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Da Comunicao em Massa Comunicao em Rede: ModelosComunicacionais e a Sociedade de Informao

Autoria

Gustavo Cardoso Ph.D., professor at ISCTE in Lisbon. Researcher at CIES-ISCTE. Member of the European Research Council (ERC) evaluationpanel "SH2 Institutions, Behaviour, Values and Beliefs" and member of the COST-European Science Foundation DomainCommittee "Individual, Societies, Cultures and Health". He also develops research together with the Catholic University of Milanand the Osservatorio Sulla Comunicazione (Osscom), the Internet Interdisciplinary Institute (IN3-UOC) in Barcelona and the

research network World Internet Project carried out at USC - Annenberg School of Communication.

Contedo

Abstract

Da Comunicao em Massa Comunicao em Rede

Da Comunicao em Massa Comunicao em Rede

A globalizao comunicacional no sculo XX

A articulao em rede atravs da interactividade num ambiente global

Da comunicao de massa para a comunicao em rede

Bibliografia

ABSTRACT

Durante os ltimos 15 anos testemunhmos uma forte mudana na paisagem dos media. Mudana que sedeve, no s, inovao tecnolgica nos prprios instrumentos de mediao, mas tambm na formacomo os utilizadores escolheram apropriar-se socialmente dos mesmos e, consequentemente, comoconstruram novos processos de mediao. []

DA COMUNICAO EM MASSA COMUNICAO EM REDE

Durante os ltimos 15 anos testemunhmos uma forte mudana na paisagem dos media. Mudana que se deve, no s, inovaotecnolgica nos prprios instrumentos de mediao, mas tambm na forma como os utilizadores escolheram apropriar-se socialmentedos mesmos e, consequentemente, como construram novos processos de mediao.

Como conclui Silverstone (2004), a crescente centralidade dos media, no exerccio de poder e na conduo do nosso dia a dia, colocao estudo da mediao no topo da ordem do dia da investigao social, exigindo a compreenso da forma como os processos decomunicao mediada moldam tanto a sociedade como a cultura (Silverstone, 2004), mas tambm como a mediao molda o sistemade media . Por outras palavras, como o sistema de media organizado e como o configuramos atravs da mediao.

A mudana de mediao tem sido, ao longo dos ltimos anos, o cerne da anlise de muitos cientistas sociais, desde as perspectivaslegais apresentadas por Lessig (2004), anlise econmica proposta por Yochai Benkler (2006), anlise cultural de Umberto Eco(1985) e Fausto Colombo (1993) e teoria social global da Idade da Informao desenvolvida por Manuel Castells (2000). A nomeao,por ltimo, do trabalho de Manuel Castells foi uma escolha deliberada, porque o seu trabalho nos permite revelar duas importantesdimenses para a compreenso do sistema de media actual: a organizao em rede da sociedade (Castells, 2000) e o processo deauto-comunicao de massa (Castells, 2007). No entanto, a anlise que aqui se desenvolve procura demonstrar a necessidade deultrapassar essas contribuies e abordar uma outra questo fundamental na teoria dos media: os modelos comunicacionais. Tendoem conta que, durante o sculo XX juntmos, teoricamente, novas tecnologias e novos usos de media com modelos de comunicao(Ortoleva, 2004), poderemos afirmar que o presente modelo ainda est enquadrado no conceito de comunicao de massa? Oudevemos questionar a sua presente validade para explicar o nosso mundo mediado pela comunicao?

Esta anlise argumenta que ultrapassmos o modelo de comunicao baseado na comunicao em massa e encontramo-nos nummodelo baseado na comunicao em rede. As pginas seguintes enquadraro esse argumento e demonstraro que, mais importantedo que a mudana tecnolgica, para a alterao no sistema de media, tem sido a forma como os utilizadores de media, nos seusprocessos de mediao privados, pblicos ou de trabalho, moldam as suas dietas e matrizes de media.

Lies do portalISSN 2014-0576

http://portalcomunicacion.com/

A primeira parte deste captulo apresenta o que sugerido como o modelo comunicacional em rede das sociedades informacionais.Um modelo comunicacional moldado por trs caractersticas principais: 1) Processos de globalizao comunicacional; 2) Ligao emrede de media de massa e interpessoais e, consequentemente, mediao em rede; e 3) Diferentes graus de uso da interactividade.

A segunda parte deste captulo lida com o que considerado como sendo novos paradigmas comunicacionais que deram, por suavez, origem ao novo sistema de media: 1) Retrica maioritariamente construda em volta da imagem em movimento; 2) NovasDinmicas de Acessibilidade da Informao; 3) Utilizadores como inovadores; e 4) Inovao nos modelos de Notcias e deEntretenimento. (1) O sistema de media, como expresso por Peppino Ortoleva, refere-se ao conjunto de interligaes entre tecnologias e organizaes que guiam asdiversas formas de comunicao. uma categoria de origem essencialmente institucional e econmica que nos ajuda a explicar, por um lado, adinmica evolutiva dos media e, por outro lado, como cada sociedade estabelece, entre os diversos media, uma diviso da funo, que nasceu doscomplexos processos socio-culturais mas que encontra mais tarde legitimidade na institucionalizao de companhias e molduras legais (Ortoleva, 2004)

DA COMUNICAO EM MASSA COMUNICAO EM REDE

A hiptese inicial para caracterizar o actual sistema de media das nossas sociedades , contrariamente ao que sugerido comfrequncia (Ortoleva, 2004), no tanto uma convergncia tecnolgica, mas a organizao em rede do sistema. Essa organizaoocorre em vrios nveis, desde a dimenso tecnolgica organizao econmica e apropriao social. (2)

O argumento adiantado aqui o de que o que pode ser realmente considerado caracterstico, na forma como o sistema actual demedia est organizado, a sua forma organizacional em rede. Mas, tambm se encontra novidade no facto de, na sociedade em rede,a organizao e o desenvolvimento do sistema de media depender, em larga medida, da forma como ns utilizadores nos apropriamossocialmente dos media e no apenas de como as empresas de media e o Estado organizam a comunicao. (3) De um mundo de comunicao em massa constitudo por organizaes de distribuio de contedos de mass media, estamos adirigir-nos para um mundo construdo, ainda, por grandes conglomerados de media (Hesmondhalgh, 2007), mas tambm pela formacomo as pessoas trabalham em rede com diferentes tecnologias mediadas, combinando mecanismos interpessoais de mediao commecanismos de mediao de massa.

pela forma como atribumos os papis sociais de informao, de entretenimento, de aco e organizao a cada um dos mediaque desenhamos as redes de interdependncia entre eles. No entanto, apesar dos media nos terem acompanhado desde queorganizmos os cdigos de comunicao de uma forma sistematizada (Eco 1977), somente neste momento da nossa histria queencontramos um sistema de organizao de media baseado em rede. Porqu? aqui sugerido que tal acontece agora porque, numafase inicial, o aparecimento da Internet permitiu a migrao dos mass media tradicionais de tecnologias analgicas para as digitais,construindo assim as pontes necessrias entre os antigos e os novos media. Numa segunda fase, a Internet e, at certo ponto, ostelemveis e a tecnologia SMS permitiram a constituio de um nmero cada vez maior de interligaes entre todos os media (Karlsene Sundet 2007; Jenkins 2006; Livingstone 1999), sejam eles analgicos ou digitais. Essas ligaes foram socialmente apropriadaspelos cidados e moldaram as formas como os media interagem com o nosso dia-a-dia.

O mundo empresarial tem sistematicamente dado voz ao longo dos anos ao facto de estarmos a assistir a uma tendncia deconvergncia em vrias dimenses do universo dos media (Storsul e Fagerjord 2007, 2008; Storsul e Syvertsen 2007). Aconvergncia teria evoludo da pura convergncia de hardware, para uma convergncia de vrias camadas, construda por trsestratos diferentes: convergncia de instrumentos, convergncia de redes e convergncia de servios de software. No entanto, umaconfirmao quanto veracidade de tais afirmaes deixa-nos muitas dvidas quanto a essas constataes servirem de resposta questo de saber at que ponto essa convergncia tem sido um verdadeiro sucesso (Storsul e Fagerjord 2007, 2008; Jenkins 2006).Apesar das fuses de gigantes dos media, no princpio do sculo XXI, como a AOL e a Time Warner (Castells, 2000) terem originadovrios processos de mimetizao pelo mundo fora, na realidade, a gesto continua essencialmente a ser baseada na lgica deunidades diferenciadas de gesto tecnolgica (4) (Kung 2002, 2007; Dubini e Raviola 2007; Fee Jr. 2007; Achtenhagen 2007).Tambm na dimenso de hardware tecnolgico, os esforos para incorporar tecnologias de media diferentes, e j socialmenteapropriadas (como a televiso e o computador), numa s pea de equipamento, tiveram diferentes nveis de sucesso (a WebTV foi umfracasso, mas a tecnologia mp3 transformou os telemveis em walkmen). Os telemveis, juntamente com hbridos como o iPhone daApple e outras ofertas tecnolgicas similares, parecem ser a nica dimenso de hardware em que encontramos uma convergnciatecnolgica de sucesso. Mas, as razes para tal sucesso relacionam-se mais com a mobilidade e a relao estabelecida com osnossos sentidos, nomeadamente a audio do que com a simples oferta de um aparelho convergente. A mobilidade explica porque que o visionamento de vdeo e a audio de msica se uniram nos nossos consumos dirios de media: demos a tais prticas novosespaos e novos tempos. Em consequncia, a particularidade do telemvel ter atingido sucesso ao reunir msica, rdio e conversaomediada oralmente, num s equipamento tecnolgico, deve-se mais ao facto de os trs interagirem com o mesmo sentido: a audio,do que com uma convergncia tecnolgica facilitadora da agregao de diferentes media. Apesar de muitas outras funes teremsido, e continuarem a ser, adicionadas aos telemveis, tambm verdade que os utilizadores tendem a concentrar os seus usos nomago das utilizaes de comunicao: conversas udio e textuais (Cardoso 2007, Castells 2006, Caron e Caronia 2007, Silverstone2005).

Ouvir msica mp3 de rdio, ver filmes e vdeos no telemvel no substituiu os rdios, leitores de mp3 e outros ecrs, apenas deu aosutilizadores destas tecnologias mveis outros tempos e lugares de escuta, ao colocar em rede usos preexistentes. O mesmo pode serdito em relao incorporao de cmaras, num corolrio da evoluo histrica da representao fotogrfica (Colombo e Scifo 2006),mas permitindo agora o trabalho em rede da cmara com a Internet e os computadores pessoais em ambientes mveis.

A convergncia pode ter falhado como negcio e conceito de apropriao social de hardware tecnolgico, mas teve um efeitosecundrio, a construo de um ambiente inovador adaptado experimentao e interaco entre as companhias de media, deTelecomunicaes e os utilizadores finais. O sistema de media forneceu contedos, ou a necessidade de experimentar novoscontedos, as companhias de Telecomunicaes trouxeram a vontade de ligar cada vez mais - e de forma mais eficiente - diferentesredes de transmisses; e os utilizadores procuraram estabeleceram novos padres ao adoptarem a mobilidade atravs do uso detelemveis e redes de WiFi. O efeito secundrio do fracasso da convergncia foi o aumento da articulao em rede entre diferentes

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media, contedos e redes, e a adopo de um padro nico de comunicao: o Protocolo de Transferncia de Internet e o endereoInternet, o bem conhecido TCP-IP.

O argumento aqui expresso o de que o sistema de media actual parece estar organizado no em torno da ideia de convergncia,tornada possvel pelas tecnologias digitais, mas em torno da articulao em rede. Mesmo em casos de larga adopo de uso, como ostelemveis utilizados para ouvir msica, mp3 ou tirar fotografias, a sua utilidade continua a depender do estabelecimento de umaligao em rede a um PC, Mac ou ao uso de um Smartphone com ligao de Internet para downloads e uploads. Essa conectividadecoloca-os numa relao em rede, tanto com o prprio computador pessoal, como com as lojas online ou as redes sociais da Web 2.0.

Outro exemplo desta articulao em rede pode ser encontrado nos chamados servidores de media, nos quais, apesar de haver umaconvergncia de sinal na rede sobre os protocolos IP (Taplin 2006) a difuso em casa feita atravs de tecnologia sem fios (Bar2006), os destinatrios sendo os diferentes aparelhos: de leitores de msica ou telemveis para mp3, televiso para filmes ou paradifuso, voz sobre IP para o telefone e a Internet para o porttil ou outro ecr mvel. Diferentes utenslios tecnolgicos que podem, seo utilizador escolher tais capacidades, comunicar entre si, dando lugar a uma articulao em rede de aparelhos, contedos e usos. Oque encontramos nas nossas ruas, escritrios e casas no tanto uma convergncia, mas antes a articulao em rede dos media eseus usos.

Como que esta rede se encontra estruturada? A hiptese defendida aqui a de que o sistema de media est cada vez maisestruturado em torno de duas redes principais que comunicam entre si, usando vrias tecnologias de comunicao e informao.Essas duas redes esto ambas baseadas na televiso e na Internet, estabelecendo ligaes ao usar diferentes tecnologias decomunicao e informao como o telefone, o rdio, a imprensa escrita, etc.

Porqu dois ns principais, um construdo em torno da televiso e o outro da Internet? A resposta complexa e ser objecto de umaanlise aprofundada nas prximas pginas. Contudo, podemos avanar com a hiptese de que tal estar relacionado com asdimenses de interactividade tornadas tecnologicamente possveis por cada uma destas tecnologias, e como valorizamos socialmenteessas dimenses interactivas diferentes. Essa uma interpretao que resulta da anlise de prticas de fruio, para a qual o conceito de matriz de media , tambm,fundamental (5) . Segundo Aroldi e Colombo (2003), uma das razes porque auto-limitamos a nossa capacidade de compreender overdadeiro papel dos media na nossa sociedade est relacionada com a prpria anlise terica das nossas escolhas, que tendem aconcentrar-se demasiado numa ideia individualizada de media. Por outras palavras, o estudo isolado da rdio, dos jornais ou daInternet, limita a nossa compreenso do poder e cunho dos media como elementos de mudana social (Fornas 2007). Como seressociais, no usamos apenas um nico media como fonte de comunicao, informao, aco e entretenimento, mas combinamo-los,usamo-los em rede. S uma anlise aprofundada das dietas de media pode revelar a complexidade dos nossos usos e representaesda sociedade atravs de e com os media. Precisamos de ir mais alm, para podermos compreender a mudana social na paisagemmeditica e nas relaes dos utilizadores de media no seu dia-a-dia, isto , os novos processos de mediao que do sentido nossarealidade (Silverstone 2005)

Todos ns lidamos com os media desde a escrita s imagens em movimento e das imagens paradas comunicao oral no nossodia a dia. Interpretamos e incorporamos permanentemente informao nas decises que tomamos, num processo reflexivo (Giddens1991). A natureza em rede do actual sistema de media necessita de ser abordada e discutida. Se a cultura da nossa sociedade emrede uma verdadeira cultura de virtualidade real (Castells 2000) e se a mediao (Silverstone 2005) um conceito chave para acompreenso das caractersticas da comunicao, como que podemos caracterizar o modelo comunicacional dominante das nossassociedades? Antes de mais, o nosso modelo comunicacional dominante est construdo em torno: 1) da globalizao da comunicao;2) da ligao em rede dos media de massa e interpessoais e, consequentemente, da mediao em rede; 3) e de diferentes graus deuso de interactividade. (2) Usando uma sugesto de McLaughlin (Ortoleva, 2004), podemos descrever convergncia como a superao de barreiras tecnolgicas, econmicase institucionais, tornadas possveis pela tecnologia digital. Estas barreiras dividiam os media em quatro sectores principais: o sector editorial dominadopela imprensa privada e controlada pelos direitos de autor; o sector das transmisses, ou seja, as redes de distribuio, que incluem os sectores postale das telecomunicaes e a Internet; o sector de emisses, baseado na publicidade, e o sector de hardware baseado na produo e distribuio deequipamento de comunicao (cmaras de vdeo, sistemas stereo, cassetes e perifricos). Mas a convergncia tratada aqui centra-se principalmente naideia de que a tecnologia permitiu a vrios sistemas de hardware, que eram usados separadamente pelo consumidor final, convergirem em unidadestecnolgicas. Tem sido esta ideia que nos ltimos dez anos tem sido o mote ou Killer Application da comunidade comercial. O que este artigo querquestionar a validade deste conceito para explicar o principal motor de mudana dentro da comunidade nos processos de comunicao e mediaonas nossas sociedades. Ver tambm (Storsul e Fagerjord 2007, 2008; Storsul e Syvertsen 2007).

(3) Para uma anlise do papel do Estado na regulao dos mercados ou da sua actuao como um dos participantes na economia ver Iosifidis (2007),Mancini e Hallin (2004).

(4) Ver, por exemplo, a Sony Records e os seus processos contra a troca ilegal de msica na Internet e a promoo em simultneo de mp3 pela secode hardware da Sony.

(5) Um termo originariamente utilizado por Meyrovitz (1985) para sublinhar o facto de que todos tendemos subjectivamente a criar uma hierarquiamental para os diferentes tipos de media e a sua importncia nas nossas vidas. Estas hierarquias so estritamente individuais, mas tambm partilhadassocialmente.

A GLOBALIZAO COMUNICACIONAL NO SCULO XX

A sociedade em que vivemos hoje em dia ela prpria o produto, da uma confluncia histrica, de desenvolvimentos que tiveramlugar em vrias reas de actividade humana (Castells 2000). Mas, esse momento de confluncia, igualmente um ponto de chegadapara um processo que comeou no incio do sculo XX: a centralidade da comunicao nas nossas sociedades (Silverstone 2006).

A centralidade da comunicao um fenmeno relativamente recente pois, at finais do sculo XIX (Rantanen 1997), a ideia decomunicao como uma entidade autnoma e independente dentro do conceito mais geral de transporte (assim como a ideia demedia como algo de distinto de outros instrumentos teis para trocas ou viagens) no era geralmente discutido (Ortolova 2004,



Winston 1999, Richeri 1996, Silverstone 2005). O nascimento de novos meios de comunicao como o cinema e a rdio, a literaturadesenhada, o gramofone, ou a linha telefnica no foram vistos, na altura, como um fenmeno unitrio que poderia ser agrupadonum nico conceito (Silverstone 2005, Ortoleva 2004). No entanto, a ideia de comunicao e informao no s se imps na suaespecificidade e autonomia, como tambm se asseverou enquanto uma ideia central da vida social, antes de se tornar, no final dosculo XX, um objectivo em termos de desenvolvimento econmico (Cardoso 2006). Hoje temos uma variedade de comunicao semprecedentes nossa disposio e tambm uma escolha sem precedentes entre media aparentemente equivalentes (Eco 2001,Silverstone 2005). Essas so as duas bases para a nossa vida no incio do sculo XXI no mundo desenvolvido (Ortoleva 2004,McPhail 2005, Lull 2007). Outra contribuio fundamental para a contextualizao desta discusso o facto de, em relao a outrosperodos da histria da humanidade, o sculo que agora acabou ter sido um momento excepcional, pois a comunicao tem sidotradicionalmente um dos mais estveis recursos e objecto de gesto prudente e conservadora (como demonstrado por toda a histriada escrita desde a China antiga, ao Egipto dos faras e Idade Mdia).

Que formas de exigncias sociais e processos resultaram nas frmulas e tcnicas de comunicao? E porque foram eles privilegiadoscom grandes recursos afim de sustentar a intensidade de desenvolvimento que se registou? Uma possvel resposta dada por vriosinvestigadores quando se referem descontinuidade que teve lugar dos anos 70 do sculo XX em diante (Castells 2000, Cardoso2006). As sociedades contemporneas testemunharam uma alterao no paradigma econmico que originou um modelo baseado nainformao. De facto, a informao parece ter substitudo a energia (6) como o elemento central na vida econmica primeiro nospases mais desenvolvidos antes de se expandir para todas as reas do planeta seguindo as regras da economia de mercado(Himanen 2006). Mas algo mais est a mudar. Quando se fala da economia informacional (Castells 2000, Lehman 2007) no fim dosculo XX, entende-se no s uma economia em que a livre circulao de informao um pr-requisito para a existncia de ummercado, mas tambm uma economia em que o sector que produz a comunicao tambm tem um papel de fora motriz em relaoao sector industrial que, tradicionalmente, dominava os mercados: as indstrias de manufactura. Neste contexto analtico, Giddens(1998) e Silverstone (2005) apresentam alguns pontos de partida importantes. Giddens, quando questionado sobre se o conceito deSociedade de Informao podia ser usado correctamente para caracterizar as alteraes que se produzem nas nossas sociedades,respondia: Realmente no, no (...) a Sociedade de Informao no nos d a uma real percepo do que se est a passar (1997).Argumento similar produzido por Silverstone (2005). Quando colocado perante a mesma pergunta, Silverstone replicou que j nodeveramos estar a pensar em algo chamado Sociedade de Informao (...) mas antes numa Sociedade Comunicacional (...), porque na nossa comunicao uns com os outros a rea em que as TIC se insinuam mais directamente na essncia da existncia social. Asglobalizaes econmica e comunicacional, e no o conceito de sociedade de informao, so ambas para Giddens e Silverstone, astendncias mais visveis de uma sociedade em mudana como resultado de uma fuso crescente das tecnologias de informao,comunicao e da computorizao.

medida que a nossa sociedade moderna se torna gradualmente mais complexa, graas especializao e garantias simblicas(Giddens 1991), e se auto-configura como um sistema, apoiando-se em organizaes de tipo sistmico, surge a necessidade deinstrumentos que interrelacionem, o mais rapidamente possvel, os diferentes pontos do sistema em si (Ortoleva 2004, Silverstone2005). Estes processos podem ser visveis no desenvolvimento do sistema da rede de transportes, que tinha como pr-requisito odesenvolvimento do telgrafo e o sistema de horrios unificado a nvel nacional e depois global ou ainda, por exemplo, na adopo dotelgrafo naval pelo navios apenas depois da introduo de navios a vapor visveis a grandes distncias (Winston 1999). Ou,finalmente, no desenvolvimento da publicidade tornada necessria, e possvel, atravs de outro sistema: o da distribuio em grandeescala (Ortoleva 2004).

A complexidade espacio-temporal da organizao social o ponto de partida para a anlise de modelos de comunicao nassociedades informacionais, porque deu origem globalizao comunicativa. Uma das dimenses da complexidade espacio-temporalque mais contribuiu para esta globalizao comunicativa, foi a dimenso econmica e a evoluo dos mercados. Como Castells (2000)demonstra, a necessidade de uma reestruturao do capitalismo forneceu o impulso para a adopo e diversificao dos media, odesenvolvimento das tecnologias de informao e a sua articulao em rede No entanto, temos que salientar que a relao entre omercado e a comunicao foi uma constante durante o sculo XX, assumindo caractersticas diferentes consoante os momentos emque a relao se manifestou. Durante um largo perodo do sculo XX, teve formatos diferentes do da presente configurao em rede,tendo-se concentrado principalmente num modelo de concentrao hierrquica. Entre a queda da bolsa de 1929 e a crise petrolferade 1973, teve lugar um desenvolvimento dos modelos de comunicao caracterizado pela difuso e experimentao com rdio eteleviso, em simultneo com um impulso em direco de uma economia de consumo de massa expandida (Winston 1999, Colombo1993). A nossa realidade social em termos de modelos de comunicao , assim, um produto destes movimentos que tiveram lugar aolongo do sculo passado.

As ligaes entre os media e a sociedade tm sido de natureza diversa ao longo da histria. Por um lado, existem os que apontamcomo determinantes as relaes causa/efeito, como a ideia de que os mass media criaram a sociedade de massas. Esta , porexemplo, a ideia de um grupo de analistas definido por Umberto Eco (1991) como apocalpticos, os quais estabelecem ligaesquase directas entre informao e o modelo de entretenimento originado nos media e processos de massificao social ehomegeneizao cultural nos anos 70 (Ortoleva 2004, Aroldi e Colombo 2003). De acordo com as teorias deterministas por exemplo,o Marxismo tradicional a comunicao em massa seria a expresso de um autoritarismo produzido pelo reduzido poder de controlosobre o desenvolvimento tcnico (Poster 1999). A mesma viso reaparece no discurso tecno-cultural (Robbins 1999) no contexto dasociedade de informao no fim do sculo XX, particularmente na oposio entre os media interactivos e passivos, ou, se preferirmos,os novos media (como a Internet) e os media antigos (como a televiso).

Outra abordagem tomada pelos que discutem que os media exprimem, tanto atravs da sua estrutura como dos seus contedos, aprpria natureza da sociedade na qual so gerados. o caso de analistas como Poster (1999) e McLuhan (1997). Segundo Poster,existem trs fases principais no Modo de Informao, que coexistem entre elas, no sendo, no entanto, consecutivas. Estas so astrocas simblicas mediadas oralmente, pela escrita e, posteriormente, pela electrnica. Em cada uma dessas fases a relao entre alinguagem e a sociedade, a ideia e a aco, o eu e o outro , por isso, diferente. Assim como, no sculo XIX, a imprensa escrita tinhaum papel fundamental na formao da noo do sujeito independente e racional ao constituir uma esfera de debate pblico que,segundo Habermas (1986), criou as bases para as democracias do sculo XX os novos media, e em particular a Internet, esto apromover, atravs das suas caractersticas, um sujeito mltiplo, descentralizado e disseminado. Segundo McLuhan (1997) no sepode falar de um s modelo de sociedade correspondente a todos os mass media, mas de dois modelos distintos. O primeiro, omodelo da imprensa e, mais tarde, cinema e, at certo ponto, do rdio, era baseado numa clara diviso de papis e uma forte ordemhierrquica. O segundo, que surgiu com a televiso e foi reforado com as formas ulteriores de comunicao electrnica(informatizao e automatizao), era baseado num sistema horizontal e com fortes relaes interactivas. Os pressupostos centraisdas anlises de Poster (1995) e McLuhan (1997) referem-se assim viso da no neutralidade dos media e ideia de que os mediatecnologicamente diferentes so fruto da sociedade em que surgem e que promovem, atravs do seu uso, realidades socio-culturais



diferenciadas.

Uma terceira abordagem, enumerada por Ortoleva (2004), argumenta que existe um reequacionamento do alcance real dascomunicaes de massa, com os seus denominados efeitos (Wolf 1992), e sublinha que os utilizadores dos media encontram umacorrespondncia numa relao interpessoal em rede que condiciona e filtra a recepo de mensagens. Uma abordagemcomplementar apresentada por Pierre Levy (1997) ao propor para a relao entre a tecnologia e a sociedade a noo de influncia,por oposio de impacto. A aco de qualquer forma de tecnologia, como os media, no pode ser considerada fora da cultura e porisso interage com a cultura, que a recebe e a modifica desde o seu nascimento (Fornas 2007).

Tendo em conta as trs dimenses acima descritas, a posio que prevalece na anlise aqui desenvolvida, sobre o presente modelocomunicacional das nossas sociedades, aproxima-se dos fundamentos analticos declarados por Wolf (1992), a relao entre atecnologia e o social sugerido por Levy (197) e o papel da reflexividade analisado por Giddens (1991). A reflexividade, permitida pelastecnologias de informao e comunicao, um elemento fundamental no processo de deciso individual e construo de vida, mastambm demonstra que no apenas atravs do desenvolvimento tecnolgico e inovao cientfica que podemos, de alguma forma,controlar ou definir o que ser o futuro. O futuro opaco e problemtico e sabemos que o que dizemos tambm contribui para essescenrios. Acontece que o prprio futuro tambm tem uma dimenso problemtica e reflexiva (Giddens 1999, Kaivo-Oja 2003). Sedesejarmos tipificar o processo relacional entre a comunicao, a informao e a sociedade, podemos argumentar que essencialmente uma relao bi-explcita. Bi-explcita no sentido em que, por um lado, a comunicao possibilita diferentes modelos deorganizao social (Castells 2004) mas, ao mesmo tempo, existem necessidades sociais supervenientes (Winston 1999) que tambmcriam novas formas de comunicao.

Nesse sentido, tendo em conta a interaco entre media e sociedade sob um processo reflexivo de interdependncia, podemos falarde correspondncia entre modelos comunicacionais e sociais.

Tendo em considerao a definio precedente, como podemos descrever o modelo de comunicao que caracteriza uma sociedadeinformacional? Tanto Giddens (1999) como Castells (2000) chamam a ateno para o facto de que muito do que temos presenciadoao longo das ltimas trs dcadas, ser uma consequncia da ligao em rede de diferentes tecnologias, ou seja, as tecnologias deinformao, comunicao e computorizao. A sua apropriao econmica e social resulta de uma interessante relao entre omercado e a democracia. Apesar da dimenso econmica da globalizao ser fundamental, no pode ser vista apenas como umfenmeno econmico, mas tambm como comunicacional (Giddens 1999, Lull 2007). Quando se vive num mundo em que as noticiastm praticamente uma caracterstica instantnea (Sparks 2007, Mazzoleni et al. 2004, Tremaine 2007, McPhail 2005, Silverstone2006, Shoemaker 2006) e em que a diversidade de contextos de informao regra (ver, por exemplo, as diferenas entre a coberturade satlite da insurreio iraquiana de Abril de 2004 pela CNN e canais de televiso rabes como a Al Jazeera), temos que aceitar quea globalizao significa tambm uma mudana nos sistemas de comunicao. Esta mudana transforma as vidas da populao localao mesmo tempo que altera a estrutura econmica da prpria vida (Lash 2007, McPhail 2005).

Os media em geral tm um duplo papel a desempenhar no mundo moderno. Por um lado so instrumentos de democracia, comoilustrado pelo papel dos canais de televiso nas revolues de 1989 na Europa de leste, o golpe de estado russo contra Gorbachev ea subida ao poder de Yeltsin (Giddens 1999, Castells 2004) e mais tarde, atravs da generalizao da Internet, a tomada deconscincia dada ao drama do povo de Timor Leste em 1999 (Cardoso 2007). Por outro lado, media como a televiso tambm tendema subverter os espaos que abrem, perseguindo retricas de personalizao e trivialidades num processo de preocupao com apersonalidade e o trivial algo que tem muitas vezes um efeito negativo no dilogo social (Dahlgren 2001, Lull 2007, Sparks 2007,Bang e Esmark 2007). Em resultado desta dualidade, o tempo presente ,pela primeira vez na histria, um tempo em que governos ecidados coexistem no mesmo ambiente de informao, e isto acontece como resultado da mudana tecnolgica, alm dos outrosdesenvolvimentos. Quando governos e cidados vivem o mesmo ambiente de informao h muitas coisas que os cidados deixamde tolerar tm muito menos tolerncia para com a corrupo, negociaes parte, acordos secretos e o uso de ligaes pessoais.Quanto mais o mesmo ambiente partilhado, menos tudo o que parecia normal na poltica h uns anos atrs aceite como normal(Giddens 1999, Castells 2004) (7) . No contexto actual temos que ver os media como um todo e pens-los em termos das suasfunes de agncia e alcance territorial, pois atravs desta dupla dimenso que possvel perceber como se articulam mutuamente.

Figura 1. Percentagem de utilizadores de Internet nos Pases Seleccionados (The WIP Project 2006)

Fonte: The World Internet Project (2006)

A comunicao global um elemento fundamental para a criao de um mercado global. Ela permitiu infra-estruturas para acomunicao de dados, notcias e imagens, aumentando assim o desejo pela posse de produtos e acesso a servios. Mas esteprocesso de associao entre a comunicao e o mercado tambm deu origem a um efeito secundrio: deu poder s vozessilenciosas dos que reclamam autodeterminao e justia social e que reagiram ao consumismo atravs da declarao de identidade(Castells 2004, Tehranian 1999, Hoff e Hansen 2007). As comunicaes globais, desde a imprensa Internet, tiveram vrios papisnesses processos. Os media globais promovem simultaneamente a homogeneizao e diferenciao dos mercados, a centralizao eao mesmo tempo a disperso de poder, implementam integrao cultural e pluralismo.

A globalizao da comunicao ao nvel global espacial, mas tambm ao nvel local, ao permitir que diferentes pessoas, dentro damesma comunidade, possam partilhar assuntos , provavelmente, a novidade mais importante nas mudanas actuais trazidas pelacomunicao no nosso quotidiano. Ao trazer a comunicao para um nvel global, atravs da transmisso, e mais tarde ao permitir s



pessoas serem globais, atravs do uso de tecnologias globais, como a Internet e as redes de telemveis, construmos uma redecomunicacional que pode ser moldada s necessidades dos seus utilizadores, seja pelo acesso a contedos, a pessoas ou ambos.

As prticas dos agentes sociais na sociedade em rede combinam os media na tentativa de obter resultados. No so usos isolados deum meio especfico. Devemos olhar para os media no como tecnologias isoladas mas como objectos de apropriao social que sodiversificados e combinados consoante os objectivos a atingir pelo utilizador. Contrariamente aos discursos sobre a sociedade deinformao (Karvonen 2001), em que se prope a hierarquizao dos media ou a subordinao ao mais recente, os media constituemum todo, um sistema de media (Ortoleva 2004), articulando-se mutuamente em redes, construdas na dialctica de objectivos entre osque deles se apropriam e os que os gerem. Um sistema de media, que apropriado na base de escolhas individuais, que sopartilhadas socialmente, constitui assim o que podemos chamar uma matriz de media (Meyrovitz 1985).

Os media no so elementos isolados. No nos limitamos a ouvir rdio, ou ler jornais, ou navegar na Internet. A prtica umaarticulao, ou se preferirmos, uma ligao em rede de vrios media no dia-a-dia em casa, no trabalho, na escola ou em deslocaes(Cardoso 2007, Castells 2007, Colombo 2003, Caron 2007). (6) Algo que pode ser constatado pelo facto de se procurar optimizar os gastos energticos - ou a substituio de fontes de energia - na suacontribuio para a estrutura de custos, atravs da inovao alimentada por conhecimento cientfico e informao e j no apenas pela busca dematrias primas energticas para obteno de baixos custos de produo.

(7) Apesar de concordar com o diagnstico de Giddens (1999) quanto procura de dicotomias da televiso comercial (por exemplo, ao recorrer dramatizao ao fornecer informao e distorcer padres de narrativa, procurando apresentar o bom e justo por oposio ao mau e injusto), tambmtemos que chamar a ateno para a hiptese dos supostos efeitos mltiplos associados aos media. A comunicao pode acontecer como um processode troca livre e igual de sentido, desenvolvimento de comunidades ou avano da solidariedade social entre as naes e os indivduos ou podesistematicamente distorcer percepes e criar inimigos de fantasia, fabricar consenso e consentimento para guerras de agresso e atirar determinadosgrupos tnicos ou naes para categorias sub-humanas (Tehranian, 1999). Esta possibilidade dos efeitos mltiplos, j presente na comunicaotelevisiva, foi acrescentada aos novos media, mas as comunicaes modernas tornaram as explicaes dualistas mais difceis, ou mesmoimpraticveis.

A ARTICULAO EM REDE ATRAVS DA INTERACTIVIDADE NUM AMBIENTE GLOBAL

Exemplos de uso em rede de media e da interdependncia entre os media e apropriaes individualizadas, mas socialmentepartilhadas, podem ser encontradas de muitas formas, produto de pesquisas em diferentes ambientes nacionais. Pelo seu impacto anvel mundial e pela sua gnese, um bom exemplo das duas dimenses que caracterizam o presente modelo comunicacional, aarticulao de media em rede e a mediao em rede, podem ser encontradas na anlise dos processos comunicativos que tiveramlugar em Espanha entre os ataques de 11 de Maro de 2004 em Madrid e o dia das eleies gerais, em 15 de Maro de 2004 (Castells2006). Em Espanha, os ataques de 11 de Maro na estao de comboios de Atocha, no centro de Madrid, ocorreram numa poca quej no era apenas da televiso ou rdio, mas uma poca em que os media incluam, atravs da apropriao por uma larga parte dapopulao, o telemvel e a Internet. As tcticas de guerrilha semitica contempornea (Eco 2004), exemplificadas pela apropriaosocial dos media nos dias que se seguiram ao 11 de Maro de 2004 em toda a Espanha, foram desenvolvidas num processo em rede,um processo de criao de ns espontneos que ecoavam em mensagens originadas atravs de comunicao interpessoal. Desta vezo telemvel, sobretudo atravs do uso dos SMS, foi usado com o fim de divulgar a mensagem de que o governo estava a mentir como envolvimento da ETA, porque era a Al-Qaeda, e convidando as pessoas a reunirem-se nas sedes do partido do governo, o PartidoPopular, ou edifcios pblicos em protesto (Eco 2004). Este um exemplo, entre outros, da procura de canais alternativos decomunicao, usando aparelhos de comunicao interpessoal num processo de comunicao em massa, tendo em vista oestabelecimento de uma alternativa difuso da comunicao das estaes de televiso e rdio. A nossa comunicao interpessoalpode ser transformada num meio de comunicao de massas quando tem lugar numa rede electrnica (como a do telemvel). Acomunicao interpessoal tomou assim a dimenso de um fenmeno colectivo. As pessoas viam televiso e liam os jornais mas, aomesmo tempo, comunicavam entre si, e perguntavam-se se o que era dito era ou no verdadeiro. Responderam a essas questescomparando notcias, lendo e ouvindo os canais de transmisso nacionais, cruzando-as com a informao que conseguiram obter naInternet, atravs dos jornais estrangeiros e canais de televiso por satlite (Eco 2004, Cardoso 2007).

Muitos outros exemplos de ligao em rede de media de massa e individual podem ser encontrados na ltima dcada por todo omundo. A televiso e a cobertura web dos ataques bombistas de Londres, os chamados ataques de 7/7 de 2005, do-nos outroexemplo dessa ligao em rede dos mass media e media interpessoais. As notcias difundidas dependiam em grande medida deimagens enviadas a partir de telemveis por transeuntes e vtimas, tendo como resultado a incorporao do dia-a-dia individual, mastecnologicamente aumentado, na corrente de eventos e conversas globais (Siverstone 2005). A combinao de e-mail e televiso foitambm essencial para o sucesso do protesto de Seattle na altura do Millenium Round do WTO (World Trade Organization) em 1999ou nas manifestaes mundiais por Timor-leste, do mesmo ano (Cardoso 2007). Como foi realado por diversos analistas (Rodot2000, Castells 2004, Wieviorka 2003), os protestos de Seattle foram organizados via Internet, sobretudo atravs de e-mail e posts emwebsites, mas s ganharam visibilidade e poder de mediao com as imagens divulgadas pelos canais de televiso atravs do mundo.Aqui a Internet teve um papel tradicionalmente representado por estruturas pessoais em redes locais, tornando possvel que pessoascom os mesmos interesses mas dispersos geograficamente pudessem coordenar as suas aces. Os participantes em aces deprotesto em torno do Millennium Round tambm compreenderam que somente o uso da Internet no lhes traria a legitimidade ou afora necessria para chegar a uma tomada de posio (Cammaersts 2003), da a necessidade de ir para a rua em aces deprotesto, que foram organizadas atravs da Internet mas divulgadas pela televiso ainda o mass media mais difundido e como tal oideal para chegar aos olhos e mentes dos outros.

Mas a mediao em rede no apenas uma ferramenta usada na autonomia politica, tambm um elemento importante para arealizao dos objectivos de comunicao definidos pelos diferentes indivduos de forma a informarmo-nos ou concretizarmos algumaforma de entretenimento. As seguintes tabelas exemplificam o uso de SMS e e-mail na TV e nos programas de rdio, concursos einquritos em Portugal e na Noruega (Karlsen 2008) exemplificando o uso da autonomia comunicativa para fins de participaopblica.



Quadro 1. SMS enviados para programas de Televiso em Portugal e na Noruega (% da Populao)

Fonte: Cardoso, Gustavo, Rita Espanha and Carmo Gomes (2006)A Sociedade em Rede em Portugal; Karlsen, Faltin; SchankeSundet, Vilde; Syvertsen Trine; Ytreberg, Espen (2008), Actividade amadora na televiso em tempos da digitalizao, Nordicom

Review.Nota: Em Portugal, apenas 14.8% dos que enviaram SMS viram-na efectivamente no ecr de televiso.

Quadro 2. E-mails enviados para programas de Televiso em Portugal e na Noruega (% da Populao)

Fonte: Cardoso, Gustavo, Rita Espanha and Carmo Gomes (2006)Inqurito A Sociedade em Rede em Portugal 2006, CIES; Karlsen,Faltin; Schanke Sundet, Vilde; Syvertsen Trine; Ytreberg, Espen (2008), Actividade amadora na televiso em tempos da digitalizao,

Nordicom Review.

Como foi sugerido anteriormente, a interactividade tornou-se umas das trs caractersticas organizacionais definidoras do modelo derede comunicacional. Assim como a mediao em rede, as diferentes formas como usamos a interactividade com os media moldaramos mesmos e, ao faz-lo, transformaram a organizao do sistema de media e os modelos comunicacionais da sociedade.

Segundo Kim e Sawney (2002), existem duas abordagens principais comunicao interactiva no contexto das novas tecnologiasaplicadas aos media: a abordagem comunicacional e a abordagem ambiental dos media. A abordagem comunicacional v ainteractividade como a relao entre os comunicadores e as mensagens trocadas. Neste sentido, no so s os media electrnicos,mas tambm cartas ao editor, telefonemas para os programas de televiso e a participao da audincia nos programas que soconsideradas formas de interactividade. Nesta perspectiva, os media interactivos so aqueles que conseguem estimular trocasinterpessoais atravs dos seus canais de comunicao. Na abordagem ambiental, em contraste, a interactividade definida comouma experincia de media tecnologicamente oferecida em que o utilizador pode participar e modificar as formas e contedos dosmedia em tempo real (Steur citado em Kim e Shawney 2002). Quanto a esta definio, caractersticas como a interaco em temporeal e a resposta imediata so consideradas de uma importncia vital para a criao de um ambiente interactivo. Caractersticas comoa comunicao de um-para-muitos e muitos-para-um, a flexibilidade de uso e a comunicao por voz, texto e vdeo, tanto entreindivduos como em grupos, o uso do meio como uma plataforma para a produo e processamento de informao e o potencial paraa criao das prprias mensagens, tm muito mais a ver com o que pode ser encontrado hoje em redes de computadores, como aInternet, do que com a interaco fornecida hoje em dia pela televiso (8) .

Podemos assim argumentar que o presente sistema de media oferece sociedade duas abordagens muito distintas em relao interactividade dentro das duas redes mais difundidas de entrega e transmisso de comunicao audiovisual: a televiso e a Internet.Devido sua estrutura organizacional, a interactividade oferecida hoje pela televiso sobretudo baseada na simulao de trocasinterpessoais, seja pelas caractersticas do programa ou pelo papel conferido ao apresentador ou jornalista. Por outro lado, devido scaractersticas j mencionadas, a interactividade na Internet est mais prxima, embora no preencha completamente, do conceito deinteractividade proposto pela abordagem do ambiente do media (Kim e Shawney 2002).Durante a ltima dcada testemunhmos a chegada da Internet ao sistema de media, alterando-o mas no substituindo qualquer umdos media anteriores. Os dados recolhidos em diferentes pases volta do mundo demonstram que, mesmo com diferentes graus porpas, a televiso tem vindo a perder tempo de consumo e, simultaneamente, navegar na Internet tem vindo a ganhar prepondernciano dia a dia das pessoas.

Dado que uma percentagem significativa da populao, em pases mais desenvolvidos, tem tanto acesso Internet como televiso,podemos discutir que os dados disponveis sobre uso, que mostram uma diminuio do visionamento da televiso entre os utilizadoresde Internet, podem levar-nos a concluir que as pessoas usam a Internet com propsitos mais interactivos e escolhem a televisoquando a interactividade menos procurada.

Figura 2. Mdia de Horas por Semana passadas a ver Televiso: Utilizadores vs. No utilizadores WIP Project 2006 (Nmerode Horas).

Fonte: The World Internet Project (2006)



Os seguintes quadros do-nos uma outra compreenso quanto relao entre a Internet e a televiso. Eles exemplificam ocomportamento na realizao de vrias tarefas em simultneo, ou multitasking, de jovens entre os 8 e os 18 anos em Portugal, masresultados similares podem ser encontrados noutras realidades como: os Estados Unidos ou o Chile. De facto 64% dos chilenosouvem msica, 25% falam ao telefone e 14,6% vm televiso enquanto navegam na Internet, tambm se concluiu que quase 43% deutilizadores chilenos mandam SMS enquanto usam o computador (Godoy 2006). Em Portugal a actividade de multi-tarefas maisrealizada enquanto se v televiso o envio de SMS ou falar ao telefone, enquanto que ao usar a Internet a mais comum ouvirmsica e enviar mensagens instantneas pela Internet. Nos Estados Unidos foram detectadas tendncias similares por Foehr (2006).

Quadro 3. Enquanto usa a Internet com que frequncia? (Idades 8-18)

Fonte: Cardoso, Gustavo, Rita Espanha e Carmo Gomes (2006) Inqurito A Sociedade em rede em Portugal 2006, CIES.

Quadro 4. Enquanto v televiso costuma? (Idades 8-18)

Fonte: Cardoso, Gustavo, Rita Espanha e Carmo Gomes (2006) Inqurito a Sociedade em Rede em Portugal 2006, CIES.

Como os dados nos quadros acima o demonstram, efectuar vrias tarefas ao mesmo e combin-las com televiso e Internet perdeterreno tanto para a combinao mltipla de uso entre a televiso ou Internet e telefone ou envio de mensagens por SMS (9) .Demonstra-se assim que, no s estas duas tecnologias (Televiso e Internet) competem entre elas pela ateno do utilizador, quasede uma forma exclusiva, mas tambm que as mltiplas combinaes disponveis para a ligao em rede de diferentes dispositivospodem igualmente estar relacionadas com o grau de interactividade que podem fornecer para as necessidades do utilizador. Aquelesenquanto vem televiso parecem privilegiar a comunicao interpessoal atravs do uso de outro dispositivo nomeadamente otelemvel, e enquanto usam o computador preferem aplicaes para ouvir msica e fornecer comunicao interpessoal atravs do usode mensagens instantneas.

No entanto a concluso principal a tirar desta anlise e dos dados empricos apresentados aqui, o papel decisivo da articulao dediferentes mass media no nosso quotidiano. Este o terreno necessrio para a ligao em rede dos media em massa e interpessoais,que, quando usados, podem tambm tornar-se mass media atravs das suas caractersticas de flexibilidade e mobilidade. Emconsequncia, qualquer anlise relacionada com a fora dos media individuais tem que ter em conta no apenas a televiso, a rdio,os jornais e a World Wide Web, mas tambm o telefone, o telemvel e as mensagens pela Internet (e-mail, grupos de noticias, chats,mensagens instantneas, etc.).

O novo modelo de comunicao em rede, descrito nas ltimas pginas, refere-se a um sistema de media onde a interactividade formao seu modelo organizacional. Um sistema de media que oferece dois ns fundamentais, um centrado na baixa interactividade, onde ateleviso reina, e outro onde o centro a Internet, proporcionando alta interactividade. Estes diferentes ns de media esto ligadossobretudo atravs dos media interpessoais, que podem tambm ser utilizados como mass media, nomeadamente os telemveis, e-mail, iPods e ofertas similares como o WiFi, etc.

Dado que a comunicao uma capacidade humana, ns como humanos, envolvidos em processos sociais, temos tendncia a usar acomunicao para atingir os nossos objectivos, sejam eles individuais ou colectivos. Numa sociedade em rede, o sistema de media constitudo pelos nossos usos de mediao de media, e evoluiu para um sistema baseado na articulao em rede de diferentesmedia. Quando instrumentos de media, por vontade das empresas de media e das companhias de telecomunicaes ou mesmo dehackers permitem a ligao em rede da comunicao, ou dos seus usos, as pessoas experimentam-nos e, se a experincia satisfazalgumas das suas necessidades em termos de autonomia, de objectivos ou de apropriao, aqueles so socialmente adoptados. Essaadopo social quando difundida em largas franjas da sociedade tende a mudar os prprios media, alterando as suas caractersticasorganizacionais, tecnolgicas e de rede. Esta a forma como a ligao em rede dos media de massa e interpessoais, econsequentemente a mediao em rede, moldada socialmente pela interactividade nas nossas sociedades. (8) As experincias na chamada televiso interactiva durante as ltimas duas dcadas podem, na maior parte dos casos, ser reduzidas criao deplataformas que incorporam vrias tecnologias que permitem aos utilizadores, atravs do pagamento de uma taxa fixa ou pagamento por consumo,escolher entre diferentes ngulos de cmara num jogo de futebol, votar em talk shows ou programas similares ou escolher o prprio filme (Richieri2002).

(9) Outros exemplos similares e igualmente complexos de apropriao em rede dos media podem ser encontrados noutros estudos e pases, porexemplo no Japo (Mikami 2004), Canad (Caron 2007), Itlia (Aroldi e Colombo 2003) e Catalunha (Castells 2003)

DA COMUNICAO DE MASSA PARA A COMUNICAO EM REDE



Todas as sociedades so caracterizadas por modelos de comunicao e no apenas por modelos informacionais (Wolton, 2000,Colombo, 1993, Castells 2006, Himanen 2006). As nossas sociedades informacionais tm testemunhado o aparecimento de um novomodelo comunicacional. Um quarto modelo, que pode ser adicionado aos trs precedentes, que podem ser cronologicamenteordenado em termos dos seus ciclos de afirmao social (Ortoleva 2004).

O primeiro definido como comunicao interpessoal, caracterizado pela troca bidireccional entre duas ou mais pessoas dentro de umgrupo. O segundo modelo, igualmente enraizado nas nossas sociedades, a comunicao de um-para-muitos, em que cada indivduoenvia uma s mensagem a um grupo limitado de pessoas. E um terceiro modelo, com o qual temos menos experincia em termos detempo histrico, o da comunicao de massa, no qual, graas ao uso de tecnologias especificas de mediao, uma s mensagem dirigida a uma massa de pessoas, isto , enviada a uma audincia cuja dimenso desconhecida, e como tal, no est previamentedelimitada.

Temos discutido neste trabalho que fomos alm de um modelo de comunicao baseado na comunicao de massa e passmos paraum quarto modelo, um modelo de comunicao baseado na comunicao em rede.

O modelo comunicacional da nossa sociedade moldado pela capacidade dos processos de globalizao comunicacional mundiais,juntamente com articulao em rede massificada e a difuso de media pessoais e em consequncia o aparecimento da mediao emrede. A organizao de usos e ligao em rede dos media dentro deste modelo comunicacional parece est directamente ligado aosdiferentes graus de uso de interactividade que os nossos media actuais permitem.

Se construmos modelos comunicacionais nas nossas sociedades, tambm verdade que os principais paradigmas comunicacionaisformatam o que um determinado sistema de media ser. Os nossos paradigmas comunicacionais parecem ser construdos em tornode uma retrica essencialmente construda na importncia da imagem em movimento, combinada com a disponibilidade das novasdinmicas de acessibilidade informao, com os novos papeis de inovao entregues aos utilizadores e com profundas alteraesnos modelos de noticias e de entretenimento.

Os nossos contedos, sejam eles informao noticiosa ou entretenimento, parecem ter mudado devido ao aumento da presena decontedos produzidos pelos utilizadores de media e j no apenas pelas empresas de media, dando origem coexistncia dadiferentes modelos de notcias para diferentes audincias. Mas, no foi s a informao noticiosa que mudou, tambm oentretenimento o fez. A inovao nos modelos de entretenimento est assim ligada disponibilidade dos contedos gerados peloutilizador, mas tambm s mudanas trazidas pelas empresas de media, nomeadamente na procura de novas formas de contedoscomo os formatos e a experimentao activa do desfocar de fronteiras entre os gneros tradicionais de programas e novasabordagens a valores sociais como a privacidade, a reserva, e alteraes no domnio do tempo, do espao e da tica, todos elesreflectidos nas formas como as histrias so contadas e os guies escritos.

O modelo comunicacional gerado nas sociedades informacionais, onde o modelo de organizao social prevalecente o daarticulao em rede, a comunicao em rede. Um modelo comunicacional que no substitui os modelos anteriores, antes articula-os,produzindo novos formatos de comunicao e tambm permitindo novas formas de facilitao de empowerment, e consequentemente,de autonomia comunicativa.

Nas Sociedades Informacionais, onde a rede a caracterstica organizacional central, um novo modelo comunicacional tem vindo atomar forma. Um modelo comunicacional caracterizado pela fuso da comunicao interpessoal e em massa, ligando audincias,emissores e editores sob uma matriz de media em rede, que vai do jornal aos jogos de vdeo, oferecendo aos seus utilizadores novasmediaes e novos papeis.

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