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O Teatro de Ousadias 1

O Teatro de Ousadias · sorriso sincero, os olhos sempre revelam a verdade seja ela nua, crua, doce ou amargue a boca, fel os olhos derrubam os véus, lagrimas, suam amores assinam

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O Teatro de Ousadias

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O Teatro de Ousadias

O Teatro de Ousadias

Por Marcelo Moro

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O Teatro de Ousadias

O Teatro de Ousadias Todos os direitos reservados © 2010Marcelo Morowww.marcelomoro.comwww.twitter.com/marcelo_moro

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O Teatro de Ousadias

Prólogo

Olhou, puxou a linha e a velas se ergueram, fez um belo arremate com o que sobrou do cordão enrolando-o a boca da garrafa, uma ultima conferida e pronto, pôde colocar a rolha, erguer e contemplar o belo galeão dentro do vasilhame de um vinho barato. Batizou–o de Colombo. Aquele seu hobby de construir navios dentro de garrafas era antigo e aprimorava-se a cada dia. Colombo ficara divino, uma verdadeira obra de arte, ele colocou-o no móvel antigo da copa de modo que a proa ficasse voltada para o Norte, onde uma enorme porta de vidro revelava o mar azul que dourado ia ficando ao cair da tarde.

Navegar, essa era a função de Colombo, preso dentro da garrafa, mas ainda assim livre para ganhar os mares da imaginação, mares místicos, onde sereias cantam para poetas, que perdidos, desorientados, deixam a deriva seus versos.

Ele era mais que poeta era visionário, surrealista, um “non sense” contemporâneo, uma vida dividida em atos de um teatro de ousadias.

Senhoras e Senhores, Bem vindos ao Teatro de Ousadias.

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Futuro do Pretérito

...naqueles dias, sentado em cima das horas ele esperava o dia em que a luz se faria trevas e a auréola que restasse do sol nesse dia, seria signo de esperança, esperança sem ambição, vida sem talvez, mundo cão, amor a quem não mereceu um fio de cabelo, uma gota de suor, mas a clareza viria e com ela a ousadia...ele construíra um barco para navegar pelas visões para transpor desertos e mares.

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O Eclipse

O cheiro forte do mar, nos becos imundos do cais A lua, estrelas cadentes, fogueiras Histórias que ao ar se lançam nas trevas de horizontes perdidos

Amores rogados ao tempo por Deus nunca me senti tão só Amores jogados ao vento Como dados rolados ao pó

Ao meu redor só algumas gaivotas como o amor consome o corpo e o torpor dói mais que o tempo a sombra da saudade me cobre sou cinza ao vento espírito em eclipse minha carne padece sou cinza ao vento

Só o sol vencerá a noite e depois de curvará diante dela só os sonhos te trazem até mim com um estranho suor chego ao fim mas não é só isso a sombra da saudade me cobre corpos queimados no chão e chove depois do eclipse

como o amor consome a mente corpos queimados no chão e chove eternamente

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Pedaços de Vidro

Há milhões de sóis e um só olhar Atrevido, atravancado, voraz Latente brilho que do nada se faz algo raro Belíssimos vitrais Sua sombra se projeta opaca Contrastes, carnavais

Da Areia temperada em fogo insaciável Elemento belo de tão alta pureza Se moldado fino, sutileza, cristal Se feito forte, inquebrável, dureza Vidraças, litros, garrafas Navegantes do tempo, ancestral

Se mãos errantes trucidam, moem Dentro do vinho tira a vida Fatiam as entranhas, e que sangrem Os piores pesadelos de um homem A dor de ser moído pelo belo Envolvido por espinhos que de dentro volvem

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Cegueira da visão

Cego é o que tenta ver com os olhossejam seus , meus, claros, castanhos, sejam fundos, profundos, belos, estrábicosos olhos são portas pra almasempre abertas, estreitas, escancaradas, mostram que sabe que sou teuque te desejo e mostra que me desejagosto de olhar nos olhos quando falaquando treme, quando encara o desafioquando ama em segredo, quando sente medoquando grita, qualquer grito, de dor, de prazer, de amorgosto de olhar o sorriso dos olhossorriso sincero, os olhos sempre revelam a verdadeseja ela nua, crua, doce ou amargue a boca, felos olhos derrubam os véus, lagrimas, suam amoresassinam sentenças e vêem as coresseus olhos são belos, não dizeseles mesmos falam que são belos pra mime eu fico assim, fixo a esconder meus olhosa tapar a emoção com a peneiraseus olhos me tiram o juízo quando me fitamacabam que me atrai, que me cala, mas me falae me faz falar sou amante desses olhos

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Futuro do Pretérito

Um amigo me disse, cego! Não vês o corte da faca Vês menos a fronteira da razão Respondo, amigo O que pingo nos olhos são gotas azuis Um colírio além da imaginação Uma tinta de tempero surreal

Se assim fosse, cego O toque me bastaria Quem toca igual perfume virtual Perde-se E de nada valeria manter-se são Vê-se no espelho um igual Porque se conhece

Gotas, tintas, perfumes Nuances que descrevem Quem sabe a cor do seu vestido Escrevem Transmutações de sentidos Me perco no que acho Das ondulações dos seus cabelos Filósofa da razão

Quem se importa Se me chamam cego Importa –me mais o que pensas No meio da noite Suposições e crenças Deitada nua ao meu lado e sem desejo

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Isso me faz de fato cego

Mas se apenas uma centelha Uma que seja brilhe Entre uma gota de vinho e outra Entre uma gota que escorre Marota por entre as curvas do decote Olhar que se fixa e morre Meus olhos se abrem, me torno vivo

Mas enquanto tudo é cinza Sopro a brasa e espero Faço de conta que acredito Na voz côncava do amigo Que me chama de cego Mas me escondo no convexo De ser um incorrigível.

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Os surrealistas

... se lançando ao mar depois do eclipse, ele leva molduras na mente, e pena, e papiro, papel e caneta, escrever como em antigos tempos, à luz de velas, escrever pra criar imagens, quadros vivos que vão se moldando sujeitos a interpretações livres de outros olhos, de outras cabeças, quadros senhores de outra situações, óleo sobre tela...

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Primeiro Surrealista

Há um conjunto que imagino agora e queria Van Gogh aqui para pintar quem sabe Dali daqui eu vejo minha mesa habitada por largos quadris doces amarras um par de coxas feito toras de madeira de lei os pés sobre os braços da cadeira dando o angulo exato que se imagina

Me fascina, me alucina tão belo desenho De tão louco desejo não fosse o cotton dessa poética peça minha imaginação travaria mas ela delineia o que antes imaginava outro mapa traço rotas a carvão e giz a saliva e mel sem bússola sem rei entre as mãos e o fruto que se derrama apenas a lei imposta por seus olhos de castanho em preto se pintando pela indiscrição das minhas linhas

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Segundo Surrealista

Desse covil de ardentes pensamentos Vivendo intensamente de revista e café Um blues qualquer, quem sabe um jazz Me inspira a escrever à mão À luz de velas como no passado Em outros devaneios que se vão Que se foram

E você musa distinta? Que não vem, que se atrasa na escuridão Que eu inventei desse dia de sol Que se aparecesse eu correria Pra me esconder em um castelo de cartas marcadas A vigiar pelas ameias da canastra De espadas, de ouro, qualquer Vigiar As brilhantes madeixas de uma cor impublicável Pois não seria pudico nem prudente Ao poeta descrever sua musa Coloca-la a nu Como a coloca em fantasias, teso e duro

Se ao revelar-me sondando teus passos E me indagares Responderei –te em ato porque as palavras falham e se vingam do seu autor prosperando, de boca em boca distorcendo, mudando

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queria te falar mais da poeira do chão ao pó das estrelas mas no simples se encontra a paixão e o resto é só teoria te ter comigo um dia qualquer é muito mais que valeria todos os livros que jazem sepultados nas estantes que ao tocados não se excitam nem se arrepiam tocar –te com palavras ainda não me é proibido

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Terceiro Surrealista

Um movimento Uma espera A frase não se completa Se transforma em solidão A palavra no ar Como ao ar se lançam mãos

Travessas e becos mal iluminados O mar de Camões Pra quem não conhece o mar Se jogar uma luz, fica óbvio Se deixar sombrio, viram sermões Dúvidas, dívidas da razão

Senhores escravos Que a certeza corrompe, calai! Deixai que falem as lacunas Amigas eternas de quem sabe o mar De quem ouve as dunas De quem se orienta pelas estrelas

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Quarto Surrealista

Das mãos esquálidas que tocam a pedra nua entalhada Brotam chamas azuis que em laranja se tornam Focam-se pares de olhos sobre a batalha de cavalos Se distraem, e a mente se esquece das perigosas diagonais Esperança tornada em jamais, em torrentes de perdas Muros que se interpõem caem Lábios que se propõem, beijam Ah! Como gostaria que não houvesse medo Nem tampouco pudor nesse segredo Viagem das mãos, jovens capitães.

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Quinto Surrealista

Mesmo se tentasse, por todos os seus erros Precisar a duração dessa noite De nada adiantaria Porque os caminhos dos ponteiros continuaram os mesmos Foi só a alma quem parou Desorganizada teoria

E se assim pelos poros vertessem perfumes Nessa noite seriam os venenos o que destilariam Os mais perigosos, coloridos e mortais Inocentes olhadas no espelho Por cima dos ombros tanto faz Se a noite jaz ou se jaz o dia

Se tentasse entender, a loucura te tomaria E ganharia as ruas como eu ganhei Não para desafiar os joelhos Cegos, surdos e pagãos Mas para olhar a lua sem dores E as coisas voltariam para onde estão

Seis, sete, oito da manhã As bancas vendem manchetes Crimes e novas vedetes Capitalismo sem juízo, Me junto ao bando que da lua nada sabe Sabem apenas das horas

Iluministas e iluminados Bêbados e equilibristas

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Todo mundo voltando para casa De onde eu não deveria ter saído E onde os ponteiros me oprimiam Mesmo com a lua tão bela na sacada da sala

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Sexto Surrealista

O olhar pra uma janela, na diagonal do tempoo vento veloz , azul pensamento atrozSei que tuas mãos manejam o fogo Sei que o tom triste desse sorriso esconde desejosEnigma pra onde corro quando sofroDecifrar-te seria querer-te Sabiam meus olhos quando fizeram contatoMesmo assim arriscado e feliz Deixei - te passear entre as minhas flores Desorganizados girassóis, óleo sobre telaImaginar cheiros e gestos torna-se doutrina dos versosSer livre para dançar em torno da fogueira, acasoOs vales e campos são seus olhando da escarpaSeus olhos são os que varrem a solidez da tardePrecipitando a noite surreal Onde estrelas e velhos marinheiros se amam Onde poetas e sorrisos ocultos se encontram Mesmo que seja no recôndito remoto da almaMesmo que sejam nas paginas de um livroMesmo que sejam em pedaços pequenos de vidro

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Sétimo Surrealista

Te dispo Te visto, de seda cinza chumbo Solto seus cabelos, dou a volta ao mundo Olho a bússola imprecisa Aureolas rosas escondidas , rosa dos ventos

Prazer infinito, Dona de um sorriso bonito e dourado Não sei se te devoro Ou se te dou um carinho delicado Algo entre a criança e o voraz

Tudo que me pede, farei Escravo sob suas leis Senhor do teu juízo Algo impreciso, puro tesão Mãos que devoram mãos

Não me faltes Em manhãs ou noites Coloridas ou cinzentas Não me falte nunca Pura, abusada, liberada, ciumenta

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Oitavo Surrealista

Dentro dos olhos nus, não é mais abstração Dentro do corpo nu, império dos sentidos flui pelo sangue, visão rosas vermelhas que vi essa manhã numa banca qualquer, cor de fogo fogo paixão, óleo sobre tela

Não é mais uma brincadeira de papel e lápis é amor de verdade em essência, em pétalas e caule amor vivo que dissipa ardores amor vivo que revive amores luzes e cores novas toda manhã

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Nono Surrealista

Como poeta posso ser Dono das linhas, do lápis, das minhas imaginações Como profeta adivinhar-te o futuro E colocar num muro surdo suas previsões Como visionário te ver exuberante Num vestido azul turquesa

Ocorre agora que sou homem E quero ser o corpo que você acha gostoso O rosto que você acha bonito O espelho, o orgasmo, o novelo O livro que você lê e escreve nas suas paginas O vento que esvoaça e bagunça seu cabelo

Ser a noite em que se perde A musica que você dança, e canta e sua A brisa que toca seu corpo nu Nas manhãs em que esquece aberta a janela Estar perto se chora, se deseja, se espera Ser o invisível aos olhos, ser o que se sente

Seu filme, seu perfume, seu pecado Seu crime sem castigo, inconfessável O macho, o doce, o anjo, o torto Sua vida em vitral, o cais do porto Seu céu , astral, a estrela que te guia Seu signo, destino, família, tudo , par

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O Teatro de Ousadias

Décimo Surrealista

Quero provar da tua língua a saliva, me leva, Ver-te fruto proibido, e tocar-te o proibido fruto, Com golpes de língua sem veneno, não cabe ao veneno função. Sentir então teu gosto, apurar, perceber todas as essências, Dizer-te bobagens, abrigar-te nos braços, Deixar-te vermelha e tesa, empinar-te os seios como quem beija a lua, Sugar-te, lamber-te, deixar-te nua, E quando em fim dobrada em gozo gritas, Amparar-te sábio, homem, macho; E entrar em ti como quem entra em casa Como quem tem a chave Mágica, sensual, brasa.

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O Teatro de Ousadias

Décimo Primeiro Surrealista

O mar prata sob a lua,A garota na praia, estrela nua, O desejo sobre as pedras, Dedos, línguas, toque do fogo,O novo, o gozo, as pernas tremulas,Derrete-se, esquece tudo que gira ao redor,A cabeça gira, pomba gira doida, Grita, morde, arranha,Desorganiza o cabelo, arranca;

A caminho do mar, a saia branca balança,Meus olhos a seguem onde a vista alcançaA água, o sal, o azul marinho,Grito seu nome, indecência,Rouba-me a noite das mãos sua inocênciaCurvo –te o corpo, e entro, espuma branca ganham os joelhos,Entro em ti fundo, estremeço,É o começo e o fim, é o meio;O gozo escorre, meu, teu, desejo...

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Décimo Segundo Surrealista

Nas tardes-noites de dezembro,Eu deixo a cidade pra trásE costumo olhar pelo espelhoQuando o sol se derrama vermelhoEntre as brechas dos edifícios e catedrais

Costumo localizar as coisasRuas, esquinas, escadas,Imagino quantas noticias de jornaisSão tecidas no momento que vejoAlguém morre, alguém nasce, desaparece; pra nunca mais

Muitos amam, odeiam, matam-se,Fogem, prometem e roubam,E o importante é a luz que se fazUm pouco mais cedo a cidade parecia dourada,Ardia em brasa, asfalto, solo de sax, flores de plástico,

Tenho tido esse sonho muitas vezesPor muitos dias seguidos,Sonho real, tantas vezes já vi esse quadro,No sonho estás comigo, encantada, mágica, assim,Te mostro pelo espelho e você sorri pra mim.

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As cartas

...tanto tempo navegando por mares surrealistas, nas gavetas deixou cartas, qual seria a função de uma carta guardada ? Torturar-se por jamais ter a enviado, talvez a glória de torturar quem a vida toda esperou pela carta no portão sem jamais ter a recebido, nem glória nem nada, sobra de um lado um pierot com sua lágrima perpétua estampada no rosto e do outro lado uma naufraga prisioneira de uma ilha de sentimentos sem saída...

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A noite que o Pierot deseja com a naufraga

que a noite seja linda! porque meu amor por você é lindo que seja leve, porque é um sentimento nobre que não seja breve, porque precisamos de tempo pra estarmos juntos que seja eterna , como é eterno esse amor que deixe habitar o sol mesmo que de noite, porque precisamos dessa luz e calor que mesmo assim haja lua, porque é a lua o mito que me inspira que seja tudo perfeito, porque você é perfeita que seja a melhor noite do mundo, feita para a melhor mulher do mundo que haja girassóis , porque eu e você gostamos que haja café forte e meio amargo, porque é nosso estilo que haja rock do bom , porque me faz viajar que haja eletrônico do melhor, porque te faz dançar que haja um sabor especial, porque você é sal e mel que todas as sensações se agucem , porque gostamos de senti-las que haja os melhores beijos, porque são os melhores mesmo que haja Deus , porque nós dois cremos que haja magia, porque um pedaço de nós é mágico que não falte nada , porque hoje é sexta que não falte nada, porque todos os dias isso é o mais importante que haja amor, porque eu te amo mais que tudo que haja riso, porque enobrece que hajam gargalhadas, porque divertem que seja lido a noite, senão perde a graça

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A resposta da Naufraga

Não sei rimar, coloco apenas sentimentos dentro de garrafas arremesso-as ao mar, faço pedidos pra que cheguem a vocêAmor mais amado, perfeito e desejado.O que desejastes em uma só noite ficou impresso pela vida inteiraessa é só minha resposta, simples e mensageira desse amorResposta escrava de verdades já entregues reposta que já te conhece e que te imprime no rosto essa máscaraque as águas te levem minha carta, porque é eterno o que digo nelaque as águas não desbotem a tinta mesmo que saiba ler até meus borrõesque você por mágica esteja na praia quando o sol fizer brilhar a garrafaque você leia e que o faça sorrir, chorar, correr, dançar sobre a mesame faltam as palavras mas não os sentimentose que eu hoje aqui naufraga nesse mar de saudade Inspire sua soberba poesia

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Cartas de Amor

Quantas cartas de Amor você tem guardadas?Quantas enviou? Quantas foram queimadas, extraviadas, subtraídas? Quantas ficaram presas em um navio que afundou? Quantas tinham um selo Real , nobre? Quantas tinham propósitos, armações, eram pobres? Quantas remetidas por plebeus, simples mortais? Quantas citavam Deus, quantas linhas vazias? Quantas foram escritas à mão, desenhadas, góticas? Quantas digitadas, mal escritas, eróticas? Quantas utilizavam papel fino , quantas em papel de pão? Quantas eram meros bilhetes, quantas consomem muita imaginação? Quantas falavam de liberdade, quantas vieram da prisão? Quantas morreram com seus autores, quantas foram corrompidas? Quantas foram parar em armários e gavetas esquecidas? Quantas foram rasgadas, quantas coladas tantas vezes? Quantas borradas por lágrimas, quantas viraram poemas? Quantas foram escondidas, quantas descobertas? Quantas viraram martírios, quantos toques em pernas entreabertas? Quantas tinham os mesmo temas? Quantas traziam cheiros nas tintas, quantas escritas com sangue? Quantas viraram e-mails, quantas falavam dos seus seios? Quantas eram de verdadeiro amor? Quantas desafiaram a dor ?Quantas? Incontáveis, riqueza

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Teatro de Ousadias

... Colombo aporta numa noite de eclipse, numa noite límpida de Abril, nas ruas o povo se aglomerava colorido, barulhento, é um espetáculo que passa pelas ruas do cais, e ganha as avenidas e toma o centro com ousadia, o teatro veria a tragédia, o riso e a revolução, o palco jamais seria o mesmo...

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Versos de Abril

Simples,Tal como o vento passando entre as floresEntre os cabelos, balançando as coresColorindo o mundo, aquarela

SimplesO café, o bolo, o cheiro de canelaA tarde que cai preguiçosaO frio que chega mansinho

Simples,Como a noite tomando o céuComo as pessoas tomando a ruaComo anil rimando com abril

Simples,Como as estampas do seu vestidoComo a tatuagem que não diz nadaComo tentar antes de ter desistido

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Primeiro Ato

Quando me encontro bêbado Também me acho clássico Um vinho qualquer numa viela de FlorençaUm florin por alguns pensamentos da renascençaO cômico e o trágicoE se no ultimo ato me jogo voando cego , Ícaro em chamasAntes de tocar o chão me salvasrecolhendo -me nu em suas asase voando comigo pelo céu do sertão me mostra o vinho de plagas distantes, sua casa

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Segundo Ato

Estou num lugar comum , num lugar qualquer, qualquer jardim da vida sem noção da hora exata na verdade nem aí para exatidão das horascom tempo a perderganhando todo tempo, exatoa paixão é casual, singularouço a canção uma velha arvore no jardim do esquecimentovejo a visãoo amor, sopro do vento

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Terceiro Ato

Conheci uma garota metida numa tempestadeentre raios e trovões destilava desejossábios e adolescentes desejos romances siderais , astrais , casas de papéis Entre flores ela respirava, se achava , e porque se acharia?por ter um sorriso cobiçado, proibidopor estar de branco sob a chuva por estar alem do seu mundo sem ter ido Conheci uma garota metida com as tempestadesum sorriso enigmático, sarcástico , zodiacal depois da chuva trazia alivio pés descalços colhendo frutas no quintal

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Quarto Ato

Abrem-se as cortinas,Fecha a porta do bar,O ser e nada na calçada, o ser e porra nenhumaEm suma o que deseja de nós esse serDeus, o parnasiano poeta concretoEscreve certo, por linhas certas E lança os tortos na fogueirae aos certos lança a primaverae nos dá a bala para o suicídioPuxa o gatilho e alguém planta uma roseira no quintalÉ o caralho a quatro o ser e o nadaQuem é ela e quem eu souMe desculpa amor pela linguagem rock' n roll

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Quinto Ato

Abra sua janelaSaboreie todos os aromas,Flores, frutas, comida feita no beco, na rua;Gente cigana que passaMágica ancestral, ouça os passos;A musica, a dança, a reza, a praga;

As tranças da menina brilham ao solOs olhos da mulher fulminam um coraçãoO dourado do dente, o ventre em véus;As cores mais belas, as feras;O circo e com ele a revolução;A cura e a ousadia

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Sexto Ato

Eu gosto de fitar essa chamaLuz e calor, câmera e açãoTranse, religião hipnóticaDesenho tribal sem definiçãoNo final do dorso, equilibristaVelha civilização a escrever seu nomeCom lírios canibais se comendo um a umTom sobre tom, sem desejo nenhumSem ambição, apenas inocência cálidaDeusa pálida que ao sul se ergueE controla as marés, e rege os ciclosEstátua tatuada, em ouro e vegetalAlucinógenos servidos em velhos cachimbos da pazUma nova língua a destilar o amorEm antigos poemas, em viagens sem fimEm mares a serem cruzadosVentos soprados por querubins Mapa do tempo e espaçoOrgia

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O Teatro de Ousadias

Sétimo Ato

é como o mar que avança pra retrocederengole cidades, prédios, catedraisonde antes havia praia deixa um caisporto repleto de caos

é como o mar, doce cantiga de ninarnuma noite tranqüila, prata reflexo da luavento que sopra manso, navega nuadoce encanto de sal e de luz

é como o mar, há um triz de transbordarde espatifar nas pedras a luxuriaa lançar pau e pedra de volta, injuriaa indignar o sono tranqüilo dos navegantes

é como o mar, milagre de peixes e pãesazul profundo a descansar a vistaonde a vista alcança, onde se arriscao tudo ou nada como lançar de dados

é como o mar, em intensidade e mistériohumor que sopra por onde quermágica faísca nas mãos de um qualquerbeleza e solidão

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Fim

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