41
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES LORRANA ALMEIDA T P DE ALBUQUERQUE O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE TELECOMUNICAÇÕES, EM ESPECIAL, A TELEFONIA. RIO DE JANEIRO 2008

O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

  • Upload
    buingoc

  • View
    244

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

LORRANA ALMEIDA T P DE ALBUQUERQUE

O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE

TELECOMUNICAÇÕES, EM ESPECIAL, A TELEFONIA.

RIO DE JANEIRO

2008

Page 2: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

LORRANA ALMEIDA T P DE ALBUQUERQUE

O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE

TELECOMUNICAÇÕES, EM ESPECIAL, A TELEFONIA.

Monografia apresentada ao Curso de Pós Graduação da Universidade Cândido Mendes.

Orientadora: Professora Cláudia Gurgel

RIO DE JANEIRO

2008

Page 3: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

RESUMO

Demonstra a transformação ocorrida no setor de telecomunicações, especialmente no que diz respeito à telefonia, por meio da entrada de empresas privadas no mercado das telecomunicações. Apresenta o modelo jurídico regulatório de telecomunicações instituído pelo Estado e o papel da agência reguladora criada para regular o setor, a Agência Nacional de Telecomunicações, abordando suas características e a eficácia da sua gestão.

Palavras-chave: Setor de Telecomunicações. Telefonia. Agência Reguladora. Agência Nacional de Telecomunicações.

Page 4: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

ABSTRACT

Demonstrates the changes occurred in the telecommunications sector, especially to what concerns telephone services, on the virtue of the entrance of private companies in the Brazilian telecommunications market. Analyses the telecommunications legal regulatory model founded by the Brazilian government and the role of the regulatory agency created to regulate the sector, namely the National Telecommunications Agency, pointing out its characteristics and the effectiveness of its administration.

Keywords: Telecommunications Sector. Telephone Services. Regulatory Agency. National Telecommunications Agency.

Page 5: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANATEL - Agência Nacional de Telecomunicações

CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica

CONTEL - Conselho Nacional de Telecomunicações

CTB - Código Brasileiro de Telecomunicações CDC – Código de Defesa do Consumidor DENTEL - Departamento Nacional de Telecomunicações EMBRATEL - Empresa Brasileira de Telecomunicações FISTEL - Fundo de Fiscalização dos Serviços de Telecomunicações FNT - Fundo Nacional de Telecomunicações LGT - Lei Geral de Telecomunicações PGO - Plano Geral de Outorgas STFC - Serviço Telefônico Fixo Comutado

Page 6: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 9

2 CENÁRIO BRASILEIRO ACERCA DAS TELECOMUNICAÇÕES,

EM ESPECIAL, A TELEFONIA .......................................................................... 11

2.1 Breve histórico do Serviço de Telefonia .................................................... 11

2.2 Sistema TELEBRÁS...................................................................................... 15

2.3 Constituição Federal de 1988 ...................................................................... 19

2.4 Emenda Constitucional n.º 8, de 1995......................................................... 21

2.5 Privatização do setor de Telecomunicações .............................................. 23

2.5.1 Privatização do Sistema Telebrás ............................................................... 24

3 ATUAL MODELO JURÍDICO REGULATÓRIO DE TELECOMUNICAÇÕES

ADOTADO PELO BRASIL ................................................................................. 27

3.1 Lei Mínima de Telecomunicações............................................................. 27

3.2 Lei Geral de Telecomunicações - LGT...................................................... 29

4 AGÊNCIA REGULADORA ANATEL. .............................................................. 34

4.1 Agência Nacional de Telecomunicações e suas características ........... 34

4.1.1 Natureza Jurídica ........................................................................................ 35

4.1.1.1 .Independência decisória ......................................................................... 36

4.1.1 2 .Ausência de subordinação hierárquica ................................................... 37

4.1.1.3 .Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ............................................ 38

4.1.1.4. Autonomia finaceira ................................................................................ 39

Page 7: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

4.1.1.5. Poder normativo ..................................................................................... 40

4.1.2 Funções da ANATEL: reguladora, fiscalizatória e sancionatória ............... 42

4.1.2.1 Função Reguladora ................................................................................. 42

4.1.2.2 Função Fiscalizatória .............................................................................. 44

4.1.2.3 Função Sancionatória ............................................................................. 44

4.2 A ANATEL e o CADE ................................................................................. 46

4.3 Estratégia pró-competição: assimetrias regulatórias ............................. 47

5 OS PROBLEMAS ENFRENTADOS PELO MODELO

DE TELECOMUNICAÇÕES................................................................................ 52

5.1 Falta de concorrência nos serviços de telefonia .................................... 52

5.2 Atuação da ANATEL junto aos usuários .................................................. 56

6 CONCLUSÃO .................................................................................................. 59

REFERÊNCIAS ................................................................................................... 61

Page 8: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Capítulo 1:

ATUAL MODELO JURÍDICO REGULATÓRIO DE TELECOMUNICAÇÕES ADOTADO

PELO BRASIL

A reestruturação do modelo de telecomunicações vigente tinha como objetivo

acompanhar a evolução e o dinamismo do setor no contexto da globalização, tanto no

que diz respeito à modernização e diversificação das redes e serviços, quanto em

universalizar a prestação dos serviços básicos de telecomunicações.

Outro aspecto que reforçou a feitura do modelo foi a pressão da comunidade

internacional. O Brasil havia se tornado um mercado muito atrativo em virtude da sua

demanda reprimida para as empresas multinacionais e o país havia obtido destaque,

principalmente em razão de sua participação nos Acordos Gerais sobre Comércio e

Tarifas ("Gatt"), bem como sobre Comércio de Serviços ("Gats"), que lhe exigia certa

adaptação regulatória em seus setores econômicos, como as telecomunicações.

Há, ainda, outros dois aspectos relevantes na elaboração do modelo regulatório

adotado: (i) o primeiro seria a criação de um específico modelo institucional, um órgão

regulador independente e com grande autonomia, que seria a Agência Nacional de

Telecomunicações ("ANATEL"); (ii) o segundo seria o fato da experiência internacional

na reestruturação das telecomunicações ter contribuído no aprendizado do Brasil na

formulação do seu quadro regulatório.

Lei Mínima de Telecomunicações e Lei Geral de Telecomunicações - LGT

Page 9: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Não obstante a criação de uma lei geral que regulamentaria o setor de

telecomunicações, foi editada a Lei Mínima n.º 9.295, de 1996, considerada uma lei de

transição. Tal legislação deu provisoriamente competência regulatória ao Ministério das

Comunicações, permitindo assim a abertura do setor.

Aprovada em caráter emergencial, a referida norma dispôs sobre a organização

dos serviços de telecomunicações, a exploração do Serviço Móvel Celular, de Serviço

Limitado e de Serviço de Transporte de Sinais de Telecomunicações por Satélite, bem

como a utilização da rede pública de telecomunicações para a prestação de Serviço de

Valor Adicionado.

A citada lei foi importante, posto que estabeleceu as condições jurídicas para

licitação das concessionárias para a exploração dos serviços de telefonia celular, da

Banda B. A telefonia celular de Banda A referia-se à faixa de freqüência utilizada pelas

antigas operadoras, as estatais. É relevante destacar que até o momento da vigência

da Lei Mínima não se discutia o que fazer com Sistema TELEBRÁS, pois o mesmo só

foi à leilão em 1998.

Mister se faz ressaltar que as regras aplicáveis à telefonia e às redes eram

elaboradas internamente pela TELEBRÁS, ou seja, a regulamentação dos serviços de

telecomunicações era feita pela própria prestadora do serviço, antes da Emenda

Constitucional nº8, de 1995, e da Lei Mínima. Convém notar que nesse sistema de

auto-regulação, no qual o órgão regular coincidia com o prestador do serviço, a

regulamentação do serviço de telecomunicações era ínfima preenchia apenas algumas

poucas páginas da lista telefônica.

Após a Lei Mínima, na busca pela desestruturação do monopólio estatal das

telecomunicações brasileiras, vários regulamentos foram editados. Finalmente, em

Page 10: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

1997, foi editada a Lei Geral de Telecomunicações ("LGT"), que viria regulamentar,

definitivamente, o novo modelo regulatório implantado no País.

A Lei nº 9.472, promulgada em 16.01.1997, conhecida como Lei Geral de

Telecomunicações (“LGT”), passou a regulamentar efetivamente o art. 21, XI, da

Constituição Federal, visto que disciplina os serviços de telefonia fixa, serviços de

telefonia móvel e demais serviços considerados como serviços de telecomunicações.

Dentre outras coisas, estabeleceu normas regulamentares sobre exploração,

organização, fiscalização de execução, comercialização, implantação e uso dos

serviços, visando, sobretudo, a instituição da competição do setor, retirando do Estado

o papel de operador e executor dos serviços, fortalecendo, todavia, a sua função

regulatória e fiscalizadora.

A elaboração desta lei levou em consideração o contexto histórico do momento,

Por isso, após a promulgação da Emenda Constitucional nº 8, de 1995, o Governo

brasileiro contratou uma robusta equipe de consultores, advogados e professores de

Direito Administrativo para criá-la.

Logo que começou a vigorar, a referida lei foi alvo de muita discussão e críticas,

no entanto, após estudos mais aprofundados sobre a legislação, verificaram que se

tratava de uma legislação de vanguarda, com algumas peculiaridades absolutamente

adequadas ao nosso ordenamento jurídico.

A LGT, portanto, marcou definitivamente o término da intervenção direta do

Estado nas telecomunicações, ao autorizar a privatização do Sistema TELEBRÁS e a

criação da Agência Reguladora do setor, qual seja, a Agência Nacional de

Telecomunicações (“ANATEL”).

Page 11: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Imperioso destacar que a LGT determinou as diretrizes básicas para

regulamentação do setor que seriam: (i) a universalização e expansão dos serviços de

telecomunicações; (ii) o estímulo à concorrência, em um primeiro momento, com o

duopólio na telefonia fixa e celular, com previsão de liberalização do mercado a partir

de 31 de dezembro de 2001; e (iii) a garantia de um padrão de qualidade compatível

com as necessidades dos usuários.

A aludida lei dispõe sobre os princípios1 norteadores das relações econômicas

no setor de telecomunicações, que foram reproduzidos na lei princípios constitucionais,

e os basilares dos serviços de telecomunicações, entre os quais vale destacar o da livre

concorrência, o da ampla e justa competição entre as companhias prestadoras,

devendo o Poder Público, através da agência reguladora ANATEL, intervir para

fiscalizar e reprimir as infrações da ordem econômica e os abusos praticados pelas

operadoras.

Conforme preceituação da LGT, os serviços de telecomunicações podem ser

classificados em dois regimes distintos, a saber: público e privado.

Na prestação de serviço em regime público, a exploração do serviço depende de

prévia Outorga da ANATEL, sendo a concessão o instrumento jurídico adequado para

exploração do serviço nesse regime. A concessão do serviço de telecomunicações é a

delegação de sua prestação, através de contrato e por prazo determinado, segundo o

Art. 83, parágrafo único, do referido diploma legal.

1 Lei Geral de Telecomunicações "Art. 5º Na disciplina das relações econômicas no setor de telecomunicações observa-se-ão, em especial, os princípios constitucionais da soberania nacional , função social da propriedade, liberdade de iniciativa, livre concorrência, defesa do consumidor, redução das desigualdades regionais e sociais, repressão ao abuso do poder econômico e continuidade do serviço prestado no regime público. Art 6º Os serviços de telecomunicações serão organizados com base no princípio da livre, ampla e justa competição entre todas as prestadoras, devendo o Poder Público atuar para propiciá-la, bem como para corrigir os efeitos da competição imperfeita e reprimir as infrações da ordem econômica.

Page 12: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

As empresas concessionárias assumem o risco do negócio e são remuneradas

pelas tarifas cobradas dos usuários que usufruem os serviços ou por outras receitas

alternativas, devendo responder diretamente pelas suas obrigações e pelos prejuízos

que causar.

Outro ponto relevante em relação à concessão, diz respeito à obrigatoriedade da

universalização e da continuidade atribuída às prestadoras de serviço em regime

público. Por universalização entende-se a possibilidade de acesso de qualquer pessoa

ou instituição ao serviço de telecomunicações, independentemente da sua localização

ou condição sócio-econômica, bem como a utilização das telecomunicações em

serviços essenciais de interesse público. A continuidade, no entanto, refere-se à fruição

do serviço de forma ininterrupta, devendo o serviço estar à disposição do usuário, sem

que haja paralisações injustificadas.

Convém salientar que as concessões de serviço público não terão caráter de

exclusividade, logo, devem seguir o Plano Geral de Outorgas2 ("PGO"), aprovado pelo

Decreto n.º 2.534, de 2 de abril de 1998.

O citado decreto, de suma importância para o setor, dividiu o país em quatro

áreas, sendo três para prestação de serviço de telefônico local, tendo como players as

empresas Telesp, Tele Norte-Leste e Tele Centro-Sul em regime público, e uma outra

área para prestação de serviço telefônico na modalidade longa distância nacional e

internacional, tendo a Embratel como a concessionária representante desta área.

2 O Decreto, de 2 de abril de 1998, que instituiu o Plano Geral de Outorgas fixou regras básicas para a prestação de serviço da telefonia fixa e dividiu o País em quatro diferentes áreas de prestação de serviço, a saber: (i) Região I – Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí, Maranhão, Pará, Amapá, Amazonas e Roraima; (ii) Região II – Distrito Federal e Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins, Rondônia e Acre; (iii) Região III – Estado de São Paulo, e (iv) Região IV - Nacional

Page 13: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Entretanto, as citadas empresas não detinham exclusividade para atuar naquelas

áreas delimitadas pelo Plano Geral de Outorgas (“PGO”).

A não exclusividade se deu em virtude da licitação dos termos de autorização para operação de "empresas-espelhos" nas áreas de atuação das concessionárias de telefonia fixa, a fim propiciar, dessa forma, um ambiente competitivo, observando também o princípio do maior benefício ao usuário e interesse social e econômico do país.

Quanto à prestação de serviço em regime privado, a mesma ocorre através do

instrumento jurídico denominado Autorização, que vem a ser o ato administrativo

vinculado que faculta a exploração do serviço de telecomunicações, desde que

preenchidas as condições objetivas e subjetivas necessárias.

No aludido regime, os serviços estão sujeitos aos princípios da livre iniciativa e

da mínima interferência do Poder Público.

Atualmente, apenas o Serviço Telefônico Fixo Comutado3 ("STFC"), oferecido

pelas concessionárias, e o Serviço de Comunicações Digitais são prestados em regime

público. Todos os outros serviços são prestados em regime privado, inclusive os

prestados pelas "empresas-espelhos".

O intuito da divisão dos regimes de prestação de serviços entre público e privado

foi de garantir a população os serviços de telecomunicações considerados mais

relevantes, por isso sujeitos a maiores condicionamentos e interferências do Poder

Público em sua prestação, como a telefonia fixa, e, por outro lado, simplificar a outorga

da prestação dos demais serviços.

O novo modelo permitiu uma expansão admirável dos serviços de

telecomunicações. E isso significou uma revolução na telefonia brasileira em todos os

sentidos.

3 Entende-se por Serviço Telefônico Fixo Comutado aquele serviço de telecomunicações que, por meio de transmissão de voz e de outros sinais, destina-se à comunicação entre pontos fixos determinados, utilizando processo de telefonia.

Page 14: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

A oferta de linhas telefônicas fixas e celulares contrasta, nesse momento, com a

precariedade na oferta de serviços telefônicos observada no País durante a vigência do

Sistema TELEBRÁS, anterior à privatização.

Capítulo 2:

AGÊNCIA REGULADORA DE TELECOMUNICAÇÕES

Page 15: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

A criação das agências reguladoras no país é resultado direto do processo de

retirada do Estado na economia, instituídas com o escopo de normatizar, fiscalizar e

regular os setores dos serviços delegados, buscando equilíbrio e harmonia entre o

Estado, usuários e as prestadoras de serviço de telecomunicações.

A função regulatória exercida pelas agências possui papel de suma relevância no

cumprimento das políticas determinadas pelo Estado, posta sua característica gerencial

(técnica) e de controle sobre os entes regulados. O antigo Estado executor deixa de

existir para dar lugar ao Estado regulador.

As agências foram criadas como autarquias em regime especial, considerando-

se como um conjunto de privilégios específicos outorgados pela lei à determinada

entidade para a consecução de seus fins. Privilégios estes caracterizados basicamente

pela independência administrativa, fundamentada pela estabilidade de seus dirigentes –

cujos mandatos são fixos -, autonomia financeira e poder normativo.

No âmbito das telecomunicações, a agência reguladora responsável pela

regulação do setor é a Agência Nacional de Telecomunicações, a ANATEL .

4.1 Agência Nacional de Telecomunicações e suas características

Como visto anteriormente, a Emenda Constitucional n.º 8, de 1995, extinguiu o

monopólio estatal sobre as telecomunicações, mantendo, no entanto, a titulariedade do

serviço à União, passando a admitir a execução indireta do serviço através de

concessão, permissão e autorização ao ente privado. Restou claro na regra

constitucional a criação de um órgão regulador que teria como funções primordiais

fiscalizar, normatizar e regular os serviços de telecomunicações.

Page 16: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Desse modo, a Lei Geral de Telecomunicações dispôs sobre a criação e as

características do órgão regulador de telecomunicações, a Agência Nacional de

Telecomunicações ("ANATEL"), em seu art. 8º, in verbis:

Art. 8º Fica criada a Agência Nacional de Telecomunicações, entidade integrante da Administração Pública Federal indireta, submetida a regime autárquico especial e vinculada ao Ministério das Comunicações, com função de órgão regulador das telecomunicações, com sede no Distrito Federal, podendo estabelecer unidades regionais. [...] § 2º A natureza de autarquia especial conferida à Agência é caracterizada por independência administrativa, ausência de subordinação hierárquica, mandato fixo e estabilidade de seus dirigentes e autonomia financeira."

Em virtude do disposto na lei, convém tratar das peculiaridades atribuídas ao

órgão regulador das telecomunicações.

4.1.1 Natureza Jurídica

Conforme depreendido da leitura do dispositivo legal, a ANATEL constitui-se

numa entidade da Administração Pública Indireta, ou seja, em um conjunto de pessoas

administrativas que, vinculada à respectiva Administração Direta, têm o objetivo de

desempenhar as atividades administrativas de forma descentralizada4.

É cristalino também a natureza jurídica atribuída à Agência, qual seja, de

autarquia especial, vinculada ao Ministério das Telecomunicações. Como autarquia

4 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 12º ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p.407

Page 17: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

especial goza de algumas prerrogativas constituídas em lei, que a diferencia das

demais autarquias, explicadas a seguir.

4.1.1.1 Independência decisória

A independência das agências reguladoras, no caso, da ANATEL, deve ser

entendida em compatibilidade com o regime constitucional brasileiro.

A independência decisória consiste na capacidade da Agência em estabelecer

objetivos e prerrogativas adequadas ao exercício de sua competência, com o fim de

regular as operações realizadas pelas concessionárias de maneira imparcial e efetiva.

Refere-se também a sua capacidade para compor conflitos, controlar as atividades

realizadas no setor, bem como para fiscalizar a política tarifária.

Conforme estabelecido no art. 195, inciso XVII da LGT, é de competência da

Agência a solução dos conflitos entre as prestadoras de serviço e a Administração

Pública, dos conflitos entre as diversas prestadoras que atuam no setor; e, entre estas

e os usuários.

Quanto aos consumidores, a questão que se insurge seria se as agências

reguladoras estariam sujeitas ao Código de Defesa do Consumidor (“CDC”), vez que, a

princípio, caberia àquelas a defesa do consumidor quando este receber tratamento

indevido pela prestação dos serviços por parte das operadoras.

5 Lei Geral de Telecomunicações Art. 19. À Agência compete adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento das telecomunicações brasileiras, atuando com independência, imparcialidade, legalidade, impessoalidade e publicidade, e especialmente: XVII - compor administrativamente conflitos de interesses entre prestadoras de serviço de telecomunicações;

Page 18: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Há de se ressaltar que a independência decisória da Agência no que tange à

resolução de conflitos esbarra na garantia constitucional enunciada pelo princípio da

inafastabilidade do acesso ao poder judiciário, prevista no art. 5º, inciso XXXV, da

Constituição Federal, posto que nenhuma lesão ou ameaça de lesão escapará à

apreciação do Poder Judiciário. Dessa forma, a Agência pode até dirimir conflitos em

última instância administrativa, mas não poderá impedir o controle de suas decisões,

caso o prestador do serviço de telecomunicações ou o consumidor que se julgarem

prejudicados com tais decisões, buscando o poder judiciário.

4.1.1.2 Ausência de subordinação hierárquica

A legislação de telecomunicações dispõe no seu art. 8º, § 2º, que a ANATEL não

possui vínculo com a Administração Direta, desse modo, não se aplica o princípio da

Tutela o qual prevê a competência da Administração Direta para rever os atos

praticados por qualquer das entidades da Administração Indireta. O vínculo limita-se à

escolha de seus dirigentes pelo Chefe do Poder Executivo.

A ausência de subordinação hierárquica está caracterizada na independência

administrativa da Agência. Esta não se subordina a nenhum outro órgão, é a “dona” de

seus atos e responsável por suas conseqüências; responsável pela composição,

nomeação e dispensa de seus membros com mandatos fixos, e outras prerrogativas

adequadas ao seu exercício.

Significa dizer, em outras palavras, que a Agência tem poder para contratar e

administrar em seu próprio nome, contrair obrigações e adquirir direitos, desde que o

faça dentro das regras do ordenamento jurídico vigente brasileiro.

Page 19: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

4.1.1.3 Mandato fixo e estabilidade de seus dirigentes

As leis, que instituem as agências reguladoras, prescrevem os processos para

nomeação de seus dirigentes, distintos daqueles expressamente elencados pelo art. 37

da Constituição Federal de 1988. Os dirigentes da Anatel têm seu processo de

nomeação descrito na Lei Geral das Telecomunicações - LGT.

A estabilidade de seus dirigentes no exercício do cargo é garantida pelo mandato

fixo, que só poderá ser perdido nos casos expressamente previsto, afastando, assim, a

hipótese de exoneração ad nutum, o que realça, ainda mais, a autonomia funcional da

Agência.

As garantias dos dirigentes do órgão regulador são fundamentais para assegurar

à Agência a autonomia e independência necessária para lhes permitir julgar com

imparcialidade. Permitem que os mesmos resistam às pressões dos interesses políticos

e econômicos, restando assegurada uma imprescindível intangibilidade política.

Aos dirigentes é vedado o exercício profissional, empresarial e político-partidário

concomitante com o exercício da função; devem se submeter a um regime de

exclusividade, afastando qualquer tipo de conflito de interesses. Terminado o mandato,

devem passar por um período de incompatibilidade, impedidos até de representarem

qualquer pessoa ou interesse perante à Anatel pelo prazo de 1 (um) ano.

Vale comentar o questionamento que se insurge acerca da validade jurídica do

mandato com prazo fixo, sob alegação de que diante a ausência de concurso o cargo

deveria ser considerado de confiança, sendo demissível ad nutum. No entanto, confere-

Page 20: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

se o conteúdo presente no art. 37, I, da Constituição Federal, que enuncia o acesso aos

cargos públicos de todos que preencham os requisitos legais exigíveis.

A LGT descreve os requisitos para preenchimento do cargo, a saber: (i) ser

brasileiro; (ii) ter reputação ilibada; (iii) possuir formação universitária e elevado conceito

no campo de sua especialidade; e (iv) ser escolhido pelo Presidente da República e por

ele nomeado, após aprovação pelo Senado Federal. Desse modo, desde que satisfeitos

os requisitos não poderá haver perda do cargo, salvo nos casos previstos em lei.

Os dirigentes são agentes políticos que se submetem aos critérios definidos em

leis, por conseguinte, a liberdade do administrador na sua exoneração é limitada,

diferente dos agentes administrativos cuja dos outros incisos do art. 37 da Constituição

Federal se impõe.

4.1.1.4 Autonomia financeira

A agência de telecomunicações usufrui de autonomia financeira, característica

relevante para exercer suas prerrogativas adequadamente e de forma imparcial. Assim,

a fim de impedir a submissão da Agência a qualquer tipo de condição, foi estabelecida

uma forma de aquisição de receita sem que os recursos transitem pelo erário.

Os recursos da Agência, portanto, advêm diretamente da taxa de regulação

instituída às empresas outorgadas, que engloba a taxa de fiscalização, instalação e

funcionamento das empresas. Tal taxa tem relação direta com o aproveitamento

financeiro obtido com a outorga.

A natureza da taxa de regulação é contratual, posto que sua cobrança é oriunda

do contrato firmado entre o prestador do serviço de telecomunicações e poder

Page 21: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

concedente. É pagamento contratualmente estipulado, para que, conforme determina a

legislação, possa ser exercido o controle do serviço autonomamente, ponto este

interessante para ambas as partes, logo que assegura a segurança jurídica dos

investimentos.

O produto arrecadado com esta taxa de regulação é revertido para o Fundo de

Fiscalização das Telecomunicações ("FISTEL") gerido pela própria Agência, por

conseguinte, os recursos do ente regulador vêm diretamente da arrecadação do

FISTEL sem ter que passar pelas mãos do Poder Executivo. Assim, a Agência não

depende das verbas orçamentárias para o seu custeio próprio.

4.1.1.5 Poder normativo

Levando-se em consideração as características especiais que foram concebidas

às agências reguladoras, o poder normativo é, sem dúvida, o que causa mais polêmica.

Controvertida porque se transfere para entidades da Administração Indireta

competência legislativa, através de lei ordinária, o que, em princípio, fere os princípios

da legalidade6 e o da separação dos poderes7.

Esta competência para "legislar", não por lei, mas através de ato normativo

próprio, sobre determinada matéria, ocorre por causa do fenômeno denominado

deslegalização, um tipo de delegação de competência defendido por Diogo de

Figueiredo Moreira Neto. 6 O princípio da legalidade, dogma, consagrado pela Constituição vigente (art. 5º, II) prevê que ninguém será obrigado a fazer alguma coisa senão em virtude de espécie normativa devidamente elaborado pelo Poder competente. 7 Trata-se de uma expressão clássica a Separação dos Poderes, no entanto, é pacífico que o poder do Estado é uno e indivisível. O que se verifia é a Separação das Funções estatais, quais sejam: a Função Executiva, Legislativa e Judiciária.

Page 22: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

A deslegalização legislativa objetiva dar a possibilidade de se editar normas de

cunho exclusivamente técnico e de forma rápida.

O instituto da deslegalização permite a outras fontes normativas regular por atos

próprios determinada matéria, ou seja, é retirada do âmbito da lei propriamente dita a

responsabilidade de reger determinada matéria específica.

A Constituição vigente, em vários dispositivos, traz a possibilidade de

deslegalização. Vejamos: Art. 22, parágrafo único; art. 217, I, e seu parágrafo 1º; art.

220, parágrafos 3º e 4º; Emenda Constitucional n.º 8 que alterou a redação do art. 21,

XI; a Emenda Constitucional n.º 9 que alterou o redação do art. 177, parágrafo 2º, III.

Como o constituinte não proibiu genericamente a deslegalização será possível

aduzir que o instituto será sempre possível no ordenamento constitucional, desde que

a Constituição não a vede Expressamente.

O poder normativo das agências reguladoras é pressuposto para que a

regulação ocorra de modo satisfatório e íntegro. Corroborando com tal entendimento,

Diogo de Figueiredo Moreira Neto explica:

[...] essa competência normativa atribuída às agências reguladoras é chave de uma desejada atuação célere e flexível para a solução, em abstrato e em concreto, de questões em que predomine a escolha técnica, distanciada e isolada das disputas partidarizadas e dos complexos debates congressuais em que preponderam as escolhas abstratas político-administrativas.

O poder normativo da Anatel, portanto, não abrange o poder de regulamentar

leis, não podendo inovar na ordem jurídica ou contrariá-la. A normatização deve apenas

definir regras e parâmetros técnicos referentes à atividade de telecomunicações.

4.1.2 Funções da Anatel: reguladora, fiscalizatória e sancionatória

Page 23: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

São amplas as funções dadas às agências reguladoras: regular determinado

setor, organizar o funcionamento do respectivo serviço público, fiscalizar a prestação do

serviço e as entidades prestadoras do serviço, dirimir conflitos entre o Poder

Concedente, empresas outorgadas e usuários, dentre outros.

A lei que institui a agência reguladora é responsável por traçar as suas funções .

Em se tratando da Anatel, suas funções encontram-se disciplinadas no art. 19 da LGT,

o qual determina o âmbito da sua competência.

4.1.2.1 Função reguladora

Dentre as funções desempenhadas pela Agência, a função de reguladora que se

concretiza no gerenciamento e controle os entes regulados se apresenta essencial na

efetividade do processo de desestatização, no cumprimento das políticas determinadas

pelo Estado.

No exercício dessa atribuição a Agência deve buscar a harmonia dos interesses dos

consumidores, como o preço e qualidade, com os interesses do ente regulado e do Estado,

fazendo com que a transferência da prestação de serviço público seja interessante para

todas as partes envolvidas.

Esta função pressupõe a existência de um instrumento regulatório determinado por

lei, em respeito ao princípio da Legalidade, o que definem como “marco regulatório”,

definido como um conjunto de orientações, regras e valoração, gerido por ente regulador,

o qual operar toda as medidas e indicações necessárias ao ordenamento e à gestão

eficiente do serviço público concedido.

Page 24: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Questiona-se, no entanto, se a Agência teria como um dos seus escopos da

função reguladora ou a regulamentadora. A fim de ilustrar a essa distinção, segue a

conceituação dos institutos segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

Regular significa estabelecer regras , independentemente de quem a

dite, seja o Legislativo ou o Executivo, ainda que por meio de órgãos da

Administração direta ou indireta. Trata-se de vocábulo de sentido mais estrito8.

Regulamentar significa também ditar regras jurídicas, porém, no

direito brasileiro, como competência exclusiva do Poder Executivo. Perante a

atual Constituição, o poder regulamentar é exclusivo do Chefe do Poder

Executivo (art. 84, IV), não sendo incluído no parágrafo único do mesmo

dispositivo , entra as competências delegáveis 9.

Conforme se depreende da leitura exposta, à Agência não

cabe o função de regulamentar, este é exclusivo do chefe do Poder Executivo, e

sim o poder de regular.

É importante relembrar que o novo modelo de gestão dos

serviços públicos escolhido pelo Estado, transformou o Estado executor, antigo

prestador direto dos serviços públicos, em um Estado regulador, o qual deixou

de executar diretamente tais serviços para executá-los de forma indireta através

de entes privados, passando apenas a regulá-los.

8 DI PIETRO, Maria Sylvia. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. 3 ed. São Paulo: Atlas, 1999, p 140 9 Idem, p 141

Page 25: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

3.1.2.2 Função fiscalizatória

A todas agências reguladoras cabe a função fiscalizatória sobre os agentes que

se encontram sobre a sua área de atuação. À ANATEL, cabe a fiscalização dos

serviços de telecomunicações.

A Agência pode, por exemplo, a qualquer tempo, por meio dos seus agentes,

realizar fiscalizações diretamente na prestadora, a fim de checar se os serviços estão

sendo prestados de acordo com as normas vigentes.

Contudo, vale a ressalva de que esse poder-dever não deve retirar da própria

prestadora de serviço o poder de gestão. A Administração tem como missão fiscalizar,

ela não administra a execução do serviço. Assim, a Agência pode exercer seu controle

por meio de mecanismos que ela própria cria, mas sem, contudo, retirar das

prestadoras a capacidade de autodeterminação na atividade regulada.

4.1.2.3 Função sancionatória

A LGT, em seu art. 19, XVII, preceitua que a Anatel possui competência para

compor administrativamente conflitos de interesses entre prestadoras de serviço de

telecomunicações.

Page 26: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Na realidade, com a exceção da Agência Nacional das Águas (‘ANA”), todas as

agências reguladoras possuem em suas leis de criação alguma previsão expressa que

as autorize a aplicar sanções administrativas.

A Agência, em geral, tem o poder de aplicar sanções decorrentes do

descumprimento de preceitos legais, normativos ou contratuais, em virtude da

competência fiscalizatória que lhe fora atribuída.

Às agências reguladoras têm sido atribuída a função de receber as denúncias e

as reclamações oriundas dos usuários, para tanto, foi prevista em suas leis instituidoras

a existência de um órgão ouvidor (OUVIDORIA), com intuito de estabelecer um canal

de acesso da sociedade. Dessas denúncias e reclamações caberão ao ente regulador a

resolução e a conseqüente sanção, caso o prestador seja considerado culpado.

Nessa seara, podemos também mencionar a instauração dos Procedimento de

Apuração por Descumprimento de Obrigação (“PADO”). Os chamados PADOs são

instaurados em virtude do não cumprimento de determinada obrigação ou em virtude de

uma reclamação de usuários. Tais procedimentos são investigados, assegurado o

devido processo legal e o contraditório, e caso a prestadora não consiga provar que

não possui culpa, a mesma sofrerá a devida sanção.

Logo, a função sancionatária deriva do poder que a Agência tem para dirimir os

eventuais conflitos existentes, bem como do não cumprimento por partes das

prestadoras de suas obrigações.

4.2 A ANATEL e o CADE

Page 27: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

O quadro regulatório desenhado pelo País coadunado com o disposto na LGT

procurou traçar diversas salvaguardas para evitar a prática de ações anticompetitivas

por parte das empresa de telecomunicações, para tanto aproveitou-se da experiência

internacional sobre o assunto.

Por esta razão a LGT, com o fim de proteger a ordem econômica, a legislação das

telecomunicações trouxe ao setor a atuação do Conselho Administrativo de Defesa

Econômica10 (“CADE”), permitindo a aplicação complementar da Lei de Defesa da

Concorrência – Lei n.º 8.884/9411.

Tal permissão implica a submissão das empresas de telecomunicações ao citado

órgão regulador da concorrência de todos os atos que possam limitar ou prejudicar a livre

concorrência.

Isto quer dizer que os atos envolvendo prestadoras de serviço telecomunicações, no

regime público ou privado, que de alguma forma visem algum tipo de concentração

econômica, mediante fusão ou incorporação de empresas, por exemplo, ficam submetidos

à apreciação do CADE.

A Anatel, portanto, possui amplos poderes para defender a competição no setor

de telecomunicações, sendo sua competência, em suma, agir preventivamente,

deixando ao CADE a função de atuar posteriormente, caso a caso, sempre que houver

10 O CADE, órgão colegiado judicante com jurisdição em todo o território nacional, foi criado pela lei n.º 4.137, de 10 de setembro de 1962. É responsável pela instância administrativa de julgamento das práticas anticompetitivas e operações de concentração.Na execução de suas tarefas recebe o auxílio de dois outros órgãos responsáveis pela investigação e instrução processual, a saber: a Secretaria de Acompanhamento Econômico (“SEAE”), vinculada ao Ministério da Fazenda, e a Secretaria de Direito Econômico (“SDE”) vinculada ao Ministério da Justiça. 11 A Lei de Defesa da Concorrência, Lei n.º 8.884, de 11 de junho de 1994, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico (Art. 1)

Page 28: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

o seu acionamento por parte da Agência, para julgar se o ato em questão constitui-se

ou não em infração da ordem econômica.

A atribuição do CADE caracteriza-se como corretiva, cabe ao órgão analisar

cada caso para depois definir se houve abuso e infrações à ordem econômica por parte

do setor. Enquanto a Anatel supervisiona permanentemente o setor, a fim de prevenir

que práticas indesejáveis sejam desenvolvidas, com poderes para atuar

preventivamente na defesa da competição no setor em relação à possibilidade de

fusões, aquisições e transferência de controle acionário, evitando abusos de poder.

4.3 Estratégia pró-competição: assimetrias regulatórias

A regulação do mercado de telecomunicações no Brasil, além das

responsabilidades e competências de correção e prevenção de práticas

anticompetitivas, incide na promoção da competição. Com o escopo de criar um

ambiente competitivo, a Agência instituiu assimetrias regulatórias que permitissem o

equilíbrio das diferentes condições de entrada das prestadoras no mercado.

As assimetrias regulatórias consistem em uma política de incentivos à

competição que busca reduzir o poder de mercado das empresas (incumbentes) que

compraram as estatais, as quais , por conseguinte, entraram no mercado em condições

superiores às novas empresas , bem como visa atrair novos operadores (entrantes).

Especificamente na telefonia fixa, os principais objetivos das assimetrias pró-

entrantes são a criação de condições de incentivos ao cumprimento das metas de

universalização e qualidade, e o estímulo à entrada de novos competidores, afim de

equilibrar as relações entre incumbentes e entrantes.

Page 29: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Para tanto, a Anatel adotou 6 critérios de assimetrias regulatórias na regulação

do segmento de telefonia, sendo estes: (i) o regime de exploração; (ii) a delimitação da

área de atuação; (iii) a restrição de expansão de atividades; (iv) o incentivo à

universalização; (v) a restrição de diversificação das atividades e (vi) de utilização de

novas tecnologias.

No que refere ao regime de exploração, as incumbentes estão sujeitas ao regime

jurídico púbilco, restando asseguradas a estas a concessão do serviço até 31 de

dezembro de 2005, podendo este prazo ser prorrogado por mais 20 anos, o que acabou

se concretizando. Já as entrantes são autorizadas do Sistema de Telefonia Fixa e estão

sujeitas ao regime jurídico privado. Dentro do critério descrito somente concessionárias

possuem a obrigação de continuidade , universalização e qualidade, assim como são

submetidas a controle tarifário e às obrigações de interconexão12, tais obrigações

encontram-se nos contratos de concessão.

A Agência fixou as metas de universalização e qualidade para que as mesma

fossem alcançadas gradualmente no prazo de 5 anos. Dentre as obrigações descritas

no Plano de Metas de Universalização podemos citar ampliação dos telefones públicos,

as concessionárias teriam como meta ampliar até 2005, em média 8 telefones de uso

público (“TUP”) por 1000 habitantes. Outra meta que beneficiou diretamente o

consumidores foi o prazo de instalação do terminal telefônico que há pouco tempo atrás

demorava ano, em 2002 o prazo máximo para instalação era de 4 semanas, em 2003

até 3 semanas, 2004 duas semanas e em 2005 caiu para apenas 1 semana.

12 Considera-se interconexão a ligação entre redes de telecomunicações funcionalmente compatíveis, de modo que os usuários de serviços de uma das redes possam comunicar-se com usuários de serviços de outra ou acessar serviços nela disponíveis

Page 30: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Cabe aduzir que o descumprimento dessas metas podem resultar em rigorosas

sanções para as concessionárias que podem chegar ao valor de milhões de reais.

As autorizadas também devem observar algumas regras, porém, mais flexíveis.

Podem atuar em regime de liberdade de preços, que são regulados pelo próprio

mercado, entretanto, devem obedecer determinados critérios de preços-limites para os

serviços e cumprir metas. Tais metas não são de universalização do serviço, e sim

compromissos mínimos, inclusive os de garantia de qualidade.

Em seus contratos ficou estabelecida meta de atendimento de levar os serviços

locais e de longa distância a capitais e municípios com mais de 200 mil habitantes do

final de 10 de dezembro de 1999, o que exclui cerca de 5.200 cidades, as quais

ficariam sob o monopólio das concessionárias, segundo a Anatel.

O segundo critério assimétrico diz respeito à delimitação da área de atuação. As

concessionárias de telefonia fixa atuam em subconjuntos regionais, sendo permitido às

entrantes a participação acionária em mais de uma autorizada por região.

Quanto ao critério de restrição de expansão de atividades de telefonia fixa que

estabelece períodos diferenciados para as concessionárias (até 31.12.2002) e para as

“empresas-espelhos” autorizadas (até 31.12.2002) nos quais estatais ficam impedidas

de ampliar ou diversificar suas atividades13. Esta restrição, porém, não recai sobre as

autorizadas a partir de 2001.

A quarta assimetria se refere ao incentivo à universalização dos serviços,

determina que somente a partir do cumprimento de metas de universalização em cada

uma das regiões do Plano Geral de Metas seria permitida a entrada em outros

segmentos do mercado, ou seja, as holdings regionais estariam autorizadas, a partir de 13 Art. 10, §§ 1º e 2º, da PGO.

Page 31: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

31 de dezembro de 2003, a expandirem suas operações para fora de suas áreas de

concessões.

Ressalta-se que esta data poderia ser antecipada e foi o que ocorreu no

mercado de telefonia fixa. As concessionárias anteciparam as metas e no de 2002 deu-

se abertura do mercado. Em relação às concessionárias, convém ressaltar que em

cada um das regiões que em cada região existe, pelo menos, a atuação de uma grande

empresa de telecomunicações e uma operada independente, desse modo, todas as

empresas tiveram que atingir as metas para que pudessem expandir sua atuação.

No que concerne à diversificação do serviço, as autorizadas poderiam, a partir de

2003, entrar em qualquer segmento ou serviço mediante o cumprimento das metas de

atendimento e expansão previstas nos contratos.

Às concessionárias é permitido a entrada em qualquer segmento, exceto TV a

cabo, desde que cumpram todas as obrigações de atendimento e expansão previstas

nos instrumentos contratuais.

Por último, o critério de assimetria regulatório referente à utilização de novas

tecnologias. Foi criada uma vantagem competitiva de mercado a favor das “empresas-

espelhos”, que contariam coma vantagem de poder utilizar a tecnologia Wireless local

Loop (WLL), que prescinde de redes cabeadas até o local de instalação, o que acarreta

menos tempo de implantação e menor volume de investimentos. Esta prerrogativa só

poderia ser utilizada em municípios com mais de 50 mil habitantes e em localidades que

contassem das propostas das “empresas-espelhos”.

As concessionárias apenas poderiam se utilizar dessa tecnologia em localidades

com menos de 30 mil habitantes ou para atender clientes em localidades onde as

Page 32: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

autorizadas não tenham assumido o compromisso de atendê-las, ao final do ano de

2001.

A implantação dessas assimetrias regulatórias, adotadas pela Anatel e pela

legislação pertinente ao setor, não teve por objetivo penalizar o equilíbrio financeiro das

incumbentes, muito menos incentivar empresas entrantes ineficientes no mercado, a

finalidade era buscar melhores resultados na concorrência do setor.

Page 33: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

5 PROBLEMAS ENFRENTADOS PELA ANATEL COM O MODELO VIGENTE

A ANATEL, embora tenha sido criada com a objetivo primordial de regulação,

fiscalização e proteção da área das telecomunicações brasileiras, carece ainda de

melhorias, especialmente com relação a maior tempo de funcionamento e aumento do

quadro de pessoal, haja vista que, até o presente momento, não demonstrou a

eficiência esperada pela sua atuação no setor.

Várias são as problemáticas a serem enfrentadas, tais como: a falta de

concorrência entre as prestadoras de telefonia fixa, que realmente ficou devendo.

Atualmente alguns especialistas arriscam em chamar o atual modelo de “monopólio

privado das Teles”; a falta de regras mais eficientes para combater os abusos por elas

empregados; o aumento constantes das tarifas, em um momento econômico tão difícil

financeiramente para o usuário; a morosidade das decisões dos processos

administrativos; a falta de pessoal no quadro da Agência, sendo ineficaz e insuficiente a

fiscalização de todas as operadoras, em todo território nacional.

5.1 Falta de concorrência nos serviços de telefonia

Page 34: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

A LGT instituiu como uma de suas premissas básicas o estímulo a

concorrência14 de modo a aumentar o padrão da qualidade e melhoria dos preços dos

serviços pelas prestadoras oferecidos, tanto a telefonia fixa como na móvel, através do

regime de duopólio até 2001, ou seja, durante esse período, duas empresas atuariam

em cada área de prestação de serviço, uma concessionária e uma autorizada (a

respectiva “empresa –espelho”).

Embora a intenção e a política empregada tenham sido boas, a competição

esperada não se efetivou, principalmente no que se refere à telefonia fixa local, na qual

ainda se constata claramente a existência de um monopólio das empresas

concessionárias que herdaram a rede e os clientes do sistema TELEBRÁS. É cristalina

a falta de competitividade das “empresas-espelhos”.

Deve se levar em consideração que não é tão simples a criação de um ambiente

competitivo, posto que se faz necessário ter a consciência das características

intrínsecas à atividade e ao mercado de telecomunicações, dentre as quais podem ser

citadas: (i) a instalação de uma grandiosa infra-estrutura; (ii) a interligação entre as

redes de telecomunicações; (iii) o fato das telecomunicações terem sido monopólio

legal, o que ocasionou que a maior parte da infra-estrutura em uso tivesse nas mãos de

poucos prestadores de serviço; (iv) a alta tributação no setor de telecomunicações,

dentre outras características..

As atuais concessionárias herdaram a infra-estrutura de telecomunicações

existente à época do Sistema TELEBRÁS, o que lhes proporcionaram grande vantagem

14 Lei Geral de Telecomunicações – Lei n.ª 9472/97 “Art. 2° O Poder Público tem o dever de: II - adotar medidas que promovam a competição e a diversidade dos serviços, incrementem sua oferta e propiciem padrões de qualidade compatíveis com a exigência dos usuários;”

Page 35: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

competitiva em relação às autorizadas (seus investimentos relativos às suas redes hoje

estão amortizadas), mesmo se for considerada os encargos pertinentes à prestação de

serviço em regime público, tais como, os compromissos de expansão, qualidade,

universalização e continuidade dos serviços.

Quanto à tributação dos serviços telecomunicações, imperioso afirmar que é

uma das mais elevadas de todo o país. O serviço chega ao usuário com um acréscimo

em torno de 50% (cinqüenta por cento) em virtude dos tributos cobrados.

Na realidade, dependendo do Estado a carga tributária varia entre 43% (quarenta

e seis por cento) e quase 55% (cinqüenta e cinco por cento) no Pará e Rio de Janeiro,

sem incluir outros tributos, como por exemplo, o FISTEL, por ser calculado em razão da

dos ativos operacionais de cada empresa, o que significa que a carga tributária é ainda

maior do que a explicitada.

Caberia à ANATEL atuar junto ao governo na tentativa de diminuir o valor da

tributação. Tal ação beneficiaria não só os consumidores que têm de arcar com altos

preços dos serviços, bem como importaria em uma maior competitividade no setor, a

medida que não assustaria os possíveis investidores, que muitas vezes deixam de

investir no setor em virtude dos altos custos dos tributos.

A alta carga tributária nos serviços de telecomunicações revela um aspecto

perverso, pois, levando-se em consideração que as telecomunicações são uma

alavanca para o desenvolvimento sócio-econômico do país e ajudam a reduzir a

exclusão social, a elevada carga tributária funciona como um freio para o progresso do

país e um entrave no combate à desigualdade de distribuição de renda no país.

Page 36: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Outro ponto relevante gira em torno da determinação imposta pela LGT quanto à

obrigatoriedade da interconexão15 entre as redes e o compartilhamento da infra-

estrutura já instalada, para possibilitar a concorrência na telefonia fixa. Ambos não

foram implementados de maneira satisfatória e ainda deixam muito a desejar. A

interferência aqui da Anatel seria fundamental para a real competição na telefonia local,

em especial.

A interconexão livre e a possibilidade dos novos operadores adquirirem das

empresas prestadoras dominantes acesso a suas redes nos pontos em que realmente

tiverem necessidade, reduziriam os investimentos em infra-estruturas duplicadas.

As empresas detentoras de cabeamento, controlam, consequentemente, o

acesso ao usuário, diante de tal premissa, tais operadoras podem facilmente se utilizar

deste expediente para discriminar novos entrantes, o que inviabiliza a entrada de novos

operadores, não permitindo o ambiente competitivo desejado.

As obrigações de interconexão impostas às concessionárias locais nos contratos de interconexão estabelecem normas gerais para negociações de acordos com as demais prestadoras, com o fim de inibir as práticas, a saber: omissão de informações técnicas, obstrução, coação, exigência de condições abusivas para celebração de contratos, subsídios tarifários para redução artificial de tarifas, entre outras.

Com intuito de dirimir os eventuais conflitos entre as prestadoras acerca do

assunto e evitar atos lesivos ao ambiente competitivo, foi criada a Comissão de

Arbitragem. Esta comissão tem capacidade de mediar inevitáveis conflitos de

interesses, assim como o de resolver questões sobre as divergências de valores

devidos quanto à remuneração da rede.

As prestadoras de longa distância reclamam que as locais, detentoras de da

maior parte infra-estrutura instalada, praticam conduta anticompetitivas

consubstanciadas em elevações dos custos das rivais, por meio da (i) discriminação de 15 Ligação entre redes de telecomunicações funcionalmente compatíveis, de modo que os usuários de serviços de uma das redes possam comunicar-se com usuários de serviços de outra ou acessar serviços nela disponíveis

Page 37: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

preços na cobrança de tarifa de interconexão de rede local para elas mesmas e para

seus concorrentes ; ou por meio do (ii) subsídio cruzado implícito entre o serviço local e

o de longa distância, oferecidos pelas prestadoras fixas locais.

Diante da problemática da indefinição acerca do preço mais apropriado a ser

cobrado pela utilização da rede de outras prestadoras (tarifas de interconexão) o tema

continua sendo objeto de discussões, especialmente entre as prestadoras de telefonia

local e as prestadoras de telefonia de longa distância fixa e móvel.

5.2 Atuação da ANATEL junto aos usuários

No tocante à proteção ao usuário, o modelo de telecomunicações brasileiro

vigente se constitui basicamente em dois instrumentos: (i) a participação do usuário

junto à ANATEL e (ii) a atuação da mesma na defesa do consumidor dos serviços de

telefonia.

A participação do usuário pode ser observada na sua possível contribuição em

consultas públicas16 (art. 42 da LGT), as quais disponibilizam, via internet, todas as

regulamentações que posteriormente entrarão em vigor no setor. Os usuários podem,

portanto, defender seus interesses e contribuir em tais consultas, que terão seu

conteúdo analisado, podendo ser aproveitado ou não. De qualquer forma, aqui se

observa a participação efetiva dos usuários.

16 Lei Geral de Telecomunicações Art. 42. As minutas de atos normativos serão submetidas à consulta pública, formalizada por publicação no Diário Oficial da União, devendo as críticas e sugestões merecer exame e permanecer à disposição do público na Biblioteca.

Page 38: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

Outro meio de participação dos usuários se dá com a participação de

representantes dos usuários17 no Conselho Consultivo da Agência, cujas funções

básicas se resumem ao aconselhamento e às sugestões.

No entanto, essa participação é muito tímida, visto que no caso das consultas

públicas não há transparência no processo que as convertem em normas, além disso,

somente são levadas à consulta os aspectos técnicos, o que limita a ação dos usuários.

No que tange à atuação da ANATEL na defesa dos consumidores, o ente

regulador conta com uma ouvidoria, pela qual os usuários podem fazer suas sugestões

e reclamações, cabendo à Agência a apuração dos fatos relatados junto às prestadoras

citadas.

Ademais, os usuários podem peticionar junto à Agência na busca de solução

para as divergências entre os mesmos e as prestadoras. A ANATEL averiguará a

reclamação, podendo até mesmo instaurar um PADO (“procedimento administrativo de

descumprimento de obrigação”) em face da prestadora, caso entenda que há

procedência na reclamação do usuário, o que poderá acarretar sanção à prestadora.

Restando, ainda, ao usuário a via judiciária para a composição do seu conflito.

Porém, a Agência poderia e deveria ser mais atuante e assegurar o direito dos

usuários de uma maneira muito mais eficaz. Se, de fato, fosse mais severa nas suas

punições junto às prestadoras, inibiria os abusos praticados.

De um modo geral, o modelo atual de telecomunicações trouxe por um lado

grandes benefícios para os usuários, pois, inegavelmente, a oferta de serviços

17 Art. 34. O Conselho será integrado por representantes indicados pelo Senado Federal, pela Câmara dos Deputados, pelo Poder Executivo, pelas entidades de classe das prestadoras de serviços de telecomunicações, por entidades representativas dos usuários e por entidades representativas da sociedade, nos termos do regulamento

Page 39: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

oferecidos não se compara ao que era oferecido pelas prestadoras antes, no antigo

modelo em que o Estado era o fornecedor/prestador do serviço.

Por outro lado, é inegável que a ANATEL na sua ineficaz atuação no que

concerne à promoção da competição, limita o poder de escolha, pelos usuários, da

operadora fixa local, que, de fato, atuam em monopólio privado.

Um ponto importante seria o fato dos serviços a preços menores para os

consumidores terem sido a justificativa da privatização da telefonia, entretanto, o

histórico da evolução das tarifas foi o pior possível para os usuários e não mostrou o

esperado. Sem dúvida, um ambiente concorrencial favoreceria a alteração desse

quadro injusto. O que se percebe em razão da atuação ineficiente da Agência é a

conseqüente enxurrada de processos judiciais, principalmente em juizados especiais.

Os processos judiciais decorrentes dos serviços de telecomunicações já representam

mais de 50% (cinqüenta por cento) do total de processos existentes em tais juizados em

todo país. As prestadoras são verdadeiras campeãs de reclamações e ações nessa

espera.

Page 40: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

CONCLUSÃO

Em virtude das inovações tecnológicas e do dinamismo pertencente do setor de

telecomunicações, o modelo brasileiro de telecomunicações precisou sofrer algumas

alterações que o permitisse acompanhar o mercado.

Assim, passamos de um Estado fornecedor dos serviços de telecomunicações para

um Estado regulador, que passa a intervir no setor apenas regulando-o e não mais

executando os serviços.

Para que essa reformulação fosse possível diversas foram a mudanças que

precisaram ser feitas no ordenamento jurídico, inclusive na Constituição Federal vigente,

a qual privilegiava o monopólio dos serviços de telecomunicações.

A Constituição Federal passou a permitir, portanto, a prestação de serviços por

parte de empresas privada, instituindo um novo modelo jurídico regulatório, que tem por

princípios a competição e a universalização dos serviços de telecomunicações.

Para tanto, foi criada uma agência reguladora, a ANATEL, que permitisse a

regulação, a fiscalização e a normatização do setor. Esta agência introduziu uma política

de assimetrias regulatórias, com intuito de viabilizar a competição entre as prestadoras

incumbentes e as entrantes.

Conforme dispunha a Emenda Constitucional n.º 8 que alterou a Constituição

Federal, foi editada uma lei que disporia sobre os serviços de telecomunicações, este seria

o chamado “marco-regulatório”. A referida lei tomou corpo em 1997 e passou a ser

denominada de Lei Geral de Telecomunicações.

No entanto, há de se enfatizar que a atuação da ANATEL, embora tenha seus

méritos de atuação, levando-se em consideração a complexidade que envolve os serviços

de telecomunicações, não se mostra eficiente, em especial no que se refere à telefonia.

Page 41: O PAPEL DA ANATEL NA REGULAÇÃO DO SETOR DE ... · Mandado fixo e estabilidade dos dirigentes ... poucas páginas da lista telefônica. ... Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins,

A competição no aludido segmento praticamente não existe, a fiscalização das

prestadoras também não se mostra eficaz, ocasionando um elevado número demanda de

processos judiciais.

Por derradeiro, conclui-se que a ANATEL precisa se conscientizar dos erros de

atuação cometidos até o momento, pois ainda tem um longo caminho a percorrer na

melhora da regulação dos serviços de telecomunicações.