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2. Contextualização dos Recursos Hídricos 15

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2. Contextualização dos Recursos Hídricos15

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Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

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Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

Coordenação da Série Água BrasilLuiz Gabriel T. Azevedo

Abel Mejia

Projeto Gráfico e ImpressãoEstação Gráfica ltda.www.estagraf.com.br

Criação de Identidade VisualTDA Desenho & Arte

Foto da capaSOHIDRA/SRH/CE

Comentários e sugestões, favor enviar para: [email protected] e/ou [email protected]

© Banco Mundial / Ministério da Integração Nacional - Brasília, 2004

As opiniões, interpretações e conclusões aqui apresentadas são dos autores e não devem ser atribuídas,de modo algum, ao Banco Mundial, às suas instituições afiliadas, ao seu conselho diretor, aos países por

ele representados, ou ao Ministério da Integração Nacional. O Banco Mundial e o Ministério da IntegraçãoNacional não garantem a precisão da informação incluída nesta publicação e não aceitam responsabilidade

alguma por qualquer conseqüência do seu uso.

Esta dissertação foi apresentada à Coordenação do Curso de Mestrado em Recursos Hídricos daUniversidade Federal do Ceará como requisito parcial para a obtenção do Título de Mestre do autor.

É permitida a reprodução total ou parcial do texto deste documento, desde que seja feitade acordo com as normas da ética científica e citada a fonte.

Banco Mundial e Ministério da Integração Nacional

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará – 1a edição– Brasília – 2004

84p.ISBN: 85-88192-12-8

I - Autor: Teixeira, Francisco José Coelho.

Banco MundialSCN Quadra 2 Lote A

Ed. Corporate Financial Center, cj. 303/30470712-900 - Brasília - DF

Fone: (61) 329 1000www.bancomundial.org.br

Ministério da Integração NacionalEsplanada dos Ministérios, bloco E

9º andar sala 90070062-900 - Brasília - DF

Fone: (61) 414 5800www.integracao.gov.br

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Agradecimentos

O autor gostaria de agradecer especialmente ao professor José Nilson Campos - PhD pela suaorientação na elaboração do estudo, sugestões, conhecimentos transmitidos e por sua dedicação àpesquisa no campo dos recursos hídricos. O autor agradece também ao professor Vicente Vieira eao Dr. Gabriel Azevedo pelas suas contribuições no sentido do enriquecimento do conteúdo deste

documento e a todos os professores que compõem o Departamento de Engenharia Hidráulicae Ambiental da UFCE.

Agradecimentos também ao ex-Secretário de Recursos Hídricos do Estado do Ceará e atualSecretario Nacional de Infra-estrutura Hídrica, Dr. Hypérides Pereira de Macedo, por ter viabilizado

este estudo e por haver transmitido sua imensa experiência e sabedoria no campo dos recursoshídricos. O autor agradece também ao atual Secretário de Recursos Hídricos do Estado do Ceará,

Dr. Edinardo Rodrigues, pela compreensão e apoio no sentido de oferecer as condições paraelaboração deste trabalho.

Especialmente, o autor dedica agradecimentos aos colegas e amigos da Secretaria de RecursosHídricos do Estado do Ceará - SRH que apoiaram, de alguma maneira, este trabalho, em especial

Martins, Vânia, Inês e Alexandre, e também aos amigos e colegas de trabalho, Domício e Albeniza,pela valiosa ajuda na elaboração eletrônica e na apresentação deste ensaio.

O autor agradece, ainda, aos seus amigos e colegas da Companhia de Gestão de Recursos Hídricos –COGERH, pela riqueza da experiência na construção de um organismo de vanguarda para o

gerenciamento das águas do Estado do Ceará, permitindo o aperfeiçoamento dos conhecimentosaplicados neste estudo. Da mesma forma, o autor agradece aos amigos e colegas da Superintendência

de Obras Hidráulicas – SOHIDRA, pela experiência que tivemos na tarefa de ampliação da infra-estrutura hídrica do Estado do Ceará, fornecendo subsídios para este trabalho.

Por fim, o autor agradece-se à equipe de recursos hídricos do Banco Mundial e à equipe do Proágua/Semi-árido do Ministério da Integração Nacional pelo empenho em produzir esta inédita versão emparceria da Série Água Brasil. Sem dúvidas, a Série Água Brasil vem contribuindo imensamente para

a disseminação do conhecimento na área de recursos hídricos no Brasil.

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Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

Vice-presidente, Região da América Latina e CaribeDavid de Ferranti

Diretor para o BrasilVinod Thomas

Diretor, Desenvolvimento Ambiental e Socialmente SustentávelJohn Redwood

Diretor, Finanças, Desenvolvimento do Setor Privado e InfraestruturaDanny Leipziger

Coordenadores SetoriaisLuiz Gabriel T. Azevedo e Abel Mejia

Equipe de Recursos Hídricos e SaneamentoAbel Mejia, Álvaro Soler, Carlos Vélez, Franz Drees, Juliana Garrido, Karin Kemper, Lilian Pena, Luiz GabrielAzevedo, Manuel Rêgo, Maria Angelica Sotomayor, Martin Gambrill, Michael Carroll, Musa Asad, PaulaFreitas, Paula Pini.

Ministério da Integração Nacional

Ministro da Integração NacionalCiro Ferreira Gomes

Secretário de Infra estrutura hídricaHypérides Pereira de Macêdo

Diretor do Departamento de Desenvolvimento Hidroagrícola - DDHRamón Flávio Gomes Rodrigues

Coordenador do Proágua Semi-árido, Unidade de Obras HídricasRogério de Abreu Menescal

Equipe TécnicaAlexandre Camarano, Carlos de Araújo França Neto, Cybele Volpato da Cunha, Daniel Vilani, Flávio de SouzaFalcão, Hênio de Azevedo Galdino, José Luiz Miranda de Almeida e Lígia Maria Coelho Ferreira.

Banco Mundial

GOVERNO FEDERAL

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ApresentaçãoSérie Água Brasil

O Brasil concentra uma das maiores reservas de água doce do mundo que, aliada à sua biodiversidade e à beleza dos seus rios e lagos, representa um importante patrimônio natural do País. Todavia, os problemas relacionados à distribuição espacial e temporal

da água têm representado enormes desafios para milhares de brasileiros. Neste contexto, o BancoMundial se insere como um agente de desenvolvimento, disponibilizando assistência técnica,experiências internacionais e apoio financeiro para a elaboração e a implementação de programassociais de impacto, visando a melhoria das condições de vida daqueles que são mais afetados poresses problemas.

Durante a última década, problemas de escassez e poluição da água têm exigido dos governos e dasociedade em geral uma maior atenção para o assunto. Expressivos avanços foram alcançados aolongo dos últimos 40 anos, quando o Brasil ampliou seus sistemas de abastecimento de água paraservir uma população adicional de 100 milhões de habitantes, enquanto mais de 50 milhões debrasileiros passaram a ter acesso a serviços de esgotamento sanitário. Nos últimos sete anos,houve uma ampliação de cerca de 34% nas áreas irrigadas, com conseqüentes benefícios na produçãode alimentos, geração de empregos e renda. O desenvolvimento hidroelétrico permitiu uma evoluçãodo acesso à energia elétrica de 500 KWh para mais de 2.000 KWh per capita, em 30 anos.

Entretanto, ainda existem imensos desafios a enfrentar em um País onde o acesso à água ainda émuito desigual, impondo enormes restrições à população mais pobre. Apenas na região Nordestedo País, mais de um terço da população não tem acesso confiável ao abastecimento de água potável.A poluição de rios e outros mananciais em regiões metropolitanas continua se alastrando. O Paístem enfrentado terríveis perdas com enchentes, sobretudo em áreas urbanas de risco, que sãodensamente povoadas por famílias de baixa renda e onde, normalmente, os serviços de saneamentobásico são precários ou inexistentes.

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Apresentação viii

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

Há uma necessidade premente de dar continuidade ao processo, já iniciado, de desenvolvimento emelhor gerenciamento dos recursos hídricos para atender demandas sociais e econômicas. Nessesentido, é essencial estender o abastecimento de água e o esgotamento sanitário para quem não temacesso confiável e de qualidade a estes serviços. O Banco Mundial, atuando nos setores de recursoshídricos e saneamento, tem apoiado o Brasil no esforço de elevar o nível de atenção para os temasligados a “agenda d’água”, de modo a torná-la parte efetiva de um processo integrado de construçãode um País mais justo, competitivo e sustentável.

A Série Água Brasil é fruto do trabalho conjunto do Banco Mundial e seus parceiros nacionais,realizado ao longo dos últimos anos. Nela, são levantadas e discutidas questões centrais para asolução de alguns dos principais problemas da agenda d’água no Brasil. Desde o lançamento doseu primeiro volume, em 2003, a Série Água Brasil vem abordando questões relevantes, promovendoreflexões, propondo alternativas para a busca de soluções para os grandes desafios que seapresentam. É com prazer que constatamos que a Série Água Brasil se transformou em um veículode profícuo e contínuo debate, contribuindo para consecução dos objetivos comuns de redução dapobreza, inclusão social, preservação do patrimônio natural e crescimento econômico sustentável.

Vinod ThomasDiretor para o Brasil e Vice-Presidente do Banco Mundial

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Sumário

1. Introdução .................................................................................................................... 3

1.1. Caracterização do Problema ............................................................................... 5

1.2. Objetivos ........................................................................................................... 6

1.3. Estrutura do Trabalho ........................................................................................ 6

2. Contextualização dos Recursos Hídricos no Estado do Ceará.................................... 9

2.1. Caracterização Hidrológica ................................................................................. 10

2.2. A Gestão dos Recursos Hídricos ......................................................................... 13

2.2.1 Os Instrumentos da Gestão ................................................................ 13

2.2.2 O Apoio à Organização dos Usuários de Água .................................... 14

2.2.3 Os Planos de Recursos Hídricos ........................................................ 16

2.2.4 O Monitoramento dos Sistemas Hídricos ........................................... 17

2.2.5 A Operação dos Sistemas Hídricos..................................................... 17

2.2.6 A Manutenção da Infra-estrutura Hídrica ........................................... 18

3. Base Conceitual ............................................................................................................ 19

3.1 Funções Hídricas ............................................................................................... 20

3.1.1 A Gestão ........................................................................................... 20

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Sumário x

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

3.1.2 A Oferta ............................................................................................ 21

3.1.3 O Uso ............................................................................................... 22

3.1.4 A Preservação ................................................................................... 22

3.1.5 As Funções Complementares ............................................................. 22

3.2 Modelos Institucionais de Recursos Hídricos ....................................................... 22

3.2.1 Órgãos Gestores ................................................................................ 24

3.2.2 Agências de Água .............................................................................. 26

3.3 Modelos Institucionais Alternativos ..................................................................... 27

3.3.1 O Modelo da França .......................................................................... 27

3.3.2 O Modelo dos Estados Unidos da América ......................................... 29

3.3.3 O Modelo da Holanda ....................................................................... 31

3.3.4 O Modelo de Israel ............................................................................ 32

3.3.5 O Modelo do Chile ............................................................................ 34

3.3.6 O Modelo do Brasil ........................................................................... 35

3.3.7 O Modelo do Ceará ........................................................................... 36

4. Análise Qualitativa dos tipos de Órgãos Gestores e de Agências de Água ................. 39

4.1 Amostra Selecionada .......................................................................................... 40

4.2 Análise dos Órgãos Gestores .............................................................................. 41

4.2.1 SUDERHSA ..................................................................................... 41

4.2.2 DAEE ............................................................................................... 42

4.2.3 IGAM ............................................................................................... 44

4.2.4 AAGISA ........................................................................................... 45

4.2.5 IGARN ............................................................................................. 46

4.2.6 COGERH ......................................................................................... 47

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Sumárioxi

4.3 Análise das Agências de Água ............................................................................. 48

4.3.1 Agência do Alto Iguaçu e Alto Ribeira ................................................ 48

4.3.2 Agência dos Rios Sorocada e Médio Tietê .......................................... 50

4.3.3 Agência do CEIVAP .......................................................................... 51

4.3.4 Agência dos Rios Pará, Paraopeba e das Velhas ................................. 52

5. Concepção de um modelo de Agência de Água para o Ceará ..................................... 53

5.1 Condicionantes do Modelo ................................................................................. 53

5.2 Formulação do Modelo ...................................................................................... 55

6. Conclusões .................................................................................................................... 61

Referências Bibliográficas ............................................................................................................ 63

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Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

Tabela 3.1 Funções de Recursos Hídricos de acordo com o PLANERH – Ceará ............. 21

Tabela 5.1 Condicionantes de Características da Agência de Água ................................... 57

Lista de Tabelas

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Lista de Figuras

Figura 2.1 Macroregiões Pluviométricas ............................................................................... 11

Figura 2.2 Mapa Geológico .................................................................................................. 12

Figura 2.3 Regiões Hidrográficas do Estado do Ceará ........................................................... 16

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Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

Lista de Siglas e Abreviaturas

AAGISA Agência de Águas, Irrigação e Saneamento do Estado da Paraíba

ANA Agência Nacional de Água

ABRH Associação Brasileira dos Recursos Hídricos

ABH-SMT Agência das Bacias Hidrográficas dos Rios Sorocaba e Médio Tietê

AGIR Agente de Guarda e Inspeção de Reservatório

CBH Comitê de Bacia Hidrográfica

CBH-PARÁ Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Pará

CBH-VELHAS Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas

CBH-SMT Comitê das Bacias Hidrográficas dos Rios Sorocaba e Médio Tietê (São Paulo)

CBRMF Comitê das Bacias da Região Metropolitana de Fortaleza

CEIVAP Comitê para Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul

CERH/PR Conselho Estadual de Recursos Hídricos do Paraná

CGERH Coordenadoria de Gestão de Recursos Hídricos da Secretaria dos Recursos Hídricosdo Ceará

CIBAPAR Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba

COGERH Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará

COMIRH Comitê Estadual de Recursos Hídricos do Estado do Ceará

CONAMA Comisión Nacional del Medio Ambiente (Chile)

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xv Lista de Siglas e Abreviaturas

CONERH Conselho Estadual de Recursos Hídricos do Ceará

CORHI Comitê Coordenador do Plano Estadual de Recursos Hídricos de São Paulo

CREA Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia

DAEE Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo

DEGERH Departamento de Gestão dos Recursos Hídricos da Secretaria dos Recursos Hídricosdo Estado do Ceará

DESOH Departamento de Engenharia e Segurança de Obras Hidráulicas da COGERH

DGA Dirección General de Aguas (Chile)

DNOCS Departamento Nacional de Obras Contra as Secas

EPA Agência de Proteção do Meio Ambiente (Estados Unidos)

FEHIDRO Fundo Estadual de Recursos Hídricos de São Paulo

FRHI/PR Fundo Estadual de Recursos Hídricos do Paraná

FUNCEME Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos

FUNORH Fundo Estadual de Recursos Hídricos do Ceará

IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDH Índice de Desenvolvimento Humano

IFOCS Inspetoria Federal de Obras contra as Secas

IGAM Instituto Mineiro de Gestão das Águas

IGARN Instituto de Gestão das Águas do Estado do Rio Grande do Norte

IOCS Inspetoria de Obras Contra as Secas

IPECE Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará

MMA Ministério do Meio Ambiente

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Lista de Siglas e Abreviaturas xvi

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MOP Ministério de Obras Públicas

OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público

OS Organização Social

PIB Produto Interno Bruto

PLANERH Plano Estadual de Recursos Hídricos do Ceará

PLERH/PR Plano Estadual de Recursos Hídricos do Paraná

PLIRHINE Plano de Aproveitamento Integrado dos Recursos Hídricos do Nordeste

PROÁGUA Subprograma de Desenvolvimento Sustentável de Recursos Hídricos do Semi-áridoBrasileiro

PROGERIRH Projeto de Gerenciamento e Integração dos Recursos Hídricos do Ceará

PROURB Projeto de Desenvolvimento Urbano e Gestão de Recursos Hídricos

RIZA Instituto do Estado para a Depuração das Águas Residuais (Holanda)

SAGE´S Schéma d´Aménagement et de Gestion des Eaux

SDAGE´S Schéma Directeur d´Aménagement et de Gestion des Eaux

SEMACE Superintendência Estadual do Meio Ambiente do Ceará

SEMARH Secretaria Extraordinária do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e Minerais doEstado da Paraíba

SEPLAN Secretaria de Planejamento e Coordenação

SEGRH/PR Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Paraná

SERHID Secretaria de Estado de Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte

SIGRH Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Estado do Paraná

SIGERH Sistema Integrado de Gestão de Recursos Hídricos do Estado do Ceará

SOHIDRA Superintendência de Obras Hidráulicas do Estado do Ceará

SRH Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará

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Lista de Siglas e Abreviaturasxvii

SUDENE Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste

SUDERHSA Superintendência de Desenvolvimento dos Recursos Hídricos e Saneamento Ambientaldo Estado do Paraná

UED´s Unidades Executivas Descentralizadas

UFC Universidade Federal do Ceará

ZCIT Zona de Convergência Intertropical

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Prefácio

Aprova mais evidente de que a água é a fonte e o sustento da vida natural, foi o marco que o discurso hídrico representou nos conceitos de sustentabilidade do meio ambiente.

Nenhum outro elemento trouxe à tona, tão fortemente, a palavra gestão e o seu significado como instrumentocapaz de estabelecer novos paradigmas para as tarefas da sociedade moderna.

O desempenho dos projetos, a perenidade das ações, a efetividade dos benefícios, a eficiência dos resultados,a medida plena da atividade empreendedora, toda esta adjetivação substantiva tem conseqüência quando apalavra gestão vira atitude real. Escrever sobre gestão é pensar no futuro, é conseguir resultados na construçãoda idéia. O conceito sistêmico e gestor, sempre foram palavras contundentes quando surgiram os primeirossinais da política hídrica.

Se projeto é criação filosófica, obra é arquitetura, gestão é ofício e arte. São conceitos naturais, humanos,sociais e culturais que influem no difícil processo de gerenciamento.

O trabalho do Engº Francisco José Coelho Teixeira tem o mérito de analisar e aprofundar os aspectosinstitucionais da gestão dos recursos hídricos, buscando, a partir da experiência do Ceará, comparar ediscutir conceitos universais de outros estados e países.

Ao abordar o modelo cearense, avaliou sua coerência com os aspectos climáticos e fisiográficos da região,procurando estabelecer razões para o aparato jurídico e institucional do marco regulatório de uma zonasemi-árida.

A tese de Teixeira é rica de conceitos técnicos e, ao mesmo tempo, um documento atualizado no plano legale da organização de institutos, normas e instrumentos reguladores. Retrata também a estratégia deimplementação de um modelo democrático e participativo, que possa conduzir o processo decisório deoperação de um sistema hídrico, resgatando a cidadania e colocando a presença do estado na condição dejuiz moderador como administrador de conflitos entre usuários de água.

Afinal, o trabalho do Engº Teixeira, é uma mensagem para as novas gerações de profissionais que se voltampara difícil tarefa de administrar os recursos hídricos da natureza.

Hypérides Pereira de MacêdoSecretário de Infra-Estrutura Hídrica do

Ministério da Integração Nacional

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Introdução

OEstado do Ceará, tendo a quase totalidadedos seus 148.826 km² (Resolução Nº 5/2002do IBGE) de área territorial inseridos no

semi-árido do Nordeste brasileiro, possuicaracterísticas físicas e socioeconômicas que otornam uma região única quanto ao estabelecimentode uma política de recursos hídricos. Dentre estascaracterísticas, destacam-se três das quais decorre,praticamente, toda a vulnerabilidade hídrica a queestá submetida a população residente no interior doEstado.

A primeira está relacionada com o clima semi-árido,caracterizado por um regime de chuvas altamentevariável e um déficit hídrico anual, haja vista o fatode que, enquanto a média anual das precipitações éde cerca de 800mm, a média da evaporação porano é de mais de 2000mm.

A segunda característica diz respeito à intermitênciados rios e à limitação na disponibilidade de recursoshídricos subterrâneos, decorrentes da geologia ondepredomina (em cerca de 75% do território estadual)o embasamento cristalino coberto por solos rasos.

Finalmente, o terceiro aspecto está associado aoelevado percentual de população rural (mais de 30%dos 7,42 milhões de habitantes do Estado),distribuída de forma difusa no território, apresentandoalto nível de pobreza, dificultando o seuabastecimento através de sistemas hídricoseconomicamente viáveis e sustentáveis sob a ópticahidrológica.

A política de recursos hídricos, empreendida noEstado do Ceará, apresenta duas fases bem distintas,tendo como marco delimitador a criação daSecretaria dos Recursos Hídricos em 1987.

Antes de 1987, não havia no âmbito estadualequipamento institucional próprio para o setor dosrecursos hídricos, tampouco uma atuação nesta áreade forma planejada e estruturada. Na esfera estadual,as ações eram desenvolvidas de forma dispersa pordiversas instituições, resumindo-se à construção depoços e de pequenos açudes, sem a adoção dosdevidos critérios técnicos, portanto pouco ou quasenada contribuindo para a diminuição davulnerabilidade do Estado às secas. As intervençõesimplementadas com a utilização de critérios técnicose de algumas ferramentas de planejamento, por isso,contribuíram para diminuir a vulnerabilidade hídricado Estado, foram aquelas desenvolvidas no âmbitofederal, basicamente pelo Departamento Nacionalde Obras contra as Secas – DNOCS. Emboraimplantada de forma desordenada e isolada ao longodos últimos 90 anos, quase sempre seguindo aperiodicidade das grandes secas no Nordeste – poisnão houve um compromisso mais efetivo de váriosgovernos federais – a infra-estrutura hídricaconstruída pelo DNOCS não apenas contribuiu parao desenvolvimento da irrigação nos vales dos maioresrios estaduais (Jaguaribe, Curu e Acaraú), comotambém, ao armazenar cerca de 80% dos estoquesde água do Estado, possibilita o abastecimentohumano e animal de boa parte dos municípios doCeará.

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1. Introdução 4

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

Com a criação da Secretaria dos Recursos Hídricos– SRH, em 1987, o Governo do Ceará deixa de serum agente passivo, passando a atuar de forma ativano sentido de estabelecer os instrumentos técnicos,jurídicos e institucionais para uma nova política deágua no Estado. Deste modo, entre 1988 e 1991,foi elaborado o Plano Estadual de Recursos Hídricos– PLANERH, fornecendo os subsídios necessáriospara o estabelecimento de uma ordenação jurídicae institucional que começou a ser implementada coma promulgação da Lei Estadual de Recursos Hídricosem 1992. O PLANERH forneceu, ainda, um imensoconjunto de dados e informações técnicas quepossibilitaram, a partir de 1993, a criação deprogramas, por parte do Governo Estadual,objetivando a ampliação da infra-estrutura hídrica ea implementação do modelo de gerenciamento dosrecursos hídricos preconizado pela norma há poucoreferenciada.

O PROURB-RH (Projeto de DesenvolvimentoUrbano e Gestão dos Recursos Hídricos), criadoem 1993, foi o primeiro grande programa de recursoshídricos do Estado do Ceará. Tendo como parceiroo Banco Mundial, o Governo Cearense conseguiu,no âmbito deste programa, estruturar o sistemaestadual de recursos hídricos, ao mesmo tempo emque realizou substancial ampliação da infra-estruturahídrica para dar suporte ao abastecimento humano.Dentre as realizações desse programa, merecemdestaque não apenas o fortalecimento institucionalda Secretaria dos Recursos Hídricos – SRH e desua vinculada SOHIDRA – Superintendência deObras Hidráulicas, mas, fundamentalmente, acriação da COGERH – Companhia de Gestão dosRecursos Hídricos. Como realizações de caráterestrutural, destaca-se a construção de açudes demédio porte para se obter melhor distribuiçãoespacial dos estoques de água, como também aimplantação de adutoras de água tratada para oabastecimento de sedes municipais.

Credenciado pelo sucesso alcançado naimplementação do PROURB-RH, o Governo doCeará concebeu um segundo e mais ambiciosoprograma e atraiu, mais uma vez, a parceria do Banco

Mundial. O PROGERIRH – Programa deGerenciamento e Integração dos Recursos Hídricosdo Ceará foi criado em 1997 com o intuito de dotaro Estado do Ceará de uma infra-estrutura hídrica ede um aparato técnico, operacional e institucionalno gerenciamento dos recursos hídricos capazes dedar suporte não só ao seu abastecimento humano,mas também ao seu desenvolvimento econômico.Concebido à semelhança do PROURB-RH, oPROGERIRH, além de conter um componente dagestão dos recursos hídricos mais amplo, apresentou,diferentemente do programa anterior, umcomponente para estudo e gerenciamento dosaqüíferos estaduais estratégicos e outro sistema paraimplantação de um projeto-piloto dedesenvolvimento sustentável de microbaciashidrográficas do semi-árido cearense. Contudo, ocomponente de maior destaque do PROGERIRH éo de estudo e implantação de eixos de integração debacias hidrográficas.

Com a vantagem de ser um Estado que muitoavançou na política setorial dos recursos hídricosao longo dos últimos dez anos, o Ceará tem sidoum dos maiores beneficiários do PROÁGUA –Subprograma de Desenvolvimento Sustentável deRecursos Hídricos do Semi-árido Brasileiro,patrocinado pelo Governo Federal em parceria como Banco Mundial.

Apesar dos grandes resultados alcançados peloEstado do Ceará na implementação de uma modernapolítica de recursos hídricos, hoje se constata queresta muito por fazer. O maior desafio anteposto é aconsolidação definitiva do modelo institucional derecursos hídricos do Estado. Foi justamente omodelo institucional adotado pelo Estado nos últimosoito anos (a partir de 1995), que possibilitou osavanços hoje reconhecidos não apenas pelasociedade cearense, mas também pelo BancoMundial, por especialistas de todo o Brasil e doexterior, a ponto de o Ceará servir de exemplo paraoutros estados brasileiros. Este modelo estabeleceua SRH como organismo coordenador da políticaestadual dos recursos hídricos, tendo três vinculadashierárquicas: a SOHIDRA, na qualidade de órgão

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1. Introdução5

executor das obras hidráulicas, a COGERH, comoentidade gerenciadora dos recursos hídricos, e aFUNCEME – Fundação Cearense de Meteorologiae Recursos Hídricos, responsável pelomonitoramento climático e pela pesquisa e estudosaplicados em recursos hídricos e meio ambiente.Entretanto, a partir de fevereiro de 2003, no âmbitode uma reforma institucional promovida peloGoverno Estadual, a FUNCEME deixou de ser umavinculada da SRH e passou a fazer parte daSecretaria de Ciência e Tecnologia. Havia ainda, noâmbito da mesma reforma, uma proposta que depoisfoi descartada, de extinção da SOHIDRA e absorçãode suas funções pela COGERH.

A recente reforma administrativa empreendida peloGoverno do Estado do Ceará, como também aquelaspromovidas por outros governos estaduais e peloGoverno Federal, demonstram a fragilidade dasinstituições públicas no Brasil, pois sempre estãoexpostas às alterações institucionais realizadas a cadamudança nos poderes executivos estaduais e federal.

1.1. CARACTERIZAÇÃO DO PROBLEMA

A partir do início dos anos 1990, por influência dosnovos paradigmas estabelecidos pela ConferênciaInternacional sobre Água e Meio Ambiente, realizadaem Dublin (Eire) em janeiro de 1992, algunsgovernos estaduais brasileiros e o próprio GovernoFederal trataram de estabelecer as bases dos seusrespectivos ordenamentos jurídicos e institucionais,visando à implementação dos princípios básicos damoderna gestão dos recursos hídricos.

Antecipando-se à União, o Governo do Estado doCeará, que criou a Secretaria dos Recursos Hídricosem 1987, promulgou a Lei Nº 11.996, em 1992,dispondo sobre a Política Estadual de RecursosHídricos e instituindo o Sistema Integrado de Gestãodos Recursos Hídricos. No ano seguinte, em 1993,através da Lei Nº 12.217, foi criada a Companhiade Gestão dos Recursos Hídricos – COGERH, coma função de operacionalizar o gerenciamento dosrecursos hídricos no território estadual.

Na esfera federal, uma legislação moderna, específicapara recursos hídricos, apareceu apenas em 1997,com a promulgação da Lei Nº 9.433, instituindo aPolítica Nacional de Recursos Hídricos e criando oSistema Nacional de Gerenciamento de RecursosHídricos.

Elaborada sob forte influência do modelo francês, aLei Nº 9.433 institui, como integrantes do SistemaNacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos,as agências de água. Estes organismos devemexercer, segundo a referida lei federal, a função desecretarias executivas dos respectivos comitês debacias, com atribuições de natureza técnica,administrativa e financeira na gestão participativa edescentralizada dos recursos hídricos. Sendo ainstituição criada pelo comitê de bacia hidrográficapara exercer a cobrança pelo uso das águas e, comestes recursos, financiar ações de controle epreservação dos corpos hídricos na própria bacia, aagência de água é o mecanismo essencial para oalcance dos objetivos de uma gestão compartilhadados recursos hídricos.

O surgimento da referida legislação federal arrefeceuum processo de discussão, já em andamento noEstado do Ceará, sobre a possibilidade de se criaragências de água no âmbito das bacias hidrográficasestaduais. Vale salientar que a legislação estadualnão prevê este tipo de instituição, como também alei de criação da COGERH não lhe confere,claramente, o papel de agência de água, tese quealguns técnicos defendem.

Do assunto exposto acima, podem ser suscitadasalgumas questões:

– O modelo de agência de água, preconizado pelaLei Nº 9.433, se aplicaria de forma adequadaa uma região semi-árida, de rios intermitentes,como é o caso de grande parte do Nordestebrasileiro, mais precisamente o Ceará?

– Considerando-se as condições econômicas,sociais e culturais do povo cearense, seriaconveniente a adoção pura e simples do modelo

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Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

1. Introdução

de agência de água estabelecido pela Lei Nº9.433?

– Diante da necessidade de se levar emconsideração o fator escala, a fim de se obter asustentabilidade operacional dos sistemashídr icos, não seria mais conveniente ainstituição de única agência de água para todasas bacias hidrográficas do Estado do Ceará?

– Tendo já em sua ordem institucional um órgãode gerenciamento dos recursos hídricos, no casoa COGERH – responsável pela alocação daágua de forma participativa, em articulação comos comitês de bacias hidrográficas, e que exercea operação, o monitoramento e a manutençãoda infra-estrutura hídrica – necessitaria o Estadodo Ceará de agências de água no modelopreconizado pela Lei Nº 9.433?

– que faltaria à COGERH para, além das funçõesque já desenvolve, desempenhar tambématribuições que a legitimem perante os comitêscomo agência de água?

1.2. OBJETIVOS

O objetivo geral da pesquisa em foco é estabeleceruma proposta de aperfeiçoamento do sistema degerenciamento de recursos hídricos do Estado doCeará, por intermédio da proposição de um modeloinstitucional de agência de água para as baciashidrográficas estaduais, tendo por base oconhecimento da política e da estrutura orgânica daságuas de alguns países e a análise qualitativa daCOGERH e de outras instituições do Brasil quedesempenham as funções de órgão gestor ou deagência de água.

Os objetivos específicos são os elencados a seguir:

– verificar se o modelo apropriado de agência deágua para o Ceará deverá estar baseado em umorganismo único para todas as baciashidrográficas, controlado pelo Estado, mas tendo

a participação dos comitês de bacias na suaadministração;

– analisar a suposição de que uma agência deágua para a região do semi-árido brasileiro, nocaso o Estado do Ceará, terá que não sódesempenhar funções específicas degerenciamento, como também de oferta de águabruta;

– estudar a possibilidade de a COGERH, sendoalvo de alterações de caráter institucional,desenvolver o papel de agência de água para oEstado do Ceará.

1.3. ESTRUTURA DO TRABALHO

O relatório configurado no presente ensaio foidesenvolvido em 6 (seis) capítulos. O Capítulo 1compreende a introdução ao trabalho, abordando acaracterização do problema e os objetivos geral eespecíficos da pesquisa desenvolvida.

O módulo seguinte apresenta a contextualização dosrecursos hídricos no Estado do Ceará,compreendendo a sua caracterização hidrológica eos aspectos da gestão dos recursos hídricos estaduais.

O Capítulo 3 discorre sobre a base conceitualinerente às funções hídricas e modelos institucionaisde recursos hídricos, enfatizando os conceitos eatribuições de órgão gestor e de agência de água, àluz do modelo do Ceará, do Brasil e de outros países.

Na seqüência é realizada uma análise qualitativa dostipos de órgãos gestores e de agências de água, apartir de uma amostra selecionada dentre os modelosdos estados brasileiros, com o intuito de fornecersubsídios para a definição de um modelo de agênciade água para o Ceará, assunto enfeixado no Capítulo4.

Tomando-se por base a análise realizada no segmentoanterior, o Capítulo 5 faz uma abordagem doscondicionantes hidrológicos, sociais, econômicos,

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71. Introdução

legais e institucionais para a concepção de um modelode agência de água para o Ceará.

Na matéria de arremate – Capítulo 6 – sãoapresentadas, em função da base conceitual

abordada, da análise qualitativa realizada e do modeloconcebido, as conclusões a que chegou a busca orarelatada.

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Aincerteza e a irregularidade das chuvas, obaixo potencial em águas subterrâneas e aintermitência dos rios condicionaram o

Governo Federal e os governos dos estados doNordeste semi-árido e, particularmente, o Governodo Estado do Ceará, a seguirem uma política comvistas à criação de uma infra-estrutura hídrica,baseada na construção de açudes, como forma degarantir, no tempo e no espaço, o abastecimentodas populações da região.

Conforme Peixoto (1994), data de 1832 a definiçãodo Poder Público Estadual de escolher a alternativada açudagem no Ceará, como forma de armazenarágua nos períodos chuvosos para atendimento dasdemandas nos períodos secos. Em 26 de setembrode 1836, o Presidente da Província José Martinianode Alencar promulgou a Lei Nº 59, estabelecendono orçamento daquele ano gratificações de doiscontos de réis aos que “fabricassem” açudes emsuas terras. No ano seguinte, a Lei Nº 84 reduzia oincentivo governamental para 50% do valor inicial.Este incentivo foi reduzido ainda mais no governoseguinte, conforme Lei N° 195, de 9 de janeiro de1840.

Em 1º de agosto de 1843, o Presidente da ProvínciaJosé Maria da Silva Bittencourt, dando prova deseriedade na condução da política de açudagem,sancionou a Lei Nº 302, onde determinava: “osproprietários de açudes, cujas gratificações já forame houveram de ser pagas, serão obrigados a tê-lossempre consertados sob pena de pagarem à tesourariauma multa de 20% do valor da respectiva gratificação,todas as vezes que por semelhantes faltas, passar o

2Contextualização dos Recursos

Hídricos no Estado do Ceará

açude dois anos sem água, ou o uso público deleestiver proibido...”. Referida Lei estabelecia aindadiversas condições para recebimento da ajudagovernamental, visando a assegurar ao açude as suasfunções sociais e econômicas.

O Governo Provincial prosseguiu induzindo apolítica de construção de pequenos barramentos emrios e riachos, ou fechamentos de sangradourosnaturais de lagoas, tendo em vista o suprimentohídrico de populações e de cultivos agrícolas.Entretanto, em 1848 essa política de açudagem foiinterrompida, sendo retomada dez anos depois(1858) com a Província assumindo compromissosorçamentários para construção de vários açudes.Destaca-se, como obra desta época, o açude SantoAntônio do Pitaguari, localizado a 30km de Fortaleza,construído por iniciativa privada em 1866.

Das ações empreendidas pela Coroa Imperial duranteeste mesmo período, caracterizadas por missões aoNordeste que acabam por propor a construção deaçudes com capacidade acima de um milhão demetros cúbicos em locais previamente identificados,surge o açude Cedro, em Quixadá, cuja obra foiconcluída em 1906 (SOUZA FILHO, 2001).

Esta fase da política de recursos hídricos caracteriza-se pela total ausência de organização institucionaltanto no âmbito da Província do Ceará como nonível do Império Brasileiro.

Com a criação da IOCS (Inspetoria de Obras contraas Secas), em 1909, que mais tarde foi chamada deIFOCS (Inspetoria Federal de Obras contra as

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2. Contextualização dos Recursos Hídricos 10

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

Secas) e finalmente de DNOCS (DepartamentoNacional de Obras contra as Secas), iniciou-se umafase caracterizada por planos singulares e nãopermanentes, visando à implementação de uma infra-estrutura hídrica no Nordeste.

Deve-se destacar o fato de que, até 1987, o GovernoEstadual, por questões políticas, financeiras e faltade capacidade técnica e de organização institucional,teve uma atuação apenas discreta na área de recursoshídricos. Ao Governo Federal, a quem compete ocombate aos efeitos das secas por determinaçãoconstitucional, coube um papel mais destacado naimplantação de uma infra-estrutura hídrica queatendesse adequadamente às diferentes demandas.Entretanto, esta atuação se deu de formadescontínua, provocando um desequilíbrio entreoferta e demanda em várias regiões do Estado. Comoresultado, a cada seca as populações eram atingidasfortemente, tornando-se praticamente impossível aconvivência com a irregularidade das chuvas.

A partir de 1987 – consoante já se adiantou – oGoverno do Estado do Ceará tomou a iniciativa,paralelamente à ação do Governo Federal,promovendo, com recursos financeiros próprios,programas na área de recursos hídricos. Paracoordenar a tarefa de aumentar a oferta d’água eassumir o controle da política de recursos hídricos,o Governo criou no mencionado ano a Secretariade Recursos Hídricos – SRH e a Superintendênciade Obras Hidráulicas – SOHIDRA, havendo tambémreestruturado a Fundação Cearense de Meteorologiae Chuvas Artificiais – FUNCEME, dando a essainstituição atribuições nas áreas de estudos,pesquisas e treinamento em recursos hídricos,passando a chamar-se Fundação Cearense deMeteorologia e Recursos Hídricos.

Após este avanço institucional, a SRH contratou aelaboração do Plano Estadual de Recursos Hídricos– PLANERH, o qual, concluído em 1991, forneceuos subsídios para a criação da Lei Nº 11.996, de 24de julho de 1992, instituindo o Sistema Integradode Gestão de Recursos Hídricos – SIGERH.

No período compreendido entre a data de sua criaçãoe a de promulgação da Lei Estadual de RecursosHídricos (1992), a SRH apresentava nas suas açõesum viés de órgão setorial no âmbito dos recursoshídricos, uma vez que sua principal missão era aimplementação de uma política de irrigação.

A partir de 1992, a SRH adotou como prioridade aampliação da infra-estrutura hídrica, baseada naconstrução de açudes de médio porte e de adutoras,de forma a reduzir o déficit hídrico, principalmentepara o abastecimento humano e para a pequenairrigação. Ao mesmo tempo, eram estruturadas naFUNCEME as bases de um sistema demonitoramento hidrológico estadual, medindo-seperiodicamente os níveis d’água de alguns açudesestratégicos e a vazão de perenização em algunstrechos dos rios Jaguaribe e Banabuiú. É ainda desteperíodo, a criação do DEGERH - Departamento deGestão dos Recursos Hídricos da SRH, tendo comoatribuição planejar, administrar e controlar a oferta,o uso e a preservação dos recursos hídricos.Iniciava-se, deste modo, a elaboração de uma baseinstitucional para a implementação do SIGERH, queculminou com a criação da COGERH – Companhiade Gestão dos Recursos Hídricos, em 1993.

Desde 1993, com o advento do PROURB - RH e acriação da COGERH, a política estadual de recursoshídricos vem auferindo avanços relacionados tantocom a gestão, como com a ampliação da infra-estrutura hídrica. O PROURB – RH (Projeto deDesenvolvimento Urbano e Gestão dos RecursosHídricos), criado em 1993, o PROGERIRH (Projetode Gerenciamento e Integração dos RecursosHídr icos), criado em 1997, ambos comfinanciamentos do Banco Mundial junto ao GovernoEstadual, conferiram as condições financeirasnecessárias para a implementação do SIGERH, oraem desenvolvimento.

2.1. CARACTERIZAÇÃO HIDROLÓGICA

O regime pluviométrico do Ceará se caracteriza poruma grande variabilidade temporal e espacial daschuvas. A distribuição das precipitações no tempo

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2. Contextualização dos Recursos Hídricos11

apresenta uma concentração da estação chuvosa nosmeses de dezembro a junho e uma grandeirregularidade interanual. As chuvas que acontecemem dezembro e janeiro são chamadas chuvas depré-estação e ocorrem mais intensamente na regiãodo Cariri. Em fevereiro de cada ano, inicia-se achamada quadra chuvosa do Estado do Ceará, quese estende até maio. As chuvas nesse período sãoinfluenciadas, principalmente, pela presença da Zonade Convergência Intertropical – ZCIT, consideradao principal sistema ocasionador da pluviometria nonorte do Nordeste.

A pluviosidade média anual no Estado é de 870mm,porém essa média varia de região para região doEstado, por exemplo: Litoral Norte 1015,5mm,Litoral de Pecém 941,1mm, Litoral de Fortaleza

Figura 2.1 – Macrorregiões Pluviométricas

NFonte: FUNCEME

ESC 1:2.800.000

1223,1mm, Maciço de Baturité 1152,1mm, Ibiapaba1047,8mm, Jaguaribana 841,0mm, Cariri 919,6mme Sertão Central e Inhamuns, 746,5mm (Fonte:Banco de dados FUNCEME). Essa diferença deprecipitação, ocorrida de região para região, denotaa variabilidade espacial das chuvas no Estado doCeará (Figura 2.1).

Em função da irregularidade interanual dasprecipitações, não é rara a ocorrência de anosextremamente secos ou exageradamente chuvosos.A oscilação irregular de anos de altas e baixaspluviosidades enseja dois problemas bastanteconhecidos pelos cearenses:

– as secas que atingem todo o território estadual,conduzindo grande parte da população ao estadode calamidade pública;

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2. Contextualização dos Recursos Hídricos 12

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Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

– as enchentes que atingem os habitantes das áreasaluviais, principalmente dos rios Jaguaribe eAcaraú.

A ocorrência de um déficit hídrico natural na maioriados meses do ano, em função das elevadas taxas deevaporação (mais de 2000mm), associada àpredominância do embasamento cristalino cobertopor solos rasos em cerca de 75% do territórioestadual, ensejam a intermitência de toda a redehidrográfica do Estado. O regime intermitente dosrios e a baixa disponibilidade de água subterrânea(em quantidade e qualidade) exigem dos habitantesdo semi-árido a construção de pequenos açudes parasatisfazer às suas necessidades em água e as dosseus rebanhos. Entretanto, os pequenos açudes são

capazes de promover somente uma regularizaçãoanual, pois a grande maioria seca durante as estiagensprolongadas. A regularização interanual das águassuperficiais somente é possível através dosreservatórios de médio e grande porte, construídosna grande maioria pelo DNOCS e parte peloGoverno Estadual. De acordo com os relatórios demonitoramento da COGERH, a capacidade total deacumulação da rede de reservatórios permanentesdo Estado do Ceará alcança, já incluindo a barragemdo Castanhão, 17,5 bilhões de metros cúbicos,podendo-se dispor de uma vazão regularizada demais de 100 m3/s (com 90% de garantia).

A formação geológica do Estado do Ceará, com cercade 75% do seu território assente sobre rochas

Figura 2.2 – Mapa Geológico

BACIA COSTEIRADUNAS/BARREIRAS

BACIA DOAPODI

BACIA DOIGUATU

BACIA DASERRA GRANDE

CRISTALINO

BACIA DOARARIPE

NFonte: SRH

FORTALEZA

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2. Contextualização dos Recursos Hídricos13

cristalinas, na sua parte central, e somente 25%situado sobre formações sedimentares, nas suasextremidades (Figura 2.2), faz com que o potencialem recursos hídricos subterrâneos seja bastantebaixo. Desta forma, os principais aqüíferossedimentares fornecem água, em razoáveisquantidades, para o abastecimento humano e para airrigação, somente em parte da região do Cariri (suldo Estado), parte da chapada do Apodi (extremoleste do Estado), pequenas áreas da região de Iguatu(centro-sul), da Ibiapaba (extremo oeste) e do litoral(extremo norte). Na grande região central do Estado,a água subterrânea só é encontrada, com enormeslimitações de quantidade e qualidade, nasfraturasdas rochas cristalinas e nas aluviões dosprincipais rios, neste último caso quase sempreassociada a água superficial resultante da perenizaçãodos açudes.

2.2. A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOSA política dos recursos hídricos do Estado do Ceará,instituída pela Lei Nº 11.996, de 24 de julho de1992, estabelece mecanismos para que a água dedomínio estadual seja gerenciada de forma integrada,participativa e descentralizada.

Considerando a importância da garantia da ofertade água, como fator determinante para odesenvolvimento econômico e social do Ceará, oGoverno Estadual criou, em 1993, a Companhia deGestão dos Recursos Hídricos – COGERH, tendocomo missão efetuar o gerenciamento dos recursoshídricos superficiais e subterrâneos de domínio doEstado. A COGERH, vinculada à Secretaria dosRecursos Hídricos – SRH, gerencia a água noterritório, exercendo funções de caráter técnico eoperacional, enquanto a própria SRH, comodetentora do poder de polícia sobre a água,desempenha, através da sua Coordenadoria deGestão dos Recursos Hídricos – CGERH, as funçõesde caráter político e institucional no gerenciamentodesses mananciais.

2.2.1. OS INSTRUMENTOS DA GESTÃO

Espelhada no modelo francês de gerenciamento daágua por bacia hidrográfica e fundamentada emprincípios básicos de descentralização, integração eparticipação dos usuários na gestão dos recursoshídricos, a Lei Nº 11.996 prevê instrumentos legais,como a outorga de direito de uso dos recursoshídricos, o licenciamento para obras hídricas e acobrança pelo uso da água bruta.

n A outorga de direito de uso dos recursoshídricos

A outorga, regulamentada através do Decreto N.º23.067 de 11 de janeiro de 1994, reformulado emseu Artigo 2º pelo Decreto N.º 25.443, de 28 deabril de 1999, constitui ato administrativo pelo qualo Estado, através da Secretaria dos RecursosHídricos – SRH, concede ao usuário o direito deuso de um determinado recurso hídrico, com prazo,quantidade e finalidade preestabelecidos.

A implantação da outorga no Estado do Ceará temse deparado, fundamentalmente, com dois entraves:

– a resistência dos usuários em solicitar a outorga,em virtude da relação que este instrumento temcom a cobrança; e

– a incerteza da recarga dos reservatórios,decorrente da irregularidade interanual daschuvas, dificultando os procedimentos deemissão de outorgas com validade por períodosmaiores do que um ano.

Assim mesmo, este instrumento tem sido exercitadopor via da emissão de outorgas para a irrigação,sujeitas a renovação anual, e para empreendimentosindustriais, com prazos de validade de 5 a 10 anos.A SRH tem ainda posto em prática a outorgapreventiva, para empreendimentos em fase deplanejamento, com validade de 3 anos.

Para a análise dos processos de solicitação de outorga,a SRH conta com uma câmara técnica formada portécnicos da própria SRH e da COGERH que

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2. Contextualização dos Recursos Hídricos 14

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

funciona sob a coordenação da CGERH(Coordenadoria de Gestão de Recursos Hídricos).

n A licença para obras hídricas

O controle técnico das obras de oferta hídrica foiregulamentado através do Decreto Nº 23.068, de11 de fevereiro de 1994, e constitui uma autorização,concedida pela SRH, para a construção de qualquerobra ou serviço de oferta de água que altere o regime,quantidade e/ou a qualidade dos recursos hídricos(barragens, poços, canais, adutoras etc).

Em 1995, a SRH criou uma câmara técnica, compostapor técnicos da SRH, COGERH e SOHIDRA, paraanalisar as solicitações de licença para execução deobras hídricas. Dependendo da obra ou serviço, aSRH poderá exigir a apresentação da licença préviada SEMACE e da licença do CREA.

A construção excessiva de pequenos açudes, sem omenor controle técnico, foi, durante muitos anos,uma das ações desenvolvidas, pelos GovernosFederal e Estadual, com o objetivo de melhorar aconvivência com as secas no Ceará. Este tipo depolítica acabou por induzir uma cultura, por meioda qual se pensa que é factível a implantação de umaçude em qualquer lugar, desde que exista um riachoe as condições topográficas para construção de ummaciço de terra. Não é por acaso que algunsreservatórios estratégicos do interior do Estadoapresentam atualmente dificuldades de recarga emfunção da interceptação dos pequenos açudeslocalizados a montante. O licenciamento de obrashídricas tem se tornado um instrumento bastanteeficaz no combate à esta política de construçãoindiscriminada, sem qualquer critério técnico, depequenos açudes.

n A cobrança pelo uso da água bruta

A cobrança pelo uso da água bruta está prevista naLei Nº 11.996, regulamentada através do DecretoNº 24.264, de 12 de novembro de 1996, tendopassado por alterações através dos Decretos Nº24.870, de 1º de abril de 1998 e Nº 25.461, de 24

de maio de 1999. Este instrumento tem os seguintesobjetivos principais:

– reconhecer a água como um bem econômico edar aos usuários uma indicação do seu realvalor;

– estimular o uso racional, na medida em quediminui o desperdício e aumenta a eficiênciado seu uso; e

– arrecadar recursos financeiros para custear asdespesas com o gerenciamento, a operação e amanutenção da infra-estrutura hídrica.

Em novembro de 1996, o Conselho Estadual deRecursos Hídricos do Ceará – CONERH delegou àCompanhia de Gestão dos Recursos Hídricos acompetência para efetuar a cobrança da tarifacorrespondente ao uso dos mananciais que integramo sistema de oferta dos recursos hídricos do Ceará.O Decreto Nº 24.264, de 12/11/96, fixou a tarifapara os usos e usuários industriais e concessionáriasde serviços de água potável.

2.2.2 O APOIO À ORGANIZAÇÃO DOSUSUÁRIOS DE ÁGUA

A Lei Nº 11.996, com arrimo em modelos degerenciamento praticados em outros estadosbrasileiros e em outros países, introduziu diretrizesdemocráticas na gestão dos recursos hídricos, aoabrir espaços à sociedade para discutir e deliberarsobre o uso racional dos recursos hídricos,quebrando a hegemonia de um setor de usuáriossobre os demais, uma vez que todos os usuáriospassaram a ter igual acesso aos recursos hídricos,com prioridade para o abastecimento humano. Agestão participativa mudou a condição do usuário,antes beneficiário passivo, para co-gestor, tomandodecisões no gerenciamento da oferta, do uso e napreservação dos recursos hídricos.

Os instrumentos previstos para a participação dasociedade na gestão dos recursos hídricos são oscomitês de bacias hidrográficas e as comissões eassociações de usuários de água. Desde 1994, a SRH

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2. Contextualização dos Recursos Hídricos15

e a COGERH vêm desenvolvendo um exaustivo esignificativo trabalho de mobilização, organização ecapacitação dos usuários para a gestão das águas,no âmbito dos açudes de médio e pequeno portes,dos municípios, dos vales perenizados e das baciashidrográficas. Este trabalho é desenvolvido com basenos seguintes princípios:

– respeito às formas de organizações em curso(associações, comissões, cooperativas);

– conhecimento da atuação institucional deentidades presentes nas bacias;

– diagnóstico da situação hídrica da bacia;

– diálogo permanente;

– regras flexíveis, baseadas nas demandas dosdiversos grupos sociais;

– negociação de conflitos através do consenso,subsidiada por elementos técnicos; e

– definição coletiva de normas de operação epreservação dos recursos hídricos.

n A organização dos usuários no âmbito dosaçudes médios e pequenos

O açude de pequeno ou médio porte, associado aum curto trecho de riacho perenizado (10 km a 30km), é considerado o núcleo básico da organizaçãodos usuários, pois deste sistema hídrico dependemdiversos setores usuários, tais como pescadores,vazanteiros, irrigantes e o abastecimento de água deuma ou duas cidades. Esses usuários devem,portanto, decidir coletivamente a melhor utilizaçãodas águas do reservatório. Neste nível érecomendada a constituição de associações deusuários.

n A organização dos usuários no âmbito dosmunicípios

O segundo nível proposto para atuação é omunicípio, onde são realizados encontros e reuniões.Nesses momentos, a situação hídrica do município

é abordada e avaliada pelos usuários, sociedade civil,poder público municipal e por instituiçõesgovernamentais e não governamentais, através dolevantamento dos problemas e apresentação depropostas para sua solução. Neste nível, sãoconstituídas as comissões municipais, comrepresentantes dos usuários, sociedade civil, do poderpúblico municipal e dos órgãos públicos estaduais efederais presentes na região.

n A organização dos usuários no âmbito dosvales perenizados

O vale perenizado é uma área mais complexa deatuação, pois envolve em geral um sistema hídricocomposto por açudes estratégicos e longos trechosde aquedutos ou de rios perenizados. É nesse nívelonde geralmente estão localizados os grandesperímetros públicos irrigados, grandes irrigantesprivados, agroindústrias e várias cidades, o queimplica muitos conflitos.

n A organização dos usuários no âmbito dasbacias hidrográficas

O quarto e mais complexo nível de atuação é a baciahidrográfica, definida como a unidade deplanejamento e gestão, apresentando umadiversidade de conflitos e potencialidades. Os comitêsde bacias são colegiados consultivos e deliberativos,com atuação nas áreas de abrangência das bacias,sub-bacias ou regiões hidrográficas (conjunto depequenas bacias). São a instância mais importantede participação dos usuários e de integração doplanejamento e execução das ações na área derecursos hídricos, sendo compostos derepresentantes dos usuários, da sociedade civil, dopoder público municipal e dos órgãos estaduais efederais atuantes na bacia.

Um mecanismo fundamental para a mobilização dosusuários, com vistas à constituição de comitês debacias, é a realização de seminários e reuniões paradiscutir o planejamento e o acompanhamento daoperação dos grandes reservatórios estratégicos doEstado. Em todo o Estado do Ceará, já foram

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2. Contextualização dos Recursos Hídricos 16

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NFonte: COGERH

ESC 1:2.800.000

constituídos 7 (sete) comitês de bacias: Curu, BaixoJaguaribe, Médio Jaguaribe, Alto Jaguaribe,Banabuiú, Salgado e Metropolitanas.

2.2.3 OS PLANOS DE RECURSOS HÍDRICOS

O planejamento tem por finalidade a realização deestudos para estabelecimento de ações voltadas para

a administração do uso, oferta e preservação dosrecursos hídricos, de forma a compatibilizar asdemandas sociais com as intervençõesgovernamentais, isto tudo no nível da baciahidrográfica. O planejamento do gerenciamento dosrecursos hídricos tem como principais ferramentaso Plano Estadual de Recursos Hídricos e os planosde gerenciamento das bacias hidrográficas.

Figura 2.3 – Regiões Hidrográficas do Estado do Ceará

BACIAS 1. Bacia do Rio Coreaú 2. Bacia do Rio Parnaíba 3. Bacia do Rio Acaraú 4. Bacia do Litoral 5. Bacia do Rio Curu 6. Bacia Metropolitana 7. Bacia do Baixo Jaguaribe 8. Bacia do Rio Banabuiú 9. Bacia do Médio Jaguaribe10. Bacia do Alto Jaguaribe11. Bacia do Rio Salgado

LEGENDA

Sedes MunicipaisDivisão MunicipalRiosLeitos Perenizados

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O Plano Estadual dos Recursos Hídr icos(PLANERH), concluído em 1991, teve comoobjetivo estabelecer opções de equilibrar o balançodas demandas em relação às ofertas, considerandoas condições de abastecimento das populações e aspropostas de intervenção governamental nos setoresde irrigação e indústria. Dentre os principais produtosapresentados pelo Plano Estadual, merecemdestaque os seguintes:

– definição da bacia hidrográfica como unidadepara gestão das águas e de planejamento dapolítica de recursos hídricos, dividindo o Estadoem 11 (onze) regiões (Figura 2.3);

– balanço oferta e demanda em todas as regiõeshidrográficas, abrangendo os diversos usos daágua (abastecimento, indústria, irrigação etc);e projeções deste balanço hídrico, considerandoa implantação de mais infra-estruturas hídricas;e

– proposta de um moderno arcabouço jurídico einstitucional para os recursos hídricos.

Os planos de bacias têm como objetivo aprogramação de ações no âmbito de cada baciahidrográfica. Os estudos e diagnósticos devem serrealizados em momentos distintos, contemplando aefetivação de estudos específicos, separados dopróprio plano. Considera-se de fundamentalimportância a participação dos comitês de bacias nadiscussão e elaboração dos planos de bacias.Entendendo essa forma de planejar como umadescentralização do poder governamental,condiciona-se a elaboração dos planos às bacias ondeexista alguma forma de organização de usuários deágua.

Cada bacia hidrográfica deverá ter um plano,contemplando a solução dos problemas hídricos daárea, para um horizonte de pelo menos 20 (vinte)anos.

A COGERH, no âmbito do PROURB-RH, elaborouos planos de gerenciamento das bacias do Curu,

Jaguaribe e Metropolitanas. Pela SRH, foramdesenvolvidos os planos das bacias do Acaraú,Coreaú e Parnaíba, através dos Estudos do Eixo deIntegração da Ibiapaba, realizados no âmbito doPROGERIRH.

Encontra-se em fase de conclusão, na SRH, otrabalho de consolidação dos planos de baciashidrográficas com vistas à atualização do PlanoEstadual de Recursos Hídricos.

2.2.4 O MONITORAMENTO DOS SISTEMASHÍDRICOS

O monitoramento, como instrumento da gestão dosrecursos hídricos, é uma atividade de caráterpermanente, com vistas a realizar oacompanhamento e produzir informações sobre osaspectos qualitativos e quantitativos da água bruta,no que diz respeito aos níveis dos açudes, vazõesliberadas, consumo dos usuários, vazões nos riosperenizados e os níveis de contaminação química ebiológica dos mananciais, auxiliando, desta forma,a tomada de decisões na operação.

Atualmente, a COGERH gerencia 123 reservatórios,com capacidade total de 17,5 bilhões de m3

(incluindo o açude Castanhão); 150 km de canais,300 km de adutoras, 2500 km de leitos de riosperenizados e 11 estações elevatórias. A capacidadetotal de regularização, com 90% de garantia, dosaçudes gerenciados pela COGERH, é da ordem de100 metros cúbicos por segundo.

Além do monitoramento da quantidade, a COGERHexecuta, em convênio com a SuperintendênciaEstadual do Meio Ambiente – SEMACE, omonitoramento qualitativo dos recursos hídricos dasbacias do Acaraú, Baixo e Médio Jaguaribe, Curu eMetropolitanas.

2.2.5 A OPERAÇÃO DOS SISTEMAS HÍDRICOS

Para operacionalizar o gerenciamento dos recursoshídricos, a COGERH já implantou 8 (oito) gerênciasde bacias, sendo 1 (uma) nas Bacias Metropolitanas

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e 7 (sete) nas bacias do restante do Estado (Baixo /Médio Jaguaribe, Alto Jaguaribe, Banabuiú, Curu /Litoral, Salgado, Parnaíba e Acaraú / Coreaú). Asgerências têm entre suas principais atribuições:operar e monitorar os sistemas hídricos da bacia,realizar trabalhos de manutenção e conservação nasestruturas hidráulicas, intermediar os conflitos deágua de forma articulada com os CBH’s e apoiar asações de organização dos usuários.

Dos 123 açudes gerenciados pela COGERH, 60 sãode propriedade do DNOCS e 63 do Estado. Nosaçudes do Estado, existe a figura do agente de guardae inspeção de reservatório (AGIR), enquanto osreservatórios do DNOCS possuem encarregados dopróprio órgão. O AGIR é responsável peloacompanhamento da operação e manutenção doaçude, com tarefas diárias de verificação do nívelde água, regulagem da vazão, pequenos serviços demanutenção e limpeza da barragem e das estruturashidromecânicas e, ainda, vigilância das áreas deproteção ambiental.

A operação tem como objetivo principal, sobretudono que se refere aos açudes, a liberação de água,visando a atender as demandas dos diversos usos,tomando por base a oferta disponível e asparticularidades de cada reservatório. Todo oprocesso de operação dos reservatórios é realizadode forma a liberar as vazões definidas, pelos comitêsde bacias, nos seminários anuais de alocação de água.Para os açudes isolados de médio e pequeno portes,a definição das vazões de liberação é obtida emreuniões realizadas, especificamente, com osusuários de cada reservatório.

Desde novembro de 1996, a COGERH éresponsável, também, pelo fornecimento de águabruta para a Região Metropolitana de Fortaleza. Para

viabilizar esta atividade, a COGERH passou a operaro sistema integrado pelos açudes Gavião, Pacoti,Riachão, Pacajus, Acarape do Meio e pelo Canaldo Trabalhador.

2.2.6 A MANUTENÇÃO DA INFRA-ESTRUTURAHÍDRICA

Ao longo dos últimos anos, a Secretaria dos RecursosHídricos, através das suas vinculadas COGERH eSOHIDRA, vem implementando um plano deampliação e recuperação de toda a infra-estruturahídr ica do Estado. Também está sendoimplementado um trabalho de manutenção esegurança de obras hidráulicas. Estes serviços sãodesenvolvidos pela COGERH, através do seuDepartamento de Engenharia e Segurança de ObrasHidráulicas (DESOH).

O DESOH elaborou um documento, intitulado Listapara Inspeção de Rotina do Açude, por intermédiodo qual é possível detectar e hierarquizar osproblemas, solucionando-os em conformidade como risco que representam. A periodicidade dechecagem dos açudes é mensal, durante o períodoseco, e semanal, no período chuvoso.

Dentre as principais ações, já executadas, derecuperação da infra-estrutura hídrica, merecemdestaques:

– recuperação dos açudes de domínio do Estadoque abastecem sedes municipais;

– recuperação do Canal do Trabalhador e dosreservatórios do sistema metropolitano(Pacajus, Pacoti, Riachão e Gavião);

– recuperação dos pontos mais críticos da adutorado Acarape.

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19

3

Base Conceitual

Conforme Campos (2001), o estabelecimentode uma política de recursos hídricos visa aproporcionar meios para que a água, recurso

essencial ao desenvolvimento social e econômico,seja usada de forma racional e justa para o conjuntoda sociedade. Utilização justa é aquela em que asnecessidades vitais tenham atendimento prioritáriosobre as demais demandas. A utilização racional éaquela realizada com parcimônia, sem desperdíciose atendendo aos modernos conceitos da gestão dosrecursos hídricos.

Campos (2001) acentua, ainda, que uma política derecursos hídricos, como a de qualquer outro recurso,é formada por objetivos a serem alcançados,fundamentos ou princípios sob os quais deve sererguida, instrumentos ou mecanismos paraimplementá-la, uma lei ou norma jurídica para lhedar sustentação e instituições para executá-la e fazerseu acompanhamento. Recomenda, também, queas políticas devam ser moldadas para determinadosespaços geográficos, respeitando as peculiaridadeslocais.

De acordo com Barth (1987), gestão de recursoshídricos é a forma pela qual se pretende equacionare resolver as questões de escassez relativa dosrecursos hídricos.

Grigg (1996) define gestão de recursos hídricos comosendo a aplicação de medidas estruturais e nãoestruturais para controlar os sistemas hídricos,naturais e artificiais, em benefício humano eatendendo a objetivos ambientais. As ações

estruturais são aquelas referentes à construção deestruturas para controle dos recursos hídricos. Asações não estruturais dizem respeito a atividadesque não requerem a construção de estruturas.

A consciência da necessidade da gestão integradados recursos hídricos vem se consolidando, em todoo mundo, desde a década de 1960. Segundo Vieiraet alii (2000), essa gestão integrada assume váriosaspectos e envolve conotações diversas: é integradano sentido de envolver todas as fases do ciclohidrológico (superficial, subterrânea e aérea); quantoaos usos e finalidades múltiplas; no que diz respeitoao inter-relacionamento dos sistemas hídricos comos demais recursos naturais e ecossistemas; emtermos de co-participação entre gestores e usuáriosno planejamento e na administração dos recursoshídricos; e integrada aos objetivos gerais dasociedade, de desenvolvimento socioeconômico epreservação ambiental.

Alguns princípios e critérios referentes à gestão dosrecursos hídricos vêm se consolidando, ao longo dosúltimos anos, obtendo o apoio consensual detécnicos, cientistas, gestores e usuários. Alguns deles,considerados fundamentais, são ressaltados por Vieiraet alii (2000) com base em Granziera (1993):

– a água é um recurso natural limitado, essencialà vida e ao desenvolvimento (declarado na CartaEuropéia de Água, França, em 1968 e reiteradona Declaração de Dublin, Irlanda, em 1992,pelas Nações Unidas);

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3. Base Conceitual 20

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

– os usos múltiplos da água devem serconsiderados no processo de planejamento(declarado na Conferência de Mar del Plata,Argentina, em 1977, pelas Nações Unidas);

– a bacia hidrográfica é a unidade básica de gestãohídrica (Carta Européia de Água, já referida,reiterado pela Conferência de Caracas,Venezuela, em 1976, pela AssociaçãoInternacional de Direito da Água); e

– a água é um bem de valor econômico, passívelde cobrança pelo seu uso (recomendação feitapela Conferência sobre Meio Ambiente eDesenvolvimento, no Rio de Janeiro, Brasil,em 1992, pelas Nações Unidas).

O presente capítulo aborda alguns conceitos acercade política e gestão de recursos hídricos,fundamentalmente aqueles relacionados com asfunções hídricas, modelos institucionais, órgãosgestores e agências de água, finalizando com umasíntese dos modelos do Ceará, do Brasil e de outrospaíses, cujas experiências podem fornecer subsídiospara este trabalho.

3.1 FUNÇÕES HÍDRICAS

O Plano Estadual de Recursos Hídricos do Ceará –PLANERH, concluído em 1991, tendo por basemodelos propostos no Plano Integrado de RecursosHídricos do Nordeste – PLIRHINE (SUDENE,1980) e por Barth e Pompeu (1987), estabeleceucinco funções hídricas principais, com respectivassubfunções, esquematizadas na Tabela 3.1,

apresentada por Campos (2001). Essas grandesfunções são: gestão, oferta, uso, preservação efunções complementares.

3.1.1 A GESTÃO

A gestão das águas, no sentido amplo, é definidacomo o conjunto de procedimentos organizados comvistas a solucionar os problemas referentes ao uso eao controle dos recursos hídricos. O objetivo dagestão é atender, dentro de princípios de justiça sociale com base nas limitações econômicas e ambientais,às necessidades de água da sociedade a partir deuma disponibilidade limitada. A gestão é compostade três subfunções: planejamento, administração eregulamentação.

O planejamento é constituído pelo conjunto dasatividades necessárias à previsão das disponibilidadese das demandas de águas, com vistas a maximizaros benefícios econômicos e sociais. As principaisatividades do planejamento são: inventário dosrecursos hídricos, estudo da qualidade das águas,estimativa das demandas, estudos prospectivos dobalanço oferta e demanda e avaliação e controle dopróprio planejamento.

A administração refere-se às ações que dão suportetécnico ao planejamento e aos mecanismos deavaliação da efetividade dos planos anteriores,visando à realimentação dos planos futuros. Sãoetapas da administração: coleta e divulgação dosdados hidrometeorológicos, as estatísticas do usoda água, o poder de polícia administrativa e aprogramação executiva e econômico-financeira dasobras previstas nos planos.

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3. Base Conceitual21

Tabela 3.1 – Funções de recursos hídricos de acordo com o PLANERH – Ceará

FUNÇÕES SUBFUNÇÕES

PlanejamentoGESTÃO Administração

Regulação

Nucleação artificialOFERTA Represamento

Poços Cisternas

Abastecimento ruralIrrigação

CONSUNTIVO Abastecimento industrialAqüiculturaAbastecimento urbano

USOGeração hidrelétricaNavegação fluvial

NÃO CONSUNTIVO LazerPesca e piscicultura extensivaAssimilação de esgotos

PRESERVAÇÃO

Ciência e tecnologiaMeio ambiente

COMPLEMENTARES Planejamento globalIncentivos econômicosDefesa civil

Fonte: Plano Estadual de Recursos Hídricos, SRH-CE

A regulamentação constitui o conjunto das ações desuporte legal para o desempenho da gestão daságuas, a partir do disciplinamento e normalizaçãodo funcionamento do Sistema Estadual de RecursosHídricos. A regulamentação se consolida através desugestões de leis, decretos, portarias, instruções eregulamentos.

3.1.2 A OFERTA

A gestão das águas, pelo lado da oferta, dá-se nosentido de aumentar as disponibilidades hídricas pela

ativação das potencialidades. Assim, classificam-secomo funções da oferta as diversas ações, em obrasou serviços, através das quais a água se tornadisponível para utilização no tempo e no local ondeocorre a demanda. A função oferta compreende aconstrução de barragens para a formação dereservatórios, a perfuração e recuperação de poços,a captação de águas em lagos naturais, a captaçãode águas da chuva através de cisternas, etc.

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3. Base Conceitual 22

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3.1.3 O USO

A gestão dos usos das águas, também denominadagestão da demanda, ocorre no sentido de utilizar, damelhor maneira possível, as disponibilidades hídricasviabilizadas pela oferta. Classificam-se comofunções do uso as diversas ações, em obras ouserviços, através das quais a água se tornaefetivamente útil aos homens, às plantas, aosanimais e às paisagens. O uso acontece sob duasformas: o consuntivo, que ocorre quando há perdas,derivação ou consumo, havendo diferença entre oque é derivado e o que retorna ao corpo d’água; onão consuntivo , quando não há consumo, derivaçãoou desperdício da água. São basicamente usos noscorpos de água.

Os usos consuntivos envolvem: o abastecimentorural, a irrigação, a aqüicultura, o abastecimentoindustrial e o abastecimento urbano. Dentre os usosnão consuntivos, estão: a geração hidrelétrica, anavegação fluvial, o lazer, a pesca, a pisciculturaextensiva e a assimilação de esgotos.

3.1.4 A PRESERVAÇÃO

A preservação engloba as ações preventivas ecorretivas voltadas para garantir o corretoescoamento das águas, evitar a erosão, promover amanutenção da vegetação e a implantação de áreasverdes. As ações de preservação também criambarreiras que impedem ou reduzem a poluição defontes de água.

3.1.5 AS FUNÇÕES COMPLEMENTARES

As funções complementares são formadasessencialmente pelas ações de suporte aofuncionamento do setor hídrico. São atividades deapoio, como o treinamento para capacitação depessoal técnico, o desenvolvimento de pesquisas, aorientação técnica dos produtores usuários de água,o aparelhamento, com máquinas, laboratórios eaeronaves, para a realização de serviços e obras dasdiversas funções e o financiamento, antecipandoreceita para as instituições públicas e privadas nodesempenho das funções hídricas.

3.2 MODELOS INSTITUCIONAIS DE RECURSOSHÍDRICOS

Um modelo institucional de recursos hídricos deveser desenvolvido com base nas funções a seremdesempenhadas, tanto no setor hídrico como emoutros segmentos da administração pública. Deve-se levar em conta tanto os aspectos técnicos comoos fatores políticos. Não adianta conceber ummodelo tecnicamente perfeito, contudo inviável doponto de vista político.

O sistema institucional deve ser delineado de formaa se obter eficiência no desenvolvimento das tarefasque lhe são atribuídas. De acordo com Campos(2001), para um modelo proposto ser caracterizadocomo bom, ele deve apresentar 3 (três) principaisatributos:

– consistência com a realidade local, política efinanceira;

– harmonia com as demais funçõesdesempenhadas em outros segmentos daadministração pública; e

– inserção no modelo nacional.

Admitindo-se a busca de uma nova estrutura do setorhídrico e que os demais segmentos da administraçãopermanecem sem modificações, Campos (2001)concebeu uma sistemática de formulação do modeloinstitucional em quatro etapas a seguir discriminadas:

n Etapa 1 – caracterização das funções no setorhídrico e identificação das funções dos outrossetores da administração pública. O que é feito?O que deve ser feito?

n Etapa 2 – diagnóstico do modelo institucionalvigente. Quem faz o quê? Há duplicidade defunções? Algumas funções importantes estãosem instituição responsável? Há funçõesdesempenhadas informalmente?

n Etapa 3 – formulação do novo modelo. Quemvai fazer o quê?

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3. Base Conceitual23

n Etapa 4 – verificação da consistência domodelo. O modelo proposto atende aosprincípios de gerenciamento? O modelo estáinserido no sistema nacional? O modelo époliticamente viável?

Por um longo tempo, as políticas e os modelos derecursos hídricos, mesmo nos países centrais, foramconcebidos dentro de uma visão, da Engenharia, debuscar o equilíbrio entre oferta e demanda, no tempoe no espaço, com base em princípios de viabilidadeeconômica.

A formulação de políticas sustentáveis de recursoshídricos para o século XXI, segundo Correia (2000),requer não somente a solução dos problemasconsiderados no enfoque tradicional da EngenhariaHidráulica, mas também um maior entendimento docontexto no qual tais problemas se inserem. Nessenovo enfoque, é importante não somente comoresponder as questões e de que modo resolver osproblemas referentes a gestão de recursos hídricos,mas também quais questões são apresentadas e queproblemas são diagnosticados. Apesar do contextono qual se formula uma política de recursos hídricosvariar de caso a caso, alguns aspectos, a seremconsiderados, são comuns à concepção de qualquermodelo, dentre os quais está a contemplação dosrequerimentos de ordens ética, econômica eambiental, com vistas a alcançar os seguintesobjetivos:

n de ordem ambiental – assegurar a proteçãodos recursos hídricos, em termos de quantidade,qualidade e diversidade ecológica paraatendimento das necessidades futuras;

n de cunho econômico – assegurar asustentabilidade financeira e econômica dosuprimento de água para os diferentes usos; e

n de teor ético – assegurar o acesso à água detoda a sociedade, com vistas ao atendimentode suas necessidades básicas, através de umsistema que garanta eqüidade, auto-satisfaçãoe equilíbrio de poderes.

Correia (2000) considera que a formulação de umapolítica de recursos hídricos é movida por umconjunto de forças condutoras, das quais destaca 3(três) principais:

– conhecimentos científicos e tecnológicosdisponíveis aos profissionais e aos tomadoresde decisão;

– estruturas e processos de tomada de decisão; e

– atores envolvidos.

Conforme Barth (1987), os critérios para aformulação de um modelo de gerenciamento derecursos hídricos para um país são inerentes àspeculiaridades desses recursos, aos condicionantespolítico-institucionais, às características físicas esocioeconômicas e à estratégia escolhida para a suaimplantação.

As peculiaridades dos recursos hídricos,fundamentais para a formulação do modelo degerenciamento, resultam, em síntese nas seguintes:

– a unidade do ciclo hidrológico, considerandoas suas fases superficiais, subterrânea emeteórica, os binômios qualidade-quantidadee quantidade-energia;

– a existência de múltiplos usos e usuários, cominteresses muitas vezes conflitantes;

– a necessidade de se exercer o controle dosrecursos hídricos, considerando-se o regime, apoluição e a erosão.

Dessa forma, segundo Barth (1989), as funções dagestão dependem, necessariamente, de coordenaçãomultiinstitucional. Os organismos da gestão deverãoter gradações de competências e mecanismos decoordenação ou instrumentos que viabilizem aintegração e a compatibilização de políticas e planossetoriais.

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3. Base Conceitual 24

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

Os condicionantes político-institucionais do paísem que se pretende implantar um sistema degerenciamento de recursos hídricos sãodeterminantes para a forma do modelo. Neste caso,o modelo dependerá da distribuição de funçõesnormativas, de planejamento e de execução, pelasorganizações públicas e privadas, das formasprevistas de delegação dessas funções, dosmecanismos de integração e coordenação adotados,e dos métodos e técnicas administrativasempregados para a realização dos projetos e obras.

O sistema político-administrativo adotado pelo paíse a sua legislação representam condicionantesfundamentais para a concepção de um modelo degerenciamento de recursos hídricos, mesmo com ausual necessidade de reorganização da estruturaadministrativa e de atualização das normas legais.

As características físicas do país, notadamenteaquelas que determinam o regime hidrológico, sãobásicas para a formulação do modelo. Ahomogeneidade hidrológica facilita uma soluçãocentralizada, enquanto as diversidades recomendamsoluções regionalizadas.

As características socioeconômicas, que dentro deum mesmo país podem apresentar diferençasacentuadas, também influenciam decisivamente noformato do modelo. Neste sentido, a adoção da baciahidrográfica como unidade geográfica para a gestãodos recursos hídricos tende a evoluir para a adoçãode regiões hidrográficas que considerem as divisõespolítico-administrativas e os aspectossocioeconômicos.

As estratégias de implantação de um modelo paragestão de recursos hídricos são diversas. Arestruturação jurídico-institucional, semprerecomendada, depende de um enorme esforçopolítico, em função da magnitude e da diversidadedos interesses envolvidos. A implantação gradual dosistema de gerenciamento, buscando alcançar omodelo ideal por passos sucessivos, tem seapresentado como a estratégia mais viável.

Uma possibilidade é a gradativa integração dasorganizações intervenientes, mediante convênios eacordos que visem à elaboração e à implantação deplanos e programas de recursos hídricos. As técnicasde administração por projetos poderão superar osentraves e obstáculos oferecidos pelas organizaçõespúblicas tradicionais à gestão integrada dos recursoshídricos.

Numa primeira etapa, o núcleo central do sistemade gerenciamento de recursos hídricos seriaconstituído pelo conjunto de entidades que podemdesenvolver ações de gestão unificada dessesrecursos, considerando os aspectos de quantidade,qualidade, integração dos múltiplos usos e controledo regime das águas, da poluição e da erosão. Naausência de única entidade com atribuição para agestão dos recursos hídricos, o modelo deverácontemplar as formas de articulação entre osdiversos organismos que, no somatório de suasatribuições, possam executar essa tarefa.

Barth (1987) ainda sugere que o modelo degerenciamento evolua no sentido de umareorganização institucional, de modo a se obter umagestão unificada dos recursos hídricos, ao menosno campo normativo, através da constituição da“Autoridade Única”, responsável.

3.2.1 ÓRGÃOS GESTORES

De forma geral, a evolução institucional inerente àgestão dos recursos hídricos tem acontecido de modosemelhante nos diferentes países, pois, enquanto aágua é abundante e não surgem os graves problemasde escassez, sejam por motivos de qualidade ou dequantidade, a responsabilidade na gestão dosrecursos hídricos vai-se dissipando, em geral semgrandes inconvenientes, entre os órgãos daadministração pública responsáveis pela suautilização e conservação, conforme a vocaçãoespecífica de cada setor e de acordo com asnecessidades do momento. Contudo, à proporçãoque se torna mais acirrada a competição entre osdiversos usos de água, as funções dos diferentessetores da administração interessados na utilização

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3. Base Conceitual25

dos recursos hídricos vão entrando em conflito,surgindo freqüentemente sobreposições e perdas deeficiência. Surge, com efeito, a necessidade deplanejar e coordenar o desenvolvimento e a alocaçãodas disponibilidades hídricas entre os múltiplos usose de criar substratos jurídicos e institucionais queassegurem a gestão da água numa perspectiva global.

Uma estrutura orgânica para gestão dos recursoshídricos tem por finalidade assegurar a execução dapolítica através do desenvolvimento de ações queenvolvem a intervenção paralela de vários órgãos eorganismos, com jurisdição nos diversos domíniosrelacionados com a água, os quais, segundo Cunhaet alii (1980), podem-se agrupar nas seguintescategorias:

– órgãos e organismos que têm ao seu cargo agestão dos recursos hídricos;

– órgãos e organismos responsáveis peloplanejamento do desenvolvimentosocioeconômico; e

– órgãos e organismos com jurisdição emdomínios relacionados com a água.

No que se refere aos órgãos e organismos quedesempenham competências em domíniosrelacionados com a água, podem distinguir-se aquelesque exercem jurisdição sobre atividades utilizadorasde água e os que condicionam decisivamente, pelasua intervenção, a utilização dos recursos hídricos.

Os órgãos e organismos que têm ao seu cargo agestão dos recursos hídricos devem estar integrados,de preferência, numa estrutura única que podeenvolver a criação de uma pasta específica daadministração pública, ou seja: um ministério naesfera federal ou uma secretaria na esfera estadual.

De acordo com Cunha et alii (1980), a estrutura degestão dos recursos hídricos deve compreenderórgãos e organismos de 3 (três) tipos:

– órgãos deliberativos e coordenadores, queformulam as políticas, definem as diretrizes do

planejamento, coordenam as intervenções etomam as decisões principais;

– aparelhos e organismos executivos, queexecutam as ações da gestão das águas e dãoapoio técnico e administrativo aos órgãosdeliberativos e coordenadores;

– colegiados consultivos, que prestam colaboraçãoàs instâncias deliberativas e coordenadoras,permitindo considerar a opinião das entidadesinteressadas nos problemas da água.

No âmbito dos diversos modelos de recursos hídricosque têm surgido no Brasil, tanto no plano federal,quanto no contexto estadual, as funções quecompreendem a gestão das águas (planejamento,administração e regulamentação) são exercidas pororganismos executivos, denominados órgãosgestores. No Brasil estes são representados por umministério, auxiliado por uma secretaria e umaagência executiva nacionais, na esfera da União, epor secretarias estaduais, auxiliadas por autarquias,fundações ou companhias, no âmbito dos estados,tendo, usualmente, as seguintes atribuições na suajurisdição:

– coordenar o Sistema Nacional ou Estadual deGerenciamento dos Recursos Hídricos;

– planejar, administrar e controlar o uso, a ofertae a preservação dos recursos hídricos;

– elaborar e coordenar a execução de planos,programas e projetos na área de recursoshídricos;

– coordenar o sistema de informações sobrerecursos hídricos;

– promover a articulação dos setores da União,dos estados e dos municípios, e destes com osusuários e a sociedade civil, tendo em vista aimplantação e funcionamento dos comitês debacias hidrográficas; e

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Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

– promover a capacitação e o treinamento detécnicos e dos demais atores envolvidos nagestão dos recursos hídricos.

Em geral, na contextura estadual, as secretarias deestado exercem o papel de órgãos coordenadoresda política das águas, presidindo os conselhosestaduais de recursos hídricos, conduzindo aimplementação dos sistemas integrados da gestão edesenvolvendo as funções de planejamento eregulação. As funções de administração dos recursoshídricos e de oferta de água são exercidas por órgãosda administração indireta, vinculados a essassecretarias de estado, sob a forma jurídica deautarquias, fundações ou empresas públicas.

3.2.2 AGÊNCIAS DE ÁGUA

A prática de promover a descentralização e aparticipação social para gerir os recursos hídricos éampla e variada, tanto no Brasil, quanto em outrospaíses. No entanto, na maioria dos casos, essaexperiência está restrita a pequenos espaçosgeográficos, onde organizações locais assumematribuições delegadas pelo poder público nas suasáreas de atuação. Quando se exercita adescentralização e a participação em áreasgeograficamente mais amplas, como é o caso dasbacias hidrográficas, os resultados obtidos com aatuação das organizações locais são pouco efetivos,pois os interesses da bacia são quase semprepreteridos diante dos interesses locais.

Uma experiência relevante na superação desseproblema é encontrada na França (HUBERT et alii,2002), onde foram criados os comitês de baciashidrográficas (órgãos colegiados deliberativos) e asagências de bacias (órgãos públicos com autonomiafinanceira). Assim é que, apesar das diferençasjurisdicionais, culturais e institucionais entre Brasile França, os modelos da gestão dos recursos hídricosadotados no Brasil, tanto pela União, como pelosestados, foram inspirados no modelo francês.

A ineficácia da legislação, até então vigente naFrança, para resolver os problemas decorrentes da

má utilização da água, levou à publicação da Lei de1964, relativa à propriedade e repartição das águase à luta contra a sua poluição. A Lei de 1964, queinstituiu a bacia hidrográfica como unidade básicapara gestão das águas, tem como um dos seusobjetivos a obtenção dos meios financeiros quepermitam a execução da política da gestão dosrecursos hídricos. Neste sentido, foram instituídasas agências financeiras de bacias hidrográficas,células básicas da gestão das águas ao nível dasbacias hidrográficas, que são autorizadas a criar assuas fontes de financiamento através da cobrançade taxas.

As agências de bacias, integrantes do sistema francês,são estabelecimentos públicos de caráteradministrativo, vinculados ao Ministério do MeioAmbiente. São encarregados de facilitar aimplementação das ações da gestão dos recursoshídricos no âmbito das 6 (seis) grandes baciashidrográficas francesas. São dotados de autonomiafinanceira, porém não têm função de polícia daságuas, nem de execução de obras. As agências debacias funcionam segundo o princípio “utilizador-poluidor-pagador” sobre uma base incitativa e nãocoercitiva: elas cobram taxas aos usuários, calculadasem relação às captações de água e aos lançamentosde efluentes no meio hídrico e, em seguida, revertemo montante arrecadado sob forma de ajudasaportadas aos encarregados pelas obras públicas eprivadas (subvenções, empréstimos etc), com afinalidade de financiar as operações de controle dapoluição e o melhoramento da gestão dos recursoshídricos.

No Brasil, a institucionalização de agências de baciascomo mecanismos de descentralização efinanciamento da gestão dos recursos hídricos surgiuatravés da Lei Nº 7.663, de 30 de dezembro de1991, do Estado de São Paulo. Conforme a Lei Nº7.663, as agências de bacias são entidades jurídicascom estrutura administrativa e financeira própria,devendo exercer as funções de secretarias executivasdos respectivos comitês de bacias hidrográficas. Ascompetências e as ações que deverão ser incluídasnos estatutos das agências de São Paulo são

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3. Base Conceitual27

delineadas pela Lei Estadual Nº 10.020, de 3 dejulho de 1998. Estão relacionadas a seguir as maisrelevantes:

n Competências

– proporcionar apoio financeiro aos planos,programas, serviços e obras, aprovados pelocomitê de bacia, a serem executados nas bacias;e

– incentivar, na área de sua atuação, a articulaçãodos participantes do Sistema Integrado deGerenciamento de Recursos Hídricos – SIGRH,com os demais sistemas do Estado, com o setorprodutivo, com a sociedade civil, assim comocom estados vizinhos e seus municípiospertencentes à bacia hidrográfica, e com aUnião, quando for o caso;

n Ações

– aplicar recursos financeiros a fundo perdido,dentro dos critérios estabelecidos pelo comitêde bacia;

– efetuar a cobrança pela utilização dos recursoshídricos da bacia de domínio do Estado, naforma fixada pela lei;

– gerenciar os recursos financeiros gerados porcobrança pela utilização das águas estaduais dasbacias e outros definidos em lei, emconformidade com as normas do ConselhoEstadual de Recursos Hídricos (CRH), ouvidoo Comitê Coordenador do Plano Estadual deRecursos Hídricos (CORHI);

– elaborar, em articulação com órgãos do Estadoe dos municípios, o plano de recursos hídricosda bacia com a periodicidade estabelecida peloConselho Estadual de Recursos Hídricos,submetendo-o à análise e aprovação do comitêde bacia; e

– prestar apoio administrativo, técnico efinanceiro necessário ao funcionamento docomitê de bacia.

A Lei Federal Nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997,que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos,prevê, no Artigo 33, as agências de água comoorganismos integrantes do Sistema Nacional deGerenciamento de Recursos Hídricos. Como nomodelo de agência de bacia de São Paulo, a agênciade água preconizada pela Lei Nº 9.433 exerce afunção de secretaria executiva de um ou maiscomitês de bacias, no âmbito de sua área de atuação,tendo como competências de maior destaque asrelacionadas a seguir:

– efetuar, mediante delegação do outorgante, acobrança pelo uso de recursos hídricos;

– gerir o sistema de informações sobre recursoshídricos em sua área de atuação;

– elaborar o plano de recursos hídricos paraapreciação do respectivo comitê de baciahidrográfica; e

– propor ao respectivo comitê de baciahidrográfica o plano de aplicação dos recursosarrecadados com a cobrança pelo uso derecursos hídricos.

3.3 MODELOS INSTITUCIONAIS ALTERNATIVOS

3.3.1 O MODELO DA FRANÇA

A partir do fim da década de 1950, começou aadquirir-se na França maior consciência dosproblemas hídricos nos aspectos de quantidade e dequalidade, problemas estes que se agravaram como desenvolvimento econômico do País.

A Lei de 1964, que constitui atualmente o diplomafundamental da legislação francesa sobre águas, nãorevogou o extenso e complexo sistema legal vigente,antes pretendendo constituir o instrumento jurídicoessencial para a progressiva transformação dostermos em que, anteriormente à sua publicação, sefazia a intervenção do Estado nos problemas daágua.

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Até 1964, era um princípio geral considerar dodomínio público apenas os cursos de águanavegáveis. A Lei de 1964 veio permitir incluir nodomínio público os cursos de água e outras massasde água necessários para o abastecimento daspopulações, para a satisfação das necessidades daagricultura e da indústria e proteção contra asinundações, adotando implicitamente uma definiçãode domínio público que ultrapassa largamente a noçãode navegabilidade. A Lei permite assim caminharno sentido de solucionar dificuldades decorrentesda contradição entre a unidade dos recursos hídricosde uma bacia hidrográfica e a pluralidade dos regimesjurídicos de nascentes, afluentes não dominiais erios dominiais, embora não introduza a simplificaçãodecisiva que teria sido a unificação do regime jurídicoda água (CUNHA et alii, 1980).

O regime de utilização das águas, anterior a 1964,era muito marcado pela ineficácia da intervençãoadministrativa. Nesse sentido, a Lei de 1964considerou os seguintes objetivos básicos:

– rever e harmonizar a legislação eregulamentação;

– instituir meios financeiros para fazer face aosinvestimentos necessários a uma intervençãoeficaz; e

– coordenar a ação administrativa.

A Lei de 1964 estabelece as bases jurídicas para aluta contra a poluição das águas, concedendo aoGoverno amplos poderes para organizar essa luta.Neste sentido, prevê a publicação de decretos quedeterminem as condições em que pode serregulamentada a alteração da qualidade das águassuperficiais e impõe a harmonização dos processosadministrativos para a autorização da rejeição deefluentes, conduzindo assim, necessariamente, àreformulação da regulamentação em vigor, de formaa tornar independentes as decisões de autorizaçãoemanadas dos diferentes serviços intervenientes. Osreferidos decretos não fixam normas, nem obrigama Administração a promulgar critérios de ação rígidos

e invariáveis, tendo antes o objetivo de promoveruma ação administrativa flexível e evolutiva.

A intervenção do Estado na gestão das águas édupla. Por um lado, há uma intervenção de caráteradministrativo através de autorizações concedidaspelas entidades encarregadas da polícia das águas e,por outro, pelas autoridades com jurisdição sobreas atividades econômicas utilizadoras, para as quaisfixam as condições de autorização de acordo comas normas ou regulamentos específicos.

Quanto aos órgãos de coordenação, aresponsabilidade ao nível mais elevado é atribuídaao Ministério da Cultura e do Ambiente, sendo asdecisões essenciais, no patamar interministerial,tomadas pela Comissão Interministerial para oAmbiente.

A unidade básica da gestão adotada é a baciahidrográfica. A França foi dividida em 6 (seis)circunscrições de bacia hidrográfica de acordo comum critério complexo em que os principais aspectosconsiderados foram as características geológicas dosolo, o tipo de ocupação (predominantementeagrícola ou industrial) e a dimensão econômicasuficiente para servir de suporte às novas estruturasde intervenção planejada. Para cada bacia foi criadauma agência financeira, com a missão de cobrartaxas pelo uso dos corpos hídricos e financiar asdiversas ações da gestão dos recursos hídricos, comvistas a atingir os objetivos de qualidade de águafixados pelos regulamentos.

Um aspecto relevante do modelo francês é o daparceria que associa o Estado, o conjunto dascoletividades territoriais e os usuários (industriais,grandes planejadores regionais, agricultores,distribuidores de água, pescadores, aqüicultores,associações de proteção ambiental), em cada níveldo sistema de gestão dos recursos hídricos (OFFICEINTERNACIONAL DE L’EAU, 1996). Destaforma, existem organismos consultivos distribuídosem três níveis:

– Comissão Nacional da Água, no planonacional;

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– Comitê de Bacia, ao nível das 6 (seis) grandescircunscrições de bacias hidrográficas; e

– Comissão Local de Água, ao nível dosaqüíferos, dos afluentes ou das sub-bacias quecorrespondem a uma unidade hidrográfica.

Apesar dos avanços obtidos pela Lei de 1964, oplanejamento e a gestão dos recursos hídricospermaneceram embrionários na França. Osinstrumentos disponíveis até então (cartasdepartamentais de objetivos de qualidade, planosdiretores de águas e planos departamentais devocação piscícola) não permitiam a realização deuma gestão verdadeiramente global, integrada eparticipativa dos recursos hídr icos. Essesdocumentos eram instruídos por portarias(ministeriais e interministeriais) e não tinham o valorjurídico necessário a viabilizar as suasimplementações. Assim, em 3 de janeiro de 1992,28 (vinte e oito) anos após a lei original, foi aprovadaoutra lei de água, oferecendo aos atores envolvidosna gestão das águas novos instrumentos em matériade planejamento participativo: os SDAGE’S –Schéma Directeur d’Aménagement et de Gestiondes Eaux e os SAGE’S – Schéma d’Aménagementet de Gestion des Eaux (HUBERT et alii, 2002).

Os SDAGES estabelecem para cada uma das 6 (seis)grandes bacias hidrográficas francesas as orientaçõesfundamentais para uma gestão integrada dos recursoshídricos. Eles têm um caráter obrigatório e alegislação previu um prazo de 5 (cinco) anos, a partirda publicação da lei, para as suas elaborações. OsSAGES estabelecem no plano de sub-bacias,correspondentes a cada uma das unidadeshidrográficas ou de sistemas de aqüíferos, osobjetivos de uso, desenvolvendo a proteção dosrecursos hídricos e dos meios aquáticos. Eles sãofacultativos e a lei não fixou prazo para suaselaborações.

3.3.2 O MODELO DOS ESTADOS UNIDOS DAAMÉRICA

O território dos Estados Unidos da Américaapresenta, em termos globais, característicasfisiográficas e climáticas relativamente diferentes nasduas partes em que o divide o rio Mississipi. A parteoriental, que ocupa cerca de um terço da superfícietotal do território, tem clima úmido, enquanto a parteocidental, correspondente aos restantes dois terçosda superfície total, tem clima árido e semi-árido, àexceção da região costeira que tem clima úmido.

Estas condições naturais contribuíram para que, naparte oriental, com relativa abundância de água eonde se estabeleceram os primeiros estados daFederação Norte-americana, a água fosse, desdelonga data, utilizada de acordo com a doutrina dosdireitos ribeirinhos, enquanto na parte ocidental, emrazão da escassez de água característica desta região,prevalecia um sistema de acordo com o qual o direitoà utilização da água era conferido ao utilizador queem primeiro lugar dela se apropriasse. Em algunsestados, em especial naqueles que se situamimediatamente a oeste do rio Mississipi, verificou-se a coexistência das duas doutrinas de direitos sobreágua: dos direitos ribeirinhos e da apropriaçãoprévia (CUNHA et alii, 1980).

Estas duas doutrinas relativas à propriedade da águareferem-se às águas superficiais. Em relação às águassubterrâneas, cuja utilização é mais recente, masque correspondem já a uma parte significativa detoda a água doce captada, o regime de propriedadeda água é mais complexo. Assim, em diferentesestados são utilizadas 4 (quatro) doutrinas diferentes(CUNHA et alii, 1980): a da propriedade absoluta(o proprietário da terra pode captar água semqualquer limitação), a da utilização razoável (o usoleva em conta os direitos dos outros), a dos direitoscorrelativos (uso proporcional ao tamanho dapropriedade) e a da apropriação (uso através delicença).

De maneira geral, a intervenção dos estados sobreos recursos hídricos tem tido caráter supletivo e

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destina-se a regular apenas a aplicação de doutrinasbaseadas no costume e na jurisprudência, traduzindoa ideologia do liberalismo econômico, segundo a qualas funções do Estado só têm lugar quando a atividadeprivada não corresponde ao interesse público.

No sistema federal dos Estados Unidos, cada estadodispõe da sua própria legislação relativa à repartição,distribuição, utilização e administração da águadentro das suas fronteiras. Além disso, algunsestados, situados na zona árida ocidental, têm tidonecessidade de adotar, por interesse público, leis eregulamentos rigorosos relativos ao controle daqualidade das águas.

Ao Governo Federal cabem competências específicasdiretas sobre os recursos hídricos, resultantes dassuas responsabilidades sobre o comérciointerestadual, a navegação e os terrenos federais quecobrem cerca de um terço do território dos 50(cinqüenta) estados e sobre cujas águas o GovernoFederal exerce plena autor idade. Essasresponsabilidades são atribuídas ao Governo Federalpela Constituição e têm vindo a ampliar-se por efeitode sucessivas emendas à Constituição, dajurisprudência do Supremo Tribunal e da ação doCongresso, dispondo hoje o Governo Federal deautoridade relativamente grande.

A Lei Federal de 1965 instituiu bases para oplanejamento dos recursos hídricos. Mais tarde, aLei Federal de 1972, relativa ao controle de poluiçãodas águas veio estabelecer novas bases para aregeneração da qualidade dos recursos hídricos nosEstados Unidos e o controle rigoroso de novas fontespoluidoras da água. De acordo com esta Lei, todosos estados criaram regulamentos para o controle depoluição das águas nos seus territórios, cuja execuçãoficou ao cargo de agências estaduais (CUNHA etalii, 1980).

A Lei Federal de 1965 relativa ao planejamento dosrecursos hídricos estabelece que a política nacionalpara satisfazer a demanda crescente de água épromover a conservação, o desenvolvimento e a

utilização da água, através de ações coordenadasno plano federal, dos estados, dos municípios e dasempresas privadas e com a colaboração de todas asagências federais e estaduais, dos governos locais,dos indivíduos, das corporações e de outrasentidades interessadas nos problemas da água. Essalei cria o Conselho dos Recursos Hídricos, instânciamáxima da estrutura da gestão das águas, e prevê oestabelecimento de comissões de bacia hidrográficapor proposta do Conselho ou dos estadosinteressados.

A Lei Federal de 1972 atribui à Agência de Proteçãodo Meio Ambiente – EPA (Environment ProtectionAgency) o encargo de elaborar planos globais paraprevenir, reduzir ou eliminar a poluição.

Nos Estados Unidos a responsabilidade pela gestãodas águas cabe ao Governo Federal, aos governosdos estados e às administrações locais,desempenhando certas empresas privadas algumasfunções e serviços específicos.

No contexto do Governo Federal, a elaboração e arealização da maior parte dos programas relativos arecursos hídricos está ao cargo dos Departamentosdo Interior, da Agricultura e do Exército (CUNHAet alii, 1980).

No Departamento do Interior, o “Bureau ofReclamation” começou por se ocupar de projetosde irrigação e recuperação de terras para agricultura,vindo, subseqüentemente, alargar os seus objetivosao planejamento dos recursos hídricos à escala dasbacias hidrográficas e mesmo regiões mais vastas.A ação do “Bureau of Reclamation” estende-seapenas a 17 estados do oeste dos Estados Unidos.Também no Departamento do Interior, o Gabinetede Investigação e Tecnologia da Água financia ainvestigação sobre problemas de recursos hídricos,que é realizada em diversas universidades e nosinstitutos de investigação de recursos hídricos,existentes nos vários estados, promovendo, alémdisso, a compilação dos resultados dos estudosrealizados.

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O Departamento da Agricultura ocupa-se doplanejamento global do desenvolvimento dosrecursos hídricos voltados para a agricultura, atravésdo serviço da Conservação do Solo, do Serviço deGestão do Solo, do Serviço de Pesca Desportiva,Peixes e Vida Silvestre e do Serviço de ParquesNacionais.

No Departamento do Exército, o “Corps ofEngineers” dedica-se à construção, manutenção eoperação de barragens e outras obras hidráulicas namaior parte dos rios navegáveis, para fins de controlede cheias, de navegação, de produção de energiahidroelétrica, portuários e de defesa de costas.

Além de outras, pode ainda se referir, no plano doGoverno Federal e como agência autônoma nadependência direta do presidente, a já citada Agênciada Proteção do Meio Ambiente (EPA), que é aautoridade ao mais alto nível em matéria de controlede poluição das águas.

Na contextura dos estados, as estruturas deintervenção nos problemas da água são, de modogeral, de dois tipos: agências que administram osdireitos sobre a água , através da concessão deautorizações para utilização da água e, maisrecentemente, agências instituídas nos termos dalegislação sobre controle de poluição das águas. Asagências destes dois tipos são, freqüentemente,independentes umas das outras.

Além das entidades instituídas no plano federal eestadual, há nos Estados Unidos vários tipos deagências independentes, com representação federal,estadual ou local, que levam a efeito os programasespecíficos de desenvolvimento dos recursos hídricosem determinadas unidades da gestão. Mereceudestaque, para os objetivos deste trabalho, osdistritos especiais estaduais, que são unidades locaisdo Governo, estabelecidas pela lei estadual, paraplanejar, construir e assegurar a manutenção deobras locais.

3.3.3 O MODELO DA HOLANDA

Os problemas da água na Holanda têm caráterespecífico dada a circunstância de um quarto doterritório nacional deste país estar abaixo do nívelmédio do mar e de cerca da metade estar protegidapor diques contra inundações provenientes do marou dos rios.

A circunstância referida determinou, desde háséculos, a criação de estruturas peculiares paraassegurar a drenagem dos terrenos e a defesa contrainundações, mas que detêm também outrasresponsabilidades associadas à gestão da quantidadede água. Estas estruturas integram as entidadesregionais de desenvolvimento (Zuivering Shapen) eas associações da água (Water Shappen), a maiorparte delas já muito antigas, constituídas derepresentantes dos proprietários agrícolas e urbanose superintendidas por delegados do Governo Centralou dos governos das províncias em que se situa cadaassociação da água. Estas associações dispõem decomissões executivas com funções administrativase técnicas (CUNHA et alii, 1980).

Além de cuidarem dos problemas a que se fezreferência, as associações da água têm procuradomais recentemente atender também aspectos dequalidade da água por meio de um adequadocontrole dos níveis freáticos e procurando impedira poluição causada por efluentes domésticos eindustriais.

Haja vista a existência de numerosas associaçõesda água, com importância e dimensões muitovariáveis, a Lei de 1969 (referida mais adiante) previua redução do número de unidades da gestão da águado País.

A poluição das águas superficiais, originada nospaíses que lançam efluentes nos rios internacionaisque deságuam na Holanda, a exemplo do Reno,constitui um grande problema para a Nação, pois aágua desse rio assegura 65% das necessidades deabastecimento do País.

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A responsabilidade da gestão das águas superficiaisna Holanda cabe ao Ministério dos Transportes eObras Públicas, através do Estado das ÁguasGovernamentais (Rijkswaterstaat), com o apoio doConselho Consultivo para a Água (Waterstaat). Emcada uma das onze províncias há delegações do“Rijkswaterstaat” que asseguram localmente aexecução da política da água. Existe ainda umInstituto do Estado para a Depuração das ÁguasResiduais (RIZA) que desenvolve atividades deinvestigação. O RIZA é independente do“Rijkswaterstaat”, mas mantém com ele estreitoscontatos (CUNHA et alii, 1980).

Para facilitar a coordenação de atividades,relacionadas com recursos hídricos, exercidas pordiversos departamentos, funciona no“Rijkswaterstaat” uma seção do ConselhoConsultivo para a Água que é obrigatoriamenteouvido sobre todos os problemas importantesrelativos à qualidade da água.

O Conselho Consultivo da Água é composto porrepresentantes dos ministérios competentes nosassuntos referentes a recursos hídricos, às atividadesindustriais e da agricultura, representantes dasprovíncias, das associações da água, dos municípios,da Associação dos Industriais de Abastecimento deÁgua, da Associação Holandesa de Depuração e daAssociação de Proteção da Natureza.

A principal legislação relativa a águas em vigor naHolanda é constituída pela Lei de 1969, já referida,relativa à poluição das águas superficiais (incluindoas águas de estuários e marítimas territoriais), e peloDecreto de 1970 relativo à poluição das águas geridaspelo Estado, o qual regulamenta a Lei de 1969. ALei de 1969 baseia-se em dois princípiosfundamentais:

– a emissão de efluentes nas águas superficiais(rios, estuários e águas marítimas territoriais)carece de autorização prévia das autoridadescompetentes, quer os efluentes sejam ou nãosujeitos a depuração; e

– os utilizadores que lançam efluentes devempagar taxas cujo montante é estabelecido emfunção da poluição provocada e que se destinama cobrir as medidas de prevenção e luta contraa poluição das águas superficiais.

3.3.4 O MODELO DE ISRAEL

Israel situa-se numa região cujo clima varia entremediterrânico e desértico, sendo a precipitação anualmédia no País relativamente baixa. Alguns pequenosrios abastecem as zonas costeiras, a área de planíciee alguns pequenos vales, porém a maior parte daágua destinada à irrigação vem de aqüíferos e doMar da Galiléia, de onde é transferida para o Desertode Negev.

Uma das principais dificuldades, que se apresentaramao Estado de Israel, consistiu na falta de umalegislação sobre águas, adaptada à situação deexigência de auto-suficiência do país referente aosuprimento hídrico, sem a qual não parecia possívelo necessário desenvolvimento agrícola e industrial.

Desta forma, após a criação do Estado de Israel,teve inicio a preparação de uma lei de águas. Defato, logo no início da década de 1950, foi constituídauma comissão de peritos e representantes daAdministração, que ao longo de 7 (sete) anospreparou um projeto de legislação que deu origem,após discussão e introdução de algumas alterações,à Lei de Águas de 1959. No desenvolvimento dostrabalhos preparatórios da referida Comissão, e nosentido de ir dando solução a algumas questões maisurgentes que faziam parte do problema global dosrecursos hídricos, foram promulgadas 3 (três) leis,ainda em vigor: a Lei de 1955 relativa à abertura defuros de captação de água, a Lei de 1955 relativa àmedição dos consumos de água e a Lei de 1957relativa à drenagem e controle de cheias. As 4(quatro) leis referidas são os diplomas básicos dalegislação israelense referentes a recursos hídricos(CUNHA et alii, 1980).

A aplicação e regulamentação das leis israelensesrelativas à água são da responsabilidade do Ministério

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da Agricultura, cuja jurisdição abrange todos osproblemas da água. A gestão das águas é dacompetência de um Comissariado da Água nomeadopelo Governo, em dependência hierárquica doreferido Ministério. Este comissariado exerce as suasfunções executivas por intermédio de um organismodenominado Comissão da Água.

Como órgão consultivo, existe o Conselho da Águacujos membros são nomeados pelo Governo. EsseConselho é presidido pelo Ministro da Agricultura econstituído por cerca de 30 (trinta) representantesdo Governo, das populações e da OrganizaçãoSionista Mundial e suas instituições, não podendo onúmero de representantes das populações ser inferiora dois terços do total. Estes últimos devem incluirrepresentantes dos consumidores, em função dosvolumes do consumo, para os vários fins, erepresentantes dos distribuidores. O número derepresentantes dos consumidores não deve serinferior à metade do total dos membros do Conselho.

As principais funções do Conselho da Água são darparecer ao ministro da agricultura relativamente àsquestões de política da gestão das águas e àpromulgação de regras e regulamentos consideradosimportantes.

Vale ressaltar, ainda, um conjunto de entidades,algumas das quais com estatuto de empresa privada,que asseguram, nacional e regionalmente, oabastecimento de água. No plano regional, intervêmem regra as autoridades regionais da água,competindo-lhes instalar, conservar e gerir ossistemas de abastecimento de água. Nas zonaseventualmente não sujeitas às autoridades regionaisda água, a responsabilidade do abastecimento éconfiada à Autoridade Nacional da Água. Tanto aAutoridade Nacional como as autoridades regionaispodem ter o caráter de empresas públicas, nãoexistindo relações hierárquicas entre elas e todasdependendo diretamente do Ministério daAgricultura.

A Lei de Águas de 1959 regula e normatiza osseguintes aspectos (CUNHA et alii, 1980):

– propriedade e condições de utilização da água;

– preço da água e Fundo de Compensação deTarifas;

– projetos de obras hidráulicas e recarga deaqüíferos;

– participação das populações na gestão da água; e

– sanções e disposições diversas.

A Lei estabelece que os recursos hídricos são dodomínio público, estão sob o controle do Estado edestinam-se à satisfação das necessidades dapopulação e do desenvolvimento do País. Destemodo, a Lei não reconhece o direito à propriedadeprivada da água, apenas concedendo aos cidadãoso direito à sua utilização.

A água pode ser utilizada mediante autorização decaptação concedida pelo Comissariado da Água coma validade de um ano e determinando as quantidadesde água que podem ser captadas, distribuídas econsumidas, assim como as diversas condições aque fica sujeita a utilização em causa. As licençassão concedidas a entidades distribuidoras de água,devendo então as respectivas licenças especificaros usuários e os correspondentes consumos.

Além das disposições referidas, a Lei de Águas de1959 contém, relativamente às condições deutilização da água, diversas outras disposições nosentido de assegurar que este uso seja eficaz semdesperdícios e não prejudique a qualidade da água.Neste sentido, a Lei determina que os utilizadoresda água devem proceder de forma eficiente e manternas devidas condições qualquer instalação ouequipamento de utilização da água sob o seucontrole, no sentido de evitar perdas e poluição deágua, bem como de impedir a obstrução,esgotamento ou poluição de todos os recursoshídricos.

Tendo-se reconhecido a insuficiência destasdisposições no que diz respeito à defesa da qualidade

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3. Base Conceitual 34

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

da água, foi promulgado, em 1971, o Aditamento àLei de Águas de 1959 relativo à prevenção dapoluição das águas. No sentido da prevenção dapoluição das águas, o Aditamento de 1971 dápoderes ao ministro da Agricultura para, apósconsulta ao Conselho da Água, promulgarregulamentos restringindo, proibindo oucondicionando os usos que afetam a qualidade daságuas.

De acordo com o estabelecido na Lei de 1959, oministro da Agricultura pode estabelecer tarifas parapagamento do custo da água. Estas tarifas podemser fixadas com generalidade ou referirem-se apenasa determinada categoria de utilizadores ou região.

A política dos recursos hídricos adotada tem porobjetivo não só produzir benefícios econômicos, mastambém atingir determinados objetivos políticos,sociais, tais como a segurança nacional e aconservação das colônias agrícolas tradicionais e dorespectivo estilo de vida. Outra determinante destapolítica é a necessidade de se assegurar que oaumento do rendimento nacional não determine oaumento do consumo de água, cujas disponibilidadessão muito reduzidas. Considera-se que os recursoshídricos estão já praticamente utilizados, sendo cercade 80% empregados na agricultura.

Outra característica fundamental da legislação daságuas em Israel é estabelecer larga participação daspopulações e das entidades privadas na gestão daságuas, quer no plano da definição de políticas, querno contexto de sua execução.

O controle da qualidade das águas não é integradonuma política da gestão global dos recursos hídricos,talvez porque a escassez desses recursos justifiquea defesa rígida e intransigente da qualidade naturaldas águas. Assim, procura-se controlar a poluiçãoda água através de sanções que podem ir até aocorte do abastecimento de água àquelas pessoas ouentidades que não acatem as imposições daAdministração no sentido de cessarem atividades quedêem origem à poluição. Com o objetivo de evitardesperdícios, a lei estabelece que só é permitido

utilizar água através de sistemas que possibilitem amedição das quantidades captadas, para efeito dorespectivo pagamento.

3.3.5 O MODELO DO CHILE

No setor hídrico do Chile existe uma dispersãoinstitucional que produz contradições e, às vezes,superposição de competências. As responsabilidadesprincipais em relação à gestão da água e àimplantação do Código de Águas se concentram naDireção Geral de Água (Dirección General de Aguas- DGA), um órgão vinculado ao Ministério de ObrasPúblicas (MOP), que tem caráter multissetorial(JOURAVLEV, 2001).

À DGA compete:

– planejar o desenvolvimento dos recursoshídricos nos corpos naturais com a finalidadede formular propostas para seu aproveitamento;

– outorgar os direitos de aproveitamento de águas;

– monitorar os recursos hídricos;

– exercer o poder de polícia e a fiscalização daságuas nos corpos hídricos naturais de usopúblico; e

– supervisionar o funcionamento dasorganizações de usuários.

A DGA integra, ainda, o Sistema de Avaliação deImpacto Ambiental, que coordena a ComissãoNacional do Meio Ambiente (Comisión Nacional delMedio Ambiente – CONAMA) criada em função daLei Nº 19.300, de 09 de março de 1994. Constituídade 13 (treze) Direções Regionais, que abrangem todoo território do País, a descentralização de funçõestem sido uma política permanente da DGA.

Existem outras entidades públicas que têmatribuições em questões referentes ao uso e controledos recursos hídricos. Uma destas instituições é aDireção de Obras Hidráulicas (Dirección de ObrasHidráulicas) , um organismo também vinculado ao

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3. Base Conceitual35

MOP, que tem como missão executar obrashidráulicas dentro de um enfoque dedesenvolvimento integrado de bacias hidrográficas,visando ao uso eficiente dos recursos hídricosdisponíveis. Essa instituição tem uma participaçãoativa no planejamento do uso dos recursos hídricos,assim como na avaliação, construção e conservaçãodo conjunto das obras hídricas da bacia.

O modelo institucional vigente apresenta certasvantagens. O fato de a DGA não ser uma instituiçãosetorial e não executar obras de aproveitamento, lhepermite desempenhar seu papel regulador enormativo com grande imparcialidade, evitando adistorção da função reguladora, favorecendo odesenvolvimento economicamente eficiente dasações setoriais.

No Chile são observados alguns problemasdecorrentes da ausência de uma gestão integradados recursos hídricos, dentre os quais se destacamos seguintes:

– a administração dos recursos hídricos não érealizada com base nas bacias hidrográficas, esim nos rios, isoladamente; e

– gestão independente dos aspectos relativos aqualidade e a quantidade das águas.

Para superar estes problemas, foram propostasalgumas alterações no Código de Águas, que oraestão sendo discutidas no sentido de fortaleceralgumas funções da DGA e favorecer a gestãointegrada da água, como, por exemplo, a criação deentidades administradoras de bacias.

3.3.6 O MODELO DO BRASIL

As discussões sobre a proposta de um sistemanacional de gerenciamento dos recursos hídricos,no Brasil, surgiram em 1987 no âmbito da AssociaçãoBrasileira dos Recursos Hídricos (ABRH), quandoda realização do Simpósio Nacional de Salvador, eprosseguiram durante os encontros promovidos pelareferida entidade em Foz do Iguaçu, em 1989, e noRio de Janeiro, em 1991.

Os resultados dessas discussões estão contidos emcartas aprovadas pela Assembléia Geral da ABRH,rotuladas com os nomes das cidades nas quaisocorreram os encontros. Através destes documentos,pode-se acompanhar a evolução dos debatesreferentes aos aspectos institucionais da gestão dosrecursos hídricos. Por exemplo:

– na Carta de Salvador foram introduzidostópicos institucionais, como múltiplos usos dosrecursos hídricos, descentralização eparticipação, sistema nacional de gerenciamento,reformas legais, desenvolvimento tecnológicopara treinamento de recursos humanos, sistemade informações de recursos hídricos e políticanacional de recursos hídricos;

– a Carta de Foz do Iguaçu aborda algunsprincípios básicos da gestão de recursoshídricos, incluindo o reconhecimento do valoreconômico da água bruta e a cobrança peloseu uso, e recomenda a instituição de umsistema nacional para gestão de recursoshídricos;

– a Carta do Rio de Janeiro, dedicada aosrecursos hídricos e ao meio ambiente,estabelece como prioridades nacionais, nestessetores, o combate à poluição dos corpos d’águae o planejamento e o gerenciamento integradosde bacias hidrográficas e de áreas costeiras.

Finalmente, após dezenas de encontros e semináriosrealizados em vários locais do País, em 8 de janeirode 1997, o Presidente da República sancionou a LeiNº 9.433, que define a Política Nacional de RecursosHídricos e cria o Sistema Nacional de Gerenciamentode Recursos Hídricos. Trata-se de uma lei avançadae importante para a ordenação territorial do País,mas implica mudanças consideráveis dosadministradores públicos e dos usuários, já querequer receptividade ao processo de constituição deparcerias.

O Sistema Nacional de Gerenciamento de RecursosHídricos, estabelecido pela Lei Nº 9.433, devecumprir os seguintes objetivos:

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3. Base Conceitual 36

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

– coordenar a gestão integrada das águas;

– arbitrar administrativamente os conflitos ligadosao uso da água;

– implementar a Política Nacional de RecursosHídricos;

– planejar, regular e controlar o uso, apreservação e a recuperação dos recursoshídricos; e

– promover a cobrança pelo uso da água.

Conforme a Lei Nº 9.433, integram o SistemaNacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos:

– o Conselho Nacional de Recursos Hídricos;

– os conselhos de recursos hídricos dos estadose do Distrito Federal;

– os comitês de bacias hidrográficas;

– os órgãos de governo cujas competências serelacionam com a gestão de recursos hídricos;

– as agências de água.

Dentre as principais inovações introduzidas pela LeiNº 9.433, está o estabelecimento claro dosinstrumentos da gestão que devem ser utilizados paraviabilizar a implantação da Política Nacional deRecursos Hídricos:

– os planos de recursos hídricos;

– o enquadramento dos corpos de água emclasses de usos preponderantes;

– a outorga dos direitos de uso dos recursoshídricos;

– a cobrança pelo uso dos recursos hídricos;

– a compensação aos municípios; e

– o Sistema de Informações sobre RecursosHídricos.

A principal dificuldade observada nos anossubseqüentes à aprovação da Lei Nº 9.433, referia-se ao arranjo institucional do Sistema Nacional deGerenciamento de Recursos Hídricos que careciade um órgão com a atribuição executiva deimplementar a Política Nacional de RecursosHídricos. Concluiu-se que um sistema, baseadoquase que exclusivamente na ação dos comitês debacias, não poderia se estruturar para atenderatividades essencialmente técnicas, como aconcessão de outorgas, ou mesmo para aimplementação de sistemas complexos de cobrançapelo uso da água. Em face a essa necessidade, apósdiscussões em diferentes níveis do Governo Federale no meio técnico, em 17 de julho de 2000, oPresidente da República sancionou a Lei Nº 9.984,criando a Agência Nacional de Água – ANA, umaagência governamental na forma de autarquia sobregime especial para o desenvolvimento do SistemaNacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

A ANA, vinculada ao Ministério do Meio Ambientee dotada de autonomia administrativa e financeira,tem o objetivo de disciplinar a utilização dos recursoshídricos, de forma a controlar a poluição e odesperdício, para garantir a disponibilidade das águaspara as gerações futuras.

3.3.7 O MODELO DO CEARÁ

A Política Estadual de Recursos Hídricos, instituídapela Lei Nº 11.996, de 24 de julho de 1992,apresenta os seguintes princípios fundamentais:

n o gerenciamento dos recursos hídricos deve serintegrado, descentralizado e participativo, sema dissociação dos aspectos qualitativos equantitativos, considerando as fases aérea,superficial e subterrânea do ciclo hidrológico;

n a unidade básica a ser adotada para ogerenciamento dos potenciais hídricos é a baciahidrográfica, como decorrência de condicionante

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3. Base Conceitual37

natural que governa as interdependências entreas disponibilidades e as demandas de recursoshídricos em cada região;

n a água, como recurso limitado que desempenhaimportante papel no processo dedesenvolvimento econômico e social, impõecustos crescentes para sua obtenção, tornando-se um bem econômico de expressivo valor,decorrendo que –

– a cobrança pelo uso da água éentendida como fundamental para aracionalidade de seu uso e conservaçãoe instrumento de viabilização derecursos para o seu gerenciamento; e

– o uso da água para fins de diluição,transporte e assimilação de esgotosurbanos e industriais, por competir comoutros usos, deve ser também objetode cobrança;

n sendo os recursos hídricos bens de usosmúltiplos e competitivos, a outorga de direitosde seu uso é considerada instrumento essencialpara o seu gerenciamento.

O Sistema Integrado de Gestão de RecursosHídricos – SIGERH, estabelecido pela Lei Nº11.996, visa à coordenação e execução da PolíticaEstadual de Recursos Hídricos, bem como àformulação, atualização e execução do PlanoEstadual de Recursos Hídricos. O SlGERH congregainstituições estaduais, federais e municipais,intervenientes no planejamento, administração eregulamentação dos recursos hídricos (sistema da

gestão), órgãos responsáveis pelas obras e serviçosde oferta, utilização e preservação dos recursoshídricos (sistemas afins), entidades encarregadas porserviços de planejamento e coordenação geral,incentivos econômicos e fiscais, ciência e tecnologia,defesa civil e meio ambiente (sistemas correlatos),bem como aqueles organismos representativos dosusuários de águas e da sociedade civil. Deste modo,a estrutura do SIGERH é a apresentada a seguir:

– Conselho de Recursos Hídricos do Ceará –CONERH;

– Comitê Estadual de Recursos Hídricos –COMIRH;

– Secretaria dos Recursos Hídricos – órgãogestor;

– Fundo Estadual de Recursos Hídricos –FUNORH;

– Comitê de Bacias Hidrográficas – CBH‘s;

– Comitê das Bacias da Região Metropolitanade Fortaleza – CBRMF;

– instituições estaduais, federais e municipaisresponsáveis por funções hídricas.

Passados mais de dez anos do estabelecimento daLei Nº 11.996, o projeto de uma nova lei de recursoshídricos, discutido com os comitês de bacias eaprovado pelo Conselho Estadual, encontra-sepronto para ser enviado à Assembléia LegislativaEstadual. A nova lei propiciará melhorcompatibilização da legislação estadual de recursoshídricos com a Lei Federal Nº 9.433 e com a lei decriação da COGERH, ambas estabelecidas em datasposteriores à Lei Nº 11.996.

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39

Em função, entre outros aspectos, de ser umpaís com vasto território, possuindo regiõesque apresentam diversidades geográficas,

econômicas e culturais, o Brasil ensejou osurgimento, a partir do início dos anos 1990, deuma variada gama de modelos institucionais derecursos hídricos, cada um retratando oscondicionantes físicos, socioeconômicos e políticosde cada estado-membro da Federação.

Os modelos apresentados pelos estados brasileiros,embora diferentes quanto às orgânicas institucionaisexistentes ou propostas, se assemelham em relaçãoaos fundamentos, aos objetivos, às diretrizes gerais,aos instrumentos da gestão e aos organismosconsultivos (conselhos estaduais e comitês de baciashidrográficas) previstos nas suas legislações. Ajustificativa para tal semelhança está no fato dainfluência exercida pelo modelo francês sobre osmodelos estaduais mais antigos (São Paulo e Ceará)e sobre o modelo nacional (Lei 9.433), que, por suavez, forneceu as linhas gerais para os novos modelosestaduais.

Passada a fase de estabelecimento das políticas ede criação dos suportes legais, tanto pela União,quanto pelos estados, o desafio atual é comoestruturar e manter os sistemas institucionaisnecessários para a implementação dos instrumentosou mecanismos da gestão de recursos hídricos.

4

Análise Qualitativa dos tiposde Órgãos Gestores e de

Agências de Água

As experiências vivenciadas pela União e por algunsestados, na tentativa de avançarem naimplementação de suas políticas de recursoshídricos, demonstram relativo sucesso referente aoenvolvimento dos usuários e da sociedade noprocesso da gestão das águas e grandes dificuldadesinerentes à estruturação dos órgãos gestores e àimplantação das agências de água. No presentecapítulo, realiza-se uma análise qualitativa de algunstipos de órgãos gestores e de alguns modelos deagências de água, no que diz respeito às atribuiçõese competências no âmbito da gestão dos recursoshídricos. Esta análise, em relação aos órgãos gestores,é desenvolvida com o enfoque em quatro aspectosconsiderados relevantes para a gestão de recursoshídricos:

– relação institucional da função gestão com asdemais funções hídricas;

– autonomia administrativa e financeira daentidade;

– sustentabilidade do sistema da gestão dosrecursos hídricos;

– atendimento aos pr incípios da gestãoparticipativa e descentralizada dos recursoshídricos.

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4. Análise Qualitativa 40

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

Quanto às agências de água, em função de todasestarem em fase embrionária, e apresentarem,praticamente, as mesmas atribuições ecompetências, aborda-se simplesmente os entravese dificuldades inerentes aos seus processos deimplantação.

4.1 AMOSTRA SELECIONADA

Para a realização da análise referida anteriormente,foi escolhido um elenco de entidades, comatribuições de órgão gestor ou de agência de água,integrantes do sistema de recursos hídricos de algunsestados brasileiros. Os critérios adotados para aescolha das entidades a serem analisadas estãorelacionados na seqüência:

– considera-se órgão gestor para efeito destaanálise, a instituição da administração públicaindireta (autarquia, fundação ou companhia deeconomia mista) que desempenha ou venha adesempenhar funções da gestão de recursoshídricos;

– a amostra deve apresentar instituições, dentrodo possível, das regiões brasileiras (Sul, Sudestee Nordeste) onde os problemas de escassez deágua, relacionados com a sua quantidade ouqualidade, levaram os estados à estruturaçãode qualquer embasamento institucional para agestão dos recursos hídricos;

– no caso das Regiões Sul e Sudeste, a amostradeve conter órgãos gestores daqueles estados(Paraná, São Paulo e Minas Gerais), cujaslegislações preconizam a criação de agênciasde água e que tenham este processo já iniciado;

– a amostra deve relacionar os casos de agênciasde água ou de bacia, em fase de discussão,criação ou implantação, dos estados da RegiãoSul e Sudeste (Paraná, São Paulo e MinasGerais) onde também são selecionados paraanálise os órgãos gestores; e

– no caso da Região Nordeste, a amostra devecontemplar as experiências de órgãos gestores,implantados ou em decurso de implantação,concebidos para exercer as funções da gestãode recursos hídricos em parceria com asrespectivas secretarias de estado.

Desta maneira, foram selecionados 6 (seis) casosde órgãos gestores e 4 (quatro) de agências de águaou de bacia, conforme a relação apresentada a seguir:

n ÓRGÃOS GESTORES

– Superintendência de Desenvolvimento dosRecursos Hídricos e Saneamento Ambiental doEstado do Paraná – SUDERHSA;

– Departamento de Águas e Energia Elétrica doEstado de São Paulo – DAEE;

– Instituto Mineiro de Gestão das Águas –IGAM;

– Agência de Águas, Irrigação e Saneamento doEstado da Paraíba – AAGISA;

– Instituto de Gestão das Águas do Estado doRio Grande do Norte – IGARN;

– Companhia de Gestão dos Recursos Hídricosdo Estado do Ceará – COGERH.

n AGÊNCIAS DE ÁGUA

– Agência das Bacias Hidrográficas do Alto Iguaçue Alto Ribeira (Paraná);

– Agência das Bacias Hidrográficas dos RiosSorocaba e Médio Tietê – ABH-SMT (SãoPaulo);

– Agência das Águas do Comitê para Integraçãoda Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul –Agência do CEIVAP (São Paulo, Minas Geriase Rio de Janeiro); e

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4. Análise Qualitativa41

– Agência das Bacias Hidrográficas dos Rios Pará,Paraopeba e Velhas (Minas Gerais).

4.2 ANÁLISE DOS ÓRGÃOS GESTORES

4.2.1 SUDERHSA

n CARACTERIZAÇÃO

A Superintendência de Desenvolvimento deRecursos Hídricos e Saneamento Ambiental –SUDERSHA é uma autarquia vinculada à Secretariade Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricosdo Paraná. Por força do Decreto Nº 2.317, de 15de julho de 2000, que regulamenta o Artigo 33 daLei Nº 12.726, de 26 de novembro de 1999, foramdelegadas à SUDERHSA as competênciasrelacionadas à formulação e à execução da PolíticaEstadual de Recursos Hídricos, em particular no queconcerne às atividades relativas ao funcionamentooperacional do Sistema Estadual de Gerenciamentode Recursos Hídricos – SEGRH/PR.

Como competências delegadas à SUDERHSA,pode-se destacar:

– encaminhar à deliberação do Conselho Estadualde Recursos Hídricos – CERH/PR a propostado Plano Estadual de Recursos Hídricos –PLERH/PR, e suas modificações, tendo osplanos de bacia hidrográfica como base;

– outorgar e suspender o direito do uso da água,mediante procedimentos próprios;

– gerir o Sistema Estadual de Informações sobreRecursos Hídricos e manter cadastro de usos eusuários das águas;

– autorizar a cobrança pelo direito de uso dosrecursos hídricos, mediante delegação àsagências de água, consórcios intermunicipais debacia hidrográfica ou associações de usuáriosde recursos hídricos, ou realizá-la diretamente;e

– aplicar penalidades por infrações previstas naLei Estadual Nº 12.726.

No que concerne à gestão de recursos hídricos, paracumprir com os encargos decorrentes dascompetências que lhe foram delegadas, conformedisposto anteriormente, a SUDERHSA deveráorganizar suas ações mediante as seguintes linhasmestras de atuação:

– suporte institucional e técnico ao funcionamentodo Sistema Estadual de Gerenciamento deRecursos Hídricos – SEGRH/PR;

– planejamento da gestão de recursos hídricos;

– a manutenção e a operacionalização dosinstrumentos técnicos, administrativos efinanceiros necessários à gestão dos recursoshídricos;

– monitoramento quantitativo e qualitativo dosrecursos hídricos;

– a fiscalização do uso de recursos hídricos;

– a organização e a execução das incumbênciaspróprias ao exercício da Secretaria Executivado Conselho Estadual de Recursos Hídricos –CERH/PR;

– a gestão do Fundo Estadual de RecursosHídricos – FRHI/PR.

A SUDERHSA poderá assumir, em cumprimentoaos termos do seu regulamento, a instituição decomitês de bacia hidrográfica, e, por delegaçãoexpressamente aprovada por estes, os encargosinerentes às unidades executivas descentralizadas –UED´s (agências de água), a serem exercidosdurante o prazo a ser determinado pelo ConselhoEstadual de Recursos Hídricos – CERH/PR,enquanto não se efetivarem a sua criação e ascondições de operacionalização.

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4. Análise Qualitativa 42

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

Além de disponibilizar serviços relacionados com agestão de recursos hídricos, a SUDERHSA põe emprática serviços técnicos de engenharia no controleda erosão e recuperação de áreas degradadas,executa obras de saneamento e drenagem,desenvolve e executa programas de resíduos sólidos,coordenando as atividades relativas à coleta e destinofinal.

n ANÁLISE

Tendo por base a classificação apresentada nestetrabalho (Capítulo 3, 3.1 – Funções Hídricas),observa-se, por suas atribuições e competências, quea SUDERHSA desempenha as funções da gestão epreservação dos recursos hídricos. Neste caso, nãose constatam desvios de função que venham pôrem risco a missão institucional do órgão, quanto aogerenciamento dos recursos hídricos. Entretanto,apresenta o sistema uma disfunção ao exercer açõesde saneamento ambiental, tais como execução deaterros sanitários e programas de coleta de lixo,atividades inerentes às funções utilizadoras do meioambiente e dos recursos hídricos.

A personalidade jurídica de autarquia não enseja àSUDERHSA autonomia administrativa e financeiradesejável para desenvolver todas as funções dagestão dos recursos hídricos. Embora as instituiçõesautárquicas, à luz dos aspectos legais e jurídicos,sejam as mais recomendadas para exercer certasfunções da gestão de recursos hídricos,fundamentalmente no que se refere à regulamentaçãoe ao poder de polícia sobre as águas, essas entidadesapresentam limitações de ordem administrativa efinanceira, impostas pela burocracia estatal, que lhesimpedem de possuir maior agilidade e flexibilidadegerencial para a operacionalização do gerenciamentodas águas. Um dos exemplos de limitação que aburocracia estatal impõe às autarquias é o controlede seus recursos financeiros, inclusive oriundos dereceita própria, por parte do Tesouro estadual.

A sustentabilidade do sistema da gestão de recursoshídricos, no caso do Estado do Paraná, decorrerá

tanto da performance da SUDERHSA, como dosucesso na implantação das unidades executivasdescentralizadas – UED’s que exercerão o papel deagências de água. Neste momento, em que se iniciaa implantação da Política Estadual de RecursosHídricos e de funcionamento do Sistema Estadualde Gerenciamento de Recursos Hídricos, é defundamental importância a atuação da SUDERHSAna figura de órgão com delegação para exercer asfunções da gestão das águas. Alguns insucessos, noalcance da missão designada a essa instituição,poderão advir da sua falta de autonomiaadministrativa e financeira.

Embora o Estado do Paraná esteja dividido em 16regiões hidrográficas, a estrutura da SUDERHSA,compreendendo a sede em Curitiba e mais 6 (seis)escr itórios regionais, possibilita razoáveldescentralização das atividades relativas à gestão derecursos hídricos. Uma estrutura maisdescentralizada com escritórios em todas as regiõeshidrográficas, funcionando como secretariasexecutivas dos comitês de bacias, facilitaria oprocesso da gestão participativa. Contudo, há de selevar em conta o fator economia de escala, não sendoviável, muitas vezes, a instalação de escritórios emtodas as bacias. Por outro lado, a falta de autonomiainerente às autarquias também dificulta os processosde descentralização e participação, para os quais sãoindispensáveis agilidade e flexibilidade administrativa,além de recursos financeiros para suasimplementações. Uma gestão totalmentedescentralizada e amplamente participativa poderáser alcançada com a implantação das agências deágua, desde que tenham autonomia administrativa efinanceira.

4.2.2 DAEE

n CARACTERIZAÇÃO

Inspirado no modelo norte-americano do Vale doTennessee, de aproveitamento múltiplo da água, oDepartamento de Águas e Energia Elétrica do Estadode São Paulo – DAEE se transformou, desde a sua

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4. Análise Qualitativa43

criação em 12 de dezembro de 1951, em uma dasmais importantes entidades de recursos hídricos doPaís, acumulando, nesse período, importantesresponsabilidades e realizações.

Atualmente, o DAEE é o órgão gestor dos recursoshídricos do Estado de São Paulo. Para melhordesenvolver suas atividades, e exercer suasatribuições conferidas por lei, atua de maneiradescentralizada, no atendimento aos municípios,usuários e cidadãos, executando a Política deRecursos Hídricos do Estado de São Paulo, bemcomo coordenando o Sistema Integrado de Gestãode Recursos Hídricos, nos termos da Lei Nº 7.663,adotando as bacias hidrográficas como unidadefísico- territorial de planejamento e gerenciamento.

Compete ao DAEE, no âmbito do Sistema Integradode Gerenciamento de Recursos Hídricos – SIGRH:

– autorizar a implantação de empreendimentosque demandem o uso de recursos hídricos;

– cadastrar os usuários e outorgar o direito deuso dos recursos hídricos; e

– efetuar a cobrança pelo uso dos recursoshídricos.

Na reorganização do DAEE, incluiram-se, entre assuas atribuições, estrutura e organização, as unidadestécnicas e de serviços necessários ao exercício dasfunções de apoio ao Conselho Estadual de RecursosHídricos – CRH e a participação no ComitêCoordenador do Plano Estadual de RecursosHídricos – CORHI.

Além de sua sede na cidade de São Paulo, o DAEEconta com 8 (oito) diretorias Regionais,descentralizadas, chamadas diretorias de bacia, quetêm em seu organograma funcional unidades técnicasque desenvolvem várias atividades relativas aosrecursos hídricos, resumidas a seguir:

– Centro de Gerenciamento de RecursosHídricos – outorga, fiscalização, planejamentoe cadastramento; atuação, participação e

suporte técnico-administrativo aos comitês debacias hidrográficas e suas câmaras técnicas;atendimento aos usuários de recursos hídricos.

– Centro Técnico – assessoria técnica; elaboraçãode estudos e projetos; acompanhamento efiscalização de obras; análise eacompanhamento dos projetos do FundoEstadual de Recursos Hídricos – FEHIDRO;coordenação de convênios com prefeituras.

– Unidades de serviços e obras – coordenaçãodos serviços de máquinas do DAEE, no campodos recursos hídricos, realizados em parceriacom as prefeituras (com “drag-lines”,escavadeiras hidráulicas, pás-carregadeiras,tratores de lâmina, valetadeiras, retro-escavadeiras etc). Dispõe também de fábricasde tubos de concreto.

n ANÁLISE

Verifica-se, por suas atuais atribuições ecompetências, que o DAEE desempenha,fundamentalmente, as funções da gestão e oferta(construção de obras hidráulicas) dos recursoshídricos. À primeira vista, não se constatam sériosdesvios de função que venham pôr em risco a missãoinstitucional do órgão, quanto ao gerenciamento dosrecursos hídricos. Contudo, as experiênciasinstitucionais têm demonstrado que, no caso do Brasile de muitos outros países, quando se junta atribuiçõesda gestão e da execução de obras no mesmoorganismo, a tendência é da secundarização dogerenciamento dos recursos hídricos, em função dosgrandes interesses que estão em torno do setor deconstrução.

A personalidade jurídica de autarquia não garanteao DAEE autonomia administrativa e financeirasuficiente para desenvolver todas as funções dagestão dos recursos hídricos. Acerca destacaracterística da entidade, vale a mesma análiseelaborada para a SUDERHSA. Embora asinstituições autárquicas, à luz dos aspectos legais ejurídicos, sejam as mais recomendadas para exercer

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4. Análise Qualitativa 44

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

certas funções da gestão de recursos hídricos,fundamentalmente no que se refere à regulamentaçãoe ao poder de polícia sobre as águas, essas entidadesapresentam limitações de ordem administrativa efinanceira, impostas pela burocracia estatal, que lhesimpedem de possuir maior agilidade e flexibilidadegerencial para a operacionalização do gerenciamentodas águas. Um dos exemplos de limitação que aburocracia estatal impõe às autarquias é o controlede seus recursos financeiros, inclusive oriundos dereceita própria, por parte do Tesouro estadual.

A sustentabilidade do sistema da gestão de recursoshídricos, no caso do Estado de São Paulo, ocorreem função da atuação do DAEE e da capacidadedos comitês para estruturação das agências de bacia.Nesta etapa de implantação da Política Estadual deRecursos Hídricos e de início de funcionamento doSistema Estadual de Gerenciamento de RecursosHídricos, é de fundamental importância a atuaçãodo DAEE na figura de órgão com delegação paraexercer as funções da gestão das águas.

Conforme abordagem anterior, o DAEE conta com8 (oito) diretorias regionais que, em parceria comos comitês, gerenciam os recursos hídricos das 22(vinte e duas) bacias hidrográficas do Estado de SãoPaulo. Mesmo com as dificuldades inerentes a umaantiga instituição que busca se amoldar a um novoparadigma em política de recursos hídricos, o DAEEmantém estreita relação com os comitês de baciashidrográficas, exercendo o papel de secretariaexecutiva da maioria deles. Entretanto, comoautarquia, enfrenta as mesmas dificuldades daSUDERHSA para desempenhar seu papel de órgãoimplementador da gestão par ticipativa edescentralizada das águas. No caso do Estado deSão Paulo, também vale a ressalva de que estemodelo de gerenciamento poderá ser alcançado coma implantação das agências de bacias previstas naLei Nº 7.663.

4.2.3 IGAM

n CARACTERIZAÇÃO

O Instituto Mineiro de Gestão das Águas – IGAM évinculado à Secretaria de Estado de Meio Ambientee Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais.Criado na Lei Nº 12.584, de 17 de julho de 1997, oIGAM é uma autarquia dotada de personalidadejurídica de direito público, com sede e foro na cidadede Belo Horizonte e jurisdição em todo o territóriodo Estado, tendo como finalidade:

– propor e executar diretrizes relacionadas àgestão das águas no território mineiro e à PolíticaEstadual de Recursos Hídricos;

– programar, coordenar, supervisionar e executarestudos que visem à elaboração e à aplicaçãodos instrumentos da gestão das águas e daPolítica Estadual de Recursos Hídricos; e

– promover, avaliar, incentivar e executar estudose projetos de proteção e conservação das águas,visando à sua utilização racional integrada e aoseu aproveitamento múltiplo.

De acordo com as Leis Nos 12.584 e 13.199 (cria aPolítica Estadual de Recursos Hídricos) as principaiscompetências do IGAM são:

– gerir o Sistema Estadual de Informações sobreRecursos Hídricos;

– manter sistema de fiscalização de uso das águas;

– incentivar e prestar apoio técnico à criação e àimplementação de comitês e agências de baciashidrográficas;

– superintender o processo de outorga e desuspensão de direito de uso de recursoshídricos; e

– coordenar tecnicamente a elaboração dos planosdiretores de recursos hídricos.

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4. Análise Qualitativa45

n ANÁLISE

De acordo com as competências ora mencionadas,nota-se que o IGAM desempenha especificamentea função da gestão dos recursos hídricos. Apresenta,portanto, à luz das relações institucionais entre asfunções hídricas, o arranjo considerado ideal.

Contudo, conforme referido, a personalidadejurídica de autarquia não garante ao IGAMautonomia administrativa e financeira desejável paradesenvolver todas as funções da gestão dos recursoshídricos. Esta é uma característica das autarquiasque impõe limitações ao processo da gestão daságuas.

A sustentabilidade do sistema da gestão de recursoshídricos, no caso do Estado de Minas Gerais,acontece de forma semelhante aos Estados doParaná e de São Paulo, onde o papel do órgão gestoré preponderante na fase inicial de implementaçãoda Política Estadual de Recursos Hídricos. Asdificuldades a serem enfrentadas pelo IGAM são asmesmas da SUDERHSA e do DAEE, decorrentesda sua personalidade jurídica de autarquia. Asustentabilidade só será alcançada com a implantaçãodas agências de água, pois, de acordo com a Lei Nº13.199, apenas estas instituições poderão exercer acobrança pelo uso dos recursos hídricos.

O IGAM, como autarquia, apresenta as mesmaslimitações administrativas e financeiras daSUDERHSA e do DAEE para desempenhar seupapel de órgão implementador da gestão participativae descentralizada das águas, embora venha atuandono sentido de fomentar a estruturação dos comitêsde bacias e da agências de água.

4.2.4 AAGISA

n CARACTERIZAÇÃO

A Agência de Águas, Irrigação e Saneamento doEstado da Paraíba – AAGISA, autarquia sob regimeespecial, vinculada à Secretaria Extraordinária do

Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e Minerais– SEMARH, foi criada pela Lei Nº 7.033, de 21 denovembro de 2001, com a finalidade de implementarem sua esfera de atribuições a Política Estadual deRecursos Hídricos, e exercer, mediante atribuiçõesexpressas na lei ou delegações dos titulares dedireitos, a regulação e fiscalização das atividades deirrigação e saneamento no território do Estado daParaíba.

São atribuições da AAGISA:

– receber delegações de atribuições para aexecução de atividades relacionadas com agestão de águas do domínio da União que lhesejam transferidas na forma da lei;

– receber delegações de atribuições para aexecução de atividades relacionadas com aregulação, fiscalização e promoção daagricultura irrigada, de competência doMinistério de Integração Nacional, medianteassinatura do instrumento jurídico cabível;

– receber delegações de atribuições para aexecução de atividades relacionadas com aregulação e fiscalização das concessões deserviço público e saneamento básico, detitularidade dos respectivos municípios,mediante assinatura do instrumento jurídicocabível; e

– assinar acordos, tratados e convenções comorganismos nacionais e internacionais na áreade recursos hídricos.

n ANÁLISE

Observando-se as competências da AAGISAprevistas na Lei Nº 7.033, deduz-se que a esta devedesempenhar as funções da gestão dos recursoshídricos e de regulação, fiscalização e promoção dasatividades de saneamento e irrigação no Estado daParaíba. Deste modo, a AAGISA é a únicaexperiência de órgão gestor de recursos hídricos, de

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4. Análise Qualitativa 46

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

que se tem conhecimento no Brasil, possuindotambém a função de agência reguladora. Vale salientara diferença entre estes dois tipos de organismos: oórgão gestor de recursos hídricos exerce as funçõesde planejamento, administração e regulamentaçãoda oferta, uso e preservação de um bem público – aágua bruta – enquanto a agência reguladora atua nointuito de regular e fiscalizar um serviço, em formade monopólio, concedido à iniciativa privada peloPoder Público. No caso da AAGISA, verifica-seuma incompatibilidade de funções, uma vez que oórgão gestor, responsável pela disponibilização deágua bruta com qualidade aos setores de saneamentoe irrigação, é o mesmo que exige a qualidade destaágua quando fornecida, em forma tratada, por umaconcessionária de saneamento, fiscalizada por elepróprio. Outro desvio de função diz respeito ao fatode um órgão gestor de recursos hídr icosdesempenhar atribuições de setores utilizadores deágua (saneamento e irrigação).

Por outro lado, mesmo a figura de autarquia especialnão confere à AAGISA autonomia administrativa efinanceira desejável para desenvolver todas asfunções da gestão dos recursos hídricos. Esta é umacaracterística das autarquias que impõe limitações àgestão das águas, especialmente no semi-árido doBrasil, onde o gerenciamento dos recursos hídricosé realizado em associação com atividades deoperação e manutenção de infra-estrutura hidráulicade usos múltiplos.

A sustentabilidade do sistema da gestão de recursoshídricos, no caso do Estado da Paraíba, dependeráfundamentalmente do desempenho da AAGISA. Emfunção das peculiaridades da região semi-árida, ondese deve garantir a sustentabilidade operacional deuma vasta infra-estrutura hídrica, a necessidade dese ter um órgão gestor autônomo, ágil e flexível éainda maior do que nas áreas úmidas do Sul eSudeste.

Para se atender aos princípios da descentralização eparticipação na gestão dos recursos hídricos, o papelda AAGISA é determinante, uma vez que, nainviabilidade de se implantar agências de água na

maioria das bacias hidrográficas do semi-árido, é oórgão gestor que tem que exercer a função dessesorganismos.

4.2.5 IGARN

n CARACTERIZAÇÃO

O Instituto de Gestão das Águas do Estado do RioGrande do Norte - IGARN foi criado através da LeiNº 8.086, de 15 de abril de 2002. O IGARNconstitui-se numa autarquia vinculada à Secretariade Estado de Recursos Hídricos – SERHID, dotadade personalidade jurídica de direito público, compatrimônio próprio, com sede e foro em Natal ejurisdição em todo o território estadual.

O IGARN é o órgão estadual responsável pela gestãotécnica e operacional dos recursos hídricos doEstado, funcionando como apoio técnico eoperacional do Sistema Integrado de Gestão dosRecursos Hídricos – SIGERH.

As principais competências atribuídas ao IGARNsão as seguintes:

– participar da implantação das políticas eprogramas estaduais de recursos hídricos;

– coordenar e executar as at ividades degerenciamento de recursos hídricos no Estado;

– implantar e manter atualizado banco de dadossobre os recursos hídricos do Estado;

– elaborar e manter atualizado o Plano Estadualde Recursos Hídricos;

– por delegação da SERHID, analisar assolicitações e expedir as outorgas do direito deuso dos recursos hídricos, efetuando a suafiscalização;

– exercer o poder de polícia relativo aos usos dosrecursos hídricos e aplicar as sanções aosinfratores;

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4. Análise Qualitativa47

– analisar projetos e conceder licença técnica paraa construção de obras hídricas, sem prejuízoda licença ambiental obrigatória;

– implantar, operar e manter redes de estaçõesmedidoras de dados hidrológicos epluviométricos;

– implantar, operar e manter todo e qualquerinstrumento para gestão de água, comocadastros, planos, estudos, sistemas, processosparticipativos;

– efetuar a cobrança pelo uso da água e aplicaras multas por inadimplência;

– estabelecer e implementar as regras de operaçãoda infra-estrutura hídrica;

– operar e manter as obras e equipamentos deinfra-estrutura hídrica; e

– compor o Sistema Integrado de Gestão deRecursos Hídricos – SIGERH.

n ANÁLISE

Pelas competências do IGARN previstas na Lei Nº8.086, deduz-se que o órgão foi criado paradesempenhar exclusivamente as funções da gestãodos recursos hídricos. Possui, portanto, no que serefere às relações institucionais entre as funçõeshídricas, o arranjo considerado ideal.

A figura de autarquia, como abordado, não confereao IGARN autonomia administrativa e financeiradesejável para desenvolver todas as funções dagestão dos recursos hídricos. Como no caso daAAGISA, o IGARN poderá ter limitações paradesenvolver a gestão das águas, especialmente nascompetências relacionadas com as ações deoperação e manutenção da infra-estrutura hidráulicade usos múltiplos.

Em razão das peculiaridades do território estadual,inserido em grande parte na região semi-árida, sendo

essencial a sustentabilidade operacional de estruturashidráulicas, há uma grande necessidade de se terum órgão gestor autônomo, ágil e flexível. Mesmotendo a prerrogativa de exercer a cobrança pelo usodos recursos hídricos, o IGARN não tem as devidasgarantias para gerenciar de forma sustentável aságuas do Estado, pois, como autarquia, os recursosoriundos de sua receita serão controlados peloTesouro estadual.

Para atender aos princípios da descentralização eparticipação na gestão dos recursos hídricos, oIGARN terá que ser uma instituição autônoma,transparente e democrática, uma vez que irá,também, exercer a função de agência de água dasbacias hidrográficas do Estado.

4.2.6 COGERH

n CARACTERIZAÇÃO

A Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos doCeará – COGERH foi instituída pela Lei Nº 12.217,de 18 de novembro de 1993, como entidade daadministração pública indireta, dotada depersonalidade jurídica própria, organizada sob aforma de sociedade anônima de capital autorizado.

A COGERH tem por finalidade gerenciar a ofertados recursos hídricos constantes dos corpos d’águasuperficiais e subterrâneos de domínio do Estado,visando a equacionar as questões referentes ao seuaproveitamento e controle, operando, para tanto,diretamente ou por subsidiária ou ainda por pessoajurídica de direito privado, mediante contrato,realizado sob forma remunerada, objetivando:

– desenvolver estudos visando a quantificar asdisponibilidades e demandas das águas paramúltiplos fins;

– implantar um sistema de informações sobrerecursos hídricos, através da coleta de dados,estatística e cadastro de usos da água, visandoa subsidiar as tomadas de decisões;

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4. Análise Qualitativa 48

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

– desenvolver ações no sentido de subsidiar oaperfeiçoamento do suporte legal ao exercícioda gestão das águas, consubstanciado na LeiNº 11.996, de 24 de julho de 1992;

– desenvolver ações que preservem a qualidadedas águas, de acordo com os padrões requeridospara usos múltiplos;

– desenvolver ações para que a gestão dosrecursos hídricos seja descentralizada,participativa e integrada em relação aos demaisrecursos naturais;

– adotar a bacia hidrográfica como base econsiderar o ciclo hidrológico, em todas as suasfases; e

– realizar outras atividades que, direta ouindiretamente, explícita ou implicitamente,digam respeito aos seus objetivos.

n ANÁLISE

De acordo com as suas atribuições contidas na LeiNº 12.217, a COGERH tem exclusivamente asfunções da gestão dos recursos hídricos. Emassociação com a Secretaria de Recursos Hídricosdo Estado do Ceará, que exerce a coordenação dagestão e o poder de polícia sobre as águas, estaCompanhia desempenha o papel de órgão executivodo gerenciamento dos recursos hídricos estaduais.Desta forma, não apresenta incompatibilidades nodesenvolvimento das funções hídricas.

No caso da COGERH, a personalidade jurídica decompanhia propicia à entidade maior autonomiaadministrativa e financeira para exercer a função deórgão executivo da gestão de água. Possuindo receitaprópria, oriunda da cobrança pela utilização dosrecursos hídricos, sem precisar se submeter aosexcessivos controles da burocracia pública, aCOGERH apresenta boas condições para executaro gerenciamento das águas do Estado.

Em razão das peculiaridades do território estadual,inserido na região semi-árida, sendo necessárias amanutenção e a operação de uma grande infra-estrutura hídrica, a figura de um órgão gestorautônomo, ágil e flexível é essencial. A COGERH,como companhia, tem melhores condições dedesempenhar estas atividades do que os organismosem forma de autarquia.

Para atender aos princípios da descentralização eparticipação na gestão dos recursos hídricos das 11(onze) regiões hidrográficas do Ceará, a COGERHestá estruturada em uma sede na cidade de Fortalezae em mais 8 (oito) gerências de bacias distribuídaspelo Estado, exercendo, dentre outras funções, opapel de secretaria executiva dos comitês. Gozandode razoável autonomia administrativa e financeira,a Companhia carece, entretanto, de maiortransparência e democracia, perante os comitês debacias, para prosseguir na implantação dosinstrumentos da gestão das águas.

4.3 ANÁLISE DAS AGÊNCIAS DE ÁGUA

4.3.1 AGÊNCIA DO ALTO IGUAÇU E ALTORIBEIRA

n CARACTERIZAÇÃO

De acordo com a Lei Nº 12.726, o Sistema Estadualde Gerenciamento de Recursos Hídricos do Paranáé composto pelo Conselho Estadual de RecursosHídricos – CERH, pela Secretaria de Estado do MeioAmbiente e Recursos Hídricos, pelos comitês debacia e pelas chamadas “unidades executivasdescentralizadas – UED’s”, constituídas a partir daprévia formação de associações de usuários derecursos hídricos e/ou de consórcios intermunicipaisde bacias hidrográficas, com a finalidade deexercerem funções e competências inerentes àsagências de água (ou de bacia).

Em 11 de novembro de 2002, o Conselho Estadualde Recursos Hídricos do Paraná reconheceu aAssociação de Usuários de Recursos Hídricos das

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4. Análise Qualitativa49

Bacias Hidrográficas do Alto Iguaçu e do Alto Ribeiracomo Agência de Água. Credenciada junto aoMinistério da Justiça como OSCIP – Organizaçãoda Sociedade Civil de Interesse Público, estaassociação firmou contrato de gestão com o Estadodo Paraná para fins de exercício de funções inerentesà Agência de Água das Bacias Hidrográficas do AltoIguaçu e Alto Ribeira, mantendo as seguintesatribuições e competências:

– promover estudos de apoio à gestão dosrecursos hídricos em sua área geográfica deatuação;

– elaborar e, após aprovação do respectivocomitê, implementar o plano de baciahidrográfica;

– participar do gerenciamento do Sistema Estadualde Informações sobre Recursos Hídricosrelativo à sua área territorial de atuação, emcooperação com as entidades estaduaisresponsáveis;

– manter cadastro dos usuários de recursoshídricos dentro de sua área territorial de atuação,em cooperação com as entidades estaduaisresponsáveis;

– efetuar, mediante delegação do outorgante, acobrança pelo direito de uso de recursoshídricos;

– analisar e emitir pareceres sobre os projetos eobras a serem financiados com recursosgerados pela cobrança pelo uso de recursoshídricos e encaminhá-los à instituição financeiraresponsável pela administração desses recursos;

– acompanhar a administração financeira dosrecursos arrecadados com a cobrança pelo usodos recursos hídricos em sua área geográficade atuação;

– identificar e informar ao órgão executivo e decoordenação central do Sistema Estadual deGerenciamento de Recursos Hídricos –

SEGRH/PR, sobre as infrações à legislaçãorelativa ao gerenciamento de recursos hídricos,bem como aos regulamentos e normas deladecorrentes;

– elaborar a proposta de seu orçamento, incluindoa previsão de recursos públicos, transferíveis àconta de contratos de gestão e termos deparceria, e submetê-la à aprovação dorespectivo comitê de bacia hidrográfica; e

– prestar o apoio administrativo, técnico efinanceiro necessário ao bom funcionamentodo comitê de bacia hidrográfica da área de suaatuação, em consonância com as previsões deseu orçamento.

n ANÁLISE

No Estado do Paraná, como em outros estadosbrasileiros onde a legislação sobre recursos hídricospreconiza o estabelecimento de agências de água oude bacia, o grande desafio está na implantaçãosustentável destes organismos. A agência de água éo mecanismo determinante para o alcance dosobjetivos da gestão integrada, participativa edescentralizada dos recursos hídricos,fundamentalmente, por ser a ferramenta prevista emlei para o financiamento e a democratização dogerenciamento das águas.

Uma condição básica para a implantação das agênciasde água é a predisposição dos dirigentes públicospara dividir o poder com os comitês de bacias. Assimé que, numa primeira fase, os comitês necessitamda ajuda dos estados e/ou da União para estruturaçãodas agências; após implantada a cobrança pelo usoda água, as agências se transformam num poderosoinstrumento financeiro da política hídrica, ensejandoaos comitês maior credencial no processo da gestãoparticipativa dos recursos hídricos.

A recente anulação do contrato de gestão (Decreto1.651, de 4 de agosto de 2003), firmado entre oEstado do Paraná e a Associação de Usuários doAlto Iguaçu e do Alto Ribeira, demonstra que os

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4. Análise Qualitativa 50

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objetivos da gestão descentralizada, contando coma participação dos usuários, sociedade e poderpúblico, tem um caminho longo a percorrer, repletode necessárias compreensões sobre o sentido dogerenciamento dos recursos hídricos.

4.3.2 AGÊNCIA DOS RIOS SOROCABA EMÉDIO TIETÊ

n CARACTERIZAÇÃO

A Lei Nº 10.020, de 3 de julho de 1998, autorizou oPoder Executivo do Estado de São Paulo a participarda constituição das agências de bacias, na forma defundações de direito privado, direcionadas aoscorpos de águas superficiais e subterrâneas dedomínio estadual.

Um desses organismos já criados é a Agência dasBacias Hidrográficas dos Rios Sorocaba e MédioTietê – ABH-SMT, entidade jurídica sem finslucrativos, com estrutura administrativa e financeiraprópria, com a participação do Estado, dosmunicípios e da sociedade civil, conforme constada sua escritura pública de constituição.

A ABH–SMT tem como competências principais:

– efetuar estudos sobre as águas da bacia emarticulação com órgãos do Estado e municípios;

– participar da gestão de recursos hídricosjuntamente com outros órgãos da bacia;

– dar parecer ao Conselho de Orientação doFEHIDRO sobre a compatibilidade de obra,serviço ou ação, com o Plano de Bacia;

– aplicar recursos financeiros a fundo perdidodentro dos critérios estabelecidos pelo CBH–SMT;

– administrar conta do FEHIDRO correspondenteaos recursos da Bacia do SMT;

– efetuar a cobrança pela utilização dos recursoshídricos da bacia, de acordo com os critériosestabelecidos pelo CBH–SMT, e fixados emlei;

– elaborar, em articulação com órgãos do Estado,dos municípios e sociedade civil, o Plano deRecursos Hídricos da Bacia, submetendo-o aanálise e aprovação do CBH–SMT; e

– prestar apoio administrativo, técnico efinanceiro necessário ao funcionamento doCBH–SMT.

n ANÁLISE

A Lei Nº 7.663, de 30 de dezembro de 1991, decriação da Política Estadual de Recursos Hídricos,já vai completar 12 (doze) anos e até o momentonão há uma só agência de bacia plenamenteestruturada no Estado de São Paulo. Os entravesocorridos no Estado são praticamente os mesmosencontrados em outros estados ou mesmo na esferada União: as soluções inovadoras enfrentamproblemas para serem compreendidas e aceitas,fundamentalmente, em função do tradicionalismo econservadorismo dos poderes constituídos.

Mesmo no meio técnico, o modelo de agências debacias encontra resistências, havendo opiniões nosentido de o gerenciamento dos recursos hídricosser desenvolvido apenas por órgãos gestores públicose o processo decisório ficar limitado ao setor público.Toda esta reserva se justifica pelo fato das agênciasvirem a ocupar grande parte do espaço destinadoatualmente aos órgãos gestores, passando a gerenciarum razoável volume de recursos financeiros.

No caso de São Paulo, o modelo de agência de baciapreconizado pela Lei Nº 10.020, com naturezajurídica de fundação de direito privado e a presençado Poder Executivo Estadual na sua constituição,demonstra a preocupação do Estado em exercer umcerto controle desse tipo de instituição.

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4. Análise Qualitativa51

Por outro lado, a opção por fundação de direitoprivado sofre restrições por parte do novo CódigoCivil Brasileiro, pois, no seu Artigo 62, recomendaeste tipo de natureza jurídica para entidades comfins religiosos, morais, culturais ou de assistência.

4.3.3 AGÊNCIA DO CEIVAP

n CARACTERIZAÇÃO

A Agência das Águas do Comitê para Integração daBacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul,denominada Agência do CEIVAP, foi criada emmarço de 2001 na forma de uma fundação de direitoprivado sem fins lucrativos, com estruturaadministrativa e financeira próprias, instituída coma participação da União, dos Estados de São Paulo,Minas Gerais e Rio de Janeiro, dos municípios, dosusuários de recursos hídricos e das organizações civisda bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul. Umano e meio depois, mudou sua natureza jurídica,constituindo-se numa sociedade civil sem finslucrativos, designada por Associação Pró-Gestão dasÁguas da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul.

Consta de seu estatuto, em conformidade com aLei Federal Nº 9.433, como competências principais,as relacionadas a seguir:

– desenvolver, facilitar e implementar osinstrumentos da Política Nacional de RecursosHídricos, no âmbito da bacia do rio Paraíba doSul, aplicando e operacionalizando as resoluçõesdo Comitê para a Integração da BaciaHidrográfica do Rio Paraíba do Sul (CEIVAP),conforme os ditames da Lei federal Nº 9433;

– defesa, preservação e conservação do meioambiente e promoção do desenvolvimentosustentável;

– apoiar técnica, administrativa eoperacionalmente o Comitê para Integração daBacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul(CEIVAP);

– manter o balanço atualizado da disponibilidadede recursos hídricos na bacia hidrográfica dorio Paraíba do Sul;

– manter o cadastro de usuários de recursoshídricos;

– efetuar, mediante delegação do outorgante, acobrança pelo uso de recursos hídricos;

– analisar e emitir pareceres sobre os projetos eobras a serem financiados com recursosgerados pela cobrança pelo uso dos recursoshídricos e encaminhá-los à instituição financeiraresponsável pela administração desses recursos;

– gerir o Sistema de Informações sobre RecursosHídricos em sua área de atuação;

– elaborar o Plano de Recursos Hídricos paraapreciação do CEIVAP, buscandocompatibilizar os planos estaduais de recursoshídricos e os planos de sub-bacias; e

– exercer o controle quantitativo e qualitativo douso da água, conciliar interesses dos usuários eassegurar vazão indispensável ao suprimentodo consumo humano e animal.

n ANÁLISE

Em 2001, o plenário do CEIVAP, através daDeliberação nº 05, de 16 de março de 2001, aprovoua criação da Agência de Águas do CEIVAP,adotando o formato de uma fundação de direitoprivado. Esta deliberação foi encaminhada aoConselho Nacional de Recursos Hídricos e à AgênciaNacional de Águas – ANA para apreciação e anecessária autorização, o que não ocorreu até o finaldo ano de 2001.

Diante do cronograma para a implantação dacobrança pelo uso da água na bacia do Paraíba doSul no ano de 2002, que exige a instituição da agênciade água da bacia, estas discussões foram retomadasatravés das reuniões de câmaras técnicas do CEIVAP

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4. Análise Qualitativa 52

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e de grupo de trabalho específico, que contou coma participação dos diversos segmentos do Comitê eda Procuradoria Geral da ANA. Diante de estudosapresentados pela ANA e do novo Código CivilBrasileiro (Lei Nº 10.406 de 2002) que veda ainstituição de fundações de direito privado paraoutros fins que não sejam os religiosos, culturais ede assistência, foi necessária uma revisão da propostaanterior, caminhando-se então para a proposição daformação de uma associação civil sem fins lucrativos,que venha a constituir-se como organização social(OS) e a qualificar-se como agência de água da bacia.

A Associação Pró-Gestão das Águas da BaciaHidrográfica do Rio Paraíba do Sul é o primeirocaso de agência em rio de domínio da União. Suaexperiência demonstra o longo caminho a percorrerpara a implantação, no Brasil, de um sistema degerenciamento de recursos hídricos que sejaparticipativo, descentralizado e sustentável. Asdificuldades inerentes à definição do modeloinstitucional das agências de águas só não são maioresdo que as relativas ao processo de implantação dacobrança, haja vista que, no caso do CEIVAP, aindanão está prevista, pelo menos num curto prazo, adelegação da cobrança pela ANA à associação recém-criada.

4.3.4 AGÊNCIA DOS RIOS PARÁ,PARAOPEBA E DAS VELHAS

n CARACTERIZAÇÃO

A proposta de criação da Agência dos Rios Pará,Paraopeba e das Velhas estabelece uma entidade na

forma de sociedade civil sem fins lucrativos,denominada Associação Pró-Gestão das Águas dasBacias Hidrográficas dos Rios Pará, Paraopeba edas Velhas.

Este organismo tem por finalidade dar apoio técnicoe operacional à gestão dos recursos hídricos dasbacias hidrográficas dos rios Pará, Paraopeba e dasVelhas, promovendo o planejamento, a execução eo acompanhamento das ações, programas e projetosdeterminados, de acordo com os respectivos planosde ações e planos diretores de recursos hídricos dasbacias, aprovados pelos comitês das referidas bacias:Pará (CBH–PARÁ), Paraopeba (CIBAPAR) e dasVelhas (CBH–VELHAS).

n ANÁLISE

Pela análise da proposta de criação da Agência dosRios Pará, Paraopeba e das Velhas, nota-se umasemelhança com a experiência do CEIVAP no sentidoda montagem inicial, pelo comitê de bacia, de umaassociação para gestão de recursos hídricos, para,em seguida, legit imá-la perante os órgãoscompetentes como agência de água.

A compreensão que têm os comitês de baciashidrográficas da necessidade de se buscar modelossustentáveis para o gerenciamento das águas édemonstrada neste caso, uma vez que 3 (três) delesse uniram (CBH–PARÁ, CIBAPAR e CBH–VELHAS) para propor apenas uma agência para assuas respectivas bacias, com a clara intenção demelhor viabilizar a gestão de recursos hídricos.

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Segundo Campos (2001), durante odesenvolvimento de um novo modelo, deve-se ter em mente que o processo de mudança

institucional interfere com vários segmentos do setorpúblico e da sociedade em geral. Desta forma,recomenda-se uma discussão prévia de propostascom os setores interessados, no sentido de se obterum modelo institucional que contemple os novosprincípios da gestão de recursos hídricos, apresenteviabilidade política para ser aprovado pelos poderesconstituídos e tenha aplicabilidade prática.

Tomando-se por base a abordagem do Capítulo 3,onde se apresentam os atributos de um bom modeloinstitucional, estabelecidos por Campos (2001), eos critérios considerados por Barth (1987) para asua concepção, comenta-se a seguir os principaiscondicionantes do modelo de agência de água parao Ceará.

5.1 CONDICIONANTES DO MODELO

Embora os tipos de condicionantes de um modeloinstitucional de recursos hídricos, como referido noCapítulo 3, sejam semelhantes para qualquer região,aqueles inerentes aos aspectos hidrológicos, sociais,econômicos, legais e institucionais são osdeterminantes no caso do Estado do Ceará.

Quanto aos aspectos hidrológicos, já foi visto noCapítulo 2 que o Ceará possui rios intermitentes epouca disponibilidade em recursos hídricossubterrâneos. Como decorrência dessas limitações,

5Concepção de um Modelo deAgência de Água para o Ceará

o Estado é dotado de uma vasta infra-estruturahídrica composta por barragens, canais e adutorasde múltiplos usos que necessitam sersustentavelmente operados e mantidos. Deste modo,a gestão das águas no Ceará está intrinsecamenteassociada com a operação e a manutenção dessainfra-estrutura hidráulica, induzindo a adoção demodelos de órgão gestor e/ou agência de água quedesenvolvam, além das atividades corriqueiras degerenciamento dos corpos hídricos, ações tais como:

– alocação de água através de rios intermitentes,perenizados por água liberada de reservatóriosde montante;

– oferta de água bruta, através da operação decanais e adutoras de múltiplos usos, parausuários dos setores de saneamento, indústriae irrigação;

– monitoramento quantitativo e qualitativo daságuas em açudes, leitos de rios perenizados,canais e adutoras de múltiplos usos;

– serviços de inspeção e segurança de obrashidráulicas.

Como aspecto social relevante, apresentado peloEstado do Ceará para a definição do modelo deagência de água, está o baixo nível de organizaçãoda sociedade, conseqüência, dentre outros fatores,do pouco grau de instrução da população (segundoo Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica doCeará – IPECE, o Estado tinha, no ano 2000, 27%

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545. Concepção de um Modelo de Agência de Água para o Ceará

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

dos seus habitantes analfabetos) e da histórica práticapolítica baseada no paternalismo e noassistencialismo, sendo os interesses individuaispriorizados em detrimento dos coletivos. Decorredo baixo nível de organização da sociedade, o fatode o Estado, no Ceará, ser o único indutor doprocesso de organização dos comitês de bacias.Enquanto em outros estados do Brasil, Rio Grandedo Sul e São Paulo por exemplo, já havia gruposcolegiados (comitês, consórcios intermunicipais etc)que discutiam as questões relacionadas com a gestãodas águas, mesmo antes da instituição da política derecursos hídricos em seus estados.

Os comitês de bacias do Ceará, mesmo o Comitêda Bacia Hidrográfica do Rio Curu, que já vaicompletar 6 (seis) anos, em função de fatorespolíticos, sociais e econômicos, ainda desenvolvemsuas atribuições de maneira induzida pelo órgãogestor. Uma vez que a agência de água, comomecanismo básico para o alcance de uma gestãoparticipativa e descentralizada dos recursos hídricos,só tem sentido se for criada por iniciativa do comitêde bacia, devendo ser por ele operacionalizada, ficadifícil imaginar, pelo menos em curto ou médioprazos, que os comitês de bacias do Estado do Cearávenham a ter condições de empreender tal tarefa.

Entre os aspectos econômicos que influenciam aconcepção do modelo de agência de água no Ceará,estão:

– o elevado nível de pobreza da população;

– as desigualdades regionais dentro do Estado;

– a capacidade de pagamento dos setores deutilização da água; e

– o alto custo da água.

Apresentando um Índice de DesenvolvimentoHumano – IDH em torno de 0,7 (de acordo com oIPECE), o Estado do Ceará é classificado como umaregião de médio nível de desenvolvimento humano.Entretanto, segundo estudo do Banco Mundial,

publicado em junho de 1999, o Estado apresentava49% da sua população em nível de pobreza. Detodos os pobres, 54% viviam em áreas rurais, 27%nas diversas cidades e 19% na Região Metropolitanade Fortaleza.

Por outro lado, conforme dados do IPECE, a RegiãoMetropolitana de Fortaleza concentrava, no ano2000, 63% do Produto Interno Bruto – PIB. Aonível do Estado, o PIB era distribuído da seguinteforma: a atividade agropecuária representava 6%, aindustrial 41% e o setor de serviços 53%.

Da análise dos dados mencionados anteriormente,pode-se concluir que a pobreza no Estado do Cearáestá, fundamentalmente, mais presente no meio rurale muito associada à atividade agropecuária. Comodecorrência da desigualdade regional, a cobrançapelo uso da água nas bacias metropolitanasrepresenta, atualmente, 94% do faturamento daCOGERH. Como resultado da desigualdade entreos setores da economia, o fornecimento de águabruta para uso industrial corresponde a 35% dofaturamento da Companhia, enquanto a utilizaçãona irrigação representa 5%.

A experiência de quase 10 (dez) anos da COGERHtem demonstrado que, no caso do Ceará, onde anecessidade de implantar, manter e operar umagrande infra-estrutura hidráulica eleva o custo daágua, a viabilização financeira da gestão dos recursoshídricos decorre da cobrança pelo fornecimento daágua bruta ao setor industrial. Isto se justifica pelasseguintes razões:

– o setor industrial tem elevada capacidade depagamento que permite sobras para subsidiaroutros setores;

– o setor de saneamento tem capacidade depagamento que permite financiar a operação emanutenção apenas dos sistemas hídricos daRegião Metropolitana de Fortaleza; e

– o setor de irrigação tem em média baixacapacidade de pagamento, tendo que sersubsidiado.

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55 5. Concepção de um modelo de Agência de Água para o Ceará

De toda a análise relativa aos aspectos econômicos,aqui desenvolvida, pode-se deduzir que, diante daatual realidade do Estado do Ceará, apenas a RegiãoHidrográfica das Bacias Metropolitanas ensejacondições financeiras para a implantação de umaagência de água.

Os aspectos legais e institucionais, consideradoscomo importantes condicionantes do processo deelaboração de um modelo de agência de água parao Ceará, são:

– a Lei Nº 11.996, que criou a Política deRecursos Hídricos do Estado do Ceará, nãoprevê a agência de água ou qualquer modelode entidade semelhante ao previsto pela Uniãoou por outros estados como organismointegrante do Sistema Integrado de Gestão deRecursos Hídricos;

– o Sistema Integrado de Gestão de Recursos doEstado do Ceará, criado pela Lei Nº 11.996 ecomplementado pela Lei Nº 12.217, estabelecea Secretaria de Recursos Hídricos – SRH comoórgão gestor, exercendo as funções deregulamentação e mantendo o poder de políciasobre as águas, e a COGERH como organismoexecutivo da gestão part icipativa,descentralizada e integrada dos recursoshídricos; e

– a COGERH foi organizada na forma desociedade anônima de capital autorizado(companhia) no intuito de possuir autonomiaadministrativa e financeira necessária à suamissão de desenvolver o gerenciamentoparticipativo e descentralizado dos recursoshídricos.

Dos aspectos legais e institucionais aqui levantados,depreende-se a idéia de que a COGERH foi criadacom a finalidade de exercer o papel de uma agênciade água de todas as regiões hidrográficas do Estadodo Ceará.

Considerando os diversos aspectos analisadosanteriormente, pode-se resumir os condicionantes

para a formulação de um modelo de agência de águapara o Estado do Ceará, da forma a seguir:

– a função gestão de recursos hídricos estáassociada a operação e manutenção de umavasta infra-estrutura hidráulica;

– incapacidade dos comitês de baciashidrográficas para, num curto ou médio prazos,criar e operacionalizar agências de água;

– a viabilização financeira da gestão dos recursoshídricos decorre da cobrança pelo fornecimentode água bruta ao setor industrial;

– das 11 (onze) regiões hidrográficas do Estadodo Ceará, apenas a Região das BaciasMetropolitanas apresenta sustentabilidadefinanceira para a gestão de recursos hídricos,sendo portanto a única que enseja condiçõespara implantação de uma agência de águaexclusiva; e

– a COGERH foi criada para exercer um papelsemelhante ao de uma agência de água de todasas regiões hidrográficas do Estado do Ceará.

5.2 FORMULAÇÃO DO MODELO

Para a formulação do modelo de agência de água,seguiu-se a sistemática estabelecida por Campos(2001), já referida no Capítulo 3 deste trabalho,respeitando, obviamente, os condicionantes inerentesaos aspectos hidrológicos, sociais, econômicos, legaise institucionais do Estado do Ceará.

n ETAPA 1 – Caracterização das funçõeshídricas a serem realizadas

Como já abordado em divers as passagens dopresente trabalho, a agência de água tem porfinalidade ser o organismo executivo dogerenciamento de recursos hídricos, funcionandocomo mecanismo de descentralização efinanciamento da gestão participativa das águas.Para tanto deve trabalhar associado ao órgão público

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565. Concepção de um modelo de Agência de Água para o Ceará

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

gestor dos recursos hídricos, conforme a seguintedivisão de atribuições:

– o órgão gestor tem o papel de coordenar aexecução da política de água definida peloconselho de recursos hídricos, exercendo acoordenação da gestão, juntamente com asatribuições de regulamentação e do poder depolícia no âmbito do gerenciamento das águasno Estado; e

– a agência deve desenvolver, basicamente, açõesde planejamento da gestão e administração dosrecursos hídricos ao nível da bacia hidrográfica,adotando como instrumento primordial acobrança pelo uso da água bruta, outorgada peloórgão gestor, para o financiamento dogerenciamento e de ações de melhoramento doscorpos hídricos.

n ETAPA 2 – Diagnóstico do modeloinstitucional vigente

No caso do Estado do Ceará, em virtude doscondicionantes estabelecidos anteriormente e daconseqüente ausência de agências de água no seumodelo institucional, as funções hídricas estãodistribuídas da seguinte forma:

– a SRH desempenha o papel de órgão gestor,exercendo o comando da execução da PolíticaEstadual de Recursos Hídricos, a coordenaçãoda gestão, efetuando as funções deregulamentação e do poder de polícia sobre aságuas;

– a SOHIDRA desenvolve a função relacionadacom a oferta hídrica, sendo encarregada daconstrução das obras hidráulicas (barragens,canais, adutoras e poços); e

– a COGERH executa o planejamento da gestãoe a administração dos recursos hídricos ao nívelde todas as bacias hidrográficas do Estado,como também parte da função de oferta d’água,mais especificamente no que diz respeito a

operação e manutenção da infra-estruturahidráulica, adotando a cobrança comoinstrumento de financiamento do gerenciamentodas águas.

Do ponto de vista da distribuição das funçõeshídricas, o Estado do Ceará apresenta um bommodelo institucional de recursos hídricos. Comoaspectos positivos pode-se destacar:

– a existência de uma autoridade única para apolítica das águas (SRH), autônoma eindependente dos setores de uso dos recursoshídricos, tendo assim as condições necessáriaspara a implementação dos instrumentos dagestão (outorga, cobrança e licenciamento deobras hídricas) e para arbitrar conflitos;

– a distribuição das funções da gestão econstrução de obras de oferta em organismosindependentes (COGERH e SOHIDRA),evitando o risco da função gestão ser relegadaa segundo plano;

– a subordinação da função relacionada com aconstrução de obras hidráulicas à entidade queexecuta a política de recursos hídricos,facilitando o planejamento e o controle da ofertahídrica; e

– a existência de uma instituição que executa omonitoramento meteorológico (FUNCEME),integrada ao Sistema Estadual de Gestão deRecursos Hídricos, fazendo com que o Cearátenha um modelo institucional que contempletodas as fases do ciclo hidrológico.

n ETAPA 3 – Definição do modelo

Segundo Barth (2000), a COGERH pode sercaracterizada como a primeira agência de águabrasileira, estabelecida na forma de direito privado,com a finalidade de desenvolver a gestãodescentralizada, participativa e integrada dos recursoshídricos, utilizando a bacia hidrográfica comounidade básica do gerenciamento. Neste sentido,

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57 5. Concepção de um modelo de Agência de Água para o Ceará

Barth pode ter percebido a sutileza que faz o modelodo Ceará diferir de todos os outros adotados noBrasil. Em outros estados da União, inclusive dosemi-árido, a agregação das funções da gestão(planejamento, administração e regulamentação)numa só instituição dificulta a escolha da melhornatureza jurídica dessa entidade. Já no Ceará, adistribuição das funções da gestão entre SRH eCOGERH, permite a definição de personalidadesjurídicas mais adequadas para os órgãos envolvidosno processo de gerenciamento das águas.

Assim é que as funções de coordenação da gestão,de regulamentação e de poder de polícia das águas,todas inerentes ao poder público, devem serexercidas por órgãos públicos da administração direta(secretarias de estado) ou por instituições daadministração indireta em forma de autarquias(institutos, departamentos, superintendências). Poroutro lado, as funções de planejamento da gestão,de administração das águas, de operação emanutenção de infra-estrutura hídrica podem serexecutadas, de forma mais eficiente, por instituiçõesmais ágeis e flexíveis, como as entidades de direito

privado (empresas públicas, sociedades de economiamista, organizações sociais, organizações dasociedade civil de interesse público).

Ao estabelecer a SRH como órgão gestorcoordenador e a COGERH como um tipo de agênciade água para todas as bacias do Estado, pode-seafirmar que o modelo do Ceará está à frente dosdemais modelos vigentes no Brasil, associando demaneira mais adequada as funções hídricas com anatureza jurídica dos organismos envolvidos noprocesso da gestão das águas.

Retomando os condicionantes anteriormenteestabelecidos, pode-se verificar se o modelo atual,com a COGERH no papel de agência de água, érealmente o mais adequado para o Estado do Ceará.Para facilitar o entendimento organizou-se a Tabela5.1 que relaciona cada condicionante com umacaracterística a ser atribuída à agência de água. Ficaevidente, ao observar a referida tabela, que umaagência de água para todas as bacias hidrográficas,na forma de empresa pública, é o modelo maisaconselhável.

A função gestão de recursos hídricos está associadaa operação e manutenção de uma vasta infra-estru-tura hidráulica.

Incapacidade dos comitês de bacias hidrográficaspara, num curto ou médio prazos, criar eoperacionalizar agências de água.

A viabilização financeira da gestão dos recursoshídricos decorre da cobrança pelo fornecimento deágua bruta ao setor industrial.

Apenas a região das bacias metropolitanas apresentasustentabilidade financeira para a gestão das águas.

Atribuições de O e M são, em geral, delegadas àsempresas públicas ou privadas.

Agências criadas e operadas pelo Estado.

Atribuição de fornecimento de água é, em geral,delegada a empresas públicas ou privadas.

Uma única agência para todas as bacias do Estado.

CONDICIONANTE CARACTERÍSTICA

Tabela 5.1 – Condicionantes e Características da Agência de Água

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585. Concepção de um modelo de Agência de Água para o Ceará

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

n ETAPA 4 – Verificação da consistênciado modelo

O modelo estabelecendo a COGERH, na forma deempresa pública de direito privado, como agênciade água de todas as bacias hidrográficas do Estadodo Ceará, não apresenta divergências em relação àLei Federal Nº 9.433, pois, além de não ferir osprincípios dessa lei, a prerrogativa de legislar sobreas águas de rios estaduais, caso de quase todos osrios do Ceará, é do Estado. A exceção fica por contade alguns rios que integram a bacia do rio Parnaíba.Neste caso, a COGERH pode receber a delegaçãoda ANA para, em articulação com o órgão gestor doEstado do Piauí, desenvolver o papel de agência deágua da parte da bacia do Parnaíba inserida no seuterritório.

Quanto à Lei Estadual Nº 11.996, por ser anterior àcriação da COGERH, esses dispositivos nãoestabelecem uma entidade executiva dogerenciamento das águas estaduais como organismocomponente do Sistema Integrado de Gestão deRecursos Hídricos. A proposta, em discussão, deatualização da referida lei poderá corrigir estadistorção.

Em relação aos princípios que norteiam a gestão derecursos hídricos no Estado do Ceará, está explícitona lei de criação da COGERH, que ela tem entreseus objetivos o gerenciamento descentralizado,participativo e integrado das águas. Através de umenorme esforço empreendido desde a sua fundação,a Companhia tem avançado na busca de atenderaos referidos princípios, realizando as seguintesações:

– de participação – apoio à organização dosusuários de água e ao processo de formação decomitês de bacias hidrográficas; alocaçãonegociada dos recursos hídricos; discussão deplanos de bacias junto aos comitês.

– De descentralização – criação de 8 (oito)gerências de regiões hidrográficas,desenvolvendo o gerenciamento

descentralizado dos recursos hídricos efuncionando como secretarias executivas doscomitês de bacias.

– De visão integrada – administração dasdisponibilidades hídricas e dos diversos usosde água (abastecimento humano e industrial,irrigação, pesca, aqüicultura e lazer); operaçãoe manutenção de infra-estrutura hidráulica demúltiplos usos; monitoramento quantitativo equalitativo da água.

Apesar dos avanços, há muito por fazer no sentidode alcançar as metas de uma gestão descentralizada,participativa e integrada das águas. Cabe àCOGERH, para se legitimar definitivamente comoagência de água das bacias hidrográficas do Estadodo Ceará, se aprofundar, fundamentalmente, noexercício do princípio da participação, estreitandosua parceria junto aos comitês. Para tanto, é essencialter a ousadia para romper as barreiras da falta detransparência e da centralização administrativa muitocomuns às instituições públicas brasileiras, porémincompatíveis com o modelo de agência de água.Desta maneira, sugere-se algumas medidas que,adotadas de forma gradual, poderiam ensejar àCOGERH uma conotação mais explícita de agênciade água:

– estabelecimento de centro de controle dereceitas e de custos / região hidrográfica, deonde seriam gerados relatórios anuais a seremapresentados aos comitês de bacias;

– fortalecimento das gerências regionais, dotando-as de pessoal e equipamentos suficientes paraa execução das atividades do gerenciamento dossistemas hídricos no âmbito das baciashidrográficas, como também, propiciando-lhesautonomia administrativa e financeira desejávelpara o desempenho da função de secretariaexecutiva do respectivo comitê de bacia;

– presença de representantes dos comitês debacias no Conselho Estadual de RecursosHídricos;

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59 5. Concepção de um modelo de Agência de Água para o Ceará

– indicação de representantes dos comitês debacias para assumir assento no Conselho Fiscalda COGERH; e

– presença de representantes dos comitês debacias no Conselho Administrativo daCOGERH.

De todas as medidas propostas, a flexibilização doConselho Administrativo seria a mais efetiva nointuito de tornar a COGERH uma autêntica agênciade água. Em sociedades de economia mista, oConselho Administrativo é composto apenas derepresentantes dos detentores de ações da empresa.

No caso da COGERH, o Estado, como possuidorde praticamente todas as ações, indica todos os seusmembros. Neste sentido, o Conselho Administrativodessa Companhia é formado por secretários deestado, sendo presidido pelo secretário de RecursosHídricos.

Considerando que os comitês de bacias hidrográficassão organismos de Estado, criados com base nalegislação estadual, através de decretos do PoderExecutivo, supõe-se que seus presidentes tambémpodem ser indicados para compor o ConselhoAdministrativo da COGERH.

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De acordo com Barth (1987), o modelo idealda gestão de recursos hídricos é teórico, epara ser alcançado deverá haver uma

significativa evolução institucional do País ou doestado da Federação que venha a adotá-lo, de formaque ele deve ser interpretado como objetivo a atingira longo prazo.

Assim é que, ao longo dos últimos 15 (quinze) anos,o Estado do Ceará tem avançado gradativamenteno sentido da estruturação e aperfeiçoamento de ummodelo institucional que permita, de forma plena, agestão participativa, descentralizada e integrada daságuas inseridas no seu território.

A abordagem realizada no presente trabalho acercade modelos institucionais de recursos hídricosvigentes no Brasil e em outros países e, maisespecificamente, a análise desenvolvida sobre ostipos de órgãos gestores e de agências de águaexistentes ou propostos no Ceará e em alguns estadosbrasileiros, permitem inferir que o modelo cearensede gerenciamento das águas, de concepção muitopeculiar, está compatível com os mais modernosprincípios da gestão de recursos hídricos.

Assim como existe no modelo francês e está previstono modelo brasileiro, as agências de bacias e asagências de água, respectivamente, comomecanismos essenciais para a democratização,descentralização e financiamento da gestão derecursos hídricos, no Ceará, a Companhia de Gestãode Recursos Hídricos – COGERH, uma entidadeda administração pública indireta, organizada sob a

forma de sociedade anônima de capital autorizado,pode ser considerada a primeira agência de água doBrasil, com personalidade jurídica de direito privado,a adotar no gerenciamento das águas os fundamentosda Lei Federal Nº 9.433.

Finalmente, considerando-se as questões a seremrespondidas e os objetivos a serem alcançados como presente trabalho de pesquisa, pode-se estabeleceras seguintes conclusões:

– em virtude das peculiaridades físicas do semi-árido do Nordeste brasileiro, onde o Estado doCeará se insere, o modelo de agência de águapreconizado pela Lei Nº 9.433 pode ser aplicadonesta região, desde que com as suascompetências ampliadas para incluir, além defunções de gestão de recursos hídricos, funçõesde oferta de água;

– a gestão de recursos hídricos no Ceará estáassociada a operação e manutenção de umavasta infra-estrutura hidráulica;

– a viabilização financeira da gestão de recursoshídricos no Ceará decorre do fornecimento deágua bruta ao setor industrial;

– em função da grande concentração dodesenvolvimento econômico do Estado sobrea Região Metropolitana de Fortaleza, a cobrançapelo uso da água bruta na Região Hidrográficadas Bacias Metropolitanas subsidia a gestão dosrecurso hídricos nas bacias hidrográficas dointerior e do litoral;

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Conclusões

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626. Conclusões

Modelos de Gerenciamento de Recursos Hídricos: Análises eProposta de Aperfeiçoamento do Sistema do Ceará

– a inviabilidade financeira de se estruturaragências de água autônomas nas baciashidrográficas do Estado enseja, para a obtençãoda sustentabilidade do gerenciamento dosrecursos hídricos em todo o território estadual,a instituição de única agência para o Ceará;

– a incapacidade dos comitês de baciashidrográficas de, em curto ou médio prazos,criar e operacionalizar agências de água, enseja,no caso do Ceará, a adoção de um modelo deagência controlada pelo poder público estadual;

– considerando as atribuições e competênciasinerentes às funções da gestão de recursoshídricos e aquelas relativas à função de ofertade água bruta para múltiplos usos, comotambém o controle que o Estado deve exercersobre a entidade, a figura de uma empresa

pública, com personalidade jurídica de direitoprivado, é bem adequada para desempenhar opapel de agência de água no Ceará.

Das conclusões expostas, depreende-se que aCOGERH, como órgão executivo do gerenciamentoparticipativo e descentralizado dos recursos hídricosdo Ceará, pode ser considerada a agência de águade todas as bacias hidrográficas estaduais.

Contudo, para se legitimar como agência de água, aCompanhia tem que romper as barreiras da falta detransparência e da centralização administrativa,adotando mecanismos para, gradualmente,estabelecer uma gestão compartilhada com aquelesque pagam pelo uso da água bruta, tendo os comitêsde bacias como instâncias de deliberação esupervisão da sua atuação.

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