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Preço € 1,50. Número atrasado € 3,00 L ’O SSERVATORE ROMANO EDIÇÃO SEMANAL EM PORTUGUÊS Unicuique suum Non praevalebunt Ano LI, número 52 (2.697) terça-feira 29 de dezembro de 2020 Cidade do Vaticano H á as “obscuridades” e “incertezas” do atual «momento histórico, marcado pela crise ecológica e por graves desequilíbrios económicos e so- ciais, agravados pela pande- mia»; mas há também «várias luzes de esperança, como a des- coberta das vacinas», na men- sagem de Natal do Papa à cida- de e ao mundo. Um momento um pouco menos tradicional do que de costume, dado que ao meio-dia de 25 de dezembro o Pontífice não assomou à varan- da central da basílica do Vatica- no — dado que não havia fiéis na praça de São Pedro por cau- sa das normas anticoronavírus — mas falou da sala da Bênção, alcançando todos os recantos da terra através dos meios de comunicação social. E ao fazê- lo, reiterou a necessidade de fraternidade que os homens têm neste tempo, tornado ainda mais difícil devido à Covid-19: «não uma fraternidade feita de palavras, ideais abstratos», mas concreta, «capaz de encontrar o próximo». Com efeito, para que a espe- rança do Natal ilumine o mun- do, disse, não se pode deixar espaço a «nacionalismos fecha- dos», nem «colocar as leis do mercado e das patentes acima» da saúde. Assim, apelou «aos líderes dos Estados, às empre- sas, aos organismos internacio- nais», chamados a promover a cooperação, para poder ofere- cer «vacinas a todos», especial- mente aos «mais vulneráveis e necessitados». Desviando o seu olhar para outras dificuldades sentidas pe- los homens, o Papa falou dos doentes, dos desempregados, das mulheres que padecem vio- lências domésticas, dos migran- tes e, em particular, das crian- ças que sofrem; depois, enume- rou os países e regiões vítimas de conflitos ou calamidades na- turais: Médio Oriente, Medi- terrâneo oriental, Nagorno-Ka- rabakh, Ucrânia, África, Améri- ca e Ásia. Na vigília, celebrando a mis- sa da Noite, Francisco repetiu a “lição” sempre atual do «pobre presépio» de Belém: «O Filho de Deus nasceu descartado pa- ra nos dizer que cada descarta- do é filho de Deus». PÁGINAS 4 E 5 Na mensagem de Natal à cidade e ao mundo, novo apelo do Papa para que as vacinas sejam garantidas a todos Há necessidade de fraternidade e esperança neste tempo de escuridão A FOTO GRAFIA «Esta é a pequenina Allam, nasceu há 15 dias. Vive no velho matadouro com os seus pais. Parece-me que ainda não há corrente elétrica. Um início não muito diferente do nascimento de Jesus, em Belém. No lugar dos bois e do jumento, há muitos ratos e baratas. Deus ajude todos nós!». Foi a simples mensagem que o irmão Luke Gre- gory enviou de Rodes a um amigo no dia de Natal. O franciscano inglês, que é tam- bém pároco de Kos, há anos presta assistência aos refugiados que chegam à ilha, so- bretudo provenientes da Síria. Hoje aquela criança no seu colo representa uma espe- rança para o seu povo, mas os seus gemidos são também um grito de socorro. As condições de vida de 450 pessoas, entre as quais 25 crianças e vários doentes de Co- vid, são dramáticas nas tendas e no velho matadouro em ruínas. Um grito de ajuda que o irmão Luke relança em nome desta humanidade ferida e esquecida. Apelo do Pontífice à comunidade internacional Ajudemos o Líbano a sair dos conflitos e da crise Foi o apelo que Francisco dirigiu à comu- nidade internacional numa carta que en- viou ao chefe da Igreja católica maronita e ao povo libanês a 24 de dezembro. PÁGINA 3 Nota da congregação para o culto divino e a disciplina dos sacramentos sobre o Domingo da Palavra de Deus PÁGINA 6 Nota da Congregação para a doutrina da fé sobre a moralidade do uso de algumas vacinas anticovid-19 PÁGINA 7 Anúncio no Angelus de 27 de dezembro Um ano especial dedicado às famílias O ano especial dedicado às famílias, anunciado pelo Papa Francisco no Angelus de 27 de dezembro terá iní- cio a 19 de março, quinto aniversário da promulgação da exortação apostólica pós-sinodal «Amoris laetitia». PÁGINA 8

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Preço € 1,50. Número atrasado € 3,00

L’OSSERVATORE ROMANOEDIÇÃO SEMANAL EM PORTUGUÊS

Unicuique suum Non praevalebunt

Ano LI, número 52 (2.697) terça-feira 29 de dezembro de 2020Cidade do Vaticano

Há as “obscuridades”e “incertezas” doatual «momentohistórico, marcado

pela crise ecológica e por gravesdesequilíbrios económicos e so-ciais, agravados pela pande-mia»; mas há também «váriasluzes de esperança, como a des-coberta das vacinas», na men-sagem de Natal do Papa à cida-de e ao mundo. Um momentoum pouco menos tradicional doque de costume, dado que aomeio-dia de 25 de dezembro oPontífice não assomou à varan-da central da basílica do Vatica-no — dado que não havia fiéisna praça de São Pedro por cau-sa das normas anticoronavírus— mas falou da sala da Bênção,alcançando todos os recantosda terra através dos meios decomunicação social. E ao fazê-lo, reiterou a necessidade defraternidade que os homenstêm neste tempo, tornado aindamais difícil devido à Covid-19:«não uma fraternidade feita depalavras, ideais abstratos», masconcreta, «capaz de encontrar opróximo».

Com efeito, para que a espe-rança do Natal ilumine o mun-do, disse, não se pode deixarespaço a «nacionalismos fecha-dos», nem «colocar as leis domercado e das patentes acima»da saúde. Assim, apelou «aoslíderes dos Estados, às empre-sas, aos organismos internacio-nais», chamados a promover acooperação, para poder ofere-cer «vacinas a todos», especial-mente aos «mais vulneráveis enecessitados».

Desviando o seu olhar paraoutras dificuldades sentidas pe-los homens, o Papa falou dosdoentes, dos desempregados,das mulheres que padecem vio-lências domésticas, dos migran-tes e, em particular, das crian-ças que sofrem; depois, enume-rou os países e regiões vítimasde conflitos ou calamidades na-turais: Médio Oriente, Medi-terrâneo oriental, Nagorno-Ka-rabakh, Ucrânia, África, Améri-ca e Ásia.

Na vigília, celebrando a mis-sa da Noite, Francisco repetiu a“lição” sempre atual do «pobrepresépio» de Belém: «O Filhode Deus nasceu descartado pa-ra nos dizer que cada descarta-do é filho de Deus».

PÁGINAS 4 E 5

Na mensagem de Natal à cidade e ao mundo, novo apelo do Papa para que as vacinas sejam garantidas a todos

Há necessidade de fraternidade e esperançaneste tempo de escuridão

A FOTO GRAFIA

«Esta é a pequenina Allam, nasceu há 15 dias. Vive no velho matadouro com os seuspais. Parece-me que ainda não há corrente elétrica. Um início não muito difere n t edo nascimento de Jesus, em Belém. No lugar dos bois e do jumento, há muitos ratose baratas. Deus ajude todos nós!». Foi a simples mensagem que o irmão Luke Gre-gory enviou de Rodes a um amigo no dia de Natal. O franciscano inglês, que é tam-bém pároco de Kos, há anos presta assistência aos refugiados que chegam à ilha, so-bretudo provenientes da Síria. Hoje aquela criança no seu colo representa uma espe-rança para o seu povo, mas os seus gemidos são também um grito de socorro. Ascondições de vida de 450 pessoas, entre as quais 25 crianças e vários doentes de Co-vid, são dramáticas nas tendas e no velho matadouro em ruínas. Um grito de ajudaque o irmão Luke relança em nome desta humanidade ferida e esquecida.

Apelo do Pontífice à comunidade internacional

Ajudemos o Líbanoa sair dos conflitos e da crise

Foi o apelo que Francisco dirigiu à comu-nidade internacional numa carta que en-viou ao chefe da Igreja católica maronitae ao povo libanês a 24 de dezembro.

PÁGINA 3

Nota da congregação para o culto divinoe a disciplina dos sacramentossobre o Domingo da Palavra de Deus

PÁGINA 6

Nota da Congregação para a doutrinada fé sobre a moralidade do usode algumas vacinas anticovid-19

PÁGINA 7

Anúncio no Angelus de 27 de dezembro

Um ano especial dedicado às famílias

O ano especial dedicado às famílias, anunciado peloPapa Francisco no Angelus de 27 de dezembro terá iní-cio a 19 de março, quinto aniversário da promulgaçãoda exortação apostólica pós-sinodal «Amoris laetitia».

PÁGINA 8

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L’OSSERVATORE ROMANOpágina 2 terça-feira 29 de dezembro de 2020, número 52

L’OSSERVATORE ROMANOEDIÇÃO SEMANAL EM PORTUGUÊS

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Discurso aos funcionários do Vaticano

Ninguém deve ser despedidopor causa da pandemia

Convite aos líderes políticos do Sudão do Sul

Continuar o compromisso de paz

«Ninguém será despedido, ninguémdeve sofrer o mau efeito económicodesta pandemia. Mas todos juntosdevemos trabalhar mais para nosajudarmos a resolver o problema»,frisou o Papa Francisco no discursodirigido aos funcionários do Vaticanoe aos seus familiares, recebidos no fi-nal da manhã de 21 de dezembro naSala Paulo VI, para a troca dos bonsvotos de Natal.

Estimados irmãos e irmãs!É para mim uma alegria en-contrar-me convosco, funcio-nários do Vaticano, e com osvossos familiares, quando nosaproximamos das festas natalí-cias. Agradeço ao vosso colegamédico que falou em nome detodos vós: as suas palavras fez-nos muito bem e dão-nos espe-rança. Estou grato a cada umde vós pelo trabalho que reali-zais com paixão ao serviço daCúria Romana e da Cidade doVaticano. A pandemia causounão só uma situação sanitária

crítica, mas também muitas di-ficuldades económicas paramuitas famílias e instituições.A Santa Sé também foi atingi-da e está a fazer todos os esfor-ços para lidar da melhor ma-neira possível com esta situa-ção precária. É uma questão desatisfazer as legítimas exigên-cias de vós, empregados, e asda Santa Sé: devemos ajudar-nos reciprocamente e ir emfrente no nosso trabalho emconjunto, mas sempre. Os nos-sos colaboradores, vós que tra-balhais na Santa Sé, sois omais importante: ninguém de-ve ser deixado de fora, nin-guém deve deixar o trabalho;os superiores do Governatora-to e também da Secretaria deEstado, todos, procuram for-mas de não diminuir os vossosrendimentos e de não diminuirnada, nada neste momento tãodifícil para o fruto do vossotrabalho. Procuram muitasmaneiras, mas os princípios

são os mesmos: não deixar otrabalho; ninguém deve serdespedido, ninguém deve so-frer o efeito económico terríveldesta pandemia. Mas todosjuntos devemos trabalhar maispara nos ajudarmos uns aosoutros a resolver este proble-ma, o que não é fácil, pois sa-beis: aqui, tanto no Governa-torato como na Secretaria deEstado, não há Mandrakes,não há varinha mágica e deve-mos procurar formas de resol-ver isto, e com boa vontade,todos juntos, resolvê-lo-emos.Ajudai-me nisto e eu ajudo-vos: todos juntos ajudamosuns aos outros a ir em frentecomo uma só família. Obriga-do.

O Natal é uma festa de ale-gria «porque Jesus nasceu pa-ra nós» (cf. Is 9, 5) e todos so-mos chamados a ir ao seu en-contro. Os pastores dão-nos oexemplo. Também nós deve-mos ir ao encontro de Jesus:

devemos despertar do torpor,do tédio, da apatia, do desinte-resse e do medo, especialmen-te neste tempo de emergênciasanitária, em que é difícil re-descobrir o entusiasmo da vidae da fé. É uma época cansativa.Imitando os pastores, somoschamados a assumir três atitu-des, três verbos: redescobrir, con-templar e a n u n c i a r. Cada um denós deve ver na própria vidacomo pode re d e s c o b r i r, comopode contemplar e como podea n u n c i a r.

É importante re d e s c o b r i r onascimento do Filho de Deuscomo o maior acontecimentoda história. É o acontecimentoprevisto pelos profetas séculosantes que acontecesse. É oacontecimento de que aindahoje se fala: de que figura his-tórica se fala quando se fala deJesus? Passaram-se vinte sécu-los e Jesus está mais vivo doque nunca — e ainda mais per-seguido, muitas vezes; aindamais manchado pela falta detestemunho de tantos cristãos.Passaram-se vinte séculos. Eaqueles que se afastam d’Ele,com o seu comportamento,dão mais testemunho de Jesus:sem Ele o homem cai no mal:no pecado, no vício, no egoís-mo, na violência, no ódio. OVerbo fez-se carne e habitouentre nós: este é o aconteci-mento que devemos redesco-b r i r.

A segunda atitude é a contem-plação. A primeira era redesco-brir, a segunda c o n t e m p l a r. Ospastores dizem: «“Vamos en-tão até Belém e vejamos o queaconteceu e o que o Senhornos deu a conhecer”» (Lc 2,15): ou seja, meditemos, con-templemos, rezemos. Eis que oexemplo mais belo nos foi da-do pela mãe de Jesus, por Ma-ria: ela ponderava no coração,meditava... E o que descobri-mos ao meditar? São Paulodiz-nos: «Mas um dia apare-ceu a bondade de Deus, nossoSalvador, e o seu amor paracom os homens. E, não porcausa de obras de justiça quetivéssemos praticado, mas uni-camente em virtude de sua mi-sericórdia, ele nos salvou me-diante o batismo da regenera-ção e renovação, pelo EspíritoSanto» (Tt 3, 4-5). Descobri-mos que Deus mani-festa a sua bondade noMenino Jesus. Mani-festa a sua misericórdiapor cada um de nós,sabemos que precisa-mos de misericórdia navida. Cada um sabe, epode dar nome e apeli-do às coisas que estãono seu coração e queprecisam da misericór-dia de Deus. Quemnão se sente movidopela ternura diante deuma criancinha? NoMenino Jesus, Deusmostra-se amável,cheio de bondade emansidão. Verdadeira-

mente um Deus que podemosamar com todo o coração.Deus manifesta a sua bondadepara nos salvar. E o que signifi-ca ser salvo? Significa entrarna própria vida de Deus, tor-nando-se filhos adotivos deDeus através do batismo. Esteé o grande significado do Na-tal: Deus torna-se homem paraque nos possamos ser filhos deD eus.

A Segunda Pessoa da Trin-dade fez-se homem, para setornar o irmão mais velho, oprimogénito de uma multidãode irmãos. E assim Deus salva-nos através do batismo e faz-nos entrar a todos como ir-mãos: contemplar este misté-rio, contemplar o Menino. Epor isso, a catequese que o pre-sépio nos dá é tão bonita, por-que nos mostra o Menino ter-no que nos anuncia a miseri-córdia de Deus. Contemplai ospresépios. E quando há diasabençoei as imagens do Meni-no Jesus: foi uma “contempla-ção”. O Menino do presépio éuma figura, mas é uma figuraque nos faz pensar nesta gran-de misericórdia de Deus que setornou um Menino.

E face a esta realidade, a ter-ceira atitude é: a n u n c i a r. Esta éa atitude que nos ajuda a ir emfrente. As três atitudes que nosajudam neste momento, e as-

sim ir em frente. Como deve-mos fazer? Olhemos nova-mente para os pastores: «Vol-taram os pastores, glorificandoe louvando a Deus por tudo oque tinham ouvido e visto, eque estava de acordo com oque lhes fora dito» (Lc 2, 20).Voltaram à sua vida diária.Também nós devemos voltar ànossa vida quotidiana: o Natalestá a passar. Mas devemos re-gressar à vida familiar, ao tra-balho, transformados, deve-mos regressar glorificando elouvando a Deus por tudo oque temos ouvido e visto. De-vemos anunciar a boa nova aomundo: Jesus é o nosso salva-dor. E isto é um dever. Por quetenho esperança? Porque o Se-nhor me salvou. Recordar oque contemplamos e ir emfrente para o anunciar. Anun-ciá-lo com a palavra, com otestemunho da nossa vida.Contudo, as dificuldades e ossofrimentos não podem obscu-recer a luz do Natal, que susci-ta uma alegria íntima que nin-guém nos pode tirar.

Portanto, vamos em frente,com estas três atitudes: re d e s c o -brir, contemplar e a n u n c i a r.

Estimados irmãos e irmãs,renovo a minha gratidão paraconvosco, e o meu apreço pelovosso trabalho. Muitos de vóssão um exemplo para outros:

trabalhais para a famí-lia, com espírito de ser-viço à Igreja e com aalegria constante de sa-ber que Deus está sem-pre entre nós, Ele éDeus-connosco. E nãovos esqueçais: a alegriaé contagiosa e faz bema toda a comunidadede trabalho. Tal como,por exemplo, a tristezaque vem da tagarelice éhorrível e arrasta parabaixo. A alegria é con-tagiosa e faz crescer.Sede alegres, e sedetestemunhas de ale-gria! E de coração, Fe-liz Natal a todos.

Publicamos o texto da mensagem de Natal enviadaaos chefes políticos do Sudão do Sul pelo PapaFrancisco, pelo arcebispo de Canterbury, Justin Wel-by, e pelo moderador da Igreja da Escócia, MartinFa i r.

A Vossas ExcelênciasOs Líderes Políticos do Sudão do Sul

Natal 2020Excelências!

Nesta época natalícia recordamos que nos-so Senhor Jesus Cristo veio ao mundo en-tre os mais pequeninos, num estábulo poei-rento com animais. Sucessivamente, elechamou aqueles que desejavam ser grandesno seu reino para se tornarem servos de to-dos (cf. Mc 10, 43).

Continuemos a estar atentos em oraçãoaos compromissos assumidos no Vaticanoem abril de 2019 — o vosso, conduzir o paísà implementação pacífica do Acordo dePaz e o nosso, visitar o Sudão do Sul no

devido tempo quando a situação voltar ànormalidade. Sentimo-nos felizes por veros pequenos progressos que fizestes, massabeis que não é suficiente para que o vossopovo sinta o pleno efeito da paz. Quandoformos em visita, queremos dar testemunhode uma nação mudada, governada por líde-res que, nas palavras do Santo Padre noano passado, se dão «as mãos. Assim, desimples cidadãos tornar-vos-eis Pais [eMães] da Nação!».

Rezemos, neste Natal, para que possaisconhecer uma maior confiança entre vós emais generosidade de serviço entre o vossopovo. Rezemos a fim de que conheçais nosvossos corações e no coração da vossa gran-de nação a paz que excede toda a inteligên-cia (cf. Fl 4,7).

FRANCESCO JUSTIN WELBY

MARTIN FAIR

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L’OSSERVATORE ROMANOnúmero 52, terça-feira 29 de dezembro de 2020 página 3

Catequese - Não reduzir o Natal a uma festa sentimental ou consumista

A ternura do presépiopara estarmos mais próximos

«Se a pandemia nos obrigou a estarmais distantes, Jesus, no presépio,mostra-nos o caminho da ternurapara estarmos próximos», frisou oPapa Francisco na audiência geralde 23 de dezembro, realizada na Bi-blioteca particular do Palácio apos-tólico do Vaticano, ainda sem a pre-sença de fiéis para contrastar a di-fusão do contágio de Covid-19.

Estimados irmãos e irmãs,bom dia!Nesta catequese, no períodoque antecede o Natal, gosta-ria de oferecer alguns pontosde reflexão em preparação pa-ra a celebração do Natal. NaLiturgia da Noite ressoará oanúncio do anjo aos pastores:«Não temais, eis que vosanuncio uma Boa Nova queserá alegria para todo o povo:hoje nasceu-vos na Cidade deDavid um Salvador, que éCristo Senhor. Isto servir-vos-á de sinal, achareis um recém-nascido envolto em faixas eposto numa manjedoura» (Lc2, 10-12).

Imitando os pastores, tam-bém nós caminhamos espiri-tualmente para Belém, ondeMaria deu à luz o Meninonum estábulo, «pois — dizSão Lucas — não havia paraeles lugar na hospedaria» (2,7). O Natal tornou-se umafesta universal e até quem nãoacredita sente o encanto desteevento. Contudo, os cristãossabem que o Natal é umacontecimento decisivo, umfogo eterno que Deus acen-deu no mundo, e não podeser confundido com coisasefémeras. É importante quenão seja reduzido a uma cele-bração meramente sentimen-tal ou consumista. No domin-go passado chamei a atençãosobre este problema, eviden-ciando que o consumismo nossequestrou o Natal. Não: oNatal não se deve reduzir afesta unicamente sentimentalou consumista, rica de pren-das e bons votos, mas pobrede fé cristã, e pobre tambémde humanidade. Portanto, énecessário refrear uma certamentalidade mundana, inca-paz de compreender o núcleoincandescente da nossa fé,que é o seguinte: «E o Verbofez-se carne e habitou entrenós, e vimos a sua glória, aglória que o Filho unigénitorecebe do seu Pai, cheio degraça e de verdade» (Jo 1, 14).Este é o núcleo do Natal,aliás: é a verdade do Natal,não há outra.

O Natal convida-nos a re-fletir, por um lado, sobre adramaticidade da história, emque homens e mulheres, feri-dos pelo pecado, procuramincessantemente a verdade,vão em busca de misericórdiae de redenção; e, por outro,sobre a bondade de Deus,que veio ao nosso encontropara nos comunicar a Verda-de que salva e para nos tornarparticipantes da sua amizadee da sua vida. Recebemos estedom de graça, é p u ra graça,sem o nosso mérito. Há umSanto Padre que diz: “Masolhai deste lado, do outro, de

lá: procurai o mérito e só en-contrareis graça”. Tudo é gra-ça, um dom de graça. Rece-bemos este dom de graçaatravés da simplicidade e dahumanidade do Natal, e elepode remover dos nossos co-rações e das nossas mentes opessimismo que hoje se difun-diu ainda mais por causa dapandemia. Podemos superaresta sensação de desconcertoinquietador, sem nos deixar-mos dominar pelas derrotas efracassos, na consciência re-descoberta de que aquele Me-nino humilde e pobre, escon-dido e indefeso, é o próprioDeus, que se fez homem paranós. O Concílio Vaticano II,numa célebre passagem daConstituição sobre a Igrejano mundo contemporâneo,diz-nos que este acontecimen-to se refere a cada um de nós:«Pela sua encarnação, Ele, oFilho de Deus, uniu-se decerto modo a cada homem.Trabalhou com mãos huma-nas, pensou com uma inteli-

gência humana, agiu comuma vontade humana, amoucom um coração humano.Nascido da Virgem Maria,tornou-se verdadeiramenteum de nós, semelhante a nósem tudo, exceto no pecado»(Constituição Pastoral Gau-dium et spes, 22). Mas Jesusnasceu há dois mil anos, e dizrespeito a mim? — Sim, dizrespeito a ti e a mim, a cadaum de nós. Jesus é um denós: Deus, em Jesus, é um denós.

Esta realidade dá-nos mui-ta alegria e coragem. Deusnão nos desprezou, não olhoupara nós de longe, não passouao nosso lado, não sentiu re-pulsa da nossa miséria, não sevestiu com um corpo aparen-te, mas assumiu plenamente anossa natureza e condição hu-mana. Nada excluiu, exceto opecado: a única coisa que Elenão tem. Toda a humanidadeestá n’Ele. Ele assumiu tudoo que somos, tal como somos.Isto é essencial para a com-

preensão da fé cristã. Refle-tindo sobre o seu caminho deconversão, Santo Agostinhoescreve nas suas Confissões:«Ainda não tinha a humilda-de suficiente para possuir omeu Deus, o humilde Jesus,ainda não conhecia os ensina-mentos da sua fraqueza»(Confissões VII, 8). E qual é afraqueza de Jesus? A “fraque-za” de Jesus é um “ensina-mento”! Porque nos revela oamor de Deus. O Natal é afesta do Amor encarnado, doamor nascido por nós em Je-sus Cristo. Jesus Cristo é aluz dos homens que resplan-dece nas trevas, que dá senti-do à existência humana e atoda a história.

Queridos irmãos e irmãs,que estas breves reflexões nosajudem a celebrar o Natalcom maior consciência. Mashá outra forma de preparaçãoque quero lembrar, tanto avós como a mim, e que estáao alcance de todos: meditarum pouco em silêncio diantedo presépio. O presépio éuma catequese daquela reali-dade, do que foi feito naqueleano, naquele dia, que ouvi-mos no Evangelho. Por estemotivo, no ano passado escre-vi uma Carta, que nos farábem reler. Intitula-se “Ad m i ra -bile signum”, “Sinal admirável”.Na escola de São Franciscode Assis, podemos tornar-nosum pouco crianças, permane-cer em contemplação da cenada Natividade, deixando querenasça em nós a admiraçãoda forma “maravilhosa” comoDeus quis vir ao mundo. Pe-çamos a graça da admiração:face a este mistério, a esta rea-lidade tão terna, tão bela, tãopróxima dos nossos corações,

que o Senhor nos conceda agraça da admiração, para queO encontremos, para que nosaproximemos d’Ele, para quenos aproximemos de todosnós. Isto irá renascer em nósa ternura. Há dias, falandocom alguns cientistas, comen-tava-se a inteligência artificiale os robôs... há robôs progra-mados para tudo e para to-dos, e isto vai progredindo. Eeu disse-lhes: “Mas o quenunca serão capazes de fazeros robôs?” Eles pensaram, de-ram sugestões, mas no finalconcordaram num ponto: aternura. Isto os robôs não se-rão capazes de fazer. E é istoque Deus nos traz hoje: umaforma maravilhosa pela qualDeus quis vir ao mundo, oque reaviva a ternura em nós,a ternura humana que estápróxima daquela de Deus. Ehoje temos tanta necessidadede ternura, tanta necessidade

de carícias humanas, face atanta miséria! Se a pandemianos obrigou a estar mais dis-tantes, Jesus, no presépio,mostra-nos o caminho da ter-nura para estarmos próximos,para sermos humanos. Siga-mos este caminho. Feliz Na-tal!

No final da audiência geral, sau-dando em várias línguas os fiéis queo seguiam através dos meios de co-municação, disse aos de expressãoportuguesa.

Queridos ouvintes de línguaportuguesa, desejo a todosum santo Natal. Se a pande-mia nos obrigou a estar maisdistanciados, Jesus, no presé-pio, mostra-nos o caminho daternura para continuarmos vi-zinhos, para sermos humanos.Assim vos abençoe o DeusMenino para terdes um AnoNovo sereno e feliz!

Apelo do Pontífice à comunidade internacional

Ajudemos o Líbano a sair dos conflitos e da crise«Ajudemos o Líbano a manter-se fora dosconflitos e das tensões regionais. Ajudemo-lo asair da grave crise e a restabelecer-se»: eis ovigoroso apelo dirigido à comunidade inter-nacional, contido numa carta que Franciscoenviou ao chefe da Igreja católica maronita eao povo libanês no dia 24 de dezembro, porocasião da celebração do Natal do Senhor.

A Sua BeatitudeCardeal Béchara Boutros Raï,

Patriarca de Antioquiados Maronitas

Presidente da Assembleiados Patriarcas e Bispos

Católicos no LíbanoA Vossa Beatitude e, através de si, atodos os libaneses, sem distinção decomunidade nem de pertença religio-sa, gostaria de dirigir algumas pala-vras de conforto e encorajamento porocasião da celebração do Natal deNosso Senhor Jesus Cristo, Príncipeda Paz.

Amados filhos e filhas do Líbano!Grande é a minha dor por ver o

sofrimento e a angústia que sufocama intrepidez e vivacidade inatas daTerra dos Cedros. Mais ainda, é do-loroso ver raptadas todas as mais

queridas esperanças de viver em paze de continuar a ser para a história epara o mundo uma mensagem de li-berdade e um testemunho de boaconvivência; e eu, que de coração ver-dadeiro tomo parte em toda a vossafelicidade, assim também em toda avossa dor, sinto no fundo da minhaalma a gravidade das vossas perdas,especialmente quando penso nosmuitos jovens que estão privados dequalquer esperança de um futuro me-l h o r.

Mas neste dia de Natal «o povoque andava nas trevas viu uma gran-de luz» (Is 9, 1), a luz que acalma osmedos e incute esperança em todos,na certeza de que a Providência nun-ca abandonará o Líbano e saberá co-mo transformar até este luto emb em.

O Líbano é mencionado muitasvezes nas Sagradas Escrituras, mas aimagem que o Salmista nos dá desta-ca-se acima de todas as outras: «Co-mo a palmeira, florescerão os justos,que se elevarão como o cedro do Lí-bano» (Sl 91, 13).

A majestade do cedro na Bíblia éum símbolo de firmeza, estabilidade

e proteção. O cedro é símbolo do jus-to que, enraizado no Senhor, trans-mite beleza e bem-estar e até na ve-lhice se eleva e produz frutos abun-dantes. Nestes dias, o Emanuel, oDeus connosco, torna-se o nosso pró-ximo, caminha ao nosso lado. Tendeconfiança na sua presença, na sua fi-delidade. Tal como o cedro, sorveidas profundezas das vossas raízes deconvivência para vos tornardes nova-mente um povo solidário; tal como ocedro, resistente a cada tempestade,que possais aproveitar as contingên-cias do momento presente para redes-cobrir a vossa identidade, a identida-de de trazer ao mundo inteiro o per-fume do respeito, da convivência edo pluralismo, a identidade de umpovo que não abandona as suas casasnem a própria herança; a identidadede um povo que não destrói o sonhodaqueles que acreditaram no futurode um país belo e próspero.

Nesta perspetiva, apelo aos líderespolíticos e religiosos, citando o tre-cho de uma carta pastoral do Patriar-ca Elias Hoyek: «Vós chefes do país,vós juízes da terra, vós deputados dopovo que viveis em nome do povo,

(...) tendes a obrigação, na vossa qua-lidade oficial e de acordo com as vos-sas responsabilidades, de procurar ointeresse público. O vosso tempo nãoé dedicado aos vossos melhores inte-resses, e o vosso trabalho não é paravós, mas para o Estado e para a naçãoque representais».

Por fim, o afeto ao querido povolibanês, que tenciono visitar logo queseja possível, juntamente com a cons-tante solicitude que animou a açãodos meus antecessores e da Sé Apos-tólica, impele-me a dirigir-me maisuma vez à comunidade internacional.Ajudemos o Líbano a manter-se afas-tado de conflitos e tensões regionais.Ajudemo-lo a sair da sua grave crise ea recuperar-se.

Amados filhos e filhas, na escuri-dão da noite elevai o olhar, que a es-trela de Belém seja a vossa guia e en-corajamento para entrar na lógica deDeus, para não perder o caminhonem a esperança.

Do Vaticano24 de dezembro de 2020

FRANCISCO

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Missa da noite e mensagem à cidade e ao mundo

Homilia do Santo Padre na Eucaristia da noite de Natal na Basílica de São Pedro

Cada descartado é filho de Deus

Nesta noite, cumpre-se a grandeprofecia de Isaías: «Um meninonasceu para nós, um filho nos foidado» (Is 9, 5).Um filho nos foi dado. Com frequên-cia se ouve dizer que a maior ale-gria da vida é o nascimento deuma criança. É algo de extraordi-nário, que muda tudo, desenca-deia energias inesperadas e fazultrapassar fadigas, incómodos enoites sem dormir, porque trazuma grande felicidade na posseda qual nada parece pesar. Assimé o Natal: o nascimento de Jesusé a novidade que nos permite re-nascer dentro, cada ano, encon-trando n’Ele força para enfrentartodas as provações. Sim, porqueJesus nasce para nós: para mim,para ti, para todos e cada um denós. A preposição «p a ra » reapare-ce várias vezes nesta noite santa:«um menino nasceu para nós»,profetizou Isaías; «hoje nasceupara nós o Salvador», repetimosno Salmo Responsorial; Jesus«entregou-Se por nós» (Ti t 2, 14),

proclamou São Paulo; e, noEvangelho, o anjo anunciou «ho-je nasceu para vós um Salvador»(Lc 2, 11). Para mim, para vós…

Mas, esta locução «para nós»que nos quer dizer? Que o Filhode Deus, o Bendito por natureza,vem fazer-nos filhos benditos porgraça. Sim, Deus vem ao mundocomo filho para nos tornar filhosde Deus. Que dom maravilhoso!Hoje Deus deixa-nos maravilha-dos, ao dizer a cada um de nós:«Tu és uma maravilha». Irmã, ir-mão, não desanimes! Estás tenta-do a sentir-te como um erro?Deus diz-te: «Não é verdade! Ésmeu filho». Tens a sensação denão estar à altura, temor de serinapto, medo de não sair do túnelda provação? Deus diz-te: «Cora-gem! Estou contigo». Não to dizcom palavras, mas fazendo-Se fi-lho como tu e por ti, para te lem-brar o ponto de partida de cadarenascimento teu: reconhecer-tefilho de Deus, filha de Deus. Es-te é o ponto de partida de qual-quer renascimento. Este é o cora-ção indestrutível da nossa espe-rança, o núcleo incandescenteque sustenta a existência: por bai-xo das nossas qualidades e defei-tos, mais forte do que as feridas efracassos do passado, os temorese ansiedades face ao futuro, estáesta verdade: somos filhos ama-dos. E o amor de Deus por nósnão depende nem dependerá ja-mais de nós: é amor gratuito. Estanoite não encontra outra explica-ção, senão na graça. Tudo é gra-ça. O dom é gratuito, sem méritoalgum da nossa parte, pura graça.

Esta noite «manifestou-se — dis-se-nos São Paulo — a graça deDeus» (Ti t 2, 11). Nada é maisp re c i o s o !

Um filho nos foi dado. O Pai nãonos deu uma coisa qualquer, maso próprio Filho unigénito, que étoda a sua alegria. Todavia, aoconsiderarmos a ingratidão dohomem para com Deus e a injus-tiça feita a tantos dos nossos ir-mãos, surge uma dúvida: o Se-nhor terá feito bem em dar-nostanto? E fará bem em confiar ain-da em nós? Não estará Ele a so-brestimar-nos? Sim, sobrestima-nos; e fá-lo porque nos ama apreço da sua vida. Não conseguedeixar de nos amar. É feito assim,tão diferente de nós. Sempre nosama, e com uma amizade maiorde quanta possamos ter a nósmesmos. É o seu segredo paraentrar no nosso coração. Deus sa-be que a única maneira de nossalvar, de nos curar por dentro, éamar-nos. Não há outra maneira!Sabe que só melhoramos aco-lhendo o seu amor incansável, quenão muda, mas muda-nos a nós.Só o amor de Jesus transforma avida, cura as feridas mais profun-das, livra do círculo vicioso insa-tisfação, irritação e lamento.

Um filho nos foi dado. Na pobremanjedoura de um lúgubre está-bulo, está precisamente o Filhode Deus. E aqui levanta-se outraquestão: porque veio Ele à luzdurante a noite, sem um aloja-mento digno, na pobreza e enjei-tado, quando merecia nascer co-mo o maior rei no mais lindo dospalácios? Porquê? Para nos fazer

compreender até onde chega oseu amor pela nossa condição hu-mana: até tocar com o seu amorc o n c re t o a nossa pior miséria. O Fi-lho de Deus nasceu descartadopara nos dizer que todo o descar-tado é filho de Deus. Veio aomundo como vem ao mundouma criança débil e frágil, parapodermos acolher com ternura asnossas fraquezas. E para nos fa-zer descobrir uma coisa impor-tante: como em Belém, tambémconnosco Deus gosta de fazergrandes coisas através das nossaspobrezas. Colocou toda a nossasalvação na manjedoura de umestábulo, sem temer as nossas po-brezas. Deixemos que a sua mise-ricórdia transforme as nossas mi-sérias!

Eis o que quer dizer um filhonasceu para nós. Mas há ainda um«p a ra » que o anjo disse aos pasto-res: «Isto servirá de sinal p a ravós: encontrareis um menino (…)deitado numa manjedoura» (Lc 2,12). Este sinal — o Menino namanjedoura — é também paranós, para nos orientar na vida.Em Belém, que significa «casa dopão», Deus está numa manjedou-ra, como se nos quisesse lembrarque, para viver, precisamos d’Elecomo de pão para a boca. Preci-samos de nos deixar permear pe-lo seu amor gratuito, incansável, con-c re t o . Mas quantas vezes, famintosde divertimento, sucesso e mun-danidade, nutrimos a vida comalimentos que não saciam e dei-xam o vazio dentro! Disto mes-mo Se lamentava o Senhor, pelaboca do profeta Isaías: enquanto

o boi e o jumento conhecem asua manjedoura, nós, seu povo,não O conhecemos a Ele, fonteda nossa vida (cf. Is 1, 2-3). É ver-dade: insaciáveis de ter, atiramo-nos para muitas manjedouras vãs,esquecendo-nos da manjedourade Belém. Esta manjedoura, po-bre de tudo mas rica de amor, en-sina que o alimento da vida é dei-xar-se amar por Deus e amar osoutros. Dá-nos o exemplo Jesus:Ele, o Verbo de Deus, é infante;não fala, mas oferece a vida. Nós,ao contrário, falamos muito, mas

MISSA D O GALO

«O Filho de Deus nasceu descartado, paranos dizer que cada descartado é filho deDeus. Veio ao mundo como uma criança,fraca e frágil, para podermos aceitar as nos-sas fragilidades com ternura»: eis a “lição”sempre atual do «pobre presépio» de Be-lém, reiterou o Papa na homilia durante amissa do galo, celebrada às 19h30 da véspe-ra do Natal, 24 de dezembro, no altar daCátedra, na Basílica de São Pedro.

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Missa da noite e mensagem à cidade e ao mundo

Homilia do Santo Padre na Eucaristia da noite de Natal na Basílica de São Pedro

Cada descartado é filho de Deus

Mensagem «Urbi et Orbi»

É preciso fraternidade e esperançaneste tempo de escuridão

Sejam garantidas as vacinas a todos, sobretudo aos mais vulneráveis e necessitados

Ao meio-dia de sexta-feira, 25 de dezembro, solenidade doNatal do Senhor, o Papa Francisco transmitiu a tradicionalmensagem «Urbi et Orbi» — da sala da Bênção, sem se es-quecer da praça de São Pedro, que permaneceu vazia porcausa das disposições anticoronavírus — aos fiéis que oacompanhavam através da rádio, da televisão e dos novosmeios de comunicação social.

Queridos irmãos e irmãs, feliz Natal!Gostava de fazer chegar a todos a mensagem quea Igreja anuncia nesta festa, com as palavras doprofeta Isaías: «Um menino nasceu para nós, umfilho nos foi dado» (Is 9, 5).

Nasceu um menino: o nascimento é semprefonte de esperança, é vida que desabrocha, é pro-messa de futuro. E este Menino — Jesus — «nas -ceu para nós»: um «nós» sem fronteiras, sem pri-vilégios nem exclusões. O Menino, que a VirgemMaria deu à luz em Belém, nasceu para todos: é o«filho» que Deus deu à família humana inteira.

Graças a este Menino, todos podemos dirigir-nos a Deus chamando-Lhe «Pai», «Papá». Jesusé o Unigénito; ninguém mais conhece o Pai, se-não Ele. Mas Ele veio ao mundo precisamentepara nos revelar o rosto do Pai celeste. E assim,graças a este Menino, todos podemos chamar-nos e ser realmente irmãos: de continentes diver-sos, de qualquer língua e cultura, com as nossasidentidades e diferenças, mas todos irmãos e ir-mãs.

Neste momento histórico, marcado pela criseecológica e por graves desequilíbrios económi-cos e sociais, agravados pela pandemia do coro-navírus, precisamos mais do que nunca de frater-nidade. E Deus no-la oferece, dando-nos o seuFilho Jesus: não uma fraternidade feita de pala-vras bonitas, ideais abstratos, vagos sentimen-tos... Não! Mas uma fraternidade baseada noamor real, capaz de encontrar o outro diferentede mim, de compadecer-me dos seus sofrimen-tos, aproximar-me e cuidar dele mesmo que nãoseja da minha família, da minha etnia, da minhareligião; é diferente de mim, mas é meu irmão, éminha irmã. E isto é válido também nas relaçõesentre os povos e as nações: todos irmãos.

No Natal, celebramos a luz de Cristo que vemao mundo e vem para todos: não apenas para al-guns. Hoje, neste tempo de escuridão e incertezadevido à pandemia, aparecem várias luzes de es-perança como a descoberta das vacinas. Mas, pa-ra que estas luzes possam iluminar e dar esperan-ça ao mundo inteiro, hão de ser colocadas à dis-posição de todos. Não podemos deixar que osnacionalismos fechados nos impeçam de vivercomo a verdadeira família humana que somos.Nem podemos deixar que nos vença o vírus doindividualismo radical, tornando-nos indiferen-tes ao sofrimento doutros irmãos e irmãs. Nãoposso passar à frente dos outros, colocando asleis do mercado e das patentes de invenção acimadas leis do amor e da saúde da humanidade. Peçoa todos, nomeadamente aos líderes dos Estados,às empresas, aos organismos internacionais, quepromovam a cooperação, e não a concorrência,na busca de uma solução para todos: vacinas pa-ra todos, especialmente para os mais vulneráveise necessitados em todas as regiões da Terra. Emprimeiro lugar, os mais vulneráveis e necessita-dos!

Por isso, que o Menino de Belém nos ajude aestar disponíveis, a ser generosos e solidários, es-pecialmente para com as pessoas mais frágeis, osdoentes e quantos neste tempo se encontram de-sempregados ou estão em graves dificuldadespelas consequências económicas da pandemia,bem como as mulheres que nestes meses de con-finamento sofreram violências domésticas.

Perante um desafio que não conhece frontei-ras, não se podem erguer barreiras. Estamos to-dos no mesmo barco. Cada pessoa é um meu ir-mão. Em cada um vejo refletido o rosto de Deuse, nos que sofrem, vislumbro o Senhor que pedea minha ajuda. Vejo-O no doente, no pobre, nodesempregado, no marginalizado, no migrante eno refugiado: todos irmãos e irmãs!

No dia em que o Verbo de Deus Se faz meni-

no, reparemos em tantas crianças que em todo omundo, especialmente na Síria, Iraque e Iémen,ainda estão a pagar o alto preço da guerra. Osseus rostos sensibilizem as consciências dos ho-mens de boa vontade, para que se enfrentem ascausas dos conflitos e se trabalhe com coragempara construir um futuro de paz.

Que este seja o tempo propício para aliviar astensões em todo o Médio Oriente e no Mediter-râneo oriental.

Jesus Menino cure as feridas do amado povosírio, que está exausto com um decénio de guerrae suas consequências, agrava-das ainda mais pela pandemia.Leve conforto ao povo ira-quiano e a todos os povos in-cluídos no caminho da recon-ciliação, em particular os yazi-dis duramente atingidos pelosúltimos anos de guerra. Dêpaz à Líbia e permita que a no-va fase de negociações em cur-so ponha fim a todas as formasde hostilidade no país.

O Menino de Belém conce-da fraternidade à terra que Oviu nascer. Possam israelitas epalestinenses recuperar a con-fiança mútua para procuraremuma paz justa e duradouraatravés de um diálogo direto,capaz de vencer a violência esuperar ressentimentos endé-micos, testemunhando aomundo a beleza da fraternida-de.

A estrela que iluminou anoite de Natal sirva de guia eencorajamento para o povo li-banês, a fim de não perder aesperança no meio das dificul-dades que tem vindo a enfren-tar com o apoio da comunida-de internacional. O Príncipeda Paz ajude os responsáveisdo país a deixar de lado inte-resses particulares e empe-nhar-se com seriedade, hones-tidade e transparência paraque o Líbano possa empreen-der um caminho de reformas e continuar na suavocação de liberdade e convivência pacífica.

O Filho do Altíssimo sustente o empenho dacomunidade internacional e dos países envolvi-dos na manutenção do cessar-fogo no Nagorno-Karabakh, bem como nas regiões orientais daUcrânia, promovendo o diálogo como único ca-minho que conduz à paz e reconciliação.

O Deus Menino alivie o sofrimento das popu-lações do Burkina Faso, Mali e Níger, atingidaspor uma grave crise humanitária, na base da qualestão extremismos e conflitos armados, mas tam-bém a pandemia e outros desastres naturais; Elefaça cessar as violências na Etiópia, onde muitaspessoas são forçadas a fugir devido aos confron-tos; o Deus Menino dê conforto aos habitantesda região de Cabo Delgado, no norte de Moçam-bique, vítimas da violência do terrorismo inter-nacional; Ele incite os responsáveis do Sudão doSul, Nigéria e Camarões a continuar pelo cami-nho de fraternidade e diálogo empreendido.

O Verbo eterno do Pai seja fonte de esperançapara o continente americano, particularmenteafetado pelo coronavírus, que exacerbou os inú-meros sofrimentos que o oprimem, muitas vezesagravados pelas consequências da corrupção edo narcotráfico. Ajude a superar as recentes ten-sões sociais no Chile e a pôr fim aos sofrimentosdo povo venezuelano.

O Rei do Céu proteja as populações flagela-das por calamidades naturais no sudeste asiático,de modo particular nas Filipinas e no Vietname,onde numerosas tempestades têm causado inun-dações com devastadoras repercussões sobre asfamílias, que moram naquelas terras, em termosde perdas de vidas humanas, danos ao meio am-

biente e consequências para as economias locais.E pensando na Ásia, não posso esquecer o po-

vo Rohingya: Jesus, nascido pobre entre os po-bres, leve esperança às suas tribulações.

Queridos irmãos e irmãs!«Um menino nasceu para nós» (Is 9, 5). Veio

para nos salvar! Anuncia-nos que o sofrimento eo mal não são a última palavra. Resignar-se à vio-lência e à injustiça significaria recusar a alegria ea esperança do Natal.

Neste dia de festa, dirijo uma saudação parti-cular a todas as pessoas que não se deixam subju-

gar pelas circunstâncias adversas, mas esforçam-se por levar esperança, consolação e ajuda, socor-rendo quem sofre e acompanhando quem estásozinho.

Jesus nasceu num estábulo, mas envolvido pe-lo amor da Virgem Maria e de São José. Nascen-do na carne, o Filho de Deus consagrou o amorfamiliar. Neste momento, penso de modo espe-cial nas famílias que hoje não se podem reunir,como também naquelas que são obrigadas a per-manecer em casa. E, para todos, seja o Natal aocasião propícia para redescobrirem a família co-mo berço de vida e de fé, lugar de amor acolhe-dor, de diálogo, perdão, solidariedade fraterna ealegria partilhada, fonte de paz para toda a hu-manidade.

Feliz Natal para todos!

Depois de ter concedido a bênção à cidade e ao mundo, oPontífice pediu orações «pelas famílias e comunidades quevivem no meio de tanto sofrimento», exortando a continuar«a rezar também» pela sua missão.

Queridos irmãos e irmãs, renovo os meus votosde Feliz Natal a todos vós que de todo o mundoestais conectados através da rádio, televisão e ou-tros meios de comunicação. Agradeço a vossapresença espiritual neste dia, marcado pela ale-gria. Nestes dias em que o clima do Natal convi-da os seres humanos a tornarem-se melhores emais fraternos, não nos esqueçamos de rezar pe-las famílias e comunidades atribuladas por tan-tos sofrimentos. E, por favor, continuai a rezartambém por mim. Bom almoço de Natal!Adeus.

frequentemente somos analfabetosem bondade.

Um filho nos foi dado. Quem temuma criança pequena, sabe quan-to amor e paciência são necessá-rios. É preciso alimentá-la, cuidardela, limpá-la, ocupar-se da suafragilidade e das suas necessida-des, muitas vezes difíceis de com-preender. Um filho faz-nos sentiramados, mas ensina também aamar. Deus nasceu menino paranos impelir a cuidar dos outros.Os seus ternos gemidos fazem-nos compreender como tantosdos nossos caprichos são inúteis.E temos tantos! O seu amor de-sarmado e desarmante lembra-nos que o tempo de que dispo-mos não serve para nos lamentar-mos, mas para consolar as lágri-mas de quem sofre. Deus vem ha-bitar perto de nós, pobre e neces-sitado, para nos dizer que, servin-do aos pobres, amá-Lo-emos aEle. Desde aquela noite, como es-creveu uma poetisa, «a residênciade Deus é próxima da minha. Omobiliário é o amor» (E. DICKIN-SON, Poems, XVII).

Um filho nos foi dado. Sois Vós,Jesus, o Filho que me torna filho.Amais-me como sou, não comoeu me sonho ser. Bem o sei!Abraçando-Vos, Menino da man-jedoura, reabraço a minha vida.Acolhendo-Vos, Pão de vida,também eu quero dar a minha vi-da. Vós que me salvais, ensinai-me a servir. Vós que não me dei-xais sozinho, ajudai-me a conso-lar os vossos irmãos, porque, apartir desta noite — como Vós sa-beis — são todos meus irmãos.

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Congregação para o culto divino e a disciplina dos sacramentos

Nota sobre o Domingo da Palavra de Deus

O Papa Francisco recebeu um grupo de estudantes de teologia

A contribuição das religiõespara a construção da fraternidade

O Domingo da Palavra de Deus, desejado peloPapa Francisco todos os anos no Terceiro Domin-go do Tempo Comum,1 recorda a todos, Pastores efiéis, a importância e o valor da Sagrada Escriturapara a vida cristã, bem como a relação entre a Pala-vra de Deus e a liturgia: «Como cristãos, somosum só povo que caminha na história, fortalecidopela presença no meio de nós do Senhor que nosfala e alimenta. O dia dedicado à Bíblia pretendeser, não “uma vez no ano”, mas uma vez por todo oano, porque temos urgente necessidade de nostornar familiares e íntimos da Sagrada Escritura edo Ressuscitado, que não cessa de partir a Palavrae o Pão na comunidade dos crentes. Para tal, preci-samos de entrar em confidência assídua com a Sa-grada Escritura; caso contrário, o coração fica frioe os olhos permanecem fechados, atingidos, comosomos, por inumeráveis formas de cegueira».2

Portanto, este domingo constitui uma boa oca-sião para reler alguns documentos eclesiais3 e es-pecialmente os Praenotanda do Ordo Lectionum Missae,que apresentam uma síntese dos princípios teoló-gicos, celebrativos e pastorais relativos à Palavrade Deus proclamada na Missa, mas que tambémsão válidos em todas as celebrações litúrgicas (Sa-cramentos, Sacramentais, Liturgia das Horas).

1. Através das leituras bíblicas proclamadas naliturgia, Deus fala ao seu povo e o próprio Cristoproclama o seu Evangelho;4 Cristo é o centro e aplenitude de toda a Escritura, do Antigo e do No-vo Testamento.5 Ouvir o Evangelho, o ponto altoda Liturgia da Palavra,6 é caracterizado por umaveneração particular,7 expressa não só por gestos eaclamações, mas também pelo próprio livro dosEvangelhos.8 Uma das modalidades rituais ade-quadas para este domingo poderia ser a procissãode entrada com o Evangeliário9 ou, na sua ausên-cia, a sua colocação sobre o altar.10

2. A ordem das leituras bíblicas organizadas pe-la Igreja no Lecionário abre o caminho para o co-nhecimento de toda a Palavra de Deus.11 Portantoé necessário respeitar as leituras indicadas, sem assubstituir ou suprimir, e utilizando versões da Bí-blia aprovadas para uso litúrgico.12 A proclamaçãodos textos do Lecionário constitui um vínculo deunidade entre todos os fiéis que os ouvem. Umacompreensão da estrutura e da finalidade da Li-turgia da Palavra ajuda a assembleia dos fiéis a re-ceber de Deus a palavra que salva.13

3. O canto do Salmo Responsorial, a respostada Igreja orante, é recomendado;14 por conseguin-te, o serviço do salmista em cada comunidade deve

ser aumentado.15

4. Na homilia, os mistérios da fé e as normas davida cristã são expostos ao longo do ano litúrgico,começando com as leituras bíblicas.16 «Primaria -mente os Pastores têm a grande responsabilidadede explicar e fazer compreender a todos a SagradaEscritura. Uma vez que é o livro do povo, todos osque têm a vocação de ser ministros da Palavra de-vem sentir fortemente a exigência de a tornar aces-sível à sua comunidade».17 Os Bispos, os sacerdo-tes e os diáconos devem sentir o compromisso derealizar este ministério com especial dedicação,valorizando os meios propostos pela Igreja.18

5. De particular importância é o silêncio que, aopromover a meditação, permite que a palavra deDeus seja recebida interiormente por aqueles quea ouvem.19

6. A Igreja sempre mostrou particular atençãoàqueles que proclamam a palavra de Deus na as-sembleia: sacerdotes, diáconos e leitores. Este mi-nistério requer uma preparação específica interiore exterior, familiaridade com o texto a proclamar ea prática necessária na forma de o proclamar, evi-tando qualquer improvisação.20 É possível pré-configurar as leituras com monições breves e apro-priadas.21

7. Devido ao valor da Palavra de Deus, a Igrejaconvida-nos a cuidar do ambão do qual ela é pro-clamada;22 não é um móvel funcional, mas sim olugar apropriado à dignidade da Palavra de Deus,em correspondência com o altar: de facto, falamosda mesa da Palavra de Deus e do Corpo de Cristo,em referência tanto ao ambão como, especialmen-te, ao altar.23 O ambão é reservado para as leituras,o canto do Salmo Responsorial e do precónio pas-

cal; a homilia e as intenções da oração universalpodem dele ser proferidas, enquanto que é menosapropriado ter acesso a ele para comentários,anúncios, e a direção do canto.24

8. Os livros que contêm excertos da SagradaEscritura despertam em quem os ouve uma vene-ração pelo mistério de Deus falando ao seu povo.25

Por esta razão, deve-se ter o cuidado de garantir oseu valor material e a sua correta utilização. É ina-dequado recorrer a folhetos, fotocópias e subsí-dios como substitutos dos livros litúrgicos.26

9. Na proximidade ou nos dias sucessivos aoDomingo da Palavra de Deus é conveniente pro-mover encontros formativos para realçar o valorda Sagrada Escritura nas celebrações litúrgicas;pode ser uma oportunidade para aprender maissobre como a Igreja em oração lê a Sagrada Escri-tura, com leitura contínua, descontínua e tipológi-ca; quais são os critérios para a distribuição litúrgi-ca dos vários livros bíblicos ao longo do ano e nosseus tempos, a estrutura dos ciclos dominicais edos dias da semana das leituras da Missa.27

10. O Domingo da Palavra de Deus é tambémuma ocasião propícia para aprofundar a ligaçãoentre a Sagrada Escritura e a Liturgia das Horas, aoração dos Salmos e Cânticos do Ofício, as leitu-ras bíblicas, promovendo a celebração comunitá-ria de Ladainhas e Vésperas.28

Entre os muitos Santos e Santas, todos teste-munhas do Evangelho de Jesus Cristo, São Jeróni-mo pode ser proposto como exemplo, devido aogrande amor que tinha pela Palavra de Deus. Co-mo o Papa Francisco recordou recentemente, foi«incansável estudioso, tradutor, exegeta, profun-do conhecedor e apaixonado divulgador da Sa-

grada Escritura […] Colocando-se à escuta da Sa-grada Escritura, Jerónimo encontra-se a si mesmo,encontra o rosto de Deus e o dos irmãos, e apura asua predileção pela vida comunitária.29

Esta Nota pretende contribuir para despertar, àluz do Domingo da Palavra de Deus, uma cons-ciência da importância da Sagrada Escritura paraa nossa vida de crentes, a começar pela sua resso-nância na liturgia que nos coloca em diálogo vivoe permanente com Deus. «A Palavra de Deus ou-vida e celebrada, sobretudo na Eucaristia, alimen-ta e reforça interiormente os cristãos e torna-os ca-pazes de um autêntico testemunho evangélico navida diária».30

Da Congregação para o Culto Divinoe a Disciplina dos Sacramentos,

17 de dezembro de 2020.

Robert Cardinal SarahP re f e i t o

Arthur RocheArcebispo Secretário

Prot. n. 602/20

1. Cf. F R A N C I S C O, Carta Apostólica sob formade Motu proprio Aperuit illis, 30 de setembro de2019.

2. F R A N C I S C O, Aperuit illis , n. 8; CONCÍLIO VATI -CANO II, Constituição Dei Verbum, n. 25: «É neces-sário, por isso, que todos os clérigos e sobretudoos sacerdotes de Cristo e outros que, como os diá-conos e os catequistas, se consagram legitimamen-te ao ministério da palavra, mantenham um con-tacto íntimo com as Escrituras, mediante a leituraassídua e o estudo aturado, a fim de que nenhumdeles se torne “pregador vão e superficial da pala-vra de Deus. por não a ouvir de dentro”, tendo, co-mo têm, a obrigação de comunicar aos fiéis quelhes estão confiados as grandíssimas riquezas dapalavra divina, sobretudo na sagrada Liturgia. Domesmo modo, o sagrado Concílio exorta com ar-dor e insistência todos os fiéis, mormente os reli-giosos, a que aprendam “a sublime ciência de Je-sus Cristo” (Fl 3, 8) com a leitura frequente das di-vinas Escrituras, porque «a ignorância das Escri-turas é ignorância de Cristo».

3. CONCÍLIO VAT I C A N O II, Constituição Dei Ver-bum; BENTO XVI, Exortação Apostólica Verbum Do-mini.

4. Cf. Sacrosanctum Concilium, nn. 7, 33; Institutio ge-neralis Missalis Romani (IGMR), n. 29; Ordo lectionumMissae (OLM), n. 12.

5. Cf. OLM, n. 5.6. Cf. IGMR, n. 60; OLM, n. 13.7. Cf. OLM, n. 17; Caeremoniale Episcoporum, n. 74.8. Cf. OLM, nn. 36, 113.9. Cf. IGMR, nn. 120, 133.10. Cf. IGMR, n. 117.11. Cf. IGMR, n. 57; OLM, n. 60.12. Cf. OLM, nn. 12, 14, 37, 111.13. Cf. OLM, n. 45.14. Cf. IGMR, n. 61; OLM, nn. 19-20.15. Cf. OLM, n. 56.16. OLM, n. 24; Congregação para o Culto Divi-

no e a Disciplina dos Sacramentos, Diretório Homi-lético, n. 16.

17. F R A N C I S C O, Aperuit illis, n. 5; Diretório Homiléti-co, n. 26.

18. F R A N C I S C O, Exortação Apostólica Evangeliigaudium, nn. 135-144; Diretório Homilético.

19. Cf. IGMR, n. 56; OLM, n. 28.20. Cf. OLM, nn. 14, 49.21. Cf. OLM, nn. 14, 49.22. Cf. IGMR, n. 309; OLM, n. 16.23. Cf. OLM, n. 32.24. Cf. OLM, n. 33.25. Cf. OLM, n. 35; Caeremoniale Episcoporum, n.

115.26. Cf. olm, n. 37.27. Cf. OLM, nn. 58-110; Diretório Homilético, nn.

37-156.28. Institutio generalis de Liturgia Horarum, n. 140:

«A leitura da Sagrada Escritura, que por tradiçãoantiga é feita publicamente não só na celebraçãoda Eucaristia, mas também no Ofício Divino, de-ve ser realizada com a maior estima por todos oscristãos, porque é proposta pela própria Igreja,não por escolha de indivíduos ou de acordo com adisposição mais favorável do seu ânimo, mas emordem ao mistério que a Esposa de Cristo desem-penha através do ciclo anual [...]. Além disso, nacelebração litúrgica, a leitura da Sagrada Escrituraé sempre acompanhada pela oração».

29. F R A N C I S C O, Carta Apostólica Scripturae sacraeaffectus, no XVI centenário da morte de São Jeróni-mo, 30 de setembro de 2020.

30. Cf. F R A N C I S C O, Exortação Apostólica Evan -gelii gaudium, n. 174.

O Papa Francisco recebeu em audiência, a18 de dezembro, um grupo de estudantes delíngua alemã do Theologisches Studien-jahr, que normalmente se realiza na Aba-dia da Dormição da Bem-AventuradaVirgem Maria em Jerusalém. Este ano,devido à pandemia, o curso teve lugar emRoma. Eis o discurso que o Pontífice lhesdirigiu.

Caros amigos, bom dia!Tenho o prazer de dar as boas-vin-das a todos vós, estudantes e res-ponsáveis do “Theologisches Stu-dienjahr” da Abadia da Dormiçãoda Bem-Aventurada Virgem Ma-ria em Jerusalém. Devido à atual

pandemia, este ano, pela primeiravez, o programa de estudo não po-de ter lugar na Terra Santa, mas éacolhido no Pontifício AteneuSanto Anselmo em Roma. Destemodo, a divina providência conce-deu-nos a ocasião de nos encon-trarmos no Vaticano.

O Studienjahr é uma oportuni-dade para os estudantes de teolo-gia católica e protestante conhece-rem os sítios bíblicos e as IgrejasOrientais, bem como os mundosjudeu e islâmico. Mesmo que esteano não possais viver a experiênciana Terra Santa, encontrando-vosquase em “exílio” — como o Padre

Schnabel o define — o estudo apro-fundado da Sagrada Escritura, doecumenismo e do diálogo inter-re-ligioso continuará a ser sempreuma caraterística distintiva do vos-so programa. Estou convicto deque Roma também lhes oferecerávárias possibilidades a este respei-to.

Como jovens que estudam teo-logia, sois testemunhas, para osvossos coetâneos e para os homense mulheres de hoje, da importânciade Deus na vida e da plenitude quedoa uma fé vivida. Será vossa tare-fa entrar em diálogo com um mun-do onde parece haver cada vez me-

nos espaço para a religião. Uma ta-refa que partilhamos com todos oscrentes das diferentes religiões, sa-bendo que tornar Deus presente éum bem para as nossas sociedades.Estamos convictos de que as reli-giões oferecem uma preciosa con-tribuição para a construção da fra-ternidade e para a defesa da justiçana sociedade. Por outro lado, acre-ditamos que quando, por várias ra-zões, as pessoas querem excluirDeus da sociedade, acaba-se ado-rando ídolos, e bem depressa opróprio homem se sente perdido(cf. Enc. Fratelli tutti, 271; 274)

Espero que este “TheologischesStudienjahr” seja uma etapa im-portante no vosso caminho forma-tivo, espiritual e humano, e que de-pois deste “exílio” tenhais em bre-ve a oportunidade de conhecer deperto a “terra prometida”, os luga-res santos da Bíblia. Ao celebrar-mos o Santo Natal daqui a uma se-mana, seremos todos peregrinosem espírito à gruta de Belém. Queo Emanuel vos encha de alegria epaz, tornando-vos verdadeiras tes-temunhas do Deus connosco. Queo Senhor vos abençoe e vos guardea vós e a todos os vossos entes que-ridos. E, por favor, não vos esque-çais de rezar por mim!

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L’OSSERVATORE ROMANOnúmero 52, terça-feira 29 de dezembro de 2020 página 7

Congregação para a doutrina da fé

Nota sobre a moralidadedo uso de algumas vacinas anticovid-19

INFORMAÇÕES

Em geral, a questão do uso de vacinasestá frequentemente no centro de de-bates insistentes na opinião pública.Nos últimos meses, esta Congregaçãorecebeu vários pedidos de um parecersobre o uso de algumas vacinas contrao vírus Sars-Cov-2 que causa a Covid-19 e desenvolvidas no processo de in-vestigação e produção, recorrendo alinhas celulares derivantes de tecidosobtidos de dois abortos ocorridos noséculo passado. Ao mesmo tempo,nos meios de comunicação socialhouve diferentes pronunciamentos deBispos, Associações católicas e Peri-tos, diversificados e às vezes contradi-tórios, que levantaram dúvidas inclu-sive em relação à moralidade do usodestas vacinas.

A respeito deste tema, já existe umimportante pronunciamento da Pon-tifícia Academia para a Vida, intitula-do «Reflexões morais acerca das vaci-nas preparadas a partir de células defetos humanos abortados» (5 de ju-nho de 2005). Sucessivamente, estaCongregação expressou-se a tal pro-pósito com a Instrução Dignitas perso-nae (8 de setembro de 2008) (cf. nn. 34e 35). Em 2017, a Pontifícia Academiapara a Vida voltou a abordar este te-ma mediante uma Nota. Estes docu-mentos já oferecem alguns critériosgerais decisivos.

Dado que as primeiras vacinas con-tra a Covid-19 já estão disponíveis pa-ra a distribuição e a relativa adminis-tração em vários países, esta Congre-gação deseja oferecer algumas indica-ções para um esclarecimento sobre es-te assunto. Não se tenciona julgar asegurança nem a eficácia destas vaci-

nas, embora sejam eticamente rele-vantes e necessárias, cuja avaliação éde competência dos investigadoresbiomédicos e das agências de medica-mentos, mas apenas refletir sobre oaspeto moral do uso destas vacinascontra a Covid-19 que foram desen-volvidas com linhas celulares de teci-dos obtidos a partir de dois fetos quenão foram abortados espontanea-mente.

1. Como a Instrução Dignitas perso-nae afirma, nos casos de utilização decélulas de fetos abortados destinadasa criar linhas celulares para a utiliza-ção na investigação científica, «exis-tem responsabilidades diferencia-das»1 de cooperação para o mal. Porexemplo, «nas empresas que utilizamlinhas celulares de origem ilícita, nãoé igual a responsabilidade dos que de-cidem a orientação da produção e ados que não têm nenhum poder dedecisão».2

2. Neste sentido, quando não esti-verem disponíveis vacinas contra aCovid-19 eticamente questionáveis(por exemplo, em países onde não fo-rem postas à disposição dos médicos edos doentes vacinas desprovidas deproblemas éticos, ou onde a sua dis-tribuição for mais difícil por causa departiculares condições de conserva-ção e transporte, ou quando foremdistribuídos vários tipos de vacinasno mesmo país, mas as autoridadesmédicas não permitirem aos cidadãosescolher a vacina a inocular), é moral-mente aceitável utilizar as vacinas anticovid-19 que tiverem utilizado linhas celulares de fe-tos abortados no seu processo de investigação ep ro d u ç ã o .

3. A razão fundamental para consi-derar moralmente lícito o uso destasvacinas é que o tipo de cooperaçãopara o mal (cooperação material passiva)do aborto provocado do qual derivamas mesmas linhas celulares, por partede quem utiliza as resultantes vacinas,é re m o t a . O dever moral de evitar estacooperação material passiva não évinculativo, se houver um perigo gra-ve como a propagação, de outro mo-do incontornável, de um grave agentepatogénico:3 em tal caso, a difusãopandémica do vírus Sars-Cov-2 quecausa a Covid-19. Portanto, conside-re-se que neste caso podem ser utiliza-das todas as vacinas reconhecidas co-mo clinicamente seguras e eficazes,com a consciência certa de que o recurso a taisvacinas não significa uma cooperação formalpara o aborto do qual derivam as célulascom que as vacinas foram produzidas.Contudo, é bom frisar que o uso mo-ralmente lícito destes tipos de vacina,em virtude das condições particularesque o tornam tal, não pode constituirem si mesmo uma legitimação, nemsequer indireta, da prática do aborto,e pressupõe a oposição a esta práticapor parte de quem a ele recorrer.

4. Com efeito, o uso lícito de taisvacinas não requer e não deve de mo-do algum implicar a aprovação moralda utilização de linhas celulares de fe-tos abortados.4 Portanto, pede-se tan-to às empresas farmacêuticas como àsagências de saúde governamentaisque produzam, aprovem, distribuam e ofere-çam vacinas eticamente aceitáveis, que nãocriem problemas de consciência para os pro-fissionais da saúde nem para quantosse devem vacinar.

5. Ao mesmo tempo, para a razãoprática parece evidente que, em geral,a vacinação não é uma obrigação mo-ral e, por conseguinte, deve ser vo-luntária. De qualquer maneira, doponto de vista ético, a moralidade da va-cinação depende não só do dever de tutela daprópria saúde, mas também do dever da bus-ca do bem comum. Um bem que, na au-sência de outros meios para impedirou apenas para prevenir a epidemia,pode recomendar a vacinação, espe-cialmente para a salvaguarda dosmais frágeis e expostos. No entanto,quantos por motivos de consciênciarejeitam as vacinas produzidas comlinhas celulares derivadas de fetosabortados, devem esforçar-se paraevitar, com outros meios profiláticose comportamentos idóneos, de se tor-nar veículos de transmissão do agentecontagioso. Em particular, devemevitar qualquer risco para a saúde da-queles que não podem ser vacinadospor motivos clínicos, ou de outra na-tureza, e que são as pessoas mais vul-neráveis.

6. Por fim, há também um impe-rativo moral para a indústria farma-cêutica, para os governos e para asorganizações internacionais, de asse-gurar que as vacinas, eficazes e seguras doponto de vista da saúde, assim como etica-mente aceitáveis, sejam acessíveis inclusiveaos países mais pobres e de modo não one-roso para eles. Caso contrário, a faltade acesso às vacinas tornar-se-iamais um motivo de discriminação ede injustiça, condenando os paísespobres a continuar a viver na indi-gência sanitária, económica e so-cial.5

Na Audiência concedida no dia 17 de de-zembro de 2020 ao abaixo assinado Prefeitoda Congregação para a Doutrina da Fé, oSumo Pontífice Francisco examinou a presenteNota e aprovou a sua publicação.

Dada em Roma, na sede da Con-gregação para a Doutrina da Fé, a 21de dezembro de 2020, Memória litúr-gica de São Pedro Canísio.

Luis F. Card. Ladaria, S.J.P re f e i t o

D. Giacomo MorandiArcebispo Titular de Caere

S e c re t á r i o

1 CONGREGAÇÃO PA R A A DOUTRI-NA DA FÉ, Instrução Dignitas personae (8de setembro de 2008), n. 35; AAS(100), 884.

2 Ibid., 885.3 Cf. PONTIFÍCIA ACADEMIA PA R A A

VIDA, Reflexões morais acerca das vacinaspreparadas a partir de células de fetos huma-nos abortados, 5 de junho de 2005.

4 Cf. CONGREGAÇÃO PA R A A DOU-TRINA DA FÉ, Instrução Dignitas perso-nae, n. 35: «Quando o ilícito tem oaval das leis que regulamentam o sis-tema sanitário e científico, é precisodistanciar-se dos aspetos iníquos dosistema, para não dar a impressão deuma certa tolerância ou aceitação táci-ta de ações gravemente injustas. Isto,de facto, contribuiria para aumentar aindiferença, se não mesmo o favor,com que tais ações são vistas em cer-tos ambientes médicos e políticos».

5 Cf. FR A N C I S C O, Discurso a voluntá-rios e amigos do Banco Farmacêutico, 19 desetembro de 2020.

Audiências

O Papa Francisco recebeu em audiências parti-c u l a re s :

No dia 17 de dezembroSua Excelência o Senhor Kyu Ho

Choo, Embaixador da República daCoreia, para a apresentação das CartasC re d e n c i a i s .

Os Senhores Cardeais Luis Francis-co Ladaria Ferrer, Prefeito da Congre-gação para a Doutrina da Fé; e JuliánHerranz, Presidente Emérito do Ponti-fício Conselho para os Textos Legisla-tivos.

No dia 18 de dezembroO Senhor Cardeal Luis Antonio G.

Tagle, Prefeito da Congregação para aEvangelização dos Povos; D. Luiz Fer-nando Lisboa, Bispo da Diocese dePemba (Moçambique); o Rev.mo

Mons. Bruno Marie Duffé, Secretáriodo Dicastério para o Serviço do Desen-volvimento Humano Integral, com oSenhor Efraín Camilo Dawkins San-miguel; e o Senhor Cardeal CarlosOsoro Sierra, Arcebispo Metropolita-no de Madrid (Espanha).

No dia 19 de dezembroSua Excelência a Senhora Marija

Efremova, Embaixadora da Macedó-nia do Norte, para a apresentação dasCartas Credenciais.

O Senhor Cardeal Marc Ouellet,Prefeito da Congregação para os Bis-p os.

Sua Excelência o Senhor Carlos An-tonio Cordero Suárez, Embaixador deHonduras, para a apresentação dasCartas Credenciais.

No dia 21 de dezembroO Senhor Cardeal Marcello Seme-

raro, Prefeito da Congregação para asCausas dos Santos.

No dia 23 de dezembroO Senhor Cardeal Juan Luis Cipria-

ni Thorne, Arcebispo Emérito de Lima( Pe ru ) .

Renúncias

O Sumo Pontífice aceitou a renúncia:

A 17 de dezembroDe D. Éric Aumonier, ao governo

pastoral da Diocese de Versailles( Fr a n ç a ) .

Nomeações

O Santo Padre nomeou:

No dia 17 de dezembroSubsecretário do Departamento pa-

ra os Funcionários Diplomáticos daSanta Sé na Secretaria de Estado, oR e v. mo Mons. Mauricio Rueda Beltz,até agora Conselheiro da NunciaturaApostólica em Portugal.

Secretário para as RepresentaçõesPontifícias, D. Jan Romeo Pawłowski,Arcebispo Titular de Sejny, até esta da-ta Delegado para as RepresentaçõesPontifícias.

No dia 18 de dezembroBispo de Greensburg, nos E UA , o

R e v. mo Mons. Larry J. Kulick, do cleroda mesma Diocese, até à presente dataAdministrador Diocesano e Pároco da“Saint James Parish” em New Alexan-dria.

D. Larry J. Kulick nasceu a 24 de fevereirode 1966, em Natrona Heights, Pittsburgh(EUA), e foi ordenado Sacerdote no dia 16 demaio de 1992.

No dia 19 de dezembroBispo de Caserta (Itália), D. Pietro

Lagnese, até hoje Bispo de Ischia.Bispo de Espinal (Colômbia), D.

Miguel Fernando González Mariño,até agora Bispo Titular de Boseta e Au-xiliar de Ibagué.

Auxiliar de San Isidro (Argentina),o Rev.do Pe. Raúl Pizarro, do clero damesma Sede, até hoje Pároco de SantaRita, simultaneamente eleito Bispo Ti-tular de Ausana.

D. Raúl Pizarro nasceu no dia 12 de marçode 1973, em San Isidro, na Argentina, e recebeua Ordenação presbiteral em 23 de outubro de1998.

No dia 22 de dezembroBispo de Kotor (Montenegro), o

R e v. do Pe. Ivan Štironja, até hoje Páro-co de Studenci e Reitor do SantuárioDiocesano do Sagrado Coração de Je-sus, em Mostar-Duvno, na Bósnia eHerzegovina.

D. Ivan Štironja nasceu a 10 de maio de1960, em Pješivac (Bósnia e Herzegovina), efoi ordenado Presbítero a 29 de junho de 1986.

No dia 23 de dezembroBispo de Valdivia (Chile), D. San-

tiago Jaime Silva Retamales, até agoraOrdinário Militar para o Chile.

Bispos Auxiliares da ArquidioceseMetropolitana de Belo Horizonte, noBrasil:

— O Rev.do Pe. Júlio César GomesMoreira, do clero da Arquidiocese Me-tropolitana de Brasília, até esta dataPároco de Nossa Senhora do Rosáriode Fátima, em Sobradinho-D F, simulta-neamente eleito Bispo Titular de Thi-siduo.

D. Júlio César Gomes Moreira nasceu a 18de abril de 1972, em Fortaleza (Brasil). Estu-dou Filosofia (1997-1999) e Teologia (2000-2003) no seminário maior Nossa Senhora deFátima, em Brasília. Frequentou o curso dePsicologia na Universidade de Brasília (1993-1997). Recebeu a Ordenação sacerdotal em 6de dezembro de 2003 e foi incardinado na Ar-quidiocese Metropolitana de Brasília, onde de-

sempenhou os seguintes cargos: pároco de SãoJosé, em Brazlândia (2004-2005); formadorno seminário maior Nossa Senhora de Fátima(2006-2007); e reitor do seminário propedêu-tico São José (2008-2010). Na ArquidioceseMetropolitana de Goiânia foi reitor do seminá-rio interdiocesano São João Maria Vianney edo seminário Santa Cruz (2011-2015); vigáriodas paróquias do Menino Jesus (2011-2012) ede Santo Hilário (2012-2014) e pároco de SãoLeopoldo Mandic. Foi também membro da co-ordenação da Organização dos Seminários eInstitutos do Brasil (Osib) a nível nacional e doRegional Centro-Oeste. Desde 2017 era coorde-nador da pastoral presbiteral da ArquidioceseMetropolitana de Brasília.

— O Rev.do Pe. Nivaldo dos SantosFerreira, do clero da Arquidiocese Me-tropolitana de Belo Horizonte, até àpresente data Reitor do Santuário Ar-quidiocesano São Judas Tadeu, em Be-lo Horizonte, simultaneamente eleitoBispo Titular de Thiava.

D. Nivaldo dos Santos Ferreira nasceu nodia 3 de junho de 1967 em Barbacena, Arqui-diocese Metropolitana de Mariana, Minas Ge-rais (Brasil). Estudou Filosofia e Teologia naPontifícia Universidade Católica de Minas Ge-rais, em Belo Horizonte. Sucessivamente, obtevea licenciatura em Teologia na Pontifícia Uni-versidade Gregoriana, em Roma. Foi ordenadoSacerdote em 18 de maio de 1996, incardinan-do-se na Arquidiocese Metropolitana de BeloHorizonte, onde desempenhou as seguintes fun-ções: vigário paroquial de São Sebastião(1996); professor no seminário propedêutico(1997-1998); pároco das paróquias do DivinoEspírito Santo (1997-2001), da SantíssimaTrindade (2001-2014) e de São João Bosco(2014-2018); vigário forâneo de São José(2010-2013); reitor do seminário arquidioce-sano (2013-2018); e secretário do conselhoepiscopal. Foi também presidente da Organiza-ção dos Seminários e Institutos do Brasil(Osib) e, há vários anos, professor no Institutode Teologia da Pontifícia Universidade Católi-ca de Minas Gerais, em Belo Horizonte.

Prelados falecidos

Adormeceram no Senhor:

A 13 de dezembroD. Tarcisius Gervazio Ziyaye, Arce-

bispo Metropolitano de Lilongwe, noMalavi.

O ilustre Prelado nasceu a 19 de maio de1949, no Município de Khombe (Malavi). Re-cebeu a Ordenação presbiteral no dia 14 deagosto de 1977 e foi ordenado Bispo em 23 demaio de 1992.

A 14 de dezembroD. José María de la Torre Martín,

Bispo da Diocese de Aguascalientes(México), de Covid-19.

O saudoso Prelado nasceu na localidade dePegueros (México), no dia 9 de setembro de1952. Recebeu a Ordenação presbiteral a 1 dejunho de 1980. Foi ordenado Bispo em 16 dejulho de 2002.

A 16 de dezembroD. Peter Yariyok Jatau, Arcebispo

Emérito de Kaduna, na Nigéria.O venerando Prelado nasceu em Marsa Ka-

je, Arquidiocese de Jos (Nigéria), em 1931. Re-cebeu a Ordenação sacerdotal no dia 7 de julhode 1963 e foi ordenado Bispo a 5 de novembrode 1972.

D. Stephen Tjephe, Bispo da Dioce-se de Loikaw, no Myanmar.

O ilustre Prelado nasceu em Danoku, Dio-cese de Loikaw (Myanmar), a 1 de agosto de1955. Foi ordenado Presbítero em 28 de marçode 1984 e recebeu a Ordenação episcopal a 21de novembro de 2009.

A 17 de dezembroD. Jacob Roberto Hilgert, Bispo

Emérito da Diocese de Cruz Alta, noBrasil.

O venerando Prelado nasceu no Municípiode Harmonia, Diocese de Montenegro (Brasil),a 27 de janeiro de 1926. Recebeu a Ordenaçãosacerdotal em 30 de novembro de 1952, foi orde-nado Bispo no dia 26 de setembro de 1976 e re-nunciou ao governo pastoral da sua Diocese a 8de maio de 2002.

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L’OSSERVATORE ROMANOpágina 8 terça-feira 29 de dezembro de 2020, número 52

Natal de 2020

Angelus de Santo Estêvão

Até os pequenosgestos de amor

mudam a história

Anunciou o Papa na prece mariana de 27 de dezembro

Um ano especialdedicado às famíliasDe 19 de março de 2021 a junho de 2022

«Gestos de amor mudam a história: atéos pequeninos, escondidos, diários». Eis oensinamento que o Papa tirou do testemu-nho de Santo Estêvão, voltando a propô-lo no Angelus de sábado, 26 de dezembro,festa do protomártir, durante o qual recor-dou «quantos hoje sofrem perseguições pe-lo nome de Jesus».

Estimados irmãos e irmãs,bom dia!Ontem o Evangelho falou de Je-sus como a «verdadeira luz» queveio ao mundo, luz que «resplan-dece nas trevas» e que «as trevasnão venceram» (Jo 1, 9.5). Hojevemos a testemunha de Jesus, SantoEstêvão, que brilha na escuridão.As testemunhas brilham com a luzde Jesus, não têm luz própria. AIgreja também não tem luz pró-pria; é por isso que os antigos Pa-dres chamavam à Igreja “o misté-rio da lua”. Assim como a lua nãotem luz própria, as testemunhasnão têm luz própria, são capazesde receber a luz de Jesus e de a re-fletir. Estevão é falsamente acusa-do e apedrejado com brutalidade,mas na escuridão do ódio, no tor-mento da lapidação, ele faz res-plandecer a luz de Jesus: reza pe-los seus assassinos e perdoa-os, co-mo Jesus na cruz. É o primeiromártir, ou seja, a primeira teste-munha, o primeiro de uma multi-dão de irmãos e irmãs que, até ho-je, continuam a trazer luz às tre-vas: pessoas que respondem aomal com o bem, que não cedem àviolência nem à mentira, mas in-terrompem a espiral do ódio coma mansidão do amor. Estas teste-munhas iluminam a aurora deDeus nas noites do mundo.

Mas como nos tornamos teste-munhas? Imitando Jesus, rece-bendo a luz de Jesus. Este é o ca-minho para cada cristão: imitar Je-sus, receber a luz de Jesus. SantoEstêvão dá-nos o exemplo: Jesusveio para servir e não para ser ser-vido (cf. Mc 10, 45), e ele vive paraservir e não para ser servido; vempara servir: Estêvão é eleito diáco-no, torna-se diácono, ou seja, ser-vidor, e assiste os pobres à mesa(cf. At 6, 2). Procura imitar o Se-nhor todos os dias e fá-lo tambémno final: como Jesus, é capturado,condenado e morto fora da cidadee, como Jesus, reza e perdoa. En-quanto o apedrejam, diz: «Se-nhor, não lhes atribuas este peca-do» (7, 60). Estêvão é testemunhaporque imita Jesus.

Contudo, poderia surgir umapergunta: são realmente necessá-rios estes testemunhos de bonda-de, quando no mundo se alastra aperversidade? Para que serve rezare perdoar? Só para dar um bomexemplo? Mas para que serve is-to? Não, há muito mais. Descobri-mo-lo através de um pormenor.Entre aqueles por quem Estêvãorezava e perdoava, o texto diz:«um jovem, chamado Saulo» (v.58), que «aprovou a sua morte»(8, 1). Pouco depois, pela graça deDeus, Saulo converte-se, recebe aluz de Jesus, aceita-a, converte-see torna-se Paulo, o maior missio-nário da história. Paulo nasce pre-cisamente da graça de Deus, masatravés do perdão de Estêvão, me-diante o testemunho de Estêvão.Eis a semente da sua conversão. É

a prova de que os gestos de amormudam a história: até os pequeni-nos, escondidos, diários. PoisDeus guia a história através da co-ragem humilde de quem reza, amae perdoa. Muitos santos escondi-dos, os santos da porta ao lado,testemunhas ocultas da vida, compequenos gestos de amor, mudama história.

É válido também para nós sertestemunhas de Jesus. O Senhordeseja que façamos da vida umaobra extraordinária, através degestos comuns, dos gestos de cadadia. Onde vivemos, em família, notrabalho, em toda a parte, somoschamados a ser testemunhas deJesus, até dando a luz de um sorri-so, luz que não é nossa: é de Jesus,e também fugindo das sombrasdas tagarelices e dos mexericos. Edepois, quando vemos algo erra-do, em vez de criticar, de falar male de reclamar, oremos por quemerrou e por aquela situação difícil.E quando em casa surge uma dis-cussão, em vez de procuramosprevalecer, tentemos desativá-la,recomeçando sempre de novo,perdoando quem ofendeu. Peque-nas coisas, mas mudam a história,porque abrem a porta, abrem a ja-nela à luz de Jesus. Enquanto re-cebia as pedras do ódio, Santo Es-têvão restituía palavras de perdão.Assim mudou a história. Tambémnós, todos os dias, podemos trans-formar o mal em bem, como suge-re um bonito provérbio, que reza:«Faz como a palmeira, atiram-lhepedras e ela deixa cair tâmaras».

Hoje oremos por quantos so-frem perseguições pelo nome deJesus. Infelizmente, são numero-sos. São mais do que nos primei-ros tempos da Igreja. Confiemos aNossa Senhora estes nossos ir-mãos e irmãs, que respondem àopressão com mansidão e, comoverdadeiras testemunhas de Jesus,vencem o mal com o bem.

Após o Angelus, o Pontífice saudou quan-tos o acompanhavam através dos meios decomunicação social e agradeceu as mensa-gens de bons votos recebidas durante asfestas de Natal.

Queridos irmãos e irmãs!Saúdo todos vós, famílias, grupose fiéis que acompanham este mo-mento de oração através dos meiosde comunicação social. Devemosfazer assim, para evitar que as pes-soas venham à praça. Assim, paracolaborar com as disposições da-das pelas Autoridades, para aju-dar todos a evitar esta pandemia.

A atmosfera de alegria do Na-tal, que hoje se prolonga, enchen-do o nosso coração, suscite em to-dos o desejo de contemplar Jesusno Presépio, para depois o servir eamar nas pessoas que estão aonosso lado. Nestes dias recebimensagens de bons votos de Ro-ma e de outras partes do mundo.É impossível responder a cadaum, mas aproveito para manifestaragora a minha gratidão, especial-mente pelo dom da oração, que fa-zeis por mim e que retribuo debom grado.

Feliz Festa de Santo Estêvão!Por favor, continuai a rezar pormim!

Bom almoço e até à vista!

«A festa de hoje evoca-nos o exemplo de evangelizar com a família, repropondo-nos o ideal do amorconjugal e familiar, como foi evidenciado na Exortação Apostólica “Amoris laetitia”, cujo quintoaniversário de promulgação será comemorado no próximo dia 19 de março». E haverá um ano dereflexão sobre o documento para aprofundar o seu conteúdo, anunciou o Papa no Angelus de 27 dedezembro, Domingo da Sagrada Família de Nazaré, explicando que o ano especial se prolongaráaté junho de 2022, quando terá lugar o décimo Encontro mundial das famílias em Roma.

RUMO AO ENCONTRO MUNDIAL

Cinco anos depois de “Amoris laetitia”

«Decidi proclamar um Ano especial dedicado à Família #Amorislaetitia,que será inaugurado na próxima solenidade de São José. Confiemos à Sa-grada Família de Nazaré este caminho com as famílias do mundo inteiro».Com um tweet na conta @Pontifex, o Papa relançou nos meios de comuni-cação social o anúncio feito no Angelus sobre esta nova iniciativa espiri-tual, pastoral e cultural, para acompanhar e assistir as famílias à luz dosdesafios do nosso tempo. Um itinerário de 15 meses, coordenado pelo Di-castério para os leigos, a família e a vida, que imediatamente após as pala-vras do Pontífice divulgou um comunicado, com um opúsculo de apresen-tação a partilhar com dioceses, paróquias, universidades, movimentos ecle-siais, associações familiares e famílias, inserido do novo site www.amorislae-titia.va, em cinco línguas (português, inglês, francês, espanhol e italiano).Na nota, o Dicastério explica que a experiência da pandemia «focou maisacentuadamente o papel central da família como igreja doméstica», salien-tando «a importância dos laços entre famílias, que fazem da Igreja uma“família de famílias”». Por este motivo, ao longo do Ano da «FamíliaAmoris laetitia» o Pontífice — acrescentou a nota — «tenciona dirigir-se atodas as comunidades eclesiais do mundo, exortando cada pessoa a ser tes-temunha do amor familiar». Para tal finalidade, serão difundidos instru-mentos de espiritualidade familiar, formação e ação pastoral sobre a prepa-ração para o casamento, a educação para a afetividade dos jovens, sobre asantidade dos cônjuges e das famílias que vivem a graça do sacramento navida diária, e simpósios académicos internacionais para aprofundar o con-teúdo e as implicações da exortação apostólica pós-sinodal.

Prezados irmãos e irmãs, bom dia!Depois do Natal, a liturgia convida-nos a fixar o olhar na Sagrada Famíliade Jesus, Maria e José. É bom refletirque o Filho de Deus, como todas ascrianças, quis ter necessidade do calorde uma família. Precisamente por estarazão, porque é a de Jesus, a família deNazaré é modelo, na qual todas as fa-mílias do mundo podem encontrar oseu seguro ponto de referência e inspi-ração. Em Nazaré floresceu a primave-ra da vida humana do Filho de Deus,no momento em que foi concebidopor obra do Espírito Santo no ventrevirginal de Maria. Dentro das paredeshospitaleiras da Casa de Nazaré, a in-fância de Jesus teve lugar na alegria,rodeada pelos cuidados maternais deMaria e de José, na qual Jesus pôdever a ternura de Deus (cf. Carta apos-tólica Patris corde, 2).

À imitação da Sagrada Família, so-mos chamados a redescobrir o valoreducativo do núcleo familiar: ele devefundar-se no amor que sempre regene-ra as relações e abre horizontes de es-perança. A comunhão sincera pode serexperimentada na família quando éuma casa de oração, quando os afetossão sérios, profundos e puros, quandoo perdão prevalece sobre a discórdia,quando a dureza diária da vida é sua-vizada pela ternura mútua e pela sere-na adesão à vontade de Deus. Destemodo, a família abre-se à alegria queDeus concede a todos os que sabemdoar alegremente. Ao mesmo tempo,encontra a energia espiritual para seabrir ao mundo exterior, aos outros, aoserviço dos irmãos, à colaboração paraa construção de um mundo semprenovo e melhor; por conseguinte, capazde se tornar portadora de estímulospositivos; a família evangeliza atravésdo exemplo de vida. É verdade, em to-das as famílias há problemas, e por ve-zes até discussões. “Padre, discuti...” —somos humanos, somos fracos e às ve-zes todos nós discutimos em família.Digo-vos uma coisa: se discutirmos emfamília, não terminemos o dia sem fa-zer as pazes. “Sim, discuti”, mas antesque o dia acabe, faz as pazes. E sabes

porquê? Porque a guerra fria do diaseguinte é muito perigosa. Não ajuda.E depois, na família há três palavras,três palavras a conservar para sempre:“com licença”, “obrigado”, “descul-pa”. “Com licença”, para não ser indis-creto na vida dos outros. “Com licen-ça: posso fazer alguma coisa? Achasque posso fazer isto?”. “Com licença”.Sempre, não sejais indiscretos. “Comlicença”, a primeira palavra. “O briga-do”: muitas ajudas, tantos serviços queprestamos uns aos outros em família.Agradecer sempre. A gratidão é o san-gue da alma nobre. “O brigado”. E de-pois, o mais difícil de dizer: “D escul-pa”. Porque cometemos sempre erros emuitas vezes alguém fica ofendido poristo. “D esculpa”, “desculpa”. Não vosesqueçais das três palavras: “com li-cença”, “obrigado”, “desculpa”. Se nu-

ma família, no ambiente familiar, exis-tirem estas três palavras, a família esta-rá bem.

A festa de hoje evoca-nos o exemplode evangelizar com a família, repro-pondo-nos o ideal do amor conjugal efamiliar, como foi evidenciado naExortação Apostólica Amoris laetitia, cu-jo quinto aniversário de promulgaçãoserá no próximo dia 19 de março. Ha-verá um ano de reflexão sobre a Am o r i slaetitia e será uma oportunidade paraaprofundar o conteúdo do documento[19 de março de 2021-junho de 2022].

Estas reflexões serão postas à dispo-sição das comunidades eclesiais e dasfamílias, para as acompanhar no seupercurso. Desde já, convido todos aaderir às iniciativas que serão promo-vidas durante o Ano e que serão coor-denadas pelo Dicastério para os Lei-gos, a Família e a Vida. Confiemos àSagrada Família de Nazaré, em parti-cular a São José, esposo e pai solícito,este caminho com as famílias do mun-do inteiro.

A Virgem Maria, a quem agora nosdirigimos com a oração do An g e l u s , façacom que as famílias de todo o mundosejam cada vez mais fascinadas peloideal evangélico da Sagrada Família,de modo a tornar-se fermento de novahumanidade e de solidariedade con-creta e universal.

No final do Angelus Francisco recordou quan-tos «perderam um parente» por causa da pan-demia, os médicos, enfermeiros e profissionaisda saúde pelo seu «grande trabalho na lutacontra a propagação do vírus» e às famílias«provadas pelas feridas da incompreensão e dadivisão».

Estimados irmãos e irmãs!Saúdo todos vós, famílias, grupos efiéis que seguem a oração do Angelusatravés dos meios de comunicação so-cial. O meu pensamento dirige-se emparticular às famílias que nestes mesesperderam um parente ou foram atingi-das pelas consequências da pandemia.Penso também nos médicos, nos enfer-meiros e em todos os profissionais dasaúde, cujo grande empenho na linhade frente no combate à propagação dovírus tem repercussões significativasna vida familiar.

E hoje confio ao Senhor todas as fa-mílias, especialmente as mais provadaspelas dificuldades da vida e pelas feri-das da incompreensão e da divisão. OSenhor, que nasceu em Belém, conce-da a todas a serenidade e a força paracaminhar unidas na vereda do bem.

Desejo bom domingo a todos e, porfavor, não vos esqueçais de rezar pormim. Bom almoço e até à vista!