Por políticas de qualidade para nossas cidades

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Nossas cidades precisam de mais planejamento, políticas públicas de qualidade e uma sociedade atuante para garantir seu dinamismo e qualidade de vida, essencial para a o crescimento do país.

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Por polticas de qualidade para nossas cidades

Imagem: http://coberturadasnoticias.com/wp-content/uploads/2014/05/Cidade-Tiradentes-1.jpgLegenda: Cidade Tiradentes, localizada no extremo zona leste da capital

Depois de anos de desvalorizao contnua e de ter seu papel rebaixado como agregados de poluio, crime e disfunes afins, as cidades vem presenciando um resgate essencial de sua imagem, com, finalmente, o reconhecimento do motor que so para o desenvolvimento socioeconmico de qualquer pas. De acordo com recente estudo conduzido pela consultoria McKinsey, de 2015 a 2025 cerca de 60% do crescimento do PIB mundial vir de apenas 600 cidades (1). Alm de ser um dnamo importante para o desempenho econmico destas regies, as cidades ao redor do mundo tem um papel importante na mobilidade social, tendo sido um histrico polo de atrao para milhes de indivduos e suas famlias, em busca de melhores condies de vida, crescimento profissional, oportunidades de educao e sade - ou mesmo pela busca por um cotidiano mais plural. No Brasil, metrpoles como So Paulo, Rio de Janeiro, Recife - mesmo Braslia - tiveram, ao longo de sua histria, importante momentos de inflexo migratria que propalaram rpidas expanses - geralmente coincidindo com concomitantes aceleraes na evoluo econmica do pas. Se por um lado a expanso da indstria e, posteriormente, do setor de comrcio e servios, funcionou como um fator de atrao para quem quer quisesse aproveitar suas oportunidades, por outro a prpria vinda destes migrantes impulsionou o crescimento, criando um efeito de retroalimentao. De qualquer maneira, esses movimentos de crescimento, por mais que tivessem alterado de forma importante parte do contexto socioeconmico do pas - e permitido a ascenso social de milhes de brasileiros ao longo das dcadas, bem como, em muitos locais, uma fratura nas tradies patriarcais e oligarquias reinantes - tambm deixaram uma herana nefasta na cultura nacional. O crescimento desordenado das cidades, permitido por um poder pblico inoperante e um planejamento mais orientado distribuio de benesses aos grupos de interesse do que efetiva melhora de qualidade de vida, ainda mais enfraquecido com o pouco poder municipal, frente ao centralismo federal (crescente) no pas, resultou na identificao pelo brasileiro de suas cidades como um caos de congestionamentos, alagamentos, alta criminalidade e pobreza. Se parcialmente verdadeira, ao analisarmos a aridez do contexto espacial de nossas cidades, a viso do cenrio urbano no Brasil esconde que suas mazelas foram, em parte, aprofundadas pela via de quem deveria resolv-las - o poder pblico. Ao abrir bulevares inspirados em Paris na dcada de 10, Pereira Passos empurraria milhares de moradores de cortios no centro carioca para as primeiras favelas do pas; ao regulamentar o uso da terra no trecho entre o Rio Pinheiros e a Avenida Paulista em So Paulo, seriam empurrados para cidades perifricas e para o extremo da Zona Leste milhes de habitantes "irregulares", em nome do exclusivismo da aberrao dos "Jardins" na metrpole - entre milhares de outros exemplos, que refletem a teimosia de resolver problemas de cima-para-baixo, sem discusso transparente, e a mania poltica de se criar grandes e exuberantes projetos populistas que prometem panaceias simples (e sobretudo cosmticas) para problemas estruturais. Ainda que grandes renovaes foram permitidas por alguns ambiciosos planos de urbanizao (e readequao), estes tambm promoveram e garantiram uma profunda desigualdade espacial no que tange ocupao de nossos centros urbanos, por hiper-regulaes que, se belas na teoria, na prtica so apenas garantidas em bairros mais abastados, que tornar-se-iam ilhas (ou litorais) de riqueza, em meio a cintures de pobreza - vide gigantescos projetos habitacionais como a Cidade Tiradentes, no extremo da zona leste paulistana. De qualquer maneira, imperativo uma ao conjunta dos nveis do Executivo, com amparo de um legislativo antenado com as necessidades do cotidiano prtico - bancadas ruralistas ou agindo pelo fulgor do lobby, por exemplo, pouco atuam nesse sentido - e um judicirio independente e atuante. preciso um esforo para entender que o crescimento e ordenamento de nossas cidades no puramente um Plano Diretor, mas sim uma contnua reao diferentes polticas pblicas, empreendimentos privados e, mais importantemente, dos indivduos que ocupam o espao, por meio de organizaes e participao cidad. Impostos, polticas de estmulo industrial, transparncia de informao, corrupo, burocracia, segurana - aes de qualquer rea do governo impactam e edificam os mecanismos urbanos. Realizar projetos que envolvam maior densidade demogrfica em locais prximo aos polos de emprego e eixos de transporte, com uso misto e quadras inteligentes, que aliem trabalho, ativa interao social, equipamentos pblicos e moradia (criando efetivos laos comunitrios); ouvir comunidades ao realizar os planos, evitando grandes projetos direto de Braslia sem conhecimento das realidades locais; subsidiar aluguis em bairros centrais e realizar acordos com empreiteiras que aliem aumento do coeficiente de construo com cotas de habitao social nos prprios empreendimentos - todos mtodos no to dispendiosos ou autoritrios, e com maior flexibilidade de ajuste, teste e acompanhamento de resultados, alm de serem sadas para o alto custo do solo urbano.A cidade de So Paulo avanou em diversos pontos, neste aspecto, com seu novo Plano Diretor - que, se chegou atrasado, foi devido a um amplo processo de discusso de suas aes, em um esforo de debate que consolidou e facilitou a aceitao da populao por suas diretrizes. Essa transparncia na poltica pblica evitou os rudos, como os observveis na implementao das ciclovias na cidade, que, na falta de um verdadeiro planejamento e boa comunicao, provocou uma polarizao indesejvel. De qualquer maneira, no deixa de ser louvvel os esforos de secretarias municipais e estaduais por maior transparncia dos dados, como o HabiSP (que permite acompanhar as moradias populares em construo ou planejamento), da Secretaria de Habitao, e a divulgao de Cenrios de Planejamento Urbano para as prximas dcadas pela Secretaria de Transportes Metropolitanos.Outra ambio do Plano, as moradias populares prximas aos eixos de transporte e polos de emprego, vem sendo limitada pelos baixos tetos do programa federal Minha Casa Minha Vida, e por sua limitao de andares em muitos de seus editais - apenas 10% dos projetos habitacionais em execuo, planejados ou prontos na cidade esto no centro expandido, de acordo com anlise do jornal O Estado de S. Paulo (2). Alis, o MCMV pouco faz pelas cidades, ao direcionar-se para os extremos perifricos - s potencialmente piora a j extremamente dbil mobilidade, com aprofundamento das cidades-dormitrio, e legalmente motiva a nefasta desigualdade espacial - uma das razes da observada na renda. Alm disso, ainda que tenha atentado para a necessidade (real, frise-se) de reajustar um VGV (Valor Geral de Vendas, usado para o clculo do IPTU) j muito defasado com o tempo - e com a vertiginosa valorizao dos imveis e terrenos na capital paulista - a estratgia de realizar este reajuste de uma s vez ser catastrfica para os de renda mais baixa, que hoje ainda conseguiam viver de aluguel no centro expandido de So Paulo. Com os maiores ndices de aumento incluindo a S e o Brs - regies com considervel populao de baixa renda (3). Se correto na inteno e na justificativa, a falta de pensamento a mdio e longo prazos implica numa maior distncia do pobre e da cidade, com largos incentivos ocupao da periferia - redues do IPTU foram reservadas para estas regies, por exemplo. Vale ressaltar que o IPTU social no aplicvel em aluguis, o que ir ter seu impacto sobre a acessibilidade a migrantes e imigrantes que escolhem tradicionalmente o centro, minando potencialmente seu dinamismo.A vitalidade e potencial socioeconmico das cidades no vem somente por meio da inrcia da concentrao demogrfica - e nem isso que sua prpria existncia sugere. A diferena entre o sucesso e contnuo crescimento de uma concentrao depende no s de fatores externos - e sim, sobretudo, a uma boa administrao pblica, com transparncia sobre dados e aes, bem como ambiente nacional propcio - experincias como a estadunidense, cujo declnio das cidades na metade do sculo XX foi impulsionada por uma poltica forjada por subsdios governamentais a suburbanizao, demonstram (4). essencial uma sociedade ativa e mdia vigilante, proporcionando real presso e provocando um fluxo de ideias e propostas, e evitando injustas e desnecessrias polarizaes - que s nos levaro a lados que se ignoram, ao invs de efetivamente melhorar a qualidade de nosso tecido urbano.

Luiz Eduardo PeixotoEconomia - 3 Semestre

(1): Extrado de http://www.mckinsey.com/insights/urbanization/urban_world. (2):Disponvel em: http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,haddad-constroi-somente-10-das-habitacoes-no-centro-imp-,1638105(3): FIORAVANTI, L. Mapa das Operaes Urbanas em So Paulo, disponvel em http://gesp.fflch.usp.br/node/194(4): DUANY, A. e SPECK, E.; Suburban Nation, GALLAGHER, L.; The End of the Suburbs, e extensa bibliografia.