Modernidade, Pós-Modernidade e Hipermodernidade ou a Crise Constitucional da União Europeia (Duarte Bué Alves)

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    ENSINA-NOSMAURICEDUVERGERque a Comunidade Europeia lha do Estado e neta da cidade1.Curiosa concepo esta que, partindo em busca de uma geneologia colectiva, vai fazerradicar na polisos fundamentos do processo da construo europeia. Tanto nos habitu-mos a ter o Estado como instituio paradigmtica de referncia nas relaes de po-der ao nvel internacional, que esquecemos que no s ele no o m da Histria alguns profetas garantiram que assim era como no foi igualmente o seu princpio.H um antes e um depois que ajudam a explicar a natureza da construo europeia masque explicam tambm em parte as crises por que esta foi passando. Crises polticas maisou menos profundas mas que atingiram o znite existencial no processo constituciona-lizante que foi da Conveno ao Tratado Constitucional.

    Vale a pena determo-nos por momentos num brevssimo olhar pela evoluo da-quilo que os ingleses, com propriedade, chamam de politye que antecedeu o Estado,fenmeno poltico recente mas que exerceu e exerce uma fora centrpeta tal que,quer do ponto de vista poltico, quer do ponto de vista da anlise histrica, acaba porprejudicar a reexo.

    Dos Pr-Modernos ModernidadeNa Grcia antiga o primeiro crculo de insero era a casa(oikos), que correspondia ao espao das relaes familiares e s relaes entre senhores

    e escravos. Ao conjunto de casas chamava-se aldeia ( kome) e estas, juntas, formavama cidade ( polis). Vrias polis formavam a comunidade ( koinomia) mas apenas nacidade h uma estrutura de governo que impele sociabilizao. Da polisgrega her-dmos ensinamentos chave que ainda hoje estruturam a nossa aco aprendemos ao humanismo individualista (a perspectiva estica do homem como coisa sagra-da2), a ideia de justia (subttulo daPoliteiade Plato), o vnculo de cidadania (que

    Duarte Bu Alves*

    Modernidade, Ps-Modernidade e Hipermodernidade ou

    a Crise Constitucional da Unio Europeia

    * Diplomata. Colocado na Embaixada de Portugal em Bruxelas. Agradeo o estmulo, os comentrios e as im-presses trocadas com o Senhor Embaixador Manuel Nuno Tavares de Sousa e com o Senhor ProfessorDoutor Armando Marques aGuedes, bem como a cito por ordem alfabtica Francesco Montanari(grazie mille!), Hugo Sobral, Joo Monteiro Rodrigues, M. Joo Mayer Branco e Pedro Leite de Faria.Naturalmente, tudo o que aqui se escreve no responsabiliza seno o seu prprio Autor.

    1 Maurice Duverger, A Europa dos cidados, s/ local, ASA, s/ data, pgina 17.2 Jos Adelino Maltez,Prncipios de Cincia Poltica Introduo Cincia Poltica,Lisboa, Ed. do Centro de Estudos do

    Pensamento Poltico do Instituto Superior de Cincias Sociais e Polticas, 1996, pgina 171.

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    6 a Unio Europeia viria a adoptar em Maastricht, por iniciativa espanhola) e a noo(constitucional) de povo que estruturante para o debate europeu.

    Mesmo se os ps-aristotlicos desferem ferozes crticas polisa verdade que o quepunham em causa era menos o conceito do que a prtica: lutavam pelo alargamento daparticipao e mesmo quando os cnicos advogam a sua supresso, contrapem que so mundo um espao verdadeiramente livre para a realizao de uma comunidadede iguais. Regressam assim ao que Digenes j tinha identicado como o espao docidado cosmopolita sem quaisquer limites ou fronteiras geogrcas.

    Com a implantao do Imprio de Roma e a ascenso do cristianismo, dois proble-mas se colocam. A sobreposio de delidades assume uma dupla vertente: o vnculo cidade e, cumulativamente, ao Imprio; e talvez politicamente mais sensvel aos olhosdos homens da poca o vnculo ao temporal e ao espiritual ( cidade de Deus porcontraposio cidade dos homens, como Sto. Agostinho viria a dizer no sculo IV).

    Quando S. Paulo foi preso em Jerusalm, longe de Tarso, sua cidade natal, pde, porfora do direito romano, invocar os direitos que lhe assistiam luz dos costumes dasua polise das normas de Roma. Um cidado romano pode ser simultaneamente umcidado da sua cidade e do Imprio3.

    Mas o cristianismo lana tambm uma nova ideia de povo o povo em sentidoecumnico. Com razes em Abrao (o povo que procura a Terra Prometida e a quemDeus diz: Farei de ti um grande povo4), vai alargar-se com Jesus Cristo, que univer-saliza esse conceito, tornando-o numa comunidade de crentes no mesmo Deus, um scorpo em que o centro ocupado por uma entidade transcendente5. Compreende-seo receio dos homens da terra (e da as perseguies aos primeiros cristos) que per-

    ceberam que competiam agora, debalde, com uma fora espiritual que era de atracosuperior6.Uns sculos frente, chegados a Jean Bodin, assimilamos o conceito pivotal de

    soberania: um conceito intrnseco ao Estado (a partir de Maquiavel faz sentido usaro termo), absoluto, perptuo, uno, indivisvel, prprio, irrevogvel, supremo mas noilimitado um Estado soberano est limitado pela rectido na aco, pelo respeito pelafamlia, pela propriedade e pelas leis (no sculo XVIII esta concepo viria a ser posta

    3 Derek Heater,Citizenship the Civic Ideal in world history, politics and education,Essex, Longman, 1990, pgina 18.

    Repare-se como a cidadania europeia retoma este conceito de sobreposio quando as cidadanias nacio-nais e comunitria coexistem e no se excluem.4 Bblia Sagrada, Livro dos Gnesis, 12, 2, edio Difusora Bblica, 14. edio, Lisboa, 1988.5 No h judeu nem grego; no h servo nem livre; no h homem nem mulher, pois todos vs sois um s

    em Cristo Carta de S. Paulo aos Glatas, 3, 27-28.6 Hannah Arendt corrobora esta ideia e vai mesmo mais longe: J se disse com acerto que, aps a queda do

    Imprio Romano, foi a Igreja Catlica que ofereceu ao homem um substituto para a cidadania, antesoutorgada exclusivamente pelo governo municipal, inA Condio Humana,Lisboa, Edies Relgio dgua,2001, pgina 48.

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    em causa pelo absolutismo). Antecipa-se em Bodin um breve anncio do contratua-lismo que confere ao cidado um conjunto de direitos e deveres por fora da con-veno mtua entre o Prncipe e os sujeitos e que obriga reciprocamente as duas par-tes7.

    Mas em Jean Jacques Rousseau que vamos encontrar as bases do que viria a forjaro contratualismo moderno (e, assim, inevitavelmente, o prprio constitucionalismo).Viver em sociedade colocar em comum todas as energias sob uma direco subordi-nada vontade geral. Passa-se, assim, do estado de natureza para o estado civil ou de so-ciedade que alicerce da liberdade civil (o eu partilhado). Nessaagora(para regressara um termo grego) participam todos os que quiserem mas ningum obrigado a isso.Os que carem de fora so os estrangeiros entre os cidados8. com o contrato socialroussiano que nasce o Estado, ares publica, o cidado que pactua o futuro em comum e,de certo modo, o constitucionalismo moderno9.

    Nestes breves exemplos ca claro que o Estado no esgota a panplia de mode-los de unidades geopolticas e, por isso, um erro identicar a comunidade polticaintemporalmente considerada com o Estado10. Estas polities tm em comum seremespaos fsicos de aco dos cidados, de insero comunitria, representando umlocus onde o grupo se sedentariza e cria razes. Nas polities que a histria nos mostra, ocontexto geogrco sempre essencial, independente da maneira como denido11 .Da polisao Imprio Romano, da cidade livre medieval ao feudo, passando pelo Estado--nao, foroso admitir que a histria no chegou ao m. Hoje vivemos dominadospor esta ideia tipicamente ps-vestefaliana inequivocamente uma fora motriz damodernidade que representa o paradigma do chamado Estado moderno, soberano e

    nacional, que diz ter tido como antecedentes a polisgrega, acivitas ou arespublica dosromanos e oregnummedieval dos sculos XII e XIII, mas que, efectivamente, apenas se

    7 Jean Bodin,Les Six Livres de la Republique, Paris, Ed. Fayard, 1986, pgina 117.8 Jean Jacques Rousseau,Du Contrat Social ou principes du droit publique, Paris, G. F. Flamarion, 1966, pgina 51 a 57.9 evidente que Rousseau no desconhecia os ares do tempo da sua poca, nomeadamente, as experincias

    contratualistas americanas e o Compact dos 41 peregrinos doMayflower.Tambm no desconhecia, como natural, o Leviat de Thomas Hobbes, essa figura bblica, drago mtico e smbolo do mal que ame-dronta o homem e o impele ao Estado de sociedade. Para Hobbes, o Estado de sociedade s faz sentidoquando a ele surgir associada a existncia de um grupo que se reconhece em laos de lealdade e que secontrape ao outro. O Estado surge, assim, para Thomas Hobbes, como um regresso liberdade que,

    por isso mesmo, s pode agir na prossecuo do que recto e justo. O contrato social hobbesiano (ou, emtermos no muito diversos, de John Locke) visto como um meio para alcanar o bem que pr-existia.Nisto, difere substancialmente de Rousseau onde o contrato social a exaltao da vontade emprica dohomem como valor supremo. Se para os filsofos ingleses os direitos esto no centro porque so inatosao prprio homem para o filsofo genebrino, o direito de auto-preservao da comunidade , de longe,o que ocupa um lugar primordial.

    10 Miguel Ayuso,Depois do Leviat Sobre o Estado e o seu destino,Lisboa, Hugin Editores, 1999, pgina 21.11 Percy B. Lehning,Pluralism, Contractarianism and Europe, in Percy B. Lehning e Albert Weale (org.),Citizenship,

    Democracy and Justice in the New Europe, Londres e Nova Iorque, Routledge, 1997, pgina 108.

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    8 conformou a partir da Renascena europeia, quando Maquiavel, em texto publicadoem 1532, lhe inventou o nome,e Jean Bodin, em 1576, lhe estabeleceu o princpiogerador, asoberania(em itlico no original)12.

    no culminar deste percurso que vamos encontrar o Estado moderno a gran-de encarnao caracterstica da modernidade da comunidade poltica13. Lutero intro-duziu-lhe afractura religiosaabrindo portas ao processo de secularizao e laicizao, oque acarretou, nomeadamente, uma mudana da origem do poder, que deixa de provirde Deus para passar a assentar no povo. Maquiavel responsvel pelafractura ticaafas-tando as concepes jus-naturalistas e abrindo portas ao realismo. Jean Bodin molda afractura polticacriando o conceito revolucionrio da soberania. A Thomas Hobbes de-vemos afractura jurdicapela centragem que faz no indivduo como clula bsica, abrin-do depois portas ao contratualismo roussiano. E, nalmente, aos homens de Vestefliavamos beber afractura sociolgicae, porventura, a smula e a consagrao de todos estes

    princpios numa sistemtica tratadista.O Estado nao foi, portanto, o cone geopoltico da modernidade14 mas nohaveria de car inclume aos ventos de mudana da histria j que no Estado veste-faliano e na soberania laBodin, cabem hoje mal muitas das realidades internacionaisintrincadas de um presente cada vez mais globalizado15.

    Rumo Ps-Modernidade Diz a generalidade dos autores que a ps-modernidade nasceu nosmovimentos arquitectnicos da Amrica dos anos 7016. Outros apontam Andy Warholcomo seu percursor17. Numa ptica mais cognitiva, Jean-Franois Lyotard sublinha aalterao da natureza do conhecimento, com a emergncia de novas linguagens e sa-

    beres comunicacionais que tem um efeito disruptivo nos poderes pblicos na medidaem que os obrigou a reconsiderar as suas relaes de direito e de facto com as grandesempresas em geral e com a sociedade civil18. Faz-se uma sntese entre o indivduoe a comunidade: quele reconhecem-se novos direitos; a esta conferem-se novas res-

    12 Jos Adelino Maltez,Ensaio sobre o Problema do Estado Tomo I A procura da Repblica Maior,Lisboa, AcademiaInternacional da Cultura Portuguesa, 1991, pgina 342.

    13 Miguel Ayuso, ob. cit., pgina 21. No mesmo sentido, Georg Jellinek,Teoria General del Estado,Buenos Aires,Ed. Albatros, 1978.

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    Barry Smart, A Ps- Modernidade,Mem- Martins, Edies Europa Amrica, 1993, pgina 131.15 Armando Marques Guedes,O funcionamento do Estado em poca de globalizao. O transbordo e as cascatas de poder,inArmando Marques Guedes,Estudos sobre Relaes Internacionais, Lisboa,Edies do Instituto Diplomtico doMinistrio dos Negcios Estrangeiros, 2005, pgina 98.

    16 Cfr., por todos, Charles Lemert,The Uses of French Structuralisms in Sociology,in George Ritzer (org.),Frontiers of SocialTheory: The new Syntheses,Nova Iorque, Columbia University Press, 1990, pgina 233.

    17 Frederic Jameson,Postmodernism, or the Cultural Logic of Late Capitalism,in New Left Review,146, 1984, pginas 53 a 92.18 Jean-Franois Lyotard, A Condio Ps- Moderna,Lisboa, Edies Gradiva, 1989, pgina 21. E mais frente: os

    antigos plos de atraco formados pelos Estados-nao () perdem os seus atractivos (pgina 40).

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    ponsabilidades. Sociologicamente, emerge uma espcie de narcisismo colectivo cujasforas antitticas obrigam a um redimensionamento dos espaos de insero para darresposta a um povo vido de identidade e em que todos clamam pelo direito decidade19. O clamor sociolgico mas tambm constitucional e, politicamente, encon-tra uma muito feliz sntese na expresso do Professor Francisco Lucas Pires: estamosperante o transbordo de poder20.

    Sobretudo a partir da segunda metade do sculo XX, foi-se tornando cada vez maisevidente que continuar a equacionar todas as questes de poder ao nvel do Estado noslevava a um beco de insucincias: a internacionalizao dos factores de produo, odespontar de organizaes internacionais, a fora crescente das empresas multinacio-nais, o pluralismo cultural e tnico, os fenmenos migratrios so alguns dos factoresque podemos apontar como tendo contribudo para a eroso do poder dos Estados,o m do seu fetichismo e o incio da sua dessacralizao21. O mundo foi obrigado

    a pensar a poltica no contra os Estados mas para almdeles: a mudana nos contextosinstitucionais, jurdicos e polticos constituem uma espcie de rombos () tanto nocasco (fronteira e cidadania) como no miolo (moeda e segurana) do Estado nao[que] acabaram por se repercutir duplamente: de um lado, comodesao ao modelo da ordemconstitucional nacional; do outro, comointerpelao constituintes embrionrias unidades deintegrao poltica supranacional (itlico nosso)22.

    O processo de construo europeia pode e deve ser visto luz destes fenme-nos sendo por isso, politicamente, o que podemos chamar um sinal de manifestaoda ps-modernidade ou, se quisermos, um degrau e contraforte da globalizao23.O Estado-nao arqutipo da modernidade ele prprio adjuvante (porque nada

    adianta constituir-se como oponente) na construo de mecanismos supra-nacionais,ps-soberanos ou ps-modernos. A passagem de um modelo intergovernamental (jde si uma espcie de modernidade plus) para um modelo supranacional (de que oTratado de Maastricht foi talvez a viragem simblica, [por causa da moeda nica e que anal o que conta do ponto de vista da percepo analtica dos grandes fenmenos

    19 Gilles Lipovetsky, A Era do Vazio,Lisboa, Edies Relgio dgua, pginas 11 a 15.20 Francisco Lucas Pires,Introduo ao Direito Constitucional Europeu,Lisboa, Almedina, 1997, pgina 11.21 Yves Boisvert,Le Monde Postmoderne,Paris, Harmattan, 1996, pgina 67. Thomas L. Friedman chama a este mundo

    o flat world (embora nas mais de 600 pginas do seu livro nunca use a expresso ps-moderno),e aponta dez factores que para isso contriburam. VideThe Flat World the Globalized World in the Tweenty-FirstCentury,Penguin, 2006, especialmente pginas 51-199.

    22 Francisco Lucas Pires,Introduo,ob. cit., pgina 11. A questo tambm se pe do ponto de vista infra-esta-dual (por exemplo nos debates sobre a regionalizao ou sobre a subsidariedade). Veja-se, a este propsito,Armando Marques Guedes, ob. cit., pgina 103: A globalizao centrfuga mas tambm centrpeta;funciona em patamares macro, mas no deixa de agir sobre domnios micro.

    23 Francisco Lucas Pires,Portugal e o Futuro da Unio Europeia Sobre a reviso dos Tratados em 1996,Lisboa, Difuso Cultural,1995, pgina 18.

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    feito com doses no despiciendas de violncia mas que o grupo, por regra, absorvee que , ela prpria, uma fora consolidadora da autonomia. A distino entre a esferado pblico e do privado assume aqui importncia crucial porque esse processo feito,necessariamente, no domnio do privado (ou melhor seria dizer: do no pblico) e asintervenes do(s) outro(s) lado(s) so vistas como uma interferncia no legtima. Jurgen Habermas fala, a este propsito, de refeudalizao do espao pblico29 eacusa quer os Governos quer a economia capitalista. Importa, por isso, saber se essenovo locusse assume como uma fora motriz constituinte e em que termos para aferir-mos, ento, da sua legitimidade.

    O Neo-Contratualismo Foi com o Tratado da Unio Europeia de 1992 que se abriram as portaspara a celebrao de um novo contrato social europeu que teve como expoente mxi-mo (porventura mais no domnio do simblico do que do real) a cidadania europeia.

    Em Maastricht, o cidado deixa de ser (apenas) o market- citizenou homo oeconomicusparaser um cidado poltico. A cidadania europeia consagra esta dimenso comunitari-zante ao colocar nas mos do povo europeu (ou dos povos europeus, mas deixemosessa questo para mais tarde) um conjunto de possibilidades que so, na sua essncia,de cariz constituinte. A partir do momento em que so organizadas eleies escalaeuropeia (para o Parlamento Europeu30), estava-se a responder armativamente per-gunta que coloca Gomes Canotilho: ou no poltica e juridicamente concebvel umpoder constituinte interdependente ou ps-soberano assente no exerccio em comumdo poder constituinte originrio dos povos?31. Quando se conferiram direitos polti-cos aos cidados europeus, fez-se-lhes um convite para que se assumissem como uma

    comunidade de sujeitos constituintes que entre si contratualizam, pactuam e consen-tem no modo de governo da cidade32.Porque falhou, ento, o Tratado Constitucional?

    29 Jrgen Habermas,The Public Sphere: An Encyclopedia Article,in New German Critique,n. 3 (Outono de 1974), pgina54. Um outro ponto de anlise interessante para o Tratado Constitucional partindo ainda sempre deHabermas olh-lo pelo prisma do que o filsofo alemo chamou a teoria da razo comunicativa. Estaabordagem afasta-se do racionalismo tradicional porque acentua o carcter racional do discurso cognitivo,em detrimento do processo ou do objecto cognoscvel. Ora, sendo o Tratado Constitucional um texto esendo esse texto um discurso, possvel aplicar-lhe os parmetros de anlise habermasiana.

    Conviria aqui acrescentar que o prprio Jrgen Habermas continua, ainda hoje, a reiterar que no umps-moderno, identificando, na Alemanha, essa linha de pensamento com a Escola de Francoforte, de quese diz distante, e a quem acusa de pessimismo ontolgico e radicalismo desusado. So clebres as suaspolmicas com alguns dos pensadores comummente identificados com o ps-modernismo.

    30 No mesmo sentido, vendo a eleio do Parlamento Europeu por sufrgio universal e directo como incio destemomento legitimador, cfr. Marta Rebelo,Constituio e Legitimidade Social da Unio Europeia,Lisboa, Almedina,2005, pgina 32.

    31 Joaquim Jos Gomes Canotilho,Direito Constitucional e Teoria da Constituio,Coimbra, Almedina, 1998, pgina 61.32 Gomes Canotilho, ob. cit., pgina 69.

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    2 O problema da estrutura convencionalista foi que, por endosso dos poderesexecutivos, a Conveno se apropriou dum direito que h pelo menos uma dcadavinha a ser prometido aos cidados33. O modelo da Conveno (desde logo invo-cando subliminarmente o esprito de Filadla) foi ao arrepio da tendncia do neo--contratualismo e das aspiraes do povo europeu. A Conveno era, na verdade, umprolongamento de uma conferncia inter-governamental que se investiu a si prpria deassembleia constituinte (espcie de Assembleia Constituinte no eleita, escreve Tony Judt)34. Ora, nenhum dos membros da Conveno (nem mesmo os que representa-vam o Parlamento Europeu ou os Parlamentos Nacionais) estavam investidos com essemandato. Daqui resultou um vcio de forma a ausncia de legitimidade demo-crtica que inquinou o processo subsequente35. Nem se invoque uma legitimi-dade indirecta (via Conselho Europeu ou, posteriormente, via Conferncia Intergover-namental36) porque, como recorda Francisco Lucas Pires, a legitimidade algo que

    no emigra, no se empresta, to pouco se delega, talvez nem mesmo se compare. Eque hoje s pode ser comprada aos cidados37. Como diz Marta Rebelo, invocandoHabermas, o factor de legitimao das decises polticas no a sua concordncia comcertos requisitos e pressupostos substanciais mas antes o processo atravs do qual a de-ciso tomada38. Foi isso que os homens do espao pblico europeu no puderamaceitar. Aquele poder o de dispor sobre o futuro colectivo, o de esboar regras de vidaem comum, o de reectir sobre smbolos darespublica s logra atingir foros de legi-timidade se emanar do povo e for feito pelo povo sem possibilidade de alienao numa autntica assembleia construda especicamente como rgo constituinte paraesse efeito39. Do modo como estava a ser feito, era justamente o que Habermas tinha

    33 Ana Maria Guerra Martins identifica ainda um outro problema que se coloca a montante. Na leitura queesta Autora faz das concluses do Conselho Europeu de Laeken (15 de Dezembro de 2001) no resultaum mandato para elaborao dum Tratado Constitucional. A Conveno tinha por misso examinar asquestes essenciais que se colocavam ao desenvolvimento futuro da Unio e procurar diferentes respostaspossveis. InO projecto de Constituio Europeia contributo para o debate sobre o futuro da Unio,Lisboa, Almedina,2004, pgina 29.

    34 Tony Judt, ob. cit, pgina 818.35 Paulo Ferreira da Cunha fala em pecado original embora, mais frente, relativize o problema alertando para

    o risco de cairmos numa armadilha positivista incapaz de perceber que estamos perante uma dimensotrans-legal, e at em certa medida meta-democrtica. Paulo Ferreira da Cunha,Novo Direito ConstitucionalEuropeu, Lisboa, Almedina, 2005 (respectivamente pginas 27 e 160/ 161).

    36 Guilherme dOliveira Martins perfilha esta abordagem: O poder constituinte no seio da Unio derivado.Por isso, a Conveno e a CIG no tiveram nem poderiam ter competncias de natureza constituinte ao contrrio de outras convenes histricas representativas de realidades nacionais (GuilhermedOliveira Martins,Sobre o Tratado Constitucional Europeu,in Cidadania e Construo Europeia,coordenao de Viriatode Soromenho Marques, Lisboa, Ideias e Rumos, 2005, pgina 69.

    37 Francisco Lucas Pires,Introduo, ob. cit., pgina 61.38 Marta Rebelo, ob. cit., pgina 54.39 Recorda Paulo de Pitta e Cunha que a experincia dos Estados europeus ensina que as constituies nacionais

    so criadas, ou revistas, a partir de assembleias sadas de eleies por sufrgio universal e directo (in A Constituio Europeia um olhar crtico,2. edio, Lisboa, Almedina, 2004, pgina 22).

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    identicado como a refeudalizao do espao pblico e, por isso mesmo, uma inter-veno inadmissvel. Chamados s urnas em catarse referendria, os eleitores disseramno.

    Eivado destes vcios congnitos de forma, o Tratado dito constitucional esta-va ferido de morte. No estava em causa, em primeira linha, o seu contedo. Estavaem causa a sua designao (e o seu processo de formatao): foi sobretudo porcausa da palavra constitucional que ele no foi aceite, porque, querendo-se arro-gar de constitucional, perdeu a sua legitimidade. Aos convencionalistas faltava alegitimidade formal (quem os nomeou no foi o conjunto dos contratualistaseuropeus voz dessa vontade popular lenta, gradual, histrica40 pelo que nopoderiam ser essa assembleia constituinte) e a legitimidade social (as suas pro-postas estavam longe de corresponder aos anseios dos europeus, tanto mais quesugeriam a introduo de elementos proto-nacionais que tinham correspondncia

    duvidosa numdemoseuropeu). O Tratado Constitucional tentou apressar a histria,investindo-se a si prprio como indutor duma relao de pertena que, na verdade,no existia41. Ora, no esqueamos o ensinamento de Philippe Schmitter para quem atransformao da legitimao indirecta e funcional numa legitimao directa e demo-crtica42 exige meios e sedes de legitimao. Se os meios so a educao e a aprendi-zagem, as sedes so os corpos e estruturas intermdias cuja ausncia mina o projectoeuropeu43 e a sua falta que interrompe a estrada boicotando a ligao entre as duasmargens e maculando a cadeia ininterrupta da legitimao democrtica44. Separadospor sculos de distncia, o fenmeno proto-constituinte europeu parece identicar-secom o que Hannah Arendt detectou como um problema originrio da prpria polis: a

    nfase passou da aco para o discurso, e para odiscurso como meio de persuasono como

    40 Paulo Ferreira da Cunha, ob.cit., pgina 185.41 Outra questo porventura mais complexa mas que no o elemento central que nos interessa abordar aqui

    de saber se h um denominador comum aos constitucionalismos europeus, sejam eles de base saxnicaou continental e que se afigura essencial para moldar um constitucionalismo europeu. A busca de umdenominador comum entre as vrias culturas constitucionais europeias tem merecido alguma ateno doscultores do Direito Constitucional. Veja-se, por todos, Peter Hberle e, entre ns, Gomes Canotilho e LucasPires. O princpio da separao de poderes, a existncia de um acervo de direitos fundamentais, o respeitopelo princpio da legalidade e de mecanismos de controlo da constitucionalidade so, em suma, as linhasmestras que os Autores apontam como base dos constitucionalismos europeus contemporneos.

    42 Francisco Lucas Pires,Introduo, pgina 63.43 Philippe C. Schmitter,Portugal: do autoritarismo democracia,Lisboa, Instituto de Cincias Sociais da Universidade

    de Lisboa, 1999, pgina 315. Em rigor, deveramos talvez, em vez de falar de ausncia, falar de desfoca-gem ou incompleitude, porque evidente que existe o Conselho como autoridade decisora (ao lado doParlamento Europeu, consoante as matrias a tratar) mas este , em boa verdade, no mais do que umaemanao dos prprios Estados e dos seus prprios Executivos nacionais. Este ponto prende-se igualmentecom a questo da existncia de partidos polticos europeus que poderiam ter aqui um papel importante adesempenhar (importante mas no decisivo se pensarmos na crise dos partidos e na descrena crescentedos cidados com os instrumentos tradicionais de democracia representativa).

    44 Bokenfrde,apudFrancisco Lucas Pires,Introduo,ob. cit., pgina 70.

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    45 Hanna Arendt, ob. cit., pgina 41.46 Boaventura de Sousa Santos,Reinventar a Democracia,Lisboa, Edies Gradiva e Fundao Mrio Soares, 1998,

    pgina 47.47 O pargrafo operativo 22 do Relatrio do Parlamento Europeu sobre a convocao da Conferncia Inter-go-

    vernamental de 2007 diz: [O Parlamento Europeu] Insta a CIG e a Comisso a apresentarem propostasconcretas para implicar de novo os cidados europeus nacontinuao do processo constitucional (destacadonosso) Relatrio do Parlamento Europeu sobre a Convocao da Conferncia Intergovernamental (CIG): parecer do Parl

    Europeu (art. 48 TUE), Comisso dos Assuntos Constitucionais, Doc. FINAL A6-0279/2007.48 Jurgen Habermas escreveu sobre isto em mltiplas ocasies. Vide, por todos, a entrevista concedida ao blogeuropean referendum em europeanreferendum.blogspot.com/2007/04/jurgen-habermas-only-way--out-is-euro.html.

    49 Paulo de Pitta e Cunha, ob. cit., pgina 13. Vide tambm Ana Maria Guerra Martins, ob. cit., pgina 19.50 Paulo Ferreira da Cunha,Introduo Constitucional Constituio Europeia,in www.hottopos.com/videtur23/pfcunha.htm51 Da que Miguel Poiares Maduro fale em We, the Court, invocando o clebre prembulo da constituio ameri-

    cana e enfatizando o papel dos juzes como autores materiais da constituio europeia. Cfr. Miguel PoiaresMaduro,We, the Court European Court of Justice and European Economic Constitution,Oxford, Hart Publishing, 1998.

    forma especicamente humana de responder, replicar e enfrentar o que acontece ouo que feito (destacado nosso)45. por isso que se torna muito difcil legitimar este novo contrato social: falta-lhe a base que insua aceitao e que, fazendo o exerccio con-formador de reconstruir a normatividade, devolve aos contratualistas novos quadrosde referncia e, necessariamente, de segurana. Este novo contrato, como bem explicaBoaventura de Sousa Santos, no pode connar-se ao espao-tempo nacional estatal edeve incluir igualmente os espaos tempo local, regional e global46. Por isso, faz malo Parlamento Europeu em continuar a insistir no epteto constitucional quando omesmo foi rejeitado pelo povo e abandonado no processo preparatrio da confernciainter-governamental de 200747.

    Regressando ainda a Habermas, rera-se que este pensador alemo defendeu umaproposta que visava dar resposta a parte do problema (embora no a todo): para ele para quem os Estados-nao continuam a ser os mais importantes actores da cena in-

    ternacional qualquer tentativa de elaborar uma Constituio s pode passar pela reali-zao de um referendo escala europeia, realizado em simultneo em todos os EstadosMembros que, para ser aprovado, teria de passar o crivo da dupla maioria (de Estadose de cidados). Para o Autor, isso contribuiria para um sentimento constituinte esca-la continental e motivaria um debate mesma escala que ele reputa de essencial48.

    Acresce a tudo isto que uma constituio europeia j existe h muito tempo,reconduzindo-se aos Tratados institutivos49. No uma constituio assim assumida,declarada como tal, mas uma constituio entendida comocorpusde princpios bsi-cos que determinam as regras de funcionamento das entidades polticas e os direitosdos cidados face aos mesmos. Trata-se de uma constituio feita dearte e tempo50, para

    a qual concorrem o labor jurisprudencial do Tribunal de Justia e a doutrina.Foi sobretudo o Tribunal de Justia das Comunidades Europeias que solidicou aideia dos Tratados como um corpo constitucional51. O AcrdoLes Verts, de 23 de Abril

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    de 1986, , neste domnio, uma pea fundamental quando arma que a CEE uma co-munidade de direito, na medida em que nem os seus Estados membros nem as suas ins-tituies esto isentos de scalizao de conformidade dos seus actos com a carta constitu-cional de base que o Tratado (destacado nosso. Note-se que os juzes no falam de cons-tituio mas, subtilmente, refugiam-se no conceito de carta constitucional. A distinoconhecida entre os dois conceitos permite-nos concluir que j os membros do TJCE esta-vam conscientes do problema subjacente e, de certo modo, lanavam aqui um alerta).

    Nos anos 60, o ento Advogado Geral Walter Hallstein tinha considerado o Tratadode Roma como o embrio de uma constituio, baseando-se em dois elementos juris-prudenciais fundamentais: o Acrdo Costa/ ENEL (de 1964, que inaugurou o princ-pio do primado) e o Acrdo Van Gend en Loss (de 1963, sobre o efeito directo).

    Partir para a leitura dos sucessivos Tratados numa ptica constitucional, implicaexpurgarmos da anlise a rigidez dogmtica e conceptual de que muitos cultores do

    direito insistem em fazer uso. Mas se entendermos constituio no sentido de umcorpo descritivo (poltico e institucional) e de um corpo prescritivo (ou seja, numadimenso axiolgica de valores), ento no teremos diculdade em partilhar da tese deCarla Amado Gomes quando diz que dada a abrangncia do conceito de constituio,basta que haja uma comunidade de destinos partilhados por um determinado subs-trato populacional, um conjunto de caractersticas que permitam distinguir o ns dosoutros, para dele se poder fazer uso. Uma constituio deve ser sobretudo umbilhete deidentidadede uma comunidade susceptvel de corporizar um projecto social irrepetvel,nico, independentemente do facto de ser ou no reconhecida como detentora do po-der constituinte formal52.

    Ou seja, a constituio europeia (ou melhor: o constitucionalismo europeu) mui-to mais um constitucionalismo material do que um constitucionalismo formal. Da que aAutora fale em hetero-pr-constituio: hetero porque vem de fora, de entidades ex-ternas os Estados (como alis aconteceu com a Lei Constitucional austraca de 1955)e pr porque antecipa linhas mestras de comportamento poltico para-constitucional.

    evidente que houve sempre aqui um desequilbrio consubstanciado no facto des-ta constituio material nunca ter sido depois compensada por um endosso formal dumpoder constituinte devidamente mandatado para esse efeito. justamente por isso que de lamentar que, quando se decidiu politicamente pela elaborao de uma constituio,no se tenha aproveitado a oportunidade para colmatar esta lacuna e se tenha, ao invs,cavado ainda mais o fosso entre o edifcio jurdico e o seu alicerce legitimador.

    Mas a ideia de uma constituio europeia (repita-se: que no do constitucio-nalismo europeu) levanta ainda mais uma perplexidade: far sentido dotar uma en-

    52 Carla Amado Gomes, A natureza constitucional do Tratado da Unio Europeia,Lisboa, Lex, 1997, pgina 26.

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    6 tidade poltica que, como j vimos, eminentemente ps-moderna dum instrumentojurdico que eminentemente moderno? Ou seja: legtimo questionarmo-nos sobrea adequao da resposta ao problema que urge resolver. O fenmeno europeu desaaa nossa compreenso e as nossas grelhas de leitura, formatadas pelos padres da mo-dernidade e em que as referncias Estado e constituio assumem lugar central.O instrumento constitucional a constituio foi a resposta moderna tambmmoderna polity que foi o Estado-nao53. Naturalmente que, tal como o Estado teve osseus antecedentes (e j vimos brevemente aqui a polis grega e o imprio romano), aconstituio tambm teve os seus (a Magna Carta de 1215, por exemplo). Se os Estadosse superam e se reinventam se fazem o seuaggiornamento originando novos patamaresde poder, no ter de se exigir o mesmo s constituies enquanto quiserem ser seo quiserem enquadradoras desses novos fenmenos? Trata-se de uma interpelaoarriscada mas se admitirmos, como Habermas, que o constitucionalismo se cristalizou

    em torno do Estado54

    , ento foroso olharmos para o que alguma doutrina (sobre-tudo anglo-saxnica) chama de constitutional substitutes. Quais sejam exactamente e qualdeles d melhor resposta Europa , seguramente, tema para outro debate.

    Em busca de um Demos Perdido Saber se existe, ou no, um povo europeu assume, nestecontexto, uma importncia crucial porque, com um tratado constitucional ou sem ele(com este ou outro nome), s far sentido falar de poder constituinte se encontrarmoselementos bsicos que sustentem a existncia dumdemoseuropeu55. O clebre acrdodo Tribunal Constitucional alemo de 1992 (sobre o Tratado de Maastricht) respondea esta questo mas est eivado das inuncias que a histria dos movimentos naciona-

    listas alemes exerceu sobre o direito positivo germnico e as suas concepes de jussanguinispara atribuio de cidadania (a que no so alheios, por seu turno, os contri-butos de Hegel e Nietzche no que diz respeito noo de povo [Volk]). desse povo,unido por laos culturais profundos e por um sentido de identicao e compreensomtua, que nasce a nao e oVolkgeist. Para os jus-constitucionalistas alemes isso no transponvel nem aplicvel para a escala europeia e, com isso, ca posta em causa a

    53 A histria do constitucionalismo siamesa do moderno Estado-nao democrtico, escreve Francisco LucasPires,Introduo,ob. cit, pgina 7.

    54

    Jrgen Habermas,Sur lEurope,Paris, Bayard, 2006, pgina 37.55 Escreve Miguel Poiares Maduro: A constituio simultaneamente define e pressupea existncia de umacomunidade poltica cujos membros esto solidariamente vinculados pela constituio. desta comu-nidade poltica que o processo democrtico retira a sualegitimidadee a das suas decises maioritrias doprocesso representativo (destacado nosso). In A Crise existencial da constituio europeia,Working Paper 2/99da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, www.fd.unl.pt/Anexos/Downloads/183.pdf.Outros Autores falam, a este propsito, de dimenso subjectiva (Francis Snyder) ou legitimao social(Joseph Weiler). Esta uma questo prvia da maior importncia, uma espcie de fasquia a transpor aque nos parece inevitvel dar resposta.

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    possibilidade de existir uma constituio europeia ( certo que no foram to longemas era isso mesmo que estava implcito no seu acrdo).

    Francisco Lucas Pires reconhece a inexistncia dumethnosmas contrape com a exis-tncia de mecanismos suplentes de coeso social, patriotismo constitucionale identidade externa, que vistos de fora e, sobretudo, da desaadora perspectivada mundializao, podero anal fornecer carne ao esqueleto de um demos semethnos. Eis-nos perante um paradoxo antropolgico que condiciona todo o debateconstituinte europeu. Para este Professor, s uma Europa que se refunde e reinvente coma sociedade inglesa, a nao francesa e o Estado alem pode superar esta falta56.

    O americano Joseph Weiler no condiciona o processo de integrao europeia existncia de umdemoseuropeu: insistir no aparecimento de umdemoseuropeu pr--existente denido em termos orgnicos, nacionais e culturais, como uma condiopara a unicao constitucional ou, mais modestamente, para um redenir das frontei-

    ras polticas, garantir que isso nunca acontecer57

    . Ou seja: onde o constitucionalistaeuropeu v uma grave brecha da europeidade, o americano v uma simples caracte-rstica que em nada afecta a construo europeia.

    O que , anal, o povo em sentido constitucional? O que estedemospara efeitosde poder constituinte europeu?

    Como sustenta Gomes Canotilho, o povo em sentido constitucional uma gran-deza pluralstica (expresso que vai buscar a Peter Hberle), ou seja, uma pluralidadede foras culturais, sociais e polticas, tais como partidos polticos, grupos, igrejas,associaes, personalidades, decisivamente inuenciadoras da formao de opinies,vontades, correntes ou sensibilidades polticas nos momentos pr- constituintes ou

    nos procedimentos constituintes. O que o constitucionalista de Coimbra prope repensar a palavra povo em sentido constitucional de modo a libert-la do sentidojacobino (quem faz a revoluo), do sentido liberal (os proprietrios) e do sentidoproletrio (quem trabalha). Afasta-se, assim, um conceito naturalista, tnico ou rcicode povo caracterizado por origem, lngua e/ ou cultura comum. Ao invs, prope-sea adopo de um conceito em sentido poltico, ou seja, de grupos de pessoas queagem segundo ideias, interesses e representaes de natureza poltica. Este poderconstituinte, assim entendido, mata essa obsessiva procura do mito da subjectividadeoriginria (Fioravanti). S o povo real concebido como comunidade aberta desujeitos constituintes que entre si contratualizam, pactuam e consentem o modo de

    56 Francisco Lucas Pires,Introduo, pgina 63 e 68. Na mesma linha (concluindo pela no existncia deum povo europeu mas com um tom ligeiramente menos optimista), Paulo de Pitta e Cunha, ob. cit.,pgina 18.

    57 Joseph Weiler,Does Europe need a Constitution? Reflections on Demos, Telos and Ethnos in the German Maastricht Decision,in PeterGowan e Perry Anderson (org.),The Question of Europe,Londres, Verso, 1997, pgina 276 (traduo nossa).

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    8 governo da cidade , tem o poder de disposio e conformao da ordem poltico-so-cial58.

    Este o debate central que importa fazer: ele muito mais importante que osarranjos normativos da tratadstica, seja em sede de Conveno ou numa dinmicaintergovernamental. Como muito bem sintetiza Joseph Weiler, mais do que dumaconstituio europeia, a Europa precisa de um novo constitucionalismo59. O processocorreu mal porque se cometeu o erro crasso de inverter as etapas.

    Sinais de Hiper-Modernidade Quando ainda pensvamos como digerir o uxo ps-moderno,eis que surgem sinais de uma nova mudana: a partir dos anos 80, os pensadores fran-ceses comearam a falar de hiper-modernidade. Uns, que diramos os negativistas,vem-na como uma acelerao ou aprofundamento da ps-modernidade uma cadavez maior rebeldia contra o que subsiste de moderno, uma vitria denitiva do ma-

    terialismo e do cinismo60

    ; outros, mais optimistas, como uma ruptura face ao movi-mento precedente, identicando uma mudana de paradigmas, mudanas radicais queoriginam novos comportamentos sociolgicos marcados pelo hiperindividualismo61 epelo ressurgimento de um homem nmada que vive e trabalha em diferentes tribos(Maffesoli). O indivduo hiper-moderno move-se numa sociedade uida (lquida naexpresso de Zygmund Bauman), de extremos, de excessos, de exacerbamentos, ondetudo levado aos limites: o consumo, a concorrncia, o lucro, o prazer, a violncia, oterrorismo e a aco.

    No que aqui nos interessa o que possa ser uma eventual dimenso poltica dahiper-modernidade e a sua repercusso (ou no) na discusso dos modelos subja-

    centes construo europeia, valer a pena atentarmos no que diz Joo Barrento quan-do fala da disseminao do centro como uma consequncia da ps-modernidadee o consequente surgimento de uma srie de ncleos mltiplos e mutantes62. Essa

    58 Gomes Canotilho, ob. cit., pginas 69 e 70. O Estado deixou de ter o monoplio do Direito e essa umamudana que desestrutura os cnones clssicos. O processo no apenas fruto da construo europeia. Hautores que falam dum constitucionalismo global (Gomes Canotilho, ob. cit., pgina 1217). Num ploideolgico diferente mas sem o assumir abertamente, deixando, porm, antever que esse o corolriodo quanto escreve o Professor Adriano Moreira diz que se trata enfim, de assumir uma perplexidadeque nunca teve resposta satisfatria: aprender a viver juntos, numa Terra nica, conseguindo perceber

    com que finalidades e o que fazer. a esta participao activa nessa dinmica de incertezas que chamamoscidadania (Teoria das Relaes Internacionais,2. edio, Coimbra, Almedina, 1997, pginas 217.59 Joseph Weiler, ob. cit., pgina 220.60 Pierre-Henri Tavoillot, prefcio aLes Temps hypermodernes,de Gilles Lipovetsky e Sbastien Charles, Paris, Grasset

    et Frasquelle, 2006, pgina 8.61 Michel Marchesnay,Small Firms and Growth: a French Hyper-modern view,in www. kmu.unisg.ch/rencontres/

    RENC2004/topics/marchesnay_renc_04_topics_D.pdf.62 Joo Barrento,O Jardim Devastado e o Perfil da Esperana,in VVAA,O Estado do Mundo,Lisboa, Temas e Debates e

    Fundao Calouste Gulbenkian, 2006, pgina 78.

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    conquista da ps-modernidade o surgimento de escalas supra-estaduais enfor-madoras de uma cidadania global parece ser posta em causa pela crise da equaoCasa-Mundo63. Ou seja, a emergncia do paradigma hiper-moderno poder estar ater como consequncia uma descrena progressiva no arqutipo ps-moderno que foia supra-estadualidade. Se a ps-modernidade no desconstruiu o Estado (no sentidode Derrida) mas se fundou nele (e nele se alou), podemos bem vir a constatar quea hiper-modernidade provoca um efeito de eroso no modelo que a antecede (os taismodelos supra-estaduais entre os quais, naturalmente, a Unio Europeia) pois este, peladistncia e pela burocracia, mostrou-se incapaz de dar resposta ao sentido premente deurgncia, de instantaneidade e de imediatismo que irromperam como caractersticasdo homem hiper-moderno.

    Politicamente, a hiper-modernidade implica o m da rigidez institucional,alertando para que num mundo cada vez menos previsvel, o mais importante ser

    mvel, exvel, reactivo, ecaz, resiliente e inovador64

    . Neste regresso ao indivduo,parece que a esfera de aco que ganha destaque a local/ regional (os ncleosde que fala Barrento) e menos a global (ou, no nosso caso, europeia). O aumento dainsegurana, explica ainda Lipovetsky, provoca a agonia das vises triunfalistas dofuturo, desmisticando algumas crenas polticas que, inevitavelmente, provocam oenfranquecimento do poder regulador das instituies colectivas () aparecendo oindivduo cada vez mais liberto e mvel, udo e socialmente independente65. Istopoder ter como consequncia o aumento da importncia das escalas regional e local:Kemal Dervis sublinha este ponto quando refere que boa parte das diculdades que oprojecto europeu est a experimentar se deve ao facto que o papel da Unio est a ser

    crescentemente encurralado [squeezed, no original] entre o local e o global. Os cidadosquerem governar-se de uma forma mais directa, com a dimenso local os problemasda suas cidades e das suas regies a assumir o papel liderante66.

    Se a ps-modernidade era, por excelncia, o terreno da globalizao, das socie-dades hiper-modernas podemos vir a ouvir um clamor pela glocalizao, ponto deconvergncia entre uma perspectiva global (dos objectivos e do pensamento) e dumaperspectiva local (da aco)67. A glocalizao fruto da globalizao e no deve ser

    63 Joo Barrento, ob. cit., pgina 86. Acrescentaria que Barrento no se perfilha, ele prprio, nos movimentos

    hiper-modernos.64 Gilles Lipovetsky,Les Temps, ob. cit, pgina 55.65 Gilles Lipovetsky,Les Temps, ob. cit., pgina 81. Uso a palavra liberto como traduo de dcloisonn.66 Kemal Dervis, A European identity is no answer to the EUs ills,in Europes World,Outono 2007, n. 7, pginas 42 a 47

    (traduo nossa).67 O termo glocalizao tem sido usado por alguma doutrina nas ltimas duas dcadas na acepo que aqui

    referimos. Parece ter origem num vocbulo japons na rea da gesto empresarial, tendo sido depoisusado, na Europa, por Manfred Lange (na Alemanha), Roland Roberston (Reino Unido) e Keith Hampton(Canad). Nos EUA, e em publicao recente, veja-se, Thomas L. Friedman, ob. cit., pginas 420-426.

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