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Padrões Setoriais de Mudança Tecnológica: rumo a uma taxonomia e uma teoria* Keith Pavitt Science Policy Research Unit, University of Sussex, Brighton, Reino Unido O propósito deste artigo é descrever e explicar padrões setoriais de mudança tecnológica, conforme revelados nos dados de cerca de 2000 inovações significativas na Grã-Bretanha desde 1945. A maior parte do conhecimento tecnológico se mostra não como “informação” que é genericamente aplicada e facilmente reproduzível, mas como específica a firmas e aplicações, cumulativa em seu desenvolvimento e variável entre setores quanto às fontes e à direção. As firmas inovadoras, principalmente nos setores eletrônico e químico, são relativamente grandes e desenvolvem inovações para uma ampla série de grupos de produtos específicos, dentro de seu setor principal, mas para relativamente poucos [grupos de produtos] fora [de seu setor]. As firmas nos setores de mecânica e instrumentos de precisão são relativamente pequenas e especializadas, e estão em simbiose com as grandes firmas de setores intensivos em escala – como metalurgia e veículos –, as quais fazem uma contribuição significativa para a tecnologia de processo das primeiras. Nas firmas têxteis, por outro lado, a maioria das inovações de processo vêm dos fornecedores. Estas características e variações podem ser classificadas numa taxonomia de três partes, constituída de firmas (1) dominadas pelos fornecedores; (2) intensivas em produção e (3) baseadas em ciência. Ela pode ser explicada pelas fontes de tecnologia, pelas demandas dos usuários e pelas possibilidades de apropriação. Esta explicação tem implicações para nossa compreensão das fontes e da direção da mudança tecnológica, para o comportamento de diversificação da firma, para a dinâmica da relação entre tecnologia e estrutura industrial e para a formação de habilidades e vantagens tecnológicas ao nível das firmas, das regiões e dos países. * O artigo a seguir baseia-se extensivamente no banco de dados sobre inovações britânicas do SPRU, descrito em J. Townsend, F. Henwood, G. Thomas, K. Pavitt e S. Wyatt (1981). “Innovations in Britain Since 1945”. SPRU Occasional Paper Series No. 16. O autor agradece a Graham Thomas e Sally Wyatt que colaboraram no trabalho estatístico, a numerosos colegas dentro e fora do SPRU por seus comentários e críticas, e a Richard Levin e dois pareceristas anônimos por seus comentários detalhados e úteis a uma versão anterior, mais longa e desorganizada. A pesquisa foi financiada pelo Leverhulme Trust, como parte do programa do SPRU sobre inovação e competitividade. Originalmente publicado em Research Policy, Amsterdã, vol. 13, no. 6 (dezembro de 1984), pp. 343-373. Tradução por José Ricardo Fucidji; revisão e figuras por Vanderléia Radaelli.

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Padrões Setoriais de Mudança Tecnológica:

rumo a uma taxonomia e uma teoria*

Keith Pavitt

Science Policy Research Unit, University of Sussex, Brighton, Reino Unido

O propósito deste artigo é descrever e explicar padrões setoriais de mudança tecnológica, conforme revelados nos dados de cerca de 2000 inovações significativas na Grã-Bretanha desde 1945. A maior parte do conhecimento tecnológico se mostra não como “informação” que é genericamente aplicada e facilmente reproduzível, mas como específica a firmas e aplicações, cumulativa em seu desenvolvimento e variável entre setores quanto às fontes e à direção. As firmas inovadoras, principalmente nos setores eletrônico e químico, são relativamente grandes e desenvolvem inovações para uma ampla série de grupos de produtos específicos, dentro de seu setor principal, mas para relativamente poucos [grupos de produtos] fora [de seu setor]. As firmas nos setores de mecânica e instrumentos de precisão são relativamente pequenas e especializadas, e estão em simbiose com as grandes firmas de setores intensivos em escala – como metalurgia e veículos –, as quais fazem uma contribuição significativa para a tecnologia de processo das primeiras. Nas firmas têxteis, por outro lado, a maioria das inovações de processo vêm dos fornecedores.

Estas características e variações podem ser classificadas numa taxonomia de três partes, constituída de firmas (1) dominadas pelos fornecedores; (2) intensivas em produção e (3) baseadas em ciência. Ela pode ser explicada pelas fontes de tecnologia, pelas demandas dos usuários e pelas possibilidades de apropriação. Esta explicação tem implicações para nossa compreensão das fontes e da direção da mudança tecnológica, para o comportamento de diversificação da firma, para a dinâmica da relação entre tecnologia e estrutura industrial e para a formação de habilidades e vantagens tecnológicas ao nível das firmas, das regiões e dos países.

* O artigo a seguir baseia-se extensivamente no banco de dados sobre inovações britânicas do SPRU, descrito em J. Townsend, F. Henwood, G. Thomas, K. Pavitt e S. Wyatt (1981). “Innovations in Britain Since 1945”. SPRU Occasional Paper Series No. 16. O autor agradece a Graham Thomas e Sally Wyatt que colaboraram no trabalho estatístico, a numerosos colegas dentro e fora do SPRU por seus comentários e críticas, e a Richard Levin e dois pareceristas anônimos por seus comentários detalhados e úteis a uma versão anterior, mais longa e desorganizada. A pesquisa foi financiada pelo Leverhulme Trust, como parte do programa do SPRU sobre inovação e competitividade.

Originalmente publicado em Research Policy, Amsterdã, vol. 13, no. 6 (dezembro de 1984), pp. 343-373. Tradução por José Ricardo Fucidji; revisão e figuras por Vanderléia Radaelli.

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1. Introdução 1.1. Propósito

Este artigo trata de padrões setoriais de mudança tecnológica. Descrevemos e tentamos explicar as similaridades e diferenças entre setores quanto às fontes, à natureza e aos impactos das inovações, definidas pelas fontes de insumos de conhecimento, pelo tamanho e linhas principais de atividade das firmas inovadoras e pelos setores que produzem e são os principais usuários da inovação.

Um grande grupo de estudiosos reconhece que a produção, adoção e difusão de inovação tecnológica são fatores essenciais para o desenvolvimento econômico e a mudança social, e que inovações tecnológicas são uma característica distintiva dos produtos e dos setores nos quais os países de altos salários competem com sucesso no mercado mundial (Soete, 1981). Entretanto, as representações dos processos de mudança tecnológica encontradas na literatura econômica são insatisfatórias em muitos aspectos. De acordo com Nelson (1981):

Na formulação neoclássica original, a nova tecnologia difunde-se instantaneamente por todos os capitais. Na formulação mais recente de ‘safras tecnológicas’, ela está associada ao capital que a incorpora e dessa forma a adoção de uma nova técnica é limitada pela taxa de investimento.

Embora tais hipóteses possam ser convenientes e úteis na construção de análises e modelos macroeconômicos, elas têm – como Nelson (1981) e Rosenberg (1976) apontam – duas limitações importantes. Primeira, elas tornam exógenas a produção de tecnologias e inovações. Segunda, elas não refletem a considerável variedade de fontes, natureza e usos de inovações que é revelada pelos estudos empíricos e na experiência prática.

Portanto, tais formulações da mudança tecnológica não são muito úteis para analistas e formuladores de políticas preocupados seja com a natureza e o impacto da mudança tecnológica ao nível da firma ou do setor, seja com a política de P&D ao nível da firma, do setor e do país. Segue-se daí, conforme argumentamos, a importância de construir sistematicamente um corpo de conhecimento – com dados e teoria – que abarque a produção de tecnologia e a diversidade setorial. O artigo que se segue é uma contribuição para esse objetivo. 1.2. A base de dados

O que o torna possível são os dados coletados por Townsend et al. (1981) sobre as características de cerca de 2000 inovações significativas e das firmas inovadoras na Grã-Bretanha, de 1945 a 1979. A metodologia, os resultados e as limitações estão detalhadamente expostos na publicação original. No presente texto, basta mencionar que:

(1) A inovação é definida como um produto ou processo de produção novo ou melhorado, comercializado ou utilizado no Reino Unido, quer tenha sido desenvolvido primeiro no Reino Unido ou em outro país.

(2) As inovações significativas foram identificadas a partir de informações de especialistas a respeito (mas independentes) das firmas inovadoras; as informações sobre as características das inovações foram identificadas diretamente nas firmas inovadoras.

(3) A amostra de inovações cobre grupos de produtos a três ou quatro dígitos, representando mais da metade do produto manufatureiro britânico. Ao nível de dois dígitos, a distribuição das inovações é similar àquela medida pelo número de patentes, mas não o é em relação à medida pelos gastos em atividades de P&D. Em termos concretos, isso significa uma

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ligeira super-representação das inovações em engenharia mecânica e metalurgia; uma considerável super-representação em instrumentos de precisão e têxteis; uma ligeira sub-representação na química e na eletrônica; e uma considerável sub-representação na aeroespacial1.

(4) Especialistas dos diversos setores definiram os limites de significância em diferentes níveis, o que significa que nossa amostra não pode ser utilizada para comparar o volume de inovações entre setores. Contudo, pode ser utilizada para comparar padrões intra-setoriais de atividade inovativa, com resultados consistentes com outras fontes (independentes) de dados sobre atividades inovativas no Reino Unido e em outros países (ver Pavitt, 1983b).

(5) Os dados mensuram inovações significativas introduzidas no Reino Unido. Eles não mensuram inovações significativas em nível mundial, nem captam as inovações incrementais e sociais que freqüentemente acompanham as inovações tecnológicas significativas. Assumiremos que os dados sobre inovações significativas são as manifestações visíveis de processos mais profundos, que envolvem inovações incrementais e sociais, tanto quanto as significativas. Também assumiremos que, embora o padrão de atividades inovativas no Reino Unido tenha alguns aspectos distintivos2, o que estamos mensurando reflete, como um todo, padrões da maioria dos países industrializados, mais do que características específicas ao Reino Unido. 1.3. Abordagem e estrutura

Dada a natureza do problema apresentado na subseção 1.1 e o tamanho da base de dados descrita na subseção 1.2, o leitor poderia esperar com razão um artigo principalmente de natureza econométrica: um modelo de mudança tecnológica alternativo aos modelos neoclássicos desse tipo seria proposto e formalizado, depois seria realizada uma série de testes estatísticos para comparar o poder explicativo dos modelos concorrentes. Entretanto, essa não será a abordagem a ser seguida, por razões que estão além das propensões intelectuais e das limitações profissionais do autor. Embora os dados estatísticos sejam mais abrangentes e sistemáticos que quaisquer outros já organizados sobre inovações, a amostra ainda tem algumas limitações. Como vimos, ela cobre apenas metade do setor manufatureiro, de modo que restam lacunas importantes. Para propósitos estatísticos, nossa amostra pode ser agrupada em 11 categorias setoriais ao nível de dois dígitos e em 26 categorias aos níveis de três e quatro dígitos. Os dados estatísticos a respeito dos outros setores muitas vezes não podem ser adequadamente organizados nas mesmas categorias e para o mesmo período. Portanto, defrontamo-nos com uma escolha entre “criar” dados para tornar qualquer regressão econometricamente satisfatória, ou fazer da análise estatística formal uma parte secundária do artigo. Optamos pela última abordagem, embora uma tentativa de análise econométrica seja descrita no Apêndice e discutida na seção 4.

Esta abordagem tem a vantagem de permitir que o padrão dos dados estatísticos seja comparado visualmente com a rica série de estudos de caso, setoriais e de empresas, sobre mudança tecnológica que têm sido acumulada nos últimos 25 anos. Dado que não emergiu nenhum padrão setorial de mudança tecnológica a partir dos trabalhos teóricos anteriores, tais comparações visuais e diretas mostram-se particularmente úteis.

Apresentamos e discutimos as principais características dos dados na seção 2 e as comparamos com algumas hipóteses teóricas prevalecentes. Na seção 3, sugerimos uma taxonomia dos padrões setoriais de atividade inovativa e uma explicação teórica, ambas

1 Para o número de inovações produzidas em cada setor a dois dígitos, ver tabela 2, coluna 3. Para os setores a três

ou quatro dígitos incluídos na amostra, ver tabela 1. 2 Ver Pavitt (1980, 1982).

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consistentes com os dados. Na seção 4, exploramos algumas das implicações analíticas dessa teoria e, na seção 5, sugerimos as pesquisas adicionais que deveriam ser feitas. 2. Padrões setoriais de inovação 2.1. Análise dos dados

As informações contidas no banco de dados descrevem as características das inovações significativas e das firmas inovadoras. Neste artigo usaremos a informação das fontes institucionais do principal insumo de conhecimento para as inovações, dos setores de produção e uso das inovações e do tamanho e principais setores (ou grupos ou linhas de produtos) de atividade das firmas inovadoras.

As fontes do principal insumo de conhecimento para as inovações foram identificadas pedindo aos especialistas setoriais e às firmas inovadoras que identificassem o tipo de instituição que fornecia os três insumos de conhecimento mais importantes para cada inovação. Essa informação oferece uma base para avaliar a importância relativa, na oferta desse conhecimento, da própria firma inovadora, das outras firmas industriais e das instituições provedoras de conhecimento público, tais como universidades e laboratórios governamentais. Isto é feito na subseção 2.2.

A informação sobre os setores que produzem as inovações vem dos especialistas setoriais e dos setores usuários das firmas inovadoras3. Definimos as inovações que são usadas nos mesmos setores em que são produzidas (por exemplo, a redução das direções das fibras de aço), como inovações de processo e aquelas que são usadas em setores diferentes (por exemplo, o tear Sulzer) como inovações de produto. Essa informação fornece o que pode ser considerado o equivalente tecnológico de uma matriz de isumo-produto. Ela mostra como os padrões intersetoriais de produção e venda de bens são refletidos na transferência intersetorial de tecnologia. E é estritamente equivalente neste sentido, senão em método, à matriz compilada recentemente para os Estados Unidos por Scherer (1982b). Ela é discutida na subseção 2.3.

As informações a respeito do tamanho e do principal setor de atividade das firmas inovadoras foram fornecidas pelas próprias firmas e algumas vezes verificadas em outras fontes. O tamanho é medido em termos do número total de empregados da empresa no mundo e (para as inovações do período 1969-1979) também dos empregados no Reino Unido. Essa informação permite-nos comparar a distribuição de tamanho das firmas inovadoras entre setores, ao longo do tempo e com outros índices de atividade econômica.

A informação sobre a atividade principal das firmas inovadoras permite comparações, entre setores e ao longo do tempo, do grau em que essas firmas produzem inovações fora de seu principal setor de atividade e em quais setores as inovações são produzidas por firmas que têm sua principal atividade em outro setor. Essas comparações podem ser entendidas como o equivalente tecnológico das comparações de diversificação das firmas em produto, emprego ou vendas. Os padrões de tamanho e de “diversificação tecnológica” das firmas inovadoras são analisados na subseção 2.4.

Deve-se notar que para cada inovação no banco de dados são atribuídos três números da Standard Industrial Classification [Classificação Industrial Padrão] ou Minimum List Heading [Lista Mínima de Capítulos], como é chamada no Reino Unido: (1) o setor produtor da inovação; (2) o setor usuário da inovação; (3) o setor da atividade principal da firma inovadora. Podemos

3 Quando uma inovação pode ser utilizada em mais de um setor, definimos o principal usuário daquela inovação

como o “setor usuário”.

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dessa forma construir uma matriz tridimensional (ainda que incompleta) que inclua os elos entre setores na produção e uso de inovações e os padrões setoriais de “diversificação tecnológica” das firmas inovadoras. Tal matriz nos permite comparar setores em termos das:

(1) fontes setoriais da tecnologia usada no setor: em particular, o grau no qual ela é gerada no setor, ou vem de fora pela compra de equipamentos e insumos de produção.

(2) fontes institucionais e natureza da tecnologia produzida no setor: em particular, a importância relativa das fontes de conhecimento intra e extra-firma e das inovações de produto e de processo.

(3) características das firmas inovadoras: em particular, seu tamanho e atividade principal.

Tais comparações foram feitas sistematicamente pelo autor aos níveis de dois, três e quatro dígitos, na preparação desse artigo. Elas foram fundamentais para uma avaliação da validade empírica dos modelos prevalecentes de mudança tecnológica e a fortiori para a elaboração da taxonomia setorial e da teoria propostas na seção 3. Entretanto, elas não serão reproduzidas em detalhe pois são longas, tediosas, e algumas vezes potencialmente confusas. Ao invés disso, apresentaremos o material estatístico principalmente ao nível setorial de dois dígitos, embora também façamos referência a alguns padrões aos níveis de três e quatro dígitos.

É suficiente dizer aqui que um aspecto central de nossa busca por uma taxonomia e uma teoria explanatória é a classificação das inovações em cada setor de acordo com o critério de os setores de produção, de uso e de atividade principal da firma inovadora serem ou não o mesmo. Há cinco combinações possíveis:

Categoria 1: o setor produtor, usuário e de atividade principal da firma é o mesmo: por exemplo, uma inovação de processo de uma firma produtora de aço (MLH 311)4;

Categoria 2: os setores produtor e de atividade principal da firma são o mesmo, mas o setor usuário é diferente: por exemplo, uma firma especializada na produção de máquinas têxteis (MLH 335), projetando uma nova máquina têxtil (MLH 335) para uso na indústria têxtil (MLH 411);

Categoria 3: os setores de atividade principal da firma e usuário da inovação são o mesmo, mas o setor produtor da inovação é diferente: por exemplo, uma firma de construção naval (MLH 370) desenvolve uma máquina-ferramenta especial (MLH 332) para uso na construção naval (MLH 370);

Categoria 4: os setores de produtor e usuário da inovação são o mesmo, mas o setor de atividade principal da firma é diferente: por exemplo, uma firma atuando principalmente em produtos químicos em geral (MLH 271), desenvolve uma inovação de processo para a indústria têxtil (MLH 411);

Categoria 5: os setores produtor da inovação, de seu uso e de atividade principal da firma são todos diferentes: por exemplo, uma firma atuando principalmente em bens de capital eletrônicos (MLH 367) desenvolve e produz uma inovação em equipamentos (MLH 354.2) para serem usados na produção de automóveis (MLH 381).

4 MLH = Minimum List Heading.

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Nos exemplos particulares dados acima, as categorias são as mesmas para os setores tomados aos níveis de dois, três ou quatro dígitos. Mas em alguns casos elas não coincidem: por exemplo, uma firma atuando em produtos químicos em geral (MLH 271) que produz uma inovação na indústria farmacêutica (MLH 272) para uso em serviços médicos (MLH 876) entra na categoria 5 ao nível de três dígitos e na categoria 2 ao nível de dois dígitos. 2.2. Fontes institucionais do principal insumo de conhecimento

Como já apontamos, os especialistas nos setores poderiam indicar até três fontes institucionais de insumos de conhecimento para cada inovação. Todos indicaram pelo menos uma fonte, 40% indicaram duas fontes, mas apenas 3% apontaram três fontes.

Tabela 1 Distribuição dos insumos de conhecimento para inovações significativas, de acordo com a fonte institucional

Setor a Fonte dos insumos de conhecimento (%) b Número de observações

Intra-firma Outras firmasInfra-estrutura

pública

Alimentos (211-229) 53,4 44,6 2,0 101 Farmacêutica (272) 62,8 37,2 0 129 Sabões e detergentes (275) 60,0 40,0 0 30 Plásticos (276) 40,4 55,2 4,4 114 Corantes (277) 68,1 30,5 1,4 69 Ferro e Aço (311) 47,7 44,9 7,4 149 Alumínio (321) 68,0 28,0 4,0 50 Máquinas-ferramenta (332) 64,1 29,8 6,1 231 Máquinas têxteis (335) 61,2 36,6 2,2 278 Máquinas para mineração de carvão (339.1) 52,3 31,6 16,1 199 Outras máquinas (339.4+339.9) 59,1 36,6 4,3 115 Plantas industriais (341) 51,6 41,9 6,5 31 Instrumentos (354.2) 61,6 25,2 13,2 440 Componentes eletrônicos (364) 48,2 37,1 14,7 170 Equipamentos de transmissão (365) 64,4 33,9 1,7 59 Computadores eletrônicos (366) 50,6 33,3 16,1 81 Bens de capital eletrônicos (367) 67,3 9,7 23,0 113 Outros bens elétricos (369) 60,8 35,3 3,9 51 Construção naval (370) 47,9 43,9 8,2 73 Tratores (380) 78,7 21,3 0 47 Veículos (381) 69,3 29,7 1,0 101 Têxteis (411-429) 67,3 32,7 0 110 Calçados e produtos de couro (450+431) 44,5 48,1 7,4 54 Vidro (463) 48,3 44,6 7,1 56 Cimento (464) 62,5 33,3 4,2 24 Papel e papelão (481) 66,7 28,2 5,1 39 Outros plásticos (496) 55,8 41,9 2,3 43 Outros – – – 56 Total 58,6 34,0 7,4 3013 a Os números entre parênteses correspondem a Minimum List Heading. b A soma de cada linha é 100%.

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Os resultados ao nível de três ou quatro dígitos estão sumariados na tabela 1. Apenas 7% dos insumos de conhecimento vêm da infra-estrutura tecnológica pública (ensino superior, laboratórios governamentais e institutos de pesquisa). O percentual mais elevado encontra-se em diversos segmentos da eletrônica, mas mesmo aí nunca atinge 25%. Por outro lado, 59% vêm de dentro das próprias firmas inovadoras e cerca de um terço de outras firmas industriais.

Estes dados têm diversas imperfeições. Dado que foram coletados por especialistas industriais e que foram identificadas apenas cerca de 1,5 fonte para cada inovação, eles subestimam a contribuição da infra-estrutura tecnológica pública para o conhecimento incorporado em pessoas e para os fundamentos de conhecimento essenciais às inovações5. De modo mais geral, a distribuição das fontes de conhecimento nesse tipo de estudos depende grandemente das definições e da amplitude temporal dos dados coletados6. A despeito dessas imperfeições, a distribuição das fontes de conhecimento na tabela 1 é similar àquela encontrada em outros estudos7.

Dado que a contribuição das firmas inovadoras ao conhecimento é estimada em quase 60% do total, não podemos realisticamente supor que exista um reservatório ou estoque de conhecimento geral disponível e aplicável, no qual cada firma – considerada muito pequena em relação ao reservatório ou estoque total – pode ganhar mais por retirar do reservatório do que por acrescentar a ele. O conceito de um “reservatório” ou “estoque” geral de conhecimento omite um aspecto essencial da tecnologia industrial, a saber, a natureza diferenciada e específica à firma da maior parte dos gastos realizados para produzi-la. Na Grã-Bretanha e em outros lugares, cerca de três quartos do gasto total em P&D industrial são feitos em “D” e uma soma equivalente é gasta em testes e para dar início ao processo produtivo8. O propósito desses gastos é pôr em movimento habilidades, conhecimentos e procedimentos da firma, de modo a comercializar produtos e processos de produção específicos, com as características de operação, confiabilidade e custo que satisfaçam as necessidades do usuário. A especificidade é um aspecto essencial das inovações e da atividade inovativa nas firmas capitalistas – tanto em termos das aplicações funcionais quanto da capacidade de as firmas inovadoras apropriarem-se do conhecimento relevante por um certo tempo.

Este aspecto é omitido em qualquer equação simples de “tecnologia” com “informação”. Embora possa ser razoável dizer que a pesquisa e a invenção produzem “informação” que é rápida e facilmente transmissível9, supor que o desenvolvimento e a inovação têm propriedades similares conduz a noções totalmente erradas. Dadas suas características específicas, seus custos de transmissão de uma firma à outra podem ser altos, mesmo na ausência de proteção legal ou segredo por parte da firma inovadora (De Melto et al., 1980; Oshima, 1973; Teece, 1977). Como Nelson (1982) argumentou recentemente, o conhecimento tecnológico tem aspectos tanto de bem privado quanto de bem público, embora a tabela 1 e outros estudos sugiram que o primeiro aspecto é mais preponderante que o último.

Tais aspectos são omitidos em algumas representações da tecnologia em uma função de produção. De acordo com Salter (1966, p. 26):

5 Ver Gibbons e Johnston (1974) para uma excelente análise de tais fontes. 6 A clássica controvérsia americana do final dos anos 1960 é um exemplo: os estudos Hindsight e Traces chegaram

a conclusões diferentes a respeito da contribuição da pesquisa básica para a inovação industrial. Para uma comparação, ver Pavitt e Wald (1971).

7 Ver Langrish et al. (1972) e Gibbons e Johnston (1974). 8 Para uma resenha dos resultados empíricos recentes sobre os custos totais da inovação, ver Kamin et al. (1982). 9 Ver o artigo clássico de Arrow (1962).

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...o conceito de função de produção... pode referir-se ou a técnicas que tenham sido detalhadamente desenvolvidas, ou a técnicas que em princípio são viáveis, mas que não foram desenvolvidas porque as pressões econômicas necessárias estão ausentes.

Salter exclui subitamente essa última possibilidade e, ao fazê-lo, torna exógena à sua análise a maior parte das atividades inovativas (isto é, desenvolvimento e pós-desenvolvimento) das firmas industriais. Como Rosenberg (1976) apontou, em geral as firmas não têm (e, pela discussão acima, não podem ter) informação ampla e completa a respeito do leque de técnicas alternativas. A suposição de que a maior parte do conhecimento tecnológico é ou poderia ser geralmente aplicável e publicamente disponível tem pouco embasamento na realidade. 2.3. Padrões setoriais de produção e uso de inovações

Como já mencionado acima, o banco de dados de inovação compilado por Townsend et al. (1981) descreve os padrões setoriais de produção e uso de inovações no Reino Unido. Utilizando um método diferente, Scherer (1982b) compilou informações similares para os Estados Unidos. Ele obteve dados detalhados a respeito da alocação setorial de recursos de P&D em mais de 400 grandes firmas americanas nos anos 1970. Com base no exame da atividade patentária dessas firmas, ele também pôde distribuir o “produto” dessa P&D por setores usuários. O trabalho de Scherer cobre mais de 40 setores produtores e usuários nos Estados Unidos. Os dados coletados por Townsend et al., por outro lado, cobrem firmas pequenas e médias, assim como grandes, mas não cobrem todos os setores. Porém – mais importante para os propósitos deste estudo – ambos exibem resultados comparáveis em termos de padrões setoriais de produção e uso de tecnologia10.

Seguindo Scherer, definimos inovações de produto como as que são usadas fora dos setores que as produziram e inovações de processo como aquelas que são usadas dentro desses setores11.

Ambos os estudos confirmam a predominância de inovações de produto, que representam 73,8% do total nos Estados Unidos, de acordo com Scherer, e 75,3% no Reino Unido, quando os setores são definidos aos níveis de três e quatro dígitos, e 69,6% quando definidos ao nível de dois dígitos.

Os dados de Scherer para os Estados Unidos, que são mais abrangentes e completos, mostram uma clara diferença, em termos de produção e uso de inovações, entre as firmas manufatureiras e os outros setores da economia (isto é, agricultura, mineração, setores de serviços privados e públicos). Para a indústria manufatureira como um todo, a taxa de produção/uso de tecnologia é de 5,3. Fora desse grupo de indústrias, ela é de 0,1. E a proporção de toda tecnologia usada fora da manufatura que é também produzida fora da manufatura representa menos que 7%. Em outras palavras, a indústria manufatureira produz a maioria das inovações que são usadas em outras partes da economia.

Entretanto, a própria manufatura está longe de ser homogênea em padrões de produção e uso de inovações. A tabela 2 mostra as características relevantes dos setores ao nível de dois dígitos da manufatura britânica para os quais temos uma amostra satisfatória de inovações. A coluna 5 mostra a porcentagem das inovações em cada setor que são compradas e usadas em outros setores: em outras palavras, a porcentagem de inovações de produto. Elas são

10 Ver Pavitt (1983a). 11 Esta definição não é estritamente igual às de inovações de produto e de processo ao nível da firma. Dessa forma, o

que é uma inovação de produto para a firma será uma inovação de processo para o setor quando a inovação for comprada e utilizada no mesmo setor; inversamente, uma inovação de processo para a firma será uma inovação de produto para o setor quando a firma produz e usa seus bens de capital. Entretanto, para o setor, assim como para a firma, predominam as inovações de produto. Ver Townsend et al. (1981, tabelas 9.1 e 9.2).

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relativamente mais importantes em instrumentos de precisão, engenharia mecânica, produtos químicos, materiais de construção (principalmente vidro e cimento) e engenharia elétrica e eletrônica, enquanto as inovações de processo predominam em calçados e produtos de couro, têxteis, veículos, metalurgia, construção naval, alimentos e bebidas. Os dados aos níveis de três e quatro dígitos mostram que todos os grupos de produtos da engenharia mecânica cobertos na pesquisa são fortemente orientados para inovações de produto, ao passo que no interior dos setores químico e elétrico/eletrônico há dois grupos de produtos com elevadas porcentagens de inovações de processo: sabões e detergentes e equipamentos de transmissão de rádio e tv.

Tabela 2 Inovações produzidas e usadas nos setores a dois dígitos Inovações usadas no setor Setor a Inovações produzidas no setor

% produzido no setor Número Número

% inovações de produto

(1) (2) (3) (4) (5)

52,9 68 III Alimentos e bebidas 65 44,7 60,5 71 V Químico 251 82,9 60,7 130 VI Metalurgia 137 42,3 68,1 169 VII Engenharia mecânica 662 82,7 38,4 60 VIII Instrumentos de precisão 332 93,1 80,8 107 IX Engenharia elétrica e eletrônica 339 60,1 32,2 90 X Construção naval 52 44,1 37,6 221 XI Veículos 128 35,2 16,2 377 XIII Têxteis 91 32,9 60,0 45 XIV&XV Couro e Calçados 34 26,5 46,1 63 XVI Pedra, cerâmica, vidro e cimento 72 85,0 n.d. 823 Outros 61 n.d.

41,9 b 2224 Total 2224 69,6 a Os numerais romanos referem-se aos respectivos capítulos MLH. b Para as 1401 inovações da amostra para as quais foi atribuído um setor usuário.

A coluna 1 da tabela 2 mostra a porcentagem de inovações usadas em cada setor que são produzidas no mesmo setor: em outras palavras, o grau no qual cada setor gera suas próprias inovações de processo.12 Ela mostra que a maioria dos setores manufatureiros a dois dígitos da amostra dá uma contribuição significativa ao desenvolvimento de suas próprias tecnologias de processo. A principal exceção é o têxtil, que depende fortemente de inovações de outros setores.

Finalmente, uma comparação entre as colunas 4 e 2 da tabela 2 mostra as diferenças entre produção e uso de inovações em cada setor. A produção é maior que o uso nos setores químico, de engenharia mecânica e de instrumentos de precisão e nos produtos elétricos e eletrônicos. A produção e o uso estão quase na mesma proporção nas indústrias caracterizadas por tecnologias de processo contínuo (por exemplo, alimentos e bebidas, metalurgia e material de construção), ao passo que as inovações são mais usadas que produzidas nos setores caracterizados por operações de montagem (por exemplo, construção naval e veículos). Estas indústrias montadoras também

12 A coluna 2 mostra 823 inovações produzidas nos setores manufatureiros identificados, mas usadas em outros

setores. Diferentemente de Scherer, não podemos, neste contexto, alocar corretamente estas inovações aos setores usuários, pois não temos ainda uma amostra das inovações produzidas naqueles setores usuários.

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dependem de um número maior de outros setores, para suas tecnologias de processo, quando comparadas com aquelas caracterizadas por tecnologias de processo contínuo.

Como podemos comparar este padrão de produção e uso de inovações com o modelo de ‘safras tecnológicas’ que supõe que toda tecnologia está incorporada ao capital e entra na economia através do investimento? Em sua formulação original desse modelo, Salter estava ciente de suas limitações. Ele reconheceu a importância das inovações em bens de capital e das inovações de produto, mas tornou-as exógenas por hipótese. Ele também afirmou que outras hipóteses tornavam o modelo “altamente simplificado”: por exemplo, que a mudança tecnológica não envolve efeitos cumulativos de uma geração de bens de capital para outra, ou que o desempenho associado à melhor tecnologia (best pratice) é definido claramente e atingido instantaneamente (Salter, 1966, p. 64).

Entretanto, as hipóteses de Salter refletem a realidade da maior parte da economia, isto é, os setores não-manufatureiros, na qual a mudança tecnológica ocorre principalmente pela compra de equipamentos, materiais e componentes da manufatura. No interior do setor manufatureiro, também refletem com acuidade as fontes de inovações de processo da indústria têxtil. Contudo, sua caracterização das fontes de mudança tecnológica nos setores manufatureiros finais mais modernos é menos satisfatória, em três aspectos.

Primeiro, embora em certos modelos econômicos possa ser conceitualmente correto supor – como o faz Salter – que os aperfeiçoamentos no desempenho dos bens de capital (isto é, inovações de produto) sejam equivalentes ao barateamento relativo dos bens de capital (isto é, inovações de processo), tal suposição induz a erros a respeito das fontes e da direção da mudança tecnológica no setor de bens de capital. As atividades inovativas são de fato fortemente concentradas na inovação de produto: por exemplo, nenhum montante de inovações de processo na produção de calculadoras mecânicas poderia torná-las competitivas com as inovações de produto que resultaram da incorporação de chips eletrônicos.

Segundo, o modelo de Salter supõe que as inovações de processo chegam aos setores usuários já desenvolvidas. Entretanto, vemos na tabela 2 que uma proporção significativa das inovações usadas na produção industrial moderna é produzida e desenvolvida nos próprios setores inovadores. Vale a pena estender-se um pouco sobre uma possível razão. Sabemos pelas pesquisas de Gold (1979), Sahal (1981) e outros que duas das hipóteses simplificadoras de Salter são falsas: as indústrias de processo contínuo e de montagem de fato exibem aprendizado cumulativo e nelas o desempenho associado à melhor tecnologia raramente é facilmente identificado e instantaneamente atingido. As próprias qualificações operacionais, de engenharia e de projeto são as que capacitam a produção de inovações em equipamentos de produção. Em outras palavras, setores com tecnologias de processo complexas e caras devotam consideráveis recursos técnicos para assegurarem que o equipamento seja eficientemente utilizado e continuamente melhorado.

Terceiro e de modo mais geral, a produção de todas as inovações é exógena por hipótese no modelo de Salter. Antes de sugerir na seção 3 um arcabouço que torne esse tipo de produção endógena, descreveremos as características das firmas inovadoras em diferentes setores. 2.4. Características das firmas inovadoras: tamanho e diversificação tecnológica

A tabela 3 sumaria os principais aspectos da distribuição das firmas inovadoras por tamanho em diferentes setores. As colunas 7-9 classificam as firmas inovadoras de acordo com seu setor de atividade principal. Esta classificação mostra uma contribuição relativamente grande de firmas pequenas (1-999 empregados) em engenharia mecânica e instrumentos de precisão, têxteis e couro e calçados; e de grandes firmas (10.000 empregados ou mais) nos outros setores.

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Este padrão setorialmente diferenciado é muito similar ao que emergiu de um estudo de inovações significativas e firmas inovadoras realizado para os Estados Unidos13.

Tabela 3 Distribuição das inovações por tamanho da firma a e por setor

Por setor da inovação Setor b Por setor de atividade da firma inovadora

Distribuição percentual c Número de inovações

Número de inovações

Distribuição percentual c

10.000+ 1000-9999 1-999 10.000+ 1000-9999 1-999 (1) (2) (3) (4) (5) (6) (7) (8) (9)

72,3 10,7 17,0 65 III Alimentos e bebidas 78 79,5 7,7 12,874,8 16,8 8,4 251 V Químico 290 82,4 7,9 9,763,5 31,4 5,1 137 VI Metalurgia 143 62,9 32,8 4,335,2 30,5 34,3 662 VII Engenharia mecânica 536 24,3 36,9 38,841,0 16,6 42,4 332 VIII Instrumentos de precisão 187 24,6 21,4 54,066,4 15,9 17,7 339 IX Engenharia elétrica e eletrônica 343 65,9 12,1 22,057,7 38,5 3,8 52 X Construção naval 89 61,8 34,8 3,470,3 18,0 11,7 128 XI Veículos 158 72,2 20,3 7,556,0 30,8 13,2 91 XIII Têxteis 77 35,1 40,3 24,611,8 20,6 67,6 34 XIV&XV Couro e Calçados 50 44,0 18,0 38,070,8 18,1 11,1 72 XVI Pedra, cerâmica, vidro e cimento 87 74,7 16,1 9,2

– – – 102 Outros 227 – – –53,1 22,0 24,9 2265 Total 2265 53,1 22,0 24,9

a Medido pelo número de empregados. b Os numerais romanos referem-se aos respectivos capítulos MLH. c A soma de cada linha é 100%.

As colunas 1-3 da tabela 3 mostram a distribuição das firmas inovadoras por tamanho de acordo com o setor [de ocorrência] das inovações, ao invés de pelo setor de atividade principal das firmas inovadoras. Nos setores em que predominam as grandes firmas, as duas distribuições por tamanho são muito similares. Entretanto, nos setores de engenharia mecânica, instrumentos de precisão e têxteis, tanto o número de inovações quanto a contribuição relativa das grandes firmas são maiores quando classificadas pelo setor da inovação, em relação à classificação pelo setor de atividade principal da firma inovadora. Em outras palavras, um número relativamente grande de inovações é produzido nestes setores por firmas relativamente grandes, que têm suas atividades principais em outros setores.

A tabela 4 mostra que, para a amostra como um todo, 31,5% das inovações são produzidas por firmas com atividade principal em outros setores a dois dígitos. A coluna 5 mostra que uma proporção relativamente grande de inovações em engenharia mecânica, instrumentos de precisão e têxteis é produzida por firmas com atividade principal em outros setores (32,1%, 54,6% e 36,3%, respectivamente), enquanto a coluna 1 mostra que as firmas que têm suas atividades principais em engenharia mecânica, instrumentos de precisão e têxteis produzem uma proporção relativamente pequena de inovações em outros setores (16,0%, 19,8% e 24,7%, respectivamente). 13 Ver Kleinman (1975). Uma comparação entre os dois conjuntos de resultados é feita por Townsend et al. (1981).

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Tabela 4 Distribuição de inovações produzidas fora do setor de atividade principal da firma inovadora

Inovações em outros setores por firmas com atividade

principal no setor Setor a

Inovações no setor por firmas com atividade principal em

outros setores Percentual Número Número Percentual

(1) (2) (3) (4) (5)

30,8 78 III Alimentos e bebidas 65 17,0 26,5 290 V Químico 251 15,2 34,3 143 VI Metalurgia b 137 31,4

(37,0) (119) (93) (19,4) 16,0 536 VII Engenharia mecânica 662 32,1 19,8 187 VIII Instrumentos de precisão 332 54,6 23,8 343 IX Engenharia elétrica e eletrônica 339 23,0 58,4 89 X Construção naval 52 28,9 33,5 158 XI Veículos 128 18,0 24,5 77 XIII Têxteis 91 36,3 50,0 50 XIV&XV Couro e Calçados 34 26,5 32,4 87 XVI Pedra, cerâmica, vidro e cimento 72 18,1

– 227 Outros 102 – 31,5 2265 Total 2265 31,5

a Os numerais romanos referem-se aos respectivos capítulos MLH. b Os valores entre parênteses referem-se apenas aos subsetores ferro e aço.

A coluna 1 também mostra as firmas com atividade principal no setor cuja proporção de inovações produzida em outros setores está próxima ou acima da média: alimentos e bebidas, metalurgia, construção naval, veículos, couro e calçados e materiais de construção. Isto é um contraste com firmas que operam principalmente na química ou em produtos elétricos e eletrônicos, as quais não produzem uma proporção relativamente grande de inovações fora de seus setores a dois dígitos (26,5% e 23,8% respectivamente). Similarmente, uma proporção relativamente pequena de inovações nestes dois setores é produzida por firmas operando principalmente em outros setores (15,2% e 23,0%, respectivamente).

Este padrão sugere, entre outras coisas, que uma proporção relativamente grande de inovações em engenharia mecânica e instrumentos de precisão é produzida por firmas caracterizadas por processos contínuos e atividades de montagem, tais como metalurgia, construção naval e veículos. Um exame mais detalhado da base de dados confirma essa afirmação. As inovações em dois setores de importância fundamental para a tecnologia de produção – engenharia mecânica e instrumentos de precisão –, portanto, são produzidas em firmas especializadas relativamente pequenas de indústrias de processo contínuo e de montagem.

Uma questão vem à mente quando examinamos os dados das tabelas 3 e 4: em que medida as diferenças intersetoriais da distribuição por tamanho das firmas inovadoras e seus padrões de diversificação tecnológica são similares às encontradas para a distribuição por tamanho e padrões de diversificação em termos de vendas, produto e emprego? Dadas as lacunas nos dados dos censos industriais britânicos, não é possível dar uma resposta direta a essa questão. Certamente há semelhanças: as firmas pequenas dão uma contribuição relativamente maior ao produto líquido e ao emprego na engenharia mecânica e instrumentos de precisão, quando comparadas aos outros setores a dois dígitos de nossa amostra; e, ao longo do tempo, tanto a contribuição

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crescente à produção de inovações das firmas com mais de 10.000 empregados quanto a parcela constante das firmas com menos de 200 empregados refletem as tendências do produto e do emprego.

Quanto à diversificação, as similaridades são menos aparentes, à primeira vista. Uma comparação com a análise de Hassid (1975), baseada nos dados do censo industrial britânico, mostra que a diversificação é consideravelmente menor em termos de produto do que na produção de inovações: 14,0% em 1963 e 16,9% em 1968, comparados a 31,5% para todo o período de 1945-1979. Também não há uma relação estrita, entre os setores, entre o grau no qual as firmas de um setor diversificam-se para outros setores em produto líquido e o grau de diversificação em termos da produção de inovações.

Entretanto, há uma similaridade entre os setores para os quais as firmas se diversificam: uma comparação da tabela 4 acima com os dados de Hassid (1975, tabela 3) mostra que tanto em termos da produção de inovações quanto de produto líquido, engenharia mecânica e instrumentos de precisão são setores em que contribuições relativamente grandes são feitas por firmas operando principalmente em outros setores, ao passo que contribuições relativamente pequenas de tais firmas ocorrem em alimentos, produtos químicos, engenharia elétrica e eletrônica e veículos.

Seria necessário mais tempo e espaço para levar essas comparações adiante, e isso não será feito neste artigo. Esperamos que nossa contribuição aqui seja para enriquecer o modo pelo qual tais comparações serão interpretadas e explicadas. Em particular, pretendemos ir além das explicações dos padrões setoriais de produção de inovações simplesmente em termos das estruturas industriais setoriais. Mesmo se houvessem, entre os setores, correlações estatísticas perfeitas entre tamanho da firma e padrões de produção, por um lado, e tamanho da firma e padrões setoriais de produção de inovações, por outro, seria errôneo interpretar esta última simplesmente como conseqüência causal da primeira. Isso porque estariam negligenciados os elos causais de sentido oposto: isto é, da diversificação na produção de inovações para a diversificação no produto e da produção de inovações para o tamanho e o crescimento da firma.

A maior parte dos estudos empíricos de padrões de diversificação de fato referem-se à noção de ‘proximidade tecnológica’ ao explicar a diversificação no produto (Berry, 1975; Gort, 1962; Hassid, 1975; Rumelt, 1974; Utton, 1979); nossa análise procura dar conteúdo empírico e teórico adicional a essa noção. Similarmente, diversos autores enfatizaram recentemente os elos causais que vão da inovação para o tamanho da firma (Levin e Reiss, 1984; Nelson e Winter, 1982); começamos por explicar, entre outras coisas, por que taxas elevadas de inovação não conduzem necessariamente a setores altamente concentrados. Antes disso, porém, apontamos na seção 3 como e por que os padrões de inovação e desenvolvimento tecnológico diferem entre setores. 3. Rumo a uma taxonomia e uma teoria 3.1. Os ingredientes

Duas características centrais das inovações e das firmas inovadoras emergem da seção 2. Primeiro, a partir da subseção 2.2 é claro que a maior parte do conhecimento aplicado pelas firmas em inovações não tem objetivos genéricos nem é facilmente transmitida e reproduzida, mas sim adequada para aplicações específicas e apropriada por firmas específicas. É justificado, portanto, que suponhamos, como Rosenberg (1976), que ao escolherem que inovações desenvolver e produzir, as firmas não identifiquem e de fato não consigam identificar e avaliar todas as possibilidades de inovação indistintamente, mas são obrigadas a restringirem suas buscas

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ao seu conjunto existente de conhecimentos e qualificações em zonas proximamente relacionadas. Em outras palavras, a mudança tecnológica é amplamente um processo cumulativo específico às firmas. O que elas poderão realisticamente tentar fazer em termos tecnológicos no futuro está fortemente condicionado pelo que elas foram capazes de fazer tecnologicamente no passado.

A segunda característica, é óbvio, é a variedade. Das subseções 2.3 e 2.4 emerge que os setores variam quanto à importância relativa das inovações de produto e de processo, quanto às fontes de tecnologia de processo e quanto ao tamanho e padrão de diversificação tecnológica das firmas inovadoras. Não obstante, algumas regularidades começam a emergir. Na subseção 2.3 podemos ver toda uma classe de setores na qual – como nos modelos de safras tecnológicas – a mudança tecnológica vem principalmente dos fornecedores de equipamento: setores não-manufatureiros e da manufatura tradicional, como têxteis. Também vemos que os outros setores manufatureiros dão uma contribuição significativa às suas tecnologias de processo. Entretanto, enquanto as firmas nas indústrias de montagem e de processo contínuo tendem a concentrar uma parcela maior de seus recursos inovativos em inovações de processo, as firmas da química, da engenharia elétrica e eletrônica e de instrumentos de precisão destinam a maior parte destes recursos à inovação de produto.

Na subseção 2.4 vemos que os setores que geram principalmente inovações de produto podem ser divididos em duas categorias. Primeiro, as firmas que operam principalmente nos setores químico e elétrico/eletrônico são relativamente grandes e diversificam-se relativamente pouco além de sua categoria a dois dígitos quando produzem inovações, que por sua vez são uma proporção relativamente grande de todas as inovações nos dois setores. Segundo, as firmas que operam principalmente em engenharia mecânica e instrumentos de precisão são relativamente pequenas, diversificam-se tecnologicamente pouco além de suas categorias a dois dígitos e dão uma menor contribuição a todas as inovações nos dois setores, dada a importante contribuição feita pelas firmas usuárias relativamente grandes, particularmente aquelas de setores caracterizado por processos de produção contínuos e de montagem.

Nas subseções 3.2-3.5 abaixo, tentaremos categorizar e explicar estas características: em outras palavras, propor uma taxonomia e uma teoria dos padrões setoriais de mudança tecnológica. Idealmente, elas deveriam ser consistentes com os dados apresentados até aqui. E também deveriam ser capazes de maior refinamento e teste empírico, dadas as inadequações dos dados disponíveis no presente, e em particular de empregar dados que são principalmente estáticos, trans-setoriais, como base para uma teoria que é essencialmente dinâmica.

Na taxonomia e teoria que propomos, a unidade básica de análise é a firma inovadora. Uma vez que os padrões de inovação são cumulativos, suas trajetórias tecnológicas serão amplamente determinadas pelo que foi feito no passado, em outras palavras, por suas atividades principais. Atividades principais diferentes geram trajetórias tecnológicas diferentes. Elas podem ser adequadamente agrupadas em três categorias, que denominamos “dominada pelo fornecedor”, “intensiva em produção” e “baseada em ciência”. Estas trajetórias diferentes podem, por sua vez, ser explicadas pelas diferenças setoriais em três características: fontes de tecnologia, necessidades dos usuários e meios para se apropriar dos benefícios. As três categorias, as diferentes trajetórias tecnológicas, e suas causas subjacentes estão sumariadas na tabela 5. Antes de discuti-la em maior detalhe, identificaremos brevemente as três tradições de análise nas quais a taxonomia e a teoria estão baseadas.

Primeiro, existem analistas que exploram deliberadamente a diversidade de padrões de mudança tecnológica. Em particular, Woodward (1958) argumentou que as formas organizacionais e as combinações de qualificações apropriadas em firmas manufatureiras são uma função de suas técnicas de produção, que ela dividiu em três: produção unitária e em

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Tabela 5 Trajetórias tecnológicas setoriais: determinantes, direções e características mensuradas

Determinantes das trajetórias tecnológicas Trajetórias tecnológicas Características mensuradas

Fontes de tecnologia

Tipos de Usuário

Mecanismos de apropriação

Fontes da tecnologia de processo

Inovação relativamente predominante

Tamanho relativo das firmas inovadoras

Intensidade e direção da diversificação tecnológica

Categoria da firma Atividades nucleares

típicas

(1) (2) (3) (4) (5) (6) (7) (8) (9) (10)

Dominada pelo fornecedor

agricultura; construção civil; serviços privados, manufatura tradicional

Extensão dos serviços de pesquisa dos fornecedores; grandes usuários

sensível ao preço

não-tecnicos (marca, marketing, propaganda, aparência estética)

redução de custos

fornecedores processo pequeno baixa vertical

Intensiva em escala

materiais volumosos (aço, vidro); montagem (bens de consumo duráveis e autos)

engenharia de produção dos fornecedores; P&D

sensível ao preço

segredo e know-how de processo; defasagens técnicas; patentes; economias dinâmicas de aprendizado

redução de custos (no projeto do produto)

interna; fornecedores

processo grande alta vertical

Intensiva em produção

Fornecedores especializados

maquinaria; instrumentos de precisão

projeto e desenvolvimento pelos usuários

sensível ao desempenho

know-how de projeto; conhecimento dos usuários; patentes

projeto de produto

interna; clientes

produto pequeno baixa concêntrica

baixa vertical Baseada em ciência

eletrônico / elétrico; químico

P&D; ciência pública; engenharia de produção

misto know-how de P&D; patentes; segredo e know-how de processo; economias dinâmicas de aprendizado

mista interna; fornecedores

mista

grande

alta concêntrica

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pequenos lotes; grandes lotes e produção em massa; e processos contínuos de produção. Nossa proposta tem o mesmo espírito mas, embora tenha elementos em comum, seu foco é diferente: abarca mudanças de produtos tanto quanto de processos, e encadeamentos com fornecedores, clientes e outras fontes de tecnologia. Já no século XVIII, Adam Smith estava ciente da diversidade das fontes de mudança tecnológica e de sua natureza dinâmica; como veremos em breve, ele identificou muitos elementos da taxonomia que propomos no capítulo I de A Riqueza das Nações (Smith, 1776).

Segundo, há o trabalho de Penrose (1959) sobre a natureza das atividades de diversificação das firmas e a importância de sua base tecnológica. Trabalhos franceses recentes que exploram a noção de complexos (filières) são da mesma tradição (Toledano, 1978), assim como a obra de Ansoff (1968) e outros sobre administração estratégica, e a contribuição recente de Teubal (1982) sobre a natureza do aprendizado tecnológico.

Terceiro, diversos analistas têm explorado a natureza cumulativa e dinâmica da mudança tecnológica: por exemplo, Dosi (1982), Freeman et al. (1982), Gold (1979), Nelson e Winter (1977, 1982), Rosenberg (1976, 1982) e Sahal (1981). A partir das pesquisas deles emergiu a noção de ‘trajetórias tecnológicas’, a saber, direções do desenvolvimento tecnológico que são cumulativas e autogeradoras, sem referência repetida ao ambiente externo à firma.

Nelson (1981) foi além e sugeriu um arcabouço para explicar as trajetórias tecnológicas. Ele afirma que em qualquer arcabouço institucional, público ou privado, de mercado ou extra-mercado, a mudança tecnológica requer mecanismos geradores de alternativas técnicas; que as monitorem, testem e avaliem; e que as difundam. No arcabouço ocidental de mercado a direção e a taxa de mudança tecnológica em qualquer setor depende de três aspectos: primeiro, das fontes de tecnologia; segundo, da natureza das necessidades dos usuários; terceiro, das possibilidades de os inovadores bem-sucedidos apropriarem-se de uma proporção dos benefícios de suas atividades inovativas suficiente para justificar os gastos associados.

Para nossos propósitos, pode haver diversas fontes possíveis de tecnologia. Dentro da firma existem laboratórios de P&D e departamentos de engenharia de produção. Fora das firmas há fornecedores, usuários, pesquisa e consultoria com financiamento público. De modo semelhante, as necessidades dos usuários podem variar. Para materiais mecânicos ou estruturas padronizadas, o preço é da maior importância, uma vez que certos requisitos de desempenho sejam satisfeitos. Para as máquinas e equipamentos usados nos modernos e interdependentes sistemas de produção, o desempenho e a confiabilidade são o atributo do prêmio mais elevado sobre o preço de compra. No setor consumidor – como Rosenberg (1976) e Gershuny (1978) têm apontado – o equipamento moderno é utilizado de modo extensivo para a produção doméstica “informal”. Entretanto, comparado a seus equivalentes na economia formal, seu preço de compra terá um prêmio mais elevado relativo ao desempenho, dado que os sistemas familiares de produção são de escala relativamente pequena, com pouca interdependência técnica e com pressões fracas da concorrência de sistemas de produção alternativos.

Os métodos usados pelos inovadores bem-sucedidos para se apropriarem dos benefícios de suas atividades em relação aos concorrentes também irão variar14. Por exemplo, as inovações de processo podem ser mantidas em segredo; algumas inovações de produto podem ser protegidas por naturais e extensas defasagens técnicas de imitação (por exemplo, aeronáutica), enquanto outras requerem proteção patentária (por exemplo, farmacêutica); e tanto as inovações de produto quanto as de processo podem ser difíceis de imitar por causa da singularidade do conhecimento tecnológico e das qualificações presentes na firma inovadora.

14 Ver Taylor e Silberston (1973), Scherer (1977) e von Hippel (1976, 1978, 1980) para uma discussão mais

detalhada.

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Todos esses ingredientes estão sumariados na tabela 5, na qual a coluna 1 define as categorias das firmas, a coluna 2 enumera os setores de atividades nucleares típicos de tais firmas, as colunas 3-5 descrevem os determinantes e a natureza das trajetórias tecnológicas das firmas e as colunas 7-10 identificam algumas das características mensuradas dessas trajetórias. Prosseguiremos agora discutindo e descrevendo esses ingredientes em maior detalhe.

3.2. Firmas dominadas pelos fornecedores

As firmas dominadas pelos fornecedores encontram-se principalmente nos setores tradicionais da produção industrial e em agricultura, construção civil, produção doméstica informal e em muitos serviços pessoais, financeiros e comerciais. Elas são também geralmente pequenas e suas capacitações de engenharia e P&D interna são fracas. Elas se apropriam menos com base em vantagens tecnológicas, quando comparadas a qualificações profissionais, aparência estética, marcas e propaganda. As trajetórias tecnológicas são definidas, portanto, por redução de custos.

Firmas dominadas pelos fornecedores geralmente dão uma contribuição secundária às suas tecnologias de processo e de produto. A maior parte das inovações vem dos fornecedores de equipamentos e materiais, embora algumas vezes os grandes clientes, a pesquisa com financiamento oficial e a extensão dos serviços também dêem sua contribuição. As escolhas tecnológicas parecem mais próximas àquelas descritas no modelo de safras de Salter, sendo o nível dos salários o principal critério, bem como o preço e o desempenho de bens de capital exogenamente desenvolvidos.

Assim, em setores formados por firmas dominadas pelos fornecedores, esperaríamos que uma elevada proporção de inovações de processo usadas nos setores seja produzida por outros setores, mesmo que uma proporção relativamente alta das atividades inovativas dos próprios setores seja destinada a inovações de processo. De acordo com os dados de Scherer (1982b, tabela 2) sobre os padrões setoriais de produção e uso de tecnologia nos Estados Unidos, os seguintes setores têm essas características: têxteis, serralharia, fabricação de produtos de madeira e papel; editorial e gráfica e construção; em outras palavras, precisamente os tipos de setores preditos por nossa taxonomia e teoria15.

Com nossos dados sobre firmas inovadoras britânicas, podemos identificar essas e outras características das firmas dominadas pelos fornecedores (assim como das firmas intensivas em produção e baseadas em ciência descritas nas subseções 3.3 e 3.4 abaixo). A tabela 6 mostra claramente características desse tipo para as firmas têxteis. Antes de descrevê-las, definamos precisamente o conteúdo de cada uma das colunas da tabela 6, uma vez que as tabelas 7, 8 e 9 apresentam quadros semelhantes para as outras categorias de firmas:

• coluna 1: define o setor de atividade principal, a dois dígitos, da firma inovadora. • coluna 2: mostra o percentual de inovações usadas no setor que é produzido por

firmas inovadoras com atividade principal no próprio setor16. Mostra o grau em que as firmas do setor desenvolvem suas próprias tecnologias de processo.

• coluna 3: mostra o percentual de inovações produzidas pelas firmas com atividade principal no setor que é usado em outros setores: em outras palavras, o percentual de inovações de produto17.

15 Os dados de Scherer são incompletos para agricultura e serviços, setores que prediríamos que têm características

similares. 16 Esse percentual não é idêntico ao da coluna 5 da tabela 2, pois o primeiro toma por base o setor da inovação,

enquanto o último baseia-se no setor de atividade principal da firma inovadora. 17 Esse percentual não é idêntico ao da coluna 1 da tabela 2 pelas razões dadas na nota 16.

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Tabela 6 Características das inovações produzidas e usadas por firmas que fabricam principalmente têxteis, couro e calçados

Inovações usadas que são produzidas pela firma

Distribuição das firmas inovadoras por tamanho

(a soma de cada linha é 100%) Setor de Atividade Principal

da Firma (2 dígitos)

Inovações produzidas pela firma que são usadas em

outros setores

Número de inovações produzidas pelas firmas do setor

% número % número 10.000+ 1000-9999 1-999

(1) (2) (3) (4)

XIII Têxtil 15,6 377 23,4 77 35,0 40,3 24,7 77

XIV&XV

Couro e Calçados 48,9 45 56,0 50 44,0 18,0 38,0 50

Total Todos os setores da amostra 49,3 1401a 64,0 2265 53,1 22,0 24,9 2265

Setor de Atividade Principal da Firma (2 dígitos)

% das inovações das firmas fora do setor de atividade principal são

diversificaçãob:

Número de inovações

produzidas pelas firmas do setor

% das inovações no setor de atividade das firmas que são produzidas por:

Número de inovações produzidas

no setor

Concêntrica / conglomerado Vertical

Firmas principalmente

do setor

Firmas principalmente de outros setores que produzem

e usam a inovação Outras

(5) (6)

XIII Têxtil 3,9 20,8 77 63,8 2,2 34,0 91

XIV&XV Couro e Calçados 42,0 8,0 50 73,5 – 26,5 34

Total Todos os setores da amostra 20,3 11,2 2265 68,6 11,1 20,3 2265

a Inclui apenas as inovações usadas pelos setores especificados na tabela 2. b A soma das duas porcentagens é igual à coluna 1 da tabela 4.

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18

• coluna 4: mostra a distribuição por tamanho das firmas inovadoras com atividades principalmente no setor. Os dados apresentados são idênticos aos das colunas 7, 8 e 9 da tabela 3.

• coluna 5: traz detalhes sobre a natureza das inovações produzidas por firmas inovadoras fora de seu setor de atividade principal. Ela separa os dados da coluna 1 da tabela 4 em diversificação tecnológica “concêntrica/conglomerado” e “vertical”. Estes termos foram tomados do trabalho de Ansoff (1968) sobre administração estratégica. A subcoluna “vertical” é o porcentual de inovações produzidas pela firma inovadora que ocorreu fora do setor de atividade principal dessa firma, mas que é usado dentro desse setor: ele reflete a importância relativa da diversificação tecnológica em direção a equipamentos, materiais e componentes utilizados na produção dessas mesmas firmas. A subcoluna “concêntrica/conglomerado” é o percentual de inovações que são produzidas e usadas fora do setor de atividade principal da firma inovadora: ele reflete a importância relativa da diversificação tecnológica em direção a mercados de produtos relacionados ou não-relacionados.

• coluna 6: mostra a origem de todas as inovações que ocorreram no setor, separando-as entre aquelas produzidas pelas firmas principalmente do setor, aquelas produzidas e usadas por firmas que cuja atividade principal é fora do setor (isto é, pelos usuários da produção do setor) e aquelas oriundas de outras fontes. Os dados da primeira subcoluna da coluna 6 somam 100% com os da coluna 5 da tabela 4.

No caso das firmas têxteis, a tabela 6 mostra um elevado grau de dependência de fontes externas para tecnologia de processo (coluna 2), uma proporção relativamente pequena de atividade inovativa destinada a inovações de produto (coluna 3), um tamanho médio relativamente pequeno das firmas inovadoras (coluna 4), diversificação tecnológica principalmente verticalizada para tecnologia de produção, com muito pouco movimento para outros mercados de produto (coluna 5); e uma contribuição relativamente grande de firmas com atividade principal em outros setores para as inovações do setor, mas não de setores que usam produtos têxteis (coluna 6). Dados mais detalhados mostram a importância considerável dos produtores de máquinas para as firmas têxteis na oferta de tecnologia de processo e na geração de inovações do próprio setor têxtil.

A tabela 6 também mostra que as firmas inovadoras que produzem principalmente couro e calçados não estão tão próximas da categoria de firmas dominadas pelos fornecedores. Certamente elas são relativamente pequenas (coluna 4) e seus usuários dão uma contribuição relativamente pequena para a inovação nesses setores de atividade (coluna 6). Entretanto, elas também produzem uma proporção razoável de inovações de produto (coluna 3), assim como dão uma forte contribuição às suas próprias tecnologias de processo (coluna 2) e têm um elevado grau de diversificação tecnológica concêntrica/de conglomerado.

Um exame mais detido mostra que toda essa diversificação tecnológica é na direção de inovações em máquinas têxteis que têm seu uso principalmente no setor têxtil. Esse padrão reflete a prática de classificação utilizada por Townsend et al. (1981) na pesquisa. Entretanto, ele também reflete o fato de que não há uma categoria específica na Classificação Industrial Padrão para máquinas de artefatos de couro, que as inovações em máquinas têxteis têm aplicações na produção de produtos de couro e que – embora os principais usos das inovações identificadas em máquinas têxteis sejam no setor têxtil – elas também têm usos na produção de produtos de couro. Em outras palavras, firmas que operam principalmente em produtos de couro estão de fato dando a contribuição principal ao desenvolvimento de suas próprias tecnologias de processo. Neste caso, elas se aproximam da categoria das “intensivas em produção”, que passamos a descrever.

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19

3.3. Firmas intensivas em produção

Adam Smith descreveu alguns dos mecanismos associados à emergência de firmas intensivas em produção, a saber, a crescente divisão do trabalho e a simplificação das tarefas que resultam do alargamento do tamanho do mercado e que possibilitam a substituição da mão-de-obra por máquinas e o conseqüente rebaixamento dos custos de produção. O aprimoramento dos transportes e o comércio crescentes, padrões de vida mais elevados e maior concentração industrial – todos contribuíram para essa trajetória da crescente fabricação e montagem em larga escala. Existem oportunidades similares de mudança tecnológica redutora de custos nos processos contínuos de produção de materiais padronizados, nos quais a assim chamada lei dos dois terços da engenharia significa que os custos unitários de capacidade são potencialmente reduzidos em 1% para cada 3% de aumento na capacidade da planta.

As qualificações tecnológicas para explorar essas economias de escala latentes aumentaram continuamente ao longo do tempo. Na fabricação e montagem, as máquinas são capazes de realizar tarefas progressivamente mais complexas e exigentes de modo confiável, como resultado do aumento na qualidade dos metais, da precisão e complexidade de corte e usinagem, das fontes de energia e dos sistemas de controle. Nos processos contínuos, os aumentos na escala e nos patamares de temperatura e pressão resultaram do aprimoramento dos materiais, do instrumental de controle e das fontes de energia18.

As pressões e incentivos econômicos à exploração dessas economias de escala são particularmente fortes em firmas que produzem para duas classes de usuários sensíveis ao preço: primeiro, aquelas que produzem materiais padronizados; segundo, aquelas que produzem bens de consumo duráveis e veículos. Na realidade (quando não em vários modelos de mudança tecnológica) é difícil fazer esses processos intensivos em escala operarem a plena capacidade. As condições operacionais são severas a respeito do desempenho do equipamento, do controle das interdependências e dos fluxos físicos e das habilidades dos operadores. Em tais sistemas de produção complexos e interdependentes os custos externos das falhas em qualquer das partes são consideráveis. Mesmo que só para propósitos de “solução de problemas”, grupos especializados de “engenharia de produção” e “engenharia de processo” foram organizados. Como Rosenberg (1976) tem mostrado, esses grupos desenvolvem a capacidade de identificar desequilíbrios e gargalos técnicos que, uma vez corrigidos, possibilitam melhorias de produtividade. Eventualmente eles são capazes de especificar, ou de projetar novos equipamentos que melhoram a produtividade ainda mais. Assim, os departamentos de engenharia de produção são uma fonte importante de tecnologia de processo para as firmas intensivas em produção.

Adam Smith também apontou que as inovações de processo são geradas também “... pelo engenho dos fabricantes de máquinas quando fazem delas a atividade de um negócio particular” (Smith, 1776). A outra fonte importante de inovações de processo em firmas intensivas em produção são as firmas relativamente pequenas e especializadas que lhes fornecem os equipamentos e instrumentos e com as quais as primeiras têm um relacionamento próximo e complementar. Grandes usuários provêm experiência operacional, estabelecimentos de testes e até recursos de projeto e desenvolvimento para fornecedores especializados de equipamentos. Tais fornecedores, por sua vez, suprem os seus grandes clientes com conhecimento especializado e experiência que resultam da concepção e construção de equipamentos para uma série de usuários, muitas vezes dispersos por diversos setores. Rosenberg (1976) descreve esse padrão como “desintegração vertical” e “convergência tecnológica”. Ele retira seus exemplos da maquinaria para usinagem de metais; pode-se ver o mesmo processo operando hoje nas funções 18 Ver Levin (1977) para exemplos bem-documentados.

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de monitoramento e controle da produção realizadas por instrumentos. Essas firmas especializadas têm uma trajetória tecnológica diferente daquelas de seus usuários. Dada a escala e a interdependência dos sistemas de produção para os quais contribuem, os custos associados a um desempenho ruim podem ser consideráveis. As trajetórias tecnológicas são, portanto, mais fortemente orientadas para inovações de produto que elevam o desempenho e menos para inovações de processo redutoras de custo.

O modo pelo qual as firmas inovadoras apropriam-se das vantagens tecnológicas varia amplamente entre os produtores em larga escala e os fornecedores de equipamentos e instrumentos em pequena escala. Para os produtores em larga escala, as invenções particulares não são geralmente de grande significado. A liderança tecnológica se reflete na capacidade de projetar, construir e operar processos contínuos de larga escala; e integrar processos de montagem de larga escala de modo a produzir um produto final. Tal liderança é mantida por meio de know-how e segredo industrial a respeito das inovações de processo e mediante as inevitáveis defasagens técnicas de imitação, assim como mediante a proteção patentária. Para os fornecedores especializados não estão disponíveis, na mesma medida, segredos, know-how de processo, e defasagens técnicas extensas como meios de apropriação da tecnologia. O sucesso competitivo depende em grau considerável de habilidades específicas às firmas refletidas no aprimoramento contínuo do projeto, na confiabilidade do produto e na capacidade de responder adequada e rapidamente às necessidades dos usuários.

As características dos produtores em larga escala e dos fornecedores especializados da categoria “firmas intensivas em produção” estão espelhadas nas tabelas 7 e 8. A tabela 7 mostra que, da nossa amostra de inovações, firmas com atividades principais em cinco setores a dois dígitos têm as características de produtores intensivos em escala da categoria das “intensivas em produção”: alimentos, metalurgia, construção naval, veículos e vidro e cimento. Nessas categorias, as firmas inovadoras produzem uma proporção relativamente grande de suas próprias tecnologias de processo (coluna 2), para as quais elas destinam uma proporção relativamente elevada de seus próprios recursos inovativos (coluna 3). As firmas inovadoras também são relativamente grandes (coluna 4); têm um nível relativamente elevado de diversificação tecnológica vertical na direção de equipamentos relacionados às suas próprias tecnologias de processo (coluna 5) e dão uma contribuição relativamente grande às inovações produzidas em seus setores de atividade principal (coluna 6).

A tabela 8 mostra um padrão muito diferente nas firmas de engenharia mecânica e instrumentos de precisão. Elas também produzem uma proporção relativamente grande de suas próprias tecnologias de processo (coluna 2), mas o foco principal de suas atividades inovativas é a geração de inovações de produto para uso em outros setores (coluna 3). As firmas inovadoras são relativamente pequenas (coluna 4); sua diversificação tecnológica é relativamente pequena seja verticalmente ou não (coluna 5); e elas não fazem uma contribuição relativamente grande a todas as inovações produzidas em seus setores de atividade principal, nos quais os usuários e as firmas de outros setores fazem contribuições significativas (coluna 6).

Um exame mais detalhado dos dados ao nível de três dígitos mostra que, na engenharia mecânica, as firmas da amostra em todos os grupos de produtos que têm uma grande proporção de seus recursos inovativos destinados à inovação de produto são relativamente especializadas em termos tecnológicos e (com exceção das firmas que produzem principalmente plantas industriais) relativamente pequenas. No entanto, cerca de 20% das inovações são feitas por firmas de engenharia em geral que produzem um conjunto amplo de produtos da engenharia mecânica e cuja distribuição por tamanho é maior que a de outras firmas de engenharia mecânica, sendo próxima à média da amostra de inovações como um todo. Em instrumentos de precisão, as inovações são geradas por firmas de uma ampla série de setores usuários, como também por firmas que operam principalmente em engenharia mecânica e bens de capital elétricos e eletrônicos.

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Tabela 7 Características das inovações produzidas por firmas que operam principalmente em setores intensivos em escala

Inovações usadas que são produzidas pela firma

Distribuição das firmas inovadoras por tamanho

(a soma de cada linha é 100%) Setor de Atividade Principal

da Firma (2 dígitos)

Inovações produzidas pela firma que são usadas em outros setores

Número de inovações produzidas pelas firmas

do setor

% número % número 10.000+ 1000-9999 1-999

(1) (2) (3) (4)

III Alimentos 58,8 68 48,8 78 79,5 7,7 12,8 78

VI Metalurgia 62,3 130 43,4 143 62,9 32,8 4,3 143

X Construção Naval 64,5 90 34,8 89 61,8 34,8 3,4 89

XI Automóveis 45,7 221 36,9 158 72,2 20,3 7,5 158

XVI Vidro e cimento 68,3 63 50,6 87 74,7 16,1 9,2 87 Total Todos os setores

da amostra 49,3 1401a 64,0 2265 53,1 22,0 24,9 2265

Setor de Atividade Principal da Firma (2 dígitos)

% das inovações das firmas fora do setor de atividade principal são

diversificaçãob:

Número de inovações

produzidas pelas firmas do setor

% das inovações no setor de atividade das firmas que são produzidas por:

Número de inovações produzidas no setor

Concêntrica / conglomerado Vertical

Firmas principalmente do

setor

Firmas principalmente de outros setores que

produzem e usam a inovação

Outras

(5) (6)

III Alimentos 16,7 14,1 78 83,1 3,1 13,8 65

VI Metalurgia 17,5 16,8 143 68,6 8,0 23,4 137

X Construção Naval 21,3 37,1 89 71,2 13,4 15,4 52

XI Automóveis 12,6 20,9 158 82,0 1,6 16,4 128

XVI Vidro e cimento 13,8 18,4 87 81,9 5,6 12,5 72 Total Todos os setores

da amostra 20,3 11,2 2265 68,6 11,1 20,3 2265 a Inclui apenas as inovações usadas pelos setores especificados na tabela 2. b A soma das duas porcentagens é igual à coluna 1 da tabela 4.

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Tabela 8 Características das inovações produzidas e usadas por firmas que fabricam equipamentos de produção

Inovações usadas que são produzidas pela firma

Distribuição das firmas inovadoras por tamanho

(a soma de cada linha é 100%) Setor de Atividade Principal

da Firma (2 dígitos)

Inovações produzidas pela firma que são usadas em

outros setores

Número de inovações produzidas pelas firmas do setor

% número % número 10.000+ 1000-9999 1-999

(1) (2) (3) (4) VII Engenharia

mecânica 55,1 169 82,6 536 24,3 36,9 38,8 536

VIII Instrumentos de precisão 58,4 60 81,4 187 24,6 21,4 54,0 187

Total Todos os setores da amostra 49,3 1401a 64,0 2265 53,1 22,0 24,9 2265

Setor de Atividade Principal da Firma (2 dígitos)

% das inovações das firmas fora do setor de atividade principal são

diversificaçãob:

Número de inovações

produzidas pelas firmas do setor

% das inovações no setor de atividade das firmas que são produzidas por:

Número de inovações produzidas

no setor

Concêntrica / conglomerado Vertical

Firmas principalmente

do setor

Firmas principalmente de outros setores que produzem

e usam a inovação Outras

(5) (6) VII Engenharia

Mecânica 15,1 0,9 536 68,0 15,2 16,8 633

VIII Instrumentos de precisão 9,7 10,2 187 45,2 19,3 35,5 332

Total Todos os setores da amostra 20,3 11,2 2265 68,6 11,1 20,3 2265

a Inclui apenas as inovações usadas pelos setores especificados na tabela 2. b A soma das duas porcentagens é igual à coluna 1 da tabela 4.

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3.4. Firmas baseadas em ciência

A terceira categoria, firmas baseadas em ciência, também foi prevista (se não observada) por Adam Smith, que falou da contribuição à técnica daqueles “... que são chamados filósofos ou homens de especulação, cujo negócio não é fazer alguma coisa, mas observar tudo; e que, com base nessa observação, são muitas vezes capazes de combinar os poderes dos mais distantes e dissimilares objetos”. A partir dos dados sobre inovação descritos acima, as firmas baseadas em ciência podem ser encontradas nos setores químico e elétrico/eletrônico. Em ambos os casos, as fontes de tecnologia são as atividades de P&D das firmas desses setores, baseadas no rápido desenvolvimento das ciências subjacentes nas universidades e em outros estabelecimentos.

Como Freeman et al. (1982) têm mostrado, o desenvolvimento de sucessivas ondas de produtos depende do desenvolvimento prévio da ciência básica relevante: em particular, da química sintética e da bioquímica na indústria química; e do eletromagnetismo, das ondas de rádio e da física do estado sólido na indústria elétrica/eletrônica. A química sintética possibilitou o desenvolvimento de uma ampla série de produtos, com proveitosas características biológicas, químicas, elétricas, mecânicas ou estruturais, que vão dos materiais que substituem madeira, aço e têxteis naturais aos agentes biológicos especializados e caros para uso médico e outros. Os avanços da bioquímica no pós-guerra estão possibilitando a extensão dessas habilidades e técnicas para produtos e processos biológicos.

Os avanços em eletromagnetismo, ondas de rádio e física do estado sólido têm tornado possíveis produtos e aplicações relacionados à disponibilidade barata, segura e descentralizada de eletricidade, comunicações e (agora) processamento, armazenagem e recuperação de dados. As aplicações em eletricidade variam dos enormes transformadores aos pequenos motores de sistemas mecânicos; nas comunicações, dos caros sistemas de localização por radar e satélite aos rádios transistorizados mais baratos; e nos sistemas de informação, dos enormes computadores aos relógios de pulso digitais.

Essa difusão tem ditado a trajetória tecnológica das firmas de setores baseados em ciência. O rico escopo das aplicações baseadas nas ciências subjacentes implicou que as firmas inovadoras e bem-sucedidas nesses setores tenham crescido rapidamente19 e que tenham pouco incentivo para buscar oportunidades de inovação além de seus setores de atividade principal. Dada a sofisticação da tecnologia e das ciências subjacentes, tem sido difícil a entrada de firmas fora do setor. A abrangência das aplicações também tem implicado uma grande variância na ênfase relativa dada à inovação de produto ou de processo no interior de cada um dos setores, refletindo os diferentes trade-offs custo/desempenho de bens de consumo, materiais padronizados e aplicações profissionais especializadas.

As firmas apropriam-se da liderança inovativa por meio de uma combinação de métodos (isto é, patentes, segredos, defasagens técnicas naturais e habilidades específicas à firma). A proteção patentária é particularmente importante na química fina, com aplicações específicas de alto nível nas quais as inovações de produto predominantes podem ser imitadas a baixo custo e rapidamente na ausência de tal proteção20. Além disso, as economias dinâmicas de aprendizado têm sido uma importante barreira à entrada de imitadores em tecnologias de processo contínuo, montagem em larga escala e – nos últimos 25 anos – na produção de componentes eletrônicos. De acordo com Dosi (1982) a taxa particularmente rápida e a forma da mudança tecnológica em componentes eletrônicos envolveu uma “mudança de paradigma”. Novas firmas foram capazes de entrar na indústria eletrônica e de crescer rapidamente com inovações de produto agressivas

19 Ver, por exemplo, a pesquisa de Rumelt (1974) sobre o crescimento e a diversificação das firmas americanas. 20 Ver, em particular, os estudos empíricos de Taylor e Silberston (1973).

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Tabela 9 Características das inovações produzidas e usadas por firmas que fabricam principalmenteprodutos químicos, elétricos e eletrônicos

Inovações usadas que são produzidas pela firma

Distribuição das firmas inovadoras por tamanho

(a soma de cada linha é 100%) Setor de Atividade Principal

da Firma (2 dígitos)

Inovações produzidas pela firma que são usadas em

outros setores

Número de inovações produzidas pelas firmas do setor

% número % número 10.000+ 1000-9999 1-999

(1) (2) (3) (4)

V Químico 77,4 71 78,0 290 82,5 7,9 9,6 290

IX Engenharia elétrica e eletrônica 80,2 107 60,9 343 65,9 12,1 22,0 343

Total Todos os setores da amostra 49,3 1401a 64,0 2265 53,1 22,0 24,9 2265

Setor de Atividade Principal da Firma (2 dígitos)

% das inovações das firmas fora do setor de atividade principal são

diversificaçãob:

Número de inovações

produzidas pelas firmas do setor

% das inovações no setor de atividade das firmas que são produzidas por:

Número de inovações produzidas

no setor

Concêntrica / conglomerado Vertical

Firmas principalmente

do setor

Firmas principalmente de outros setores que produzem

e usam a inovação Outras

(5) (6)

V Químico 21,7 4,8 290 84,8 2,4 12,8 251

IX Engenharia elétrica e eletrônica 21,5 2,3 343 77,0 11,5 11,5 339

Total Todos os setores da amostra 20,3 11,2 2265 68,6 11,1 20,3 2265

a Inclui apenas as inovações usadas pelos setores especificados na tabela 2. b A soma das duas porcentagens é igual à coluna 1 da tabela 4.

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conjugadas com a exploração de acentuadas economias de escala dinâmicas. Nos dados sobre inovações britânicas coletados por Townsend e seus colegas, as

características de firmas baseadas em ciência emergem mais claramente principalmente na química. A tabela 9 mostra que elas produzem uma proporção relativamente grande de suas próprias tecnologias de processo (coluna 2), assim como uma elevada proporção de inovações de produto que são usadas em outros setores (coluna 3). Elas também são relativamente grandes (coluna 4), sua diversificação é principalmente concêntrica/de conglomerado, mais do que vertical (coluna 5) e elas produzem uma proporção relativamente grande de todas as inovações geradas em seus setores de atividade principal (coluna 6). Dados mais detalhados também mostram que, no interior do setor químico a dois dígitos, o grupo de produtos “detergentes” tem uma proporção relativamente elevada de inovações de processo; e que a diversificação tecnológica das firmas químicas fora de seu setor de atividade principal a dois dígitos é principalmente na direção de instrumentos, máquinas e têxteis. De acordo com a tabela 9, as firmas que operam principalmente na engenhara elétrica e eletrônica também têm a maior parte das características preditas para firmas baseadas em ciência: uma contribuição relativamente grande à sua própria tecnologia de processo (coluna 2), firmas inovadoras relativamente grandes (coluna 4), diversificação principalmente concêntrica/de conglomerado21 (coluna 5) e uma contribuição relativamente grande a todas as inovações geradas em seu setor de atividade principal (coluna 6).

Entretanto, a proporção de inovações de produto, embora grande em termos absolutos, é relativamente pequena (coluna 3); dados mais detalhados mostram que isso não pode ser explicado simplesmente pela preponderância de inovações de processo em equipamentos de transmissão de rádio e tv, senão que refletem uma elevada proporção de inovações em componentes eletrônicos que são produzidos e usados por firmas que produzem principalmente bens de capital eletrônicos. Mais do que isso, a contribuição relativamente grande à produção de inovações feita pelas firmas com menos de 1.000 empregados (coluna 4), reflete a grande contribuição feita por tais firmas na década de setenta no grupo de produtos “computadores”.

Finalmente, dados mais detalhados sugerem que firmas grandes e diversificadas dão uma contribuição maior às inovações de firmas baseadas em ciência, que a de fornecedores especializados de equipamentos. Como vimos na subseção 3.3, as firmas de engenharia em geral produzem cerca de 20% de todas as inovações na engenharia mecânica. Na química, as firmas que operam principalmente em química em geral produzem cerca de 40% do total de inovações; e em produtos elétricos/eletrônicos as firmas que atuam em bens de capital eletrônicos produzem cerca de 50% do total de inovações. 3.5. Encadeamentos tecnológicos e trajetórias em mudança

As ligações entre as diferentes categorias de firmas vão além das descritas na categoria intensiva em produção (subseção 3.3 acima). A figura 1 procura representar os principais fluxos tecnológicos que emergem de nossa taxonomia e teoria. As firmas dominadas pelos fornecedores obtêm a maior parte de suas tecnologias de firmas intensivas em produção e baseadas em ciência (por exemplo, energia, ferramentas e equipamentos de transporte das primeiras, eletrônica de consumo e plástico das últimas). As firmas baseadas em ciência também transferem tecnologia para as intensivas em produção (por exemplo, o uso de plásticos e eletrônica de consumo na indústria automobilística). E, como vimos, tanto as firmas baseadas em ciência quanto as

21 Dados mais detalhados mostram que sua direção é principalmente para os setores de engenharia mecânica e

instrumentos científicos.

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intensivas em produção recebem e fornecem tecnologia para fornecedores especializados de equipamentos de produção.

Figura 1 – Principais encadeamentos tecnológicos entre as diferentes categorias de firmas

Também argumentamos que os encadeamentos tecnológicos podem ir além das transações

relacionadas à compra e venda de bens que incorporam tecnologia. Eles podem incluir fluxos de informações e habilidades, bem como diversificação tecnológica para as principais áreas de produto dos fornecedores e clientes. Exemplos incluem a contribuição de firmas intensivas em escala à tecnologia de seus fornecedores de equipamentos e de firmas químicas e eletrônicas às inovações em têxteis, instrumentos científicos e engenharia mecânica.

Nossos dados ainda não nos permitem analisar se e como os padrões de mudança tecnológica em setores específicos mudam ao longo do tempo. Sugerimos na subseção 3.3 que os setores podem mudar do padrão das dominadas pelos fornecedores para o das intensivas em produção como resultado do acesso, por firmas individuais, a mercados mais amplos ou de aperfeiçoamentos autônomos e induzidos nos bens de capital: certos serviços comerciais e financeiros podem ser um exemplo atual, dada a concentração da oferta e o rápido progresso técnico nos equipamentos de processamento de informação. Por outro lado, analistas como Utterback e Albernathy (1975) prediriam, com base em seu modelo de “ciclo de produto” que, onde as tecnologias de processo estão maduras, os setores podem mudar do padrão das intensivas em produção para o das dominadas pelos fornecedores; por exemplo, na química sintética de grande volume, atualmente se diz que o foco mudou das firmas químicas para as fornecedoras de equipamentos de processo (BETA, 1982). Quaisquer que sejam as regularidades eventualmente observadas em tais mudanças, os dois exemplos acima sugerem que as tendências na taxa de mudança tecnológica serão uma variável explicativa importante. A exploração sistemática dos efeitos das mudanças tecnológicas radicais (por exemplo, a eletrônica de estado sólido) será de particular interesse para as trajetórias prevalecentes e os padrões de mudança tecnológica22. 22 Para uma discussão mais detalhada da indústria automobilística, ver Anderson et al. (1984). Para uma discussão

mais geral, ver Ergas (1983a).

Firmasdominadas

pelosfornecedores

Firmas baseadas em

ciência

Fornecedoras

deequipamentos

especializadas

Firmas intensivas em

escala

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4. Algumas implicações analíticas

A taxonomia e teoria que propomos tem diversas implicações para a análise da natureza, das fontes, dos determinantes e dos efeitos econômicos da mudança tecnológica. Passamos a identificar algumas das mais óbvias, sem pretendermos ser exaustivos nem na extensão nem na profundidade da discussão. 4.1. Inovação: empurrada pela ciência e tecnologia versos puxada pela demanda

Há um debate recorrente a respeito da importância relativa do “empurrão da ciência e tecnologia” (technology push) e do “puxão da demanda” (demand pull) para deflagrar a atividade inovativa e determinar seus padrões. Como Mowery e Rosenberg (1979) e outros têm apontado, tanto o empurrão da tecnologia quanto o puxão da demanda são necessários para qualquer inovação bem-sucedida e a maior parte do debate sobre a importância relativa das duas têm sido mal-concebido. No entanto, de acordo com Schmookler (1966), o “puxão da demanda” tem tido uma influência mais forte que o “empurrão da ciência e tecnologia” nos padrões de atividade inovativa, tanto entre os setores quanto ao longo do tempo. Entre os setores ele encontrou uma correlação estatística entre o volume de atividades inovativas em bens de capital (mensuradas por patentes) e o volume de atividades de investimento dos setores usuários, mais forte do que entre o volume de atividades inovativas e o produto dos setores fornecedores. Ao longo do tempo, ele mostrou que às mudanças no volume de atividade inovativa seguiam-se mudanças no volume de atividades de investimento. Usando uma base de dados mais abrangente, Scherer (1982a) confirmou recentemente o primeiro dos resultados de Schmookler, mas não encontrou evidências de defasagem temporal entre as atividades de inovação e de investimento.

Em nossa taxonomia, a relação próxima entre o investimento dos setores usuários e as atividades inovativas nos setores de bens de capital a montante não é surpreendente. As atividades de investimento das firmas dominadas pelos fornecedores e intensivas em produção provavelmente estimulam atividades inovativas tanto nos departamentos de engenharia de produção das firmas usuárias, quanto nas firmas a montante que fornecem os bens de capital23. Na medida em que essas atividades de investimento são planejadas com antecedência e coordenadas com as atividades do departamento de engenharia de produção da firma investidora e das firmas fornecedoras de equipamentos de produção, deveríamos esperar também – como Scherer mostrou – que a defasagem temporal entre as atividades de inovação e investimento tendam a desaparecer.

Entretanto, nas firmas que definimos como baseadas em ciência não esperamos a mesma correspondência clara e defasada entre as atividades de investimento dos setores usuários e as atividades inovativas. A pesquisa recente de Walsh (1984) mostra que a emergência de famílias de produtos radicalmente novas na indústria química do século XX foi precedida pela irrupção de atividades científicas e inventivas. Além disso, Scherer (1982a) mostrou que nos setores de materiais, em contraste com os de bens de capital, a correlação estatística entre o volume de atividades inovativas e o investimento dos setores usuários é muito mais fraca; dado o papel da indústria química no desenvolvimento de materiais sintéticos substitutos, isso não nos deveria surpreender. Finalmente, Scherer (1982a) mostrou que a relação entre o volume de atividades inovativas e o produto dos setores fornecedores torna-se muito mais forte quando são levadas em conta as diferenças setoriais em oportunidades científicas e tecnológicas – sendo particularmente

23 Os setores usuários cobertos pela pesquisa de Schmookler incluem refino de petróleo, fibras sintéticas, vidro,

açúcar, tabaco, ferrovias, têxtil e vestuário e papel e papelão.

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forte nos setores de química orgânica e de eletrônica, nos quais esperamos que as oportunidades tecnológicas baseadas em ciência sejam particularmente fortes. 4.2. Inovação de produto versus inovação de processo

A teoria que propomos também oferece uma explicação da proporção entre inovação de produto e inovação de processo entre os diversos setores. Esperaríamos que a importância relativa de inovações de produto em um setor esteja positivamente associada com sua intensidade de P&D e de patentes; e negativamente associada com as proxies para as medidas de escala e complexidade de sua tecnologia de processo, tais como a relação capital/trabalho, o tamanho médio da planta ou os coeficientes de concentração das vendas.

O raciocínio por trás dessas expectativas é o seguinte. Em grupos de produtos que tenham uma elevada proporção de firmas baseadas em ciência, esperaríamos uma intensidade de P&D relativamente elevada, e uma grande proporção de oportunidades de produtos e mercados geradas fora dos grupos de produtos. A relação deveria ser ainda mais forte entre a intensidade de patentes e a inovação de produto, dado que – em adição às atividades de P&D – as estatísticas de patentes refletem as atividades inovativas de firmas pequenas, assim como os departamentos de engenharia de produção, as das grandes firmas, ambas as quais são fontes particularmente importantes de inovação de produto em engenharia mecânica e instrumentos de precisão. Por sua vez, em setores com uma proporção relativamente grande de firmas intensivas em produção, esperaríamos que uma proporção elevada de recursos fosse destinada à inovação de processo, por um lado; e que as intensidades de capital, o tamanho da planta e os coeficientes de concentração fossem relativamente elevados, por outro lado.

Como pode ser visto no Apêndice, as regressões (E1, E2, E3) baseadas em nossas (insatisfatórias) estatísticas são consistentes com as expectativas24. Os sinais foram preditos corretamente e, para algumas equações, as variáveis explicativas são significativas aos níveis de 1% e 2,5%. Somente a relação capital/trabalho tem um baixo poder explicativo em todas as equações rodadas, o que pode dizer respeito tanto aos problemas de medida de capital, quanto ao poder preditivo de nossa teoria. 4.3. O locus da inovação de processo

Nossa taxonomia e teoria também geram expectativas a respeito do grau no qual as firmas desenvolvem suas próprias tecnologias de processo ou as compram dos fornecedores de equipamentos de produção “a montante”. Nos setores com firmas dominadas pelos fornecedores, esperaríamos firmas e plantas produtivas de tamanho pequeno, e que as inovações viessem por definição dos fornecedores. Em setores com firmas intensivas em produção, esperaríamos firmas e plantas produtivas de tamanho grande, e que uma elevada proporção da tecnologia de processo fosse gerada internamente. O mesmo é válido para firmas baseadas em ciência, especialmente para produtos que envolvem tecnologias de processo contínuo ou de montagem. Em outras palavras, esperaríamos uma relação positiva entre a proporção de tecnologia de processo setorial gerada internamente à firma, de um lado; e o tamanho das firmas e das plantas desse setor, de outro lado.

Outros autores fizeram predições semelhantes, mas de certa forma diferentes, a saber, que os fornecedores de equipamentos a montante tornar-se-iam as fontes relativamente mais importantes de inovações de processo à medida que o mercado para os equipamentos do processo 24 E1, E2, etc. referem-se às respectivas equações no Apêndice.

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produtivo crescesse. Para Rosenberg (1976), isso refletiria a maior divisão do trabalho na produção, resultante do aumento do tamanho do mercado. Para Utterback e Albernathy (1975), refletiria o grande tamanho do mercado e a estabilidade tecnológica das firmas nos últimos estágios do ciclo de produto.

Von Hippel (1982) e Buer (1982) fazem predições numa base diferente, argumentando que a proporção entre o desenvolvimento interno e o recurso aos fornecedores a montante depende dos benefícios prospectivos a serem apropriados pelo usuário do equipamento de produção. Eles argumentam que os benefícios a serem apropriados pelo usuário – comparados àqueles apropriados pelos fornecedores – aumentam com o grau de concentração do setor usuário. A proporção de tecnologia de processo desenvolvida internamente irá, portanto, aumentar com o grau de concentração do usuário. Os dados disponíveis até o momento não nos permitem um teste estatístico competente para essas várias hipóteses. Nossa medida da proporção de tecnologias de processo desenvolvidas internamente é, de certa forma, frágil, e não temos dados abrangentes das fontes de tecnologias de processo para os setores não-manufatureiros. Entretanto, podemos explorar a relação trans-setorial entre a proporção de tecnologias de processo desenvolvidas internamente, de um lado; e a série de variáveis que refletem as diferentes hipóteses descritas acima, por outro lado: tamanho médio das firmas inovadoras, relação capital/trabalho e tamanho médio da planta (a hipótese do presente autor); o volume de investimento na planta e em equipamentos pelos setores usuários (a hipótese de Rosenberg, Utterback e Albernathy); o coeficiente de concentração das cinco maiores firmas nos setores usuários de equipamentos (a hipótese de von Hippel e Buer).

As variáveis explicativas do autor foram as que se comportaram menos bem. Embora os sinais tenham sido todos corretamente preditos, nenhuma delas é estatisticamente significativa. Entretanto, as outras hipóteses foram fortemente confirmadas em termos estatísticos (E4). A proporção de tecnologias de processo desenvolvida pelas firmas no setor está negativamente correlacionada com o tamanho do mercado para os equipamentos do processo produtivo, e positivamente correlacionada com o grau de concentração das vendas nos setores usuários. 4.4. Diversificação

Quanto ao impacto econômico da mudança tecnológica, nossa taxonomia e teoria também oferecem alguns insights sobre os mecanismos de diversificação, seja em termos de P&D e tecnologia, seja em termos do setor de atividade. Nelson (1959) certa vez sugeriu uma relação positiva entre o desempenho da pesquisa básica realizada pelas firmas e a variedade de sua linha de produtos, dado que os resultados incertos da pesquisa básica são mais prováveis de encontrar uso em uma firma diversificada do que em uma especializada. De acordo com Scherer (1981, p. 422), entretanto, o resultado da análise estatística da relação entre os gastos em pesquisa básica e o total de P&D, por um lado; e a diversificação, por outro lado, “...são confusos e em certa medida contraditórios”.

De acordo com nossa taxonomia, a relação entre diversificação e total de P&D provavelmente é confusa, uma vez que postulamos uma causalidade diferente, que prediz uma correlação indeterminada e confusa entre as variáveis. Ela é indeterminada (ou pelo menos não-linear), dado que predizemos níveis relativamente baixos de diversificação baseada em tecnologia (ao nível de dois dígitos) tanto nos setores que são intensivos em P&D (químico, instrumentos e elétrico/eletrônico) quanto nos que gastam pouco em P&D (dominados pelos fornecedores). E ela é confusa, dado que o potencial para diversificação baseada em tecnologia nas firmas baseadas em ciência é muito mais elevado em nível de três dígitos que em nível de dois dígitos.

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Além disso, tanto nas firmas intensivas em produção quanto nas dominadas pelos fornecedores, os elos entre tecnologia e diversificação produtiva podem ser fracos. Isso emerge de uma comparação dos dados de Hassid (1975) sobre diversificação produtiva das firmas britânicas com os da diversificação tecnológica da tabela 4. Firmas intensivas em produção diversificam-se menos em termos produtivos que em termos tecnológicos, possivelmente porque não exploram, elas próprias, as oportunidades abertas para diversificação baseada em tecnologia “a montante”, em direção aos fornecedores de equipamentos. As firmas têxteis, por outro lado, diversificam-se mais em produção que em tecnologia, possivelmente por conta das complementaridades não-tecnológicas com outros setores.

Entretanto, com base em nossa taxonomia, podemos fazer algumas predições a respeito dos fatores que determinam as trajetórias tecnológicas potenciais das firmas inovadoras, em função de sua atividade principal. A importância de diversificação tecnológica “a montante” (isto é, vertical), rumo aos setores fornecedores de equipamentos, provavelmente é negativamente correlacionada com a intensidade de P&D (que tende a gerar oportunidades tecnológicas concêntricas ou a jusante) e positivamente correlacionada com a escala e a complexidade da tecnologia de produção (que induzem atividades inovativas focadas nas técnicas de produção e nos equipamentos a montante). Usando a relação capital/trabalho e o tamanho médio da planta como proxies para a escala e a complexidade da tecnologia de produção, não encontramos nenhuma das correlações estatísticas esperadas ao nível de três dígitos. Contudo, tomando a mesma relação ao nível de dois dígitos e o coeficiente de concentração das 20 maiores firmas como as proxies para escala e complexidade da tecnologia de processo, as correlações estatísticas são as esperadas, e significativas ao nível de 1% (E5).

A taxonomia e teoria propostas também podem nos ajudar a entender melhor os elos ao nível da firma entre a estratégia de P&D e a estratégia geral da firma. Embora muito estudo tenha-se devotado aos problemas “táticos” da gestão das atividades necessárias à inovação25, relativamente pouca atenção tem sido dada à questão “estratégica” do papel da tecnologia na determinação das atividades futuras da firma, e em particular de suas linhas de produto futuras.

Propomos um modelo que identifica as “trajetórias tecnológicas” das firmas como uma função de suas atividades principais, o que nos permite prever as possíveis trajetórias de diversificação tecnológica entre linhas de produtos e setores. Dada a riqueza e o detalhe dos dados que agora estão tornando-se disponíveis a respeito das atividades tecnológicas de firmas individuais, será possível realizar testes estatísticos com nossas predições, respondendo duas questões. Primeira: firmas dos mesmos setores de atividade principal tem uma distribuição estatisticamente similar de atividades tecnológicas entre grupos de produtos e áreas técnicas? Segunda: as distribuições são aquelas preditas por nossa taxonomia e teoria? Embora não sejamos capazes de afirmar que podemos prever as forças e fraquezas competitivas específicas de firmas particulares, podemos pelo menos identificar e explicar as oportunidades e restrições tecnológicas que em parte determinam seus comportamentos e escolhas.

Contudo, podemos prever com maior certeza que, ao nível de firmas individuais, o grau de diversificação tecnológica está possivelmente associado ao tamanho. Isso reflete três mecanismos presentes em nossa taxonomia e teoria: primeiro, firmas intensivas em produção em grande escala produzindo inovações a montante, principalmente em engenharia mecânica e instrumentos de precisão; segundo, as oportunidades abertas às firmas pequenas e especializadas que produzem equipamentos de produção para permanecerem pequenas, competitivas e tecnologicamente dinâmicas; e terceiro, as oportunidades abertas às firmas baseadas em ciência para diversificação tecnológica fora de seus setores de atividade principal a três dígitos (mas dentro de seu setor a 25 Ver a revisão da literatura feita por Rothwell (1977).

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dois dígitos). Dados os padrões de diversificação tecnológica das firmas baseadas em ciência, esperaríamos que essa relação fosse mais forte ao nível de três dígitos do que ao de dois dígitos.

Nossos dados sobre inovações confirmam essas predições. A distribuição por tamanho das firmas que produzem inovações fora de seus setores de atividade principal a três dígitos é mais viesada para o tamanho grande do que a média das firmas inovadoras: 69,9 (53,2)% nas de 10.000 ou mais empregados; 14,0 (23,2)% nas firmas entre 1.000 e 9.999 empregados; e 16,1 (23,7)% nas firmas com menos de 1.000 empregados26. Analisando trans-setorialmente a três dígitos, encontramos uma relação positiva e estatisticamente significante (ao nível de 5%) entre o grau no qual as firmas inovadoras diversificam-se tecnologicamente fora de seus setores e seu tamanho médio em cada setor.

Finalmente, prediríamos com base em nossa taxonomia que, entre as firmas baseadas em ciência, níveis relativamente elevados de pesquisa básica possibilitarão mais diversificação em direção a outros setores a três ou quatro dígitos e mais crescimento. Em um estudo recente, Link e Long (1981) concluíram que os dois fatores mais significativos que explicam as diferenças entre 250 firmas americanas quanto à proporção das vendas gasta com pesquisa básica são a diversificação ao nível de quatro dígitos e o fato de estarem em setores baseados em ciência. Embora a causalidade que propomos seja de sentido oposto, nossos resultados são consistentes com os de Link e Long. Da mesma forma, em um estudo recente sobre as firmas americanas da indústria petroquímica, Mansfield (1980) encontrou uma relação positiva entre a pesquisa básica como porcentagem do valor adicionado, por um lado; e a taxa de crescimento da produtividade total dos fatores, por outro. Se se assume, além disso, que o crescimento da produtividade total dos fatores está positivamente correlacionado com o crescimento do produto, então os resultados de Mansfield são consistentes com nossa taxonomia e teoria. 4.5. Tamanho da firma e estrutura industrial

Os elos causais que vão da inovação para o crescimento e o tamanho da firma são centrais para a pesquisa recente de Nelson e Winter (1982) a respeito da concorrência schumpeteriana. Eles predizem que, em indústrias com taxas rápidas de mudança tecnológica, com incerteza quanto aos resultados das atividades inovativas e com fortes possibilidades de as firmas inovadoras apropriarem-se das vantagens inovativas, há uma poderosa tendência, ao longo do tempo, à concentração tanto da produção quanto das atividades inovativas.

Nossos dados e teoria são consistentes com tais hipóteses e resultados na categoria de firmas baseadas em ciência, mas não nas categorias dominadas pelos fornecedores ou intensivas em produção. Nas firmas dominadas pelos fornecedores, normalmente o aumento no tamanho da firma não pode ser atribuído à inovação, dado que uma proporção pequena das inovações aí usadas é gerada no setor, embora o aumento de tamanho possa estimular (como observado por Adam Smith) a introdução de tecnologias de processo mais eficientes. Nas firmas intensivas em produção, a inovação está associada ao tamanho grande e crescente e não – como Nelson e Winter (1982) sugerem – à exploração desigual entre as firmas de um rico feixe de novas oportunidades de produto e de mercado; a inovação decorre da busca de crescentes economias estáticas de escala na produção27.

A diferença mais importante entre o modelo de Nelson e Winter e o que propomos é a existência estável de firmas pequenas que geram inovações em equipamentos e instrumentos de produção. A descrição de Rosenberg (1976) das firmas produtoras de máquinas têxteis da

26 Os números entre parênteses referem-se às porcentagens para o conjunto das inovações; ver tabela 4. 27 Ver, por exemplo, Levin (1977).

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primeira metade do século XIX não é muito diferente – afora o estado da arte tecnológica – da descrição de Rothwell (1976) das firmas produtoras de máquinas têxteis da segunda metade do século XX. Como vimos na subseção 2.4, firmas fornecedoras de equipamentos pequenas, especializadas e tecnologicamente dinâmicas da engenharia mecânica e instrumentos de precisão continuam a viver em simbiose com grandes firmas intensivas em produção e baseadas em ciência e a frustrar as tendências à concentração schumpeteriana. Isto é enigmático, pois, como Rosenberg (1976) observou, know-how, habilidades e técnicas comuns estão subjacentes a todos os produtos da engenharia mecânica, assim como os das firmas baseadas em produtos químicos ou elétricos/eletrônicos. Por que então as firmas típicas dos setores baseados em ciência diversificaram-se e cresceram com base em suas habilidades acumuladas, enquanto aquelas típicas da engenharia mecânica e instrumentos de precisão não o fizeram?

Neste artigo não podemos dar uma resposta definitiva. É suficiente sugerir que as explicações provavelmente estão nas diferenças setoriais quanto a fontes de tecnologia, necessidades dos usuários e condições de apropriabilidade28. Comparadas às firmas químicas e eletrônicas, as de engenharia mecânica e instrumentos de precisão dependem mais de seus clientes para obter informação e habilidades relacionadas ao desempenho operacional e ao projeto, desenvolvimento e teste de seus produtos: portanto, elas podem dar-se ao luxo de permanecerem pequenas; mas não acumulam a mesma série e profundidade de habilidades tecnológicas. Elas também operam em mercados que não têm características tão pronunciadas de ciclo de produto e, dessa forma, têm menos pressões de mercado para se diversificarem. Finalmente, elas encontram dificuldades para se apropriarem dos benefícios de suas inovações, dadas a opressiva importância de produzir inovações e as relativamente baixas barreiras à entrada que resultam de gastos relativamente baixos no desenvolvimento do produto e da existência de muitas fontes independentes de habilidades e know-how nos departamentos de engenharia de produção das grandes firmas.

De fato, pequenas firmas inovadoras não são encontradas apenas em engenharia mecânica e instrumentos de precisão, mas também na eletrônica: de acordo com Townsend et al., a parcela de firmas eletrônicas com até 1.000 empregados cresceu na década de 1970. Há uma diferença essencial entre as firmas inovadoras da engenharia mecânica e instrumentos de precisão e as da eletrônica. Enquanto as primeiras, em seu conjunto, têm-se mantido relativamente pequenas e especializadas, algumas das últimas tornaram-se muito grandes precisamente mediante os mecanismos de inovação e crescimento descritos por Nelson e Winter.

De acordo com Dosi (1982) novas firmas pequenas podem-se tornar grandes quando ocorre uma “mudança de paradigma” na tecnologia que altera radicalmente a taxa, a direção e as habilidades associadas à trajetória tecnológica. Contudo, ainda que isso possa servir para explicar a entrada de novas firmas na indústria eletrônica americana entre 1950 e 1970 baseadas em avanços na tecnologia de estados sólidos, não explica a relativa estabilidade da indústria química mundial nos últimos 60 anos, a despeito das sucessivas ondas de inovações radicais – ou “mudanças de paradigma” – que surgiram na química sintética.

As razões para esta diferença provavelmente devem ser buscadas mais uma vez na natureza das barreiras de escala enfrentadas pelos novos entrantes. Na eletrônica (principalmente os componentes de estado sólido e os equipamentos relacionados) as barreiras de escala estáticas são baixas, mas há economias dinâmicas de produção muito acentuadas. Isto significa que um pequeno e bem-sucedido inovador pode rapidamente tornar-se muito grande, uma vez que os imitadores estão atrás do inovador ao longo de uma curva de custo acentuadamente inclinada para baixo. Na química, por outro lado, existem barreiras de escala estáticas aos novos entrantes: 28 Para uma exploração mais detalhada dessa questão, ver Ergas (1983b).

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em produtos químicos de grande volume, há grandes economias de escala estáticas; na química fina existem agências públicas de regulação e controle de novos produtos, as quais exigem gastos pesados em monitoramento e testes.

Esta discussão sugere que modelos formais de dinâmica da concorrência schumpeteriana, como os desenvolvidos por Nelson e Winter, refletiriam mais acuradamente a realidade variada das trajetórias tecnológicas se explorassem uma série de hipóteses a respeito dos novos entrantes e das economias estáticas e dinâmicas de escala; a respeito das pressões de mercado para diversificação; e a respeito das relações de complementaridade entre produtores e usuários de bens de capital. 5. Perspectivas futuras

Começamos este artigo com alguma insatisfação a respeito da conceituação existente da mudança tecnológica. Baseados em dados empíricos sistemáticos, tentamos mostrar o por quê e propusemos uma conceituação alternativa que, esperamos, reflete mais acuradamente a natureza cumulativa e variada da mudança tecnológica que pode ser encontrada na economia moderna. Não é necessário aqui sumariar as principais conclusões de nossa análise, uma vez que já o fizemos no início do artigo. É suficiente sugerir algumas direções para a pesquisa futura.

Primeiro, a taxonomia que propomos precisa ser testada com base em uma cobertura setorial mais completa das características das inovações na Grã-Bretanha, de estudos de caso acumulados e de outros dados sobre atividades inovativas que venham a tornar-se disponíveis. Nossa análise sugere que as estatísticas de P&D não mensuram duas fontes importantes de mudança tecnológica: os departamentos de engenharia de produção das firmas intensivas em produção e as atividades de projeto e desenvolvimento de fornecedores pequenos e especializados de equipamentos de produção. Por razões que são discutidas em outro artigo (Pavitt, 1982), é provável que as estatísticas de patentes capturem as atividades inovativas daquelas fontes mais efetivamente que as estatísticas de P&D. As informações detalhadas que agora se estão tornando disponíveis sobre atividades patentárias por empresa devem, portanto, permitir um grande passo adiante. Como Rosenberg (1976) observou, os avanços teóricos e práticos têm dependido de bons sistemas de mensuração e de dados refinados e abrangentes. As estatísticas patentárias americanas podem eventualmente permitir a análise econométrica profunda e abrangente que consideramos e rejeitamos no início do artigo.

Segundo, a própria taxonomia proposta precisa ser modificada e ampliada. Deveria-se dar maior ênfase à exploração de recursos naturais na utilização de equipamentos e instrumentos de produção em larga escala29 e assim incluída em nossa categoria de firmas intensivas em produção. E uma quarta categoria deveria ser acrescentada para cobrir a compra pelo governo e pelos serviços públicos de bens de capital caros relacionados à defesa, energia, comunicações e transportes.

Terceiro, nossa taxonomia pode ter diversos usos para analistas e formuladores de políticas. No mínimo, pode ajudar a evitar debates genéricos e estéreis a respeito da contribuição relativa de firmas grandes ou pequenas à inovação, ou da importância relativa do “empurrão da ciência e tecnologia” comparado ao “puxão da demanda”. Pode também aumentar o valor e a eficiência dos estudos e políticas em nível microeconômico de mudança tecnológica, sugerindo questões como ponto de partida e colocando ao final os resultados numa perspectiva mais ampla.

Quarto, a taxonomia e a teoria podem exibir usos mais proveitosos. Como vimos na seção 4, elas lançam uma luz diferente e talvez nova sobre diversos aspectos importantes da mudança 29 Ver, por exemplo, Townsend (1980).

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tecnológica: por exemplo, as fontes e direções das atividades inovativas; o papel destas na atividade de diversificação das firmas, na acumulação de habilidades e vantagens tecnológicas no interior das firmas e na evolução das estruturas industriais. Elas também podem nos oferecer uma compreensão mais sólida dos determinantes dos padrões setoriais de vantagens comparativas tecnológicas que emergiram em diversos países30. Nelson e Winter (1977) observaram corretamente que a análise da mudança tecnológica tem sido “balcanizada”; talvez os conceitos presentes neste artigo sejam úteis para uma reunificação.

Quinto, nossa taxonomia e teoria contêm um óbvio e importante alerta tanto para os formuladores de política preocupados com a mudança tecnológica, quanto para os cientistas sociais acadêmicos preocupados com sua conceituação. Dada a variedade de padrões de mudança tecnológica que temos observado, a maior parte das generalizações provavelmente estará errada se estiver baseada numa experiência prática muito específica, ainda que profunda, ou num modelo analítico simples, ainda que elegante.

Para os formuladores de política – muitos dos quais vêm das ciências duras e da engenharia – isto implica aceitar que a experiência pessoal e a evidência pontual de colegas são uma base insuficiente para políticas que cobrem uma série de atividades tecnológicas. Também implica a necessidade de simpatia para com a coleta de dados sistemáticos de atividades científicas e tecnológicas. Tais dados podem ser imperfeitos em precisão, mas têm a vantagem de serem abrangentes.

Para os cientistas sociais acadêmicos, uma implicação é que os modelos analíticos de mudança tecnológica provavelmente tornaram-se mais complexos e numerosos31. O modelo de Salter (1966) de safras de mudança tecnológica pode ser um reflexo acurado do que ocorre fora da indústria e na manufatura tradicional mas, nas indústrias de montagem em massa e de processo contínuo, a ênfase colocada no investimento e na produção como fontes de mudança tecnológica, por autores tais como Schmookler (1966), Gold (1979), Sahal (1981) ou mesmo Kaldor (1966) e Verdoorn (1949) pode ser mais apropriada, enquanto a dinâmica schumpeteriana de inovação, crescimento e concentração em setores baseados em ciência está melhor refletida nos modelos e análises de autores tais como Freeman (1982), Freeman et al. (1982), Nelson e Winter (1982) e Dosi (1982). Como vimos neste artigo, a variedade dos padrões setoriais de mudança tecnológica foi reconhecida por Adam Smith. Talvez devamos voltar à sua tradição. Apêndice Uma análise estatística exploratória

Como apontamos na subseção 1.3, uma série de inadequações nos dados é uma das razões pelas quais este artigo não é de natureza econométrica. Algumas das principais inadequações são as seguintes:

• O banco de dados de inovações britânicas, junto com os outros dados disponíveis sobre as características industriais, permite no máximo 11 observações ao nível de 2 dígitos e 26 observações ao nível de 3 dígitos.

• Embora o banco de dados de inovações britânicas cubra o período 1945-1979, outros dados sobre a atividade industrial britânica, sistemáticos e detalhados, começaram a surgir apenas a partir do final dos anos 1960.

30 Para mais discussão, ver Pavitt (1983b) e Pavitt e Soete (1981). 31 Gold (1979) fez o mesmo comentário.

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• Algumas estatísticas industriais não estão prontamente disponíveis no grau de detalhe adequado aos propósitos de nossa análise: por exemplo, a medida de intensidade de patentes (T/Y) não está prontamente disponível ao nível de 3 dígitos.

Dessa forma, um exercício estatístico adequado, usando a base de dados de inovações britânicas, provavelmente terá que aguardar a conclusão da cobertura setorial e provavelmente requererá esforços estatísticos consideráveis para compilar dados compatíveis de outras fontes. Os resultados discutidos na seção 4 estão mais detalhadamente descritos nas tabelas 10 e 11. Tabela 10 Definição e descrição das variáveis

Símbolo Descrição Fonte

Prop 3 % de inovações usadas fora do setor produtor (3 dígitos) Banco de dados de inovações.

Prop 2 % de inovações usadas fora do setor produtor (2 dígitos) Coluna 1 da tabela 2.

Inhouse 3 % de inovações usadas no setor em que foram produzidas, pelo setor/firmas do setor (3 dígitos).

Banco de dados de inovações.

vertical % de inovações pela firmas com atividade principal no setor, que são diversificação vertical (2 dígitos).

Tabelas 6 a 9, coluna 5.

R/Y Total de P&D das firmas manufatureiras em % do produto líquido em 1975 (2 e 3 dígitos).

Business Monitor, M014, 1979, tabela 20 (HMSO).

PSU Tamanho médio da planta (3 dígitos). Informações do Departamento de Indústria, baseadas no Censo Industrial 1977.

C5 % das vendas das 5 maiores firmas em 1970 (3 dígitos). Business Monitor, PA1002, 1975, tabela 9 (HMSO)>

T/Y Patentes registradas no Reino Unido em % do produto líquido em 1975 (2 dígitos).

A mesma de R/Y; Townsend et al. (1981), tabela 11.1.

D20 % das vendas das 20 maiores firmas em 1970 (2 dígitos) A mesma de C5.

I Gastos em planta e maquinaria, 1970 (3 dígitos). A mesma de PSU.

Tabela 11 Resultados de Regressões Selecionadas

Equação V.Dependente Variáveis independentes: sinal e significância R2 g.l. F

E1 Prop 3 +R/Y** –PSU* 0.22 22 4.432** E2 Prop 3 +R/Y –C5** 0.23 15 3.475 E3 Prop 2 –D20 +T/Y* 0.54 8 6.872** E4 Inhouse 3 +C5* –I* 0.56 15 11.786* E5 vertical +D20* –K/L 0.71 7 9.013* * Significativa ao nível de 1%. ** Significativa ao nível de 2,5%.

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