11
A MULHER NO TAMBOR DE MINA - 1994 Análise da posição e representação da mulher e das entidades espirituais femininas no Tambor de Mina do Maranhão. Mundicarmo Maria Rocha Ferretti Mandrágora (São Bernardo do Campo), Marília-SP, v. 3, n. 3, p. 33-41, 1996 Revista de Ciências Sociais da UFMA, São Luis, v. 4, n. 1/2, p. 117-136, 1994. A MULHER NO TAMBOR DE MINA 1 Mundicarmo Maria Rocha Ferretti 2 1. INTRODUÇÃO A importância da mulher na religião afro-brasileira tem sido afirmada e demonstrada por muitos pesquisadores, mas há uma carência de estudos sobre a representação do feminino nas diversas manifestações da religião afro-brasileira: Candomblé, Umbanda, Batuque, Xangô, Tambor de Mina e outras. Neste trabalho pretendemos examinar a posição da mulher e das entidades espirituais femininas no Tambor de Mina do Maranhão e fazer uma análise de alguns rituais realizados em terreiros de São Luís, para entidades femininas, procurando ver como a mulher (ou o feminino) é representada naqueles rituais. 3 2. A MULHER NO TAMBOR DE MINA DO MARANHÃO No Tambor de Mina - manifestação da religião afro-brasileira típica do Maranhão e predominante no Norte do Brasil - a mulher é maioria, tanto como médium de incorporação quanto na chefia dos terreiros. Esta posição, apesar de maior nos terreiros antigos (que vêm do século passado) é também observada em terreiros mais novos, onde a Mina costuma coexistir com outros sistemas religiosos como: Cura ou Pajelança, Mesa Branca (kardecista), Umbanda e o Candomblé. Em São Luís, nos terreiros mais antigos, homem não costuma entrar em transe e, quando recebe uma entidade espiritual, não dança tambor. Por essa razão, nunca assume a chefia do terreiro, o que justifica a afirmação da existência de um matriarcado no Tambor de Mina. Embora tenha havido no Maranhão, no século passado e no início do nosso século, alguns pais-de-santo que prepararam mães de terreiros importantes, só as mulheres são lembradas como "pilares" do Tambor de Mina - é difícil alguém contar a história da Mina sem lembrar os nomes de: Andresa, da Casa das Minas, Dudu, da Casa de Nagô, Anastácia, do Terreiro da Turquia, Vó Severa, Nhá Alice, Maximiana e de tantas outras mães-de-santo. A partir dos anos cinqüenta, houve, em São Luís, uma proliferação de terreiros abertos por homens (geralmente já integrados no campo religioso afro-maranhense, como curador/ pajé), mas, mesmo nos terreiros abertos por eles, a mulher tem maioria e ocupa posições de destaque. Embora não seja ali a mãe-de-santo, é, geralmente, a guia ou mãe- pequena e a contra-guia (a segunda e terceira pessoa da casa). Na Casa Fanti-Ashanti (terreiro aberto em 1958 por Pai Euclides, já conhecido como curador, e que introduziu 1 Apresentado originalmente em Caxambu, no 18 o Encontro Anual da ANPOCS - GT: Religião e Sociedade, coordenado por Maria Helena Concone - 23-27/11/1994. 2 Dr. em Antropologia; Adjunto IV - Dep. de Psicologia UFMA/aposentada; professora Titular da UEMA - Dep. Ciências Sociais. 3 Entre os trabalhos publicados sobre religião afro-brasileira, que dão uma atenção especial à mulher, merecem destaque: AUGRAS (1983 e 1989), BIRMAN (1982), BOYER-ARAUJO (1993), COSTA LIMA (1977), LANDES (1947), SILVERSTEIN (1979), SEGATO (1989). Em São Luís, a questão foi também tratada em trabalhos ainda não publicados como os de: BARBOSA (1994), BRILMAN (1989), LEITE (1984), e outros.

Mf_a Mulher No Tambor de Mina

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Análise da posição e representação da mulher e das entidades espirituais femininas no Tambor de Mina do Maranhão.Mundicarmo Maria Rocha Ferretti

Citation preview

A MULHER NO TAMBOR DE MINA - 1994

A MULHER NO TAMBOR DE MINA - 1994

Anlise da posio e representao da mulher e das entidades espirituais femininas no Tambor de Mina do Maranho.

Mundicarmo Maria Rocha Ferretti

Mandrgora (So Bernardo do Campo), Marlia-SP, v. 3, n. 3, p. 33-41, 1996Revista de Cincias Sociais da UFMA, So Luis, v. 4, n. 1/2, p. 117-136, 1994.A MULHER NO TAMBOR DE MINA

Mundicarmo Maria Rocha Ferretti

1. INTRODUO

A importncia da mulher na religio afro-brasileira tem sido afirmada e demonstrada por muitos pesquisadores, mas h uma carncia de estudos sobre a representao do feminino nas diversas manifestaes da religio afro-brasileira: Candombl, Umbanda, Batuque, Xang, Tambor de Mina e outras. Neste trabalho pretendemos examinar a posio da mulher e das entidades espirituais femininas no Tambor de Mina do Maranho e fazer uma anlise de alguns rituais realizados em terreiros de So Lus, para entidades femininas, procurando ver como a mulher (ou o feminino) representada naqueles rituais.

2. A mulher no Tambor de Mina do Maranho

No Tambor de Mina - manifestao da religio afro-brasileira tpica do Maranho e predominante no Norte do Brasil - a mulher maioria, tanto como mdium de incorporao quanto na chefia dos terreiros. Esta posio, apesar de maior nos terreiros antigos (que vm do sculo passado) tambm observada em terreiros mais novos, onde a Mina costuma coexistir com outros sistemas religiosos como: Cura ou Pajelana, Mesa Branca (kardecista), Umbanda e o Candombl.

Em So Lus, nos terreiros mais antigos, homem no costuma entrar em transe e, quando recebe uma entidade espiritual, no dana tambor. Por essa razo, nunca assume a chefia do terreiro, o que justifica a afirmao da existncia de um matriarcado no Tambor de Mina. Embora tenha havido no Maranho, no sculo passado e no incio do nosso sculo, alguns pais-de-santo que prepararam mes de terreiros importantes, s as mulheres so lembradas como "pilares" do Tambor de Mina - difcil algum contar a histria da Mina sem lembrar os nomes de: Andresa, da Casa das Minas, Dudu, da Casa de Nag, Anastcia, do Terreiro da Turquia, V Severa, Nh Alice, Maximiana e de tantas outras mes-de-santo.

A partir dos anos cinqenta, houve, em So Lus, uma proliferao de terreiros abertos por homens (geralmente j integrados no campo religioso afro-maranhense, como curador/ paj), mas, mesmo nos terreiros abertos por eles, a mulher tem maioria e ocupa posies de destaque. Embora no seja ali a me-de-santo, , geralmente, a guia ou me-pequena e a contra-guia (a segunda e terceira pessoa da casa). Na Casa Fanti-Ashanti (terreiro aberto em 1958 por Pai Euclides, j conhecido como curador, e que introduziu ali, em 1980, o Candombl), todas as posies hierrquicas logo abaixo do pai-de-santo so ocupadas por mulheres e, quando realizamos ali nosso trabalho de campo (1984-1987), 90% dos participantes dos toques de Mina e 80% dos participantes do Candombl eram do sexo feminino (FERRETTI,M.R., 1993).

A posio das entidades espirituais femininas nos terreiros de Mina da capital maranhense parece, no entanto, inferior das masculinas, sejam elas vodum, orix, gentil (nobre associado a orix) ou caboclo. Alm delas serem numericamente inferiores e de, geralmente, permanecerem "em terra" por menos tempo que as masculinas, as entidades femininas no so recebidas em todos os rituais, e poucas so "donas" de terreiro ou da cabea dos filhos-de-santo. Na Mina, a maioria das entidades espirituais recebidas como "donas da cabea" ou guia-chefe (seu representante na linha de caboclo), pertence ao sexo masculino e, raramente, um terreiro tem como chefe espiritual uma entidade feminina. Embora o nome dos terreiros nem sempre reflita suas crenas e valores atuais, parece significativo que, num levantamento de terreiros maranhenses realizado por Maria do Rosrio e Manuel Santos (SANTOS e SANTOS NETO, 1989), enquanto 60% dos terreiros de Mina da capital eram dirigidos por mes-de-santo, menos de 20% dos que tm nome de santo ou de entidade espiritual tinham nomes femininos (Iemanj, Rainha Rosa, Chica Baiana, Maria Bogi, Cabocla Ita, Nossa Senhora da Guia, Santa Brbara).

Na Casa das Minas-Jeje (terreiro considerado o mais antigo do Maranho), embora o transe com vodum feminino tenha a mesma durao e ocorra nos mesmos rituais em que ocorre o das entidades masculinas, atualmente, s Ab est sendo recebida, o que significa que, atualmente, mais de 90% das vodunsis da casa entram em transe com vodum masculino (Dossu, Lepon, Averequete, Jotim, e outros). No passado, no entanto, eram tambm recebidas ali, pelas vodunsis-gonjai (com iniciao completa) as tobssis - entidades femininas infantis (meninas) que, embora no fossem "donas da cabea", eram recebidas, com orgulho, fora do "toque", nas festas e obrigaes grandes.

Na Casa de Nag (fundada por africanas, no sculo passado, como a Casa das Minas-Jeje, onde se recebem orixs, voduns, gentis e caboclos) embora no haja uma festa ou ritual s para entidades femininas, elas so incorporadas, principalmente, na festa de Santa Brbara e na Bancada (ritual realizado na quarta-feira de cinzas, onde h grande distribuio de doces e frutas, de que nos ocuparemos mais adiante, neste trabalho). Na Casa de Nag, embora as entidades femininas e os gentis participem dos toques, nunca ficam "em terra" at o encerramento dos rituais. Depois de algum tempo, costumam "dar passagem" a uma entidade masculina e cabocla, prtica tambm observada em outros terreiros.

Em diversos terreiros de So Lus, costuma ocorrer uma festa s para entidades femininas, freqentemente denominadas tobssas, realizada, geralmente, no aniversrio da "senhora" do pai ou me-de-santo, ou no dia de uma santa do catolicismo a ela associada: Santana (associada a V Miss ou Nan), Santa Brbara (a Maria Brbara Soeira, a Ians e outras), Nossa Senhora da Conceio (a Me Maria e a Iemanj), Santa Luzia (a linha de princesas da Cura/Pajelana), e outras. Nestes terreiros, as festas e os rituais para as tobssas so, geralmente, muito dispendiosos, pois envolvem luxo, delicadeza e sofisticao - "coisas finas", de classe alta, e distribuio de alimentos. Entre estes rituais, merecem destaque: a Bancada e o Tambor das tobssas, realizados em muitos terreiros de Mina da capital, onde o feminino e o infantil esto muito associados.

3. Bancada e Tambor das tobssas ("senhoras")

O termo Bancada designa, no Tambor de Mina, rituais realizados na Casa das Minas-Jeje, na Casa de Nag (terreiros de So Lus fundados por africanos) e em terreiros nelas inspirados, na quarta-feira de cinzas, onde h grande distribuio de frutas, doces, bebidas, pipocas e outros alimentos, a pessoas ligadas religio ou ao pessoal a ela devotado. Estes alimentos, antes de serem distribudos, permanecem por vrias horas no quarto de santo e sua preparao envolve a observncia de muitos preceitos. Na Mina-Jeje, a distribuio feita pelas filhas-de-santo em transe com voduns masculinos ou femininos e inclui, obrigatoriamente, pipoca, "azogri" - farinha de milho torrado misturada com acar, coco e feijo torrados (FERRETTI,S.F., 1985 e 1991). Na Casa de Nag, a Bancada realizada pelas filhas-de-santo incorporadas com entidade espiritual feminina (adulta ou menina, como a Princesa Mira e Diana) ou com entidade masculina (vodum, como Xapan, gentil, como Dom Joo, e caboclo, como Tabajara).

Em outros terreiros de So Lus, a Bancada costuma ser realizada apenas com entidades femininas, de preferncia com as nobres (rainhas e princesas) e, embora possa ocorrer na quarta-feira de cinzas, realiza-se mais freqentemente: 1) no primeiro dia do ano (quando muitos terreiros no Brasil festejam Iemanj); 2) no dia 31 de maio ou em outra data de festejo de Nossa Senhora no calendrio catlico, como 8 de dezembro (festa de N. Sra. da Conceio, associada por uns a Iemanj e por outros a Me Maria, e a Oxum); 3) em festa de santa do catolicismo (Brbara, Luzia, Rosa de Lima e outras). Nestes terreiros a Bancada realizada, preferentemente, no aniversrio da principal entidade feminina da casa (geralmente, a "senhora" do pai ou da me-de-santo), quando se rende tambm homenagem s "senhoras" das filhas-de-santo. 3.1. Bancada na casa de Santana (So Lus/MA - zona rural)

Na casa de Santana, a Bancada realizada no aniversrio de Rainha Madalena, no dia 31 de maio. Mas, no dia 12 de dezembro de 1993, realizou-se ali uma Bancada para a "senhora" de Dona Nenem - filha-de-santo de um terreiro j desaparecido (de Me Irinia), que est "encostada" ali desde 1969 Dona Nenem trabalha na Coliseu, empresa encarregada da limpeza urbana de So Lus, e zela pelo Terreiro da Turquia com Pai Euclides (da Casa Fanti-Ashanti) - que assumiu a chefia la casa aps o falecimento de sua fundadora. Embora Pai Euclides e Dona Nenem no sejam filhos da Turquia so ligados a ele por receberem encantados da famlia do Rei da Turquia - seu chefe espiritual.

Santana uma das muitas mes e pais-de-santo de So Lus que no se definem como Umbanda e que continuam resistindo ao fascnio do Candombl, embora no tenham vinculao com as centenrias casas das Minas e de Nag, e tenham iniciado sua carreira como "curador" (na linha de Cura/ Pajelana). Apesar de ter, h muito, se tornado "mineira", continua realizando festas e rituais de Cura/Pajelana. Como outros pais-de-santo de So Lus que comearam a trabalhar como curador, realiza tambm, em sua residncia, sesses de "mesa-branca" (presidida por pessoa a ela ligada) e, no stio, onde fica sediado seu terreiro, a tradicional festa do Esprito Santo. Alm de muito conhecida em So Lus como me-de-santo e "curadeira", muito procurada como bordadeira. Santana passa muitas horas do dia e da noite na mquina de costura bordando, em "Richelieu", as toalhas usadas na guma (barraco) por pessoas de sua casa e de muitos outros terreiros da capital e do interior do Maranho. Segundo informao de Santana (me-de-santo), a "senhora" de Dona Nenem, que nunca "arreara" na Mina, veio nela na Casa Fanti-Ashanti, quando assistia a um candombl. Como ela no gosta muito de Candombl, resolveu dar sua obrigao na Mina, no terreiro onde "encostada". Escolheu para madrinha Dona Celeste, da Casa das Minas-Jeje, de quem muito amiga e que se responsabilizou pelo bolo confeitado e pelas lembranas distribudas aos convidados (uma cestinha de flores). Para diferenar aquela Bancada da que realizada ali no ms de maio, na festa de Rainha Madalena, com todas as danantes usando saia de mesma cor, as participantes usaram saias diferentes.

Encontravam-se no terreiro, alm do pessoal da casa, seus familiares e amigos, muitos vizinhos (moradores do bairro - alguns como convidados e outros atrados pelo movimento da casa). Havia tambm na assistncia pessoas de vrios terreiros: da Casa das Minas, do terreiro de Me Elzita (membro do INTECAB, como Dona Nenem, muito amiga de Dona Celeste - sua presidente), terreiro de Adelmo (pai-de-santo muito ligado a Santana, que tambm sentou naquela Bancada para "arreada" de sua "senhora"). Naquela mesma data (vspera da festa de Santa Luzia) realizou-se, na Casa Fanti-Ashanti, o Baio - baile de sanfona, com pandeiro e instrumentos de corda, participado por entidades femininas da linha Cura"/ Pajelana - princesas e caboclas, descrito por ns em outro trabalho (FERRETTI, M.R. 1991 e 1993:359).

A "senhora" de Dona Nenem Rainha Dina, tambm conhecida na Mina por Fina Jia, esposa de Dom Joo. Foi ela quem determinou tudo na Bancada, com grande antecedncia. Santana, como era de se esperar, sentou com Rainha Madalena. Didi (danante do terreiro da Turquia, tambm encostada naquela casa), com Menina do Maracuj, Sulica com Flor de Lys, Concita (guia da casa) com Princesa Flora, Adelmo (pai-de-santo visitante) com Moa Laura, Alice com Borboletinha, uma danante da casa, com Linda, e duas outras com encantadas cujo nome no chegou ao nosso conhecimento.

No sendo filha da casa, observamos apenas a parte pblica do ritual, realizada no barraco. tarde, quando chegamos, os tambores (abats e mata) estavam no salo, e o altar j estava enfeitado, podendo ser visto entre as santos as imagens de: Santa Luzia, So Joo e So Sebastio. Encontramos a casa cheia de crianas, cada uma com uma sacola de plstico na mo, prontas para receber os alimentos que lhes seriam ofertados na Bancada. A mesa comeou a ser armada depois da nossa chegada. Primeiro o cho foi forrado com esteiras cobertas por toalhas brancas e bordadas. Depois, foram trazidos para o salo, em tabuleiros, bacias, travessas, tigelas e pratos: frutas, batata doce, amendoim, pipoca, bolos, cocada, mariola, balas, chocolates, biscoitos e outros alimentos. Em seguida, foram trazidas para o salo, pelas auxiliares, as garrafas de refrigerante, licor, refresco e de outras bebidas no alcolicas. Depois de armada, a mesa foi enfeitada com vasos de flores e, em torno dela, foram colocadas cadeiras forradas de renda (para as encantadas) e banquinhos (para as mulheres que iam ajud-las na distribuio dos alimentos) As filhas-de-santo receberam as encantadas antes de virem para o barraco, longe dos olhos da assistncia. Depois de incorporadas, vieram para uma sala que fica antes dele, onde permaneceram em p ou sentadas, por algum tempo, quase em silncio. Em seguida, foram para o salo, onde sentaram em cadeiras que lembravam os tronos que so armados nos terreiros de So Lus, para o Imprio, na festa do Esprito Santo. Mais da metade destas cadeiras estavam sendo ocupadas ou guardadas por bonecas (geralmente grandes e louras). Observamos que, quando as tobssas sentaram no "trono", algumas (como Rainha Madalena) colocaram a boneca em p, ao lado dele e outras ficaram com ela no colo, mas nenhuma brincou com ela. Esta relao, que idntica da Princesa Doralice (Troirinha) e sua boneca, na Cura/ Pajelana da casa de Me Elzita, contrasta com a dos ers com sua boneca, no Candombl da Casa Fanti-Ashanti.

As tobssas estavam ricamente vestidas e vrias traziam uma manta de miangas coloridas, no estilo das que eram usadas na Casa das Minas-Jeje pelas tobssis (entidades femininas infantis - meninas), alm do capote de seda ou de renda colocado sobre a blusa em um dos ombros (no estilo das usadas na Casa Fanti-Ashanti pelas princesas no Baio) e que poderia ser um substituto do "pano da Costa", usado no Maranho na Casa das Minas-Jeje, na festa de pagamento. Para marcar a diferena entre aquela Bancada e a realizada, em maio, para Rainha Madalena, as saias das tobssas eram de cores diferentes e duas delas tinham saia estampada (Fina Jia, de Dona Nenem, e Flor de Lys, de Sulica). Adelmo usou cala e tnica de cetim branco e, sobre esta, manta de miangas verdes.

No salo, as tobssas sentaram com suas serventes (moas ou senhoras), prximo aos alimentos que iam distribuir. Na mesa, em frente a cada uma delas, havia um bolo confeitado que, apesar de nunca ser dividido no salo, sempre colocado na Bancada.

A distribuio de alimentos comeou pelas crianas, que iam passando, em fila, com suas sacolas, por cada tobssa. Ao contrrio do que ocorre nas festas de Cosme e Damio e do Esprito Santo, a distribuio realizada na Bancada nunca eqitativa (umas pessoas sempre recebem muito mais do que outras), o que considerado normal, uma vez que decorre de preferncias das encantadas e no das filhas-de-santo. Cada pessoa deveria entrar na fila s uma vez, mas algumas crianas e adultos entraram mais de uma vez, o que foi objeto de falatrio, mas no foi impedido por ningum. possvel que alguma delas estivesse substituindo pessoas que no se encontravam ali ou que no podiam ir para a fila.

Como estvamos fotografando, vez por outra uma encantada ou um parente das filhas-de-santo que participavam do ritual, nos solicitava uma foto. Terminada a distribuio e retirados da "mesa" os bolos confeitados, as encantadas deixaram o salo e sentaram, com suas bonecas, na sala onde sentaram antes, aguardando o incio do "toque". Enquanto isso, suas auxiliares dividiam o bolo confeitado e as lembranas da festa entre pessoas escolhidas pelas encantadas. Observando que trs delas no tinham bonecas (a de Adelmo e a de duas danantes) e indagando sobre o motivo desta diferena, fomos informados por uma pessoa da casa que "s as princesas danavam com bonecas". Em outra ocasio, Adelmo nos esclareceu que, em sua casa, as tobssas no levavam boneca para o barraco porque ele "achava feio gente grande com boneca".

Logo que a mesa foi desfeita, uma equipe providenciou a limpeza do local, para que o "toque" pudesse ser iniciado, pois, apesar das "senhoras" gostarem de danar, nunca ficam incorporadas at "altas horas" da noite.

3.2. Tambor das tobssas na casa de Santana (12/12/1993)

No dia 12/12/1993, aps a Bancada da "senhora" de Dona Nenem, descrita anteriormente, foi realizado um toque de tambor na casa de Santana. O ritual no comeou com "Ibarab", canto de abertura da Mina-nag para Legba ou Exu, e sim com uma saudao ao terreiro, prtica muito adotada em casas abertas por curador:

"Salvar, salvar, terreiro novo de meu pai"

Como de costume, danou-se as primeiras msicas indo e vindo em direo aos tambores. Depois, o grupo fez uma roda, e, em seguida ficou alternando esses dois movimentos bsicos de acordo com a "doutrina" que ia sendo "puxada". Aps serem cantadas as "doutrinas" obrigatrias, cada encantada "puxou" pelo menos uma "doutrina" falando de si ou reverenciando os donos da casa ou entidade espiritual de sua famlia. A dana delas era lenta, desanimada e sem rodadas - muito diferente da apresentada pelas encantadas do Baio que estava sendo realizado, naquele momento, na Casa Fanti-Ashanti (geralmente, caboclas e mais ligadas linha de Cura/Pajelana). As tobssas quase no olhavam para a assistncia. Apesar de muitas cantarem com "voz de criana mimada", nenhuma veio para o barraco com sua boneca. Durante o toque, Rainha Dina tinha as mos sempre cobertas pelo capote ou enroladas na "pana" - leno grande de cetim, usado principalmente em terreiros de curadores e no Tambor da Mata (linha de Cod - estilo do interior do Maranho). Este procedimento foi tambm por ns observado em 1993, no terreiro de Pai Jorge Itaci, em "toques" para tobssas. Depois de danarem por algum tempo, as tobssas "deram passagem" aos caboclos, que ficaram incorporados nas filhas-de-santo que as receberam at o encerramento do ritual ou at se esvaziar a ltima garrafa de bebida comprada para a festa (como acontece com Seu Beberro, "caboclo farrista" de Santana, e com muitos encantados da Turquia).

Entidades espirituais femininas no Tambor de Mina do Maranho: tobssis e senhoras

A importncia das entidades espirituais femininas no Tambor de Mina uma questo complexa. Sendo em nmero menor que as masculinas, recebidas com menor frequncia e permanecendo "em terra" por menos tempo, parecem ter uma importncia menor. No entanto, so recebidas com orgulho pelos "mineiros" e para elas so realizadas obrigaes dispendiosas, festas e rituais especiais, que atraem para o terreiro pessoas de todas as idades e muitas crianas. E, na Mina-Jeje, existe um culto especial para entidades femininas infantis, as tobssis (meninas), que, apesar de ter chamado a ateno de muitos pesquisadores, est longe de ser compreendido. Mas, se as entidades femininas tm uma presena to grande na Mina por que so to ausentes no barraco (espao ritual onde so realizados os toques de Mina) e por que raramente so "donas da cabea" ou dos terreiros?!... Observaes realizadas em So Lus tem nos levado concluso que as entidades espirituais femininas raramente so donas de terreiro ou "da cabea" dos filhos-de-santo, so minoritrias no barraco, e permanecem "em terra" por menos tempo do que as masculinas, no por serem menos importantes, mas, porque so femininas.

Indagando certa vez a Pai Euclides, da Casa Fanti-Ashanti, por que o Baio (ritual da linha de Cura/Pajelana para entidades femininas) termina mais cedo do que os toques de Mina e porque as encantadas recebidas nele no vm com maior frequncia, obtivemos a seguinte explicao: "no Baio vm moas de categoria alta, moa volta cedo para casa e no anda saindo todo dia"...

Apesar da mulher ter na Mina uma posio muito elevada, a anlise de rituais realizados para entidades espirituais femininas recebidas como "senhoras" mostra que a representao da mulher no Tambor de Mina parece no se distanciar muito do esteretipo machista de mulher, expresso claramente nas mensagens do Dia das Mes (segundo domingo de maio, ms de Maria e de muitas festas para tobssas) que so veiculadas pelos meios de massa. Tal como as mes brasileiras, as entidades espirituais femininas recebidas como "senhoras" so representadas em So Lus como "santas" (recatadas), rainhas (reservadas), maternais e domsticas, no que parecem imitar a "Virgem Maria", me de Jesus.

Na sociedade brasileira, embora a mulher seja quase sempre submissa ao homem (que assume a maioria das posies de comando), , freqentemente, apresentada como rainha (do lar), tendo a casa como o seu verdadeiro espao de atuao - da a denominao "rainha do lar". Apesar desta ideologia no encontrar grande fundamento na realidade dos terreiros de Mina - chefiados principalmente por mulheres - parece influenciar a concepo de entidades espirituais femininas, fazendo com que elas se apresentem ali como subordinadas s masculinas e permaneam "em terra" por menos tempo que aquelas.

Na Mina a figura das entidades femininas parece tambm associada fertilidade, como a das Iam Oxorong africanas, da porque, fora das centenrias casas das Minas-Jeje e de Nag, o ritual da Bancada (onde h abundncia de alimentos e grande nmero de crianas) sempre realizado como uma obrigao de tobssa (senhora). A distribuio no eqitativa de alimentos na Bancada, em contraste com a realizada nos terreiros nas festas de Cosme e Damio e do Divino Esprito Santo (do catolicismo popular), aponta para as matrizes no crists da representao feminina no Tambor de Mina. Mas, se tem poder sobre a fertilidade, tal como as Iam Oxorong (AUGRS, 1989), no so temidas ou representadas como terrveis, embora, quando distribuem alimentos, possam dar muito a uns e quase nada a outros.

A anlise da Bancada e do Tambor de Tobssa realizados fora das Casas das Minas-Jeje e de Nag, chama ateno ainda para outros aspectos da representao da mulher no Tambor de Mina. Naqueles rituais as "senhoras" aparecem, freqentemente, com bonecas e, no raramente, exibem um comportamento infantil. Sem querer negar a existncia desse trao nos esteretipos de mulher da sociedade brasileira, gostaramos de chamar ateno para a associao havida na Mina entre as tobssis da Casa das Minas-Jeje (meninas) e as entidades recebidas como "senhora" em outros terreiros. No por acaso que estas so, genericamente, denominadas tobssas e que usam, freqentemente, a tradicional manta de miangas das tobssis da Casa das Minas...

O esteretipo de mulher como frgil, dominada e imatura (chorona e manhosa como uma criana mimada), encontrado em muitos domnios da cultura brasileira, deve ter contribudo para que a fuso senhora-menina fosse realizada na Mina quase sem crtica. Fora da reao de Pai Adelmo: "l em casa tobssa no sai com boneca porque acho feio gente grande com boneca", no encontramos ningum questionando os traos infantis apresentados pelas tobssas (senhoras) nos rituais observados. Mas o comportamento infantil das entidades femininas recebidas na Mina como "senhora" torna-se mais compreensvel quando se considera a influncia exercida pela Mina-Jeje no Tambor de Mina do Maranho e a impresso deixada pelas tobssis da Casa das Minas-Jeje no meio religioso afro-maranhense.

A boneca, que aparece na Bancada e s vezes tambm no Tambor de tobssa, embora possa ser considerada um brinquedo de menina, parece ser ali um smbolo de feminilidade (da porque as tobssas no brincam com ela). Nos pejis cubanos ela tambm encontrada com saias longas e rodadas cobrindo as jarras de orixs femininos (negras, nas de Iemanj e louras ou mulatas, nas de Oxum). Nos terreiros de So Lus, a boneca aparece tambm como smbolo de nobreza, tanto na Mina, como na Cura/Pajelana, o que nos foi explicado por uma senhora no terreiro de Santana: "princesa dana com boneca"...

Como j foi mencionado, na Bancada as tobssas recebem um tratamento principesco e so apresentadas nos toques realizados para elas como nobres - com vestimentas caras e especiais, comportamento reservado, sem se misturar com a assistncia - bem diferentes das caboclas, que gostam de cumprimentar a assistncia, de dar rodadas no salo e de permanecer "em terra" aps os rituais (as vezes para beber e animar a festa com suas brincadeiras). Na Mina-Jeje as tobssis so comandadas por Noch Na (a grande me) - vodum da famlia real que no incorpora - e so tratadas ali como princesas.

Embora haja pontos em comum entre as tobssas (senhoras) e as tobssis (meninas), preciso no esquecer que na Casa das Minas-Jeje as tobssis no se confundem com voduns femininos, nem mesmo quando esses so toqenos (adolescentes) ou desempenham funes anlogas s deles. Nunca so recebidas como "senhoras" (donas da cabea) como so, por exemplo, Ab e Noch Dec (voduns femininos adulto e toqeno), da porque no participam dos toques. So meninas, "sinhazinhas", recebidas apenas nas festas e obrigaes maiores, tanto pelas vodunsis-gonjai que tinham vodum masculino ("senhor") como pelas que tinham vodum feminino ("senhora"). E so consideradas mais puras e mais prximas s pessoas do que os voduns (comem, dormem, tomam banho, tm medo de mascarado). J as tobssas recebidas em outros terreiros vm sempre como "senhoras" (donas da cabea ou ajunt). Na Mina-Jeje os voduns femininos so recebidos em todos os rituais e permanecem "em terra" por tanto tempo quanto os voduns masculinos, mesmo quando pertencem famlia real e so toqenos (adolescentes).

As tobssis Mina-Jeje parece que tambm no se confundem com as meninas recebidas hoje na Casa de Nag. Alm de se afirmar na Casa das Minas-Jeje que tobssis (meninas) s existem na Mina-Jeje, antes da Bancada de 1994, ouvimos de Dona Lcia (atual chefe da casa) a seguinte explicao: "ns aqui no temos tobssi, tobssi l em cima, em jeje, ns temos menina"... E ainda, observaes do comportamento das entidades femininas, em rituais atualmente realizados na Casa de Nag, tm demonstrado que elas se aproximam mais das "tobssas" de outros terreiros do que das "tobssis" da Casa das Minas. Na Casa de Nag as entidades femininas (adultas e meninas) participam de rituais com as entidades masculinas (Bancada, toque) e so, geralmente, recebidas como "senhora" (donas da cabea ou ajunt).

Existe ainda uma caracterstica apresentada pelas "senhoras" no Tambor de Tobssa que no foi aqui analisada: as tobssas danam, geralmente, com as mos encobertas. Como na Bancada as "senhoras" so tratadas como a nobreza na Festa do Divino Esprito Santo (sentam em cadeiras cobertas por rendas, tm roupas luxuosas, etc) e nesta festa a nobreza usa luvas, cobrir as mos pode ser mais um smbolo de nobreza. Mas, as tobssas com suas mos encobertas, lembram tambm imagens da Virgem Maria com seu manto nas mos. A identificao das "senhoras" da Mina com a Nossa Senhora do catolicismo, religio tambm professada pelo pessoal dos terreiros de So Lus, que j foi lembrada, pode tambm explicar o comportamento recatado e reservado daquelas encantadas, em contraste com o das caboclas (menos identificadas com a Me de Jesus e com as santas catlicas do que as "senhoras").

5. CONCLUSO

A representao da mulher no Tambor de Mina influenciada pela ideologia dominante (machismo, catolicismo) mas no pode ser reduzida a ela. Muitos traos das entidades espirituais do Tambor de Mina s podem ser bem interpretados levando-se em conta sua origem africana e peculiaridades do campo religioso afro-maranhense (influncias das Casas das Minas e de Nag, etc.). Assim, reproduz, em parte, a ideologia dominante na sociedade brasileira, mas apresenta aspectos que s podem ser bem interpretados conhecendo-se o contexto especfico em que foi produzida.

GRAMSCI (1978), em Literatura e Vida Nacional, chama ateno para a heterogeneidade do momento histrico e para a existncia na mesma poca e na mesma sociedade de obras que refletem as concepes dominantes e outras a realidade vivida por grupos no hegemnicos. No caso brasileiro, o negro, alm de constituir um desses segmentos no hegemnicos, tem tradies culturais prprias e estas tradies so encontradas de forma bastante viva nos terreiros de religio afro-brasileira. Por conseguinte, no se pode estranhar que representaes da mulher no Tambor de Mina de So Lus reproduzam a ideologia dominante mas reflitam tambm outras formas de relaes sociais, outros valores e vises de mundo.

Ao mesmo tempo que o culto s tobssis e tobssas tem a ver com o matriarcado da Mina, revela o machismo dominante na sociedade brasileira e to forte no Maranho. Assim, na Mina, as entidades espirituais femininas so objeto de um culto especial, dispendioso, mas aquelas entidades so recebidas por um nmero menor de mdiuns, vm poucas vezes por ano e, fora da Mina-Jeje, permanecem "em terra" por pouco tempo. Isto significa que, em ltima anlise, elas deixam o campo livre para a atuao das entidades masculinas. Embora no se possa dizer que na Casa das Minas-Jeje as tobssis esto acima dos voduns toqenos (adolescentes) e que as tobssas so superiores s entidades espirituais masculinas, recebidas como senhores em outros terreiros, h mais exigncias para que elas sejam recebidas. Elas, geralmente, s vm em quem tem grau inicitico elevado e nas festas e obrigaes maiores ou mais "finas". Contudo, esto, geralmente, abaixo das entidades masculinas - que so maioritrias como chefes espirituais de terreiro e como "donos da cabea" dos mineiros.

A importncia da mulher no Tambor de Mina como me de terreiro e filha-de-santo associada grande impresso causada pelas tobssis da Casa das Minas-Jeje podem ser apontadas entre os fatores responsveis pelo orgulho dos "mineiros" pelas suas "senhoras", pela existncia nos terreiros de So Lus de rituais especiais para elas e pelo esmero com que esses rituais so realizados. Mas a representao da mulher no Tambor de Mina, embora apresente muitos traos em comum, varia de casa para casa. de se esperar que apresente diferenas significativas quando se compara casas dirigidas por mulher com casas dirigidas por homens, terreiros de Mina apegados aos modelos das Casas das Minas e de Nag com terreiros de Mina de caboclo, terreiros que se definem como Umbanda e terreiros de Mina que introduziram o Candombl.

Nas representaes aqui analisadas, as entidades espirituais femininas, recebidas como "senhoras" na Mina maranhense, aproximam-se da Iemanj e distanciam-se da Pomba Gira da Umbanda (AUGRS, 1989) e correspondem mulher onrica (que se ope "piranha"), encontrada por BERLINK (1976) em anlise de letras de samba: frgil, graciosa, desligada, "diferente da mulher que se tem". Com efeito, enquanto na Mina-Jeje as tobssis so consideradas mais puras do que os voduns, as mulheres so vistas como mais sujeitas a impurezas do que os homens, pois, alm do contato com a morte e da atividade sexual (que torna o "corpo sujo"), so contaminadas pelo sangue menstrual e pelo parto.

Na representao de entidades espirituais caboclas ou no recebidas como "senhora" ("dona da cabea" ou ajunt) estes modelos se apresentam em graus diferentes e combinados, permitindo a distino de um nmero maior de modelos femininos.

BIBLIOGRAFIA

AUGRS, Monique.

De Yi Mi a Pomba Gira: transformaes e smbolos da libido. In: MOURA, Carlos Eugnio Marcondes de. Meu sinal est em teu corpo. So Paulo, EDICON/EDUSP, 1989.

Os gmeos e a morte: notas sobre os mitos dos Ibeji e dos abiku na cultura afro-brasileira. In: MOURA, Carlos Eugnio M. de. As senhoras do pssaro da noite: escritos sobre a religio dos Orixs V. So Paulo: AM/EDUSP, 1994.

BARBOSA, Maria Venina C. (Venina d'Ogum).

A mulher negra e a religio afro-brasileiro. Texto elaborado para reunio do INTECAB/MA, 1994

BASTIDE, Roger

As religies africanas no Brasil: contribuies a uma Sociologia das interpretaes de civilizaes. So Paulo: Pioneira/EDUSP, 1971.

As Amricas negras: as civilizaes africanas no Novo Mundo. So Paulo: DIFEL, 1974.

O Candombl da Bahia: rito nag. 2ed. So Paulo: Ed. Nacional; Braslia: INL, 1978.

BERLINK, Manoel Tosta.

Sossega leo: algumas consideraes sobre o samba com forma de cultura popular. Contexto, n.1, nov.1976, p.101-114.

BIRMAN, Patrcia.

Fazer estilo criando gneros: estudo sobre a construo religiosa da possesso e da diferena de gneros em terreiros da Baixada Fluminense. Tese de doutorado em Antropologia. Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1988.

BRILMAN, Sonja.

Minha religio, uma questo de f, irm!: uma reflexo teolgica na prtica religiosa das negras da tradio religiosa afro-brasileira dos tambores de Mina. Amisterdam: Universidade de Amisterdam, 1989 (Adaptao de captulo de monografia de mestrado - 21p).

BOYER-ARAUJO, Veronique.

Femmes et cultes de possession au Bresil: les compagnons invisibles. Paris, L'Harmattan, 1993.

COSTA EDUARDO, Octvio da.

The negro in Northern Brazil, a study in acculturation. New York: J.J.Augustin Publisher, 1948.

COSTA LIMA, Vivaldo da.

A famlia-de-santo nos Candombls jeje-nags da Bahia: um estudo de relaes intra-grupais. Dissertao de Mestrado. Salvador: Universidade Federal da Bahia, 1977.

FERRETTI, Mundicarmo Maria R.

Tambor de Mina, Cura e Baio na Casa Fanti-Ashanti/MA, So Lus, SECMA, 1991 (Disco e folheto).

Rei da Turquia o Ferrabrs de Alexandria?. In: MOURA, Carlos Eugnio Marcondes de. Meu sinal est em teu corpo. So Paulo, EDICON/EDUSP, 1989.

Desceu na guma: o caboclo do Tambor de Mina no processo de mudana de um terreiro de So Lus - a Casa Fanti-Ashanti. So Lus: SIOGE, 1993.

FERRETTI, Srgio F.

Querebentan de Zomadunu: Etnologia da Casa das Minas. So Lus: EDUFMA, 1985.

Voduns da Casa das Minas. In: MOURA, Carlos Eugnio M. de. Meu sinal est no teu corpo. So Paulo: EDICON/EDUSP, 1989.

Repensando o sincretismo: estudo sobre a Casa das Minas. Tese de Doutorado, USP/FFLCH, 1991.

GRAMSCI, Antnio.

Literatura e vida nacional. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

LANDES, Ruth.

A cidade das mulheres. Rio de Janeiro: Civilizaes Brasileiras, 1967. Edio original em ingls, 1947.

LEITE, Slvia Cristina Costa.

A mulher negra no Maranho. Monografia de Especializao em Sociologia, UFMA, 1984.

PEREIRA, Manoel Nunes.

A Casa das Minas: contribuio ao estudo do culto dos voduns, do panteo Daomeano, no Estado do Maranho - Brasil. 2.ed., Petrpolis: Vozes, 1979.

SANTOS, Maria do Rosrio C. e SANTOS NETO, Manoel dos.

Boboromina: terreiros de So Lus, uma interpretao scio-cultural. So Lus: SECMA/SIOGE, 1989.

SEGATO, Rita Laura.

Inventando a natureza: famlia, sexo e -gnero no Xang do Recife. In: Moura, Carlos Eugnio M de. Meu sinal est no teu corpo. So Paulo: EDICON/EDUSP, 1989.

SILVERSTEIN, Leni M.

Me de todo mundo: sobrevivncias nas comunidades de Candombl da Bahia. Religio e Sociedade, n.4, out. 1979, p.143-169.

VERGER, Pierre F.

Notes sur le cult de Orisa et Vodun Bahia, la baie de tous les saints, ou Brsil, et l'ancienne Cte des Esclaves en Afrique. Memoire 51 de l'Institut Franais de l'frique Noire. Dakar, 1957.

Publicado em:

Revista de Cincias Sociais da UFMA, v.4, n.1/2, jan./dez.1994, p.116-136.

Mandrgora: gnero, cultura e religio, Ano 3, n3 - 1996, p.33-41

Apresentado originalmente em Caxambu, no 18o Encontro Anual da ANPOCS - GT: Religio e Sociedade, coordenado por Maria Helena Concone - 23-27/11/1994.

Dr. em Antropologia; Adjunto IV - Dep. de Psicologia UFMA/aposentada; professora Titular da UEMA - Dep. Cincias Sociais.

Entre os trabalhos publicados sobre religio afro-brasileira, que do uma ateno especial mulher, merecem destaque: AUGRAS (1983 e 1989), BIRMAN (1982), BOYER-ARAUJO (1993), COSTA LIMA (1977), LANDES (1947), SILVERSTEIN (1979), SEGATO (1989). Em So Lus, a questo foi tambm tratada em trabalhos ainda no publicados como os de: BARBOSA (1994), BRILMAN (1989), LEITE (1984), e outros.

Apesar de COSTA EDUARDO (1948) ter denominado as tobssis da Casa das Minas-Jeje de tobosa, as vodunsis daquele terreiro denominam tobssis as entidades femininas infantis recebidas, no passado, pelas gonja e que, segundo elas no vm em outros terreiros. Atualmente o termo tobssa usado apenas fora da Casa das Minas-Jeje e designa o conjunto de entidades femininas recebidas como "senhora" (dona da cabea ou segunda entidade espiritual) pelas filhas-de-santo. Por esta razo, quando falamos aqui em tobssi estamos nos referindo s meninas da Casa das Minas, e quando falamos em tobssa estamos nos referindo s "senhoras" recebidas em outros terreiros de Mina.

No Tambor de Mina, o termo "encostado" designa as pessoas de um terreiro que no foram iniciados ali (que o pai ou a me-de-santo no "colocou a mo em sua cabea").

Embora a Bancada seja um ritual da Mina, tambm realizado, em So Lus, em terreiros que se definem como Umbanda, e para entidades da linha de Cura/Pajelana. No sabemos quando ela comeou a ser realizada no terreiro de Santana. Em 1985, quando ela bordou uma toalha para uma exposio realizada no Museu de Cultura Popular, por ocasio do colquio internacional da UNESCO: Sobrevivncias da religio africana na Amrica e no Caribe, ela j ocorria ali com grande pompa.

Na Bancada realizada em maio daquele ano, na festa de Rainha Madalena, havia tanta comida que foi difcil conseguir espao na mesa para tudo o que fora trazido.

Na Festa do Divino os bolos confeitados e as lembranas so distribudos no dia seguinte, entre os que contriburam mais para a sua realizao, as pessoas mais ligadas ao festeiro e casa onde foi realizada. Na Bancada da Casa das Minas (Arrambam) a distribuio dos alimentos feita pelas vodunsis incorporadas com vodum, mesmo quando elas contaram com a colaborao de "assissis" (pessoas que tem ligao com um vodum mas no entram em transe com ele) na sua aquisio e preparao. Na Casa de Nag, cada entidade espiritual que senta na Bancada se faz acompanhar de uma auxiliar, prtica tambm adotada em outros terreiros de So Lus.

BASTIDE (1978; 1974; 1971) levanta vrias hipteses sobre as tobssis. Para ele elas seriam equivalentes a Ibjis ou a ers do Candombl; ancestrais da famlia real cultuados, que levam as vodunsis a um estado de semitranse; e, citando VERGER (1957), questiona se no seriam um estgio inicial de incorporao do vodum. Na pressuposio de que todos os voduns da Casa das Minas so masculinos (no que se equivocou) sugere que as tobssis so femininas porque os voduns so masculinos. Alm da necessidade de continuao da pesquisa na Casa das Minas-Jeje, necessrio um estudo comparativo com o Candombl Jeje-Mahi da Bahia e com outras manifestaes religiosas originrias do antigo reino do Dahom (Benim) como: a Regra Arar de Cuba, o vodum do Haiti e com as religies tradicionais do Benim.

A extenso s "senhoras" de caractersticas das tobssis Mina-Jeje pode explicar o comportamento infantil de entidades espirituais femininas em outros terreiros, tanto na Bancada como no Tambor de Tobssa como: fala "tepe-tepe" (observada em Rainha Madalena, no terreiro de Santana), expresso fisionmica dengosa ou infantil (observada em Iemananja, no terreiro de Jorge), dana com pulinhos (como observamos no terreiro de Elzita, na festa das moas, e em Dona Dro, recebida por Lucimar, da Casa Fanti-Ashanti, no terreiro da Turquia.

Como as tobssis s eram recebidas por vodunsis-gonjai e a Casa das Minas deixou de fazer iniciao completa, elas desapareceram em meados dos anos sessenta (segundo clculos de Srgio Ferretti).

Para Srgio FERRETTI (1989:186) o culto a Na pode ser comparado ao das Iam Oxorong da Nigria, Benim e outras regies da frica - mes ancestrais respeitadas e temidas, que no incorporam e que tm o poder de se transformar em pssaro.

preciso lembrar que a Casa de Nag, como a Casa das Minas, deixou de fazer iniciaes completas por volta de 1915 e que, segundo informao de Me Dud (falecida em 1989 com mais de cem anos) a Srgio FERRETTI (1985), a mina-nag tinha tobssis como as da Casa das Minas-Jeje.