pertinente ao caso em pauta ou
seja a apresentaccedilatildeo do EIARIMA Aleacutem disso ressaltamos que
durante as audiecircncias praticamente natildeo foram consideradas as vozes
dos habitantes de Treviso que seriam afetados pela implementaccedilatildeo do
projeto As discussotildees envolveram apenas uma parcela dos
representantes da sociedade civil sediados em outros municiacutepios e em
outros estados Poucos habitantes de Treviso participaram das
audiecircncias puacuteblicas Num municiacutepio em que 69 dos postos de trabalho
estatildeo vinculados a atividade carboniacutefera torna-se difiacutecil imaginar que os
habitantes estivessem em condiccedilotildees favoraacuteveis para se posicionarem
contra a implantaccedilatildeo da USITESC
Mostramos tambeacutem que a competecircncia da FATMA e da UNESC
foi repetidamente questionada nessas audiecircncias Se os representantes da
FATMA argumentaram agrave luz do princiacutepio de respeito agrave legislaccedilatildeo em
vigor e os pesquisadores da UNESC agrave luz do princiacutepio de neutralidade
da ciecircncia ambos os grupos evitaram assumir o desafio de encarar uma
discussatildeo poliacutetica do caso em pauta Por sua vez foi enaltecido o papel
desempenhado pelo Ministeacuterio Puacuteblico na defesa dos interesses da
populaccedilatildeo local Natildeo obstante consideramos que os depoimentos dos
Procuradores permaneceram refeacutens de um ponto de vista essencialmente
legalista na avaliaccedilatildeo do processo de licenciamento
Na busca de respostas agrave questatildeo de ldquoserdquo e ldquocomordquo as accedilotildees
coletivas estudadas teriam gerado oportunidades de aprendizagem social
adaptativa capazes de deflagrar accedilotildees coletivas de mudanccedila
institucional concluiacutemos que a atuaccedilatildeo de parte dos segmentos sociais
envolvidos no caso da USITESC aponta nesta direccedilatildeo Eles jaacute
conseguem perceber o surgimento da demanda de ampliaccedilatildeo do sistema
termeleacutetrico como um elemento de uma problemaacutetica mais ampla e mais
complexa que natildeo foi considerada nas audiecircncias puacuteblicas Eles estatildeo
mobilizados de outras formas mas a concessatildeo do licenciamento ainda
tem a audiecircncia puacuteblica (consultiva) como uacutenica modalidade de
participaccedilatildeo Diante disso pensamos que os problemas de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo existentes no espaccedilo da audiecircncia
precisariam ser vistos com mais cuidado pelo Ministeacuterio Puacuteblico Seria
interessante que daqui em diante o Ministeacuterio Puacuteblico superasse a
visatildeo dominante segundo a qual a anaacutelise das deficiecircncias do
EIARIMA (MPF 2004) satildeo suficientes para democratizar os processos
209
de licenciamento de projetos programas e poliacuteticas de desenvolvimento
no Paiacutes
Finalmente o trabalho ofereceu subsiacutedios que reforccedilam a
validade do pressuposto de que a maturaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo de
recursos comuns voltado para um novo estilo de desenvolvimento
norteado pelo princiacutepio de sustentabilidade forte deveraacute passar
necessariamente pela ldquodemocratizaccedilatildeo do aparelho do Estado de modo
que a sociedade possa controlar seus controladoresrdquo (BOcircA NOVA
1985 p 227)
A sugestatildeo eacute que se faccedila uma pesquisa sobre ldquodeficiecircncias nas
audiecircncias puacuteblicasrdquo Como mencionado na justificativa desta tese um
dos encaminhamentos possiacuteveis seria a realizaccedilatildeo de um levantamento
mais rigoroso dos processos de licenciamento realizados no litoral de
Santa Catarina nos uacuteltimos anos a ser suplementado pela anaacutelise criacutetica
das respectivas audiecircncias puacuteblicas Os resultados poderiam ser
encaminhados ao Ministeacuterio Puacuteblico Estadual e Federal servindo assim
de base para o questionamento da forma pela qual os anseios de
distribuiccedilatildeo justa reconhecimento e representaccedilatildeo autecircntica dos
segmentos sociais tecircm sido incorporados nos processos de
licenciamento Neste sentido o caraacuteter meramente consultivo das
audiecircncias puacuteblicas poderia se tornar tambeacutem objeto de reconsideraccedilatildeo
na trilha ainda incipiente que nos conduziria ao exerciacutecio da cidadania
ambiental plena
Em outras palavras as perspectivas de ampliaccedilatildeo da rede de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica no Sul de Santa Catarina refletem uma
tomada de consciecircncia ainda bastante restrita dos riscos envolvidos na
continuidade da atividade carboniacutefera e de forma mais ampla de um
modelo de gestatildeo de recursos naturais de cunho ecologicamente
predatoacuterio e socialmente injusto Diante de argumentos que defendem o
caraacuteter ldquoinevitaacutevelrdquo do apelo a fontes natildeo renovaacuteveis de geraccedilatildeo de
energia cabe lembrar que
() existe pela frente um futuro repleto de possibilidades
alternativas e de potenciais inexplorados que natildeo cabem na bitola
estreita dos que estatildeo presos a modelos do passado ou a interesses do establishment Ou seja o futuro natildeo se projeta nas equaccedilotildees
matemaacuteticas mas se inventa na incessante discussatildeo das alternativas e
se faz na luta poliacutetica (BOcircA NOVA 1985 p 233)
210
Transformar a essa situaccedilatildeo envolve a adoccedilatildeo de outra
perspectiva baseada natildeo soacute na compreensatildeo da complexidade do
problema mas tambeacutem na consideraccedilatildeo simultacircnea dos fatores que
comparecem em todas as escalas do local ao global e na formaccedilatildeo de
parcerias capazes de impulsionar a gestaccedilatildeo de um projeto alternativo de
sociedade Esperamos que os resultados obtidos ofereccedilam subsiacutedios
uacuteteis apontando nesta direccedilatildeo insistindo que a superaccedilatildeo dos atuais
dilemas que cercam o exerciacutecio da democracia em nosso Paiacutes deveria
transcender a preocupaccedilatildeo pela pertinecircncia dos arranjos institucionais
em vigor Se os limites da tradiccedilatildeo democraacutetico-representativa tornam-
se evidentes quando prevalecem os interesses dos grupos sociais
atrelados agrave hegemonia do regime de apropriaccedilatildeo privada e economicista
dos ldquocommonsrdquo por sua vez os avanccedilos alcanccedilados na promoccedilatildeo de um
novo formato democraacutetico-participativo correm o risco de se tornarem
funcionais agrave reproduccedilatildeo das tendecircncias dominantes se permanecerem
restritos aos limites fixados pela obediecircncia agraves determinaccedilotildees legais
Impotildee-se assim uma dinacircmica de radicalizaccedilatildeo da democracia
entendida como componente essencial de uma estrateacutegia consistente de
enfrentamento dos dilemas colocados pela urgecircncia de uma transiccedilatildeo
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LUCIANA BUTZKE
IMPASSES DA GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS E DA
DEMOCRACIA NO BRASIL O CASO DO CARVAtildeO MINERAL
NO SUL DE SANTA CATARINA
Tese de doutorado apresentada ao
Programa de Poacutes-graduaccedilatildeo em
Sociologia Poliacutetica do Centro de
Filosofia e Ciecircncias Humanas da
Universidade Federal de Santa
Catarina como requisito para a
obtenccedilatildeo do grau de doutor em
Sociologia Poliacutetica
Orientador Prof Dr Paulo Henrique
Freire Vieira
FLORIANOacutePOLIS
2014
Aos meus pais Marilda e Hermes que
com seus exemplos me inspiram a
tentar ser uma pessoa melhor
AGRADECIMENTOS
O doutoramento foi muito mais abertura de caminhos e encontros que
pontos de chegada E nesses caminhos e encontros pude conhecer
pessoas e estreitar laccedilos que foram muito importantes ao longo desse
processo Aproveito para deixar registrado aqui os meus
agradecimentos
Ao meu orientador Prof Paulo Freire Vieira que me acompanha desde
o mestrado Eacute muito importante ter algueacutem que com equanimidade nos
faccedila perceber os nossos limites e nos estimule a ir aleacutem com humildade
e sem ilusotildees
Aos professores que gentilmente participaram da qualificaccedilatildeo e da
defesa e trouxeram valiosas contribuiccedilotildees ao texto aqui apresentado
Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes da UNESC Profordf Drordf Cristiane
Mansur de Moraes Souza da FURB Prof Dr Luiz Fernando Scheibe do
Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Geografia da UFSC Profordf Drordf Janice
Pontes Tirelli e Marcia Grisotti do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em
Sociologia Poliacutetica da UFSC
Agrave coordenaccedilatildeo e aos professores e professoras do Programa de Poacutes-
Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica importantiacutessimos nesse processo de
formaccedilatildeo
Agrave Albertina Buss Volkmann e agrave Maria de Faacutetima Xavier da Silva pelo
carinho e pela ajuda junto agrave Secretaria do PPGSP
Ao CNPq pelo auxiacutelio financeiro por meio da bolsa de estudos
Agraves amigas e amigos do Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio Ambiente e
Desenvolvimento do Grupo de Educaccedilatildeo para o Ecodesenvolvimento e
do Nuacutecleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional Nossas
vivecircncias e convivecircncias foram fundamentais para o meu processo
formativo Foi muito bom poder contar com o carinho e apoio de vocecircs
Agrave Juliana Adriano Marina Fravrim Gasparini Melissa Vivacqua
Tatiane Viega Vargas e Tadeu Santos (da ONG Soacutecios da Natureza) que
gentilmente compartilharam suas impressotildees sobre partes da tese
Agrave Mariana Thibes pela agradaacutevel parceria ao longo desse percurso e ao
Juliano Giassi Goularti pela sugestatildeo dos dados do quinto capiacutetulo
Aos colegas da rede TransForMar pela acolhida e pela oportunidade de
compartilhar e dialogar sobre nossos projetos
Aos amigos Andresa Graciela Wagner Joaquim Hoepers Silvana Maria
Bittencourt e Vanessa Juliana da Silva Santos
Agraves amigas Katia Parizoto e Laurete Coleti que me inspiraram com a sua
coragem
Agraves minhas tias Lizete e Dalila eacute muito bom tecirc-las por perto
Ao Ivo cuja presenccedila tornou minha caminhada mais leve Com carinho e
paciecircncia nas nossas incontaacuteveis conversas sobre a tese ajudou e falou
o essencial quando eu mais precisava e permaneceu em silecircncio quando
isso significava me compreender e respeitar
Agrave minha famiacutelia Marilda Hermes Viviana Susana Lucas Hermes
Carlos Dora Dara e Bruna presenccedilas constantes em minha vida O
amor carinho e apoio de vocecircs foi e sempre seraacute fundamental
Agrave minha querida oma Leonida tio Flaacutevio tio Irineu minha prima
Valeacuteria e minha cachorrinha Nicole que partiram no periacuteodo de
doutorado e deixaram muitas saudades
Meus mais sinceros agradecimentos a todas e todos pois naquilo que
faccedilo sou e me torno a cada dia levo um pouquinho de cada um de
vocecircs
A terra natildeo eacute soacute um espaccedilo onde vivemos Eacute um
mundo que produz e condiciona nossa proacutepria
existecircncia que antecede e se prolonga em nossa
vida em todas as suas dimensotildees Somos seres
terrestres A democracia natildeo eacute soacute um espaccedilo
institucional da poliacutetica Ela para existir deve
tambeacutem realizar-se e estar presente em todas as
dimensotildees de nossas vidas Talvez por isso haja
uma relaccedilatildeo histoacuterica tatildeo estreita entre terra e
democracia Quando a terra eacute apropriada usada
monopolizada por uns poucos a democracia natildeo
existe Quando a democracia natildeo existe a terra se
transforma em um mundo de poucos contra a
maioria (Herbert de Souza ndash Betinho 1991 p
108-9)
RESUMO
Esta tese focaliza os dilemas que continuam bloqueando quatro deacutecadas
apoacutes a Conferecircncia de Estocolmo o funcionamento do sistema de gestatildeo
de recursos naturais natildeo renovaacuteveis no Brasil Mais especificamente o
texto conteacutem uma anaacutelise dos bastidores do processo de licenciamento
ambiental voltado para a implantaccedilatildeo de uma nova usina termeleacutetrica na
regiatildeo sul do estado de Santa Catarina O enfoque analiacutetico utilizado foi
construiacutedo mediante uma hibridizaccedilatildeo de duas linhas de pesquisa
sistecircmica sobre o binocircmio meio ambiente amp desenvolvimento ainda
pouco conhecidas em nosso Paiacutes a saber gestatildeo de recursos comuns
(ldquocommonsrdquo) para o ecodesenvolvimento e justiccedila ambiental e ecoloacutegica Aleacutem da introduccedilatildeo e de uma siacutentese da revisatildeo de literatura
sobre a atualidade dos princiacutepios de ecodesenvolvimento no debate
sobre modos de apropriaccedilatildeo e sistemas de gestatildeo de ldquocommonsrdquo o texto
oferece inicialmente um resgate historiograacutefico das modalidades e das
implicaccedilotildees socioecoloacutegicas do aproveitamento de jazidas de carvatildeo
mineral no Brasil e em Santa Catarina Na sequecircncia coloca em
primeiro plano uma anaacutelise dos padrotildees de interaccedilatildeo dos segmentos
sociais envolvidos no projeto de implantaccedilatildeo da Usina Termeleacutetrica Sul-
Catarinense (USITESC) no municiacutepio de Treviso Os dados coletados
permitiram validar a hipoacutetese segundo a qual a decisatildeo de implantar esta
usina constitui um indicador suplementar de crise do sistema poliacutetico
implantado no Paiacutes relativamente ao agravamento tendencial da
problemaacutetica socioecoloacutegica A linha de criacutetica adotada incide nas
implicaccedilotildees da reproduccedilatildeo de falhas estruturais nos processos de
construccedilatildeo da cidadania ambiental e de promoccedilatildeo da justiccedila ambiental
e ecoloacutegica em todos os niacuteveis de governo ndash do local ao nacional
Argumenta-se que a despeito dos avanccedilos obtidos no debate social
contemporacircneo sobre a urgecircncia de uma transiccedilatildeo ecoloacutegica
consequente para aleacutem de uma ldquoeconomia verderdquo ou do ideaacuterio de um
ldquodesenvolvimento sustentaacutevelrdquo que natildeo rompe com o imaginaacuterio
ocidental de um crescimento material ilimitado a intenccedilatildeo de ampliar a
utilizaccedilatildeo do carvatildeo como fonte de energia estaacute diretamente associada agrave
formaccedilatildeo de redes de influecircncia envolvendo empresaacuterios e agentes
governamentais Buscando elucidar os condicionantes desse cenaacuterio de
mercantilizaccedilatildeo intensiva e indiscriminada de ldquocommonsrdquo o trabalho
reuacutene tambeacutem evidecircncias de iniciativas de resistecircncia que vecircm sendo
gestadas na regiatildeo estudada por de grupos sociais portadores de uma
visatildeo ecoloacutegica da economia da cultura e da poliacutetica
Palavras-chave Ecodesenvolvimento Gestatildeo de recursos comuns
Justiccedila ambiental Justiccedila Ecoloacutegica Democracia Energia Termeleacutetrica
Carvatildeo Mineral Santa Catarina
ABSTRACT
This thesis focuses on the dilemmas that continue blocking four
decades after the Stockholm Conference the functioning of the
management system based on non-renewable natural resources in Brazil
More specifically the text contains an analysis of the backstage of the
licensing process focused on the deployment of a new thermal power
plant in the southern state of Santa Catarina The analytical approach
used was built by a hybridization of two lines of systemic research on
the binomial environment amp development still little known in our
country namely management of common resources (commons) for
the ecodevelopment and environmental and ecological justice Besides
the introduction and a summary of the literature review on the actuality
of the principles of ecodevelopment in the current debate on modes of
ownership and management of commons systems the text initially
provides a historiographical rescuing of the terms and socio-ecological
implications of utilizing coal mines in Brazil and in Santa Catarina
State Following it foregrounds an analysis of the patterns of interaction
of social groups involved in the deployment project Thermoelectric
Plant of South of the Santa Catarina (USITESC) in the city of Treviso
The collected data allow to validate the hypothesis that the decision to
deploy this Plant is a further indicator of the political system deployed
crisis in the country regarding the trend towards worsening of socio-
ecological problems The adopted line of criticism focuses on the
implications of reproducing structural flaws in the processes of
construction of environmental citizenship and promotion of
environmental and ecological justice at all levels of government - from
local to national It is argued that despite the progress achieved in the
contemporary social debate on the urgency of a consequent ecological
transition beyond a green economy or the ideas of sustainable
development that does not break the Western imagination of a growing
unlimited material intention of expanding nowadays the use of coal as
an energy source is directly associated with the formation of powerful
lobbies involving businessmen and government officials Trying to
elucidate the determinants of this intensive and indiscriminate
commodification of commons scenario the paper also gathers
evidence of resistance initiatives that have been gestated in the study
area for social groups suffering from an ecological view of the
economy culture and policy
Keywords Ecodevelopment Management of common resources
Environmental justice Ecological justice Democracy Thermoelectric
energy Coal Santa Catarina
LISTA DE FIGURAS
Figura 1ndash Tipologia das formas de expressatildeo do cidadatildeo numa
democracia 56 Figura 2 - Modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns ajustado a
co-gestatildeo adaptativa 69 Figura 3 - Primeira adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa 72 Figura 4 - Segunda adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa 75 Figura 5 - Tipos de carvatildeo e uso 87 Figura 6 - Etapas da avaliaccedilatildeo de impacto ambiental 95 Figura 7 ndash Mapa de localizaccedilatildeo da Bacia Carboniacutefera Santa Catarina
114 Figura 8- Brasatildeo do municiacutepio de Treviso 158 Figura 9 ndash Mapa de localizaccedilatildeo do municiacutepio de Treviso 159 Figura 10 - Aacuterea prevista para a implantaccedilatildeo da USITESC 163
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 ndash Divisatildeo dos envolvidos na gestatildeo por segmentos 55 Quadro 2 - Quadro de anaacutelise do sistema democraacutetico agrave luz da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica 57 Quadro 3 ndash O enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento e as
dimensotildees baacutesicas do conceito sistecircmico de meio ambiente 64 Quadro 4 - Aspectos das atividades de mineraccedilatildeo e processamento do
carvatildeo mineral 91 Quadro 5 - Siacutentese dos pontos que favorecem e questionam a
amplicaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral
por macro variaacutevel 104 Quadro 6 ndash Limites e oportunidades do sistema democraacutetico no Brasil
106 Quadro 7 ndash Aspectos que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral Santa Catarina
130 Quadro 8 ndash Limites e possibilidades do sistema democraacutetico em Santa
Catarina 132 Quadro 9 - Principais caracteriacutesticas fiacutesicas e bioacuteticas da aacuterea de
influecircncia indireta do projeto USITESC 160 Quadro 10- Impactos sobre o Meio Fiacutesico Bioacutetico e Antroacutepico e accedilotildees
geradoras 165 Quadro 11 - Siacutentese dos Programas da USITESC e alvos principais 168 Quadro 12 - Procedimento para conduccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas
FATMA 175
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral em operaccedilatildeo
em 2013 Brasil 88 Tabela 2 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral com outorga
de 1998 a 2013 Brasil 88 Tabela 3 - Faturamento do Segmento do Carvatildeo Mineral 2012 118 Tabela 4 - Produccedilatildeo de carvatildeo bruto (ROM) de 2009 a 2012 119 Tabela 5 - Distribuiccedilatildeo de passivos ambientais em relaccedilatildeo agraves empresas
120 Tabela 6 - Cronograma de recuperaccedilatildeo dos passivos ambientais 120 Tabela 7 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2002 141 Tabela 8 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2002 que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral 142 Tabela 9 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2002 142 Tabela 10 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2006 143 Tabela 11 - Candidatosas que receberam doaccedilotildees das empresas ligadas
ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2006 144 Tabela 12 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2006 145 Tabela 13 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2010 145 Tabela 14 - Candidatosas receberam doaccedilotildees das empresas ligadas ao
carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2010 146 Tabela 15 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2010 147 Tabela 16 - Doadores eleiccedilotildees de 2004 148 Tabela 17 - Comitecircs e candidatos que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2004 149 Tabela 18 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2004 149 Tabela 19 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2008 150 Tabela 20 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2008 que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 151 Tabela 21 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2008 151 Tabela 22 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2012 152 Tabela 23 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2012 que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 152 Tabela 24 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2012 153 Tabela 25 - Siacutentese dos doadores Eleiccedilotildees de 2002 e 2012 154 Tabela 26 - Candidatos que receberam maiores doaccedilotildees Eleiccedilotildees de
2002 a 2012 155 Tabela 27 - Doaccedilotildees por Partido Poliacutetico Eleiccedilotildees de 2002 a 2012 155 Tabela 28 ndash Principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo com a construccedilatildeo da
USITESC 179
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABCM Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo Mineral
ACARESC
Associaccedilatildeo de Creacutedito e Assistecircncia Rural de Santa
Catarina
ACARIMO Associaccedilatildeo Comunitaacuteria do Alto do Rio Molha
AIA Avaliaccedilatildeo de Impacto Ambiental
ALESC Assembleacuteia Legislativa do Estado de Santa Catarina
AMESC Associaccedilatildeo dos Municiacutepios do Extremo Sul Catarinense
AMREC Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera
AMUREL Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo de Laguna
ANEEL Agecircncia Nacional de Energia Eleacutetrica
ANSDNPM Associaccedilatildeo Nacional de Servidores do Departamento
Nacional de Produccedilatildeo Mineral
APC Associaccedilatildeo Proacute-Carvatildeo
APIB Articulaccedilatildeo dos Povos Indiacutegenas do Brasil
APINE
Associaccedilatildeo Brasileira dos Produtores Independentes de
Energia Eleacutetrica
APP Agraverea de Preservaccedilatildeo Permanente
ASMURC
Associaccedilatildeo de Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera do
Rio Grande do Sul
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento
CAPES
Coordenadoria de Aperfeiccediloamento de Pessoal de Niacutevel
Superior
CASA Centro de Apoio Socioambiental
CBCA Companhia Carboniacutefera de Araranguaacute
CCEE Cacircmara de Comercializaccedilatildeo de Energia Eleacutetrica
CEPCAN Comissatildeo Executiva do Plano do Carvatildeo Nacional
CETEM Centro de Tecnologia Mineral
CETMA Conselho Estadual de Tecnologia e Meio ambiente
CFEM
Compensaccedilatildeo Finaceira pela Exploraccedilatildeo de Recursos
Minerais
CFM Comitecircs Financeiros Municipais
CGBHRA
Comitecirc de Gerenciamento da Bacia Hidrograacutefica do Rio
Araranguaacute
CGTEE Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica
CNBB Conferecircncia Nacional dos Bispos do Brasil
CNPE Conselho Nacional de Poliacutetica Energeacutetica
CNPq
Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientiacutefico e
Tecnoloacutegico
CO2 Dioacutexido de Carbono
COCALIT Coque Catarinense Ltda
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
CONDEMA Conselho Municipal de Defesa Ambiental
COPEL Companhia Paranaense de Energia
CPRM Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
CSN Companhia Sideruacutergica Nacional
DEM Democratas
DNPM Departamento Nacional de Produccedilatildeo Mineral
EIA Estudo de Impacto Ambiental
EPE Empresa de Pesquisa Energeacutetica
FASE
Federaccedilatildeo de oacutergatildeos para Assistecircncia Social e
Educacional
FATMA Fundaccedilatildeo do Meio Ambiente
FBOMS Foacuterum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais
FBOMS
Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento
FDESC Foacuterum de Desenvolvimento do Extremo Sul Catarinense
FEEC Federaccedilatildeo de Entidades Ecologistas Catarinenses
FELC Foacuterum de Ecodesenvolvimento do Litoral Catarinense
FURB Universidade Regional de Blumenau
GAPLAN Gabinete de Planejamento
GEE Gases de Efeito Estufa
GWH Gigawatt-hora
IAD Institutional Framework for Policy Analysis and Design IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renovaacuteveis
IBASE Instituto Brasileiro de Anaacutelises Sociais e Econocircmicas
IBRAM Instituto Brasileiro de Mineraccedilatildeo
ICA Instituto da Cidadania de Araranguaacute
ICC Induacutestria Carboquiacutemica Catarinense
ICMS
Imposto sobre Circulaccedilatildeo de Mercadorias e Prestaccedilatildeo de
Serviccedilos
IEA Agecircncia Internacional de Energia
INESC Instituto de Estudos Socioeconocircmicos
IPAT Instituto de Pesquisas Ambientais e Tecnoloacutegicas
JICA Agecircncia de Cooperaccedilatildeo internacional do Japatildeo
KWh QuiloWatt hora
LI Licenccedila de Instalaccedilatildeo
LO Licenccedila de Operaccedilatildeo
LP Licenccedila Preacutevia
MAM Movimento Popular frente agrave Mineraccedilatildeo
MEcircS Movimento Ecoloacutegico de Sideroacutepolis
MMA Ministeacuterio do Meio Ambiente
MME Ministeacuterio das Minas e Energia
MOVET Movimento Ecoloacutegico Tubaronense
MPA Movimento Proacute-Araranguaacute
MST Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
MW Megawatt
N Nitrogecircnio
NMD
Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio Ambiente e
Desenvolvimento
NPDR Nuacutecleo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional
OCDE
Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento
Econocircmico
ONG Organizaccedilatildeo Natildeo Governamental
ONU Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas
PAC Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento
PFL Partido da Frente Liberal
PL Projeto de Lei
PMA Prefeitura Municipal de Araranguaacute
PMDB Partido do Movimento Democraacutetico Brasileiro
PNMA Poliacutetica Nacional de Meio Ambiente
PNUMA Programa das Naccedilotildees Unidas para o Meio Ambiente
PP Partido Progressista
PPB Partido Progressista Brasileiro
PPS Partido Popular Socialista
PR Partido da Repuacuteblica
PSD Partido Social Democraacutetico
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira
PT Partido dos Trabalhadores
PTB Partido Trabalhista Brasileiro
RBJA Rede Brasileira de Justiccedila Ambiental
RIMA Relatoacuterio de Impacto Ambiental
ROM Run of Mine
SATC
Associaccedilatildeo Beneficente da Induacutestria Carboniacutefera de
Santa Catarina
SDR Secretaria de Desenvolvimento Regional
SETMA Secretaria de Tecnologia e Meio Ambiente
SIESESC
Sindicato da Induacutestria da Extraccedilatildeo de Carvatildeo do Estado
de Santa Catarina
SISNAMA Sistema Nacional do Meio Ambiente
SNIEC Sindicato Nacional da Induacutestria de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
SOLTECA Sociedade Termoeleacutetrica de Capivari SA
TWH Tera Watt Hora
UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina
UNESC Universidade do Extremo Sul Catarinense
USITESC Usina Termeleacutetrica Sul-Catarinense
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO39
2 A ATUALIDADE DO ECODESENVOLVIMENTO NO ESTUDO
CONTEMPORAcircNEO SOBRE GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS59
21 RESGATE DO ENFOQUE ldquoCLAacuteSSICOrdquo DE
ECODESENVOLVIMENTO 61
22 AS CONTRIBUICcedilOtildeES DE DIFERENTES ENFOQUES 63
221 Gestatildeo de recursos comuns a importacircncia da
aprendizagem social adaptativa 66
222 Ecodesenvolvimento territorial os recursos comuns no
contexto do desenvolvimento 71
223 Justiccedila ambiental e justiccedila ecoloacutegica os caminhos da
democracia 73
23 LIMITES E POSSIBILIDADES DO
ECODESENVOLVIMENTO REVISITADO 77
3 GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS NO BRASIL O CARVAtildeO
MINERAL EM QUESTAtildeO79
31 DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO GESTAtildeO DE
RECURSOS COMUNS E ENERGIA 81
32 CARACTERIZACcedilAtildeO E USOS DO CARVAtildeO MINERAL NO
BRASIL 86
33 TECNOLOGIAS DISPONIacuteVEIS E IMPACTOS
SOCIOAMBIENTAIS 89
34 REGRAS EM USO NUMA PERSPECTIVA HISTOacuteRICA
INTERFACE ENTRE DIREITOS AMBIENTAIS E DIREITOS
HUMANOS 92
35 ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO 98
351 Segmentos poliacuteticos 98
352 Segmentos econocircmicos 100
353 Segmentos sociais 102
36 SITUACcedilAtildeO ATUAL E DESAFIOS 103
4 CARVAtildeO MINERAL EM SANTA
CATARINA109
41 ldquoCombinandordquo crescimento econocircmico e proteccedilatildeo ambiental 110
42 O sul catarinense uma trajetoacuteria (de desenvolvimento) marcada
pelo carvatildeo mineral 114
43 Da extraccedilatildeo manual agrave mecanizaccedilatildeo das minas 121
44 Regras em uso 122
45 Envolvidos na gestatildeo 124
451 Segmentos poliacuteticos 124
452 Segmentos econocircmicos 124
453 Segmentos sociais 126
46 Situaccedilatildeo atual e desafios 129
5 CARVAtildeO MINERAL E POLIacuteTICA EM SANTA CATARINA
ELEICcedilOtildeES E FINANCIAMENTO PRIVADO133
51 Os argumentos presentes no discurso dos poliacuteticos 134
52 Panorama das eleiccedilotildees e doaccedilotildees de campanha de 2002 a 2012
139
521 Eleiccedilotildees gerais 140
522 Eleiccedilotildees municipais 148
53 Os fatos ausentes do discurso dos poliacuteticos 153
6 CARVAtildeO MINERAL E AMPLIACcedilAtildeO DA ENERGIA
TERMELEacuteTRICA EM SANTA CATARINA157
61 O municiacutepio de Treviso 157
62 O processo de licenciamento os documentos escritos 162
621 O EIARIMA da USITESC 163
622 Das audiecircncias puacuteblicas e licenccedilas 169
623 Pressotildees dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos no
processo de licenciamento 170
624 A posiccedilatildeo dos segmentos sociais 173
63 Relaccedilotildees de poder e desigualdade nas audiecircncias puacuteblicas os
documentos falados 175
631 A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica 177
632 As mudanccedilas climaacuteticas natildeo vecircm ao caso 183
633 Quem defende quem E quem defende os
afetadosatingidosameaccedilados 188
634 O papel da FATMA em questatildeo 192
635 O IPAT e a neutralidade da ciecircncia 195
636 Audiecircncias puacuteblicas como espaccedilos democraacuteticos 200
64 Democracias possiacuteveis e aprendizagem social 202
7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS205
REFEREcircNCIAS211
1 INTRODUCcedilAtildeO
O crescimento e as transformaccedilotildees da economia mundial ao
longo do seacuteculo XX foram impulsionados pela oferta de energia tendo
como fonte principal os combustiacuteveis foacutesseis petroacuteleo e carvatildeo mineral
O uso da energia eacute essencial agrave cultura consumista moderna presente em
todas as regiotildees do mundo Os processos de produccedilatildeo e consumo satildeo
responsaacuteveis por inuacutemeros riscos e danos ecoloacutegicos (TOUCHEacute 2004)
A geopoliacutetica mundial dos recursos naturais faz da energia aacutegua
mineacuterio e espaccedilo territorial elementos do comeacutercio internacional Esse
movimento global afeta as localidades atraveacutes da implantaccedilatildeo de redes
de infraestrutura reconversatildeo de atividades alteraccedilatildeo das formas de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo e satildeo geradores de injusticcedila ambiental Aiacute surgem
conflitos entre a exploraccedilatildeo dos recursos orientada por interesses
presentes em vaacuterias escalas espaciais (ACSELRAD BEZERRA 2010
ZHOURI 2008)
A partir da deacutecada de 1990 depois de mais de cinquenta anos de
controle estatal o sistema energeacutetico brasileiro passou por um periacuteodo
de liberalizaccedilatildeo Duas mudanccedilas consideraacuteveis podem ser apontadas A
privatizaccedilatildeo das companhias operadoras iniciando com a Lei nordm 9427
de dezembro de 1996 que instituiu a Agecircncia Nacional de Energia
Eleacutetrica (ANEEL) e determinou que o potencial energeacutetico seria
concedido via leilatildeo A segunda mudanccedila ocorreu em 2004 com o Novo
Modelo do Setor Eleacutetrico marcando a retomada do planejamento nesse
setor pelo Estado garantindo a seguranccedila no suprimento modicidade
tarifaacuteria e inserccedilatildeo social (atraveacutes do Programa Luz para Todos)
(ANEEL 2008a) Essa deacutecada marcou tambeacutem a desregulamentaccedilatildeo do
setor carboniacutefero que perdeu o mercado metaluacutergico e enfrentou seacuterias
dificuldades vindo a se recuperar somente com a possibilidade de
ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica (JFSC 2008)
Muitas poliacuteticas puacuteblicas incluindo as do setor energeacutetico tecircm
como efeitos colaterais grandes impactos socioambientais (PINHEIRO
2006 RAULINO 2009 SAacuteNCHEZ 2008a VIEacuteGAS 2007) O
Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento (PAC) reforccedilou a velha loacutegica
de grandes projetos de infraestrutura e a atuaccedilatildeo do Estado ainda eacute
bastante controversa (VIEIRA 2009 ZHOURI LASCHEFSKI 2010)
Dentre as controveacutersias presentes na atuaccedilatildeo do Estado uma refere-se
ao compromisso assumido pelo Brasil no Plano Nacional sobre
40
Mudanccedila do Clima de reduzir as desigualdades sociais a partir de uma
dinacircmica econocircmica que natildeo repita a trajetoacuteria dos paiacuteses
industrializados em termos de emissotildees de Gases de Efeito Estufa
(GEE) (BRASIL 2008) Esse discurso parece caminhar na contramatildeo
do PAC que prevecirc a construccedilatildeo de mais cinco termeleacutetricas movidas a
carvatildeo mineral sendo uma em Santa Catarina (MONTEIRO 2008)
A Poliacutetica Estadual sobre Mudanccedilas Climaacuteticas e
Desenvolvimento Sustentaacutevel de Santa Catarina foi instituiacuteda em 2009
Esta pretende compatibilizar desenvolvimento social econocircmico e
tecnoloacutegico com a proteccedilatildeo do sistema climaacutetico e do meio ambiente
com ecircnfase especial agrave minimizaccedilatildeo das atividades geradoras de gases de
efeito estufa (SANTA CATARINA 2009a) Entretanto o Coacutedigo
Estadual do Meio Ambiente aprovado em 2009 (SANTA CATARINA
2009b) e alterado em 2013 abre a possibilidade de regularizaccedilatildeo
fundiaacuteria em Aacutereas de Preservaccedilatildeo Permanente (APP) e do
licenciamento por decurso de prazo (FEEC 2008 SANTA
CATARINA 2014a) Estes e outros aspectos causam grande impacto
nas relaccedilotildees sociedade e meio ambiente no geral e na questatildeo
energeacutetica em particular
O desenvolvimento de Santa Catarina foi durante muito tempo
considerado bem sucedido por ter reduzido grau de desigualdade
socioeconocircmica amparada no predomiacutenio da pequena propriedade e da
produccedilatildeo diversificada (LISBOA THEIS 1993) Todavia com o passar
do tempo observa-se a elevaccedilatildeo do ecircxodo rural o aumento dos
problemas urbanos e da degradaccedilatildeo ecossistecircmica (VIEIRA et al
2010 VIEIRA CUNHA 2002) A crise socioecoloacutegica catarinense estaacute
intimamente ligada agrave civilizaccedilatildeo dos negoacutecios (LENZI 2000) e o
sistema energeacutetico que a sustenta contribui em alguma medida para o
agravamento deste quadro (LISBOA THEIS 1993) O aumento da
produccedilatildeo e consumo de energia em Santa Catarina relaciona-se ao
crescimento da atividade econocircmica e ao crescimento dos impactos
ambientais (THEIS 1988)
Dentre as regiotildees mais afetadas estaacute o Sul de Santa Catarina A
regiatildeo concentra 1041 das reservas de carvatildeo mineral do Brasil
(MONTEIRO 2008) Desde a descoberta do carvatildeo catarinense pelos
tropeiros em 1822 ateacute os dias atuais muitas coisas mudaram em termos
de incentivos ao uso do carvatildeo mineral tecnologias utilizadas
agravamento da problemaacutetica socioambiental global e desenvolvimento
de mecanismos institucionais para lidar com esta problemaacutetica Todavia
41
apesar de existirem avanccedilos intensificaram-se tambeacutem processos de
degradaccedilatildeo ambiental (MENEZES WATERKEMPER 2009 SANTA
CATARINA 1990)
A Agecircncia de Cooperaccedilatildeo Internacional do Japatildeo (JICA)
identificou 4700 hectares degradados no Sul de Santa Catarina mas
estima-se que seriam 6000 hectares (NASCIMENTO BURSZTYN
2010) Do mineacuterio extraiacutedo 25 eacute aproveitado e 75 torna-se rejeito
piritoso (MILIOLI 2009) Na regiatildeo carboniacutefera apesar da
mecanizaccedilatildeo da extraccedilatildeo do carvatildeo ainda existem precaacuterias condiccedilotildees
de trabalho e peacutessimas condiccedilotildees de vida (moradia sauacutede saneamento)
(MONTIBELLER FILHO 2004) Haacute na regiatildeo um gradativo
comprometimento do setor agriacutecola As aacutereas proacuteximas agraves lavras de
subsolo sofrem com rachaduras desabamentos e rebaixamentos do solo
Ocorrem tambeacutem infiltraccedilotildees secagem de cursos de aacutegua accediludes e
poccedilos Dois terccedilos do sistema hidrograacutefico da regiatildeo estatildeo
comprometidos Existem tambeacutem impactos na flora e fauna e decliacutenio
do potencial pesqueiro (MILIOLI 2009)
Em 1993 o Ministeacuterio Puacuteblico Federal propocircs uma Accedilatildeo Civil
Puacuteblica contra as empresas carboniacuteferas diretores soacutecios majoritaacuterios o
Estado de Santa Catarina e a Uniatildeo Federal visando agrave recuperaccedilatildeo do
passivo ambiental resultante da mineraccedilatildeo do carvatildeo Em 2000
aconteceu a condenaccedilatildeo dos reacuteus agrave recuperaccedilatildeo de 619159 hectares de
aacutereas degradadas trecircs bacias hidrograacuteficas (bacias dos rios Araranguaacute
Tubaratildeo e Urussanga) e 768 minas de boca abandonadas (TSJ 2007)
A regiatildeo eacute palco de muitos conflitos No que diz respeito agrave
extraccedilatildeo do carvatildeo destacam-se em 1988 o conflito entre a Companhia
Sideruacutergica Nacional (CSN) e moradores da comunidade rural de
Montanhatildeo em 1994 entre a Companhia Carboniacutefera Belluno e 200
agricultores em 1995 envolvendo a Associaccedilatildeo Comunitaacuteria do Alto do
Rio Molha (ACARIMO) em Urussanga em 1996 o conflito entre
mineradores e agricultores no ldquoMorrordquo do Albino e Estevatildeo em
Criciuacutema (SILVA SCHEIBE 2005) em 1999 o conflito com a
Carboniacutefera Rio Deserto em Sideroacutepolis e em Iccedilara entre agricultores e
a Carboniacutefera Rio Deserto (NASCIMENTO BURSZTYN 2010) Em
2004 com a ocorrecircncia do furacatildeo Catarina o primeiro do Atlacircntico
Sul inaugura-se uma mobilizaccedilatildeo social que une a discussatildeo sobre a
mineraccedilatildeo do carvatildeo com a discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas e
justiccedila ambiental (SOacuteCIOS DA NATUREZA 2009 e 2005)
Historicamente na regiatildeo aqueles que tecircm o benefiacutecio econocircmico
42
geralmente natildeo arcam com os impactos negativos resultantes da
mineraccedilatildeo (MILIOLI 2009 NASCIMENTO BURSZTYN 2010)
Todavia os impactos natildeo necessariamente afetam apenas as populaccedilotildees
mais vulneraacuteveis do ponto de vista socioeconocircmico
O iacutendice meacutedio de mortalidade por neoplasias e doenccedilas
respiratoacuterias eacute superior ao resto do territoacuterio catarinense e ultrapassa a
meacutedia nacional Chama atenccedilatildeo tambeacutem o iacutendice de mortalidade de
menores de um ano por doenccedilas respiratoacuterias anomalias congecircnitas
notadamente no sistema nervoso incluindo anencefalia tambeacutem
superiores ao resto do paiacutes (MPF 2009) Os municiacutepios de Imbituba
Tubaratildeo Criciuacutema e Urussanga lideram os piores iacutendices de qualidade
do ar do Estado Existem tambeacutem muitos prejuiacutezos relacionados agrave sauacutede
da populaccedilatildeo De 1980 a 2004 foram 846 mortes causadas por doenccedilas
do aparelho respiratoacuterio nos municiacutepios de Criciuacutema Iccedilara Lauro
Muumlller Morro da Fumaccedila Sideroacutepolis Nova Veneza Urussanga
(MILIOLI 2009)
A mineraccedilatildeo no Sul em 2010 contava com 12 induacutestrias e
aproximadamente 4136 empregos diretos O principal destino do carvatildeo
(95) era o Complexo Termeleacutetrico Jorge Lacerda localizado no
municiacutepio de Capivari de Baixo administrado pela Tractebel
(SIECESC 2010) A Usina Termeleacutetrica Jorge Lacerda foi inaugurada
em 1965 entrando em operaccedilatildeo em 1966 com potecircncia instalada de 50
MW atualmente 856 MW com a incorporaccedilatildeo de mais unidades e
ampliaccedilatildeo da produccedilatildeo de energia eleacutetrica Em 1998 como parte dos
processos de privatizaccedilatildeo o Complexo Jorge Lacerda foi vendido para o
Grupo SuezTractebel (Beacutelgica) (GOULARTI FILHO MORAES
2004)
O Complexo Jorge Lacerda tem o compromisso da compra de
200 mil toneladas mensais de carvatildeo mineral A cadeia produtiva do
carvatildeo gera mais de seis mil empregos (na mineraccedilatildeo do carvatildeo
transporte e abastecimento do carvatildeo geraccedilatildeo de energia eleacutetrica e
extraccedilatildeo e transporte de cinzas) e eacute responsaacutevel por 70 da arrecadaccedilatildeo
de tributos municipais e por 75 da economia de Capivari de Baixo
(TRACTEBEL 2008)
A ampliaccedilatildeo de energia termeleacutetrica tornou-se uma possibilidade
atraveacutes da construccedilatildeo da Usina Termeleacutetrica Sul-Catarinense
(USITESC) Ela faz parte de uma realidade diferente se comparada ao
Complexo Termeleacutetrico Jorge Lacerda Enquanto o Complexo
Termeleacutetrico Jorge Lacerda foi construiacutedo num periacuteodo em que a
43
questatildeo da energia passava pela intervenccedilatildeo federal e estadual
(GOULARTI FILHO MORAES 2004) a USITESC vai ser construiacuteda
num periacuteodo de liberalizaccedilatildeo e privatizaccedilatildeo do setor eleacutetrico Ocorrem
ainda nesse intervalo de tempo a democratizaccedilatildeo e a criaccedilatildeo de espaccedilos
legais e institucionais motivados pela crescente preocupaccedilatildeo com
questotildees socioambientais (VAINER 2007) Todavia existem
dificuldades na articulaccedilatildeo entre os niacuteveis de planejamento e gestatildeo
(federal estadual regional municipal) especificidades da cultura
poliacutetica brasileira a degeneraccedilatildeo das instituiccedilotildees poliacuteticas e o vieacutes
tecno-burocraacutetico das poliacuteticas ambientais (VIEIRA 2006) Ao liberar
as forccedilas do capital das regulamentaccedilotildees do Estado o controle social
sobre os efeitos nocivos do uso exacerbado do meio ambiente pelos
interesses privados pode ser inviabilizado (ACSELRAD 1992b)
No que se refere agrave geraccedilatildeo de energia do Complexo Jorge
Lacerda a Tractebel natildeo sofre nenhum tipo de fiscalizaccedilatildeo O
Complexo Jorge Lacerda emite 42 milhotildees de toneladas de Dioacutexido de
Carbono (CO2) por ano (MONTEIRO 2008) A Fundaccedilatildeo do Meio
Ambiente (FATMA) autorizou a Tractebel a emitir 15667117
toneladasano de dioacutexido de enxofre Essa e as demais emissotildees
ultrapassam em muito os limites da Resoluccedilatildeo do Conselho Nacional do
Meio Ambiente (CONAMA) nordm 0890 e violam tambeacutem a Convenccedilatildeo da
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre a Mudanccedila do Clima da
qual o Brasil eacute signataacuterio Em 2009 o Ministeacuterio Puacuteblico Federal
determinou que a Tractebel Energia SA realize uma auditoria
ambiental uma vez que sua atuaccedilatildeo tem como base um estudo de
impacto ambiental feito em 1986 (MPF 2009)
Jaacute o relatoacuterio de impacto ambiental da USITESC foi questionado
pela sociedade civil organizada e em alguns pontos pelo Ministeacuterio
Puacuteblico (SANTOS 2011 DIAS 2011) Segundo Dias (2011) o estudo
de impacto ambientalrelatoacuterio de impacto ambiental considerou apenas
os impactos da implantaccedilatildeo da usina termeleacutetrica desconsiderando os
empreendimentos acessoacuterios (reservatoacuterio de aacutegua ramal da Ferrovia
Tereza Cristina linha de transmissatildeo e terminal de amocircnia no porto de
ImbitubaSC) Foram feitos estudos complementares e o Ministeacuterio
Puacuteblico corroborou o licenciamento ambiental emitido pela FATMA
Se os estudos de impacto ambiental e relatoacuterios de impacto
ambiental satildeo a base para as tomadas de decisatildeo aleacutem da qualidade
documental a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo em associaccedilotildees locais eacute uma
conquista democraacutetica importante mas a praacutetica permanece precaacuteria
44
(SAacuteNCHEZ 2008b AGRA FILHO 2010) na medida em que o campo
ambiental eacute ldquoconstituiacutedo por posiccedilotildees hieraacuterquicas e relaccedilotildees de poder
muito desiguaisrdquo (ZHOURI 2008 p 99) Os empresaacuterios enaltecem os
benefiacutecios sociais dos empreendimentos e o governo tem demonstrado
atitudes controvertidas nos espaccedilos de negociaccedilatildeo e decisatildeo As
audiecircncias puacuteblicas passam de ldquo() um instrumento de avaliaccedilatildeo da
sustentabilidade socioambiental das obras para ser mero instrumento
viabilizador de um projeto de sociedade que tem no meio ambiente um
recurso material a ser explorado economicamenterdquo (ZHOURI 2008 p
101) Outro risco que se corre para aleacutem da negociaccedilatildeo caso a caso eacute
lidar ldquoapenas com a manifestaccedilatildeo superficial de questotildees mais
fundamentais e enraizadas ndash os conflitos de valores e princiacutepios baacutesicos
relativos agrave gestatildeo dos recursosrdquo (ACSELRAD BEZERRA 2010 p
52) Ou seja a preocupaccedilatildeo socioambiental acaba muitas vezes
limitada ao processo de avaliaccedilatildeo de impacto ambiental de casos
isolados sem levar em conta uma discussatildeo ampla e bem informada
sobre alternativas ao estilo de desenvolvimento hegemocircnico
A regiatildeo Sul catarinense convive com um problema socioambiental
considerado grave a saber os impactos negativos decorrentes da
mineraccedilatildeo e do uso do carvatildeo mineral e a construccedilatildeo da USITESC
demonstram a insistecircncia nesse estilo de desenvolvimento Levando em
conta a situaccedilatildeo-problema aqui descrita a questatildeo norteadora dessa tese
foi assim formulada Por que apesar da evoluccedilatildeo do debate sobre os
impactos socioambientais da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral e dos avanccedilos institucionais relacionados agrave questatildeo ambiental o sistema de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral vem sendo
ampliado em Santa Catarina
Partindo dessa questatildeo norteadora satildeo apresentados a seguir o enfoque
analiacutetico e os principais conceitos que ajudaram a delimitar essa tese
Enfoque analiacutetico
Desde a emergecircncia social e cientiacutefica da problemaacutetica
socioambiental a partir da deacutecada de 1960 podemos destacar avanccedilos
conceituais que se somam a progressos no conhecimento empiacuterico
sobre os problemas e ameaccedilas socioambientais e avanccedilos institucionais
da questatildeo ambiental Apesar dos avanccedilos os desafios da problemaacutetica
45
socioambiental satildeo ineacuteditos e possuem implicaccedilotildees epistemoloacutegicas
eacuteticas e poliacuteticas
O ecodesenvolvimento tem sido o ponto de confluecircncia dessa
reflexatildeo Mencionado pela primeira vez no acircmbito da Conferecircncia de
Estocolmo foi utilizado no decorrer da deacutecada de 1970 sendo
progressivamente marginalizado na deacutecada seguinte considerado como
um enfoque demasiadamente criacutetico e radical pela ideologia neoliberal
(SACHS 1986 VIEIRA 2006) O enfoque analiacutetico aqui apresentado
resgata o enfoque ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento enfatizando suas
trecircs dimensotildees (i) recursos naturais (ii) espaccedilo-territoacuterio e (iii) habitat
(compreendido como qualidade de vida)
No que se refere agrave primeira dimensatildeo satildeo consideradas as
contribuiccedilotildees do enfoque da gestatildeo de recursos comuns que vecircm
permeando o debate sobre os modos de apropriaccedilatildeo e gestatildeo No que diz
respeito agrave segunda dimensatildeo traz-se o enfoque do ecodesenvolvimento
territorial como uma possibilidade de operacionalizar o enfoque de
ecodesenvolvimento Por fim as contribuiccedilotildees agrave dimensatildeo do haacutebitat a
partir do enfoque de justiccedila ambiental e ecoloacutegica entendido como
capaz de contribuir na avaliaccedilatildeo da distribuiccedilatildeo dos benefiacutecios dos
riscos e danos ambientais assim como na reflexatildeo sobre redistribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo nas relaccedilotildees entre os seres humanos
destes com o meio ambiente com as futuras geraccedilotildees espeacutecies natildeo
humanas e processos ecossistecircmicos
O enfoque da gestatildeo de recursos comuns atraveacutes do Institutional Framework for Policy Analysis and Design (IAD) adaptado por
Oakerson (1992) oferece atraveacutes de quatro macro variaacuteveis uma forma
de descrever a gestatildeo de um dado recurso os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso as regras em uso que orientam a interaccedilatildeo dos
envolvidos na gestatildeo a arena de accedilatildeo que compreendem os espaccedilo nos
quais os envolvidos se relacionam e os resultados e consequecircncias da
gestatildeo A relaccedilatildeo entre essas macro variaacuteveis eacute dinacircmica e as mudanccedilas
da gestatildeo envolvem o aprendizado social adaptativo que se incorpora
ao modelo a partir das contribuiccedilotildees recentes do enfoque da cogestatildeo
adaptativa (ARMITAGE et al 2009 PLUMMER 2009 HOLLING
2001 BERKES 2009 CUNDILL 2010) Esse enfoque eacute importante
para o problema desta tese porque a descriccedilatildeo e anaacutelise das macro
variaacuteveis possibilita um diagnoacutestico e uma compreensatildeo mais ampla do
problema bem como um prognoacutestico avaliando estrateacutegias passiacuteveis de
serem colocadas em accedilatildeo visando a resoluccedilatildeo do problema inicial
46
A fim de complementar o enfoque da gestatildeo de recursos comuns
o enfoque do ecodesenvolvimento territorial reforccedila a ideia de que a
gestatildeo de recursos comuns deve ser analisada junto ao estilo de
desenvolvimento Para aleacutem da situaccedilatildeo especiacutefica do recurso
encontram-se as opccedilotildees de desenvolvimento que influenciam as macro
variaacuteveis acima listadas em todas as escalas espaciais do local ao global
(VIEIRA 2006)
Os enfoques da justiccedila ambiental e da justiccedila ecoloacutegica por sua
vez trazem a indissociabilidade da questatildeo ambiental e da questatildeo
democraacutetica enfatizando o fortalecimento do sistema democraacutetico como
condiccedilatildeo para a aprendizagem social adaptativa e como um caminho
para a reflexatildeo-accedilatildeo criacutetica em relaccedilatildeo agrave gestatildeo de recursos comuns e agraves
opccedilotildees de desenvolvimento A democracia (representativa e
participativa) eacute um ldquoelemento dardquo e uma ldquocondiccedilatildeo parardquo a justiccedila
ambiental e ecoloacutegica (SCHLOSBERG 2009)
No sistema democraacutetico eacute preciso identificar os mecanismos de
produccedilatildeo da injusticcedila ambiental entendida como distribuiccedilatildeo
desproporcional dos riscos e danos ambientais proteccedilatildeo ambiental
desigual e acesso desigual aos recursos naturais A justiccedila ambiental
centraliza sua anaacutelise na redistribuiccedilatildeo (que remete a aspectos
econocircmicos) e a justiccedila ecoloacutegica complementa com outras duas
dimensotildees o reconhecimento (que remete a aspectos culturais) e a
representaccedilatildeo (que remete a aspectos poliacuteticos) (FRASER 2009 2007
SCHLOSBERG 2009) A ampliaccedilatildeo da democracia e
consequentemente do aprendizado social adaptativo envolve estrateacutegias
dos segmentos sociais que considerem essas duas dimensotildees
Dessa forma o enfoque central utilizado nessa tese o
ecodesenvolvimento conta com as contribuiccedilotildees da gestatildeo de recursos
comuns do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila ambiental e da
justiccedila ecoloacutegica Mesmo diante da situaccedilatildeo-problema apresentada na
qual os problemas tendem a se acirrar com a ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica a combinaccedilatildeo dos enfoques permite aleacutem de um
diagnoacutestico visando compreender o problema a possibilidade de
atraveacutes do exame das dinacircmicas de desenvolvimento do sistema
democraacutetico e da aprendizagem social adaptativa identificar avanccedilos e
margens de manobra junto aos segmentos sociais que possibilitem o
questionamento da situaccedilatildeo e seu enfrentamento
47
Questotildees norteadoras
Por que apesar da evoluccedilatildeo do debate sobre os impactos
socioambientais da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral e dos avanccedilos
institucionais relacionados agrave questatildeo ambiental o sistema de geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral vem sendo ampliado em
Santa Catarina
Para auxiliar a questatildeo norteadora constam ainda as seguintes questotildees auxiliares
Quais condicionantes levam agrave ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica no Brasil e em Santa Catarina
Como as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento influenciam
as accedilotildees coletivas dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais
De que maneira os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais se
articulam para que a atividade carboniacutefera se mantenha e se
amplie
Como se deu o processo de licenciamento da Usitesc
Como se manifestam os problemas de reconhecimento e
representaccedilatildeo no processo de licenciamento
As accedilotildees coletivas estudadas tecircm gerado oportunidades para
processos de aprendizagem social adaptativa
Haacute indiacutecios de uma possiacutevel rota para uma democracia que
permita que os segmentos sociais intervenham efetivamente em
debates cada vez mais mediados por uma ciecircncia e tecnologia a
serviccedilo dos projetos dos segmentos econocircmicos e respaldados
pelos segmentos poliacuteticos
Hipoacuteteses
Partindo do pressuposto de que a democracia representativa e
participativa eacute um ldquoelemento dardquo e uma ldquocondiccedilatildeo parardquo a
justiccedila social ambiental e ecoloacutegica a falta de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e de representaccedilatildeo nos processos democraacuteticos
seria uma condiccedilatildeo favoraacutevel agrave produccedilatildeo de injusticcedila ambiental
48
e ecoloacutegica Dessa forma a hipoacutetese sustentada aqui eacute de que o
processo poliacutetico que resulta na ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica envolve problemas de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo nos processos democraacuteticos em
todas as escalas espaciais (nacional estadual regional e local)
tanto na modalidade representativa quanto na modalidade
participativa
A tomada de consciecircncia dos limites da democracia
representativa e da democracia participativa faz com que os
segmentos sociais passem a investir em accedilotildees autocircnomas
favorecendo a aprendizagem social adaptativa
Objetivos
Compreender as contradiccedilotildees inerentes agrave ampliaccedilatildeo do sistema de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral no Sul de
Santa Catarina agrave luz do enfoque hiacutebrido envolvendo gestatildeo de recursos
comuns ecodesenvolvimento territorial e justiccedila ambiental e ecoloacutegica
Como objetivos especiacuteficos destacam-se
Apontar as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento que
influenciam as accedilotildees coletivas dos segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais envolvidos na gestatildeo do carvatildeo mineral
Descrever a gestatildeo de recursos comuns no Brasil e em Santa
Catarina com ecircnfase no carvatildeo mineral
Compreender a maneira como os segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais envolvidos na gestatildeo se articulam em
relaccedilatildeo agrave gestatildeo de recursos comuns
Descrever o processo de licenciamento da Usitesc
Reconhecer os problemas de distribuiccedilatildeo reconhecimento e
representaccedilatildeo no processo de licenciamento e nas audiecircncias
puacuteblicas
Verificar ldquoserdquo e ldquocomordquo as accedilotildees coletivas estudadas tecircm
gerado oportunidades para processos de aprendizagem social
adaptativa e
49
Reconhecer indiacutecios de uma possiacutevel rota para uma democracia
que permita que os segmentos sociais intervenham efetivamente
em debates cada vez mais mediados por uma ciecircncia e
tecnologia a serviccedilo dos projetos dos segmentos econocircmicos e
respaldados pelos segmentos poliacuteticos
Justificativa
Satildeo muitos os caminhos que levam ateacute o tema e o problema da
tese Desde a apresentaccedilatildeo do projeto na ocasiatildeo do processo seletivo
da qualificaccedilatildeo agrave defesa e depois O permanente refletir duvidar
reconstruir o que se cristaliza no papel e vai aleacutem dele A aacuterdua tarefa de
tentar traduzir em palavras a dinacircmica complexa da qual todas e todos
satildeo parte
O tema do planejamento do desenvolvimento me acompanha
desde o mestrado e na ocasiatildeo da seleccedilatildeo do doutorado apresentei um
projeto cujo tema era planejamento e aquecimento global Nos anos
subsequentes nas oportunidades que tive para debater o projeto fui
desafiada a trazer o tema para a realidade do estado de Santa Catarina
E seguindo essa intuiccedilatildeo a partir da pesquisa exploratoacuteria entrei em
contato com o Manifesto por Justiccedila Climaacutetica formulado por
movimentos sociais do Sul de Santa Catarina que trazia a reflexatildeo sobre
as mudanccedilas climaacuteticas e a exploraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral para
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica no Sul de Santa Catarina Tive tambeacutem a
oportunidade de participar de uma saiacuteda de campo na bacia carboniacutefera
e ter contato direto com os impactos causados pela mineraccedilatildeo Essas
experiecircncias e as leituras foram gradativamente me ajudando a definir
o tema e o problema desta tese
Existe muito material jaacute produzido sobre a trajetoacuteria de
desenvolvimento e os impactos decorrentes da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo
mineral no Sul de Santa Catarina Aqui se objetivou uma breve siacutentese
de dados e de parte do material jaacute produzido pois a ecircnfase desta tese
recaiu sobre a identificaccedilatildeo de incoerecircncias na relaccedilatildeo entre as questotildees ambientais e o sistema democraacutetico mostrando que o funcionamento do
sistema poliacutetico eacute parte do problema e que as margens de manobra
existentes podem ser mais bem exploradas pelos movimentos sociais
que atuam na regiatildeo Como jaacute foi assinalado anteriormente apesar da
possibilidade de ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a
50
carvatildeo mineral no Sul de Santa Catarina o cenaacuterio atual eacute de
aguccedilamento dos conflitos bem maior do que nas deacutecadas anteriores
Nesse sentido a construccedilatildeo da USITESC eacute mais um elo de um
segmento que tem historicamente um caraacuteter eminentemente destrutivo
do ponto de vista socioecoloacutegico Resta confirmar se isto eacute um destino
inexoraacutevel em funccedilatildeo das caracteriacutesticas especiacuteficas da regiatildeo ou se
pode ser mudado num contexto de questionamento da loacutegica subjacente
agraves dinacircmicas do sistema democraacutetico que envolvem decisotildees sobre as
poliacuteticas ambientais energeacuteticas e poliacuteticas de desenvolvimento
No plano teoacuterico a contribuiccedilatildeo desta tese inscreve-se no
aprofundamento teoacuterico do enfoque ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento
agregando as contribuiccedilotildees dos enfoques da gestatildeo de recursos comuns
do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila ambiental e da justiccedila
ecoloacutegica O esforccedilo de juntar enfoques se justificou na medida em que
se um dos condicionantes da problemaacutetica socioambiental eacute a
fragmentaccedilatildeo do problema e a dificuldade de concebecirc-lo como
problema complexo (GARCIacuteA 1994) religar as perspectivas segundo
as quais observamos e analisamos a realidade faz parte tambeacutem das
estrateacutegias para o enfrentamento do problema
Dessa forma o diaacutelogo entre enfoques trouxe pontos de reflexatildeo
diferentes que enriqueceram a anaacutelise ao enfoque da gestatildeo de recursos
comuns a questatildeo das dinacircmicas de desenvolvimento e do sistema
poliacutetico ao ecodesenvolvimento territorial a preocupaccedilatildeo com a gestatildeo
de recursos comuns e com a desigualdade ambiental e agrave justiccedila
ambiental e ecoloacutegica a atenccedilatildeo agraves dinacircmicas de desenvolvimento e agrave
gestatildeo de recursos comuns Um ponto que merece destaque eacute o esforccedilo
recente das pesquisas sobre gestatildeo de recursos comuns e justiccedila
ambiental e ecoloacutegica de aplicar os enfoques para tratar as
especificidades do caso brasileiro Esta tese se inscreve como parte
desse esforccedilo
Outro ponto importante eacute a junccedilatildeo dos temas democracia e meio
ambiente no Brasil A democracia foi e eacute sem duacutevida um tema muito
caro agrave Sociologia brasileira e a inclusatildeo de um tema mais recente (o
meio ambiente) tambeacutem eacute considerada uma contribuiccedilatildeo possiacutevel dessa tese
Vale a pena ressaltar ainda que essa tese se insere nas atividades
realizadas pelos integrantes do Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio
Ambiente e Desenvolvimento (NMD) vinculado ao Programa de Poacutes-
51
Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica O Nuacutecleo atua no litoral Centro Sul
de Santa Catarina haacute mais de dez anos Dentre as atividades
desenvolvidas pelo NMD inclui-se a participaccedilatildeo no Observatoacuterio do
Litoral Catarinense que tem como objetivo
Organizar e coordenar uma rede de apoio teacutecnico-
cientiacutefico ao Ministeacuterio Puacuteblico Federal e
Estadual tendo em vista a promoccedilatildeo de um estilo
de gestatildeo democraacutetico-participativa de conflitos
relacionados agrave apropriaccedilatildeo dos recursos
ambientais existentes na zona costeira e o
consequente fortalecimento da cidadania
ambiental no Paiacutes (OBSERVATOacuteRIO DO
LITORAL 2010)
Como parte das atividades do Observatoacuterio do Litoral
Catarinense a realizaccedilatildeo de pesquisas sobre meio ambiente e
desenvolvimento auxilia na elaboraccedilatildeo de diagnoacutesticos e prognoacutesticos e
pode favorecer a mobilizaccedilatildeo jaacute que a visibilidade dos problemas
existentes pode estimular a criaccedilatildeo de redes visando a criaccedilatildeo de
estrateacutegias integradas para enfrentamento dos problemas
Essa tese tambeacutem faz parte de um esforccedilo mais amplo de
pesquisa articulado pelo edital da Coordenadoria de Aperfeiccediloamento de
Pessoal de Niacutevel Superior (CAPES) Ciecircncias do Mar tendo como tema
a Gestatildeo Integrada e Compartilhada de Territoacuterios Marinho-Costeiros O projeto possibilitou o compartilhamento do objeto de estudo do
marco conceitual e epistecircmico e a articulaccedilatildeo dos estudos entre os
membros da equipe
Em siacutentese dentre os possiacuteveis aspectos inovativos do trabalho
destacam-se do ponto de vista praacutetico o olhar sobre a questatildeo da
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral a partir do
funcionamento do sistema democraacutetico a identificaccedilatildeo dos
condicionantes da ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica em
diferentes escalas e consequentemente o reconhecimento de limites e
das possibilidades do sistema democraacutetico e da aprendizagem social
adaptativa Do ponto de vista teoacuterico destacam-se o diaacutelogo entre os
enfoques e a aplicaccedilatildeo dos enfoques agraves especificidades brasileiras
Metodologia
52
O agravamento dos problemas socioambientais tem povoado o
debate nos campos de especializaccedilatildeo cientiacutefica seja para a criaccedilatildeo de
novas disciplinas seja para ir aleacutem da fragmentaccedilatildeo disciplinar ldquoA
problemaacutetica socioambiental constituiacute um vigoroso instrumento de
integraccedilatildeo de conceitos teorias e meacutetodos desenvolvidos em
praticamente todas as especialidades cientiacuteficasrdquo (VIEIRA 1993 p
26) A epistemologia das ciecircncias ambientais entra como uma
importante contribuiccedilatildeo para a pesquisa ambiental Ela considera a
complexidade inerente agrave crise socioambiental privilegiando uma visatildeo
integrada do problema socioecoloacutegico e da ciecircncia no acircmbito do novo
paradigma sistecircmico Neste sentido a busca de integraccedilatildeo inter e
transdisciplinar do conhecimento emerge como um elemento essencial
no enfrentamento da crise (GARCIacuteA 1994 JOLLIVET PAVEacute 2000
MORIN 2002)
A tese aqui apresentada se insere nesse esforccedilo de pesquisa Para
tanto a construccedilatildeo da tese considerou sete etapas (a pergunta de partida
a exploraccedilatildeo a problemaacutetica a construccedilatildeo do modelo de anaacutelise a
observaccedilatildeo a anaacutelise das informaccedilotildees e as conclusotildees) segundo os trecircs
princiacutepios do procedimento cientiacutefico em ciecircncias sociais (ruptura
construccedilatildeo e verificaccedilatildeo) (BOURDIEU CHAMBOREDON
PASSERON 2004 QUIVY CAMPENHOUDT 1998)
Apesar de haver uma sequecircncia loacutegica as etapas subsequentes
influenciaram a reelaboraccedilatildeo das etapas precedentes As etapas
estiveram ao longo do processo em permanente interaccedilatildeo (QUIVY
CAMPENHOUDT 1998)
Se eacute evidente que os automatismos adquiridos
podem permitir a economia de uma invenccedilatildeo
permanente devemos nos abster de deixar crer
que o sujeito da invenccedilatildeo cientiacutefica eacute um
automaton spirituale obedecendo aos
mecanismos bem ajustados de uma programaccedilatildeo
metodoloacutegica constituiacuteda uma vez por todas e
confinar dessa forma o pesquisador na submissatildeo
cega ao programa que exclui o retorno reflexivo
ao mesmo condiccedilatildeo da invenccedilatildeo de novos
programas (BOURDIEU CHAMBOREDON
PASSERON 2004 p 15)
53
Dessa forma a evoluccedilatildeo dessa tese natildeo foi linear As quatro
primeiras etapas (a pergunta de partida a exploraccedilatildeo a problemaacutetica e a
construccedilatildeo do modelo de anaacutelise) jaacute apresentadas nessa introduccedilatildeo satildeo
tratadas a seguir de forma a indicar como se deu o processo de sua
construccedilatildeo
1ordf etapa (A pergunta de partida) Foi sendo elaborada e
reelaborada ao longo das vaacuterias etapas da pesquisa
2ordf etapa (A exploraccedilatildeo) Essa etapa compreendeu conversas com
o orientador leituras e entrevistas exploratoacuterias Nessa etapa destacou-se
uma saiacuteda de campo no ano de 2010 agrave Bacia do Rio Araranguaacute
supervisionada pelo Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes e Profordf Drordf
Vanilde Citadini Zanette da Universidade do Extremo Sul Catarinense
(UNESC) Essa saiacuteda de campo foi fundamental para despertar o
interesse pelo problema da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral no Sul do
Estado
Foi feita uma entrevista exploratoacuteria com Tadeu Santos da
Organizaccedilatildeo Natildeo Governamental (ONG) Soacutecios da Natureza com sede
em Araranguaacute e conversas informais com estudantes da Poacutes-Graduaccedilatildeo
em Auditoria e Periacutecia Ambiental da UNESC em 2010 e 2012
Etapa 3 (A problemaacutetica) e Etapa 4 (A construccedilatildeo do modelo de
anaacutelise) Destacam-se tambeacutem nessa fase aleacutem das conversas com o
orientador as leituras e o esforccedilo de preparaccedilatildeo do projeto para
qualificaccedilatildeo que ocorreu em 2011 contando com as contribuiccedilotildees do
Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes da UNESC do Prof Dr Luiz
Fernando Scheibe do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Geografia da
Universidade Federal de Santa Catarina e da Profordf Drordf Janice Pontes
Tirelli do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica da UFSC
O projeto foi tambeacutem discutido no acircmbito do NMD em alguns
seminaacuterios de pesquisa na disciplina de Ecologia Humana (ministrada
pela ProfordfDrordf Marcia Grisotti e pelo Prof Dr Fernando Dias Aacutevila
Pires) em 2010 nas duas disciplinas de seminaacuterio de pesquisa uma
ministrada pela Profordf Drordf Elizabeth Farias da Silva (na qual o projeto
foi debatido pelo Prof Dr Daniel Silva) e outra ministrada pelo Prof
Dr Raul Burgos no ano de 2011 O projeto tambeacutem foi apresentado e debatido no Nuacutecleo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional (NPDR)
da Universidade Regional de Blumenau (FURB) coordenado pelo Prof
Dr Ivo Marcos Theis e em dois eventos do Projeto Gestatildeo Integrada e Compartilhada de Territoacuterios Marinho-Costeiros em 2011 e 2012
54
Etapa 5 ndash A observaccedilatildeo Nessa etapa o modelo de anaacutelise foi
submetido aos fatos e confrontado com os dados observaacuteveis Aqui satildeo
respondidas as questotildees baacutesicas o que foi observado Em que observou-se E como observou-se
O procedimento da pesquisa foi bibliograacutefico e documental Na
pesquisa bibliograacutefica foram selecionadas fontes secundaacuterias (obras e
artigos) que tratavam do tema de estudo jaacute reconhecidas no domiacutenio
cientiacutefico e na pesquisa documental foram priorizadas fontes primaacuterias
(escritas e audiovisuais) que ateacute entatildeo natildeo haviam recebido tratamento
cientiacutefico (SAacute-SILVA ALMEIDA GUIDANI 2009)
Os discursos da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo
Mineral foram acessados atraveacutes de consulta agrave Cacircmara de Deputados
pelo correio eletrocircnico Os dados sobre prestaccedilatildeo de contas eleitorais
foram acessados atraveacutes do banco de dados online do TSE O processo
de licenciamento da USITESC arquivado na FATMA conta com oito
volumes e 1617 paacuteginas e com arquivos audiovisuais de duas das quatro
audiecircncias puacuteblicas (FATMA 2013) Das quatro audiecircncias puacuteblicas
realizadas soacute foram disponibilizadas as gravaccedilotildees da terceira e da quarta
audiecircncia (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006 2007) Segundo informaccedilatildeo
da FATMA a primeira e a segunda audiecircncia puacuteblica foram gravadas em
VHS e foram danificadas pela accedilatildeo do tempo
A descriccedilatildeo das macro variaacuteveis (as dinacircmicas de
desenvolvimento os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos as regras em uso a
arena de accedilatildeo e os resultadosconsequecircncias) foi feita atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica a fontes secundaacuterias (obras e artigos) Jaacute a
variaacutevel do sistema democraacutetico contou com fontes primaacuterias os
discursos da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral na
Cacircmara dados sobre prestaccedilatildeo de contas eleitoral do Tribunal Superior
Eleitoral e os documentos referentes ao processo de licenciamento
ambiental da USITESC arquivados na FATMA
Na arena de accedilatildeo um primeiro passo foi descrever os envolvidos
na gestatildeo Para tanto os envolvidos foram divididos em segmentos
poliacuteticos econocircmicos e sociais que por sua vez foram subdivididos Os
segmentos poliacuteticos em executivo parlamento e autocircnomo os segmentos econocircmicos em associaccedilotildees empresariais e mistas e empresas
e cooperativas e os segmentos sociais em trabalhadores
afetadosatingidosameaccedilados ONG e academia (Quadro 1) Os
segmentos natildeo apresentam um posicionamento homogecircneo em relaccedilatildeo
ao tema da tese Ao longo do texto a preocupaccedilatildeo eacute tambeacutem de
55
explicitar os diferentes posicionamentos entre e no interior de cada
segmento
Quadro 1 ndash Divisatildeo dos envolvidos na gestatildeo por segmentos SEGMENTOS ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO
Poliacuteticos Executivo
Parlamento
Autocircnomo
Econocircmicos Associaccedilotildees empresariais e mistas
Empresas
Cooperativas
Sociais Trabalhadores
AfetadosAtingidosAmeaccedilados
Organizaccedilotildees Natildeo Governamentais
Academia
Fonte baseada em Oliveira (2013)
A existecircncia de afetados atingidos e ameaccedilados se inscreve no
reconhecimento e legitimaccedilatildeo de direitos A legislaccedilatildeo ambiental faz
com que os impactos passem a ser considerados e se existem impactos
existem seres humanos que satildeo afetados atingidos e ameaccedilados
(VAINER 2008) A distinccedilatildeo entre os termos afetados atingidos e
ameaccedilados remete agrave proximidade dos seres humanos em relaccedilatildeo aos
impactos Nos afetados o impacto fica num limiar tecircnue entre o direto e
indireto nos atingidos o impacto eacute direto e nos ameaccedilados o impacto eacute
potencialmente indireto
Uma variaacutevel importante na arena de accedilatildeo eacute a democracia que
por sua vez envolve a questatildeo da representaccedilatildeo e da participaccedilatildeo A
expressatildeo cidadatilde atraveacutes da representaccedilatildeo se daacute principalmente nas
eleiccedilotildees plebiscitos e conselhos Jaacute a expressatildeo mediante participaccedilatildeo
pode ser accedilatildeo sob convite (planejamento participativo consulta puacuteblica
e mediaccedilatildeo) e accedilatildeo autocircnoma (lobby peticcedilotildees manifestaccedilotildees
campanhas na imprensa outros) (Figura 1) (SAacuteNCHEZ 2008b)
56
Figura 1ndash Tipologia das formas de expressatildeo do cidadatildeo numa
democracia
Fonte Adaptado de Sagravenchez (2008b p 409)
Na anaacutelise do sistema democraacutetico foi importante identificar as
dimensotildees da justiccedila ambiental (redistribuiccedilatildeo) e da justiccedila ecoloacutegica
(reconhecimento e representaccedilatildeo) ldquoO natildeo reconhecimento eacute uma
questatildeo de impedimentos externamente manifestados e publicamente
verificaacuteveis a que certos indiviacuteduos sejam membros integrais da
sociedaderdquo (FRASER 2007 p 114) O centro normativo da concepccedilatildeo
de Fraser (2007) eacute a paridade de participaccedilatildeo que demanda uma
condiccedilatildeo objetiva e outra intersubjetiva A condiccedilatildeo objetiva ldquoexclui formas e niacuteveis de desigualdade material e dependecircncia econocircmica que
impedem a paridade de participaccedilatildeordquo (FRASER 2007 p 119) A
condiccedilatildeo intersubjetiva ldquoexclui normas institucionalizadas que
sistematicamente depreciam algumas categorias de pessoas e as
caracteriacutesticas associadas a elasrdquo (FRASER 2007 p 120)
57
Quadro 2 - Quadro de anaacutelise do sistema democraacutetico agrave luz da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica
DIMENSOtildeES DO SISTEMA
DEMOCRAacuteTICO
ESTRATEacuteGIAS DA JUSTICcedilA
AMBIENTAL E ECOLOacuteGICA
- Redistribuiccedilatildeo
- Reconhecimento e
- Representaccedilatildeo
- Produccedilatildeo do conhecimento proacuteprio
- Pressatildeo pela aplicaccedilatildeo universal das
leis
- Pressatildeo pelo aperfeiccediloamento da
legislaccedilatildeo de ambiental
- Pressatildeo por novas racionalidades no
exerciacutecio do poder estatal
- Introduccedilatildeo de procedimentos de
avaliaccedilatildeo de equidade ambiental
- Accedilatildeo direta e difusatildeo espacial do
movimento
Fonte Adaptado de Acselrad Mello Bezerra (2009) e Fraser (2009
2007)
As dimensotildees e estrateacutegias da justiccedila ambiental e ecoloacutegica
presentes no Quadro acima entraram no modelo de anaacutelise dessa tese
como indicadores da aprendizagem social adaptativa
Quanto aos meacutetodos de anaacutelise priorizou-se a anaacutelise estatiacutestica e
a anaacutelise do discurso Anaacutelise estatiacutestica privilegiou a interpretaccedilatildeo dos
dados atraveacutes do modelo de anaacutelise buscando ir aleacutem da mera exposiccedilatildeo
de resultados A anaacutelise do discurso aqui proposta ficou num limiar
entre essa modalidade e a anaacutelise de conteuacutedo As categorias utilizadas
estatildeo dispostas no quadro da paacutegina 56 Elas orientaram a seleccedilatildeo de
passagens relevantes nas audiecircncias puacuteblicas analisadas com o
propoacutesito de revelar aspectos da atividade cognitiva do locutor dos
significados sociais e poliacuteticos do discurso (GILL 2002 QUIVY
CAMPENHOUDT 1998 RESENDE RAMALHO 2006)
O processo da tese aqui descrito natildeo foi linear Para Quivy e
Campenhoudt (1998 p 236) ldquoum processo de diaacutelogo e de vaiveacutens
permanentes entre teoria e empirismo mas tambeacutem entre construccedilatildeo e
intuiccedilatildeo que estatildeo mais imbricadasrdquo
As etapas 6 e 7 (Anaacutelise de informaccedilotildees e Conclusotildees)
correspondem ao ldquocorpordquo da tese apresentado na sequecircncia
58
Estrutura da tese
Essa tese foi dividida em sete capiacutetulos O primeiro capiacutetulo eacute
esta introduccedilatildeo dedicada agrave siacutentese dos principais pontos que nortearam a
tese O segundo capiacutetulo busca resgatar a contribuiccedilatildeo do enfoque
ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento agregando com o enfoque da gestatildeo
de recursos comuns do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica elementos que satildeo incorporados no modelo de
anaacutelise e que conferem uma atualidade maior agrave discussatildeo No terceiro
capiacutetulo e quarto capiacutetulo eacute feita uma descriccedilatildeo da gestatildeo de recursos
comuns do Brasil e de Santa Catarina enfatizando as particularidades do
carvatildeo mineral A preocupaccedilatildeo presente nos dois capiacutetulos eacute de realizar
um balanccedilo dos fatores que estimulam a ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral e os fatores que podem favorecer
o questionamento da ampliaccedilatildeo bem como tratar dos limites e
possibilidades do sistema democraacutetico e possibilidades de aprendizagem
social adaptativa O quinto capiacutetulo trata da rede de influecircncia entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos no campo da democracia
representativa tratando a relaccedilatildeo entre doaccedilotildees de campanha e apoio
poliacutetico a causa do carvatildeo mineral O sexto capiacutetulo trata da ampliaccedilatildeo
da energia termeleacutetrica atraveacutes do caso da USITESC no Sul de Santa
Catarina buscando atraveacutes da anaacutelise do processo de licenciamento
compreender os condicionantes locais da ampliaccedilatildeo O seacutetimo e uacuteltimo
capiacutetulo faz uma siacutentese dos principais pontos discutidos na tese
2 A ATUALIDADE DO ECODESENVOLVIMENTO NO ESTUDO
CONTEMPORAcircNEO SOBRE GESTAtildeO DE RECURSOS
COMUNS
O surgimento de uma problemaacutetica de pesquisa envolve o
amadurecimento dos olhares com os quais se observa analisa e
empreende esforccedilos para transformar a realidade A problemaacutetica
socioambiental natildeo surge em um lugar especiacutefico e num tempo
determinado Surge em paiacuteses diferentes em eacutepocas diferentes As
formas variadas de delimitaccedilatildeo da situaccedilatildeo-problema e da construccedilatildeo da
problemaacutetica correspondente envolvem as diferentes percepccedilotildees dos
cidadatildeos bem como o protagonismo dos foacuteruns locais e movimentos
sociais o envolvimento da comunidade cientiacutefica e a busca de respostas
poliacuteticas agrave altura dos desafios identificados
No final da deacutecada de 1960 a problemaacutetica socioambiental
assume um perfil de crise global ensejando a realizaccedilatildeo de vaacuterios
eventos sobre o tema Numa visatildeo retrospectiva e criacutetica do surgimento
do Clube de Roma em 1968 agrave realizaccedilatildeo da Rio +20 em 2012 muitos
avanccedilos e retrocessos podem ser apontados no espectro que se estende
do questionamento radical do estilo de desenvolvimento hegemocircnico
visto como condicionante da crise socioambiental agrave incorporaccedilatildeo da
crise soacutecio ecoloacutegica na reproduccedilatildeo da loacutegica economicista no campo do
planejamento e da gestatildeo das experiecircncias de gestatildeo dos recursos
comuns agrave caracterizaccedilatildeo da Trageacutedia dos Comuns (HARDIN 1980)
das denuacutencias de injusticcedila ambiental e ecoloacutegica agrave constataccedilatildeo da
violecircncia estrutural embutida na persistecircncia das assimetrias de riqueza
e poder envolvendo os dois hemisfeacuterios (ESTEVA 2001 FENNY et
al 2001 SACHS 1993)
Desde sua origem um desafio que acompanha essa problemaacutetica
refere-se agrave dificuldade de se lidar (na pesquisa cientiacutefica e nos espaccedilos
de tomada de decisatildeo poliacutetica) com dinacircmicas natildeo lineares de
dinamizaccedilatildeo socioeconocircmica e recriaccedilatildeo cultural envolvendo para tanto
a coordenaccedilatildeo de processos transescalares num horizonte de
planejamento de longo prazo Neste contexto vem se tornando cada vez mais evidente a capacidade ainda bastante restrita de cientistas gestores
e agentes governamentais de compreender e tratar a complexidade
inerente agrave teia de interdependecircncias que configura a coordenaccedilatildeo da
dinacircmica de sistemas socioecoloacutegicos que envolve diferentes niacuteveis e
escalas espaciais (BERKES FOLKE 1998 CASHet al 2006)
60
Levando em conta essas consideraccedilotildees gerais o objetivo deste
capiacutetulo eacute discutir a atualidade do enfoque de ecodesenvolvimento e por
implicaccedilatildeo da necessidade de dotaacute-lo da capacidade de assegurar a
coerecircncia das regras que norteiam a gestatildeo dos modos de apropriaccedilatildeo
dos recursos comuns nas diferentes escalas espaciais Parte-se assim da
premissa segundo a qual a efetividade de experiecircncias compatiacuteveis com
os fundamentos deste enfoque dependeraacute de uma consideraccedilatildeo mais
precisa do papel da democracia e da aprendizagem social adaptativa nos
processos de gestatildeo de recursos comuns Para tanto leva-se em conta o
lento processo de elaboraccedilatildeo do enfoque ldquoclaacutessicordquo de
ecodesenvolvimento com a incorporaccedilatildeo sucessiva dos debates sobre (i)
gestatildeo de recursos comuns (ii) ecodesenvolvimento territorial e (iii)
justiccedila ambiental e ecoloacutegica
Em siacutentese defende-se o ponto de vista segundo o qual a gestatildeo
de recursos comuns internaliza os criteacuterios de promoccedilatildeo da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica na produccedilatildeo-reproduccedilatildeo-superaccedilatildeo da siacutendrome
de violecircncia estrutural que caracteriza a dinacircmica de globalizaccedilatildeo
assimeacutetrica Por sua vez o enfoque de ecodesenvolvimento territorial
focaliza este debate de uma perspectiva mais ampla insistindo na
complexidade envolvida na construccedilatildeo de dinacircmicas territoriais de
desenvolvimento ecologicamente prudente no atual cenaacuterio ldquopoacutes-
fordistardquo
O capiacutetulo estaacute dividido em quatro seccedilotildees contando com essa
introduccedilatildeo A seccedilatildeo seguinte delineia o contexto de emergecircncia da
problemaacutetica socioambiental e do enfoque de ecodesenvolvimento Na
sequecircncia satildeo apresentadas as dimensotildees do conceito sistecircmico de meio
ambiente assumidas pelos estudiosos do ecodesenvolvimento
relacionando-as com as maneiras pelas quais as linhas de reflexatildeo sobre
gestatildeo de recursos comuns ecodesenvolvimento territorial e justiccedila
ambiental e ecoloacutegica focalizam suas anaacutelises Finalmente na quarta
seccedilatildeo avaliam-se as possibilidades e os limites de um esforccedilo de
hibridizaccedilatildeo dessas vaacuterias linhas de reflexatildeo tendo em vista uma
caracterizaccedilatildeo mais rigorosa do conceito de co-gestatildeo adaptativa face agraves
novas configuraccedilotildees do processo de globalizaccedilatildeo econocircmica e cultural
61
21 RESGATE DO ENFOQUE ldquoCLAacuteSSICOrdquo DE
ECODESENVOLVIMENTO
Mar que se encontra na beira do mar congelado do
Norte No inverno todas as palavras e sons da
regiatildeo satildeo congelados na primavera comeccedilam a
degelar e podem ser claramente ouvidos Os
viajantes podem apanhar as palavras congeladas
que se parecem com doces cristalizados de vaacuterias
cores (Franccedilois Rabelais 1991)
A percepccedilatildeo de que a crise socioambiental decorre
fundamentalmente da reproduccedilatildeo de um estilo de desenvolvimento que
hipertrofia a dimensatildeo do crescimento econocircmico ilimitado e eacute
insensiacutevel a uma avaliaccedilatildeo multidimensional de custos sociais e
ecoloacutegicos passou a ser discutida em vaacuterios encontros internacionais
desde o final da deacutecada de 1960 Vaacuterios termos foram sendo criados nos
debates que vecircm sendo conduzidos desde entatildeo Alguns deles foram
esquecidos e outros foram ressignificados visando pontuar as criacuteticas
mais ou menos radicais ao modelo neoliberal hegemocircnico O resgate
dessa polissemia contribui para alimentar a reflexatildeo contemporacircnea e o
aprendizado obtido ao longo das quatro uacuteltimas deacutecadas na concepccedilatildeo
de estrateacutegias de superaccedilatildeo deste modelo Alguns termos atualizam o
modelo de desenvolvimento hegemocircnico incorporando marginalmente
a questatildeo socioecoloacutegica outros se abrem a experimentaccedilotildees criativas
com projetos que subvertem o mainstream da economia do
desenvolvimento O ecodesenvolvimento e o desenvolvimento
sustentaacutevel tratados nessa seccedilatildeo representam dois contrapontos desse
movimento sem duacutevida incerto e controvertido
Maurice Strong utilizou pela primeira vez o conceito de
ecodesenvolvimento no contexto da Conferecircncia de Estocolmo
organizada pela ONU em 1972 A ideia foi reelaborada e sistematizada
de forma pioneira num artigo publicado por Ignacy Sachs em 19741 na
eacutepoca atuando como coordenador do primeiro coletivo interdisciplinar
de pesquisa sistecircmica voltada para a internalizaccedilatildeo da variaacutevel
socioecoloacutegica no campo das teorias do desenvolvimento Deste ponto
1 Em um estudo que foi realizado no acircmbito do Programa das Naccedilotildees Unidas
para o Meio Ambiente (PNUMA) no ano referido e reproduzido em Sachs
(1986 2007)
62
de vista a noccedilatildeo de ecodesenvolvimento foi veiculada como uma
resposta possiacutevel de caraacuteter experimental agrave ideologia que identifica o
desenvolvimento com a supervalorizaccedilatildeo do crescimento econocircmico
sobre o pano de fundo de uma visatildeo tecnocraacutetica dos sistemas de
planejamento e gestatildeo Na contramatildeo do modelo de desenvolvimento
hegemocircnico o enfoque de ecodesenvolvimento foi desenhado com base
numa plataforma normativa composta pelos seguintes criteacuterios
interdependentes (i) satisfaccedilatildeo de necessidades baacutesicas (materiais e
intangiacuteveis) (ii) autonomia local (ou self reliance) (iii) prudecircncia
ecoloacutegica e (iv) eficiecircncia econocircmica a ser reavaliada com base no
debate sobre limites do crescimento material e da prospectiva ecoloacutegica
(SACHS 1986)
O Coloacutequio de Cocoyoc realizado no Meacutexico em 1974
significou uma tentativa bem sucedida de reenfatizar a importacircncia da
dimensatildeo geopoliacutetica na estruturaccedilatildeo do arcabouccedilo metodoloacutegico do
enfoque de ecodesenvolvimento Acreditava-se assim que ldquouma luta
efetiva contra o subdesenvolvimento demandaria o questionamento do
sobredesenvolvimento dos ricosrdquo (SACHS 2009 p 243) Naquela
eacutepoca falar em contracultura e natildeo-crescimento em natildeo repetir nos
paiacuteses do Sul o mesmo caminho percorrido pelos paiacuteses
industrializados num cenaacuterio marcado pela Guerra Fria parecia no
miacutenimo um gesto inconsequente e provocativo Desde entatildeo o conceito
foi eclipsado no acircmbito do sistema onusiano Mas ressurgiu com novas
roupagens vinte anos depois por ocasiatildeo da Cuacutepula da Terra Os
conceitos de desenvolvimento sustentaacutevel e Agenda 21 passaram a
representar os dois principais pontos de referecircncia do debate social
voltado para o enfrentamento da crise global (SACHS 2009 SACHS
2007 VIEIRA 2005)
Seria importante salientar que o Relatoacuterio Nosso Futuro Comum
publicado pela Comissatildeo Brundtland em1987 contribuiu para
aprofundar a discussatildeo em torno do conceito de sustentabilidade Este
texto enfatiza a necessidade de se colocar em primeiro plano nas
agendas governamentais a busca de satisfaccedilatildeo das necessidades da
geraccedilatildeo atual mas sem desconsiderar as geraccedilotildees futuras (CMMAD
1988)
Existem certamente semelhanccedilas entre os conceitos de
ecodesenvolvimento e desenvolvimento sustentaacutevel na medida em que
ambos colocam em primeiro plano a adoccedilatildeo de uma visatildeo de longo
prazo na busca de enfrentamento da crise socioecoloacutegica e de uma
63
incorporaccedilatildeo sistemaacutetica dos atores locais nos processos de tomada de
decisatildeo sobre dinacircmicas alternativas de desenvolvimento Mas apesar
das semelhanccedilas existem diferenccedilas marcantes que tecircm sido objeto de
um volume crescente de contribuiccedilotildees acadecircmicas As mais importantes
referem-se ao contraste entre a radicalidade embutida na cosmovisatildeo
sistecircmico-complexa assumida pelos adeptos do ecodesenvolvimento e o
vieacutes de ldquoeconomicizaccedilatildeo da ecologiardquo que continua a nortear as
propostas dos arquitetos de uma ldquoeconomia verderdquo Satildeo evidentes os
reflexos desse debate na maneira de se levar em conta as assimetrias
Norte-Sul a promoccedilatildeo da equidade inter e transgeracional os riscos
embutidos nas inovaccedilotildees tecnoloacutegicas inspiradas na siacutendrome de
mercantilizaccedilatildeo indiscriminada de todas as dimensotildees da vida em
sociedade e a hipertrofia da economia de mercado na dinacircmica de
mundializaccedilatildeo
A experimentaccedilatildeo de estrateacutegias de ecodesenvolvimento vem sendo
associada ao questionamento dos fundamentos epistemoloacutegicos eacuteticos e
poliacuteticos do modelo de desenvolvimento que se tornou hegemocircnico nos
dois hemisfeacuterios para aleacutem da ldquooacutetica simplificadora e alienada dos
paradigmas culturais dominantesrdquo (VIEIRA 2005 p 357) Dessa
forma contesta o efeito de imitaccedilatildeo deste modelo pelos paiacuteses do Sul
apostando na fecundidade da pesquisa de um novo projeto civilizador
inspirado numa nova cosmologia e nos princiacutepios de ecossocioeconomia
e convivialidade (LAYRARGUES 1997 SACHS 2007 KAPP 1987
ILLICH 1973)
22 AS CONTRIBUICcedilOtildeES DE DIFERENTES ENFOQUES
Como foi sugerido o ecodesenvolvimento pode ser encarado
como ponto de partida para a reflexatildeo-elaboraccedilatildeo-implementaccedilatildeo de
novos projetos de sociedade e como ponto de convergecircncia das linhas
de reflexatildeo centradas nas noccedilotildees de gestatildeo de recursos comuns
territorializaccedilatildeo das dinacircmicas de desenvolvimento e justiccedila ambientalecoloacutegica O desenho e a concretizaccedilatildeo de estrateacutegias de
gestatildeo levam em conta as dimensotildees essenciais do conceito sistecircmico de meio ambiente incorporado ao modelo de anaacutelise de alternativas de
desenvolvimento territorializado a saber a base de recursos naturais o
espaccedilo-territoacuterio e a qualidade dos haacutebitats (GODARD SACHS 1975
SACHS 1993 1986 VIEIRA 2005 1993) Dessa forma
64
() o ambiente eacute concebido como um fornecedor
de recursos naturais e um receptor de dejetos da
accedilatildeo antroacutepica um espaccedilo-territoacuterio onde
ocorrem as interaccedilotildees entre processos sociais e
ecoloacutegicos e um haacutebitat pensado em sentido
amplo integrando a dimensatildeo da qualidade de
vida das populaccedilotildees (VIEIRA 2006 p 346)
No quadro abaixo essas dimensotildees encontram-se relacionadas
com as trecircs linhas de reflexatildeo que aqui foram incorporadas ao enfoque
de ecodesenvolvimento
Quadro 3 ndash O enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento e as
dimensotildees baacutesicas do conceito sistecircmico de meio ambiente Enfoque central Ecodesenvolvimento
Dimensotildees do
conceito de meio
ambiente
Recursos
naturais Espaccedilo-territoacuterio
Haacutebitat-
qualidade de
vida
Enfoques
complementares
Gestatildeo de
recursos comuns
Desenvolvimento
territorial
Justiccedila ambiental
e ecoloacutegica
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na perspectiva do enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento a
dimensatildeo dos recursos naturais refere-se agrave busca de preservaccedilatildeo e
economia de recursos renovaacuteveis e natildeo renovaacuteveis de valorizaccedilatildeo de
recursos locais subutilizados eou ainda desconhecidos e de promoccedilatildeo
da soberania alimentar e energeacutetica O enfoque de gestatildeo de recursos
comuns ao oferecer uma nova perspectiva de abordagem dos desafios
colocados pela regulaccedilatildeo das modalidades de acesso e uso da base de
recursos naturais pode ser tomado como um ponto de referecircncia Nessa
perspectiva o termo recurso comum avanccedila em relaccedilatildeo aos termos
recurso natural renovaacutevel e recurso natural natildeo renovaacutevel O fato de
serem renovaacuteveis ou natildeo tem relaccedilatildeo com a disponibilidade e
reprodutibilidade dos recursos O termo recurso comum envolve duas
caracteriacutesticas baacutesicas a exclusatildeo ou controle do acesso que eacute
problemaacutetica e o uso que se faz do recurso subtrai aquilo que pertence a todos que tambeacutem coloca em questatildeo o uso compartilhado (BERKES
2005a) As pesquisas em curso ressaltam a importacircncia da participaccedilatildeo
das populaccedilotildees nas tomadas de decisatildeo e da consideraccedilatildeo da
65
complexidade envolvida nas interaccedilotildees transescalares nas dinacircmicas de
planejamento e gestatildeo (VIEIRA 2005)
Por sua vez na internalizaccedilatildeo da dimensatildeo do espaccedilo-territoacuterio a
ecircnfase eacute colocada na organizaccedilatildeo territorial das atividades produtivas
tendo em vista a minimizaccedilatildeo dos desequiliacutebrios nas configuraccedilotildees
rural-urbanas ndash a exemplo do ecircxodo rural e da hiperurbanizaccedilatildeo O
ecodesenvolvimento territorial sensiacutevel agrave variaacutevel socioecoloacutegica acena
com a inclusatildeo da dimensatildeo territorial no planejamento de novas
estrateacutegias de desenvolvimento favorecendo assim o enfrentamento dos
problemas de compatibilidade entre diferentes tipos de atividades
econocircmicas e os demais aspectos que compotildeem a dinacircmica de
coordenaccedilatildeo das interaccedilotildees sociais (GODARD SACHS 1975
VIEIRA et al 2010 VIEIRA 2005)
Finalmente a dimensatildeo do haacutebitat refere-se agrave gestatildeo da qualidade
de vida das populaccedilotildees Converge para os estudos da ecologia humana e
justiccedila ambiental e ecoloacutegica que demonstram ser necessaacuterio considerar
as condiccedilotildees ambientais de existecircncia direitos sociais e trabalhistas
direitos de seguranccedila e integridade fiacutesica direitos de informaccedilatildeo
educaccedilatildeo e auto-realizaccedilatildeo direitos de participaccedilatildeo democraacutetica e
cidadania poliacutetica Neste contexto as noccedilotildees de justiccedila ambiental e
ecoloacutegica alimentam um novo tipo de questionamento da
produccedilatildeoreproduccedilatildeo das relaccedilotildees desiguais entre os seres humanos e
destes com o meio ambiente assim como dos seres humanos com as
futuras geraccedilotildees espeacutecies natildeo humanas e processos ecossistecircmicos
(DANSEREAU 1999 LEROY et al 2002 LOW GLEESON 1998
SCHLOSBERG 2009) ldquoA noccedilatildeo de justiccedila ambiental implica pois o
direito a um meio ambiente seguro sadio e produtivo para todos onde o
lsquomeio ambientersquo eacute considerado em sua totalidade incluindo suas
dimensotildees ecoloacutegicas fiacutesicas construiacutedas sociais poliacuteticas esteacuteticas e
econocircmicasrdquo (ACSELRAD MELLO BEZERRA 2009 p 16)
Em siacutentese o resgate do processo de complexificaccedilatildeo progressiva
do enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento permite a obtenccedilatildeo de
uma imagem mais niacutetida das contribuiccedilotildees oferecidas por outras linhas
de teorizaccedilatildeo sobre o planejamento de dinacircmicas alternativas de
desenvolvimento que corporificam diferentes olhares sobre a crise
socioambiental As trecircs dimensotildees do conceito de meio ambiente
mencionadas acima trazem agrave tona as inter-relaccedilotildees entre processos
naturais e sociais e a escolha de ldquofuturos possiacuteveisrdquo no campo das
dinacircmicas de desenvolvimento Mas resta incorporar agrave linha de
66
argumentaccedilatildeo os subitens correspondentes a contribuiccedilatildeo dos trecircs
enfoques ao ecodesenvolvimento
221 Gestatildeo de recursos comuns a importacircncia da aprendizagem
social adaptativa
O presente enfoque da gestatildeo de recursos comuns tem como
ponto de partida um artigo publicado por Garrett Hardin em 1968 a
Trageacutedia dos Comuns Os recursos comuns satildeo aqueles cuja exclusatildeo de
possiacuteveis usuaacuterios e cujo controle do acesso satildeo geralmente
problemaacuteticos e seu uso envolve subtraccedilatildeo eou rivalidade - que coloca
o problema do uso compartilhado Natildeo haacute um consenso na literatura dos
comuns sobre quais recursos podem ser considerados recursos comuns
Para Berkes (2005) incluem-se entre os recursos comuns peixes
animais selvagens florestas pastagens comunitaacuterias sistemas de
irrigaccedilatildeo aacutegua subterracircnea selvas parques espaccedilos puacuteblicos e
excluem-se as terras agricultaacuteveis e a mineraccedilatildeo Jaacute Oakerson (1992)
afirma que os comuns podem ter uma locaccedilatildeo fixa (mineacuterios) ou pode
ser moacuteveis (como peixes e animais selvagens) Em alguns casos
(oceanos atmosfera) satildeo indivisiacuteveis e natildeo podem ser apropriados de
forma privada e em outros casos (pasto) satildeo organizados como
recursos comuns de acordo com a opccedilatildeo social Os padrotildees de
organizaccedilatildeo variam conforme o lugar e a cultura
A modernidade ocidental transformou a natureza
em ldquoambienterdquo simples cenaacuterio no centro do qual
reina o homem que se autoproclama ldquodono e
senhorrdquo Esse ambiente cedo perderaacute toda a
consistecircncia ontoloacutegica sendo desde logo
reduzido a um simples conservatoacuterio de recursos
antes de se tornar depoacutesito de resiacuteduos (OST
1995 p 10)
O enfoque eacute aqui considerado na perspectiva da gestatildeo integrada
de recursos naturais pois um recurso comum natildeo pode ser gerido
independentemente de outras partes do sistema e de outros recursos
(BERKES 2005a VIEIRA BERKES SEIXAS 2005 VIEIRA
67
WEBER 1997)2 Esse posicionamento converge para o enfoque
patrimonial de recursos naturais desenvolvido na Franccedila Dessa forma
ldquoa qualidade da natureza deve se tornar o lsquobem comumrsquo do conjunto da
sociedaderdquo (OLLAGNON 1997 p 172) No enfoque patrimonial os
recursos satildeo considerados na perspectiva da gestatildeo integrada
Evidecircncias de maacute gestatildeo e prescriccedilotildees de soluccedilotildees convencionais
na gestatildeo de recursos comuns tecircm se avolumado no periacuteodo recente Haacute
falhas em reconhecer a importacircncia das interaccedilotildees entre niacuteveis e escalas
persistecircncia na fragmentaccedilatildeo dos sistemas socioambientais e omissatildeo
em reconhecer a heterogeneidade da percepccedilatildeo das escalas pelos
diferentes atores sociais envolvidos na gestatildeo Isso pode resultar em
poliacuteticas amplas que constrangem poliacuteticas locais accedilotildees locais
desvinculadas de problemas mais amplos soluccedilotildees de curto prazo que
acirram problemas de longo prazo pesquisas cientiacuteficas que enfatizam
apenas um niacutevel e raramente analisam as interaccedilotildees sociais e ecoloacutegicas
do fenocircmeno entre niacuteveis (CASH et al 2006 FENNY et al 2001
HOLLING BERKES FOLKE 1998)
O enfoque da gestatildeo de recursos comuns vem evoluindo atraveacutes
do enfoque da co-gestatildeo e da gestatildeo adaptativa A co-gestatildeo enfatiza a
partilha do poder e responsabilidade entre governo e usuaacuterios e a gestatildeo
adaptativa enfatiza a aprendizagem Ambos vecircm evoluindo em direccedilatildeo agrave
co-gestatildeo adaptativa (BERKES 2009)
Como parte do esforccedilo coletivo dos pesquisadores alinhados com
o enfoque dos comuns vem se desenvolvendo o Institutional Framework for Policy Analysis and Design (IAD) desde a deacutecada de 1970
Inicialmente o modelo de anaacutelise IAD foi utilizado no estudo de
poliacuteticas puacuteblicas em aacutereas metropolitanas e em 1985 Ronald Oakerson
adaptou o IAD aos recursos comuns apresentando o modelo num painel
da Academia Nacional de Ciecircncias (HESS OSTROM 2005)
Oakerson (1992) distingue quatro atributos ou variaacuteveis que
podem ser usadas para descrever os recursos comuns atributos fiacutesicos e
tecnoloacutegicos as regras em uso que governam as relaccedilotildees entre usuaacuterios
a arena de accedilatildeo que envolve a escolha de estrateacutegias e a interaccedilatildeo entre
os envolvidos na gestatildeo e os resultados e consequecircncias O quadro
2 Aqui eacute feita a opccedilatildeo pelo enfoque da gestatildeo de recursos comuns mas outra
possibilidade seria via teoria da regulaccedilatildeo explorada por Drummond e Marsden
(1995)
68
conceitual eacute uma ferramenta heuriacutestica para pensar a loacutegica da situaccedilatildeo e
considerar possibilidades alternativas
Com base em Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992) segue uma breve descriccedilatildeo do modelo de anaacutelise
adaptado a co-gestatildeo adaptativa3
Atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos A natureza fiacutesica e tecnoloacutegica
determinam as limitaccedilotildees e possibilidades de uso do recurso comum
Esses atributos compreendem o tamanho localizaccedilatildeo limites
capacidade e abundacircncia do recurso A tecnologia determina a forma
como se lida com o recurso e com os demais fatores relacionados
Regras em uso O segundo conjunto de atributos no modelo de
anaacutelise consiste nas regras que estruturam as escolhas individuais e
coletivas em relaccedilatildeo aos recursos comuns
Arena de accedilatildeo As regras natildeo satildeo garantia da emergecircncia de
novos padrotildees de comportamento Entre as regras e os comportamentos
observados existe uma distacircncia A arena de accedilatildeo eacute um espaccedilo
conceitual no qual os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais se
informam consideram cursos de accedilatildeo alternativos tomam decisotildees
agem e experienciam as consequecircncias de suas accedilotildees A arena de accedilatildeo
conta com dois aspectos interligados a situaccedilatildeo de accedilatildeo e os segmentos
que interagem na situaccedilatildeo de accedilatildeo A situaccedilatildeo de accedilatildeo enfatiza como as
pessoas cooperam ou natildeo cooperam entre si em vaacuterias circunstacircncias Agrave
anaacutelise da situaccedilatildeo da accedilatildeo eacute necessaacuteria a identificaccedilatildeo dos envolvidos e
os papeacuteis que desempenham na gestatildeo do recurso comum
Resultados eou consequecircncias A observacircncia dos resultados
eou consequecircncias eacute fundamental para avaliar o sistema de gestatildeo
encorajando a inovaccedilatildeo e a aprendizagem adaptativa
As relaccedilotildees entre essas macro variaacuteveis satildeo o principal foco dos
estudos A Figura 2 traz modelo de anaacutelise e como as macro variaacuteveis se
relacionam umas com as outras Os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos e as
regras em uso afetam a arena de accedilatildeo e os resultados e consequecircncias
As linhas soacutelidas a e b representam fortes conexotildees causais
compreendendo que o comportamento individual eacute constrangido mas
natildeo determinado pelo mundo biofiacutesico e pelas regras As linhas soacutelidas
3 Outra opccedilatildeo seria utilizar o modelo de anaacutelise dos ciclos adaptativos descrito
no artigo de Holling (2001) e na coletacircnea organizada por Gunderson e Holling
(2002)
69
c e d representam fortes relaccedilotildees Os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos
afetam os recursos comuns de duas formas afetam a arena de accedilatildeo e
caso natildeo sejam considerados na arena de accedilatildeo podem afetar diretamente
os resultados As regras em uso por sua vez natildeo tecircm efeito nos
resultados independente da escolha humana No longo prazo a interaccedilatildeo
entre as macro variaacuteveis eacute marcada pelas linhas tracejadas Dessa forma
o movimento eacute incorporado no modelo na forma de aprendizagem social
adaptativa
Figura 2 - Modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns ajustado
a co-gestatildeo adaptativa
Fonte Baseado em Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
A aprendizagem social adaptativa marcada principalmente pela
retroalimentaccedilatildeo (linhas tracejadas) presente no modelo de anaacutelise da
gestatildeo de recursos comuns eacute um processo interativo e contiacutenuo No
entanto por ser um processo coletivo a cooperaccedilatildeo entre os envolvidos
na gestatildeo pode ser difiacutecil devido agrave distribuiccedilatildeo de poder tanto nos
segmentos sociais quanto nos segmentos poliacuteticos e entre eles
(BERKES 2009) A expectativa eacute que a aprendizagem leve a accedilatildeo
coletiva agrave mudanccedila institucional na forma de regras leis costumes e
normas As abordagens do aprendizado social visam encontrar formas
70
nas quais as pessoas possam transcender as normas sociais valores e
formas tradicionais de pensar os problemas convergindo para mudanccedilas
socioecoloacutegicas e desempenhando um papel direto no estiacutemulo da
inovaccedilatildeo institucional (CUNDILL 2010)
No campo da co-gestatildeo adaptativa a aprendizagem eacute definida
como a reflexatildeo e accedilatildeo coletiva que tem lugar entre indiviacuteduos e grupos
quanto trabalham para melhorar a gestatildeo das relaccedilotildees entre sistemas
sociais e ecoloacutegicos Aiacute entram em cena os niacuteveis de aprendizagem
aprendizagem em circuito simples duplo e triplo A aprendizagem em
circuito simples se refere a melhorar as accedilotildees estrateacutegias e praacuteticas que
ocorrem num grupo envolvido num projeto de gestatildeo de recursos
comuns A aprendizagem em circuito duplo envolve o questionamento
dos pressupostos e dos modelos mentais que apoiam a seleccedilatildeo de
estrateacutegias particulares e accedilotildees Isto eacute particularmente importante nos
processos colaborativos onde diferentes formas de conhecimento e
modelos mentais estatildeo juntos Na aprendizagem em circuito triplo a
aprendizagem ocorre quando os valores e normas que sustentam as
hipoacuteteses satildeo questionados e refletidos Isto leva a um entendimento
mais profundo do contexto dinacircmicas de poder valores que influenciam
a capacidade de gerir os recursos comuns (CUNDILL 2010)4
A ecircnfase da gestatildeo de recursos comuns eacute na anaacutelise dos modos de
apropriaccedilatildeo e dos sistemas de gestatildeo e neste sentido a cooperaccedilatildeo entre
instituiccedilotildees situadas em diversas escalas e niacuteveis torna-se um elemento
fundamental Inuacutemeras atividades humanas tecircm causas e consequecircncias
que podem ser medidas em niacuteveis diferentes ao longo de muacuteltiplas
escalas Os multi-niacuteveis e as multi-escalas e a transescalaridade dos
problemas relacionados com as dimensotildees humanas das mudanccedilas
globais demandam que pesquisadores abordem questotildees-chave de
escalas e niacuteveis em suas anaacutelises Se a arena de accedilatildeo compreende
tambeacutem as relaccedilotildees que se estabelecem entre os vaacuterios niacuteveis de uma
mesma escala a gestatildeo refere-se a arranjos por meio dos quais o poder
decisoacuterio e as responsabilidades decorrentes satildeo compartilhados entre os
atores envolvidos nas vaacuterias escalas espaciais (CASH et al 2006
BERKES 2005b DIETZ et al 2002 GIBSON OSTROM AHN
2000)
4 A aprendizagem em circuito triplo converge para o engajamento reflexivo e a
reflexividade ecoloacutegica (SCHLOSBERG 2009)
71
222 Ecodesenvolvimento territorial os recursos comuns no
contexto do desenvolvimento
Na tentativa de incorporar ao presente o que o passado nos traz
como bagagem vaacuterios autores vecircm descortinando novas vias de anaacutelise
criacutetica das limitaccedilotildees do conceito de desenvolvimento sustentaacutevel que
tem sido apropriado pelos arautos da globalizaccedilatildeo neoliberal desde o
iniacutecio dos anos 1990
Ignacy Sachs escreve sobre desenvolvimento e meio ambiente haacute
vaacuterias deacutecadas e tem acompanhado as mudanccedilas que aconteceram ao
longo da histoacuteria Para unir os enfoques do ecodesenvolvimento e do
desenvolvimento sustentaacutevel ele distingue no ecodesenvolvimento as
cinco dimensotildees da sustentabilidade sustentabilidade social
sustentabilidade econocircmica sustentabilidade ecoloacutegica sustentabilidade
espacial e sustentabilidade cultural Mais recentemente tem utilizado os
termos desenvolvimento territorial integrado e sustentaacutevel ou ainda
desenvolvimento includente sustentaacutevel sustentado (RIBEIRO 2005
SACHS 2004 2002 1993)
Nos uacuteltimos anos Paulo Freire Vieira tem utilizado o termo
desenvolvimento territorial sustentaacutevel e mais recentemente
ecodesenvolvimento territorial tendo como ideia central o
ecodesenvolvimento agregando tambeacutem o enfoque da gestatildeo de
recursos comuns e os estudos territoriais Nas palavras de Pierre
Dansereau (2005 p 523) Paulo Freire Vieira deu ldquoum novo tom agrave
Sociologia um desembaraccedilo maior agrave experiecircncia em quadros teoacutericos
ampliadosrdquo Nessa linha o conceito emergente de ecodesenvolvimento
territorial leva em conta os riscos de desvio economicista e tecnocraacutetico
nos estudos sobre dinacircmicas territoriais de desenvolvimento
enfatizando a criaccedilatildeo de sistemas de gestatildeo compartilhada e adaptativa
de recursos comuns e a governanccedila territorial Deste ponto de vista
ainda em construccedilatildeo trata-se de favorecer ao maacuteximo possiacutevel a gestatildeo
das conexotildees institucionais transescalares evitando soluccedilotildees
reducionistas e uniformizadoras aleacutem de escalas fixas (GODARD
1997 SACHS 2002 VIEIRA 2010 2009 2005 2006 VIEIRA CAZELLA CERDAN 2006)
A noccedilatildeo de territoacuterio incorporada recentemente ao debate sobre
desenvolvimento amp ambiente designa processos de criaccedilatildeo coletiva e
institucional e as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento
72
ecologicamente prudente pressupotildeem o resgate dos criteacuterios de
endogeneidade descentralizaccedilatildeo e autonomia local (pensada
sistemicamente) assumidos como elementos constitutivos do enfoque
ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento (VIEIRA et al 2010 VIEIRA
2006)
O ecodesenvolvimento territorial traz agrave gestatildeo de recursos
comuns a preocupaccedilatildeo com o estilo de desenvolvimento conforme
demonstrado na Figura 3 Mas partindo do pressuposto que a gestatildeo de
recursos comuns eacute um dos principais componentes na interaccedilatildeo
sociedade e natureza capaz de assegurar seu bom funcionamento seu
melhor rendimento sua perenidade e desenvolvimento ela deveria estar
a montante e natildeo a jusante das principais opccedilotildees de desenvolvimento
(GODARD 1997) Todavia seraacute mantido o estilo de desenvolvimento
como mais amplo para reforccedilar a ideia de que a gestatildeo de recursos
comuns precisa considerar o estilo de desenvolvimento assumindo cada
vez mais a responsabilidade da criacutetica e da mudanccedila
Figura 3 - Primeira adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa
Fonte Adaptado de Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
73
A anaacutelise do contexto e do discurso presente na gestatildeo de
recursos comuns explicita os fatores endoacutegenos e exoacutegenos das
dinacircmicas de desenvolvimento demonstrando seus limites e margens de
manobra
O problema natildeo se identifica tanto com a
preocupaccedilatildeo em se especificar o niacutevel de
responsabilidade ideal mas antes com o
entendimento daquelas formas de interaccedilatildeo entre
os diversos niacuteveis territoriais que tornariam
possiacutevel uma decisatildeo que levasse em conta ao
mesmo tempo os interesses e objetivos locais
regionais e nacionais ou mesmo internacionais
(GODARD 1997 p 237)
Para colocar em praacutetica estrateacutegias alternativas de
desenvolvimento eacute importante reequilibrar a transferecircncia de poder e a
comunicaccedilatildeo entre o local o regional e o nacional e integrar as vaacuterias
dimensotildees das estrateacutegias de desenvolvimento (social econocircmica
ecoloacutegica espacial e cultural) ldquoAgrave luz do princiacutepio da co-gestatildeo
adaptativa os sistemas de planejamento e gestatildeo deveratildeo se abrir cada
vez mais a um padratildeo de envolvimento autecircntico da sociedade civilrdquo
(VIEIRA 2005 p 366)
223 Justiccedila ambiental e justiccedila ecoloacutegica os caminhos da
democracia
O movimento por justiccedila ambiental teve origem nos Estados
Unidos em 1982 com um conflito em Afton na Carolina do Norte Na
iminecircncia de instalaccedilatildeo de um depoacutesito de bifenilpoliclorinato que
contaminaria a aacutegua que abastecia a cidade a populaccedilatildeo organizou
protestos Como a populaccedilatildeo de Afton era composta de 84 de negros e
negras o movimento se desenvolveu como uma reaccedilatildeo expliacutecita agrave
atenccedilatildeo inadequada dos movimentos ambientalistas agrave questatildeo da raccedila e
da classe social Os princiacutepios da justiccedila ambiental ofereceram ao ambientalismo possibilidades de pensar classe social e raccedila junto com
questotildees ambientais combatendo o abuso de corporaccedilotildees poluentes e o
abuso do proacuteprio Estado (ACSELRAD 2009 ACSELRAD MELLO
BEZERRA 2009 SZE LONDON 2008)
74
Desde entatildeo as pesquisas sobre justiccedila ambiental contribuiacuteram
para ampliar a discussatildeo sobre a necessidade de um enfoque consistente
de anaacutelise deste fenocircmeno Aleacutem de vaacuterias aacutereas de conhecimento
(geografia radical geografia criacutetica e economia poliacutetica entre outras)
passaram a ser mobilizados dados relacionados a diferentes grupos
raciais e eacutetnicos aleacutem de disparidades associadas a gecircnero e idade Mais
recentemente as reflexotildees sobre justiccedila ecoloacutegica conduziram o
enfoque a um niacutevel cada vez mais alto de abrangecircncia e abstraccedilatildeo
(BYRNE MARTINEZ GLOVER 2002 HOLIFIELD PORTER
WALKER 2009 SZE LONDON 2008)
O conceito de injusticcedila ambiental designa uma distribuiccedilatildeo
desproporcional dos riscos e danos ambientais devido agrave implantaccedilatildeo de
projetos industriais homogeneizadores do espaccedilo bem como de
poliacuteticas globais que impactam negativamente as camadas mais
vulneraacuteveis da sociedade Trata-se de uma siacutendrome recorrente que
transcende a simples distribuiccedilatildeo de riscos ambientais delimitados
localmente refletindo tambeacutem o reconhecimento de que as poliacuteticas
ambientais tecircm consequecircncias que atravessam as fronteiras nacionais
afetam muacuteltiplas escalas e se estendem agraves redes globais As iniciativas
que geram espaccedilos de desigualdade e injusticcedila ambiental satildeo histoacuterica e
geograficamente muito mais complexas do que parecem (ACSELRAD
MELLO BEZERRA 2009 HOLIFIELD PORTER WALKER 2009
ZHOURI 2008)
A ampliaccedilatildeo dos temas tratados pela justiccedila ambiental e o uso da
pesquisa sistecircmica refletem a percepccedilatildeo da complexidade intriacutenseca aos
problemas estudados inclusive das conexotildees transescalares - do local ao
global Alguns autores passaram a adotar o termo justiccedila ecoloacutegica entendida como aquela que afeta natildeo apenas os seres humanos mais
vulneraacuteveis mas todos os seres humanos as geraccedilotildees futuras espeacutecies
natildeo humanas e processos ecossistecircmicos (BYRNE MARTINEZ
GLOVER 2002 HOLIFIELD PORTER WALKER 2009 LOW e
GLEESON 1998 MAacuteRMORA 1992 PENtildeA 2003 SCHLOSBERG
2009 e 2004 SZE LONDON 2008 TOUCHEacute 2004)
Partindo do pressuposto de que a desigualdade socioambiental se
relaciona ao sistema poliacutetico aquela eacute apenas um sintoma de um
processo que envolve a redistribuiccedilatildeo o reconhecimento e a
representaccedilatildeo (SCHLOSBERG 2009 e 2004) A redistribuiccedilatildeo envolve
minimizar a desigualdade ambiental Jaacute o reconhecimento envolve a
consideraccedilatildeo de distintas perspectivas (das minorias eacutetnicas ldquoraciaisrdquo e
75
sexuais) O reconhecimento objetiva tambeacutem ldquodesinstitucionalizar
padrotildees de valoraccedilatildeo cultural que impedem a paridade de participaccedilatildeo
e substituiacute-los por padrotildees que a promovamrdquo (FRASER 2007 p 109)
A representaccedilatildeo torna-se central nas lutas pela redistribuiccedilatildeo e
pelo reconhecimento natildeo haacute redistribuiccedilatildeo e reconhecimento sem
representaccedilatildeo Logo os problemas na representaccedilatildeo satildeo condicionantes
da injusticcedila ambiental e ecoloacutegica (FRASER 2010 2009)
A representaccedilatildeo juntamente com a redistribuiccedilatildeo e
reconhecimento satildeo fundamentais para o fortalecimento e recriaccedilatildeo do
sistema democraacutetico e aprendizagem social adaptativa Na Figura 4
insere-se no modelo de anaacutelise a variaacutevel do fortalecimento do sistema
democraacutetico
Figura 4 - Segunda adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa
Fonte Adaptado de Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
Satildeo os mesmos caminhos que levam ao restabelecimento do
equiliacutebrio na natureza e agrave construccedilatildeo da democracia na sociedade ldquoO
pensamento democraacutetico estaacute desafiado a pensar o desenvolvimento de
toda a humanidade em harmonia com a naturezardquo (SOUZA 1992 p
76
13) Cabe questionar ldquosob que condiccedilotildees eacute de se esperar que a
democracia produza resultados poliacuteticos justosrdquo (VITA 2003 p 111)
A democracia representativa vem sendo alvo de inuacutemeras
criacuteticas economicizaccedilatildeo do poliacutetico incapacidade de cumprir com suas
promessas fundamentais (governo do povo igualdade poliacutetica
participaccedilatildeo dos cidadatildeos na tomada de decisatildeo) a falta de controle da
representaccedilatildeo e a crescente desconfianccedila dos cidadatildeos na democracia
(MANIN et al 2006 MIGUEL 2005 ROSANVALLON 2006
SCHUMPETER1984)
Jaacute a democracia participativa pretende alcanccedilar uma democracia
digna de seu nome (MIGUEL 2005) A consciecircncia do custo do
crescimento econocircmico da produccedilatildeo das desigualdades e da apatia
poliacutetica podem ser consideradas brechas para a democracia participativa
e a expansatildeo e aprofundamento da participaccedilatildeo pode ser uma estrateacutegia
promissora para desafiar as desigualdades as assimetrias de interesses e
as hierarquias sociais e poliacuteticas tradicionais (FUNG COHEN 2007
PATEMAN 1992) Todavia ldquo() o principal problema quanto agrave
democracia participativa natildeo eacute quanto a fazecirc-la funcionar mas como
atingi-lardquo (MACPHERSON 1978 p 101)
A ecologia e a democracia se determinam mutuamente ldquo() seja
pela accedilatildeo dos condicionantes soacutecio-poliacuteticos da degradaccedilatildeo ambiental
seja pela prevalecircncia das bases ambientais da desigualdade socialrdquo
(ACSELRAD 1992a p 10) Para compreender essa relaccedilatildeo eacute preciso
identificar e entender a origem das contradiccedilotildees na incorporaccedilatildeo da
questatildeo ambiental pelo Estado e a correlaccedilatildeo de forccedilas sociais em
confronto pelo controle dos recursos
Os estudos sobre justiccedila ambiental identificam como causas da
injusticcedila ambiental as redes de influecircncia (baseadas em alianccedilas entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos) a desinformaccedilatildeo e a neutralizaccedilatildeo
da criacutetica potencial Na linha de questionamento entre as accedilotildees que
buscam reverter quadros de injusticcedilas ambientais estatildeo a produccedilatildeo do
conhecimento proacuteprio a pressatildeo pela aplicaccedilatildeo universal das leis a
pressatildeo pelo aperfeiccediloamento da legislaccedilatildeo de proteccedilatildeo ambiental a
pressatildeo por novas racionalidades no exerciacutecio do poder estatal a introduccedilatildeo de procedimentos de avaliaccedilatildeo de equidade ambiental e a
accedilatildeo direta e difusatildeo espacial do movimento (ACSELRAD MELLO
BEZERRA 2009 GRAZIANO 1997) A base de um modelo mais
justo envolveria a democratizaccedilatildeo do controle dos recursos naturais a
77
desprivatizaccedilatildeo do meio ambiente assegurando o caraacuteter puacuteblico do
patrimocircnio comum (ACSELRAD 1992a)
O desafio consiste em identificar os limites da representaccedilatildeo e da
participaccedilatildeo identificando experiecircncias que caminhem na direccedilatildeo de
uma recuperaccedilatildeo da autonomia (CASTORIADIS COHN-BENDIT
PUacuteBLICO DE LOUVAIN-LA-NEUVE 1981 ILLICH 1973) da
construccedilatildeo de uma democracia cognitiva (MORIN 2002 THEYS
1997) de uma cidadania terrestre (MORIN KERN 2000) de uma
cidadania ecoloacutegica (DOBSON 2003) de uma ecologia da
transformaccedilatildeolibertaccedilatildeo (HATHAWAY BOFF 2012) A direccedilatildeo
apontada a partir dos termos indicados eacute exigente e implica reconhecer
o caraacuteter indissociaacutevel da natureza e da comunidade seres humanos natildeo
humanos e a Terra em uma concepccedilatildeo alargada de justiccedila
(SCHLOSBERG 2009)
23 LIMITES E POSSIBILIDADES DO ECODESENVOLVIMENTO
REVISITADO
De todos os objetos os que mais amo satildeo os
usados () Impregnado do uso de muitos a
miuacuteda transformados foram aperfeiccediloando suas
formas e se fizeram preciosos porque tecircm sido
apreciados muitas vezes (Bertolt Brecht
Antologia Poeacutetica 1982 p 58)
A procura da harmonizaccedilatildeo entre desenvolvimento e gestatildeo de
longo prazo do meio ambiente natildeo pode ser feita de maneira isolada
pois se trata de uma reflexatildeo global sobre a viabilidade de novos estilos
de desenvolvimento baseados no pensamento sistecircmico-complexo
(GODARD SACHS 1975 VIEIRA 2006) Este capiacutetulo insere-se
nessa linha de reflexatildeo ao tratar a atualidade do ecodesenvolvimento
aplicado agrave gestatildeo de recursos comuns
O ecodesenvolvimento eacute o eixo central do modelo de anaacutelise
trazendo em si a criacutetica do modelo hegemocircnico de desenvolvimento e a
preocupaccedilatildeo com a criaccedilatildeo de novos projetos civilizatoacuterios Para tanto eacute preciso considerar o meio ambiente como relaccedilatildeo e natildeo como objeto
Suas dimensotildees os recursos naturais o espaccedilo-territoacuterio e o haacutebitat
colocam no centro as relaccedilotildees que os seres humanos estabelecem entre
si e com o meio Os conceitos de co-gestatildeo adaptativa
78
ecodesenvolvimento territorial e justiccedila ambiental e ecoloacutegica vecircm
sendo incorporados ao modelo de anaacutelise ldquoclaacutessicordquo ampliando o seu
potencial heuriacutestico no enfrentamento da crise socioecoloacutegica global
O enfrentamento envolve mais adaptaccedilatildeo que controle poliacuteticas
flexiacuteveis integradas e adaptativas gestatildeo e planejamento voltados agrave
aprendizagem acompanhamento concebido como uma parte de
intervenccedilotildees ativas para conseguir compreender e identificar respostas
aos problemas natildeo a vigilacircncia pela vigilacircncia investimentos ecleacuteticos
em ciecircncia participaccedilatildeo dos cidadatildeos e parceria na construccedilatildeo de uma
ciecircncia mais cidadatilde evitando a informaccedilatildeo passiva (HOLLING 1995)
O desenvolvimento de uma democracia cognitiva
soacute eacute possiacutevel com uma reorganizaccedilatildeo do saber e
esta pede uma reforma do pensamento que
permita natildeo apenas isolar para conhecer mas
tambeacutem ligar o que estaacute isolado e nela
renasceriam de uma nova maneira as noccedilotildees
pulverizadas pelo esmagamento disciplinar o ser
humano a natureza o cosmo a realidade
(MORIN 2002 p 104)
O ecodesenvolvimento e os enfoques complementares ajudam a
compreender a gestatildeo de recursos comuns em relaccedilatildeo agrave sustentabilidade
dos recursos naturais as dinacircmicas de desenvolvimento e a
desigualdade ecoloacutegica A pesquisa sobre gestatildeo de recursos comuns
nessa perspectiva incorpora uma perspectiva mais ampla sobre seu
papel no modelo de desenvolvimento hegemocircnico e ao mesmo tempo
seu potencial de mudanccedila como parte integrante e importante na
proposta do ecodesenvolvimento O fundamental eacute a compreensatildeo de
que nenhum enfoque eacute completo e que para aleacutem da fragmentaccedilatildeo da
ciecircncia o diaacutelogo entre os enfoques pode oferecer insights para uma
melhor compreensatildeo dos problemas e para a construccedilatildeo de alternativas
capazes de fazer frente agrave crise sistecircmica do meio ambiente
3 GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS NO BRASIL O CARVAtildeO
MINERAL EM QUESTAtildeO
Tudo se aniquilava no fundo desconhecido das
noites obscuras soacute percebia muito ao longe os
altos-fornos e as fornalhas de coque () Era uma
tristeza de incecircndio natildeo havia no horizonte
ameaccedilador outros astros elevando-se a natildeo ser
esses fogos noturnos dos paiacuteses da hulha e do
ferro (Eacutemile Zola 1981 p 14)
O uso do carvatildeo mineral em larga escala estaacute intrinsecamente
ligada agrave Revoluccedilatildeo Industrial e com a origem do movimento dos
trabalhadores na Inglaterra como bem ilustrou Emile Zola em seu livro
Germinal e nos Estados Unidos Ele continua sendo a fonte mais
utilizada para geraccedilatildeo de energia eleacutetrica no mundo correspondendo em
meacutedia a 40 da produccedilatildeo total mundial no periacuteodo de 1973 a 2006
Segundo a Agecircncia Internacional de Energia (IEA) a posiccedilatildeo seraacute
mantida nos proacuteximos trinta anos e a discussatildeo sobre reconversatildeo da
mineraccedilatildeo do carvatildeo ainda permanece incipiente5(ANEEL 2008a
FERREIRA 2002)
No debate sobre mudanccedila ambiental global os recursos naturais
natildeo renovaacuteveis satildeo centrais Embora o petroacuteleo ocupe posiccedilatildeo
privilegiada os impactos ambientais do processo produtivo do carvatildeo
mineral eacute um ponto importante a ser considerado Os combustiacuteveis
foacutesseis continuam a dominar a matriz energeacutetica mundial apoiados por
523 mil milhotildees de doacutelares de subsiacutedios em 2011 quase 30 a mais que
em 2010 e seis vezes mais do que as fontes renovaacuteveis (OCDE IEA
2012) O carvatildeo mineral representou em 2012 195 da matriz
energeacutetica dos paiacuteses que compotildeem a Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e
Desenvolvimento Econocircmico (OCDE) e 282 da matriz mundial Em
relaccedilatildeo agrave oferta de energia eleacutetrica o carvatildeo mineral representou em
2012 14 da oferta brasileira e 417 da oferta mundial Se
consideradas as dimensotildees de sustentabilidade seguranccedila energeacutetica
equidade social e mitigaccedilatildeo dos impactos ambientais o Brasil aparece
como 53ordm lugar em 2012 Se tomadas separadamente o Brasil assume o
5 Destaca-se aqui a iniciativa da Comissatildeo das Comunidades Europeias que
teve iniacutecio em 1989 de proporcionar assistecircncia as Comunidades que queiram
adotar uma reconversatildeo econocircmica das aacutereas de mineraccedilatildeo do carvatildeo atraveacutes de
empreacutestimos e subsiacutedios (COMISSAtildeO DAS COMUNIDADES EUROPEacuteIAS
1990)
80
77ordm lugar em seguranccedila energeacutetica 65ordm em equidade social e 21ordm em
mitigaccedilatildeo dos impactos ambientais (WORLD ENERGY COUNCIL
2012)
A matriz energeacutetica brasileira teve em sua composiccedilatildeo no ano de
2012 424 de oferta de energia de fontes renovaacuteveis (biomassa da
cana hidraacuteulica e eletricidade lenha e carvatildeo vegetal e lixiacutevia dentre
outras) e 576 de fontes de energia natildeo renovaacuteveis (petroacuteleo e
derivados gaacutes natural carvatildeo mineral e uracircnio) da qual o carvatildeo
mineral tem uma participaccedilatildeo de 54 (BRASIL EPE 2013) A
presenccedila de combustiacuteveis foacutesseis na matriz energeacutetica brasileira tende a
aumentar com a exploraccedilatildeo do petroacuteleo do preacute-sal com a possiacutevel
exploraccedilatildeo do gaacutes de xisto e com o retorno do carvatildeo mineral nos leilatildeo
A-56 de 2013 Eacute urgente lidar com a questatildeo das emissotildees de gases de
efeito estufa devido agraves altas emissotildees dos combustiacuteveis foacutesseis O
carvatildeo mineral eacute o mais abundante combustiacutevel foacutessil do mundo e
tambeacutem o que mais produz gases de efeito estufa (BRASIL MME
2007 YAMAOKA et al 2013)
O Brasil no cenaacuterio mundial desponta como fornecedor global
de commodities minerais energeacuteticas e agriacutecolas Esse papel justifica a
abertura de minas de fosfato a mineraccedilatildeo de uracircnio do ferro e de outros
mineacuterios Apesar do carvatildeo mineral brasileiro ser o ldquoprimo pobrerdquo dos
mineacuterios voltado ao mercado interno eacute preciso considerar tambeacutem a
mineraccedilatildeo no geral O marco legal da mineraccedilatildeo estaacute mudando com a
regulamentaccedilatildeo da mineraccedilatildeo em terras indiacutegenas quilombolas e
ribeirinhas e a expansatildeo das mineradoras brasileiras para outros paiacuteses
A conjuntura brasileira eacute de desregulamentaccedilatildeo e de flexibilizaccedilatildeo da
normativa ambiental sem um questionamento profundo sobre as
desigualdades socioambientais existentes no territoacuterio (MALERBA
2012 MILANEZ et al 2013)
O objetivo deste capiacutetulo foi descrever as macro variaacuteveis
presentes no modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns (HESS
6 Os leilotildees foram instituiacutedos em 2005 e satildeo processos licitatoacuterios com o
objetivo de contratar energia eleacutetrica para assegurar o pleno atendimento da
demanda futura no Ambiente de Regulaccedilatildeo Controlada Os leilotildees satildeo divididos
em A-1 A-3 e A-5 Os nuacutemeros 1 3 e 5 correspondem aos anos de
antecedecircncia do iniacutecio do suprimento O Leilatildeo A-5 por exemplo envolve a
licitaccedilatildeo para contrataccedilatildeo de energia eleacutetrica de novos empreendimentos
realizado com cinco anos de antecedecircncia do iniacutecio do suprimento (MME
2014)
81
OSTROM 2005 OAKERSON 1992 POLSKI OSTROM 1992)
abordando o tema no Brasil com destaque agrave gestatildeo do carvatildeo mineral
Para tanto aleacutem de uma breve introduccedilatildeo sobre desenvolvimento
econocircmico gestatildeo de recursos comuns e energia no Brasil o capiacutetulo
traz uma caracterizaccedilatildeo dos atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso
em termos de disponibilidade usos tecnologias disponiacuteveis e impactos
As regras em uso tratam das principais leis que afetam o recurso bem
como das interfaces entre direitos ambientais e direitos humanos Em
relaccedilatildeo agrave arena de accedilatildeo eacute feita uma breve descriccedilatildeo dos envolvidos na
gestatildeo no niacutevel nacional O balanccedilo da gestatildeo de recursos comuns no
Brasil em especial do carvatildeo mineral revela ao longo desse capiacutetulo
importantes pontos a serem considerados na compreensatildeo da ampliaccedilatildeo
da geraccedilatildeo de energia eleacutetrica movida a carvatildeo mineral no Sul de Santa
Catarina e da possibilidade de surgirem caminhos alternativos para a
questatildeo energeacutetica
31 DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO GESTAtildeO DE RECURSOS
COMUNS E ENERGIA
A gestatildeo de recursos comuns em particular do carvatildeo mineral
traz agrave tona questotildees relacionadas ao desenvolvimento econocircmico e a
questatildeo energeacutetica que envolvem a atuaccedilatildeo de segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais O desafio de tratar a gestatildeo de recursos comuns
reside justamente na complexidade existente nessas inter-relaccedilotildees A
tentativa dessa seccedilatildeo eacute tratar a gestatildeo contextualizada para na
sequecircncia abordar as especificidades do carvatildeo mineral
Na eacutepoca da Repuacuteblica Velha (1889-1930) o governo era
controlado pela oligarquia rural (SCARDUA BURSZTYN 2003) Se
ateacute 1930 a teoria econocircmica pregava o livre funcionamento do mercado
com a crise mundial passou a aceitar um papel mais atuante do Estado e
tambeacutem do planejamento Os recursos comuns acompanharam essa
mesma linha de atuaccedilatildeo federal sendo marcada pelo controle federal na
disputa com elites locais Isso justificou a criaccedilatildeo de poderes setoriais e
deu lugar a burocracias especializadas (NEDER 2002) O setor eleacutetrico que antes era resultado de investimentos privados e locais sofreu
intervenccedilatildeo estatal e de empresas estrangeiras (MALAGUTI 2009)
A Ditadura Vargas (1930-1945) foi centralizada no presidente
com a dissoluccedilatildeo das representaccedilotildees poliacuteticas e baseada numa poliacutetica
82
voltada ao desenvolvimento urbano industrial e nacionalista
(SCARDUA BURSZTYN 2003) Nesse periacuteodo houve pouca
demanda por energia baseada principalmente na geraccedilatildeo de energia a
partir de fontes vegetais indicando um reduzido grau de expansatildeo das
forccedilas produtivas De 1939 em diante ocorreu a consolidaccedilatildeo da
industrializaccedilatildeo com o crescimento da atividade econocircmica e uma
participaccedilatildeo maior no uso de combustiacuteveis foacutesseis (THEIS 1990)
Durante o periacuteodo democraacutetico (1945-1964) teve lugar a
reorganizaccedilatildeo dos partidos poliacuteticos e das representaccedilotildees favorecendo a
descentralizaccedilatildeo sem uma poliacutetica especiacutefica para esse fim Na Ditadura
Militar (1964-1985) a centralidade federal voltou a ser realidade e nesse
contexto o crescimento econocircmico aconteceu a despeito dos custos
sociais e ambientais (EGLER 1997 SCARDUA BURSZTYN 2003)
A questatildeo ambiental era tratada como gestatildeo de recursos naturais com a
criaccedilatildeo de parques e reservas bioloacutegicas Com vieacutes claramente
conservacionista natildeo havia uma preocupaccedilatildeo com os impactos do
crescimento econocircmico da eacutepoca (NEDER 2002) ldquoA ideia de
desenvolvimento econocircmico penetrava a consciecircncia da cidadania
justificando cada ato de governo e ateacute de ditadura e de extinccedilatildeo da
naturezardquo (DEAN 1996 p 281)
O processo de crise na economia mundial deflagrado na deacutecada
de 1970 contou com trecircs marcos poliacuteticos o rompimento dos Estados
Unidos aos acordos de Bretton Woods em 1971 que trouxe a crise aos
paiacuteses membros da OCDE a inclusatildeo das questotildees ambientais no debate
sobre desenvolvimento estimulada pelo relatoacuterio do Clube de Roma e
pela Conferecircncia de Estocolmo em 1972 e a elevaccedilatildeo do preccedilo do
petroacuteleo em 1973 que trouxe a preocupaccedilatildeo com a questatildeo energeacutetica
Esses eventos dentre outros colocaram tambeacutem em questatildeo a regulaccedilatildeo
das relaccedilotildees econocircmicas internacionais e os mecanismos internos de
promoccedilatildeo do desenvolvimento (EGLER 1997)
Na deacutecada de 1970 aumentou a preocupaccedilatildeo com a poluiccedilatildeo
industrial todavia natildeo se alterou a relaccedilatildeo Estado-empresa (NEDER
2002) O movimento ambientalista em sua fase fundacional (1971-86)
foi dominado por uma compreensatildeo estreita da problemaacutetica ambiental
tendo como principais preocupaccedilotildees a poluiccedilatildeo industrial e a
preservaccedilatildeo dos ecossistemas naturais A conexatildeo entre a problemaacutetica
ambiental e o desenvolvimento econocircmico natildeo era percebida pelo
movimento ambientalista nessa fase (VIOLA 1992)
83
Na deacutecada de 1980 a crise do Estado e o processo de
redemocratizaccedilatildeo do paiacutes somou-se agrave discussatildeo do ldquodesenvolvimento
sustentaacutevelrdquo que se inseriu no discurso e na definiccedilatildeo de poliacuteticas Poacutes
1980 outro padratildeo de regulaccedilatildeo puacuteblica socioambiental veio se
desenvolvendo no Brasil ldquoele desloca a dicotomia estado versus capital
privado para um patamar mais complexo que amplia os dois modos
claacutessicos de coordenaccedilatildeo a ordem estatal e mercantil para incluir novas
arenas de conflitosrdquo (NEDER 2009 p 8)
Com a crise econocircmica dos anos 1980 o movimento
ambientalista passou a considerar a dimensatildeo econocircmica como
condicionante e parte da crise socioambiental Nessa mesma deacutecada
formaram-se grupos cientiacuteficos que passaram a tratar da questatildeo
ambiental Em 1981 com a aprovaccedilatildeo da Poliacutetica Nacional de Meio
Ambiente (PNMA) constituiu-se segundo o artigo 6ordm o Sistema
Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) e o CONAMA O movimento
ambientalista de 1987 a 1991 passou por uma fase de institucionalizaccedilatildeo
que envolveu uma organizaccedilatildeo maior do movimento ambientalista em
relaccedilatildeo a recursos financeiros especializaccedilatildeo dos envolvidos e com o
envolvimento com movimentos socioambientais (como o Movimento de
Atingidos por Barragens Movimento dos Seringueiros Movimentos
Indiacutegenas etc) (VIOLA 1992) Somado a isso o fim da Ditadura
Militar em 1985 e a Constituiccedilatildeo de 1988 acenavam com a volta da
democracia representativa e com novos mecanismos participativos
O governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) realizou
uma grande reforma no setor eleacutetrico marcando a transiccedilatildeo entre um
modelo de crescimento impulsionado pelo Estado para um modelo de
crescimento impulsionado pelo mercado A reforma teve como objetivos
a separaccedilatildeo das atividades de geraccedilatildeo transmissatildeo distribuiccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo privatizaccedilatildeo competiccedilatildeo na geraccedilatildeo e na
comercializaccedilatildeo e livre acesso agraves redes de transmissatildeo e distribuiccedilatildeo
(GOLDENBERG PRADO 2003) ldquoO processo de privatizaccedilatildeo do setor
eleacutetrico representou um gigantesco processo de transferecircncia de rendas
utilizando-se de dinheiro puacuteblico para beneficiar grupos empresariais e
garantir o propalado lsquosucessorsquo das privatizaccedilotildeesrdquo (BERMANN 2003
p 47) O ano de 2001 foi conhecido como o ano do ldquoapagatildeordquo Houve
falta de energia eleacutetrica causada pelo desabastecimento de aacutegua e por
uma privatizaccedilatildeo parcial na qual as estatais perderam sua capacidade de
planejamento mediante reduccedilatildeo de investimentos e o setor privado ainda
natildeo havia tomado o seu lugar (GOLDENBERG 2012a)
84
Com a vitoacuteria de Luis Inaacutecio Lula da Silva em 2002 do Partido
dos Trabalhadores (PT) para a presidecircncia da repuacuteblica houve uma
grande expectativa por parte dos movimentos sociais que possuiacuteam uma
ligaccedilatildeo histoacuterica com os partidos de esquerda especialmente o PT Lula
permaneceu na presidecircncia de 2003 a 2010 rompendo com uma
tradiccedilatildeo de eleiccedilotildees que mantinham na presidecircncia a elite tradicional
(LOSEKANN 2012) O fato de ter tido como ministra do meio
ambiente Marina Silva ligada agrave luta dos seringueiros fez com que
muitos acreditassem que o governo Lula seria um marco na poliacutetica
ambiental brasileira Mas contrariando as expectativas houve a
legalizaccedilatildeo dos transgecircnicos a transposiccedilatildeo do Rio Satildeo Francisco e a
anistia aos desmatadores O Ministeacuterio das Minas e Energia (MME) na
eacutepoca liderado por Dilma Russef atual presidenta do Brasil ressuscitou
projetos hidreleacutetricos na Amazocircnia e retomou o programa da energia
nuclear Se durante a sua histoacuteria o PT esteve receptivo agraves demandas
dos movimentos socioambientais uma vez no poder a praacutetica foi
restritiva no CONAMA a participaccedilatildeo dos movimentos sociais foi
diminuiacuteda resultando numa injusticcedila poliacutetica em relaccedilatildeo aos segmentos
poliacuteticos e empresariais A poliacutetica de desenvolvimento empreendida
pelo Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) priorizou a
pecuaacuteria mineraccedilatildeo geraccedilatildeo de energia soja cimento e celulose
causadores de impactos socioambientais e injusticcedilas ambientais e
ecoloacutegicas (LISBOA 2011)
Na Rio+20 que aconteceu em 2012 o tema central da Cuacutepula
dos Povos foi a justiccedila social e ambiental Para a Cuacutepula dos Povos natildeo
houve um balanccedilo das dificuldades e conquistas poacutes Rio-92 e a ecircnfase
na ldquoeconomia verderdquo foi uma forma de reforccedilar a acumulaccedilatildeo
capitalista que natildeo questiona ou substitui a economia baseada no uso de
combustiacuteveis foacutesseis nem nos padrotildees de produccedilatildeo industrial e
consumo crescente (CUacutePULA DOS POVOS 2012)
No governo Dilma (2011- atual) foi aprovada a mudanccedila no
Coacutedigo Florestal que estava tramitando desde 1996 ateacute ser totalmente
reformulado em 2012 Tramita tambeacutem a mudanccedila do Coacutedigo da
Mineraccedilatildeo que vai reduzir radicalmente as conquistas de grupos eacutetnicos
e comunidades tradicionais Com essas mudanccedilas instaura-se a
dominaccedilatildeo poliacutetica empresarial na qual o territoacuterio passa a ser objeto da
accedilatildeo de empresas preocupadas com as proacuteprias metas e apoiadas pela
accedilatildeo do Estado Confunde-se aiacute capitalismo com democracia e liberdade
poliacutetica com liberdade para explorar e investir (SEVAacute FILHO 2013)
No que se refere agrave matriz energeacutetica antes se pensava no que era melhor
85
para o Estado e atualmente a poliacutetica energeacutetica eacute pensada para os
empreiteiros (GOLDENBERG 2012b)
O planejamento energeacutetico no Brasil apoacutes as reformas passou a
ter uma visatildeo ldquoofertistardquo natildeo se baseia em previsotildees de demandas
Existe um emaranhado de interesses e o ldquoplanejamentordquo se eacute que pode
ser assim chamado serve aos que querem vender energia e aos que
querem comprar As empresas por sua vez aperfeiccediloam sua influecircncia
poliacutetica nos espaccedilos de poder do Estado atuando sobre os
licenciamentos ambientais mecanismos de financiamento
influenciando ateacute propostas de reforma do Estado (BERMANN 2012)
No final da deacutecada de 1980 apoacutes momentos de crescimento
econocircmico e crise houve um reposicionamento da economia da gestatildeo
de recursos comuns e da energia do fim da deacutecada de 1980 em diante
Se a PNMA de 1986 e a Constituiccedilatildeo de 1988 pareciam acenar com a
garantia aos direitos humanos e ambientais e uma preocupaccedilatildeo maior
com a participaccedilatildeo das pessoas nos processos de tomada de decisatildeo as
recentes alteraccedilotildees nas leis ambientais parecem um grande retrocesso e
a participaccedilatildeo das pessoas restrita agrave democracia representativa e a
instacircncias participativas controladas
O Estado passou a reforccedilar seu papel como indutor do
desenvolvimento capitalista direcionando investimentos em alguns
setores econocircmicos aos quais se destina financiamento subsiacutedios e
infraestrutura logiacutestica (transporte e energia) Acabou criando tambeacutem
mecanismos que asseguram o aumento no ritmo da exploraccedilatildeo de
recursos naturais e da despossessatildeo de grupos sociais com a desculpa de
gerar divisas para reduzir a pobreza e a desigualdade social ldquoEm nome
da superaccedilatildeo da desigualdade e da pobreza governos progressistas
impulsionam a expansatildeo de atividades extrativas ndash notadamente o
petroacuteleo e os mineacuterios ndash cujos custos sociais e ambientais tecircm gerado
exclusatildeo e desigualdaderdquo (MALERBA 2012 p 12-3)
O carvatildeo mineral acompanha esse movimento mais amplo com
suas especificidades que satildeo tratadas a seguir
86
32 CARACTERIZACcedilAtildeO E USOS DO CARVAtildeO MINERAL7 NO
BRASIL
A histoacuteria do carvatildeo mineral no Brasil teve iniacutecio em 1795 no Rio
Grande do Sul Ele foi descoberto por teacutecnicos ingleses que construiacuteam
ferrovias na regiatildeo do baixo Jacuiacute Durante muito tempo sua exploraccedilatildeo
foi manual passando agrave etapa da mecanizaccedilatildeo somente apoacutes a Segunda
Guerra Mundial (CHAVES 2008 GOMES et al 1998)
A mineraccedilatildeo eacute uma atividade intensiva em recursos naturais
principalmente do solo e da aacutegua competindo com outros usos dos
recursos naturais locais principalmente aqueles que dependem do meio
ambiente tais como pesca turismo agricultura etc Dentre os principais
usos do carvatildeo mineral destacam-se a produccedilatildeo de energia eleacutetrica e uso
industrial principalmente sideruacutergico O uso tem relaccedilatildeo com a
qualidade do carvatildeo medida pela capacidade de produccedilatildeo de calor
Capacidade essa que eacute favorecida pela existecircncia de carbono e
prejudicada pela quantidade de impurezas normalmente material
orgacircnico (macerais do carvatildeo) e inorgacircnicos (argilas pirita e
carbonatos) (ANEEL 2008a SAMPAIO 2002)
O Brasil natildeo tem uma cultura de uso do carvatildeo mineral como em
outros paiacuteses sua exploraccedilatildeo eacute restrita ao Sul do paiacutes outras regiotildees natildeo
convivem com a questatildeo A qualidade do carvatildeo mineral brasileiro eacute
inferior dado resultante dos altos teores de cinza e enxofre (carvatildeo de
SC e PR) e o passivo ambiental de uma exploraccedilatildeo predatoacuteria e sem
compromisso com o meio ambiente fez com que essa atividade natildeo
contasse com boa fama (CHAVES 2008)
O carvatildeo mineral de acordo com o poder caloriacutefico e a incidecircncia
de impurezas se subdivide em carvatildeo de baixa qualidade (linhito e sub-
betuminoso) e hulha (Betuminoso e Antracito) As reservas brasileiras
satildeo compostas pelo carvatildeo dos tipos linhito e sub-betuminoso que pode
ser utilizado na produccedilatildeo de energia eleacutetrica e usado industrialmente
(ANEEL 2008a) (Figura 5)
7 O carvatildeo mineral natildeo eacute um mineral no sentido estrito sendo mais correto
chamaacute-lo de carvatildeo foacutessil A opccedilatildeo pelo carvatildeo mineral se justifica na medida
em que a maior parte dos documentos e referecircncias consultadas utilizam o
termo (CHAVES 2008)
87
Figura 5 - Tipos de carvatildeo e uso
Fonte Adaptado de Aneel (2008a p 133)
A produccedilatildeo do carvatildeo mineral bruto no Brasil em 1970 foi de 55
milhotildees de toneladas chegando ao pico em 1985 com 249 milhotildees de
toneladas (MILIOLI 2009) Ateacute final da deacutecada de 1980 as sideruacutergicas
brasileiras eram obrigadas a comprar carvatildeo coqueificaacutevel nacional para
misturar com o importado Os empresaacuterios do setor contaram com as
benesses do governo federal que obrigava as sideruacutergicas a utilizarem o
carvatildeo mineral brasileiro e os consumidores do carvatildeo mineral eram
empresas governamentais Como natildeo havia diferenccedila entre o preccedilo e a
qualidade do produto as carboniacuteferas natildeo eram estimuladas a melhorar
a qualidade nem buscar tecnologia para isso
O Governo Collor rompeu com a obrigatoriedade do consumo do
carvatildeo mineral pelas metaluacutergicas e muitas mineradoras enfrentaram
problemas (CHAVES 2008) O pano de fundo para o debate eleacutetrico
dos anos 1990 principalmente durante o governo de Fernando Henrique
Cardoso era a liberalizaccedilatildeo dos preccedilos do comeacutercio e do investimento
estrangeiro a desregulamentaccedilatildeo e a privatizaccedilatildeo em grande escala
(GOLDENBERG PRADO 2003)
O carvatildeo energeacutetico passou a ser uma opccedilatildeo para a crise
enfrentada pelas carboniacuteferas As termeleacutetricas estatais foram
privatizadas ou tiveram o seu capital aberto na deacutecada de 1990 exceto a
Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica (CGTEE) Em 2013
estavam em operaccedilatildeo treze usinas termeleacutetricas em seis estados
brasileiros somando um total de 2711 Megawatts (MW) (Tabela 1)
Destaca-se nessas usinas a participaccedilatildeo de empresas estrangeiras
88
Tractebel CITIC Group (estatal chinesa em parceria com a Companhia
de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica) o Consoacutercio Alumar (formado
pelas empresas Alcoa BHP Billiton e Rio Tinto Alcan) e a ENEVA
Tabela 1 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral em
operaccedilatildeo em 2013 Brasil
Fonte ANEEL 2013
Natildeo havia nenhum empreendimento movido a carvatildeo mineral em
construccedilatildeo no ano de 2013 Existem quatro empreendimentos com
outorga no periacuteodo de 1998 a 2013 somando um total de 1445 MW
localizados nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul (Tabela
2)
Tabela 2 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral com
outorga de 1998 a 2013 Brasil
Fonte ANEEL 2013
USINAPOTEcircNCIA
(MW)MUNICIacutePIO UF PROPRIETAacuteRIO
Charqueadas 72 Charqueadas RS Tractebel
Presidente Meacutedici A B 446 Candiota RS CGTEE
Satildeo Jerocircnimo 20 Satildeo Jerocircnimo RS CGTEE
Figueira 20 Figueira PR Copel
Jorge Lacerda I e II 232 Capivari de Baixo SC Tractebel
Jorge Lacerda III 262 Capivari de Baixo SC Tractebel
Jorge Lacerda IV 363 Capivari de Baixo SC Tractebel
Alunorte 103 Nossa Senhora do Socorro SE Alumina Norte do Brasil SA
Alumar 75 Satildeo Luiacutes MA Consoacutercio Alumar
Porto do Itaqui 360 Satildeo Luiacutes MA UTE Porto do Itaqui Geraccedilatildeo de Energia SA
Porto do Peceacutem I 381 Satildeo Gonccedilalo do Amarante CE Porto do Peceacutem Geraccedilatildeo de Energia SA
Candiota III 12 Candiota RS CGTEE
Porto do Peceacutem II 365 Satildeo Gonccedilalo do Amarante CE MPX Peceacutem II Geraccedilatildeo de Energia SA
TOTAL 2711
USINAPOTEcircNCIA
(MW)MUNICIacutePIO UF PROPRIETAacuteRIO
Jacuiacute 350 Charqueadas RS Eleacutetrica Jacuiacute SA
Sul Catarinense 440 Treviso SC UTE Sul Catarinense
Concoacuterdia 5 Concoacuterdia SC Sadia
CTSUL 650 Cachoeira do Sul RS Central Termoeleacutetrica Sul SA
TOTAL 1445
89
As reservas de carvatildeo no Brasil totalizam sete bilhotildees de
toneladas ocupando o 10ordm lugar no ranking mundial podendo gerar 17
mil mw (ANEEL 2008B) Conveacutem ressaltar tambeacutem que o Brasil
produz mais energia eleacutetrica do que consome em 2011 foram
disponibilizados 5676 TeraWattshora (TWh) e consumidos 4801TWh
e em 2012 foram disponibilizados 5928TWh e consumidos 4984 TWh
A oferta de energia eleacutetrica a base de carvatildeo mineral tende a aumentar
em 53 se as usinas termeleacutetricas com outorga forem construiacutedas Com
a inclusatildeo do carvatildeo mineral nos leilotildees em 2013 parece ser uma
questatildeo de tempo para que as termeleacutetricas listadas na tabela 22 entrem
no leilatildeo e comecem a ser construiacutedas (BRASIL EPE 2013b)
33 TECNOLOGIAS DISPONIacuteVEIS E IMPACTOS
SOCIOAMBIENTAIS
Da extraccedilatildeo do carvatildeo mineral ateacute a geraccedilatildeo de energia eleacutetrica
existem diferentes processos a serem considerados a extraccedilatildeo o
beneficiamento o transporte o uso do carvatildeo mineral para geraccedilatildeo de
energia eleacutetrica e a disposiccedilatildeo dos rejeitos Cada um desses processos
envolve escolhas tecnoloacutegicas e seus impactos Nesta seccedilatildeo faz-se uma
breve exposiccedilatildeo dos meacutetodos utilizados nos processos compreendendo
que a escolha entre os meacutetodos e impactos decorrentes eacute mais
condicionada pelas leis existentes do que pelo tipo de tecnologia
disponiacutevel A escolha tem a ver com a opccedilatildeo do desenvolvimento
(BRITO 1981)
No que se refere agrave extraccedilatildeo do carvatildeo mineral os meacutetodos
utilizados satildeo a lavra a ceacuteu aberto e subterracircnea dependendo das
caracteriacutesticas geoloacutegicas No iniacutecio as lavras eram essencialmente
manuais depois passaram para uma fase semi-mecanizada e depois
mecanizada Na fase manual o impacto ambiental e a produtividade
eram menores O processo de mecanizaccedilatildeo aumentou a produccedilatildeo e com
ela uma maior destruiccedilatildeo ambiental e problemas de sauacutede (MENEZES
CAROLA 2011)
As lavras a ceacuteu aberto utilizam os seguintes meacutetodos meacutetodo de
lavras em tiras (strip mining) lavra de descobertura com escavadeiras de
arrasto (dragline stripping method) lavra em bancadasescavadeira Os
trecircs meacutetodos de formas diferentes retiram as camadas de solo e outras
formaccedilotildees sedimentares que cobrem as camadas de carvatildeo Satildeo meacutetodos
90
de baixo custo comparados aos de lavra subterracircnea mas foram as
lavras a ceacuteu aberto que causaram entre 1960 e 1970 os maiores danos
ambientais do Sul de Santa Catarina (KOPPE COSTA 2008
MENEZES CAROLA 2011 MONTEIRO 2008)
Dentre os meacutetodos de lavra subterracircnea destacam-se o meacutetodo de
cacircmaras e pilares e de frente larga No primeiro meacutetodo o carvatildeo eacute
extraiacutedo e os pilares satildeo formados pelo proacuteprio carvatildeo que sustenta a
cobertura e facilita o fluxo de ar Na medida em que a mineraccedilatildeo
avanccedila os pilares satildeo retirados e a cobertura tomba Jaacute o meacutetodo da
frente larga envolve a remoccedilatildeo total do carvatildeo e a sustentaccedilatildeo eacute feita por
macacos hidraacuteulicos O meacutetodo precisa estar adequado agrave geologia da
mina e o custo do maquinaacuterio eacute cerca de dez vezes maior que do outro
meacutetodo A lavra subterracircnea causa menos impacto visual mas os
impactos ambientais tambeacutem satildeo significativos Torna-se necessaacuterio o
descarte da aacutegua subterracircnea alterando o regime hiacutedrico e inviabiliza
outros usos do solo (KOPPE COSTA 2008 MONTEIRO 2008)
Dentre os principais impactos resultantes das lavras estatildeo as
mudanccedilas na vida da populaccedilatildeo nos recursos hiacutedricos na fauna e flora
Jaacute o processo de beneficiamento que compreende a separaccedilatildeo dos
materiais desejaacuteveis e indesejaacuteveis tem como principal causador de
impacto o rejeito (ANEEL 2008a) O Quadro 4 apresenta alguns
aspectos ambientais associados agrave atividade de mineraccedilatildeo e
processamento mineral
91
Quadro 4 - Aspectos das atividades de mineraccedilatildeo e processamento
do carvatildeo mineral Mineraccedilatildeo e
processamento
Ar Dispersatildeo de partiacuteculas
Variaccedilatildeo da composiccedilatildeo da poeira do
ar
Poeira
Solo Fontes pontuais de contaminaccedilatildeo
Geraccedilatildeo de resiacuteduos
Alteraccedilatildeo na vegetaccedilatildeo
Instabilidade de taludes
Variaccedilatildeo na morfologia do terreno
Cavidades subterracircneas
Aacutegua
superficial
Contaminaccedilatildeo quiacutemica (drenagem
aacutecida etc)
Soacutelidos em suspensatildeo
Desestabilizaccedilatildeo das margens
Alteraccedilatildeo dos cursos de aacutegua
Criaccedilatildeo de novos corpos hiacutedricos
Aacutegua
subterracircnea
Contaminaccedilatildeo quiacutemica
Alteraccedilatildeo na profundidade do niacutevel
drsquoaacutegua
Variaccedilatildeo nas propriedades dos
aquiacuteferos
Fonte CETEM (2000 p 16)
No meacutetodo mais tradicional de geraccedilatildeo de energia eleacutetrica o
carvatildeo mineral eacute queimado a altas temperaturas transformando a aacutegua da
caldeira em vapor capaz de mover a turbina gerando eletricidade Em
meacutedia as teacutermicas movidas a carvatildeo mineral produzem 700g de CO2
por Quilowatt-hora (KWh) sendo responsaacuteveis por 30 a 35 do total de
emissotildees de CO2 no mundo Aleacutem do CO2 tambeacutem emitem Nitrogecircnio
(N) (ANEEL 2008a YAMAOKA et al 2013)
As chamadas tecnologias limpas compreendem a combustatildeo
pulverizada supercriacutetica a combustatildeo em leito fluidizado e a
gaseificaccedilatildeo integrada a ciclo combinado segundo a IEA Na
combustatildeo pulverizada supercriacutetica o carvatildeo eacute queimado como partiacuteculas pulverizadas o que aumenta substancialmente a eficiecircncia da
combustatildeo e conversatildeo No processo de combustatildeo em leito fluidizado
haacute uma reduccedilatildeo de Enxofre (ateacute 90) e de Nitrogecircnio (7080) pelo
emprego de partiacuteculas calcaacuterias e de temperaturas inferiores ao processo
convencional de pulverizaccedilatildeo Jaacute a gaseificaccedilatildeo integrada a ciclo
92
combinado consiste na reaccedilatildeo do carvatildeo com vapor de alta temperatura
e um oxidante (processo de gaseificaccedilatildeo) o que daacute origem a um gaacutes
combustiacutevel sinteacutetico de meacutedio poder caloriacutefico Esse gaacutes pode ser
queimado em turbinas a gaacutes e recuperado por meio de uma turbina a
vapor (ciclo combinado) o que possibilita a remoccedilatildeo de cerca de 95
do Enxofre e a captura de 90 do Nitrogecircnio Apesar da reduccedilatildeo de
Enxofre e Nitrogecircnio as tecnologias do chamado ldquocarvatildeo limpordquo natildeo
representam uma soluccedilatildeo para a emissatildeo de gases de efeito estufa
(ANEEL 2008a MONTEIRO 2008)
Cada tecnologia tem o seu impacto Na escolha por uma
tecnologia ou outra um impacto menor natildeo eacute considerado o motivador
inicial Atender os requisitos miacutenimos da legislaccedilatildeo e ser viaacutevel do
ponto de vista econocircmico satildeo os motivadores principais das escolhas
Os interesses dos segmentos econocircmicos natildeo raro prevalecem sobre os
interesses dos segmentos sociais ldquoO planejamento pauta-se em acordos
setoriais natildeo necessariamente fruto de uma compilaccedilatildeo e mediaccedilatildeo de
interesses mais amplos da sociedaderdquo (BERMANN 2012 p 21)
O raciociacutenio eacute produzir mais e natildeo pensar em eficiecircncia
energeacutetica O paiacutes perde cerca de 20 de energia na transmissatildeo e
distribuiccedilatildeo Antes de investir em novas tecnologias e ampliar o sistema
seria interessante resolver a perda na transmissatildeo e distribuiccedilatildeo de
energia (BERMANN 2012)
34 REGRAS EM USO NUMA PERSPECTIVA HISTOacuteRICA
INTERFACE ENTRE DIREITOS AMBIENTAIS E DIREITOS
HUMANOS
O marco regulatoacuterio do carvatildeo mineral se relaciona com o modo
como a questatildeo ambiental foi sendo incorporada nas leis e numa
perspectiva mais ampla sobre como os direitos ambientais e os direitos
humanos foram sendo constituiacutedos no Brasil O desafio da justiccedila em
sua relaccedilatildeo com as poliacuteticas ambientais tem dois aspectos relacionais a
justiccedila da distribuiccedilatildeo de ambientes entre pessoas e a justiccedila da relaccedilatildeo
entre humanos e o resto do mundo natural a justiccedila ambiental e justiccedila
ecoloacutegica respectivamente A justiccedila eacute uma qualidade da conduta
humana e envolve tanto a reflexatildeo sobre si mesmo e o estar no mundo
quanto a conduta coordenada com os outros a conduta social e poliacutetica
(LOW GLEESON 1998)
93
Durante muito tempo na histoacuteria recente do brasil os recursos
naturais natildeo renovaacuteveis foram tratados como recursos a serem
explorados natildeo havia uma preocupaccedilatildeo com sua preservaccedilatildeo e com os
impactos socioambientais decorrentes das atividades econocircmicas A
Constituiccedilatildeo de 1934 mencionou pela primeira vez a competecircncia
privativa da Uniatildeo para legislar sobre o subsolo mineraccedilatildeo metalurgia
aacuteguas energia hidreleacutetrica florestas caccedila e pesca Do ponto de vista das
competecircncias a Constituiccedilatildeo de 1937 manteacutem a competecircncia privativa
da Uniatildeo sobre os recursos naturais e seus usos considerando a
competecircncia supletiva dos Estados As Constituiccedilotildees de 1946 1967-69
reproduzem com poucas atualizaccedilotildees as mesmas competecircncias
(SCARDUA BURSZTYN 2003)
A despeito do Coacutedigo das Aacuteguas de 1934 que lograva proteger
os recursos hiacutedricos e imputava ao poluidor os custos com a
recuperaccedilatildeo o setor carboniacutefero seguiu intensificando a poluiccedilatildeo das
aacuteguas e dos solos O mesmo aconteceu com as condiccedilotildees miacutenimas de
trabalho presentes no Coacutedigo de Mineraccedilatildeo e no Coacutedigo de Higiene e
Seguranccedila no Trabalho que foram sistematicamente desconsideradas
impondo condiccedilotildees muitas vezes incompatiacuteveis com a vida humana
(MENEZES CAROLA 2011)
O avanccedilo do segmento do carvatildeo mineral contou com incentivos
e proteccedilatildeo do governo federal a partir de 1931 atraveacutes do Decreto
20089 em 1940 com o Decreto 2667e o Decreto 1828 de 1937 Aleacutem
de regular o aproveitamento do carvatildeo mineral iniciou nesse momento a
obrigatoriedade de compra do carvatildeo nacional em 10 em 1931 e 20
em 1937 do montante das importaccedilotildees (BRASIL 1931 1937 1940) As
medidas tomadas nesse periacuteodo incluindo aiacute o Plano do Carvatildeo
Nacional Lei nordm 1886 de 1953 fortaleceram muito o setor (BRASIL
1953) Inclui-se nessa lista o Coacutedigo de Mineraccedilatildeo de 1967 Decreto-Lei
nordm 227 (BRASIL 1967) Junto com o Plano do Carvatildeo Mineral eacute criada
a Comissatildeo Executiva do Plano do Carvatildeo Nacional (CEPCAN) ligada
inicialmente ao Presidente da Repuacuteblica e depois ao MME A
CEPCAN foi responsaacutevel pela consolidaccedilatildeo da modernizaccedilatildeo e dos
subsiacutedios para o setor carboniacutefero (MENEZES CAROLA 2011)
A Avaliaccedilatildeo de Impacto Ambiental (AIA) apareceu no Brasil
pela primeira vez na deacutecada de 1970 no projeto da hidroeleacutetrica de
Sobradinho por pressatildeo do Banco Mundial e na Lei nordm 6803 de 1980
que dispotildee sobre zoneamento industrial Mas soacute se efetivou na Lei nordm
6938 de 1981 que dispotildee sobre a PNMA que coloca a avaliaccedilatildeo de
94
impacto ambiental como instrumento da Poliacutetica Com o Decreto nordm
88351 ela se tornou parte do licenciamento de atividades e
empreendimentos potencialmente poluidores ou causadores de
degradaccedilatildeo ambiental (BARBIERI 1995)
O CONAMA atraveacutes da Resoluccedilatildeo nordm 1 de 1986 trouxe os
criteacuterios baacutesicos e diretrizes para o uso e implementaccedilatildeo da AIA A
resoluccedilatildeo define impacto ambiental como ldquoqualquer alteraccedilatildeo das
propriedades fiacutesicas quiacutemicas e bioloacutegicas do meio ambiente causada por qualquer forma de mateacuteria ou energia resultante das atividades
humanas que direta ou indiretamente afetam I) a sauacutede e bem-estar da
populaccedilatildeo II) as atividades sociais e econocircmicas III) a biota IV) as condiccedilotildees esteacuteticas e sanitaacuterias do meio ambiente V) a qualidade dos
recursos ambientaisrdquo Os processos que envolvem o carvatildeo mineral
extraccedilatildeo beneficiamento transporte uso para geraccedilatildeo de energia satildeo
considerados passiacuteveis de causar impacto e por isso a exigecircncia da
avaliaccedilatildeo de impacto ambiental para seus licenciamentos (BARBIERI
1995)
O Decreto nordm 9927490 conta com a seguinte redaccedilatildeo
Art 19 O Poder Puacuteblico no exerciacutecio de sua
competecircncia de controle expediraacute as seguintes
licenccedilas
I - Licenccedila Preacutevia (LP) na fase preliminar do
planejamento de atividade contendo requisitos
baacutesicos a serem atendidos nas fases de
localizaccedilatildeo instalaccedilatildeo e operaccedilatildeo observados os
planos municipais estaduais ou federais de uso do
solo
II - Licenccedila de Instalaccedilatildeo (LI) autorizando o
iniacutecio da implantaccedilatildeo de acordo com as
especificaccedilotildees constantes do Projeto Executivo
aprovado e
III - Licenccedila de Operaccedilatildeo (LO) autorizando
apoacutes as verificaccedilotildees necessaacuterias o iniacutecio da
atividade licenciada e o funcionamento de seus
equipamentos de controle de poluiccedilatildeo de acordo
com o previsto nas Licenccedilas Preacutevia e de
Instalaccedilatildeo (BRASIL 1990)
Uma exigecircncia no processo de licenciamento eacute a elaboraccedilatildeo do
Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatoacuterio de Impacto
Ambiental (RIMA) A avaliaccedilatildeo de impacto ambiental conforme consta
95
na Figura 6 compreende segundo orientaccedilotildees internacionalmente
aceitas uma etapa inicial de triagem [na qual o estudo de impacto
ambiental eacute solicitado ou natildeo de acordo com o grau de possiacuteveis
impactos ambientais] uma etapa de anaacutelise detalhada [que inclui a
delimitaccedilatildeo do escopo do estudo a elaboraccedilatildeo do estudo de impacto
ambiental e do relatoacuterio de impacto ambiental a anaacutelise teacutecnica e a
consulta puacuteblica] e a etapa poacutes-aprovaccedilatildeo [que prevecirc o monitoramento
e gestatildeo ambiental e o acompanhamento] (SAacuteNCHEZ 2008a)
Figura 6 - Etapas da avaliaccedilatildeo de impacto ambiental
Fonte Adaptado de Saacutenchez (2008 p 96)
96
A audiecircncia puacuteblica no processo de licenciamento ambiental eacute
uma forma de consulta puacuteblica (consta na anaacutelise detalhada na Figura 6)
um instrumento de participaccedilatildeo de caraacuteter consultivo e informativo
segundo resoluccedilatildeo do CONAMA Nordm 009 de 03 de dezembro de 1987
A audiecircncia pode ser solicitada pelo oacutergatildeo ambiental responsaacutevel pelo
licenciamento por uma entidade civil pelo ministeacuterio puacuteblico ou por
um grupo de pelo menos 50 cidadatildeos (CONAMA 1987) Todavia a
decisatildeo no processo de licenciamento cabe aos oacutergatildeos ambientais
competentes No acircmbito federal ao IBAMA e no acircmbito estadual os
oacutergatildeos ambientais estaduais (SAacuteNCHEZ 2008a)
A Avaliaccedilatildeo Ambiental Estrateacutegica (AAE) surge dos limites da
AIA Entre esses limites estatildeo a dificuldade ldquode analisar com
profundidade alternativas tecnoloacutegicas e de localizaccedilatildeo de levar em
conta satisfatoriamente os impactos cumulativos e os impactos indiretos
satildeo inerentes a esta forma de avaliaccedilatildeo de impacto ambientalrdquo
(SAacuteNCHEZ 2008 p 4)
A Constituiccedilatildeo de 1988 traz um capiacutetulo sobre o meio ambiente e
pela primeira vez na histoacuteria do Brasil coloca o meio ambiente como
direito ldquoTodos tecircm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado bem de uso comum do povo e essencial agrave sadia qualidade de vida impondo-se ao Poder Puacuteblico e agrave coletividade o dever de
defendecirc-lo e preservaacute-lo para as presentes e futuras geraccedilotildeesrdquo (Art
225 BRASIL 1988) Cabe aos Estados Distrito Federal e Municiacutepios
acrescentar normas especiacuteficas desde que natildeo colidam com a norma
federal (BARBIERI 1995)
A descentralizaccedilatildeo estimulada pela Constituiccedilatildeo de 1988 foi
inovadora ao contemplar mecanismos de democracia participativa
complementando os mecanismos da democracia representativa todavia
essa ainda natildeo ocorreu em niacutevel satisfatoacuterio e efetivo Desde 1996 todos
os estados brasileiros contam com poliacuteticas ambientais estaduais e
oacutergatildeos responsaacuteveis pela sua implementaccedilatildeo Os municiacutepios caminham
devagar 117 contam com algum oacutergatildeo para tratar do meio ambiente e
213 possuem Conselho Municipal de Meio Ambiente (SCARDUA BURSZTYN 2003)
Outro ponto tratado na Constituiccedilatildeo de 1988 que diz respeito agrave
atividade mineradora eacute a Compensaccedilatildeo Financeira pela Exploraccedilatildeo de
Recursos Minerais (CFEM) O valor da CFEM eacute aplicado sobre o
97
faturamento liacutequido e varia de acordo com a substacircncia mineral Para o
carvatildeo aplica-se a aliacutequota de 2 O valor eacute pago mensalmente e 12
dele vai para a Uniatildeo 23 para o Estado e 65 para o municiacutepio
produtor Os recursos devem ser aplicados em projetos que direta ou
indiretamente melhorem a infra-estrutura qualidade ambiental sauacutede e
educaccedilatildeo da comunidade local (DNPM 2013) Um desafio colocado por
algumas pesquisas eacute o uso adequado da CFEM pela gestatildeo puacuteblica jaacute
que natildeo haacute uma regulamentaccedilatildeo legal para o uso do recurso (AARAtildeO
2011 ENRIacuteQUEZ 2007)
No Governo Fernando Henrique Cardoso foi aprovado o Decreto
nordm 3371 de 24 de fevereiro de 2000 que instituiu o Programa
Prioritaacuterio de Termeletricidade (BRASIL 2000) Com o apagatildeo de 2001
ressurgiu a ideia de que a seguranccedila energeacutetica do paiacutes estaria garantida
com a construccedilatildeo de mais usinas termeleacutetricas (GOLDENBERG
2012a)
Em 2010 comeccedilou a ser articulado um novo marco regulatoacuterio
para a mineraccedilatildeo no Brasil sendo lanccedilado o Projeto de Lei (PL) em
junho de 2013 Em 2014 o Congresso analisaraacute o PL 58072013
(BRASIL 2013a) fruto da Frente Parlamentar da Mineraccedilatildeo Brasileira
da qual fazem parte Celso Maldaner (PMDB) Deacutecio Lima (PT)
Jorginho Mello (Partido da Repuacuteblica - PR) Onofre Santo Agostini
(Partido Social Democraacutetico - PSD) todos eleitos por Santa Catarina
(BRASIL 2013b)
Um dos pontos polecircmicos eacute a regulamentaccedilatildeo da mineraccedilatildeo em
terras indiacutegenas quilombolas e ribeirinhas questatildeo que se situa na
interface entre direitos ambientais e direitos humanos A Constituiccedilatildeo de
1891 vinculava a propriedade do subsolo agrave do solo sendo alterada pela
Constituiccedilatildeo de 1934 ateacute os dias atuais permanecendo a natildeo existecircncia
de viacutenculo entre propriedade do solo e subsolo que pertence agrave Uniatildeo
Todavia conveacutem ressaltar que apesar do domiacutenio puacuteblico dos recursos
minerais eacute possiacutevel a apropriaccedilatildeo privada mediante concessatildeo
(BRASIL MME 2013) A principal criacutetica do novo marco regulatoacuterio eacute
a de que ldquoeacute necessaacuterio reafirmar que o lsquopuacuteblicorsquo e a lsquonaccedilatildeorsquo vivem e
ocorrem sobre o solo e natildeo no subsolo Dessa forma eacute o uso do solo que
deve definir a possibilidade da exploraccedilatildeo do subsolo e natildeo o contraacuteriordquo
(MILANEZ 2012 p 82)
O crescimento da consciecircncia ambiental relaciona-se agrave discussatildeo
histoacuterica sobre direitos humanos e do exerciacutecio desigual de direitos O
movimento ambientalista eacute fruto dessa tradiccedilatildeo de lutas por direitos
98
individuais e coletivos (GONCcedilALVES 1992) Todavia o desafio eacute
superar a visatildeo de que o natildeo-humano eacute de interesse apenas na medida
em que afeta os seres humanos A democracia a justiccedila social e os
direitos humanos satildeo condiccedilatildeo importante para enfrentar a crise mas
natildeo satildeo suficientes Eacute preciso superar tambeacutem o antropocentrismo
caminhando da justiccedila ambiental para a justiccedila ecoloacutegica (DELUCA
2007)
35 ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO
Nesta seccedilatildeo satildeo destacados os envolvidos na gestatildeo do carvatildeo
mineral no Brasil que atuam numa escala mais ampla que a estadual Os
envolvidos na gestatildeo de recursos comuns de Santa Catarina sediados no
estado seratildeo destacados no capiacutetulo quatro Os que foram aqui citados
aparecem nos documentos consultados Dessa forma conveacutem ressaltar
que pode haver outros envolvidos que natildeo estejam citados nesse
capiacutetulo
351 Segmentos poliacuteticos
A atual presidente da repuacuteblica Dilma Rousseff eleita pelo PT
tem mandato de 2011 a 2014 Em sua campanha mais de 90 da receita
foi proveniente de doaccedilotildees ao Comitecirc Financeiro Nacional Do total de
R$ 137 milhotildees e meio o setor mineral contribuiu com 10 desse
valor A Tractebel empresa geradora de energia eleacutetrica doou um
milhatildeo de reais para o Comitecirc Financeiro Nacional para Presidente da
Repuacuteblica do PT o que correspondeu a 07 da receita (OLIVEIRA
2013 TSE 2013) Do setor carboniacutefero natildeo foram identificadas
doaccedilotildees
O Ministeacuterio das Minas e Energia (MME) eacute chave tambeacutem no
processo de gestatildeo Ele foi criado em 1960 e tem como competecircncias a
formulaccedilatildeo e supervisatildeo das poliacuteticas puacuteblicas nos seguintes segmentos geologia recursos minerais e energeacuteticos aproveitamento da energia
hidraacuteulica mineraccedilatildeo e metalurgia e petroacuteleo combustiacutevel e energia
eleacutetrica inclusive nuclear Tem como ministro Edison Lobatildeo e congrega
as secretarias de Petroacuteleo Gaacutes Natural e Combustiacuteveis Renovaacuteveis a
99
Secretaria de Energia Eleacutetrica a Secretaria de Planejamento e
Desenvolvimento Energeacutetico Estatildeo vinculados ao MME o
Departamento Nacional de Produccedilatildeo Mineral (DNPM) (Criado em
1934) a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM)
(Criada em 1969 e iniciando suas atividades em 1970) a ANEEL
(Criada em 1996) o Conselho Nacional de Poliacutetica Energeacutetica (CNPE)
(Criado em 1997)
No Brasil apesar de haverem espaccedilos institucionais o debate
sobre a poliacutetica energeacutetica permanece restrito O Conselho Nacional de
Poliacutetica Energeacutetica (CNPE) criado em 1997 e regulamentado em 2000
eacute um oacutergatildeo de assessoramento da Presidecircncia da Repuacuteblica Ele tem em
sua composiccedilatildeo sete Ministros um representante dos estados e do
Distrito Federal um cidadatildeo brasileiro especialista em energia
designado pelo Presidente da Repuacuteblica e um representante de
universidade brasileira especialista em energia O CNPE eacute influente nos
rumos da poliacutetica energeacutetica nacional todavia pouco democraacutetica em
sua composiccedilatildeo A ANEEL por sua vez ao inveacutes de ser autocircnoma e
independente estaacute formalmente vinculada ao MME como autarquia e
na praacutetica demostra subordinaccedilatildeo ao governo federal (BERMANN
2001)
O Ministeacuterio do Meio Ambiente (MMA) foi criado em 1992
tendo como missatildeo ldquopromover a adoccedilatildeo de princiacutepios e estrateacutegias para
o conhecimento a proteccedilatildeo e a recuperaccedilatildeo do meio ambiente o uso
sustentaacutevel dos recursos naturais a valorizaccedilatildeo dos serviccedilos ambientais
e a inserccedilatildeo do desenvolvimento sustentaacutevel na formulaccedilatildeo e
implementaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas de forma transversal e
compartilhada participativa e democraacutetica em todos os niacuteveis e
instacircncias de governo e sociedaderdquo (MMA 2013) O CONAMA eacute o
oacutergatildeo consultivo e deliberativo do SISNAMA ambos criados em 1981
como instrumentos participativos da PNMA O CONAMA eacute o uacutenico
conselho com poder de legislar Os recursos naturais renovaacuteveis ficam
sob a tutela do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renovaacuteveis (IBAMA) criado em 1989 vinculado
posteriormente ao MMA Jaacute os recursos natildeo renovaacuteveis ficam sob tutela
do MME
O Parlamento eacute composto pelos representantes eleitos pelo povo
Ele se divide entre o Senado Federal (Senadores) e a Cacircmara dos
Deputados (Deputados Federais) e exerce o poder legislativo e
fiscalizador no Congresso Nacional Atuam tambeacutem no Parlamento a
100
Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral criada em 2005
e a Frente Parlamentar da Mineraccedilatildeo Brasileira criada em 2011 As
relaccedilotildees entre o parlamento e os segmentos econocircmicos junto agrave questatildeo
do carvatildeo mineral satildeo analisadas no capiacutetulo cinco dessa tese
(OLIVEIRA 2013)
Jaacute o Ministeacuterio Puacuteblico tem autonomia na estrutura do Estado em
relaccedilatildeo ao executivo legislativo e judiciaacuterio Cabe ao Ministeacuterio Puacuteblico
a defesa da ordem juriacutedica do regime democraacutetico dos interesses
sociais e dos interesses individuais indisponiacuteveis O Ministeacuterio Puacuteblico
da Uniatildeo divide-se em Ministeacuterio Puacuteblico Federal e os Ministeacuterios
Puacuteblicos de cada Estado da Federaccedilatildeo (BRASIL 1993 MPSC 2013)
Os segmentos poliacuteticos aqui apresentados atuam com limitaccedilotildees
mas tambeacutem oferecem brechas A sociedade deveria aproveitaacute-las para
debater os rumos da poliacutetica energeacutetica e as opccedilotildees de desenvolvimento
Contudo o contexto de energia privada e de consequente concentraccedilatildeo
de poder econocircmico se mostra prejudicial agraves questotildees ecoloacutegicas e
democraacuteticas (BERMANN 2001)
352 Segmentos econocircmicos
Os segmentos econocircmicos estatildeo organizados em associaccedilotildees
empresariais e mistas O Instituto Brasileiro de Mineraccedilatildeo (IBRAM) foi
criado em 1976 eacute uma associaccedilatildeo privada sem fins lucrativos que tem
por objetivo congregar representar promover e divulgar a induacutestria
mineral brasileira contribuindo para a sua competitividade nacional e
internacional A mineraccedilatildeo tambeacutem conta com o Consoacutercio Alumar
inaugurado em 1984 eacute um dos maiores complexos de produccedilatildeo de
alumiacutenio do mundo localiza-se no Maranhatildeo e eacute formado pelas
empresas Alcoa BHP Biliton e Rio Tinto Alcan
Os segmentos econocircmicos ligados ao carvatildeo mineral organizam-
se junto ao Sindicato Nacional da Induacutestria de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
(SNIEC) e a Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo Mineral (ABCM) O
SNIEC foi criado em 1989 em Santa Catarina reuacutene as empresas de
mineraccedilatildeo A ABCM foi constituiacuteda em 2006 e reuacutene agentes da cadeia
produtiva do carvatildeo mineradoras geradoras e transportadores O
principal objetivo da Associaccedilatildeo eacute integrar a cadeia produtiva visando o
desenvolvimento sustentaacutevel Conta com 20 empresas associadas
101
Como o tema de tese relaciona-se com a geraccedilatildeo de energia
eleacutetrica conveacutem ressaltar o papel da Cacircmara de Comercializaccedilatildeo de
Energia Eleacutetrica (CCEE) A CCEE foi criada em 2004 ela viabiliza a
compra e venda de energia em todo o paiacutes Ela reuacutene empresas de
geraccedilatildeo de serviccedilo puacuteblico produtores independentes autoprodutores
distribuidoras comercializadoras importadoras e exportadoras de
energia aleacutem de consumidores livres e especiais de todo o paiacutes
Existem empresas e cooperativas bastante influentes a niacutevel
nacional
- A Tractebel do grupo franco-belga GDF-Suez eacute a segunda
maior geradora de energia eleacutetrica privada do Brasil e maior produtora
independente de energia do mundo
- A CITIC Group estatal Chinesa eacute parceira da Eletrobraacutes no
acordo promulgado pelo Decreto nordm 6009 de 3 de janeiro de 2007
(BRASIL 2007)
- A Alunorte Alumina do Norte do Brasil SA criada em 1973
num acordo entre Brasil e Japatildeo pertencia a Vale e localiza-se no estado
do Paraacute A Vale foi privatizada em 1997 e em 2011 negociou as accedilotildees
da Alunorte com a Norsk Hydro ASA
- A ENEVA antiga MPX tendo como principais acionistas a
empresa alematilde EON com 362 e o empresaacuterio brasileiro Eike Batista
com 285 Eacute a maior geradora de energia eleacutetrica privada do Brasil
- A Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica
(CGTEE) constituiacuteda em 1997 pela Uniatildeo tornou-se uma empresa do
Sistema Eletrobraacutes em 2000 Em 2009 assinou um contrato com as
empresas Alstom Power Systems SA ndash France e com a Alstom Brasil
Energia e Transporte Ltda para recuperaccedilatildeo de caldeiras
- A estatal Companhia Paranaense de Energia (COPEL) foi criada
em 1954 abrindo seu capital em abril de 1994
- A Empresa de Pesquisa Energeacutetica (EPE) eacute uma empresa
puacuteblica criada em 2004 e tem por finalidade prestar serviccedilos na aacuterea de
estudos e pesquisas destinadas a subsidiar o planejamento do setor energeacutetico
Destaca-se nas empresas citadas um nuacutemero consideraacutevel de
empresas estrangeiras Conveacutem ressaltar aqui que as mineradoras
102
beneficiadoras e transportadoras natildeo constam nesse item por terem
influecircncia principalmente nos estados e regiotildees produtoras
353 Segmentos sociais
Os trabalhadores do setor mineral encontram-se organizados na
Associaccedilatildeo Nacional de Servidores do Departamento Nacional de
Produccedilatildeo Mineral (ANSDNPM) nos Sindicatos Metabase dentre
outros Jaacute os trabalhadores ligados ao carvatildeo mineral natildeo contam com
uma associaccedilatildeo especiacutefica em niacutevel nacional mas estatildeo organizados em
sindicatos estaduais A posiccedilatildeo dos trabalhadores em relaccedilatildeo ao carvatildeo
mineral eacute de apoio atuando em parceria com os segmentos econocircmicos
O que estaacute em jogo para os trabalhadores eacute a manutenccedilatildeo dos postos de
trabalho e seu sustento (MILANEZ et al 2013)
Os afetadosatingidosameaccedilados enfrentam dificuldades de
vaacuterias ordens no acesso agrave informaccedilatildeo falta de conhecimento teacutecnico-
cientiacutefico espaccedilo de debate restrito etc Na maioria das vezes as
decisotildees sobre empreendimentos de geraccedilatildeo de energia satildeo alimentadas
pela siacutendrome do ldquoapagatildeordquo e os direitos das populaccedilotildees atingidas
parecem ferir o ldquodireitordquo da maioria que precisa de energia
(BERMANN 2001) Mas apesar de todas as dificuldades os
afetadosatingidosameaccedilados pelo setor da mineraccedilatildeo se organizam em
frentes de defesa apoiadas por vaacuterias entidades sediadas em vaacuterias
escalas do local ao global Somam-se aiacute entidades religiosas sindicais
movimentos ambientais movimentos em defesa dos direitos humanos
movimentos indiacutegenas dentre outros Em 2012 surgiu o Movimento
Popular frente agrave Mineraccedilatildeo (MAM) e em 2013 surgiu o Comitecirc
Nacional em Defesa dos Territoacuterios Frente agrave Mineraccedilatildeo Faz parte do
Comitecirc a Federaccedilatildeo de Oacutergatildeos para a Assistecircncia Social e Educacional
(FASE) que atua desde 1961 pela democracia o Instituto de Estudos
Socioeconocircmicos (INESC) criado em 1979 e tem como principal frente
agrave questatildeo da cidadania a Conferecircncia Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB) o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) a
Articulaccedilatildeo dos Povos Indiacutegenas do Brasil (APIB) o Instituto Brasileiro de Anaacutelises Sociais e Econocircmicas (IBASE) entre outros (OLIVEIRA
2013) No caso especiacutefico do carvatildeo mineral natildeo haacute um movimento
popular ou comitecirc em acircmbito nacional embora tenha relaccedilatildeo com o
movimento e comitecirc acima referidos
103
As ONGs e representantes da comunidade acadecircmica tecircm um
papel de parceria com esses movimentos Vaacuterias publicaccedilotildees
demonstram a preocupaccedilatildeo com a questatildeo do carvatildeo mineral o
Greenpeace reprova o chamado ldquocarvatildeo limpordquo e os investimentos feitos
nesse setor (YAMAOKA et al 2013) Amigos da Terra Brasil publicou
Carvatildeo combustiacutevel de ontem com dados atualizados sobre os impactos
do carvatildeo mineral no Brasil (MONTEIRO 2008) A FASE apoiada
pela Fundaccedilatildeo Ford e pela Heinrich Boumlll Stiftung publicou em 2012 o
livro Novo marco legal da mineraccedilatildeo no Brasil Para quecirc Para
Quem (MARLERBA 2012) O IBASE com o apoio da Fundaccedilatildeo Ford
lanccedilou em 2013 Quem eacute quem nas discussotildees do novo coacutedigo da mineraccedilatildeo (OLIVEIRA 2013) Com um caraacuteter mais articulador
aparece o Foacuterum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio
Ambiente e o Desenvolvimento (FBOMS) desde 1990 e a Rede
Brasileira de Justiccedila Ambiental a partir de 2001
Os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais natildeo tecircm um
posicionamento homogecircneo em relaccedilatildeo a criacutetica ou continuidade da
exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral diferente da posiccedilatildeo dos segmentos
econocircmicos todos contam com contradiccedilotildees internas e externas As
relaccedilotildees estabelecidas nos segmentos e os diferentes posicionamentos de
segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais seratildeo examinados ao longo
dos proacuteximos capiacutetulos
36 SITUACcedilAtildeO ATUAL E DESAFIOS
O objetivo do capiacutetulo foi o de tratar a gestatildeo de recursos
comuns colocando ecircnfase no carvatildeo mineral Pela importacircncia
geopoliacutetica e econocircmica os recursos natildeo renovaacuteveis satildeo de competecircncia
do Ministeacuterio das Minas e Energia mesmo apoacutes a criaccedilatildeo do Ministeacuterio
do Meio Ambiente Dessa forma se a gestatildeo dos recursos naturais no
Brasil se pautou durante um longo periacuteodo pela preservaccedilatildeo e pela
conservaccedilatildeo os recursos naturais natildeo renovaacuteveis natildeo participaram desse
movimento A apropriaccedilatildeo e uso dos recursos naturais natildeo renovaacuteveis
passaram ao largo da regulaccedilatildeo dos recursos comuns
O segmento do carvatildeo mineral aleacutem da preocupaccedilatildeo com os
impactos socioambientais sofreu na deacutecada de 1990 com o corte dos
subsiacutedios e reorientou sua produccedilatildeo para a geraccedilatildeo de energia
termeleacutetrica Tambeacutem na geraccedilatildeo de energia eleacutetrica os novos
104
empreendimentos movidos a carvatildeo mineral passaram por um periacuteodo
sem entrar nos leilotildees de energia sendo incluiacutedos novamente em 2013
A inclusatildeo do carvatildeo mineral nos leilotildees e a reforma do Coacutedigo
de Mineraccedilatildeo demonstram a forte articulaccedilatildeo entre parte dos segmentos
poliacuteticos e econocircmicos Os segmentos sociais tecircm aiacute um grande desafio
Uma possibilidade jaacute explorada pelo movimento ambiental eacute a
interface entre direitos ambientais e direitos humanos Eacute preciso cada
vez mais politizar o tema da mineraccedilatildeo do carvatildeo mineral e da energia
Mineraccedilatildeo por quecirc Como Para quem Energia por quecirc Como Para
quem Natildeo existem respostas uacutenicas mas se parte dos segmentos
poliacuteticos e econocircmicos fazem valer seus interesses como ficam os
interesses dos segmentos sociais
Com a Poliacutetica Nacional de Meio Ambiente atraveacutes da avaliaccedilatildeo
de impacto ambiental e a Constituiccedilatildeo de 1988 surgiram novos espaccedilos
de participaccedilatildeo vistos como uma grande conquista pelo movimento
ambiental Um ponto chave para a questatildeo ambiental eacute o avanccedilo das
praacuteticas democraacuteticas E o campo de lutas por direitos envolve todas as
escalas
No Quadro 5 a seguir foi feita uma siacutentese dos principais
aspectos tratados ao longo do capiacutetulo que favorecem e questionam a
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral
Quadro 5 - Siacutentese dos pontos que favorecem e questionam a
amplicaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo
mineral por macro variaacutevel
MACRO
VARIAacuteVEIS
ASPECTOS QUE
FAVORECEM A
AMPLIACcedilAtildeO
ASPECTOS QUE
QUESTIONAM A
AMPLIACcedilAtildeO
Dinacircmicas de
desenvolvimento
- Papel central do Estado
em assegurar os interesses
privados na gestatildeo de
recursos comuns e na
poliacutetica energeacutetica
- Fragmentaccedilatildeo da gestatildeo
de recursos comuns os
recursos renovaacuteveis satildeo da
competecircncia do MMA e os
recursos natildeo renovaacuteveis satildeo
da competecircncia do MME
- Discussatildeo mundial sobre
mudanccedila ambiental global
- Brasil como fornecedor
de commodities minerais
energeacuteticas e agriacutecolas e
- Atuaccedilatildeo do movimento
ambiental
105
- Privatizaccedilatildeo do setor
eleacutetrico
- subsiacutedios aos combustiacuteveis
foacutesseis
- Matriz energeacutetica
brasileira considerada limpa
em relaccedilatildeo a outros paiacuteses
justifica a ampliaccedilatildeo do uso
de combustiacuteveis foacutesseis e
- Visatildeo do planejamento
energeacutetico eacute aumentar a
oferta de energia eleacutetrica
Atributos fiacutesicos
e tecnoloacutegicos
- Disponibilidade do
recurso
- Evoluccedilatildeo tecnoloacutegica
- Neutralidade ldquodardquo e
confianccedila ldquonardquo tecnologia
- Ecircnfase na produccedilatildeo e natildeo
na eficiecircncia energeacutetica
- O Brasil natildeo tem uma
cultura do carvatildeo mineral a
atividade estaacute restrita ao sul
do paiacutes
- Mineraccedilatildeo impede outros
usos do solo
- Evoluccedilatildeo tecnoloacutegica natildeo
garante minimizaccedilatildeo dos
impactos socioambientais
- Escolhas teacutecnicas satildeo
escolhas poliacuteticas natildeo satildeo
neutras
- Necessidade de aumento
da eficiecircncia energeacutetica
Regras em uso - Desregulamentaccedilatildeo e
flexibilizaccedilatildeo das leis
(Coacutedigo de Mineraccedilatildeo)
- A CFEM faz com que o
governo em todos os seus
niacuteveis administrativos
ganhe com a exploraccedilatildeo
mineral
- Participaccedilatildeo tutelada
- Avanccedilo nas leis
(Exigecircncia da AIA nos
licenciamentos)
- Ampliaccedilatildeo da
participaccedilatildeo via audiecircncia
puacuteblica accedilatildeo civil puacuteblica
etc
- Relaccedilatildeo entre direitos
ambientais e direitos
humanos
Arena de accedilatildeo
(Caracterizaccedilatildeo
dos envolvidos
na gestatildeo)
- Parte dos segmentos
poliacuteticos tecircm parcerias com
os segmentos econocircmicos
atraveacutes de doaccedilotildees de
campanha e atraveacutes da
atuaccedilatildeo de parlamentares na
Frente Parlamentar Mista
em Defesa do Carvatildeo
Mineral
- Parte dos segmentos
poliacuteticos possuem
instacircncias participativas e
destaca-se tambeacutem a
atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico
- Os segmentos sociais
exceto o movimento
sindical estatildeo organizados
106
- Os segmentos econocircmicos
estatildeo organizados de vaacuterias
formas (sindicato
associaccedilatildeo instituto
cacircmara consoacutercio) e as
empresas exceto a COPEL
e a EPE satildeo
majoritariamente de capital
estrangeiro
- Nos segmentos sociais
destaca-se o apoio dos
sindicatos agrave causa do carvatildeo
mineral
e atuantes no
questionamento da
ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica movida a
carvatildeo mineral
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na macro variaacutevel arena de accedilatildeo a variaacutevel da democracia
apresenta limites relacionadas aos problemas da democracia
representativa e a reduccedilatildeo da participaccedilatildeo aos espaccedilos existentes Nas
oportunidades destacam-se a organizaccedilatildeo dos segmentos sociais (no
MAM e no Comitecirc Nacional em Defesa dos Territoacuterios Frente agrave
Mineraccedilatildeo) nas redes que unem ONGs academia e
afetadosatingidosameaccedilados e as publicaccedilotildees (Quadro 6)
Quadro 6 ndash Limites e oportunidades do sistema democraacutetico no
Brasil VARIAacuteVEL LIMITES OPORTUNIDADES
Fortalecimento do
sistema
democraacutetico
- Democracia
representativa
- Reduccedilatildeo da
participaccedilatildeo aos
espaccedilos existentes
- Organizaccedilatildeo dos Segmentos
sociais
- Redes unindo ONGs
academia e
afetadosatingidos
ameaccedilados
- Publicaccedilotildees
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Se a aprendizagem social adaptativa eacute chave nesse processo para
que ela ocorra defende-se a hipoacutetese de que o fortalecimento do sistema
democraacutetico se faz necessaacuterio A compreensatildeo da ampliaccedilatildeo da energia
107
termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral aleacutem das evidecircncias descritas
nesse capiacutetulo depende tambeacutem da investigaccedilatildeo dos processos do
ponto de vista do exerciacutecio da democracia em todas as escalas espaciais
e entre os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais A questatildeo passa
pelo modo como os recursos satildeo explorados mas coloca tambeacutem em
questatildeo os objetivos e a direccedilatildeo do desenvolvimento (MELUCCI
2001)
4 CARVAtildeO MINERAL EM SANTA CATARINA
Eacute o duplo resultado da extraccedilatildeo do carvatildeo bens e
riquezas de um lado pirita e restos de homens de
outro (VOLPATO 1984 p 16)
A gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina foi marcada pela
apropriaccedilatildeo privada dos recursos e seu uso serviu principalmente ao
crescimento econocircmico As poliacuteticas ambientais por sua vez foram
condicionadas e limitadas pelos interesses poliacuteticos e econocircmicos e o
oacutergatildeo responsaacutevel a FATMA adotou uma postura de defesa das causas
ambientais sem desestruturar o crescimento econocircmico Nesse contexto
o discurso do carvatildeo foi habilmente sustentado do ponto de vista
material cultural psicoloacutegico e simboacutelico (CAROLA 2004)
O segmento do carvatildeo mineral alternou desde as primeiras
deacutecadas do seacuteculo XX periacuteodos de crescimento e periacuteodos de crise Os
periacuteodos de crescimento amparados por incentivos do governo federal
e os momentos de crise associados a momentos de crise na esfera
governamental Isso levou os segmentos econocircmicos da regiatildeo sul
catarinense a se articularem cada vez mais com os segmentos poliacuteticos
visando a proteccedilatildeo do segmento e a continuidade da mineraccedilatildeo do
carvatildeo no Sul de Santa Catarina Uma das estrateacutegias mais recentes eacute a
construccedilatildeo da USITESC
Cerca de 95 do carvatildeo mineral extraiacutedo na regiatildeo tem como
destino a geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica Se observados os dados sobre
geraccedilatildeo e consumo de energia eleacutetrica em Santa Catarina o estado natildeo eacute
autossuficiente Em 2012 o estado produziu 16963 Gigawatt-hora
(GWh) consumiu 21601 GWh O consumo industrial ficou em 9312
GWh 431 do total consumido no estado e o consumo residencial foi
de 4699 GWh 218 do total consumido (ANEEL 2014 EPE 2013)
O carvatildeo mineral foi responsaacutevel pelo equivalente a 35 da eletricidade
gerada em Santa Catarina (ALESC 2013)
Existem fortes argumentos para que a geraccedilatildeo de energia
termeleacutetrica se amplie contudo o histoacuterico de impactos socioambientais
poderia ser impeditivo Buscando aprofundar a reflexatildeo sobre os
argumento proacute e contra a ampliaccedilatildeo o objetivo deste capiacutetulo eacute tratar da
gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina com destaque agrave gestatildeo do
carvatildeo mineral considerando as macro variaacuteveis presentes no modelo de
110
anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns (HESS OSTROM 2005
OAKERSON 1992 POLSKI OSTROM 1992)
Inicialmente eacute apresentada uma breve siacutentese de como foi se
organizando a gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina tendo
como eixo central o oacutergatildeo responsaacutevel pelas questotildees ambientais no
estado a FATMA Na sequecircncia as seccedilotildees contextualizam o carvatildeo
mineral na trajetoacuteria de desenvolvimento do Sul de Santa Catarina e
tratam das mudanccedilas ocorridas na extraccedilatildeo do carvatildeo mineral bem
como de seus impactos na regiatildeo Satildeo ainda discutidas as regras em uso
incorporando as alteraccedilotildees recentes do Coacutedigo Estadual do Meio
Ambiente de Santa Catarina e eacute feita uma breve caracterizaccedilatildeo da arena
de accedilatildeo com uma descriccedilatildeo dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais envolvidos na gestatildeo do recurso A forma como a gestatildeo de
recursos comuns se organiza em Santa Catarina revela aspectos
importantes para a compreensatildeo da ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica
bem como aspectos que ldquocoloquem em chequerdquo a continuidade da
atividade carboniacutefera
41 ldquoCombinandordquo crescimento econocircmico e proteccedilatildeo ambiental
Santa Catarina fez parte da histoacuteria do Brasil num primeiro
momento como territoacuterio de passagem para o gado gauacutecho e gerava
produtos primaacuterios para satisfazer as necessidades locais Na segunda
metade do seacuteculo XIX foram implantadas as primeiras induacutestrias do
estado A industrializaccedilatildeo catarinense teve em seu iniacutecio uma estreita
ligaccedilatildeo com os movimentos migratoacuterios da Alemanha e Itaacutelia jaacute que os
imigrantes tinham formaccedilatildeo intelectual e profissional e viveram a
modernizaccedilatildeo provocada pela Revoluccedilatildeo Industrial Destacaram-se
nesse periacuteodo a induacutestria tecircxtil alimentar e madeireira e o uso
energeacutetico do carvatildeo vegetal (THEIS 1988)
No final do seacuteculo XIX o estado ainda tinha uma economia
predominantemente agriacutecola e foram os produtos primaacuterios que
possibilitaram a geraccedilatildeo de capital para o investimento na induacutestria Na
histoacuteria de Santa Catarina dois marcos se destacaram na disputa pela
hegemonia na apropriaccedilatildeo dos recursos comuns o Genociacutedio Indiacutegena e
a Guerra do Contestado A desobstruccedilatildeo das aacutereas contestadas e
daquelas ocupadas pelos Carijoacute Xokleng e Kaingang foram
fundamentais para ampliar a apropriaccedilatildeo privada dos recursos naturais
111
(BORINELLI 1998) Aleacutem disso para sustentar o processo de
industrializaccedilatildeo em Santa Catarina no iniacutecio do seacuteculo XX ocorreu a
instalaccedilatildeo de pequenas usinas hidraacuteulicas e o aumento no uso do carvatildeo
mineral Na Primeira Guerra Mundial o carvatildeo mineral passou a ter
destaque possibilitando o surgimento da induacutestria carboniacutefera (THEIS
1988)
Ateacute a deacutecada de 1960 a regulaccedilatildeo dos recursos comuns foi
marcada pelo poder federal Todavia no campo econocircmico o estado
catarinense assumiu para si diversas funccedilotildees na promoccedilatildeo do
desenvolvimento econocircmico Data dessa eacutepoca a criaccedilatildeo do Banco
Estadual de Santa Catarina a Caixa Estadual de Santa Catarina do
Fundo de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina da
Universidade para o Desenvolvimento de Santa Catarina e a instalaccedilatildeo
de 46 escritoacuterios locais da Associaccedilatildeo de Creacutedito e Assistecircncia Rural de
Santa Catarina (ACARESC) e a Companhia Telefocircnica de Santa
Catarina (BORINELLI 1998) O sistema poliacutetico por sua vez teve um
predomiacutenio conservador relacionado principalmente com a dominaccedilatildeo
oligaacuterquica As lideranccedilas empresariais encontravam-se acomodadas nos
grandes partidos (CARREIRAtildeO 1990)
O crescimento econocircmico somado a uma regulaccedilatildeo dos recursos
naturais que privilegiava o acesso privado deu forma agrave crise ambiental
que teve lugar em Santa Catarina apoacutes a deacutecada de 1970 O consumo de
energia eleacutetrica com o processo de industrializaccedilatildeo catarinense
aumentou sensivelmente O consumo final de energia do setor industrial
ficou numa meacutedia de 60 O modelo de desenvolvimento
industrializante de Santa Catarina implicou natildeo apenas num elevado
consumo de energia mas tambeacutem numa exploraccedilatildeo inadequada da
natureza (THEIS 1988)
No Governo Konder Reis em 1975 foi criada a Secretaria de
Tecnologia e Meio Ambiente (SETMA) o Conselho Estadual de
Tecnologia e Meio ambiente (CETMA) e a FATMA na eacutepoca
Fundaccedilatildeo de Amparo agrave Tecnologia e Meio Ambiente A FATMA esteve
vinculada a SETMA ateacute sua extinccedilatildeo em 1977 Para o Governo Konder
Reis a finalidade baacutesica da SETMA era ldquoservir numa primeira fase ao
desenvolvimento do Estadordquo Dentre as principais preocupaccedilotildees
ambientais estavam os serviccedilos de aacutegua e esgoto e contraditoriamente o
aumento da produccedilatildeo mineral e da oferta de madeira (BORINELLI
1998)
112
Todas as unidades de conservaccedilatildeo estaduais foram criadas no
periacuteodo de 1975 a 1983 sob a influecircncia direta de Raulino Reitz Parque
Estadual da Serra Tabuleiro (1975) Reserva Bioloacutegica Estadual de
Sassafraacutes (1977) Parque Estadual da Serra Furada e Reserva Bioloacutegica
da Canela Preta (1980) e Reserva Bioloacutegica Estadual de Aguaiacute (1983)
(BORINELLI 1998 MASSIGNAN 1995)
O primeiro secretaacuterio da SETMA foi Augusto Batista Pereira
empresaacuterio do setor carboniacutefero A preocupaccedilatildeo principal da SETMA no
primeiro ano foi de implantar uma Usina Sideruacutergica no Sul do Estado
Nessa eacutepoca foi construiacuteda a Usina Teacutermica Jorge Lacerda a Induacutestria
Carboquiacutemica Catarinense (ICC) e a proposta da Sideruacutergica
Catarinense Havia tambeacutem uma preocupaccedilatildeo com a poluiccedilatildeo industrial
com a balneabilidade e com os recursos hiacutedricos no geral (BORINELLI
1998 MASSIGNAN 1995)
Da segunda parte da deacutecada de 1970 ateacute meados da deacutecada de
1980 a agenda ambiental foi se ampliando passando a exigir da
FATMA respostas mais consistentes (BORINELLI 1998) O intervalo
de tempo compreendido entre 1979 a 1982 marcou o fim do periacuteodo de
maior crescimento econocircmico de Santa Catarina Durante o periacuteodo
conservador do Governo Estadual e no novo contexto democraacutetico a
poliacutetica ambiental sofreu um grande desgaste com a crise econocircmica e
fiscal
As forccedilas conservadoras continuaram atuantes com a eleiccedilatildeo de
Esperidiatildeo Amin para governador (1983-1987) e os problemas
ambientais continuaram divorciados de outras poliacuteticas setoriais
(econocircmicas de ciecircncia e tecnologia minerais) O licenciamento
ambiental entrou como atividade inovadora e a FATMA na condiccedilatildeo
de fundaccedilatildeo passava a imagem de independecircncia em relaccedilatildeo ao estado
o que na praacutetica natildeo acontecia e tornava difusa a responsabilidade sobre
a poliacutetica ambiental (BORINELLI 1998) Entre os anos de 1983 e 1987
o oacutergatildeo diretamente envolvido com o Planejamento Ambiental no
Estado de Santa Catarina era o Gabinete de Planejamento (GAPLAN)
(SDS 2014)
Mesmo sendo baseada na pequena propriedade rural Santa Catarina sofreu com o enfraquecimento da pequena produccedilatildeo rural
aumentando o ecircxodo rural e consequentemente os problemas urbanos
Em termos socioambientais intensificaram-se os processos de
degradaccedilatildeo ecossistecircmica mau uso do solo falta de saneamento
impacto do turismo nas zonas costeiras etc (VIEIRA CUNHA 2002)
113
A incapacidade de resolver a contento estas tensotildees inaugurava o
reconhecimento de uma crise ambiental em Santa Catarina e uma crise
institucional da FATMA Nos municiacutepios foram criados os Conselhos
Municipais de Defesa Ambiental (CONDEMA) oacutergatildeos consultivos de
assessoramento das Prefeituras Os membros do CONDEMA eram
escolhidos pelos Prefeitos Em 1983 foram criados trecircs escritoacuterios
regionais da FATMA em Joinville Chapecoacute e Joaccedilaba totalizando
quatro com o escritoacuterio de Criciuacutema criado em 1979 Apesar disso as
poliacuteticas ambientais continuaram condicionadas e limitadas pelos
interesses poliacuteticos e econocircmicos (BORINELLI 1998)
Na linha da natildeo responsabilizaccedilatildeo durante muito tempo os
empresaacuterios do segmento do carvatildeo mineral atuaram livremente na
regiatildeo Sul de Santa Catarina gerando o maior passivo ambiental do
estado Em 1983 a FATMA foi incumbida de licenciar e fiscalizar essa
atividade fazendo um acordo com as empresas que assumiram o
compromisso de instalar equipamentos e modificar processos visando a
diminuiccedilatildeo dos impactos Mesmo assim treze anos depois em 1996 o
diretor da FATMA veio a puacuteblico declarar que natildeo era possiacutevel
identificar os responsaacuteveis pelos impactos na regiatildeo e que a sociedade
pagaria o custo da recuperaccedilatildeo cerca de 70 milhotildees de doacutelares
(BORINELLI 1998)
Nos anos 1990 proliferaram denuncias de corrupccedilatildeo envolvendo
oacutergatildeos ambientais federais e estaduais em processos de licenciamento
apontando para a crise do Estado a fragilidade da democracia e dos
mecanismos de controle puacuteblico das instituiccedilotildees O aumento da procura
por licenciamento ambiental trouxe agrave FATMA uma posiccedilatildeo mais
influente entre os segmentos econocircmicos e poliacuteticos e aumentou
tambeacutem sua autonomia financeira atraveacutes dos licenciamentos
ambientais Apesar disso sua trajetoacuteria estaacute marcada por uma atuaccedilatildeo na
defesa das causas ambientais sem desestruturar o desenvolvimento
econocircmico (BORINELLI 2013 2007)
114
42 O sul catarinense uma trajetoacuteria marcada pelo carvatildeo mineral
A regiatildeo Sul Catarinense eacute formada por 46 municiacutepios agrupados
em trecircs microrregiotildees Araranguaacute8 Criciuacutema
9 e Tubaratildeo
10 Tem como
limites o Oceano Atlacircntico a Leste a mesorregiatildeo da Grande
Florianoacutepolis e Serrana no estado de Santa Catarina e a Mesorregiatildeo
Metropolitana de Porto Alegre e Nordeste Rio-Grandense no estado do
Rio Grande do Sul
Figura 7 ndash Mapa de localizaccedilatildeo da Bacia Carboniacutefera Santa
Catarina
Fonte Concepccedilatildeo de Luciana Butzke Elaborado por Ruy Lucas de
Souza
8 Municiacutepios Araranguaacute Balneaacuterio Arroio do Silva Balneaacuterio Gaivota Ermo
Jacinto Machado Maracajaacute Meleiro Morro Grande Passo de Torres Praia
Grande Santa Rosa do Sul Satildeo Joatildeo do Sul Sombrio Timbeacute do Sul e Turvo 9 Municiacutepios Balneaacuterio Rincatildeo Cocal do Sul Criciuacutema Forquilhinha Iccedilara
Lauro Muller Morro da Fumaccedila Nova Veneza Sideroacutepolis Treviso e
Urussanga 10
Municiacutepios Armazeacutem Braccedilo do Norte Capivari de Baixo Garopaba Gratildeo
Paraacute Gravatal Imaruiacute Imbituba Jaguaruna Lagura Orleans Pedras Grandes
Pescaria Brava Rio Fortuna Sangatildeo Santa Rosa de Lima Satildeo Ludgero Satildeo
Martinho Treze de Maio e Tubaratildeo
115
Os municiacutepios da regiatildeo se dividem em trecircs associaccedilotildees de
municiacutepios a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios do Extremo Sul Catarinense
(AMESC)11
a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera
(AMREC)12
e a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo de Laguna
(AMUREL)13
(FECAM 2014) (Figura 7) A regiatildeo possui tambeacutem
quatro Secretarias de Desenvolvimento Regional (SDR) SDR de
Laguna SDR de Tubaratildeo SDR de Criciuacutema e SDR de Araranguaacute
(SANTA CATARINA 2014a)
Na aacuterea existem quatro feiccedilotildees geoloacutegicas as rochas
cristalinas e metamoacuterficas mais antigas do ldquoembasamento cristalinordquo a
sucessatildeo de rochas sedimentares gondwacircnicas que contecircm as camadas
de carvatildeo os derrames baacutesicos aacutecidos e intermediaacuterios da Formaccedilatildeo
Serra Geral e os sedimentos litoracircneos recentes (SCHEIBE 2000)
Na regiatildeo sul localizam-se duas regiotildees hidrograacuteficas
pertencentes agrave Vertente Atlacircntica a Regiatildeo Hidrograacutefica Sul
Catarinense que tem como bacias hidrograacuteficas a Bacia Hidrograacutefica do
Rio Tubaratildeo e a Bacia Hidrograacutefica do Rio drsquoUna contando com 5733
km2 e a Regiatildeo Hidrograacutefica do Extremo Sul Catarinense tendo como
bacias hidrograacuteficas a Bacia do Rio Urussanga a Bacia Hidrograacutefica do
Rio Araranguaacute e a Bacia Hidrograacutefica do Rio Mambituba contando com
5052 km2 (SANTA CATARINA 2006)
O relevo predominante eacute o forte ondulado e montanhoso com
ocorrecircncia de plano e suave ondulado na planiacutecie costeira Jaacute os solos
predominantes na Regiatildeo Hidrograacutefica Sul Catarinense satildeo os
mediamente profundos de origem graniacutetica pouco feacuterteis e aacutecidos
apresentando pedregosidade Na Regiatildeo Hidrograacutefica Extremo Sul
Catarinense predominam os solos mediamente profundos cascalhentos
11
Municiacutepios filiados Araranguaacute Balneaacuterio Arroio do Silva Balneaacuterio
Gaivota Ermo Jacinto Machado Maracajaacute Meleiro Morro Grande Passo de
Torres Praia Grande Santa Rosa do Sul Satildeo Joatildeo do Sul Sombrio Timbeacute do
Sul e Turvo 12
Municiacutepios filiados Balneaacuterio Rincatildeo Cocal do Sul Criciuacutema Forquilhinha
Iccedilara Lauro Muller Morro da Fumaccedila Nova Veneza Orleans Sideroacutepolis
Treviso e Urussanga 13
Municiacutepios filiados Armazeacutem Braccedilo do Norte Capivari de Baixo Gratildeo
Paraacute Gravatal Imaruiacute Imbituba Jaguaruna Laguna Pedras Grandes Pescaria
Brava Rio Fortuna Sangatildeo Santa Rosa de Lima Satildeo Ludgero Satildeo Martinho
Treze de Maio e Tubaratildeo
116
com baixa fertilidade de origem graniacutetica e sedimentar (SANTA
CATARINA 2006)
Na regiatildeo predomina a Floresta Tropical Atlacircntica e a Vegetaccedilatildeo
Litoracircnea contando com trecircs Unidades de Conservaccedilatildeo estaduais o
Parque Estadual da Serra do Tabuleiro (criado em 1975) o Parque
Estadual da Serra Furada (1980) e a Reserva Bioloacutegica Estadual do
Aguaiacute (1983) e duas Unidades de Conservaccedilatildeo Federais o Parque
Nacional de Satildeo Joaquim (1961) e a Aacuterea de Proteccedilatildeo Integral da Baleia
Franca (2000) (SANTA CATARINA 2006)
Em 2010 a regiatildeo contava com uma populaccedilatildeo de 906927
habitantes e uma densidade populacional de 944 habkm2 Em 2009 a
movimentaccedilatildeo econocircmica segundo a composiccedilatildeo do PIB foi de R$ 147
bilhotildees que equivale a 113 do PIB estadual ocupando a quinta
posiccedilatildeo no ranking estadual entre as nove macrorregiotildees (SEBRAE
2013a)
A ocupaccedilatildeo do sul do Brasil contou com a presenccedila de grupos
caccediladores-coletores (aproximadamente 8000 anos) pescadores-
coletores (6000 e 4000 anos) ceramistas TaquaraItarareacute e Guarani e
horticultores (1000 anos) (CAMPOS et al 2013) Em 1877 chegaram
os italianos seguidos de poloneses e alematildees Os primeiros nuacutecleos
coloniais foram Azambuja (1877) Urussanga (1878) Satildeo Joseacute de
Cresciuacutema (1880) Cocal (1885) Nova Veneza (1890) Nova Belluno
(1891) dentre outros As lavras de carvatildeo surgiram em Santa Catarina
no final do seacuteculo XIX por iniciativa de uma empresa britacircnica Ateacute
entatildeo a economia da regiatildeo era agriacutecola A transformaccedilatildeo urbano-
industrial foi estimulada pelo carvatildeo que vinculava-se a ideia de
progresso Eacute marcante a presenccedila do carvatildeo nos hinos das cidades
monumentos festas de Santa Baacuterbara (Protetora dos Mineiros) houve
uma fusatildeo entre a memoacuteria da imigraccedilatildeo e a memoacuteria do carvatildeo
(CAROLA 2004 GOULARTI FILHO LIVRAMENTO 2004a)
A Primeira Guerra Mundial marcou o aumento da produccedilatildeo do
carvatildeo mineral destacando-se a Companhia Carboniacutefera de Araranguaacute
(CBCA) (1917) a Companhia Carboniacutefera Urussanga (1918) e a
Companhia Carboniacutefera Proacutespera (1921) Em 1920 Santa Catarina jaacute contava com alguns elementos importantes para um complexo
carboniacutefero minas ferrovia e porto Em 1924 com a Lei nordm 4801
abordou-se pela primeira vez a possibilidade de construccedilatildeo de uma usina
sideruacutergica no estado Isso se concretizou em 1941 no Governo Getuacutelio
117
Vargas com a fundaccedilatildeo da Companhia Sideruacutergica Nacional (CSN)
(KOPPE COSTA 2008 MORAES 2003)
Nos periacuteodos referentes ao Plano de Metas (1956-1960) e Plano
Nacional do Desenvolvimento (1974 a 1978) o clima estava propiacutecio
para o aumento da produccedilatildeo do carvatildeo mineral No Plano de Metas
surgiu a Sociedade Termoeleacutetrica de Capivari SA (SOLTECA)
passando depois a se chamar Complexo Termoeleacutetrico Jorge Lacerda
constituiacuteda em 1957 entrou em operaccedilatildeo em 1965 No periacuteodo do Plano
Nacional do Desenvolvimento foi construiacuteda a ICC e o Complexo Jorge
Lacerda foi ampliado (KOPPE COSTA 2008 MORAES 2003)
O primeiro boom do setor foi na ocasiatildeo da Primeira Guerra
Mundial e depois durante a Segunda Guerra Mundial com a produccedilatildeo
aumentando em 300 Com o fim da Segunda Guerra o governo
acabou com as cotas e o setor entrou em crise A reaccedilatildeo do segmento do
carvatildeo mineral foi a ldquobatalha do carvatildeordquo14
e o governo reagiu criando a
CEPCAM e retornando agraves cotas Em 1973 com a crise do petroacuteleo o
setor passou novamente por um boom O auge da mineraccedilatildeo foi entre
1982 a 1985 No periacuteodo aacuteureo do carvatildeo poucas vozes denunciavam as
peacutessimas condiccedilotildees de trabalho tudo em nome do progresso pois o
carvatildeo mineral representava a consolidaccedilatildeo da induacutestria de base no
Brasil De 1970 em diante onze empresas pertencentes a empresaacuterios
locais passaram a explorar o carvatildeo mineral (CAROLA 2004
GOULARTI FILHO 2002)
Ateacute 1990 o Sul de Santa Catarina tinha a primazia em termos de
volume de produccedilatildeo nuacutemero e mecanizaccedilatildeo de minas trabalhadores
empregados e valores econocircmicos entrando em crise a partir daiacute com
sua desregulamentaccedilatildeo no Governo Collor O que precisa ser destacado
eacute que a crise da deacutecada de 1990 natildeo foi a ldquocrise do carvatildeordquo As
induacutestrias de ceracircmica vestuaacuterio e plaacutestico localizadas no Sul tambeacutem
sofreram com a recessatildeo de 1990 a 1992 (BEacuteRZIN 2005 GOULARTI
FILHO 2002 MORAES 2003)
A deacutecada de 1990 foi marcada pelo fechamento e desestatizaccedilatildeo
das induacutestrias do complexo carboniacutefero e eliminaccedilatildeo dos benefiacutecios
governamentais O lavador de Capivari foi fechado em 1992 a ICC
14
A ldquobatalha do carvatildeordquo compreende a adoccedilatildeo de estrateacutegias por parte dos
segmentos econocircmicos envolvidos com o carvatildeo mineral visando pressionar e
convencer o governo federal a apoiar a continuidade da atividade (CAROLA
2010)
118
passou para o controle da Petrobraacutes em 1993 A CSN foi privatizada em
1993 e a Companhia Proacutespera propriedade da CSN foi vendida para a
Nova Proacutespera A Ferrovia Teresa Cristina foi privatizada em 1996 e o
Complexo Jorge Lacerda em 1998 (BEacuteRZIN 2005 GOULARTI
FILHO 2002 MORAES 2003)
O setor carboniacutefero foi cedendo espaccedilo para a induacutestria de
revestimento ceracircmico de plaacutesticos e descartaacuteveis do vestuaacuterio de
calccedilados e metal-mecacircnica Em 1985 a atividade do carvatildeo era a que
mais empregava na regiatildeo sul com 10536 trabalhadores Em 2000
passou para a quinta posiccedilatildeo com 2752 trabalhadores empregados
(GOULARTI FILHO 2005) Em 2010 as atividades econocircmicas que
mais se destacaram foram Induacutestria de transformaccedilatildeo com 3395
estabelecimentos e 58652 trabalhadores seguida por serviccedilos com
16971 estabelecimentos e 47956 trabalhadores em terceiro Comeacutercio
com 7062 estabelecimentos e 34467 trabalhadores construccedilatildeo civil
com 828 estabelecimentos e 6641 trabalhadores induacutestria extrativa
mineral com 78 estabelecimentos e 4083 trabalhadores As atividades
que mais empregavam vestuaacuterio minerais natildeo metaacutelicos (ceracircmica)
alimentar e plaacutestico (FIESC 2012)
Em 2012 as mineradoras empregavam em Santa Catarina 4042
trabalhadores no Paranaacute 358 e no Rio Grande do Sul 734 trabalhadores
Jaacute o faturamento para o mesmo ano foi de R$ 49231200000 (Tabela 3)
(SATC 2012)
Tabela 3 - Faturamento do Segmento do Carvatildeo Mineral 2012
Estado Total (R$)
Paranaacute 2602336257
RG Sul 29354141523
S Catarina 49231200000
Total de R$ 81187677780
Fonte SATC (2012 p 11)
Jaacute a arrecadaccedilatildeo da CFEM para o ano de 2013 ficou em R$
358664403 contando os municiacutepios de Treviso (R$ 356903710)
Lauro Muller (R$ 1570791) e Urussanga (R$ 189902) para um total de R$ 18589306884 (DNPM 2014)
Aleacutem de ocupar o primeiro lugar em faturamento e na
arrecadaccedilatildeo da CFEM Santa Catarina tambeacutem ocupa o primeiro lugar
na produccedilatildeo de carvatildeo bruto considerando os trecircs estados do Sul do
Brasil conforme dados da Tabela 4
119
Tabela 4 - Produccedilatildeo de carvatildeo bruto (ROM) de 2009 a 2012
ESTADOS PRODUCcedilAtildeO ROM (t)
2009 2010 2011 2012
Santa Catarina 8208063 6278327 6570292 6097496
Rio Grande do Sul 4585050 5010779 5153199 5134217
Paranaacute 351930 293329 344161 315131
Brasil 13145043 11582435 12067652 11546844
SCBrasil () 6244 5421 5445 5281
Ranking de SC 1ordm 1ordm 1ordm 1ordm
Fonte Fiesc (2012 p 68) SATC (2012)
O segmento do carvatildeo mineral no Sul de Santa Catarina apesar
do destaque na produccedilatildeo do carvatildeo bruto teve ao longo dos uacuteltimos
anos sua participaccedilatildeo diminuiacuteda em nuacutemero de empregos Isso
demonstra uma maior diversificaccedilatildeo econocircmica e poderia representar a
possibilidade de reconversatildeo da atividade Contudo as accedilotildees do
segmento do carvatildeo mineral e dos segmentos poliacuteticos caminham para a
continuidade e ampliaccedilatildeo da atividade e natildeo para sua reconversatildeo
Um importante passo para o questionamento da atividade
carboniacutefera foi dado em 1993 O passivo ambiental resultante da
atividade carboniacutefera foi alvo de uma accedilatildeo civil puacuteblica (processo
938000533-4) Os reacuteus da accedilatildeo foram as empresas carboniacuteferas seus
diretores e soacutecios majoritaacuterios do Estado de Santa Catarina e da Uniatildeo
totalizando 24 reacuteus (MPF 2012)
A sentenccedila foi declarada em 05012000 tendo como resultado a
condenaccedilatildeo dos reacuteus A eles foi solicitado a elaboraccedilatildeo de ldquoum projeto
de recuperaccedilatildeo da regiatildeo que compotildee a Bacia Carboniacutefera do Sul do Estadordquo contemplando ldquoas aacutereas de depoacutesitos de rejeitos aacutereas
mineradas a ceacuteu aberto e minas abandonadas bem como o
desassoreamento fixaccedilatildeo de barrancas descontaminaccedilatildeo e retificaccedilatildeo dos cursos drsquoaacutegua aleacutem de outras obras que visem amenizar os danos
sofridos principalmente pela populaccedilatildeo dos municiacutepios-sede da extraccedilatildeo e do beneficiamentordquo (MPF 2012)
Apoacutes os acordos e imposiccedilotildees judiciais os passivos ambientais
foram distribuiacutedos de acordo com a responsabilidade das empresas
(Tabela 5)
120
Tabela 5 - Distribuiccedilatildeo de passivos ambientais em relaccedilatildeo agraves
empresas
RESPONSAacuteVEL HECTARES
CSN 1336 26
Uniatildeo 1215 24
Rio Deserto 571 11
Catarinense 522 10
Criciuacutema 457 9
Cocalit 181 4
Outras empresas 807 16
Fonte MPF (2012)
As aacutereas terrestres a recuperar totalizam 5094 hectares em 217
diferentes aacutereas da Bacia Carboniacutefera O cronograma de recuperaccedilatildeo
compreende o periacuteodo de 2012 a 2020 e um total de 3726 hectares
(Tabela 6) (MPF 2012)
Tabela 6 - Cronograma de recuperaccedilatildeo dos passivos ambientais
Ano conclusatildeo Hectares a serem
recuperadas
Acumulado da
recuperaccedilatildeo
Obras jaacute concluiacutedas e assim
consideradas apoacutes vistorias
526 526
2012 1142 1667
2013 205 1872
2014 528 2400
2015 141 2542
2016 560 3102
2017 84 3186
2018 71 3257
2019 382 3639
2020 87 3726
3726
Fonte MPF (2012)
121
Os 1365 hectares restantes natildeo dispotildeem de cronogramas
definidos e representam aacutereas cuja recuperaccedilatildeo eacute de incumbecircncia da
Uniatildeo (89 deles) (MPF 2012)
A trajetoacuteria do Sul eacute marcada pelo carvatildeo mineral mas para aleacutem
da ldquocultura do carvatildeordquo nascem possibilidades ligadas agrave diversificaccedilatildeo
econocircmica que rompem com a dependecircncia econocircmica do carvatildeo
43 Da extraccedilatildeo manual agrave mecanizaccedilatildeo das minas
A mecanizaccedilatildeo das minas comeccedilou na deacutecada de 1970 e com
ela o fim do ldquovelho mineirordquo que dominava todo o processo de
produccedilatildeo Com a mecanizaccedilatildeo iniciou-se a divisatildeo teacutecnica do trabalho e
aumentou a poluiccedilatildeo Na extraccedilatildeo manual do carvatildeo a pneumoconiose
afetava 5 a 8 passando a 10 a 12 com a mecanizaccedilatildeo das minas
Somadas a pneumoconiose bronquites crocircnicas doenccedilas de pele e
ansiedade (CHOINACKI 1992) A tecnologia dessa forma foi ldquo()
implantada na induacutestria natildeo como serva dos trabalhadores mas como
instrumento que tecircm como fim a acumulaccedilatildeo de capitalrdquo (VOLPATO
1984 p 43)
Volpato (2001) destaca trecircs momentos distintos um primeiro
momento que compreende o periacuteodo de 1913 a 1976 no qual a extraccedilatildeo
de carvatildeo era artesanal sem agregar maiores recursos tecnoloacutegicos um
segundo periacuteodo de 1976 a 1981 no qual procurou-se agregar recursos
tecnoloacutegicos para aumentar a produccedilatildeo e um terceiro periacuteodo de 1981 a
1988 no qual verificaram-se os malefiacutecios da tecnologia para o meio
ambiente sauacutede e seguranccedila do trabalhador ldquoAos poucos os operadores
foram sentindo alguns efeitos prejudiciais das novas maacutequinas - A
desagregaccedilatildeo das praacuteticas nas frentes de trabalho pela agilidade e
domiacutenio da maacutequina sobre o processordquo (VOLPATO 2001 p 34)
A mecanizaccedilatildeo por um lado facilitou as praacuteticas de trabalho
poupando a forccedila fiacutesica do mineiro mas por outro com a intensificaccedilatildeo do processo aumentaram os impactos na sauacutede do trabalhador e no meio
ambiente A pneumoconiose natildeo era reconhecida como doenccedila
profissional o que fazia com que os mineiros escondessem os sintomas
e prejudicassem ainda mais sua sauacutede (VOLPATO 2001) Aleacutem das
doenccedilas pulmonares acontecem tambeacutem acidentes de trabalho Em
122
outubro de 2013 os mineiros fizeram uma paralisaccedilatildeo apoacutes a morte de
um colega na mina Fontanella em Treviso Foi o segundo acidente com
morte em menos de trecircs meses e o nono nos uacuteltimos cinco anos (G1SC
2013)
44 Regras em uso
Em grande medida as leis estaduais se articulam agraves leis federais
Nessa seccedilatildeo satildeo apresentados alguns casos em que a lei estadual difere
da lei federal Um primeiro exemplo eacute o Projeto de Lei nordm 026632005
de autoria do Deputado Estadual Julio Garcia que entrou em tramitaccedilatildeo
em 2005 O Projeto defendia a dispensa do Estudo de Impacto
Ambiental e Relatoacuterio de Impacto Ambiental para a atividade de
pequeno porte de extraccedilatildeo de carvatildeo mineral em aacutereas de ateacute dois
hectares e meio Para tanto contava com a seguinte fundamentaccedilatildeo
O art 12 sectsect 1ordm a 3ordm da Resoluccedilatildeo CONAMA n
237 de 19 de dezembro 1997 permite que o
oacutergatildeo ambiental competente no caso a FATMA
se necessaacuterio estabeleccedila procedimentos
especiacuteficos e simplificados para o licenciamento
de atividades cujas caracteriacutesticas e peculiaridades
importem em pequeno potencial de impacto
ambiental ou ainda o licenciamento uacutenico e
simplificado para atividades integrantes de planos
e programas voluntaacuterios de gestatildeo ambiental
(SANTA CATARINA 2005 p 2)
Como os impactos do carvatildeo foram considerados de ldquopequeno
potencialrdquo pelos membros da Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina
(ALESC) o Projeto de Lei foi transformado na Lei nordm 18052 de 26 de
janeiro de 2007 (SANTA CATARINA 2007)
Outro exemplo foi a assinatura do Decreto em 2013 que reduziu
o Imposto sobre Circulaccedilatildeo de Mercadoria (ICMS) de 25 para 3 na
venda de energia eleacutetrica para novos empreendimentos beneficiando
principalmente as termeleacutetricas a carvatildeo O Decreto tem como objetivo favorecer a competitividade do carvatildeo mineral catarinense nos proacuteximos
leilotildees de energia eleacutetrica A-5 (ALESC 2013)
Um uacuteltimo exemplo eacute o Coacutedigo Estadual do Meio Ambiente de
Santa Catarina que continua cercado de muitos pontos polecircmicos
123
(SALVADOR 2009 SANTOS 2014) No Coacutedigo aprovado em 2009 o
Governador em exerciacutecio Luiz Henrique da Silveira fez severas criacuteticas
ao Coacutedigo Ambiental Brasileiro que resulta de uma medida provisoacuteria
que ele chamou de ldquofilha bastarda dos Decretos-Lei da Ditadurardquo
(SILVEIRA 2009 p 9) concebido sem amplitude democraacutetica
Segundo ele o Coacutedigo Ambiental Catarinense levou cinco anos para ser
elaborado e envolveu debates e audiecircncias puacuteblicas
Nosso Coacutedigo foi alvo de poucas mas barulhentas
reaccedilotildees e incompreensotildees contraacuterias ao
desenvolvimento sustentaacutevel Houve quem
ameaccedilasse mandar prender os honestos e
indefesos agricultores que lavrassem suas terras a
menos de trinta metros da mata ciliar
(SILVEIRA 2009 p 9)
A alusatildeo aos agricultores se justifica na medida em que um dos
pontos mais polecircmicos do Coacutedigo eacute a reduccedilatildeo da mata ciliar de 30
metros como prevecirc o Coacutedigo Florestal para 5 metros em propriedades
de menos de cinco hectares
O Coacutedigo natildeo trata de forma especiacutefica o carvatildeo mineral mas
traz novidades em relaccedilatildeo a flexibilizaccedilatildeo e simplificaccedilatildeo do processo
de licenciamento A Seccedilatildeo II do Coacutedigo estabelece prazos para a
concessatildeo das licenccedilas trecircs meses para a LAP e nos casos em que
houver EIARIMA e audiecircncia puacuteblica o prazo seraacute de quatro meses
trecircs meses para a LI e dois meses para a LO Quanto aos prazos de
validade das licenccedilas cinco anos para a LP seis anos para a LI e de
quatro a dez anos para a LAO (SANTA CATARINA 2009b)
Em 2013 entrou em tramitaccedilatildeo o Projeto de Lei 030542013 que
trouxe mudanccedilas ao Coacutedigo Ambiental de Santa Catarina (SANTA
CATARINA 2013) O Projeto foi transformado na Lei nordm 16342 de 21
de janeiro de 2014 A principal mudanccedila eacute a possibilidade de
regularizaccedilatildeo fundiaacuteria em aacuterea rural e urbana de edificaccedilotildees atividades
e demais formas de ocupaccedilatildeo em Aacutereas de Preservaccedilatildeo Permanente
desde que aprovadas pelo Municiacutepio (SANTA CATARINA 2014b) Conveacutem ressaltar que a revisatildeo do Coacutedigo Ambiental de SC e a defesa
do carvatildeo mineral na produccedilatildeo termeleacutetrica foram as duas principais
bandeiras da Assembleia Legislativa de Santa Catarina em 2013
124
45 Envolvidos na gestatildeo
Na sequecircncia faz-se uma breve descriccedilatildeo dos envolvidos na
gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina lembrando que aparecem
aqui os envolvidos que constam nos documentos e publicaccedilotildees
consultadas
451 Segmentos poliacuteticos
O governador em exerciacutecio Raimundo Colombo investiu em sua
campanha de 2010 R$ 323669211 Natildeo houve nenhuma doaccedilatildeo de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral diretamente ao candidato Mas o
Comitecirc Financeiro Uacutenico do Democratas (DEM) que tambeacutem repassou
recursos ao candidato recebeu R$ 6000000 da Carboniacutefera Nossa
Senhora do Caravagio Ltda (TSE 2013) Jaacute os representantes eleitos se
dividem na Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina (Deputados
Estaduais) e nas Cacircmaras Municipais (Vereadores) As relaccedilotildees entre
carvatildeo mineral e poliacutetica seratildeo aprofundadas no proacuteximo capiacutetulo
A FATMA tambeacutem faz parte dos segmentos poliacuteticos Aleacutem do
seu papel descrito na seccedilatildeo 41 um outro ponto merece ser destacado
De 2000 ateacute 2014 periacuteodo que compreende o licenciamento da
USITESC passaram pela FATMA na funccedilatildeo de presidente Suzana
Maria Cordeiro Trebien Seacutergio Joseacute Grando Jacircnio Wagner Constante
Carlos L Kreuz Murilo Xavier Flores e Gean Loureiro Desses Seacutergio
Joseacute Grando recebeu na eleiccedilatildeo de 2006 quando concorreu a Deputado
Estadual R$ 200000 da Sul Catarinense Mineraccedilatildeo e R$ 3000000 da
Tractebel e Jean Marques Loureiro recebeu R$ 10000000 da
Tractebel quando concorreu a prefeito do municiacutepio de Florianoacutepolis
(TSE 2013)
Inclui-se tambeacutem nos segmentos poliacuteticos o Ministeacuterio Puacuteblico
Estadual que atua em parceria com o Ministeacuterio Puacuteblico Federal no
acompanhamento da accedilatildeo civil puacuteblica do carvatildeo (MPF 2012) e no
acompanhamento dos processos de licenciamento
452 Segmentos econocircmicos
Os segmentos econocircmicos se organizam no Sindicato da Induacutestria
da Extraccedilatildeo de Carvatildeo do Estado de Santa Catarina (SIESESC) criado
125
em 1989 em Criciuacutema e na Associaccedilatildeo Beneficente da Induacutestria
Carboniacutefera de Santa Catarina (SATC)15
As principais empresas que atuam no segmento tecircm origem na
proacutepria regiatildeo A Carboniacutefera Metropolitana SA iniciou suas atividades
em 1890 em Nova Veneza A empresa tem sede em Criciuacutema eacute
detentora das maiores reservas de carvatildeo mineral do paiacutes e explora trecircs
minas no municiacutepio de Treviso Outra empresa que atua na regiatildeo haacute
mais de noventa anos criada em 1918 eacute a Carboniacutefera Rio Deserto
Ltda administrada pela famiacutelia Zanette hoje na terceira geraccedilatildeo A
Carboniacutefera conta com minas nos municiacutepios de Lauro Muller Treviso
Criciuacutema e Iccedilara A Carboniacutefera Criciuacutema SA tecircm origem na fusatildeo da
Carboniacutefera Caeteacute Ltda e Carboniacutefera Cocal Ltda em 1943 Com sede
em Criciuacutema a carboniacutefera explora o carvatildeo no municiacutepio de
Forquilhinha A Comin amp Cia atua no rebeneficiamento de rejeitos
antigos Suas atividades iniciaram em 1984 e sua unidade de
beneficiamento localiza-se em Criciuacutema Na deacutecada de 1980 foi criada
tambeacutem a Cooperminas a partir da falecircncia da CBCA A Cooperminas eacute
uma cooperativa de trabalhadores da mineraccedilatildeo que explora o carvatildeo em
Forquilhinha A Carboniacutefera Belluno Ltda iniciou suas atividades em
1991 tem sede em Sideroacutepolis e aleacutem de trabalhar na extraccedilatildeo e
beneficiamento do Carvatildeo atua tambeacutem no transporte e na
comunicaccedilatildeo A empresa eacute administrada pelo Grupo Salvaro e conta
com reservas de 140 milhotildees de toneladas de carvatildeo mineral e minas em
Treviso e Sideroacutepolis Em 1999 a Carboniacutefera Catarinense Ltda passou
a explorar e beneficiar o carvatildeo em duas minas localizadas em Lauro
Muller A Carboniacutefera Sideroacutepolis Ltda opera a Usina de
Beneficiamento Lageado no municiacutepio de Urussanga A Companhia
Energeacutetica Meridional pertence agrave Tractebel Energia SA e tem sede em
Florianoacutepolis A Gabriella Mineraccedilatildeo foi fundada em 2004 a partir da
dissoluccedilatildeo da empresa Coque Catarinense Ltda (COCALIT) A
Minageo atua desde 1986 em sondagens e obras subterracircneas entrando
para a extraccedilatildeo do carvatildeo em 1997 Em 2000 assinou um contrato de
fornecimento de carvatildeo para a Tractebel Energia neste ano mudando
seu nome para Mineraccedilatildeo Santa Augusta em (SIESESC 2008)
15
A SATC foi criada em 1959 como Sociedade de Assistecircncia aos
Trabalhadores do Carvatildeo e tinha como objetivo a preparaccedilatildeo de matildeo-de-obra
qualificada e assistecircncia social As carboniacuteferas contribuem com 1 de seu
faturamento para a manutenccedilatildeo da instituiccedilatildeo (SATC 2014)
126
453 Segmentos sociais
O movimento mineiro teve iniacutecio em 1920 com uma greve na
CBCA Em 1944 surgiu em Criciuacutema a Associaccedilatildeo dos Trabalhadores
na Induacutestria Extrativa do Carvatildeo Em 1945 a associaccedilatildeo passou a ser
sindicato Nos anos 1950 foram fundados sindicatos mineiros em Lauro
Muller (1951) TubaratildeoCapivari (1953) Urussanga (1957) e Rio Maina
(1961) A primeira greve apoacutes o surgimento dos sindicatos aconteceu
em 1958 seguida de outras em 1959 1960 1961 e 1963 (GOULARTI
FILHO LIVRAMENTO 2004b)
Aleacutem das muitas greves um dos maiores feitos do movimento
sindical mineiro foi a ocupaccedilatildeo da CSN e o gerenciamento da massa
falida da CBCA e da Mineraccedilatildeo Barro Branco De 1945 a 1957 os
mineiros natildeo encontraram no sindicato um espaccedilo de luta De 1957 a
1964 formou-se um sindicalismo baseado na luta e na resistecircncia O
sindicato denunciou as condiccedilotildees precaacuterias de trabalho a exploraccedilatildeo
sofrida pela categoria e a falta de seguranccedila nas minas Passando por
momentos difiacuteceis durante a ditadura militar de 1964 a 1978 o
sindicalismo passou por uma letargia vindo a se reorganizar em 1988
apoiando quatro greves da CBCA e da Proacutespera (CHOINACKI 1992
VOLPATO 2001)
Os mineiros apoiam a causa do carvatildeo mineral e as mineradoras
se o assunto for a questatildeo ambiental A categoria natildeo se envolve em
movimentos ambientais
A negaccedilatildeo ou o silecircncio e a passividade dos
mineiros em relaccedilatildeo agrave degradaccedilatildeo ambiental
resultante da induacutestria carboniacutefera eacute a expressatildeo
de um mecanismo de defesa reforccedilando a
seguranccedila dos trabalhadores na manutenccedilatildeo do
emprego e da sobrevivecircncia como objetivo mais
imediato e realista (VOLPATO 2001 p 132)
Essas ideias aleacutem de serem defendidas pelos mineiros satildeo
apoiadas por poliacuteticos ligados ao movimento sindical e agrave luta histoacuterica dos trabalhadores Destacam-se Luci Choinacki Joseacute Paulo Serafim e
Milton Mendes de Oliveira que adotam um discurso de apoio ao carvatildeo
mineral em funccedilatildeo de sua importacircncia social (CHOINACKI 1992)
127
A regiatildeo sul de Santa Catarina contou com vaacuterios movimentos
sociais que atuaram e atuam contra a mineraccedilatildeo ao longo da sua
histoacuteria Em 1986 em Sideroacutepolis surgiu o Movimento Ecoloacutegico de
Sideroacutepolis (MES) que atuou ateacute 1989 Tambeacutem em 1986 em Tubaratildeo
surgiu o Movimento Ecoloacutegico Tubaronense (MOVET) que atuou ateacute
1996 Havia um grande envolvimento da igreja catoacutelica que se
consolidou atraveacutes da criaccedilatildeo da Pastoral da Ecologia ligada agrave Diocese
de Tubaratildeo O objetivo da Pastoral da Ecologia era ldquodespertar uma
consciecircncia ecoloacutegica no homem do sul de Santa Catarina destacando a
importacircncia da preservaccedilatildeo da natureza dom de Deus para todos para
que possa atuar comunitariamente na recuperaccedilatildeo do meio ambienterdquo
(Diocese de Tubaratildeo citada por SANTOS 2008 p 81-2) A Pastoral da
Ecologia organizou romarias ecoloacutegicas a primeira aconteceu em
Criciuacutema em 1986 com o tema ldquoNatureza a ganacircncia te destruiu Noacutes te
reconstruiremosrdquo a segunda em Sideroacutepolis em 1988 com o tema ldquoPela
vida pela paz Contra a induacutestria da morterdquo e a terceira em Tubaratildeo em
1991 com o tema ldquoA Matildee Natureza pede socorro O povo exige a
recuperaccedilatildeo da vida na regiatildeo sulrdquo
Uma iniciativa mais recente de mobilizaccedilatildeo e discussatildeo
aconteceu apoacutes o Furacatildeo Catarina em 2004 Exatamente um ano
depois em 2005 aconteceu o 1ordm Encontro da Regiatildeo Sul sobre fenocircmenos naturais adversidades e mudanccedilas climaacuteticas suas causas
efeitos e necessidades de adaptaccedilatildeo que deu origem ao Manifesto por
Justiccedila Climaacutetica O 2ordm Encontro sobre fenocircmenos naturais adversidades e mudanccedilas climaacuteticas da regiatildeo Sul foi realizado em 6 a
8 de outubro de 2009 A realizaccedilatildeo dos dois eventos coube agrave Cacircmara
Temaacutetica do Meio Ambiente do Foacuterum de Desenvolvimento do Extremo
Sul Catarinense (FDESC) sob a Coordenaccedilatildeo da ONG Soacutecios da
Natureza da AMESC do Nuacutecleo Amigos da TerraBrasil Secretaria de
Desenvolvimento Regional (22ordf SDR) da Prefeitura Municipal de
Araranguaacute (PMA) e do Comitecirc de Gerenciamento da Bacia Hidrograacutefica
do Rio Araranguaacute (CGBHRA) Os eventos tambeacutem receberam apoio das
seguintes organizaccedilotildees e coletivos Assembleia Legislativa do Estado de
Santa Catarina (ALESC) Centro de Apoio Socioambiental (CASA)
Rede Brasileira de Justiccedila Ambiental (RBJA) Amigos da Terra
Internacional Defesa Civil de Santa Catarina Movimento Proacute-
Araranguaacute (MPA) Instituto da Cidadania de Araranguaacute (ICA) Proacute-
Comitecirc da Bacia do Mampituba e Federaccedilatildeo de Entidades Ecologistas
Catarinenses (FEEC) (SOacuteCIOS DA NATUREZA 2009 2005) Os dois
encontros demonstram o interesse e a organizaccedilatildeo socioinstitucional da
128
aacuterea afetada em torno da discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas
relacionada ao mesmo tempo com problemas jaacute existentes no territoacuterio
O Manifesto por justiccedila climaacutetica elaborado em 2005 eacute um ponto de
partida para a discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas e justiccedila ambiental
em Santa Catarina Trata-se de uma discussatildeo local que se conecta com
o global sobre um problema atual que se conecta com problemas jaacute
existentes na regiatildeo (MALUF ROSA 2009)
Outra iniciativa importante eacute a dos Foacuteruns Sul Ambiental que
tecircm como objetivo fortalecer um espaccedilo democraacutetico juntando pessoas
instituiccedilotildees e organizaccedilotildees populares na discussatildeo sobre os problemas
socioambientais do Sul Destaca-se aiacute a participaccedilatildeo de professores e
professoras da UNESC e UFSC aleacutem de convidados e convidadas de
outras universidades sediadas em outros estados brasileiros (SANTOS
2008)
A regiatildeo tambeacutem eacute palco de conflitos Dois casos emblemaacuteticos
envolvendo a resistecircncia dos agricultores aconteceram em 1996 em
Criciuacutema na localidade chamada Morro do Estevatildeo e Albino e em
2003 em Iccedilara na localidade de Santa Cruz e Esperanccedila Neste segundo
conflito havia 300 famiacutelias envolvidas aproximadamente mil pessoas
Essas pessoas sobreviviam da agricultura habitavam o local haacute mais de
cem anos e o tamanho de suas propriedades era na meacutedia de vinte
hectares O conflito era de natureza econocircmica (mineraccedilatildeo versus
agricultura) social (envolvimento e mobilizaccedilatildeo social regional) e
ambiental (degradaccedilatildeo) (NASCIMENTO BURSZTYN 2010 p 79)
Nesses conflitos e nas discussotildees regionais destacam-se
- A ONG Soacutecios da Natureza que surgiu em 1980 em
Araranguaacute e se institucionalizou em 1996 tendo uma atuaccedilatildeo regional
(SANTOS 2008)
A ONG trabalha no sentido de buscar em suas
vaacuterias fontes de accedilatildeo a preservaccedilatildeo da natureza e
uma melhor qualidade de vida para a regiatildeo sul de
Santa Catarina o que assinala sua performance de
conotaccedilatildeo socioambiental No entanto por estar
do mesmo modo voltada a accedilotildees que
constantemente envolvem o papel do Estado
tambeacutem pode ser caracterizada por suas
suposiccedilotildees poliacuteticas contra o poder estabelecido
(SANTOS 2008 p 124)
129
- A FEEC que surgiu em 1989 tendo como objetivo unificar e
fortalecer a luta ecoloacutegica catarinense (SANTOS 2008)
- A atuaccedilatildeo de pesquisadores da UNESC e UFSC bem como
pesquisadores sediados em outras universidades do Brasil
- O Grupo de Pesquisa ldquoMemoacuteria e Cultura do Carvatildeo em Santa
Catarinardquo que foi formado em 2000 e inscrito no CNPq em 2002 Ele
reuacutene professores e alunos da UNESC Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS) e CETEM do Rio de Janeiro que estudam
temas relacionados agraves atividades carboniacuteferas O objetivo principal do
Grupo eacute discutir criticamente a cultura a histoacuteria e a economia do
carvatildeo
Ainda nos segmentos sociais incluem-se
- O IPAT vinculado agrave UNESC responsaacutevel pela confecccedilatildeo de
EIARIMA para muitas mineradoras da regiatildeo
- Os meios de comunicaccedilatildeo locais e regionais que natildeo publicam
informaccedilotildees que prejudiquem o segmento carboniacutefero jaacute que muitos satildeo
de propriedade de mineradores e outros recebem valores na forma
patrociacutenio (SANTOS 2008)
46 Situaccedilatildeo atual e desafios
As poucas mudanccedilas ocorridas ateacute o momento satildeo
frutos da pressatildeo exercida pelo movimento
ambiental como um todo na qual seus integrantes
protagonizam um conflito que revela o quanto a
voz do lsquoinimigorsquo fala mais alto (SANTOS 2008
p 160)
A intenccedilatildeo do capiacutetulo foi tratar da gestatildeo de recursos comuns em
Santa Catarina com ecircnfase no carvatildeo mineral O resgate agrave trajetoacuteria do
desenvolvimento catarinense mostra uma ecircnfase na apropriaccedilatildeo privada
dos recursos comuns subordinada ao crescimento econocircmico A
preocupaccedilatildeo ambiental por muito tempo foi considerada marginal
curiosamente ateacute mesmo pelo oacutergatildeo ambiental estadual que incentivou
a expansatildeo da atividade carboniacutefera Essa condiccedilatildeo marginal tambeacutem se
mostra nas regras em uso O Coacutedigo Ambiental de Santa Catarina eacute um
exemplo disso Vaacuterios pontos flexibilizaram a lei ambiental federal para
beneficiar os segmentos econocircmicos
130
O Sul de Santa Catarina tem disponibilidade de carvatildeo mineral e
ao longo de sua trajetoacuteria de desenvolvimento o vem explorando a
despeito dos impactos socioambientais causados pela atividade Nas
uacuteltimas deacutecadas a centralidade desta vem cedendo lugar a outra
atividades econocircmicas Todavia o viacutenculo cultural eacute muito forte Mas
tambeacutem satildeo fortes as vozes contraacuterias agrave exploraccedilatildeo do carvatildeo Os
segmentos sociais se organizam regionalmente e satildeo responsaacuteveis por
movimentos eventos e por uma articulaccedilatildeo em rede com organizaccedilotildees
sediadas em outros estados do Brasil
No Quadro 7 eacute feita uma siacutentese dos principais pontos abordados
ao longo do capiacutetulo que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
energia termeleacutetrica
Quadro 7 ndash Aspectos que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral Santa
Catarina
MACRO
VARIAacuteVEIS
ASPECTOS QUE
FAVORECEM A
AMPLIACcedilAtildeO
ASPECTOS QUE
QUESTIONAM A
AMPLIACcedilAtildeO
Dinacircmicas de
desenvolvimento
- Fragilidade institucional da
FATMA
- Dependecircncia da matriz
energeacutetica catarinense ndash 35
da energia eleacutetrica
consumida no estado vem do
carvatildeo mineral
- Possibilidade de
conexatildeo do carvatildeo
com discussotildees mais
amplas
Atributos fiacutesicos e
tecnoloacutegicos
- Cultura do carvatildeo no Sul
de Santa Catarina
- Disponibilidade do recurso
- Bom faturamento do
segmento do carvatildeo mineral
- Aumento da produccedilatildeo com
a mecanizaccedilatildeo do processo
de trabalho
- Recuperaccedilatildeo do passivo
ambiental como ponto
positivo para a continuidade
da exploraccedilatildeo do recurso
- Aumento da
produccedilatildeo associado a
degradaccedilatildeo
socioambiental
- Diversificaccedilatildeo
econocircmica da regiatildeo
Sul de Santa
Catarina
Regras em uso - Coacutedigo Estadual do Meio
Ambiente estabelece prazos
para as licenccedilas ambientais
131
- Dispensa do EIARIMA
para a atividade de extraccedilatildeo
do carvatildeo mineral de
pequeno porte
- Reduccedilatildeo do ICMS de 25
para 3
Arena de accedilatildeo
(Caracterizaccedilatildeo dos
envolvidos na gestatildeo)
- Parceria de parte dos
segmentos poliacuteticos com os
segmentos econocircmicos
- Parte dos segmentos
sociais os trabalhadores
costumam apoiar a causa do
carvatildeo
- A UNESC que tambeacutem faz
parte dos segmentos sociais
elaborou o EIARIMA
- Miacutedia (segmentos sociais)
natildeo divulga notiacutecias que
prejudiquem o segmento
carboniacutefero
- Parte dos segmentos
sociais ocupam
espaccedilos de
participaccedilatildeo
instituiacutedos
- Existecircncia de
movimentos sociais
regionais
- Parcerias com
ONGs e
Universidades
- Observatoacuterio do
Carvatildeo
- Foacuteruns de
discussatildeo
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na macro variaacutevel arena de accedilatildeo a variaacutevel da democracia
apresenta limites relacionados ao apoio dos segmentos poliacuteticos
(Governo Estadual e FATMA) e de parte dos segmentos sociais
(Movimento Sindical IPATUNESC e miacutedia) agrave causa do carvatildeo
mineral Nas possibilidades destacam-se a atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico a organizaccedilatildeo dos segmentos sociais nas redes que unem
ONGs academia e afetadosatingidosameaccedilados e as publicaccedilotildees
(Quadro 8)
132
Quadro 8 ndash Limites e possibilidades do sistema democraacutetico em
Santa Catarina VARIAacuteVEL LIMITES POSSIBILIDADES
Fortalecimento
do sistema
democraacutetico
- Parte dos segmentos
poliacuteticos (Governo
estadual e FATMA)
apoiam a atividade
- Parte dos segmentos
sociais (Movimento
sindical e o
IPATUNESC) apoiam a
causa do carvatildeo mineral
- Miacutedia apoia o segmento
carboniacutefero
- Atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico
- Organizaccedilatildeo de parte dos
segmentos sociais
- Redes unindo ONGs
academia e
afetadosatingidosameaccedilados
- Publicaccedilotildees
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Apesar do forte viacutenculo entre parte dos segmentos poliacuteticos
segmentos econocircmicos e parte dos segmentos sociais em defesa do
carvatildeo mineral outra parte dos segmentos sociais demonstra
aprendizado social adaptativo ao coordenar suas accedilotildees no niacutevel regional
Em uma regiatildeo na qual a atividade estaacute tatildeo arraigada e muitos
municiacutepios e pessoas dependem dela para o seu sustento a mobilizaccedilatildeo
regional eacute uma forma criativa e articulada de enfrentar um problema que
eacute histoacuterico e que se perpetua nas relaccedilotildees poliacuteticas existentes Estas
seratildeo tratadas nos capiacutetulos cinco e seis tanto na democracia
representativa (via eleiccedilotildees) quanto na democracia participativa
(audiecircncias puacuteblicas no processo de licenciamento) para elucidar ainda
mais os limites e as margens de manobra colocadas nos capiacutetulos trecircs e
quatro fundamentais no delineamento de alternativas ao carvatildeo mineral
5 CARVAtildeO MINERAL E POLIacuteTICA EM SANTA CATARINA
ELEICcedilOtildeES E FINANCIAMENTO PRIVADO
Como montanhas de rejeitos soacutelidos compostos de
pirita e enxofre permanece a mesma poliacutetica do
passado patrimonial (TEIXEIRA 1996 p 95)
A histoacuteria do Sul de Santa Catarina estaacute intimamente ligada ao
carvatildeo mineral Dos tempos aacuteureos entre as deacutecadas de 1930 e 1980 agrave
crise dos anos 1990 e do seu ressurgimento no Governo Fernando
Henrique Cardoso com o anuacutencio da construccedilatildeo de novas termeleacutetricas
movidas a carvatildeo mineral Agora em 2013 no Governo Dilma o carvatildeo
nos leilotildees de energia em 2013 As decisotildees nacionais que ora
incentivam o carvatildeo mineral ora dificultam sua exploraccedilatildeo e uso
impactam sensivelmente as regiotildees que tecircm em seu subsolo esse
recurso natural natildeo renovaacutevel Cabe a essas regiotildees se adaptar
preferencialmente influenciando esses contextos mais amplos
No livro Os donos da cidade Joseacute Paulo Teixeira (1996 p 16)
afirma que o complexo carboniacutefero do Sul de Santa Catarina ldquofoi
constituiacutedo a partir de uma ligaccedilatildeo poliacutetico-estrutural entre a esfera
puacuteblica e privadardquo Tendo essa ideia como referecircncia o objetivo do
capiacutetulo eacute identificar relaccedilotildees entre a poliacutetica catarinense e as empresas
que exploram e utilizam o carvatildeo mineral
Para aleacutem dos discursos sobre desenvolvimento econocircmico
seguranccedila energeacutetica e tecnologias natildeo poluentes a hipoacutetese de que se
parte eacute que existe uma reciprocidade entre os interesses dos poliacuteticos ao
receberem doaccedilotildees para suas campanhas eleitorais e os interesses dos
doadores ligados ao carvatildeo mineral Nesse sentido as injusticcedilas
ecoloacutegicas se referem natildeo apenas agrave distribuiccedilatildeo de riscos ambientais
delimitados localmente Elas satildeo condicionadas tambeacutem poliacuteticas e
praacuteticas cujas consequecircncias atravessam fronteiras instituiacutedas e afetam
muacuteltiplas escalas Como jaacute foi ressaltado anteriormente o conceito de
injusticcedila ecoloacutegica designa um sintoma de um processo que envolve a
distribuiccedilatildeo o reconhecimento e a representaccedilatildeo poliacutetica e determina a
distribuiccedilatildeo desigual dos riscos e danos ambientais (HOLIFIELD et al
2009 SCHLOSBERG 2009 e 2004)
Para tanto foram analisados os pronunciamentos da Frente
Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral e as prestaccedilotildees de
contas das eleiccedilotildees de 2002 2004 2006 2008 2010 e 2012 As eleiccedilotildees
de 2004 2008 e 2012 foram eleiccedilotildees municipais e as eleiccedilotildees de 2002
134
2006 e 2010 foram gerais O recorte temporal utilizado se deve a duas
razotildees principais acompanhar as doaccedilotildees durante o periacuteodo em que se
deu o processo de licenciamento da USITESC e o acesso agraves prestaccedilotildees
de contas que teve iniacutecio na eleiccedilatildeo de 2002
O capiacutetulo eacute dividido em trecircs seccedilotildees principais aleacutem dessa
introduccedilatildeo A primeira seccedilatildeo trata dos argumentos presentes nos
discursos poliacuteticos A segunda apresenta os dados sobre doaccedilotildees de
empresas nas eleiccedilotildees gerais e municipais A terceira e uacuteltima seccedilatildeo traz
uma siacutentese dos fatos ausentes dos discursos Os dados apresentados
sugerem um apoio muacutetuo entre os interesses poliacuteticos e privados Os
candidatos de Santa Catarina que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral em suas campanhas satildeo os mesmos que
apoiam a causa do carvatildeo mineral Nesse caso o apoio envolve a
construccedilatildeo de mais uma termeleacutetrica a USITESC a inclusatildeo do carvatildeo
mineral nos leilotildees de 2013 e a reduccedilatildeo de Imposto sobre o ICMS de
25 para 3 na venda de energia eleacutetrica visando melhorar a
competitividade do carvatildeo mineral de Santa Catarina frente a outros
recursos energeacuteticos
51 Os argumentos presentes no discurso dos poliacuteticos
A Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral foi
constituiacuteda no Congresso Nacional em 2005 tendo como principal
objetivo a expansatildeo do uso do carvatildeo mineral na matriz energeacutetica
nacional Datam desse ano quatro pronunciamentos na Cacircmara dos
Deputados Afonso Hamm (Partido Progressista - PPRS) no dia 19 de
outubro Leodegar Tiscoski (PPSC) no dia 2 de novembro Marcus
Vicente (Partido Trabalhista Brasileiro - PTBES) no dia 9 de
novembro e Edinho Bez (PMDBSC) no dia 18 de novembro
As frentes satildeo constituiacutedas por parlamentares que de forma
suprapartidaacuteria se reuacutenem para tratar de uma questatildeo especiacutefica O que
estaacute em jogo eacute a defesa de interesses econocircmicos ou empresariais
corporativos setoriais ou profissionais regionais e ideoloacutegicos dentre
outros No periacuteodo de 2003 a 2007 havia 148 frentes no parlamento
brasileiro (CORADINI 2010)
Em 19 de outubro de 2005 Afonso Hamm (PPRS) em seu
pronunciamento na Cacircmara dos Deputados reforccedilou a importacircncia do
setor para a seguranccedila energeacutetica e para a geraccedilatildeo de empregos em
Santa Catarina e no Rio Grande do Sul Natildeo houve qualquer menccedilatildeo agrave
135
questatildeo socioambiental exceto para falar do carvatildeo mineral como
ldquoreserva de energiardquo O carvatildeo foi colocado como ldquotema de grande
relevacircnciardquo ressaltando-se a importacircncia de buscar a ldquocompetitividade
do setorrdquo atraveacutes de novos projetos para gerar ldquoem torno de 10 mil
empregos na regiatildeo atualmente deprimida econocircmica e socialmenterdquo
(HAMM 2005 p 50549) Os argumentos em defesa do carvatildeo mineral
enaltecem a seguranccedila e a auto-suficiecircncia energeacutetica do Sul e do Brasil
juntamente com outros argumentos de cunho econocircmico
Por sua vez o pronunciamento de Leodegard Tiscoski traz um
histoacuterico do carvatildeo mineral desafios e medidas reinvindicadas pela
Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral Sobre a
questatildeo ambiental a uacutenica menccedilatildeo aparece no seguinte trecho
Principal insumo energeacutetico no iniacutecio do seacuteculo
XX o carvatildeo foi gradualmente perdendo
importacircncia ateacute transformar-se no patinho feio das
nossas fontes energeacuteticas natildeo soacute pelas suas
deficiecircncias naturais mas principalmente pelos
danos ambientais causados pela sua exploraccedilatildeo
(TISCOSKI 2005 p 52894)
Os problemas enfrentados pelo carvatildeo mineral satildeo imputados ao
governo federal como sugere o trecho a seguir ldquoA histoacuteria do carvatildeo
em Santa Catarina eacute uma sucessatildeo de altos e baixos determinados
sempre pela vontade do Governo Federal independentemente de que tal
vontade fosse beneacutefica ou maleacutefica aos interesses estaduaisrdquo
(TISCOSKI 2005 p 52895) Ao Governo Federal eacute atribuiacuteda tambeacutem a
responsabilidade pela estabilidade de empregos retorno de
investimentos e recuperaccedilatildeo do ambiente natural ldquoRelegado agrave proacutepria
sorte o carvatildeo em Santa Catarina passou a conviver com a incerteza do
emprego e mais que tudo com a anguacutestia da perda de renda de milhares
e milhares de famiacutelias da regiatildeo sul de Santa Catarinardquo (TISCOSKI
2005 p 52895)
Somados aos argumentos sobre a importacircncia econocircmica
ressalta-se o carvatildeo mineral como alternativa ao petroacuteleo e agrave
hidroeletricidade A Frente Parlamentar reivindica a isonomia das regras do leilatildeo de energia nova regulamentaccedilatildeo do artigo 13 da Lei nordm
10438 retomada das pesquisas geoloacutegicas e implementaccedilatildeo de projetos
de pesquisa visando um melhor aproveitamento do carvatildeo ldquoO carvatildeo
136
mineral do Brasil natildeo pode ser objeto de atenccedilatildeo por parte do Governo
Federal apenas nos momentos de criserdquo (TISCOSKI 2005 p 52896)
Em seu pronunciamento Marcus Vicente (PTBES) (2005 p
53630) trata o carvatildeo mineral como ldquoitem de alto significado
estrateacutegicordquo ldquofonte energeacutetica segura e confiaacutevelrdquo que ldquosempre foi
colocado em plano secundaacuteriordquo O discurso reforccedila a geraccedilatildeo de
empregos e a seguranccedila energeacutetica Quanto agrave questatildeo ambiental ela eacute
ldquocolocada em duacutevida quando se fala em maior aproveitamento do
carvatildeordquo (VICENTE 2005 p 53630) Haacute uma aposta na pesquisa e no
desenvolvimento tecnoloacutegico que coloca a mineraccedilatildeo como uma
atividade que pode ser feita ldquosem degradaccedilatildeo ambiental nem
comprometimento da sauacutede dos trabalhadoresrdquo Afirma-se que em
1520 anos a energia seraacute gerada com emissatildeo zero e que as aacutereas
degradadas no Brasil jaacute estatildeo sendo recuperadas (VICENTE 2005 p
53631) Segundo este parlamentar o Brasil precisa acompanhar o curso
da histoacuteria
Jaacute Edinho Bez (PMDBSC) fundamenta seus argumentos em uma
reuniatildeo do G-8 na qual se assume que ldquosuprimentos de energia
confiaacuteveis e baratos satildeo essenciais para um forte crescimento
econocircmicordquo (BEZ 2005 p 55746) Ele afirma que o carvatildeo mineral
tem um papel ldquovitalrdquo a desempenhar face ao contingente de pessoas que
ainda natildeo dispotildeem de acesso a energia comercial por ser uma energia
barata O petroacuteleo e o gaacutes natural seriam fontes energeacuteticas inseguras se
comparadas ao carvatildeo mineral A questatildeo ambiental aparece como
desafio que estaacute sendo equacionado pelo investimento em
desenvolvimento tecnoloacutegico Segundo Bez (2005 p 55746) o objetivo
da Frente Parlamentar eacute o de colocar o carvatildeo mineral ldquodefinitivamente
na agenda do Governo Federal com isso induzindo ao desenvolvimento
regional gerando renda e trabalho e aumentando a seguranccedila energeacutetica
vital para o crescimento do Paiacutesrdquo
No intervalo de tempo compreendido entre dezembro de 2005 e
maio de 2011 natildeo houve pronunciamentos da Frente Parlamentar em
Defesa do Carvatildeo Mineral Todavia nesse periacuteodo a Frente manteve a
articulaccedilatildeo natildeo soacute com o segmento produtivo do carvatildeo mineral mas
tambeacutem com o Ministeacuterio das Minas e Energia e o Ministeacuterio da Ciecircncia
e Tecnologia resultando em accedilotildees programas e projetos importantes
para o segmento (AMARAL 2011)
Em 2011 ocorreram apenas dois pronunciamentos um de Edinho
Bez e outro de Delciacutedio do Amaral O pronunciamento de Edinho Bez
137
(PMDBSC) primeiro secretaacuterio da Frente Parlamentar refere-se agrave
posse da Comissatildeo Executiva da referida Frente Ele fala no carvatildeo
mineral como ldquoenergia do futurordquo ldquoresponsaacutevel pela boa qualidade de
vida de centenas de pessoas nas economias mais desenvolvidasrdquo (BEZ
2011 p 20895) Menciona apenas aspectos econocircmicos da induacutestria
carboniacutefera entendida como base do desenvolvimento socioeconocircmico
do Sul de Santa Catarina Ele finaliza o pronunciamento afirmando que
natildeo se poderia abrir matildeo de nenhuma alternativa energeacutetica
Em novembro de 2011 ocorreu a reinstalaccedilatildeo da Frente formada
por 203 deputados federais e 12 senadores e integrada por ex-
parlamentares do Congresso Nacional Deputados Estaduais Prefeitos
Municipais Vereadores Sindicalistas O principal objetivo da Frente em
2011 era a participaccedilatildeo nos leilotildees A-5
A Frente Parlamentar tem como presidentes de honra o Senador
Joseacute Sarney (PMDBAP) e o Deputado Marco Maia (PTRS) Na
Comissatildeo Executiva o Presidente eacute o Senador Delciacutedio do Amaral
(PTMG) Primeiro Vice-Presidente Deputado Afonso Hamm (PPRS)
Segundo Vice-Presidente Senador Paulo Bauer (Partido da Social
Democracia Brasileira - PSDBSC) Primeiro Secretaacuterio Deputado
Edinho Bez (PMDBSC) Segundo Secretaacuterio Deputado Henrique
Fontanta (PTRS) Terceiro Secretaacuterio Deputado Eduardo Sciarra
(DEMPR) e Quarto Secretaacuterio Deputado Ronaldo Zulke (PTRS)
(AMARAL 2011)
Fazem parte do Conselho Consultivo da Frente como Presidente
o Senador Luiz Henrique da Silveira (PMDBSC) e Vice-Presidente
Deputado Ronaldo Benedet (PMDBSC) como membros cooperadores
Fernando Luiz Zancan (Presidente da ABCM) Cesar Weinschenck de
Faria (Presidente do SNIEC) Ruy Hulse (Presidente do SIECESC)
Sereno Chaise (Diretor da CGTEE) Manoel Arlindo Zaroni Torres
(Diretor-Presidente da Tractebel Energia SA) Paulo Monteiro (Diretor
de Sustentabilidade da EBX representando a MPX Energia SA)
Benony Schmitz Filho (Diretor-Presidente da Ferrovia Tereza Cristina
SA ndash FTC) Paulo Camillo Vargas Penna (Presidente do IBRAM) Luiz
Fernando Leone Vianna (Presidente do Conselho de Administraccedilatildeo da
Associaccedilatildeo Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Eleacutetrica
ndash APINE) Heacutelio Bunn (Presidente da AMREC e prefeito do municiacutepio
de Lauro Muller) Paulo Roberto Felix Machado (Presidente da
Associaccedilatildeo de Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera do Rio Grande do Sul
ndash ASMURC e prefeito de Butiaacute) Genoir Joseacute dos Santos (Presidente da
138
Federaccedilatildeo Interestadual dos Trabalhadores na Induacutestria da Extraccedilatildeo de
Carvatildeo) e Oniro da Silva Camilo (Presidente do Sindicato
Intermunicipal dos Trabalhadores nas Induacutestrias de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
Ouro Calcaacuterio Cal e Barro da Regiatildeo Centro-Sul do Estado do Rio
Grande do Sul) (AMARAL 2011) A composiccedilatildeo do conselho
consultivo demonstra que a Frente Parlamentar Mista em Defesa do
Carvatildeo Mineral se assenta em interesses setoriais e empresariais
regionalmente e nacionalmente representados (CORADINI 2010)
Em agosto de 2012 Afonso Hamm fez um pronunciamento cujo
tema era a sustentabilidade da matriz energeacutetica do Brasil e a criaccedilatildeo da
Associaccedilatildeo Proacute-Carvatildeo (APC) Na sua opiniatildeo ldquoa associaccedilatildeo tem como
propoacutesito estabelecer estrateacutegias de reivindicaccedilatildeo tendo como principal
finalidade a inclusatildeo das usinas termeleacutetricas a carvatildeo mineral nos
leilotildees de energia A-5rdquo (HAMM 2012 p 28704) Mais adiante
esclarece que ldquofalei pessoalmente com a Presidenta Dilma haacute
aproximadamente um ano em Esteio tratando dessa Agendardquo (HAMM
2012 p 28704) Natildeo se fala da questatildeo ambiental a natildeo ser quando eacute
colocada em pauta a inclusatildeo no leilatildeo dos empreendimentos jaacute
instalados e daqueles cuja licenccedila ambiental encontra-se em andamento
Em marccedilo de 2013 Edinho Bez fez seu pronunciamento sobre a
inclusatildeo do carvatildeo mineral no leilatildeo
Sr Presidente meus colegas Parlamentares falo
com satisfaccedilatildeo envaidecido com esta casa e o
proacuteprio Paiacutes pela notiacutecia dada pelo Ministro
Edison Lobatildeo de Minas e Energia com a
autorizaccedilatildeo da Presidente Dilma de que seraacute
incluiacutedo nos proacuteximos leilotildees o carvatildeo mineral
uma fonte de energia uma fonte que garante o
fornecimento de energia natildeo dependeraacute de Satildeo
Pedro natildeo dependeraacute das chuvas natildeo dependeraacute
sequer de uma nem duas ou trecircs Noacutes teremos
mais uma alternativa (BEZ 2013 p 06320)
Bez (2013) ressaltou ainda que o preccedilo do carvatildeo nacional
precisa baixar e para tanto torna-se necessaacuterio reduzir a carga
tributaacuteria Segundo ele o Vice-Governador do Estado de Santa Catarina
Eduardo Moreira jaacute manifestou a disposiccedilatildeo de avanccedilar nessa direccedilatildeo O
resultado dessa disposiccedilatildeo foi a reduccedilatildeo via Decreto em 2013 do ICMS
de 25 para 3 na venda de energia eleacutetrica para novos
empreendimentos beneficiando principalmente as termeleacutetricas a carvatildeo
(ALESC 2013)
139
Ao comentar sobre a posse da nova diretoria da Frente
Parlamentar composta por 182 deputados e senadores presidida pelo
Deputado Federal Afonso Hamm Bez (2013 p 06321) comenta que a
abertura ficou a cargo do presidente da Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo
Mineral o ldquoamigordquo Fernando Zancan
Nos pronunciamentos transparece a ecircnfase colocada na promoccedilatildeo
da seguranccedila energeacutetica do Sul e do Paiacutes mediante o aproveitamento do
carvatildeo mineral visto como uma alternativa viaacutevel se comparada agrave
hidroeletricidade ao gaacutes natural e ao petroacuteleo Como argumentos de
defesa o desenvolvimento econocircmico das regiotildees carboniacuteferas de Santa
Catarina e do Rio Grande do Sul parece depender desta atividade
Aspectos socioambientais satildeo apenas tangenciados reconhecendo-se em
alguns momentos que a atividade carboniacutefera causou impactos mas
tambeacutem se admitindo que os mesmos jaacute foram ou estatildeo sendo
resolvidos natildeo devendo se repetir em decorrecircncia dos avanccedilos
tecnoloacutegicos do segmento
52 Panorama das eleiccedilotildees e doaccedilotildees de campanha de 2002 a 2012
Ateacute 1992 a legislaccedilatildeo em vigor proibia a oferta de doaccedilotildees por
parte das empresas Mas as reformas na legislaccedilatildeo apoacutes 1992 tornaram o
sistema mais tolerante apostando na prestaccedilatildeo de contas como forma de
controle puacuteblico Em 1994 o TSE passou a divulgar dados sobre as
candidaturas e contas de campanha Os dados satildeo de responsabilidade
dos candidatos e questiona-se a veracidade dos mesmos vaacuterios satildeo os
casos de financiamentos ilegais corrupccedilatildeo traacutefico de influecircncias
envolvimento com crime organizado que passam a contribuir para a
criacutetica ao financiamento privado Em funccedilatildeo desses problemas o tema
do financiamento poliacutetico tornou-se central no debate recente sobre a
reforma poliacutetica (LEMOS MARCELINO PEDERIVA 2010 SPECK
2005)
Os resultados das eleiccedilotildees indicam fortes viacutenculos com doaccedilotildees e
gastos de campanha quanto maiores as doaccedilotildees e gastos maiores as
chances de o candidato se eleger Os doadores se tornaram tatildeo
fundamentais nas campanhas que tecircm determinado muitas vezes a
proacutepria escolha do candidato A reeleiccedilatildeo apresenta-se como um trunfo
aos candidatos jaacute que o risco do doador eacute menor do que se este
escolhesse um iniciante (LEMOS MARCELINO PEDERIVA 2010)
140
Em contrapartida candidatos tendem a compensar tais investimentos se
e quando eleitos ldquoEacute grande a lista de entidades que satildeo potencialmente
beneficiadas por decisotildees ou medidas administrativas do governo entre
estes os bancosrdquo (SPECK 2005 p 148)
No Brasil satildeo permitidas doaccedilotildees de empresas que possuem
relaccedilotildees contratuais com o Estado natildeo existindo regra que limite a
dependecircncia entre candidato e doador Dados sobre as prestaccedilotildees de
contas demonstram um problema de dependecircncia entre os candidatos e
seus principais financiadores (SPECK 2005)
Na sequecircncia satildeo examinadas as doaccedilotildees das eleiccedilotildees de 2002 a
2012 divididas em eleiccedilotildees gerais e eleiccedilotildees municipais A ecircnfase recai
nas doaccedilotildees realizadas por empresas ligadas ao carvatildeo mineral e sua
relaccedilatildeo com os candidatos de Santa Catarina As doaccedilotildees para
candidatos de outros estados natildeo satildeo tratadas neste capiacutetulo
521 Eleiccedilotildees gerais
No periacuteodo compreendido entre os anos de 2002 e 2012
ocorreram trecircs eleiccedilotildees gerais Constam nos registros do Tribunal
Superior Eleitoral nove empresas relacionadas ao carvatildeo mineral em
Santa Catarina como doadoras
O Complexo Jorge Lacerda que utiliza carvatildeo mineral para
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica pertence agrave Tractebel que tambeacutem eacute
proprietaacuteria das Usinas Hidreleacutetricas de Itaacute Machadinho e Co-geraccedilatildeo
de biomassa em Lages todos situados em Santa Catarina A Carboniacutefera
Metropolitana SA tem 123 anos de existecircncia estaacute sediada em
Criciuacutema e possui parte da USITESC A Carboniacutefera Belluno Ltda foi
fundada em 1991 apoacutes a compra de parte da Companhia Sideruacutergica
Nacional pelo Grupo Salvaro e localiza-se em Sideroacutepolis Aleacutem de
trabalhar na extraccedilatildeo e beneficiamento do Carvatildeo a Carboniacutefera
Belluno tambeacutem atua no transporte e na comunicaccedilatildeo A Mineraccedilatildeo
Castelo Branco Ltda localiza-se em Lauro Muller A Carboniacutefera
Criciuacutema foi fundada em 1943 e tem sede em Criciuacutema A Induacutestria
Carboniacutefera Rio Deserto foi criada em 1918 e localiza-se em Criciuacutema
bem como a Coque Catarinense a Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos e a
Mineraccedilatildeo Santa Augusta
141
A eleiccedilatildeo de 2002 teve como principais doadores a Tractebel
(5007) a Carboniacutefera Metropolitana (1488) e a Carboniacutefera
Belluno (1320) A empresa que mais apoiou candidatos dez no total
foi a Carboniacutefera Metropolitana As demais empresas apoiaram cinco
candidatos ou menos conforme consta na Tabela 7
Tabela 7 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2002
Fonte TSE 2013
Quanto ao montante de doaccedilotildees por candidato em 2002
destacou-se o candidato a governador Esperidiatildeo Amin que recebeu de
quatro empresas 4138 do total de doaccedilotildees O candidato Paulo Roberto
Bauer recebeu de quatro empresas o equivalente a 1182 das doaccedilotildees
Cleacutesio Salvaro recebeu apenas 673 Aleacutem dos trecircs candidatos citados
outros dezesseis candidatos ficaram com 4007 das doaccedilotildees conforme
dados da Tabela 8 As duas uacuteltimas colunas da Tabela 8 relacionam as
doaccedilotildees com a receita total dos candidatos Em quatro dos 19 candidatos
as doaccedilotildees das empresas ligadas ao carvatildeo mineral representam mais de
50 de sua respectiva receita
Nordm
CANDIDATOS
Tractebel Egi South America Ltda 5 PFL PP PPB PSDB 53000000 5007
Carboniacutefera Metropolitana SA 10 PP PMDB PSDB PT PPB PFL 15750000 1488
Carboniacutefera Belluno Ltda 3 PMDB PFL PT 13970000 1320
Mineraccedilatildeo Castelo Branco Ltda 5 PFL PMDB PP PPB PSDB 8467400 800
Carboniacutefera Criciuacutema Ltda 5 PFL PT PSDB PMDB PT 6450000 609
Induacutestria Carboniacutefera Rio Deserto Ltda 5 PFL PMDB PSDB 4050000 383
Coque Catarinense Ltda 2 PFL PMDB 2434000 230
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos Ltda 4 PFL PMDB PP 927000 088
Mineraccedilatildeo Santa Augusta Ltda 1 PP 800000 076
TOTAL 105848400 10000
DOADOR PARTIDOS VALOR R$
142
Tabela 8 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2002 que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees de 2002 o PP recebeu 46 das doaccedilotildees o Partido
da Frente Liberal (PFL) 2147 o PSDB 1352 o PMDB 1027
o PT 477 e o Partido Progressista Brasileiro (PPB) 397
Tabela 9 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2002
Fonte TSE 2013
NO ME PARTIDO CANDIDATURA VALO R R$ RECEITA TO TAL R$
Esperidiatildeo Amin PP Governador 43798600 4138 373920269 1171
Paulo R Bauer PSDB Deputado Federal 12510800 1182 49994468 2502
Clesio Salvaro PFL Deputado Estadual 7120000 673 11296000 6303
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 5266200 498 27320200 1928
Paulo R Bornhausen PFL Senador 4900000 463 198753494 247
Leodegar da C Tiscoski PP Deputado Federal 4892000 462 20432951 2394
Joseacute P Serafim PT Deputado Estadual 4500000 425 7303000 6162
Luiz H da Silveira PMDB Governador 4000000 378 240099527 167
Ivan C Ranzolin PFL Deputado Federal 3000000 283 26017099 1153
Pedro Bittencourt Neto PFL Deputado Federal 2860800 27 13469800 2124
Vanio de Oliveira PPB Deputado Federal 2200000 208 3110990 7072
Celestino RSecco PPB Deputado Estadual 2000000 189 21164000 945
Joatildeo P K Kleinubing PFL Deputado Estadual 2000000 189 10710330 1867
Julio Cesar Garcia PFL Deputado Estadual 2000000 189 4449450 4495
Cezar P de Luca PSDB Deputado Federal 1800000 17 3925683 4585
Ronaldo J Benedet PMDB Deputado Estadual 1350000 128 12097324 1116
Arleu R da Silveira PFL Deputado Estadual 850000 08 890370 9547
Edson C Rodrigues PT Deputado Federal 550000 052 8653600 636
Aceacutelio Casagrande PMDB Deputado Federal 250000 024 1512694 1653
TOTAL 105848400 100
PARTIDO VALOR R$
PP 48690600 46
PFL 22730800 2147
PSDB 14310800 1352
PMDB 10866200 1027
PT 5050000 477
PPB 4200000 397
TOTAL 105848400 100
143
Nas Eleiccedilotildees de 2006 entraram em cena as seguintes empresas
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasileira que atua na regiatildeo Companhia
Energeacutetica Meridional que eacute subsidiaacuteria da empresa Tractebel A
Mendes Terraplanagem Construccedilatildeo e Extraccedilatildeo de Minerais Ltda que
atua na regiatildeo Minageo Ltda de Criciuacutema Sulcatarinense Mineraccedilatildeo e
Artefatos Ltda com sede em Biguaccedilu Carboniacutefera Sideroacutepolis de
Criciuacutema Gabriella Mineraccedilatildeo de Sideroacutepolis Carboniacutefera Catarinense
Ltda de Lauro Muller Nas eleiccedilotildees de 2006 a Tractebel doou 4038
para onze candidatos a Carboniacutefera Metropolitana 1226 para quatro
candidatos e a Carboniacutefera Criciuacutema 1136 (Tabela 10) O montante
de doaccedilotildees aumentou de R$ 105848400 em 2002 para R$
158506900 em 2006
Tabela 10 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2006
Fonte TSE 2013
Dos 22 candidatos apoiados pelas empresas em 2006 Edson Bez
de Oliveira recebeu 1325 dos recursos de seis empresas Ada Lili
Faraco de Luca recebeu 1262 de duas empresas Luiz Henrique da
Silveira recebeu 1262 de uma empresa e Paulo Roberto Bauer
recebeu 946 de quatro empresas (Tabela 11) Constata-se uma
distribuiccedilatildeo maior das doaccedilotildees jaacute que na Eleiccedilatildeo de 2002 um uacutenico
candidato Esperidiatildeo Amim recebeu 4138 das doaccedilotildees
DOADOR NordmCANDIDATOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora 11 PFL PMDB PP PPS PSDB PT 64000000 4038
Carboniacutefera Metropolitana SA 4 PMDB PP PSDB 19432000 1226
Carboniacutefera Criciuacutema SA 2 PMDB PSDB 18000000 1136
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasil Ltda 7 PFL PMDB PP PPS PT 15555000 981
Cia Energeacutetica Meridional 3 PFL PP PT 14000000 883
Carboniacutefera Catarinense Ltda 2 PFL PP 8183000 516
Carboniacutefera Belluno Ltda 2 PMDB PSDB 6776000 427
A Mendes TerConstr E Extr De
Minerais Ltda 1 PMDB 4000000 252
Minageo Ltda 2 PMDB PT 3288000 207
Sul Catarinense Mineraccedilatildeo e Art 4 PP PPS PSDB 2400000 151
Carboniacutefera Sideroacutepolis Ltda 1 PP 1186500 075
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda 1 PP 1186400 075
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos 1 PMDB 500000 032
TOTAL 158506900 10000
144
Tabela 11 - Candidatosas que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2006
Fonte TSE 2013
Em 2006 o PMDB recebeu o maior montante de doaccedilotildees
4104 enquanto na eleiccedilatildeo de 2002 o maior montante foi destinado ao
PP 46 O PSDB aumentou suas captaccedilotildees junto ao lobby do carvatildeo de
1352 em 2002 para 1640 em 2006 O PT de 477 em 2002
para 807 em 2006 O PFL diminuiu de 2147 para 1577 no
periacuteodo Aleacutem do PMDB apareceu na lista tambeacutem o Partido Popular
Socialista (PPS) com 265 (Tabela 12)
NOME PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 21000000 1325 44379023 4732
Ada Lili Faraco de Luca PMDB Deputado Estadual 20000000 1262 62976575 3176
Luiz Henrique da Silveira PMDB Governador 20000000 1262 725548795 276
Paulo Roberto Bauer PSDB Deputado Federal 15000000 946 63272293 2371
Leodegar da Cunha Tiscoski PP Deputado Federal 12263900 774 16487006 7439
Geraldo Cesar Althoff PFL Deputado Federal 11000000 694 113398356 97
Angela Regina Heinzen Amin Helou PP Deputado Federal 10000000 631 25349000 3945
Djalma Vando Berger PSDB Deputado Federal 5000000 315 107978844 463
Gervaacutesio Joseacute da Silva PFL Deputado Federal 5000000 315 95845710 522
Giancarlo Tomelin PSDB Deputado Estadual 5000000 315 14028277 3564
Jorge Catalino Leonardelli Boeira PT Deputado Federal 5000000 315 47519555 1052
Paulo Roberto Barreto Bornhausen PFL Deputado Federal 5000000 315 132260292 378
Ivan Cesar Ranzolin PFL Deputado Federal 4000000 252 23237183 1721
Milton Mendes de Oliveira PT Deputado Federal 4000000 252 18603010 215
Joseacute Paulo Serafim PT Deputado Estadual 3788000 239 19238000 1969
Sergio Joseacute Grando PPS Deputado Estadual 3200000 202 16206665 1974
Antonio Carlos Vieira PP Deputado Estadual 3000000 189 15931786 1883
Acelio Casagrande PMDB Deputado Federal 2055000 13 14020875 1466
Ronaldo Joseacute Benedet PMDB Deputado Estadual 2000000 126 42694345 468
Altair Guidi PPS Deputado Estadual 1000000 063 10547730 948
Joseacute Natal Pereira PSDB Deputado Estadual 1000000 063 13659460 732
Licio Mauro Ferreira da Silveira PP Deputado Estadual 200000 013 10092456 198
158506900 100
145
Tabela 12 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2006
Fonte TSE 2013
Na Eleiccedilatildeo de 2010 cinco empresas aparecem como doadoras A
Tractebel assim como na Eleiccedilatildeo de 2002 e 2006 doou a maior parte
dos recursos 7483 para 27 candidatos de vaacuterios partidos As outras
quatro empresas dividem os 2517 restantes conforme dados
apresentados na Tabela 13
Tabela 13 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2010
Fonte TSE 2013
Os candidatos que receberam o maior montante de doaccedilotildees foram
Angela Amin com 1515 Paulo Roberto Bauer com 1082 e Edson
Bez de Oliveira com 884 (Tabela 14) O nuacutemero de candidatos
apoiados por doaccedilotildees aumentou de 19 candidatos em 2002 para 22 em
2006 e 30 em 2010 Diminuiu tambeacutem a concentraccedilatildeo dos recursos em
relaccedilatildeo ao nuacutemero de candidatos em 2002 os trecircs primeiros candidatos
receberam 5993 das doaccedilotildees em 2006 receberam 3849 e em
2010 3481 Isso demonstra que as empresas passaram a investir em
um nuacutemero maior de candidatos concentrando menos as doaccedilotildees
PARTIDO VALOR [R$]
PMDB 65055000 4104
PSDB 26000000 164
PP 25463900 1606
PFL 25000000 1577
PT 12788000 807
PPS 4200000 265
TOTAL 158506900 100
DOADOR NordmCANDIDATOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora
Ltda
27 PMDB PP
PPS PR
PSDB e PT
123500000 7483
Industria Carboniacutefera Rio Deserto
Ltda
4 PMDB e
PSDB
12548100 760
Carboniacutefera Metropolitana SA 5 PMDB
PSDB
11700000 709
Carboniacutefera Belluno Ltda 2 PSDB 10600000 642
Carboniacutefera Criciuacutema Ltda 3 PMDB 6700600 406
TOTAL 165048700 10000
146
Tabela 14 - Candidatosas receberam doaccedilotildees das empresas ligadas
ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2010
Fonte TSE 2013
Em 2010 o mesmo natildeo aconteceu com os partidos poliacuteticos As
doaccedilotildees concentraram-se em trecircs partidos PMDB com 3641 PT com
3393 e PSDB com 1784 conforme dados apresentados na Tabela
15 A concentraccedilatildeo de doaccedilotildees no PMDB diminuiu de 4104 em 2006
para 3641 em 2010 e aumentou para o PT (de 807 em 2006 para
3393 em 2010) e o PSDB (de 1640 em 2006 para 1784 em
2010)
NOME PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Angela R H Amin Helou PP Governador 25000000 1515 285235728 876
Paulo Roberto Bauer PSDB Senador 17859100 1082 215018697 831
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 14589500 884 76475776 1908
Ronaldo Joseacute Benedet PMDB Deputado Federal 10037000 608 62224076 1613
Claudio Antocircnio Vignatti PT Senador 10000000 606 225944994 443
Luiz Henrique da Silveira PMDB Senador 7463100 452 316150000 236
Thatiane Ferro Teixeira PSDB Deputado Estadual 5600000 339 21357586 2622
Ada Lili Faraco de Luca PMDB Deputado Estadual 5000000 303 66479091 752
Jorge C Leonardeli Boeira PT Deputado Federal 5000000 303 51226181 976
Celso Maldaner PMDB Deputado Federal 4000000 242 56183406 712
Deacutecio Nery de Lima PT Deputado Federal 4000000 242 94602191 423
Gean Marques Loureiro PMDB Deputado Federal 4000000 242 47666076 839
Gervaacutesio Joseacute da Silva PSDB Deputado Federal 4000000 242 68162276 587
Luci T K Choinacki PT Deputado Federal 4000000 242 53638737 746
Paulo R B Bornhausen DEM Deputado Federal 4000000 242 132193682 303
Pedro Francisco Uczai PT Deputado Federal 4000000 242 45421410 881
Vanio dos Santos PT Deputado Federal 4000000 242 68945421 580
Aceacutelio Casagrande PMDB Deputado Estadual 2500000 151 19129380 1307
Alexandre Santos Moraes PMDB Deputado Estadual 2500000 151 11717054 2134
Ana Paulo de Souza Lima PT Deputado Estadual 2500000 151 19360800 1291
Antonio M R de Aguiar PMDB Deputado Estadual 2500000 151 57962102 431
Carlos Joseacute Stupp PSDB Deputado Estadual 2500000 151 41555975 602
Edison A A de Oliveira PMDB Deputado Estadual 2500000 151 44778059 558
Giancarlo Tomelin PSDB Deputado Estadual 2500000 151 26041812 960
Joatildeo Batista Nunes PR Deputado Estadual 2500000 151 28970265 863
Joatildeo Olavio Falchetti PT Deputado Estadual 2500000 151 6753000 3702
Joares Carlos Ponticelli PP Deputado Estadual 2500000 151 45669621 547
Luciano Formighieri PPS Deputado Estadual 2500000 151 17351190 1441
Marcos Luiz Vieira PSDB Deputado Estadual 2500000 151 79902729 313
Rosemeacuteri Bartucheski PMDB Deputado Estadual 2500000 151 30045075 832
TOTAL 165048700 10000
147
Tabela 15 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2010
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees gerais de 2002 2006 e 2010 foram registradas
doaccedilotildees de 16 empresas ligadas ao carvatildeo mineral somando um total de
R$ 429404000 A Tractebel doou 5601 do total (R$ 240500000)
seguida pela Carboniacutefera Metropolitana SA com 1092 (R$
46882000) e pela Carboniacutefera Belluno com 730 (R$ 31346000) As
doaccedilotildees tecircm aumentado a cada eleiccedilatildeo em 2002 foram R$
105848400 em 2006 foram R$ 158506900 e em 2010 foram R$
165048700
O candidato Paulo Roberto Bauer recebeu um total de R$
45369900 em doaccedilotildees representando 1057 do total de doaccedilotildees Jaacute
Esperidiatildeo Amin recebeu R$ 43798600 (1020) e Edson Bez de
Oliveira foi agraciado com R$ 40855700 (951) Todos os candidatos
eleitos que receberam doaccedilotildees de campanha das empresas ligadas ao
carvatildeo mineral participam da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral confirmando a hipoacutetese da relaccedilatildeo estreita entre doaccedilotildees e
apoio agrave causa do carvatildeo mineral
No que se refere agrave relaccedilatildeo entre doaccedilotildees e os partidos poliacuteticos
constatou-se que o PMDB recebeu 3168 das doaccedilotildees no periacuteodo de
2002 a 2010 (R$ 136017900) Quanto ao PP este recebeu 1937 (R$
83154500) O PT levou 1720 (R$ 73838000) O PMDB aumentou
de R$ 10866200 em 2002 para R$ 60096700 em 2010 O PT
aumentou de R$ 5050000 em 2002 para R$ 56000000 em 2010 Jaacute
o PP diminuiu de R$ 48690600 em 2002 para R$ 9000000 em
2010 O aumento das doaccedilotildees para o PMDB e o PT pode ser explicado
se considerarmos a reeleiccedilatildeo e ascensatildeo de alguns candidatos inclusive
pela reeleiccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Lula da Silva do PT para a presidecircncia da
Repuacuteblica Jaacute as doaccedilotildees concedidas ao PP diminuiacuteram apoacutes a aposta
frustrada na eleiccedilatildeo de Esperidiatildeo Amin para governador
PARTIDO VALOR R$
PMDB 60096700 3641
PT 56000000 3393
PSDB 29452000 1784
PP 9000000 545
DEM 4000000 242
PR 4000000 242
PPS 2500000 151
TOTAL 165048700 10000
148
522 Eleiccedilotildees municipais
Nas eleiccedilotildees municipais de 2004 cinco empresas foram
doadoras Carboniacutefera Belluno (6383) Carboniacutefera Criciuacutema
(1558) Carboniacutefera Metropolitana (895) Carboniacutefera Catarinense
(823) e Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos (341) conforme dados da
Tabela 16 Foram doados R$ 41232300 para sete municiacutepios
Tabela 16 - Doadores eleiccedilotildees de 2004
Fonte TSE 2013
O municiacutepio de Criciuacutema recebeu 852 das doaccedilotildees Dentre os
candidatos estatildeo o candidato a vereador do municiacutepio de Criciuacutema
Edson do Nascimento do PMDB com 728 das doaccedilotildees o candidato
a prefeito de Criciuacutema Deacutecio Gomes Goacutees do PT com 606 e Carlos
Joseacute Stupp candidato a prefeito no municiacutepio de Tubaratildeo pelo PSDB
com 485 Aleacutem dos Comitecircs Financeiros Municipais (CFM) de
Criciuacutema Sideroacutepolis Treviso Lauro Muller e Iccedilara quatorze
candidatos a prefeito e vereador foram apoiados por doaccedilotildees (Tabela
17) Dos quatorze candidatos seis se mostram mais dependentes das
doaccedilotildees representando mais de 50 de sua receita total
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Carboniacutefera Criciuacutema Criciuacutema e Tubaratildeo PFL PMDB PSDB 6425000 3791
Carboniacutefera Metropolitana Criciuacutema Iccedilara e Tubaratildeo PFL PMDB e PT 3688500 2176
Caboniacutefera Catarinense Criciuacutema Lauro Muller Sideroacutepolis
Tubaratildeo
PFL PP PT 3391500 2001
Carboniacutefera Belluno Criciuacutema e Treviso PSDB 2034300 1200
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos Criciuacutema Lauro Muller Urussanga
PMDB PP PSDB e
PT 1408000 831
TOTAL 16947300 10000
149
Tabela 17 - Comitecircs e candidatos que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
2004
Fonte TSE 2013
Em 2004 dos cinco partidos que estatildeo entre os receptores o
PSDB recebeu 6798 das doaccedilotildees o PMDB recebeu 1823 o PT
recebeu 657 o PP recebeu 402 e o PFL recebeu 319 (Tabela
18)
Tabela 18 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2004
Fonte TSE 2013
CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$
RECEITA
TOTAL
R
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Criciuacutema PSDB - 29431300 7138 37042800 7945
Edson Do Nascimento Criciuacutema PMDB Vereador 3000000 728 3777163 7942
Deacutecio Gomes Goacutees Criciuacutema PT Prefeito 2500000 606 41391000 604
Carlos Jose Stupp Tubaratildeo PSDB Prefeito 2000000 485 66861662 299
Comitecirc Financeiro
Municipal Uacutenico
Sideroacutepolis PP - 791500 192 916500 8636
Luiz Carlos Zen Urussanga PP Prefeito 668000 162 4418000 1512
Felipe Felisbino Tubaratildeo PFL Vereador 500000 121 641145 7799
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Treviso PMDB - 388000 094 1004554 3862
Nestor Spricigo Lauro Muller PMDB Prefeito 330000 080 830752 3972
Elemar Nunes Tubaratildeo PFL Vereador 264000 064 404248 6531
Dalton Luiz Marcon Tubaratildeo PFL Vereador 202500 049 342514 5912
Manoel Duarte Porto Tubaratildeo PFL Vereador 202500 049 529725 3823
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Lauro Muller PP - 200000 049 600000 3333
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Iccedilara PMDB - 200000 049 6610000 303
Rudemar Silveira Da
Cunha
Tubaratildeo PFL Vereador 144500 035 242894 5949
Paulo Gonccedilalves Filho Lauro Muller PT Prefeito 110000 027 535000 2056
Antonio Alves Elias Lauro Muller PT Vereador 100000 024 166828 5994
Lauro Pirolla Criciuacutema PSDB Vereador 100000 024 279420 3579
Vanderlei Joseacute Zilli Criciuacutema PMDB Vereador 100000 024 1007126 993
41232300 10000
PARTIDO VALOR R$
PSDB 28031300 6798
PMDB 7518000 1823
PT 2710000 657
PP 1659500 402
PFL 1313500 319
TOTAL 41232300 10000
150
Nas eleiccedilotildees de 2008 seis empresas doaram um total de R$
22918311 A Carboniacutefera Criciuacutema doou 4132 a Mineraccedilatildeo e
Pesquisa Brasileira doou 2313 e a Tractebel doou 2182 (Tabela
19) O montante de doaccedilotildees de 2008 se comparado ao de 2004
diminuiu 4442
Tabela 19 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2008
Fonte TSE 2013
As doaccedilotildees de 2008 se concentraram em trecircs candidatos O
candidato a prefeito de Tubaratildeo Joatildeo Falchetti do PT recebeu 4363
das doaccedilotildees Edison do Nascimento do PMDB candidato a vereador
por Criciuacutema recebeu 2396 e Joseacute Claudio Gonccedilalves do DEM
candidato a prefeito de Forquilhinha recebeu 1091 das doaccedilotildees
Conforme dados apresentados na Tabela 20 receberam doaccedilotildees
candidatos dos municiacutepios de Criciuacutema Tubaratildeo Forquilhinha Iccedilara
Meleiro Timbeacute do Sul Sideroacutepolis e Lauro Muller Se consideradas as
receitas totais dos dezesseis candidatos cinco candidatos satildeo muito
dependentes das doaccedilotildees jaacute que elas representam mais de 50 da
receita total
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Carbonifera Criciuma SA Criciuacutema Forquilhinha Lauro Muller
Meleiro Timbeacute do Sul
PMDB DEM 9468944 4132
Mineraccedilatildeo E Pesquisa Brasileira Criciuacutema Tubaratildeo PMDB PT 5300000 2313
Tractebel Energia Tubaratildeo PT 5000000 2182
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda Criciuacutema Iccedilara DEM PP PSDB 1679175 733
Carboniacutefera Belluno Ltda Criciuacutema PSDB 1120192 489
Carbonifera Metropolitana SA Criciuacutema Sideroacutepolis Timbeacute do Sul PMDB 350000 153
TOTAL 22918311 10000
151
Tabela 20 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2008 que receberam doaccedilotildees
das empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
Fonte TSE 2013
As doaccedilotildees entre os partidos nas eleiccedilotildees de 2008 foram
distribuiacutedas da seguinte forma o PT recebeu 4363 das doaccedilotildees o
PMDB recebeu 3181 o DEM recebeu 1158 o PSDB recebeu
774 e o PP recebeu 524 (Tabela 21)
Tabela 21 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2008
Fonte TSE 2013
Nas Eleiccedilotildees de 2012 cinco empresas doaram R$ 22700000
para candidatos de trecircs municiacutepios Criciuacutema Iccedilara e Tubaratildeo Os
maiores montantes de doaccedilatildeo tiveram origem na Tractebel (6608) Carboniacutefera Metropolitana (1762) e Carboniacutefera Criciuacutema (1101)
conforme dados apresentados na Tabela 22
NOME DO CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Joatildeo Olavio Falchetti Tubaratildeo PT Prefeito 10000000 4363 18223525 5487
Edison Do Nascimento Criciuacutema PMDB Vereador 5490944 2396 10054122 5461
Joseacute Claudio Gonccedilalves Forquilhinha DEM Prefeito 2500000 1091 10147880 2464
Darlan Bitencourt Carpes Iccedilara PP Vereador 1200000 524 3761519 3190
Antoninho Dal Molin Netto Meleiro PMDB Prefeito 1000000 436 1997000 5008
Clesio Salvaro Criciuacutema PSDB Prefeito 842992 368 72173591 117
Andre M Jucoski Iccedilara PSDB Vereador 454175 198 1245875 3645
Luiz Fernando Cardoso Criciuacutema PMDB Vereador 400000 175 8071771 496
Jose Daminelli Criciuacutema PSDB Vereador 277200 121 1227765 2258
Arleu Ronaldo Da Silveira Criciuacutema PSDB Vereador 200000 087 1649455 1213
Heacutelio Roberto Cesa Sideroacutepolis PMDB Prefeito 150000 065 9963963 151
Wersmberg Laureano Lauro Muumlller DEM Vereador 128000 056 385903 3317
Loraci Davila Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 100000 044 163000 6135
Gislael Floriano Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 100000 044 195000 5128
Joao Batista Mandelli Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 50000 022 255800 1955
Romanna G C L Remor Criciuacutema DEM Vereador 25000 011 10166479 025
22918311 10000
152
Tabela 22 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2012
Fonte TSE 2013
Os candidatos a prefeito de Tubaratildeo do PSDB PMDB PSD e
PT receberam 8812 das doaccedilotildees (Tabela 23) O municiacutepio de Tubaratildeo
recebeu 8944 do total de doaccedilotildees Se consideradas as receitas totais
natildeo haacute evidecircncias de uma maior dependecircncia grande das doaccedilotildees
Tabela 23 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2012 que receberam doaccedilotildees
das empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
Fonte TSE 2013
Em 2012 o PSDB recebeu 2996 das doaccedilotildees o PMDB o PSD
e o PT receberam 2203 respectivamente e o PP recebeu 396
(Tabela 24) As doaccedilotildees da Eleiccedilatildeo de 2012 se comparadas agraves eleiccedilotildees
de 2004 e 2008 foram distribuiacutedas de forma mais equilibrada entre os
partidos
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora
Ltda
Tubaratildeo PSD PSDB
PT
15000000 6608
Carboniacutefera Metropolitana SA Iccedilara Tubaratildeo PSDB 4000000 1762
Carboniacutefera Criciuacutema SA Iccedilara Tubaratildeo PMDB PSDB 2500000 1101
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasileira Ltda Criciuacutema PP 900000 396
Minageo Ltda Tubaratildeo PSDB 300000 132
TOTAL 22700000 10000
CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Carlos Joseacute Stupp Tubaratildeo PSDB Prefeito 5000000 2203 36245503 1379
Edson Bez de
Oliveira
Tubaratildeo PMDB Prefeito 5000000 2203 129287720 387
Felippe Luiz Collaccedilo Tubaratildeo PSD Prefeito 5000000 2203 34140000 1465
Joatildeo Olavio falchetti Tubaratildeo PT Prefeito 5000000 2203 42272000 1183
Andreacute Mazzuchello
Jucoski
Iccedilara PSDB Vereador 1500000 661 4995950 3002
Daniel Costa de
Freitas
Criciuacutema PP Vereador 900000 396 6319977 1424
Felipe Felisbino Tubaratildeo PSDB Vereador 300000 132 4119158 728
22700000 10000
153
Tabela 24 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2012
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees municipais de 2004 2008 e 2012 nove empresas
doaram R$ 86850611 para os candidatos a prefeito e vereador As
doaccedilotildees direcionadas agraves eleiccedilotildees municipais apresentam uma reduccedilatildeo
significativa foram R$ 41232300 em 2004 R$ 22918311 em 2008 e
R$ 22700000 em 2012 A Carboniacutefera Belluno lidera as doaccedilotildees com
3159 seguida da Tractebel com 2303 e da Carboniacutefera Criciuacutema
com 2118 Os trecircs partidos que mais recebem doaccedilotildees nas eleiccedilotildees
municipais satildeo PSDB com 4215 PMDB com 2281 e PT com
2039
53 Os fatos ausentes do discurso dos poliacuteticos
No Brasil a degradaccedilatildeo do meio ambiente
e da sociedade das pessoas e da natureza
constitui cara e coroa de uma mesma
moeda de um mesmo estilo de
desenvolvimento e da ausecircncia de
democracia (SOUZA 1992 p 16)
As empresas ligadas ao carvatildeo mineral em Santa Catarina
doaram no intervalo de dez anos R$ 516254611 para candidatos a
eleiccedilotildees gerais e municipais Das dezessete empresas que aparecem
como doadoras a Tractebel foi responsaacutevel por 5046 das doaccedilotildees
seguida pela Carboniacutefera Belluno com 1139 e pela Carboniacutefera
Metropolitana com 1064 As demais quatorze empresas somam
2751 das doaccedilotildees (Tabela 25) O aumento nas doaccedilotildees para eleiccedilotildees
gerais e a diminuiccedilatildeo das doaccedilotildees para eleiccedilotildees municipais mostra que cresce nas empresas o interesse em apoiar candidatos a eleiccedilotildees gerais
que possam participar da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral
PARTIDO VALOR R$
PSDB 6800000 2996
PMDB 5000000 2203
PSD 5000000 2203
PT 5000000 2203
PP 900000 396
TOTAL 22700000 10000
154
Tabela 25 - Siacutentese dos doadores Eleiccedilotildees de 2002 e 2012
Fonte TSE 2013
Os dez candidatos que receberam maiores doaccedilotildees entre 2002 e
2012 foram candidatos a eleiccedilotildees gerais exceto Joatildeo Olavio Falchetti
que foi candidato em duas eleiccedilotildees municipais em 2008 e 2012 (Tabela
26) Todos os candidatos a eleiccedilotildees gerais que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e foram eleitos fazem parte
atualmente da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral
ANO ELEICcedilAtildeO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
DOADOR VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$
Tractebel Egi South
America Ltda 53000000 0 64000000 5000000 123500000 15000000 260500000 5046
Carboniacutefera Belluno Ltda 13970000 26319300 6776000 1120192 10600000 0 58785492 1139
Carboniacutefera
Metropolitana SA 15750000 3688500 19432000 350000 11700000 4000000 54920500 1064
Carboniacutefera Criciuacutema 6450000 6425000 18000000 9468944 6700600 2500000 49544544 96
Mineraccedilatildeo e Pesquisa
Brasil Ltda 0 0 15555000 5300000 0 900000 21755000 421
Induacutestria Carboniacutefera Rio
Deserto 4050000 0 0 0 12548100 0 16598100 322
Cia Energeacutetica Meridional 0 0 14000000 0 0 0 14000000 271
Mineraccedilatildeo Castelo
Branco Ltda 8467400 0 0 0 0 0 8467400 164
Carboniacutefera Catarinense
Ltda 0 0 8183000 0 0 0 8183000 159
Coque Catarinense Ltda 2434000 3391500 0 0 0 0 5825500 113
A Mendes TC e E de
Minerais Ltda 0 0 4000000 0 0 0 4000000 077
Minageo Ltda 0 0 3288000 0 0 300000 3588000 07
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda 0 0 1186400 1679175 0 0 2865575 056
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos
Ltda 927000 1408000 500000 0 0 0 2835000 055
Sul Catarinense
Mineraccedilatildeo e Art 0 0 2400000 0 0 0 2400000 046
Carboniacutefera Sideroacutepolis
Ltda 0 0 1186500 0 0 0 1186500 023
Mineraccedilatildeo Santa Augusta
Ltda 800000 0 0 0 0 0 800000 015
TOTAL 105848400 41232300 158506900 22918311 165048700 22700000 516254611 100
TOTAL
155
Tabela 26 - Candidatos que receberam maiores doaccedilotildees Eleiccedilotildees de
2002 a 2012
Fonte TSE 2013
Os partidos poliacuteticos que se destacam como maiores
receptores das doaccedilotildees satildeo PMDB com 3018 PSDB com 2060
PT com 1773 e PP com 1684 (Tabela 27)
Tabela 27 - Doaccedilotildees por Partido Poliacutetico Eleiccedilotildees de 2002 a 2012
Fonte TSE 2013
Os dados apresentados corroboram a hipoacutetese de que na defesa da causa do carvatildeo mineral se aliam poliacuteticos e empresas pelas doaccedilotildees
de campanha Trazer os fatos ausentes do discurso coloca em questatildeo o
reconhecimento e a representaccedilatildeo poliacutetica condiccedilotildees fundamentais para
assegurar a justiccedila ecoloacutegica e consequentemente para favorecer a
ANO ELEICcedilAtildeO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
NOME VALOR R$ VALOR R$VALOR R$ VALOR R$VALOR R$VALOR R$ TOTAL R$
Edson Bez de
Oliveira 5266200 0 21000000 0 14589500 5000000 45855700 89
Paulo Roberto
Bauer 12510800 0 15000000 0 17859100 0 45369900 88
Esperidiatildeo Amin
Helou Filho 43798600 0 0 0 0 0 43798600 85
Angela R H Amin
Helou 0 0 10000000 0 25000000 0 35000000 68
Luiz Henrique da
Silveira 4000000 0 20000000 0 7463100 0 31463100 61
Ada Lili Faraco de
Luca 0 0 20000000 0 5000000 0 25000000 48
Leodegar da Cunha
Tiscoski 4892000 0 12263900 0 0 0 17155900 33
Joatildeo Olavio
Falchetti 0 0 0 10000000 2500000 1500000 14000000 27
Paulo R B
Bornhausen 4900000 0 5000000 0 4000000 0 13900000 27
Ronaldo Joseacute
Benedet 1350000 0 2000000 0 10037000 0 13387000 26
ANO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
PARTIDO VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ TOTAL
PMDB 10866200 7518000 65055000 7290944 60096700 5000000 155826844 3018
PSDB 14310800 28031300 26000000 1774367 29452000 6800000 106368467 206
PT 5050000 2710000 12788000 10000000 56000000 5000000 91548000 1773
PP 48690600 1659500 25463900 1200000 9000000 900000 86914000 1684
PFL 22730800 1313500 25000000 0 0 0 49044300 95
PPB 4200000 0 4200000 0 2500000 0 10900000 211
DEM 0 0 0 2653000 4000000 0 6653000 129
PR 0 0 0 0 4000000 0 4000000 077
PSD 0 0 0 0 0 5000000 5000000 097
TOTAL 516254611 100
156
aplicaccedilatildeo do enfoque do ecodesenvolvimento Os candidatos eleitos natildeo
representam os interesses da maioria que os elegeu e sim daqueles
poucos que investiram em suas campanhas por meio de doaccedilotildees Vecircm se
consolidando assim um cenaacuterio no qual a injusticcedila poliacutetica alimenta a
reproduccedilatildeo da injusticcedila ambiental e ecoloacutegica
6 CARVAtildeO MINERAL E AMPLIACcedilAtildeO DA ENERGIA
TERMELEacuteTRICA EM SANTA CATARINA
A trajetoacuteria do carvatildeo mineral no Brasil e em Santa Catarina eacute
acompanhada de periacuteodos de crise e recuperaccedilatildeo do segmento A
construccedilatildeo da USITESC eacute uma forma de garantir a continuidade da
exploraccedilatildeo e do consumo do carvatildeo Aleacutem da crise do carvatildeo o que
aparece nos discursos de parlamentares presentes no capiacutetulo anterior eacute
o carvatildeo como seguranccedila energeacutetica
O objetivo desse capiacutetulo eacute compreender a ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo
de energia eleacutetrica movida a carvatildeo mineral atraveacutes da anaacutelise do
processo de licenciamento ambiental da USITESC Nos capiacutetulos dois e
trecircs foram tratados condicionantes mais amplos que incidem sobre a
ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo No capiacutetulo quatro foi examinada a relaccedilatildeo das
redes de influecircncia entre segmentos poliacuteticos e econocircmicos em vaacuterias
escalas Neste capiacutetulo a ideia eacute verificar os condicionantes que atuam
localmente
Para tanto o capiacutetulo estaacute dividido em quatro seccedilotildees aleacutem dessa
introduccedilatildeo A primeira seccedilatildeo trata das principais caracteriacutesticas do
municiacutepio de Treviso A segunda seccedilatildeo traz informaccedilotildees sobre os
documentos escritos da USITESC o EIARIMA o processo de
licenciamento e audiecircncias as correspondecircncias e articulaccedilotildees entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos e a posiccedilatildeo dos segmentos sociais Na
terceira seccedilatildeo entram os documentos falados do processo de
licenciamento os discursos nas audiecircncias puacuteblicas A anaacutelise dos
discursos torna expliacutecitas as relaccedilotildees de poder e desigualdade nas
audiecircncias puacuteblicas A quarta seccedilatildeo faz uma siacutentese das limitaccedilotildees e
possibilidades da democracia e do aprendizado social no caso do
licenciamento da USITESC
61 O municiacutepio de Treviso
A chegada dos primeiros imigrantes italianos no Sul de Santa
Catarina data de 1891 oriundas das proviacutencias de Treviso Beacutergamo
158
Cremona e Ferrara O povoado de Treviso tornou-se distrito de
Urussanga em 1933 Em 1958 o controle do distrito passou para
Sideroacutepolis emancipado de Urussanga Em 1995 o distrito de Treviso eacute
desmembrado de Sideroacutepolis formando um novo municiacutepio (IBGE
2013 PMT 2014)
No brasatildeo do municiacutepio a alusatildeo ao navio que trouxe os
primeiros imigrantes as duas atividades econocircmicas principais (extraccedilatildeo
do carvatildeo e o cultivo da banana) e as datas de colonizaccedilatildeo e
emancipaccedilatildeo (Figura 8)
Figura 8- Brasatildeo do municiacutepio de Treviso
Fonte PMT (2014) Autora Daniela Losso Redesenhado por Edson
Cesconetto
O municiacutepio de Treviso localiza-se na Bacia Carboniacutefera (Figura
9) entre Sideroacutepolis Lauro Muumlller e Urussanga a 220 km da capital
Florianoacutepolis a 35 km da BR 101 e a 25 km da cidade de Criciuacutema
(PMT 2014)
159
Figura 9 ndash Mapa de localizaccedilatildeo do municiacutepio de Treviso
Fonte Concepccedilatildeo de Luciana Butzke Elaborado por Ruy Lucas de
Souza
O clima geral da regiatildeo segundo a classificaccedilatildeo climaacutetica de
Koumleppen eacute do tipo Cfa (mesoteacutermico uacutemido e com veratildeo quente) A
temperatura meacutedia anual varia de 170 a 193ordmC maacuteximas de 234 a
259ordmC e miacutenimas entre 120 e 151ordmC A meacutedia anual pluviomeacutetrica fica
em torno de 1220 a 1660mm e a umidade relativa do ar varia de 814
a 822 (UNESC PLURAL 2006)
A regiatildeo conta com grandes variaccedilotildees de relevo clima tipos de
solo fauna e flora A geomorfologia da regiatildeo conta com seis domiacutenios
ambientais Planalto dos Campos Gerais Serra Geral Patamares da
Serra Geral Depressatildeo da Zona Carboniacutefera Sudeste Catarinense
Embasamento em estilos complexos e Planiacutecie Coluacutevio-aluvionar (Quadro 9)
160
Quadro 9 - Principais caracteriacutesticas fiacutesicas e bioacuteticas da aacuterea de
influecircncia indireta do projeto USITESC DOMIacuteNIOS
AMBIENTAIS
SIacuteNTESE DAS CARACTERIacuteSTICAS
1 Planalto dos
Campos Gerais
Corresponde agrave regiatildeo mais elevada com relevo pouco
ondulado e altitudes superiores a 1000 metros Neste
domiacutenio prevalecem rochas de origem vulcacircnicasub-
vulcacircnica com solos pouco desenvolvidos normalmente
utilizados para produccedilatildeo de maccedilatilde reflorestamento e
pastagem Esse domiacutenio abriga algumas nascentes de rios
da bacia do Araranguaacute e da bacia do Tubaratildeo com
cobertura vegetal representada pelas matas de araucaacuteria
matinha nebular e campos de cima da serra tendo fauna
diversificada Aacuterea impactada pela derrubada das matas
de araucaacuteria plantio de pinus e queimadas nos campos
2 Serra Geral Corresponde agraves aacutereas de encosta com altitudes entre
500m e 1000m onde os desniacuteveis satildeo acentuados e os
vales satildeo fechados e profundos Satildeo formadas
principalmente por rochas arenosas e basaacutelticas e solos
rasos normalmente susceptiacuteveis agrave erosatildeo e a movimentos
de massa Abriga grande parte das nascentes dos rios das
bacias do Araranguaacute e do Tubaratildeo As florestas
encontram-se entre as mais preservadas da regiatildeo sul do
Estado atuando como reguladoras do clima do ciclo e da
distribuiccedilatildeo de chuvas servindo de centro de dispersatildeo e
conexatildeo de espeacutecies Caracteriza-se pela ampla
biodiversidade representando um dos ambientes mais
complexos fraacutegeis e ameaccedilados da regiatildeo que deve ser
preservado Neste domiacutenio se insere a Reserva Bioloacutegica
Estadual do Aguaiacute
3 Patamares da
Serra Geral
Os patamares da Serra Geral representam o
prolongamento da escarpa da Serra Geral que avanccedila
sobre a Depressatildeo Carboniacutefera e a Planiacutecie Coluacutevio-
Aluvionar constituindo morros-testemunhos como o
Montanhatildeo sustentados principalmente por basaltos e
diabaacutesicos Os solos tecircm normalmente baixa fertilidade e
satildeo utilizados nas aacutereas planas para pastagens plantio de
eucalipto e lavouras de subsistecircncia Nos terrenos
iacutengremes o solo eacute usado para o cultivo de banana No
alto do Montanhatildeo encontra-se uma das aacutereas mais
preservadas deste domiacutenio correspondente agrave APA do rio
Ferreira
4 Depressatildeo da
Zona Carboniacutefera
Regiatildeo de relevo mais suave em que predominam vales
abertos e pouco profundos Constitui-se principalmente
161
do Sudeste
Catarinense
de rochas sedimentares como arenitos folhelhos siltitos
e camadas de carvatildeo Os solos satildeo variados utilizados
principalmente para pastagens culturas de subsistecircncia e
reflorestamento de eucalipto Os recursos hiacutedricos
encontram-se comprometidos principalmente pela
exploraccedilatildeo de carvatildeo mas tambeacutem pelas atividades
industriais agriacutecolas e esgotamento sanitaacuterio A regiatildeo eacute
fortemente impactada com vaacuterias aacutereas degradadas pela
exploraccedilatildeo do carvatildeo paisagens fortemente
descaracterizadas e reduzida biodiversidade em alguns
locais
5 Embasamento
em estilos
complexos
Corresponde aos relevos ondulados formados por rochas
granitoacuteides e gnaacuteissicas onde os solos normalmente satildeo
pouco desenvolvidos e de baixa fertilidade
6 Planiacutecie Coluacutevio-
Aluvionar
Aacuterea de relevo plano (cotas inferiores a 100m) com solos
do tipo hidromoacuterficos com elevado teor de mateacuteria
orgacircnica Os solos satildeo empregados no cultivo de arroz
irrigado produccedilatildeo de hortaliccedilas uva e cana-de-accediluacutecar
Em regiotildees menos inundadas satildeo utilizados tambeacutem para
reflorestamento e pastagem
Fonte UNESC Plural (2006 p 24)
Eacute destaque em Treviso a Reserva Bioloacutegica Estadual do Aguaiacute e
a Aacuterea de Preservaccedilatildeo Permanente do Rio Ferreira A Reserva Bioloacutegica
Estadual do Aguaiacute conta com aacuterea de 7762 hectares que se estende
entre os municiacutepios de Treviso Sideroacutepolis e Nova Veneza nos beirais
da Serra Geral A reserva abriga cachoeiras fauna e flora diversificadas
que constituem grande riqueza natural (UNESC PLURAL 2006)
O municiacutepio contava em 2010 com 3527 habitantes em
157084 km2 com uma densidade demograacutefica de 2245 habitantes por
quilocircmetro quadrado Desses 1789 eram homens e 1738 eram
mulheres 1833 habitavam o espaccedilo urbano e 1694 o espaccedilo rural A
Populaccedilatildeo Economicamente Ativa (PEA) correspondia a 487 da
populaccedilatildeo (SEBRAE 2013b)
O Produto Interno Bruto (PIB) de Treviso corresponde a 008
da composiccedilatildeo do PIB catarinense Jaacute em relaccedilatildeo ao PIB per capita
Treviso encontra-se em 2009 na 17ordf posiccedilatildeo no ranking estadual O
Valor Adicionado Bruto (VAB) que representa a soma de todos os bens
e serviccedilos produzidos num determinado territoacuterio econocircmico ficou
assim distribuiacutedo 61 na induacutestria 24 no setor de serviccedilos e 9 na
administraccedilatildeo puacuteblica Em relaccedilatildeo ao Valor Adicionado Fiscal (VAF)
162
indicador econocircmico contaacutebil utilizado para calcular a participaccedilatildeo
municipal no repasse de impostos a extraccedilatildeo de carvatildeo mineral era
responsaacutevel por 66 da participaccedilatildeo do VAF no ano de 2010
(SEBRAE 2013b) Esses dados demonstram uma forte dependecircncia do
municiacutepio agrave atividade carboniacutefera
Dos 1093 domiciacutelios existentes no municiacutepio 853 eram
proacuteprios 91 alugados 55 cedidos e 01 em outra condiccedilatildeo No
que se refere agrave renda familiar 04 da populaccedilatildeo contava com renda
familiar per capita de ateacute R$ 7000 16 com renda familiar per capita
de ateacute frac12 salaacuterio miacutenimo e 103 com ateacute frac14 do salaacuterio miacutenimo A meacutedia
salarial da induacutestria extrativa era de R$ 185480 inferior apenas a
atividades relacionadas agrave eletricidade e gaacutes com uma meacutedia de R$
277460 Nesse mesmo ano o municiacutepio contava com 1629 postos de
trabalho com carteira assinada dos quais 1132 eram vinculados agrave
atividade carboniacutefera em cinco empresas (SEBRAE 2013b) Quando
69 dos postos de trabalho com carteira assinada tecircm origem na
atividade carboniacutefera que na localidade apresenta tambeacutem uma das
melhores meacutedias salariais a populaccedilatildeo fica numa posiccedilatildeo de
vulnerabilidade jaacute que depende dessa atividade para o seu sustento
Na lavoura temporaacuteria destacam-se a produccedilatildeo do arroz batata-
doce batata inglesa feijatildeo (gratildeo) fumo mandioca milho (gratildeo) Na
lavoura permanente tem se destacado a banana No municiacutepio tambeacutem
satildeo criadas aves (galos galinhas frangos e pintos) que em 2010
somavam 500000 cabeccedilas (SEBRAE 2013b)
Treviso conta com trecircs aacutereas inclusas na Accedilatildeo Civil Puacuteblica nordm
938000533-4 que determina a recuperaccedilatildeo das aacutereas degradas pela
mineraccedilatildeo Aacuterea III Rio Pio que tem 11781 hectares Campo Morosini
com 22100 hectares e UM IV Volta Redonda com 5797 hectares A
primeira aacuterea natildeo foi iniciada a segunda estaacute em andamento e a terceira
jaacute estaacute finalizada O processo de recuperaccedilatildeo foi orccedilado em 319 milhotildees
de reais (ACP DO CARVAtildeO 2014)
62 O processo de licenciamento os documentos escritos
A primeira solicitaccedilatildeo de parecer da USITESC referente ao
Licenciamento Preacutevio (LP) data do dia 2 de maio de 2000 Segundo a
solicitaccedilatildeo o parecer se fazia necessaacuterio para que a Usina fosse
163
implantada dentro do prazo previsto pelo Governo e pelo Programa
Prioritaacuterio de Termeleacutetricas que se colocava para dezembro de 2003
(FATMA 2013a fl 1) A contrataccedilatildeo do EIARIMA foi em 2001 e a
entrega aconteceu em 18 de agosto de 2003 (FATMA 2013a fl 49)
621 O EIARIMA da USITESC
A equipe responsaacutevel pelo projeto da USITESC foi composta por
consoacutercio formado pela Carboniacutefera Criciuacutema SA e pela Companhia
Carboniacutefera Metropolitana SA O projeto foi desenvolvido com o apoio
da Parsons Energy amp Chemicals Group Main Engenharia amp Consultoria
Ltda e Taylor DeJongh E o EIARIMA foi realizado pelo IPAT
vinculado agrave UNESC e Plural
A previsatildeo de construccedilatildeo da USITESC eacute de 40 meses A aacuterea a
ser ocupada pela usina localiza-se na margem direita do rio Matildee Luzia
tem aproximadamente 500000m2 e pertence agrave Carboniacutefera
Metropolitana sendo utilizada como depoacutesito de rejeitos (Figura 10)
(UNESC PLURAL 2006)
Figura 10 - Aacuterea prevista para a implantaccedilatildeo da USITESC
Fonte UNESC Plural 2006 p 5
164
Para a produccedilatildeo de energia termeleacutetrica a usina vai utilizar carvatildeo
bruto da camada Bonito (70) e rejeitos da camada Barro Branco
(30) que seratildeo fornecidos pelas duas empresas que compotildeem o
consoacutercio O consumo meacutedio anual previsto eacute de 1900000 toneladas de
carvatildeo e 820000 toneladas de rejeito A USITESC teraacute potecircncia
instalada de 440 MW e segundo a descriccedilatildeo do empreendimento vai
gerar 180 empregos diretos (FATMA 2013a fl 34)
Na justificativa do EIARIMA destacou-se a importacircncia
estrateacutegica do carvatildeo dada a dependecircncia hidroenergeacutetica e a
inseguranccedila quanto agrave importaccedilatildeo do gaacutes natural e o uso de tecnologias
limpas de queima de carvatildeo Natildeo satildeo citados dados sobre consumo e
demanda A USITESC adquire importacircncia na recuperaccedilatildeo ambiental do
Sul jaacute que vai consumir os rejeitos (UNESC PLURAL 2006)
Para gerar energia termeleacutetrica a USITESC vai utilizar o ciclo
teacutermico regenerativo com uso de caldeira de leito fluidizado que
recupera calor exigindo um consumo menor de combustiacutevel A
combustatildeo em leito fluidizado circulante reduz a produccedilatildeo de oacutexidos de
nitrogecircnio O controle das emissotildees atmosfeacutericas seraacute feito atraveacutes da
injeccedilatildeo de calcaacuterio na caldeira (Consumo meacutedio anual de 150000
toneladas) e de um sistema de filtragem que utilizaraacute amocircnia (consumo
meacutedio anual entre 72000 a 80000 toneladas Como resultado seratildeo
obtidas aproximadamente 300000 toneladas de sulfato de amocircnia que
seratildeo utilizadas na produccedilatildeo de fertilizantes quiacutemicos Quanto ao
consumo de aacutegua prevecirc-se um consumo meacutedio de 32 ls (115m3h) no
processo e 2361 ls (848m3h) no resfriamento Soacute a tiacutetulo de
comparaccedilatildeo para o abastecimento de Criciuacutema e municiacutepios vizinhos
satildeo utilizados 800ls do rio Satildeo Bento localizado na sub-bacia do Rio
Matildee Luzia (UNESC PLURAL 2006)16
Na avaliaccedilatildeo de impactos constam no RIMA oito impactos no
meio fiacutesico seis impactos no meio bioacutetico e 11 no meio antroacutepico
(Quadro 10) Dentre os impactos listados os de maior expressatildeo satildeo
16
O alto consumo de aacutegua e a construccedilatildeo de uma barragem no Rio
Matildee Luzia foram desde o iniacutecio do processo de licenciamento
pontos polecircmicos do projeto Devido a esses pontos o projeto foi
alterado de torre uacutemida para torre seca diminuindo o consumo de
aacutegua para 115m3h em todo o processo
165
reduccedilatildeo na geraccedilatildeo de drenagem aacutecida (considerado um impacto
positivo) alteraccedilatildeo da qualidade do ar (principalmente durante a
construccedilatildeo da Usina com a movimentaccedilatildeo de veiacuteculos pesados o
dioacutexido de enxofre pode elevar-se) reduccedilatildeo da disponibilidade de aacutegua
(com as torres de resfriamento uacutemidas) e impacto sobre aacutereas
protegidas
Quadro 10- Impactos sobre o Meio Fiacutesico Bioacutetico e Antroacutepico e
accedilotildees geradoras IMPACTOS SOBRE O
MEIO FIacuteSICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Solo Intensificaccedilatildeo de
processos erosivos e
de assoreamento
Obras de corte e aterro necessaacuterias agrave
implantaccedilatildeo do empreendimento
Contaminaccedilatildeo do solo
pela disposiccedilatildeo de
resiacuteduos soacutelidos e
efluentes
Operaccedilatildeo da usina resiacuteduos produzidos
durante as fases de construccedilatildeo e operaccedilatildeo da
usina
Reduccedilatildeo da geraccedilatildeo
de drenagem aacutecida
Consumo de rejeito do beneficiamento de
carvatildeo e recuperaccedilatildeo de aacutereas degradadas
pela mineraccedilatildeo
Aacutegua
Alteraccedilatildeo na
qualidade das aacuteguas
superficiais
Construccedilatildeo da usina efluentes oleosos
como oacuteleos e graxas advindos da
manutenccedilatildeo de maacutequinas e caminhotildees
ligados agraves obras eou do armazenamento
temporaacuterio de combustiacuteveis e lubrificantes
Efluentes a serem descartados pelo
empreendimento durante a fase de operaccedilatildeo
Alteraccedilatildeo na
qualidade das aacuteguas
subterracircneas
Disposiccedilatildeo inadequada de resiacuteduos soacutelidos
efluentes sanitaacuterios efluentes industriais
Reduccedilatildeo da
disponibilidade de
aacutegua
Operaccedilatildeo da usina captaccedilatildeo de aacutegua para
torre de resfriamento da usina
Ar e
ruiacutedo
Alteraccedilatildeo da
qualidade do ar
Aumento do traacutefego de veiacuteculos pesados
movimentaccedilatildeo de veiacuteculos em aacutereas natildeo
pavimentadas operaccedilatildeo da usina manuseio
do combustiacutevel
Alteraccedilatildeo das
condiccedilotildees de ruiacutedo de
fundo
Traacutefego e operaccedilatildeo de veiacuteculos pesados
operaccedilatildeo de equipamentos como
compressores britadores sondas etc
operaccedilatildeo dos equipamentos da usina
166
IMPACTOS SOBRE O
MEIO BIOacuteTICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Fauna
e
Flora
Reduccedilatildeo de habitats
para a fauna local
Preparaccedilatildeo da aacuterea de implantaccedilatildeo da usina
obras de terraplenagem e retirada da
cobertura vegetal
Evasatildeo da fauna Ruiacutedos produzidos durante a fase de
implantaccedilatildeo e construccedilatildeo da usina alteraccedilatildeo
da qualidade do ar e perda de habitats devido
agraves obras de terraplenagem
Impacto sobre a
avifauna
Operaccedilatildeo da usina
Impacto sobre a fauna
de peixes e
organismos aquaacuteticos
Construccedilatildeo da usina operaccedilatildeo da usina
manutenccedilatildeo de equipamentos transporte e
armazenamento de reagentes e outros
insumos natildeo inertes
Impacto sobre a
vegetaccedilatildeo
remanescente e
culturas
Traacutefego de veiacuteculos movidos a oacuteleo diesel
operaccedilatildeo da usina (queima de carvatildeo)
Impacto sobre as aacutereas
protegidas
Periacuteodo de construccedilatildeo da usina contingente
de trabalhadores e operaccedilatildeo da usina
IMPACTOS SOBRE O
MEIO ANTROacutePICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Geraccedilatildeo de conflitos Contrataccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
instalaccedilatildeo do canteiro de obras
Geraccedilatildeo de
expectativa e
mobilizaccedilatildeo da
comunidade
Estudos e projetos contrataccedilatildeo e
mobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
Sobrecarga da infra-
estrutura social
existente
Obras da usina contrataccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo
da matildeo-de-obra
Geraccedilatildeo de emprego Construccedilatildeo da usina operaccedilatildeo da usina
mineraccedilatildeo do carvatildeo serviccedilos terceirizados
Geraccedilatildeo de renda e
ampliaccedilatildeo da oferta de
serviccedilos
Construccedilatildeo e operaccedilatildeo da usina
Atraccedilatildeo de matildeo-de-
obra de outras aacutereas
Construccedilatildeo da usina contrataccedilatildeo e
desmobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
Incremento do
desenvolvimento
econocircmico
Operaccedilatildeo da usina
Mudanccedila no cotidiano
da comunidade
Obras da usina contrataccedilatildeo de matildeo-de-obra
de outras regiotildees demanda por serviccedilos e
167
sobrecarga da infra-estrutura social
alteraccedilatildeo do padratildeo de traacutefego dos veiacuteculos
Alteraccedilatildeo das
condiccedilotildees de sauacutede da
populaccedilatildeo
Implantaccedilatildeo da usina fase das obras e
operaccedilatildeo da usina emissatildeo de gases ruiacutedo
disposiccedilatildeo das cinzas e depoacutesito temporaacuterio
de carvatildeo e reagentes
Aumento do traacutefego
de veiacuteculos e pressatildeo
sobre a infra-estrutura
viaacuteria
Obras da usina obras complementares
operaccedilatildeo da usina transporte de insumos de
subprodutos e de resiacuteduos
Aumento do risco de
acidentes de tracircnsito
Obras da usina transporte de pessoas e
insumos
Impacto na paisagem
local e perda de
referecircncias histoacuterico-
culturais
Obras da usina e complementares
Interferecircncia em siacutetios
arqueoloacutegicos
Obras complementares da usina barragem e
reservatoacuterio estradas e vias de acesso linha
de transmissatildeo
Fonte UNESC Plural (2006 p 34-5)
No EIARIMA natildeo haacute nenhuma referecircncia aos empreendimentos
acessoacuterios a saber o reservatoacuterio de aacutegua a ser construiacutedo no rio Matildee
Luzia a extensatildeo da ferrovia entre Sideroacutepolis e a Mina Esperanccedila e
Fontanella a linha de transmissatildeo que vai conectar a subestaccedilatildeo da
ELETROSUL em Sideroacutepolis com a Usina e o terminal de recebimento
e estocagem de amocircnia no Porto de Imbituba Os empreendimentos
acessoacuterios seratildeo tratados na sessatildeo 63 deste capiacutetulo Faltou tambeacutem
mencionar nos impactos sobre o meio antroacutepico da desarticulaccedilatildeo da
estrutura econocircmica existente o pequeno comeacutercio a lavoura de
subsistecircncia a pesca artesanal as atividades domeacutesticas etc
Tendo como referecircncia os impactos listados no Quadro 10 foram
propostas 59 medidas mitigatoacuterias sendo 25 preventivas duas
corretivas trecircs preventivas e corretivas 17 compensatoacuterias nove de
acompanhamento e trecircs de controle
Dentre os programas ambientais propostos para a USITESC
destacam-se programa de monitoramento ambiental programa de
conservaccedilatildeo da fauna e flora programa de preservaccedilatildeo do patrimocircnio
arqueoloacutegico programa de comunicaccedilatildeo social programa de
gerenciamento de risco programa de reabilitaccedilatildeo de aacutereas degradadas
168
programa de gestatildeo ambiental e programa de fomento ao
desenvolvimento sustentaacutevel No Quadro 11 uma siacutentese dos programas
e seus alvos principais
Quadro 11 - Siacutentese dos Programas da USITESC e alvos principais PROGRAMA ALVO
Monitoramento ambiental Qualidade do ar solo e aacutegua
Adequaccedilatildeo da infraestrutura baacutesica Rodovias sauacutede educaccedilatildeo e
abastecimento de aacutegua
Controle ambiental Qualidade do ar solo e aacutegua na aacuterea
do empreendimento
Conservaccedilatildeo da fauna e flora Fauna e flora no entorno do
empreendimento
Preservaccedilatildeo do patrimocircnio
arqueoloacutegico
Patrimocircnio arqueoloacutegico da regiatildeo
Comunicaccedilatildeo social Informaccedilotildees atualizadas sobre o
empreendimento para a comunidade
Gerenciamento de risco Armazenamento de produtos
perigosos
Reabilitaccedilatildeo de aacutereas degradadas Entorno do empreendimento
Gestatildeo ambiental Processo decisoacuterio da Usina e relaccedilatildeo
com os colaboradores
Fomento ao desenvolvimento
sustentaacutevel
Criaccedilatildeo de um fundo de fomento agrave
atividades de recuperaccedilatildeo ambiental
melhoria da qualidade de vida e
desenvolvimento sustentaacutevel
Fonte Baseado em UNESC Plural (2006)
Quando analisadas as perspectivas para a regiatildeo com e sem a
implantaccedilatildeo do empreendimento alguns aspectos podem ser destacados
Sem o empreendimento natildeo haveria pressatildeo antroacutepica e a regiatildeo seguiria
as atuais tendecircncias de desconcentraccedilatildeo crescimento moderado da
atividade agropecuaacuteria continuidade da atividade carboniacutefera num
cenaacuterio de suposta estagnaccedilatildeo econocircmica Com o empreendimento
haveria uma dinamizaccedilatildeo da economia municipal geraccedilatildeo de emprego e
renda o consumo do rejeito para geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica e a pressatildeo antroacutepica na aacuterea de influecircncia da USITESC inclusive aacutereas
preservadas (UNESC PLURAL 2006)
169
622 Das audiecircncias puacuteblicas e licenccedilas
O processo de licenciamento da USITESC contou com a
realizaccedilatildeo de quatro audiecircncias puacuteblicas que ocorreram de acordo com
a resoluccedilatildeo do CONAMA nordm 00987 As audiecircncias aconteceram no
municiacutepio de Treviso A primeira ocorreu em 19 de fevereiro de 2004 a
segunda em oito de julho de 2004 a terceira em 16 de maio de 2006 e a
quarta em 8 de novembro de 2007 A realizaccedilatildeo das quatro audiecircncias
puacuteblicas se deve ao fato de que vaacuterias informaccedilotildees natildeo constavam do
EIARIMA tendo sido solicitados estudos complementares que
incluiacuteam tambeacutem os empreendimentos acessoacuterios
Apoacutes a terceira audiecircncia puacuteblica em trecircs de julho de 2006
Darlan Aiacuterton Dias Procurador da Repuacuteblica enviou uma
correspondecircncia para o entatildeo presidente da FATMA Jacircnio Wagner
Constante informando que o licenciamento da USITESC e do
reservatoacuterio de aacutegua precisam ser conjuntos sob pena de fracionar o
licenciamento (FATMA 2013d fl 687) O procurador da repuacuteblica
recomendou que ldquonatildeo seja concedida LP para a USITESC sem que
antes seja apresentado EIARIMA relativo agrave construccedilatildeo do reservatoacuterio
no rio Matildee Luzia o qual deveraacute ser publicado e submetido a audiecircncia
puacuteblica conforme determina a legislaccedilatildeo vigenterdquo (FATMA 2013d fl
687)
Em seis de marccedilo de 2007 Alfredo Flavio Gazzolla informou ao
novo presidente da FATMA Carlos L Kreuz que diante da situaccedilatildeo
colocada a USITESC estava alterando seu projeto original mudando o
sistema de resfriamento da usina e reduzindo o consumo de aacutegua a 10
do previsto anteriormente (FATMA 2013e fl 831)
Com a alteraccedilatildeo do projeto o Procurador da Repuacuteblica Darlan
Airton Dias em oito de maio de 2007 informou a necessidade da
realizaccedilatildeo de uma nova audiecircncia puacuteblica ldquoConsiderando a mudanccedila
conceitual no projeto eventual concessatildeo de Licenccedila Ambiental Preacutevia
ndash LAP depende da realizaccedilatildeo de nova audiecircncia puacuteblicardquo (FATMA
2013e fl 842-3) Apoacutes a realizaccedilatildeo da quarta audiecircncia puacuteblica em 8 de novembro de 2007 a LP foi concedida em 14 de dezembro de 2007
(LAP nordm 1482007) (FATMA 2013f fl 1065)
Em 31 de marccedilo de 2008 foi comunicada a Alteraccedilatildeo da
composiccedilatildeo acionaacuteria da USITESC 95 do capital foi assumido pela
170
Linear Participaccedilotildees e Incorporaccedilotildees Ltda e os 5 restantes ficam com
as Carboniacuteferas Criciuacutema e Metropolitana A comunicaccedilatildeo remetida por
Kaioaacute Gomes diretor teacutecnico da Linear foi endereccedilada ao novo
presidente da FATMA Murilo Xavier Flores (FATMA 2013f fl
1111)
Em dois de marccedilo de 2010 foi concedida a LI (LAI nordm 06GELUR
2010) (FATMA 2013h fl 1540) Ainda em 2010 foi estabelecido o
Termo de Compromisso de Compensaccedilatildeo Ambiental R$ 670800000 a
serem aplicados na Reserva Bioloacutegica Estadual do Aguaiacute (FATMA
2013h fl 1549-1554)
Em 15 de fevereiro de 2013 Kaioaacute Gomes solicitou a
prorrogaccedilatildeo da LI (FATMA 2013h fl 1607-08) Em resposta Ivana
Becker concluiu ser viaacutevel a prorrogaccedilatildeo da LI pelo prazo de 36 meses
(FATMA 2013h fl 1603-5)
A solicitaccedilatildeo de estudos complementares e as quatro audiecircncias
puacuteblicas parecem demonstrar uma estrateacutegia de desinformaccedilatildeo por parte
dos segmentos econocircmicos O papel do Ministeacuterio Puacuteblico foi chave no
questionamento e equacionamento dessa questatildeo
623 Pressotildees dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos no processo de
licenciamento
Um aspecto interessante na anaacutelise do discurso dos documentos
do processo de licenciamento foi a pressatildeo exercida pela USITESC e
pelo Governo do Estado sobre a FATMA Em janeiro de 2005 o entatildeo
presidente da USITESC enviou uma carta ao governo do estado
questionando o tratamento dado pela FATMA ao processo de
licenciamento ambiental destacando a importacircncia da USITESC e
sugerindo uma falta de sintonia entre FATMA e poder executivo
conforme trecho da carta a seguir
Esta empresa gostaria de registrar seu protesto e
indignaccedilatildeo pelo peacutessimo tratamento dado por esta
Fundaccedilatildeo ao processo de licenciamento ambiental
da USITESC embora tenhamos sempre procurado
dar o maacuteximo de suporte e pautado nossa postura
171
no sentido da maacutexima cooperaccedilatildeo e pronto
atendimento a qualquer solicitaccedilatildeo da FATMA
Nossa paciecircncia esgota-se no momento em que
percebemos o descaso com que eacute tratado um
projeto da magnitude da Usina Termeleacutetrica Sul
Catarinense ndash USITESC cujo conceito de
desenvolvimento vem desde o iniacutecio de seus
estudos buscando a melhor integraccedilatildeo do projeto
com sua aacuterea de influecircncia e geraccedilatildeo de resultados
positivos para o meio ambiente em que se insere
()
Este fato contrasta com as manifestaccedilotildees puacuteblicas
de apoio ao Projeto USITESC recebidas do
Governo Estadual pelos empreendedores e revela
falta de sintonia entre a Fatma e o poder executivo
do Estado de Santa Catarina (Alfredo Flaacutevio
Gazzolla presidente da USITESC FATMA
2013c fl 357 e 359)
Em marccedilo de 2005 o vice-governador em exerciacutecio Eduardo
Pinho Moreira cobrou um posicionamento do diretor geral da FATMA
Janio Wagner Constante
Pela inegaacutevel importacircncia da instalaccedilatildeo da Usina
para o Estado de Santa Catarina e tendo em vista
ter a mesma cumprido com todas as
recomendaccedilotildees ministeriais solicito-lhe urgecircncia
na anaacutelise teacutecnica do projeto pelo que agradeccedilo
antecipadamente (FATMA 2013b fl 352)
Em dezembro de 2005 novamente Alfredo Flaacutevio Gazzolla
enviou carta ao governador do estado Luiz Henrique da Silveira
pedindo a determinaccedilatildeo de um ldquomelhor estudordquo para a emissatildeo da LP
Assim em respeito ao vosso honrado nome e na
defesa do maior empreendimento em estudo no
estado de Santa Catarina solicito seus preacutestimos
no sentido de determinar um melhor estudo
quanto agrave emissatildeo da LAP sem a qual estaremos
impossibilitados de participar do proacuteximo leilatildeo
de energia no semestre vindouro (FATMA
2013c fl 388)
172
Na mesma carta o presidente da USITESC solicitou a licenccedila
preacutevia independente da conclusatildeo do Estudo Suplementar solicitado
pela FATMA
Solicita-se ao Governo do Estado que emita a
Licenccedila Preacutevia para a USITESC
independentemente da conclusatildeo do Estudo
Suplementar solicitado pela FATMA jaacute que nada
impede a FATMA de emitir esta licenccedila uma vez
que o empreendedor cumpriu todas as exigecircncias
legais cabiacuteveis para sua obtenccedilatildeo e que a FATMA
poderaacute nela colocar todos os condicionantes que
considerar pertinentes tendo em vista assegurar a
viabilidade da continuidade do processo de
licenciamento ambiental da USITESC (FATMA
2013c fl 390)
Em resposta Luiz Antocircnio Garcia Correcirca Diretor de controle
ambiental da FATMA em 19 de dezembro de 2005 repreendeu a
USITESC quanto agraves manifestaccedilotildees da miacutedia que relacionavam o natildeo
licenciamento da USITESC e a natildeo participaccedilatildeo no leilatildeo da ANEEL a
uma decisatildeo da FATMA
Temos observado manifestaccedilotildees equivocadas na
miacutedia provenientes de representante do SIECESC
relativa ao processo de licenciamento ambiental
reputado inclusive a FATMA a natildeo participaccedilatildeo
da USITESC no leilatildeo da ANEEL o que natildeo
condiz com a realidade Tais fatos em nada
contribuem ao processo de licenciamento
ambiental (FATMA 2013c fl 641-642)
O conteuacutedo das correspondecircncias demonstra as articulaccedilotildees entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos Depois de 2005 natildeo constam mais
correspondecircncias relacionadas Eacute importante frisar que eacute em 2005 que
surgiu a Frente Parlamentar Mista em defesa do Carvatildeo Mineral e
aumentaram as doaccedilotildees das carboniacuteferas aos poliacuteticos Dessa forma
sugere-se que se ateacute 2005 a pressatildeo sobre o oacutergatildeo ambiental era
173
exercida diretamente apoacutes 2005 com uma maior articulaccedilatildeo a pressatildeo
pode ser exercida de outras formas natildeo passando necessariamente pelo
oacutergatildeo ambiental
624 A posiccedilatildeo dos segmentos sociais
Os segmentos sociais se posicionaram contra a ampliaccedilatildeo da
energia termeleacutetrica ao longo do processo de licenciamento Na ocasiatildeo
da primeira audiecircncia puacuteblica em 19 de fevereiro de 2004 a ONG
Amigos da Terra Brasil enviou a seguinte mensagem
Amigos da Terra se solidariza com as entidades da
regiatildeo sul de Santa Catarina e acredita que as lutas
locais satildeo responsaacuteveis pela resistecircncia agraves
injusticcedilas socioambientais e pela promoccedilatildeo das
mudanccedilas necessaacuterias para um futuro sustentaacutevel
Um futuro onde as energias renovaacuteveis podem
promover descentralizaccedilatildeo universalizaccedilatildeo do
acesso controle social e empregos sem a
contaminaccedilatildeo local e o aquecimento global
decorrentes do uso do carvatildeo mineral (FATMA
2013c Fl 463)
O Grupo de Trabalho Energia do FBOMS tambeacutem enviou uma
mensagem
As organizaccedilotildees do GT Energia do Foacuterum
Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o
Meio Ambiente e o Desenvolvimento expressam
sua solidariedade agraves populaccedilotildees direta ou
indiretamente afetadas pelos impactos da
mineraccedilatildeo e queima do carvatildeo mineral para a
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica na regiatildeo sul de
Santa Catarina () Conhecendo os graves
impactos jaacute causados pelas atividades carboniacuteferas
no Sul de Santa Catarina temos a certeza do
equiacutevoco que representa a instalaccedilatildeo de mais uma
174
usina a carvatildeo na regiatildeo (FATMA 2013c fl
464)
O Movimento pela Vida de Iccedilara tambeacutem registrou sua posiccedilatildeo
ldquoA regiatildeo natildeo suporta mais impactos ambientais eacute preciso mais
seriedade quando se discute qualquer accedilatildeo que interfira na natureza e na
qualidade de vida das crianccedilas dos jovens das mulheres e dos homens
que vivem na regiatildeordquo (FATMA 2013c fl 466)
Na ocasiatildeo da segunda audiecircncia puacuteblica 8 de julho de 2004 natildeo
constaram manifestaccedilotildees escritas Na terceira audiecircncia puacuteblica 16 de
maio de 2006 em carta da ONG Soacutecios da Natureza assinada por Tadeu
Santos agrave Direccedilatildeo da FATMA ficou registrado que havia uma
solicitaccedilatildeo ldquo() agrave FATMA que realizasse a terceira AP em Criciuacutema ou
mesmo em Araranguaacute jaacute que se trata de um empreendimento que
comprovadamente promove impactos ambientais em toda regiatildeordquo E
mais a frente ao falar sobre o processo de licenciamento afirmou que
ldquosomos atores num circo montado para apresentar uma peccedila com o final
desejado pelo empreendedorrdquo (FATMA 2013c fl 538-542)
Na quarta audiecircncia puacuteblica 8 de novembro de 2007 tambeacutem
natildeo constam manifestaccedilotildees escritas Em 19 de maio de 2011 a Diocese
de Criciuacutema enviou um manifesto para o entatildeo presidente da FATMA
Murilo Xavier Flores contra a instalaccedilatildeo da USITESC (FATMA
2013h fl 1601)
A articulaccedilatildeo dos segmentos sociais apresenta estrateacutegias
importantes que convergem com o enfoque da justiccedila ambiental A
difusatildeo espacial do movimento torna-se vital quando aleacutem dos impactos
regionais a populaccedilatildeo diretamente afetada pelo empreendimento tem
uma forte dependecircncia do segmento em questatildeo Conforme jaacute
mencionamos neste capiacutetulo 69 dos empregos com carteira assinada
satildeo oferecidos pelo segmento do carvatildeo mineral e boa parte da
arrecadaccedilatildeo da prefeitura local vem desta atividade Dessa forma natildeo se
verifica uma resistecircncia local ao empreendimento daiacute porque os
segmentos sociais sediados em outros municiacutepios regiotildees estados
brasileiros desempenham um papel fundamental no questionamento do
empreendimento
175
63 Relaccedilotildees de poder e desigualdade nas audiecircncias puacuteblicas os
documentos falados
No estado de Santa Catarina o procedimento adotado durante
uma audiecircncia puacuteblica eacute descrito resumidamente no Quadro 12 A
coordenaccedilatildeo dos trabalhos eacute feita pela FATMA e o tempo de duraccedilatildeo
maacuteximo da audiecircncia puacuteblica eacute de quatro horas Eacute feita uma abertura da
sessatildeo na qual o presidente da mesa esclarece os objetivos e transmite
as regras gerais Na sequecircncia o empreendedor apresenta o projeto e a
consultoria apresenta o EIARIMA Um intervalo de 15 minutos eacute feito
para que os presentes possam se inscrever Os questionamentos satildeo
feitos por ordem de inscriccedilatildeo e podem ser orais ou escritos Os escritos
satildeo lidos pelo coordenador da sessatildeo e os orais devem ser formulados
em trecircs minutos O empreendedor e a consultoria tecircm cinco minutos
para responder e ainda constam dois minutos para reacuteplica e trecircs minutos
para treacuteplica O encerramento eacute feito pelo coordenador da sessatildeo
Quadro 12 - Procedimento para conduccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas
FATMA ETAPAS DA AUDIEcircNCIA TEMPO
Abertura FATMA (10min)
Exposiccedilotildees Proponente do projeto (20min)
Consultoria responsaacutevel pelo
EIARIMA (45min)
Manifestaccedilatildeo da plenaacuteria e debates Intervalo para inscriccedilotildees (15min)
Questionamento (3min)
Resposta (5min)
Reacuteplica (2min)
Treacuteplica (3min)
Encerramento FATMA (sem tempo definido)
Fonte Adaptado de FATMA (2013a fl 101-2)
A elaboraccedilatildeo do projeto da USITESC iniciou em 1999 (Luis
Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007) Em 19 de
fevereiro de 2004 foi realizada a primeira audiecircncia puacuteblica Na
abertura foi lido um ofiacutecio do Ministeacuterio Puacuteblico Federal avisando que
seria requerida uma segunda audiecircncia puacuteblica dado que o EIA
precisava da anaacutelise dos peritos da quarta cacircmara de Brasiacutelia A segunda
audiecircncia puacuteblica foi realizada no dia 8 de julho de 2004 por solicitaccedilatildeo
da FATMA para discutir o projeto da USITESC com o Comitecirc Gestor
176
da Bacia do Rio Araranguaacute porque havia uma preocupaccedilatildeo com o
consumo de aacutegua Motivado pela recomendaccedilatildeo nordm 14 foi contratado
entatildeo um estudo de suplementaccedilatildeo Esse estudo foi apresentado na
terceira audiecircncia puacuteblica em 16 de maio de 2006 tratando dos
empreendimentos acessoacuterios da USITESC (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
As duas audiecircncias puacuteblicas analisadas neste capiacutetulo a terceira e
quarta audiecircncia de 16 de maio de 2006 e 8 de novembro de 2007
respectivamente seguiram o procedimento acima apresentado Em
ambas constatou-se um rigor maior no controle do tempo dos
participantes que apresentaram seus questionamentos que com os
respondentes (empreendedor IPAT Ministeacuterio Puacuteblico Federal e
FATMA) Foram convidados para tomar assento na mesa representantes
da FATMA Ministeacuterio Puacuteblico Federal empreendedor IPAT
prefeitura e SIESESC Diante disso cabe questionar Por que somente
representantes dos segmentos poliacuteticos e econocircmicos tiveram assento na
mesa de trabalho Por que os representantes dos segmentos sociais natildeo
tiveram assento
Na quarta audiecircncia mediada por Adhiles Bortot da FATMA foi
utilizada uma sequecircncia diferente nos questionamentos orais e escritos
natildeo foi respeitada a ordem de chegada Os questionamentos escritos
foram lidos primeiro Em muitos momentos nos questionamentos orais
diante de colocaccedilotildees polecircmicas Adhiles Bortot passava para a pergunta
seguinte como se o questionamento natildeo precisasse ser respondido Por
vaacuterias vezes ele foi interrompido pelo IPAT e Ministeacuterio Puacuteblico
Federal que queriam comentar as intervenccedilotildees do puacuteblico Outro ponto
que merece ser destacado eacute que ele interrompia repetidamente o
questionador pedindo que o tempo fosse respeitado Logo as pessoas
que faziam questionamentos resumiam sua fala sobrando mais tempo
para os respondentes
Nas proacuteximas seccedilotildees desse capiacutetulo a partir da transcriccedilatildeo e
anaacutelise das audiecircncias puacuteblicas encontram-se trechos selecionados de
temas Fragmentos dos discursos dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais foram destacados e comentados a partir dos pontos mais
controvertidos
177
631 A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica
Os discursos das audiecircncias puacuteblicas proacute USITESC tenderam a
minimizar os impactos causados pelo empreendimento ressaltando seus
aspectos positivos Os segmentos econocircmicos representados pelo
empreendedor situaram a USITESC num contexto mundial no qual o
carvatildeo mineral eacute base da matriz energeacutetica O uso de novas tecnologias
e a situaccedilatildeo do Brasil colocaria as emissotildees de gases de efeito estufa
como insignificantes na matriz energeacutetica brasileira
() os estudos energeacuteticos mostram que o carvatildeo
ainda seraacute a base da matriz energeacutetica mundial ateacute
o ano de 2050 no miacutenimo O incremento de
novos projetos a carvatildeo vem paulatinamente
recebendo tratamento tecnoloacutegico para minimizar
a formaccedilatildeo de gases de efeito estufa Isso eacute uma
verdade () a contribuiccedilatildeo do Brasil para o efeito
estufa com novas usinas a carvatildeo eacute insignificante
perante o quadro mundial Soacute para citar um
exemplo esse ano soacute na Alemanha foram
contratados mais de oito mil novos megawatts a
carvatildeo O Brasil todo tem pouco mais de mil
megawatts a carvatildeo instalados A USITESC estaacute
propondo colocar uma potecircncia bruta de 200440
dos quais vai gerar em meacutedia 280 a 300
Alemanha tem 70 mil megawatts de carvatildeo
instalados O nordeste dos Estados Unidos tem
350 mil soacute o nordeste dos Estados Unidos 350
mil megawatts de carvatildeo instalados (Luis Carlos
Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
A ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral eacute
ldquonecessaacuteriardquo para o Brasil e a USITESC eacute um empreendimento
economicamente viaacutevel
() o sistema eleacutetrico brasileiro necessita da
geraccedilatildeo teacutermica e para isso o carvatildeo mineral eacute
sem duacutevida o nosso melhor potencial a USITESC
utilizaraacute um combustiacutevel de baixo custo os niacuteveis
tarifaacuterios sinalizados para o horizonte de
contrataccedilatildeo da energia da Usina indicam boa
rentabilidade para o Projeto adicional pela venda
178
do sulfato de amocircnia 320000 toneladas por ano
(Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Os impactos ambientais e riscos foram minimizados nas
colocaccedilotildees garantindo-se que os investidores internacionais natildeo
participam de empreendimentos que contrariem a legislaccedilatildeo e possuam
risco ambiental A atuaccedilatildeo fiscalizadora do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
tambeacutem foi citada Natildeo foi destacada em nenhum momento a
importacircncia da FATMA
() a USITESC significa um investimento global
da ordem de 750 milhotildees de doacutelares Esse
dinheiro natildeo vai ser buscado em algum fundo de
quintal Esse dinheiro tem investidores
internacionais e ningueacutem arrasta dinheiro
ningueacutem bota dinheiro em empreendimento que
possui risco ambiental A maior garantia que vocecirc
tem que um projeto vai ser implantado com a
qualidade ambiental que estaacute sendo anunciada eacute
que hoje os auditores internacionais natildeo aprovam
os financiamentos se o projeto natildeo estiver de
acordo com aquela disposiccedilatildeo feita no papel
(Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
O que noacutes estamos querendo implantar aqui na
regiatildeo natildeo eacute nada de coisa anormal que vai
prejudicar algueacutem Mesmo porque () o
Ministeacuterio Puacuteblico natildeo vai deixar noacutes cometermos
barbaridade () Eu digo a todos vocecircs o seguinte
como o proacuteprio Banco Mundial me disse laacute em
Washington ldquose vocecircs tiverem algum problema de
poluiccedilatildeo ao implantar o projeto noacutes natildeo daremos
um centavo sequer (Alfredo Flaacutevio Gazzolla
USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
A importacircncia do empreendimento para a regiatildeo e para o municiacutepio tambeacutem foi destacada Ele vai trazer desenvolvimento para
Treviso e regiatildeo com geraccedilatildeo de emprego e renda E quanto agrave
dependecircncia do municiacutepio em relaccedilatildeo ao carvatildeo Luis Carlos Cunha
garantiu que o municiacutepio diversificaraacute sua economia
179
Ora cinquenta anos eacute um prazo bastante grande
pra pra pra um desenvolvimento de outras
atividades no municiacutepio Natildeo vai o municiacutepio natildeo
vai ficar estagnado somente na mina e numa
Usina E a Usina eacute multiplicadora na medida em
que ela vai proporcionar com os seus subprodutos
o sulfato de amocircnia e a proacutepria cinza que eacute uma
mateacuteria prima importante para a construccedilatildeo civil
etc a implantaccedilatildeo de outros empreendimentos na
regiatildeo ou no proacuteprio municiacutepio pra
aproveitamento industrial desses subprodutos e
presumo ao longo de cinquenta anos outras
oportunidades apareceratildeo para o municiacutepio dentro
das suas vocaccedilotildees (Luis Carlos Cunha USITESC
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A usina foi colocada pelo empreendedor como uma forma de
recuperaccedilatildeo ambiental jaacute que vai ser construiacuteda em aacuterea degradada e
utilizar 30 de rejeito como mateacuteria prima para geraccedilatildeo de energia ldquoA
rigor a instalaccedilatildeo da Usina nessa localizaccedilatildeo significa uma accedilatildeo de
recuperaccedilatildeo ambientalrdquo (Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
O maior impacto ambiental segundo o representante do
empreendedor eacute a pressatildeo sobre a infraestrutura urbana de Treviso que
seraacute devidamente minimizada com investimentos nessa aacuterea Como
principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo foi destacada a geraccedilatildeo de emprego e
renda apresentada ao puacuteblico da audiecircncia atraveacutes da Tabela 28
Tabela 28 ndash Principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo com a construccedilatildeo da
USITESC SETOR DA
ECONOMIA
EMPREGOS
DIRETOS
EMPREGOS
INDIRETOS
Mineraccedilatildeo de carvatildeo 400-500
Mineraccedilatildeo de calcaacuterio ~60
Geraccedilatildeo de energia ~150
Amocircnia e sulfato de
amocircnia
~60
Transportes diversos ~140
Restante da economia
associada
4500
Fonte Luis Carlos Cunha USITESC Audiecircncia Puacuteblica (2007)
180
Os segmentos poliacuteticos tambeacutem se posicionaram em relaccedilatildeo agrave
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica O representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal ressaltou a necessidade da ampliaccedilatildeo da oferta de
energia eleacutetrica resguardando seu posicionamento teacutecnico-legal
E aiacute o Brasil estaacute numa encruzilhada no meu
ponto de vista e aqui isso que noacutes estamos
vivendo em Treviso eacute um microcosmo do que taacute
acontecendo no paiacutes Porque o paiacutes estaacute diante de
uma crise energeacutetica noacutes tivemos um apagatildeo
daqui a um tempo vamos ter outro aqui noacutes
estamos discutindo USITESC mas tem problema
de usina hidreleacutetrica em Itaacute em Anita Garibaldi
em Belo Monte laacute na Amazocircnia e natildeo sei mais
aonde e noacutes estamos refeacutem do gasoduto do Evo
Morales Entatildeo Esse eacute um questionamento pra
noacutes brasileiros como um todo Claro que natildeo
somos noacutes aqui que vamos resolver isso mas
temos que ter isso em mente E isso passa pelo
presidente da repuacuteblica pelo Congresso a
sociedade tem que ter uma resposta pra isso
porque noacutes queremos luz eleacutetrica queremos o
desenvolvimento econocircmico Entatildeo daonde vai
sair a energia Algum impacto ambiental em
algum lugar vai ter que ter Eacute claro que noacutes
queremos o mais longe possiacutevel do nosso quintal
E o papel do Ministeacuterio Puacuteblico nesse processo eacute
um oacutergatildeo independente que fiscaliza E noacutes
estamos fiscalizando esse processo da USITESC
com base olhando duas coisas o cumprimento da
legislaccedilatildeo e os aspectos teacutecnicos Vocecircs viram
aqui que tem uma equipe teacutecnica trabalhando
temos outros profissionais que estatildeo trabalhando
nisso () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico
Federal AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A prefeita Lucia Simolin enfatizou a situaccedilatildeo de dependecircncia do municiacutepio em relaccedilatildeo agrave atividade carboniacutefera
Eacute verdade tambeacutem que Treviso hoje tem a
seguinte realidade incontestaacutevel feliz ou
infelizmente 80 da nossa economia faltando
alguns poucos deacutecimos praticamente
181
arredondando para 80 depende da economia da
extraccedilatildeo do carvatildeo mineral nos seus diversos tipos
de exploraccedilatildeo e usos Em torno de 20 gira em
torno da produccedilatildeo agropecuaacuteria embora a gente
tenha 168km2 de aacuterea Entatildeo senhores a
exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral para Treviso ela eacute
equivalente agrave monocultura do arroz para Turvo e
Meleiro Essa eacute uma realidade teacutecnica e
administrativa que natildeo eacute do dia pra noite que a
gente pode alterar (Lucia Simolin prefeita
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
() noacutes temos a consciecircncia dos problemas que
podem advir uns mais visiacuteveis e comprovados
outros que o tempo vai nos dizer e a natureza de
que um empreendimento desse porte ele vai nos
afetar Mas vejamos bem como vamos
sobreviver a uma condiccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos
municipais se praticamente a receita do
municiacutepio hoje estaacute diretamente vinculada a
extraccedilatildeo de um foacutessil (Lucia Simolin prefeita
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Apesar de demonstrar uma certa inseguranccedila em relaccedilatildeo aos
impactos o empreendimento natildeo foi questionado A prefeita inclusive
enfatizou a ldquocultura do carvatildeordquo e a ideia da construccedilatildeo do museu do
carvatildeo como algo positivo para a cidade
noacutes temos a nossa cultura eacute o carvatildeo Aiacute a natildeo
exploraacute-lo ou a transformaacute-lo em energia eacute uma
discussatildeo que noacutes estamos presentes e portanto
natildeo fugindo () A gente tem que ver a melhor
saiacuteda pra todas as situaccedilotildees E noacutes do poder
puacuteblico estamos aqui pra isso Estamos aqui para
contribuir Entatildeo esse eacute o meu depoimento a
respeito do empreendimento essa eacute a realidade do
municiacutepio e que natildeo pode ser negada Eacute a nossa
realidade Eacute a nossa verdade A verdade que eacute
uma verdade econocircmico-financeira mas eacute a nossa
verdade (Lucia Simolin AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
182
O crescimento econocircmico do municiacutepio e regiatildeo foi um
argumento forte de convencimento
Noacutes temos que ter consciecircncia de que o projeto
USITESC quando implantado ele seraacute a mola
propulsora de uma nova fase de desenvolvimento
para toda a regiatildeo carboniacutefera Natildeo eacute soacute mineiro
que quer emprego Toda a populaccedilatildeo quer
emprego Quer investimento em sauacutede educaccedilatildeo
e a USITESC eacute investimento eacute sinal de
investimento () Eu acho que a regiatildeo toda tem
muito a ganhar com esse grande projeto que vai
alavancar o progresso e o desenvolvimento de
uma nova fase () (Marcos Antocircnio Cesconetto
Vereador AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
O que fica expliacutecito nos discursos de alguns poliacuteticos locais eacute
uma confianccedila no processo de licenciamento e nas empresas
carboniacuteferas
Noacutes temos que discutir aqui assuntos pertinentes
agrave populaccedilatildeo ou seja a instalaccedilatildeo da Usina E
dizer Dr Darlan que noacutes confiamos na atuaccedilatildeo do
Ministeacuterio Puacuteblico Federal confiamos na atuaccedilatildeo
do Ministeacuterio Puacuteblico Estadual na atuaccedilatildeo da
Fatma e de tantos oacutergatildeos como o Ibama que satildeo
realmente quem tem condiccedilotildees de fiscalizar aquilo
que vai acontecer no empreendimento Natildeo satildeo
afirmaccedilotildees infundadas que foram levantadas aqui
e que muitas delas natildeo tem a ver com o
empreendimento Noacutes queremos dizer que noacutes
confiamos na Carboniacutefera Metropolitana e na
Carboniacutefera Criciuacutema uma delas aqui a mais de
vinte anos outra jaacute explorou carvatildeo aqui na volta
redonda e nas reservas que eles tecircm aqui E noacutes
temos consciecircncia de que o empreendimento eacute
viaacutevel e eacute viaacutevel porque ele pode viabilizar a
exploraccedilatildeo de carvatildeo e a grande maioria das
pessoas eu posso dizer que quase a totalidade das
pessoas que estatildeo aqui ou satildeo mineiros ou algueacutem
da famiacutelia vive do carvatildeo nos mais diversos
municiacutepios (Marcos Antocircnio Cesconetto
Vereador AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
183
A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica fica evidente
nos discursos aqui apresentados O empreendimento se justifica na
medida em que paiacuteses ldquodesenvolvidosrdquo utilizam o carvatildeo para geraccedilatildeo
de energia e o Brasil por ter uma matriz energeacutetica considerada
ldquolimpardquo pode usaacute-lo sem maiores problemas Os impactos ambientais
do empreendimento seratildeo miacutenimos jaacute que os investidores internacionais
assim o exigem e o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute fiscalizando Afinal a
concessatildeo do licenciamento estaacute condicionada ao respeito agraves leis e a
criteacuterios teacutecnicos
Os poliacuteticos municipais dada a dependecircncia econocircmica da
atividade carboniacutefera veem o empreendimento com ldquobons olhosrdquo pois
apesar dos impactos negativos ele traraacute tambeacutem o crescimento ao
municiacutepio e agrave regiatildeo Segundo eles a cultura do carvatildeo precisa ser
mantida
632 As mudanccedilas climaacuteticas natildeo vecircm ao caso
Os segmentos sociais presentes nas audiecircncia puacuteblicas (Amigos
da Terra Movimento Iccedilara pela Vida Soacutecios da Natureza UNESC
dentre outros) demonstraram preocupaccedilatildeo com as mudanccedilas climaacuteticas
com o aquecimento global com o impacto regional do empreendimento
e a continuidade da atividade carboniacutefera que jaacute causou muitos impactos
na regiatildeo
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionou a
continuidade de uma atividade que se mostrou e se mostra inviaacutevel do
ponto de vista socioambiental
Porque a nossa preocupaccedilatildeo do Movimento pela
Vida aleacutem de todo o efeito estufa aleacutem de toda a
poluiccedilatildeo que vai gerar aqui na regiatildeo que natildeo eacute
soacute o CO2 que vai largar O gaacutes que vai ser largado
aqui mas toda uma poluiccedilatildeo que vai ser gerada
aqui proacuteximo do Aquiacutefero Guarani da Serra todo
esse ecossistema que existe que essa usina estaacute
colocando em perigo E tambeacutem vai a meacutedio e
longo prazo trazer problemas para as famiacutelias da
regiatildeo onde existe carvatildeo no subsolo porque
assim como laacute na Iccedilara eles tatildeo tentando tirar
carvatildeo eles vatildeo tentar continuar tirando de outros
184
lugares (Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela
Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Carlyle professor da UNESC fez a seguinte pergunta
ldquoConsiderando as implicaccedilotildees das emissotildees de CO2 Dioacutexido de Carbono
para o aquecimento global quais as razotildees pelas quais esse poluente natildeo
foi analisado17
tendo em vista os recentes relatoacuterios do Painel sobre
Mudanccedilas Climaacuteticasrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Em resposta Luiz Nogueira Palma deixou claro que a questatildeo
das mudanccedilas climaacuteticas natildeo dizia respeito ao conteuacutedo da audiecircncia
puacuteblica
Eu vou responder isso aiacute eu acho que o Carlyle
estaacute colocando uma pergunta muito interessante
mas que no meu entendimento ela foge
totalmente ao objeto dessa audiecircncia Eacute todo
mundo sabe que uma usina termeleacutetrica que
queima carvatildeo ou qualquer outro combustiacutevel
emite CO2 Existem necessidades de gerar energia
e o que estaacute se discutindo aqui eacute a necessidade de
um empreendimento que foi colocado junto ao
cenaacuterio nacional Eacute eu natildeo vou mentir para vocecircs
essa usina emite CO2 como o carro de cada um de
noacutes emite CO2 e o que o que o Carlyle taacute
colocando eacute uma preocupaccedilatildeo mundial de emissatildeo
de CO2 Mas nem por isso nenhum paiacutes estaacute
deixando de implantar usina as necessaacuterias como
todos os controles necessaacuterios [ele interrompe
momentaneamente a fala por conta do burburinho]
Entatildeo eu acho que essa pergunta que trata de uma
mateacuteria global A usina trata os poluentes
atmosfeacutericos de forma exemplar com elementos
de controle extremamente sofisticados
encarecendo o preccedilo da energia gerada e por isso
estaacute se chamando usina da energia verde neacute
Porque a teacutermica que usa um combustiacutevel natildeo tatildeo
nobre como o gaacutes que eacute o carvatildeo nacional ela taiacute
para produzir mostrando que as emissotildees tatildeo
muito abaixo dos padrotildees nacionais Natildeo existe
um padratildeo nacional para CO2 em lugar nenhum
17
Nos estudos complementares que haviam sido apresentados na audiecircncia
puacuteblica
185
do mundo Entatildeo essa eacute outra questatildeo () O
contraponto dessa pergunta e de que se noacutes
estamos ou natildeo colaborando com o Protocolo de
Quioto O Brasil colabora porque a nossa matriz
energeacutetica mais de 90 da energia gerada no paiacutes
eacute hidraacuteulica (Luiz Nogueira Palma IPAT
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida fez a leitura de
uma moccedilatildeo que foi aprovada na etapa regional da Conferecircncia do Meio
Ambiente A Conferecircncia aconteceu na UNESC e foi promovida pela
Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econocircmico Sustentaacutevel pelo
IBAMA Secretaria de Estado da Educaccedilatildeo EPAGRI CIRAM
FECAM ANAMA FLORAM FEEC FIESC ALESC FETAESC
Poliacutecia Militar Ambiental e ACAFE Aconteceram sete delas em Santa
Catarina O objetivo das Conferecircncias foi traccedilar poliacuteticas puacuteblicas sobre
meio ambiente no paiacutes em relaccedilatildeo ao aquecimento global ldquoE qual foi a
decisatildeo que a Conferecircncia Regional aqui tomou em relaccedilatildeo ao carvatildeo
Em resumo ldquoa substituiccedilatildeo da matriz energeacutetica baseada no carvatildeo para
outras alternativas de modo gradativordquo Moccedilatildeo que foi aprovada por
unanimidade Ele aproveitou para ler um trecho da moccedilatildeo
() em face da comprovada participaccedilatildeo da
queima de carvatildeo mineral no aumento do
aquecimento global e na intensa degradaccedilatildeo do
solo e aacuteguas provocadas pela sua extraccedilatildeo a
Conferecircncia Regional do Meio Ambiente de
Criciuacutema solicita o cancelamento de todo o
processo de licenciamento da Termeleacutetrica
USITESC em Santa Catarina bem como outras da
regiatildeo sul do Estado dado o elevado passivo
ambiental associado aos empreendimentos
especialmente em termos de degradaccedilatildeo dos
ecossistemas costeiros e da perda da qualidade de
vida das populaccedilotildees que ocupam o sul do estadordquo
Ele completou sua intervenccedilatildeo fazendo o seguinte comentaacuterio
Algueacutem estaacute indo na contramatildeo da histoacuteria ()
Ou noacutes nos damos conta que esse
empreendimento vai contra taacute indo contra tudo o
que estaacute se vendo nesse paiacutes nesse planeta ou
entatildeo a gente estaacute assinando nossa sentenccedila de
morte Chegamos ao absurdo de escutar dos
186
teacutecnicos do IPAT que essa questatildeo do CO2 eacute uma
questatildeo irrelevante natildeo vem ao caso Gente essa
eacute a maior questatildeo E que foi deixada de lado E o
IPAT estaacute indo contra a missatildeo da UNESC
(Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Diante do comentaacuterio o representante do IPAT Marcos Back
fez as seguintes consideraccedilotildees
Em primeiro lugar eu gostaria de esclarecer
algumas questotildees por aqui que natildeo estatildeo muito
claras Primeiro existe um posicionamento
equivocado aqui Noacutes temos que entender
exatamente o que noacutes estamos colocando
Primeiro noacutes estamos discutindo o EIARIMA
que se refere a uma usina termeleacutetrica que queima
carvatildeo e que emite CO2 Quando o Engenheiro
Palma coloca que a questatildeo do CO2 natildeo deve ser
discutida aqui natildeo eacute que ele estaacute querendo dizer
que a questatildeo do CO2 eacute irrelevante Natildeo eacute que ele
quer dizer que o problema do CO2 do
aquecimento global natildeo sejam questotildees
importantes a serem discutidas Pelo contraacuterio a
questatildeo do aquecimento global e da emissatildeo de
CO2 eacute uma questatildeo muito importante a ser
discutida Que a sociedade tem que pensar
seriamente nas consequecircncias da emissatildeo de CO2
que natildeo vem soacute do carvatildeo taacute Entatildeo noacutes temos
que pensar nisso que o aquecimento global estaacute
mostrando seus efeitos e jaacute vaacuterios cientistas
demonstraram mostraram esses efeitos Entatildeo noacutes
temos que pensar nisso sim Quando o IPAT taacute
colocando aqui que noacutes estamos discutindo o
EIARIMA da USITESC noacutes estamos colocando
que discutir licenciamento ambiental eacute um
procedimento legal vocecirc segue o tracircmite as
normas de um procedimento legal () Natildeo eacute da
competecircncia do IPAT julgar a matriz energeacutetica
brasileira Quem estabeleceu isso foram as leis
federais o Congresso Nacional e o Presidente
Lula Satildeo eles que estabelecem se pode ou natildeo
pode produzir carvatildeo se pode ou natildeo pode ter
187
energia movida a carvatildeo Entatildeo natildeo compete ao
IPAT nesse estudo NESSE ESTUDO de usina
termeleacutetrica conduzir uma discussatildeo sobre
aquecimento global porque natildeo eacute isso que estaacute
em discussatildeo aqui O que taacute em discussatildeo aqui eacute
se pode ou natildeo implantar a usina termeleacutetrica
dentro dos tracircmites da lei atual (Marcos Back
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Um representante dos segmentos poliacuteticos Joatildeo Luiacutes presidente
da Cacircmara de Vereadores de Trevisto tambeacutem fez um questionamento
sobre o assunto
Eu gostaria de fazer uma pergunta aos oacutergatildeos
ambientais Noacutes vimos na televisatildeo todos os dias
que os Estados Unidos eacute o maior produtor desse
planeta e foi superado pela China Exatamente nas
suas termeleacutetricas que queimam carvatildeo mineral
87 da energia produzida pela China eacute da queima
do carvatildeo mineral Entatildeo noacutes vemos aiacute o mundo
todo criticando brigando contra isso agora eu
gostaria que vocecircs respondessem a todos noacutes que
satildeo pessoas entendidas Noacutes podemos implantar
um projeto como esse em Treviso Ele eacute viaacutevel
Noacutes podemos pagar esse preccedilo E por que (Joatildeo
Luis Presidente da Cacircmara de Vereadores de
Treviso AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
A resposta do representante da FATMA tambeacutem natildeo contemplou
a preocupaccedilatildeo com questotildees mais amplas
Algumas questotildees que jaacute foram hoje objeto de
abordagem aqui ele foge do escopo do processo
de licenciamento Noacutes tratarmos de mudanccedilas
climaacuteticas natildeo eacute uma questatildeo que estaacute inserida no
projeto que hoje estaacute sendo objeto dessa audiecircncia
puacuteblica A garantia que eu posso dar aos senhores
em relaccedilatildeo ao projeto que estaacute sendo avaliado pela
FATMA e logicamente que noacutes temos natildeo eacute uma
parceria mas um papel fiscalizador do Ministeacuterio
Puacuteblico que tem auxiliado e tem contribuiacutedo de
uma maneira positiva pra que noacutes ao longo desses
dois trecircs anos desse processo de licenciamento
noacutes tenhamos tido avanccedilos significativos em
188
termos de ganhos ambientais () (Luis Antocircnio
Garcia FATMA AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Jaacute o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal Darlan Aiacutelton
Dias contemplou a preocupaccedilatildeo dos presentes afirmando que ldquoeu acho
sim que o aquecimento global faz parte da discussatildeo da USITESC Deve
ser discutida mas a decisatildeo do licenciamento eacute verificar a adequaccedilatildeo
teacutecnica e o atendimento agrave legislaccedilatildeordquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Apesar do parecer favoraacutevel do representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal fica claro que para os que compotildeem a mesa de
trabalho na audiecircncia puacuteblica o tema natildeo tem relaccedilatildeo com o
licenciamento Aos representantes dos segmentos sociais e poliacuteticos aqui
citados foi permitida a manifestaccedilatildeo quanto ao tema mas ela natildeo
encontrou eco Isso aconteceu tambeacutem para a tentativa de discutir o
empreendimento regionalmente
633 Quem defende quem E quem defende os
afetadosatingidosameaccedilados
Nas audiecircncias puacuteblicas foram colocadas duacutevidas em relaccedilatildeo agrave
participaccedilatildeo da populaccedilatildeo de Treviso O vereador Joatildeo Luis Brunel fez a
seguinte colocaccedilatildeo seguida de uma pergunta
() Eu quero dizer que sou a favor do progresso e
quero que a nossa gente tenha emprego mas que
noacutes temos que pagar um preccedilo justo Eu gostaria
de fazer uma pergunta aqui Falou-se sobre muita
coisa mas eu gostaria de saber sobre todas essas
famiacutelias que seratildeo desapropriadas Eu cito aqui a
comunidade da Brasiacutelia Eu vejo aqui a
comunidade satildeo famiacutelias centenaacuterias de gente que
desbravaram essa terra que ajudaram a construir
esse municiacutepio Entatildeo eu faccedilo a seguinte pergunta
como que eles tem o direito de se defender Eles
simplesmente vatildeo ser notificados vatildeo ser
desapropriados Satildeo pessoas que estatildeo aiacute haacute mais
de um seacuteculo Eu gostaria de saber onde estatildeo os
direitos humanos Quais satildeo os direitos que eles
189
tecircm (Joatildeo Luis Brunel AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
Joaquim Teixeira Neto estudante da UNESC fez seu comentaacuterio
sobre a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo na audiecircncia puacuteblica
Entatildeo o seguinte eu gostaria que a populaccedilatildeo de
Treviso que natildeo estaacute aqui presente por motivos
que a gente desconhece precisa A populaccedilatildeo de
Treviso precisa se manifestar em audiecircncia
exclusiva Porque esse empreendimento apesar de
ser regional vai atingir primeiramente essa
comunidade e eles natildeo estatildeo sendo ouvidos Eles
estatildeo sendo calados e todos sabemos (Joaquim
Teixeira Neto AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Lucia Ortiz da Amigos da Terra fez um relato de um processo
de licenciamento que aconteceu no Rio Grande do Sul no qual mesmo
depois de emitida a licenccedila foi feito um plebiscito na regiatildeo
() mesmo depois que a Fepam liberou a licenccedila
preacutevia pra instalaccedilatildeo dessa usina o pessoal
conseguiu realizar a realizaccedilatildeo de um plebiscito
na regiatildeo que vai ser agora esse saacutebado pra que a
populaccedilatildeo de fato possa decidir se quer ou natildeo
esse empreendimento A minha pergunta eu tenho
duas perguntas uma eu acho que seria saber se
tem resposta pra populaccedilatildeo dos municiacutepios aqui
da regiatildeo que eacute se as pessoas aqui estatildeo mesmo
dispostas a abrirem matildeo das suas reservas de
aacutegua pro seu abastecimento proacuteprio ou dos seus
filhos ou dos seus netos tendo em vista que essa
usina vai consumir muito mais que a populaccedilatildeo da
regiatildeo de aacutegua a aacutegua do Rio Matildee Luzia aquilo
que ainda resta de aacutegua natildeo contaminada nessa
bacia (Lucia Ortiz Amigos da Terra
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A prefeita de Treviso Lucia Simolin na quarta Audiecircncia
Puacuteblica comentou que foi realizada uma pesquisa e que 70 da
populaccedilatildeo de Treviso concorda com o empreendimento Duas criacuteticas
feitas merecem destaque
190
A primeira feita pelo estudante da UNESC Joaquim Teixeira
chamou a atenccedilatildeo para o fato de que a USITESC eacute um empreendimento
que afetaraacute a regiatildeo e ouvir apenas a populaccedilatildeo de Treviso natildeo seria
uma medida adequada Segundo ele ldquoa termeleacutetrica natildeo eacute soacute um
problema de Treviso Fazer pesquisa de opiniatildeo soacute em Treviso eacute
desprezar uma questatildeo que eacute regionalrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
A segunda criacutetica questionou a pesquisa citada pela prefeita com
base em uma pesquisa feita no municiacutepio de Iccedilara
O IPAT quando fala que eacute imparcial ele estaacute
numa situaccedilatildeo que eu passei pelo conjunto do
Movimento pela Vida em Iccedilara Foi feita uma
pesquisa na Iccedilara pelo IPAT perguntando o
seguinte se a mina natildeo degradar natildeo poluir natildeo
fazer isso natildeo fazer aquilo nanana nananan vocecirc
vai ser a favor da mina Ai o pessoal ateacute eu
responderia que sim Aiacute fizeram uma publicaccedilatildeo
ldquoO IPAT confirma que 80 da populaccedilatildeo de Iccedilara
eacute a favor da mina Fomos laacute saber qual era a
pergunta que foi feita era desse jeito Noacutes
queremos contratar o IPAT para fazer a seguinte
pesquisa se levar em conta toda a degradaccedilatildeo que
a mina provoca os caimentos as casas rachadas a
aacutegua poluiacuteda o aquecimento global papapaacute vocecircs
seriam a favor da mina ou natildeo Ah isso noacutes natildeo
podemos fazer Pra noacutes podiam fazer uma
pesquisa desde fugiu a palavra aqui () mas pra
eles sim Eu questiono sim o IPAT mas
parabenizo grande parte da UNESC professores e
alunos que estatildeo buscando realmente uma defesa
do meio ambiente (Gilmar Bonifaacutecio Movimento
Iccedilara pela Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Nos discursos das duas audiecircncias puacuteblicas constatou-se que
apenas uma pessoa se colocou como representante de uma comunidade
de Treviso Gerson Hanne A intervenccedilatildeo seguinte de Sivio Saad
sintetiza a preocupaccedilatildeo de quem assistiu as duas audiecircncias puacuteblicas
Noacutes temos uma cidade pacata com 3500
habitantes e algueacutem resolve colocar um
empreendimento dentro dessa cidade Os
moradores claro devem saber o que estaacute
191
acontecendo Vimos a exposiccedilatildeo do
empreendedor vimos a exposiccedilatildeo da universidade
e o poder de julgar de saber se aceitam ou natildeo o
empreendimento agrave medida que eles foram
convincentes neacute os empreendedores satildeo
convincentes tatildeo preparados tem audiovisual satildeo
convincentes Mas eu gostaria de saber se a
populaccedilatildeo decide que natildeo quer quem defende os
interesses da populaccedilatildeo Quem eacute que taacute aqui
sentado (ele mostra os integrantes da mesa) que
representa os interesses dessa populaccedilatildeo Que
possa pelo menos equilibrar esse jogo Seria o
empreendedor Claro que natildeo Ele taacute defendendo
os seus interesses Ele eacute capaz de dizer aqui que
os oacutergatildeos internacionais soacute aprovam o dinheiro se
tiver cuidado com o meio ambiente Acredite se
quiser Temos aqui o pessoal da FATMA Eu jaacute vi
a FATMA aprovar coisas absurdas () Agora
depois que ela aprovou ela fiscaliza () Aiacute eles
respondem ldquonatildeo temos quem fiscalizerdquo Quem
seria a Universidade A UNESC () A prefeita
() eu ouvi uma entrevista dela hoje cedo dizendo
que se der dinheiro para a cidade ela aprova
Quem mais O governador que vem aqui diz que
vai dar emprego Vocecircs querem emprego Vocecircs
querem colocar mais duas mil pessoas aqui
dentro () Se a populaccedilatildeo quer oacutetimo Se a
populaccedilatildeo natildeo quer precisa ter algueacutem aqui que
defende () Soacute tem uma pessoa que defende os
interesses da populaccedilatildeo o Dr Darlan Esse
defende Dentro da lei esse defende Agora
precisava mais algueacutem () Se for confiar em
quem taacute aqui na mesa vocecircs tatildeo perdidos Se a
populaccedilatildeo chega agrave conclusatildeo que natildeo quer e
confia nesses que tatildeo aqui vocecircs estatildeo perdidos
A minha pergunta eacute quem defende os interesses
da populaccedilatildeo (Silvio Saad AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Diante dessa fala o apresentador Adhiles Bortot da FATMA
passou para a proacutexima pergunta sem que ningueacutem da mesa se
pronunciasse Essa atitude refletiu o clima das duas audiecircncias
analisadas Quando o assunto se referia aos
192
atingidosafetadosameaccedilados muitas respostas evasivas eram dadas
ressaltando sempre o respeito pelas leis e pelos criteacuterios teacutecnicos
As interveccedilotildees apresentadas demonstram a injusticcedila poliacutetica Se a
mineraccedilatildeo respeita as leis e os criteacuterios teacutecnicos ela eacute liacutecita O que passa
ao largo eacute uma discussatildeo mais ampla sobre gestatildeo de recursos comuns
opccedilotildees de desenvolvimento direitos humanos e justiccedila ecoloacutegica
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida falou da importacircncia
de uma discussatildeo sobre os direitos do cidadatildeo ldquo() concordamos
tambeacutem com o direito constitucional que todo cidadatildeo tem o direito a
um ambiente saudaacutevel () Essa tambeacutem eacute uma questatildeo legal Entatildeo noacutes
devemos comeccedilar a discutir questotildees legaisrdquo (Gilmar Bonifaacutecio
Movimento Iccedilara pela Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007) Mas as
evidecircncias demonstram que as audiecircncias se propunham a ser espaccedilo de
discussatildeo apenas de assuntos referentes ao licenciamento Todas as
discussotildees mais amplas foram desconsideradas
634 O papel da FATMA em questatildeo
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionou o
Ministeacuterio Puacuteblico e a FATMA que na segunda audiecircncia afirmaram
que a licenccedila natildeo seria emitida sem estudos conclusivos Ele citou o
exemplo de Iccedilara que haacute trecircs anos vinha se mobilizando para a natildeo
instalaccedilatildeo de uma mina de carvatildeo Ele destacou o papel do Ministeacuterio
Puacuteblico e questionou o papel da FATMA No caso da USITESC a
preocupaccedilatildeo dele foi que se a LP fosse dada e os empreendedores
participassem do leilatildeo haveria uma pressatildeo para a aprovaccedilatildeo dos
processos de licenciamento dos empreendimentos acessoacuterios
(AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Joatildeo Luis Brunel tambeacutem questionou os criteacuterios da FATMA na
concessatildeo da licenccedila
() noacutes vemos aiacute todos os dias uma campanha
mundial de preservaccedilatildeo da natureza
principalmente das aacuteguas aacuteguas do nosso planeta
que estatildeo quase que totalmente poluiacutedas entatildeo eu
faccedilo a pergunta noacutes vamos construir essa usina ao
lado de uma reserva ambiental e vamos captar a
maior fonte de aacutegua potaacutevel do nosso municiacutepio
193
uma aacutegua que jaacute estaacute mapeada pela Casan pra
abastecimento futuro em cidades vizinhas E onde
vatildeo passar a linha do trem e a linha de transmissatildeo
vatildeo atingir terrenos cobertos por floresta nativa
Entatildeo eu gostaria de saber quais satildeo os criteacuterios
que a Fatma os oacutergatildeos ambientais adotam pra dar
a licenccedila ou natildeo para a construccedilatildeo de um projeto
como esse (Joatildeo Luis Brunel AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Luis Antocircnio Garcia da FATMA respondeu ldquoA Fatma atraveacutes
de seu corpo teacutecnico e seus consultores vai avaliar os estudos como os
demais e leva em consideraccedilatildeo criteacuterios teacutecnicos e aspectos legais Se
houver viabilidade pelo licenciamento assim seraacute feito Se natildeo houver
viabilidade a licenccedila natildeo seraacute concedidardquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
O representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal na defesa da
FATMA fez as seguintes consideraccedilotildees
Mas posso dizer que na maioria dos casos
inclusive envolvendo o carvatildeo a Fatma tem
atuado em bastante sintonia com o Ministeacuterio
Puacuteblico Eacute claro que a Fatma eacute um oacutergatildeo do poder
executivo e noacutes conhecemos a tradiccedilatildeo do nosso
estado poliacutetica inclusive tudo eacute muito politizado
noacutes sabemos que a Fatma sofre pressotildees poliacuteticas
de toda ordem Mas eu sou testemunha pelo que
vivo aqui em Criciuacutema que os teacutecnicos tem se
esforccedilado e a direccedilatildeo tambeacutem pra resistir agraves
pressotildees e fazer um trabalho teacutecnico (Darlan
Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Na quarta audiecircncia puacuteblica a legitimidade da FATMA nos
processos de licenciamento tambeacutem foi colocada vaacuterias vezes em
duacutevida A jornalista Ana Echevenguaacute de Florianoacutepolis fez o seguinte
questionamento
() eu gostaria de perguntar para o Dr Darlan de
acordo com aquela decisatildeo liminar proferida pelo
Dr Germano juiz federal onde ele dizia que
enquanto a FATMA natildeo tiver o corpo teacutecnico
194
capaz de apreciar EIARIMA ela estaacute proibida e o
IBAMA assumiria essa responsabilidade eu
entendo que nem essa audiecircncia deveria estar
acontecendo (Ana Echevenguaacute AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Em resposta o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
enfatizou o caraacuteter fiscalizador do Ministeacuterio Puacuteblico e que o IBAMA
natildeo seria a soluccedilatildeo para os problemas de licenciamento em Santa
Catarina
Aquela decisatildeo do juiz que disse que o
licenciamento das minas e dos PRADES de
recuperaccedilatildeo de aacutereas degradadas natildeo poderia ser
feito pela FATMA se natildeo fosse embasada em
pareceres teacutecnicos aiacute o juiz lista uma seacuterie de
empreendedores perdatildeo de profissionais
geoacutelogos engenheiro de minas bioacutelogo
agrocircnomo e tal tal tal natildeo me lembro de cabeccedila
mas se a FATMA tiver um parecer teacutecnico
embasado por esses profissionais ela pode emitir a
licenccedila Quando o juiz disse que o licenciamento
tem que ser passado para o IBAMA o Ministeacuterio
Puacuteblico entende que isso eacute um equiacutevoco do juiz e
noacutes recorremos contra essa parte da decisatildeo Por
que Primeiro que isso natildeo foi pedido entatildeo o
juiz natildeo pode julgar extra petita18
e ele fez isso
nesse caso Segundo o IBAMA natildeo eacute a soluccedilatildeo
A FATMA tem problemas Tem seacuterios e vaacuterios
problemas Noacutes estamos fiscalizando e atuando
para que isso se altere Mas o IBAMA natildeo eacute a
soluccedilatildeo Porque o IBAMA eacute totalmente ausente
da regiatildeo Sul de Santa Catarina O estado de Santa
Catarina inteiro a equipe do IBAMA eacute
precariacutessima Entatildeo com respeito ao Leonir aqui
que taacute por aiacute que agora eacute do Chico Mendes O
IBAMA aqui na regiatildeo sul natildeo existe Entatildeo
passar o licenciamento de qualquer coisa pro
IBAMA aqui na regiatildeo eacute um equiacutevoco (Darlan
Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico Federal
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
18
Decisotildees extra petita satildeo aquelas que o juiz toma concedendo ao
autor coisa diversa da que foi requerida em sua peticcedilatildeo inicial
195
O representante da FATMA Luis Antocircnio Garcia por sua vez
insistiu que a FATMA tem melhorado seu quadro teacutecnico e conta com
consultores externos Ele ressaltou tambeacutem que a decisatildeo do
licenciamento eacute baseada nos criteacuterios legais e teacutecnicos
Dos segmentos sociais que participaram das audiecircncias
percebeu-se uma desconfianccedila em relaccedilatildeo agrave conduta da FATMA nos
processos de licenciamento A FATMA por sua vez reconhece as
dificuldades existentes e faz uma aposta na atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico Segundo o representante da FATMA ldquoo licenciamento com
todas as dificuldades que temos mas noacutes temos hoje uma cooperaccedilatildeo
uma parceria extremamente sadia e participativa e com resultados
extremamente beneacuteficos a sociedade que eacute junto com o Ministeacuterio
Puacuteblico ()rdquo (Luis Antocircnio Garcia FATMA AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Nos discursos dos segmentos sociais e poliacuteticos transparece a
fragilidade do oacutergatildeo ambiental E aiacute a responsabilidade que seria do
oacutergatildeo ambiental eacute passada para o Ministeacuterio Puacuteblico Isso pode ser bom
por um lado uma vez que existe fiscalizaccedilatildeo do oacutergatildeo ambiental mas
por outro lado pode fazer com que as fragilidades do oacutergatildeo ambiental se
perpetuem
635 O IPAT e a neutralidade da ciecircncia
A linguagem teacutecnica do IPAT foi questionada na terceira
audiecircncia puacuteblica ldquo() a maioria de noacutes cidadatildeos mortais e comuns
natildeo temos conhecimento suficiente para traduzir as informaccedilotildees que
foram passadasrdquo (Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida
AUDIEcircNCIA 2006) Mauricio Luis Camara questionou sobre a
apresentaccedilatildeo do IPAT para que fizessem um resumo de forma que
todos entendessem (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Outro ponto que merece destaque eacute o fato de o IPAT natildeo ter
deixado clara a viabilidade do empreendimento Abaixo a intervenccedilatildeo
de Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionando esse
ponto
196
[] eacute nesse sentido que eu gostaria de saber []
quais satildeo os pontos positivos e quais satildeo os
pontos negativos para que a populaccedilatildeo tambeacutem
tenha condiccedilatildeo de por si soacute analisar e tomar uma
posiccedilatildeo e natildeo simplesmente tomar uma posiccedilatildeo
porque algueacutem ou um chefe poliacutetico tipo um
empreendedor taacute dizendo que eacute assim [] na
minha opiniatildeo ficou faltando isso do IPAT uma
posiccedilatildeo clara de quais satildeo os pontos positivos e
negativos porque aiacute se coloca na balanccedila Porque
eacute isso que a gente tem que ver [] (AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Em resposta Fabiano Luzi Neris representante do IPAT
afirmou que ldquoo IPAT natildeo tem posicionamento se a Usina eacute viaacutevel ou
natildeo eacute viaacutevel se ele eacute a favor ou contra a Usina () Soacute o oacutergatildeo
ambiental tem competecircncia para viabilizar ou natildeo a Usinardquo (Fabiano
Luiz Neris IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A Universidade apresentou os resultados teacutecnicos
que estatildeo aqui e foram apresentados e estatildeo nos
documentos entregues ao empreendedor e ao
oacutergatildeo ambiental A Universidade natildeo tem o papel
de emitir o parecer favoraacutevel ou contraacuterio agrave
liberaccedilatildeo da licenccedila da Usina A Universidade tem
o papel de apresentar os estudos realizados Se
tiver algum conflito em relaccedilatildeo aos estudos a
gente estaacute a disposiccedilatildeo para discutir tecnicamente
(Fabiano Luiz Neris IPAT AUDIEcircNCIA 2006)
A representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal questionou a
resposta dada pelo IPAT ldquose o EIA natildeo vai dizer se eacute viaacutevel ou natildeo
quem de noacutes diraacute issordquo (Denise Cristina de Resende Nicolaitz
Ministeacuterio Puacuteblico Federal AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Na sequecircncia manifesta-se um posicionamento que parece
contraacuterio ao anterior
Todas as consideraccedilotildees positivas ou negativas
estatildeo e fazem parte de uma matriz de anaacutelise de
impacto Elas constam tanto do estudo da
USITESC quanto dos estudos dos
empreendimentos acessoacuterios E a equipe embora
tenha optado por natildeo fazer nenhuma manifestaccedilatildeo
197
proacute ou contra a USITESC ela nos estudos nas
suas conclusotildees ela deixa bem claro se eacute viaacutevel
ou natildeo dentro do estudo que foi feito Eu soacute queria
dizer isso e que a populaccedilatildeo tivesse ciecircncia e os
nossos colegas ecologistas que Que noacutes
apresentamos os trabalhos e noacutes temos
consciecircncia Noacutes temos nossa responsabilidade
social tambeacutem Noacutes natildeo somos levianos noacutes natildeo
queremos aprovar absolutamente nada Noacutes
estamos fazendo um estudo que demonstra a
possibilidade ou natildeo do empreendimento (Luiz
Nogueira Palma IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
O IPAT enfatizou em muitas intervenccedilotildees o ldquocaraacuteter teacutecnicordquo das
informaccedilotildees prestadas Alguns exemplos de explicaccedilotildees duvidosas
foram extraiacutedos das duas audiecircncias puacuteblicas e satildeo apresentados na
sequecircncia Na audiecircncia puacuteblica de 2006 o IPAT afirmou que uma
barragem no Rio Matildee Luzia preservaria a aacutegua
() quando vocecirc constroacutei um barramento ele
isola ou seja vocecirc taacute preservando a aacutegua boa a
aacutegua de boa qualidade Vocecirc taacute reservando vocecirc
taacute evitando que aquela aacutegua polua neacute pelo menos
pelos outros motivos que mineraccedilatildeo a gente sabe
que o ph nesses frac34 de trecho do Rio Matildee Luzia o
ph da aacutegua eacute 3 E laacute em cima na foz onde natildeo
tem onde natildeo ocorre ou seja a aacutegua eacute de boa
qualidade Entatildeo vocecirc taacute isolando vocecirc taacute
isolando vocecirc taacute preservando (Naacutedia e Andreacuteia
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Quanto agrave existecircncia de risco na construccedilatildeo da barragem e na
possibilidade de caimento de mina o IPAT tambeacutem manifestou sua
posiccedilatildeo
Teoricamente eu natildeo vou te dizer que natildeo eacute
possiacutevel ocorrer um problema na construccedilatildeo da
barragem mas isso aiacute eacute uma coisa que eacute pouco
provaacutevel E quanto aos caimentos de mina cai em
vaacuterios locais e esse caimento que ocorreu
recentemente natildeo tem absolutamente nada a ver
vamos dizer assim com a eventual construccedilatildeo de
198
um barramento neacute Natildeo tem realmente natildeo tem
nada a ver e foi uma coisa improvaacutevel daquelas
coisas que natildeo se pode dizer que estava por
acontecer A mina onde caiu era um lugar
conhecido claro tinha falha geoloacutegica neacute Mas
ela tava sendo vamos dizer assim toda eacute toda
minerada de uma maneira muito teacutecnica com um
fator de seguranccedila muito alto e aconteceu Quer
dizer eacute a natureza neacute Eu com toda sinceridade
natildeo vou lhe enganar pra dizer que eacute impossiacutevel de
ocorrer um caimento laacute () Se for minerado de
uma maneira teacutecnica eacute pouco provaacutevel que
aconteccedila Agora dizer que natildeo tem caimento eu
acho que teacutecnico nenhum diria isso (Cleacutevis
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Na quarta audiecircncia puacuteblica mais duas explicaccedilotildees chamaram a
atenccedilatildeo uma do IPAT outra do empreendedor A primeira foi dada por
Marcos Back do IPAT ldquoSegundo as pesquisas natildeo haacute uma correlaccedilatildeo
entre a usina e a sauacutede da populaccedilatildeo entre a Usina Termeleacutetrica Jorge
Lacerda e as doenccedilas respiratoacuteriasrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Em contraposiccedilatildeo a essa informaccedilatildeo Joseacute Dagostin do Movimento
Iccedilara pela Vida trouxe informaccedilotildees atualizadas dados do Datasus
questionando o IPAT sobre os dados defasados do estudo sobre sauacutede e
tambeacutem sobre acidentes com amocircnia Dois anos depois o proacuteprio
Ministeacuterio Puacuteblico coletou e analisou dados confirmando a relaccedilatildeo
entre diversos problemas de sauacutede e o funcionamento do Complexo
Jorge Lacerda (MPF 2009)
A outra fala do empreendedor sugeriu que ldquoa estocagem de
amocircnia eacute mais segura que o botijatildeo de gaacutes que vocecircs tecircm em suas casas
Muitos dos senhores tecircm mangueiras inadequadas para conectar o
botijatildeo de gaacutes Quantas vezes passam perto do botijatildeo de gaacutesrdquo (Luis
Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Essa eacute uma amostra pequena das explicaccedilotildees dadas em resposta
aos questionamentos Muitas pessoas tambeacutem natildeo se sentiram
contempladas com as respostas As evasivas contemplavam encaminhar questionamentos por escrito agrave FATMA e ao IPAT desconsiderar as
perguntas com base no fato de que as informaccedilotildees jaacute haviam sido
apresentadas nas outras audiecircncias ou que as informaccedilotildees seriam
tratadas posteriormente na anaacutelise de risco
199
Nas duas audiecircncias puacuteblicas analisadas o IPAT foi questionado
ao fazer o EIARIMA da USITESC quanto ao seu posicionamento
O estudante da UNESC Joaquim Teixeira fez a seguinte
intervenccedilatildeo
ldquoA USITESC eacute a nova Marion do seacuteculo XXIrdquo Eacute
preciso separar a UNESC eacute nossa o IPAT eacute de
quem paga () o empreendimento pode ser feito
ou natildeo feito tem essa possibilidade taacute na lei Tem
alternativas ao empreendimento () Eacute preciso
mudar de paradigma () Vocecircs podem virar a
paacutegina da histoacuteria Treviso natildeo precisa de mina
Ou melhor termeleacutetrica (Joaquim Teixeira
estudante da UNESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Em resposta Marcos Back do IPAT reclamou dessa e de outras
intervenccedilotildees como ldquoataque gratuito agrave Universidaderdquo E completou
() Eu quero dizer o seguinte que eacute muito faacutecil
muito faacutecil a gente vir para uma audiecircncia e
quando a gente natildeo tem mais argumento vocecirc
desqualifica quem produziu Quem dizer eu tocirc
numa discussatildeo eu natildeo sei mais o que dizer eu
desqualifico o outro eu falo que o outro natildeo sabe
nada E na hora que eu desqualifico a pessoa
comeccedilo a desqualificar todo o estudo que foi feito
() natildeo adianta dizer que o IPAT natildeo eacute
Universidade porque a decisatildeo de implantaccedilatildeo
que o IPAT participasse desse estudo partiu da
eacutepoca que o reitor era Edson Rodrigues que fez
uma reuniatildeo com a Universidade inteira e decidiu
que a Universidade ia participar desse processo
porque eacute muito grande para a regiatildeo inteira esse
empreendimento e era preciso que a Universidade
se envolvesse no projeto para fazer a avaliaccedilatildeo
desses impactos ambientais (Marcos Back IPAT
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Percebe-se nos posicionamentos do IPAT que existe a confianccedila
de que o documento produzido eacute neutro Dessa forma os segmentos
sociais natildeo teriam que questionar quem produz o documento apenas as
informaccedilotildees que o documento traz
200
636 Audiecircncias puacuteblicas como espaccedilos democraacuteticos
Somente o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal Darlan
Aiacutelton Dias e os segmentos sociais fizeram menccedilatildeo agrave questatildeo
democraacutetica nas audiecircncias puacuteblicas Na terceira audiecircncia puacuteblica o
representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal fez a seguinte intervenccedilatildeo
A audiecircncia puacuteblica eacute um ambiente democraacutetico
bonito agraves vezes a gente fica [pausa] vem com
uma preacute-concepccedilatildeo e fica irritado quando algueacutem
fala o contraacuterio mas isso eacute o processo
democraacutetico uma sociedade democraacutetica Em
outros tempos da nossa histoacuteria recente era
inimaginaacutevel um empreendedor ter que se
submeter a esse tipo de [pausa] situaccedilatildeo Mas eacute a
realidade da nossa sociedade democraacutetica graccedilas
a deus neacute E a Constituiccedilatildeo nos daacute esse recado do
desenvolvimento sustentaacutevel noacutes queremos
desenvolver o paiacutes mas queremos preservar o
meio ambiente (Darlan Aiacutelton Dias
AUDIEcircNCIA 2006)
Todavia o elogio agrave democracia contrasta com o processo da
audiecircncia puacuteblica Tadeu Santos da ONG Soacutecios da Natureza colocou
em questatildeo o caraacuteter democraacutetico da audiecircncia puacuteblica depois de ter
sido lembrado do limite de tempo quatro vezes Segundo ele
As audiecircncias puacuteblicas anteriores foram mais
democraacuteticas a coisa taacute ficando fechada Taacute se
percebendo que o grande lobby das mineradoras
estaacute funcionando Eacute possiacutevel que realmente a
FATMA venha a dar o licenciamento Eacute possiacutevel
natildeo vai dar Porque deu para a mineradora em
Treviso (Tadeu Santos AUDIEcircNCIA 2006)
E continua referindo-se a Luis Antocircnio Garcia da FATMA ldquoSr
diretor eu gostaria que o Sr fosse mais maleaacutevel que conduzisse a
assembleia de forma mais democraacutetica porque afinal estamos
discutindo uma coisa muito seacuteriardquo (Tadeu Santos AUDIEcircNCIA 2006)
201
Na quarta audiecircncia puacuteblica o representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal novamente enaltece o caraacuteter democraacutetico da audiecircncia
() a audiecircncia puacuteblica eacute o instrumento que estaacute
previsto na lei e noacutes vivemos num estado
democraacutetico de direito e que a publicidade dos
licenciamentos ambientais eacute um princiacutepio
fundamental previsto na poliacutetica nacional do meio
ambiente Entatildeo um processo de licenciamento
tem que ser puacuteblico as pessoas tem que ter o
direito de se manifestar desde que haja claro
respeito muacutetuo Mas por outro lado eu percebo
que muita gente veio aqui hoje com a cabeccedila feita
a favor ou contra o empreendimento sem querer
ouvir qualquer coisa Isso ficou muito claro jaacute
nano niacutevel de conversa durante as apresentaccedilotildees
As pessoas tem o direito de ser contra ou a favor
do empreendimento Aleacutem disso disse a prefeita
aqui que os estudos ficaram agrave disposiccedilatildeo da
populaccedilatildeo por 45 dias como manda a lei mas soacute
duas pessoas consultaram os estudos na prefeitura
Entatildeo eu peccedilo que se respeite as opiniotildees e que
todos tem direito a fazer uso da palavra E isso eacute
democraacutetico () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio
Puacuteblico Federal AUDIEcircNCIA 2007)
O reflexo dessa democracia foi o rigoroso controle do tempo de
questionamento o despeito pela ordem de chegada dos questionamentos
(orais e escritos) e a inexistecircncia de reacuteplica Gilmar Bonifaacutecio do
Movimento Iccedilara pela Vida criticou a forma como foram conduzidos os
debates jaacute que natildeo foi respeitado o direito agrave reacuteplica
A intervenccedilatildeo do representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
trouxe alguma esperanccedila para os segmentos sociais
Na verdade toda essa discussatildeo que hoje se trava
aqui eacute uma discussatildeo se a gente for pensar aqui
do ponto de vista histoacuterico bonita e importante e
acho que essa luta pode mudar o rumo dessa
legislaccedilatildeo Mas vamos colocar ela num contexto
maior que precisa ser colocado Na verdade eacute
uma discussatildeo que se trava no Brasil inteiro e no
mundo inteiro que eacute a discussatildeo de que modelo
de sociedade e desenvolvimento noacutes queremos
202
Pela questatildeo do efeito estufa e toda a questatildeo de
sobrevivecircncia da espeacutecie E eu como ser humano
como pai eu quero tambeacutem que o mundo pros
meus filhos pros meus netos seja viaacutevel No
entanto diante desse debate e assim como aqui
natildeo se quer uma usina termeleacutetrica laacute em Belo
Monte natildeo se quer uma hidreleacutetrica laacute em
Campos Novos natildeo se quer uma hidreleacutetrica laacute no
Rio Madeira e assim por diante Mas de algum
lugar tem que sair energia E o Ministeacuterio Puacuteblico
nessa discussatildeo tem que se pautar no equiliacutebrio e
ter como paracircmetro o que A Constituiccedilatildeo e as
leis E eacute assim que eu procuro agir Entatildeo essa
discussatildeo eacute legiacutetima essa oposiccedilatildeo a qualquer
empreendimento desse tipo eacute legiacutetima e esse eacute o
espaccedilo para falar Mas noacutes vamos nos pautar pela
lei () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico
Federal Federal AUDIEcircNCIA 2007)
O representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal reconhece a
possibilidade de mudanccedila na legislaccedilatildeo mas reconhece que sua atuaccedilatildeo
se restringe ao que eacute legal O Ministeacuterio Puacuteblico Federal produziu em
2004 um dossiecirc sobre as Deficiecircncias em estudos de impacto ambiental
mas natildeo tocou na questatildeo das audiecircncias puacuteblicas (MPF 2004) Apesar
das audiecircncias puacuteblicas natildeo serem deliberativas a observacircncia do
processo democraacutetico eacute algo necessaacuterio e deveria entrar nos estudos do
Ministeacuterio Puacuteblico
64 Democracias possiacuteveis e aprendizagem social
A avaliaccedilatildeo de impacto ambiental compreende processos que
envolvem muacuteltiplos segmentos que recolhem analisam sintetizam e
comunicam informaccedilotildees sobre as condiccedilotildees ambientais tendecircncias
direccedilotildees impactos e futuros possiacuteveis com o objetivo de sensibilizar
para uma questatildeo especiacutefica ou apoiar processos de regulaccedilatildeo ambiental
Essas avaliaccedilotildees satildeo processos sociais de comunicaccedilatildeo e interaccedilatildeo que
envolvem muito mais do que a mera produccedilatildeo de relatoacuterios Todavia os
limites estruturais e conjunturais das avaliaccedilotildees natildeo garantem o
questionamento do estilo de desenvolvimento de planos poliacuteticas e
203
programas que estariam sendo elaborados avaliados e implementados
(SACHS 1986 VIEIRA 2005)
O licenciamento ambiental estaacute envolto numa suposta
neutralidade em relaccedilatildeo aos criteacuterios juriacutedicos e teacutecnicos que o
sustentam e os condicionantes e interesses intriacutensecos ao processo
acabam passando para segundo plano ldquoNatildeo eacute porque a mineradora
cumpre com as exigecircncias que o oacutergatildeo licenciador pode liberar a
atividade Eacute preciso considerar a aceitaccedilatildeo do empreendimento pela
comunidade que poderaacute ser afetadardquo (Soacutecios da Natureza citado por
SANTOS 2008 p 103)
No caso especiacutefico da USITESC os segmentos poliacuteticos
(representados pelos poliacuteticos estaduais e municipais Ministeacuterio Puacuteblico
e FATMA) apresentaram em seus discursos algumas peculiaridades Os
poliacuteticos estaduais e municipais apoiam o empreendimento porque
querem estimular o desenvolvimento econocircmico A FATMA sofre
pressotildees poliacuteticas e tem dificuldades teacutecnicas mas garante que o
licenciamento eacute concedido considerando a anaacutelise teacutecnico-legal O
Ministeacuterio Puacuteblico aparece nos discursos dos segmentos econocircmicos
poliacuteticos e sociais como confiaacutevel Ele se mostra receptivo as colocaccedilotildees
dos segmentos sociais mas se move dentro do que considera legal Pode
questionar os dados do EIARIMA mas dificilmente questionaria a
questatildeo democraacutetica no processo da audiecircncia puacuteblica
Os segmentos econocircmicos como tratado na seccedilatildeo 623 fazem
pressatildeo sobre os segmentos poliacuteticos Nas audiecircncias puacuteblicas sua
participaccedilatildeo se limita a responder agrave perguntas e fazer a defesa do
empreendimento quando necessaacuterio O fato eacute que a USITESC tem a LI e
pode participar dos leilotildees de energia O iniacutecio da construccedilatildeo vai
depender dos interesses econocircmicos e poliacuteticos envolvidos O ponto
importante nesse capiacutetulo era tornar mais expliacutecitas as redes de
influecircncia e os mecanismos que satildeo utilizados nas audiecircncias puacuteblicas
para neutralizar as criacuteticas (aqui entra a injusticcedila poliacutetica nos tempos e
nas intervenccedilotildees) e a desinformaccedilatildeo Ao mesmo tempo tornam-se
tambeacutem mais expliacutecitas as formas de atuaccedilatildeo dos segmentos sociais
(afetadosatingidosameaccedilados ONGs e parte da academia)
A histoacuteria dos segmentos sociais no Sul de Santa Catarina traz
evidecircncias de aprendizagem social adaptativa Eles contam com uma
atuaccedilatildeo regional articulada fazem a relaccedilatildeo dos problemas globais e
locais questionam os segmentos poliacuteticos e os segmentos econocircmicos e
reivindicam que as audiecircncias puacuteblicas sejam mais democraacuteticas Isso
204
demonstra na discussatildeo especiacutefica da USITESC que se vem travando
uma luta histoacuterica na regiatildeo
7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta tese buscamos compreender as contradiccedilotildees inerentes agrave
proposta de ampliaccedilatildeo do sistema de geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica na
regiatildeo sul de Santa Catarina Para tanto adotamos um modelo de anaacutelise
que combina os enfoques de gestatildeo de ldquocommonsrdquo para o
ecodesenvolvimento e de justiccedila ambiental e ecoloacutegica Na estrutura
deste modelo hiacutebrido comparecem os conceitos de trajetoacuteria de
desenvolvimento local de atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso em
questatildeo de padrotildees de interaccedilatildeo entre os atores sociais envolvidos no
sistema de gestatildeo de regras em uso de arena de accedilatildeo e de resultados
eou consequecircncias das tomadas de decisatildeo
Caracterizamos inicialmente a especificidade das dinacircmicas de
desenvolvimento que tecircm influenciado as accedilotildees coletivas dos segmentos
poliacuteticos econocircmicos e sociais envolvidos nos modos de apropriaccedilatildeo e
gestatildeo do carvatildeo mineral na regiatildeo em pauta Neste sentido destacamos
o papel hegemocircnico exercido pelos agentes governamentais na
centralizaccedilatildeo dos processos decisoacuterios e na oferta de subsiacutedios agrave
utilizaccedilatildeo de combustiacuteveis foacutesseis natildeo obstante o apelo agrave necessidade
de se promover uma ldquomatriz energeacutetica limpardquo no Paiacutes
No resgate da dinacircmica de exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral
buscamos caracterizar os fatores relacionados agrave disponibilidade do
recurso agrave rentabilidade econocircmica deste segmento atualmente aos
criteacuterios de tomada de decisatildeo na pesquisa de inovaccedilotildees na busca de
alternativas de mecanizaccedilatildeo dos processos de extraccedilatildeo agraves praacuteticas de
recuperaccedilatildeo do passivo ambiental e ao perfil dominante das poliacuteticas de
suprimento energeacutetico no bojo do modelo de desenvolvimento adotado
Com base nas evidecircncias coletadas foi possiacutevel constatar que o nosso
Paiacutes natildeo conta ainda hoje com uma ldquocultura do carvatildeordquo e que na
regiatildeo estudada as atividades de mineraccedilatildeo dificultam ou mesmo
impedem outros usos possiacuteveis do solo aleacutem de responderem pela
geraccedilatildeo de riscos e de impactos socioambientais cujos custos
geralmente muito elevados continuam a ser distribuiacutedos de forma
socialmente desigual Aleacutem disso reforccedilamos o ponto de vista segundo
o qual as escolhas tecnoloacutegicas satildeo essencialmente tributaacuterias de
orientaccedilotildees poliacuteticas As anaacutelises mostraram tambeacutem que uma parcela
significativa da populaccedilatildeo catarinense jaacute percebe natildeo soacute uma relaccedilatildeo
causal direta entre o aumento da exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral e o
comprometimento da resiliecircncia ecossistecircmica e da qualidade de vida
das comunidades locais Ao mesmo tempo vem se impondo
206
gradualmente a impressatildeo de que os processos de diversificaccedilatildeo da
economia regional vecircm legitimando a adoccedilatildeo de uma poliacutetica mais firme
de reconversatildeo do segmento de exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral
No que diz respeito agrave adequaccedilatildeo dos arranjos institucionais em
vigor na dinacircmica de gestatildeo deste segmento correlacionamos a
iniciativa de ampliaccedilatildeo do sistema de geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica
movida a carvatildeo mineral agrave desregulamentaccedilatildeo e flexibilizaccedilatildeo da
legislaccedilatildeo ambiental - especialmente do Coacutedigo de Mineraccedilatildeo e do
Coacutedigo Estadual do Meio Ambiente em Santa Catarina No segundo
caso o Coacutedigo estabeleceu prazos para as licenccedilas ambientais e a
Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina dispensou o EIARIMA para
atividade de extraccedilatildeo de pequeno porte A CFEM e a reduccedilatildeo do ICMS
de 15 para 3 no estado contribuiacuteram fortemente para legitimar o
projeto de uma nova usina junto agrave opiniatildeo puacuteblica Mas outros aspectos
relevantes foram destacados a exemplo da evoluccedilatildeo progressiva das leis
ambientais favorecendo a percepccedilatildeo de que o direito a um meio
ambiente saudaacutevel integra o coacutedigo universal dos direitos humanos
fundamentais Todavia o balanccedilo entre os aspectos que favorecem a
ampliaccedilatildeo e os que questionam eacute bastante desigual A
desregulamentaccedilatildeo e a flexibilizaccedilatildeo dos coacutedigos juriacutedicos promovidas
nos uacuteltimos anos representam da perspectiva adotada na tese um
evidente e preocupante retrocesso em relaccedilatildeo aos avanccedilos alcanccedilados
anteriormente Finalmente acreditamos que a dimensatildeo da participaccedilatildeo
autecircntica da sociedade civil organizada nas tomadas de decisatildeo uma das
bandeiras da deacutecada de 1980 continua ainda hoje muito aqueacutem das
expectativas ndash sobretudo pelo fato de permanecer tutelada pelo jogo de
alianccedilas formadas pelos representantes dos setores econocircmico e
governamental
A reflexatildeo centrada no aprofundamento deste uacuteltimo toacutepico
mostrou que o sistema de gestatildeo de recursos comuns no Brasil continua
atrelado a um modelo de desenvolvimento que faz do apelo agrave
sustentabilidade uma retoacuterica que natildeo ataca as raiacutezes do problema
Trata-se de evitar as mudanccedilas estruturais que se tornaram emergenciais
face ao agravamento da crise em escala global Nesse contexto o
componente democraacutetico-representativo do sistema poliacutetico que tende a
reforccedilar e a legitimar a formaccedilatildeo de lobbies envolvendo os segmentos
poliacuteticos e econocircmicos contrasta com o componente democraacutetico-
participativo que responde pela abertura de espaccedilos ainda incipientes e
restritos de participaccedilatildeo aos setores majoritaacuterios da populaccedilatildeo A
existecircncia da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral eacute
207
um indiacutecio da existecircncia dessas articulaccedilotildees entre segmentos
econocircmicos e poliacuteticos E os dados apresentados no capiacutetulo 5
confirmam a hipoacutetese de que no bojo do processo de licenciamento da
USITESC no periacuteodo de 2002 a 2012 as doaccedilotildees de empresaacuterios para o
financiamento de campanhas eleitorais (nos niacuteveis municipal estadual e
nacional) tornaram-se um fenocircmeno recorrente
Em outras palavras consideramos que a gestatildeo de recursos
comuns em Santa Catarina segue as tendecircncias nacionais
Historicamente a questatildeo ambiental vem sendo apropriada de forma
marginal no estado permanecendo subordinada agrave hegemonia dos
interesses dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos Um dos principais
indicadores dessa tendecircncia pode ser encontrado na dinacircmica de
organizaccedilatildeo e funcionamento da FATMA abrigando a formaccedilatildeo de
lobbies ativos no setor da exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral - seja
estimulando sua expansatildeo seja dificultando sua fiscalizaccedilatildeo em
coerecircncia com os avanccedilos da legislaccedilatildeo ambiental Todavia ressaltamos
ainda que se uma parte dos segmentos poliacuteticos e dos segmentos sociais
apoia a tendecircncia de ampliaccedilatildeo deste setor os posicionamentos natildeo satildeo
homogecircneos e o fortalecimento do sistema democraacutetico vem se dando
por meio da organizaccedilatildeo dos segmentos sociais (ONGs academia
afetadosatingidosameaccedilados) e da atuaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico No
que diz respeito agrave organizaccedilatildeo dos segmentos sociais as iniciativas
extrapolam os espaccedilos de participaccedilatildeo previstos constitucionalmente
envolvendo tambeacutem accedilotildees autocircnomas de produccedilatildeo e difusatildeo de
conhecimentos aleacutem da promoccedilatildeo de campanhas e manifestaccedilotildees
Na consideraccedilatildeo do processo de licenciamento da USITESC
constatamos que no processo de licenciamento as audiecircncias puacuteblicas
realizadas no municiacutepio de Treviso foram coordenadas pela FATMA e
natildeo contaram com estrateacutegias de distribuiccedilatildeo (minimizando a
desigualdade) reconhecimento (considerando as distintas perspectivas)
e a representaccedilatildeo (paridade de participaccedilatildeo) As evidecircncias obtidas
indicam que essas reuniotildees foram organizadas visando reproduzir a
loacutegica que bloqueia na base a concretizaccedilatildeo desses anseios
Os principais temas tratados nas audiecircncias puacuteblicas foram
tratados no capiacutetulo 6 mostrando as contradiccedilotildees existentes ldquoentrerdquo e
ldquodentrordquo dos segmentos sociais principalmente A ampliaccedilatildeo de energia
termeleacutetrica eacute inevitaacutevel do ponto de vista dos segmentos econocircmicos
sendo respaldada por uma parcela dos agentes governamentais locais e
dos representantes da sociedade civil A discussatildeo sobre a relaccedilatildeo entre
208
a construccedilatildeo da USITESC e as mudanccedilas climaacuteticas proposta pela rede
de ONGs movimentos sociais e parte da UNESC foi categoricamente
colocada de lado como um aspecto natildeo pertinente ao caso em pauta ou
seja a apresentaccedilatildeo do EIARIMA Aleacutem disso ressaltamos que
durante as audiecircncias praticamente natildeo foram consideradas as vozes
dos habitantes de Treviso que seriam afetados pela implementaccedilatildeo do
projeto As discussotildees envolveram apenas uma parcela dos
representantes da sociedade civil sediados em outros municiacutepios e em
outros estados Poucos habitantes de Treviso participaram das
audiecircncias puacuteblicas Num municiacutepio em que 69 dos postos de trabalho
estatildeo vinculados a atividade carboniacutefera torna-se difiacutecil imaginar que os
habitantes estivessem em condiccedilotildees favoraacuteveis para se posicionarem
contra a implantaccedilatildeo da USITESC
Mostramos tambeacutem que a competecircncia da FATMA e da UNESC
foi repetidamente questionada nessas audiecircncias Se os representantes da
FATMA argumentaram agrave luz do princiacutepio de respeito agrave legislaccedilatildeo em
vigor e os pesquisadores da UNESC agrave luz do princiacutepio de neutralidade
da ciecircncia ambos os grupos evitaram assumir o desafio de encarar uma
discussatildeo poliacutetica do caso em pauta Por sua vez foi enaltecido o papel
desempenhado pelo Ministeacuterio Puacuteblico na defesa dos interesses da
populaccedilatildeo local Natildeo obstante consideramos que os depoimentos dos
Procuradores permaneceram refeacutens de um ponto de vista essencialmente
legalista na avaliaccedilatildeo do processo de licenciamento
Na busca de respostas agrave questatildeo de ldquoserdquo e ldquocomordquo as accedilotildees
coletivas estudadas teriam gerado oportunidades de aprendizagem social
adaptativa capazes de deflagrar accedilotildees coletivas de mudanccedila
institucional concluiacutemos que a atuaccedilatildeo de parte dos segmentos sociais
envolvidos no caso da USITESC aponta nesta direccedilatildeo Eles jaacute
conseguem perceber o surgimento da demanda de ampliaccedilatildeo do sistema
termeleacutetrico como um elemento de uma problemaacutetica mais ampla e mais
complexa que natildeo foi considerada nas audiecircncias puacuteblicas Eles estatildeo
mobilizados de outras formas mas a concessatildeo do licenciamento ainda
tem a audiecircncia puacuteblica (consultiva) como uacutenica modalidade de
participaccedilatildeo Diante disso pensamos que os problemas de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo existentes no espaccedilo da audiecircncia
precisariam ser vistos com mais cuidado pelo Ministeacuterio Puacuteblico Seria
interessante que daqui em diante o Ministeacuterio Puacuteblico superasse a
visatildeo dominante segundo a qual a anaacutelise das deficiecircncias do
EIARIMA (MPF 2004) satildeo suficientes para democratizar os processos
209
de licenciamento de projetos programas e poliacuteticas de desenvolvimento
no Paiacutes
Finalmente o trabalho ofereceu subsiacutedios que reforccedilam a
validade do pressuposto de que a maturaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo de
recursos comuns voltado para um novo estilo de desenvolvimento
norteado pelo princiacutepio de sustentabilidade forte deveraacute passar
necessariamente pela ldquodemocratizaccedilatildeo do aparelho do Estado de modo
que a sociedade possa controlar seus controladoresrdquo (BOcircA NOVA
1985 p 227)
A sugestatildeo eacute que se faccedila uma pesquisa sobre ldquodeficiecircncias nas
audiecircncias puacuteblicasrdquo Como mencionado na justificativa desta tese um
dos encaminhamentos possiacuteveis seria a realizaccedilatildeo de um levantamento
mais rigoroso dos processos de licenciamento realizados no litoral de
Santa Catarina nos uacuteltimos anos a ser suplementado pela anaacutelise criacutetica
das respectivas audiecircncias puacuteblicas Os resultados poderiam ser
encaminhados ao Ministeacuterio Puacuteblico Estadual e Federal servindo assim
de base para o questionamento da forma pela qual os anseios de
distribuiccedilatildeo justa reconhecimento e representaccedilatildeo autecircntica dos
segmentos sociais tecircm sido incorporados nos processos de
licenciamento Neste sentido o caraacuteter meramente consultivo das
audiecircncias puacuteblicas poderia se tornar tambeacutem objeto de reconsideraccedilatildeo
na trilha ainda incipiente que nos conduziria ao exerciacutecio da cidadania
ambiental plena
Em outras palavras as perspectivas de ampliaccedilatildeo da rede de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica no Sul de Santa Catarina refletem uma
tomada de consciecircncia ainda bastante restrita dos riscos envolvidos na
continuidade da atividade carboniacutefera e de forma mais ampla de um
modelo de gestatildeo de recursos naturais de cunho ecologicamente
predatoacuterio e socialmente injusto Diante de argumentos que defendem o
caraacuteter ldquoinevitaacutevelrdquo do apelo a fontes natildeo renovaacuteveis de geraccedilatildeo de
energia cabe lembrar que
() existe pela frente um futuro repleto de possibilidades
alternativas e de potenciais inexplorados que natildeo cabem na bitola
estreita dos que estatildeo presos a modelos do passado ou a interesses do establishment Ou seja o futuro natildeo se projeta nas equaccedilotildees
matemaacuteticas mas se inventa na incessante discussatildeo das alternativas e
se faz na luta poliacutetica (BOcircA NOVA 1985 p 233)
210
Transformar a essa situaccedilatildeo envolve a adoccedilatildeo de outra
perspectiva baseada natildeo soacute na compreensatildeo da complexidade do
problema mas tambeacutem na consideraccedilatildeo simultacircnea dos fatores que
comparecem em todas as escalas do local ao global e na formaccedilatildeo de
parcerias capazes de impulsionar a gestaccedilatildeo de um projeto alternativo de
sociedade Esperamos que os resultados obtidos ofereccedilam subsiacutedios
uacuteteis apontando nesta direccedilatildeo insistindo que a superaccedilatildeo dos atuais
dilemas que cercam o exerciacutecio da democracia em nosso Paiacutes deveria
transcender a preocupaccedilatildeo pela pertinecircncia dos arranjos institucionais
em vigor Se os limites da tradiccedilatildeo democraacutetico-representativa tornam-
se evidentes quando prevalecem os interesses dos grupos sociais
atrelados agrave hegemonia do regime de apropriaccedilatildeo privada e economicista
dos ldquocommonsrdquo por sua vez os avanccedilos alcanccedilados na promoccedilatildeo de um
novo formato democraacutetico-participativo correm o risco de se tornarem
funcionais agrave reproduccedilatildeo das tendecircncias dominantes se permanecerem
restritos aos limites fixados pela obediecircncia agraves determinaccedilotildees legais
Impotildee-se assim uma dinacircmica de radicalizaccedilatildeo da democracia
entendida como componente essencial de uma estrateacutegia consistente de
enfrentamento dos dilemas colocados pela urgecircncia de uma transiccedilatildeo
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ZOLA Eacutemile Germinal Satildeo Paulo Ciacuterculo do Livro 1981
Aos meus pais Marilda e Hermes que
com seus exemplos me inspiram a
tentar ser uma pessoa melhor
AGRADECIMENTOS
O doutoramento foi muito mais abertura de caminhos e encontros que
pontos de chegada E nesses caminhos e encontros pude conhecer
pessoas e estreitar laccedilos que foram muito importantes ao longo desse
processo Aproveito para deixar registrado aqui os meus
agradecimentos
Ao meu orientador Prof Paulo Freire Vieira que me acompanha desde
o mestrado Eacute muito importante ter algueacutem que com equanimidade nos
faccedila perceber os nossos limites e nos estimule a ir aleacutem com humildade
e sem ilusotildees
Aos professores que gentilmente participaram da qualificaccedilatildeo e da
defesa e trouxeram valiosas contribuiccedilotildees ao texto aqui apresentado
Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes da UNESC Profordf Drordf Cristiane
Mansur de Moraes Souza da FURB Prof Dr Luiz Fernando Scheibe do
Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Geografia da UFSC Profordf Drordf Janice
Pontes Tirelli e Marcia Grisotti do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em
Sociologia Poliacutetica da UFSC
Agrave coordenaccedilatildeo e aos professores e professoras do Programa de Poacutes-
Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica importantiacutessimos nesse processo de
formaccedilatildeo
Agrave Albertina Buss Volkmann e agrave Maria de Faacutetima Xavier da Silva pelo
carinho e pela ajuda junto agrave Secretaria do PPGSP
Ao CNPq pelo auxiacutelio financeiro por meio da bolsa de estudos
Agraves amigas e amigos do Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio Ambiente e
Desenvolvimento do Grupo de Educaccedilatildeo para o Ecodesenvolvimento e
do Nuacutecleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional Nossas
vivecircncias e convivecircncias foram fundamentais para o meu processo
formativo Foi muito bom poder contar com o carinho e apoio de vocecircs
Agrave Juliana Adriano Marina Fravrim Gasparini Melissa Vivacqua
Tatiane Viega Vargas e Tadeu Santos (da ONG Soacutecios da Natureza) que
gentilmente compartilharam suas impressotildees sobre partes da tese
Agrave Mariana Thibes pela agradaacutevel parceria ao longo desse percurso e ao
Juliano Giassi Goularti pela sugestatildeo dos dados do quinto capiacutetulo
Aos colegas da rede TransForMar pela acolhida e pela oportunidade de
compartilhar e dialogar sobre nossos projetos
Aos amigos Andresa Graciela Wagner Joaquim Hoepers Silvana Maria
Bittencourt e Vanessa Juliana da Silva Santos
Agraves amigas Katia Parizoto e Laurete Coleti que me inspiraram com a sua
coragem
Agraves minhas tias Lizete e Dalila eacute muito bom tecirc-las por perto
Ao Ivo cuja presenccedila tornou minha caminhada mais leve Com carinho e
paciecircncia nas nossas incontaacuteveis conversas sobre a tese ajudou e falou
o essencial quando eu mais precisava e permaneceu em silecircncio quando
isso significava me compreender e respeitar
Agrave minha famiacutelia Marilda Hermes Viviana Susana Lucas Hermes
Carlos Dora Dara e Bruna presenccedilas constantes em minha vida O
amor carinho e apoio de vocecircs foi e sempre seraacute fundamental
Agrave minha querida oma Leonida tio Flaacutevio tio Irineu minha prima
Valeacuteria e minha cachorrinha Nicole que partiram no periacuteodo de
doutorado e deixaram muitas saudades
Meus mais sinceros agradecimentos a todas e todos pois naquilo que
faccedilo sou e me torno a cada dia levo um pouquinho de cada um de
vocecircs
A terra natildeo eacute soacute um espaccedilo onde vivemos Eacute um
mundo que produz e condiciona nossa proacutepria
existecircncia que antecede e se prolonga em nossa
vida em todas as suas dimensotildees Somos seres
terrestres A democracia natildeo eacute soacute um espaccedilo
institucional da poliacutetica Ela para existir deve
tambeacutem realizar-se e estar presente em todas as
dimensotildees de nossas vidas Talvez por isso haja
uma relaccedilatildeo histoacuterica tatildeo estreita entre terra e
democracia Quando a terra eacute apropriada usada
monopolizada por uns poucos a democracia natildeo
existe Quando a democracia natildeo existe a terra se
transforma em um mundo de poucos contra a
maioria (Herbert de Souza ndash Betinho 1991 p
108-9)
RESUMO
Esta tese focaliza os dilemas que continuam bloqueando quatro deacutecadas
apoacutes a Conferecircncia de Estocolmo o funcionamento do sistema de gestatildeo
de recursos naturais natildeo renovaacuteveis no Brasil Mais especificamente o
texto conteacutem uma anaacutelise dos bastidores do processo de licenciamento
ambiental voltado para a implantaccedilatildeo de uma nova usina termeleacutetrica na
regiatildeo sul do estado de Santa Catarina O enfoque analiacutetico utilizado foi
construiacutedo mediante uma hibridizaccedilatildeo de duas linhas de pesquisa
sistecircmica sobre o binocircmio meio ambiente amp desenvolvimento ainda
pouco conhecidas em nosso Paiacutes a saber gestatildeo de recursos comuns
(ldquocommonsrdquo) para o ecodesenvolvimento e justiccedila ambiental e ecoloacutegica Aleacutem da introduccedilatildeo e de uma siacutentese da revisatildeo de literatura
sobre a atualidade dos princiacutepios de ecodesenvolvimento no debate
sobre modos de apropriaccedilatildeo e sistemas de gestatildeo de ldquocommonsrdquo o texto
oferece inicialmente um resgate historiograacutefico das modalidades e das
implicaccedilotildees socioecoloacutegicas do aproveitamento de jazidas de carvatildeo
mineral no Brasil e em Santa Catarina Na sequecircncia coloca em
primeiro plano uma anaacutelise dos padrotildees de interaccedilatildeo dos segmentos
sociais envolvidos no projeto de implantaccedilatildeo da Usina Termeleacutetrica Sul-
Catarinense (USITESC) no municiacutepio de Treviso Os dados coletados
permitiram validar a hipoacutetese segundo a qual a decisatildeo de implantar esta
usina constitui um indicador suplementar de crise do sistema poliacutetico
implantado no Paiacutes relativamente ao agravamento tendencial da
problemaacutetica socioecoloacutegica A linha de criacutetica adotada incide nas
implicaccedilotildees da reproduccedilatildeo de falhas estruturais nos processos de
construccedilatildeo da cidadania ambiental e de promoccedilatildeo da justiccedila ambiental
e ecoloacutegica em todos os niacuteveis de governo ndash do local ao nacional
Argumenta-se que a despeito dos avanccedilos obtidos no debate social
contemporacircneo sobre a urgecircncia de uma transiccedilatildeo ecoloacutegica
consequente para aleacutem de uma ldquoeconomia verderdquo ou do ideaacuterio de um
ldquodesenvolvimento sustentaacutevelrdquo que natildeo rompe com o imaginaacuterio
ocidental de um crescimento material ilimitado a intenccedilatildeo de ampliar a
utilizaccedilatildeo do carvatildeo como fonte de energia estaacute diretamente associada agrave
formaccedilatildeo de redes de influecircncia envolvendo empresaacuterios e agentes
governamentais Buscando elucidar os condicionantes desse cenaacuterio de
mercantilizaccedilatildeo intensiva e indiscriminada de ldquocommonsrdquo o trabalho
reuacutene tambeacutem evidecircncias de iniciativas de resistecircncia que vecircm sendo
gestadas na regiatildeo estudada por de grupos sociais portadores de uma
visatildeo ecoloacutegica da economia da cultura e da poliacutetica
Palavras-chave Ecodesenvolvimento Gestatildeo de recursos comuns
Justiccedila ambiental Justiccedila Ecoloacutegica Democracia Energia Termeleacutetrica
Carvatildeo Mineral Santa Catarina
ABSTRACT
This thesis focuses on the dilemmas that continue blocking four
decades after the Stockholm Conference the functioning of the
management system based on non-renewable natural resources in Brazil
More specifically the text contains an analysis of the backstage of the
licensing process focused on the deployment of a new thermal power
plant in the southern state of Santa Catarina The analytical approach
used was built by a hybridization of two lines of systemic research on
the binomial environment amp development still little known in our
country namely management of common resources (commons) for
the ecodevelopment and environmental and ecological justice Besides
the introduction and a summary of the literature review on the actuality
of the principles of ecodevelopment in the current debate on modes of
ownership and management of commons systems the text initially
provides a historiographical rescuing of the terms and socio-ecological
implications of utilizing coal mines in Brazil and in Santa Catarina
State Following it foregrounds an analysis of the patterns of interaction
of social groups involved in the deployment project Thermoelectric
Plant of South of the Santa Catarina (USITESC) in the city of Treviso
The collected data allow to validate the hypothesis that the decision to
deploy this Plant is a further indicator of the political system deployed
crisis in the country regarding the trend towards worsening of socio-
ecological problems The adopted line of criticism focuses on the
implications of reproducing structural flaws in the processes of
construction of environmental citizenship and promotion of
environmental and ecological justice at all levels of government - from
local to national It is argued that despite the progress achieved in the
contemporary social debate on the urgency of a consequent ecological
transition beyond a green economy or the ideas of sustainable
development that does not break the Western imagination of a growing
unlimited material intention of expanding nowadays the use of coal as
an energy source is directly associated with the formation of powerful
lobbies involving businessmen and government officials Trying to
elucidate the determinants of this intensive and indiscriminate
commodification of commons scenario the paper also gathers
evidence of resistance initiatives that have been gestated in the study
area for social groups suffering from an ecological view of the
economy culture and policy
Keywords Ecodevelopment Management of common resources
Environmental justice Ecological justice Democracy Thermoelectric
energy Coal Santa Catarina
LISTA DE FIGURAS
Figura 1ndash Tipologia das formas de expressatildeo do cidadatildeo numa
democracia 56 Figura 2 - Modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns ajustado a
co-gestatildeo adaptativa 69 Figura 3 - Primeira adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa 72 Figura 4 - Segunda adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa 75 Figura 5 - Tipos de carvatildeo e uso 87 Figura 6 - Etapas da avaliaccedilatildeo de impacto ambiental 95 Figura 7 ndash Mapa de localizaccedilatildeo da Bacia Carboniacutefera Santa Catarina
114 Figura 8- Brasatildeo do municiacutepio de Treviso 158 Figura 9 ndash Mapa de localizaccedilatildeo do municiacutepio de Treviso 159 Figura 10 - Aacuterea prevista para a implantaccedilatildeo da USITESC 163
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 ndash Divisatildeo dos envolvidos na gestatildeo por segmentos 55 Quadro 2 - Quadro de anaacutelise do sistema democraacutetico agrave luz da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica 57 Quadro 3 ndash O enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento e as
dimensotildees baacutesicas do conceito sistecircmico de meio ambiente 64 Quadro 4 - Aspectos das atividades de mineraccedilatildeo e processamento do
carvatildeo mineral 91 Quadro 5 - Siacutentese dos pontos que favorecem e questionam a
amplicaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral
por macro variaacutevel 104 Quadro 6 ndash Limites e oportunidades do sistema democraacutetico no Brasil
106 Quadro 7 ndash Aspectos que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral Santa Catarina
130 Quadro 8 ndash Limites e possibilidades do sistema democraacutetico em Santa
Catarina 132 Quadro 9 - Principais caracteriacutesticas fiacutesicas e bioacuteticas da aacuterea de
influecircncia indireta do projeto USITESC 160 Quadro 10- Impactos sobre o Meio Fiacutesico Bioacutetico e Antroacutepico e accedilotildees
geradoras 165 Quadro 11 - Siacutentese dos Programas da USITESC e alvos principais 168 Quadro 12 - Procedimento para conduccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas
FATMA 175
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral em operaccedilatildeo
em 2013 Brasil 88 Tabela 2 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral com outorga
de 1998 a 2013 Brasil 88 Tabela 3 - Faturamento do Segmento do Carvatildeo Mineral 2012 118 Tabela 4 - Produccedilatildeo de carvatildeo bruto (ROM) de 2009 a 2012 119 Tabela 5 - Distribuiccedilatildeo de passivos ambientais em relaccedilatildeo agraves empresas
120 Tabela 6 - Cronograma de recuperaccedilatildeo dos passivos ambientais 120 Tabela 7 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2002 141 Tabela 8 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2002 que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral 142 Tabela 9 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2002 142 Tabela 10 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2006 143 Tabela 11 - Candidatosas que receberam doaccedilotildees das empresas ligadas
ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2006 144 Tabela 12 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2006 145 Tabela 13 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2010 145 Tabela 14 - Candidatosas receberam doaccedilotildees das empresas ligadas ao
carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2010 146 Tabela 15 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2010 147 Tabela 16 - Doadores eleiccedilotildees de 2004 148 Tabela 17 - Comitecircs e candidatos que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2004 149 Tabela 18 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2004 149 Tabela 19 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2008 150 Tabela 20 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2008 que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 151 Tabela 21 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2008 151 Tabela 22 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2012 152 Tabela 23 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2012 que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 152 Tabela 24 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2012 153 Tabela 25 - Siacutentese dos doadores Eleiccedilotildees de 2002 e 2012 154 Tabela 26 - Candidatos que receberam maiores doaccedilotildees Eleiccedilotildees de
2002 a 2012 155 Tabela 27 - Doaccedilotildees por Partido Poliacutetico Eleiccedilotildees de 2002 a 2012 155 Tabela 28 ndash Principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo com a construccedilatildeo da
USITESC 179
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABCM Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo Mineral
ACARESC
Associaccedilatildeo de Creacutedito e Assistecircncia Rural de Santa
Catarina
ACARIMO Associaccedilatildeo Comunitaacuteria do Alto do Rio Molha
AIA Avaliaccedilatildeo de Impacto Ambiental
ALESC Assembleacuteia Legislativa do Estado de Santa Catarina
AMESC Associaccedilatildeo dos Municiacutepios do Extremo Sul Catarinense
AMREC Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera
AMUREL Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo de Laguna
ANEEL Agecircncia Nacional de Energia Eleacutetrica
ANSDNPM Associaccedilatildeo Nacional de Servidores do Departamento
Nacional de Produccedilatildeo Mineral
APC Associaccedilatildeo Proacute-Carvatildeo
APIB Articulaccedilatildeo dos Povos Indiacutegenas do Brasil
APINE
Associaccedilatildeo Brasileira dos Produtores Independentes de
Energia Eleacutetrica
APP Agraverea de Preservaccedilatildeo Permanente
ASMURC
Associaccedilatildeo de Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera do
Rio Grande do Sul
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento
CAPES
Coordenadoria de Aperfeiccediloamento de Pessoal de Niacutevel
Superior
CASA Centro de Apoio Socioambiental
CBCA Companhia Carboniacutefera de Araranguaacute
CCEE Cacircmara de Comercializaccedilatildeo de Energia Eleacutetrica
CEPCAN Comissatildeo Executiva do Plano do Carvatildeo Nacional
CETEM Centro de Tecnologia Mineral
CETMA Conselho Estadual de Tecnologia e Meio ambiente
CFEM
Compensaccedilatildeo Finaceira pela Exploraccedilatildeo de Recursos
Minerais
CFM Comitecircs Financeiros Municipais
CGBHRA
Comitecirc de Gerenciamento da Bacia Hidrograacutefica do Rio
Araranguaacute
CGTEE Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica
CNBB Conferecircncia Nacional dos Bispos do Brasil
CNPE Conselho Nacional de Poliacutetica Energeacutetica
CNPq
Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientiacutefico e
Tecnoloacutegico
CO2 Dioacutexido de Carbono
COCALIT Coque Catarinense Ltda
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
CONDEMA Conselho Municipal de Defesa Ambiental
COPEL Companhia Paranaense de Energia
CPRM Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
CSN Companhia Sideruacutergica Nacional
DEM Democratas
DNPM Departamento Nacional de Produccedilatildeo Mineral
EIA Estudo de Impacto Ambiental
EPE Empresa de Pesquisa Energeacutetica
FASE
Federaccedilatildeo de oacutergatildeos para Assistecircncia Social e
Educacional
FATMA Fundaccedilatildeo do Meio Ambiente
FBOMS Foacuterum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais
FBOMS
Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento
FDESC Foacuterum de Desenvolvimento do Extremo Sul Catarinense
FEEC Federaccedilatildeo de Entidades Ecologistas Catarinenses
FELC Foacuterum de Ecodesenvolvimento do Litoral Catarinense
FURB Universidade Regional de Blumenau
GAPLAN Gabinete de Planejamento
GEE Gases de Efeito Estufa
GWH Gigawatt-hora
IAD Institutional Framework for Policy Analysis and Design IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renovaacuteveis
IBASE Instituto Brasileiro de Anaacutelises Sociais e Econocircmicas
IBRAM Instituto Brasileiro de Mineraccedilatildeo
ICA Instituto da Cidadania de Araranguaacute
ICC Induacutestria Carboquiacutemica Catarinense
ICMS
Imposto sobre Circulaccedilatildeo de Mercadorias e Prestaccedilatildeo de
Serviccedilos
IEA Agecircncia Internacional de Energia
INESC Instituto de Estudos Socioeconocircmicos
IPAT Instituto de Pesquisas Ambientais e Tecnoloacutegicas
JICA Agecircncia de Cooperaccedilatildeo internacional do Japatildeo
KWh QuiloWatt hora
LI Licenccedila de Instalaccedilatildeo
LO Licenccedila de Operaccedilatildeo
LP Licenccedila Preacutevia
MAM Movimento Popular frente agrave Mineraccedilatildeo
MEcircS Movimento Ecoloacutegico de Sideroacutepolis
MMA Ministeacuterio do Meio Ambiente
MME Ministeacuterio das Minas e Energia
MOVET Movimento Ecoloacutegico Tubaronense
MPA Movimento Proacute-Araranguaacute
MST Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
MW Megawatt
N Nitrogecircnio
NMD
Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio Ambiente e
Desenvolvimento
NPDR Nuacutecleo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional
OCDE
Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento
Econocircmico
ONG Organizaccedilatildeo Natildeo Governamental
ONU Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas
PAC Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento
PFL Partido da Frente Liberal
PL Projeto de Lei
PMA Prefeitura Municipal de Araranguaacute
PMDB Partido do Movimento Democraacutetico Brasileiro
PNMA Poliacutetica Nacional de Meio Ambiente
PNUMA Programa das Naccedilotildees Unidas para o Meio Ambiente
PP Partido Progressista
PPB Partido Progressista Brasileiro
PPS Partido Popular Socialista
PR Partido da Repuacuteblica
PSD Partido Social Democraacutetico
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira
PT Partido dos Trabalhadores
PTB Partido Trabalhista Brasileiro
RBJA Rede Brasileira de Justiccedila Ambiental
RIMA Relatoacuterio de Impacto Ambiental
ROM Run of Mine
SATC
Associaccedilatildeo Beneficente da Induacutestria Carboniacutefera de
Santa Catarina
SDR Secretaria de Desenvolvimento Regional
SETMA Secretaria de Tecnologia e Meio Ambiente
SIESESC
Sindicato da Induacutestria da Extraccedilatildeo de Carvatildeo do Estado
de Santa Catarina
SISNAMA Sistema Nacional do Meio Ambiente
SNIEC Sindicato Nacional da Induacutestria de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
SOLTECA Sociedade Termoeleacutetrica de Capivari SA
TWH Tera Watt Hora
UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina
UNESC Universidade do Extremo Sul Catarinense
USITESC Usina Termeleacutetrica Sul-Catarinense
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO39
2 A ATUALIDADE DO ECODESENVOLVIMENTO NO ESTUDO
CONTEMPORAcircNEO SOBRE GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS59
21 RESGATE DO ENFOQUE ldquoCLAacuteSSICOrdquo DE
ECODESENVOLVIMENTO 61
22 AS CONTRIBUICcedilOtildeES DE DIFERENTES ENFOQUES 63
221 Gestatildeo de recursos comuns a importacircncia da
aprendizagem social adaptativa 66
222 Ecodesenvolvimento territorial os recursos comuns no
contexto do desenvolvimento 71
223 Justiccedila ambiental e justiccedila ecoloacutegica os caminhos da
democracia 73
23 LIMITES E POSSIBILIDADES DO
ECODESENVOLVIMENTO REVISITADO 77
3 GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS NO BRASIL O CARVAtildeO
MINERAL EM QUESTAtildeO79
31 DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO GESTAtildeO DE
RECURSOS COMUNS E ENERGIA 81
32 CARACTERIZACcedilAtildeO E USOS DO CARVAtildeO MINERAL NO
BRASIL 86
33 TECNOLOGIAS DISPONIacuteVEIS E IMPACTOS
SOCIOAMBIENTAIS 89
34 REGRAS EM USO NUMA PERSPECTIVA HISTOacuteRICA
INTERFACE ENTRE DIREITOS AMBIENTAIS E DIREITOS
HUMANOS 92
35 ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO 98
351 Segmentos poliacuteticos 98
352 Segmentos econocircmicos 100
353 Segmentos sociais 102
36 SITUACcedilAtildeO ATUAL E DESAFIOS 103
4 CARVAtildeO MINERAL EM SANTA
CATARINA109
41 ldquoCombinandordquo crescimento econocircmico e proteccedilatildeo ambiental 110
42 O sul catarinense uma trajetoacuteria (de desenvolvimento) marcada
pelo carvatildeo mineral 114
43 Da extraccedilatildeo manual agrave mecanizaccedilatildeo das minas 121
44 Regras em uso 122
45 Envolvidos na gestatildeo 124
451 Segmentos poliacuteticos 124
452 Segmentos econocircmicos 124
453 Segmentos sociais 126
46 Situaccedilatildeo atual e desafios 129
5 CARVAtildeO MINERAL E POLIacuteTICA EM SANTA CATARINA
ELEICcedilOtildeES E FINANCIAMENTO PRIVADO133
51 Os argumentos presentes no discurso dos poliacuteticos 134
52 Panorama das eleiccedilotildees e doaccedilotildees de campanha de 2002 a 2012
139
521 Eleiccedilotildees gerais 140
522 Eleiccedilotildees municipais 148
53 Os fatos ausentes do discurso dos poliacuteticos 153
6 CARVAtildeO MINERAL E AMPLIACcedilAtildeO DA ENERGIA
TERMELEacuteTRICA EM SANTA CATARINA157
61 O municiacutepio de Treviso 157
62 O processo de licenciamento os documentos escritos 162
621 O EIARIMA da USITESC 163
622 Das audiecircncias puacuteblicas e licenccedilas 169
623 Pressotildees dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos no
processo de licenciamento 170
624 A posiccedilatildeo dos segmentos sociais 173
63 Relaccedilotildees de poder e desigualdade nas audiecircncias puacuteblicas os
documentos falados 175
631 A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica 177
632 As mudanccedilas climaacuteticas natildeo vecircm ao caso 183
633 Quem defende quem E quem defende os
afetadosatingidosameaccedilados 188
634 O papel da FATMA em questatildeo 192
635 O IPAT e a neutralidade da ciecircncia 195
636 Audiecircncias puacuteblicas como espaccedilos democraacuteticos 200
64 Democracias possiacuteveis e aprendizagem social 202
7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS205
REFEREcircNCIAS211
1 INTRODUCcedilAtildeO
O crescimento e as transformaccedilotildees da economia mundial ao
longo do seacuteculo XX foram impulsionados pela oferta de energia tendo
como fonte principal os combustiacuteveis foacutesseis petroacuteleo e carvatildeo mineral
O uso da energia eacute essencial agrave cultura consumista moderna presente em
todas as regiotildees do mundo Os processos de produccedilatildeo e consumo satildeo
responsaacuteveis por inuacutemeros riscos e danos ecoloacutegicos (TOUCHEacute 2004)
A geopoliacutetica mundial dos recursos naturais faz da energia aacutegua
mineacuterio e espaccedilo territorial elementos do comeacutercio internacional Esse
movimento global afeta as localidades atraveacutes da implantaccedilatildeo de redes
de infraestrutura reconversatildeo de atividades alteraccedilatildeo das formas de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo e satildeo geradores de injusticcedila ambiental Aiacute surgem
conflitos entre a exploraccedilatildeo dos recursos orientada por interesses
presentes em vaacuterias escalas espaciais (ACSELRAD BEZERRA 2010
ZHOURI 2008)
A partir da deacutecada de 1990 depois de mais de cinquenta anos de
controle estatal o sistema energeacutetico brasileiro passou por um periacuteodo
de liberalizaccedilatildeo Duas mudanccedilas consideraacuteveis podem ser apontadas A
privatizaccedilatildeo das companhias operadoras iniciando com a Lei nordm 9427
de dezembro de 1996 que instituiu a Agecircncia Nacional de Energia
Eleacutetrica (ANEEL) e determinou que o potencial energeacutetico seria
concedido via leilatildeo A segunda mudanccedila ocorreu em 2004 com o Novo
Modelo do Setor Eleacutetrico marcando a retomada do planejamento nesse
setor pelo Estado garantindo a seguranccedila no suprimento modicidade
tarifaacuteria e inserccedilatildeo social (atraveacutes do Programa Luz para Todos)
(ANEEL 2008a) Essa deacutecada marcou tambeacutem a desregulamentaccedilatildeo do
setor carboniacutefero que perdeu o mercado metaluacutergico e enfrentou seacuterias
dificuldades vindo a se recuperar somente com a possibilidade de
ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica (JFSC 2008)
Muitas poliacuteticas puacuteblicas incluindo as do setor energeacutetico tecircm
como efeitos colaterais grandes impactos socioambientais (PINHEIRO
2006 RAULINO 2009 SAacuteNCHEZ 2008a VIEacuteGAS 2007) O
Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento (PAC) reforccedilou a velha loacutegica
de grandes projetos de infraestrutura e a atuaccedilatildeo do Estado ainda eacute
bastante controversa (VIEIRA 2009 ZHOURI LASCHEFSKI 2010)
Dentre as controveacutersias presentes na atuaccedilatildeo do Estado uma refere-se
ao compromisso assumido pelo Brasil no Plano Nacional sobre
40
Mudanccedila do Clima de reduzir as desigualdades sociais a partir de uma
dinacircmica econocircmica que natildeo repita a trajetoacuteria dos paiacuteses
industrializados em termos de emissotildees de Gases de Efeito Estufa
(GEE) (BRASIL 2008) Esse discurso parece caminhar na contramatildeo
do PAC que prevecirc a construccedilatildeo de mais cinco termeleacutetricas movidas a
carvatildeo mineral sendo uma em Santa Catarina (MONTEIRO 2008)
A Poliacutetica Estadual sobre Mudanccedilas Climaacuteticas e
Desenvolvimento Sustentaacutevel de Santa Catarina foi instituiacuteda em 2009
Esta pretende compatibilizar desenvolvimento social econocircmico e
tecnoloacutegico com a proteccedilatildeo do sistema climaacutetico e do meio ambiente
com ecircnfase especial agrave minimizaccedilatildeo das atividades geradoras de gases de
efeito estufa (SANTA CATARINA 2009a) Entretanto o Coacutedigo
Estadual do Meio Ambiente aprovado em 2009 (SANTA CATARINA
2009b) e alterado em 2013 abre a possibilidade de regularizaccedilatildeo
fundiaacuteria em Aacutereas de Preservaccedilatildeo Permanente (APP) e do
licenciamento por decurso de prazo (FEEC 2008 SANTA
CATARINA 2014a) Estes e outros aspectos causam grande impacto
nas relaccedilotildees sociedade e meio ambiente no geral e na questatildeo
energeacutetica em particular
O desenvolvimento de Santa Catarina foi durante muito tempo
considerado bem sucedido por ter reduzido grau de desigualdade
socioeconocircmica amparada no predomiacutenio da pequena propriedade e da
produccedilatildeo diversificada (LISBOA THEIS 1993) Todavia com o passar
do tempo observa-se a elevaccedilatildeo do ecircxodo rural o aumento dos
problemas urbanos e da degradaccedilatildeo ecossistecircmica (VIEIRA et al
2010 VIEIRA CUNHA 2002) A crise socioecoloacutegica catarinense estaacute
intimamente ligada agrave civilizaccedilatildeo dos negoacutecios (LENZI 2000) e o
sistema energeacutetico que a sustenta contribui em alguma medida para o
agravamento deste quadro (LISBOA THEIS 1993) O aumento da
produccedilatildeo e consumo de energia em Santa Catarina relaciona-se ao
crescimento da atividade econocircmica e ao crescimento dos impactos
ambientais (THEIS 1988)
Dentre as regiotildees mais afetadas estaacute o Sul de Santa Catarina A
regiatildeo concentra 1041 das reservas de carvatildeo mineral do Brasil
(MONTEIRO 2008) Desde a descoberta do carvatildeo catarinense pelos
tropeiros em 1822 ateacute os dias atuais muitas coisas mudaram em termos
de incentivos ao uso do carvatildeo mineral tecnologias utilizadas
agravamento da problemaacutetica socioambiental global e desenvolvimento
de mecanismos institucionais para lidar com esta problemaacutetica Todavia
41
apesar de existirem avanccedilos intensificaram-se tambeacutem processos de
degradaccedilatildeo ambiental (MENEZES WATERKEMPER 2009 SANTA
CATARINA 1990)
A Agecircncia de Cooperaccedilatildeo Internacional do Japatildeo (JICA)
identificou 4700 hectares degradados no Sul de Santa Catarina mas
estima-se que seriam 6000 hectares (NASCIMENTO BURSZTYN
2010) Do mineacuterio extraiacutedo 25 eacute aproveitado e 75 torna-se rejeito
piritoso (MILIOLI 2009) Na regiatildeo carboniacutefera apesar da
mecanizaccedilatildeo da extraccedilatildeo do carvatildeo ainda existem precaacuterias condiccedilotildees
de trabalho e peacutessimas condiccedilotildees de vida (moradia sauacutede saneamento)
(MONTIBELLER FILHO 2004) Haacute na regiatildeo um gradativo
comprometimento do setor agriacutecola As aacutereas proacuteximas agraves lavras de
subsolo sofrem com rachaduras desabamentos e rebaixamentos do solo
Ocorrem tambeacutem infiltraccedilotildees secagem de cursos de aacutegua accediludes e
poccedilos Dois terccedilos do sistema hidrograacutefico da regiatildeo estatildeo
comprometidos Existem tambeacutem impactos na flora e fauna e decliacutenio
do potencial pesqueiro (MILIOLI 2009)
Em 1993 o Ministeacuterio Puacuteblico Federal propocircs uma Accedilatildeo Civil
Puacuteblica contra as empresas carboniacuteferas diretores soacutecios majoritaacuterios o
Estado de Santa Catarina e a Uniatildeo Federal visando agrave recuperaccedilatildeo do
passivo ambiental resultante da mineraccedilatildeo do carvatildeo Em 2000
aconteceu a condenaccedilatildeo dos reacuteus agrave recuperaccedilatildeo de 619159 hectares de
aacutereas degradadas trecircs bacias hidrograacuteficas (bacias dos rios Araranguaacute
Tubaratildeo e Urussanga) e 768 minas de boca abandonadas (TSJ 2007)
A regiatildeo eacute palco de muitos conflitos No que diz respeito agrave
extraccedilatildeo do carvatildeo destacam-se em 1988 o conflito entre a Companhia
Sideruacutergica Nacional (CSN) e moradores da comunidade rural de
Montanhatildeo em 1994 entre a Companhia Carboniacutefera Belluno e 200
agricultores em 1995 envolvendo a Associaccedilatildeo Comunitaacuteria do Alto do
Rio Molha (ACARIMO) em Urussanga em 1996 o conflito entre
mineradores e agricultores no ldquoMorrordquo do Albino e Estevatildeo em
Criciuacutema (SILVA SCHEIBE 2005) em 1999 o conflito com a
Carboniacutefera Rio Deserto em Sideroacutepolis e em Iccedilara entre agricultores e
a Carboniacutefera Rio Deserto (NASCIMENTO BURSZTYN 2010) Em
2004 com a ocorrecircncia do furacatildeo Catarina o primeiro do Atlacircntico
Sul inaugura-se uma mobilizaccedilatildeo social que une a discussatildeo sobre a
mineraccedilatildeo do carvatildeo com a discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas e
justiccedila ambiental (SOacuteCIOS DA NATUREZA 2009 e 2005)
Historicamente na regiatildeo aqueles que tecircm o benefiacutecio econocircmico
42
geralmente natildeo arcam com os impactos negativos resultantes da
mineraccedilatildeo (MILIOLI 2009 NASCIMENTO BURSZTYN 2010)
Todavia os impactos natildeo necessariamente afetam apenas as populaccedilotildees
mais vulneraacuteveis do ponto de vista socioeconocircmico
O iacutendice meacutedio de mortalidade por neoplasias e doenccedilas
respiratoacuterias eacute superior ao resto do territoacuterio catarinense e ultrapassa a
meacutedia nacional Chama atenccedilatildeo tambeacutem o iacutendice de mortalidade de
menores de um ano por doenccedilas respiratoacuterias anomalias congecircnitas
notadamente no sistema nervoso incluindo anencefalia tambeacutem
superiores ao resto do paiacutes (MPF 2009) Os municiacutepios de Imbituba
Tubaratildeo Criciuacutema e Urussanga lideram os piores iacutendices de qualidade
do ar do Estado Existem tambeacutem muitos prejuiacutezos relacionados agrave sauacutede
da populaccedilatildeo De 1980 a 2004 foram 846 mortes causadas por doenccedilas
do aparelho respiratoacuterio nos municiacutepios de Criciuacutema Iccedilara Lauro
Muumlller Morro da Fumaccedila Sideroacutepolis Nova Veneza Urussanga
(MILIOLI 2009)
A mineraccedilatildeo no Sul em 2010 contava com 12 induacutestrias e
aproximadamente 4136 empregos diretos O principal destino do carvatildeo
(95) era o Complexo Termeleacutetrico Jorge Lacerda localizado no
municiacutepio de Capivari de Baixo administrado pela Tractebel
(SIECESC 2010) A Usina Termeleacutetrica Jorge Lacerda foi inaugurada
em 1965 entrando em operaccedilatildeo em 1966 com potecircncia instalada de 50
MW atualmente 856 MW com a incorporaccedilatildeo de mais unidades e
ampliaccedilatildeo da produccedilatildeo de energia eleacutetrica Em 1998 como parte dos
processos de privatizaccedilatildeo o Complexo Jorge Lacerda foi vendido para o
Grupo SuezTractebel (Beacutelgica) (GOULARTI FILHO MORAES
2004)
O Complexo Jorge Lacerda tem o compromisso da compra de
200 mil toneladas mensais de carvatildeo mineral A cadeia produtiva do
carvatildeo gera mais de seis mil empregos (na mineraccedilatildeo do carvatildeo
transporte e abastecimento do carvatildeo geraccedilatildeo de energia eleacutetrica e
extraccedilatildeo e transporte de cinzas) e eacute responsaacutevel por 70 da arrecadaccedilatildeo
de tributos municipais e por 75 da economia de Capivari de Baixo
(TRACTEBEL 2008)
A ampliaccedilatildeo de energia termeleacutetrica tornou-se uma possibilidade
atraveacutes da construccedilatildeo da Usina Termeleacutetrica Sul-Catarinense
(USITESC) Ela faz parte de uma realidade diferente se comparada ao
Complexo Termeleacutetrico Jorge Lacerda Enquanto o Complexo
Termeleacutetrico Jorge Lacerda foi construiacutedo num periacuteodo em que a
43
questatildeo da energia passava pela intervenccedilatildeo federal e estadual
(GOULARTI FILHO MORAES 2004) a USITESC vai ser construiacuteda
num periacuteodo de liberalizaccedilatildeo e privatizaccedilatildeo do setor eleacutetrico Ocorrem
ainda nesse intervalo de tempo a democratizaccedilatildeo e a criaccedilatildeo de espaccedilos
legais e institucionais motivados pela crescente preocupaccedilatildeo com
questotildees socioambientais (VAINER 2007) Todavia existem
dificuldades na articulaccedilatildeo entre os niacuteveis de planejamento e gestatildeo
(federal estadual regional municipal) especificidades da cultura
poliacutetica brasileira a degeneraccedilatildeo das instituiccedilotildees poliacuteticas e o vieacutes
tecno-burocraacutetico das poliacuteticas ambientais (VIEIRA 2006) Ao liberar
as forccedilas do capital das regulamentaccedilotildees do Estado o controle social
sobre os efeitos nocivos do uso exacerbado do meio ambiente pelos
interesses privados pode ser inviabilizado (ACSELRAD 1992b)
No que se refere agrave geraccedilatildeo de energia do Complexo Jorge
Lacerda a Tractebel natildeo sofre nenhum tipo de fiscalizaccedilatildeo O
Complexo Jorge Lacerda emite 42 milhotildees de toneladas de Dioacutexido de
Carbono (CO2) por ano (MONTEIRO 2008) A Fundaccedilatildeo do Meio
Ambiente (FATMA) autorizou a Tractebel a emitir 15667117
toneladasano de dioacutexido de enxofre Essa e as demais emissotildees
ultrapassam em muito os limites da Resoluccedilatildeo do Conselho Nacional do
Meio Ambiente (CONAMA) nordm 0890 e violam tambeacutem a Convenccedilatildeo da
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre a Mudanccedila do Clima da
qual o Brasil eacute signataacuterio Em 2009 o Ministeacuterio Puacuteblico Federal
determinou que a Tractebel Energia SA realize uma auditoria
ambiental uma vez que sua atuaccedilatildeo tem como base um estudo de
impacto ambiental feito em 1986 (MPF 2009)
Jaacute o relatoacuterio de impacto ambiental da USITESC foi questionado
pela sociedade civil organizada e em alguns pontos pelo Ministeacuterio
Puacuteblico (SANTOS 2011 DIAS 2011) Segundo Dias (2011) o estudo
de impacto ambientalrelatoacuterio de impacto ambiental considerou apenas
os impactos da implantaccedilatildeo da usina termeleacutetrica desconsiderando os
empreendimentos acessoacuterios (reservatoacuterio de aacutegua ramal da Ferrovia
Tereza Cristina linha de transmissatildeo e terminal de amocircnia no porto de
ImbitubaSC) Foram feitos estudos complementares e o Ministeacuterio
Puacuteblico corroborou o licenciamento ambiental emitido pela FATMA
Se os estudos de impacto ambiental e relatoacuterios de impacto
ambiental satildeo a base para as tomadas de decisatildeo aleacutem da qualidade
documental a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo em associaccedilotildees locais eacute uma
conquista democraacutetica importante mas a praacutetica permanece precaacuteria
44
(SAacuteNCHEZ 2008b AGRA FILHO 2010) na medida em que o campo
ambiental eacute ldquoconstituiacutedo por posiccedilotildees hieraacuterquicas e relaccedilotildees de poder
muito desiguaisrdquo (ZHOURI 2008 p 99) Os empresaacuterios enaltecem os
benefiacutecios sociais dos empreendimentos e o governo tem demonstrado
atitudes controvertidas nos espaccedilos de negociaccedilatildeo e decisatildeo As
audiecircncias puacuteblicas passam de ldquo() um instrumento de avaliaccedilatildeo da
sustentabilidade socioambiental das obras para ser mero instrumento
viabilizador de um projeto de sociedade que tem no meio ambiente um
recurso material a ser explorado economicamenterdquo (ZHOURI 2008 p
101) Outro risco que se corre para aleacutem da negociaccedilatildeo caso a caso eacute
lidar ldquoapenas com a manifestaccedilatildeo superficial de questotildees mais
fundamentais e enraizadas ndash os conflitos de valores e princiacutepios baacutesicos
relativos agrave gestatildeo dos recursosrdquo (ACSELRAD BEZERRA 2010 p
52) Ou seja a preocupaccedilatildeo socioambiental acaba muitas vezes
limitada ao processo de avaliaccedilatildeo de impacto ambiental de casos
isolados sem levar em conta uma discussatildeo ampla e bem informada
sobre alternativas ao estilo de desenvolvimento hegemocircnico
A regiatildeo Sul catarinense convive com um problema socioambiental
considerado grave a saber os impactos negativos decorrentes da
mineraccedilatildeo e do uso do carvatildeo mineral e a construccedilatildeo da USITESC
demonstram a insistecircncia nesse estilo de desenvolvimento Levando em
conta a situaccedilatildeo-problema aqui descrita a questatildeo norteadora dessa tese
foi assim formulada Por que apesar da evoluccedilatildeo do debate sobre os
impactos socioambientais da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral e dos avanccedilos institucionais relacionados agrave questatildeo ambiental o sistema de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral vem sendo
ampliado em Santa Catarina
Partindo dessa questatildeo norteadora satildeo apresentados a seguir o enfoque
analiacutetico e os principais conceitos que ajudaram a delimitar essa tese
Enfoque analiacutetico
Desde a emergecircncia social e cientiacutefica da problemaacutetica
socioambiental a partir da deacutecada de 1960 podemos destacar avanccedilos
conceituais que se somam a progressos no conhecimento empiacuterico
sobre os problemas e ameaccedilas socioambientais e avanccedilos institucionais
da questatildeo ambiental Apesar dos avanccedilos os desafios da problemaacutetica
45
socioambiental satildeo ineacuteditos e possuem implicaccedilotildees epistemoloacutegicas
eacuteticas e poliacuteticas
O ecodesenvolvimento tem sido o ponto de confluecircncia dessa
reflexatildeo Mencionado pela primeira vez no acircmbito da Conferecircncia de
Estocolmo foi utilizado no decorrer da deacutecada de 1970 sendo
progressivamente marginalizado na deacutecada seguinte considerado como
um enfoque demasiadamente criacutetico e radical pela ideologia neoliberal
(SACHS 1986 VIEIRA 2006) O enfoque analiacutetico aqui apresentado
resgata o enfoque ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento enfatizando suas
trecircs dimensotildees (i) recursos naturais (ii) espaccedilo-territoacuterio e (iii) habitat
(compreendido como qualidade de vida)
No que se refere agrave primeira dimensatildeo satildeo consideradas as
contribuiccedilotildees do enfoque da gestatildeo de recursos comuns que vecircm
permeando o debate sobre os modos de apropriaccedilatildeo e gestatildeo No que diz
respeito agrave segunda dimensatildeo traz-se o enfoque do ecodesenvolvimento
territorial como uma possibilidade de operacionalizar o enfoque de
ecodesenvolvimento Por fim as contribuiccedilotildees agrave dimensatildeo do haacutebitat a
partir do enfoque de justiccedila ambiental e ecoloacutegica entendido como
capaz de contribuir na avaliaccedilatildeo da distribuiccedilatildeo dos benefiacutecios dos
riscos e danos ambientais assim como na reflexatildeo sobre redistribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo nas relaccedilotildees entre os seres humanos
destes com o meio ambiente com as futuras geraccedilotildees espeacutecies natildeo
humanas e processos ecossistecircmicos
O enfoque da gestatildeo de recursos comuns atraveacutes do Institutional Framework for Policy Analysis and Design (IAD) adaptado por
Oakerson (1992) oferece atraveacutes de quatro macro variaacuteveis uma forma
de descrever a gestatildeo de um dado recurso os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso as regras em uso que orientam a interaccedilatildeo dos
envolvidos na gestatildeo a arena de accedilatildeo que compreendem os espaccedilo nos
quais os envolvidos se relacionam e os resultados e consequecircncias da
gestatildeo A relaccedilatildeo entre essas macro variaacuteveis eacute dinacircmica e as mudanccedilas
da gestatildeo envolvem o aprendizado social adaptativo que se incorpora
ao modelo a partir das contribuiccedilotildees recentes do enfoque da cogestatildeo
adaptativa (ARMITAGE et al 2009 PLUMMER 2009 HOLLING
2001 BERKES 2009 CUNDILL 2010) Esse enfoque eacute importante
para o problema desta tese porque a descriccedilatildeo e anaacutelise das macro
variaacuteveis possibilita um diagnoacutestico e uma compreensatildeo mais ampla do
problema bem como um prognoacutestico avaliando estrateacutegias passiacuteveis de
serem colocadas em accedilatildeo visando a resoluccedilatildeo do problema inicial
46
A fim de complementar o enfoque da gestatildeo de recursos comuns
o enfoque do ecodesenvolvimento territorial reforccedila a ideia de que a
gestatildeo de recursos comuns deve ser analisada junto ao estilo de
desenvolvimento Para aleacutem da situaccedilatildeo especiacutefica do recurso
encontram-se as opccedilotildees de desenvolvimento que influenciam as macro
variaacuteveis acima listadas em todas as escalas espaciais do local ao global
(VIEIRA 2006)
Os enfoques da justiccedila ambiental e da justiccedila ecoloacutegica por sua
vez trazem a indissociabilidade da questatildeo ambiental e da questatildeo
democraacutetica enfatizando o fortalecimento do sistema democraacutetico como
condiccedilatildeo para a aprendizagem social adaptativa e como um caminho
para a reflexatildeo-accedilatildeo criacutetica em relaccedilatildeo agrave gestatildeo de recursos comuns e agraves
opccedilotildees de desenvolvimento A democracia (representativa e
participativa) eacute um ldquoelemento dardquo e uma ldquocondiccedilatildeo parardquo a justiccedila
ambiental e ecoloacutegica (SCHLOSBERG 2009)
No sistema democraacutetico eacute preciso identificar os mecanismos de
produccedilatildeo da injusticcedila ambiental entendida como distribuiccedilatildeo
desproporcional dos riscos e danos ambientais proteccedilatildeo ambiental
desigual e acesso desigual aos recursos naturais A justiccedila ambiental
centraliza sua anaacutelise na redistribuiccedilatildeo (que remete a aspectos
econocircmicos) e a justiccedila ecoloacutegica complementa com outras duas
dimensotildees o reconhecimento (que remete a aspectos culturais) e a
representaccedilatildeo (que remete a aspectos poliacuteticos) (FRASER 2009 2007
SCHLOSBERG 2009) A ampliaccedilatildeo da democracia e
consequentemente do aprendizado social adaptativo envolve estrateacutegias
dos segmentos sociais que considerem essas duas dimensotildees
Dessa forma o enfoque central utilizado nessa tese o
ecodesenvolvimento conta com as contribuiccedilotildees da gestatildeo de recursos
comuns do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila ambiental e da
justiccedila ecoloacutegica Mesmo diante da situaccedilatildeo-problema apresentada na
qual os problemas tendem a se acirrar com a ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica a combinaccedilatildeo dos enfoques permite aleacutem de um
diagnoacutestico visando compreender o problema a possibilidade de
atraveacutes do exame das dinacircmicas de desenvolvimento do sistema
democraacutetico e da aprendizagem social adaptativa identificar avanccedilos e
margens de manobra junto aos segmentos sociais que possibilitem o
questionamento da situaccedilatildeo e seu enfrentamento
47
Questotildees norteadoras
Por que apesar da evoluccedilatildeo do debate sobre os impactos
socioambientais da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral e dos avanccedilos
institucionais relacionados agrave questatildeo ambiental o sistema de geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral vem sendo ampliado em
Santa Catarina
Para auxiliar a questatildeo norteadora constam ainda as seguintes questotildees auxiliares
Quais condicionantes levam agrave ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica no Brasil e em Santa Catarina
Como as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento influenciam
as accedilotildees coletivas dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais
De que maneira os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais se
articulam para que a atividade carboniacutefera se mantenha e se
amplie
Como se deu o processo de licenciamento da Usitesc
Como se manifestam os problemas de reconhecimento e
representaccedilatildeo no processo de licenciamento
As accedilotildees coletivas estudadas tecircm gerado oportunidades para
processos de aprendizagem social adaptativa
Haacute indiacutecios de uma possiacutevel rota para uma democracia que
permita que os segmentos sociais intervenham efetivamente em
debates cada vez mais mediados por uma ciecircncia e tecnologia a
serviccedilo dos projetos dos segmentos econocircmicos e respaldados
pelos segmentos poliacuteticos
Hipoacuteteses
Partindo do pressuposto de que a democracia representativa e
participativa eacute um ldquoelemento dardquo e uma ldquocondiccedilatildeo parardquo a
justiccedila social ambiental e ecoloacutegica a falta de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e de representaccedilatildeo nos processos democraacuteticos
seria uma condiccedilatildeo favoraacutevel agrave produccedilatildeo de injusticcedila ambiental
48
e ecoloacutegica Dessa forma a hipoacutetese sustentada aqui eacute de que o
processo poliacutetico que resulta na ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica envolve problemas de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo nos processos democraacuteticos em
todas as escalas espaciais (nacional estadual regional e local)
tanto na modalidade representativa quanto na modalidade
participativa
A tomada de consciecircncia dos limites da democracia
representativa e da democracia participativa faz com que os
segmentos sociais passem a investir em accedilotildees autocircnomas
favorecendo a aprendizagem social adaptativa
Objetivos
Compreender as contradiccedilotildees inerentes agrave ampliaccedilatildeo do sistema de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral no Sul de
Santa Catarina agrave luz do enfoque hiacutebrido envolvendo gestatildeo de recursos
comuns ecodesenvolvimento territorial e justiccedila ambiental e ecoloacutegica
Como objetivos especiacuteficos destacam-se
Apontar as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento que
influenciam as accedilotildees coletivas dos segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais envolvidos na gestatildeo do carvatildeo mineral
Descrever a gestatildeo de recursos comuns no Brasil e em Santa
Catarina com ecircnfase no carvatildeo mineral
Compreender a maneira como os segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais envolvidos na gestatildeo se articulam em
relaccedilatildeo agrave gestatildeo de recursos comuns
Descrever o processo de licenciamento da Usitesc
Reconhecer os problemas de distribuiccedilatildeo reconhecimento e
representaccedilatildeo no processo de licenciamento e nas audiecircncias
puacuteblicas
Verificar ldquoserdquo e ldquocomordquo as accedilotildees coletivas estudadas tecircm
gerado oportunidades para processos de aprendizagem social
adaptativa e
49
Reconhecer indiacutecios de uma possiacutevel rota para uma democracia
que permita que os segmentos sociais intervenham efetivamente
em debates cada vez mais mediados por uma ciecircncia e
tecnologia a serviccedilo dos projetos dos segmentos econocircmicos e
respaldados pelos segmentos poliacuteticos
Justificativa
Satildeo muitos os caminhos que levam ateacute o tema e o problema da
tese Desde a apresentaccedilatildeo do projeto na ocasiatildeo do processo seletivo
da qualificaccedilatildeo agrave defesa e depois O permanente refletir duvidar
reconstruir o que se cristaliza no papel e vai aleacutem dele A aacuterdua tarefa de
tentar traduzir em palavras a dinacircmica complexa da qual todas e todos
satildeo parte
O tema do planejamento do desenvolvimento me acompanha
desde o mestrado e na ocasiatildeo da seleccedilatildeo do doutorado apresentei um
projeto cujo tema era planejamento e aquecimento global Nos anos
subsequentes nas oportunidades que tive para debater o projeto fui
desafiada a trazer o tema para a realidade do estado de Santa Catarina
E seguindo essa intuiccedilatildeo a partir da pesquisa exploratoacuteria entrei em
contato com o Manifesto por Justiccedila Climaacutetica formulado por
movimentos sociais do Sul de Santa Catarina que trazia a reflexatildeo sobre
as mudanccedilas climaacuteticas e a exploraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral para
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica no Sul de Santa Catarina Tive tambeacutem a
oportunidade de participar de uma saiacuteda de campo na bacia carboniacutefera
e ter contato direto com os impactos causados pela mineraccedilatildeo Essas
experiecircncias e as leituras foram gradativamente me ajudando a definir
o tema e o problema desta tese
Existe muito material jaacute produzido sobre a trajetoacuteria de
desenvolvimento e os impactos decorrentes da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo
mineral no Sul de Santa Catarina Aqui se objetivou uma breve siacutentese
de dados e de parte do material jaacute produzido pois a ecircnfase desta tese
recaiu sobre a identificaccedilatildeo de incoerecircncias na relaccedilatildeo entre as questotildees ambientais e o sistema democraacutetico mostrando que o funcionamento do
sistema poliacutetico eacute parte do problema e que as margens de manobra
existentes podem ser mais bem exploradas pelos movimentos sociais
que atuam na regiatildeo Como jaacute foi assinalado anteriormente apesar da
possibilidade de ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a
50
carvatildeo mineral no Sul de Santa Catarina o cenaacuterio atual eacute de
aguccedilamento dos conflitos bem maior do que nas deacutecadas anteriores
Nesse sentido a construccedilatildeo da USITESC eacute mais um elo de um
segmento que tem historicamente um caraacuteter eminentemente destrutivo
do ponto de vista socioecoloacutegico Resta confirmar se isto eacute um destino
inexoraacutevel em funccedilatildeo das caracteriacutesticas especiacuteficas da regiatildeo ou se
pode ser mudado num contexto de questionamento da loacutegica subjacente
agraves dinacircmicas do sistema democraacutetico que envolvem decisotildees sobre as
poliacuteticas ambientais energeacuteticas e poliacuteticas de desenvolvimento
No plano teoacuterico a contribuiccedilatildeo desta tese inscreve-se no
aprofundamento teoacuterico do enfoque ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento
agregando as contribuiccedilotildees dos enfoques da gestatildeo de recursos comuns
do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila ambiental e da justiccedila
ecoloacutegica O esforccedilo de juntar enfoques se justificou na medida em que
se um dos condicionantes da problemaacutetica socioambiental eacute a
fragmentaccedilatildeo do problema e a dificuldade de concebecirc-lo como
problema complexo (GARCIacuteA 1994) religar as perspectivas segundo
as quais observamos e analisamos a realidade faz parte tambeacutem das
estrateacutegias para o enfrentamento do problema
Dessa forma o diaacutelogo entre enfoques trouxe pontos de reflexatildeo
diferentes que enriqueceram a anaacutelise ao enfoque da gestatildeo de recursos
comuns a questatildeo das dinacircmicas de desenvolvimento e do sistema
poliacutetico ao ecodesenvolvimento territorial a preocupaccedilatildeo com a gestatildeo
de recursos comuns e com a desigualdade ambiental e agrave justiccedila
ambiental e ecoloacutegica a atenccedilatildeo agraves dinacircmicas de desenvolvimento e agrave
gestatildeo de recursos comuns Um ponto que merece destaque eacute o esforccedilo
recente das pesquisas sobre gestatildeo de recursos comuns e justiccedila
ambiental e ecoloacutegica de aplicar os enfoques para tratar as
especificidades do caso brasileiro Esta tese se inscreve como parte
desse esforccedilo
Outro ponto importante eacute a junccedilatildeo dos temas democracia e meio
ambiente no Brasil A democracia foi e eacute sem duacutevida um tema muito
caro agrave Sociologia brasileira e a inclusatildeo de um tema mais recente (o
meio ambiente) tambeacutem eacute considerada uma contribuiccedilatildeo possiacutevel dessa tese
Vale a pena ressaltar ainda que essa tese se insere nas atividades
realizadas pelos integrantes do Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio
Ambiente e Desenvolvimento (NMD) vinculado ao Programa de Poacutes-
51
Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica O Nuacutecleo atua no litoral Centro Sul
de Santa Catarina haacute mais de dez anos Dentre as atividades
desenvolvidas pelo NMD inclui-se a participaccedilatildeo no Observatoacuterio do
Litoral Catarinense que tem como objetivo
Organizar e coordenar uma rede de apoio teacutecnico-
cientiacutefico ao Ministeacuterio Puacuteblico Federal e
Estadual tendo em vista a promoccedilatildeo de um estilo
de gestatildeo democraacutetico-participativa de conflitos
relacionados agrave apropriaccedilatildeo dos recursos
ambientais existentes na zona costeira e o
consequente fortalecimento da cidadania
ambiental no Paiacutes (OBSERVATOacuteRIO DO
LITORAL 2010)
Como parte das atividades do Observatoacuterio do Litoral
Catarinense a realizaccedilatildeo de pesquisas sobre meio ambiente e
desenvolvimento auxilia na elaboraccedilatildeo de diagnoacutesticos e prognoacutesticos e
pode favorecer a mobilizaccedilatildeo jaacute que a visibilidade dos problemas
existentes pode estimular a criaccedilatildeo de redes visando a criaccedilatildeo de
estrateacutegias integradas para enfrentamento dos problemas
Essa tese tambeacutem faz parte de um esforccedilo mais amplo de
pesquisa articulado pelo edital da Coordenadoria de Aperfeiccediloamento de
Pessoal de Niacutevel Superior (CAPES) Ciecircncias do Mar tendo como tema
a Gestatildeo Integrada e Compartilhada de Territoacuterios Marinho-Costeiros O projeto possibilitou o compartilhamento do objeto de estudo do
marco conceitual e epistecircmico e a articulaccedilatildeo dos estudos entre os
membros da equipe
Em siacutentese dentre os possiacuteveis aspectos inovativos do trabalho
destacam-se do ponto de vista praacutetico o olhar sobre a questatildeo da
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral a partir do
funcionamento do sistema democraacutetico a identificaccedilatildeo dos
condicionantes da ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica em
diferentes escalas e consequentemente o reconhecimento de limites e
das possibilidades do sistema democraacutetico e da aprendizagem social
adaptativa Do ponto de vista teoacuterico destacam-se o diaacutelogo entre os
enfoques e a aplicaccedilatildeo dos enfoques agraves especificidades brasileiras
Metodologia
52
O agravamento dos problemas socioambientais tem povoado o
debate nos campos de especializaccedilatildeo cientiacutefica seja para a criaccedilatildeo de
novas disciplinas seja para ir aleacutem da fragmentaccedilatildeo disciplinar ldquoA
problemaacutetica socioambiental constituiacute um vigoroso instrumento de
integraccedilatildeo de conceitos teorias e meacutetodos desenvolvidos em
praticamente todas as especialidades cientiacuteficasrdquo (VIEIRA 1993 p
26) A epistemologia das ciecircncias ambientais entra como uma
importante contribuiccedilatildeo para a pesquisa ambiental Ela considera a
complexidade inerente agrave crise socioambiental privilegiando uma visatildeo
integrada do problema socioecoloacutegico e da ciecircncia no acircmbito do novo
paradigma sistecircmico Neste sentido a busca de integraccedilatildeo inter e
transdisciplinar do conhecimento emerge como um elemento essencial
no enfrentamento da crise (GARCIacuteA 1994 JOLLIVET PAVEacute 2000
MORIN 2002)
A tese aqui apresentada se insere nesse esforccedilo de pesquisa Para
tanto a construccedilatildeo da tese considerou sete etapas (a pergunta de partida
a exploraccedilatildeo a problemaacutetica a construccedilatildeo do modelo de anaacutelise a
observaccedilatildeo a anaacutelise das informaccedilotildees e as conclusotildees) segundo os trecircs
princiacutepios do procedimento cientiacutefico em ciecircncias sociais (ruptura
construccedilatildeo e verificaccedilatildeo) (BOURDIEU CHAMBOREDON
PASSERON 2004 QUIVY CAMPENHOUDT 1998)
Apesar de haver uma sequecircncia loacutegica as etapas subsequentes
influenciaram a reelaboraccedilatildeo das etapas precedentes As etapas
estiveram ao longo do processo em permanente interaccedilatildeo (QUIVY
CAMPENHOUDT 1998)
Se eacute evidente que os automatismos adquiridos
podem permitir a economia de uma invenccedilatildeo
permanente devemos nos abster de deixar crer
que o sujeito da invenccedilatildeo cientiacutefica eacute um
automaton spirituale obedecendo aos
mecanismos bem ajustados de uma programaccedilatildeo
metodoloacutegica constituiacuteda uma vez por todas e
confinar dessa forma o pesquisador na submissatildeo
cega ao programa que exclui o retorno reflexivo
ao mesmo condiccedilatildeo da invenccedilatildeo de novos
programas (BOURDIEU CHAMBOREDON
PASSERON 2004 p 15)
53
Dessa forma a evoluccedilatildeo dessa tese natildeo foi linear As quatro
primeiras etapas (a pergunta de partida a exploraccedilatildeo a problemaacutetica e a
construccedilatildeo do modelo de anaacutelise) jaacute apresentadas nessa introduccedilatildeo satildeo
tratadas a seguir de forma a indicar como se deu o processo de sua
construccedilatildeo
1ordf etapa (A pergunta de partida) Foi sendo elaborada e
reelaborada ao longo das vaacuterias etapas da pesquisa
2ordf etapa (A exploraccedilatildeo) Essa etapa compreendeu conversas com
o orientador leituras e entrevistas exploratoacuterias Nessa etapa destacou-se
uma saiacuteda de campo no ano de 2010 agrave Bacia do Rio Araranguaacute
supervisionada pelo Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes e Profordf Drordf
Vanilde Citadini Zanette da Universidade do Extremo Sul Catarinense
(UNESC) Essa saiacuteda de campo foi fundamental para despertar o
interesse pelo problema da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral no Sul do
Estado
Foi feita uma entrevista exploratoacuteria com Tadeu Santos da
Organizaccedilatildeo Natildeo Governamental (ONG) Soacutecios da Natureza com sede
em Araranguaacute e conversas informais com estudantes da Poacutes-Graduaccedilatildeo
em Auditoria e Periacutecia Ambiental da UNESC em 2010 e 2012
Etapa 3 (A problemaacutetica) e Etapa 4 (A construccedilatildeo do modelo de
anaacutelise) Destacam-se tambeacutem nessa fase aleacutem das conversas com o
orientador as leituras e o esforccedilo de preparaccedilatildeo do projeto para
qualificaccedilatildeo que ocorreu em 2011 contando com as contribuiccedilotildees do
Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes da UNESC do Prof Dr Luiz
Fernando Scheibe do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Geografia da
Universidade Federal de Santa Catarina e da Profordf Drordf Janice Pontes
Tirelli do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica da UFSC
O projeto foi tambeacutem discutido no acircmbito do NMD em alguns
seminaacuterios de pesquisa na disciplina de Ecologia Humana (ministrada
pela ProfordfDrordf Marcia Grisotti e pelo Prof Dr Fernando Dias Aacutevila
Pires) em 2010 nas duas disciplinas de seminaacuterio de pesquisa uma
ministrada pela Profordf Drordf Elizabeth Farias da Silva (na qual o projeto
foi debatido pelo Prof Dr Daniel Silva) e outra ministrada pelo Prof
Dr Raul Burgos no ano de 2011 O projeto tambeacutem foi apresentado e debatido no Nuacutecleo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional (NPDR)
da Universidade Regional de Blumenau (FURB) coordenado pelo Prof
Dr Ivo Marcos Theis e em dois eventos do Projeto Gestatildeo Integrada e Compartilhada de Territoacuterios Marinho-Costeiros em 2011 e 2012
54
Etapa 5 ndash A observaccedilatildeo Nessa etapa o modelo de anaacutelise foi
submetido aos fatos e confrontado com os dados observaacuteveis Aqui satildeo
respondidas as questotildees baacutesicas o que foi observado Em que observou-se E como observou-se
O procedimento da pesquisa foi bibliograacutefico e documental Na
pesquisa bibliograacutefica foram selecionadas fontes secundaacuterias (obras e
artigos) que tratavam do tema de estudo jaacute reconhecidas no domiacutenio
cientiacutefico e na pesquisa documental foram priorizadas fontes primaacuterias
(escritas e audiovisuais) que ateacute entatildeo natildeo haviam recebido tratamento
cientiacutefico (SAacute-SILVA ALMEIDA GUIDANI 2009)
Os discursos da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo
Mineral foram acessados atraveacutes de consulta agrave Cacircmara de Deputados
pelo correio eletrocircnico Os dados sobre prestaccedilatildeo de contas eleitorais
foram acessados atraveacutes do banco de dados online do TSE O processo
de licenciamento da USITESC arquivado na FATMA conta com oito
volumes e 1617 paacuteginas e com arquivos audiovisuais de duas das quatro
audiecircncias puacuteblicas (FATMA 2013) Das quatro audiecircncias puacuteblicas
realizadas soacute foram disponibilizadas as gravaccedilotildees da terceira e da quarta
audiecircncia (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006 2007) Segundo informaccedilatildeo
da FATMA a primeira e a segunda audiecircncia puacuteblica foram gravadas em
VHS e foram danificadas pela accedilatildeo do tempo
A descriccedilatildeo das macro variaacuteveis (as dinacircmicas de
desenvolvimento os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos as regras em uso a
arena de accedilatildeo e os resultadosconsequecircncias) foi feita atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica a fontes secundaacuterias (obras e artigos) Jaacute a
variaacutevel do sistema democraacutetico contou com fontes primaacuterias os
discursos da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral na
Cacircmara dados sobre prestaccedilatildeo de contas eleitoral do Tribunal Superior
Eleitoral e os documentos referentes ao processo de licenciamento
ambiental da USITESC arquivados na FATMA
Na arena de accedilatildeo um primeiro passo foi descrever os envolvidos
na gestatildeo Para tanto os envolvidos foram divididos em segmentos
poliacuteticos econocircmicos e sociais que por sua vez foram subdivididos Os
segmentos poliacuteticos em executivo parlamento e autocircnomo os segmentos econocircmicos em associaccedilotildees empresariais e mistas e empresas
e cooperativas e os segmentos sociais em trabalhadores
afetadosatingidosameaccedilados ONG e academia (Quadro 1) Os
segmentos natildeo apresentam um posicionamento homogecircneo em relaccedilatildeo
ao tema da tese Ao longo do texto a preocupaccedilatildeo eacute tambeacutem de
55
explicitar os diferentes posicionamentos entre e no interior de cada
segmento
Quadro 1 ndash Divisatildeo dos envolvidos na gestatildeo por segmentos SEGMENTOS ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO
Poliacuteticos Executivo
Parlamento
Autocircnomo
Econocircmicos Associaccedilotildees empresariais e mistas
Empresas
Cooperativas
Sociais Trabalhadores
AfetadosAtingidosAmeaccedilados
Organizaccedilotildees Natildeo Governamentais
Academia
Fonte baseada em Oliveira (2013)
A existecircncia de afetados atingidos e ameaccedilados se inscreve no
reconhecimento e legitimaccedilatildeo de direitos A legislaccedilatildeo ambiental faz
com que os impactos passem a ser considerados e se existem impactos
existem seres humanos que satildeo afetados atingidos e ameaccedilados
(VAINER 2008) A distinccedilatildeo entre os termos afetados atingidos e
ameaccedilados remete agrave proximidade dos seres humanos em relaccedilatildeo aos
impactos Nos afetados o impacto fica num limiar tecircnue entre o direto e
indireto nos atingidos o impacto eacute direto e nos ameaccedilados o impacto eacute
potencialmente indireto
Uma variaacutevel importante na arena de accedilatildeo eacute a democracia que
por sua vez envolve a questatildeo da representaccedilatildeo e da participaccedilatildeo A
expressatildeo cidadatilde atraveacutes da representaccedilatildeo se daacute principalmente nas
eleiccedilotildees plebiscitos e conselhos Jaacute a expressatildeo mediante participaccedilatildeo
pode ser accedilatildeo sob convite (planejamento participativo consulta puacuteblica
e mediaccedilatildeo) e accedilatildeo autocircnoma (lobby peticcedilotildees manifestaccedilotildees
campanhas na imprensa outros) (Figura 1) (SAacuteNCHEZ 2008b)
56
Figura 1ndash Tipologia das formas de expressatildeo do cidadatildeo numa
democracia
Fonte Adaptado de Sagravenchez (2008b p 409)
Na anaacutelise do sistema democraacutetico foi importante identificar as
dimensotildees da justiccedila ambiental (redistribuiccedilatildeo) e da justiccedila ecoloacutegica
(reconhecimento e representaccedilatildeo) ldquoO natildeo reconhecimento eacute uma
questatildeo de impedimentos externamente manifestados e publicamente
verificaacuteveis a que certos indiviacuteduos sejam membros integrais da
sociedaderdquo (FRASER 2007 p 114) O centro normativo da concepccedilatildeo
de Fraser (2007) eacute a paridade de participaccedilatildeo que demanda uma
condiccedilatildeo objetiva e outra intersubjetiva A condiccedilatildeo objetiva ldquoexclui formas e niacuteveis de desigualdade material e dependecircncia econocircmica que
impedem a paridade de participaccedilatildeordquo (FRASER 2007 p 119) A
condiccedilatildeo intersubjetiva ldquoexclui normas institucionalizadas que
sistematicamente depreciam algumas categorias de pessoas e as
caracteriacutesticas associadas a elasrdquo (FRASER 2007 p 120)
57
Quadro 2 - Quadro de anaacutelise do sistema democraacutetico agrave luz da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica
DIMENSOtildeES DO SISTEMA
DEMOCRAacuteTICO
ESTRATEacuteGIAS DA JUSTICcedilA
AMBIENTAL E ECOLOacuteGICA
- Redistribuiccedilatildeo
- Reconhecimento e
- Representaccedilatildeo
- Produccedilatildeo do conhecimento proacuteprio
- Pressatildeo pela aplicaccedilatildeo universal das
leis
- Pressatildeo pelo aperfeiccediloamento da
legislaccedilatildeo de ambiental
- Pressatildeo por novas racionalidades no
exerciacutecio do poder estatal
- Introduccedilatildeo de procedimentos de
avaliaccedilatildeo de equidade ambiental
- Accedilatildeo direta e difusatildeo espacial do
movimento
Fonte Adaptado de Acselrad Mello Bezerra (2009) e Fraser (2009
2007)
As dimensotildees e estrateacutegias da justiccedila ambiental e ecoloacutegica
presentes no Quadro acima entraram no modelo de anaacutelise dessa tese
como indicadores da aprendizagem social adaptativa
Quanto aos meacutetodos de anaacutelise priorizou-se a anaacutelise estatiacutestica e
a anaacutelise do discurso Anaacutelise estatiacutestica privilegiou a interpretaccedilatildeo dos
dados atraveacutes do modelo de anaacutelise buscando ir aleacutem da mera exposiccedilatildeo
de resultados A anaacutelise do discurso aqui proposta ficou num limiar
entre essa modalidade e a anaacutelise de conteuacutedo As categorias utilizadas
estatildeo dispostas no quadro da paacutegina 56 Elas orientaram a seleccedilatildeo de
passagens relevantes nas audiecircncias puacuteblicas analisadas com o
propoacutesito de revelar aspectos da atividade cognitiva do locutor dos
significados sociais e poliacuteticos do discurso (GILL 2002 QUIVY
CAMPENHOUDT 1998 RESENDE RAMALHO 2006)
O processo da tese aqui descrito natildeo foi linear Para Quivy e
Campenhoudt (1998 p 236) ldquoum processo de diaacutelogo e de vaiveacutens
permanentes entre teoria e empirismo mas tambeacutem entre construccedilatildeo e
intuiccedilatildeo que estatildeo mais imbricadasrdquo
As etapas 6 e 7 (Anaacutelise de informaccedilotildees e Conclusotildees)
correspondem ao ldquocorpordquo da tese apresentado na sequecircncia
58
Estrutura da tese
Essa tese foi dividida em sete capiacutetulos O primeiro capiacutetulo eacute
esta introduccedilatildeo dedicada agrave siacutentese dos principais pontos que nortearam a
tese O segundo capiacutetulo busca resgatar a contribuiccedilatildeo do enfoque
ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento agregando com o enfoque da gestatildeo
de recursos comuns do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica elementos que satildeo incorporados no modelo de
anaacutelise e que conferem uma atualidade maior agrave discussatildeo No terceiro
capiacutetulo e quarto capiacutetulo eacute feita uma descriccedilatildeo da gestatildeo de recursos
comuns do Brasil e de Santa Catarina enfatizando as particularidades do
carvatildeo mineral A preocupaccedilatildeo presente nos dois capiacutetulos eacute de realizar
um balanccedilo dos fatores que estimulam a ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral e os fatores que podem favorecer
o questionamento da ampliaccedilatildeo bem como tratar dos limites e
possibilidades do sistema democraacutetico e possibilidades de aprendizagem
social adaptativa O quinto capiacutetulo trata da rede de influecircncia entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos no campo da democracia
representativa tratando a relaccedilatildeo entre doaccedilotildees de campanha e apoio
poliacutetico a causa do carvatildeo mineral O sexto capiacutetulo trata da ampliaccedilatildeo
da energia termeleacutetrica atraveacutes do caso da USITESC no Sul de Santa
Catarina buscando atraveacutes da anaacutelise do processo de licenciamento
compreender os condicionantes locais da ampliaccedilatildeo O seacutetimo e uacuteltimo
capiacutetulo faz uma siacutentese dos principais pontos discutidos na tese
2 A ATUALIDADE DO ECODESENVOLVIMENTO NO ESTUDO
CONTEMPORAcircNEO SOBRE GESTAtildeO DE RECURSOS
COMUNS
O surgimento de uma problemaacutetica de pesquisa envolve o
amadurecimento dos olhares com os quais se observa analisa e
empreende esforccedilos para transformar a realidade A problemaacutetica
socioambiental natildeo surge em um lugar especiacutefico e num tempo
determinado Surge em paiacuteses diferentes em eacutepocas diferentes As
formas variadas de delimitaccedilatildeo da situaccedilatildeo-problema e da construccedilatildeo da
problemaacutetica correspondente envolvem as diferentes percepccedilotildees dos
cidadatildeos bem como o protagonismo dos foacuteruns locais e movimentos
sociais o envolvimento da comunidade cientiacutefica e a busca de respostas
poliacuteticas agrave altura dos desafios identificados
No final da deacutecada de 1960 a problemaacutetica socioambiental
assume um perfil de crise global ensejando a realizaccedilatildeo de vaacuterios
eventos sobre o tema Numa visatildeo retrospectiva e criacutetica do surgimento
do Clube de Roma em 1968 agrave realizaccedilatildeo da Rio +20 em 2012 muitos
avanccedilos e retrocessos podem ser apontados no espectro que se estende
do questionamento radical do estilo de desenvolvimento hegemocircnico
visto como condicionante da crise socioambiental agrave incorporaccedilatildeo da
crise soacutecio ecoloacutegica na reproduccedilatildeo da loacutegica economicista no campo do
planejamento e da gestatildeo das experiecircncias de gestatildeo dos recursos
comuns agrave caracterizaccedilatildeo da Trageacutedia dos Comuns (HARDIN 1980)
das denuacutencias de injusticcedila ambiental e ecoloacutegica agrave constataccedilatildeo da
violecircncia estrutural embutida na persistecircncia das assimetrias de riqueza
e poder envolvendo os dois hemisfeacuterios (ESTEVA 2001 FENNY et
al 2001 SACHS 1993)
Desde sua origem um desafio que acompanha essa problemaacutetica
refere-se agrave dificuldade de se lidar (na pesquisa cientiacutefica e nos espaccedilos
de tomada de decisatildeo poliacutetica) com dinacircmicas natildeo lineares de
dinamizaccedilatildeo socioeconocircmica e recriaccedilatildeo cultural envolvendo para tanto
a coordenaccedilatildeo de processos transescalares num horizonte de
planejamento de longo prazo Neste contexto vem se tornando cada vez mais evidente a capacidade ainda bastante restrita de cientistas gestores
e agentes governamentais de compreender e tratar a complexidade
inerente agrave teia de interdependecircncias que configura a coordenaccedilatildeo da
dinacircmica de sistemas socioecoloacutegicos que envolve diferentes niacuteveis e
escalas espaciais (BERKES FOLKE 1998 CASHet al 2006)
60
Levando em conta essas consideraccedilotildees gerais o objetivo deste
capiacutetulo eacute discutir a atualidade do enfoque de ecodesenvolvimento e por
implicaccedilatildeo da necessidade de dotaacute-lo da capacidade de assegurar a
coerecircncia das regras que norteiam a gestatildeo dos modos de apropriaccedilatildeo
dos recursos comuns nas diferentes escalas espaciais Parte-se assim da
premissa segundo a qual a efetividade de experiecircncias compatiacuteveis com
os fundamentos deste enfoque dependeraacute de uma consideraccedilatildeo mais
precisa do papel da democracia e da aprendizagem social adaptativa nos
processos de gestatildeo de recursos comuns Para tanto leva-se em conta o
lento processo de elaboraccedilatildeo do enfoque ldquoclaacutessicordquo de
ecodesenvolvimento com a incorporaccedilatildeo sucessiva dos debates sobre (i)
gestatildeo de recursos comuns (ii) ecodesenvolvimento territorial e (iii)
justiccedila ambiental e ecoloacutegica
Em siacutentese defende-se o ponto de vista segundo o qual a gestatildeo
de recursos comuns internaliza os criteacuterios de promoccedilatildeo da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica na produccedilatildeo-reproduccedilatildeo-superaccedilatildeo da siacutendrome
de violecircncia estrutural que caracteriza a dinacircmica de globalizaccedilatildeo
assimeacutetrica Por sua vez o enfoque de ecodesenvolvimento territorial
focaliza este debate de uma perspectiva mais ampla insistindo na
complexidade envolvida na construccedilatildeo de dinacircmicas territoriais de
desenvolvimento ecologicamente prudente no atual cenaacuterio ldquopoacutes-
fordistardquo
O capiacutetulo estaacute dividido em quatro seccedilotildees contando com essa
introduccedilatildeo A seccedilatildeo seguinte delineia o contexto de emergecircncia da
problemaacutetica socioambiental e do enfoque de ecodesenvolvimento Na
sequecircncia satildeo apresentadas as dimensotildees do conceito sistecircmico de meio
ambiente assumidas pelos estudiosos do ecodesenvolvimento
relacionando-as com as maneiras pelas quais as linhas de reflexatildeo sobre
gestatildeo de recursos comuns ecodesenvolvimento territorial e justiccedila
ambiental e ecoloacutegica focalizam suas anaacutelises Finalmente na quarta
seccedilatildeo avaliam-se as possibilidades e os limites de um esforccedilo de
hibridizaccedilatildeo dessas vaacuterias linhas de reflexatildeo tendo em vista uma
caracterizaccedilatildeo mais rigorosa do conceito de co-gestatildeo adaptativa face agraves
novas configuraccedilotildees do processo de globalizaccedilatildeo econocircmica e cultural
61
21 RESGATE DO ENFOQUE ldquoCLAacuteSSICOrdquo DE
ECODESENVOLVIMENTO
Mar que se encontra na beira do mar congelado do
Norte No inverno todas as palavras e sons da
regiatildeo satildeo congelados na primavera comeccedilam a
degelar e podem ser claramente ouvidos Os
viajantes podem apanhar as palavras congeladas
que se parecem com doces cristalizados de vaacuterias
cores (Franccedilois Rabelais 1991)
A percepccedilatildeo de que a crise socioambiental decorre
fundamentalmente da reproduccedilatildeo de um estilo de desenvolvimento que
hipertrofia a dimensatildeo do crescimento econocircmico ilimitado e eacute
insensiacutevel a uma avaliaccedilatildeo multidimensional de custos sociais e
ecoloacutegicos passou a ser discutida em vaacuterios encontros internacionais
desde o final da deacutecada de 1960 Vaacuterios termos foram sendo criados nos
debates que vecircm sendo conduzidos desde entatildeo Alguns deles foram
esquecidos e outros foram ressignificados visando pontuar as criacuteticas
mais ou menos radicais ao modelo neoliberal hegemocircnico O resgate
dessa polissemia contribui para alimentar a reflexatildeo contemporacircnea e o
aprendizado obtido ao longo das quatro uacuteltimas deacutecadas na concepccedilatildeo
de estrateacutegias de superaccedilatildeo deste modelo Alguns termos atualizam o
modelo de desenvolvimento hegemocircnico incorporando marginalmente
a questatildeo socioecoloacutegica outros se abrem a experimentaccedilotildees criativas
com projetos que subvertem o mainstream da economia do
desenvolvimento O ecodesenvolvimento e o desenvolvimento
sustentaacutevel tratados nessa seccedilatildeo representam dois contrapontos desse
movimento sem duacutevida incerto e controvertido
Maurice Strong utilizou pela primeira vez o conceito de
ecodesenvolvimento no contexto da Conferecircncia de Estocolmo
organizada pela ONU em 1972 A ideia foi reelaborada e sistematizada
de forma pioneira num artigo publicado por Ignacy Sachs em 19741 na
eacutepoca atuando como coordenador do primeiro coletivo interdisciplinar
de pesquisa sistecircmica voltada para a internalizaccedilatildeo da variaacutevel
socioecoloacutegica no campo das teorias do desenvolvimento Deste ponto
1 Em um estudo que foi realizado no acircmbito do Programa das Naccedilotildees Unidas
para o Meio Ambiente (PNUMA) no ano referido e reproduzido em Sachs
(1986 2007)
62
de vista a noccedilatildeo de ecodesenvolvimento foi veiculada como uma
resposta possiacutevel de caraacuteter experimental agrave ideologia que identifica o
desenvolvimento com a supervalorizaccedilatildeo do crescimento econocircmico
sobre o pano de fundo de uma visatildeo tecnocraacutetica dos sistemas de
planejamento e gestatildeo Na contramatildeo do modelo de desenvolvimento
hegemocircnico o enfoque de ecodesenvolvimento foi desenhado com base
numa plataforma normativa composta pelos seguintes criteacuterios
interdependentes (i) satisfaccedilatildeo de necessidades baacutesicas (materiais e
intangiacuteveis) (ii) autonomia local (ou self reliance) (iii) prudecircncia
ecoloacutegica e (iv) eficiecircncia econocircmica a ser reavaliada com base no
debate sobre limites do crescimento material e da prospectiva ecoloacutegica
(SACHS 1986)
O Coloacutequio de Cocoyoc realizado no Meacutexico em 1974
significou uma tentativa bem sucedida de reenfatizar a importacircncia da
dimensatildeo geopoliacutetica na estruturaccedilatildeo do arcabouccedilo metodoloacutegico do
enfoque de ecodesenvolvimento Acreditava-se assim que ldquouma luta
efetiva contra o subdesenvolvimento demandaria o questionamento do
sobredesenvolvimento dos ricosrdquo (SACHS 2009 p 243) Naquela
eacutepoca falar em contracultura e natildeo-crescimento em natildeo repetir nos
paiacuteses do Sul o mesmo caminho percorrido pelos paiacuteses
industrializados num cenaacuterio marcado pela Guerra Fria parecia no
miacutenimo um gesto inconsequente e provocativo Desde entatildeo o conceito
foi eclipsado no acircmbito do sistema onusiano Mas ressurgiu com novas
roupagens vinte anos depois por ocasiatildeo da Cuacutepula da Terra Os
conceitos de desenvolvimento sustentaacutevel e Agenda 21 passaram a
representar os dois principais pontos de referecircncia do debate social
voltado para o enfrentamento da crise global (SACHS 2009 SACHS
2007 VIEIRA 2005)
Seria importante salientar que o Relatoacuterio Nosso Futuro Comum
publicado pela Comissatildeo Brundtland em1987 contribuiu para
aprofundar a discussatildeo em torno do conceito de sustentabilidade Este
texto enfatiza a necessidade de se colocar em primeiro plano nas
agendas governamentais a busca de satisfaccedilatildeo das necessidades da
geraccedilatildeo atual mas sem desconsiderar as geraccedilotildees futuras (CMMAD
1988)
Existem certamente semelhanccedilas entre os conceitos de
ecodesenvolvimento e desenvolvimento sustentaacutevel na medida em que
ambos colocam em primeiro plano a adoccedilatildeo de uma visatildeo de longo
prazo na busca de enfrentamento da crise socioecoloacutegica e de uma
63
incorporaccedilatildeo sistemaacutetica dos atores locais nos processos de tomada de
decisatildeo sobre dinacircmicas alternativas de desenvolvimento Mas apesar
das semelhanccedilas existem diferenccedilas marcantes que tecircm sido objeto de
um volume crescente de contribuiccedilotildees acadecircmicas As mais importantes
referem-se ao contraste entre a radicalidade embutida na cosmovisatildeo
sistecircmico-complexa assumida pelos adeptos do ecodesenvolvimento e o
vieacutes de ldquoeconomicizaccedilatildeo da ecologiardquo que continua a nortear as
propostas dos arquitetos de uma ldquoeconomia verderdquo Satildeo evidentes os
reflexos desse debate na maneira de se levar em conta as assimetrias
Norte-Sul a promoccedilatildeo da equidade inter e transgeracional os riscos
embutidos nas inovaccedilotildees tecnoloacutegicas inspiradas na siacutendrome de
mercantilizaccedilatildeo indiscriminada de todas as dimensotildees da vida em
sociedade e a hipertrofia da economia de mercado na dinacircmica de
mundializaccedilatildeo
A experimentaccedilatildeo de estrateacutegias de ecodesenvolvimento vem sendo
associada ao questionamento dos fundamentos epistemoloacutegicos eacuteticos e
poliacuteticos do modelo de desenvolvimento que se tornou hegemocircnico nos
dois hemisfeacuterios para aleacutem da ldquooacutetica simplificadora e alienada dos
paradigmas culturais dominantesrdquo (VIEIRA 2005 p 357) Dessa
forma contesta o efeito de imitaccedilatildeo deste modelo pelos paiacuteses do Sul
apostando na fecundidade da pesquisa de um novo projeto civilizador
inspirado numa nova cosmologia e nos princiacutepios de ecossocioeconomia
e convivialidade (LAYRARGUES 1997 SACHS 2007 KAPP 1987
ILLICH 1973)
22 AS CONTRIBUICcedilOtildeES DE DIFERENTES ENFOQUES
Como foi sugerido o ecodesenvolvimento pode ser encarado
como ponto de partida para a reflexatildeo-elaboraccedilatildeo-implementaccedilatildeo de
novos projetos de sociedade e como ponto de convergecircncia das linhas
de reflexatildeo centradas nas noccedilotildees de gestatildeo de recursos comuns
territorializaccedilatildeo das dinacircmicas de desenvolvimento e justiccedila ambientalecoloacutegica O desenho e a concretizaccedilatildeo de estrateacutegias de
gestatildeo levam em conta as dimensotildees essenciais do conceito sistecircmico de meio ambiente incorporado ao modelo de anaacutelise de alternativas de
desenvolvimento territorializado a saber a base de recursos naturais o
espaccedilo-territoacuterio e a qualidade dos haacutebitats (GODARD SACHS 1975
SACHS 1993 1986 VIEIRA 2005 1993) Dessa forma
64
() o ambiente eacute concebido como um fornecedor
de recursos naturais e um receptor de dejetos da
accedilatildeo antroacutepica um espaccedilo-territoacuterio onde
ocorrem as interaccedilotildees entre processos sociais e
ecoloacutegicos e um haacutebitat pensado em sentido
amplo integrando a dimensatildeo da qualidade de
vida das populaccedilotildees (VIEIRA 2006 p 346)
No quadro abaixo essas dimensotildees encontram-se relacionadas
com as trecircs linhas de reflexatildeo que aqui foram incorporadas ao enfoque
de ecodesenvolvimento
Quadro 3 ndash O enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento e as
dimensotildees baacutesicas do conceito sistecircmico de meio ambiente Enfoque central Ecodesenvolvimento
Dimensotildees do
conceito de meio
ambiente
Recursos
naturais Espaccedilo-territoacuterio
Haacutebitat-
qualidade de
vida
Enfoques
complementares
Gestatildeo de
recursos comuns
Desenvolvimento
territorial
Justiccedila ambiental
e ecoloacutegica
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na perspectiva do enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento a
dimensatildeo dos recursos naturais refere-se agrave busca de preservaccedilatildeo e
economia de recursos renovaacuteveis e natildeo renovaacuteveis de valorizaccedilatildeo de
recursos locais subutilizados eou ainda desconhecidos e de promoccedilatildeo
da soberania alimentar e energeacutetica O enfoque de gestatildeo de recursos
comuns ao oferecer uma nova perspectiva de abordagem dos desafios
colocados pela regulaccedilatildeo das modalidades de acesso e uso da base de
recursos naturais pode ser tomado como um ponto de referecircncia Nessa
perspectiva o termo recurso comum avanccedila em relaccedilatildeo aos termos
recurso natural renovaacutevel e recurso natural natildeo renovaacutevel O fato de
serem renovaacuteveis ou natildeo tem relaccedilatildeo com a disponibilidade e
reprodutibilidade dos recursos O termo recurso comum envolve duas
caracteriacutesticas baacutesicas a exclusatildeo ou controle do acesso que eacute
problemaacutetica e o uso que se faz do recurso subtrai aquilo que pertence a todos que tambeacutem coloca em questatildeo o uso compartilhado (BERKES
2005a) As pesquisas em curso ressaltam a importacircncia da participaccedilatildeo
das populaccedilotildees nas tomadas de decisatildeo e da consideraccedilatildeo da
65
complexidade envolvida nas interaccedilotildees transescalares nas dinacircmicas de
planejamento e gestatildeo (VIEIRA 2005)
Por sua vez na internalizaccedilatildeo da dimensatildeo do espaccedilo-territoacuterio a
ecircnfase eacute colocada na organizaccedilatildeo territorial das atividades produtivas
tendo em vista a minimizaccedilatildeo dos desequiliacutebrios nas configuraccedilotildees
rural-urbanas ndash a exemplo do ecircxodo rural e da hiperurbanizaccedilatildeo O
ecodesenvolvimento territorial sensiacutevel agrave variaacutevel socioecoloacutegica acena
com a inclusatildeo da dimensatildeo territorial no planejamento de novas
estrateacutegias de desenvolvimento favorecendo assim o enfrentamento dos
problemas de compatibilidade entre diferentes tipos de atividades
econocircmicas e os demais aspectos que compotildeem a dinacircmica de
coordenaccedilatildeo das interaccedilotildees sociais (GODARD SACHS 1975
VIEIRA et al 2010 VIEIRA 2005)
Finalmente a dimensatildeo do haacutebitat refere-se agrave gestatildeo da qualidade
de vida das populaccedilotildees Converge para os estudos da ecologia humana e
justiccedila ambiental e ecoloacutegica que demonstram ser necessaacuterio considerar
as condiccedilotildees ambientais de existecircncia direitos sociais e trabalhistas
direitos de seguranccedila e integridade fiacutesica direitos de informaccedilatildeo
educaccedilatildeo e auto-realizaccedilatildeo direitos de participaccedilatildeo democraacutetica e
cidadania poliacutetica Neste contexto as noccedilotildees de justiccedila ambiental e
ecoloacutegica alimentam um novo tipo de questionamento da
produccedilatildeoreproduccedilatildeo das relaccedilotildees desiguais entre os seres humanos e
destes com o meio ambiente assim como dos seres humanos com as
futuras geraccedilotildees espeacutecies natildeo humanas e processos ecossistecircmicos
(DANSEREAU 1999 LEROY et al 2002 LOW GLEESON 1998
SCHLOSBERG 2009) ldquoA noccedilatildeo de justiccedila ambiental implica pois o
direito a um meio ambiente seguro sadio e produtivo para todos onde o
lsquomeio ambientersquo eacute considerado em sua totalidade incluindo suas
dimensotildees ecoloacutegicas fiacutesicas construiacutedas sociais poliacuteticas esteacuteticas e
econocircmicasrdquo (ACSELRAD MELLO BEZERRA 2009 p 16)
Em siacutentese o resgate do processo de complexificaccedilatildeo progressiva
do enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento permite a obtenccedilatildeo de
uma imagem mais niacutetida das contribuiccedilotildees oferecidas por outras linhas
de teorizaccedilatildeo sobre o planejamento de dinacircmicas alternativas de
desenvolvimento que corporificam diferentes olhares sobre a crise
socioambiental As trecircs dimensotildees do conceito de meio ambiente
mencionadas acima trazem agrave tona as inter-relaccedilotildees entre processos
naturais e sociais e a escolha de ldquofuturos possiacuteveisrdquo no campo das
dinacircmicas de desenvolvimento Mas resta incorporar agrave linha de
66
argumentaccedilatildeo os subitens correspondentes a contribuiccedilatildeo dos trecircs
enfoques ao ecodesenvolvimento
221 Gestatildeo de recursos comuns a importacircncia da aprendizagem
social adaptativa
O presente enfoque da gestatildeo de recursos comuns tem como
ponto de partida um artigo publicado por Garrett Hardin em 1968 a
Trageacutedia dos Comuns Os recursos comuns satildeo aqueles cuja exclusatildeo de
possiacuteveis usuaacuterios e cujo controle do acesso satildeo geralmente
problemaacuteticos e seu uso envolve subtraccedilatildeo eou rivalidade - que coloca
o problema do uso compartilhado Natildeo haacute um consenso na literatura dos
comuns sobre quais recursos podem ser considerados recursos comuns
Para Berkes (2005) incluem-se entre os recursos comuns peixes
animais selvagens florestas pastagens comunitaacuterias sistemas de
irrigaccedilatildeo aacutegua subterracircnea selvas parques espaccedilos puacuteblicos e
excluem-se as terras agricultaacuteveis e a mineraccedilatildeo Jaacute Oakerson (1992)
afirma que os comuns podem ter uma locaccedilatildeo fixa (mineacuterios) ou pode
ser moacuteveis (como peixes e animais selvagens) Em alguns casos
(oceanos atmosfera) satildeo indivisiacuteveis e natildeo podem ser apropriados de
forma privada e em outros casos (pasto) satildeo organizados como
recursos comuns de acordo com a opccedilatildeo social Os padrotildees de
organizaccedilatildeo variam conforme o lugar e a cultura
A modernidade ocidental transformou a natureza
em ldquoambienterdquo simples cenaacuterio no centro do qual
reina o homem que se autoproclama ldquodono e
senhorrdquo Esse ambiente cedo perderaacute toda a
consistecircncia ontoloacutegica sendo desde logo
reduzido a um simples conservatoacuterio de recursos
antes de se tornar depoacutesito de resiacuteduos (OST
1995 p 10)
O enfoque eacute aqui considerado na perspectiva da gestatildeo integrada
de recursos naturais pois um recurso comum natildeo pode ser gerido
independentemente de outras partes do sistema e de outros recursos
(BERKES 2005a VIEIRA BERKES SEIXAS 2005 VIEIRA
67
WEBER 1997)2 Esse posicionamento converge para o enfoque
patrimonial de recursos naturais desenvolvido na Franccedila Dessa forma
ldquoa qualidade da natureza deve se tornar o lsquobem comumrsquo do conjunto da
sociedaderdquo (OLLAGNON 1997 p 172) No enfoque patrimonial os
recursos satildeo considerados na perspectiva da gestatildeo integrada
Evidecircncias de maacute gestatildeo e prescriccedilotildees de soluccedilotildees convencionais
na gestatildeo de recursos comuns tecircm se avolumado no periacuteodo recente Haacute
falhas em reconhecer a importacircncia das interaccedilotildees entre niacuteveis e escalas
persistecircncia na fragmentaccedilatildeo dos sistemas socioambientais e omissatildeo
em reconhecer a heterogeneidade da percepccedilatildeo das escalas pelos
diferentes atores sociais envolvidos na gestatildeo Isso pode resultar em
poliacuteticas amplas que constrangem poliacuteticas locais accedilotildees locais
desvinculadas de problemas mais amplos soluccedilotildees de curto prazo que
acirram problemas de longo prazo pesquisas cientiacuteficas que enfatizam
apenas um niacutevel e raramente analisam as interaccedilotildees sociais e ecoloacutegicas
do fenocircmeno entre niacuteveis (CASH et al 2006 FENNY et al 2001
HOLLING BERKES FOLKE 1998)
O enfoque da gestatildeo de recursos comuns vem evoluindo atraveacutes
do enfoque da co-gestatildeo e da gestatildeo adaptativa A co-gestatildeo enfatiza a
partilha do poder e responsabilidade entre governo e usuaacuterios e a gestatildeo
adaptativa enfatiza a aprendizagem Ambos vecircm evoluindo em direccedilatildeo agrave
co-gestatildeo adaptativa (BERKES 2009)
Como parte do esforccedilo coletivo dos pesquisadores alinhados com
o enfoque dos comuns vem se desenvolvendo o Institutional Framework for Policy Analysis and Design (IAD) desde a deacutecada de 1970
Inicialmente o modelo de anaacutelise IAD foi utilizado no estudo de
poliacuteticas puacuteblicas em aacutereas metropolitanas e em 1985 Ronald Oakerson
adaptou o IAD aos recursos comuns apresentando o modelo num painel
da Academia Nacional de Ciecircncias (HESS OSTROM 2005)
Oakerson (1992) distingue quatro atributos ou variaacuteveis que
podem ser usadas para descrever os recursos comuns atributos fiacutesicos e
tecnoloacutegicos as regras em uso que governam as relaccedilotildees entre usuaacuterios
a arena de accedilatildeo que envolve a escolha de estrateacutegias e a interaccedilatildeo entre
os envolvidos na gestatildeo e os resultados e consequecircncias O quadro
2 Aqui eacute feita a opccedilatildeo pelo enfoque da gestatildeo de recursos comuns mas outra
possibilidade seria via teoria da regulaccedilatildeo explorada por Drummond e Marsden
(1995)
68
conceitual eacute uma ferramenta heuriacutestica para pensar a loacutegica da situaccedilatildeo e
considerar possibilidades alternativas
Com base em Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992) segue uma breve descriccedilatildeo do modelo de anaacutelise
adaptado a co-gestatildeo adaptativa3
Atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos A natureza fiacutesica e tecnoloacutegica
determinam as limitaccedilotildees e possibilidades de uso do recurso comum
Esses atributos compreendem o tamanho localizaccedilatildeo limites
capacidade e abundacircncia do recurso A tecnologia determina a forma
como se lida com o recurso e com os demais fatores relacionados
Regras em uso O segundo conjunto de atributos no modelo de
anaacutelise consiste nas regras que estruturam as escolhas individuais e
coletivas em relaccedilatildeo aos recursos comuns
Arena de accedilatildeo As regras natildeo satildeo garantia da emergecircncia de
novos padrotildees de comportamento Entre as regras e os comportamentos
observados existe uma distacircncia A arena de accedilatildeo eacute um espaccedilo
conceitual no qual os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais se
informam consideram cursos de accedilatildeo alternativos tomam decisotildees
agem e experienciam as consequecircncias de suas accedilotildees A arena de accedilatildeo
conta com dois aspectos interligados a situaccedilatildeo de accedilatildeo e os segmentos
que interagem na situaccedilatildeo de accedilatildeo A situaccedilatildeo de accedilatildeo enfatiza como as
pessoas cooperam ou natildeo cooperam entre si em vaacuterias circunstacircncias Agrave
anaacutelise da situaccedilatildeo da accedilatildeo eacute necessaacuteria a identificaccedilatildeo dos envolvidos e
os papeacuteis que desempenham na gestatildeo do recurso comum
Resultados eou consequecircncias A observacircncia dos resultados
eou consequecircncias eacute fundamental para avaliar o sistema de gestatildeo
encorajando a inovaccedilatildeo e a aprendizagem adaptativa
As relaccedilotildees entre essas macro variaacuteveis satildeo o principal foco dos
estudos A Figura 2 traz modelo de anaacutelise e como as macro variaacuteveis se
relacionam umas com as outras Os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos e as
regras em uso afetam a arena de accedilatildeo e os resultados e consequecircncias
As linhas soacutelidas a e b representam fortes conexotildees causais
compreendendo que o comportamento individual eacute constrangido mas
natildeo determinado pelo mundo biofiacutesico e pelas regras As linhas soacutelidas
3 Outra opccedilatildeo seria utilizar o modelo de anaacutelise dos ciclos adaptativos descrito
no artigo de Holling (2001) e na coletacircnea organizada por Gunderson e Holling
(2002)
69
c e d representam fortes relaccedilotildees Os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos
afetam os recursos comuns de duas formas afetam a arena de accedilatildeo e
caso natildeo sejam considerados na arena de accedilatildeo podem afetar diretamente
os resultados As regras em uso por sua vez natildeo tecircm efeito nos
resultados independente da escolha humana No longo prazo a interaccedilatildeo
entre as macro variaacuteveis eacute marcada pelas linhas tracejadas Dessa forma
o movimento eacute incorporado no modelo na forma de aprendizagem social
adaptativa
Figura 2 - Modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns ajustado
a co-gestatildeo adaptativa
Fonte Baseado em Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
A aprendizagem social adaptativa marcada principalmente pela
retroalimentaccedilatildeo (linhas tracejadas) presente no modelo de anaacutelise da
gestatildeo de recursos comuns eacute um processo interativo e contiacutenuo No
entanto por ser um processo coletivo a cooperaccedilatildeo entre os envolvidos
na gestatildeo pode ser difiacutecil devido agrave distribuiccedilatildeo de poder tanto nos
segmentos sociais quanto nos segmentos poliacuteticos e entre eles
(BERKES 2009) A expectativa eacute que a aprendizagem leve a accedilatildeo
coletiva agrave mudanccedila institucional na forma de regras leis costumes e
normas As abordagens do aprendizado social visam encontrar formas
70
nas quais as pessoas possam transcender as normas sociais valores e
formas tradicionais de pensar os problemas convergindo para mudanccedilas
socioecoloacutegicas e desempenhando um papel direto no estiacutemulo da
inovaccedilatildeo institucional (CUNDILL 2010)
No campo da co-gestatildeo adaptativa a aprendizagem eacute definida
como a reflexatildeo e accedilatildeo coletiva que tem lugar entre indiviacuteduos e grupos
quanto trabalham para melhorar a gestatildeo das relaccedilotildees entre sistemas
sociais e ecoloacutegicos Aiacute entram em cena os niacuteveis de aprendizagem
aprendizagem em circuito simples duplo e triplo A aprendizagem em
circuito simples se refere a melhorar as accedilotildees estrateacutegias e praacuteticas que
ocorrem num grupo envolvido num projeto de gestatildeo de recursos
comuns A aprendizagem em circuito duplo envolve o questionamento
dos pressupostos e dos modelos mentais que apoiam a seleccedilatildeo de
estrateacutegias particulares e accedilotildees Isto eacute particularmente importante nos
processos colaborativos onde diferentes formas de conhecimento e
modelos mentais estatildeo juntos Na aprendizagem em circuito triplo a
aprendizagem ocorre quando os valores e normas que sustentam as
hipoacuteteses satildeo questionados e refletidos Isto leva a um entendimento
mais profundo do contexto dinacircmicas de poder valores que influenciam
a capacidade de gerir os recursos comuns (CUNDILL 2010)4
A ecircnfase da gestatildeo de recursos comuns eacute na anaacutelise dos modos de
apropriaccedilatildeo e dos sistemas de gestatildeo e neste sentido a cooperaccedilatildeo entre
instituiccedilotildees situadas em diversas escalas e niacuteveis torna-se um elemento
fundamental Inuacutemeras atividades humanas tecircm causas e consequecircncias
que podem ser medidas em niacuteveis diferentes ao longo de muacuteltiplas
escalas Os multi-niacuteveis e as multi-escalas e a transescalaridade dos
problemas relacionados com as dimensotildees humanas das mudanccedilas
globais demandam que pesquisadores abordem questotildees-chave de
escalas e niacuteveis em suas anaacutelises Se a arena de accedilatildeo compreende
tambeacutem as relaccedilotildees que se estabelecem entre os vaacuterios niacuteveis de uma
mesma escala a gestatildeo refere-se a arranjos por meio dos quais o poder
decisoacuterio e as responsabilidades decorrentes satildeo compartilhados entre os
atores envolvidos nas vaacuterias escalas espaciais (CASH et al 2006
BERKES 2005b DIETZ et al 2002 GIBSON OSTROM AHN
2000)
4 A aprendizagem em circuito triplo converge para o engajamento reflexivo e a
reflexividade ecoloacutegica (SCHLOSBERG 2009)
71
222 Ecodesenvolvimento territorial os recursos comuns no
contexto do desenvolvimento
Na tentativa de incorporar ao presente o que o passado nos traz
como bagagem vaacuterios autores vecircm descortinando novas vias de anaacutelise
criacutetica das limitaccedilotildees do conceito de desenvolvimento sustentaacutevel que
tem sido apropriado pelos arautos da globalizaccedilatildeo neoliberal desde o
iniacutecio dos anos 1990
Ignacy Sachs escreve sobre desenvolvimento e meio ambiente haacute
vaacuterias deacutecadas e tem acompanhado as mudanccedilas que aconteceram ao
longo da histoacuteria Para unir os enfoques do ecodesenvolvimento e do
desenvolvimento sustentaacutevel ele distingue no ecodesenvolvimento as
cinco dimensotildees da sustentabilidade sustentabilidade social
sustentabilidade econocircmica sustentabilidade ecoloacutegica sustentabilidade
espacial e sustentabilidade cultural Mais recentemente tem utilizado os
termos desenvolvimento territorial integrado e sustentaacutevel ou ainda
desenvolvimento includente sustentaacutevel sustentado (RIBEIRO 2005
SACHS 2004 2002 1993)
Nos uacuteltimos anos Paulo Freire Vieira tem utilizado o termo
desenvolvimento territorial sustentaacutevel e mais recentemente
ecodesenvolvimento territorial tendo como ideia central o
ecodesenvolvimento agregando tambeacutem o enfoque da gestatildeo de
recursos comuns e os estudos territoriais Nas palavras de Pierre
Dansereau (2005 p 523) Paulo Freire Vieira deu ldquoum novo tom agrave
Sociologia um desembaraccedilo maior agrave experiecircncia em quadros teoacutericos
ampliadosrdquo Nessa linha o conceito emergente de ecodesenvolvimento
territorial leva em conta os riscos de desvio economicista e tecnocraacutetico
nos estudos sobre dinacircmicas territoriais de desenvolvimento
enfatizando a criaccedilatildeo de sistemas de gestatildeo compartilhada e adaptativa
de recursos comuns e a governanccedila territorial Deste ponto de vista
ainda em construccedilatildeo trata-se de favorecer ao maacuteximo possiacutevel a gestatildeo
das conexotildees institucionais transescalares evitando soluccedilotildees
reducionistas e uniformizadoras aleacutem de escalas fixas (GODARD
1997 SACHS 2002 VIEIRA 2010 2009 2005 2006 VIEIRA CAZELLA CERDAN 2006)
A noccedilatildeo de territoacuterio incorporada recentemente ao debate sobre
desenvolvimento amp ambiente designa processos de criaccedilatildeo coletiva e
institucional e as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento
72
ecologicamente prudente pressupotildeem o resgate dos criteacuterios de
endogeneidade descentralizaccedilatildeo e autonomia local (pensada
sistemicamente) assumidos como elementos constitutivos do enfoque
ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento (VIEIRA et al 2010 VIEIRA
2006)
O ecodesenvolvimento territorial traz agrave gestatildeo de recursos
comuns a preocupaccedilatildeo com o estilo de desenvolvimento conforme
demonstrado na Figura 3 Mas partindo do pressuposto que a gestatildeo de
recursos comuns eacute um dos principais componentes na interaccedilatildeo
sociedade e natureza capaz de assegurar seu bom funcionamento seu
melhor rendimento sua perenidade e desenvolvimento ela deveria estar
a montante e natildeo a jusante das principais opccedilotildees de desenvolvimento
(GODARD 1997) Todavia seraacute mantido o estilo de desenvolvimento
como mais amplo para reforccedilar a ideia de que a gestatildeo de recursos
comuns precisa considerar o estilo de desenvolvimento assumindo cada
vez mais a responsabilidade da criacutetica e da mudanccedila
Figura 3 - Primeira adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa
Fonte Adaptado de Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
73
A anaacutelise do contexto e do discurso presente na gestatildeo de
recursos comuns explicita os fatores endoacutegenos e exoacutegenos das
dinacircmicas de desenvolvimento demonstrando seus limites e margens de
manobra
O problema natildeo se identifica tanto com a
preocupaccedilatildeo em se especificar o niacutevel de
responsabilidade ideal mas antes com o
entendimento daquelas formas de interaccedilatildeo entre
os diversos niacuteveis territoriais que tornariam
possiacutevel uma decisatildeo que levasse em conta ao
mesmo tempo os interesses e objetivos locais
regionais e nacionais ou mesmo internacionais
(GODARD 1997 p 237)
Para colocar em praacutetica estrateacutegias alternativas de
desenvolvimento eacute importante reequilibrar a transferecircncia de poder e a
comunicaccedilatildeo entre o local o regional e o nacional e integrar as vaacuterias
dimensotildees das estrateacutegias de desenvolvimento (social econocircmica
ecoloacutegica espacial e cultural) ldquoAgrave luz do princiacutepio da co-gestatildeo
adaptativa os sistemas de planejamento e gestatildeo deveratildeo se abrir cada
vez mais a um padratildeo de envolvimento autecircntico da sociedade civilrdquo
(VIEIRA 2005 p 366)
223 Justiccedila ambiental e justiccedila ecoloacutegica os caminhos da
democracia
O movimento por justiccedila ambiental teve origem nos Estados
Unidos em 1982 com um conflito em Afton na Carolina do Norte Na
iminecircncia de instalaccedilatildeo de um depoacutesito de bifenilpoliclorinato que
contaminaria a aacutegua que abastecia a cidade a populaccedilatildeo organizou
protestos Como a populaccedilatildeo de Afton era composta de 84 de negros e
negras o movimento se desenvolveu como uma reaccedilatildeo expliacutecita agrave
atenccedilatildeo inadequada dos movimentos ambientalistas agrave questatildeo da raccedila e
da classe social Os princiacutepios da justiccedila ambiental ofereceram ao ambientalismo possibilidades de pensar classe social e raccedila junto com
questotildees ambientais combatendo o abuso de corporaccedilotildees poluentes e o
abuso do proacuteprio Estado (ACSELRAD 2009 ACSELRAD MELLO
BEZERRA 2009 SZE LONDON 2008)
74
Desde entatildeo as pesquisas sobre justiccedila ambiental contribuiacuteram
para ampliar a discussatildeo sobre a necessidade de um enfoque consistente
de anaacutelise deste fenocircmeno Aleacutem de vaacuterias aacutereas de conhecimento
(geografia radical geografia criacutetica e economia poliacutetica entre outras)
passaram a ser mobilizados dados relacionados a diferentes grupos
raciais e eacutetnicos aleacutem de disparidades associadas a gecircnero e idade Mais
recentemente as reflexotildees sobre justiccedila ecoloacutegica conduziram o
enfoque a um niacutevel cada vez mais alto de abrangecircncia e abstraccedilatildeo
(BYRNE MARTINEZ GLOVER 2002 HOLIFIELD PORTER
WALKER 2009 SZE LONDON 2008)
O conceito de injusticcedila ambiental designa uma distribuiccedilatildeo
desproporcional dos riscos e danos ambientais devido agrave implantaccedilatildeo de
projetos industriais homogeneizadores do espaccedilo bem como de
poliacuteticas globais que impactam negativamente as camadas mais
vulneraacuteveis da sociedade Trata-se de uma siacutendrome recorrente que
transcende a simples distribuiccedilatildeo de riscos ambientais delimitados
localmente refletindo tambeacutem o reconhecimento de que as poliacuteticas
ambientais tecircm consequecircncias que atravessam as fronteiras nacionais
afetam muacuteltiplas escalas e se estendem agraves redes globais As iniciativas
que geram espaccedilos de desigualdade e injusticcedila ambiental satildeo histoacuterica e
geograficamente muito mais complexas do que parecem (ACSELRAD
MELLO BEZERRA 2009 HOLIFIELD PORTER WALKER 2009
ZHOURI 2008)
A ampliaccedilatildeo dos temas tratados pela justiccedila ambiental e o uso da
pesquisa sistecircmica refletem a percepccedilatildeo da complexidade intriacutenseca aos
problemas estudados inclusive das conexotildees transescalares - do local ao
global Alguns autores passaram a adotar o termo justiccedila ecoloacutegica entendida como aquela que afeta natildeo apenas os seres humanos mais
vulneraacuteveis mas todos os seres humanos as geraccedilotildees futuras espeacutecies
natildeo humanas e processos ecossistecircmicos (BYRNE MARTINEZ
GLOVER 2002 HOLIFIELD PORTER WALKER 2009 LOW e
GLEESON 1998 MAacuteRMORA 1992 PENtildeA 2003 SCHLOSBERG
2009 e 2004 SZE LONDON 2008 TOUCHEacute 2004)
Partindo do pressuposto de que a desigualdade socioambiental se
relaciona ao sistema poliacutetico aquela eacute apenas um sintoma de um
processo que envolve a redistribuiccedilatildeo o reconhecimento e a
representaccedilatildeo (SCHLOSBERG 2009 e 2004) A redistribuiccedilatildeo envolve
minimizar a desigualdade ambiental Jaacute o reconhecimento envolve a
consideraccedilatildeo de distintas perspectivas (das minorias eacutetnicas ldquoraciaisrdquo e
75
sexuais) O reconhecimento objetiva tambeacutem ldquodesinstitucionalizar
padrotildees de valoraccedilatildeo cultural que impedem a paridade de participaccedilatildeo
e substituiacute-los por padrotildees que a promovamrdquo (FRASER 2007 p 109)
A representaccedilatildeo torna-se central nas lutas pela redistribuiccedilatildeo e
pelo reconhecimento natildeo haacute redistribuiccedilatildeo e reconhecimento sem
representaccedilatildeo Logo os problemas na representaccedilatildeo satildeo condicionantes
da injusticcedila ambiental e ecoloacutegica (FRASER 2010 2009)
A representaccedilatildeo juntamente com a redistribuiccedilatildeo e
reconhecimento satildeo fundamentais para o fortalecimento e recriaccedilatildeo do
sistema democraacutetico e aprendizagem social adaptativa Na Figura 4
insere-se no modelo de anaacutelise a variaacutevel do fortalecimento do sistema
democraacutetico
Figura 4 - Segunda adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa
Fonte Adaptado de Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
Satildeo os mesmos caminhos que levam ao restabelecimento do
equiliacutebrio na natureza e agrave construccedilatildeo da democracia na sociedade ldquoO
pensamento democraacutetico estaacute desafiado a pensar o desenvolvimento de
toda a humanidade em harmonia com a naturezardquo (SOUZA 1992 p
76
13) Cabe questionar ldquosob que condiccedilotildees eacute de se esperar que a
democracia produza resultados poliacuteticos justosrdquo (VITA 2003 p 111)
A democracia representativa vem sendo alvo de inuacutemeras
criacuteticas economicizaccedilatildeo do poliacutetico incapacidade de cumprir com suas
promessas fundamentais (governo do povo igualdade poliacutetica
participaccedilatildeo dos cidadatildeos na tomada de decisatildeo) a falta de controle da
representaccedilatildeo e a crescente desconfianccedila dos cidadatildeos na democracia
(MANIN et al 2006 MIGUEL 2005 ROSANVALLON 2006
SCHUMPETER1984)
Jaacute a democracia participativa pretende alcanccedilar uma democracia
digna de seu nome (MIGUEL 2005) A consciecircncia do custo do
crescimento econocircmico da produccedilatildeo das desigualdades e da apatia
poliacutetica podem ser consideradas brechas para a democracia participativa
e a expansatildeo e aprofundamento da participaccedilatildeo pode ser uma estrateacutegia
promissora para desafiar as desigualdades as assimetrias de interesses e
as hierarquias sociais e poliacuteticas tradicionais (FUNG COHEN 2007
PATEMAN 1992) Todavia ldquo() o principal problema quanto agrave
democracia participativa natildeo eacute quanto a fazecirc-la funcionar mas como
atingi-lardquo (MACPHERSON 1978 p 101)
A ecologia e a democracia se determinam mutuamente ldquo() seja
pela accedilatildeo dos condicionantes soacutecio-poliacuteticos da degradaccedilatildeo ambiental
seja pela prevalecircncia das bases ambientais da desigualdade socialrdquo
(ACSELRAD 1992a p 10) Para compreender essa relaccedilatildeo eacute preciso
identificar e entender a origem das contradiccedilotildees na incorporaccedilatildeo da
questatildeo ambiental pelo Estado e a correlaccedilatildeo de forccedilas sociais em
confronto pelo controle dos recursos
Os estudos sobre justiccedila ambiental identificam como causas da
injusticcedila ambiental as redes de influecircncia (baseadas em alianccedilas entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos) a desinformaccedilatildeo e a neutralizaccedilatildeo
da criacutetica potencial Na linha de questionamento entre as accedilotildees que
buscam reverter quadros de injusticcedilas ambientais estatildeo a produccedilatildeo do
conhecimento proacuteprio a pressatildeo pela aplicaccedilatildeo universal das leis a
pressatildeo pelo aperfeiccediloamento da legislaccedilatildeo de proteccedilatildeo ambiental a
pressatildeo por novas racionalidades no exerciacutecio do poder estatal a introduccedilatildeo de procedimentos de avaliaccedilatildeo de equidade ambiental e a
accedilatildeo direta e difusatildeo espacial do movimento (ACSELRAD MELLO
BEZERRA 2009 GRAZIANO 1997) A base de um modelo mais
justo envolveria a democratizaccedilatildeo do controle dos recursos naturais a
77
desprivatizaccedilatildeo do meio ambiente assegurando o caraacuteter puacuteblico do
patrimocircnio comum (ACSELRAD 1992a)
O desafio consiste em identificar os limites da representaccedilatildeo e da
participaccedilatildeo identificando experiecircncias que caminhem na direccedilatildeo de
uma recuperaccedilatildeo da autonomia (CASTORIADIS COHN-BENDIT
PUacuteBLICO DE LOUVAIN-LA-NEUVE 1981 ILLICH 1973) da
construccedilatildeo de uma democracia cognitiva (MORIN 2002 THEYS
1997) de uma cidadania terrestre (MORIN KERN 2000) de uma
cidadania ecoloacutegica (DOBSON 2003) de uma ecologia da
transformaccedilatildeolibertaccedilatildeo (HATHAWAY BOFF 2012) A direccedilatildeo
apontada a partir dos termos indicados eacute exigente e implica reconhecer
o caraacuteter indissociaacutevel da natureza e da comunidade seres humanos natildeo
humanos e a Terra em uma concepccedilatildeo alargada de justiccedila
(SCHLOSBERG 2009)
23 LIMITES E POSSIBILIDADES DO ECODESENVOLVIMENTO
REVISITADO
De todos os objetos os que mais amo satildeo os
usados () Impregnado do uso de muitos a
miuacuteda transformados foram aperfeiccediloando suas
formas e se fizeram preciosos porque tecircm sido
apreciados muitas vezes (Bertolt Brecht
Antologia Poeacutetica 1982 p 58)
A procura da harmonizaccedilatildeo entre desenvolvimento e gestatildeo de
longo prazo do meio ambiente natildeo pode ser feita de maneira isolada
pois se trata de uma reflexatildeo global sobre a viabilidade de novos estilos
de desenvolvimento baseados no pensamento sistecircmico-complexo
(GODARD SACHS 1975 VIEIRA 2006) Este capiacutetulo insere-se
nessa linha de reflexatildeo ao tratar a atualidade do ecodesenvolvimento
aplicado agrave gestatildeo de recursos comuns
O ecodesenvolvimento eacute o eixo central do modelo de anaacutelise
trazendo em si a criacutetica do modelo hegemocircnico de desenvolvimento e a
preocupaccedilatildeo com a criaccedilatildeo de novos projetos civilizatoacuterios Para tanto eacute preciso considerar o meio ambiente como relaccedilatildeo e natildeo como objeto
Suas dimensotildees os recursos naturais o espaccedilo-territoacuterio e o haacutebitat
colocam no centro as relaccedilotildees que os seres humanos estabelecem entre
si e com o meio Os conceitos de co-gestatildeo adaptativa
78
ecodesenvolvimento territorial e justiccedila ambiental e ecoloacutegica vecircm
sendo incorporados ao modelo de anaacutelise ldquoclaacutessicordquo ampliando o seu
potencial heuriacutestico no enfrentamento da crise socioecoloacutegica global
O enfrentamento envolve mais adaptaccedilatildeo que controle poliacuteticas
flexiacuteveis integradas e adaptativas gestatildeo e planejamento voltados agrave
aprendizagem acompanhamento concebido como uma parte de
intervenccedilotildees ativas para conseguir compreender e identificar respostas
aos problemas natildeo a vigilacircncia pela vigilacircncia investimentos ecleacuteticos
em ciecircncia participaccedilatildeo dos cidadatildeos e parceria na construccedilatildeo de uma
ciecircncia mais cidadatilde evitando a informaccedilatildeo passiva (HOLLING 1995)
O desenvolvimento de uma democracia cognitiva
soacute eacute possiacutevel com uma reorganizaccedilatildeo do saber e
esta pede uma reforma do pensamento que
permita natildeo apenas isolar para conhecer mas
tambeacutem ligar o que estaacute isolado e nela
renasceriam de uma nova maneira as noccedilotildees
pulverizadas pelo esmagamento disciplinar o ser
humano a natureza o cosmo a realidade
(MORIN 2002 p 104)
O ecodesenvolvimento e os enfoques complementares ajudam a
compreender a gestatildeo de recursos comuns em relaccedilatildeo agrave sustentabilidade
dos recursos naturais as dinacircmicas de desenvolvimento e a
desigualdade ecoloacutegica A pesquisa sobre gestatildeo de recursos comuns
nessa perspectiva incorpora uma perspectiva mais ampla sobre seu
papel no modelo de desenvolvimento hegemocircnico e ao mesmo tempo
seu potencial de mudanccedila como parte integrante e importante na
proposta do ecodesenvolvimento O fundamental eacute a compreensatildeo de
que nenhum enfoque eacute completo e que para aleacutem da fragmentaccedilatildeo da
ciecircncia o diaacutelogo entre os enfoques pode oferecer insights para uma
melhor compreensatildeo dos problemas e para a construccedilatildeo de alternativas
capazes de fazer frente agrave crise sistecircmica do meio ambiente
3 GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS NO BRASIL O CARVAtildeO
MINERAL EM QUESTAtildeO
Tudo se aniquilava no fundo desconhecido das
noites obscuras soacute percebia muito ao longe os
altos-fornos e as fornalhas de coque () Era uma
tristeza de incecircndio natildeo havia no horizonte
ameaccedilador outros astros elevando-se a natildeo ser
esses fogos noturnos dos paiacuteses da hulha e do
ferro (Eacutemile Zola 1981 p 14)
O uso do carvatildeo mineral em larga escala estaacute intrinsecamente
ligada agrave Revoluccedilatildeo Industrial e com a origem do movimento dos
trabalhadores na Inglaterra como bem ilustrou Emile Zola em seu livro
Germinal e nos Estados Unidos Ele continua sendo a fonte mais
utilizada para geraccedilatildeo de energia eleacutetrica no mundo correspondendo em
meacutedia a 40 da produccedilatildeo total mundial no periacuteodo de 1973 a 2006
Segundo a Agecircncia Internacional de Energia (IEA) a posiccedilatildeo seraacute
mantida nos proacuteximos trinta anos e a discussatildeo sobre reconversatildeo da
mineraccedilatildeo do carvatildeo ainda permanece incipiente5(ANEEL 2008a
FERREIRA 2002)
No debate sobre mudanccedila ambiental global os recursos naturais
natildeo renovaacuteveis satildeo centrais Embora o petroacuteleo ocupe posiccedilatildeo
privilegiada os impactos ambientais do processo produtivo do carvatildeo
mineral eacute um ponto importante a ser considerado Os combustiacuteveis
foacutesseis continuam a dominar a matriz energeacutetica mundial apoiados por
523 mil milhotildees de doacutelares de subsiacutedios em 2011 quase 30 a mais que
em 2010 e seis vezes mais do que as fontes renovaacuteveis (OCDE IEA
2012) O carvatildeo mineral representou em 2012 195 da matriz
energeacutetica dos paiacuteses que compotildeem a Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e
Desenvolvimento Econocircmico (OCDE) e 282 da matriz mundial Em
relaccedilatildeo agrave oferta de energia eleacutetrica o carvatildeo mineral representou em
2012 14 da oferta brasileira e 417 da oferta mundial Se
consideradas as dimensotildees de sustentabilidade seguranccedila energeacutetica
equidade social e mitigaccedilatildeo dos impactos ambientais o Brasil aparece
como 53ordm lugar em 2012 Se tomadas separadamente o Brasil assume o
5 Destaca-se aqui a iniciativa da Comissatildeo das Comunidades Europeias que
teve iniacutecio em 1989 de proporcionar assistecircncia as Comunidades que queiram
adotar uma reconversatildeo econocircmica das aacutereas de mineraccedilatildeo do carvatildeo atraveacutes de
empreacutestimos e subsiacutedios (COMISSAtildeO DAS COMUNIDADES EUROPEacuteIAS
1990)
80
77ordm lugar em seguranccedila energeacutetica 65ordm em equidade social e 21ordm em
mitigaccedilatildeo dos impactos ambientais (WORLD ENERGY COUNCIL
2012)
A matriz energeacutetica brasileira teve em sua composiccedilatildeo no ano de
2012 424 de oferta de energia de fontes renovaacuteveis (biomassa da
cana hidraacuteulica e eletricidade lenha e carvatildeo vegetal e lixiacutevia dentre
outras) e 576 de fontes de energia natildeo renovaacuteveis (petroacuteleo e
derivados gaacutes natural carvatildeo mineral e uracircnio) da qual o carvatildeo
mineral tem uma participaccedilatildeo de 54 (BRASIL EPE 2013) A
presenccedila de combustiacuteveis foacutesseis na matriz energeacutetica brasileira tende a
aumentar com a exploraccedilatildeo do petroacuteleo do preacute-sal com a possiacutevel
exploraccedilatildeo do gaacutes de xisto e com o retorno do carvatildeo mineral nos leilatildeo
A-56 de 2013 Eacute urgente lidar com a questatildeo das emissotildees de gases de
efeito estufa devido agraves altas emissotildees dos combustiacuteveis foacutesseis O
carvatildeo mineral eacute o mais abundante combustiacutevel foacutessil do mundo e
tambeacutem o que mais produz gases de efeito estufa (BRASIL MME
2007 YAMAOKA et al 2013)
O Brasil no cenaacuterio mundial desponta como fornecedor global
de commodities minerais energeacuteticas e agriacutecolas Esse papel justifica a
abertura de minas de fosfato a mineraccedilatildeo de uracircnio do ferro e de outros
mineacuterios Apesar do carvatildeo mineral brasileiro ser o ldquoprimo pobrerdquo dos
mineacuterios voltado ao mercado interno eacute preciso considerar tambeacutem a
mineraccedilatildeo no geral O marco legal da mineraccedilatildeo estaacute mudando com a
regulamentaccedilatildeo da mineraccedilatildeo em terras indiacutegenas quilombolas e
ribeirinhas e a expansatildeo das mineradoras brasileiras para outros paiacuteses
A conjuntura brasileira eacute de desregulamentaccedilatildeo e de flexibilizaccedilatildeo da
normativa ambiental sem um questionamento profundo sobre as
desigualdades socioambientais existentes no territoacuterio (MALERBA
2012 MILANEZ et al 2013)
O objetivo deste capiacutetulo foi descrever as macro variaacuteveis
presentes no modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns (HESS
6 Os leilotildees foram instituiacutedos em 2005 e satildeo processos licitatoacuterios com o
objetivo de contratar energia eleacutetrica para assegurar o pleno atendimento da
demanda futura no Ambiente de Regulaccedilatildeo Controlada Os leilotildees satildeo divididos
em A-1 A-3 e A-5 Os nuacutemeros 1 3 e 5 correspondem aos anos de
antecedecircncia do iniacutecio do suprimento O Leilatildeo A-5 por exemplo envolve a
licitaccedilatildeo para contrataccedilatildeo de energia eleacutetrica de novos empreendimentos
realizado com cinco anos de antecedecircncia do iniacutecio do suprimento (MME
2014)
81
OSTROM 2005 OAKERSON 1992 POLSKI OSTROM 1992)
abordando o tema no Brasil com destaque agrave gestatildeo do carvatildeo mineral
Para tanto aleacutem de uma breve introduccedilatildeo sobre desenvolvimento
econocircmico gestatildeo de recursos comuns e energia no Brasil o capiacutetulo
traz uma caracterizaccedilatildeo dos atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso
em termos de disponibilidade usos tecnologias disponiacuteveis e impactos
As regras em uso tratam das principais leis que afetam o recurso bem
como das interfaces entre direitos ambientais e direitos humanos Em
relaccedilatildeo agrave arena de accedilatildeo eacute feita uma breve descriccedilatildeo dos envolvidos na
gestatildeo no niacutevel nacional O balanccedilo da gestatildeo de recursos comuns no
Brasil em especial do carvatildeo mineral revela ao longo desse capiacutetulo
importantes pontos a serem considerados na compreensatildeo da ampliaccedilatildeo
da geraccedilatildeo de energia eleacutetrica movida a carvatildeo mineral no Sul de Santa
Catarina e da possibilidade de surgirem caminhos alternativos para a
questatildeo energeacutetica
31 DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO GESTAtildeO DE RECURSOS
COMUNS E ENERGIA
A gestatildeo de recursos comuns em particular do carvatildeo mineral
traz agrave tona questotildees relacionadas ao desenvolvimento econocircmico e a
questatildeo energeacutetica que envolvem a atuaccedilatildeo de segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais O desafio de tratar a gestatildeo de recursos comuns
reside justamente na complexidade existente nessas inter-relaccedilotildees A
tentativa dessa seccedilatildeo eacute tratar a gestatildeo contextualizada para na
sequecircncia abordar as especificidades do carvatildeo mineral
Na eacutepoca da Repuacuteblica Velha (1889-1930) o governo era
controlado pela oligarquia rural (SCARDUA BURSZTYN 2003) Se
ateacute 1930 a teoria econocircmica pregava o livre funcionamento do mercado
com a crise mundial passou a aceitar um papel mais atuante do Estado e
tambeacutem do planejamento Os recursos comuns acompanharam essa
mesma linha de atuaccedilatildeo federal sendo marcada pelo controle federal na
disputa com elites locais Isso justificou a criaccedilatildeo de poderes setoriais e
deu lugar a burocracias especializadas (NEDER 2002) O setor eleacutetrico que antes era resultado de investimentos privados e locais sofreu
intervenccedilatildeo estatal e de empresas estrangeiras (MALAGUTI 2009)
A Ditadura Vargas (1930-1945) foi centralizada no presidente
com a dissoluccedilatildeo das representaccedilotildees poliacuteticas e baseada numa poliacutetica
82
voltada ao desenvolvimento urbano industrial e nacionalista
(SCARDUA BURSZTYN 2003) Nesse periacuteodo houve pouca
demanda por energia baseada principalmente na geraccedilatildeo de energia a
partir de fontes vegetais indicando um reduzido grau de expansatildeo das
forccedilas produtivas De 1939 em diante ocorreu a consolidaccedilatildeo da
industrializaccedilatildeo com o crescimento da atividade econocircmica e uma
participaccedilatildeo maior no uso de combustiacuteveis foacutesseis (THEIS 1990)
Durante o periacuteodo democraacutetico (1945-1964) teve lugar a
reorganizaccedilatildeo dos partidos poliacuteticos e das representaccedilotildees favorecendo a
descentralizaccedilatildeo sem uma poliacutetica especiacutefica para esse fim Na Ditadura
Militar (1964-1985) a centralidade federal voltou a ser realidade e nesse
contexto o crescimento econocircmico aconteceu a despeito dos custos
sociais e ambientais (EGLER 1997 SCARDUA BURSZTYN 2003)
A questatildeo ambiental era tratada como gestatildeo de recursos naturais com a
criaccedilatildeo de parques e reservas bioloacutegicas Com vieacutes claramente
conservacionista natildeo havia uma preocupaccedilatildeo com os impactos do
crescimento econocircmico da eacutepoca (NEDER 2002) ldquoA ideia de
desenvolvimento econocircmico penetrava a consciecircncia da cidadania
justificando cada ato de governo e ateacute de ditadura e de extinccedilatildeo da
naturezardquo (DEAN 1996 p 281)
O processo de crise na economia mundial deflagrado na deacutecada
de 1970 contou com trecircs marcos poliacuteticos o rompimento dos Estados
Unidos aos acordos de Bretton Woods em 1971 que trouxe a crise aos
paiacuteses membros da OCDE a inclusatildeo das questotildees ambientais no debate
sobre desenvolvimento estimulada pelo relatoacuterio do Clube de Roma e
pela Conferecircncia de Estocolmo em 1972 e a elevaccedilatildeo do preccedilo do
petroacuteleo em 1973 que trouxe a preocupaccedilatildeo com a questatildeo energeacutetica
Esses eventos dentre outros colocaram tambeacutem em questatildeo a regulaccedilatildeo
das relaccedilotildees econocircmicas internacionais e os mecanismos internos de
promoccedilatildeo do desenvolvimento (EGLER 1997)
Na deacutecada de 1970 aumentou a preocupaccedilatildeo com a poluiccedilatildeo
industrial todavia natildeo se alterou a relaccedilatildeo Estado-empresa (NEDER
2002) O movimento ambientalista em sua fase fundacional (1971-86)
foi dominado por uma compreensatildeo estreita da problemaacutetica ambiental
tendo como principais preocupaccedilotildees a poluiccedilatildeo industrial e a
preservaccedilatildeo dos ecossistemas naturais A conexatildeo entre a problemaacutetica
ambiental e o desenvolvimento econocircmico natildeo era percebida pelo
movimento ambientalista nessa fase (VIOLA 1992)
83
Na deacutecada de 1980 a crise do Estado e o processo de
redemocratizaccedilatildeo do paiacutes somou-se agrave discussatildeo do ldquodesenvolvimento
sustentaacutevelrdquo que se inseriu no discurso e na definiccedilatildeo de poliacuteticas Poacutes
1980 outro padratildeo de regulaccedilatildeo puacuteblica socioambiental veio se
desenvolvendo no Brasil ldquoele desloca a dicotomia estado versus capital
privado para um patamar mais complexo que amplia os dois modos
claacutessicos de coordenaccedilatildeo a ordem estatal e mercantil para incluir novas
arenas de conflitosrdquo (NEDER 2009 p 8)
Com a crise econocircmica dos anos 1980 o movimento
ambientalista passou a considerar a dimensatildeo econocircmica como
condicionante e parte da crise socioambiental Nessa mesma deacutecada
formaram-se grupos cientiacuteficos que passaram a tratar da questatildeo
ambiental Em 1981 com a aprovaccedilatildeo da Poliacutetica Nacional de Meio
Ambiente (PNMA) constituiu-se segundo o artigo 6ordm o Sistema
Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) e o CONAMA O movimento
ambientalista de 1987 a 1991 passou por uma fase de institucionalizaccedilatildeo
que envolveu uma organizaccedilatildeo maior do movimento ambientalista em
relaccedilatildeo a recursos financeiros especializaccedilatildeo dos envolvidos e com o
envolvimento com movimentos socioambientais (como o Movimento de
Atingidos por Barragens Movimento dos Seringueiros Movimentos
Indiacutegenas etc) (VIOLA 1992) Somado a isso o fim da Ditadura
Militar em 1985 e a Constituiccedilatildeo de 1988 acenavam com a volta da
democracia representativa e com novos mecanismos participativos
O governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) realizou
uma grande reforma no setor eleacutetrico marcando a transiccedilatildeo entre um
modelo de crescimento impulsionado pelo Estado para um modelo de
crescimento impulsionado pelo mercado A reforma teve como objetivos
a separaccedilatildeo das atividades de geraccedilatildeo transmissatildeo distribuiccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo privatizaccedilatildeo competiccedilatildeo na geraccedilatildeo e na
comercializaccedilatildeo e livre acesso agraves redes de transmissatildeo e distribuiccedilatildeo
(GOLDENBERG PRADO 2003) ldquoO processo de privatizaccedilatildeo do setor
eleacutetrico representou um gigantesco processo de transferecircncia de rendas
utilizando-se de dinheiro puacuteblico para beneficiar grupos empresariais e
garantir o propalado lsquosucessorsquo das privatizaccedilotildeesrdquo (BERMANN 2003
p 47) O ano de 2001 foi conhecido como o ano do ldquoapagatildeordquo Houve
falta de energia eleacutetrica causada pelo desabastecimento de aacutegua e por
uma privatizaccedilatildeo parcial na qual as estatais perderam sua capacidade de
planejamento mediante reduccedilatildeo de investimentos e o setor privado ainda
natildeo havia tomado o seu lugar (GOLDENBERG 2012a)
84
Com a vitoacuteria de Luis Inaacutecio Lula da Silva em 2002 do Partido
dos Trabalhadores (PT) para a presidecircncia da repuacuteblica houve uma
grande expectativa por parte dos movimentos sociais que possuiacuteam uma
ligaccedilatildeo histoacuterica com os partidos de esquerda especialmente o PT Lula
permaneceu na presidecircncia de 2003 a 2010 rompendo com uma
tradiccedilatildeo de eleiccedilotildees que mantinham na presidecircncia a elite tradicional
(LOSEKANN 2012) O fato de ter tido como ministra do meio
ambiente Marina Silva ligada agrave luta dos seringueiros fez com que
muitos acreditassem que o governo Lula seria um marco na poliacutetica
ambiental brasileira Mas contrariando as expectativas houve a
legalizaccedilatildeo dos transgecircnicos a transposiccedilatildeo do Rio Satildeo Francisco e a
anistia aos desmatadores O Ministeacuterio das Minas e Energia (MME) na
eacutepoca liderado por Dilma Russef atual presidenta do Brasil ressuscitou
projetos hidreleacutetricos na Amazocircnia e retomou o programa da energia
nuclear Se durante a sua histoacuteria o PT esteve receptivo agraves demandas
dos movimentos socioambientais uma vez no poder a praacutetica foi
restritiva no CONAMA a participaccedilatildeo dos movimentos sociais foi
diminuiacuteda resultando numa injusticcedila poliacutetica em relaccedilatildeo aos segmentos
poliacuteticos e empresariais A poliacutetica de desenvolvimento empreendida
pelo Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) priorizou a
pecuaacuteria mineraccedilatildeo geraccedilatildeo de energia soja cimento e celulose
causadores de impactos socioambientais e injusticcedilas ambientais e
ecoloacutegicas (LISBOA 2011)
Na Rio+20 que aconteceu em 2012 o tema central da Cuacutepula
dos Povos foi a justiccedila social e ambiental Para a Cuacutepula dos Povos natildeo
houve um balanccedilo das dificuldades e conquistas poacutes Rio-92 e a ecircnfase
na ldquoeconomia verderdquo foi uma forma de reforccedilar a acumulaccedilatildeo
capitalista que natildeo questiona ou substitui a economia baseada no uso de
combustiacuteveis foacutesseis nem nos padrotildees de produccedilatildeo industrial e
consumo crescente (CUacutePULA DOS POVOS 2012)
No governo Dilma (2011- atual) foi aprovada a mudanccedila no
Coacutedigo Florestal que estava tramitando desde 1996 ateacute ser totalmente
reformulado em 2012 Tramita tambeacutem a mudanccedila do Coacutedigo da
Mineraccedilatildeo que vai reduzir radicalmente as conquistas de grupos eacutetnicos
e comunidades tradicionais Com essas mudanccedilas instaura-se a
dominaccedilatildeo poliacutetica empresarial na qual o territoacuterio passa a ser objeto da
accedilatildeo de empresas preocupadas com as proacuteprias metas e apoiadas pela
accedilatildeo do Estado Confunde-se aiacute capitalismo com democracia e liberdade
poliacutetica com liberdade para explorar e investir (SEVAacute FILHO 2013)
No que se refere agrave matriz energeacutetica antes se pensava no que era melhor
85
para o Estado e atualmente a poliacutetica energeacutetica eacute pensada para os
empreiteiros (GOLDENBERG 2012b)
O planejamento energeacutetico no Brasil apoacutes as reformas passou a
ter uma visatildeo ldquoofertistardquo natildeo se baseia em previsotildees de demandas
Existe um emaranhado de interesses e o ldquoplanejamentordquo se eacute que pode
ser assim chamado serve aos que querem vender energia e aos que
querem comprar As empresas por sua vez aperfeiccediloam sua influecircncia
poliacutetica nos espaccedilos de poder do Estado atuando sobre os
licenciamentos ambientais mecanismos de financiamento
influenciando ateacute propostas de reforma do Estado (BERMANN 2012)
No final da deacutecada de 1980 apoacutes momentos de crescimento
econocircmico e crise houve um reposicionamento da economia da gestatildeo
de recursos comuns e da energia do fim da deacutecada de 1980 em diante
Se a PNMA de 1986 e a Constituiccedilatildeo de 1988 pareciam acenar com a
garantia aos direitos humanos e ambientais e uma preocupaccedilatildeo maior
com a participaccedilatildeo das pessoas nos processos de tomada de decisatildeo as
recentes alteraccedilotildees nas leis ambientais parecem um grande retrocesso e
a participaccedilatildeo das pessoas restrita agrave democracia representativa e a
instacircncias participativas controladas
O Estado passou a reforccedilar seu papel como indutor do
desenvolvimento capitalista direcionando investimentos em alguns
setores econocircmicos aos quais se destina financiamento subsiacutedios e
infraestrutura logiacutestica (transporte e energia) Acabou criando tambeacutem
mecanismos que asseguram o aumento no ritmo da exploraccedilatildeo de
recursos naturais e da despossessatildeo de grupos sociais com a desculpa de
gerar divisas para reduzir a pobreza e a desigualdade social ldquoEm nome
da superaccedilatildeo da desigualdade e da pobreza governos progressistas
impulsionam a expansatildeo de atividades extrativas ndash notadamente o
petroacuteleo e os mineacuterios ndash cujos custos sociais e ambientais tecircm gerado
exclusatildeo e desigualdaderdquo (MALERBA 2012 p 12-3)
O carvatildeo mineral acompanha esse movimento mais amplo com
suas especificidades que satildeo tratadas a seguir
86
32 CARACTERIZACcedilAtildeO E USOS DO CARVAtildeO MINERAL7 NO
BRASIL
A histoacuteria do carvatildeo mineral no Brasil teve iniacutecio em 1795 no Rio
Grande do Sul Ele foi descoberto por teacutecnicos ingleses que construiacuteam
ferrovias na regiatildeo do baixo Jacuiacute Durante muito tempo sua exploraccedilatildeo
foi manual passando agrave etapa da mecanizaccedilatildeo somente apoacutes a Segunda
Guerra Mundial (CHAVES 2008 GOMES et al 1998)
A mineraccedilatildeo eacute uma atividade intensiva em recursos naturais
principalmente do solo e da aacutegua competindo com outros usos dos
recursos naturais locais principalmente aqueles que dependem do meio
ambiente tais como pesca turismo agricultura etc Dentre os principais
usos do carvatildeo mineral destacam-se a produccedilatildeo de energia eleacutetrica e uso
industrial principalmente sideruacutergico O uso tem relaccedilatildeo com a
qualidade do carvatildeo medida pela capacidade de produccedilatildeo de calor
Capacidade essa que eacute favorecida pela existecircncia de carbono e
prejudicada pela quantidade de impurezas normalmente material
orgacircnico (macerais do carvatildeo) e inorgacircnicos (argilas pirita e
carbonatos) (ANEEL 2008a SAMPAIO 2002)
O Brasil natildeo tem uma cultura de uso do carvatildeo mineral como em
outros paiacuteses sua exploraccedilatildeo eacute restrita ao Sul do paiacutes outras regiotildees natildeo
convivem com a questatildeo A qualidade do carvatildeo mineral brasileiro eacute
inferior dado resultante dos altos teores de cinza e enxofre (carvatildeo de
SC e PR) e o passivo ambiental de uma exploraccedilatildeo predatoacuteria e sem
compromisso com o meio ambiente fez com que essa atividade natildeo
contasse com boa fama (CHAVES 2008)
O carvatildeo mineral de acordo com o poder caloriacutefico e a incidecircncia
de impurezas se subdivide em carvatildeo de baixa qualidade (linhito e sub-
betuminoso) e hulha (Betuminoso e Antracito) As reservas brasileiras
satildeo compostas pelo carvatildeo dos tipos linhito e sub-betuminoso que pode
ser utilizado na produccedilatildeo de energia eleacutetrica e usado industrialmente
(ANEEL 2008a) (Figura 5)
7 O carvatildeo mineral natildeo eacute um mineral no sentido estrito sendo mais correto
chamaacute-lo de carvatildeo foacutessil A opccedilatildeo pelo carvatildeo mineral se justifica na medida
em que a maior parte dos documentos e referecircncias consultadas utilizam o
termo (CHAVES 2008)
87
Figura 5 - Tipos de carvatildeo e uso
Fonte Adaptado de Aneel (2008a p 133)
A produccedilatildeo do carvatildeo mineral bruto no Brasil em 1970 foi de 55
milhotildees de toneladas chegando ao pico em 1985 com 249 milhotildees de
toneladas (MILIOLI 2009) Ateacute final da deacutecada de 1980 as sideruacutergicas
brasileiras eram obrigadas a comprar carvatildeo coqueificaacutevel nacional para
misturar com o importado Os empresaacuterios do setor contaram com as
benesses do governo federal que obrigava as sideruacutergicas a utilizarem o
carvatildeo mineral brasileiro e os consumidores do carvatildeo mineral eram
empresas governamentais Como natildeo havia diferenccedila entre o preccedilo e a
qualidade do produto as carboniacuteferas natildeo eram estimuladas a melhorar
a qualidade nem buscar tecnologia para isso
O Governo Collor rompeu com a obrigatoriedade do consumo do
carvatildeo mineral pelas metaluacutergicas e muitas mineradoras enfrentaram
problemas (CHAVES 2008) O pano de fundo para o debate eleacutetrico
dos anos 1990 principalmente durante o governo de Fernando Henrique
Cardoso era a liberalizaccedilatildeo dos preccedilos do comeacutercio e do investimento
estrangeiro a desregulamentaccedilatildeo e a privatizaccedilatildeo em grande escala
(GOLDENBERG PRADO 2003)
O carvatildeo energeacutetico passou a ser uma opccedilatildeo para a crise
enfrentada pelas carboniacuteferas As termeleacutetricas estatais foram
privatizadas ou tiveram o seu capital aberto na deacutecada de 1990 exceto a
Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica (CGTEE) Em 2013
estavam em operaccedilatildeo treze usinas termeleacutetricas em seis estados
brasileiros somando um total de 2711 Megawatts (MW) (Tabela 1)
Destaca-se nessas usinas a participaccedilatildeo de empresas estrangeiras
88
Tractebel CITIC Group (estatal chinesa em parceria com a Companhia
de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica) o Consoacutercio Alumar (formado
pelas empresas Alcoa BHP Billiton e Rio Tinto Alcan) e a ENEVA
Tabela 1 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral em
operaccedilatildeo em 2013 Brasil
Fonte ANEEL 2013
Natildeo havia nenhum empreendimento movido a carvatildeo mineral em
construccedilatildeo no ano de 2013 Existem quatro empreendimentos com
outorga no periacuteodo de 1998 a 2013 somando um total de 1445 MW
localizados nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul (Tabela
2)
Tabela 2 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral com
outorga de 1998 a 2013 Brasil
Fonte ANEEL 2013
USINAPOTEcircNCIA
(MW)MUNICIacutePIO UF PROPRIETAacuteRIO
Charqueadas 72 Charqueadas RS Tractebel
Presidente Meacutedici A B 446 Candiota RS CGTEE
Satildeo Jerocircnimo 20 Satildeo Jerocircnimo RS CGTEE
Figueira 20 Figueira PR Copel
Jorge Lacerda I e II 232 Capivari de Baixo SC Tractebel
Jorge Lacerda III 262 Capivari de Baixo SC Tractebel
Jorge Lacerda IV 363 Capivari de Baixo SC Tractebel
Alunorte 103 Nossa Senhora do Socorro SE Alumina Norte do Brasil SA
Alumar 75 Satildeo Luiacutes MA Consoacutercio Alumar
Porto do Itaqui 360 Satildeo Luiacutes MA UTE Porto do Itaqui Geraccedilatildeo de Energia SA
Porto do Peceacutem I 381 Satildeo Gonccedilalo do Amarante CE Porto do Peceacutem Geraccedilatildeo de Energia SA
Candiota III 12 Candiota RS CGTEE
Porto do Peceacutem II 365 Satildeo Gonccedilalo do Amarante CE MPX Peceacutem II Geraccedilatildeo de Energia SA
TOTAL 2711
USINAPOTEcircNCIA
(MW)MUNICIacutePIO UF PROPRIETAacuteRIO
Jacuiacute 350 Charqueadas RS Eleacutetrica Jacuiacute SA
Sul Catarinense 440 Treviso SC UTE Sul Catarinense
Concoacuterdia 5 Concoacuterdia SC Sadia
CTSUL 650 Cachoeira do Sul RS Central Termoeleacutetrica Sul SA
TOTAL 1445
89
As reservas de carvatildeo no Brasil totalizam sete bilhotildees de
toneladas ocupando o 10ordm lugar no ranking mundial podendo gerar 17
mil mw (ANEEL 2008B) Conveacutem ressaltar tambeacutem que o Brasil
produz mais energia eleacutetrica do que consome em 2011 foram
disponibilizados 5676 TeraWattshora (TWh) e consumidos 4801TWh
e em 2012 foram disponibilizados 5928TWh e consumidos 4984 TWh
A oferta de energia eleacutetrica a base de carvatildeo mineral tende a aumentar
em 53 se as usinas termeleacutetricas com outorga forem construiacutedas Com
a inclusatildeo do carvatildeo mineral nos leilotildees em 2013 parece ser uma
questatildeo de tempo para que as termeleacutetricas listadas na tabela 22 entrem
no leilatildeo e comecem a ser construiacutedas (BRASIL EPE 2013b)
33 TECNOLOGIAS DISPONIacuteVEIS E IMPACTOS
SOCIOAMBIENTAIS
Da extraccedilatildeo do carvatildeo mineral ateacute a geraccedilatildeo de energia eleacutetrica
existem diferentes processos a serem considerados a extraccedilatildeo o
beneficiamento o transporte o uso do carvatildeo mineral para geraccedilatildeo de
energia eleacutetrica e a disposiccedilatildeo dos rejeitos Cada um desses processos
envolve escolhas tecnoloacutegicas e seus impactos Nesta seccedilatildeo faz-se uma
breve exposiccedilatildeo dos meacutetodos utilizados nos processos compreendendo
que a escolha entre os meacutetodos e impactos decorrentes eacute mais
condicionada pelas leis existentes do que pelo tipo de tecnologia
disponiacutevel A escolha tem a ver com a opccedilatildeo do desenvolvimento
(BRITO 1981)
No que se refere agrave extraccedilatildeo do carvatildeo mineral os meacutetodos
utilizados satildeo a lavra a ceacuteu aberto e subterracircnea dependendo das
caracteriacutesticas geoloacutegicas No iniacutecio as lavras eram essencialmente
manuais depois passaram para uma fase semi-mecanizada e depois
mecanizada Na fase manual o impacto ambiental e a produtividade
eram menores O processo de mecanizaccedilatildeo aumentou a produccedilatildeo e com
ela uma maior destruiccedilatildeo ambiental e problemas de sauacutede (MENEZES
CAROLA 2011)
As lavras a ceacuteu aberto utilizam os seguintes meacutetodos meacutetodo de
lavras em tiras (strip mining) lavra de descobertura com escavadeiras de
arrasto (dragline stripping method) lavra em bancadasescavadeira Os
trecircs meacutetodos de formas diferentes retiram as camadas de solo e outras
formaccedilotildees sedimentares que cobrem as camadas de carvatildeo Satildeo meacutetodos
90
de baixo custo comparados aos de lavra subterracircnea mas foram as
lavras a ceacuteu aberto que causaram entre 1960 e 1970 os maiores danos
ambientais do Sul de Santa Catarina (KOPPE COSTA 2008
MENEZES CAROLA 2011 MONTEIRO 2008)
Dentre os meacutetodos de lavra subterracircnea destacam-se o meacutetodo de
cacircmaras e pilares e de frente larga No primeiro meacutetodo o carvatildeo eacute
extraiacutedo e os pilares satildeo formados pelo proacuteprio carvatildeo que sustenta a
cobertura e facilita o fluxo de ar Na medida em que a mineraccedilatildeo
avanccedila os pilares satildeo retirados e a cobertura tomba Jaacute o meacutetodo da
frente larga envolve a remoccedilatildeo total do carvatildeo e a sustentaccedilatildeo eacute feita por
macacos hidraacuteulicos O meacutetodo precisa estar adequado agrave geologia da
mina e o custo do maquinaacuterio eacute cerca de dez vezes maior que do outro
meacutetodo A lavra subterracircnea causa menos impacto visual mas os
impactos ambientais tambeacutem satildeo significativos Torna-se necessaacuterio o
descarte da aacutegua subterracircnea alterando o regime hiacutedrico e inviabiliza
outros usos do solo (KOPPE COSTA 2008 MONTEIRO 2008)
Dentre os principais impactos resultantes das lavras estatildeo as
mudanccedilas na vida da populaccedilatildeo nos recursos hiacutedricos na fauna e flora
Jaacute o processo de beneficiamento que compreende a separaccedilatildeo dos
materiais desejaacuteveis e indesejaacuteveis tem como principal causador de
impacto o rejeito (ANEEL 2008a) O Quadro 4 apresenta alguns
aspectos ambientais associados agrave atividade de mineraccedilatildeo e
processamento mineral
91
Quadro 4 - Aspectos das atividades de mineraccedilatildeo e processamento
do carvatildeo mineral Mineraccedilatildeo e
processamento
Ar Dispersatildeo de partiacuteculas
Variaccedilatildeo da composiccedilatildeo da poeira do
ar
Poeira
Solo Fontes pontuais de contaminaccedilatildeo
Geraccedilatildeo de resiacuteduos
Alteraccedilatildeo na vegetaccedilatildeo
Instabilidade de taludes
Variaccedilatildeo na morfologia do terreno
Cavidades subterracircneas
Aacutegua
superficial
Contaminaccedilatildeo quiacutemica (drenagem
aacutecida etc)
Soacutelidos em suspensatildeo
Desestabilizaccedilatildeo das margens
Alteraccedilatildeo dos cursos de aacutegua
Criaccedilatildeo de novos corpos hiacutedricos
Aacutegua
subterracircnea
Contaminaccedilatildeo quiacutemica
Alteraccedilatildeo na profundidade do niacutevel
drsquoaacutegua
Variaccedilatildeo nas propriedades dos
aquiacuteferos
Fonte CETEM (2000 p 16)
No meacutetodo mais tradicional de geraccedilatildeo de energia eleacutetrica o
carvatildeo mineral eacute queimado a altas temperaturas transformando a aacutegua da
caldeira em vapor capaz de mover a turbina gerando eletricidade Em
meacutedia as teacutermicas movidas a carvatildeo mineral produzem 700g de CO2
por Quilowatt-hora (KWh) sendo responsaacuteveis por 30 a 35 do total de
emissotildees de CO2 no mundo Aleacutem do CO2 tambeacutem emitem Nitrogecircnio
(N) (ANEEL 2008a YAMAOKA et al 2013)
As chamadas tecnologias limpas compreendem a combustatildeo
pulverizada supercriacutetica a combustatildeo em leito fluidizado e a
gaseificaccedilatildeo integrada a ciclo combinado segundo a IEA Na
combustatildeo pulverizada supercriacutetica o carvatildeo eacute queimado como partiacuteculas pulverizadas o que aumenta substancialmente a eficiecircncia da
combustatildeo e conversatildeo No processo de combustatildeo em leito fluidizado
haacute uma reduccedilatildeo de Enxofre (ateacute 90) e de Nitrogecircnio (7080) pelo
emprego de partiacuteculas calcaacuterias e de temperaturas inferiores ao processo
convencional de pulverizaccedilatildeo Jaacute a gaseificaccedilatildeo integrada a ciclo
92
combinado consiste na reaccedilatildeo do carvatildeo com vapor de alta temperatura
e um oxidante (processo de gaseificaccedilatildeo) o que daacute origem a um gaacutes
combustiacutevel sinteacutetico de meacutedio poder caloriacutefico Esse gaacutes pode ser
queimado em turbinas a gaacutes e recuperado por meio de uma turbina a
vapor (ciclo combinado) o que possibilita a remoccedilatildeo de cerca de 95
do Enxofre e a captura de 90 do Nitrogecircnio Apesar da reduccedilatildeo de
Enxofre e Nitrogecircnio as tecnologias do chamado ldquocarvatildeo limpordquo natildeo
representam uma soluccedilatildeo para a emissatildeo de gases de efeito estufa
(ANEEL 2008a MONTEIRO 2008)
Cada tecnologia tem o seu impacto Na escolha por uma
tecnologia ou outra um impacto menor natildeo eacute considerado o motivador
inicial Atender os requisitos miacutenimos da legislaccedilatildeo e ser viaacutevel do
ponto de vista econocircmico satildeo os motivadores principais das escolhas
Os interesses dos segmentos econocircmicos natildeo raro prevalecem sobre os
interesses dos segmentos sociais ldquoO planejamento pauta-se em acordos
setoriais natildeo necessariamente fruto de uma compilaccedilatildeo e mediaccedilatildeo de
interesses mais amplos da sociedaderdquo (BERMANN 2012 p 21)
O raciociacutenio eacute produzir mais e natildeo pensar em eficiecircncia
energeacutetica O paiacutes perde cerca de 20 de energia na transmissatildeo e
distribuiccedilatildeo Antes de investir em novas tecnologias e ampliar o sistema
seria interessante resolver a perda na transmissatildeo e distribuiccedilatildeo de
energia (BERMANN 2012)
34 REGRAS EM USO NUMA PERSPECTIVA HISTOacuteRICA
INTERFACE ENTRE DIREITOS AMBIENTAIS E DIREITOS
HUMANOS
O marco regulatoacuterio do carvatildeo mineral se relaciona com o modo
como a questatildeo ambiental foi sendo incorporada nas leis e numa
perspectiva mais ampla sobre como os direitos ambientais e os direitos
humanos foram sendo constituiacutedos no Brasil O desafio da justiccedila em
sua relaccedilatildeo com as poliacuteticas ambientais tem dois aspectos relacionais a
justiccedila da distribuiccedilatildeo de ambientes entre pessoas e a justiccedila da relaccedilatildeo
entre humanos e o resto do mundo natural a justiccedila ambiental e justiccedila
ecoloacutegica respectivamente A justiccedila eacute uma qualidade da conduta
humana e envolve tanto a reflexatildeo sobre si mesmo e o estar no mundo
quanto a conduta coordenada com os outros a conduta social e poliacutetica
(LOW GLEESON 1998)
93
Durante muito tempo na histoacuteria recente do brasil os recursos
naturais natildeo renovaacuteveis foram tratados como recursos a serem
explorados natildeo havia uma preocupaccedilatildeo com sua preservaccedilatildeo e com os
impactos socioambientais decorrentes das atividades econocircmicas A
Constituiccedilatildeo de 1934 mencionou pela primeira vez a competecircncia
privativa da Uniatildeo para legislar sobre o subsolo mineraccedilatildeo metalurgia
aacuteguas energia hidreleacutetrica florestas caccedila e pesca Do ponto de vista das
competecircncias a Constituiccedilatildeo de 1937 manteacutem a competecircncia privativa
da Uniatildeo sobre os recursos naturais e seus usos considerando a
competecircncia supletiva dos Estados As Constituiccedilotildees de 1946 1967-69
reproduzem com poucas atualizaccedilotildees as mesmas competecircncias
(SCARDUA BURSZTYN 2003)
A despeito do Coacutedigo das Aacuteguas de 1934 que lograva proteger
os recursos hiacutedricos e imputava ao poluidor os custos com a
recuperaccedilatildeo o setor carboniacutefero seguiu intensificando a poluiccedilatildeo das
aacuteguas e dos solos O mesmo aconteceu com as condiccedilotildees miacutenimas de
trabalho presentes no Coacutedigo de Mineraccedilatildeo e no Coacutedigo de Higiene e
Seguranccedila no Trabalho que foram sistematicamente desconsideradas
impondo condiccedilotildees muitas vezes incompatiacuteveis com a vida humana
(MENEZES CAROLA 2011)
O avanccedilo do segmento do carvatildeo mineral contou com incentivos
e proteccedilatildeo do governo federal a partir de 1931 atraveacutes do Decreto
20089 em 1940 com o Decreto 2667e o Decreto 1828 de 1937 Aleacutem
de regular o aproveitamento do carvatildeo mineral iniciou nesse momento a
obrigatoriedade de compra do carvatildeo nacional em 10 em 1931 e 20
em 1937 do montante das importaccedilotildees (BRASIL 1931 1937 1940) As
medidas tomadas nesse periacuteodo incluindo aiacute o Plano do Carvatildeo
Nacional Lei nordm 1886 de 1953 fortaleceram muito o setor (BRASIL
1953) Inclui-se nessa lista o Coacutedigo de Mineraccedilatildeo de 1967 Decreto-Lei
nordm 227 (BRASIL 1967) Junto com o Plano do Carvatildeo Mineral eacute criada
a Comissatildeo Executiva do Plano do Carvatildeo Nacional (CEPCAN) ligada
inicialmente ao Presidente da Repuacuteblica e depois ao MME A
CEPCAN foi responsaacutevel pela consolidaccedilatildeo da modernizaccedilatildeo e dos
subsiacutedios para o setor carboniacutefero (MENEZES CAROLA 2011)
A Avaliaccedilatildeo de Impacto Ambiental (AIA) apareceu no Brasil
pela primeira vez na deacutecada de 1970 no projeto da hidroeleacutetrica de
Sobradinho por pressatildeo do Banco Mundial e na Lei nordm 6803 de 1980
que dispotildee sobre zoneamento industrial Mas soacute se efetivou na Lei nordm
6938 de 1981 que dispotildee sobre a PNMA que coloca a avaliaccedilatildeo de
94
impacto ambiental como instrumento da Poliacutetica Com o Decreto nordm
88351 ela se tornou parte do licenciamento de atividades e
empreendimentos potencialmente poluidores ou causadores de
degradaccedilatildeo ambiental (BARBIERI 1995)
O CONAMA atraveacutes da Resoluccedilatildeo nordm 1 de 1986 trouxe os
criteacuterios baacutesicos e diretrizes para o uso e implementaccedilatildeo da AIA A
resoluccedilatildeo define impacto ambiental como ldquoqualquer alteraccedilatildeo das
propriedades fiacutesicas quiacutemicas e bioloacutegicas do meio ambiente causada por qualquer forma de mateacuteria ou energia resultante das atividades
humanas que direta ou indiretamente afetam I) a sauacutede e bem-estar da
populaccedilatildeo II) as atividades sociais e econocircmicas III) a biota IV) as condiccedilotildees esteacuteticas e sanitaacuterias do meio ambiente V) a qualidade dos
recursos ambientaisrdquo Os processos que envolvem o carvatildeo mineral
extraccedilatildeo beneficiamento transporte uso para geraccedilatildeo de energia satildeo
considerados passiacuteveis de causar impacto e por isso a exigecircncia da
avaliaccedilatildeo de impacto ambiental para seus licenciamentos (BARBIERI
1995)
O Decreto nordm 9927490 conta com a seguinte redaccedilatildeo
Art 19 O Poder Puacuteblico no exerciacutecio de sua
competecircncia de controle expediraacute as seguintes
licenccedilas
I - Licenccedila Preacutevia (LP) na fase preliminar do
planejamento de atividade contendo requisitos
baacutesicos a serem atendidos nas fases de
localizaccedilatildeo instalaccedilatildeo e operaccedilatildeo observados os
planos municipais estaduais ou federais de uso do
solo
II - Licenccedila de Instalaccedilatildeo (LI) autorizando o
iniacutecio da implantaccedilatildeo de acordo com as
especificaccedilotildees constantes do Projeto Executivo
aprovado e
III - Licenccedila de Operaccedilatildeo (LO) autorizando
apoacutes as verificaccedilotildees necessaacuterias o iniacutecio da
atividade licenciada e o funcionamento de seus
equipamentos de controle de poluiccedilatildeo de acordo
com o previsto nas Licenccedilas Preacutevia e de
Instalaccedilatildeo (BRASIL 1990)
Uma exigecircncia no processo de licenciamento eacute a elaboraccedilatildeo do
Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatoacuterio de Impacto
Ambiental (RIMA) A avaliaccedilatildeo de impacto ambiental conforme consta
95
na Figura 6 compreende segundo orientaccedilotildees internacionalmente
aceitas uma etapa inicial de triagem [na qual o estudo de impacto
ambiental eacute solicitado ou natildeo de acordo com o grau de possiacuteveis
impactos ambientais] uma etapa de anaacutelise detalhada [que inclui a
delimitaccedilatildeo do escopo do estudo a elaboraccedilatildeo do estudo de impacto
ambiental e do relatoacuterio de impacto ambiental a anaacutelise teacutecnica e a
consulta puacuteblica] e a etapa poacutes-aprovaccedilatildeo [que prevecirc o monitoramento
e gestatildeo ambiental e o acompanhamento] (SAacuteNCHEZ 2008a)
Figura 6 - Etapas da avaliaccedilatildeo de impacto ambiental
Fonte Adaptado de Saacutenchez (2008 p 96)
96
A audiecircncia puacuteblica no processo de licenciamento ambiental eacute
uma forma de consulta puacuteblica (consta na anaacutelise detalhada na Figura 6)
um instrumento de participaccedilatildeo de caraacuteter consultivo e informativo
segundo resoluccedilatildeo do CONAMA Nordm 009 de 03 de dezembro de 1987
A audiecircncia pode ser solicitada pelo oacutergatildeo ambiental responsaacutevel pelo
licenciamento por uma entidade civil pelo ministeacuterio puacuteblico ou por
um grupo de pelo menos 50 cidadatildeos (CONAMA 1987) Todavia a
decisatildeo no processo de licenciamento cabe aos oacutergatildeos ambientais
competentes No acircmbito federal ao IBAMA e no acircmbito estadual os
oacutergatildeos ambientais estaduais (SAacuteNCHEZ 2008a)
A Avaliaccedilatildeo Ambiental Estrateacutegica (AAE) surge dos limites da
AIA Entre esses limites estatildeo a dificuldade ldquode analisar com
profundidade alternativas tecnoloacutegicas e de localizaccedilatildeo de levar em
conta satisfatoriamente os impactos cumulativos e os impactos indiretos
satildeo inerentes a esta forma de avaliaccedilatildeo de impacto ambientalrdquo
(SAacuteNCHEZ 2008 p 4)
A Constituiccedilatildeo de 1988 traz um capiacutetulo sobre o meio ambiente e
pela primeira vez na histoacuteria do Brasil coloca o meio ambiente como
direito ldquoTodos tecircm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado bem de uso comum do povo e essencial agrave sadia qualidade de vida impondo-se ao Poder Puacuteblico e agrave coletividade o dever de
defendecirc-lo e preservaacute-lo para as presentes e futuras geraccedilotildeesrdquo (Art
225 BRASIL 1988) Cabe aos Estados Distrito Federal e Municiacutepios
acrescentar normas especiacuteficas desde que natildeo colidam com a norma
federal (BARBIERI 1995)
A descentralizaccedilatildeo estimulada pela Constituiccedilatildeo de 1988 foi
inovadora ao contemplar mecanismos de democracia participativa
complementando os mecanismos da democracia representativa todavia
essa ainda natildeo ocorreu em niacutevel satisfatoacuterio e efetivo Desde 1996 todos
os estados brasileiros contam com poliacuteticas ambientais estaduais e
oacutergatildeos responsaacuteveis pela sua implementaccedilatildeo Os municiacutepios caminham
devagar 117 contam com algum oacutergatildeo para tratar do meio ambiente e
213 possuem Conselho Municipal de Meio Ambiente (SCARDUA BURSZTYN 2003)
Outro ponto tratado na Constituiccedilatildeo de 1988 que diz respeito agrave
atividade mineradora eacute a Compensaccedilatildeo Financeira pela Exploraccedilatildeo de
Recursos Minerais (CFEM) O valor da CFEM eacute aplicado sobre o
97
faturamento liacutequido e varia de acordo com a substacircncia mineral Para o
carvatildeo aplica-se a aliacutequota de 2 O valor eacute pago mensalmente e 12
dele vai para a Uniatildeo 23 para o Estado e 65 para o municiacutepio
produtor Os recursos devem ser aplicados em projetos que direta ou
indiretamente melhorem a infra-estrutura qualidade ambiental sauacutede e
educaccedilatildeo da comunidade local (DNPM 2013) Um desafio colocado por
algumas pesquisas eacute o uso adequado da CFEM pela gestatildeo puacuteblica jaacute
que natildeo haacute uma regulamentaccedilatildeo legal para o uso do recurso (AARAtildeO
2011 ENRIacuteQUEZ 2007)
No Governo Fernando Henrique Cardoso foi aprovado o Decreto
nordm 3371 de 24 de fevereiro de 2000 que instituiu o Programa
Prioritaacuterio de Termeletricidade (BRASIL 2000) Com o apagatildeo de 2001
ressurgiu a ideia de que a seguranccedila energeacutetica do paiacutes estaria garantida
com a construccedilatildeo de mais usinas termeleacutetricas (GOLDENBERG
2012a)
Em 2010 comeccedilou a ser articulado um novo marco regulatoacuterio
para a mineraccedilatildeo no Brasil sendo lanccedilado o Projeto de Lei (PL) em
junho de 2013 Em 2014 o Congresso analisaraacute o PL 58072013
(BRASIL 2013a) fruto da Frente Parlamentar da Mineraccedilatildeo Brasileira
da qual fazem parte Celso Maldaner (PMDB) Deacutecio Lima (PT)
Jorginho Mello (Partido da Repuacuteblica - PR) Onofre Santo Agostini
(Partido Social Democraacutetico - PSD) todos eleitos por Santa Catarina
(BRASIL 2013b)
Um dos pontos polecircmicos eacute a regulamentaccedilatildeo da mineraccedilatildeo em
terras indiacutegenas quilombolas e ribeirinhas questatildeo que se situa na
interface entre direitos ambientais e direitos humanos A Constituiccedilatildeo de
1891 vinculava a propriedade do subsolo agrave do solo sendo alterada pela
Constituiccedilatildeo de 1934 ateacute os dias atuais permanecendo a natildeo existecircncia
de viacutenculo entre propriedade do solo e subsolo que pertence agrave Uniatildeo
Todavia conveacutem ressaltar que apesar do domiacutenio puacuteblico dos recursos
minerais eacute possiacutevel a apropriaccedilatildeo privada mediante concessatildeo
(BRASIL MME 2013) A principal criacutetica do novo marco regulatoacuterio eacute
a de que ldquoeacute necessaacuterio reafirmar que o lsquopuacuteblicorsquo e a lsquonaccedilatildeorsquo vivem e
ocorrem sobre o solo e natildeo no subsolo Dessa forma eacute o uso do solo que
deve definir a possibilidade da exploraccedilatildeo do subsolo e natildeo o contraacuteriordquo
(MILANEZ 2012 p 82)
O crescimento da consciecircncia ambiental relaciona-se agrave discussatildeo
histoacuterica sobre direitos humanos e do exerciacutecio desigual de direitos O
movimento ambientalista eacute fruto dessa tradiccedilatildeo de lutas por direitos
98
individuais e coletivos (GONCcedilALVES 1992) Todavia o desafio eacute
superar a visatildeo de que o natildeo-humano eacute de interesse apenas na medida
em que afeta os seres humanos A democracia a justiccedila social e os
direitos humanos satildeo condiccedilatildeo importante para enfrentar a crise mas
natildeo satildeo suficientes Eacute preciso superar tambeacutem o antropocentrismo
caminhando da justiccedila ambiental para a justiccedila ecoloacutegica (DELUCA
2007)
35 ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO
Nesta seccedilatildeo satildeo destacados os envolvidos na gestatildeo do carvatildeo
mineral no Brasil que atuam numa escala mais ampla que a estadual Os
envolvidos na gestatildeo de recursos comuns de Santa Catarina sediados no
estado seratildeo destacados no capiacutetulo quatro Os que foram aqui citados
aparecem nos documentos consultados Dessa forma conveacutem ressaltar
que pode haver outros envolvidos que natildeo estejam citados nesse
capiacutetulo
351 Segmentos poliacuteticos
A atual presidente da repuacuteblica Dilma Rousseff eleita pelo PT
tem mandato de 2011 a 2014 Em sua campanha mais de 90 da receita
foi proveniente de doaccedilotildees ao Comitecirc Financeiro Nacional Do total de
R$ 137 milhotildees e meio o setor mineral contribuiu com 10 desse
valor A Tractebel empresa geradora de energia eleacutetrica doou um
milhatildeo de reais para o Comitecirc Financeiro Nacional para Presidente da
Repuacuteblica do PT o que correspondeu a 07 da receita (OLIVEIRA
2013 TSE 2013) Do setor carboniacutefero natildeo foram identificadas
doaccedilotildees
O Ministeacuterio das Minas e Energia (MME) eacute chave tambeacutem no
processo de gestatildeo Ele foi criado em 1960 e tem como competecircncias a
formulaccedilatildeo e supervisatildeo das poliacuteticas puacuteblicas nos seguintes segmentos geologia recursos minerais e energeacuteticos aproveitamento da energia
hidraacuteulica mineraccedilatildeo e metalurgia e petroacuteleo combustiacutevel e energia
eleacutetrica inclusive nuclear Tem como ministro Edison Lobatildeo e congrega
as secretarias de Petroacuteleo Gaacutes Natural e Combustiacuteveis Renovaacuteveis a
99
Secretaria de Energia Eleacutetrica a Secretaria de Planejamento e
Desenvolvimento Energeacutetico Estatildeo vinculados ao MME o
Departamento Nacional de Produccedilatildeo Mineral (DNPM) (Criado em
1934) a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM)
(Criada em 1969 e iniciando suas atividades em 1970) a ANEEL
(Criada em 1996) o Conselho Nacional de Poliacutetica Energeacutetica (CNPE)
(Criado em 1997)
No Brasil apesar de haverem espaccedilos institucionais o debate
sobre a poliacutetica energeacutetica permanece restrito O Conselho Nacional de
Poliacutetica Energeacutetica (CNPE) criado em 1997 e regulamentado em 2000
eacute um oacutergatildeo de assessoramento da Presidecircncia da Repuacuteblica Ele tem em
sua composiccedilatildeo sete Ministros um representante dos estados e do
Distrito Federal um cidadatildeo brasileiro especialista em energia
designado pelo Presidente da Repuacuteblica e um representante de
universidade brasileira especialista em energia O CNPE eacute influente nos
rumos da poliacutetica energeacutetica nacional todavia pouco democraacutetica em
sua composiccedilatildeo A ANEEL por sua vez ao inveacutes de ser autocircnoma e
independente estaacute formalmente vinculada ao MME como autarquia e
na praacutetica demostra subordinaccedilatildeo ao governo federal (BERMANN
2001)
O Ministeacuterio do Meio Ambiente (MMA) foi criado em 1992
tendo como missatildeo ldquopromover a adoccedilatildeo de princiacutepios e estrateacutegias para
o conhecimento a proteccedilatildeo e a recuperaccedilatildeo do meio ambiente o uso
sustentaacutevel dos recursos naturais a valorizaccedilatildeo dos serviccedilos ambientais
e a inserccedilatildeo do desenvolvimento sustentaacutevel na formulaccedilatildeo e
implementaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas de forma transversal e
compartilhada participativa e democraacutetica em todos os niacuteveis e
instacircncias de governo e sociedaderdquo (MMA 2013) O CONAMA eacute o
oacutergatildeo consultivo e deliberativo do SISNAMA ambos criados em 1981
como instrumentos participativos da PNMA O CONAMA eacute o uacutenico
conselho com poder de legislar Os recursos naturais renovaacuteveis ficam
sob a tutela do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renovaacuteveis (IBAMA) criado em 1989 vinculado
posteriormente ao MMA Jaacute os recursos natildeo renovaacuteveis ficam sob tutela
do MME
O Parlamento eacute composto pelos representantes eleitos pelo povo
Ele se divide entre o Senado Federal (Senadores) e a Cacircmara dos
Deputados (Deputados Federais) e exerce o poder legislativo e
fiscalizador no Congresso Nacional Atuam tambeacutem no Parlamento a
100
Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral criada em 2005
e a Frente Parlamentar da Mineraccedilatildeo Brasileira criada em 2011 As
relaccedilotildees entre o parlamento e os segmentos econocircmicos junto agrave questatildeo
do carvatildeo mineral satildeo analisadas no capiacutetulo cinco dessa tese
(OLIVEIRA 2013)
Jaacute o Ministeacuterio Puacuteblico tem autonomia na estrutura do Estado em
relaccedilatildeo ao executivo legislativo e judiciaacuterio Cabe ao Ministeacuterio Puacuteblico
a defesa da ordem juriacutedica do regime democraacutetico dos interesses
sociais e dos interesses individuais indisponiacuteveis O Ministeacuterio Puacuteblico
da Uniatildeo divide-se em Ministeacuterio Puacuteblico Federal e os Ministeacuterios
Puacuteblicos de cada Estado da Federaccedilatildeo (BRASIL 1993 MPSC 2013)
Os segmentos poliacuteticos aqui apresentados atuam com limitaccedilotildees
mas tambeacutem oferecem brechas A sociedade deveria aproveitaacute-las para
debater os rumos da poliacutetica energeacutetica e as opccedilotildees de desenvolvimento
Contudo o contexto de energia privada e de consequente concentraccedilatildeo
de poder econocircmico se mostra prejudicial agraves questotildees ecoloacutegicas e
democraacuteticas (BERMANN 2001)
352 Segmentos econocircmicos
Os segmentos econocircmicos estatildeo organizados em associaccedilotildees
empresariais e mistas O Instituto Brasileiro de Mineraccedilatildeo (IBRAM) foi
criado em 1976 eacute uma associaccedilatildeo privada sem fins lucrativos que tem
por objetivo congregar representar promover e divulgar a induacutestria
mineral brasileira contribuindo para a sua competitividade nacional e
internacional A mineraccedilatildeo tambeacutem conta com o Consoacutercio Alumar
inaugurado em 1984 eacute um dos maiores complexos de produccedilatildeo de
alumiacutenio do mundo localiza-se no Maranhatildeo e eacute formado pelas
empresas Alcoa BHP Biliton e Rio Tinto Alcan
Os segmentos econocircmicos ligados ao carvatildeo mineral organizam-
se junto ao Sindicato Nacional da Induacutestria de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
(SNIEC) e a Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo Mineral (ABCM) O
SNIEC foi criado em 1989 em Santa Catarina reuacutene as empresas de
mineraccedilatildeo A ABCM foi constituiacuteda em 2006 e reuacutene agentes da cadeia
produtiva do carvatildeo mineradoras geradoras e transportadores O
principal objetivo da Associaccedilatildeo eacute integrar a cadeia produtiva visando o
desenvolvimento sustentaacutevel Conta com 20 empresas associadas
101
Como o tema de tese relaciona-se com a geraccedilatildeo de energia
eleacutetrica conveacutem ressaltar o papel da Cacircmara de Comercializaccedilatildeo de
Energia Eleacutetrica (CCEE) A CCEE foi criada em 2004 ela viabiliza a
compra e venda de energia em todo o paiacutes Ela reuacutene empresas de
geraccedilatildeo de serviccedilo puacuteblico produtores independentes autoprodutores
distribuidoras comercializadoras importadoras e exportadoras de
energia aleacutem de consumidores livres e especiais de todo o paiacutes
Existem empresas e cooperativas bastante influentes a niacutevel
nacional
- A Tractebel do grupo franco-belga GDF-Suez eacute a segunda
maior geradora de energia eleacutetrica privada do Brasil e maior produtora
independente de energia do mundo
- A CITIC Group estatal Chinesa eacute parceira da Eletrobraacutes no
acordo promulgado pelo Decreto nordm 6009 de 3 de janeiro de 2007
(BRASIL 2007)
- A Alunorte Alumina do Norte do Brasil SA criada em 1973
num acordo entre Brasil e Japatildeo pertencia a Vale e localiza-se no estado
do Paraacute A Vale foi privatizada em 1997 e em 2011 negociou as accedilotildees
da Alunorte com a Norsk Hydro ASA
- A ENEVA antiga MPX tendo como principais acionistas a
empresa alematilde EON com 362 e o empresaacuterio brasileiro Eike Batista
com 285 Eacute a maior geradora de energia eleacutetrica privada do Brasil
- A Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica
(CGTEE) constituiacuteda em 1997 pela Uniatildeo tornou-se uma empresa do
Sistema Eletrobraacutes em 2000 Em 2009 assinou um contrato com as
empresas Alstom Power Systems SA ndash France e com a Alstom Brasil
Energia e Transporte Ltda para recuperaccedilatildeo de caldeiras
- A estatal Companhia Paranaense de Energia (COPEL) foi criada
em 1954 abrindo seu capital em abril de 1994
- A Empresa de Pesquisa Energeacutetica (EPE) eacute uma empresa
puacuteblica criada em 2004 e tem por finalidade prestar serviccedilos na aacuterea de
estudos e pesquisas destinadas a subsidiar o planejamento do setor energeacutetico
Destaca-se nas empresas citadas um nuacutemero consideraacutevel de
empresas estrangeiras Conveacutem ressaltar aqui que as mineradoras
102
beneficiadoras e transportadoras natildeo constam nesse item por terem
influecircncia principalmente nos estados e regiotildees produtoras
353 Segmentos sociais
Os trabalhadores do setor mineral encontram-se organizados na
Associaccedilatildeo Nacional de Servidores do Departamento Nacional de
Produccedilatildeo Mineral (ANSDNPM) nos Sindicatos Metabase dentre
outros Jaacute os trabalhadores ligados ao carvatildeo mineral natildeo contam com
uma associaccedilatildeo especiacutefica em niacutevel nacional mas estatildeo organizados em
sindicatos estaduais A posiccedilatildeo dos trabalhadores em relaccedilatildeo ao carvatildeo
mineral eacute de apoio atuando em parceria com os segmentos econocircmicos
O que estaacute em jogo para os trabalhadores eacute a manutenccedilatildeo dos postos de
trabalho e seu sustento (MILANEZ et al 2013)
Os afetadosatingidosameaccedilados enfrentam dificuldades de
vaacuterias ordens no acesso agrave informaccedilatildeo falta de conhecimento teacutecnico-
cientiacutefico espaccedilo de debate restrito etc Na maioria das vezes as
decisotildees sobre empreendimentos de geraccedilatildeo de energia satildeo alimentadas
pela siacutendrome do ldquoapagatildeordquo e os direitos das populaccedilotildees atingidas
parecem ferir o ldquodireitordquo da maioria que precisa de energia
(BERMANN 2001) Mas apesar de todas as dificuldades os
afetadosatingidosameaccedilados pelo setor da mineraccedilatildeo se organizam em
frentes de defesa apoiadas por vaacuterias entidades sediadas em vaacuterias
escalas do local ao global Somam-se aiacute entidades religiosas sindicais
movimentos ambientais movimentos em defesa dos direitos humanos
movimentos indiacutegenas dentre outros Em 2012 surgiu o Movimento
Popular frente agrave Mineraccedilatildeo (MAM) e em 2013 surgiu o Comitecirc
Nacional em Defesa dos Territoacuterios Frente agrave Mineraccedilatildeo Faz parte do
Comitecirc a Federaccedilatildeo de Oacutergatildeos para a Assistecircncia Social e Educacional
(FASE) que atua desde 1961 pela democracia o Instituto de Estudos
Socioeconocircmicos (INESC) criado em 1979 e tem como principal frente
agrave questatildeo da cidadania a Conferecircncia Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB) o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) a
Articulaccedilatildeo dos Povos Indiacutegenas do Brasil (APIB) o Instituto Brasileiro de Anaacutelises Sociais e Econocircmicas (IBASE) entre outros (OLIVEIRA
2013) No caso especiacutefico do carvatildeo mineral natildeo haacute um movimento
popular ou comitecirc em acircmbito nacional embora tenha relaccedilatildeo com o
movimento e comitecirc acima referidos
103
As ONGs e representantes da comunidade acadecircmica tecircm um
papel de parceria com esses movimentos Vaacuterias publicaccedilotildees
demonstram a preocupaccedilatildeo com a questatildeo do carvatildeo mineral o
Greenpeace reprova o chamado ldquocarvatildeo limpordquo e os investimentos feitos
nesse setor (YAMAOKA et al 2013) Amigos da Terra Brasil publicou
Carvatildeo combustiacutevel de ontem com dados atualizados sobre os impactos
do carvatildeo mineral no Brasil (MONTEIRO 2008) A FASE apoiada
pela Fundaccedilatildeo Ford e pela Heinrich Boumlll Stiftung publicou em 2012 o
livro Novo marco legal da mineraccedilatildeo no Brasil Para quecirc Para
Quem (MARLERBA 2012) O IBASE com o apoio da Fundaccedilatildeo Ford
lanccedilou em 2013 Quem eacute quem nas discussotildees do novo coacutedigo da mineraccedilatildeo (OLIVEIRA 2013) Com um caraacuteter mais articulador
aparece o Foacuterum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio
Ambiente e o Desenvolvimento (FBOMS) desde 1990 e a Rede
Brasileira de Justiccedila Ambiental a partir de 2001
Os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais natildeo tecircm um
posicionamento homogecircneo em relaccedilatildeo a criacutetica ou continuidade da
exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral diferente da posiccedilatildeo dos segmentos
econocircmicos todos contam com contradiccedilotildees internas e externas As
relaccedilotildees estabelecidas nos segmentos e os diferentes posicionamentos de
segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais seratildeo examinados ao longo
dos proacuteximos capiacutetulos
36 SITUACcedilAtildeO ATUAL E DESAFIOS
O objetivo do capiacutetulo foi o de tratar a gestatildeo de recursos
comuns colocando ecircnfase no carvatildeo mineral Pela importacircncia
geopoliacutetica e econocircmica os recursos natildeo renovaacuteveis satildeo de competecircncia
do Ministeacuterio das Minas e Energia mesmo apoacutes a criaccedilatildeo do Ministeacuterio
do Meio Ambiente Dessa forma se a gestatildeo dos recursos naturais no
Brasil se pautou durante um longo periacuteodo pela preservaccedilatildeo e pela
conservaccedilatildeo os recursos naturais natildeo renovaacuteveis natildeo participaram desse
movimento A apropriaccedilatildeo e uso dos recursos naturais natildeo renovaacuteveis
passaram ao largo da regulaccedilatildeo dos recursos comuns
O segmento do carvatildeo mineral aleacutem da preocupaccedilatildeo com os
impactos socioambientais sofreu na deacutecada de 1990 com o corte dos
subsiacutedios e reorientou sua produccedilatildeo para a geraccedilatildeo de energia
termeleacutetrica Tambeacutem na geraccedilatildeo de energia eleacutetrica os novos
104
empreendimentos movidos a carvatildeo mineral passaram por um periacuteodo
sem entrar nos leilotildees de energia sendo incluiacutedos novamente em 2013
A inclusatildeo do carvatildeo mineral nos leilotildees e a reforma do Coacutedigo
de Mineraccedilatildeo demonstram a forte articulaccedilatildeo entre parte dos segmentos
poliacuteticos e econocircmicos Os segmentos sociais tecircm aiacute um grande desafio
Uma possibilidade jaacute explorada pelo movimento ambiental eacute a
interface entre direitos ambientais e direitos humanos Eacute preciso cada
vez mais politizar o tema da mineraccedilatildeo do carvatildeo mineral e da energia
Mineraccedilatildeo por quecirc Como Para quem Energia por quecirc Como Para
quem Natildeo existem respostas uacutenicas mas se parte dos segmentos
poliacuteticos e econocircmicos fazem valer seus interesses como ficam os
interesses dos segmentos sociais
Com a Poliacutetica Nacional de Meio Ambiente atraveacutes da avaliaccedilatildeo
de impacto ambiental e a Constituiccedilatildeo de 1988 surgiram novos espaccedilos
de participaccedilatildeo vistos como uma grande conquista pelo movimento
ambiental Um ponto chave para a questatildeo ambiental eacute o avanccedilo das
praacuteticas democraacuteticas E o campo de lutas por direitos envolve todas as
escalas
No Quadro 5 a seguir foi feita uma siacutentese dos principais
aspectos tratados ao longo do capiacutetulo que favorecem e questionam a
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral
Quadro 5 - Siacutentese dos pontos que favorecem e questionam a
amplicaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo
mineral por macro variaacutevel
MACRO
VARIAacuteVEIS
ASPECTOS QUE
FAVORECEM A
AMPLIACcedilAtildeO
ASPECTOS QUE
QUESTIONAM A
AMPLIACcedilAtildeO
Dinacircmicas de
desenvolvimento
- Papel central do Estado
em assegurar os interesses
privados na gestatildeo de
recursos comuns e na
poliacutetica energeacutetica
- Fragmentaccedilatildeo da gestatildeo
de recursos comuns os
recursos renovaacuteveis satildeo da
competecircncia do MMA e os
recursos natildeo renovaacuteveis satildeo
da competecircncia do MME
- Discussatildeo mundial sobre
mudanccedila ambiental global
- Brasil como fornecedor
de commodities minerais
energeacuteticas e agriacutecolas e
- Atuaccedilatildeo do movimento
ambiental
105
- Privatizaccedilatildeo do setor
eleacutetrico
- subsiacutedios aos combustiacuteveis
foacutesseis
- Matriz energeacutetica
brasileira considerada limpa
em relaccedilatildeo a outros paiacuteses
justifica a ampliaccedilatildeo do uso
de combustiacuteveis foacutesseis e
- Visatildeo do planejamento
energeacutetico eacute aumentar a
oferta de energia eleacutetrica
Atributos fiacutesicos
e tecnoloacutegicos
- Disponibilidade do
recurso
- Evoluccedilatildeo tecnoloacutegica
- Neutralidade ldquodardquo e
confianccedila ldquonardquo tecnologia
- Ecircnfase na produccedilatildeo e natildeo
na eficiecircncia energeacutetica
- O Brasil natildeo tem uma
cultura do carvatildeo mineral a
atividade estaacute restrita ao sul
do paiacutes
- Mineraccedilatildeo impede outros
usos do solo
- Evoluccedilatildeo tecnoloacutegica natildeo
garante minimizaccedilatildeo dos
impactos socioambientais
- Escolhas teacutecnicas satildeo
escolhas poliacuteticas natildeo satildeo
neutras
- Necessidade de aumento
da eficiecircncia energeacutetica
Regras em uso - Desregulamentaccedilatildeo e
flexibilizaccedilatildeo das leis
(Coacutedigo de Mineraccedilatildeo)
- A CFEM faz com que o
governo em todos os seus
niacuteveis administrativos
ganhe com a exploraccedilatildeo
mineral
- Participaccedilatildeo tutelada
- Avanccedilo nas leis
(Exigecircncia da AIA nos
licenciamentos)
- Ampliaccedilatildeo da
participaccedilatildeo via audiecircncia
puacuteblica accedilatildeo civil puacuteblica
etc
- Relaccedilatildeo entre direitos
ambientais e direitos
humanos
Arena de accedilatildeo
(Caracterizaccedilatildeo
dos envolvidos
na gestatildeo)
- Parte dos segmentos
poliacuteticos tecircm parcerias com
os segmentos econocircmicos
atraveacutes de doaccedilotildees de
campanha e atraveacutes da
atuaccedilatildeo de parlamentares na
Frente Parlamentar Mista
em Defesa do Carvatildeo
Mineral
- Parte dos segmentos
poliacuteticos possuem
instacircncias participativas e
destaca-se tambeacutem a
atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico
- Os segmentos sociais
exceto o movimento
sindical estatildeo organizados
106
- Os segmentos econocircmicos
estatildeo organizados de vaacuterias
formas (sindicato
associaccedilatildeo instituto
cacircmara consoacutercio) e as
empresas exceto a COPEL
e a EPE satildeo
majoritariamente de capital
estrangeiro
- Nos segmentos sociais
destaca-se o apoio dos
sindicatos agrave causa do carvatildeo
mineral
e atuantes no
questionamento da
ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica movida a
carvatildeo mineral
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na macro variaacutevel arena de accedilatildeo a variaacutevel da democracia
apresenta limites relacionadas aos problemas da democracia
representativa e a reduccedilatildeo da participaccedilatildeo aos espaccedilos existentes Nas
oportunidades destacam-se a organizaccedilatildeo dos segmentos sociais (no
MAM e no Comitecirc Nacional em Defesa dos Territoacuterios Frente agrave
Mineraccedilatildeo) nas redes que unem ONGs academia e
afetadosatingidosameaccedilados e as publicaccedilotildees (Quadro 6)
Quadro 6 ndash Limites e oportunidades do sistema democraacutetico no
Brasil VARIAacuteVEL LIMITES OPORTUNIDADES
Fortalecimento do
sistema
democraacutetico
- Democracia
representativa
- Reduccedilatildeo da
participaccedilatildeo aos
espaccedilos existentes
- Organizaccedilatildeo dos Segmentos
sociais
- Redes unindo ONGs
academia e
afetadosatingidos
ameaccedilados
- Publicaccedilotildees
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Se a aprendizagem social adaptativa eacute chave nesse processo para
que ela ocorra defende-se a hipoacutetese de que o fortalecimento do sistema
democraacutetico se faz necessaacuterio A compreensatildeo da ampliaccedilatildeo da energia
107
termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral aleacutem das evidecircncias descritas
nesse capiacutetulo depende tambeacutem da investigaccedilatildeo dos processos do
ponto de vista do exerciacutecio da democracia em todas as escalas espaciais
e entre os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais A questatildeo passa
pelo modo como os recursos satildeo explorados mas coloca tambeacutem em
questatildeo os objetivos e a direccedilatildeo do desenvolvimento (MELUCCI
2001)
4 CARVAtildeO MINERAL EM SANTA CATARINA
Eacute o duplo resultado da extraccedilatildeo do carvatildeo bens e
riquezas de um lado pirita e restos de homens de
outro (VOLPATO 1984 p 16)
A gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina foi marcada pela
apropriaccedilatildeo privada dos recursos e seu uso serviu principalmente ao
crescimento econocircmico As poliacuteticas ambientais por sua vez foram
condicionadas e limitadas pelos interesses poliacuteticos e econocircmicos e o
oacutergatildeo responsaacutevel a FATMA adotou uma postura de defesa das causas
ambientais sem desestruturar o crescimento econocircmico Nesse contexto
o discurso do carvatildeo foi habilmente sustentado do ponto de vista
material cultural psicoloacutegico e simboacutelico (CAROLA 2004)
O segmento do carvatildeo mineral alternou desde as primeiras
deacutecadas do seacuteculo XX periacuteodos de crescimento e periacuteodos de crise Os
periacuteodos de crescimento amparados por incentivos do governo federal
e os momentos de crise associados a momentos de crise na esfera
governamental Isso levou os segmentos econocircmicos da regiatildeo sul
catarinense a se articularem cada vez mais com os segmentos poliacuteticos
visando a proteccedilatildeo do segmento e a continuidade da mineraccedilatildeo do
carvatildeo no Sul de Santa Catarina Uma das estrateacutegias mais recentes eacute a
construccedilatildeo da USITESC
Cerca de 95 do carvatildeo mineral extraiacutedo na regiatildeo tem como
destino a geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica Se observados os dados sobre
geraccedilatildeo e consumo de energia eleacutetrica em Santa Catarina o estado natildeo eacute
autossuficiente Em 2012 o estado produziu 16963 Gigawatt-hora
(GWh) consumiu 21601 GWh O consumo industrial ficou em 9312
GWh 431 do total consumido no estado e o consumo residencial foi
de 4699 GWh 218 do total consumido (ANEEL 2014 EPE 2013)
O carvatildeo mineral foi responsaacutevel pelo equivalente a 35 da eletricidade
gerada em Santa Catarina (ALESC 2013)
Existem fortes argumentos para que a geraccedilatildeo de energia
termeleacutetrica se amplie contudo o histoacuterico de impactos socioambientais
poderia ser impeditivo Buscando aprofundar a reflexatildeo sobre os
argumento proacute e contra a ampliaccedilatildeo o objetivo deste capiacutetulo eacute tratar da
gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina com destaque agrave gestatildeo do
carvatildeo mineral considerando as macro variaacuteveis presentes no modelo de
110
anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns (HESS OSTROM 2005
OAKERSON 1992 POLSKI OSTROM 1992)
Inicialmente eacute apresentada uma breve siacutentese de como foi se
organizando a gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina tendo
como eixo central o oacutergatildeo responsaacutevel pelas questotildees ambientais no
estado a FATMA Na sequecircncia as seccedilotildees contextualizam o carvatildeo
mineral na trajetoacuteria de desenvolvimento do Sul de Santa Catarina e
tratam das mudanccedilas ocorridas na extraccedilatildeo do carvatildeo mineral bem
como de seus impactos na regiatildeo Satildeo ainda discutidas as regras em uso
incorporando as alteraccedilotildees recentes do Coacutedigo Estadual do Meio
Ambiente de Santa Catarina e eacute feita uma breve caracterizaccedilatildeo da arena
de accedilatildeo com uma descriccedilatildeo dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais envolvidos na gestatildeo do recurso A forma como a gestatildeo de
recursos comuns se organiza em Santa Catarina revela aspectos
importantes para a compreensatildeo da ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica
bem como aspectos que ldquocoloquem em chequerdquo a continuidade da
atividade carboniacutefera
41 ldquoCombinandordquo crescimento econocircmico e proteccedilatildeo ambiental
Santa Catarina fez parte da histoacuteria do Brasil num primeiro
momento como territoacuterio de passagem para o gado gauacutecho e gerava
produtos primaacuterios para satisfazer as necessidades locais Na segunda
metade do seacuteculo XIX foram implantadas as primeiras induacutestrias do
estado A industrializaccedilatildeo catarinense teve em seu iniacutecio uma estreita
ligaccedilatildeo com os movimentos migratoacuterios da Alemanha e Itaacutelia jaacute que os
imigrantes tinham formaccedilatildeo intelectual e profissional e viveram a
modernizaccedilatildeo provocada pela Revoluccedilatildeo Industrial Destacaram-se
nesse periacuteodo a induacutestria tecircxtil alimentar e madeireira e o uso
energeacutetico do carvatildeo vegetal (THEIS 1988)
No final do seacuteculo XIX o estado ainda tinha uma economia
predominantemente agriacutecola e foram os produtos primaacuterios que
possibilitaram a geraccedilatildeo de capital para o investimento na induacutestria Na
histoacuteria de Santa Catarina dois marcos se destacaram na disputa pela
hegemonia na apropriaccedilatildeo dos recursos comuns o Genociacutedio Indiacutegena e
a Guerra do Contestado A desobstruccedilatildeo das aacutereas contestadas e
daquelas ocupadas pelos Carijoacute Xokleng e Kaingang foram
fundamentais para ampliar a apropriaccedilatildeo privada dos recursos naturais
111
(BORINELLI 1998) Aleacutem disso para sustentar o processo de
industrializaccedilatildeo em Santa Catarina no iniacutecio do seacuteculo XX ocorreu a
instalaccedilatildeo de pequenas usinas hidraacuteulicas e o aumento no uso do carvatildeo
mineral Na Primeira Guerra Mundial o carvatildeo mineral passou a ter
destaque possibilitando o surgimento da induacutestria carboniacutefera (THEIS
1988)
Ateacute a deacutecada de 1960 a regulaccedilatildeo dos recursos comuns foi
marcada pelo poder federal Todavia no campo econocircmico o estado
catarinense assumiu para si diversas funccedilotildees na promoccedilatildeo do
desenvolvimento econocircmico Data dessa eacutepoca a criaccedilatildeo do Banco
Estadual de Santa Catarina a Caixa Estadual de Santa Catarina do
Fundo de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina da
Universidade para o Desenvolvimento de Santa Catarina e a instalaccedilatildeo
de 46 escritoacuterios locais da Associaccedilatildeo de Creacutedito e Assistecircncia Rural de
Santa Catarina (ACARESC) e a Companhia Telefocircnica de Santa
Catarina (BORINELLI 1998) O sistema poliacutetico por sua vez teve um
predomiacutenio conservador relacionado principalmente com a dominaccedilatildeo
oligaacuterquica As lideranccedilas empresariais encontravam-se acomodadas nos
grandes partidos (CARREIRAtildeO 1990)
O crescimento econocircmico somado a uma regulaccedilatildeo dos recursos
naturais que privilegiava o acesso privado deu forma agrave crise ambiental
que teve lugar em Santa Catarina apoacutes a deacutecada de 1970 O consumo de
energia eleacutetrica com o processo de industrializaccedilatildeo catarinense
aumentou sensivelmente O consumo final de energia do setor industrial
ficou numa meacutedia de 60 O modelo de desenvolvimento
industrializante de Santa Catarina implicou natildeo apenas num elevado
consumo de energia mas tambeacutem numa exploraccedilatildeo inadequada da
natureza (THEIS 1988)
No Governo Konder Reis em 1975 foi criada a Secretaria de
Tecnologia e Meio Ambiente (SETMA) o Conselho Estadual de
Tecnologia e Meio ambiente (CETMA) e a FATMA na eacutepoca
Fundaccedilatildeo de Amparo agrave Tecnologia e Meio Ambiente A FATMA esteve
vinculada a SETMA ateacute sua extinccedilatildeo em 1977 Para o Governo Konder
Reis a finalidade baacutesica da SETMA era ldquoservir numa primeira fase ao
desenvolvimento do Estadordquo Dentre as principais preocupaccedilotildees
ambientais estavam os serviccedilos de aacutegua e esgoto e contraditoriamente o
aumento da produccedilatildeo mineral e da oferta de madeira (BORINELLI
1998)
112
Todas as unidades de conservaccedilatildeo estaduais foram criadas no
periacuteodo de 1975 a 1983 sob a influecircncia direta de Raulino Reitz Parque
Estadual da Serra Tabuleiro (1975) Reserva Bioloacutegica Estadual de
Sassafraacutes (1977) Parque Estadual da Serra Furada e Reserva Bioloacutegica
da Canela Preta (1980) e Reserva Bioloacutegica Estadual de Aguaiacute (1983)
(BORINELLI 1998 MASSIGNAN 1995)
O primeiro secretaacuterio da SETMA foi Augusto Batista Pereira
empresaacuterio do setor carboniacutefero A preocupaccedilatildeo principal da SETMA no
primeiro ano foi de implantar uma Usina Sideruacutergica no Sul do Estado
Nessa eacutepoca foi construiacuteda a Usina Teacutermica Jorge Lacerda a Induacutestria
Carboquiacutemica Catarinense (ICC) e a proposta da Sideruacutergica
Catarinense Havia tambeacutem uma preocupaccedilatildeo com a poluiccedilatildeo industrial
com a balneabilidade e com os recursos hiacutedricos no geral (BORINELLI
1998 MASSIGNAN 1995)
Da segunda parte da deacutecada de 1970 ateacute meados da deacutecada de
1980 a agenda ambiental foi se ampliando passando a exigir da
FATMA respostas mais consistentes (BORINELLI 1998) O intervalo
de tempo compreendido entre 1979 a 1982 marcou o fim do periacuteodo de
maior crescimento econocircmico de Santa Catarina Durante o periacuteodo
conservador do Governo Estadual e no novo contexto democraacutetico a
poliacutetica ambiental sofreu um grande desgaste com a crise econocircmica e
fiscal
As forccedilas conservadoras continuaram atuantes com a eleiccedilatildeo de
Esperidiatildeo Amin para governador (1983-1987) e os problemas
ambientais continuaram divorciados de outras poliacuteticas setoriais
(econocircmicas de ciecircncia e tecnologia minerais) O licenciamento
ambiental entrou como atividade inovadora e a FATMA na condiccedilatildeo
de fundaccedilatildeo passava a imagem de independecircncia em relaccedilatildeo ao estado
o que na praacutetica natildeo acontecia e tornava difusa a responsabilidade sobre
a poliacutetica ambiental (BORINELLI 1998) Entre os anos de 1983 e 1987
o oacutergatildeo diretamente envolvido com o Planejamento Ambiental no
Estado de Santa Catarina era o Gabinete de Planejamento (GAPLAN)
(SDS 2014)
Mesmo sendo baseada na pequena propriedade rural Santa Catarina sofreu com o enfraquecimento da pequena produccedilatildeo rural
aumentando o ecircxodo rural e consequentemente os problemas urbanos
Em termos socioambientais intensificaram-se os processos de
degradaccedilatildeo ecossistecircmica mau uso do solo falta de saneamento
impacto do turismo nas zonas costeiras etc (VIEIRA CUNHA 2002)
113
A incapacidade de resolver a contento estas tensotildees inaugurava o
reconhecimento de uma crise ambiental em Santa Catarina e uma crise
institucional da FATMA Nos municiacutepios foram criados os Conselhos
Municipais de Defesa Ambiental (CONDEMA) oacutergatildeos consultivos de
assessoramento das Prefeituras Os membros do CONDEMA eram
escolhidos pelos Prefeitos Em 1983 foram criados trecircs escritoacuterios
regionais da FATMA em Joinville Chapecoacute e Joaccedilaba totalizando
quatro com o escritoacuterio de Criciuacutema criado em 1979 Apesar disso as
poliacuteticas ambientais continuaram condicionadas e limitadas pelos
interesses poliacuteticos e econocircmicos (BORINELLI 1998)
Na linha da natildeo responsabilizaccedilatildeo durante muito tempo os
empresaacuterios do segmento do carvatildeo mineral atuaram livremente na
regiatildeo Sul de Santa Catarina gerando o maior passivo ambiental do
estado Em 1983 a FATMA foi incumbida de licenciar e fiscalizar essa
atividade fazendo um acordo com as empresas que assumiram o
compromisso de instalar equipamentos e modificar processos visando a
diminuiccedilatildeo dos impactos Mesmo assim treze anos depois em 1996 o
diretor da FATMA veio a puacuteblico declarar que natildeo era possiacutevel
identificar os responsaacuteveis pelos impactos na regiatildeo e que a sociedade
pagaria o custo da recuperaccedilatildeo cerca de 70 milhotildees de doacutelares
(BORINELLI 1998)
Nos anos 1990 proliferaram denuncias de corrupccedilatildeo envolvendo
oacutergatildeos ambientais federais e estaduais em processos de licenciamento
apontando para a crise do Estado a fragilidade da democracia e dos
mecanismos de controle puacuteblico das instituiccedilotildees O aumento da procura
por licenciamento ambiental trouxe agrave FATMA uma posiccedilatildeo mais
influente entre os segmentos econocircmicos e poliacuteticos e aumentou
tambeacutem sua autonomia financeira atraveacutes dos licenciamentos
ambientais Apesar disso sua trajetoacuteria estaacute marcada por uma atuaccedilatildeo na
defesa das causas ambientais sem desestruturar o desenvolvimento
econocircmico (BORINELLI 2013 2007)
114
42 O sul catarinense uma trajetoacuteria marcada pelo carvatildeo mineral
A regiatildeo Sul Catarinense eacute formada por 46 municiacutepios agrupados
em trecircs microrregiotildees Araranguaacute8 Criciuacutema
9 e Tubaratildeo
10 Tem como
limites o Oceano Atlacircntico a Leste a mesorregiatildeo da Grande
Florianoacutepolis e Serrana no estado de Santa Catarina e a Mesorregiatildeo
Metropolitana de Porto Alegre e Nordeste Rio-Grandense no estado do
Rio Grande do Sul
Figura 7 ndash Mapa de localizaccedilatildeo da Bacia Carboniacutefera Santa
Catarina
Fonte Concepccedilatildeo de Luciana Butzke Elaborado por Ruy Lucas de
Souza
8 Municiacutepios Araranguaacute Balneaacuterio Arroio do Silva Balneaacuterio Gaivota Ermo
Jacinto Machado Maracajaacute Meleiro Morro Grande Passo de Torres Praia
Grande Santa Rosa do Sul Satildeo Joatildeo do Sul Sombrio Timbeacute do Sul e Turvo 9 Municiacutepios Balneaacuterio Rincatildeo Cocal do Sul Criciuacutema Forquilhinha Iccedilara
Lauro Muller Morro da Fumaccedila Nova Veneza Sideroacutepolis Treviso e
Urussanga 10
Municiacutepios Armazeacutem Braccedilo do Norte Capivari de Baixo Garopaba Gratildeo
Paraacute Gravatal Imaruiacute Imbituba Jaguaruna Lagura Orleans Pedras Grandes
Pescaria Brava Rio Fortuna Sangatildeo Santa Rosa de Lima Satildeo Ludgero Satildeo
Martinho Treze de Maio e Tubaratildeo
115
Os municiacutepios da regiatildeo se dividem em trecircs associaccedilotildees de
municiacutepios a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios do Extremo Sul Catarinense
(AMESC)11
a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera
(AMREC)12
e a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo de Laguna
(AMUREL)13
(FECAM 2014) (Figura 7) A regiatildeo possui tambeacutem
quatro Secretarias de Desenvolvimento Regional (SDR) SDR de
Laguna SDR de Tubaratildeo SDR de Criciuacutema e SDR de Araranguaacute
(SANTA CATARINA 2014a)
Na aacuterea existem quatro feiccedilotildees geoloacutegicas as rochas
cristalinas e metamoacuterficas mais antigas do ldquoembasamento cristalinordquo a
sucessatildeo de rochas sedimentares gondwacircnicas que contecircm as camadas
de carvatildeo os derrames baacutesicos aacutecidos e intermediaacuterios da Formaccedilatildeo
Serra Geral e os sedimentos litoracircneos recentes (SCHEIBE 2000)
Na regiatildeo sul localizam-se duas regiotildees hidrograacuteficas
pertencentes agrave Vertente Atlacircntica a Regiatildeo Hidrograacutefica Sul
Catarinense que tem como bacias hidrograacuteficas a Bacia Hidrograacutefica do
Rio Tubaratildeo e a Bacia Hidrograacutefica do Rio drsquoUna contando com 5733
km2 e a Regiatildeo Hidrograacutefica do Extremo Sul Catarinense tendo como
bacias hidrograacuteficas a Bacia do Rio Urussanga a Bacia Hidrograacutefica do
Rio Araranguaacute e a Bacia Hidrograacutefica do Rio Mambituba contando com
5052 km2 (SANTA CATARINA 2006)
O relevo predominante eacute o forte ondulado e montanhoso com
ocorrecircncia de plano e suave ondulado na planiacutecie costeira Jaacute os solos
predominantes na Regiatildeo Hidrograacutefica Sul Catarinense satildeo os
mediamente profundos de origem graniacutetica pouco feacuterteis e aacutecidos
apresentando pedregosidade Na Regiatildeo Hidrograacutefica Extremo Sul
Catarinense predominam os solos mediamente profundos cascalhentos
11
Municiacutepios filiados Araranguaacute Balneaacuterio Arroio do Silva Balneaacuterio
Gaivota Ermo Jacinto Machado Maracajaacute Meleiro Morro Grande Passo de
Torres Praia Grande Santa Rosa do Sul Satildeo Joatildeo do Sul Sombrio Timbeacute do
Sul e Turvo 12
Municiacutepios filiados Balneaacuterio Rincatildeo Cocal do Sul Criciuacutema Forquilhinha
Iccedilara Lauro Muller Morro da Fumaccedila Nova Veneza Orleans Sideroacutepolis
Treviso e Urussanga 13
Municiacutepios filiados Armazeacutem Braccedilo do Norte Capivari de Baixo Gratildeo
Paraacute Gravatal Imaruiacute Imbituba Jaguaruna Laguna Pedras Grandes Pescaria
Brava Rio Fortuna Sangatildeo Santa Rosa de Lima Satildeo Ludgero Satildeo Martinho
Treze de Maio e Tubaratildeo
116
com baixa fertilidade de origem graniacutetica e sedimentar (SANTA
CATARINA 2006)
Na regiatildeo predomina a Floresta Tropical Atlacircntica e a Vegetaccedilatildeo
Litoracircnea contando com trecircs Unidades de Conservaccedilatildeo estaduais o
Parque Estadual da Serra do Tabuleiro (criado em 1975) o Parque
Estadual da Serra Furada (1980) e a Reserva Bioloacutegica Estadual do
Aguaiacute (1983) e duas Unidades de Conservaccedilatildeo Federais o Parque
Nacional de Satildeo Joaquim (1961) e a Aacuterea de Proteccedilatildeo Integral da Baleia
Franca (2000) (SANTA CATARINA 2006)
Em 2010 a regiatildeo contava com uma populaccedilatildeo de 906927
habitantes e uma densidade populacional de 944 habkm2 Em 2009 a
movimentaccedilatildeo econocircmica segundo a composiccedilatildeo do PIB foi de R$ 147
bilhotildees que equivale a 113 do PIB estadual ocupando a quinta
posiccedilatildeo no ranking estadual entre as nove macrorregiotildees (SEBRAE
2013a)
A ocupaccedilatildeo do sul do Brasil contou com a presenccedila de grupos
caccediladores-coletores (aproximadamente 8000 anos) pescadores-
coletores (6000 e 4000 anos) ceramistas TaquaraItarareacute e Guarani e
horticultores (1000 anos) (CAMPOS et al 2013) Em 1877 chegaram
os italianos seguidos de poloneses e alematildees Os primeiros nuacutecleos
coloniais foram Azambuja (1877) Urussanga (1878) Satildeo Joseacute de
Cresciuacutema (1880) Cocal (1885) Nova Veneza (1890) Nova Belluno
(1891) dentre outros As lavras de carvatildeo surgiram em Santa Catarina
no final do seacuteculo XIX por iniciativa de uma empresa britacircnica Ateacute
entatildeo a economia da regiatildeo era agriacutecola A transformaccedilatildeo urbano-
industrial foi estimulada pelo carvatildeo que vinculava-se a ideia de
progresso Eacute marcante a presenccedila do carvatildeo nos hinos das cidades
monumentos festas de Santa Baacuterbara (Protetora dos Mineiros) houve
uma fusatildeo entre a memoacuteria da imigraccedilatildeo e a memoacuteria do carvatildeo
(CAROLA 2004 GOULARTI FILHO LIVRAMENTO 2004a)
A Primeira Guerra Mundial marcou o aumento da produccedilatildeo do
carvatildeo mineral destacando-se a Companhia Carboniacutefera de Araranguaacute
(CBCA) (1917) a Companhia Carboniacutefera Urussanga (1918) e a
Companhia Carboniacutefera Proacutespera (1921) Em 1920 Santa Catarina jaacute contava com alguns elementos importantes para um complexo
carboniacutefero minas ferrovia e porto Em 1924 com a Lei nordm 4801
abordou-se pela primeira vez a possibilidade de construccedilatildeo de uma usina
sideruacutergica no estado Isso se concretizou em 1941 no Governo Getuacutelio
117
Vargas com a fundaccedilatildeo da Companhia Sideruacutergica Nacional (CSN)
(KOPPE COSTA 2008 MORAES 2003)
Nos periacuteodos referentes ao Plano de Metas (1956-1960) e Plano
Nacional do Desenvolvimento (1974 a 1978) o clima estava propiacutecio
para o aumento da produccedilatildeo do carvatildeo mineral No Plano de Metas
surgiu a Sociedade Termoeleacutetrica de Capivari SA (SOLTECA)
passando depois a se chamar Complexo Termoeleacutetrico Jorge Lacerda
constituiacuteda em 1957 entrou em operaccedilatildeo em 1965 No periacuteodo do Plano
Nacional do Desenvolvimento foi construiacuteda a ICC e o Complexo Jorge
Lacerda foi ampliado (KOPPE COSTA 2008 MORAES 2003)
O primeiro boom do setor foi na ocasiatildeo da Primeira Guerra
Mundial e depois durante a Segunda Guerra Mundial com a produccedilatildeo
aumentando em 300 Com o fim da Segunda Guerra o governo
acabou com as cotas e o setor entrou em crise A reaccedilatildeo do segmento do
carvatildeo mineral foi a ldquobatalha do carvatildeordquo14
e o governo reagiu criando a
CEPCAM e retornando agraves cotas Em 1973 com a crise do petroacuteleo o
setor passou novamente por um boom O auge da mineraccedilatildeo foi entre
1982 a 1985 No periacuteodo aacuteureo do carvatildeo poucas vozes denunciavam as
peacutessimas condiccedilotildees de trabalho tudo em nome do progresso pois o
carvatildeo mineral representava a consolidaccedilatildeo da induacutestria de base no
Brasil De 1970 em diante onze empresas pertencentes a empresaacuterios
locais passaram a explorar o carvatildeo mineral (CAROLA 2004
GOULARTI FILHO 2002)
Ateacute 1990 o Sul de Santa Catarina tinha a primazia em termos de
volume de produccedilatildeo nuacutemero e mecanizaccedilatildeo de minas trabalhadores
empregados e valores econocircmicos entrando em crise a partir daiacute com
sua desregulamentaccedilatildeo no Governo Collor O que precisa ser destacado
eacute que a crise da deacutecada de 1990 natildeo foi a ldquocrise do carvatildeordquo As
induacutestrias de ceracircmica vestuaacuterio e plaacutestico localizadas no Sul tambeacutem
sofreram com a recessatildeo de 1990 a 1992 (BEacuteRZIN 2005 GOULARTI
FILHO 2002 MORAES 2003)
A deacutecada de 1990 foi marcada pelo fechamento e desestatizaccedilatildeo
das induacutestrias do complexo carboniacutefero e eliminaccedilatildeo dos benefiacutecios
governamentais O lavador de Capivari foi fechado em 1992 a ICC
14
A ldquobatalha do carvatildeordquo compreende a adoccedilatildeo de estrateacutegias por parte dos
segmentos econocircmicos envolvidos com o carvatildeo mineral visando pressionar e
convencer o governo federal a apoiar a continuidade da atividade (CAROLA
2010)
118
passou para o controle da Petrobraacutes em 1993 A CSN foi privatizada em
1993 e a Companhia Proacutespera propriedade da CSN foi vendida para a
Nova Proacutespera A Ferrovia Teresa Cristina foi privatizada em 1996 e o
Complexo Jorge Lacerda em 1998 (BEacuteRZIN 2005 GOULARTI
FILHO 2002 MORAES 2003)
O setor carboniacutefero foi cedendo espaccedilo para a induacutestria de
revestimento ceracircmico de plaacutesticos e descartaacuteveis do vestuaacuterio de
calccedilados e metal-mecacircnica Em 1985 a atividade do carvatildeo era a que
mais empregava na regiatildeo sul com 10536 trabalhadores Em 2000
passou para a quinta posiccedilatildeo com 2752 trabalhadores empregados
(GOULARTI FILHO 2005) Em 2010 as atividades econocircmicas que
mais se destacaram foram Induacutestria de transformaccedilatildeo com 3395
estabelecimentos e 58652 trabalhadores seguida por serviccedilos com
16971 estabelecimentos e 47956 trabalhadores em terceiro Comeacutercio
com 7062 estabelecimentos e 34467 trabalhadores construccedilatildeo civil
com 828 estabelecimentos e 6641 trabalhadores induacutestria extrativa
mineral com 78 estabelecimentos e 4083 trabalhadores As atividades
que mais empregavam vestuaacuterio minerais natildeo metaacutelicos (ceracircmica)
alimentar e plaacutestico (FIESC 2012)
Em 2012 as mineradoras empregavam em Santa Catarina 4042
trabalhadores no Paranaacute 358 e no Rio Grande do Sul 734 trabalhadores
Jaacute o faturamento para o mesmo ano foi de R$ 49231200000 (Tabela 3)
(SATC 2012)
Tabela 3 - Faturamento do Segmento do Carvatildeo Mineral 2012
Estado Total (R$)
Paranaacute 2602336257
RG Sul 29354141523
S Catarina 49231200000
Total de R$ 81187677780
Fonte SATC (2012 p 11)
Jaacute a arrecadaccedilatildeo da CFEM para o ano de 2013 ficou em R$
358664403 contando os municiacutepios de Treviso (R$ 356903710)
Lauro Muller (R$ 1570791) e Urussanga (R$ 189902) para um total de R$ 18589306884 (DNPM 2014)
Aleacutem de ocupar o primeiro lugar em faturamento e na
arrecadaccedilatildeo da CFEM Santa Catarina tambeacutem ocupa o primeiro lugar
na produccedilatildeo de carvatildeo bruto considerando os trecircs estados do Sul do
Brasil conforme dados da Tabela 4
119
Tabela 4 - Produccedilatildeo de carvatildeo bruto (ROM) de 2009 a 2012
ESTADOS PRODUCcedilAtildeO ROM (t)
2009 2010 2011 2012
Santa Catarina 8208063 6278327 6570292 6097496
Rio Grande do Sul 4585050 5010779 5153199 5134217
Paranaacute 351930 293329 344161 315131
Brasil 13145043 11582435 12067652 11546844
SCBrasil () 6244 5421 5445 5281
Ranking de SC 1ordm 1ordm 1ordm 1ordm
Fonte Fiesc (2012 p 68) SATC (2012)
O segmento do carvatildeo mineral no Sul de Santa Catarina apesar
do destaque na produccedilatildeo do carvatildeo bruto teve ao longo dos uacuteltimos
anos sua participaccedilatildeo diminuiacuteda em nuacutemero de empregos Isso
demonstra uma maior diversificaccedilatildeo econocircmica e poderia representar a
possibilidade de reconversatildeo da atividade Contudo as accedilotildees do
segmento do carvatildeo mineral e dos segmentos poliacuteticos caminham para a
continuidade e ampliaccedilatildeo da atividade e natildeo para sua reconversatildeo
Um importante passo para o questionamento da atividade
carboniacutefera foi dado em 1993 O passivo ambiental resultante da
atividade carboniacutefera foi alvo de uma accedilatildeo civil puacuteblica (processo
938000533-4) Os reacuteus da accedilatildeo foram as empresas carboniacuteferas seus
diretores e soacutecios majoritaacuterios do Estado de Santa Catarina e da Uniatildeo
totalizando 24 reacuteus (MPF 2012)
A sentenccedila foi declarada em 05012000 tendo como resultado a
condenaccedilatildeo dos reacuteus A eles foi solicitado a elaboraccedilatildeo de ldquoum projeto
de recuperaccedilatildeo da regiatildeo que compotildee a Bacia Carboniacutefera do Sul do Estadordquo contemplando ldquoas aacutereas de depoacutesitos de rejeitos aacutereas
mineradas a ceacuteu aberto e minas abandonadas bem como o
desassoreamento fixaccedilatildeo de barrancas descontaminaccedilatildeo e retificaccedilatildeo dos cursos drsquoaacutegua aleacutem de outras obras que visem amenizar os danos
sofridos principalmente pela populaccedilatildeo dos municiacutepios-sede da extraccedilatildeo e do beneficiamentordquo (MPF 2012)
Apoacutes os acordos e imposiccedilotildees judiciais os passivos ambientais
foram distribuiacutedos de acordo com a responsabilidade das empresas
(Tabela 5)
120
Tabela 5 - Distribuiccedilatildeo de passivos ambientais em relaccedilatildeo agraves
empresas
RESPONSAacuteVEL HECTARES
CSN 1336 26
Uniatildeo 1215 24
Rio Deserto 571 11
Catarinense 522 10
Criciuacutema 457 9
Cocalit 181 4
Outras empresas 807 16
Fonte MPF (2012)
As aacutereas terrestres a recuperar totalizam 5094 hectares em 217
diferentes aacutereas da Bacia Carboniacutefera O cronograma de recuperaccedilatildeo
compreende o periacuteodo de 2012 a 2020 e um total de 3726 hectares
(Tabela 6) (MPF 2012)
Tabela 6 - Cronograma de recuperaccedilatildeo dos passivos ambientais
Ano conclusatildeo Hectares a serem
recuperadas
Acumulado da
recuperaccedilatildeo
Obras jaacute concluiacutedas e assim
consideradas apoacutes vistorias
526 526
2012 1142 1667
2013 205 1872
2014 528 2400
2015 141 2542
2016 560 3102
2017 84 3186
2018 71 3257
2019 382 3639
2020 87 3726
3726
Fonte MPF (2012)
121
Os 1365 hectares restantes natildeo dispotildeem de cronogramas
definidos e representam aacutereas cuja recuperaccedilatildeo eacute de incumbecircncia da
Uniatildeo (89 deles) (MPF 2012)
A trajetoacuteria do Sul eacute marcada pelo carvatildeo mineral mas para aleacutem
da ldquocultura do carvatildeordquo nascem possibilidades ligadas agrave diversificaccedilatildeo
econocircmica que rompem com a dependecircncia econocircmica do carvatildeo
43 Da extraccedilatildeo manual agrave mecanizaccedilatildeo das minas
A mecanizaccedilatildeo das minas comeccedilou na deacutecada de 1970 e com
ela o fim do ldquovelho mineirordquo que dominava todo o processo de
produccedilatildeo Com a mecanizaccedilatildeo iniciou-se a divisatildeo teacutecnica do trabalho e
aumentou a poluiccedilatildeo Na extraccedilatildeo manual do carvatildeo a pneumoconiose
afetava 5 a 8 passando a 10 a 12 com a mecanizaccedilatildeo das minas
Somadas a pneumoconiose bronquites crocircnicas doenccedilas de pele e
ansiedade (CHOINACKI 1992) A tecnologia dessa forma foi ldquo()
implantada na induacutestria natildeo como serva dos trabalhadores mas como
instrumento que tecircm como fim a acumulaccedilatildeo de capitalrdquo (VOLPATO
1984 p 43)
Volpato (2001) destaca trecircs momentos distintos um primeiro
momento que compreende o periacuteodo de 1913 a 1976 no qual a extraccedilatildeo
de carvatildeo era artesanal sem agregar maiores recursos tecnoloacutegicos um
segundo periacuteodo de 1976 a 1981 no qual procurou-se agregar recursos
tecnoloacutegicos para aumentar a produccedilatildeo e um terceiro periacuteodo de 1981 a
1988 no qual verificaram-se os malefiacutecios da tecnologia para o meio
ambiente sauacutede e seguranccedila do trabalhador ldquoAos poucos os operadores
foram sentindo alguns efeitos prejudiciais das novas maacutequinas - A
desagregaccedilatildeo das praacuteticas nas frentes de trabalho pela agilidade e
domiacutenio da maacutequina sobre o processordquo (VOLPATO 2001 p 34)
A mecanizaccedilatildeo por um lado facilitou as praacuteticas de trabalho
poupando a forccedila fiacutesica do mineiro mas por outro com a intensificaccedilatildeo do processo aumentaram os impactos na sauacutede do trabalhador e no meio
ambiente A pneumoconiose natildeo era reconhecida como doenccedila
profissional o que fazia com que os mineiros escondessem os sintomas
e prejudicassem ainda mais sua sauacutede (VOLPATO 2001) Aleacutem das
doenccedilas pulmonares acontecem tambeacutem acidentes de trabalho Em
122
outubro de 2013 os mineiros fizeram uma paralisaccedilatildeo apoacutes a morte de
um colega na mina Fontanella em Treviso Foi o segundo acidente com
morte em menos de trecircs meses e o nono nos uacuteltimos cinco anos (G1SC
2013)
44 Regras em uso
Em grande medida as leis estaduais se articulam agraves leis federais
Nessa seccedilatildeo satildeo apresentados alguns casos em que a lei estadual difere
da lei federal Um primeiro exemplo eacute o Projeto de Lei nordm 026632005
de autoria do Deputado Estadual Julio Garcia que entrou em tramitaccedilatildeo
em 2005 O Projeto defendia a dispensa do Estudo de Impacto
Ambiental e Relatoacuterio de Impacto Ambiental para a atividade de
pequeno porte de extraccedilatildeo de carvatildeo mineral em aacutereas de ateacute dois
hectares e meio Para tanto contava com a seguinte fundamentaccedilatildeo
O art 12 sectsect 1ordm a 3ordm da Resoluccedilatildeo CONAMA n
237 de 19 de dezembro 1997 permite que o
oacutergatildeo ambiental competente no caso a FATMA
se necessaacuterio estabeleccedila procedimentos
especiacuteficos e simplificados para o licenciamento
de atividades cujas caracteriacutesticas e peculiaridades
importem em pequeno potencial de impacto
ambiental ou ainda o licenciamento uacutenico e
simplificado para atividades integrantes de planos
e programas voluntaacuterios de gestatildeo ambiental
(SANTA CATARINA 2005 p 2)
Como os impactos do carvatildeo foram considerados de ldquopequeno
potencialrdquo pelos membros da Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina
(ALESC) o Projeto de Lei foi transformado na Lei nordm 18052 de 26 de
janeiro de 2007 (SANTA CATARINA 2007)
Outro exemplo foi a assinatura do Decreto em 2013 que reduziu
o Imposto sobre Circulaccedilatildeo de Mercadoria (ICMS) de 25 para 3 na
venda de energia eleacutetrica para novos empreendimentos beneficiando
principalmente as termeleacutetricas a carvatildeo O Decreto tem como objetivo favorecer a competitividade do carvatildeo mineral catarinense nos proacuteximos
leilotildees de energia eleacutetrica A-5 (ALESC 2013)
Um uacuteltimo exemplo eacute o Coacutedigo Estadual do Meio Ambiente de
Santa Catarina que continua cercado de muitos pontos polecircmicos
123
(SALVADOR 2009 SANTOS 2014) No Coacutedigo aprovado em 2009 o
Governador em exerciacutecio Luiz Henrique da Silveira fez severas criacuteticas
ao Coacutedigo Ambiental Brasileiro que resulta de uma medida provisoacuteria
que ele chamou de ldquofilha bastarda dos Decretos-Lei da Ditadurardquo
(SILVEIRA 2009 p 9) concebido sem amplitude democraacutetica
Segundo ele o Coacutedigo Ambiental Catarinense levou cinco anos para ser
elaborado e envolveu debates e audiecircncias puacuteblicas
Nosso Coacutedigo foi alvo de poucas mas barulhentas
reaccedilotildees e incompreensotildees contraacuterias ao
desenvolvimento sustentaacutevel Houve quem
ameaccedilasse mandar prender os honestos e
indefesos agricultores que lavrassem suas terras a
menos de trinta metros da mata ciliar
(SILVEIRA 2009 p 9)
A alusatildeo aos agricultores se justifica na medida em que um dos
pontos mais polecircmicos do Coacutedigo eacute a reduccedilatildeo da mata ciliar de 30
metros como prevecirc o Coacutedigo Florestal para 5 metros em propriedades
de menos de cinco hectares
O Coacutedigo natildeo trata de forma especiacutefica o carvatildeo mineral mas
traz novidades em relaccedilatildeo a flexibilizaccedilatildeo e simplificaccedilatildeo do processo
de licenciamento A Seccedilatildeo II do Coacutedigo estabelece prazos para a
concessatildeo das licenccedilas trecircs meses para a LAP e nos casos em que
houver EIARIMA e audiecircncia puacuteblica o prazo seraacute de quatro meses
trecircs meses para a LI e dois meses para a LO Quanto aos prazos de
validade das licenccedilas cinco anos para a LP seis anos para a LI e de
quatro a dez anos para a LAO (SANTA CATARINA 2009b)
Em 2013 entrou em tramitaccedilatildeo o Projeto de Lei 030542013 que
trouxe mudanccedilas ao Coacutedigo Ambiental de Santa Catarina (SANTA
CATARINA 2013) O Projeto foi transformado na Lei nordm 16342 de 21
de janeiro de 2014 A principal mudanccedila eacute a possibilidade de
regularizaccedilatildeo fundiaacuteria em aacuterea rural e urbana de edificaccedilotildees atividades
e demais formas de ocupaccedilatildeo em Aacutereas de Preservaccedilatildeo Permanente
desde que aprovadas pelo Municiacutepio (SANTA CATARINA 2014b) Conveacutem ressaltar que a revisatildeo do Coacutedigo Ambiental de SC e a defesa
do carvatildeo mineral na produccedilatildeo termeleacutetrica foram as duas principais
bandeiras da Assembleia Legislativa de Santa Catarina em 2013
124
45 Envolvidos na gestatildeo
Na sequecircncia faz-se uma breve descriccedilatildeo dos envolvidos na
gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina lembrando que aparecem
aqui os envolvidos que constam nos documentos e publicaccedilotildees
consultadas
451 Segmentos poliacuteticos
O governador em exerciacutecio Raimundo Colombo investiu em sua
campanha de 2010 R$ 323669211 Natildeo houve nenhuma doaccedilatildeo de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral diretamente ao candidato Mas o
Comitecirc Financeiro Uacutenico do Democratas (DEM) que tambeacutem repassou
recursos ao candidato recebeu R$ 6000000 da Carboniacutefera Nossa
Senhora do Caravagio Ltda (TSE 2013) Jaacute os representantes eleitos se
dividem na Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina (Deputados
Estaduais) e nas Cacircmaras Municipais (Vereadores) As relaccedilotildees entre
carvatildeo mineral e poliacutetica seratildeo aprofundadas no proacuteximo capiacutetulo
A FATMA tambeacutem faz parte dos segmentos poliacuteticos Aleacutem do
seu papel descrito na seccedilatildeo 41 um outro ponto merece ser destacado
De 2000 ateacute 2014 periacuteodo que compreende o licenciamento da
USITESC passaram pela FATMA na funccedilatildeo de presidente Suzana
Maria Cordeiro Trebien Seacutergio Joseacute Grando Jacircnio Wagner Constante
Carlos L Kreuz Murilo Xavier Flores e Gean Loureiro Desses Seacutergio
Joseacute Grando recebeu na eleiccedilatildeo de 2006 quando concorreu a Deputado
Estadual R$ 200000 da Sul Catarinense Mineraccedilatildeo e R$ 3000000 da
Tractebel e Jean Marques Loureiro recebeu R$ 10000000 da
Tractebel quando concorreu a prefeito do municiacutepio de Florianoacutepolis
(TSE 2013)
Inclui-se tambeacutem nos segmentos poliacuteticos o Ministeacuterio Puacuteblico
Estadual que atua em parceria com o Ministeacuterio Puacuteblico Federal no
acompanhamento da accedilatildeo civil puacuteblica do carvatildeo (MPF 2012) e no
acompanhamento dos processos de licenciamento
452 Segmentos econocircmicos
Os segmentos econocircmicos se organizam no Sindicato da Induacutestria
da Extraccedilatildeo de Carvatildeo do Estado de Santa Catarina (SIESESC) criado
125
em 1989 em Criciuacutema e na Associaccedilatildeo Beneficente da Induacutestria
Carboniacutefera de Santa Catarina (SATC)15
As principais empresas que atuam no segmento tecircm origem na
proacutepria regiatildeo A Carboniacutefera Metropolitana SA iniciou suas atividades
em 1890 em Nova Veneza A empresa tem sede em Criciuacutema eacute
detentora das maiores reservas de carvatildeo mineral do paiacutes e explora trecircs
minas no municiacutepio de Treviso Outra empresa que atua na regiatildeo haacute
mais de noventa anos criada em 1918 eacute a Carboniacutefera Rio Deserto
Ltda administrada pela famiacutelia Zanette hoje na terceira geraccedilatildeo A
Carboniacutefera conta com minas nos municiacutepios de Lauro Muller Treviso
Criciuacutema e Iccedilara A Carboniacutefera Criciuacutema SA tecircm origem na fusatildeo da
Carboniacutefera Caeteacute Ltda e Carboniacutefera Cocal Ltda em 1943 Com sede
em Criciuacutema a carboniacutefera explora o carvatildeo no municiacutepio de
Forquilhinha A Comin amp Cia atua no rebeneficiamento de rejeitos
antigos Suas atividades iniciaram em 1984 e sua unidade de
beneficiamento localiza-se em Criciuacutema Na deacutecada de 1980 foi criada
tambeacutem a Cooperminas a partir da falecircncia da CBCA A Cooperminas eacute
uma cooperativa de trabalhadores da mineraccedilatildeo que explora o carvatildeo em
Forquilhinha A Carboniacutefera Belluno Ltda iniciou suas atividades em
1991 tem sede em Sideroacutepolis e aleacutem de trabalhar na extraccedilatildeo e
beneficiamento do Carvatildeo atua tambeacutem no transporte e na
comunicaccedilatildeo A empresa eacute administrada pelo Grupo Salvaro e conta
com reservas de 140 milhotildees de toneladas de carvatildeo mineral e minas em
Treviso e Sideroacutepolis Em 1999 a Carboniacutefera Catarinense Ltda passou
a explorar e beneficiar o carvatildeo em duas minas localizadas em Lauro
Muller A Carboniacutefera Sideroacutepolis Ltda opera a Usina de
Beneficiamento Lageado no municiacutepio de Urussanga A Companhia
Energeacutetica Meridional pertence agrave Tractebel Energia SA e tem sede em
Florianoacutepolis A Gabriella Mineraccedilatildeo foi fundada em 2004 a partir da
dissoluccedilatildeo da empresa Coque Catarinense Ltda (COCALIT) A
Minageo atua desde 1986 em sondagens e obras subterracircneas entrando
para a extraccedilatildeo do carvatildeo em 1997 Em 2000 assinou um contrato de
fornecimento de carvatildeo para a Tractebel Energia neste ano mudando
seu nome para Mineraccedilatildeo Santa Augusta em (SIESESC 2008)
15
A SATC foi criada em 1959 como Sociedade de Assistecircncia aos
Trabalhadores do Carvatildeo e tinha como objetivo a preparaccedilatildeo de matildeo-de-obra
qualificada e assistecircncia social As carboniacuteferas contribuem com 1 de seu
faturamento para a manutenccedilatildeo da instituiccedilatildeo (SATC 2014)
126
453 Segmentos sociais
O movimento mineiro teve iniacutecio em 1920 com uma greve na
CBCA Em 1944 surgiu em Criciuacutema a Associaccedilatildeo dos Trabalhadores
na Induacutestria Extrativa do Carvatildeo Em 1945 a associaccedilatildeo passou a ser
sindicato Nos anos 1950 foram fundados sindicatos mineiros em Lauro
Muller (1951) TubaratildeoCapivari (1953) Urussanga (1957) e Rio Maina
(1961) A primeira greve apoacutes o surgimento dos sindicatos aconteceu
em 1958 seguida de outras em 1959 1960 1961 e 1963 (GOULARTI
FILHO LIVRAMENTO 2004b)
Aleacutem das muitas greves um dos maiores feitos do movimento
sindical mineiro foi a ocupaccedilatildeo da CSN e o gerenciamento da massa
falida da CBCA e da Mineraccedilatildeo Barro Branco De 1945 a 1957 os
mineiros natildeo encontraram no sindicato um espaccedilo de luta De 1957 a
1964 formou-se um sindicalismo baseado na luta e na resistecircncia O
sindicato denunciou as condiccedilotildees precaacuterias de trabalho a exploraccedilatildeo
sofrida pela categoria e a falta de seguranccedila nas minas Passando por
momentos difiacuteceis durante a ditadura militar de 1964 a 1978 o
sindicalismo passou por uma letargia vindo a se reorganizar em 1988
apoiando quatro greves da CBCA e da Proacutespera (CHOINACKI 1992
VOLPATO 2001)
Os mineiros apoiam a causa do carvatildeo mineral e as mineradoras
se o assunto for a questatildeo ambiental A categoria natildeo se envolve em
movimentos ambientais
A negaccedilatildeo ou o silecircncio e a passividade dos
mineiros em relaccedilatildeo agrave degradaccedilatildeo ambiental
resultante da induacutestria carboniacutefera eacute a expressatildeo
de um mecanismo de defesa reforccedilando a
seguranccedila dos trabalhadores na manutenccedilatildeo do
emprego e da sobrevivecircncia como objetivo mais
imediato e realista (VOLPATO 2001 p 132)
Essas ideias aleacutem de serem defendidas pelos mineiros satildeo
apoiadas por poliacuteticos ligados ao movimento sindical e agrave luta histoacuterica dos trabalhadores Destacam-se Luci Choinacki Joseacute Paulo Serafim e
Milton Mendes de Oliveira que adotam um discurso de apoio ao carvatildeo
mineral em funccedilatildeo de sua importacircncia social (CHOINACKI 1992)
127
A regiatildeo sul de Santa Catarina contou com vaacuterios movimentos
sociais que atuaram e atuam contra a mineraccedilatildeo ao longo da sua
histoacuteria Em 1986 em Sideroacutepolis surgiu o Movimento Ecoloacutegico de
Sideroacutepolis (MES) que atuou ateacute 1989 Tambeacutem em 1986 em Tubaratildeo
surgiu o Movimento Ecoloacutegico Tubaronense (MOVET) que atuou ateacute
1996 Havia um grande envolvimento da igreja catoacutelica que se
consolidou atraveacutes da criaccedilatildeo da Pastoral da Ecologia ligada agrave Diocese
de Tubaratildeo O objetivo da Pastoral da Ecologia era ldquodespertar uma
consciecircncia ecoloacutegica no homem do sul de Santa Catarina destacando a
importacircncia da preservaccedilatildeo da natureza dom de Deus para todos para
que possa atuar comunitariamente na recuperaccedilatildeo do meio ambienterdquo
(Diocese de Tubaratildeo citada por SANTOS 2008 p 81-2) A Pastoral da
Ecologia organizou romarias ecoloacutegicas a primeira aconteceu em
Criciuacutema em 1986 com o tema ldquoNatureza a ganacircncia te destruiu Noacutes te
reconstruiremosrdquo a segunda em Sideroacutepolis em 1988 com o tema ldquoPela
vida pela paz Contra a induacutestria da morterdquo e a terceira em Tubaratildeo em
1991 com o tema ldquoA Matildee Natureza pede socorro O povo exige a
recuperaccedilatildeo da vida na regiatildeo sulrdquo
Uma iniciativa mais recente de mobilizaccedilatildeo e discussatildeo
aconteceu apoacutes o Furacatildeo Catarina em 2004 Exatamente um ano
depois em 2005 aconteceu o 1ordm Encontro da Regiatildeo Sul sobre fenocircmenos naturais adversidades e mudanccedilas climaacuteticas suas causas
efeitos e necessidades de adaptaccedilatildeo que deu origem ao Manifesto por
Justiccedila Climaacutetica O 2ordm Encontro sobre fenocircmenos naturais adversidades e mudanccedilas climaacuteticas da regiatildeo Sul foi realizado em 6 a
8 de outubro de 2009 A realizaccedilatildeo dos dois eventos coube agrave Cacircmara
Temaacutetica do Meio Ambiente do Foacuterum de Desenvolvimento do Extremo
Sul Catarinense (FDESC) sob a Coordenaccedilatildeo da ONG Soacutecios da
Natureza da AMESC do Nuacutecleo Amigos da TerraBrasil Secretaria de
Desenvolvimento Regional (22ordf SDR) da Prefeitura Municipal de
Araranguaacute (PMA) e do Comitecirc de Gerenciamento da Bacia Hidrograacutefica
do Rio Araranguaacute (CGBHRA) Os eventos tambeacutem receberam apoio das
seguintes organizaccedilotildees e coletivos Assembleia Legislativa do Estado de
Santa Catarina (ALESC) Centro de Apoio Socioambiental (CASA)
Rede Brasileira de Justiccedila Ambiental (RBJA) Amigos da Terra
Internacional Defesa Civil de Santa Catarina Movimento Proacute-
Araranguaacute (MPA) Instituto da Cidadania de Araranguaacute (ICA) Proacute-
Comitecirc da Bacia do Mampituba e Federaccedilatildeo de Entidades Ecologistas
Catarinenses (FEEC) (SOacuteCIOS DA NATUREZA 2009 2005) Os dois
encontros demonstram o interesse e a organizaccedilatildeo socioinstitucional da
128
aacuterea afetada em torno da discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas
relacionada ao mesmo tempo com problemas jaacute existentes no territoacuterio
O Manifesto por justiccedila climaacutetica elaborado em 2005 eacute um ponto de
partida para a discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas e justiccedila ambiental
em Santa Catarina Trata-se de uma discussatildeo local que se conecta com
o global sobre um problema atual que se conecta com problemas jaacute
existentes na regiatildeo (MALUF ROSA 2009)
Outra iniciativa importante eacute a dos Foacuteruns Sul Ambiental que
tecircm como objetivo fortalecer um espaccedilo democraacutetico juntando pessoas
instituiccedilotildees e organizaccedilotildees populares na discussatildeo sobre os problemas
socioambientais do Sul Destaca-se aiacute a participaccedilatildeo de professores e
professoras da UNESC e UFSC aleacutem de convidados e convidadas de
outras universidades sediadas em outros estados brasileiros (SANTOS
2008)
A regiatildeo tambeacutem eacute palco de conflitos Dois casos emblemaacuteticos
envolvendo a resistecircncia dos agricultores aconteceram em 1996 em
Criciuacutema na localidade chamada Morro do Estevatildeo e Albino e em
2003 em Iccedilara na localidade de Santa Cruz e Esperanccedila Neste segundo
conflito havia 300 famiacutelias envolvidas aproximadamente mil pessoas
Essas pessoas sobreviviam da agricultura habitavam o local haacute mais de
cem anos e o tamanho de suas propriedades era na meacutedia de vinte
hectares O conflito era de natureza econocircmica (mineraccedilatildeo versus
agricultura) social (envolvimento e mobilizaccedilatildeo social regional) e
ambiental (degradaccedilatildeo) (NASCIMENTO BURSZTYN 2010 p 79)
Nesses conflitos e nas discussotildees regionais destacam-se
- A ONG Soacutecios da Natureza que surgiu em 1980 em
Araranguaacute e se institucionalizou em 1996 tendo uma atuaccedilatildeo regional
(SANTOS 2008)
A ONG trabalha no sentido de buscar em suas
vaacuterias fontes de accedilatildeo a preservaccedilatildeo da natureza e
uma melhor qualidade de vida para a regiatildeo sul de
Santa Catarina o que assinala sua performance de
conotaccedilatildeo socioambiental No entanto por estar
do mesmo modo voltada a accedilotildees que
constantemente envolvem o papel do Estado
tambeacutem pode ser caracterizada por suas
suposiccedilotildees poliacuteticas contra o poder estabelecido
(SANTOS 2008 p 124)
129
- A FEEC que surgiu em 1989 tendo como objetivo unificar e
fortalecer a luta ecoloacutegica catarinense (SANTOS 2008)
- A atuaccedilatildeo de pesquisadores da UNESC e UFSC bem como
pesquisadores sediados em outras universidades do Brasil
- O Grupo de Pesquisa ldquoMemoacuteria e Cultura do Carvatildeo em Santa
Catarinardquo que foi formado em 2000 e inscrito no CNPq em 2002 Ele
reuacutene professores e alunos da UNESC Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS) e CETEM do Rio de Janeiro que estudam
temas relacionados agraves atividades carboniacuteferas O objetivo principal do
Grupo eacute discutir criticamente a cultura a histoacuteria e a economia do
carvatildeo
Ainda nos segmentos sociais incluem-se
- O IPAT vinculado agrave UNESC responsaacutevel pela confecccedilatildeo de
EIARIMA para muitas mineradoras da regiatildeo
- Os meios de comunicaccedilatildeo locais e regionais que natildeo publicam
informaccedilotildees que prejudiquem o segmento carboniacutefero jaacute que muitos satildeo
de propriedade de mineradores e outros recebem valores na forma
patrociacutenio (SANTOS 2008)
46 Situaccedilatildeo atual e desafios
As poucas mudanccedilas ocorridas ateacute o momento satildeo
frutos da pressatildeo exercida pelo movimento
ambiental como um todo na qual seus integrantes
protagonizam um conflito que revela o quanto a
voz do lsquoinimigorsquo fala mais alto (SANTOS 2008
p 160)
A intenccedilatildeo do capiacutetulo foi tratar da gestatildeo de recursos comuns em
Santa Catarina com ecircnfase no carvatildeo mineral O resgate agrave trajetoacuteria do
desenvolvimento catarinense mostra uma ecircnfase na apropriaccedilatildeo privada
dos recursos comuns subordinada ao crescimento econocircmico A
preocupaccedilatildeo ambiental por muito tempo foi considerada marginal
curiosamente ateacute mesmo pelo oacutergatildeo ambiental estadual que incentivou
a expansatildeo da atividade carboniacutefera Essa condiccedilatildeo marginal tambeacutem se
mostra nas regras em uso O Coacutedigo Ambiental de Santa Catarina eacute um
exemplo disso Vaacuterios pontos flexibilizaram a lei ambiental federal para
beneficiar os segmentos econocircmicos
130
O Sul de Santa Catarina tem disponibilidade de carvatildeo mineral e
ao longo de sua trajetoacuteria de desenvolvimento o vem explorando a
despeito dos impactos socioambientais causados pela atividade Nas
uacuteltimas deacutecadas a centralidade desta vem cedendo lugar a outra
atividades econocircmicas Todavia o viacutenculo cultural eacute muito forte Mas
tambeacutem satildeo fortes as vozes contraacuterias agrave exploraccedilatildeo do carvatildeo Os
segmentos sociais se organizam regionalmente e satildeo responsaacuteveis por
movimentos eventos e por uma articulaccedilatildeo em rede com organizaccedilotildees
sediadas em outros estados do Brasil
No Quadro 7 eacute feita uma siacutentese dos principais pontos abordados
ao longo do capiacutetulo que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
energia termeleacutetrica
Quadro 7 ndash Aspectos que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral Santa
Catarina
MACRO
VARIAacuteVEIS
ASPECTOS QUE
FAVORECEM A
AMPLIACcedilAtildeO
ASPECTOS QUE
QUESTIONAM A
AMPLIACcedilAtildeO
Dinacircmicas de
desenvolvimento
- Fragilidade institucional da
FATMA
- Dependecircncia da matriz
energeacutetica catarinense ndash 35
da energia eleacutetrica
consumida no estado vem do
carvatildeo mineral
- Possibilidade de
conexatildeo do carvatildeo
com discussotildees mais
amplas
Atributos fiacutesicos e
tecnoloacutegicos
- Cultura do carvatildeo no Sul
de Santa Catarina
- Disponibilidade do recurso
- Bom faturamento do
segmento do carvatildeo mineral
- Aumento da produccedilatildeo com
a mecanizaccedilatildeo do processo
de trabalho
- Recuperaccedilatildeo do passivo
ambiental como ponto
positivo para a continuidade
da exploraccedilatildeo do recurso
- Aumento da
produccedilatildeo associado a
degradaccedilatildeo
socioambiental
- Diversificaccedilatildeo
econocircmica da regiatildeo
Sul de Santa
Catarina
Regras em uso - Coacutedigo Estadual do Meio
Ambiente estabelece prazos
para as licenccedilas ambientais
131
- Dispensa do EIARIMA
para a atividade de extraccedilatildeo
do carvatildeo mineral de
pequeno porte
- Reduccedilatildeo do ICMS de 25
para 3
Arena de accedilatildeo
(Caracterizaccedilatildeo dos
envolvidos na gestatildeo)
- Parceria de parte dos
segmentos poliacuteticos com os
segmentos econocircmicos
- Parte dos segmentos
sociais os trabalhadores
costumam apoiar a causa do
carvatildeo
- A UNESC que tambeacutem faz
parte dos segmentos sociais
elaborou o EIARIMA
- Miacutedia (segmentos sociais)
natildeo divulga notiacutecias que
prejudiquem o segmento
carboniacutefero
- Parte dos segmentos
sociais ocupam
espaccedilos de
participaccedilatildeo
instituiacutedos
- Existecircncia de
movimentos sociais
regionais
- Parcerias com
ONGs e
Universidades
- Observatoacuterio do
Carvatildeo
- Foacuteruns de
discussatildeo
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na macro variaacutevel arena de accedilatildeo a variaacutevel da democracia
apresenta limites relacionados ao apoio dos segmentos poliacuteticos
(Governo Estadual e FATMA) e de parte dos segmentos sociais
(Movimento Sindical IPATUNESC e miacutedia) agrave causa do carvatildeo
mineral Nas possibilidades destacam-se a atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico a organizaccedilatildeo dos segmentos sociais nas redes que unem
ONGs academia e afetadosatingidosameaccedilados e as publicaccedilotildees
(Quadro 8)
132
Quadro 8 ndash Limites e possibilidades do sistema democraacutetico em
Santa Catarina VARIAacuteVEL LIMITES POSSIBILIDADES
Fortalecimento
do sistema
democraacutetico
- Parte dos segmentos
poliacuteticos (Governo
estadual e FATMA)
apoiam a atividade
- Parte dos segmentos
sociais (Movimento
sindical e o
IPATUNESC) apoiam a
causa do carvatildeo mineral
- Miacutedia apoia o segmento
carboniacutefero
- Atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico
- Organizaccedilatildeo de parte dos
segmentos sociais
- Redes unindo ONGs
academia e
afetadosatingidosameaccedilados
- Publicaccedilotildees
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Apesar do forte viacutenculo entre parte dos segmentos poliacuteticos
segmentos econocircmicos e parte dos segmentos sociais em defesa do
carvatildeo mineral outra parte dos segmentos sociais demonstra
aprendizado social adaptativo ao coordenar suas accedilotildees no niacutevel regional
Em uma regiatildeo na qual a atividade estaacute tatildeo arraigada e muitos
municiacutepios e pessoas dependem dela para o seu sustento a mobilizaccedilatildeo
regional eacute uma forma criativa e articulada de enfrentar um problema que
eacute histoacuterico e que se perpetua nas relaccedilotildees poliacuteticas existentes Estas
seratildeo tratadas nos capiacutetulos cinco e seis tanto na democracia
representativa (via eleiccedilotildees) quanto na democracia participativa
(audiecircncias puacuteblicas no processo de licenciamento) para elucidar ainda
mais os limites e as margens de manobra colocadas nos capiacutetulos trecircs e
quatro fundamentais no delineamento de alternativas ao carvatildeo mineral
5 CARVAtildeO MINERAL E POLIacuteTICA EM SANTA CATARINA
ELEICcedilOtildeES E FINANCIAMENTO PRIVADO
Como montanhas de rejeitos soacutelidos compostos de
pirita e enxofre permanece a mesma poliacutetica do
passado patrimonial (TEIXEIRA 1996 p 95)
A histoacuteria do Sul de Santa Catarina estaacute intimamente ligada ao
carvatildeo mineral Dos tempos aacuteureos entre as deacutecadas de 1930 e 1980 agrave
crise dos anos 1990 e do seu ressurgimento no Governo Fernando
Henrique Cardoso com o anuacutencio da construccedilatildeo de novas termeleacutetricas
movidas a carvatildeo mineral Agora em 2013 no Governo Dilma o carvatildeo
nos leilotildees de energia em 2013 As decisotildees nacionais que ora
incentivam o carvatildeo mineral ora dificultam sua exploraccedilatildeo e uso
impactam sensivelmente as regiotildees que tecircm em seu subsolo esse
recurso natural natildeo renovaacutevel Cabe a essas regiotildees se adaptar
preferencialmente influenciando esses contextos mais amplos
No livro Os donos da cidade Joseacute Paulo Teixeira (1996 p 16)
afirma que o complexo carboniacutefero do Sul de Santa Catarina ldquofoi
constituiacutedo a partir de uma ligaccedilatildeo poliacutetico-estrutural entre a esfera
puacuteblica e privadardquo Tendo essa ideia como referecircncia o objetivo do
capiacutetulo eacute identificar relaccedilotildees entre a poliacutetica catarinense e as empresas
que exploram e utilizam o carvatildeo mineral
Para aleacutem dos discursos sobre desenvolvimento econocircmico
seguranccedila energeacutetica e tecnologias natildeo poluentes a hipoacutetese de que se
parte eacute que existe uma reciprocidade entre os interesses dos poliacuteticos ao
receberem doaccedilotildees para suas campanhas eleitorais e os interesses dos
doadores ligados ao carvatildeo mineral Nesse sentido as injusticcedilas
ecoloacutegicas se referem natildeo apenas agrave distribuiccedilatildeo de riscos ambientais
delimitados localmente Elas satildeo condicionadas tambeacutem poliacuteticas e
praacuteticas cujas consequecircncias atravessam fronteiras instituiacutedas e afetam
muacuteltiplas escalas Como jaacute foi ressaltado anteriormente o conceito de
injusticcedila ecoloacutegica designa um sintoma de um processo que envolve a
distribuiccedilatildeo o reconhecimento e a representaccedilatildeo poliacutetica e determina a
distribuiccedilatildeo desigual dos riscos e danos ambientais (HOLIFIELD et al
2009 SCHLOSBERG 2009 e 2004)
Para tanto foram analisados os pronunciamentos da Frente
Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral e as prestaccedilotildees de
contas das eleiccedilotildees de 2002 2004 2006 2008 2010 e 2012 As eleiccedilotildees
de 2004 2008 e 2012 foram eleiccedilotildees municipais e as eleiccedilotildees de 2002
134
2006 e 2010 foram gerais O recorte temporal utilizado se deve a duas
razotildees principais acompanhar as doaccedilotildees durante o periacuteodo em que se
deu o processo de licenciamento da USITESC e o acesso agraves prestaccedilotildees
de contas que teve iniacutecio na eleiccedilatildeo de 2002
O capiacutetulo eacute dividido em trecircs seccedilotildees principais aleacutem dessa
introduccedilatildeo A primeira seccedilatildeo trata dos argumentos presentes nos
discursos poliacuteticos A segunda apresenta os dados sobre doaccedilotildees de
empresas nas eleiccedilotildees gerais e municipais A terceira e uacuteltima seccedilatildeo traz
uma siacutentese dos fatos ausentes dos discursos Os dados apresentados
sugerem um apoio muacutetuo entre os interesses poliacuteticos e privados Os
candidatos de Santa Catarina que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral em suas campanhas satildeo os mesmos que
apoiam a causa do carvatildeo mineral Nesse caso o apoio envolve a
construccedilatildeo de mais uma termeleacutetrica a USITESC a inclusatildeo do carvatildeo
mineral nos leilotildees de 2013 e a reduccedilatildeo de Imposto sobre o ICMS de
25 para 3 na venda de energia eleacutetrica visando melhorar a
competitividade do carvatildeo mineral de Santa Catarina frente a outros
recursos energeacuteticos
51 Os argumentos presentes no discurso dos poliacuteticos
A Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral foi
constituiacuteda no Congresso Nacional em 2005 tendo como principal
objetivo a expansatildeo do uso do carvatildeo mineral na matriz energeacutetica
nacional Datam desse ano quatro pronunciamentos na Cacircmara dos
Deputados Afonso Hamm (Partido Progressista - PPRS) no dia 19 de
outubro Leodegar Tiscoski (PPSC) no dia 2 de novembro Marcus
Vicente (Partido Trabalhista Brasileiro - PTBES) no dia 9 de
novembro e Edinho Bez (PMDBSC) no dia 18 de novembro
As frentes satildeo constituiacutedas por parlamentares que de forma
suprapartidaacuteria se reuacutenem para tratar de uma questatildeo especiacutefica O que
estaacute em jogo eacute a defesa de interesses econocircmicos ou empresariais
corporativos setoriais ou profissionais regionais e ideoloacutegicos dentre
outros No periacuteodo de 2003 a 2007 havia 148 frentes no parlamento
brasileiro (CORADINI 2010)
Em 19 de outubro de 2005 Afonso Hamm (PPRS) em seu
pronunciamento na Cacircmara dos Deputados reforccedilou a importacircncia do
setor para a seguranccedila energeacutetica e para a geraccedilatildeo de empregos em
Santa Catarina e no Rio Grande do Sul Natildeo houve qualquer menccedilatildeo agrave
135
questatildeo socioambiental exceto para falar do carvatildeo mineral como
ldquoreserva de energiardquo O carvatildeo foi colocado como ldquotema de grande
relevacircnciardquo ressaltando-se a importacircncia de buscar a ldquocompetitividade
do setorrdquo atraveacutes de novos projetos para gerar ldquoem torno de 10 mil
empregos na regiatildeo atualmente deprimida econocircmica e socialmenterdquo
(HAMM 2005 p 50549) Os argumentos em defesa do carvatildeo mineral
enaltecem a seguranccedila e a auto-suficiecircncia energeacutetica do Sul e do Brasil
juntamente com outros argumentos de cunho econocircmico
Por sua vez o pronunciamento de Leodegard Tiscoski traz um
histoacuterico do carvatildeo mineral desafios e medidas reinvindicadas pela
Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral Sobre a
questatildeo ambiental a uacutenica menccedilatildeo aparece no seguinte trecho
Principal insumo energeacutetico no iniacutecio do seacuteculo
XX o carvatildeo foi gradualmente perdendo
importacircncia ateacute transformar-se no patinho feio das
nossas fontes energeacuteticas natildeo soacute pelas suas
deficiecircncias naturais mas principalmente pelos
danos ambientais causados pela sua exploraccedilatildeo
(TISCOSKI 2005 p 52894)
Os problemas enfrentados pelo carvatildeo mineral satildeo imputados ao
governo federal como sugere o trecho a seguir ldquoA histoacuteria do carvatildeo
em Santa Catarina eacute uma sucessatildeo de altos e baixos determinados
sempre pela vontade do Governo Federal independentemente de que tal
vontade fosse beneacutefica ou maleacutefica aos interesses estaduaisrdquo
(TISCOSKI 2005 p 52895) Ao Governo Federal eacute atribuiacuteda tambeacutem a
responsabilidade pela estabilidade de empregos retorno de
investimentos e recuperaccedilatildeo do ambiente natural ldquoRelegado agrave proacutepria
sorte o carvatildeo em Santa Catarina passou a conviver com a incerteza do
emprego e mais que tudo com a anguacutestia da perda de renda de milhares
e milhares de famiacutelias da regiatildeo sul de Santa Catarinardquo (TISCOSKI
2005 p 52895)
Somados aos argumentos sobre a importacircncia econocircmica
ressalta-se o carvatildeo mineral como alternativa ao petroacuteleo e agrave
hidroeletricidade A Frente Parlamentar reivindica a isonomia das regras do leilatildeo de energia nova regulamentaccedilatildeo do artigo 13 da Lei nordm
10438 retomada das pesquisas geoloacutegicas e implementaccedilatildeo de projetos
de pesquisa visando um melhor aproveitamento do carvatildeo ldquoO carvatildeo
136
mineral do Brasil natildeo pode ser objeto de atenccedilatildeo por parte do Governo
Federal apenas nos momentos de criserdquo (TISCOSKI 2005 p 52896)
Em seu pronunciamento Marcus Vicente (PTBES) (2005 p
53630) trata o carvatildeo mineral como ldquoitem de alto significado
estrateacutegicordquo ldquofonte energeacutetica segura e confiaacutevelrdquo que ldquosempre foi
colocado em plano secundaacuteriordquo O discurso reforccedila a geraccedilatildeo de
empregos e a seguranccedila energeacutetica Quanto agrave questatildeo ambiental ela eacute
ldquocolocada em duacutevida quando se fala em maior aproveitamento do
carvatildeordquo (VICENTE 2005 p 53630) Haacute uma aposta na pesquisa e no
desenvolvimento tecnoloacutegico que coloca a mineraccedilatildeo como uma
atividade que pode ser feita ldquosem degradaccedilatildeo ambiental nem
comprometimento da sauacutede dos trabalhadoresrdquo Afirma-se que em
1520 anos a energia seraacute gerada com emissatildeo zero e que as aacutereas
degradadas no Brasil jaacute estatildeo sendo recuperadas (VICENTE 2005 p
53631) Segundo este parlamentar o Brasil precisa acompanhar o curso
da histoacuteria
Jaacute Edinho Bez (PMDBSC) fundamenta seus argumentos em uma
reuniatildeo do G-8 na qual se assume que ldquosuprimentos de energia
confiaacuteveis e baratos satildeo essenciais para um forte crescimento
econocircmicordquo (BEZ 2005 p 55746) Ele afirma que o carvatildeo mineral
tem um papel ldquovitalrdquo a desempenhar face ao contingente de pessoas que
ainda natildeo dispotildeem de acesso a energia comercial por ser uma energia
barata O petroacuteleo e o gaacutes natural seriam fontes energeacuteticas inseguras se
comparadas ao carvatildeo mineral A questatildeo ambiental aparece como
desafio que estaacute sendo equacionado pelo investimento em
desenvolvimento tecnoloacutegico Segundo Bez (2005 p 55746) o objetivo
da Frente Parlamentar eacute o de colocar o carvatildeo mineral ldquodefinitivamente
na agenda do Governo Federal com isso induzindo ao desenvolvimento
regional gerando renda e trabalho e aumentando a seguranccedila energeacutetica
vital para o crescimento do Paiacutesrdquo
No intervalo de tempo compreendido entre dezembro de 2005 e
maio de 2011 natildeo houve pronunciamentos da Frente Parlamentar em
Defesa do Carvatildeo Mineral Todavia nesse periacuteodo a Frente manteve a
articulaccedilatildeo natildeo soacute com o segmento produtivo do carvatildeo mineral mas
tambeacutem com o Ministeacuterio das Minas e Energia e o Ministeacuterio da Ciecircncia
e Tecnologia resultando em accedilotildees programas e projetos importantes
para o segmento (AMARAL 2011)
Em 2011 ocorreram apenas dois pronunciamentos um de Edinho
Bez e outro de Delciacutedio do Amaral O pronunciamento de Edinho Bez
137
(PMDBSC) primeiro secretaacuterio da Frente Parlamentar refere-se agrave
posse da Comissatildeo Executiva da referida Frente Ele fala no carvatildeo
mineral como ldquoenergia do futurordquo ldquoresponsaacutevel pela boa qualidade de
vida de centenas de pessoas nas economias mais desenvolvidasrdquo (BEZ
2011 p 20895) Menciona apenas aspectos econocircmicos da induacutestria
carboniacutefera entendida como base do desenvolvimento socioeconocircmico
do Sul de Santa Catarina Ele finaliza o pronunciamento afirmando que
natildeo se poderia abrir matildeo de nenhuma alternativa energeacutetica
Em novembro de 2011 ocorreu a reinstalaccedilatildeo da Frente formada
por 203 deputados federais e 12 senadores e integrada por ex-
parlamentares do Congresso Nacional Deputados Estaduais Prefeitos
Municipais Vereadores Sindicalistas O principal objetivo da Frente em
2011 era a participaccedilatildeo nos leilotildees A-5
A Frente Parlamentar tem como presidentes de honra o Senador
Joseacute Sarney (PMDBAP) e o Deputado Marco Maia (PTRS) Na
Comissatildeo Executiva o Presidente eacute o Senador Delciacutedio do Amaral
(PTMG) Primeiro Vice-Presidente Deputado Afonso Hamm (PPRS)
Segundo Vice-Presidente Senador Paulo Bauer (Partido da Social
Democracia Brasileira - PSDBSC) Primeiro Secretaacuterio Deputado
Edinho Bez (PMDBSC) Segundo Secretaacuterio Deputado Henrique
Fontanta (PTRS) Terceiro Secretaacuterio Deputado Eduardo Sciarra
(DEMPR) e Quarto Secretaacuterio Deputado Ronaldo Zulke (PTRS)
(AMARAL 2011)
Fazem parte do Conselho Consultivo da Frente como Presidente
o Senador Luiz Henrique da Silveira (PMDBSC) e Vice-Presidente
Deputado Ronaldo Benedet (PMDBSC) como membros cooperadores
Fernando Luiz Zancan (Presidente da ABCM) Cesar Weinschenck de
Faria (Presidente do SNIEC) Ruy Hulse (Presidente do SIECESC)
Sereno Chaise (Diretor da CGTEE) Manoel Arlindo Zaroni Torres
(Diretor-Presidente da Tractebel Energia SA) Paulo Monteiro (Diretor
de Sustentabilidade da EBX representando a MPX Energia SA)
Benony Schmitz Filho (Diretor-Presidente da Ferrovia Tereza Cristina
SA ndash FTC) Paulo Camillo Vargas Penna (Presidente do IBRAM) Luiz
Fernando Leone Vianna (Presidente do Conselho de Administraccedilatildeo da
Associaccedilatildeo Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Eleacutetrica
ndash APINE) Heacutelio Bunn (Presidente da AMREC e prefeito do municiacutepio
de Lauro Muller) Paulo Roberto Felix Machado (Presidente da
Associaccedilatildeo de Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera do Rio Grande do Sul
ndash ASMURC e prefeito de Butiaacute) Genoir Joseacute dos Santos (Presidente da
138
Federaccedilatildeo Interestadual dos Trabalhadores na Induacutestria da Extraccedilatildeo de
Carvatildeo) e Oniro da Silva Camilo (Presidente do Sindicato
Intermunicipal dos Trabalhadores nas Induacutestrias de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
Ouro Calcaacuterio Cal e Barro da Regiatildeo Centro-Sul do Estado do Rio
Grande do Sul) (AMARAL 2011) A composiccedilatildeo do conselho
consultivo demonstra que a Frente Parlamentar Mista em Defesa do
Carvatildeo Mineral se assenta em interesses setoriais e empresariais
regionalmente e nacionalmente representados (CORADINI 2010)
Em agosto de 2012 Afonso Hamm fez um pronunciamento cujo
tema era a sustentabilidade da matriz energeacutetica do Brasil e a criaccedilatildeo da
Associaccedilatildeo Proacute-Carvatildeo (APC) Na sua opiniatildeo ldquoa associaccedilatildeo tem como
propoacutesito estabelecer estrateacutegias de reivindicaccedilatildeo tendo como principal
finalidade a inclusatildeo das usinas termeleacutetricas a carvatildeo mineral nos
leilotildees de energia A-5rdquo (HAMM 2012 p 28704) Mais adiante
esclarece que ldquofalei pessoalmente com a Presidenta Dilma haacute
aproximadamente um ano em Esteio tratando dessa Agendardquo (HAMM
2012 p 28704) Natildeo se fala da questatildeo ambiental a natildeo ser quando eacute
colocada em pauta a inclusatildeo no leilatildeo dos empreendimentos jaacute
instalados e daqueles cuja licenccedila ambiental encontra-se em andamento
Em marccedilo de 2013 Edinho Bez fez seu pronunciamento sobre a
inclusatildeo do carvatildeo mineral no leilatildeo
Sr Presidente meus colegas Parlamentares falo
com satisfaccedilatildeo envaidecido com esta casa e o
proacuteprio Paiacutes pela notiacutecia dada pelo Ministro
Edison Lobatildeo de Minas e Energia com a
autorizaccedilatildeo da Presidente Dilma de que seraacute
incluiacutedo nos proacuteximos leilotildees o carvatildeo mineral
uma fonte de energia uma fonte que garante o
fornecimento de energia natildeo dependeraacute de Satildeo
Pedro natildeo dependeraacute das chuvas natildeo dependeraacute
sequer de uma nem duas ou trecircs Noacutes teremos
mais uma alternativa (BEZ 2013 p 06320)
Bez (2013) ressaltou ainda que o preccedilo do carvatildeo nacional
precisa baixar e para tanto torna-se necessaacuterio reduzir a carga
tributaacuteria Segundo ele o Vice-Governador do Estado de Santa Catarina
Eduardo Moreira jaacute manifestou a disposiccedilatildeo de avanccedilar nessa direccedilatildeo O
resultado dessa disposiccedilatildeo foi a reduccedilatildeo via Decreto em 2013 do ICMS
de 25 para 3 na venda de energia eleacutetrica para novos
empreendimentos beneficiando principalmente as termeleacutetricas a carvatildeo
(ALESC 2013)
139
Ao comentar sobre a posse da nova diretoria da Frente
Parlamentar composta por 182 deputados e senadores presidida pelo
Deputado Federal Afonso Hamm Bez (2013 p 06321) comenta que a
abertura ficou a cargo do presidente da Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo
Mineral o ldquoamigordquo Fernando Zancan
Nos pronunciamentos transparece a ecircnfase colocada na promoccedilatildeo
da seguranccedila energeacutetica do Sul e do Paiacutes mediante o aproveitamento do
carvatildeo mineral visto como uma alternativa viaacutevel se comparada agrave
hidroeletricidade ao gaacutes natural e ao petroacuteleo Como argumentos de
defesa o desenvolvimento econocircmico das regiotildees carboniacuteferas de Santa
Catarina e do Rio Grande do Sul parece depender desta atividade
Aspectos socioambientais satildeo apenas tangenciados reconhecendo-se em
alguns momentos que a atividade carboniacutefera causou impactos mas
tambeacutem se admitindo que os mesmos jaacute foram ou estatildeo sendo
resolvidos natildeo devendo se repetir em decorrecircncia dos avanccedilos
tecnoloacutegicos do segmento
52 Panorama das eleiccedilotildees e doaccedilotildees de campanha de 2002 a 2012
Ateacute 1992 a legislaccedilatildeo em vigor proibia a oferta de doaccedilotildees por
parte das empresas Mas as reformas na legislaccedilatildeo apoacutes 1992 tornaram o
sistema mais tolerante apostando na prestaccedilatildeo de contas como forma de
controle puacuteblico Em 1994 o TSE passou a divulgar dados sobre as
candidaturas e contas de campanha Os dados satildeo de responsabilidade
dos candidatos e questiona-se a veracidade dos mesmos vaacuterios satildeo os
casos de financiamentos ilegais corrupccedilatildeo traacutefico de influecircncias
envolvimento com crime organizado que passam a contribuir para a
criacutetica ao financiamento privado Em funccedilatildeo desses problemas o tema
do financiamento poliacutetico tornou-se central no debate recente sobre a
reforma poliacutetica (LEMOS MARCELINO PEDERIVA 2010 SPECK
2005)
Os resultados das eleiccedilotildees indicam fortes viacutenculos com doaccedilotildees e
gastos de campanha quanto maiores as doaccedilotildees e gastos maiores as
chances de o candidato se eleger Os doadores se tornaram tatildeo
fundamentais nas campanhas que tecircm determinado muitas vezes a
proacutepria escolha do candidato A reeleiccedilatildeo apresenta-se como um trunfo
aos candidatos jaacute que o risco do doador eacute menor do que se este
escolhesse um iniciante (LEMOS MARCELINO PEDERIVA 2010)
140
Em contrapartida candidatos tendem a compensar tais investimentos se
e quando eleitos ldquoEacute grande a lista de entidades que satildeo potencialmente
beneficiadas por decisotildees ou medidas administrativas do governo entre
estes os bancosrdquo (SPECK 2005 p 148)
No Brasil satildeo permitidas doaccedilotildees de empresas que possuem
relaccedilotildees contratuais com o Estado natildeo existindo regra que limite a
dependecircncia entre candidato e doador Dados sobre as prestaccedilotildees de
contas demonstram um problema de dependecircncia entre os candidatos e
seus principais financiadores (SPECK 2005)
Na sequecircncia satildeo examinadas as doaccedilotildees das eleiccedilotildees de 2002 a
2012 divididas em eleiccedilotildees gerais e eleiccedilotildees municipais A ecircnfase recai
nas doaccedilotildees realizadas por empresas ligadas ao carvatildeo mineral e sua
relaccedilatildeo com os candidatos de Santa Catarina As doaccedilotildees para
candidatos de outros estados natildeo satildeo tratadas neste capiacutetulo
521 Eleiccedilotildees gerais
No periacuteodo compreendido entre os anos de 2002 e 2012
ocorreram trecircs eleiccedilotildees gerais Constam nos registros do Tribunal
Superior Eleitoral nove empresas relacionadas ao carvatildeo mineral em
Santa Catarina como doadoras
O Complexo Jorge Lacerda que utiliza carvatildeo mineral para
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica pertence agrave Tractebel que tambeacutem eacute
proprietaacuteria das Usinas Hidreleacutetricas de Itaacute Machadinho e Co-geraccedilatildeo
de biomassa em Lages todos situados em Santa Catarina A Carboniacutefera
Metropolitana SA tem 123 anos de existecircncia estaacute sediada em
Criciuacutema e possui parte da USITESC A Carboniacutefera Belluno Ltda foi
fundada em 1991 apoacutes a compra de parte da Companhia Sideruacutergica
Nacional pelo Grupo Salvaro e localiza-se em Sideroacutepolis Aleacutem de
trabalhar na extraccedilatildeo e beneficiamento do Carvatildeo a Carboniacutefera
Belluno tambeacutem atua no transporte e na comunicaccedilatildeo A Mineraccedilatildeo
Castelo Branco Ltda localiza-se em Lauro Muller A Carboniacutefera
Criciuacutema foi fundada em 1943 e tem sede em Criciuacutema A Induacutestria
Carboniacutefera Rio Deserto foi criada em 1918 e localiza-se em Criciuacutema
bem como a Coque Catarinense a Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos e a
Mineraccedilatildeo Santa Augusta
141
A eleiccedilatildeo de 2002 teve como principais doadores a Tractebel
(5007) a Carboniacutefera Metropolitana (1488) e a Carboniacutefera
Belluno (1320) A empresa que mais apoiou candidatos dez no total
foi a Carboniacutefera Metropolitana As demais empresas apoiaram cinco
candidatos ou menos conforme consta na Tabela 7
Tabela 7 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2002
Fonte TSE 2013
Quanto ao montante de doaccedilotildees por candidato em 2002
destacou-se o candidato a governador Esperidiatildeo Amin que recebeu de
quatro empresas 4138 do total de doaccedilotildees O candidato Paulo Roberto
Bauer recebeu de quatro empresas o equivalente a 1182 das doaccedilotildees
Cleacutesio Salvaro recebeu apenas 673 Aleacutem dos trecircs candidatos citados
outros dezesseis candidatos ficaram com 4007 das doaccedilotildees conforme
dados da Tabela 8 As duas uacuteltimas colunas da Tabela 8 relacionam as
doaccedilotildees com a receita total dos candidatos Em quatro dos 19 candidatos
as doaccedilotildees das empresas ligadas ao carvatildeo mineral representam mais de
50 de sua respectiva receita
Nordm
CANDIDATOS
Tractebel Egi South America Ltda 5 PFL PP PPB PSDB 53000000 5007
Carboniacutefera Metropolitana SA 10 PP PMDB PSDB PT PPB PFL 15750000 1488
Carboniacutefera Belluno Ltda 3 PMDB PFL PT 13970000 1320
Mineraccedilatildeo Castelo Branco Ltda 5 PFL PMDB PP PPB PSDB 8467400 800
Carboniacutefera Criciuacutema Ltda 5 PFL PT PSDB PMDB PT 6450000 609
Induacutestria Carboniacutefera Rio Deserto Ltda 5 PFL PMDB PSDB 4050000 383
Coque Catarinense Ltda 2 PFL PMDB 2434000 230
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos Ltda 4 PFL PMDB PP 927000 088
Mineraccedilatildeo Santa Augusta Ltda 1 PP 800000 076
TOTAL 105848400 10000
DOADOR PARTIDOS VALOR R$
142
Tabela 8 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2002 que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees de 2002 o PP recebeu 46 das doaccedilotildees o Partido
da Frente Liberal (PFL) 2147 o PSDB 1352 o PMDB 1027
o PT 477 e o Partido Progressista Brasileiro (PPB) 397
Tabela 9 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2002
Fonte TSE 2013
NO ME PARTIDO CANDIDATURA VALO R R$ RECEITA TO TAL R$
Esperidiatildeo Amin PP Governador 43798600 4138 373920269 1171
Paulo R Bauer PSDB Deputado Federal 12510800 1182 49994468 2502
Clesio Salvaro PFL Deputado Estadual 7120000 673 11296000 6303
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 5266200 498 27320200 1928
Paulo R Bornhausen PFL Senador 4900000 463 198753494 247
Leodegar da C Tiscoski PP Deputado Federal 4892000 462 20432951 2394
Joseacute P Serafim PT Deputado Estadual 4500000 425 7303000 6162
Luiz H da Silveira PMDB Governador 4000000 378 240099527 167
Ivan C Ranzolin PFL Deputado Federal 3000000 283 26017099 1153
Pedro Bittencourt Neto PFL Deputado Federal 2860800 27 13469800 2124
Vanio de Oliveira PPB Deputado Federal 2200000 208 3110990 7072
Celestino RSecco PPB Deputado Estadual 2000000 189 21164000 945
Joatildeo P K Kleinubing PFL Deputado Estadual 2000000 189 10710330 1867
Julio Cesar Garcia PFL Deputado Estadual 2000000 189 4449450 4495
Cezar P de Luca PSDB Deputado Federal 1800000 17 3925683 4585
Ronaldo J Benedet PMDB Deputado Estadual 1350000 128 12097324 1116
Arleu R da Silveira PFL Deputado Estadual 850000 08 890370 9547
Edson C Rodrigues PT Deputado Federal 550000 052 8653600 636
Aceacutelio Casagrande PMDB Deputado Federal 250000 024 1512694 1653
TOTAL 105848400 100
PARTIDO VALOR R$
PP 48690600 46
PFL 22730800 2147
PSDB 14310800 1352
PMDB 10866200 1027
PT 5050000 477
PPB 4200000 397
TOTAL 105848400 100
143
Nas Eleiccedilotildees de 2006 entraram em cena as seguintes empresas
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasileira que atua na regiatildeo Companhia
Energeacutetica Meridional que eacute subsidiaacuteria da empresa Tractebel A
Mendes Terraplanagem Construccedilatildeo e Extraccedilatildeo de Minerais Ltda que
atua na regiatildeo Minageo Ltda de Criciuacutema Sulcatarinense Mineraccedilatildeo e
Artefatos Ltda com sede em Biguaccedilu Carboniacutefera Sideroacutepolis de
Criciuacutema Gabriella Mineraccedilatildeo de Sideroacutepolis Carboniacutefera Catarinense
Ltda de Lauro Muller Nas eleiccedilotildees de 2006 a Tractebel doou 4038
para onze candidatos a Carboniacutefera Metropolitana 1226 para quatro
candidatos e a Carboniacutefera Criciuacutema 1136 (Tabela 10) O montante
de doaccedilotildees aumentou de R$ 105848400 em 2002 para R$
158506900 em 2006
Tabela 10 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2006
Fonte TSE 2013
Dos 22 candidatos apoiados pelas empresas em 2006 Edson Bez
de Oliveira recebeu 1325 dos recursos de seis empresas Ada Lili
Faraco de Luca recebeu 1262 de duas empresas Luiz Henrique da
Silveira recebeu 1262 de uma empresa e Paulo Roberto Bauer
recebeu 946 de quatro empresas (Tabela 11) Constata-se uma
distribuiccedilatildeo maior das doaccedilotildees jaacute que na Eleiccedilatildeo de 2002 um uacutenico
candidato Esperidiatildeo Amim recebeu 4138 das doaccedilotildees
DOADOR NordmCANDIDATOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora 11 PFL PMDB PP PPS PSDB PT 64000000 4038
Carboniacutefera Metropolitana SA 4 PMDB PP PSDB 19432000 1226
Carboniacutefera Criciuacutema SA 2 PMDB PSDB 18000000 1136
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasil Ltda 7 PFL PMDB PP PPS PT 15555000 981
Cia Energeacutetica Meridional 3 PFL PP PT 14000000 883
Carboniacutefera Catarinense Ltda 2 PFL PP 8183000 516
Carboniacutefera Belluno Ltda 2 PMDB PSDB 6776000 427
A Mendes TerConstr E Extr De
Minerais Ltda 1 PMDB 4000000 252
Minageo Ltda 2 PMDB PT 3288000 207
Sul Catarinense Mineraccedilatildeo e Art 4 PP PPS PSDB 2400000 151
Carboniacutefera Sideroacutepolis Ltda 1 PP 1186500 075
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda 1 PP 1186400 075
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos 1 PMDB 500000 032
TOTAL 158506900 10000
144
Tabela 11 - Candidatosas que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2006
Fonte TSE 2013
Em 2006 o PMDB recebeu o maior montante de doaccedilotildees
4104 enquanto na eleiccedilatildeo de 2002 o maior montante foi destinado ao
PP 46 O PSDB aumentou suas captaccedilotildees junto ao lobby do carvatildeo de
1352 em 2002 para 1640 em 2006 O PT de 477 em 2002
para 807 em 2006 O PFL diminuiu de 2147 para 1577 no
periacuteodo Aleacutem do PMDB apareceu na lista tambeacutem o Partido Popular
Socialista (PPS) com 265 (Tabela 12)
NOME PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 21000000 1325 44379023 4732
Ada Lili Faraco de Luca PMDB Deputado Estadual 20000000 1262 62976575 3176
Luiz Henrique da Silveira PMDB Governador 20000000 1262 725548795 276
Paulo Roberto Bauer PSDB Deputado Federal 15000000 946 63272293 2371
Leodegar da Cunha Tiscoski PP Deputado Federal 12263900 774 16487006 7439
Geraldo Cesar Althoff PFL Deputado Federal 11000000 694 113398356 97
Angela Regina Heinzen Amin Helou PP Deputado Federal 10000000 631 25349000 3945
Djalma Vando Berger PSDB Deputado Federal 5000000 315 107978844 463
Gervaacutesio Joseacute da Silva PFL Deputado Federal 5000000 315 95845710 522
Giancarlo Tomelin PSDB Deputado Estadual 5000000 315 14028277 3564
Jorge Catalino Leonardelli Boeira PT Deputado Federal 5000000 315 47519555 1052
Paulo Roberto Barreto Bornhausen PFL Deputado Federal 5000000 315 132260292 378
Ivan Cesar Ranzolin PFL Deputado Federal 4000000 252 23237183 1721
Milton Mendes de Oliveira PT Deputado Federal 4000000 252 18603010 215
Joseacute Paulo Serafim PT Deputado Estadual 3788000 239 19238000 1969
Sergio Joseacute Grando PPS Deputado Estadual 3200000 202 16206665 1974
Antonio Carlos Vieira PP Deputado Estadual 3000000 189 15931786 1883
Acelio Casagrande PMDB Deputado Federal 2055000 13 14020875 1466
Ronaldo Joseacute Benedet PMDB Deputado Estadual 2000000 126 42694345 468
Altair Guidi PPS Deputado Estadual 1000000 063 10547730 948
Joseacute Natal Pereira PSDB Deputado Estadual 1000000 063 13659460 732
Licio Mauro Ferreira da Silveira PP Deputado Estadual 200000 013 10092456 198
158506900 100
145
Tabela 12 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2006
Fonte TSE 2013
Na Eleiccedilatildeo de 2010 cinco empresas aparecem como doadoras A
Tractebel assim como na Eleiccedilatildeo de 2002 e 2006 doou a maior parte
dos recursos 7483 para 27 candidatos de vaacuterios partidos As outras
quatro empresas dividem os 2517 restantes conforme dados
apresentados na Tabela 13
Tabela 13 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2010
Fonte TSE 2013
Os candidatos que receberam o maior montante de doaccedilotildees foram
Angela Amin com 1515 Paulo Roberto Bauer com 1082 e Edson
Bez de Oliveira com 884 (Tabela 14) O nuacutemero de candidatos
apoiados por doaccedilotildees aumentou de 19 candidatos em 2002 para 22 em
2006 e 30 em 2010 Diminuiu tambeacutem a concentraccedilatildeo dos recursos em
relaccedilatildeo ao nuacutemero de candidatos em 2002 os trecircs primeiros candidatos
receberam 5993 das doaccedilotildees em 2006 receberam 3849 e em
2010 3481 Isso demonstra que as empresas passaram a investir em
um nuacutemero maior de candidatos concentrando menos as doaccedilotildees
PARTIDO VALOR [R$]
PMDB 65055000 4104
PSDB 26000000 164
PP 25463900 1606
PFL 25000000 1577
PT 12788000 807
PPS 4200000 265
TOTAL 158506900 100
DOADOR NordmCANDIDATOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora
Ltda
27 PMDB PP
PPS PR
PSDB e PT
123500000 7483
Industria Carboniacutefera Rio Deserto
Ltda
4 PMDB e
PSDB
12548100 760
Carboniacutefera Metropolitana SA 5 PMDB
PSDB
11700000 709
Carboniacutefera Belluno Ltda 2 PSDB 10600000 642
Carboniacutefera Criciuacutema Ltda 3 PMDB 6700600 406
TOTAL 165048700 10000
146
Tabela 14 - Candidatosas receberam doaccedilotildees das empresas ligadas
ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2010
Fonte TSE 2013
Em 2010 o mesmo natildeo aconteceu com os partidos poliacuteticos As
doaccedilotildees concentraram-se em trecircs partidos PMDB com 3641 PT com
3393 e PSDB com 1784 conforme dados apresentados na Tabela
15 A concentraccedilatildeo de doaccedilotildees no PMDB diminuiu de 4104 em 2006
para 3641 em 2010 e aumentou para o PT (de 807 em 2006 para
3393 em 2010) e o PSDB (de 1640 em 2006 para 1784 em
2010)
NOME PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Angela R H Amin Helou PP Governador 25000000 1515 285235728 876
Paulo Roberto Bauer PSDB Senador 17859100 1082 215018697 831
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 14589500 884 76475776 1908
Ronaldo Joseacute Benedet PMDB Deputado Federal 10037000 608 62224076 1613
Claudio Antocircnio Vignatti PT Senador 10000000 606 225944994 443
Luiz Henrique da Silveira PMDB Senador 7463100 452 316150000 236
Thatiane Ferro Teixeira PSDB Deputado Estadual 5600000 339 21357586 2622
Ada Lili Faraco de Luca PMDB Deputado Estadual 5000000 303 66479091 752
Jorge C Leonardeli Boeira PT Deputado Federal 5000000 303 51226181 976
Celso Maldaner PMDB Deputado Federal 4000000 242 56183406 712
Deacutecio Nery de Lima PT Deputado Federal 4000000 242 94602191 423
Gean Marques Loureiro PMDB Deputado Federal 4000000 242 47666076 839
Gervaacutesio Joseacute da Silva PSDB Deputado Federal 4000000 242 68162276 587
Luci T K Choinacki PT Deputado Federal 4000000 242 53638737 746
Paulo R B Bornhausen DEM Deputado Federal 4000000 242 132193682 303
Pedro Francisco Uczai PT Deputado Federal 4000000 242 45421410 881
Vanio dos Santos PT Deputado Federal 4000000 242 68945421 580
Aceacutelio Casagrande PMDB Deputado Estadual 2500000 151 19129380 1307
Alexandre Santos Moraes PMDB Deputado Estadual 2500000 151 11717054 2134
Ana Paulo de Souza Lima PT Deputado Estadual 2500000 151 19360800 1291
Antonio M R de Aguiar PMDB Deputado Estadual 2500000 151 57962102 431
Carlos Joseacute Stupp PSDB Deputado Estadual 2500000 151 41555975 602
Edison A A de Oliveira PMDB Deputado Estadual 2500000 151 44778059 558
Giancarlo Tomelin PSDB Deputado Estadual 2500000 151 26041812 960
Joatildeo Batista Nunes PR Deputado Estadual 2500000 151 28970265 863
Joatildeo Olavio Falchetti PT Deputado Estadual 2500000 151 6753000 3702
Joares Carlos Ponticelli PP Deputado Estadual 2500000 151 45669621 547
Luciano Formighieri PPS Deputado Estadual 2500000 151 17351190 1441
Marcos Luiz Vieira PSDB Deputado Estadual 2500000 151 79902729 313
Rosemeacuteri Bartucheski PMDB Deputado Estadual 2500000 151 30045075 832
TOTAL 165048700 10000
147
Tabela 15 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2010
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees gerais de 2002 2006 e 2010 foram registradas
doaccedilotildees de 16 empresas ligadas ao carvatildeo mineral somando um total de
R$ 429404000 A Tractebel doou 5601 do total (R$ 240500000)
seguida pela Carboniacutefera Metropolitana SA com 1092 (R$
46882000) e pela Carboniacutefera Belluno com 730 (R$ 31346000) As
doaccedilotildees tecircm aumentado a cada eleiccedilatildeo em 2002 foram R$
105848400 em 2006 foram R$ 158506900 e em 2010 foram R$
165048700
O candidato Paulo Roberto Bauer recebeu um total de R$
45369900 em doaccedilotildees representando 1057 do total de doaccedilotildees Jaacute
Esperidiatildeo Amin recebeu R$ 43798600 (1020) e Edson Bez de
Oliveira foi agraciado com R$ 40855700 (951) Todos os candidatos
eleitos que receberam doaccedilotildees de campanha das empresas ligadas ao
carvatildeo mineral participam da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral confirmando a hipoacutetese da relaccedilatildeo estreita entre doaccedilotildees e
apoio agrave causa do carvatildeo mineral
No que se refere agrave relaccedilatildeo entre doaccedilotildees e os partidos poliacuteticos
constatou-se que o PMDB recebeu 3168 das doaccedilotildees no periacuteodo de
2002 a 2010 (R$ 136017900) Quanto ao PP este recebeu 1937 (R$
83154500) O PT levou 1720 (R$ 73838000) O PMDB aumentou
de R$ 10866200 em 2002 para R$ 60096700 em 2010 O PT
aumentou de R$ 5050000 em 2002 para R$ 56000000 em 2010 Jaacute
o PP diminuiu de R$ 48690600 em 2002 para R$ 9000000 em
2010 O aumento das doaccedilotildees para o PMDB e o PT pode ser explicado
se considerarmos a reeleiccedilatildeo e ascensatildeo de alguns candidatos inclusive
pela reeleiccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Lula da Silva do PT para a presidecircncia da
Repuacuteblica Jaacute as doaccedilotildees concedidas ao PP diminuiacuteram apoacutes a aposta
frustrada na eleiccedilatildeo de Esperidiatildeo Amin para governador
PARTIDO VALOR R$
PMDB 60096700 3641
PT 56000000 3393
PSDB 29452000 1784
PP 9000000 545
DEM 4000000 242
PR 4000000 242
PPS 2500000 151
TOTAL 165048700 10000
148
522 Eleiccedilotildees municipais
Nas eleiccedilotildees municipais de 2004 cinco empresas foram
doadoras Carboniacutefera Belluno (6383) Carboniacutefera Criciuacutema
(1558) Carboniacutefera Metropolitana (895) Carboniacutefera Catarinense
(823) e Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos (341) conforme dados da
Tabela 16 Foram doados R$ 41232300 para sete municiacutepios
Tabela 16 - Doadores eleiccedilotildees de 2004
Fonte TSE 2013
O municiacutepio de Criciuacutema recebeu 852 das doaccedilotildees Dentre os
candidatos estatildeo o candidato a vereador do municiacutepio de Criciuacutema
Edson do Nascimento do PMDB com 728 das doaccedilotildees o candidato
a prefeito de Criciuacutema Deacutecio Gomes Goacutees do PT com 606 e Carlos
Joseacute Stupp candidato a prefeito no municiacutepio de Tubaratildeo pelo PSDB
com 485 Aleacutem dos Comitecircs Financeiros Municipais (CFM) de
Criciuacutema Sideroacutepolis Treviso Lauro Muller e Iccedilara quatorze
candidatos a prefeito e vereador foram apoiados por doaccedilotildees (Tabela
17) Dos quatorze candidatos seis se mostram mais dependentes das
doaccedilotildees representando mais de 50 de sua receita total
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Carboniacutefera Criciuacutema Criciuacutema e Tubaratildeo PFL PMDB PSDB 6425000 3791
Carboniacutefera Metropolitana Criciuacutema Iccedilara e Tubaratildeo PFL PMDB e PT 3688500 2176
Caboniacutefera Catarinense Criciuacutema Lauro Muller Sideroacutepolis
Tubaratildeo
PFL PP PT 3391500 2001
Carboniacutefera Belluno Criciuacutema e Treviso PSDB 2034300 1200
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos Criciuacutema Lauro Muller Urussanga
PMDB PP PSDB e
PT 1408000 831
TOTAL 16947300 10000
149
Tabela 17 - Comitecircs e candidatos que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
2004
Fonte TSE 2013
Em 2004 dos cinco partidos que estatildeo entre os receptores o
PSDB recebeu 6798 das doaccedilotildees o PMDB recebeu 1823 o PT
recebeu 657 o PP recebeu 402 e o PFL recebeu 319 (Tabela
18)
Tabela 18 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2004
Fonte TSE 2013
CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$
RECEITA
TOTAL
R
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Criciuacutema PSDB - 29431300 7138 37042800 7945
Edson Do Nascimento Criciuacutema PMDB Vereador 3000000 728 3777163 7942
Deacutecio Gomes Goacutees Criciuacutema PT Prefeito 2500000 606 41391000 604
Carlos Jose Stupp Tubaratildeo PSDB Prefeito 2000000 485 66861662 299
Comitecirc Financeiro
Municipal Uacutenico
Sideroacutepolis PP - 791500 192 916500 8636
Luiz Carlos Zen Urussanga PP Prefeito 668000 162 4418000 1512
Felipe Felisbino Tubaratildeo PFL Vereador 500000 121 641145 7799
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Treviso PMDB - 388000 094 1004554 3862
Nestor Spricigo Lauro Muller PMDB Prefeito 330000 080 830752 3972
Elemar Nunes Tubaratildeo PFL Vereador 264000 064 404248 6531
Dalton Luiz Marcon Tubaratildeo PFL Vereador 202500 049 342514 5912
Manoel Duarte Porto Tubaratildeo PFL Vereador 202500 049 529725 3823
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Lauro Muller PP - 200000 049 600000 3333
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Iccedilara PMDB - 200000 049 6610000 303
Rudemar Silveira Da
Cunha
Tubaratildeo PFL Vereador 144500 035 242894 5949
Paulo Gonccedilalves Filho Lauro Muller PT Prefeito 110000 027 535000 2056
Antonio Alves Elias Lauro Muller PT Vereador 100000 024 166828 5994
Lauro Pirolla Criciuacutema PSDB Vereador 100000 024 279420 3579
Vanderlei Joseacute Zilli Criciuacutema PMDB Vereador 100000 024 1007126 993
41232300 10000
PARTIDO VALOR R$
PSDB 28031300 6798
PMDB 7518000 1823
PT 2710000 657
PP 1659500 402
PFL 1313500 319
TOTAL 41232300 10000
150
Nas eleiccedilotildees de 2008 seis empresas doaram um total de R$
22918311 A Carboniacutefera Criciuacutema doou 4132 a Mineraccedilatildeo e
Pesquisa Brasileira doou 2313 e a Tractebel doou 2182 (Tabela
19) O montante de doaccedilotildees de 2008 se comparado ao de 2004
diminuiu 4442
Tabela 19 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2008
Fonte TSE 2013
As doaccedilotildees de 2008 se concentraram em trecircs candidatos O
candidato a prefeito de Tubaratildeo Joatildeo Falchetti do PT recebeu 4363
das doaccedilotildees Edison do Nascimento do PMDB candidato a vereador
por Criciuacutema recebeu 2396 e Joseacute Claudio Gonccedilalves do DEM
candidato a prefeito de Forquilhinha recebeu 1091 das doaccedilotildees
Conforme dados apresentados na Tabela 20 receberam doaccedilotildees
candidatos dos municiacutepios de Criciuacutema Tubaratildeo Forquilhinha Iccedilara
Meleiro Timbeacute do Sul Sideroacutepolis e Lauro Muller Se consideradas as
receitas totais dos dezesseis candidatos cinco candidatos satildeo muito
dependentes das doaccedilotildees jaacute que elas representam mais de 50 da
receita total
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Carbonifera Criciuma SA Criciuacutema Forquilhinha Lauro Muller
Meleiro Timbeacute do Sul
PMDB DEM 9468944 4132
Mineraccedilatildeo E Pesquisa Brasileira Criciuacutema Tubaratildeo PMDB PT 5300000 2313
Tractebel Energia Tubaratildeo PT 5000000 2182
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda Criciuacutema Iccedilara DEM PP PSDB 1679175 733
Carboniacutefera Belluno Ltda Criciuacutema PSDB 1120192 489
Carbonifera Metropolitana SA Criciuacutema Sideroacutepolis Timbeacute do Sul PMDB 350000 153
TOTAL 22918311 10000
151
Tabela 20 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2008 que receberam doaccedilotildees
das empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
Fonte TSE 2013
As doaccedilotildees entre os partidos nas eleiccedilotildees de 2008 foram
distribuiacutedas da seguinte forma o PT recebeu 4363 das doaccedilotildees o
PMDB recebeu 3181 o DEM recebeu 1158 o PSDB recebeu
774 e o PP recebeu 524 (Tabela 21)
Tabela 21 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2008
Fonte TSE 2013
Nas Eleiccedilotildees de 2012 cinco empresas doaram R$ 22700000
para candidatos de trecircs municiacutepios Criciuacutema Iccedilara e Tubaratildeo Os
maiores montantes de doaccedilatildeo tiveram origem na Tractebel (6608) Carboniacutefera Metropolitana (1762) e Carboniacutefera Criciuacutema (1101)
conforme dados apresentados na Tabela 22
NOME DO CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Joatildeo Olavio Falchetti Tubaratildeo PT Prefeito 10000000 4363 18223525 5487
Edison Do Nascimento Criciuacutema PMDB Vereador 5490944 2396 10054122 5461
Joseacute Claudio Gonccedilalves Forquilhinha DEM Prefeito 2500000 1091 10147880 2464
Darlan Bitencourt Carpes Iccedilara PP Vereador 1200000 524 3761519 3190
Antoninho Dal Molin Netto Meleiro PMDB Prefeito 1000000 436 1997000 5008
Clesio Salvaro Criciuacutema PSDB Prefeito 842992 368 72173591 117
Andre M Jucoski Iccedilara PSDB Vereador 454175 198 1245875 3645
Luiz Fernando Cardoso Criciuacutema PMDB Vereador 400000 175 8071771 496
Jose Daminelli Criciuacutema PSDB Vereador 277200 121 1227765 2258
Arleu Ronaldo Da Silveira Criciuacutema PSDB Vereador 200000 087 1649455 1213
Heacutelio Roberto Cesa Sideroacutepolis PMDB Prefeito 150000 065 9963963 151
Wersmberg Laureano Lauro Muumlller DEM Vereador 128000 056 385903 3317
Loraci Davila Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 100000 044 163000 6135
Gislael Floriano Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 100000 044 195000 5128
Joao Batista Mandelli Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 50000 022 255800 1955
Romanna G C L Remor Criciuacutema DEM Vereador 25000 011 10166479 025
22918311 10000
152
Tabela 22 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2012
Fonte TSE 2013
Os candidatos a prefeito de Tubaratildeo do PSDB PMDB PSD e
PT receberam 8812 das doaccedilotildees (Tabela 23) O municiacutepio de Tubaratildeo
recebeu 8944 do total de doaccedilotildees Se consideradas as receitas totais
natildeo haacute evidecircncias de uma maior dependecircncia grande das doaccedilotildees
Tabela 23 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2012 que receberam doaccedilotildees
das empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
Fonte TSE 2013
Em 2012 o PSDB recebeu 2996 das doaccedilotildees o PMDB o PSD
e o PT receberam 2203 respectivamente e o PP recebeu 396
(Tabela 24) As doaccedilotildees da Eleiccedilatildeo de 2012 se comparadas agraves eleiccedilotildees
de 2004 e 2008 foram distribuiacutedas de forma mais equilibrada entre os
partidos
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora
Ltda
Tubaratildeo PSD PSDB
PT
15000000 6608
Carboniacutefera Metropolitana SA Iccedilara Tubaratildeo PSDB 4000000 1762
Carboniacutefera Criciuacutema SA Iccedilara Tubaratildeo PMDB PSDB 2500000 1101
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasileira Ltda Criciuacutema PP 900000 396
Minageo Ltda Tubaratildeo PSDB 300000 132
TOTAL 22700000 10000
CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Carlos Joseacute Stupp Tubaratildeo PSDB Prefeito 5000000 2203 36245503 1379
Edson Bez de
Oliveira
Tubaratildeo PMDB Prefeito 5000000 2203 129287720 387
Felippe Luiz Collaccedilo Tubaratildeo PSD Prefeito 5000000 2203 34140000 1465
Joatildeo Olavio falchetti Tubaratildeo PT Prefeito 5000000 2203 42272000 1183
Andreacute Mazzuchello
Jucoski
Iccedilara PSDB Vereador 1500000 661 4995950 3002
Daniel Costa de
Freitas
Criciuacutema PP Vereador 900000 396 6319977 1424
Felipe Felisbino Tubaratildeo PSDB Vereador 300000 132 4119158 728
22700000 10000
153
Tabela 24 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2012
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees municipais de 2004 2008 e 2012 nove empresas
doaram R$ 86850611 para os candidatos a prefeito e vereador As
doaccedilotildees direcionadas agraves eleiccedilotildees municipais apresentam uma reduccedilatildeo
significativa foram R$ 41232300 em 2004 R$ 22918311 em 2008 e
R$ 22700000 em 2012 A Carboniacutefera Belluno lidera as doaccedilotildees com
3159 seguida da Tractebel com 2303 e da Carboniacutefera Criciuacutema
com 2118 Os trecircs partidos que mais recebem doaccedilotildees nas eleiccedilotildees
municipais satildeo PSDB com 4215 PMDB com 2281 e PT com
2039
53 Os fatos ausentes do discurso dos poliacuteticos
No Brasil a degradaccedilatildeo do meio ambiente
e da sociedade das pessoas e da natureza
constitui cara e coroa de uma mesma
moeda de um mesmo estilo de
desenvolvimento e da ausecircncia de
democracia (SOUZA 1992 p 16)
As empresas ligadas ao carvatildeo mineral em Santa Catarina
doaram no intervalo de dez anos R$ 516254611 para candidatos a
eleiccedilotildees gerais e municipais Das dezessete empresas que aparecem
como doadoras a Tractebel foi responsaacutevel por 5046 das doaccedilotildees
seguida pela Carboniacutefera Belluno com 1139 e pela Carboniacutefera
Metropolitana com 1064 As demais quatorze empresas somam
2751 das doaccedilotildees (Tabela 25) O aumento nas doaccedilotildees para eleiccedilotildees
gerais e a diminuiccedilatildeo das doaccedilotildees para eleiccedilotildees municipais mostra que cresce nas empresas o interesse em apoiar candidatos a eleiccedilotildees gerais
que possam participar da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral
PARTIDO VALOR R$
PSDB 6800000 2996
PMDB 5000000 2203
PSD 5000000 2203
PT 5000000 2203
PP 900000 396
TOTAL 22700000 10000
154
Tabela 25 - Siacutentese dos doadores Eleiccedilotildees de 2002 e 2012
Fonte TSE 2013
Os dez candidatos que receberam maiores doaccedilotildees entre 2002 e
2012 foram candidatos a eleiccedilotildees gerais exceto Joatildeo Olavio Falchetti
que foi candidato em duas eleiccedilotildees municipais em 2008 e 2012 (Tabela
26) Todos os candidatos a eleiccedilotildees gerais que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e foram eleitos fazem parte
atualmente da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral
ANO ELEICcedilAtildeO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
DOADOR VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$
Tractebel Egi South
America Ltda 53000000 0 64000000 5000000 123500000 15000000 260500000 5046
Carboniacutefera Belluno Ltda 13970000 26319300 6776000 1120192 10600000 0 58785492 1139
Carboniacutefera
Metropolitana SA 15750000 3688500 19432000 350000 11700000 4000000 54920500 1064
Carboniacutefera Criciuacutema 6450000 6425000 18000000 9468944 6700600 2500000 49544544 96
Mineraccedilatildeo e Pesquisa
Brasil Ltda 0 0 15555000 5300000 0 900000 21755000 421
Induacutestria Carboniacutefera Rio
Deserto 4050000 0 0 0 12548100 0 16598100 322
Cia Energeacutetica Meridional 0 0 14000000 0 0 0 14000000 271
Mineraccedilatildeo Castelo
Branco Ltda 8467400 0 0 0 0 0 8467400 164
Carboniacutefera Catarinense
Ltda 0 0 8183000 0 0 0 8183000 159
Coque Catarinense Ltda 2434000 3391500 0 0 0 0 5825500 113
A Mendes TC e E de
Minerais Ltda 0 0 4000000 0 0 0 4000000 077
Minageo Ltda 0 0 3288000 0 0 300000 3588000 07
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda 0 0 1186400 1679175 0 0 2865575 056
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos
Ltda 927000 1408000 500000 0 0 0 2835000 055
Sul Catarinense
Mineraccedilatildeo e Art 0 0 2400000 0 0 0 2400000 046
Carboniacutefera Sideroacutepolis
Ltda 0 0 1186500 0 0 0 1186500 023
Mineraccedilatildeo Santa Augusta
Ltda 800000 0 0 0 0 0 800000 015
TOTAL 105848400 41232300 158506900 22918311 165048700 22700000 516254611 100
TOTAL
155
Tabela 26 - Candidatos que receberam maiores doaccedilotildees Eleiccedilotildees de
2002 a 2012
Fonte TSE 2013
Os partidos poliacuteticos que se destacam como maiores
receptores das doaccedilotildees satildeo PMDB com 3018 PSDB com 2060
PT com 1773 e PP com 1684 (Tabela 27)
Tabela 27 - Doaccedilotildees por Partido Poliacutetico Eleiccedilotildees de 2002 a 2012
Fonte TSE 2013
Os dados apresentados corroboram a hipoacutetese de que na defesa da causa do carvatildeo mineral se aliam poliacuteticos e empresas pelas doaccedilotildees
de campanha Trazer os fatos ausentes do discurso coloca em questatildeo o
reconhecimento e a representaccedilatildeo poliacutetica condiccedilotildees fundamentais para
assegurar a justiccedila ecoloacutegica e consequentemente para favorecer a
ANO ELEICcedilAtildeO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
NOME VALOR R$ VALOR R$VALOR R$ VALOR R$VALOR R$VALOR R$ TOTAL R$
Edson Bez de
Oliveira 5266200 0 21000000 0 14589500 5000000 45855700 89
Paulo Roberto
Bauer 12510800 0 15000000 0 17859100 0 45369900 88
Esperidiatildeo Amin
Helou Filho 43798600 0 0 0 0 0 43798600 85
Angela R H Amin
Helou 0 0 10000000 0 25000000 0 35000000 68
Luiz Henrique da
Silveira 4000000 0 20000000 0 7463100 0 31463100 61
Ada Lili Faraco de
Luca 0 0 20000000 0 5000000 0 25000000 48
Leodegar da Cunha
Tiscoski 4892000 0 12263900 0 0 0 17155900 33
Joatildeo Olavio
Falchetti 0 0 0 10000000 2500000 1500000 14000000 27
Paulo R B
Bornhausen 4900000 0 5000000 0 4000000 0 13900000 27
Ronaldo Joseacute
Benedet 1350000 0 2000000 0 10037000 0 13387000 26
ANO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
PARTIDO VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ TOTAL
PMDB 10866200 7518000 65055000 7290944 60096700 5000000 155826844 3018
PSDB 14310800 28031300 26000000 1774367 29452000 6800000 106368467 206
PT 5050000 2710000 12788000 10000000 56000000 5000000 91548000 1773
PP 48690600 1659500 25463900 1200000 9000000 900000 86914000 1684
PFL 22730800 1313500 25000000 0 0 0 49044300 95
PPB 4200000 0 4200000 0 2500000 0 10900000 211
DEM 0 0 0 2653000 4000000 0 6653000 129
PR 0 0 0 0 4000000 0 4000000 077
PSD 0 0 0 0 0 5000000 5000000 097
TOTAL 516254611 100
156
aplicaccedilatildeo do enfoque do ecodesenvolvimento Os candidatos eleitos natildeo
representam os interesses da maioria que os elegeu e sim daqueles
poucos que investiram em suas campanhas por meio de doaccedilotildees Vecircm se
consolidando assim um cenaacuterio no qual a injusticcedila poliacutetica alimenta a
reproduccedilatildeo da injusticcedila ambiental e ecoloacutegica
6 CARVAtildeO MINERAL E AMPLIACcedilAtildeO DA ENERGIA
TERMELEacuteTRICA EM SANTA CATARINA
A trajetoacuteria do carvatildeo mineral no Brasil e em Santa Catarina eacute
acompanhada de periacuteodos de crise e recuperaccedilatildeo do segmento A
construccedilatildeo da USITESC eacute uma forma de garantir a continuidade da
exploraccedilatildeo e do consumo do carvatildeo Aleacutem da crise do carvatildeo o que
aparece nos discursos de parlamentares presentes no capiacutetulo anterior eacute
o carvatildeo como seguranccedila energeacutetica
O objetivo desse capiacutetulo eacute compreender a ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo
de energia eleacutetrica movida a carvatildeo mineral atraveacutes da anaacutelise do
processo de licenciamento ambiental da USITESC Nos capiacutetulos dois e
trecircs foram tratados condicionantes mais amplos que incidem sobre a
ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo No capiacutetulo quatro foi examinada a relaccedilatildeo das
redes de influecircncia entre segmentos poliacuteticos e econocircmicos em vaacuterias
escalas Neste capiacutetulo a ideia eacute verificar os condicionantes que atuam
localmente
Para tanto o capiacutetulo estaacute dividido em quatro seccedilotildees aleacutem dessa
introduccedilatildeo A primeira seccedilatildeo trata das principais caracteriacutesticas do
municiacutepio de Treviso A segunda seccedilatildeo traz informaccedilotildees sobre os
documentos escritos da USITESC o EIARIMA o processo de
licenciamento e audiecircncias as correspondecircncias e articulaccedilotildees entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos e a posiccedilatildeo dos segmentos sociais Na
terceira seccedilatildeo entram os documentos falados do processo de
licenciamento os discursos nas audiecircncias puacuteblicas A anaacutelise dos
discursos torna expliacutecitas as relaccedilotildees de poder e desigualdade nas
audiecircncias puacuteblicas A quarta seccedilatildeo faz uma siacutentese das limitaccedilotildees e
possibilidades da democracia e do aprendizado social no caso do
licenciamento da USITESC
61 O municiacutepio de Treviso
A chegada dos primeiros imigrantes italianos no Sul de Santa
Catarina data de 1891 oriundas das proviacutencias de Treviso Beacutergamo
158
Cremona e Ferrara O povoado de Treviso tornou-se distrito de
Urussanga em 1933 Em 1958 o controle do distrito passou para
Sideroacutepolis emancipado de Urussanga Em 1995 o distrito de Treviso eacute
desmembrado de Sideroacutepolis formando um novo municiacutepio (IBGE
2013 PMT 2014)
No brasatildeo do municiacutepio a alusatildeo ao navio que trouxe os
primeiros imigrantes as duas atividades econocircmicas principais (extraccedilatildeo
do carvatildeo e o cultivo da banana) e as datas de colonizaccedilatildeo e
emancipaccedilatildeo (Figura 8)
Figura 8- Brasatildeo do municiacutepio de Treviso
Fonte PMT (2014) Autora Daniela Losso Redesenhado por Edson
Cesconetto
O municiacutepio de Treviso localiza-se na Bacia Carboniacutefera (Figura
9) entre Sideroacutepolis Lauro Muumlller e Urussanga a 220 km da capital
Florianoacutepolis a 35 km da BR 101 e a 25 km da cidade de Criciuacutema
(PMT 2014)
159
Figura 9 ndash Mapa de localizaccedilatildeo do municiacutepio de Treviso
Fonte Concepccedilatildeo de Luciana Butzke Elaborado por Ruy Lucas de
Souza
O clima geral da regiatildeo segundo a classificaccedilatildeo climaacutetica de
Koumleppen eacute do tipo Cfa (mesoteacutermico uacutemido e com veratildeo quente) A
temperatura meacutedia anual varia de 170 a 193ordmC maacuteximas de 234 a
259ordmC e miacutenimas entre 120 e 151ordmC A meacutedia anual pluviomeacutetrica fica
em torno de 1220 a 1660mm e a umidade relativa do ar varia de 814
a 822 (UNESC PLURAL 2006)
A regiatildeo conta com grandes variaccedilotildees de relevo clima tipos de
solo fauna e flora A geomorfologia da regiatildeo conta com seis domiacutenios
ambientais Planalto dos Campos Gerais Serra Geral Patamares da
Serra Geral Depressatildeo da Zona Carboniacutefera Sudeste Catarinense
Embasamento em estilos complexos e Planiacutecie Coluacutevio-aluvionar (Quadro 9)
160
Quadro 9 - Principais caracteriacutesticas fiacutesicas e bioacuteticas da aacuterea de
influecircncia indireta do projeto USITESC DOMIacuteNIOS
AMBIENTAIS
SIacuteNTESE DAS CARACTERIacuteSTICAS
1 Planalto dos
Campos Gerais
Corresponde agrave regiatildeo mais elevada com relevo pouco
ondulado e altitudes superiores a 1000 metros Neste
domiacutenio prevalecem rochas de origem vulcacircnicasub-
vulcacircnica com solos pouco desenvolvidos normalmente
utilizados para produccedilatildeo de maccedilatilde reflorestamento e
pastagem Esse domiacutenio abriga algumas nascentes de rios
da bacia do Araranguaacute e da bacia do Tubaratildeo com
cobertura vegetal representada pelas matas de araucaacuteria
matinha nebular e campos de cima da serra tendo fauna
diversificada Aacuterea impactada pela derrubada das matas
de araucaacuteria plantio de pinus e queimadas nos campos
2 Serra Geral Corresponde agraves aacutereas de encosta com altitudes entre
500m e 1000m onde os desniacuteveis satildeo acentuados e os
vales satildeo fechados e profundos Satildeo formadas
principalmente por rochas arenosas e basaacutelticas e solos
rasos normalmente susceptiacuteveis agrave erosatildeo e a movimentos
de massa Abriga grande parte das nascentes dos rios das
bacias do Araranguaacute e do Tubaratildeo As florestas
encontram-se entre as mais preservadas da regiatildeo sul do
Estado atuando como reguladoras do clima do ciclo e da
distribuiccedilatildeo de chuvas servindo de centro de dispersatildeo e
conexatildeo de espeacutecies Caracteriza-se pela ampla
biodiversidade representando um dos ambientes mais
complexos fraacutegeis e ameaccedilados da regiatildeo que deve ser
preservado Neste domiacutenio se insere a Reserva Bioloacutegica
Estadual do Aguaiacute
3 Patamares da
Serra Geral
Os patamares da Serra Geral representam o
prolongamento da escarpa da Serra Geral que avanccedila
sobre a Depressatildeo Carboniacutefera e a Planiacutecie Coluacutevio-
Aluvionar constituindo morros-testemunhos como o
Montanhatildeo sustentados principalmente por basaltos e
diabaacutesicos Os solos tecircm normalmente baixa fertilidade e
satildeo utilizados nas aacutereas planas para pastagens plantio de
eucalipto e lavouras de subsistecircncia Nos terrenos
iacutengremes o solo eacute usado para o cultivo de banana No
alto do Montanhatildeo encontra-se uma das aacutereas mais
preservadas deste domiacutenio correspondente agrave APA do rio
Ferreira
4 Depressatildeo da
Zona Carboniacutefera
Regiatildeo de relevo mais suave em que predominam vales
abertos e pouco profundos Constitui-se principalmente
161
do Sudeste
Catarinense
de rochas sedimentares como arenitos folhelhos siltitos
e camadas de carvatildeo Os solos satildeo variados utilizados
principalmente para pastagens culturas de subsistecircncia e
reflorestamento de eucalipto Os recursos hiacutedricos
encontram-se comprometidos principalmente pela
exploraccedilatildeo de carvatildeo mas tambeacutem pelas atividades
industriais agriacutecolas e esgotamento sanitaacuterio A regiatildeo eacute
fortemente impactada com vaacuterias aacutereas degradadas pela
exploraccedilatildeo do carvatildeo paisagens fortemente
descaracterizadas e reduzida biodiversidade em alguns
locais
5 Embasamento
em estilos
complexos
Corresponde aos relevos ondulados formados por rochas
granitoacuteides e gnaacuteissicas onde os solos normalmente satildeo
pouco desenvolvidos e de baixa fertilidade
6 Planiacutecie Coluacutevio-
Aluvionar
Aacuterea de relevo plano (cotas inferiores a 100m) com solos
do tipo hidromoacuterficos com elevado teor de mateacuteria
orgacircnica Os solos satildeo empregados no cultivo de arroz
irrigado produccedilatildeo de hortaliccedilas uva e cana-de-accediluacutecar
Em regiotildees menos inundadas satildeo utilizados tambeacutem para
reflorestamento e pastagem
Fonte UNESC Plural (2006 p 24)
Eacute destaque em Treviso a Reserva Bioloacutegica Estadual do Aguaiacute e
a Aacuterea de Preservaccedilatildeo Permanente do Rio Ferreira A Reserva Bioloacutegica
Estadual do Aguaiacute conta com aacuterea de 7762 hectares que se estende
entre os municiacutepios de Treviso Sideroacutepolis e Nova Veneza nos beirais
da Serra Geral A reserva abriga cachoeiras fauna e flora diversificadas
que constituem grande riqueza natural (UNESC PLURAL 2006)
O municiacutepio contava em 2010 com 3527 habitantes em
157084 km2 com uma densidade demograacutefica de 2245 habitantes por
quilocircmetro quadrado Desses 1789 eram homens e 1738 eram
mulheres 1833 habitavam o espaccedilo urbano e 1694 o espaccedilo rural A
Populaccedilatildeo Economicamente Ativa (PEA) correspondia a 487 da
populaccedilatildeo (SEBRAE 2013b)
O Produto Interno Bruto (PIB) de Treviso corresponde a 008
da composiccedilatildeo do PIB catarinense Jaacute em relaccedilatildeo ao PIB per capita
Treviso encontra-se em 2009 na 17ordf posiccedilatildeo no ranking estadual O
Valor Adicionado Bruto (VAB) que representa a soma de todos os bens
e serviccedilos produzidos num determinado territoacuterio econocircmico ficou
assim distribuiacutedo 61 na induacutestria 24 no setor de serviccedilos e 9 na
administraccedilatildeo puacuteblica Em relaccedilatildeo ao Valor Adicionado Fiscal (VAF)
162
indicador econocircmico contaacutebil utilizado para calcular a participaccedilatildeo
municipal no repasse de impostos a extraccedilatildeo de carvatildeo mineral era
responsaacutevel por 66 da participaccedilatildeo do VAF no ano de 2010
(SEBRAE 2013b) Esses dados demonstram uma forte dependecircncia do
municiacutepio agrave atividade carboniacutefera
Dos 1093 domiciacutelios existentes no municiacutepio 853 eram
proacuteprios 91 alugados 55 cedidos e 01 em outra condiccedilatildeo No
que se refere agrave renda familiar 04 da populaccedilatildeo contava com renda
familiar per capita de ateacute R$ 7000 16 com renda familiar per capita
de ateacute frac12 salaacuterio miacutenimo e 103 com ateacute frac14 do salaacuterio miacutenimo A meacutedia
salarial da induacutestria extrativa era de R$ 185480 inferior apenas a
atividades relacionadas agrave eletricidade e gaacutes com uma meacutedia de R$
277460 Nesse mesmo ano o municiacutepio contava com 1629 postos de
trabalho com carteira assinada dos quais 1132 eram vinculados agrave
atividade carboniacutefera em cinco empresas (SEBRAE 2013b) Quando
69 dos postos de trabalho com carteira assinada tecircm origem na
atividade carboniacutefera que na localidade apresenta tambeacutem uma das
melhores meacutedias salariais a populaccedilatildeo fica numa posiccedilatildeo de
vulnerabilidade jaacute que depende dessa atividade para o seu sustento
Na lavoura temporaacuteria destacam-se a produccedilatildeo do arroz batata-
doce batata inglesa feijatildeo (gratildeo) fumo mandioca milho (gratildeo) Na
lavoura permanente tem se destacado a banana No municiacutepio tambeacutem
satildeo criadas aves (galos galinhas frangos e pintos) que em 2010
somavam 500000 cabeccedilas (SEBRAE 2013b)
Treviso conta com trecircs aacutereas inclusas na Accedilatildeo Civil Puacuteblica nordm
938000533-4 que determina a recuperaccedilatildeo das aacutereas degradas pela
mineraccedilatildeo Aacuterea III Rio Pio que tem 11781 hectares Campo Morosini
com 22100 hectares e UM IV Volta Redonda com 5797 hectares A
primeira aacuterea natildeo foi iniciada a segunda estaacute em andamento e a terceira
jaacute estaacute finalizada O processo de recuperaccedilatildeo foi orccedilado em 319 milhotildees
de reais (ACP DO CARVAtildeO 2014)
62 O processo de licenciamento os documentos escritos
A primeira solicitaccedilatildeo de parecer da USITESC referente ao
Licenciamento Preacutevio (LP) data do dia 2 de maio de 2000 Segundo a
solicitaccedilatildeo o parecer se fazia necessaacuterio para que a Usina fosse
163
implantada dentro do prazo previsto pelo Governo e pelo Programa
Prioritaacuterio de Termeleacutetricas que se colocava para dezembro de 2003
(FATMA 2013a fl 1) A contrataccedilatildeo do EIARIMA foi em 2001 e a
entrega aconteceu em 18 de agosto de 2003 (FATMA 2013a fl 49)
621 O EIARIMA da USITESC
A equipe responsaacutevel pelo projeto da USITESC foi composta por
consoacutercio formado pela Carboniacutefera Criciuacutema SA e pela Companhia
Carboniacutefera Metropolitana SA O projeto foi desenvolvido com o apoio
da Parsons Energy amp Chemicals Group Main Engenharia amp Consultoria
Ltda e Taylor DeJongh E o EIARIMA foi realizado pelo IPAT
vinculado agrave UNESC e Plural
A previsatildeo de construccedilatildeo da USITESC eacute de 40 meses A aacuterea a
ser ocupada pela usina localiza-se na margem direita do rio Matildee Luzia
tem aproximadamente 500000m2 e pertence agrave Carboniacutefera
Metropolitana sendo utilizada como depoacutesito de rejeitos (Figura 10)
(UNESC PLURAL 2006)
Figura 10 - Aacuterea prevista para a implantaccedilatildeo da USITESC
Fonte UNESC Plural 2006 p 5
164
Para a produccedilatildeo de energia termeleacutetrica a usina vai utilizar carvatildeo
bruto da camada Bonito (70) e rejeitos da camada Barro Branco
(30) que seratildeo fornecidos pelas duas empresas que compotildeem o
consoacutercio O consumo meacutedio anual previsto eacute de 1900000 toneladas de
carvatildeo e 820000 toneladas de rejeito A USITESC teraacute potecircncia
instalada de 440 MW e segundo a descriccedilatildeo do empreendimento vai
gerar 180 empregos diretos (FATMA 2013a fl 34)
Na justificativa do EIARIMA destacou-se a importacircncia
estrateacutegica do carvatildeo dada a dependecircncia hidroenergeacutetica e a
inseguranccedila quanto agrave importaccedilatildeo do gaacutes natural e o uso de tecnologias
limpas de queima de carvatildeo Natildeo satildeo citados dados sobre consumo e
demanda A USITESC adquire importacircncia na recuperaccedilatildeo ambiental do
Sul jaacute que vai consumir os rejeitos (UNESC PLURAL 2006)
Para gerar energia termeleacutetrica a USITESC vai utilizar o ciclo
teacutermico regenerativo com uso de caldeira de leito fluidizado que
recupera calor exigindo um consumo menor de combustiacutevel A
combustatildeo em leito fluidizado circulante reduz a produccedilatildeo de oacutexidos de
nitrogecircnio O controle das emissotildees atmosfeacutericas seraacute feito atraveacutes da
injeccedilatildeo de calcaacuterio na caldeira (Consumo meacutedio anual de 150000
toneladas) e de um sistema de filtragem que utilizaraacute amocircnia (consumo
meacutedio anual entre 72000 a 80000 toneladas Como resultado seratildeo
obtidas aproximadamente 300000 toneladas de sulfato de amocircnia que
seratildeo utilizadas na produccedilatildeo de fertilizantes quiacutemicos Quanto ao
consumo de aacutegua prevecirc-se um consumo meacutedio de 32 ls (115m3h) no
processo e 2361 ls (848m3h) no resfriamento Soacute a tiacutetulo de
comparaccedilatildeo para o abastecimento de Criciuacutema e municiacutepios vizinhos
satildeo utilizados 800ls do rio Satildeo Bento localizado na sub-bacia do Rio
Matildee Luzia (UNESC PLURAL 2006)16
Na avaliaccedilatildeo de impactos constam no RIMA oito impactos no
meio fiacutesico seis impactos no meio bioacutetico e 11 no meio antroacutepico
(Quadro 10) Dentre os impactos listados os de maior expressatildeo satildeo
16
O alto consumo de aacutegua e a construccedilatildeo de uma barragem no Rio
Matildee Luzia foram desde o iniacutecio do processo de licenciamento
pontos polecircmicos do projeto Devido a esses pontos o projeto foi
alterado de torre uacutemida para torre seca diminuindo o consumo de
aacutegua para 115m3h em todo o processo
165
reduccedilatildeo na geraccedilatildeo de drenagem aacutecida (considerado um impacto
positivo) alteraccedilatildeo da qualidade do ar (principalmente durante a
construccedilatildeo da Usina com a movimentaccedilatildeo de veiacuteculos pesados o
dioacutexido de enxofre pode elevar-se) reduccedilatildeo da disponibilidade de aacutegua
(com as torres de resfriamento uacutemidas) e impacto sobre aacutereas
protegidas
Quadro 10- Impactos sobre o Meio Fiacutesico Bioacutetico e Antroacutepico e
accedilotildees geradoras IMPACTOS SOBRE O
MEIO FIacuteSICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Solo Intensificaccedilatildeo de
processos erosivos e
de assoreamento
Obras de corte e aterro necessaacuterias agrave
implantaccedilatildeo do empreendimento
Contaminaccedilatildeo do solo
pela disposiccedilatildeo de
resiacuteduos soacutelidos e
efluentes
Operaccedilatildeo da usina resiacuteduos produzidos
durante as fases de construccedilatildeo e operaccedilatildeo da
usina
Reduccedilatildeo da geraccedilatildeo
de drenagem aacutecida
Consumo de rejeito do beneficiamento de
carvatildeo e recuperaccedilatildeo de aacutereas degradadas
pela mineraccedilatildeo
Aacutegua
Alteraccedilatildeo na
qualidade das aacuteguas
superficiais
Construccedilatildeo da usina efluentes oleosos
como oacuteleos e graxas advindos da
manutenccedilatildeo de maacutequinas e caminhotildees
ligados agraves obras eou do armazenamento
temporaacuterio de combustiacuteveis e lubrificantes
Efluentes a serem descartados pelo
empreendimento durante a fase de operaccedilatildeo
Alteraccedilatildeo na
qualidade das aacuteguas
subterracircneas
Disposiccedilatildeo inadequada de resiacuteduos soacutelidos
efluentes sanitaacuterios efluentes industriais
Reduccedilatildeo da
disponibilidade de
aacutegua
Operaccedilatildeo da usina captaccedilatildeo de aacutegua para
torre de resfriamento da usina
Ar e
ruiacutedo
Alteraccedilatildeo da
qualidade do ar
Aumento do traacutefego de veiacuteculos pesados
movimentaccedilatildeo de veiacuteculos em aacutereas natildeo
pavimentadas operaccedilatildeo da usina manuseio
do combustiacutevel
Alteraccedilatildeo das
condiccedilotildees de ruiacutedo de
fundo
Traacutefego e operaccedilatildeo de veiacuteculos pesados
operaccedilatildeo de equipamentos como
compressores britadores sondas etc
operaccedilatildeo dos equipamentos da usina
166
IMPACTOS SOBRE O
MEIO BIOacuteTICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Fauna
e
Flora
Reduccedilatildeo de habitats
para a fauna local
Preparaccedilatildeo da aacuterea de implantaccedilatildeo da usina
obras de terraplenagem e retirada da
cobertura vegetal
Evasatildeo da fauna Ruiacutedos produzidos durante a fase de
implantaccedilatildeo e construccedilatildeo da usina alteraccedilatildeo
da qualidade do ar e perda de habitats devido
agraves obras de terraplenagem
Impacto sobre a
avifauna
Operaccedilatildeo da usina
Impacto sobre a fauna
de peixes e
organismos aquaacuteticos
Construccedilatildeo da usina operaccedilatildeo da usina
manutenccedilatildeo de equipamentos transporte e
armazenamento de reagentes e outros
insumos natildeo inertes
Impacto sobre a
vegetaccedilatildeo
remanescente e
culturas
Traacutefego de veiacuteculos movidos a oacuteleo diesel
operaccedilatildeo da usina (queima de carvatildeo)
Impacto sobre as aacutereas
protegidas
Periacuteodo de construccedilatildeo da usina contingente
de trabalhadores e operaccedilatildeo da usina
IMPACTOS SOBRE O
MEIO ANTROacutePICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Geraccedilatildeo de conflitos Contrataccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
instalaccedilatildeo do canteiro de obras
Geraccedilatildeo de
expectativa e
mobilizaccedilatildeo da
comunidade
Estudos e projetos contrataccedilatildeo e
mobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
Sobrecarga da infra-
estrutura social
existente
Obras da usina contrataccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo
da matildeo-de-obra
Geraccedilatildeo de emprego Construccedilatildeo da usina operaccedilatildeo da usina
mineraccedilatildeo do carvatildeo serviccedilos terceirizados
Geraccedilatildeo de renda e
ampliaccedilatildeo da oferta de
serviccedilos
Construccedilatildeo e operaccedilatildeo da usina
Atraccedilatildeo de matildeo-de-
obra de outras aacutereas
Construccedilatildeo da usina contrataccedilatildeo e
desmobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
Incremento do
desenvolvimento
econocircmico
Operaccedilatildeo da usina
Mudanccedila no cotidiano
da comunidade
Obras da usina contrataccedilatildeo de matildeo-de-obra
de outras regiotildees demanda por serviccedilos e
167
sobrecarga da infra-estrutura social
alteraccedilatildeo do padratildeo de traacutefego dos veiacuteculos
Alteraccedilatildeo das
condiccedilotildees de sauacutede da
populaccedilatildeo
Implantaccedilatildeo da usina fase das obras e
operaccedilatildeo da usina emissatildeo de gases ruiacutedo
disposiccedilatildeo das cinzas e depoacutesito temporaacuterio
de carvatildeo e reagentes
Aumento do traacutefego
de veiacuteculos e pressatildeo
sobre a infra-estrutura
viaacuteria
Obras da usina obras complementares
operaccedilatildeo da usina transporte de insumos de
subprodutos e de resiacuteduos
Aumento do risco de
acidentes de tracircnsito
Obras da usina transporte de pessoas e
insumos
Impacto na paisagem
local e perda de
referecircncias histoacuterico-
culturais
Obras da usina e complementares
Interferecircncia em siacutetios
arqueoloacutegicos
Obras complementares da usina barragem e
reservatoacuterio estradas e vias de acesso linha
de transmissatildeo
Fonte UNESC Plural (2006 p 34-5)
No EIARIMA natildeo haacute nenhuma referecircncia aos empreendimentos
acessoacuterios a saber o reservatoacuterio de aacutegua a ser construiacutedo no rio Matildee
Luzia a extensatildeo da ferrovia entre Sideroacutepolis e a Mina Esperanccedila e
Fontanella a linha de transmissatildeo que vai conectar a subestaccedilatildeo da
ELETROSUL em Sideroacutepolis com a Usina e o terminal de recebimento
e estocagem de amocircnia no Porto de Imbituba Os empreendimentos
acessoacuterios seratildeo tratados na sessatildeo 63 deste capiacutetulo Faltou tambeacutem
mencionar nos impactos sobre o meio antroacutepico da desarticulaccedilatildeo da
estrutura econocircmica existente o pequeno comeacutercio a lavoura de
subsistecircncia a pesca artesanal as atividades domeacutesticas etc
Tendo como referecircncia os impactos listados no Quadro 10 foram
propostas 59 medidas mitigatoacuterias sendo 25 preventivas duas
corretivas trecircs preventivas e corretivas 17 compensatoacuterias nove de
acompanhamento e trecircs de controle
Dentre os programas ambientais propostos para a USITESC
destacam-se programa de monitoramento ambiental programa de
conservaccedilatildeo da fauna e flora programa de preservaccedilatildeo do patrimocircnio
arqueoloacutegico programa de comunicaccedilatildeo social programa de
gerenciamento de risco programa de reabilitaccedilatildeo de aacutereas degradadas
168
programa de gestatildeo ambiental e programa de fomento ao
desenvolvimento sustentaacutevel No Quadro 11 uma siacutentese dos programas
e seus alvos principais
Quadro 11 - Siacutentese dos Programas da USITESC e alvos principais PROGRAMA ALVO
Monitoramento ambiental Qualidade do ar solo e aacutegua
Adequaccedilatildeo da infraestrutura baacutesica Rodovias sauacutede educaccedilatildeo e
abastecimento de aacutegua
Controle ambiental Qualidade do ar solo e aacutegua na aacuterea
do empreendimento
Conservaccedilatildeo da fauna e flora Fauna e flora no entorno do
empreendimento
Preservaccedilatildeo do patrimocircnio
arqueoloacutegico
Patrimocircnio arqueoloacutegico da regiatildeo
Comunicaccedilatildeo social Informaccedilotildees atualizadas sobre o
empreendimento para a comunidade
Gerenciamento de risco Armazenamento de produtos
perigosos
Reabilitaccedilatildeo de aacutereas degradadas Entorno do empreendimento
Gestatildeo ambiental Processo decisoacuterio da Usina e relaccedilatildeo
com os colaboradores
Fomento ao desenvolvimento
sustentaacutevel
Criaccedilatildeo de um fundo de fomento agrave
atividades de recuperaccedilatildeo ambiental
melhoria da qualidade de vida e
desenvolvimento sustentaacutevel
Fonte Baseado em UNESC Plural (2006)
Quando analisadas as perspectivas para a regiatildeo com e sem a
implantaccedilatildeo do empreendimento alguns aspectos podem ser destacados
Sem o empreendimento natildeo haveria pressatildeo antroacutepica e a regiatildeo seguiria
as atuais tendecircncias de desconcentraccedilatildeo crescimento moderado da
atividade agropecuaacuteria continuidade da atividade carboniacutefera num
cenaacuterio de suposta estagnaccedilatildeo econocircmica Com o empreendimento
haveria uma dinamizaccedilatildeo da economia municipal geraccedilatildeo de emprego e
renda o consumo do rejeito para geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica e a pressatildeo antroacutepica na aacuterea de influecircncia da USITESC inclusive aacutereas
preservadas (UNESC PLURAL 2006)
169
622 Das audiecircncias puacuteblicas e licenccedilas
O processo de licenciamento da USITESC contou com a
realizaccedilatildeo de quatro audiecircncias puacuteblicas que ocorreram de acordo com
a resoluccedilatildeo do CONAMA nordm 00987 As audiecircncias aconteceram no
municiacutepio de Treviso A primeira ocorreu em 19 de fevereiro de 2004 a
segunda em oito de julho de 2004 a terceira em 16 de maio de 2006 e a
quarta em 8 de novembro de 2007 A realizaccedilatildeo das quatro audiecircncias
puacuteblicas se deve ao fato de que vaacuterias informaccedilotildees natildeo constavam do
EIARIMA tendo sido solicitados estudos complementares que
incluiacuteam tambeacutem os empreendimentos acessoacuterios
Apoacutes a terceira audiecircncia puacuteblica em trecircs de julho de 2006
Darlan Aiacuterton Dias Procurador da Repuacuteblica enviou uma
correspondecircncia para o entatildeo presidente da FATMA Jacircnio Wagner
Constante informando que o licenciamento da USITESC e do
reservatoacuterio de aacutegua precisam ser conjuntos sob pena de fracionar o
licenciamento (FATMA 2013d fl 687) O procurador da repuacuteblica
recomendou que ldquonatildeo seja concedida LP para a USITESC sem que
antes seja apresentado EIARIMA relativo agrave construccedilatildeo do reservatoacuterio
no rio Matildee Luzia o qual deveraacute ser publicado e submetido a audiecircncia
puacuteblica conforme determina a legislaccedilatildeo vigenterdquo (FATMA 2013d fl
687)
Em seis de marccedilo de 2007 Alfredo Flavio Gazzolla informou ao
novo presidente da FATMA Carlos L Kreuz que diante da situaccedilatildeo
colocada a USITESC estava alterando seu projeto original mudando o
sistema de resfriamento da usina e reduzindo o consumo de aacutegua a 10
do previsto anteriormente (FATMA 2013e fl 831)
Com a alteraccedilatildeo do projeto o Procurador da Repuacuteblica Darlan
Airton Dias em oito de maio de 2007 informou a necessidade da
realizaccedilatildeo de uma nova audiecircncia puacuteblica ldquoConsiderando a mudanccedila
conceitual no projeto eventual concessatildeo de Licenccedila Ambiental Preacutevia
ndash LAP depende da realizaccedilatildeo de nova audiecircncia puacuteblicardquo (FATMA
2013e fl 842-3) Apoacutes a realizaccedilatildeo da quarta audiecircncia puacuteblica em 8 de novembro de 2007 a LP foi concedida em 14 de dezembro de 2007
(LAP nordm 1482007) (FATMA 2013f fl 1065)
Em 31 de marccedilo de 2008 foi comunicada a Alteraccedilatildeo da
composiccedilatildeo acionaacuteria da USITESC 95 do capital foi assumido pela
170
Linear Participaccedilotildees e Incorporaccedilotildees Ltda e os 5 restantes ficam com
as Carboniacuteferas Criciuacutema e Metropolitana A comunicaccedilatildeo remetida por
Kaioaacute Gomes diretor teacutecnico da Linear foi endereccedilada ao novo
presidente da FATMA Murilo Xavier Flores (FATMA 2013f fl
1111)
Em dois de marccedilo de 2010 foi concedida a LI (LAI nordm 06GELUR
2010) (FATMA 2013h fl 1540) Ainda em 2010 foi estabelecido o
Termo de Compromisso de Compensaccedilatildeo Ambiental R$ 670800000 a
serem aplicados na Reserva Bioloacutegica Estadual do Aguaiacute (FATMA
2013h fl 1549-1554)
Em 15 de fevereiro de 2013 Kaioaacute Gomes solicitou a
prorrogaccedilatildeo da LI (FATMA 2013h fl 1607-08) Em resposta Ivana
Becker concluiu ser viaacutevel a prorrogaccedilatildeo da LI pelo prazo de 36 meses
(FATMA 2013h fl 1603-5)
A solicitaccedilatildeo de estudos complementares e as quatro audiecircncias
puacuteblicas parecem demonstrar uma estrateacutegia de desinformaccedilatildeo por parte
dos segmentos econocircmicos O papel do Ministeacuterio Puacuteblico foi chave no
questionamento e equacionamento dessa questatildeo
623 Pressotildees dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos no processo de
licenciamento
Um aspecto interessante na anaacutelise do discurso dos documentos
do processo de licenciamento foi a pressatildeo exercida pela USITESC e
pelo Governo do Estado sobre a FATMA Em janeiro de 2005 o entatildeo
presidente da USITESC enviou uma carta ao governo do estado
questionando o tratamento dado pela FATMA ao processo de
licenciamento ambiental destacando a importacircncia da USITESC e
sugerindo uma falta de sintonia entre FATMA e poder executivo
conforme trecho da carta a seguir
Esta empresa gostaria de registrar seu protesto e
indignaccedilatildeo pelo peacutessimo tratamento dado por esta
Fundaccedilatildeo ao processo de licenciamento ambiental
da USITESC embora tenhamos sempre procurado
dar o maacuteximo de suporte e pautado nossa postura
171
no sentido da maacutexima cooperaccedilatildeo e pronto
atendimento a qualquer solicitaccedilatildeo da FATMA
Nossa paciecircncia esgota-se no momento em que
percebemos o descaso com que eacute tratado um
projeto da magnitude da Usina Termeleacutetrica Sul
Catarinense ndash USITESC cujo conceito de
desenvolvimento vem desde o iniacutecio de seus
estudos buscando a melhor integraccedilatildeo do projeto
com sua aacuterea de influecircncia e geraccedilatildeo de resultados
positivos para o meio ambiente em que se insere
()
Este fato contrasta com as manifestaccedilotildees puacuteblicas
de apoio ao Projeto USITESC recebidas do
Governo Estadual pelos empreendedores e revela
falta de sintonia entre a Fatma e o poder executivo
do Estado de Santa Catarina (Alfredo Flaacutevio
Gazzolla presidente da USITESC FATMA
2013c fl 357 e 359)
Em marccedilo de 2005 o vice-governador em exerciacutecio Eduardo
Pinho Moreira cobrou um posicionamento do diretor geral da FATMA
Janio Wagner Constante
Pela inegaacutevel importacircncia da instalaccedilatildeo da Usina
para o Estado de Santa Catarina e tendo em vista
ter a mesma cumprido com todas as
recomendaccedilotildees ministeriais solicito-lhe urgecircncia
na anaacutelise teacutecnica do projeto pelo que agradeccedilo
antecipadamente (FATMA 2013b fl 352)
Em dezembro de 2005 novamente Alfredo Flaacutevio Gazzolla
enviou carta ao governador do estado Luiz Henrique da Silveira
pedindo a determinaccedilatildeo de um ldquomelhor estudordquo para a emissatildeo da LP
Assim em respeito ao vosso honrado nome e na
defesa do maior empreendimento em estudo no
estado de Santa Catarina solicito seus preacutestimos
no sentido de determinar um melhor estudo
quanto agrave emissatildeo da LAP sem a qual estaremos
impossibilitados de participar do proacuteximo leilatildeo
de energia no semestre vindouro (FATMA
2013c fl 388)
172
Na mesma carta o presidente da USITESC solicitou a licenccedila
preacutevia independente da conclusatildeo do Estudo Suplementar solicitado
pela FATMA
Solicita-se ao Governo do Estado que emita a
Licenccedila Preacutevia para a USITESC
independentemente da conclusatildeo do Estudo
Suplementar solicitado pela FATMA jaacute que nada
impede a FATMA de emitir esta licenccedila uma vez
que o empreendedor cumpriu todas as exigecircncias
legais cabiacuteveis para sua obtenccedilatildeo e que a FATMA
poderaacute nela colocar todos os condicionantes que
considerar pertinentes tendo em vista assegurar a
viabilidade da continuidade do processo de
licenciamento ambiental da USITESC (FATMA
2013c fl 390)
Em resposta Luiz Antocircnio Garcia Correcirca Diretor de controle
ambiental da FATMA em 19 de dezembro de 2005 repreendeu a
USITESC quanto agraves manifestaccedilotildees da miacutedia que relacionavam o natildeo
licenciamento da USITESC e a natildeo participaccedilatildeo no leilatildeo da ANEEL a
uma decisatildeo da FATMA
Temos observado manifestaccedilotildees equivocadas na
miacutedia provenientes de representante do SIECESC
relativa ao processo de licenciamento ambiental
reputado inclusive a FATMA a natildeo participaccedilatildeo
da USITESC no leilatildeo da ANEEL o que natildeo
condiz com a realidade Tais fatos em nada
contribuem ao processo de licenciamento
ambiental (FATMA 2013c fl 641-642)
O conteuacutedo das correspondecircncias demonstra as articulaccedilotildees entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos Depois de 2005 natildeo constam mais
correspondecircncias relacionadas Eacute importante frisar que eacute em 2005 que
surgiu a Frente Parlamentar Mista em defesa do Carvatildeo Mineral e
aumentaram as doaccedilotildees das carboniacuteferas aos poliacuteticos Dessa forma
sugere-se que se ateacute 2005 a pressatildeo sobre o oacutergatildeo ambiental era
173
exercida diretamente apoacutes 2005 com uma maior articulaccedilatildeo a pressatildeo
pode ser exercida de outras formas natildeo passando necessariamente pelo
oacutergatildeo ambiental
624 A posiccedilatildeo dos segmentos sociais
Os segmentos sociais se posicionaram contra a ampliaccedilatildeo da
energia termeleacutetrica ao longo do processo de licenciamento Na ocasiatildeo
da primeira audiecircncia puacuteblica em 19 de fevereiro de 2004 a ONG
Amigos da Terra Brasil enviou a seguinte mensagem
Amigos da Terra se solidariza com as entidades da
regiatildeo sul de Santa Catarina e acredita que as lutas
locais satildeo responsaacuteveis pela resistecircncia agraves
injusticcedilas socioambientais e pela promoccedilatildeo das
mudanccedilas necessaacuterias para um futuro sustentaacutevel
Um futuro onde as energias renovaacuteveis podem
promover descentralizaccedilatildeo universalizaccedilatildeo do
acesso controle social e empregos sem a
contaminaccedilatildeo local e o aquecimento global
decorrentes do uso do carvatildeo mineral (FATMA
2013c Fl 463)
O Grupo de Trabalho Energia do FBOMS tambeacutem enviou uma
mensagem
As organizaccedilotildees do GT Energia do Foacuterum
Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o
Meio Ambiente e o Desenvolvimento expressam
sua solidariedade agraves populaccedilotildees direta ou
indiretamente afetadas pelos impactos da
mineraccedilatildeo e queima do carvatildeo mineral para a
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica na regiatildeo sul de
Santa Catarina () Conhecendo os graves
impactos jaacute causados pelas atividades carboniacuteferas
no Sul de Santa Catarina temos a certeza do
equiacutevoco que representa a instalaccedilatildeo de mais uma
174
usina a carvatildeo na regiatildeo (FATMA 2013c fl
464)
O Movimento pela Vida de Iccedilara tambeacutem registrou sua posiccedilatildeo
ldquoA regiatildeo natildeo suporta mais impactos ambientais eacute preciso mais
seriedade quando se discute qualquer accedilatildeo que interfira na natureza e na
qualidade de vida das crianccedilas dos jovens das mulheres e dos homens
que vivem na regiatildeordquo (FATMA 2013c fl 466)
Na ocasiatildeo da segunda audiecircncia puacuteblica 8 de julho de 2004 natildeo
constaram manifestaccedilotildees escritas Na terceira audiecircncia puacuteblica 16 de
maio de 2006 em carta da ONG Soacutecios da Natureza assinada por Tadeu
Santos agrave Direccedilatildeo da FATMA ficou registrado que havia uma
solicitaccedilatildeo ldquo() agrave FATMA que realizasse a terceira AP em Criciuacutema ou
mesmo em Araranguaacute jaacute que se trata de um empreendimento que
comprovadamente promove impactos ambientais em toda regiatildeordquo E
mais a frente ao falar sobre o processo de licenciamento afirmou que
ldquosomos atores num circo montado para apresentar uma peccedila com o final
desejado pelo empreendedorrdquo (FATMA 2013c fl 538-542)
Na quarta audiecircncia puacuteblica 8 de novembro de 2007 tambeacutem
natildeo constam manifestaccedilotildees escritas Em 19 de maio de 2011 a Diocese
de Criciuacutema enviou um manifesto para o entatildeo presidente da FATMA
Murilo Xavier Flores contra a instalaccedilatildeo da USITESC (FATMA
2013h fl 1601)
A articulaccedilatildeo dos segmentos sociais apresenta estrateacutegias
importantes que convergem com o enfoque da justiccedila ambiental A
difusatildeo espacial do movimento torna-se vital quando aleacutem dos impactos
regionais a populaccedilatildeo diretamente afetada pelo empreendimento tem
uma forte dependecircncia do segmento em questatildeo Conforme jaacute
mencionamos neste capiacutetulo 69 dos empregos com carteira assinada
satildeo oferecidos pelo segmento do carvatildeo mineral e boa parte da
arrecadaccedilatildeo da prefeitura local vem desta atividade Dessa forma natildeo se
verifica uma resistecircncia local ao empreendimento daiacute porque os
segmentos sociais sediados em outros municiacutepios regiotildees estados
brasileiros desempenham um papel fundamental no questionamento do
empreendimento
175
63 Relaccedilotildees de poder e desigualdade nas audiecircncias puacuteblicas os
documentos falados
No estado de Santa Catarina o procedimento adotado durante
uma audiecircncia puacuteblica eacute descrito resumidamente no Quadro 12 A
coordenaccedilatildeo dos trabalhos eacute feita pela FATMA e o tempo de duraccedilatildeo
maacuteximo da audiecircncia puacuteblica eacute de quatro horas Eacute feita uma abertura da
sessatildeo na qual o presidente da mesa esclarece os objetivos e transmite
as regras gerais Na sequecircncia o empreendedor apresenta o projeto e a
consultoria apresenta o EIARIMA Um intervalo de 15 minutos eacute feito
para que os presentes possam se inscrever Os questionamentos satildeo
feitos por ordem de inscriccedilatildeo e podem ser orais ou escritos Os escritos
satildeo lidos pelo coordenador da sessatildeo e os orais devem ser formulados
em trecircs minutos O empreendedor e a consultoria tecircm cinco minutos
para responder e ainda constam dois minutos para reacuteplica e trecircs minutos
para treacuteplica O encerramento eacute feito pelo coordenador da sessatildeo
Quadro 12 - Procedimento para conduccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas
FATMA ETAPAS DA AUDIEcircNCIA TEMPO
Abertura FATMA (10min)
Exposiccedilotildees Proponente do projeto (20min)
Consultoria responsaacutevel pelo
EIARIMA (45min)
Manifestaccedilatildeo da plenaacuteria e debates Intervalo para inscriccedilotildees (15min)
Questionamento (3min)
Resposta (5min)
Reacuteplica (2min)
Treacuteplica (3min)
Encerramento FATMA (sem tempo definido)
Fonte Adaptado de FATMA (2013a fl 101-2)
A elaboraccedilatildeo do projeto da USITESC iniciou em 1999 (Luis
Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007) Em 19 de
fevereiro de 2004 foi realizada a primeira audiecircncia puacuteblica Na
abertura foi lido um ofiacutecio do Ministeacuterio Puacuteblico Federal avisando que
seria requerida uma segunda audiecircncia puacuteblica dado que o EIA
precisava da anaacutelise dos peritos da quarta cacircmara de Brasiacutelia A segunda
audiecircncia puacuteblica foi realizada no dia 8 de julho de 2004 por solicitaccedilatildeo
da FATMA para discutir o projeto da USITESC com o Comitecirc Gestor
176
da Bacia do Rio Araranguaacute porque havia uma preocupaccedilatildeo com o
consumo de aacutegua Motivado pela recomendaccedilatildeo nordm 14 foi contratado
entatildeo um estudo de suplementaccedilatildeo Esse estudo foi apresentado na
terceira audiecircncia puacuteblica em 16 de maio de 2006 tratando dos
empreendimentos acessoacuterios da USITESC (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
As duas audiecircncias puacuteblicas analisadas neste capiacutetulo a terceira e
quarta audiecircncia de 16 de maio de 2006 e 8 de novembro de 2007
respectivamente seguiram o procedimento acima apresentado Em
ambas constatou-se um rigor maior no controle do tempo dos
participantes que apresentaram seus questionamentos que com os
respondentes (empreendedor IPAT Ministeacuterio Puacuteblico Federal e
FATMA) Foram convidados para tomar assento na mesa representantes
da FATMA Ministeacuterio Puacuteblico Federal empreendedor IPAT
prefeitura e SIESESC Diante disso cabe questionar Por que somente
representantes dos segmentos poliacuteticos e econocircmicos tiveram assento na
mesa de trabalho Por que os representantes dos segmentos sociais natildeo
tiveram assento
Na quarta audiecircncia mediada por Adhiles Bortot da FATMA foi
utilizada uma sequecircncia diferente nos questionamentos orais e escritos
natildeo foi respeitada a ordem de chegada Os questionamentos escritos
foram lidos primeiro Em muitos momentos nos questionamentos orais
diante de colocaccedilotildees polecircmicas Adhiles Bortot passava para a pergunta
seguinte como se o questionamento natildeo precisasse ser respondido Por
vaacuterias vezes ele foi interrompido pelo IPAT e Ministeacuterio Puacuteblico
Federal que queriam comentar as intervenccedilotildees do puacuteblico Outro ponto
que merece ser destacado eacute que ele interrompia repetidamente o
questionador pedindo que o tempo fosse respeitado Logo as pessoas
que faziam questionamentos resumiam sua fala sobrando mais tempo
para os respondentes
Nas proacuteximas seccedilotildees desse capiacutetulo a partir da transcriccedilatildeo e
anaacutelise das audiecircncias puacuteblicas encontram-se trechos selecionados de
temas Fragmentos dos discursos dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais foram destacados e comentados a partir dos pontos mais
controvertidos
177
631 A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica
Os discursos das audiecircncias puacuteblicas proacute USITESC tenderam a
minimizar os impactos causados pelo empreendimento ressaltando seus
aspectos positivos Os segmentos econocircmicos representados pelo
empreendedor situaram a USITESC num contexto mundial no qual o
carvatildeo mineral eacute base da matriz energeacutetica O uso de novas tecnologias
e a situaccedilatildeo do Brasil colocaria as emissotildees de gases de efeito estufa
como insignificantes na matriz energeacutetica brasileira
() os estudos energeacuteticos mostram que o carvatildeo
ainda seraacute a base da matriz energeacutetica mundial ateacute
o ano de 2050 no miacutenimo O incremento de
novos projetos a carvatildeo vem paulatinamente
recebendo tratamento tecnoloacutegico para minimizar
a formaccedilatildeo de gases de efeito estufa Isso eacute uma
verdade () a contribuiccedilatildeo do Brasil para o efeito
estufa com novas usinas a carvatildeo eacute insignificante
perante o quadro mundial Soacute para citar um
exemplo esse ano soacute na Alemanha foram
contratados mais de oito mil novos megawatts a
carvatildeo O Brasil todo tem pouco mais de mil
megawatts a carvatildeo instalados A USITESC estaacute
propondo colocar uma potecircncia bruta de 200440
dos quais vai gerar em meacutedia 280 a 300
Alemanha tem 70 mil megawatts de carvatildeo
instalados O nordeste dos Estados Unidos tem
350 mil soacute o nordeste dos Estados Unidos 350
mil megawatts de carvatildeo instalados (Luis Carlos
Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
A ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral eacute
ldquonecessaacuteriardquo para o Brasil e a USITESC eacute um empreendimento
economicamente viaacutevel
() o sistema eleacutetrico brasileiro necessita da
geraccedilatildeo teacutermica e para isso o carvatildeo mineral eacute
sem duacutevida o nosso melhor potencial a USITESC
utilizaraacute um combustiacutevel de baixo custo os niacuteveis
tarifaacuterios sinalizados para o horizonte de
contrataccedilatildeo da energia da Usina indicam boa
rentabilidade para o Projeto adicional pela venda
178
do sulfato de amocircnia 320000 toneladas por ano
(Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Os impactos ambientais e riscos foram minimizados nas
colocaccedilotildees garantindo-se que os investidores internacionais natildeo
participam de empreendimentos que contrariem a legislaccedilatildeo e possuam
risco ambiental A atuaccedilatildeo fiscalizadora do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
tambeacutem foi citada Natildeo foi destacada em nenhum momento a
importacircncia da FATMA
() a USITESC significa um investimento global
da ordem de 750 milhotildees de doacutelares Esse
dinheiro natildeo vai ser buscado em algum fundo de
quintal Esse dinheiro tem investidores
internacionais e ningueacutem arrasta dinheiro
ningueacutem bota dinheiro em empreendimento que
possui risco ambiental A maior garantia que vocecirc
tem que um projeto vai ser implantado com a
qualidade ambiental que estaacute sendo anunciada eacute
que hoje os auditores internacionais natildeo aprovam
os financiamentos se o projeto natildeo estiver de
acordo com aquela disposiccedilatildeo feita no papel
(Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
O que noacutes estamos querendo implantar aqui na
regiatildeo natildeo eacute nada de coisa anormal que vai
prejudicar algueacutem Mesmo porque () o
Ministeacuterio Puacuteblico natildeo vai deixar noacutes cometermos
barbaridade () Eu digo a todos vocecircs o seguinte
como o proacuteprio Banco Mundial me disse laacute em
Washington ldquose vocecircs tiverem algum problema de
poluiccedilatildeo ao implantar o projeto noacutes natildeo daremos
um centavo sequer (Alfredo Flaacutevio Gazzolla
USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
A importacircncia do empreendimento para a regiatildeo e para o municiacutepio tambeacutem foi destacada Ele vai trazer desenvolvimento para
Treviso e regiatildeo com geraccedilatildeo de emprego e renda E quanto agrave
dependecircncia do municiacutepio em relaccedilatildeo ao carvatildeo Luis Carlos Cunha
garantiu que o municiacutepio diversificaraacute sua economia
179
Ora cinquenta anos eacute um prazo bastante grande
pra pra pra um desenvolvimento de outras
atividades no municiacutepio Natildeo vai o municiacutepio natildeo
vai ficar estagnado somente na mina e numa
Usina E a Usina eacute multiplicadora na medida em
que ela vai proporcionar com os seus subprodutos
o sulfato de amocircnia e a proacutepria cinza que eacute uma
mateacuteria prima importante para a construccedilatildeo civil
etc a implantaccedilatildeo de outros empreendimentos na
regiatildeo ou no proacuteprio municiacutepio pra
aproveitamento industrial desses subprodutos e
presumo ao longo de cinquenta anos outras
oportunidades apareceratildeo para o municiacutepio dentro
das suas vocaccedilotildees (Luis Carlos Cunha USITESC
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A usina foi colocada pelo empreendedor como uma forma de
recuperaccedilatildeo ambiental jaacute que vai ser construiacuteda em aacuterea degradada e
utilizar 30 de rejeito como mateacuteria prima para geraccedilatildeo de energia ldquoA
rigor a instalaccedilatildeo da Usina nessa localizaccedilatildeo significa uma accedilatildeo de
recuperaccedilatildeo ambientalrdquo (Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
O maior impacto ambiental segundo o representante do
empreendedor eacute a pressatildeo sobre a infraestrutura urbana de Treviso que
seraacute devidamente minimizada com investimentos nessa aacuterea Como
principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo foi destacada a geraccedilatildeo de emprego e
renda apresentada ao puacuteblico da audiecircncia atraveacutes da Tabela 28
Tabela 28 ndash Principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo com a construccedilatildeo da
USITESC SETOR DA
ECONOMIA
EMPREGOS
DIRETOS
EMPREGOS
INDIRETOS
Mineraccedilatildeo de carvatildeo 400-500
Mineraccedilatildeo de calcaacuterio ~60
Geraccedilatildeo de energia ~150
Amocircnia e sulfato de
amocircnia
~60
Transportes diversos ~140
Restante da economia
associada
4500
Fonte Luis Carlos Cunha USITESC Audiecircncia Puacuteblica (2007)
180
Os segmentos poliacuteticos tambeacutem se posicionaram em relaccedilatildeo agrave
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica O representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal ressaltou a necessidade da ampliaccedilatildeo da oferta de
energia eleacutetrica resguardando seu posicionamento teacutecnico-legal
E aiacute o Brasil estaacute numa encruzilhada no meu
ponto de vista e aqui isso que noacutes estamos
vivendo em Treviso eacute um microcosmo do que taacute
acontecendo no paiacutes Porque o paiacutes estaacute diante de
uma crise energeacutetica noacutes tivemos um apagatildeo
daqui a um tempo vamos ter outro aqui noacutes
estamos discutindo USITESC mas tem problema
de usina hidreleacutetrica em Itaacute em Anita Garibaldi
em Belo Monte laacute na Amazocircnia e natildeo sei mais
aonde e noacutes estamos refeacutem do gasoduto do Evo
Morales Entatildeo Esse eacute um questionamento pra
noacutes brasileiros como um todo Claro que natildeo
somos noacutes aqui que vamos resolver isso mas
temos que ter isso em mente E isso passa pelo
presidente da repuacuteblica pelo Congresso a
sociedade tem que ter uma resposta pra isso
porque noacutes queremos luz eleacutetrica queremos o
desenvolvimento econocircmico Entatildeo daonde vai
sair a energia Algum impacto ambiental em
algum lugar vai ter que ter Eacute claro que noacutes
queremos o mais longe possiacutevel do nosso quintal
E o papel do Ministeacuterio Puacuteblico nesse processo eacute
um oacutergatildeo independente que fiscaliza E noacutes
estamos fiscalizando esse processo da USITESC
com base olhando duas coisas o cumprimento da
legislaccedilatildeo e os aspectos teacutecnicos Vocecircs viram
aqui que tem uma equipe teacutecnica trabalhando
temos outros profissionais que estatildeo trabalhando
nisso () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico
Federal AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A prefeita Lucia Simolin enfatizou a situaccedilatildeo de dependecircncia do municiacutepio em relaccedilatildeo agrave atividade carboniacutefera
Eacute verdade tambeacutem que Treviso hoje tem a
seguinte realidade incontestaacutevel feliz ou
infelizmente 80 da nossa economia faltando
alguns poucos deacutecimos praticamente
181
arredondando para 80 depende da economia da
extraccedilatildeo do carvatildeo mineral nos seus diversos tipos
de exploraccedilatildeo e usos Em torno de 20 gira em
torno da produccedilatildeo agropecuaacuteria embora a gente
tenha 168km2 de aacuterea Entatildeo senhores a
exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral para Treviso ela eacute
equivalente agrave monocultura do arroz para Turvo e
Meleiro Essa eacute uma realidade teacutecnica e
administrativa que natildeo eacute do dia pra noite que a
gente pode alterar (Lucia Simolin prefeita
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
() noacutes temos a consciecircncia dos problemas que
podem advir uns mais visiacuteveis e comprovados
outros que o tempo vai nos dizer e a natureza de
que um empreendimento desse porte ele vai nos
afetar Mas vejamos bem como vamos
sobreviver a uma condiccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos
municipais se praticamente a receita do
municiacutepio hoje estaacute diretamente vinculada a
extraccedilatildeo de um foacutessil (Lucia Simolin prefeita
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Apesar de demonstrar uma certa inseguranccedila em relaccedilatildeo aos
impactos o empreendimento natildeo foi questionado A prefeita inclusive
enfatizou a ldquocultura do carvatildeordquo e a ideia da construccedilatildeo do museu do
carvatildeo como algo positivo para a cidade
noacutes temos a nossa cultura eacute o carvatildeo Aiacute a natildeo
exploraacute-lo ou a transformaacute-lo em energia eacute uma
discussatildeo que noacutes estamos presentes e portanto
natildeo fugindo () A gente tem que ver a melhor
saiacuteda pra todas as situaccedilotildees E noacutes do poder
puacuteblico estamos aqui pra isso Estamos aqui para
contribuir Entatildeo esse eacute o meu depoimento a
respeito do empreendimento essa eacute a realidade do
municiacutepio e que natildeo pode ser negada Eacute a nossa
realidade Eacute a nossa verdade A verdade que eacute
uma verdade econocircmico-financeira mas eacute a nossa
verdade (Lucia Simolin AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
182
O crescimento econocircmico do municiacutepio e regiatildeo foi um
argumento forte de convencimento
Noacutes temos que ter consciecircncia de que o projeto
USITESC quando implantado ele seraacute a mola
propulsora de uma nova fase de desenvolvimento
para toda a regiatildeo carboniacutefera Natildeo eacute soacute mineiro
que quer emprego Toda a populaccedilatildeo quer
emprego Quer investimento em sauacutede educaccedilatildeo
e a USITESC eacute investimento eacute sinal de
investimento () Eu acho que a regiatildeo toda tem
muito a ganhar com esse grande projeto que vai
alavancar o progresso e o desenvolvimento de
uma nova fase () (Marcos Antocircnio Cesconetto
Vereador AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
O que fica expliacutecito nos discursos de alguns poliacuteticos locais eacute
uma confianccedila no processo de licenciamento e nas empresas
carboniacuteferas
Noacutes temos que discutir aqui assuntos pertinentes
agrave populaccedilatildeo ou seja a instalaccedilatildeo da Usina E
dizer Dr Darlan que noacutes confiamos na atuaccedilatildeo do
Ministeacuterio Puacuteblico Federal confiamos na atuaccedilatildeo
do Ministeacuterio Puacuteblico Estadual na atuaccedilatildeo da
Fatma e de tantos oacutergatildeos como o Ibama que satildeo
realmente quem tem condiccedilotildees de fiscalizar aquilo
que vai acontecer no empreendimento Natildeo satildeo
afirmaccedilotildees infundadas que foram levantadas aqui
e que muitas delas natildeo tem a ver com o
empreendimento Noacutes queremos dizer que noacutes
confiamos na Carboniacutefera Metropolitana e na
Carboniacutefera Criciuacutema uma delas aqui a mais de
vinte anos outra jaacute explorou carvatildeo aqui na volta
redonda e nas reservas que eles tecircm aqui E noacutes
temos consciecircncia de que o empreendimento eacute
viaacutevel e eacute viaacutevel porque ele pode viabilizar a
exploraccedilatildeo de carvatildeo e a grande maioria das
pessoas eu posso dizer que quase a totalidade das
pessoas que estatildeo aqui ou satildeo mineiros ou algueacutem
da famiacutelia vive do carvatildeo nos mais diversos
municiacutepios (Marcos Antocircnio Cesconetto
Vereador AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
183
A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica fica evidente
nos discursos aqui apresentados O empreendimento se justifica na
medida em que paiacuteses ldquodesenvolvidosrdquo utilizam o carvatildeo para geraccedilatildeo
de energia e o Brasil por ter uma matriz energeacutetica considerada
ldquolimpardquo pode usaacute-lo sem maiores problemas Os impactos ambientais
do empreendimento seratildeo miacutenimos jaacute que os investidores internacionais
assim o exigem e o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute fiscalizando Afinal a
concessatildeo do licenciamento estaacute condicionada ao respeito agraves leis e a
criteacuterios teacutecnicos
Os poliacuteticos municipais dada a dependecircncia econocircmica da
atividade carboniacutefera veem o empreendimento com ldquobons olhosrdquo pois
apesar dos impactos negativos ele traraacute tambeacutem o crescimento ao
municiacutepio e agrave regiatildeo Segundo eles a cultura do carvatildeo precisa ser
mantida
632 As mudanccedilas climaacuteticas natildeo vecircm ao caso
Os segmentos sociais presentes nas audiecircncia puacuteblicas (Amigos
da Terra Movimento Iccedilara pela Vida Soacutecios da Natureza UNESC
dentre outros) demonstraram preocupaccedilatildeo com as mudanccedilas climaacuteticas
com o aquecimento global com o impacto regional do empreendimento
e a continuidade da atividade carboniacutefera que jaacute causou muitos impactos
na regiatildeo
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionou a
continuidade de uma atividade que se mostrou e se mostra inviaacutevel do
ponto de vista socioambiental
Porque a nossa preocupaccedilatildeo do Movimento pela
Vida aleacutem de todo o efeito estufa aleacutem de toda a
poluiccedilatildeo que vai gerar aqui na regiatildeo que natildeo eacute
soacute o CO2 que vai largar O gaacutes que vai ser largado
aqui mas toda uma poluiccedilatildeo que vai ser gerada
aqui proacuteximo do Aquiacutefero Guarani da Serra todo
esse ecossistema que existe que essa usina estaacute
colocando em perigo E tambeacutem vai a meacutedio e
longo prazo trazer problemas para as famiacutelias da
regiatildeo onde existe carvatildeo no subsolo porque
assim como laacute na Iccedilara eles tatildeo tentando tirar
carvatildeo eles vatildeo tentar continuar tirando de outros
184
lugares (Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela
Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Carlyle professor da UNESC fez a seguinte pergunta
ldquoConsiderando as implicaccedilotildees das emissotildees de CO2 Dioacutexido de Carbono
para o aquecimento global quais as razotildees pelas quais esse poluente natildeo
foi analisado17
tendo em vista os recentes relatoacuterios do Painel sobre
Mudanccedilas Climaacuteticasrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Em resposta Luiz Nogueira Palma deixou claro que a questatildeo
das mudanccedilas climaacuteticas natildeo dizia respeito ao conteuacutedo da audiecircncia
puacuteblica
Eu vou responder isso aiacute eu acho que o Carlyle
estaacute colocando uma pergunta muito interessante
mas que no meu entendimento ela foge
totalmente ao objeto dessa audiecircncia Eacute todo
mundo sabe que uma usina termeleacutetrica que
queima carvatildeo ou qualquer outro combustiacutevel
emite CO2 Existem necessidades de gerar energia
e o que estaacute se discutindo aqui eacute a necessidade de
um empreendimento que foi colocado junto ao
cenaacuterio nacional Eacute eu natildeo vou mentir para vocecircs
essa usina emite CO2 como o carro de cada um de
noacutes emite CO2 e o que o que o Carlyle taacute
colocando eacute uma preocupaccedilatildeo mundial de emissatildeo
de CO2 Mas nem por isso nenhum paiacutes estaacute
deixando de implantar usina as necessaacuterias como
todos os controles necessaacuterios [ele interrompe
momentaneamente a fala por conta do burburinho]
Entatildeo eu acho que essa pergunta que trata de uma
mateacuteria global A usina trata os poluentes
atmosfeacutericos de forma exemplar com elementos
de controle extremamente sofisticados
encarecendo o preccedilo da energia gerada e por isso
estaacute se chamando usina da energia verde neacute
Porque a teacutermica que usa um combustiacutevel natildeo tatildeo
nobre como o gaacutes que eacute o carvatildeo nacional ela taiacute
para produzir mostrando que as emissotildees tatildeo
muito abaixo dos padrotildees nacionais Natildeo existe
um padratildeo nacional para CO2 em lugar nenhum
17
Nos estudos complementares que haviam sido apresentados na audiecircncia
puacuteblica
185
do mundo Entatildeo essa eacute outra questatildeo () O
contraponto dessa pergunta e de que se noacutes
estamos ou natildeo colaborando com o Protocolo de
Quioto O Brasil colabora porque a nossa matriz
energeacutetica mais de 90 da energia gerada no paiacutes
eacute hidraacuteulica (Luiz Nogueira Palma IPAT
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida fez a leitura de
uma moccedilatildeo que foi aprovada na etapa regional da Conferecircncia do Meio
Ambiente A Conferecircncia aconteceu na UNESC e foi promovida pela
Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econocircmico Sustentaacutevel pelo
IBAMA Secretaria de Estado da Educaccedilatildeo EPAGRI CIRAM
FECAM ANAMA FLORAM FEEC FIESC ALESC FETAESC
Poliacutecia Militar Ambiental e ACAFE Aconteceram sete delas em Santa
Catarina O objetivo das Conferecircncias foi traccedilar poliacuteticas puacuteblicas sobre
meio ambiente no paiacutes em relaccedilatildeo ao aquecimento global ldquoE qual foi a
decisatildeo que a Conferecircncia Regional aqui tomou em relaccedilatildeo ao carvatildeo
Em resumo ldquoa substituiccedilatildeo da matriz energeacutetica baseada no carvatildeo para
outras alternativas de modo gradativordquo Moccedilatildeo que foi aprovada por
unanimidade Ele aproveitou para ler um trecho da moccedilatildeo
() em face da comprovada participaccedilatildeo da
queima de carvatildeo mineral no aumento do
aquecimento global e na intensa degradaccedilatildeo do
solo e aacuteguas provocadas pela sua extraccedilatildeo a
Conferecircncia Regional do Meio Ambiente de
Criciuacutema solicita o cancelamento de todo o
processo de licenciamento da Termeleacutetrica
USITESC em Santa Catarina bem como outras da
regiatildeo sul do Estado dado o elevado passivo
ambiental associado aos empreendimentos
especialmente em termos de degradaccedilatildeo dos
ecossistemas costeiros e da perda da qualidade de
vida das populaccedilotildees que ocupam o sul do estadordquo
Ele completou sua intervenccedilatildeo fazendo o seguinte comentaacuterio
Algueacutem estaacute indo na contramatildeo da histoacuteria ()
Ou noacutes nos damos conta que esse
empreendimento vai contra taacute indo contra tudo o
que estaacute se vendo nesse paiacutes nesse planeta ou
entatildeo a gente estaacute assinando nossa sentenccedila de
morte Chegamos ao absurdo de escutar dos
186
teacutecnicos do IPAT que essa questatildeo do CO2 eacute uma
questatildeo irrelevante natildeo vem ao caso Gente essa
eacute a maior questatildeo E que foi deixada de lado E o
IPAT estaacute indo contra a missatildeo da UNESC
(Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Diante do comentaacuterio o representante do IPAT Marcos Back
fez as seguintes consideraccedilotildees
Em primeiro lugar eu gostaria de esclarecer
algumas questotildees por aqui que natildeo estatildeo muito
claras Primeiro existe um posicionamento
equivocado aqui Noacutes temos que entender
exatamente o que noacutes estamos colocando
Primeiro noacutes estamos discutindo o EIARIMA
que se refere a uma usina termeleacutetrica que queima
carvatildeo e que emite CO2 Quando o Engenheiro
Palma coloca que a questatildeo do CO2 natildeo deve ser
discutida aqui natildeo eacute que ele estaacute querendo dizer
que a questatildeo do CO2 eacute irrelevante Natildeo eacute que ele
quer dizer que o problema do CO2 do
aquecimento global natildeo sejam questotildees
importantes a serem discutidas Pelo contraacuterio a
questatildeo do aquecimento global e da emissatildeo de
CO2 eacute uma questatildeo muito importante a ser
discutida Que a sociedade tem que pensar
seriamente nas consequecircncias da emissatildeo de CO2
que natildeo vem soacute do carvatildeo taacute Entatildeo noacutes temos
que pensar nisso que o aquecimento global estaacute
mostrando seus efeitos e jaacute vaacuterios cientistas
demonstraram mostraram esses efeitos Entatildeo noacutes
temos que pensar nisso sim Quando o IPAT taacute
colocando aqui que noacutes estamos discutindo o
EIARIMA da USITESC noacutes estamos colocando
que discutir licenciamento ambiental eacute um
procedimento legal vocecirc segue o tracircmite as
normas de um procedimento legal () Natildeo eacute da
competecircncia do IPAT julgar a matriz energeacutetica
brasileira Quem estabeleceu isso foram as leis
federais o Congresso Nacional e o Presidente
Lula Satildeo eles que estabelecem se pode ou natildeo
pode produzir carvatildeo se pode ou natildeo pode ter
187
energia movida a carvatildeo Entatildeo natildeo compete ao
IPAT nesse estudo NESSE ESTUDO de usina
termeleacutetrica conduzir uma discussatildeo sobre
aquecimento global porque natildeo eacute isso que estaacute
em discussatildeo aqui O que taacute em discussatildeo aqui eacute
se pode ou natildeo implantar a usina termeleacutetrica
dentro dos tracircmites da lei atual (Marcos Back
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Um representante dos segmentos poliacuteticos Joatildeo Luiacutes presidente
da Cacircmara de Vereadores de Trevisto tambeacutem fez um questionamento
sobre o assunto
Eu gostaria de fazer uma pergunta aos oacutergatildeos
ambientais Noacutes vimos na televisatildeo todos os dias
que os Estados Unidos eacute o maior produtor desse
planeta e foi superado pela China Exatamente nas
suas termeleacutetricas que queimam carvatildeo mineral
87 da energia produzida pela China eacute da queima
do carvatildeo mineral Entatildeo noacutes vemos aiacute o mundo
todo criticando brigando contra isso agora eu
gostaria que vocecircs respondessem a todos noacutes que
satildeo pessoas entendidas Noacutes podemos implantar
um projeto como esse em Treviso Ele eacute viaacutevel
Noacutes podemos pagar esse preccedilo E por que (Joatildeo
Luis Presidente da Cacircmara de Vereadores de
Treviso AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
A resposta do representante da FATMA tambeacutem natildeo contemplou
a preocupaccedilatildeo com questotildees mais amplas
Algumas questotildees que jaacute foram hoje objeto de
abordagem aqui ele foge do escopo do processo
de licenciamento Noacutes tratarmos de mudanccedilas
climaacuteticas natildeo eacute uma questatildeo que estaacute inserida no
projeto que hoje estaacute sendo objeto dessa audiecircncia
puacuteblica A garantia que eu posso dar aos senhores
em relaccedilatildeo ao projeto que estaacute sendo avaliado pela
FATMA e logicamente que noacutes temos natildeo eacute uma
parceria mas um papel fiscalizador do Ministeacuterio
Puacuteblico que tem auxiliado e tem contribuiacutedo de
uma maneira positiva pra que noacutes ao longo desses
dois trecircs anos desse processo de licenciamento
noacutes tenhamos tido avanccedilos significativos em
188
termos de ganhos ambientais () (Luis Antocircnio
Garcia FATMA AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Jaacute o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal Darlan Aiacutelton
Dias contemplou a preocupaccedilatildeo dos presentes afirmando que ldquoeu acho
sim que o aquecimento global faz parte da discussatildeo da USITESC Deve
ser discutida mas a decisatildeo do licenciamento eacute verificar a adequaccedilatildeo
teacutecnica e o atendimento agrave legislaccedilatildeordquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Apesar do parecer favoraacutevel do representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal fica claro que para os que compotildeem a mesa de
trabalho na audiecircncia puacuteblica o tema natildeo tem relaccedilatildeo com o
licenciamento Aos representantes dos segmentos sociais e poliacuteticos aqui
citados foi permitida a manifestaccedilatildeo quanto ao tema mas ela natildeo
encontrou eco Isso aconteceu tambeacutem para a tentativa de discutir o
empreendimento regionalmente
633 Quem defende quem E quem defende os
afetadosatingidosameaccedilados
Nas audiecircncias puacuteblicas foram colocadas duacutevidas em relaccedilatildeo agrave
participaccedilatildeo da populaccedilatildeo de Treviso O vereador Joatildeo Luis Brunel fez a
seguinte colocaccedilatildeo seguida de uma pergunta
() Eu quero dizer que sou a favor do progresso e
quero que a nossa gente tenha emprego mas que
noacutes temos que pagar um preccedilo justo Eu gostaria
de fazer uma pergunta aqui Falou-se sobre muita
coisa mas eu gostaria de saber sobre todas essas
famiacutelias que seratildeo desapropriadas Eu cito aqui a
comunidade da Brasiacutelia Eu vejo aqui a
comunidade satildeo famiacutelias centenaacuterias de gente que
desbravaram essa terra que ajudaram a construir
esse municiacutepio Entatildeo eu faccedilo a seguinte pergunta
como que eles tem o direito de se defender Eles
simplesmente vatildeo ser notificados vatildeo ser
desapropriados Satildeo pessoas que estatildeo aiacute haacute mais
de um seacuteculo Eu gostaria de saber onde estatildeo os
direitos humanos Quais satildeo os direitos que eles
189
tecircm (Joatildeo Luis Brunel AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
Joaquim Teixeira Neto estudante da UNESC fez seu comentaacuterio
sobre a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo na audiecircncia puacuteblica
Entatildeo o seguinte eu gostaria que a populaccedilatildeo de
Treviso que natildeo estaacute aqui presente por motivos
que a gente desconhece precisa A populaccedilatildeo de
Treviso precisa se manifestar em audiecircncia
exclusiva Porque esse empreendimento apesar de
ser regional vai atingir primeiramente essa
comunidade e eles natildeo estatildeo sendo ouvidos Eles
estatildeo sendo calados e todos sabemos (Joaquim
Teixeira Neto AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Lucia Ortiz da Amigos da Terra fez um relato de um processo
de licenciamento que aconteceu no Rio Grande do Sul no qual mesmo
depois de emitida a licenccedila foi feito um plebiscito na regiatildeo
() mesmo depois que a Fepam liberou a licenccedila
preacutevia pra instalaccedilatildeo dessa usina o pessoal
conseguiu realizar a realizaccedilatildeo de um plebiscito
na regiatildeo que vai ser agora esse saacutebado pra que a
populaccedilatildeo de fato possa decidir se quer ou natildeo
esse empreendimento A minha pergunta eu tenho
duas perguntas uma eu acho que seria saber se
tem resposta pra populaccedilatildeo dos municiacutepios aqui
da regiatildeo que eacute se as pessoas aqui estatildeo mesmo
dispostas a abrirem matildeo das suas reservas de
aacutegua pro seu abastecimento proacuteprio ou dos seus
filhos ou dos seus netos tendo em vista que essa
usina vai consumir muito mais que a populaccedilatildeo da
regiatildeo de aacutegua a aacutegua do Rio Matildee Luzia aquilo
que ainda resta de aacutegua natildeo contaminada nessa
bacia (Lucia Ortiz Amigos da Terra
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A prefeita de Treviso Lucia Simolin na quarta Audiecircncia
Puacuteblica comentou que foi realizada uma pesquisa e que 70 da
populaccedilatildeo de Treviso concorda com o empreendimento Duas criacuteticas
feitas merecem destaque
190
A primeira feita pelo estudante da UNESC Joaquim Teixeira
chamou a atenccedilatildeo para o fato de que a USITESC eacute um empreendimento
que afetaraacute a regiatildeo e ouvir apenas a populaccedilatildeo de Treviso natildeo seria
uma medida adequada Segundo ele ldquoa termeleacutetrica natildeo eacute soacute um
problema de Treviso Fazer pesquisa de opiniatildeo soacute em Treviso eacute
desprezar uma questatildeo que eacute regionalrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
A segunda criacutetica questionou a pesquisa citada pela prefeita com
base em uma pesquisa feita no municiacutepio de Iccedilara
O IPAT quando fala que eacute imparcial ele estaacute
numa situaccedilatildeo que eu passei pelo conjunto do
Movimento pela Vida em Iccedilara Foi feita uma
pesquisa na Iccedilara pelo IPAT perguntando o
seguinte se a mina natildeo degradar natildeo poluir natildeo
fazer isso natildeo fazer aquilo nanana nananan vocecirc
vai ser a favor da mina Ai o pessoal ateacute eu
responderia que sim Aiacute fizeram uma publicaccedilatildeo
ldquoO IPAT confirma que 80 da populaccedilatildeo de Iccedilara
eacute a favor da mina Fomos laacute saber qual era a
pergunta que foi feita era desse jeito Noacutes
queremos contratar o IPAT para fazer a seguinte
pesquisa se levar em conta toda a degradaccedilatildeo que
a mina provoca os caimentos as casas rachadas a
aacutegua poluiacuteda o aquecimento global papapaacute vocecircs
seriam a favor da mina ou natildeo Ah isso noacutes natildeo
podemos fazer Pra noacutes podiam fazer uma
pesquisa desde fugiu a palavra aqui () mas pra
eles sim Eu questiono sim o IPAT mas
parabenizo grande parte da UNESC professores e
alunos que estatildeo buscando realmente uma defesa
do meio ambiente (Gilmar Bonifaacutecio Movimento
Iccedilara pela Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Nos discursos das duas audiecircncias puacuteblicas constatou-se que
apenas uma pessoa se colocou como representante de uma comunidade
de Treviso Gerson Hanne A intervenccedilatildeo seguinte de Sivio Saad
sintetiza a preocupaccedilatildeo de quem assistiu as duas audiecircncias puacuteblicas
Noacutes temos uma cidade pacata com 3500
habitantes e algueacutem resolve colocar um
empreendimento dentro dessa cidade Os
moradores claro devem saber o que estaacute
191
acontecendo Vimos a exposiccedilatildeo do
empreendedor vimos a exposiccedilatildeo da universidade
e o poder de julgar de saber se aceitam ou natildeo o
empreendimento agrave medida que eles foram
convincentes neacute os empreendedores satildeo
convincentes tatildeo preparados tem audiovisual satildeo
convincentes Mas eu gostaria de saber se a
populaccedilatildeo decide que natildeo quer quem defende os
interesses da populaccedilatildeo Quem eacute que taacute aqui
sentado (ele mostra os integrantes da mesa) que
representa os interesses dessa populaccedilatildeo Que
possa pelo menos equilibrar esse jogo Seria o
empreendedor Claro que natildeo Ele taacute defendendo
os seus interesses Ele eacute capaz de dizer aqui que
os oacutergatildeos internacionais soacute aprovam o dinheiro se
tiver cuidado com o meio ambiente Acredite se
quiser Temos aqui o pessoal da FATMA Eu jaacute vi
a FATMA aprovar coisas absurdas () Agora
depois que ela aprovou ela fiscaliza () Aiacute eles
respondem ldquonatildeo temos quem fiscalizerdquo Quem
seria a Universidade A UNESC () A prefeita
() eu ouvi uma entrevista dela hoje cedo dizendo
que se der dinheiro para a cidade ela aprova
Quem mais O governador que vem aqui diz que
vai dar emprego Vocecircs querem emprego Vocecircs
querem colocar mais duas mil pessoas aqui
dentro () Se a populaccedilatildeo quer oacutetimo Se a
populaccedilatildeo natildeo quer precisa ter algueacutem aqui que
defende () Soacute tem uma pessoa que defende os
interesses da populaccedilatildeo o Dr Darlan Esse
defende Dentro da lei esse defende Agora
precisava mais algueacutem () Se for confiar em
quem taacute aqui na mesa vocecircs tatildeo perdidos Se a
populaccedilatildeo chega agrave conclusatildeo que natildeo quer e
confia nesses que tatildeo aqui vocecircs estatildeo perdidos
A minha pergunta eacute quem defende os interesses
da populaccedilatildeo (Silvio Saad AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Diante dessa fala o apresentador Adhiles Bortot da FATMA
passou para a proacutexima pergunta sem que ningueacutem da mesa se
pronunciasse Essa atitude refletiu o clima das duas audiecircncias
analisadas Quando o assunto se referia aos
192
atingidosafetadosameaccedilados muitas respostas evasivas eram dadas
ressaltando sempre o respeito pelas leis e pelos criteacuterios teacutecnicos
As interveccedilotildees apresentadas demonstram a injusticcedila poliacutetica Se a
mineraccedilatildeo respeita as leis e os criteacuterios teacutecnicos ela eacute liacutecita O que passa
ao largo eacute uma discussatildeo mais ampla sobre gestatildeo de recursos comuns
opccedilotildees de desenvolvimento direitos humanos e justiccedila ecoloacutegica
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida falou da importacircncia
de uma discussatildeo sobre os direitos do cidadatildeo ldquo() concordamos
tambeacutem com o direito constitucional que todo cidadatildeo tem o direito a
um ambiente saudaacutevel () Essa tambeacutem eacute uma questatildeo legal Entatildeo noacutes
devemos comeccedilar a discutir questotildees legaisrdquo (Gilmar Bonifaacutecio
Movimento Iccedilara pela Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007) Mas as
evidecircncias demonstram que as audiecircncias se propunham a ser espaccedilo de
discussatildeo apenas de assuntos referentes ao licenciamento Todas as
discussotildees mais amplas foram desconsideradas
634 O papel da FATMA em questatildeo
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionou o
Ministeacuterio Puacuteblico e a FATMA que na segunda audiecircncia afirmaram
que a licenccedila natildeo seria emitida sem estudos conclusivos Ele citou o
exemplo de Iccedilara que haacute trecircs anos vinha se mobilizando para a natildeo
instalaccedilatildeo de uma mina de carvatildeo Ele destacou o papel do Ministeacuterio
Puacuteblico e questionou o papel da FATMA No caso da USITESC a
preocupaccedilatildeo dele foi que se a LP fosse dada e os empreendedores
participassem do leilatildeo haveria uma pressatildeo para a aprovaccedilatildeo dos
processos de licenciamento dos empreendimentos acessoacuterios
(AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Joatildeo Luis Brunel tambeacutem questionou os criteacuterios da FATMA na
concessatildeo da licenccedila
() noacutes vemos aiacute todos os dias uma campanha
mundial de preservaccedilatildeo da natureza
principalmente das aacuteguas aacuteguas do nosso planeta
que estatildeo quase que totalmente poluiacutedas entatildeo eu
faccedilo a pergunta noacutes vamos construir essa usina ao
lado de uma reserva ambiental e vamos captar a
maior fonte de aacutegua potaacutevel do nosso municiacutepio
193
uma aacutegua que jaacute estaacute mapeada pela Casan pra
abastecimento futuro em cidades vizinhas E onde
vatildeo passar a linha do trem e a linha de transmissatildeo
vatildeo atingir terrenos cobertos por floresta nativa
Entatildeo eu gostaria de saber quais satildeo os criteacuterios
que a Fatma os oacutergatildeos ambientais adotam pra dar
a licenccedila ou natildeo para a construccedilatildeo de um projeto
como esse (Joatildeo Luis Brunel AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Luis Antocircnio Garcia da FATMA respondeu ldquoA Fatma atraveacutes
de seu corpo teacutecnico e seus consultores vai avaliar os estudos como os
demais e leva em consideraccedilatildeo criteacuterios teacutecnicos e aspectos legais Se
houver viabilidade pelo licenciamento assim seraacute feito Se natildeo houver
viabilidade a licenccedila natildeo seraacute concedidardquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
O representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal na defesa da
FATMA fez as seguintes consideraccedilotildees
Mas posso dizer que na maioria dos casos
inclusive envolvendo o carvatildeo a Fatma tem
atuado em bastante sintonia com o Ministeacuterio
Puacuteblico Eacute claro que a Fatma eacute um oacutergatildeo do poder
executivo e noacutes conhecemos a tradiccedilatildeo do nosso
estado poliacutetica inclusive tudo eacute muito politizado
noacutes sabemos que a Fatma sofre pressotildees poliacuteticas
de toda ordem Mas eu sou testemunha pelo que
vivo aqui em Criciuacutema que os teacutecnicos tem se
esforccedilado e a direccedilatildeo tambeacutem pra resistir agraves
pressotildees e fazer um trabalho teacutecnico (Darlan
Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Na quarta audiecircncia puacuteblica a legitimidade da FATMA nos
processos de licenciamento tambeacutem foi colocada vaacuterias vezes em
duacutevida A jornalista Ana Echevenguaacute de Florianoacutepolis fez o seguinte
questionamento
() eu gostaria de perguntar para o Dr Darlan de
acordo com aquela decisatildeo liminar proferida pelo
Dr Germano juiz federal onde ele dizia que
enquanto a FATMA natildeo tiver o corpo teacutecnico
194
capaz de apreciar EIARIMA ela estaacute proibida e o
IBAMA assumiria essa responsabilidade eu
entendo que nem essa audiecircncia deveria estar
acontecendo (Ana Echevenguaacute AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Em resposta o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
enfatizou o caraacuteter fiscalizador do Ministeacuterio Puacuteblico e que o IBAMA
natildeo seria a soluccedilatildeo para os problemas de licenciamento em Santa
Catarina
Aquela decisatildeo do juiz que disse que o
licenciamento das minas e dos PRADES de
recuperaccedilatildeo de aacutereas degradadas natildeo poderia ser
feito pela FATMA se natildeo fosse embasada em
pareceres teacutecnicos aiacute o juiz lista uma seacuterie de
empreendedores perdatildeo de profissionais
geoacutelogos engenheiro de minas bioacutelogo
agrocircnomo e tal tal tal natildeo me lembro de cabeccedila
mas se a FATMA tiver um parecer teacutecnico
embasado por esses profissionais ela pode emitir a
licenccedila Quando o juiz disse que o licenciamento
tem que ser passado para o IBAMA o Ministeacuterio
Puacuteblico entende que isso eacute um equiacutevoco do juiz e
noacutes recorremos contra essa parte da decisatildeo Por
que Primeiro que isso natildeo foi pedido entatildeo o
juiz natildeo pode julgar extra petita18
e ele fez isso
nesse caso Segundo o IBAMA natildeo eacute a soluccedilatildeo
A FATMA tem problemas Tem seacuterios e vaacuterios
problemas Noacutes estamos fiscalizando e atuando
para que isso se altere Mas o IBAMA natildeo eacute a
soluccedilatildeo Porque o IBAMA eacute totalmente ausente
da regiatildeo Sul de Santa Catarina O estado de Santa
Catarina inteiro a equipe do IBAMA eacute
precariacutessima Entatildeo com respeito ao Leonir aqui
que taacute por aiacute que agora eacute do Chico Mendes O
IBAMA aqui na regiatildeo sul natildeo existe Entatildeo
passar o licenciamento de qualquer coisa pro
IBAMA aqui na regiatildeo eacute um equiacutevoco (Darlan
Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico Federal
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
18
Decisotildees extra petita satildeo aquelas que o juiz toma concedendo ao
autor coisa diversa da que foi requerida em sua peticcedilatildeo inicial
195
O representante da FATMA Luis Antocircnio Garcia por sua vez
insistiu que a FATMA tem melhorado seu quadro teacutecnico e conta com
consultores externos Ele ressaltou tambeacutem que a decisatildeo do
licenciamento eacute baseada nos criteacuterios legais e teacutecnicos
Dos segmentos sociais que participaram das audiecircncias
percebeu-se uma desconfianccedila em relaccedilatildeo agrave conduta da FATMA nos
processos de licenciamento A FATMA por sua vez reconhece as
dificuldades existentes e faz uma aposta na atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico Segundo o representante da FATMA ldquoo licenciamento com
todas as dificuldades que temos mas noacutes temos hoje uma cooperaccedilatildeo
uma parceria extremamente sadia e participativa e com resultados
extremamente beneacuteficos a sociedade que eacute junto com o Ministeacuterio
Puacuteblico ()rdquo (Luis Antocircnio Garcia FATMA AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Nos discursos dos segmentos sociais e poliacuteticos transparece a
fragilidade do oacutergatildeo ambiental E aiacute a responsabilidade que seria do
oacutergatildeo ambiental eacute passada para o Ministeacuterio Puacuteblico Isso pode ser bom
por um lado uma vez que existe fiscalizaccedilatildeo do oacutergatildeo ambiental mas
por outro lado pode fazer com que as fragilidades do oacutergatildeo ambiental se
perpetuem
635 O IPAT e a neutralidade da ciecircncia
A linguagem teacutecnica do IPAT foi questionada na terceira
audiecircncia puacuteblica ldquo() a maioria de noacutes cidadatildeos mortais e comuns
natildeo temos conhecimento suficiente para traduzir as informaccedilotildees que
foram passadasrdquo (Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida
AUDIEcircNCIA 2006) Mauricio Luis Camara questionou sobre a
apresentaccedilatildeo do IPAT para que fizessem um resumo de forma que
todos entendessem (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Outro ponto que merece destaque eacute o fato de o IPAT natildeo ter
deixado clara a viabilidade do empreendimento Abaixo a intervenccedilatildeo
de Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionando esse
ponto
196
[] eacute nesse sentido que eu gostaria de saber []
quais satildeo os pontos positivos e quais satildeo os
pontos negativos para que a populaccedilatildeo tambeacutem
tenha condiccedilatildeo de por si soacute analisar e tomar uma
posiccedilatildeo e natildeo simplesmente tomar uma posiccedilatildeo
porque algueacutem ou um chefe poliacutetico tipo um
empreendedor taacute dizendo que eacute assim [] na
minha opiniatildeo ficou faltando isso do IPAT uma
posiccedilatildeo clara de quais satildeo os pontos positivos e
negativos porque aiacute se coloca na balanccedila Porque
eacute isso que a gente tem que ver [] (AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Em resposta Fabiano Luzi Neris representante do IPAT
afirmou que ldquoo IPAT natildeo tem posicionamento se a Usina eacute viaacutevel ou
natildeo eacute viaacutevel se ele eacute a favor ou contra a Usina () Soacute o oacutergatildeo
ambiental tem competecircncia para viabilizar ou natildeo a Usinardquo (Fabiano
Luiz Neris IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A Universidade apresentou os resultados teacutecnicos
que estatildeo aqui e foram apresentados e estatildeo nos
documentos entregues ao empreendedor e ao
oacutergatildeo ambiental A Universidade natildeo tem o papel
de emitir o parecer favoraacutevel ou contraacuterio agrave
liberaccedilatildeo da licenccedila da Usina A Universidade tem
o papel de apresentar os estudos realizados Se
tiver algum conflito em relaccedilatildeo aos estudos a
gente estaacute a disposiccedilatildeo para discutir tecnicamente
(Fabiano Luiz Neris IPAT AUDIEcircNCIA 2006)
A representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal questionou a
resposta dada pelo IPAT ldquose o EIA natildeo vai dizer se eacute viaacutevel ou natildeo
quem de noacutes diraacute issordquo (Denise Cristina de Resende Nicolaitz
Ministeacuterio Puacuteblico Federal AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Na sequecircncia manifesta-se um posicionamento que parece
contraacuterio ao anterior
Todas as consideraccedilotildees positivas ou negativas
estatildeo e fazem parte de uma matriz de anaacutelise de
impacto Elas constam tanto do estudo da
USITESC quanto dos estudos dos
empreendimentos acessoacuterios E a equipe embora
tenha optado por natildeo fazer nenhuma manifestaccedilatildeo
197
proacute ou contra a USITESC ela nos estudos nas
suas conclusotildees ela deixa bem claro se eacute viaacutevel
ou natildeo dentro do estudo que foi feito Eu soacute queria
dizer isso e que a populaccedilatildeo tivesse ciecircncia e os
nossos colegas ecologistas que Que noacutes
apresentamos os trabalhos e noacutes temos
consciecircncia Noacutes temos nossa responsabilidade
social tambeacutem Noacutes natildeo somos levianos noacutes natildeo
queremos aprovar absolutamente nada Noacutes
estamos fazendo um estudo que demonstra a
possibilidade ou natildeo do empreendimento (Luiz
Nogueira Palma IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
O IPAT enfatizou em muitas intervenccedilotildees o ldquocaraacuteter teacutecnicordquo das
informaccedilotildees prestadas Alguns exemplos de explicaccedilotildees duvidosas
foram extraiacutedos das duas audiecircncias puacuteblicas e satildeo apresentados na
sequecircncia Na audiecircncia puacuteblica de 2006 o IPAT afirmou que uma
barragem no Rio Matildee Luzia preservaria a aacutegua
() quando vocecirc constroacutei um barramento ele
isola ou seja vocecirc taacute preservando a aacutegua boa a
aacutegua de boa qualidade Vocecirc taacute reservando vocecirc
taacute evitando que aquela aacutegua polua neacute pelo menos
pelos outros motivos que mineraccedilatildeo a gente sabe
que o ph nesses frac34 de trecho do Rio Matildee Luzia o
ph da aacutegua eacute 3 E laacute em cima na foz onde natildeo
tem onde natildeo ocorre ou seja a aacutegua eacute de boa
qualidade Entatildeo vocecirc taacute isolando vocecirc taacute
isolando vocecirc taacute preservando (Naacutedia e Andreacuteia
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Quanto agrave existecircncia de risco na construccedilatildeo da barragem e na
possibilidade de caimento de mina o IPAT tambeacutem manifestou sua
posiccedilatildeo
Teoricamente eu natildeo vou te dizer que natildeo eacute
possiacutevel ocorrer um problema na construccedilatildeo da
barragem mas isso aiacute eacute uma coisa que eacute pouco
provaacutevel E quanto aos caimentos de mina cai em
vaacuterios locais e esse caimento que ocorreu
recentemente natildeo tem absolutamente nada a ver
vamos dizer assim com a eventual construccedilatildeo de
198
um barramento neacute Natildeo tem realmente natildeo tem
nada a ver e foi uma coisa improvaacutevel daquelas
coisas que natildeo se pode dizer que estava por
acontecer A mina onde caiu era um lugar
conhecido claro tinha falha geoloacutegica neacute Mas
ela tava sendo vamos dizer assim toda eacute toda
minerada de uma maneira muito teacutecnica com um
fator de seguranccedila muito alto e aconteceu Quer
dizer eacute a natureza neacute Eu com toda sinceridade
natildeo vou lhe enganar pra dizer que eacute impossiacutevel de
ocorrer um caimento laacute () Se for minerado de
uma maneira teacutecnica eacute pouco provaacutevel que
aconteccedila Agora dizer que natildeo tem caimento eu
acho que teacutecnico nenhum diria isso (Cleacutevis
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Na quarta audiecircncia puacuteblica mais duas explicaccedilotildees chamaram a
atenccedilatildeo uma do IPAT outra do empreendedor A primeira foi dada por
Marcos Back do IPAT ldquoSegundo as pesquisas natildeo haacute uma correlaccedilatildeo
entre a usina e a sauacutede da populaccedilatildeo entre a Usina Termeleacutetrica Jorge
Lacerda e as doenccedilas respiratoacuteriasrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Em contraposiccedilatildeo a essa informaccedilatildeo Joseacute Dagostin do Movimento
Iccedilara pela Vida trouxe informaccedilotildees atualizadas dados do Datasus
questionando o IPAT sobre os dados defasados do estudo sobre sauacutede e
tambeacutem sobre acidentes com amocircnia Dois anos depois o proacuteprio
Ministeacuterio Puacuteblico coletou e analisou dados confirmando a relaccedilatildeo
entre diversos problemas de sauacutede e o funcionamento do Complexo
Jorge Lacerda (MPF 2009)
A outra fala do empreendedor sugeriu que ldquoa estocagem de
amocircnia eacute mais segura que o botijatildeo de gaacutes que vocecircs tecircm em suas casas
Muitos dos senhores tecircm mangueiras inadequadas para conectar o
botijatildeo de gaacutes Quantas vezes passam perto do botijatildeo de gaacutesrdquo (Luis
Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Essa eacute uma amostra pequena das explicaccedilotildees dadas em resposta
aos questionamentos Muitas pessoas tambeacutem natildeo se sentiram
contempladas com as respostas As evasivas contemplavam encaminhar questionamentos por escrito agrave FATMA e ao IPAT desconsiderar as
perguntas com base no fato de que as informaccedilotildees jaacute haviam sido
apresentadas nas outras audiecircncias ou que as informaccedilotildees seriam
tratadas posteriormente na anaacutelise de risco
199
Nas duas audiecircncias puacuteblicas analisadas o IPAT foi questionado
ao fazer o EIARIMA da USITESC quanto ao seu posicionamento
O estudante da UNESC Joaquim Teixeira fez a seguinte
intervenccedilatildeo
ldquoA USITESC eacute a nova Marion do seacuteculo XXIrdquo Eacute
preciso separar a UNESC eacute nossa o IPAT eacute de
quem paga () o empreendimento pode ser feito
ou natildeo feito tem essa possibilidade taacute na lei Tem
alternativas ao empreendimento () Eacute preciso
mudar de paradigma () Vocecircs podem virar a
paacutegina da histoacuteria Treviso natildeo precisa de mina
Ou melhor termeleacutetrica (Joaquim Teixeira
estudante da UNESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Em resposta Marcos Back do IPAT reclamou dessa e de outras
intervenccedilotildees como ldquoataque gratuito agrave Universidaderdquo E completou
() Eu quero dizer o seguinte que eacute muito faacutecil
muito faacutecil a gente vir para uma audiecircncia e
quando a gente natildeo tem mais argumento vocecirc
desqualifica quem produziu Quem dizer eu tocirc
numa discussatildeo eu natildeo sei mais o que dizer eu
desqualifico o outro eu falo que o outro natildeo sabe
nada E na hora que eu desqualifico a pessoa
comeccedilo a desqualificar todo o estudo que foi feito
() natildeo adianta dizer que o IPAT natildeo eacute
Universidade porque a decisatildeo de implantaccedilatildeo
que o IPAT participasse desse estudo partiu da
eacutepoca que o reitor era Edson Rodrigues que fez
uma reuniatildeo com a Universidade inteira e decidiu
que a Universidade ia participar desse processo
porque eacute muito grande para a regiatildeo inteira esse
empreendimento e era preciso que a Universidade
se envolvesse no projeto para fazer a avaliaccedilatildeo
desses impactos ambientais (Marcos Back IPAT
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Percebe-se nos posicionamentos do IPAT que existe a confianccedila
de que o documento produzido eacute neutro Dessa forma os segmentos
sociais natildeo teriam que questionar quem produz o documento apenas as
informaccedilotildees que o documento traz
200
636 Audiecircncias puacuteblicas como espaccedilos democraacuteticos
Somente o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal Darlan
Aiacutelton Dias e os segmentos sociais fizeram menccedilatildeo agrave questatildeo
democraacutetica nas audiecircncias puacuteblicas Na terceira audiecircncia puacuteblica o
representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal fez a seguinte intervenccedilatildeo
A audiecircncia puacuteblica eacute um ambiente democraacutetico
bonito agraves vezes a gente fica [pausa] vem com
uma preacute-concepccedilatildeo e fica irritado quando algueacutem
fala o contraacuterio mas isso eacute o processo
democraacutetico uma sociedade democraacutetica Em
outros tempos da nossa histoacuteria recente era
inimaginaacutevel um empreendedor ter que se
submeter a esse tipo de [pausa] situaccedilatildeo Mas eacute a
realidade da nossa sociedade democraacutetica graccedilas
a deus neacute E a Constituiccedilatildeo nos daacute esse recado do
desenvolvimento sustentaacutevel noacutes queremos
desenvolver o paiacutes mas queremos preservar o
meio ambiente (Darlan Aiacutelton Dias
AUDIEcircNCIA 2006)
Todavia o elogio agrave democracia contrasta com o processo da
audiecircncia puacuteblica Tadeu Santos da ONG Soacutecios da Natureza colocou
em questatildeo o caraacuteter democraacutetico da audiecircncia puacuteblica depois de ter
sido lembrado do limite de tempo quatro vezes Segundo ele
As audiecircncias puacuteblicas anteriores foram mais
democraacuteticas a coisa taacute ficando fechada Taacute se
percebendo que o grande lobby das mineradoras
estaacute funcionando Eacute possiacutevel que realmente a
FATMA venha a dar o licenciamento Eacute possiacutevel
natildeo vai dar Porque deu para a mineradora em
Treviso (Tadeu Santos AUDIEcircNCIA 2006)
E continua referindo-se a Luis Antocircnio Garcia da FATMA ldquoSr
diretor eu gostaria que o Sr fosse mais maleaacutevel que conduzisse a
assembleia de forma mais democraacutetica porque afinal estamos
discutindo uma coisa muito seacuteriardquo (Tadeu Santos AUDIEcircNCIA 2006)
201
Na quarta audiecircncia puacuteblica o representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal novamente enaltece o caraacuteter democraacutetico da audiecircncia
() a audiecircncia puacuteblica eacute o instrumento que estaacute
previsto na lei e noacutes vivemos num estado
democraacutetico de direito e que a publicidade dos
licenciamentos ambientais eacute um princiacutepio
fundamental previsto na poliacutetica nacional do meio
ambiente Entatildeo um processo de licenciamento
tem que ser puacuteblico as pessoas tem que ter o
direito de se manifestar desde que haja claro
respeito muacutetuo Mas por outro lado eu percebo
que muita gente veio aqui hoje com a cabeccedila feita
a favor ou contra o empreendimento sem querer
ouvir qualquer coisa Isso ficou muito claro jaacute
nano niacutevel de conversa durante as apresentaccedilotildees
As pessoas tem o direito de ser contra ou a favor
do empreendimento Aleacutem disso disse a prefeita
aqui que os estudos ficaram agrave disposiccedilatildeo da
populaccedilatildeo por 45 dias como manda a lei mas soacute
duas pessoas consultaram os estudos na prefeitura
Entatildeo eu peccedilo que se respeite as opiniotildees e que
todos tem direito a fazer uso da palavra E isso eacute
democraacutetico () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio
Puacuteblico Federal AUDIEcircNCIA 2007)
O reflexo dessa democracia foi o rigoroso controle do tempo de
questionamento o despeito pela ordem de chegada dos questionamentos
(orais e escritos) e a inexistecircncia de reacuteplica Gilmar Bonifaacutecio do
Movimento Iccedilara pela Vida criticou a forma como foram conduzidos os
debates jaacute que natildeo foi respeitado o direito agrave reacuteplica
A intervenccedilatildeo do representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
trouxe alguma esperanccedila para os segmentos sociais
Na verdade toda essa discussatildeo que hoje se trava
aqui eacute uma discussatildeo se a gente for pensar aqui
do ponto de vista histoacuterico bonita e importante e
acho que essa luta pode mudar o rumo dessa
legislaccedilatildeo Mas vamos colocar ela num contexto
maior que precisa ser colocado Na verdade eacute
uma discussatildeo que se trava no Brasil inteiro e no
mundo inteiro que eacute a discussatildeo de que modelo
de sociedade e desenvolvimento noacutes queremos
202
Pela questatildeo do efeito estufa e toda a questatildeo de
sobrevivecircncia da espeacutecie E eu como ser humano
como pai eu quero tambeacutem que o mundo pros
meus filhos pros meus netos seja viaacutevel No
entanto diante desse debate e assim como aqui
natildeo se quer uma usina termeleacutetrica laacute em Belo
Monte natildeo se quer uma hidreleacutetrica laacute em
Campos Novos natildeo se quer uma hidreleacutetrica laacute no
Rio Madeira e assim por diante Mas de algum
lugar tem que sair energia E o Ministeacuterio Puacuteblico
nessa discussatildeo tem que se pautar no equiliacutebrio e
ter como paracircmetro o que A Constituiccedilatildeo e as
leis E eacute assim que eu procuro agir Entatildeo essa
discussatildeo eacute legiacutetima essa oposiccedilatildeo a qualquer
empreendimento desse tipo eacute legiacutetima e esse eacute o
espaccedilo para falar Mas noacutes vamos nos pautar pela
lei () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico
Federal Federal AUDIEcircNCIA 2007)
O representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal reconhece a
possibilidade de mudanccedila na legislaccedilatildeo mas reconhece que sua atuaccedilatildeo
se restringe ao que eacute legal O Ministeacuterio Puacuteblico Federal produziu em
2004 um dossiecirc sobre as Deficiecircncias em estudos de impacto ambiental
mas natildeo tocou na questatildeo das audiecircncias puacuteblicas (MPF 2004) Apesar
das audiecircncias puacuteblicas natildeo serem deliberativas a observacircncia do
processo democraacutetico eacute algo necessaacuterio e deveria entrar nos estudos do
Ministeacuterio Puacuteblico
64 Democracias possiacuteveis e aprendizagem social
A avaliaccedilatildeo de impacto ambiental compreende processos que
envolvem muacuteltiplos segmentos que recolhem analisam sintetizam e
comunicam informaccedilotildees sobre as condiccedilotildees ambientais tendecircncias
direccedilotildees impactos e futuros possiacuteveis com o objetivo de sensibilizar
para uma questatildeo especiacutefica ou apoiar processos de regulaccedilatildeo ambiental
Essas avaliaccedilotildees satildeo processos sociais de comunicaccedilatildeo e interaccedilatildeo que
envolvem muito mais do que a mera produccedilatildeo de relatoacuterios Todavia os
limites estruturais e conjunturais das avaliaccedilotildees natildeo garantem o
questionamento do estilo de desenvolvimento de planos poliacuteticas e
203
programas que estariam sendo elaborados avaliados e implementados
(SACHS 1986 VIEIRA 2005)
O licenciamento ambiental estaacute envolto numa suposta
neutralidade em relaccedilatildeo aos criteacuterios juriacutedicos e teacutecnicos que o
sustentam e os condicionantes e interesses intriacutensecos ao processo
acabam passando para segundo plano ldquoNatildeo eacute porque a mineradora
cumpre com as exigecircncias que o oacutergatildeo licenciador pode liberar a
atividade Eacute preciso considerar a aceitaccedilatildeo do empreendimento pela
comunidade que poderaacute ser afetadardquo (Soacutecios da Natureza citado por
SANTOS 2008 p 103)
No caso especiacutefico da USITESC os segmentos poliacuteticos
(representados pelos poliacuteticos estaduais e municipais Ministeacuterio Puacuteblico
e FATMA) apresentaram em seus discursos algumas peculiaridades Os
poliacuteticos estaduais e municipais apoiam o empreendimento porque
querem estimular o desenvolvimento econocircmico A FATMA sofre
pressotildees poliacuteticas e tem dificuldades teacutecnicas mas garante que o
licenciamento eacute concedido considerando a anaacutelise teacutecnico-legal O
Ministeacuterio Puacuteblico aparece nos discursos dos segmentos econocircmicos
poliacuteticos e sociais como confiaacutevel Ele se mostra receptivo as colocaccedilotildees
dos segmentos sociais mas se move dentro do que considera legal Pode
questionar os dados do EIARIMA mas dificilmente questionaria a
questatildeo democraacutetica no processo da audiecircncia puacuteblica
Os segmentos econocircmicos como tratado na seccedilatildeo 623 fazem
pressatildeo sobre os segmentos poliacuteticos Nas audiecircncias puacuteblicas sua
participaccedilatildeo se limita a responder agrave perguntas e fazer a defesa do
empreendimento quando necessaacuterio O fato eacute que a USITESC tem a LI e
pode participar dos leilotildees de energia O iniacutecio da construccedilatildeo vai
depender dos interesses econocircmicos e poliacuteticos envolvidos O ponto
importante nesse capiacutetulo era tornar mais expliacutecitas as redes de
influecircncia e os mecanismos que satildeo utilizados nas audiecircncias puacuteblicas
para neutralizar as criacuteticas (aqui entra a injusticcedila poliacutetica nos tempos e
nas intervenccedilotildees) e a desinformaccedilatildeo Ao mesmo tempo tornam-se
tambeacutem mais expliacutecitas as formas de atuaccedilatildeo dos segmentos sociais
(afetadosatingidosameaccedilados ONGs e parte da academia)
A histoacuteria dos segmentos sociais no Sul de Santa Catarina traz
evidecircncias de aprendizagem social adaptativa Eles contam com uma
atuaccedilatildeo regional articulada fazem a relaccedilatildeo dos problemas globais e
locais questionam os segmentos poliacuteticos e os segmentos econocircmicos e
reivindicam que as audiecircncias puacuteblicas sejam mais democraacuteticas Isso
204
demonstra na discussatildeo especiacutefica da USITESC que se vem travando
uma luta histoacuterica na regiatildeo
7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta tese buscamos compreender as contradiccedilotildees inerentes agrave
proposta de ampliaccedilatildeo do sistema de geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica na
regiatildeo sul de Santa Catarina Para tanto adotamos um modelo de anaacutelise
que combina os enfoques de gestatildeo de ldquocommonsrdquo para o
ecodesenvolvimento e de justiccedila ambiental e ecoloacutegica Na estrutura
deste modelo hiacutebrido comparecem os conceitos de trajetoacuteria de
desenvolvimento local de atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso em
questatildeo de padrotildees de interaccedilatildeo entre os atores sociais envolvidos no
sistema de gestatildeo de regras em uso de arena de accedilatildeo e de resultados
eou consequecircncias das tomadas de decisatildeo
Caracterizamos inicialmente a especificidade das dinacircmicas de
desenvolvimento que tecircm influenciado as accedilotildees coletivas dos segmentos
poliacuteticos econocircmicos e sociais envolvidos nos modos de apropriaccedilatildeo e
gestatildeo do carvatildeo mineral na regiatildeo em pauta Neste sentido destacamos
o papel hegemocircnico exercido pelos agentes governamentais na
centralizaccedilatildeo dos processos decisoacuterios e na oferta de subsiacutedios agrave
utilizaccedilatildeo de combustiacuteveis foacutesseis natildeo obstante o apelo agrave necessidade
de se promover uma ldquomatriz energeacutetica limpardquo no Paiacutes
No resgate da dinacircmica de exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral
buscamos caracterizar os fatores relacionados agrave disponibilidade do
recurso agrave rentabilidade econocircmica deste segmento atualmente aos
criteacuterios de tomada de decisatildeo na pesquisa de inovaccedilotildees na busca de
alternativas de mecanizaccedilatildeo dos processos de extraccedilatildeo agraves praacuteticas de
recuperaccedilatildeo do passivo ambiental e ao perfil dominante das poliacuteticas de
suprimento energeacutetico no bojo do modelo de desenvolvimento adotado
Com base nas evidecircncias coletadas foi possiacutevel constatar que o nosso
Paiacutes natildeo conta ainda hoje com uma ldquocultura do carvatildeordquo e que na
regiatildeo estudada as atividades de mineraccedilatildeo dificultam ou mesmo
impedem outros usos possiacuteveis do solo aleacutem de responderem pela
geraccedilatildeo de riscos e de impactos socioambientais cujos custos
geralmente muito elevados continuam a ser distribuiacutedos de forma
socialmente desigual Aleacutem disso reforccedilamos o ponto de vista segundo
o qual as escolhas tecnoloacutegicas satildeo essencialmente tributaacuterias de
orientaccedilotildees poliacuteticas As anaacutelises mostraram tambeacutem que uma parcela
significativa da populaccedilatildeo catarinense jaacute percebe natildeo soacute uma relaccedilatildeo
causal direta entre o aumento da exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral e o
comprometimento da resiliecircncia ecossistecircmica e da qualidade de vida
das comunidades locais Ao mesmo tempo vem se impondo
206
gradualmente a impressatildeo de que os processos de diversificaccedilatildeo da
economia regional vecircm legitimando a adoccedilatildeo de uma poliacutetica mais firme
de reconversatildeo do segmento de exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral
No que diz respeito agrave adequaccedilatildeo dos arranjos institucionais em
vigor na dinacircmica de gestatildeo deste segmento correlacionamos a
iniciativa de ampliaccedilatildeo do sistema de geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica
movida a carvatildeo mineral agrave desregulamentaccedilatildeo e flexibilizaccedilatildeo da
legislaccedilatildeo ambiental - especialmente do Coacutedigo de Mineraccedilatildeo e do
Coacutedigo Estadual do Meio Ambiente em Santa Catarina No segundo
caso o Coacutedigo estabeleceu prazos para as licenccedilas ambientais e a
Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina dispensou o EIARIMA para
atividade de extraccedilatildeo de pequeno porte A CFEM e a reduccedilatildeo do ICMS
de 15 para 3 no estado contribuiacuteram fortemente para legitimar o
projeto de uma nova usina junto agrave opiniatildeo puacuteblica Mas outros aspectos
relevantes foram destacados a exemplo da evoluccedilatildeo progressiva das leis
ambientais favorecendo a percepccedilatildeo de que o direito a um meio
ambiente saudaacutevel integra o coacutedigo universal dos direitos humanos
fundamentais Todavia o balanccedilo entre os aspectos que favorecem a
ampliaccedilatildeo e os que questionam eacute bastante desigual A
desregulamentaccedilatildeo e a flexibilizaccedilatildeo dos coacutedigos juriacutedicos promovidas
nos uacuteltimos anos representam da perspectiva adotada na tese um
evidente e preocupante retrocesso em relaccedilatildeo aos avanccedilos alcanccedilados
anteriormente Finalmente acreditamos que a dimensatildeo da participaccedilatildeo
autecircntica da sociedade civil organizada nas tomadas de decisatildeo uma das
bandeiras da deacutecada de 1980 continua ainda hoje muito aqueacutem das
expectativas ndash sobretudo pelo fato de permanecer tutelada pelo jogo de
alianccedilas formadas pelos representantes dos setores econocircmico e
governamental
A reflexatildeo centrada no aprofundamento deste uacuteltimo toacutepico
mostrou que o sistema de gestatildeo de recursos comuns no Brasil continua
atrelado a um modelo de desenvolvimento que faz do apelo agrave
sustentabilidade uma retoacuterica que natildeo ataca as raiacutezes do problema
Trata-se de evitar as mudanccedilas estruturais que se tornaram emergenciais
face ao agravamento da crise em escala global Nesse contexto o
componente democraacutetico-representativo do sistema poliacutetico que tende a
reforccedilar e a legitimar a formaccedilatildeo de lobbies envolvendo os segmentos
poliacuteticos e econocircmicos contrasta com o componente democraacutetico-
participativo que responde pela abertura de espaccedilos ainda incipientes e
restritos de participaccedilatildeo aos setores majoritaacuterios da populaccedilatildeo A
existecircncia da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral eacute
207
um indiacutecio da existecircncia dessas articulaccedilotildees entre segmentos
econocircmicos e poliacuteticos E os dados apresentados no capiacutetulo 5
confirmam a hipoacutetese de que no bojo do processo de licenciamento da
USITESC no periacuteodo de 2002 a 2012 as doaccedilotildees de empresaacuterios para o
financiamento de campanhas eleitorais (nos niacuteveis municipal estadual e
nacional) tornaram-se um fenocircmeno recorrente
Em outras palavras consideramos que a gestatildeo de recursos
comuns em Santa Catarina segue as tendecircncias nacionais
Historicamente a questatildeo ambiental vem sendo apropriada de forma
marginal no estado permanecendo subordinada agrave hegemonia dos
interesses dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos Um dos principais
indicadores dessa tendecircncia pode ser encontrado na dinacircmica de
organizaccedilatildeo e funcionamento da FATMA abrigando a formaccedilatildeo de
lobbies ativos no setor da exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral - seja
estimulando sua expansatildeo seja dificultando sua fiscalizaccedilatildeo em
coerecircncia com os avanccedilos da legislaccedilatildeo ambiental Todavia ressaltamos
ainda que se uma parte dos segmentos poliacuteticos e dos segmentos sociais
apoia a tendecircncia de ampliaccedilatildeo deste setor os posicionamentos natildeo satildeo
homogecircneos e o fortalecimento do sistema democraacutetico vem se dando
por meio da organizaccedilatildeo dos segmentos sociais (ONGs academia
afetadosatingidosameaccedilados) e da atuaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico No
que diz respeito agrave organizaccedilatildeo dos segmentos sociais as iniciativas
extrapolam os espaccedilos de participaccedilatildeo previstos constitucionalmente
envolvendo tambeacutem accedilotildees autocircnomas de produccedilatildeo e difusatildeo de
conhecimentos aleacutem da promoccedilatildeo de campanhas e manifestaccedilotildees
Na consideraccedilatildeo do processo de licenciamento da USITESC
constatamos que no processo de licenciamento as audiecircncias puacuteblicas
realizadas no municiacutepio de Treviso foram coordenadas pela FATMA e
natildeo contaram com estrateacutegias de distribuiccedilatildeo (minimizando a
desigualdade) reconhecimento (considerando as distintas perspectivas)
e a representaccedilatildeo (paridade de participaccedilatildeo) As evidecircncias obtidas
indicam que essas reuniotildees foram organizadas visando reproduzir a
loacutegica que bloqueia na base a concretizaccedilatildeo desses anseios
Os principais temas tratados nas audiecircncias puacuteblicas foram
tratados no capiacutetulo 6 mostrando as contradiccedilotildees existentes ldquoentrerdquo e
ldquodentrordquo dos segmentos sociais principalmente A ampliaccedilatildeo de energia
termeleacutetrica eacute inevitaacutevel do ponto de vista dos segmentos econocircmicos
sendo respaldada por uma parcela dos agentes governamentais locais e
dos representantes da sociedade civil A discussatildeo sobre a relaccedilatildeo entre
208
a construccedilatildeo da USITESC e as mudanccedilas climaacuteticas proposta pela rede
de ONGs movimentos sociais e parte da UNESC foi categoricamente
colocada de lado como um aspecto natildeo pertinente ao caso em pauta ou
seja a apresentaccedilatildeo do EIARIMA Aleacutem disso ressaltamos que
durante as audiecircncias praticamente natildeo foram consideradas as vozes
dos habitantes de Treviso que seriam afetados pela implementaccedilatildeo do
projeto As discussotildees envolveram apenas uma parcela dos
representantes da sociedade civil sediados em outros municiacutepios e em
outros estados Poucos habitantes de Treviso participaram das
audiecircncias puacuteblicas Num municiacutepio em que 69 dos postos de trabalho
estatildeo vinculados a atividade carboniacutefera torna-se difiacutecil imaginar que os
habitantes estivessem em condiccedilotildees favoraacuteveis para se posicionarem
contra a implantaccedilatildeo da USITESC
Mostramos tambeacutem que a competecircncia da FATMA e da UNESC
foi repetidamente questionada nessas audiecircncias Se os representantes da
FATMA argumentaram agrave luz do princiacutepio de respeito agrave legislaccedilatildeo em
vigor e os pesquisadores da UNESC agrave luz do princiacutepio de neutralidade
da ciecircncia ambos os grupos evitaram assumir o desafio de encarar uma
discussatildeo poliacutetica do caso em pauta Por sua vez foi enaltecido o papel
desempenhado pelo Ministeacuterio Puacuteblico na defesa dos interesses da
populaccedilatildeo local Natildeo obstante consideramos que os depoimentos dos
Procuradores permaneceram refeacutens de um ponto de vista essencialmente
legalista na avaliaccedilatildeo do processo de licenciamento
Na busca de respostas agrave questatildeo de ldquoserdquo e ldquocomordquo as accedilotildees
coletivas estudadas teriam gerado oportunidades de aprendizagem social
adaptativa capazes de deflagrar accedilotildees coletivas de mudanccedila
institucional concluiacutemos que a atuaccedilatildeo de parte dos segmentos sociais
envolvidos no caso da USITESC aponta nesta direccedilatildeo Eles jaacute
conseguem perceber o surgimento da demanda de ampliaccedilatildeo do sistema
termeleacutetrico como um elemento de uma problemaacutetica mais ampla e mais
complexa que natildeo foi considerada nas audiecircncias puacuteblicas Eles estatildeo
mobilizados de outras formas mas a concessatildeo do licenciamento ainda
tem a audiecircncia puacuteblica (consultiva) como uacutenica modalidade de
participaccedilatildeo Diante disso pensamos que os problemas de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo existentes no espaccedilo da audiecircncia
precisariam ser vistos com mais cuidado pelo Ministeacuterio Puacuteblico Seria
interessante que daqui em diante o Ministeacuterio Puacuteblico superasse a
visatildeo dominante segundo a qual a anaacutelise das deficiecircncias do
EIARIMA (MPF 2004) satildeo suficientes para democratizar os processos
209
de licenciamento de projetos programas e poliacuteticas de desenvolvimento
no Paiacutes
Finalmente o trabalho ofereceu subsiacutedios que reforccedilam a
validade do pressuposto de que a maturaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo de
recursos comuns voltado para um novo estilo de desenvolvimento
norteado pelo princiacutepio de sustentabilidade forte deveraacute passar
necessariamente pela ldquodemocratizaccedilatildeo do aparelho do Estado de modo
que a sociedade possa controlar seus controladoresrdquo (BOcircA NOVA
1985 p 227)
A sugestatildeo eacute que se faccedila uma pesquisa sobre ldquodeficiecircncias nas
audiecircncias puacuteblicasrdquo Como mencionado na justificativa desta tese um
dos encaminhamentos possiacuteveis seria a realizaccedilatildeo de um levantamento
mais rigoroso dos processos de licenciamento realizados no litoral de
Santa Catarina nos uacuteltimos anos a ser suplementado pela anaacutelise criacutetica
das respectivas audiecircncias puacuteblicas Os resultados poderiam ser
encaminhados ao Ministeacuterio Puacuteblico Estadual e Federal servindo assim
de base para o questionamento da forma pela qual os anseios de
distribuiccedilatildeo justa reconhecimento e representaccedilatildeo autecircntica dos
segmentos sociais tecircm sido incorporados nos processos de
licenciamento Neste sentido o caraacuteter meramente consultivo das
audiecircncias puacuteblicas poderia se tornar tambeacutem objeto de reconsideraccedilatildeo
na trilha ainda incipiente que nos conduziria ao exerciacutecio da cidadania
ambiental plena
Em outras palavras as perspectivas de ampliaccedilatildeo da rede de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica no Sul de Santa Catarina refletem uma
tomada de consciecircncia ainda bastante restrita dos riscos envolvidos na
continuidade da atividade carboniacutefera e de forma mais ampla de um
modelo de gestatildeo de recursos naturais de cunho ecologicamente
predatoacuterio e socialmente injusto Diante de argumentos que defendem o
caraacuteter ldquoinevitaacutevelrdquo do apelo a fontes natildeo renovaacuteveis de geraccedilatildeo de
energia cabe lembrar que
() existe pela frente um futuro repleto de possibilidades
alternativas e de potenciais inexplorados que natildeo cabem na bitola
estreita dos que estatildeo presos a modelos do passado ou a interesses do establishment Ou seja o futuro natildeo se projeta nas equaccedilotildees
matemaacuteticas mas se inventa na incessante discussatildeo das alternativas e
se faz na luta poliacutetica (BOcircA NOVA 1985 p 233)
210
Transformar a essa situaccedilatildeo envolve a adoccedilatildeo de outra
perspectiva baseada natildeo soacute na compreensatildeo da complexidade do
problema mas tambeacutem na consideraccedilatildeo simultacircnea dos fatores que
comparecem em todas as escalas do local ao global e na formaccedilatildeo de
parcerias capazes de impulsionar a gestaccedilatildeo de um projeto alternativo de
sociedade Esperamos que os resultados obtidos ofereccedilam subsiacutedios
uacuteteis apontando nesta direccedilatildeo insistindo que a superaccedilatildeo dos atuais
dilemas que cercam o exerciacutecio da democracia em nosso Paiacutes deveria
transcender a preocupaccedilatildeo pela pertinecircncia dos arranjos institucionais
em vigor Se os limites da tradiccedilatildeo democraacutetico-representativa tornam-
se evidentes quando prevalecem os interesses dos grupos sociais
atrelados agrave hegemonia do regime de apropriaccedilatildeo privada e economicista
dos ldquocommonsrdquo por sua vez os avanccedilos alcanccedilados na promoccedilatildeo de um
novo formato democraacutetico-participativo correm o risco de se tornarem
funcionais agrave reproduccedilatildeo das tendecircncias dominantes se permanecerem
restritos aos limites fixados pela obediecircncia agraves determinaccedilotildees legais
Impotildee-se assim uma dinacircmica de radicalizaccedilatildeo da democracia
entendida como componente essencial de uma estrateacutegia consistente de
enfrentamento dos dilemas colocados pela urgecircncia de uma transiccedilatildeo
ecoloacutegica consistente com os princiacutepios do ecodesenvolvimento
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AGRADECIMENTOS
O doutoramento foi muito mais abertura de caminhos e encontros que
pontos de chegada E nesses caminhos e encontros pude conhecer
pessoas e estreitar laccedilos que foram muito importantes ao longo desse
processo Aproveito para deixar registrado aqui os meus
agradecimentos
Ao meu orientador Prof Paulo Freire Vieira que me acompanha desde
o mestrado Eacute muito importante ter algueacutem que com equanimidade nos
faccedila perceber os nossos limites e nos estimule a ir aleacutem com humildade
e sem ilusotildees
Aos professores que gentilmente participaram da qualificaccedilatildeo e da
defesa e trouxeram valiosas contribuiccedilotildees ao texto aqui apresentado
Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes da UNESC Profordf Drordf Cristiane
Mansur de Moraes Souza da FURB Prof Dr Luiz Fernando Scheibe do
Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Geografia da UFSC Profordf Drordf Janice
Pontes Tirelli e Marcia Grisotti do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em
Sociologia Poliacutetica da UFSC
Agrave coordenaccedilatildeo e aos professores e professoras do Programa de Poacutes-
Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica importantiacutessimos nesse processo de
formaccedilatildeo
Agrave Albertina Buss Volkmann e agrave Maria de Faacutetima Xavier da Silva pelo
carinho e pela ajuda junto agrave Secretaria do PPGSP
Ao CNPq pelo auxiacutelio financeiro por meio da bolsa de estudos
Agraves amigas e amigos do Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio Ambiente e
Desenvolvimento do Grupo de Educaccedilatildeo para o Ecodesenvolvimento e
do Nuacutecleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional Nossas
vivecircncias e convivecircncias foram fundamentais para o meu processo
formativo Foi muito bom poder contar com o carinho e apoio de vocecircs
Agrave Juliana Adriano Marina Fravrim Gasparini Melissa Vivacqua
Tatiane Viega Vargas e Tadeu Santos (da ONG Soacutecios da Natureza) que
gentilmente compartilharam suas impressotildees sobre partes da tese
Agrave Mariana Thibes pela agradaacutevel parceria ao longo desse percurso e ao
Juliano Giassi Goularti pela sugestatildeo dos dados do quinto capiacutetulo
Aos colegas da rede TransForMar pela acolhida e pela oportunidade de
compartilhar e dialogar sobre nossos projetos
Aos amigos Andresa Graciela Wagner Joaquim Hoepers Silvana Maria
Bittencourt e Vanessa Juliana da Silva Santos
Agraves amigas Katia Parizoto e Laurete Coleti que me inspiraram com a sua
coragem
Agraves minhas tias Lizete e Dalila eacute muito bom tecirc-las por perto
Ao Ivo cuja presenccedila tornou minha caminhada mais leve Com carinho e
paciecircncia nas nossas incontaacuteveis conversas sobre a tese ajudou e falou
o essencial quando eu mais precisava e permaneceu em silecircncio quando
isso significava me compreender e respeitar
Agrave minha famiacutelia Marilda Hermes Viviana Susana Lucas Hermes
Carlos Dora Dara e Bruna presenccedilas constantes em minha vida O
amor carinho e apoio de vocecircs foi e sempre seraacute fundamental
Agrave minha querida oma Leonida tio Flaacutevio tio Irineu minha prima
Valeacuteria e minha cachorrinha Nicole que partiram no periacuteodo de
doutorado e deixaram muitas saudades
Meus mais sinceros agradecimentos a todas e todos pois naquilo que
faccedilo sou e me torno a cada dia levo um pouquinho de cada um de
vocecircs
A terra natildeo eacute soacute um espaccedilo onde vivemos Eacute um
mundo que produz e condiciona nossa proacutepria
existecircncia que antecede e se prolonga em nossa
vida em todas as suas dimensotildees Somos seres
terrestres A democracia natildeo eacute soacute um espaccedilo
institucional da poliacutetica Ela para existir deve
tambeacutem realizar-se e estar presente em todas as
dimensotildees de nossas vidas Talvez por isso haja
uma relaccedilatildeo histoacuterica tatildeo estreita entre terra e
democracia Quando a terra eacute apropriada usada
monopolizada por uns poucos a democracia natildeo
existe Quando a democracia natildeo existe a terra se
transforma em um mundo de poucos contra a
maioria (Herbert de Souza ndash Betinho 1991 p
108-9)
RESUMO
Esta tese focaliza os dilemas que continuam bloqueando quatro deacutecadas
apoacutes a Conferecircncia de Estocolmo o funcionamento do sistema de gestatildeo
de recursos naturais natildeo renovaacuteveis no Brasil Mais especificamente o
texto conteacutem uma anaacutelise dos bastidores do processo de licenciamento
ambiental voltado para a implantaccedilatildeo de uma nova usina termeleacutetrica na
regiatildeo sul do estado de Santa Catarina O enfoque analiacutetico utilizado foi
construiacutedo mediante uma hibridizaccedilatildeo de duas linhas de pesquisa
sistecircmica sobre o binocircmio meio ambiente amp desenvolvimento ainda
pouco conhecidas em nosso Paiacutes a saber gestatildeo de recursos comuns
(ldquocommonsrdquo) para o ecodesenvolvimento e justiccedila ambiental e ecoloacutegica Aleacutem da introduccedilatildeo e de uma siacutentese da revisatildeo de literatura
sobre a atualidade dos princiacutepios de ecodesenvolvimento no debate
sobre modos de apropriaccedilatildeo e sistemas de gestatildeo de ldquocommonsrdquo o texto
oferece inicialmente um resgate historiograacutefico das modalidades e das
implicaccedilotildees socioecoloacutegicas do aproveitamento de jazidas de carvatildeo
mineral no Brasil e em Santa Catarina Na sequecircncia coloca em
primeiro plano uma anaacutelise dos padrotildees de interaccedilatildeo dos segmentos
sociais envolvidos no projeto de implantaccedilatildeo da Usina Termeleacutetrica Sul-
Catarinense (USITESC) no municiacutepio de Treviso Os dados coletados
permitiram validar a hipoacutetese segundo a qual a decisatildeo de implantar esta
usina constitui um indicador suplementar de crise do sistema poliacutetico
implantado no Paiacutes relativamente ao agravamento tendencial da
problemaacutetica socioecoloacutegica A linha de criacutetica adotada incide nas
implicaccedilotildees da reproduccedilatildeo de falhas estruturais nos processos de
construccedilatildeo da cidadania ambiental e de promoccedilatildeo da justiccedila ambiental
e ecoloacutegica em todos os niacuteveis de governo ndash do local ao nacional
Argumenta-se que a despeito dos avanccedilos obtidos no debate social
contemporacircneo sobre a urgecircncia de uma transiccedilatildeo ecoloacutegica
consequente para aleacutem de uma ldquoeconomia verderdquo ou do ideaacuterio de um
ldquodesenvolvimento sustentaacutevelrdquo que natildeo rompe com o imaginaacuterio
ocidental de um crescimento material ilimitado a intenccedilatildeo de ampliar a
utilizaccedilatildeo do carvatildeo como fonte de energia estaacute diretamente associada agrave
formaccedilatildeo de redes de influecircncia envolvendo empresaacuterios e agentes
governamentais Buscando elucidar os condicionantes desse cenaacuterio de
mercantilizaccedilatildeo intensiva e indiscriminada de ldquocommonsrdquo o trabalho
reuacutene tambeacutem evidecircncias de iniciativas de resistecircncia que vecircm sendo
gestadas na regiatildeo estudada por de grupos sociais portadores de uma
visatildeo ecoloacutegica da economia da cultura e da poliacutetica
Palavras-chave Ecodesenvolvimento Gestatildeo de recursos comuns
Justiccedila ambiental Justiccedila Ecoloacutegica Democracia Energia Termeleacutetrica
Carvatildeo Mineral Santa Catarina
ABSTRACT
This thesis focuses on the dilemmas that continue blocking four
decades after the Stockholm Conference the functioning of the
management system based on non-renewable natural resources in Brazil
More specifically the text contains an analysis of the backstage of the
licensing process focused on the deployment of a new thermal power
plant in the southern state of Santa Catarina The analytical approach
used was built by a hybridization of two lines of systemic research on
the binomial environment amp development still little known in our
country namely management of common resources (commons) for
the ecodevelopment and environmental and ecological justice Besides
the introduction and a summary of the literature review on the actuality
of the principles of ecodevelopment in the current debate on modes of
ownership and management of commons systems the text initially
provides a historiographical rescuing of the terms and socio-ecological
implications of utilizing coal mines in Brazil and in Santa Catarina
State Following it foregrounds an analysis of the patterns of interaction
of social groups involved in the deployment project Thermoelectric
Plant of South of the Santa Catarina (USITESC) in the city of Treviso
The collected data allow to validate the hypothesis that the decision to
deploy this Plant is a further indicator of the political system deployed
crisis in the country regarding the trend towards worsening of socio-
ecological problems The adopted line of criticism focuses on the
implications of reproducing structural flaws in the processes of
construction of environmental citizenship and promotion of
environmental and ecological justice at all levels of government - from
local to national It is argued that despite the progress achieved in the
contemporary social debate on the urgency of a consequent ecological
transition beyond a green economy or the ideas of sustainable
development that does not break the Western imagination of a growing
unlimited material intention of expanding nowadays the use of coal as
an energy source is directly associated with the formation of powerful
lobbies involving businessmen and government officials Trying to
elucidate the determinants of this intensive and indiscriminate
commodification of commons scenario the paper also gathers
evidence of resistance initiatives that have been gestated in the study
area for social groups suffering from an ecological view of the
economy culture and policy
Keywords Ecodevelopment Management of common resources
Environmental justice Ecological justice Democracy Thermoelectric
energy Coal Santa Catarina
LISTA DE FIGURAS
Figura 1ndash Tipologia das formas de expressatildeo do cidadatildeo numa
democracia 56 Figura 2 - Modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns ajustado a
co-gestatildeo adaptativa 69 Figura 3 - Primeira adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa 72 Figura 4 - Segunda adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa 75 Figura 5 - Tipos de carvatildeo e uso 87 Figura 6 - Etapas da avaliaccedilatildeo de impacto ambiental 95 Figura 7 ndash Mapa de localizaccedilatildeo da Bacia Carboniacutefera Santa Catarina
114 Figura 8- Brasatildeo do municiacutepio de Treviso 158 Figura 9 ndash Mapa de localizaccedilatildeo do municiacutepio de Treviso 159 Figura 10 - Aacuterea prevista para a implantaccedilatildeo da USITESC 163
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 ndash Divisatildeo dos envolvidos na gestatildeo por segmentos 55 Quadro 2 - Quadro de anaacutelise do sistema democraacutetico agrave luz da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica 57 Quadro 3 ndash O enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento e as
dimensotildees baacutesicas do conceito sistecircmico de meio ambiente 64 Quadro 4 - Aspectos das atividades de mineraccedilatildeo e processamento do
carvatildeo mineral 91 Quadro 5 - Siacutentese dos pontos que favorecem e questionam a
amplicaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral
por macro variaacutevel 104 Quadro 6 ndash Limites e oportunidades do sistema democraacutetico no Brasil
106 Quadro 7 ndash Aspectos que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral Santa Catarina
130 Quadro 8 ndash Limites e possibilidades do sistema democraacutetico em Santa
Catarina 132 Quadro 9 - Principais caracteriacutesticas fiacutesicas e bioacuteticas da aacuterea de
influecircncia indireta do projeto USITESC 160 Quadro 10- Impactos sobre o Meio Fiacutesico Bioacutetico e Antroacutepico e accedilotildees
geradoras 165 Quadro 11 - Siacutentese dos Programas da USITESC e alvos principais 168 Quadro 12 - Procedimento para conduccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas
FATMA 175
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral em operaccedilatildeo
em 2013 Brasil 88 Tabela 2 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral com outorga
de 1998 a 2013 Brasil 88 Tabela 3 - Faturamento do Segmento do Carvatildeo Mineral 2012 118 Tabela 4 - Produccedilatildeo de carvatildeo bruto (ROM) de 2009 a 2012 119 Tabela 5 - Distribuiccedilatildeo de passivos ambientais em relaccedilatildeo agraves empresas
120 Tabela 6 - Cronograma de recuperaccedilatildeo dos passivos ambientais 120 Tabela 7 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2002 141 Tabela 8 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2002 que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral 142 Tabela 9 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2002 142 Tabela 10 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2006 143 Tabela 11 - Candidatosas que receberam doaccedilotildees das empresas ligadas
ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2006 144 Tabela 12 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2006 145 Tabela 13 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2010 145 Tabela 14 - Candidatosas receberam doaccedilotildees das empresas ligadas ao
carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2010 146 Tabela 15 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2010 147 Tabela 16 - Doadores eleiccedilotildees de 2004 148 Tabela 17 - Comitecircs e candidatos que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2004 149 Tabela 18 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2004 149 Tabela 19 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2008 150 Tabela 20 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2008 que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 151 Tabela 21 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2008 151 Tabela 22 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2012 152 Tabela 23 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2012 que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 152 Tabela 24 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2012 153 Tabela 25 - Siacutentese dos doadores Eleiccedilotildees de 2002 e 2012 154 Tabela 26 - Candidatos que receberam maiores doaccedilotildees Eleiccedilotildees de
2002 a 2012 155 Tabela 27 - Doaccedilotildees por Partido Poliacutetico Eleiccedilotildees de 2002 a 2012 155 Tabela 28 ndash Principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo com a construccedilatildeo da
USITESC 179
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABCM Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo Mineral
ACARESC
Associaccedilatildeo de Creacutedito e Assistecircncia Rural de Santa
Catarina
ACARIMO Associaccedilatildeo Comunitaacuteria do Alto do Rio Molha
AIA Avaliaccedilatildeo de Impacto Ambiental
ALESC Assembleacuteia Legislativa do Estado de Santa Catarina
AMESC Associaccedilatildeo dos Municiacutepios do Extremo Sul Catarinense
AMREC Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera
AMUREL Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo de Laguna
ANEEL Agecircncia Nacional de Energia Eleacutetrica
ANSDNPM Associaccedilatildeo Nacional de Servidores do Departamento
Nacional de Produccedilatildeo Mineral
APC Associaccedilatildeo Proacute-Carvatildeo
APIB Articulaccedilatildeo dos Povos Indiacutegenas do Brasil
APINE
Associaccedilatildeo Brasileira dos Produtores Independentes de
Energia Eleacutetrica
APP Agraverea de Preservaccedilatildeo Permanente
ASMURC
Associaccedilatildeo de Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera do
Rio Grande do Sul
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento
CAPES
Coordenadoria de Aperfeiccediloamento de Pessoal de Niacutevel
Superior
CASA Centro de Apoio Socioambiental
CBCA Companhia Carboniacutefera de Araranguaacute
CCEE Cacircmara de Comercializaccedilatildeo de Energia Eleacutetrica
CEPCAN Comissatildeo Executiva do Plano do Carvatildeo Nacional
CETEM Centro de Tecnologia Mineral
CETMA Conselho Estadual de Tecnologia e Meio ambiente
CFEM
Compensaccedilatildeo Finaceira pela Exploraccedilatildeo de Recursos
Minerais
CFM Comitecircs Financeiros Municipais
CGBHRA
Comitecirc de Gerenciamento da Bacia Hidrograacutefica do Rio
Araranguaacute
CGTEE Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica
CNBB Conferecircncia Nacional dos Bispos do Brasil
CNPE Conselho Nacional de Poliacutetica Energeacutetica
CNPq
Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientiacutefico e
Tecnoloacutegico
CO2 Dioacutexido de Carbono
COCALIT Coque Catarinense Ltda
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
CONDEMA Conselho Municipal de Defesa Ambiental
COPEL Companhia Paranaense de Energia
CPRM Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
CSN Companhia Sideruacutergica Nacional
DEM Democratas
DNPM Departamento Nacional de Produccedilatildeo Mineral
EIA Estudo de Impacto Ambiental
EPE Empresa de Pesquisa Energeacutetica
FASE
Federaccedilatildeo de oacutergatildeos para Assistecircncia Social e
Educacional
FATMA Fundaccedilatildeo do Meio Ambiente
FBOMS Foacuterum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais
FBOMS
Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento
FDESC Foacuterum de Desenvolvimento do Extremo Sul Catarinense
FEEC Federaccedilatildeo de Entidades Ecologistas Catarinenses
FELC Foacuterum de Ecodesenvolvimento do Litoral Catarinense
FURB Universidade Regional de Blumenau
GAPLAN Gabinete de Planejamento
GEE Gases de Efeito Estufa
GWH Gigawatt-hora
IAD Institutional Framework for Policy Analysis and Design IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renovaacuteveis
IBASE Instituto Brasileiro de Anaacutelises Sociais e Econocircmicas
IBRAM Instituto Brasileiro de Mineraccedilatildeo
ICA Instituto da Cidadania de Araranguaacute
ICC Induacutestria Carboquiacutemica Catarinense
ICMS
Imposto sobre Circulaccedilatildeo de Mercadorias e Prestaccedilatildeo de
Serviccedilos
IEA Agecircncia Internacional de Energia
INESC Instituto de Estudos Socioeconocircmicos
IPAT Instituto de Pesquisas Ambientais e Tecnoloacutegicas
JICA Agecircncia de Cooperaccedilatildeo internacional do Japatildeo
KWh QuiloWatt hora
LI Licenccedila de Instalaccedilatildeo
LO Licenccedila de Operaccedilatildeo
LP Licenccedila Preacutevia
MAM Movimento Popular frente agrave Mineraccedilatildeo
MEcircS Movimento Ecoloacutegico de Sideroacutepolis
MMA Ministeacuterio do Meio Ambiente
MME Ministeacuterio das Minas e Energia
MOVET Movimento Ecoloacutegico Tubaronense
MPA Movimento Proacute-Araranguaacute
MST Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
MW Megawatt
N Nitrogecircnio
NMD
Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio Ambiente e
Desenvolvimento
NPDR Nuacutecleo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional
OCDE
Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e Desenvolvimento
Econocircmico
ONG Organizaccedilatildeo Natildeo Governamental
ONU Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas
PAC Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento
PFL Partido da Frente Liberal
PL Projeto de Lei
PMA Prefeitura Municipal de Araranguaacute
PMDB Partido do Movimento Democraacutetico Brasileiro
PNMA Poliacutetica Nacional de Meio Ambiente
PNUMA Programa das Naccedilotildees Unidas para o Meio Ambiente
PP Partido Progressista
PPB Partido Progressista Brasileiro
PPS Partido Popular Socialista
PR Partido da Repuacuteblica
PSD Partido Social Democraacutetico
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira
PT Partido dos Trabalhadores
PTB Partido Trabalhista Brasileiro
RBJA Rede Brasileira de Justiccedila Ambiental
RIMA Relatoacuterio de Impacto Ambiental
ROM Run of Mine
SATC
Associaccedilatildeo Beneficente da Induacutestria Carboniacutefera de
Santa Catarina
SDR Secretaria de Desenvolvimento Regional
SETMA Secretaria de Tecnologia e Meio Ambiente
SIESESC
Sindicato da Induacutestria da Extraccedilatildeo de Carvatildeo do Estado
de Santa Catarina
SISNAMA Sistema Nacional do Meio Ambiente
SNIEC Sindicato Nacional da Induacutestria de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
SOLTECA Sociedade Termoeleacutetrica de Capivari SA
TWH Tera Watt Hora
UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina
UNESC Universidade do Extremo Sul Catarinense
USITESC Usina Termeleacutetrica Sul-Catarinense
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO39
2 A ATUALIDADE DO ECODESENVOLVIMENTO NO ESTUDO
CONTEMPORAcircNEO SOBRE GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS59
21 RESGATE DO ENFOQUE ldquoCLAacuteSSICOrdquo DE
ECODESENVOLVIMENTO 61
22 AS CONTRIBUICcedilOtildeES DE DIFERENTES ENFOQUES 63
221 Gestatildeo de recursos comuns a importacircncia da
aprendizagem social adaptativa 66
222 Ecodesenvolvimento territorial os recursos comuns no
contexto do desenvolvimento 71
223 Justiccedila ambiental e justiccedila ecoloacutegica os caminhos da
democracia 73
23 LIMITES E POSSIBILIDADES DO
ECODESENVOLVIMENTO REVISITADO 77
3 GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS NO BRASIL O CARVAtildeO
MINERAL EM QUESTAtildeO79
31 DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO GESTAtildeO DE
RECURSOS COMUNS E ENERGIA 81
32 CARACTERIZACcedilAtildeO E USOS DO CARVAtildeO MINERAL NO
BRASIL 86
33 TECNOLOGIAS DISPONIacuteVEIS E IMPACTOS
SOCIOAMBIENTAIS 89
34 REGRAS EM USO NUMA PERSPECTIVA HISTOacuteRICA
INTERFACE ENTRE DIREITOS AMBIENTAIS E DIREITOS
HUMANOS 92
35 ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO 98
351 Segmentos poliacuteticos 98
352 Segmentos econocircmicos 100
353 Segmentos sociais 102
36 SITUACcedilAtildeO ATUAL E DESAFIOS 103
4 CARVAtildeO MINERAL EM SANTA
CATARINA109
41 ldquoCombinandordquo crescimento econocircmico e proteccedilatildeo ambiental 110
42 O sul catarinense uma trajetoacuteria (de desenvolvimento) marcada
pelo carvatildeo mineral 114
43 Da extraccedilatildeo manual agrave mecanizaccedilatildeo das minas 121
44 Regras em uso 122
45 Envolvidos na gestatildeo 124
451 Segmentos poliacuteticos 124
452 Segmentos econocircmicos 124
453 Segmentos sociais 126
46 Situaccedilatildeo atual e desafios 129
5 CARVAtildeO MINERAL E POLIacuteTICA EM SANTA CATARINA
ELEICcedilOtildeES E FINANCIAMENTO PRIVADO133
51 Os argumentos presentes no discurso dos poliacuteticos 134
52 Panorama das eleiccedilotildees e doaccedilotildees de campanha de 2002 a 2012
139
521 Eleiccedilotildees gerais 140
522 Eleiccedilotildees municipais 148
53 Os fatos ausentes do discurso dos poliacuteticos 153
6 CARVAtildeO MINERAL E AMPLIACcedilAtildeO DA ENERGIA
TERMELEacuteTRICA EM SANTA CATARINA157
61 O municiacutepio de Treviso 157
62 O processo de licenciamento os documentos escritos 162
621 O EIARIMA da USITESC 163
622 Das audiecircncias puacuteblicas e licenccedilas 169
623 Pressotildees dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos no
processo de licenciamento 170
624 A posiccedilatildeo dos segmentos sociais 173
63 Relaccedilotildees de poder e desigualdade nas audiecircncias puacuteblicas os
documentos falados 175
631 A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica 177
632 As mudanccedilas climaacuteticas natildeo vecircm ao caso 183
633 Quem defende quem E quem defende os
afetadosatingidosameaccedilados 188
634 O papel da FATMA em questatildeo 192
635 O IPAT e a neutralidade da ciecircncia 195
636 Audiecircncias puacuteblicas como espaccedilos democraacuteticos 200
64 Democracias possiacuteveis e aprendizagem social 202
7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS205
REFEREcircNCIAS211
1 INTRODUCcedilAtildeO
O crescimento e as transformaccedilotildees da economia mundial ao
longo do seacuteculo XX foram impulsionados pela oferta de energia tendo
como fonte principal os combustiacuteveis foacutesseis petroacuteleo e carvatildeo mineral
O uso da energia eacute essencial agrave cultura consumista moderna presente em
todas as regiotildees do mundo Os processos de produccedilatildeo e consumo satildeo
responsaacuteveis por inuacutemeros riscos e danos ecoloacutegicos (TOUCHEacute 2004)
A geopoliacutetica mundial dos recursos naturais faz da energia aacutegua
mineacuterio e espaccedilo territorial elementos do comeacutercio internacional Esse
movimento global afeta as localidades atraveacutes da implantaccedilatildeo de redes
de infraestrutura reconversatildeo de atividades alteraccedilatildeo das formas de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo e satildeo geradores de injusticcedila ambiental Aiacute surgem
conflitos entre a exploraccedilatildeo dos recursos orientada por interesses
presentes em vaacuterias escalas espaciais (ACSELRAD BEZERRA 2010
ZHOURI 2008)
A partir da deacutecada de 1990 depois de mais de cinquenta anos de
controle estatal o sistema energeacutetico brasileiro passou por um periacuteodo
de liberalizaccedilatildeo Duas mudanccedilas consideraacuteveis podem ser apontadas A
privatizaccedilatildeo das companhias operadoras iniciando com a Lei nordm 9427
de dezembro de 1996 que instituiu a Agecircncia Nacional de Energia
Eleacutetrica (ANEEL) e determinou que o potencial energeacutetico seria
concedido via leilatildeo A segunda mudanccedila ocorreu em 2004 com o Novo
Modelo do Setor Eleacutetrico marcando a retomada do planejamento nesse
setor pelo Estado garantindo a seguranccedila no suprimento modicidade
tarifaacuteria e inserccedilatildeo social (atraveacutes do Programa Luz para Todos)
(ANEEL 2008a) Essa deacutecada marcou tambeacutem a desregulamentaccedilatildeo do
setor carboniacutefero que perdeu o mercado metaluacutergico e enfrentou seacuterias
dificuldades vindo a se recuperar somente com a possibilidade de
ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica (JFSC 2008)
Muitas poliacuteticas puacuteblicas incluindo as do setor energeacutetico tecircm
como efeitos colaterais grandes impactos socioambientais (PINHEIRO
2006 RAULINO 2009 SAacuteNCHEZ 2008a VIEacuteGAS 2007) O
Programa de Aceleraccedilatildeo do Crescimento (PAC) reforccedilou a velha loacutegica
de grandes projetos de infraestrutura e a atuaccedilatildeo do Estado ainda eacute
bastante controversa (VIEIRA 2009 ZHOURI LASCHEFSKI 2010)
Dentre as controveacutersias presentes na atuaccedilatildeo do Estado uma refere-se
ao compromisso assumido pelo Brasil no Plano Nacional sobre
40
Mudanccedila do Clima de reduzir as desigualdades sociais a partir de uma
dinacircmica econocircmica que natildeo repita a trajetoacuteria dos paiacuteses
industrializados em termos de emissotildees de Gases de Efeito Estufa
(GEE) (BRASIL 2008) Esse discurso parece caminhar na contramatildeo
do PAC que prevecirc a construccedilatildeo de mais cinco termeleacutetricas movidas a
carvatildeo mineral sendo uma em Santa Catarina (MONTEIRO 2008)
A Poliacutetica Estadual sobre Mudanccedilas Climaacuteticas e
Desenvolvimento Sustentaacutevel de Santa Catarina foi instituiacuteda em 2009
Esta pretende compatibilizar desenvolvimento social econocircmico e
tecnoloacutegico com a proteccedilatildeo do sistema climaacutetico e do meio ambiente
com ecircnfase especial agrave minimizaccedilatildeo das atividades geradoras de gases de
efeito estufa (SANTA CATARINA 2009a) Entretanto o Coacutedigo
Estadual do Meio Ambiente aprovado em 2009 (SANTA CATARINA
2009b) e alterado em 2013 abre a possibilidade de regularizaccedilatildeo
fundiaacuteria em Aacutereas de Preservaccedilatildeo Permanente (APP) e do
licenciamento por decurso de prazo (FEEC 2008 SANTA
CATARINA 2014a) Estes e outros aspectos causam grande impacto
nas relaccedilotildees sociedade e meio ambiente no geral e na questatildeo
energeacutetica em particular
O desenvolvimento de Santa Catarina foi durante muito tempo
considerado bem sucedido por ter reduzido grau de desigualdade
socioeconocircmica amparada no predomiacutenio da pequena propriedade e da
produccedilatildeo diversificada (LISBOA THEIS 1993) Todavia com o passar
do tempo observa-se a elevaccedilatildeo do ecircxodo rural o aumento dos
problemas urbanos e da degradaccedilatildeo ecossistecircmica (VIEIRA et al
2010 VIEIRA CUNHA 2002) A crise socioecoloacutegica catarinense estaacute
intimamente ligada agrave civilizaccedilatildeo dos negoacutecios (LENZI 2000) e o
sistema energeacutetico que a sustenta contribui em alguma medida para o
agravamento deste quadro (LISBOA THEIS 1993) O aumento da
produccedilatildeo e consumo de energia em Santa Catarina relaciona-se ao
crescimento da atividade econocircmica e ao crescimento dos impactos
ambientais (THEIS 1988)
Dentre as regiotildees mais afetadas estaacute o Sul de Santa Catarina A
regiatildeo concentra 1041 das reservas de carvatildeo mineral do Brasil
(MONTEIRO 2008) Desde a descoberta do carvatildeo catarinense pelos
tropeiros em 1822 ateacute os dias atuais muitas coisas mudaram em termos
de incentivos ao uso do carvatildeo mineral tecnologias utilizadas
agravamento da problemaacutetica socioambiental global e desenvolvimento
de mecanismos institucionais para lidar com esta problemaacutetica Todavia
41
apesar de existirem avanccedilos intensificaram-se tambeacutem processos de
degradaccedilatildeo ambiental (MENEZES WATERKEMPER 2009 SANTA
CATARINA 1990)
A Agecircncia de Cooperaccedilatildeo Internacional do Japatildeo (JICA)
identificou 4700 hectares degradados no Sul de Santa Catarina mas
estima-se que seriam 6000 hectares (NASCIMENTO BURSZTYN
2010) Do mineacuterio extraiacutedo 25 eacute aproveitado e 75 torna-se rejeito
piritoso (MILIOLI 2009) Na regiatildeo carboniacutefera apesar da
mecanizaccedilatildeo da extraccedilatildeo do carvatildeo ainda existem precaacuterias condiccedilotildees
de trabalho e peacutessimas condiccedilotildees de vida (moradia sauacutede saneamento)
(MONTIBELLER FILHO 2004) Haacute na regiatildeo um gradativo
comprometimento do setor agriacutecola As aacutereas proacuteximas agraves lavras de
subsolo sofrem com rachaduras desabamentos e rebaixamentos do solo
Ocorrem tambeacutem infiltraccedilotildees secagem de cursos de aacutegua accediludes e
poccedilos Dois terccedilos do sistema hidrograacutefico da regiatildeo estatildeo
comprometidos Existem tambeacutem impactos na flora e fauna e decliacutenio
do potencial pesqueiro (MILIOLI 2009)
Em 1993 o Ministeacuterio Puacuteblico Federal propocircs uma Accedilatildeo Civil
Puacuteblica contra as empresas carboniacuteferas diretores soacutecios majoritaacuterios o
Estado de Santa Catarina e a Uniatildeo Federal visando agrave recuperaccedilatildeo do
passivo ambiental resultante da mineraccedilatildeo do carvatildeo Em 2000
aconteceu a condenaccedilatildeo dos reacuteus agrave recuperaccedilatildeo de 619159 hectares de
aacutereas degradadas trecircs bacias hidrograacuteficas (bacias dos rios Araranguaacute
Tubaratildeo e Urussanga) e 768 minas de boca abandonadas (TSJ 2007)
A regiatildeo eacute palco de muitos conflitos No que diz respeito agrave
extraccedilatildeo do carvatildeo destacam-se em 1988 o conflito entre a Companhia
Sideruacutergica Nacional (CSN) e moradores da comunidade rural de
Montanhatildeo em 1994 entre a Companhia Carboniacutefera Belluno e 200
agricultores em 1995 envolvendo a Associaccedilatildeo Comunitaacuteria do Alto do
Rio Molha (ACARIMO) em Urussanga em 1996 o conflito entre
mineradores e agricultores no ldquoMorrordquo do Albino e Estevatildeo em
Criciuacutema (SILVA SCHEIBE 2005) em 1999 o conflito com a
Carboniacutefera Rio Deserto em Sideroacutepolis e em Iccedilara entre agricultores e
a Carboniacutefera Rio Deserto (NASCIMENTO BURSZTYN 2010) Em
2004 com a ocorrecircncia do furacatildeo Catarina o primeiro do Atlacircntico
Sul inaugura-se uma mobilizaccedilatildeo social que une a discussatildeo sobre a
mineraccedilatildeo do carvatildeo com a discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas e
justiccedila ambiental (SOacuteCIOS DA NATUREZA 2009 e 2005)
Historicamente na regiatildeo aqueles que tecircm o benefiacutecio econocircmico
42
geralmente natildeo arcam com os impactos negativos resultantes da
mineraccedilatildeo (MILIOLI 2009 NASCIMENTO BURSZTYN 2010)
Todavia os impactos natildeo necessariamente afetam apenas as populaccedilotildees
mais vulneraacuteveis do ponto de vista socioeconocircmico
O iacutendice meacutedio de mortalidade por neoplasias e doenccedilas
respiratoacuterias eacute superior ao resto do territoacuterio catarinense e ultrapassa a
meacutedia nacional Chama atenccedilatildeo tambeacutem o iacutendice de mortalidade de
menores de um ano por doenccedilas respiratoacuterias anomalias congecircnitas
notadamente no sistema nervoso incluindo anencefalia tambeacutem
superiores ao resto do paiacutes (MPF 2009) Os municiacutepios de Imbituba
Tubaratildeo Criciuacutema e Urussanga lideram os piores iacutendices de qualidade
do ar do Estado Existem tambeacutem muitos prejuiacutezos relacionados agrave sauacutede
da populaccedilatildeo De 1980 a 2004 foram 846 mortes causadas por doenccedilas
do aparelho respiratoacuterio nos municiacutepios de Criciuacutema Iccedilara Lauro
Muumlller Morro da Fumaccedila Sideroacutepolis Nova Veneza Urussanga
(MILIOLI 2009)
A mineraccedilatildeo no Sul em 2010 contava com 12 induacutestrias e
aproximadamente 4136 empregos diretos O principal destino do carvatildeo
(95) era o Complexo Termeleacutetrico Jorge Lacerda localizado no
municiacutepio de Capivari de Baixo administrado pela Tractebel
(SIECESC 2010) A Usina Termeleacutetrica Jorge Lacerda foi inaugurada
em 1965 entrando em operaccedilatildeo em 1966 com potecircncia instalada de 50
MW atualmente 856 MW com a incorporaccedilatildeo de mais unidades e
ampliaccedilatildeo da produccedilatildeo de energia eleacutetrica Em 1998 como parte dos
processos de privatizaccedilatildeo o Complexo Jorge Lacerda foi vendido para o
Grupo SuezTractebel (Beacutelgica) (GOULARTI FILHO MORAES
2004)
O Complexo Jorge Lacerda tem o compromisso da compra de
200 mil toneladas mensais de carvatildeo mineral A cadeia produtiva do
carvatildeo gera mais de seis mil empregos (na mineraccedilatildeo do carvatildeo
transporte e abastecimento do carvatildeo geraccedilatildeo de energia eleacutetrica e
extraccedilatildeo e transporte de cinzas) e eacute responsaacutevel por 70 da arrecadaccedilatildeo
de tributos municipais e por 75 da economia de Capivari de Baixo
(TRACTEBEL 2008)
A ampliaccedilatildeo de energia termeleacutetrica tornou-se uma possibilidade
atraveacutes da construccedilatildeo da Usina Termeleacutetrica Sul-Catarinense
(USITESC) Ela faz parte de uma realidade diferente se comparada ao
Complexo Termeleacutetrico Jorge Lacerda Enquanto o Complexo
Termeleacutetrico Jorge Lacerda foi construiacutedo num periacuteodo em que a
43
questatildeo da energia passava pela intervenccedilatildeo federal e estadual
(GOULARTI FILHO MORAES 2004) a USITESC vai ser construiacuteda
num periacuteodo de liberalizaccedilatildeo e privatizaccedilatildeo do setor eleacutetrico Ocorrem
ainda nesse intervalo de tempo a democratizaccedilatildeo e a criaccedilatildeo de espaccedilos
legais e institucionais motivados pela crescente preocupaccedilatildeo com
questotildees socioambientais (VAINER 2007) Todavia existem
dificuldades na articulaccedilatildeo entre os niacuteveis de planejamento e gestatildeo
(federal estadual regional municipal) especificidades da cultura
poliacutetica brasileira a degeneraccedilatildeo das instituiccedilotildees poliacuteticas e o vieacutes
tecno-burocraacutetico das poliacuteticas ambientais (VIEIRA 2006) Ao liberar
as forccedilas do capital das regulamentaccedilotildees do Estado o controle social
sobre os efeitos nocivos do uso exacerbado do meio ambiente pelos
interesses privados pode ser inviabilizado (ACSELRAD 1992b)
No que se refere agrave geraccedilatildeo de energia do Complexo Jorge
Lacerda a Tractebel natildeo sofre nenhum tipo de fiscalizaccedilatildeo O
Complexo Jorge Lacerda emite 42 milhotildees de toneladas de Dioacutexido de
Carbono (CO2) por ano (MONTEIRO 2008) A Fundaccedilatildeo do Meio
Ambiente (FATMA) autorizou a Tractebel a emitir 15667117
toneladasano de dioacutexido de enxofre Essa e as demais emissotildees
ultrapassam em muito os limites da Resoluccedilatildeo do Conselho Nacional do
Meio Ambiente (CONAMA) nordm 0890 e violam tambeacutem a Convenccedilatildeo da
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) sobre a Mudanccedila do Clima da
qual o Brasil eacute signataacuterio Em 2009 o Ministeacuterio Puacuteblico Federal
determinou que a Tractebel Energia SA realize uma auditoria
ambiental uma vez que sua atuaccedilatildeo tem como base um estudo de
impacto ambiental feito em 1986 (MPF 2009)
Jaacute o relatoacuterio de impacto ambiental da USITESC foi questionado
pela sociedade civil organizada e em alguns pontos pelo Ministeacuterio
Puacuteblico (SANTOS 2011 DIAS 2011) Segundo Dias (2011) o estudo
de impacto ambientalrelatoacuterio de impacto ambiental considerou apenas
os impactos da implantaccedilatildeo da usina termeleacutetrica desconsiderando os
empreendimentos acessoacuterios (reservatoacuterio de aacutegua ramal da Ferrovia
Tereza Cristina linha de transmissatildeo e terminal de amocircnia no porto de
ImbitubaSC) Foram feitos estudos complementares e o Ministeacuterio
Puacuteblico corroborou o licenciamento ambiental emitido pela FATMA
Se os estudos de impacto ambiental e relatoacuterios de impacto
ambiental satildeo a base para as tomadas de decisatildeo aleacutem da qualidade
documental a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo em associaccedilotildees locais eacute uma
conquista democraacutetica importante mas a praacutetica permanece precaacuteria
44
(SAacuteNCHEZ 2008b AGRA FILHO 2010) na medida em que o campo
ambiental eacute ldquoconstituiacutedo por posiccedilotildees hieraacuterquicas e relaccedilotildees de poder
muito desiguaisrdquo (ZHOURI 2008 p 99) Os empresaacuterios enaltecem os
benefiacutecios sociais dos empreendimentos e o governo tem demonstrado
atitudes controvertidas nos espaccedilos de negociaccedilatildeo e decisatildeo As
audiecircncias puacuteblicas passam de ldquo() um instrumento de avaliaccedilatildeo da
sustentabilidade socioambiental das obras para ser mero instrumento
viabilizador de um projeto de sociedade que tem no meio ambiente um
recurso material a ser explorado economicamenterdquo (ZHOURI 2008 p
101) Outro risco que se corre para aleacutem da negociaccedilatildeo caso a caso eacute
lidar ldquoapenas com a manifestaccedilatildeo superficial de questotildees mais
fundamentais e enraizadas ndash os conflitos de valores e princiacutepios baacutesicos
relativos agrave gestatildeo dos recursosrdquo (ACSELRAD BEZERRA 2010 p
52) Ou seja a preocupaccedilatildeo socioambiental acaba muitas vezes
limitada ao processo de avaliaccedilatildeo de impacto ambiental de casos
isolados sem levar em conta uma discussatildeo ampla e bem informada
sobre alternativas ao estilo de desenvolvimento hegemocircnico
A regiatildeo Sul catarinense convive com um problema socioambiental
considerado grave a saber os impactos negativos decorrentes da
mineraccedilatildeo e do uso do carvatildeo mineral e a construccedilatildeo da USITESC
demonstram a insistecircncia nesse estilo de desenvolvimento Levando em
conta a situaccedilatildeo-problema aqui descrita a questatildeo norteadora dessa tese
foi assim formulada Por que apesar da evoluccedilatildeo do debate sobre os
impactos socioambientais da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral e dos avanccedilos institucionais relacionados agrave questatildeo ambiental o sistema de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral vem sendo
ampliado em Santa Catarina
Partindo dessa questatildeo norteadora satildeo apresentados a seguir o enfoque
analiacutetico e os principais conceitos que ajudaram a delimitar essa tese
Enfoque analiacutetico
Desde a emergecircncia social e cientiacutefica da problemaacutetica
socioambiental a partir da deacutecada de 1960 podemos destacar avanccedilos
conceituais que se somam a progressos no conhecimento empiacuterico
sobre os problemas e ameaccedilas socioambientais e avanccedilos institucionais
da questatildeo ambiental Apesar dos avanccedilos os desafios da problemaacutetica
45
socioambiental satildeo ineacuteditos e possuem implicaccedilotildees epistemoloacutegicas
eacuteticas e poliacuteticas
O ecodesenvolvimento tem sido o ponto de confluecircncia dessa
reflexatildeo Mencionado pela primeira vez no acircmbito da Conferecircncia de
Estocolmo foi utilizado no decorrer da deacutecada de 1970 sendo
progressivamente marginalizado na deacutecada seguinte considerado como
um enfoque demasiadamente criacutetico e radical pela ideologia neoliberal
(SACHS 1986 VIEIRA 2006) O enfoque analiacutetico aqui apresentado
resgata o enfoque ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento enfatizando suas
trecircs dimensotildees (i) recursos naturais (ii) espaccedilo-territoacuterio e (iii) habitat
(compreendido como qualidade de vida)
No que se refere agrave primeira dimensatildeo satildeo consideradas as
contribuiccedilotildees do enfoque da gestatildeo de recursos comuns que vecircm
permeando o debate sobre os modos de apropriaccedilatildeo e gestatildeo No que diz
respeito agrave segunda dimensatildeo traz-se o enfoque do ecodesenvolvimento
territorial como uma possibilidade de operacionalizar o enfoque de
ecodesenvolvimento Por fim as contribuiccedilotildees agrave dimensatildeo do haacutebitat a
partir do enfoque de justiccedila ambiental e ecoloacutegica entendido como
capaz de contribuir na avaliaccedilatildeo da distribuiccedilatildeo dos benefiacutecios dos
riscos e danos ambientais assim como na reflexatildeo sobre redistribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo nas relaccedilotildees entre os seres humanos
destes com o meio ambiente com as futuras geraccedilotildees espeacutecies natildeo
humanas e processos ecossistecircmicos
O enfoque da gestatildeo de recursos comuns atraveacutes do Institutional Framework for Policy Analysis and Design (IAD) adaptado por
Oakerson (1992) oferece atraveacutes de quatro macro variaacuteveis uma forma
de descrever a gestatildeo de um dado recurso os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso as regras em uso que orientam a interaccedilatildeo dos
envolvidos na gestatildeo a arena de accedilatildeo que compreendem os espaccedilo nos
quais os envolvidos se relacionam e os resultados e consequecircncias da
gestatildeo A relaccedilatildeo entre essas macro variaacuteveis eacute dinacircmica e as mudanccedilas
da gestatildeo envolvem o aprendizado social adaptativo que se incorpora
ao modelo a partir das contribuiccedilotildees recentes do enfoque da cogestatildeo
adaptativa (ARMITAGE et al 2009 PLUMMER 2009 HOLLING
2001 BERKES 2009 CUNDILL 2010) Esse enfoque eacute importante
para o problema desta tese porque a descriccedilatildeo e anaacutelise das macro
variaacuteveis possibilita um diagnoacutestico e uma compreensatildeo mais ampla do
problema bem como um prognoacutestico avaliando estrateacutegias passiacuteveis de
serem colocadas em accedilatildeo visando a resoluccedilatildeo do problema inicial
46
A fim de complementar o enfoque da gestatildeo de recursos comuns
o enfoque do ecodesenvolvimento territorial reforccedila a ideia de que a
gestatildeo de recursos comuns deve ser analisada junto ao estilo de
desenvolvimento Para aleacutem da situaccedilatildeo especiacutefica do recurso
encontram-se as opccedilotildees de desenvolvimento que influenciam as macro
variaacuteveis acima listadas em todas as escalas espaciais do local ao global
(VIEIRA 2006)
Os enfoques da justiccedila ambiental e da justiccedila ecoloacutegica por sua
vez trazem a indissociabilidade da questatildeo ambiental e da questatildeo
democraacutetica enfatizando o fortalecimento do sistema democraacutetico como
condiccedilatildeo para a aprendizagem social adaptativa e como um caminho
para a reflexatildeo-accedilatildeo criacutetica em relaccedilatildeo agrave gestatildeo de recursos comuns e agraves
opccedilotildees de desenvolvimento A democracia (representativa e
participativa) eacute um ldquoelemento dardquo e uma ldquocondiccedilatildeo parardquo a justiccedila
ambiental e ecoloacutegica (SCHLOSBERG 2009)
No sistema democraacutetico eacute preciso identificar os mecanismos de
produccedilatildeo da injusticcedila ambiental entendida como distribuiccedilatildeo
desproporcional dos riscos e danos ambientais proteccedilatildeo ambiental
desigual e acesso desigual aos recursos naturais A justiccedila ambiental
centraliza sua anaacutelise na redistribuiccedilatildeo (que remete a aspectos
econocircmicos) e a justiccedila ecoloacutegica complementa com outras duas
dimensotildees o reconhecimento (que remete a aspectos culturais) e a
representaccedilatildeo (que remete a aspectos poliacuteticos) (FRASER 2009 2007
SCHLOSBERG 2009) A ampliaccedilatildeo da democracia e
consequentemente do aprendizado social adaptativo envolve estrateacutegias
dos segmentos sociais que considerem essas duas dimensotildees
Dessa forma o enfoque central utilizado nessa tese o
ecodesenvolvimento conta com as contribuiccedilotildees da gestatildeo de recursos
comuns do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila ambiental e da
justiccedila ecoloacutegica Mesmo diante da situaccedilatildeo-problema apresentada na
qual os problemas tendem a se acirrar com a ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica a combinaccedilatildeo dos enfoques permite aleacutem de um
diagnoacutestico visando compreender o problema a possibilidade de
atraveacutes do exame das dinacircmicas de desenvolvimento do sistema
democraacutetico e da aprendizagem social adaptativa identificar avanccedilos e
margens de manobra junto aos segmentos sociais que possibilitem o
questionamento da situaccedilatildeo e seu enfrentamento
47
Questotildees norteadoras
Por que apesar da evoluccedilatildeo do debate sobre os impactos
socioambientais da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral e dos avanccedilos
institucionais relacionados agrave questatildeo ambiental o sistema de geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral vem sendo ampliado em
Santa Catarina
Para auxiliar a questatildeo norteadora constam ainda as seguintes questotildees auxiliares
Quais condicionantes levam agrave ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica no Brasil e em Santa Catarina
Como as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento influenciam
as accedilotildees coletivas dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais
De que maneira os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais se
articulam para que a atividade carboniacutefera se mantenha e se
amplie
Como se deu o processo de licenciamento da Usitesc
Como se manifestam os problemas de reconhecimento e
representaccedilatildeo no processo de licenciamento
As accedilotildees coletivas estudadas tecircm gerado oportunidades para
processos de aprendizagem social adaptativa
Haacute indiacutecios de uma possiacutevel rota para uma democracia que
permita que os segmentos sociais intervenham efetivamente em
debates cada vez mais mediados por uma ciecircncia e tecnologia a
serviccedilo dos projetos dos segmentos econocircmicos e respaldados
pelos segmentos poliacuteticos
Hipoacuteteses
Partindo do pressuposto de que a democracia representativa e
participativa eacute um ldquoelemento dardquo e uma ldquocondiccedilatildeo parardquo a
justiccedila social ambiental e ecoloacutegica a falta de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e de representaccedilatildeo nos processos democraacuteticos
seria uma condiccedilatildeo favoraacutevel agrave produccedilatildeo de injusticcedila ambiental
48
e ecoloacutegica Dessa forma a hipoacutetese sustentada aqui eacute de que o
processo poliacutetico que resulta na ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de
energia termeleacutetrica envolve problemas de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo nos processos democraacuteticos em
todas as escalas espaciais (nacional estadual regional e local)
tanto na modalidade representativa quanto na modalidade
participativa
A tomada de consciecircncia dos limites da democracia
representativa e da democracia participativa faz com que os
segmentos sociais passem a investir em accedilotildees autocircnomas
favorecendo a aprendizagem social adaptativa
Objetivos
Compreender as contradiccedilotildees inerentes agrave ampliaccedilatildeo do sistema de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movido a carvatildeo mineral no Sul de
Santa Catarina agrave luz do enfoque hiacutebrido envolvendo gestatildeo de recursos
comuns ecodesenvolvimento territorial e justiccedila ambiental e ecoloacutegica
Como objetivos especiacuteficos destacam-se
Apontar as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento que
influenciam as accedilotildees coletivas dos segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais envolvidos na gestatildeo do carvatildeo mineral
Descrever a gestatildeo de recursos comuns no Brasil e em Santa
Catarina com ecircnfase no carvatildeo mineral
Compreender a maneira como os segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais envolvidos na gestatildeo se articulam em
relaccedilatildeo agrave gestatildeo de recursos comuns
Descrever o processo de licenciamento da Usitesc
Reconhecer os problemas de distribuiccedilatildeo reconhecimento e
representaccedilatildeo no processo de licenciamento e nas audiecircncias
puacuteblicas
Verificar ldquoserdquo e ldquocomordquo as accedilotildees coletivas estudadas tecircm
gerado oportunidades para processos de aprendizagem social
adaptativa e
49
Reconhecer indiacutecios de uma possiacutevel rota para uma democracia
que permita que os segmentos sociais intervenham efetivamente
em debates cada vez mais mediados por uma ciecircncia e
tecnologia a serviccedilo dos projetos dos segmentos econocircmicos e
respaldados pelos segmentos poliacuteticos
Justificativa
Satildeo muitos os caminhos que levam ateacute o tema e o problema da
tese Desde a apresentaccedilatildeo do projeto na ocasiatildeo do processo seletivo
da qualificaccedilatildeo agrave defesa e depois O permanente refletir duvidar
reconstruir o que se cristaliza no papel e vai aleacutem dele A aacuterdua tarefa de
tentar traduzir em palavras a dinacircmica complexa da qual todas e todos
satildeo parte
O tema do planejamento do desenvolvimento me acompanha
desde o mestrado e na ocasiatildeo da seleccedilatildeo do doutorado apresentei um
projeto cujo tema era planejamento e aquecimento global Nos anos
subsequentes nas oportunidades que tive para debater o projeto fui
desafiada a trazer o tema para a realidade do estado de Santa Catarina
E seguindo essa intuiccedilatildeo a partir da pesquisa exploratoacuteria entrei em
contato com o Manifesto por Justiccedila Climaacutetica formulado por
movimentos sociais do Sul de Santa Catarina que trazia a reflexatildeo sobre
as mudanccedilas climaacuteticas e a exploraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral para
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica no Sul de Santa Catarina Tive tambeacutem a
oportunidade de participar de uma saiacuteda de campo na bacia carboniacutefera
e ter contato direto com os impactos causados pela mineraccedilatildeo Essas
experiecircncias e as leituras foram gradativamente me ajudando a definir
o tema e o problema desta tese
Existe muito material jaacute produzido sobre a trajetoacuteria de
desenvolvimento e os impactos decorrentes da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo
mineral no Sul de Santa Catarina Aqui se objetivou uma breve siacutentese
de dados e de parte do material jaacute produzido pois a ecircnfase desta tese
recaiu sobre a identificaccedilatildeo de incoerecircncias na relaccedilatildeo entre as questotildees ambientais e o sistema democraacutetico mostrando que o funcionamento do
sistema poliacutetico eacute parte do problema e que as margens de manobra
existentes podem ser mais bem exploradas pelos movimentos sociais
que atuam na regiatildeo Como jaacute foi assinalado anteriormente apesar da
possibilidade de ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a
50
carvatildeo mineral no Sul de Santa Catarina o cenaacuterio atual eacute de
aguccedilamento dos conflitos bem maior do que nas deacutecadas anteriores
Nesse sentido a construccedilatildeo da USITESC eacute mais um elo de um
segmento que tem historicamente um caraacuteter eminentemente destrutivo
do ponto de vista socioecoloacutegico Resta confirmar se isto eacute um destino
inexoraacutevel em funccedilatildeo das caracteriacutesticas especiacuteficas da regiatildeo ou se
pode ser mudado num contexto de questionamento da loacutegica subjacente
agraves dinacircmicas do sistema democraacutetico que envolvem decisotildees sobre as
poliacuteticas ambientais energeacuteticas e poliacuteticas de desenvolvimento
No plano teoacuterico a contribuiccedilatildeo desta tese inscreve-se no
aprofundamento teoacuterico do enfoque ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento
agregando as contribuiccedilotildees dos enfoques da gestatildeo de recursos comuns
do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila ambiental e da justiccedila
ecoloacutegica O esforccedilo de juntar enfoques se justificou na medida em que
se um dos condicionantes da problemaacutetica socioambiental eacute a
fragmentaccedilatildeo do problema e a dificuldade de concebecirc-lo como
problema complexo (GARCIacuteA 1994) religar as perspectivas segundo
as quais observamos e analisamos a realidade faz parte tambeacutem das
estrateacutegias para o enfrentamento do problema
Dessa forma o diaacutelogo entre enfoques trouxe pontos de reflexatildeo
diferentes que enriqueceram a anaacutelise ao enfoque da gestatildeo de recursos
comuns a questatildeo das dinacircmicas de desenvolvimento e do sistema
poliacutetico ao ecodesenvolvimento territorial a preocupaccedilatildeo com a gestatildeo
de recursos comuns e com a desigualdade ambiental e agrave justiccedila
ambiental e ecoloacutegica a atenccedilatildeo agraves dinacircmicas de desenvolvimento e agrave
gestatildeo de recursos comuns Um ponto que merece destaque eacute o esforccedilo
recente das pesquisas sobre gestatildeo de recursos comuns e justiccedila
ambiental e ecoloacutegica de aplicar os enfoques para tratar as
especificidades do caso brasileiro Esta tese se inscreve como parte
desse esforccedilo
Outro ponto importante eacute a junccedilatildeo dos temas democracia e meio
ambiente no Brasil A democracia foi e eacute sem duacutevida um tema muito
caro agrave Sociologia brasileira e a inclusatildeo de um tema mais recente (o
meio ambiente) tambeacutem eacute considerada uma contribuiccedilatildeo possiacutevel dessa tese
Vale a pena ressaltar ainda que essa tese se insere nas atividades
realizadas pelos integrantes do Nuacutecleo Transdisciplinar de Meio
Ambiente e Desenvolvimento (NMD) vinculado ao Programa de Poacutes-
51
Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica O Nuacutecleo atua no litoral Centro Sul
de Santa Catarina haacute mais de dez anos Dentre as atividades
desenvolvidas pelo NMD inclui-se a participaccedilatildeo no Observatoacuterio do
Litoral Catarinense que tem como objetivo
Organizar e coordenar uma rede de apoio teacutecnico-
cientiacutefico ao Ministeacuterio Puacuteblico Federal e
Estadual tendo em vista a promoccedilatildeo de um estilo
de gestatildeo democraacutetico-participativa de conflitos
relacionados agrave apropriaccedilatildeo dos recursos
ambientais existentes na zona costeira e o
consequente fortalecimento da cidadania
ambiental no Paiacutes (OBSERVATOacuteRIO DO
LITORAL 2010)
Como parte das atividades do Observatoacuterio do Litoral
Catarinense a realizaccedilatildeo de pesquisas sobre meio ambiente e
desenvolvimento auxilia na elaboraccedilatildeo de diagnoacutesticos e prognoacutesticos e
pode favorecer a mobilizaccedilatildeo jaacute que a visibilidade dos problemas
existentes pode estimular a criaccedilatildeo de redes visando a criaccedilatildeo de
estrateacutegias integradas para enfrentamento dos problemas
Essa tese tambeacutem faz parte de um esforccedilo mais amplo de
pesquisa articulado pelo edital da Coordenadoria de Aperfeiccediloamento de
Pessoal de Niacutevel Superior (CAPES) Ciecircncias do Mar tendo como tema
a Gestatildeo Integrada e Compartilhada de Territoacuterios Marinho-Costeiros O projeto possibilitou o compartilhamento do objeto de estudo do
marco conceitual e epistecircmico e a articulaccedilatildeo dos estudos entre os
membros da equipe
Em siacutentese dentre os possiacuteveis aspectos inovativos do trabalho
destacam-se do ponto de vista praacutetico o olhar sobre a questatildeo da
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral a partir do
funcionamento do sistema democraacutetico a identificaccedilatildeo dos
condicionantes da ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica em
diferentes escalas e consequentemente o reconhecimento de limites e
das possibilidades do sistema democraacutetico e da aprendizagem social
adaptativa Do ponto de vista teoacuterico destacam-se o diaacutelogo entre os
enfoques e a aplicaccedilatildeo dos enfoques agraves especificidades brasileiras
Metodologia
52
O agravamento dos problemas socioambientais tem povoado o
debate nos campos de especializaccedilatildeo cientiacutefica seja para a criaccedilatildeo de
novas disciplinas seja para ir aleacutem da fragmentaccedilatildeo disciplinar ldquoA
problemaacutetica socioambiental constituiacute um vigoroso instrumento de
integraccedilatildeo de conceitos teorias e meacutetodos desenvolvidos em
praticamente todas as especialidades cientiacuteficasrdquo (VIEIRA 1993 p
26) A epistemologia das ciecircncias ambientais entra como uma
importante contribuiccedilatildeo para a pesquisa ambiental Ela considera a
complexidade inerente agrave crise socioambiental privilegiando uma visatildeo
integrada do problema socioecoloacutegico e da ciecircncia no acircmbito do novo
paradigma sistecircmico Neste sentido a busca de integraccedilatildeo inter e
transdisciplinar do conhecimento emerge como um elemento essencial
no enfrentamento da crise (GARCIacuteA 1994 JOLLIVET PAVEacute 2000
MORIN 2002)
A tese aqui apresentada se insere nesse esforccedilo de pesquisa Para
tanto a construccedilatildeo da tese considerou sete etapas (a pergunta de partida
a exploraccedilatildeo a problemaacutetica a construccedilatildeo do modelo de anaacutelise a
observaccedilatildeo a anaacutelise das informaccedilotildees e as conclusotildees) segundo os trecircs
princiacutepios do procedimento cientiacutefico em ciecircncias sociais (ruptura
construccedilatildeo e verificaccedilatildeo) (BOURDIEU CHAMBOREDON
PASSERON 2004 QUIVY CAMPENHOUDT 1998)
Apesar de haver uma sequecircncia loacutegica as etapas subsequentes
influenciaram a reelaboraccedilatildeo das etapas precedentes As etapas
estiveram ao longo do processo em permanente interaccedilatildeo (QUIVY
CAMPENHOUDT 1998)
Se eacute evidente que os automatismos adquiridos
podem permitir a economia de uma invenccedilatildeo
permanente devemos nos abster de deixar crer
que o sujeito da invenccedilatildeo cientiacutefica eacute um
automaton spirituale obedecendo aos
mecanismos bem ajustados de uma programaccedilatildeo
metodoloacutegica constituiacuteda uma vez por todas e
confinar dessa forma o pesquisador na submissatildeo
cega ao programa que exclui o retorno reflexivo
ao mesmo condiccedilatildeo da invenccedilatildeo de novos
programas (BOURDIEU CHAMBOREDON
PASSERON 2004 p 15)
53
Dessa forma a evoluccedilatildeo dessa tese natildeo foi linear As quatro
primeiras etapas (a pergunta de partida a exploraccedilatildeo a problemaacutetica e a
construccedilatildeo do modelo de anaacutelise) jaacute apresentadas nessa introduccedilatildeo satildeo
tratadas a seguir de forma a indicar como se deu o processo de sua
construccedilatildeo
1ordf etapa (A pergunta de partida) Foi sendo elaborada e
reelaborada ao longo das vaacuterias etapas da pesquisa
2ordf etapa (A exploraccedilatildeo) Essa etapa compreendeu conversas com
o orientador leituras e entrevistas exploratoacuterias Nessa etapa destacou-se
uma saiacuteda de campo no ano de 2010 agrave Bacia do Rio Araranguaacute
supervisionada pelo Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes e Profordf Drordf
Vanilde Citadini Zanette da Universidade do Extremo Sul Catarinense
(UNESC) Essa saiacuteda de campo foi fundamental para despertar o
interesse pelo problema da extraccedilatildeo e uso do carvatildeo mineral no Sul do
Estado
Foi feita uma entrevista exploratoacuteria com Tadeu Santos da
Organizaccedilatildeo Natildeo Governamental (ONG) Soacutecios da Natureza com sede
em Araranguaacute e conversas informais com estudantes da Poacutes-Graduaccedilatildeo
em Auditoria e Periacutecia Ambiental da UNESC em 2010 e 2012
Etapa 3 (A problemaacutetica) e Etapa 4 (A construccedilatildeo do modelo de
anaacutelise) Destacam-se tambeacutem nessa fase aleacutem das conversas com o
orientador as leituras e o esforccedilo de preparaccedilatildeo do projeto para
qualificaccedilatildeo que ocorreu em 2011 contando com as contribuiccedilotildees do
Prof Dr Carlyle Bezerra de Menezes da UNESC do Prof Dr Luiz
Fernando Scheibe do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Geografia da
Universidade Federal de Santa Catarina e da Profordf Drordf Janice Pontes
Tirelli do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Sociologia Poliacutetica da UFSC
O projeto foi tambeacutem discutido no acircmbito do NMD em alguns
seminaacuterios de pesquisa na disciplina de Ecologia Humana (ministrada
pela ProfordfDrordf Marcia Grisotti e pelo Prof Dr Fernando Dias Aacutevila
Pires) em 2010 nas duas disciplinas de seminaacuterio de pesquisa uma
ministrada pela Profordf Drordf Elizabeth Farias da Silva (na qual o projeto
foi debatido pelo Prof Dr Daniel Silva) e outra ministrada pelo Prof
Dr Raul Burgos no ano de 2011 O projeto tambeacutem foi apresentado e debatido no Nuacutecleo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional (NPDR)
da Universidade Regional de Blumenau (FURB) coordenado pelo Prof
Dr Ivo Marcos Theis e em dois eventos do Projeto Gestatildeo Integrada e Compartilhada de Territoacuterios Marinho-Costeiros em 2011 e 2012
54
Etapa 5 ndash A observaccedilatildeo Nessa etapa o modelo de anaacutelise foi
submetido aos fatos e confrontado com os dados observaacuteveis Aqui satildeo
respondidas as questotildees baacutesicas o que foi observado Em que observou-se E como observou-se
O procedimento da pesquisa foi bibliograacutefico e documental Na
pesquisa bibliograacutefica foram selecionadas fontes secundaacuterias (obras e
artigos) que tratavam do tema de estudo jaacute reconhecidas no domiacutenio
cientiacutefico e na pesquisa documental foram priorizadas fontes primaacuterias
(escritas e audiovisuais) que ateacute entatildeo natildeo haviam recebido tratamento
cientiacutefico (SAacute-SILVA ALMEIDA GUIDANI 2009)
Os discursos da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo
Mineral foram acessados atraveacutes de consulta agrave Cacircmara de Deputados
pelo correio eletrocircnico Os dados sobre prestaccedilatildeo de contas eleitorais
foram acessados atraveacutes do banco de dados online do TSE O processo
de licenciamento da USITESC arquivado na FATMA conta com oito
volumes e 1617 paacuteginas e com arquivos audiovisuais de duas das quatro
audiecircncias puacuteblicas (FATMA 2013) Das quatro audiecircncias puacuteblicas
realizadas soacute foram disponibilizadas as gravaccedilotildees da terceira e da quarta
audiecircncia (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006 2007) Segundo informaccedilatildeo
da FATMA a primeira e a segunda audiecircncia puacuteblica foram gravadas em
VHS e foram danificadas pela accedilatildeo do tempo
A descriccedilatildeo das macro variaacuteveis (as dinacircmicas de
desenvolvimento os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos as regras em uso a
arena de accedilatildeo e os resultadosconsequecircncias) foi feita atraveacutes da
pesquisa bibliograacutefica a fontes secundaacuterias (obras e artigos) Jaacute a
variaacutevel do sistema democraacutetico contou com fontes primaacuterias os
discursos da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral na
Cacircmara dados sobre prestaccedilatildeo de contas eleitoral do Tribunal Superior
Eleitoral e os documentos referentes ao processo de licenciamento
ambiental da USITESC arquivados na FATMA
Na arena de accedilatildeo um primeiro passo foi descrever os envolvidos
na gestatildeo Para tanto os envolvidos foram divididos em segmentos
poliacuteticos econocircmicos e sociais que por sua vez foram subdivididos Os
segmentos poliacuteticos em executivo parlamento e autocircnomo os segmentos econocircmicos em associaccedilotildees empresariais e mistas e empresas
e cooperativas e os segmentos sociais em trabalhadores
afetadosatingidosameaccedilados ONG e academia (Quadro 1) Os
segmentos natildeo apresentam um posicionamento homogecircneo em relaccedilatildeo
ao tema da tese Ao longo do texto a preocupaccedilatildeo eacute tambeacutem de
55
explicitar os diferentes posicionamentos entre e no interior de cada
segmento
Quadro 1 ndash Divisatildeo dos envolvidos na gestatildeo por segmentos SEGMENTOS ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO
Poliacuteticos Executivo
Parlamento
Autocircnomo
Econocircmicos Associaccedilotildees empresariais e mistas
Empresas
Cooperativas
Sociais Trabalhadores
AfetadosAtingidosAmeaccedilados
Organizaccedilotildees Natildeo Governamentais
Academia
Fonte baseada em Oliveira (2013)
A existecircncia de afetados atingidos e ameaccedilados se inscreve no
reconhecimento e legitimaccedilatildeo de direitos A legislaccedilatildeo ambiental faz
com que os impactos passem a ser considerados e se existem impactos
existem seres humanos que satildeo afetados atingidos e ameaccedilados
(VAINER 2008) A distinccedilatildeo entre os termos afetados atingidos e
ameaccedilados remete agrave proximidade dos seres humanos em relaccedilatildeo aos
impactos Nos afetados o impacto fica num limiar tecircnue entre o direto e
indireto nos atingidos o impacto eacute direto e nos ameaccedilados o impacto eacute
potencialmente indireto
Uma variaacutevel importante na arena de accedilatildeo eacute a democracia que
por sua vez envolve a questatildeo da representaccedilatildeo e da participaccedilatildeo A
expressatildeo cidadatilde atraveacutes da representaccedilatildeo se daacute principalmente nas
eleiccedilotildees plebiscitos e conselhos Jaacute a expressatildeo mediante participaccedilatildeo
pode ser accedilatildeo sob convite (planejamento participativo consulta puacuteblica
e mediaccedilatildeo) e accedilatildeo autocircnoma (lobby peticcedilotildees manifestaccedilotildees
campanhas na imprensa outros) (Figura 1) (SAacuteNCHEZ 2008b)
56
Figura 1ndash Tipologia das formas de expressatildeo do cidadatildeo numa
democracia
Fonte Adaptado de Sagravenchez (2008b p 409)
Na anaacutelise do sistema democraacutetico foi importante identificar as
dimensotildees da justiccedila ambiental (redistribuiccedilatildeo) e da justiccedila ecoloacutegica
(reconhecimento e representaccedilatildeo) ldquoO natildeo reconhecimento eacute uma
questatildeo de impedimentos externamente manifestados e publicamente
verificaacuteveis a que certos indiviacuteduos sejam membros integrais da
sociedaderdquo (FRASER 2007 p 114) O centro normativo da concepccedilatildeo
de Fraser (2007) eacute a paridade de participaccedilatildeo que demanda uma
condiccedilatildeo objetiva e outra intersubjetiva A condiccedilatildeo objetiva ldquoexclui formas e niacuteveis de desigualdade material e dependecircncia econocircmica que
impedem a paridade de participaccedilatildeordquo (FRASER 2007 p 119) A
condiccedilatildeo intersubjetiva ldquoexclui normas institucionalizadas que
sistematicamente depreciam algumas categorias de pessoas e as
caracteriacutesticas associadas a elasrdquo (FRASER 2007 p 120)
57
Quadro 2 - Quadro de anaacutelise do sistema democraacutetico agrave luz da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica
DIMENSOtildeES DO SISTEMA
DEMOCRAacuteTICO
ESTRATEacuteGIAS DA JUSTICcedilA
AMBIENTAL E ECOLOacuteGICA
- Redistribuiccedilatildeo
- Reconhecimento e
- Representaccedilatildeo
- Produccedilatildeo do conhecimento proacuteprio
- Pressatildeo pela aplicaccedilatildeo universal das
leis
- Pressatildeo pelo aperfeiccediloamento da
legislaccedilatildeo de ambiental
- Pressatildeo por novas racionalidades no
exerciacutecio do poder estatal
- Introduccedilatildeo de procedimentos de
avaliaccedilatildeo de equidade ambiental
- Accedilatildeo direta e difusatildeo espacial do
movimento
Fonte Adaptado de Acselrad Mello Bezerra (2009) e Fraser (2009
2007)
As dimensotildees e estrateacutegias da justiccedila ambiental e ecoloacutegica
presentes no Quadro acima entraram no modelo de anaacutelise dessa tese
como indicadores da aprendizagem social adaptativa
Quanto aos meacutetodos de anaacutelise priorizou-se a anaacutelise estatiacutestica e
a anaacutelise do discurso Anaacutelise estatiacutestica privilegiou a interpretaccedilatildeo dos
dados atraveacutes do modelo de anaacutelise buscando ir aleacutem da mera exposiccedilatildeo
de resultados A anaacutelise do discurso aqui proposta ficou num limiar
entre essa modalidade e a anaacutelise de conteuacutedo As categorias utilizadas
estatildeo dispostas no quadro da paacutegina 56 Elas orientaram a seleccedilatildeo de
passagens relevantes nas audiecircncias puacuteblicas analisadas com o
propoacutesito de revelar aspectos da atividade cognitiva do locutor dos
significados sociais e poliacuteticos do discurso (GILL 2002 QUIVY
CAMPENHOUDT 1998 RESENDE RAMALHO 2006)
O processo da tese aqui descrito natildeo foi linear Para Quivy e
Campenhoudt (1998 p 236) ldquoum processo de diaacutelogo e de vaiveacutens
permanentes entre teoria e empirismo mas tambeacutem entre construccedilatildeo e
intuiccedilatildeo que estatildeo mais imbricadasrdquo
As etapas 6 e 7 (Anaacutelise de informaccedilotildees e Conclusotildees)
correspondem ao ldquocorpordquo da tese apresentado na sequecircncia
58
Estrutura da tese
Essa tese foi dividida em sete capiacutetulos O primeiro capiacutetulo eacute
esta introduccedilatildeo dedicada agrave siacutentese dos principais pontos que nortearam a
tese O segundo capiacutetulo busca resgatar a contribuiccedilatildeo do enfoque
ldquoclaacutessicordquo do ecodesenvolvimento agregando com o enfoque da gestatildeo
de recursos comuns do ecodesenvolvimento territorial e da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica elementos que satildeo incorporados no modelo de
anaacutelise e que conferem uma atualidade maior agrave discussatildeo No terceiro
capiacutetulo e quarto capiacutetulo eacute feita uma descriccedilatildeo da gestatildeo de recursos
comuns do Brasil e de Santa Catarina enfatizando as particularidades do
carvatildeo mineral A preocupaccedilatildeo presente nos dois capiacutetulos eacute de realizar
um balanccedilo dos fatores que estimulam a ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral e os fatores que podem favorecer
o questionamento da ampliaccedilatildeo bem como tratar dos limites e
possibilidades do sistema democraacutetico e possibilidades de aprendizagem
social adaptativa O quinto capiacutetulo trata da rede de influecircncia entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos no campo da democracia
representativa tratando a relaccedilatildeo entre doaccedilotildees de campanha e apoio
poliacutetico a causa do carvatildeo mineral O sexto capiacutetulo trata da ampliaccedilatildeo
da energia termeleacutetrica atraveacutes do caso da USITESC no Sul de Santa
Catarina buscando atraveacutes da anaacutelise do processo de licenciamento
compreender os condicionantes locais da ampliaccedilatildeo O seacutetimo e uacuteltimo
capiacutetulo faz uma siacutentese dos principais pontos discutidos na tese
2 A ATUALIDADE DO ECODESENVOLVIMENTO NO ESTUDO
CONTEMPORAcircNEO SOBRE GESTAtildeO DE RECURSOS
COMUNS
O surgimento de uma problemaacutetica de pesquisa envolve o
amadurecimento dos olhares com os quais se observa analisa e
empreende esforccedilos para transformar a realidade A problemaacutetica
socioambiental natildeo surge em um lugar especiacutefico e num tempo
determinado Surge em paiacuteses diferentes em eacutepocas diferentes As
formas variadas de delimitaccedilatildeo da situaccedilatildeo-problema e da construccedilatildeo da
problemaacutetica correspondente envolvem as diferentes percepccedilotildees dos
cidadatildeos bem como o protagonismo dos foacuteruns locais e movimentos
sociais o envolvimento da comunidade cientiacutefica e a busca de respostas
poliacuteticas agrave altura dos desafios identificados
No final da deacutecada de 1960 a problemaacutetica socioambiental
assume um perfil de crise global ensejando a realizaccedilatildeo de vaacuterios
eventos sobre o tema Numa visatildeo retrospectiva e criacutetica do surgimento
do Clube de Roma em 1968 agrave realizaccedilatildeo da Rio +20 em 2012 muitos
avanccedilos e retrocessos podem ser apontados no espectro que se estende
do questionamento radical do estilo de desenvolvimento hegemocircnico
visto como condicionante da crise socioambiental agrave incorporaccedilatildeo da
crise soacutecio ecoloacutegica na reproduccedilatildeo da loacutegica economicista no campo do
planejamento e da gestatildeo das experiecircncias de gestatildeo dos recursos
comuns agrave caracterizaccedilatildeo da Trageacutedia dos Comuns (HARDIN 1980)
das denuacutencias de injusticcedila ambiental e ecoloacutegica agrave constataccedilatildeo da
violecircncia estrutural embutida na persistecircncia das assimetrias de riqueza
e poder envolvendo os dois hemisfeacuterios (ESTEVA 2001 FENNY et
al 2001 SACHS 1993)
Desde sua origem um desafio que acompanha essa problemaacutetica
refere-se agrave dificuldade de se lidar (na pesquisa cientiacutefica e nos espaccedilos
de tomada de decisatildeo poliacutetica) com dinacircmicas natildeo lineares de
dinamizaccedilatildeo socioeconocircmica e recriaccedilatildeo cultural envolvendo para tanto
a coordenaccedilatildeo de processos transescalares num horizonte de
planejamento de longo prazo Neste contexto vem se tornando cada vez mais evidente a capacidade ainda bastante restrita de cientistas gestores
e agentes governamentais de compreender e tratar a complexidade
inerente agrave teia de interdependecircncias que configura a coordenaccedilatildeo da
dinacircmica de sistemas socioecoloacutegicos que envolve diferentes niacuteveis e
escalas espaciais (BERKES FOLKE 1998 CASHet al 2006)
60
Levando em conta essas consideraccedilotildees gerais o objetivo deste
capiacutetulo eacute discutir a atualidade do enfoque de ecodesenvolvimento e por
implicaccedilatildeo da necessidade de dotaacute-lo da capacidade de assegurar a
coerecircncia das regras que norteiam a gestatildeo dos modos de apropriaccedilatildeo
dos recursos comuns nas diferentes escalas espaciais Parte-se assim da
premissa segundo a qual a efetividade de experiecircncias compatiacuteveis com
os fundamentos deste enfoque dependeraacute de uma consideraccedilatildeo mais
precisa do papel da democracia e da aprendizagem social adaptativa nos
processos de gestatildeo de recursos comuns Para tanto leva-se em conta o
lento processo de elaboraccedilatildeo do enfoque ldquoclaacutessicordquo de
ecodesenvolvimento com a incorporaccedilatildeo sucessiva dos debates sobre (i)
gestatildeo de recursos comuns (ii) ecodesenvolvimento territorial e (iii)
justiccedila ambiental e ecoloacutegica
Em siacutentese defende-se o ponto de vista segundo o qual a gestatildeo
de recursos comuns internaliza os criteacuterios de promoccedilatildeo da justiccedila
ambiental e ecoloacutegica na produccedilatildeo-reproduccedilatildeo-superaccedilatildeo da siacutendrome
de violecircncia estrutural que caracteriza a dinacircmica de globalizaccedilatildeo
assimeacutetrica Por sua vez o enfoque de ecodesenvolvimento territorial
focaliza este debate de uma perspectiva mais ampla insistindo na
complexidade envolvida na construccedilatildeo de dinacircmicas territoriais de
desenvolvimento ecologicamente prudente no atual cenaacuterio ldquopoacutes-
fordistardquo
O capiacutetulo estaacute dividido em quatro seccedilotildees contando com essa
introduccedilatildeo A seccedilatildeo seguinte delineia o contexto de emergecircncia da
problemaacutetica socioambiental e do enfoque de ecodesenvolvimento Na
sequecircncia satildeo apresentadas as dimensotildees do conceito sistecircmico de meio
ambiente assumidas pelos estudiosos do ecodesenvolvimento
relacionando-as com as maneiras pelas quais as linhas de reflexatildeo sobre
gestatildeo de recursos comuns ecodesenvolvimento territorial e justiccedila
ambiental e ecoloacutegica focalizam suas anaacutelises Finalmente na quarta
seccedilatildeo avaliam-se as possibilidades e os limites de um esforccedilo de
hibridizaccedilatildeo dessas vaacuterias linhas de reflexatildeo tendo em vista uma
caracterizaccedilatildeo mais rigorosa do conceito de co-gestatildeo adaptativa face agraves
novas configuraccedilotildees do processo de globalizaccedilatildeo econocircmica e cultural
61
21 RESGATE DO ENFOQUE ldquoCLAacuteSSICOrdquo DE
ECODESENVOLVIMENTO
Mar que se encontra na beira do mar congelado do
Norte No inverno todas as palavras e sons da
regiatildeo satildeo congelados na primavera comeccedilam a
degelar e podem ser claramente ouvidos Os
viajantes podem apanhar as palavras congeladas
que se parecem com doces cristalizados de vaacuterias
cores (Franccedilois Rabelais 1991)
A percepccedilatildeo de que a crise socioambiental decorre
fundamentalmente da reproduccedilatildeo de um estilo de desenvolvimento que
hipertrofia a dimensatildeo do crescimento econocircmico ilimitado e eacute
insensiacutevel a uma avaliaccedilatildeo multidimensional de custos sociais e
ecoloacutegicos passou a ser discutida em vaacuterios encontros internacionais
desde o final da deacutecada de 1960 Vaacuterios termos foram sendo criados nos
debates que vecircm sendo conduzidos desde entatildeo Alguns deles foram
esquecidos e outros foram ressignificados visando pontuar as criacuteticas
mais ou menos radicais ao modelo neoliberal hegemocircnico O resgate
dessa polissemia contribui para alimentar a reflexatildeo contemporacircnea e o
aprendizado obtido ao longo das quatro uacuteltimas deacutecadas na concepccedilatildeo
de estrateacutegias de superaccedilatildeo deste modelo Alguns termos atualizam o
modelo de desenvolvimento hegemocircnico incorporando marginalmente
a questatildeo socioecoloacutegica outros se abrem a experimentaccedilotildees criativas
com projetos que subvertem o mainstream da economia do
desenvolvimento O ecodesenvolvimento e o desenvolvimento
sustentaacutevel tratados nessa seccedilatildeo representam dois contrapontos desse
movimento sem duacutevida incerto e controvertido
Maurice Strong utilizou pela primeira vez o conceito de
ecodesenvolvimento no contexto da Conferecircncia de Estocolmo
organizada pela ONU em 1972 A ideia foi reelaborada e sistematizada
de forma pioneira num artigo publicado por Ignacy Sachs em 19741 na
eacutepoca atuando como coordenador do primeiro coletivo interdisciplinar
de pesquisa sistecircmica voltada para a internalizaccedilatildeo da variaacutevel
socioecoloacutegica no campo das teorias do desenvolvimento Deste ponto
1 Em um estudo que foi realizado no acircmbito do Programa das Naccedilotildees Unidas
para o Meio Ambiente (PNUMA) no ano referido e reproduzido em Sachs
(1986 2007)
62
de vista a noccedilatildeo de ecodesenvolvimento foi veiculada como uma
resposta possiacutevel de caraacuteter experimental agrave ideologia que identifica o
desenvolvimento com a supervalorizaccedilatildeo do crescimento econocircmico
sobre o pano de fundo de uma visatildeo tecnocraacutetica dos sistemas de
planejamento e gestatildeo Na contramatildeo do modelo de desenvolvimento
hegemocircnico o enfoque de ecodesenvolvimento foi desenhado com base
numa plataforma normativa composta pelos seguintes criteacuterios
interdependentes (i) satisfaccedilatildeo de necessidades baacutesicas (materiais e
intangiacuteveis) (ii) autonomia local (ou self reliance) (iii) prudecircncia
ecoloacutegica e (iv) eficiecircncia econocircmica a ser reavaliada com base no
debate sobre limites do crescimento material e da prospectiva ecoloacutegica
(SACHS 1986)
O Coloacutequio de Cocoyoc realizado no Meacutexico em 1974
significou uma tentativa bem sucedida de reenfatizar a importacircncia da
dimensatildeo geopoliacutetica na estruturaccedilatildeo do arcabouccedilo metodoloacutegico do
enfoque de ecodesenvolvimento Acreditava-se assim que ldquouma luta
efetiva contra o subdesenvolvimento demandaria o questionamento do
sobredesenvolvimento dos ricosrdquo (SACHS 2009 p 243) Naquela
eacutepoca falar em contracultura e natildeo-crescimento em natildeo repetir nos
paiacuteses do Sul o mesmo caminho percorrido pelos paiacuteses
industrializados num cenaacuterio marcado pela Guerra Fria parecia no
miacutenimo um gesto inconsequente e provocativo Desde entatildeo o conceito
foi eclipsado no acircmbito do sistema onusiano Mas ressurgiu com novas
roupagens vinte anos depois por ocasiatildeo da Cuacutepula da Terra Os
conceitos de desenvolvimento sustentaacutevel e Agenda 21 passaram a
representar os dois principais pontos de referecircncia do debate social
voltado para o enfrentamento da crise global (SACHS 2009 SACHS
2007 VIEIRA 2005)
Seria importante salientar que o Relatoacuterio Nosso Futuro Comum
publicado pela Comissatildeo Brundtland em1987 contribuiu para
aprofundar a discussatildeo em torno do conceito de sustentabilidade Este
texto enfatiza a necessidade de se colocar em primeiro plano nas
agendas governamentais a busca de satisfaccedilatildeo das necessidades da
geraccedilatildeo atual mas sem desconsiderar as geraccedilotildees futuras (CMMAD
1988)
Existem certamente semelhanccedilas entre os conceitos de
ecodesenvolvimento e desenvolvimento sustentaacutevel na medida em que
ambos colocam em primeiro plano a adoccedilatildeo de uma visatildeo de longo
prazo na busca de enfrentamento da crise socioecoloacutegica e de uma
63
incorporaccedilatildeo sistemaacutetica dos atores locais nos processos de tomada de
decisatildeo sobre dinacircmicas alternativas de desenvolvimento Mas apesar
das semelhanccedilas existem diferenccedilas marcantes que tecircm sido objeto de
um volume crescente de contribuiccedilotildees acadecircmicas As mais importantes
referem-se ao contraste entre a radicalidade embutida na cosmovisatildeo
sistecircmico-complexa assumida pelos adeptos do ecodesenvolvimento e o
vieacutes de ldquoeconomicizaccedilatildeo da ecologiardquo que continua a nortear as
propostas dos arquitetos de uma ldquoeconomia verderdquo Satildeo evidentes os
reflexos desse debate na maneira de se levar em conta as assimetrias
Norte-Sul a promoccedilatildeo da equidade inter e transgeracional os riscos
embutidos nas inovaccedilotildees tecnoloacutegicas inspiradas na siacutendrome de
mercantilizaccedilatildeo indiscriminada de todas as dimensotildees da vida em
sociedade e a hipertrofia da economia de mercado na dinacircmica de
mundializaccedilatildeo
A experimentaccedilatildeo de estrateacutegias de ecodesenvolvimento vem sendo
associada ao questionamento dos fundamentos epistemoloacutegicos eacuteticos e
poliacuteticos do modelo de desenvolvimento que se tornou hegemocircnico nos
dois hemisfeacuterios para aleacutem da ldquooacutetica simplificadora e alienada dos
paradigmas culturais dominantesrdquo (VIEIRA 2005 p 357) Dessa
forma contesta o efeito de imitaccedilatildeo deste modelo pelos paiacuteses do Sul
apostando na fecundidade da pesquisa de um novo projeto civilizador
inspirado numa nova cosmologia e nos princiacutepios de ecossocioeconomia
e convivialidade (LAYRARGUES 1997 SACHS 2007 KAPP 1987
ILLICH 1973)
22 AS CONTRIBUICcedilOtildeES DE DIFERENTES ENFOQUES
Como foi sugerido o ecodesenvolvimento pode ser encarado
como ponto de partida para a reflexatildeo-elaboraccedilatildeo-implementaccedilatildeo de
novos projetos de sociedade e como ponto de convergecircncia das linhas
de reflexatildeo centradas nas noccedilotildees de gestatildeo de recursos comuns
territorializaccedilatildeo das dinacircmicas de desenvolvimento e justiccedila ambientalecoloacutegica O desenho e a concretizaccedilatildeo de estrateacutegias de
gestatildeo levam em conta as dimensotildees essenciais do conceito sistecircmico de meio ambiente incorporado ao modelo de anaacutelise de alternativas de
desenvolvimento territorializado a saber a base de recursos naturais o
espaccedilo-territoacuterio e a qualidade dos haacutebitats (GODARD SACHS 1975
SACHS 1993 1986 VIEIRA 2005 1993) Dessa forma
64
() o ambiente eacute concebido como um fornecedor
de recursos naturais e um receptor de dejetos da
accedilatildeo antroacutepica um espaccedilo-territoacuterio onde
ocorrem as interaccedilotildees entre processos sociais e
ecoloacutegicos e um haacutebitat pensado em sentido
amplo integrando a dimensatildeo da qualidade de
vida das populaccedilotildees (VIEIRA 2006 p 346)
No quadro abaixo essas dimensotildees encontram-se relacionadas
com as trecircs linhas de reflexatildeo que aqui foram incorporadas ao enfoque
de ecodesenvolvimento
Quadro 3 ndash O enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento e as
dimensotildees baacutesicas do conceito sistecircmico de meio ambiente Enfoque central Ecodesenvolvimento
Dimensotildees do
conceito de meio
ambiente
Recursos
naturais Espaccedilo-territoacuterio
Haacutebitat-
qualidade de
vida
Enfoques
complementares
Gestatildeo de
recursos comuns
Desenvolvimento
territorial
Justiccedila ambiental
e ecoloacutegica
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na perspectiva do enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento a
dimensatildeo dos recursos naturais refere-se agrave busca de preservaccedilatildeo e
economia de recursos renovaacuteveis e natildeo renovaacuteveis de valorizaccedilatildeo de
recursos locais subutilizados eou ainda desconhecidos e de promoccedilatildeo
da soberania alimentar e energeacutetica O enfoque de gestatildeo de recursos
comuns ao oferecer uma nova perspectiva de abordagem dos desafios
colocados pela regulaccedilatildeo das modalidades de acesso e uso da base de
recursos naturais pode ser tomado como um ponto de referecircncia Nessa
perspectiva o termo recurso comum avanccedila em relaccedilatildeo aos termos
recurso natural renovaacutevel e recurso natural natildeo renovaacutevel O fato de
serem renovaacuteveis ou natildeo tem relaccedilatildeo com a disponibilidade e
reprodutibilidade dos recursos O termo recurso comum envolve duas
caracteriacutesticas baacutesicas a exclusatildeo ou controle do acesso que eacute
problemaacutetica e o uso que se faz do recurso subtrai aquilo que pertence a todos que tambeacutem coloca em questatildeo o uso compartilhado (BERKES
2005a) As pesquisas em curso ressaltam a importacircncia da participaccedilatildeo
das populaccedilotildees nas tomadas de decisatildeo e da consideraccedilatildeo da
65
complexidade envolvida nas interaccedilotildees transescalares nas dinacircmicas de
planejamento e gestatildeo (VIEIRA 2005)
Por sua vez na internalizaccedilatildeo da dimensatildeo do espaccedilo-territoacuterio a
ecircnfase eacute colocada na organizaccedilatildeo territorial das atividades produtivas
tendo em vista a minimizaccedilatildeo dos desequiliacutebrios nas configuraccedilotildees
rural-urbanas ndash a exemplo do ecircxodo rural e da hiperurbanizaccedilatildeo O
ecodesenvolvimento territorial sensiacutevel agrave variaacutevel socioecoloacutegica acena
com a inclusatildeo da dimensatildeo territorial no planejamento de novas
estrateacutegias de desenvolvimento favorecendo assim o enfrentamento dos
problemas de compatibilidade entre diferentes tipos de atividades
econocircmicas e os demais aspectos que compotildeem a dinacircmica de
coordenaccedilatildeo das interaccedilotildees sociais (GODARD SACHS 1975
VIEIRA et al 2010 VIEIRA 2005)
Finalmente a dimensatildeo do haacutebitat refere-se agrave gestatildeo da qualidade
de vida das populaccedilotildees Converge para os estudos da ecologia humana e
justiccedila ambiental e ecoloacutegica que demonstram ser necessaacuterio considerar
as condiccedilotildees ambientais de existecircncia direitos sociais e trabalhistas
direitos de seguranccedila e integridade fiacutesica direitos de informaccedilatildeo
educaccedilatildeo e auto-realizaccedilatildeo direitos de participaccedilatildeo democraacutetica e
cidadania poliacutetica Neste contexto as noccedilotildees de justiccedila ambiental e
ecoloacutegica alimentam um novo tipo de questionamento da
produccedilatildeoreproduccedilatildeo das relaccedilotildees desiguais entre os seres humanos e
destes com o meio ambiente assim como dos seres humanos com as
futuras geraccedilotildees espeacutecies natildeo humanas e processos ecossistecircmicos
(DANSEREAU 1999 LEROY et al 2002 LOW GLEESON 1998
SCHLOSBERG 2009) ldquoA noccedilatildeo de justiccedila ambiental implica pois o
direito a um meio ambiente seguro sadio e produtivo para todos onde o
lsquomeio ambientersquo eacute considerado em sua totalidade incluindo suas
dimensotildees ecoloacutegicas fiacutesicas construiacutedas sociais poliacuteticas esteacuteticas e
econocircmicasrdquo (ACSELRAD MELLO BEZERRA 2009 p 16)
Em siacutentese o resgate do processo de complexificaccedilatildeo progressiva
do enfoque ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento permite a obtenccedilatildeo de
uma imagem mais niacutetida das contribuiccedilotildees oferecidas por outras linhas
de teorizaccedilatildeo sobre o planejamento de dinacircmicas alternativas de
desenvolvimento que corporificam diferentes olhares sobre a crise
socioambiental As trecircs dimensotildees do conceito de meio ambiente
mencionadas acima trazem agrave tona as inter-relaccedilotildees entre processos
naturais e sociais e a escolha de ldquofuturos possiacuteveisrdquo no campo das
dinacircmicas de desenvolvimento Mas resta incorporar agrave linha de
66
argumentaccedilatildeo os subitens correspondentes a contribuiccedilatildeo dos trecircs
enfoques ao ecodesenvolvimento
221 Gestatildeo de recursos comuns a importacircncia da aprendizagem
social adaptativa
O presente enfoque da gestatildeo de recursos comuns tem como
ponto de partida um artigo publicado por Garrett Hardin em 1968 a
Trageacutedia dos Comuns Os recursos comuns satildeo aqueles cuja exclusatildeo de
possiacuteveis usuaacuterios e cujo controle do acesso satildeo geralmente
problemaacuteticos e seu uso envolve subtraccedilatildeo eou rivalidade - que coloca
o problema do uso compartilhado Natildeo haacute um consenso na literatura dos
comuns sobre quais recursos podem ser considerados recursos comuns
Para Berkes (2005) incluem-se entre os recursos comuns peixes
animais selvagens florestas pastagens comunitaacuterias sistemas de
irrigaccedilatildeo aacutegua subterracircnea selvas parques espaccedilos puacuteblicos e
excluem-se as terras agricultaacuteveis e a mineraccedilatildeo Jaacute Oakerson (1992)
afirma que os comuns podem ter uma locaccedilatildeo fixa (mineacuterios) ou pode
ser moacuteveis (como peixes e animais selvagens) Em alguns casos
(oceanos atmosfera) satildeo indivisiacuteveis e natildeo podem ser apropriados de
forma privada e em outros casos (pasto) satildeo organizados como
recursos comuns de acordo com a opccedilatildeo social Os padrotildees de
organizaccedilatildeo variam conforme o lugar e a cultura
A modernidade ocidental transformou a natureza
em ldquoambienterdquo simples cenaacuterio no centro do qual
reina o homem que se autoproclama ldquodono e
senhorrdquo Esse ambiente cedo perderaacute toda a
consistecircncia ontoloacutegica sendo desde logo
reduzido a um simples conservatoacuterio de recursos
antes de se tornar depoacutesito de resiacuteduos (OST
1995 p 10)
O enfoque eacute aqui considerado na perspectiva da gestatildeo integrada
de recursos naturais pois um recurso comum natildeo pode ser gerido
independentemente de outras partes do sistema e de outros recursos
(BERKES 2005a VIEIRA BERKES SEIXAS 2005 VIEIRA
67
WEBER 1997)2 Esse posicionamento converge para o enfoque
patrimonial de recursos naturais desenvolvido na Franccedila Dessa forma
ldquoa qualidade da natureza deve se tornar o lsquobem comumrsquo do conjunto da
sociedaderdquo (OLLAGNON 1997 p 172) No enfoque patrimonial os
recursos satildeo considerados na perspectiva da gestatildeo integrada
Evidecircncias de maacute gestatildeo e prescriccedilotildees de soluccedilotildees convencionais
na gestatildeo de recursos comuns tecircm se avolumado no periacuteodo recente Haacute
falhas em reconhecer a importacircncia das interaccedilotildees entre niacuteveis e escalas
persistecircncia na fragmentaccedilatildeo dos sistemas socioambientais e omissatildeo
em reconhecer a heterogeneidade da percepccedilatildeo das escalas pelos
diferentes atores sociais envolvidos na gestatildeo Isso pode resultar em
poliacuteticas amplas que constrangem poliacuteticas locais accedilotildees locais
desvinculadas de problemas mais amplos soluccedilotildees de curto prazo que
acirram problemas de longo prazo pesquisas cientiacuteficas que enfatizam
apenas um niacutevel e raramente analisam as interaccedilotildees sociais e ecoloacutegicas
do fenocircmeno entre niacuteveis (CASH et al 2006 FENNY et al 2001
HOLLING BERKES FOLKE 1998)
O enfoque da gestatildeo de recursos comuns vem evoluindo atraveacutes
do enfoque da co-gestatildeo e da gestatildeo adaptativa A co-gestatildeo enfatiza a
partilha do poder e responsabilidade entre governo e usuaacuterios e a gestatildeo
adaptativa enfatiza a aprendizagem Ambos vecircm evoluindo em direccedilatildeo agrave
co-gestatildeo adaptativa (BERKES 2009)
Como parte do esforccedilo coletivo dos pesquisadores alinhados com
o enfoque dos comuns vem se desenvolvendo o Institutional Framework for Policy Analysis and Design (IAD) desde a deacutecada de 1970
Inicialmente o modelo de anaacutelise IAD foi utilizado no estudo de
poliacuteticas puacuteblicas em aacutereas metropolitanas e em 1985 Ronald Oakerson
adaptou o IAD aos recursos comuns apresentando o modelo num painel
da Academia Nacional de Ciecircncias (HESS OSTROM 2005)
Oakerson (1992) distingue quatro atributos ou variaacuteveis que
podem ser usadas para descrever os recursos comuns atributos fiacutesicos e
tecnoloacutegicos as regras em uso que governam as relaccedilotildees entre usuaacuterios
a arena de accedilatildeo que envolve a escolha de estrateacutegias e a interaccedilatildeo entre
os envolvidos na gestatildeo e os resultados e consequecircncias O quadro
2 Aqui eacute feita a opccedilatildeo pelo enfoque da gestatildeo de recursos comuns mas outra
possibilidade seria via teoria da regulaccedilatildeo explorada por Drummond e Marsden
(1995)
68
conceitual eacute uma ferramenta heuriacutestica para pensar a loacutegica da situaccedilatildeo e
considerar possibilidades alternativas
Com base em Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992) segue uma breve descriccedilatildeo do modelo de anaacutelise
adaptado a co-gestatildeo adaptativa3
Atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos A natureza fiacutesica e tecnoloacutegica
determinam as limitaccedilotildees e possibilidades de uso do recurso comum
Esses atributos compreendem o tamanho localizaccedilatildeo limites
capacidade e abundacircncia do recurso A tecnologia determina a forma
como se lida com o recurso e com os demais fatores relacionados
Regras em uso O segundo conjunto de atributos no modelo de
anaacutelise consiste nas regras que estruturam as escolhas individuais e
coletivas em relaccedilatildeo aos recursos comuns
Arena de accedilatildeo As regras natildeo satildeo garantia da emergecircncia de
novos padrotildees de comportamento Entre as regras e os comportamentos
observados existe uma distacircncia A arena de accedilatildeo eacute um espaccedilo
conceitual no qual os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais se
informam consideram cursos de accedilatildeo alternativos tomam decisotildees
agem e experienciam as consequecircncias de suas accedilotildees A arena de accedilatildeo
conta com dois aspectos interligados a situaccedilatildeo de accedilatildeo e os segmentos
que interagem na situaccedilatildeo de accedilatildeo A situaccedilatildeo de accedilatildeo enfatiza como as
pessoas cooperam ou natildeo cooperam entre si em vaacuterias circunstacircncias Agrave
anaacutelise da situaccedilatildeo da accedilatildeo eacute necessaacuteria a identificaccedilatildeo dos envolvidos e
os papeacuteis que desempenham na gestatildeo do recurso comum
Resultados eou consequecircncias A observacircncia dos resultados
eou consequecircncias eacute fundamental para avaliar o sistema de gestatildeo
encorajando a inovaccedilatildeo e a aprendizagem adaptativa
As relaccedilotildees entre essas macro variaacuteveis satildeo o principal foco dos
estudos A Figura 2 traz modelo de anaacutelise e como as macro variaacuteveis se
relacionam umas com as outras Os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos e as
regras em uso afetam a arena de accedilatildeo e os resultados e consequecircncias
As linhas soacutelidas a e b representam fortes conexotildees causais
compreendendo que o comportamento individual eacute constrangido mas
natildeo determinado pelo mundo biofiacutesico e pelas regras As linhas soacutelidas
3 Outra opccedilatildeo seria utilizar o modelo de anaacutelise dos ciclos adaptativos descrito
no artigo de Holling (2001) e na coletacircnea organizada por Gunderson e Holling
(2002)
69
c e d representam fortes relaccedilotildees Os atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos
afetam os recursos comuns de duas formas afetam a arena de accedilatildeo e
caso natildeo sejam considerados na arena de accedilatildeo podem afetar diretamente
os resultados As regras em uso por sua vez natildeo tecircm efeito nos
resultados independente da escolha humana No longo prazo a interaccedilatildeo
entre as macro variaacuteveis eacute marcada pelas linhas tracejadas Dessa forma
o movimento eacute incorporado no modelo na forma de aprendizagem social
adaptativa
Figura 2 - Modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns ajustado
a co-gestatildeo adaptativa
Fonte Baseado em Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
A aprendizagem social adaptativa marcada principalmente pela
retroalimentaccedilatildeo (linhas tracejadas) presente no modelo de anaacutelise da
gestatildeo de recursos comuns eacute um processo interativo e contiacutenuo No
entanto por ser um processo coletivo a cooperaccedilatildeo entre os envolvidos
na gestatildeo pode ser difiacutecil devido agrave distribuiccedilatildeo de poder tanto nos
segmentos sociais quanto nos segmentos poliacuteticos e entre eles
(BERKES 2009) A expectativa eacute que a aprendizagem leve a accedilatildeo
coletiva agrave mudanccedila institucional na forma de regras leis costumes e
normas As abordagens do aprendizado social visam encontrar formas
70
nas quais as pessoas possam transcender as normas sociais valores e
formas tradicionais de pensar os problemas convergindo para mudanccedilas
socioecoloacutegicas e desempenhando um papel direto no estiacutemulo da
inovaccedilatildeo institucional (CUNDILL 2010)
No campo da co-gestatildeo adaptativa a aprendizagem eacute definida
como a reflexatildeo e accedilatildeo coletiva que tem lugar entre indiviacuteduos e grupos
quanto trabalham para melhorar a gestatildeo das relaccedilotildees entre sistemas
sociais e ecoloacutegicos Aiacute entram em cena os niacuteveis de aprendizagem
aprendizagem em circuito simples duplo e triplo A aprendizagem em
circuito simples se refere a melhorar as accedilotildees estrateacutegias e praacuteticas que
ocorrem num grupo envolvido num projeto de gestatildeo de recursos
comuns A aprendizagem em circuito duplo envolve o questionamento
dos pressupostos e dos modelos mentais que apoiam a seleccedilatildeo de
estrateacutegias particulares e accedilotildees Isto eacute particularmente importante nos
processos colaborativos onde diferentes formas de conhecimento e
modelos mentais estatildeo juntos Na aprendizagem em circuito triplo a
aprendizagem ocorre quando os valores e normas que sustentam as
hipoacuteteses satildeo questionados e refletidos Isto leva a um entendimento
mais profundo do contexto dinacircmicas de poder valores que influenciam
a capacidade de gerir os recursos comuns (CUNDILL 2010)4
A ecircnfase da gestatildeo de recursos comuns eacute na anaacutelise dos modos de
apropriaccedilatildeo e dos sistemas de gestatildeo e neste sentido a cooperaccedilatildeo entre
instituiccedilotildees situadas em diversas escalas e niacuteveis torna-se um elemento
fundamental Inuacutemeras atividades humanas tecircm causas e consequecircncias
que podem ser medidas em niacuteveis diferentes ao longo de muacuteltiplas
escalas Os multi-niacuteveis e as multi-escalas e a transescalaridade dos
problemas relacionados com as dimensotildees humanas das mudanccedilas
globais demandam que pesquisadores abordem questotildees-chave de
escalas e niacuteveis em suas anaacutelises Se a arena de accedilatildeo compreende
tambeacutem as relaccedilotildees que se estabelecem entre os vaacuterios niacuteveis de uma
mesma escala a gestatildeo refere-se a arranjos por meio dos quais o poder
decisoacuterio e as responsabilidades decorrentes satildeo compartilhados entre os
atores envolvidos nas vaacuterias escalas espaciais (CASH et al 2006
BERKES 2005b DIETZ et al 2002 GIBSON OSTROM AHN
2000)
4 A aprendizagem em circuito triplo converge para o engajamento reflexivo e a
reflexividade ecoloacutegica (SCHLOSBERG 2009)
71
222 Ecodesenvolvimento territorial os recursos comuns no
contexto do desenvolvimento
Na tentativa de incorporar ao presente o que o passado nos traz
como bagagem vaacuterios autores vecircm descortinando novas vias de anaacutelise
criacutetica das limitaccedilotildees do conceito de desenvolvimento sustentaacutevel que
tem sido apropriado pelos arautos da globalizaccedilatildeo neoliberal desde o
iniacutecio dos anos 1990
Ignacy Sachs escreve sobre desenvolvimento e meio ambiente haacute
vaacuterias deacutecadas e tem acompanhado as mudanccedilas que aconteceram ao
longo da histoacuteria Para unir os enfoques do ecodesenvolvimento e do
desenvolvimento sustentaacutevel ele distingue no ecodesenvolvimento as
cinco dimensotildees da sustentabilidade sustentabilidade social
sustentabilidade econocircmica sustentabilidade ecoloacutegica sustentabilidade
espacial e sustentabilidade cultural Mais recentemente tem utilizado os
termos desenvolvimento territorial integrado e sustentaacutevel ou ainda
desenvolvimento includente sustentaacutevel sustentado (RIBEIRO 2005
SACHS 2004 2002 1993)
Nos uacuteltimos anos Paulo Freire Vieira tem utilizado o termo
desenvolvimento territorial sustentaacutevel e mais recentemente
ecodesenvolvimento territorial tendo como ideia central o
ecodesenvolvimento agregando tambeacutem o enfoque da gestatildeo de
recursos comuns e os estudos territoriais Nas palavras de Pierre
Dansereau (2005 p 523) Paulo Freire Vieira deu ldquoum novo tom agrave
Sociologia um desembaraccedilo maior agrave experiecircncia em quadros teoacutericos
ampliadosrdquo Nessa linha o conceito emergente de ecodesenvolvimento
territorial leva em conta os riscos de desvio economicista e tecnocraacutetico
nos estudos sobre dinacircmicas territoriais de desenvolvimento
enfatizando a criaccedilatildeo de sistemas de gestatildeo compartilhada e adaptativa
de recursos comuns e a governanccedila territorial Deste ponto de vista
ainda em construccedilatildeo trata-se de favorecer ao maacuteximo possiacutevel a gestatildeo
das conexotildees institucionais transescalares evitando soluccedilotildees
reducionistas e uniformizadoras aleacutem de escalas fixas (GODARD
1997 SACHS 2002 VIEIRA 2010 2009 2005 2006 VIEIRA CAZELLA CERDAN 2006)
A noccedilatildeo de territoacuterio incorporada recentemente ao debate sobre
desenvolvimento amp ambiente designa processos de criaccedilatildeo coletiva e
institucional e as dinacircmicas territoriais de desenvolvimento
72
ecologicamente prudente pressupotildeem o resgate dos criteacuterios de
endogeneidade descentralizaccedilatildeo e autonomia local (pensada
sistemicamente) assumidos como elementos constitutivos do enfoque
ldquoclaacutessicordquo de ecodesenvolvimento (VIEIRA et al 2010 VIEIRA
2006)
O ecodesenvolvimento territorial traz agrave gestatildeo de recursos
comuns a preocupaccedilatildeo com o estilo de desenvolvimento conforme
demonstrado na Figura 3 Mas partindo do pressuposto que a gestatildeo de
recursos comuns eacute um dos principais componentes na interaccedilatildeo
sociedade e natureza capaz de assegurar seu bom funcionamento seu
melhor rendimento sua perenidade e desenvolvimento ela deveria estar
a montante e natildeo a jusante das principais opccedilotildees de desenvolvimento
(GODARD 1997) Todavia seraacute mantido o estilo de desenvolvimento
como mais amplo para reforccedilar a ideia de que a gestatildeo de recursos
comuns precisa considerar o estilo de desenvolvimento assumindo cada
vez mais a responsabilidade da criacutetica e da mudanccedila
Figura 3 - Primeira adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa
Fonte Adaptado de Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
73
A anaacutelise do contexto e do discurso presente na gestatildeo de
recursos comuns explicita os fatores endoacutegenos e exoacutegenos das
dinacircmicas de desenvolvimento demonstrando seus limites e margens de
manobra
O problema natildeo se identifica tanto com a
preocupaccedilatildeo em se especificar o niacutevel de
responsabilidade ideal mas antes com o
entendimento daquelas formas de interaccedilatildeo entre
os diversos niacuteveis territoriais que tornariam
possiacutevel uma decisatildeo que levasse em conta ao
mesmo tempo os interesses e objetivos locais
regionais e nacionais ou mesmo internacionais
(GODARD 1997 p 237)
Para colocar em praacutetica estrateacutegias alternativas de
desenvolvimento eacute importante reequilibrar a transferecircncia de poder e a
comunicaccedilatildeo entre o local o regional e o nacional e integrar as vaacuterias
dimensotildees das estrateacutegias de desenvolvimento (social econocircmica
ecoloacutegica espacial e cultural) ldquoAgrave luz do princiacutepio da co-gestatildeo
adaptativa os sistemas de planejamento e gestatildeo deveratildeo se abrir cada
vez mais a um padratildeo de envolvimento autecircntico da sociedade civilrdquo
(VIEIRA 2005 p 366)
223 Justiccedila ambiental e justiccedila ecoloacutegica os caminhos da
democracia
O movimento por justiccedila ambiental teve origem nos Estados
Unidos em 1982 com um conflito em Afton na Carolina do Norte Na
iminecircncia de instalaccedilatildeo de um depoacutesito de bifenilpoliclorinato que
contaminaria a aacutegua que abastecia a cidade a populaccedilatildeo organizou
protestos Como a populaccedilatildeo de Afton era composta de 84 de negros e
negras o movimento se desenvolveu como uma reaccedilatildeo expliacutecita agrave
atenccedilatildeo inadequada dos movimentos ambientalistas agrave questatildeo da raccedila e
da classe social Os princiacutepios da justiccedila ambiental ofereceram ao ambientalismo possibilidades de pensar classe social e raccedila junto com
questotildees ambientais combatendo o abuso de corporaccedilotildees poluentes e o
abuso do proacuteprio Estado (ACSELRAD 2009 ACSELRAD MELLO
BEZERRA 2009 SZE LONDON 2008)
74
Desde entatildeo as pesquisas sobre justiccedila ambiental contribuiacuteram
para ampliar a discussatildeo sobre a necessidade de um enfoque consistente
de anaacutelise deste fenocircmeno Aleacutem de vaacuterias aacutereas de conhecimento
(geografia radical geografia criacutetica e economia poliacutetica entre outras)
passaram a ser mobilizados dados relacionados a diferentes grupos
raciais e eacutetnicos aleacutem de disparidades associadas a gecircnero e idade Mais
recentemente as reflexotildees sobre justiccedila ecoloacutegica conduziram o
enfoque a um niacutevel cada vez mais alto de abrangecircncia e abstraccedilatildeo
(BYRNE MARTINEZ GLOVER 2002 HOLIFIELD PORTER
WALKER 2009 SZE LONDON 2008)
O conceito de injusticcedila ambiental designa uma distribuiccedilatildeo
desproporcional dos riscos e danos ambientais devido agrave implantaccedilatildeo de
projetos industriais homogeneizadores do espaccedilo bem como de
poliacuteticas globais que impactam negativamente as camadas mais
vulneraacuteveis da sociedade Trata-se de uma siacutendrome recorrente que
transcende a simples distribuiccedilatildeo de riscos ambientais delimitados
localmente refletindo tambeacutem o reconhecimento de que as poliacuteticas
ambientais tecircm consequecircncias que atravessam as fronteiras nacionais
afetam muacuteltiplas escalas e se estendem agraves redes globais As iniciativas
que geram espaccedilos de desigualdade e injusticcedila ambiental satildeo histoacuterica e
geograficamente muito mais complexas do que parecem (ACSELRAD
MELLO BEZERRA 2009 HOLIFIELD PORTER WALKER 2009
ZHOURI 2008)
A ampliaccedilatildeo dos temas tratados pela justiccedila ambiental e o uso da
pesquisa sistecircmica refletem a percepccedilatildeo da complexidade intriacutenseca aos
problemas estudados inclusive das conexotildees transescalares - do local ao
global Alguns autores passaram a adotar o termo justiccedila ecoloacutegica entendida como aquela que afeta natildeo apenas os seres humanos mais
vulneraacuteveis mas todos os seres humanos as geraccedilotildees futuras espeacutecies
natildeo humanas e processos ecossistecircmicos (BYRNE MARTINEZ
GLOVER 2002 HOLIFIELD PORTER WALKER 2009 LOW e
GLEESON 1998 MAacuteRMORA 1992 PENtildeA 2003 SCHLOSBERG
2009 e 2004 SZE LONDON 2008 TOUCHEacute 2004)
Partindo do pressuposto de que a desigualdade socioambiental se
relaciona ao sistema poliacutetico aquela eacute apenas um sintoma de um
processo que envolve a redistribuiccedilatildeo o reconhecimento e a
representaccedilatildeo (SCHLOSBERG 2009 e 2004) A redistribuiccedilatildeo envolve
minimizar a desigualdade ambiental Jaacute o reconhecimento envolve a
consideraccedilatildeo de distintas perspectivas (das minorias eacutetnicas ldquoraciaisrdquo e
75
sexuais) O reconhecimento objetiva tambeacutem ldquodesinstitucionalizar
padrotildees de valoraccedilatildeo cultural que impedem a paridade de participaccedilatildeo
e substituiacute-los por padrotildees que a promovamrdquo (FRASER 2007 p 109)
A representaccedilatildeo torna-se central nas lutas pela redistribuiccedilatildeo e
pelo reconhecimento natildeo haacute redistribuiccedilatildeo e reconhecimento sem
representaccedilatildeo Logo os problemas na representaccedilatildeo satildeo condicionantes
da injusticcedila ambiental e ecoloacutegica (FRASER 2010 2009)
A representaccedilatildeo juntamente com a redistribuiccedilatildeo e
reconhecimento satildeo fundamentais para o fortalecimento e recriaccedilatildeo do
sistema democraacutetico e aprendizagem social adaptativa Na Figura 4
insere-se no modelo de anaacutelise a variaacutevel do fortalecimento do sistema
democraacutetico
Figura 4 - Segunda adaptaccedilatildeo do modelo de anaacutelise da co-gestatildeo
adaptativa
Fonte Adaptado de Hess e Ostrom (2005) Oakerson (1992) Polski e
Ostrom (1992)
Satildeo os mesmos caminhos que levam ao restabelecimento do
equiliacutebrio na natureza e agrave construccedilatildeo da democracia na sociedade ldquoO
pensamento democraacutetico estaacute desafiado a pensar o desenvolvimento de
toda a humanidade em harmonia com a naturezardquo (SOUZA 1992 p
76
13) Cabe questionar ldquosob que condiccedilotildees eacute de se esperar que a
democracia produza resultados poliacuteticos justosrdquo (VITA 2003 p 111)
A democracia representativa vem sendo alvo de inuacutemeras
criacuteticas economicizaccedilatildeo do poliacutetico incapacidade de cumprir com suas
promessas fundamentais (governo do povo igualdade poliacutetica
participaccedilatildeo dos cidadatildeos na tomada de decisatildeo) a falta de controle da
representaccedilatildeo e a crescente desconfianccedila dos cidadatildeos na democracia
(MANIN et al 2006 MIGUEL 2005 ROSANVALLON 2006
SCHUMPETER1984)
Jaacute a democracia participativa pretende alcanccedilar uma democracia
digna de seu nome (MIGUEL 2005) A consciecircncia do custo do
crescimento econocircmico da produccedilatildeo das desigualdades e da apatia
poliacutetica podem ser consideradas brechas para a democracia participativa
e a expansatildeo e aprofundamento da participaccedilatildeo pode ser uma estrateacutegia
promissora para desafiar as desigualdades as assimetrias de interesses e
as hierarquias sociais e poliacuteticas tradicionais (FUNG COHEN 2007
PATEMAN 1992) Todavia ldquo() o principal problema quanto agrave
democracia participativa natildeo eacute quanto a fazecirc-la funcionar mas como
atingi-lardquo (MACPHERSON 1978 p 101)
A ecologia e a democracia se determinam mutuamente ldquo() seja
pela accedilatildeo dos condicionantes soacutecio-poliacuteticos da degradaccedilatildeo ambiental
seja pela prevalecircncia das bases ambientais da desigualdade socialrdquo
(ACSELRAD 1992a p 10) Para compreender essa relaccedilatildeo eacute preciso
identificar e entender a origem das contradiccedilotildees na incorporaccedilatildeo da
questatildeo ambiental pelo Estado e a correlaccedilatildeo de forccedilas sociais em
confronto pelo controle dos recursos
Os estudos sobre justiccedila ambiental identificam como causas da
injusticcedila ambiental as redes de influecircncia (baseadas em alianccedilas entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos) a desinformaccedilatildeo e a neutralizaccedilatildeo
da criacutetica potencial Na linha de questionamento entre as accedilotildees que
buscam reverter quadros de injusticcedilas ambientais estatildeo a produccedilatildeo do
conhecimento proacuteprio a pressatildeo pela aplicaccedilatildeo universal das leis a
pressatildeo pelo aperfeiccediloamento da legislaccedilatildeo de proteccedilatildeo ambiental a
pressatildeo por novas racionalidades no exerciacutecio do poder estatal a introduccedilatildeo de procedimentos de avaliaccedilatildeo de equidade ambiental e a
accedilatildeo direta e difusatildeo espacial do movimento (ACSELRAD MELLO
BEZERRA 2009 GRAZIANO 1997) A base de um modelo mais
justo envolveria a democratizaccedilatildeo do controle dos recursos naturais a
77
desprivatizaccedilatildeo do meio ambiente assegurando o caraacuteter puacuteblico do
patrimocircnio comum (ACSELRAD 1992a)
O desafio consiste em identificar os limites da representaccedilatildeo e da
participaccedilatildeo identificando experiecircncias que caminhem na direccedilatildeo de
uma recuperaccedilatildeo da autonomia (CASTORIADIS COHN-BENDIT
PUacuteBLICO DE LOUVAIN-LA-NEUVE 1981 ILLICH 1973) da
construccedilatildeo de uma democracia cognitiva (MORIN 2002 THEYS
1997) de uma cidadania terrestre (MORIN KERN 2000) de uma
cidadania ecoloacutegica (DOBSON 2003) de uma ecologia da
transformaccedilatildeolibertaccedilatildeo (HATHAWAY BOFF 2012) A direccedilatildeo
apontada a partir dos termos indicados eacute exigente e implica reconhecer
o caraacuteter indissociaacutevel da natureza e da comunidade seres humanos natildeo
humanos e a Terra em uma concepccedilatildeo alargada de justiccedila
(SCHLOSBERG 2009)
23 LIMITES E POSSIBILIDADES DO ECODESENVOLVIMENTO
REVISITADO
De todos os objetos os que mais amo satildeo os
usados () Impregnado do uso de muitos a
miuacuteda transformados foram aperfeiccediloando suas
formas e se fizeram preciosos porque tecircm sido
apreciados muitas vezes (Bertolt Brecht
Antologia Poeacutetica 1982 p 58)
A procura da harmonizaccedilatildeo entre desenvolvimento e gestatildeo de
longo prazo do meio ambiente natildeo pode ser feita de maneira isolada
pois se trata de uma reflexatildeo global sobre a viabilidade de novos estilos
de desenvolvimento baseados no pensamento sistecircmico-complexo
(GODARD SACHS 1975 VIEIRA 2006) Este capiacutetulo insere-se
nessa linha de reflexatildeo ao tratar a atualidade do ecodesenvolvimento
aplicado agrave gestatildeo de recursos comuns
O ecodesenvolvimento eacute o eixo central do modelo de anaacutelise
trazendo em si a criacutetica do modelo hegemocircnico de desenvolvimento e a
preocupaccedilatildeo com a criaccedilatildeo de novos projetos civilizatoacuterios Para tanto eacute preciso considerar o meio ambiente como relaccedilatildeo e natildeo como objeto
Suas dimensotildees os recursos naturais o espaccedilo-territoacuterio e o haacutebitat
colocam no centro as relaccedilotildees que os seres humanos estabelecem entre
si e com o meio Os conceitos de co-gestatildeo adaptativa
78
ecodesenvolvimento territorial e justiccedila ambiental e ecoloacutegica vecircm
sendo incorporados ao modelo de anaacutelise ldquoclaacutessicordquo ampliando o seu
potencial heuriacutestico no enfrentamento da crise socioecoloacutegica global
O enfrentamento envolve mais adaptaccedilatildeo que controle poliacuteticas
flexiacuteveis integradas e adaptativas gestatildeo e planejamento voltados agrave
aprendizagem acompanhamento concebido como uma parte de
intervenccedilotildees ativas para conseguir compreender e identificar respostas
aos problemas natildeo a vigilacircncia pela vigilacircncia investimentos ecleacuteticos
em ciecircncia participaccedilatildeo dos cidadatildeos e parceria na construccedilatildeo de uma
ciecircncia mais cidadatilde evitando a informaccedilatildeo passiva (HOLLING 1995)
O desenvolvimento de uma democracia cognitiva
soacute eacute possiacutevel com uma reorganizaccedilatildeo do saber e
esta pede uma reforma do pensamento que
permita natildeo apenas isolar para conhecer mas
tambeacutem ligar o que estaacute isolado e nela
renasceriam de uma nova maneira as noccedilotildees
pulverizadas pelo esmagamento disciplinar o ser
humano a natureza o cosmo a realidade
(MORIN 2002 p 104)
O ecodesenvolvimento e os enfoques complementares ajudam a
compreender a gestatildeo de recursos comuns em relaccedilatildeo agrave sustentabilidade
dos recursos naturais as dinacircmicas de desenvolvimento e a
desigualdade ecoloacutegica A pesquisa sobre gestatildeo de recursos comuns
nessa perspectiva incorpora uma perspectiva mais ampla sobre seu
papel no modelo de desenvolvimento hegemocircnico e ao mesmo tempo
seu potencial de mudanccedila como parte integrante e importante na
proposta do ecodesenvolvimento O fundamental eacute a compreensatildeo de
que nenhum enfoque eacute completo e que para aleacutem da fragmentaccedilatildeo da
ciecircncia o diaacutelogo entre os enfoques pode oferecer insights para uma
melhor compreensatildeo dos problemas e para a construccedilatildeo de alternativas
capazes de fazer frente agrave crise sistecircmica do meio ambiente
3 GESTAtildeO DE RECURSOS COMUNS NO BRASIL O CARVAtildeO
MINERAL EM QUESTAtildeO
Tudo se aniquilava no fundo desconhecido das
noites obscuras soacute percebia muito ao longe os
altos-fornos e as fornalhas de coque () Era uma
tristeza de incecircndio natildeo havia no horizonte
ameaccedilador outros astros elevando-se a natildeo ser
esses fogos noturnos dos paiacuteses da hulha e do
ferro (Eacutemile Zola 1981 p 14)
O uso do carvatildeo mineral em larga escala estaacute intrinsecamente
ligada agrave Revoluccedilatildeo Industrial e com a origem do movimento dos
trabalhadores na Inglaterra como bem ilustrou Emile Zola em seu livro
Germinal e nos Estados Unidos Ele continua sendo a fonte mais
utilizada para geraccedilatildeo de energia eleacutetrica no mundo correspondendo em
meacutedia a 40 da produccedilatildeo total mundial no periacuteodo de 1973 a 2006
Segundo a Agecircncia Internacional de Energia (IEA) a posiccedilatildeo seraacute
mantida nos proacuteximos trinta anos e a discussatildeo sobre reconversatildeo da
mineraccedilatildeo do carvatildeo ainda permanece incipiente5(ANEEL 2008a
FERREIRA 2002)
No debate sobre mudanccedila ambiental global os recursos naturais
natildeo renovaacuteveis satildeo centrais Embora o petroacuteleo ocupe posiccedilatildeo
privilegiada os impactos ambientais do processo produtivo do carvatildeo
mineral eacute um ponto importante a ser considerado Os combustiacuteveis
foacutesseis continuam a dominar a matriz energeacutetica mundial apoiados por
523 mil milhotildees de doacutelares de subsiacutedios em 2011 quase 30 a mais que
em 2010 e seis vezes mais do que as fontes renovaacuteveis (OCDE IEA
2012) O carvatildeo mineral representou em 2012 195 da matriz
energeacutetica dos paiacuteses que compotildeem a Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e
Desenvolvimento Econocircmico (OCDE) e 282 da matriz mundial Em
relaccedilatildeo agrave oferta de energia eleacutetrica o carvatildeo mineral representou em
2012 14 da oferta brasileira e 417 da oferta mundial Se
consideradas as dimensotildees de sustentabilidade seguranccedila energeacutetica
equidade social e mitigaccedilatildeo dos impactos ambientais o Brasil aparece
como 53ordm lugar em 2012 Se tomadas separadamente o Brasil assume o
5 Destaca-se aqui a iniciativa da Comissatildeo das Comunidades Europeias que
teve iniacutecio em 1989 de proporcionar assistecircncia as Comunidades que queiram
adotar uma reconversatildeo econocircmica das aacutereas de mineraccedilatildeo do carvatildeo atraveacutes de
empreacutestimos e subsiacutedios (COMISSAtildeO DAS COMUNIDADES EUROPEacuteIAS
1990)
80
77ordm lugar em seguranccedila energeacutetica 65ordm em equidade social e 21ordm em
mitigaccedilatildeo dos impactos ambientais (WORLD ENERGY COUNCIL
2012)
A matriz energeacutetica brasileira teve em sua composiccedilatildeo no ano de
2012 424 de oferta de energia de fontes renovaacuteveis (biomassa da
cana hidraacuteulica e eletricidade lenha e carvatildeo vegetal e lixiacutevia dentre
outras) e 576 de fontes de energia natildeo renovaacuteveis (petroacuteleo e
derivados gaacutes natural carvatildeo mineral e uracircnio) da qual o carvatildeo
mineral tem uma participaccedilatildeo de 54 (BRASIL EPE 2013) A
presenccedila de combustiacuteveis foacutesseis na matriz energeacutetica brasileira tende a
aumentar com a exploraccedilatildeo do petroacuteleo do preacute-sal com a possiacutevel
exploraccedilatildeo do gaacutes de xisto e com o retorno do carvatildeo mineral nos leilatildeo
A-56 de 2013 Eacute urgente lidar com a questatildeo das emissotildees de gases de
efeito estufa devido agraves altas emissotildees dos combustiacuteveis foacutesseis O
carvatildeo mineral eacute o mais abundante combustiacutevel foacutessil do mundo e
tambeacutem o que mais produz gases de efeito estufa (BRASIL MME
2007 YAMAOKA et al 2013)
O Brasil no cenaacuterio mundial desponta como fornecedor global
de commodities minerais energeacuteticas e agriacutecolas Esse papel justifica a
abertura de minas de fosfato a mineraccedilatildeo de uracircnio do ferro e de outros
mineacuterios Apesar do carvatildeo mineral brasileiro ser o ldquoprimo pobrerdquo dos
mineacuterios voltado ao mercado interno eacute preciso considerar tambeacutem a
mineraccedilatildeo no geral O marco legal da mineraccedilatildeo estaacute mudando com a
regulamentaccedilatildeo da mineraccedilatildeo em terras indiacutegenas quilombolas e
ribeirinhas e a expansatildeo das mineradoras brasileiras para outros paiacuteses
A conjuntura brasileira eacute de desregulamentaccedilatildeo e de flexibilizaccedilatildeo da
normativa ambiental sem um questionamento profundo sobre as
desigualdades socioambientais existentes no territoacuterio (MALERBA
2012 MILANEZ et al 2013)
O objetivo deste capiacutetulo foi descrever as macro variaacuteveis
presentes no modelo de anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns (HESS
6 Os leilotildees foram instituiacutedos em 2005 e satildeo processos licitatoacuterios com o
objetivo de contratar energia eleacutetrica para assegurar o pleno atendimento da
demanda futura no Ambiente de Regulaccedilatildeo Controlada Os leilotildees satildeo divididos
em A-1 A-3 e A-5 Os nuacutemeros 1 3 e 5 correspondem aos anos de
antecedecircncia do iniacutecio do suprimento O Leilatildeo A-5 por exemplo envolve a
licitaccedilatildeo para contrataccedilatildeo de energia eleacutetrica de novos empreendimentos
realizado com cinco anos de antecedecircncia do iniacutecio do suprimento (MME
2014)
81
OSTROM 2005 OAKERSON 1992 POLSKI OSTROM 1992)
abordando o tema no Brasil com destaque agrave gestatildeo do carvatildeo mineral
Para tanto aleacutem de uma breve introduccedilatildeo sobre desenvolvimento
econocircmico gestatildeo de recursos comuns e energia no Brasil o capiacutetulo
traz uma caracterizaccedilatildeo dos atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso
em termos de disponibilidade usos tecnologias disponiacuteveis e impactos
As regras em uso tratam das principais leis que afetam o recurso bem
como das interfaces entre direitos ambientais e direitos humanos Em
relaccedilatildeo agrave arena de accedilatildeo eacute feita uma breve descriccedilatildeo dos envolvidos na
gestatildeo no niacutevel nacional O balanccedilo da gestatildeo de recursos comuns no
Brasil em especial do carvatildeo mineral revela ao longo desse capiacutetulo
importantes pontos a serem considerados na compreensatildeo da ampliaccedilatildeo
da geraccedilatildeo de energia eleacutetrica movida a carvatildeo mineral no Sul de Santa
Catarina e da possibilidade de surgirem caminhos alternativos para a
questatildeo energeacutetica
31 DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO GESTAtildeO DE RECURSOS
COMUNS E ENERGIA
A gestatildeo de recursos comuns em particular do carvatildeo mineral
traz agrave tona questotildees relacionadas ao desenvolvimento econocircmico e a
questatildeo energeacutetica que envolvem a atuaccedilatildeo de segmentos poliacuteticos
econocircmicos e sociais O desafio de tratar a gestatildeo de recursos comuns
reside justamente na complexidade existente nessas inter-relaccedilotildees A
tentativa dessa seccedilatildeo eacute tratar a gestatildeo contextualizada para na
sequecircncia abordar as especificidades do carvatildeo mineral
Na eacutepoca da Repuacuteblica Velha (1889-1930) o governo era
controlado pela oligarquia rural (SCARDUA BURSZTYN 2003) Se
ateacute 1930 a teoria econocircmica pregava o livre funcionamento do mercado
com a crise mundial passou a aceitar um papel mais atuante do Estado e
tambeacutem do planejamento Os recursos comuns acompanharam essa
mesma linha de atuaccedilatildeo federal sendo marcada pelo controle federal na
disputa com elites locais Isso justificou a criaccedilatildeo de poderes setoriais e
deu lugar a burocracias especializadas (NEDER 2002) O setor eleacutetrico que antes era resultado de investimentos privados e locais sofreu
intervenccedilatildeo estatal e de empresas estrangeiras (MALAGUTI 2009)
A Ditadura Vargas (1930-1945) foi centralizada no presidente
com a dissoluccedilatildeo das representaccedilotildees poliacuteticas e baseada numa poliacutetica
82
voltada ao desenvolvimento urbano industrial e nacionalista
(SCARDUA BURSZTYN 2003) Nesse periacuteodo houve pouca
demanda por energia baseada principalmente na geraccedilatildeo de energia a
partir de fontes vegetais indicando um reduzido grau de expansatildeo das
forccedilas produtivas De 1939 em diante ocorreu a consolidaccedilatildeo da
industrializaccedilatildeo com o crescimento da atividade econocircmica e uma
participaccedilatildeo maior no uso de combustiacuteveis foacutesseis (THEIS 1990)
Durante o periacuteodo democraacutetico (1945-1964) teve lugar a
reorganizaccedilatildeo dos partidos poliacuteticos e das representaccedilotildees favorecendo a
descentralizaccedilatildeo sem uma poliacutetica especiacutefica para esse fim Na Ditadura
Militar (1964-1985) a centralidade federal voltou a ser realidade e nesse
contexto o crescimento econocircmico aconteceu a despeito dos custos
sociais e ambientais (EGLER 1997 SCARDUA BURSZTYN 2003)
A questatildeo ambiental era tratada como gestatildeo de recursos naturais com a
criaccedilatildeo de parques e reservas bioloacutegicas Com vieacutes claramente
conservacionista natildeo havia uma preocupaccedilatildeo com os impactos do
crescimento econocircmico da eacutepoca (NEDER 2002) ldquoA ideia de
desenvolvimento econocircmico penetrava a consciecircncia da cidadania
justificando cada ato de governo e ateacute de ditadura e de extinccedilatildeo da
naturezardquo (DEAN 1996 p 281)
O processo de crise na economia mundial deflagrado na deacutecada
de 1970 contou com trecircs marcos poliacuteticos o rompimento dos Estados
Unidos aos acordos de Bretton Woods em 1971 que trouxe a crise aos
paiacuteses membros da OCDE a inclusatildeo das questotildees ambientais no debate
sobre desenvolvimento estimulada pelo relatoacuterio do Clube de Roma e
pela Conferecircncia de Estocolmo em 1972 e a elevaccedilatildeo do preccedilo do
petroacuteleo em 1973 que trouxe a preocupaccedilatildeo com a questatildeo energeacutetica
Esses eventos dentre outros colocaram tambeacutem em questatildeo a regulaccedilatildeo
das relaccedilotildees econocircmicas internacionais e os mecanismos internos de
promoccedilatildeo do desenvolvimento (EGLER 1997)
Na deacutecada de 1970 aumentou a preocupaccedilatildeo com a poluiccedilatildeo
industrial todavia natildeo se alterou a relaccedilatildeo Estado-empresa (NEDER
2002) O movimento ambientalista em sua fase fundacional (1971-86)
foi dominado por uma compreensatildeo estreita da problemaacutetica ambiental
tendo como principais preocupaccedilotildees a poluiccedilatildeo industrial e a
preservaccedilatildeo dos ecossistemas naturais A conexatildeo entre a problemaacutetica
ambiental e o desenvolvimento econocircmico natildeo era percebida pelo
movimento ambientalista nessa fase (VIOLA 1992)
83
Na deacutecada de 1980 a crise do Estado e o processo de
redemocratizaccedilatildeo do paiacutes somou-se agrave discussatildeo do ldquodesenvolvimento
sustentaacutevelrdquo que se inseriu no discurso e na definiccedilatildeo de poliacuteticas Poacutes
1980 outro padratildeo de regulaccedilatildeo puacuteblica socioambiental veio se
desenvolvendo no Brasil ldquoele desloca a dicotomia estado versus capital
privado para um patamar mais complexo que amplia os dois modos
claacutessicos de coordenaccedilatildeo a ordem estatal e mercantil para incluir novas
arenas de conflitosrdquo (NEDER 2009 p 8)
Com a crise econocircmica dos anos 1980 o movimento
ambientalista passou a considerar a dimensatildeo econocircmica como
condicionante e parte da crise socioambiental Nessa mesma deacutecada
formaram-se grupos cientiacuteficos que passaram a tratar da questatildeo
ambiental Em 1981 com a aprovaccedilatildeo da Poliacutetica Nacional de Meio
Ambiente (PNMA) constituiu-se segundo o artigo 6ordm o Sistema
Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) e o CONAMA O movimento
ambientalista de 1987 a 1991 passou por uma fase de institucionalizaccedilatildeo
que envolveu uma organizaccedilatildeo maior do movimento ambientalista em
relaccedilatildeo a recursos financeiros especializaccedilatildeo dos envolvidos e com o
envolvimento com movimentos socioambientais (como o Movimento de
Atingidos por Barragens Movimento dos Seringueiros Movimentos
Indiacutegenas etc) (VIOLA 1992) Somado a isso o fim da Ditadura
Militar em 1985 e a Constituiccedilatildeo de 1988 acenavam com a volta da
democracia representativa e com novos mecanismos participativos
O governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) realizou
uma grande reforma no setor eleacutetrico marcando a transiccedilatildeo entre um
modelo de crescimento impulsionado pelo Estado para um modelo de
crescimento impulsionado pelo mercado A reforma teve como objetivos
a separaccedilatildeo das atividades de geraccedilatildeo transmissatildeo distribuiccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo privatizaccedilatildeo competiccedilatildeo na geraccedilatildeo e na
comercializaccedilatildeo e livre acesso agraves redes de transmissatildeo e distribuiccedilatildeo
(GOLDENBERG PRADO 2003) ldquoO processo de privatizaccedilatildeo do setor
eleacutetrico representou um gigantesco processo de transferecircncia de rendas
utilizando-se de dinheiro puacuteblico para beneficiar grupos empresariais e
garantir o propalado lsquosucessorsquo das privatizaccedilotildeesrdquo (BERMANN 2003
p 47) O ano de 2001 foi conhecido como o ano do ldquoapagatildeordquo Houve
falta de energia eleacutetrica causada pelo desabastecimento de aacutegua e por
uma privatizaccedilatildeo parcial na qual as estatais perderam sua capacidade de
planejamento mediante reduccedilatildeo de investimentos e o setor privado ainda
natildeo havia tomado o seu lugar (GOLDENBERG 2012a)
84
Com a vitoacuteria de Luis Inaacutecio Lula da Silva em 2002 do Partido
dos Trabalhadores (PT) para a presidecircncia da repuacuteblica houve uma
grande expectativa por parte dos movimentos sociais que possuiacuteam uma
ligaccedilatildeo histoacuterica com os partidos de esquerda especialmente o PT Lula
permaneceu na presidecircncia de 2003 a 2010 rompendo com uma
tradiccedilatildeo de eleiccedilotildees que mantinham na presidecircncia a elite tradicional
(LOSEKANN 2012) O fato de ter tido como ministra do meio
ambiente Marina Silva ligada agrave luta dos seringueiros fez com que
muitos acreditassem que o governo Lula seria um marco na poliacutetica
ambiental brasileira Mas contrariando as expectativas houve a
legalizaccedilatildeo dos transgecircnicos a transposiccedilatildeo do Rio Satildeo Francisco e a
anistia aos desmatadores O Ministeacuterio das Minas e Energia (MME) na
eacutepoca liderado por Dilma Russef atual presidenta do Brasil ressuscitou
projetos hidreleacutetricos na Amazocircnia e retomou o programa da energia
nuclear Se durante a sua histoacuteria o PT esteve receptivo agraves demandas
dos movimentos socioambientais uma vez no poder a praacutetica foi
restritiva no CONAMA a participaccedilatildeo dos movimentos sociais foi
diminuiacuteda resultando numa injusticcedila poliacutetica em relaccedilatildeo aos segmentos
poliacuteticos e empresariais A poliacutetica de desenvolvimento empreendida
pelo Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) priorizou a
pecuaacuteria mineraccedilatildeo geraccedilatildeo de energia soja cimento e celulose
causadores de impactos socioambientais e injusticcedilas ambientais e
ecoloacutegicas (LISBOA 2011)
Na Rio+20 que aconteceu em 2012 o tema central da Cuacutepula
dos Povos foi a justiccedila social e ambiental Para a Cuacutepula dos Povos natildeo
houve um balanccedilo das dificuldades e conquistas poacutes Rio-92 e a ecircnfase
na ldquoeconomia verderdquo foi uma forma de reforccedilar a acumulaccedilatildeo
capitalista que natildeo questiona ou substitui a economia baseada no uso de
combustiacuteveis foacutesseis nem nos padrotildees de produccedilatildeo industrial e
consumo crescente (CUacutePULA DOS POVOS 2012)
No governo Dilma (2011- atual) foi aprovada a mudanccedila no
Coacutedigo Florestal que estava tramitando desde 1996 ateacute ser totalmente
reformulado em 2012 Tramita tambeacutem a mudanccedila do Coacutedigo da
Mineraccedilatildeo que vai reduzir radicalmente as conquistas de grupos eacutetnicos
e comunidades tradicionais Com essas mudanccedilas instaura-se a
dominaccedilatildeo poliacutetica empresarial na qual o territoacuterio passa a ser objeto da
accedilatildeo de empresas preocupadas com as proacuteprias metas e apoiadas pela
accedilatildeo do Estado Confunde-se aiacute capitalismo com democracia e liberdade
poliacutetica com liberdade para explorar e investir (SEVAacute FILHO 2013)
No que se refere agrave matriz energeacutetica antes se pensava no que era melhor
85
para o Estado e atualmente a poliacutetica energeacutetica eacute pensada para os
empreiteiros (GOLDENBERG 2012b)
O planejamento energeacutetico no Brasil apoacutes as reformas passou a
ter uma visatildeo ldquoofertistardquo natildeo se baseia em previsotildees de demandas
Existe um emaranhado de interesses e o ldquoplanejamentordquo se eacute que pode
ser assim chamado serve aos que querem vender energia e aos que
querem comprar As empresas por sua vez aperfeiccediloam sua influecircncia
poliacutetica nos espaccedilos de poder do Estado atuando sobre os
licenciamentos ambientais mecanismos de financiamento
influenciando ateacute propostas de reforma do Estado (BERMANN 2012)
No final da deacutecada de 1980 apoacutes momentos de crescimento
econocircmico e crise houve um reposicionamento da economia da gestatildeo
de recursos comuns e da energia do fim da deacutecada de 1980 em diante
Se a PNMA de 1986 e a Constituiccedilatildeo de 1988 pareciam acenar com a
garantia aos direitos humanos e ambientais e uma preocupaccedilatildeo maior
com a participaccedilatildeo das pessoas nos processos de tomada de decisatildeo as
recentes alteraccedilotildees nas leis ambientais parecem um grande retrocesso e
a participaccedilatildeo das pessoas restrita agrave democracia representativa e a
instacircncias participativas controladas
O Estado passou a reforccedilar seu papel como indutor do
desenvolvimento capitalista direcionando investimentos em alguns
setores econocircmicos aos quais se destina financiamento subsiacutedios e
infraestrutura logiacutestica (transporte e energia) Acabou criando tambeacutem
mecanismos que asseguram o aumento no ritmo da exploraccedilatildeo de
recursos naturais e da despossessatildeo de grupos sociais com a desculpa de
gerar divisas para reduzir a pobreza e a desigualdade social ldquoEm nome
da superaccedilatildeo da desigualdade e da pobreza governos progressistas
impulsionam a expansatildeo de atividades extrativas ndash notadamente o
petroacuteleo e os mineacuterios ndash cujos custos sociais e ambientais tecircm gerado
exclusatildeo e desigualdaderdquo (MALERBA 2012 p 12-3)
O carvatildeo mineral acompanha esse movimento mais amplo com
suas especificidades que satildeo tratadas a seguir
86
32 CARACTERIZACcedilAtildeO E USOS DO CARVAtildeO MINERAL7 NO
BRASIL
A histoacuteria do carvatildeo mineral no Brasil teve iniacutecio em 1795 no Rio
Grande do Sul Ele foi descoberto por teacutecnicos ingleses que construiacuteam
ferrovias na regiatildeo do baixo Jacuiacute Durante muito tempo sua exploraccedilatildeo
foi manual passando agrave etapa da mecanizaccedilatildeo somente apoacutes a Segunda
Guerra Mundial (CHAVES 2008 GOMES et al 1998)
A mineraccedilatildeo eacute uma atividade intensiva em recursos naturais
principalmente do solo e da aacutegua competindo com outros usos dos
recursos naturais locais principalmente aqueles que dependem do meio
ambiente tais como pesca turismo agricultura etc Dentre os principais
usos do carvatildeo mineral destacam-se a produccedilatildeo de energia eleacutetrica e uso
industrial principalmente sideruacutergico O uso tem relaccedilatildeo com a
qualidade do carvatildeo medida pela capacidade de produccedilatildeo de calor
Capacidade essa que eacute favorecida pela existecircncia de carbono e
prejudicada pela quantidade de impurezas normalmente material
orgacircnico (macerais do carvatildeo) e inorgacircnicos (argilas pirita e
carbonatos) (ANEEL 2008a SAMPAIO 2002)
O Brasil natildeo tem uma cultura de uso do carvatildeo mineral como em
outros paiacuteses sua exploraccedilatildeo eacute restrita ao Sul do paiacutes outras regiotildees natildeo
convivem com a questatildeo A qualidade do carvatildeo mineral brasileiro eacute
inferior dado resultante dos altos teores de cinza e enxofre (carvatildeo de
SC e PR) e o passivo ambiental de uma exploraccedilatildeo predatoacuteria e sem
compromisso com o meio ambiente fez com que essa atividade natildeo
contasse com boa fama (CHAVES 2008)
O carvatildeo mineral de acordo com o poder caloriacutefico e a incidecircncia
de impurezas se subdivide em carvatildeo de baixa qualidade (linhito e sub-
betuminoso) e hulha (Betuminoso e Antracito) As reservas brasileiras
satildeo compostas pelo carvatildeo dos tipos linhito e sub-betuminoso que pode
ser utilizado na produccedilatildeo de energia eleacutetrica e usado industrialmente
(ANEEL 2008a) (Figura 5)
7 O carvatildeo mineral natildeo eacute um mineral no sentido estrito sendo mais correto
chamaacute-lo de carvatildeo foacutessil A opccedilatildeo pelo carvatildeo mineral se justifica na medida
em que a maior parte dos documentos e referecircncias consultadas utilizam o
termo (CHAVES 2008)
87
Figura 5 - Tipos de carvatildeo e uso
Fonte Adaptado de Aneel (2008a p 133)
A produccedilatildeo do carvatildeo mineral bruto no Brasil em 1970 foi de 55
milhotildees de toneladas chegando ao pico em 1985 com 249 milhotildees de
toneladas (MILIOLI 2009) Ateacute final da deacutecada de 1980 as sideruacutergicas
brasileiras eram obrigadas a comprar carvatildeo coqueificaacutevel nacional para
misturar com o importado Os empresaacuterios do setor contaram com as
benesses do governo federal que obrigava as sideruacutergicas a utilizarem o
carvatildeo mineral brasileiro e os consumidores do carvatildeo mineral eram
empresas governamentais Como natildeo havia diferenccedila entre o preccedilo e a
qualidade do produto as carboniacuteferas natildeo eram estimuladas a melhorar
a qualidade nem buscar tecnologia para isso
O Governo Collor rompeu com a obrigatoriedade do consumo do
carvatildeo mineral pelas metaluacutergicas e muitas mineradoras enfrentaram
problemas (CHAVES 2008) O pano de fundo para o debate eleacutetrico
dos anos 1990 principalmente durante o governo de Fernando Henrique
Cardoso era a liberalizaccedilatildeo dos preccedilos do comeacutercio e do investimento
estrangeiro a desregulamentaccedilatildeo e a privatizaccedilatildeo em grande escala
(GOLDENBERG PRADO 2003)
O carvatildeo energeacutetico passou a ser uma opccedilatildeo para a crise
enfrentada pelas carboniacuteferas As termeleacutetricas estatais foram
privatizadas ou tiveram o seu capital aberto na deacutecada de 1990 exceto a
Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica (CGTEE) Em 2013
estavam em operaccedilatildeo treze usinas termeleacutetricas em seis estados
brasileiros somando um total de 2711 Megawatts (MW) (Tabela 1)
Destaca-se nessas usinas a participaccedilatildeo de empresas estrangeiras
88
Tractebel CITIC Group (estatal chinesa em parceria com a Companhia
de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica) o Consoacutercio Alumar (formado
pelas empresas Alcoa BHP Billiton e Rio Tinto Alcan) e a ENEVA
Tabela 1 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral em
operaccedilatildeo em 2013 Brasil
Fonte ANEEL 2013
Natildeo havia nenhum empreendimento movido a carvatildeo mineral em
construccedilatildeo no ano de 2013 Existem quatro empreendimentos com
outorga no periacuteodo de 1998 a 2013 somando um total de 1445 MW
localizados nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul (Tabela
2)
Tabela 2 - Usinas termeleacutetricas movidas a carvatildeo mineral com
outorga de 1998 a 2013 Brasil
Fonte ANEEL 2013
USINAPOTEcircNCIA
(MW)MUNICIacutePIO UF PROPRIETAacuteRIO
Charqueadas 72 Charqueadas RS Tractebel
Presidente Meacutedici A B 446 Candiota RS CGTEE
Satildeo Jerocircnimo 20 Satildeo Jerocircnimo RS CGTEE
Figueira 20 Figueira PR Copel
Jorge Lacerda I e II 232 Capivari de Baixo SC Tractebel
Jorge Lacerda III 262 Capivari de Baixo SC Tractebel
Jorge Lacerda IV 363 Capivari de Baixo SC Tractebel
Alunorte 103 Nossa Senhora do Socorro SE Alumina Norte do Brasil SA
Alumar 75 Satildeo Luiacutes MA Consoacutercio Alumar
Porto do Itaqui 360 Satildeo Luiacutes MA UTE Porto do Itaqui Geraccedilatildeo de Energia SA
Porto do Peceacutem I 381 Satildeo Gonccedilalo do Amarante CE Porto do Peceacutem Geraccedilatildeo de Energia SA
Candiota III 12 Candiota RS CGTEE
Porto do Peceacutem II 365 Satildeo Gonccedilalo do Amarante CE MPX Peceacutem II Geraccedilatildeo de Energia SA
TOTAL 2711
USINAPOTEcircNCIA
(MW)MUNICIacutePIO UF PROPRIETAacuteRIO
Jacuiacute 350 Charqueadas RS Eleacutetrica Jacuiacute SA
Sul Catarinense 440 Treviso SC UTE Sul Catarinense
Concoacuterdia 5 Concoacuterdia SC Sadia
CTSUL 650 Cachoeira do Sul RS Central Termoeleacutetrica Sul SA
TOTAL 1445
89
As reservas de carvatildeo no Brasil totalizam sete bilhotildees de
toneladas ocupando o 10ordm lugar no ranking mundial podendo gerar 17
mil mw (ANEEL 2008B) Conveacutem ressaltar tambeacutem que o Brasil
produz mais energia eleacutetrica do que consome em 2011 foram
disponibilizados 5676 TeraWattshora (TWh) e consumidos 4801TWh
e em 2012 foram disponibilizados 5928TWh e consumidos 4984 TWh
A oferta de energia eleacutetrica a base de carvatildeo mineral tende a aumentar
em 53 se as usinas termeleacutetricas com outorga forem construiacutedas Com
a inclusatildeo do carvatildeo mineral nos leilotildees em 2013 parece ser uma
questatildeo de tempo para que as termeleacutetricas listadas na tabela 22 entrem
no leilatildeo e comecem a ser construiacutedas (BRASIL EPE 2013b)
33 TECNOLOGIAS DISPONIacuteVEIS E IMPACTOS
SOCIOAMBIENTAIS
Da extraccedilatildeo do carvatildeo mineral ateacute a geraccedilatildeo de energia eleacutetrica
existem diferentes processos a serem considerados a extraccedilatildeo o
beneficiamento o transporte o uso do carvatildeo mineral para geraccedilatildeo de
energia eleacutetrica e a disposiccedilatildeo dos rejeitos Cada um desses processos
envolve escolhas tecnoloacutegicas e seus impactos Nesta seccedilatildeo faz-se uma
breve exposiccedilatildeo dos meacutetodos utilizados nos processos compreendendo
que a escolha entre os meacutetodos e impactos decorrentes eacute mais
condicionada pelas leis existentes do que pelo tipo de tecnologia
disponiacutevel A escolha tem a ver com a opccedilatildeo do desenvolvimento
(BRITO 1981)
No que se refere agrave extraccedilatildeo do carvatildeo mineral os meacutetodos
utilizados satildeo a lavra a ceacuteu aberto e subterracircnea dependendo das
caracteriacutesticas geoloacutegicas No iniacutecio as lavras eram essencialmente
manuais depois passaram para uma fase semi-mecanizada e depois
mecanizada Na fase manual o impacto ambiental e a produtividade
eram menores O processo de mecanizaccedilatildeo aumentou a produccedilatildeo e com
ela uma maior destruiccedilatildeo ambiental e problemas de sauacutede (MENEZES
CAROLA 2011)
As lavras a ceacuteu aberto utilizam os seguintes meacutetodos meacutetodo de
lavras em tiras (strip mining) lavra de descobertura com escavadeiras de
arrasto (dragline stripping method) lavra em bancadasescavadeira Os
trecircs meacutetodos de formas diferentes retiram as camadas de solo e outras
formaccedilotildees sedimentares que cobrem as camadas de carvatildeo Satildeo meacutetodos
90
de baixo custo comparados aos de lavra subterracircnea mas foram as
lavras a ceacuteu aberto que causaram entre 1960 e 1970 os maiores danos
ambientais do Sul de Santa Catarina (KOPPE COSTA 2008
MENEZES CAROLA 2011 MONTEIRO 2008)
Dentre os meacutetodos de lavra subterracircnea destacam-se o meacutetodo de
cacircmaras e pilares e de frente larga No primeiro meacutetodo o carvatildeo eacute
extraiacutedo e os pilares satildeo formados pelo proacuteprio carvatildeo que sustenta a
cobertura e facilita o fluxo de ar Na medida em que a mineraccedilatildeo
avanccedila os pilares satildeo retirados e a cobertura tomba Jaacute o meacutetodo da
frente larga envolve a remoccedilatildeo total do carvatildeo e a sustentaccedilatildeo eacute feita por
macacos hidraacuteulicos O meacutetodo precisa estar adequado agrave geologia da
mina e o custo do maquinaacuterio eacute cerca de dez vezes maior que do outro
meacutetodo A lavra subterracircnea causa menos impacto visual mas os
impactos ambientais tambeacutem satildeo significativos Torna-se necessaacuterio o
descarte da aacutegua subterracircnea alterando o regime hiacutedrico e inviabiliza
outros usos do solo (KOPPE COSTA 2008 MONTEIRO 2008)
Dentre os principais impactos resultantes das lavras estatildeo as
mudanccedilas na vida da populaccedilatildeo nos recursos hiacutedricos na fauna e flora
Jaacute o processo de beneficiamento que compreende a separaccedilatildeo dos
materiais desejaacuteveis e indesejaacuteveis tem como principal causador de
impacto o rejeito (ANEEL 2008a) O Quadro 4 apresenta alguns
aspectos ambientais associados agrave atividade de mineraccedilatildeo e
processamento mineral
91
Quadro 4 - Aspectos das atividades de mineraccedilatildeo e processamento
do carvatildeo mineral Mineraccedilatildeo e
processamento
Ar Dispersatildeo de partiacuteculas
Variaccedilatildeo da composiccedilatildeo da poeira do
ar
Poeira
Solo Fontes pontuais de contaminaccedilatildeo
Geraccedilatildeo de resiacuteduos
Alteraccedilatildeo na vegetaccedilatildeo
Instabilidade de taludes
Variaccedilatildeo na morfologia do terreno
Cavidades subterracircneas
Aacutegua
superficial
Contaminaccedilatildeo quiacutemica (drenagem
aacutecida etc)
Soacutelidos em suspensatildeo
Desestabilizaccedilatildeo das margens
Alteraccedilatildeo dos cursos de aacutegua
Criaccedilatildeo de novos corpos hiacutedricos
Aacutegua
subterracircnea
Contaminaccedilatildeo quiacutemica
Alteraccedilatildeo na profundidade do niacutevel
drsquoaacutegua
Variaccedilatildeo nas propriedades dos
aquiacuteferos
Fonte CETEM (2000 p 16)
No meacutetodo mais tradicional de geraccedilatildeo de energia eleacutetrica o
carvatildeo mineral eacute queimado a altas temperaturas transformando a aacutegua da
caldeira em vapor capaz de mover a turbina gerando eletricidade Em
meacutedia as teacutermicas movidas a carvatildeo mineral produzem 700g de CO2
por Quilowatt-hora (KWh) sendo responsaacuteveis por 30 a 35 do total de
emissotildees de CO2 no mundo Aleacutem do CO2 tambeacutem emitem Nitrogecircnio
(N) (ANEEL 2008a YAMAOKA et al 2013)
As chamadas tecnologias limpas compreendem a combustatildeo
pulverizada supercriacutetica a combustatildeo em leito fluidizado e a
gaseificaccedilatildeo integrada a ciclo combinado segundo a IEA Na
combustatildeo pulverizada supercriacutetica o carvatildeo eacute queimado como partiacuteculas pulverizadas o que aumenta substancialmente a eficiecircncia da
combustatildeo e conversatildeo No processo de combustatildeo em leito fluidizado
haacute uma reduccedilatildeo de Enxofre (ateacute 90) e de Nitrogecircnio (7080) pelo
emprego de partiacuteculas calcaacuterias e de temperaturas inferiores ao processo
convencional de pulverizaccedilatildeo Jaacute a gaseificaccedilatildeo integrada a ciclo
92
combinado consiste na reaccedilatildeo do carvatildeo com vapor de alta temperatura
e um oxidante (processo de gaseificaccedilatildeo) o que daacute origem a um gaacutes
combustiacutevel sinteacutetico de meacutedio poder caloriacutefico Esse gaacutes pode ser
queimado em turbinas a gaacutes e recuperado por meio de uma turbina a
vapor (ciclo combinado) o que possibilita a remoccedilatildeo de cerca de 95
do Enxofre e a captura de 90 do Nitrogecircnio Apesar da reduccedilatildeo de
Enxofre e Nitrogecircnio as tecnologias do chamado ldquocarvatildeo limpordquo natildeo
representam uma soluccedilatildeo para a emissatildeo de gases de efeito estufa
(ANEEL 2008a MONTEIRO 2008)
Cada tecnologia tem o seu impacto Na escolha por uma
tecnologia ou outra um impacto menor natildeo eacute considerado o motivador
inicial Atender os requisitos miacutenimos da legislaccedilatildeo e ser viaacutevel do
ponto de vista econocircmico satildeo os motivadores principais das escolhas
Os interesses dos segmentos econocircmicos natildeo raro prevalecem sobre os
interesses dos segmentos sociais ldquoO planejamento pauta-se em acordos
setoriais natildeo necessariamente fruto de uma compilaccedilatildeo e mediaccedilatildeo de
interesses mais amplos da sociedaderdquo (BERMANN 2012 p 21)
O raciociacutenio eacute produzir mais e natildeo pensar em eficiecircncia
energeacutetica O paiacutes perde cerca de 20 de energia na transmissatildeo e
distribuiccedilatildeo Antes de investir em novas tecnologias e ampliar o sistema
seria interessante resolver a perda na transmissatildeo e distribuiccedilatildeo de
energia (BERMANN 2012)
34 REGRAS EM USO NUMA PERSPECTIVA HISTOacuteRICA
INTERFACE ENTRE DIREITOS AMBIENTAIS E DIREITOS
HUMANOS
O marco regulatoacuterio do carvatildeo mineral se relaciona com o modo
como a questatildeo ambiental foi sendo incorporada nas leis e numa
perspectiva mais ampla sobre como os direitos ambientais e os direitos
humanos foram sendo constituiacutedos no Brasil O desafio da justiccedila em
sua relaccedilatildeo com as poliacuteticas ambientais tem dois aspectos relacionais a
justiccedila da distribuiccedilatildeo de ambientes entre pessoas e a justiccedila da relaccedilatildeo
entre humanos e o resto do mundo natural a justiccedila ambiental e justiccedila
ecoloacutegica respectivamente A justiccedila eacute uma qualidade da conduta
humana e envolve tanto a reflexatildeo sobre si mesmo e o estar no mundo
quanto a conduta coordenada com os outros a conduta social e poliacutetica
(LOW GLEESON 1998)
93
Durante muito tempo na histoacuteria recente do brasil os recursos
naturais natildeo renovaacuteveis foram tratados como recursos a serem
explorados natildeo havia uma preocupaccedilatildeo com sua preservaccedilatildeo e com os
impactos socioambientais decorrentes das atividades econocircmicas A
Constituiccedilatildeo de 1934 mencionou pela primeira vez a competecircncia
privativa da Uniatildeo para legislar sobre o subsolo mineraccedilatildeo metalurgia
aacuteguas energia hidreleacutetrica florestas caccedila e pesca Do ponto de vista das
competecircncias a Constituiccedilatildeo de 1937 manteacutem a competecircncia privativa
da Uniatildeo sobre os recursos naturais e seus usos considerando a
competecircncia supletiva dos Estados As Constituiccedilotildees de 1946 1967-69
reproduzem com poucas atualizaccedilotildees as mesmas competecircncias
(SCARDUA BURSZTYN 2003)
A despeito do Coacutedigo das Aacuteguas de 1934 que lograva proteger
os recursos hiacutedricos e imputava ao poluidor os custos com a
recuperaccedilatildeo o setor carboniacutefero seguiu intensificando a poluiccedilatildeo das
aacuteguas e dos solos O mesmo aconteceu com as condiccedilotildees miacutenimas de
trabalho presentes no Coacutedigo de Mineraccedilatildeo e no Coacutedigo de Higiene e
Seguranccedila no Trabalho que foram sistematicamente desconsideradas
impondo condiccedilotildees muitas vezes incompatiacuteveis com a vida humana
(MENEZES CAROLA 2011)
O avanccedilo do segmento do carvatildeo mineral contou com incentivos
e proteccedilatildeo do governo federal a partir de 1931 atraveacutes do Decreto
20089 em 1940 com o Decreto 2667e o Decreto 1828 de 1937 Aleacutem
de regular o aproveitamento do carvatildeo mineral iniciou nesse momento a
obrigatoriedade de compra do carvatildeo nacional em 10 em 1931 e 20
em 1937 do montante das importaccedilotildees (BRASIL 1931 1937 1940) As
medidas tomadas nesse periacuteodo incluindo aiacute o Plano do Carvatildeo
Nacional Lei nordm 1886 de 1953 fortaleceram muito o setor (BRASIL
1953) Inclui-se nessa lista o Coacutedigo de Mineraccedilatildeo de 1967 Decreto-Lei
nordm 227 (BRASIL 1967) Junto com o Plano do Carvatildeo Mineral eacute criada
a Comissatildeo Executiva do Plano do Carvatildeo Nacional (CEPCAN) ligada
inicialmente ao Presidente da Repuacuteblica e depois ao MME A
CEPCAN foi responsaacutevel pela consolidaccedilatildeo da modernizaccedilatildeo e dos
subsiacutedios para o setor carboniacutefero (MENEZES CAROLA 2011)
A Avaliaccedilatildeo de Impacto Ambiental (AIA) apareceu no Brasil
pela primeira vez na deacutecada de 1970 no projeto da hidroeleacutetrica de
Sobradinho por pressatildeo do Banco Mundial e na Lei nordm 6803 de 1980
que dispotildee sobre zoneamento industrial Mas soacute se efetivou na Lei nordm
6938 de 1981 que dispotildee sobre a PNMA que coloca a avaliaccedilatildeo de
94
impacto ambiental como instrumento da Poliacutetica Com o Decreto nordm
88351 ela se tornou parte do licenciamento de atividades e
empreendimentos potencialmente poluidores ou causadores de
degradaccedilatildeo ambiental (BARBIERI 1995)
O CONAMA atraveacutes da Resoluccedilatildeo nordm 1 de 1986 trouxe os
criteacuterios baacutesicos e diretrizes para o uso e implementaccedilatildeo da AIA A
resoluccedilatildeo define impacto ambiental como ldquoqualquer alteraccedilatildeo das
propriedades fiacutesicas quiacutemicas e bioloacutegicas do meio ambiente causada por qualquer forma de mateacuteria ou energia resultante das atividades
humanas que direta ou indiretamente afetam I) a sauacutede e bem-estar da
populaccedilatildeo II) as atividades sociais e econocircmicas III) a biota IV) as condiccedilotildees esteacuteticas e sanitaacuterias do meio ambiente V) a qualidade dos
recursos ambientaisrdquo Os processos que envolvem o carvatildeo mineral
extraccedilatildeo beneficiamento transporte uso para geraccedilatildeo de energia satildeo
considerados passiacuteveis de causar impacto e por isso a exigecircncia da
avaliaccedilatildeo de impacto ambiental para seus licenciamentos (BARBIERI
1995)
O Decreto nordm 9927490 conta com a seguinte redaccedilatildeo
Art 19 O Poder Puacuteblico no exerciacutecio de sua
competecircncia de controle expediraacute as seguintes
licenccedilas
I - Licenccedila Preacutevia (LP) na fase preliminar do
planejamento de atividade contendo requisitos
baacutesicos a serem atendidos nas fases de
localizaccedilatildeo instalaccedilatildeo e operaccedilatildeo observados os
planos municipais estaduais ou federais de uso do
solo
II - Licenccedila de Instalaccedilatildeo (LI) autorizando o
iniacutecio da implantaccedilatildeo de acordo com as
especificaccedilotildees constantes do Projeto Executivo
aprovado e
III - Licenccedila de Operaccedilatildeo (LO) autorizando
apoacutes as verificaccedilotildees necessaacuterias o iniacutecio da
atividade licenciada e o funcionamento de seus
equipamentos de controle de poluiccedilatildeo de acordo
com o previsto nas Licenccedilas Preacutevia e de
Instalaccedilatildeo (BRASIL 1990)
Uma exigecircncia no processo de licenciamento eacute a elaboraccedilatildeo do
Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatoacuterio de Impacto
Ambiental (RIMA) A avaliaccedilatildeo de impacto ambiental conforme consta
95
na Figura 6 compreende segundo orientaccedilotildees internacionalmente
aceitas uma etapa inicial de triagem [na qual o estudo de impacto
ambiental eacute solicitado ou natildeo de acordo com o grau de possiacuteveis
impactos ambientais] uma etapa de anaacutelise detalhada [que inclui a
delimitaccedilatildeo do escopo do estudo a elaboraccedilatildeo do estudo de impacto
ambiental e do relatoacuterio de impacto ambiental a anaacutelise teacutecnica e a
consulta puacuteblica] e a etapa poacutes-aprovaccedilatildeo [que prevecirc o monitoramento
e gestatildeo ambiental e o acompanhamento] (SAacuteNCHEZ 2008a)
Figura 6 - Etapas da avaliaccedilatildeo de impacto ambiental
Fonte Adaptado de Saacutenchez (2008 p 96)
96
A audiecircncia puacuteblica no processo de licenciamento ambiental eacute
uma forma de consulta puacuteblica (consta na anaacutelise detalhada na Figura 6)
um instrumento de participaccedilatildeo de caraacuteter consultivo e informativo
segundo resoluccedilatildeo do CONAMA Nordm 009 de 03 de dezembro de 1987
A audiecircncia pode ser solicitada pelo oacutergatildeo ambiental responsaacutevel pelo
licenciamento por uma entidade civil pelo ministeacuterio puacuteblico ou por
um grupo de pelo menos 50 cidadatildeos (CONAMA 1987) Todavia a
decisatildeo no processo de licenciamento cabe aos oacutergatildeos ambientais
competentes No acircmbito federal ao IBAMA e no acircmbito estadual os
oacutergatildeos ambientais estaduais (SAacuteNCHEZ 2008a)
A Avaliaccedilatildeo Ambiental Estrateacutegica (AAE) surge dos limites da
AIA Entre esses limites estatildeo a dificuldade ldquode analisar com
profundidade alternativas tecnoloacutegicas e de localizaccedilatildeo de levar em
conta satisfatoriamente os impactos cumulativos e os impactos indiretos
satildeo inerentes a esta forma de avaliaccedilatildeo de impacto ambientalrdquo
(SAacuteNCHEZ 2008 p 4)
A Constituiccedilatildeo de 1988 traz um capiacutetulo sobre o meio ambiente e
pela primeira vez na histoacuteria do Brasil coloca o meio ambiente como
direito ldquoTodos tecircm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado bem de uso comum do povo e essencial agrave sadia qualidade de vida impondo-se ao Poder Puacuteblico e agrave coletividade o dever de
defendecirc-lo e preservaacute-lo para as presentes e futuras geraccedilotildeesrdquo (Art
225 BRASIL 1988) Cabe aos Estados Distrito Federal e Municiacutepios
acrescentar normas especiacuteficas desde que natildeo colidam com a norma
federal (BARBIERI 1995)
A descentralizaccedilatildeo estimulada pela Constituiccedilatildeo de 1988 foi
inovadora ao contemplar mecanismos de democracia participativa
complementando os mecanismos da democracia representativa todavia
essa ainda natildeo ocorreu em niacutevel satisfatoacuterio e efetivo Desde 1996 todos
os estados brasileiros contam com poliacuteticas ambientais estaduais e
oacutergatildeos responsaacuteveis pela sua implementaccedilatildeo Os municiacutepios caminham
devagar 117 contam com algum oacutergatildeo para tratar do meio ambiente e
213 possuem Conselho Municipal de Meio Ambiente (SCARDUA BURSZTYN 2003)
Outro ponto tratado na Constituiccedilatildeo de 1988 que diz respeito agrave
atividade mineradora eacute a Compensaccedilatildeo Financeira pela Exploraccedilatildeo de
Recursos Minerais (CFEM) O valor da CFEM eacute aplicado sobre o
97
faturamento liacutequido e varia de acordo com a substacircncia mineral Para o
carvatildeo aplica-se a aliacutequota de 2 O valor eacute pago mensalmente e 12
dele vai para a Uniatildeo 23 para o Estado e 65 para o municiacutepio
produtor Os recursos devem ser aplicados em projetos que direta ou
indiretamente melhorem a infra-estrutura qualidade ambiental sauacutede e
educaccedilatildeo da comunidade local (DNPM 2013) Um desafio colocado por
algumas pesquisas eacute o uso adequado da CFEM pela gestatildeo puacuteblica jaacute
que natildeo haacute uma regulamentaccedilatildeo legal para o uso do recurso (AARAtildeO
2011 ENRIacuteQUEZ 2007)
No Governo Fernando Henrique Cardoso foi aprovado o Decreto
nordm 3371 de 24 de fevereiro de 2000 que instituiu o Programa
Prioritaacuterio de Termeletricidade (BRASIL 2000) Com o apagatildeo de 2001
ressurgiu a ideia de que a seguranccedila energeacutetica do paiacutes estaria garantida
com a construccedilatildeo de mais usinas termeleacutetricas (GOLDENBERG
2012a)
Em 2010 comeccedilou a ser articulado um novo marco regulatoacuterio
para a mineraccedilatildeo no Brasil sendo lanccedilado o Projeto de Lei (PL) em
junho de 2013 Em 2014 o Congresso analisaraacute o PL 58072013
(BRASIL 2013a) fruto da Frente Parlamentar da Mineraccedilatildeo Brasileira
da qual fazem parte Celso Maldaner (PMDB) Deacutecio Lima (PT)
Jorginho Mello (Partido da Repuacuteblica - PR) Onofre Santo Agostini
(Partido Social Democraacutetico - PSD) todos eleitos por Santa Catarina
(BRASIL 2013b)
Um dos pontos polecircmicos eacute a regulamentaccedilatildeo da mineraccedilatildeo em
terras indiacutegenas quilombolas e ribeirinhas questatildeo que se situa na
interface entre direitos ambientais e direitos humanos A Constituiccedilatildeo de
1891 vinculava a propriedade do subsolo agrave do solo sendo alterada pela
Constituiccedilatildeo de 1934 ateacute os dias atuais permanecendo a natildeo existecircncia
de viacutenculo entre propriedade do solo e subsolo que pertence agrave Uniatildeo
Todavia conveacutem ressaltar que apesar do domiacutenio puacuteblico dos recursos
minerais eacute possiacutevel a apropriaccedilatildeo privada mediante concessatildeo
(BRASIL MME 2013) A principal criacutetica do novo marco regulatoacuterio eacute
a de que ldquoeacute necessaacuterio reafirmar que o lsquopuacuteblicorsquo e a lsquonaccedilatildeorsquo vivem e
ocorrem sobre o solo e natildeo no subsolo Dessa forma eacute o uso do solo que
deve definir a possibilidade da exploraccedilatildeo do subsolo e natildeo o contraacuteriordquo
(MILANEZ 2012 p 82)
O crescimento da consciecircncia ambiental relaciona-se agrave discussatildeo
histoacuterica sobre direitos humanos e do exerciacutecio desigual de direitos O
movimento ambientalista eacute fruto dessa tradiccedilatildeo de lutas por direitos
98
individuais e coletivos (GONCcedilALVES 1992) Todavia o desafio eacute
superar a visatildeo de que o natildeo-humano eacute de interesse apenas na medida
em que afeta os seres humanos A democracia a justiccedila social e os
direitos humanos satildeo condiccedilatildeo importante para enfrentar a crise mas
natildeo satildeo suficientes Eacute preciso superar tambeacutem o antropocentrismo
caminhando da justiccedila ambiental para a justiccedila ecoloacutegica (DELUCA
2007)
35 ENVOLVIDOS NA GESTAtildeO
Nesta seccedilatildeo satildeo destacados os envolvidos na gestatildeo do carvatildeo
mineral no Brasil que atuam numa escala mais ampla que a estadual Os
envolvidos na gestatildeo de recursos comuns de Santa Catarina sediados no
estado seratildeo destacados no capiacutetulo quatro Os que foram aqui citados
aparecem nos documentos consultados Dessa forma conveacutem ressaltar
que pode haver outros envolvidos que natildeo estejam citados nesse
capiacutetulo
351 Segmentos poliacuteticos
A atual presidente da repuacuteblica Dilma Rousseff eleita pelo PT
tem mandato de 2011 a 2014 Em sua campanha mais de 90 da receita
foi proveniente de doaccedilotildees ao Comitecirc Financeiro Nacional Do total de
R$ 137 milhotildees e meio o setor mineral contribuiu com 10 desse
valor A Tractebel empresa geradora de energia eleacutetrica doou um
milhatildeo de reais para o Comitecirc Financeiro Nacional para Presidente da
Repuacuteblica do PT o que correspondeu a 07 da receita (OLIVEIRA
2013 TSE 2013) Do setor carboniacutefero natildeo foram identificadas
doaccedilotildees
O Ministeacuterio das Minas e Energia (MME) eacute chave tambeacutem no
processo de gestatildeo Ele foi criado em 1960 e tem como competecircncias a
formulaccedilatildeo e supervisatildeo das poliacuteticas puacuteblicas nos seguintes segmentos geologia recursos minerais e energeacuteticos aproveitamento da energia
hidraacuteulica mineraccedilatildeo e metalurgia e petroacuteleo combustiacutevel e energia
eleacutetrica inclusive nuclear Tem como ministro Edison Lobatildeo e congrega
as secretarias de Petroacuteleo Gaacutes Natural e Combustiacuteveis Renovaacuteveis a
99
Secretaria de Energia Eleacutetrica a Secretaria de Planejamento e
Desenvolvimento Energeacutetico Estatildeo vinculados ao MME o
Departamento Nacional de Produccedilatildeo Mineral (DNPM) (Criado em
1934) a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM)
(Criada em 1969 e iniciando suas atividades em 1970) a ANEEL
(Criada em 1996) o Conselho Nacional de Poliacutetica Energeacutetica (CNPE)
(Criado em 1997)
No Brasil apesar de haverem espaccedilos institucionais o debate
sobre a poliacutetica energeacutetica permanece restrito O Conselho Nacional de
Poliacutetica Energeacutetica (CNPE) criado em 1997 e regulamentado em 2000
eacute um oacutergatildeo de assessoramento da Presidecircncia da Repuacuteblica Ele tem em
sua composiccedilatildeo sete Ministros um representante dos estados e do
Distrito Federal um cidadatildeo brasileiro especialista em energia
designado pelo Presidente da Repuacuteblica e um representante de
universidade brasileira especialista em energia O CNPE eacute influente nos
rumos da poliacutetica energeacutetica nacional todavia pouco democraacutetica em
sua composiccedilatildeo A ANEEL por sua vez ao inveacutes de ser autocircnoma e
independente estaacute formalmente vinculada ao MME como autarquia e
na praacutetica demostra subordinaccedilatildeo ao governo federal (BERMANN
2001)
O Ministeacuterio do Meio Ambiente (MMA) foi criado em 1992
tendo como missatildeo ldquopromover a adoccedilatildeo de princiacutepios e estrateacutegias para
o conhecimento a proteccedilatildeo e a recuperaccedilatildeo do meio ambiente o uso
sustentaacutevel dos recursos naturais a valorizaccedilatildeo dos serviccedilos ambientais
e a inserccedilatildeo do desenvolvimento sustentaacutevel na formulaccedilatildeo e
implementaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas de forma transversal e
compartilhada participativa e democraacutetica em todos os niacuteveis e
instacircncias de governo e sociedaderdquo (MMA 2013) O CONAMA eacute o
oacutergatildeo consultivo e deliberativo do SISNAMA ambos criados em 1981
como instrumentos participativos da PNMA O CONAMA eacute o uacutenico
conselho com poder de legislar Os recursos naturais renovaacuteveis ficam
sob a tutela do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renovaacuteveis (IBAMA) criado em 1989 vinculado
posteriormente ao MMA Jaacute os recursos natildeo renovaacuteveis ficam sob tutela
do MME
O Parlamento eacute composto pelos representantes eleitos pelo povo
Ele se divide entre o Senado Federal (Senadores) e a Cacircmara dos
Deputados (Deputados Federais) e exerce o poder legislativo e
fiscalizador no Congresso Nacional Atuam tambeacutem no Parlamento a
100
Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral criada em 2005
e a Frente Parlamentar da Mineraccedilatildeo Brasileira criada em 2011 As
relaccedilotildees entre o parlamento e os segmentos econocircmicos junto agrave questatildeo
do carvatildeo mineral satildeo analisadas no capiacutetulo cinco dessa tese
(OLIVEIRA 2013)
Jaacute o Ministeacuterio Puacuteblico tem autonomia na estrutura do Estado em
relaccedilatildeo ao executivo legislativo e judiciaacuterio Cabe ao Ministeacuterio Puacuteblico
a defesa da ordem juriacutedica do regime democraacutetico dos interesses
sociais e dos interesses individuais indisponiacuteveis O Ministeacuterio Puacuteblico
da Uniatildeo divide-se em Ministeacuterio Puacuteblico Federal e os Ministeacuterios
Puacuteblicos de cada Estado da Federaccedilatildeo (BRASIL 1993 MPSC 2013)
Os segmentos poliacuteticos aqui apresentados atuam com limitaccedilotildees
mas tambeacutem oferecem brechas A sociedade deveria aproveitaacute-las para
debater os rumos da poliacutetica energeacutetica e as opccedilotildees de desenvolvimento
Contudo o contexto de energia privada e de consequente concentraccedilatildeo
de poder econocircmico se mostra prejudicial agraves questotildees ecoloacutegicas e
democraacuteticas (BERMANN 2001)
352 Segmentos econocircmicos
Os segmentos econocircmicos estatildeo organizados em associaccedilotildees
empresariais e mistas O Instituto Brasileiro de Mineraccedilatildeo (IBRAM) foi
criado em 1976 eacute uma associaccedilatildeo privada sem fins lucrativos que tem
por objetivo congregar representar promover e divulgar a induacutestria
mineral brasileira contribuindo para a sua competitividade nacional e
internacional A mineraccedilatildeo tambeacutem conta com o Consoacutercio Alumar
inaugurado em 1984 eacute um dos maiores complexos de produccedilatildeo de
alumiacutenio do mundo localiza-se no Maranhatildeo e eacute formado pelas
empresas Alcoa BHP Biliton e Rio Tinto Alcan
Os segmentos econocircmicos ligados ao carvatildeo mineral organizam-
se junto ao Sindicato Nacional da Induacutestria de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
(SNIEC) e a Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo Mineral (ABCM) O
SNIEC foi criado em 1989 em Santa Catarina reuacutene as empresas de
mineraccedilatildeo A ABCM foi constituiacuteda em 2006 e reuacutene agentes da cadeia
produtiva do carvatildeo mineradoras geradoras e transportadores O
principal objetivo da Associaccedilatildeo eacute integrar a cadeia produtiva visando o
desenvolvimento sustentaacutevel Conta com 20 empresas associadas
101
Como o tema de tese relaciona-se com a geraccedilatildeo de energia
eleacutetrica conveacutem ressaltar o papel da Cacircmara de Comercializaccedilatildeo de
Energia Eleacutetrica (CCEE) A CCEE foi criada em 2004 ela viabiliza a
compra e venda de energia em todo o paiacutes Ela reuacutene empresas de
geraccedilatildeo de serviccedilo puacuteblico produtores independentes autoprodutores
distribuidoras comercializadoras importadoras e exportadoras de
energia aleacutem de consumidores livres e especiais de todo o paiacutes
Existem empresas e cooperativas bastante influentes a niacutevel
nacional
- A Tractebel do grupo franco-belga GDF-Suez eacute a segunda
maior geradora de energia eleacutetrica privada do Brasil e maior produtora
independente de energia do mundo
- A CITIC Group estatal Chinesa eacute parceira da Eletrobraacutes no
acordo promulgado pelo Decreto nordm 6009 de 3 de janeiro de 2007
(BRASIL 2007)
- A Alunorte Alumina do Norte do Brasil SA criada em 1973
num acordo entre Brasil e Japatildeo pertencia a Vale e localiza-se no estado
do Paraacute A Vale foi privatizada em 1997 e em 2011 negociou as accedilotildees
da Alunorte com a Norsk Hydro ASA
- A ENEVA antiga MPX tendo como principais acionistas a
empresa alematilde EON com 362 e o empresaacuterio brasileiro Eike Batista
com 285 Eacute a maior geradora de energia eleacutetrica privada do Brasil
- A Companhia de Geraccedilatildeo Teacutermica de Energia Eleacutetrica
(CGTEE) constituiacuteda em 1997 pela Uniatildeo tornou-se uma empresa do
Sistema Eletrobraacutes em 2000 Em 2009 assinou um contrato com as
empresas Alstom Power Systems SA ndash France e com a Alstom Brasil
Energia e Transporte Ltda para recuperaccedilatildeo de caldeiras
- A estatal Companhia Paranaense de Energia (COPEL) foi criada
em 1954 abrindo seu capital em abril de 1994
- A Empresa de Pesquisa Energeacutetica (EPE) eacute uma empresa
puacuteblica criada em 2004 e tem por finalidade prestar serviccedilos na aacuterea de
estudos e pesquisas destinadas a subsidiar o planejamento do setor energeacutetico
Destaca-se nas empresas citadas um nuacutemero consideraacutevel de
empresas estrangeiras Conveacutem ressaltar aqui que as mineradoras
102
beneficiadoras e transportadoras natildeo constam nesse item por terem
influecircncia principalmente nos estados e regiotildees produtoras
353 Segmentos sociais
Os trabalhadores do setor mineral encontram-se organizados na
Associaccedilatildeo Nacional de Servidores do Departamento Nacional de
Produccedilatildeo Mineral (ANSDNPM) nos Sindicatos Metabase dentre
outros Jaacute os trabalhadores ligados ao carvatildeo mineral natildeo contam com
uma associaccedilatildeo especiacutefica em niacutevel nacional mas estatildeo organizados em
sindicatos estaduais A posiccedilatildeo dos trabalhadores em relaccedilatildeo ao carvatildeo
mineral eacute de apoio atuando em parceria com os segmentos econocircmicos
O que estaacute em jogo para os trabalhadores eacute a manutenccedilatildeo dos postos de
trabalho e seu sustento (MILANEZ et al 2013)
Os afetadosatingidosameaccedilados enfrentam dificuldades de
vaacuterias ordens no acesso agrave informaccedilatildeo falta de conhecimento teacutecnico-
cientiacutefico espaccedilo de debate restrito etc Na maioria das vezes as
decisotildees sobre empreendimentos de geraccedilatildeo de energia satildeo alimentadas
pela siacutendrome do ldquoapagatildeordquo e os direitos das populaccedilotildees atingidas
parecem ferir o ldquodireitordquo da maioria que precisa de energia
(BERMANN 2001) Mas apesar de todas as dificuldades os
afetadosatingidosameaccedilados pelo setor da mineraccedilatildeo se organizam em
frentes de defesa apoiadas por vaacuterias entidades sediadas em vaacuterias
escalas do local ao global Somam-se aiacute entidades religiosas sindicais
movimentos ambientais movimentos em defesa dos direitos humanos
movimentos indiacutegenas dentre outros Em 2012 surgiu o Movimento
Popular frente agrave Mineraccedilatildeo (MAM) e em 2013 surgiu o Comitecirc
Nacional em Defesa dos Territoacuterios Frente agrave Mineraccedilatildeo Faz parte do
Comitecirc a Federaccedilatildeo de Oacutergatildeos para a Assistecircncia Social e Educacional
(FASE) que atua desde 1961 pela democracia o Instituto de Estudos
Socioeconocircmicos (INESC) criado em 1979 e tem como principal frente
agrave questatildeo da cidadania a Conferecircncia Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB) o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) a
Articulaccedilatildeo dos Povos Indiacutegenas do Brasil (APIB) o Instituto Brasileiro de Anaacutelises Sociais e Econocircmicas (IBASE) entre outros (OLIVEIRA
2013) No caso especiacutefico do carvatildeo mineral natildeo haacute um movimento
popular ou comitecirc em acircmbito nacional embora tenha relaccedilatildeo com o
movimento e comitecirc acima referidos
103
As ONGs e representantes da comunidade acadecircmica tecircm um
papel de parceria com esses movimentos Vaacuterias publicaccedilotildees
demonstram a preocupaccedilatildeo com a questatildeo do carvatildeo mineral o
Greenpeace reprova o chamado ldquocarvatildeo limpordquo e os investimentos feitos
nesse setor (YAMAOKA et al 2013) Amigos da Terra Brasil publicou
Carvatildeo combustiacutevel de ontem com dados atualizados sobre os impactos
do carvatildeo mineral no Brasil (MONTEIRO 2008) A FASE apoiada
pela Fundaccedilatildeo Ford e pela Heinrich Boumlll Stiftung publicou em 2012 o
livro Novo marco legal da mineraccedilatildeo no Brasil Para quecirc Para
Quem (MARLERBA 2012) O IBASE com o apoio da Fundaccedilatildeo Ford
lanccedilou em 2013 Quem eacute quem nas discussotildees do novo coacutedigo da mineraccedilatildeo (OLIVEIRA 2013) Com um caraacuteter mais articulador
aparece o Foacuterum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio
Ambiente e o Desenvolvimento (FBOMS) desde 1990 e a Rede
Brasileira de Justiccedila Ambiental a partir de 2001
Os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais natildeo tecircm um
posicionamento homogecircneo em relaccedilatildeo a criacutetica ou continuidade da
exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral diferente da posiccedilatildeo dos segmentos
econocircmicos todos contam com contradiccedilotildees internas e externas As
relaccedilotildees estabelecidas nos segmentos e os diferentes posicionamentos de
segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais seratildeo examinados ao longo
dos proacuteximos capiacutetulos
36 SITUACcedilAtildeO ATUAL E DESAFIOS
O objetivo do capiacutetulo foi o de tratar a gestatildeo de recursos
comuns colocando ecircnfase no carvatildeo mineral Pela importacircncia
geopoliacutetica e econocircmica os recursos natildeo renovaacuteveis satildeo de competecircncia
do Ministeacuterio das Minas e Energia mesmo apoacutes a criaccedilatildeo do Ministeacuterio
do Meio Ambiente Dessa forma se a gestatildeo dos recursos naturais no
Brasil se pautou durante um longo periacuteodo pela preservaccedilatildeo e pela
conservaccedilatildeo os recursos naturais natildeo renovaacuteveis natildeo participaram desse
movimento A apropriaccedilatildeo e uso dos recursos naturais natildeo renovaacuteveis
passaram ao largo da regulaccedilatildeo dos recursos comuns
O segmento do carvatildeo mineral aleacutem da preocupaccedilatildeo com os
impactos socioambientais sofreu na deacutecada de 1990 com o corte dos
subsiacutedios e reorientou sua produccedilatildeo para a geraccedilatildeo de energia
termeleacutetrica Tambeacutem na geraccedilatildeo de energia eleacutetrica os novos
104
empreendimentos movidos a carvatildeo mineral passaram por um periacuteodo
sem entrar nos leilotildees de energia sendo incluiacutedos novamente em 2013
A inclusatildeo do carvatildeo mineral nos leilotildees e a reforma do Coacutedigo
de Mineraccedilatildeo demonstram a forte articulaccedilatildeo entre parte dos segmentos
poliacuteticos e econocircmicos Os segmentos sociais tecircm aiacute um grande desafio
Uma possibilidade jaacute explorada pelo movimento ambiental eacute a
interface entre direitos ambientais e direitos humanos Eacute preciso cada
vez mais politizar o tema da mineraccedilatildeo do carvatildeo mineral e da energia
Mineraccedilatildeo por quecirc Como Para quem Energia por quecirc Como Para
quem Natildeo existem respostas uacutenicas mas se parte dos segmentos
poliacuteticos e econocircmicos fazem valer seus interesses como ficam os
interesses dos segmentos sociais
Com a Poliacutetica Nacional de Meio Ambiente atraveacutes da avaliaccedilatildeo
de impacto ambiental e a Constituiccedilatildeo de 1988 surgiram novos espaccedilos
de participaccedilatildeo vistos como uma grande conquista pelo movimento
ambiental Um ponto chave para a questatildeo ambiental eacute o avanccedilo das
praacuteticas democraacuteticas E o campo de lutas por direitos envolve todas as
escalas
No Quadro 5 a seguir foi feita uma siacutentese dos principais
aspectos tratados ao longo do capiacutetulo que favorecem e questionam a
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral
Quadro 5 - Siacutentese dos pontos que favorecem e questionam a
amplicaccedilatildeo da geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo
mineral por macro variaacutevel
MACRO
VARIAacuteVEIS
ASPECTOS QUE
FAVORECEM A
AMPLIACcedilAtildeO
ASPECTOS QUE
QUESTIONAM A
AMPLIACcedilAtildeO
Dinacircmicas de
desenvolvimento
- Papel central do Estado
em assegurar os interesses
privados na gestatildeo de
recursos comuns e na
poliacutetica energeacutetica
- Fragmentaccedilatildeo da gestatildeo
de recursos comuns os
recursos renovaacuteveis satildeo da
competecircncia do MMA e os
recursos natildeo renovaacuteveis satildeo
da competecircncia do MME
- Discussatildeo mundial sobre
mudanccedila ambiental global
- Brasil como fornecedor
de commodities minerais
energeacuteticas e agriacutecolas e
- Atuaccedilatildeo do movimento
ambiental
105
- Privatizaccedilatildeo do setor
eleacutetrico
- subsiacutedios aos combustiacuteveis
foacutesseis
- Matriz energeacutetica
brasileira considerada limpa
em relaccedilatildeo a outros paiacuteses
justifica a ampliaccedilatildeo do uso
de combustiacuteveis foacutesseis e
- Visatildeo do planejamento
energeacutetico eacute aumentar a
oferta de energia eleacutetrica
Atributos fiacutesicos
e tecnoloacutegicos
- Disponibilidade do
recurso
- Evoluccedilatildeo tecnoloacutegica
- Neutralidade ldquodardquo e
confianccedila ldquonardquo tecnologia
- Ecircnfase na produccedilatildeo e natildeo
na eficiecircncia energeacutetica
- O Brasil natildeo tem uma
cultura do carvatildeo mineral a
atividade estaacute restrita ao sul
do paiacutes
- Mineraccedilatildeo impede outros
usos do solo
- Evoluccedilatildeo tecnoloacutegica natildeo
garante minimizaccedilatildeo dos
impactos socioambientais
- Escolhas teacutecnicas satildeo
escolhas poliacuteticas natildeo satildeo
neutras
- Necessidade de aumento
da eficiecircncia energeacutetica
Regras em uso - Desregulamentaccedilatildeo e
flexibilizaccedilatildeo das leis
(Coacutedigo de Mineraccedilatildeo)
- A CFEM faz com que o
governo em todos os seus
niacuteveis administrativos
ganhe com a exploraccedilatildeo
mineral
- Participaccedilatildeo tutelada
- Avanccedilo nas leis
(Exigecircncia da AIA nos
licenciamentos)
- Ampliaccedilatildeo da
participaccedilatildeo via audiecircncia
puacuteblica accedilatildeo civil puacuteblica
etc
- Relaccedilatildeo entre direitos
ambientais e direitos
humanos
Arena de accedilatildeo
(Caracterizaccedilatildeo
dos envolvidos
na gestatildeo)
- Parte dos segmentos
poliacuteticos tecircm parcerias com
os segmentos econocircmicos
atraveacutes de doaccedilotildees de
campanha e atraveacutes da
atuaccedilatildeo de parlamentares na
Frente Parlamentar Mista
em Defesa do Carvatildeo
Mineral
- Parte dos segmentos
poliacuteticos possuem
instacircncias participativas e
destaca-se tambeacutem a
atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico
- Os segmentos sociais
exceto o movimento
sindical estatildeo organizados
106
- Os segmentos econocircmicos
estatildeo organizados de vaacuterias
formas (sindicato
associaccedilatildeo instituto
cacircmara consoacutercio) e as
empresas exceto a COPEL
e a EPE satildeo
majoritariamente de capital
estrangeiro
- Nos segmentos sociais
destaca-se o apoio dos
sindicatos agrave causa do carvatildeo
mineral
e atuantes no
questionamento da
ampliaccedilatildeo da energia
termeleacutetrica movida a
carvatildeo mineral
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na macro variaacutevel arena de accedilatildeo a variaacutevel da democracia
apresenta limites relacionadas aos problemas da democracia
representativa e a reduccedilatildeo da participaccedilatildeo aos espaccedilos existentes Nas
oportunidades destacam-se a organizaccedilatildeo dos segmentos sociais (no
MAM e no Comitecirc Nacional em Defesa dos Territoacuterios Frente agrave
Mineraccedilatildeo) nas redes que unem ONGs academia e
afetadosatingidosameaccedilados e as publicaccedilotildees (Quadro 6)
Quadro 6 ndash Limites e oportunidades do sistema democraacutetico no
Brasil VARIAacuteVEL LIMITES OPORTUNIDADES
Fortalecimento do
sistema
democraacutetico
- Democracia
representativa
- Reduccedilatildeo da
participaccedilatildeo aos
espaccedilos existentes
- Organizaccedilatildeo dos Segmentos
sociais
- Redes unindo ONGs
academia e
afetadosatingidos
ameaccedilados
- Publicaccedilotildees
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Se a aprendizagem social adaptativa eacute chave nesse processo para
que ela ocorra defende-se a hipoacutetese de que o fortalecimento do sistema
democraacutetico se faz necessaacuterio A compreensatildeo da ampliaccedilatildeo da energia
107
termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral aleacutem das evidecircncias descritas
nesse capiacutetulo depende tambeacutem da investigaccedilatildeo dos processos do
ponto de vista do exerciacutecio da democracia em todas as escalas espaciais
e entre os segmentos poliacuteticos econocircmicos e sociais A questatildeo passa
pelo modo como os recursos satildeo explorados mas coloca tambeacutem em
questatildeo os objetivos e a direccedilatildeo do desenvolvimento (MELUCCI
2001)
4 CARVAtildeO MINERAL EM SANTA CATARINA
Eacute o duplo resultado da extraccedilatildeo do carvatildeo bens e
riquezas de um lado pirita e restos de homens de
outro (VOLPATO 1984 p 16)
A gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina foi marcada pela
apropriaccedilatildeo privada dos recursos e seu uso serviu principalmente ao
crescimento econocircmico As poliacuteticas ambientais por sua vez foram
condicionadas e limitadas pelos interesses poliacuteticos e econocircmicos e o
oacutergatildeo responsaacutevel a FATMA adotou uma postura de defesa das causas
ambientais sem desestruturar o crescimento econocircmico Nesse contexto
o discurso do carvatildeo foi habilmente sustentado do ponto de vista
material cultural psicoloacutegico e simboacutelico (CAROLA 2004)
O segmento do carvatildeo mineral alternou desde as primeiras
deacutecadas do seacuteculo XX periacuteodos de crescimento e periacuteodos de crise Os
periacuteodos de crescimento amparados por incentivos do governo federal
e os momentos de crise associados a momentos de crise na esfera
governamental Isso levou os segmentos econocircmicos da regiatildeo sul
catarinense a se articularem cada vez mais com os segmentos poliacuteticos
visando a proteccedilatildeo do segmento e a continuidade da mineraccedilatildeo do
carvatildeo no Sul de Santa Catarina Uma das estrateacutegias mais recentes eacute a
construccedilatildeo da USITESC
Cerca de 95 do carvatildeo mineral extraiacutedo na regiatildeo tem como
destino a geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica Se observados os dados sobre
geraccedilatildeo e consumo de energia eleacutetrica em Santa Catarina o estado natildeo eacute
autossuficiente Em 2012 o estado produziu 16963 Gigawatt-hora
(GWh) consumiu 21601 GWh O consumo industrial ficou em 9312
GWh 431 do total consumido no estado e o consumo residencial foi
de 4699 GWh 218 do total consumido (ANEEL 2014 EPE 2013)
O carvatildeo mineral foi responsaacutevel pelo equivalente a 35 da eletricidade
gerada em Santa Catarina (ALESC 2013)
Existem fortes argumentos para que a geraccedilatildeo de energia
termeleacutetrica se amplie contudo o histoacuterico de impactos socioambientais
poderia ser impeditivo Buscando aprofundar a reflexatildeo sobre os
argumento proacute e contra a ampliaccedilatildeo o objetivo deste capiacutetulo eacute tratar da
gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina com destaque agrave gestatildeo do
carvatildeo mineral considerando as macro variaacuteveis presentes no modelo de
110
anaacutelise de gestatildeo de recursos comuns (HESS OSTROM 2005
OAKERSON 1992 POLSKI OSTROM 1992)
Inicialmente eacute apresentada uma breve siacutentese de como foi se
organizando a gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina tendo
como eixo central o oacutergatildeo responsaacutevel pelas questotildees ambientais no
estado a FATMA Na sequecircncia as seccedilotildees contextualizam o carvatildeo
mineral na trajetoacuteria de desenvolvimento do Sul de Santa Catarina e
tratam das mudanccedilas ocorridas na extraccedilatildeo do carvatildeo mineral bem
como de seus impactos na regiatildeo Satildeo ainda discutidas as regras em uso
incorporando as alteraccedilotildees recentes do Coacutedigo Estadual do Meio
Ambiente de Santa Catarina e eacute feita uma breve caracterizaccedilatildeo da arena
de accedilatildeo com uma descriccedilatildeo dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais envolvidos na gestatildeo do recurso A forma como a gestatildeo de
recursos comuns se organiza em Santa Catarina revela aspectos
importantes para a compreensatildeo da ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica
bem como aspectos que ldquocoloquem em chequerdquo a continuidade da
atividade carboniacutefera
41 ldquoCombinandordquo crescimento econocircmico e proteccedilatildeo ambiental
Santa Catarina fez parte da histoacuteria do Brasil num primeiro
momento como territoacuterio de passagem para o gado gauacutecho e gerava
produtos primaacuterios para satisfazer as necessidades locais Na segunda
metade do seacuteculo XIX foram implantadas as primeiras induacutestrias do
estado A industrializaccedilatildeo catarinense teve em seu iniacutecio uma estreita
ligaccedilatildeo com os movimentos migratoacuterios da Alemanha e Itaacutelia jaacute que os
imigrantes tinham formaccedilatildeo intelectual e profissional e viveram a
modernizaccedilatildeo provocada pela Revoluccedilatildeo Industrial Destacaram-se
nesse periacuteodo a induacutestria tecircxtil alimentar e madeireira e o uso
energeacutetico do carvatildeo vegetal (THEIS 1988)
No final do seacuteculo XIX o estado ainda tinha uma economia
predominantemente agriacutecola e foram os produtos primaacuterios que
possibilitaram a geraccedilatildeo de capital para o investimento na induacutestria Na
histoacuteria de Santa Catarina dois marcos se destacaram na disputa pela
hegemonia na apropriaccedilatildeo dos recursos comuns o Genociacutedio Indiacutegena e
a Guerra do Contestado A desobstruccedilatildeo das aacutereas contestadas e
daquelas ocupadas pelos Carijoacute Xokleng e Kaingang foram
fundamentais para ampliar a apropriaccedilatildeo privada dos recursos naturais
111
(BORINELLI 1998) Aleacutem disso para sustentar o processo de
industrializaccedilatildeo em Santa Catarina no iniacutecio do seacuteculo XX ocorreu a
instalaccedilatildeo de pequenas usinas hidraacuteulicas e o aumento no uso do carvatildeo
mineral Na Primeira Guerra Mundial o carvatildeo mineral passou a ter
destaque possibilitando o surgimento da induacutestria carboniacutefera (THEIS
1988)
Ateacute a deacutecada de 1960 a regulaccedilatildeo dos recursos comuns foi
marcada pelo poder federal Todavia no campo econocircmico o estado
catarinense assumiu para si diversas funccedilotildees na promoccedilatildeo do
desenvolvimento econocircmico Data dessa eacutepoca a criaccedilatildeo do Banco
Estadual de Santa Catarina a Caixa Estadual de Santa Catarina do
Fundo de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina da
Universidade para o Desenvolvimento de Santa Catarina e a instalaccedilatildeo
de 46 escritoacuterios locais da Associaccedilatildeo de Creacutedito e Assistecircncia Rural de
Santa Catarina (ACARESC) e a Companhia Telefocircnica de Santa
Catarina (BORINELLI 1998) O sistema poliacutetico por sua vez teve um
predomiacutenio conservador relacionado principalmente com a dominaccedilatildeo
oligaacuterquica As lideranccedilas empresariais encontravam-se acomodadas nos
grandes partidos (CARREIRAtildeO 1990)
O crescimento econocircmico somado a uma regulaccedilatildeo dos recursos
naturais que privilegiava o acesso privado deu forma agrave crise ambiental
que teve lugar em Santa Catarina apoacutes a deacutecada de 1970 O consumo de
energia eleacutetrica com o processo de industrializaccedilatildeo catarinense
aumentou sensivelmente O consumo final de energia do setor industrial
ficou numa meacutedia de 60 O modelo de desenvolvimento
industrializante de Santa Catarina implicou natildeo apenas num elevado
consumo de energia mas tambeacutem numa exploraccedilatildeo inadequada da
natureza (THEIS 1988)
No Governo Konder Reis em 1975 foi criada a Secretaria de
Tecnologia e Meio Ambiente (SETMA) o Conselho Estadual de
Tecnologia e Meio ambiente (CETMA) e a FATMA na eacutepoca
Fundaccedilatildeo de Amparo agrave Tecnologia e Meio Ambiente A FATMA esteve
vinculada a SETMA ateacute sua extinccedilatildeo em 1977 Para o Governo Konder
Reis a finalidade baacutesica da SETMA era ldquoservir numa primeira fase ao
desenvolvimento do Estadordquo Dentre as principais preocupaccedilotildees
ambientais estavam os serviccedilos de aacutegua e esgoto e contraditoriamente o
aumento da produccedilatildeo mineral e da oferta de madeira (BORINELLI
1998)
112
Todas as unidades de conservaccedilatildeo estaduais foram criadas no
periacuteodo de 1975 a 1983 sob a influecircncia direta de Raulino Reitz Parque
Estadual da Serra Tabuleiro (1975) Reserva Bioloacutegica Estadual de
Sassafraacutes (1977) Parque Estadual da Serra Furada e Reserva Bioloacutegica
da Canela Preta (1980) e Reserva Bioloacutegica Estadual de Aguaiacute (1983)
(BORINELLI 1998 MASSIGNAN 1995)
O primeiro secretaacuterio da SETMA foi Augusto Batista Pereira
empresaacuterio do setor carboniacutefero A preocupaccedilatildeo principal da SETMA no
primeiro ano foi de implantar uma Usina Sideruacutergica no Sul do Estado
Nessa eacutepoca foi construiacuteda a Usina Teacutermica Jorge Lacerda a Induacutestria
Carboquiacutemica Catarinense (ICC) e a proposta da Sideruacutergica
Catarinense Havia tambeacutem uma preocupaccedilatildeo com a poluiccedilatildeo industrial
com a balneabilidade e com os recursos hiacutedricos no geral (BORINELLI
1998 MASSIGNAN 1995)
Da segunda parte da deacutecada de 1970 ateacute meados da deacutecada de
1980 a agenda ambiental foi se ampliando passando a exigir da
FATMA respostas mais consistentes (BORINELLI 1998) O intervalo
de tempo compreendido entre 1979 a 1982 marcou o fim do periacuteodo de
maior crescimento econocircmico de Santa Catarina Durante o periacuteodo
conservador do Governo Estadual e no novo contexto democraacutetico a
poliacutetica ambiental sofreu um grande desgaste com a crise econocircmica e
fiscal
As forccedilas conservadoras continuaram atuantes com a eleiccedilatildeo de
Esperidiatildeo Amin para governador (1983-1987) e os problemas
ambientais continuaram divorciados de outras poliacuteticas setoriais
(econocircmicas de ciecircncia e tecnologia minerais) O licenciamento
ambiental entrou como atividade inovadora e a FATMA na condiccedilatildeo
de fundaccedilatildeo passava a imagem de independecircncia em relaccedilatildeo ao estado
o que na praacutetica natildeo acontecia e tornava difusa a responsabilidade sobre
a poliacutetica ambiental (BORINELLI 1998) Entre os anos de 1983 e 1987
o oacutergatildeo diretamente envolvido com o Planejamento Ambiental no
Estado de Santa Catarina era o Gabinete de Planejamento (GAPLAN)
(SDS 2014)
Mesmo sendo baseada na pequena propriedade rural Santa Catarina sofreu com o enfraquecimento da pequena produccedilatildeo rural
aumentando o ecircxodo rural e consequentemente os problemas urbanos
Em termos socioambientais intensificaram-se os processos de
degradaccedilatildeo ecossistecircmica mau uso do solo falta de saneamento
impacto do turismo nas zonas costeiras etc (VIEIRA CUNHA 2002)
113
A incapacidade de resolver a contento estas tensotildees inaugurava o
reconhecimento de uma crise ambiental em Santa Catarina e uma crise
institucional da FATMA Nos municiacutepios foram criados os Conselhos
Municipais de Defesa Ambiental (CONDEMA) oacutergatildeos consultivos de
assessoramento das Prefeituras Os membros do CONDEMA eram
escolhidos pelos Prefeitos Em 1983 foram criados trecircs escritoacuterios
regionais da FATMA em Joinville Chapecoacute e Joaccedilaba totalizando
quatro com o escritoacuterio de Criciuacutema criado em 1979 Apesar disso as
poliacuteticas ambientais continuaram condicionadas e limitadas pelos
interesses poliacuteticos e econocircmicos (BORINELLI 1998)
Na linha da natildeo responsabilizaccedilatildeo durante muito tempo os
empresaacuterios do segmento do carvatildeo mineral atuaram livremente na
regiatildeo Sul de Santa Catarina gerando o maior passivo ambiental do
estado Em 1983 a FATMA foi incumbida de licenciar e fiscalizar essa
atividade fazendo um acordo com as empresas que assumiram o
compromisso de instalar equipamentos e modificar processos visando a
diminuiccedilatildeo dos impactos Mesmo assim treze anos depois em 1996 o
diretor da FATMA veio a puacuteblico declarar que natildeo era possiacutevel
identificar os responsaacuteveis pelos impactos na regiatildeo e que a sociedade
pagaria o custo da recuperaccedilatildeo cerca de 70 milhotildees de doacutelares
(BORINELLI 1998)
Nos anos 1990 proliferaram denuncias de corrupccedilatildeo envolvendo
oacutergatildeos ambientais federais e estaduais em processos de licenciamento
apontando para a crise do Estado a fragilidade da democracia e dos
mecanismos de controle puacuteblico das instituiccedilotildees O aumento da procura
por licenciamento ambiental trouxe agrave FATMA uma posiccedilatildeo mais
influente entre os segmentos econocircmicos e poliacuteticos e aumentou
tambeacutem sua autonomia financeira atraveacutes dos licenciamentos
ambientais Apesar disso sua trajetoacuteria estaacute marcada por uma atuaccedilatildeo na
defesa das causas ambientais sem desestruturar o desenvolvimento
econocircmico (BORINELLI 2013 2007)
114
42 O sul catarinense uma trajetoacuteria marcada pelo carvatildeo mineral
A regiatildeo Sul Catarinense eacute formada por 46 municiacutepios agrupados
em trecircs microrregiotildees Araranguaacute8 Criciuacutema
9 e Tubaratildeo
10 Tem como
limites o Oceano Atlacircntico a Leste a mesorregiatildeo da Grande
Florianoacutepolis e Serrana no estado de Santa Catarina e a Mesorregiatildeo
Metropolitana de Porto Alegre e Nordeste Rio-Grandense no estado do
Rio Grande do Sul
Figura 7 ndash Mapa de localizaccedilatildeo da Bacia Carboniacutefera Santa
Catarina
Fonte Concepccedilatildeo de Luciana Butzke Elaborado por Ruy Lucas de
Souza
8 Municiacutepios Araranguaacute Balneaacuterio Arroio do Silva Balneaacuterio Gaivota Ermo
Jacinto Machado Maracajaacute Meleiro Morro Grande Passo de Torres Praia
Grande Santa Rosa do Sul Satildeo Joatildeo do Sul Sombrio Timbeacute do Sul e Turvo 9 Municiacutepios Balneaacuterio Rincatildeo Cocal do Sul Criciuacutema Forquilhinha Iccedilara
Lauro Muller Morro da Fumaccedila Nova Veneza Sideroacutepolis Treviso e
Urussanga 10
Municiacutepios Armazeacutem Braccedilo do Norte Capivari de Baixo Garopaba Gratildeo
Paraacute Gravatal Imaruiacute Imbituba Jaguaruna Lagura Orleans Pedras Grandes
Pescaria Brava Rio Fortuna Sangatildeo Santa Rosa de Lima Satildeo Ludgero Satildeo
Martinho Treze de Maio e Tubaratildeo
115
Os municiacutepios da regiatildeo se dividem em trecircs associaccedilotildees de
municiacutepios a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios do Extremo Sul Catarinense
(AMESC)11
a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera
(AMREC)12
e a Associaccedilatildeo dos Municiacutepios da Regiatildeo de Laguna
(AMUREL)13
(FECAM 2014) (Figura 7) A regiatildeo possui tambeacutem
quatro Secretarias de Desenvolvimento Regional (SDR) SDR de
Laguna SDR de Tubaratildeo SDR de Criciuacutema e SDR de Araranguaacute
(SANTA CATARINA 2014a)
Na aacuterea existem quatro feiccedilotildees geoloacutegicas as rochas
cristalinas e metamoacuterficas mais antigas do ldquoembasamento cristalinordquo a
sucessatildeo de rochas sedimentares gondwacircnicas que contecircm as camadas
de carvatildeo os derrames baacutesicos aacutecidos e intermediaacuterios da Formaccedilatildeo
Serra Geral e os sedimentos litoracircneos recentes (SCHEIBE 2000)
Na regiatildeo sul localizam-se duas regiotildees hidrograacuteficas
pertencentes agrave Vertente Atlacircntica a Regiatildeo Hidrograacutefica Sul
Catarinense que tem como bacias hidrograacuteficas a Bacia Hidrograacutefica do
Rio Tubaratildeo e a Bacia Hidrograacutefica do Rio drsquoUna contando com 5733
km2 e a Regiatildeo Hidrograacutefica do Extremo Sul Catarinense tendo como
bacias hidrograacuteficas a Bacia do Rio Urussanga a Bacia Hidrograacutefica do
Rio Araranguaacute e a Bacia Hidrograacutefica do Rio Mambituba contando com
5052 km2 (SANTA CATARINA 2006)
O relevo predominante eacute o forte ondulado e montanhoso com
ocorrecircncia de plano e suave ondulado na planiacutecie costeira Jaacute os solos
predominantes na Regiatildeo Hidrograacutefica Sul Catarinense satildeo os
mediamente profundos de origem graniacutetica pouco feacuterteis e aacutecidos
apresentando pedregosidade Na Regiatildeo Hidrograacutefica Extremo Sul
Catarinense predominam os solos mediamente profundos cascalhentos
11
Municiacutepios filiados Araranguaacute Balneaacuterio Arroio do Silva Balneaacuterio
Gaivota Ermo Jacinto Machado Maracajaacute Meleiro Morro Grande Passo de
Torres Praia Grande Santa Rosa do Sul Satildeo Joatildeo do Sul Sombrio Timbeacute do
Sul e Turvo 12
Municiacutepios filiados Balneaacuterio Rincatildeo Cocal do Sul Criciuacutema Forquilhinha
Iccedilara Lauro Muller Morro da Fumaccedila Nova Veneza Orleans Sideroacutepolis
Treviso e Urussanga 13
Municiacutepios filiados Armazeacutem Braccedilo do Norte Capivari de Baixo Gratildeo
Paraacute Gravatal Imaruiacute Imbituba Jaguaruna Laguna Pedras Grandes Pescaria
Brava Rio Fortuna Sangatildeo Santa Rosa de Lima Satildeo Ludgero Satildeo Martinho
Treze de Maio e Tubaratildeo
116
com baixa fertilidade de origem graniacutetica e sedimentar (SANTA
CATARINA 2006)
Na regiatildeo predomina a Floresta Tropical Atlacircntica e a Vegetaccedilatildeo
Litoracircnea contando com trecircs Unidades de Conservaccedilatildeo estaduais o
Parque Estadual da Serra do Tabuleiro (criado em 1975) o Parque
Estadual da Serra Furada (1980) e a Reserva Bioloacutegica Estadual do
Aguaiacute (1983) e duas Unidades de Conservaccedilatildeo Federais o Parque
Nacional de Satildeo Joaquim (1961) e a Aacuterea de Proteccedilatildeo Integral da Baleia
Franca (2000) (SANTA CATARINA 2006)
Em 2010 a regiatildeo contava com uma populaccedilatildeo de 906927
habitantes e uma densidade populacional de 944 habkm2 Em 2009 a
movimentaccedilatildeo econocircmica segundo a composiccedilatildeo do PIB foi de R$ 147
bilhotildees que equivale a 113 do PIB estadual ocupando a quinta
posiccedilatildeo no ranking estadual entre as nove macrorregiotildees (SEBRAE
2013a)
A ocupaccedilatildeo do sul do Brasil contou com a presenccedila de grupos
caccediladores-coletores (aproximadamente 8000 anos) pescadores-
coletores (6000 e 4000 anos) ceramistas TaquaraItarareacute e Guarani e
horticultores (1000 anos) (CAMPOS et al 2013) Em 1877 chegaram
os italianos seguidos de poloneses e alematildees Os primeiros nuacutecleos
coloniais foram Azambuja (1877) Urussanga (1878) Satildeo Joseacute de
Cresciuacutema (1880) Cocal (1885) Nova Veneza (1890) Nova Belluno
(1891) dentre outros As lavras de carvatildeo surgiram em Santa Catarina
no final do seacuteculo XIX por iniciativa de uma empresa britacircnica Ateacute
entatildeo a economia da regiatildeo era agriacutecola A transformaccedilatildeo urbano-
industrial foi estimulada pelo carvatildeo que vinculava-se a ideia de
progresso Eacute marcante a presenccedila do carvatildeo nos hinos das cidades
monumentos festas de Santa Baacuterbara (Protetora dos Mineiros) houve
uma fusatildeo entre a memoacuteria da imigraccedilatildeo e a memoacuteria do carvatildeo
(CAROLA 2004 GOULARTI FILHO LIVRAMENTO 2004a)
A Primeira Guerra Mundial marcou o aumento da produccedilatildeo do
carvatildeo mineral destacando-se a Companhia Carboniacutefera de Araranguaacute
(CBCA) (1917) a Companhia Carboniacutefera Urussanga (1918) e a
Companhia Carboniacutefera Proacutespera (1921) Em 1920 Santa Catarina jaacute contava com alguns elementos importantes para um complexo
carboniacutefero minas ferrovia e porto Em 1924 com a Lei nordm 4801
abordou-se pela primeira vez a possibilidade de construccedilatildeo de uma usina
sideruacutergica no estado Isso se concretizou em 1941 no Governo Getuacutelio
117
Vargas com a fundaccedilatildeo da Companhia Sideruacutergica Nacional (CSN)
(KOPPE COSTA 2008 MORAES 2003)
Nos periacuteodos referentes ao Plano de Metas (1956-1960) e Plano
Nacional do Desenvolvimento (1974 a 1978) o clima estava propiacutecio
para o aumento da produccedilatildeo do carvatildeo mineral No Plano de Metas
surgiu a Sociedade Termoeleacutetrica de Capivari SA (SOLTECA)
passando depois a se chamar Complexo Termoeleacutetrico Jorge Lacerda
constituiacuteda em 1957 entrou em operaccedilatildeo em 1965 No periacuteodo do Plano
Nacional do Desenvolvimento foi construiacuteda a ICC e o Complexo Jorge
Lacerda foi ampliado (KOPPE COSTA 2008 MORAES 2003)
O primeiro boom do setor foi na ocasiatildeo da Primeira Guerra
Mundial e depois durante a Segunda Guerra Mundial com a produccedilatildeo
aumentando em 300 Com o fim da Segunda Guerra o governo
acabou com as cotas e o setor entrou em crise A reaccedilatildeo do segmento do
carvatildeo mineral foi a ldquobatalha do carvatildeordquo14
e o governo reagiu criando a
CEPCAM e retornando agraves cotas Em 1973 com a crise do petroacuteleo o
setor passou novamente por um boom O auge da mineraccedilatildeo foi entre
1982 a 1985 No periacuteodo aacuteureo do carvatildeo poucas vozes denunciavam as
peacutessimas condiccedilotildees de trabalho tudo em nome do progresso pois o
carvatildeo mineral representava a consolidaccedilatildeo da induacutestria de base no
Brasil De 1970 em diante onze empresas pertencentes a empresaacuterios
locais passaram a explorar o carvatildeo mineral (CAROLA 2004
GOULARTI FILHO 2002)
Ateacute 1990 o Sul de Santa Catarina tinha a primazia em termos de
volume de produccedilatildeo nuacutemero e mecanizaccedilatildeo de minas trabalhadores
empregados e valores econocircmicos entrando em crise a partir daiacute com
sua desregulamentaccedilatildeo no Governo Collor O que precisa ser destacado
eacute que a crise da deacutecada de 1990 natildeo foi a ldquocrise do carvatildeordquo As
induacutestrias de ceracircmica vestuaacuterio e plaacutestico localizadas no Sul tambeacutem
sofreram com a recessatildeo de 1990 a 1992 (BEacuteRZIN 2005 GOULARTI
FILHO 2002 MORAES 2003)
A deacutecada de 1990 foi marcada pelo fechamento e desestatizaccedilatildeo
das induacutestrias do complexo carboniacutefero e eliminaccedilatildeo dos benefiacutecios
governamentais O lavador de Capivari foi fechado em 1992 a ICC
14
A ldquobatalha do carvatildeordquo compreende a adoccedilatildeo de estrateacutegias por parte dos
segmentos econocircmicos envolvidos com o carvatildeo mineral visando pressionar e
convencer o governo federal a apoiar a continuidade da atividade (CAROLA
2010)
118
passou para o controle da Petrobraacutes em 1993 A CSN foi privatizada em
1993 e a Companhia Proacutespera propriedade da CSN foi vendida para a
Nova Proacutespera A Ferrovia Teresa Cristina foi privatizada em 1996 e o
Complexo Jorge Lacerda em 1998 (BEacuteRZIN 2005 GOULARTI
FILHO 2002 MORAES 2003)
O setor carboniacutefero foi cedendo espaccedilo para a induacutestria de
revestimento ceracircmico de plaacutesticos e descartaacuteveis do vestuaacuterio de
calccedilados e metal-mecacircnica Em 1985 a atividade do carvatildeo era a que
mais empregava na regiatildeo sul com 10536 trabalhadores Em 2000
passou para a quinta posiccedilatildeo com 2752 trabalhadores empregados
(GOULARTI FILHO 2005) Em 2010 as atividades econocircmicas que
mais se destacaram foram Induacutestria de transformaccedilatildeo com 3395
estabelecimentos e 58652 trabalhadores seguida por serviccedilos com
16971 estabelecimentos e 47956 trabalhadores em terceiro Comeacutercio
com 7062 estabelecimentos e 34467 trabalhadores construccedilatildeo civil
com 828 estabelecimentos e 6641 trabalhadores induacutestria extrativa
mineral com 78 estabelecimentos e 4083 trabalhadores As atividades
que mais empregavam vestuaacuterio minerais natildeo metaacutelicos (ceracircmica)
alimentar e plaacutestico (FIESC 2012)
Em 2012 as mineradoras empregavam em Santa Catarina 4042
trabalhadores no Paranaacute 358 e no Rio Grande do Sul 734 trabalhadores
Jaacute o faturamento para o mesmo ano foi de R$ 49231200000 (Tabela 3)
(SATC 2012)
Tabela 3 - Faturamento do Segmento do Carvatildeo Mineral 2012
Estado Total (R$)
Paranaacute 2602336257
RG Sul 29354141523
S Catarina 49231200000
Total de R$ 81187677780
Fonte SATC (2012 p 11)
Jaacute a arrecadaccedilatildeo da CFEM para o ano de 2013 ficou em R$
358664403 contando os municiacutepios de Treviso (R$ 356903710)
Lauro Muller (R$ 1570791) e Urussanga (R$ 189902) para um total de R$ 18589306884 (DNPM 2014)
Aleacutem de ocupar o primeiro lugar em faturamento e na
arrecadaccedilatildeo da CFEM Santa Catarina tambeacutem ocupa o primeiro lugar
na produccedilatildeo de carvatildeo bruto considerando os trecircs estados do Sul do
Brasil conforme dados da Tabela 4
119
Tabela 4 - Produccedilatildeo de carvatildeo bruto (ROM) de 2009 a 2012
ESTADOS PRODUCcedilAtildeO ROM (t)
2009 2010 2011 2012
Santa Catarina 8208063 6278327 6570292 6097496
Rio Grande do Sul 4585050 5010779 5153199 5134217
Paranaacute 351930 293329 344161 315131
Brasil 13145043 11582435 12067652 11546844
SCBrasil () 6244 5421 5445 5281
Ranking de SC 1ordm 1ordm 1ordm 1ordm
Fonte Fiesc (2012 p 68) SATC (2012)
O segmento do carvatildeo mineral no Sul de Santa Catarina apesar
do destaque na produccedilatildeo do carvatildeo bruto teve ao longo dos uacuteltimos
anos sua participaccedilatildeo diminuiacuteda em nuacutemero de empregos Isso
demonstra uma maior diversificaccedilatildeo econocircmica e poderia representar a
possibilidade de reconversatildeo da atividade Contudo as accedilotildees do
segmento do carvatildeo mineral e dos segmentos poliacuteticos caminham para a
continuidade e ampliaccedilatildeo da atividade e natildeo para sua reconversatildeo
Um importante passo para o questionamento da atividade
carboniacutefera foi dado em 1993 O passivo ambiental resultante da
atividade carboniacutefera foi alvo de uma accedilatildeo civil puacuteblica (processo
938000533-4) Os reacuteus da accedilatildeo foram as empresas carboniacuteferas seus
diretores e soacutecios majoritaacuterios do Estado de Santa Catarina e da Uniatildeo
totalizando 24 reacuteus (MPF 2012)
A sentenccedila foi declarada em 05012000 tendo como resultado a
condenaccedilatildeo dos reacuteus A eles foi solicitado a elaboraccedilatildeo de ldquoum projeto
de recuperaccedilatildeo da regiatildeo que compotildee a Bacia Carboniacutefera do Sul do Estadordquo contemplando ldquoas aacutereas de depoacutesitos de rejeitos aacutereas
mineradas a ceacuteu aberto e minas abandonadas bem como o
desassoreamento fixaccedilatildeo de barrancas descontaminaccedilatildeo e retificaccedilatildeo dos cursos drsquoaacutegua aleacutem de outras obras que visem amenizar os danos
sofridos principalmente pela populaccedilatildeo dos municiacutepios-sede da extraccedilatildeo e do beneficiamentordquo (MPF 2012)
Apoacutes os acordos e imposiccedilotildees judiciais os passivos ambientais
foram distribuiacutedos de acordo com a responsabilidade das empresas
(Tabela 5)
120
Tabela 5 - Distribuiccedilatildeo de passivos ambientais em relaccedilatildeo agraves
empresas
RESPONSAacuteVEL HECTARES
CSN 1336 26
Uniatildeo 1215 24
Rio Deserto 571 11
Catarinense 522 10
Criciuacutema 457 9
Cocalit 181 4
Outras empresas 807 16
Fonte MPF (2012)
As aacutereas terrestres a recuperar totalizam 5094 hectares em 217
diferentes aacutereas da Bacia Carboniacutefera O cronograma de recuperaccedilatildeo
compreende o periacuteodo de 2012 a 2020 e um total de 3726 hectares
(Tabela 6) (MPF 2012)
Tabela 6 - Cronograma de recuperaccedilatildeo dos passivos ambientais
Ano conclusatildeo Hectares a serem
recuperadas
Acumulado da
recuperaccedilatildeo
Obras jaacute concluiacutedas e assim
consideradas apoacutes vistorias
526 526
2012 1142 1667
2013 205 1872
2014 528 2400
2015 141 2542
2016 560 3102
2017 84 3186
2018 71 3257
2019 382 3639
2020 87 3726
3726
Fonte MPF (2012)
121
Os 1365 hectares restantes natildeo dispotildeem de cronogramas
definidos e representam aacutereas cuja recuperaccedilatildeo eacute de incumbecircncia da
Uniatildeo (89 deles) (MPF 2012)
A trajetoacuteria do Sul eacute marcada pelo carvatildeo mineral mas para aleacutem
da ldquocultura do carvatildeordquo nascem possibilidades ligadas agrave diversificaccedilatildeo
econocircmica que rompem com a dependecircncia econocircmica do carvatildeo
43 Da extraccedilatildeo manual agrave mecanizaccedilatildeo das minas
A mecanizaccedilatildeo das minas comeccedilou na deacutecada de 1970 e com
ela o fim do ldquovelho mineirordquo que dominava todo o processo de
produccedilatildeo Com a mecanizaccedilatildeo iniciou-se a divisatildeo teacutecnica do trabalho e
aumentou a poluiccedilatildeo Na extraccedilatildeo manual do carvatildeo a pneumoconiose
afetava 5 a 8 passando a 10 a 12 com a mecanizaccedilatildeo das minas
Somadas a pneumoconiose bronquites crocircnicas doenccedilas de pele e
ansiedade (CHOINACKI 1992) A tecnologia dessa forma foi ldquo()
implantada na induacutestria natildeo como serva dos trabalhadores mas como
instrumento que tecircm como fim a acumulaccedilatildeo de capitalrdquo (VOLPATO
1984 p 43)
Volpato (2001) destaca trecircs momentos distintos um primeiro
momento que compreende o periacuteodo de 1913 a 1976 no qual a extraccedilatildeo
de carvatildeo era artesanal sem agregar maiores recursos tecnoloacutegicos um
segundo periacuteodo de 1976 a 1981 no qual procurou-se agregar recursos
tecnoloacutegicos para aumentar a produccedilatildeo e um terceiro periacuteodo de 1981 a
1988 no qual verificaram-se os malefiacutecios da tecnologia para o meio
ambiente sauacutede e seguranccedila do trabalhador ldquoAos poucos os operadores
foram sentindo alguns efeitos prejudiciais das novas maacutequinas - A
desagregaccedilatildeo das praacuteticas nas frentes de trabalho pela agilidade e
domiacutenio da maacutequina sobre o processordquo (VOLPATO 2001 p 34)
A mecanizaccedilatildeo por um lado facilitou as praacuteticas de trabalho
poupando a forccedila fiacutesica do mineiro mas por outro com a intensificaccedilatildeo do processo aumentaram os impactos na sauacutede do trabalhador e no meio
ambiente A pneumoconiose natildeo era reconhecida como doenccedila
profissional o que fazia com que os mineiros escondessem os sintomas
e prejudicassem ainda mais sua sauacutede (VOLPATO 2001) Aleacutem das
doenccedilas pulmonares acontecem tambeacutem acidentes de trabalho Em
122
outubro de 2013 os mineiros fizeram uma paralisaccedilatildeo apoacutes a morte de
um colega na mina Fontanella em Treviso Foi o segundo acidente com
morte em menos de trecircs meses e o nono nos uacuteltimos cinco anos (G1SC
2013)
44 Regras em uso
Em grande medida as leis estaduais se articulam agraves leis federais
Nessa seccedilatildeo satildeo apresentados alguns casos em que a lei estadual difere
da lei federal Um primeiro exemplo eacute o Projeto de Lei nordm 026632005
de autoria do Deputado Estadual Julio Garcia que entrou em tramitaccedilatildeo
em 2005 O Projeto defendia a dispensa do Estudo de Impacto
Ambiental e Relatoacuterio de Impacto Ambiental para a atividade de
pequeno porte de extraccedilatildeo de carvatildeo mineral em aacutereas de ateacute dois
hectares e meio Para tanto contava com a seguinte fundamentaccedilatildeo
O art 12 sectsect 1ordm a 3ordm da Resoluccedilatildeo CONAMA n
237 de 19 de dezembro 1997 permite que o
oacutergatildeo ambiental competente no caso a FATMA
se necessaacuterio estabeleccedila procedimentos
especiacuteficos e simplificados para o licenciamento
de atividades cujas caracteriacutesticas e peculiaridades
importem em pequeno potencial de impacto
ambiental ou ainda o licenciamento uacutenico e
simplificado para atividades integrantes de planos
e programas voluntaacuterios de gestatildeo ambiental
(SANTA CATARINA 2005 p 2)
Como os impactos do carvatildeo foram considerados de ldquopequeno
potencialrdquo pelos membros da Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina
(ALESC) o Projeto de Lei foi transformado na Lei nordm 18052 de 26 de
janeiro de 2007 (SANTA CATARINA 2007)
Outro exemplo foi a assinatura do Decreto em 2013 que reduziu
o Imposto sobre Circulaccedilatildeo de Mercadoria (ICMS) de 25 para 3 na
venda de energia eleacutetrica para novos empreendimentos beneficiando
principalmente as termeleacutetricas a carvatildeo O Decreto tem como objetivo favorecer a competitividade do carvatildeo mineral catarinense nos proacuteximos
leilotildees de energia eleacutetrica A-5 (ALESC 2013)
Um uacuteltimo exemplo eacute o Coacutedigo Estadual do Meio Ambiente de
Santa Catarina que continua cercado de muitos pontos polecircmicos
123
(SALVADOR 2009 SANTOS 2014) No Coacutedigo aprovado em 2009 o
Governador em exerciacutecio Luiz Henrique da Silveira fez severas criacuteticas
ao Coacutedigo Ambiental Brasileiro que resulta de uma medida provisoacuteria
que ele chamou de ldquofilha bastarda dos Decretos-Lei da Ditadurardquo
(SILVEIRA 2009 p 9) concebido sem amplitude democraacutetica
Segundo ele o Coacutedigo Ambiental Catarinense levou cinco anos para ser
elaborado e envolveu debates e audiecircncias puacuteblicas
Nosso Coacutedigo foi alvo de poucas mas barulhentas
reaccedilotildees e incompreensotildees contraacuterias ao
desenvolvimento sustentaacutevel Houve quem
ameaccedilasse mandar prender os honestos e
indefesos agricultores que lavrassem suas terras a
menos de trinta metros da mata ciliar
(SILVEIRA 2009 p 9)
A alusatildeo aos agricultores se justifica na medida em que um dos
pontos mais polecircmicos do Coacutedigo eacute a reduccedilatildeo da mata ciliar de 30
metros como prevecirc o Coacutedigo Florestal para 5 metros em propriedades
de menos de cinco hectares
O Coacutedigo natildeo trata de forma especiacutefica o carvatildeo mineral mas
traz novidades em relaccedilatildeo a flexibilizaccedilatildeo e simplificaccedilatildeo do processo
de licenciamento A Seccedilatildeo II do Coacutedigo estabelece prazos para a
concessatildeo das licenccedilas trecircs meses para a LAP e nos casos em que
houver EIARIMA e audiecircncia puacuteblica o prazo seraacute de quatro meses
trecircs meses para a LI e dois meses para a LO Quanto aos prazos de
validade das licenccedilas cinco anos para a LP seis anos para a LI e de
quatro a dez anos para a LAO (SANTA CATARINA 2009b)
Em 2013 entrou em tramitaccedilatildeo o Projeto de Lei 030542013 que
trouxe mudanccedilas ao Coacutedigo Ambiental de Santa Catarina (SANTA
CATARINA 2013) O Projeto foi transformado na Lei nordm 16342 de 21
de janeiro de 2014 A principal mudanccedila eacute a possibilidade de
regularizaccedilatildeo fundiaacuteria em aacuterea rural e urbana de edificaccedilotildees atividades
e demais formas de ocupaccedilatildeo em Aacutereas de Preservaccedilatildeo Permanente
desde que aprovadas pelo Municiacutepio (SANTA CATARINA 2014b) Conveacutem ressaltar que a revisatildeo do Coacutedigo Ambiental de SC e a defesa
do carvatildeo mineral na produccedilatildeo termeleacutetrica foram as duas principais
bandeiras da Assembleia Legislativa de Santa Catarina em 2013
124
45 Envolvidos na gestatildeo
Na sequecircncia faz-se uma breve descriccedilatildeo dos envolvidos na
gestatildeo de recursos comuns em Santa Catarina lembrando que aparecem
aqui os envolvidos que constam nos documentos e publicaccedilotildees
consultadas
451 Segmentos poliacuteticos
O governador em exerciacutecio Raimundo Colombo investiu em sua
campanha de 2010 R$ 323669211 Natildeo houve nenhuma doaccedilatildeo de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral diretamente ao candidato Mas o
Comitecirc Financeiro Uacutenico do Democratas (DEM) que tambeacutem repassou
recursos ao candidato recebeu R$ 6000000 da Carboniacutefera Nossa
Senhora do Caravagio Ltda (TSE 2013) Jaacute os representantes eleitos se
dividem na Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina (Deputados
Estaduais) e nas Cacircmaras Municipais (Vereadores) As relaccedilotildees entre
carvatildeo mineral e poliacutetica seratildeo aprofundadas no proacuteximo capiacutetulo
A FATMA tambeacutem faz parte dos segmentos poliacuteticos Aleacutem do
seu papel descrito na seccedilatildeo 41 um outro ponto merece ser destacado
De 2000 ateacute 2014 periacuteodo que compreende o licenciamento da
USITESC passaram pela FATMA na funccedilatildeo de presidente Suzana
Maria Cordeiro Trebien Seacutergio Joseacute Grando Jacircnio Wagner Constante
Carlos L Kreuz Murilo Xavier Flores e Gean Loureiro Desses Seacutergio
Joseacute Grando recebeu na eleiccedilatildeo de 2006 quando concorreu a Deputado
Estadual R$ 200000 da Sul Catarinense Mineraccedilatildeo e R$ 3000000 da
Tractebel e Jean Marques Loureiro recebeu R$ 10000000 da
Tractebel quando concorreu a prefeito do municiacutepio de Florianoacutepolis
(TSE 2013)
Inclui-se tambeacutem nos segmentos poliacuteticos o Ministeacuterio Puacuteblico
Estadual que atua em parceria com o Ministeacuterio Puacuteblico Federal no
acompanhamento da accedilatildeo civil puacuteblica do carvatildeo (MPF 2012) e no
acompanhamento dos processos de licenciamento
452 Segmentos econocircmicos
Os segmentos econocircmicos se organizam no Sindicato da Induacutestria
da Extraccedilatildeo de Carvatildeo do Estado de Santa Catarina (SIESESC) criado
125
em 1989 em Criciuacutema e na Associaccedilatildeo Beneficente da Induacutestria
Carboniacutefera de Santa Catarina (SATC)15
As principais empresas que atuam no segmento tecircm origem na
proacutepria regiatildeo A Carboniacutefera Metropolitana SA iniciou suas atividades
em 1890 em Nova Veneza A empresa tem sede em Criciuacutema eacute
detentora das maiores reservas de carvatildeo mineral do paiacutes e explora trecircs
minas no municiacutepio de Treviso Outra empresa que atua na regiatildeo haacute
mais de noventa anos criada em 1918 eacute a Carboniacutefera Rio Deserto
Ltda administrada pela famiacutelia Zanette hoje na terceira geraccedilatildeo A
Carboniacutefera conta com minas nos municiacutepios de Lauro Muller Treviso
Criciuacutema e Iccedilara A Carboniacutefera Criciuacutema SA tecircm origem na fusatildeo da
Carboniacutefera Caeteacute Ltda e Carboniacutefera Cocal Ltda em 1943 Com sede
em Criciuacutema a carboniacutefera explora o carvatildeo no municiacutepio de
Forquilhinha A Comin amp Cia atua no rebeneficiamento de rejeitos
antigos Suas atividades iniciaram em 1984 e sua unidade de
beneficiamento localiza-se em Criciuacutema Na deacutecada de 1980 foi criada
tambeacutem a Cooperminas a partir da falecircncia da CBCA A Cooperminas eacute
uma cooperativa de trabalhadores da mineraccedilatildeo que explora o carvatildeo em
Forquilhinha A Carboniacutefera Belluno Ltda iniciou suas atividades em
1991 tem sede em Sideroacutepolis e aleacutem de trabalhar na extraccedilatildeo e
beneficiamento do Carvatildeo atua tambeacutem no transporte e na
comunicaccedilatildeo A empresa eacute administrada pelo Grupo Salvaro e conta
com reservas de 140 milhotildees de toneladas de carvatildeo mineral e minas em
Treviso e Sideroacutepolis Em 1999 a Carboniacutefera Catarinense Ltda passou
a explorar e beneficiar o carvatildeo em duas minas localizadas em Lauro
Muller A Carboniacutefera Sideroacutepolis Ltda opera a Usina de
Beneficiamento Lageado no municiacutepio de Urussanga A Companhia
Energeacutetica Meridional pertence agrave Tractebel Energia SA e tem sede em
Florianoacutepolis A Gabriella Mineraccedilatildeo foi fundada em 2004 a partir da
dissoluccedilatildeo da empresa Coque Catarinense Ltda (COCALIT) A
Minageo atua desde 1986 em sondagens e obras subterracircneas entrando
para a extraccedilatildeo do carvatildeo em 1997 Em 2000 assinou um contrato de
fornecimento de carvatildeo para a Tractebel Energia neste ano mudando
seu nome para Mineraccedilatildeo Santa Augusta em (SIESESC 2008)
15
A SATC foi criada em 1959 como Sociedade de Assistecircncia aos
Trabalhadores do Carvatildeo e tinha como objetivo a preparaccedilatildeo de matildeo-de-obra
qualificada e assistecircncia social As carboniacuteferas contribuem com 1 de seu
faturamento para a manutenccedilatildeo da instituiccedilatildeo (SATC 2014)
126
453 Segmentos sociais
O movimento mineiro teve iniacutecio em 1920 com uma greve na
CBCA Em 1944 surgiu em Criciuacutema a Associaccedilatildeo dos Trabalhadores
na Induacutestria Extrativa do Carvatildeo Em 1945 a associaccedilatildeo passou a ser
sindicato Nos anos 1950 foram fundados sindicatos mineiros em Lauro
Muller (1951) TubaratildeoCapivari (1953) Urussanga (1957) e Rio Maina
(1961) A primeira greve apoacutes o surgimento dos sindicatos aconteceu
em 1958 seguida de outras em 1959 1960 1961 e 1963 (GOULARTI
FILHO LIVRAMENTO 2004b)
Aleacutem das muitas greves um dos maiores feitos do movimento
sindical mineiro foi a ocupaccedilatildeo da CSN e o gerenciamento da massa
falida da CBCA e da Mineraccedilatildeo Barro Branco De 1945 a 1957 os
mineiros natildeo encontraram no sindicato um espaccedilo de luta De 1957 a
1964 formou-se um sindicalismo baseado na luta e na resistecircncia O
sindicato denunciou as condiccedilotildees precaacuterias de trabalho a exploraccedilatildeo
sofrida pela categoria e a falta de seguranccedila nas minas Passando por
momentos difiacuteceis durante a ditadura militar de 1964 a 1978 o
sindicalismo passou por uma letargia vindo a se reorganizar em 1988
apoiando quatro greves da CBCA e da Proacutespera (CHOINACKI 1992
VOLPATO 2001)
Os mineiros apoiam a causa do carvatildeo mineral e as mineradoras
se o assunto for a questatildeo ambiental A categoria natildeo se envolve em
movimentos ambientais
A negaccedilatildeo ou o silecircncio e a passividade dos
mineiros em relaccedilatildeo agrave degradaccedilatildeo ambiental
resultante da induacutestria carboniacutefera eacute a expressatildeo
de um mecanismo de defesa reforccedilando a
seguranccedila dos trabalhadores na manutenccedilatildeo do
emprego e da sobrevivecircncia como objetivo mais
imediato e realista (VOLPATO 2001 p 132)
Essas ideias aleacutem de serem defendidas pelos mineiros satildeo
apoiadas por poliacuteticos ligados ao movimento sindical e agrave luta histoacuterica dos trabalhadores Destacam-se Luci Choinacki Joseacute Paulo Serafim e
Milton Mendes de Oliveira que adotam um discurso de apoio ao carvatildeo
mineral em funccedilatildeo de sua importacircncia social (CHOINACKI 1992)
127
A regiatildeo sul de Santa Catarina contou com vaacuterios movimentos
sociais que atuaram e atuam contra a mineraccedilatildeo ao longo da sua
histoacuteria Em 1986 em Sideroacutepolis surgiu o Movimento Ecoloacutegico de
Sideroacutepolis (MES) que atuou ateacute 1989 Tambeacutem em 1986 em Tubaratildeo
surgiu o Movimento Ecoloacutegico Tubaronense (MOVET) que atuou ateacute
1996 Havia um grande envolvimento da igreja catoacutelica que se
consolidou atraveacutes da criaccedilatildeo da Pastoral da Ecologia ligada agrave Diocese
de Tubaratildeo O objetivo da Pastoral da Ecologia era ldquodespertar uma
consciecircncia ecoloacutegica no homem do sul de Santa Catarina destacando a
importacircncia da preservaccedilatildeo da natureza dom de Deus para todos para
que possa atuar comunitariamente na recuperaccedilatildeo do meio ambienterdquo
(Diocese de Tubaratildeo citada por SANTOS 2008 p 81-2) A Pastoral da
Ecologia organizou romarias ecoloacutegicas a primeira aconteceu em
Criciuacutema em 1986 com o tema ldquoNatureza a ganacircncia te destruiu Noacutes te
reconstruiremosrdquo a segunda em Sideroacutepolis em 1988 com o tema ldquoPela
vida pela paz Contra a induacutestria da morterdquo e a terceira em Tubaratildeo em
1991 com o tema ldquoA Matildee Natureza pede socorro O povo exige a
recuperaccedilatildeo da vida na regiatildeo sulrdquo
Uma iniciativa mais recente de mobilizaccedilatildeo e discussatildeo
aconteceu apoacutes o Furacatildeo Catarina em 2004 Exatamente um ano
depois em 2005 aconteceu o 1ordm Encontro da Regiatildeo Sul sobre fenocircmenos naturais adversidades e mudanccedilas climaacuteticas suas causas
efeitos e necessidades de adaptaccedilatildeo que deu origem ao Manifesto por
Justiccedila Climaacutetica O 2ordm Encontro sobre fenocircmenos naturais adversidades e mudanccedilas climaacuteticas da regiatildeo Sul foi realizado em 6 a
8 de outubro de 2009 A realizaccedilatildeo dos dois eventos coube agrave Cacircmara
Temaacutetica do Meio Ambiente do Foacuterum de Desenvolvimento do Extremo
Sul Catarinense (FDESC) sob a Coordenaccedilatildeo da ONG Soacutecios da
Natureza da AMESC do Nuacutecleo Amigos da TerraBrasil Secretaria de
Desenvolvimento Regional (22ordf SDR) da Prefeitura Municipal de
Araranguaacute (PMA) e do Comitecirc de Gerenciamento da Bacia Hidrograacutefica
do Rio Araranguaacute (CGBHRA) Os eventos tambeacutem receberam apoio das
seguintes organizaccedilotildees e coletivos Assembleia Legislativa do Estado de
Santa Catarina (ALESC) Centro de Apoio Socioambiental (CASA)
Rede Brasileira de Justiccedila Ambiental (RBJA) Amigos da Terra
Internacional Defesa Civil de Santa Catarina Movimento Proacute-
Araranguaacute (MPA) Instituto da Cidadania de Araranguaacute (ICA) Proacute-
Comitecirc da Bacia do Mampituba e Federaccedilatildeo de Entidades Ecologistas
Catarinenses (FEEC) (SOacuteCIOS DA NATUREZA 2009 2005) Os dois
encontros demonstram o interesse e a organizaccedilatildeo socioinstitucional da
128
aacuterea afetada em torno da discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas
relacionada ao mesmo tempo com problemas jaacute existentes no territoacuterio
O Manifesto por justiccedila climaacutetica elaborado em 2005 eacute um ponto de
partida para a discussatildeo sobre mudanccedilas climaacuteticas e justiccedila ambiental
em Santa Catarina Trata-se de uma discussatildeo local que se conecta com
o global sobre um problema atual que se conecta com problemas jaacute
existentes na regiatildeo (MALUF ROSA 2009)
Outra iniciativa importante eacute a dos Foacuteruns Sul Ambiental que
tecircm como objetivo fortalecer um espaccedilo democraacutetico juntando pessoas
instituiccedilotildees e organizaccedilotildees populares na discussatildeo sobre os problemas
socioambientais do Sul Destaca-se aiacute a participaccedilatildeo de professores e
professoras da UNESC e UFSC aleacutem de convidados e convidadas de
outras universidades sediadas em outros estados brasileiros (SANTOS
2008)
A regiatildeo tambeacutem eacute palco de conflitos Dois casos emblemaacuteticos
envolvendo a resistecircncia dos agricultores aconteceram em 1996 em
Criciuacutema na localidade chamada Morro do Estevatildeo e Albino e em
2003 em Iccedilara na localidade de Santa Cruz e Esperanccedila Neste segundo
conflito havia 300 famiacutelias envolvidas aproximadamente mil pessoas
Essas pessoas sobreviviam da agricultura habitavam o local haacute mais de
cem anos e o tamanho de suas propriedades era na meacutedia de vinte
hectares O conflito era de natureza econocircmica (mineraccedilatildeo versus
agricultura) social (envolvimento e mobilizaccedilatildeo social regional) e
ambiental (degradaccedilatildeo) (NASCIMENTO BURSZTYN 2010 p 79)
Nesses conflitos e nas discussotildees regionais destacam-se
- A ONG Soacutecios da Natureza que surgiu em 1980 em
Araranguaacute e se institucionalizou em 1996 tendo uma atuaccedilatildeo regional
(SANTOS 2008)
A ONG trabalha no sentido de buscar em suas
vaacuterias fontes de accedilatildeo a preservaccedilatildeo da natureza e
uma melhor qualidade de vida para a regiatildeo sul de
Santa Catarina o que assinala sua performance de
conotaccedilatildeo socioambiental No entanto por estar
do mesmo modo voltada a accedilotildees que
constantemente envolvem o papel do Estado
tambeacutem pode ser caracterizada por suas
suposiccedilotildees poliacuteticas contra o poder estabelecido
(SANTOS 2008 p 124)
129
- A FEEC que surgiu em 1989 tendo como objetivo unificar e
fortalecer a luta ecoloacutegica catarinense (SANTOS 2008)
- A atuaccedilatildeo de pesquisadores da UNESC e UFSC bem como
pesquisadores sediados em outras universidades do Brasil
- O Grupo de Pesquisa ldquoMemoacuteria e Cultura do Carvatildeo em Santa
Catarinardquo que foi formado em 2000 e inscrito no CNPq em 2002 Ele
reuacutene professores e alunos da UNESC Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS) e CETEM do Rio de Janeiro que estudam
temas relacionados agraves atividades carboniacuteferas O objetivo principal do
Grupo eacute discutir criticamente a cultura a histoacuteria e a economia do
carvatildeo
Ainda nos segmentos sociais incluem-se
- O IPAT vinculado agrave UNESC responsaacutevel pela confecccedilatildeo de
EIARIMA para muitas mineradoras da regiatildeo
- Os meios de comunicaccedilatildeo locais e regionais que natildeo publicam
informaccedilotildees que prejudiquem o segmento carboniacutefero jaacute que muitos satildeo
de propriedade de mineradores e outros recebem valores na forma
patrociacutenio (SANTOS 2008)
46 Situaccedilatildeo atual e desafios
As poucas mudanccedilas ocorridas ateacute o momento satildeo
frutos da pressatildeo exercida pelo movimento
ambiental como um todo na qual seus integrantes
protagonizam um conflito que revela o quanto a
voz do lsquoinimigorsquo fala mais alto (SANTOS 2008
p 160)
A intenccedilatildeo do capiacutetulo foi tratar da gestatildeo de recursos comuns em
Santa Catarina com ecircnfase no carvatildeo mineral O resgate agrave trajetoacuteria do
desenvolvimento catarinense mostra uma ecircnfase na apropriaccedilatildeo privada
dos recursos comuns subordinada ao crescimento econocircmico A
preocupaccedilatildeo ambiental por muito tempo foi considerada marginal
curiosamente ateacute mesmo pelo oacutergatildeo ambiental estadual que incentivou
a expansatildeo da atividade carboniacutefera Essa condiccedilatildeo marginal tambeacutem se
mostra nas regras em uso O Coacutedigo Ambiental de Santa Catarina eacute um
exemplo disso Vaacuterios pontos flexibilizaram a lei ambiental federal para
beneficiar os segmentos econocircmicos
130
O Sul de Santa Catarina tem disponibilidade de carvatildeo mineral e
ao longo de sua trajetoacuteria de desenvolvimento o vem explorando a
despeito dos impactos socioambientais causados pela atividade Nas
uacuteltimas deacutecadas a centralidade desta vem cedendo lugar a outra
atividades econocircmicas Todavia o viacutenculo cultural eacute muito forte Mas
tambeacutem satildeo fortes as vozes contraacuterias agrave exploraccedilatildeo do carvatildeo Os
segmentos sociais se organizam regionalmente e satildeo responsaacuteveis por
movimentos eventos e por uma articulaccedilatildeo em rede com organizaccedilotildees
sediadas em outros estados do Brasil
No Quadro 7 eacute feita uma siacutentese dos principais pontos abordados
ao longo do capiacutetulo que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
energia termeleacutetrica
Quadro 7 ndash Aspectos que favorecem e questionam a ampliaccedilatildeo da
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral Santa
Catarina
MACRO
VARIAacuteVEIS
ASPECTOS QUE
FAVORECEM A
AMPLIACcedilAtildeO
ASPECTOS QUE
QUESTIONAM A
AMPLIACcedilAtildeO
Dinacircmicas de
desenvolvimento
- Fragilidade institucional da
FATMA
- Dependecircncia da matriz
energeacutetica catarinense ndash 35
da energia eleacutetrica
consumida no estado vem do
carvatildeo mineral
- Possibilidade de
conexatildeo do carvatildeo
com discussotildees mais
amplas
Atributos fiacutesicos e
tecnoloacutegicos
- Cultura do carvatildeo no Sul
de Santa Catarina
- Disponibilidade do recurso
- Bom faturamento do
segmento do carvatildeo mineral
- Aumento da produccedilatildeo com
a mecanizaccedilatildeo do processo
de trabalho
- Recuperaccedilatildeo do passivo
ambiental como ponto
positivo para a continuidade
da exploraccedilatildeo do recurso
- Aumento da
produccedilatildeo associado a
degradaccedilatildeo
socioambiental
- Diversificaccedilatildeo
econocircmica da regiatildeo
Sul de Santa
Catarina
Regras em uso - Coacutedigo Estadual do Meio
Ambiente estabelece prazos
para as licenccedilas ambientais
131
- Dispensa do EIARIMA
para a atividade de extraccedilatildeo
do carvatildeo mineral de
pequeno porte
- Reduccedilatildeo do ICMS de 25
para 3
Arena de accedilatildeo
(Caracterizaccedilatildeo dos
envolvidos na gestatildeo)
- Parceria de parte dos
segmentos poliacuteticos com os
segmentos econocircmicos
- Parte dos segmentos
sociais os trabalhadores
costumam apoiar a causa do
carvatildeo
- A UNESC que tambeacutem faz
parte dos segmentos sociais
elaborou o EIARIMA
- Miacutedia (segmentos sociais)
natildeo divulga notiacutecias que
prejudiquem o segmento
carboniacutefero
- Parte dos segmentos
sociais ocupam
espaccedilos de
participaccedilatildeo
instituiacutedos
- Existecircncia de
movimentos sociais
regionais
- Parcerias com
ONGs e
Universidades
- Observatoacuterio do
Carvatildeo
- Foacuteruns de
discussatildeo
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Na macro variaacutevel arena de accedilatildeo a variaacutevel da democracia
apresenta limites relacionados ao apoio dos segmentos poliacuteticos
(Governo Estadual e FATMA) e de parte dos segmentos sociais
(Movimento Sindical IPATUNESC e miacutedia) agrave causa do carvatildeo
mineral Nas possibilidades destacam-se a atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico a organizaccedilatildeo dos segmentos sociais nas redes que unem
ONGs academia e afetadosatingidosameaccedilados e as publicaccedilotildees
(Quadro 8)
132
Quadro 8 ndash Limites e possibilidades do sistema democraacutetico em
Santa Catarina VARIAacuteVEL LIMITES POSSIBILIDADES
Fortalecimento
do sistema
democraacutetico
- Parte dos segmentos
poliacuteticos (Governo
estadual e FATMA)
apoiam a atividade
- Parte dos segmentos
sociais (Movimento
sindical e o
IPATUNESC) apoiam a
causa do carvatildeo mineral
- Miacutedia apoia o segmento
carboniacutefero
- Atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico
- Organizaccedilatildeo de parte dos
segmentos sociais
- Redes unindo ONGs
academia e
afetadosatingidosameaccedilados
- Publicaccedilotildees
Fonte Elaboraccedilatildeo proacutepria
Apesar do forte viacutenculo entre parte dos segmentos poliacuteticos
segmentos econocircmicos e parte dos segmentos sociais em defesa do
carvatildeo mineral outra parte dos segmentos sociais demonstra
aprendizado social adaptativo ao coordenar suas accedilotildees no niacutevel regional
Em uma regiatildeo na qual a atividade estaacute tatildeo arraigada e muitos
municiacutepios e pessoas dependem dela para o seu sustento a mobilizaccedilatildeo
regional eacute uma forma criativa e articulada de enfrentar um problema que
eacute histoacuterico e que se perpetua nas relaccedilotildees poliacuteticas existentes Estas
seratildeo tratadas nos capiacutetulos cinco e seis tanto na democracia
representativa (via eleiccedilotildees) quanto na democracia participativa
(audiecircncias puacuteblicas no processo de licenciamento) para elucidar ainda
mais os limites e as margens de manobra colocadas nos capiacutetulos trecircs e
quatro fundamentais no delineamento de alternativas ao carvatildeo mineral
5 CARVAtildeO MINERAL E POLIacuteTICA EM SANTA CATARINA
ELEICcedilOtildeES E FINANCIAMENTO PRIVADO
Como montanhas de rejeitos soacutelidos compostos de
pirita e enxofre permanece a mesma poliacutetica do
passado patrimonial (TEIXEIRA 1996 p 95)
A histoacuteria do Sul de Santa Catarina estaacute intimamente ligada ao
carvatildeo mineral Dos tempos aacuteureos entre as deacutecadas de 1930 e 1980 agrave
crise dos anos 1990 e do seu ressurgimento no Governo Fernando
Henrique Cardoso com o anuacutencio da construccedilatildeo de novas termeleacutetricas
movidas a carvatildeo mineral Agora em 2013 no Governo Dilma o carvatildeo
nos leilotildees de energia em 2013 As decisotildees nacionais que ora
incentivam o carvatildeo mineral ora dificultam sua exploraccedilatildeo e uso
impactam sensivelmente as regiotildees que tecircm em seu subsolo esse
recurso natural natildeo renovaacutevel Cabe a essas regiotildees se adaptar
preferencialmente influenciando esses contextos mais amplos
No livro Os donos da cidade Joseacute Paulo Teixeira (1996 p 16)
afirma que o complexo carboniacutefero do Sul de Santa Catarina ldquofoi
constituiacutedo a partir de uma ligaccedilatildeo poliacutetico-estrutural entre a esfera
puacuteblica e privadardquo Tendo essa ideia como referecircncia o objetivo do
capiacutetulo eacute identificar relaccedilotildees entre a poliacutetica catarinense e as empresas
que exploram e utilizam o carvatildeo mineral
Para aleacutem dos discursos sobre desenvolvimento econocircmico
seguranccedila energeacutetica e tecnologias natildeo poluentes a hipoacutetese de que se
parte eacute que existe uma reciprocidade entre os interesses dos poliacuteticos ao
receberem doaccedilotildees para suas campanhas eleitorais e os interesses dos
doadores ligados ao carvatildeo mineral Nesse sentido as injusticcedilas
ecoloacutegicas se referem natildeo apenas agrave distribuiccedilatildeo de riscos ambientais
delimitados localmente Elas satildeo condicionadas tambeacutem poliacuteticas e
praacuteticas cujas consequecircncias atravessam fronteiras instituiacutedas e afetam
muacuteltiplas escalas Como jaacute foi ressaltado anteriormente o conceito de
injusticcedila ecoloacutegica designa um sintoma de um processo que envolve a
distribuiccedilatildeo o reconhecimento e a representaccedilatildeo poliacutetica e determina a
distribuiccedilatildeo desigual dos riscos e danos ambientais (HOLIFIELD et al
2009 SCHLOSBERG 2009 e 2004)
Para tanto foram analisados os pronunciamentos da Frente
Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral e as prestaccedilotildees de
contas das eleiccedilotildees de 2002 2004 2006 2008 2010 e 2012 As eleiccedilotildees
de 2004 2008 e 2012 foram eleiccedilotildees municipais e as eleiccedilotildees de 2002
134
2006 e 2010 foram gerais O recorte temporal utilizado se deve a duas
razotildees principais acompanhar as doaccedilotildees durante o periacuteodo em que se
deu o processo de licenciamento da USITESC e o acesso agraves prestaccedilotildees
de contas que teve iniacutecio na eleiccedilatildeo de 2002
O capiacutetulo eacute dividido em trecircs seccedilotildees principais aleacutem dessa
introduccedilatildeo A primeira seccedilatildeo trata dos argumentos presentes nos
discursos poliacuteticos A segunda apresenta os dados sobre doaccedilotildees de
empresas nas eleiccedilotildees gerais e municipais A terceira e uacuteltima seccedilatildeo traz
uma siacutentese dos fatos ausentes dos discursos Os dados apresentados
sugerem um apoio muacutetuo entre os interesses poliacuteticos e privados Os
candidatos de Santa Catarina que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral em suas campanhas satildeo os mesmos que
apoiam a causa do carvatildeo mineral Nesse caso o apoio envolve a
construccedilatildeo de mais uma termeleacutetrica a USITESC a inclusatildeo do carvatildeo
mineral nos leilotildees de 2013 e a reduccedilatildeo de Imposto sobre o ICMS de
25 para 3 na venda de energia eleacutetrica visando melhorar a
competitividade do carvatildeo mineral de Santa Catarina frente a outros
recursos energeacuteticos
51 Os argumentos presentes no discurso dos poliacuteticos
A Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral foi
constituiacuteda no Congresso Nacional em 2005 tendo como principal
objetivo a expansatildeo do uso do carvatildeo mineral na matriz energeacutetica
nacional Datam desse ano quatro pronunciamentos na Cacircmara dos
Deputados Afonso Hamm (Partido Progressista - PPRS) no dia 19 de
outubro Leodegar Tiscoski (PPSC) no dia 2 de novembro Marcus
Vicente (Partido Trabalhista Brasileiro - PTBES) no dia 9 de
novembro e Edinho Bez (PMDBSC) no dia 18 de novembro
As frentes satildeo constituiacutedas por parlamentares que de forma
suprapartidaacuteria se reuacutenem para tratar de uma questatildeo especiacutefica O que
estaacute em jogo eacute a defesa de interesses econocircmicos ou empresariais
corporativos setoriais ou profissionais regionais e ideoloacutegicos dentre
outros No periacuteodo de 2003 a 2007 havia 148 frentes no parlamento
brasileiro (CORADINI 2010)
Em 19 de outubro de 2005 Afonso Hamm (PPRS) em seu
pronunciamento na Cacircmara dos Deputados reforccedilou a importacircncia do
setor para a seguranccedila energeacutetica e para a geraccedilatildeo de empregos em
Santa Catarina e no Rio Grande do Sul Natildeo houve qualquer menccedilatildeo agrave
135
questatildeo socioambiental exceto para falar do carvatildeo mineral como
ldquoreserva de energiardquo O carvatildeo foi colocado como ldquotema de grande
relevacircnciardquo ressaltando-se a importacircncia de buscar a ldquocompetitividade
do setorrdquo atraveacutes de novos projetos para gerar ldquoem torno de 10 mil
empregos na regiatildeo atualmente deprimida econocircmica e socialmenterdquo
(HAMM 2005 p 50549) Os argumentos em defesa do carvatildeo mineral
enaltecem a seguranccedila e a auto-suficiecircncia energeacutetica do Sul e do Brasil
juntamente com outros argumentos de cunho econocircmico
Por sua vez o pronunciamento de Leodegard Tiscoski traz um
histoacuterico do carvatildeo mineral desafios e medidas reinvindicadas pela
Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral Sobre a
questatildeo ambiental a uacutenica menccedilatildeo aparece no seguinte trecho
Principal insumo energeacutetico no iniacutecio do seacuteculo
XX o carvatildeo foi gradualmente perdendo
importacircncia ateacute transformar-se no patinho feio das
nossas fontes energeacuteticas natildeo soacute pelas suas
deficiecircncias naturais mas principalmente pelos
danos ambientais causados pela sua exploraccedilatildeo
(TISCOSKI 2005 p 52894)
Os problemas enfrentados pelo carvatildeo mineral satildeo imputados ao
governo federal como sugere o trecho a seguir ldquoA histoacuteria do carvatildeo
em Santa Catarina eacute uma sucessatildeo de altos e baixos determinados
sempre pela vontade do Governo Federal independentemente de que tal
vontade fosse beneacutefica ou maleacutefica aos interesses estaduaisrdquo
(TISCOSKI 2005 p 52895) Ao Governo Federal eacute atribuiacuteda tambeacutem a
responsabilidade pela estabilidade de empregos retorno de
investimentos e recuperaccedilatildeo do ambiente natural ldquoRelegado agrave proacutepria
sorte o carvatildeo em Santa Catarina passou a conviver com a incerteza do
emprego e mais que tudo com a anguacutestia da perda de renda de milhares
e milhares de famiacutelias da regiatildeo sul de Santa Catarinardquo (TISCOSKI
2005 p 52895)
Somados aos argumentos sobre a importacircncia econocircmica
ressalta-se o carvatildeo mineral como alternativa ao petroacuteleo e agrave
hidroeletricidade A Frente Parlamentar reivindica a isonomia das regras do leilatildeo de energia nova regulamentaccedilatildeo do artigo 13 da Lei nordm
10438 retomada das pesquisas geoloacutegicas e implementaccedilatildeo de projetos
de pesquisa visando um melhor aproveitamento do carvatildeo ldquoO carvatildeo
136
mineral do Brasil natildeo pode ser objeto de atenccedilatildeo por parte do Governo
Federal apenas nos momentos de criserdquo (TISCOSKI 2005 p 52896)
Em seu pronunciamento Marcus Vicente (PTBES) (2005 p
53630) trata o carvatildeo mineral como ldquoitem de alto significado
estrateacutegicordquo ldquofonte energeacutetica segura e confiaacutevelrdquo que ldquosempre foi
colocado em plano secundaacuteriordquo O discurso reforccedila a geraccedilatildeo de
empregos e a seguranccedila energeacutetica Quanto agrave questatildeo ambiental ela eacute
ldquocolocada em duacutevida quando se fala em maior aproveitamento do
carvatildeordquo (VICENTE 2005 p 53630) Haacute uma aposta na pesquisa e no
desenvolvimento tecnoloacutegico que coloca a mineraccedilatildeo como uma
atividade que pode ser feita ldquosem degradaccedilatildeo ambiental nem
comprometimento da sauacutede dos trabalhadoresrdquo Afirma-se que em
1520 anos a energia seraacute gerada com emissatildeo zero e que as aacutereas
degradadas no Brasil jaacute estatildeo sendo recuperadas (VICENTE 2005 p
53631) Segundo este parlamentar o Brasil precisa acompanhar o curso
da histoacuteria
Jaacute Edinho Bez (PMDBSC) fundamenta seus argumentos em uma
reuniatildeo do G-8 na qual se assume que ldquosuprimentos de energia
confiaacuteveis e baratos satildeo essenciais para um forte crescimento
econocircmicordquo (BEZ 2005 p 55746) Ele afirma que o carvatildeo mineral
tem um papel ldquovitalrdquo a desempenhar face ao contingente de pessoas que
ainda natildeo dispotildeem de acesso a energia comercial por ser uma energia
barata O petroacuteleo e o gaacutes natural seriam fontes energeacuteticas inseguras se
comparadas ao carvatildeo mineral A questatildeo ambiental aparece como
desafio que estaacute sendo equacionado pelo investimento em
desenvolvimento tecnoloacutegico Segundo Bez (2005 p 55746) o objetivo
da Frente Parlamentar eacute o de colocar o carvatildeo mineral ldquodefinitivamente
na agenda do Governo Federal com isso induzindo ao desenvolvimento
regional gerando renda e trabalho e aumentando a seguranccedila energeacutetica
vital para o crescimento do Paiacutesrdquo
No intervalo de tempo compreendido entre dezembro de 2005 e
maio de 2011 natildeo houve pronunciamentos da Frente Parlamentar em
Defesa do Carvatildeo Mineral Todavia nesse periacuteodo a Frente manteve a
articulaccedilatildeo natildeo soacute com o segmento produtivo do carvatildeo mineral mas
tambeacutem com o Ministeacuterio das Minas e Energia e o Ministeacuterio da Ciecircncia
e Tecnologia resultando em accedilotildees programas e projetos importantes
para o segmento (AMARAL 2011)
Em 2011 ocorreram apenas dois pronunciamentos um de Edinho
Bez e outro de Delciacutedio do Amaral O pronunciamento de Edinho Bez
137
(PMDBSC) primeiro secretaacuterio da Frente Parlamentar refere-se agrave
posse da Comissatildeo Executiva da referida Frente Ele fala no carvatildeo
mineral como ldquoenergia do futurordquo ldquoresponsaacutevel pela boa qualidade de
vida de centenas de pessoas nas economias mais desenvolvidasrdquo (BEZ
2011 p 20895) Menciona apenas aspectos econocircmicos da induacutestria
carboniacutefera entendida como base do desenvolvimento socioeconocircmico
do Sul de Santa Catarina Ele finaliza o pronunciamento afirmando que
natildeo se poderia abrir matildeo de nenhuma alternativa energeacutetica
Em novembro de 2011 ocorreu a reinstalaccedilatildeo da Frente formada
por 203 deputados federais e 12 senadores e integrada por ex-
parlamentares do Congresso Nacional Deputados Estaduais Prefeitos
Municipais Vereadores Sindicalistas O principal objetivo da Frente em
2011 era a participaccedilatildeo nos leilotildees A-5
A Frente Parlamentar tem como presidentes de honra o Senador
Joseacute Sarney (PMDBAP) e o Deputado Marco Maia (PTRS) Na
Comissatildeo Executiva o Presidente eacute o Senador Delciacutedio do Amaral
(PTMG) Primeiro Vice-Presidente Deputado Afonso Hamm (PPRS)
Segundo Vice-Presidente Senador Paulo Bauer (Partido da Social
Democracia Brasileira - PSDBSC) Primeiro Secretaacuterio Deputado
Edinho Bez (PMDBSC) Segundo Secretaacuterio Deputado Henrique
Fontanta (PTRS) Terceiro Secretaacuterio Deputado Eduardo Sciarra
(DEMPR) e Quarto Secretaacuterio Deputado Ronaldo Zulke (PTRS)
(AMARAL 2011)
Fazem parte do Conselho Consultivo da Frente como Presidente
o Senador Luiz Henrique da Silveira (PMDBSC) e Vice-Presidente
Deputado Ronaldo Benedet (PMDBSC) como membros cooperadores
Fernando Luiz Zancan (Presidente da ABCM) Cesar Weinschenck de
Faria (Presidente do SNIEC) Ruy Hulse (Presidente do SIECESC)
Sereno Chaise (Diretor da CGTEE) Manoel Arlindo Zaroni Torres
(Diretor-Presidente da Tractebel Energia SA) Paulo Monteiro (Diretor
de Sustentabilidade da EBX representando a MPX Energia SA)
Benony Schmitz Filho (Diretor-Presidente da Ferrovia Tereza Cristina
SA ndash FTC) Paulo Camillo Vargas Penna (Presidente do IBRAM) Luiz
Fernando Leone Vianna (Presidente do Conselho de Administraccedilatildeo da
Associaccedilatildeo Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Eleacutetrica
ndash APINE) Heacutelio Bunn (Presidente da AMREC e prefeito do municiacutepio
de Lauro Muller) Paulo Roberto Felix Machado (Presidente da
Associaccedilatildeo de Municiacutepios da Regiatildeo Carboniacutefera do Rio Grande do Sul
ndash ASMURC e prefeito de Butiaacute) Genoir Joseacute dos Santos (Presidente da
138
Federaccedilatildeo Interestadual dos Trabalhadores na Induacutestria da Extraccedilatildeo de
Carvatildeo) e Oniro da Silva Camilo (Presidente do Sindicato
Intermunicipal dos Trabalhadores nas Induacutestrias de Extraccedilatildeo de Carvatildeo
Ouro Calcaacuterio Cal e Barro da Regiatildeo Centro-Sul do Estado do Rio
Grande do Sul) (AMARAL 2011) A composiccedilatildeo do conselho
consultivo demonstra que a Frente Parlamentar Mista em Defesa do
Carvatildeo Mineral se assenta em interesses setoriais e empresariais
regionalmente e nacionalmente representados (CORADINI 2010)
Em agosto de 2012 Afonso Hamm fez um pronunciamento cujo
tema era a sustentabilidade da matriz energeacutetica do Brasil e a criaccedilatildeo da
Associaccedilatildeo Proacute-Carvatildeo (APC) Na sua opiniatildeo ldquoa associaccedilatildeo tem como
propoacutesito estabelecer estrateacutegias de reivindicaccedilatildeo tendo como principal
finalidade a inclusatildeo das usinas termeleacutetricas a carvatildeo mineral nos
leilotildees de energia A-5rdquo (HAMM 2012 p 28704) Mais adiante
esclarece que ldquofalei pessoalmente com a Presidenta Dilma haacute
aproximadamente um ano em Esteio tratando dessa Agendardquo (HAMM
2012 p 28704) Natildeo se fala da questatildeo ambiental a natildeo ser quando eacute
colocada em pauta a inclusatildeo no leilatildeo dos empreendimentos jaacute
instalados e daqueles cuja licenccedila ambiental encontra-se em andamento
Em marccedilo de 2013 Edinho Bez fez seu pronunciamento sobre a
inclusatildeo do carvatildeo mineral no leilatildeo
Sr Presidente meus colegas Parlamentares falo
com satisfaccedilatildeo envaidecido com esta casa e o
proacuteprio Paiacutes pela notiacutecia dada pelo Ministro
Edison Lobatildeo de Minas e Energia com a
autorizaccedilatildeo da Presidente Dilma de que seraacute
incluiacutedo nos proacuteximos leilotildees o carvatildeo mineral
uma fonte de energia uma fonte que garante o
fornecimento de energia natildeo dependeraacute de Satildeo
Pedro natildeo dependeraacute das chuvas natildeo dependeraacute
sequer de uma nem duas ou trecircs Noacutes teremos
mais uma alternativa (BEZ 2013 p 06320)
Bez (2013) ressaltou ainda que o preccedilo do carvatildeo nacional
precisa baixar e para tanto torna-se necessaacuterio reduzir a carga
tributaacuteria Segundo ele o Vice-Governador do Estado de Santa Catarina
Eduardo Moreira jaacute manifestou a disposiccedilatildeo de avanccedilar nessa direccedilatildeo O
resultado dessa disposiccedilatildeo foi a reduccedilatildeo via Decreto em 2013 do ICMS
de 25 para 3 na venda de energia eleacutetrica para novos
empreendimentos beneficiando principalmente as termeleacutetricas a carvatildeo
(ALESC 2013)
139
Ao comentar sobre a posse da nova diretoria da Frente
Parlamentar composta por 182 deputados e senadores presidida pelo
Deputado Federal Afonso Hamm Bez (2013 p 06321) comenta que a
abertura ficou a cargo do presidente da Associaccedilatildeo Brasileira do Carvatildeo
Mineral o ldquoamigordquo Fernando Zancan
Nos pronunciamentos transparece a ecircnfase colocada na promoccedilatildeo
da seguranccedila energeacutetica do Sul e do Paiacutes mediante o aproveitamento do
carvatildeo mineral visto como uma alternativa viaacutevel se comparada agrave
hidroeletricidade ao gaacutes natural e ao petroacuteleo Como argumentos de
defesa o desenvolvimento econocircmico das regiotildees carboniacuteferas de Santa
Catarina e do Rio Grande do Sul parece depender desta atividade
Aspectos socioambientais satildeo apenas tangenciados reconhecendo-se em
alguns momentos que a atividade carboniacutefera causou impactos mas
tambeacutem se admitindo que os mesmos jaacute foram ou estatildeo sendo
resolvidos natildeo devendo se repetir em decorrecircncia dos avanccedilos
tecnoloacutegicos do segmento
52 Panorama das eleiccedilotildees e doaccedilotildees de campanha de 2002 a 2012
Ateacute 1992 a legislaccedilatildeo em vigor proibia a oferta de doaccedilotildees por
parte das empresas Mas as reformas na legislaccedilatildeo apoacutes 1992 tornaram o
sistema mais tolerante apostando na prestaccedilatildeo de contas como forma de
controle puacuteblico Em 1994 o TSE passou a divulgar dados sobre as
candidaturas e contas de campanha Os dados satildeo de responsabilidade
dos candidatos e questiona-se a veracidade dos mesmos vaacuterios satildeo os
casos de financiamentos ilegais corrupccedilatildeo traacutefico de influecircncias
envolvimento com crime organizado que passam a contribuir para a
criacutetica ao financiamento privado Em funccedilatildeo desses problemas o tema
do financiamento poliacutetico tornou-se central no debate recente sobre a
reforma poliacutetica (LEMOS MARCELINO PEDERIVA 2010 SPECK
2005)
Os resultados das eleiccedilotildees indicam fortes viacutenculos com doaccedilotildees e
gastos de campanha quanto maiores as doaccedilotildees e gastos maiores as
chances de o candidato se eleger Os doadores se tornaram tatildeo
fundamentais nas campanhas que tecircm determinado muitas vezes a
proacutepria escolha do candidato A reeleiccedilatildeo apresenta-se como um trunfo
aos candidatos jaacute que o risco do doador eacute menor do que se este
escolhesse um iniciante (LEMOS MARCELINO PEDERIVA 2010)
140
Em contrapartida candidatos tendem a compensar tais investimentos se
e quando eleitos ldquoEacute grande a lista de entidades que satildeo potencialmente
beneficiadas por decisotildees ou medidas administrativas do governo entre
estes os bancosrdquo (SPECK 2005 p 148)
No Brasil satildeo permitidas doaccedilotildees de empresas que possuem
relaccedilotildees contratuais com o Estado natildeo existindo regra que limite a
dependecircncia entre candidato e doador Dados sobre as prestaccedilotildees de
contas demonstram um problema de dependecircncia entre os candidatos e
seus principais financiadores (SPECK 2005)
Na sequecircncia satildeo examinadas as doaccedilotildees das eleiccedilotildees de 2002 a
2012 divididas em eleiccedilotildees gerais e eleiccedilotildees municipais A ecircnfase recai
nas doaccedilotildees realizadas por empresas ligadas ao carvatildeo mineral e sua
relaccedilatildeo com os candidatos de Santa Catarina As doaccedilotildees para
candidatos de outros estados natildeo satildeo tratadas neste capiacutetulo
521 Eleiccedilotildees gerais
No periacuteodo compreendido entre os anos de 2002 e 2012
ocorreram trecircs eleiccedilotildees gerais Constam nos registros do Tribunal
Superior Eleitoral nove empresas relacionadas ao carvatildeo mineral em
Santa Catarina como doadoras
O Complexo Jorge Lacerda que utiliza carvatildeo mineral para
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica pertence agrave Tractebel que tambeacutem eacute
proprietaacuteria das Usinas Hidreleacutetricas de Itaacute Machadinho e Co-geraccedilatildeo
de biomassa em Lages todos situados em Santa Catarina A Carboniacutefera
Metropolitana SA tem 123 anos de existecircncia estaacute sediada em
Criciuacutema e possui parte da USITESC A Carboniacutefera Belluno Ltda foi
fundada em 1991 apoacutes a compra de parte da Companhia Sideruacutergica
Nacional pelo Grupo Salvaro e localiza-se em Sideroacutepolis Aleacutem de
trabalhar na extraccedilatildeo e beneficiamento do Carvatildeo a Carboniacutefera
Belluno tambeacutem atua no transporte e na comunicaccedilatildeo A Mineraccedilatildeo
Castelo Branco Ltda localiza-se em Lauro Muller A Carboniacutefera
Criciuacutema foi fundada em 1943 e tem sede em Criciuacutema A Induacutestria
Carboniacutefera Rio Deserto foi criada em 1918 e localiza-se em Criciuacutema
bem como a Coque Catarinense a Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos e a
Mineraccedilatildeo Santa Augusta
141
A eleiccedilatildeo de 2002 teve como principais doadores a Tractebel
(5007) a Carboniacutefera Metropolitana (1488) e a Carboniacutefera
Belluno (1320) A empresa que mais apoiou candidatos dez no total
foi a Carboniacutefera Metropolitana As demais empresas apoiaram cinco
candidatos ou menos conforme consta na Tabela 7
Tabela 7 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2002
Fonte TSE 2013
Quanto ao montante de doaccedilotildees por candidato em 2002
destacou-se o candidato a governador Esperidiatildeo Amin que recebeu de
quatro empresas 4138 do total de doaccedilotildees O candidato Paulo Roberto
Bauer recebeu de quatro empresas o equivalente a 1182 das doaccedilotildees
Cleacutesio Salvaro recebeu apenas 673 Aleacutem dos trecircs candidatos citados
outros dezesseis candidatos ficaram com 4007 das doaccedilotildees conforme
dados da Tabela 8 As duas uacuteltimas colunas da Tabela 8 relacionam as
doaccedilotildees com a receita total dos candidatos Em quatro dos 19 candidatos
as doaccedilotildees das empresas ligadas ao carvatildeo mineral representam mais de
50 de sua respectiva receita
Nordm
CANDIDATOS
Tractebel Egi South America Ltda 5 PFL PP PPB PSDB 53000000 5007
Carboniacutefera Metropolitana SA 10 PP PMDB PSDB PT PPB PFL 15750000 1488
Carboniacutefera Belluno Ltda 3 PMDB PFL PT 13970000 1320
Mineraccedilatildeo Castelo Branco Ltda 5 PFL PMDB PP PPB PSDB 8467400 800
Carboniacutefera Criciuacutema Ltda 5 PFL PT PSDB PMDB PT 6450000 609
Induacutestria Carboniacutefera Rio Deserto Ltda 5 PFL PMDB PSDB 4050000 383
Coque Catarinense Ltda 2 PFL PMDB 2434000 230
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos Ltda 4 PFL PMDB PP 927000 088
Mineraccedilatildeo Santa Augusta Ltda 1 PP 800000 076
TOTAL 105848400 10000
DOADOR PARTIDOS VALOR R$
142
Tabela 8 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2002 que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees de 2002 o PP recebeu 46 das doaccedilotildees o Partido
da Frente Liberal (PFL) 2147 o PSDB 1352 o PMDB 1027
o PT 477 e o Partido Progressista Brasileiro (PPB) 397
Tabela 9 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2002
Fonte TSE 2013
NO ME PARTIDO CANDIDATURA VALO R R$ RECEITA TO TAL R$
Esperidiatildeo Amin PP Governador 43798600 4138 373920269 1171
Paulo R Bauer PSDB Deputado Federal 12510800 1182 49994468 2502
Clesio Salvaro PFL Deputado Estadual 7120000 673 11296000 6303
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 5266200 498 27320200 1928
Paulo R Bornhausen PFL Senador 4900000 463 198753494 247
Leodegar da C Tiscoski PP Deputado Federal 4892000 462 20432951 2394
Joseacute P Serafim PT Deputado Estadual 4500000 425 7303000 6162
Luiz H da Silveira PMDB Governador 4000000 378 240099527 167
Ivan C Ranzolin PFL Deputado Federal 3000000 283 26017099 1153
Pedro Bittencourt Neto PFL Deputado Federal 2860800 27 13469800 2124
Vanio de Oliveira PPB Deputado Federal 2200000 208 3110990 7072
Celestino RSecco PPB Deputado Estadual 2000000 189 21164000 945
Joatildeo P K Kleinubing PFL Deputado Estadual 2000000 189 10710330 1867
Julio Cesar Garcia PFL Deputado Estadual 2000000 189 4449450 4495
Cezar P de Luca PSDB Deputado Federal 1800000 17 3925683 4585
Ronaldo J Benedet PMDB Deputado Estadual 1350000 128 12097324 1116
Arleu R da Silveira PFL Deputado Estadual 850000 08 890370 9547
Edson C Rodrigues PT Deputado Federal 550000 052 8653600 636
Aceacutelio Casagrande PMDB Deputado Federal 250000 024 1512694 1653
TOTAL 105848400 100
PARTIDO VALOR R$
PP 48690600 46
PFL 22730800 2147
PSDB 14310800 1352
PMDB 10866200 1027
PT 5050000 477
PPB 4200000 397
TOTAL 105848400 100
143
Nas Eleiccedilotildees de 2006 entraram em cena as seguintes empresas
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasileira que atua na regiatildeo Companhia
Energeacutetica Meridional que eacute subsidiaacuteria da empresa Tractebel A
Mendes Terraplanagem Construccedilatildeo e Extraccedilatildeo de Minerais Ltda que
atua na regiatildeo Minageo Ltda de Criciuacutema Sulcatarinense Mineraccedilatildeo e
Artefatos Ltda com sede em Biguaccedilu Carboniacutefera Sideroacutepolis de
Criciuacutema Gabriella Mineraccedilatildeo de Sideroacutepolis Carboniacutefera Catarinense
Ltda de Lauro Muller Nas eleiccedilotildees de 2006 a Tractebel doou 4038
para onze candidatos a Carboniacutefera Metropolitana 1226 para quatro
candidatos e a Carboniacutefera Criciuacutema 1136 (Tabela 10) O montante
de doaccedilotildees aumentou de R$ 105848400 em 2002 para R$
158506900 em 2006
Tabela 10 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2006
Fonte TSE 2013
Dos 22 candidatos apoiados pelas empresas em 2006 Edson Bez
de Oliveira recebeu 1325 dos recursos de seis empresas Ada Lili
Faraco de Luca recebeu 1262 de duas empresas Luiz Henrique da
Silveira recebeu 1262 de uma empresa e Paulo Roberto Bauer
recebeu 946 de quatro empresas (Tabela 11) Constata-se uma
distribuiccedilatildeo maior das doaccedilotildees jaacute que na Eleiccedilatildeo de 2002 um uacutenico
candidato Esperidiatildeo Amim recebeu 4138 das doaccedilotildees
DOADOR NordmCANDIDATOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora 11 PFL PMDB PP PPS PSDB PT 64000000 4038
Carboniacutefera Metropolitana SA 4 PMDB PP PSDB 19432000 1226
Carboniacutefera Criciuacutema SA 2 PMDB PSDB 18000000 1136
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasil Ltda 7 PFL PMDB PP PPS PT 15555000 981
Cia Energeacutetica Meridional 3 PFL PP PT 14000000 883
Carboniacutefera Catarinense Ltda 2 PFL PP 8183000 516
Carboniacutefera Belluno Ltda 2 PMDB PSDB 6776000 427
A Mendes TerConstr E Extr De
Minerais Ltda 1 PMDB 4000000 252
Minageo Ltda 2 PMDB PT 3288000 207
Sul Catarinense Mineraccedilatildeo e Art 4 PP PPS PSDB 2400000 151
Carboniacutefera Sideroacutepolis Ltda 1 PP 1186500 075
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda 1 PP 1186400 075
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos 1 PMDB 500000 032
TOTAL 158506900 10000
144
Tabela 11 - Candidatosas que receberam doaccedilotildees das empresas
ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2006
Fonte TSE 2013
Em 2006 o PMDB recebeu o maior montante de doaccedilotildees
4104 enquanto na eleiccedilatildeo de 2002 o maior montante foi destinado ao
PP 46 O PSDB aumentou suas captaccedilotildees junto ao lobby do carvatildeo de
1352 em 2002 para 1640 em 2006 O PT de 477 em 2002
para 807 em 2006 O PFL diminuiu de 2147 para 1577 no
periacuteodo Aleacutem do PMDB apareceu na lista tambeacutem o Partido Popular
Socialista (PPS) com 265 (Tabela 12)
NOME PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 21000000 1325 44379023 4732
Ada Lili Faraco de Luca PMDB Deputado Estadual 20000000 1262 62976575 3176
Luiz Henrique da Silveira PMDB Governador 20000000 1262 725548795 276
Paulo Roberto Bauer PSDB Deputado Federal 15000000 946 63272293 2371
Leodegar da Cunha Tiscoski PP Deputado Federal 12263900 774 16487006 7439
Geraldo Cesar Althoff PFL Deputado Federal 11000000 694 113398356 97
Angela Regina Heinzen Amin Helou PP Deputado Federal 10000000 631 25349000 3945
Djalma Vando Berger PSDB Deputado Federal 5000000 315 107978844 463
Gervaacutesio Joseacute da Silva PFL Deputado Federal 5000000 315 95845710 522
Giancarlo Tomelin PSDB Deputado Estadual 5000000 315 14028277 3564
Jorge Catalino Leonardelli Boeira PT Deputado Federal 5000000 315 47519555 1052
Paulo Roberto Barreto Bornhausen PFL Deputado Federal 5000000 315 132260292 378
Ivan Cesar Ranzolin PFL Deputado Federal 4000000 252 23237183 1721
Milton Mendes de Oliveira PT Deputado Federal 4000000 252 18603010 215
Joseacute Paulo Serafim PT Deputado Estadual 3788000 239 19238000 1969
Sergio Joseacute Grando PPS Deputado Estadual 3200000 202 16206665 1974
Antonio Carlos Vieira PP Deputado Estadual 3000000 189 15931786 1883
Acelio Casagrande PMDB Deputado Federal 2055000 13 14020875 1466
Ronaldo Joseacute Benedet PMDB Deputado Estadual 2000000 126 42694345 468
Altair Guidi PPS Deputado Estadual 1000000 063 10547730 948
Joseacute Natal Pereira PSDB Deputado Estadual 1000000 063 13659460 732
Licio Mauro Ferreira da Silveira PP Deputado Estadual 200000 013 10092456 198
158506900 100
145
Tabela 12 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2006
Fonte TSE 2013
Na Eleiccedilatildeo de 2010 cinco empresas aparecem como doadoras A
Tractebel assim como na Eleiccedilatildeo de 2002 e 2006 doou a maior parte
dos recursos 7483 para 27 candidatos de vaacuterios partidos As outras
quatro empresas dividem os 2517 restantes conforme dados
apresentados na Tabela 13
Tabela 13 - Doadores da Eleiccedilatildeo de 2010
Fonte TSE 2013
Os candidatos que receberam o maior montante de doaccedilotildees foram
Angela Amin com 1515 Paulo Roberto Bauer com 1082 e Edson
Bez de Oliveira com 884 (Tabela 14) O nuacutemero de candidatos
apoiados por doaccedilotildees aumentou de 19 candidatos em 2002 para 22 em
2006 e 30 em 2010 Diminuiu tambeacutem a concentraccedilatildeo dos recursos em
relaccedilatildeo ao nuacutemero de candidatos em 2002 os trecircs primeiros candidatos
receberam 5993 das doaccedilotildees em 2006 receberam 3849 e em
2010 3481 Isso demonstra que as empresas passaram a investir em
um nuacutemero maior de candidatos concentrando menos as doaccedilotildees
PARTIDO VALOR [R$]
PMDB 65055000 4104
PSDB 26000000 164
PP 25463900 1606
PFL 25000000 1577
PT 12788000 807
PPS 4200000 265
TOTAL 158506900 100
DOADOR NordmCANDIDATOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora
Ltda
27 PMDB PP
PPS PR
PSDB e PT
123500000 7483
Industria Carboniacutefera Rio Deserto
Ltda
4 PMDB e
PSDB
12548100 760
Carboniacutefera Metropolitana SA 5 PMDB
PSDB
11700000 709
Carboniacutefera Belluno Ltda 2 PSDB 10600000 642
Carboniacutefera Criciuacutema Ltda 3 PMDB 6700600 406
TOTAL 165048700 10000
146
Tabela 14 - Candidatosas receberam doaccedilotildees das empresas ligadas
ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total 2010
Fonte TSE 2013
Em 2010 o mesmo natildeo aconteceu com os partidos poliacuteticos As
doaccedilotildees concentraram-se em trecircs partidos PMDB com 3641 PT com
3393 e PSDB com 1784 conforme dados apresentados na Tabela
15 A concentraccedilatildeo de doaccedilotildees no PMDB diminuiu de 4104 em 2006
para 3641 em 2010 e aumentou para o PT (de 807 em 2006 para
3393 em 2010) e o PSDB (de 1640 em 2006 para 1784 em
2010)
NOME PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Angela R H Amin Helou PP Governador 25000000 1515 285235728 876
Paulo Roberto Bauer PSDB Senador 17859100 1082 215018697 831
Edson Bez de Oliveira PMDB Deputado Federal 14589500 884 76475776 1908
Ronaldo Joseacute Benedet PMDB Deputado Federal 10037000 608 62224076 1613
Claudio Antocircnio Vignatti PT Senador 10000000 606 225944994 443
Luiz Henrique da Silveira PMDB Senador 7463100 452 316150000 236
Thatiane Ferro Teixeira PSDB Deputado Estadual 5600000 339 21357586 2622
Ada Lili Faraco de Luca PMDB Deputado Estadual 5000000 303 66479091 752
Jorge C Leonardeli Boeira PT Deputado Federal 5000000 303 51226181 976
Celso Maldaner PMDB Deputado Federal 4000000 242 56183406 712
Deacutecio Nery de Lima PT Deputado Federal 4000000 242 94602191 423
Gean Marques Loureiro PMDB Deputado Federal 4000000 242 47666076 839
Gervaacutesio Joseacute da Silva PSDB Deputado Federal 4000000 242 68162276 587
Luci T K Choinacki PT Deputado Federal 4000000 242 53638737 746
Paulo R B Bornhausen DEM Deputado Federal 4000000 242 132193682 303
Pedro Francisco Uczai PT Deputado Federal 4000000 242 45421410 881
Vanio dos Santos PT Deputado Federal 4000000 242 68945421 580
Aceacutelio Casagrande PMDB Deputado Estadual 2500000 151 19129380 1307
Alexandre Santos Moraes PMDB Deputado Estadual 2500000 151 11717054 2134
Ana Paulo de Souza Lima PT Deputado Estadual 2500000 151 19360800 1291
Antonio M R de Aguiar PMDB Deputado Estadual 2500000 151 57962102 431
Carlos Joseacute Stupp PSDB Deputado Estadual 2500000 151 41555975 602
Edison A A de Oliveira PMDB Deputado Estadual 2500000 151 44778059 558
Giancarlo Tomelin PSDB Deputado Estadual 2500000 151 26041812 960
Joatildeo Batista Nunes PR Deputado Estadual 2500000 151 28970265 863
Joatildeo Olavio Falchetti PT Deputado Estadual 2500000 151 6753000 3702
Joares Carlos Ponticelli PP Deputado Estadual 2500000 151 45669621 547
Luciano Formighieri PPS Deputado Estadual 2500000 151 17351190 1441
Marcos Luiz Vieira PSDB Deputado Estadual 2500000 151 79902729 313
Rosemeacuteri Bartucheski PMDB Deputado Estadual 2500000 151 30045075 832
TOTAL 165048700 10000
147
Tabela 15 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2010
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees gerais de 2002 2006 e 2010 foram registradas
doaccedilotildees de 16 empresas ligadas ao carvatildeo mineral somando um total de
R$ 429404000 A Tractebel doou 5601 do total (R$ 240500000)
seguida pela Carboniacutefera Metropolitana SA com 1092 (R$
46882000) e pela Carboniacutefera Belluno com 730 (R$ 31346000) As
doaccedilotildees tecircm aumentado a cada eleiccedilatildeo em 2002 foram R$
105848400 em 2006 foram R$ 158506900 e em 2010 foram R$
165048700
O candidato Paulo Roberto Bauer recebeu um total de R$
45369900 em doaccedilotildees representando 1057 do total de doaccedilotildees Jaacute
Esperidiatildeo Amin recebeu R$ 43798600 (1020) e Edson Bez de
Oliveira foi agraciado com R$ 40855700 (951) Todos os candidatos
eleitos que receberam doaccedilotildees de campanha das empresas ligadas ao
carvatildeo mineral participam da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral confirmando a hipoacutetese da relaccedilatildeo estreita entre doaccedilotildees e
apoio agrave causa do carvatildeo mineral
No que se refere agrave relaccedilatildeo entre doaccedilotildees e os partidos poliacuteticos
constatou-se que o PMDB recebeu 3168 das doaccedilotildees no periacuteodo de
2002 a 2010 (R$ 136017900) Quanto ao PP este recebeu 1937 (R$
83154500) O PT levou 1720 (R$ 73838000) O PMDB aumentou
de R$ 10866200 em 2002 para R$ 60096700 em 2010 O PT
aumentou de R$ 5050000 em 2002 para R$ 56000000 em 2010 Jaacute
o PP diminuiu de R$ 48690600 em 2002 para R$ 9000000 em
2010 O aumento das doaccedilotildees para o PMDB e o PT pode ser explicado
se considerarmos a reeleiccedilatildeo e ascensatildeo de alguns candidatos inclusive
pela reeleiccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Lula da Silva do PT para a presidecircncia da
Repuacuteblica Jaacute as doaccedilotildees concedidas ao PP diminuiacuteram apoacutes a aposta
frustrada na eleiccedilatildeo de Esperidiatildeo Amin para governador
PARTIDO VALOR R$
PMDB 60096700 3641
PT 56000000 3393
PSDB 29452000 1784
PP 9000000 545
DEM 4000000 242
PR 4000000 242
PPS 2500000 151
TOTAL 165048700 10000
148
522 Eleiccedilotildees municipais
Nas eleiccedilotildees municipais de 2004 cinco empresas foram
doadoras Carboniacutefera Belluno (6383) Carboniacutefera Criciuacutema
(1558) Carboniacutefera Metropolitana (895) Carboniacutefera Catarinense
(823) e Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos (341) conforme dados da
Tabela 16 Foram doados R$ 41232300 para sete municiacutepios
Tabela 16 - Doadores eleiccedilotildees de 2004
Fonte TSE 2013
O municiacutepio de Criciuacutema recebeu 852 das doaccedilotildees Dentre os
candidatos estatildeo o candidato a vereador do municiacutepio de Criciuacutema
Edson do Nascimento do PMDB com 728 das doaccedilotildees o candidato
a prefeito de Criciuacutema Deacutecio Gomes Goacutees do PT com 606 e Carlos
Joseacute Stupp candidato a prefeito no municiacutepio de Tubaratildeo pelo PSDB
com 485 Aleacutem dos Comitecircs Financeiros Municipais (CFM) de
Criciuacutema Sideroacutepolis Treviso Lauro Muller e Iccedilara quatorze
candidatos a prefeito e vereador foram apoiados por doaccedilotildees (Tabela
17) Dos quatorze candidatos seis se mostram mais dependentes das
doaccedilotildees representando mais de 50 de sua receita total
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Carboniacutefera Criciuacutema Criciuacutema e Tubaratildeo PFL PMDB PSDB 6425000 3791
Carboniacutefera Metropolitana Criciuacutema Iccedilara e Tubaratildeo PFL PMDB e PT 3688500 2176
Caboniacutefera Catarinense Criciuacutema Lauro Muller Sideroacutepolis
Tubaratildeo
PFL PP PT 3391500 2001
Carboniacutefera Belluno Criciuacutema e Treviso PSDB 2034300 1200
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos Criciuacutema Lauro Muller Urussanga
PMDB PP PSDB e
PT 1408000 831
TOTAL 16947300 10000
149
Tabela 17 - Comitecircs e candidatos que receberam doaccedilotildees das
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
2004
Fonte TSE 2013
Em 2004 dos cinco partidos que estatildeo entre os receptores o
PSDB recebeu 6798 das doaccedilotildees o PMDB recebeu 1823 o PT
recebeu 657 o PP recebeu 402 e o PFL recebeu 319 (Tabela
18)
Tabela 18 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2004
Fonte TSE 2013
CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$
RECEITA
TOTAL
R
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Criciuacutema PSDB - 29431300 7138 37042800 7945
Edson Do Nascimento Criciuacutema PMDB Vereador 3000000 728 3777163 7942
Deacutecio Gomes Goacutees Criciuacutema PT Prefeito 2500000 606 41391000 604
Carlos Jose Stupp Tubaratildeo PSDB Prefeito 2000000 485 66861662 299
Comitecirc Financeiro
Municipal Uacutenico
Sideroacutepolis PP - 791500 192 916500 8636
Luiz Carlos Zen Urussanga PP Prefeito 668000 162 4418000 1512
Felipe Felisbino Tubaratildeo PFL Vereador 500000 121 641145 7799
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Treviso PMDB - 388000 094 1004554 3862
Nestor Spricigo Lauro Muller PMDB Prefeito 330000 080 830752 3972
Elemar Nunes Tubaratildeo PFL Vereador 264000 064 404248 6531
Dalton Luiz Marcon Tubaratildeo PFL Vereador 202500 049 342514 5912
Manoel Duarte Porto Tubaratildeo PFL Vereador 202500 049 529725 3823
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Lauro Muller PP - 200000 049 600000 3333
Comitecirc Financeiro
MunicipalPrefeito
Iccedilara PMDB - 200000 049 6610000 303
Rudemar Silveira Da
Cunha
Tubaratildeo PFL Vereador 144500 035 242894 5949
Paulo Gonccedilalves Filho Lauro Muller PT Prefeito 110000 027 535000 2056
Antonio Alves Elias Lauro Muller PT Vereador 100000 024 166828 5994
Lauro Pirolla Criciuacutema PSDB Vereador 100000 024 279420 3579
Vanderlei Joseacute Zilli Criciuacutema PMDB Vereador 100000 024 1007126 993
41232300 10000
PARTIDO VALOR R$
PSDB 28031300 6798
PMDB 7518000 1823
PT 2710000 657
PP 1659500 402
PFL 1313500 319
TOTAL 41232300 10000
150
Nas eleiccedilotildees de 2008 seis empresas doaram um total de R$
22918311 A Carboniacutefera Criciuacutema doou 4132 a Mineraccedilatildeo e
Pesquisa Brasileira doou 2313 e a Tractebel doou 2182 (Tabela
19) O montante de doaccedilotildees de 2008 se comparado ao de 2004
diminuiu 4442
Tabela 19 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2008
Fonte TSE 2013
As doaccedilotildees de 2008 se concentraram em trecircs candidatos O
candidato a prefeito de Tubaratildeo Joatildeo Falchetti do PT recebeu 4363
das doaccedilotildees Edison do Nascimento do PMDB candidato a vereador
por Criciuacutema recebeu 2396 e Joseacute Claudio Gonccedilalves do DEM
candidato a prefeito de Forquilhinha recebeu 1091 das doaccedilotildees
Conforme dados apresentados na Tabela 20 receberam doaccedilotildees
candidatos dos municiacutepios de Criciuacutema Tubaratildeo Forquilhinha Iccedilara
Meleiro Timbeacute do Sul Sideroacutepolis e Lauro Muller Se consideradas as
receitas totais dos dezesseis candidatos cinco candidatos satildeo muito
dependentes das doaccedilotildees jaacute que elas representam mais de 50 da
receita total
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Carbonifera Criciuma SA Criciuacutema Forquilhinha Lauro Muller
Meleiro Timbeacute do Sul
PMDB DEM 9468944 4132
Mineraccedilatildeo E Pesquisa Brasileira Criciuacutema Tubaratildeo PMDB PT 5300000 2313
Tractebel Energia Tubaratildeo PT 5000000 2182
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda Criciuacutema Iccedilara DEM PP PSDB 1679175 733
Carboniacutefera Belluno Ltda Criciuacutema PSDB 1120192 489
Carbonifera Metropolitana SA Criciuacutema Sideroacutepolis Timbeacute do Sul PMDB 350000 153
TOTAL 22918311 10000
151
Tabela 20 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2008 que receberam doaccedilotildees
das empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
Fonte TSE 2013
As doaccedilotildees entre os partidos nas eleiccedilotildees de 2008 foram
distribuiacutedas da seguinte forma o PT recebeu 4363 das doaccedilotildees o
PMDB recebeu 3181 o DEM recebeu 1158 o PSDB recebeu
774 e o PP recebeu 524 (Tabela 21)
Tabela 21 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2008
Fonte TSE 2013
Nas Eleiccedilotildees de 2012 cinco empresas doaram R$ 22700000
para candidatos de trecircs municiacutepios Criciuacutema Iccedilara e Tubaratildeo Os
maiores montantes de doaccedilatildeo tiveram origem na Tractebel (6608) Carboniacutefera Metropolitana (1762) e Carboniacutefera Criciuacutema (1101)
conforme dados apresentados na Tabela 22
NOME DO CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Joatildeo Olavio Falchetti Tubaratildeo PT Prefeito 10000000 4363 18223525 5487
Edison Do Nascimento Criciuacutema PMDB Vereador 5490944 2396 10054122 5461
Joseacute Claudio Gonccedilalves Forquilhinha DEM Prefeito 2500000 1091 10147880 2464
Darlan Bitencourt Carpes Iccedilara PP Vereador 1200000 524 3761519 3190
Antoninho Dal Molin Netto Meleiro PMDB Prefeito 1000000 436 1997000 5008
Clesio Salvaro Criciuacutema PSDB Prefeito 842992 368 72173591 117
Andre M Jucoski Iccedilara PSDB Vereador 454175 198 1245875 3645
Luiz Fernando Cardoso Criciuacutema PMDB Vereador 400000 175 8071771 496
Jose Daminelli Criciuacutema PSDB Vereador 277200 121 1227765 2258
Arleu Ronaldo Da Silveira Criciuacutema PSDB Vereador 200000 087 1649455 1213
Heacutelio Roberto Cesa Sideroacutepolis PMDB Prefeito 150000 065 9963963 151
Wersmberg Laureano Lauro Muumlller DEM Vereador 128000 056 385903 3317
Loraci Davila Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 100000 044 163000 6135
Gislael Floriano Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 100000 044 195000 5128
Joao Batista Mandelli Timbeacute Do Sul PMDB Vereador 50000 022 255800 1955
Romanna G C L Remor Criciuacutema DEM Vereador 25000 011 10166479 025
22918311 10000
152
Tabela 22 - Doadores Eleiccedilatildeo de 2012
Fonte TSE 2013
Os candidatos a prefeito de Tubaratildeo do PSDB PMDB PSD e
PT receberam 8812 das doaccedilotildees (Tabela 23) O municiacutepio de Tubaratildeo
recebeu 8944 do total de doaccedilotildees Se consideradas as receitas totais
natildeo haacute evidecircncias de uma maior dependecircncia grande das doaccedilotildees
Tabela 23 - Candidatos da Eleiccedilatildeo de 2012 que receberam doaccedilotildees
das empresas ligadas ao carvatildeo mineral e relaccedilatildeo com a receita total
Fonte TSE 2013
Em 2012 o PSDB recebeu 2996 das doaccedilotildees o PMDB o PSD
e o PT receberam 2203 respectivamente e o PP recebeu 396
(Tabela 24) As doaccedilotildees da Eleiccedilatildeo de 2012 se comparadas agraves eleiccedilotildees
de 2004 e 2008 foram distribuiacutedas de forma mais equilibrada entre os
partidos
DOADOR MUNICIacutePIOS PARTIDOS VALOR R$
Tractebel Energia Comercializadora
Ltda
Tubaratildeo PSD PSDB
PT
15000000 6608
Carboniacutefera Metropolitana SA Iccedilara Tubaratildeo PSDB 4000000 1762
Carboniacutefera Criciuacutema SA Iccedilara Tubaratildeo PMDB PSDB 2500000 1101
Mineraccedilatildeo e Pesquisa Brasileira Ltda Criciuacutema PP 900000 396
Minageo Ltda Tubaratildeo PSDB 300000 132
TOTAL 22700000 10000
CANDIDATO MUNICIacutePIO PARTIDO CANDIDATURA VALOR R$ RECEITA
TOTAL R$
Carlos Joseacute Stupp Tubaratildeo PSDB Prefeito 5000000 2203 36245503 1379
Edson Bez de
Oliveira
Tubaratildeo PMDB Prefeito 5000000 2203 129287720 387
Felippe Luiz Collaccedilo Tubaratildeo PSD Prefeito 5000000 2203 34140000 1465
Joatildeo Olavio falchetti Tubaratildeo PT Prefeito 5000000 2203 42272000 1183
Andreacute Mazzuchello
Jucoski
Iccedilara PSDB Vereador 1500000 661 4995950 3002
Daniel Costa de
Freitas
Criciuacutema PP Vereador 900000 396 6319977 1424
Felipe Felisbino Tubaratildeo PSDB Vereador 300000 132 4119158 728
22700000 10000
153
Tabela 24 - Doaccedilotildees por partido Eleiccedilatildeo de 2012
Fonte TSE 2013
Nas eleiccedilotildees municipais de 2004 2008 e 2012 nove empresas
doaram R$ 86850611 para os candidatos a prefeito e vereador As
doaccedilotildees direcionadas agraves eleiccedilotildees municipais apresentam uma reduccedilatildeo
significativa foram R$ 41232300 em 2004 R$ 22918311 em 2008 e
R$ 22700000 em 2012 A Carboniacutefera Belluno lidera as doaccedilotildees com
3159 seguida da Tractebel com 2303 e da Carboniacutefera Criciuacutema
com 2118 Os trecircs partidos que mais recebem doaccedilotildees nas eleiccedilotildees
municipais satildeo PSDB com 4215 PMDB com 2281 e PT com
2039
53 Os fatos ausentes do discurso dos poliacuteticos
No Brasil a degradaccedilatildeo do meio ambiente
e da sociedade das pessoas e da natureza
constitui cara e coroa de uma mesma
moeda de um mesmo estilo de
desenvolvimento e da ausecircncia de
democracia (SOUZA 1992 p 16)
As empresas ligadas ao carvatildeo mineral em Santa Catarina
doaram no intervalo de dez anos R$ 516254611 para candidatos a
eleiccedilotildees gerais e municipais Das dezessete empresas que aparecem
como doadoras a Tractebel foi responsaacutevel por 5046 das doaccedilotildees
seguida pela Carboniacutefera Belluno com 1139 e pela Carboniacutefera
Metropolitana com 1064 As demais quatorze empresas somam
2751 das doaccedilotildees (Tabela 25) O aumento nas doaccedilotildees para eleiccedilotildees
gerais e a diminuiccedilatildeo das doaccedilotildees para eleiccedilotildees municipais mostra que cresce nas empresas o interesse em apoiar candidatos a eleiccedilotildees gerais
que possam participar da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral
PARTIDO VALOR R$
PSDB 6800000 2996
PMDB 5000000 2203
PSD 5000000 2203
PT 5000000 2203
PP 900000 396
TOTAL 22700000 10000
154
Tabela 25 - Siacutentese dos doadores Eleiccedilotildees de 2002 e 2012
Fonte TSE 2013
Os dez candidatos que receberam maiores doaccedilotildees entre 2002 e
2012 foram candidatos a eleiccedilotildees gerais exceto Joatildeo Olavio Falchetti
que foi candidato em duas eleiccedilotildees municipais em 2008 e 2012 (Tabela
26) Todos os candidatos a eleiccedilotildees gerais que receberam doaccedilotildees de
empresas ligadas ao carvatildeo mineral e foram eleitos fazem parte
atualmente da Frente Parlamentar em Defesa do Carvatildeo Mineral
ANO ELEICcedilAtildeO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
DOADOR VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$
Tractebel Egi South
America Ltda 53000000 0 64000000 5000000 123500000 15000000 260500000 5046
Carboniacutefera Belluno Ltda 13970000 26319300 6776000 1120192 10600000 0 58785492 1139
Carboniacutefera
Metropolitana SA 15750000 3688500 19432000 350000 11700000 4000000 54920500 1064
Carboniacutefera Criciuacutema 6450000 6425000 18000000 9468944 6700600 2500000 49544544 96
Mineraccedilatildeo e Pesquisa
Brasil Ltda 0 0 15555000 5300000 0 900000 21755000 421
Induacutestria Carboniacutefera Rio
Deserto 4050000 0 0 0 12548100 0 16598100 322
Cia Energeacutetica Meridional 0 0 14000000 0 0 0 14000000 271
Mineraccedilatildeo Castelo
Branco Ltda 8467400 0 0 0 0 0 8467400 164
Carboniacutefera Catarinense
Ltda 0 0 8183000 0 0 0 8183000 159
Coque Catarinense Ltda 2434000 3391500 0 0 0 0 5825500 113
A Mendes TC e E de
Minerais Ltda 0 0 4000000 0 0 0 4000000 077
Minageo Ltda 0 0 3288000 0 0 300000 3588000 07
Gabriella Mineraccedilatildeo Ltda 0 0 1186400 1679175 0 0 2865575 056
Mineraccedilatildeo Satildeo Domingos
Ltda 927000 1408000 500000 0 0 0 2835000 055
Sul Catarinense
Mineraccedilatildeo e Art 0 0 2400000 0 0 0 2400000 046
Carboniacutefera Sideroacutepolis
Ltda 0 0 1186500 0 0 0 1186500 023
Mineraccedilatildeo Santa Augusta
Ltda 800000 0 0 0 0 0 800000 015
TOTAL 105848400 41232300 158506900 22918311 165048700 22700000 516254611 100
TOTAL
155
Tabela 26 - Candidatos que receberam maiores doaccedilotildees Eleiccedilotildees de
2002 a 2012
Fonte TSE 2013
Os partidos poliacuteticos que se destacam como maiores
receptores das doaccedilotildees satildeo PMDB com 3018 PSDB com 2060
PT com 1773 e PP com 1684 (Tabela 27)
Tabela 27 - Doaccedilotildees por Partido Poliacutetico Eleiccedilotildees de 2002 a 2012
Fonte TSE 2013
Os dados apresentados corroboram a hipoacutetese de que na defesa da causa do carvatildeo mineral se aliam poliacuteticos e empresas pelas doaccedilotildees
de campanha Trazer os fatos ausentes do discurso coloca em questatildeo o
reconhecimento e a representaccedilatildeo poliacutetica condiccedilotildees fundamentais para
assegurar a justiccedila ecoloacutegica e consequentemente para favorecer a
ANO ELEICcedilAtildeO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
NOME VALOR R$ VALOR R$VALOR R$ VALOR R$VALOR R$VALOR R$ TOTAL R$
Edson Bez de
Oliveira 5266200 0 21000000 0 14589500 5000000 45855700 89
Paulo Roberto
Bauer 12510800 0 15000000 0 17859100 0 45369900 88
Esperidiatildeo Amin
Helou Filho 43798600 0 0 0 0 0 43798600 85
Angela R H Amin
Helou 0 0 10000000 0 25000000 0 35000000 68
Luiz Henrique da
Silveira 4000000 0 20000000 0 7463100 0 31463100 61
Ada Lili Faraco de
Luca 0 0 20000000 0 5000000 0 25000000 48
Leodegar da Cunha
Tiscoski 4892000 0 12263900 0 0 0 17155900 33
Joatildeo Olavio
Falchetti 0 0 0 10000000 2500000 1500000 14000000 27
Paulo R B
Bornhausen 4900000 0 5000000 0 4000000 0 13900000 27
Ronaldo Joseacute
Benedet 1350000 0 2000000 0 10037000 0 13387000 26
ANO 2002 2004 2006 2008 2010 2012
PARTIDO VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ VALOR R$ TOTAL
PMDB 10866200 7518000 65055000 7290944 60096700 5000000 155826844 3018
PSDB 14310800 28031300 26000000 1774367 29452000 6800000 106368467 206
PT 5050000 2710000 12788000 10000000 56000000 5000000 91548000 1773
PP 48690600 1659500 25463900 1200000 9000000 900000 86914000 1684
PFL 22730800 1313500 25000000 0 0 0 49044300 95
PPB 4200000 0 4200000 0 2500000 0 10900000 211
DEM 0 0 0 2653000 4000000 0 6653000 129
PR 0 0 0 0 4000000 0 4000000 077
PSD 0 0 0 0 0 5000000 5000000 097
TOTAL 516254611 100
156
aplicaccedilatildeo do enfoque do ecodesenvolvimento Os candidatos eleitos natildeo
representam os interesses da maioria que os elegeu e sim daqueles
poucos que investiram em suas campanhas por meio de doaccedilotildees Vecircm se
consolidando assim um cenaacuterio no qual a injusticcedila poliacutetica alimenta a
reproduccedilatildeo da injusticcedila ambiental e ecoloacutegica
6 CARVAtildeO MINERAL E AMPLIACcedilAtildeO DA ENERGIA
TERMELEacuteTRICA EM SANTA CATARINA
A trajetoacuteria do carvatildeo mineral no Brasil e em Santa Catarina eacute
acompanhada de periacuteodos de crise e recuperaccedilatildeo do segmento A
construccedilatildeo da USITESC eacute uma forma de garantir a continuidade da
exploraccedilatildeo e do consumo do carvatildeo Aleacutem da crise do carvatildeo o que
aparece nos discursos de parlamentares presentes no capiacutetulo anterior eacute
o carvatildeo como seguranccedila energeacutetica
O objetivo desse capiacutetulo eacute compreender a ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo
de energia eleacutetrica movida a carvatildeo mineral atraveacutes da anaacutelise do
processo de licenciamento ambiental da USITESC Nos capiacutetulos dois e
trecircs foram tratados condicionantes mais amplos que incidem sobre a
ampliaccedilatildeo da geraccedilatildeo No capiacutetulo quatro foi examinada a relaccedilatildeo das
redes de influecircncia entre segmentos poliacuteticos e econocircmicos em vaacuterias
escalas Neste capiacutetulo a ideia eacute verificar os condicionantes que atuam
localmente
Para tanto o capiacutetulo estaacute dividido em quatro seccedilotildees aleacutem dessa
introduccedilatildeo A primeira seccedilatildeo trata das principais caracteriacutesticas do
municiacutepio de Treviso A segunda seccedilatildeo traz informaccedilotildees sobre os
documentos escritos da USITESC o EIARIMA o processo de
licenciamento e audiecircncias as correspondecircncias e articulaccedilotildees entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos e a posiccedilatildeo dos segmentos sociais Na
terceira seccedilatildeo entram os documentos falados do processo de
licenciamento os discursos nas audiecircncias puacuteblicas A anaacutelise dos
discursos torna expliacutecitas as relaccedilotildees de poder e desigualdade nas
audiecircncias puacuteblicas A quarta seccedilatildeo faz uma siacutentese das limitaccedilotildees e
possibilidades da democracia e do aprendizado social no caso do
licenciamento da USITESC
61 O municiacutepio de Treviso
A chegada dos primeiros imigrantes italianos no Sul de Santa
Catarina data de 1891 oriundas das proviacutencias de Treviso Beacutergamo
158
Cremona e Ferrara O povoado de Treviso tornou-se distrito de
Urussanga em 1933 Em 1958 o controle do distrito passou para
Sideroacutepolis emancipado de Urussanga Em 1995 o distrito de Treviso eacute
desmembrado de Sideroacutepolis formando um novo municiacutepio (IBGE
2013 PMT 2014)
No brasatildeo do municiacutepio a alusatildeo ao navio que trouxe os
primeiros imigrantes as duas atividades econocircmicas principais (extraccedilatildeo
do carvatildeo e o cultivo da banana) e as datas de colonizaccedilatildeo e
emancipaccedilatildeo (Figura 8)
Figura 8- Brasatildeo do municiacutepio de Treviso
Fonte PMT (2014) Autora Daniela Losso Redesenhado por Edson
Cesconetto
O municiacutepio de Treviso localiza-se na Bacia Carboniacutefera (Figura
9) entre Sideroacutepolis Lauro Muumlller e Urussanga a 220 km da capital
Florianoacutepolis a 35 km da BR 101 e a 25 km da cidade de Criciuacutema
(PMT 2014)
159
Figura 9 ndash Mapa de localizaccedilatildeo do municiacutepio de Treviso
Fonte Concepccedilatildeo de Luciana Butzke Elaborado por Ruy Lucas de
Souza
O clima geral da regiatildeo segundo a classificaccedilatildeo climaacutetica de
Koumleppen eacute do tipo Cfa (mesoteacutermico uacutemido e com veratildeo quente) A
temperatura meacutedia anual varia de 170 a 193ordmC maacuteximas de 234 a
259ordmC e miacutenimas entre 120 e 151ordmC A meacutedia anual pluviomeacutetrica fica
em torno de 1220 a 1660mm e a umidade relativa do ar varia de 814
a 822 (UNESC PLURAL 2006)
A regiatildeo conta com grandes variaccedilotildees de relevo clima tipos de
solo fauna e flora A geomorfologia da regiatildeo conta com seis domiacutenios
ambientais Planalto dos Campos Gerais Serra Geral Patamares da
Serra Geral Depressatildeo da Zona Carboniacutefera Sudeste Catarinense
Embasamento em estilos complexos e Planiacutecie Coluacutevio-aluvionar (Quadro 9)
160
Quadro 9 - Principais caracteriacutesticas fiacutesicas e bioacuteticas da aacuterea de
influecircncia indireta do projeto USITESC DOMIacuteNIOS
AMBIENTAIS
SIacuteNTESE DAS CARACTERIacuteSTICAS
1 Planalto dos
Campos Gerais
Corresponde agrave regiatildeo mais elevada com relevo pouco
ondulado e altitudes superiores a 1000 metros Neste
domiacutenio prevalecem rochas de origem vulcacircnicasub-
vulcacircnica com solos pouco desenvolvidos normalmente
utilizados para produccedilatildeo de maccedilatilde reflorestamento e
pastagem Esse domiacutenio abriga algumas nascentes de rios
da bacia do Araranguaacute e da bacia do Tubaratildeo com
cobertura vegetal representada pelas matas de araucaacuteria
matinha nebular e campos de cima da serra tendo fauna
diversificada Aacuterea impactada pela derrubada das matas
de araucaacuteria plantio de pinus e queimadas nos campos
2 Serra Geral Corresponde agraves aacutereas de encosta com altitudes entre
500m e 1000m onde os desniacuteveis satildeo acentuados e os
vales satildeo fechados e profundos Satildeo formadas
principalmente por rochas arenosas e basaacutelticas e solos
rasos normalmente susceptiacuteveis agrave erosatildeo e a movimentos
de massa Abriga grande parte das nascentes dos rios das
bacias do Araranguaacute e do Tubaratildeo As florestas
encontram-se entre as mais preservadas da regiatildeo sul do
Estado atuando como reguladoras do clima do ciclo e da
distribuiccedilatildeo de chuvas servindo de centro de dispersatildeo e
conexatildeo de espeacutecies Caracteriza-se pela ampla
biodiversidade representando um dos ambientes mais
complexos fraacutegeis e ameaccedilados da regiatildeo que deve ser
preservado Neste domiacutenio se insere a Reserva Bioloacutegica
Estadual do Aguaiacute
3 Patamares da
Serra Geral
Os patamares da Serra Geral representam o
prolongamento da escarpa da Serra Geral que avanccedila
sobre a Depressatildeo Carboniacutefera e a Planiacutecie Coluacutevio-
Aluvionar constituindo morros-testemunhos como o
Montanhatildeo sustentados principalmente por basaltos e
diabaacutesicos Os solos tecircm normalmente baixa fertilidade e
satildeo utilizados nas aacutereas planas para pastagens plantio de
eucalipto e lavouras de subsistecircncia Nos terrenos
iacutengremes o solo eacute usado para o cultivo de banana No
alto do Montanhatildeo encontra-se uma das aacutereas mais
preservadas deste domiacutenio correspondente agrave APA do rio
Ferreira
4 Depressatildeo da
Zona Carboniacutefera
Regiatildeo de relevo mais suave em que predominam vales
abertos e pouco profundos Constitui-se principalmente
161
do Sudeste
Catarinense
de rochas sedimentares como arenitos folhelhos siltitos
e camadas de carvatildeo Os solos satildeo variados utilizados
principalmente para pastagens culturas de subsistecircncia e
reflorestamento de eucalipto Os recursos hiacutedricos
encontram-se comprometidos principalmente pela
exploraccedilatildeo de carvatildeo mas tambeacutem pelas atividades
industriais agriacutecolas e esgotamento sanitaacuterio A regiatildeo eacute
fortemente impactada com vaacuterias aacutereas degradadas pela
exploraccedilatildeo do carvatildeo paisagens fortemente
descaracterizadas e reduzida biodiversidade em alguns
locais
5 Embasamento
em estilos
complexos
Corresponde aos relevos ondulados formados por rochas
granitoacuteides e gnaacuteissicas onde os solos normalmente satildeo
pouco desenvolvidos e de baixa fertilidade
6 Planiacutecie Coluacutevio-
Aluvionar
Aacuterea de relevo plano (cotas inferiores a 100m) com solos
do tipo hidromoacuterficos com elevado teor de mateacuteria
orgacircnica Os solos satildeo empregados no cultivo de arroz
irrigado produccedilatildeo de hortaliccedilas uva e cana-de-accediluacutecar
Em regiotildees menos inundadas satildeo utilizados tambeacutem para
reflorestamento e pastagem
Fonte UNESC Plural (2006 p 24)
Eacute destaque em Treviso a Reserva Bioloacutegica Estadual do Aguaiacute e
a Aacuterea de Preservaccedilatildeo Permanente do Rio Ferreira A Reserva Bioloacutegica
Estadual do Aguaiacute conta com aacuterea de 7762 hectares que se estende
entre os municiacutepios de Treviso Sideroacutepolis e Nova Veneza nos beirais
da Serra Geral A reserva abriga cachoeiras fauna e flora diversificadas
que constituem grande riqueza natural (UNESC PLURAL 2006)
O municiacutepio contava em 2010 com 3527 habitantes em
157084 km2 com uma densidade demograacutefica de 2245 habitantes por
quilocircmetro quadrado Desses 1789 eram homens e 1738 eram
mulheres 1833 habitavam o espaccedilo urbano e 1694 o espaccedilo rural A
Populaccedilatildeo Economicamente Ativa (PEA) correspondia a 487 da
populaccedilatildeo (SEBRAE 2013b)
O Produto Interno Bruto (PIB) de Treviso corresponde a 008
da composiccedilatildeo do PIB catarinense Jaacute em relaccedilatildeo ao PIB per capita
Treviso encontra-se em 2009 na 17ordf posiccedilatildeo no ranking estadual O
Valor Adicionado Bruto (VAB) que representa a soma de todos os bens
e serviccedilos produzidos num determinado territoacuterio econocircmico ficou
assim distribuiacutedo 61 na induacutestria 24 no setor de serviccedilos e 9 na
administraccedilatildeo puacuteblica Em relaccedilatildeo ao Valor Adicionado Fiscal (VAF)
162
indicador econocircmico contaacutebil utilizado para calcular a participaccedilatildeo
municipal no repasse de impostos a extraccedilatildeo de carvatildeo mineral era
responsaacutevel por 66 da participaccedilatildeo do VAF no ano de 2010
(SEBRAE 2013b) Esses dados demonstram uma forte dependecircncia do
municiacutepio agrave atividade carboniacutefera
Dos 1093 domiciacutelios existentes no municiacutepio 853 eram
proacuteprios 91 alugados 55 cedidos e 01 em outra condiccedilatildeo No
que se refere agrave renda familiar 04 da populaccedilatildeo contava com renda
familiar per capita de ateacute R$ 7000 16 com renda familiar per capita
de ateacute frac12 salaacuterio miacutenimo e 103 com ateacute frac14 do salaacuterio miacutenimo A meacutedia
salarial da induacutestria extrativa era de R$ 185480 inferior apenas a
atividades relacionadas agrave eletricidade e gaacutes com uma meacutedia de R$
277460 Nesse mesmo ano o municiacutepio contava com 1629 postos de
trabalho com carteira assinada dos quais 1132 eram vinculados agrave
atividade carboniacutefera em cinco empresas (SEBRAE 2013b) Quando
69 dos postos de trabalho com carteira assinada tecircm origem na
atividade carboniacutefera que na localidade apresenta tambeacutem uma das
melhores meacutedias salariais a populaccedilatildeo fica numa posiccedilatildeo de
vulnerabilidade jaacute que depende dessa atividade para o seu sustento
Na lavoura temporaacuteria destacam-se a produccedilatildeo do arroz batata-
doce batata inglesa feijatildeo (gratildeo) fumo mandioca milho (gratildeo) Na
lavoura permanente tem se destacado a banana No municiacutepio tambeacutem
satildeo criadas aves (galos galinhas frangos e pintos) que em 2010
somavam 500000 cabeccedilas (SEBRAE 2013b)
Treviso conta com trecircs aacutereas inclusas na Accedilatildeo Civil Puacuteblica nordm
938000533-4 que determina a recuperaccedilatildeo das aacutereas degradas pela
mineraccedilatildeo Aacuterea III Rio Pio que tem 11781 hectares Campo Morosini
com 22100 hectares e UM IV Volta Redonda com 5797 hectares A
primeira aacuterea natildeo foi iniciada a segunda estaacute em andamento e a terceira
jaacute estaacute finalizada O processo de recuperaccedilatildeo foi orccedilado em 319 milhotildees
de reais (ACP DO CARVAtildeO 2014)
62 O processo de licenciamento os documentos escritos
A primeira solicitaccedilatildeo de parecer da USITESC referente ao
Licenciamento Preacutevio (LP) data do dia 2 de maio de 2000 Segundo a
solicitaccedilatildeo o parecer se fazia necessaacuterio para que a Usina fosse
163
implantada dentro do prazo previsto pelo Governo e pelo Programa
Prioritaacuterio de Termeleacutetricas que se colocava para dezembro de 2003
(FATMA 2013a fl 1) A contrataccedilatildeo do EIARIMA foi em 2001 e a
entrega aconteceu em 18 de agosto de 2003 (FATMA 2013a fl 49)
621 O EIARIMA da USITESC
A equipe responsaacutevel pelo projeto da USITESC foi composta por
consoacutercio formado pela Carboniacutefera Criciuacutema SA e pela Companhia
Carboniacutefera Metropolitana SA O projeto foi desenvolvido com o apoio
da Parsons Energy amp Chemicals Group Main Engenharia amp Consultoria
Ltda e Taylor DeJongh E o EIARIMA foi realizado pelo IPAT
vinculado agrave UNESC e Plural
A previsatildeo de construccedilatildeo da USITESC eacute de 40 meses A aacuterea a
ser ocupada pela usina localiza-se na margem direita do rio Matildee Luzia
tem aproximadamente 500000m2 e pertence agrave Carboniacutefera
Metropolitana sendo utilizada como depoacutesito de rejeitos (Figura 10)
(UNESC PLURAL 2006)
Figura 10 - Aacuterea prevista para a implantaccedilatildeo da USITESC
Fonte UNESC Plural 2006 p 5
164
Para a produccedilatildeo de energia termeleacutetrica a usina vai utilizar carvatildeo
bruto da camada Bonito (70) e rejeitos da camada Barro Branco
(30) que seratildeo fornecidos pelas duas empresas que compotildeem o
consoacutercio O consumo meacutedio anual previsto eacute de 1900000 toneladas de
carvatildeo e 820000 toneladas de rejeito A USITESC teraacute potecircncia
instalada de 440 MW e segundo a descriccedilatildeo do empreendimento vai
gerar 180 empregos diretos (FATMA 2013a fl 34)
Na justificativa do EIARIMA destacou-se a importacircncia
estrateacutegica do carvatildeo dada a dependecircncia hidroenergeacutetica e a
inseguranccedila quanto agrave importaccedilatildeo do gaacutes natural e o uso de tecnologias
limpas de queima de carvatildeo Natildeo satildeo citados dados sobre consumo e
demanda A USITESC adquire importacircncia na recuperaccedilatildeo ambiental do
Sul jaacute que vai consumir os rejeitos (UNESC PLURAL 2006)
Para gerar energia termeleacutetrica a USITESC vai utilizar o ciclo
teacutermico regenerativo com uso de caldeira de leito fluidizado que
recupera calor exigindo um consumo menor de combustiacutevel A
combustatildeo em leito fluidizado circulante reduz a produccedilatildeo de oacutexidos de
nitrogecircnio O controle das emissotildees atmosfeacutericas seraacute feito atraveacutes da
injeccedilatildeo de calcaacuterio na caldeira (Consumo meacutedio anual de 150000
toneladas) e de um sistema de filtragem que utilizaraacute amocircnia (consumo
meacutedio anual entre 72000 a 80000 toneladas Como resultado seratildeo
obtidas aproximadamente 300000 toneladas de sulfato de amocircnia que
seratildeo utilizadas na produccedilatildeo de fertilizantes quiacutemicos Quanto ao
consumo de aacutegua prevecirc-se um consumo meacutedio de 32 ls (115m3h) no
processo e 2361 ls (848m3h) no resfriamento Soacute a tiacutetulo de
comparaccedilatildeo para o abastecimento de Criciuacutema e municiacutepios vizinhos
satildeo utilizados 800ls do rio Satildeo Bento localizado na sub-bacia do Rio
Matildee Luzia (UNESC PLURAL 2006)16
Na avaliaccedilatildeo de impactos constam no RIMA oito impactos no
meio fiacutesico seis impactos no meio bioacutetico e 11 no meio antroacutepico
(Quadro 10) Dentre os impactos listados os de maior expressatildeo satildeo
16
O alto consumo de aacutegua e a construccedilatildeo de uma barragem no Rio
Matildee Luzia foram desde o iniacutecio do processo de licenciamento
pontos polecircmicos do projeto Devido a esses pontos o projeto foi
alterado de torre uacutemida para torre seca diminuindo o consumo de
aacutegua para 115m3h em todo o processo
165
reduccedilatildeo na geraccedilatildeo de drenagem aacutecida (considerado um impacto
positivo) alteraccedilatildeo da qualidade do ar (principalmente durante a
construccedilatildeo da Usina com a movimentaccedilatildeo de veiacuteculos pesados o
dioacutexido de enxofre pode elevar-se) reduccedilatildeo da disponibilidade de aacutegua
(com as torres de resfriamento uacutemidas) e impacto sobre aacutereas
protegidas
Quadro 10- Impactos sobre o Meio Fiacutesico Bioacutetico e Antroacutepico e
accedilotildees geradoras IMPACTOS SOBRE O
MEIO FIacuteSICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Solo Intensificaccedilatildeo de
processos erosivos e
de assoreamento
Obras de corte e aterro necessaacuterias agrave
implantaccedilatildeo do empreendimento
Contaminaccedilatildeo do solo
pela disposiccedilatildeo de
resiacuteduos soacutelidos e
efluentes
Operaccedilatildeo da usina resiacuteduos produzidos
durante as fases de construccedilatildeo e operaccedilatildeo da
usina
Reduccedilatildeo da geraccedilatildeo
de drenagem aacutecida
Consumo de rejeito do beneficiamento de
carvatildeo e recuperaccedilatildeo de aacutereas degradadas
pela mineraccedilatildeo
Aacutegua
Alteraccedilatildeo na
qualidade das aacuteguas
superficiais
Construccedilatildeo da usina efluentes oleosos
como oacuteleos e graxas advindos da
manutenccedilatildeo de maacutequinas e caminhotildees
ligados agraves obras eou do armazenamento
temporaacuterio de combustiacuteveis e lubrificantes
Efluentes a serem descartados pelo
empreendimento durante a fase de operaccedilatildeo
Alteraccedilatildeo na
qualidade das aacuteguas
subterracircneas
Disposiccedilatildeo inadequada de resiacuteduos soacutelidos
efluentes sanitaacuterios efluentes industriais
Reduccedilatildeo da
disponibilidade de
aacutegua
Operaccedilatildeo da usina captaccedilatildeo de aacutegua para
torre de resfriamento da usina
Ar e
ruiacutedo
Alteraccedilatildeo da
qualidade do ar
Aumento do traacutefego de veiacuteculos pesados
movimentaccedilatildeo de veiacuteculos em aacutereas natildeo
pavimentadas operaccedilatildeo da usina manuseio
do combustiacutevel
Alteraccedilatildeo das
condiccedilotildees de ruiacutedo de
fundo
Traacutefego e operaccedilatildeo de veiacuteculos pesados
operaccedilatildeo de equipamentos como
compressores britadores sondas etc
operaccedilatildeo dos equipamentos da usina
166
IMPACTOS SOBRE O
MEIO BIOacuteTICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Fauna
e
Flora
Reduccedilatildeo de habitats
para a fauna local
Preparaccedilatildeo da aacuterea de implantaccedilatildeo da usina
obras de terraplenagem e retirada da
cobertura vegetal
Evasatildeo da fauna Ruiacutedos produzidos durante a fase de
implantaccedilatildeo e construccedilatildeo da usina alteraccedilatildeo
da qualidade do ar e perda de habitats devido
agraves obras de terraplenagem
Impacto sobre a
avifauna
Operaccedilatildeo da usina
Impacto sobre a fauna
de peixes e
organismos aquaacuteticos
Construccedilatildeo da usina operaccedilatildeo da usina
manutenccedilatildeo de equipamentos transporte e
armazenamento de reagentes e outros
insumos natildeo inertes
Impacto sobre a
vegetaccedilatildeo
remanescente e
culturas
Traacutefego de veiacuteculos movidos a oacuteleo diesel
operaccedilatildeo da usina (queima de carvatildeo)
Impacto sobre as aacutereas
protegidas
Periacuteodo de construccedilatildeo da usina contingente
de trabalhadores e operaccedilatildeo da usina
IMPACTOS SOBRE O
MEIO ANTROacutePICO
ACcedilOtildeES GERADORAS
Geraccedilatildeo de conflitos Contrataccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
instalaccedilatildeo do canteiro de obras
Geraccedilatildeo de
expectativa e
mobilizaccedilatildeo da
comunidade
Estudos e projetos contrataccedilatildeo e
mobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
Sobrecarga da infra-
estrutura social
existente
Obras da usina contrataccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo
da matildeo-de-obra
Geraccedilatildeo de emprego Construccedilatildeo da usina operaccedilatildeo da usina
mineraccedilatildeo do carvatildeo serviccedilos terceirizados
Geraccedilatildeo de renda e
ampliaccedilatildeo da oferta de
serviccedilos
Construccedilatildeo e operaccedilatildeo da usina
Atraccedilatildeo de matildeo-de-
obra de outras aacutereas
Construccedilatildeo da usina contrataccedilatildeo e
desmobilizaccedilatildeo de matildeo-de-obra
Incremento do
desenvolvimento
econocircmico
Operaccedilatildeo da usina
Mudanccedila no cotidiano
da comunidade
Obras da usina contrataccedilatildeo de matildeo-de-obra
de outras regiotildees demanda por serviccedilos e
167
sobrecarga da infra-estrutura social
alteraccedilatildeo do padratildeo de traacutefego dos veiacuteculos
Alteraccedilatildeo das
condiccedilotildees de sauacutede da
populaccedilatildeo
Implantaccedilatildeo da usina fase das obras e
operaccedilatildeo da usina emissatildeo de gases ruiacutedo
disposiccedilatildeo das cinzas e depoacutesito temporaacuterio
de carvatildeo e reagentes
Aumento do traacutefego
de veiacuteculos e pressatildeo
sobre a infra-estrutura
viaacuteria
Obras da usina obras complementares
operaccedilatildeo da usina transporte de insumos de
subprodutos e de resiacuteduos
Aumento do risco de
acidentes de tracircnsito
Obras da usina transporte de pessoas e
insumos
Impacto na paisagem
local e perda de
referecircncias histoacuterico-
culturais
Obras da usina e complementares
Interferecircncia em siacutetios
arqueoloacutegicos
Obras complementares da usina barragem e
reservatoacuterio estradas e vias de acesso linha
de transmissatildeo
Fonte UNESC Plural (2006 p 34-5)
No EIARIMA natildeo haacute nenhuma referecircncia aos empreendimentos
acessoacuterios a saber o reservatoacuterio de aacutegua a ser construiacutedo no rio Matildee
Luzia a extensatildeo da ferrovia entre Sideroacutepolis e a Mina Esperanccedila e
Fontanella a linha de transmissatildeo que vai conectar a subestaccedilatildeo da
ELETROSUL em Sideroacutepolis com a Usina e o terminal de recebimento
e estocagem de amocircnia no Porto de Imbituba Os empreendimentos
acessoacuterios seratildeo tratados na sessatildeo 63 deste capiacutetulo Faltou tambeacutem
mencionar nos impactos sobre o meio antroacutepico da desarticulaccedilatildeo da
estrutura econocircmica existente o pequeno comeacutercio a lavoura de
subsistecircncia a pesca artesanal as atividades domeacutesticas etc
Tendo como referecircncia os impactos listados no Quadro 10 foram
propostas 59 medidas mitigatoacuterias sendo 25 preventivas duas
corretivas trecircs preventivas e corretivas 17 compensatoacuterias nove de
acompanhamento e trecircs de controle
Dentre os programas ambientais propostos para a USITESC
destacam-se programa de monitoramento ambiental programa de
conservaccedilatildeo da fauna e flora programa de preservaccedilatildeo do patrimocircnio
arqueoloacutegico programa de comunicaccedilatildeo social programa de
gerenciamento de risco programa de reabilitaccedilatildeo de aacutereas degradadas
168
programa de gestatildeo ambiental e programa de fomento ao
desenvolvimento sustentaacutevel No Quadro 11 uma siacutentese dos programas
e seus alvos principais
Quadro 11 - Siacutentese dos Programas da USITESC e alvos principais PROGRAMA ALVO
Monitoramento ambiental Qualidade do ar solo e aacutegua
Adequaccedilatildeo da infraestrutura baacutesica Rodovias sauacutede educaccedilatildeo e
abastecimento de aacutegua
Controle ambiental Qualidade do ar solo e aacutegua na aacuterea
do empreendimento
Conservaccedilatildeo da fauna e flora Fauna e flora no entorno do
empreendimento
Preservaccedilatildeo do patrimocircnio
arqueoloacutegico
Patrimocircnio arqueoloacutegico da regiatildeo
Comunicaccedilatildeo social Informaccedilotildees atualizadas sobre o
empreendimento para a comunidade
Gerenciamento de risco Armazenamento de produtos
perigosos
Reabilitaccedilatildeo de aacutereas degradadas Entorno do empreendimento
Gestatildeo ambiental Processo decisoacuterio da Usina e relaccedilatildeo
com os colaboradores
Fomento ao desenvolvimento
sustentaacutevel
Criaccedilatildeo de um fundo de fomento agrave
atividades de recuperaccedilatildeo ambiental
melhoria da qualidade de vida e
desenvolvimento sustentaacutevel
Fonte Baseado em UNESC Plural (2006)
Quando analisadas as perspectivas para a regiatildeo com e sem a
implantaccedilatildeo do empreendimento alguns aspectos podem ser destacados
Sem o empreendimento natildeo haveria pressatildeo antroacutepica e a regiatildeo seguiria
as atuais tendecircncias de desconcentraccedilatildeo crescimento moderado da
atividade agropecuaacuteria continuidade da atividade carboniacutefera num
cenaacuterio de suposta estagnaccedilatildeo econocircmica Com o empreendimento
haveria uma dinamizaccedilatildeo da economia municipal geraccedilatildeo de emprego e
renda o consumo do rejeito para geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica e a pressatildeo antroacutepica na aacuterea de influecircncia da USITESC inclusive aacutereas
preservadas (UNESC PLURAL 2006)
169
622 Das audiecircncias puacuteblicas e licenccedilas
O processo de licenciamento da USITESC contou com a
realizaccedilatildeo de quatro audiecircncias puacuteblicas que ocorreram de acordo com
a resoluccedilatildeo do CONAMA nordm 00987 As audiecircncias aconteceram no
municiacutepio de Treviso A primeira ocorreu em 19 de fevereiro de 2004 a
segunda em oito de julho de 2004 a terceira em 16 de maio de 2006 e a
quarta em 8 de novembro de 2007 A realizaccedilatildeo das quatro audiecircncias
puacuteblicas se deve ao fato de que vaacuterias informaccedilotildees natildeo constavam do
EIARIMA tendo sido solicitados estudos complementares que
incluiacuteam tambeacutem os empreendimentos acessoacuterios
Apoacutes a terceira audiecircncia puacuteblica em trecircs de julho de 2006
Darlan Aiacuterton Dias Procurador da Repuacuteblica enviou uma
correspondecircncia para o entatildeo presidente da FATMA Jacircnio Wagner
Constante informando que o licenciamento da USITESC e do
reservatoacuterio de aacutegua precisam ser conjuntos sob pena de fracionar o
licenciamento (FATMA 2013d fl 687) O procurador da repuacuteblica
recomendou que ldquonatildeo seja concedida LP para a USITESC sem que
antes seja apresentado EIARIMA relativo agrave construccedilatildeo do reservatoacuterio
no rio Matildee Luzia o qual deveraacute ser publicado e submetido a audiecircncia
puacuteblica conforme determina a legislaccedilatildeo vigenterdquo (FATMA 2013d fl
687)
Em seis de marccedilo de 2007 Alfredo Flavio Gazzolla informou ao
novo presidente da FATMA Carlos L Kreuz que diante da situaccedilatildeo
colocada a USITESC estava alterando seu projeto original mudando o
sistema de resfriamento da usina e reduzindo o consumo de aacutegua a 10
do previsto anteriormente (FATMA 2013e fl 831)
Com a alteraccedilatildeo do projeto o Procurador da Repuacuteblica Darlan
Airton Dias em oito de maio de 2007 informou a necessidade da
realizaccedilatildeo de uma nova audiecircncia puacuteblica ldquoConsiderando a mudanccedila
conceitual no projeto eventual concessatildeo de Licenccedila Ambiental Preacutevia
ndash LAP depende da realizaccedilatildeo de nova audiecircncia puacuteblicardquo (FATMA
2013e fl 842-3) Apoacutes a realizaccedilatildeo da quarta audiecircncia puacuteblica em 8 de novembro de 2007 a LP foi concedida em 14 de dezembro de 2007
(LAP nordm 1482007) (FATMA 2013f fl 1065)
Em 31 de marccedilo de 2008 foi comunicada a Alteraccedilatildeo da
composiccedilatildeo acionaacuteria da USITESC 95 do capital foi assumido pela
170
Linear Participaccedilotildees e Incorporaccedilotildees Ltda e os 5 restantes ficam com
as Carboniacuteferas Criciuacutema e Metropolitana A comunicaccedilatildeo remetida por
Kaioaacute Gomes diretor teacutecnico da Linear foi endereccedilada ao novo
presidente da FATMA Murilo Xavier Flores (FATMA 2013f fl
1111)
Em dois de marccedilo de 2010 foi concedida a LI (LAI nordm 06GELUR
2010) (FATMA 2013h fl 1540) Ainda em 2010 foi estabelecido o
Termo de Compromisso de Compensaccedilatildeo Ambiental R$ 670800000 a
serem aplicados na Reserva Bioloacutegica Estadual do Aguaiacute (FATMA
2013h fl 1549-1554)
Em 15 de fevereiro de 2013 Kaioaacute Gomes solicitou a
prorrogaccedilatildeo da LI (FATMA 2013h fl 1607-08) Em resposta Ivana
Becker concluiu ser viaacutevel a prorrogaccedilatildeo da LI pelo prazo de 36 meses
(FATMA 2013h fl 1603-5)
A solicitaccedilatildeo de estudos complementares e as quatro audiecircncias
puacuteblicas parecem demonstrar uma estrateacutegia de desinformaccedilatildeo por parte
dos segmentos econocircmicos O papel do Ministeacuterio Puacuteblico foi chave no
questionamento e equacionamento dessa questatildeo
623 Pressotildees dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos no processo de
licenciamento
Um aspecto interessante na anaacutelise do discurso dos documentos
do processo de licenciamento foi a pressatildeo exercida pela USITESC e
pelo Governo do Estado sobre a FATMA Em janeiro de 2005 o entatildeo
presidente da USITESC enviou uma carta ao governo do estado
questionando o tratamento dado pela FATMA ao processo de
licenciamento ambiental destacando a importacircncia da USITESC e
sugerindo uma falta de sintonia entre FATMA e poder executivo
conforme trecho da carta a seguir
Esta empresa gostaria de registrar seu protesto e
indignaccedilatildeo pelo peacutessimo tratamento dado por esta
Fundaccedilatildeo ao processo de licenciamento ambiental
da USITESC embora tenhamos sempre procurado
dar o maacuteximo de suporte e pautado nossa postura
171
no sentido da maacutexima cooperaccedilatildeo e pronto
atendimento a qualquer solicitaccedilatildeo da FATMA
Nossa paciecircncia esgota-se no momento em que
percebemos o descaso com que eacute tratado um
projeto da magnitude da Usina Termeleacutetrica Sul
Catarinense ndash USITESC cujo conceito de
desenvolvimento vem desde o iniacutecio de seus
estudos buscando a melhor integraccedilatildeo do projeto
com sua aacuterea de influecircncia e geraccedilatildeo de resultados
positivos para o meio ambiente em que se insere
()
Este fato contrasta com as manifestaccedilotildees puacuteblicas
de apoio ao Projeto USITESC recebidas do
Governo Estadual pelos empreendedores e revela
falta de sintonia entre a Fatma e o poder executivo
do Estado de Santa Catarina (Alfredo Flaacutevio
Gazzolla presidente da USITESC FATMA
2013c fl 357 e 359)
Em marccedilo de 2005 o vice-governador em exerciacutecio Eduardo
Pinho Moreira cobrou um posicionamento do diretor geral da FATMA
Janio Wagner Constante
Pela inegaacutevel importacircncia da instalaccedilatildeo da Usina
para o Estado de Santa Catarina e tendo em vista
ter a mesma cumprido com todas as
recomendaccedilotildees ministeriais solicito-lhe urgecircncia
na anaacutelise teacutecnica do projeto pelo que agradeccedilo
antecipadamente (FATMA 2013b fl 352)
Em dezembro de 2005 novamente Alfredo Flaacutevio Gazzolla
enviou carta ao governador do estado Luiz Henrique da Silveira
pedindo a determinaccedilatildeo de um ldquomelhor estudordquo para a emissatildeo da LP
Assim em respeito ao vosso honrado nome e na
defesa do maior empreendimento em estudo no
estado de Santa Catarina solicito seus preacutestimos
no sentido de determinar um melhor estudo
quanto agrave emissatildeo da LAP sem a qual estaremos
impossibilitados de participar do proacuteximo leilatildeo
de energia no semestre vindouro (FATMA
2013c fl 388)
172
Na mesma carta o presidente da USITESC solicitou a licenccedila
preacutevia independente da conclusatildeo do Estudo Suplementar solicitado
pela FATMA
Solicita-se ao Governo do Estado que emita a
Licenccedila Preacutevia para a USITESC
independentemente da conclusatildeo do Estudo
Suplementar solicitado pela FATMA jaacute que nada
impede a FATMA de emitir esta licenccedila uma vez
que o empreendedor cumpriu todas as exigecircncias
legais cabiacuteveis para sua obtenccedilatildeo e que a FATMA
poderaacute nela colocar todos os condicionantes que
considerar pertinentes tendo em vista assegurar a
viabilidade da continuidade do processo de
licenciamento ambiental da USITESC (FATMA
2013c fl 390)
Em resposta Luiz Antocircnio Garcia Correcirca Diretor de controle
ambiental da FATMA em 19 de dezembro de 2005 repreendeu a
USITESC quanto agraves manifestaccedilotildees da miacutedia que relacionavam o natildeo
licenciamento da USITESC e a natildeo participaccedilatildeo no leilatildeo da ANEEL a
uma decisatildeo da FATMA
Temos observado manifestaccedilotildees equivocadas na
miacutedia provenientes de representante do SIECESC
relativa ao processo de licenciamento ambiental
reputado inclusive a FATMA a natildeo participaccedilatildeo
da USITESC no leilatildeo da ANEEL o que natildeo
condiz com a realidade Tais fatos em nada
contribuem ao processo de licenciamento
ambiental (FATMA 2013c fl 641-642)
O conteuacutedo das correspondecircncias demonstra as articulaccedilotildees entre
segmentos poliacuteticos e econocircmicos Depois de 2005 natildeo constam mais
correspondecircncias relacionadas Eacute importante frisar que eacute em 2005 que
surgiu a Frente Parlamentar Mista em defesa do Carvatildeo Mineral e
aumentaram as doaccedilotildees das carboniacuteferas aos poliacuteticos Dessa forma
sugere-se que se ateacute 2005 a pressatildeo sobre o oacutergatildeo ambiental era
173
exercida diretamente apoacutes 2005 com uma maior articulaccedilatildeo a pressatildeo
pode ser exercida de outras formas natildeo passando necessariamente pelo
oacutergatildeo ambiental
624 A posiccedilatildeo dos segmentos sociais
Os segmentos sociais se posicionaram contra a ampliaccedilatildeo da
energia termeleacutetrica ao longo do processo de licenciamento Na ocasiatildeo
da primeira audiecircncia puacuteblica em 19 de fevereiro de 2004 a ONG
Amigos da Terra Brasil enviou a seguinte mensagem
Amigos da Terra se solidariza com as entidades da
regiatildeo sul de Santa Catarina e acredita que as lutas
locais satildeo responsaacuteveis pela resistecircncia agraves
injusticcedilas socioambientais e pela promoccedilatildeo das
mudanccedilas necessaacuterias para um futuro sustentaacutevel
Um futuro onde as energias renovaacuteveis podem
promover descentralizaccedilatildeo universalizaccedilatildeo do
acesso controle social e empregos sem a
contaminaccedilatildeo local e o aquecimento global
decorrentes do uso do carvatildeo mineral (FATMA
2013c Fl 463)
O Grupo de Trabalho Energia do FBOMS tambeacutem enviou uma
mensagem
As organizaccedilotildees do GT Energia do Foacuterum
Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o
Meio Ambiente e o Desenvolvimento expressam
sua solidariedade agraves populaccedilotildees direta ou
indiretamente afetadas pelos impactos da
mineraccedilatildeo e queima do carvatildeo mineral para a
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica na regiatildeo sul de
Santa Catarina () Conhecendo os graves
impactos jaacute causados pelas atividades carboniacuteferas
no Sul de Santa Catarina temos a certeza do
equiacutevoco que representa a instalaccedilatildeo de mais uma
174
usina a carvatildeo na regiatildeo (FATMA 2013c fl
464)
O Movimento pela Vida de Iccedilara tambeacutem registrou sua posiccedilatildeo
ldquoA regiatildeo natildeo suporta mais impactos ambientais eacute preciso mais
seriedade quando se discute qualquer accedilatildeo que interfira na natureza e na
qualidade de vida das crianccedilas dos jovens das mulheres e dos homens
que vivem na regiatildeordquo (FATMA 2013c fl 466)
Na ocasiatildeo da segunda audiecircncia puacuteblica 8 de julho de 2004 natildeo
constaram manifestaccedilotildees escritas Na terceira audiecircncia puacuteblica 16 de
maio de 2006 em carta da ONG Soacutecios da Natureza assinada por Tadeu
Santos agrave Direccedilatildeo da FATMA ficou registrado que havia uma
solicitaccedilatildeo ldquo() agrave FATMA que realizasse a terceira AP em Criciuacutema ou
mesmo em Araranguaacute jaacute que se trata de um empreendimento que
comprovadamente promove impactos ambientais em toda regiatildeordquo E
mais a frente ao falar sobre o processo de licenciamento afirmou que
ldquosomos atores num circo montado para apresentar uma peccedila com o final
desejado pelo empreendedorrdquo (FATMA 2013c fl 538-542)
Na quarta audiecircncia puacuteblica 8 de novembro de 2007 tambeacutem
natildeo constam manifestaccedilotildees escritas Em 19 de maio de 2011 a Diocese
de Criciuacutema enviou um manifesto para o entatildeo presidente da FATMA
Murilo Xavier Flores contra a instalaccedilatildeo da USITESC (FATMA
2013h fl 1601)
A articulaccedilatildeo dos segmentos sociais apresenta estrateacutegias
importantes que convergem com o enfoque da justiccedila ambiental A
difusatildeo espacial do movimento torna-se vital quando aleacutem dos impactos
regionais a populaccedilatildeo diretamente afetada pelo empreendimento tem
uma forte dependecircncia do segmento em questatildeo Conforme jaacute
mencionamos neste capiacutetulo 69 dos empregos com carteira assinada
satildeo oferecidos pelo segmento do carvatildeo mineral e boa parte da
arrecadaccedilatildeo da prefeitura local vem desta atividade Dessa forma natildeo se
verifica uma resistecircncia local ao empreendimento daiacute porque os
segmentos sociais sediados em outros municiacutepios regiotildees estados
brasileiros desempenham um papel fundamental no questionamento do
empreendimento
175
63 Relaccedilotildees de poder e desigualdade nas audiecircncias puacuteblicas os
documentos falados
No estado de Santa Catarina o procedimento adotado durante
uma audiecircncia puacuteblica eacute descrito resumidamente no Quadro 12 A
coordenaccedilatildeo dos trabalhos eacute feita pela FATMA e o tempo de duraccedilatildeo
maacuteximo da audiecircncia puacuteblica eacute de quatro horas Eacute feita uma abertura da
sessatildeo na qual o presidente da mesa esclarece os objetivos e transmite
as regras gerais Na sequecircncia o empreendedor apresenta o projeto e a
consultoria apresenta o EIARIMA Um intervalo de 15 minutos eacute feito
para que os presentes possam se inscrever Os questionamentos satildeo
feitos por ordem de inscriccedilatildeo e podem ser orais ou escritos Os escritos
satildeo lidos pelo coordenador da sessatildeo e os orais devem ser formulados
em trecircs minutos O empreendedor e a consultoria tecircm cinco minutos
para responder e ainda constam dois minutos para reacuteplica e trecircs minutos
para treacuteplica O encerramento eacute feito pelo coordenador da sessatildeo
Quadro 12 - Procedimento para conduccedilatildeo de audiecircncias puacuteblicas
FATMA ETAPAS DA AUDIEcircNCIA TEMPO
Abertura FATMA (10min)
Exposiccedilotildees Proponente do projeto (20min)
Consultoria responsaacutevel pelo
EIARIMA (45min)
Manifestaccedilatildeo da plenaacuteria e debates Intervalo para inscriccedilotildees (15min)
Questionamento (3min)
Resposta (5min)
Reacuteplica (2min)
Treacuteplica (3min)
Encerramento FATMA (sem tempo definido)
Fonte Adaptado de FATMA (2013a fl 101-2)
A elaboraccedilatildeo do projeto da USITESC iniciou em 1999 (Luis
Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007) Em 19 de
fevereiro de 2004 foi realizada a primeira audiecircncia puacuteblica Na
abertura foi lido um ofiacutecio do Ministeacuterio Puacuteblico Federal avisando que
seria requerida uma segunda audiecircncia puacuteblica dado que o EIA
precisava da anaacutelise dos peritos da quarta cacircmara de Brasiacutelia A segunda
audiecircncia puacuteblica foi realizada no dia 8 de julho de 2004 por solicitaccedilatildeo
da FATMA para discutir o projeto da USITESC com o Comitecirc Gestor
176
da Bacia do Rio Araranguaacute porque havia uma preocupaccedilatildeo com o
consumo de aacutegua Motivado pela recomendaccedilatildeo nordm 14 foi contratado
entatildeo um estudo de suplementaccedilatildeo Esse estudo foi apresentado na
terceira audiecircncia puacuteblica em 16 de maio de 2006 tratando dos
empreendimentos acessoacuterios da USITESC (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
As duas audiecircncias puacuteblicas analisadas neste capiacutetulo a terceira e
quarta audiecircncia de 16 de maio de 2006 e 8 de novembro de 2007
respectivamente seguiram o procedimento acima apresentado Em
ambas constatou-se um rigor maior no controle do tempo dos
participantes que apresentaram seus questionamentos que com os
respondentes (empreendedor IPAT Ministeacuterio Puacuteblico Federal e
FATMA) Foram convidados para tomar assento na mesa representantes
da FATMA Ministeacuterio Puacuteblico Federal empreendedor IPAT
prefeitura e SIESESC Diante disso cabe questionar Por que somente
representantes dos segmentos poliacuteticos e econocircmicos tiveram assento na
mesa de trabalho Por que os representantes dos segmentos sociais natildeo
tiveram assento
Na quarta audiecircncia mediada por Adhiles Bortot da FATMA foi
utilizada uma sequecircncia diferente nos questionamentos orais e escritos
natildeo foi respeitada a ordem de chegada Os questionamentos escritos
foram lidos primeiro Em muitos momentos nos questionamentos orais
diante de colocaccedilotildees polecircmicas Adhiles Bortot passava para a pergunta
seguinte como se o questionamento natildeo precisasse ser respondido Por
vaacuterias vezes ele foi interrompido pelo IPAT e Ministeacuterio Puacuteblico
Federal que queriam comentar as intervenccedilotildees do puacuteblico Outro ponto
que merece ser destacado eacute que ele interrompia repetidamente o
questionador pedindo que o tempo fosse respeitado Logo as pessoas
que faziam questionamentos resumiam sua fala sobrando mais tempo
para os respondentes
Nas proacuteximas seccedilotildees desse capiacutetulo a partir da transcriccedilatildeo e
anaacutelise das audiecircncias puacuteblicas encontram-se trechos selecionados de
temas Fragmentos dos discursos dos segmentos poliacuteticos econocircmicos e
sociais foram destacados e comentados a partir dos pontos mais
controvertidos
177
631 A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica
Os discursos das audiecircncias puacuteblicas proacute USITESC tenderam a
minimizar os impactos causados pelo empreendimento ressaltando seus
aspectos positivos Os segmentos econocircmicos representados pelo
empreendedor situaram a USITESC num contexto mundial no qual o
carvatildeo mineral eacute base da matriz energeacutetica O uso de novas tecnologias
e a situaccedilatildeo do Brasil colocaria as emissotildees de gases de efeito estufa
como insignificantes na matriz energeacutetica brasileira
() os estudos energeacuteticos mostram que o carvatildeo
ainda seraacute a base da matriz energeacutetica mundial ateacute
o ano de 2050 no miacutenimo O incremento de
novos projetos a carvatildeo vem paulatinamente
recebendo tratamento tecnoloacutegico para minimizar
a formaccedilatildeo de gases de efeito estufa Isso eacute uma
verdade () a contribuiccedilatildeo do Brasil para o efeito
estufa com novas usinas a carvatildeo eacute insignificante
perante o quadro mundial Soacute para citar um
exemplo esse ano soacute na Alemanha foram
contratados mais de oito mil novos megawatts a
carvatildeo O Brasil todo tem pouco mais de mil
megawatts a carvatildeo instalados A USITESC estaacute
propondo colocar uma potecircncia bruta de 200440
dos quais vai gerar em meacutedia 280 a 300
Alemanha tem 70 mil megawatts de carvatildeo
instalados O nordeste dos Estados Unidos tem
350 mil soacute o nordeste dos Estados Unidos 350
mil megawatts de carvatildeo instalados (Luis Carlos
Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
A ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica movida a carvatildeo mineral eacute
ldquonecessaacuteriardquo para o Brasil e a USITESC eacute um empreendimento
economicamente viaacutevel
() o sistema eleacutetrico brasileiro necessita da
geraccedilatildeo teacutermica e para isso o carvatildeo mineral eacute
sem duacutevida o nosso melhor potencial a USITESC
utilizaraacute um combustiacutevel de baixo custo os niacuteveis
tarifaacuterios sinalizados para o horizonte de
contrataccedilatildeo da energia da Usina indicam boa
rentabilidade para o Projeto adicional pela venda
178
do sulfato de amocircnia 320000 toneladas por ano
(Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Os impactos ambientais e riscos foram minimizados nas
colocaccedilotildees garantindo-se que os investidores internacionais natildeo
participam de empreendimentos que contrariem a legislaccedilatildeo e possuam
risco ambiental A atuaccedilatildeo fiscalizadora do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
tambeacutem foi citada Natildeo foi destacada em nenhum momento a
importacircncia da FATMA
() a USITESC significa um investimento global
da ordem de 750 milhotildees de doacutelares Esse
dinheiro natildeo vai ser buscado em algum fundo de
quintal Esse dinheiro tem investidores
internacionais e ningueacutem arrasta dinheiro
ningueacutem bota dinheiro em empreendimento que
possui risco ambiental A maior garantia que vocecirc
tem que um projeto vai ser implantado com a
qualidade ambiental que estaacute sendo anunciada eacute
que hoje os auditores internacionais natildeo aprovam
os financiamentos se o projeto natildeo estiver de
acordo com aquela disposiccedilatildeo feita no papel
(Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
O que noacutes estamos querendo implantar aqui na
regiatildeo natildeo eacute nada de coisa anormal que vai
prejudicar algueacutem Mesmo porque () o
Ministeacuterio Puacuteblico natildeo vai deixar noacutes cometermos
barbaridade () Eu digo a todos vocecircs o seguinte
como o proacuteprio Banco Mundial me disse laacute em
Washington ldquose vocecircs tiverem algum problema de
poluiccedilatildeo ao implantar o projeto noacutes natildeo daremos
um centavo sequer (Alfredo Flaacutevio Gazzolla
USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
A importacircncia do empreendimento para a regiatildeo e para o municiacutepio tambeacutem foi destacada Ele vai trazer desenvolvimento para
Treviso e regiatildeo com geraccedilatildeo de emprego e renda E quanto agrave
dependecircncia do municiacutepio em relaccedilatildeo ao carvatildeo Luis Carlos Cunha
garantiu que o municiacutepio diversificaraacute sua economia
179
Ora cinquenta anos eacute um prazo bastante grande
pra pra pra um desenvolvimento de outras
atividades no municiacutepio Natildeo vai o municiacutepio natildeo
vai ficar estagnado somente na mina e numa
Usina E a Usina eacute multiplicadora na medida em
que ela vai proporcionar com os seus subprodutos
o sulfato de amocircnia e a proacutepria cinza que eacute uma
mateacuteria prima importante para a construccedilatildeo civil
etc a implantaccedilatildeo de outros empreendimentos na
regiatildeo ou no proacuteprio municiacutepio pra
aproveitamento industrial desses subprodutos e
presumo ao longo de cinquenta anos outras
oportunidades apareceratildeo para o municiacutepio dentro
das suas vocaccedilotildees (Luis Carlos Cunha USITESC
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A usina foi colocada pelo empreendedor como uma forma de
recuperaccedilatildeo ambiental jaacute que vai ser construiacuteda em aacuterea degradada e
utilizar 30 de rejeito como mateacuteria prima para geraccedilatildeo de energia ldquoA
rigor a instalaccedilatildeo da Usina nessa localizaccedilatildeo significa uma accedilatildeo de
recuperaccedilatildeo ambientalrdquo (Luis Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
O maior impacto ambiental segundo o representante do
empreendedor eacute a pressatildeo sobre a infraestrutura urbana de Treviso que
seraacute devidamente minimizada com investimentos nessa aacuterea Como
principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo foi destacada a geraccedilatildeo de emprego e
renda apresentada ao puacuteblico da audiecircncia atraveacutes da Tabela 28
Tabela 28 ndash Principal ldquobenefiacutecio ambientalrdquo com a construccedilatildeo da
USITESC SETOR DA
ECONOMIA
EMPREGOS
DIRETOS
EMPREGOS
INDIRETOS
Mineraccedilatildeo de carvatildeo 400-500
Mineraccedilatildeo de calcaacuterio ~60
Geraccedilatildeo de energia ~150
Amocircnia e sulfato de
amocircnia
~60
Transportes diversos ~140
Restante da economia
associada
4500
Fonte Luis Carlos Cunha USITESC Audiecircncia Puacuteblica (2007)
180
Os segmentos poliacuteticos tambeacutem se posicionaram em relaccedilatildeo agrave
ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica O representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal ressaltou a necessidade da ampliaccedilatildeo da oferta de
energia eleacutetrica resguardando seu posicionamento teacutecnico-legal
E aiacute o Brasil estaacute numa encruzilhada no meu
ponto de vista e aqui isso que noacutes estamos
vivendo em Treviso eacute um microcosmo do que taacute
acontecendo no paiacutes Porque o paiacutes estaacute diante de
uma crise energeacutetica noacutes tivemos um apagatildeo
daqui a um tempo vamos ter outro aqui noacutes
estamos discutindo USITESC mas tem problema
de usina hidreleacutetrica em Itaacute em Anita Garibaldi
em Belo Monte laacute na Amazocircnia e natildeo sei mais
aonde e noacutes estamos refeacutem do gasoduto do Evo
Morales Entatildeo Esse eacute um questionamento pra
noacutes brasileiros como um todo Claro que natildeo
somos noacutes aqui que vamos resolver isso mas
temos que ter isso em mente E isso passa pelo
presidente da repuacuteblica pelo Congresso a
sociedade tem que ter uma resposta pra isso
porque noacutes queremos luz eleacutetrica queremos o
desenvolvimento econocircmico Entatildeo daonde vai
sair a energia Algum impacto ambiental em
algum lugar vai ter que ter Eacute claro que noacutes
queremos o mais longe possiacutevel do nosso quintal
E o papel do Ministeacuterio Puacuteblico nesse processo eacute
um oacutergatildeo independente que fiscaliza E noacutes
estamos fiscalizando esse processo da USITESC
com base olhando duas coisas o cumprimento da
legislaccedilatildeo e os aspectos teacutecnicos Vocecircs viram
aqui que tem uma equipe teacutecnica trabalhando
temos outros profissionais que estatildeo trabalhando
nisso () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico
Federal AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A prefeita Lucia Simolin enfatizou a situaccedilatildeo de dependecircncia do municiacutepio em relaccedilatildeo agrave atividade carboniacutefera
Eacute verdade tambeacutem que Treviso hoje tem a
seguinte realidade incontestaacutevel feliz ou
infelizmente 80 da nossa economia faltando
alguns poucos deacutecimos praticamente
181
arredondando para 80 depende da economia da
extraccedilatildeo do carvatildeo mineral nos seus diversos tipos
de exploraccedilatildeo e usos Em torno de 20 gira em
torno da produccedilatildeo agropecuaacuteria embora a gente
tenha 168km2 de aacuterea Entatildeo senhores a
exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral para Treviso ela eacute
equivalente agrave monocultura do arroz para Turvo e
Meleiro Essa eacute uma realidade teacutecnica e
administrativa que natildeo eacute do dia pra noite que a
gente pode alterar (Lucia Simolin prefeita
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
() noacutes temos a consciecircncia dos problemas que
podem advir uns mais visiacuteveis e comprovados
outros que o tempo vai nos dizer e a natureza de
que um empreendimento desse porte ele vai nos
afetar Mas vejamos bem como vamos
sobreviver a uma condiccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos
municipais se praticamente a receita do
municiacutepio hoje estaacute diretamente vinculada a
extraccedilatildeo de um foacutessil (Lucia Simolin prefeita
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Apesar de demonstrar uma certa inseguranccedila em relaccedilatildeo aos
impactos o empreendimento natildeo foi questionado A prefeita inclusive
enfatizou a ldquocultura do carvatildeordquo e a ideia da construccedilatildeo do museu do
carvatildeo como algo positivo para a cidade
noacutes temos a nossa cultura eacute o carvatildeo Aiacute a natildeo
exploraacute-lo ou a transformaacute-lo em energia eacute uma
discussatildeo que noacutes estamos presentes e portanto
natildeo fugindo () A gente tem que ver a melhor
saiacuteda pra todas as situaccedilotildees E noacutes do poder
puacuteblico estamos aqui pra isso Estamos aqui para
contribuir Entatildeo esse eacute o meu depoimento a
respeito do empreendimento essa eacute a realidade do
municiacutepio e que natildeo pode ser negada Eacute a nossa
realidade Eacute a nossa verdade A verdade que eacute
uma verdade econocircmico-financeira mas eacute a nossa
verdade (Lucia Simolin AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
182
O crescimento econocircmico do municiacutepio e regiatildeo foi um
argumento forte de convencimento
Noacutes temos que ter consciecircncia de que o projeto
USITESC quando implantado ele seraacute a mola
propulsora de uma nova fase de desenvolvimento
para toda a regiatildeo carboniacutefera Natildeo eacute soacute mineiro
que quer emprego Toda a populaccedilatildeo quer
emprego Quer investimento em sauacutede educaccedilatildeo
e a USITESC eacute investimento eacute sinal de
investimento () Eu acho que a regiatildeo toda tem
muito a ganhar com esse grande projeto que vai
alavancar o progresso e o desenvolvimento de
uma nova fase () (Marcos Antocircnio Cesconetto
Vereador AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
O que fica expliacutecito nos discursos de alguns poliacuteticos locais eacute
uma confianccedila no processo de licenciamento e nas empresas
carboniacuteferas
Noacutes temos que discutir aqui assuntos pertinentes
agrave populaccedilatildeo ou seja a instalaccedilatildeo da Usina E
dizer Dr Darlan que noacutes confiamos na atuaccedilatildeo do
Ministeacuterio Puacuteblico Federal confiamos na atuaccedilatildeo
do Ministeacuterio Puacuteblico Estadual na atuaccedilatildeo da
Fatma e de tantos oacutergatildeos como o Ibama que satildeo
realmente quem tem condiccedilotildees de fiscalizar aquilo
que vai acontecer no empreendimento Natildeo satildeo
afirmaccedilotildees infundadas que foram levantadas aqui
e que muitas delas natildeo tem a ver com o
empreendimento Noacutes queremos dizer que noacutes
confiamos na Carboniacutefera Metropolitana e na
Carboniacutefera Criciuacutema uma delas aqui a mais de
vinte anos outra jaacute explorou carvatildeo aqui na volta
redonda e nas reservas que eles tecircm aqui E noacutes
temos consciecircncia de que o empreendimento eacute
viaacutevel e eacute viaacutevel porque ele pode viabilizar a
exploraccedilatildeo de carvatildeo e a grande maioria das
pessoas eu posso dizer que quase a totalidade das
pessoas que estatildeo aqui ou satildeo mineiros ou algueacutem
da famiacutelia vive do carvatildeo nos mais diversos
municiacutepios (Marcos Antocircnio Cesconetto
Vereador AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
183
A ldquoinevitaacutevelrdquo ampliaccedilatildeo da energia termeleacutetrica fica evidente
nos discursos aqui apresentados O empreendimento se justifica na
medida em que paiacuteses ldquodesenvolvidosrdquo utilizam o carvatildeo para geraccedilatildeo
de energia e o Brasil por ter uma matriz energeacutetica considerada
ldquolimpardquo pode usaacute-lo sem maiores problemas Os impactos ambientais
do empreendimento seratildeo miacutenimos jaacute que os investidores internacionais
assim o exigem e o Ministeacuterio Puacuteblico estaacute fiscalizando Afinal a
concessatildeo do licenciamento estaacute condicionada ao respeito agraves leis e a
criteacuterios teacutecnicos
Os poliacuteticos municipais dada a dependecircncia econocircmica da
atividade carboniacutefera veem o empreendimento com ldquobons olhosrdquo pois
apesar dos impactos negativos ele traraacute tambeacutem o crescimento ao
municiacutepio e agrave regiatildeo Segundo eles a cultura do carvatildeo precisa ser
mantida
632 As mudanccedilas climaacuteticas natildeo vecircm ao caso
Os segmentos sociais presentes nas audiecircncia puacuteblicas (Amigos
da Terra Movimento Iccedilara pela Vida Soacutecios da Natureza UNESC
dentre outros) demonstraram preocupaccedilatildeo com as mudanccedilas climaacuteticas
com o aquecimento global com o impacto regional do empreendimento
e a continuidade da atividade carboniacutefera que jaacute causou muitos impactos
na regiatildeo
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionou a
continuidade de uma atividade que se mostrou e se mostra inviaacutevel do
ponto de vista socioambiental
Porque a nossa preocupaccedilatildeo do Movimento pela
Vida aleacutem de todo o efeito estufa aleacutem de toda a
poluiccedilatildeo que vai gerar aqui na regiatildeo que natildeo eacute
soacute o CO2 que vai largar O gaacutes que vai ser largado
aqui mas toda uma poluiccedilatildeo que vai ser gerada
aqui proacuteximo do Aquiacutefero Guarani da Serra todo
esse ecossistema que existe que essa usina estaacute
colocando em perigo E tambeacutem vai a meacutedio e
longo prazo trazer problemas para as famiacutelias da
regiatildeo onde existe carvatildeo no subsolo porque
assim como laacute na Iccedilara eles tatildeo tentando tirar
carvatildeo eles vatildeo tentar continuar tirando de outros
184
lugares (Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela
Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Carlyle professor da UNESC fez a seguinte pergunta
ldquoConsiderando as implicaccedilotildees das emissotildees de CO2 Dioacutexido de Carbono
para o aquecimento global quais as razotildees pelas quais esse poluente natildeo
foi analisado17
tendo em vista os recentes relatoacuterios do Painel sobre
Mudanccedilas Climaacuteticasrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Em resposta Luiz Nogueira Palma deixou claro que a questatildeo
das mudanccedilas climaacuteticas natildeo dizia respeito ao conteuacutedo da audiecircncia
puacuteblica
Eu vou responder isso aiacute eu acho que o Carlyle
estaacute colocando uma pergunta muito interessante
mas que no meu entendimento ela foge
totalmente ao objeto dessa audiecircncia Eacute todo
mundo sabe que uma usina termeleacutetrica que
queima carvatildeo ou qualquer outro combustiacutevel
emite CO2 Existem necessidades de gerar energia
e o que estaacute se discutindo aqui eacute a necessidade de
um empreendimento que foi colocado junto ao
cenaacuterio nacional Eacute eu natildeo vou mentir para vocecircs
essa usina emite CO2 como o carro de cada um de
noacutes emite CO2 e o que o que o Carlyle taacute
colocando eacute uma preocupaccedilatildeo mundial de emissatildeo
de CO2 Mas nem por isso nenhum paiacutes estaacute
deixando de implantar usina as necessaacuterias como
todos os controles necessaacuterios [ele interrompe
momentaneamente a fala por conta do burburinho]
Entatildeo eu acho que essa pergunta que trata de uma
mateacuteria global A usina trata os poluentes
atmosfeacutericos de forma exemplar com elementos
de controle extremamente sofisticados
encarecendo o preccedilo da energia gerada e por isso
estaacute se chamando usina da energia verde neacute
Porque a teacutermica que usa um combustiacutevel natildeo tatildeo
nobre como o gaacutes que eacute o carvatildeo nacional ela taiacute
para produzir mostrando que as emissotildees tatildeo
muito abaixo dos padrotildees nacionais Natildeo existe
um padratildeo nacional para CO2 em lugar nenhum
17
Nos estudos complementares que haviam sido apresentados na audiecircncia
puacuteblica
185
do mundo Entatildeo essa eacute outra questatildeo () O
contraponto dessa pergunta e de que se noacutes
estamos ou natildeo colaborando com o Protocolo de
Quioto O Brasil colabora porque a nossa matriz
energeacutetica mais de 90 da energia gerada no paiacutes
eacute hidraacuteulica (Luiz Nogueira Palma IPAT
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida fez a leitura de
uma moccedilatildeo que foi aprovada na etapa regional da Conferecircncia do Meio
Ambiente A Conferecircncia aconteceu na UNESC e foi promovida pela
Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econocircmico Sustentaacutevel pelo
IBAMA Secretaria de Estado da Educaccedilatildeo EPAGRI CIRAM
FECAM ANAMA FLORAM FEEC FIESC ALESC FETAESC
Poliacutecia Militar Ambiental e ACAFE Aconteceram sete delas em Santa
Catarina O objetivo das Conferecircncias foi traccedilar poliacuteticas puacuteblicas sobre
meio ambiente no paiacutes em relaccedilatildeo ao aquecimento global ldquoE qual foi a
decisatildeo que a Conferecircncia Regional aqui tomou em relaccedilatildeo ao carvatildeo
Em resumo ldquoa substituiccedilatildeo da matriz energeacutetica baseada no carvatildeo para
outras alternativas de modo gradativordquo Moccedilatildeo que foi aprovada por
unanimidade Ele aproveitou para ler um trecho da moccedilatildeo
() em face da comprovada participaccedilatildeo da
queima de carvatildeo mineral no aumento do
aquecimento global e na intensa degradaccedilatildeo do
solo e aacuteguas provocadas pela sua extraccedilatildeo a
Conferecircncia Regional do Meio Ambiente de
Criciuacutema solicita o cancelamento de todo o
processo de licenciamento da Termeleacutetrica
USITESC em Santa Catarina bem como outras da
regiatildeo sul do Estado dado o elevado passivo
ambiental associado aos empreendimentos
especialmente em termos de degradaccedilatildeo dos
ecossistemas costeiros e da perda da qualidade de
vida das populaccedilotildees que ocupam o sul do estadordquo
Ele completou sua intervenccedilatildeo fazendo o seguinte comentaacuterio
Algueacutem estaacute indo na contramatildeo da histoacuteria ()
Ou noacutes nos damos conta que esse
empreendimento vai contra taacute indo contra tudo o
que estaacute se vendo nesse paiacutes nesse planeta ou
entatildeo a gente estaacute assinando nossa sentenccedila de
morte Chegamos ao absurdo de escutar dos
186
teacutecnicos do IPAT que essa questatildeo do CO2 eacute uma
questatildeo irrelevante natildeo vem ao caso Gente essa
eacute a maior questatildeo E que foi deixada de lado E o
IPAT estaacute indo contra a missatildeo da UNESC
(Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Diante do comentaacuterio o representante do IPAT Marcos Back
fez as seguintes consideraccedilotildees
Em primeiro lugar eu gostaria de esclarecer
algumas questotildees por aqui que natildeo estatildeo muito
claras Primeiro existe um posicionamento
equivocado aqui Noacutes temos que entender
exatamente o que noacutes estamos colocando
Primeiro noacutes estamos discutindo o EIARIMA
que se refere a uma usina termeleacutetrica que queima
carvatildeo e que emite CO2 Quando o Engenheiro
Palma coloca que a questatildeo do CO2 natildeo deve ser
discutida aqui natildeo eacute que ele estaacute querendo dizer
que a questatildeo do CO2 eacute irrelevante Natildeo eacute que ele
quer dizer que o problema do CO2 do
aquecimento global natildeo sejam questotildees
importantes a serem discutidas Pelo contraacuterio a
questatildeo do aquecimento global e da emissatildeo de
CO2 eacute uma questatildeo muito importante a ser
discutida Que a sociedade tem que pensar
seriamente nas consequecircncias da emissatildeo de CO2
que natildeo vem soacute do carvatildeo taacute Entatildeo noacutes temos
que pensar nisso que o aquecimento global estaacute
mostrando seus efeitos e jaacute vaacuterios cientistas
demonstraram mostraram esses efeitos Entatildeo noacutes
temos que pensar nisso sim Quando o IPAT taacute
colocando aqui que noacutes estamos discutindo o
EIARIMA da USITESC noacutes estamos colocando
que discutir licenciamento ambiental eacute um
procedimento legal vocecirc segue o tracircmite as
normas de um procedimento legal () Natildeo eacute da
competecircncia do IPAT julgar a matriz energeacutetica
brasileira Quem estabeleceu isso foram as leis
federais o Congresso Nacional e o Presidente
Lula Satildeo eles que estabelecem se pode ou natildeo
pode produzir carvatildeo se pode ou natildeo pode ter
187
energia movida a carvatildeo Entatildeo natildeo compete ao
IPAT nesse estudo NESSE ESTUDO de usina
termeleacutetrica conduzir uma discussatildeo sobre
aquecimento global porque natildeo eacute isso que estaacute
em discussatildeo aqui O que taacute em discussatildeo aqui eacute
se pode ou natildeo implantar a usina termeleacutetrica
dentro dos tracircmites da lei atual (Marcos Back
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Um representante dos segmentos poliacuteticos Joatildeo Luiacutes presidente
da Cacircmara de Vereadores de Trevisto tambeacutem fez um questionamento
sobre o assunto
Eu gostaria de fazer uma pergunta aos oacutergatildeos
ambientais Noacutes vimos na televisatildeo todos os dias
que os Estados Unidos eacute o maior produtor desse
planeta e foi superado pela China Exatamente nas
suas termeleacutetricas que queimam carvatildeo mineral
87 da energia produzida pela China eacute da queima
do carvatildeo mineral Entatildeo noacutes vemos aiacute o mundo
todo criticando brigando contra isso agora eu
gostaria que vocecircs respondessem a todos noacutes que
satildeo pessoas entendidas Noacutes podemos implantar
um projeto como esse em Treviso Ele eacute viaacutevel
Noacutes podemos pagar esse preccedilo E por que (Joatildeo
Luis Presidente da Cacircmara de Vereadores de
Treviso AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
A resposta do representante da FATMA tambeacutem natildeo contemplou
a preocupaccedilatildeo com questotildees mais amplas
Algumas questotildees que jaacute foram hoje objeto de
abordagem aqui ele foge do escopo do processo
de licenciamento Noacutes tratarmos de mudanccedilas
climaacuteticas natildeo eacute uma questatildeo que estaacute inserida no
projeto que hoje estaacute sendo objeto dessa audiecircncia
puacuteblica A garantia que eu posso dar aos senhores
em relaccedilatildeo ao projeto que estaacute sendo avaliado pela
FATMA e logicamente que noacutes temos natildeo eacute uma
parceria mas um papel fiscalizador do Ministeacuterio
Puacuteblico que tem auxiliado e tem contribuiacutedo de
uma maneira positiva pra que noacutes ao longo desses
dois trecircs anos desse processo de licenciamento
noacutes tenhamos tido avanccedilos significativos em
188
termos de ganhos ambientais () (Luis Antocircnio
Garcia FATMA AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Jaacute o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal Darlan Aiacutelton
Dias contemplou a preocupaccedilatildeo dos presentes afirmando que ldquoeu acho
sim que o aquecimento global faz parte da discussatildeo da USITESC Deve
ser discutida mas a decisatildeo do licenciamento eacute verificar a adequaccedilatildeo
teacutecnica e o atendimento agrave legislaccedilatildeordquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Apesar do parecer favoraacutevel do representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal fica claro que para os que compotildeem a mesa de
trabalho na audiecircncia puacuteblica o tema natildeo tem relaccedilatildeo com o
licenciamento Aos representantes dos segmentos sociais e poliacuteticos aqui
citados foi permitida a manifestaccedilatildeo quanto ao tema mas ela natildeo
encontrou eco Isso aconteceu tambeacutem para a tentativa de discutir o
empreendimento regionalmente
633 Quem defende quem E quem defende os
afetadosatingidosameaccedilados
Nas audiecircncias puacuteblicas foram colocadas duacutevidas em relaccedilatildeo agrave
participaccedilatildeo da populaccedilatildeo de Treviso O vereador Joatildeo Luis Brunel fez a
seguinte colocaccedilatildeo seguida de uma pergunta
() Eu quero dizer que sou a favor do progresso e
quero que a nossa gente tenha emprego mas que
noacutes temos que pagar um preccedilo justo Eu gostaria
de fazer uma pergunta aqui Falou-se sobre muita
coisa mas eu gostaria de saber sobre todas essas
famiacutelias que seratildeo desapropriadas Eu cito aqui a
comunidade da Brasiacutelia Eu vejo aqui a
comunidade satildeo famiacutelias centenaacuterias de gente que
desbravaram essa terra que ajudaram a construir
esse municiacutepio Entatildeo eu faccedilo a seguinte pergunta
como que eles tem o direito de se defender Eles
simplesmente vatildeo ser notificados vatildeo ser
desapropriados Satildeo pessoas que estatildeo aiacute haacute mais
de um seacuteculo Eu gostaria de saber onde estatildeo os
direitos humanos Quais satildeo os direitos que eles
189
tecircm (Joatildeo Luis Brunel AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
Joaquim Teixeira Neto estudante da UNESC fez seu comentaacuterio
sobre a participaccedilatildeo da populaccedilatildeo na audiecircncia puacuteblica
Entatildeo o seguinte eu gostaria que a populaccedilatildeo de
Treviso que natildeo estaacute aqui presente por motivos
que a gente desconhece precisa A populaccedilatildeo de
Treviso precisa se manifestar em audiecircncia
exclusiva Porque esse empreendimento apesar de
ser regional vai atingir primeiramente essa
comunidade e eles natildeo estatildeo sendo ouvidos Eles
estatildeo sendo calados e todos sabemos (Joaquim
Teixeira Neto AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Lucia Ortiz da Amigos da Terra fez um relato de um processo
de licenciamento que aconteceu no Rio Grande do Sul no qual mesmo
depois de emitida a licenccedila foi feito um plebiscito na regiatildeo
() mesmo depois que a Fepam liberou a licenccedila
preacutevia pra instalaccedilatildeo dessa usina o pessoal
conseguiu realizar a realizaccedilatildeo de um plebiscito
na regiatildeo que vai ser agora esse saacutebado pra que a
populaccedilatildeo de fato possa decidir se quer ou natildeo
esse empreendimento A minha pergunta eu tenho
duas perguntas uma eu acho que seria saber se
tem resposta pra populaccedilatildeo dos municiacutepios aqui
da regiatildeo que eacute se as pessoas aqui estatildeo mesmo
dispostas a abrirem matildeo das suas reservas de
aacutegua pro seu abastecimento proacuteprio ou dos seus
filhos ou dos seus netos tendo em vista que essa
usina vai consumir muito mais que a populaccedilatildeo da
regiatildeo de aacutegua a aacutegua do Rio Matildee Luzia aquilo
que ainda resta de aacutegua natildeo contaminada nessa
bacia (Lucia Ortiz Amigos da Terra
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A prefeita de Treviso Lucia Simolin na quarta Audiecircncia
Puacuteblica comentou que foi realizada uma pesquisa e que 70 da
populaccedilatildeo de Treviso concorda com o empreendimento Duas criacuteticas
feitas merecem destaque
190
A primeira feita pelo estudante da UNESC Joaquim Teixeira
chamou a atenccedilatildeo para o fato de que a USITESC eacute um empreendimento
que afetaraacute a regiatildeo e ouvir apenas a populaccedilatildeo de Treviso natildeo seria
uma medida adequada Segundo ele ldquoa termeleacutetrica natildeo eacute soacute um
problema de Treviso Fazer pesquisa de opiniatildeo soacute em Treviso eacute
desprezar uma questatildeo que eacute regionalrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
A segunda criacutetica questionou a pesquisa citada pela prefeita com
base em uma pesquisa feita no municiacutepio de Iccedilara
O IPAT quando fala que eacute imparcial ele estaacute
numa situaccedilatildeo que eu passei pelo conjunto do
Movimento pela Vida em Iccedilara Foi feita uma
pesquisa na Iccedilara pelo IPAT perguntando o
seguinte se a mina natildeo degradar natildeo poluir natildeo
fazer isso natildeo fazer aquilo nanana nananan vocecirc
vai ser a favor da mina Ai o pessoal ateacute eu
responderia que sim Aiacute fizeram uma publicaccedilatildeo
ldquoO IPAT confirma que 80 da populaccedilatildeo de Iccedilara
eacute a favor da mina Fomos laacute saber qual era a
pergunta que foi feita era desse jeito Noacutes
queremos contratar o IPAT para fazer a seguinte
pesquisa se levar em conta toda a degradaccedilatildeo que
a mina provoca os caimentos as casas rachadas a
aacutegua poluiacuteda o aquecimento global papapaacute vocecircs
seriam a favor da mina ou natildeo Ah isso noacutes natildeo
podemos fazer Pra noacutes podiam fazer uma
pesquisa desde fugiu a palavra aqui () mas pra
eles sim Eu questiono sim o IPAT mas
parabenizo grande parte da UNESC professores e
alunos que estatildeo buscando realmente uma defesa
do meio ambiente (Gilmar Bonifaacutecio Movimento
Iccedilara pela Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Nos discursos das duas audiecircncias puacuteblicas constatou-se que
apenas uma pessoa se colocou como representante de uma comunidade
de Treviso Gerson Hanne A intervenccedilatildeo seguinte de Sivio Saad
sintetiza a preocupaccedilatildeo de quem assistiu as duas audiecircncias puacuteblicas
Noacutes temos uma cidade pacata com 3500
habitantes e algueacutem resolve colocar um
empreendimento dentro dessa cidade Os
moradores claro devem saber o que estaacute
191
acontecendo Vimos a exposiccedilatildeo do
empreendedor vimos a exposiccedilatildeo da universidade
e o poder de julgar de saber se aceitam ou natildeo o
empreendimento agrave medida que eles foram
convincentes neacute os empreendedores satildeo
convincentes tatildeo preparados tem audiovisual satildeo
convincentes Mas eu gostaria de saber se a
populaccedilatildeo decide que natildeo quer quem defende os
interesses da populaccedilatildeo Quem eacute que taacute aqui
sentado (ele mostra os integrantes da mesa) que
representa os interesses dessa populaccedilatildeo Que
possa pelo menos equilibrar esse jogo Seria o
empreendedor Claro que natildeo Ele taacute defendendo
os seus interesses Ele eacute capaz de dizer aqui que
os oacutergatildeos internacionais soacute aprovam o dinheiro se
tiver cuidado com o meio ambiente Acredite se
quiser Temos aqui o pessoal da FATMA Eu jaacute vi
a FATMA aprovar coisas absurdas () Agora
depois que ela aprovou ela fiscaliza () Aiacute eles
respondem ldquonatildeo temos quem fiscalizerdquo Quem
seria a Universidade A UNESC () A prefeita
() eu ouvi uma entrevista dela hoje cedo dizendo
que se der dinheiro para a cidade ela aprova
Quem mais O governador que vem aqui diz que
vai dar emprego Vocecircs querem emprego Vocecircs
querem colocar mais duas mil pessoas aqui
dentro () Se a populaccedilatildeo quer oacutetimo Se a
populaccedilatildeo natildeo quer precisa ter algueacutem aqui que
defende () Soacute tem uma pessoa que defende os
interesses da populaccedilatildeo o Dr Darlan Esse
defende Dentro da lei esse defende Agora
precisava mais algueacutem () Se for confiar em
quem taacute aqui na mesa vocecircs tatildeo perdidos Se a
populaccedilatildeo chega agrave conclusatildeo que natildeo quer e
confia nesses que tatildeo aqui vocecircs estatildeo perdidos
A minha pergunta eacute quem defende os interesses
da populaccedilatildeo (Silvio Saad AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Diante dessa fala o apresentador Adhiles Bortot da FATMA
passou para a proacutexima pergunta sem que ningueacutem da mesa se
pronunciasse Essa atitude refletiu o clima das duas audiecircncias
analisadas Quando o assunto se referia aos
192
atingidosafetadosameaccedilados muitas respostas evasivas eram dadas
ressaltando sempre o respeito pelas leis e pelos criteacuterios teacutecnicos
As interveccedilotildees apresentadas demonstram a injusticcedila poliacutetica Se a
mineraccedilatildeo respeita as leis e os criteacuterios teacutecnicos ela eacute liacutecita O que passa
ao largo eacute uma discussatildeo mais ampla sobre gestatildeo de recursos comuns
opccedilotildees de desenvolvimento direitos humanos e justiccedila ecoloacutegica
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida falou da importacircncia
de uma discussatildeo sobre os direitos do cidadatildeo ldquo() concordamos
tambeacutem com o direito constitucional que todo cidadatildeo tem o direito a
um ambiente saudaacutevel () Essa tambeacutem eacute uma questatildeo legal Entatildeo noacutes
devemos comeccedilar a discutir questotildees legaisrdquo (Gilmar Bonifaacutecio
Movimento Iccedilara pela Vida AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007) Mas as
evidecircncias demonstram que as audiecircncias se propunham a ser espaccedilo de
discussatildeo apenas de assuntos referentes ao licenciamento Todas as
discussotildees mais amplas foram desconsideradas
634 O papel da FATMA em questatildeo
Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionou o
Ministeacuterio Puacuteblico e a FATMA que na segunda audiecircncia afirmaram
que a licenccedila natildeo seria emitida sem estudos conclusivos Ele citou o
exemplo de Iccedilara que haacute trecircs anos vinha se mobilizando para a natildeo
instalaccedilatildeo de uma mina de carvatildeo Ele destacou o papel do Ministeacuterio
Puacuteblico e questionou o papel da FATMA No caso da USITESC a
preocupaccedilatildeo dele foi que se a LP fosse dada e os empreendedores
participassem do leilatildeo haveria uma pressatildeo para a aprovaccedilatildeo dos
processos de licenciamento dos empreendimentos acessoacuterios
(AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Joatildeo Luis Brunel tambeacutem questionou os criteacuterios da FATMA na
concessatildeo da licenccedila
() noacutes vemos aiacute todos os dias uma campanha
mundial de preservaccedilatildeo da natureza
principalmente das aacuteguas aacuteguas do nosso planeta
que estatildeo quase que totalmente poluiacutedas entatildeo eu
faccedilo a pergunta noacutes vamos construir essa usina ao
lado de uma reserva ambiental e vamos captar a
maior fonte de aacutegua potaacutevel do nosso municiacutepio
193
uma aacutegua que jaacute estaacute mapeada pela Casan pra
abastecimento futuro em cidades vizinhas E onde
vatildeo passar a linha do trem e a linha de transmissatildeo
vatildeo atingir terrenos cobertos por floresta nativa
Entatildeo eu gostaria de saber quais satildeo os criteacuterios
que a Fatma os oacutergatildeos ambientais adotam pra dar
a licenccedila ou natildeo para a construccedilatildeo de um projeto
como esse (Joatildeo Luis Brunel AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Luis Antocircnio Garcia da FATMA respondeu ldquoA Fatma atraveacutes
de seu corpo teacutecnico e seus consultores vai avaliar os estudos como os
demais e leva em consideraccedilatildeo criteacuterios teacutecnicos e aspectos legais Se
houver viabilidade pelo licenciamento assim seraacute feito Se natildeo houver
viabilidade a licenccedila natildeo seraacute concedidardquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
O representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal na defesa da
FATMA fez as seguintes consideraccedilotildees
Mas posso dizer que na maioria dos casos
inclusive envolvendo o carvatildeo a Fatma tem
atuado em bastante sintonia com o Ministeacuterio
Puacuteblico Eacute claro que a Fatma eacute um oacutergatildeo do poder
executivo e noacutes conhecemos a tradiccedilatildeo do nosso
estado poliacutetica inclusive tudo eacute muito politizado
noacutes sabemos que a Fatma sofre pressotildees poliacuteticas
de toda ordem Mas eu sou testemunha pelo que
vivo aqui em Criciuacutema que os teacutecnicos tem se
esforccedilado e a direccedilatildeo tambeacutem pra resistir agraves
pressotildees e fazer um trabalho teacutecnico (Darlan
Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Na quarta audiecircncia puacuteblica a legitimidade da FATMA nos
processos de licenciamento tambeacutem foi colocada vaacuterias vezes em
duacutevida A jornalista Ana Echevenguaacute de Florianoacutepolis fez o seguinte
questionamento
() eu gostaria de perguntar para o Dr Darlan de
acordo com aquela decisatildeo liminar proferida pelo
Dr Germano juiz federal onde ele dizia que
enquanto a FATMA natildeo tiver o corpo teacutecnico
194
capaz de apreciar EIARIMA ela estaacute proibida e o
IBAMA assumiria essa responsabilidade eu
entendo que nem essa audiecircncia deveria estar
acontecendo (Ana Echevenguaacute AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2007)
Em resposta o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
enfatizou o caraacuteter fiscalizador do Ministeacuterio Puacuteblico e que o IBAMA
natildeo seria a soluccedilatildeo para os problemas de licenciamento em Santa
Catarina
Aquela decisatildeo do juiz que disse que o
licenciamento das minas e dos PRADES de
recuperaccedilatildeo de aacutereas degradadas natildeo poderia ser
feito pela FATMA se natildeo fosse embasada em
pareceres teacutecnicos aiacute o juiz lista uma seacuterie de
empreendedores perdatildeo de profissionais
geoacutelogos engenheiro de minas bioacutelogo
agrocircnomo e tal tal tal natildeo me lembro de cabeccedila
mas se a FATMA tiver um parecer teacutecnico
embasado por esses profissionais ela pode emitir a
licenccedila Quando o juiz disse que o licenciamento
tem que ser passado para o IBAMA o Ministeacuterio
Puacuteblico entende que isso eacute um equiacutevoco do juiz e
noacutes recorremos contra essa parte da decisatildeo Por
que Primeiro que isso natildeo foi pedido entatildeo o
juiz natildeo pode julgar extra petita18
e ele fez isso
nesse caso Segundo o IBAMA natildeo eacute a soluccedilatildeo
A FATMA tem problemas Tem seacuterios e vaacuterios
problemas Noacutes estamos fiscalizando e atuando
para que isso se altere Mas o IBAMA natildeo eacute a
soluccedilatildeo Porque o IBAMA eacute totalmente ausente
da regiatildeo Sul de Santa Catarina O estado de Santa
Catarina inteiro a equipe do IBAMA eacute
precariacutessima Entatildeo com respeito ao Leonir aqui
que taacute por aiacute que agora eacute do Chico Mendes O
IBAMA aqui na regiatildeo sul natildeo existe Entatildeo
passar o licenciamento de qualquer coisa pro
IBAMA aqui na regiatildeo eacute um equiacutevoco (Darlan
Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico Federal
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
18
Decisotildees extra petita satildeo aquelas que o juiz toma concedendo ao
autor coisa diversa da que foi requerida em sua peticcedilatildeo inicial
195
O representante da FATMA Luis Antocircnio Garcia por sua vez
insistiu que a FATMA tem melhorado seu quadro teacutecnico e conta com
consultores externos Ele ressaltou tambeacutem que a decisatildeo do
licenciamento eacute baseada nos criteacuterios legais e teacutecnicos
Dos segmentos sociais que participaram das audiecircncias
percebeu-se uma desconfianccedila em relaccedilatildeo agrave conduta da FATMA nos
processos de licenciamento A FATMA por sua vez reconhece as
dificuldades existentes e faz uma aposta na atuaccedilatildeo do Ministeacuterio
Puacuteblico Segundo o representante da FATMA ldquoo licenciamento com
todas as dificuldades que temos mas noacutes temos hoje uma cooperaccedilatildeo
uma parceria extremamente sadia e participativa e com resultados
extremamente beneacuteficos a sociedade que eacute junto com o Ministeacuterio
Puacuteblico ()rdquo (Luis Antocircnio Garcia FATMA AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Nos discursos dos segmentos sociais e poliacuteticos transparece a
fragilidade do oacutergatildeo ambiental E aiacute a responsabilidade que seria do
oacutergatildeo ambiental eacute passada para o Ministeacuterio Puacuteblico Isso pode ser bom
por um lado uma vez que existe fiscalizaccedilatildeo do oacutergatildeo ambiental mas
por outro lado pode fazer com que as fragilidades do oacutergatildeo ambiental se
perpetuem
635 O IPAT e a neutralidade da ciecircncia
A linguagem teacutecnica do IPAT foi questionada na terceira
audiecircncia puacuteblica ldquo() a maioria de noacutes cidadatildeos mortais e comuns
natildeo temos conhecimento suficiente para traduzir as informaccedilotildees que
foram passadasrdquo (Gilmar Bonifaacutecio Movimento Iccedilara pela Vida
AUDIEcircNCIA 2006) Mauricio Luis Camara questionou sobre a
apresentaccedilatildeo do IPAT para que fizessem um resumo de forma que
todos entendessem (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Outro ponto que merece destaque eacute o fato de o IPAT natildeo ter
deixado clara a viabilidade do empreendimento Abaixo a intervenccedilatildeo
de Gilmar Bonifaacutecio do Movimento Iccedilara pela Vida questionando esse
ponto
196
[] eacute nesse sentido que eu gostaria de saber []
quais satildeo os pontos positivos e quais satildeo os
pontos negativos para que a populaccedilatildeo tambeacutem
tenha condiccedilatildeo de por si soacute analisar e tomar uma
posiccedilatildeo e natildeo simplesmente tomar uma posiccedilatildeo
porque algueacutem ou um chefe poliacutetico tipo um
empreendedor taacute dizendo que eacute assim [] na
minha opiniatildeo ficou faltando isso do IPAT uma
posiccedilatildeo clara de quais satildeo os pontos positivos e
negativos porque aiacute se coloca na balanccedila Porque
eacute isso que a gente tem que ver [] (AUDIEcircNCIA
PUacuteBLICA 2006)
Em resposta Fabiano Luzi Neris representante do IPAT
afirmou que ldquoo IPAT natildeo tem posicionamento se a Usina eacute viaacutevel ou
natildeo eacute viaacutevel se ele eacute a favor ou contra a Usina () Soacute o oacutergatildeo
ambiental tem competecircncia para viabilizar ou natildeo a Usinardquo (Fabiano
Luiz Neris IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
A Universidade apresentou os resultados teacutecnicos
que estatildeo aqui e foram apresentados e estatildeo nos
documentos entregues ao empreendedor e ao
oacutergatildeo ambiental A Universidade natildeo tem o papel
de emitir o parecer favoraacutevel ou contraacuterio agrave
liberaccedilatildeo da licenccedila da Usina A Universidade tem
o papel de apresentar os estudos realizados Se
tiver algum conflito em relaccedilatildeo aos estudos a
gente estaacute a disposiccedilatildeo para discutir tecnicamente
(Fabiano Luiz Neris IPAT AUDIEcircNCIA 2006)
A representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal questionou a
resposta dada pelo IPAT ldquose o EIA natildeo vai dizer se eacute viaacutevel ou natildeo
quem de noacutes diraacute issordquo (Denise Cristina de Resende Nicolaitz
Ministeacuterio Puacuteblico Federal AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Na sequecircncia manifesta-se um posicionamento que parece
contraacuterio ao anterior
Todas as consideraccedilotildees positivas ou negativas
estatildeo e fazem parte de uma matriz de anaacutelise de
impacto Elas constam tanto do estudo da
USITESC quanto dos estudos dos
empreendimentos acessoacuterios E a equipe embora
tenha optado por natildeo fazer nenhuma manifestaccedilatildeo
197
proacute ou contra a USITESC ela nos estudos nas
suas conclusotildees ela deixa bem claro se eacute viaacutevel
ou natildeo dentro do estudo que foi feito Eu soacute queria
dizer isso e que a populaccedilatildeo tivesse ciecircncia e os
nossos colegas ecologistas que Que noacutes
apresentamos os trabalhos e noacutes temos
consciecircncia Noacutes temos nossa responsabilidade
social tambeacutem Noacutes natildeo somos levianos noacutes natildeo
queremos aprovar absolutamente nada Noacutes
estamos fazendo um estudo que demonstra a
possibilidade ou natildeo do empreendimento (Luiz
Nogueira Palma IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2006)
O IPAT enfatizou em muitas intervenccedilotildees o ldquocaraacuteter teacutecnicordquo das
informaccedilotildees prestadas Alguns exemplos de explicaccedilotildees duvidosas
foram extraiacutedos das duas audiecircncias puacuteblicas e satildeo apresentados na
sequecircncia Na audiecircncia puacuteblica de 2006 o IPAT afirmou que uma
barragem no Rio Matildee Luzia preservaria a aacutegua
() quando vocecirc constroacutei um barramento ele
isola ou seja vocecirc taacute preservando a aacutegua boa a
aacutegua de boa qualidade Vocecirc taacute reservando vocecirc
taacute evitando que aquela aacutegua polua neacute pelo menos
pelos outros motivos que mineraccedilatildeo a gente sabe
que o ph nesses frac34 de trecho do Rio Matildee Luzia o
ph da aacutegua eacute 3 E laacute em cima na foz onde natildeo
tem onde natildeo ocorre ou seja a aacutegua eacute de boa
qualidade Entatildeo vocecirc taacute isolando vocecirc taacute
isolando vocecirc taacute preservando (Naacutedia e Andreacuteia
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Quanto agrave existecircncia de risco na construccedilatildeo da barragem e na
possibilidade de caimento de mina o IPAT tambeacutem manifestou sua
posiccedilatildeo
Teoricamente eu natildeo vou te dizer que natildeo eacute
possiacutevel ocorrer um problema na construccedilatildeo da
barragem mas isso aiacute eacute uma coisa que eacute pouco
provaacutevel E quanto aos caimentos de mina cai em
vaacuterios locais e esse caimento que ocorreu
recentemente natildeo tem absolutamente nada a ver
vamos dizer assim com a eventual construccedilatildeo de
198
um barramento neacute Natildeo tem realmente natildeo tem
nada a ver e foi uma coisa improvaacutevel daquelas
coisas que natildeo se pode dizer que estava por
acontecer A mina onde caiu era um lugar
conhecido claro tinha falha geoloacutegica neacute Mas
ela tava sendo vamos dizer assim toda eacute toda
minerada de uma maneira muito teacutecnica com um
fator de seguranccedila muito alto e aconteceu Quer
dizer eacute a natureza neacute Eu com toda sinceridade
natildeo vou lhe enganar pra dizer que eacute impossiacutevel de
ocorrer um caimento laacute () Se for minerado de
uma maneira teacutecnica eacute pouco provaacutevel que
aconteccedila Agora dizer que natildeo tem caimento eu
acho que teacutecnico nenhum diria isso (Cleacutevis
IPAT AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2006)
Na quarta audiecircncia puacuteblica mais duas explicaccedilotildees chamaram a
atenccedilatildeo uma do IPAT outra do empreendedor A primeira foi dada por
Marcos Back do IPAT ldquoSegundo as pesquisas natildeo haacute uma correlaccedilatildeo
entre a usina e a sauacutede da populaccedilatildeo entre a Usina Termeleacutetrica Jorge
Lacerda e as doenccedilas respiratoacuteriasrdquo (AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Em contraposiccedilatildeo a essa informaccedilatildeo Joseacute Dagostin do Movimento
Iccedilara pela Vida trouxe informaccedilotildees atualizadas dados do Datasus
questionando o IPAT sobre os dados defasados do estudo sobre sauacutede e
tambeacutem sobre acidentes com amocircnia Dois anos depois o proacuteprio
Ministeacuterio Puacuteblico coletou e analisou dados confirmando a relaccedilatildeo
entre diversos problemas de sauacutede e o funcionamento do Complexo
Jorge Lacerda (MPF 2009)
A outra fala do empreendedor sugeriu que ldquoa estocagem de
amocircnia eacute mais segura que o botijatildeo de gaacutes que vocecircs tecircm em suas casas
Muitos dos senhores tecircm mangueiras inadequadas para conectar o
botijatildeo de gaacutes Quantas vezes passam perto do botijatildeo de gaacutesrdquo (Luis
Carlos Cunha USITESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Essa eacute uma amostra pequena das explicaccedilotildees dadas em resposta
aos questionamentos Muitas pessoas tambeacutem natildeo se sentiram
contempladas com as respostas As evasivas contemplavam encaminhar questionamentos por escrito agrave FATMA e ao IPAT desconsiderar as
perguntas com base no fato de que as informaccedilotildees jaacute haviam sido
apresentadas nas outras audiecircncias ou que as informaccedilotildees seriam
tratadas posteriormente na anaacutelise de risco
199
Nas duas audiecircncias puacuteblicas analisadas o IPAT foi questionado
ao fazer o EIARIMA da USITESC quanto ao seu posicionamento
O estudante da UNESC Joaquim Teixeira fez a seguinte
intervenccedilatildeo
ldquoA USITESC eacute a nova Marion do seacuteculo XXIrdquo Eacute
preciso separar a UNESC eacute nossa o IPAT eacute de
quem paga () o empreendimento pode ser feito
ou natildeo feito tem essa possibilidade taacute na lei Tem
alternativas ao empreendimento () Eacute preciso
mudar de paradigma () Vocecircs podem virar a
paacutegina da histoacuteria Treviso natildeo precisa de mina
Ou melhor termeleacutetrica (Joaquim Teixeira
estudante da UNESC AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA
2007)
Em resposta Marcos Back do IPAT reclamou dessa e de outras
intervenccedilotildees como ldquoataque gratuito agrave Universidaderdquo E completou
() Eu quero dizer o seguinte que eacute muito faacutecil
muito faacutecil a gente vir para uma audiecircncia e
quando a gente natildeo tem mais argumento vocecirc
desqualifica quem produziu Quem dizer eu tocirc
numa discussatildeo eu natildeo sei mais o que dizer eu
desqualifico o outro eu falo que o outro natildeo sabe
nada E na hora que eu desqualifico a pessoa
comeccedilo a desqualificar todo o estudo que foi feito
() natildeo adianta dizer que o IPAT natildeo eacute
Universidade porque a decisatildeo de implantaccedilatildeo
que o IPAT participasse desse estudo partiu da
eacutepoca que o reitor era Edson Rodrigues que fez
uma reuniatildeo com a Universidade inteira e decidiu
que a Universidade ia participar desse processo
porque eacute muito grande para a regiatildeo inteira esse
empreendimento e era preciso que a Universidade
se envolvesse no projeto para fazer a avaliaccedilatildeo
desses impactos ambientais (Marcos Back IPAT
AUDIEcircNCIA PUacuteBLICA 2007)
Percebe-se nos posicionamentos do IPAT que existe a confianccedila
de que o documento produzido eacute neutro Dessa forma os segmentos
sociais natildeo teriam que questionar quem produz o documento apenas as
informaccedilotildees que o documento traz
200
636 Audiecircncias puacuteblicas como espaccedilos democraacuteticos
Somente o representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal Darlan
Aiacutelton Dias e os segmentos sociais fizeram menccedilatildeo agrave questatildeo
democraacutetica nas audiecircncias puacuteblicas Na terceira audiecircncia puacuteblica o
representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal fez a seguinte intervenccedilatildeo
A audiecircncia puacuteblica eacute um ambiente democraacutetico
bonito agraves vezes a gente fica [pausa] vem com
uma preacute-concepccedilatildeo e fica irritado quando algueacutem
fala o contraacuterio mas isso eacute o processo
democraacutetico uma sociedade democraacutetica Em
outros tempos da nossa histoacuteria recente era
inimaginaacutevel um empreendedor ter que se
submeter a esse tipo de [pausa] situaccedilatildeo Mas eacute a
realidade da nossa sociedade democraacutetica graccedilas
a deus neacute E a Constituiccedilatildeo nos daacute esse recado do
desenvolvimento sustentaacutevel noacutes queremos
desenvolver o paiacutes mas queremos preservar o
meio ambiente (Darlan Aiacutelton Dias
AUDIEcircNCIA 2006)
Todavia o elogio agrave democracia contrasta com o processo da
audiecircncia puacuteblica Tadeu Santos da ONG Soacutecios da Natureza colocou
em questatildeo o caraacuteter democraacutetico da audiecircncia puacuteblica depois de ter
sido lembrado do limite de tempo quatro vezes Segundo ele
As audiecircncias puacuteblicas anteriores foram mais
democraacuteticas a coisa taacute ficando fechada Taacute se
percebendo que o grande lobby das mineradoras
estaacute funcionando Eacute possiacutevel que realmente a
FATMA venha a dar o licenciamento Eacute possiacutevel
natildeo vai dar Porque deu para a mineradora em
Treviso (Tadeu Santos AUDIEcircNCIA 2006)
E continua referindo-se a Luis Antocircnio Garcia da FATMA ldquoSr
diretor eu gostaria que o Sr fosse mais maleaacutevel que conduzisse a
assembleia de forma mais democraacutetica porque afinal estamos
discutindo uma coisa muito seacuteriardquo (Tadeu Santos AUDIEcircNCIA 2006)
201
Na quarta audiecircncia puacuteblica o representante do Ministeacuterio
Puacuteblico Federal novamente enaltece o caraacuteter democraacutetico da audiecircncia
() a audiecircncia puacuteblica eacute o instrumento que estaacute
previsto na lei e noacutes vivemos num estado
democraacutetico de direito e que a publicidade dos
licenciamentos ambientais eacute um princiacutepio
fundamental previsto na poliacutetica nacional do meio
ambiente Entatildeo um processo de licenciamento
tem que ser puacuteblico as pessoas tem que ter o
direito de se manifestar desde que haja claro
respeito muacutetuo Mas por outro lado eu percebo
que muita gente veio aqui hoje com a cabeccedila feita
a favor ou contra o empreendimento sem querer
ouvir qualquer coisa Isso ficou muito claro jaacute
nano niacutevel de conversa durante as apresentaccedilotildees
As pessoas tem o direito de ser contra ou a favor
do empreendimento Aleacutem disso disse a prefeita
aqui que os estudos ficaram agrave disposiccedilatildeo da
populaccedilatildeo por 45 dias como manda a lei mas soacute
duas pessoas consultaram os estudos na prefeitura
Entatildeo eu peccedilo que se respeite as opiniotildees e que
todos tem direito a fazer uso da palavra E isso eacute
democraacutetico () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio
Puacuteblico Federal AUDIEcircNCIA 2007)
O reflexo dessa democracia foi o rigoroso controle do tempo de
questionamento o despeito pela ordem de chegada dos questionamentos
(orais e escritos) e a inexistecircncia de reacuteplica Gilmar Bonifaacutecio do
Movimento Iccedilara pela Vida criticou a forma como foram conduzidos os
debates jaacute que natildeo foi respeitado o direito agrave reacuteplica
A intervenccedilatildeo do representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal
trouxe alguma esperanccedila para os segmentos sociais
Na verdade toda essa discussatildeo que hoje se trava
aqui eacute uma discussatildeo se a gente for pensar aqui
do ponto de vista histoacuterico bonita e importante e
acho que essa luta pode mudar o rumo dessa
legislaccedilatildeo Mas vamos colocar ela num contexto
maior que precisa ser colocado Na verdade eacute
uma discussatildeo que se trava no Brasil inteiro e no
mundo inteiro que eacute a discussatildeo de que modelo
de sociedade e desenvolvimento noacutes queremos
202
Pela questatildeo do efeito estufa e toda a questatildeo de
sobrevivecircncia da espeacutecie E eu como ser humano
como pai eu quero tambeacutem que o mundo pros
meus filhos pros meus netos seja viaacutevel No
entanto diante desse debate e assim como aqui
natildeo se quer uma usina termeleacutetrica laacute em Belo
Monte natildeo se quer uma hidreleacutetrica laacute em
Campos Novos natildeo se quer uma hidreleacutetrica laacute no
Rio Madeira e assim por diante Mas de algum
lugar tem que sair energia E o Ministeacuterio Puacuteblico
nessa discussatildeo tem que se pautar no equiliacutebrio e
ter como paracircmetro o que A Constituiccedilatildeo e as
leis E eacute assim que eu procuro agir Entatildeo essa
discussatildeo eacute legiacutetima essa oposiccedilatildeo a qualquer
empreendimento desse tipo eacute legiacutetima e esse eacute o
espaccedilo para falar Mas noacutes vamos nos pautar pela
lei () (Darlan Aiacutelton Dias Ministeacuterio Puacuteblico
Federal Federal AUDIEcircNCIA 2007)
O representante do Ministeacuterio Puacuteblico Federal reconhece a
possibilidade de mudanccedila na legislaccedilatildeo mas reconhece que sua atuaccedilatildeo
se restringe ao que eacute legal O Ministeacuterio Puacuteblico Federal produziu em
2004 um dossiecirc sobre as Deficiecircncias em estudos de impacto ambiental
mas natildeo tocou na questatildeo das audiecircncias puacuteblicas (MPF 2004) Apesar
das audiecircncias puacuteblicas natildeo serem deliberativas a observacircncia do
processo democraacutetico eacute algo necessaacuterio e deveria entrar nos estudos do
Ministeacuterio Puacuteblico
64 Democracias possiacuteveis e aprendizagem social
A avaliaccedilatildeo de impacto ambiental compreende processos que
envolvem muacuteltiplos segmentos que recolhem analisam sintetizam e
comunicam informaccedilotildees sobre as condiccedilotildees ambientais tendecircncias
direccedilotildees impactos e futuros possiacuteveis com o objetivo de sensibilizar
para uma questatildeo especiacutefica ou apoiar processos de regulaccedilatildeo ambiental
Essas avaliaccedilotildees satildeo processos sociais de comunicaccedilatildeo e interaccedilatildeo que
envolvem muito mais do que a mera produccedilatildeo de relatoacuterios Todavia os
limites estruturais e conjunturais das avaliaccedilotildees natildeo garantem o
questionamento do estilo de desenvolvimento de planos poliacuteticas e
203
programas que estariam sendo elaborados avaliados e implementados
(SACHS 1986 VIEIRA 2005)
O licenciamento ambiental estaacute envolto numa suposta
neutralidade em relaccedilatildeo aos criteacuterios juriacutedicos e teacutecnicos que o
sustentam e os condicionantes e interesses intriacutensecos ao processo
acabam passando para segundo plano ldquoNatildeo eacute porque a mineradora
cumpre com as exigecircncias que o oacutergatildeo licenciador pode liberar a
atividade Eacute preciso considerar a aceitaccedilatildeo do empreendimento pela
comunidade que poderaacute ser afetadardquo (Soacutecios da Natureza citado por
SANTOS 2008 p 103)
No caso especiacutefico da USITESC os segmentos poliacuteticos
(representados pelos poliacuteticos estaduais e municipais Ministeacuterio Puacuteblico
e FATMA) apresentaram em seus discursos algumas peculiaridades Os
poliacuteticos estaduais e municipais apoiam o empreendimento porque
querem estimular o desenvolvimento econocircmico A FATMA sofre
pressotildees poliacuteticas e tem dificuldades teacutecnicas mas garante que o
licenciamento eacute concedido considerando a anaacutelise teacutecnico-legal O
Ministeacuterio Puacuteblico aparece nos discursos dos segmentos econocircmicos
poliacuteticos e sociais como confiaacutevel Ele se mostra receptivo as colocaccedilotildees
dos segmentos sociais mas se move dentro do que considera legal Pode
questionar os dados do EIARIMA mas dificilmente questionaria a
questatildeo democraacutetica no processo da audiecircncia puacuteblica
Os segmentos econocircmicos como tratado na seccedilatildeo 623 fazem
pressatildeo sobre os segmentos poliacuteticos Nas audiecircncias puacuteblicas sua
participaccedilatildeo se limita a responder agrave perguntas e fazer a defesa do
empreendimento quando necessaacuterio O fato eacute que a USITESC tem a LI e
pode participar dos leilotildees de energia O iniacutecio da construccedilatildeo vai
depender dos interesses econocircmicos e poliacuteticos envolvidos O ponto
importante nesse capiacutetulo era tornar mais expliacutecitas as redes de
influecircncia e os mecanismos que satildeo utilizados nas audiecircncias puacuteblicas
para neutralizar as criacuteticas (aqui entra a injusticcedila poliacutetica nos tempos e
nas intervenccedilotildees) e a desinformaccedilatildeo Ao mesmo tempo tornam-se
tambeacutem mais expliacutecitas as formas de atuaccedilatildeo dos segmentos sociais
(afetadosatingidosameaccedilados ONGs e parte da academia)
A histoacuteria dos segmentos sociais no Sul de Santa Catarina traz
evidecircncias de aprendizagem social adaptativa Eles contam com uma
atuaccedilatildeo regional articulada fazem a relaccedilatildeo dos problemas globais e
locais questionam os segmentos poliacuteticos e os segmentos econocircmicos e
reivindicam que as audiecircncias puacuteblicas sejam mais democraacuteticas Isso
204
demonstra na discussatildeo especiacutefica da USITESC que se vem travando
uma luta histoacuterica na regiatildeo
7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta tese buscamos compreender as contradiccedilotildees inerentes agrave
proposta de ampliaccedilatildeo do sistema de geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica na
regiatildeo sul de Santa Catarina Para tanto adotamos um modelo de anaacutelise
que combina os enfoques de gestatildeo de ldquocommonsrdquo para o
ecodesenvolvimento e de justiccedila ambiental e ecoloacutegica Na estrutura
deste modelo hiacutebrido comparecem os conceitos de trajetoacuteria de
desenvolvimento local de atributos fiacutesicos e tecnoloacutegicos do recurso em
questatildeo de padrotildees de interaccedilatildeo entre os atores sociais envolvidos no
sistema de gestatildeo de regras em uso de arena de accedilatildeo e de resultados
eou consequecircncias das tomadas de decisatildeo
Caracterizamos inicialmente a especificidade das dinacircmicas de
desenvolvimento que tecircm influenciado as accedilotildees coletivas dos segmentos
poliacuteticos econocircmicos e sociais envolvidos nos modos de apropriaccedilatildeo e
gestatildeo do carvatildeo mineral na regiatildeo em pauta Neste sentido destacamos
o papel hegemocircnico exercido pelos agentes governamentais na
centralizaccedilatildeo dos processos decisoacuterios e na oferta de subsiacutedios agrave
utilizaccedilatildeo de combustiacuteveis foacutesseis natildeo obstante o apelo agrave necessidade
de se promover uma ldquomatriz energeacutetica limpardquo no Paiacutes
No resgate da dinacircmica de exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral
buscamos caracterizar os fatores relacionados agrave disponibilidade do
recurso agrave rentabilidade econocircmica deste segmento atualmente aos
criteacuterios de tomada de decisatildeo na pesquisa de inovaccedilotildees na busca de
alternativas de mecanizaccedilatildeo dos processos de extraccedilatildeo agraves praacuteticas de
recuperaccedilatildeo do passivo ambiental e ao perfil dominante das poliacuteticas de
suprimento energeacutetico no bojo do modelo de desenvolvimento adotado
Com base nas evidecircncias coletadas foi possiacutevel constatar que o nosso
Paiacutes natildeo conta ainda hoje com uma ldquocultura do carvatildeordquo e que na
regiatildeo estudada as atividades de mineraccedilatildeo dificultam ou mesmo
impedem outros usos possiacuteveis do solo aleacutem de responderem pela
geraccedilatildeo de riscos e de impactos socioambientais cujos custos
geralmente muito elevados continuam a ser distribuiacutedos de forma
socialmente desigual Aleacutem disso reforccedilamos o ponto de vista segundo
o qual as escolhas tecnoloacutegicas satildeo essencialmente tributaacuterias de
orientaccedilotildees poliacuteticas As anaacutelises mostraram tambeacutem que uma parcela
significativa da populaccedilatildeo catarinense jaacute percebe natildeo soacute uma relaccedilatildeo
causal direta entre o aumento da exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral e o
comprometimento da resiliecircncia ecossistecircmica e da qualidade de vida
das comunidades locais Ao mesmo tempo vem se impondo
206
gradualmente a impressatildeo de que os processos de diversificaccedilatildeo da
economia regional vecircm legitimando a adoccedilatildeo de uma poliacutetica mais firme
de reconversatildeo do segmento de exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral
No que diz respeito agrave adequaccedilatildeo dos arranjos institucionais em
vigor na dinacircmica de gestatildeo deste segmento correlacionamos a
iniciativa de ampliaccedilatildeo do sistema de geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica
movida a carvatildeo mineral agrave desregulamentaccedilatildeo e flexibilizaccedilatildeo da
legislaccedilatildeo ambiental - especialmente do Coacutedigo de Mineraccedilatildeo e do
Coacutedigo Estadual do Meio Ambiente em Santa Catarina No segundo
caso o Coacutedigo estabeleceu prazos para as licenccedilas ambientais e a
Assembleacuteia Legislativa de Santa Catarina dispensou o EIARIMA para
atividade de extraccedilatildeo de pequeno porte A CFEM e a reduccedilatildeo do ICMS
de 15 para 3 no estado contribuiacuteram fortemente para legitimar o
projeto de uma nova usina junto agrave opiniatildeo puacuteblica Mas outros aspectos
relevantes foram destacados a exemplo da evoluccedilatildeo progressiva das leis
ambientais favorecendo a percepccedilatildeo de que o direito a um meio
ambiente saudaacutevel integra o coacutedigo universal dos direitos humanos
fundamentais Todavia o balanccedilo entre os aspectos que favorecem a
ampliaccedilatildeo e os que questionam eacute bastante desigual A
desregulamentaccedilatildeo e a flexibilizaccedilatildeo dos coacutedigos juriacutedicos promovidas
nos uacuteltimos anos representam da perspectiva adotada na tese um
evidente e preocupante retrocesso em relaccedilatildeo aos avanccedilos alcanccedilados
anteriormente Finalmente acreditamos que a dimensatildeo da participaccedilatildeo
autecircntica da sociedade civil organizada nas tomadas de decisatildeo uma das
bandeiras da deacutecada de 1980 continua ainda hoje muito aqueacutem das
expectativas ndash sobretudo pelo fato de permanecer tutelada pelo jogo de
alianccedilas formadas pelos representantes dos setores econocircmico e
governamental
A reflexatildeo centrada no aprofundamento deste uacuteltimo toacutepico
mostrou que o sistema de gestatildeo de recursos comuns no Brasil continua
atrelado a um modelo de desenvolvimento que faz do apelo agrave
sustentabilidade uma retoacuterica que natildeo ataca as raiacutezes do problema
Trata-se de evitar as mudanccedilas estruturais que se tornaram emergenciais
face ao agravamento da crise em escala global Nesse contexto o
componente democraacutetico-representativo do sistema poliacutetico que tende a
reforccedilar e a legitimar a formaccedilatildeo de lobbies envolvendo os segmentos
poliacuteticos e econocircmicos contrasta com o componente democraacutetico-
participativo que responde pela abertura de espaccedilos ainda incipientes e
restritos de participaccedilatildeo aos setores majoritaacuterios da populaccedilatildeo A
existecircncia da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvatildeo Mineral eacute
207
um indiacutecio da existecircncia dessas articulaccedilotildees entre segmentos
econocircmicos e poliacuteticos E os dados apresentados no capiacutetulo 5
confirmam a hipoacutetese de que no bojo do processo de licenciamento da
USITESC no periacuteodo de 2002 a 2012 as doaccedilotildees de empresaacuterios para o
financiamento de campanhas eleitorais (nos niacuteveis municipal estadual e
nacional) tornaram-se um fenocircmeno recorrente
Em outras palavras consideramos que a gestatildeo de recursos
comuns em Santa Catarina segue as tendecircncias nacionais
Historicamente a questatildeo ambiental vem sendo apropriada de forma
marginal no estado permanecendo subordinada agrave hegemonia dos
interesses dos segmentos econocircmicos e poliacuteticos Um dos principais
indicadores dessa tendecircncia pode ser encontrado na dinacircmica de
organizaccedilatildeo e funcionamento da FATMA abrigando a formaccedilatildeo de
lobbies ativos no setor da exploraccedilatildeo do carvatildeo mineral - seja
estimulando sua expansatildeo seja dificultando sua fiscalizaccedilatildeo em
coerecircncia com os avanccedilos da legislaccedilatildeo ambiental Todavia ressaltamos
ainda que se uma parte dos segmentos poliacuteticos e dos segmentos sociais
apoia a tendecircncia de ampliaccedilatildeo deste setor os posicionamentos natildeo satildeo
homogecircneos e o fortalecimento do sistema democraacutetico vem se dando
por meio da organizaccedilatildeo dos segmentos sociais (ONGs academia
afetadosatingidosameaccedilados) e da atuaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico No
que diz respeito agrave organizaccedilatildeo dos segmentos sociais as iniciativas
extrapolam os espaccedilos de participaccedilatildeo previstos constitucionalmente
envolvendo tambeacutem accedilotildees autocircnomas de produccedilatildeo e difusatildeo de
conhecimentos aleacutem da promoccedilatildeo de campanhas e manifestaccedilotildees
Na consideraccedilatildeo do processo de licenciamento da USITESC
constatamos que no processo de licenciamento as audiecircncias puacuteblicas
realizadas no municiacutepio de Treviso foram coordenadas pela FATMA e
natildeo contaram com estrateacutegias de distribuiccedilatildeo (minimizando a
desigualdade) reconhecimento (considerando as distintas perspectivas)
e a representaccedilatildeo (paridade de participaccedilatildeo) As evidecircncias obtidas
indicam que essas reuniotildees foram organizadas visando reproduzir a
loacutegica que bloqueia na base a concretizaccedilatildeo desses anseios
Os principais temas tratados nas audiecircncias puacuteblicas foram
tratados no capiacutetulo 6 mostrando as contradiccedilotildees existentes ldquoentrerdquo e
ldquodentrordquo dos segmentos sociais principalmente A ampliaccedilatildeo de energia
termeleacutetrica eacute inevitaacutevel do ponto de vista dos segmentos econocircmicos
sendo respaldada por uma parcela dos agentes governamentais locais e
dos representantes da sociedade civil A discussatildeo sobre a relaccedilatildeo entre
208
a construccedilatildeo da USITESC e as mudanccedilas climaacuteticas proposta pela rede
de ONGs movimentos sociais e parte da UNESC foi categoricamente
colocada de lado como um aspecto natildeo pertinente ao caso em pauta ou
seja a apresentaccedilatildeo do EIARIMA Aleacutem disso ressaltamos que
durante as audiecircncias praticamente natildeo foram consideradas as vozes
dos habitantes de Treviso que seriam afetados pela implementaccedilatildeo do
projeto As discussotildees envolveram apenas uma parcela dos
representantes da sociedade civil sediados em outros municiacutepios e em
outros estados Poucos habitantes de Treviso participaram das
audiecircncias puacuteblicas Num municiacutepio em que 69 dos postos de trabalho
estatildeo vinculados a atividade carboniacutefera torna-se difiacutecil imaginar que os
habitantes estivessem em condiccedilotildees favoraacuteveis para se posicionarem
contra a implantaccedilatildeo da USITESC
Mostramos tambeacutem que a competecircncia da FATMA e da UNESC
foi repetidamente questionada nessas audiecircncias Se os representantes da
FATMA argumentaram agrave luz do princiacutepio de respeito agrave legislaccedilatildeo em
vigor e os pesquisadores da UNESC agrave luz do princiacutepio de neutralidade
da ciecircncia ambos os grupos evitaram assumir o desafio de encarar uma
discussatildeo poliacutetica do caso em pauta Por sua vez foi enaltecido o papel
desempenhado pelo Ministeacuterio Puacuteblico na defesa dos interesses da
populaccedilatildeo local Natildeo obstante consideramos que os depoimentos dos
Procuradores permaneceram refeacutens de um ponto de vista essencialmente
legalista na avaliaccedilatildeo do processo de licenciamento
Na busca de respostas agrave questatildeo de ldquoserdquo e ldquocomordquo as accedilotildees
coletivas estudadas teriam gerado oportunidades de aprendizagem social
adaptativa capazes de deflagrar accedilotildees coletivas de mudanccedila
institucional concluiacutemos que a atuaccedilatildeo de parte dos segmentos sociais
envolvidos no caso da USITESC aponta nesta direccedilatildeo Eles jaacute
conseguem perceber o surgimento da demanda de ampliaccedilatildeo do sistema
termeleacutetrico como um elemento de uma problemaacutetica mais ampla e mais
complexa que natildeo foi considerada nas audiecircncias puacuteblicas Eles estatildeo
mobilizados de outras formas mas a concessatildeo do licenciamento ainda
tem a audiecircncia puacuteblica (consultiva) como uacutenica modalidade de
participaccedilatildeo Diante disso pensamos que os problemas de distribuiccedilatildeo
reconhecimento e representaccedilatildeo existentes no espaccedilo da audiecircncia
precisariam ser vistos com mais cuidado pelo Ministeacuterio Puacuteblico Seria
interessante que daqui em diante o Ministeacuterio Puacuteblico superasse a
visatildeo dominante segundo a qual a anaacutelise das deficiecircncias do
EIARIMA (MPF 2004) satildeo suficientes para democratizar os processos
209
de licenciamento de projetos programas e poliacuteticas de desenvolvimento
no Paiacutes
Finalmente o trabalho ofereceu subsiacutedios que reforccedilam a
validade do pressuposto de que a maturaccedilatildeo de um sistema de gestatildeo de
recursos comuns voltado para um novo estilo de desenvolvimento
norteado pelo princiacutepio de sustentabilidade forte deveraacute passar
necessariamente pela ldquodemocratizaccedilatildeo do aparelho do Estado de modo
que a sociedade possa controlar seus controladoresrdquo (BOcircA NOVA
1985 p 227)
A sugestatildeo eacute que se faccedila uma pesquisa sobre ldquodeficiecircncias nas
audiecircncias puacuteblicasrdquo Como mencionado na justificativa desta tese um
dos encaminhamentos possiacuteveis seria a realizaccedilatildeo de um levantamento
mais rigoroso dos processos de licenciamento realizados no litoral de
Santa Catarina nos uacuteltimos anos a ser suplementado pela anaacutelise criacutetica
das respectivas audiecircncias puacuteblicas Os resultados poderiam ser
encaminhados ao Ministeacuterio Puacuteblico Estadual e Federal servindo assim
de base para o questionamento da forma pela qual os anseios de
distribuiccedilatildeo justa reconhecimento e representaccedilatildeo autecircntica dos
segmentos sociais tecircm sido incorporados nos processos de
licenciamento Neste sentido o caraacuteter meramente consultivo das
audiecircncias puacuteblicas poderia se tornar tambeacutem objeto de reconsideraccedilatildeo
na trilha ainda incipiente que nos conduziria ao exerciacutecio da cidadania
ambiental plena
Em outras palavras as perspectivas de ampliaccedilatildeo da rede de
geraccedilatildeo de energia termeleacutetrica no Sul de Santa Catarina refletem uma
tomada de consciecircncia ainda bastante restrita dos riscos envolvidos na
continuidade da atividade carboniacutefera e de forma mais ampla de um
modelo de gestatildeo de recursos naturais de cunho ecologicamente
predatoacuterio e socialmente injusto Diante de argumentos que defendem o
caraacuteter ldquoinevitaacutevelrdquo do apelo a fontes natildeo renovaacuteveis de geraccedilatildeo de
energia cabe lembrar que
() existe pela frente um futuro repleto de possibilidades
alternativas e de potenciais inexplorados que natildeo cabem na bitola
estreita dos que estatildeo presos a modelos do passado ou a interesses do establishment Ou seja o futuro natildeo se projeta nas equaccedilotildees
matemaacuteticas mas se inventa na incessante discussatildeo das alternativas e
se faz na luta poliacutetica (BOcircA NOVA 1985 p 233)
210
Transformar a essa situaccedilatildeo envolve a adoccedilatildeo de outra
perspectiva baseada natildeo soacute na compreensatildeo da complexidade do
problema mas tambeacutem na consideraccedilatildeo simultacircnea dos fatores que
comparecem em todas as escalas do local ao global e na formaccedilatildeo de
parcerias capazes de impulsionar a gestaccedilatildeo de um projeto alternativo de
sociedade Esperamos que os resultados obtidos ofereccedilam subsiacutedios
uacuteteis apontando nesta direccedilatildeo insistindo que a superaccedilatildeo dos atuais
dilemas que cercam o exerciacutecio da democracia em nosso Paiacutes deveria
transcender a preocupaccedilatildeo pela pertinecircncia dos arranjos institucionais
em vigor Se os limites da tradiccedilatildeo democraacutetico-representativa tornam-
se evidentes quando prevalecem os interesses dos grupos sociais
atrelados agrave hegemonia do regime de apropriaccedilatildeo privada e economicista
dos ldquocommonsrdquo por sua vez os avanccedilos alcanccedilados na promoccedilatildeo de um
novo formato democraacutetico-participativo correm o risco de se tornarem
funcionais agrave reproduccedilatildeo das tendecircncias dominantes se permanecerem
restritos aos limites fixados pela obediecircncia agraves determinaccedilotildees legais
Impotildee-se assim uma dinacircmica de radicalizaccedilatildeo da democracia
entendida como componente essencial de uma estrateacutegia consistente de
enfrentamento dos dilemas colocados pela urgecircncia de uma transiccedilatildeo
ecoloacutegica consistente com os princiacutepios do ecodesenvolvimento
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