6
COLÉGIO EQUIPE 24 março 2015 | 08:05 (leia a parte 1 aqui: ) Os cronistas do 8° ano do Colégio Equipe, talvez não tão crianças, começam a percorrer a cidade sozinhos. Descobrem trajetos, manhas do metrô e do ônibus, personagens. Muitos andam com um caderninho de anotações, fazem exercícios de observação, de aguçar o olhar cronista e encontrar, na aparente banalidade do dia a dia, material de escrita e reflexão. “Leitores, aqui vou contar sobre como foi (e ainda está sendo) minha experiência de deixar de ir de perua para a escola, para começar a ir de ônibus.” “Mas nesse dia foi difícil, o dia começou como qualquer, dia normal de aulas e blá blá blá, estávamos indo pro metrô assim de boas, então o mundo parece que desabou e todas as pessoas do mundo estavam lá, na estação da Marechal Deodoro,(…)” “Hoje eu estava indo para a escola, e fiz uma pausa pra comprar um chiclete na banca… Passei por um farol, então continuei a andar e ouvi uma mulher gritando comigo, naquela hora senti tanta vergonha que não virei, mas ela gritou tão alto que comecei a gritar: - O que é que você quer? - Din-din!!! - O que é din-din? - Dinheiro, sua fora de moda!! No que pensam as crianças? (parte 2) No que pensam as crianças? (parte 2) http://educacao.estadao.com.br/blogs/colegio-equipe/no-que-... 1 de 6 24/03/15 10:32

No Que Pensam as Crianças

  • Upload
    soranz

  • View
    17

  • Download
    0

Embed Size (px)

DESCRIPTION

No Que Pensam as Crianças

Citation preview

  • COLGIO EQUIPE

    24 maro 2015 | 08:05

    (leia a parte 1 aqui: )

    Os cronistas do 8 ano do Colgio Equipe, talvez no to crianas, comeam a percorrer a cidade sozinhos. Descobrem trajetos, manhas

    do metr e do nibus, personagens. Muitos andam com um caderninho de anotaes, fazem exerccios de observao, de aguar o olhar

    cronista e encontrar, na aparente banalidade do dia a dia, material de escrita e reflexo.

    Leitores, aqui vou contar sobre como foi (e ainda est sendo) minha experincia de deixar de ir de perua para a escola, para comear

    a ir de nibus.

    Mas nesse dia foi difcil, o dia comeou como qualquer, dia normal de aulas e bl bl bl, estvamos indo pro metr assim de boas,

    ento o mundo parece que desabou e todas as pessoas do mundo estavam l, na estao da Marechal Deodoro,()

    Hoje eu estava indo para a escola, e fiz uma pausa pra comprar um chiclete na banca Passei por um farol, ento continuei a andar e

    ouvi uma mulher gritando comigo, naquela hora senti tanta vergonha que no virei, mas ela gritou to alto que comecei a gritar:

    - O que que voc quer?

    - Din-din!!!

    - O que din-din?

    - Dinheiro, sua fora de moda!!

    No que pensam as crianas? (parte 2)

    No que pensam as crianas? (parte 2) http://educacao.estadao.com.br/blogs/colegio-equipe/no-que-...

    1 de 6 24/03/15 10:32

  • Meu lugar favorito no parque o lago, perto deste lago tem uma rvore grande, com folhas bem verdes, aquela rvore a minha

    preferida, para outras pessoas pode ser s mais uma rvore do parque, mas para mim, a rvore, gosto de sentar embaixo dela, e

    ficar l, at a hora de ir embora chegar. Fico l observando as pessoas, lendo, olhando o lago.

    Escrevem sobre urbanismo, construes bizarras em meio aos bairros, figuras que encontram pelas ruas. Os cronistas registram a

    desigualdade social, procuram conversar sobre isso, militam e contam da militncia, por uma cidade melhor:

    A menina sorriu, e foi em frente, com o chinelo rosa fazendo barulho sobre as pequenas pedras, ela sorriu e pegou um pedao de pizza,

    algo que parecia ser precioso. E deu uma mordida. E foi vendo isso que eu entendi. Somos uma comunidade, precisamos uns dos

    outros, ajudamos uns aos outros e fazer algo gentil no custa caro, e por isso, pelo povo de So Paulo, por mim, por voc, por ns,

    estamos tentando salvar o parque Augusta.

    Em meio a reflexes sobre livros e mortes de personagens favoritos, escrevem sobre a crise hdrica e seus desdobramentos:

    EPA! Sem gua, no tem energia eltrica, pois ela vem das usinas hidroeltricas, que so movidas a gua. Ento, no teramos nem

    gua nem luz? Espero no precisar escrever uma crnica dizendo: como assim j acabou a luz?

    As crianas adolescentes escrevem sobre os espaos que ocupam e os espaos que gostariam de ocupar. Sobre modelos impostos, turmas,

    a medida das coisas e a prpria medida. Falam da dificuldade de simplesmente ser, achar um lugar para si neste mundo, na escola, na

    vida:

    Quando voc v uma pessoa na rua o que voc pensa sobre ela? No se engane com as aparncias ().

    Por que ser que todo roqueiro obrigado a usar roupa preta e ser rebelde? Por que todo mauricinho deve usar blusa polo com a gola

    alta? Por que ser que todo hippie toca violo e usa faixa na cabea?

    Ah velhos tempos discutindo com a minha me, e isso porque as crianas do meu colgio de Salvador diziam que eu era uma

    desenhista muito boa, e que tinha que me tornar artista, mas como assim eu TINHA que me tornar artista?

    No que pensam as crianas? (parte 2) http://educacao.estadao.com.br/blogs/colegio-equipe/no-que-...

    2 de 6 24/03/15 10:32

  • Eu sempre pensei: como assim s futebol? () Ento, aos 8 anos de idade, cheguei a uma concluso final. Cheguei concluso de que

    seria melhor viver em outro pas com outro futebol.() E com uma maior variedade de temas e medidas.

    Do que o Brasil.

    Feito para o futebol de p.

    Com uma menor variedade de temas.

    E tendo o Futebol como a maior e principal medida.

    Mas descobri que tambm h pessoas como eu.

    Pessoas da mesma medida a que eu perteno.

    Mas que gostam das mesmas coisas que eu gosto.

    E ento, descobri que, mesmo estando num pas futebolstico, poderia ficar nele em paz.

    Com a pequena medida.

    Sempre fui assim. Posso mudar algumas coisas, posso. Mas esse meu jeito, e jeito a gente no esquece, a gente zela, dentro da gente.

    As pessoas no podem ter o seu jeito? Tem que se preocupar com o que os outros pensam dela? Tem que ser idntica a todo o mundo?

    Se fosse assim, s existiriam clones sendo reproduzidos pelo mundo e pronto! Por isso que, se um dia essa onda realmente acontecer,

    vou querer ser um nada, para poder ser eu mesma.

    Escrevem sobre esteretipos, preconceitos e pedem para que sejamos, todos, mais gentis:

    Basicamente o que estou querendo dizer com esta crnica, que h bilhes de pessoas ao redor do mundo, que podem ter alguma

    ligao com voc ou no, mas o que importa que somos todos iguais, pode haver diferenas nas personalidades ou em outra coisa,

    mas todos ns temos os mesmos direitos e s vezes at os mesmos problemas, ento caro leitor, peo que da prxima vez que olhar

    para qualquer outra pessoa, pense duas vezes antes de falar algo que no seja um elogio, no quero tirar sua liberdade, quero apenas

    que sejamos pessoas melhores, que convivam melhor.

    No que pensam as crianas? (parte 2) http://educacao.estadao.com.br/blogs/colegio-equipe/no-que-...

    3 de 6 24/03/15 10:32

  • Escrevem sobre a noite. Os barulhos da casa noite, os bichinhos de pelcia aninhados na cama, e o prazer de ler:

    Toda a casa est escura, menos meu quarto. Os nicos barulhos que escuto so das pessoas conversando em prdios vizinhos e minhas

    gatas andando sutilmente (). Minha me e minha irm esto no quinto sono, eu no. Estou em minha cama, travesseiro apoiado na

    cabeceira, lenol cobrindo as pernas (que esto dobradas), todos os meus 7 bichinhos de pelcia exatamente posicionados em seus

    devidos lugares, meu abajur ligado e: um livro em meu colo.

    Contam sobre as descobertas da vida:

    Quando eu era menor, minha casa era rodeada por msicas. Meu irmo sempre colocava um disco na vitrola e aumentava o volume,

    colocava coisas como Clube da esquina. Ns corramos e danvamos pela casa cantando Um girassol da cor do seu cabelo. Ele me

    mostrava msicas do Caetano, Chico, Cazuza, Cartola, entre outros. Comecei a me interessar pela msica nacional, nossa msica. Um

    dia, quando eu tinha 11 anos de idade, ou mais, meu irmo me convidou para um show do Cazuza, ou melhor, com as msicas do

    Cazuza, que na poca j era falecido.

    As crianas cronistas afiam os olhos e buscam histrias. Falam sobre a chuva e as narrativas que a chuva traz. Cronistas que so, afiam o

    olhar sobre o mundo, e o observam, devagar:

    Eu gosto da chuva, eu gosto do frio que se sente quando a chuva est por vir (). Uma coisa que percebi que a chuva pode trazer

    tanto gua () quanto histrias, no importa se so insignificantes ou se so SUPER importantes, uma histria voc sempre vai ter.

    Quando finalmente chega minha hora de atravessar, vou andando bem devagar, ainda observando o homem das frutas. Mas um dia,

    olhei para o alto da arvore por onde passo todo dia e vi que no era uma rvore qualquer. Ela tinha chupetas. Vrias chupetas

    penduradas, rosas, azuis, verdes, sujas, rasgadas, quebradas.

    Escrevem sobre iguarias gourmet:

    Agora, muitas pessoas esto vindo para o lado delicioso da gastronomia barata, de um e cinquenta (). Esses so os amiguinhos do

    No que pensam as crianas? (parte 2) http://educacao.estadao.com.br/blogs/colegio-equipe/no-que-...

    4 de 6 24/03/15 10:32

  • Glico. A Julia no gosta de Glico, mas no o trata mal como o Joo. Ela diz que eu como tanto Glico que eu vou entrar em coma,

    principalmente agora, que a minha bebida preferida para acompanhar Dolly sabor fanta laranja ()

    e mamilos masculinos:

    Bom, quando eu tinha mais ou menos uns 8 anos de idade, eu cheguei a concluso de que os homens tinham mamilos para colocar

    piercings, mas eu achei que esta concluso era meio idiota, e por isso continuei achando-os uma coisa muito estranha. Eu passei muitos

    anos da minha vida tentando desvendar esta difcil e complexa questo que estava corroendo o meu crebro de curiosidade, at que um

    dia, eu li no Mundo Estranho que todo o mamfero independente do sexo, tm glndulas especializadas na produo de leite, e essas

    glndulas se concentram na regio dos mamilos ().

    Finalmente, os cronistas equipanos escrevem sobre o prprio ato de escrever. O dom das palavras, seu uso e poder.

    Eu nunca entendi o nome dos objetos! Para mim to difcil entender o sentindo do nome travesseiro, por que no apoiador de

    cabeas? Como que a pessoa que nomeou o travesseiro de travesseiro fez?

    Em um mundo onde todos falam, mas poucas pessoas realmente dizem alguma coisa, nasceu um menino: Silncio, filho da Voz e do Som:

    Em um mundo em que as pessoas tinham nomes () exticos, um garoto chamado Silncio, de dez anos, s sabia dizer a palavra

    FALA. () ele dizia principalmente quando as pessoas comeavam a dizer vrias coisas ao mesmo tempo e muito rpido, isso deixava

    ele nervoso e para tentar fazer parar gritava FALA. Todos ensinavam (ou tentavam ensinar), outras palavras pra ele, mas ele

    continuava dizendo FALA. Com o tempo seus pais, Voz e Som, estavam achando isso muito estranho, e foram em busca de terapeutas,

    mdicos, ou qualquer coisa que fizesse Silncio a falar.

    No Colgio Equipe acreditamos que educar um diretivo e poltico, de otimismo e esperana. Os cronistas equipanos pensam muito,

    escrevem e reescrevem um bocado, sobre muitas coisas. Em tempos desesperanados, ou no, ouvir suas vozes d fora e alento.

    Aprendamos com eles: que possamos ser mais gentis, melhorar a nossa cidade, descobrir nossos espaos, achar nossas medidas, ler

    nossos livros, chorar por nossas perdas. Que possamos brincar nas ruas, percorr-las livremente, descobri-las; que cultivemos nossas

    amizades e conversas, os cuidados familiares, as brigas. Que possamos escrever e ler, falar e escutar, Achar nossas vozes, em meio a tanto

    barulho.

    Luana Chnaiderman de Almeida

    Professora de Portugus do F2 do Colgio Equipe e autora do livro Minhocas, Editora Cosac Naify, 2014.

    No que pensam as crianas? (parte 2) http://educacao.estadao.com.br/blogs/colegio-equipe/no-que-...

    5 de 6 24/03/15 10:32

  • Para acessar o blog Blogueiros equipanos, com o link de todos os blogs e mais explicaes sobre o projeto:

    No que pensam as crianas? (parte 2) http://educacao.estadao.com.br/blogs/colegio-equipe/no-que-...

    6 de 6 24/03/15 10:32