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170 Regime Diferenciado de Contratações: breves comentários à exceção que virou tendência Fernanda Karlla Rodrigues Celestino 1 Resumo: O presente artigo tem por objetivo analisar algumas das inovações trazidas pelo Regime Diferenciado de Contratação, implementado em nosso ordenamento por meio da Lei nº 12.462/11, resultante da conversão da Medida Provisória nº 527/2011. Ao longo do texto, serão traçadas comparações entre referido regime e o preceituado pela Lei nº 8.666/93, principal diploma legal sobre licitações e contratos no âmbito da Administração Pública. Não há o intuito de avaliar a eficiência da aplicabilidade da nova lei, o que demandaria a conclusão das obras em andamento. Considerando que o novo regime de contratação, de exceção, torna-se cada vez mais regra e tendência para as futuras contratações da Administração Pública, busca-se expor os posicionamentos favoráveis e contrários às suas práticas, demonstrar sua expansão, bem como tratar dos pontos polêmicos da Lei que o instituiu, que tornam sua constitucionalidade objeto de questionamento perante o Supremo Tribunal Federal, por meio da ADI 4.645 e da ADI 4.655, que até a presente data se encontram pendentes de julgamento. Palavras-chave: Inovações; Regime Diferenciado Contratações; Administração Pública; Constitucionalidade. 1 Analista Judiciário em Execução de Mandados no TJ – CE, Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará.

Regime Diferenciado de Contratações: breves comentários à ... · Características do RDC O regime diferenciado de contratações públicas, ... caráter sigiloso do orçamento,

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    Regime Diferenciado de Contrataes: breves comentrios exceo que virou tendncia

    Fernanda Karlla Rodrigues Celestino1

    Resumo: O presente artigo tem por objetivo analisar algumas das inovaes trazidas pelo Regime Diferenciado de Contratao, implementado em nosso ordenamento por meio da Lei n 12.462/11, resultante da converso da Medida Provisria n 527/2011. Ao longo do texto, sero traadas comparaes entre referido regime e o preceituado pela Lei n 8.666/93, principal diploma legal sobre licitaes e contratos no mbito da Administrao Pblica. No h o intuito de avaliar a eficincia da aplicabilidade da nova lei, o que demandaria a concluso das obras em andamento. Considerando que o novo regime de contratao, de exceo, torna-se cada vez mais regra e tendncia para as futuras contrataes da Administrao Pblica, busca-se expor os posicionamentos favorveis e contrrios s suas prticas, demonstrar sua expanso, bem como tratar dos pontos polmicos da Lei que o instituiu, que tornam sua constitucionalidade objeto de questionamento perante o Supremo Tribunal Federal, por meio da ADI 4.645 e da ADI 4.655, que at a presente data se encontram pendentes de julgamento.

    Palavras-chave: Inovaes; Regime Diferenciado Contrataes; Administrao Pblica; Constitucionalidade.

    1 Analista Judicirio em Execuo de Mandados no TJ CE, Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Cear.

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    Introduo

    A Lei n 8.666/93, que pelo seu excesso de formalismo, traz morosidade e custos s contrataes pblicas, para alguns crticos, no satisfaz aos anseios de eficincia do Estado gerencial. Por esse motivo, o legislador vem, ao longo dos anos, esforando-se para inovar no campo das licitaes e contratos, com a instituio, por exemplo, do Sistema de Registro de Preos, atravs do Decreto n 3.931/01 e posteriormente da Lei n 10.520/02, que instituiu o prego eletrnico, dentre outros.

    No intuito de tornar mais rpida a execuo de obras para Copa do Mundo e para as Olimpadas, foi criado, atravs da Lei n 12.462/11, o Regime Diferenciado de Contratao Pblica, regulamentado pelo Decreto n 7.581/11.

    Conforme o art. 1 da referida lei, o Regime Diferenciado de Contrataes Pblicas aplicar-se-ia exclusivamente s licitaes e contratos necessrios realizao dos Jogos Olmpicos e Paraolmpicos de 2016; da Copa das Confederaes, da Federao Internacional de Futebol Associao Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014 , e s obras de infraestrutura e contratao de servios para os aeroportos das capitais dos estados da Federao distantes at 350 km (trezentos e cinquenta quilmetros) das cidades sedes dos mundiais indicados acima. Contudo suas condies acabaram se estendendo s obras do Programa de Acelerao do Crescimento, por meio da Medida Provisria n 559/12, e hoje tambm se aplicam a licitaes na rea da educao, (MP n 570/12) e da sade (MP n 580/12).

    O que seria um regime de exceo passa cada vez mais a tornar-se a preferncia dos gestores pblicos. Contudo o RDC foi aprovado por meio de medida provisria, cuja constitucionalidade, conforme ser observado, ainda objeto de discusso perante o Supremo.

    Em que consiste esse novo regime de contratao? Em que aspectos difere da Lei n 8.666/93? Porque sua aplicao, para alguns, vem resolver o problema de inadequao da lei geral, ao mesmo tempo em que, para outros, tem sido objeto de duras crticas e de Aes Diretas de Inconstitucionalidade?

    Longe de exaurir o tema, o presente artigo tem a pretenso de apresentar

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    aspectos do RDC e algumas crticas que lhe so lanadas, deixando ao leitor margem de reflexo a respeito, sem deixar de apresentar o que se entende por tendncia para as prximas contrataes.

    1. Caractersticas do RDC

    O regime diferenciado de contrataes pblicas, ou simplesmente RDC, foi institudo pela Lei n 12.462, de 2011, sob a alegao de necessidade de desburocratizao de determinados processos licitatrios, tendo em vista a proximidade dos eventos j mencionados e a ausncia de uma reforma tempestiva na Lei n 8.666/93.

    Ao fixar as condies e procedimentos que devem ser observados pela Administrao Pblica no mbito do RDC, a lei que o instituiu, em seu art. 1, 2, determina que a adoo do regime resulta no afastamento das normas contidas na Lei n 8.666, de 1993.

    Alm de contemplar os princpios da licitao em geral, regulada pela Lei n 8.666/93, como a isonomia na competio entre os licitantes, o RDC busca proposta mais vantajosa para a Administrao, impondo expressamente, atravs do seu artigo 3, a observncia dos princpios da eficincia, da economicidade e do desenvolvimento sustentvel como norteadores das licitaes e contratos.

    Referido regime trouxe em seu bojo uma srie de inovaes a fim de dar efetividade s celebraes contratuais, dentre elas esto: carter sigiloso do oramento, inverso de fases, regime de contratao integrada, remunerao varivel, regulamentao do Registro de Preos, pr-qualificao permanente, critrio do maior retorno econmico, escolha de proposta, prazo recursal nico, dentre outras.

    Alm das alteraes acima indicadas, que sero tratadas de forma mais detalhada ao longo dos prximos itens, o art. 7, I, da Lei n 12.462/11 prev que, para os casos de licitao para aquisio de bens, a Administrao Pblica poder indicar marca ou modelo, desde que formalmente justificado, em trs situaes: a) em decorrncia da necessidade de padronizao do objeto; b) quando determinada marca ou modelo comercializado por mais de um fornecedor for a nica capaz de atender s necessidades da entidade contratante; ou c) quando a descrio do objeto a ser licitado puder ser melhor

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    compreendida pela identificao de determinada marca ou modelo aptos a servir como referncia, situao em que ser obrigatrio o acrscimo da expresso ou similar ou de melhor qualidade.

    A lei em comento destoa da 8.666/93, em que se probe a restrio da licitao a uma marca especfica. Quanto ao tema, o consultor legislativo do Senado Federal, Renato Monteiro Rezende (2011, p. 24) ressalta:

    A Lei n 8.666, de 1993, autoriza, em seu art. 7, 5, a indicao de marca, quando tecnicamente justificvel, nas licitaes para contratao de obras ou servios. Em seu art. 15, 7, I, veda a indicao de marca nos certames de compras. E, em seu art. 15, I, estabelece que as compras, sempre que possvel, atendero ao princpio da padronizao.Tanto a doutrina quanto a jurisprudncia do Tribunal de Contas da Unio (TCU) tm admitido, por interpretao dos citados dispositivos da Lei Geral, a indicao de marca em editais de licitao, nas situaes contempladas na Lei n 12.462, de 2011. Assim, pode-se entender que seu art. 7 constituiria, nesse ponto, apenas um detalhamento das previses genricas da Lei Geral sobre a matria.

    O novo regime prev possibilidade de se adotar o modo de disputa aberto nas licitaes (art.16), ao contrrio do que ocorre na Lei 8.666/93, bem como a disputa por meio de lances (art.17) e, nesse aspecto, propicia evidente reduo de custos para a Administrao Pblica. Ainda seguindo os moldes da Lei n 10.520/02, que institui o Prego, a lei em anlise estipula que os modos de disputa, aberto e fechado, podero ser combinados na forma do regulamento.

    O art.13 da Lei 12.462/2011, seguindo a mesma linha do art. 4, caput, Decreto 5.450/05, que regulamenta o Prego, determina que a licitao seja feita preferencialmente em meio eletrnico, admitida a presencial, visando tornar o certame mais clere, competitivo e econmico.

    De forma inovadora, o art. 24, I, da referida Lei, determina que sero desclassificadas as propostas que contenham vcios insanveis. Sobre o tema

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    Pereira (2011, on line) destaca que:

    Passou-se a adotar legislativamente o critrio, amplamente acolhido na doutrina e fortemente adotado pela jurisprudncia, de que apenas vcios insanveis invalidam os atos na licitao. Adota-se agora expressamente a orientao de que vcios sanveis no podem acarretar a invalidao ou a desconsiderao de atos praticados na licitao tal como exemplo, a apresentao de proposta ou documentos de habilitao.

    No art.11, prev-se a possibilidade de contratao de mais de uma empresa para a prestao do mesmo servio, nos seguintes casos: 1) em que o objeto seja passvel de execuo de forma concorrente e simultnea por mais de um contratado; ou 2) em que a mltipla execuo seja conveniente para atender Administrao Pblica. O art.71 do Decreto n 7.581/11 une os dois incisos (cuja redao idntica da Lei) pela conjuno aditiva e, indicando que tais requisitos devem ser verificados simultaneamente (JUSTEN FILHO, 2011, on line).

    Ao contrrio da Lei Geral, que em seu art. 57, II, limita a 60 meses a durao mxima dos contratos de servios a serem executados de forma contnua, dispe o art.43 da nova Lei que os contratos dessa natureza podem ter sua vigncia estabelecida at a data da extino da Autoridade Pblica Olmpica. De acordo com Fernandes (2012, p. 269), a iniciativa elogivel na medida em que a vigncia contratual ser atrelada utilidade do objeto contratado e no a um mero parmetro temporal que pode causar transtornos continuidade dos servios. Deve-se, contudo, evitar a perenizao dos contratos.

    Outra novidade, preceito moralizador, a vedao expressa no art. 37, proibindo a contratao direta de empresa cujo scio ou dirigente seja parente ou afim at o 3 grau de qualquer agente pblico envolvido nas contrataes, ou qualquer agente pblico que ocupe cargos superiores. No obstante essas e outras inovaes, estatui o art. 39 da referida lei, que se aplicaro as normas da Lei n 8.666/1993 aos contratos administrativos celebrados com base no RDC, com exceo das regras especficas nela

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    previstas. Os contratos celebrados com fundamento no RDC seguem a Lei n

    8.666/93, inclusive quanto s clusulas exorbitantes, e ainda nas hipteses de contratao direta (dispensas e inexigibilidade). Em seu art. 45, repetem-se os comandos dos arts. 41 e 109 da Lei Geral, relativos s hipteses de interposio de impugnaes e recursos. Contudo, alguns prazos sofreram alteraes, a exemplo da data limite para impugnao do edital, que passou de 2 para 5 dias teis antes da abertura das propostas, e do prazo para interposio de recurso contra deciso que declare a inidoneidade do contratado, que foi reduzido de 10 para 5 dias teis.

    Quanto ao art. 44 da nova Lei, que trata da anulao e revogao de licitaes, este dispe que as regras do art. 49 da Lei Geral sero aplicveis s anulaes e revogaes de certames regidos pela RDC.

    A partir de agora, merecem ser trazidos lume alguns comentrios acerca das alteraes mais polmicas da referida lei, que a fazem objeto de crtica pela doutrina e por via de Ao Direta de Inconstitucionalidade perante o Supremo.

    1.1 Oramento Sigiloso

    Conforme o art. 6 da Lei 12.462/2011, observado o disposto no 3, o oramento previamente estimado para a contratao ser tornado pblico apenas e imediatamente aps o encerramento da licitao, sem prejuzo da divulgao do detalhamento dos quantitativos e das demais informaes necessrias para a elaborao das propostas.

    J nas contrataes regidas pela Lei n 8.666/93, a divulgao do preo de referncia uma informao bsica e obrigatria do certame, o que torna a sigilosidade de oramento um dos pontos mais polmicos do RDC.

    Conforme a nova lei, caso o oramento no conste do instrumento convocatrio, ele possuir carter sigiloso, ressalvando-se, contudo, sua disponibilizao estrita e permanentemente aos rgos de controle interno e externo da Administrao Pblica. O 3 do art. 6 permite aos rgos de fiscalizao e tribunais de contas acesso a esses dados, que devero ser mantidos em sigilo, sob pena de responsabilizao.

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    Para os defensores do oramento sigiloso, a ocultao do preo de referncia, alm de dificultar a formao de conluios e cartis nos procedimentos licitatrios, induziria reduo dos preos.

    Quanto ao primeiro benefcio sugerido, importante salientar que, se a publicao do valor estimado da contratao no edital pode facilitar a formao de cartis de empresas e combinao de preos para fraudar a licitao, a alterao para oramento sigiloso no consiste em soluo milagrosa para o problema. Ainda resta a possibilidade de que um ou outro licitante tenha acesso a tal informao, bem como no h garantia de que o preo de referncia no esteja superfaturado.

    Conforme orientao de Rezende (2011, p. 40-41):

    Evidentemente, a formao ou no de um cartel independe da divulgao dos oramentos prvios elaborados pela Administrao promotora do certame. Com ou sem oramento, cartis podero se formar. []Em um mundo onde no haja corrupo dos agentes pblicos, a manuteno do oramento em sigilo pode funcionar como estratgia de combate prtica acima descrita. Com efeito, desconhecendo o valor mximo admitido pela Administrao, o licitante (mesmo na hiptese de combinao de preos pelo cartel) ter incentivos para reduzir o valor de sua proposta, sob o temor de v-la desclassificada, o que redundar em margens maiores de desconto para o Poder Pblico, relativamente ao valor constante do oramento. []No mundo real, no entanto, essa ideia, concebida para combater o conluio de licitantes, pode resultar ineficaz quando: a) houver corrupo dos servidores pblicos que tiverem acesso s informaes sigilosas; b) os competidores se recusarem a baixar os preos de suas propostas.

    O receio de alguns crticos o de que o sigilo no oramento leve contratao por um preo injusto; que o governo fique merc da vontade das empreiteiras, tendo em vista a necessidade de realizar obras em curto espao de tempo. Os defensores da sigilosidade argumentam, pelo contrrio, que

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    o fato de o referido valor se tornar pblico apenas e imediatamente aps o encerramento da licitao ocasionaria obteno de maior competitividade e de melhores preos, visto que os participantes da licitao fariam sua oferta sem conhecer o montante de recursos que a Administrao tem para gastar.

    Peixoto (2011, on line) destaca que referido sigilo, alm de ser relativo, no uma novidade no cenrio da contrataes pblicas e gera uma real diminuio dos valores:

    O artigo 6, 3, fala em sigilo do valor estimado da licitao, ou seja, somente no ser informado o valor de que dispe a Administrao para aquele determinado gasto, e no como tem noticiado os veculos de informao de que nenhum valor (at o da proposta dos licitantes) ser divulgado.A Lei 8.666/93 sempre estabeleceu a obrigatoriedade da divulgao desses preos aos licitantes. J a Lei 10.520, que regula a modalidade prego para aquisio de bens e servios comuns, silenciou sobre o assunto, fazendo com que parte dos rgos pblicos licitantes no divulgasse o preo estimado da licitao e outra parte, os divulgasse. Portanto, a matria em discusso - sigilo do preo estimado - no to estranha aos ouvidos da comunidade especializada em licitao. Ao contrrio, muito comum a no disponibilizao do preo estimado da licitao (na modalidade prego), com vistas a no prejudicar o processo de negociao do pregoeiro com o detentor da melhor proposta.O sigilo tratado no artigo 6 do RDC, portanto, limitar-se- fase da veiculao do edital aos interessados em participar do certame, uma vez que os preos propostos e o valor estimado da licitao sero todos divulgados a partir da escolha do melhor classificado.

    A autora acrescenta que nas licitaes realizadas na modalidade prego, o sigilo do preo estimado no parece ter prejudicado o carter competitivo; a ausncia da informao confere maior disputa com preos mais vantajosos ao poder pblico (PEIXOTO, 2011, on line).

    Impende ressaltar que o sigilo do oramento, por si s, no confere maior disputa e preos mais vantajosos ao Poder Pblico. A efetiva reduo

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    dos valores se deve em muito ao fato de que no regime diferenciado facultado o estabelecimento de procedimentos similares aos do prego, como o da inverso de fases e o da fase de lances, o que incentiva a concorrncia entre os licitantes e, consequentemente, a obteno de um melhor negcio.

    Quanto ao sigilo em si, o que ocorre que, de acordo com art. 26 da nova lei, ao final da licitao, autoriza-se a negociao do preo ofertado pelo vencedor, que, na ocasio, ainda no saber, face sigilosidade, qual o valor orado pela Administrao. Ser a tendncia, ento, a reduo dos preos pelos licitantes que realmente pretendam fechar negcio. Caso contrrio, ao oferecer valor acima do estimado, esses licitantes sero afastados da disputa, nos termos do art. 24, III.

    Mesmo diante das controvrsias apontadas, esses seriam os dois pilares em que se fundamentam os defensores do sigilo do oramento: dificultar a formao de conluios e cartis e incentivar os licitantes a oferecem o preo mais baixo. Contudo, referido sigilo ainda tem sua constitucionalidade contestada, na forma apresentada adiante.

    1.2 Inverso das fases

    Como foi dito anteriormente, a Lei que instituiu o RDC, estabeleceu em seu art.12, como regra para o procedimento licitatrio, a inverso das fases, onde sero inicialmente analisadas as propostas, e s aps o julgamento, analisados os documentos de habilitao, ao contrrio do que dispe a Lei 8.666/93, de acordo com a qual todos os concorrentes tm a habilitao analisada previamente, para s depois ser escolhida a melhor proposta, o que torna o certame mais burocrtico e moroso.

    De acordo com seus defensores, referida inverso encurta sensivelmente o prazo do certame. Contudo, ainda o art. 12, em seu pargrafo nico, autoriza a Administrao Pblica a inverter a ordem das fases estipulada para o RDC, desde que mediante ato motivado e previso expressa no instrumento convocatrio. Nessa hiptese, a fase de habilitao anteceder a de julgamento, ou seja, aplicando-se a regra j disposta na Lei n 8.666/93.

    Para alguns, a inverso de fases no RDC, muito embora torne o certame

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    mais clere, dever ser aplicada com cautela, porque induz a Administrao Pblica a relevar eventuais falhas nos documentos de habilitao do licitante vencedor, podendo levar adjudicao do objeto a empresas sem condies de execut-lo adequadamente (AIDAR, 2012, on line).

    Tal receio tem fundamento, uma vez que, se na aplicao da Lei n 8.666/93 a empresa comprovar sua capacidade tcnica para a obra antes de apresentar a proposta financeira, no RDC o Governo julgar os preos antes mesmo de verificar se a empresa vencedora tem capacidade tcnica para executar a obra.

    Quanto implementao da inverso de fases, Rezende (2011, p. 28) aponta como esse mecanismo pode dificultar fraudes e conluios:

    Mesmo na hiptese de parte dos licitantes atuar em conluio, a inverso de fases apresenta vantagens, pois, em licitaes sem inverso de fases, ainda que os integrantes do cartel no interponham recursos contra a habilitao uns dos outros, fazem-no em relao aos concorrentes que no participam do conluio, para no correrem o risco de ver sua estratgia falhar, no julgamento das propostas. Ademais, como o intuito do cartel forar a celebrao de contratos com menos vantagens para a Administrao ou mesmo com valores acima dos de mercado, o cotejo das propostas de preo de todos os licitantes, que caracteriza as licitaes com inverso de fases, possibilita desvelar esse tipo de prtica cartelstica.

    Assim, esse instituto, que j tem previso no ordenamento, apresenta-se como forma mais eficaz e clere que o modelo previsto na Lei Geral e coaduna-se com os objetivos perseguidos pelo RDC.

    1.3 Contratao Integrada

    Outro aspecto que diferencia o RDC da Lei n 8.666/93 a possibilidade de utilizao do regime de contratao integrada. De inspirao no regulamento do procedimento licitatrio simplificado da Petrobrs, aprovado pelo Decreto n 2.745, de 24 de agosto de 1998, a Lei n 12.462, de 2011, em seu art. 9 e

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    incisos, vem estabelecer que, nas licitaes de obras e servios de engenharia, a elaborao e o desenvolvimento dos projetos bsico e executivo, a execuo, a montagem, a realizao de testes, a pr-operao e todas as demais operaes necessrias e suficientes para a entrega final do objeto podem ser de responsabilidade de uma mesma empresa.

    Conforme o art. 9, caput, a utilizao da contratao integrada fica condicionada a ser tcnica e economicamente justificada.

    A polmica do assunto se deve ao fato de que a Lei Geral veda a licitao de um empreendimento sem a elaborao prvia do projeto bsico de engenharia, que detalha como ser a obra em todas as fases, enquanto o Regime Diferenciado de Contratao permite a licitao de obra sem projeto bsico.

    Os que defendem a pr-existncia de um projeto bsico argumentam que sua ausncia acarretaria desperdcio de dinheiro pblico, vez que referido projeto permitiria ao governo estimar o custo, calculando um preo justo para a execuo da obra antes de sua contratao, evitando a formao de cartis entre as empresas e superfaturamento do preo.

    O art. 9, 2, I, prev que, no certame da contratao integrada, embora no haja projeto bsico, a Administrao dever disponibilizar no edital respectivo anteprojeto de engenharia que contemple os documentos tcnicos destinados a possibilitar a caracterizao da obra ou servio. Obviamente, se a elaborao do projeto bsico sempre foi uma pedra no sapato da Administrao, espera-se que o anteprojeto seja mais simples, contudo, sem negligenciar as informaes imprescindveis caracterizao da obra (PEIXOTO, 2011, on line).

    Enquanto para alguns a disponibilizao de anteprojeto de engenharia tornar o processo mais clere e eficaz, para outros, a contratao integrada gera riscos para a Administrao pelo nvel de transferncia que feita ao particular, antes mesmo da elaborao de um projeto bsico, como ressalta Aidar (2012, on line):

    a contratao integrada mostra-se extremamente gravosa ao particular, na medida em que a ele transfere integralmente os riscos

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    relativos a obras de alta complexidade, contratadas em fase muito preliminar, antes mesmo da elaborao do projeto bsico, quando ainda no se tem a exata noo das quantidades e dos problemas que sero enfrentados na execuo do empreendimento. A situao mostra-se ainda mais delicada quando se observa que o RDC impe, salvo em situaes especiais, que o custo global das obras e servios de engenharia seja obtido a partir de custos unitrios de insumos ou servios menores ou iguais mediana de seus correspondentes ao Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e ndices da Construo Civil (Sinapi), no caso de construo civil em geral, ou na tabela do Sistema de Custos de Obras Rodovirias (Sicro), no caso de obras e servios rodovirios, o que sujeita o particular ao enorme risco de arcar com o prejuzo decorrente da desatualizao de tais tabelas frente realidade do mercado.

    Rezende (2011, p. 46) alerta que a situao pode constituir ofensa aos princpios do julgamento objetivo e da isonomia:

    Assim, o Poder Pblico realizar certame sem dispor de balizamento mnimo daquilo que deseja ver executado. A deficincia de parmetros comparativos prejudica a aferio do grau de adequao das propostas s necessidades do Poder Pblico e abre margem ao subjetivismo no julgamento. Ademais, d-se um poder excessivo ao contratado para definir o que e como ser executado. Enquanto se discute a elaborao do prprio projeto executivo anteriormente abertura do certame, a previso da Lei do RDC vai na contramo de esforos para assegurar um melhor planejamento das obras pblicas, que evite problemas de execuo, o encarecimento dos custos para Administrao e a celebrao de aditivos.

    Para outros entendedores, o fato de o contratado ficar responsvel pela elaborao do projeto bsico eliminaria o risco de sobrecusto para a Administrao decorrente de falhas no projeto. Sendo vedado o aditivo por erro de projeto, uma vez que aditivos contratuais s so permitidos nas hipteses

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    descritas no art. 9, 4 e incisos: (i) para o reequilbrio econmico-financeiro desses contratos, em caso fortuito ou fora maior; (ii) ou por necessidade de alterao do projeto ou das especificaes para melhor adequao tcnica aos objetivos da contratao, a pedido da Administrao Pblica, desde que no decorrentes de erros ou omisses por parte do contratado, observados os limites previstos no 1 do art. 65 da Lei n 8.666, de 21 de junho de 1993.

    Jurksaitis (2012, on line), adotando posio favorvel, destaca que referida transferncia no novidade:

    Mas algo muito semelhante acontece quando se licita uma concesso de servio pblico precedida de obra pblica. Nesse caso, o edital tambm no contm um projeto bsico da futura obra. E o motivo simples. Ao invs de jogar para o licitante o dever de prever as caractersticas gerais da obra e o mtodo de execuo, a administrao transfere a ele todos os riscos do projeto e de realizao da obra. Assim, tanto a contratao integrada como as concesses atribuem ao particular os riscos inerentes plena execuo do que foi contratado. Por essa razo, a contratao integrada tentou ser mais restritiva em relao aos aditivos contratuais (art. 9, 4).Ao transferir a elaborao do projeto bsico para o particular, abre-se a possibilidade de solues diferentes para a execuo da obra, que podem ser mais econmicas e eficientes. O julgamento, nesses casos de contratao integrada, dever obrigatoriamente ser por tcnica e preo (art. 9, 2, III), adotando-se critrios objetivos previstos pelo edital.

    As palavras de Justen Filho (2010, p. 134) demonstram a importncia do projeto bsico:

    O projeto bsico no se destina a disciplinar a execuo da obra ou do servio, mas a demonstrar a viabilidade e a convenincia de sua execuo. Deve evidenciar que os custos so compatveis com as disponibilidades financeiras; que todas as solues possveis foram cogitadas, selecionando-se a mais conveniente; que os

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    prazos para a execuo foram calculados; que os reflexos sobre o meio-ambiente foram sopesados, etc.

    A jurisprudncia do TCU, quanto ao projeto bsico, destaca a imprescindibilidade de sua existncia, relacionando-o questo da economicidade dos contratos:

    A elaborao de projeto bsico adequado e atualizado, assim considerado aquele que possua elementos descritivos e que expressem a composio de todos os custos unitrios, imprescindvel para a realizao de qualquer obra pblica, resguardando a Administrao Pblica de sobrepreos e manipulao indevida do contrato original. Acrdo n 2737/2009-TCU-Plenrio. Relator: Ministro Raimundo Carreiro. Braslia, 18 de novembro de 2009. Dirio Oficial de Unio, 20 de nov. de 2009.[...] a necessidade de prvia elaborao de projeto bsico nas licitaes de obras pblicas, a fim de garantir a lisura do procedimento licitatrio e que a proposta apresentada seja factvel, evitando reajustes contratuais indevidos ou superiores aos limites previstos na Lei n 8.666/93, alteraes em quantitativos de itens contratados e modificaes nas solues tcnicas que, alm de dificultar sobremaneira o exerccio do controle, aumentam as necessidades de recursos financeiros para a concluso dos empreendimentos, ao ponto de, em alguns casos retardar, em muito sua concluso, gerando as chamadas obras inacabadas, indiscutivelmente nocivas sociedade. Acrdo n 339/2000-TCU-Plenrio. Relator: Humberto Guimares Souto. Braslia, 26 de abril de 2000. Dirio Oficial de Unio, 10 de maio de 2000.

    No Acrdo de n 2873/08, do Plenrio do Tribunal de Contas da Unio, o Ministro Relator Augusto Sherman destaca o quanto a baixa qualidade do projeto bsico pode comprometer os propsitos de uma licitao, uma vez que projeto bsico excessivamente impreciso amplifica o potencial risco acerca das regras de medio do contrato, de modo que contrariam as boas regras da Administrao Pblica.

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    Para Fernandes (2012, p. 245), a elaborao e execuo do projeto pela mesma pessoa foi permitido pelo RDC devido a uma grave carncia na elaborao do projeto bsico, no sendo possvel ao servidor pblico dominar conhecimento suficiente para produzir projeto bsico com nvel de detalhamento que vem exigindo a lei e os rgo de controle, deficincia que acaba acarretando, na ao de controle, o dever da Administrao de aceitar alteraes de preos em contratos e incluso de novos itens em planilhas, tornando-a refm das exigncias das empresas contratadas.

    Em que pese os posicionamentos favorveis contratao integrada, esse constitui um dos aspectos do RDC, que tem sua constitucionalidade bastante questionada.

    1.4 Remunerao Varivel

    O artigo 10, caput, da Lei n 12.462/2011 traz como flexibilizao Lei n 8.666/93 a previso de uma remunerao varivel na contratao de obras e servios, inclusive de engenharia, permitindo que a empresa contratada receba um bnus de acordo com seu desempenho, que ser aferido com base em metas, padres de qualidade, critrios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatrio e no contrato.

    Referida remunerao, alm de ser motivada, dever respeitar o limite oramentrio fixado pela Administrao Pblica para a contratao, conforme previsto no pargrafo nico do referido artigo. Peixoto (2011, on line) esclarece:

    A remunerao varivel permite que o pagamento possa variar para mais ou para menos, a depender do desempenho da empresa contratada. Se cumprir o contrato dentro do prazo, receber o valor pactuado; se antecipar a entrega da obra, receber antecipadamente o valor, podendo, ainda, fixar-se um bnus pela eficincia; e se houver atraso, alm da reduo proporcional do valor, poder a contratada sofrer as sanes legais. Obviamente, qualquer condio de remunerao varivel dever constar detalhada e objetivamente no edital da licitao.

    Contudo, o fato de no haver uma previso exata dos gastos antes da

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    contratao, sendo a remunerao varivel, vinculada ao desempenho da contratada, causa uma preocupao quanto subjetividade dos processos licitatrios e a possibilidade de desvios. Rezende (2011, p.26) destaca que:

    A Lei no descreve suficientemente bem como seria essa sistemtica de remunerao varivel, remetendo sua disciplina ao edital e ao contrato. Tal descrio, com algum grau de detalhamento, deveria constar da prpria lei, mesmo porque trata da contraprestao devida empresa contratada e assegurada pelo prprio texto constitucional, que determina sejam mantidas, na vigncia do contrato, as condies efetivas da proposta (art. 37, XXI, da Lei Maior). Teoricamente, poder-se-ia cogitar de remunerao varivel em casos de reduo do valor da contraprestao estatal por cumprimento insatisfatrio do contrato ou abaixo de um nvel considerado timo. Os critrios de aplicao de tal regra deveriam ser objetivamente definidos, para evitar perseguies. Mesmo assim, pode-se questionar a criao de um regime como esse, sob a perspectiva de que ele tornaria a inexecuo do objeto um evento normal e sujeito a uma disciplina especfica no tocante remunerao do contratado, quando na verdade a inexecuo do contrato, ainda que a parcial, deve ser vista como uma falta, punvel na forma da lei. Ademais, a previso do limite oramentrio fixado pela Administrao como teto para os pagamentos permite interpretaes de que a remunerao poderia exceder o valor da proposta vencedora (considerando-se que o valor da proposta vencedora deve ser inferior ao valor orado), deixando aberta a possibilidade de fraudes.

    Do exposto, pode-se deduzir que temeroso remeter a sistemtica de remunerao varivel ao instrumento convocatrio, uma vez que os mesmos deveriam ser objetivamente definidos em lei, trazendo maior iseno ao processo de contratao. Outro ponto que merece relevo a mitigao das punies em razo do inadimplemento ou adimplemento intempestivo a pretexto da reduo do valor da contraprestao pela Administrao, pois vai

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    de encontro ao princpio do enriquecimento sem causa, principalmente na hiptese de cumprimento contratual abaixo de um nvel considerado timo.

    1.5 Procedimentos Auxiliares

    A Lei n 12.462, de 2011, define, em seus arts. 29 a 33, uma srie de procedimentos auxiliares das licitaes no mbito do RDC, so eles: o sistema de registro de preos, a pr-qualificao permanente, o cadastramento e o catlogo eletrnico de padronizao.

    O sistema de registro de preos, procedimento administrativo j bastante utilizado, originalmente previsto na Lei n 8.666/93, depende de prvia licitao, na qual sero selecionadas as propostas mais vantajosas, posteriormente registradas e colocadas disposio da autoridade estatal para futuras e eventuais contrataes, desde que obedecido determinado prazo, na medida de sua necessidade.

    Apesar de apresentar pontos favorveis, como a reduo de formalidades, de gastos, reduo do nmero de licitaes e ampliao da escala de fornecimento, esta ltima devido possibilidade de adeso superveniente de outros rgos administrativos, o Sistema de Registro de Preos foi severamente criticado por autores como Maral Justen, por entender que essa adeso pelo carona no encontra autorizao legislativa na Lei 8.666/93, constituindo espcie de dispensa de licitao no prevista em lei.

    Mas a Lei n 12.462, inovou ao regular com mincia razovel a situao do carona. Nas palavras de Justen Filho (2012, on line):

    O Regulamento apresentou uma soluo para uma das maiores distores experimentadas na prtica do carona. Trata-se da questo de limite mximo de quantitativos passveis de contratao com base em registro de preos.Segundo a disciplina do regime geral de contrataes, o limite seria individual por rgo aderente e corresponderia a 100% do quantitativo registrado. Mas poderia haver tantas contrataes quantos fossem os rgos aderentes. O regulamento do RDC estabeleceu que os quantitativos totais contratados por rgos aderentes no poder ser superior a cinco vezes (seis, em verdade,

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    contando os rgos participantes) a quantidade prevista para cada item (art.102 3). A fixao desse limite representa uma evoluo em face da situao anterior, ainda que no afaste as crticas [...].

    A nova Lei estabeleceu um Sistema de Registro de Preos especfico para o Regime Diferenciado de Contrataes Pblicas, que se assemelha ao sistema de registro de preos institudo pela Lei 8.666/93, mas apresenta algumas peculiaridades, no s a citada acima, relativa limitao da quantidade total de bens ou servios que podero ser contratados pelos rgos aderentes, mas tambm, como afirma Coelho (2012, on line):

    a) a possibilidade de registro de preos relativos prestao de servios de engenharia, remunerados por unidade de medida ou em regime de tarefa; b) a adequao a qualquer dos modos de licitao previstos na Lei n12.462/2011 e Decreto n7.851/2011; c) a possibilidade dos demais licitantes aceitarem cotar seus bens ou servios em valor igual ao do licitante mais bem classificado, para ampliar a quantidade de fornecedores, produtos e servios;[...]

    Os defensores da utilizao do Sistema de Registro de Preos no RDC sempre destacam que a celeridade e economia gerada e as regras inseridas na nova lei condizem com o que se espera nas licitaes e contratos nos quais ser aplicado.

    A pr-qualificao permanente constitui outro procedimento auxiliar previsto pela lei que instituiu o RDC. A Lei n 8.666/93 introduziu a figura da pr-qualificao, conceituada por Justen Filho (2010, p. 950) nos seguintes termos:

    consiste na dissociao da fase de habilitao do restante do procedimento da concorrncia. A administrao institui exigncias especiais e excepcionalmente severas como requisito de participao em futura concorrncia. Essas exigncias envolvem a idoneidade financeira e a capacitao tcnica, alm dos requisitos comuns sobre a capacidade jurdica e regularidade fiscal. Instaura-se um procedimento seletivo preliminar destinado a verificar o preenchimento de tais requisitos.

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    Os licitantes que preencherem os requisitos previstos sero considerados pr-habilitados para a concorrncia. Somente eles estaro legitimados a participar da concorrncia.

    Conforme prev a Lei Geral, em seu art. 114, a pr-qualificao poder ser utilizada nas concorrncias sempre que o objeto da licitao recomende maior anlise da qualificao tcnica dos interessados. A pr-qualificao aludida na Lei do RDC, diversamente da pr-qualificao convencional, de natureza permanente, no se referindo a um caso concreto considerado, e destina-se a identificar, conforme art.30 e seus incisos: a) fornecedores que renam condies de habilitao exigidas para o fornecimento de bem ou a execuo de servio ou obra nos prazos, locais e condies previamente estabelecidos; ou b) bens que atendam s exigncias tcnicas e de qualidade da Administrao Pblica.

    O art. 30, que trata da criao da pr-qualificao permanente, dispe em seu 2 que um regulamento estabelecer as condies em que a Administrao poder fazer uma licitao restrita aos pr-qualificados. O participante que tiver realizado pr-qualificao poder apresentar a certido de pr-qualificao, que substituir todos os documentos de habilitao. Rezende (2011, p. 37) alerta para aspecto desfavorvel da pr-qualificao permanente:

    A pr-qualificao da Lei n 12.462, de 2011, mais se assemelha ao cadastro da modalidade de tomada de preos, ao qual alude o art. 22, 2, da Lei n 8.666, de 1993. Todavia, a nova Lei no estabelece qualquer limite utilizao do procedimento de pr-qualificao. Considerando que a Administrao poder promover certames restritos aos licitantes pr-qualificados (art. 30, 2), cabendo a regulamento definir em que condies isso se dar, no se pode descartar o risco de que a pr-qualificao possa acarretar a frustrao do carter competitivo das licitaes. Com efeito, sabendo- se de antemo quem poder participar da disputa, mais fcil promover conluios e formar cartis.

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    O art. 33 da nova lei define o catlogo eletrnico de padronizao de compras, servios e obras como um sistema informatizado, de gerenciamento centralizado, destinado a permitir a padronizao dos itens a serem adquiridos pela Administrao Pblica, que estaro disponveis para a realizao de licitao.

    O pargrafo nico destaca que referido catlogo poder ser utilizado em licitaes cujo critrio de julgamento seja a oferta de menor preo ou de maior desconto e conter toda a documentao e procedimentos da fase interna da licitao, assim como as especificaes dos respectivos objetos. O catlogo eletrnico consiste, portanto, em forma de padronizao, que permite aos interessados conhecer previamente os modelos e tcnicas que serviro de padro para as futuras contrataes. Quanto a essa prtica, Fernandes (2012, p. 265) recomenda:

    Bem de ver, contudo, que as crticas existiro na medida em que o lanamento inicial pode implicar em direcionamento injustificado em favor do produto que venceu a licitao anterior.Por isso, quando a incluso em catlogo implicar em restrio competio com a indicao de marca e modelo, recomendvel que a introduo de bens no catlogo seja precedida de estudos prvios que revelem que a Administrao procedeu anlise do mercado de forma impessoal, criando, por exemplo, uma comisso tcnica para o exame.

    Finalmente, no cadastramento, procedimento auxiliar j autorizado no art. 34, caput, Lei n 8.666/93, os rgos e entidades da Administrao Pblica que realizam frequentemente licitaes mantero registros cadastrais para efeito de habilitao, na forma regulamentar, vlidos por no mximo um ano.

    No art.31, 1, da Lei do RDC, exige-se que os registros cadastrais sejam amplamente divulgados e fiquem permanentemente abertos para a inscrio de interessados. Com isso evitam-se as fraudes que ocorriam no passado no sentido de manter o cadastro fechado e somente aps longos perodos permitir novos cadastramentos, promovendo-se no interregno licitaes sucessivas e volumosas em favor de pequeno grupo de empresas (FERNANDES, 2012, p. 263).

  • 190

    1.6 Critrio do maior retorno econmico

    Os critrios de julgamento possveis no RDC constituem a matria dos arts. 18 a 23 da Lei n 12.462/11, os quais inovam ao criar os critrios de maior desconto, de contedo artstico e de maior retorno econmico, bem como ao ampliar as hipteses de cabimento dos critrios de tcnica e preo e de melhor tcnica, sofrendo este ltimo modificaes substanciais em relao figura de mesma designao, prevista na Lei n 8.666, de 1993 (MACEDO, PELINSARI, OLIVEIRA, 2012, on line).

    Ainda na fase preparatria, a comisso escolher um dos critrios de julgamento, tipos especiais previstos pela Lei do RDC, dentre eles o previsto no art.23, que utiliza o critrio do maior retorno econmico, exclusivo para a celebrao de contratos de eficincia. As propostas sero consideradas de forma a selecionar a que proporcionar a maior economia para a Administrao Pblica decorrente da execuo do contrato. Tal critrio tem sido objeto de crticas, conforme aponta Rezende (2011, p. 34):

    Sobre o critrio de maior retorno econmico e o contrato de eficincia, cumpre registrar que o conceito de despesas correntes dado pelo Direito Financeiro (art. 12 da Lei n 4.320, de 17 de maro de 1964). Eventual reduo em tais despesas no necessariamente se vincula ao de uma empresa contratada pela Administrao para lhe prestar servios. Variaes nas despesas correntes dependem, inclusive, de uma deciso do Poder Legislativo, quando da elaborao do oramento anual. A necessidade de individualizao de cada uma das causas que levam a variaes nas despesas correntes dificulta em muito a gesto de contratos celebrados a partir de licitaes que utilizem o novo critrio previsto. Ademais, as despesas correntes podem aumentar pela simples ampliao dos servios prestados pela Administrao, ainda que a empresa contratada tenha efetivamente realizado aes que proporcionam economia ao rgo ou entidade contratante. Dada a dificuldade em se estabelecer uma correlao material entre os servios prestados e a contraprestao devida pela Administrao, contratos celebrados com fulcro no art. 23

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    da Lei, a exemplo do que o recente histrico indica quanto aos servios de publicidade, podero facilitar a ocorrncia de desvios e fraudes no uso de recursos pblicos.

    Conforme o exposto, o critrio ora apreciado gerar um grande risco para o contratado, na medida em que fatores independentes da sua vontade podem contribuir para que suas metas de reduo de despesas.

    1.7 Escolha de proposta

    Conforme o art. 40 da referida Lei n 12.462/11, facultado Administrao Pblica, quando o convocado no assinar o termo de contrato ou no aceitar ou retirar o instrumento equivalente no prazo e condies estabelecidos: I - revogar a licitao, sem prejuzo da aplicao das cominaes previstas na Lei n 8.666, de 21 de junho de 1993, e nesta Lei; ou II - convocar os licitantes remanescentes, na ordem de classificao, para a celebrao do contrato nas condies ofertadas pelo licitante vencedor.

    A novidade consta no pargrafo nico do mesmo artigo, que permite a convocao dos licitantes remanescentes do certame na ordem de classificao e no preo ofertado por estes, desde que o respectivo valor seja igual ou inferior ao oramento estimado para a contratao. Esta regra, que j existe na Lei do Prego, art. 4, XXIII, colide com a da Lei 8.666/93, de acordo com aqual o segundo colocado somente ser escolhido se concordar em acatar as condies financeiras feitas pelo primeiro colocado.

    1.8 Prazo recursal nico

    Enquanto nas demais modalidades licitatrias abre-se prazo de recurso ao trmino de cada ato ou deciso (art.109 da Lei 8.666/93), o art.27 da Lei do RDC prev, nos moldes do que se d na modalidade prego, que todos os recursos sero postergados para uma fase recursal nica aps a anlise dos documentos de habilitao do licitante vencedor.

    A Lei do RDC tambm inova em seu art.45, 1, ao prever a necessidade dos licitantes manifestarem o interesse de recorrer imediatamente, no momento

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    em que o ato ocorreu, registrando em ata inteno de recorrer futuramente, contra os atos que defiram ou indefiram pedido de pr-qualificao, atos de habilitao ou inabilitao ou julgamento das propostas, sob pena de precluso. O prazo continua a ser o de 5 dias teis, tando para recorrer quanto para apresentar contra-argumentos, nos termos do mesmo artigo.

    2. Das aes de inconstitucionalidade

    A Lei 12.462/2011, que instituiu o RDC, resultante da converso da MP 527/2011, que originalmente tratava da organizao da Presidncia da Repblica e dos Ministrios, criava a Secretaria de Aviao Civil, alterava a legislao da Agncia Nacional de Aviao Civil e da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroporturia, criava cargos em comisso e dispunha sobre a contratao de controladores de trfego areo. O Regime Diferenciado de Contrataes foi includo em seu texto pelo relator Jos Guimares (PT-CE), quando referida MP ainda tramitava na Cmara dos Deputados.

    O PSDB, juntamente com o partido Democratas e o PPS, ajuizou no Supremo Tribunal Federal, em agosto de 2011, a Ao Direta de Inconstitucionalidade de n 4.645, contestando a Lei 12.462/2011. Referida ao, distribuda ao Ministro Luiz Fux, fundamenta-se na ausncia dos pressupostos constitucionais de relevncia e urgncia, necessrios edio de Medida Provisria, e no abuso no poder de emendar no mbito do processo de converso da Medida Provisria n. 527, de 2011 (pela incluso de matria que excede os limites temticos da proposio principal, que no dispunha a respeito de licitaes e contratos e criao de obstculos atuao institucional dos demais parlamentares).

    Alega-se ainda violao dos artigos 22, inciso XXVII, 37, inciso XXI, e dos princpios da eficincia, moralidade e publicidade, com a indicao dos dispositivos confrontados:

    As inconstitucionalidades encontradas na Lei 12.462 de 2011, dizem respeito essncia e ao todo do Regime Diferenciado de Contrataes Pblicas, notadamente os seguintes dispositivos: art.1 e 65, que delegam ao Executivo a escolha do regime

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    jurdico aplicvel, art.6 3, que estabelece presuno de sigilo do custo das obras, art. 9, que permite a contratao integrada, para realizao de obras e servios de engenharia, art.10, que permite o estabelecimento de remunerao varivel para obras e servios pblicos, e art.15 2, que dispensa a publicao em dirio oficial, entre outros2 .

    Em setembro de 2011, o Procurador-Geral da Repblica (PGR), Roberto Monteiro Gurgel Santos, enviou ao Supremo Tribunal Federal, uma nova Ao Direta de Inconstitucionalidade, ADIN n 4.655, tambm questionando a constitucionalidade do Regime Diferenciado de Contrataes Pblicas, previsto na Lei 12.462/11.

    Assim como na ADIN n 4.645, aponta-se vcio formal de incluso de matria estranha MP n 527/11, em afronta ao devido processo legislativo e ao princpio da separao dos Poderes3 .

    Quanto aos vcios materiais, alega-se ofensa ao princpio da legalidade do artigo 37, XXI, da Constituio Federal, inicialmente pelo fato de que os dispositivos da lei no fixam parmetros mnimos para identificar obras, servios e compras que devam seguir o Regime Diferenciado de Contrataes Pblicas; em segundo lugar, pelo fato do regime de licitao pblica no estar previsto em lei e, sim, por ato do poder Executivo, no havendo qualquer parmetro legal sobre o que seja uma licitao ou contratao necessria aos eventos previstos na Lei, outorgando-se desproporcional poder de deciso ao Poder Executivo.

    Frente ao mesmo artigo, questionam-se os dispositivos que conferem Administrao o dever de adoo preferencial do regime de contratao integrada no caso de obras e servios de engenharia, apontando como dois aspectos que tornariam referidos dispositivos inconstitucionais: 1) no definio clara do que vem a ser o objeto da licitao, por admitir que se contrate uma obra ou um servio sem a elaborao do projeto bsico 2) possibilidade de

    2 Disponvel em: 3 Disponvel em:

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    que se concentre, na figura de um mesmo contratante, a elaborao do projeto bsico e a posterior execuo da obra ou servio.

    Aponta-se ainda a inconstitucionalidade dos dispositivos relacionados pr-qualificao permanente, por tambm estarem em desconformidade com o artigo 37, XXI, da CF, atingindo a finalidade do procedimento licitatrio, que a ampla competitividade.

    Por fim, anota haver inconstitucionalidade material nos artigos 4, 1, II e 2, e art.14, pargrafo nico, II, ao preverem a adoo de medidas mitigadoras e/ou compensatrias no caso de obras ou atividades potencialmente causadoras de danos ambientais ou culturais. Tais dispositivos, face os arts. 225 e 226 da CF, no podem ser interpretadas para que sejam dispensadas exigncias estabelecidas nas normas que regulam o licenciamento ambiental.

    Outra suposta inconstitucionalidade da lei apontada por Rezende (2011, p. 56):

    []II - A despeito de veicular algumas importantes e positivas inovaes na disciplina das licitaes e contratos, a Lei do RDC contraria, em diversos dispositivos, normas gerais fixadas pela Lei Geral de Licitaes e, por assim o fazer, padece de inconstitucionalidade formal, a qual no existiria caso as inovaes fossem incorporadas prpria Lei Geral, em lugar de se fazer uma lei ad hoc, de mbitos temporal , espacial, objetivo e subjetivo limitados;[...]

    Zockun (2012, on line) critica a nova Lei, por afastar a aplicao da lei geral de licitaes:

    [..] o RDC no poderia ter afastado a aplicao da lei geral de licitaes, como se deu na espcie (art. 1, 2, da Lei do RDC). Deveras, a Constituio da Repblica exige que as licitaes e contrataes pblicas sejam obedientes a um modelo nacional, sem embargo de a Unio, os Estados e os Municpios poderem ditar normas suplementares.Ao editar-se a lei do RDC criou-se, ao arrepio da ordem constitucional, um regime de licitao e contratao que convive

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    margem do regime geral em invulgar desobedincia ordem jurdica, o que no admitido, como j cuidou de pedagogicamente assinalar o STF ao julgar a ADI 1.668.

    Referido autor aponta ainda vcio na forma como esse regime tem sido estendido:

    [] Fundado na suposta idia(sic) de que o modelo do RDC mais eficiente, a Lei federal 12.688 fez incluir no seu campo de abrangncia as obras do PAC, afastando-se, uma vez mais a Lei 8.666.Ainda que manifestavelmente(sic) indesejvel, a aplicao do RDC em sua redao original sem, portanto, a insero do PAC causaria dano jurdico limitado no tempo. Isso porque suas disposies normativas foram inicialmente concebidas para produzir efeitos at o trmino dos aludidos eventos esportivos.Com a incluso do PAC no rol de bens passveis de licitaes e contrataes pblicas por meio do RDC, os danos jurdicos j no so mais limitados no tempo. E nesta condio, a procedncia das ADIs n s 4.645 e 4.655 poder, ao final, ensejar a declarao de nulidade das licitaes que, adotando o rito do RDC, forem volvidas ao PAC. E, neste caso, se for possvel, tero que ser novamente licitadas sob o manto da Lei 8.666.

    Questionando expanso do regime, em agosto de 2012, o Procurador-Geral requereu aditamento da Adin n 4.655, a fim de incluir em seu objeto as alteraes efetuadas pelo art. 28 da Lei 12.688/12 lei originalmente impugnada, que estendeu o RDC s aes integrantes do Programa de Acelerao do Crescimento (PAC). Em fevereiro do presente ano, aditou-se novamente a ao, para acrescentar ao seu objeto as alteraes efetuadas pelas Leis 12.722/12, art. 14, e 12.745/12, art.4, que autorizam a aplicao do regime s obras e servios de engenharia no mbito do Sistema nico de Sade (SUS) e no sistema pblico de ensino.

    Em que pesem as inconsistncias apresentadas pela referida Lei, esta continua sendo aplicada e estendida. Espera-se o julgamento de referidas aes

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    diretas de inconstitucionalidade. O procurador-geral da Repblica, Roberto Gurgel, enviou parecer ao ministro Luiz Fux, favorvel Adin 4.645. As duas aes j contam com pareceres contrrios da Advocacia-Geral da Unio e esto aptas a serem submetidas ao pleno.

    Consideraes Finais

    Em pouco tempo, o regime diferenciado de contratao, entendido por alguns como amadurecimento da Lei n 8.666/93, passou a fazer parte do cotidiano da Administrao Pblica, que o tem utilizado de forma experimental, visando a uma possvel substituio das atuais normas de licitao e contratos administrativos.

    fato que a Lei de Licitaes precisa sofrer inovaes e que algumas das advindas desse novo regime podem servir como base para a elaborao de novas normas para licitaes e contratos, essa a tendncia; contudo, a forma como foi editado o regime, com ingerncia do legislativo em acrescentar matria ao texto de uma medida provisria, quebra de pertinncia temtica, ausncia dos pressupostos da MP, bem como a insero de algumas prticas demonstradas nos itens anteriores, so criticveis sob a tica constitucional.

    O RDC apresenta carter de exceo, pois foi criado para uma situao emergencial causada pelos Poderes Executivo e Legislativo, uma vez que a reforma Lei 8.666/93 tem sido postergada desde 2007, quando j se sabia que o Brasil seria sede da Copa do Mundo de 2014. Mas o que deveria ser uma medida de carter temporrio vem se tornando regra e se expandindo para outras reas, sem passar pelo processo legislativo adequado, por meio de sucessivas medidas provisrias, enquanto ainda se espera uma posio definitiva da Suprema Corte acerca de sua constitucionalidade.

    A aplicao desse regime para as obras da Copa e das Olimpadas, ainda que decorrentes de uma situao de emergncia ficta, pode at ser tolervel, porm no se detecta urgncia em ampliar referido regime s reas da sade e educao, consolidando situao que, para alguns, flagrantemente inconstitucional.

    A mesma presso exercida para aprovao do RDC no Poder Legislativo agora se volta ao Judicirio, que passar a ser o foco das atenes no julgamento

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    das aes de inconstitucionalidade em trmite. Assim, o Poder Executivo, alm de se outorgar poderes desproporcionais de deciso com o RDC, aprovado no Legislativo por meio de estratgia juridicamente duvidosa, conta com a presso dos meios de comunicao, reforada pela proximidade dos eventos para aprovao desses atos perante o Supremo, forando uma deciso poltica que mais uma vez beneficie o governo, sob pena do Poder Judicirio se tornar o grande vilo dos eventos esportivos.

    Cumpre ressaltar que, se a exiguidade dos prazos foi um dos argumentos favorveis utilizao do RDC para instalao e ampliao de infraestrutura necessria para o desenvolvimento das atividades esportivas, nem todas as obras estaro acabadas at os eventos, o que traz questionamentos acerca da possibilidade de aplicao do RDC para projetos que, embora aproveitem as competies, no estaro completamente concludos at l.

    Esse tema foi objeto de anlise pelo TCU no Processo n 038.038/2011, DOU 06/06/2012, no qual o rgo apreciou auditoria concernente execuo das obras e dos servios de engenharia para reforma, ampliao e modernizao do Terminal de Passageiros, adequao do sistema virio de acesso e ampliao do ptio de aeronaves para o Aeroporto Pinto Martins, em Fortaleza/CE, ao que se insere no esforo para a realizao da Copa do Mundo de 2014. Chamou ateno o fato de que a vigncia do contrato, de 47 meses, ultrapassa o referido evento.

    Adotou-se o posicionamento de que a utilizao do RDC em obras com trmino posterior Copa do Mundo de 2014 ou s Olimpadas de 2016, conforme o caso, ser legtima nas situaes em que ao menos frao do empreendimento tenha efetivo proveito para a realizao desses megaeventos esportivos, cumulativamente com a necessidade de se demonstrar a inviabilidade tcnica e econmica do parcelamento das fraes da empreitada a serem concludas a posteriori. Ou seja, mais uma vez se estende o mbito de incidncia do RDC.

    Se o regime continuar a ser aplicado, cabe agora ao STF decidir. As consequncias econmicas de sua utilizao s sero conhecidas aps o evento, com a divulgao dos custos, quando se saber o quanto se ultrapassou da previso oramentria inicial. J a reformulao da Lei de Licitaes, que

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    dever decorrer de projeto de lei especfico, continua em andamento. Com base nos inmeros projetos de lei que tramitam na Cmara, o

    deputado federal Fbio Trad (PMDB-MS) apresentou, em 17 de dezembro de 2012, ponto substitutivo que altera significativamente a Lei 8.666/93, tentando alcanar um meio-termo entre o RDC e a mencionada Lei de Licitaes, cujo texto incorpora alguns dos dispositivos do novo regime, exceto o da contratao integrada4 .

    A despeito das controvrsias sobre a inteno do RDC e de sua constitucionalidade, algumas de suas prticas atendem aos anseios no campo das contrataes e licitaes, dotando-os de mais celeridade e eficincia, ampliando a competio, com diminuio de formalidades desnecessrias e a utilizao de tecnologia.

    No se pode negligenciar a necessidade de uma nova legislao sobre licitaes do Brasil, que se adeque realidade do Pas, mas, de fato, nem a aplicao do RDC, nem a de uma futura lei de licitaes poder prescindir de uma atuao menos amadora por parte dos administradores pblicos, com aplicao das melhores prticas de gesto, em especial as de execuo oramentria.

    Neste sentido, espera-se que as discusses que se iniciaram para melhoria dos procedimentos para contrataes na Administrao Pblica sirvam como patamar inicial para mudana efetiva da Lei de Licitaes, mas sobretudo espera-se sua aplicao por um gestor bem preparado e comprometido com o interesse pblico, bem como uma efetiva fiscalizao por parte dos rgos de controle.

    4 Conforme matria veiculada no site do Instituto Certame, o deputado Na elaborao do texto, teve acompanhamento do Instituto Brasileiro de Estudos Jurdicos da Infraestrutura (Ibeji), ligado PUC-SP. Do RDC, o que absorvi mais o conceito de agilidade dos certames e a simplificao dos procedimentos e a questo da sustentabilidade. Da Lei de Licitaes, mantive a criminalizao para os desvios, as clusulas sociais; reforamos o princpio da impessoalidade, eficincia, moralidade e inclumos os da proporcionalidade e da razoabilidade. Disponvel em . Acesso em 25 mar. 2013.

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