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1 Revista ATUAÇÃO | Março 2014 | EDIÇÃO 09 | MARÇO 2014 UMA PUBLICAÇÃO DA FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO DE MATO GROSSO DO SUL Pág. 10

Revista Atuação - Edição 9 - Março de 2014

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Revista Atuação, uma publicação da Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul (FETEMS). Redação e Produção:Íris Comunicação Integrada; Diretora de Criação: Nanci Silva; Diretor de arte: Ivan Cardeal Nunes; Jornalista responsável e editora: Laura Samudio Chudecki (DRT-MS 242); Revisão: Vanda Escalante (DRT-159) e Greice Maciel; Colaboraram nesta edição: Vanda Escalante e Dani Reis; Fotos: Wilson Jr.; Dani Reis, Betinho Escalante; Rua Chafica Fatuche Abussafi, 200; Vila Nascente - CEP 79036-112; Campo Grande; Mato Grosso do Sul; Brasil

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EDIÇÃO 09 | MARÇO 2014UMA PUBLICAÇÃO DA FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORESEM EDUCAÇÃO DE MATO GROSSO DO SUL

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EXPEDIENTE

Redação e Produção Íris Comunicação IntegradaRua Chafica Fatuche Abussafi, 200Parque dos Poderes - 79036-112Campo Grande/MS+ 55 67 3025.6466

Diretora de criação: Nanci SilvaDiretor de arte: Ivan Cardeal NunesJornalista responsável e editora: Laura Samudio Chudecki (DRT-MS 242)

Revisão: Vanda Escalante (DRT-MS 159) e Greice MacielColaboraram nesta ediçãoVanda EscalanteDani Reis

FotosWilson Jr.Dani ReisBetinho Escalante

Os textos assinados são de responsabilidade dos autores e não representam, necessariamente, a opinião da revista.

WWW.FETEMS.ORG.BRRua 26 de Agosto, 2.296, Bairro Amambaí. Campo Grande - MS

CEP 79005-030. Fone: (67) 3382.0036. E-mail: [email protected]

DiretoriaPresidente: Roberto Magno Botareli Cesar Vice-Presidente: Elaine Aparecida Sá CostaSecretária-Geral: Deumeires Batista de Souza Secretária-Adjunta: Maria Ildonei de Lima Pedra Secretário de Finanças: Jaime Teixeira Sec. Adjunto de Finanças: José Remijo Perecin Sec. de Assuntos Jurídicos: Amarildo do Prado Sec. de Formação Sindical: Joaquim Donizete de Matos Sec. de Assuntos Educacionais: Edevagno P. da Silva Sec. dos Funcionários Administrativos: Idalina da Silva Sec. de Comunicação Social: Ademir Cerri Sec. de Administração e Patrimônio: Wilds Ovando Pereira Sec. de Políticas Municipais: Ademar Plácido da Rosa Sec. dos Aposentados e Assuntos Previdenciários: José Felix Filho Sec. de Políticas Sociais: Iara G. Cuellar Sec. dos Especialistas em Educação e Coord. Pedagógica: Sueli Veiga Melo Dep. dos Trabalhadores em Educação em Assent. Rurais: Rodney C. da Silva Ferreira Dep. dos Trabalhadores em Educação Antirracismo: Edson Granato Dep. da Mulher Trabalhadora: Leuslania C. de Matos

Vice-presidentes regionais: Amambai: Humberto Vilhalva; Aquidauana: Francisco Tavares da Câmara; Campo Grande: Paulo César Lima; Corumbá: Raul Nunes Delgado; Coxim: Thereza Cristina Ferreira Pedro; Dourados: Admir Candido da Silva; Fátima do Sul: Manoel Messias Viveiros; Jardim: André Luiz M. de Mattos; Naviraí: Nelfitali Ferreira de Assis; Nova Andradina: Maurício dos Santos; Paranaíba: Sebastião Serafim Garcia; Ponta Porã: Vitória Elfrida Antunes; Três Lagoas: Maria Aparecida Diogo

Delegados de base à CNTE: Jardim: Sandra Luiza da Silva; São Gabriel do Oeste: Marcos Antonio Paz da Silveira; Costa Rica: Rosely Cruz Machado

Conselho Fiscal da FETEMS: Fátima do Sul: Adair Luis Antoniete; Naviraí: José Luis dos Santos; Dourados: Nilson Francisco da Silva; Miranda: Robelsi Pereira

Assessoria de Imprensa da FETEMS: Karina Vilas Boas

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Escola Pantaneira .............................................................................................................................36

Por meio de várias ações, o Acaia Pantanal conjuga educação, proteção e desenvolvimento ambiental nas comunidades ribeirinhas de Corumbá

Capa ......................................................................................................................................................10

Fruto da luta e da perseverança de quem sempre acreditou na educação, a FETEMS comemora 35 anos num cenário de boas histórias e grandes conquistas

DESTAQUES

Política ....................................................................................................................................................7

A FETEMS e seus sindicatos afiliados estão engajados na campanha do Plebiscito Popular por uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político

Cultura ..................................................................................................................................................46

Ícone da cultura sul-mato-grossense, a cantora Delinha, aos 77 anos, ainda embala gerações de fãs

Mulher ..............................................................................................................................40

Mesmo com a Lei Maria da Penha, a violência contra a mulher continua aumentando. Autoridades afirmam que a maior arma nesse combate é a informação

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EDITORIAL

Tempo de comemorar, hora de refletir

A Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul (FETEMS) completa 35 anos de existência. É uma história de lutas e desafios, de vitórias e conquistas, de muito aprendizado. Ao longo da caminhada, encontramos muitos companheiros e companheiras de valor, que ousaram acreditar numa educação melhor, para construir uma sociedade melhor. Muitos permanecem conosco, outros já se foram. A todos eles, nossa gratidão e nossa homenagem.

Ao longo desse tempo, também encontramos vários desafios e, sem medo, conseguimos superar a maioria deles, transformando os obstáculos do caminho em oportunidades de melhora e crescimento. Agregamos forças, aprendemos que a organização é a melhor estratégia para alcançar objetivos comuns, entendemos que a ação política é parte necessária e essencial à vida sindical.

Crescemos em número de filiados, ampliamos a base, articulamos entendimentos, ganhamos respeito, conquistamos reconhecimento e valorização profissional. No entanto, e apesar de tantas importantes vitórias, a Educação Pública ainda tem grandes problemas a superar, e nós, educadores, a cada dia temos novos desafios nessa luta incansável pela educação de qualidade, uma educação cidadã e igualitária.

Ao comemorar os 35 anos da FETEMS, ao olhar para trás e ver o quanto já avançamos, devemos também centrar foco nos desafios do presente, para continuar aprimorando nosso fazer de educadores, nosso interminável ensinar e aprender. A realidade nos impõe novas questões, que precisam de posicionamento e reflexão, não apenas na relação com os estudantes, os pais e a comunidade, mas também nas relações de trabalho, com os colegas de escola, com os companheiros e companheiras da luta sindical, com os representantes do poder público.

Nesta edição comemorativa, a revista Atuação traz, mais uma vez, grandes temas para debate e reflexão, como a crescente violência contra a mulher, os desafios de manter uma escola no meio do Pantanal, as transformações no tradicional modelo escolar retratadas no cotidiano do Educandário Getúlio Vargas, em Campo Grande, e também traços importantes da cultura sul-mato-grossense, como as histórias da cantora Delinha, que, inclusive, está virando personagem de cinema.

Nossa revista, assim como a própria FETEMS, é feita para você, com a sua participação. Colabore, mande sua sugestão ou opinião. E aproveite a leitura.

Roberto Magno Botareli CesarPresidente da Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul

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POLÍTICA

Movimentos sociais vêm se articulando para realizarplebiscito por uma ConstituinteExclusiva e Soberana do Sistema Político

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No mês de junho de 2013, o Brasil, interna-cionalmente conheci-

do pela grandiosidade do Car-naval, pelo drible do futebol, praias paradisíacas, sol, calor, e por ser habitado por um povo brando e pacífico, ganhou as manchetes dos principais jor-nais estrangeiros. O motivo: os brasileiros resolveram tomar as ruas, movidos pela insatisfação com os rumos e resultados em setores essenciais, como educa-ção, saúde, transporte, moradia e segurança.

A capa do New York Times, do dia 19 de junho, trazia o títu-lo “Protestos crescem enquanto brasileiros culpam seus líderes”. A reportagem, que começava na primeira página do jornal ameri-cano, exibia uma foto de um fla-grante de abuso policial ocorri-do na cidade do Rio de Janeiro. Um policial militar lançava, de uma distância mínima, spray de pimenta no rosto de uma mani-festante. E assim, mundo afora, os meios de comunicação trans-mitiam a confusão.

O estopim que deu vazão à onda de protestos foi o aumento das tarifas de transportes públi-cos em diversas capitais brasi-leiras. Os milhões que saíram às ruas contestaram os preços das tarifas e reivindicaram melhores condições na saúde, educação de qualidade, transparência na gestão pública, reforma agrária e urbana, combate à corrupção etc.. A situação revelou um abis-mo entre o povo e os poderes que regem o país. Executivo, Legislativo e Judiciário ficaram com a imagem profundamente abalada.

Plebiscito

Diante do caos, entidades, movimentos sociais e a própria presidente Dilma Rousseff pro-puseram um Plebiscito Popu-lar, por uma Assembleia Cons-

tituinte, com poder soberano para mudar o Sistema Político Brasileiro e exclusivamente elei-ta para esse fim. Somente com a mudança do Sistema Político será possível atender as reivin-dicações exaltadas durante as manifestações de 2013.

É importante esclarecer que, no Brasil, apenas o Congres-so Nacional pode convocar um plebiscito, que é uma consulta na qual os cidadãos e as cidadãs votam para aprovar ou não uma questão. Como o Congresso não deve “abrir seus ouvidos” à voz das ruas, a alternativa é a or-ganização de um Plebiscito Po-pular para saber se a população está de acordo com a forma-ção ou não de uma Assembleia Constituinte Exclusiva.

Em setembro de 2013, a Ple-nária Nacional dos Movimentos Sociais se reuniu e aprovou a realização do Plebiscito Popu-lar pela Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político. A Plenária também definiu que a pergunta será única: “Você é a favor de uma constituinte exclu-siva e soberana sobre o sistema político?”

Até lá, há muito trabalho pela frente. Uma luta que contribuirá decisivamente para a democra-tização do Brasil.

Expectativa

A expectativa é de que a As-sembleia Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político sirva para melhorar a vida da população brasileira. Com um novo sistema político, mais par-ticipativo, será possível buscar mudanças que no passado não foram feitas, como as reformas agrária, urbana, tributária e ou-tras, que assegurem a igualdade de direitos econômicos, sociais e civis.

Para que a Assembleia Cons-tituinte Exclusiva aconteça é preciso que a sociedade brasi-

Assembleia Nacional Constituinte é a realização de uma assembleia de re-presentantes eleitos pelo povo para modificar a eco-nomia e a política do país e definir as regras, insti-tuições e o funcionamen-to das instituições de um Estado, como o Governo, o Congresso e o Judiciário. Suas decisões resultam em uma Constituição. A Cons-tituição brasileira atual é de 1988.

Assembleia Nacional Constituinte

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leira esteja mobilizada e infor-mada sobre a importância de uma reforma política no país. Para isso, movimentos e enti-dades sociais vêm se articulan-do para esclarecer a população a respeito da realização desses dois processos (plebiscito e constituinte).

FETEMS

A Federação dos Trabalha-dores em Educação de Mato Grosso do Sul (FETEMS), maior entidade sindical do estado, esteve presente nas manifesta-ções de 2013. No dia 11 de julho, a FETEMS e demais entidades marcharam em defesa da clas-se trabalhadora e reivindicaram o fim do fator previdenciário; reajuste digno para os aposen-tados; jornada de 40 horas se-manais, sem redução salarial; transporte público de quali-dade, fim do Projeto de Lei nº 4.330, que amplia a terceiri-zação; reforma agrária; fim dos leilões do petróleo; mais recursos para educação e saúde; piso salarial nacional e carreira; plano nacional de educação; profissionalização dos funcionários da educa-ção.

Agora, a FETEMS está engajada na campanha do Ple-biscito Popular por uma Assembleia Constituinte Ex-clusiva e Sobe-rana do Siste-ma Político. Por meio dos sindi-catos afi-liados, está também cole-tando assinaturas em prol da realiza-ção do plebiscito.

No final de janeiro, a FETEMS e os demais movimentos sociais e sin-

Na proposta de uma Constituinte Exclusiva, os representantes eleitos exercerão exclusivamente o poder soberano de defi-nir politicamente o Estado brasileiro, consultando de forma criativa a cidadania, e retornarão à vida de ci-dadãos e cidadãs, iguais aos demais, ao término desse processo.

Assembleia Constituinte Exclusiva

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dicais estiveram reunidos para o lançamento da campanha. Se-gundo o secretário de finanças da Federação, Jaime Teixeira, o Plebiscito Popular permite que os brasileiros expressem suas reais necessidades e pressio-nem o poder público para aten-dê-los. “Queremos um sistema político participativo que, de fato, atenda o povo”, comenta.

Atiliana Brunetto, dirigente do Movimento dos Trabalhado-res Rurais Sem Terra (MST/MS), que também integra a organiza-ção do Plebiscito Popular no es-tado, compartilha dessa opinião. Para ela, o Brasil só será efeti-vamente democrático quando o sistema político mudar. “Somen-te através da mudança será pos-sível resolver os problemas que afligem o país”, afirma.

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CAPA

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Na década de 1970, nas-ce, junto com Mato Grosso do Sul, um mo-

vimento sindical de vanguarda, organizado pelos professores que lecionavam na rede públi-ca de ensino do novo estado. Era o princípio de um ideal, que se transformou em lutas, que se transformaram em direitos e conquistas. A Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul (FETEMS) é fruto da ousadia e da perse-verança de homens e mulheres que acreditaram que a educa-ção é capaz de transformar a sociedade.

“Quando o movimento come-çou, nós não tínhamos nada. Só tínhamos a cara e a coragem de fazer acontecer. Éramos muito jovens. Mas, acho que tinha que ser assim mesmo, sem medo e com muita ousadia. A gente era até mal visto, ninguém queria nos receber. Professor, e ain-da sindicalista, não tinha crédi-to em lugar nenhum”, conta o professor e atual secretário de comunicação da FETEMS, Ade-mir Cerri, que participa do mo-vimento da Educação no estado desde o começo.

As primeiras reuniões sindi-cais tinham que ser discretas, pois o país ainda sentia a re-pressão da ditadura militar. Na década de 1980, havia muito a fazer. O tempo era de mudan-ças e desafios, e a categoria da Educação lutava em defesa dos interesses dos trabalhado-res. A Educação era precária em todos os sentidos, não havia condições estruturais, faltavam escolas, não existia concurso público, não havia uma carreira estabelecida. Na pauta de rei-vindicações, junto com as ques-tões salariais, sempre esteve a luta por uma educação de qua-lidade, bem como pela valori-zação profissional da categoria, tanto professores quanto admi-nistrativos.

Diante das dificuldades, o jei-to era ir à luta e tentar mudar as coisas. Foi o que fizeram os jovens que compunham o movi-mento sindical da Educação de Mato Grosso do Sul.

A mobilização dos trabalha-dores em Educação era feita boca a boca, de cidade em ci-dade. Tudo era longe, as estra-das eram ruins. Mesmo assim, as reuniões aconteciam. O re-sultado do esforço coletivo foi a fundação da Federação dos Professores de Mato Grosso do Sul (FEPROSUL), em 3 de março de 1979.

A Federação dos Trabalhado-res em Educação de Mato Gros-so do Sul (FETEMS) veio dez anos depois, em 1989, quando a entidade se filiou à Central Única dos Trabalhadores (CUT) duran-te o Congresso Estadual realiza-do no município de Amambai. Naquele momento aconteceu também a unificação da carrei-ra: professores e funcionários administrativos de escolas pas-saram a ser reconhecidos como tralhadores em Educação, e as associações passaram a ser cha-madas de sindicatos.

“Participei do momento mais difícil do movimento sindical no estado, em que os governos não reconheciam o direito de asso-ciação e o sindicato. Eles não aceitavam nossa organização. Tratar do Piso Salarial e de me-lhorias na vida profissional era tabu. A sociedade, em sua maio-ria elitizada, era contrária às rei-vindicações dos trabalhadores e das trabalhadoras”, lembra o deputado federal Antônio Car-los Biffi (PT), que foi presidente da FETEMS por três mandatos.

Para Ademir Cerri, que já vive três décadas e meia militando no movimento sindical, o senti-mento é de satisfação: “Não me arrependo de nada, faria tudo novamente. Entrei no movimen-to para nunca mais sair. O que nós conquistamos, o que nós

Ademir Cerri, secretário de comu-nicação da FETEMS

“Quando o movimento começou, nós não tínhamos nada. Só tínhamos a cara e a coragem de fazer acontecer. Éramos muito jovens. Mas, acho que tinha que ser assim mesmo, sem medo e com muita ousadia. A gente era até mal visto, ninguém queria nos receber. Professor e ainda sindicalista não tinha crédito em lugar nenhum”

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Antônio Carlos Biffi, deputado federal (PT/MS), ex-presidente da FETEMS(1983 a 1984, 1985 a 1986, 1990 a 1992)

“À frente da FEPROSUL, hoje FETEMS, por três gestões, fui membro fundador da Federação, onde iniciei a vida de luta sindical em defesa dos trabalhadores e trabalhadoras em Educação de Mato Grosso do Sul. Luta essa que faço atualmente na Câmara dos Deputados e no dia a dia no Estado. Participei do momento mais difícil do movimento sindical no estado, em que os governos não reconheciam o direito de associação e do sindicato. Eles não aceitavam nossa organização. Tratar do Piso Salarial e de melhorias na vida profissional era tabu. A sociedade, em sua maioria elitizada, era contrária às reivindicações dos trabalhadores e trabalhadoras. Tenho orgulho de fazer parte da história do movimento sindical dessa entidade, ao lado de companheiros guerreiros que marcaram a luta dos trabalhadores e trabalhadoras de Mato Grosso do Sul, responsáveis pela primeira greve no estado e diversos enfrentamentos para garantirmos boas conquistas aos educadores”

vivemos, isso não tem preço. Quem vê a FETEMS hoje, não sabe o que passamos para che-gar até aqui.”

O professor François de Oli-veira Vasconcelos, que também foi presidente da FETEMS, entre os anos de 1993 e 1995, lembra que a principal reivindicação da categoria era manter os salários em dia. “Nós ficávamos meses sem receber. Em 1990 estáva-mos com os salários atrasados e, por conta disso, fizemos uma greve e invadimos a sede da go-vernadoria. Ficamos acampados na governadoria por 40 dias, até conseguirmos negociar os salários e garantir a eleição para diretores nas escolas. A primeira eleição para diretor aconteceu em junho de 1991”, conta.

Ao longo do tempo e soman-do avanços, o movimento sin-dical foi passando por grandes transformações e hoje já não exige tanto uma postura de en-frentamento, mas sim de manu-tenção das conquistas e renova-ção das bandeiras de luta.

Missão

Desde sua fundação, a FETEMS tem procurado desempenhar um papel transformador da realida-de, a partir da educação. Junto com os sindicatos municipais, tem sido um dos principais ins-trumentos da categoria na luta pela conquista de uma socieda-de em que haja distribuição da renda socialmente produzida, os direitos sociais sejam respei-tados, e haja valorização do ser humano com autonomia e liber-dade.

A FETEMS é, hoje, a maior entidade sindical de Mato Gros-so do Sul, reunindo 72 sindica-tos municipais filiados, mais de 25 mil trabalhadores na base, representando mais de 50% do funcionalismo público do Esta-do. Depois de 35 anos de luta, a FETEMS, ao lado de seus traba-

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lhadores e trabalhadoras, con-seguiu garantir vários direitos. A categoria conta atualmente com concurso público e plano de cargos e carreiras, e os dois últimos anos, 2012 e 2013, foram marco de grandes vitórias para a FETEMS. Em 2012, a categoria conseguiu garantir a unificação da carreira de administrativos e professores, acrescentando oito mil profissionais ao Esta-tuto da Educação Básica, am-pliando a promoção funcional, bem como a regulamentação e implantação de 1/3 da hora--atividade. A unificação da car-reira era uma reivindicação que vinha sendo debatida por mais de 20 anos. Outros pontos con-quistados são a política salarial do magistério, contemplando a política salarial nacional, a pro-gressão funcional dos adminis-trativos da Educação, a realiza-ção do concurso de remoção do magistério, e a realização do concurso público para o magis-tério e para os administrativos da Educação, que aconteceu no primeiro semestre de 2013.

Piso por 20 horas

A FETEMS fechou o ano de 2013 com chave de ouro, garan-tindo a implantação do Piso Na-cional por 20 horas semanais. Mato Grosso do Sul é o primeiro estado do país a pagar o piso salarial para os professores com base em jornada de 20 ho-ras. O acordo entre a categoria e o Governo do Estado prevê quatro anos para a implantação da medida.

A Lei nº 11.738 diz que o piso pode ser pago para uma jorna-da de até 40 horas. Assim, ao invés de receber R$ 1.698 por 40 horas, os professores da rede estadual vão receber esse valor por 20 horas, em uma cor-reção que vai levar quatro anos para ser finalizada.

O índice de reajuste para o

Francois de Oliveira Vasconcelos, ex-presidente da FETEMS(1993 a 1995)

“No final do ano de 1990, estávamos com os salários atrasados e, por conta disso, fizemos uma greve e invadimos a sede da governadoria. Ficamos acampados na governadoria por 40 dias, até conseguirmos negociar os salários e garantir a eleição para diretores nas escolas. A primeira eleição para diretor aconteceu em junho de 1991”

magistério da Rede Estadual de Ensino, para 2014, foi esta-belecido em 8,5%, com a incor-poração de 20% da regência no vencimento base, o que signifi-ca que, em quatro anos, o pro-fessor terá 100% de aumento.

Ao comemorar os 35 anos de fundação neste mês de março, a FETEMS reconhece que ain-da existe muita luta pela fren-te, mas se pauta nas conquistas obtidas para continuar a bata-lha pela Educação Pública de qualidade, uma educação que seja mais justa, humana e igua-litária.

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Eusébio Garcia Barrio, ex-presi-dente da FETEMS (1979 a 1980 e 1981 a 1982)

“Começamos do zero e na labuta. Hoje, me sinto feliz por ter contribuído com a formação da maior entidade sindical do estado”

Comunicação e cidadania

A defesa da Educação Públi-ca de qualidade, com valorização profissional dos trabalhadores e trabalhadoras, implica também o reconhecimento e a integração com a sociedade de modo geral. Ao longo do tempo, a FETEMS im-plementou e utilizou diversos ins-trumentos de interação e comuni-cação que permitem o constante fortalecimento do movimento sin-dical, ao passo em que legitimam as lutas e as vitórias da categoria como conquistas sociais.

O projeto Aula da Cidadania

é um exemplo. O projeto foi de-senvolvido durante 15 anos, entre 1997 e 2012. De início, a Aula da Ci-dadania foi concebida como mais uma estratégia de luta, uma forma diferente para envolver alunos e comunidade no debate sobre os problemas da Educação. Material impresso em formato de jornal, com notícias e informações, além de propostas de atividades, temas e provocações para reflexão era o principal subsídio nos encontros, envolvendo professores, pais e alunos.

Com o tempo, e com a cres-cente aceitação da proposta, até mesmo a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) adotou a Aula da Cida-dania como ferramenta que, pela amplitude que alcançou, passou a abranger a discussão de outros temas, como as questões étnicas, de gênero e de política. Assim, datas como o 8 de Março (Dia In-ternacional da Mulher) e o 20 de Novembro (Dia da Consciência Negra) ganharam edições espe-ciais da Aula da Cidadania.

Em 2011, a FETEMS organi-zou, no dia 11 de maio, um deba-te ao vivo, com uma hora de du-ração, por uma televisão aberta para 74 municípios sul-mato--grossenses. O programa rece-beu o nome de “A Educação no centro do debate” e foi transmi-tido pela TV Campo Grande e pela internet, por meio da pági-na da FETEMS.

Há mais de 30 anos, a FETEMS edita o periódico Quadro Ver-de, que, junto com as várias fer-ramentas do site – como a TV FETEMS – e, mais recentemen-te, com as redes sociais, cons-titui um canal de comunicação direta com os educadores, via SIMTEDs e escolas, em todos os 72 municípios que compõem a base da Federação. E a Revis-ta Atuação chega à 9ª edição como importante veículo para o debate e para a luta pela Edu-cação Pública de qualidade.

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• Nasce, junto com o estado de Mato Grosso do Sul, um mo-vimento sindical de vanguarda, organizado pelos professores que lecionavam na rede públi-ca de ensino.

• Fundação da Federação dos Professores de Mato Gros-so do Sul (FEPROSUL), em 3 de março de 1979, tendo como primeiro presidente o professor Eusébio Garcia Barrio. As pri-meiras reuniões da FEPROSUL foram feitas em uma casa ce-dida pela ex-prefeita de Cam-po Grande, Nelly Bacha. A casa ficava no bairro Amambaí, nas proximidades da Rua Engenhei-ro Roberto Mange, em Campo Grande.

• Primeiro Congresso Esta-dual realizado pela FEPROSUL (SAMPROSUL), na Câmara dos Vereadores, em Campo Gran-de.

• Lei Complementar Nº 4, de 12 janeiro de 1981, dispõe sobre o primeiro Estatuto do Magisté-rio do Estado de Mato Grosso do Sul.

• Realização do primeiro con-curso público para professores.

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• Com pagamento do salário em atraso, professores realizam a primei-ra greve no estado. O lema da greve é: “Vem, vamos embora que esperar não é saber, quem sabe faz a hora não espera acontecer” (música de Geraldo Vandré).

• Conquista da licença sindical. Os presidentes das entidades sindicais pas-sam a ter direito a 22 horas-aula para trabalhar em prol da categoria.

• Realização do segundo concurso público para professores, no mês de agosto.

• Lei Complementar nº 35, que subs-titui a Lei Complementar nº 4 e atualiza o Estatuto do Magistério do Estado de Mato Grosso do Sul.

• Aquisição da sede da FEPROSUL, na rua 26 de Agosto, no bairro Amambaí. A compra da casa só foi possível com a organização de uma rifa, que tinha como premiação um veículo fusca. A rifa foi vendida no estado inteiro. O ganhador residia no município de Ponta Porã.

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• Paralisação das atividades na Rede Pública de Ensino por 30 dias, com a participação de 15 mil professores. Na pauta de negociações: eleição para diretor, Estatuto do Magistério e Piso Salarial de quatro salários mínimos.

• Conquista do Piso de três salários mínimos. Publicada no Di-ário Oficial em 17 de dezembro de 1987, a Lei Complementar nº 807, de 16 de dezembro de 1987, fixa o Piso Salarial do Grupo do Magistério e dá outras providências. Art. 1º - O piso salarial do Professor com carga horária de 22 horas semanais é fixado em: I - 2.80 do salário mínimo, a partir de 1º de fevereiro de 1.988; II - 3.00 do salário mínimo, a partir de 1º de março de 1.988. O valor real do salário não se manteve por muito tempo, em decorrência da instabilidade econômica do período.

• Greve por falta de pagamento dos salários. Integrantes do movimento sindical ficaram 40 dias acampados na sede da governadoria, em Campo Grande.

• Consolidação da Lei nº 1.102, que dispõe sobre o Estatuto dos Funcionários Públicos do Estado de Mato Grosso do Sul, e dá outras pro-vidências. O artigo 156 garante a licença sindical.

• 16º Congresso Estadual realizado pela FEPROSUL no mu-nicípio de Amambai. É neste Congresso que a entidade se filia à Central Única dos Trabalhadores (CUT) e, com isso, profes-sores e administrativos passam a ser reconhecidos como tra-balhadores em Educação. Durante o Congresso, foi aprovada a mudança do nome da entidade para Federação dos Traba-lhadores em Educação de Mato Grosso do Sul (FETEMS). Com isso, as associações municipais passam a ser sindicatos.

• No final do Governo Marcelo Miranda, a categoria con-quistou um aumento de 104%, mas o Governo do Estado não conseguiu efetuar o pagamento, e os trabalhadores ficaram sem receber o salário.

A década de 1990 foi marcada por greves, paralisações e manifestações.

• No mês de outubro, o Governo do Estado suspende a licença sindical.

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• No mês de maio, a con-tribuição sindical passa de 1% para 2%.

• No mês de junho, acontece a eleição para diretores e cole-giado escolar nas escolas esta-duais.

• Mais um ano com greve, que dura 47 dias. No dia 17 de março, a categoria reúne 20 mil pessoas, entre tra-balhadores em Educação e pais de alunos, num protesto que percorreu o centro de Campo Grande.

• Vigência da Lei Complementar nº 87, que substitui a Lei Complementar nº 35 e atualiza o Estatuto dos Profissionais da Educação Básica do Estado de Mato Grosso do Sul. Com a Lei Complementar nº 87, os trabalhadores em Educação pas-saram a ter um novo Plano de Cargos e Carreira.

• Participação ativa da FETEMS na for-mação da Caixa de Assistência aos Servi-dores do Estado de Mato Grosso do Sul (Cassems), primeiro plano de saúde de autogestão sindical do Brasil.

• No mês de junho, a FETEMS realiza o Encon-tro Estadual de Funcio-nários Administrativos da Educação, que teve como tema central a profissionalização desse segmento.

Tempo de conquistas e efetivação de direitos.

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• Implantação do Projeto Pé de Cedro, voltado para a profissionalização dos funcio-nários administrativos da Edu-cação.

• Lei 11.738 (Lei do Piso) institui o Piso Salarial Profissio-nal Nacional para os profissionais do magistério público da Educação Básica.

• Inauguração da Casa do Trabalhador Elson Lot Rigo.

• A política permanente de reajuste salarial estabelecida pela FETEMS nos últimos dois anos do governo Zeca do PT, em 2005 e 2006, e no governo André Puccinelli, entre 2007 e 2010, elaborada e defendida pela direção da FETEMS, resultou em um reajuste de 91,78%, enquanto a inflação no período de cinco anos foi de 25,36%. Portanto, o ganho real conquistado pela política salarial implementada pela diretoria da FETEMS foi de 52,78%.

• No dia 16 de março, paralisação em todo o Estado e Audiência Pública na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul. Após paralisação e Audiência, a FETEMS se reúne com o governador para iniciar um processo de negociação em torno da política salarial, realização de concurso público e garantia das eleições diretas para di-retor no prazo determinado pela lei.

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• Derrubada da Adin (Ação de Inconstitucionali-dade). O governador André Puccinelli manifestou formalmente, perante o STF e os demais Estados signatários da Adin nº 4.848, seu desinteresse na apreciação e procedência da referida ação. A Adin n° 4848 contestava o artigo 5º da Lei do Piso Salarial Nacional (Lei n° 11.738), que trata da atualização mo-netária anual do Piso Nacional do magistério.

• A categoria conseguiu, ainda, garantir a unifi-cação da carreira de administrativos e professores, acrescentando oito mil profissionais ao Estatuto da Educação Básica, ampliando a promoção funcional, bem como a regulamentação e a implantação de 1/3 da hora-atividade.

• Por meio de acordo entre FETEMS e Governo do Estado, ficou estabelecido o cronograma de paga-mento do Piso por 20 horas semanais. Mato Grosso do Sul é o primeiro estado do país a garantir o piso salarial para os professores com base em jornada de 20 horas. O índice de reajuste para o magistério da Rede Estadual de Ensino, para 2014, foi estabelecido em 8,5%, com a incorporação de 20% da regência no vencimento base, o que significa que, em quatro anos, o professor terá mais de 100% de aumento.

Cumprimento de 1/3 da hora-atividade.

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Vagner Freitas, presidente da CUT NacionalDelcídio do Amaral, senador (PT-MS)

“Eu defendo muito a organização sindical através do sistema federativo e a FETEMS é um exemplo de que esse sistema dá certo e é o melhor caminho para a luta pelos direitos da categoria, tanto na mobilização, quanto na força de atuação sindical que exerce nacionalmente. Quero parabenizar a entidade e os seus filiados pelos 35 anos de história, muitas lutas e conquistas, pois só haverá revolução se efetivamente investirmos na Educação, mas numa Educação libertária, que permitirá a construção de um país mais justo e humano”

“A FETEMS faz um trabalho exemplar em defesa dos interesses dos trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul. As conquistas obtidas ao longo dos 35 anos de história falam por si. Vitórias como as obtidas em 2013, entre elas o estabelecimento do Piso para a carga horária de 20 horas, o reajuste salarial com índices superiores ao da inflação, a incorporação de 20% do adicional de regência de classe e a garantia aos professores da rede estadual do direito de reservar 1/3 de sua carga horária para o planejamento escolar, são provas disso. Parabéns, FETEMS! Parabéns a todos os trabalhadores em Educação!”

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Elza Maria Jorge, ex-presidente da FETEMS (1987 a 1989)Genilson Duarte, presidente da CUT-MS

“A FEPROSUL mudou a história do movimento sindical sul-mato-grossense. É muito gratificante ver os resultados de uma história que teve início há décadas”

“A FETEMS é um grande instrumento de luta, que defende os trabalhadores em Educação do estado, as lutas do movimento social e sindical cutista, nas ruas e nos protestos, participando ativamente da construção da história de Mato Grosso do Sul. A Central Única dos Trabalhadores parabeniza a Federação pelos 35 anos de luta, e desejamos muitas vitórias e conquistas para sua direção e seus filiados”

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Jaime Teixeira, atual te-soureiro e ex-presidente da FETEMS (2005 a 2008, 2009 a 2012)

Ricardo AyachePresidente da CASSEMS

“Quando a FETEMS ampliou os interesses, passando a atender todos os trabalhadores da Educação, foi uma evolução, uma posição de vanguarda. Hoje, nosso maior desafio está na modernização das escolas, na universalização do acesso à Educação Infantil e na aprovação do Plano Nacional de Educação”

“Reconheço que a história dessa entidade passa por momentos únicos, como a construção da nossa CASSEMS, que nasceu praticamente dentro do dia a dia dessa Federação, que sempre extrapolou os muros da batalha pela valorização dos profissionais da Educação e por um ensino público de qualidade, indo além, na luta por um mundo melhor”

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Fátima Aparecida da SilvaAtual secretária de Relações Internacionais da CNTE, vice-presidente da IEAL e ex--presidente da FETEMS 1996 a 1998 e 1999 a 2002

“O período em que estive à frente da FETEMS foi uma época de muita efervescência política, marcada por mobilizações e protestos. O cenário era de salários atrasados, carreiras desrespeitadas, corrupção e total desgovernança. Era preciso ter garra e nós tínhamos. Fomos protagonistas da nossa história e conseguimos mudar para melhor o cenário da educação. Foi uma honra fazer parte desta construção, ao lado de mulheres e homens que seguem defendendo a Educação Pública e valorização dos seus profissionais. Seguimos com nossos sonhos e nossas utopias”

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Atiliana Brunetto, dirigente do MST/MSRoberto Leão, presidente da CNTE

“Queremos uma escola que interaja com a comunidade, que seja participativa, onde, de fato, possamos formar cidadãos com condições de defender seus direitos. Ao meu ver, a FETEMS tem cumprido muito bem esse papel de lutar por uma Educação melhor nestes 35 anos de sua existência. Também destaco que, quando a Federação sai de sua área de atuação específica e vai para a luta mais ampla, quando os direitos da sociedade estão envolvidos, em defesa do povo, cumpre um papel social fundamental. O trabalho da atual gestão merece ser destacado”

“Nestes 35 anos, a FETEMS tem sido um exemplo do que é um sindicalismo que não é apenas corporativo, mas que discute os grandes temas deste país. Defensora intransigente da escola pública e do direito dos trabalhadores em Educação, a FETEMS tem se engajado na luta pela reforma agrária e, mais recentemente, tem se envolvido, muito fortemente, na luta em defesa das terras indígenas. É um sindicalismo que deve ser referência e que mostra que nós, trabalhadores em Educação, temos interesses gerais no nosso país e defendemos uma mudança de qualidade na sociedade brasileira. Parabéns, FETEMS. Continue nessa caminhada, luta daqueles que sonham por um país melhor para todos”

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Desafios e superação no comando da maior entidade sindical de MS

Roberto Botarelli fala da realidade sindical e aponta as possibilidades da Educação Pública com relação à valorização dos trabalhadores e à qualidade do ensino

Anos de luta, dificul-dades de organiza-ção, vitórias, avanços

e conquistas compõem a his-tória da FETEMS ao longo de seus 35 anos de existência. À frente da entidade responsá-vel por representar uma cate-goria composta por mais de 25 mil trabalhadores, o presiden-te da Federação avalia a tra-jetória do movimento e avisa: precisamos de pessoas e go-vernantes que acreditem no poder transformador da Edu-cação. Confira a entrevista:

Revista Atuação – Como é estar à frente da maior entida-de sindical do estado?

Roberto – Com certeza é emocionante, motivo de mui-to orgulho e satisfação. Nunca pensei que chegaria até aqui. Em 1984, mudei para Mato Grosso do Sul para lecionar. Em 1993, em Aquidauana, en-trei para o movimento sindical. Já tinha uma admiração pelo movimento no estado, era or-ganizado e atuante. Hoje, a FETEMS, que é o resultado da perseverança, organização e

união dos trabalhadores em Educação, completa 35 anos em defesa da Educação Pú-blica e da valorização profis-sional. Além de me sentir or-gulhoso, sinto-me responsável por representar mais de 25 mil filiados. São trabalhadores e trabalhadoras que depositam confiança em nosso trabalho. Acreditam na nossa disposi-ção e na nossa força para lutar em defesa e pela garantia dos nossos direitos. Enquanto es-tiver à frente da FETEMS, vou continuar trabalhando ao lado dos meus colegas de sindica-to, por uma Educação Públi-ca de qualidade, por respeito, cidadania e igualdade. Quero agradecer a todos e a todas que se dispuseram a caminhar ao meu lado e acreditam no potencial que a Educação tem para melhorar o mundo.

Revista Atuação – A orga-nização e a luta já renderam grandes conquistas aos tra-balhadores da Educação. Do início da FETEMS para hoje, quais os principais marcos?

Roberto – Lembro que a

gente trabalhava sem saber quando o pagamento ia sair e como pagaríamos nossas contas. Nos pátios das esco-las, tinha um amontoado de bicicletas, que era o meio de transporte dos professores e dos demais funcionários de es-cola. Professor não tinha cré-dito em lugar nenhum. Hoje, em virtude das lutas da cate-goria, a realidade dos traba-lhadores em Educação é outra. Recebemos nossos salários em dia e temos um plano de car-gos e carreiras. A Lei Comple-mentar nº 87, sancionada no governo Zeca do PT, foi uma das maiores conquistas da nossa categoria. A partir daí, podemos dizer que os traba-lhadores passaram a ter uma perspectiva melhor de vida. Já é possível ter um carro, uma casa e, acima de tudo, temos dignidade. Mais recentemente, conquistamos o Piso Salarial, 1/3 da hora-atividade, a uni-ficação da carreira e o paga-mento do Piso Salarial por uma jornada de 20 horas semanais. São direitos que beneficiam a Educação como um todo, os trabalhadores têm mais valori-

ENTREVISTA

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zação profissional, e os alunos têm mais qualidade no ensino. E assim, aos poucos, com mui-ta luta e perseverança vamos mudando a “cara” da Educa-ção Pública para melhor.

Revista Atuação – Entre as conquistas mais recentes e marcantes está o pagamento do Piso Nacional para jornada de 20 horas. Como o senhor avalia essa vitória?

Roberto – Essa vitória é úni-ca na trajetória da FETEMS. Somos o primeiro estado bra-sileiro a conseguir implantar o Piso Salarial para os profes-sores com base em jornada de 20 horas. A implantação é gradativa e vai acontecer em quatro anos. No final de qua-tro dos anos, o professor terá 100% de aumento. A conquis-ta do Piso para 20 horas, as-sim como outros direitos que já efetivamos ao logo da nossa trajetória de 35 anos, demons-tra a força da nossa categoria e da nossa entidade. É preci-so ressaltar que só chegamos até aqui porque acreditamos que era possível mudar. O Piso Salarial não é apenas uma con-quista dos trabalhadores em Educação, é uma conquista de toda a sociedade.

Revista Atuação – Ao lon-

go do tempo, e também em decorrência das próprias con-quistas e das mudanças de conjuntura, as bandeiras de luta, os desafios vão se trans-formando. Atualmente, qual a prioridade na agenda sindical da educação?

Roberto – Penso que a agen-da sindical de hoje deve ultra-passar os limites das questões trabalhistas. Isso não quer dizer que devemos deixar o nosso foco de lado, que é a qualidade do ensino público e a valoriza-

ção dos profissionais. Contudo, a educação está inserida num contexto muito amplo, que envolve diferenças e diversi-dades sociais, econômicas, re-ligiosas, étnicas, sexuais, etc. Como vamos debater qualida-de na educação se não estiver-mos atentos a essas questões? Sendo assim, é preciso que a nossa pauta priorize também a formação de uma escola inclu-siva, preparada para atender o perfil do aluno do século XXI e as demandas da sociedade globalizada. É preciso, acima de tudo, que a escola seja um local atrativo e interessante para os estudantes.

Revista Atuação – Em sua opinião, qual a maior dificulda-de para a organização interna da categoria?

Roberto – Apesar de a nos-sa entidade ter um grande po-tencial de mobilização, com 72 sindicatos espalhados pelo estado e mais de 25 mil traba-lhadores filiados, percebemos, ao longo dos anos, um certo desinteresse da categoria pe-las questões sindicais. Vem di-minuindo o número de filiados e a participação deles nos sin-dicatos. Isso ocorre justamen-te pelas mudanças de conjun-tura. Antes, quando a pauta era o bolso do trabalhador, as questões salariais, era mais fácil mobilizar. O trabalhador era ativo no sindicato e briga-va por seus direitos. Hoje, com a carreira mais estabilizada os trabalhadores estão mais dis-tantes das suas entidades re-presentativas. Isso não é uma característica apenas do mo-vimento da educação, mas, sim, do movimento sindical brasileiro. O que precisamos mostrar para os novos traba-lhadores e para os que estão desacreditados, é que tudo o que conquistamos é fruto de

anos de muita persistência e luta. Muitos homens e mulhe-res doaram suas vidas em prol de um ideal, em prol da edu-cação e em prol de uma socie-dade melhor, sem diferenças, e com mais oportunidades. Isso não pode ser esquecido. É preciso esclarecer que sempre haverá muito a ser feito pelos trabalhadores e pela socieda-de.

Revista Atuação – As lide-ranças sindicais de Mato Gros-so do Sul têm consciência do papel que exercem perante a categoria e na sociedade de uma forma geral?

Roberto – Nesse sentido, nada é unânime. Temos repre-sentantes sérios, batalhado-res, dedicados e comprometi-dos com as questões sindicais. E, por outro lado, temos re-presentantes que se benefi-ciam do status sindical. E isso acontece em todos os setores da sociedade, vivemos ao lado de pessoas boas e outras nem tão boas assim. Mas minha referência são os líderes sé-rios e comprometidos. Temos companheiros brilhantes, que só agregam valores ao nosso trabalho. Prova disso é o Fó-rum dos Movimentos Sindi-cais Cutistas e Sociais de Mato Grosso do Sul, que se reúne a cada 15 dias para debater pau-tas da classe trabalhadora do campo e da cidade. O Fórum já realizou diversas ações, como a Marcha da Classe Trabalha-dora, que aconteceu em julho do ano passado, levando às ruas de Campo Grande mais de 35 mil pessoas. Sempre vou acreditar nessas pessoas que lutam e seguem firmes no pro-pósito da ética.

Revista Atuação – Como o senhor avalia as transforma-ções políticas em Mato Grosso

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do Sul, nos últimos anos?Roberto – Nós vivemos em

um estado historicamente la-tifundiário e coronelista, que passou anos na mão de uma oligarquia de direita, que pen-sava muito mais no capital do que no social. Com o governo Zeca do PT, Mato Grosso do Sul teve um avanço significa-tivo no que tange às políticas sociais, populares e inclusivas. Organizamos a pauta dos tra-balhadores, que tiveram vários avanços, como salários em dia e uma ampliação significativa de seus direitos. Depois, en-trou o atual governo, que pos-sui suas características de di-reita, mas não ficou estagnado. Fomos para as ruas várias ve-zes e conseguimos nosso es-paço para negociar. Com isso, conseguimos garantir direitos que entram para a história da FETEMS, como a unificação da carreira, a implantação de 1/3 de hora-atividade e a política do Piso Salarial para jornada de 20 horas. Contudo, não po-demos deixar de destacar que existem muitas questões a se-rem tratadas, como a reforma agrária e a demarcação de ter-ras indígenas. São pautas que precisam ser discutidas com urgência e não podem ser ig-noradas pelo poder público e nem pela população.

Revista Atuação – Quais as perspectivas para a educação neste ano de eleições?

Roberto – Que seja priori-dade para os nossos candida-tos, que não seja apenas uma “promessa” de campanha. Queremos que a Educação Pública inclusiva, laica e de qualidade seja a pauta princi-pal no desenvolvimento desse país. Não queremos mais pas-sar anos lutando pela manu-tenção de uma lei, como a Lei do Piso Salarial Nacional, que

foi regulamentada em 2008 e, até hoje, sofre “ameaças” dos nossos governantes, que se recusam a cumprir a legis-lação na íntegra. Esperamos, ainda, que a aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE) esteja na lista de priori-dades dos nossos candidatos. O PNE foi construído na Con-ferência Nacional de Educa-ção (CONAE) e enviado pelo governo federal ao Congresso em 15 de dezembro de 2010. Era para estar vigorando des-de 2011 e até agora os nossos parlamentares não consegui-ram entrar em um consenso para a sua aprovação. Quere-mos a educação no topo das prioridades. Queremos sair das promessas e ir para a ação concreta.

Revista Atuação – Qual a sua avaliação do governo Dil-ma?

Roberto – Ao longo dos últimos anos, o Brasil passou por enormes transformações. O país foi palco de profundas mudanças desde que elegeu o Partido dos Trabalhadores. Compreender e refletir esse legado tornou-se uma tarefa incontornável para pensar os rumos do país. Nesses últimos anos, o Brasil combateu a di-tadura política clássica neoli-beral, democratizou os direi-tos sociais, mas, para avançar, precisa acabar com as ditadu-ras do dinheiro, da terra e da palavra, além de aprimorar o sistema eleitoral. Lula deixou um grande legado a Dilma. Um governo é continuidade do outro, uma espécie de reflexo, com suas diferenças de atua-ção. Penso que a presidenta avançou em questões signifi-cativas, como o ensino técnico profissionalizante, o programa Mais Médicos, as políticas so-ciais, de relação internacional,

enfim, questões de extrema importância. Mas ainda temos gargalos sociais, que passam pelo transporte público, por políticas de juventude, pelas reformas políticas, judiciais e de comunicação, pelos confli-tos de terra, enfim, questões que precisam ser solucionadas com políticas públicas sérias e emergenciais.

Revista Atuação – O que falta para que o país tenha uma Edu-cação Pública de qualidade?

Roberto – Faltam pesso-as que acreditem que a edu-cação é transformadora, que por meio dela é que vamos construir um mundo melhor. Precisamos de governantes que acreditem em uma esco-la gratuita, capaz de traba-lhar um currículo significativo, preparada para que o ensino e a aprendizagem de fato se efetivem, em que a propos-ta político-pedagógica esteja alicerçada a uma metodolo-gia crítica, capaz de desafiar o educando a pensar criti-camente a realidade social, política e histórica. Costumo citar Paulo Freire, que expres-sa que a escola deve ser um lugar de trabalho, de ensino, de aprendizagem. Um lugar em que a convivência permi-ta estar continuamente se su-perando, porque a escola é o espaço privilegiado para pen-sar e agir. Com isso, fica cla-ro que o que falta em nosso país é mais investimento em uma educação para formar se-res críticos, escolas com suas portas abertas para a comuni-dade, inclusiva, respeitando as diferenças. Falta-nos também profissionais valorizados, com condições dignas e justas de trabalho. Unindo valorização e qualidade, sem dúvida, tere-mos o Ensino Público que so-nhamos para o nosso país.

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TRADIÇÃO

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Educandário Getúlio Vargas comemora 70 anos dedicados à missão de prevenir, promover e proteger

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Maria Neuma Porfírio de Moura passa o dia bordando. Aprendeu o

ofício ainda menina, no Educan-dário Getúlio Vargas, local que conhece como lar desde que os pais a deixaram lá, na companhia de mais seis irmãos. Segundo ela, a família era do interior de Mato Grosso do Sul. Gente pobre, sem recursos para educar tantos fi-lhos. A solução encontrada pelos pais foi deixar os pequenos no Educandário, em Campo Gran-de, para que pudessem estudar e, quem sabe, prosperar na vida.

E assim foi. Maria e seus irmãos passaram parte da vida dentro de uma casa imensa, cheia de quartos, com um quintal enorme, na companhia de muitas outras crianças que ali chegavam. Histó-rias que se misturavam e forma-vam uma grande família. Ali es-tudaram, cresceram, aprenderam profissões e seguiram na vida. Com frequência, voltam para visi-tar o lar da infância. Outros, como Maria, já com 42 anos, decidiram ficar e ajudar a receber as novas gerações que chegavam.

Há pouco menos de uma dé-cada, essas instituições eram conhecidas como orfanatos ou internatos. Em decorrência do Estatuto da Criança e do Adoles-cente (ECA) e demais legislações vigentes, os orfanatos foram ex-

tintos, mudaram o perfil e a no-menclatura. Com as novas dire-trizes, as entidades de amparo tiveram que se readaptar para atender crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Em 2006, a instituição sus-pendeu o programa de internato e passou a oferecer a Educação Infantil, em período integral e o Apoio Socioeducativo, em meio período. Atualmente, o Educan-dário atende 284 crianças e ado-lescentes.

História

A Sociedade Eunice Weaver de Campo Grande, mantenedora do Educandário Getúlio Vargas, completou 70 anos em 31 de ou-tubro de 2013, mantendo a mis-são de “prevenção, promoção e proteção da criança e do ado-lescente, qualificando suas vidas para futuros cidadãos conscien-tes e dignos”. É uma entidade beneficente, sem fins lucrativos. Foi fundada com o objetivo ini-cial de abrigar os filhos sadios de pais que sofriam com o “Mal de Hansen”. O tratamento da do-ença, popularmente conhecida como lepra, era feito no Hospital São Julião e em outras entida-des de apoio aos portadores de hanseníase, como a Sociedade de Integração e Reabilitação da

Pessoa Humana (SIRFHA). Com a doença praticamente erradica-da, o Educandário passou a re-ceber crianças carentes, vindas de comunidade rurais, vítimas de abandono e também vindas de outros estados.

A assistente social da entida-de, Daniela Maria Rolim, fez um le-vantamento nos registros e cons-tatou que mais de 1.300 crianças viveram na instituição, no perío-do de internato. Contudo, Daniela acredita que o número exato, ao longo de sete décadas, seja bem maior. “Eles chegavam aqui ain-da bebês, outros maiores e fica-vam até completar 18 anos. Hoje, na instituição, temos mais de 10 funcionários que foram internos e agora trabalham aqui. Muitos ex-internos fizeram o casamento deles aqui. Aqui é a casa deles. É aqui que eles vêm visitar. O pro-grama de internato era uma ati-vidade muito bonita, que benefi-ciou várias pessoas”, comenta.

É importante ressaltar que muitas crianças matriculadas na instituição na época do regime de internato tinham família e, re-gularmente, recebiam visitas dos pais. Nem todas se encontravam em situação de abandono, mas eram de famílias carentes, que não dispunham de condições fi-nanceiras para educar seus filhos e viam o Educandário como uma

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esperança de um futuro melhor.Presidente da entidade há

mais de 40 anos, Nelly Maksoud Rahe lamenta o fim do internato e comenta: “O Educandário sem-pre foi uma entidade respeitada. Nós fizemos um trabalho impor-tante de integração dessas crian-ças com a sociedade. Quando assumimos a direção, as crianças que aqui moravam eram arre-dias. Quando recebíamos visitas, elas se escondiam, tínhamos que subir aos quartos e pedir que elas descessem e recebessem os visitantes. Com o tempo, isso foi acabando. Elas passaram a ser mais sociáveis e ajudavam a or-ganizar os nossos eventos, como a festa de São João. Nossa edu-cação sempre foi baseada nos sentimentos de amor, carinho e no respeito ao próximo. Eram to-dos nossos filhos. Inclusive, edu-quei meus filhos aqui dentro, eles participavam de todas as ativida-des. Hoje, a educação mudou, o mundo de uma forma geral mu-dou”.

De acordo com Nelly, a dis-ciplina exigida no Educandário resultou em bons frutos: “Nós achávamos que éramos rígidos, mas o resultado que tivemos com os nossos alunos foi muito bom. Sempre recebemos home-nagens dos nossos ex-alunos, eles são gratos pela oportunida-de de vida que receberam aqui”.

Antes de assumir a direção do Educandário, Dona Nelly já era voluntária na instituição, que, na época, era administrada pelo Rotary Club. “Assumi para ficar apenas seis meses, fui ficando e ficando, até que tudo isso se tornou minha vida. Não me arre-pendo de nada e faria tudo no-vamente se fosse necessário”, afirma.

Tempo integral

O Getúlio Vargas é uma das poucas instituições educacionais que oferecem a Educação Infantil

O Educandário Getúlio Vargas conta cOm aproximadamente 30 trabalhadorEs voluntáriOs e mais de 40 funcionários. a instituição é mantida com recursos próprios, vindos da vEnda de artesanatos, biscoitos, bazares, doações e prOmoções de eVentos benEficentes. além dissO, o EducandáriO conta com alguns cOnvêniOs municipais.

“En CantO” é o nome do cOral que há duas décadas encanta o público. mais de 50 crianças e adOlescEntes com-põem o grupo, que realiza diversas apresEntações ao lOngo do anO. as aulas dE músiCa trabalham a auto-estima E o dEsenvOlvimEnto artístico--cultural. a oficina de violão, que teVe iníciO em 2012, tEm inCentiVado noVos talentos.

músiCa

reCursos

Os alunos do EducandáriO recEbem atEndimEnto médico, odontolóGico, psicológiCo e fonoaudiolóGico. a enti-dade também Conta, diariamentE, cOm uma técnica dE enfErmagem.

assistência

Os jOvens têm acessO a cursos pro-fissionalizantes, cOmo as ofiCinas de informática, padaria, balas E bisCoi-tos, bOrdadO e embelezamEnto.

cursos

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Nelly Maksoud Rahe, presidente do Educandário há 40 anos

Paulo Fernando da Silva Nogueira, 19 anos, ex-aluno Educandário

“Assumi para ficar apenas seis meses, fui ficando e ficando, até que tudo isso se tornou minha vida. Não me arrependo de nada e faria tudo novamente se fosse necessário”

“Antes de entrar aqui, eu ficava em casa, sem fazer nada. Quando vim para cá, aos 15 anos, vi a oportunidade na minha frente e aproveitei tudo”

em tempo integral para crianças com até 6 anos de idade. Com as novas diretrizes educacionais, o período integral nas escolas pú-blicas agora é ofertado apenas para crianças com até 3 anos e 11 meses. Para a assistente social Daniela, isso foi extremamente prejudicial para a população de baixa renda que não dispõe de recursos para pagar um escola particular de tempo integral. “Os pais precisam trabalhar e essas crianças ficam onde? É preciso rever essa política. Aqui nós re-cebemos pais angustiados atrás de vagas para seus filhos. Infeliz-mente, não temos estrutura para atender a todos. Geralmente, as crianças matriculadas aqui po-dem ficar até completarem 18 anos. Então, quase não abrimos novas vagas.

Novo tempo

Mesmo não trabalhando mais com o programa de internato, o Educandário continua atenden-do crianças e jovens carentes. Na Educação Infantil, a instituição atende crianças com idade entre 18 meses e 6 anos. O Apoio So-cioeducativo é voltado a crian-ças e jovens entre 7 e 17 anos. As duas modalidades de ensino estão associadas a uma série de projetos que enriquecem o cur-rículo escolar do aluno e contri-buem para o desenvolvimento saudável.

“Os esportes, como o karatê e a capoeira, trabalham a disci-plina e o respeito com os cole-gas. Para todos os alunos e para todos os setores da instituição, a regra é sempre a mesma: disci-plina e respeito”, explica a dire-tora Nelly.

Além das aulas de karatê e capoeira, a instituição também oferece aulas de Educação Físi-ca, que acontecem em parceria com o curso de Educação Física da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB).

Os jovens têm também aces-so a cursos profissionalizantes, como as oficinas de informática, padaria, balas e biscoitos, borda-do e embelezamento. Além dis-so, duas vezes na semana, a bi-blioteca da instituição é o ponto de encontro da meninada. Com o apoio de duas voluntárias, são desenvolvidas atividades que es-timulam o gosto pela leitura.

O ensino no Educandário é tradicional. As meninas têm aulas de boas maneiras, aprendem a se arrumar e a se maquiar de acor-do com a idade e também apren-dem a se portar em uma entre-vista de trabalho. De acordo com a diretora Nelly, o objetivo é que os alunos sejam independentes: “Os cursos profissionalizantes que nós oferecemos garantem uma autonomia financeira aos jovens. Desta forma, eles podem se garantir profissionalmente e se organizar para cursar o Ensino Superior.”

Foi no Educandário que Pau-lo Fernando da Silva Nogueira, 19 anos, aprendeu a profissão de padeiro e, logo em seguida, con-seguiu um emprego em uma pa-daria de renome na cidade. Paulo foi aluno do programa Socioedu-cativo. Estudava num período e

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Maria Neuma Porfírio de Moura, 42 anos, ex-interna do Educandário e funcionária da instituição

Daniela Maria Rolim, assistente social do Educandário

“O primeiro ponto que aprendi a fazer foi o ponto Paris, depois eu aprendi o ponto Cruz”

“Hoje, na instituição, temos mais de 10 funcionários que foram internos e agora trabalham aqui. Muitos ex-internos fizeram o casamento deles aqui. Aqui é a casa deles. É aqui que eles vêm visitar. O programa de internato era uma atividade muito bonita, que beneficiou várias pessoas”

no outro ia para o Educandário. Para o rapaz de família humilde, o primeiro emprego foi uma ver-dadeira conquista. “Antes de en-trar aqui, eu ficava em casa, sem fazer nada. Quando vim para cá, aos 15 anos, vi a oportunidade na minha frente e aproveitei tudo”, diz.

Paulo não perdeu tempo. Além do curso de padaria, fez to-dos os demais cursos oferecidos pela instituição. Atualmente, está cumprindo o serviço militar, no 3º Batalhão de Aviação do Exér-cito, pretende seguir carreira e, em breve, fazer uma faculdade.

Biscoitos e bordados

A direção do Educandário sempre precisou ser criativa para manter as portas abertas. Despe-sa alta e receita suada, vinda de donativos, algumas parcerias e muito trabalho. Nelly conta que quando a entidade atendia os filhos dos portadores de hanse-níase, as doações eram maiores. “As pessoas se sensibilizam mais com a questão da saúde”, avalia.

Diante das dificuldades, o jei-to foi inovar. A fabricação de bis-coitos passou de amadora para profissional, sem perder as ca-

racterísticas de um bom biscoito caseiro. As alunas aprendiam as receitas e passavam para as de-mais. A produção começou e ser vendida para ajudar nas despe-sas do internato. Hoje, os biscoi-tos do Educandário são tradição e já completaram 33 anos ado-çando paladares. Todas as fun-cionárias que trabalham no setor de produção de biscoitos são ex--alunas da entidade e continuam a passar as receitas adiante por meio dos cursos profissionali-zantes.

Da mesma forma seguiu a confecção de bordados. Pontos ricos em detalhes, que transfor-mam peças de cama, mesa e ba-nho em glamorosos presentes. Maria Neuma, a personagem do início da reportagem, chegou ao Educandário quando tinha 10 anos e, de lá para cá, não parou mais de bordar. É funcionária da instituição e não pretende deixar o local nem a profissão. “O pri-meiro ponto que aprendi a fa-zer foi o ponto Paris, depois eu aprendi o ponto Cruz,” relembra.

Os biscoitos e os bordados estão à venda na butique Açúcar e Afeto, na Rua Rio Grande do Sul, 387, Jardim dos Estados, em Campo Grande.

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ESCOLAPANTANEIRA

Com forte viés ambiental, sustentado na educação e na proteção social dos ribeiri-nhos, a Acaia Pantanal leva uma moderna proposta pe-dagógica a uma das regiões mais isoladas do mundo

Ensinando a preservar e preservando o ensinar

Até onde a parceria en-tre poder público e terceiro setor pode ir

pela educação? Com uma ad-ministração municipal disposta a priorizar o ensino e uma insti-tuição imbuída de uma moderna proposta pedagógica, essa par-ceria tem ido bem longe em Co-rumbá (MS), município na fron-teira com a Bolívia. No Pantanal sul-mato-grossense, onde só se chega de barco ou avião, a edu-cação acontece e favorece uma população que vive geografica-mente isolada.

As famílias ribeirinhas não vi-vem em vilas ou agrupamentos, mas separadas umas das outras, entre campos, salinas, cordilhei-ras, capões, corixos e vazantes,

à beira do rio, mediante condi-ções naturais que impedem a construção de estradas e difi-cultam a instalação de infraes-trutura elétrica e de telefonia.

Por viver em uma região de constantes cheias, na maior pla-nície alagável de que se tem re-gistro, essa população fica sem acesso a serviços essenciais como educação e saúde. A eco-nomia é de subsistência, basea-da na pesca artesanal e na cole-ta de iscas.

Em 2006, buscando ampliar sua atuação ambiental, o Ins-tituto Acaia, sediado em São Paulo, vislumbrou no Pantanal a possibilidade de contribuir com a preservação de um dos maio-res biomas do planeta, consi-derado patrimônio natural da humanidade pela Unesco. Os pesquisadores constataram ali um inexpressivo índice de de-senvolvimento humano e social, que incluía baixa escolaridade, alto índice de analfabetismo, prática de atividades ilícitas e mazelas, como o alcoolismo, a exploração sexual e a gravidez precoce.

Acaia Pantanal

Após dois anos de entrevis-tas, levantamentos e pesquisas socioambientais, nasceu, em 2008, o Acaia Pantanal. Uma organização social sem fins lu-crativos, que tem como objetivo conjugar educação e proteção social aos ribeirinhos e assegu-rar o desenvolvimento ambien-tal da região. “Embora tenha-mos um viés ambiental muito forte, acreditamos que o ho-mem e o meio em que vive tem de estar unidos. E o homem só atuará em prol do ambiente se tiver instrução. Por isso, a edu-cação para nós é a ferramenta e a base de tudo”, resume Syl-via Helena Bourroul, diretora do Acaia Pantanal.

Em 2009, nas instalações da Fazenda Jatobazinho, uma anti-ga pousada a 90 quilômetros rio abaixo da zona urbana de Co-rumbá, foi implantada a tão es-perada sede da Acaia Pantanal e o núcleo de Ensino Fundamen-tal. O local passou a funcionar como base de quatro progra-mas desenvolvidos pela ONG

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na região: Jatobazinho (ensino fundamental); Relações com a Comunidade; Educação para o Trabalho; e Rede de Proteção e Conservação da Serra do Amo-lar (RPCSA).

Escola Itinerante

A primeira ação social do Acaia Pantanal foi batizada de Projeto Escola Itinerante. Parte integrante do programa Rede de Proteção e Conservação da Serra do Amolar, essa ação consiste basicamente em um educador percorrendo de bar-co semanalmente as moradias das famílias ribeirinhas e levan-do curso de alfabetização a jo-vens e adultos, orientação pré--escolar às crianças e familiares, biblioteca e brinquedoteca cir-culantes.

Em 2013, os alunos se agru-param em cinco núcleos de tra-balho estrategicamente escolhi-dos em locais que permitem o deslocamento e a participação do maior número possível de pessoas, além do maior tempo de visita. As aulas são semanais, e parte dos livros didáticos de alfabetização é doada pela Pre-feitura de Corumbá.

Há dois anos nessa função, o educador Hamilton Álvaro Bran-dão cita os principais desafios

de trabalhar a alfabetização jun-to à população ribeirinha: “Qua-se todos os adultos, ou cerca de 90% deles, são analfabetos. As aulas acontecem apenas uma vez por semana em cada núcleo e muitos alunos ainda faltam por priorizar o trabalho para a sub-sistência da família. Isso atrasa bastante o processo de ensino. Muitos até querem estudar, mas nem sempre podem”, lamenta.

As oportunidades de geração de renda das famílias são pou-cas, sobrevivem basicamente da pesca artesanal e da coleta de iscas, como a tuvira, o caran-guejo e o cascudo.

É o caso de Romildo, que co-letava iscas no Porto Santa Ca-tarina e só aos 30 anos aprendeu a ler e escrever. “O sonho dele era conseguir ler um livro intei-ro”, lembra o professor, que se emocionou ao ver o aluno lendo sozinho pela primeira vez. “Com a Escola Itinerante, Romildo re-alizou seu velho desejo. Agora quer ir além, ler algo maior, com menos figuras e mais textos,” acrescenta o professor.

Mais do que permitir o acesso aos livros, a alfabetização tem ajudado os ribeirinhos nas ta-refas mais básicas do dia a dia, como ler a bula de um remédio ou a embalagem de um produ-to, enviar uma carta ou assinar

um documento. “Já vi casos de gente com dor de cabeça to-mando anticoncepcional”, relata Hamilton, que faz esse trabalho há dois anos e atende 29 ribeiri-nhos. “É uma questão de auto-estima, de não morrer de vergo-nha sempre que tem de assinar um papel com a impressão digi-tal e, pior, ser manipulado por pessoas mal-intencionadas por não saber ler um contrato, ou coisa do tipo”, diz.

Relações com a Comunidade

O programa Relações com a Comunidade tem como obje-tivo contribuir para o aumento da qualidade de vida da popu-lação do entorno da Fazenda Jatobazinho, incluindo alunos e funcionários, por meio de ações de saúde, cidadania e educação. As atividades são realizadas em quatro linhas de ação: Acom-panhamento de Ex-Alunos, que garante a continuidade do es-tudo formal de alunos do Ja-tobazinho; Saúde e Cidadania, que, por meio de parceria com a Rede Pública de Saúde e com a Marinha do Brasil, promove pe-riodicamente o cadastro no SUS de todos os alunos e atendimen-to médico, odontológico e sani-tário às crianças, educadores e funcionários; Fortalecimento de

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Políticas Públicas, com ações no Conselho Municipal dos Di-reitos da Criança e do Adoles-cente (CMDCA/Corumbá); e Educação e Cultura, com ativi-dades de estudo do meio que apresentam aos alunos de ou-tras unidades do Instituto Acaia a fauna e a flora do local e o contexto social dos ribeirinhos, além do apoio à Orquestra Co-rumbaense de Viola Caipira.

Educação para o Trabalho

Segundo a diretora Sylvia Bourroul, vários fatores moti-varam a criação do programa Educação para o Trabalho. Um deles foi o desenvolvimento da autoestima das mulheres ribei-rinhas a partir de um novo olhar para objetos do cotidiano. Sur-giram daí as aulas de pintura, artesanato e bordado, sempre utilizando elementos fartos na região, como o couro de peixe, o urucum e o capim de taboa.

O outro fator foi a baixa es-colaridade e a falta de capaci-tação para o trabalho dos jo-vens que, acostumados à vida isolada da região pantaneira, acabavam se envolvendo em ocupações predatórias ao meio ambiente. Nasceu, então, da parceria com a Fazenda Cai-

man, também no Pantanal, o curso técnico de Peão Pan-taneiro. “Percebemos que a maioria dos adolescentes e jo-vens ribeirinhos não almejava trabalhar em São Paulo ou al-gum outro grande centro, mas sonhava ser veterinário e ter uma criação no rio ou ser peão de boiadeiro. Por isso, a parce-ria para viabilizar esse curso e, de quebra, resgatar um modo de vida histórico e cultural da região, em harmonia com a na-tureza”, diz Sylvia.

Para ilustrar, ela cita o caso do jovem Benedito, que, aos 14 anos, chegou analfabeto à Fa-zenda Jatobazinho, mas, com apoio psicológico e pedagógi-co específico, aprendeu a ler e escrever e concluiu o primeiro ciclo do Ensino Fundamental aos 18 anos. “Após encerrar essa etapa, ele optou por rea-lizar outro sonho, que era o de ser peão de boiadeiro e largar a atividade insalubre de cole-ta de iscas, que ele praticava antes de ingressar na escola”, lembra a diretora. “Ele não só se formou no curso de peão de boiadeiro, como já foi con-tratado pela Fazenda Caiman e, agora, além de alfabetizado, tem uma profissão e carteira assinada”, comemora. “A pe-

dido dos ribeirinhos, estamos analisando agora a oferta de cursos de piloteiro e de mecâ-nico de barcos”, acrescenta a diretora.

Jatobazinho

Às margens do rio Paraguai, as amplas e modernas instala-ções da Fazenda Jatobazinho contrastam com as acanhadas e humildes residências ribei-rinhas avistadas ao longo das duas horas e meia de viagem de voadeira, de Corumbá até o local. São salas de aula amplas, dormitórios confortáveis, bi-blioteca, filmoteca, laboratório de informática e área de lazer com churrasqueira, piscina e playground, além de uma an-tena de telecomunicações com link de satélite e uma estação de tratamento de água.

Além de polo central de to-das as atividades, a Fazenda Ja-tobazinho funciona como sede do programa de educação cur-ricular da Acaia Pantanal, que oferece o Ensino Fundamental I gratuito a 47 crianças da região do Paraguai Mirim.

Fruto de uma parceria com a Prefeitura de Corumbá, por meio da Secretaria de Educa-ção, a Escola Jatobazinho é

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integral e atende os alunos em regime de semi-internato. O sistema de ensino é justifica-do pelo isolamento geográfico, dificuldades financeiras e de locomoção dos ribeirinhos. O material didático e a assessoria pedagógica ficam por conta da Fundação Bradesco, por meio do programa Educa+Ação. A Prefeitura contribui com a ce-dência e o salário dos professo-res, além de transporte escolar e combustível, pagamento de piloteiros e complementação da merenda escolar. “A Acaia Pantanal é de suma importân-cia para Corumbá, pois é um exemplo de como o terceiro setor e o poder público, juntos, podem oferecer uma educação de excelência a uma comunida-de tão carente”, elogia a secre-tária municipal de Educação de Corumbá, Roseane Limoeiro.

Cerca de 15 funcionários (sendo cinco educadores) tra-balham no Jatobazinho, que oferece aos alunos educação curricular durante as manhãs e atividades socioeducativas no período da tarde. “Traba-lhamos com horta, artesanato em oficina de barro, expressão corporal, para desinibi-los e es-

timulá-los. Enfim, é a educação holística, no conceito global, que educa, orienta e alavanca o ser humano a partir do próprio conhecimento do espaço e de si mesmo”, explica a psicóloga Dilma Castro Costa, coordena-dora administrativa do Acaia Pantanal.

Segundo ela — responsável também pela supervisão das rotinas e demais atividades diárias do local —, em um sis-tema de educação integral e de semi-internato, as crianças aprendem desde a hora em que se levantam até o momento em que vão se deitar. Apren-dem, por exemplo, a ter mais cuidado com a higiene pessoal e até a comer educadamente. “Muitas crianças chegam aqui sem saber o que é um vaso sa-nitário, sem conseguir segurar um garfo e faca, pois comiam com as mãos em suas casas. Aqui aprendem tudo isso e muito mais”, acrescenta ela, que cita as aulas de massa de modelar como uma das ativi-dades lúdicas ministradas na escola para trabalhar a motri-cidade fina dos alunos de pri-meira série e o correto manejo com os talheres.

Em busca de desafios, e atra-ída pela proposta de trabalho da Acaia, a pedagoga Fabiana França Catarino veio de longe, da capital paulista, para o Pan-tanal, lecionar às crianças ribei-rinhas. “É muito interessante trabalhar em um lugar onde o contexto social e regional dos alunos tem um peso tão gran-de no conteúdo das aulas. Aqui passo atividades educativas sobre o rio, pássaros, barcos, animais, árvores, enfim, tudo o que for relacionado ao mundo deles. Ensino e aprendo o tem-po todo”, diz.

Segundo Sylvia Bourroul, um trabalho diferenciado como esse nem sempre é compre-endido por todos e, às vezes, desperta sentimentos diversos e interpretações equivocadas. “Uma minoria nos acusa de tentar ‘globalizar’ as crianças e adolescentes, como se qui-séssemos que elas almejassem outra vida”, diz ela. “Mas nossa ideia é justamente que se apro-priem de conhecimentos que ajudem a elas e suas famílias. Não queremos que saiam do rio, mas que voltem com outro instrumental, para uma nova condição de vida”, acrescenta.

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MULHER

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“Existe apenas uma verdade universal, aplicável a todos os pa-íses, culturas e comunidades: a violência contra as mulheres nun-ca é aceitável, nunca é perdoável, nunca é tolerável.”

(Ban Ki-Moon, secretário--geral da ONU)

Seja na campanha desen-volvida pelo secretário--geral da ONU, seja em

grandes metrópoles, cidades pe-quenas ou aldeias de países dis-tantes, o tema da violência con-tra a mulher tem ganhado cada vez mais visibilidade. Ao deixar o espaço da vida privada para se tornar tema de discussão, objeto de políticas e até um problema de saúde pública, a questão mos-tra sua verdadeira natureza: um fenômeno social que desconhece limites e fronteiras e que existe desde que se estabeleceram as regras do patriarcado e do ma-chismo.

Em Mato Grosso do Sul, os primeiros dias de 2014 foram de

noticiários repletos de casos de violência contra a mulher. Vio-lência física, agressão e morte. Vindo num crescente, a média de ocorrências registradas pela De-legacia Especializada de Atendi-mento à Mulher (DEAM) de Cam-po Grande chegou a cem por dia. Em 2013, a média era de 70 bole-tins de ocorrência por dia. No ano anterior, 2012, foram registrados 5.550 boletins, com 2.805 inqué-ritos relatados e 80 estupros.

De acordo com a titular da DEAM, Rosely Molina, foram re-gistrados 5.640 boletins de ocor-rência em 2013. Do total, 3.022 inquéritos foram relatados e en-caminhados ao Ministério Público Estadual (MPE). “Nossa média continua sendo de 70 atendi-mentos por dia. Mas tivemos dia de atender 112 pessoas”, comenta a delegada.

Em 2013, as defensorias es-pecializadas nos direitos da mu-lher realizaram um total de 6.801 atendimentos em Campo Gran-de. Com média de 26 casos por dia útil. Em geral, dirige-se ao serviço, que funciona anexo ao Fórum, quem tem vergonha ou medo de levar a denúncia para a delegacia. Ainda no ano passa-do, 312 homens foram presos em Campo Grande por crimes contra a mulher, como estupro, violência doméstica, lesão corporal e homi-cídio. É quase uma prisão por dia. Em 2013, a delegacia registrou 72 estupros e seis homicídios.

O Brasil tem uma das leis con-sideradas de excelência para o enfrentamento à violência do-méstica. Conhecida como Lei Maria da Penha, a Lei nº 11.340, de agosto de 2006, trata especi-ficamente da questão, tipifica as modalidades da violência contra a mulher (física, psicológica, se-xual, moral e patromônial) prevê penas mais severas e também amplia as possibilidades de com-bate à violência, na medida em que possibilita, por exemplo, a denúncia anônima.

A delegada conta que, com a Lei Maria da Penha, o efeito ime-diato foi o aumento do número de denúncias. “Antes da lei, em 2004, 2005, nós registrávamos 1.600, 1.700 ocorrências. Quan-do a lei entrou em vigor, esse número pulou para 4 mil. Signi-fica que as mulheres se sentiram mais amparadas, mais seguras para denunciar. Então, a violên-cia aumentou? Aumentou, como aumentou toda a violência, que hoje é algo alarmante, mas não só a violência contra a mulher, a violência de um modo geral. A violência contra a mulher é algo construído, é um processo muito longo. As conquistas femininas vêm sendo realizadas aos pou-cos, de pouco tempo para cá. No Brasil, só em 1988, a Constituição deu garantias de direitos para as mulheres. Daí para a frente é que a gente pode considerar que houve avanços realmente. Antes disso, eram coisas pontuais”, ava-lia.

A delegada relata também que, apesar dos avanços, a mu-lher vítima de violência ainda tem vergonha e medo de denunciar. “Não só por ter que ir a uma de-legacia, mas ela tem vergonha porque, primeiro, ela pensa as-sim: meu Deus, eu errei. É difícil para ela admitir que aquela pes-soa que ela amou, que ela ama, que é o companheiro dela, que é o pai dos filhos dela, é que é o agressor. Ela pensa que ‘esco-lheu errado’. E não é isso, não é ela que tem problema, é a pessoa violenta que tem problema. Tem o lado financeiro, tem o lado do ‘o que as pessoas vão dizer se eu me separar’, além do medo. Por-que o medo do próprio compa-nheiro é uma coisa muito forte. Equivocadamente, ela tem medo de denunciar e ele se tornar ain-da mais violento; ela acha que, se denunciar, ele vai ficar pior, vai agravar a prática da violência. E não é. Se ela denunciar, a violên-cia vai cessar”, afirma.

Rosely Molina,Titular da DEAM

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A Delegacia Especia-lizada de Atendimento à Mulher (DEAM) de Cam-po Grande conta atual-mente com:

• 3 delegadas• 5 escrivãs• 10 investigadores• 1 psicóloga• 2 assistentes sociaisAlém de estagiários,

em número variável, de vários setores.

ESTRUTURADA DELEGACIA

DENUNCIEA VIOLÊNCIA

Os casos de violência contra a mulher podem ser denunciados, inclu-sive anonimamente, por qualquer pessoa. Para denunciar, ligue:

• 180Disque-denúncia nacio-nal• 3384-1149 / 3384-2946DEAM Campo Grande

Para Rosely Molina, a maior arma para combater a violência doméstica é a informação. “As pessoas têm que ter conheci-mento da lei, dos mecanismos que existem dentro da lei, do aparato que o Estado tem para defender e ajudar essas mulhe-res. E não é só a delegacia. Nós temos uma rede de atendimento que funciona, mas é preciso que as pessoas cheguem até nós para buscar ajuda”, avalia.

A delegada afirma também que o ciúme é um elemento re-corrente nas histórias das mulhe-res vítimas da violência domés-tica. “Se não for minha, não vai ser de mais ninguém!” De acordo com Rosely Molina, essa é a fra-se que mais se ouve dentro das delegacias, nos relatos feitos pe-las vítimas. “Elas frequentemente contam que os homens dizem isso. Mas aí, é preciso traduzir o que é esse ciúme. O ciúme é pos-se. O homem fala ‘é minha’, por-que ele acha que é dono da mu-lher, que pode dispor do corpo e da vida dela da maneira que lhe convier. E isso se dá por conta do machismo, de uma coisa que já está incorporada no senso co-mum”, diz.

Informação e reflexão

A professora Ana Maria Go-mes, doutora em Sociologia, é professora aposentada da Uni-versidade Federal de Mato Groso do Sul (UFMS) e há muito traba-lha com as questões de gênero. Para ela, a mudança necessária passa, sim, pela informação, mas requer um entendimento mais profundo das causas da violência.

“A gente trabalha com rela-ções sociais. E essas relações sociais são imbuídas de poder, são desiguais, não são igualitá-rias. E na relação social que exis-te entre homens e mulheres, nas chamadas relações de gênero, as mulheres têm uma condição de subalternidade em relação aos

homens. Dá para perceber isso em coisas assim bem simples, como quando é o marido que diz o tamanho da saia que ela vai usar, se ela pode cortar o cabelo ou não. Enfim, a gente sabe — e pode ver no dia a dia — que um homem, um marido, também se sente muito à vontade e está le-gitimado para depreciar a sua mulher ou para gritar com ela em público. Nessas relações de-siguais, o homem se sente legiti-mado em relação à mulher e em relação à própria sociedade para ser violento”, diz Ana Maria.

A professora concorda que, apesar dos avanços, as mulhe-res ainda têm dificuldade para denunciar e convida a uma refle-xão: “Por um lado, existem mui-tas ações de falar para a mulher que procure a delegacia, que procure centro de atendimento, mas ainda não existe um traba-lho de mostrar para as mulheres por que é que isso ocorre. Em geral, elas pensam ‘bom, dessa vez vai dar certo’; elas acham que ele vai mudar, mas a gente sabe que, daqui a pouco, tudo começa de novo. E isso, dentro de uma perspectiva de análise sociológi-ca, tem a ver com o próprio lugar que a mulher e o homem têm na sociedade. Então essa relação de poder não é só o homem dizer para a mulher o que ela vai fazer, se ela pode ou não pode, mas é o conjunto da sociedade ser prepa-rado para dar à mulher esse lugar de subalternidade e esse lugar de poder para o homem.”

Para a professora, o caminho é educar principalmente as mu-lheres, “porque são elas que vão sair dessa situação de violência”: “Nessa relação social, de marido e mulher, ela precisa entrar já se fazendo respeitar, já tendo cons-ciência de que ela é uma cidadã com direitos, que tem direito à igualdade. E as pessoas confun-dem um pouco achando que as mulheres querem ser iguais aos homens, mas não se trata disso.

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Somos biologicamente e ana-tomicamente diferentes, mas essa diferença não justifica a desigualdade. Nós somos dife-rentes, não desiguais. Mas as próprias mulheres não têm isso claro. Essas relações sociais não ocorrem só de uma direção para outra. Elas implicam duas pesso-as, grupos, não são construídas apenas pelos homens, mas pelas pessoas que compõem a socie-dade. E a sociedade é composta por homens e mulheres.”

Quanto ao papel da educa-ção na transformação dessa re-alidade, Ana Maria também faz um alerta: “A educação só vai funcionar aí se trabalhar bem essas questões, que ainda são trabalhadas de maneira muito precária. As próprias mulheres professoras ainda têm um com-portamento dentro dos valores da desigualdade. O que precisa ser feito é um trabalho em pro-fundidade. E o que a gente vê é pontual: palestra, oficina de dois dias... e nada vai mudar só com isso. Eu sou muito crítica com relação a algumas coisas gover-namentais, seja em que nível for, sobre o verdadeiro impacto dis-so. Sou muito crítica, porque não

chega a tocar, a fazer com que as pessoas reconheçam no seu cotidiano as relações desiguais.”

Pesquisa mostra visão da so-ciedade sobre violência contra a mulher

Uma pesquisa de opinião re-alizada ano passado pelo Data Popular e pelo Instituto Patrícia Galvão revelou que 7 em cada 10 entrevistados consideram que as brasileiras sofrem mais violência dentro de casa do que em espaços públicos, sendo que metade avalia ainda que as mu-lheres se sentem de fato mais in-seguras dentro da própria casa.

Os dados revelam também que o problema está presen-te no cotidiano da maior parte dos brasileiros: entre os entre-vistados, de ambos os sexos e todas as classes sociais, 54% conhecem uma mulher que já foi agredida por um parceiro e 56% conhecem um homem que já agrediu uma parceira. E 69% afirmaram acreditar que a vio-lência contra a mulher não ocor-re apenas em famílias pobres. Vergonha e medo de ser assas-sinada são percebidas como as principais razões para a mulher não se separar do agressor.

A pesquisa aponta ainda que a maioria dos homens concorda que bater na parceira deve ser crime. “Aí temos um dado positi-vo: 84% dos homens acham que não devem bater na parceira; isso é uma explicitação de que bater na parceira é, no mínimo, errado. E certamente muitos desses homens batem na par-ceira, e aí existe a conhecida dis-tância entre o que se diz e o que se faz. De alguma maneira, em função da grande divulgação e da grande aceitabilidade da Lei Maria da Penha, o politicamente correto é dizer que não se deve bater na parceira. Já a mudança cultural é um processo mais lon-go; é difícil imaginar que em seis

ou sete anos da lei o machismo acabaria”, comenta a advogada Leila Linhares Barsted, da ONG Cidadania, Estudo, Pesquisa, In-formação e Ação (Cepia).

A pesquisa completa está disponível em www.agenciapa-triciagalvao.org.br.

Número de assassinatos não diminuiu

Em setembro passado, o Ins-tituto de Políticas Econômicas Aplicadas (IPEA) divulgou os re-sultados de uma pesquisa sobre o feminicídio no Brasil, mostran-do que, entre 2001 e 2011, a cada uma hora e meia, uma mulher morreu de forma violenta no Bra-sil. Foram 5.664 mortes por ano, 472 por mês, 15 por dia. Cerca de 40% de todos os assassinatos de mulheres foram cometidos por um parceiro íntimo.

O termo feminicídio refere-se ao assassinato de mulheres em decorrência de elas serem sim-plesmente… mulheres! Trata-se de uma violência extrema que acontece dentro de um contex-to de relações sociais de gênero, em que o homem — geralmente atual ou ex-companheiro — en-tende que tem legitimidade para tirar a vida de alguém porque esta pessoa seria sua proprieda-de ou um “ser inferior” a ele. Tra-mita no Congresso Nacional uma proposta para alterar o Código Penal, inserindo o feminicídio como circunstância qualificado-ra do crime de homicídio, “como uma forma extrema de violência de gênero contra as mulheres”.

No período analisado pela pes-quisa IPEA, estima-se que tenham ocorrido mais de 50 mil feminicí-dios. Outra conclusão é que a Lei Maria da Penha não contribuiu para reduzir o número de assas-sinatos de mulheres. Segundo o relatório, as taxas de mortalidade por 100 mil mulheres foram 5,28 no período 2001-2006 (antes da

Ana Maria Gomes,doutora em Sociologia

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lei) e 5,22 em 2007-2011 (de-pois). Houve apenas um peque-no decréscimo da taxa em 2007, imediatamente após a vigência da lei, quando, possivelmente, a campanha para divulgá-la foi mais intensa.

Veja alguns outros resultados da pesquisa IPEA sobre assassi-nato de mulheres no Brasil:

• Os estados com maiores ta-xas foram: Espírito Santo (11,24), Bahia (9,08), Alagoas (8,84), Ro-raima (8,51) e Pernambuco (7,81). Por sua vez, taxas mais baixas foram observadas no Piauí (2,71), Santa Catarina (3,28) e São Paulo (3,74).

• Mulheres jovens foram as principais vítimas: 31% estavam

“A violência contra as mulhe-res não está confinada a uma cultura, uma região ou um país específicos, nem a grupos de mulheres em particular dentro de uma sociedade. As raízes da violência contra as mulhe-res decorrem da discriminação persistente contra as mulhe-res”, informa a ONU, na página da campanha UNA-SE pelo fim da violência contra a mulher (http://www.onu.org.br/unase/).

Estima-se que cerca de 70% das mulheres sofram algum tipo de violência no decorrer da vida. E, de acordo com da-dos do Banco Mundial, as mu-lheres de 15 a 44 anos correm mais risco de sofrer estupro e violência doméstica do que de morrer de câncer, acidentes de carro, guerra e malária.

na faixa etária de 20 a 29 anos e 23% de 30 a 39 anos. Mais da me-tade dos óbitos (54%) foram de mulheres de 20 a 39 anos.

• No Brasil, 61% dos óbitos foram de mulheres negras, que foram as principais vítimas em todas as regiões, à exceção da região Sul. Merece destaque a elevada proporção de óbitos de mulheres negras nas regiões Nordeste (87%), Norte (83%) e Centro-Oeste (68%).

• A maior parte das vítimas tinha baixa escolaridade, 48% daquelas com 15 ou mais anos de idade tinham até 8 anos de estudo.

• No Brasil, 50% dos feminicí-dios envolveram o uso de armas de

fogo e 34%, de instrumento perfu-rante, cortante ou contundente. Enforcamento ou sufocação foi re-gistrado em 6% dos óbitos. Maus--tratos — incluindo agressão por meio de força corporal, força física, violência sexual, negligência, aban-dono e outras síndromes de maus tratos (abuso sexual, crueldade mental e tortura) — foram registra-dos em 3% dos óbitos.

• 29% dos feminicídios ocorre-ram no domicílio, 31% em via pú-blica e 25% em hospital ou outro estabelecimento de saúde.

• 36% ocorreram aos finais de semana. Os domingos concentra-ram 19% das mortes.

(Com informações do Blog Território de Maíra, no site Carta Capital)

A forma mais comum de violência experimentada pelas mulheres em todo o mundo é a violência física praticada por um parceiro íntimo, em que as mulheres são surradas, força-das a manter relações sexuais ou abusadas de outro modo. Diversas pesquisas mundiais apontam que metade das mu-lheres vítimas de homicídio é morta pelo marido ou parceiro, atual ou anterior.

Na Austrália, no Canadá, em Israel, na África do Sul e nos Es-tados Unidos, 40% a 70% das mulheres vítimas de homicídio foram mortas pelos parceiros, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. Na Colôm-bia, a cada seis dias uma mu-lher é morta pelo parceiro ou ex-parceiro.

PELO MUNDO

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Aos 77 anos, a “dama do rasqueado” ainda canta na noite de Campo Grande e mora na mesma “casinha velha”

CULTURA

Difícil escrever sobre Delinha e não deixar transparecer a admi-

ração de fã. Desde a infância, escuto sucessos como Malvada, Prazer de Fazendeiro, O Sol e a Lua, Por Onde Andei e tantas outras canções que embalam, ao ritmo do rasqueado, um pú-blico que agrega gerações.

Délio e Delinha passaram dé-cadas cantando e compondo mú-sicas que se tornaram clássicos da cultura sul-mato-grossense. Ainda hoje, em meio à onda do sertanejo universitário, a Dama do Rasqueado, aos 77 anos, mantém um público fiel, apre-sentando-se na noite campo--grandense e nos municípios do interior do estado.

A idade e as dificuldades que a vida lhe impôs não foram ca-pazes de ofuscar o intenso bri-lho de seu olhar. Carrega no semblante as linhas da sua his-tória, repleta de altos e baixos, alegrias e tristezas, e uma cole-ção de amigos, fãs e admirado-res que mantêm vivo o sorriso de uma das maiores intérpretes da música de raiz.

Foi na casinha de tábua da rua Paissandu, bairro Amambaí, que a senhora Delanira nos re-

cebeu para uma prosa. Simples como as letras de suas canções, encantadora e fascinante como a lua, Delinha falou sobre a vida e sobre sua paixão pela música.

Infância

“Moro nesta casa desde os meus 8 anos. A música Casinha Velha é uma homenagem a esta casa. Aqui, nesta região, só ti-nha mato e vários pés de guavi-ra”, conta Delinha.

Delanira Pereira Gonçalves nasceu em Vista Alegre, distrito de Maracaju, no dia 7 de setem-bro de 1936. Desde pequena, já demonstrava vocação para a música. A mãe de Delinha so-nhava ver a menina cantando no coral da igreja. “Eu era pequena e cantava aquela música... oh, jardineira por que estás tão tris-te”, [Jardineira, Orlando Silva].

A infância de Delinha foi po-bre. O pai, Avelardo Alves Gon-çalves, era tocador de gado e a mãe, Jerônima Pereira Gonçal-ves (Chiruca), lavava e passava roupas para fora. Embora Deli-nha fosse filha única, passava longe de ser uma menina mima-da, cheia de regalias. Quando não estava na escola, ajudava no orçamento familiar, venden-do leite e outros produtos que o

pai trazia das chácaras nos arre-dores da cidade para revender.

Assim Delinha cresceu, na simplicidade. Estudou no Co-légio Estadual até os oito anos de idade. Depois, Dona Chiruca foi pedir ao padre a isenção da mensalidade para que a menina pudesse estudar no Colégio das Irmãs Vicentinas. O pedido foi atendido, não pagavam a men-salidade, mas Delinha tinha que varrer duas galerias de salas de aulas e lavar 10 vasos sanitários. Estudando no Colégio das Ir-mãs, o sonho da mãe pôde ser realizado: conseguiu entrar para o coral da igreja.

Delinha só conseguiu estudar até o equivalente, hoje, ao oita-vo ano do Ensino Fundamental. As dificuldades eram muitas. Não era possível manter as des-pesas com livros e tudo mais que a escola exigia. Naquela época, estudar era um privilé-gio que estava bem distante da realidade da menina de família pobre.

Juventude

Já moça, Delinha começou a trabalhar numa loja de roupas e depois foi recepcionista no con-sultório do médico Cláudio Fra-gelli. Ficou noiva do primo Délio,

Por Laura Samudio Chudecki

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que era conhecido como Zezi-nho, sobrinho de sua mãe. Os jovens começaram a cantar por brincadeira e passatempo. Délio ensinou Delinha a tocar violão e assim foram. Com o tempo pas-saram a se apresentar nas emis-soras de rádio locais. A primeira apresentação de Delinha foi na Emissora de Rádio PRI7, que fi-cava na galeria São José.

A vida dos jovens não era fácil, viver da música era algo impossível, apenas um sonho. Então, o negócio era trabalhar e trabalhar. Délio aprendeu a pro-fissão de tintureiro e Delinha e sua mãe o ajudavam no ofício. O sonho de Délio era tentar a vida em São Paulo e conseguir uma oportunidade para cantar nas grandes emissoras de rádio.

A visita do compositor Za-carias Mourão a Campo Grande aguçou os planos de Délio, de tentar a fama na cidade grande. Zacarias pediu que Délio o pro-curasse na Emissora Bandeiran-tes quando fosse à capital pau-lista.

Assim, os noivos Délio e De-linha, com a ajuda de familiares, conseguiram casar e juntar al-

gum dinheiro para a viagem até São Paulo. O casamento acon-teceu no dia 22 de fevereiro de 1958, em Vista Alegre.

São Paulo

Viagem longa e recepção com choque de realidade. A vida em São Paulo foi dura. Os jovens cantaram durante cinco anos na Rádio Bandeirantes, mas dinheiro que é bom, nada! Com o tempo, foram aparecen-do oportunidades para cantar em shows, circos e eventos. Enquanto o dinheiro da música não vinha, precisavam sobrevi-ver de outra forma. Délio traba-lhava em uma empresa no Vale do Anhangabaú e Delinha tra-balhava como empregada do-méstica.

Depois de muito sacrifício, cantando nos mais diversos e distantes lugares, a dupla Délio e Delinha — que também ficou co-nhecida como ‘O Casal de Onças do Pantanal’, apelido dado pelo Capitão Barduíno, apresentador de vários programas na Rádio Bandeirantes — conseguiu gra-var seu primeiro disco de 78 rota-

ções, em 26 de março de 1959. As músicas gravadas foram Malvada e Cidades Irmãs.

Delinha conta que o disco foi mais uma frustração: “De lá para cá, mudou muita coisa no mundo da música. Antes, você não gravava se não tivesse voz, ritmo e tudo mais. Eu ainda to-cava violão e o Délio também. Do nosso primeiro disco, vende-mos 230 cópias em três meses. O pessoal gravava e achava que ia ficar rico. O Délio ficou bra-vo e disse: Vou voltar para Mato Grosso e plantar mandioca! Ele pediu rescisão do contrato com a gravadora, que era a Califór-nia. Nesse tempo, o Zacarias Mourão veio para cá e estava

“A música é minha vida... A música a gente tem que cantar aqui de dentro, a gentetem que sentirpara poder passarpara as pessoas”

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tocando nas emissoras a mú-sica Malvada. Bom, ele voltou para São Paulo e pediu para o Délio autorização para regravar a música Malvada com sua pró-pria dupla. O Délio não quis, ele achava que se a música não ti-nha feito sucesso na nossa voz, não ia fazer sucesso com outras pessoas. Nisso tudo, o dono da gravadora Califórnia voltou a fa-lar com o Délio e pediu para ele regravar a música. Acabamos gravando novamente.”

Depois de tanta luta, e mais de 20 anos morando em São Paulo, a dupla conseguiu um es-paço no mercado da música e gravou 14 discos de 78 rotações e 19 LPs.

A saudade da família fa-lou mais alto e Délio e Delinha decidiram voltar para Campo Grande. A dupla ganhava a vida se apresentando pelos rincões mato-grossenses e ia a São Paulo apenas para gravar novas músicas.

Música

“A música é minha vida. Eu canto desde criança. Antes de casar com o Délio, eu cantava no coral da igreja. Depois que casei com ele, aos 19 anos, pas-sei a vida cantando.”

“Cada época é uma época. Outro dia me perguntaram se eu gosto de Luan Santana. Eu gosto daquela música dele, Me-teoro. Também gosto do Michel Teló. Cada um tem um estilo. Acho que a nova geração não tem muito aquele romantismo. A

música, a gente tem que cantar aqui de dentro, a gente tem que sentir para poder passar para as pessoas. Mas, mesmo assim, eles fazem sucesso, as pessoas gostam. São estilos diferentes. Eu gosto mesmo é do rasquea-do, bolero, fado, tango...”

Vida

Ainda hoje, beirando oito dé-cadas de vida, o ritmo de Deli-nha é acelerado. Continua tra-balhando, lutando para vencer os percalços do caminho. O di-nheiro da música não veio até hoje, mas, segundo ela, Deus sempre foi generoso e lhe ofere-ceu uma vida de sorte. A Dama do Rasqueado vive modesta-mente, não tem luxo, sua vaida-de se limita a unhas bem feitas, um batom e o cabelo arrumado. “Antes, eu vivia arrumada, mas, agora, já não tenho o mesmo ânimo”, diz ela.

Acorda cedo para arrumar e limpar a velha casinha, cheias de lembranças e histórias. “Não dá para parar, eu não fiquei rica! Te-nho que fazer hoje para comer amanhã. Enquanto Deus estiver me dando voz, eu vou continuar cantando. Minha vida é sempre uma coisa só, eu nunca tive em-pregada, sempre fiz todo o ser-viço da casa, lavo, passo e cozi-nho. Eu só tive uma pessoa para me ajudar quando João Paulo era pequeno e quando uma tia já de idade morou aqui”, conta.

Delinha só teve um filho. João Paulo Pompeu é filho do coração. Delinha o adotou ain-da bebê, no ano de 1969. Délio e Delinha se separaram em 1978. O motivo, segundo ela, foi a “in-compatibilidade de gênios”. De-linha conheceu outra pessoa, o Jairo, que foi seu companheiro durante 32 anos. Jairo Ferreira Barbosa morreu em setembro de 2012.

O fim do casamento de Dé-lio e Delinha não colocou fim na

“Com tantocarinho que eu recebo do meu público, não tem como não ser feliz. Sou muito feliz”

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parceria da música. Algum tem-po depois de separados, a dupla voltou a gravar e se apresentar em shows e eventos. Délio mor-reu em fevereiro de 2010, aos 84 anos de idade.

Felicidade e fama

Delinha nunca foi contagiada pela fama, considera-se uma mu-lher feliz e não faz ideia de que é um ícone da cultura sul-mato--grossense. “Com tanto carinho que eu recebo do meu público, não tem como não ser feliz. Sou muito feliz. Costumo dizer que meu único inimigo é a doen-ça. Fiquei muito ruim esses dias atrás, fiquei baixo astral, ia can-tar e não conseguia, minha voz é alta, mas estava precisando baixar o tom. A música O Sol e a Lua, já não estava conseguindo cantar mais. Agora estou come-çando a melhorar. Eu tenho que cantar, eu tenho que sobreviver”, afirma.

“Se eu tivesse noção do que sou, daquelas coisas todas que falam, já não ia prestar. Não que-ro saber nunca o que sou, o que

“Se eu tivesse noção do que sou, daquelas coisas todas que falam, já não ia prestar. Não quero saber nunca o que sou, o que represento. Quero apenas fazer jus ao carinho que as pessoas me dão. Isso me dá força, apoio”

represento. Quero apenas fazer jus ao carinho que as pessoas me dão. Isso me dá força, apoio. Não sou de ter o nariz pra cima, eu vivo aqui, nesta casa simples. As pessoas acham que eu moro num palácio, que tenho muito dinheiro... Sou uma pessoa sim-ples. E o que eu represento ou não, deixa pra lá.”

Está previsto ainda para o primeiro se-mestre de 2014, o lançamento de um vídeo documentário sobre a vida de Delinha. O documentário A Dama do Rasqueado terá 52 minutos de duração. O projeto é coor-denado pela cineasta Marinete Pinheiro e conta com recursos do Fundo de Investi-mentos Culturais de Mato Grosso do Sul (FIC).

A biografia de Delinha também está retratada no livro Por Onde Andei, de Wilson Werner Koller, que foi importante fonte para a elaboração deste texto. Contém episó-dios importantes da vida da cantora, impossíveis de resumir em poucas páginas. É uma agradável opção de leitura:

Por Onde Andei – Uma biografia de DelinhaWilson Werner KollerEditora Mart, 126 páginasÀ venda pela internet: www.martmusic.com.br

Telas e páginas

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Mato Grosso do Sul nas lentes cinematográficas Entre bois, pastos e lavouras, Marinete Pinheiro faz o cinema acontecer

CINEMA

Num estado de raízes agropecuárias, onde o incentivo à cultura e às

artes é um dos últimos na lista das políticas públicas, uma jo-vem cineasta, de 32 anos, voltou seu olhar às paragens onde se vê apenas bois, pastos e lavouras e descobriu um universo rico, ideal para histórias de cinema. Mari-nete Pinheiro é a dona de toda a ousadia, e tem como proposta inicial a produção de um vídeo documentário com lançamento previsto para acontecer ainda no primeiro semestre de 2014.

Antes de ingressar na Es-cuela Internacional de Cinema y Televisión de San Antonio de Los Baños, em Cuba, Marinete estudou jornalismo em Campo Grande. É natural de Aral Morei-ra, mas vive na capital sul-mato--grossense desde a primeira in-fância. Inscreveu-se no processo de seleção da escola cubana sem nenhuma pretensão. “Vai que dá”, pensou.

Segundo ela, o que a favore-ceu foi sua história de vida e o livro Salas de Sonhos – Histórias dos Cinemas de Campo Grande, que produziu como projeto de conclusão de curso, na faculda-de. O segundo volume, Salas de Sonhos – Memórias dos Cinemas de Mato Grosso do Sul, estava em produção quando recebeu o comunicado que havia sido aprovada para estudar em Cuba.

A personagem escolhida para o documentário em produção é a cantora Delinha, que durante décadas compôs a dupla Dé-lio e Delinha. Em suas músicas, a dupla sempre retratou o jeito simples de quem vive no campo

e descreveu com harmonia as paisagens que compõem Mato Grosso do Sul. Veja a entrevista:

Por que você decidiu fazer cinema?

A maioria das pessoas que querem fazer cinema são apaixo-nadas por cinema. No meu caso, não. Acho que a vida me levou a fazer cinema. Na verdade, a minha vontade era escrever um livro, e o livro acabou abrindo as portas para que eu fizesse cine-ma. Quando apareceu a oportu-nidade de fazer a prova para a fa-culdade de Cuba, eu pensei: Ah, vou fazer, vai que dá! Eu sempre aproveitei todas as oportunida-des, quando se abre uma porta eu entro para saber qual é. Fiz a prova, mas eu não achava que ia ser chamada. Acabei sendo a pri-meira a ser chamada. O meu pri-meiro livro me ajudou. A prova para a faculdade de Cuba ava-lia a sua história de vida, é sub-jetiva. Você tem que contar em uma lauda, um episódio de sua vida que acha que serviria para o roteiro de um filme. São conhe-cimentos que a escola julga váli-dos para o cinema. Quando rece-bi a carta de Cuba, dizendo que havia sido contemplada, estava dando início ao meu segundo li-vro. Fiz uma viagem de 45 dias por todo o estado, levantei todo o material possível e terminei de escrever lá em Cuba.

E a experiência de viver em Cuba?

Cuba é rodeada de lendas e mitos. É um país fantástico. Foi

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a melhor experiência de vida que tive. Eu morava na escola, que fica a sete quilômetros do povoado mais próximo e a 40 quilômetros de Havana. Então, ficava dentro desse ambiente do cinema, respirava cinema, uma imersão muito grande. São selecionados 40 alunos por ano, de todos os lugares do mundo. Então, não é só uma experiência de aprender cine-ma. Essa escola já foi conside-rada a melhor escola de cinema do mundo. Hoje ela é a quarta melhor, e a classificação atual se dá por conta da crise eco-nômica do país. Cuba enfren-ta muitos problemas políticos, especialmente com os Estados Unidos. Contudo, é um país que investe no aspecto social. A economia fica em segundo plano. Existe um grande inves-timento em saúde, educação e cultura. O básico tem, o ex-cedente não tem. O luxo, o su-pérfluo, não existem. Uma das coisas que aprendi lá foi o de-sapego, viver com pouco. Ao invés de investir o potencial econômico no consumo, eles investem na vida, no conheci-mento.

A Escola de Cinema de Cuba foi criada com o propósito de oferecer a oportunidade aos que nunca poderiam estudar cinema. Por exemplo, no meu caso, se não fosse essa oportu-nidade, eu provavelmente não teria condições para estudar em outro lugar. Foram os me-lhores anos da minha vida! E é muito difícil voltar.

Como você se manteve lá?

O custo para estudar lá é de 5 mil euros por ano. Mas os brasileiros têm uma bolsa mantida pelo governo federal, ou seja, nós não pagamos esse valor. Só os europeus pagam o valor. Não tínhamos despesa com nada, alimentação e mo-

radia é tudo por conta da es-cola. Minha única despesa era com passagens. Nesse período, eu vim quatro vezes ao Brasil. Quando fui para Cuba, eu vendi tudo o que eu tinha.

Por que escolheu a Delinha para o documentário?

Penso que temos que retra-tar as pessoas enquanto elas estão vivas. E a Delinha já está com 77 anos. Outra coisa: ela é mulher e é uma referência da música. A Delinha fala que a música dela não é música serta-neja, é uma música de raiz, uma música folclórica. É um registro de um personagem fundamen-tal para a música do estado. Ela e o Délio compuseram inúme-ras canções, que identificam a nossa cultura. É tão difícil viver da música e ela vive há 55 anos. A Delinha, por si só, é um per-sonagem, não tem como não se apaixonar por ela.

Qual sua avaliação do cine-ma nacional?

Nós temos muita produção de qualidade. Mas precisamos de mais janelas, como o Festi-val de Cinema, que é uma janela para a produção independente. Acho que o Brasil vive a melhor fase do cinema, pela qualidade da produção. Também temos que considerar que o Brasil quase não tem escolas de cine-ma, não tem investimento, não tem política de fomento e, mes-mo assim, estamos produzindo. A política de fomento ainda é muito fraca. Falta, ainda, incen-tivo para formação intelectual e cultural. Por que o cinema argentino é tão bom? Porque tem incentivo, formação cultu-ral. O Festival de Cinema, como o FestCine Vídeo América do Sul, além de um espaço para formação de público, deve ser um espaço onde o mercado do

cinema possa se encontrar.

Não acha muita ousadia fa-zer cinema em Mato Grosso do Sul?

Por que os europeus vão

para a América e para a África filmar? Porque o olhar está para a região periférica do mundo. Por exemplo: São Paulo, que é o nosso grande centro, é um lugar comum. Aqui não. Essa é justamente a minha expectati-va: filmar em uma região peri-férica, que nunca foi explorada antes. Aqui é uma região fan-tástica. Joel Pizzini, que, para mim, é o maior cineasta brasi-leiro, também tem essa pers-pectiva de filmar o fantástico. Filmar é algo que tenho que aprender muito. E isso a gente só aprende fazendo.

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Dicas para uma boa leitura

Quando lemos em voz alta, retomamos a experiência do compartilhar; lemos para um grupo de crianças, e elas, no decorrer da leitura, podem se sentir fazendo parte de uma unidade. Quantas vezes já presenciamos gru-pos inteiros de ouvintes se encostando e se “protegendo” das histórias de terror que estávamos lendo? Os grupos que ouvem histórias possivelmen-te saem mais unidos, seus participantes, mais cúmplices uns dos outros. A percepção é clara: a leitura dessas histórias realmente acalma, instaura um novo clima na sala de aula, silencia os ruídos infantis, entre outros muitos efeitos benéficos observados e invisíveis. Sabemos que as crianças amam as histórias, que poucas outras atividades de sua vida despertam tanto interesse; então, por que ainda se insiste em usá-las somente como meio de barganha? Por que não as tornamos o centro do ensino da leitura? As crianças, desde a mais tenra idade, deveriam saber que a leitura é capaz de abrir um mundo repleto de experiências e possibilidades. O desvelar dos mistérios do mundo e da própria vida interior deveria ser o objetivo principal da aprendizagem da leitura. A ânsia pela vida e a curiosidade es-tonteante das crianças encontram refúgio na leitura de livros de literatura.

“Pedagogia é arte. Em todas as gerações, há seres avisados, que não se deixam corroer pelos ácidos de tempos sombrios, seres que arejam insti-tuições, abrindo janelas por onde penetram ventos de mudança. Nas apá-ticas escolas que ainda vamos tendo (e merecendo?), a ‘Idade da Educa-ção’ já acontece, em espaços intersticiais, apenas acessíveis a olhares que se não deixaram corromper. Todos os dias me chegam notícias de discre-tos prodígios. No segredo das suas salas, há professores que não esperam, que recriam. Ser esperançoso também é isto: escrever para os netos com a serena segurança de que eles serão os nossos olhos e as nossas mãos, quando os filhos deles forem, finalmente, as crianças felizes e sábias que desejaríamos todas as crianças fossem.” O educador português propõe, por meio de histórias contadas ao seu neto Marcos, uma nova pedago-gia, e questiona determinados padrões da escola atual. Pacheco é mestre pela Universidade do Porto, professor do ensino fundamental na Escola da Ponte, e do ensino superior.

Através da Vidraça da Escola - FormandoNovos LeitoresIlan BrenmanEditora Aletria2ª Edição166 Páginas

Para os filhos dos filhos dos nossos filhos José PachecoPapirus Editora3ª Edição128 Páginas

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ARTIGO

Estou pensando cá com minhas inquietudes so-bre por que gosto de

documentários que falam de povos, grupos e situações que não conheço e com os quais não irei conviver. Talvez eu goste das histórias diferentes do meu cotidiano porque pos-so só assistir sem que me exi-jam nenhum posicionamento, nem sobre mim e nem sobre eles. Quando o documentário da vida é ali, no meu espaço de vida... ah, esse, sim, exige de mim.

O diferente, quando está dis-tante, já sabemos que é diferen-te e por isso olho com olhos de mim e até admiro a diferença... difícil mesmo é quando o dife-rente fica perto, convive, me olha nos olhos... e não me deixa desviar. Esse sim, me confunde. Já não tenho mais uma recei-ta pronta para as respostas e, pior, exige também modificar--me. A aventura do novo pre-cisa do abandono da certeza, ganho e perda, numa dialética que me requer tomar posição – o exercício da adultez.

Esse cotidiano que me forma todos os dias, na maioria das vezes, é separado da lida edu-cadora. Mas, nós que vivemos no chão da educação, vamos compondo nosso conhecimen-to e nosso viver, manifestado na ética e na estética, com tudo

que aprendemos aqui e acolá.

Minha vizinha, com seu neto, ainda menina, me disse: “esse me-

nino é brabo, não sei prá quem puxô,

mas se você olhá firme e com bonda-

de nos olhos dele, ele amolece e lhe escuta”.

Ou o Seu Mário que, diante

da notí-c i a

da televisão de que o filho já ti-nha passado mais de 10 vezes pela polícia falou: “lá na escola, ele falou que fica só na diferen-ça, que ninguém entende que ele quer pichar, que quer ser artista, e eu falei prá ele: então, você vai levando até encontrar um lugar que lhe entenda e, na escola, vai lá passar de ano. Mas evita falar que mora num terrei-ro, senão a coisa fica pior prá você! ”

Eles me ensinaram que a di-ficuldade do ensinar não estava nos meninos, mas em nós, que, na pressa das metas, não tínha-mos criado o vácuo entre os va-lores da escola e os meninos e suas famílias, na perspectiva de construir relações educadoras, coletivos de aprendizagem. Em ambos os casos foi na conversa de corredor que encontramos saída. A diversidade como vi-vência ainda não chegou como deve ser na sala dos professo-res, na cantina, na secretaria escolar.

A formação que recebemos ainda é para tratar caso a caso, como se fossem exceções, ou seja, sem fazer política, que é, como diria Arendt (2012), uma relação que avança em busca de coletivos visando superar as problemáticas que não são deste ou daquele. Ainda pau-tamos os “casos” das diversi-dades como sendo de respon-sabilidade ou vulnerabilidade individual e até mesmo atribuí-mos culpa ao sujeito pelos pro-blemas vivenciados. A busca por compreender o contexto produtor de desigualdades e de gentes que se expressam di-ferentemente no viver, visando fugir das discriminações, ainda é pouco exercitada, pois exige pensar, politicar, tomar posi-ção.

Somos seres sociais em (des)construção permanente e fomos educados para nos divi-dir entre trabalho, família, re-

Sobre diversidades e inteirezas: os (des)aprenderes que caminham também pela escola

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Estela Márcia Rondina ScandolaEducadora, doutoranda em Serviço Social, pelo ISCTE-Lisboa / UFPE-Brasil

Referências

ARENDT, Hannah. O que é política? Organização: Úrsula Ludz. Traduzido por Reinaldo Guarany. 10ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012.

FREIRE, Paulo. À sombra desta mangueira. 10ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.

ligião, amizades, ou seja, para viver em pedaços, ou, dolorida-mente, para comportarmo-nos em cada lugar de um jeito. Isso não é saudável. Freire (2012), ao responder os eternos ques-tionamentos sobre a sua amo-rosidade em todos os lugares e papéis que tinha, anunciou: “Eu sou uma inteireza e não uma dicotomia”, pois lhe questiona-vam sobre a paixão com que vi-via no ambiente escolar ou nas atividades com os movimen-tos sociais e a maneira como se relacionava com os amigos e a família. Da mesma forma de ser social integral, escrevia e produzia ciência: “a paixão com que conheço e com que falo ou escrevo não diminui em nada o compromisso com que denuncio ou anuncio” (Freire, 2012:28).

Não somos vários seres e, se queremos ser, sofremos enor-memente. É por isso que se-parar o trabalho na educação do restante do nosso viver é tão ruim e pernicioso para nós mesmos e para as pessoas com as quais trabalhamos, e tam-bém para os educandos. É pre-ciso regrar o horário em que cada universo – trabalho, lazer, cultura, amigos e família – é a principal atividade, mas sepa-rá-los sem que se influenciem e se componham, é impossível. No entanto, as regras de cada grupo social de que participa-mos, muitas vezes, nos impe-dem de ser o que somos, pois podem estar tão fechados em valores autoritários diante das diversidades, que estas não po-dem aparecer, como as sexua-lidades, as religiões, as prefe-rências culturais, as ideologias. Quando a visibilidade corajo-sa da diversidade aparece, o nosso relacionamento chega, ao máximo, à consideração da aceitação ao “exótico”, “dife-rente”, sem que se abale ou nos questione.

As escolas têm o desafio de ser o lugar do convívio com a diversidade, pois é ali um dos territórios de possibilidades. Não um território onde os edu-cadores constroem uma edu-cação libertária para os estu-dantes, mas onde eles próprios podem viver o processo liber-tário de ser educadores. Nova-mente chamando Freire (2012), significa que a escola não é o lugar só dos estudantes, mas pode ser o lugar das relações libertárias. A coerência dos educadores é o fundamento para isso, pois, se convivem em diversidades também entre os trabalhadores, com os estu-dantes vivenciarão coerências aprendidas, ou seja, terão a au-toridade sobre o exercício de aprender/desaprender diver-sidades: “A força do educador democrata está na sua coerên-cia exemplar. É sua coerência que segura sua autoridade. O educador incoerente, que diz uma coisa e faz outra, etica-mente inconsistente, irrespon-sável, não é só ineficaz, é pre-judicial. Desserve mais do que o autoritário coerente” (Freire, 2012:118).

Por isso, os projetos que objetivam escolas democrá-ticas e não violentas, ou seja, educadoras, com diversidades étnico-raciais, de orientação sexual e identidade de gênero, de geração, religiosa, cognitiva e de necessidades específicas, precisam que, no seu corpo de trabalhadores, estas marcas es-tejam presentes, conviventes, questionadoras e tensionado-ras do certo e o errado, do bo-nito e do feio.

É urgente ir em busca de um jeito de educar, em que os mar-cadores das diversidades não sejam discriminatórios, mas motivos de alegria, em que os documentários do nosso viver nos impulsionem a coletivos de aprendizagem apaixonantes.

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CRÔNICA

Na edição de novem-bro de 2013, a re-vista Atuação abor-

dou, na reportagem de capa, o ensino dentro das unida-des prisionais de Mato Gros-so do Sul, estado pioneiro na regulamentação de uma escola pública para aten-der a população carcerária. Mostramos como a educa-ção pode melhorar a vida de quem está atrás das grades, além de oportunizar condi-ções mais dignas e equâni-mes no retorno à liberdade.

Recebemos vários e-mails parabenizando nossa repor-tagem, bem como as demais matérias da revista. E, para nós, é sempre uma grande satisfação receber o feedback dos nossos leitores e entre-vistados.

Exemplares da revista foram distribuídos nas pe-nitenciárias, por meio da direção da Escola Estadu-al Prof.ª Regina Lúcia Anffe Nunes Betine, que atende a população de presos. E agora, faltando poucos dias para o fechamento desta edição, recebemos uma cor-respondência do Estabele-cimento Penal Feminino do

município de Rio Brilhante (MS). A remetente, interna do estabelecimento, diz na carta que leu várias vezes a reportagem sobre o ensino penitenciário, até que criou coragem para nos escrever e narrar sua história.

Rosalina Ferreira nasceu na cidade de Maracaju, tem 38 anos, foi condenada por furto em 2010 e processada por roubo em 2012. É tam-bém ex-dependente quími-ca. Segundo ela, ainda está em processo de recupera-ção: “Me encontro limpa há dois anos e três meses, cada amanhecer é uma vitória, me considero uma guerreira. Mato um leão por dia, como diz o ditado popular, pois a droga é traiçoeira. Por isso, me considero uma vigilante de mim mesma...”, escreveu.

De acordo com a Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen/MS), mais de 90% das prisões de mulheres são decorrentes do tráfico ou uso de entorpecentes.

Em breve, Rosalina deve passar a cumprir a pena em regime semiaberto e diz que está disposta a lutar pelo

sonho de ser escritora. Na carta, pede oportunidade para publicar uma de suas crônicas. Os textos da presi-diária tratam do mundo das drogas, “lugar” que ela co-nhece bem, mas para onde não quer mais voltar.

Rosalina diz que está qui-tando seu débito com a so-ciedade e, depois, vai come-çar uma nova história. Em Rio Brilhante, em 2011, a in-terna foi aluna de uma das extensões da Escola Esta-dual Prof.ª Regina Lúcia An-ffe Nunes Betine. Na prisão, além de estudar, fez vários cursos profissionalizantes. “Não vejo este lugar como um presídio, mas sim como uma escola disciplinar. Aqui aprendi muitas coisas boas”, afirma.

Diante da solicitação de Rosalina, a FETEMS e o con-selho editorial da revista Atuação acharam por bem publicar uma das crônicas, reafirmando o poder trans-formador da educação, seja na sala de aula de uma esco-la convencional, seja na cela de uma penitenciária.

Esperamos que aprecie a leitura.

O poder transformadorda educaçãoSeja na sala de aula de uma escola convencional, seja na cela de uma penitenciária, a educação é capaz de transformar realidades e motivar novas histórias, como é o caso de Rosalina Ferreira

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Fama!Rosalina Ferreira

Já fiz minha fama, sou fa-moso, sou herói. No mundo eu fiz minha fama, sou aplaudido de pé. Meu nome todos sabem, sou lindo, sou loiro, minha pele é branquinha, sou magro. Mi-nhas roupas, meus fãs é que escolhem. Eu faço todo mundo rir, tremer, ficar ansioso. Eu sou poderoso. Se eu quiser, faço você morrer de medo, te faço ter delírios.

Você nunca vai se esconder de mim, pois estou em qualquer lugar. Se eu não vou até você, é você que vem até mim, pois estou em qualquer lugar. Eu te-nho mais força que você e sem-pre vou ter, nem adianta tentar se livrar de mim. Mas tem um porém: quando você não me quiser mais, eu me adianto e te mato.

Onde eu estiver, você vai fa-zer de tudo para marcar um en-contro comigo. Eu sei que você é louco por mim, mas vou me adiantando: eu não posso ser só seu, eu sou de todos que me querem, que me amam.

Se eu te pedir... pedir, não! Se eu mandar, você rouba e mata por mim. Você está sob o meu comando, eu mando e você obedece. E o que eu faço por você? NADA! Nada, não! Eu te destruo! Primeiro faço você perder o respeito por si mes-mo. Segundo passo: tiro o amor da sua família. E o respeito que eles têm por você, faço você perder. Terceiro passo: afasto seus melhores amigos até eles te esquecerem. Adoro te ver na solidão, se sentindo sozinho, ti-rado. Amo te ver magoado, tris-te e infeliz, pois sua infelicidade é minha maior alegria.

Eu adoro ver você corren-do atrás de mim, não dos seus familiares. Quando você não consegue me ter, até chora. Eu gosto mesmo de te ver se humi-

lhando por mim, essa é a minha alegria! Você, pra mim, é uma marionete, que me trata bem, me esconde para não me dividir com ninguém. Por mim, você mente, implora, e é por isso que eu gosto de brincar com você.

O mestre manda, o burro obedece. Mas, é lógico, o mes-tre sou eu, por mais que você cuide bem de mim. Me esconde dos outros, me veste com várias cores de roupas, azuis, brancas, amarelas, pretas, prateadas e até transparentes. Você me veste do jeito que você quer, não se cansa de me querer.

Não sou cantor, mas te levo à loucura. Não sou ator, mas você faz tudo para estar comigo. Não sou astro de Hollywood, mas tenho domínio sobre você. Mas mesmo sabendo disso, você me ama e me obedece. Quem me conhece, quem me experimen-ta, larga tudo para estar comi-go. Enquanto isso, eu só quero te usar, te deixar delirando. Na verdade, otário, aos poucos eu vou te matar.

Depois de te contar tudo o que eu posso fazer com você, eu te faço um convite: vem co-migo, pois eu gostaria e vou matar você. Vem ou não?

Só me fala uma coisa: sou ou não sou um herói? Posso ou não posso me considerar o “todo poderoso”?

Vou lhe contar meu nome. Tenho vários, mas sou o mesmo. Pode me chamar “o senhor Cra-ck”! Sobrenome: Pasta-Base. Vulgo: Pedra. Uns me chamam de Oxi! Mas também tenho um irmão chamado Cocaína, tam-bém conhecido como Pó, que é tão avassalador quanto eu, que também destrói e até mata. Somos uma família de distribui-dores de fracos e otários, mas você nos procura sem se can-sar!

Ha ha ha ha ha ha! Venha co-nosco, otário! Te daremos um caixão de presente...

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Ser cidadão é saber que há na lei igualdade para todos.Igualdade, essa, que não é respeitada, valorizada, mas

dizimada.Alguns chegam até a pensar...

“– Quem pode, pode! Quem não pode, não pode”! Outros interrogam:

“– Até quando viveremos assim?”Será que em outras vidas isso também existirá?

Perguntas como estas, muitas pessoas estão a fazer.Mas poucas são as que têm coragem de responder.

Eis aqui algumas opiniões para quem quer aprender a ser cidadão.

Ser cidadão...Não é aquele que deixa o irmão levar, sozinho, a cruz.

Mas aquele que o ajuda nos momentos mais difíceis da caminhada.

Não é aquele que reparte somente tristezas e agonias,Mas é o que ajuda o necessitado com um pedaço de pão.

Ações de solidariedade são pregadas, mas não vividas.Vidas, para serem realmente vividas, têm que ter consciência.

Para dizer não à humilhação!Humilhação que faz crianças morrerem de fome e exclusão.

Exclusão social, política, partidária e até de religião.Ser cidadão é procurar seguir os passos de um rei que

pouco aqui viveu.Mas exemplos de cidadania nos deu.

Um deles diz: “lança seu pão sobre as águas...”Lançar o pão não é...

Dar com uma mão e correr, contar e querer aparecer;Não é...

Fazer por fazer;Não é...

Vangloriar-se perante os menos favorecidos;Não é...

Fazer política usando inocentes;Não é... Não é... Não é...

Ser cidadão, então, é ter consciência de que igualdade, dignidade, fraternidade...

Dependem de cada ser humano da nação.Sem olhar cor, conhecimento, fé ou religião.

É, acima de tudo, saber que fazemos parte de uma nação.E somos todos irmãos!

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Elisabete da Silva SchroederProfessora da Rede Municipal de

Ensino de Ponta Porã - MS

SER CIDAD

ÃO

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