Olavo de Carvalho - Descartes E a Psicologia Da Duvida

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  • 5/23/2018 Olavo de Carvalho - Descartes E a Psicologia Da Duvida

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    DESCARTES E A PSICOLOGIA DA DVIDA(1)

    Colquio Descartes da Academia Brasileira de Filosofia

    Faculdade da Cidade, Rio de Janeiro, 9 de maio de 1996

    "a !erdad es lo que es si#ue siendo !erdad

    aunque se $iense al re!%s&"A''* +ACAD

    Descartes asse#ura-nos que a seq./ncia das Meditaesque o le!a do questionamento

    do mundo e0terior desco2erta do cogito n3o % a$enas um modelo l#ico, uma

    articula43o 5i$ot%tica de $ensamentos $ens!eis, mas uma e0$eri/ncia !i!ida, uma

    narrati!a de $ensamentos $ensados& +as ter sido 2oa a sua auto-o2ser!a43o7

    8odemos dar $or su$osta a fidedi#nidade do seu relato7 +ais ainda, $odemos dar $or

    su$osta a uni!ersalidade $aradi#mtica dessa seq./ncia de $ensamentos, admitindo

    que se dar de modo i#ual ou semel5ante, com semel5antes ou i#uais resultados, em

    todo 5omem que se dis$on5a a ree0aminar desde os fundamentos o edifcio de suas

    cren4as7 :er $oss!el a um 5omem reali;ar e0$eri/ncia similar, ou, ao contrrio, foi

    Descartes quem e0$erimentou de fato coisa totalmente outra, dei0ando-se en#anar e

    tomando $or descri43o o que % $ura in!en43o&

    !ida % um $ensamento, e, no instante em que a $enso, n3o $osso

    du!idar de que a $enso& A autoconfian4a na solide; metafsica do e#o $ensante sur#e

    como $oderosa com$ensa43o $sicol#ica $ara a $erda da confian4a na realidade do

    "mundo"&

    : que, t3o minucioso em descre!er os $ensamentos que antecedem o estado de

    d>!ida, Descartes % estran5amente e!asi!o quanto ao estado de d>!ida mesmo& 'a

    !erdade, ele n3o o descre!e? afirma-o, a$enas, e, saltando imediatamente da descri43o

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    $ara a dedu43o, $assa a tirar as conseq./ncias l#icas que a constata43o desse estado

    l5e im$=e&

    Fa4amos ns o que n3o fe; Descartes& entemos refrear o automatismo do im$ulso

    conseq.encialista, e deten5amo-nos $or um momento na descri43o do estado de d>!ida&@m que consiste esse estado7

    @m $rimeiro lu#ar, n3o % um estado uma $osi43o esttica em que um 5omem $ossa

    $ermanecer inalteradamente, como $ermanece triste ou a2sorto, im!el ou deitado&

    uma alternncia entre um sim e um n3o, uma im$ossi2ilidade de deter-se num dos

    termos da alternati!a sem que o outro !en5a dis$utar-l5e a $rima;ia& 8ois o sim ou o

    n3o, t3o lo#o aceitos como definiti!os, eliminariam imediatamente a d>!ida, que % feitade sua coe0ist/ncia anta#nica e de nada mais& +as esse anta#onismo n3o % esttico? %

    m!el& A mente em d>!ida $assa incessantemente de um dos termos ao outro, sem

    encontrar um $onto de a$oio onde $ossa re$ousar e "estar"& : que, como cada um dos

    termos % a ne#a43o do outro, a mente n3o $oderia deter-se nele sem, $or um instante,

    ne#ar o outro? e,precisamente nesse instante, no est em dvida est afirmando ou

    ne#ando, afirmando uma coisa e ne#ando a outra, ainda que n3o consi#a $erse!erar na

    afirma43o ou na ne#a43o sem que l5e ocorram mil e uma ra;=es $ara a2andon-la& @,

    no instante em que ne#a ou afirma, a d>!ida su$rime-se a si mesma como d>!ida, e luta

    $ara se esta2elecer como afirma43o ou ne#a43oE mas fracassa, e % s neste fracasso

    que consiste $recisamente, a d>!ida& :e#ue-se a conclus3o fatal? impossvel uma

    dvida que no se ponha em dvida a si mesma, uma dvida que, suspendendo a

    alternncia, se imponha como "estado" e permanea& Ao tomar a d>!ida como um

    "estado", omitindo que se trata de uma alternncia entre dois momentos anta#nicos,

    Descartes a coisifica e a toma como uma certe;a? "'3o $osso du!idar de que du!ido no

    instante em que du!ido", frase que Descartes toma como e0$ress3o da mais $atente

    o2!iedade, manifesta no entanto um contra-senso l#ico e uma im$ossi2ilidade

    $sicol#ica& +ais certo %? ao du!idar, $on5o tudo em d>!ida, inclusi!e a d>!ida mesma& A

    d>!ida n3o % um estado? % uma sucess3o e coe0ist/ncia de estados anta#nicos, % um

    n3o $oder estar ()&

    que le!a Descartes ao erro % o fato de que confunde a d>!ida com a ne#a43o, mais

    $ro$riamente com a ne#a43o 5i$ot%tica& 8osso efeti!amente $rodu;ir uma ne#a43o

    5i$ot%tica e re$eti-la indefinidamente& 8osso mesmo am$li-la 5i$oteticamente, % claro

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    at% que a2ranGa a totalidade do que Gul#o sa2er& +as n3o $osso "du!idar" do meu

    sa2er sem ao mesmo tem$o afirm-lo reiteradamente, na medida em que s assim

    $oderei intercalar s suas afirma4=es sucessi!as as sucessi!as ne#a4=es, e a estas as

    afirma4=es, cuGo crculo !icioso constitui a d>!ida&

    Colocado nesses termos, o cogito cartesiano se redu; a$enas a uma no!a e alis

    2astante ne2ulosa enuncia43o do anti#o ar#umento de :crates contra o c%$tico, de que

    n3o se $ode ne#ar sem afirmar a ne#a43o, sem afirmar $ortanto al#uma coisa& +as,

    !istas as coisas assim, a 2em $ouco se redu; a desco2erta cartesiana? lon#e de ter

    instaurado um no!o fundamento, crtico ou ne#ati!o, $ara o mundo do sa2er, ela n3o fe;

    sen3o demonstrar no!amente, $elas !ias tortuosas de uma falsa autodescri43o

    $sicol#ica, o $rimado l#ico da afirma43o so2re a ne#a43o& : que o recon5ecimentodeste $rimado %, no mesmo ato, a ne#a43o da d>!ida como ato fundante& A desco2erta

    de Descartes % uma n3o-desco2erta, % a desco2erta da im$ossi2ilidade de desco2rir o

    que quer que seGa $or uma !ia em cuGa defini43o mesma est contida uma

    autocontradi43o intoler!el (H)&

    +as, com isto, demonstrei a$enas que a d>!ida, como tal, n3o $ode ser!ir de

    fundamento crticoE n3o e0$us ainda os fundamentos que, $or sua !e;, $ossi2ilitam a

    d>!ida& @ este % o $onto decisi!o, $ois, se 5 um al#o "$or trs" da d>!ida, % este al#o, e

    n3o a d>!ida, que constitui o $onto de a$oio firme que Descartes 2usca!a, e que

    acreditou in#enuamente ter encontrado na constata43o da d>!ida&

    Descartes di; que a d>!ida % uma certe;a no instante em que % $ensada& +as isto %

    falso? o que % certe;a % a refle03o $osterior que afirma a realidade da e0$eri/ncia da

    d>!ida& 'o instante mesmo da d>!ida, o que 5 %, como !imos, uma alternncia entre

    afirma43o e ne#a43o, e $ortanto a im$ossi2ilidade mesma de afirmar um estado

    qualquer, se $or estado entendemos, como se de!e entender, a coincid/ncia entre um

    Gu;o de fato e o sentimento que o !alori;a ne#ati!a ou $ositi!amente, como ocorre na

    triste;a, na rai!a, na $ressa, na es$eran4a etc& A d>!ida n3o % um estado, $ela sim$les

    ra;3o de que nela o sentimento, que $ode ser de ansiedade, de es$eran4a, de

    curiosidade, etc&, n3o coincide com um Gu;o determinado, mas $ro!%m Gustamente da

    im$ossi2ilidade de afirmar ou ne#ar um Gu;o& @la % antes um momento de sus$ens3o

    entre estados, um !a;io a#itado que cont%m em #erme !rios estados $oss!eis $elo

    menos dois e n3o se resol!e em nen5um deles sem su$rimir-se a si mesma&

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    5omem $ortanto nunca "est" em d>!ida? a$enas $assa $or ela, $recisamente como

    transi43o entre estados& s quando a d>!ida dei0a de ser !i!/ncia $resente $ara

    $assar a ser o2Geto de refle03o que sur#e esta certe;a $uramente retros$ecti!a e

    narrati!a? "No consegui, at agora, estaili!arme na negao ou na a#irmao$"@0iste,

    $ortanto, n3o s distin43o l#ica como tam2%m se$ara43o de fato entre a d>!idaenquanto !i!/ncia $resente e a d>!ida enquanto o2Geto de recorda43o e refle03o e %

    esta que % certa e indu2it!el (I), n3o aquela, em2ora Descartes tome uma $ela outra e

    nos re$asse como e!id/ncia intuiti!a direta o que % fruto de refle03o $osterior& somente

    esta refle03o que, dando um nome alternncia !i!enciada, confere artificialmente a

    unidade de um "estado" ao que % na !erdade uma sucess3o de estados que se

    su$rimem mutuamente ou uma coe0ist/ncia de estados $uramente $otenciais, dos quais

    cada um s se $ode atuali;ar custa da e0clus3o dos outros& Conferindo ao !a;io daalternncia a consist/ncia $ositi!a de um estado, no mesmo instante Descartes

    transforma a d>!ida em mera ne#a43o 5i$ot%tica, tomando ent3o como estado

    $sicol#ico efeti!o o que % a$enas o conceito l#ico de um estado $oss!el&

    8ara $iorar ainda mais as coisas, na afirma43o refle0i!a da realidade da d>!ida est3o

    $ressu$ostas duas cren4as? a cren4a na continuidade da consci/ncia entre a d>!ida e a

    refle03o, e o con5ecimento da distin43o entre !erdade e falsidade&

    1 Aquele que reflete so2re a d>!ida sa2e que ainda % "o mesmo" que te!e a d>!idaE e se

    o ato de du!idar % formalmente distinto do ato da refle03o, o eu consciente, ao refletir,

    sa2e que % suGeito de doisatos distintos distintos lo#icamente e distintos no tem$o ,

    donde se conclui que % esse eu % lo#icamente e tem$oralmente anterior aos dois atos e

    inde$endente deles? n3o % o ato da d>!ida que funda a certe;a do eu, mas, ao contrrio,

    a certe!a da continuidade do eu a garantia nica de que a dvida #oi realmente

    vivenciada$ 8ois a d>!ida, se n3o rece2esse da refle03o $osterior o nome que l5e

    confere a a$arente unidade de um estado, aca2aria $or se redu;ir a mera sucess3o de

    ne#a4=es e afirma4=es irrelacionadas, sucessi!as alucina4=es de um suGeito

    esqui;ofrenicamente $lural, destitudo do im$%rio de si e dissol!ido no flu0o atomstico

    dos seus estados& 8ara $oder ser o2Geto de refle03o, a d>!ida rece2e a artificial unidade

    de um nomeE e se lo#o em se#uida a mente se esquece de que essa unidade % um mero

    ente de ra;3o e a toma como unidade su2stancial, ent3o se trata de um desses casos de

    auto-5i$nose refle0i!a em que o nome $rodu; ma#icamente, a posteriori, a realidade do

    seu o2Geto&

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    :endo formalmente distintos, os dois atos s3o distintos tam2%m em$iricamente, isto %,

    no tem$o?primeirodu!ido (isto %, !ou e !en5o entre sucessi!as afirma4=es e ne#a4=es),

    depois reflito que du!idei (isto %, unifico so2 o nome "d>!ida" essa multi$licidade de

    !i!/ncias anta#nicas)& +as a unidade do eu, que est su2entendida nessa refle03omesma, e $ortanto na certe;a da d>!ida, % aquela continuidade no tem$o, que se

    denomina mem%riae recordao? a memria, estando $ressu$osta na refle03o, % l#ica

    e tem$oralmente anterior a ela? lon#e de $oder fundar a nossa confian4a na memria, % a

    d>!ida que de$ende dela $ara ter um fundamento l#ico e $ara tornar-se $oss!el no

    cam$o dos fatos $sicol#icos&

    +as, se a d>!ida de$ende da #arantia que l5e % dada $elo eu e $ela memria, ent3o elan3o tem nen5um $oder fundante& coisa fundada, % certe;a secundria e deri!ada, %

    o2ra de um a#ente mais $rofundo e mais inquestion!el&

    H 8or%m, a d>!ida su2entende al#o mais& Como % $oss!el du!idar7 A $ossi2ilidade da

    d>!ida re$ousa inteiramente no nosso $oder de conce2er que as coisas seGam de um

    outro modo que n3o aquele com que se nos a$resentam num dado momento& A d>!ida

    assenta-se numa suposioE ela requer e su2entende o $oder de su$or& ra, tendo as

    coisas se a$resentado ao suGeito de um certo modo, e n3o de outro, este outro e su$osto

    modo s $ode a$resentar-se consci/ncia como o2ra do suGeito mesmo, como $roduto

    de ima#ina43o ou conGetura& 8ara sa2er que du!ida, % necessrio ent3o que o suGeito

    saia que sup&sE que se recon5e4a $ortanto como suGeito n3o a$enas de dois atos, como

    aca2amos de !er, mas de tr's? o ato de duvidar, o ato de re#letira d>!ida e, antes de

    am2os, o ato de suporou ima#inar& A ima#ina43o %, somando-se continuidade do eu e

    memria, um terceiro requisito e um terceiro fundamento da $ossi2ilidade da d>!ida&

    I +as, se o suGeito n3o $erce2esse nen5uma diferen4a entre as coisas tal como se l5e

    a$resentam e as coisas tal como as su$=e, n3o $oderia tomar consci/ncia de que su$s,

    $ois n3o 5a!eria $ara ele diferen4a entre su$or e $erce2er& @is, $ortanto, que a

    consci/ncia dessa diferen4a %, ela tam2%m, um requisito e um fundamento da

    $ossi2ilidade da d>!ida& 8ara du!idar, necessito distin#uir, na re$resenta43o, o dado e o

    construdo, o rece2ido e o in!entado, aquilo que me !em $ronto e aquilo que fa4o e

    $ro$on5o& o#o, est a $ressu$osta a consci/ncia da diferen4a entre o o2Geti!o e o

    su2Geti!o e, $ortanto, a cren4a na o2Geti!idade do o2Geti!o e na su2Geti!idade do su2Geti!o&

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    K +ais ainda? se o suGeito confundisse esses dois domnios, acreditando que su$s o

    $erce2ido e $erce2eu o su$osto, teria $erdido a continuidade da consci/ncia e da

    memria, que %, como !imos, condi43o de $ossi2ilidade da d>!ida& o#o, a d>!ida so2re

    a realidade do mundo n3o $ode se a$resentar como sim$les escol5a entre duas$ossi2ilidades de !alor i#ual e id/ntica ori#em, mas sempre como escolha entre um dado

    e um suposto, entre o receido e o inventado&

    K '3o % $oss!el $ortanto du!idar da realidade do mundo sem sa2er de antem3o que

    esta d>!ida, e a su$osi43o que a fundamenta, s3o $uras in!en4=es do $r$rio suGeito, e

    que esta in!en43o % formal e tem$oralmente distinta do ato de $erce2er, 2em como do

    conte>do $erce2ido& A d>!ida % uma su$osi43o de que um mundo in!entado % mais!lido que o mundo rece2ido, su$osi43o que se funda $or sua !e; na consci/ncia de

    in!entar, de su$or e de fin#ir& A d>!ida quanto realidade do mundo % sem$re e

    necessariamente um fin#imento, e quanto mais o fin#idor se esforce $ara le!ar esta

    d>!ida a s%rio, $ara torn-la cada !e; mais !erossmil, tanto mais o 2ril5o mesmo da

    per#ormanceatestar a diferen4a entre o !erossmil e o !erdadeiro, assim como, no

    teatro, concedemos nossos a$lausos ao ator $recisamente $orque sa2emos que ele no

    o $ersona#em&

    6 +as esta consci/ncia de fin#ir seria im$oss!el se n3o se fundasse, a seu turno, na

    consci/ncia da diferen4a entre $ensar e ser, ima#inar e a#ir& 8ois, su2entendida a

    consci/ncia da diferen4a entre su$or e $erce2er, $aralelamente consci/ncia que o eu

    tem de suas $r$rias a4=es, n3o 5a!eria como ne#ar que o eu $ensante tem consci/ncia

    da diferen4a entre a43o su$osta e a43o reali;ada, de !e; que a a43o reali;ada n3o %

    somente $ensada, mas $erce2ida fisicamente, e0atamente como os seres do mundo

    sens!el& '3o $osso $ortanto colocar em d>!ida os seres do mundo sens!el sem no

    mesmo ato colocar tam2%m em d>!ida os atos fsicos que me !eGo reali;ando, como $or

    e0em$lo os mo!imentos de min5as m3os e $ernas& +as, ao mesmo tem$o, n3o os $osso

    colocar em d>!ida sem questionar, no mesmo instante, a continuidade e unidade do eu, a

    qual no entanto est $ressu$osta, como !imos, no ato mesmo de du!idar do que quer

    que seGa& @is a outro moti!o $elo qual a d>!ida, sendo d>2ia $or sua nature;a mesma,

    n3o $oderia instalar-se sen3o $ondo-se tam2%m a si mesma em d>!ida, isto %, sa2endo-

    se fundada numa su$osi43o e num fin#imento !oluntrio& @is tam2%m $or que a d>!ida %

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    t3o rara e dificultosa? ela im$lica um mo!imento que se desmente a si mesmo, que

    coloca em quest3o as condi4=es mesmas que o $ossi2ilitam (K)&

    L Finalmente, a d>!ida s % $oss!el quando se sa2e que al#o, seGa no $erce2ido, seGa

    no su$osto, % insatisfatrio, que n3o atende a um requisito fundamental de !eracidade&+as como $oderia o suGeito du2itante e0i#ir !eracidade de suas su$osi4=es ou

    $erce$4=es se n3o ti!esse nen5uma id%ia a res$eito da !eracidade7 @sta e0i#/ncia seria

    inconce2!el sem uma id%ia da !erdade, ainda que como mero o2Geto ima#inrio de

    deseGo& deseGo de fundamento $ressu$=e no suGeito ao menos a $ossi2ilidade de

    ima#inar que seus con5ecimentos $ossam ser mais se#uros do que realmente ele sente

    que o s3o num dado momento, ou seGa, a !erdade como ideal e a o$43o $ela !erdade&

    +as, ao mesmo tem$o, !imos que o suGeito n3o con5ecia esta !erdade somente comoideal a2strato, mas G tin5a id%ia depelo menos umadiferen4a efeti!a entre !erdade e

    falsidade? a diferen4a entre o dado e o su$osto, acom$an5ada da consci/ncia !erdadeira

    de que o su$osto n3o foi dado, nem dado o su$osto&

    A d>!ida er#ue-se, assim, so2re todo um edifcio de dados e $ressu$ostos? lon#e de ser

    lo#icamente $rimeira, ela % um $roduto requintado e ela2oradssimo de uma mquina de

    sa2er& on#e de ter um $oder fundante, ela n3o % sen3o uma manifesta43o mais ou

    menos acidental e secundria de um sistema de certe;as&

    : que, se assim %, se o $rimado da d>!ida metdica % a$enas o $rimado de um

    equ!oco, ent3o ficam so2 sus$eita, i#ualmente, o $rimado Mantiano do $ro2lema crtico,

    o do#ma $ositi!ista da im$ossi2ilidade de o2ter certe;as metafsicas !lidas, e muitas

    outras cren4as que o 5omem de 5oGe toma, mesmo a contra#osto, como !erdades 2!ias

    e $atentes& +as isto G % mat%ria $ara outras comunica4=es, que ser3o a$resentadas em

    outras o$ortunidades& +uito o2ri#ado&

    'A:

    1& 8rimeira $arte resumida do te0to "Du!idar da D>!ida e Criticar o Criticismo?

    8reliminares de um Retorno +etafsica Do#mtica", distri2udo aos alunos do

    (eminrio )ermanente de *iloso#ia e +umanidadesem mar4o de 1996&

    & Ao di;er "sucess3o e coe0ist/ncia", $are4o estar $ronunciando um monumental

    contra-senso& +as o sim e o n3o que com$=em a d>!ida s3o coe0istentes so2 um

    as$ecto, sucessi!os $or outro& Coe0istentes lo#icamente como termos de uma

    contradi43o, s3o sucessi!os $sicolo#icamente, isto %, entram no $alco da consci/ncia

    7

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    de modo cclico, rotati!o? um entra, o outro sai, como o dia e a noite, que coe0istem

    no c%u e se sucedem num $onto da terra&

    H& Nma $rimeira !ers3o desta anlise da d>!ida cartesiana encontra-se em meu li!reto

    niversalidade e -strao e .utros /studos(:3o 8aulo, :$eculum, 19OH), so2 o

    ttulo " cogitocartesiano lu; da $sicolo#ia es$iritual"&I& "Certo e indu2it!el" ou "incerto e du!idoso" s3o $redicados que n3o se a$licam ao

    fato como tal, mas aos Gu;os que fa;emos a res$eito dele&

    K& @la % uma tor43o do a$arato mental 5umano, um #esto doloroso que se auto-su$rime,

    e que raros 5omens t/m condi43o de su$ortar $or muito tem$o sem #ra!e risco $ara

    sua inte#ridade $sicol#ica& A $ossi2ilidade de assumir esse risco e !enc/-lo re$ousa

    na e0ist/ncia de um cor$o de cren4as t3o arrai#ado, t3o slido, que o 5omem $ossa

    se dar o lu0o de sair dele numa !ia#em mental, se#uro de reencontr-lo na !olta&@ssa $ossi2ilidade, $or sua !e;, s se cum$re nas sociedades e nas culturas ur2anas

    altamente diferenciadas e est!eis, que d3o ao indi!duo $ensante o es$a4o $ara

    inocentes !os de ima#ina43o que em nada afetar3o sua conduta de cidad3o ou de

    s>dito 5onrado e cum$ridor de seus de!eresE que l5e d3o, mais ainda, es$a4o li!re

    $ara $ensar uma coisa e fa;er outra, $ara culti!ar aquela 5i$ocrisia defensi!a que %

    notoriamente ausente entre os $rimiti!os, e que, $ara o mal e $ara o 2em, % uma

    slida $rote43o da consci/ncia indi!idual contra a tirania do discurso coleti!o& Da a

    coe0ist/ncia $acfica entre a audcia re!olucionria da d>!ida cartesiana e o

    conser!adorismo da "moral $ro!isria" que a $ossi2ilita&

    la!o de Car!al5o

    8