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Aneurisma extracraniano de artéria carótida interna 1) Cirurgião de Cabeça e Pescoço do Hospital São Marcos e Professor da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Curso de Medicina da Universidade Estadual do Piauí – UESPI. 2) Acadêmico do Curso de Medicina da Universidade Estadual do Piauí – UESPI. 3) Acadêmico do Curso de Medicina da Universidade Federal do Piauí – UFPI. 4) Neurocirurgião com especialização em Cirurgia Endovascular do Hospital São Marcos. 5) Cirurgião Vascular do Hospital São Marcos. Instituição: Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital São Marcos, Teresina, PI. Correspondência: Germano Pinho de Moraes, Rua Desembargador Pires de Castro, 380/Sul; Edifício Centro Médico Dirceu Arcoverde, sala 206 - 64001-390 Teresina, PI. E-mail: [email protected] Relato de Caso Extracranial aneurysm of the internal carotid artery RESUMO ABSTRACT Aneurisma extracraniano de artéria carótida interna é um evento incomum, podendo produzir complicações neurológicas graves. Relata-se um caso de um paciente do gênero feminino com 51 anos de idade que apresentou massa pulsátil e semifixa em região cervical esquerda nível II, que revelou ser um aneurisma extracra- niano de carótida interna, sendo submetida ao tratamento cirúrgico. Descritores: aneurisma; doenças das artérias carótidas; artéria carótida interna extracraniana. Extracranial aneurysm of the internal carotid artery is an unusual event that can produce neurological complications. We report a case of a 51-year-old female patient who presented a pulsate and partially fixed mass in left cervical region level II, that unveil to be an aneurysm extracranial of internal carotid artery; undergoing the surgery treatment. Key words: aneurysm; carotid artery diseases; extracranial internal carotid artery. Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 36, nº 2, p. 118 - 120, abril / maio / junho 2007 118 1 Germano Pinho de Moraes 2 Caio Alcobaça Marcondes 3 Mariana Paiva Sousa 2 Antonio Fortes Rodrigues 4 Benjamim Pessoa Vale 5 Marcos Conde Medeiros 3 Alan Pinho Sobral . INTRODUÇÃO Aneurisma extracraniano de artéria carótida interna é uma 1-2 doença incomum . Sua exata incidência não está ainda bem definida. Tem sido estimado um percentual variável entre 3 0,4% e 4,0% entre todos os aneurismas periféricos . Em virtude disso, os detalhes referentes à sua etiologia, localiza- ções mais comuns, história natural, sintomas iniciais e tratamento não podem ser derivados da experiência de nenhum cirurgião individualmente. Ao invés, deve-se recorrer a revisões dos casos relatados para obter essas informações. Os autores relatam o caso de um paciente com aneurisma gigante em artéria carótida interna. RELATO DE CASO Paciente de 51anos, gênero feminino, caucasiana, deu entrada no Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital São Marcos com abaulamento na região cervical, referindo história de odinofagia progressiva há dois anos e dor em face lateral esquerda do pescoço, procurando diversos serviços médicos sem sucesso terapêutico. Negava sintomas neurológicos, hipertensão arterial, diabetes mellitus, hábitos tabagistas e trauma na região. Ao exame físico, observou-se lesão nodular cervical esquerda em nível II de 4cm pulsátil e semifixa. Foi realizada tomografia computadorizada do crânio, evidencian- do-se formação aneurismática relacionada à artéria carótida externa esquerda, medindo 4,5 x 3,3 x 3,3cm (figura 1), com efeito de massa, expandindo-se na fossa infratemporal e na região parafaríngea esquerda. À arteriografia (figura 2) e à angiorressonância (figura 3), observou-se formação aneuris- mática gigante na artéria carótida interna esquerda no nível de sua origem. Figura 1 – Tomografia computadorizada mostrando aneurisma medindo 4,5 x 3,3 x 3,3cm. Figura 2 – Arteriografia evidenciando aneurisma em artéria carótida interna esquerda.

Relato de Caso - sbccp.org.br · teste diagnóstico definitivo, sendo utilizada no planejamento cirúrgico. No caso clínico, observou-se, na tomografia computa- ... A necessidade

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Aneurisma extracraniano de artéria carótida interna

1) Cirurgião de Cabeça e Pescoço do Hospital São Marcos e Professor da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Curso de Medicina da Universidade Estadual do Piauí – UESPI. 2) Acadêmico do Curso de Medicina da Universidade Estadual do Piauí – UESPI.3) Acadêmico do Curso de Medicina da Universidade Federal do Piauí – UFPI.4) Neurocirurgião com especialização em Cirurgia Endovascular do Hospital São Marcos.5) Cirurgião Vascular do Hospital São Marcos.

Instituição: Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital São Marcos, Teresina, PI.Correspondência: Germano Pinho de Moraes, Rua Desembargador Pires de Castro, 380/Sul; Edifício Centro Médico Dirceu Arcoverde, sala 206 - 64001-390 Teresina, PI. E-mail: [email protected]

Relato de Caso

Extracranial aneurysm of the internal carotid artery

RESUMO ABSTRACT

Aneurisma extracraniano de artéria carótida interna é um evento incomum, podendo produzir complicações neurológicas graves. Relata-se um caso de um paciente do gênero feminino com 51 anos de idade que apresentou massa pulsátil e semifixa em região cervical esquerda nível II, que revelou ser um aneurisma extracra-niano de carótida interna, sendo submetida ao tratamento cirúrgico.

Descritores: aneurisma; doenças das artérias carótidas; artéria carótida interna extracraniana.

Extracranial aneurysm of the internal carotid artery is an unusual event that can produce neurological complications. We report a case of a 51-year-old female patient who presented a pulsate and partially fixed mass in left cervical region level II, that unveil to be an aneurysm extracranial of internal carotid artery; undergoing the surgery treatment.

Key words: aneurysm; carotid artery diseases; extracranial internal carotid artery.

Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 36, nº 2, p. 118 - 120, abril / maio / junho 2007118

1Germano Pinho de Moraes2Caio Alcobaça Marcondes3Mariana Paiva Sousa2Antonio Fortes Rodrigues4Benjamim Pessoa Vale5Marcos Conde Medeiros

3Alan Pinho Sobral .

INTRODUÇÃO

Aneurisma extracraniano de artéria carótida interna é uma 1-2doença incomum . Sua exata incidência não está ainda bem

definida. Tem sido estimado um percentual variável entre 30,4% e 4,0% entre todos os aneurismas periféricos . Em

virtude disso, os detalhes referentes à sua etiologia, localiza-ções mais comuns, história natural, sintomas iniciais e tratamento não podem ser derivados da experiência de nenhum cirurgião individualmente. Ao invés, deve-se recorrer a revisões dos casos relatados para obter essas informações. Os autores relatam o caso de um paciente com aneurisma gigante em artéria carótida interna.

RELATO DE CASO

Paciente de 51anos, gênero feminino, caucasiana, deu entrada no Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital São Marcos com abaulamento na região cervical, referindo história de odinofagia progressiva há dois anos e dor em face lateral esquerda do pescoço, procurando diversos serviços médicos sem sucesso terapêutico. Negava sintomas neurológicos, hipertensão arterial, diabetes mellitus, hábitos tabagistas e trauma na região. Ao exame físico, observou-se lesão nodular cervical esquerda em nível II de 4cm pulsátil e semifixa. Foi realizada tomografia computadorizada do crânio, evidencian-do-se formação aneurismática relacionada à artéria carótida externa esquerda, medindo 4,5 x 3,3 x 3,3cm (figura 1), com efeito de massa, expandindo-se na fossa infratemporal e na região parafaríngea esquerda. À arteriografia (figura 2) e à angiorressonância (figura 3), observou-se formação aneuris-mática gigante na artéria carótida interna esquerda no nível de sua origem.

Figura 1 – Tomografia computadorizada mostrando aneurisma medindo 4,5 x 3,3 x 3,3cm.

Figura 2 – Arteriografia evidenciando aneurisma em artéria carótida interna esquerda.

Figura 3 – Angiorressonância indicando dilatação aneurismática em região cervical nível II.

A paciente submeteu-se, sob anestesia geral, a mandibuloto-mia no intuito de acessar a região aneurismática (figura 4), em seguida, implantou-se um shunt trans-operatório (Pruit Niahara) na artéria carótida interna esquerda (figura 5). Ressecou-se, então, o aneurisma, restabelecendo o fluxo arterial através de uma anastomose término-terminal na artéria carótida interna (figura 6). A mandíbula foi reduzida e fixada com placas de titânio ao final do procedimento. Após a cirurgia, a paciente evoluiu bem e não apresentou mais formação aneurismática na região cervical esquerda, sendo acompanha-da ambulatorialmente.

Figura 4 – Dilatação aneurismáica em região cervical nível II.

Figura 5 – Shunt trans-operatório de Pruit Niahara em artéria carótica interna.

Figura 6 – Anastomose término-terminal em artéria carótida interna.

DISCUSSÃO

Aneurisma arterial é definido como um alargamento permanen-te de uma artéria em mais de 50% do seu diâmetro esperado. Os aneurismas das artérias carótidas são considerados eventos extremamente raros, sendo classificados de acordo com a sua localização anatômica, morfologia e etiologia. Em relação a sua localização, é mais comumente encontrado na artéria carótida comum, especialmente em sua bifurcação. As partes média e distal da artéria carótida interna seguem-se pela ordem de freqüência. Os aneurismas da bifurcação são geralmente fusiformes quanto à classificação morfológica, enquanto aqueles localizados na artéria carótida interna são

1,4saculares . Em aproximadamente 50 a 70% dos casos, produzem complicações neurológicas graves. Outras vezes, rompem-se com hemorragia para os tecidos moles do pescoço

5,6podendo levar ao óbito .Em relação à etiologia, a aterosclerose é a causa mais comum (46-70%) sendo o trauma, o pós-operatório de operação

7carotídea e as arterites causas mais raras . O maior risco da presença do aneurisma carotídeo é a possibilidade de provocar ataque isquêmico transitório ou isquemia cerebral por embolia de trombo mural. Raramente os sintomas cerebrais são causados pela diminuição do fluxo através da artéria carótida secundariamente a sua compressão pela massa de um

1-2,5aneurisma sacular adjacente . A ruptura do aneurisma da carótida é um evento infreqüente, manifestando-se por uma hemorragia na orofaringe, canal auditivo ou nos tecidos moles,

1,6podendo levar o paciente ao óbito por sufocação .O quadro clínico do aneurisma extracraniano de carótida interna varia de acordo com sua localização e tamanho, podendo ser assintomático e detectado ao exame físico ou manifestar-se como uma massa pulsátil no pescoço associado a áreas doloridas e sensíveis. Ocasionalmente, um aneurisma carotídeo faz protrusão na orofaringe, podendo provocar desconforto por compressão, que se traduz em sintomas como disfagia e odinofagia, como no paciente em questão. Em alguns casos, poderá ainda apresentar-se como tumor assintomático

2,8na orofaringe .A ultra-sonografia com Doppler pode confirmar ou excluir a presença de um aneurisma. Aneurismas do terço distal da carótida interna podem não ser diagnosticado pelo método, devendo-se empregar a tomografia computadorizada ou

7ressonância nuclear magnética . A arteriografia continua a ser o teste diagnóstico definitivo, sendo utilizada no planejamento cirúrgico. No caso clínico, observou-se, na tomografia computa-dorizada da região cervical, uma formação aneurismática em artéria carótida externa; contudo, na angiorressonância nuclear magnética, foi evidenciado um aneurisma em artéria carótida interna, sendo confirmado pela arteriografia.A presença de linfonodos aumentados, cisto braquial, tumores do corpo carotídeo ou outras massas que se situam em posição sobrejacente e transmitem o pulso carotídeo fazem parte do

1diagnóstico diferencial de um aneurisma de carótida interna .O tratamento cirúrgico consiste na exérese da formação aneurismática e reconstrução arterial ou através de anastomo-se término-terminal, como no paciente em questão ou com

7interposição de veia ou de prótese . A necessidade de uma derivação temporária deve ser identificada através de um eletroencefalograma, mediadas da pressão no coto ou garroteamento-teste da artéria carótida, com uso de anestesia regional, a fim de evitar complicações neurológicas. No paciente, foi utilizado um shunt trans-operatório (Pruit Niahara) na artéria carótida interna, com a finalidade de evitar uma baixa perfusão cerebral, prevenindo seqüelas neurológicas irreversí-veis. Quando usadas essas técnicas, juntamente com a anticoagulação por heparina intra-operatória e procedimentos anestésicos modernos, a mortalidade e os déficits neurológicos

9,10reduzem-se consideravelmente .A historia natural da doença geralmente é desfavorável e

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condiciona complicações significantes, que podem ser evidenciadas por ruptura do aneurisma, embolia cerebral, trombose ou expansão sobre estruturas adjacentes com sintomas de compressão. Embora o tratamento cirúrgico esteja associado a certo grau de morbidade, o tratamento não cirúrgico pode levar a um risco maior de complicações, sendo proscrito, exceto em paciente com risco cirúrgico proibitivo. A terapêutica deve ser individualizada visando prevenir seqüelas neurológicas.

REFERÊNCIAS

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