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  • UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJA CENTRO DE CINCIAS DA SADE CURSO DE PSICOLOGIA

    Representaes Sociais da Sndrome da Fibromialgia em mulheres

    portadoras desta sndrome e em seus familiares

    MICHELLE ARAIS SPIAZZI

    Itaja (SC), 2009

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    MICHELLE ARAIS SPIAZZI

    Representaes Sociais da Sndrome da Fibromialgia em mulheres

    portadoras desta sndrome e em seus familiares

    Monografia apresentada como requisito parcial para obteno do titulo de Bacharel em Psicologia da Universidade do Vale do Itaja

    Orientador: Prof. Giovana Delvan Stuhler.

    Itaja (SC), 2009

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    Dedico este trabalho s pessoas que vivem com fibromialgia e aos seus familiares.

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    AGRADECIMENTOS

    Agradeo a Deus pelo dom da vida e pela companhia sempre presente em todos os momentos.

    minha orientadora, professora Giovana Delvan Stuhler, pela pacincia, compreenso e incentivo em toda essa caminhada at a concluso da monografia!

    professora Marcia A. M. Oliveira por aceitar participar da banca examinadora e colaborar na melhoria deste trabalho.

    Um duplo agradecimento professora Ana Lgia Oliveira, responsvel pelo atendimento das mulheres com fibromialgia no curso de fisioterapia, por participar da banca examinadora e por apoiar a realizao desta pesquisa.

    s mulheres com fibromialgia e aos seus familiares, pela disposio em participar deste estudo, pela confiana depositada e pelo carinho com que me receberam em suas residncias.

    minha amiga Mrcia G. G. Guidine (in memoriam) pelo exemplo de coragem e de fora.

    Ao meu marido, pelo seu amor e compreenso.

    minha familia, por sempre acreditar em mim.

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    SUMRIO

    RESUMO .................................................................................................................. 05

    1 INTRODUO ...................................................................................................... 06 2 EMBASAMENTO TERICO ................................................................................. 08 2.1 Dor e dor crnica ................................................................................................ 08 2.2 Fibromialgia ....................................................................................................... 09 2.2.1 Diagnstico ...................................................................................................... 12 2.2.2 Tratamento ...................................................................................................... 12 2.3 Famlia e doenas crnicas ................................................................................ 14 2.4 Teoria das Representaes Sociais ................................................................... 15 3 ASPECTOS METODOLGICOS ......................................................................... 19 3.1 Sujeitos participantes da pesquisa ..................................................................... 19 3.2 Instrumento ......................................................................................................... 20 3.3 Procedimento de coleta de dados ...................................................................... 21 3.4 Anlise dos dados .............................................................................................. 22 4 APRESENTAO DOS RESULTADOS .............................................................. 25 4.1 Participantes (mulheres com fibromialgia) ......................................................... 25 4.2 Familiares ........................................................................................................... 41 5 DISCUSSO DOS RESULTADOS ....................................................................... 55 6 CONSIDERAES FINAIS .................................................................................. 70 7 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ..................................................................... 74 8 APNDICES .......................................................................................................... 79

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    REPRESENTAES SOCIAIS DA SNDROME DA FIBROMIALGIA EM MULHERES PORTADORAS DESTA SNDROME E EM SEUS FAMILIARES

    Orientador: Giovana Delvan Stuhler Defesa: Novembro de 2009

    Resumo:

    A fibromialgia uma sndrome dolorosa crnica, que em geral atinge mulheres entre 35 e 60 anos e traz grande prejuzo a qualidade de vida do individuo. Trata-se de uma sndrome multifatorial e complexa na sua manifestao, diagnstico e tratamento. Alm do sofrimento fsico, a fibromialgia acarreta perdas em nvel de relacionamentos pessoais e de trabalho. A famlia acompanha de perto esse processo e pode contribuir para um melhor ou pior enfrentamento da sndrome. As representaes sociais influenciam diretamente as prticas dos grupos no cotidiano, inclusive as atitudes em relao ao processo sade-doena. Desta forma, esta pesquisa objetivou conhecer as representaes sociais da sndrome da fibromialgia em mulheres portadoras desta sndrome e em seus familiares. Participaram do estudo cinco mulheres com fibromialgia, as quais eram atendidas pelo Programa de Assistncia Interdisciplinar a Mulheres com Sndrome da Fibromialgia da UNIVALI, e cinco familiares destas pacientes. Para coleta de dados foram realizadas entrevistas individuais, utilizando dois roteiros semi-estruturados, um para a participante e outro para o seu familiar. Aps a transcrio, o material textual foi submetido anlise categorial temtica, emergindo seis categorias: Desconhecimento: Eu no sei nada..., Definio e Possveis Causas: O que e da onde vem, Diagnstico: A difcil descoberta, Sintomas: A doena da dor, Tratamento: Pode ajudar?, Repercusses: A vida que muda. As representaes sociais da fibromialgia foram semelhantes entre as participantes e os familiares. No entanto, para as participantes houve mais nfase na representao da doena da dor, enquanto que para os familiares a representao de uma doena desconhecida foi mais significativa. Semelhante a outras doenas crnicas, a fibromialgia inscreve-se em uma representao social negativa, que envolve perdas em vrios nveis (perda do corpo saudvel e ativo, isolamento social, perda da identidade profissional, dificuldades em exercer o papel de esposa e/ou de dona de casa, entre outros) e o sofrimento devido natureza dos sintomas e conseqncias de sobrecarga da famlia e/ou de um de seus membros que sofrem por no saber como ajudar.

    Palavras-chave: Fibromialgia. Famlia. Representaes sociais.

    rea de conhecimento: 7.07.00.00-1 - PSICOLOGIA Sub-rea de concentrao: 7.07.05.00-3 - PSICOLOGIA SOCIAL

    Membros da Banca

    ______________________________________

    Professora convidada: Mrcia A. M. Oliveira

    ______________________________________

    Professora convidada: Ana Lgia Oliveira

    ________________________________________

    Professora Orientadora: Giovana Delvan Stuhler

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    1. INTRODUO

    A Teoria das Representaes Sociais apresenta-se como um valioso instrumento de diagnstico para a rea da sade, na medida em que considera o ser humano como um todo, integrado ao seu sistema cognitivo, ao seu sistema de valores, sua histria, seu contexto social e ideolgico. As Representaes Sociais (RS) podem ser definidas como uma forma de conhecimento do senso comum e esto relacionadas diretamente s maneiras como as pessoas interpretam ou traduzem o conhecimento que emerge da vida cotidiana no decorrer da comunicao interpessoal. As pessoas constroem RS como uma forma de dominar, compreender e explicar os fatos e as idias que preenchem o universo da vida.

    Para as pessoas que vivem com fibromialgia, bem como para os seus familiares, a realidade a mesma, pois no h como elas se desligarem das suas crenas, dos seus valores, que muitas vezes direcionam seu enfrentamento da sndrome e suas atitudes frente ao tratamento. Portanto, o entendimento das reaes que a doena desperta nas pessoas que vivem com fibromialgia e nos seus familiares, necessita de uma compreenso do significado do corpo doente que vai alm dos aspectos biolgicos, pois o processo sade-doena traduzido na inter-relao entre o fsico, o psicolgico e o social.

    A fibromialgia, assim como outras sndromes dolorosas crnicas, traz consigo prejuzos em vrias esferas da vida cotidiana, tanto para o individuo, ao afetar a qualidade de vida, quanto para a sociedade, nas questes trabalhistas e procura freqente aos servios de sade (SALVETTI, 2004).

    Segundo Veronese (2007), o adoecimento gera crises e momentos de desestruturao ao indivduo e tambm sua famlia, pois esta o primeiro grupo de relaes em que ele se insere. Muitas mudanas ocorrem na vida das pessoas com doenas crnicas, levando-as a se depararem com limitaes, frustraes e perdas. Essas mudanas sero definidas pelo tipo de doena, o modo como se manifesta e como segue o seu curso, e, em especial, pelo significado que a famlia atribui ao evento.

    A partir da necessidade das pessoas de saber como se comportar, como dominar o meio, identificar e resolver problemas que so construdas as

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    representaes sociais (JODELET, 2001); por isso as representaes sociais so importantes na vida cotidiana. Elas circulam nos discursos, so trazidas pelas palavras e veiculadas atravs de mensagens e imagens miditicas.

    Atualmente, o estudo das representaes sociais tem ganhado destaque no campo da sade, pois h uma compreenso de que, para trabalhar as questes neste mbito, necessrio conhecer que sentidos as pessoas do a sua condio de sade/doena. Isso importante, principalmente quando se pensa em propostas de interveno, para que estas faam sentido para a populao a ser atendida e venha ao encontro de suas necessidades (SERPA, 2007).

    Atravs da caracterizao das representaes sociais da fibromialgia pelas mulheres portadoras desta sndrome e pelos seus familiares, ser possvel ampliar o campo de conhecimento sobre a mesma, o que poder ser traduzido em intervenes cada vez mais efetivas no sentido de contemplar os vrios aspectos envolvidos na sndrome da fibromialgia.

    Deste modo, este trabalho teve como objetivo geral conhecer as Representaes Sociais da Sndrome da Fibromialgia em mulheres portadoras desta sndrome e em seus familiares. E como objetivos especficos pretendeu descrever e analisar as Representaes Sociais da Sndrome da Fibromialgia tanto em mulheres portadoras desta sndrome quanto em seus familiares.

    A presente pesquisa est organizada da seguinte forma: em um primeiro momento ser apresentado o embasamento terico o qual aborda alguns aspectos referentes dor e dor crnica (principal sintoma da fibromialgia), sndrome da fibromialgia, famlia e doenas crnicas, e por fim teoria das representaes sociais. Em seguida sero explicitados os procedimentos metodolgicos, contendo a identificao dos sujeitos participantes da pesquisa, a descrio do instrumento utilizado, os procedimentos para a coleta dos dados e como se deu a anlise dos mesmos, finalizando com a descrio das categorias encontradas a partir desta anlise. No captulo seguinte est a apresentao dos resultados, a qual foi dividida em duas partes, iniciando pelas mulheres com fibromialgia e encerrando com os seus familiares. Aps este momento os resultados so discutidos tendo em vista o referencial explicitado anteriormente e no ltimo captulo esto expostas as consideraes e concluses.

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    2. EMBASAMENTO TERICO

    2.1- Dor e dor crnica

    A dor um importante sinal de alerta de que algo no est bem em nosso sistema fisiolgico, alm de ser uma das sensaes mais temidas pela maioria dos indivduos que, se alada a intensidades alm do suportvel, pode exceder seu carter de advertncia e comprometer seriamente a qualidade de vida do indivduo. Desta forma, evitar a dor algo natural, tanto pelo seu carter aversivo, quanto pelo estresse que dela decorre (ANGELOTTI; FORTES, 2007).

    Segundo a Associao Internacional para o Estudo da Dor, a dor uma experincia desagradvel, sensitiva e emocional, associada a uma leso real ou potencial dos tecidos ou descrita em termos dessa leso. a causa mais comum de procura mdica (cerca de 75% das pessoas que procuram os servios mdicos referem estar com algum tipo de dor). Assim, a dor um sintoma freqente, presente tanto em doenas agudas quanto crnicas (SARD JR; CRUZ, 2007).

    No entanto, os prejuzos para o paciente podem exceder o quadro doloroso em si na medida em que, com o passar dos anos sob o jugo da experincia dolorosa, os efeitos da dor crnica podem estabelecer comportamentos que acabam por rotular as pessoas como impotentes e sem habilidades para controlar o problema (ANGELOTTI; FORTES, 2007). Sard Jr e Cruz (2007) afirmam que as dores crnicas fazem parte de um processo complexo, multidimensional, determinado no apenas pela rea lesada, mas tambm por experincias prvias com eventos dolorosos, estados emocionais, histria familiar, ganhos secundrios, dentre outros aspectos. Deste modo, a forma como a dor se manifesta influenciada por diversos fatores biolgicos, sociais, culturais e psicolgicos.

    Angelotti e Fortes (2007) ressaltam a questo da subjetividade do fenmeno doloroso, pois no h como o profissional da sade ou cuidador mensurar a sensao dolorosa de algum, a no ser pelo relato verbal do prprio paciente, sendo que s possvel a especulao de sua presena ou intensidade atravs da interpretao das reaes corporais do paciente, porm sem a certeza absoluta do que est ocorrendo.

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    Levando em conta que o diagnstico da dor amparado basicamente nos relatos do paciente e que nem sempre fcil encontrar termos universais para descrever sensaes to subjetivas, foram estabelecidas algumas formas de definio das variaes e ocorrncias dolorosas. Existem, portanto, diversos tipos e classificaes de dor, criados para tentar estabelecer protocolos de tratamento cada vez mais efetivos de acordo com a sua especificidade. A dor pode ser classificada, por exemplo, em aguda ou crnica, ou ainda de origem nociceptiva somtica, nociceptiva visceral, neuroptica ou psicognica (ANGELOTTI; FORTES, 2007).

    A dor uma sensao desconfortvel que pode fazer com que o indivduo perca o controle sobre sua vida caso se torne crnica. Em longo prazo, ela prejudica enormemente o paciente, na medida em que este pode sentir dificuldades em realizar as tarefas mais bsicas de seu cotidiano. As estruturas sociais e familiares tambm so comprometidas, uma vez que muito desagradvel para os outros ficarem ao lado de algum que reclama o tempo todo, ainda que justificadamente (ANGELOTTI; FORTES, 2007; PENIDO; RANG, 2007)

    O conceito de aceitao vem sendo utilizado recentemente na questo da dor crnica e embora ainda necessite de maiores investigaes, reconhecido o seu papel como mediador e preditor de incapacidade e ajustamento/adaptao nestes casos. A aceitao entendida aqui como uma atitude, ligada a crenas centrais do indivduo, sendo que aceitar no est relacionado passividade, mas a mudana de foco. Neste caso especfico, pode ser definida como viver com a dor sem reaes desnecessrias ou esforos para tentar evit-la. Aceitar a realidade de ter que conviver com dores crnicas pode reduzir estresse, ansiedade, depresso e outros afetos negativos e colaborar sobremaneira para que a pessoa tenha expectativas mais realistas, desenvolva estratgias de enfrentamento adequadas, se envolva ativamente na resoluo de problemas e minimize sentimentos de frustrao e raiva inerentes a no-aceitao de uma realidade (SARD JR, 2007, p.29).

    2.2- Fibromialgia

    Historicamente a fibromialgia, e/ou condies muito similares, tem sido apresentada por sculos sob vrios nomes, inclusive o de fibrosite. Mas apenas na dcada de 80 que ocorreu uma redefinio do que era at ento um quadro confuso

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    de uma condio clnica comum. Em 1987, a fibromialgia foi reconhecida como uma sndrome distinta pela American Medical Association, mas ainda no havia um conhecimento detalhado do que a englobava. Em 1990 foi apresentada a definio atual, a qual amplamente aceita, do American College of Reumatology (ACR). Em 1992, um documento de consenso sobre fibromialgia foi apresentado no Second World Congress on Myofascial Pain and Fibromyalgia em Copenhagen. Esta declarao aceitou a definio do ACR como a base para um diagnstico e adicionou uma srie de sintomas aquela definio (fora dor generalizada e mltiplos pontos sensveis), incluindo fadiga persistente, rigidez matinal generalizada e sono no reparador (CHAITOW, 2002).

    A fibromialgia pode ser definida como uma sndrome dolorosa crnica, cujo principal sintoma a dor muscular difusa, a qual no advm de nenhuma leso articular ou processo inflamatrio, e est presente por mais de trs meses, associada a outros sintomas, como fadiga, sono no reparador, rigidez matinal, constipao ou diarria, bruxismo, cefalia, ansiedade e depresso, entre outros (CHAITOW, 2002; BERBER; KUPEK; BERBER, 2005; JORGE; TOMIKAWA; JUC, 2007).

    Pesquisas recentes e o consenso clnico parecem indicar que a fibromialgia no um problema primariamente musculoesqueltico, ainda que seja nos tecidos deste sistema que seus principais sintomas se manifestem, mas que ela est associada a alteraes na percepo da dor, padres de sono anormais, serotonina cerebral reduzida, anormalidades na microcirculao e no metabolismo energtico muscular (CHAITOW, 2002). A prevalncia da sndrome da fibromialgia na populao em geral varia entre 0,66% e 4,4%, acomete em sua grande maioria mulheres, na faixa etria entre 35 e 60 anos (CAVALCANTE, 2006).

    De acordo com Chaitow (2002), a fibromialgia no apresenta uma causa nica ou cura para seus sintomas abrangentes e persistentes. Este autor afirma que os quadros disfuncionais, como sndrome da fadiga crnica e fibromialgia, parecem apresentar trs aspectos etiolgicos que se sobrepem, interagindo tanto com as caractersticas inatas quanto com as adquiridas subseqentemente pelos indivduos. Estes trs aspectos compreendem: 1) fatores bioqumicos (que podem incluir toxicidade adquirida ou autogerada, deficincias nutricionais, infeco, caractersticas endcrinas, alrgicas e outros fatores); 2) fatores biomecnicos, os quais podem ser estruturais (exemplos: pernas curtas, hipermobilidade,

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    caractersticas posturais, traumas musculoesquelticos) e/ou funcionais (quadros de uso excessivo ou desuso, estresse de hiperventilao nos mecanismos e estruturas respiratrias, etc.); 3) Fatores psicossociais (traos de depresso e/ou ansiedade, desnimo, solido, medo, conseqncias de abusos na infncia, etc.).

    Muitos reumatologistas dividem a sndrome da fibromialgia em primria e secundria. Na forma primria a causa desconhecida, mas pode ser induzida por traumas, infeces, estresse, inflamaes, entre outros. E na forma secundria h uma condio primria, como hipotireoidismo, por exemplo, que desencadeia concomitantemente a fibromialgia que, com o tratamento da causa primria, deve desaparecer (WALLACE, 2005).

    A ansiedade e depresso esto entre os sintomas freqentemente relacionados fibromialgia (CHAITOW, 2002). Em sua pesquisa Berber et al (2005), relatam que a prevalncia de depresso e outras anormalidades psicolgicas elevada na fibromialgia, variando entre 49% a 80%, e que estes pacientes apresentam pior qualidade de vida em relao a outras populaes com doenas crnicas (como artrite reumatide, cncer, entre outros). A depresso pode iniciar ou perpetuar os sintomas da fibromialgia, pois suas caractersticas como fadiga, sentimentos de culpa, baixa auto-estima e vitimizao, tendem a exacerbar os sintomas da fibromialgia e dificultam as estratgias de enfretamento do paciente, reforando o sentimento de incapacidade deste.

    Os possveis componentes psicolgicos na sndrome da fibromialgia constituem uma rea de estudo repleta de crenas arraigadas e respostas defensivas. Um largo nmero de opinies mdicas atribui todo o fenmeno da fibromialgia rea das doenas psicossomticas, enquanto h uma posio igualmente bem definida de muitos profissionais da sade (assim como por muitos pacientes), que considera que os sintomas de ansiedade e depresso so mais comumente um resultado do que uma causa da dor e da inaptido experimentadas na sndrome da fibromialgia. Muitos pesquisadores consideram uma explicao orgnica bioqumica - neurolgica para os principais sintomas da fibromialgia, e no aceitam as explicaes psicolgicas para a condio (CHAITOW, 2002).

    2.2.1- Diagnstico

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    O diagnstico da fibromialgia se d por meio dos critrios estabelecidos pelo Colgio Americano de Reumatologia em 1990, que, segundo Costa et al (2005) e Marques (2004), consiste em histria de dor difusa crnica, com durao igual ou superior a trs meses, nos quatro quadrantes do corpo (lado esquerdo, lado direito, acima e abaixo da linha da cintura) e no esqueleto axial (seguimento cervical, torcico ou lombar da coluna vertebral), alm da presena de pelo menos 11 dos 18 pontos anatomicamente especficos, chamados de tender points, dolorosos a palpao uma dgito presso de aproximadamente 4kgf (quantidade de presso capaz de deixar com a cor branca a unha do primeiro quirodctilo do examinador). Desta forma, o exame fsico e a anamnese so essenciais, visto que se trata de uma sndrome de etiologia desconhecida e no h exames complementares para o diagnstico (COSTA et al, 2005; CAVALCANTE et al, 2006).

    Martinez (2006) alerta para a questo do diagnstico correto, visto que atualmente h uma abundncia de casos de fibromialgia, com muitos falsos positivos, o que traz um impacto no s a nvel individual, mas para sociedade como um todo; as questes de afastamento do trabalho e conseqentes gastos pblicos seriam um exemplo disso.

    Penido e Rang (2007) apontam que alguns casos de dor crnica, como a fibromialgia, demoram a receber um diagnstico, passando muitas vezes por uma peregrinao mdica sem resposta, ou escutando que o problema exclusivamente psicolgico, e que ele, paciente, no tem nada. Esse descrdito com os sintomas pode ocorrer tambm por parte da famlia, que muitas vezes no valida o sofrimento do paciente.

    2.2.2- Tratamento

    Acerca do tratamento, Weidebach (2002) classificou-o em tratamento farmacolgico (com a finalidade de melhorar a qualidade do sono) e no-farmacolgico (com a mesma finalidade, porm acrescenta o controle dos sintomas ansiosos e depressivos). Na ltima categoria ele cita os exerccios aerbicos, acupuntura, yoga e demais tcnicas de relaxamento como comprovadamente eficazes, e a psicoterapia como til nos casos em que a depresso, ansiedade ou pnico forem proeminentes.

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    Para Jorge et al (2007) o tratamento deve contemplar aspectos educativos e ser realizado de maneira interdisciplinar, de modo a combinar atividades fsicas e psicolgicas/comportamentais. Em geral, os programas sugerem bons resultados em modelos baseados na comunidade, com aulas, discusso entre os participantes, demonstraes de atividades fsicas adaptadas condio dolorosa e medidas de conservao de energia. Estes autores concluem que, independentemente do formato e durao do programa, o paciente sente-se satisfeito, desde que haja oferta de informao focadas na dor e nas atitudes a serem tomadas.

    Em um estudo de reviso de literatura sobre os benefcios do exerccio fsico em pacientes com fibromialgia, Valim (2006) afirma que a atividade fsica aerbica deve ser prescrita para todos os pacientes, com raras excees, pois h forte evidncia que ela reduz a dor, o nmero de pontos dolorosos, bem como a ansiedade, depresso, alm da melhora na qualidade de vida entre outros aspectos psicolgicos. Em outro estudo apontado pela autora, onde se comparou o efeito de exerccios aerbicos com os do alongamento, observou-se melhora em ambos os grupos, porm os aspectos emocionais e psicolgicos s foram alterados pelo exerccio aerbico.

    De modo geral, a melhora na qualidade de vida e em aspectos psicossociais acontece em programas de exerccio de longa durao, aps 15 a 24 semanas contnuas (VALIM, 2006; SABBAG et al, 2007). Assim como em outras doenas reumticas, a hidroterapia comumente prescrita na fibromialgia, pois um dos mtodos teraputicos mais completos para estes pacientes, visto que promovem a manuteno do condicionamento aerbico e por serem realizados em gua aquecida diminuem a dor, o impacto musculoesqueltico e possibilita o relaxamento muscular (FRANZEN; IDE, 2004; VALIM, 2006).

    Outro tratamento no-medicamentoso inclui as intervenes psicoterpicas, dentre as quais se destaca a terapia cognitiva comportamental. Ao relatar sua experincia no atendimento a dois grupos de terapia para pacientes com dor crnica, Fortes (2000) ressalta a importncia do profissional da sade mental, psiclogo e psiquiatra, nos programas de atendimento a estes pacientes e indica a grupoterapia como uma alternativa eficaz nestes casos, pois a mesma possibilita uma identidade em comum entre os pacientes, onde h a troca de informaes e um espao para aprender a lidar com a dor, romper com o isolamento e expressar seus sentimentos, desta forma aumentado a confiana de cada um em si mesmo,

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    reforando a capacidade de resolubilidade, quebrando os vnculos de dependncia e incapacidade que se expressam nas relaes interpessoais destes.

    De semelhante modo, Vandenberghe, Cruz, e Ferro (2003) apontam a terapia de grupo como uma importante medida de interveno em pacientes com dor crnica. Eles relatam que meses e anos de sofrimento levam, muitas vezes, a estilos de vida focalizados na dor e acumulam-se estratgias malsucedidas de controlar a dor. Desta forma, trabalhar com situaes concretas, manejo da ansiedade e estresse, possibilita novas estratgias de enfrentamento, menos dor e conseqentemente menos sofrimento.

    Segundo Wallace (2005) h vrios estudos controlados que mostram a validade da terapia cognitivo-comportamental na melhora da fibromialgia. Esta abordagem trabalha com programas que combinam educao, intervenes cognitvo-comportamentais, tcnicas de reduo do estresse, apoio para famlia e estratgias para melhorar a capacidade fsica e flexibilidade das pacientes.

    2.3- Famlia e Doenas Crnicas

    A palavra famlia deriva do latim famulus, que significa o conjunto de servos e dependentes de um chefe ou senhor. Ela por um lado, um fenmeno fundado na natureza prpria do homem e, por outro, uma instituio social e como tal, varia atravs da histria e de uma cultura para outra (ZILLES, 2002).

    Segundo Minuchin (1982), a famlia deve ser entendida como um sistema ativo, em constante transformao para garantir sua continuidade e o crescimento psicossocial de seus membros. Assim, a famlia um sistema aberto, em transformao, cuja principal tarefa psicossocial a de apoiar seus membros.

    Para Contim (2001), a famlia considerada uma unidade primria de cuidado, pois ela o espao social em que seus membros interagem, trocam informaes, apiam-se mutuamente, buscam e medeiam esforos, para amenizar e solucionar problemas. A famlia deve ser entendida como um grupo dinmico, variando de acordo com a cultura e o momento histrico, econmico, cultural e social que est vivenciando.

    Veronese (2007) afirma que os familiares funcionam como pontos de referncia no desenvolvimento de valores do ser humano, bem como veiculam as

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    representaes sociais no seu cotidiano. As famlias se diferenciam pelos valores e crenas que adquirem ao longo de seu processo histrico, de forma que as interaes entre os membros, o comportamento e a postura diante dos acontecimentos so influenciados por esses mesmos valores. Em relao ao processo de sade-doena, os cuidados prestados por esse grupo so de extrema importncia para o enfrentamento que o sujeito tem em relao a doena.

    De forma semelhante, Contim (2001) identifica a famlia como uma unidade primria de cuidados, assim, sua estrutura de grande ajuda pessoa doente. A interao entre os membros visa garantir a continuidade do sistema ligado afetivamente, amenizando o sofrimento causado pelo adoecer. A tendncia a busca de um equilbrio para se adaptar ao sistema.

    fundamental para os profissionais de sade compreender os diferentes estgios de desenvolvimento da famlia, em relao ao ciclo vital, e os impactos de uma doena no seu cotidiano, como tambm reconhecer quais as estratgias a adotar para torn-la participante dos cuidados da pessoa com doena crnica (VERONESE, 2007). Rolland (2001) descreve a doena crnica em um contexto desenvolvimental dentro da famlia, considerando o entrelaamento de trs fios evolutivos: a doena, os ciclos de vida do indivduo e da famlia.

    2.4- Teoria das Representaes Sociais

    Segundo Souza (2006), a Teoria das Representaes Sociais uma forma sociolgica de Psicologia Social, a qual se originou na Europa, a partir da publicao de Moscovici, em 1961, de seu estudo intitulado La psychanalyse: Son image et son public. Neste estudo, Moscovici se props a compreender como a Psicanlise, uma novidade produzida no campo da cincia (conhecimento especializado), era recebida e incorporada ao cotidiano da populao francesa na dcada de 1950, transformando-se em um saber prtico do senso comum (NBREGA, 2001).

    Silveira (2006) destaca que a psicossociologia de Moscovici enfatiza a importncia da comunicao, a qual permite transformar o individual em social e vice-versa, opondo-se a noo de homogeneidade e de mera reproduo do pensamento, considerando as representaes como um processo criativo e

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    dinmico. a partir da dcada de 1970, que a Teoria das Representaes Sociais ganha destaque e repercusso nas mais diversas reas e pases, passando surgir diferentes concepes sobre a mesma.

    De acordo com S (1993), a expresso "representaes sociais" qualifica tanto um conjunto de fenmenos, quanto o conceito que os engloba e a teoria construda para explic-las, identificando um vasto campo de estudos psicossociolgicos. As representaes so construdas e compartilhadas pelos seres humanos, na sociedade, atravs de palavras, de sentimentos, de condutas, de crenas e de informaes. As representaes so, portanto, uma mistura de conceitos, imagens e percepes originadas do cotidiano, compartilhadas por um grupo em relao a um objeto social, as quais so vinculadas pelo indivduo, que ao mesmo tempo autor e ator de suas representaes (S, 1993; SOUZA, 2006).

    Para Jodelet (2001), a representao social uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prtico, e que contribui para a construo de uma realidade comum a um conjunto social (p.22) e ainda: a representao social sempre representao de alguma coisa (objeto) e de algum (sujeito). As caractersticas do sujeito e do objeto nela se manifestam (p.27).

    As Representaes Sociais possuem trs dimenses: a informao, o campo de representao ou imagem e a atitude. A informao diz respeito a organizao do conhecimento sobre um objeto social em um determinado grupo; o campo de representao ou imagem configura o modelo social; e a atitude a tomada de posio em relao ao objeto representado, seja ela positiva ou negativa (SECCHI, 2006; SOUZA, 2006).

    Para transformar um objeto social desconhecido em algo familiar, o sujeito faz uso de dois mecanismos denominados objetivao e ancoragem. Na objetivao um conceito no definido associa-se a uma imagem concreta que resume o conceito e o torna compreensvel. Fazem parte do processo de objetivao as etapas de reduo (construo seletiva), esquematizao estruturante (ou ncleo figurativo) e naturalizao (onde os conceitos adquirem materialidade). Na ancoragem idias estranhas (novas) so reduzidas a categorias e a imagens comuns, incorporando-as a uma rede de significaes j existentes. Fazem parte da ancoragem os processos de classificao, onde h generalizao e individuao, e de nomeao, no qual se rotula, utiliza uma palavra de domnio comum do grupo social (MOSCOVICI, 2003; SECCHI, 2006; SILVEIRA, 2006; SOUZA, 2006; TORRES, 2006).

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    Sobre a teoria do ncleo central, Abric (2001) menciona que ela se articula em torno de uma hiptese geral, a de que toda representao se organiza em torno de um ncleo central. Este ncleo o elemento fundamental da representao, pois determina ao mesmo tempo sua significao e sua organizao. Assim, o ncleo central possui basicamente duas funes: (1) funo geradora, pois constitui o elemento pelo qual se cria ou transforma a significao dos outros elementos que compem a representao, dando sentido aos mesmos; (2) funo organizadora, pois unifica e estabiliza os elementos da representao.

    Ainda sob a perspectiva de Abric (2001), o ncleo central pode ser definido como um subconjunto da representao, composto de um ou de alguns elementos, cuja ausncia desestruturaria ou daria uma significao radicalmente diferente representao em seu conjunto. Constitui ainda, o elemento mais estvel da representao, ou seja, o que mais resiste mudana. Uma representao social pode evoluir e se transformar superficialmente se houver uma mudana do sentido ou da natureza de seus elementos perifricos. Mas ela s se transformar por completo (mudar a significao) se o ncleo central for posto em questo, pois necessrio o questionamento de um elemento do ncleo central para que haja transformao da representao (ABRIC, 2001, p.166). O ncleo central da representao determinado tanto pela natureza do objeto apresentado, quanto pela relao que o sujeito mantm com esse objeto.

    De acordo com Rey (2006) a representao social da doena traz em si uma expresso negativa, pois esta considerada como uma impossibilidade de acompanhar o sistema de prticas e valores sociais, sendo assim associada ao fracasso.

    por isso que os sujeitos portadores de doenas associadas idia de morte ou limitao social passam a ter seu valor diminudo naqueles espaos definidos pela representao social do cotidiano, que foi gerada a partir do nvel atual da sociedade de consumo (REY, 2006, p.81).

    De modo semelhante, Serpa (2007) aponta que a motivao para mudar os estilos de vida geralmente afetada pela desesperana, tristeza e depresso, sentimentos esses caractersticos das perdas sociais, emocionais e fsicas que ocorrem com pessoas portadoras de doenas crnicas e que a doena traz alteraes na forma do indivduo perceber a si mesmo, sua auto-estima, suas relaes com o mundo e a sua integridade pessoal. Assim, as representaes

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    sociais em relao a doena afetam os sentidos dados avaliao subjetiva dos sintomas, s causas e evoluo das doenas, deciso em aderir aos tratamentos, reflexo e a deciso sobre alterar hbitos e estilos de vida e por isso, o senso comum e as opinies particulares devem ser valorizadas na busca de se realizar tratamentos e intervenes pblicas que possam realmente alcanar suas reais necessidades (p.54).

    Em uma pesquisa com pacientes de uma escola da postura, Oliveira, Gazetta e Salimene (2004) identificaram que as representaes sociais da dor crnica na coluna vertebral estavam relacionadas a uma tendncia ao isolamento, diminuio da capacidade de produo, absentesmo no trabalho, possvel perda de espao social e profissional, e diminuio da virilidade. Os autores relatam que os pacientes demonstram dificuldade em aceitar e assumir as suas limitaes fsicas, porque a dor pode diminuir sua autonomia, poder e autoridade no grupo social a que pertencem, estereotipando-os como incapazes para o trabalho.

    Nesse sentido, os participantes da pesquisa evidenciaram que as representaes sociais sobre sade esto relacionadas a percepo do corpo como uma mquina resistente s aes da natureza e pronta para funcionar. Em contrapartida, as representaes sociais do corpo doente revelam o corpo nesse estado, como intil, limitado e incapaz. Os autores concluram que as representaes negativas contriburam para que os pacientes no admitissem o fato de possuam uma doena crnica e/ou que no dessem s dores na coluna vertebral a devida ateno (OLIVEIRA et al, 2004).

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    3. ASPECTOS METODOLGICOS

    Esta pesquisa se enquadra como descritivo-exploratria, pois pretendeu identificar, descrever e analisar as representaes sociais da sndrome da fibromialgia, em mulheres portadoras da mesma e em seus familiares. Ela um estudo qualitativo na medida em que visa identificar para o pesquisador, o que os sujeitos tm a dizer sobre determinado assunto, qual o sentido, significado que do ao mesmo, sendo descrita em termos no numricos (TURATO, 2003).

    3.1 Participantes da pesquisa

    Participaram da presente pesquisa cinco mulheres com diagnstico de fibromialgia e cinco familiares destas. As participantes estavam em atendimento, durante o segundo semestre de 2008, no Programa de Assistncia Interdisciplinar a Mulheres com Sndrome da Fibromialgia da UNIVALI, coordenado pelos cursos de Fisioterapia e Psicologia. Os critrios de incluso das participantes foram: ser portadora da sndrome da fibromialgia, estar cadastrada na Clnica de Fisioterapia da UNIVALI para tratamento fisioterpico e participar do Programa. No caso dos familiares, considerou-se o convvio dirio com a participante e o grau de parentesco, o qual deveria ser preferencialmente primeiro grau (pai, me, filhos, irmos) ou seu cnjuge.

    Para melhor visualizao, apresenta-se a seguir um quadro contendo os dados de identificao das participantes e de seus familiares, tais como idade, estado civil, escolaridade, profisso, tempo de diagnstico e tempo no Programa (para as participantes) e parentesco (para os familiares).

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    Participantes

    Identificao Idade Estado Civil

    Esco

    larid

    ade1

    Profisso2

    Tem

    po de

    Diag

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    tico

    Tem

    po n

    o

    Pro

    gram

    a

    Participante 01 56 a. Casada EF Costureira (A) 03 anos 06 meses Participante 02 59 a. Viva EFI Do lar / Pensionista 05 anos 02 anos Participante 03 58 a. Casada EFI Do lar / Voluntria 04 anos 02 anos Participante 04 55 a. Casada EF Vendedora (AI) 03 anos 06 meses Participante 05 26 a. Casada EM Operadora de Caixa (A) 01 ano 01 ano

    Familiares

    Identificao Idade Estado Civil

    Esco

    larid

    ade1

    Profisso2 Parentesco

    Familiar 01 23 a. Casada EM Do lar Nora

    Familiar 02 38 a. Casada ES Do lar / Psicopedagoga Filha

    Familiar 03 57 a. Casado EFI Aposentado Marido Familiar 04 18 a. Solteiro EM Repositor (mercado) Filho Familiar 05 31 a. Casado EM Lavador Marido

    Quadro 01 Dados de identificao das participantes da pesquisa e de seus familiares.

    3.2 Instrumento

    A coleta de dados foi realizada por meio da entrevista semi-estruturada, a qual, segundo Trivios (1987), possui questionamentos bsicos, apoiados nas teorias e hipteses que fundamentam a pesquisa, os quais se ampliam na medida em que se recebem as respostas do informante, que relata de forma espontnea o

    Legenda: 1 EF = Ensino Fundamental

    EFI = Ensino Fundamental Incompleto EM = Ensino Mdio ES = Ensino Superior

    2 A = Afastada de sua profisso

    AI = Afastada pelo INSS

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    seu pensamento e experincias em relao ao foco principal colocado pelo investigador.

    Foram utilizados dois roteiros (Apndice A e B), um com questes voltadas para a paciente e outro para o seu familiar. Os dois roteiros possuem seis questes, que se inter-relacionam. A primeira parte do instrumento foi composta pelos dados de identificao (nome, idade, escolaridade, profisso, estado civil e, no caso do familiar, o grau de parentesco com a paciente) e dados clnicos (tempo de diagnstico, tratamentos que utiliza e tempo de atendimento no Programa).

    A segunda parte do roteiro investigou o que pacientes e familiares conheciam sobre a sndrome (o que fibromialgia?), as conseqncias desta (como viver com fibromialgia / como viver com algum que tem a sndrome), o tratamento (o que e o que o sujeito pensa sobre o tratamento) e a viso do outro sobre a fibromialgia (no caso da paciente, o que a famlia pensa sobre a sua condio de sade, e no caso do familiar, o que a paciente pensa sobre ter fibromialgia). Estas questes foram formuladas utilizando-se como referncia o roteiro de entrevista utilizado por Souza (2006) para investigar as representaes sociais sobre o viver com tuberculose, tendo em vista que se trata de uma condio crnica de sade.

    3.3 Procedimentos de Coleta dos Dados

    Inicialmente, foi contatada a coordenao do Curso de Fisioterapia, para prestar devidos esclarecimentos em relao pesquisa e solicitar autorizao para realizao da mesma (APNDICE C). Posteriormente, foi feito contato com as professoras responsveis pelo Programa de Assistncia Interdisciplinar a Mulheres com Sndrome da Fibromialgia, dos cursos de Psicologia e de Fisioterapia da UNIVALI, no qual foram esclarecidos os objetivos do estudo, bem como agendado o primeiro contato com as mulheres participantes do Programa.

    No primeiro contato com as participantes, a pesquisadora utilizou alguns minutos do atendimento em grupo realizado pelo curso de Psicologia, para apresentar a pesquisa e os propsitos da mesma. Nesta ocasio foi entregue s pacientes uma carta de apresentao (APNDICE D) convidando-as para participar da pesquisa. Essa carta foi levada para casa, de modo que a paciente teve a

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    oportunidade de ler com ateno e estender o convite a um de seus familiares de convvio dirio. Nesta carta, havia um espao para que ela assinalasse se desejava ou no participar da pesquisa, bem como a resposta do seu familiar frente ao convite. As mulheres que responderam positivamente, bem como os seus familiares, forneceram um nmero de telefone para contato, e as entrevistas para a coleta de dados foram agendadas.

    Na ocasio das entrevistas, foi apresentado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APNDICE E), o qual foi assinado tanto pela participante quanto pelo seu familiar. As entrevistas foram gravadas em udio e realizadas individualmente, nas residncias das participantes.

    3.4 Anlise dos Dados

    Aps a transcrio das entrevistas foi realizada a anlise temtica categorial, a qual est englobada na anlise de contedo proposta por Bardin (1977), que consiste em vrias tcnicas. Esta forma de anlise a mais antiga e tambm a mais utilizada, sendo o texto desmembrado em unidades e reagrupado em categorias analgicas.

    Oliveira (2008) afirma que a anlise de contedo um recurso metodolgico que pode servir a muitas disciplinas e objetivos, uma vez que tudo o que pode ser transformado em texto passvel de ser analisado com a aplicao desta tcnica ou mtodo. Os procedimentos utilizados podem variar em funo dos objetivos da pesquisa, porm, para que a anlise tenha valor cientfico, necessrio respeitar algumas regras que a diferenciam de anlises meramente intuitivas. Bardin (1977) dividiu a anlise em trs etapas, a saber: (1) pr-anlise; (2) explorao do material ou codificao; (3) tratamento dos resultados, inferncia e interpretao. Assim, Oliveira (2008) prope os seguintes procedimentos para efetuar uma anlise de contedo temtico-categorial:

    - Leitura flutuante, intuitiva, ou parcialmente orientada do texto; - Definio de hipteses provisrias sobre o objeto estudado e o texto

    analisado;

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    - Determinao das unidades de registro, as quais podem ser palavras, frases, pargrafos, temas, personagens, acontecimentos, documentos, entre outros;

    - Definio das unidades de significao ou temas (conjunto de unidades de registro);

    - Anlise temtica das unidades de registro; - Anlise categorial do texto (agrupa temas de acordo com critrios tericos ou

    empricos, considerando as hipteses de anlise); - Tratamento e apresentao dos resultados; - Discusso dos resultados e retorno ao objeto de estudo.

    As caractersticas de uma boa categoria so a homogeneidade, a exaustividade, a exclusividade, a objetividade e a adequao ou pertinncia. Um segundo conjunto de caractersticas das boas categorias pode ser destacado: importncia quantitativa dos temas e importncia qualitativa dos temas (OLIVEIRA, 2008).

    No presente estudo, aps a transcrio das entrevistas foram selecionadas 407 unidades de registro para as participantes e 257 para os familiares, as quais deram origem a doze (12) unidades de significao ou temas, que depois de agrupados e selecionados efetivaram seis categorias correlatas, tanto para as participantes quanto para os familiares, a saber:

    1) Desconhecimento: Eu no conheo muita coisa...: esta categoria abrange as falas sobre o desconhecimento acerca da sndrome da fibromialgia, tanto pelas mulheres participantes desta pesquisa e seus familiares, quanto pelas outras pessoas de um modo geral.

    2) Definio e Possveis causas: O que e de onde vem? Nesta categoria esto expostas as teorias construdas pelas participantes e em especial pelos familiares para definir a sndrome e explicar a sua origem.

    3) Diagnstico: A difcil descoberta: esta categoria contempla os relatos sobre o diagnstico da sndrome e a demora vivenciada at se chegar ao mesmo.

    4) Sintomas: A doena da dor: abrange as falas referentes a sintomatologia dolorosa da fibromialgia e as alteraes de humor que advm em decorrncia desta.

    5) Tratamento: Pode ajudar? A aceitao da cronicidade da sndrome, os diversos tratamentos experimentados e as estratgias para o controle e alvio da dor so descritos nesta categoria.

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    6) Repercusses: A vida que muda: Na sexta e ltima categoria esto descritas as mudanas ocasionadas pela sndrome da fibromialgia, alm da forma como as participantes e os seus familiares enfrentam essas mudanas.

    Deste modo, o prximo captulo apresenta os resultados, os exemplos das unidades de registro pertencentes a cada categoria. Na etapa seguinte estes dados sero discutidos sob a ptica da Teoria das Representaes Sociais.

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    4 APRESENTAO DOS RESULTADOS

    A apresentao dos resultados divide-se em duas partes, na primeira esto os relatos das participantes (mulheres com fibromialgia) e na segunda parte so expostos os resultados dos seus familiares. No captulo seguinte os resultados sero discutidos tendo em vista o referencial terico j exposto.

    4.1- Participantes (mulheres com fibromialgia)

    1 Categoria - Desconhecimento: Eu no conheo muita coisa...

    No relato das participantes, percebe-se que elas possuem um conhecimento sobre o viver com a fibromialgia e mediante a isso no verbalizam que no sabem nada a respeito da sndrome, ainda que haja muitos aspectos da mesma que permanecem desconhecidos para as participantes, estando isto implcito nos discursos. Apenas uma participante fala abertamente sobre o desconhecimento da sndrome, tanto no passado (antes do diagnstico), quanto no momento atual, conforme segue abaixo:

    Olha, a doena eu no sei te dizer em si o que que ... Eu acho que tem bem poucas pessoas estudadas que podem dizer o que que ela realmente. (Participante 02)

    Porque pra mim era uma doena desconhecida; eu sabia que eu tinha alguma coisa diferente, porque em mim as coisas doem mais do que nos outros. (Participante 02)

    (...) a gente sofreu tanto sem saber o que que era (...). (Participante 02)

    No entanto, entre as participantes, h um consenso de que para as outras pessoas a fibromialgia uma doena desconhecida, em especial para os mdicos,

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    que no sabem explicar o porqu dos sintomas, enquanto outros referem que a fibromialgia no seria uma doena/sndrome reconhecida e, portanto, no existiria. Isso fica expresso nos relatos descritos abaixo, referentes a situaes vividas pelas participantes da pesquisa:

    Ele [mdico anestesista] sabia que eu tinha dor, mas ele no podia fazer nada porque ele no conseguia descobrir da onde que vinha tanta dor. (Participante 02)

    [Os mdicos] olhavam pra tua cara assim como se voc... ah no tem nada, isso mentira. Ta querendo enrolar.. (Participante 02)

    [O mdico] disse assim fibromialgia no existe, que doena pra mdico que no sabe dar o diagnstico(...). (Participante 02)

    Eles [mdicos da percia] olham pra gente ah, mas fibromialgia no doena. No, no doena, sofrimento. Eu digo mesmo, no doena sofrimento. Por que no doena, porque no tem uma ferida aberta na pele? No doena porque no ta caindo nossos cabelos? (Participante 04)

    A tu vai no mdico ele diz uma coisa, tu vai em outro mdico ele diz outra coisa e te atocha de remdio mas no v a causa. Porque isso eu j to assim mais de dez anos (...). (Participante 03)

    (...) ele [reumatologista] me deu s o medicamento e disse que eu no tinha nada (...). Mas como, se ele me deu medicamento pra tirar a dor e eu no tenho nada? E por que que ele me deu, n? (Participante 05)

    2 Categoria - Definio e Possveis Causas: O que e de onde vem...

    Quando questionadas sobre o que fibromialgia, as participantes relataram ser uma sndrome de manifestao repentina, o que foi expresso atravs da palavra atacar utilizadas por elas, evidenciando um carter de doena silenciosa, como algo que vai acumulando durante anos e de repente se manifesta, conforme segue:

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    (...) a fibromialgia uma tentao que ela te ataca quando tu menos espera. E ela ataca em vrias partes do corpo. (Participante 03)

    (...) ela [a fibromialgia] uma coisa que ela se instala na gente sem a gente saber (...). (Participante 03)

    Ah, [fibromialgia] uma coisa do outro mundo... Porque eu nunca vi uma, atacar tanta coisa num ser humano. (Participante 04)

    Eu, eu assim, j respondi, o que que isso? Que doena essa que voc tem? A eu falei assim, uma doena que ataca os nervos da gente, que a gente no consegue mais esticar o brao direito, as pernas, e uma dor insuportvel. (Participante 01)

    Eu vejo fibromialgia como so dores, nos pontos (...) que o msculo e os tendes, pra mim. Que crnico, n. Com o passar do tempo foi acumulando n, pra mim, fibromialgia isso. (Participante 05)

    Como causas atribudas ao aparecimento da fibromialgia, uma participante referiu um procedimento cirrgico, enquanto outras destacaram o sofrimento/estresse como precursores da sndrome e ainda como responsvel por exacerbar os sintomas:

    (...) eu me lembro que eu comecei a sofrer com esse problema, ... na gravidez dele [filho caula]. Depois da gravidez eu comecei a ficar doente com freqncia, com freqncia. (...) Porque quando eu tive ele foi cesrea e eu fiz laqueadura, e aquilo me provocou. (Participante 04)

    Eu acredito que seja isso que desencadeou essa doena, que desencadeia n, nas pessoas. Isso de tenso nervosa, voc no consegue relaxar nunca, porque s pensava em trabalho, trabalho, trabalho pra poder ajudar n. (Participante 01)

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    Olha, sofri, sofri... E acho que cada uma que tem fibromialgia deve ter uma histria por trs. A minha histria meu marido. (Participante 02)

    Se ta tudo maravilha pra mim, no influencia muito, mas se eu estou nervosa, a mesmo que eu caio, bem influente. (Participante 04)

    3 Categoria - Diagnstico: A difcil descoberta

    O diagnstico da fibromialgia um desafio para o profissional de sade, pois exige certo conhecimento da sndrome, visto que o diagnstico puramente clnico, no detectado por exames laboratoriais. Essa dificuldade no diagnstico leva a realizao de diversos exames para excluir outras hipteses diagnsticas, o que fica expresso atravs dos seguintes relatos:

    [O mdico] fez tudo quanto foi raio-x, tudo quanto foi coisa, no dava nada. (Participante 02)

    (...) ele [mdico] me examinou tudo. Pediu uma bateria de exames, a ele deixou bem claro eu vou pedir uma bateria de exames, mas este problema no consta em exame nenhum. A senhora pode fazer mil exames, no vai constar em nenhum. O que consta o seu sofrimento e tem que dizer o seu sofrimento pra poder ser diagnosticado. (Participante 04)

    A demora para se chegar ao diagnstico, relacionada a pouca informao a respeito da sndrome, acarreta anos de sofrimento (fsico e psquico) com dvidas/questionamentos sobre os sintomas, conforme os exemplos abaixo:

    A minha vida foi assim, foi cinco anos assim com dores, sem eu saber o que que era. (Participante 05)

    (...) uma doena que pra mim ela era desconhecida, fiquei sabendo poucos anos atrs. (...) t indo pra uns cinco anos que eu descobri que eu tinha essa doena. Mas, eu tenho ela h muitos anos, muitos e muitos anos eu tenho essa doena. (...)

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    eu no sei dizer o tanto de anos que faz, mas uns trinta anos e da pra fora eu sei que faz. (Participante 02)

    (...) eu j tinha, mas como se diz assim, fui empurrando com a barriga; di aqui, di ali, toma um analgsico alguma coisa. (Participante 01)

    Antes eu tinha, s que assim, eu no dava muita bola, (...) eu acho que eu deixei, eu deixei se agravar muito, porque eu j sentia dores (...). (Participante 04)

    4 Categoria - Sintomas: A doena da dor

    A dor o principal sintoma da fibromialgia e est presente na maior parte dos relatos das participantes. possvel ter uma dimenso do fenmeno doloroso na descrio que elas fazem com relao a este sintoma, conforme os exemplos abaixo:

    uma coisa que te di e que no tem motivo de doer, no tem motivo pra estar doendo. (Participante 02)

    Eu no desejo pro pior co de rua a dor de fibromialgia, muito triste. (Participante 04)

    S que ... a dor triste, n. muita dor demais. (Participante 03)

    At a cor da fisionomia da gente muda, porque a dor muita, n? muita... Voc tenta se segurar em p, mas a dor muita. (Participante 04)

    Tinha vezes que eu tomava trs [comprimidos] de goela abaixo pra tirar a dor, de tanta dor que eu sentia. (Participante 05)

    (...) eu no posso tocar no meu cabelo pra pentear de tanta dor. Eu vou tomar banho, at a gua que toca nos meus ombros parece assim que ta furando meus ombros. (Participante 04)

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    As participantes contam que a dor difusa, ou seja, espalhada por todo corpo, o que aumenta a sensao de mal-estar geral. Este carter difuso expresso em relatos como os que seguem:

    E a um dia tinha dor aqui, outro dia tinha dor ali... (Participante 03)

    muita dor, meu Deus, muita dor... Hoje eu acordei assim que eu no sabia se a dor era embaixo das minhas unhas, se a dor era embaixo dos meus dedos, se a dor era aqui, dor de cabea... (Participante 04)

    Este sintoma, a dor, referido como constante na vida das participantes desta pesquisa. Segundo elas, a dor est sempre presente, variando em intensidade, mas perpassando o cotidiano dessas mulheres. Elas tambm relatam que h momentos de crise, onde a dor alcana propores maiores a ponto de impedir a realizao de qualquer atividade diria. As seguintes falas evidenciam estas proposies:

    Agora dizer assim, voc t sem dor, isso mentira, porque em algum lugar a miservel t doendo. (...) Agora, tem hora que mais forte, tem hora que so mais fracas. Agora, quando crise mesmo, ai meu Deus, ai de botar na cama. E no tenho vontade de fazer nada, a s tenho vontade de dormir. (Participante 02)

    bem poucas horas [do dia] que a gente passa bem. (Participante 02)

    Sempre com muita dor (...). Eu tenho dor assim, quase que continuamente. (Participante 03)

    (...) uma dor que voc no controla, vem do nada e sai do nada. S que voc infelizmente ta todo tempo com dor (...) mais forte ou mais fraca, mas ela ta ali. (Participante 02)

    No, assim, falar assim, cem por cento no tenho dor mentira, porque tem dia que aparece. (Participante 01)

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    (...) todo dia isso aqui ta embolado. Embolado e isso aqui lateja, lateja, lateja... (Participante 05)

    Mas a fibromialgia isso que ta a, ela uma dor perene, constante e assim , ela no te abandona, mas ela tem dia que mais forte e tem dia que suportvel, mas eu tenho dor sempre. (Participante 03)

    A dor constante e difusa traz consigo conseqncias emocionais, relatadas pelas participantes como depresso e angstia. Abaixo esto os exemplos dessas falas, que remetem a depresso como conseqncia da fibromialgia:

    (...) comea a te doer o corpo e logo em seguida tu j entra em depresso, sabe? uma dor que vai te deprimindo, uma coisa que no passa, que no... e vai te tirando tua auto-estima, vai te botando pra baixo (...) (Participante 02)

    A j vai me dando depresso, j vai me dando uma angstia, eu j tenho vontade de chorar direto... e chora mesmo. (Participante 04)

    Aquela cobrana me fazia cair em depresso. s vezes eu tinha vontade de dormir, dormir, dormir e no acordar. (Participante 01)

    (...) chegava em casa caa na cama e chorava, chorava, chorava... No dava mais ateno pro meu filho, no fazia comida, fiquei bem ruim. (Participante 05)

    E antes eu no tinha mais [vontade de costurar] n, porque eu sentava na mquina e vinha todas aquelas dores j. (Participante 01)

    5 Categoria - Tratamento: pode ajudar?

    O tratamento da fibromialgia visa atenuar os sintomas, pois no h uma cura para esta sndrome. Isto afeta o modo como as participantes encaram sua condio de ser algum que vive com fibromialgia; algumas expressam que no aceitam a

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    cronicidade da doena, enquanto outras referem a necessidade de aceitar sua condio clnica para viver melhor com a fibromialgia:

    E eu queria tirar essa dor e no sai, no sai. O que mais di isso, n. (Participante 05)

    Mas, eu fico assim indignada porque isso uma coisa que eles dizem que no tem cura, e uma coisa que eu luto pra ter cura. Porque eu no queria ficar mais com isso. isso que eu acho do tratamento que eu no consigo me conformar, essa palavra que eles colocaram. Se uma doena fibromialgia, tem que ter cura, se uma doena, n, e eles dizem que no tem. (Participante 05)

    Eu no aceito ter dor (...). (Participante 03)

    como disse o doutor W., bem categrico, tens que botar na tua idia que isso a no tem cura, tens que botar na tua idia que tu vai conviver com isso a, o que eu fao, n. (Participante 03)

    (...) ento eu entendi que ns tambm somos como mquina, que a gente se desgasta ao longo do tempo e que a gente tem que aceitar tambm isso. E eu no conseguia aceitar. De repente, to ficando assim incapaz, isso me fazia muito, muito, muito mal mesmo. Agora, mesmo que eu to emocionada, mas eu entendi isso a. (Participante 01)

    A gente aprende a viver melhor com ela [com a fibromialgia]. Porque a gente no consegue lidar com esse negcio de dor, eu no conseguia lidar com isso a e agora j to conseguindo lidar melhor, com essa parte. Ento eu j sei que aquilo, j no me preocupo porque eu sei... ela s vai me cois, mas no vai me matar, n? (Participante 02)

    As participantes referem melhora aps o tratamento no Programa de Assistncia Interdisciplinar a Mulheres com Sndrome da Fibromialgia da UNIVALI. J o tratamento medicamentoso, por si s, visto como ineficaz na remisso dos

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    sintomas, mas benfico se combinado com a hidroterapia, conforme os relatos a seguir:

    (...) s o remdio no tava tendo resultado. Mas, com o remdio e a hidro eu melhorei, n. Agora eu consigo dormir bem. (...) Esse, esse trabalho em conjunto, ta me ajudando bastante. To tendo resposta nisso a. Aliviou as dores que eu tinha muita... muita, muita, muita dor mesmo, n? (Participante 01)

    (...) depois que eu descobri o que eu tenho e depois que eu comecei a me tratar na Univali melhorou bastante, bastante, bastante mesmo, sabe? Foi um sucesso assim pra mim. (Participante 02)

    (...) porque realmente o que alivia a gente bastante e d bom nimo a piscina. Porque o exerccio dentro da gua ele no tem o impacto que tem fora, ento onde alivia a dor, n. (Participante 03)

    (...) o remdio, comprimido, ele melhora uma coisa e estraga outra (...). (Participante 03)

    A tomava um [remdio] a noite e um de manh. A mesmo assim no tirava a dor. (Participante 05)

    (...) da nesse ano fiz tratamento e melhorou, mas no voltei mais como eu era antes. (Participante 05)

    (...) porque quero melhorar dia a dia, cada dia mais, quero voltar ao que eu era antes n, e eu tenho certeza que com esse tratamento eu vou conseguir. (Participante 01)

    possvel notar na fala das participantes que h certa dependncia do tratamento para que se sintam bem, dispostas. Uma participante em especial expressa isso claramente, como se v na seguinte frase:

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    E medicamento e o tratamento, n, que como te falei, aqui duas vezes por semana, com mais duas vezes por semana que eu tinha na Univali, quer dizer, eu vivo atravs do tratamento. (Participante 04)

    A busca pelo alvio dos sintomas vai alm do tratamento realizado no Programa. As participantes buscam atendimento em outros servios de sade e em associaes. Em suas casas h a busca pelo alvio atravs de diversas estratgias, como chs, massagens, banhos, compressas, entre outros. A famlia participa de algumas dessas estratgias, em especial os cnjuges na realizao de massagens. Abaixo seguem os exemplos:

    E tambm, l na APAVI, fazem massoterapia tambm. Ento, como eu falei pra voc, tudo que falar pra mim alivia a dor eu fao, n? (Participante 01)

    A eu fao alongamento n, fiz esse exerccio de respirar n, direitinho (...). (Participante 01)

    (...) porque eu fazia fisioterapia, eu fazia acupuntura, massoterapia, sabe? Pra ver se alguma coisa me ajudava. (Participante 02)

    (...) eu tento ocupar a minha cabea com o que eu gosto (...). To sempre procurando alguma coisa pra fazer, que eu no posso ficar desocupada. Alguma coisa pra ajudar a passar o tempo e ajudar tambm na questo de voc esquecer que voc est com tanta dor. Enquanto voc ta fazendo alguma outra coisa at parece que a dor menor, n, diminui um pouco. (Participante 02)

    E eu fao Do-in, eu fao massagem, porque eu no posso parar, n. Perdi peso (...). (Participante 03)

    (...) quando eu no agento mais eu vou e tomo uma injeo, mas eu no queria isso. (Participante 03)

    Ento eu tenho aquela tcnica de respirao que eu fao. (Participante 03)

  • 35

    Eu to fazendo acupuntura, (...) ela alivia um monte, d at um soninho na gente (...) (Participante 03)

    Eu vou tentar a homeopatia (...). Eu vou continuar com os alopticos, mas eu tenho esperana, n. (Participante 03)

    (...) quando no tem piscina eu me desconjunto embaixo do chuveiro, (...) o nico jeito de eu aliviar a dor. A deixo correr bastante gua e vou fazendo os exerccios que a gente faz l. Vai, sabe, vai amolecendo os nervos, e a eu consigo... sobreviver. (Participante 04)

    Pra mim dormir, pra mim poder deitar, era a base de compressa quente, eu fazia, eu esquentava, eu e o meu marido esquentava, ... toalhas de rosto no ferro e colocava aqui, tirava e colocava de novo... (Participante 04)

    (...) meu marido toda noite faz massagem em mim, com arnica (...). (Participante 05)

    E eu tenho que ta tomando banho... Oito horas eu tomo banho, depois dez horas eu tomo mais um banho, meio dia tomo mais um banho; porque comea a esquentar e comea a queimar, comeo a queimar e eu no consigo fazer nada. (Participante 05)

    6 Categoria - Repercusses: A vida que muda...

    As mudanas na vida das participantes so citadas como perdas, coisas que j no se pode mais fazer, alm das alteraes na rotina que dependem de como est o quadro de dor. Os relatos abaixo ilustram essas situaes:

    A voc tem que desmarcar s vezes um compromisso, s vezes alguma coisa que voc tem vontade de fazer, voc no faz por causa da bendita [dor]... Pode ta tudo planejado, tudo direitinho, naquele dia tu ta ruim j no pode. (Participante 02)

  • 36

    A eu penso assim oh intil, n, que coisa intil, n, voc se programa com uma coisa, ah eu to bem, eu to bem, mas daqui a pouco voc j muda tua rotina, j no mais aquilo (...). (Participante 04)

    Eu amo fazer croch, amo de paixo. Amo bordar. Nada disso d mais pra fazer. (Participante 04)

    (...) at pra minha higiene pessoal, eu to tendo dificuldade. Tipo, levar um brao pra trs, levar um brao pra cima, esfregar cabelo, pra depilar uma perna, pra segurar a gilete... (Participante 04)

    (...) mas eu no consigo fazer mais nada como eu fazia antigamente. Antigamente eu mudava o sof de lugar, eu varria uma casa, limpava vidraa, no tem? Lavava o cabelo, que uma coisa simples, hoje, vamos dizer, se eu lavo o cabelo hoje, tem que ficar dois dias sem lavar minha cabea. (Participante 05)

    (...) esses nibus so muito altos, meu Deus, eu passo uma trabalheira... J subo me agarrando e bem. J no primeiro assento e eu sento com dor. (Participante 03)

    Da, vou fazendo as minhas coisinhas aos poucos, quando eu sinto muita dor a eu paro e... daqui a pouco eu volto a fazer o meu servio de novo. (Participante 04)

    uma doena que ta me impedindo n, de exercer assim, ah ... at a minha funo de dona de casa (...). (Participante 01)

    As participantes referem ainda os cuidados que elas tm para no piorar o quadro de dor, como por exemplo, no pegar friagem e evitar se deitar na cama durante o dia, e que, paradoxalmente, a piora pode vir do fato de no se fazer nada.

    E no posso apanhar friagem (...). E assim, a gente parece um biscuit dentro de casa. (Participante 04)

    Porque da tu fica muito parada, a tu comea a atrofiar por causa da dor, quando tu v ta tudo atrofiado, tudo dolorido e tu no consegue movimentar. (Participante 05)

  • 37

    (...) quando vou me deitar, a cama pra alguns ela descanso, pra mim ela tortura. Parece que uma minhoca no asfalto quente, porque eu (...) no tenho posio na cama pra mim ficar porque di o corpo todo (...). (Participante 02)

    Se voc cai a deitar na cama voc no levanta mais. A um todo, a o travesseiro toca aqui... o pescoo j fica todo duro, as pernas quando tu vai levantar, parece que ta deste tamanho, que a incha mesmo. (...) Te d um inchume, te d um mal estar terrvel. (Participante 04)

    Uma das mudanas na vida das pacientes o isolamento que elas passam a viver, no sentido de passar pelas crises dolorosas sozinhas, sem expressar para a famlia o que sentem. A reclamao constante, em especial nos perodos de crise, gera o afastamento da famlia e as participantes tm a conscincia de que eles no podem ser culpados por isso, assim, elas procuram o isolamento a fim de gerar menos transtornos famlia. Seguem os exemplos desses relatos:

    Porque voc reclama e ningum te escuta, ningum te ai, ai, ai... [ningum] te escuta, [ningum] te apia, porque no ta sentindo, n? (Participante 02)

    Porque a gente tambm no pode botar nas costas dos outros o que tu sente, ningum culpado de tu ta com dor. (...) Ento eu no deixo transparecer isso. (Participante 03)

    E da aquilo n, causava um transtorno, porque ningum tinha nada a ver com as minhas dores, se eu falasse que tava com dor aqui, dor ali, dor acol, no ia adiantar. (Participante 01)

    Eu acho que deve ser muito pior [pra quem convive], porque da vive com uma pessoa mal humorada, que ta reclamando o tempo todo... (...) Pra quem no tem, mas convive com as pessoas eu acho que deve ser muito triste. (Participante 02)

  • 38

    E eu reclamava tanto, tanto, que nem meu marido, coitado, que j foi, passou tambm um bocado comigo. Ento tanto ele, quanto as minhas filhas, j no me escutavam muito, no davam muita... [ateno]. (Participante 02)

    (...) eu deixo bem claro pra eles [famlia], , se eu to alegre eu to bem. Se eu to triste, eu no to bem; ento s no fazer muita pergunta. Quanto mais quietinha eu estiver, vocs me deixem assim. Ento respeitado, entendeu? Mas eles sabem, eles to conscientes que a coisa , coisa forte mesmo. (Participante 04)

    A fibromialgia muda a rotina familiar, em especial entre os casais. As participantes relatam que os maridos, principalmente no incio da manifestao dos sintomas, demonstraram dificuldade em compreender as constantes idas ao mdico e as reclamaes sobre as dores, alm das mudanas na vida sexual do casal, conforme expresso a seguir:

    No comeo, eu deduzia que... Eu achava que ele [marido] achava que eu no tinha nada. (Participante 03)

    No comeo foi muito difcil. [Marido dizia:] , porque tu no sai do mdico, porque tens mania de mdico. (...) Mas a depois ele comeou a ver (...) (Participante 03)

    [No conseguia mais exercer minha funo] de esposa tambm, porque s vezes tudo essa dor, como que uma mulher vai n, sentir prazer com tanta dor, ento isso muito, muito uma dor, isso muito terrvel. (Participante 01)

    A at meu marido, assim... fica chateado, comigo assim, n. (...) Ele diz que eu no dou carinho nele, mas eu no consigo (...). Se eu fao de um jeito eu comeo a sentir dor, no tem? bem complicado at nesse detalhe. (Participante 05)

    Ele assim pra mim Como que pode, tava boa at agora e tais com essa cara, e verdade. Eu digo Chero, eu to com dor, o que tu queres que eu faa?, porque de repente, n, vem aquela dor assim... (Participante 03)

  • 39

    Tem vezes que ele tambm ta com dor e eu to com dor, ele pega e respira trs vezes pra dar ateno pra mim, no tem? Ele diz s tu que tem dor? Eu tambm to com dor, ele diz. (Participante 05)

    Alm das relaes familiares, a fibromialgia afeta as relaes de trabalho, pois a dor muitas vezes impede a pessoa de realizar suas atividades tambm neste contexto. Cabe ressaltar que nenhuma das participantes desta pesquisa estava trabalhando quando as entrevistas foram realizadas. Todas estavam afastadas de suas atividades, sendo que apenas uma recebia auxlio-doena em decorrncia da fibromialgia e outra era pensionista; as demais no contribuam financeiramente para a renda familiar. Deste modo, as falas de algumas participantes trazem exemplos das dificuldades em continuar realizando suas atividades no ambiente de trabalho, gastos com medicao e a dificuldade em comprovar na percia mdica, e tambm judicialmente, a existncia da fibromialgia como uma doena crnica que as impede de exercer suas funes.

    Eu trabalhava fora, o que eu ganhava era pra botar no remdio. Porque todo o tempo que eu trabalhava fora, todo tempo eu tava na injeo, tomando injeo e remdios fortes pras dores, direto, direto... (Participante 02)

    E a eu no conseguia mais limpar minha seo, eu no conseguia nem mais atender na minha seo. A onde eu fui no mdico, foi mais por isso. Ah doutor... eu no to conseguindo trabalhar, eu to faltando servio de tanta dor e eu no... eu no acho certo, ir pra l pra no poder trabalhar, pra no poder vender, pra no poder cuidar da minha seo.. (Participante 04)

    (...) uma luta pra gente passar pela percia, no fcil. Eles sabem de todo o diagnstico, eles sabem de tudo que a gente ta fazendo e ainda humilham a gente. E no s eu no. Ns conversamos l na piscina e todas ns passamos por isso. (Participante 04)

    Eu no consegui mais trabalhar. Eu no conseguia digitar, doam meus dedos e o meu brao comeou a tremer, tremer, sabe assim, tremer que tu no conseguia segurar nada. (Participante 05)

  • 40

    (...) eu trabalhava com dor, chorava com dor e tinha que parar no meio do caminho, porque eu no dava conta de passar a compra, porque era um quilo de arroz e eu j no conseguia passar. E eram s seis horinhas trabalhando. (Participante 05)

    (...) [Estou h] sete meses com advogado que entrou com recurso contra o Y [mercado], ou v se manda embora, ou v se manda volta a trabalhar. Porque eu to sem receber, da no ajuda pra pagar as coisas da casa, a tudo acumulou (...). (Participante 05)

    As participantes relatam que de modo geral, as pessoas apresentam certa dificuldade em compreender a sndrome da fibromialgia. Os outros muitas vezes no acreditam na veracidade dos sintomas, julgando que se trata de frescura ou preguia, alm da indagao de que como uma pessoa que aparenta ser jovem no consegue realizar suas atividades. As participantes falam tambm do que sentem com relao a isso, conforme segue:

    (...) as pessoas no entendem n, porque uma pessoa to jovem tem essa doena. (Participante 01)

    (...) eu sinto envergonhada de ter essa doena, porque tem pessoas assim, que tem mais idade do que eu e consegue fazer muito mais coisa que eu. (Participante 01)

    [Os outros devem pensar] ah, ela deve ser muito fresca ou sei l... ta sempre reclamando... (Participante 02)

    (...) dor, dor, mas do que? De nada, ta reclamando porque ta com preguia, no quer trabalhar, alguma coisa assim. (Participante 02)

    A o motorista assim Meu Deus, mas a senhora no to velha assim Ai, mas eu tenho fibromialgia, queria que fosse nada. T bom dona D., ta bom. (Participante 03)

  • 41

    (...) as meninas diziam que era frescura. E eu dizia eu sinto tanta dor gente, no tem como, sentia dor nas costas, na barriga aqui, nas pernas sentia muito e no brao. Ah, mas isso frescura, frescura. (Participante 05)

    4.2- Familiares

    1 Categoria - Desconhecimento: Eu no conheo muita coisa...

    Ao contrrio das participantes, os familiares expressam abertamente que no possuem muitas informaes com relao fibromialgia, conforme os exemplos a seguir:

    (...) eu no consigo entender o que que essa doena, eu sei que ela ataca os nervos (...). (Familiar 05)

    Eu no conheo muita coisa. (Familiar 04)

    (...) como diz o outro, da fibrio... dessa doena da D., eu no conheo nada. (Familiar 03)

    E uma doena que ela ta ali, mas no tem uma cura, no tem um diagnstico preciso, certo, exato, uma coisa que o pessoal ta comeando a estudar, t comeando a conhecer n. E a gente no sabe. (Familiar 05)

    [] uma doena que na verdade no se fala, n. Vamos ser bem realistas, dificilmente voc ouve falar da doena. A por fora quando ah tem fibromialgia, mas o que que isso?, n? (Familiar 02)

    s vezes a me traz alguns panfletos, informativos, tu d uma lida, mas aquela coisa muito vaga, muito vaga pra voc entender. (Familiar 02)

  • 42

    Alm disso, dois familiares relatam que os mdicos no reconhecem a fibromialgia como uma doena, o que dificulta o entendimento da sndrome, alm de no passarem informaes precisas, o que aumenta suas dvidas.

    A maioria dos mdicos no entende, tambm no sabe, tambm no reconhece [como doena]. (Familiar 05)

    Eu acho muito complicado lidar com essa doena, porque uma doena que pra alguns mdicos no existe, n; (Familiar 02)

    Ento assim, mesmo o mdico s vezes... n... no, eu acredito na fibromialgia, at aqueles que no, isso a no existe, isso a coisa que esto inventando, moda, como eu j ouvi falar isso a moda, modismo. Mesmo aquele que acredita, mas ele tambm no tem a informao, da origem, da onde veio, da onde vai, da onde vem, n... do que causa, n. (Familiar 02)

    2 Categoria - Definio e Possveis Causas: O que e de onde vem...

    Sobre a definio da sndrome, os familiares tentam explicar a partir de doenas que eles conhecem melhor e/ou listando os sintomas e as conseqncias da fibromialgia:

    uma doena assim, alguma coisa que ataca as fibras n, dela, alguma coisa assim, dos nervos, coisa assim, ... Parte emocional, n, psicolgico dela, que s vezes fica depressivo, fica meio depressiva, assim meio triste, um pouco de falta de nimo. isso que eu sei, n. (Familiar 05)

    Eu acho que calcificao nos ossos, n. Que eu tambm... inclusive eu tenho. (Familiar 03)

    (...) uma doena que debilita os nervos da pessoa, o fsico, sente bastante dor pelo corpo, uma dor crnica, n. E fica com o corpo debilitado, no consegue fazer

  • 43

    as coisas, executar as coisas, como ela executava antigamente quando tinha normal n. (Familiar 05)

    (...) que eu sei, que eu convivo com ela assim, dessas dores que ela tem no brao, no ombro, que s vezes ela no consegue nem fazer o servio de casa. (Familiar 01)

    Acho que so essas dores que ela tem na, no osso, essas coisas que ela tem n, eu acho que isso. (Familiar 01)

    Como causas (etiologia) da fibromialgia, os familiares citam os mais diversos fatores, como a falta de nutrientes, infeces por bactrias, o uso excessivo de remdios sem indicao mdica e acontecimentos do passado geradores de grande estresse emocional.

    Eu imagino que deva ter alguma coisa que falte de protena, de nutriente, no sei eu... uma coisa que ataca o nervo, de repente uma bactria (...). (Familiar 05)

    (...) na minha opinio... Ela usou muito remdio por conta dela. (...)Teve uma poca que ela andava dopada de remdio e eu acho que isso a tudo devido ao remdio. Mas remdio errado ou tomado por arte e criao dela, alguma coisa. Ela dizia que no, que o mdico dava, n, mas eu achava muito remdio. (Familiar 03)

    Fibromialgia, (...) no caso dela, por exemplo, eu acho que foi excesso de nervos, no caso. Que ela teve um casamento problemtico (...). (Familiar 04)

    Isso tudo foi tudo, depois que ns perdemos o filho, sabe? A ela... Apareceu essa montoera de doena nela, j faz 14 anos... Vai pra 14 anos que perdemos o filho... (...) a a doena dela foi agravando mais ainda, mais, mais e mais... (Familiar 03)

    Dois familiares relataram a relao do agravamento dos sintomas e o desencadear de novas crises de dor, devido ao estresse e abalos emocionais vividos pelas participantes. Eles questionam a relao entre os aspectos fsicos e emocionais da fibromialgia. Seguem alguns exemplos desses relatos:

  • 44

    [Ela] comeou a ficar estressada com o servio e da comeou a vir o agravamento. (Familiar 05)

    Se ta mais nervosa sente mais dor, se ta com emocional mais legal, anda mais legal. (...) Sinceramente eu no sei, porque tem vezes que ta tudo bem e tambm sente dor, n. Mas quando o emocional ta ruim ataca mais. (Familiar 05)

    o emocional talvez at mais do que o fsico, que anda bem junto assim, tu nota que ta triste j debilita mais, fica mais frgil... mais sensvel assim, o corpo, tudo. (Familiar 05)

    Porque sempre tem essa dvida: o psicolgico que causa a dor, que mexe com a fibromialgia, ou a dor que mexe com o emocional? (Familiar 02)

    (...) a gente sempre notou que sempre que ela passa por um perodo de estresse grande, de emocional grande, no outro dia ela ta na cama com dor. (Familiar 02)

    A doena em si, eu relaciono ela muito com o emocional, acho que tem tudo a ver com o emocional da pessoa. As duas to ali, sabe, elas trabalham juntas, a fibromialgia e o fator emocional e depressivo. (Familiar 02)

    3 Categoria - Diagnstico: A difcil descoberta

    A demora em diagnosticar e o fato de no haver exames laboratoriais que comprovem a existncia da sndrome gera dvidas nos familiares que acompanham as pessoas com fibromialgia. Essa situao evidenciada nas falas abaixo:

    (...) o mdico passava remdio pra dor, o mdico passava isso, passava aquilo outro, da mandava fazer exame disso, exame daquilo, da no , no , no ... E nunca achava soluo, no sabia o que tinha, falava ah parece at que coisa da cabea da pessoa mesmo, porque no tem diagnstico nenhum. (Familiar 05)

  • 45

    (...) no tem, como eu disse, nenhuma coisa, nenhum papel que tu vai l, um exame que tu vai l e tu constata. (Familiar 05)

    Fez vrios exames j. Exame de sangue, de fezes, de urina, de tudo... Meu Deus, j no tem mais o que fazer. (Familiar 03)

    (...) eu sei que uma doena que no d em exames (...). (Familiar 02)

    (...) eu ouvi mdico j falar no uma doena que voc vai encontrar ali , num resultado de papel, num exame clnico, no vai. So atravs dos relatos, dos diagnsticos que a pessoa vai falando, a gente vai... pra chegar at a causa. (Familiar 02)

    Um familiar aponta as conseqncias da demora em diagnosticar a sndrome, o que leva a anos de sofrimento e questionamentos da prpria pessoa sobre os seus sintomas, conforme os trechos a seguir:

    Depois que ela descobriu ficou mais fcil tambm, n? Porque at ento o que que eu tenho?, n? Vai no mdico, no nada; faz exame, ta tudo bom; faz aquilo, ta tudo bom; nunca nada. O que que eu tenho que eu sinto tanta dor? Porque que eu vou varrer uma casa, me di o corpo todo, me di a carne. Ela costumava dizer que era a carne dela que doa, ela assim ai, a minha carne que di. (Familiar 02)

    (...) antes por no saber o que que era, por no conhecer, no saa [da crise] com tanta facilidade, era mais difcil (...). (Familiar 02)

    (...) quantas vezes ela sofreu sem saber o que tinha e quantas vezes assim, foi incompreendida pela prpria dor (...). (Familiar 02)

    Assim, o diagnstico da fibromialgia foi dado recentemente e os familiares relatam anos de sofrimento, buscando vrios profissionais da rea da sade. Um familiar refere ainda que aps o diagnstico houve uma melhora no quadro clnico e na forma da pessoa lidar com a sndrome. Seguem as falas que expressam tais situaes:

  • 46

    Ela tem esse problema, segundo o que o mdico dela descobriu, h quinze anos. S que a gente comeou a notar os problemas a mais ou menos uns quatro, trs anos, pra c. Porque a ela j no se agentava mais (...). (Familiar 04)

    Mas que a busca foi grande, foi. Nossa, foi anos e anos se estendendo. E ia no mdico, no era nada, ou dizia que era uma outra coisa, tratava ta, voltava. Ento sempre naquela coisa, tipo assim, empurrando com a barriga. Sabe, tratava uma coisa aqui, depois tratava outra ali... E assim, na sorte s vezes a medicao batia, fazia efeito, parava, pronto, cessava. Mas, que ela foi muito tempo procurando, foi. No foi, assim, fcil no... (Familiar 02)

    Agora o descobrir foi a melhor coisa que aconteceu pra poder tratar a causa, entrar com uma medicao mais propicia; (Familiar 02)

    O dia que a me descobriu que ela tinha fibromialgia, acho que pra ela aquilo ali foi o dia mais alegre da vida dela. Pelo menos ela descobriu realmente o ela tinha, sabe? (Familiar 02)

    Um familiar expressou que tinha dvidas sobre os sintomas de sua parenta em decorrncia da procura de vrios mdicos, realizao de vrios exames, e por conseqncia, da demora em diagnosticar a fibromialgia. Os trechos a seguir exemplificam esta situao:

    (...) fica aquela coisa perdida tem ou no tem alguma coisa?. Ns muitas vezes chegamos a desconfiar que eram dores psicossomticas, porque se no existia nada, ento ela tava somatizando essas dores. A gente chegou muitas vezes a desconfiar onde a gente falou me, procura um psiclogo, vai te ajudar. (Familiar 02)

    Tu vai no mdico com a pessoa no, no tem nada, tudo bem... Ento, tem alguma coisa errada, tem alguma coisa que no ta certa a. Esse mdico fez os exames todos e no tem nada? Ento o problema ta com a pessoa. (Familiar 02)

  • 47

    4 Categoria - Sintomas: A doena da dor

    O principal sintoma da fibromialgia a dor em todo o corpo. Os familiares acompanham de perto esta sintomatologia e os exemplos abaixo ilustram suas percepes:

    Percebe-se que uma doena que causa muita dor, que a pessoa no ta falando da boca pra fora no, ela ta sentindo dor naquele momento. E s vezes a dor por mais que tome remdio no passa. (Familiar 02)

    Tem dia mesmo a que ela fica de cama e comea a dar dor de cabea, e di isso, di aquilo... (Familiar 03)

    (...) no fcil uma pessoa ter dor todo dia (...). (Familiar 02)

    (...) s vezes dava dor na coluna, s vezes no era mais na coluna, j era no brao. E deitava, acordava boa dum lugar, j no era mais no mesmo, j era no outro. (Familiar 04)

    Assim como as participantes, os familiares relatam que h crises nas quais a dor piora e que em outros momentos elas esto bem e conseguem fazer suas atividades dirias, conforme as falas abaixo:

    (...) essa semana que deu uma crise nela, ela voltou a ter, mas ela tava, tava normal. (Familiar 04)

    A fica dois, trs dias, uma semana s vezes, sem incomodar. Daqui a pouco d, de novo. (Familiar 03)

    (...) tem poca, tem dia que ela ta mais legal, faz as coisas. (Familiar 05)

    Porque tem dia que ela ta disposta, ta legal, que no tem dor nenhuma. Mas tem dia que... (Familiar 03)

  • 48

    Em conseqncia das crises de dor, os familiares relatam que h alteraes de humor (impacincia, irritabilidade), falta de apetite e isolamento, e que nestes perodos h um esforo da famlia para evitar barulhos ou qualquer outra coisa que irrite a pessoa com fibromialgia.

    (...) pelo fato acho que da prpria dor, a gente percebe que entra em crise depressiva. (Familiar 02)

    (...) quando ela ta com as crises, assim... Ela fica bem irritada, a qualquer coisa que voc fale... (Familiar 02)

    (...) quando ela comea a doer muito, s vezes fica sem vontade de comer e vai ficando, e vai ficando... (Familiar 04)

    (...) quando a me ta com a crise, a me no tem pacincia, e ela qualquer coisa que fale, pronto, se desmorona inteira. (Familiar 02)

    A no consegue fazer as coisas n, que a pessoa da idade normalmente pode fazer, n, da ela fica bem assim, no sei se fica deprimida. Fica bem assim, quer ficar sozinha, no quer barulho. (Familiar 01)

    Porque qualquer barulhinho, qualquer risadinha ela j se estressa, fica nervosa, incomodada, assim. (Familiar 01)

    5 Categoria - Tratamento: pode ajudar?

    A opinio da famlia sobre o tratamento diverge, a maioria relata que houve uma melhora aps a entrada no Programa, mas outros se queixam de que no h uma melhora efetiva. Alm disso, pode-se notar certo desconhecimento de alguns familiares sobre o tratamento da fibromialgia. Seguem os relatos:

  • 49

    No vejo, ... um tratamento real mesmo, especfico, que nem tem nas outras doenas que a gente escuta, que a gente conhece n. (Familiar 05)

    (...) ela toma o remdio, mas no... nem sempre surte o efeito que ela... que ela esperava, n. (Familiar 05)

    Ela vai l toma um remdio, toma outro, vai l faz na Univali, uma poro de coisa l na Univali, que l tem bastante gente l, cuidam dela e tal... Mas ela no... No se v melhora. No vejo melhora. (Familiar 03)

    [O tratamento na Univali] melhorava um pouco, dava uma diminuda n, talvez pela, ali pelo exerccio, talvez pela conversa, no sei... (Familiar 05)

    Eu no sei que relao teria esses exerccios dentro da gua pra melhorar o... no caso, os nervos dela n. Sinceramente eu no sei (...). (Familiar 05)

    No sei se foi o tratamento com a gua que fez isso ou se os exerccios que ela faz l que ta mexendo nos msculos, no sei. Mas, melhorou muito, isso foi notvel. (Familiar 04)

    At agora, que eu vi, [o Programa] o melhor tratamento que tem. Porque de vez em quando ela vai l e vem melhor. No sei se ela esquece a dor ou... ou faz bem. Porque ela tem muita amizade l (...). (Familiar 03)

    (...) eu como filho tenho visto resultado [no tratamento] e eu acredito que ela tambm. No cem por cento, n, mas uns cinqenta, sessenta e cinco por cento mais ou menos. J aliviou muita coisa. (Familiar 04)

    No melhorou cem por cento, mas melhorou bastante. (Familiar 01)

    (...) achei interessante tambm que implantaram a psicologia em grupo. E a gente comeou a observar, tipo assim, que a linguagem da me comeou a mudar, a linguagem no sentido de ver as coisas de forma diferente, n, o que antes se tornava um drama ela comeou a ver de forma diferente e isso acabou melhorando

  • 50

    mais o quadro dela da fibromialgia, entrando com um espaamento maior assim, a crise, deu um espaamento maior entre uma e outra. (Familiar 02)

    Eles relatam tambm que quando no tem atendimento no Programa h uma piora nos sintomas da fibromialgia, conforme os seguintes exemplos:

    (...) a semana passada, no teve negcio na Univali, n, porque agora ta parado, n, ela ficou que ela no podia se mexer a. (Familiar 03)

    (...) parou de ir l, uns dois, trs dias, depois ela fica toda dura. Ela mesma reconhece que s parar aquilo l, pronto. (Familiar 03)

    (...) se a me no consegue ir na hidroterapia ela mesma sente a falta j, de to bem que fez. (Familiar 02)

    Ai quando j no tem ela j fica assim, meio assim, no sei se fica carente, fica assim, deprimida. (Familiar 01)

    Em relao cura da fibromialgia, os familiares demonstram uma esperana de que esta ainda seja desenvolvida, mas reconhecem que at o momento o que pode ser feito amenizar os sintomas para uma melhor qualidade de vida. Seguem as ilustraes destes relatos:

    (...) no sabe se tem cura, at agora pelo que a gente sabe no tem cura s d pra amenizar e ter uma vida mais ou menos estvel, n, normal ali, n. (Familiar 05)

    (...) a o mdico l da Univali diz que isso ela tem que aprender a conviver com isso, que cura no tem... (Familiar 03)

    (...) uma medicao que no resolve, porque pelo que eu vejo no tem cura, pelo que eu percebo acho que uma doena que no tem cura, uma doena que voc vai amenizando a causa, vai amenizando, no caso, a dor em si, n, a crise em si. (Familiar 02)

  • 51

    (...) dizem que a fibromialgia no tem cura, eu no acredito nisso. Eu acredito que conforme ela vai se tratando ela vai se curando, nem que seja aos pouquinhos, mas... estabilizando essa dor. (Familiar 04)

    (...) pelo que eu vejo assi