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#134 EDIÇÃO OÁSIS NEUROSSEXISMO O cérebro é masculino ou feminino? LÍNGUAS EM EXTINÇÃO Quantos idiomas antigos ainda são falados? O MUSEU DE VOCÊ Histórias de cada um de nós PARA COMBATER O FIM DO MUNDO BRIGADA DE SUPERCIENTISTAS

Oásis - Brasil 24/7 · capazes atingiram hoje um nível tecno-lógico tão sofisticado a ponto de ... a levaram a criar um neologismo: ... também incentivar um debate sobre como

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#134

Edição Oásis

NEUROSSEXISMO o cérebro é masculino

ou feminino?LÍNGUAS EM

EXTINÇÃO Quantos idiomas

antigos ainda são falados?

O MUSEU DE VOCÊ

Histórias de cada um de nós

Para combatEr o fim do mundo

BRIGADA DE SUPERCIENTISTAS

2/30OáSIS . Editorial

por

Editor

PEllEgriniLuis

Um grupo de cientistas do quilate do astrofísico Ste-phen Hawking e do astrônomo inglês lord rees cria-ram uma instituição em Cambridge, na inglaterra, para

estudar os diferentes riscos de extinção que corre a vida sobre o planeta terra – inclusive a extinção da nossa própria espécie. Parece prólogo de livro de ficção científica, mas é pura verda-de. Essa elite das cabeças pensantes contemporâneas passou as duas primeiras semanas de setembro discutindo, para che-gar a algumas conclusões. Elas estão descritas na nossa matéria de capa “Brigada de supercientistas para combater o fim do mundo”.

alguns desses riscos, como veremos, devem-se à possibilida-de de catástrofes naturais como, por exemplo, o choque de um meteorito gigante com a terra. Mas a maioria dos demais riscos deve-se à ação muitas vezes deletéria da mão do ho-mem sobre o planeta. Uma das maiores ameaças parece ser o

“O fim dO mundO nãO é um rOteirO de cinema”, adverte O astrônOmO inglês

lOrd rees. e O final feliz, diferente dO que acOntece nOs filmes, depende dOs

espectadOres. de tOdOs nós.

OáSIS . Editorial

por

Editor

PEllEgriniLuis

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desenvolvimento desmesurado da própria tecnologia. graças ao nível que alcançamos na produção da inteligência artificial, hoje, computadores e todo o séquito de funções de que são capazes podem assumir o controle do mundo e, em seguida, decidir o extermínio dos humanos. o cineasta Stanley Kubrick já tinha imaginado uma situação do gênero em seu filme “2001 odisseia no Espaço”, mas as coisas agora poderiam acontecer em escala muito maior. Exagerado? não, a possibilidade é real, sobretudo quando se sabe que entidades puramente matemá-ticas como os algoritmos decidem milhões de transações finan-ceiras a cada segundo.

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BRIGADA DE SUPERCIENTISTASPara combater o fim do mundo

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eunidos numa associação cujo nome parece o título de um romance de ficção cien-tífica – o Cambridge Centre for the Study of Existen-tial Risk (http://cser.org/),

Centro Cambridge para o estudo do risco existencial – o astrofísico Stephen Ha-wking, o astrônomo Martin Rees, o filóso-fo Huw Price e vários outros acadêmicos de mente brilhante e reconhecida fama internacional compilaram neste mês de setembro uma lista dos perigos que po-

dem destruir o globo terrestre ou, pelo menos, os seus habitantes. Desse encon-tro surgiram algumas propostas de solu-ções que, implementadas, seriam capa-zes de evitá-los.

As preocupações desses grandes cien-tistas não são anódinas e muito menos destituídas de fundamento. O fim do mundo é uma hipótese real, sobretudo no que diz respeito ao fim da espécie humana sobre a Terra.

Vários são os fatores que podem condu-zir a esse apocalipse. A lista começa com a inteligência artificial. Computadores e todo o séquito de funções de que são capazes atingiram hoje um nível tecno-lógico tão sofisticado a ponto de poder assumir o controle do mundo e, em se-guida, decidir o extermínio dos huma-nos. O cineasta Stanley Kubrick já tinha imaginado uma situação do gênero em seu filme “2001 Odisseia no Espaço”, mas as coisas agora poderiam acontecer em escala muito maior. Exagerado? Não, a possibilidade é real, sobretudo quando se sabe que entidades puramente ma-temáticas como os algoritmos decidem milhões de transações financeiras a cada segundo.

Rmuitos cientistas estão convencidos de que o desenvolvimento da tecnologia humana poderá em breve apresentar novos riscos de extinção, tanto para a espécie humana quanto para a totalidade do planetaPor: EquiPE oásis

A seguir, na lista, es-tão os ataques ciber-néticos, uma onda de atentados terroristas digitais capazes de embaralhar absolu-tamente tudo, do for-necimento de energia às comunicações, dos transportes às redes de computadores. Logo depois a lista das ameaças cita-se o risco de uma infec-ção bacteriológica mundial, uma peste criada em laborató-rio que vá parar nas mãos de um louco

niilista, um ditador sanguinário ou os comandantes de uma guerra civil fratricida. Há também a possi-bilidade de uma pandemia, o surgimento de um ví-rus resistente a todo antibiótico que nenhuma vaci-na poderá curar.

Outras ameaças para a humanidade aventadas nesse encontro de cientistas do Centro Cambridge: uma sabotagem da cadeia alimentar; condições atmosfé-ricas extremas provocadas pelas mudanças climáti-cas, com consequentes inundações, furacões, terre-motos; um ou mais asteroides que se chocam com a Terra; para encerrar, a sempre presente hipótese da guerra termonuclear, ou química, ou até mesmo

convencional se combatida com a devida intensida-de.

“Vivemos num mundo cada vez mais interconec-tado, cada vez mais tecnológico e dependente da web”, afirma lord Rees, ex-presidente da Royal Society e um dos promotores do encontro. “A nós ocidentais o mundo atual pode parecer mais seguro do que jamais foi no passado, mas a verdade é que nosso mundo é muito mais vulnerável agora do que parece. E já que os líderes políticos estão concen-trados apenas nos problemas de curto prazo, é ne-cessário que alguém sugira à opinião pública inter-nacional quais são os perigos mais realistas e com

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quais meios seria possível impedi-los”.

Os cientistas do grupo de Cambridge não são, no entanto, pessimistas: permanecem otimistas, ape-sar de tudo, convencidos de que o homem dispõe de recursos para sobreviver e enfrentar qualquer ame-aça. Mas ao mesmo tempo advertem que os riscos mais graves, para o nosso planeta, hoje não provêm do cosmos ou da natureza, mas sim da ação do pró-prio homem. “O fim do mundo não é um roteiro de cinema”, adverte o astrônomo Rees. E o final feliz, diferente do que acontece nos filmes, depende dos espectadores. De todos nós.

Elenco dos atores do apocalipse

A tecnologia inteligente – Uma rede de computa-dores poderia se tornar uma “mente” e utilizar seus recursos para atingir os seus próprios objetivos, às custas das necessidades humanas.

Os cyber ataques – As redes de energia, o controle do tráfego aéreo e das comunicações estão hoje sob o comando de sistemas de computadores interco-nectados. Se esses networks forem destruídos pela ação de terroristas, isso representaria o colapso da nossa sociedade.

O bioterrorismo – Um super vírus criado pelo ho-mem ou uma bactéria escapada de um laboratório ou liberada por terroristas poderia causar a morte de milhões de pessoas.

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o astrônomo Lord rEEs

o astrofísico stEPhEn hawking

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o choquE dE um mEtEorito gigantE com a tErra PodEria causar uma nova Extinção Em massa, ELiminando incLusivE a nossa EsPéciE

A falta de alimento – Graças às mega redes de dis-tribuição, muitas nações ocidentais possuem reser-vas de comida suficientes para 48 horas. Qualquer interrupção nos fornecimentos causaria revoltas populares e aquisições maciças ditadas pelo pânico.

O asteroide – O impacto de um grande asteroide com a Terra destruiria a espécie humana. Isso já ocorreu no passado remoto, causando, como tudo leva a crer, a extinção dos dinossauros.

O clima – Visto que a temperatura média da Terra continua subindo, poderemos chegar nas próximas décadas a um ponto crítico no qual os desastres na-turais sofreriam uma piora irreversível.

As pandemias – Devido às viagens internacionais, um novo vírus assassino, surgido a partir de muta-ções genéticas de vírus animais, poderia se difundir em todo o mundo em poucos dias.

A guerra – O aumento das populações, sobretudo nos países pobres e nos em via de desenvolvimen-to, poderão esgotar as reservas de comida e de água potável. Para se apoderar dos bens necessários, muitas guerras poderiam ser desencadeadas.

O apocalipse nuclear – No caso do emprego da bomba atômica por um país, poderia ser desenca-deado um conflito mundial. Ogivas nucleares pode-riam cair nas mãos de terroristas.

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o tEma do fim do mundo é usado Por artistas dE todas as éPocas

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um vírus ou bactéria LEtaL,rEsistEntEs a todo mEdicamEnto E Produzidos PELo homEm, PodEriam EscaPar do Laboratório E matar miLhõEs dE PEssoas

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TONEUROSSEXISMO

O cérebro é masculino ou feminino?

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ara muitas pessoas, homens e mulheres são diferentes, e não só fisicamente. Estudos recen-tes, popularizados por incon-táveis livros, jornais e revistas, difundiram a imagem de que elas são, por características ce-rebrais, mais sensíveis e empá-ticas, enquanto eles, mais racio-nais, exibem superioridade nas

ciências exatas. A neurocientista australiana Cordelia Fine, no entanto, critica o uso da

ciência para justificar essa visão. De acor-do com ela, esses estudos que comprovam a diferença de gênero contêm falhas meto-dológicas e interpretações equivocadas que a levaram a criar um neologismo: “neuros-sexismo”, ou o conjunto de situações em que a neurociência é (mal) utilizada para justificar estereótipos de gênero.

Cordelia publicou o livro Delusions of Gen-der: The Real Science Behind Sex Diffe-rences (Ilusões de Gênero – A Verdadeira Ciência por Trás da Diferença Sexual, em tradução livre), no qual faz um alerta sobre como a neurociência pode se transformar em “neuro-sem-sentido” quando não pos-sui rigor metodológico ou é mal interpre-tada. “Uso o termo neurossexismo para me referir a situações em que as pessoas supe-rinterpretam, interpretam mal ou até cons-troem a neurociência como forma de dis-farçar os estereótipos de gênero”, afirma.

Homens e mulheres não são assim tão diferentes

Cordelia explica no livro que “queria tor-nar a ciência real sobre a diferença de gê-nero acessível e mostrar que é muito mais complicada e interessante do que somos induzidos a pensar”. Ela deseja acabar com a crença, estimulada por best-sellers

Pa neurocientista cordelia fine mostra que muitos estudos a respeito das diferenças dos cérebros de homens e mulheres podem ter sido mal interpretados para justificar um condicionamento sociocultural muito antigo

Por: maíra LiE chao – fontE rEvista PLanEta

como Homens São de Marte, Mulheres São de Vênus, do escritor norteamericano John Gray, de que é inútil esperar por uma “igualdade de gênero”, porque a ciên-cia apontou diferenças inatas entre os sexos. “Se o livro também incentivar um debate sobre como melhorar a produção científica e a transmissão de informação so-bre o assunto, então, estarei muito contente”, declara.

O ponto central abordado por Cordelia é o uso equi-vocado da neurociência para justificar a questão de gênero. Por se referirem a um campo novo, as pesqui-sas neurocientíficas precisam ser mais bem estudadas. “Certamente, há diferença sexual de cognição e com-portamento, mas o que é interessante é que ela pode aumentar, diminuir, desaparecer e mesmo ser reverti-da, dependendo do contexto social, ou do país, ou do período histórico”, avalia.A neurocientista critica diversos estudos muito popula-res que oferecem respaldo ao neurossexismo. Eles surgiram, em parte, como uma reação à ênfase que os psicólogos deram à importância do meio no

desenvolvimento das habilidades e da personalidade durante os anos 1970 e o início da década de 1980. A resposta científica resultou, então, num peso exagera-do para a influência dos genes e das habilidades her-dadas.

Um desses estudos é sobre como os hormônios in-fluenciam no comportamento e, em contato com o feto, podem determinar sua estrutura cerebral – e, consequentemente, seu padrão comportamental. A médica norte-americana Louann Brizendine, autora do best-seller Como as Mulheres Pensam, defende, por exemplo, que a testosterona que interage com o feto masculino por volta da oitava semana de gesta-ção responde pelo desenvolvimento e pela inibição de algumas áreas do cérebro, como as relacionadas à agressividade e à comunicação, que dão aos homens habilidades matemáticas com as quais nos habituamos a associá-los.

Cordelia retruca, porém, assinalando que o comporta

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a neurocientista australiana cordelia fine

delusions of gender, livro de cordelia fine, ainda

não traduzido no brasil

mento característico e a diferença de sexo têm muito mais a ver com a socialização das crianças do que com a testosterona fetal. Segundo ela, os métodos de medi-ção hormonal durante a gestação ainda não são exatos. Além disso, se houvesse habilidades inatas de homens e mulheres derivadas da estrutura cerebral, isso impli-caria indivíduos seguindo carreiras de acordo com essa aptidão natural. No entanto, hoje há mulheres na área de exatas e em outros campos antes exclusivos dos ho-

mens, como o jornalismo esportivo.

O ambiente pode levar a mu-danças hormonais

“Certamente, os hormônios influen-ciam nosso comportamento, mas o comportamento também influencia os hormônios”, afirma Cordelia. Para ela, embora estejamos habi-tuados a achar que, por conta dos hormônios, é natural que os ho-mens sejam menos ligados à vida doméstica, o estímulo do ambiente pode levar a mudanças hormonais. “[Em seu estudo, a psicóloga nor-teamericana] Francine Deutsch descobriu que pais que dividem as tarefas igualmente com as esposas desenvolveram um tipo de proximi-dade com os filhos que normalmen-te associamos às mães”, escreve a neurocientista.Assim, as funções inatas de homens

e mulheres podem não ser tão “instintivas” quanto se pensava. É a vivência social que acaba nos fazendo crer que há funções específicas para cada sexo. “Acho que há uma explicação plausível para o aparecimento da ideia de diferenças sexuais inatas”, afirma Cordelia. “Psicólogos sociais mostraram que somos motivados psicologicamente a pensar que nossa estrutura social é justa, natural e inevitável.” No quesito empatia, por exemplo, ela ressalta que os dois sexos conseguem ter

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o mesmo desempenho – “mas, quando uma mulher é lembrada que, como as demais mulheres, deveria ser boa nessa característica, ela tem performance melhor que a dos homens”.

A vulnerabilidade das neuroimagens

Um tipo de estudo que merece atenção especial de Cordelia no livro é o que usa neuroimagens, como res-sonância magnética funcional (fMRI, em inglês) e to-mografia por emissão de pósitrons (PET, em inglês). Segundo a neurocientista, o atual entusiasmo com as pesquisas baseadas nesse recurso pode levar a desco-bertas superficiais sobre diferença de sexo.

Cordelia argumenta que, por esses exames de imagem cerebral serem muito caros, o número de participantes

é limitado. Logo, a baixa amostragem pode levar a re-sultados duvidosos, já que pequenas variáveis, como cafeína e taxa respiratória, podem alterar a imagem, sem que tenham algum efeito significativo no compor-tamento.

Diferença sexual na ativação cerebral

A cientista australiana observa ainda que, pelo fato de a neurociência ser uma área nova, seu uso gera contro-vérsias. Muitos especialistas defendem que a análise estatística baseada nessas imagens deve ser feita com mais rigor. Segundo eles, muitos estudos recentes so-bre diferença sexual na ativação cerebral não possuem, por exemplo, um dado estatístico relevante, ou podem mudar, dependendo do método de análise. “Por essas razões, é essencial não apostar muito em um único es-tudo que aponte diferenças sexuais, mas tentar encon-trar um padrão consistente”, analisa Cordelia.Um estudo feito pela equipe da neurocientista holan-desa Iris Sommer exemplifica a existência de pesqui-sas equivocadas nessa área. A equipe revisou duas ve-zes todos os estudos sobre lateralização da linguagem (quando uma parte do cérebro é mais desenvolvida em razão de hormônios e, por isso, o indivíduo tem mais ou menos habilidades verbais) que usavam fMRI. A primeira avaliação, de 2004, considerou cerca de 800 participantes; a segunda, de 2008, incluiu mais 2 mil voluntários. Em ambas, os cientistas não encontraram nenhuma diferença sexual significativa na laterali-zação funcional para a linguagem. Os pesquisadores também observaram que os estudos que mostravam as

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diferenças sexuais tinham menos participantes. Um estudo feito por Janet Shibley Hyde, professora de psicologia da Universidade de Wisconsin- Madison (EUA), constatou, por meio de meta análises de outras 46 pesquisas, que 78% das diferenças entre os gêneros são muito pequenas ou inexistentes. Ou seja: meni-nas podem se sair tão bem na área de exatas quanto os meninos. Outra evidência disso é um estudo da norte--americana Giordana Grossi, da Universidade Estadual de Nova York (EUA), que mostra que, dependendo do país e da cultura social, garotas podem obter resulta-dos tão altos quanto os garotos em testes matemáticos. Alunas da Finlândia tiraram notas maiores do que seus colegas do sexo masculino e do que os alunos norte--americanos que superaram suas conterrâneas.

Questão de gênero e educação

Um dos motivos pelos quais Cordelia se preocupa com a divulgação de estudos neurocientíficos sobre dife-rença sexual é o uso destes na área pedagógica. “Tenho objeção a meninos e meninas serem ensinados de for-ma diferente porque os estereótipos de gênero estão disfarçados de neurociência”, declara. A autora exem-plifica que há escolas mistas com “educação paralela” em alguns anos do período escolar. Durante essa fase de separação de classes em masculinas e femininas, os jovens são ensinados de forma diferente. Por exemplo, o ensino de matemática para meninos é feito com base em atividades práticas, como desenho e exercícios. Já nas classes femininas, o professor é orientado a dis-cutir a matéria por cerca de dez minutos no início da

aula, fazendo uma analogia dos eixos horizontal e ver-tical de um plano cartesiano com uma relação entre duas pessoas.

Para a neurocientista australiana, é fundamental au-mentar o rigor das pesquisas sobre diferença sexual no cérebro. Nesse aspecto, ela argumenta que tanto cien-tistas quanto autores não especializados na área de-vem trabalhar em conjunto para que a ideia errada não seja passada ao público. “Jornalistas e editores que trabalham com mídia popular precisam estar cons-cientes da necessidade de apurar as declarações; e os cientistas têm a obrigação moral de ajudá-los”, afirma. Os neurocientistas também devem estar cientes de que suas informações sobre diferença de gênero influen-ciam seu trabalho e o de colegas. “O neurossexismo afeta atitudes sociais de um modo prejudicial, e não devemos fazer pouco-caso disso.”

Cérebro feminino de antes

Desde 1915, acreditava-se que as diferenças físicas do formato e da estrutura do cérebro das mulheres pode-riam ter influência em seu comportamento. Naquele ano, o neurologista norte-americano Charles L. Dana utilizou essa crença como argumento para dizer que as mulheres não tinham como especialidade a área políti-ca e judicial, em seu artigo sobre direito de voto femi-nino no jornal The New York Times.

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LÍNGUAS EM EXTINÇÃO

Quantos idiomas antigos ainda

são falados?

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ameaça de extinção, hoje, não paira apenas sobre a maioria das espécies ani-mais e vegetais que vivem

em nosso planeta. A humanidade enfrenta também outra forma de extinção em mas-sa: a das línguas. Centenas, milhares de sistemas linguísticos estão desaparecendo num ritmo sem precedentes. Quando uma língua morre, com ela morre também uma

visão de mundo absolutamente única. Com a língua que se vai perdemos uma enorme herança cultural; o entendi-mento de como um grupo específico de seres humanos se relaciona com o mun-do a seu redor; conhecimentos médicos e botânicos e zoológicos; e, ainda mais importante, perdemos a expressão do humor, do amor e da vida como a viam e entendiam essas pessoas. Em resumo, perdemos o testemunho de séculos, de milênios de vida.

Línguas são entidades vivas em cons-tante fluxo, e sua extinção não é coisa de agora; no entanto, o ritmo no qual as línguas estão desaparecendo é alarman-te. Metade das cerca de 7 mil línguas do mundo correm sério risco de desapare-cer no decorrer dos próximos 100 anos.

O risco é realmente importante, sobre-tudo para as línguas antigas que sobre-viveram até os nossos dias. Da grande família afro-asiática, por exemplo, o aramaico, a língua falada por Jesus, de tronco semítico da mesma forma que o hebraico, ainda é usado em algumas al-deias da Síria. Uma delas é Maaloula, um pequeno povoado sobre os montes Al Qalamoun, nos arredores de Damasco.

Aa ameaça de extinção, hoje, não paira apenas sobre a maioria das espécies animais e vegetais que vivem em nosso planeta. a humanidade enfrenta também outra forma de extinção em massa: a das línguas

Por: EquiPE oásis

Ali, no mosteiro cristão de São Jorge, o Pai Nosso e certos trechos litúrgicos ainda são recitados em ara-maico. O egípcio antigo ainda é usado como língua litúrgica pela igreja copta. Dentre as línguas célti-cas de matriz indo-europeia, a mais antiga é o galês, falado na Irlanda e também em certas comunidades nos Estados Unidos graças à maciça imigração eu-ropeia.

Do ladino ao basco

Por seu lado, o ladino antigo – língua das comuni-

dades de judeus marranos no sul da Europa -, que deriva diretamente do latim, ainda é falado por pe-quenos grupos nos vales dos Alpes centrais e orien-tais da Suíça e do Trentino-Alto Ádige, na Itália. Outra variante dessa língua, o ladino oriental, está hoje identificada com o friulano, a célebre língua poética do nordeste da Itália usada por Pier Paolo Pasolini em sua obra literária.

O basco, falado no nordeste da Espanha, corre um risco um pouco menor graças ao nacionalismo do povo basco que defende sua língua e suas tradições com unhas e dentes. Nem todos sabem, no entanto,

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a cidadEzinha dE maaLuLa, na síria, ondE a PoPuLação cristã ainda faLa aramaico, a Lingua dE JEsus

nEsta igrEJa coPta do cairo,

no Egito, os ritos ainda são cELEbrados Em EgíPcio antigo

que o basco é a língua mais velha da Europa, pre-cedente às línguas indo-europeias e muito próxima dos dialetos berberes do Norte da África e também das línguas caucásicas.

Hoje, as línguas mais faladas no mundo são o chi-nês mandarim, inglês, espanhol, português, híndi/urdu, russo, árabe, bengali, indonésio e japonês. A cultura da globalização tende cada vez mais a for-talecer as grandes línguas, como o inglês – hoje considerado uma espécie de língua-franca mundial.

O fortalecimento dessas lín-guas fortes em alguns países enfraquece paulatinamente os próprios idiomas locais. Este é o caso, por exemplo, das Filipinas, país onde o inglês vem paulatinamente substituindo os dialetos fili-pinos.

A maior concentração de línguas faladas encontra-se nas zonas do planeta onde é maior a biodiversidade (va-riedade de animais, plantas e ambientes). Nas florestas pluviais tropicais, que hoje ocupam apenas 7% da super-fície terrestre, estão 36% dos grupos etnolinguísticos do mundo.

Avaliando-se a situação dos últimos decênios, so-bretudo a evolução da cultura da globalização, cal-cula-se que até o final do século 21 estarão extintas entre 50 e 90% das línguas atualmente faladas.

Os árabes falam todos a mesma língua?

Não, os árabes falam muitos dialetos diversos. Mas escrevem e oram na mesma língua, o árabe clássi-co ou literário. Isso acontece porque o árabe, como outras línguas do mundo, possui várias formas, en

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JudEu turco dE faLa Ladina, uma Língua amEaçada

tre elas a forma literária e a forma oral.

O árabe literário é a língua oficial, com uma prosa substancialmente igual à do Alcorão (livro sagra-do dos muçulmanos, escrito no século 7 da nossa era). É usado para as orações e demais ritos reli-giosos, os discursos oficiais, nos telejornais e para escrever. Não é falado no dia-a-dia, mas é estuda-do nas escolas de todos os 22 países da Liga Árabe (Argélia, Arábia Saudita, Bahrein, Ilhas Comores, Egito, Emirados Árabes, Jordânia, Djibuti, Iraque, Kuwait, Líbano, Líbia, Marrocos, Mauritânia, Omã, Palestina, Qatar, Síria, Somália, Sudão, Tunísia e Iêmen).

No dia-a-dia, para conversar, os árabes usam as línguas locais, dialetos que são diferentes de uma nação para outra e pouco compreensíveis para além dos limites dentro dos quais são utilizados (muda a

pronúncia e, em muitos casos, também os vocábu-los).

Uma exceção é o dialeto egípcio, que se tornou fa-miliar a todos os árabes graças aos filmes e aos se-riados televisivos produzidos no Egito e exportados

para todo o mundo árabe.

Preocupadas com a séria ameaça de extinção das línguas, algumas mega entidades que atuam em âmbito mundial, como a Unesco, e empresas como o Google, desencadearam ações para a salvaguarda do nosso patrimônio linguístico.

O Google lançou em 2012 um projeto que pretende

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mongEs do cristianismo coPta. muitos ainda cELEbram os ritos Em Lingua EgíPcia antiga

Página do novo tEstamEnto Em

aramaixo

documentar mais de 3 mil línguas ameaçadas de ex-tinção, em uma tentativa de preservar idiomas. No site do projeto “Idiomas em Risco”, falantes das lín-guas ameaçadas ou pesquisadores podem trabalhar na preservação desses idiomas, documentando em texto, áudio e vídeo informações sobre a linguagem.“Quando o último falante de uma língua morre, per-demos séculos de conhecimento e tradições que aju-daram a formar quem somos”, afirma a companhia. Para o Google, a preservação de uma língua está ligada à preservação da identidade cultural, dos va-lores e da tradição de uma comunidade.

No site criado pela gigante informática (http://www.endangeredlanguages.com/) é possível explorar as línguas ameaçadas, filtrar a busca pelo risco de desaparecimento, local ou quantidade de falantes. As informações foram fornecidas pela Universidade do Havaí, em Manoa, e pelo Instituto de línguas e Tecnologia da Informação (The Lin-guist List) na Universidade Oriental de Michigan.

Vídeo: Lançamento do Projeto Idiomas em Risco)

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PLaca rodoviária com tExto Em gaLês E Em ingLês

o aLfabEto gaLês E fonEmas EquivaLEntEs Em ingLês

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mem

ór

iaO MUSEU DE VOCÊHistórias de cada um de nós

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m terço do mundo pode ver em tempo real o World Trade Center ruir em 11 de setembro de 2001; outro terço ouviu no-tícias sobre o ocorrido em 24 horas. Você lembra onde você estava quando esse atentado

ocorreu? Exposições Museu e Memorial 11 de Setembro, prestes a inaugurar, irão re-fletir sobre a diversidade de experiências ao redor do mundo, naquele dia.

Uem uma palestra comovente, o designer Jake Barton mostra e comenta algumas instalações destinadas a fixar memórias pessoais e também a de fatos importantes. mostra também outros projetos que visam transformar o observador em participante ativo da exposição

vídEo: tEd – idEas worth sPrEadingtradução: vivian PoLikar. rEvisão: gustavo rocha

Desenhista e contador de histórias, Jake Barton é o diretor de mídia da Local Pro-jects, empresa de design em Nova York. Ele é o criador de várias exposições inte-rativas e digitais. Desde 2006, Barton e sua equipe trabalham na criação de me-dia design para o Memorial e Museu 11 de Setembro.

Recentemente, a Local Projects foi pre-miada no concurso National Design Award winner for Interaction Design. Em 2011 já fora premiada como a segunda empresa mais inovadora pelo Fast Com-pany magazine.

Tradução integral da conferencia de Jake Barton no TED

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Tradução integral da conferencia de Jake Barton no TED

“Esse é Charley Williams. Ele tinha 94 anos quando essa foto-grafia foi tirada. Na década de 30, Roosevelt fez com que mi-lhares e milhares de americanos voltassem a trabalhar, através da construção de obras de infraestrutura, pontes e túneis. Mas ele também fez algo interessante, que foi contratar algumas centenas de escritores para vasculhar a América e registrar a história dos americanos comuns. Charley Williams, um pobre arrendatário, não seria, normalmente, o objeto de uma grande entrevista. Mas Charley foi um escravo até os seus 22 anos. E as histórias da sua vida são um dos carros-chefes de histórias das experiências humanas de ex-escravos.

Anna Deavere Smith disse que há uma literatura dentro de cada um de nós e, três gerações depois, eu era parte de um pro-jeto chamado StoryCorps, criado para capturar a história dos americanos comuns, através de uma cabine pública a prova de som. A ideia é muito, muito simples. Você entre numa dessas cabines, entrevista sua avó ou outro parente. Você ganha uma cópia da entrevista e a entrevista vai para a Biblioteca do Con-gresso. É, basicamente, uma forma de criar um arquivo oral nacional de histórias com uma conversa por vez. E a questão é: quem você quer lembrar, se você tivesse apenas 45 minu-tos com a sua avó? É interessante, que o fundador, Dave Isay, considera – e nós sempre falamos disso - que na verdade esse projeto é um tanto subversivo, porque quando você pensa a respeito, o projeto não é sobre as histórias que estão sendo contadas, é sobre escutar. E é sobre as perguntas que você faz, perguntas que talvez você não tenha permissão para fazer em qualquer outro dia. Eu vou mostrar para vocês alguns rápidos trechos do projeto.[Jesus Melendez falando sobre os momentos finais do poeta Pedro Pietri]Jesus Melendez: Nós decolamos e, a medida que subíamos, an-

tes de estabilizarmos, estávamos a 45.000 pés de altura, então, antes de estabilizarmos, Pedro começou a nos dei-xar. E a beleza disso é que eu acredito que há algo depois da vida. Você pode ver isso no Pedro.[Danny Perasa para sua esposa Annie Perasa - casados há 26 anos]Danny Perasa: Veja, a questão é que eu sempre me sinto culpado quando digo “Eu te amo” para você e, eu digo isso com tanta frequência. Eu digo isso para te lembrar que por menor que eu seja, está vindo de mim, é como ouvir uma linda música de um velho rádio, e é legal da sua parte manter o rádio na casa.[Michael Wolmetz com sua namorada Debora Brakarz]Michal Wolmetz: Então, esse é o anel que meu pai deu para a minha mãe, e nós podemos deixá-lo aí. E ele eco-nomizou e comprou esse anel e pediu minha mãe em casamento, então, eu pensei em dá-lo para você para que

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Tradução integral da conferencia de Jake Barton no TED

ele possa estar conosco neste momento também. Então, eu vou compartilhar um microfone com você, Debora. Cadê o dedo direito?Debora Brakarz: (chorando) MW: Debora, casa comi-go, por favor? DB: Sim. É claro. Eu te amo. (Beijos) MW: Então crianças, assim foi como eu e sua mãe nos casamos, em uma cabine na Grande Estação Central, com o anel do meu pai. Meu avô foi um taxista por 40 anos. Ele costumava pegar as pessoas aqui todos os dias. Então, parece certo.Jake Barton: Eu tenho que dizer que não escolhi essas amos-tras para fazer vocês chorarem, porque todas fazem vocês cho-rar. Todo o projeto é baseado nesse ato de amor que é ouvir. E o movimento de construir uma instituição de um momento de conversa e escuta é muito do que minha empresa, a Local Pro-jects, está fazendo com nossos projetos em geral. Somos uma empresa de design de mídia e nós trabalhamos com uma ampla gama de instituições, construindo instalações de mídias para museus e espaços públicos.

Nosso último trabalho é o Museu de Arte de Cleveland, para o qual criamos um projeto chamado Galeria Um. A Galeria Um é um projeto interessante pois começou com essa grande expan-são de U$350 milhões para o Museu de Arte de Cleveland e, nós trouxemos essa peça especificamente para aumentar a ca-pacidade e atrair novos públicos, ao mesmo tempo que o pró-prio museu está crescendo.

Glenn Lowry, o chefe do MoMa, explica melhor quando diz: “Nós queremos que os visitantes parem de ser visitantes. Vi-sitantes são passageiros. Queremos pessoas que morem aqui, pessoas que sejam donas disso.”Então, o que estamos fazendo são várias formas de as pessoas interagirem com o material dentro dessas galerias. Assim, você ainda pode ter uma experiência tradicional em uma galeria,

mas, se você estiver interessado, você pode se envolver com qualquer obra de arte e ver o seu contexto original, de onde ela veio, ou até manipulá-la. Por exemplo, você pode clicar nessa cabeça de leão e aqui está sua origem: em 1300 A.C. Ou essa peça aqui, você pode ver a cama, o que realmente muda o jeito que você pensa sobre esse tipo de pintura. Essa é uma das minhas preferidas, porque você vê o próprio estúdio. Esse é o busto de Rodin. Você pode obter a sensação des-sa incrível fábrica de criatividade. Isso te fazer pensar, literalmente, nas centenas ou milhares de anos da criati-vidade humana e como cada trabalho individual compõe uma parte da história. Esse é Picasso, claro que incorpo-rando tanto do século 20.

A nossa próxima interface, que eu vou mostrar para vo-cês, aproveita essa ideia de linhagem da criatividade. É um algoritmo que te permite navegar pela coleção atual do museu usando reconhecimento facial. Essa pessoa está fazendo diferentes caretas, e o programa mostra quatro objetos diferentes da coleção que se relacionam com essa careta. E vocês podem imaginar que, à medida que as pessoas estão desempenhando dentro do próprio museu, você tem essa sensação de conexão emocional, essa forma com que nossas caras se conectam com mi-lhares e dezenas de milhares de anos. Essa é uma inter-face que te permite desenhar e buscar quatro objetos que usam as mesmas formas do seu desenho. Assim, cada vez mais, estamos tentando achar formas de as pessoas real-mente criarem coisas dentro do museu, de serem criati-vas, mesmo que olhando e entendendo a criatividade de outras pessoas.

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Nessa parede, a parede de coleções, você consegue ver todas as 3000 obras ao mesmo tempo, e ainda pode criar a sua própria caminhada no museu e compartilhá-la. Alguém pode fazer um passeio com o diretor do museu ou com o seu priminho.Mas, durante todo o tempo que trabalhamos nesse projeto para Cleveland, nós também trabalhamos, em paralelo, no nosso maior projeto até hoje, o Memorial e Museu de 11 de Setembro.

Nós começamos em 2006, como parte de uma equipe com Thinc Design para criar o plano diretor original do museu. En-tão, fizemos todo o design de mídia, tanto para o museu quanto para o memorial e, depois, a produção das mídias. O memorial foi inaugurado em 2011 e o museu irá abrir no próximo ano, em 2014. E vocês podem ver, através dessas imagens, que o local é tão cru e quase arqueológico. E claro, o próprio evento é muito recente, está em algum lugar entre a história e os even-tos atuais. Foi um grande desafio imaginar como você faz jus a um espaço como esse e a um evento como esse, para realmente contar a história.

Então nós começamos com um novo jeito de pensar sobre a construção de uma instituição, através de um projeto chama-do “Fazer História”, que lançamos em 2009.Estima-se que um terço do mundo assistiu ao vivo ao 11 de setembro, outro ter-ço ouviu sobre ele em 24 horas, tornado-o, por natureza, um momento sem precedentes de conhecimento global. Então nós lançamos o programa para captar as histórias de todo o mun-do, através de vídeos, fotos, histórias escritas das experiências das pessoas naquele dia, o que foi, na verdade, um risco enor-me para a instituição fazer seu primeiro filme em uma platafor-ma aberta. Mas isso ocorreu junto com essa cabine de histórias orais,realmente a mais simples que já fizemos, em que você se localiza em um mapa. É em 6 idiomas e você pode contar sua

própria história sobre o que aconteceu com você naquele dia. Quando começamos a ver as incríveis imagens e his-tórias que vieram de todo o mundo - isso é obviamente parte de um trem de aterrissagem - nós realmente come-çamos a entender que existia essa incrível simetria entre o próprio evento, o jeito que as pessoas estavam contan-do as histórias do evento e como nós mesmos precisáva-mos contar essa história.

Essa imagem, em particular, realmente prende nossa atenção, porque resume o evento tão bem. Essa é uma foto do túnel Brooklyn-Battery. Um bombeiro está preso no trânsito, e, então, os bombeiros correm 2,4 km para o local, com mais de 30kg de equipamentos nas suas cos-tas. E recebemos esse incrível e-mail que dizia: “Enquan-to eu via milhares de fotos no local, eu, inesperadamente, vi a foto do meu filho. Foi um choque emocional, mas também, uma benção achar essa foto,” e ele estava escre-vendo porque ele disse: “Eu gostaria de agradecer pesso-almente ao fotógrafo por postar esta foto, que significou mais do que as palavras podem descrever ter acesso ao que, provavelmente, é a última foto tirada que eu vou ver do meu filho”.

Isso realmente fez a gente reconhecer o que essa ins-tituição precisava ser para conseguir contar a história. Não podemos ter apenas um historiador ou um curador narrando objetivamente, em terceira pessoa, um evento como esse, quando você têm as testemunhas da história que contarão do jeito delas através do museu.

Então, começamos a imaginar o museu, junto com a equipe de criação e os curadores,pensando que a primei

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ra voz que ouviríamos dentro do museu seria a de outros visi-tantes.Assim, criamos essa ideia de uma galeria aberta chama-da “Nós Lembramos”. E eu vou mostrar para vocês apenas uma parte, mas vocês vão ter uma noção do que é realmente ir para esse momento no tempo e ser transportado para o passado.(Video) 1ª Voz: Eu estava em Honolulu, Hawaí. 2ª Voz: Eu es-tava no Cairo, Egito.3ª Voz: Na Champs-Élysées, Paris. 4ª Voz: Na faculdade, U.C. Berkeley.5ª Voz: Eu estava na Times Square. 6ª Voz: São Paulo, Brasil.(Múltiplas vozes)7ª Voz: Era, provavelmente, 11 horas da noite.8ª Voz: Eu estava dirigindo para o trabalho, às 5:45 da manhã, no horário local.9ª Voz: Nós estávamos em uma reunião quando alguém entrou e disse: “Meu Deus, um avião acabou de bater no World Trade Center!”10ª Voz: Tentando, freneticamente, achar um rádio.11ª Voz: Quando eu ouvi no rádio...12ª Voz: Ouvi no rádio.(Múltiplas vozes)13ª Voz: Eu recebi uma ligação do meu pai. 14ª Voz: O telefone tocou e me acordou. Meu sócio me disse para ligar a televisão.15ª Voz: Então eu liguei a TV.16ª Voz: Todos os canais na Itália estavam mostrando a mesma coisa.17ª Voz: As torres gêmeas. 18ª Voz: As torres gêmeas.JB: E você sai daí para esse espaço aberto, essa caverna. Essa é a chamada parede de contenção. É a parede original, escavada na base do World Trade Center, que resistiu a pressão do rio Hudson por um ano inteiro, depois do atentado. Então pensa-mos em manter essa sensação de autenticidade, de presença daquele momento na própria exposição. E nós contamos as

histórias de quem estava dentro das torres através dessa mesma colagem de som. Estamos literalmente ouvindo as pessoas falarem sobre a visão dos aviões vindo em di-reção ao prédio, ou quando elas estão descendo as esca-das. E enquanto você anda pela exposição, até onde fala sobre a recuperação, nós projetamos, diretamente sobre esses momentos de aço retorcido todas as experiências das pessoas que literalmente escavaram do topo da pilha. Assim, vocês podem ouvir as histórias... e as pessoas que estavam trabalhando nas brigadas, enquanto você está vendo as milhares de experiências deste momento.

E quando você sai do momento de narração das histó-rias, entendendo sobre o 11 de setembro, o museu volta a ser um local de escuta e fala com os visitantes, pergun-tando sobre suas próprias experiências no 11 de setem-bro. E nós fazemos perguntas que, na verdade, não têm uma resposta. O tipo de pergunta que o próprio evento do 11/09 faz para todos nós. Perguntas como: “Como a democracia pode dar liberdade e segurança ao mesmo tempo?” “Como 11/09 pode ter acontecido?” “Como o mundo mudou depois de 11/09?”

E essas histórias orais, que estamos registrando por anos, são misturadas com as entrevistas que estamos fazendo com pessoas como Donald Rumsfeld, Bill Clinton, Rudy Giuliani. A gente mistura essas diferentes personalida-des e essas diferentes experiências e pontos de reflexão sobre o 11 de setembro. E de repente, a instituição, mais uma vez, vira uma experiência de escuta. Então, eu vou mostrar para vocês um pequeno trecho que fizemos com algumas dessas vozes, e vocês realmente podem sentir a poesia da reflexão de todos nesse evento.

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(Video) 1ª Voz: 11/09 não foi apenas uma experiência nova--iorquina.2ª Voz: É algo que dividimos e que nos une.3ª Voz: E eu sabia, quando eu vi, que as pessoas que estavam lá naquele dia, que imediatamente foram ajudar pessoas conheci-das e desconhecidas iriam nos ajudar a passar por isso.4ª Voz: Toda a manifestação de carinho e emoção que veio do nosso país é algo que realmente vai ficar para sempre comigo.5ª Voz: Ainda hoje eu rezo e penso naqueles que perderam suas vidas, e naqueles que deram suas vidas para ajudar os ou-tros, mas eu também me lembro do tecido desse país,o amor, a compaixão, a força, eu assisti a uma nação se unir no meio de uma terrível tragédia.JB: E então as pessoas saem do museu, refletindo sobre a ex-periência e sobre seus próprios pensamento em relação a isso, e elas chegam ao espaço do memorial, porque eles voltaram um nível, e nós realmente nos envolvemos no memorial depois que trabalhamos no museu por alguns anos. O designer origi-nal do memorial, Michael Arad,tinha essa imagem na cabeça, de todos os nomes aparecendo indiferenciados, de forma quase aleatória, uma reflexão poética sobre a natureza de um ato de terrorismo. Mas foi um grande desafio para as famílias, para a fundação, certamente para os primeiros ajudantes, e houve uma negociação e uma solução foi encontrada para criar não uma ordem cronológica, ou alfabética, mas uma ordem através do que é chamado de adjacência significativa. Então, esses são grupos de nomes que aparecem sem diferenciação, mas na ver-dade em uma ordem, e nós, junto com Jer Thorp, criamos um algoritmo para processar quantidades massivas de informação e conectar todos esses nomes diferentes. Essa é uma imagem do próprio algoritmo com os nomes misturados para manter a privacidade,mas vocês podem ver que esses blocos de cor são os quatro voôs, as duas torres, o primeiros ajudantes, os dife-

rentes andares.

As linhas verdes são as conexões interpessoais que foram solicitadas pelas próprias famílias. Assim, quando você chega ao memorial, você consegue ver a organização glo-bal dentro das próprias piscinas individuais.Vocês po-dem ver como a geografia do evento está refletida nesse memorial, e vocês podem procurar o nome de uma pes-soa, ou nesse caso, de um funcionário, Cantor Fitzgerald, e ver como todos esses nomes, centenas de nomes, estão organizados no próprio memorial,e usar isso para nave-gar pelo memorial. E mais importante, quando você está realmente no local do memorial, você consegue ver essas conexões. Você consegue ver as relações entre os diferen-tes nomes. E de repente, o que era um grupo indiferen-ciado e anônimo de nomes torna-se uma realidade, como uma vida. Nesse exemplo, Harry Ramos, que era o chefe da mesa de um banco de investimentos, parou para so-correr Victor Wald, no 55º andar da torre Sul. E Ramos disse a Wald, de acordo com testemunhas, “Eu não vou te deixar”. A viúva de Wald pediu para que eles fossem listados um ao lado do outro.Três gerações atrás, nós recrutamos pessoas para saírem e registrarem as histórias de pessoas comuns. Hoje, cla-ro, há uma quantidade sem precedentes de histórias que estão sendo registradas para as futuras gerações. E essa é a nossa esperança, que existe poesia em cada uma das nossas histórias.Muito obrigado.”

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