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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO OS PRESSUPOSTOS E FUNDAMENTOS DO POSITIVISMO JURÍDICO: ASPECTOS DESTACADOS ROBERTO WÖHLKE

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPSCURSO DE DIREITO

OS PRESSUPOSTOS E FUNDAMENTOS DO POSITIVISMO JURÍDICO: ASPECTOS DESTACADOS

ROBERTO WÖHLKE

Itajaí, SC, julho de 2006

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPSCURSO DE DIREITO

OS PRESSUPOSTOS E FUNDAMENTOS DO POSITIVISMO JURÍDICO: ASPECTOS DESTACADOS

ROBERTO WÖHLKE

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Msc. Clovis Demarchi

Itajaí [SC], julho de 2006

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AGRADECIMENTO

Ao professor Clóvis Demarchi que durante toda

esta trajetória incentivou e forneceu o completo

apoio para a produção do presente trabalho.

Aos professores do Curso de Ciência Política e

Ciências Sociais por sempre manterem aguçada

minha percepção crítica ao Direito.

Aos professores do NUPEX, pelo convívio quase

que diário nestes últimos cinco anos e por tudo

que apreendi enquanto acadêmico e pelas lições

que tirei para a vida.

Em especial,

A Fernanda de Salles Cavedon, pelo exemplo

de Professora e pesquisadora.

Ao Professor José Everton da Silva pela

amizade, companheirismo e determinação desde

seus primeiros anos nesta Universidade.

Ao Professor Josemar Sidnei Soares pelo

constante incentivo a prática reflexiva de nossas

atitudes.

Ao amigo Ricardo Miranda da Rosa pela

confiança, parceria e companheirismo nesta

intensa vida acadêmica.

E a todos meus amigos e colegas de que forma

direita ou indireta sempre se preocuparam e

incentivaram a produção deste trabalho.

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DEDICATÓRIA

Aos meus amados pais, Renato André Wöhlke e

Ivanir Schramm Wöhlke, por toda a dedicação

atribuída a minha formação, pela qual sou

eternamente grato e pelo incondicional apoio em

cada etapa desta intensa vida acadêmica.

Aos meus irmãos, Rodrigo, Marina e Cristina

pelo apoio e convívio estabelecido por todos estes

anos, da qual sou grato.

Ao Ledo e ao Rafael pela sincera amizade por

todos estes anos.

E em especial

A Gabriella, pelos momentos vivenciados juntos

na eterna construção do amor.

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“O direito não é uma pura teoria, mas uma força

viva. Todos os direitos da humanidade foram

conseguidos na luta. O direito é um trabalho

incessante, não somente dos poderes públicos,

mas da nação inteira”.

(A luta pelo Direito, Rudof Von Ihering)

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de Direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí [SC], julho de 2006

Roberto WöhlkeGraduando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Roberto Wöhlke, sob o título OS

PRESSUPOSTOS E FUNDAMENTOS DO POSITIVISMO JURÍDICO, foi

submetida em 21/06/06 à banca examinadora composta pelos seguintes

professores: Dr. Moacyr Motta da Silva; Msc. Natan Bem hur Braga e Msc. Clovis

Demarch e aprovada com a nota 9,8.

Itajaí [SC], julho de 2006

Professor Msc. Clóvis DemarchiOrientador e Presidente da Banca

Prof. MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o autor considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Ciência Jurídica

“Estudo sistemático de toda fenomenologia ligada às regras coativas da conduta.

Saber que tem por objetivos a descrição da norma jurídica que é e como é.”

(MELO, 2001, p. 21).

Direito Natural

A idéia de que acima das leis positivas existe um Direito que serve de modelo às

leis humanas, vem desde a Grécia. Atravessou a história humana e não vai

desaparecer nunca, porque se confunde com a própria noção de justiça. O

homem nunca se conformou em reconhecer que a lei tem um caráter puramente

estatal, independente de um conteúdo ético. O Direito Natural teve a sua

concepção apoiada sobre as mais diversas bases: originário de Deus (Direito

Natural teológico), de um contrato social em que os homens convencionaram

formar uma sociedade justa, nenhum dos contratantes, enunciando ao Direito de

resistência à injustiça (Direito Natural racional) e outras variantes. Opondo-se aos

que alegam o relativismo histórico da moral e das idéias, criou-se um "Direito

Natural de conteúdo variável" (SOIBELMAN, 1998).

Direito Positivo

“Por Direito Positivo entende-se, pois, o Direito que está mandando numa

sociedade. Positivo, aí, vem de positum, e designa o fato de que se trata de

Direito que foi imposto, ou posto, à obediência de todos os membros da

sociedade. Pode ter sido imposto pelo costume, pela lei e pela sentença judicial,

conjunta ou separadamente”. [Sentido lato] (GALVES, 1995, p. 214).

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Dogmática Jurídica

“Sistema que articula princípios, conceitos, normas e regras técnicas, construído

com apoio na Ciência do Direito e aplicado na esfera judicial, com vistas à

decidibilidade dos conflitos. Na mediação entre a instância normativa e a judicial,

esta práxis das tarefas dogmáticas, dentro da expectativa de que desejado pelo

legislador vai ganhar vida nas decisões daquele que julgará o caso concreto,

tendo-se em vista a preservação da segurança jurídica.” (MELO, 2000, p. 33).

Doutrina

“Conjunto de teorias que envolvem um julgamento de valor, tem como propósito

transformar uma realidade. Difere da teoria, porque esta se limita a uma

explicação causal, um juízo de existência”. (SOIBELMAN, 1998).

Experiência Jurídica

Processo mental que nos leva a perceber e identificar fenômenos exteriores

possibilitando escolhas. Nesta acepção, a experiência é importante domínio da

mente, exercendo influência na formação da Consciência. Quando esses

fenômenos (acontecimentos, fatos ou objetos de conhecimento) se passam na

esfera do Direito, ocorre o que chamamos Experiência Jurídica. (MELO, 2000,

p. 40).

Historicismo

Termo que aplica-se especialmente à doutrina que defende que o Direito, assim,

como as línguas e os costumes, é produto de uma criação coletiva, inconsciente e

involuntária, que termina no momento em que a reflexão a ela se aplica, e que,

por conseqüência não se pode modificar deliberadamente, nem compreendê-la e

interpretá-la de outra maneira se não pelo estudo da história. (LALANDE, 1996,

p. 472).

Interpretação

“Juntamente com a produção e a aplicação do Direito, a interpretação é um dos

elementos básicos da experiência jurídica. Consiste em procurar, com auxílio de

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técnicas apropriadas e a partir de conhecimentos interdisciplinares, o sentido e o

alcance das formulações jurídicas, com vistas a reta aplicação do Direito." (MELO,

2000, p. 51).

Ordem Social

“A ordem é uma realidade: não material, mas nem por isso é menos um dado

objetivo. A sociedade não é pois apenas uma soma de indivíduos, porque há

ligações espirituais entre eles que lhe são essenciais”. (ASCENSÃO, 1995,

p. 15).

Teoria

“Tese que afirma que as atribuições habituais de intenções, crenças e significados

à outras pessoas procedem através do uso tácito de uma teoria que nos permite

construir essas interpretações como explicações das suas ações. As teorias

podem ser concebidas de várias maneiras como: suscetíveis de formalização,

gerando previsões e explicações, resultando de um processo de teorização,

respondendo a dados empíricos, no qual a princípio podem ser descritos sem

elas, podendo ser ultrapassadas por novas e melhores teorias, etc.”

(BLACKBURN, 1997, p. 387).

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SUMÁRIO

RESUMO..............................................................................................................XII

INTRODUÇÃO........................................................................................................1

CAPÍTULO 1...........................................................................................................5

AS ORIGENS E OS PRESSUPOSTOS DO POSITIVISMO JURÍDICO.................51.1 DIALÉTICA ENTRE O DIREITO POSITIVO E O DIREITO NATURAL...............61.2 ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO SOCIAL........................................................101.3 FORMAÇÃO DO DIREITO COMUM EUROPEU...............................................141.4 MONOPOLIZAÇÃO DA PRODUÇÃO JURÍDICA.............................................191.5 PROCESSO DE CODIFICAÇÃO.......................................................................24

CAPÍTULO 2.........................................................................................................28

DAS CORRENTES DOUTRINÁRIAS DO POSITIVISMO JURÍDICO..................282.1 DOS PRECURSORES DO POSITIVISMO JURÍDICO......................................29

2.1.1 CONTRIBUIÇÃO ALEMÃ: A ESCOLA HISTÓRICA......................................................292.1.2 CONTRIBUIÇÃO FRANCESA: A ESCOLA DA EXEGESE..............................................312.1.3 CONTRIBUIÇÃO INGLESA: O UTILITARISMO E A ESCOLA ANALÍTICA........................34

2.2 DO DIREITO CIENTÍFICO..................................................................................362.2.1 POSITIVISMO FILOSÓFICO......................................................................................382.2.2 INFLUÊNCIAS DO POSITIVISMO FILOSÓFICO NO POSITIVISMO JURÍDICO...................42

2.3 FORMALISMO JURÍDICO.................................................................................44

CAPÍTULO 3.........................................................................................................50

CARACTERIZAÇÃO DO POSITIVISMO JURÍDICO............................................503.1 POSITIVISMO JURÍDICO ENQUANTO MÉTODO............................................533.2 POSITIVISMO JURÍDICO ENQUANTO TEORIA..............................................55

3.2.1 TEORIA DA COATIVIDADE DO DIREITO....................................................................563.2.2 TEORIA DAS FONTES DO DIREITO..........................................................................573.2.3 TEORIA DA NORMA JURÍDICA................................................................................573.2.4 TEORIA DO ORDENAMENTO JURÍDICO....................................................................583.2.5 TEORIA DA INTERPRETAÇÃO MECANICISTA............................................................59

3.3 POSITIVISMO JURÍDICO ENQUANTO IDEOLOGIA........................................603.4 PÓS-POSITIVISMO............................................................................................66

3.4.1 TEORIA CRÍTICA DO DIREITO................................................................................673.4.2 PLURALISMO JURÍDICO.........................................................................................68

CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................71

Referência das Fontes Citadas.............................................................................75

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RESUMO

O positivismo jurídico como aspecto destacado é

caracterizado, ao longo de sua história, por apresentar sua derivação da

expressão oriunda do direito positivo. Como é sabido, este se contrapõe ao

Direito Natural. Remete-se, com a doutrina, segundo a qual, não se admiti outro

direito, senão, o direito positivo (BOBBIO, 1995, p. 26). Pode-se afirmar, numa

tentativa de síntese, que aquele direito emana de um poder soberano do Estado,

mediante o reconhecimento exclusivo da lei. Esta idéia parte, principalmente, do

processo de monopolização da produção jurídica por parte do Estado, vindo este

a consolidar a codificação das leis. (BOBBIO, 1995, p. 119). A presente

Monografia tem por objetivo descrever quais as origens, os pressupostos e a

caracterização do positivismo jurídico. Para tanto o trabalho foi dividido em três

partes. A primeira, tem por objetivo demonstrar e contextualizar as origens e os

pressupostos do positivismo jurídico. Identificados em cinco fases distintas no

panorama da cultura jurídica ocidental. Do contexto de Grécia e Roma ao

processo revolucionário do final do século XVIII, consolidando o monopólio da

produção jurídica por parte do Estado. A segunda parte trabalhará com

positivismo jurídico, como ficou caracterizado pelas discussões e movimentos

realizados no século XIX através das três importantes escolas: Exegese na

França; Histórica na Alemanha e a Analítica na Inglaterra. Além de, demonstrar as

contribuições do positivismo filosófico ao positivismo jurídico que caracterizam-se

pela necessidade de uniformização e sistematização do conhecimento jurídico

(direito científico). Na terceira e última parte, trabalha-se com as características do

positivismo jurídico, demonstrando que esse movimento definiu uma forma de agir

a pensar distinta e que pode ser analisada a partir de três concepções:

Positivismo jurídico enquanto método, teoria e ideologia. Ao final do trabalho é

realizado um esboço de dois fortes movimentos opositores ao positivismo jurídico:

a Teoria Crítica do Direito e o Pluralismo Jurídico que se caracterizam por negar e

proporem uma nova forma de pensar a experiência jurídica.

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INTRODUÇÃO

A indagação inicial parte de um modo específico de pensar

dos operadores jurídicos. Este modo, traduz em certo sentido à prática e a própria

realidade jurídica. A “crise” evidência a manutenção de um sistema jurídico falho,

lento e burocrático. A concepção estatal legalista não corresponde mais aos

anseios sociais de uma efetiva proteção dos direito fundamentais. Percebe-se que

a eficácia da norma jurídica torna-se cada vez mais distante de cumprir seu

verdadeiro papel, isto é, produzir efeito desejado entre as partes. Verifica-se,

principalmente, que o “direito” como vem sendo aplicado, reproduz e matem o

“status quo” de uma sociedade ainda fortemente hierarquizada. Neste contexto,

existe uma lógica própria e que muitos operadores foram acostumados a pensar e

agir desta forma.

Perceber-se que esse direito se traduz no chamado

“Positivismo jurídico”, sistema que caracteriza uma forma de agir e pensar, pois

tal expressão não designa somente uma corrente teórica adotada, pressupõe a

adoção de um método específico de analisar a realidade jurídica, justificada por

um conjunto de teorias historicamente construídas e que condicionam a um

modelo específico da experiência jurídica.

Diante disto, a presente monografia tem por objetivo

descrever as origens, os pressupostos e a caracterização do positivismo jurídico

enquanto elemento ainda predominante na realidade social. Percebe-se que o

Positivismo jurídico chega ao seu ponto mais elevado no projeto positivista de

ciência de Hans Kelsen, quando consegue através de critérios lógicos formais

definir o sistema do direito. Mas tais concepções logo entram em choque com o

postulado da modernidade, no início do século XX. Diante disto, os fundamentos

da racionalidade empírica fazem com que este projeto positivista de ciência do

Direito não encontre mais sua base, entrando em crise e, com ele, o modelo do

sistema jurídico vigente.

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Cabe ressaltar que este modelo jurídico não é resultado

exclusivo dos trabalhos realizados por Kelsen. Este somente representa o

desfecho dessa construção.

O positivismo jurídico conforme observa Bobbio (1995), foi o

movimento que durante um século dominou a cultura jurídica e proporcionou o

surgimento de uma geração de pessoas que foram “educadas e habituadas a

considerá-lo como uma filosofia dos juristas”. O que a presente pesquisa pretende

analisar, não são as conseqüências e a crise desse modelo, mas tão somente,

descrever a sua origem e os fundamentos que o caracterizaram sua

predominância na base da cultura jurídica ocidental.

Com isso foram levantadas, no presente trabalho, algumas

hipóteses: a) O surgimento dos pólos sociais (cidades) é um elemento causador

do surgimento do positivismo jurídico; b) a falta de segurança e a necessidade de

organização do Estado contribuíram para o surgimento do Positivismo Jurídico; c)

o positivismo filosófico enquanto corrente do pensamento científico contribui para

a consolidação do positivismo jurídico; d) o positivismo jurídico constitui um

método de estudo do direito.

A metodologia adotada na presente monografia constitui-se

na pesquisa bibliográfica, destacando os principais autores utilizando técnicas do

referente, da categoria e do conceito operacional. No que se refere ao método

adotado destaca-se o indutivo, visto que, através do contexto histórico e das

formulações teóricas pretende-se identificar as fases que caracterizam o

fenômeno do “positivismo jurídico”.

Neste sentido, o primeiro capítulo irá caracterizar através de

um resgaste histórico as origens e os pressupostos do Positivismo jurídico.

Identificando-os em cinco fases distintas. A primeira no contexto histórico grego-

romano, pontuando a dialética existente entre o direito natural e o direito positivo.

A segunda fase identifica o direito como fator para o surgimento dos primeiros

agrupamentos sociais e a necessidade de caracterizar o direito como ordem

social. Na terceira fase, mostrar-se-á o surgimento do direito numa forte vertente

racionalista, caracterizando o final da Idade Média. Na quarta fase, destaca-se o

2

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processo de monopolização por parte dos Estados Modernos. E por último,

evidencia-se a lei como a única fonte do direito no processo de codificação.

No segundo capítulo, o positivismo jurídico ficará

caracterizado, principalmente, pelas discussões e movimentos realizados no

século XIX através das três importantes escolas: Exegese na França, Histórica na

Alemanha, e a Analítica na Inglaterra, que se caracterizam pelos estudos da

necessidade de uniformização e sistematização do conhecimento jurídico (direito

científico), além de se contraporem ao movimento da metafísica.

Por outro lá, neste mesmo período surge o chamado

“positivismo filosófico”, que se caracterizou por estabelecer um método de

investigação às ciências sociais e por validar o trabalho científico, como aquele

único possível de comprovação empírica. Eliminando, desse modo, qualquer tipo

de especulação abstrata ou metafísica.

Desta forma, será necessário avaliar e distinguir as

contribuições do positivismo filosófico ao positivismo jurídico para não serem

confundidas, nem uma sobrepor a outra. Identificar-se-á que em alguns aspectos

estes movimentos convergem, principalmente, no sentido de estabelecerem um

método de investigação e de negarem a metafísica. Com isso, verifica-se que o

positivismo filosófico caracterizou e constituiu as bases científicas do século XIX,

influenciando o positivismo jurídico no estabelecimento de um método próprio de

investigação à ciência jurídica, consolidando-se no processo de purificação do

direito no início do século XX. Hoje, um dos pilares do conhecimento jurídico.

Além disto, o positivismo filosófico influenciou, no final do século XIX e início do

século XX, a política no Brasil, tendo como principal adepto, boa parte dos

intelectuais brasileiros oriundos das faculdades de direito daquela época.

No terceiro capítulo desta monografia irá trabalhar-se com

os elementos que definem o positivismo jurídico. Inicialmente, resgatando nos

autores os elementos da autonomia do Direito e a concepção de sistema, para

então, trabalhar com a classificação proposta por Bobbio. O Positivismo Jurídico,

conforme o autor, poderá ser classificado de três formas distintas, mas que

historicamente apresentam uma ligação, sendo elas: o positivismo jurídico

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enquanto método; o positivismo jurídico enquanto teoria e o positivismo jurídico

enquanto ideologia. Pretende-se após esta abordagem apresentar de forma

breve, as correntes e movimentos que pretendem superar e contribuir para

construção de uma nova reflexão do “Direito” e da sua “Ciência”.

A relevância do trabalho está em descrever os fundamentos

do positivismo jurídico e perceber que sua origem esta ligada a própria concepção

de direito. Num outro sentido, a sua caracterização possibilitará ao pesquisador a

aquisição de conhecimento referente a temática para novos e futuros estudos,

numa perspectiva crítica sobre a produção e aplicação do direito em tempos

atuais.

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CAPÍTULO 1

DAS ORIGENS E OS PRESSUPOSTOS DO POSITIVISMO JURÍDICO

O positivismo jurídico como aspecto destacado é

caracterizado, ao longo de sua história, por apresentar sua derivação da

expressão oriunda do Direito Positivo. Como é sabido, este contrapõe-se ao

Direito Natural. Remete-se, com a doutrina, segundo a qual, não se admite outro

Direito senão o Direito Positivo (BOBBIO, 1995, p. 26). Pode-se afirmar, numa

tentativa de síntese, que aquele Direito emana de um poder soberano do Estado,

mediante o reconhecimento exclusivo da lei. Esta idéia parte, principalmente, do

processo de monopolização da produção jurídica por parte do Estado, vindo este

a consolidar a codificação das leis. (BOBBIO, 1995, p. 119).

O presente capítulo, tem por objetivo demonstrar e

contextualizar as origens e os pressupostos do Positivismo Jurídico. A princípio,

resgatar a origem do Direito Positivo é, ao mesmo tempo, resgatar a origem das

sociedades. Não se pretende aqui fazer um tratado pormenorizado de cada fase

do desenvolvimento histórico das concepções de Direito. Mas, numa perspectiva

histórico-social faz-se necessário referenciar as bases da cultura jurídica

ocidental. Entende-se por cultura, os processos de criação e produção de uma

determinada sociedade. Desse modo, “jurídica” é o adjetivo dado à criação e

produção do Direito de determinada sociedade. No caso aqui explicitado, a

“ocidental”.

Destacam-se cinco importantes aspectos da perspectiva

histórico-social do positivismo jurídico. No primeiro, trabalhar-se-á com as noções

de Direito, pontuando a dialética existente entre o Direito Positivo e o Direito

Natural. No segundo ponto, tratar-se-á do pressuposto da criação do Direito como

elemento primordial para a formação e a organização da vida em sociedade,

elucidando a necessidade do estabelecimento de uma ordem social. No terceiro

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ponto, mostrar-se-á que no final da Idade Média houve o surgimento de uma forte

corrente racional/humanista que irá estabelecer as bases para o Renascimento.

Já no quarto ponto, serão abordadas as conseqüências deste movimento,

proporcionado à monopolização da produção jurídica através da formação do

Estado. No último ponto, serão discutidas as referências que consolidaram e, de

fato, atribuíram ao Direito Positivo o sinônimo de Estado e Lei (Direito = Estado =

Lei), no processo de codificação.

Ainda cabe salientar, como critério metodológico, que o

resgate histórico não obedecerá propriamente a uma linha cronológica dos

acontecimentos, em virtude de dois aspectos: primeiro, a contextualização do

positivismo jurídico se estabelece através da história das idéias e não dos fatos e

acontecimentos; estes são apenas resultados daquelas. Segundo, o Direito não é

visto como uma sucessão de fatos lineares e cronologicamente sedimentados,

mas como uma sucessão de sistemas jurídicos anacrônicos, possuindo várias

rupturas, pois a história é formada por discursos, e estes discursos possuem

determinado sentido em determinada época. Por isso, uma história autônoma do

Direito é a própria releitura da história do Direito. (HESPANHA, 2005, p. 40-45).

1.1 DIALÉTICA ENTRE O DIREITO POSITIVO E O DIREITO NATURAL

As origens do Positivismo Jurídico, conforme salientado na

introdução do capítulo, partem da compreensão e do significado da expressão

“Direito Positivo”. A dialética existente entre as concepções de Direito Positivo e

Direito Natural, na verdade, encontra-se na distinção entre Direito e Moral, no

sentido de se atribuir, ou não, um significado axiológico ao Direito1. Como não é

objetivo desta pesquisa diferenciar o Direito da moral, iremos tão somente

contextualizar os períodos em que uma das concepções acima referidas se

sobressai à outra.

1

? Uma discussão pormenorizada a respeito de Direito e Moral pode ver visto em: REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20 ed. – São Paulo: Saraiva, 2002. Título XI.

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Embora a dialética existente entre as duas expressões

possa ser mais antiga que a civilização grego-romana, estabelece-se esta como

base. Sabe-se que no contexto clássico antigo, tanto os romanos quanto os

gregos tinham uma noção distintiva das expressões. Atribuindo ao Direito Natural

os aspectos relacionados às causas físico-naturais, enquanto que, o Direito

Positivo era visto como resultado das convenções e tratados estabelecidos pelos

homens. (BOBBIO, 1995, p. 16).

Aristóteles, numa passagem de “Ética a Nicômaco”,

evidencia bem esta distinção, atribuindo as categorias Justiça Legal (Direito

Positivo) e Justiça Natural (Direito Natural) como parte constituinte da Justiça

Política, sendo assim conceituada (ARISTÓTELES, 2002, p. 117):

A Justiça Política é em parte natural e em parte legal. A parte

natural é aquela que tem a mesma força em todos os lugares e

não existe por pensarem os homens deste ou daquele modo. A

Legal é o que de início pode ser determinada indiferentemente,

mas deixa de sê-lo depois que foi estabelecido.

Percebe-se em Aristóteles a nítida diferença entre os dois

termos. Segundo Moacyr Motta da Silva, tais concepções oferecem critérios

distintivos entre o Direito Natural e o Direito Positivo. O primeiro apresenta-se

como imutável, permanece o mesmo em todos os lugares, advém como fruto da

razão humana. O segundo oferece um grau de mutabilidade e varia em função do

governo, sendo estabelecido de forma convencional pelas pessoas. (SILVA, 2003,

p. 60).

Conforme Norberto Bobbio, esta distinção também é

encontrada nas primeiras codificações realizadas no Império Romano o Jus Civile

e o Jus gentium. Deste modo, Bobbio (1995, p. 18) destaca:

O Direito Natural é aquele que a natureza ensina a todos os

animais (...) O Direito Civil e o Direito das gentes devem ser

distinguidos: todos os povos que são regidos por leis e pelos

costumes têm um Direito que lhes é próprio em parte e em parte

comum a todos os homens. Com efeito, o Direito que cada povo

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estabelece para si mesmo é o Direito próprio da cidade: chama-se

Direito civil por que é o Direito especial da cidade. Mas o Direito

que a razão natural estabeleceu entre os homens, que é

igualmente observado entre todos os povos, chama-se Direito das

gentes, isto é, Direito de todas as nações.

Vale a observação de que o Jus gentium e o Jus civile

correspondem à nossa distinção entre Direito Natural e Direito Positivo, visto que,

também, apresentam critérios distintivos. Fica assim, o Direito Positivo limitado a

determinado povo, enquanto o Direito Natural não se limita a territorialidade nem

a determinado povo.

Outra contribuição do pensamento clássico para o debate,

está na chamada Filosofia Estóica. Segundo NADER (1999, p. 112) “O estoicismo

foi fundado por Zenão de Cítia (335-263 a.C.) (...) expandiu-se por toda a Grécia

indo projetar-se em Roma possuindo notáveis representantes: Cícero, Sêneca,

Marco Aurélio (...)” . Seus fundamentos estão consubstanciados na razão; eles

acreditavam que o “universo seria conduzido por um princípio geral, logos, a

razão, estando o mundo da matéria impregnado de racionalidade”. Contudo, o

homem passa também a ser sujeito desta racionalidade.

A contribuição do estoicismo está em afirmar a existência de

um Direito Natural superior ao Direito Positivo. É dentro desta concepção que

Galves (1995, p. 117) busca a síntese deste pensamento:

A razão humana, como se viu, é capaz de conhecer as leis do

logos que presidem a estrutura e a existência da natureza

humana. Ora, o Direito Natural é aquela parte das leis do logos

que comandam a conduta humana na sociedade. A regra

fundamental é viver de acordo com a natura; e como a natureza

humana é racional, viver bem é viver de acordo com a reta razão.

Da passagem das concepções de Direito da Grécia Antiga

para o Direito Romano, Marcus Tullius Cícero (106 – 43 a.C.) foi o responsável

pela fusão da tradição filosófica. Ainda muito ligado aos preceitos dos estóicos,

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Cícero utiliza novas fontes do Direito, através dos trabalhos realizados pelos

Jurisconsultores2.

O Direito na concepção Romana, advém das experiências

práticas exercidas pelos jurisconsultores. Esta nova função caracteriza uma das

primeiras formas de profissionalizar o Direito e faz com ele passe a ser

interpretado de duas formas: a primeira com base no desenvolvimento da

realidade, das experiências vívidas, e a segunda, apenas no desenvolvimento

teórico (REALE, 2002, p. 628).

Na obra de Marcus Tullius Cícero pode-se perceber a

transformação do conceito do Direito Natural (grego) para o conceito de Direito

Natural do qual os filósofos medievais irão se fundamentar. Veja-se (CÍCERO,

2001, p. 33):

A razão reta, conforme à natureza, (...) eterna, cuja voz ensina e

prescreve o bem, afasta do mal que proíbe e, ora com seus

mandatos, ora com suas proibições, jamais se dirige inutilmente

aos bons, nem fica impotente ante os maus. Essa lei não pode ser

contestada, nem derrogada em parte, nem anulada; não podemos

ser isentos de seu cumprimento pelo povo nem pelo senado; não

há que procurar para ela outro comentador nem intérprete; não é

uma lei em Roma e outra em Atenas, - uma antes e outra depois,

mas una, sempiterna e imutável, entre todos os povos e em todos

os tempos; uno será sempre o seu imperador e mestre, que é

Deus, seu inventor, sancionador e publicador, não podendo o

homem desconhecê-la sem renegar-se a si mesmo, (...).

2

? Cabe destacar que para os Jurisconsultores Romanos existem duas formas de classificar o Direito: A primeira divide o Direito em três grandes ramos (Jus naturalis; jus gentium; jus civile) e foi defendida por Ulpianus; a segunda forma divide o Direito em (Jus gentium e jus civile) e foi defendida por Gaius. Segundo BATALHA (1968, p. 513) “A divisão tricotômica, Direito natural é o que a natureza ensinou a todos os animais; Direito das gentes é o que a razão natural constituiu entre todos os homens e é observado igualmente por todos; Direito civil é o que um povo forma para si, isto é, o Direito da própria civitas. Segundo a divisão dicotômica, o Direito natural confunde-se com o das Gentes”. Através desta distinção percebe-se nitidamente o posicionamento de Norberto Bobbio.

9

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Nesta passagem percebem-se as características que

séculos à frente dominarão a filosofia cristã, diante do fato de atribuir ao Direito

Natural aspectos justos e por muitos transcendentais.

Bobbio (1999, p. 26) esclarece que estes preceitos do Direito

Natural serão supervalorizados na Idade Média por três motivos. Primeiro por

estarem implícitos na sua definição critérios de justiça; segundo por

estabelecerem os parâmetros da ordem do universal (cosmos); e terceiro por

justificar sua origem numa vontade divina. Deste modo, o Direito Positivo não

passa de um simples Direito comum feito pelos homens, mas muitas vezes

fundamentado na própria vontade de Deus.

A partir deste ponto, constata-se que o Direito, como ordem

universal e divina passa a ser visto como pressuposto para a organização das

sociedades. Como será reputado no próximo ponto.

1.2 ORGANIZAÇÃO E FORMAÇÃO SOCIAL

A origem social, como hoje se concebe, possui a mesma

formação que o Direito, uma constituição muito longínqua, sendo atribuída a

própria origem do ser humano. Como se pode perceber, Aristóteles atribuía ao ser

humano esta condição: por natureza o homem é um animal político (Zoon

Politikon), isto é, está na base da sua origem a necessidade de relacionar-se com

outros de sua mesma espécie (ARISTÓTELES, 1965, p. 14).

Neste sentido, parte-se da premissa de que o homem é um

ser eminentemente “social”. Possui elementos físicos constitutivos que

demonstram a necessidade de, para se desenvolver e reproduzir precise de outro

membro da mesma espécie. Com isso, da união entre o homem e a mulher

nascia a prole que “passa a servir como fator de organização e estabilidade do

núcleo social básico e fundamental ‘a família’” (CRISTOFARI, 1998, p. 42).

A formação social, tendo como elemento chave a família, já

encontra sua base na própria filosofia grega. Por muitas vezes exemplificadas na

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formação das gens, e conseqüentemente na construção da polis. O recorte aqui

encontrado é demonstrar o Direito como fator de organização e estabilidade

social.

O Direito, neste sentido, passa a ser visto como um

fenômeno humano e social. José de Oliveira Ascensão (1995, p. 22) conceitua

humano e social da seguinte forma:

Sendo um fenômeno humano, o Direito não é um fenômeno do

homem isolado, é um fenômeno social: há uma ligação necessária

e constante entre o Direito e sociedade. Por isso se diz ubi ius ibi

societas (onde há sociedade, há Direito)

O fator sociabilidade implícito na ordem social e

conseqüentemente no Direito, verifica-se nas mais diversas formas e estágios da

civilização. Isto porque o Direito como ordem social, pertence ao gênero - ordem

natural.

Estas características fundamentam por um logo período o

pensamento político medieval, que acreditava existir leis universais que

estabelecem e organizam toda a formação social, e por isso, são dotadas de

características imutáveis e transcendentais (HESPANHA, 2005).

Mas o Direito, além de ordem social, se estabelece como um

conjunto de regras socialmente aceitas de um determinado grupo. Estas regras

sociais são assim expostas por Paulo Dourado Gusmão (2001, p. 32):

A sociedade é redutível a um complexo de normas, podendo ser

por isso entendida como “ordem social” estabelecida por normas

sociais. Esse tipo de organização, específica à sociedade

humana, é necessário em virtude da liberdade que caracteriza o

homem, que pode levá-lo a inobservar os padrões de conduta

estabelecidos pelas normas.

Esta característica da liberdade do homem é o que lhe

diferencia da ordem natural, como salienta Ascensão (1995, p. 16):

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Page 24: monografia Roberto final_Direito rev pós_banca_v.Final

A ordem social, servindo-se ou tendo a sua base na ordem da

natureza, não é uma ordem da necessidade, mas uma ordem da

liberdade. A possibilidade fática de o homem se subtrair é da

própria essência: existe, mas pode ser afastada. Propõe-se à

vontade do homem, e pode justificar-se pela racionalidade. Mas

não se impõe cegamente. O homem mantém a liberdade de se

rebelar contra ela, podendo chegar a alterar os equilíbrios

existentes ou até a revolucionar a ordem social.

Percebe-se que o elemento Direito, visto como ordem,

estabelece uma série de relações que, com o passar do tempo, vão se tornando

complexas e numerosas, até a vinda dos sacerdotes, juízes e homens da lei que

passaram a aplicar o Direito a cada caso concreto. Com isso caracterizaram mais

um pressuposto da atividade racional do Direito. Pois, a utilização destas normas

fazia com que o Direito fosse regulamentado, isto é, torna-se um conhecimento,

um “saber” que era transmitido através da tradição. Esta sabedoria adquirida era

acumulada e passada de geração para geração, evidenciando um aspecto

cultural da racionalidade humana diferenciado, portanto, dos aspectos

relacionados à lei natural (ASCENSÃO, 1995).

É importante frisar que o pensamento jurídico da Idade

Média irá manter esta nítida distinção entre ordem natural e a ordem elaborada

através do uso racional do homem. Pode-se perceber que a partir desta noção, o

Direito Natural ganha força e adeptos, legitimando o discurso cristão, pensamento

teológico que dominou praticamente todo o período medieval.

Assim sendo, ocorre uma separação nas regras sociais. Por

um lado, existirá uma ordem divina, superior a todas as coisas, que conservará os

princípios jurídicos decorrentes das sociedades humanas e que servirá de base

para a legitimação do Direito vigente (HESPANHA, 2005, p. 106). E no outro lado

O Direito divino desempenhará uma função constitucional,

não podendo ser alterado. “Isto porque se funda nos princípios necessários de

toda a convivência humana (affectio societatis) (HESPANHA, 2005, p. 107).

Numa passagem da obra Livre-Arbítrio, Santo Agostinho

(1995, p. 41) assim define esta função:

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(...) àquela lei que é chamada a razão suprema de tudo, à qual é

preciso obedecer sempre e em virtude da qual os bons merecem

vida feliz (...) é ela o fundamento da retidão e das modificações

daquela outra lei que justamente denominamos temporal (...)

reconhecerás (...) que na lei temporal dos homens nada existe de

justo e legítimo que não tenha sido tirado da lei eterna.

No plano das relações entre os homens, é importante

caracterizar uma importante mudança na definição de ordem / vontade.

Salienta Hespanha (2005, p. 105) que “as ordens antes de

se tornarem Direito formal, eram consideradas como ordens espontâneas da

vida”, Isto é, também adquiriam características de ordem natural, ganhando

então, fundamentos divinos.

Deste modo, como as ordens tinham seu fundamento último

na existência de Deus, este fato fazia com que ações voltadas a obedecerem as

ordens pudessem ser consideradas como ordens justas.

O critério, nesta época, atribuído à categoria justiça, advinha

então das ordenações divinas. Com isso, atribuía-se como injustas as ordens que

não tinham seu fundamento na ordem divina.

O que definirá esta opção é o livre-arbítrio dos homens.

Bittar (2002, p. 187) assim define: “o livre-arbítrio é o que permite ao homem atuar

segundo sua vontade, que pode estar a favor ou contra a lei divina”. Em Santo

Agostinho (1995, p. 25) percebe-se esta autodeterminação dos homens: “as más

ações (...) não seriam punidas com justiça, se não tivessem sido praticadas”.

Neste sentido, cria-se um elemento distintivo entre as ações

corretas e as ações incorretas, cabendo, a estas últimas, a devida punição

quando cometidas, pois no pensamento medieval eram consideradas injustas,

provenientes da ordem dos homens (HESPANHA, 2005).

Nesta direção caminha um dos principais elementos

característicos do Direito: a “coerção”. O Direito enquanto pressuposto da ordem

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social, necessitará da coerção para estabelecer a segurança jurídica e a paz

social.

Entende-se que a partir do estabelecimento do livre-arbítrio,

o homem adquiriu a capacidade de discernimento para distinguir as ações justas,

das injustas. Este discernimento permitiu à Idade Média estabelecer o discurso

legitimador do Direito, posto que, perante o Direito, era possível punir os

culpados, pois não obedeciam as ordens de Deus.

Num trecho da Obra “Crepúsculo dos Ídolos” de Nietzsche

(2004, p. 49) encontra-se uma crítica a idéia do livre-arbítrio:

Toda a antiga psicologia da vontade, teve sua existência ao fato

de que seus inventores, os sacerdotes, chefes das comunidades

antigas, quiseram atribuir-se o Direito de infligir uma pena – ou

melhor, por que quiseram criar esse Direito para Deus (...)

O elemento coerção adere ao pensamento medieval e se

fixa na base de todo o Direito Canônico. Já no fim da alta Idade Média São Tomás

de Aquino ainda utiliza a coerção do Direito ao definir “débito como ordem de

exigir, ou necessidade de alguém em relação ao que está ordenado” isto é, posto

em ordem” (HESPANHA, 2005, p. 115).

Com isso, identificam-se três importantes elementos do

Direito, a saber: Direito como ordem social, Direito como elemento da paz social e

Direito enquanto conhecimento adquirido e racionalizado pelo homem. Tais

características justificam o fenômeno jurídico enquanto pressuposto da formação

social. Adiante pretende-se trabalhar com os aspectos relacionados a laicização

do Direito e à permanência desses seus elementos.

1.3 FORMAÇÃO DO DIREITO COMUM EUROPEU

Embora o Direito Canônico fosse o Direito difundido por toda

a Idade Média, nos contextos locais de cada reino ou principado existia um

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verdadeiro pluralismo jurídico, pois o Direito da Igreja era, na verdade, utilizado

somente quando houvesse alguns impasses referentes ao Direito local. Assim

existiam, conjuntamente, o Direito das corporações, o Direito dos reinados, o

Direito das cidades. Este universo de ordenações caracterizava o pleno

desenvolvimento do feudalismo. Deste pluralismo resultou a política jurídica

vigente adotada pelos povos, impondo “o princípio da personalidade das leis,

segundo o qual, a nacionalidade da pessoa determina o seu estatuto jurídico”.

(GUSMÃO, 2001, p. 300).

Segundo Martins (2001, p. 196):

A Europa Ocidental transforma-se numa multiplicidade de

pequenos senhorios economicamente auto-suficientes,

comandados por nobres bélicos que mantinham exércitos

próprios. O poder real, apesar de ocupar um lugar no topo da

hierarquia medieval, era incapaz de impor sua vontade aos

nobres, o que gerou o desaparecimento da atividade legislativa

imperial e principalmente o desmembramento do poder judicial

nas mãos dos senhores feudais. Desta forma, o Direito fica

adstrito às relações feudovassálicas, ou seja, as relações dos

senhores com os seus servos.

No entanto, a partir do século XII, o Direito Romano se

reacende com a descoberta, por juristas europeus, do Corpus Juris Civilis de

Justiniano, tornando o Direito Romano novamente como principal fonte de

estudos. (MARTINS, 2001).

Este fato propiciou o início de um intenso movimento na

redescoberta do mundo clássico, pois a Europa necessitava de algumas

mudanças devidas ao crescente desenvolvimento do comércio e das cidades,

além da necessidade de uma segurança jurídica nas relações comerciais que

começam a se estabelecer. Manuel Hespanha (2005) demonstra que no bojo

destas alterações nasce o que ele denomina de “Direito Comum”.

As características básicas do Direito Comum estão

fundamentadas na “unidade”, a partir das mudanças culturais, econômicas, e

políticas. O Direito europeu começa a ganhar corpo e homogeneíza a cultura

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jurídica para todos os povos do continente europeu, apresentando os seguintes

elementos: a) unidade e ordenação – unifica as várias fontes de Direito; b)

unidade do objeto da ciência jurídica – num modo racional de pensar o Direito; c)

unidade quanto aos métodos científicos empregados pelos juristas – discurso

comum; d) unidade enquanto ao ensino jurídico comum por toda Europa – criação

das universidades medievais; e) difusão de uma literatura especializada,

vulgarizada pela língua universal, o Latim. (HESPANHA, 2005, p. 121).

Como salienta Martins, (2001) tais características são

evidenciadas pelo acontecimento de três fases distintas:

A primeira, que corresponde aos séculos XII e XIII, é caracteriza

pela predominância, no âmbito doutrinal, do Direito romano sobre

os vários Direitos locais. A segunda, que compreende os séculos

XIV e XV, assinala o desenvolvimento dos Direitos locais como

fonte pari passu ao Direito Justiniano. E, por fim, a terceira que , a

partir do século XVI, afirma a supremacia dos preceitos legais

régios e citadinos sobre o Direito privado clássico.

Seguindo este entendimento, é importante destacar alguns

elementos essenciais destas três fases do redescobrimento do Direito Romano.

Tais elementos constituirão os fundamentos do positivismo jurídico, como serão

vistos no início do século XX. Destaca-se cada um deles em cada fase

apresentada acima.

Na primeira fase, o que ressalta é a redescoberta por parte

de um monge, chamado Irnerius, dos antigos textos romanos do Corpus Iures

Civiles, de Justiniano. Tal descoberta caracterizou o nascimento das primeiras

universidades medievais. O Monge de Bolonha, região da Itália, fundou a Escola

dos Glosadores. Umas das principais características da escola eram “a fidelidade

ao texto justianeu, sua interpretação analítica, não sistemática dos axiomas

jurídicos clássicos” (MARTINS, 2001, p. 208).

Já na segunda fase, devido ao surto urbanístico e mercantil

dos séculos XIII e XIV, houve, no plano jurídico, uma valorização dos tratados ou

estatutos jurídicos locais, no estabelecimento da segurança jurídica necessária

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para as relações de comércio agora existente. Neste sentido, o trabalho realizado

no âmbito das universidades com os textos antigos começam a ganhar

visibilidade, com isso, as pessoas letradas e que detinham o conhecimento

jurídico a respeito dos textos, trabalhavam como intermediários. A atividade do

jurista passa a ser valorizada, e a necessidade de sistematização dos vários

ordenamentos fica cada vez mais evidente. Diante disto, surge a Escola dos

Comentadores, como esclarece Martins (2001, p. 209):

A exegese erudita dos textos clássicos afastava os glosadores da

vida jurídica-legislativa de seu tempo; isso em uma época de

grande surto mercantil, como foram os séculos XII e XIV. Assim,

surgiu a necessidade de tornar o Direito romano clássico

aplicável, como forma de entregá-lo aos diversos Direitos locais,

em especial os estatutos das cidades Italianas, mais diretamente

vinculadas aos interesses da burguesia mercantil. Foi esta a tarefa

levada a termo pelos juristas chamados de conciliadores, práticos

ou comentadores.

Diferentemente dos glosadores, a Escola dos Comentadores

utilizava o método sistemático de interpretação dos textos jurídicos e aplicava a

realidade da época. Estes juristas debruçaram-se pela primeira vez sobre todo o

corpo do Direito (Direito romano, Direito canônico, Direito feudal, estatuto das

cidades) orientados com finalidade eminentemente prática. Irão procurar unificá-lo

e adaptá-lo às necessidades normativas dos fins da Idade Média. (HESPANHA,

2005, p. 211).

Além dos aspectos institucionais, com a consolidação do

ensino jurídico por toda Europa e a propagação das universidades e dos textos

jurídicos em Latim, existe ainda uma questão de ordem filosófica. Através dos

trabalhos desenvolvidos pelos juristas da época, do uso constante da razão e da

atitude dos Comentadores para com o Direito vivido, fonte da tradição e

pressuposta realidade, os argumentos teológicos do Direito divino não

conseguiram mais se sustentar.

Diante desta realidade, a legitimidade da razão, enquanto

pensamento vigente, ganha força com filosofia tomista que concilia o discurso

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racional com os limites da fé. Num trecho de sua obra, Santo Tomás de Aquino

(1979, p. 66), distingue a fé da razão e as compatibiliza para a busca da verdade:

É um fato que esses princípios naturalmente inatos à razão

humana são absolutamente verdadeiros; são tão verdadeiros, que

chega a ser impossível que possam ser falsos. Tampouco é

permitido considerar falso aquilo que cremos pela fé, e que Deus

confirmou de maneira tão evidente. Já que só o falso constitui o

contrário do verdadeiro, como se conclui claramente da definição

dos dois conceitos é impossível que a verdade da fé seja contrária

aos princípios que a razão humana conhece em virtude das suas

forças naturais.

A filosofia de Santo Tomás de Aquino liberta a razão dos

mistérios da fé, ou, pelo menos, não permite que se contradizem. A partir deste

fato a “razão secular passa a coexistir com a razão clerical, com a única condição

de se manter dentro de sua competência específica, ou seja, o mundo temporal,

onde a razão emerge como critério supremo”. Com esta liberdade a razão laica

atinge a esfera do Direito e se identifica com todo o sistema legal romano

(MARTINS, 2001, p. 208).

Ferraz Junior (1980, p. 21) salienta o trabalho realizado

pelos juristas medievais (glosadores e posteriormente os comentadores) no

desenvolvimento de uma técnica especial de abordagem de textos pré-fabricados

e aceitos por sua autoridade, caracterizando o primeiro passo em direção à

Ciência do Direito.

Neste confronto do texto estabelecido e do seu tratamento

explicativo é que nasce a Ciência do Direito com seu caráter

eminentemente dogmático, portanto de Dogmática Jurídica

enquanto processo de conhecimento, cujas condicionantes e

proposições fundamentais eram dadas e predeterminadas por

autoridades

O estabelecimento da Dogmática para os estudos jurídicos

irão proporcionar a completa secularização do Direito, isto é, o Direito passa a ser

visto como fonte do trabalho racional realizado pelos juristas, tendo como

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pressuposto a obediência à autoridade e à lei. A partir deste ponto inicia-se a

terceira fase do “Direito Comum”, consolidando sua base no processo de

unificação e sistemática interpretação dos textos legais. Assim, o próximo passo

da ciência jurídica para alcançar sua completa laicização dos preceitos

jusnaturalistas, será o de monopolizar a produção jurídica. Dará fim à Idade

Média, e consolidará o poder e a autoridade ao Estado-Nação, dando início à

Idade moderna. É o que se verá no próximo item.

1.4 MONOPOLIZAÇÃO DA PRODUÇÃO JURÍDICA

Sabe-se que, com o fim da Idade Média e o início da Idade

Moderna uma grande corrente do pensamento jurídico entra em cena: o

jusnaturalismo moderno.

O Jusnaturalismo Moderno é a corrente filosófica vigente do

início do século XVI ao final do século XVIII, e representou uma nova etapa no

pensamento do Direito Natural. Embora a primeira etapa caracterize a concepção

de Direito Natural no período clássico/medieval sob a ótica divina, transcendente,

a segunda caracteriza o Direito Natural a partir da “concepção ideológica de

Estado, fundado este na razão humana” (NADER, 1999, p. 129).

Segundo Franz Wieacker (1967, p. 279), pode-se também

definir este período do pensamento jurídico-filosófico como pertencente ao

“Jusracionalismo”, pois consolida o estudo do Direito enquanto Ciência Jurídica.

Pode designar-se por época do jusnaturalismo os dois séculos

(1600-1800) nos quais a antiga filosofia jurídica e social do

ocidente (jusnaturalismo), na forma que lhe foi dada pelo primeiro

iluminismo, adquiriu uma influência direta sobre a ciência jurídica,

a legislação e a jurisprudência da maior parte dos povos

europeus. (...) o “jusracionalismo” não constitui senão um curto

capítulo histórico das mais vastas manifestações do

“jusnaturalismo.

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Neste sentido, os principais fundadores desta corrente são

Hugo Grócio; Tomas Hobbes; John Locke; Pofendorf e Rousseau. Embora possa

haver uma diversidade de idéias entres os pensadores e muitas vezes até

antagônicas entre si, o que cria a unidade entre eles e os aproxima enquanto

estudo do Direito é o método tido como “racional”.

A melhor prova disso, de resto, é o fato de ter prevalecido o uso

de chamar o Direito Natural moderno de “Direito racional”: temos

aqui um indicador do fato de que aquilo que caracteriza o

movimento em seu conjunto não é tanto o objeto (a natureza),

mas o modo de abordá-lo (a razão), não um princípio ontológico

(que pressuporia uma metafísica, comum que, de fato, jamais

existiu), mas um princípio metodológico. (BOBBIO, 1987, p. 16).

Desta forma, o que está implícito nesta corrente do

pensamento é a sua técnica, pois é através da forma (uso da razão) que o

homem se liberta das concepções anteriores do Direito Natural (divino) e “a

pretensão moderna de conhecimento das leis naturais é agora estendida a

natureza da sociedade, ou seja, ao Direito e ao Estado” (WIEACHKER, 1967,

p. 288).

Destaca-se aqui o trabalho realizado por Hobbes, Locke e

Rousseau, pois além de filósofos em matéria de Direito Natural, foram

importantes na diferenciação entre Direito privado e público, dedicando suas

obras e este último, pois estabeleceram o “problema do fundamento e da

natureza do Estado” (BOBBIO, 1987, p. 14).

No que se refere especificamente às idéias desenvolvidas

por estes três principais filósofos, destaca-se a “Teoria do Contrato Social” que

estabelece uma visão através de um pacto (contrato) feito entre o Estado e os

homens. Através dos seus escritos, os homens eram guiados por paixões e

necessidades que regiam suas condições primitivas chamadas de “estado de

natureza”. O “estado civil” representa uma ruptura com o “estado natural”,

instituindo um corpo político onde a razão prepondera sobre o instinto. Nesta

tradição jusnaturalista “estado civil” tinha a idéia de Estado onde, através daquele

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pacto o homem abdicaria de parte de sua liberdade para as instituições (o

Estado), que deveriam garantir segurança e convívio social (GUSMÃO, 2001,

p. 379).

Neste ponto da monografia, é necessário fazer algumas

considerações de ordem metodológica para não se perder de vista o objetivo do

trabalho. O processo de monopolização da produção jurídica está implicitamente

ligado ao nascimento da concepção de Estado3, enquanto instituição

juridicamente dotada de poder coercitivo sobre seus cidadãos. Justifica-se assim,

mais um dos pressupostos do positivismo jurídico, visto ser o Estado a única

instituição legitimamente constituída para a produção do Direito. Com isso,

precisa-se fazer um corte na filosofia do jusracionalismo, no sentido de somente

trabalhar as questões relativas às concepções de Estado dessa época. Destaca-

se o pensamento de Hobbes.

Tomas Hobbes, em sua Obra “O Leviatã”, assim define o

Estado (1997, p. 144):

Uma pessoa de cujos atos uma grande multidão, mediante pactos

recíprocos uns com os outros, foi instituída por cada um como

autora, de modo a ela poder usar a força e os recursos de todos,

da maneira que considerar conveniente, para assegurar a paz e a

defesa comum. Rever 1ª linha

Percebe-se, a princípio, que Hobbes, na própria definição de

Estado, estabelece as bases do Absolutismo Monárquico de sua época e

centraliza na figura do Estado a coerção, ou o exercício legítimo da força. Numa

outra passagem compreende-se claramente o monopólio da produção jurídica por

parte do soberano, e com isso, o critério de validade do Direito posto (HOBBES,

1997, p. 208):

Em todos os Estados o legislador é unicamente o soberano, seja

este um homem, como numa monarquia, ou numa assembléia,

3 Conforme as palavras de MELO (2001, p. 38) “ instituição que detém o poder de coerção incidente sobre a conduta dos cidadãos, determinando-lhes, através de um sistema normativo respaldado na força”

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como numa democracia ou numa aristocracia. Porque o legislador

é aquele que faz a lei. E só o Estado prescreve e ordena a

observância daquelas regras que chamamos leis, portanto o

Estado é o único legislador. Mas o Estado só é uma pessoa com

capacidade para fazer seja o que for, através do representante

(isto é, o soberano), portanto o soberano é o único legislador.

Norberto Bobbio em sua obra “Tomas Hobbes”, faz uma

importante observação do pensamento deste, que vem de encontro com os

objetivos do presente trabalho.

Tomas Hobbes pertence, “de fato”, à história do Direito Natural:

não existe nenhum tratamento da história do pensamento jurídico

e político que não mencione e examine sua filosofia como uma

das expressões mais típicas da corrente jusnaturalista. Por outro

lado, Hobbes pertence, “de Direito”, à história do positivismo

jurídico: sua concepção de lei e do Estado é uma antecipação,

verdadeiramente surpreendente, das teorias positivistas do século

passado. (BOBBIO, 1991, p. 101).

Deste modo, para explicar esta questão que a princípio é um

tanto quanto paradoxal, visto que as expressões jusnaturalismo - juspositivismo

são historicamente antagônicas. Norberto Bobbio parte da concepção dos três

diferentes sistemas jusnaturalistas, destacando o último como pertencente ao

modelo proposto por Hobbes. Assim,

1) Direito Natural e Direito

Positivo estão entre si numa relação de princípio a conclusão

(ou de máximas gerais às aplicações concretas);

2) o Direito Natural determina

o conteúdo das normas jurídicas, enquanto o Direito Positivo,

tornando-as obrigatórias, garante-lhes a eficácia;

3) o Direito Natural constitui o

fundamento de validade do ordenamento jurídico positivo,

considerado em seu conjunto. (BOBBIO, 1991, p. 139).

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Embora a formação destes três sistemas possa auxiliar a

distinguir as contribuições do jusnaturalismo ao positivismo jurídico, Hobbes

atribui como pressuposto de validade das leis civis o Direito Natural. Isto

pressupõe um modelo rigoroso de justiça formal, implícito na sua obra. Numa

outra passagem do Leviatã (1997, p. 207), percebe-se o modelo Legalista de

justiça:

Entendo por leis civis aquelas leis que os homens são obrigados a

respeitar, não por serem membros deste ou daquele Estado em

particular, mas por serem membros de um Estado (...) o

conhecimento da lei civil é de caráter geral e compete a todos os

homens, (...) é evidente que a lei , não é um conselho, mas uma

ordem, (...) para usar como critério de distinção entre o bem e o

mal; isto é, do que é contrário ou não é contrário à regra.

Assim sendo, a concepção legalista de justiça irá considerar

a lei como comando de quem detêm o poder, e a partir deste critério (autoridade)

se estabelece o que é justo ou injusto. As leis impostas pelo soberano passaram

a ser condicionadamente obedecidas. A partir desse entendimento Norberto

Bobbio (1991, p. 103) conclui:

Pode-se ver que a concepção legalista da justiça é a ideologia do

positivismo jurídico, isto é, daquela concepção jurídica que –

considerando o Direito Positivo como critério auto-suficiente do

justo e do injusto – elimina totalmente qualquer referência ao

Direito Natural, entendido esse como o conjunto de princípios ou

de normas de conduta que deveriam nos permitir tomar posição

diante do Direito Positivo a fim de aprová-lo ou desaprová-lo.

Como forma de síntese do pensamento jusnaturalista

moderno destacam-se aqui duas importantes contribuições para o Direito Positivo.

A primeira refere-se ao formalismo – “na definição não faz referência nem ao

conteúdo, nem ao fim do Direito (...) a definição do Direito é dada apenas como

base da autoridade que põe as normas”, possuindo como pressuposto o aspecto

formal. A segunda refere-se ao aspecto do imperativismo – “o Direito é definido

como o conjunto de normas com o qual o soberano ordena ou proíbe dados

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comportamentos aos seus súditos”. O Direito é visto como comando. (BOBBIO,

1995, p. 37).

Além dessa forte influência das concepções de Direito e

Estado, os contratualistas, bem como os jurisnaturalistas, contribuíram para uma

mudança política e cultural. Foram utilizados como fonte de inspiração para as

Revoluções Americana e Francesa, para a auto-limitação das instituições políticas

e para a teoria do Estado de Direito, isto é, subordinado à lei. O jusnaturalismo

moderno se consolidou quando serviu de fundamentação para a promulgação da

Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão. (GUSMÃO, 2001,

p. 378).

Nesta perspectiva, o Estado Moderno ganha força e se

legitima enquanto autoridade, chegando ao modelo hegemônico como atualmente

é conhecido – Estado Liberal (capitalista, constitucional e representativa).

Demonstrando a ascensão do sistema capitalista mercantil, através do

fortalecimento da burguesia e da forte expansão marítima com o descobrimento

do “novo mundo”. Com isso, intensificam-se as relações comerciais e a

racionalidade burguesa desenvolve a economia e a secularização do Direito,

promovendo a doutrina dos Direitos e garantias dos indivíduos (WOLKMER,

1990, p. 25).

É no bojo desse contexto sócio-político que o processo de

codificação do Direito mais uma vez é retomado. Tem que garantir o mínimo de

segurança jurídica nas relações comerciais, fortemente desenvolvidas. Como a

seguir pode-se verificar.

1.5 PROCESSO DE CODIFICAÇÃO

Não perdendo de vista os ideais jusracionalistas, no século

XVIII têm início os projetos de codificação dos ordenamentos jurídicos europeus.

É importante destacar que na concepção racional de Estado Moderno os códigos

representavam uma reforma necessária a ser realizada. É que estavam

24

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direcionados a “uma planificação global da sociedade através de uma

reordenação sistemática e inovadora da matéria jurídica”, atendendo a

necessidade de unidade do estudo do Direito por parte dos governantes

(WIEACKER, 1993, p. 378).

Neste sentido os códigos deveriam obedecer

necessariamente a três critérios: 1) serem sintéticos, isto é, deveriam conter uma

síntese clara e objetivada de seus preceitos; 2) representarem uma atividade

científica na sua constituição e 3) serem sistemáticos, demonstrando possuir uma

ordem lógica no conjunto dos textos legais. Isso porque eles vão

substantivamente se diferenciando das antigas compilações, pois já obedecem a

critérios empíricos, frutos de uma nova ciência jurídico-racional (ASCENSÃO,

1995, p. 352).

As questões relativas aos aspectos da ciência jurídica serão

abordadas no próximo capítulo, visto que, a partir do jusracionalismo, o estudo da

ciência jurídica ganhará novos adeptos e algumas diferenciações relativas aos

métodos adotados por diferentes correntes do positivismo jurídico.

Ainda no que diz respeito ao processo de codificação,

evidencia-se, segundo entendimento de José de Oliveira Ascensão (1995, p.

353), quatro causas que justificam aquele movimento. A primeira relaciona as

causas ideológicas, visto ser o racionalismo o responsável pela mudança nos

padrões da ciência. Naquela época “a razão humana podia descobrir a

generalidade dos princípios que deveriam regular a vida social” e neste sentido a

codificação representaria o modo mais fiel de reproduzir aqueles princípios.

A segunda causa reflete as questões políticas.

Primeiramente a necessidade de impor uma legislação geral que favorecesse a

unificação política dos Estados Modernos; depois, um código para o qual todos os

cidadãos tivessem acesso. Homogeneizaria, com isso, o conhecimento da lei e

garantiria o poder político dos governantes, tanto nos aspectos internos quanto

externos. Os códigos representavam o conjunto de princípios e leis que serviam

como elemento legitimador do Estado. (ASCENSÃO, 1995, p. 355).

25

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Em terceiro lugar estão as causas técnico-jurídicas. Como o

código era considerado um instrumento científico e sistemático, tinha na sua base

um plano para ordenar tecnicamente os ramos do Direito. Traçava a estrutura e a

construção dos princípios aplicados em cada área do Direito, e tornava o

conhecimento jurídico de fácil acesso. (ASCENSÂO, 1995, p. 356).

Em quarto lugar estão as causas práticas. O processo de

codificação era necessário, pois atendia aos aspectos práticos da época. O

desenvolvimento econômico e a situação político-social da Europa renascentista

proporcionaram uma profunda revolução cultural. Havia uma diversidade de

códigos e normas do Direito que proporcionavam, na prática, uma situação

caótica, pois entendimentos e interpretações de várias fontes do Direito não

atendiam à evolução da sociedade burguesa e capitalista do início do século XIX

(ASCENSÃO, 1995, p. 357).

Elucidadas as causas que justificam o processo de

codificação, cabe agora demonstrar sua forte ligação às concepções do

positivismo jurídico. Os códigos tornaram-se a própria materialização do Direito

Positivo, pois somente eram prescritos sob a tutela jurídica dos Estados. No plano

das relações sociais, os códigos apresentavam-se como “rígidos”, pois advinham

de um grande esforço de quem os elaborava, e impunham-se como uma obra

completa e de absoluta reflexão racional. Por isso o Filósofo e Jurista Italiano

Francesco Carnelutti (1960, p. 274) concluiu:

A formação dos códigos na Europa e, antes de mais, na França,

teve lugar no período em que começa a delinear-se aquela

corrente de pensamento que se chama positivismo em geral. Os

homens começaram, então, a não acreditar senão naquilo que

podiam ver. Isso aconteceu, não porque tenham renunciado a

raciocinar, mas porque não faziam senão raciocinar. Positivismo e

racionalismo são duas formae mentis ìntimamente ligadas entre si.

Assim as várias concepções do jusracionalismo criam

diferentes critérios e métodos para o estudo do Direito. Parte-se do pressuposto

que essas posições, ou melhor, interpretações, de uma forma ou de outra,

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caracterizaram o positivismo jurídico como a doutrina do Direito Positivo. Assim,

serão vistas no próximo capítulo.

27

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CAPÍTULO 2

DAS CORRENTES DOUTRINÁRIAS DO POSITIVISMO JURÍDICO

O presente capítulo tem como objetivo apresentar as

principais correntes doutrinários do positivismo jurídico. Essas correntes tendem a

caracterizar o positivismo enquanto doutrina do Direito Positivo. Percebe-se que

tal característica ganha corpo no pensamento jusracionalista que, por sua vez,

começa a se separar do pensamento jusnaturalista iluminista. Salienta-se que o

corte metodológico encontrado visa tão somente demonstrar as principais

contribuições das correntes do pensamento jurídico que, a partir dos séculos XVII

ao XX definem os elementos do positivismo jurídico.

Desse modo o capítulo apresenta-se dividido em três partes.

A primeira trabalha com as correntes do positivismo jurídico apresentadas na obra

de Norberto Bobbio, intitulada “O Positivismo Jurídico”. Nela, o autor realiza um

corte geográfico na cultura jurídica Européia do século XVII ao XIX, e apresenta

as contribuições dos precursores do positivismo jurídico dos três grandes centros

de referências do pensamento jurídico: a Alemanha, a França e a Inglaterra. Traz

os principais representantes e suas respectivas contribuições ao tópico proposto.

Diga-se que, além das contribuições dadas à doutrina do

positivismo jurídico, existia no cerne do pensamento jurídico europeu pós-

codificação, a necessidade de desenvolver métodos adequados ao estudo do

Direito. Entende-se então, que a revolução científica provocada por Augusto

Comte no positivismo filosófico, aprimorou o positivismo jurídico enquanto ciência

do Direito Positivo.

Por isso, nesta segunda parte trabalha-se com o positivismo

filosófico e sua contribuição para o positivismo jurídico. Sabe-se, pois, a princípio,

que o método aplicado ao Estudo do Direito, isto é, a ciência do Direito, é anterior

ao positivismo filosófico de Augusto Comte. Sua contribuição, porém está na

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delimitação dada ao estudo do Direito, principalmente, pelo método adotado e

pela eliminação da análise metafísica aplicada ao direito.

Na última parte, trataremos do Formalismo Jurídico como

uma corrente do pensamento jurídico que mais intensificou os trabalhos de

cientificação do Direito. Ele também sedimentou as características do Positivismo

jurídico corrente representada principalmente pelo austríaco Hans Kelsen.

2.1 DOS PRECURSORES DO POSITIVISMO JURÍDICO

2.1.1 Contribuição alemã: a Escola Histórica

Embora a Europa estivesse no auge do pensamento

jusracionalista, nasce na Alemanha uma corrente de pensamento jurídico que fez

resistência ao Direito Natural no seu aspecto racional, e contribuiu criticamente ao

processo de codificação na Europa. Nas palavras de Norberto Bobbio, pode-se

assim sintetizar a contribuição da Escola para o positivismo Jurídico: “a escola

histórica e o positivismo jurídico não são a mesma coisa, contudo, a primeira

preparou o segundo através das críticas radicais do Direito Natural” (BOBBIO,

1995, p. 54).

Dentre os filósofos alemães da Escola História, a principal

referência é Friedrich Karl von Savigny (1779-1861). Os adeptos desta escola

compreendem o Direito como resultante do processo histórico, de uma realidade

socialmente “dada” ou “posta”. Como afirma Gusmão (2001, p. 384):

Para os que formaram a Escola histórica do Direito, o Direito é um

fenômeno espontâneo da sociedade, manifestado primeiro como

costume, que para os seus corifeus, é a sua fonte por excelência,

por corresponder mais fielmente aos ideais e necessidades da

sociedade em dado momento historio e por acompanhar de perto

as transformações dos demais fatos históricos.

Para a escola Histórica, o sentido da tradição é expresso

nos costumes e o Direito é visto como normas consuetudinárias que se formam e

29

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se desenvolvem através de uma lenta evolução da sociedade. (BOBBIO, 1995,

p. 52).

O próprio percurso da Escola, assim definia o Direito

(SAVIGNY, ANO apud NADER, 1999, p. 151):

O Direito é um produto de formas interiores, que operam em

silêncio e está profundamente enraizado no passado da nação e

as suas verdadeiras fontes são a crença popular, os costumes e a

consciência comum do povo.

O Historicismo Jurídico opõe-se ao processo de codificação,

iniciado na França pela escola da exegese, por considerá-lo limitado para

remediar os efeitos do Direito. Nesse sentido, sustentava que somente através de

uma ciência do Direito era possível compartilhar dos mesmos preceitos

positivistas dos exegetas, na busca de um Direito unitário, sistemático e que

garantisse a segurança jurídica. (BOBBIO, 1995, p. 121).

Com isso as características apresentadas pela escola são

sintetizadas em três (3) elementos. O primeiro caracteriza o anti-legalismo, isto

porque a idéia de positivação era a destruição do Direito. E como acreditavam no

Direito advindo de uma tradição viva que o passava de geração para geração, a

codificação iria cristalizar a evolução natural do Direito (HESPANHA, 2005,

p. 385).

O segundo relaciona-se com a “valorização dos elementos

consuetudinário e doutrinal do Direito”. O costume é o ponto central dos

historicistas, é a forma como se expressa o Direito. Embora Savigny saiba que o

Direito vinha do povo, não despreza o trabalho realizado pelos juristas e juízes no

aperfeiçoamento e no trabalho sistemático do Direito, desenvolvendo uma

tradição de ensinamentos que tem como base o Direito Romano (HESPANHA,

2005, p. 386).

O terceiro está relacionado ao papel dogmático que esta

tradição revela. Pois a investigação histórica do Direito com a utilização de

métodos adequados permitia que o “estudo científico (histórico) do Direito

30

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Romano visasse o estabelecimento daquilo que era ainda utilizável no presente

de sua época”. (FERRAZ, 1980, p. 30).

Pela caracterização desta dogmática, vista como “teoria do

Direito vigente” e por sua elevada valorização, os representantes da Escola

histórica passaram a distorcer as fontes romanas e formariam um outro ramo

chamado de Pandectismo.

O movimento do pandectismo, na Alemanha, foi realizado

pelos juristas que se dedicavam ao estudo do Direito romano, principalmente, na

pesquisa do Digesto de Justiniano. Nader (1999, p. 180) contextualiza os

Pandectistas afirmando: “Em sua função elaborativa, os pandectistas cultivaram a

organização do sistema jurídico alemão, contribuindo com o seu esforço para a

unidade do Direito, do ensino jurídico e, ainda, da política nacional.”

Verificou-se que as idéias expostas pelos Pandectistas iriam

influenciar outros movimentos, como o Sociologismo Jurídico e a moderna

Ciência do Direito. (GUSMÃO, 2001, p. 385).

Contudo a “ciência jurídica da Escola Histórica acabou por

se reduzir a um conjunto de proposições, logicamente, ordenado e concatenado,

abrindo, desta forma, as portas para a chamada Escola de Exegese e a Analítica”

permitindo anos mais tarde a codificação na Alemanha (FERRAZ, 1980, p. 30).

2.1.2 Contribuição francesa: a Escola da Exegese

A Escola da Exegese, na França, surgiu através da

elaboração do código civil de Napoleão, em 1804. Este código representava uma

importante obra legal, pois consolidava, para a recente burguesia francesa, todas

as aspirações da Revolução (1789), como a liberdade, a igualdade, a

fraternidade, a laicização do Estado e o republicanismo (GALVES, 1995, p. 215).

Fazia-se necessária tal elaboração, em virtude da grande insegurança jurídica

que a burguesia vinha sofrendo logo após a tomada do poder.

31

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As características apresentadas pela escola, estão na forte

ênfase dada somente ao Direito estabelecido no código. Seus principais

formuladores negavam aos julgadores a liberdade de recorrerem a outras fontes

na busca de solução, e afirmavam que o código seria um todo “perfeito” e sem

lacunas (NADER, 1999, p. 180). A escola, na verdade, propõe uma forma

adequada de interpretar o código. Como expõe Bobbio (1995, p. 148):

A escola da exegese deve seu nome à técnica adotada pelos seus

primeiros expoentes no estudo e exposição do código de

Napoleão, técnica que consiste em assumir pelo tratamento

científico o mesmo sistema de distribuição da matéria seguido

pelo legislador e, sem mais, em reduzir tal tratamento a um

comentário, artigo por artigo, do próprio Código.

Para esclarecer os fatos e demonstrar a importância da

escola da exegese para o positivismo jurídico, é importante apresentar os

fundamentos que justificam seu advento e por conseqüência, que legitimam suas

características. Segundo Norberto Bobbio, são cinco os pontos que determinaram

o advento da escola, como se passa a ver.

O primeiro justifica-se pelo próprio motivo da codificação, no

sentido de atender as necessidades de unificação e simplicidade dos textos

jurídicos. Outro fator associado está na lógica dos próprios juristas que “procuram

sempre a via mais simples e mais curta para resolver uma dada questão (...)

sendo o manuseio destas fontes mais complexo e difícil do que a do Direito

codificado”. (BOBBIO, 1995, p. 78).

O segundo ponto a ser defendido é representado pelo

princípio da autoridade. Neste contexto, a vontade expressada pelo legislador é

materializada na norma que constitui os códigos. Nas palavras de Bobbio “a

vontade do legislador é expressa de modo seguro e completo e aos operadores

do Direito basta ater-se ao ditado pela autoridade soberana” (BOBBIO, 1995,

p. 79).

O terceiro ponto encontra-se na doutrina da separação dos

poderes. Esta, segundo Bobbio, constitui a ideologia da estrutura do Estado

32

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moderno, na qual os três poderes (executivo, legislativo e judiciário) não poderiam

interferir, um, na competência do outro. O poder legislativo seria o único

competente para criar leis, cabendo tão somente ao judiciário aplicar a lei, pois

“elementos normativos estranhos ao código sufocaria a voz do Legislador“

(BOBBIO, 1995, p. 79).

O quarto ponto, também de natureza ideológica, é

representado pelo princípio da certeza do Direito. Somente um conjunto normativo

torna possível trazer a certeza da segurança jurídica. Através deste corpo estável

de leis é que os cidadãos poderiam ter, de forma antecipada, o conhecimento da

lei e por isso poderiam pautar suas condutas. Segundo Bobbio (1995, p. 80):

A exigência da segurança jurídica faz com que o jurista deva

renunciar a toda contribuição criativa na interpretação da lei,

limitando-se a simplesmente tornar explícito, através de um

procedimento lógico, aquilo que já está implicitamente

estabelecido na lei.

O último ponto representa bem o contexto histórico da

época, pois expõe as pressões exercidas pelo regime napoleônico. Disto

decorreu dois fatos: o primeiro foi a legitimação do próprio regime, visto que o

trabalho realizado na codificação permitia a Napoleão disseminar seu

ordenamento aos povos europeus, exercendo forte influência na unificação

jurídica de suas conquistas. Como salienta Hespanha (2005). O segundo fato

ficou associado à abrupta mudança do ensino jurídico francês, pois a partir da

exegese, as faculdades de Direito passam a somente lecionar o Direito Positivo.

Assim afirma Bobbio (1995, p. 81):

As velhas Faculdades de Direito da universidade haviam sido

substituídas pelas Escolas Centrais por obra da República,

transformadas posteriormente sob o Império em Escolas de

Direito e colocadas sob o controle direto das autoridades políticas,

a fim de que, fosse ensinado somente o Direito Positivo e se

deixasse de lado as teorias gerais do Direito e as concepções

jusnaturalistas.

33

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Deste modo, percebe-se que o método da exegese foi uma

das fortes influências para a concepção de positivismo jurídico, pois a partir desta

técnica, iniciou-se na tradição jurídica ocidental a prática da criação dos manuais.

Os Exegetas, assim, desconstituem o Direito Natural e atribuem à lei uma rígida

concepção estatal do Direito. (CAPELLARI, 2000, p. 148).

2.1.3 Contribuição Inglesa: o Utilitarismo e a Escola Analítica

Uma das contribuições à concepção de Direito Positivo

advém dos trabalhos realizados pelo iluminista Jeremy Bentham (1748-1832).

Bentham trabalhou sua argumentação no sentido de constituir uma crítica ao

sistema da Common Law4 isto é , ao Direito produzido pelos juízes. Para

compreender o posicionamento utilizado por Bentham, é necessário elucidar sua

filosofia utilitarista e suas críticas ao método adotado pelo sistema Inglês

(Common Law).

Segundo Diniz (1997, p. 58), Bentham acreditava que o

método para interpretar o Direito não deveria utilizar critério abstrato e ilimitado,

típico da abstração racional. Deve-se “interpretar as normas sob o ponto de vista

dos efeitos reais por elas produzidos quando aplicadas”. Desta forma desenvolve

a doutrina utilitarista do Direito. O principal critério de interpretação destas normas

é o da utilidade, afirmando que tudo aquilo que é útil, por conseqüência torna-se

bom, pois proporciona prazer. Ao contrário, aquilo que não é útil, portanto, adquire

a concepção de mau, resulta na dor. Numa passagem de sua obra “Uma

introdução aos princípios da moral e da legislação (1789)”, Bentham (2002,

p. 262) assim conceitua o princípio da utilidade:

4 Common Law, locução Inglesa. Lei comum ou costume geral e imemorial que designa a lei não escrita ou não estatuída, criada por decisões jurídicas, contrapondo-se à escrita, emanada do poder legislativo. È portanto o conjunto de normas consuetudinárias, baseadas nos precedentes judiciários, que impera na Inglaterra e nas nações que adotam, por recepção, por terem sido colonizadas pelo povo inglês (...) Caracteriza-se por ser um Direito consuetudinário jurisprudencial não escrito, que tem por base os casos resolvidos pelas cortes de justiça. (DINIZ, MARIA Helena. Dicionário Jurídico. 1998.)

34

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Por princípio de utilidade queremos dizer o princípio que aprova

ou desaprova toda e qualquer ação, segundo a tendência que

parece ter para aumentar ou diminuir a felicidade da parte cujo

interesse está em questão; ou, o que é a mesma coisa, em outras

palavras, para promover ou opor-se a essa felicidade. Digo de

toda e qualquer ação, e, por conseguinte, não apenas de toda

ação de um indivíduo particular, mas de todas as medidas do

governo.

Segundo ele o método para o estudo do Direito deveria

atender o critério objetivo pautado pela utilidade, criticando o sistema jurídico

inglês da Common Law.

Dentre as críticas destaca-se a necessidade de maior

segurança jurídica para os cidadãos, pois através da elaboração das normas

pelos magistrados, não era possível controlar a produção do Direito.

Diferentemente do Direito produzido pelo parlamento (BOBBIO, 1995, p. 99).

Outra crítica ao sistema Inglês, consistia na defesa que

Bentham fazia a favor da codificação, pois acreditava que através da

sistematização do Direito num código, o princípio utilitarista de “maior felicidade

para o maior número de pessoas” estaria sendo realizado, visto que, a idéia do

código traria quatro requisitos fundamentais: “utilidade, completude,

cognoscibilidade, justificabilidade”. Requisitos, estes, típicos do positivismo

jurídico. (BOBBIO, 1995, p. 100).

Paralelamente, desenvolve-se na Inglaterra o pensamento

da Escola Analítica, também conhecida como Positivismo Analítico. Tal escola

tem como principal representante John Austin, (1790-1859) jurista Inglês que,

através das influências obtidas do utilitarismo de Benthan, reelabora a crítica ao

Direito legislado pelos juízes. Tal crítica fundamenta-se na incerteza do Common

Law, pois o Direito elaborado pelos juízes não traz segurança à sociedade,

porque não se pode prever as conseqüências das ações daqueles (CAPELLARI,

2000, p.150). Mas diferentemente de Bentham, Austin acentua os trabalhos no

sentido de elaborar uma ciência do Direito. Por isso, propõe um Direito Positivo

fundamentado em três pontos, como descritos por Bobbio (1995, p. 108):

35

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a) a afirmação de que o objeto da jurisprudência (isto é, da ciência

do Direito) é o Direito tal como ele é e não como deveria ser

(concepção positivista do Direito); b) a afirmação de que a norma

jurídica tem a estrutura de um comando (concepção imperativista

do Direito); c) a afirmação de que o Direito é posto pelo soberano

da comunidade política independente – isto é, em termos

modernos pelo órgão legislativo do Estado (concepção estatal do

Direito).

Austin analisa as leis procurando isolar os conceitos

jurídicos fundamentais de todo o Direito Positivo. Submete-os, assim, a uma

classificação, no sentido de reduzir a um sistema de conceitos cujas

simplificações e até mesmo as aplicações práticas, possam ser alcançadas pelo

uso restrito da lógica formal. Galves (1995, p. 220) fornece uma síntese

afirmando:

O estudo analítico do Direito Positivo é, pois, uma tarefa

estritamente racional, despreocupada do conteúdo dele, não se

perguntando jamais se é bom ou mau, justo ou injusto, natural ou

artificial. O jurista só se preocupa com saber se os comandos ou

regras de conduta social foram postos por um soberano, capaz de

sancioná-lo. Se foi, é o que basta para ser Direito de verdade.

Percebe-se que, tanto nos pontos fundamentais

apresentados por Bobbio quanto na síntese elaborada por Galves, existe um

delineamento da concepção positivista do Direito. A necessidade da construção

de uma ciência específica ao estudo do Direito fica cada vez mais necessária. É

o que se verá no ponto seguinte.

2.2 DO DIREITO CIENTÍFICO

Considerando as escolas acima analisadas, cabe fazer

algumas afirmações para demonstrar-se a necessidade e as características de

um Direito Científico constituído no século XIX. Visto o desenvolvimento

socioeconômico daquele período, os juristas franceses, alemães e ingleses eram

36

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premidos pela considerável quantidade de matéria jurídica confusa e dispersa.

Muitos viam que a solução não estava no processo de codificação iniciado na

França, mas sustentavam que a obrigação de trazer ordem ao caos caberia a eles

também, através do estabelecimento de um Direito Científico. Assim sendo,

Bobbio (1995, p. 123) destaca:

Esta idéia de uma ciência jurídica universal estava muito mais

próxima da concepção racionalista (...) A universalidade da ciência

jurídica é possível porque se serve de um método próprio, de

certas técnicas de pesquisa elaboradas e refinadas através dos

séculos, as quais são válidas para o estudo de qualquer

ordenamento.

O Direito Científico ganhou força, principalmente com as

contribuições de Rudolf Von Jhering, através de sua obra “Espírito do Direito

Romano”. Nela estabelece um método à ciência jurídica fundamentado,

basicamente, em três pontos: a) a análise jurídica, que consiste em decompor o

material jurídico em simples conceitos; b) a concentração lógica, que consiste na

ordem inversa da primeira, num sentido de reconstruir o material jurídico com os

conceitos, estabelecendo a síntese, elemento chave para toda a ciência; e, c)

ordenamento sistemático, pelo qual o jurista não apenas teria uma visão do

conjunto sobre dados da experiência jurídica, mas ainda, a possibilidade de

produzir regras (BOBBIO, 1995, p. 125).

A partir deste entendimento, pode-se afirmar, em termos

gerais, que a doutrina do positivismo jurídico não é unívoca, compondo-se de

várias escolas e movimentos que caracterizam um modo de pensar. Por isso,

acrescenta Bobbio (1995, p. 126):

Não me disporei a dizer que essas coisas ditas por Jhering sobre

o método da ciência jurídica são exatas e convincentes. Mas

certamente são indicativas de uma certa mentalidade, da

mentalidade do jurista teórico, que constrói um belo sistema,

preocupando-se mais com a lógica e com a estética do que com

as conseqüências práticas de suas construções. É a mentalidade

37

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que geralmente tem sido atribuída ao jurista partidário do

positivismo.

A necessidade de sistematização e uniformidade do Direito

influenciado pelos avanços científicos do século XIX, foi o que motivou o

surgimento da doutrina do Direito Positivo. Pôs-se de lado a metafísica,

reduzindo-se o Direito Positivo a fato passível de estudo científico, fundado em

dados reais. (GUSMÃO, 2001, p. 385).

No próximo item tratar-se-á das contribuições do positivismo

filosófico para a doutrina do Direito Positivo, estabelecendo-se pontos de

convergência e destacando seus elementos.

2.2.1 Positivismo filosófico

O positivismo filosófico constitui uma das correntes do

pensamento científico que maior influência teve no séc. XIX. A sintetização de tal

pensamento está expressa na obra de Augusto Comte intitulada “Curso de

Filosofia Positiva”.

Ele caracteriza-se por utilizar os métodos investigativos das

ciências naturais e por aplicá-los ao estudo das ciências sociais. Afirma ser válido

somente o trabalho científico em que fosse possível a comprovação empírica.

Neste sentido Nader (2004, p. 375) afirma:

O positivismo filosófico floresceu no século XIX, quando o método

experimental era amplamente empregado, com sucesso, no

âmbito das ciências da natureza. O positivismo pretendeu

transportar o método para o setor das ciências sociais. O trabalho

científico deveria ter por base a observação dos fatos capazes de

serem comprovados. A mera dedução, o raciocínio abstrato, a

especulação, não possuíam dignidade científica, devendo, pois,

ficar fora de cogitação.

38

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Com isso, Comte estabelece que a ciência é a única fonte

legítima de conhecimento. Tal afirmação apóia-se na marcha historicamente

comprovada do desenvolvimento do espírito humano, que culminou no que ficou

conhecido com a “lei dos três estados”. Como afirma Comte (1978, p. 4):

(...) creio ter descoberto uma grande lei fundamental a que se

sujeita por uma necessidade invariável, e que me parece poder

ser solidamente estabelecida, que na base de provas racionais

fornecidas pelo conhecimento de nossa organização quer na base

de verificações históricas (...) Essa lei consiste em que cada uma

de nossas concepções principais, cada ramo de nosso

conhecimento, passa sucessivamente por três estados históricos

diferentes: estado teológico ou fictício; estado metafísico ou

abstrato, estado científico ou positivo.

Os três estados constituem os métodos de investigação

filosóficos, tendo o estado teológico dirigido essencialmente suas investigações

para a natureza íntima dos seres, as causas primeiras e finais de todos os efeitos,

os conhecimentos absolutos e dirige a ação para os fenômenos sobrenaturais.

(COMTE, 1978, p. 4).

No estado Metafísico “(...) os fenômenos sobrenaturais são

substituídos por forças abstratas (...) inerentes aos diversos seres do mundo (...)

capazes de engendrar por elas próprias todos os fenômenos observados”

(COMTE, 1978, p. 4).

O estado Positivo, como último elemento do

desenvolvimento humano, é assim conceituado por Comte (1978, p. 4):

(...) o espírito humano reconhece a impossibilidade de obter

noções absolutas, renuncia a procurar a origem e o destino do

universo (...) preocupa-se unicamente em descobrir, graças ao

uso bem combinado do raciocínio e da observação, suas leis

efetivas (...). A explicação dos fatos, reduzida então a seus termos

reais, se resume de agora em diante na ligação estabelecida entre

os diversos fenômenos particulares e alguns fatos gerais (...)

39

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A partir deste ponto Comte estabelece a classificação das

Ciências, indo desde as Ciências Naturais julgadas por ele como as mais simples,

até às mais complexas, chegando à última das ciências, a Física Social. “Como

resultado definitivo temos a matemática, a astronomia, a física, a química, a

fisiologia e a física social” (COMTE, 1978, p. 39). Cria a partir desta classificação

a Sociologia (Física Social) e classifica o Direito como uma secção da Sociologia

(NADER, 2004, p. 376).

É evidente que tal classificação encontra-se incompleta, mas

salienta-se que a importância do trabalho desenvolvido por Augusto Comte está

em estabelecer o método experimental para as ciências sociais. Este método é

constituído de três fases fundamentais; a) observação; b) formulação de

hipóteses; c) experimentação. Nader (2004, p. 377) explica com a síntese:

A observação é o ponto de partida. O pensamento humano é

atraído por algum acontecimento ou fenômeno. A sucessão de

fatos observados sugere a formulação de uma hipótese, que

deverá explicar os fatos. Finalmente, a explicação. Aqui o cientista

põe à prova a sua hipótese, o seu pensamento. A experimentação

deverá ser a mais ampla possível. Alcançado o êxito, ou seja, a

confirmação do suposto, o conhecimento terá alcançado um valor

científico.

Com isso, o conhecimento científico positivo está baseado

na observação dos fatos conjuntamente estabelecidos pelo raciocínio, que exclui

tentativas de descobrir a origem ou as causas indiretas dos fenômenos; são

tomadas como verdadeiras as leis dos fenômenos que devem traduzir,

obrigatoriamente, o que ocorre na natureza. (ANDERY, et al., 1996, p. 381). Na

obra “ O discurso sobre o espírito positivo” Comte (1978, p. 51) afirma:

Nossas pesquisas positivas devem essencialmente reduzir-se, em

todo os gêneros, à apreciação sistemática daquilo que é,

renunciando a descobrir sua primeira origem e seu destino final.

(...) Nas leis dos fenômenos consiste realmente a ciência, à qual

os fatos propriamente ditos, em que pese a sua exatidão e o seu

número, não fornecem mais do que os materiais indispensáveis.

40

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A partir destas afirmações Comte apresenta as

características do conhecimento científico, fundamentado na sua certeza, isto é,

não admitindo conjecturas. O conhecimento sempre apresenta um grau de

precisão, embora admita que este grau varie de ciência para ciência. Assim,

conforme salienta Andery (1996, p. 382) “Comte reforça a noção de que o

conhecimento científico é um conhecimento que não admite dúvidas,

indeterminações e o desvincula de todo conhecimento especulativo”.

Traçados os elementos característicos do positivismo

filosófico, cabe destacar que a importância do trabalho de Augusto Comte está

em propor as bases da metodologia ao estudo das ciências. O movimento do

positivismo não se esgota somente com suas contribuições. A partir de suas

obras, vários autores adaptam e utilizam parte de suas idéias, constituindo uma

teoria positiva da ciência. Com isso, torna-se difícil afirmar que as interpretações

existentes representam todo o conjunto proposto pelo positivismo filosófico. Desta

forma, afirma Cupani (1985, p. 13):

As dificuldades para caracterizar a teoria “positiva” não se

reduzem todavia à questão de sua correta denominação. Não é

fácil encontrar uma exposição completa e pormenorizada desta

posição e nem todos os positivistas estão de acordo em todos os

detalhes da teoria que se lhes atribui.

Com isso, percebe-se que as relações existentes entre o

positivismo filosófico e o positivismo jurídico, estão no fato de o primeiro aprimorar

o segundo no que se refere ao método. Ficando assim, as contribuições do

positivismo filosófico à algumas escolas do positivismo jurídico, principalmente,

àquelas surgidas no século XIX, e que contribuirão para a noção do que se

conhece sobre o positivismo jurídico.

A seguir passa-se à exposição de algumas influências do

positivismo filosófico sobre a configuração do positivismo jurídico.

41

Page 54: monografia Roberto final_Direito rev pós_banca_v.Final

2.2.2 Influências do Positivismo Filosófico no Positivismo Jurídico

As contribuições aqui expressas não têm a pretensão de

demonstrar que as configurações do positivismo jurídico do século XIX

apresentem traços que o positivismo filosófico tenha determinado. Cabe salientar

que o positivismo jurídico, enquanto doutrina do Direito Positivo, é anterior ao

positivismo filosófico de Augusto de Comte. O que de fato ocorre é que ambos os

movimentos estimulam um ao outro, como se irá demonstrar (MACHADO, 1995,

p. 144).

O positivismo filosófico proporcionou, no século XIX, uma

atitude epistemológica que tinha por características a realidade, no sentido

objetivo dos fenômenos, a utilidade, a certeza e a precisão do conhecimento. Nas

palavras de Alonso (1996, p. 109), “o conhecimento científico vinha sendo

definido por Comte como mais do que um método de explicação da realidade. A

constituição da ciência seria produto do desenvolvimento da razão na história”.

Por isso, destaca-se aqui que o positivismo filosófico

contribuiu no sentido de estabelecer três pontos à ciência do Direito: a) reduziu a

atividade humana e social a uma simples realidade física ou natural; b) identificou

fundamentalmente as ciências humanas e sociais e, entre elas, a moral e o

Direito, discriminando-as das ciências físicas e naturais; c) considerou a atividade

humana sujeita ao mesmo determinismo rígido do mundo físico e biológico, e

negou, conseqüentemente, a existência da liberdade (MONTORO, 2000, p. 247).

Neste sentido o positivismo jurídico equivale aos princípios

do positivismo filosófico, pois rejeita todos os elementos da abstração na área do

Direito, a começar pela idéia do Direito Natural, por julgá-la metafísica e

anticientífica (NADER, 2004, p. 376).

A partir do método de investigação do positivismo filosófico

no século XIX, originam-se as mais diversas escolas positivas. Destacam-se aqui

algumas delas.

42

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A Escola Sociológica Francesa possui como principal

fundador Émile Durkheim, influenciado diretamente pelas idéias de Comte. Ele

pretende substituir o Direito Natural, considerando-o apriorístico e anti-histórico,

pela ciência positiva. Com isso, Durkheim refutou o jusnaturalismo dos

contratualistas, e procurou demonstrar que os Direitos naturais, inatos ou pré-

sociais do indivíduo, nada mais são do que Direitos que lhes foram dados pela

consciência coletiva, cujo órgão máximo é o poder estatal, fruto da evolução

histórica e cultural. Sobre isso Reale (1998, p. 61) destaca:

A consciência coletiva, tal como aparece nas obras de Durkheim e

de Davy, é a fonte primordial de todo Direito. A lei não é mais que

a expressão consciente da vontade coletiva do grupo social (...)

Durkheim em sua análise sociológica do fenômeno jurídico aceita,

como ponto de partida o conceito de Direito tal como é fixado pelo

técnico para caracterizar o Direito Objetivo. Para ele o Direito é a

expressão exterior do fato da solidariedade social, de sorte que é

através do Direito que pretende estudar a solidariedade,

fenômeno este de ordem moral que não se prestaria à observação

exata.

Através das idéias de Durkheim, sobre solidariedade social,

Léon Duguit fundamenta o Direito no puro fato social do sentimento de

solidariedade e de justiça, confinando a ciência jurídica à pura observação dos

fatos sociais. Com isso, nas palavras de Diniz (1997, p. 104) transforma a ciência

dogmática numa disciplina sociológica.

Outra importante escola do Direito que aplicou o método de

Comte à Ciência do Direito foi a Escola Positiva de Direito Penal, cujos principais

representantes são César Lombroso e Enrique Ferri. Reduziu a ciência do Direito

penal ao plano das ciências físico-naturais.

Montoro (2000, p. 249) salienta que a escola positiva de

Direito penal aplicava os métodos experimental e indutivo, baseados na rigorosa e

exata observação dos fatos, e os constituía a única fonte de fundamento racional.

O contexto no qual surge esta escola, foi assim expresso por Diniz (1997, p. 109):

43

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Com o advento da tecnologia, da industrialização, das

descobertas de Darwin e Spencer, o sistema de raciocínio

abstrato do século XIX entrou em crise, consequentemente houve

o crescente prestígio das ciências naturais, pelo emprego do

método positivo, método de exploração com o qual se estudava o

homem, considerado em sua própria natureza e em suas relações

sociais. O Direito penal deixou a esfera de abstração em que se

encontrava ao tempo do classicismo, passando para o terreno das

verificações objetivas sobre o delito e seu autor.

Percebe-se através destas escolas, que o emprego do

método de investigação positivo começa a ser reinterpretado nos mais diversos

ramos do conhecimento. Com isso, pode-se obter uma síntese da aplicação das

idéias de Comte nas palavras de Ferraz Júnior (1995, p. 31):

Todas as teses de Comte foram base comum para o positivismo

jurídico do século XIX. Daí surgiu, finalmente, a negação de toda

metafísica, a preferência dada às ciências experimentais, a

confiança exclusiva no conhecimento de fatos, etc.

Através do desenvolvimento das várias configurações e

tendências do positivismo que dominaram o século XIX transformou-se a ciência

do Direito, ora em dogmática jurídica, como ciência positiva da norma, ora como

sociologia, ora como psicologia do Direito. Nasceu a preocupação, por parte de

alguns filósofos, por definir a ciência do Direito com um rigor metodológico mais

acentuado, o que fez originar desta, o chamado formalismo Jurídico (FERRAZ

JÚNIOR, 1986, p.32). O fenômeno será melhor elucidado a seguir.

2.3 FORMALISMO JURÍDICO

As idéias que acompanham o início do século XX acentuam

a preocupação metodológica com relação à ciência do Direito. Por outro lado, as

concepções do positivismo filosófico vão ganhando a contribuição de novos

autores e se destacando na formação duma base lógica forte, com relação ao

método científico. Esta tendência se consolidou no chamado “Círculo de Viena”

44

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que tinha como principal característica a análise da linguagem científica. Os

autores desta nova versão do positivismo constituíram a Escola do

Neopositivismo, também chamado de Empirismo Lógico (ABBAGNAMO, 2000,

p. 140).

Os neopositivistas caracterizam-se pelo rigoroso emprego

da linguagem, dando-lhe adequada interpretação, a fim de salientar os

significados mais autênticos, eliminando os equívocos que conduzem ao uso

impróprio de tais significados. Nascimento (2002, p. 65) assim caracteriza o

neopositivismo:

(...) é uma forma do empirismo. O neopositivismo reduz a filosofia

à função de zelar pela linguagem, tornando-a clara e significativa.

(...) O neopositivismo obrigou os filósofos a se questionarem sobre

a propriedade da sua linguagem e a se esforçarem para ser mais

precisos e mais rigorosos ao se expressarem.

Segundo Abbagnano (2000, p. 141) contribuíram para a

base de discussão do Círculo de Viena, entre outros, H. Hahn, Karl Popper, L.

Wittgenstein e Hans Kelsen.

Acresce que, desde a segunda metade do século XIX a

concepção positivista do saber identificava o conhecimento válido com a ciência

natural. O jurista aderia ao sociologismo que submetia o Direito às várias

metodologias empíricas. Com isso, destaca Diniz (1996, p. 13) “não havia domínio

científico no qual o cientista do Direito não se achasse autorizado a penetrar”.

Assim o austríaco Hans Kelsen, ligado ao Círculo de Viena,

centrado na questão da cientificidade, irá promover o movimento da purificação

do Direito, considerando a ciência jurídica como a única ciência do Direito. Desta

forma destaca o autor (Kelsen, 1998, p. 1):

(...) um realce de olhos sobre a ciência jurídica tradicional, tal

como se desenvolveu no decurso dos sécs. XIX e XX mostra

claramente quão longe ele está de satisfazer á exigência da

pureza. De um modo inteiramente acrítico, a jurisprudência tem-se

45

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confundido com a psicologia e a sociologia, com a ética e a teoria

política. Esta confusão pode porventura explicar-se pelo fato de

estas ciências se referirem aos objetos que indubitavelmente têm

uma estreita conexão com o Direito.

Kelsen apresenta suas idéias numa das mais celebres obras

de sua carreira “A teoria pura do Direito”. Segundo Diniz (1996, p. 45) Kelsen

constituiu o objeto do conhecimento jurídico-científico, e por conseqüência o

direito deve ser entendido como norma, pois a atividade do jurista esgota-se com

o conhecimento da norma. A conduta humana só será analisada enquanto

constituir conteúdo de comandos jurídicos. Tal método empregado à Ciência

Jurídica torna-a um dos principais pilares do sistema jurídico contemporâneo e

constitui o que se chama-se de “Formalismo Jurídico5”.

Para compreender o método adotado por Kelsen, e a própria

denominação de positivista, faz-se necessário elucidar, de forma sucinta alguns

conceitos elementares de sua teoria.

A teoria de Kelsen, conforme explicitado acima, busca a

purificação do estudo do Direito. Para tanto, dois critérios são adotados pelo

autor. O primeiro é o corte epistemológico que visa definir a ciência Jurídica e

delimitar seu único e exclusivo objeto ao estudo da norma jurídica. O segundo

critério é o corte axiológico, dado justamente pela concepção positiva de ciência,

que visa buscar a neutralidade nos resultados, evitando, a princípio, qualquer tipo

de interferência política ou moral no estudo da norma jurídica. (COELHO, 1997,

p. 22).

Sobre o objeto da Ciência do Direito, Kelsen afirma que a

norma jurídica funciona como “esquema de interpretação” (2003, p. 4). Pois as

normas jurídicas “conferem a determinados fatos o caráter de atos jurídicos ou

antijurídicos” (2003, p. 5). Assim, Kelsen tenta delimitar o estudo do Direito

diferenciando os fenômenos sociais dos naturais. Classifica o Direito como um

fenômeno social, diferentemente do natural, pois possui dois sentidos no ato de

vontade, um objetivo e outro subjetivo. E “o que torna objetivo, em termos

5 O formalismo jurídico de Kelsen, segundo Gonçalves (2002, p. 171) também é conhecido como Normativismo Jurídico pois limita-se ao estudo das normas jurídicas.

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jurídicos, o sentido subjetivo de um ato de vontade, é a existência de uma norma

jurídica que preveja esse fato e lhe atribua o efeito jurídico” (BARZOTTO, 1999,

p. 34).

Kelsen (2003, p. 79) ainda afirmar sobre o objeto da ciência

jurídica:

Pelo que respeita à questão de saber se as relações inter-

humanas são objetos da ciência jurídica, importa dizer que elas

também só são objeto de um conhecimento jurídico enquanto

relações jurídicas, isto é, como relações que são constituídas

através de normas jurídicas.

Em nota, o próprio autor esclarece que esta é a posição da

Teoria pura do Direito, demonstrando que a ciência jurídica, no contexto da teoria

pura refere-se tão somente à norma jurídica. Sobre a norma jurídica ainda se faz

necessário esclarecer alguns pontos.

O primeiro está no fato de que a partir da delimitação

realizada pelo autor, existe a necessidade de validar o sistema jurídico proposto.

Para tanto, Kelsen (2003) utiliza o conceito de “norma fundamental” como

pressuposto último de validade das normas jurídicas e, neste sentido propõe a

idéia de “sistema de normas”.

Todas as normas cuja validade pode ser reconduzida a uma e

mesma norma fundamental forma um sistema de normas, uma

ordem normativa. A norma fundamental é a fonte comum da

validade de todas as normas pertencentes a uma e mesma ordem

normativa, o seu fundamento de validade comum. O fato de uma

norma pertencer a uma determinada ordem normativa baseia-se

em que o seu último fundamento de validade é a norma

fundamental desta ordem. É a norma fundamental que constitui a

unidade de uma pluralidade de normas enquanto representa o

fundamento da validade de todas as normas pertencentes a essa

ordem normativa. (Kelsen, 2003, p. 217).

47

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A partir do fundamento de validade do “ordenamento

jurídico” Kelsen (2003) utiliza dois critérios distintivos para classificar as normas

jurídicas.

O primeiro trabalha com o princípio “Estático” do Direito, isto

é, com o conjunto de normas jurídicas que “determinam a conduta dos indivíduos

(...) considerada como devida (devendo ser) por força de seu comando” (Kelsen,

2003, p. 216). Estas normas teriam validade noutras normas que numa operação

lógica, chegaria ao fundamento último de validade (norma fundamental). No

princípio estático, as normas adquirem validade, pois advém de uma norma

pressuposta que lhe serve de fundamento.

O segundo princípio trabalha com a “Dinâmica” do Direito,

isto é, com o fundamento de validade através da delegação, a uma autoridade, o

fato de produzir normas jurídicas. Kelsen (2003, p. 219) assim conceitua o

princípio dinâmico:

Dinâmico é caracterizado pelo fato de a norma fundamental

pressuposta não ter por conteúdo senão a instituição de um fato

produtor de normas, a atribuição de poder a uma autoridade

legisladora ou (...) uma regra que determine como devem ser

criadas as normas gerais e individuais do ordenamento

fundamentado sobre esta norma fundamental.

Segundo Miguel Reale (2002, p. 473), a classificação

estabelecida por Kelsen entre o princípio estático e o princípio dinâmico deixa de

“considerar o Direito somente enquanto sistema de normas logicamente

escalonadas, (Sistema Estático) para examinar o Direito também na sua

aplicação prática (Sistema Dinâmico)”. Tais preocupações atendiam as

necessidades da época, enquanto justificavam sua teoria.

Outro aspecto importante na teoria de Kelsen é o da

coerção. Em sua obra publica em 1945 “ General theory of Law and State” (Teoria

Geral do Direito e do Estado), a coerção é trabalhada como elemento essencial

do Direito, pois conforme o autor, a natureza da validade de uma norma jurídica

está no fato de ser coercitiva, impondo determinada conduta a todos em virtude

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do estabelecimento de uma sanção. Portanto, a validade da norma está na sua

“força de obrigatoriedade” (KELSEN, 1998, p. 43).

Cabe ainda salientar que no contexto da aplicação da norma

jurídica, isto é, da dinâmica do Direito, o conceito e a própria definição de Estado

não apresentam diferenças. Kelsen (1998, p. 275 seg.) afirma que ambas as

definições apresentam-se como análogas. Do ponto de vista jurídico, o “Estado é

o Direito enquanto subjetivado. Toda a regra jurídica pressupõe logicamente um

sujeito; da mesma maneira, a totalidade do ordenamento jurídico pressupõe (...) a

pessoa jurídica do Estado (REALE, 2002, p. 477). “O Estado como pessoa nada

mais é que a personificação dessa unidade. Um órgão do Estado equivale a um

órgão do Direito” (KELSEN, 1998, p. 277).

Neste sentido a contribuição do Formalismo jurídica para o

Positivismo está no fato de que Kelsen aprofundou, com a devida objetividade

científica, o estudo do Direito. Tornou sua teoria uma referência no método do

Estudo do Direito por todo o século XX. O positivismo jurídico Kelsiano,

consciente de seus fundamentos e limites “não nega a legitimidade do problema

axiológico, mas limita-se a verificar a impossibilidade de seu tratamento científico”

(GOLÇALVES, 2001, p. 102).

Através da contribuição das principais Escolas do

Positivismo Jurídico, passa-se a ver, no próximo capítulo, a característica do

Positivismo jurídico.

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CAPÍTULO 3

CARACTERIZAÇÃO DO POSITIVISMO JURÍDICO

Pelo que se percebe, a caracterização do positivismo

jurídico não é uma tarefa fácil, em virtude de sua heterogeneidade de conceitos e

formas. A definição do próprio termo “positivismo”, já implica uma série de

ambigüidades. Por isso, necessário se faz realizar algumas definições de termos

correlatos para melhor esclarecer o que é positivismo jurídico.

Inicialmente, não se pode caracterizar o positivismo jurídico

como uma escola do pensamento jurídico, pois configuraria um reducionismo

monolítico de algo que possui uma história ampla de contraposição ao

jusnaturalismo (ANDRADE, 2003, p. 55). Por outro lado, também não se pode

caracterizar o positivismo jurídico como um movimento derivado do positivismo

filosófico realizado por Comte. Apesar de muitos equívocos, pode-se afirmar que

existe apenas algumas contribuições do positivismo filosófico ao positivismo

jurídico (WÖHLKE; DEMARCHI, 2005, p. 287).

O positivismo jurídico, portanto, partindo da premissa

elucidada por Bobbio (1995, p. 26), deriva do Direito Positivo, uma vez que, este

se contrapõe ao Direito Natural. Caracteriza-se como a doutrina, segundo a qual,

não se admite outro Direito senão o Direito Positivo. No capítulo primeiro da

presente pesquisa, apresentou-se o contexto sócio-histórico da origem deste

termo, isto é, daquele Direito que emana de um poder soberano do Estado,

mediante o reconhecimento exclusivo da lei. Destacam-se, nesta trajetória, o

processo de monopolização da produção jurídica por parte do Estado e o

reconhecimento exclusivo da lei.

Desta forma, caberá tão somente destacar as características

desta expressão, com a apresentação de algumas conceituações já realizadas

por alguns autores.

50

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Cabe destacar que a maioria das definições apresenta

elementos históricos e concepções muito amplas, o que dificulta a delimitação do

termo. Portanto, o positivismo, para estas definições, apresenta-se como uma

forma de “pensar” o direito, o que implica tanto em aspectos teóricos (cognitivos),

quanto práticos. Isto é, o que resulta da experiência jurídica de determinado

momento histórico. Dentre estas definições, pode-se destacar a de Bodenheimer

(1966, p. 113):

O positivismo jurídico é uma idéia segundo a qual o direito é

ditado pelo poder dominante na sociedade, em um processo

histórico. Segundo essa concepção, só é direito aquilo que o

poder dominante determina, e o que ele determina só é direito em

virtude dessa circunstância mesma. O jurista positivista insiste

também numa rigorosa separação da lei positiva com a

legalidade, ou seja, com a observância das normas assentadas

pelo Estado.

Percebe-se nesta definição, embora genérica, uma das

características que o positivismo jurídico adquiriu no início do século XX: o caráter

de sistema, isto é, um ordenamento que se auto-limita e se auto-reproduz.

Barzotto (2004, p. 18) em sua obra “O positivismo jurídico

contemporâneo” afirma que o positivismo jurídico serve ao ideal da segurança

jurídica e o define como um sistema normativo. Assim diz:

Com efeito, o positivismo jurídico que, certamente, é um

fenômeno complexo, controvertido, de difícil delimitação e

correntes múltiplas, pode caracterizar-se, entretanto, pela

perseguição de certo objetivo ou anelo que pulsa em uníssono

sob toda a variedade de suas correntes: a consecução da

segurança nas relações sociais. A condição básica para alcançá-

la era uma perfeita delimitação do jurídico que impedisse o

recurso a valorações do tipo ético ou político, cujo emprego, por

causa do seu caráter controvertido, colocaria em perigo essa

intenção prática principal. Fazia-se necessário, definitivamente,

elaborar um conceito de Direito que não remetesse a esferas

alheias ao jurídico.

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Este conceito, embora o próprio autor destaque, apresenta-

se de forma incompleta, pois as críticas ao positivismo jurídico identificam que a

“perfeita delimitação do jurídico com vistas a alcançar a segurança jurídica” nunca

foi realmente atingida e apresenta-se falha em relação ao valor e aos fatos.

Mas a importância, de tal conceituação para a presente

pesquisa, está justamente, em enfocar que o positivismo jurídico decorre de uma

crença nas idéias de determinados pressupostos.

A descrição destes pressupostos, como vistos, culmina no

formalismo jurídico de Hans Kelsen. Destaca-se que o modelo teórico proposto

por ele se consolidou com base em dois elementos.

O primeiro por estabelecer de forma definitiva a autonomia

do Direito, isto é, “o Direito é elaborado a partir da definição do Direito como

sistema normativo”. Segundo Barzotto (2004, p. 19):

O que caracteriza (Conceito de Direito autônomo) é simplesmente

a presença de critérios regulativos em relação aos quais se pode

decidir em face de qualquer norma se pertence ou não ao

sistema. O que constitui, portanto, o Direito como sistema

normativo é a presença de um critério regulativo que possibilite

determinar a pertinência ou não de uma norma ao sistema, o que

significa qualificá-la como jurídica. Se o Direito é um sistema,

normativo, o critério de pertinência é também o critério de

“juricidade”.

O outro elemento ligado ao formalismo, mas com base no

positivismo jurídico contemporâneo, é a forma acabada e definitiva da ciência do

Direito. Na análise crítica realizada por Barzotto (2004), existe uma semelhança

no pensamento dos três grandes juristas do século XX: Hans Kelsen, Alf Ross e

Herbert Hart. A semelhança é que ambos apresentaram como proposta teórica a

“consolidação” do projeto positivista de ciência do Direito.

Embora não tenham conseguido, seus estudos e escritos

mostraram tal direcionamento. Como não é proposta desse item apresentar as

52

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críticas ao positivismo jurídico6, salientam-se tão somente que elas se dirigem às

contribuições do projeto positivista, na base dos seus postulados de “segurança”

e “certeza” jurídica (BARZOTTO, 2004, p. 139).

Deste modo, como forma de caracterizar o positivismo

jurídico e ao mesmo tempo não se distanciar da necessidade e rever esta

concepção trabalhar-se-á com a classificação estabelecida por Norberto Bobbio.

Ele considera o positivismo jurídico um movimento da cultura jurídica sob a qual

muitos juristas e filósofos foram acostumados a pensar. Assim o positivismo

jurídico apresenta-se em três formas distintas, mas historicamente relacionadas,

como será visto no próximo ponto.

3.1 POSITIVISMO JURÍDICO ENQUANTO MÉTODO

O positivismo jurídico enquanto método, necessariamente

não se diz Direito enquanto técnica, ferramenta de pesquisa ou de investigação

do Direito, mas Direito enquanto Ciência Jurídica. O esforço do positivismo

jurídico neste caso é de mostrar a delimitação de sua ciência e o real objeto que o

caracteriza (ANDRADE, 2003, p. 56).

A ciência jurídica nasce do esforço histórico de transformar o

estudo do Direito em uma ciência propriamente dita. Para tanto, percebe-se que

desde os pressupostos do Direito positivo até a configuração das suas escolas na

Europa (Histórica, Exegese e Analítica), a tentativa de identificar as

características próprias de seu estudo culminou em ver o positivismo jurídico

como método (Ciência).

Esta caracterização teve a forte influência do positivismo

filosófico, bem como da escola do livre Direito de Jhering, no intuito de constituir

uma sistemática do estudo do Direito.

6 Vide o item 3.4 do presente capítulo. Para maiores esclarecimentos às críticas do positivismo jurídico recomenda-se as seguintes obras: “Introdução ao pensamento jurídico crítico” , “Pluralismo jurídico: fundamentos de uma nova cultura do Direito amplos de Antonio Carlos Wolkmer.

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Norberto Bobbio (1995, p. 135) enfatiza que o positivismo

jurídico enquanto método “assume uma atitude científica frente ao Direito.

Possuindo uma abordagem avalorativa, isto é, despida de qualquer juízo de valor

que se possa fazer, seja ele de características políticos ou morais”.

Nesta afirmação, Bobbio estabelece uma distinção entre os

juízos de valor e os juízos de fato. Afirma que os primeiros “representam uma

tomada de posição frente à realidade, visto que, sua formulação possui a

finalidade, não de informar, mais de influir sobre o outro”. Os juízos de valor num

certo sentido determinam uma posição ideológica. Por outro lado, os juízos de

fato “representam uma tomada de conhecimento da realidade, visto que, a

formulação de tais juízos, possui finalidade de informar”.

O caráter informativo, associado à definição do objeto é o

que determina a cientificidade do método, como postularam as ciências físico-

naturais do final do século XIX e início do século XX. O que caracterizará a

ciência jurídica foi o objeto a ser estudado, como visto anteriormente, nas

contribuições do positivismo filosófico.

Neste sentido, Andrade (2003, p. 57) destaca que:

Trata-se de uma aproximação ao estudo do Direito que pode ser

designada de científica precisamente por se inserir no movimento

mais geral das ciências para uma distinção radical entre fatos e

valores; para a exigência de objetividade e neutralidade valorativa

como critérios de cientificidade.

Realça-se assim, a idéia postulada por Ferraz Junior (1976),

de sistema do Direito, uma vez que possui seu objeto específico “a norma

jurídica” e se caracteriza como um sistema fechado, pois a norma se auto-limita.

Percebe-se então que o positivismo, enquanto método, diz

mais respeito à validade do sistema, e não ao valor que adquire. A distinção entre

validade e valor é assim expressa por Norberto Bobbio (1995, 137):

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A validade de uma norma jurídica indica a qualidade de tal norma,

segundo a qual existe na esfera do Direito (...) Dizer que uma

norma jurídica é válida significa dizer que tal norma faz parte de

um ordenamento jurídico real, (...) existente numa dada

sociedade. O Valor de uma norma jurídica indica a qualidade de

tal norma pela qual esta é conforme o Direito ideal (entendida

como síntese de todos os valores fundamentais nos quais o

Direito deve se inspirar).

Tais características constituem, como visto, o que se

denomina de formalismo jurídico. Uma vez que “define o Direito exclusivamente

em função da sua estrutura formal, prescindido completamente do seu conteúdo

isto é, considerando somente como o Direito se produz e não o que ele

estabelece” (BOBBIO, 1995, p. 145).

Com isso, Andrade (2003, p. 59) também afirma que o

método do positivismo jurídico pretendeu fundamentalmente “delimitar a esfera do

Direito enquanto objeto da Ciência Jurídica” tendo, ainda segundo a autora,

proporcionado um efeito de “conformar a ideologia da neutralidade à ciência

jurídica”, tema a ser trabalhado no item 3.3 desta monografia.

3.2 POSITIVISMO JURÍDICO ENQUANTO TEORIA

Um dos aspectos importantes do positivismo jurídico

enquanto teoria é a concepção atribuída ao Direito enquanto fenômeno vinculado

ao Estado. Neste sentido, pode-se caracterizar o positivismo jurídico como um

conjunto de teorias que legitimam o “poder soberano detentor do monopólio da lei

e da coerção” (ANDRADE, 2003, p. 59).

Godoy (2004), numa tentativa de síntese, assim define o

positivismo jurídico:

O positivismo jurídico defende a concepção monista, identificando

o Direito com o Estado, apontado como o detentor exclusivo da

monopolização da produção normativa. Formalismo e

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imperativismo informam o monismo jurídico estatal. O Direito

ficaria resumido a mero comando, desprezando-se seu conteúdo

e seus fins.

Percebe-se, como salienta Bobbio, que existe um nexo entre

o positivismo jurídico enquanto método e enquanto teoria, e este nexo não é

lógico, mas sim, histórico.

Pois os primeiros estudiosos que aplicaram o método positivista

viveram num contexto histórico-social no qual o Direito era

produzido exclusivamente pelo Estado e com base em tal dado

elaboraram a teoria juspositivista (BOBBIO,1995, p. 233).

Desse positivismo jurídico resultam cinco características

fundamentais que compõem a base da teoria juspositivista do Direito, a saber:

3.2.1 Teoria da coatividade do Direito

Ligada ao conceito do Direito, a teoria da coatividade é vista

como um “sistema de normas jurídicas gerais aplicadas coativamente ou cujo

conteúdo é a regulação do uso da força em dada sociedade” (ANDRADE, 2004,

p. 60). Como foi visto no formalismo jurídico, Hans kelsen é um dos principais

autores que trabalham o elemento coação como essencial ao conceito de Direito.

Numa passagem de sua obra “Teoria Geral do Direito e do Estado” o autor

esclarece que o conceito de Direito em termos sociais é caracterizado como uma

“técnica social específica de uma ordem coercitiva”. E como técnica social, é

assim definida (KELSEN, 1998, p. 27): “Consiste em obter a conduta social

desejada dos homens através da ameaça de uma medida de coerção a ser

aplicada em caso de conduta contrária”.

Resgatando o sentido Contratualista do Estado, a coerção

surge para limitar o exercício indiscriminado da força individual, sendo ela válida

quando atribuída a um grupo legitimamente constituído que, utilizando o

monopólio desta força, o faz em favor de toda a coletividade.

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3.2.2 Teoria das fontes do Direito

Como se trata da teoria das fontes do Direito, isto é, das

bases onde o Direito se forma, necessário se faz, segundo Bobbio, a existência

de um ordenamento jurídico composto por dois fatores. O primeiro exige que seja

um ordenamento complexo, isto é, “aquele no qual existem várias fontes”. Em

segundo, que seja um ordenamento hierárquico, isto é, aquele ordenamento no

qual existem várias fontes e que são colocadas em planos diferentes, possuindo

conseqüentemente valores diferenciados (BOBBIO, 1995, p. 162).

Em sua definição técnica, Bobbio esclarece que as fontes do

Direito “são aqueles fatos ou aqueles atos aos quais um determinado

ordenamento jurídico atribui a competência ou a capacidade de produzir normas

jurídicas”. Neste sentido, as fontes do Direito num ordenamento jurídico complexo

e hierarquizado pressupõe a lei como fonte mais alta, sendo ela a “manifestação

direta do poder soberano do Estado” estando os outros elementos, atos e fatos

produtores do Direito numa posição de subordinação à lei7. (BOBBIO, 1995,

p. 164).

3.2.3 Teoria da norma jurídica

No que se refere ao conceito de norma jurídica é

importante salientar a teoria imperativa que concebe o Direito como um

“mandado”, fazendo-o no estrito cumprimento da norma. Neste sentido, os

positivistas defendem que a norma jurídica contém a estrutura de um comando,

isto é, na concepção legalista-estatal do Direito a “lei como expressão do poder

normativo do Estado” manifesta um comando que “é uma manifestação

espontânea da convicção jurídica”. (BOBBIO, 1995, p. 181).

7 Não perdendo de vista o objetivo do trabalho e ao mesmo tempo uma análise crítica. Cabe destacar o problema das fontes do Direito, pois a uma nítida diferenciação entre o aspecto da fonte do Direito enquanto lei (perspectiva positivista) e as fontes do Direito enquanto costume (perspectiva histórica). Para mais informações consultar REALE, Miguel. Lições preliminares do Direito, 1994 (cap. XII, XIII, XIV).

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Continuando, Bobbio entende que a teoria imperativa da

norma não surgiu como o positivismo jurídico; esta advém de uma longa tradição

da cultura jurídica ocidental. Deste modo, necessário se faz, distinguir duas

expressões: a noção de comando e a noção de conselho. O primeiro exerce um

caráter de subordinação à autoridade que o emite, tendo o receptor do comando a

obrigatoriedade de seu cumprimento, a responsabilidade pelo ato exercido caberá

a autoridade. Já a noção de conselho possui a faculdade do seu cumprimento,

isto é, ao indivíduo é dada a liberdade de escolha, assumindo desta forma, a

responsabilidade pelo cumprimento ou não do ato. (BOBBIO, 1995, p. 183 e

seg.).

3.2.4 Teoria do ordenamento jurídico

Como teoria própria dos positivistas a teoria do ordenamento

jurídico encontra suas origens no final do século XVIII e início do século XIX. Ela

se fundamenta no pressuposto, já visto no item 2.3 da presente pesquisa, de “dar

unidade a um conjunto de normas fragmentárias, afastando o arbítrio e as

incertezas”. Neste sentido, a teoria do ordenamento jurídico irá encontrar em

Hans Kelsen o seu mais alto grau de desenvolvimento e, por outro lado, o próprio

declínio, pois é na fundamentação teórica do ordenamento jurídico que estão

localizadas as principais críticas ao projeto positivista de Kelsen. (SCREMIN,

2004, p. 153).

A teoria do Ordenamento Jurídico se fundamenta em três

características, a saber: a unidade, a coerência e a completude do Direito. No que

se refere à unidade do ordenamento, é importante destacar que este aspecto é

exclusivo da concepção positivista, uma vez que, permite pensar as normas

jurídicas como pertencentes a um determinado sistema normativo que se auto-

regula (BOBBIO, 1995, p. 199). Mas o sistema apresenta-se fechado, pois como

se percebe, o pressuposto de validade desta unidade no ordenamento jurídico é

descrito por Kelsen através da norma fundamental. Numa passagem da obra

“Teoria pura do Direito” Kelsen (2003, p. 228) assim afirma:

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A norma fundamental é o fundamento de validade de todas as

normas pertencentes a uma e mesma ordem jurídica, ela

constituía unidade na pluralidade destas normas. Esta unidade

também se exprime na circunstância de uma ordem jurídica poder

ser descrita em proposições jurídicas que não contradizem.

Nesta passagem Kelsen já expõe a necessidade dos outros

dois elementos da teoria do ordenamento jurídico: a coerência e a completude.

No primeiro as normas não se contradizem, pois quando ocorrer o fato de existir

duas normas que se contradigam, uma delas não possui validade perante o

sistema, pois as normas obedecem a uma hierarquia e possuem critérios

distintivos entre si. Já o caráter de completude do Direito está no fato de que,

neste sistema não há lacunas. “O Direito vigente é sempre aplicado” (Kelsen,

2003, p. 273). O trabalho do jurista consistiria pois, em buscar a integração do

próprio ordenamento. (BOBBIO, 1995, p. 202).

3.2.5 Teoria da interpretação mecanicista

Aqui é importante esclarecer que a interpretação dos

positivistas jurídicos é vista como o método pelo qual a dogmática jurídica

descreve a lei. A interpretação daqueles tem a função de “reproduzir o Direito, ou

seja, de explicar o conteúdo das normas jurídicas já dadas, e não produzi-las”

(SCREMIN, 2004, p. 153).

Norberto Bobbio esclarece que, na atividade relativa ao

Direito, existem dois momentos: “o momento criativo (...), que encontra sua

manifestação na legislação” e o momento teórico, que é utilizado pela dogmática

jurídica. A principal crítica realizada pelos antipositivistas a esta técnica de

interpretação consiste em acusá-la de “atividade puramente declarativa ou

reprodutiva de um Direito preexistente, isto é, de um conhecimento puramente

passivo e contemplativo de um objeto já dado”. Ao contrário de um Direito que

carece de uma interpretação ativa e produtiva do Direito. (BOBBIO, 1995, p. 211).

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Por isso, o positivismo jurídico impõe severos limites à

atividade interpretativa, devendo esta, ser segundo Bobbio: textual ou

extratextual. As duas têm como objetivo descrever a vontade que o legislador

expressou. A primeira corresponde aos métodos tradicionais que objetivam

integrar a lei, que são: léxico (gramatical); teleológico (finalidade); sistemático; e

histórico. A segunda consiste no método de interpretação analógica que é

atividade racional puramente lógica, “que se limita a evidenciar certas

conseqüências já implicitamente presentes nas premissas dadas” (BOBBIO,

1995, p. 216).

O positivismo jurídico, enquanto teoria se fundamenta em

diversos juízos fáticos que constituem o Direito vigente como “um conjunto de

normas de conduta que direta ou indiretamente são formuladas e aplicadas pelo

Estado” (ANDRADE, 2003, p. 61).

3.3 POSITIVISMO JURÍDICO ENQUANTO IDEOLOGIA

O positivismo jurídico enquanto ideologia refere-se ao Direito

enquanto fenômeno social. Neste sentido, cabe destacar o que vem a ser a

Ideologia como categoria analítica. Luiz Fernando Coelho (2000, p. 1) assim

define o termo:

Emprego a palavra Ideologia no sentido de categoria crítica. Não é

um esquema do pensamento formal, “a priori” e independente da

experiência (sentido Kantiano); nem uma estrutura objetiva e

essencial que se impõe ao conhecimento (sentido

fenomenológico); mas uma construção teórica que tem sua base

na realidade social, dela deriva, mas ao mesmo tempo é voltada

para a realidade, no sentido de atuar como parte dessa mesma

realidade, conscientizando dos seus problemas e do alcance

dessa participação.

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Percebe-se, com isso, que a categoria ideologia, possui sua

base em dois campos distintos: um refere-se à concepção enquanto teoria a

segunda diz respeito ao campo da práxis8

A partir desta definição percebe-se que a ideologia não é

somente um critério subjetivo ou puramente cognitivo (teoria) da realidade social,

mas um termo que possui profundas aplicações práticas. A ideologia assim, é

vista como produtora desta realidade. A filósofa Marilena Chauí (1985, p. 31), na

ótica do materialismo histórico dialético de Marx, assim define a categoria:

A ideologia não é sinônimo de subjetividade, mas é um fato social

justamente porque é produzida pelas relações sociais, possui

razões muito determinadas para surgir e se conservar, não sendo

um amontoado de idéias falsas que prejudicam a ciência, mas

uma certa maneira da produção das idéias pela sociedade, ou

melhor, por formas históricas determinadas das relações sociais.

Destas concepções de ideologia, pretende-se demonstrar

que o seu emprego para o positivismo jurídico possui dois momentos: enquanto

categoria teórica9 e enquanto categoria da práxis conforme os críticos do

positivismo jurídico.

A ideologia do Direito enquanto teoria, está inserida nas

concepções atribuídas ao estudo do Direito e à sua delimitação enquanto estudo

dos juízos de fato ou de valor.

Kelsen, numa obra escrita em 1929 intitulada “A doutrina do

Direito Natural e o positivismo jurídico”10 estabelece um intenso debate entre o

Direito Natural e o Direito Positivo, apresentando os primeiros apontamentos da

teoria pura do Direito.

8 Utiliza-se aqui conceito de práxis como ação voluntária que procura alcançar objetivos, embora por vezes, também inclua aquelas que em si mesma fazem parte do fim visado. (Dicionário Oxford de Filosofia, 1997)

9 Percebe-se que tanto o positivismo jurídico quanto o jusnaturalismo possuem esta categoria ideológica, pois amplos crêem em valores cognitivos absolutos. (Neutralidade, metafísica).

10 Esta obra encontra-se no apêndice da obra Teoria Geral do Direito e do Estado, traduzida por Luís Carlos Borges e editada pela Martins Fontes em 1990.

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Nesta monografia, Kelsen afirma que a teoria pura do Direito

pretende ser uma teoria monista, isto é, contra a concepção da existência de duas

realidades jurídicas, (Direito objetivo, Direito subjetivo; Direito e justiça, Direito

Positivo e Direito Natural) . Para o autor, a teoria pura do Direito somente irá

analisar o Direito enquanto realidade concreta, positiva. Esclarece ainda que

existe uma limitação na idéia de Direito Natural, visto que, para se tornar

aplicável, dependerá primeiro do conhecimento e da vontade dos homens, e

depois da necessidade de “transmutação para uma realidade jurídica concreta”,

isto é, passar por um processo de positivação. (KELSEN, 1998, p. 567).

Neste sentido, Kelsen quer demonstrar o caráter anti-

ideológico que a teoria pura do Direito pretende ser, fundamentando este, na idéia

da “ciência como cognição (teoria) tendo como propósito sempre a tendência

imanente de revelar seu objeto”, neste caso, o Direito Positivo. A ideologia para o

autor ganha a seguinte conotação:

(...) a ideologia política encobre a realidade, seja transfigurando-a

a fim de conservá-la ou defendê-la, seja desfigurando-a a fim de

atacá-la, destruí-la ou substituí-la por outra realidade. Toda

ideologia política tem a sua raiz na volição, não na cognição, no

elemento emocional da nossa consciência, não no racional; ela se

origina de certos interesses, ou antes, de outros interesses que

não a verdade (KELSEN, 1998, p. XXXII).

Seguindo este raciocínio, Kelsen afirmará que a doutrina do

Direito Natural representa para o positivismo jurídico uma ideologia. Isto porque o

Direito Natural adquire características ideais, metafísicas, transcendentais

incompatíveis com o sistema monista do Direito Positivo. Neste sentido, a

doutrina do Direito Natural passará a ter uma “tendência de legitimar o Direito

Positivo como justo; como o que é humanamente possível”, tendo a pretensão de

validar o sistema na crença de uma verdade absoluta e transcendental (KELSEN,

1998, p. 612).

Mas o próprio autor confessa a dificuldade de separar os

dois posicionamentos. Percebe-se a nítida defesa de Kelsen ao positivismo

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jurídico. Mas é fato que o próprio positivismo jurídico também apresenta o caráter

ideológico, pois na concepção positivista de ciência, a busca da verdade ganha

um caráter absoluto. Neste sentido, Wolkmer (1995, p. 151) assim define a

ideologia do positivismo jurídico:

A ideologia do positivismo jurídico se contrapõe à concepção

metajurídica jusfilosófica, na medida em que rejeita toda e

qualquer dimensão “a priori”. Descarta, assim, princípios e juízos

valorativos em função de uma suposta neutralidade axiomática, de

um rigoroso experimentalismo e, ao mesmo tempo, de um

tecnicismo formalista.

Este mesmo pressuposto da neutralização dos valores pela

ciência, entrará como mais uma crítica ao sentido ideológico do positivismo

jurídico. Entende-se por neutralização “o processo pelo qual os valores parecem

perder suas características intersubjetivas na medida em que dão a impressão de

valer independentemente de situações ou contextos”. (FERRAZ, JR. 1998,

p. 182).

Com isso, tanto a questão da imparcialidade do juiz, quanto

a absoluta certeza da ciência, enquanto método para a busca da verdade, são

questionados e ganham severas críticas dos autores pós-positivistas.

Por outro lado, existe ainda a análise da Ideologia do Direito

enquanto práxis. Nela os autores afirmam que o positivismo jurídico se

caracterizou como ideologia, pois se tornou produto duma sociedade capitalista

que aperfeiçoou seu domínio na esfera econômica e política. Conforme exposto

acima, Elisa A Mendez de Smith (1982, p. 121) assim conceitua a Ideologia do

Direito enquanto práxis:

Si todo acto de gobierno, de legislación o de jurisdicción; si todo

acto normativo que expresa la denominada “voluntad del Estado”

responde a una determinada actitud política – a la actitud política

de un grupo dominante, fácil es inferir que las normas creadas por

esos actos en determinado momento histórico son también, en

mayor o menor medida, el producto de un cierta concepción de la

vida social y de sus circunstancias históricas concretas.

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Ainda na perspectiva do positivismo jurídico enquanto

ideologia cabe, acrescentar a posição adotada por Norberto Bobbio e demais

positivistas contemporâneos. O positivismo jurídico enquanto ideologia poderá

receber várias denominações, mas entre elas se destaca o positivismo ético

através de suas duas correntes. O positivismo jurídico ético extremista ou forte e

o positivismo jurídico moderado ou fraco. O adjetivo “ético” dado ao positivismo é,

segundo Bobbio, o que melhor representa a categoria “positivismo enquanto

ideologia”, pois aqui, o positivismo não é mais visto como doutrina científica

(método) nem como um plano teórico abstrato, mas como “comportamento

avaliativo que o homem assume face a uma realidade, constituindo num conjunto

de juízos de valores”(sic). (BOBBIO, 1995, p. 225).

O primeiro consiste em afirmar “o dever absoluto e

incondicional de obedecer à lei enquanto tal” verificando-se que este

posicionamento encontra seu fundamento na origem histórica do Estado

Moderno. A lei se torna fonte última do Direito e ao Estado pertence o monopólio

exclusivo da aplicação e da produção jurídica (BOBBIO, 1995, p. 226).

Com isso, a obediência incondicional ao Estado torna-se um

preceito moral e se legitima através de quatro concepções na cultura jurídica, a

saber: 1) concepção cética: “a justiça é a expressão da vontade do mais forte”; 2)

concepção convencionalista da justiça: “a justiça é o que os homens consideram

justiça”; 3) concepção sagrada da autoridade: “o poder de mandar se funda num

carisma”; 4) concepção de Estado ético: “pode ser considerada como a

transposição em termos racionais, ou como a laicização da concepção sagrada

de autoridade” (BOBBIO, 1995, p. 229).

Por outro lado o positivismo ético moderado ou fraco,

também apresenta seu fundamento na obediência à lei, mas não de forma

absoluta e incondicional como a anterior. Aqui o significado da obediência da lei

tem fundamento na existência de uma ordem social. A lei aqui, não é vista como

doutrina da coação, mas como elemento necessário à organização social. Neste

sentido, o positivismo ético moderado apresenta duas características: a

generalidade da lei e a abstração da lei.

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A primeira caracteriza a lei num sentido geral. É que a lei

não disciplina o comportamento de uma única pessoa, mas de modo geral, a lei

deve ser respeitada por todos. Além disso, ainda garante às pessoas à igualdade

de tratamento, também chamada de igualitarismo formal (BOBBIO, 1995, p. 232).

A segunda caracteriza a lei num sentido abstrato, isto é, o

comando nela contido não se refere a uma ação singular, mas a um conjunto de

ações. Isto porque a lei deverá atingir um elemento fundamental para o Direito, ou

seja, a necessidade que a ordem possa ser conservada. Acresce ainda o status

de certeza jurídica, que “consiste na possibilidade de cada pessoa poder, no

âmbito de um sistema normativo, prever as conseqüências do próprio

comportamento”. (BOBBIO, 1995, p. 232).

Tom Campbell, professor da Universidade de Berkey num

artigo denominado “O sentido do Positivismo Jurídico” (tradução nossa)11, trabalha

com a construção do positivismo ético demonstrando ser este uma “teoria ética

relativa a uma conduta juridicamente relevante para os cidadãos, legisladores e

juizes”12. Segundo ele, o positivismo ético é um modelo, uma justificativa para a

construção de um sistema jurídico que possibilite a aproximação do sistema

autônomo de regras jurídicas, com a parte necessária de qualquer sistema

político. Define-se assim um novo sentido à concepção do positivismo jurídico:

El sentido del positivismo jurídico, así entendido, es recomendar

que los sistemas jurídicos sean desarrollados de tal forma que se

maximicen los beneficios sociales y políticos de tener un sistema

de reglas de mandato rápidamente identificable, de tal claridad,

precisón y alcance que pueden habitualmente entenderse y

aplicarse sin recurrir a juicios morales y políticos controvertidos

(CAMPBEL, 2002, p. 308).

Neste sistema autônomo de regras jurídicas, o autor se

refere aos modelos democráticos do positivismo jurídico, entre as quais, a

11 Artigo publicado na revista DOXA – “Cadernos de Filosofia do Direito” do departamento de filosofia do Direito da Universidade de Alicante na Espanha. Também está disposto na versão “online” no sítio da Universidade de Alicante.

12 Tradução realizada pelo autor do trabalho.

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concepção de Estado democrático de Direito, aonde as regras são elaboradas e

aplicadas pelos poderes legitimamente constituídos.

3.4 PÓS-POSITIVISMO

O Direito Positivo como resultado da doutrina do positivismo

jurídico atinge o auge no início do século XX. Mas no decorrer deste mesmo

século, os mecanismos de legitimação da norma jurídica mostram-se ineficazes,

tendo em vista a representação do Estado como o único modelo legítimo de

produção jurídica. A ineficiência dos poderes constituídos e a complexificação de

suas atribuições demonstram o esgotamento do modelo (WOLKEMER, 1997,

p. 24).

Surge então diversos questionamentos a respeito do modo

como foi construído e operacionalizado este Direito. Os pressupostos e

fundamentos jurídicos também são questionados e os elementos que constituem

a crítica deste modelo propõe-se a repensar as fontes de produção jurídica do

Direito, tendo em vista a efetiva adequação às necessidades e aos interesses da

sociedade (ANDRADE, 2003, p. 68).

As “verdades” do positivismo jurídico, principalmente,

aquelas que dizem respeito à segurança jurídica e à certeza de suas formas e

conceitos, passam a ser profundamente revistos. O modelo de ciência do Direito

proposto por Hans Kelsen recebe inúmeras críticas, pois os críticos associam a

sua formulação teórica como o resultado jurídico-prático dos regimes totalitários.

Denunciam, desta forma, a necessidade de uma revisão do postulado teórico do

positivismo jurídico. (SCREMIN, 2004, p. 152).

Neste sentido surgem movimentos que irão questionar a

base e a legitimidade desse modelo. Os que se destacam para o presente

trabalho são: a contribuição da Teoria Crítica ao Direito e a perspectiva do

Pluralismo Jurídico.

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3.4.1 Teoria Crítica do Direito

No início do século XX na cidade de Frankfurt é criado o

Instituto de Pesquisas Sociais (1923). Esta instituição congregava diversos

pensadores, dentre os quais destaca-se Hokheimer, Adorno, Habermas, Marcuse

e Arendt que buscavam “distanciar-se do marxismo ortodoxo, mas sem deixar de

compartilhar metodologicamente de ideário utópico, dialético, crítico,

revolucionário e emancipador” (WOLKMER, 2002, p. 5). Suas contribuições nas

áreas da Filosofia, Sociologia, Psicologia tinham como pressuposto básico a

contraposição da teoria tradicional esclarecendo as bases para a teoria crítica.

A teoria tradicional estava fundamentada num modelo de

verdade absoluta aceita predominantemente em determinado momento histórico

(início do século XX). A prática científica baseava-se nos princípios do idealismo

individual, do racionalismo liberal e do formalismo positivista. Com isso, a também

denominada “Escola de Frankfurt” através da construção crítica realizada,

questiona os fundamentos dessa teoria tradicional e propõe novos modelos que

irão rever os problemas decorrentes da civilização ocidental do início no século

XX, sujeita à “crescente complexidade dos conflitos, à heterogeneidade

socioeconômica, à concentração e centralização do capital, à expansão do

intervencionismo estatal”. (WOLKMER, 2002, p. 2).

Nesse sentido, a teoria crítica poderá ser descrita como um

método que se propõe, além de descrever a realidade, pretende intervir nela.

Como bem lembra Antônio Carlos Wolkmer (2002, p. 5):

Pode-se conceituar teoria crítica como o instrumental pedagógico

operante (teórico-prático) que permite a sujeitos inertes e

mitificados uma tomada histórica de consciência, desencadeando

processos que conduzem à formação de agentes sociais

possuidores de uma concepção de mundo racionalizada,

antidogmática, participativa e transformadora.

A teoria crítica no campo do Direito, objetivou desconstruir a

lógica linear da estrutura do saber jurídico fundamentado nos dois modelos

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hegemônicos do racionalismo: “metafísico-natural (jusnaturalismo) e o lógico-

instrumental (positivismo jurídico). (WOLKMER, 2002, p. 2).

Assim a teoria jurídica crítica pressupõe a “formulação

teórico-prática (...) sob a forma do exercício reflexivo capaz de questionar e de

romper com o que está disciplinadamente ordenado e oficialmente consagrado”

(WOLKMER, 2002, p. 19).

Luis Alberto Warat assinala alguns objetivos da constituição

de uma “teoria jurídica crítica” que pretendeu analisar e transformar o fenômeno

jurídico em propostas metodológicas distintas, como: a) “mostrar os mecanismos

discursivos a partir dos quais a cultura jurídica converte-se em um conjunto

fetichizado de discurso”; b) “demonstrar como as funções políticas e ideológicas

das concepções normativistas do Direito e do Estado encontram-se apoiadas na

falaciosa separação do Direito e da Política”; c) “rever as bases epistemológicas

que comandam a produção tradicional da ciência do Direito, demonstrando como

as crenças teóricas dos juristas em torno da problemática da verdade e da

objetividade cumprem a função de legitimação” do poder; d) “tentar recolocar o

Direito no conjunto das práticas sociais que o determinam” (WARAT, 1983, p. 40).

Percebe-se que o postulado da teoria crítica se insere num

contexto maior, isto é, nos fundamentos da modernidade. Max Weber em sua

obra “Ciência e Política: duas vocações” é um dos primeiros no início do século

XX a questionar o racionalismo do mundo ocidental e suas principais

conseqüência. A partir daí, uma série de refutações foram realizadas,

principalmente, nos aspectos relacionados aos fundamentos da ciência. Dentre

estes, se destaca o aspecto da neutralidade científica que, como já vista, adquire

conotação ideológica.

3.4.2 Pluralismo Jurídico

Embora não esteja ligado historicamente aos postulados da

modernidade, o pluralismo jurídico encontra sua raiz na sociologia do Direito

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principalmente nos trabalhos de Eugen Ehrlich. O pluralismo estabelece como

crítica à concepção monista de Estado, visto que, o Direito ganha a conotação de

“vivo” uma vez que “emerge dinamicamente das flutuações da vida social”, não

concebendo mais o Estado como único e exclusivo produtor de normas

(WOLKMER, 1992, p. 178).

É no contexto da Modernidade com a ruptura do modelo da

teoria tradicional com seus postulados dogmático-reducionistas que o movimento

do pluralismo jurídico está inserido. O seu aspecto novo está ligado ao fato de

agir e pensar a prática jurídica.

Este “novo” pluralismo jurídico apresenta seus fundamentos

nas formas de emancipação social. Seu surgimento marca a origem de um novo

movimento, iniciado logo após a segunda guerra mundial. Boaventura de Souza

Santos (2002, p. 85) caracteriza como movimentos contra-hegemônicos, no

sentido de marcarem uma positivação contrária aos modelos de uma democracia

liberal-representativa. Onde as regras democráticas são submetidas ao jogo de

interesses políticos e econômicos, a restritos grupos, que por sua vez,

estabelecem uma relação estritamente passiva e consumista com os cidadãos na

disputa eleitoral.

Nessa perspectiva o pluralismo jurídico se caracteriza como

um movimento que se “pressupõe pensar e adequar uma proposta prático-teórica

tendo em conta as condições existenciais, materiais e culturais refletidas pela

globalidade” e que possuem como base o aspecto societário dos movimentos

sociais e a legitimidade da sociedade civil numa concepção democrático-

participativa (WOLKMER, 1992, p.157). Com isso o pluralismo jurídico é assim

definido:

O novo pluralismo jurídico, de características participativas, é

concebido a partir de uma nova racionalidade e uma nova ética,

pelo refluxo político e jurídico de novos sujeitos – os coletivos; de

novas necessidades desejadas – os direitos construídos pelo

processo histórico; pela reordenação da sociedade civil – a

descentralização normativa do centro para a periferia; do Estado

para a sociedade; da lei para os acordos, os arranjos, a

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negociação. É, portanto, a dinâmica interativa de um espaço

público aberto e democrático (WOLKMER, 1992, p. 157).

Um dos desdobramentos desse movimento foi o chamado

Direito Alternativo que mobiliza juízes, advogados, promotores e juristas numa

revisão crítica de suas funções e principalmente dos métodos e procedimentos

adotados pelo direito para a efetiva aplicação das leis em busca dos interesses

coletivos. Amílton Bueno de Carvalho (1993, p. 10), assim define sua

aplicabilidade:

A alternatividade luta para que surjam leis efetivamente justas,

comprometidas com os interesses da maioria da população, ou

seja, realmente democráticas. E busca instrumental interpretativo

que siga a mesma diretiva. O que a alternatividade não reconhece

é a identificação do direito tão-só com a lei, nem que apenas o

Estado produz direito, o que é diverso da negativa à lei.

Percebe-se desde modo, que o Direito Alternativo como

movimento, com fundamentos no Pluralismo jurídico é um dos movimentos mais

opositores ao positivismo jurídico na sua ampla definição.

Nesta concepção do Pluralismo Jurídico resulta num

processo que possibilita o avanço das lutas populares, revendo conceitos e as

técnicas de um direito tradicional, estabelecendo um posicionamento crítico na

prática jurídica (MELO, 2001, p. 83).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente monografia teve como proposta de trabalho

descrever e caracterizar o Positivismo jurídico. Partiu-se do princípio que este

movimento determinou a forma de “pensar e agir” das gerações no século XX.

Bobbio descreveu que este movimento resultou numa filosofia dos juristas.

As indagações referentes ao tema tiveram como objetivo

responder as seguintes perguntas: o que é o positivismo jurídico? Como ele se

caracteriza? E qual sua origem? Deste modo o objetivo central do trabalho estava

em descrever a origem, os pressupostos e a caracterização do positivismo

jurídico.

No que diz respeito ao contexto histórico, o positivismo é

analisado a partir das definições do Direito positivo, pois tal expressão só ganhou

esta conotação a partir do início do século XX através das contribuições dos

juristas ligados ao Círculo de Viena.

Deste modo o primeiro capítulo da monografia teve como

objetivo demonstrar os pressupostos e as origens do Direito Positivo, do período

clássico ao final da idade média. Pois, a partir do advento do Jusnaturalismo

Moderno com o predomínio da razão nas atividades humanas, o Direito Positivo

exerce um predomínio e se sobrepõe ao Direito Natural, evidenciando o

nascimento do Positivismo Jurídico.

Pode-se observar este movimento nos seguintes aspectos:

1) primeiro na compreensão racional do Direito, visto como método de estudo.

Destacando as atividades dos glosadores até o processo de codificação,

evidenciando a consolidação da Dogmática Jurídica; 2) segundo na compreensão

do Estado Moderno – visto como instituição que monopolizou a produção do

Direito como forma de legitimar o poder; 3) terceiro na compreensão do Direito

enquanto análogo ao conceito de lei escrita, visto no processo de codificação.

Estes elementos de forma genérica representam os pressupostos e a origem do

positivismo jurídico, objeto da presente pesquisa.

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Com isso as duas primeiras hipóteses da pesquisa: a) O

surgimento dos pólos sociais (cidades) é um elemento causador do surgimento do

positivismo jurídico; b) a falta de segurança e a necessidade de organização do

Estado contribuíram para o surgimento do Positivismo Jurídico; são confirmadas.

A primeira evidencia que através da necessidade de organizar a sociedade e

estabelecer normas sociais para o mútuo convívio foram fundamentais para o uso

do direito positivo como ato de coerção. Deste modo a segunda hipótese de

pesquisa também é comprovada. Visto que a organização social foi necessária

devido à falta de segurança existente entre as pessoas. Motivo este, que fez a

sociedade civil criar através de um pacto, a sociedade política (Estado) que

legitima o poder coercitivo para estabelecer a ordem e a harmonia, definindo,

portanto, a concepção básica do Positivismo Jurídico, isto é, a equivalência dos

termos Estado e Direito.

No segundo capítulo, percebe-se que os juristas do início do

século XX, além de positivistas jurídicos na acepção da palavra, eram positivistas

também no sentido filosófico, pois o emprego do método científico no século XIX

possibilitou todo o desenvolvimento socioeconômico da nova burguesia européia.

No campo do Direito nota-se a importância do positivismo

filosófico, principalmente, por influenciá-lo a adquirir uma concepção positivista de

sistema, não só enquanto estrutura formal fechada e acabada, mas também,

enquanto instrumento metódico do pensamento jurídico (FERRAZ JUNIOR, 1980,

p. 35).

Cabe ainda salientar que as influências do positivismo

filosófico no Brasil são ainda mais predominantes. O próprio processo de

Proclamação da República, como também, as primeiras faculdades de direito

tiveram o marco das idéias positivistas. O positivismo no Brasil esteve presente

tanto no campo ideológico, influenciando na política (atuação dos militares), como

na formação da nova elite intelectual brasileira (ALONSO, 1996, p. 116). No que

diz respeito estritamente ao mundo jurídico, salienta Soares (1992, p. 372),

distinguir-se-ão eminentemente nomes como Tobias Barreto, Sílvio Romero,

Clóvis Beviláquia, Pontes de Miranda, Pedro Lessa entre outros, todos ligados ao

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positivismo filosófico, alguns dos quais, tendo evoluído para outras correntes

confluentes do pensamento.

Portanto, as contribuições do Positivismo Filosófico ao

positivismo jurídico foram importantes por estabelecer todo um modo de pensar e

agir diante da realidade jurídica, que está ainda fortemente presente no início do

século XXI, sofrendo inúmeras críticas.

Deste modo, a terceira hipótese: c) o positivismo filosófico

enquanto corrente do pensamento científico contribui para a consolidação do

positivismo jurídico; também foi comprovada, demonstrando que as contribuições

do positivismo filosófico auxiliaram a teoria jurídica no início do século XX, a

propor o estudo do direito enquanto ciência. Através da negação de critérios

axiológicos e metafísicos.

O terceiro e último capítulo apresentou as características e

os elementos que constituem o positivismo jurídico. Dentre estes elementos

destaca-se a concepção do positivismo jurídico enquanto ciência jurídica, pois

este estabeleceu ao direito à concepção de sistema fechado. A partir deste ponto,

o direito ganha autonomia e estabelece seus próprios critérios de

regulamentação.

Estes dois elementos (noção de sistema fechado e auto-

regulativo) caracterizam o fim do projeto positivista de ciência. O positivismo

jurídico passa a receber inúmeras críticas. Até o próprio Kelsen afirma saber da

dificuldade de separar a Ciência Jurídica da influência valorativa e política.

O positivismo jurídico, ao longo de sua história, desenvolveu

uma forma de pensar a realidade jurídica tão peculiar, que caracterizá-lo somente

enquanto determinada corrente do pensamento jurídico implicaria num grande

reducionismo.

Neste sentido, Norberto Bobbio estabeleceu uma

classificação para a expressão “positivismo jurídico”, podendo perceber a

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influência de tal expressão em três características distintas. Seja ela enquanto

método, enquanto teoria, ou enquanto ideologia.

Desta classificação o próprio autor admite que o positivismo

jurídico enquanto método será necessário “adotá-lo para se fazer ciência jurídica

ou teoria do direito. Se não for adotado, não se fará ciência, mas filosofia ou

ideologia”.

No que concerne a última hipótese de pesquisa, d) o

positivismo jurídico constitui um método de estudo do direito; verifica-se que o

positivismo jurídico não é somente um método de estudo do direito. Ao longo da

tradição da cultura jurídica ocidental, o positivismo jurídico mostrou-se como uma

forma específica de pensar e através dessa forma apresentou no campo prático

algumas conseqüências. Por este fator é que a classificação apresentada por

Bobbio distingue bem as três características, mas que devido ao processo

histórico ambas tiveram sua ligação.

Relativo às correntes e movimentos contrários ao

positivismo jurídico, destacou-se no presente trabalho, a teoria crítica como

movimento de ruptura a concepção do cientificismo positivista. E a possibilidade

da adoção a uma nova forma de pensar e agir.

Ao final deste estudo, constata-se que através dessa

abordagem panorâmica do Positivismo Jurídico, o pesquisador adquiriu um

conhecimento, embora superficial, mas da gênese do direito positivo moderno,

isto é, a origem de sua atual crise, e os possíveis caminhos para outras formas da

experiência jurídica. Pretende-se, portanto, dar continuidade a este estudo no

avanço dos movimentos e dos novos modelos “críticos” da experiência jurídica.

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