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i Universidade Estadual de Campinas Faculdade de Educação O papel da Estatística na inclusão de alunos da Educação de Jovens e Adultos em atividades letradas Keli Cristina Conti Orientadora: Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de Carvalho Campinas 2009 Dissertação apresentada como exigência parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação no Programa de Pós-Graduação em Educação da Unicamp, área de concentração: Educação Matemática, sob a orientação do Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de Carvalho.

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Universidade Estadual de Campinas Faculdade de Educação

O papel da Estatística na inclusão de alunos da Educação de Jovens e Adultos em atividades letradas

Keli Cristina Conti Orientadora: Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de Carvalho

Campinas 2009

Dissertação apresentada como exigência parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação no Programa de Pós-Graduação em Educação da Unicamp, área de concentração: Educação Matemática, sob a orientação do Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de Carvalho.

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A meus pais, Nadir e Luiza,

pelo apoio incondicional em

todos os momentos.

Aos alunos da Educação de Jovens e Adultos,

sujeitos desta pesquisa

e com os quais aprendi muito.

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Agradecimentos

Acima de tudo, a Deus!

Fui muito bem acompanhada neste trabalho.

Os agradecimentos são muitos:

A Dione, minha orientadora, pela confiança conferida a mim;

pelo incentivo a meu crescimento pessoal e acadêmico; e pela dedicação na

orientação.

Ao professor Dario Fiorentini, pelas valiosas contribuições, sempre! E também na

defesa.

Às professoras participantes da banca de qualificação,

Roseli Cação Fontana e Cláudia Borim da Silva, que contribuíram muito em nossas

reflexões e à Cláudia Borim da silva que pode continuar a contribuir conosco na defesa.

Aos professores do Centro de Estudos e Memória em Educação Matemática

(Cempem), Antonio Miguel, Maria Ângela Miorim e Anna Regina Lanner Moura.

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Aos colegas do grupo Prática Pedagógica em Educação Matemática (Prapem),

Maria Auxilia(DORA), Maria Apare(CIDA), Renata, Admur, Ronaldo, Gislaine, Adriana

F. C. Lima, Adriana A. Molina Gomes, Fernando e Marisol, pelo apoio e pelas

contribuições dadas ao trabalho.

Aos estagiários, agora já professores, Gilberto e Alexandre, que me acompanharam no

trabalho de campo.

Aos familiares, pelo apoio e

pela compreensão nas minhas ausências.

A TODOS os “velhos” e “novos” amigos do Grupo de Sábado (GdS), pela amizade,

pelo convívio e pela consideração.

A Du, amiga (e mãe) de longa data,

pelo apoio e pela torcida, sempre!

Aos “velhos” amigos professores de Águas de Lindóia que,

mesmo de longe, sempre manifestaram seu carinho e apoio.

À direção, aos professores e aos funcionários da E.E. Telêmaco Paioli Melges,

por abrirem as portas da escola para nós.

A todos os meus professores, aos colegas educadores e aos alunos, por me ajudarem

a ser a professora que sou hoje.

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Ao apoio da Fapesp, que através da bolsa de estudos concedida possibilitou a

dedicação exclusiva à pesquisa.

Cada um deixou uma marca, à sua maneira; e a todos, mencionados ou não, sou

imensamente grata!

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“Pesquisa é o que permite a interface criativa entre teoria e prática”.

Ubiratan D’Ambrosio

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RESUMO

O objetivo deste trabalho foi analisar e compreender o ensino e a aprendizagem de Estatística em aulas de Matemática de alunos da 7.ª série do Ensino Fundamental da Educação de Jovens e Adultos e o papel da produção desse conhecimento na inclusão desses alunos em atividades letradas. O trabalho de campo da pesquisa que denominarei participante foi realizado em uma escola pública do interior do Estado de São Paulo, onde desenvolvi um projeto chamado “Construindo Estatística”, que contou com o auxílio, de forma colaborativa, de dois estagiários, auxiliares de pesquisa. O material de análise foi constituído por transcrições das gravações em áudio e vídeo das atividades de sala de aula, portfólios das produções dos alunos, diários de campo meu e dos estagiários. Os três eixos de análise emergiram do processo de análise desse material: a) a relação dos alunos com a Matemática; b) a produção de conhecimentos dos alunos em Estatística nos encontros referentes ao projeto; c) a inclusão dos alunos em atividades letradas. Embora consciente das dificuldades dos alunos em “ler e escrever” e das situações pouco propícias para o desenvolvimento dessas competências na realidade da própria escola, não enfrentei esses fatos como obstáculos intransponíveis: fiz questão de caminhar para a inclusão desses alunos em atividades letradas, quer respondendo seus questionamentos, quer dando-lhes voz, quer, ainda, fazendo-os transformar suas “vozes” em escrita e, até mesmo, acreditando que seriam capazes de significar um texto acadêmico. É possível afirmar que essa produção de conhecimento foi além do conhecimento de Matemática e de Estatística e cumpriu o que se pretendia com relação à construção de conhecimento. Além disso, os alunos interagiram com a comunidade escolar, com a pesquisadora, com os estagiários e com os colegas, de forma a serem protagonistas da constituição de seu conhecimento, e isso foi muito importante para nós e provavelmente para eles.

Palavras-chave: Educação Matemática, Educação Estatística, Letramento Estatístico,

Educação de Jovens e Adultos.

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ABSTRACT

The role of statistics in the incorporation of students in Adult Education literacy activities

The purpose of this study is to analyze and understand the teaching and learning methods of statistics in Mathematics classes for students in the 7th grade in an elementary school of “Adult Education” and also to analyze the role of production of knowledge in the incorporation of students in literacy activities. The fieldwork of this participative research was set in a public school in the countryside of the state of São Paulo, where I developed a project called "Building Statistics", which was aided in a collaborative manner by two research assistant trainees. The analysis material consists of transcripts of audio and video recordings of classroom activities, portfolios of students productions, and of the daily notes the trainees and I did. Through the process of analyzing the material, three axis of analysis emerged: a) The relationship of students with Mathematics. b) The production of knowledge in Statistics for students at the meetings regarding the project. c) The incorporation of students in literacy activities. Although I was aware of the "reading and writing" difficulties, and the unfavorable situation for the development of these capacities in the school environment, I did not find these difficulties to be overwhelming obstacles: I did my best to make the students participate in the literacy activities. Both by answering their questions, giving them the chance to speak and then transforming their "voices" into written words, as well as letting them believe that their words could be converted into an academic paper. It is possible to say that this knowledge production was beyond the knowledge of Statistics and Mathematics. In addition the students interacted with the school community, with the researcher, with the trainees and with their colleagues, to be a part of the founding of their knowledge, and it was very important for us and probably for them. Keywords: Mathematics education, Statistics education, Statistical Literacy, Adult education

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Papéis essenciais do professor e dos alunos ......................................... 15

Figura 2 Profissões, salários e inserção no mercado de trabalho .......................... 26

Figura 3 “Estatisticar” ............................................................................................. 35

Figura 4 Capa do projeto “Construindo Estatística” ................................................ 86

Figura 5 Oralidade e a construção da leitura por crianças de meios iletrados ....... 86

Figura 6 Movimento inicial de letramento realizado na EJA ................................... 87

Figura 7 Produção da aluna Rosana ...................................................................... 96

Figura 8 Esquema dos enfoques relacionados ao tema gravidez ........................ 117

Figura 9 Cálculo de porcentagens – Grupo 4 ....................................................... 143

Figura 10 Cálculo de porcentagens – Grupo 5 ....................................................... 143

Figura 11 Gráfico apresentado pelo grupo 1 .......................................................... 147

Figura 12 Histograma apresentado pelo grupo 2 ................................................... 148

Figura 13 Slide/Mensagem..................................................................................... 155

Figura 14 Slide/Trabalho na escola ........................................................................ 156

Figura 15 Slide/O projeto na escola ....................................................................... 156

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Matemática e fatos do cotidiano ............................................................. 27

Quadro 2 Um modelo de letramento estatístico ..................................................... 31

Quadro 3 Sinais utilizados na transcrição das gravações de áudio e vídeo ........... 42

Quadro 4 Apresentação dos alunos ....................................................................... 50

Quadro 5 Fases de um projeto ............................................................................... 98

Quadro 6 Explorando alguns instrumentos de coleta de informações ................. 125

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Quadro 7 Produção parcial do grupo 1 – Registro da variável “sexo” .................. 134

Quadro 8 Produção parcial do grupo 6 ................................................................ 135

Quadro 9 Produção parcial do grupo 2 – Registro da variável “idade” ................. 135

Quadro 10 Produção parcial do grupo 3 ................................................................ 136

Quadro 11 Produção parcial do grupo 1 – Registro das respostas ........................ 137

Quadro 12 produção parcial do grupo 5 ................................................................. 138

Quadro 13 Reelaboração feita pelo grupo 4 .......................................................... 140

Quadro 14 Reelaboração feita pelo grupo 1 – Registro da variável “idade” ........... 140

Quadro 15 Reelaboração feita pelo grupo 3 – Tabulação das respostas ............... 141

Quadro 16 Registros do grupo 1 - Porcentagens ................................................... 144

Quadro 17 Registros do grupo 3 – Tabulação dos dados ...................................... 144

Quadro 18 Registros do grupo 2 – Tabulação dos dados ...................................... 145

Quadro 19 Registros do grupo 5 – Tabulação dos dados ...................................... 145

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Número de alunos matriculados por turno ............................................... 46

Tabela 2 Número de alunos matriculados por modalidade de ensino .................... 46

Tabela 3 Faixa etária dos alunos ........................................................................... 48

Tabela 4 Motivo que levou o aluno a parar de estudar ........................................... 50

Tabela 5 Motivo que levou o aluno a voltar a estudar ou a continuar na escola ..... 50

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LISTA DE PÔSTERES

Pôster 1 Pergunta 1 ............................................................................................. 157

Pôster 2 Pergunta 2 ............................................................................................. 158

Pôster 3 Pergunta 3 ............................................................................................. 159

Pôster 4 Pergunta 5 .............................................................................................. 160

Pôster 5 Pergunta 6 ............................................................................................... 162

LISTA DE FOTOS

Foto 1 Vista parcial do bairro .................................................................................. 43

Foto 2 Lateral esquerda da escola ......................................................................... 45

Foto 3 Lateral direita da escola .............................................................................. 45

Foto 4 Gráfico exposto no pátio da escola ............................................................. 93

Foto 5 Cartaz que deu origem ao pôster 2 ........................................................... 139

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 1

2 AS ORIGENS E A PROBLEMÁTICA DA PESQUISA .......................................... 3

2.1 – Meus caminhos ............................................................................................ 3 2.2 – A opção pela Estatística e a EJA ............................................................... 11 2.3 – Chegada à questão de investigação .......................................................... 14

3 DIALOGANDO COM A LITERATURA ................................................................ 17

3.1 - Características e objetivos da EJA ............................................................. 18 3.2 - Cenário de ensino e aprendizagem de Estatística na EJA .......................... 23 3.3 - Letramento estatístico ................................................................................. 28 3.4 - Desafios educacionais ................................................................................ 33

4 METODOLOGIA DA PESQUISA ......................................................................... 39

4.1 - Caracterizando e contextualizando o trabalho de campo ........................... 40 4.2 - A escolha da escola .................................................................................... 42 4.3 - Conhecendo o bairro ................................................................................... 43 4.4 - A escola ...................................................................................................... 44 4.5 - Protagonistas .............................................................................................. 47 4.5.1 - Alunos ............................................................................................. 47 4.5.2 - Estagiários Gilberto e Alexandre ..................................................... 54 4.6 - Os encontros ............................................................................................... 57 4.7 - Os eixos de análise ..................................................................................... 58

5 NARRATIVAS DO TRABALHO DE CAMPO ...................................................... 61

5.1 - Primeiros contatos com os alunos .............................................................. 61 5.2 - Preparando o campo ................................................................................... 64 5.3 - Iniciando o projeto de estatística com os alunos ......................................... 65 5.4 - Identificação do aluno ................................................................................. 67 5.5 - Captando o relacionamento dos sujeitos com a Matemática ...................... 69 5.6 - Primeira filmagem – Bingo matemático ....................................................... 74 5.7 - Os sujeitos e suas outras histórias .............................................................. 77 5.8 - Enfim chegou a hora da Estatística ............................................................. 80 5.9 - De professora-pesquisadora a pesquisadora-professora ............................ 89 5.10 - Aulas de Estatística ..................................................................................... 91 5.11 - As escolhas dos alunos ............................................................................... 97 5.12 - Gravidez ................................................................................................... 108 5.13 - Busca por material .................................................................................... 113 5.14 - Os enfoques do projeto ............................................................................. 115 5.15 - Roda de conversa ..................................................................................... 120 5.16 - Produção do questionário ......................................................................... 124 5.17 - Aplicação do questionário ......................................................................... 129 5.18 - Primeiros registros das informações ......................................................... 133

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5.19 - O registro das informações em tabelas ..................................................... 138 5.20 - Cálculos de freqüências percentuais e médias ......................................... 141 5.21 - Construindo gráficos ................................................................................. 146 5.22 - Construção dos pôsteres .......................................................................... 149 5.23 - Preparando a “festa” ................................................................................. 152 5.24 - Encerramento do projeto ........................................................................... 153 5.25 - Avaliando o projeto.................................................................................... 165

6 O QUE FICOU... ................................................................................................. 171

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................. 177

APÊNDICES ...................................................................................................... 187

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Capítulo 1

INTRODUÇÃO

A pesquisa alvo deste trabalho de mestrado esteve vinculada ao projeto

intitulado: “A formação do supervisor de estágio e a colaboração na tríade: estagiário

licenciando em Matemática, professor da escola básica e formador da universidade”

coordenado então pela Profa. Dra. Dione Lucchesi de Carvalho. Desenvolvemos, minha

orientadora e eu, a parte referente ao ensino de Estatística em aulas de Matemática da

Educação de Jovens e Adultos (EJA)1, cujo trabalho se configurou em uma componente

colaborativa com dois estagiários licenciandos em Matemática pela Unicamp2.

Percebi na Estatística uma importante ferramenta de construção de

conhecimento, de integração de conteúdos e temas transversais, de discussão e de

desenvolvimento do pensamento reflexivo e, principalmente, observei sua utilização na

vida cotidiana, como meio para a compreensão do que ocorre a nossa volta e, até

mesmo, para vislumbrar a transformação da realidade que nos cerca. Concordo com

Lopes (1998), quando afirma que:

[...] nenhuma área da atividade e do pensamento humano pode desconsiderar a Estatística, pois ela contribui para o conhecimento e a interpretação das características dos fenômenos coletivamente típicos e para indicar a probabilidade do seu desenvolvimento futuro. Atualmente, é essencial que tenhamos consciência disso, pois o cidadão desse final de século tem como necessidade básica pensar estatisticamente, ou seja, desenvolver sua capacidade de análise, de crítica e de intervenção ao lidar com as informações veiculadas em seu cotidiano. (LOPES, 1998, p. 5)

1 Que passarei a chamar de EJA, forma como é usualmente chamada essa modalidade de ensino. 2 Universidade Estadual de Campinas.

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Inicialmente apresento uma reflexão sobre minha trajetória, considerando

questões do ensino de Estatística e da colaboração. Em seguida, apresento os motivos

da escolha da Estatística e da EJA. Depois da questão de investigação, discuto, em

diálogo com a literatura, no capítulo 3, as características e os objetivos da EJA, os

cenários do ensino-aprendizagem, o letramento estatístico e os desafios educacionais.

No capítulo 4, explicito a metodologia utilizada, caracterizo e contextualizo o

trabalho de campo: a apresentação da escola, do bairro e dos protagonistas. Também

exponho, nesse capítulo, os eixos de análise que emergiram no processo de análise do

material produzido. Esta análise é trazida na forma de narrativa, no capítulo 5, para

contar os encontros desenvolvidos em uma 7.ª série de EJA de uma escola pública

estadual.

Para finalizar a dissertação, retomo a questão de investigação, no capítulo 6,

sistematizando “o que ficou” e arriscando algumas considerações finais.

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Capítulo 2

AS ORIGENS E A PROBLEMÁTICA DA PESQUISA

2.1 - Meus caminhos

“Tinha o tempo que você sentia e sentir era a forma mais sábia de saber e você nem sabia!” (Alice Ruiz)

Desde pequena, pensava em ser professora ou, mais especificamente, traçava

uma meta para os anos futuros: o Magistério, embora não tivesse consciência dos

caminhos a percorrer. O ato de ensinar; os materiais escolares; a própria escola

próxima a minha casa; a lousinha infantil; os livros — tudo isso sempre fez parte de

minha infância.

Logo após concluir o 1.º Grau (hoje Ensino Fundamental), fui cursar o Normal –

Magistério de 1.º Grau3 — como queria. Tive boas experiências, de 1991 a 1993, com

as “metodologias de ensino” nas áreas de Língua Portuguesa, Matemática, Estudos

Sociais, Ciências e Saúde. Hoje percebo que até concluir aquele curso não havia tido

nenhum contato formal ou sistemático com a Estatística e a Probabilidade, e foram 11

anos de estudo!

Após a conclusão do curso, com 17 anos, enquanto buscava colocação

profissional, freqüentei um curso técnico na área de Contabilidade. Aí, sim, “conheci” a

Estatística, com um professor de Matemática. Numa disciplina de 60 horas,

3 Conforme a nomenclatura da época.

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construíamos gráficos; utilizávamos, entre outros recursos, instrumentos de desenho e

papel quadriculado, leitura de jornal; éramos avaliados pela construção correta dos

gráficos e das tabelas. Apesar de não pensar em atuar na área contábil, esse curso

despertou em mim o gosto pela Matemática; talvez porque tivesse vivenciado algumas

aplicações, as aulas iam um pouco além da resolução de listas de expressões e

equações, embora isso também estivesse presente.

Após terminar esse curso, optei pela Licenciatura em Matemática, que iniciei em

1996 pelas Faculdades Integradas de Amparo, no interior de São Paulo, e creio que fiz

a escolha correta. Novamente considerando a Estatística, conheci os conceitos básicos

através de aulas expositivas, durante dois semestres, nos quais não analisávamos nem

discutíamos os resultados.

Nessa mesma época, em 1996, comecei a atuar em turmas de Educação Infantil

(crianças de 3 a 6 anos) como professora efetiva, em uma rede pública municipal do

interior de São Paulo.

Logo que conclui a Licenciatura, em 1999, comecei a atuar também em turmas

do Ensino Fundamental (5.ª a 8.ª séries) da mesma rede pública municipal e a substituir

professores na rede pública estadual, onde, pela primeira vez, trabalhei na EJA. Foi

com uma turma de 3.º ano do Ensino Médio, sempre com muitos ideais, com vontade

de fazer algo diferente do que havia encontrado em minha formação. Na prática nem

tudo era tão ideal assim: pouca experiência; classes de alunos repetentes; pouca

confiança por parte dos alunos e da direção da escola, durante as substituições; muita

descontinuidade no trabalho; sentimentos de repulsa pela Matemática por parte dos

alunos, entre outros, como relatado por Rocha (2005):

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A iniciação à docência é um período marcado por sentimentos ambíguos. Se, de um lado, ela é caracterizada como uma etapa de tensões, angústias, frustrações e inseguranças, por outro, o iniciante a professor sente-se alegre por ter uma turma, por pertencer a um grupo de profissionais. Como todo início de profissão, esses primeiros anos constituem uma etapa de profundas mudanças e aprendizagem sobre a profissão. (ROCHA, 2005, p. 40).

E, com o objetivo de realizar sempre um trabalho melhor do que aquele que eu

havia vivenciado e via no cotidiano das escolas, continuei atuando com essas turmas e

buscando constantemente cursos, palestras, capacitações, entre outros recursos, numa

perspectiva de “educação contínua”, como nos trazem Fiorentini e Nacarato (2005):

O professor, nessa perspectiva de educação contínua, constitui-se num agente reflexivo de sua prática pedagógica, passando a buscar, autônoma e/ou colaborativamente, subsídios teóricos e práticos que ajudem a compreender e a enfrentar os problemas e desafios do trabalho docente (FIORENTINI; NACARATO, 2005, p.9)

E, nessa busca, uma identificação especial com o ensino da Estatística me foi

despertada no XVI Encontro de Professores de Matemática4, onde conheci o trabalho

do Gepepei5. Nessa época continuava atuando na Educação Infantil e nas séries finais

do Ensino Fundamental na mesma rede municipal do interior de São Paulo. A partir de

então, comecei a adaptar e a propor, para as turmas compostas por crianças de 3 e 4

anos, algumas das atividades elaboradas naquele grupo, que envolviam probabilidade

de ocorrência de determinados fatos, pesquisa de opinião, construção de gráfico de

colunas, de acordo com Lopes e Moura (2002), que argumentam:

A aquisição do conhecimento matemático na Educação Infantil tem se justificado pelas necessidades das próprias crianças de construírem e recriarem conhecimentos, desenvolverem a imaginação e a criatividade, bem como por uma necessidade social de instrumentalizá-las para a vida no mundo (LOPES; MOURA, 2002, p. 12).

4 Promovido em abril de 2002, pelo Laboratório de Ensino de Matemática (LEM) do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica (Imecc) na Unicamp. 5 Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Estatística e Probabilidade na Educação Infantil, então coordenado pela Prof.ª Celi Lopes.

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Os resultados das atividades foram surpreendentes e motivadores. Alunos muito

novos, além de manterem contato com linguagens próprias da probabilidade,

levantaram hipóteses, apresentaram opiniões, construíram e interpretaram gráficos,

mostraram-se envolvidos com as atividades e também apresentaram melhora

significativa, principalmente na área de Matemática; e assim fui ampliando essas

vivências para as outras séries em que atuava (séries finais do Ensino Fundamental),

consciente de meu papel na formação dos alunos e das novas exigências atuais, como

destacam Lopes e Moura (ibidem):

Vivemos em uma sociedade de informações, que valoriza cada vez mais o conhecimento e, portanto, é imprescindível que faça parte da formação dos alunos a aquisição de conceitos da probabilidade de ocorrência de acontecimentos, para agilizar a tomada de decisão e fazer previsões, assim como faz-se necessário adquirir competência em pensar sobre a aleatoriedade, pois se torna cada vez mais precoce o acesso do cidadão a questões sociais e econômicas nas quais tabelas e gráficos sintetizam levantamentos e pesquisas realizados ( LOPES; MOURA, 2002, p. 12).

Em conversas com os alunos de 5.ª a 8.ª séries, alguns mesmo já perto de

concluir o Ensino Fundamental, percebi que não haviam tido nenhum contato anterior

com a Estatística. Isso me inquietava, assim como a Lopes (1998, p. 15), quando

menciona que “não é possível esperarmos que nosso aluno chegue ao Ensino Médio

para iniciarmos conteúdos essenciais para o desenvolvimento de sua visão de mundo”.

Vale mencionar que isso não é algo novo, conforme traz Megid (2002, p.15) em sua

dissertação, ao referir-se ao modo “como o tema Ensino de Estatística vem sendo

abordado em diferentes propostas curriculares”. Segundo a autora, a Proposta

Curricular para o Ensino de Matemática – 1.º Grau, da Secretaria de Estado da

Educação de São Paulo (SÃO PAULO, 1986) já sinalizava para o ensino de Estatística,

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e, nos PCN (BRASIL, 1998), o tema, que vem explícito no bloco “Tratamento da

Informação”, é proposto para o trabalho em todas as séries do Ensino Fundamental.

Motivada pela prática que estava desenvolvendo e inquieta com o que

encontrava, como o descaso com o trabalho na área de Estatística pelas escolas, em

2004, resolvi fazer um curso de especialização — Mat-500 —, oferecido pelo Instituto

de Matemática, Estatística e Computação Científica da Unicamp (Imecc), para

professores de 5.ª a 8.ª séries do Ensino Fundamental. Viajava toda semana, com uma

colega, para participar do curso; tivemos, entre outras, uma disciplina de 70 horas

chamada “Análise de Dados e Princípios de Contagem”. A partir dessa aproximação

com a Unicamp, quis ir além da especialização e já pensava num mestrado, embora

visse dificuldades em relação à distância da cidade onde morava até a Unicamp, pois

imaginava que a dedicação à pós-graduação poderia ser dificultada por essa distância,

mesmo esta não sendo tão grande.

No final de 2003, houve um concurso público para professores de diversas áreas,

no Estado de São Paulo e, embora eu já tivesse dois cargos públicos (PEB I e PEBII6),

resolvi prestar, estimulada mais pela repercussão que o concurso causou entre os

professores do que por convicção. Com a aprovação no concurso com uma boa

classificação, veio a ideia — considerada descabida pelos colegas e familiares — de

assumir um cargo em Campinas.

Mesmo assim, foi o que fiz: no início do segundo semestre de 2004, fiz a escolha

por uma escola localizada nas proximidades da Unicamp, já com a intenção de me

6 Como professora de Educação Básica I (PEB I) podia atuar na Educação Infantil e nas séries iniciais do Ensino Fundamental (1.ª a 4.ª séries) e, como professora de Educação Básica II (PEB II), nas séries finais do Ensino Fundamental (5.ª a 8.ª séries). A rede municipal não possuía Ensino Médio.

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aproximar cada vez mais dessa instituição. Afastei-me7 dos meus cargos na rede

municipal, lamentando deixar de lado um caminho que estava trilhando, mas querendo

encontrar outras formas de caminhar, e assumi um cargo numa escola pública estadual

paulista em novembro de 2004. Nessa escola trabalhei com alunos das séries finais do

Ensino Fundamental, com alunos do Ensino Médio e da Educação de Jovens e Adultos.

No início de 2005, já mais próxima à Unicamp e por sugestão do Prof. Dr. Dario

Fiorentini, comecei a freqüentar o Grupo de Sábado (GdS), que se reúne aos sábados

pela manhã, com o intuito de ler, refletir, investigar e escrever sobre a própria prática

escolar em Matemática. O grupo, desde sua formação em 1999, tem publicado, além de

artigos, livros que trazem narrativas e estudos de professores de Matemática sobre a

própria prática profissional.

Essa participação no GdS, no processo de troca e reflexão, contribuiu muito para

o amadurecimento e a (re)significação da minha prática, da mesma forma como é

relatado em livro publicado pelo grupo em 2006:

No grupo e pelo grupo, o professor não apenas acompanha e recebe os novos conhecimentos e ideias, mas, também, troca e contribui, tornando-se protagonista da cultura profissional de seu campo de trabalho. O grupo pode ser o espaço de formação e de constituição profissional do professor e de construção de sua identidade, pois é com o outro que ele se torna continuamente professor. O grupo constitui, portanto, um espaço para o professor resistir às condições adversas de trabalho e “re-existe” principalmente através da reflexão, da investigação e da escrita. O professor, nesse processo, adquire mais autonomia, tornando-se sujeito de sua profissão; alguém habilitado a participar do debate público e a desenvolver projetos e grupos de estudo dentro e fora da escola, produzindo inovações curriculares a partir da própria escola (FIORENTINI e CRISTOVÃO, 2006, p. 34).

Nesse período, a convite da Prof.ª Dr.ª Dione e do Prof. Dr. Dario, envolvi-me no

chamado “estágio colaborativo”, entendido como caso particular do conceito de

7 De acordo com a legislação municipal vigente, pude me afastar por quatro anos sem remuneração.

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grupos colaborativos (FIORENTINI, 2004). Vivi, nesse contexto, práticas que posso

considerar colaborativas, assumindo com Fiorentini (2004, p.50) que, quando há

colaboração, “todos trabalham conjuntamente (co-laboram) e se apóiam

mutuamente, visando atingir objetivos comuns negociados pelo coletivo do grupo” e

que na “colaboração, as relações, portanto, tendem a ser não-hierárquicas, havendo

liderança compartilhada e co-responsabilidade pela condução das ações” (ibidem).

Esse projeto fez parte do projeto temático intitulado “Inter-relações entre formação

docente e desenvolvimento curricular no campo da Educação Matemática”8,

desenvolvido pelo grupo de pesquisa Prapem9 da Unicamp. Essa produção de

saberes norteia-se pela concepção de “conhecimento-da-prática”, elaborada por

Cochran-Smith e Lytle (1999).

A base desta concepção de conhecimento-da-prática é que os professores, ao longo de sua vida, têm papel central e crítico na geração de conhecimento sobre a prática, uma vez que suas salas de aula são locais de investigação, e, ao conectar seu trabalho nas escolas a questões mais amplas, assumem um ponto de vista crítico na teoria e pesquisa de outros. Redes de professores, comunidades de investigação e outros coletivos escolares nos quais os professores e outros somam esforços para construir conhecimento são o contexto privilegiado para o aprendizado do professor neste contexto (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999, p. 2810).

Foi muito significativo para minha prática envolver-me nesse projeto,

principalmente pelo exercício de pensar sobre a própria prática. E nesse contexto

formou-se uma parceria, no início de 2005, com o estagiário Soares, entre vários

estagiários que tenho recebido desde então, com intuito de participar e analisar essa

proposta diferenciada de estágio colaborativo sob duas perspectivas: a do professor e a

do estagiário. 8 Este projeto foi coordenado pelo Prof. Dr. Dario Fiorentini. 9 Prática Pedagógica em Matemática. 10 Tradução para uso de um subgrupo do Prapem.

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Nossa proposta de estágio colaborativo teve uma ênfase especial em atividades

investigativas em sala de aula, de modo que a participação no GdS e as reflexões

levantadas nessas reuniões tiveram grande contribuição na realização da proposta que

chamamos na época “aulas investigativas”, em sintonia com o que trazem Ponte,

Brocardo e Oliveira (2003):

O conceito de investigação matemática, como atividade de ensino-aprendizagem, ajuda a trazer para a sala de aula o espírito da atividade matemática genuína, constituindo, por isso, uma poderosa metáfora educativa. O aluno é chamado a agir como um matemático, não só na formulação de questões e conjecturas e na realização de provas e refutações, mas também na apresentação de resultados e na discussão e argumentação com os seus colegas e o professor (PONTE; BROCARDO; OLIVEIRA, 2003, p. 23).

O termo “aulas investigativas” mais tarde foi reelaborado em discussões do GdS

e substituído por “aulas exploratório-investigativas”, conforme explicitado por Fiorentini

(2006):

As aulas exploratório-investigativas são aquelas que mobilizam e desencadeiam, em sala de aula , tarefas e atividades abertas, exploratórias e não-diretivas do pensamento do aluno e que apresentam múltiplas possibilidades de alternativa de tratamento e significação. Essas aulas servem, geralmente para introduzir um novo tema de estudo ou para problematizar e produzir significados a um conceito matemático (FIORENTINI, 2006, p. 29, grifo do autor).

O processo de investigar e pensar sobre a própria prática, desencadeado no

GdS, contribuiu para aumentar ainda mais a vontade de fazer parte de um grupo — e

um grupo onde todos colaboram, segundo Fiorentini (2004):

Na colaboração, todos trabalham conjuntamente (co-laboram) e se apóiam mutuamente, visando atingir objetivos comuns negociados pelo coletivo do grupo. Na colaboração, as relações, portanto, tendem a ser não-hierárquicas, havendo liderança compartilhada e co-responsabilidade pela condução das ações (FIORENTINI, 2004, p. 50, grifo do autor).

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O trabalho desenvolvido no GdS e o incentivo do grupo para o registro dessas

reflexões, em parceria com o estagiário, culminaram na publicação de um primeiro texto

intitulado “Primeiras experiências em aulas investigativas”, capítulo do livro Histórias e

investigações de / em aulas de Matemática (FIORENTINI; CRISTOVÃO, 2006) e

também na participação em congressos, relatando a experiência vivenciada.

Leituras como Fiorentini e Nacarato (2005) fizeram-me compreender melhor o

processo de protagonismo e desenvolvimento profissional pelo qual estava passando:

Esse processo de educação contínua de professores pode também ajudá-los a se tornar os principais protagonistas de seu desenvolvimento profissional e do processo educacional à medida que participam da construção dos conhecimentos do trabalho docente e da construção do patrimônio cultural do grupo profissional ao qual pertencem (FIORENTINI; NACARATO, 2005, p. 9).

Durante todas essas (re)significações da prática docente, eu continuava atuando

na EJA e querendo de alguma forma fazer algo especial com aqueles alunos daquela

modalidade de ensino.

2.2 - A opção pela Estatística e a EJA

Durante minha atuação na EJA, que se iniciou em 2000 com uma substituição

do professor de uma turma de 3.º ano do Ensino Médio, identifiquei-me de modo

especial com o comprometimento e o interesse dos alunos e com a valorização do

professor; surgiu a vontade de “fazer algo a mais” pelos alunos”. Essa identificação foi

aumentando. Quando, posteriormente, passei a atuar nessa modalidade em todas as

séries do Ensino Fundamental e Médio, na rede pública estadual, o comprometimento

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profissional continuou presente e busquei aumentar minha sensibilidade com relação a

esses alunos, tentando ir em direção ao que nos coloca Fonseca (2005):

Cabe ao educador, assumindo-se a si mesmo como sujeito sociocultural, da mesma forma que reconhece o caráter sociocultural que identifica seu aluno, aluno da EJA, postar-se, pois investido de uma honestidade intelectual que lhe permita relativizar os valores das contribuições da(s) Matemática(s) oficial(is) da Escola e da(s) produzida(s) em outros contextos e com outros níveis e aspectos de formalidade profissional que lhe imputa disposição e argumentos na negociação com as demandas dos alunos e com os compromissos da Escola em relação à construção do conhecimento matemático; investido ainda, de uma sensibilidade, que é preciso cultivar e exercitar, ao acolher as reações e as perplexidades, as indagações e os constrangimentos, as reservas e as ousadias de seus alunos e alunas, pessoas jovens e adultas, e compartilhar com elas essas mesmas emoções com as quais ele impregna seu projeto educativo (FONSECA, 2005, p. 39, grifo da autora).

Então, motivada pelos resultados encontrados na Educação Infantil relatados

anteriormente e pela prática colaborativa que estava desenvolvendo no GdS,

reelaborei, para propor também em aulas de Matemática para EJA, as atividades que

envolviam probabilidade de ocorrência de determinados fatos, pesquisa de opinião,

construção de gráficos. Como ocorria no ensino regular, deparei-me com alunos, já em

fase de conclusão do Ensino Fundamental e mesmo do Ensino Médio, que não haviam

tido contato com a Estatística ou que tiveram um contato mínimo, muitas vezes em

circunstâncias não escolares. Situação semelhante a esta foi descrita em reflexões a

respeito do INAF11 2002, no trecho em que Lopes (2004) comenta os resultados do

teste:

Os resultados no INAF 2002 em relação à compreensão da linguagem gráfica evidenciam a pouca vivência da população brasileira na leitura de dados que expressam sua realidade, o que gera menores possibilidades de um exercício crítico de sua cidadania, diminuindo as perspectivas positivas de transformações sociais (LOPES, 2004, p. 191).

11 INAF – Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional. O INAF consiste no levantamento periódico de dados sobre as habilidades de leitura e Matemática da população brasileira. É uma iniciativa do Instituto Paulo Montenegro e da ONG Ação Educativa.

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Juntei estes elementos: a identificação especial com a EJA e a aproximação com

a Estatística; o desejo de discutir a ausência de trabalhos de Estatística nessa

modalidade de ensino e de propor algo que me possibilitasse debater algumas das

questões que me angustiavam, mas que ainda eram amplas, como:

Quais os objetivos da EJA? Em que o ensino de Estatística pode contribuir para

alcançá-los?

O que os alunos são capazes de significar em Estatística?

Como incorporar em sala de aula o conhecimento extra-escolar?

Como interpretar os procedimentos matemáticos desenvolvidos fora da sala de

aula?

Como outras disciplinas podem ou puderam utilizar esse conhecimento

estatístico em seus conteúdos?

O que significou para o aluno a aquisição desse conteúdo de Estatística?

Resolvi, então, propor um projeto de pesquisa que focasse a EJA e a Estatística,

ingressando no mestrado em 2006.

Preparei-me para desenvolver o trabalho de campo em 2007, e o que seria

considerado ruim, por questão de distância e horários — ter que “escolher aulas em

outra escola” —, transformou-se em ponto positivo e levou-me por outros caminhos: eu

era a professora responsável pela disciplina Matemática na E.E. “Prof. Adalberto Prado

e Silva”, mas, pela questão de “quantidade de aulas” na rede pública estadual, fiquei

responsável apenas por uma turma de 6.ª série nessa escola, no período da tarde, e

completei minha carga horária inicial12 na E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”, com três

turmas de EJA no período noturno: uma turma de 7.ª série de Ensino Fundamental

12 Na rede pública estadual, a carga horária inicial é de 20 aulas.

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(onde desenvolvi o trabalho) e duas turmas de Ensino Médio, 1.º e 3.º anos. Por

acreditar na importância da dedicação integral à pesquisa, candidatei-me a uma bolsa

de estudos da Fapesp13. A partir de abril de 2007, com a aprovação do projeto por essa

fundação, exonerei-me do cargo de professora efetiva, embora continuasse

freqüentando a escola e atuando na EJA, para a realização do trabalho de campo.

2.3 - Chegada à questão de investigação

Eram muitos os meus questionamentos e, lendo sobre o assunto, foquei

inicialmente as características e os objetivos da EJA, o ensino e aprendizagem da

Estatística, as aulas exploratório-investigativas e a prática das aulas de Matemática.

Minha questão era: Quais as possibilidades e os limites das aulas exploratório-

investigativas no ensino da Estatística, em aulas de Matemática, no segundo segmento

do Ensino Fundamental da EJA?

Sem abandonar esta questão, ampliei meu referencial e direcionei-me para a

análise do ensino e da aprendizagem de Estatística por alunos do Segundo Segmento

do Ensino Fundamental da EJA14 que participavam de atividades exploratório-

investigativas em caráter de cooperação investigativa.

Na cooperação investigativa, de acordo com Skovsmose (2006, p. 77), o que se

realiza é aprendizagem com ação, e seus “elementos-chaves” são: “estabelecer

contato, perceber, reconhecer, posicionar-se, pensar alto, reformular, desafiar e

13 Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. 14 O Segundo Segmento do Ensino Fundamental corresponde às séries de 5.ª a 8.ª.

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avaliar”. Para compreender a maneira como a comunicação entre professor e alunos

pode favorecer a aprendizagem, destaco de Skovsmose (2006, p. 69) a Figura 1, que

apresenta os papéis essenciais do professor e dos alunos:

Em sintonia com a cooperação investigativa, ocorre a valorização dos estudantes

como protagonistas, a valorização de suas experiências e a apropriação de

conhecimentos estatísticos. Posso complementar estas idéias com as de “aulas

exploratório-investigativas” apresentadas por Fiorentini (2006) sobre a necessidade de

[...]construir gradativamente uma cultura com a turma para desenvolver o trabalho investigativo, habituando os alunos ao trabalho em grupo, às discussões e explorações, ao levantamento e teste de conjecturas, à tentativa de provar ao argumentar a validade das mesmas, à elaboração dos relatórios das investigações e à socialização e negociação dos resultados (FIORENTINI, 2006, p. 28).

Minha questão foi então reformulada, ficando com a seguinte redação: Quais as

possibilidades e os limites, num ambiente de cooperação investigativa, para o ensino e

a aprendizagem da Estatística, em aulas de Matemática, no segundo segmento do

Ensino Fundamental da EJA?

estabelecer contato perceber

reconhecer posicionar-se

pensar alto reformular desafiar

avaliar

Aluno Professor

Figura 1: Papéis essenciais do professor e dos alunos.

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Como esperado em uma pesquisa como esta, a questão foi novamente

reelaborada. Dois fatores que motivaram essa reelaboração foram: o desenvolvimento

do trabalho de campo, concomitante com as primeiras análises do material resultante

dos questionários; com o diário de campo; com a transcrição dos registros das

atividades de sala de aula; com o material gráfico elaborado pelos alunos; e as

discussões com outros pesquisadores, notadamente aqueles participantes do Prapem.

Intimamente relacionado a esses, destaco um terceiro fator: a percepção de que o foco

da investigação se encaminhou para o letramento e a inclusão social e escolar dos

alunos de EJA. Sendo assim, minha questão de pesquisa ficou assim redigida no texto

apresentado para o exame de qualificação:

Quais os indícios de letramento presentes nas aulas de Matemática da Educação

de Jovens e Adultos mediadas por uma prática de ensino de Estatística exploratório-

investigativa?

Devido às contribuições da banca no exame de qualificação, decidi centrar o

trabalho no ensino e na aprendizagem da Estatística, como já constava no título, e a

questão de pesquisa foi reelaborada mais uma vez:

Qual o papel da Estatística na inclusão de alunos da Educação de Jovens e

Adultos em atividades letradas?

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Capítulo 3

DIALOGANDO COM A LITERATURA

Para a discussão sobre as características e os objetivos da EJA, tenho como

interlocutores, neste trabalho, Leôncio Soares (2003), Schmelkes (1996), Fonseca

(2004, 2005 e 2006) e Arroyo (2006) e como referências a Proposta Curricular para a

Educação de Jovens e Adultos (Pceja) e as recomendações da LDBEN15 n.º 9.394/96.

Faço interlocução com Carolina Carvalho (2006) e Fonseca (2005), para situar a

pesquisa num cenário mais amplo do ensino e aprendizagem de Estatística na EJA.

Devido ao encaminhamento de meu trabalho de campo em uma 7.ª série do Ensino

Fundamental de EJA, discuti também o letramento estatístico, partindo do letramento de

forma mais geral, com Magda Soares (2003), e ampliando as discussões do letramento

estatístico, com Gal (2002) e Watson (2002). Pensando nos desafios educacionais

quando se aborda Estatística, referendei-me em Batanero (2001), Règnier (2006),

Lopes (1998, 2004) e Skovsmose (2007), além de Megid (2002), Garfield (1993) e

Ponte, Brocardo e Oliveira (2003).

15 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

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3.1 - Características e objetivos da EJA

Tinha em mente a importância dessa modalidade de Educação, constatada com

dados do Inep16 de março de 2006 de que havia 5.616.291 alunos matriculados na EJA

no Brasil, em cursos presenciais ou semi-presenciais17. Segundo Leôncio Soares

(2003, p. 123), então professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal de

Minas Gerais (UFMG) e pesquisador na área, há evidências de que a “educação

voltada para jovens e adultos vem, de forma acelerada, ocupando um espaço cada vez

mais importante no cenário mundial. Anuncia-se um momento de “ [...]proliferação de

programas de EJA quer no âmbito público quer no privado [...] ”18 E ainda o documento

produzido na V Conferência Internacional de Educação de Adultos (Confintea) —

organizada pela Unesco e realizada em Hamburgo, em julho de 1997, considerada o

principal fórum mundial sobre o tema — destacou a educação de adultos como a

“chave de entrada para o século XXI”.

O Documento Base Nacional Preparatório à VI Confitea (BRASIL, 2008) ajuda-

nos a entender a quem ele se refere quando menciona “educação de adultos”: inclui

mulheres, homens, adolescentes, jovens, adultos, idosos, pessoas portadoras de

necessidades especiais, indígenas, pessoas de diversas descendências, na

“diversidade” brasileira:

16 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. 17 Essa quantidade de alunos matriculados corresponde a aproximadamente 10% do total de matrículas na Educação Básica, que inclui Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio, Educação Especial e Educação Profissional. 18 São exemplos disso: Integrar e Integração, da Central Única dos Trabalhadores (CUT); Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), nascido da interlocução e parceria do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) com o governo federal; Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem), entre outros.

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[...] os sujeitos da diversidade tentam dialogar entre si, ou pelo menos buscam negociar, a partir de suas diferenças, propostas políticas que incluam a todos nas suas especificidades, sem, contudo, comprometer a coesão nacional, tampouco concepções e propostas de EJA voltadas à formação humana que passam a entender quem são esses sujeitos e que processos político-pedagógicos deverão ser desenvolvidos para dar conta de suas necessidades, desejos, resistências e utopias (BRASIL, 2008, p.13).

A mesma importância atribuída à EJA ou à educação de adultos por Leôncio

Soares (2003) e pela Confintea é também defendida por Schmelkes (1996), então

coordenadora geral de Educação Intercultural Bilíngüe, da Secretaria de Educação

Pública no México:

Pero es esencial que la educación de adultos tenga capacidad, además de contribuir a la satisfacción de las necesidades básicas de sobrevivencia, de trascender lo relativo a la misma y de propiciar el desarrollo de individuos y colectividades. Sin embargo, es necesario que la educación de adultos se proponga ese segundo objetivo. Esta función, propia del quehacer educativo, no se logra en forma automática cuando si atiende desde lo educativo la satisfacción de las necesidades de sobrevivencia. Es necesario que se proponga, que lo haga operativo y que disponga de los medios para que ello sea posible. (SCHMELKES, 1996, p. 25)19.

E ainda será “necesario, para que este ejercicio resulte completo, agregar a esta

lista los derechos humanos de tercera generación: los derechos econômicos y sociales

y los políticos y culturales.” (SCHMELKES, 1996, p. 26). Continuando a destacar

objetivos da EJA, ela entende a educação de adultos principalmente como um

instrumento para o desenvolvimento pessoal e social do aluno, ressaltando a

contribuição que a Educação pode propiciar: a de transformação da realidade. Essa

transformação é a que problematiza, é criativa e reflete sobre a realidade, buscando a

19 Porém é essencial que a educação de adultos tenha capacidade, além de contribuir com a satisfação das necessidades básicas de sobrevivência, de transcender o relativo a esta e propiciar o desenvolvimento de indivíduos e coletividade. Mas, contudo, é necessário que a educação de adultos se proponha a este segundo objetivo. Esta função, própria da tarefa educativa, não se obtém de forma automática quando se atende o educativo, a satisfação e as necessidades de sobrevivência. É necessário que se proponham e se operem os meios para que isso seja possível e que se disponha deles. (SCHMELKES, 1996, p. 25, tradução nossa).

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formação de uma consciência crítica. Além disso, a educadora mexicana destaca que

não se trata, como no caso do ensino regular, de no futuro os alunos poderem enfrentar

as múltiplas exigências da vida pessoal e social com qualidade; é necessário oferecer

os elementos para que os adultos possam, hoje, ir conseguindo uma vida de melhor

qualidade.

Essas recomendações parecem estar contempladas na LDBEN20 n.º 9.394/96,

que prescreve que a EJA se destina àqueles que não tiveram acesso ou não deram

continuidade aos estudos no Ensino Fundamental e Médio, na faixa etária de 7 a 17

anos. Recomenda também que a EJA seja oferecida em sistemas gratuitos, com

oportunidades educacionais apropriadas, considerando as características, os

interesses, as condições de vida e de trabalho do cidadão; somando-se a isso, temos a

Proposta Curricular para a Educação de Jovens e Adultos (Pceja), que destaca que a

EJA deve desempenhar três funções: reparadora, equalizadora e qualificadora

(BRASIL, v. 1, 2002, p.18).

A função reparadora menciona o direito a uma escola de qualidade, que atenda

às necessidades de aprendizagem dos jovens e dos adultos, e enfatiza que essa

função não deve ser a de suprimento. A equalizadora está relacionada à igualdade de

oportunidades que possam oferecer novas inserções no mundo do trabalho, na vida

social, entre outras. E a função qualificadora, considerada como o próprio sentido da

EJA, refere-se a uma possibilidade de educação permanente.

20 Lei de Diretrizes a Bases da Educação Nacional.

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Complementando a legislação e as funções da EJA, trago Arroyo (2006),

professor titular emérito da Faculdade de Educação da UFMG21, com uma posição

crítica, quando comenta sobre a EJA e as políticas públicas brasileiras:

A EJA vem se enredando nessa estranheza do reconhecimento do direito à educação apenas ao ensino fundamental e apenas a essa idade de 7 a 14 anos. Sem alargar essa estreita visão do direito à educação não sairemos do mesmo lugar: a EJA continuará um tempo de suplência. Ultimamente os termos suplência, supletivo vão sendo abandonados, porém a lógica continua a mesma. Falamos em EJA de 1.ª a 4.ª e de 5.ª a 8.ª. O direito à educação continua restrito ao ensino fundamental e à idade de 7 a 14 anos, porém se abre uma brecha para esse direito ao ensino fundamental para além dos 14 anos para suprir o cardápio intelectual que deveriam ter recebido quando crianças e adolescentes (ARROYO, 2006, p. 27).

Entretanto, apesar das recomendações e das funções que a EJA deve

desempenhar, segundo a Pceja, o que vemos é que esse direito à educação ainda está

muito distante de realmente ser ideal.

Depois dessa visão mais geral da EJA, inicialmente foquei a Matemática,

considerando os papéis que pode assumir na formação ou na exclusão do jovem e do

adulto e, posteriormente, a Estatística. A Pceja também traz a Matemática como direito

de todos:

Aprender matemática é um direito básico de todos e uma necessidade individual e social de homens e mulheres. Saber calcular, medir, raciocinar, argumentar, tratar informações estatisticamente etc. são requisitos necessários para exercer a cidadania, o que demonstra a importância da matemática na formação de jovens e adultos (BRASIL, v. 3, 2002, p. 11, grifo meu).

Embora o acesso dos alunos à EJA esteja garantido por legislação e haja

documentos oficiais que mencionem a Matemática e, indiretamente, a Estatística, isso

não garante a formação crítica dos alunos, como nos traz Fonseca (2005), então

21 Universidade Federal de Minas Gerais.

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Coordenadora do Núcleo de Educação de Jovens e Adultos e do Programa de

Educação Básica de Jovens e Adultos da Universidade Federal de Minas Gerais; ela

destaca que,

[...] embora já seja um lugar comum, nunca é demais insistir na importância da Matemática para a solução de problemas reais, urgentes e vitais nas atividades profissionais ou em outras circunstâncias do exercício da cidadania vivenciadas pelos alunos da EJA (FONSECA, 2005, p. 50).

Ressalta a importância de propostas de ensino que abordem problemas

significativos para o aluno, conectadas com a realidade; tal abordagem parece de

consenso entre muitos educadores matemáticos, não só daqueles que trabalham com

EJA; entretanto, parece que essa transformação curricular encontra muitas resistências

para sua efetivação.

A Educação Matemática de Jovens e Adultos pode oferecer muitas

possibilidades de construção de significado para o ensinar e o aprender Matemática,

dependendo da forma como são negociadas essas produções de sentido, assim como

completa Fonseca (2006):

Dessa maneira, essa relação também definirá os modos de matematizar que os sujeitos mobilizarão, tentarão ou desejarão mobilizar no contexto escolar, e a compreensão, e muitas vezes a explicitação, de sua marca no fazer matemático de alunos e professores podem ser decisivas para o estabelecimento de uma relação de respeito e de co-responsabilidade nos processos de negociação de significados na sala de aula (ou em outros contextos de aprendizagem) (FONSECA, 2006, p. 235).

Trabalhar com Matemática na EJA deve ter uma dimensão que envolva o fazer, o

pensar e o aprender Matemática, respeitando a identidade sociocultural dos alunos —

carregada de seus fazeres, de suas histórias, de seus medos, de sua exclusão da

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escola regular e até de uma possível repulsa pela Matemática —, tudo isso posto numa

condição adulta, pois o aluno precisa posicionar-se diante do que a vida lhe impõe.

3.2 - Cenário de ensino e aprendizagem de Estatística na EJA

Uma análise da Pceja relativa ao ensino da Matemática permite-nos perceber

uma aproximação muito grande com os PCN destinados ao ensino regular, embora se

destaque que os sujeitos são diferentes. Quanto a objetivos gerais do ensino de

Matemática, o documento explicita: “O ensino de Matemática na Educação de Jovens e

Adultos, que visa à construção da cidadania e à constituição do aluno como sujeito da

aprendizagem, compartilha os mesmos objetivos gerais do Ensino Fundamental.”

(BRASIL, v. 3, 2002, p. 17).

Podemos dizer que a Pceja considera a importância da abordagem da Estatística

na EJA:

Os assuntos referentes a estatística, probabilidade e combinatória também precisam ser levados em conta pelos professores do Segundo Segmento da EJA, pois integram o rol de conhecimentos indispensáveis à alfabetização matemática, tão necessária para sobreviver no mundo atual, e podem ser articulados num grande tema denominado “tratamento da informação”. Além disso, são ferramentas importantes para análise das chamadas questões sociais urgentes, a serem trabalhadas transversalmente (BRASIL, v. 1, 2002, p. 23, grifos dos autores).

Entretanto, esta mesma proposta não é otimista, pois menciona, em outro ponto

do documento, que os conteúdos estatísticos, muitas vezes, estão sendo relegados ao

segundo plano:

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Nota-se uma forte tendência a considerar como pouco relevantes os conteúdos do bloco referente a tratamento da informação, embora seja preciso permitir aos jovens e adultos o contato com os conteúdos de estatística muito importantes e em grande parte da comunicação social (BRASIL, v. 1, 2002, p. 73).

A indicação dos dados do Inaf 2002 apresentados por Fonseca (2004) reforça a

idéia de que isso não tem sido tratado de forma correta, não só na EJA:

A indicação de que apenas 21% da população brasileira consegue compreender informações a partir de gráfico e tabelas, freqüentemente estampados nos veículos de comunicação, é absolutamente aflitiva, na medida em que sugere que a maior parte dos brasileiros encontra-se privada de uma participação efetiva na vida social, por não acessar dados e relações que podem ser importantes na avaliação de situações e na tomada de decisões (FONSECA, 2004, p. 23).

Segundo a Pceja (BRASIL, v. 3, 2002, p. 20), o trabalho com Matemática na EJA

“deve visar o desenvolvimento de conceitos e procedimentos relativos ao pensamento

numérico, geométrico, algébrico, à competência métrica, ao raciocínio combinatório,

estatístico e probabilístico”. A proposta apresenta detalhes do raciocínio estatístico:

Exploração de situações de aprendizagem que permitam ao aluno: • coletar, organizar e analisar informações, construir e interpretar tabelas e gráficos, formular argumentos convincentes, tendo por base a análise de dados organizados em representações matemáticas diversas (BRASIL, v. 3, 2002, p. 22).

Para a seleção de conteúdos, a mesma proposta tenta dar indicativos para uma

construção crítica:

• compreensão da importância da estatística na atividade humana, assim como de que ela pode induzir a erros de julgamento, pela manipulação de dados e pela apresentação incorreta das informações (ausência de indicação da freqüência relativa, construção de gráficos com escalas inadequadas etc.); • predisposição para analisar criticamente informações e opiniões veiculadas pela mídia, suscetíveis de análise à luz dos conhecimentos matemáticos (BRASIL, v.3, 2002, p.24).

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Mas, quando a Pceja traz “orientações didáticas”, percebemos um

distanciamento dos conteúdos propostos. As “orientações” apresentam a atividade

intitulada “Profissões, salários e inserção no mercado de trabalho”, considerando-a

como de “grande interesse” do aluno, e relatam o acontecido na escola: “fez-se uma

pesquisa para saber qual a profissão que mais interessava aos alunos da escola”

(BRASIL, v. 3, 2002, p. 59); parecem não considerar que se trata de alunos que, em

sua maioria, já têm uma profissão ou pelo menos têm (ou tiveram) um emprego.

Sugerem-se algumas tarefas interessantes que puderam até ser desenvolvidas, embora

não descritas detalhadamente, como, por exemplo, a leitura e a pesquisa em jornais.

No documento priorizou-se a execução de procedimentos de cálculo e de construção do

gráfico, com ênfase no emprego de técnica: “Foram entrevistados 88 estudantes,

organizaram os dados e a professora propôs então que fosse construído outro tipo de

gráfico – o de setores” (ibidem), como podemos ver na figura 2 trazida pela proposta,

com o acréscimo das “idéias matemáticas” que foram trabalhadas. Os registros dos

alunos resumem-se aos cálculos, sem destaque para as idéias estatísticas:

A construção do gráfico de setores permitiu que a professora trabalhasse algumas idéias matemáticas – porcentagem, medidas de ângulos, raio e diâmetro de uma circunferência – e alguns conteúdos procedimentais – construção de uma circunferência com compasso, construção de ângulos com transferidor, construção de gráfico de setores com legenda, coleta e organização de dados (BRASIL, v. 3, 2002, p. 59).

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Figura 2. Profissões, salários e inserção no mercado de trabalho. (Pceja, 2002, p. 60-61).

Analisando-se o documento, percebe-se uma proposta inadequada quanto à

temática e indícios de que o tema não partiu do interesse do aluno; uma inadequação

na forma de abordar a temática, principalmente por priorizar o ensino mecânico da

Matemática, já que a Estatística ficou relegada a segundo plano. Os conteúdos

matemáticos mencionados são importantes e necessários para o ensino de Estatística e

devem estar presentes, mas essa proposta contradiz o que chama de “construção

crítica”, pois, segundo Carolina Carvalho (2006, p.3), “uma interpretação do problema

em estudo não é conseguida seguindo mecanicamente um conjunto de noções e

técnicas rigorosas com um tratamento associal dos mesmos”. Ainda segundo esta

autora, “a ênfase deve ser colocada não numa suposta aquisição de conhecimentos,

mas na mobilização de competências, ou seja, no saber em ação”.

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Pesquisando outros materiais — e vale mencionar a escassez de materiais

voltados à EJA —, encontramos os livros desenvolvidos pela Ação Educativa22 para o

Segundo Segmento do Ensino Fundamental, intitulados “Matemática e fatos do

cotidiano”, que apresentam o capítulo “Lendo e interpretando informações estatísticas!”

(p. 129) em seu primeiro volume. Embora ele traga atividades fechadas do tipo

“Observe a tabela e responda usando somente algarismos” (p. 148), apresenta uma

orientação interessante aos professores, sugerindo a “decisão conjunta dos

participantes” e incentivando o “trabalho com dados reais” (grifos meus), conforme

trecho do material, trazido no Quadro 1:

Quadro 1 – Matemática e fatos do cotidiano A seguir, um roteiro que pode ser tomado como referência para fazer uma pesquisa de opinião na escola. É conveniente não considerá-lo como norma, mas como ponto de partida para a elaboração de um projeto de trabalho coletivo. Em primeiro lugar, é fundamental uma decisão conjunta para a escolha do tema e a atribuição de responsabilidades entre estudantes, professores e outros participantes da comunidade escolar envolvidos no projeto. Em seguida, pode-se, por exemplo, propor as seguintes etapas:

� Definição do objetivo da pesquisa: estabelecer as metas a serem alcançadas; � Definição da população e das amostras: decidir se o grupo vai utilizar toda a população

ou apenas uma amostra; � Elaboração dos questionários: selecionar os aspectos mais importantes, levando em

conta que um questionário tem limitações em sua extensão e finalidade; � Coleta de dados (campo): organizar bem as equipes, dividir responsabilidades e

combinar prazos; � Processamento dos dados (tabulação): preparar previamente as folhas em que se

registrarão os resultados, levando em conta a organização dos dados e a utilização de símbolos de fácil visualização;

� Análise e interpretação dos resultados: destacar no conjunto de dados os mais comuns (típicos) e o que são distintos (discrepantes) e fazer uma análise descritiva das informações;

� Apresentação e divulgação dos resultados: organizar uma exposição sobre o tema, apresentando as conclusões em gráficos, tabelas ou pequenos textos explicativos, acompanhados de fotos e ilustrações.

ONAGA, Dulce S. Matemática e fatos do cotidiano. Livro do Professor. São Paulo: Global; Ação Educativa Assessoria, Pesquisa e Informação, 2004. p. 99-100. (Coleção Viver, aprender, v. 1).

22 ONG Ação Educativa Assessoria, Pesquisa e Informação.

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Mas o trabalho na EJA não se pode limitar só à Pceja e a materiais didáticos;

deve ir além, buscando o sentido para ensinar e aprender Matemática e Estatística na

escola; os sentidos que os alunos dão a esse processo; e a significação que assumem

a Matemática e a Estatística ensinadas e aprendidas, conforme diz Fonseca (2005):

Acreditamos que o sentido se constrói à medida que a rede de significados ganha corpo, substância, profundidade. A busca do sentido do ensinar-e-aprender Matemática será, pois, uma busca de acessar, reconstruir, tornar robustos, mas também flexíveis, os significados da Matemática que é ensinada-e-aprendida (FONSECA, 2005, p. 75, grifos da autora).

3.3 - Letramento estatístico

O termo letramento tornou-se comum atualmente, mas surge a necessidade de

refletir um pouco mais sobre a questão de letramento, aprofundando a concepção

desenvolvida por Soares (2003b), professora titular da Universidade Federal de Minas

Gerais, a fim de discutir o letramento estatístico.

Letramento é assim explicado pela autora:

Embora correndo o risco de uma excessiva simplificação, pode-se dizer que a inserção no mundo da escrita se dá por meio da aquisição de uma tecnologia – a isso se chama alfabetização, e por meio do desenvolvimento de competências (habilidades, conhecimentos, atitudes) de uso efetivo dessa tecnologia em práticas sociais que envolvem a língua escrita – a isso se chama letramento (SOARES, 2003b, p. 90, grifos da autora).

Soares (2003b) aponta para a importância de conceituar o que é letramento

justamente pela necessidade de avaliar ou medir o quanto uma pessoa pode ser

considerada letrada ou não.

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Para ampliar esta discussão, gostaria de trazer a definição da Unesco, de 1958,

para “padronizar as estatísticas em educação”:

É letrada a pessoa que consegue tanto ler quanto escrever com compreensão uma frase simples e curta sobre sua vida cotidiana. É iletrada a pessoa que não consegue ler nem escrever com compreensão uma frase simples e curta sobre sua vida cotidiana (Unesco, 1958, apud SOARES, 2003b, p. 71).

Concordo com Soares (2003a, p. 71): essa definição chama a atenção apenas

para a “dimensão individual do letramento”. De acordo com a autora, temos a

“dimensão individual” e a “dimensão social” do letramento:

Quando o foco é posto na dimensão individual, o letramento é visto como atributo pessoal, parecendo referir-se, como afirma Wagner (1983, p. 5), à “simples posse individual das tecnologias mentais complementares de ler e escrever”. Quando o foco se desloca para a dimensão social, o letramento é visto como um fenômeno cultural, um conjunto de atividades sociais que envolvem a língua escrita e de exigências sociais de uso da língua escrita (SOARES, 2003a, p.66).

Penso ser essa segunda perspectiva apresentada por Soares (2003a) a que

mais contribui para as análises que realizarei. É possível aproximá-la da utilização que

faz Gal (2002, p.2, tradução minha), da Universidade de Haifa (Israel): para ele, o termo

letramento tem sido “combinado com termos que denotam domínios de conhecimento

específico”, como letramento escolar, letramento social ou não escolar, letramento

computacional, letramento científico, letramento cultural, letramento visual, letramento

estatístico (que este trabalho vai explorar), entre outros.

Gal (2002, p. 01, tradução minha) considera o letramento estatístico como “uma

habilidade-chave esperada de cidadãos em sociedades sobrecarregadas de

informação, freqüentemente vista como um resultado esperado da escolaridade e como

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componente necessário do letramento e da numeracia de adultos”. O autor pondera

também que o letramento estatístico apresenta dois componentes inter-relacionados:

(a) Habilidade de interpretar criticamente e avaliar a informação estatística; os argumentos relativos aos dados; ou os fenômenos estocásticos que se encontrarem em contextos diversos; e, quando for de relevância, (b) a capacidade de discutir ou comunicar suas reações frente a tais informações estatísticas, assim como o entendimento do significado da informação; suas opiniões sobre as implicações dessa informação; ou seus vínculos com respeito à aceitabilidade das conclusões dadas (GAL, 2002, p.02-03, grifos do autor. Tradução minha).

Watson (1997, apud GAL, 2002), da Universidade da Tasmânia (Austrália),

apresenta uma estrutura do letramento estatístico, “constituída por três camadas com

crescente sofisticação”, que listo abaixo:

• Uma compreensão básica da terminologia estatística e probabilística. • Um entendimento da linguagem estatística e de seus conceitos, na

medida em que estão presentes no contexto de uma discussão social mais ampla.

• Uma atitude de questionamento que se pode assumir ao aplicar conceitos para contradizer afirmações feitas sem o fundamento estatístico apropriado (WATSON, 1997, apud GAL, 2002, p. 02. Tradução minha).

Gal (2002) propõe o que chama de “um modelo de letramento estatístico”

(Quadro 2), ou seja, um modelo das bases de conhecimento que os adultos e também

os estudantes em processo de formação deveriam ter disponíveis, para poderem

compreender, analisar e criticar as estatísticas que nos cercam.

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Quadro 2 : Um modelo de letramento estatístico Elementos

de conhecimento

Elementos de

disposição Habilidades de letramento Conhecimento estatístico Conhecimento matemático Conhecimento contextual Questionamento crítico

Crenças e atitudes Posicionamento crítico

Letramento

estatístico

Gal, 2002, p.4. (Tradução minha)

Explorando o que Gal (2002) classifica como “elementos de conhecimento”, vale

destacar que eles não ocorrem separadamente e muitas vezes são até confundidos por

isso, mas são descritos separadamente para facilitar a apresentação. A necessidade

de “habilidades de letramento” - letramento compreendido em seu sentido mais geral e

próximo do que eu trouxe com Soares (2003b) - surge pelo fato de as mensagens

estatísticas apresentarem-se em textos orais ou escritos e por estar a informação

estatística, muitas vezes, inserida em textos complexos; ou seja, tais habilidades são

essenciais para a competência de ler e escrever em práticas sociais. Gal (2002,

tradução minha) aponta ainda que “o letramento estatístico e o letramento geral estão

interligados”. O “conhecimento estatístico” implica saber como os dados podem ser

produzidos e por que são necessários; familiarizar-se com os termos básicos, com

idéias da estatística descritiva, com representações em gráficos e tabelas, incluindo sua

interpretação, com noções básicas de probabilidade; e conhecer como as conclusões

são alcançadas. Com relação ao “conhecimento estatístico”, Gal (2002) ainda completa

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que incluir em um curso uma grande quantidade de conteúdo estatístico não é

suficiente para garantir o letramento estatístico.

Com relação ao “conhecimento matemático”, destaco o papel de apoio que este

vem dar não só ao letramento estatístico, mas ao conhecimento estatístico; entretanto,

ele, o conhecimento matemático, não pode ser o centro do processo, pois existem

recursos tecnológicos de apoio, como calculadoras e computadores. O “conhecimento

contextual”, segundo Gal (idem), “é a fonte de significado e a base para a interpretação

dos resultados obtidos” (tradução minha). E o “questionamento crítico” aparece como

forma de avaliação crítica das informações estatísticas, principalmente devido à forma

como muitas vezes essas informações podem se apresentar, como, por exemplo, com

abuso intencional dos dados, apresentados de forma sensacionalista.

Quanto ao que Gal (2002) chama de “elementos de disposição”, há uma ênfase

no fato de os conceitos de posição crítica, crenças e atitudes estarem interligados. A

posição crítica está relacionada à atitude de questionamento às informações que nos

chegam, pois certas crenças e atitudes estão “na base de posição crítica das pessoas”

(p. 18) e estas devem acreditar em seu poder de ação crítica.

Em síntese, Gal (2002) afirma que o “comportamento letrado estatísticamente”

(p. 19) precisa da ativação inter-relacionada dessas cinco bases de conhecimento,

mencionadas no Quadro 2, na presença da disposição crítica com apoio de crenças e

atitudes, e realça “o papel-chave que fatores e componentes não-estatísticos

desempenham no letramento estatístico e refletem a natureza abrangente

freqüentemente multifacetada das situações nas quais o letramento estatístico pode ser

ativado” (p. 19, tradução minha). Ainda segundo Gal (idem), não necessariamente a

pessoa tem que possuir plenamente todos esses elementos de conhecimento e

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disposição para ter condições de lidar com as informações estatísticas, e o letramento

estatístico deveria ser visto “como um conjunto de capacidades que podem existir em

graus diversos no mesmo indivíduo, dependendo dos contextos em que é invocado ou

aplicado” (p. 19, tradução minha).

Como fazer um trabalho que favoreça uma formação de adultos na perspectiva

que Gal apresenta? O conjunto de tarefas que respondem a essa questão é o que

chamei de desafios educacionais.

3.4 - Desafios educacionais

A Educação Estatística assume um importante papel na Educação Matemática,

segundo Ponte, Brocardo e Oliveira (2003, p.107), pesquisadores da Universidade de

Lisboa: “é no campo do estudo de problemas e situações reais, numa perspectiva de

investigação contextualizada, que a Estatística é chamada a dar a sua grande

contribuição para a educação matemática”.

A Educação Estatística é considerada por Batanero (2001), então coordenadora

do Departamento de Didática da Matemática da Universidade de Granada, Espanha,

como uma parte da Educação geral. A autora refere-se a crianças e adolescentes, mas

podemos adequar para a EJA o detalhamento que ela faz do espírito estatístico,

considerando que os alunos já são adultos, não o serão no futuro.

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La estadística es una parte de la educación general deseable para los futuros ciudadanos adultos, quienes precisan adquirir la capacidad de lectura e interpretación de tablas y gráficos estadísticos que con frecuencia aparecen en los medios informativos. Para orientarse en el mundo actual, ligado por las telecomunicaciones e interdependiente social, económica y políticamente, es preciso interpretar una amplia gama de información sobre los temas más variados (BATANERO, 2001, p. 17).

Embora a Educação Estatística seja relativamente recente no currículo de

Matemática brasileiro, Lopes (2004), pesquisadora da área do ensino e aprendizagem

da Estatística, explicita a importância desta:

Explicitamos a importância para a literacia estatística que transcende as questões escolares, assumindo suas dimensões sociais e políticas. Vislumbramos para isso uma perspectiva de aulas de matemática que visem uma descoberta de princípios estatísticos e análise de dados, sobre uma temática, realizada a partir da utilização de procedimentos estatísticos. Isso requer que os estudantes coletem dados genuínos e também de fontes diferenciadas, que possam realizar experimentações e elaborar conclusões. A capacidade crítica para a análise de dados de sua realidade será adquirida na vivência de situações problematizadas no âmbito escolar (LOPES, 2004, p. 195).

Aprofundando as considerações de Batanero (2001) e Lopes (2004), trago

Règnier (2006), da Universidade Lumière Lyon2; ele destaca que o aluno em sua

“formação escolar de base”, além de tornar-se capaz de ler, escrever e contar, o que

era tido como suficiente até recentemente, precisa aprender a “estatisticar”, ou seja, ser

capaz de usar a Estatística para exercer sua cidadania. Traduzimos um diagrama

(figura 3) que Règnier apresenta na página 13:

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Essa necessidade de “estatisticar” também já foi levantada por Lopes (1998), que

se refere à “literacia estatística”, e a autora parece concordar com Règnier no que diz

respeito ao papel da escola, destacando a possibilidade de ser a Estatística um

elemento importante para estabelecer uma conexão entre a instituição e a realidade do

aluno:

Consideramos que o ensino da Probabilidade e da Estatística possa contribuir para que a escola cumpra seu papel de preparar os estudantes para a realidade à medida que desenvolve a elaboração de questões para responder a uma investigação, que possibilita o fazer conjecturas, formular hipóteses, estabelecer relações, processos necessários à resolução de problemas (LOPES, 1998, p. 9).

O “estatisticar” não acontece de forma isolada na formação do aluno, mas

integrado às competências de “ler”, “escrever” e “contar”, citadas anteriormente por

Règnier. Nesse sentido, Watson (2002, p. 27, tradução minha) completa: “o letramento

estatístico não deveria ser considerado como responsabilidade exclusiva dos

professores de Matemática para exclusão de professores em outras áreas curriculares”;

ou seja, é quase impossível levar o aluno a construir conhecimento, argumentar e

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apropriar-se das idéias estatísticas, fechando-nos no conteúdo estatístico e em nossa

própria disciplina.

Mas não basta ensinar Estatística, temos que ensinar de modo que sejam

produzidos conhecimentos significativos. Concordamos com Megid (2002, p.35),

quando destaca, em sua dissertação de mestrado, defendida na Faculdade de

Educação da Unicamp: “Faz-se necessário, então, buscar uma maneira diferente de

abordar o tema, procurando torná-lo interessante para o aluno, fazendo-o ampliar seus

conhecimentos, numa postura de agente de sua aprendizagem”, ou seja, é preciso

formar um aluno participante da constituição de seu conhecimento, ativo, que sabe qual

o objetivo da tarefa proposta; envolve-se com ela; e percebe o desafio de sua

execução.

Outra pesquisadora do ensino de Estatística, do Departamento de Psicologia

Educacional da Universidade de Minnesota, é Garfield (1993). Ela se refere às

atividades de aprendizagem cooperativa em grupos como uma forma de abordagem da

Estatística para complementar ou substituir as tradicionais aulas expositivas,

ressaltando a importância da discussão sobre as diferentes soluções e estratégias para

a resolução do problema que os alunos utilizaram.

Já Ponte, Brocardo e Oliveira (2003) destacam a importância da Estatística,

mencionando-a como ferramenta para a realização de projetos e investigações:

Na verdade, a Estatística constitui uma importante ferramenta para a realização de projetos e investigações em numerosos domínios, sendo usada no planejamento, na recolha e análise de dados e na realização de inferências para tomar decisões. A sua linguagem e conceitos são utilizados em cada passo do dia-a-dia para apoiar afirmações em domínios como a saúde, o desporto, a educação, a ciência, a economia e a política. Todo cidadão precisa saber quando um argumento estatístico está ou não a ser utilizado com propriedade (PONTE; BROCARDO; OLIVEIRA, 2003, p. 91).

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Aos projetos e investigações é possível acrescentar uma prática que deveria

estar mais presente no cotidiano de nossas escolas, conforme Skovsmose (2001),

então pesquisador da Universidad de Aalborg – Dinamarca: o “problema” na sala de

aula. Diz este pesquisador: “Problemas não devem pertencer a ‘realidades de faz-de-

conta’, sem nenhuma significação exceto como ilustração da matemática como ciência

das situações hipotéticas [...]” (SKOVSMOSE, 2001, p. 24).

Nessa perspectiva de problematizações reais, está presente também a

aprendizagem para a autonomia, que se relaciona diretamente com os alunos da EJA,

bem como o que Skovsmose (2007) chama de “novas possibilidades para a vida”:

A aprendizagem para a autonomia é possível, também no que diz respeito à aprendizagem de matemática. Os alunos poderiam tornar-se capazes de “dar uma resposta à autoridade”. Alunos que, de outra forma, poderiam tender a ser marginalizados, conquistaram novas possibilidades na vida. Tem sido apontado que a educação matemática pode assumir uma variedade de formas alternativas – por exemplo, através de trabalhos de projetos, abordagens temáticas, cenários para investigação, processos dialógicos de invenção etc. – que podem ajudar a garantir não apenas uma educação matemática para a cidadania, mas também para a cidadania crítica (SKOVSMOSE, 2007, p. 16).

Inspirada por essas perspectivas de “estatisticar”; de trabalhar com situações

reais; de estabelecer uma conexão entre a escola e a realidade do aluno de forma a

produzir conhecimento significativos; de envolver outros professores/disciplinas no

trabalho é que propus a realização de um projeto de Estatística no trabalho de campo,

para alunos da 7.ª série do Ensino Fundamental da Educação de Jovens e Adultos, que

começarei a descrever através da metodologia da pesquisa para, posteriormente,

apresentar todas as fases que desenvolvi.

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Capítulo 4

METODOLOGIA DA PESQUISA

“Só depois de haver conhecido a superfície das coisas é que se pode proceder à busca daquilo que está embaixo”. Calvino, apud Santos.

Querendo investigar qual o papel da Estatística na inclusão de alunos da

Educação de Jovens e Adultos em atividades letradas e querendo estar na escola,

para vivenciar o trabalho de campo, escolhi desenvolver uma pesquisa que

compreendesse uma intervenção na qual eu pudesse atuar como professora de uma

turma de EJA e como pesquisadora. Então optei por desenvolver a chamada “pesquisa

de campo”, de acordo com o que nos apresentam Fiorentini e Lorenzato (2006, p. 106):

“modalidade de investigação na qual a coleta de dados é realizada diretamente no local

em que o problema ou fenômeno acontece e pode se dar por amostragem, entrevista,

observação participante, pesquisa-ação, aplicação de questionário, teste, entre outros”.

A pesquisa de campo se constituiu como “pesquisa participante”, assim descrita

por Gajardo (1986, p. 44): “pesquisa participante é o termo usado com mais freqüência,

na atualidade, para fazer referência às experiências que procuram conhecer,

transformando” (grifo da autora). O enfoque desse tipo de pesquisa tem, em sua

origem, vínculo com “os processos de educação de adultos e, como tal, reconhece a

influência das idéias de Paulo Freire” (ibidem).

Ainda segundo Gajardo (1986, p. 32), é no campo (em meu caso, a escola) que

surgem os “temas” para “discussão, reflexão e ação”, e são os alunos participantes que

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“através da discussão das unidades, objetivizam um problema do meio, problematizam

sua situação, colocam-se como sujeitos ativos e protagonistas, buscando, a partir de

sua experiência e realidade, um caminho de ação eficaz para enfrentá-los”.

Demo (2004, p. 16) refere-se a esse tipo de pesquisa como pesquisa

participativa com “princípio educativo”, destacando seu “valor pedagógico, educativo,

formativo, à medida que implica questionamento, consciência crítica, incentivo à

formação do sujeito capaz de história própria, sustentação da autonomia crítica e

criativa”. Gajardo (1986, p.12), nessa mesma perspectiva, classifica-a como “vertente

educacional” da pesquisa participante.

A mesma pesquisadora (ibidem, p. 45) caracteriza também o que denomina

“processos” da pesquisa participante, que assim resumo: a) são baseados na

necessidade do grupo social; b) têm como ponto de partida como objetivo e como meta

o processo de aprendizagem dos participantes; c) valorizam a interação entre

pesquisador e participantes; d) buscam relações “as mais horizontais possíveis” entre

os envolvidos; e) valorizam o diálogo em todo o processo.

Planejamos e realizamos dois estagiários e eu, um trabalho de campo nessa

perspectiva, que compreendeu o desenvolvimento de um projeto de Estatística com os

alunos. Segue a descrição do contexto e dos envolvidos.

4.1 - Caracterizando e contextualizando o trabalho de campo

Inicialmente gostaria de esclarecer que são muitos os interlocutores dessa fase

da pesquisa; por isso procuro explicitar quem eram os participantes naquele momento e

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busco também indicar os momentos em que eu priorizava a professora, a pesquisadora

ou ambas, de acordo com o papel que era necessário ser assumido, embora isto muitas

vezes tenha sido difícil: separar o professor do pesquisador.

A narrativa que ora se inicia foi produzida a partir da análise do material

registrado ao longo do processo da pesquisa de campo, a saber:

• Gravações em áudio e vídeo das atividades que posteriormente

foram transcritas.

• Fotos dos alunos, do espaço escolar, do bairro e do trajeto até a

escola.

• Respostas a um questionário de identificação (Apêndice A).

• Portfólios individuais dos alunos, contendo suas produções durante

o semestre.

• Pôsteres produzidos pelos alunos em pequenos grupos.

• Diário de campo da pesquisadora, onde foi anotado tudo o que

envolveu a pesquisa de campo e suas percepções pessoais.

• Diários de campo dos estagiários.

Passo, então, à apresentação destes cenários e personagens da pesquisa: o

bairro, a escola, os alunos e os estagiários e procuro narrar um pouco das histórias que

envolveram algumas escolhas.

Informo que, para as transcrições das gravações em áudio e vídeo, utilizo os

sinais adaptados de Preti (1999, p. 11), conforme indica o Quadro 3:

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Quadro 3 – Sinais utilizados na transcrição das gravações de áudio e vídeo

Ocorrências Sinais Incompreensão de palavras ou segmentos ( ) Entoação enfática maiúscula Qualquer pausa ... Comentários descritivos da pesquisadora (( comentário)) Leituras de textos ou frases, durante a gravação “ “ Expressões fáticas Da forma como apareceram:

Ah, hã, tá, né

4.2 - A escolha da escola

No início de 2007, como professora, participei de uma reunião que definiu a

escolha das classes para o mesmo ano na E.E. “Adalberto Prado e Silva”, onde era

professora efetiva, e, como previsto, não havia classes suficientes para todos os

professores efetivos de Matemática da escola. Havia vários professores na mesma

situação que eu na Diretoria de Ensino Campinas Leste e então foi necessário que

escolhêssemos aulas em outra escola. Chegada a minha vez de completar minha

jornada, avaliei as salas disponíveis de forma que pudesse haver condições para

realizar o trabalho de campo, pois, além de professora, também teria de assumir o

papel de pesquisadora. A única escola com a quantidade de aulas suficiente para a

minha carga de professora (jornada de 20 horas) e que possuía classes de EJA de

Ensino Fundamental era a E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”, que fica num conjunto de

prédios do chamado CDHU23 e tida como distante e perigosa. E assim foi feita a

escolha. A convicção de que esta havia sido certa para um ano de muito trabalho se

confirmou.

23 Sigla referente à Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo.

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O acesso à escola foi facilitado para nós, pesquisadora, orientadora e

estagiários, e fomos muito bem recepcionados pelo diretor, assim como por todos os

outros professores e funcionários.

4.3 - Conhecendo o bairro

Instalado nos arredores de Campinas, o CDHU foi inaugurado em 03/05/2003.

Segundo informações levantadas em minha visita à associação de moradores do bairro,

no início do segundo semestre de 2007, o bairro contava com aproximadamente 11.500

moradores, vivendo em 2.340 apartamentos. Estes são distribuídos em 12 quadras e

estas, subdivididas em blocos. São 117 blocos, em cada um dos quais vivem 20

famílias.

O bairro conta com 2 escolas: a Escola Estadual “Conjunto Habitacional

Campinas E1B”24, que atende aproximadamente 880 alunos25 das séries iniciais do

24 Há um projeto de que a escola passe a se chamar E.E. “Maria de Lourdes Bordini”. 25 Estes dados me foram fornecidos em minha visita à escola.

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Ensino Fundamental, e a E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”, com aproximadamente

1.260 alunos, das séries finais do Ensino Fundamental; do Ensino Médio; e da EJA, das

séries finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio. Além disso, há um pequeno

Centro de Saúde. Contornando o conjunto habitacional, há estabelecimentos de

comércio informal — erguidos provisoriamente, muitos de forma precária —, que

oferecem produtos e serviços diversos, como gêneros alimentícios, bebidas, frutas e

verduras, lanches, material escolar, serviços de cabeleireira e manicure, acesso à

internet, entre outros. Oferecem também pequenos espaços para reuniões religiosas.

Como é um bairro novo, ainda há problemas operacionais, como a questão do

endereço das pessoas, a entrega de correspondência, o sistema de telefonia, a creche

para filhos de mães trabalhadoras, os bombeiros, o posto policial, entre outros.

4.4 - A escola

O prédio da escola surge grande e imponente na paisagem, tem três andares,

além do pátio térreo. A escola, cuja pintura estava sendo concluída na ocasião da

nossa primeira visita — orientadora, estagiários e professora/pesquisadora —, estava

limpa e bonita. As salas de aula são amplas, arejadas e claras. Como é um prédio novo,

inaugurado em 24/05/2004, já conta com elevador, para permitir o acesso de pessoas

portadoras de deficiências físicas a todos os andares. A biblioteca ainda é um

amontoado de livros, mas existe. Há uma sala de informática, com 12 computadores

novos, embora não conte com acesso a internet, e também há uma sala de vídeo muito

espaçosa e equipada com mesas grandes, onde foram desenvolvidas muitas das

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atividades relativas ao nosso trabalho de campo. A sala dos professores é ampla, com

muitos armários e uma cozinha improvisada. Nesse local os professores têm fácil

acesso a livros didáticos, que em muitas escolas ficam trancados e distantes. A escola

conta com uma quadra poliesportiva coberta, no terceiro andar, o que me chamou

bastante atenção, por ser uma inovação em termos de arquitetura, num cenário em que

normalmente nos deparamos com essa dependência em estado precário ou com a falta

dela. Em contrapartida, é curioso notar que só há banheiros e bebedouros no andar

térreo. Ali há um jardim mantido por uma entidade religiosa da comunidade, pois a

escola também é utilizada por várias delas como espaço de encontro, já que o bairro

não possui outra área destinada a eventos com grande número de participantes.

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De acordo com dados levantados por mim no final do 1.º semestre de 2007, a

escola, que é responsável pelo atendimento também de alunos dos bairros vizinhos

como Vila Olímpia, Jardim Mirassol e Parque Cidade, funcionava com a estrutura e com

o número de matriculados que constam nas Tabelas 1 e 2:

Tabela 1 – Número de alunos matriculados por turno Manhã Tarde Noite

Série N.º alunos Série N.º alunos Série N.º alunos 7.ª A 39 5.ª A 35 8.ª E 38 7.ª B 38 5.ª B 35 1.º C 37 7.ª C 38 5.ª C 32 2.º B 29 7.ª D 38 5.ª D 34 2.º C 36 8.ª A 36 5.ª E 33 3.º B 30 8.ª B 35 5.ª F 32 5.ª EJA 38 8.ª C 36 6.ª A 36 7.ª EJA 39 8.ª D 35 6.ª B 38 8.ª EJA 33 1.º A 37 6.ª C 38 1.º EJA 44 1.º B 36 6.ª D 36 2.º EJA 46 2.° A 31 6.ª E 37 3.º EJA 38 3.° A 27 7.ª E 41 - - Total 426 Total 427 Total 408

Fonte: Secretaria da Escola Estadual “Dr.Telêmaco Paioli Melges”

Tabela 2 – Número de alunos matriculados por modalidade de ensino Modalidade N.º alunos Ensino Fundamental 760 Ensino Médio 263 Ensino Fundamental - EJA 110 Ensino Médio - EJA 128 Total de alunos 1.261

Fonte: Secretaria da Escola Estadual “Dr. Telêmaco Paioli Melges”

A escola atende um número significativo de jovens e adultos trabalhadores, o

que pode ser observado pela grande quantidade de alunos matriculados no período

noturno, principalmente no Ensino Médio (regular: 132 alunos e EJA: 128 alunos) e

também no Ensino Fundamental da EJA (110 alunos). Na EJA, muitas vezes, o grande

número de matriculados reflete uma necessidade geral, no bairro, de atender às

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exigências do mercado de trabalho. Na prática, porém, há um número bem menor que

realmente freqüenta e conclui seus estudos, devido, paradoxalmente, à necessidade de

trabalhar.

Isso parece concordante com o destacado pelo IBGE:

A crescente permanência dos jovens na escola não é somente uma escolha destes ou uma maior conscientização dos pais quanto à importância da educação para o desenvolvimento humano. Nos últimos anos, a crise do desemprego que perpassa a sociedade e atinge mais fortemente a força de trabalho jovem reforça essa necessidade de qualificação (educação), principalmente para os grupos mais jovens em busca de uma colocação no mercado de trabalho (IBGE, 2002, p. 322, apud ANDRADE, 2004, p. 46).

A escola contava, na ocasião do levantamento dos dados, com 59 professores

efetivos, 17 professores contratados, também chamados de OFAs26, 9 professores

eventuais, ou seja, os que são chamados à escola eventualmente para substituição de

professores. Na área administrativa a escola contava com 6 funcionários efetivos

(diretor, vice-diretor, 2 coordenadores pedagógicos e 2 secretárias) e 7 funcionários

contratados através do sistema de cooperativa (1 secretária, 3 inspetores de alunos e 3

auxiliares de limpeza).

4.5 – Protagonistas

4.5.1 – Alunos

26 Ocupante de Função-Atividade.

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Nossa convivência com os alunos e as atividades desenvolvidas

colaborativamente, por mais de um semestre letivo, transformaram-nos em amigos e,

sem eles, o trabalho não teria se realizado!

Nossa turma, a 7.ª EJA27, como era carinhosamente chamada, contava

inicialmente com 39 alunos. Dentre esses alunos foram obtidos dados de 29, seja por

que alguns nunca compareceram às aulas, seja porque compareceram apenas às aulas

anteriores ao início do projeto.

Os dados foram conseguidos através de uma ficha de identificação (Apêndice A)

elaborada por mim com o que julguei mais relevante na ocasião e preenchida pelos

alunos. Continha o nome da escola, espaço de uma foto 3x4 e os campos a serem

preenchidos, com dados pessoais: nome, idade, cidade de nascimento, estado civil e

número de filhos; dados sobre a vida profissional: registro de atividade remunerada ou

não e o tipo de atividade; e dados sobre os motivos que os levaram a parar de estudar

e a retornar à escola.

Na Tabela 3, sintetizo os dados referentes à faixa etária dos alunos:

Tabela 3 – Faixa etária dos alunos Faixa etária Número de alunos 15 a 17 anos 8 18 a 20 anos 1 21 a 23 anos 4 24 a 26 anos 2 27 a 29 anos 2 30 a 32 anos 4 33 a 35 anos 2 36 a 38 anos 0 39 a 41 anos 4 42 a 44 anos 2

27 Corresponde à 7.ª série do Ensino Fundamental ou à 3.ª série do Segundo Segmento do Ensino Fundamental da Educação de Jovens e Adultos. Também encontrei autores que se referiam ao Nível III ou 3.º Termo do Segundo Segmento do Ensino Fundamental.

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Constata-se presença marcante de jovens até 17 anos na turma, fato que

também já foi mencionado por alguns pesquisadores, como Andrade (2004) que, além

de mencioná-lo, faz uma crítica ao atual sistema educacional brasileiro:

Na escola de EJA estão os jovens reais, os jovens aos quais o sistema educacional tem dado as costas. Percebê-los significa a possibilidade de dar visibilidade a esse expressivo grupo que tem direito à educação e contribuir para a busca de resposta a uma realidade cada vez mais aguda e representativa de problemas que habitam o sistema educacional brasileiro como um todo (ANDRADE, 2004, p.45).

Dos 29 alunos, 8 se declararam casados, 10 solteiros, 09 casados não

oficialmente e 2 divorciados.

Quanto a seus estados de origem, 17 alunos nasceram no Estado de São Paulo,

2 no Mato Grosso do Sul, 1 no Rio Grande do Norte, 2 na Bahia, 2 no Paraná, 2 em

Minas Gerais, 2 em Alagoas e 1 em Goiás.

Quis dar uma atenção especial à questão do retorno à escola quando perguntei

por quanto tempo pararam de estudar e os motivos que os levaram a parar e a voltar à

escola. Dos 29 alunos, apenas 5 não haviam parado de estudar; dos que haviam

parado, 8 haviam parado por até 5 anos, 3 alunos pararam de 5 a 10 anos, 11, por mais

de 10 anos e 2 alunos não sabiam precisar exatamente e deixaram de responder a

questão. Nas Tabelas 4 e 5, podemos notar a forte presença da questão “trabalho”,

paradoxalmente tanto nos motivos que levaram o aluno a parar de estudar, quanto nos

que os fizeram retornar à escola:

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Tabela 4 – Motivo que levou o aluno a parar de estudar Motivo que levou o aluno a parar de estudar Número de alunos Para trabalhar 8 Porque se casou 4 Porque teve filhos 4 Mora distante da escola 5 Família não permitiu a continuidade dos estudos 1 Outros motivos não especificados 2

Tabela 5 – Motivo que levou o aluno a voltar a estudar ou a continuar na escola

Motivo que levou o aluno a voltar a estudar ou a continuar na escola

Número de alunos

Conseguir emprego 7 Conseguir um emprego melhor 17 Acompanhar os filhos 1 Atender à exigência do empregador 1 Outros motivos não especificados 3

Farei uma rápida apresentação esquemática de cada aluno, no Quadro 4,

elaborada a partir da ficha de identificação, dos portfólios dos alunos, das minhas

impressões como pesquisadora e de conversas informais. Estes dois últimos tipos de

informações foram registrados no meu diário de pesquisadora. Ainda que 24 pessoas

tenham sido apresentadas, 6 não concluíram o semestre letivo. Outros 5 estudantes

não foram apresentados, pois, embora freqüentes, não me entregaram os dados.

Atribuí nomes fictícios aos alunos, para garantir seu anonimato.

Quadro 4 – Apresentação dos alunos

Adilson 34 anos 2 filhos (um de 15 e um de 13 anos) Natural de Iporã – Paraná Encanador Parou de estudar por 12 anos. Quer conseguir um emprego melhor. “O objetivo de vida é sempre melhorar para que eu possa dar um custo de vida melhor para meus filhos e para mim”.

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Alexia 35 anos 3 filhos: Luiz, com 15 anos; Karen, com 13 anos; e Caio, com 7. Natural de Campinas Dona de casa Parou de estudar por 15 anos porque teve filho. Quer conseguir um emprego. Embora falte muito às aulas, tem liderança na turma. “Moro no CDHU há 4 anos, tenho minha casa. Sou feliz”.

Ângela 39 anos 1 filho Dona de casa Parou de estudar por 27 anos porque a escola era longe. Quer conseguir um emprego. É muito nervosa, principalmente quando tem dificuldade. “Gosto de tudo o que faço e graças a Deus não tenho nenhum vício”.

Cristina 30 anos 1 filho de 8 anos Natural de Campinas Desempregada Parou de estudar por 15 anos porque o primeiro marido não deixava. Quer conseguir um emprego melhor. É muito aplicada. “Voltei a estudar, pois meu marido me dá a maior força, ...vivemos muito bem, ele é um excelente marido, um paizão, companheiro, moramos em uma casa harmoniosa, sem briga e com muito respeito”.

Edite 26 anos 2 filhas Natural de Campinas Parou de estudar por 4 anos. Desempregada Quer conseguir emprego melhor. Sempre se isola e constantemente chora. “... e parei de estudar e me arrependi de ter parado, por isso retornei à escola”. Desistiu do curso bem no final do semestre.

Elias 17 anos Natural de Campinas Desempregado Quer conseguir um emprego. Desistiu do curso.

Elisa 21 anos 1 filha Natural de Campinas Casada não oficialmente Auxiliar de limpeza afastada de suas funções Parou de estudar por 5 anos porque teve uma filha. Voltou a estudar porque quer conseguir um emprego melhor.

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Janete 39 anos Divorciada 2 filhos (um casal) Natural de Macaíba – RN Trabalha cuidando de uma idosa. Parou de estudar por 25 anos, mas sempre teve vontade de retomar os estudos.

Jorge 29 anos Natural de Bom Jesus da Lapa - Bahia 1 casal de filhos Não freqüentou a escola por ser ela distante. Iniciou seus estudos recentemente e não parou mais de estudar. Quer conseguir um emprego melhor.

Josi 19 anos Natural de Arapicara – Alagoas Desempregada Parou de estudar por 2 anos. Quer conseguir um emprego. “... quero agora para mim e para a minha família um bom futuro e um ótimo bem-estar”. Desistiu do curso.

Kelma 21 anos 2 filhos Natural de Campinas Desempregada Parou de estudar por 4 anos porque teve filhos. Quer conseguir um emprego. Tem verdadeiro trauma de Matemática. “... e estou eu aqui trabalhando, estudando, sendo mãe, esposa enfim tudo ao mesmo tempo. O que eu quero mostrar para eles amanhã é que, mesmo enfrentando mil obstáculos, eu nunca desisti, eu lutei e conquistei meu espaço nesse grande mundo em que vivemos”. Desistiu do curso.

Márcio 16 anos Natural de Campinas Desempregado Não parou de estudar. “Gosto praticamente de tudo, só não gosto da escola, mas fazer o quê? Se não vir para a escola, qual será meu futuro?”

Marilena 42 anos 5 filhos (1 filha com necessidades especiais) 1 neto Natural de Campinas Faxineira Parou de estudar por 22 anos; não levava o estudo a sério. Quer fazer enfermagem. Líder da classe e do bairro. Gosta de Matemática.

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Meire 33 anos Natural de Ouro Verde - SP Estado civil: Casada não oficialmente. 2 filhos Trabalha como copeira. Parou de estudar por 17 anos porque não tinha interesse pelo estudo. Voltou a estudar porque quer conseguir um emprego melhor.

Moacir 15 anos Natural de Campinas Não parou de estudar. Quer conseguir um emprego. É tido pelos professores como indisciplinado. Foi reprovado na série.

Rosana 39 anos 2 filhos: um de 14 e outra de 9 anos Natural de Uberlândia – MG Desempregada Parou de estudar por 23 anos para trabalhar. Quer conseguir um emprego. Escreve muito bem e tem muita sede de aprender. Também tem interesse em assuntos extra-curriculares. “Falar de mim mesma ou dos meus sonhos é um pouco difícil, por que são tantos planos e sonhos... e poucas oportunidades de realizá-los”.

Rosiane 16 anos

Natural de Icaraíma – Paraná Quer conseguir um emprego. Nunca parou de estudar. Tem muita dificuldade, não só em Matemática, mas em leitura, escrita e compreensão. “Eu quero trabalhar na loja e o que eu mais queria, além disso, era ser modelo, um sonho para mim”.

Silvana 26 anos

Grávida do primeiro filho Natural de Campinas Desempregada Quer conseguir um emprego. Muito participativa e falante Desistiu do curso devido à gravidez.

Suelem 29 anos Auxiliar de limpeza Quer ser enfermeira. Tem muita vontade de aprender, mas também muita dificuldade.

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Vitória 43 anos 1 filha Natural de Medina – MG Auxiliar de limpeza Parou de estudar por 20 anos. Quer conseguir um emprego melhor. Tem dificuldade em Matemática. “Eu não tive oportunidade e ela ((filha)) está conseguindo com muito esforço... ela é tudo na

minha vida!”

4.5.2 - Estagiários Gilberto e Alexandre

Durante todo o trabalho de campo, tive a colaboração de dois estagiários,

Gilberto e Alexandre, que se envolveram com a proposta, com a Estatística, com a

escola e, de uma maneira muito especial, com os alunos, fato que os tornou mais que

“auxiliares de pesquisa”. Essa colaboração foi muito importante para a configuração e o

desenvolvimento deste trabalho.

Gilberto cursava na época o último ano da Licenciatura em Matemática na

Unicamp. Estava desenvolvendo um projeto de Iniciação Científica, financiado pela

Fapesp28, sob orientação da orientadora deste mestrado, com o título “Quais

contribuições, problemas e limitações são apresentados em aulas de Matemática, de

EJA – em classes nas quais houver heterogeneidade etária – e cujas propostas de

trabalho visem uma aprendizagem cooperativa?”

Alexandre concluiu o bacharelado em Matemática Pura em 2004, era aluno do

mestrado em Matemática Aplicada do IMECC da Unicamp29 e estava concluindo a

Licenciatura. Ambos, ele e Gilberto, eram alunos de Prática de Ensino em Matemática e 28 Processo 05/50265-4. 29 Dissertação defendida em junho de 2007. Título: Redes neurais morfológicas: aspectos teóricos e resultados experimentais em problemas de classificação.

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Estágio Supervisionado, disciplina na qual fui monitora30, sob a orientação da Prof.ª Dr.ª

Dione.

Os estagiários atuaram em alguns momentos como auxiliares de pesquisa,

ajudando nas gravações em áudio e vídeo; como monitores, colaborando com o

trabalho dos alunos; como parceiros, nas discussões antes e depois das aulas relativas

ao trabalho de campo e via e-mail, com sugestões, na elaboração dos encontros, sobre

a aplicação das atividades e sobre as mudanças e adaptações em nosso cronograma.

Seus registros, em diários de campo, das atividades desenvolvidas também foram

importantes e são utilizados durante a narrativa destas, como um outro olhar sobre o

episódio.

Numa dinâmica das aulas de Prática de Ensino, Gilberto entrevistou Alexandre e

vice-versa e elaboraram uma biografia do colega, da qual trago trechos para contar um

pouco de suas histórias, ricas em particularidades sobre sua trajetória de professores

de Matemática:

Graduando, estagiário e futuro professor de matemática: Alexandre Monteiro

Por Gilberto da Silva Liberato

Alexandre começou a sua relação com a Matemática no Ensino Fundamental em uma escola

da rede particular em São Bernardo do Campo, chamada Colégio Viva Vida. Após essa fase partiu para outros planos no Ensino Médio, cursando a Escola Técnica

Federal de São Paulo, na verdade, um curso técnico e médio. Com respeito à formação técnica, especializou-se em mecânica. A escola é bastante conceituada e conhecida por ter um alto índice de aprovação de alunos em vestibulares de importância.

Alexandre sempre imaginava a Matemática como uma disciplina que dizia respeito à resolução de problemas. Neste sentido, no Ensino Fundamental procurava sempre uma razão, um sentido para aprender equações do primeiro e segundo grau e outras coisas. De fato, a professora procurava formular problemas e cenários para investigação e, nas feiras de ciências, sempre havia uma seção de matemática, da qual o entrevistado gostava de participar.

No Ensino Médio dedicava-se bastante ao curso e estudava bastante, achando que o

30 Programa de Estágio Docente (PED) da Unicamp.

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conteúdo era de fato mais elaborado e exigia uma maior dedicação. Mas no vestibular a matemática, em minha opinião, infelizmente não foi sua primeira

opção. Primeiramente prestou para o curso de engenharia porque os professores do cursinho achavam que com o curso de engenharia poderia ter um leque maior de opções e poderia também trabalhar como educador. De fato eles estavam equivocados, e por sorte não passou no vestibular naquele ano e no ano seguinte fez a primeira opção em matemática: “Eu fiz a escolha por matemática pelo fato de sempre ter gostado de matemática e com o intuito de ser educador”.

Assim, durante sua graduação teve um primeiro contato como professor: trabalhou como voluntário no projeto VEJA Unicamp, no ano de 2003.

Apesar de estar se direcionando para o doutorado, tem vontade de lecionar e interesse em atuar como professor de matemática em todos os níveis de ensino.

Apesar de sua primeira experiência, não se sente preparado para ser professor de matemática, pois essa experiência do dia-a-dia do educador é fundamental para gradativamente se tornar um professor de matemática com uma didática interessante.

Mas no futuro, como professor de matemática, acredita que existirão muitos desafios tais como a organização da lousa, a organização do tempo da aula, a criação de cenários favoráveis para a aprendizagem do aluno (conseqüência de muita pesquisa), a questão de atender diferentes alunos de diferentes formas, entender a limitação de alguns e ser capaz de dar a melhor contribuição possível.

Ele avalia sua formação acadêmica como boa. E sua tranqüilidade e paciência muito possivelmente serão qualidades que contribuirão para a atuação como professor de matemática.

Em sua opinião ele avalia que o que tem de ruim como professor é a organização na lousa certamente, que é um ponto o qual deve melhorar muito ainda. E acredita que somente com a prática de professor será possível superar este problema. A organização do tempo da aula também é um ponto que precisa melhorar.

Ao ser professor de Matemática, ele pretende inovar, realizando pesquisas a respeito de cenários de investigação, novas tendências matemáticas e problematizações. Acredita que, pelo fato de ter sido graduado pela Unicamp, se encontrará no ponto da pesquisa. Tem a impressão de que sempre vai colocar esse enfoque da importância de fazer pesquisa. E diz que em suas aulas de Matemática nunca faltará motivação por sua parte.

Trecho de biografia apresentada na disciplina Prática de Ensino e Estágio Supervisionado,

maio/2007.

Gilberto – Um caminho para a profissão de professor de Matemática

Por Alexandre Monteiro

Gilberto cursou o Ensino Fundamental em uma escola particular, Colégio João e Raphaella

Passalacqua, que era uma escola católica e providenciava um ambiente muito agradável e estimulador para o ensino; a escola tinha laboratórios, biblioteca, sala de informática e realmente os alunos contavam com a orientação dos professores. Nesse período, não era ainda a Matemática a sua paixão, mas sim a Geografia. Não era um aluno ruim, tinha notas satisfatórias e nunca fez recuperação ou reprovou em Matemática, as notas sempre estavam entre 7 e 9.

Com respeito ao Ensino Médio, Gilberto fez o curso em uma escola pública, mas de muito conceito em São Paulo, Caetano de Campos- Consolação. Apesar de muito se ouvir falar mal do ensino público, essa escola é diferenciada, pelo grupo dos professores e por ser a associação de pais muito presente. Foi nesse instante da sua vida que se apaixonou pela Matemática. Não sabia

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se foi pelo professor de Matemática que tinha um conhecimento fora do normal. Suas aulas eram sempre no estilo do professor Antonio Miguel: investigações, busca pelo significado através da história da Matemática. Ele não era bom aluno, mas no 2º ano do Ensino Médio ele foi meio que desafiado pelo professor de Matemática, quando fez uma prova e tirou PS que é igual a um 10. E ele disse que ele supostamente tinha colado, então disse para dar outra prova. Dito e feito, fez outra prova e tirou 9 e ele no final acabou atribuindo 10. Naquele momento pensou: “agora é Matemática”.

O seu gosto por Matemática se iniciou depois dessa prova em que foi desafiado, sentindo mais facilidade em abstrair as informações e, portanto, ficando mais interessado. O assunto que mais lhe interessava era álgebra, gostava de ficar trabalhando com as equações. Geometria nunca foi de seu interesse. Em sua opinião a álgebra é mais desafiante. Na hora do vestibular, Matemática era a sua primeira opção. Prestou Matemática em todas as universidades públicas do estado de São Paulo, em todas foi Matemática e licenciatura. Gilberto acredita que o motivo para tal escolha foi a facilidade que apresentou no segundo e no terceiro ano do Ensino Médio, conciliada com a vontade de ser professor. E a história de que o mercado de trabalho para o professor de Matemática estava em alta também foi um fator fundamental.

Com respeito a sua experiência como professor de Matemática, de fato Gilberto teve algumas experiências, como voluntário num curso de EJA em São Paulo ainda na fase do cursinho. Aqui em Campinas, já na Unicamp, trabalhou no projeto Escola da Juventude e dando aulas particulares para alunos do Ensino Fundamental e Médio. Gilberto planeja estratégia em especial para as aulas de Matemática, para quando for atuar de fato como professor de Matemática. Na verdade ele acredita que três coisas podem ser fundamentais para ser "especial": uma relação de amizade com os alunos, de respeito; e, na aula de Matemática em si, trazer curiosidades da história da Matemática, trazer esse lado histórico; e depois aplicar os conceitos em contexto da realidade.

Trecho de biografia apresentada na disciplina Prática de Ensino e Estágio Supervisionado,

maio/2007.

4.6 - Os encontros

Os encontros com os alunos para a realização das atividades de campo foram

inicialmente planejados para ocorrer às quartas-feiras nos primeiros horários do período

noturno, durante o primeiro semestre de 2007. Contamos com imprevistos como

paralisação das aulas, “reunião de pais”, que impediram a realização das atividades às

quartas-feiras, mas, em contrapartida, pudemos realizar encontros extras, em aulas

gentilmente cedidas por outros professores. Também houve aulas que “não foram” de

Matemática e que se revelaram fundamentais para o desenvolvimento do projeto.

Tivemos, então, 18 encontros, num total de 36 aulas de 45 minutos.

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Para apresentar a análise, escolhi fazer uma narrativa, respeitando a ordem

cronológica em que ocorreram as diversas atividades relativas ao projeto, às festas, às

filmagens, às gravações em áudio, enfim, tudo o que envolveu o trabalho de campo e

seus desdobramentos. Sempre que possível, optei por realizar a triangulação que,

segundo Mathison (1998, p. 13), é a utilização de “múltiplos métodos, fontes de dados e

outros pesquisadores para ampliar a validade das descobertas da pesquisa” e, além

disso, é também “uma estratégia para enriquecer a validade da pesquisa” e ajudar na

“eliminação de tendências e vícios”. Sendo assim, na elaboração da narrativa, além dos

meus diários de campo como pesquisadora, utilizei o diário dos estagiários, que

acabaram se constituindo como outros pesquisadores na perspectiva de triangulação

acima citada. Fiz uso também das transcrições das falas gravadas em áudio e em vídeo

e das produções escritas dos alunos, a fim de compor outros olhares sobre o que foi

desenvolvido. Essas triangulações permitiram-me refinar a análise, construindo uma

narrativa na qual os eixos se entrelaçam.

4.7 - Os eixos de análise

Com o propósito de analisar o percurso para explicitar as respostas à questão de

investigação: Qual o papel da Estatística na inclusão de alunos da Educação de

Jovens e adultos em atividades letradas?, li e revisei cuidadosamente os múltiplos

registros e produções vindos do trabalho de campo e relacionei as informações aos

eixos de análise:

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Eixo 1: Relação dos alunos com a Matemática.

Eixo 2: Produção de conhecimento dos alunos em Estatística nos encontros

referentes ao projeto.

Eixo 3: Inclusão dos alunos em atividades letradas.

Esses eixos não foram definidos a priori; emergiram no processo de análise do

material produzido no trabalho de campo, nas interações entre os envolvidos,

procurando captar não apenas o que ficou explícito, mas “buscando indícios”

(GINZBURG, 1991) que evidenciem as percepções ocorridas. Para essa busca, as

conversas com a bibliografia e a leitura de outros textos, na mesma perspectiva, foram

fundamentais.

A participação no projeto de Estatística também estimulou o interesse e o espírito

de investigação dos alunos. Mesmo receosos no início, sempre se mostravam

interessados, questionadores, reflexivos e, ao final, expressaram querer continuar, com

outros temas e/ou envolvendo outras disciplinas. Assim, ao refletir sobre os avanços

que foram percebidos no decorrer do semestre em que o trabalho de campo foi

desenvolvido, pude perceber os indícios de letramento presentes em nossas aulas.

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Capítulo 5

NARRATIVAS DO TRABALHO DE CAMPO

“A maneira como cada um ensina está diretamente dependente daquilo que somos como pessoa quando exercemos o ensino”

Nóvoa

5.1- Primeiros contatos com os alunos

“O que é EJA?” Silvana

Posso considerar que o meu31 primeiro contato com os alunos ocorreu quando,

como professora, passei pelo mural onde se encontravam as listas com seus nomes. A

primeira coisa que fiz foi olhar a quantidade de alunos em cada classe: 7.ª EJA - 39

alunos!

Sem dúvida a quantidade me surpreendeu! Sala cheia! Mas sei que, em geral,

nessas classes de ensino noturno da EJA há grande evasão e até mesmo alunos que

nem começam a freqüentar as aulas.

Para mostrar o “primeiro” contato efetivo com os alunos, transcrevo trecho do

meu diário de campo como pesquisadora:

Campinas, 12 de fevereiro de 2007.

Primeiro contato com os alunos

Por Keli Cristina Conti Quando cheguei à sala, cumprimentei os alunos, logo percebo que o número de presentes não

era 39, dou as boas vindas a todos mencionando a palavra 7.ª EJA, a fim de garantir que não houvesse

31 Este capítulo traz o relato do trabalho realizado em conjunto por mim e pelos dois estagiários que não apenas acompanharam as atividades, mas também participaram ativamente de sua organização e realização. Por esse motivo, o foco narrativo oscila da primeira pessoa do singular para a primeira do plural, ao longo de toda esta parte do texto.”

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nenhum aluno de outra turma perdido na classe. Para minha surpresa, uma jovem, aparentemente muito nova me perguntou: - “O que é EJA?”

Essa era uma pergunta que eu realmente não esperava! Disse então que as letras “E, J, A” significavam Educação de Jovens e Adultos e que era uma forma encontrada “pelo governo” de possibilitar o acesso à escola a pessoas que não puderam concluir seus estudos em idade regular, fazendo uma adaptação da LDBEN n.º 9.394/96. E completei a explicação, mencionando o fato de que, por já serem jovens ou adultos, tinham condições de fazer a série em um semestre, ao invés de um ano.

Fiz uma apresentação simples minha e pedi que fizessem o mesmo para nos conhecermos. Durante a apresentação alguns aspectos chamaram minha atenção - havia três grupos na sala:

- um primeiro grupo de pessoas que voltaram a estudar na 5.ª série e que, portanto, já estavam juntos há um ano;

- um segundo grupo de jovens adolescentes, oriundos provavelmente do diurno; - um terceiro grupo de pessoas de idades variadas, que retomaram o estudo na 7.ª série. Enquanto se apresentavam, entre os membros do 1.º e do 3.º grupos, havia o comentário do

tempo em que tinham ficado sem estudar e, avaliando rapidamente, uma média de 15 anos. Para fazer uma sondagem do nível da classe, perguntei sobre o que se lembravam do semestre

anterior. Alguns alunos começam a folhear os cadernos e uma aluna me ofereceu o seu, para que eu pudesse ver o que já haviam estudado.

Fui falando o que encontrei no caderno:

- Vocês estudaram frações, números positivos e negativos... Algumas pessoas confirmaram com a cabeça e alguém completou:

- “Menos com menos...” querendo se referir às regras de sinais.

Com isso, observando mais um pouco, percebi que tiveram um contato com Álgebra (equações), mas nenhum contato com Geometria e Estatística.

Diário de Campo da pesquisadora

Esse contato com os alunos e com o “caderno da aluna” me ajudou, como

professora, a começar a delinear o plano de curso para a turma e, como pesquisadora,

a dar continuidade na elaboração das propostas para o trabalho; estava conhecendo o

campo, antes de começar oficialmente a proposta e, como professora-pesquisadora,

passar a refletir sobre a importância de, além de acolher, ter um cuidado especial com

relação às lembranças, como “menos com menos...”. Segundo Fonseca (2002, p. 16),

esta última expressão provavelmente introduziu no discurso “uma voz que não é a de

uma professora, de um livro didático ou de uma anotação no caderno, mas é a voz do

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ensino escolar da Matemática, a voz e a autoridade culturalmente constituídas da

memória da matemática escolar.” (grifos da autora).

Algumas outras reflexões a respeito do episódio sobre “o que é EJA” surgiram

posteriormente e em duas esferas diferentes:

- O episódio pode ser considerado, de acordo com Soares (2003b), como parte

das práticas sociais de letramento; na vida cotidiana a aluna deparou-se em algum

momento com o termo “EJA”, talvez num cartaz de divulgação de matrículas ou de

vagas, até mesmo de relance, e, no momento em que ele apareceu num contexto

escolar (não planejado), viu a oportunidade de questionar, e esse questionamento foi

respondido.

- O mesmo episódio poderia ter configurado um momento de discussão de

política pública com os alunos, de acordo com Arroyo (2006, p. 23), que diz, em

comentário sobre a LDBEN, criticando a forma como se dá a “segunda oportunidade de

escolarização”, que “A EJA somente será reconfigurada se esse olhar for revisto”.

Surgiram, então, alguns questionamentos meus que serviram para reafirmar

minhas intenções com a proposta do trabalho de campo: Como estamos vendo esses

alunos? Fracassados a quem damos uma nova chance ou protagonistas em seu

processo de aprendizagem?

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5.2 - Preparando o campo

“Quando o campo é a escola” Megid (2002)

Tive o cuidado de agendar previamente uma reunião com a direção da escola,

para só depois iniciar efetivamente o trabalho de campo. Orientadora, estagiário

Gilberto e eu, pesquisadora, dirigimo-nos à diretoria da escola e, embora com dia e

horário combinados, foi necessário esperar um pouco, pois o então diretor, por estar

acumulando múltiplas funções, não pôde nos atender na hora marcada.

Fizemos a entrega da carta de apresentação (Apêndice B) e a apresentação

geral do projeto, partindo da minha experiência como professora que tinha encontrado

alunos que nunca tiveram contato com a Estatística; o próprio diretor compartilhou

conosco suas experiências como estudante de Pedagogia, na Faculdade de Educação

da Unicamp, relatando-nos que durante a graduação “fugiu” da disciplina eletiva de

Estatística. Posteriormente, enquanto fazia uma complementação pedagógica em

Administração Escolar em outra faculdade, é que obrigatoriamente teve contato com a

Estatística e adorou. E lembra-se carinhosamente da professora que lhe possibilitou

isso.

Informamos a ele sobre alguns detalhes do trabalho de campo, como os

cuidados com a ética, a autorização para o uso da imagem, as atividades a serem

realizadas, entre outras que se encontravam em uma pasta à disposição da Direção

para consulta.

Também fizemos a apresentação do auxiliar de pesquisa e licenciando em

Matemática – Gilberto. Naquele momento ainda não sabíamos do interesse de

Alexandre em trabalhar conosco.

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O diretor também fez questão de nos colocar a par da situação social da

comunidade, mencionando a diversidade presente e principalmente os problemas que

ele enfrenta, como a falta de serviço de correio, e o que isso acarreta para a própria

escola, como a impossibilidade de assinar revistas e jornais. Informou-nos que a

maioria das famílias tem como arrimo as mulheres. E contou-nos de sua vontade de

regressar à Universidade para realizar pós-graduação.

Como pesquisadora, considero ter sido essa uma visita muito importante para o

trabalho de campo, não só devido à receptividade que encontramos na escola e ao

clima de cooperação que se estabeleceu, mas por entender e respeitar a escola como

espaço sociocultural e, de acordo com Dayrell (1996, p. 137), um “espaço social

próprio” e ainda com “dupla dimensão”:

Institucionalmente, por um conjunto de normas e regras, que busquem unificar e delimitar a ação dos seus sujeitos. Cotidianamente, por uma complexa trama de relações sociais entre os sujeitos envolvidos, que incluem alianças e conflitos, imposição de normas e estratégias individuais, ou coletivas, de transgressão e de acordo (DAYRELL, 1996, p. 137).

5.3 - Iniciando o projeto de Estatística com os alunos

“Enfim chegou um dia esperado pelos alunos! Será que agora iriam saber de tudo sobre o projeto que a professora tanto anunciava?”

(Diário de campo da pesquisadora, 13/03/2007)

Tinha a impressão de ver essa pergunta estampada nos rostos daqueles alunos,

pois, como professora de Matemática da turma, já havia mencionado “um projeto”,

havia perguntado se eles gostariam de fazer parte dele, mas era sempre “um projeto”...

Confesso que era muito evasiva... distante..., mas propositalmente! Eu não queria

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estragar certas questões, queria captar as reações espontâneas dos alunos, relativas,

por exemplo, a suas concepções prévias sobre Estatística.

Ainda sem contar o nome do projeto, como professora-pesquisadora, comecei

falando do formulário de autorização para o uso da imagem (Apêndices C e D); fiz dele

uma leitura junto com os alunos e orientei o seu preenchimento, mencionando também

a questão dos menores presentes. Ainda um pouco inseguros quanto ao “teor do

documento”, alguns alunos iam entregando as duas vias que foram assinadas por mim.

Uma cópia foi arquivada junto com os documentos do trabalho e a outra foi entregue ao

aluno. Percebi também dificuldades ao indicar o número do documento de identidade

no preenchimento. Vários alunos pediram para “levar para casa”. Os menores de idade

tiveram que levar a autorização para casa, para anotar o número não só do seu

documento, como também o de seu responsável e a assinatura deste. Parece que eles

também desejavam certificar-se de que não estariam assinando nada que pudesse se

voltar contra eles; ou talvez estivessem receosos pela lembrança de algum episódio

em que foram enganados ou se viram forçados a assinar documentos. Esse

sentimento foi exteriorizado posteriormente na avaliação do projeto por uma aluna em

seu portfólio: “Confesso que fiquei preocupada quando a professora pediu meus

documentos e pensei muito. Mas acreditei na sinceridade da professora.” (Vitória,

28/06/2007).

Novamente trago Soares (2003b), pois esse momento de “ler” o documento

constituiu uma “prática de letramento” planejada e instituída, com um objetivo definido;

os alunos podem até ter relacionado o evento a “práticas de letramento na vida

cotidiana”, em que se depararam com a questão da leitura de outros documentos, mas

a respeito desse evento concordo com a afirmação da autora: “de certa forma, a escola

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autonomiza as atividades de leitura e escrita”, e estas são diferentes dos “eventos e

práticas associados a objetivos e a concepções não escolares.” (SOARES, 2003b, p.

107). Minha intenção era desenvolver um processo em sentido contrário.

5.4 - Identificação do aluno

“Não, professora! Eu comecei a estudar, fiz a primeira, segunda e fui continuando... É que eu, antes, nunca tinha ido para a escola.”

Jorge

A atividade, a primeira do trabalho de campo, iniciou-se bem antes, em um dos

encontros do GdS, quando apresentei minha proposta de formulário de identificação

dos alunos aos colegas do grupo. Discutimos, recebi várias sugestões e o reelaborei.

Na escola, também fiz questão de apresentar o formulário aos estagiários, numa

“reunião”, conforme foi chamada por Alexandre, em que também expus a eles a

proposta para esse encontro com os alunos.

Quando fomos, os estagiários e eu, pesquisadora, para a sala de uso múltiplo

com os alunos, foi entregue a estes o formulário de identificação (Apêndice A), cujos

dados de caracterização dos sujeitos foram explorados anteriormente. Novas dúvidas

surgiram por parte dos alunos! Então sugeri que lêssemos juntos item por item e

fôssemos respondendo, o que já era esperado, já que preencher um formulário não é

algo tão elementar. Assim foi feito; eram poucos os que arriscavam se adiantar! Havia

dúvidas também quanto a preencher a lápis ou caneta. Durante toda a aula procurei

deixá-los à vontade, usando sempre a expressão “Como você se sentir melhor!”

Desejava deixar de lado a idéia de obrigatoriedade, estabelecendo a de voluntariedade!

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Enquanto terminavam de preencher, circulei pela classe e percebi que havia

pessoas que não tinham começado a preencher, ainda com dúvidas. Eis algumas que

me chamaram a atenção e que foram transcritas da gravação em áudio:

Jorge - Quanto tempo parei de estudar? Mas eu não parei professora, o que eu faço? Keli – Você não parou? ((achando estranho que uma pessoa de 30 e poucos anos não tivesse parado de estudar!)) Jorge – Não, professora! Eu comecei a estudar, fiz a primeira, segunda e fui continuando... É que eu antes, nunca tinha ido para a escola. Keli – Entendi, Jorge. Então você marca aqui ((mostrando o espaço destinado às pessoas que não haviam parado de estudar)).

Surpreendeu-me a situação: nos dias de hoje, em um grande centro, uma pessoa

jovem que só foi alfabetizada recentemente é algo difícil de imaginar! Estou entendendo

aqui alfabetização como “processo pelo qual se adquire o domínio de um código e das

habilidades de utilizá-lo para ler e escrever”, conforme explicitado por Soares (2003b,

p.91).

Algumas dúvidas eram a respeito das profissões que não apareciam na pequena

lista e que, portanto, deveriam ser marcadas como “outras”.

Também encontrei situações como estas, transcritas de gravação de voz

realizada na classe, que podem representar a falta de diálogo familiar e até a pouca

importância que os alunos dão à própria historicidade:

Keli – Aqui você não vai preencher? ((Referindo-me ao local de nascimento)) Josi – É que eu não sei! Preciso ver com minha mãe.

Durante o preenchimento dos formulários fui questionada por dois alunos sobre a

“obrigatoriedade” daquilo; percebi não ser o questionamento a respeito do trabalho, mas

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referente à exposição pública de imagem, foto, filmagem, gravação. Preferi deixar livre,

mas de certa forma apelando para uma autoridade maior, ao responder:

O diretor da escola autorizou a realização do projeto, ele ((o projeto)) vai ocupar muitas de nossas aulas, vai ser uma das formas de avaliação ((mas não quis forçar a questão nota X reprovação)). Você não quer conhecer um pouco mais e depois decide se quer ou não fazer?

Embora apenas dois alunos se manifestassem sobre isso, percebi não serem os

únicos receosos de tudo aquilo que de repente “descarreguei” sobre eles (estou me

referindo à quantidade de informações)!

Outra coisa que os deixou agitados foi a questão de já saberem que no dia

seguinte haveria filmagem da atividade. Sempre preferi antecipar acontecimentos como

esse, para que não se sentissem invadidos, surpreendidos, usados, mas sim

participantes importantes, seguros, pois na perspectiva em que trabalho, valorizo a

interação social e a interação entre as pessoas, assim como nos trazem Carvalho e

Pamplona (2008):

[...] as experiências vivenciadas pelos sujeitos, na sua interação com outras pessoas e com o meio, é que possibilitam a produção e manipulação de símbolos. Nessa perspectiva é ressaltada a importância das condições concretas de vida, da linguagem e das relações de ensino (CARVALHO; PAMPLONA, 2008, p.2).

5.5 - Captando o relacionamento dos sujeitos com a Matemática

“Antes, quando tinha aula de Matemática me dava até calafrios, às vezes nem simpatizava com a professora por causa da matéria”

Cristina

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Como educadora preocupada com a constituição dos alunos da EJA como

sujeitos de ensino e aprendizagem (FONSECA, 2002), não poderia deixar de refletir

sobre as vivências dos alunos e tentar mostrar inicialmente como era a relação de meus

alunos com a Matemática:

A reflexão que queremos propor aqui considera, pois, que os alunos da EJA compartilham uma memória matemática coletiva, sociocultural, ao mesmo tempo presumida e construída no âmbito das interações discursivas. Eles não lembram de qualquer coisa, nem lembram de qualquer jeito, nem lembram sozinhos (FONSECA, 2002, p. 13).

E, quando falo em aprendizagem, acredito que a concepção histórico-cultural

seja a mais adequada, porque tem sido tratada como intimamente relacionada a ensino

e compartilhada com outros pesquisadores e interlocutores da EJA. Sendo assim, para

mim, o termo aprendizagem será utilizado de acordo com Castorina (2002),

pesquisador da Universidade de Buenos Aires (Argentina), quando comenta o trabalho

de Vygotsky, destacando a relação entre “aprendizagem” e “ensino”: “A própria noção

de “aprendizagem” significa processo de ensino-aprendizagem, justamente para incluir

quem aprende, quem ensina e a relação social entre eles, de modo coerente com a

perspectiva sócio-histórica” (CASTORINA, 2002, p. 19).

A atividade foi realizada no mesmo encontro em que preenchemos os formulários

de identificação. Com o propósito de saber que tipo de relação os alunos tiveram ou

tinham com a Matemática, utilizei uma dinâmica com gravuras de revistas, inspirada em

uma proposta desenvolvida por uma colega do GdS com seus alunos e compartilhada

com o grupo em nossos encontros.

Pesquisei em revistas previamente e apresentei aos alunos gravuras de pessoas,

animais, situações de alegria, perigo e tristeza, locais calmos e agitados, alimentos e

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objetos diversos. Os alunos foram orientados a trabalhar em duplas ou trios, e cada um

escolheu uma gravura que representasse o relacionamento que teve ou tinha com a

Matemática. Podemos ver em trechos de gravação em áudio da atividade, transcritos

no meu diário, as instruções que orientaram a dinâmica:

Keli – Então agora eu quero que vocês procurem alguma figura, que mostre o relacionamento de vocês com a Matemática e depois procurem formar trios para darmos continuidade ao trabalho! Vamos lá! ... Keli – Podem levantar, olhar as figuras, procurar...

Depois de escolhida a gravura, foram orientados a conversar com seus parceiros

sobre ela e escrever palavras ou frases que mostrassem a relação ali expressa.

Trago trechos transcritos do meu diário e da gravação em áudio da atividade,

durante o momento que os alunos estavam escolhendo as gravuras e conversando com

seus colegas, mostrando como a atividade teve continuidade:

Alguns alunos, principalmente os mais novos, tiveram um pouco de dificuldade para encontrar a gravura ou, talvez, para expressar seu relacionamento com a Matemática: Moacir: Tira só uma dúvida aqui! Olha só o que achei ((mostrando um gravura cheia de borboletas)) que a quantidade tem alguma coisa a ver com a Matemática! Não sei. Keli: Você se sente assim como as borboletas? Moacir: Noooooooooooosssaaaaaaaa! Keli: Com a Matemática? Moacir: Não sei... com a Matemática, não. Keli: ((pegando outras gravuras)) Você se sente assim com a Matemática, como na montanha russa? Moacir: Que é isso aqui? Keli: Livro! ... ((e indicando outras gravuras)) Com a Matemática você se sente como esse rapaz aí?... Livre assim? ...Você se sente assim na Lua? Moises: Eu me sinto um macaco numa ilha deserta. ((risos)) Keli: E você, Márcio? ((que se aproximou com dúvida)). Márcio: Na Lua precisa de muita Matemática! Keli: Cada um é cada um! Você se sente assim? Tem vontade de jogar o livro, se sente na Lua?... Na montanha russa?... Quer fugir para esse lugar? Moacir: Vamos fugir... ((cantando uma música conhecida)).

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Algumas percepções durante esse momento também foram registradas por um

dos estagiários, em seu diário de campo:

Crenças sobre a Matemática

Por Gilberto da Silva Liberato

No entanto, um fato despertou minha atenção, enquanto caminhava pela sala de aula, observei a fala de alguns alunos. Que narravam o sentimento, experiências e crenças sobre a Matemática. Alguns afirmavam que nunca iriam aprender Matemática, por ela ser muito difícil ou então por ser um problema em sua vida e por ficar nervosa toda vez que a encontra. Que a Matemática é coisa para louco ou então que não iam querer estudá-la.

Esse tipo de sentimento e pensamento levou-me a pensar como foi o contato e de que maneira eles aprenderam Matemática anteriormente. Fiquei curioso para saber como era antes a aprendizagem desses alunos, como eram suas aulas, seus professores, a escola e a sua disposição para estudar Matemática.

Trecho de diário de campo, 13/03/2007.

Durante o momento de socialização, para os que se sentiram à vontade em

compartilhar com o grupo, confirmaram-se as percepções citadas: nenhum dos alunos

mostrou ou relatou um bom relacionamento com a Matemática; revelaram ter muita

dificuldade, mas também uma grande vontade de aprender. A seguir, trechos de

gravação de áudio da socialização:

Keli: A Rosana vai contar para a gente, então! Rosana: Matemática para mim a princípio é uma grande confusão na minha cabeça. É estranho isso, a Matemática de hoje, para mim ((gravura da cabeça de uma pessoa, de onde saíam milhares de coisas)). Keli: A Matemática de antes era melhor? Rosana: Era diferente! Keli: Era diferente? Mais fácil ou mais difícil? Rosana: Mais fácil. Mas se a gente quer alcançar nossos objetivos nós temos que lutar por aquilo que a gente quer! ((gravura de uma piscina tipo olímpica)) Meire: Oi, gente. Eu me sinto assim. Gostaria de refrescar minha cabeça ((gravura de uma chama)). Keli: Por que sua cabeça está fervendo nas aulas? Meire: Nossa! Cruel! Keli: A professora é cruel? Meire: Não, a Matemática! ...

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Kelma: O meu... como é mesmo o nome disso? Keli: Carro de fórmula 1. Kelma: Eu escolhi um carro de fórmula 1 e é mais ou menos assim: eu não gostava de Matemática, mas hoje meu relacionamento com a Matemática está assim, não importa em qual posição eu fique, o importante é que eu sei que eu vou chegar lá! ... Suelem: Bom, gente, a Matemática para mim é como se fosse um obstáculo, mas eu desejo vencê-lo! ((gravura de uma montanha rochosa)) Keli: Que tamanho é esse obstáculo? Suelem: Muito, muito, muito grande! Faz uma confusão total na minha cabeça! Keli: Mas você vai vencer! Suelem: Vou vencer!

Transcrevo também trechos de depoimentos dos alunos que não quiseram

socializar suas opiniões com seus colegas, pois posteriormente pude ter acesso a suas

produções através de seus portfólios. As dificuldades continuam a aparecer:

A Matemática é muito difícil para mim. O meu pensamento fica todo enrolado (Rosiane – gravura que se assemelhava a um emaranhado de fios). Eu na matemática sou como um abacaxi, mas é fácil de descascar, isto é resolver as contas, pois fui quitandeira e vendi muitos abacaxis, mas nos problemas, isto azeda! (Marilena, contando que tem facilidade em resolver operações, mas dificuldade em interpretar situações-problema – gravura de um abacaxi).

Pude perceber o que também foi relatado por Tassoni (2001, p. 225): “os

fenômenos afetivos estão diretamente relacionados às relações sociais e, portanto, à

qualidade das interações entre pessoas, expressas nas experiências vivenciadas”.

Embora as experiências de relacionamento ruim com a Matemática estivessem

presentes, esperava poder mudar essa situação, propondo atividades em aula nas

quais se instigasse o protagonismo desses alunos no processo de produção do

conhecimento.

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5.6 - Primeira filmagem – Bingo matemático

- “Vai passar na Globo?” Ouvido de um aluno não identificado

Essa experiência teve como objetivo principal ser um “quebra-gelo” com o

equipamento de filmagem e isso foi muito importante para os alunos se familiarizarem

com a câmera. Foi importante também para nós, auxiliares-estagiários e pesquisadora,

nos “entendermos” com essa tecnologia, além de aprofundarmos o conhecimento da

relação dos alunos com a Matemática.

Na perspectiva do estagiário, tivemos um bom início de atividade:

Segundo diário de campo Por Gilberto da Silva Liberato

Eu acredito que os alunos se adaptaram com a presença das câmeras, pois faziam algumas brincadeiras, referindo-se a alguns programas de televisão, como o Big Brother, Jornal Nacional, Faustão e Domingo Legal. Eles não ficaram receosos em solicitar auxílio para os estagiários: sempre que surgia a dúvida, nos chamavam por “colega”.

Trecho de diário de campo. 14/03/2007.

O “bingo” proposto era de tabuada. Cada aluno recebeu uma cartela contendo 24

números, que eram resultados possíveis de multiplicações. A dinâmica foi o sorteio de

multiplicações presentes na tabuada usual, como por exemplo, 2 x 7, e os alunos

marcavam em suas cartelas, caso tivessem o resultado dessas multiplicações.

Os alunos mostraram-se ansiosos com a atividade! Claro que a ansiedade não

era só dos alunos, pois eu também estaria em foco, como pesquisadora, e, um tanto

nervosa, iniciei pedindo que os alunos falassem seus nomes, o que posteriormente nos

ajudaria na identificação, se necessário; também pedi que os estagiários fizessem o

mesmo, e era comum o riso nervoso, o movimento de abaixar a cabeça, mostrando

certo acanhamento.

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O bingo seguiu animado, foram distribuídos alguns “brindes”, alguns alunos

foram auxiliados pelos estagiários, e estes também se encarregaram de distribuir os

salgadinhos que os próprios alunos haviam trazido, enquanto jogávamos (conforme

arquivo em DVD), mas sempre acabava saindo alguma frase — como a transcrita da

filmagem realizada — que indicava ainda o nervosismo. A frase recorrente, ouvida

várias vezes, fazendo menção a uma emissora de televisão foi:

“Vai passar na Globo?”

Os prêmios foram muito bem-vindos, e os “comes e bebes” proporcionaram um

clima ainda mais descontraído. O clima de cooperação que começava a se instaurar

também foi sentido, conforme relatos no diário de campo de Gilberto, que evidenciou “a

ajuda de uns aos outros”:

Segundo diário de campo Por Gilberto da Silva Liberato

O Alexandre ficou na filmagem flagrando os melhores momentos da atividade. E eu fiquei servindo o refrigerante e os lanches para os alunos, para que eles não ficassem levantando ou fizessem tumulto.

Mas, durante meu percurso pela sala com os refrigerantes, observei a dificuldade dos alunos, mesmo com auxílio e ajuda do colega. Então comecei a ajudar um grupo de três alunas, duas mais velhas e uma mais nova. Elas estavam com dificuldades em resolver as multiplicações, chegando às vezes a errar os números na cartela. O que de fato foi observado pela professora Keli, pois uma aluna tinha gritado “Bingo!”; esse grito acontece quando um estudante completa todos os números da cartela. Então, quando a professora foi conferir os resultados, ela tinha feito uma conta errada, de 6x9; ao invés de ela colocar 54, ela colocou 56.

Trecho de diário de campo. 14/03/2007.

A atividade cumpriu seu objetivo principal: ao final, todos, professora, estagiários

e alunos, estavam mais relaxados em relação à câmera, havia um clima amistoso entre

nós e também pudemos nos aprimorar na utilização do equipamento. Um outro olhar

sobre isso mostra também a aprovação da proposta pelos estagiários:

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Segundo diário de campo Por Gilberto da Silva Liberato

Em minha opinião a atividade proposta pela Profª Keli foi muito bem desenvolvida, ela explicou muito bem, atendeu a todos e ensinava, ao mesmo tempo que conduzia as atividades. Fiquei com a convicção de que os alunos adoram essas atividades diferenciadas, podendo trabalhar em grupo e num clima de alegria.

Trecho de diário de campo. 14/03/2007.

Esse outro olhar sobre a escola tem sido muito importante para mim, como

pesquisadora, pois muitas vezes voltei minha atenção para fatos não menos

importantes que ocorriam no dia-a-dia da escola e que, pelo envolvimento no trabalho

de campo, acabavam não sendo percebidos ou não ficavam muito evidentes. São

exemplos dessas percepções dois aspectos comentados por Gilberto: a constante falta

de professores na escola e a possibilidade de fazermos algo para mudar a relação dos

alunos com a Matemática. Nas suas palavras, “de certa forma se envolvendo com a

Matemática de uma maneira diferenciada”. Vale conferir em seu próprio diário:

Segundo diário de campo Por Gilberto da Silva Liberato

Um outro detalhe que venho reparando, com esse dia de estágio, é que muitos alunos durante o horário de aula ficam passeando pelos corredores. Fiquei curioso para saber o que acontece, então o Alexandre e eu fomos perguntar a um grupo de estudantes porque estavam fora da sala de aula. Os mesmos afirmavam que faltou professor e que é assim todo dia.

Aquele dia ficou um pouco contraditório para mim. Desenvolvemos uma atividade instrutiva, bem elaborada com aquela classe que estamos estagiando. A Prof. Keli sendo elogiada por diversos alunos, os alunos aprendendo tabuada e de uma certa forma se envolvendo com a Matemática de uma maneira diferenciada. Eles podendo contar com uma professora presente, preocupada, que elabora atividades diferenciadas e cria um clima de alegria e amizade na sala de aula. Enquanto seus colegas de escola estão indo embora sem a sorte de terem a Prof.ª Keli como educadora.

Trecho de diário de campo. 14/03/2007.

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5.7 - Os sujeitos e suas “outras histórias”

Se você quiser conhecer uma pessoa, o que você gostaria de saber? (Diário de campo da pesquisadora 21/03/2007)

Essa foi a pergunta geradora da atividade que chamamos de “Minha história”

(Apêndice E), cujo objetivo foi conhecer melhor os alunos, sem focar algo específico,

mas conhecer aquilo que eles quisessem nos contar e que não fez parte do formulário

de identificação. Essa atividade também foi apresentada e discutida no GdS, cujos

integrantes participaram das discussões e colaboraram na reelaboração desse

formulário.

Embora não fosse o objetivo principal, a atividade “Minha história”, acabou

constituindo-se num momento de “conhecer-se” e “entender-se” escrevendo, na

perspectiva de Soares (2003a, p. 43) de que “letramento é descobrir-se a si mesmo

pela leitura e pela escrita”.

Em resposta à pergunta inicial, anotei na lousa e posteriormente transcrevi do

diário de campo dos estagiários as sugestões dadas oralmente pelos alunos:

- Nome - Idade - Filhos - Do que gosta? - Trabalha em quê? - Qual seu objetivo de vida? - Gosta do que faz? - Vícios (sugestão aluna Rosana) - Planos para os filhos ou para si...

Iniciada essa conversa, foram entregues as folhas impressas em papel pautado,

mais apropriadas para a escrita, e pedi, então, que escrevessem a “sua história”.

Poderiam utilizar as sugestões que havíamos colocado na lousa, acrescentar coisas

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que não tínhamos lembrado ou, ainda, se não quisessem falar sobre algumas delas,

também estaria tudo bem.

Percebi certa resistência de alguns alunos, em especial dos mais jovens, em

escrever; senti que o problema talvez não fosse falar de si, mas o “ato de escrever”.

Passei por entre as carteiras, troquei impressões com alguns, tentando ajudar

com algumas idéias... para alguns faltava aquele “empurrãozinho” inicial, colocar a

primeira frase no papel... e minhas tentativas foram nesse sentido.

Tudo correu bem, até que a aluna Silvana, que havia participado bastante no

início da proposta, disse que não queria “terminar a história”. Como percebi que ela

estava abalada e com lágrimas prestes a rolar, recolhi a sua folha e discretamente

permiti (incentivando-a para isso) que ela saísse um pouco; nesse momento fui mais

que pesquisadora: fui alguém com sensibilidade de amigo, que não questiona e acolhe.

Aparentemente ninguém da sala percebeu e, quando ela voltou, já tinha se recomposto.

Terminamos a aula normalmente, com os alunos me entregando “suas histórias”.

Tive o cuidado de receber as folhas e guardar logo em minha pasta, pois ficava nítido o

receio dos alunos de que eu lesse naquele momento e, de alguma forma, os

expusesse.

Posteriormente, lendo essas histórias, que fazem parte do portfólio de cada

aluno, encontramos, pesquisadora e estagiários, vários relatos32 que mostram o motivo

da volta para a escola, como:

“[...] Aos Domingos vou a Igreja do E.Q. pois sou evangélica, e tenho um ministério que é Diretora de crianças e juniores. Foi por esse motivo que voltei a estudar [...]” (Marilena)

32 Os trechos foram mantidos conforme a escrita do aluno, corrigindo-se apenas alguns erros de ortografia (e concordância).

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“[...] Voltei a estudar, pois meu marido me dá a maior força, pois pretendo fazer um curso técnico de Enfermagem do Trabalho, primeiro para ter uma profissão e segundo para dar um futuro melhor para o meu único filho [...]” (Cristina)

“[...] voltei a estudar, pois o patrão exigia que eu voltasse ou então eu era demitida [...]” (Kelma)

Também encontramos fatos que marcaram muito sua vida e que depois também

se refletiram nas escolhas feitas durante o projeto:

“[...] Aos 8 anos fui violentada por um vizinho que no caso foi preso. Meus tios na época entraram na justiça para querer a minha guarda. Minha mãe de criação quase morreu de desespero. Mas Deus foi fiel, não deixou [...]” (Aluna, 35 anos)33. “[...] Me casei com 16 anos por que eu estava grávida [...]” (Aluna, 26 anos). “[...] logo tive que parar [de estudar], pois descobri que estava grávida, engravidei cedo com14 anos [...]” (Aluna, 21 anos). “[...] Meu pai bebia muito e não ligava para dentro de casa deixava faltar alimentos para beber [...]” (Aluno, 17 anos).

Embora os sujeitos tivessem marcas muito fortes, isso não os impedia de sonhar

e sonhar muito:

“[...] Eu gostaria de ver minha filha formada e graças a Deus, com muito esforço dela já vai se formar este ano em administração estou muito feliz [...]” (Vitória) “[...] Minha vontade é de fazer a faculdade de gastronomia. É um sonho que no momento é impossível, mas tudo que é difícil, tudo que é conquistado com a força de vontade, tem um gostinho melhor, força essa que só consegue aquele que realmente deseja[...]” (Rosana)

“[...] O meu maior objetivo da minha vida hoje é terminar o meus estudos para tentar fazer um curso em técnica de nutrição[...]” (Ângela)

Conhecer essas histórias foi muito importante para aproximar-nos dos alunos;

para compreender melhor todos os acontecimentos que fizeram parte do projeto e

influenciaram na produção de conhecimento dos alunos; e para permitir que a

33 Por tratar de situações que poderiam expor em excesso os alunos, optei por identificá-los apenas por sexo e idade.

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afetividade permeasse nossas relações. Esses fatos também foram compartilhados e

assim registrados pelo estagiário Gilberto:

Diário de campo 03 Por Gilberto da Silva Liberato

Ao começar a ler a história de vida de cada aluno, observamos que não ficaram acanhados em dizer suas realidades. Alguns fatos até chamaram nossa atenção, como traição no relacionamento conjugal, tentativa de suicídio, gravidez de risco com conseqüência de aborto, problemas familiares, brigas entre pais e filhos e doenças. Percebemos na leitura que muitos estudantes são pais ou mães, a maioria tem filhos com uma idade ainda precoce. Sofrem do problema de desemprego ou trabalham em lugares que não oferecem boas condições de trabalho. A grande maioria vem de outros lugares do Brasil, e estão em Campinas com a esperança de uma vida melhor e com mais condições financeiras. Um detalhe que apareceu em muitas histórias é que os alunos afirmam que voltaram a estudar para conseguir um emprego ou para dar melhores condições de vida para seus filhos. Após essa leitura das histórias, fiquei um pouco triste com a realidade de vida desses alunos, nunca imaginei que teriam tantos problemas assim tão graves. Estou vivendo em uma outra realidade, mas isso serviu de forma a acrescentar em uma vontade de fazer algo por eles. Nem que seja um conversar, uma ajuda na sala de aula, a atenção para ouvir suas dificuldades ou brincadeiras.

Trecho de diário de campo, 21/03/2007.

5.8 - Enfim chegou a hora da Estatística

“A gente sempre ouve: as estatísticas mostram...” Rosana

Nesse momento foi pronunciada pela primeira vez, durante o trabalho de campo,

a palavra “Estatística”. Ela apareceu inicialmente grafada na lousa por mim e seguida

da pergunta oral: O que é Estatística?

Diante do silêncio por parte dos alunos, a questão foi modificada para: Quem já

ouviu falar essa palavra?

Nossas relações, como pesquisadora e estagiários em sala de aula, já estavam

sendo construídas na perspectiva de Skovsmose (2006, p. 130), de que a

aprendizagem “pressupõe comunicação e diálogo”, de forma que todos possam falar,

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formular hipóteses, pensar alto, reformular e saibam que não há uma única resposta

correta. Estávamos tentando romper com a concepção de que o professor chega à sala

de aula e transmite conhecimento; tentávamos envolver os alunos, instigando-os a

querer saber “o que vem depois”.

E, com isso, imediatamente alguém já falou:

- “A gente sempre ouve: as estatísticas mostram...”

E várias pessoas mencionaram fatos que haviam vivenciado. A cada

participação, foram sendo anotadas na lousa aquelas que considerei como palavras-

chave, que foram posteriormente transcritas do diário de campo dos estagiários:

- Violência - Aumento de violência -Desemprego - Falta de moradia

Nesse momento houve maior participação dos alunos “mais velhos” da classe.

Logo lembraram também do que estavam estudando nas aulas de Geografia e exibiram

orgulhosos alguns gráficos de setores, caprichosamente coloridos com lápis de cor.

Em seguida, outras palavras foram sugeridas por eles e anotadas por mim na

lousa:

- Gráfico - IBGE

Aproveitei a sugestão e perguntei: O que é IBGE? Mas ninguém soube dizer ao

certo, embora tenha havido várias tentativas. Com a minha colocação de que era

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística seguida da pergunta: O que o IBGE faz?,

surgiram mais palavras:

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- Censo - Pesquisas

Novas perguntas: como o IBGE faz pesquisas?

- “Perguntando”

E ampliei nossas palavras na lousa com:

Perguntas Organiza os dados

E um aluno completou:

-“Faz contas”.

Anotei, então:

Cálculos

Analisando a palavra apresentada aqui, percebemos que “traduzimos” o discurso

do aluno para o discurso da Matemática escolar, concordando com Fonseca (2002, p.

18) que essa apropriação do “gênero discursivo próprio da Matemática escolar” pode

ser “tomada como uma marca de sua inclusão nesse universo socialmente valorizado

da cultura escolar”.

E a última expressão — com o significado de “através da Estatística, podemos

nos informar” — a ser anotada na lousa foi:

Se informar

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Percebi que os alunos falavam, segundo Besson (1995, p.18), “das estatísticas”,

ou seja, do que observavam à sua volta. Assim, para relacionar as diversas palavras

que anotei na lousa com o meu objetivo — caracterizar “a Estatística” como técnica —,

comecei por dizer que a Estatística era uma área de conhecimento ou “como se fosse”

uma matéria da escola, assim como Geografia, Ciências, Matemática; que tinha como

objetivos observar, coletar dados, interpretar e organizar esses dados, muitas vezes em

gráficos e apresentá-los ao público interessado, por meio de jornais, revistas, TV.

Falei também do diferencial dos gráficos; de sua propriedade de chamar a

atenção das pessoas em jornais e revistas; e da grande quantidade de informações que

poderiam sintetizar. E expliquei que, diante dos resultados dessas pesquisas, em

muitos casos, elas poderiam servir para ajudar o cidadão a tomar uma decisão mais

fundamentada.

No momento de os alunos escreverem “o que havia ficado” de tudo o que foi

falado, registrei na lousa a seguinte questão:

O QUE É ESTATÍSTICA?

Pedi então que relatassem como se fossem contar em suas casas sobre a nossa

aula.

Escrever não é tarefa fácil, mas faz parte de nossa postura investigativa instigar

o registro. Percebi que algumas senhoras tinham facilidade e logo estavam a escrever,

mas a maioria levou certo tempo, talvez tentando organizar as idéias, antes de colocá-

las no papel.

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Depois, lendo seus registros nos portfólios, encontrei “sua compreensão” sobre o

tema. Todos relacionaram a pesquisa com termos específicos que foram mencionados

em classe e alguns deles se prenderam aos termos que perceberam vinculados à

palavra “estatística”, como:

“[...]Tudo faz parte da Estatística porque quando não tem moradia é muito triste não depende dos governantes e precisa muita paciência [...]” (Vitória)

Alguns alunos se prenderam mais aos métodos relacionados à Estatística,

utilizando as palavras “cálculo”, “índice”, “pesquisa”:

“[...] São pesquisas, as pessoas saem nas ruas ou em residências para saber, por exemplo: sobre a violência eles fazem um cálculo sobre o número de assassinatos de um ano para cá [...]” (Alexia) “[...] Acredito eu que esta palavra mostra o índice crescente dos problemas em que o país enfrenta [...]” (Rosana) “[...] Você fica informado sobre esse assunto na TV, no jornal. Estatística também está relacionada com a violência com desemprego, falta de moradia, Estatística também é uma pesquisa [...]” (Ronaldo)

Já outros procuraram incorporar à sua definição a discussão conduzida pela

professora, como:

“Estatística é um tipo de pesquisa feito pelo IBGE, as pesquisas feitas falam praticamente de todos os problemas do Brasil e talvez do mundo [...]” (Márcio)

Para finalizar esse momento e para que tivessem também um texto mais

sintetizado, montamos coletivamente uma “definição” para Estatística. Essa definição

valorizou o que cada aluno tinha produzido e deixava claro, naquele momento, o que

era Estatística e qual sua função. Era uma “definição” ainda incipiente, que foi sendo,

de alguma forma, tornada mais complexa e completa à medida que o projeto se

desenvolveu. Com meu direcionamento das afirmações dos alunos, sistematizamos:

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ESTATÍSTICA PARA NÓS É... Sempre ouvimos na TV: “as estatísticas mostram...”. E hoje pudemos discutir um pouco sobre isso. Vimos que a Estatística começa com o planejamento de uma pesquisa interessante, importante e verdadeira. A pesquisa é aplicada e os dados organizados, algumas vezes são realizados cálculos e os resultados são apresentados na forma de tabelas e/ou gráficos em grandes meios de comunicação que é a maneira mais fácil de informar a população. Temos visto estatística a respeito de... - Dengue - Violência - Divórcio - Acidentes - Educação - Programas sociais - Aquecimento global

- Água

Na visão de Gilberto, a aula foi muito importante e contribuiu bastante para o

desenvolvimento de todo o projeto, como relata em seu diário:

Diário de campo 04 Por Gilberto da Silva Liberato

Em minha concepção, a lógica com que ela ((Keli)) conduziu a aula, faz com que os alunos não tenham certas dificuldades no futuro do Projeto Estatístico. As definições foram construídas a partir do próprio conhecimento dos estudantes. O fato de trazer as pesquisas com problemas da realidade deles, acredito que também colaborou para um bom desenvolvimento da aula.

Trecho de diário de campo, 28/03/2007.

A partir desse momento a Estatística passou a fazer parte da maioria de nossos

encontros, seja através de um comentário, de algo que viram na TV ou jornal ou nos

momentos em que nos debruçamos realmente sobre ela. Entreguei também aos alunos

o que chamei de “capa” ou identificação dos portfólios (Figura 4). Os alunos que se

sentiram à vontade deram um toque pessoal a ela, como Cristina:

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Figura 4 – Capa do projeto “Construindo Estatística”

Considero também que possibilitamos aos alunos, neste estudo de Estatística,

um movimento inicial de letramento, similar ao trazido por Terzi (2005) em seu estudo

sobre a “Oralidade e a construção da leitura por crianças de meios iletrados”, que

reproduzimos na Figura 5:

fala 1 escrita 1 fala 2 escrita 2

Figura 5. Oralidade e a construção da leitura por crianças de meios iletrados. Terzi (2005)

Ainda segundo as idéias de Terzi (ibidem), na fala 1 os alunos contam suas

experiências e revelam conhecimentos anteriores; na escrita 1, os alunos constroem

seus textos a partir das palavras ditas oralmente e anotadas na lousa para apoio; na

fala 2, os alunos expõem seus pensamentos, já mais elaborados devido à escrita 1, e

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essa é (re)elaborada, em grupo, com a mediação de alguém que já tenha um

conhecimento prévio sobre o tema e sobre práticas de leitura e escrita (professora-

pesquisadora). Terzi (ibidem, p. 92) também ressalta que, dependendo das práticas de

sala de aula, em “situações propícias, a oralidade passa a influenciar a construção da

escrita”.

Pudemos, então, re-elaborar o “movimento” trazido por Terzi (2005), de acordo

com os movimentos que realizamos na EJA. O destaque nessa elaboração foi a

mediação de alguém mais experiente na cultura escolar como pano de fundo (figura 6):

Figura 6 – Movimento inicial de letramento realizado na EJA

Quando foram feitas as perguntas: “O que é Estatística?” e “Quem já ouviu essa

palavra?”, dei início ao “movimento de letramento”, para que pudéssemos criar, com os

alunos, um movimento de “estatisticar” que fosse além das apreensões de técnicas

matemáticas. As palavras mencionadas pelos alunos, como: “violência”, “desemprego”,

“falta de moradia”, entre outras, constituíram o que chamei de “fala 1”; esta gerou,

devido ao meu papel de mediadora, a escrita que denominei “escrita 1”, como a da

aluna Alexia, que utiliza inclusive as palavras mencionadas pelos alunos, dando indícios

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de que as estava ressignificando: “São pesquisas, as pessoas saem nas ruas ou em

residências para saber, por exemplo: sobre a violência eles fazem um cálculo sobre o

número de assassinatos de um ano para cá” (grifos meus).

A “fala 2” foi iniciada com os comentários realizados pelos alunos, em explicação

ao que foi escrito e à discussão das idéias que surgiram, novamente mediadas por mim;

isso gerou a “escrita 2”, ou seja, a sistematização das idéias com “Estatística para nós

é...”. Essa escrita dá indícios da ressignificação do que tinha sido dito anteriormente, na

“fala 2”, num contínuo movimento que serviu de base para o processo de formação de

pessoas que deixassem de apenas fazer parte de estatísticas ruins a respeito de

problemas do bairro e que passassem a “estatisticar”; ou seja, que fossem capazes de

interpretar, comunicar-se, argumentar e avaliar criticamente a informação do mundo

que nos cerca, passando, assim, a incorporar a estatística ao seu fazer.

Considero importante, como apresentado na figura 6, destacar a mediação que

ficou em evidência nesse encontro. Ao expor o conceito de mediação, Oliveira (2001, p.

27), professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, relata que

“Vygotsky trabalha então, com a noção de que a relação do homem com o mundo não é

uma relação direta, mas, profundamente, uma relação mediada”. A autora menciona

dois tipos de “elementos mediadores”: os “instrumentos” e os “signos”. Dentre os

sistemas de signos ou simbólicos, destacamos a linguagem e o papel do outro na

mediação, cuja importância é mencionada por Albuquerque e Leal (2004),

pesquisadoras da Universidade Federal de Pernambuco, considerando que ninguém

aprende sozinho, mas a partir das intervenções do professor e do compartilhamento

com seus pares:

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O aluno, através da interação mediada pela língua escrita e através dos desafios que o professor propõe, é capaz de refletir sobre como a escrita se constitui. No entanto, é indispensável perceber que não é a atividade em si que conduz ao conhecimento, mas a ação do aprendiz mediada pelas informações e intervenções que o professor realiza durante a atividade, bem como pelas trocas de informações entre pares (interação entre alunos). Por essa razão não se pode deixar de refletir sobre a postura que o professor precisa assumir (ALBUQUERQUE; LEAL, 2004, p. 113, grifos meus).

As atividades desenvolvidas até aqui com os alunos, de certa forma, posso

afirmar que estavam centradas nas “habilidades de letramento”, discutidas por Gal

(2002).

5.9 - De professora-pesquisadora a pesquisadora-professora

“A partir de agora novas perspectivas se abrem com a possibilidade de me dedicar exclusivamente ao projeto de pesquisa. Que bom!!”

(Diário de campo da pesquisadora)

Como professora da classe, com a postura de pesquisadora, fui desenvolvendo

uma relação com os alunos diferente da convencional: éramos amigos, colaboradores,

parceiros numa proposta; até mesmo o relacionamento dos alunos com a “prova” de

Matemática estava entrando em uma esfera diferente, não da prova em si, mas do

aprendizado; as aulas “só de Matemática” caminhavam em paralelo às aulas “do

projeto”. Em meu planejamento, procurei priorizar conteúdos que nos auxiliassem nas

atividades do projeto, como porcentagem, regra de três e noções relacionadas a

ângulo, destacando o papel de apoio do “conhecimento matemático” como, de acordo

com Gal (2002), um dos elementos de conhecimento para que se alcance o letramento

estatístico.

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Nesse contexto, no final de março, recebi comunicação de que nosso projeto

havia sido aprovado pela Fapesp e que precisaria me afastar do cargo de professora.

Por questões burocráticas da legislação própria da Secretaria Estadual de Educação do

Estado de São Paulo, o afastamento não foi possível; então, exonerei-me do cargo e

passei a dedicar-me exclusivamente à pesquisa.

Trago aqui um pequeno trecho do meu diário como pesquisadora, em que revelo

o sentimento que percebi nos alunos e em mim a respeito das novas perspectivas:

Campinas, 29 de março de 2007. Percebi em alguns ((alunos)) um desejo de poder ter opções como as minhas, embora houvesse tristeza por perder a professora de Matemática. Também os tranqüilizei, dizendo que ficaria como voluntária com a turma, enquanto a “nova” professora não chegasse. A partir de agora novas perspectivas se abrem, com a possibilidade de me dedicar exclusivamente ao projeto de pesquisa.

Diário da pesquisadora.

A partir de então me tornei formalmente apenas a pesquisadora, embora nunca

tenha conseguido me separar muito da professora que sou; isso talvez explique o título

“De professora-pesquisadora a pesquisadora-professora”, mostrando que, no início, eu

talvez fosse mais a professora e, posteriormente, mais a pesquisadora.

Continuei como voluntária na turma por duas semanas, até que a professora E.,

assumiu as aulas. Ela se prontificou imediatamente em ceder as aulas de quarta-feira

para que pudéssemos dar continuidade ao projeto. Procurei informá-la de tudo o que

estava desenvolvendo, das propostas, dos portfólios dos alunos, do plano de ensino

previsto; também lhe dei uma cópia de nosso projeto de pesquisa e formalizei o convite

para que participasse conosco dos encontros. Esse talvez tenha sido nosso momento

de conversa mais longo, pois, depois disso, encontrava-a raramente pelos corredores

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da escola, e infelizmente não pudemos contar com sua presença nos encontros, em

função de seus horários pessoais.

Embora eu não fosse mais a professora oficial da turma, o projeto teve

continuidade, contando com o apoio da direção da escola e com a participação

colaborativa dos dois estagiários e dos alunos.

5. 10 - Aulas de Estatística

“A professora Keli pediu que eu explicasse isso aos alunos. Percebi que isso facilitou realmente para eles.”

Alexandre

O conteúdo estatístico ganhou mais destaque do que usualmente tem no

currículo e gerou um interesse especial nos alunos, porque veio inserido num contexto

mais abrangente, embora as aulas relativas ao projeto só ocorressem uma vez por

semana, em 2 aulas de 45 minutos. Nas demais aulas de Matemática (4 aulas de 45

minutos) a professora E. cumpria seu planejamento.

A primeira atividade do projeto envolveu a exploração de uma questão a respeito

do bairro onde a escola se localiza e redigida assim: Do que o bairro precisa?

Pude perceber, no desenrolar da atividade, o envolvimento e a participação dos

alunos, lendo a narração apresentada por Gilberto em seu diário de campo, e a

importância do diálogo e da interação, como nos traz Skovsmose (2006, p. 130): “é

importante considerar a aprendizagem como um processo de interação entre várias

pessoas, o que pressupõe comunicação e diálogo”. Também percebo que a Estatística

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não estava sendo vista como um exercício de aplicação do conteúdo trabalhado, mas

como problema, e os alunos assumiam a questão como deles:

Diário de campo 05 Por Gilberto da Silva Liberato

Então, com a ajuda dos estagiários, a Keli tinha elaborado um cartaz, como se fosse para realizar a construção de um gráfico, pois tinha os traços do eixo horizontal e vertical. Para o desenvolvimento da atividade, a Keli começou a abordar algumas questões na sala de aula, como “Do que o bairro precisa?”.

E escreveu alguns serviços públicos e privados, por sugestões dos alunos, tais como creche, rodoviária, caixa eletrônico, comércio, indústria, supermercado, igrejas, escola profissional, bombeiro, policial militar, escola de educação infantil, médico 24 horas, biblioteca, guarda municipal, centro de lazer, posto de gasolina, posto de recebimento e patrulheiros. Mas, logo em seguida, os alunos começaram a falar que alguns não seriam tão importantes, e através de um sistema de votação os alunos teriam que escolher apenas cinco deles. E os escolhidos numa votação democrática foram: creche, médico 24 horas, biblioteca, guarda municipal e indústria. Esses foram os que os estudantes consideraram de mais importância para o bairro. Então ficou combinado com os alunos que o eixo horizontal ficaria para as opções escolhidas. Quando a Keli começou a colar as opções, o aluno Moacir pensou que o gráfico seria um mapa e perguntou em voz alta: “Professora, esses negócios vai ser tudo na mesma rua?” Então, cada aluno ganhou um papel em forma de retângulo, e teriam que colar em cima da opção que preferiam para o bairro. Os estagiários auxiliaram os alunos na colagem e na organização da atividade, que por sinal criou muita discussão entre os alunos. Esse aspecto de discutir os problemas do bairro, avalio como bom durante a aula de Matemática, pois mostra que estamos além das fórmulas e operações algébricas. Depois de todos os alunos terem votado, ficou assim: Escola : 5 votos Atendimento médico 24 horas: 4 votos Comércio: 2 votos Creche : 2 votos Guarda municipal : 1 voto Depois colocamos o gráfico no pátio do colégio para que os outros alunos pudessem ver o trabalho da turma da 7ª EJA. Na aula de hoje aprendi algo super interessante: quanto mais o docente traz exemplos da vida cotidiana dos alunos, mais fica o aprendizado e parece que a sala de aula muda de clima, de monotonia para descontração e discussão. No momento em que vi os alunos discutindo o que seria melhor para bairro, comparando os votos, falando dos números dos gráficos depois entendendo o que seria a média, fiquei animado.

Trecho de diário de campo,04/04/2007.

Ilustro a descrição de Gilberto com a foto do gráfico exposto no pátio da escola,

em um mural utilizado para avisos, informativos e exposição de trabalhos dos alunos.

Infelizmente a produção e a exposição de trabalhos de alunos do período noturno da

escola não são muito freqüentes. A sugestão da exposição foi minha, mas

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imediatamente acatada pelos alunos, com um sentimento de valorização do trabalho

realizado e dos autores:

Nesse mesmo encontro também foram trabalhados alguns aspectos históricos da

Estatística, através de uma história em quadrinhos intitulada “As origens da Estatística”,

de Costa (1992, p. 3-6), incluída no Apêndice G, que busca, de maneira simples e

sintética, situar a Estatística ao longo do tempo, relacionar a palavra “Estatística” com

suas origens e mostrar algumas situações onde se poderia utilizar a palavra e, como o

próprio Costa (1992, prefácio) diz, “embora a Estatística seja a mesma, os recursos

para apresentá-la são diferentes”. A proposta foi aceita pelos alunos, que se mostraram

curiosos e envolvidos com os “quadrinhos”.

Uma outra forma de trazer alguns conteúdos estatísticos para a turma, em nosso

encontro subseqüente, foi o trabalho com os dados levantados através do formulário de

identificação já citado (Apêndice A). Escolhi para isso os dados sobre os alunos que

haviam parado de estudar e seus motivos (item 7 do formulário), pois julguei que

apresentavam características boas, como, por exemplo, reduzido número de itens a ser

representado nas colunas. Os dados foram tabulados por mim, apresentados na forma

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de tabelas aos alunos e, em seguida, foram construídos gráficos de colunas e setores.

Foi utilizada a dinâmica de construir o gráfico na lousa, explicando parte por parte, para

que os alunos pudessem acompanhar, anotando o item assinalado por cada um, e

ficasse claro que os seus dados estavam representados ali; ou seja, eu estava

propondo um trabalho com dados vinculados a uma situação próxima ao aluno,

conforme recomendam Lopes e Moura (2002). De acordo com Gal (2002), esse era o

momento do “conhecimento estatístico”, um dos elementos de conhecimento

necessários para a formação de pessoas estatisticamente letradas.

Um episódio que merece destaque, por mostrar reflexos da prática colaborativa

desenvolvida nas atividades em sala de aula, foi registrado no diário de campo de

Alexandre. Nessa perspectiva de colaboração, o estagiário tem voz e vez, como

destaca Fiorentini (2004): “há um forte desejo de compartilhar saberes e experiências”

e “não existe uma verdade ou orientação única para as atividades”; além disso, nota-se

o envolvimento e a sensibilidade de que a Estatística não é só a utilização de fórmulas

e a realização de cálculos:

Conhecendo mais sobre a Estatística e se conhecendo Por Alexandre Monteiro da Silva

No início da aula a professora Keli perguntou se alguém sabia o que era o gráfico de setores. O aluno Moacir disse que era o gráfico do queijo e a professora Keli disse que tal gráfico era popularmente referido como gráfico de pizzas. O aluno Moacir distribuiu para cada aluno da turma um círculo azul e um amarelo. A professora Keli apresentou a situação a ser representada em que, numa pesquisa feita na sala no total de 32 alunos, 5 alunos continuaram a estudar e 27 pararam de estudar. O objetivo era representar esta situação no gráfico de setores. De fato alguns alunos estavam apresentando dificuldades em representar esta situação de forma aproximada no gráfico de setores. Intuitivamente eles sabiam que no gráfico, a parte que se refere aos alunos que não pararam de estudar era de menor área do que a parte que se refere aos alunos que pararam de estudar, mas eles não estavam sabendo precisar se era um quarto, menos que um quarto... Eu sugeri para a professora Keli um modo de fazer uma conta simplificada que forneceria um modo bastante razoável de representar no gráfico. No fundo, o que eu sugeri foi aproximar o número de 32 alunos para 30 e 27 para 25. Então a parte que diz respeito aos alunos que não pararam de estudar ficou aproximadamente dada por:

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5 = 1 30 6

Figura 1. E este modo de estimar esta quantidade certamente facilitaria a representação da situação por parte dos alunos. Bastava dividir o círculo em seis partes iguais e representar um pedaço como os alunos que continuaram a estudar e os outros cinco como os alunos que pararam de estudar. A Figura 1 ilustra esta situação. A professora Keli pediu que eu explicasse isso aos alunos. Percebi que isso facilitou realmente para eles.

Trecho de diário de campo, 11/04/2007)

A contribuição de Alexandre foi importante, pois relacionou a apresentação usual

de frações nos livros didáticos com o gráfico de setores que desejávamos construir:

para mostrar a situação, exponho a produção da aluna Rosana (Figura 7):

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Figura 7 – Produção da aluna Rosana

Para o planejamento de nosso próximo encontro, tomei como base a

necessidade de mais conteúdo estatístico, como a exploração de tipos de gráficos. Isso

foi realizado através de uma pequena apostila, montada a partir de livros didáticos do

Ensino Fundamental, que mostrou exemplos de gráficos: de colunas, barras,

segmentos, segmentos duplos, setores e pictogramas (Apêndice H). Também pudemos

explorar um pouco o histograma, de forma intuitiva — apenas suas idéias, sem o uso de

fórmulas ou termos estatísticos (Apêndice I).

Trabalhando com dados quantitativos, presentes no formulário de identificação,

como idade, número de filhos e tempo sem estudar, nesse mesmo encontro foram

Transcrição: Conhecendo mais sobre a Estatística e se conhecendo Você parou de estudar? Essa foi a pergunta feita à 32 alunos de 7.ª EJA Veja os resultados encontrados: 5 alunos responderam que não haviam parado de estudar. 27 alunos responderam que haviam parado de estudar (amarelo) Pararam de estudar (27) (azul) Não pararam de estudar (5)

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apresentadas as medidas de tendência central, média, moda e mediana, explorando os

dados da própria classe.

Acredito que com isso estava contribuindo para a produção inicial de

conhecimentos em Estatística na perspectiva de Lopes (2004), já abordada quando

tratei dos “Desafios educacionais”, da necessidade de trabalhar com “dados genuínos”

e da “análise de dados de sua realidade”, saindo do ensino tradicional. Munidos de

idéias básicas do conhecimento estatístico, que foi retomado em outras fases do

trabalho, é que pudemos dar continuidade aos trabalhos do projeto e avançar no

protagonismo dos alunos.

5.11 - As escolhas dos alunos

Hora da escolha do tema central do nosso projeto! (Diário da pesquisadora, 18/04/2007)

Para esse encontro, construí o Quadro 5, baseado em Biajone (2006, p. 76), por

explicitar de maneira clara e didática as fases de um projeto e por estar em sintonia

com o trabalho que iríamos desenvolver. Considero esse momento do projeto

importante, pois, além de me orientar, queria que os alunos vivenciassem todas as

fases, conscientes delas e compromissados com seu desenvolvimento.

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Quadro 5 – Fases de um projeto Fases de um projeto Fases do projeto estatístico 1) Definição do tema 1) Definição do tema do projeto

2) Definição de um enfoque do tema a ser investigado por cada um dos grupos

2) Planejamento das ações 3) Aprofundamento de informações sobre cada um dos enfoques do tema 4) Elaboração de questões a partir desses enfoques para a construção de um questionário 5) Definição das amostras (dependendo do tema). 6) Revisão dos questionários

3) Realização das ações 7) Entrega e coleta questionários 8) Tabulação dos dados obtidos para cada enfoque do tema

4) Elaboração das análises e das conclusões

9) Análise dos dados obtidos para cada enfoque do tema 10) Interpretação dos dados obtidos para cada enfoque do tema

5) Divulgação e comunicação dos resultados

11) Divulgação e comunicação oral e por escrito dos resultados dos enfoques do tema

Inicialmente foram estabelecidas com o grupo algumas normas ou o novo

contrato didático: de acordo com Silva, Moreira e Grando (1996, p. 10), o contrato

didático trata da “tríplice relação professor/aluno/saber”. Segundo os mesmos autores,

ainda que implicitamente, o contrato didático aponta as expectativas que são previstas

para cada participante. Garfield (1993, p.4), quando discute “aprendizagem

cooperativa”, menciona a importância de “que se estabeleçam algumas regras para os

estudantes”. Nosso contrato era:

• Os grupos de trabalho, a partir de então, deveriam ser fixos (até o final do

projeto).

• As escolhas para a formação dos grupos seriam livres.

• A professora e os estagiários auxiliariam os grupos nas atividades.

• Cada elemento do grupo se responsabilizaria pelo registro da memória de

cada encontro relativo ao projeto, e todos poderiam e/ou deveriam

colaborar.

• A professora traria os formulários para os registros das memórias.

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• A memória deveria ser adicionada ao portfólio do aluno responsável pela

sua redação naquele encontro.

• A professora acompanharia os registros através dos portfólios dos alunos.

Posteriormente, analisando nosso contrato didático no desenvolvimento das

atividades, constatei que os grupos de trabalho funcionaram bem: embora tenha havido

desistência de alguns alunos, o grupo foi mantido e sustentado pelos integrantes que

restaram. O clima sempre foi o de cooperação, no sentido mencionado por Garfield

(1993): alunos trabalhando juntos, com um objetivo comum, compromissados e

envolvidos com a realização do trabalho.

Sempre que possível, transcreverei também os registros dos alunos, que chamo

de “memória” acerca da atividade realizada, pois há registros muito interessantes.

Transcrevo, da filmagem, trechos da nossa conversa, após o contrato didático,

quando estávamos, pesquisadora e estagiários, iniciando o projeto “Construindo

Estatística”:

Preparei então, com papel kraft, a base para um cartaz e, enquanto fui

mencionando as fases que aparecem numeradas no quadro 5, fui montando o cartaz no

mural, colocando as frases que já estavam impressas em tiras de papel sulfite,

informando cada fase. Usava os termos científicos no cartaz e a linguagem oral, menos

formal, para fornecer pistas, indicar caminhos, desafiar. Novamente me apropriei das

idéias de Terzi (2005, p. 115), adaptando-a: é a “fala 1” (conhecimento dos alunos),

sendo (re)significada através da “escrita 1” (termos científicos do cartaz), que gera a

“fala 2”, (re)significando a “escrita 1” e gerando uma “escrita 2” nos registros dos

alunos. Isso aparece com muita freqüência em todo o episódio. Podemos aproximar o

modelo de Terzi (2005) da zona de desenvolvimento proximal proposta por Vygotsky

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(1984) para nos auxiliar na compreensão da interação ocorrida neste encontro. Zona de

desenvolvimento proximal, segundo o próprio psicólogo russo:

[...] é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes (VYGOTSKY, 1984, p.97).

Segundo Carvalho (1995), quase sempre é o professor da EJA que faz o papel

do “adulto”. Então sua atuação se torna fundamental, pois cabe a ele auxiliar o aluno a

tornar-se capaz de realizar tarefas que inicialmente não consegue fazer sozinho. E este

auxílio torna-se um processo, talvez incluindo colegas que se apropriam mais

rapidamente dos conhecimentos escolares como “companheiros mais capazes”.

Seguem agora trechos retirados da transcrição de filmagem do encontro:

Keli: Nós estamos fazendo um projeto de Estatística, não estamos? Alunos: Estamos! Keli: E vocês sabem quais são as fases de um projeto? Por que agora nós vamos realizar um projeto.

Durante essa fala iniciei nosso cartaz, colando a frase:

Fases de um projeto34

Silvana: Tem que ter COMEÇO, MEIO e FIM ((fala 1)). Keli: Tem que ter começo, meio e fim. Para isso, olha, Silvana, eu vou passar aqui quais são as fases de um projeto, por onde é que a gente começa. Qual vai ser o começo... Silvana: E agora? Keli: Eu é que pergunto? Por onde a gente começa? ... Keli: Como é que eu vou saber que projeto eu vou fazer? Silvana: Pensa! O que você precisa!

34 A partir deste momento, durante a transcrição do encontro, utilizarei quadros para mostrar as frases impressas que eu estava apresentando aos alunos e colando no mural, seguidas de nossas conversas sobre este.

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Mesmo sem ter conhecimento de todo o projeto, Silvana reforça, com a

afirmação “O que você precisa!”, a necessidade de falar do que se precisa, ou seja, da

necessidade da turma.

1) Definição do tema

Silvana: “Definição do tema” ((lendo o que coloquei no mural – escrita 1)). Keli: Definição do tema. Então se eu quero fazer um projeto, eu defini o tema do meu projeto que é “Construindo Estatística”, mas hoje nós vamos definir um outro tema do nosso projeto... ( ) ... Como? Silvana: Cada um vai se centrar em um tema? ((fala 2)) Keli: Não... Mais ou menos. Vamos esclarecer isso depois! ... ( ) ... Keli: Depois que eu sei qual vai ser o tema...

2) Planejamento das ações

Silvana: “Planejamento das ações” ((novamente lendo o mural)) Keli: Planejamento das ações. Eu tenho que planejar, assim como eu planejei, eu trouxe a folha, eu trouxe os papéis impressos, a gente combinou, eu trouxe a câmera. Então houve um planejamento. Não é assim: Eu chego aqui e pergunto: o que é que a gente vai fazer hoje?? Tem um planejamento! Depois que eu planejei, o que eu faço? Silvana: Aí, professora, você vai ter que começar a fazer, não tem jeito.

Dessa vez, a aluna já conseguiu antecipar qual seria nossa próxima atividade,

mostrando sua sintonia com o que estava ocorrendo naquele momento:

Keli: Exatamente. Depois que eu escolhi o tema, planejei, eu tenho que fazer o que eu planejei. Eu tenho que... realizar as... ações. Eu planejo e depois ponho em prática... ( ) ... Quase! Antes de mostrar o resultado, o Moacir falou: depois você mostra! Eu vou mostrar realmente as conclusões, ao que nós chegamos. Mas nessa: mostrar os resultados: “DIVULGAÇÃO E COMUNICAÇÃO DOS RESULTADOS” seria no final, a última coisa.

3) Realização das ações

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Neste momento aproveitei a afirmação do aluno Moacir, que diz “depois você

mostra” e antecipei a colocação da última fase do projeto, mas deixando uma lacuna a

ser preenchida, passando da frase n.º 3 para a frase n.º 5:

5) Divulgação e comunicação dos resultados

Nossa conversa seguiu e continuei provocando os alunos, a fim de que

aceitassem e compreendessem as fases do projeto:

Keli: O que vem antes da conclusão? Silvana: Revisão. Keli: O que seria essa revisão, Silvana? Silvana: Fazer uma análise de tudo, professora, analisar. Keli: Exatamente! Analisar, ver o que suas ações trouxeram. Alexia: É uma análise, mas ao mesmo tempo uma arrumação. Keli: Isso mesmo: arrumar tudo isso que vocês fizeram.

Coloquei, então, a frase que havia ficado faltando:

4) Elaboração das análises e conclusões

Com o preenchimento da coluna da esquerda do quadro, comecei as discussões

sobre a coluna da direita, falando do projeto estatístico. Notadamente, Silvana

continuava centralizando as discussões com sua participação; os outros alunos, embora

acompanhassem atentamente e estivessem anotando tudo, muitas vezes acabavam

não se manifestando, ou manifestando-se apenas quando Silvana lhes dava espaço.

Talvez essa seja uma das limitações do que se conhece como aula dialogada, em que

o professor expõe o conteúdo com a participação dos alunos:

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Fases do projeto estatístico

Keli: O nosso projeto... aí eu já começo a direcionar: O nosso projeto é um projeto estatístico. Um projeto que vai envolver a Estatística. Então eu não vou fazer um projeto é... eu posso fazer um projeto voltado para a saúde, mas tem que envolver... Silvana: Estatística! Keli: A Estatística, eu vou precisar usar, o nosso projeto tem esse foco maior. Então, o que a gente vai fazer primeiro? Silvana: Pesquisar! Keli: Antes de pesquisar, como eu vou saber sobre o que eu vou pesquisar? Silvana: Não sabe não, professora! Keli: Primeiro, do mesmo jeito, eu vou ter que... Silvana: Definir um tema! Keli: Definir o tema do projeto.

Coloquei, então, a frase abaixo, contente com a sintonia de alguns alunos:

1) Definição do tema do projeto

Keli: Só que, além de um tema para a nossa classe, nós vamos trabalhar em grupo, não vamos? Keli: Vamos ter que definir um tema geral para a classe e depois cada grupo vai definir um enfoque do tema a ser investigado por cada um dos grupos. O que será isso?

2) Definição de um enfoque do tema a ser investigado por cada um dos alunos

Neste momento, chamei a atenção para a dificuldade dos alunos de

compreender o termo “enfoque”:

Alexia: O quê? Keli: “Definição de um enfoque do tema a ser investigado por cada um dos grupos”. Aluno: Que é isso? Silvana: Alguma coisa que a gente tem que discutir. Keli: O que é enfoque? Quem pode me dizer o que é enfoque? Alexia: É sobre o tema, uma parte do tema, né? Keli: Exatamente! Então vamos fazer de conta que eu escolhi um tema aqui. Desse tema eu posso puxar várias coisas que eu quero falar sobre ele. Se eu quero falar sobre saúde, eu posso falar sobre limpeza, sobre doenças, sobre o posto de saúde, posso falar sobre os remédios, então eu tenho um tema e cada grupo vai escolher um “raminho” desse tema... Alguma coisa desse tema maior que a classe vai escolher. Depois, será que a gente tem que estudar sobre o tema que a gente escolheu?

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Alunos: Sim! Alexia e Silvana: Com certeza.

3) Aprofundamento de informações sobre cada um dos enfoques do tema

Keli: A Silvana falou: pesquisar, só que a gente só vai poder pesquisar depois que a gente decidir o tema que cada grupo decidiu que quer pesquisar... então a gente vai aprofundar essas informações sobre os enfoques de cada grupo. Por que senão... eu consigo falar sobre alguma coisa que eu não sei? Alunos: Não. Keli: E eu também não sei tudo! Não é porque eu sou professora que eu também sei tudo. Silvana: Por isso que você continua estudando, né, professora? Keli: Claro!

Com minhas afirmações seguintes, já encaminhei a próxima fase, colocando-a,

enquanto falava:

4) Elaboração de questões a partir destes enfoques para a construção de um questionário

Keli: E a pesquisa estatística, ela sempre envolve questionários, perguntas que eu vou levar a campo. Depois que eu já me informei sobre o tema, eu vou elaborar questões para construção de um questionário. Então, eu escolhi o tema da classe, cada grupo escolheu seu, a sua ramificação do tema, estudou e daí vai elaborar questões, vai fazer o questionário... Silvana: Depois de perguntar? ((risos)) Keli: E depois vai perguntar. Mas... Silvana: A gente pode perguntar para você! Keli: E aí será que pode perguntar só para mim? Silvana: Ai, professora, você é a mais inteligente da classe... ou então pergunta para os meninos ali. Keli: Sabe o que eu vou fazer, Silvana? “Definição das amostras”. O que será isso?... Definição das amostras...

5) Definição das amostras

Esse era um termo desconhecido dos alunos, “amostras”, mas, além disso,

aparece a “idéia que se tem da escola”, ou seja, quando não se sabe, “pergunta para a

professora” (fala da Silvana). Mesmo sem conhecer alguns termos, continuamos

partindo do conhecimento dos alunos (fala 1):

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Keli: Nesse momento eu vou... nós vamos discutir para quem é que a gente vai levar esse questionário. Eu vou levar para o bairro inteiro? Meu enfoque vai falar só das crianças? Meu enfoque vai falar só das mulheres? Para quem é que eu vou perguntar? Eu vou perguntar na escola? Eu vou perguntar para os idosos? Eu vou perguntar para as gestantes? Então eu vou definir as minhas amostras. Cada um, de repente, tem um enfoque... se eu quero falar sobre... vacinação infantil, por exemplo, para quem que eu tenho que perguntar? Alexia: Posto de saúde. Para a gente, para as mães.

6) Revisão dos questionários

Keli: Vamos revisar esses questionários...( )... o que será que é essa revisão dos questionários? Aluna: Revisar as perguntas, ver se as perguntas servem para... Keli: Quem pode ajudar a gente nessa hora? ...( )... Keli: A gente pode pedir ajuda até da professora de português para nos ajudar, no vocabulário, podemos testar esse questionário...

7) Entrega e coleta dos questionários

Keli: Depois de todo esse planejamento... nós estamos... olhe lá, Suelem, nós estamos aqui na parte do planejamento ((informando à aluna que havia chegado mais tarde para a aula)). Na hora de realizar as ações, a gente vai entregar os questionários e recolher, para quem eu decidir que vai fazer parte da minha pesquisa. Então isso também para vocês. Então entreguei e recolhi...

Neste momento veio uma importante afirmação, mostrando o protagonismo e o

envolvimento dos alunos, percebidos pela palavra “nós”:

Silvana: E nós vai analisar...

8) Tabulação dos dados obtidos para cada enfoque do tema

Para lidar com termos desconhecidos, próprios da Estatística, uma das alunas

valeu-se possivelmente de uma associação:

Keli: Antes de analisar, eu vou tabular, que será que quer dizer essa palavra? Alexia: Tabuação? Keli: Tabulação. Alexia: Tabulação? São tabelas, não é?

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Keli: Vou fazer as tabelas, vou organizar, nessa parte não seria análise, por que eu estou separando. Por exemplo, esse votou A, esse votou B, esse votou C, esse votou D. Não estou analisando, eu só estou separando os dados, para depois que eu separar, e contar, aí, sim, eu vou analisar os dados. Mas aí eu vou estar no item 4. Alexia: Está bom já, né, dona... Keli: Não tem bastante coisa para a gente fazer. Silvana: Para fazer uma pesquisa, um projeto, tem que ter tudo isso? Keli: Tudo isso! Silvana: Mas ter começo, meio e fim, já ta bom! Keli: Só que o começo, meio e fim, ... tem que ter tudo isso! ... Keli: Silvana, se eu só falasse para você, projeto tem que ter e colocasse ali: COMEÇO, MEIO E FIM, você ia ficar perdida. O que você tem que fazer no começo? O que você tem que fazer no meio? Silvana: E o que eu faço no fim? Keli: Calma, você vai analisar os dados, depois vai interpretar esses dados e por último, para terminar, vem o que a gente já antecipou: o item cinco, que é divulgar o que a gente... as conclusões que a gente chegou.

Enquanto fazia essas considerações, acrescentei os próximos itens:

9) Análise dos dados obtidos para cada enfoque do tema 10) Interpretação dos dados obtidos para cada enfoque do tema

Keli: “Divulgação e comunicação oral e escrita dos resultados dos enfoques do tema”.

Com essa minha fala, coloquei a nossa última fase:

11) Divulgação e comunicação oral e por escrito dos resultados dos enfoques do tema

Silvana: Cá entre nós, a gente vai ter que falar aí na frente para todo mundo ver nóis? Passo vir de saco na cabeça para ninguém me ver?... Ver meu rosto? Keli: Pode. Silvana: Então, tá beleza. Keli: Então a pesquisa vai envolver tudo isso que eu estou antecipando. É uma coisa fácil? Alunos: Não.

Como as conversas se encaminharam nesse sentido, reforcei o papel dos alunos

e chamei-os a serem protagonistas em nosso projeto, ao mesmo tempo instigando-os a

fazerem parte do “mundo letrado”:

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Keli: Mas... Aí é que está o desafio: eu poderia trazer a minha pesquisa pronta, o Gilberto trazer a pesquisa pronta dele e pronto. Vocês iriam estar construindo? Alunos: Não! Keli: Realmente fazendo? Alunos: Não! Keli: Na teoria tem muitas coisas que são bonitas, parece dar tudo certo, mas a gente tem que fazer na prática. Conhecimento que a gente tem aqui, eu vou estar ajudando, eles vão estar ajudando ((estagiários)), tem que ir lá na prática, certo? Alunos: Certo! Keli: E eu quero que vocês sejam realmente protagonistas. O que quer dizer isso? ... interferências... Keli: O principal do projeto. O projeto depende de vocês. Você é o principal, ela é a principal... vocês são os principais... por que senão, não sai projeto. Senão eu trago o meu pronto e dou uma cópia para cada um – Boa noite – Tchau! Adiantou alguma coisa? ... ( )... Keli: Então nesse momento agora, vocês tentem pensar num tema geral para a classe. Cada grupo vai tentar pensar num tema geral e eu vou dar um tempinho e depois a gente vai falar para todo mundo esse tema e vamos discutir até que a gente resolva e chegue num tema final para a classe toda, certo?

Nesse momento a aluna Silvana, que esteve muito participativa durante todo

nosso encontro, numa mistura de agitação, dúvida, alegria, tristeza, foi se colocando e

trouxe um fato que pode ter direcionado todo o projeto a partir de então:

Silvana: ...Tem um monte de problema que eu não tenho resposta e ninguém me fala... Keli: E você está grávida? Silvana: Descobri ontem! Alunos: óóóóóóó´... Silvana: Está vendo... ( )... Keli: Já temos um tema que a gente... tente discutir aí no seu grupo, o que a gente pode pensar sobre isso... Vamos lá? Cada grupo agora trabalhando?

Confesso que fiquei atônita com a notícia. Foi aí que compreendi sua

necessidade de centralizar todas as atenções durante a atividade. Os estagiários me

contaram depois que, observando os alunos, Alexandre através das lentes do

equipamento e Gilberto do fundo da sala, perceberam que não houve impacto com a

notícia, talvez por que isso já fosse algo “rotineiro para eles”, muitas já viveram a

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mesma situação. Terminei de guardar a cola e as canetas que utilizei na confecção do

cartaz e fui cumprimentá-la e tranqüilizá-la um pouco, ou tranqüilizar-me.

Provavelmente, eu não imaginaria um projeto com tema GRAVIDEZ para meus

alunos, devido à estranheza minha com o assunto. Concordo com Lopes (2003, p. 26),

quando menciona que “um projeto pode emergir da definição de um conceito, de um

problema mais geral ou particular, de uma temática ou de um conjunto de questões

inter-relacionadas” (grifo meu).

5.12 - Gravidez

“Professora, eu voto na GRAVIDEZ.” Alexia

Depois da apresentação das fases do projeto, no mesmo encontro, seguiu-se um

debate entre os integrantes do grupo, momento em que nós, pesquisadora e

estagiários, observamos, ouvimos, questionamos e demos assistência aos grupos,

quando necessário. À semelhança do que destaca Garfield (1993, p. 6), foi um

momento de “observar os alunos esforçarem-se para resolver os problemas por si

mesmos”. E também visualizamos o que Ponte, Brocardo e Oliveira (2003, p. 102)

dizem sobre as investigações estatísticas, quando mencionam a discussão como

“necessidade de defender as suas idéias e de confrontá-las com as dos outros”, e

afirmam que isso contribui para “o desenvolvimento das capacidades de crítica e

reflexão” (ibidem). Depois disso, foi feita uma plenária, que filmamos, de cujas falas

transcrevo trechos.

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O grupo da “nossa grávida” quis falar sobre GRAVIDEZ; ele foi formado por

Silvana, Rosiane, Vitória e Elisa, que assumiu a função de oradora, porta voz do grupo.

Uma aluna de outro grupo participou também da discussão, dando apoio à escolha do

tema:

Elisa: Nosso grupo resolveu falar, né, porque nossa amiga aqui que está grávida, descobriu ontem, e a gente queria falar sobre aaaaaaaaa GRAVIDEZ. Que lógico, que todo mundo conhece, menina nova, que não planejaram a gravidez, que tem pessoas assim, mais velhas ou mais novas também que planejaram a gravidez. Então nosso grupo queria falar sobre a GRAVIDEZ. Leidiane: EU CONCORDO! Elisa: Eu acho que é bom, professora, porque na verdade tem bastante meninas novas, que não tiveram filhos, e também seria bom estar explicando como evitar, porque tem mães que não conversam com as filhas, igual, minha mãe não conversou comigo sobre preservativo, então..., não por isso eu culpo ela porque eu fiquei grávida. Silvana: Aliás, elas não gostam que a gente ande com preservativo, ela acha isso coisa do homem. Keli: Por enquanto vamos nos ater ao tema e depois a gente vai estudar, olhe, aprofundamento das informações, vamos discutir e entrar... Keli: Então vocês acham que é um bom tema? Leidiane: Eu acho! Keli: Também pensaram nesse... ( )... GRAVIDEZ. Quem mais? Temos dois grupos querendo falar disso. Quem gostaria de vir falar?

O grupo das “meninas” Luana, Leidiane e Edite decidiu-se logo: GRAVIDEZ NA

ADOLESCÊNCIA e acabou contentando-se com as pequenas intervenções de Leidiane

durante as afirmações de Elisa, transcritas anteriormente.

O grupo formado pelas alunas Cristina, Ângela e Alexia mencionou a

preocupação que tinham no bairro com os maus tratos com as crianças da vizinhança;

ajudei um pouco a direcionar o pensamento delas para os CUIDADOS NA PRIMEIRA

INFÂNCIA.

Alexia: Bom, o nosso grupo ficou decidido que nós iremos falar sobre, a respeito da PRIMEIRA INFÂNCIA, a infância que foi roubada, né, as crianças que sofrem abuso sexual dentro das suas próprias casas, né, e que ficam isoladas, né, crianças também que sofrem cárcere privado, né, muitas vezes nós acompanhamos em... jornal, em revista e também falar sobre a infância da

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criança também, sobre o abandono, o que foi decido, né, sobre a desnutrição e tal nós vamos falar sobre isso. Keli: Uma pergunta para o grupo de vocês: Você acha que o problema da gravidez não planejada pode acarretar esses problemas que vocês estão falando? Alexia: Também. Keli: Cárcere, maus tratos. Alexia: Também. Cristina: Depressão pós-parto. Keli: Depressão, tudo isso. Alexia: hã, hã.

O grupo de Marilena, Jorge, Carlos e Suelem quis falar sobre a ÁGUA,

justificando ser esse um problema do planeta Terra e do bairro:

Marilena: O nosso grupo... pusemos o tema a ÁGUA..., porque o planeta pede socorro, é uma coisa que está aparecendo bastante na TV. Silvana: É verdade! Marilena: Falar sobre a água e até mesmo para a gente fazer a pesquisa pelo bairro porque o que mais se vê pela rua diz respeito à água. A água empoçada que dá dengue, a água que... Jorge: ...( ) Marilena: ... eu acho que água é uma coisa boa por que vai entrar a taxa de Matemática, quantos metros cúbicos gasta de água um apartamento. Interferência... ((Marilena faz a divisão dos gastos com água em seu prédio)). Aluna: Puxa saco não! ((referindo-se a Marilena querer levar a discussão para seus interesses pessoais)) Marilena: Então agora fica para vocês decidir. Por que pelo que eu entendi e pegando um pouquinho do que está ali ((aponta para o cartaz)), né, o nosso tema vai entrar tudo aquilo ((indicando as fases do projeto)).

Acompanhando o grupo de Moacir e Ronaldo, pude perceber que eles tiveram

dificuldade em expressar suas idéias, pensando em algo como globalização,

aquecimento global... Acabaram por mudar de tema, percebendo que o escolhido não

havia ficado muito bom; escolheram, então, VIOLÊNCIA, apresentado pelo porta-voz do

grupo, Moacir:

Keli: Então vamos ouvir o Moacir. A hora é agora, Moacir. Keli: Qual a sua idéia, antes de escrever, qual a sua idéia? Moacir: Ta pensando ainda, dona. Keli: Falar sobre a...?? Moacir: VIOLÊNCIA. Keli: Violência no bairro? Moacir: Tudo, tudo, dona.

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Keli: A gente pode falar de tudo, mas dá para falar do bairro? ...( )... Moacir: Mas eu não moro aqui.

Durante as conversas nos grupos, já havia percebido o encaminhamento para a

GRAVIDEZ, o que me agradou, pois era um tema polêmico, sem ser agressivo ou

comprometedor — como são, por exemplo, a violência ou o tráfico de drogas presente

no bairro — e tinha as características de um projeto: aproveitar o momento da classe e

ter muito da realidade daquelas pessoas, já que a maioria era mãe e/ou tinha sido muito

cedo, em condições conflitantes, muitas vezes, que era ilustrado naquele momento

pela situação de Silvana. Estávamos dando “uma importância para a literacia estatística

que transcende as questões escolares, assumindo suas dimensões sociais e políticas.”

(LOPES, 2004, p.195).

O debate continuou, algumas pessoas apresentaram seus argumentos a favor da

gravidez, embora Marilena, sem falar pelo grupo, estivesse firme no propósito de

abordar o tema “Água”!

Keli: A decisão é de vocês. Alexia: Trabalho sobre a ÁGUA a gente fez. Marilena: Não, não é isso, aqui é outra coisa. Aqui é um grupo. Keli: E nós não vamos fazer um trabalho sobre a ÁGUA. Uma pesquisa de livro só. Nós vamos pesquisar também, mas a nossa vai ser mais uma pesquisa estatística, voltada a perguntar ao povo, para o povo. Marilena: Ela ali. Quanto ela gasta de água. Ela grávida agora quanto mais ela ia gastar. Silvana: Vixxxe! Marilena: É estatística, entendeu?

Alexia, que defendia a GRAVIDEZ, logo “chamou” uma votação:

Alexia: Professora, eu voto na GRAVIDEZ. Keli: Gravidez, um voto. Alexia: Ela ali, ela aqui, a gente aqui ((Referindo-se aos grupos que desejavam falar sobre o tema)).

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... Alexia: Quem vota GRAVIDEZ, levanta a mão! Keli: A Alexia propôs uma votação. ... ( )...

Keli: Então, Alexia, quantas pessoas estão pretendendo, junto com esse grupo, falar sobre GRAVIDEZ?

Keli: As três, mais três... 10 pessoas. Keli: Marilena, você gostaria de propor uma votação para a água? Marilena: Acho que sim. Keli: E aí? Quais são seus argumentos? Faça uma chamada que nem a Alexia

fez: “Quem vota pela GRAVIDEZ”? Foi o que ela fez, e aí? Marilena: Quem vota pela ÁGUA? Elisa: Eu também voto pela ÁGUA. Keli: É preciso se definir, se não todo mundo vai votar para tudo...

Keli: Os quatro... Moacir: Esse tema de GRAVIDEZ, nada a ver! Marilena: Aqui tem quatro, mais três. Keli: Olha só, nós temos mais pessoas querendo falar sobre GRAVIDEZ.

Embora o debate tenha se prolongado um pouco mais, com vários participantes

expondo suas opiniões, favoráveis e contrárias, terminamos a plenária com o tema

central escolhido: GRAVIDEZ.

Sobre isso, relataram os estagiários juntos:

Diário de campo Por Gilberto da Silva Liberato e Alexandre Monteiro da Silva

Achamos interessante como a professora conduziu a votação e não interferiu na escolha dos alunos. Ela desempenhou um papel de mediadora, envolvendo todos os alunos para a discussão e argumentando com eles, orientando as discussões. Percebemos que ela sempre faz isso, ela deixa os alunos definirem suas escolhas, afinal o projeto será desenvolvido pelos alunos. Então esse trabalho tem que ter a vontade e a cara deles! A aula foi filmada, os alunos não reagiram com um certo estranhamento à presença da câmera. Acho que eles já se familiarizaram, pois a mesma não interferiu em nada.

Trecho de diário de campo, 18/04/2007. Grifos meus.

Fiquei satisfeita, depois da escolha do tema, quando li as anotações dos

estagiários a respeito da maneira com que a aula foi conduzida, com as suas

percepções do desenvolvimento do projeto e das escolhas que estávamos fazendo, que

garantiriam o envolvimento dos alunos e o desenvolvimento do trabalho. Parece que

fomos ao encontro do que nos indica Lopes (2003, p. 26): “os projetos valorizam a

aquisição de conhecimento e promovem uma maior participação do aluno nesse

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processo, levando-os a perceber sua grande responsabilidade no processo de ensino e

aprendizagem”.

5.13 - Busca por material

“Como promover práticas de leitura sem que haja material de leitura?”

Diário da pesquisadora, maio de 2007, baseado nas idéias de Soares (2003a)

Definido o tema e consideradas as condições da comunidade quanto ao acesso

às publicações diversas, à internet, aos livros e à biblioteca, deparamo-nos com uma

questão importante: Como promover práticas de leitura sem que haja material de

leitura? Essa é “uma condição de letramento” considerada por Soares (2003a, p. 158).

Uma outra questão que surgiu foi meu conhecimento insuficiente sobre gravidez como

tema de projeto, embora, assim como Biajone (2006, p. 94), eu tivesse certeza de que

“tinha em mãos enormes possibilidades de desenvolver um projeto sobre aquele tema

com o auxílio da Estatística”.

Procurando sanar esses problemas, fui em busca de materiais que pudessem ser

levados à escola e servissem também para minha informação. Procurei na própria

Unicamp e em outros locais do distrito de Barão Geraldo. As visitas foram em geral

marcadas pela espera, mesmo com horário agendado, pois normalmente os

profissionais estavam em atendimento a pacientes, mas sempre me prontifiquei a

esperar.

Os locais procurados foram:

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• Cecom (Centro de Saúde da Comunidade): Fui atendida por uma enfermeira

que me forneceu alguns folhetos a respeito de aleitamento materno, direitos

das gestantes e de material utilizado em seu grupo de gestantes.

• Caism (Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher): Também fui atendida

por uma enfermeira, que possuía bastante material didático de uso do próprio

centro (cartazes, banners, material de acrílico e borracha), mas infelizmente

esse material não poderia ser disponibilizado para ser levado à escola. O que

puderam me fornecer foram alguns livretos a respeito de HIV e gravidez, pois

atendiam muitos desses casos.

• Cemicamp (Centro de Pesquisa e Controle de Doenças Materno-Infantis de

Campinas): Fui atendida por uma secretária que se prontificou a montar um

kit, que retirei no dia seguinte e fiquei satisfeita com o material fornecido:

camisinha masculina, camisinha feminina, DIU, “pílula”, injeção

anticoncepcional, pílula do dia seguinte, espermicida e material utilizado em

exames tipo Papanicolau.

• POSTO DE SAÚDE DE BARÃO GERALDO: Lá encontrei uma ex-aluna, que

relatou que havia material, mas que este tinha sido levado por uma

profissional para outro lugar. Passou-me o telefone de um órgão chamado

Amda.

• Amda (Ambulatório Municipal de Doenças Sexualmente Transmissíveis Aids):

Liguei para este órgão especializado na questão de HIV e por telefone uma

coordenadora me disse que se eu precisasse de um folheto apenas, ela

poderia me fornecer, mas, caso eu precisasse de uma quantidade maior,

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seria necessário um ofício. Devido a essa questão e à distância de Barão

Geraldo, optei por não ir até lá.

Visitei também vários sites sobre o assunto; relaciono a seguir aqueles nos quais

consegui material:

http://www.aborto.com.br/aborto_terapeutico/index.htm http://www.aborto.com.br/aborto_retido/index.htm http://www.aborto.com.br/aborto_espontaneo/index.htm http://www.aborto.com.br/aborto_clandestino/index.htm http://www.aborto.com.br/cancro_mama/index.htm http://gballone.sites.uol.com.br/infantil/adolesc3b.html http://mulher.terra.com.br/maesefilhos/interna/0,,OI384614-EI4103,00.html http://www.aborto.com.br/aids/index.htm http://www.abcdasaude.com.br/artigo.php?212 http://www.aids.gov.br/final/prevencao/pre_natal.htm http://www.soropositivo.org/dossie_mulher_e_AIDS/direitoreprotudivo.htm http://www.abcdasaude.com.br/artigo.php?260 http://www.portalbebe.com.br/parto1.htm http://www.unicef.org/brazil/aleitamento.htm.

Consultei também diversos outros sites, partindo de um site de busca, mas não

achei material apropriado às necessidades dos alunos, seja por serem cientificamente

muito aprofundados, seja por serem muito extensos. Naquele momento, minhas buscas

ainda eram amplas, procurando por gravidez e temas relacionados a ela que julguei

relevantes para que tivéssemos material de consulta em nosso próximo encontro e

pudéssemos trabalhar.

5.14 - Os enfoques do projeto

“No dia de hoje estamos dialogando com os grupos e a professora para a definição de um enfoque”.

Memória de Marilena

Comecei o encontro colocando num papel kraft a palavra GRAVIDEZ, assim:

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E fui anotando os enfoques, pois os alunos, nesse momento, não só sabiam o

que eram enfoques, pois havíamos discutido isso em um de nossos encontros, como

também começavam a dar indícios da apropriação do termo em seus registros, que

aparecerão na seqüência. Isso é mais um indício de letramento ou, como Soares

(2003b, p. 108) classifica, “práticas de letramento adquiridas”; ou seja, das práticas

ensinadas, aquelas de que “os alunos efetivamente se apropriam e levam consigo para

a vida fora da escola”.

Conforme os alunos iam falando, sempre partindo do tema gerador, que era

gravidez, montamos um esquema que deixou explícitas as relações. Além de

mencionar os enfoques e os temas, colocavam também suas dúvidas, contavam suas

histórias e suas experiências.

No final nosso esquema ficou assim:

Gravidez

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Figura 8 – Esquema dos enfoques relacionados ao tema gravidez

Eram seis grupos e levantamos 15 temas; assim, cada grupo pôde escolher e

manifestar o enfoque que havia escolhido. Foram eles:

Grupo 1 - Métodos anticoncepcionais Alexia Cristina Ângela

Grupo 2 - Gravidez na adolescência Vitória Elisa Meire

Grupo 3 - Tipos de parto Marilena Jorge Adilson Rosiane

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Grupo 4 - HIV e gravidez Edite Luana Leidiane

Grupo 5 - Infertilidade Rosana Janete Kely

Grupo 6 - Aborto Ronaldo Moacir Paulo Márcio

Com relação à produção escrita a respeito da atividade e dos acontecimentos

que os alunos estavam presenciando, trago a “memória” produzida por Marilena, que

descreve o encontro, registrando o esquema trabalhado no início do encontro, que é

cópia da Figura 8 posta na lousa.

E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”35 Projeto Construindo Estatística

MEMÓRIA DA REUNIÃO

GRUPO: n.º 6

Alunos presentes: Adilson Data: 02/05/2007 Jorge Marilena Rosiane Suelem

Em 02/05/2007, a professora Keli nos pediu para os alunos da 7.ª EJA, formar um grupo de no máximo 5 alunos. E que cada grupo escrevesse um questionário do projeto que estamos elaborando. No dia 18/04/ teve uma definição do tema do projeto que ficou o tema gravidez. No dia de hoje estamos dialogando com os grupos e a professora para a definição de um enfoque. Estes são alguns, vamos escolher um:

O grupo 6 que é o nosso escolhemos o enfoque que tipo de parto. O grupo 1 escolheu método anticoncepcional, o grupo 2 gravidez na adolescência, o grupo 3 infertilidade, o grupo 4 HIV, o grupo 5 aborto e o grupo 6, que é o nosso, já foi mencionado o enfoque.

Memória de Marilena, portfólio da aluna.

35 Os alunos recebiam uma folha impressa com os dados que aparecem em negrito.

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Marilena não se limitou a apresentar o desenvolvimento do projeto da professora:

com a expressão “estamos elaborando”, mostrou também o sentido do “nós” no projeto.

Ela se apropriou de termos próprios da pesquisa estatística que vinham sendo

utilizados nas aulas, como “definição do tema” e “definição dos enfoques”, caminhando

em direção do que coloca Lopes (2004):

[...] seu ensino [o de Estatística], porém, cada vez mais, vem requerendo propostas de atividades nas quais o estudante reconheça vários modelos de problemas, reproduza e elabore procedimentos, aproprie-se e utilize conceitos estatísticos (LOPES, 2004, p.194).

Acreditamos também que a produção escrita incentivada por nós tenha

contribuído bastante para a produção de conhecimento dos alunos, pois, conforme

afirmam Powell e Bairral (2006, p. 27), “a capacidade da escrita em colocar o educando

no centro da sua própria aprendizagem pode e deve tornar-se um elemento facilitador

importante na aprendizagem de tudo que envolva linguagem”.

Alguns temas escolhidos, como infertilidade e tipos de parto, não seriam os mais

indicados para serem estudados em uma pesquisa deste tipo, mas não intervim.

Percebi que havia motivos, por trás dessas escolhas, que iam além do que estava

explícito e passavam por histórias, por momentos de vida e pela realidade social e

econômica dos componentes do grupo.

O material levantado inicialmente nas buscas na internet e em locais de

atendimento à saúde não foi suficiente para nossas discussões iniciais, pois não

contemplava os grupos que haviam escolhido os tipos de parto e a infertilidade e

atendia apenas parcialmente o grupo que queria falar sobre gravidez e HIV.

Posteriormente, mesmo conseguindo material de consulta para todos os grupos,

ainda surgiam questões, principalmente sociais, que não dávamos conta de responder

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de forma fundamentada, como, por exemplo, o que poderia ser feito em relação à

gravidez, em caso de estupro. Percebemos, então, a necessidade de buscar ajuda de

outros profissionais e discutir as questões que inquietavam os alunos. Sobre isso,

Lopes (2003, p. 26) menciona tratar-se de “uma tentativa de uma organização da

informação, de centralizar-se em alguns temas contemplados a partir de múltiplos

ângulos e métodos” e afirma que essa estratégia de relacionar “os diferentes conteúdos

em torno de um problema” ajudaria os alunos na construção de seu próprio

conhecimento.

5.15 - Roda de conversa

“Foi um bom momento, os alunos expressavam suas dúvidas e narravam fatos acontecidos nas suas vidas.”

Gilberto

Nessa atividade tivemos a participação do professor de Ciências, responsável

pelas aulas de Ciências e Biologia da escola e da Assistente Social, funcionária do

Serviço Social do Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism/Unicamp),

além do apoio do professor coordenador da escola, dos estagiários que cuidaram do

equipamento de filmagem e de 16 alunos participantes do projeto, que se dispuseram a

estar conosco, não para uma palestra, mas para uma conversa, onde todos puderam

falar, contar de si, perguntar e esclarecer suas dúvidas. Por esse motivo, pedi aos

alunos que procurassem trazer anotadas suas dúvidas e aos outros participantes, que

não fizessem nenhuma explanação “teórica” inicial.

Tivemos momentos que inicialmente se assemelhavam a um questionário com

perguntas e respostas, como nos trechos transcritos da gravação em vídeo. Tais

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questões revelaram dúvidas, situações vivenciadas pelos alunos e pela minha

participação efetiva no projeto; identifiquei episódios diretamente relacionados com os

enfoques escolhidos:

Cristina: Eu gostaria de fazer uma pergunta para o Professor de Ciências. O que é uma gravidez não embrionária? Prof. de Ciências: Gravidez não embrionária? Onde você ouviu isso? Cristina: Eu tive! Prof. de Ciências: A gravidez tem que ser embrionária, a formação do embrião se dá pela união do óvulo com o espermatozóide. Que eu saiba a gravidez não embrionária seria a gravidez psicológica. Cristina: Então, eu fiquei grávida, tive todos os sintomas e fui ao médico. Aí, ele foi ver e cadê o bebê? Eu tinha um saquinho gestacional. Eu fiquei bem decepcionada, por que eu queria. Ele falou para eu ficar tranqüila que eu ia ter uma menstruação e que iria sair aquilo. Mas não foi isso que aconteceu. Eu tive uma hemorragia muito forte, tive que ir para o hospital, fazer curetagem... E depois de um ano é que engravidei. Prof. de Ciências: Uma gravidez psicológica, a mulher tem certeza que está grávida! Existem casos que ela tem todos os sintomas, cresce a barriga... ... Silvana: É normal a mulher ter tanta dor quando está grávida? Assistente Social: A questão fisiológica, eu não vou poder responder para você, mas pela vivência que eu tenho lá no hospital, o CAISM, que fez 20 anos em 2006, você fala da dor do parto? Silvana: Não a dor do dia-a-dia, dor todo o tempo. Assistente Social: No caso, quando ela está gestando? Silvana: Sim. Keli: A Silvana é gestante! Está de quantos meses, Silvana? Silvana: Fiz, ontem, dois meses. Assistente Social: A dor não é normal e a gente deve sempre procurar um médico. Fazer um acompanhamento sério, ou seja, o pré-natal; a dor do parto, sim, é normal...

Houve interação entre os próprios alunos, quando surgiam questões nos

diálogos, numa dinâmica de conversa, mesmo, e até aconselhando os colegas. Parece

que a assistente social, o professor de Ciências e o professor coordenador cederam

seu lugar de “parceiro mais experiente na cultura” para outro estudante (VYGOTSKY,

1984):

Rosana: É sua primeira gravidez ou você já teve algum problema anterior? Silvana: Já tive problemas, há três anos atrás quando fiquei grávida.

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Prof. de Ciências: E você perdeu? Silvana: Foi. Os médicos dizem que deu uma bolha do lado da bolsa e essa bolha estourou e estourou a bolsa, dizem eles. Prof. de Ciências: De quantos meses você estava? Silvana: Cinco meses. Professor Coordenador: Precisa se cuidar, menina! ... Elisa: Eu queria perguntar sobre a raqui ((tipo de anestesia)). É assim, depois que eu tive minha filha, eu quebrei minha dieta ( ) acabei caindo numa piscina e hoje eu tenho muita dor de cabeça, forte. E o pessoal diz que se eu tiver outro filho, e cuidando direitinho, acaba minha dor de cabeça! ... Marilena: Eu queria responder a pergunta dela ((Elisa)), que falaram para ela que a dor de cabeça dela só vai passar quando ela engravidar novamente. Não caia nessa, não!!! ((risos)) Marilena: Eu tive cinco filhos e fiz a laqueadura para ver se passava a dor de cabeça e eu estou com a dor de cabeça até hoje! ((o grupo de Marilena escolheu falar sobre tipos de parto)).

Algumas falas eram, na realidade, mais um depoimento de vida, uma

necessidade de compartilhar vivências com o grupo do que perguntas, como na

participação de Ângela:

Ângela: Quando eu fiquei grávida, eu já estava grávida de quatro meses e não sabia! Antes, eu não tinha sintomas nenhum, não tinha tontura, nada! E eu menstruei até o sexto mês. Quando eu descobri, eu já estava grávida de quatro meses! E também descobri que tinha de tudo: já era hipertensa, já estava com diabetes gestacional... E agora eles falam que eu não posso ter outro filho, não aconselham! Meu sonho seria ter outro filho! E é verdade o que o médico falou para mim, por que tenho dúvida, disse que se eu ficar grávida, vou ficar nove meses no hospital! ((o grupo de Ângela escolheu falar sobre métodos anticoncepcionais)).

Também tocamos em assuntos polêmicos, sobre os quais os alunos queriam

conversar e que nem sempre são postos em discussão:

Assistente Social: É comum a gente falar assim: “Sou contra o aborto” e fim de papo! Nós sabemos que tem situações de aborto no Brasil que é autorizado: em patologias incompatíveis com a vida e tem que pedir autorização judicial e às vezes é concedido, é uma polêmica, mas existe, a interrupção da gestação daqueles fetos anencéfalos. Prof. de Ciências: Vocês sabem o que é isso? Rosana: Nós tivemos um caso de uma menininha, recente! ...

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Assistente Social: A vítima de estupro, ela tem direito de interromper a gestação. Ela tem direito de solicitar ao hospital o aborto ou quando ela corre risco de vida. Então tem situações, no Brasil, onde ele pode ser realizado. ... Assistente Social: Nós temos dois tipos de protocolo, aquele do aborto imediato. Aquela situação da violência imediata, ela vai, é atendida, toma a pílula do dia seguinte que também é polêmica, e ela toma alguns medicamentos para conter as DSTs, doenças sexualmente transmissíveis. Há situações que a polícia leva o agressor lá para a gente também, então é possível fazer exames nele para ver se ele tem HIV e também outras doenças, mas isso é raro, normalmente só vai a vítima mesmo. Nesses casos, quanto mais rápido você faz atendimento médico, mais rápido você vai evitar uma doença. A vitima é acompanhada durante seis meses pelo nosso ambulatório para evitar que ela pegue uma doença ou fique grávida. E tem também o atendimento a violência, tardio, onde ela fica guardando, ela não conta para ninguém e de repente ela se vê grávida. Ela tem o direito de fazer o boletim de ocorrência tardiamente, no Caism nós só fazemos o aborto até 12 semanas. Depois disso, dependendo do caso, até 20 semanas, discutimos com toda a equipe, envolvemos mais pessoas na discussão. Essa é uma situação em que a família fica muito sensibilizada e então você coloca a questão, ela tem que criar um filho, fruto de um estupro e quando ela olhar para aquele bebê ela vai lembrar da violência... Quando eu iniciei no Caism, nós tínhamos mais interrupções da gravidez, hoje já não, temos mais recursos para se evitar a gravidez, como a pílula do dia seguinte. Agora o aborto provocado é crime! Mas no hospital nós falamos que não estamos lá para julgar ninguém, estamos lá para fazer o atendimento médico!

Outro momento interessante foi a participação de Jorge, com um depoimento muito

consciente, trazendo questões familiares pessoais:

Jorge: Eu ia comentar assim, por que essas pílulas que as mulheres tomam, não fazem bem para todas, e para a minha esposa não fazia bem. Então eu tinha duas soluções, ou enchia a casa de filhos ou fazia a vasectomia. E eu disse, faço vasectomia! E aí fiz! Prof. de Ciências: Você fez, Jorge? E é rapidinha! Jorge: Três minutos! Não senti nada até hoje!

Esse momento de conversa, embora os temas abordados não fossem da

Matemática nem da Estatística, foi formativo para todos e ajudou muito na continuação

do projeto. Novamente mencionamos o trabalho interdisciplinar, rompendo com o

ensino fragmentado; a Matemática e a Estatística recorrendo e servindo a outras

disciplinas e, ainda, expandindo-se para além das próprias disciplinas — para a vida.

Isso também é destacado por Ponte, Brocardo e Oliveira (2003, p. 102), quando

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mencionam as investigações estatísticas como “campo privilegiado para promover a

interdisciplinaridade”.

5.16 - Produção do questionário

“Assumimos o compromisso de manter o sigilo e a ética cabíveis em pesquisas dessa natureza”

Alunos da 7.ª EJA

Com o material impresso fornecido por órgãos públicos já citados e artigos

diversos encontrados na internet, quisemos também orientar os alunos na elaboração

dos questionários, já prevista como uma de nossas fases: elaboração de questões a

partir destes enfoques para a construção de um questionário. Para isso, levei um trecho

de Fiorentini e Lorenzato (2006), apresentado no Quadro 6, que considerei acessível ao

grupo, embora lançar mão de textos acadêmicos não seja uma prática comum na

Escola Básica. Mais uma vez acreditei nas possibilidades de inserção nas atividades

letradas daqueles alunos (SOARES, 2003b).

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Quadro 6 – Explorando alguns instrumentos de coleta de informações

4- EXPLORANDO ALGUNS INSTRUMENTOS DE COLETA DE INFORMAÇÕES 4.1 Questionários O questionário é um dos instrumentos mais tradicionais de coleta de informações e consiste numa série de perguntas que podem ser:

• Fechadas, quando apresentam alternativas para respostas. Neste caso, o pesquisador pressupõe quais são as respostas possíveis que o sujeito irá responder, não havendo, portanto, possibilidade de obter alguma resposta fora desse conjunto.

• Abertas, quando não apresentam alternativas para respostas, podendo o pesquisador captar alguma informação não prevista por ele ou pela literatura.

• Mistas, combinando parte com perguntas fechadas e parte com perguntas abertas. As questões fechadas são mais fáceis de ser respondidas, compiladas e tratadas estatisticamente. As questões abertas, por sua vez, se prestam melhor a coletar informações qualitativas. No entanto, são mais difíceis de ser obtidas, pois exigem do sujeito que responde maior atenção e tempo. As informações fornecidas pelo questionário aberto podem ser agrupadas em categorias, sendo possível também a sua quantificação. As perguntas mistas, que combinam parte fechada com parte aberta, podem ser do tipo:

Assinale a matéria que você menos gosta: ( ) Matemática; ( ) Física; ( ) Português... Justifique por quê:________________________________________________

Embora, atualmente, sejam pouco utilizados pelas pesquisas em abordagem qualitativa, os questionários podem servir como uma fonte complementar de informações, sobretudo na fase inicial e exploratória da pesquisa. Além disso, eles podem ajudar a caracterizar e a descrever os sujeitos do estudo, destacando algumas variáveis como idade, sexo, estado civil, nível de escolaridade, preferências, número de horas de estudo, número semanal de hora-aula do professor, matérias ou temas preferidos, etc.

FIORENTINI; LORENZATO, 2006 p. 116-117.

Fiz uma leitura cuidadosa, na qual expliquei todas as partes, exemplificando,

informando o significado de expressões ou palavras desconhecidas. Esse tipo de

atividade é considerada por Bortoni (2005) como “eventos de fala relacionados à língua

escrita” (p. 124) e “nesse evento, há sempre um texto escrito que funciona como uma

pauta para o que está sendo vocalizado.” (p. 125).

Após esse momento, no mesmo encontro, relembramos de forma sucinta as

fases do projeto estatístico que já havíamos desenvolvido: 1) definição do tema; 2)

definição dos enfoques; 3) aprofundamento de informações, para então realizarmos: 4)

elaboração das questões. Também relembramos o que faria parte de nossos próximos

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encontros: 5) definição das amostras; 6) revisão dos questionários; 7) entrega e coleta

dos questionários.

De posse do texto, os grupos se reuniram para elaborar, cada um, uma pergunta

fechada sobre o seu enfoque. Os estagiários e eu passamos pelos grupos e fomos

orientando o trabalho, percebendo também o quanto já estavam se tornando

autônomos. Esse momento foi registrado por duas alunas do mesmo grupo, Cristina e

Ângela, em suas “memórias”, apesar de chamarem seu enfoque de “tema”:

E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”36

Projeto Construindo Estatística

MEMÓRIA DA REUNIÃO Alunos presentes: Cristina Data: 02/05/2007 Rosângela Alexia

Depois de decidirmos na aula sobre o tema, vamos fazer o questionário. O tema que escolhemos para fazer a pesquisa será sobre Método Anticoncepcional. Nós vamos elaborar um questionário para levar para as pessoas que serão entrevistadas.

Memória de Cristina, portfólio da aluna. Hoje em sala de aula a professora nos explicou que vamos usar um questionário nesse questionário haverá várias perguntas que deverá ser dado as respostas assinalando X como resposta e a pesquisa será feita em sala de aula na própria escola.

Memória de Ângela, portfólio da aluna.

Na aula seguinte à leitura e à elaboração dos questionários, fizemos uma leitura

coletiva de cada questão e todos os alunos puderam opinar sobre a forma como

estavam apresentadas, sua linguagem e as respostas (clareza, objetividade,

vocabulário acessível, entre outras coisas).

Inicialmente houve um grupo que entendeu que deveria ser elaborada uma

questão nos moldes que normalmente se encontravam nas disciplinas escolares: o

professor pergunta e o aluno responde. Prática que costuma aparecer após a

36 Os alunos recebiam uma folha impressa com os dados que aparecem em negrito, ou seja, o cabeçalho da memória.

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apresentação de um tema do programa. Eles não haviam se apropriado do sentido

apresentado no texto de Fiorentini e Lorenzato (2006).

Qual o método certo para você não se contaminar com o vírus do HIV? Resposta: Preservativo.

Mesmo alguns grupos que entenderam bem a questão precisaram de algumas

sugestões, nossas e dos colegas, mais uma vez, enfatizando a importância “do outro”

que deveria responder. Selecionei as propostas iniciais e finais de dois grupos que

foram mais participativos e trouxeram a própria reelaboração para a discussão. A

passagem da proposta inicial para a final não foi rápida e exigiu muita discussão entre

os próprios integrantes do grupo e entre os integrantes e a pesquisadora, avaliando

cada alternativa de resposta e ampliando com novas alternativas que também poderiam

ser encontradas, dependendo da situação do respondente:

Proposta inicial do grupo 1: Você sempre procura orientação médica para usar algum método anticoncepcional? ( ) Sim; ( ) Fui na farmácia e comprei. ( ) Minha amiga me indicou. ( ) Minha mãe que comprou. ( ) Meu namorado é que compra. Proposta final do grupo 1: Atualmente, você procura orientação médica para escolher e utilizar algum método anticoncepcional com seu parceiro? ( ) Sim. ( ) Não. Vou à farmácia, pergunto ao farmacêutico e compro. ( ) Não. Compro o que minha amiga/amigo indicou. ( ) Não. Minha mãe/pai é que compra. ( ) Não. Meu namorado/namorada é que compra. ( ) Não utilizo método anticoncepcional. ( ) Ainda não iniciei minha vida sexual. ( ) Outros.

Proposta inicial do grupo 2: O que leva uma adolescente a gerar uma vida tão cedo? ( ) Por falta de orientação;

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( )Por não ter acesso ao método de anticoncepcional; ( ) Falta de conversa familiar; ( ) Quer sair da casa dos pais; ( ) Medo de perder o namorado. Proposta final do grupo 2: GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA. O que leva uma adolescente a gerar uma vida tão cedo? Assinale a alternativa que você considera como principal causa: ( ) Falta de orientação ou informação. ( ) Dificuldade de encontrar os métodos anticoncepcionais (como camisinha, pílula, entre outros). ( ) Falta de conversa e orientação familiar. ( ) Querer sair da casa dos pais. ( ) Medo de perder o namorado. ( ) Vergonha de ir ao médico. ( ) Outras causas.

O texto inicial de apresentação do questionário também passou pelo processo de

discussão e, dessa vez, com todos os alunos da sala, em uma plenária, enquanto

também apresentávamos e socializávamos todas as questões. Valorizamos o texto

inicial como uma maneira de informar aos alunos participantes da pesquisa do que se

tratava e de criar um clima amigável entre o aplicador do questionário e o respondente.

Proposta inicial da classe: Caro colega Gostaríamos de contar com sua colaboração respondendo a este questionário que faz parte de nosso projeto “CONSTRUINDO ESTATÍSTICA” sob coordenação da Prof. Keli. Comprometemo-nos a manter o sigilo e ética, cabíveis em pesquisas dessa natureza. Obrigada. Alunos da 7.ª EJA e prof.ª Keli

Proposta final da classe: Caro colega Contamos com sua colaboração! Para isso, basta responder este questionário, que faz parte de nosso projeto “CONSTRUINDO ESTATÍSTICA”, sob coordenação da Prof.ª Keli. Assumimos o compromisso de manter o sigilo e a ética cabíveis em pesquisas dessa natureza. Agradecemos a cooperação.

Alunos da 7.ª EJA e Prof.ª Keli

Somente depois de todo o questionário aprovado, feitas as devidas correções de

português, realizado um pré-teste com uma funcionária da escola e passado pela

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aprovação final dos alunos é que os questionários foram impressos (Apêndice F) e foi

preparada a aplicação. Durante todo esse processo, novamente percebi o “movimento”

trazido por Terzi (2005, p.15) e desta vez até mais ampliado: posso considerar o texto

de Fiorentini e Lorenzato (2006) como “escrita zero”, a escrita do “outro” que motivou a

“fala 1”, durante a leitura, gerando a “escrita 1”, ou primeira proposta do grupo para o

questionário; “a fala 2”, durante a leitura coletiva com a participação de todos os grupos,

gerando a “escrita 2” e a (re)significação que isso foi produzindo.

Novamente trazemos a produção de Cristina, registrada em seu porfólio, a

respeito do processo de aprovação dos alunos:

E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”37 Projeto Construindo Estatística

MEMÓRIA DA REUNIÃO

Alunos presentes: Cristina Data: 09/05/2007 Ângela

Hoje analisamos o questionário trazido pela professora Keli e discutimos sobre as perguntas feitas no mesmo e alteramos algumas perguntas para melhor ficar.

Memória de Cristina, portfólio da aluna.

5.17 - Aplicação do questionário

“Eu nunca fiz pesquisa nenhuma, foi a primeira vez que eu fui, assim, para pesquisar alguém.”

Suelem

A sugestão da população e da amostra em que aplicaríamos o questionário

partiu de uma reunião entre mim e a orientadora, ressaltando a importância do

acompanhamento dos alunos e da inviabilidade temporal para que todos entregassem e 37 Os alunos recebiam uma folha impressa com os dados que aparecem em negrito.

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recolhessem questionários na comunidade, já que muitos saíam cedo de suas

residências para trabalhar e só retornavam após a aula. Então, o melhor seria a

utilização do ambiente escolar. Essa proposta foi acatada pela classe, quando

discutimos essas mesmas questões. Também resolvemos que cada grupo aplicaria o

questionário em uma das classes do período noturno da escola. No dia combinado

sortearíamos as classes do nosso universo, que era a escola, e o questionário seria

aplicado aos que estivessem presentes naquele dia.

No dia acordado, percebi certo nervosismo no ar, manifestado por muitas risadas

na classe. Alguns haviam se preparado, cuidando melhor da aparência. Inicialmente

queriam confirmar se realmente iriam para as classes. Confirmada a ida, lemos

novamente os questionários, esclarecendo dúvidas, que eram poucas.

Sorteamos, então, entre todas as classes do período noturno, aquelas nas quais

seriam aplicados os questionários. Elegemos um responsável pelo grupo, na tentativa

de organizar a aplicação. As turmas sorteadas e os respectivos responsáveis foram:

- 8.ª EJA: responsável pela aplicação — Elisa; - 5.ª EJA: responsáveis pela aplicação — Adilson e Rosiane; - 8.ª E : responsáveis pela aplicação — Márcio e Moacir; - 2.º B: responsável pela aplicação — Rosana; - 3.º C: responsável pela aplicação — Marilena.

O aluno Márcio queria e insistia em aplicar o questionário na 8.ª E, pois tinha

vários amigos nessa classe e, como seu grupo não a sorteou, permiti que trocasse com

o grupo de Rosana, que a havia sorteado, mudando apenas o aplicador. Principalmente

os mais novos estavam muito preocupados sobre o que deveriam falar. Ficavam

“treinando” entre si e, algumas vezes, tentando empurrar a tarefa para o colega. Neste

momento percebi que o protagonismo no projeto passava também por um protagonismo

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escolar, ou seja, uma inserção e uma valorização que não são habituais com relação às

classes de EJA.

Esperamos até o início da 2.ª aula. Já havia conversado com os outros

professores sobre isso e iniciamos a aplicação, que transcorreu sem problemas, com

exceção da 8.ª E que, segundo uma professora, “é a pior da escola” e que esteve

agitada durante a aplicação.

Adilson, responsável pela “memória” de seu grupo, apresentou seu relato, do

qual transcrevemos um trecho:

E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”38 Projeto Construindo Estatística

MEMÓRIA DA REUNIÃO

GRUPO: n.º 6

Alunos presentes: Adilson Data: 16/05/2007 Jorge Marilena Rosiane Suelem

A professora chegou na sala de aula e estava conversando sobre o projeto com cada grupo e ela deu uma folha com tudo escrito sobre a pesquisa que cada grupo vai fazer com cada sala de aula. Nessa folha tinha 6 perguntas que cada sala teria que responder sobre anticoncepcional, sobre gravidez, sobre as pessoas que já tiveram filhos, sobre gestantes portadoras de HIV (Aids), sobre tipos de aborto, que tipo de parto a pessoa escolheu para fazer.

Memória de Adilson, portfólio do aluno.

Percebi que os alunos lidaram bem com situações ou imprevistos que surgiram

durante uma tarefa escolar inusitada. Um exemplo disso é o caso de Moacir, que

aplicou o questionário do seu grupo na 8.ª E, conforme transcrições das gravações de

áudio do episódio:

Keli: Como foi lá, Moacir? Conta para nós! O que eles falaram? Moacir: Nada!

Keli: Como assim, nada?!

38 Os alunos recebiam uma folha impressa com os dados que aprecem em negrito.

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Moacir: A gente chegou lá e perguntamos para eles assim: Se eles responderiam para nós. Aí um aluno perguntou assim: "Vai valer nota para nós?". Eu falei que não, que era um trabalho que a gente estava fazendo e tal e tal. Keli: Tal e tal o quê? Moacir: Que era um trabalho para nós. Aí ele pegou e falou assim: - Então a gente não vai querer fazer mais não!. Aí eu falei, tudo bem, se você não quiser fazer não faz, a gente não está obrigando ninguém a fazer! Aí ele falou: - Então nós vamos fazer! E fizeram. Keli: Que bom!

Também ficaram satisfeitos com o resultado, como nos traz Suelem,

complementada por Marilena, nas gravações de áudio transcritas:

Keli: Então, Suelem, conta como foi na sala em que você aplicou. Suelem: Então, eu nunca fiz pesquisa nenhuma, foi a primeira vez que eu fui, assim, para pesquisar alguém. Na classe onde a gente foi só tinha adolescente, não tinha nenhum com cara de pai ou mãe, mas todos mostraram interesse. Fomos bem recebidos tanto pelo professor como pelos alunos. Então eu fiquei satisfeita com o nosso trabalho na classe. Keli: Foi o 2.º B, não? Marilena: Foi. Suelem: Foram educados, nada de bagunça! Marilena: A classe que a gente pegou tinha... Suelem: Tinha mais menino que menina. Marilena: E os meninos estavam mais interessados que as meninas. Hoje em dia isso não é só coisa de mulher, os homens também têm que participar. Então está na hora de acordar! Suelem: Tem homem mais interessado nessa parte para não fazer filhos por aí do que a própria mulher.

Nesse momento de aplicação, considero que os alunos sentiram realmente que

estavam vivenciando o processo de tratamento de informação e, segundo Lopes (2004,

p. 195), isso “é fazer estatística”.

Recolhidos todos os questionários, combinamos nosso próximo encontro para

trabalharmos com eles.

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5.18 - Primeiros registros das informações

Ao todo foram recolhidos 115 questionários. Avaliei como um bom número para

trabalharmos na fase do projeto estatístico chamada de “tabulação dos dados obtidos

para cada enfoque do tema”.

Os questionários já haviam sido preparados, quanto à formatação, para serem

recortados posteriormente. Assim, cada um dos seis grupos receberia apenas a sua

questão, e todos poderiam trabalhar simultaneamente. Durante a fase de recortar as

partes do questionário para distribuirmos para cada grupo, notamos algumas falhas,

pois algumas pessoas não responderam todas as questões e ainda, com freqüência,

esqueceram-se de indicar o sexo e a idade. Nos questionários que apresentaram essas

falhas nós, pesquisadora e alunos, preenchemos as “lacunas”, baseando-nos nos

dados informados nas questões iniciais. Quando o aluno pesquisado não opinou, ficou

difícil! Então, embora tenhamos recebido 115 questionários, alguns grupos trabalharam

com um número menor, devido a problemas de incompletude das informações.

Sabia que, se trabalhássemos com dados encontrados em livros ou jornais,

poderíamos ter uma dimensão e um alcance grande, com dados do país, dos estados,

por exemplo; mas acreditamos que os alunos não experimentariam várias questões e

problemas que surgiram nessa etapa, ao trabalhar com dados reais. Acredito que

possibilitei aos alunos “gerarem seus próprios dados” (LOPES, 2004, p. 196), organizar

esses dados e resolver problemas decorrentes dessa coleta real.

Nesse encontro de tabulação dos dados, os alunos ficaram muito concentrados,

pois nosso ponto inicial foi a tabulação manual dos resultados, ou seja, a contagem

baseada nos questionários, o levantamento de sexo, idade e das escolhas para cada

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item, o que exigiu muito tempo. Os alunos tiveram que desenvolver formas de registro,

estratégias para contagem e para verificação dos dados.

Nos Quadros 7 a 12, trazidos dos portfólios dos alunos e escolhidos para

exemplificar algumas análises, são reproduzidos trechos das produções trazidas, com a

redação e a distribuição que recebi, de forma a indicar como os alunos produziram os

primeiros registros de suas contagens e como esses registros se aproximam ou não

dos convencionais da Estatística.

Passamos a relacionar cada grupo à pergunta com a qual estava trabalhando e à

sua numeração.

Quatro dos seis grupos preocuparam-se em contar e registrar a quantidade de

pessoas de cada sexo que responderam ao questionário. Analisando as anotações do

grupo 1, que trabalhou com a pergunta: “Atualmente você procura orientação médica

para escolher e utilizar algum método anticoncepcional com seu parceiro?”, pude

perceber a preocupação também em verificar se o total de participantes estava correto,

somando a quantidade de pessoas de cada sexo que responderam a questão (69 + 46

= 115), conforme Quadro 7:

Quadro 7 – Produção parcial do grupo 1 – Registro da variável “sexo”

06/06/2007 Feminino: 69 Masculino: 46 + 115

Quanto à organização dos dados da variável idade, três grupos, em seus

primeiros registros, já se aproximavam das tabelas convencionais da Estatística, mas

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apenas um deles, cujo registro trago no Quadro 8, preocupou-se em ordenar as idades

em ordem crescente.

Quadro 8 – produção parcial do grupo 6 Pergunta 6 Quais são os tipos de aborto que você conhece? (é possível assinalar mais de uma alternativa). 14 anos = 16 respondidos 15 anos = 7 respondidos 16 anos = 30 respondidos 17 anos = 30 respondidos 18 anos = 7 respondidos 19 anos = 4 respondidos 20 anos = 1 respondido 22 anos = 2 respondidos 23 anos = 1 respondido 25 anos = 1 respondido 28 anos = 1 respondido (( e assim segue))

Os outros três grupos apresentaram um registro que se afasta da organização

dos dados em tabelas. No Quadro 9, apresento, para exemplificar, a produção do grupo

2. Provavelmente os alunos separaram as partes do questionário por idade e depois

registraram conforme os grupos de idade apareciam em sua frente, utilizando o espaço

até o final da linha do caderno e novamente voltando ao início para novas idades, sem

a preocupação de ordená-las.

Quadro 9 – Produção parcial do grupo 2 – Registro da variável “idade” 06/06/2007

Idade idade idade idade idade idade 46 51 25 41 60 47 1 pessoa 1 pessoa 1 pessoa 1 pessoa 1 pessoa 1 pessoa Idade idade idade idade idade idade 36 35 32 28 23 22 1 pessoa 1 pessoa 1 pessoa 1 pessoa 1 pessoa 2 pessoa Idade idade idade idade idade idade 20 39 14 15 19 16 1 pessoa 3 15 7 4 29

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Idade idade idade 16 18 17 29 7 32

O grupo 3 trabalhou com a questão “Você já teve filhos? Qual parto escolheu?”,

utilizou outro recurso para organizar os dados — as cores — e preocupou-se em

informar isso à pesquisadora e ao leitor, como podemos observar no Quadro 10, onde

acrescentei comentários39 no portfólio da aluna Marilena:

Quadro 10 – Produção parcial do grupo 3 Pergunta 3: Você já teve filhos? Qual parto escolheu? Idade azul X quantidade vermelho ((legenda)) Sexo feminino 67 questionários respondidos ((grifo meu))

((portfólio da aluna Marilena))

Na contagem das escolhas dos itens da questão, foi interessante notar que os

alunos de cinco grupos utilizaram a própria formatação dos itens para auxiliá-los nos

registros, como a produção do grupo 1, no Quadro 11. Outro fato de destaque nesse

grupo é que, na contagem, falta um elemento, já que inicialmente apontaram 115

participantes e depois, nas respostas, apontaram 114. O fato foi destacado para alertar

outros grupos, para que também ficassem atentos em suas contagens e as corrigissem,

se necessário: 39 Os comentários feitos por mim nas produções dos alunos estão entre parênteses duplos.

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Quadro 11 – Produção parcial do grupo 1 – Registro das respostas 06/06/2007

Quanto às respostas: ( 42 ) Sim. ( 02 ) Não. Vou à farmácia, pergunto ao farmacêutico e compro. ( 03 ) Não. Compro o que minha amiga/amigo indicou. ( 03 ) Não. Minha mãe/pai é que compra. ( 04 ) Não. Meu namorado/namorada é que compra. ( 17 ) Não utilizo método anticoncepcional. ( 27 ) Ainda não iniciei minha vida sexual. ( 16 ) Outros. ((total 114 questionários))

Dois grupos apresentaram ainda registros complexos, considerando duas

variáveis ao mesmo tempo, como é o caso do grupo 5, quando registrou sexo e opção

de item, que exemplifico no Quadro 12. Devido à complexidade dos registros, o grupo

teve dificuldades posteriores em compreendê-los e dar continuidade ao trabalho até a

produção do gráfico. Foi necessário contar, organizar e refazer os registros.

Quadro 12 – Produção parcial do grupo 5 Pergunta 5 Se você tivesse problemas com infertilidade, ou seja, problemas para gerar uma criança, qual seria sua principal opção? MASCULINO 6 alunos responderam ( ) Buscaria recursos na medicina como inseminação artificial. 2 alunos responderam ( ) Desistiria de ter filhos. 14 alunos responderam ( ) Adotaria uma criança. 2 alunos responderam ( ) Me sentiria inútil. 12 responderam ( ) Não tenho opinião formada sobre isso. 7 alunos responderam ( ) Tentaria outras possibilidades. FEMININO 1.º item: buscaria recursos = 15 pessoas 2.º item: desistiria = 1 pessoa 3.º item: adotaria = 16 pessoas 4.º item: sentiria inútil = 3 pessoas 5.º item não tem opinião = 12 pessoas 6.º item: outras possibilidades = 10 pessoas 45 masculino

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12 alunos com 16 anos 2 alunos com 15 anos 1 aluno com 19 anos 5 alunos com 14 anos 10 alunos femininos com 14 anos 15 alunos masc com 17 anos 5 alunos mas com 18 anos 1 aluno masc com 19 anos FEMININO 15 alunos com 18 alunos com 16 anos 18 alunos com 17 anos 2 alunos com 18 anos 3 alunos com 19 anos 1 aluno com 20 anos 1 masc com 25 anos 1 masc com 51 anos 1 masc com 22 anos 1 fem com 23 anos 1 fem com 32 anos 1 fem com 39 anos 1 fem com 46 anos 1 fem com 41 anos 1 fem com 36 anos 1 fem com 47 anos 1 fem com 60 anos

Devido a questões que apareceram no decorrer do encontro, quanto à

organização dos dados, à organização de tabelas e pela observação dos primeiros

registros que fui mediando, preparei-me para, no encontro seguinte, tentar fazer com

que os alunos avançassem em seus registros.

5.19 - O registro das informações em tabelas

Iniciei nosso encontro, explorando o assunto “tabelas”, levando algumas para a

sala de aula, chamando a atenção para sua organização, partindo de situações que

encontrei nas produções que os alunos haviam entregado e mostrando como construir

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uma tabela. Na foto 5, apresento parte do material que utilizei e com o qual montamos,

os alunos e eu, um cartaz para a sala:

Essa fase do trabalho evidencia que a produção de tabelas, que também é um

componente do letramento estatístico, não é algo espontâneo e precisa ser explorada.

Esse tipo de proposta usualmente não é valorizado pelos materiais didáticos que

apresentam a tabela pronta para ser transformada em gráficos. Além disso, esse

processo dificilmente é desencadeado se o “material bruto” não foi produzido “com” os

alunos.

Nesse encontro, apenas um grupo, o que trabalhou com a quarta questão,

demonstrou dificuldades em organizar os dados em uma tabela (Quadro 13). Mesmo

assim, o grupo aprimorou suas estratégias de contagem, elaborando registros mais

próximos dos convencionais que os apresentados inicialmente.

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Quadro 13 – Reelaboração feita pelo grupo 4 (13/06/2007)

Pergunta 4 Na sua opinião qual a maior dificuldade que gestantes portadoras do HIV (Aids) encontram? 15p 14 6p 15 31p 16 32p 17 7p 18 ...

Os outros grupos apresentaram seus novos registros, dessa vez organizando os

dados da variável idade em ordem numérica, tendo como referência os modelos

apresentados. Alguns exemplos desses registros encontram-se nos Quadros 14 e 15,

transcritos dos portfólios dos alunos.

Mesmo os grupos que nos primeiros registros já se aproximavam dos

convencionais, como o grupo que trabalhou com a primeira pergunta, reelaboraram

seus registros, apresentando uma tabela, seguindo as orientações dadas (Quadro 14).

Quadro 14 – Reelaboração feita pelo grupo 1 – Registro da variável “idade” (13/06/2007)

Pergunta 1: Atualmente, você procura orientação médica para escolher e utilizar algum método anticoncepcional com seu parceiro? Idade Quantidade de

pessoas 14 15 15 07 16 31 17 33 ... ...

Cada grupo organizou uma tabela com as respostas encontradas para sua

questão e para a variável idade. Um exemplo é apresentado no Quadro 15.

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Quadro 15 – Reelaboração feita pelo grupo 3 – tabulação das respostas Pergunta 3: (13/06/2007) Você já teve filhos? Qual parto escolheu?

Item (tipo) Quantidade de parto

Não teve filhos ainda 53

Parto normal 17

Parto cesária 12

Parto em casa (parteira) 1

Os grupos que nesse encontro conseguiram conferir suas tabelas e verificar sua

correção iniciaram os cálculos das freqüências percentuais. Nesse momento ficou

evidente a importância do “conhecimento matemático”, apresentado por Gal (2002),

como elemento de apoio ao letramento e ao conhecimento estatístico. Este autor nos

remete à relativização do avanço dos alunos com relação a este conhecimento, pois

este depende do interesse e do nível esperado dos alunos em uma escola, comunidade

ou país. Assim, embora eles estivessem colocando o conhecimento matemático à

serviço do trabalho estatístico, ainda pode ser considerado um nível inicial de

letramento estatístico.

5.20 - Cálculos de freqüências percentuais e médias

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Nessa fase do trabalho, alguns grupos continuavam a trabalhar com a tabulação

dos dados, prevista no que chamamos de fase 8 do projeto: “Tabulação dos dados

obtidos para cada enfoque do tema”; outros já iniciavam a fase 9: “Análise dos dados

obtidos para cada enfoque do tema”, aplicando conceitos de porcentagem. Aceitei que

estivessem em fases diferentes, procurei respeitar o nível e o ritmo de cada um. O

atendimento aos grupos, juntamente com Alexandre e Gilberto, também respeitou esse

ritmo.

Nesse atendimento, em alguns grupos, resgatamos o conhecimento sobre “regra

de três”, conteúdo trabalhado por mim como professora da turma, e uma outra forma de

calcular porcentagens. Os alunos não tiveram dificuldades. Entraram em cena, então,

como ferramenta auxiliar ao cálculo, as calculadoras que foram disponibilizadas por nós

aos grupos.

Embora nosso foco não fosse o trabalho com calculadora, a dificuldade dos

alunos em lidar com a situação não pode ser desconsiderada. Eles tinham dificuldade

em digitar os dados e realizar a leitura dos resultados40; ao mesmo tempo, estavam,

segundo Skovsmose (2006, p.55), “ponderando sobre a confiabilidade dos cálculos”,

atitude comum quando se utilizam dados da vida real. Então nós os auxiliamos nessa

leitura, orientando-os quanto às aproximações, e eles foram (re)significando o trabalho

com a calculadora e produzindo conhecimentos em Estatística.

Analisando posteriormente os registros dos grupos, encontrei os cálculos das

freqüências percentuais através da “regra de três”, exemplificados nas Figuras 9 e 10, 40 Por exemplo, na freqüência acumulada das idades, onde encontramos números maiores, muitos achavam que no 1.500, deveriam digitar “1ponto500” e não sabiam que assim a calculadora trataria como 1,5. Outra dificuldade inicial foi “ler” os números que apareciam no visor da calculadora quando realizavam as divisões, pois causava muita estranheza algo como: 45,8756437. Ficavam desconfiados do resultado, achando que haviam feito algo errado; pensavam que só existissem resultados possíveis, exatos e “redondinhos”, comuns nos exercícios que estavam acostumados a resolver.

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reproduzidos das produções dos alunos. Como podemos perceber, foram feitas as

devidas aproximações para que pudessem encontrar a porcentagem de escolha de

cada item das questões e posteriormente passar para a construção de gráficos.

O Quadro 16, por sua vez, revela que os registros do grupo 1, que trabalhou com

a primeira questão, encontravam-se mais próximos dos convencionais, pois foram

sendo reelaborados ao longo dos encontros. Apesar de não perceber o fato da

multiplicação por 100, pois precisou registrar a multiplicação 69 x 100 antes de colocar

o resultado (6900), este grupo percebeu que não precisaria calcular a porcentagem de

mulheres que responderam a pesquisa, pois, quando encontrou o resultado de 60%

para os homens, já se sabia que o restante (40%) seriam as mulheres. Esse fato não foi

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registrado por escrito, mas verbalizado em conversas durante o desenvolvimento da

proposta e está registrado no meu diário de campo.

Quadro 16 – Registros do grupo 1 - Porcentagens 20/05/2007

Feminino: 69 Masculino: 46 Total de questionários: 115 Homens: 60 % Mulheres: 40% Total de quest. % 115 100 69 x 115x = 69 . 100 115x = 6900 X = 6900 115 X = 60%

O grupo 3, assim como outros dois grupos, após os cálculos, organizou uma

tabela que se aproximou de uma tabela de distribuição de freqüência convencional,

informando o número de escolhas a cada item e, respectivamente, a freqüência

percentual. (Quadro 17):

Quadro 17 – Registros Grupo 3 – Tabulação dos dados

Quantidade de parto

porcentagem

Não tive ainda 94 86% Parto normal 7 6% Parto cesárea 6 6% Mais de um tipo de parto 2 2%

Depois do cálculo de freqüências percentuais, cinco dos seis grupos trabalharam

com as medidas de tendência central média e moda. O grupo 2 apresentou uma

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organização, como consta no Quadro 18, de modo a facilitar o cálculo da média. Isso

também esteve presente nos registros do grupo 4.

Quadro 18 – Registros Grupo 2 – Tabulação dos dados Idade (anos) n.º pessoas 60 . 1 = 60 51 . 1 = 51 47 . 1 = 47 46 . 1 = 46 41 . 1 = 41 39 . 3 = 117 36 . 1 = 36 35 . 1 = 35 32 . 1 = 32 28 . 1 = 28 25 . 1 = 25 23 . 1 = 23 22 . 2 = 44 20 . 1 = 20 19 . 4 = 76 18 . 7 = 126 17 . 32 = 544 16 . 29 = 464 15 . 7 = 105 14 . 14 = 196 Total 110 2116 2116∟110 ((essa foi a indicação dos alunos para a divisão realizada)) Média de idade é 19 anos (( já com a aproximação)) Moda de idade é 17 anos

O grupo 5 optou por não trabalhar com medidas de tendência central,

manifestando a vontade de produzir uma tabela de freqüência utilizando intervalos.

Contou com nosso auxílio e do Apêndice H para isso. Em seus registros (Quadro 19),

podemos notar que inicialmente os intervalos não tinham a mesma amplitude, eles não

valorizavam a regularidade própria do instrumento estatístico. Devido à minha

intervenção e orientação, eles reelaboraram seu registro e parece que compreenderam

que a amplitude escolhida deveria ser mantida em toda a sequência e utilizado um

tamanho de intervalo mais adequado.

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Quadro 19 – Registros Grupo 5 – Tabulação dos dados 14 a 18 anos = 93 pessoas 19 a 25 anos = 9 pessoas 26 a 31 anos = 0 32 a 41 anos = 7 pessoas 46 a 60 anos = 5 pessoas ((pós-reelaboração )) 14 a 18 = 93 pessoas 19 a 23 = 8 pessoas 24 a 28 = 1 pessoa 29 a 33 = 1 pessoa 34 a 38 = 2 pessoas 39 a 43 = 4 pessoas 44 a 48 = 3 pessoas 49 a 53 = 1 pessoa 54 a 58 = 0 pessoas 59 a 60 = 1 pessoa

Os grupos foram trabalhando em ritmos próprios e sob nossa orientação, e cada

um foi iniciando a construção dos seus gráficos. A partir desse encontro, os

componentes do grupo 4, cujo enfoque era “Gravidez e HIV”, não compareceram mais

às aulas. As alunas Edite, Luana e Leidiane deixaram de freqüentar as aulas por

motivos que não consegui investigar. Passamos a ter, então, cinco grupos de trabalho

e, conseqüentemente, foram produzidos cinco pôsteres.

5.21 - Construindo gráficos

Os grupos escolheram o tipo de gráfico mais adequado para a apresentação de

seus dados e fizeram seus esboços em seus portfólios. Quatro grupos, assim como o

grupo 1, na figura 11, optaram pelo gráfico de setores para representar os dados que

haviam obtido. Embora as divisões relativas a cada setor do gráfico tenham sido feitas

aproximadamente e algumas vezes o número de setores fosse muito grande,

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apresentaram um esboço coerente, organizado e não deixaram de colocar uma

legenda:

Dois grupos, o 6 e o 2, optaram por outro tipo de gráfico. O grupo 6 optou por

fazer, além de um gráfico de setores, um gráfico de colunas, adequado para a

sistematização de seus dados, já que sua pergunta do questionário permitia mais de

uma resposta pelo mesmo respondente. Esta opção foi feita com a minha mediação.

E ambos os grupos, 6 e 2, quiseram fazer um histograma para a apresentação

da variável idade. A análise de seus histogramas os levou a concluir que esse tipo de

representação é adequada mas tem uma distribuição assimétrica e eles concluíram que

a tabela comunicaria melhor os resultados. Apresento, na figura 12, o histograma cuja

análise levou o grupo 2 a concluir que aquela não era uma boa apresentação, pois

havia uma concentração muito grande de pessoas na faixa etária de 14 a 18 anos e

freqüências muito pequenas nos outros intervalos.

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O esboço do histograma do grupo 2 foi descartado e o grupo 6 reelaborou seus

intervalos, mas apresentou-os apenas na forma de tabela, que será trazida

posteriormente.

Durante essas discussões, enquanto trabalhavam com a variabilidade de dados

percebida com a tabulação, com as elaborações e reelaborações de tabelas e gráficos,

os alunos também realizavam as fases 9 e 10 do projeto: “Análise dos dados obtidos

para cada enfoque do tema” e “Interpretação dos dados obtidos para cada enfoque do

tema”. Essas análises e interpretações não foram registradas por escrito, mas percebi

indícios de letramento, de que havia uma seleção dos dados e dos registros mais

relevantes e, quando encontravam as porcentagem, faziam comentários indicando que

concordavam ou não ou que já haviam antecipado determinado resultado como a

maior opção por determinado item, com comentários do tipo: “já sabia que o resultado

seria esse”.

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Destaca-se também que as análises e as interpretações não incluíram as

medidas de tendência central – média e moda – que apareceram em alguns registros.

Parece que as identificações dessas medidas se constituíram apenas em tarefas

escolares. Isso pode estar relacionado ao foco das investigações pelos grupos, que não

eram passíveis do cálculo da média.

5.22 - Construção dos pôsteres

O encontro aconteceu uma semana depois do trabalho com os questionários e

da finalização de gráficos de alguns grupos. Teríamos mais dois encontros, além

daquele; e dois grupos tinham cálculos a finalizar, além da montagem de um pôster,

que foi projetado em uma cartolina e posteriormente passado para o computador por

mim. Mostrei-lhes um que tínhamos feito, minha orientadora e eu, para um congresso

em Itatiba41, para que eles tivessem uma idéia do que seria uma divulgação através de

um pôster.

Os alunos não apresentaram dificuldades nesse momento, trabalhavam com

calculadora, tinham suas anotações, seus esboços dos gráficos; as dificuldades

apareceram mesmo na hora de planejar o que iriam colocar no pôster, selecionar dentre

todo o “conteúdo” que tinham. Além disso, os alunos estavam inseguros com relação à

letra que iriam usar e a qual o aluno que iria escrever, pois consideravam que suas

letras não eram “bonitas” e tinham medo de errar quando escreviam com canetas do

41 Fórum Paulista de Formação de Professor de Matemática. Universidade São Francisco – Campus Itatiba. Título: “Duas professoras, duas salas de aula, dois níveis escolares... uma proposta de colaboração”.

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tipo “piloto”. Percebo nessa preocupação com a estética uma insegurança quanto à

aceitação em uma apresentação pública.

Procuramos organizar a sala de modo que as cartolinas pudessem ficar

estendidas sobre as carteiras e os alunos pudessem trabalhar em grupo, em seus

pôsteres. Embora a sala de uso múltiplo fosse a ideal, ela estava sendo utilizada por

outro professor e optamos por usar a própria sala de aula, ao invés de adiar o trabalho.

A “construção” levou mais que os dois encontros que havíamos previsto. Além desses

três encontros, alguns grupos precisaram de aulas extras para concluir seus trabalhos,

e essas aulas foram gentilmente cedidas por colegas professores da escola.

Após cada encontro, procurei passar as idéias que os alunos haviam colocado

nas cartolinas para o programa de computador “Power point”, em minha casa, em

arquivos já preparados com as medidas dos pôsteres. O objetivo era antecipar a

produção e possibilitar que participassem desse momento ativamente, dando palpites e

sugestões, aprovando ou reprovando, embora não dominassem o software e alguns

nunca houvessem trabalhado no computador.

Nas construções, ao passar para o computador, procurei ser fiel às idéias dos

alunos, respeitando, na medida do possível, o tipo de letra escolhida, as cores e a

forma de distribuir as frases e os gráficos no papel. Na Foto 6, temos a proposta que

deu origem ao pôster sobre a pergunta 2 e que se encontra, assim como os outros, nas

próximas páginas:

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Uma proposta que foi bem aceita, na montagem dos pôsteres, foi a idéia do

grupo 1, que trabalhou com métodos anticoncepcionais e sugeriu a colocação de

figuras no pôster. Os outros alunos se envolveram também na tarefa de procurar

figuras, em nosso material de estudo — o mesmo disponibilizado por mim para que

pudéssemos nos informar sobre o tema — e em revistas, que pudessem ilustrar seus

trabalhos.

Após terem visto os pôsteres no computador disponível na sala dos professores,

os alunos deram sua aprovação final, em 10/06/2007. Os pôsteres foram impressos em

papel fotográfico, medindo 60x90cm e a apresentação dos resultados foi agendada

para o início do segundo semestre.

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5.23 - Preparando “a festa”

Depois do período de férias dos alunos, retornamos à escola, no segundo

semestre de 2007. Agora a 7.ª EJA já havia se tornado a 8.ª EJA42. Escolhemos, para o

retorno, a segunda semana de aula, quando imaginamos que tudo já estivesse mais

acertado. Realmente, encontramos a escola organizada, com todos os professores,

horário já estabelecido, o que não havia ocorrido no início do ano.

Encontrei o professor coordenador, animado como sempre, que me recepcionou

muito bem. Ele já sabia da proposta de exposição dos pôsteres pelos alunos e do

ambiente festivo que pretendíamos criar; o que formalizamos nesse dia foi a data da

apresentação. Estabelecemos o dia 31/08 para a realização da atividade, data que

também ficou acertada com a nova diretora43.

Durante a troca de professores, da primeira para a segunda aula, fui até a sala

da 8.ª EJA. Não havia muitos alunos presentes, mas vi um brilho no olhar dos que ali

estavam. A recepção foi boa e senti o entusiasmo que movimentações — festa,

convidados, familiares, exposição... — sempre causam neles. Vários alunos chegaram,

naquele momento, para a aula: como são alunos trabalhadores, pelas normas da

escola, lhes é permitido chegar um pouco mais tarde. Aproveitei e pedi os portfólios que

alguns alunos ainda não haviam entregado. Combinamos que eu voltaria nos próximos

dias para acertarmos detalhes e entreguei a sala para a próxima professora, que daria

continuidade às aulas daquele dia.

42 Relembrando que, nessa modalidade de ensino, cada série, nível ou termo é feito em um semestre. 43 Devido a um processo de remoção promovido pela Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo, o antigo diretor foi transferido para uma escola mais próxima de sua residência.

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Na estada na classe, percebi a ausência de alguns alunos e a presença de

outros novos; senti nos alunos vontade de aprender, embora alguns tivessem desistido;

senti o prazer deles por estarem ali, apesar das dificuldades enfrentadas. Outra coisa

que os surpreendeu foi perceber que realmente nosso projeto teve “começo, meio e

fim”.

Nos dias combinados, voltei à escola, dividi as responsabilidades de cada um

para o dia do encerramento do projeto, quando faríamos também uma festa de

confraternização. Fizemos pequenos convites impressos, para que os alunos pudessem

levar a familiares e amigos, e convites oficiais que foram encaminhados às pessoas

encarregadas da gestão da escola, aos professores e à Diretoria de Ensino à qual a

escola pertence.

5.24 - Encerramento do projeto

O encerramento aconteceu em uma sexta-feira. Combinei com a direção da

escola a utilização do horário de intervalo, para não atrapalhar o desenvolvimento das

aulas daquele dia.

Como de costume, chegamos, os estagiários e eu, mais cedo à escola, munidos

de filmadora, máquina fotográfica, gravadores, equipamento de projeção multimídia,

telão, além dos pôsteres. Esses recursos não estavam presentes todos os dias, nem

em nosso projeto, nem na “rotina” da escola, mas vão ao encontro da recomendação

dos Pceja (BRASIL, 2002, p. 139): “a tecnologia põe à disposição da escola uma série

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de recursos valiosos como o computador, a televisão, o videocassete, as filmadoras,

gravadores e toca-fitas, dos quais os professores devem fazer o melhor uso possível”.

Todo esse aparato tecnológico gerou uma movimentação muito interessante na

escola, além da circulação dos alunos participantes do projeto, arrumando o local,

pendurando os pôsteres; havia, por toda a escola, uma curiosidade em relação ao que

os equipamentos produziam, um deslumbramento com a tecnologia, além de ansiedade

e contentamento com a apresentação dos trabalhos.

Esse momento representou também a preocupação com a inclusão dos alunos

em eventos e práticas de letramento, não só por parte dos que faziam parte diretamente

do projeto, mas também da comunidade escolar, formada pelos próprios professores,

pela diretora, pelo coordenador, pelos funcionários, pelos alunos do ensino regular e de

EJA e também por seus familiares. Por isso, preparamos uma pequena exposição, a fim

de apresentar o projeto que desenvolvemos com os alunos e explicar à comunidade o

processo de produção dos pôsteres. A exposição foi ancorada por alguns dos slides

que foram projetados, trazidos do meu arquivo digital.

Após os agradecimentos gerais aos gestores da escola e aos professores que

estiveram diretamente ligados ao trabalho, quisemos deixar uma mensagem inicial a

todos os presentes, com o trecho de 44Paulo Freire que foi projetado no telão (Figura

13).

44 Poema do educador Paulo Freire, disponível no site do Instituto Paulo Freire: <www.paulofreire.org>.

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A escola (Paulo Freire) “Escola é o lugar onde se faz amigos

Não se trata só de prédios, salas, quadros, programas, horários, conceitos... Escola é, sobretudo, gente,

Gente que trabalha, que estuda, que se alegra, se conhece, se estima.

Diretor é gente. O coordenador é gente, o professor é gente,

O aluno é gente, cada funcionário é gente. A escola será cada vez melhor

na medida em que cada um se comporte como colega, amigo, irmão.

Nada de ‘ilha cercada de gente por todos os lados’. Nada de conviver com pessoas e depois descobrir

que não tem amizade a ninguém, Nada de ser como o tijolo que forma a parede,

indiferente, frio, só. Importante na escola não é só estudar,

não é só trabalhar, é também criar laços de amizade, é criar ambiente de camaradagem, é conviver, é ‘se amarrar nela’!

Ora, é lógico... numa escola assim vai ser fácil Estudar, trabalhar, crescer,

fazer amigos, educar-se, ser feliz”

Figura 13 – Slide/Mensagem

Quisemos contar um pouco dos nossos estudos, mostrando a importância da Estatística

e do “estatisticar”, como destaca Règnier (2006), e também o diagrama apresentado

por ele e já explorado neste trabalho.

Para mostrar todo o percurso, da chegada à escola à apresentação dos pôsteres,

montamos os seguintes slides para que todos o compreendessem (Figuras 14 e 15)

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Trabalho na escola

• Conhecendo os alunos.

• Registro em áudio e vídeo.

• Porfólios.

• Aproximação da Estatística.

• Produção de Estatística:

Figura 14 – Slide/Trabalho na escola

O projeto na escola

• Escolha do tema.

• Estudo do tema.

• Elaboração de um questionário.

• Aplicação do questionário na escola, em classes

sorteadas.

• Tabulação dos dados dos questionários.

• Apresentação dos resultados encontrados.

Figura 15 – Slide/O projeto na escola

Após a projeção, encaminhamos a exposição dos trabalhos, solicitando que os

autores ficassem próximos dos seus pôsteres que estavam afixados nas paredes do

pátio e que a comunidade escolar participasse observando, fazendo perguntas, pedindo

esclarecimentos. Além de os alunos terem seus trabalhos valorizados pela comunidade

escolar e pelos presentes no evento, eles também se sentiram valorizados pela

possibilidade de fazer parte de uma experiência significativa.

As análises a seguir são fundamentadas em trechos das gravações em áudio e

do meu diário. Foram separadas de acordo com os pôsteres. Consideramos os

episódios dignos de nota por mostrarem a interação que ocorreu entre “os autores e o

público”, embora muitos episódios não tivessem sido captados devido ao sentimento de

acanhamento gerado nos alunos pelas câmeras ou pelo gravador. Em muitas destas

conversas podemos perceber que a moda é mencionada.

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PÔSTER 1 – PERGUNTA 1:

Pergunta geradora: Atualmente, você

procura orientação médica para escolher

e utilizar algum método anticoncepcional

com seu parceiro?

Podemos avaliar que houve uma boa interação entre os alunos que estavam

expondo seus pôsteres e outros professores da escola, todos falando, perguntando,

observando e interagindo, como podemos comprovar em trecho de gravação:

Prof. de Matemática: Vergonha de ir ao médico, 6%! Aluna 1: Falta de conversa familiar... Prof. de Matemática: Você viu a estatística aqui? Aluno 2: Mas será que está falando a verdade? Cristina: As pessoas escreveram no papel, sem que a gente visse. Prof. de Matemática: Então é [verdade]!

Um professor da escola, além de observar os pôsteres, mostrou-se interessado

pelo assunto, deu sugestões de outros enfoques do tema; avaliou positivamente nosso

trabalho e sugeriu continuar:

PARA EVITAR UMA GRAVIDEZ

INDESEJADA

USE MÉTODOS ANTICONCEPCIONAIS!

Resultado da pesquisa realizada na E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges” com os alunos do período noturno:

Estado civil

Pergunta feita aos alunos:“ Atualmente, você procura orientação médica para escolher e utilizar algum método anticoncepcional?”

Não iniciou a vida sexual 20%

Sim, procuro orientação 30%

Não. Vou à fermácia e compro 17%

Não utiliza método anticoncepcional 14%

Não. Meu namorado(a) é quem compra 3%

Não. Meu pai/mãe compra 3%

Não. Compro o que minha amiga indicou 3%

Outros 10%

E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”7.ª EJA – Projeto construindo Estatística

Alunas: Cristina, Angela e AlexiaProf.ª Keli Cristina Conti

Infelizmente a maioria dos jovens não procuram orientação médica para o início de sua vida sexual e nem sobre os métodos que podem prevenir não só uma gravidez indesejada, mas muitas

doenças.

Projeto financiado pela FAPESP

Em 114 questionários respondidos:

87% Solteiros

8% Casados

2% Divorciados

2% Viúvos

1% Casados não-oficialmente

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Prof. de Matemática: Futuramente poderíamos fazer essa pesquisa, separando homem e mulher, para ver como é que está! Pelo que eu converso com a molecada... os meninos estão preocupados com isso! Keli: Professor, se você quiser utilizar nossos questionários para fazer um levantamento, nós temos esses questionários respondidos. Então você pode trabalhar com seus alunos essa proporção de homens e mulheres. Prof. de Matemática: É um trabalho que pode continuar... ... Prof. de Matemática: Eu achei muito interessante, porque mostra uma realidade da escola. Se fizéssemos no período da manhã, seria diferente. Cristina: Daria outro resultado! Prof. de Matemática: Outra faixa etária e outra maneira de pensar e enxergar a vida!

PÔSTER 2 – PERGUNTA 2:

Pergunta geradora: GRAVIDEZ NA

ADOLESCÊNCIA. O que leva uma

adolescente a gerar uma vida tão cedo?

NNNNóóóós da 7.s da 7.s da 7.s da 7.ªªªª sssséééérie EJA da E.E. rie EJA da E.E. rie EJA da E.E. rie EJA da E.E. ““““Dr. Telêmaco Dr. Telêmaco Dr. Telêmaco Dr. Telêmaco Paioli MelgesPaioli MelgesPaioli MelgesPaioli Melges”””” fizemos uma pesquisa fizemos uma pesquisa fizemos uma pesquisa fizemos uma pesquisa

com os alunos.com os alunos.com os alunos.com os alunos.Vejam o que descobrimos sobreVejam o que descobrimos sobreVejam o que descobrimos sobreVejam o que descobrimos sobregravidez na adolescência:gravidez na adolescência:gravidez na adolescência:gravidez na adolescência:

O que leva uma adolescente a gerar uma vida tão cedo?

Vergonha de ir ao médico 6%

Dificuldade de encontrar os métodosanticoncepcionais 5%Medo de perder o namorado 12%

Falta de conversa e orientação familiar28%Falta de informação 18%

Querer sair da casa dos pais 5%

Outras causas 26%

Nossos 110Nossos 110Nossos 110Nossos 110Pesquisados:Pesquisados:Pesquisados:Pesquisados:

Homens - 37%

Mulheres - 63%

E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”7.ª EJA – Projeto construindo Estatística

Alunas: Elisa, Meire e VitóriaProf.ª Keli Cristina Conti Projeto financiado pela FAPESP

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A aluna Elisa Cristina dialogou com professores participantes e também chamou a

atenção para alguns itens que aparecem no pôster, mostrando que acompanhava a

análise dos professores:

Prof.ª de Inglês: Olha, querem sair da casa dos pais! Gente! Prof. de Matemática: Bom... precisa ver bem! Não tem um aluno aqui que quer ir para a FEBEM porque na casa dele não tem comida? Prof.ª de Inglês: É, uma fuga! Você quer fugir de um problema e acha que a gravidez vai resolver. Elisa: E acaba piorando! Elisa: Medo de perder o namorado também é alto. Prof.ª de Inglês: É, foi a primeira coisa que eu notei!

PÔSTER 3 – PERGUNTA 3

Pergunta geradora: Você já teve filhos?

Qual parto escolheu?

NOSSO GRUPO PESQUISOU ALUNOS DA E.E. “Dr. TELÊMACO PAIOLI MELGES”, SOBRE

TIPOS DE PARTO.VEJA O RESULTADO QUE ENCONTRAMOS

NESTE GRÁFICO DE SETORES:

TIPOS DE PARTOTIPOS DE PARTOTIPOS DE PARTOTIPOS DE PARTO

Não tive filhos 86%

Parto normal 6%

Parto cesária 6%

Outros 2%

E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”7.ª EJA – Projeto construindo Estatística

Alunos: Marilena, Adilson, Rosiane, Jorge e SuelemProf.ª Keli Cristina Conti

Tivemos uma porcentagem alta de pessoas que não tiveram filhos (86%) pois a maior parte dos

pesquisados eram adolescentesentre 14 e 17 anos.

Mulheres 61%

Homens 39%

Projeto financiado pela FAPESP

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Em sua fala, Marilena conseguiu expor a alguns professores e alunos

vários dados encontrados no pôster, como faixa etária, sexo e tipo de parto

assinalado, de maneira bem rápida:

Marilena: participaram da pesquisa de 14 a 60 anos, mas os que mais responderam foram os de 14 a 17 anos, que não tiveram filhos [relacionando a tabela do pôster, com o gráfico], isso dá 86%. Marilena: 61% foram mulheres que responderam nossa pesquisa! Prof.ª de Inglês: É, realmente, temos mais mulheres na nossa escola! Marilena: E aqui temos representado outros tipos de parto, que creio que seja tipo fórceps, de cócoras ou na água. Prof.ª de Inglês: Essa é a porcentagem do parto que eles mais conhecem [86%]? Marilena: Não, essa é a porcentagem de entrevistados que não tiveram filhos. Foram 109 questionários respondidos. Marilena: E até mesmo os homens responderam o tipo de parto da esposa.

PÔSTER 4 – PERGUNTA 545

Pergunta geradora: Se você tivesse

problemas com infertilidade, ou seja,

problemas para gerar uma criança,

sua principal opção seria?

45 Lembro que infelizmente o grupo de alunas que trabalhou com a pergunta 4 não concluiu seus trabalhos, pois elas deixaram de freqüentar as aulas.

InfertilidadeInfertilidadeEssa pesquisa foi feita com os alunos da

E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges” e o resultado foi um tanto surpreendente:

Muitas pessoas encontraram na solução de seu problema, uma maneira de resolver o

problema de outros: adotando uma criança!

Adotaria uma criança 39%

Buscaria recursos na medicina 18%

Tentaria outras possibilidades 15%

Me sentiria inútil 4%

Desistiria de ter filhos 2%

Não tenho opinião formada a esserespeito 22%

Se você tivesse problemas com Se você tivesse problemas com Se você tivesse problemas com Se você tivesse problemas com infertilidade, ou seja, problemas para infertilidade, ou seja, problemas para infertilidade, ou seja, problemas para infertilidade, ou seja, problemas para gerar uma criangerar uma criangerar uma criangerar uma criançççça, sua principal opa, sua principal opa, sua principal opa, sua principal opçççção ão ão ão seria?seria?seria?seria?

E.E. E.E. E.E. E.E. ““““Dr. Telêmaco Paioli MelgesDr. Telêmaco Paioli MelgesDr. Telêmaco Paioli MelgesDr. Telêmaco Paioli Melges””””7.7.7.7.ªªªª EJA EJA EJA EJA –––– Projeto construindo EstatProjeto construindo EstatProjeto construindo EstatProjeto construindo EstatíííísticasticasticasticaAlunas: Janete e RosanaAlunas: Janete e RosanaAlunas: Janete e RosanaAlunas: Janete e RosanaProf.Prof.Prof.Prof.ªªªª Keli Cristina ContiKeli Cristina ContiKeli Cristina ContiKeli Cristina ContiFaixa etFaixa etFaixa etFaixa etáááária dos ria dos ria dos ria dos 110 pesquisados:110 pesquisados:110 pesquisados:110 pesquisados: Até 18 anos

De 19 a 38 anos

De 39 a 60 anosProjeto financiado pela FAPESPProjeto financiado pela FAPESPProjeto financiado pela FAPESPProjeto financiado pela FAPESP

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A aluna Rosana não só apresentou seu trabalho, mas também questionou os

alunos a respeito de sua temática, a infertilidade, e as opções que poderiam ser

tomadas, como a adoção:

Rosana: 39% das pessoas escolheram adotar uma criança, você viu que legal? Então, resolvendo o problema de uma pessoa, ela está resolvendo o dela também! Acho que vocês responderam esse questionário. Lembra dele? Aluno 1: É, eu participei! Rosana: Você também não? Aluno 2: Não. Aluno 3: Interessante, por incrível que pareça, que a idade da maioria é 18 anos. Rosana: Todos jovens! E você [aluno 2], agora que está aqui, qual a atitude você tomaria em relação à infertilidade, sua ou de sua esposa? Aluno 2: Eu adotaria, no futuro, mesmo não havendo caso de infertilidade, eu já penso em adotar! Eu acho bacana! Rosana: Por quê? Aluno 2: Acho que porque, primeiro, fazer alguém feliz e resolver meu problema, vai me fazer feliz e fazer alguém feliz! ... Rosana: Você viu que a maior parte dos questionários foram respondidos por jovens! Olha, 18 anos!

Rosana também lidou com opiniões diferentes e, principalmente, diferentes da

sua:

Rosana: Você faria o quê? Aluno 4: Eu gosto muito de criança! Rosana: O problema é que é burocrático!

...

Rosana: E você, o que faria? Aluno 4: Eu? Rosana: Você adotaria uma criança? Aluno 4: Jamais! Rosana: Não adotaria? Aluno 4: Não. Eu faria parte dessa aqui [desistiria de ter filhos].

Também houve momento para uma pequena avaliação e para informar aos

alunos que novas pesquisas estão sendo desenvolvidas:

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Rosana: Você gostou da pesquisa? Participou dela? Aluno 5: Fiquei sabendo agora! Legal! Rosana: Nós já estamos com outro projeto. Vamos fazer outra! Aluno 5: Legal! Rosana: Mas vai ser diferente!

PÔSTER 5 – PERGUNTA 6

Pergunta geradora: Quais são os

tipos de aborto que você conhece?

Este foi o único pôster que trazia um “gráfico de barras”, devido à natureza da

pergunta, que possibilitava a escolha de mais de uma resposta - fato que não ocorreu

com as outras perguntas -, e uma tabela de distribuição de freqüência, que surgiu da

análise de um histograma. Porém, conforme relatei anteriormente, o grupo concluiu que

este não era adequado devido à variabilidade dos dados disponíveis. Embora Ronaldo,

o representante do grupo, fosse um aluno tímido, lidou bem com os questionamentos

Quais os tipos de aborto que você conhece?Quais os tipos de aborto que você conhece?Quais os tipos de aborto que você conhece?Quais os tipos de aborto que você conhece?Essa foi a pergunta feita aos alunos da E.E. Essa foi a pergunta feita aos alunos da E.E. Essa foi a pergunta feita aos alunos da E.E. Essa foi a pergunta feita aos alunos da E.E. ““““Dr. Telêmaco Dr. Telêmaco Dr. Telêmaco Dr. Telêmaco

Paioli MelgesPaioli MelgesPaioli MelgesPaioli Melges””””. Veja as respostas que encontramos:. Veja as respostas que encontramos:. Veja as respostas que encontramos:. Veja as respostas que encontramos:

0

10

20

30

40

50

60

70

Abortoterapêutico

Aborto retido Abortoespontâneo

Abortoclandestino

Abortoprevisto em

lei

Nenhumdesses

Nossos pesquisad

os

Nossos pesquisad

os

Nossos pesquisad

os

Nossos pesquisad

os

1 pessoa1 pessoa1 pessoa1 pessoa58 a 62 anos58 a 62 anos58 a 62 anos58 a 62 anos

1 pessoa1 pessoa1 pessoa1 pessoa49 a 53 anos49 a 53 anos49 a 53 anos49 a 53 anos

2 pessoas2 pessoas2 pessoas2 pessoas44 a 48 anos44 a 48 anos44 a 48 anos44 a 48 anos

000054 a 58 anos54 a 58 anos54 a 58 anos54 a 58 anos

110 pessoas110 pessoas110 pessoas110 pessoasTotal entrevistadosTotal entrevistadosTotal entrevistadosTotal entrevistados

3 pessoas3 pessoas3 pessoas3 pessoas39 a 43 anos39 a 43 anos39 a 43 anos39 a 43 anos

2 pessoas2 pessoas2 pessoas2 pessoas34 a 38 anos34 a 38 anos34 a 38 anos34 a 38 anos

1 pessoa1 pessoa1 pessoa1 pessoa29 a 33 anos29 a 33 anos29 a 33 anos29 a 33 anos

2 pessoas2 pessoas2 pessoas2 pessoas24 a 28 anos24 a 28 anos24 a 28 anos24 a 28 anos

8 pessoas8 pessoas8 pessoas8 pessoas19 a 23 anos19 a 23 anos19 a 23 anos19 a 23 anos

90 pessoas90 pessoas90 pessoas90 pessoas14 a 18 anos14 a 18 anos14 a 18 anos14 a 18 anos

FreqFreqFreqFreqüüüüênciaênciaênciaênciaIdadeIdadeIdadeIdade

Mulheres 62%

Homens 38%

E.E. E.E. E.E. E.E. ““““Dr. Telêmaco Paioli MelgesDr. Telêmaco Paioli MelgesDr. Telêmaco Paioli MelgesDr. Telêmaco Paioli Melges””””7.7.7.7.ªªªª EJA EJA EJA EJA –––– Projeto construindo EstatProjeto construindo EstatProjeto construindo EstatProjeto construindo EstatíííísticasticasticasticaAlunos: Paulo, Marcio, Moacir e RonaldoAlunos: Paulo, Marcio, Moacir e RonaldoAlunos: Paulo, Marcio, Moacir e RonaldoAlunos: Paulo, Marcio, Moacir e Ronaldo

Prof.Prof.Prof.Prof.ªªªª Keli Cristina ContiKeli Cristina ContiKeli Cristina ContiKeli Cristina Conti Projeto financiado pela FAPESPProjeto financiado pela FAPESPProjeto financiado pela FAPESPProjeto financiado pela FAPESP

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que apareceram na exposição, fossem eles de origem estatística ou não, como a

curiosidade em relação aos tipos de aborto:

Prof.ª de Inglês: O que é aborto retido? Ronaldo: Quando a criança morre por algum motivo, mas permanece no útero. Prof.ª de Inglês: Aí tem que fazer tipo uma curetagem! Aluno 1: O clandestino é o que mais se faz, por esta estatística! Ronaldo: Não, é o que mais eles conhecem! ... Aluna: O que tem aqui, as perguntas? Ronaldo: Não, a faixa etária das pessoas que participaram da pesquisa! Ronaldo: Então, de 14 a 18 anos, foram 90 pessoas que responderam o questionário. Keli: Isso mostra também que quem está procurando o ensino noturno é dessa faixa etária, mais nova, no máximo até 23 anos.

Acabamos captando também questões de relação de algumas pessoas com a

Estatística:

Prof.ª de Português: O EJA é tão rico de se trabalhar. Eu aprendi a gostar de Estatística quando eu fiz pedagogia. Para ser pedagoga, trabalhar na direção de escola, lógico que você tem que trabalhar com as estatísticas da escola. Como eu sou da área de humanas, Letras, pôxa, como é que eu vou... mas na hora de fazer pedagogia, adorei! Keli: Você é aqui do bairro mesmo? Prof.ª de Português: Não, mas estou há três anos nessa escola e acho que o EJA é o coração dessa escola, porque eles ajudam a segurar muito essa escola. É uma pena que vemos que está diminuindo o número de alunos...

Para finalizar a atividade, a aluna Rosana, por iniciativa própria, pediu o gravador

de voz e foi entrevistar alguns participantes a respeito do projeto. Uma iniciativa que se

mostrou importante para o trabalho, pois revelou o quanto o projeto significou e

transformou a aluna e “mexeu” com a comunidade escolar. Trazemos alguns trechos

dessa gravação, agrupados em gestores e alunos.

A avaliação positiva por parte dos gestores da escola:

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Rosana: O que você achou? Diretora: Achei lindo. Rosana: Legal! Tem que ter outros, não tem? Diretora: Tem que ter outros desse! Isso engrandece a escola! Valoriza o trabalho de vocês! Cria vínculo! ... Rosana: Você pode conceder uma entrevista? Queria saber o que o senhor achou do projeto! Prof. Coordenador: Excelente! Rosana: Você acha que tem que ter mais? Prof. Coordenador: Com certeza! Não só em Matemática, mas esse tipo de trabalho tem que ser feito por todas as outras disciplinas também! ... Rosana: Qual sua opinião disso, Prof.ª de Inglês? Tem que ter mais projetos? Prof.ª de Inglês: Na minha opinião, sim! Prof. Coordenador: Tem que ter também a participação dos alunos na apresentação. Com certeza! Prof.ª de Inglês: Os alunos apresentando! Prof. Coordenador: Assim eles acabam mostrando mais ainda o que eles aprenderam. Nem que seja para falar três parágrafos. Rosana: É bom! Prof. Coordenador: E para eles também sentirem mais parte do trabalho! Rosana: Isso também é parte importante do que ele realizou. Prof. Coordenador: Exatamente!

A avaliação por parte de alunos da escola:

Rosana: O que você achou do projeto de Estatística, de Matemática da 8.ª EJA? Aluna 1: Foi excelente! Muito bem programado! Organizado! Os alunos se esforçaram e fizeram um bom trabalho! Rosana: A gente pode perceber também uma valorização do professor para o aluno. Uma amizade... uma cumplicidade... ... Rosana: Oi, gente! Posso fazer umas perguntas? Quero saber se vocês gostaram do que houve aqui hoje a noite... Aluno da 8.ª série: Eu gostei! Aluna da 8.ª série: Eu gostei da parte que falou sobre o aborto. Rosana: Qual? Aluna 8.ª série: Aquela pergunta: Qual tipo de aborto vocês conhecem? Eu estava achando que era qual tipo você já tinha feito! E o menino explicou que não. Acho que tem muita forma de aborto que a gente não conhece.

E Rosana também fez algumas provocações, pensando em dar continuidade a

essa dinâmica na escola:

Rosana: O que vocês acharam? Prof.ª de Artes: Não pode parar por aí!

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Prof.ª de Geografia: Muito interessante, tem que continuar sempre assim. Rosana: Que tal a gente pensar num projeto de artística desse nível? Prof.ª de Geografia: acabamos de falar sobre isso, Geografia, Português, História... Rosana: Na verdade, abriu um bom campo! Professores: Tem campo aí para todas as disciplinas!

Até a continuação do projeto, por parte do estagiário Gilberto, foi captada:

Rosana: Gilberto, dá uma entrevista para mim? O que que você achou de trabalhar com Estatística na 8.ª EJA? 7.ª, agora 8.ª! Gilberto: Foi muito bom trabalhar, tanto que agora estou continuando com a 8. ª EJA, com a mesma turma e continuando com o mesmo tema! Está sendo muito bom!

Além disso, também eu, pesquisadora, e os alunos ouvimos crítica:

Rosana: Professor, você acha que tem que ter mais desses projetos na escola? Prof. de História: Acho importante! Vir coisa de fora e haver uma troca. Acho que a única crítica que eu faço é que o formato foi muito acadêmico. Acho que o formato tem que se adequar um pouco mais à escola. Isso é uma crítica não a esse projeto, mas à Universidade. Ela sempre faz isso. É um problema da Universidade que precisa ser resolvido! Ela não sabe falar em outra língua que não a dela.

5.25 – Avaliando o projeto

“Que tal a gente começar tudo de novo?” Moacir

Mesmo depois do “encerramento” com a apresentação dos resultados do projeto,

voltamos à escola, pois algumas “coisas” precisavam ser realizadas: o cumprimento de

alguns combinados, como a apresentação das fotos e da filmagem realizada no dia do

encerramento e a avaliação de nossa proposta por parte dos alunos.

Para a apresentação das fotos e da filmagem realizadas, preparei uma

montagem digital, na qual incluí um “fundo musical”, parte da qual disponibilizei aos

alunos através de gravações em CDs e DVDs. Optei por essas mídias, pensando no

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acesso às gravações em aparelhos mais comuns daquele contexto. Aparentemente, os

alunos ficaram muito contentes ao receberem esse material, no qual se puderam ver

como “artistas principais”, como protagonistas!

Para as avaliações utilizamos três formulários: o primeiro, explorando “os

relacionamentos” com o projeto, com os colegas, com a pesquisadora e com os

estagiários (Apêndice J); o segundo, avaliando o aprendizado em Estatística e

Matemática (Apêndice K); e o terceiro, possibilitando aos alunos um momento para

sugerir ou criticar o projeto (Apêndice L). Os alunos que estavam presentes na ocasião

fizeram as avaliações na classe, em horário cedido por outro professor. Para os que

não estavam presentes, encaminhei os formulários via colegas e marquei outro

encontro, a fim de recolhê-los.

Sistematizando as avaliações recebidas de 12 alunos, gostaria de voltar a

nossos eixos de análises, refletindo um pouco mais sobre o que foi construído nos três

eixos e buscando evidenciar o letramento presente nas aulas:

Eixo 1: Relação dos alunos com a Matemática.

Eixo 2: Produção de conhecimento dos alunos em Estatística nos encontros

referentes ao projeto.

Eixo 3: Inclusão dos alunos em atividades letradas.

Quando descrevi o trabalho de campo, citei alguns depoimentos, orais e escritos,

que captavam o relacionamento do aluno com a Matemática, em que ficava

evidente, através de gravuras escolhidas pelos alunos, que o relacionamento era

confuso, difícil, causava medo; e a aquisição desse conhecimento era representada

como algo impossível, tanto para os que estavam fora da escola por longo tempo,

quanto para os que não haviam interrompido seus estudos. No decorrer do projeto

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desenvolvido com os alunos, pelo envolvimento deles com as atividades, por suas

produções, posso afirmar que esse relacionamento, tido como difícil, teve uma melhora

significativa e que ocorreu uma valorização da Matemática no dia-a-dia das pessoas.

Isso pode ser acompanhado nos registros dos alunos, em avaliação escrita sobre o

projeto:

A Matemática não é tão complicada e é essencial no dia-a-dia, para se fazer um teste em uma empresa, inclui cálculos de Matemática, em receitas da cozinha também, passei a também a observar os juros e porcentagens quando compro em lojas. (Registro escrito de Rosana, em 27/09/2007). Aprendi a gostar de Matemática! Muitas coisa que aprendemos usamos no dia-a-dia! (Registro escrito de Cristina, em 27/09/2007).

Infelizmente não posso dizer que isso seja uma unanimidade, pois houve

depoimentos que mostraram que esse relacionamento ainda é conflitante:

Matemática é muito difícil! Mas tentei aprender o que pude. (Registro escrito de Jorge, em 27/09/2007). Eu preciso aprender muito mais a respeito da Matemática: a montar as contas e também dividir. Isto ainda é um bicho de sete cabeças. (Registro escrito de Rosiane, em 27/09/2007).

Já a Estatística esteve mais evidente no trabalho de campo e, quanto à

produção de conhecimento dos alunos sobre ela, além do que foi construído,

gostaria de mostrar também o que não foi “exposto” na escola, mas trazido pelos alunos

em seus portfólios, e não é menos importante:

Sobre a aprendizagem em Estatística:

Eu aprendi na Estatística muitas coisas que não conhecia, porém a que mais gostei é que hoje eu já sei como fazer quando é mais de 100 para fazer a porcentagem. Isto é o máximo!!! (Marilena, 28/09/2007). A Estatística não é tão complicada! (Rosana, 27/09/2007).

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Além das porcentagens, gráficos e regra de três, aprendi um grande conhecimento sobre PESQUISA! (Alexia, 28/09/2007).

Sobre a utilização do conhecimento produzido:

Aprendi que tudo neste mundo usa Estatística. Por exemplo: Os gráficos mostram o crescimento da população, nas porcentagens o que gastamos de água e aprendi que tudo o que vou fazer preciso saber Matemática. (Vitória, 28/06/2007). Hoje estou vendo o quanto estas aulas foram importantes! Eu poderia até ter aproveitado mais. (Márcio, 27/09/2007).

As percepções dos alunos também focaram a importância de “projetos” e a

importância do outro, do colega e do trabalho em grupo durante nossos encontros:

O projeto é importante para discutir dúvidas e adquirir mais conhecimento. Para mim foi importante, fiquei tendo um pouco mais de conhecimento. (Vitória, 28/09/2007). O meu relacionamento com o projeto foi muito legal e eu aprendi mais e mais com meus colegas. (Márcio, 28/09/2007). Adorei o projeto, aprendi várias coisas importantes, também gostei muito dos meus colegas, pois cada um passava um pouco de seus conhecimentos e também nos conhecemos um pouco mais. Vou guardar tudo isso e muito mais de tudo que aprendi. (Ângela, 27/09/2007).

Em suas avaliações, além de manifestarem também que haviam “gostado muito”,

muitos revelaram a vontade de continuar; além disso, as próprias provocações de

Rosana, citadas nas entrevistas que realizou, mostram também que o “projeto”

realmente possibilitou — através da minha mediação, como professora-pesquisadora, e

do contato com o outro — aprendizado e desenvolvimento:

Que tal a gente fazer outros projetos? Seria muito bom! (Sugestão de Suelem). Que tal nos próximos anos termos novos projetos? (Sugestão de Adilson).

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Que pena que o projeto acabou, mas só por enquanto. Que tal a gente começar tudo de novo? (Sugestão de Moacir).

Acredito que é possível dizer que essa produção de conhecimento realmente foi

além do conhecimento de Matemática e Estatística e cumpriu o que pretendia com

relação à construção de conhecimento. Os alunos vivenciaram o processo de forma

contextualizada, interagiram e construíram seu conhecimento como protagonistas, e

isso foi muito importante para mim e, principalmente, para eles.

Ainda me resta algo a cumprir, um pedido de muitos alunos e formalizado pela

aluna Ângela:

Quando você apresentar esse projeto, Keli, gostaria que contasse para nós como foi! (Sugestão de Ângela).

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Capítulo 6

O QUE FICOU...

Retomo a questão de investigação:

Qual o papel da Estatística na inclusão de alunos da Educação de Jovens e

Adultos em atividades letradas?

A inclusão em atividades letradas, embora não expressa verbalmente pelos

alunos, permeou todo o trabalho. Mesmo consciente das dificuldades dos alunos em

“ler e escrever” e das situações pouco propícias da realidade da própria escola para o

desenvolvimento dessas competências, não considerei esses fatos como obstáculos

intransponíveis. Desde nosso contato inicial na primeira aula, quando a aluna perguntou

o que era EJA, fiz questão de caminhar para a inclusão desses alunos em atividades

letradas, quer respondendo a seus questionamentos, quer dando-lhes voz ou

instigando-os a transformar suas “vozes” em escrita, como nas memórias; e, até

mesmo, acreditando que seriam capazes de significar um texto acadêmico. Esta

crença, por exemplo, manifestou-se ao explorarmos instrumentos de coleta de

informações, quando lhes propus que elaborassem e apresentassem um pôster.

Vale retomar “letramento”, na conceituação de Soares (2003a, p.112), que defende

que, para avaliá-lo e medi-lo, não há consenso e que “em síntese, o letramento é ‘um

fenômeno de muitos significados’; uma única definição consensual de letramento é,

assim, impossível”. Segundo Gal (2002), cada um dos componentes do modelo de

letramento estatístico que propõe poderia ser modificado ou reelaborado, dependendo

do contexto, de interesses e do nível esperado dos alunos ou cidadãos em uma escola,

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comunidade ou país. Concordo com Soares (2003a, p. 112): essa dificuldade “não

elimina a importância da avaliação”; sendo assim, considero importante destacar

sinteticamente os avanços dos alunos da 7.ª/8.a EJA durante a participação no Projeto

de Estatística. Tais avanços nem sempre ficaram explícitos na apresentação da análise

que constituiu a narrativa e embora significassem muito quando menciono o letramento,

para aqueles alunos, daquele nível de ensino e realidade, ainda poderia ser

considerado um nível inicial de letramento estatístico. Pude perceber indícios de que os

alunos passaram a:

a) identificar os conhecimentos matemáticos como meio de compreender o mundo

em sua volta, sua presença e importância no cotidiano e a valorização da

escolarização;

b) ser capazes de relacionar a Estatística às outras áreas curriculares e à vida,

pois, durante a escolha do tema do projeto, “gravidez”, mencionaram problemas

do cotidiano, como dengue, falta d’água, divisão de gastos com água nos

prédios, maus-tratos com crianças, violência;

c) ser capazes de selecionar, organizar e produzir informações relevantes e

analisá-las criticamente; um fato que ilustra bem essa capacidade é a construção

dos pôsteres pelos alunos, para a qual selecionaram, dentre as informações

sistematizadas através dos dados encontrados nos questionários, o que seria

mais relevante a ser apresentado e a forma de apresentação própria da

Estatística;

d) resolver situações-problema, o que pôde ser percebido pela forma não

convencional como organizaram inicialmente os dados encontrados nos

questionários e, posteriormente, pela sua reorganização;

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e) comunicar-se, utilizando informações quantificadas: nos diálogos estabelecidos

entre os alunos e os demais participantes na apresentação dos pôsteres, são

capazes de interagir, respondendo perguntas, ouvindo opiniões, chamando a

atenção para determinados pontos e participando de discussões;

f) mostrar-se mais seguros quanto a sua “própria capacidade de construir

conhecimento”, não só em Matemática; isso foi exteriorizado e registrado

principalmente pela aluna Rosana, enquanto “provocava” os demais professores

a dar continuidade à dinâmica de projetos na escola;

g) mostrar-se mais seguros na “exposição social” requerida na escola; este fato é

mais evidente nas gravações em vídeo, ao longo das quais percebemos

mudanças de atitude: alunos que se “escondiam” inicialmente da câmera já

eram capazes de argumentar durante as atividades desenvolvidas;

h) ser capazes de trabalhar de forma cooperativa, respeitando e aprendendo com o

colega, movimento que foi se ampliando durante o desenvolvimento do projeto e

que certamente contribuiu para que conseguíssemos realizar de maneira

satisfatória todas as etapas previstas.

Talvez isso também seja mais um indício de que é possível, sim, “letrar” e

“estatisticar” e que isso pode acontecer em uma escola pública, de periferia, com alunos

que podem superar suas próprias dificuldades; e essa possibilidade não se resume ao

conhecimento estatístico.

Tenho certeza de que esse processo não se encerrou com a finalização do

projeto, fato constatado no acompanhamento do trabalho do licenciando Gilberto, que

permaneceu com a mesma turma para a continuação de seu estágio docente como

aluno da disciplina Prática de Ensino de Matemática e Estágio Supervisionado II, no

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segundo semestre de 2007. Há, em uma de suas narrativas, indícios não só de que

nossos objetivos tinham sido alcançados com relação ao letramento estatístico - e pela

forma como o foram, permaneceram - como também do quanto essa experiência

promoveu o seu desenvolvimento profissional como professor de Matemática.

Diário de campo, 13/09/2007. Por Gilberto da Silva Liberato

Na minha cabeça como docente, que por sinal vem mudando a cada dia que passo com esses alunos, a aula foi uma surpresa. Acreditava que os estudantes teriam dificuldade para o desenvolvimento da atividade dessa semana, exigindo um tempo maior na aula, mas, pelo contrário, fizeram e no começo da segunda aula tinham todos acabado a tabela e o gráfico. No planejamento não tinha mais nada para continuar com eles naquele dia, então para meu alívio surgiu uma idéia, fiz com que eles comparassem as tabelas com as dos outros grupos. Os alunos organizaram a sala em um semicírculo e colei com fita adesiva os gráficos na lousa. Então começaram a leitura e a discussão; infelizmente não tinha um gravador de voz para registrar esse momento, pois a sala de aula se tornou num ambiente muito rico e estimulante. Os alunos perceberam nos cursos de EJA a tendência a ter alunos cada vez mais novos e que nos cursos regulares a idade do pessoal vem aumentando, devido ao alto índice de reprovação. Então esse fato iniciou praticamente uma discussão educacional, os alunos perceberam que muitos estão repetindo ou atrasando os estudos no curso regular, depois se matriculam na EJA para recuperar o tempo perdido. Nesse instante que começam os estudos no curso para adultos eles influenciam na idade dos alunos mais velhos. No momento que percebi que a discussão estava nesse ponto, e com esse alto nível de percepção, fiquei de “boca aberta”, eu jamais esperava isso dos alunos da EJA, uma discussão bem elaborada, fundamentada na própria pesquisa deles. Nesse aspecto aprendi, como professor, nunca subestimar os alunos, não que eu tivesse algum preconceito, nas por todo histórico que venho acompanhando. A fala de uma aluna também colaborou com isso, quando afirmava, dizendo que as minhas aulas e o jeito que trabalho com eles envolvem muito e eles ficam empolgados, explicando o bom desenvolvimento deles dentro do projeto de Estatística.

(grifos meus)

E os estagiários? Além do que já foi citado por Gilberto, tenho certeza de ter

contribuído para sua formação e desenvolvimento profissional, assim como eles

contribuíram com o nosso desenvolvimento, como pesquisadora e como alunos.

Novamente dou voz a eles:

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Diário de Campo, 16/10/2007. Por Gilberto da Silva Liberato

O estágio que realizei nesse ano deixou mais concretizada a minha decisão de ser professor de Matemática; como foi prazeroso o desenvolvimento e o auxílio na formação daqueles alunos/cidadãos, agora entendendo mais do que nunca toda discussão que realizamos na Disciplina EL 202 - Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1o e 2o graus: Educação e Sociedade. Não sei se pelo fato de trabalhar com a Estatística, no projeto junto com a professora Keli, com alunos de EJA, escola pública, comunidade carente ou todos esses fatores juntos. Esses foram meus primeiros alunos, tenho convicção de que dei o melhor de mim, fiz tudo que pude e terminei o estágio com a consciência de missão cumprida e ensinada.

Gostaria que o trabalho realizado com os alunos da 7.ª EJA servisse de

inspiração para novos pesquisadores e propostas para a escola básica, embora

possam restar alguns questionamentos a respeito do cotidiano da escola pública e das

dificuldades encontradas por alguns professores, ao elaborar novas estratégias e ao

cumprir seu planejamento, como: É possível, durante um ano escolar, de EJA ou não,

realizar uma proposta como a descrita nesta dissertação?

Acredito que uma proposta séria de trabalho, envolvendo a Estatística, não deve

ser vista pelo professor apenas como tarefa extra, ou seja, mais trabalho para o

professor e só mais uma atividade para o aluno, já que aprender Estatística não é

simplesmente observar gráficos e dizer “aumentou aqui” ou “diminuiu ali”. Vale destacar

também que não se trata de elaboração de uma receita pedagógica. No

questionamento sobre a viabilidade de desenvolvimento do projeto, surge também a

questão do tempo, já que a proposta desenvolvida abrangeu mais que um semestre, e

que muitas mesmo o trabalho é vinculado a material apostilado, mas vejo que é

possível, sim! Essa possibilidade se concretizará mais facilmente se a responsabilidade

não recair apenas sobre um professor, sobre o professor de Matemática. O trabalho

terá muito a ganhar se for verdadeiramente conjunto, como um desafio para toda a

comunidade escolar: com a elaboração de um planejamento comum, com a negociação

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de responsabilidades e sentidos desde a escolha do tema, caminhando para o trabalho

verdadeiramente colaborativo; sem que os professores trabalhem paralelamente, cada

um em sua disciplina, voltado apenas para interesses individuais. Depois de um

trabalho finalizado, de divulgados os resultados, a escola deve registrar o conhecimento

de forma a servir a novos estudos que serão realizados. Ela pode, dessa forma, ir

construindo sua identidade.

Para concluir, não poderia deixar de dizer que se, por um lado, houve ganhos

para a escola e para os alunos, houve ganhos grandes também para mim como

pesquisadora. Não só mediei as atividades, mas apurei o olhar para minha prática e

pude (re)significá-la através do aprofundamento da fundamentação teórica; da reflexão

com os estagiários, com os colegas dos grupos de pesquisa Prapem e GdS, com a

orientadora, com a banca de qualificação; e, principalmente, através da interação com

os alunos.

Alguns questionamentos ainda ficam, depois de todo o percurso da pesquisa:

Como seria propor as mesmas questões para outras séries do Ensino Fundamental?

Ou Médio? Como interferir no desenvolvimento profissional de professores, de modo

que eles acreditem nas possibilidades de um trabalho desse tipo e se sintam instigados

a desenvolvê-lo? Como professores de outras disciplinas podem ensinar Estatística?

Um vasto campo que ainda pode ser explorado, sem falar nas impossibilidades reais,

sejam elas crenças do professor, sejam condições que a escola oferece.

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contribuições para a prática. Campinas, SP: Komedi: Arte Escrita, 2001. p. 223-259.

TERZI, Sylvia B. A oralidade e a construção da leitura por crianças de meios iletrados.

In: KLEIMAN, Angela B. (Org). Os significados do letramento: uma nova perspectiva

sobre a prática social da escrita. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2005. p. 91-117.

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VYGOTSKY, Levi S. A formação social da mente. Tradução de José Cipolla Neto,

Luis Silveira Menna Barreto e Solange Castro Afeche. São Paulo: Martins Fontes, 1984.

WATSON, Jane. Discussion: statistical literacy before adulthood. International

Statistical Review, n. 70, 2002.

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APÊNDICE A Formulário de identificação do aluno

IDENTIFICAÇÃO DO ALUNO E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”

1- Nome:_______________________________________________________________ 2- Idade:_______ 3- Cidade onde nasceu:________________________________Estado:_____________ 4- Estado civil: ( ) casado(a) ( )solteiro(a) ( ) casado(a) não oficialmente ( ) divorciado(a) ( ) viúvo(a) 5- Número de filhos: _______ 6- Atividade remunerada? ( ) SIM ( ) ÃO

( ) Construção civil:

- pedreiro - pintor - encanador - marceneiro

( ) Comércio (caixa, atendente, vendedor) ( ) Vendedor ambulante ( ) Empregada doméstica ou babá ( ) Empregado industrial: - operário - produção ( ) Outro. Qual:_______________________

( ) Dona de casa ( ) Desempregado ( ) Trabalho comunitário

7- Parei de estudar por (anos ou meses) ___________Por quê?: ( ) Para trabalhar ( ) Porque casei ( ) Porque tive filhos ( ) Porque a escola era longe ( ) Porque a família não deixou continuar os estudos ( ) Outro motivo. Qual? ____________________ ( ) Não parei de estudar. 8- Voltei a estudar para: ( ) conseguir emprego ( ) conseguir um emprego melhor ( ) ocupar meu tempo ( ) acompanhar os filhos ( ) cumprir exigência do empregador ( ) outros:__________________

Campinas, de março de 2007.

FOTO

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APÊNDICE B

Carta de apresentação à escola

Campinas, 01 de março de 2007.

Prezado Adriano Caetano Rolindo

Senhor Diretor da E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”

Venho, por meio desta, solicitar sua autorização para realizar nessa escola o trabalho de campo da pesquisa de Mestrado em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), de Keli Cristina Conti, RA: 065371.

O trabalho intitula-se “Projetos Colaborativos entre Estagiários Licenciandos em Matemática e Professores da Escola Básica: a Estatística na Educação de Jovens e Adultos” e conta com o apoio da Secretaria Estadual de Educação, na forma de Bolsa Mestrado. Neste projeto pretendemos analisar o ensino e a aprendizagem da Estatística na Educação de Jovens e Adultos (EJA) do Segundo Segmento do Ensino Fundamental e a colaboração entre estagiários licenciandos e professores da escola básica. Contaremos com a colaboração do licenciando em Matemática Gilberto da Silva Liberato, RA: 033013, bolsista Fapesp, que atuará como auxiliar de pesquisa e estagiário.

Nosso trabalho de campo compreende as seguintes atividades:

• Entrevista de grupos, que provavelmente oferecerá dados para a realização e o direcionamento do trabalho docente e da pesquisa.

• Aplicação de questionários, para a coleta de informações, combinando perguntas abertas e perguntas fechadas.

• Entrevistas individuais, informais ou semi-estruturadas com alguns dos sujeitos, provavelmente escolhidos a partir da análise dos questionários.

• Elaboração de diário de campo, para relatar e registrar temporalmente a experiência vivida.

• Elaboração e desenvolvimento de aulas de Matemática com atividades exploratório-investigativas referentes à abordagem da Estatística.

O duplo papel do bolsista não implicará outras atividades que não as decorrentes das mencionadas anteriormente.

Vale destacar a importância da sua atuação como auxiliar de pesquisa em sua formação como professor de Matemática e para as reflexões que faremos na disciplina pela qual sou responsável e que ele estará cursando: EL 755 – Prática de Ensino em Matemática e Estágio Supervisionado.

Como contrapartida dessa colaboração, será oferecida a possibilidade de contribuir com a elaboração de materiais destinados à Educação de Jovens e Adultos (EJA).

Assumimos, orientadora, orientanda e auxiliar de pesquisa, o compromisso de manter o sigilo cabível eticamente em pesquisas dessa natureza.

Antecipadamente agradeço e coloco-me à disposição para maiores esclarecimentos pelo telefone 3788-5587 ou pelo e-mail [email protected].

Atenciosamente,

Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de Carvalho

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APÊNDICE C Termo de autorização de uso da imagem

TERMO DE AUTORIZAÇÃO

Eu, ________________________________________________________________,

RG:_______________________da E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”, na cidade de Campinas/SP, autorizo, a título

gratuito, mantido o sigilo cabível eticamente em pesquisas dessa natureza, a utilização de dados que forneci, nesta

unidade educativa, para publicação, reprodução, exposição, comunicação ao público, edição, adaptação, arranjo,

transcrição, divulgação, produção audiovisual, inclusão em base de dados, armazenamento em quaisquer meios,

digitalização e outras transformações em FOTOGRAFIAS, ENTREVISTAS, DEPOIMENTOS, GRAVAÇÕES DE

ÁUDIO E VÍDEO E MATERIAIS PRODUZIDOS pela pesquisadora Keli Cristina Conti, RA: 065371, e-mail

[email protected], telefone para contato: (19) 3788-5587, no âmbito de sua dissertação de Mestrado sobre a

Estatística na Educação de Jovens e Adultos, orientada pela Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de Carvalho, na Faculdade de

Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Declaro estar ciente de que os direitos autorais do material acima citado serão de propriedade da

pesquisadora e que ele não poderá ser reproduzido, a qualquer título, sem sua autorização prévia e por escrito.

Expresso minha concordância com relação à reutilização do material acima citado nos termos mencionados,

sendo certo que em nenhum caso a utilização ou reutilização dependerá de autorização prévia ou de remuneração.

Por estarem de acordo, as partes firmam o presente em 2 (duas) vias de igual teor.

Campinas, março de 2007.

_______________________________ _______________________________ Aluno Pesquisadora Recebi cópia do documento Keli Cristina Conti

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APÊNDICE D

Termo de autorização do uso da imagem para alunos menores de idade TERMO DE AUTORIZAÇÃO

Eu, ________________________________________________________________,

RG:_______________________, _______________________________ do

menor____________________________________________________________________da E.E. “Dr. Telêmaco

Paioli Melges”, na cidade de Campinas/SP, autorizo, a título gratuito, mantido o sigilo cabível eticamente em

pesquisas dessa natureza, a utilização de dados que forneci ou que foram fornecidos pelo menor, nesta unidade

educativa, para publicação, reprodução, exposição, comunicação ao público, edição, adaptação, arranjo, transcrição,

divulgação, produção audiovisual, inclusão em base de dados, armazenamento em quaisquer meios, digitalização e

outras transformações em FOTOGRAFIAS, ENTREVISTAS, DEPOIMENTOS, GRAVAÇÕES DE ÁUDIO E

VÍDEO E MATERIAIS PRODUZIDOS pela pesquisadora Keli Cristina Conti, RA: 065371, e-mail

[email protected], telefone para contato: (19) 3788-5587, no âmbito de sua dissertação de Mestrado sobre a

Estatística na Educação de Jovens e Adultos, orientada pela Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de Carvalho, na Faculdade de

Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Declaro estar ciente de que os direitos autorais do material acima citado serão de propriedade da

pesquisadora e que ele não poderá ser reproduzido, a qualquer título, sem sua autorização prévia e por escrito.

Expresso minha concordância com relação à reutilização do material acima citado nos termos citados, sendo

certo que em nenhum caso a utilização ou reutilização dependerá de autorização prévia ou de remuneração.

Por estarem de acordo, as partes firmam o presente em 2 (duas) vias de igual teor.

Campinas, março de 2007. _______________________________ _______________________________ Responsável Pesquisadora Recebi cópia do documento Keli Cristina Conti

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APÊNDICE E Minha história

E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges”

Campinas, 21 de março de 2007.

Minha História

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APÊNDICE F VERSÃO FINAL DO QUESTIONÁRIO

E.E. “Dr. Telêmaco Paioli Melges” Data:

Caro colega Contamos com sua colaboração! Para isso, basta responder este questionário, que faz parte de nosso projeto “CONSTRUINDO ESTATÍSTICA”, sob coordenação da Prof.ª Keli. Assumimos o compromisso de manter o sigilo e a ética cabíveis em pesquisas dessa natureza. Agradecemos a cooperação.

Alunos da 7.ª EJA e prof.ª Keli

ASSINALE APENAS UMA ALTERNATIVA

1- Idade:____anos sexo: ( ) masculino ( ) feminino Estado civil: ( ) casado(a) ( ) solteiro(a) ( ) casado(a) não oficialmente ( ) divorciado(a) ( ) viúvo(a) Atualmente, você procura orientação médica para escolher e utilizar algum método anticoncepcional com seu parceiro?

( ) Sim. ( ) Não. Vou à farmácia, pergunto ao farmacêutico e compro. ( ) Não. Compro o que minha amiga/amigo indicou. ( ) Não. Minha mãe/pai é que compra. ( ) Não. Meu namorado/namorada é que compra. ( ) Não utilizo método anticoncepcional. ( ) Ainda não iniciei minha vida sexual. ( ) Outros.

2- Idade:____anos sexo: ( ) masculino ( ) feminino GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA. O que leva uma adolescente a gerar uma vida tão cedo? Assinale a alternativa que você considera como principal causa: ( ) Falta de orientação ou informação. ( ) Dificuldade de encontrar os métodos anticoncepcionais (como camisinha, pílula, entre outros). ( ) Falta de conversa e orientação familiar. ( ) Vontade de sair da casa dos pais. ( ) Medo de perder o namorado. ( ) Vergonha de ir ao médico. ( ) Outras causas.

3- Idade:____anos sexo: ( ) masculino ( ) feminino Número de filhos: __________ Você já teve filhos? Qual parto escolheu?

( ) Não tive filhos ainda. ( ) Parto normal. ( ) Parto cesárea. ( ) Parto em casa com parteira. ( ) Parto de cócoras.

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( ) Como tive mais de um filho, escolhi mais de um tipo. ( ) Outros.

4- Idade:____anos sexo: ( ) masculino ( ) feminino Na sua opinião, qual a maior dificuldade que gestantes portadoras do HIV (Aids) encontram?

( ) Falta de informação. ( ) Medo. ( ) Rejeição das pessoas que estão próximas. ( ) Custo do tratamento. ( ) Falta de cuidados consigo mesma. ( ) Não tenho opinião formada a esse respeito. ( ) Outras dificuldades.

_________________________________________________________________________

5- Idade:____anos sexo: ( ) masculino ( ) feminino Se você tivesse problemas com infertilidade, ou seja, problemas para gerar uma criança, qual seria sua principal opção? ( ) Buscaria recursos na medicina, como inseminação artificial. ( ) Desistiria de ter filhos. ( ) Adotaria uma criança. ( ) Eu me sentiria inútil. ( ) Não tenho opinião formada sobre isso. ( ) Tentaria outras possibilidades.

6- Idade:____anos sexo: ( ) masculino ( ) feminino Quais são os tipos de aborto que você conhece? (É possível assinalar mais de uma alternativa).

( ) Aborto terapêutico ( ) Aborto retido ( ) Aborto espontâneo ( ) Aborto clandestino ( ) Aborto previsto em lei ( ) Não conheço nenhum desses.

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APÊNDICE G – “AS ORIGENS DA ESTATÍSTICA”

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APÊNDICE H – APOSTILA DE ESTATÍSTICA

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APÊNDICE I – APOSTILA DE ESTATÍSTICA – HISTOGRAMA

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APÊNDICE J

PROJETO CONSTRUINDO ESTATÍSTICA

E.E. “Dr. TELÊMACO PAIOLI MELGES” data: Nome: ___________________________________________________________________________ 7.ª EJA Já estamos finalizando o projeto e gostaria que nos contasse um pouco... Sobre o seu relacionamento com o projeto.

Sobre o seu relacionamento com os colegas, durante o projeto.

Sobre o seu relacionamento com a pesquisadora Keli, durante o projeto.

Sobre o seu relacionamento com os estagiários Alexandre e Gilberto, durante o projeto.

Muito Obrigada! Keli

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APÊNDICE K

PROJETO CONSTRUINDO ESTATÍSTICA E.E.“Dr. TELÊMACO PAIOLI MELGES” data: Nome: ___________________________________________________________________________ 7.ª EJA

No desenvolvimento do projeto...

O que eu aprendi de Estatística?

O que eu relembrei de Matemática?

O que eu aprendi de Matemática?

Obrigada! Keli

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APÊNDICE L

PROJETO CONSTRUINDO ESTATÍSTICA E.E.“Dr. TELÊMACO PAIOLI MELGES” data: Nome: ___________________________________________________________________________ 7.ª EJA

Aproveite este espaço caso queira fazer alguma sugestão ou crítica!

Que bom...

Que pena...

Que tal...?

Muito obrigada! Keli