47
1 ÍNDICE I – Introdução .....................................................................................................3 II – Peculato 1 – Histórico ....................................................................................................4 2 – Conceito ....................................................................................................5 3 – Objetividade Jurídica .................................................................................9 4 – Sujeito ativo .............................................................................................11 5 – Sujeito Passivo ........................................................................................12 6 – Conduta: Pressuposto ..............................................................................14 7 – Elemento Objetivo ...................................................................................15 8 – Elemento Subjetivo .................................................................................21 9 – Objeto Material ........................................................................................23 10 – A conduta ..............................................................................................25 11 – Consumação e Tentativa .......................................................................25 12 – Distinção e Concurso .............................................................................27 13 - Extinção da Punibilidade e atenuação de pena ......................................34

ÍNDICE I – Introdução II – Peculato 1 – 2 – 3 · 2005. 2. 22. · O Direito Romano promoveu o peculato a crime autônomo não em razão da qualidade do sujeito agente,

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Page 1: ÍNDICE I – Introdução II – Peculato 1 – 2 – 3 · 2005. 2. 22. · O Direito Romano promoveu o peculato a crime autônomo não em razão da qualidade do sujeito agente,

1

ÍNDICE

I – Introdução .....................................................................................................3

II – Peculato

1 – Histórico ....................................................................................................4

2 – Conceito ....................................................................................................5

3 – Objetividade Jurídica .................................................................................9

4 – Sujeito ativo .............................................................................................11

5 – Sujeito Passivo ........................................................................................12

6 – Conduta: Pressuposto ..............................................................................14

7 – Elemento Objetivo ...................................................................................15

8 – Elemento Subjetivo .................................................................................21

9 – Objeto Material ........................................................................................23

10 – A conduta ..............................................................................................25

11 – Consumação e Tentativa .......................................................................25

12 – Distinção e Concurso .............................................................................27

13 - Extinção da Punibilidade e atenuação de pena ......................................34

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III - Peculato-furto ..........................................................................................28

IV – Peculato-culposo .......................................................................................31

V – Peculato Mediante Erro de Outrem

1 – Conceito ........................................................................................................35

2 – Objetividade Jurídica ....................................................................................37

3 – Sujeitos do delito ..........................................................................................37

4 – Tipo Objetivo ................................................................................................38

5 – Tipo Subjetivo ..............................................................................................40

6 – Consumação e tentativa ................................................................................41

7 – Distinção .......................................................................................................42

VI – Conclusão ..................................................................................................43

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho destina-se a apresentar o crime de

peculato apresentando uma acurada pesquisa no que tange à sua objetividade

jurídica, sujeitos ativo e passivo, condutas que ensejam o delito, elementos

objetivo e subjetivo, consumação e tentativa, e outros aspectos importantes para

bem definir o tema abordado.

Outossim, fez-se necessária a pesquisa das subdivisões do

crime de peculato: peculato-apropriação, peculato-desvio, peculato-furto,

peculato-culposo, peculato mediante erro de outrem.

Para a elaboração do trabalho, foi fundamental a pesquisa em

doutrinas que envolvem toda produção de estudos e obras nos quais são

encontradas opiniões de juristas sobre o presente tema . Ademais, foi pesquisada

a legislação inerente ao crime de peculato, bem como jurisprudências que tratam

de recentes julgados sobre o tema em análise; com isso, a pesquisa apresenta-se

atualizada.

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PECULATO

Histórico

O crime de peculato já era conhecido no Direito Romano,

onde a subtração de coisas do Estado era reprimida como peculatus ou

depeculatos. Daí o nome peculatus derivado de pecus – gado - que foi meio de

troca ou permuta nas sociedades primitivas sendo, aliás, as primeiras moedas

feitas de pele de animal, trazendo depois as de metal, a imagem de um boi.1

O Direito Romano promoveu o peculato a crime autônomo

não em razão da qualidade do sujeito agente, que poderia ser funcionário

público ou particular. Mas pela condição da coisa desviada ou subtraída, coisa

pública (“res publicae”) ou sagrada (“res sacrae”).2

As penas aplicadas eram severas, o estatuto de Florença

chegava a ordenar que aquele que fugisse com o dinheiro do erário público fosse

amarrado à cauda de um burro e arrastado pelas ruas da cidade.3

1 Costa Jr., Paulo José – Comentários ao Código Penal, Vol. 03.2 Ibid.3 Ibid.

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Conceito

Peculato é um crime contra a administração pública que está

tipificado nos artigos 312 e 313 do Código Penal, inserido nos crimes praticados

por funcionário público contra a administração geral.

Art. 312 – “Apropriar-se o funcionário público de dinheiro,

valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de quem tem a posse

em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio”:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.

Parágrafo 1° - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário

público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou

concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio valendo-se de

facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.

Parágrafo 2° - Se o funcionário concorre culposamente para

o crime de outrem:

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.

Parágrafo 3° - No caso do parágrafo anterior, a reparação

do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade, se lhe é

posterior, reduz de metade a pena imposta. ’’

Art. 313 – “Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade

que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem:

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Pena – reclusão, de 1(um) a 4 (quatro) anos, e multa”.

O peculato é um crime que só pode ser praticado de forma

direta por funcionário público, por isso é um crime funcional impróprio.

Excluindo-se a qualidade de funcionário público, haverá outro crime. Por

exemplo: se ficar provado que a pessoa não é funcionário público, desclassifica-

se o peculato, passando o crime a ser classificado como furto ou apropriação

indébita.

O funcionário público é denominado ’’intraneus’’.

O não funcionário público é denominado “extraneus”.

O conceito de funcionário público é estabelecido no artigo

327 do Código Penal, que reza: “Considera-se funcionário público, para os

efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce

cargo, emprego ou função pública”.

Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo,

emprego, ou função em entidade paraestatal.

Tal conceito está, entretanto, longe de ser pacífico. De modo

geral, pode-se dizer que o conceito é tomado em sentido amplo ou restrito.

Neste, o funcionário é aquele que exerce um poder de império, autoridade ou

discricionário, por menor que seja. Em sentido amplo, o conceito está fugindo

ao de função pública, isto é, à atividade exercida pelo Estado, para consecução

de seus fins.

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Para os efeitos penais, nosso diploma considera funcionário

público não apenas esse, mas também o que exerce emprego público (como o

contratado, o diarista etc.), ou, de qualquer modo, uma função pública. Pode-se

dizer então, que o conceito advém desta, embora o Código lhe haja dado maior

extensão do que a do Direito Administrativo. Para este, pois, são funcionários

públicos, tanto o Presidente da República, do Congresso, ou do Supremo

Tribunal, como o contínuo da repartição.

Mais amplo ainda, o Código tornou o conceito com a

equiparação. Têm-se em vista, aqui, órgãos descentralizados da administração

pública, dotados de personalidade jurídica toda própria: refere-se a lei às

autarquias.

Tendo em vista o art. 312 do Código Penal, podemos dizer

que, sinteticamente, peculato é a apropriação, desvio ou subtração de coisa

móvel pública ou particular, praticado pelo funcionário público, em razão de seu

cargo ou valendo-se dessa qualidade. Sendo assim, o peculato se subdivide em:

-Peculato-apropriação (art.312, ’’caput’’, 1 ° parte);

-Peculato-desvio (art. 312, ’’caput’’, 2 ° parte);

-Peculato-furto (art. 312, parágrafo 1°);

-Peculato culposo (art. 312, parágrafo 2°);

-Peculato mediante erro de outrem (art. 313).

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Peculato segundo o art.312, caput, é definido como o fato de

“apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem

móvel, público ou particular, de quem tem a posse em razão do cargo, ou

desviá-lo em proveito próprio ou alheio.’’

À primeira vista este crime poderá apresentar-se como

apropriação indébita praticada pelo funcionário público ’’ ratione officii’’.

“Não basta para a configuração do peculato que o agente

que se apropriou do dinheiro seja funcionário público. É mister que a

denúncia esclareça a que título lhe foi o dinheiro confiado, se ratione officii ou

contemplatione officii, distinção essa fundamental para a exata definição do

delito” (TJSP – RHC – Rel. Chiaradia Netto – RT 369/52).4

Entretanto, entre apropriação indébita e o peculato há uma

diferença estrutural que provém:

a) da qualidade do sujeito ativo;

b) do titulo da posse, que no peculato deve ser relacionado ao

cargo ou serviço, e na apropriação indébita poderá ser de qualquer natureza;

c) da pluralidade de condutas previstas no peculato.

4 Franco, Alberto Silva – Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial – Vol. 1 – Tomo II

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Assim, este pode ser considerado como uma modalidade

especial de apropriação indébita cometida por funcionário público. É o delito do

sujeito que arbitrariamente faz sua ou desvia, em proveito próprio ou de terceiro,

a coisa móvel que possui em razão do cargo, seja ela pertencente ao Estado ou a

particular, ou esteja sob sua guarda ou vigilância.

“Para a configuração do peculato é indiferente tenha, ou

não, o acusado tirado vantagem do crime. Basta o desvio do bem público em

proveito próprio ou alheio”(TJSP – AC – Rel. Humberto da Nova – RT

395/81).5

Objetividade Jurídica

O peculato pluriofensivo: ofende tanto o interesse em que não

seja mudado o destino da “ res mobile’’, como o interesse em que o funcionário

público não abuse de sua função, para beneficiar-se a si mesmo ou terceiros.

Tem em vista a lei a probidade administrativa, tutelando-se a

administração pública no que tange ao patrimônio público e o interesse

patrimonial do Estado, ainda que de bens particulares. A maior relevância,

porém, não é tanto a defesa dos bens da administração, mas o interesse do

5 Ibid.

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Estado, genericamente vista, no sentido de zelar pela probidade e fidelidade da

administração. O dano, mais do que material, é moral e político.

O interesse prevalente, não obstante, é o da modalidade

administrativa, sem a qual é impossível o desenvolvimento normal da atividade

do Estado.

Como na apropriação indébita, o delito, na modalidade do

artigo, tem como pressuposto material a posse da coisa pelo agente. Deve o

dinheiro, o valor ou o bem móvel achar-se na posse do funcionário.6

Ao contrário do que fez no art. 168, o legislador não se

referiu à detenção, que difere da posse.

Vale, entretanto, ao Código que com a capitulação do

peculato-furto se a detenção não se prestar ao tipo fundamental do artigo dará

lugar à figura do parágrafo 1°.

Não há distinção da posse. A indireta, ou exercida por

intermédio de outra pessoa, configura igualmente o delito. Por exemplo, o chefe

da repartição onde se guardam valores.

A lei deixa bem claro que a posse deve ser em razão do

cargo: é necessário que haja relação de causa e efeito entre a posse e este. Deve

ela ser lícita, isto é, provir de lei, regulamento, ou do costume, não interditado

ou colidente com a lei.

6 Magalhães, Noronha – Direito Penal, Vol. 04

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Assim, protege-se a Administração Pública no que diz

respeito ao interesse patrimonial, moral e político.

Sujeito Ativo

Sujeito ativo do crime do peculato é o funcionário público,

previsto no artigo 327. Porém, havendo concurso de agentes, diante do que

dispõe o artigo 30, trata-se de circunstância elementar do crime. Desconhecendo

o particular a condição de funcionário do agente não responderá por peculato,

mas por outro ilícito. No caso, o dolo do co-autor ou partícipe não abrange

aquele circunstância elementar.

É irrelevante que o funcionário tenha prestado compromisso

ou tomado posse ou que sua admissão tenha sido irregular. Somente aquele que

ocupe o cargo arbitrariamente não responde por esse delito mas pelo crime

previsto no artigo 328 além de eventual furto ou estelionato.

“Não é funcionário público apenas aquele que percebe

estipêndios dos cofres do Estado, mas todo aquele que exerça uma função

pública, seja esta de império, de gestão, ou simplesmente técnica. Não se pode

negar, pois, que o serventuário de Cartório, ainda que não oficializado, exerce

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função pública, função que visa diretamente a uma necessidade e mesmo uma

conveniência pública (TJSP – AC – Rel. Weiss de Andrade – RT 461/333).7

“Escrevente habilitado de cartório não oficializado – que se

apropriou de importâncias que lhe foram confiadas em razão de ofício – Sua

condição de funcionário público – Irrelevância do fato de haver devolvido,

posteriormente, o “quantum” apropriado – Condenação – Apelação provida –

Voto vencido – Inteligência do art. 312 do CP – “A utilização, ainda que

temporária, para proveito próprio, de dinheiro público de que se tem a guarda

bem como o empréstimo, a si mesmo ou a outrem, são fatos que configuram o

crime de peculato”(TJSP – AC – Rel. Camargo Sampaio – RT 533/314). 8

Sujeito Passivo

Sujeito passivo do crime é o Estado, pois se trata de crime

contra a administração pública. Diante do conceito abrangente da expressão,

7 Franco, Alberto Silva – Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial – Vol. 1 – Tomo II

8 Ibid.

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além da União, Estados e Municípios, podem ser vítimas as autarquias e as

entidades paraestatais (empresas públicas, sociedades de economia mista etc.),

diante da equiparação prevista pelo artigo 327, como já foi acentuado. O artigo

552 da CLT, com a redação que lhe deu o Decreto-lei 925, de 10-10-69,

equiparou ao crime de peculato os praticados em detrimento de patrimônio das

associações sindicais, até então assimilados aos delitos contra a economia

popular.9

“A apropriação de quantia pelo presidente de associação ou

entidade sindical, em razão de função, recebida para pagamento a associados

por força de acordo em reclamação trabalhista, configura o delito de peculato

(CP, art. 312, e CLT, art. 552)” (STF – HC – Rel. Leitão de Abreu – RT

520/520).

No mesmo sentido: RT 520/46110

“O crime de peculato é contra a Administração Púbica e

não contra o patrimônio. O dano, na espécie, necessário e suficiente para a

sua integração, é o inerente à violação do dever de fidelidade para a mesma

administração. E o animus restituendi é irrelevante para o peculato doloso,

9 Mirabete, Julio Fabbrini – Manual de Direito Penal – Vol. 0310 Franco, Alberto Silva – Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial – Vol. 1 – Tomo II

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influindo a reposição tão-somente nos casos de apropriação indébita e de

peculato culposo” (TJSP – AC – Rel. Felizardo Calil – RJTJSP 68/405).11

Sujeito passivo é ainda o particular proprietário do bem

apropriado ou desviado que se encontrava na posse, guarda ou custódia da

administração (peculato-malversação).

Quanto ao sujeito passivo eventual, convém distinguir: se no

caso o objeto material for de natureza pública, sujeito passivo será o Estado ou

outra entidade de direito público. Cuidando-se de bem particular, o sujeito

passivo será o proprietário ou possuidor.

Quanto à entidade paraestatal, sendo desmembramento da

administração pública, quando patrimonialmente lesada pelos seus funcionários,

surge como sujeito passivo do peculato.

Conduta: Pressuposto

Pressuposto do fato é que o sujeito agente tenha a posse

legítima da coisa móvel (dinheiro, valor ou qualquer outro bem). Se o sujeito

11 Ibid.

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ativo do delito não tiver a posse, o crime praticado será o de peculato-furto

(art.312, parágrafo 1°), ou o do furto (art.155).

No Direito Penal, a posse deve ser entendida de acordo com a

concepção autonomista, segundo a qual o poder de gozar e dispor da coisa far-

se-á por meio de pessoas físicas, às quais são conferidos poderes jurídicos.12

Tais poderes são atribuídos em razão do exercício da posse por parte do ente, ou,

na falta deste, por parte do próprio sujeito em suas vestes publicistas. Assim a

posse deve ser entendida em sentido amplo, compreendendo o poder de

disposição direta sobre a coisa, ou a disponibilidade jurídica, que consiste na

disponibilidade facultada legalmente ao agente pelo cargo que desempenha, sem

detenção material.

A lei penal se refere à “posse em razão do cargo’’ e não “em

razão do exercício de função pública’’, como anota Hungria. Assim, se confiar a

um amigo, que é fiscal do Imposto de Renda, uma soma para saldar um débito,

apropriando-se ele da quantia, não há peculato, mas apropriação indébita.

Elemento Objetivo

12 Costa Jr., José da Costa – Comentários ao Código Penal - Vol. 3

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No peculato próprio, definido no “caput’ ’ do artigo, as

condutas típicas constituem-se em apropriação ou desvio. Na primeira hipótese,

como ocorre com o crime de apropriação indébita, o agente se dispõe a fazer sua

a coisa de que tem a posse, é o ato pelo qual se inverte a posse em situação

idêntica a do domínio, atuando o agente como se dono fosse. Pressuposto

material do crime é, portanto, a situação de posse. Quanto á conceituação de

posse, segundo Fragoso: “A posse deve ser entendida em sentido amplo,

compreendendo não se o poder material de disposição sobre a coisa, como

também a chamada, disponibilidade jurídica, isto é, a possibilidade de livre

disposição que ao agente faculta (legalmente) o cargo que desempenha.

Nesse sentido é perfeita a lição de Antolísei, quando afirma

que a posse consiste na disponibilidade de dispor, fora da esfera de vigilância de

outrem, de coisa, seja em virtude de uma situação de fato, seja em conseqüência

da função jurídica desempenhada pelo agente no âmbito da administração. Tem,

assim, a posse, o funcionário a quem incube receber, guardar ou conferir a coisa,

como também seu chefe e superior hierárquico, que dela pode dispor mediante

ordens ou requisições.’’ Abrange o termo, portanto, a detenção (guarda,

depósito, arrecadação, administração, exação, custodia etc.). Deve-se tratar de

posse lícita, ou seja, que a entrega da coisa resulte de mandamento legal,

regulamento ou, pelo menos, de inveterada praxe, não proibida por lei

indispensável, também, que a posse exista em função do cargo (ratione oficii),

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estabelecendo-se, assim, uma relação de causa e efeito, expressiva de confiança,

não só da que é necessariamente estabelecida por lei, como a resultante de ato

facultativo, da vontade de quem entrega, quando tal seja permitido ou tolerado

pela administração.

Quando a entrega da coisa ao sujeito ativo for viciada por

fraude, erro ou violência, não ocorrerá a posse lícita e, portanto, não existirá o

estelionato mas outro delito, como o peculato mediante erro de outrem, a

conclusão, o roubo.

Não advindo a entrega em razão do cargo, pode ocorrer a

apropriação indébita. No agente que não tinha a posse exclusiva da coisa, haverá

subtração e, portanto, o crime do artigo 312, § 3.

O objeto material do crime pode ser dinheiro, valor ou

qualquer bem móvel, público ou particular.Dinheiro é moeda corrente, coisa

fungível. Valor, no sentido legal, é título, documento ou efeito que representa

dinheiro ou mercadorias (títulos da dívida pública, apólices, conhecimentos de

gêneros, letra de câmbio, vale postal, letras do tesouro etc). Refere-se a lei,

genericamente, a qualquer bem móvel, cujo conceito já foi exposto

anteriormente, abrangendo a energia elétrica.

Pratica peculato, por exemplo, o policial ou carcereiro que se

apropria de bens do preso. Não estando a coisa sob guarda e responsabilidade da

Administração Pública não ocorre o crime, mas outro, como no caso de policial

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que subtraiu toca-fita de automóvel que perseguira e fora abandonado pelo

motorista.

“Comete o crime de peculato o policial que, em serviço de

carceragem, se apropria de dinheiro e objetos do preso cuja guarda lhe foi

confiada, desviando-os em proveito próprio” (TJPR – AC – Rel. Lima Lopes –

RT 512/427).13

É indispensável que a conduta recaia sobre coisa corpórea,

não constituindo o crime o uso de mão-de-obra ou de serviços.

“Peculato é a apropriação ou desvio, em proveito próprio ou

alheio, de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público, ou

particular, de que o funcionário tem a posse em razão de seu cargo. Coisa

muito diversa é o uso de mão-de-obra ou de serviços da Administração

Pública, conduta não abrangida pelo disposto no art. 312 ou em seu § 1º do

CP” (TJSP – HC – Rel. Djalma Lofrano – RT 506/326-327).14

13 Franco, Alberto Silva – Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial – Vol. 1 – Tomo II14 Ibid.

Page 19: ÍNDICE I – Introdução II – Peculato 1 – 2 – 3 · 2005. 2. 22. · O Direito Romano promoveu o peculato a crime autônomo não em razão da qualidade do sujeito agente,

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A segunda hipótese de peculato próprio é o de desviar a

coisa. Desviar é mudar de direção, alterar o destino ou a aplicação, deslocar,

desencaminhar. O agente dá à coisa destinação diversa da exigida, em proveito

próprio ou de outrem. Noronha diz que ao invés de destino certo e determinado

do bem de quem tem a posse, o agente lhe dá outro, no interesse próprio ou de

terceiro. “Na doutrina encontra-se como exemplo o empréstimo, pelo

funcionário, de dinheiro de quem tem a guarda”. Na jurisprudência considerou-

se a ocorrência do peculado-desvio na conduta do coletor que empregou

dinheiro público em fim diverso daquele para o qual lhe fora confiado e do

policial que apreendeu o dinheiro do crime e dele se apropriou, desviando,

assim, em proveito próprio aquilo que detinha em nome da Administração

Pública.

“Comete peculato o policial que, no cumprimento do seu

dever funcional, apreende o dinheiro do crime e dele se apropria, desviando,

assim, em proveito próprio aquilo que detinha em nome da Administração

Pública” (TJSP – AC – Rel. Mendes Pereira – RT 503/310).15

Comete peculato-desvio o funcionário que, conscientemente,

efetua pagamentos pela administração por serviço não efetuado ou por

15 Ibid.

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mercadoria não recebida ou a maior, ainda que em benefício apenas do

pseudoprestador de serviço ao fornecedor.

Quando o desvio de verba se verifica em favor do próprio

ente público, com utilização diversa da prevista na sua destinação e em

desacordo com as determinações legais, o que ocorre é o emprego irregular da

verba (art. 315), e não o peculato.

O proveito a que se refere a lei no caso do peculato tarifo

pode ser tanto material como moral, auferindo o agente outra vantagem que não

de natureza econômica. Em se tratando de peculato-desvio não é necessário que

o agente obtenha vantagem, bastando para o seu aperfeiçoamento o desvio do

bem público.

Não prevê a lei penal o denominado peculato de uso. Para

falar-se, porém, em peculato de uso impunível é necessário que se trate de coisa

infungível, pois a utilização do dinheiro público, ainda que ocorra a intenção de

restituir, configura o crime de peculato. Portanto, é pacifico que o USO de

máquinas e veículos não constitui o crime, mas acertadamente se tem concluído

pela condenação pelo consumo do combustível utilizado. Também não se

caracteriza o crime no desvio de mão-de-obra pública, porque não se configuram

nem o peculato-apropriação, nem o peculato-desvio.

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21

O Decreto-lei n° 201, de 27-2-1967 prevê um caso especial

de peculato de uso como crime de responsabilidade de Prefeitos Municipais na

utilização indevida de bens, rendas ou serviços públicos.

Não exclui a responsabilidade penal o fato de ter sido o

agente inocentado por órgão administrativo do poder Executivo ou Judiciário

quando do procedimento necessário ao afastamento do cargo.

Elemento Subjetivo

O dolo do crime de peculato é a vontade de transformar a

posse em domínio, como ocorre com o delito de apropriação indébita. Quanto ao

peculato de apropriação, diz-se que basta a vontade referida a esta, que

pressupõe, conceitualmente, o animus rem sibi habendi, ou seja, a intenção

definitiva de não restituir a res. No peculato-desvio é necessário o elemento

subjetivo do tipo que consiste na finalidade de obter proveito próprio ou para

terceiro.

“Indispensável para a integração do delito definido no art.

312 do CP é o dolo do agente. Segundo o entendimento dominante na

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doutrina, o dolo é genérico no peculato por apropriação e específico no

peculato por desvio” (TJSP – AC – Rel. Cunha Camargo – RT 412/99).16

Na jurisprudência, embora se tenha por configurado o crime

com o dolo genérico, tem-se entendido, muitas vezes, que a ausência do

elemento subjetivo do peculato afasta a configuração do crime. Nesse sentido:

“A ausência do elemento subjetivo do peculato, o animus

rem sibi habendi , afasta a configuração do delito” (TJSP – Rev. – Rel. Acácio

Rebouças – RT 487/304)17.

“Não se encontrando na atuação do acusado o dolo q ue

caracteriza o peculato-apropriação e que pressupõe, conceitualmente, o

animus rem sibi habendi, ou seja, a intenção definitiva de não restituir a coisa

e a obtenção de proveito próprio ou alheio, não há falar no delito do art. 312

do Código Penal” (TJSP – Rev. – Rel. Felizardo Calil – RT 441/373)18

16 Ibid.17 Ibid.18 Ibid.

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23

No peculato-desvio em favor de terceiro, é indispensável o

elemento do tipo, qual seja, a vontade de desviar o bem de forma que o terceiro

tenha proveito desse desvio.

Para autores causalistas, tipo subjetivo do crime de peculato-

apropriação é dolo genérico. Consiste ele na vontade consciente e livre, voltada

à apropriação de dinheiro, valor ou qualquer bem móvel, de que se tem posse em

razão do cargo.

No peculato-desvio, faz-se necessária a presença não só do

dolo genérico, mas também do específico. O primeiro consiste na vontade

consciente e livre de empregar o bem móvel em fim diverso daquele que era

destinado. O segundo é representado pela intenção de proveito, excluído o

“ animus” de assenhorar-se da coisa.

Na apropriação indébita, a intenção de restituir a coisa

apropriada impede o aperfeiçoamento da figura criminosa. No peculato, ao

contrário, semelhante intenção de devolver a “ res” não tem o mesmo efeito.

Objeto Material

Objeto material da conduta é o dinheiro (moeda circulante no

País), valor (qualquer título, papel de crédito ou documento negociável, como

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apólices) ou qualquer outro bem móvel que é toda coisa passível de ser

apreendida e removida de um lugar para o outro (“de loco ad locum’’).

“O peculato se efetiva com a apropriação sine jure de

dinheiro, valor ou outra coisa móvel, de que tem a posse o funcionário

público, procedendo com abuso do cargo ou infidelidade a este” (TJSP – AC –

Rel. Camargo Sampaio – RT 520/353).19

A lei não distingue entre o dinheiro nacional e o estrangeiro.

Poderá configurar-se o peculato por parte daquele funcionário do Banco do

Brasil que se apropriar de dólares que tenha recebido, para trocar em reais. Se

tratar-se de dinheiro que já saiu de circulação, não se apresenta o peculato,

podendo caracterizar-se o furto, ou a apropriação indébita.20

Pratica peculato o funcionário que se apropria do dinheiro

público de que tem a posse, ainda que o faça temporariamente, disposto a repô-

lo logo mais, ou seja, despojado do “ animus rem sibi habendi”’ (vontade de

reter a coisa como se fosse dele). A devolução ulterior do dinheiro não elimina o

crime, pois há sempre um desvio.

19 Ibid.20 Costa Jr., Paulo José – Comentários ao Código Penal, Vol. 03

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A Conduta

Peculato próprio, é o previsto no art. 312, ’’caput’’, do

Código Penal Pátrio, e neste caso a conduta pode se perfazer de dois modos:

mediante apropriação ou desvio21.

Apropriar-se é assenhorar-se da coisa móvel, passando dela a

dispor como se fosse sua, usufruindo-a como se fosse seu senhor (“uti

dominus”), em proveito próprio ou alheio.

Desviar é dar à coisa destinação diversa daquela em razão da

qual foi ela entregue ou confiada ao agente. Se o desvio se fizer em beneficio da

própria administração, não haverá peculato, mas desvio de verba.

Consumação e Tentativa

Consuma-se o peculato quando ocorre, na primeira hipótese,

a apropriação, ou seja, quando o funcionário público torna seu o dinheiro, valor

ou bem móvel de que tem a posse em razão do cargo.

Tem-se entendido que o peculato é um crime de dano e

conseqüentemente se consuma com este, que existe sempre na apropriação ou

no desvio, seja pela diminuição efetiva do patrimônio da administração, seja

21 Ibid.

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pela falta de acréscimo ou aumento devido. Exigir-se-ia, assim, um dano

patrimonial efetivo. Afirma-se na doutrina ocorrer a consumação do delito ainda

que haja caução ou fiança do peculatário, pois elas se destinam justamente à

indenização do dano causado. De qualquer forma, pouco importa que o agente

tenha obtido a vantagem do crime e não é necessário que se fixe o montante dos

valores assenhoreados ou extraviados.

Não se exige, salvo nos casos excepcionais, o exame pericial

para a comprovação do peculato, máxime quando está ele demonstrado por

documentos.

O ressarcimento do dano ou a restituição da coisa apropriada,

em se tratando de peculato doloso, não exclui o delito, podendo apenas influir na

aplicação da pena. A reparação do dano anterior ao recebimento da denúncia

agora é causa de diminuição de pena, nos termos do artigo 16 do Código Penal.

É admissível a tentativa de peculato, citando Noronha a

hipótese do tesoureiro ou caixa da repartição que é detido ao sair desta portando

dinheiro que devia ter ficado no cofre.

Consuma-se o crime com a efetividade concreta da

apropriação ou do desvio, realizando-se este quando o funcionário dá à coisa

destino diverso daquele para o qual foi ela entregue, sendo irrelevante a intenção

de restituir a coisa.

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Indispensável, todavia, que a apropriação ou desvio de bens,

verbas ou rendas públicas se façam em proveito próprio ou alheio. Se o desvio

de verbas realizar-se em proveito da própria administração, ter-se-á como

aperfeiçoado o delito previsto no art. 315 do Código Penal.

Necessário ainda à consumação, é o dano patrimonial efetivo.

Sendo o ’’ iter criminis’’ fracionável, é admissível a tentativa,

embora um tanto rara.

“Admite-se a tentativa de peculato, capitulado no § 1º, do

art. 312 do CP, quando perfeitamente caracterizado o fracionamento do iter

criminis”(TJSC – AC – Rel. Ivo Sell – RT 527/401).22

Distinção e Concurso

Tratando-se de Prefeito Municipal o peculato é previsto

também como crime de responsabilidade no artigo 1º do Decreto-lei n°201, de

27-2-1967. Em se tratando de militar, o crime é previsto no artigo 303 do

Código Penal Militar. Ocorrendo falsidade ideológica ou material que constitui

apenas o elemento essencial e indispensável à prática do desfalque, é ela

22 Franco, Alberto Silva – Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial – Vol. 1 – Tomo II

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absorvida pelo peculato. Já decidiu o STF, porém, pela existência de concurso

formal entre peculato e falsidade, e o TJSP pelo concurso material. Comete o

crime de peculato, absorvendo este a violação de correspondência o funcionário

dos Correios que viola mala de correspondência dela retirando o dinheiro

remetido. É possível a continuidade delitiva no peculato.23

PECULATO FURTO

A hipótese de peculato-furto está prevista no art. 312,

parágrafo 1°. Nela, o agente não tem a posse da coisa móvel, pública ou

particular. Valendo-se da condição de funcionário, vem a subtrair a ‘’ res

mobile’’.

“Configura-se a hipótese do art. 312, § 1º, do CP, quando o

agente se apropria de dinheiro ou valor do erário público, em proveito próprio,

valendo-se da sua qualidade de funcionário. Impossibilidade de

desclassificação para o delito de furto” (TFR – AC – Rel. Adhemar Raymundo

– DJU 15.10.81, p. 10.250).24

23 Mirabete, Julio Fabbrini – Manual do Direito Penal, Vol. 0324 Franco, Alberto Silva – Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial – Vol. 1 – Tomo II

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O núcleo do tipo é o verbo subtrair e a condição de

funcionário público é a ocasião que enseja o ato. Se o funcionário não se valer

de sua condição para subtrair a coisa, mas arrombar a repartição altas horas da

madrugada, estará praticando o crime de furto qualificado, jamais o de peculato.

Nesse crime a lei prevê duas modalidades de conduta, uma

delas ocorre quando o próprio funcionário executa a subtração, e a outra quando

a subtração é realizada por terceiro, que poderá ser um ‘’ extraneus’’, deixando,

por exemplo, a porta da repartição encostada, sem chave.25

Consuma-se o crime quando a coisa sai da posse do ofendido,

passando para a do agente. É configurável a tentativa.

O dolo, para os causalistas, é genérico, pois consiste na

vontade consciente e livre de subtrair a coisa móvel, pública ou particular,

ciente da ilicitude do ato.

Na mesma classificação doutrinária acima, há, também, o

dolo específico, representado pela locução normativa “em proveito próprio ou

alheio”, que é a intenção de realizar o lucro (“ animus lucri faciendi”).

O peculato impróprio, também denominado na doutrina de

peculato-furto, está previsto no art. 312, § 1°, com a seguinte redação: “Aplica-

se a mesma pena (do peculato próprio), se o funcionário público, embora não

tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja

25 Costa Jr., Paulo José – Comentários ao Código Penal, Vol. 03

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subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe

proporciona a qualidade de funcionário’’.

A conduta típica não é mais de apropriação e sim de

subtração (furto). O sujeito ativo não tem a posse da res ,nem o crime ocorre em

virtude de sua função, mas aproveita-se ele da facilidade que a condição de

funcionário lhe concede para praticar a conduta.

Essa qualidade não é causa do resultado, mas se revela em

ocasião para a sua ocorrência. Ausente a facilidade criada pelo exercício do

cargo e função, não ocorre o peculato, e sim simples furto.

Não basta também a condição de funcionário ou que tenha se

valido das facilidades para perpetrar a subtração; é necessário que a coisa seja

pública ou que, sendo particular, esteja sob guarda da administração pública.

Como já dito anteriormente, duas são as hipóteses previstas

no artigo. Na primeira, o funcionário subtrai a coisa nas condições já citadas.

Citam-se como exemplos: o funcionário que subtrai dinheiro do cofre da

repartição em que trabalha por encontrar a porta aberta; o policial que subtrai

peças de uma motocicleta e que arrecadara em razão das suas funções; o policial

que subtrai cheque assinado pela vítima de crime ao proceder investigações para

apurá-lo, o policial subtrai cédulas do porta-notas de uma pessoa na qual se dava

uma busca pessoal. Nos dois últimos casos, porém, não se pode afirmar que a

coisa estava sob guarda ou custódia da administração, ocorrendo apenas furto.

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Na segunda hipótese, o funcionário apenas concorre

conscientemente para a subtração praticada por um terceiro, como no exemplo

de Noronha, de distrair o caixa ou pagador da repartição para que outrem se

aposse do dinheiro. O terceiro, ainda que não funcionário público, responde por

peculato diante do disposto no artigo 30 do Código Penal.

Não se consumando a subtração, responde o terceiro pela

tentativa de peculato-furto.

Admite-se a tentativa de peculato-furto quando perfeitamente

caracterizado o fracionamento do iter criminis, consumando-se o ilícito com a

efetiva subtração. O dolo é a vontade de praticar umas das ações incriminadas,

visando o agente proveito próprio ou alheio, com a consciência de que se

prevalece da condição de funcionário.26

PECULATO CULPOSO

Considera-se peculato culposo o concurso não intencional

(negligência, imprudência, inépcia).

26 Mirabete, Julio Fabbrini – Manual de Direito Penal, Vol. 03

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“Quem deixa a serventia de cartório por conta de outrem,

irregularmente, sem conhecimento oficial da autoridade superior, cria

culposamente condições favoráveis à prática de ilícitos administrativos e

criminais, respondendo pelo delito previsto no art. 312, § 2º, do CP” (TJSP –

AC – Rel. Márcio Bonilha – RT 488/312).27

Aplica-se a modalidade culposa aos tipos precedentes, isto é,

ao peculato-apropriação (peculato próprio), contido no caput do dispositivo, e ao

peculato-furto, previsto em seu parágrafo inicial.

Sujeito ativo é o funcionário que facilita a subtração de coisas

móveis que lhe estavam confiadas, em virtude da função desempenhada.

Aqueles que delas se apropriam, ou as desviam, ou as subtrai é sempre um

terceiro, funcionário público ou não, que age dolosamente.

Se o funcionário público (“ intraneus”), efetuar a subtração,

agora sim em concurso, a hipótese fática recaíra no tipo do art.312, parágrafo 1°,

do Código Penal.

Estabelece o parágrafo 3° do art. 312, que o ressarcimento

anterior à sentença definitiva (irrecorrível, da qual não cabe mais recurso algum)

extingue a punibilidade.

27 Franco, Alberto Silva – Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial – Vol. 1 – Tomo II

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Se o ressarcimento se der posteriormente à condenação

imposta, a pena será reduzida pela de metade. Pouco importa que seja efetuado

pelo próprio réu, ou por terceiro em seu nome.

Evidentemente, o ressarcimento do dano ou mesmo a

extinção da punibilidade não impedirão eventuais sanções administrativas

cabíveis, em razão do ilícito funcional.

Esta modalidade de peculato está disposta no artigo 312, § 2°,

o crime de peculato culposo: “Se o funcionário concorre culposamente para o

crime de outrem: Pena-detenção, de três meses a um ano.”

Como já foi dito, nessa hipótese, o funcionário, por

negligência, imprudência ou imperícia, permite que haja apropriação ou desvio

(caput), subtração ou concurso. Não se trata de concurso de agentes em sentido

próprio, pois não há que se falar em participação culposa em crime doloso. Há

apenas uma oportunidade criada por culpa do funcionário a possibilitar a

ocorrência de peculato doloso. Portanto, o dispositivo pressupõe a conduta

dolosa de um outro funcionário, ou seja, a prática de um crime do peculato

próprio ou peculato-furto. Quem, por exemplo, deixa a serventia de cartório por

conta de outrem, irregularmente, sem conhecimento oficial de autoridade

superior, cria culposamente condições favoráveis à prática de ilícitos

administrativos e criminais, respondendo por peculato culposo. Não é suficiente,

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porém, a inobservância pelo agente de disposição regulamentar se esta não

constitui, no caso concreto, culpa penal.

É necessário que se comprove a falta de cautela ordinária e

especial a que estava obrigado o funcionário, na guarda e preservação das coisas

que lhe são confiadas, por força da função pública que desempenha.

Noronha acrescenta a hipótese da conduta culposa do

funcionário no caso de subtração praticada por estranho sem colaboração doloso

de outro funcionário (furto comum). O §° 2, porém, deve ser interpretado em

conjunto com o “caput” e § ° 1, referentes apenas a espécies de peculato. É de se

observar que também para a configuração da modalidade culposa de peculato é

necessário que se estabeleça estreita relação entre o ato do funcionário e a ação

dolosa de outrem, de modo a evidenciar que o primeiro tenha dado ensejo à

pratica do último.

Extinção da Punibilidade e Atenuação de Pena

Prevê o artigo 312, §° 3, casos de extinção da punibilidade e

atenuantes da pena em peculato culposo. A reparação do dano para dar causa à

extinção da punibilidade deve ser anterior ao trânsito da sentença. Como fator de

redução da pena, é posterior à sentença irrecorrível.

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Refere-se a lei exclusivamente ao crime culposo. No ilícito

doloso, a restituição anterior ao recebimento da denúncia constitui, diante da

nova Parte Geral do Código Penal, causa de diminuição de pena (art. 16).

PECULATO MEDIANTE ERRO DE OUTREM

Conceito

O peculato mediante erro de outrem está tipificado no artigo

313: “Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo,

recebeu, por erro de outrem:

Pena-reclusão, de um a quatro anos, e multa.”

“Se o réu embolsa quantia recebida de particulares por erro

destes, não em razão, mas apenas, no exercício de cargo público, comete o

delito previsto no art. 313 do CP” (TJSP – Rev. – Rel. Gonçalves Santana – RT

396/128). Idem: RJTJSP 7/554-555.28

28 Franco, Alberto Silva – Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial – Vol. 1 – Tomo II

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Como bem observa Noronha, embora a doutrina tenha dado a

denominação ao crime de peculato-estelionato, a infração se aproxima mais da

apropriação por erro (art. 169, 1° parte), qualificada pela qualidade do agente.

Este é um tipo autônomo de peculato, que por alguns é

denominado peculato-estelionato. Pode ser considerado como impróprio; com

efeito, nele o agente não tem a posse legítima de bens pertencentes ao Estado,

que vem ter às mãos por erro.

“Peculato – Caracterização na modalidade culposa – Falta

de cautela ordinária por parte do funcionário – “Havendo reparação do

dano, essa circunstância funciona como causa de extinção da punibilidade”

(TJSP – AC – Rel. Goulart Sobrinho – RJTJSP – 1-2/330-331).29

Sustenta parte da doutrina, que por isso, o agente não viola

seu dever funcional para com o Estado.

Diferencia-se do estelionato porque, neste, a indução em erro

faz-se pela conduta do próprio agente, ao passo que na presente modalidade de

peculato o sujeito ativo nada o faz: o dinheiro vem ter-lhe às mãos por equívoco,

sem sua cooperação.

29 Ibid.

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Objetividade Jurídica

No artigo 313, como no anterior, tutela-se a administração

pública no seu aspecto moral e patrimonial.

Assim, pode-se dizer que o bem tutelado é o regular

funcionamento da Administração Pública em seu dúplice aspecto: bom

andamento e imparcialidade.

Sujeitos do Delito

Por tratar-se de crime próprio, o sujeito ativo do delito em

estudo é o funcionário público, pois a norma refere-se ao exercício de cargo ou

função.

Tomando-se a expressão no seu sentido penal, admite-se que

um particular possa contribuir para a conduta delitiva do funcionário, induzindo-

o a não devolver a soma recebida por equívoco.

Noronha cita a hipótese de um funcionário receber, por

equívoco, determinada quantia de um contribuinte, pensando em restituí-la, no

que, entretanto, é desaconselhado por um amigo – não funcionário – acabando

por dividirem entre si o dinheiro.

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O sujeito passivo é o Estado, já que se trata de crime contra a

Administração Pública. Podem ser vítimas, também, um extraneus ou outro

funcionário público, que entregam a res por erro ou são dela proprietários.

Portanto, poderá ser um particular ou até mesmo o funcionário público.30

Tipo Objetivo

A conduta prevista no dispositivo traduz-se como peculato

próprio (primeira hipótese), na apropriação do objeto do crime. A posse do

agente, porém, agora decorre de erro (de direito ou de fato) daquela que faz a

entrega. Esse erro pode versar sobre a coisa que é entregue; sobre a obrigação

que deu causa é entrega; sobre a pessoa que faz a entrega; ou mesmo sobre a

quantidade da coisa devida. Nesta última hipótese, a apropriação entre a

importância realmente devida e o indébito configura o delito. O erro tanto pode

ser do particular como da própria Administração Pública.

Dá causa ao crime em estudo apenas o erro espontâneo

daquele que entrega a coisa; se foi ele induzido ao engano pelo funcionário

caracterizar-se-á o estelionato.

30 Mirabete, Julio Fabbrini – Manual de Direito Penal, Vol. 03

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Não caracteriza crime simples o simples recebimento quando

o funcionário também labora o erro. Descoberto o engano, porém, se ele não a

devolve, ocorre o peculato.

Indispensável para a existência do ilícito previsto no artigo

313 é que o recebimento ocorra quando o sujeito ativo está no exercício do

cargo, ou seja, em função do exercício do cargo. Não ocorrendo essa substância

elementar, o crime será de apropriação por erro (art. 169). Por outro lado, se o

recebimento se der em razão do cargo, sem que haja erro, haverá o peculato

previsto no artigo 312, “caput” . Decidiu-se que devia responder por peculato

mediante erro de outrem e não por apropriação indébita o escrivão de Cartório

de Notas que, tendo recebido dinheiro de partes para pagamento de sisa e

lavratura de escritura, se apropria do numerário deixando de praticar os referidos

atos. Isso porque a vítima entregou o dinheiro da sisa ao serventuário por

manifesto erro, supondo fosse ele encarregado de receber o imposto.

O erro no crime em questão diversifica-se fundamentalmente

do encontrado no estelionato. Neste, o erro em que incide o sujeito passivo é

conseqüência da atividade maliciosa do sujeito ativo, que emprega artifícios ou

ardis. No peculato mediante erro de outrem, este surge e se desenvolve sem que

sobre ele a atividade do agente exerça qualquer influência.

O objeto material do crime é o dinheiro ou qualquer utilidade.

O conceito de dinheiro já foi examinado anteriormente. Utilidades é o termo que

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abrange apenas coisas móveis e não outras vantagens, como a moral, por

exemplo, já que são estas incompatíveis com a noção de peculato.

Tipo Subjetivo

O dolo é a vontade de se apropriar do dinheiro ou de outra

coisa móvel, que recebeu por erro de outrem. Existe o dolo quando o sujeito

ativo, verificando que houve o engano, não o desfaz, tornando seu o objeto

(animus rem sibí habendi,). Não há que se falar em dolo superveniente; sendo

que ele existe no momento da apropriação, que é a conduta caracterizadora do

ilícito. Exige-se, outrossim, que o agente tenha consciência do exercício da

função pública e de sua relação com a errônea consignação.31

Segundo a corrente causalista, o dolo é genérico e deverá

apresentar-se no momento ulterior (“ dolus subsequens”): o da apropriação.

Não no momento do recebimento, quando muitas vezes o

agente está embuído de boa fé.

É imprescindível que o agente esteja ciente do erro do

exercício da função pública.

31 Mirabete, Julio Fabbrini – Manual de Direito Penal – Vol. 03

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Consumação e Tentativa

Consuma-se o crime com a apropriação, isto é, quando o

funcionário, ciente do erro de outrem, torna a coisa sua, agindo como se dono

fosse (“uti dominus”). Em se tratando de peculato impróprio, em que o

funcionário é dela proprietário, sendo devedor apenas de quantidade, o momento

consumativo do delito se opera quando, chamado a dar conta do alcance, cai em

mora e não o entrega, conforme adverte Carrara. Assim ocorre quando o

funcionário recebe vencimentos a mais.32

A tentativa é admissível, citando os doutrinários como

exemplo a conduta do funcionário que, recebendo por erro uma carta com

valores para cujo registro não é competente, é surpreendido no momento em que

rasga o envelope para apropriar-se da importância. Haverá também tentativa

quando o funcionário receber por erro um valor de que não consegue apropriar-

se pela oportuna intervenção de seu superior hierárquico.

32 Ibid.

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Distinção

Haverá estelionato e não peculato mediante erro de outrem se

o funcionário induziu a vítima ao engano ou se, percebendo no momento do

recebimento o equívoco mantém o ofendido nesse estado. Haverá concussão se a

entrega não se faz espontaneamente mas por exigência do funcionário (art. 316).

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CONCLUSÃO

Peculato é um crime funcional, pois deve ser praticado de

forma direta pelo funcionário público contra a Administração Pública.

Dentro da classificação direta dos crimes funcionais estão

inseridos na categoria dos crimes próprios, isso porque a lei exige uma

característica específica no sujeito ativo, ou seja, funcionário público.

O funcionário público é denominado intraneus. O não

funcionário público é denominado extraneus

É o único crime contra a Administração Pública que admite a

modalidade culposa, que é o caso do funcionário público que falta com cautela

normal a que estava obrigado na guarda de um bem público (ART. 312, § 2º,

código Penal Pátrio). As outras modalidades de peculato são todas dolosas e,

subdividem-se em: peculato-apropriação (art. 312, caput, 1ª parte); peculato-

desvio (art. 312, caput, 2ª parte); peculato-furto (art. 312, § 1º); peculato

mediante erro de outrem (art. 313).

No peculato-apropriação o funcionário tem a posse do bem,

em razão de seu cargo, portanto adquiriu de forma lícita, mas passou a atuar

como se fosse seu dono. A posse é também no sentido de detenção e de posse

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indireta. O objeto material do crime de peculato deve ser coisa corpórea móvel,

inexistindo assim o peculato de coisa imóvel.

No peculato desvio, como o próprio nome diz há o desvio, ou

seja, o funcionário público emprega o objeto de que tem posse em um fim

diverso de sua destinação original, com o intuito de beneficiar-se ou beneficiar

terceiro. O proveito pode ser material (patrimonial) ou moral, como obtenção de

prestígio ou vantagem política. O funcionário tem também que adquirir a posse

do bem de forma lícita e desviando-o depois.

O peculato-furto, denominado também de peculato

impróprio, dar-se-á através da subtração da coisa pelo funcionário público no

exercício de sua função ou quando o funcionário concorre dolosamente para que

terceiro subtraia. Se ocorrer colaboração por negligência ou imprudência, haverá

peculato culposo.

O peculato mediante erro de outrem, é também denominado

de peculato-estelionato, porque a vítima entrega o bem ao agente por estar em

erro, não sendo tal erro provocado pelo agente. O delito, portanto, ocorre quando

o funcionário, no exercício de suas atividades, recebe dinheiro ou qualquer coisa

móvel de valor econômico e, percebendo o erro da vítima, apodera-se do bem,

não devolvendo ao proprietário.

O legislador ao tipificar este crime visou proteger o

patrimônio público, o particular e a probidade administrativa. Sendo assim, é

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necessário para o crime a elementar de ser o sujeito ativo o funcionário público.

Já o sujeito passivo, além do Estado, poderá ser o particular, pois a lei tutela o

bem público e também os particulares que estejam sob custódia da

administração.

Se a coisa particular não estiver sob a guarda ou custódia da

administração e o funcionário público dela se apropriar responderá por

apropriação indébita.

Assim, o peculato mostra-se como o crime mais importante

praticado contra a administração pública, ao qual deve ser dada maior atenção,

pois é um crime plurissubjetivo que pode ser punido de várias maneiras através

dos verbos que caracterizam as modalidades existentes. Além de proteger o

Estado e o particular.

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