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RESISTÊNCIA URBANA - MANIFESTO SOBRE OS MEGAEVENTOS ESPORTIVOS COPA DO MUNDO 2014 E JOGOS OLÍMPICOS 2016 Resistência Urbana é uma frente de movimentos populares presente na maioria dos estados brasileiros. Nosso compromisso é trabalhar para organizar vários setores de nossa sociedade, lutar por nossos direitos e, no longo prazo, construir o que denominamos poder popular. A vida só vai mudar de verdade quando o povo tomar a direção de seu destino e não permitir mais que uma pequena elite se beneficie do trabalho que é todos. Mais uma vez, estamos promovendo esta Jornada Nacional de Lutas. O foco de nosso protesto são os chamados megaeventos esportivos: a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, no Rio de Janeiro. A propaganda oficial, a euforia dos empresá- rios e a falta de informações sistematizadas na mídia faz que boa parte do povo brasileiro pense que esses eventos esportivos serão bons para o país, que elevarão a imagem do Brasil no exterior, que vão trazer centenas de milhares de turistas que aqui vão gastar milhões de dólares. Em suma, muitos acham que a Copa e as Olimpíadas vão beneficiar o povo como um todo. Infelizmente, isso não é verdade. O número de beneficiados é muito pequeno. Inclui a classe política dirigente do país, alguns setores do grande capital nacional (redes de comunicação e empreiteiras, por exemplo), os cartolas de certos clubes, a Fifa e um punhado de empresas transnacionais, patrocinadoras dos eventos. O número de prejudicados, porém, é imenso. Perdem, em primeiro lugar, as dezenas de milhares de famílias diretamente afetadas pelos despejos e remoções realizadas em nome de obras viárias e de infraestrutura ou construções e reformas de estádios. O propalado programa habitacional do governo federal, com o sugestivo nome de Minha casa, minha vida tem um desempenho muito pior do que geralmente esse divulga. Da meta de construção de 1 milhão de casas, apenas 400 mil se referiam à população que ganha até três salários mínimos, e que corresponde a cerca de 90% do chamado déficit habitacional, ou seja, o número dos que não têm moradia digna, hoje na casa dos 7 milhões de famílias. A meta do Minha casa, minha vida é, portanto, tímida. E simplesmente não tem sido atingida. Do total prometido, pouco menos de metade foi efetivamente entregue, até agora, mesmo passado mais de um ano do prazo prometido. Isso para não falar que se trata de casas muito pequenas (em geral, 32 m 2 ), que devem ser pagas por 25 anos, sem terreno para expansão futura, localizadas em áreas muito distantes, em geral sem infraestrutura, isto é, sem asfalto, sem transporte, sem escolas, creches ou postos de saúde. E os megaeventos esportivos agravam o quadro, pois despejam famílias das áreas consideradas “nobres”, num processo que chamamos de higienização social. Perdem os torcedores de futebol. Muita gente parece supor que poderá acompanhar os jogos nos estádios, mas, durante a Copa ou as Olimpíadas, como se sabe, os ingressos, mesmo nos jogos menos importantes das fases classificatórias, não custarão menos do que R$ 700 ou R$ 1 mil. Essa lógica elitista deve, inclusive, se manter após as competições, pois os estádios novos ou reformados terão seu custo de manutenção elevado e, consequentemente, passarão a cobrar entradas bem mais caras. Perde a população usuária dos serviços públicos, como a saúde e educação. Quando pedimos mais e melhores escolas ou postos de saúde, por exemplo, a resposta-padrão é que “não há verbas”. Agora, o cinismo dessa atitude fica mais claro do que nunca. Para melhorar a vida das pessoas, para dar acesso digno aos direitos garantidos pela Constituição, para construir a cidadania o Estado jamais tem dinheiro. Mas para erguer estádios que chegam a custar R$ 1 bilhão, para reformar aeroportos que servirão a relativamente poucas pessoas, para transferir bilhões de reais a grandes empreiteiras de obras públicas, para emprestar enormes somas a grandes empresas, bem, aí o dinheiro aparece.

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RESISTÊNCIA URBANA - MANIFESTO SOBRE OS MEGAEVENTOS ESPORTIVOS

COPA DO MUNDO 2014 E JOGOS OLÍMPICOS 2016

Resistência Urbana é uma frente de

movimentos populares presente na maioria dos

estados brasileiros. Nosso compromisso é

trabalhar para organizar vários setores de nossa

sociedade, lutar por nossos direitos e, no longo

prazo, construir o que denominamos poder

popular. A vida só vai mudar de verdade quando

o povo tomar a direção de seu destino e não

permitir mais que uma pequena elite se beneficie

do trabalho que é todos.

Mais uma vez, estamos promovendo esta

Jornada Nacional de Lutas. O foco de nosso

protesto são os chamados megaeventos

esportivos: a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos

Olímpicos de 2016, no Rio de Janeiro.

A propaganda oficial, a euforia dos empresá-

rios e a falta de informações sistematizadas na

mídia faz que boa parte do povo brasileiro pense

que esses eventos esportivos serão bons para o

país, que elevarão a imagem do Brasil no

exterior, que vão trazer centenas de milhares de

turistas que aqui vão gastar milhões de dólares.

Em suma, muitos acham que a Copa e as

Olimpíadas vão beneficiar o povo como um todo.

Infelizmente, isso não é verdade. O número

de beneficiados é muito pequeno. Inclui a classe

política dirigente do país, alguns setores do

grande capital nacional (redes de comunicação e

empreiteiras, por exemplo), os cartolas de certos

clubes, a Fifa e um punhado de empresas

transnacionais, patrocinadoras dos eventos.

O número de prejudicados, porém, é imenso.

Perdem, em primeiro lugar, as dezenas de

milhares de famílias diretamente afetadas pelos

despejos e remoções realizadas em nome de

obras viárias e de infraestrutura ou construções e

reformas de estádios. O propalado programa

habitacional do governo federal, com o sugestivo

nome de Minha casa, minha vida tem um

desempenho muito pior do que geralmente esse

divulga. Da meta de construção de 1 milhão de

casas, apenas 400 mil se referiam à população

que ganha até três salários mínimos, e que

corresponde a cerca de 90% do chamado déficit

habitacional, ou seja, o número dos que não têm

moradia digna, hoje na casa dos 7 milhões de

famílias. A meta do Minha casa, minha vida é,

portanto, tímida. E simplesmente não tem sido

atingida. Do total prometido, pouco menos de

metade foi efetivamente entregue, até agora,

mesmo passado mais de um ano do prazo

prometido. Isso para não falar que se trata de

casas muito pequenas (em geral, 32 m2), que

devem ser pagas por 25 anos, sem terreno para

expansão futura, localizadas em áreas muito

distantes, em geral sem infraestrutura, isto é,

sem asfalto, sem transporte, sem escolas,

creches ou postos de saúde. E os megaeventos

esportivos agravam o quadro, pois despejam

famílias das áreas consideradas “nobres”, num

processo que chamamos de higienização social.

Perdem os torcedores de futebol. Muita gente

parece supor que poderá acompanhar os jogos

nos estádios, mas, durante a Copa ou as

Olimpíadas, como se sabe, os ingressos, mesmo

nos jogos menos importantes das fases

classificatórias, não custarão menos do que R$

700 ou R$ 1 mil. Essa lógica elitista deve,

inclusive, se manter após as competições, pois

os estádios novos ou reformados terão seu custo

de manutenção elevado e, consequentemente,

passarão a cobrar entradas bem mais caras.

Perde a população usuária dos serviços

públicos, como a saúde e educação. Quando

pedimos mais e melhores escolas ou postos de

saúde, por exemplo, a resposta-padrão é que

“não há verbas”. Agora, o cinismo dessa atitude

fica mais claro do que nunca. Para melhorar a

vida das pessoas, para dar acesso digno aos

direitos garantidos pela Constituição, para

construir a cidadania o Estado jamais tem

dinheiro. Mas para erguer estádios que chegam a

custar R$ 1 bilhão, para reformar aeroportos que

servirão a relativamente poucas pessoas, para

transferir bilhões de reais a grandes empreiteiras

de obras públicas, para emprestar enormes

somas a grandes empresas, bem, aí o dinheiro

aparece.

Perdem os que pagam impostos. No Brasil, é

preciso lembrar, a maior parte dos imposto está

embutido em todos os produtos que compramos,

inclusive os de primeira necessidade, como

alimentos ou produtos de higiene e limpeza. Em

nosso país, aliás, os ricos, apesar de reclamarem

muito, praticamente não pagam impostos, seja

porque os repassam para o consumidor, seja

pela simples sonegação. Agora, como se não

bastasse que o dinheiro dos impostos seja

investido sem qualquer prioridade, assistimos o

governo concedendo isenção tributária às

empresas envolvidas com a Copa. Isso significa,

simplesmente, que essas empresas não

precisarão recolher impostos sobre os lucros que

obtiverem com a competição. Por que o povo,

que trabalho duro e ganha pouco, paga tanto

imposto e o grande capital nacional e trans-

nacional fica isento?

Perdem, enfim, todos os brasileiros. Um dos

maiores bens de um país é a sua independência,

a sua soberania. Nenhuma nação quer ser

dominada por outra. Mas a chamada Lei Geral da

Copa concede à Fifa algumas prerrogativas

aviltantes, que fazem do Brasil um país ainda

mais subordinado aos interesses do capital

estrangeiro. Durante a Copa, nas áreas em que

ocorrem os jogos serão montados tribunais

especiais, verdadeiros tribunais de exceção, que

julgarão alegados crimes que ocorrerem no

entorno dos estádios, o que inclui até a venda de

bebidas ou produtos alimentícios não autoriza-

dos. Serão julgamentos muito rápidos (julga-

mentos sumários), com restrito direito de defesa.

Ao aceitar essas imposições, os governantes

brasileiros passam ao mundo, não a imagem de

um país dinâmico e moderno, mas do velho país

subordinado e governado por uma elite mesqui-

nha e antipopular.

Por tudo isso, o Resistência Urbana, frente

nacional de movimentos populares, protesta

contra os megaeventos esportivos e reivindica

que as necessidades da população venham antes

dos interesses do grande capital.

Confira dez pontos para refletir sobre a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016.

1. Despejos - As obras dos megaeventos levam a grande número de despejos violentos sem

compensação às famílias removidas.

2. Obras: dinheiro público, lucros privados - Apesar de atenderem a interesses privados, as

obras feitas para os megaeventos recebem enormes quantias de dinheiro público.

3. O exemplo do Pan 2007 - No Pan de 2007, no RJ, as obras custaram 10 vezes mais que o

planejado e aumentaram a repressão, como as dezenas de mortes no Complexo do Alemão.

4. No resto do mundo também não deu certo - Os megaeventos sempre causaram

prejuízos. Em Montreal, 1976, produziram dívidas que duram até hoje. As Olimpíadas de 2004 estão

entre as causas da crise na Grécia. A África do Sul passa, hoje, por crise advinda da Copa de 2010.

5. Quem manda no Brasil é a FIFA? - Para sediar uma Copa do Mundo, o país deve abrir

mão de sua soberania, permitindo que a FIFA influa nos impostos, nas licitações e até nas leis do país.

6. Futebol agora é coisa da elite? - Os ingressos para a Copa de 2014 serão caríssimos,

proibitivos para quase todo do povo. É mais um passo no caminho da elitização do futebol brasileiro.

7. Quem são as marcas que mandam na Fifa - As marcas que dominam os megaeventos

são constantemente envolvidas em escândalos financeiros e denúncias de superexploração no Terceiro

Mundo.

8. Cidades não são marcas de negócio - Os megaeventos esportivos induzem as cidades a

se agirem como um produto do mercado mundial, geridas pelos negócios e não pelo interesse da

população.

9. A quem serve a cidade? - O planejamento da cidade fica submetido, à lógica da

competição esportiva, que dura semanas, mas determina como a cidade será por várias décadas.

10. Como se deve gastar o dinheiro do povo? - Dinheiro para a Saúde, a Educação, a

Moradia… dizem sempre que não tem. É justo, então, gastar com eventos que beneficiam tão poucas

pessoas?