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Relatório de Arte – 1º semestre/2017
Turma: 9º ano
Professora: Agda Brigatto
Coordenadora: Maria Aparecida de Lima Leme
… E O ANO COMEÇA COM IDEIAS DE TRANSFORMAÇÃO
Baseado no tema transformação (tema do ano), no primeiro dia de aula, todas as
turmas com folhas de jornal as mãos, refletiram sobre ideias e significados desse material
tão cotidiano em nossas vidas:
_ É impresso… mancha as mãos… a sua impressão é pior que a dos livros… nós
lemos… serve para gente se informar… é feito de papel… perde a informação em poucos
dias, depois vira banheiro de cachorro, recorte na escola, embrulho na loja, protetor de chão
para não sujar com tinta…
A partir dessa discussão de efemeridade e versatilidade desse material, os alunos
foram convidados a explorar algumas possibilidades ao manusear o jornal: amassar,
perceber a direção de suas fibras, rasgar, torcer, agregar, jogar, etc. Após esse contato
inicial com o material e descobertas de que, por exemplo, se rasgado na direção de sua fibra
o jornal pode ser cortado em tiras iguais usando apenas as mãos, foi proposta a criação de
um objeto a partir do jornal usando apenas esse material e fita adesiva.
Os alunos perceberam que um material tão frágil pode ser forte quando enrolado,
amassado e aglomerado. Puderam notar também que esse objeto de leitura pode se
transformar em um objeto de outra utilidade (cesto, protetor de superfícies), um objeto lúdico
(espada, binóculo, fantasia) e, ainda, transformar-se em um objeto expressivo e estético
utilizando linguagens e técnicas artísticas.
TRABALHO CRIATIVO COM A TRANSFORMAÇÃO DE FOLHAS DE JORNAL
A partir dessa atividade, discutimos o significado da arte em nossa sociedade e como
o artista precisa, necessariamente, do processo de transformação para poder modificar
sentimentos, sensações, ideias, materiais, ambientes e, algumas vezes, até o próprio corpo
para modificar o sentido das coisas e criar novas formas de ver e falar sobre o mundo.
Assim, o jornal feito para informar, frágil, efêmero, pode ganhar dezenas de outros
significados, formas e consistências pela manipulação artística.
O QUE QUEREMOS DIZER SOBRE E EM NOSSOS CORPOS?
Um questionário de interesses foi oferecido no início desse período letivo e os alunos
do nono ano, majoritariamente, elencaram temáticas artísticas relacionadas ao corpo, suas
representações e o corpo como suporte artístico.
Iniciamos as discussões sobre essa temática analisando representações do corpo na
propaganda da marca Coca-Cola da década de 1950 até os dias de hoje e as correlações
entre as imagens e aspectos culturais e sociais. Segundo a observação dos alunos durante
a aula, pudemos apontar que, (1) a figura masculina, nessas propagandas, estão vinculadas
à esporte, movimento, saúde; (2) durante os anos houve mudanças na representação dos
padrões familiares e (3) a figura feminina, em geral, é apresentada com senxualidade
exacerbada e dentro de padrões de beleza muito específicos (branca, magra, etc). Essas
características podem ser visualizadas nas imagens abaixo:
Imagens de propagandas da Coca-cola (dos anos 1950 aos dias de hoje)
A figura masculina, nessas propagandas, vem associada ao esporte e a saúde
Os padrões de representação das famílias vem mudando no decorrer dos anos na propaganda
A figura feminina, em geral, vem vinculada a sensualização exacerbada na publicidade
A análise crítica de imagens, artísticas ou cotidianas (propagandas, revistas,
televisão, internet), possibilita ao aluno ampliar suas formas de leitura do mundo,
compreender as intenções de quem elabora uma imagem e se tornar menos vulneráveis a
mensagens cotidianas que a mídia e a propaganda costumam oferecer de forma automática.
Maria Emilia Sardelich, professora da Universidade Federal da Paraíba e especialista
na área de cultura visual afirma que “nômades em nossas próprias casas, capturamos
imagens, muitas vezes sem modelo, sem fundo, cópias de cópias, no cruzamento de
inúmeras significações. Imagens para deleitar, entreter, vender, que nos dizem o que vestir,
comer, aparentar, pensar.” (p. 452) . A veiculação de imagens que ditam nossas relações e 1
modo de vida precisam passar por uma elaboração a fim de tornar consciente sua
mensagem. Além da fruição cultural pela leitura da imagem artística, precisamos ter a
prática de ler imagens a fim de ampliar nossa visão crítica sobre o mundo e as mensagens
simbólicas que nos rodeiam.
Após a análise das imagens publicitárias, os alunos pensaram sobre o que
concordavam e discordavam nessas propagandas. Receberam cópias dessas imagens para
realizar intervenções com suas opiniões por meio de desenho, pintura e palavras,
modificando o sentido da imagem original. A cor da pele foi alterada, os padrões de
comportamento reelaborados repensados e atualizados, assim como foi apontado que a
propaganda pode gerar imagens enganosas e sedutoras.
Trabalho criativo: intervenção em fotografia alterando o sentido publicitário original
Felipe Dosso Nathália Robles
1 SARDELICH, M. E. Leitura de imagens e cultura visual: desenredando conceitos para a prática educativa. Educar em Revista, Curitiba, n. 27, p. 203 – 219, jun. 2006. <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-40602006000100013&lng=pt&nrm=iso> Acesso em 16 ago. 2016
Danilo Torres
Posteriormente, os alunos voltaram sua atenção para o próprio corpo, mas diferente
do ano anterior estudando autorretratos, os alunos agora focalizaram pequenos detalhes
corporais que nos passam despercebidos: marcas de nascença, cicatrizes, poros,
sobrancelhas, cílios, orelhas foram retratados em desenho e fotografias a fim de representar
seus corpos por meio de outras linguagens.
Atividade prática: desenho de detalhes corporais
Alice Montanari Leonidas Alves
Anthony Kaam Nathália Robles
A partir da apreciação dos desenhos, observamos o fotógrafo britânico John Coplans
em suas fotografias corporais, em sua maioria autorretratos. Ao contrário das imagens
publicitárias, John explora o corpo real, envelhecido, em grandes escalas e, utilizando o
macro, o artista realiza o foco aproximado, gerando imagens que nos despertam
curiosidade, aflição, humor, etc.
John Coplans (1920, Londres Inglaterra - 2003, Nova Iorque, EUA)
Autorretrato (Costas com braços acima), 1984 Autorretrato (Peito do pé), 1984
Autorretrato (Mão com dedos esticados), 1987 Autorretrato, 1985
Ao observar essa imagens discutimos também como as imagens fotográficas de
John compõem uma série. A série se constitui em trabalhos artísticos que apresentam
alguns aspectos em comum como temática, cor, dimensões, técnica, enquadramento e luz.
No caso da obra de John, os alunos nomearam a técnica fotográfica, a temática corporal, o
uso do recurso monocromático - chamada pelos fotógrafos de imagem em PB (preto e
branco) - o foco e o enquadramento que faz o espectador buscar descobrir na imagem qual
foi a sessão do corpo retratada. A partir desses conceitos, os alunos desenvolveram
pequenas séries fotográficas. As imagens deveriam assemelhar-se tecnicamente e deveriam
apresentar o mesmo enquadramento, cor, se possível a mesma iluminação e todas as
imagens deveriam retratar algum detalhe corporal. O resultado foi surpreendente!
Atividade Prática: desenvolvimento de série fotográfica
Larissa Lisardo
Léo Leon Silva
A turma ficou envolvida com o material fotográfico, baixando aplicativos de
tratamento de imagem no celular (Snapseed), e analisando como poderiam melhorar as a
maneira de fotografar. Utilizando o Gimp (software livre de edição de imagem) realizamos
corte, alterações de brilho, cor e contraste e foram vislumbradas novas possibilidades de
edição da imagem para além da máquina fotográfica. Ainda nesse clima de intervenção
sobre a imagem capturada, os alunos ainda realizaram interferências em desenho em suas
fotografias impressas.
Atividade Prática: intervenção na própria fotografia
Alice Montanari Anthony Kaam
Tainá Silva Larissa Lisardo
Aproveitando o envolvimento temático, apresentei aos alunos uma fotógrafa que
havia acabado de conhecer e que, contrária a John Coplans, não pertencia ao cenário
artístico de sua época e faleceu em pleno anonimato exercendo por muitos anos a função
de babá. Vivian Maier nasceu nos Estados Unidos, viveu na França com a mãe por alguns
anos, mas passou a maior parte da vida em Nova Iorque e Chicago revelando frágeis laços
familiares.
Sozinha, reservada e com costume de acumular jornais, notícias, recibos, roupas,
sapatos, Vivian mudava seus endereços conforme seu novo emprego de babá ou cuidadora
e, não diferentemente das outras compulsões, a fotografia se revelava uma atividade vital
realizada o tempo todo em qualquer lugar que estivesse.
Seu trabalho póstumo foi descoberto pelo jovem historiador (atual curador de sua
obra) John Maloof que realizou um trabalho intenso para descobrir nos negativos de Vivian a
qualidade estética que sua intuição apontava, assim como para revelar a história de vida da
incrível fotógrafa que ele havia encontrado, por acaso, em um leilão de antiguidades,
buscando fotos de Chicago para um estudo que, na época, ele realizava.
Os alunos apreciaram as imagens fotográficas de Vivian em seu site oficial,
discutiram como essas imagens se conectam dentro conceito de série e apontaram o caráter
de espontaneidade presente nas imagens capturadas por Maier. As poses espontâneas das
pessoas flagradas pela fotógrafa se deviam, em grande parte, por um recurso da antiga
câmera Rolleiflex que apresentava um espelho, permitindo ao fotógrafo manter a câmera
baixa ao capturar a imagem.
Vivian Maier (1926, Nova Iorque, Estados Unidos - 2009, Chicago, Estados Unidos)
Autorretato, 1953
Sem título, 1962
Sem título, 1979 Chicago, 1965
A partir da obra de Vivian, os alunos estudaram possibilidades composicionais que
podem originar uma imagem artística. Essas regras são utilizadas por fotógrafos
desenhistas e pintores ao criar uma composição, no entanto, quebrá-las também pode
significar criar uma composição harmônica, pois essas regras devem ser apenas guias
composicionais. São elas a Regra dos Terços, o Enquadramento, a Simetria, o uso de
Reflexo, da Sombra e das Linhas Guias.
REGRA DOS TERÇOS: Se dividimos a tela fotográfica em três, temos a seguinte
formação dividida em terços:
Grade que divide a foto em terços. Algumas câmeras fotográficas e celulares têm esse recurso
Vivian Maier, Autorretrato, sem data
Repare como o rosto da artista está praticamente na intersecção da linha horizontal inferior e da linha vertical
à direita
Algumas câmeras fotográficas e celulares podem ser programados para ter essa
divisão já em sua tela, localizando o fotógrafo durante seu trabalho. Essa regra é seguida
quando o objeto principal da fotografia se encontra em uma das quatro intersecções das
divisões dos terços (onde tem os círculos da primeira imagem).
ENQUADRAMENTO: A regra do enquadramento é seguida quando o fotógrafo
utiliza um objeto, cenário ou paisagem para dar contorno a pessoa ou objeto principal da
fotografia. O enquadramento pode ser realizado por uma janela, buraco, porta, ou duas
árvores contra a luz que deem importância a figura principal da fotografia.
Vivian Maier, Chicago, 1963
O vidro quebrado da janela enquadra a cena onde duas figuras humanas caminham em meio a neve
SIMETRIA : A regra da simetria é notada em fotografias em que a imagem, dividida
ao meio verticalmente, apresenta os mesmos elementos do lado esquerdo e direito, com
exceção de pequenos detalhes. Essa fotografia é comum em fotos arquitetônicas como
pontes, túneis e prédios.
Vivian Maier, NY, 1954
Perceba que até a posição dos pés das mulheres que dão as
mãos para a criança estão simétricos
Vivian Maier, 1970
A distribuição das três figuras e suas sombras também dão o caráter simétrico a essa imagem
REFLEXO: O reflexo é utilizado como efeito fotográfico quando o assunto principal da
imagem aparece refletido ou é duplicado pelo efeito do espelhamento em um vidro, objeto
metálico ou outro material refletor.
Vivian Maier, Nova York, 1953
A imagem do adulto com duas crianças caminhando aparecem refletidas no acúmulo de água no chão.
Vivian Maier, Autorretrato, 1955
A própria artista aparece refletida duas vezes no espelho. Isso ocorre, pois há dois espelhos um frente ao outro.
SOMBRA: Nesse método o fotógrafo não focaliza o sujeito ou a cena principal da
imagem, mas sim a sua sombra, em geral, projetada no chão.
Vivian Maier, Autorretrato, 1959
A sombra da fotógrafa e sua bicicleta aparecem projetadas na calçada.
Vivian Maier, Autorretrato, sem data
Perceba a folha seca que estava caída ao chão, foi enquadrada por Vivian ao lado esquerdo da sua sombra,
lugar onde fica o coração humano.
LINHAS GUIAS: Ao utilizar esse recurso, o fotógrafo aproveita de linhas presentes
na imagem para guiar o olhar do observador para o objeto principal a ser retratado. Essas
linhas podem ser decorrentes do piso, de linhas de construções, assim como estruturas
urbanas como pontes e túneis.
Vivian Maier, Nova Iorque, 1954
Além das linhas da calçada e do edifício, as próprias mulheres presentes nessa imagem formam uma fila
estruturada.
Vivian Maier, Ásia, 1959
Aqui o grande barco atracado forma uma linha branca inclinada da direita para esquerda que leva o observador à
pequena mulher carregado a trouxa na cabeça.
Os alunos realizaram, por fim, três fotografias baseadas no uso das regras
composicionais obtendo o seguinte resultado:
Atividade Prática: fotografias seguindo as regras composicionais
Alice Montanari - Regra dos terços
Felipe Dosso - Regra dos terços
Danilo Torres - Reflexo
Gabriela Figueiredo - Regra dos terços
Julia Chaves - Simetria Lira Argolo - Simetria
Hoje, juntos analisamos as fotografias compostas pelos alunos, revendo o trabalho
do semestre todo em meio a um clima agradável de parceria. Os alunos, vendo projetadas
as próprias imagens capturadas, relataram sobre suas composições, enquanto os colegas
realizavam análises técnicas muito apuradas relacionadas ao tema das fotos, assim como
às regras composicionais. Pistas foram apontadas para a criação de melhores composições,
elogios foram tecidas e risadas, muitas risadas fecharam nosso semestre apontando que o
caminho percorrido foi construído de tijolinhos de sentidos que, subjetivamente, foi unindo a
turma, dentro de suas subjetividades, em um mesmo projeto.