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Joseph Pipa Artigos Digitais O SERMÃO PURITANO espiritual e claro

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O Sermão Puritano — Espiritual e Claro

Transcrição da palestra proferida pelo Pr. Joseph Pipa por ocasião do Simpósio Os Puritanos, 1994, em Recife, Pernambuco.

Dr. Joseph Pipa: Presidente do Greenville Presbyterian Theological Seminary, U.S.A, SC; Prof. de Teologia Sistemática e Histórica; BA, Belhaven College, 1968; M.Div, Reformed Theological Seminary, 1971; Ph.D., Seminário Teológico de Westminster, Filadélfia, 1985.

1ª Edição em Português – Fevereiro 2013 - Edição Digital

É permitido baixar esta publicação para uso pessoal, bem como compartilhá-la digitalmente, desde que citada a fonte com o endereçamento do link onde originalmente ela está hospedada (ospuritanos.org), sendo vedada a reprodução total ou parcial desta publicação por meio impresso, sem autorização por escrito dos editores, exceto citações em resenhas.

Editor: Manoel CanutoProjeto Gráfico da capa e miolo: Heraldo Ferreira de Almeida

Direitos de tradução e publicação em língua portuguesa reservados à Editora Os Puritanos/CLIRE. Rua São João, 473 - São José Recife-PE, Brasil. CEP 50.020-150, Fone: 81 3223-3642. www.ospuritanos.org

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SumárioCapítulo I — O Sermão Puritano 5

Capítulo II — Modelos de Pregação 9

I) Estilo simples 9

Uso de Ilustrações

II) Entrega Espiritual do Sermão 12

III) A entrega viva do sermão 18

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Capítulo I — O Sermão Puritano

Os puritanos insistiam que o sermão deveria estar cheio de demonstrações de outras partes da Escritura, de forma que fosse bíblico. A estrutura do sermão era de tal forma que o fazia lógico e fácil de memorizar. O intenso desejo destes pregadores puritanos era fazer um sermão aplicativo com o propósito de que fosse transformador. Outra preocu-pação dos puritanos era que o sermão fosse direto, claro e concreto na sua apresentação.

O estilo de pregação anglicano, na época, era muito “florido” e poético, mas não comunicava aos ouvintes, em contraste com o estilo de pregação simples e direta que os puritanos desenvolveram. O propósito deste estilo de ser-mão puritano não era ser simples como um propósito em si mesmo, mas por amor à comunicação do Evangelho. Era na realidade uma filosofia de comunicação. Era um método que os capacitava a transmitir a mensagem na língua ingle-sa (numa língua conhecida) atingindo o povo em geral.

Alguém disse: “O sermão puritano não era uma espada de brinquedo, era um instrumento agudo, penetrante e capaz de ferir a alma”. Se o propósito era atingir as pessoas com o sermão, então elas deveriam ser capazes de entendê-lo e

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lembrá-lo. Foi através do estilo simples e direto de pregar que os puritanos conseguiram isso. Era o propósito do pre-gador encontrar-se com o povo nivelando-se com ele. Uma vez que os ouvintes entendessem o sentido do texto, os pu-ritanos desejavam que eles sentissem a verdade expressa no texto. É verdade que eles usaram o método de retórica, mas nunca como um propósito em si mesmo para deixar as pessoas admiradas, mas como um veículo para comu-nicar a verdade ao coração. Quando falamos de um estilo simples e direto não devemos pensar que era um sermão sem qualquer adorno. O que contribuísse para a edificação do povo, os puritanos achavam que era útil, desde que não ultrapassasse as normas bíblicas. O que não contribuísse para edificação era considerado como vaidade e, por isso, deixado de lado.

A rejeição do estilo elaborado e florido da pregação angli-cana advinha do fato da congregação não entendê-lo. O pre-gador puritano estava disposto a usar qualquer instrumen-to lícito que servisse como um meio para alcançar o fim que tinha em vista. E este fim era que a pessoa sentisse o poder e a realidade daquilo que o pregador falava. Por isso os pre-gadores puritanos usavam ilustrações da vida cotidiana, da natureza, da vida na fazenda, no lar, na loja e contavam até estórias populares, provérbios e ditos do povo do campo.

William Perkins, que foi o principal arquiteto deste méto-do chamado de “novo método reformado de pregação”, foi também responsável e usado por Deus para que este estilo fosse adaptado e usado pelos demais pregadores puritanos. O seu livro “A Arte de Profetizar” tinha duas seções prin-cipais: (a) a preparação do sermão e (b) a proclamação do

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sermão. Na seção de proclamação ele coloca os princípios de uma pregação simples e direta.

Vejamos de forma breve o que Perkins diz: “Nós mante-mos que na proclamação do sermão o pregador deve dei-xar de lado a sabedoria humana e pregar em demonstração do Espírito”. Diz ainda que a sabedoria humana deve estar oculta dentro do conteúdo do sermão e na sua entrega. Dizia isto porque “a pregação da Palavra é o testemunho de Deus e a confissão do conhecimento de Cristo e não da habilidade humana”. Dizia ainda: “Os ouvintes não deveriam ter uma fé dependente da habilidade humana, e, sim, do poder da Palavra de Deus”. Com a expressão “demonstração do Es-pírito” Perkins se refere à congregação que está julgando a manifestação do Espírito através das palavras do pregador. Então, a pregação tem de ser espiritual e cheia da graça.

A exposição espiritual é marcada por palavras que são simples e claras de tal forma que elas expressam a majes-tade do Espírito Santo. Para ser entendida pelo povo a pre-gação deve ser simples. Perkins se opunha a citações longas do latim e grego no sermão. William Perkins era contra o contar estórias ridículas e pueris. A pregação que é cheia da graça se manifesta quando a graça do coração se torna evidente no sermão. O sermão cheio da graça de Deus in-clui: (1) a graça que vem de uma vida santa e (2) a graça do ministério. A graça de uma pessoa é a santidade do seu coração e uma vida que não pode ser questionada. Mesmo que isso não seja o que faz um pastor, na realidade é algo muito necessário.

A graça do ministério inclui três coisas:

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(1) capacidade de ensinar; (2) autoridade para ensinar e (3) zelo no ensinar.

Perkins diz que na entrega do sermão a demonstração do Espírito se manifesta no uso da voz e do corpo. A voz tem de ser alta o suficiente para ser ouvida por todos; moderada quando se está entregando a doutrina; mais fervente e vee-mente quando no momento da exortação. Deve haver sem-pre seriedade nos gestos corporais. O pregador não deve se fazer de palhaço ou de tolo no púlpito. A melhor maneira de se aprender a pregar desta forma, diz Perkins, é observar modelos de pregação.

Podemos ver estas coisas de forma simples para que os pregadores apliquem em seus sermões:

1) Estilo simples.

2) Entrega espiritual.

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Capítulo II — Modelos de Pregação

I) Estilo simples1) Devemos ocultar a sabedoria humana. O pro-

pósito do nosso sermão não é mostrar a todos nossa ha-bilidade intelectual, e não devemos trazer tudo aquilo que estudamos no gabinete para o púlpito. Temos que estudar a Palavra de Deus cuidadosamente, mas devemos apresen-tar um sermão que reflita a verdade de Deus e não todas as descobertas que fizemos ao usar as “ferramentas” do escri-tório. Raramente deveríamos introduzir uma palavra gre-ga ou hebraica no sermão. O sermão também não deveria estar cheio de citações dos livros que lemos. Deveríamos evitar discussões teológicas abstratas. Com tudo isso estou me referindo a ocultar a sabedoria humana no conteúdo da pregação.

2) Devemos ocultar a sabedoria humana na en-trega do sermão. Isto afeta em primeiro lugar o nosso vocabulário. Assim como o sermão não deve ser uma de-monstração da erudição do pregador, igualmente suas pa-lavras, seu vocabulário, não devem ser uma demonstração do quanto é erudito. O pregador deve pregar com um es-tilo “crucificado”; deve se adaptar ao vocabulário de seus ouvintes. Deve usar palavras simples e básicas. O pregador não deve desejar que as pessoas saiam da igreja admira-

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das do quanto ele é sábio e erudito, mas que saiam só com uma coisa em mente: Quão maravilhoso é o nosso Deus! Portanto, devemos usar um vocabulário simples e claro que seja compreensível até pelas crianças. Isso de nenhuma for-ma vai perturbar aqueles que são intelectuais e eruditos e que estão na nossa audiência porque, se uma criança pode entender, então, todos podem entender. Aqueles que estão sedentos da justiça e de ouvir a Palavra de Deus não se im-portarão com um estilo simples e “crucificado”.

3) Linguagem Concreta. Devemos seguir aqui o exemplo dos puritanos. Nosso sermão poderia estar cheio de símbolos e metáforas extraídos do lugar de traba-lho, da fazenda, do mar, do lar, de tal forma que possa haver uma empatia entre o que o pastor está falando e o povo. Desta forma ele se relaciona com a verdade de Deus que está sendo ministrada. A figura de linguagem que Henry Smith usou para se referir a uma congregação que precisa de um pastor foi esta: “É preferível ter um corpo sem alma do que uma igreja sem pregador”. Este é um contraste que comunica até mesmo nos dias de hoje. Ele continua falando da figura do pastor e o chama de uma lâmpada, uma coluna de fogo, a galinha que chama os seus pintinhos, as trom-betas que derrubaram as muralhas de Jericó. É isto que eu quero dizer com imagem concreta, metáforas e símiles.

Uso de Ilustrações Se nós estivermos ocultando a nossa sabedoria humana,

nossas ilustrações haverão de ser simples. Se uma pessoa sai do sermão e lembra da ilustração, mas não lembra do ponto que a ilustração mostrava, então, esta ilustração fa-lhou. Perkins diz a respeito do uso de ilustrações: O pre-

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gador deveria usar figuras e ilustrações que fossem opor-tunas, mas que fossem apropriadas e com um uso mínimo destas estórias e ilustrações. Também encontramos conse-lhos muito bons no Diretório de Culto de Westminster que é muito usada pela Igreja Livre da Escócia. Nele lemos: “As ilustrações de qualquer tipo devem ser cheias de luz, de tal forma que possa levar a verdade aos corações dos ouvintes com deleite espiritual”. Portanto, percebamos que o propó-sito das ilustrações não é entreter o povo, nem “esquentar” a audiência ou distraí-la, fazendo as pessoas rirem. Mas é ajudar o povo a compreender a verdade, sentir a verdade e lembrar da verdade. Dessa forma, as ilustrações deveriam provir das experiências do dia-a-dia; não simplesmente provir das leituras do pregador, com citações fantasiosas da literatura clássica. Elas deveriam ser tiradas dos jornais, do mercado, da televisão, da natureza, da vida familiar. Toda verdade de Deus pode ser ilustrada pelas coisas que estão ao nosso redor. Quando usamos ilustrações deste tipo as pessoas saem da igreja e, por exemplo, ao verem uma árvo-re podem lembrar de uma ilustração que foi feita e daquela verdade que ilustramos.

Não há lugar no sermão para narrativas longas. Não te-mos tempo para contar a vida das pessoas. Estamos tratan-do com a verdade preciosa da Palavra de Deus. Podemos usar uma ilustração, mas não histórias longas.

Portanto, existem três aspectos na pregação referentes a “ocultar” a sabedoria humana:

1. Vocabulário simples.2. Usos de ilustrações concretas da vida diária.3. Uso de ilustrações simples.

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Isso não quer dizer que o pregador deva excluir o uso da retórica e outros instrumentos. O puritano Perkins diz que este estilo simples não é para promover a preguiça e a ociosidade entre os pastores. Deus exige um alto padrão na preparação de um sermão. Aquele que vai pregar o Evange-lho deve se preparar diligentemente; tanto quanto possível deveria ser um homem de cultura vasta, uma pessoa que ler bastante; um conhecedor de literatura filosófica e histórica. É muito importante que conheça o grego e o hebraico e que deles faça uso. Mas não precisa demonstrar, no sermão, que sabe de tudo isso. Estas são suas ferramentas. As donas de casa quando estão na cozinha se armam de vários utensílios para cozinhar. Mas quando servem a comida não trazem para a mesa a faca de cortar ou a tábua de amassar carne e os temperos que utilizaram. Ao contrário, já trazem a re-feição pronta, com bom aspecto e gostosa — não precisam trazer todo seu aparato técnico da cozinha para a mesa de jantar. É isto que não podemos fazer como pregadores.

Além disso, para que um sermão não seja cheio de osten-tação no seu conteúdo, ele tem de ser muito bem preparado. Diante de Deus, antes que o pregador exponha um texto da Escritura, deve conhecê-lo profundamente. Deve construir o seu sermão cuidadosamente. Na realidade leva-se muito mais tempo em preparação para se conseguir um sermão simples. Aquele pastor que prepara um sermão às pressas, torna-se técnico, seco, porque não tirou tempo suficiente para destilar e cozer aquela verdade até que saísse algo que, de fato, fosse vida para a congregação.

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II) Entrega Espiritual do Sermão 1) O sermão deve ser um falar cheio da graça.

Perkins sempre se refere ao modo de se falar que é cheio da graça. Ele se refere ao que está por trás das palavras que são ditas: A graça da vida, a graça do ministério (a graça de Deus). Não há nenhum poder na pregação se não hou-ver santidade na vida do pregador! Há necessidade de que o pastor cuide de seu próprio coração e expulse todos os maus desejos, todas as paixões e as inclinações munda-nas. Mantenha de pé a vida de fé, de amor e de zelo. Gaste muito tempo em casa especialmente com Deus. O pastor deveria desenvolver “dores especiais” com seu coração. Ou seja, neste esforço de estar perto de Deus ele deveria de-senvolver este sofrimento antes de falar à congregação. Se o pregador for frio, como poderá esquentar os corações dos ouvintes? É exatamente isto que Perkins queria dizer a res-peito do sermão que, para ser espiritual, deveria vir da gra-ça da vida. Ele enumera uma série de razões pelas quais os pastores devem procurar a santidade. Desde que a doutrina bíblica é difícil de entender e praticar, o ministro deve ofe-recer um exemplo à congregação. Somente o piedoso pode compreender o sentido íntimo da Escritura à medida que ele experimenta a Palavra em seu coração. Deus detesta a combinação de um discurso piedoso com uma vida onde a piedade está ausente. Um ministro em pecado não é digno de ficar em pé diante de Deus.

William Perkins fala de algumas coisas em relação à gra-ça da vida:

1. Uma boa consciência. Isto significa manter sua vida sempre “atualizada” diante de Deus e dos homens, ou seja, prestar contas a Deus dos seus pecados durante

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todos os dias da sua vida. Não deve pecar de forma deli-berada e nem permanecer na prática do pecado. Se cair em pecado deve odiá-lo, lamentá-lo e clamar a Deus que o liberte, e confessar o pecado àqueles contra quem pe-cou. Assim, você mantém uma vida piedosa e sem isso não haverá pregação piedosa. Muitos pregadores estão brincando com Deus em suas congregações, pois suas vidas estão manchadas com práticas pecaminosas. Po-dem até ser pensamentos e fantasias mentais, ou, quem sabe, não estejam se relacionando com suas esposas da forma escriturística, nem tratando biblicamente suas crianças. Talvez não estejam sendo fiéis com suas dívi-das. Deus não abençoará a pregação de um homem que não seja piedoso. Ele deve manter uma boa consciência.

2. Deve sentir bem a doutrina que vai pregar. Deve sentir, amar a verdade e se deleitar nela. A verdade precisa consumir o pregador e o fogo do seu coração deve estar aceso antes que o coração do seu povo se torne em chamas. Isso é verdade em relação à aplicação. Quando o pregador vai fazer a aplicação deve começar consigo mes-mo. Deve, antes, aplicar a Palavra a seu próprio coração. Deve ser quebrantado e, então, confortado. Desta forma terá uma ousadia que não vem de sua justiça própria, mas de Deus, para aplicar as verdades aos ouvintes. Se sua cons-ciência lhe proíbe aplicar a Palavra aos seus ouvintes, há pelo menos duas coisas erradas: (1) Ou não está vivendo fielmente diante de Deus, ou (2) está permitindo que o dia-bo o desencoraje. Deve manter a consciência limpa, pregar a si mesmo e ao seu povo.

3) Deve ter o temor de Deus. O pastor deve reve-renciar, amar e confiar em Deus. Deve temer desagradar

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a Deus; deve desejar a glória de Deus acima de todas as coisas. Junto com o temor de Deus vem o amor ao povo. Se a congregação sabe que o pastor a ama, ela o ouvirá. O pastor não deve vir como alguém que vai bater na cabeça do rebanho, mas como alguém que vai ajudá-lo na Palavra de Deus.

4. A vida do pastor deve ser marcada pela so-briedade e constância. A vida do pastor deve ser mar-cada pela perseverança, consistência, sobriedade e tempe-rança. Ou seja, que pode desfrutar de todas as coisas, mas não deixar-se dominar por nenhuma delas. Isso se aplica às finanças, ao lazer, e sua moderação quanto ao comer e beber. Fazer tudo isso com moderação. Esse é um grande desafio com referência à entrega espiritual do sermão, por-que a entrega espiritual do sermão deve proceder da graça de Deus na vida.

Mas deve haver, além desta graça, alguns dons relacio-nados com o ministério e por isso Perkins fala da graça do ministério que inclui três coisas:

a) Habilidade em ensinar; habilidade intelectual de en-tender e analisar a Palavra de Deus e preparar um sermão de forma clara e estruturada; pregar um sermão que seja bem compreensivo e acessível à congregação.

b) Ter uma autoridade que venha da consciência que tem do seu ofício. O pregador deve ter a consciência de que Cristo colocou “Suas mãos” sobre ele e o comissionou como seu arauto. Dessa forma o pastor não vai ao púlpito com dúvidas, de forma tímida e sem convicção; o pastor não está de pé neste lugar por ele mesmo, mas como embaixador de

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Cristo. Sua autoridade vem desta Palavra. O pastor diz: “As-sim diz o Senhor”.

c) Ter zelo na pregação. À medida que a verdade toma conta do pregador ele transmite fervor à congregação.

Portanto, a entrega espiritual do sermão deve ser através de uma forma graciosa, cheia da graça da vida e com a graça do ministério (comissionado).

2) Um falar espiritual. Isto significa que o pastor deve falar na dependência do Espírito Santo. A pregação espiritual se manifesta quando a congregação pode obser-var a manifestação do Espírito nas palavras e nos gestos do pregador. Perkins baseia esta afirmação em I Co 2:4 – “A minha palavra e a minha pregação não consistiram em linguagem persuasiva de sabedoria, mas em demonstra-ção do Espírito e de poder”. Palavras simples e claras são aquelas que expressam da melhor forma possível a majes-tade do Espírito.

A presença do Espírito “carrega” aquelas palavras como uma corrente elétrica e uma “transação” espiritual ocorre. Os ouvintes percebem que é o próprio Espírito de Cristo fa-lando através da pregação. Isto é chamado de “unção”. Esta unção é dupla na sua ação. (1) O derramar do Espírito sobre o pastor e (2) sobre congregação de tal forma que percebem que aquela autoridade é espiritual. Existe esse relaciona-mento entre o pregador e sua audiência quando ele é repen-tinamente “tomado” com liberdade e percepção aplicando a mensagem ao coração da congregação de forma penetrante. É como se ele tomasse a congregação e a carregasse consi-go, como se ambos fossem levados pelas “asas” do Espíri-

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to Santo. É difícil definir esta experiência e só sentindo-a, poder-se-á compreender melhor.

O pregador deve fazer alguma coisa para receber esta “unção”.

1) Devemos orar. Mais uma vez citamos Baxter: “Toda nossa obra deve ser desenvolvida debaixo do senso de nossa insuficiência e da nossa total dependência de Cristo. Deve-mos ir a Cristo em busca de luz, vida e força para que nos envie ao trabalho. Nosso trabalho deve ser levado adian-te, tanto pela pregação, quanto pela oração. Ninguém pode pregar com o coração ao seu povo se não orar fervorosa-mente por ele. Se não prevalecermos com Deus para con-ceder ao nosso povo fé e arrependimento, jamais prevale-ceremos em nossa congregação para que o ouvinte se arre-penda e creia”. A oração é absolutamente essencial para se ter uma pregação espiritual. Os pastores devem ser consa-grados, comprometidos e devotados à oração. Devem orar semanalmente por todas as pessoas da sua congregação — homens, mulheres e crianças. Orar pelos visitantes e por aquelas pessoas da congregação que não são convertidas. Esforçar-se na oração e instar com Deus para que Ele venha sobre a igreja. Deve orar diariamente sobre a preparação do seu sermão para que Deus lhe dê a mensagem, sua pregação e aplicação. Deve colocar sua mensagem diante de Deus e orar para que Ele desça sobre o povo. Mas este ministério da oração é também para cada um dos membros da igreja. Os presbíteros deveriam estar orando por todas as pessoas da comunidade e cada um deveria estar orando para que Deus abençoasse seu pastor à medida que ele se prepara para pregar e que Deus lhes dê a mensagem que precisam.

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Devem orar para que Deus abençoe a entrega do sermão. Somente através da nossa oração o Espírito deverá descer sobre a congregação.

2) O segundo princípio para o pastor envolvido na busca da unção é não confiar na sua própria preparação. Acredito que aqui muitos pastores reforma-dos falham. Porque levam o estudo a sério, pensam que, ao terminarem o sermão, não vão precisar de mais nada. O pastor pode ir ao púlpito confiando em seus estudos, mas o estudo é apenas uma parte. O sermão não está completo até que seja pregado e o sermão vai sendo transformado à medida que for sendo pregado, à medida que o Espírito vem sobre o pastor e se move nele. Portanto, o pastor não deve confiar na sua preparação apenas. Perkins insistia que não se deveria usar métodos para memorizar os sermões, mas o pastor deveria estruturar cuidadosamente o sermão. Ele tem de ser lógico, seu esboço deve ser conhecido e ir ao púl-pito sem a preocupação com cada palavrinha que irá falar, mas confiar que o Espírito Santo irá trazer as palavras do fundo do coração. As palavras virão se o coração do prega-dor estiver queimando com a verdade daquela mensagem. Se fizer isso, o Espírito de Deus haverá de descer. Isso nos leva a um próximo aspecto da pregação espiritual.

Já vimos sobre a entrega graciosa do sermão, a pregação espiritual, mas agora veremos sobre uma entrega viva.

III) A entrega viva do sermão Perkins sempre dava conselhos a respeito da voz do pre-

gador, isto é, que seja num volume alto para ser escutado por todos, moderado quando estivesse entregando a dou-trina, porém fervente e veemente quando estivesse fazendo

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a exortação. Deveria haver um fogo cheio de zelo na mensa-gem. Mais uma citação de Baxter:

“Ó amigos, como deveríamos entregar a mensagem de forma direta e zelosa neste momento tão sério em que vivemos. Em nome de Deus, irmãos, laborem para despertar seus próprios corações antes de irem ao púl-pito e assim serem capazes de despertar os corações dos pecadores. Lembrem-se, eles serão despertados ou condenados. Um pregador sonolento dificilmente irá despertar pecadores que também estão sonolentos. Apesar de valorizar as coisas santas de Deus, se as valo-rizar de forma fria irá desfazer, com sua atitude, aqui-lo que está dizendo com suas palavras. Só aqui e ali, mesmo entre bons pastores, encontramos um que tem uma forma de pregar fervorosa, persuasiva e poderosa, fazendo com que o povo sinta a sua pregação quando o escuta. Embora não esteja dizendo que têm de pregar com voz muito alta, pois isto lança dúvidas sobre seu fervor, mas veja que deve ter uma seriedade constante. E quando for necessário, especialmente na aplicação, levante sua voz e não poupe seu fervor. Fale à sua con-gregação como pessoas que têm de ser despertadas ou aqui ou no inferno. Olhe para eles com o olho da fé e da compaixão e medite no estado de bênção ou de tormen-to, onde cada um irá permanecer para sempre. Creio que isso o fará fervoroso e derreterá o seu coração com uma idéia do que seja a condição de seus ouvintes. Ó, nunca fale uma palavra fria ou descuidada a respeito deste assunto tão grandioso que é o céu ou inferno”.

Em suma, o sermão deve ser simples no estilo e espiritual na entrega. Assim, pois, Deus conceda a cada pastor o tra-balhar através do seu vocabulário, sua linguagem, os usos e

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ilustrações e por uma vida santa; pelos dons e pela depen-dência do Espírito Santo de Deus. Que preguem a Palavra de Deus com fervor, entusiasmo e fogo.

Concluímos com três citações de três grandes puritanos:

“Eu preguei aquilo que senti; na realidade eu me senti como aquele que foi mandado para alguém de entre os mortos; fui pregar em correntes àqueles que estavam acorrentados, e carregava em minha própria consciên-cia aquele fogo do qual estava persuadido que eles se alertassem” — John Bunyan

“Eu preguei como se nunca tivesse certeza de que pre-garia uma outra vez; como moribundo a moribundos”. — Richard Baxter

“Pregação, portanto, não pode ser morta, mas viva e eficaz, de tal forma que se um descrente entrasse na congregação seria afetado e transformado pelo simples ouvir a Palavra, para que pudesse dar glória a Deus.” — William Ames

Amém!

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Edição Digital – ospuritanos.orgFacebook/ospuritanos.org

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Os puritanos insistiam que o sermão deveria estar cheio de demonstrações de outras partes da Escritura, de forma que fosse bíblico. A estrutura do sermão era de tal forma que o fazia lógico e fácil de memorizar. O intenso desejo destes pregadores puritanos era fazer um sermão aplicativo com o propósito de que fosse transformador. Outra preocupação dos puritanos era que o sermão fosse direto, claro e concreto na sua apresentação.

O estilo de pregação anglicano, na época, era muito "florido" e poético, mas não comunicava aos ouvintes, em contraste com o estilo de pregação simples e direta que os puritanos desen-volveram. O propósito deste estilo de sermão puritano não era ser simples como um propósito em si mesmo, mas por amor à comunicação do Evangelho. Era na realidade uma filosofia de comunicação. Era um método que os capacitava a transmitir a mensagem na língua inglesa (numa língua conhecida) atingindo o povo em geral.

O Dr. Joseph Pipa é o Presidente do Greenville Presbyterian Theological Seminary; Prof. de Teologia Sistemática e Histórica; BA, Belhaven College, 1968; M.Div, Reformed Theological Seminary, 1971; Ph.D., Seminário Teológico de Westminster, Filadélfia, 1985.

Autor de vários livros, entre eles: Raízes e Ramos; William Perkins e o Desenvolvimento da Pregação Puritana; O Dia do Senhor; A Confissão de Fé Westminster: Um Guia de Estudo para as Igrejas; Gálatas: Proclamação da Liberdade de Deus.