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elulas solares “caseiras” (“Homemade” solar cells) Reginaldo da Silva 1 , Adenilson J. Chiquito, Marcelo G. de Souza e Rodrigo P. Macedo Laborat´ orio de Semicondutores, Departamento de F´ ısica, Universidade Federal de S˜ ao Carlos, S ˜ ao Carlos, SP, Brasil Recebido em 28/06/2004; Aceito em 22/09/2004 Usando alguns transistores de potˆ encia comerciais constru´ ımos uma bateria solar para uso como demonstrac ¸˜ ao ou para o fornecimento de energia para pequenos projetos. Al´ em disso, foi realizado um estudo destas c´ elulas, medindo suas curvas caracter´ ısticas para diferentes fontes de luz. Palavras-chave: energia solar, dispositivos de sil´ ıcio. Using some power transistors, it was developed a solar battery which can be used in science demonstrations or as a power supply for simple experiments. We study also the characteristic curves of these cells using different light sources. Keywords: solar energy, silicon devices. 1. Introduc ¸˜ ao Muito tempo antes da atual e necess´ aria procura por novas tecnologias de gerac ¸˜ ao de energia, mais limpas, eficazes e de menor custo ambiental, as c´ elulas solares a haviam mostrado sua potencialidade neste campo. Por volta de 1950, foi desenvolvida a primeira c´ elula solar usando uma junc ¸˜ ao p-n de sil´ ıcio [1] e logo em seguida outros materiais semicondutores comec ¸aram a ser usados na produc ¸˜ ao de c´ elulas. Inicialmente, foram usadas com um enorme sucesso no fornecimento de energia para sat´ elites e ve´ ıculos espaciais (d´ ecadas de 60 e 70), e em seguida em pequenas aplicac ¸˜ oes “terrestres”. Atualmente com a escassez de fontes renov´ aveis de energia, as c´ elulas solares vˆ em ganhando espac ¸o devido a seu custo de produc ¸˜ ao ter diminu´ ıdo grac ¸as ` as novas tecnologias de fabricac ¸˜ ao. Do ponto de vista de funcionamento, uma c´ elula solar ´ e um fotodiodo com uma grande ´ area que pode ser exposta ` a luz, seja solar ou n˜ ao. Desta forma, qual- quer diodo (junc ¸˜ ao p-n) cuja ´ area ativa possa ser ex- posta ` a luz tornar-se-´ a uma c´ elula solar! Obviamente, queremos dizer que o diodo ir´ a se comportar como uma c´ elula solar mas n˜ ao produzir´ a energia suficiente para uma aplicac ¸˜ ao comercial, como fonte de ener- gia, embora seja de f´ acil utilizac ¸˜ ao como equipamento did´ atico em demonstrac ¸˜ oes pr´ aticas. Alguns transistores comerciais fabricados em inv´ olucros de metal (como o 2N3055) possuem uma pastilha de um material semicondutor (sil´ ıcio) relativa- mente grande e que pode ser usada diretamente como uma c´ elula solar. Isto ´ e poss´ ıvel porque um transis- tor basicamente possui duas junc ¸˜ oes p-n (o 2N3055 ´ e do tipo n-p-n) as quais funcionam como diodos. Se ex- postas ` a luz, comportam-se como fotodiodos ou c´ elulas solares. Partindo desta id´ eia, realizamos uma s´ erie de ex- perimentos com estas c´ elulas solares que podemos chamar de caseiras, procurando entender de um modo geral, o funcionamento de tais fontes alternativas de energia. A seguir ´ e apresentada uma descric ¸˜ ao da teo- ria b´ asica de uma junc ¸˜ ao p-n, importante para a com- preens˜ ao de como ´ e gerada a corrente em uma c´ elula solar; em seguida, s˜ ao descritos alguns experimentos que usam o transistor acima citado como fonte de ener- gia. 1 Enviar correspondˆ encia para Reginaldo da Silva. E-mail: [email protected]. Copyright by the Sociedade Brasileira de F´ ısica. Printed in Brazil.

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Celulas solares “caseiras”(“Homemade” solar cells)

Reginaldo da Silva1, Adenilson J. Chiquito, Marcelo G. de Souza e Rodrigo P. Macedo

Laboratorio de Semicondutores, Departamento de Fısica, Universidade Federal de Sao Carlos, Sao Carlos, SP, BrasilRecebido em 28/06/2004; Aceito em 22/09/2004

Usando alguns transistores de potencia comerciais construımos uma bateria solar para uso como demonstracaoou para o fornecimento de energia para pequenos projetos. Alem disso, foi realizado um estudo destas celulas,medindo suas curvas caracterısticas para diferentes fontes de luz.Palavras-chave: energia solar, dispositivos de silıcio.

Using some power transistors, it was developed a solar battery which can be used in science demonstrationsor as a power supply for simple experiments. We study also the characteristic curves of these cells using differentlight sources.Keywords: solar energy, silicon devices.

1. Introducao

Muito tempo antes da atual e necessaria procura pornovas tecnologias de geracao de energia, mais limpas,eficazes e de menor custo ambiental, as celulas solaresja haviam mostrado sua potencialidade neste campo.Por volta de 1950, foi desenvolvida a primeira celulasolar usando uma juncao p-n de silıcio [1] e logo emseguida outros materiais semicondutores comecarama ser usados na producao de celulas. Inicialmente,foram usadas com um enorme sucesso no fornecimentode energia para satelites e veıculos espaciais (decadasde 60 e 70), e em seguida em pequenas aplicacoes“terrestres”. Atualmente com a escassez de fontesrenovaveis de energia, as celulas solares vem ganhandoespaco devido a seu custo de producao ter diminuıdogracas as novas tecnologias de fabricacao.

Do ponto de vista de funcionamento, uma celulasolar e um fotodiodo com uma grande area que podeser exposta a luz, seja solar ou nao. Desta forma, qual-quer diodo (juncao p-n) cuja area ativa possa ser ex-posta a luz tornar-se-a uma celula solar! Obviamente,queremos dizer que o diodo ira se comportar como

uma celula solar mas nao produzira energia suficientepara uma aplicacao comercial, como fonte de ener-gia, embora seja de facil utilizacao como equipamentodidatico em demonstracoes praticas.

Alguns transistores comerciais fabricados eminvolucros de metal (como o 2N3055) possuem umapastilha de um material semicondutor (silıcio) relativa-mente grande e que pode ser usada diretamente comouma celula solar. Isto e possıvel porque um transis-tor basicamente possui duas juncoes p-n (o 2N3055 edo tipo n-p-n) as quais funcionam como diodos. Se ex-postas a luz, comportam-se como fotodiodos ou celulassolares.

Partindo desta ideia, realizamos uma serie de ex-perimentos com estas celulas solares que podemoschamar de caseiras, procurando entender de um modogeral, o funcionamento de tais fontes alternativas deenergia. A seguir e apresentada uma descricao da teo-ria basica de uma juncao p-n, importante para a com-preensao de como e gerada a corrente em uma celulasolar; em seguida, sao descritos alguns experimentosque usam o transistor acima citado como fonte de ener-gia.

1Enviar correspondencia para Reginaldo da Silva. E-mail: [email protected].

Copyright by the Sociedade Brasileira de Fısica. Printed in Brazil.

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2 Enviar dúvidas para Juarez Gouveia E-mail: [email protected]

2. As celulas solares

Uma celula solar convencional e geralmente compostade uma juncao semicondutora p-n. Os materiais semi-condutores, dopados ou nao, sao caracterizados poruma faixa de energia proibida ou gap de energia (Eg)2.Na Fig. 1(a) temos a representacao esquematica doperfil das bandas de energia em uma juncao p-n [2].Unindo dois semicondutores de mesma energia de gapmas com dopagem diferente (tipo p - excesso de car-gas positivas, ou buracos e tipo n - excesso de car-gas negativas, ou eletrons), surge um campo eletricona regiao da interface como consequencia do dese-quilıbrio de cargas de cada lado da juncao. Alcancadoo equilıbrio, as bandas de energia sao curvadas comoaparece na Fig. 1(a), dando origem a uma regiao co-nhecida como regiao de deplecao, cuja principal carac-terıstica e a falta de portadores de carga livres, eletronsou buracos. A carga eletrica desta regiao e dada apenaspela carga das impurezas que foram ionizadas por acaodo campo eletrico na regiao da interface.

Figura 1 - (a) juncao p-n, onde Eg representa o gap de energiasproibidas, EC,V sao o fundo da banda de conducao e o topo dade valencia, respectivamente e E representa o campo eletrico najuncao; (b) corrente em uma juncao p-n sem e com iluminacao:IS e a corrente de saturacao e IL e a corrente foto-gerada, ICC ea corrente de curto circuito (V = 0), VCA e a voltagem em cir-cuito aberto (I = 0). A curva caracterıstica de uma celula solarsob iluminacao permite determinar a potencia maxima fornecida,a qual e representada pela area hachurada. Im e Vm sao as volta-gem e corrente maximas que podem ser fornecidas para uma dadapotencia de iluminacao.

Vamos agora discutir algumas caracterısticas de

uma juncao semicondutora como a da Fig. 1 e comosao influenciadas pela luz. Como mencionado acima,uma celula solar ou um fotodiodo referem-se a mesmaestrutura e se polarizados externamente, apresentam ascaracterısticas de corrente-voltagem de uma juncao p-n, seguindo uma expressao simples, dada a seguir [3]:

I = IS

[exp

(qV

kT

)− 1

], (1)

onde IS e a corrente de saturacao, V e a polarizacao ex-terna aplicada a juncao e os outros sımbolos tem seussignificados usuais. A equacao acima mostra qual e acorrente lıquida na juncao p-n (eletrons e buracos) se aela aplicar-se uma polarizacao V.

Quando uma juncao for iluminada por umaradiacao (luz) de energia hν, eletrons da bandade valencia podem ser excitados para a banda deconducao, deixando um buraco (portador de carga po-sitiva) na banda de valencia. Este sistema e conhecidocomo par eletron-buraco. Quando a iluminacao e re-tirada, ocorre a recombinacao do par eletron-buraco,com os eletrons excitados retornando para a bandade valencia. Para que este processo ocorra, somenteuma radiacao com energia hν > Eg sera efetiva-mente aproveitada: energias menores que a energiado gap nao conseguem excitar eletrons da banda devalencia para a de conducao e como nao existem es-tados eletronicos entre as duas bandas de energia naohavera excitacao. Para fixacao de conceitos, o pro-cesso de conversao da radiacao em corrente eletrica ebaseado fundamentalmente na criacao de pares eletron-buraco pela absorcao dos fotons da radiacao incidente.

Sob iluminacao, buracos e eletrons que foram fo-toexcitados no material podem deslocar-se ate a regiaode deplecao antes de se recombinarem, sendo ace-lerados pelo campo eletrico na interface (Fig. 1) deum para outro lado da juncao, contribuindo com umacorrente IL que tera o mesmo sentido da corrente desaturacao IS . Assim, levando em conta fotoexcitacao,a corrente total sera

I = IS

[exp

(qV

kT

)− 1

]− IL. (2)

A corrente IL esta ligada a um propriedadechamada eficiencia quantica que mede a “habilidade”do material usado em converter fotons em pares

2Dopagem refere-se ao processo de incorporacao de impurezas na rede cristalina do semicondutor, fornecendo cargas eletricas adi-cionais uteis para o desenvolvimento de dispositivos. Eg e o intervalo de energia que separa as bandas de conducao e de valencia de umsemicondutor. Neste intervalo nao existem nıveis de energia acessıveis aos portadores de carga, sejam eletrons ou buracos.

eletron-buraco e depende do comprimento de onda usa-do. A nocao simples de que quanto maior for a inten-sidade da luz incidente na celula maior sera a correnteproduzida, esbarra no valor da eficiencia quantica quee um fator limitante da corrente final produzida pelacelula solar. Na secao seguinte iremos trabalhar comesta propriedade. Alem disso, deve-se lembrar tambemque ao penetrar em um determinado material a radiacaoincidente pode excitar outros processos (espalhamentoelasticos ou inelasticos com a rede cristalina, por exem-plo) e ser absorvida. Tais processos tambem limitam afaixa de operacao de uma celula solar (alteram tambema eficiencia quantica), mas nao serao discutidos aqui.Para um tratamento mais geral ver a Ref. [3] e suasreferencias.

Como uma fonte de energia, precisamos determi-nar a potencia total util entregue pela celula solar auma carga RL, quando iluminada. A potencia e escritacomo o produto da voltagem pela corrente produzidapela celula, ou seja [3],

P = IV = V IS

[exp

(qV

kT

)− 1

]− V IL, (3)

e a potencia maxima [Pm = ImVm], com Im e Vm in-dicados na Fig. 1(c), sera obtida quando

(dP

dV

)

V m,Im

= 0.

Assim, fazendo a derivada acima e resolvendo paraV = Vm, obtemos

qVmkT

= ln

[1 + IL

IS

1 + qVmkT

]. (4)

Substituindo a Eq. (4) na Eq. (2), encontramosfacilmente a corrente maxima Im :

Im = ISqVmkT

exp

(qVmkT

), (5)

e o produto ImVm fica determinado. Para calcular ovalor deste produto falta encontrar uma solucao paraa Eq. (4) a qual e uma equacao transcendental e naoadmite solucoes analıticas. Para isso, podemos ini-cialmente reescrever a Eq. (2) supondo que I = 0, ouseja, iremos determinar a voltagem em circuito aberto(VCA) fornecida pela celula solar. Desta forma a Eq.(2) torna-se

0 = IS

[exp

(qV

kT

)

VCA

− 1

]− IL,

ou

exp

(qVCAkT

)=ILIS

+ 1.

Substituindo na Eq. (4), obtemos:

Vm = VCA −kT

qln

[1 +

qVmkT

]. (6)

A Eq. (6) continua sem solucao analıtica, maspermite uma estimativa do valor da voltagem maximaque pode ser fornecida pela celula solar. Com esteparametro inicial podemos encontrar o valor de Vm

numericamente, calcular Im e determinar a potenciamaxima fornecida pela celula quando iluminada. E im-portante destacar que a aplicacao de uma polarizacaoexterna como descrito acima serve para caracterizacaoda celula solar como dispositivo eletronico (esse modode operacao e conhecido como fotocondutivo e ba-sicamente usado em fotodiodos). Apos determinaras caracterısticas e o funcionamento da celula, esta enormalmente operada no modo fotovoltaico, no qualos terminais da celula disponibilizam uma tensao ecorrente uteis e dentro dos limites encontrados nacaracterizacao.

3. Aquisicao, preparacao e caracteri-zacao das celulas solares

Como mencionado na Introducao, os transistores dotipo 2N3055 apresentam uma pastilha de silıcio quetem dimensoes razoaveis para ser usada como umacelula solar de demonstracao. Esta ideia nao e nova,e o leitor interessado pode procurar, usando uma ferra-menta de busca na Internet, outras informacoes e tran-sitores que podem ser usados. Algumas publicacoestecnicas destinadas ao publico em geral tambem temrepetidos artigos sobre este assunto (ver por exemplo,Eletronica Total, Saber Eletronica, entre muitas ou-tras). Nossa intencao principal aqui e caracterizar estetransistor como celula solar, tentando entender comose processa a conversao luz/corrente eletrica em umajuncao semicondutora, e apos isso, propor experimen-tos que possam ser usados ate mesmo em salas de aula.

O transistor 2N3055 e facilmente encontrado nocomercio de componentes eletronicos a um customedio de R$ 5,00 ou mesmo em sucatas. Este tipode transistor e muito usado em sistemas de potencia deequipamentos de som e TV e tambem em sistemas de

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regulagem de corrente/tensao. O aspecto deste com-ponente e a identificacao de sua pinagem estao na Fig.2(a) e Fig. 2(b). A blindagem externa serve tanto paraprotecao mecanica da pastilha de silıcio como tambemevita a penetracao de luz. Para usa-lo em nossas ex-periencias, inicialmente retiramos a parte superior dotransistor como mostra a Fig. 2(c). Note que ficam ex-postos a pastilha de silıcio e os contatos eletricos comomostrado em detalhe na mesma figura. Dependendo dofabricante do transistor, a pastilha vem coberta por umaresina plastica esbranquicada (como em nosso caso)que limita a quantidade de luz que chega a juncao.Esta resina pode ser retirada utilizando-se um sol-vente organico como o tetracloreto de carbono ou o tri-cloetileno. Entretanto dada a alta toxidade destes doissolventes resolvemos manter a resina3 .

Figura 2 - (a) aspecto de um transistor de potencia 2N3055 (topo);(b) mesmo transistor, agora visto por baixo; (c) sem o involucro su-perior de protecao. Neste caso ve-se a pastilha de silıcio (colocadatambem no detalhe) e o contatos eletricos de base (B) e emissor(E). A terceira conexao eletrica (coletor, C) e feita no dissipadorde calor sobre o qual esta colada a pastilha; (d) esquema eletricousado para a caracterizacao da celula solar.

Retirada a protecao, efetuamos as ligacoes eletricasno transistor. Usualmente, uma celula solar e cons-truıda com apenas uma juncao p-n; logo, precisamosutilizar dois dos tres terminais presente no transis-tor (lembre-se que o 2N3055 tem duas juncoes p-n)e desta forma, mesmo transistores “queimados” po-dem servir para nossas experiencias, pois podemosaproveitar a juncao que nao esteja estragada. Comisso, temos uma celula solar caseira e como ilustradona Fig. 2(d) montamos um circuito eletrico simplesusado para a obtencao das curvas de corrente por vol-tagem sob diferentes condicoes de iluminacao. Usandoeste circuito, foram levantadas curvas de corrente porvoltagem para diferentes condicoes, como descrito aseguir.

Figura 3 - (a) curvas de corrente por voltagem caracterısticas dacelula solar usada, quando sob iluminacao (laser, λ = 488 nm)em varias potencias; (b) resposta da celula solar quando iluminadacom luz solar. Note que a corrente obtida e bastante maior que aobtida com a iluminacao pelo laser.

Na Fig. 3(a) apresentamos as curvas citadas acimausando como fonte de luz um laser de ıons de Argoniocom um comprimento de onda fixo em λ = 488 nm

3Usando os solventes indicados, retirou-se a resina de um transistor para comparar sua sensibilidade ao de outro, ainda com resina. Osdois transistores mostraram praticamente o mesmo comportamento, nao justificando a retirada da resina.

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mas com potencia variavel entre 30 mW e 100 mW4.Atraves da observacao destas curvas podemos verificaro efeito produzido pela potencia da luz incidente so-bre a celula solar, fator nao levado em conta explici-tamente na Eq. (2). Aumentando a potencia incidentesobre a area da celula houve um aumento expressivo dacorrente. No entanto, o aumento da corrente mostrouuma tendencia a saturacao, ou seja, a corrente tende aum valor maximo em funcao da potencia aplicada nacelula. Este efeito fica bem evidente nas duas ultimascurvas, obtidas para potencias de 80 e 100 mW, asquais mostram um aumento relativo de corrente muitomenor em comparacao com as outras curvas. Estecomportamento esta basicamente ligado a natureza dosistema, e de maneira simples podemos entender o re-sultado observando a dependencia da corrente fotoge-rada com o comprimento de onda da luz incidente, achamada eficiencia quantica e a area sob iluminacao. Acorrente IL pode ser escrita em termos microscopicoscomo [4]

IL =ηqPLλ

hc, (7)

onde η e a eficiencia quantica, q a carga eletronica,PL e a potencia da luz incidente, λ e o comprimentode onda, h a constante de Planck e c a velocidade daluz. Para o material (silıcio) e o comprimento de ondausados, a eficiencia quantica e relativamente baixa ouaproximadamente 20 % de conversao. Voltando a Eq.(7), dados η e λ, a corrente IL ira depender da intensi-dade de luz incidente, como observado. Desa forma,quanto maior a potencia da luz incidente, maior se-ria a corrente fotogerada. Mas nao foi isso o obser-vado em nossos experimentos: lembrando que a areasob iluminacao nao se altera, aumentando a intensidadeda luz aumentamos o numero de fotons incidentes masnem todos os fotons sao aproveitados para a criacao depares eletron-buraco: a corrente observada satura.

Finalmente, para concluir a caracterizacao de nossacelula solar precisamos usa-la de fato, ou seja, comoconversora de luz em corrente eletrica. Para isso acelula foi exposta a luz solar, com incidencia normale os experimentos foram realizados no dia 22 de abrilde 2004 entre 12:00 e 12:30 horario oficial de Brasılia.As curvas obtidas sem e com exposicao ao Sol estaona Fig. 3(b). Usando a Eq. (6), obtivemos Vm =0.404 V, visto que VCA = 0.473 V [Fig. 3(b)]. Us-ando agora a Eq. (5), a corrente maxima encontrada

foi Im = 0.031 A e portanto a potencia maxima quenossa celula pode fornecer e Pm = VmIm = 12 mW. Einteressante comparar as correntes maximas fornecidaspela celula para iluminacao com o laser (λ = 488 nm,PL = 100 mW) e com luz solar: esta ultima produ-ziu uma corrente (IL) cinco vezes maior que a pro-porcionada pelo laser. Lembrando que a eficienciaquantica do silıcio aproxima-se de 80 % na regiao doinfravermelho e que o Sol emite uma potencia elevadade radiacao nesta faixa de comprimento de onda, ficafacil entender a diferenca.

4. Alguns experimentos com a celula -Geracao de corrente e fotodetetor

Com o intuito de mostrar possıveis aplicacoes destascelulas solares, buscamos usar fontes de luz do dia-a-dia para verificar a potencia que as celulas pode-riam disponibilizar. Na Fig. 4(a) apresentamos umaserie de fontes de luz que foram usadas e as re-spectivas potencias maximas fornecidas pela celulasolar. Neste caso, como a maioria das fontes deluz sao policromaticas e tem intensidades maximasmuito diferentes, preocupamo-nos apenas em manterum parametro sob controle que foi a distancia entrea celula e a fonte de luz. Ao optar por este procedi-mento fica algo difıcil apresentar resultados quantita-tivos como os da secao anterior. Mas o intuito aqui eexatamente este: atraves de resultados qualitativos ob-servar o fucionamento de uma celula solar.

Continuando com as experiencias, tomemos comoexemplo a fonte de luz “Sol”, da secao anterior: acelula conseguiu uma corrente maxima de 31 mW, oque e suficiente fazer girar um pequeno motor. Apesardisso, a corrente medida e bastante pequena para quea celula possa ser utilizada como fonte de alimentacaoem dispositivos eletronicos; por outro lado, sendo ba-sicamente uma bateria, nada nos impede de conectarvarios transistores em serie (para aumentar a voltagem)e em paralelo (para aumentar a corrente) para assimconseguirmos uma bateria solar. Ligando seis celulasnuma configuracao onde tres conjuntos de duas celulasem serie estao em paralelo, obtivemos Pm ' 82 mWpara iluminacao solar. Para pequenos projetos ou parademonstracao do conceito de celula solar esta “bateriasolar” e bastante util.

4Estas energia e potencia foram escolhidas em virtude do sistema disponıvel quando da realizacao do experimento. Obviamente adisponibilidade de outros valores seria de grande utilidade, mas o usado ja e suficiente para explorar algumas das propriedades das celulassolares.

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Figura 4 - (a) curvas de corrente por voltagem obtidas com dife-rentes fontes de iluminacao; (b) dependencia da potencia luminosacom a distancia da fonte de luz.

Outra caracterıstica interessante da nossa celula so-lar e talvez mais util do ponto de vista de aplicacaoe a sua utilizacao como um detector de luz, ja quepara diferentes fontes utilizadas a celula apresentoucorrentes de resposta bastante diferentes e razoavel-mente intensas para este fim. Como um exemplo,a celula solar construıda pode servir para uma ex-periencia bastante instrutiva, na qual podemos verificarque a potencia de uma fonte luminosa decai com o in-verso do quadrado da distancia entre a fonte e ponto deobservacao [5], ou seja,

I ∝ 1

d2,

onde d e a distancia entre fonte e ponto de observacao.Na Fig. 4(b) estao os dados experimentais obtidos comnossa celula solar usada como detector. Usamos umalampada incandescente comum (60 W) como fonte deluz e o experimento foi realizado em um ambiente obs-curecido. Note que os pontos experimentais seguem atendencia da curva teorica, representada na Fig. 4(b)como uma linha contınua. A nao coincidencia exatados comportamentos teorico e experimental deve-se aofato de que a lei do inverso do quadrado assume que afonte de luz emite uniformemente em todas as direcoes,situacao que pode nao ser verdadeira para uma dada

fonte particular. Esta situacao pode ser verificada ex-perimentalmente usando-se um laser como fonte deluz.

Outro exemplo e que de fato foi um dos motivosque levou a este trabalho, foi a utilizacao deste tran-sistor em nosso laboratorio como um detector de luzpara experimentos nos quais caracterısticas eletricasde amostras semicondutoras estao sendo avaliadas emfuncao da iluminacao. A resposta fornecida por estacelula (tempo de resposta, intensidade de sinal e custo)deixou muitos outros detectores comerciais em claradesvantagem.

5. Conclusao

Neste trabalho, construımos uma celula solar “caseira”,utilizando um transistor de potencia 2N3055, e obser-vamos a resposta da celula quando submetida a difer-entes iluminacoes, atraves de medidas de corrente porvoltagem. Com isso, alem de estudarmos o processo deconversao luz em corrente eletrica, pudemos tambemexplorar experimentos simples utilizando a celula. Eimportante destacar que a pesquisa em celulas solarescomo uma fonte de energia mais limpa e inesgotavel(pelo menos nos proximos bilhoes de anos) deve ser in-centivada em todo o planeta, principalmente em paısestropicais como o nosso. Alias, como disse Carl Sagan[6], “a vida na Terra ocorre quase que exclusivamentea luz solar. Os vegetais reunem os fotons e convertema energia solar em quımica. Os animais parasitamas plantas. A agricultura e simplesmente a colheitametodica da luz solar, utilizando plantas como inter-mediarios forcados. Nos somos, quase todos, movidosa energia solar.” Porque nao aplicar esta ultima ideiaem todas as nossas atividades?

Referencias[1] D.M. Chapin, C.S. Fuller, and G.L. Person, J. Appl.

Phys. 25, 676 (1954).

[2] A.J. Chiquito, Rev. Bras. Ens. Fıs. 21, 514 (1999).

[3] S.M. Sze, Physics of Semiconductor Devices (Wileyand Sons, New York, 1981).

[4] S.M. Rezende, A Fısica de Materiais e DispositivosEletronicos (Editora da UFPe, Recife, 1996)

[5] D. Halliday e R. Resnick, Fısica 4 (Livros Tecnicos eCientıficos LTDA, Rio de Janeiro, 1990).

[6] Carl Sagan, Cosmos (Francisco Alves Editora S.A.,Rio de Janeiro, 1992).

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VER PROJETO CÉLULA SOLAR EXPERIMENTAL Pag. 6