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VOLUME 96 NÚMERO 2 MAIO—JUNHO—JULHO—AGOSTO 2015
REVISTA BRASILEIRA DE FARMÁCIA
Brazilian Journal of Pharmacy
PUBLICAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE FARMACÊUTICOS
WWW.RBFARMA.COM.BR ISSN (online) 2176-0667
Revista Brasileira de Farmácia – ISSN 2176 – 0667 (on line)
Volume 96 Número 2 Maio – Junho – Julho - Agosto / 2015
SUMÁRIO
PESQUISA / RESEARCH / REVIEW
DESCARTE DE MEDICAMENTOS NO MEIO AMBIENTE NO BRASIL DISPOSE OF MEDICINES ON THE ENVIRONMENT IN BRAZIL Carla Patricia Figueiredo Antunes de Souza & Elda Falqueto
1142
ESTRATÉGIAS PARA PROMOÇÃO DA ADESÃO EM UM AMBULATÓRIO DE ANTICOAGULAÇÃO: CONTRIBUIÇÃO PARA A EFETIVIDADE DO TRATAMENTO. STRATEGIES FOR PROMOTING MEDICATION ADHERENCE IN AN OUTPATIENT ANTICOAGULATION: A CONTRIBUTION TO THE EFFECTIVENESS OF TREATMENT. Ronara Camila de Souza Groia, Josiane Moreira da Costa, Tayane Oliveira dos Santos, Lázara Montezano Lopes, Josiane de Macedo Martins, Luana Amaral Pedroso, Maria Auxiliadora Parreiras Martins & Adriano Max Moreira Reis
1159
ESTUDOS BRASILEIROS SOBRE AUTOMEDICAÇÃO: UMA ANÁLISE DA LITERATURA Amanda Luzia De Araújo, Camila Alves Areda, Emília Vitória da Silva, Micheline Marie Milward de Azevedo Meiners & Dayani Galato
1178
EXPOSIÇÃO OCUPACIONAL A MATERIAL BIOLÓGICO ENVOLVENDO TRABALHADORES QUE ATUAM EM DROGARIAS E MEDIDAS ADOTADAS PARA PREVENÇÃO Vivian Etienne Gonçalves e Silva, Michele Sousa, Debora Heloisa Quadros Araujo, Priscila do Carmo Freitas de Carvalho, Elucir Gir, Silmara Elaine Malaguti Toffano
1202
COMPARAÇÃO DE MÉTODOS DE PREPARO DE AMOSTRAS DE SANGUE PARA DETERMINAÇÃO DE CHUMBO E CÁDMIO POR ICP-MS COMPARISON OF BLOOD SAMPLES PREPARATION METHODS FOR LEAD AND CADMIUM DETERMINATION USING ICP-MS Luciana Juncioni de Arauz, Lidiane Raquel Verola Mataveli, Maria de Fátima Henriques Carvalho, Márcia Liane Buzzo & Paulo Tiglea
1216
DESENVOLVIMENTO E VALIDAÇÃO DE MÉTODO ANALÍTICO PARA DETERMINAÇÃO DE ANLODIPINO EM COMPRIMIDOS E AVALIAÇÃO DA EQUIVALÊNCIA FARMACÊUTICA DEVELOPMENT AND VALIDATION OF AN ANALYTICAL METHOD FOR DETERMINATION OF AMLODIPINE TABLETS AND EVALUATION OF PHARMACEUTICAL EQUIVALENCE Aline Marques Rosa, Teófilo Fernando Mazon Cardoso, Rúbia Adrieli Sversut, Joslaine de Oliveira Nunes, Marcos Serrou do Amaral & Nájla Mohamad Kassab
1228
AVALIAÇÃO E COMPARAÇÃO DA QUALIDADE DE MEDICAMENTOS CONTENDO CLORIDRATO RANITIDINA Vanessa Bellini Espindola, Teófilo Fernando Mazon Cardoso, Rúbia Adrieli Sversut, Aline Regina Hellmann Carollo, Marcos Serrou do Amaral & Nájla Mohamad Kassab
1248
Revista Brasileira de Farmácia – ISSN 2176 – 0667 (on line)
AVALIAÇÃO DA EQUIVALÊNCIA FARMACÊUTICA DE COMPRIMIDOS DE HIDROCLOROTIAZIDA DISPONÍVEIS NO MERCADO DO RIO DE JANEIRO EVALUATION OF PHARMACEUTICAL EQUIVALENCE OF HYDROCHLOROTHIAZIDE TABLETS AVAILABLE IN THE RIO DE JANEIRO MARKET Larissa Ferreira Correia, Marcos Martins Gouvêa, Elizabeth Valverde Macedo2, Carlos Augusto de Freitas Peregrino & Samanta Cardozo Mourão
1266
DISLIPIDEMIAS EM USUÁRIAS DE ANTICONCEPCIONAIS ORAIS DYSLIPIDEMIA IN ORAL CONTRACEPTIVE PILL USERS Kisnielly Lacerda Alves de Moura, Diego Uchoa Viana, Luana Lucena Ramalho, Emanuela Machado Silva Saraiva, Fernando Figueredo Gomes & Natalia Bitu Pinto
1285
VALIDAÇÃO DE METODOLOGIA ANALÍTICA PARA QUANTIFICAÇÃO DE BOLDINA EM UM FITOTERÁPICO COMPOSTO CONTENDO PEUMUS BOLDUS MOLINA E SOLANUM PANICULATUM L. Luciene de Oliveira Morais, Jéssica Salvador Areias de Araújo & Elizabeth Valverde Macedo
1302
CARACTERIZAÇÃO FITOQUÍMICA, TOXICIDADE E AVALIAÇÃO PRELIMINAR DA ATIVIDADE ANTIBACTERIANA DAS FOLHAS DE BAUHINIA UNGULATA L. PHYTOCHEMICAL CHARACTERIZATION, PRELIMINARY TOXICITY AND EVALUATION OF THE ANTIBACTERIAL ACTIVITY OF THE LEAVES OF BAUHINIA UNGULATA L. Cristiane da Silva Paula, Maria Christina dos Santos Verdam, Beatriz Cristina Konopatzki Hirota , Angela Maria de Souza, Cristiane Bezerra da Silva, Obdúlio Gomes Miguel & Marilis Dallarmi Miguel
1315
ASSUNTOS GERAIS
Expediente
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
Descarte de Medicamentos no Meio Ambiente no Brasil
Dispose of Medicines on the environment in Brazil
Carla Patricia Figueiredo Antunes de Souza¹* & Elda Falqueto²
¹ Farmacêutica mestranda em Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca ENSP/FIOCRUZ. Rio
de Janeiro, RJ, Brasil. ² Farmacêutica Doutora em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca
ENSP/FIOCRUZ. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
*Contato: Travessa Roberto, 25 – Vilar dos Teles, São João de Meriti, RJ. Brasil. CEP: 25570-167. Tel: (21) 96239297
email: [email protected]
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1143 Souza, C. P. F. A.; Falqueto, Elda Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1142 – 1158, 2015.
RESUMO
O medicamento tem um papel relevante na saúde pública, desde o combate as enfermidades até a
manutenção e prolongamento da vida. Estudos demonstraram que vários medicamentos são
persistentes no meio ambiente e não são completamente removidos das estações de tratamento de
esgoto, estando presentes na água para consumo, acarretando intoxicação, doenças e degradação
ambiental. Analisar os danos causados pelo descarte incorreto de medicamentos no meio ambiente e
sua relação com a Saúde Pública é o objetivo principal deste trabalho. Nesta análise identificaram-
se as principais fontes geradoras e quais os fármacos mais encontrados. Através de levantamento
bibliográfico foram consultados artigos científicos e dissertações, no período de 2003 a 2011. Como
resultado principal destaca-se o descarte feito pela população no lixo ou esgoto. O descarte de
medicamentos, principalmente de antibióticos e hormônios, preocupam as autoridades sanitárias por
gerar um grave problema de saúde pública. Embora vários fármacos sejam encontrados no meio
ambiente as classes de antibióticos e hormônios são os que mais preocupam. O presente trabalho
identificou que as questões relacionadas à geração e o descarte de resíduos de medicamentos devem
ser amplamente discutidas e estudadas em nível de saúde pública visando sensibilizar a população,
as empresas e as autoridades pertinentes para que se preocupem com soluções urgentes voltadas
para o uso racional de medicamentos e o correto descarte de seus resíduos.
Palavras-chave: Gerenciamento de resíduos, Saúde pública e Impacto ambiental.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1144 Souza, C. P. F. A.; Falqueto, Elda Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1142 – 1158, 2015.
ABSTRACT
The medicine has an important role in public health, from combating the diseases to maintenance
and life extension. Studies have shown that several drugs are persistent in the environment and are
not completely removed from sewage treatment plants, being present in drinking water, causing
poisoning, disease and environmental degradation. Analyze the damage caused by incorrect
disposal of medicines on the environment and its relationship to public health is the main objective
of this work. This analysis identified the major sources and which found more drugs. Through
literature research papers and dissertations were consulted, from 2003 to 2011. The main result
stands out disposal made by the population in the garbage or sewage. While several drugs are found
in the environment classes of antibiotics and hormones are the most care. This study identified that
the issues related to the generation and drug waste disposal should be widely discussed and studied
in public health level to sensitize the population, companies and the relevant authorities to worry
about urgent solutions aimed at the rational use of medicines and the correct disposal of their waste.
Keywords: waste management, public health and environmental impact.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1145 Souza, C. P. F. A.; Falqueto, Elda Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1142 – 1158, 2015.
INTRODUÇÃO
Os medicamentos têm um papel de relevância em nossa sociedade, dada sua importância no
combate das enfermidades bem como de proporcionar o prolongamento da vida humana. No
entanto, são também precursores de agravos à saúde, quando mal utilizados ou usados para fins
diferentes de sua indicação terapêutica, (Ueda et al., 2009), pois os medicamentos podem ser
agentes tóxicos quando usados de forma errada. O uso indiscriminado ocorre, na maioria dos casos
pela aquisição dos medicamentos, mas merece destaque o acesso através de compartilhamento entre
parentes e amigos ou através daquilo que é jogado fora (Falqueto, 2010).
O Brasil é um grande consumidor de medicamentos que, na maioria das residências acaba
por ter seu prazo de validade vencido (Febrafarma, 2002). Durante o tratamento urgente ou crônico,
as pessoas adquirem medicamentos que muitas vezes não são consumidos por completo e acabam
por ser armazenado para um possível consumo posterior, seu próprio ou de conhecidos. Muitos
desses produtos sobram após o tratamento e acabam sendo descartados com o lixo doméstico ou
esgoto comum (Ueda et al., 2009).
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) está cada vez mais exigente no que
dizem respeito à qualidade, segurança e eficácia dos medicamentos, exigindo a realização de testes
mais rígidos para o registro de produtos novos e readequação dos que estão no mercado (Falqueto,
2007). Isso aumenta a segurança no uso controlado de medicamentos, porém, é necessário rever a
Política de Medicamentos no que tange ao consumo exacerbado com intuito de coibi-lo e evitar
também desperdícios que, além de onerarem o cidadão, podem ser fonte para uso indevido e
descarte ao meio ambiente. (Brasil, 1998; Barcelos et al., 2011).
Aspectos relacionados ao descarte são deveras importantes quando dados estimam que 20%
dos medicamentos adquiridos tenham o lixo como destino final (Abrelpe, 2010). Essa situação é
agravada pela inexistência de um programa de recolhimento de medicamentos vencidos nas
residências. Vale destacar que o Brasil está no ranking entre os dez maiores consumidores de
medicamentos do mundo, apesar dos altos custos destes produtos (Febrafarma, 2002).
A contaminação ambiental causada por medicamentos já foi comprovada por alguns estudos
como os realizados por Zaparroli et al., 2011; Almeida & Weber, 2005; Bila e Dezotti, 2003. Esta
contaminação é, em parte devido ao descarte incorreto de sobras de tratamento e medicamentos
vencidos, mas também se deve àquilo que é excretado pela urina e pelas fezes após metabolismo
destes produtos no corpo humano. Outra fonte importante para o lançamento de medicamentos no
ambiente são os efluentes hospitalares, além de substâncias diagnósticas e desinfetantes, apesar da
existência da força legal para gerenciar os resíduos dos serviços de saúde (Brasil, 2004). Os
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
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medicamentos de uso veterinário também são lançados no meio ambiente por meio de excrementos
e de transporte pela água das chuvas (Almeida et al., 2005).
Fatos especialmente preocupantes referem-se aos medicamentos que podem causar
dependência física ou psíquica; aos antibióticos; hormônios; anestésicos; antilipêmicos; meios de
contrate de raios X; anti-inflamatórios entre outras substâncias. Neste contexto, o descarte de
medicamentos vencidos pode culminar em impactos ambientais extremamente relevantes, afetando
diversos ecossistemas (Barcelos et al., 2011).
Dada a importância do tema, o presente trabalho se propôs a analisar os danos causados pelo
descarte incorreto de medicamentos no meio ambiente e sua relação com a saúde pública através de
um levantamento bibliográfico relacionado ao tema em estudo, além de apontar ferramentas para o
melhor gerenciamento dos resíduos de medicamentos, inclusive os oriundos das residências dos
cidadãos.
MATERIAIS E MÉTODOS
A pesquisa realizada foi de base bibliográfica. Pressupôs o levantamento de textos
publicados em revistas científicas, que constituiu a principal fonte de pesquisa. Outras fontes
utilizadas foram livros, dissertações de mestrado e trabalhos científicos apresentados em
Congressos.
Nesta pesquisa foram utilizados os seguintes descritores: resíduo de medicamento, descarte
de medicamento, fármacos residuais, resíduos de fármacos no meio ambiente, fármacos no meio
ambiente e resíduo medicamento e saúde pública. A pesquisa abrangeu o período de publicação
2003 a 2011 no Brasil.
Foram pesquisadas as bases de dados dos Periódicos Capes, Scielo, Lilacs e Google
Acadêmico com páginas em Português. A inclusão da fonte Google Acadêmico deveu-se aos
poucos resultados encontrados nas bases pesquisadas a fim de tornar a pesquisa mais rica de
informações.
Os critérios de inclusão e exclusão: estar dentro do período fixado (2003 a 2011) e conter no
título algum dos descritores mencionados. Para o Google Acadêmico foram analisados os artigos
das primeiras três páginas geradas pela pesquisa que fossem de revistas científicas e/ou instituições
públicas, visto que as demais páginas fugiam do assunto pesquisado.
Utilizou-se como fonte de consulta o livro: O que você precisa saber sobre resíduos de
medicamentos; por abordar especificamente o tema. A inclusão de uma monografia, dois trabalhos
científicos e quatro dissertações de mestrado na pesquisa, além dos artigos, se tornou relevante visto
que abordam o conteúdo de interesse pesquisado de forma mais profunda e são de locais de
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interesse acadêmico e das mais variadas regiões do Brasil, como a Escola Politécnica Joaquim
Venâncio – Fiocruz, a Escola Nacional Saúde Pública - Fiocruz, Universidade Federal Tecnológica
Paraná, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, a Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, USP e UNICAMP. Os materiais encontrados foram analisados segundo sua pertinência ao tema
deste trabalho, ou seja, a relação do resíduo de medicamento com a saúde pública. Neste sentido, as
unidades de análise desta pesquisa foram: métodos de análise e quantificação de fármacos; análise
dos aspectos legais e ambientais do descarte de resíduos de medicamentos; aspectos toxicológicos
do descarte de medicamentos; caracterização dos medicamentos descartados e consciência
ambiental; gerenciamento de resíduos de medicamentos; tratamento de resíduos medicamentos e
logística reversa de medicamentos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os materiais científicos selecionados após a busca bibliográfica foram: 16 artigos, 2
trabalhos de congresso, 4 dissertações de mestrado e 1 monografia. A partir da avaliação do
material selecionado foram identificadas as unidades de análise sobre resíduo de medicamentos e
sua relação com o meio ambiente.
Métodos de análise e quantificação de Fármacos
O estudo realizado por Pizzolato et al (2007) mostrou o desenvolvimento de uma
metodologia analítica para quantificação de fármacos em nível de traços como poluentes no meio
aquoso, usando a técnica de cromatografia líquida com detector espectrofotométrico na região do
ultravioleta (HPLC-UV). Os fármacos analisados foram da classe dos antibióticos. Estudos
realizados por Bila & Dezotti (2003) e Almeida et al (2005) sobre a detecção de baixas
concentrações de diferentes grupos de fármacos no ambiente aquático, mostraram que a extração
em fase sólida é o melhor meio para análise, e frequentemente requer fases específicas, associadas à
cromatografia líquida de alta eficiência acoplada à espectrometria de massas (CLAE/EM) ou ainda
a cromatografia líquida de alta eficiência acoplada a dois espectrômetros de massa em série (CLAE-
EM/EM).
Alguns artigos como de Melo et al (2009); Crestana et al (2011) e Zuccato et al (2006)
informaram que existe uma preocupação no desenvolvimento de métodos analíticos suficientemente
sensíveis na determinação dos fármacos residuais em ambientes aquáticos, com limites de detecção
na ordem de μg/L e ng/L. O estudo realizado por Crestana et al (2011) teve como objetivo mostrar a
dimensão da exposição da população aos fármacos residuais citando métodos de identificação e
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quantificação dos fármacos. O estudo realizado por Zuccato et al (2006), revelou a presença de
resíduos de fármacos em corpos hídricos e sua contaminação resulta da excreção de metabólitos de
fármacos, tanto por seres humanos quanto por animais e do descarte indevido destes compostos
diretamente da rede de esgoto (Zuccato et al., 2006). A remoção de poluentes orgânicos
persistentes, como fármacos, na água e em efluentes, pode ser obtida utilizando-se tecnologias
avançadas de tratamento, tais como Biorreatores com membranas, Processos Oxidativos Avançados
e Adsorção em carvão ativado (Tambosi, 2008). Os processos oxidativos avançados também têm
sido extensivamente estudados devido ao seu potencial como alternativa ou complemento aos
processos convencionais de tratamento de efluentes, uma vez que os radicais hidroxila gerados são
altamente reativos e pouco seletivos, podendo atuar na oxidação química de uma vasta gama de
substâncias (Melo et al., 2009).
No estudo de Pizzolato et al (2007) para detecção e quantificação de fármacos os de maior
ocorrência são em ambiente aquáticos, que é a principal via de contaminação destes resíduos no
meio ambiente, sendo a concentração dos resíduos um fator importante na detecção dos mesmos
(Melo et al., 2009). Não identificamos estudos feitos no solo e no ar e que ainda são escassas as
informações sobre a identidade dos produtos de degradação e sua toxicidade no Brasil. O estudo de
Melo et al (2009) evidencia que os processos convencionais de tratamento de água e esgoto, não
mostram ser eficientes para a remoção de vários resíduos de fármacos. Sendo assim alerta-se para a
realização de mais pesquisas com emprego de tecnologias para melhorar o tratamento da água e a
remoção dos resíduos do esgoto.
Análise dos aspectos legais do descarte de resíduos de medicamentos
No estudo realizado por Rodrigues (2009), sobre a análise dos aspectos legais e ambientais
do descarte de resíduos de medicamentos, foi avaliado o cenário do fluxo de informações em três
dimensões: cadeia de suprimentos, gerenciamento dos resíduos e legislação. O estudo agrupou as
empresas em três níveis: indústrias farmacêuticas, distribuidoras de medicamentos e farmácias.
Também foram avaliados os seguintes aspectos para cada nível agrupado: tipo de resíduo
produzido, situações em que ocorre a devolução dos medicamentos e aplicação da legislação. O
Brasil conseguiu grandes avanços na legislação, porém existem ainda divergências entre os aspectos
regulatórios. No setor farmacêutico há divergências quanto à responsabilidade do descarte, pois os
laboratórios farmacêuticos declaram a responsabilidade à indústria química e esta repassa aos
laboratórios (Rodrigues, 2009). Embora cada poluidor seja responsável pelos seus resíduos, todos
os atores envolvidos possuem responsabilidade compartilhada na sua correta destinação final,
segundo a Política Nacional de Resíduos Sólidos (2010).
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
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Uma melhor relação entre os integrantes da cadeia de suprimentos pode proporcionar a
implantação de sistemas de manufatura mais enxutos e ágeis, possibilitando a redução de estoque ao
longo do processo. Com relação à questão do gerenciamento de resíduos, percebe-se que é um
procedimento complexo e requer a participação efetiva de todos os agentes envolvidos na em todas
as etapas de produção. Evidencia-se a necessidade de regulamentos mais específicos quanto ao
descarte final de resíduos de medicamentos domiciliares, mas por outro lado, faz-se necessário
também um maior rigor na fiscalização e aplicabilidade das leis ambientais já existentes e
atividades voltadas para educação ambiental.
Aspectos toxicológicos do descarte de medicamentos
No estudo realizado por Carvalho et al (2009), foram identificados aspectos toxicológicos
do descarte de medicamentos principalmente para fármacos em meio aquático e o impacto da
mistura de diferentes fármacos no ambiente, que pode resultar em efeitos de toxicidade mais
pronunciados do que aqueles causados por um determinado composto sozinho. O estudo conduzido
por Flaherty & Dodson (2005) mostra que misturas de diferentes compostos se comportam de forma
imprevisível em meio aquático, e causam sérios efeitos em Daphnia magna, organismo aquático
que funciona como biorregulador e muito utilizado em teste de laboratório para avaliar o risco de
toxicidade como deformidades e aumento na mortalidade (Flaherty & Dodson, 2005). Os efeitos
ambientais mais sérios têm sido observados em relação aos interferentes endócrinos, tais como o
hormônio 17α-estradiol, que pode ocasionar a efeminação em peixes expostos a concentrações
menores que 1 ng/L (Ghiselli, 2007). Os interferentes endócrinos englobam uma grande variedade
de classes de substâncias químicas, que incluem os hormônios naturais e sintéticos, fitoestrógenos,
pesticidas, compostos utilizados na indústria, subprodutos de processos, além de apresentam uma
variedade de rotas de exposição no ambiente.
A preocupação em relação a estes compostos está nos possíveis efeitos na saúde humana e
no ambiente, incluindo espécies animais. Substâncias químicas suspeitas de causar alteração no
sistema endócrino estão potencialmente associadas a doenças, como o câncer de testículo, de mama
e de próstata, à queda da taxa de espermatozoides, deformidades dos órgãos reprodutivos, disfunção
da tireoide e alterações relacionadas com o sistema neurológico (Carvalho et al 2009). Além dos
interferentes endócrinos, outra preocupação dos cientistas, é com o grupo dos antibióticos. O uso
desenfreado de antibióticos acarreta dois problemas ambientais: um, é a contaminação dos recursos
hídricos e o outro, é que alguns micro-organismos criam resistência a esses fármacos. Martinez
(2009) apresenta uma discussão detalhada a respeito da poluição por antibióticos e genes
resistentes, e o impacto destes na estrutura e atividade de populações de micro-organismos, e
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destaca que o uso de antibióticos para outros fins, não terapêuticos, pode enriquecer o ambiente
com bactérias resistentes capazes de infectar o homem. Segundo Schwartz et al (2002), isso pode
acontecer nas estações de tratamento de esgotos ou nos corpos receptores, ou em ambientes onde os
antibióticos são lançados diretamente, como em lagos de criação de peixes ou na agricultura.
Noutro estudo realizado, por Almeida et al (2005) o diclofenaco foi o composto detectado
em maior concentração na análise da água do reservatório de uma represa, seguido do ibuprofeno e
da cafeína. Esses compostos, indicados no tratamento da dor, são largamente prescritos, além de
serem adquiridos livremente. Embora o ibuprofeno e o diclofenaco tenham comportamento
diferente no meio ambiente, ambos não são totalmente eliminados durante o tratamento de efluentes
(Almeida et al., 2005). O diclofenaco sofre fotodegradação nos lagos, porém apresenta um tempo
de residência maior que o ibuprofeno (Buser et al., 1998). Embora as informações sejam poucas,
sabe-se que estas substâncias estão presentes nos rios e, mesmo em baixas concentrações, muitas
delas podem causar efeitos ecotoxicológicos crônicos e agudos no ambiente aquático (Almeida et al
2005).
A partir das informações levantadas nesta pesquisa, é possível inferir que existe a
necessidade, em primeiro lugar, de informar aos consumidores sobre os riscos ao meio ambiente e a
saúde da população do descarte inadequado dos medicamentos domiciliares, e a partir daí,
desenvolver mecanismos eficientes para a coleta e destinação segura dos mesmos.
Caracterização dos medicamentos descartados e consciência ambiental
O estudo de Rocha et al (2009) em Porto Alegre, teve por objetivo caracterizar os
medicamentos descartados na Farmácia Popular do Brasil/Farmácia-escola da UFRGS. A pesquisa
foi feita através da triagem dos medicamentos coletados e entrevistas educativas com os usuários.
Observou-se que a maioria dos medicamentos coletados dos usuários estavam vencidos e que havia
um número considerável de amostras grátis vencidas. Destacou-se a presença da classe dos
antiinflamatórios, seguido dos analgésicos e antimicrobianos, sendo a forma farmacêutica mais
frequente os comprimidos. O estudo realizado por Gasparini et al (2011), no município de
Catanduva – SP avaliou o acúmulo de medicamentos, o seu uso após o vencimento e a maneira de
descarte dos mesmos. Avaliou-se também se as pessoas possuíam consciência do impacto ambiental
causado pelo descarte inadequado e se já receberam alguma informação sobre o descarte correto. A
maioria dos entrevistados joga o medicamento no lixo seco e relataram nunca terem recebido
informação sobre o assunto. O estudo realizado por Bueno et al (2009) junto a famílias do bairro
Luiz Fogliatto, Ijuí, RS, teve como objetivo verificar a prática da farmácia caseira, conhecendo os
medicamentos que a compõem, os locais destinados ao armazenamento e o seu descarte. Das
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famílias entrevistadas mais de 90% possui medicamentos estocados em casa, principalmente na
cozinha. Muitas pessoas têm medicamentos vencidos guardados e descartam os mesmos no lixo
comum.
O estudo realizado por Marques et al (2011), no Gama - Distrito Federal, buscou identificar
a situação do descarte de medicamentos pelo comércio local, pela população em geral e pelos
estudantes. A maior parte da população e dos estudantes jogam os resíduos de medicamentos no
lixo comum, nunca procuram orientação para o descarte e aprovariam a instalação de postos de
coleta, embora um percentual considerável (17%) afirmou que não levaria os resíduos a um ponto
de coleta (Marques et al 2011).
No estudo realizado por Falqueto et al (2008), no município de São Mateus - Espírito Santo,
buscou-se avaliar o fluxograma de distribuição do diazepam, desde a produção do medicamento até
a disposição final do resíduo gerado. Neste estudo procurou- se entender os mecanismos práticos da
geração e destinação final destes resíduos provenientes das farmácias, drogarias, hospitais,
distribuidoras e indústrias farmacêuticas. Todos os estabelecimentos são fontes geradoras de
resíduos, as indústrias são as que se mantêm mais atualizadas quanto a legislação e somente as
indústrias e distribuidoras fazem correta segregação e identificação. Embora todos tenham Plano de
Gerenciamento de Resíduos de Serviço de Saúde não há no município estudado uma disposição
adequada do resíduo gerado. O estudo realizado por Ueda et al (2009), para analisar a comunidade
da UNICAMP-SP teve por objetivo averiguar a conscientização quanto aos impactos ambientais do
descarte de fármacos. Os resultados mostraram que a maioria das pessoas não tem conscientização
do problema e acreditam não causar danos ao ambiente. No estudo realizado por Silva (2005), que
teve como objetivo conhecer o destino final de medicamentos vencidos e descartados pela
população observou-se que a maioria da população faz uso de medicamento em casa e despejam no
lixo domiciliar os vencidos por nunca terem sido orientados.
Foi observado que houve uma quantidade considerável de medicamentos fora de uso
encontrada nas residências ou recolhidos em campanhas, principalmente analgésicos, anti-
inflamatórios e antibióticos, e que grande parte dos entrevistados joga os resíduos no lixo ou no
vaso sanitário (Bueno et al 2009). Isso mostra que a conscientização da população é fundamental
para o sucesso de um programa de recolhimento, principalmente porque muitos afirmam que não
levariam a um ponto de coleta, mesmo que este existisse. Estabelecer um esquema para
recolhimento de medicamentos vencidos da população e campanhas de conscientização pode ser
diretrizes fundamentais para minimização destes resíduos no meio ambiente.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1152 Souza, C. P. F. A.; Falqueto, Elda Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1142 – 1158, 2015.
Gerenciamento resíduos de medicamentos
O estudo realizado por Falqueto et al (2009) discute que o plano de gerenciamento de
resíduos de serviço de saúde, preconizado em resolução, é uma ferramenta que auxilia “o
estabelecimento de saúde” no controle dos resíduos gerados. No conteúdo de um plano estão as
instruções, procedimentos e informações relacionados aos resíduos e seu objetivo principal é
estabelecer as condições necessárias para a segurança do processo de manejo destes. O plano de
gerenciamento de resíduos deve ser elaborado com base no diagnóstico do estabelecimento,
expressar os objetivos e as ferramentas de curto, médio e longo prazo, a intenção de minimização de
geração de resíduos, além de programas de melhorias contínuas com indicadores de monitoramento
para verificar os pontos que devem ser revistos. Outro estudo realizado por Crestana et al (2010),
mostra que as estratégias adotadas por diversos países para o gerenciamento de medicamentos em
desuso, vencidos ou não, são a reutilização e o descarte responsável, com controle. Paim et al
(2002) realizaram um estudo onde observaram que nos laboratórios de diversas Universidades, a
geração de resíduos químicos não é gerenciada e o descarte inadequado continua a ser praticado.
No gerenciamento do resíduo de medicamentos existem controvérsias sobre a reutilização de
medicamentos, pois, em algumas situações, não se conhecem as condições anteriores de cuidados
no armazenamento (Daughton, 2003), em função disso os autores concluem que dentre as
justificativas para a adoção do programa de recolhimento de medicamentos, foram citados a
redução de envenenamentos acidentais de crianças por medicamentos vencidos, redução de custos,
de automedicação imprópria e do potencial dano ambiental (Daughton, 2003). Seria necessária a
criação de métodos de descarte apresentados no Guia de recomendações sobre manejo seguro de
resíduos gerados pelas atividades de saúde: retorno à indústria; disposição em aterro; incineração
em contêineres fechados; incineração em média temperatura e; decomposição química (WHO,
1999). Segundo os autores os estudos analisados concordam que a gestão integrada de resíduos
deve priorizar a não geração, a minimização da geração e o reaproveitamento dos resíduos, a fim de
evitar os efeitos negativos sobre o meio ambiente e a saúde pública. A prevenção da geração de
resíduos deve ser considerada tanto no âmbito das indústrias como também no âmbito de projetos e
processo produtivos, baseada na análise do ciclo de vida dos produtos e na produção limpa para
buscar o desenvolvimento sustentável. Além disso, as políticas públicas de desenvolvimento
nacional e regional devem incorporar uma visão mais pró-ativa com adoção da avaliação ambiental
estratégica e o desenvolvimento de novos indicadores ambientais que permitam monitorar a
evolução do eco-eficiência da sociedade (Brasil, 2006). É importante existir o intercâmbio de
informações entre órgãos reguladores e empresas com o objetivo final de encontrar a melhor
solução para os problemas envolvidos no gerenciamento de resíduos de medicamentos.
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Tratamento de Resíduos
Falqueto et al (2010) em seu estudo abordou o tratamento dos resíduos de maneira bem
detalhada. Mostrou que os resíduos de medicamentos devem ser submetidos às condições de
tratamento térmico para resíduos industriais ou ser dispostos em aterros de resíduos perigosos
devidamente licenciados pelos órgãos ambientais. Segundo o trabalho citado a incineração é um
tratamento muito utilizado e consiste num processo de redução do peso, volume e das
características de periculosidade dos resíduos, com consequente eliminação da matéria orgânica e
características de patogenicidade, através da combustão controlada. Deve estar interconectado a um
sistema de depuração de gases e de tratamento e recirculação dos líquidos de processo para remover
e neutralizar poluentes provenientes deste processo. Coprocessamento ou coincineração em fornos
de fabricação de clínquer é um processo também utilizado como descarte de resíduos de
medicamentos e consiste num tratamento diferenciado da incineração por ser considerado um
subproduto dos processos de produção de cimento, porém muitos resíduos não têm sido aprovados
para tratamento por este processo, dentre eles: dioxinas, organoclorados, explosivos, radioativos,
hospitalares, agrotóxicos, pesticidas, resíduos com altos teores de cloro, enxofre e metais pesados,
além de lixo urbano (Falqueto, 2010).
Quanto ao tratamento de resíduos os autores mostram os diferentes tipos de tratamento de
resíduos e que existem avanços na legislação, porém de forma geral, o gerenciamento de resíduos
de serviços de saúde ainda apresenta grandes deficiências no aspecto de tratamento e disposição
final, principalmente no que concerne aos resíduos de medicamentos, em razão de suas
características farmacológicas, pois podem se tornar tóxicos ao meio ambiente e ao homem, o que
demonstra a necessidade de mais pesquisas e estudos (Falqueto, 2010).
Logística Reversa de Medicamentos.
A logística reversa de medicamentos é o instrumento de desenvolvimento econômico e
social caracterizado pelo conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta
e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em
outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada (Brasil, 2010). No
estudo de Rodrigues (2009) & Boer (2011) foi mencionado a Logística Reversa (LR) como uma das
saídas alternativas para o correto descarte dos resíduos de medicamentos. Nos últimos anos,
necessidades de diferenciação de serviço em relação à concorrência, redução de custo e questões
ambientais tem incentivado as empresas a optarem por uma política de LR para dar fim a alguns
subprodutos de seus produtos e embalagens associadas. No artigo, os autores explicam que a LR
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
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operacionaliza a retirada dos produtos de mercado, tanto no que se refere a produtos vencidos ou
contaminados, como também os produtos que estão no final de sua vida útil. Segundo os autores
“para implementar, efetivamente, a LR de resíduo de medicamentos (RM) como uma política a
nível federal, é de grande importância que haja uma atuação efetiva do Poder Público e incentivo à
participação do consumidor final, e o comprometimento do setor farmacêutico com a questão, já
que a sociedade como um todo possui a responsabilidade de manter o meio ambiente em
equilíbrio”. Se este mecanismo existisse, seria muito mais fácil a adoção de programas de entrega
voluntária de medicamentos pela população às farmácias, que poderiam encaminhá-los aos
distribuidores e estes, às indústrias, para o destino final ambientalmente adequado.
Para os autores estudados, a logística reversa é apontada como uma das alternativas viáveis
para o correto descarte de resíduos de medicamentos. Atualmente a ANVISA juntamente com o
Ministério do Meio Ambiente, baseados na Política Nacional de Resíduos Sólidos vêm realizando
grupos de trabalhos temáticos, a fim de formular acordos setoriais regionais para a implantação da
logística reversa no Brasil. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/10) foi instituída
em 2010 e após anos de discussão foi estabelecido como um de seus instrumentos a Logística
Reversa, que visa à devolução de determinados resíduos aos fabricantes de modo que estes insiram
dentro do seu ciclo produtivo e possam dar o tratamento e a destinação final adequada. Cabe
ressaltar que o governo federal estabeleceu setores prioritários para a implantação da LR e um
desses setores é o de medicamentos (Brasil, 2010). A prevenção à contaminação, através de
medidas que diminuam o descarte, bem como o uso racional de medicamentos e a redução do
consumo também são aspectos importante na implementação da Logística Reversa, que visa ações
efetivas que protejam o meio ambiente e a saúde pública.
CONCLUSÃO
O presente trabalho identificou que as questões relacionadas à geração dos resíduos e o
descarte de medicamentos devem ser amplamente discutidas e estudadas em nível de saúde pública
para que haja responsabilidade coletiva quanto ao uso e destinação corretos. Isso é explicado
principalmente porque a destinação inadequada ocorre por falta de informação e divulgação sobre
os danos causados pelos medicamentos ao meio ambiente e, por carência de postos de coleta.
Esforços devem ser estabelecidos para a conscientização da população quanto ao uso
racional de medicamentos, além do impacto gerado ao meio ambiente decorrente do seu
desperdício. Isso que ocorre por várias razões e a responsabilidade quanto ao correto descarte e
proteção da saúde e do meio ambiente deverá ser amplamente esclarecida para que não somente o
destino do resíduo gerado seja considerado, mas principalmente a diminuição de sua geração.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1155 Souza, C. P. F. A.; Falqueto, Elda Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1142 – 1158, 2015.
Promover a execução do fracionamento de medicamentos não só por parte do Sistema Único de
Saúde (SUS), mas também, em farmácias e drogarias privadas representaria também uma medida
importante, já que minimizaria o desperdício e descarte indevido. Muitas indústrias ainda não
adequaram as embalagens de seus produtos às condições constantes no Decreto nº 5.775 de 2006,
que dispõe sobre o fracionamento de medicamentos. Há também a necessidade de um maior
controle das propagandas de medicamentos, pois na sua utilização não sabemos até onde prevalece
a exigência terapêutica voltada para o controle de enfermidades e onde começa a pressão
mercadológica para estimular o seu consumo. Por outro lado, a exploração do valor simbólico do
medicamento pela grande mídia passa a representar poderoso instrumento de indução de hábitos
para estimular a compra excessiva e desnecessária de medicamentos, mesmo os de venda livre.
Neste contexto fica clara a necessidade de um trabalho de conscientização ambiental
visando o uso racional de medicamentos e seu correto descarte. Devem ser estabelecidos fluxos
para o tratamento adequado e a destinação final correta dos resíduos de medicamentos e os cidadãos
devem ser informados sobre estes fluxos. Nesse sentido, através da Política Nacional de Resíduos
Sólidos foram estabelecidos Sistemas de Logística Reversa com a finalidade de sanar esta lacuna. O
uso racional de medicamentos não é uma atitude isolada e sim uma ação conjunta que deverá ser
exercida com a participação de pacientes, cuidadores, familiares, profissionais de saúde,
legisladores, formuladores de políticas públicas, indústrias, comércio e políticas governamentais,
cada um exercendo adequadamente as funções de sua competência no processo global.
Assim são fundamentais ações integradas entre os diversos setores e a conscientização da
população estimulando sua participação em atividades voltadas à educação ambiental e ao uso
correto do medicamento, pois a falta de informação é um fator crucial no que diz respeito aos
métodos e conduta adequados para o descarte correto dos resíduos de medicamentos e ao impacto
que pode provocar ao meio ambiente, inclusive ao próprio ser humano.
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ARTIGO ORGINAL / RESEARCH
Estratégias para promoção da adesão em um ambulatório de anticoagulação:
contribuição para a efetividade do tratamento.
Strategies for promoting medication adherence in an outpatient anticoagulation:
a contribution to the effectiveness of treatment.
Ronara Camila de Souza Groia1*, Josiane Moreira da Costa2, Tayane Oliveira dos Santos1, Lázara
Montezano Lopes1, Josiane de Macedo Martins1, Luana Amaral Pedroso1, Maria Auxiliadora
Parreiras Martins³ & Adriano Max Moreira Reis³.
1 Farmacêutica Residente Multiprofissional Saúde do Idoso - Hospital das Clínicas - UFMG. Belo Horizonte, MG –
Brasil. 2 Farmacêutica. Preceptora do Programa de Residência Multiprofissional Saúde do Idoso – Hospital Risoleta
Tolentino Neves. Belo Horizonte, MG – Brasil. 3 Professor na Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de
Minas Gerais, MG – Brasil.
Autor Correspondente: Ronara Camila de Souza Groia, Hospital Risoleta Tolentino Neves, Rua das Gabirobas, 01, Vila
Clóris, CEP 31744-012, Belo Horizonte/MG, Telefone: (31) 34593423, e-mail: [email protected]
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1160 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
RESUMO
O presente estudo tem por objetivo identificar contribuições do serviço de promoção da adesão ao
uso de varfarina (SPAUV) para a efetividade desse tratamento. Todos os pacientes encaminhados
ao serviço tiveram valores de Relação Normatizada Internacional (RNI) identificados nos períodos
pré e pós acompanhamento. Coletaram-se dados sobre fatores determinantes da não adesão e
realizou-se o cálculo do Therapeutic Time Range (TTR), a fim de identificar o tempo de
permanência na faixa terapêutica pelo paciente antes e após o seguimento farmacoterapêutico. Os
fatores encontrados como determinantes para diminuir TTR e inferir na adesão foram:
esquecimento; dificuldade para autoadministração dos medicamentos; não compreensão sobre o
tratamento; analfabetismo. As intervenções realizadas compreendem: elaboração de fita
termoselada com instruções sobre uso de medicamentos; realização de educação em saúde ao
paciente/acompanhante; elaboração de caixa organizadora de medicamentos; agendamento de
ambulância para facilitar acesso ao ambulatório. Os valores médios de TTR nos períodos antes e
após o seguimento foram respectivamente 40,8% e 60,9%. Diante dos resultados encontrados foi
observado que após o seguimento farmacoterapêutico houve aumento do TTR, demonstrando
possível contribuição do acompanhamento para efetividade da farmacoterapia.
PALAVRAS-CHAVE
Varfarina, Adesão à Medicação, Educação em Saúde.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1161 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
ABSTRACT
The present study aims to identify the contributions of service promotion of adherence to warfarin
(SPAUV) for the effectiveness and safety of this treatment. All patients referred to the service
during the period of 18 months after implementation were included in the study, and values of the
international normalized ratio (INR) were identified before and after monitoring. We collected data
on the determinants of non-adherence by identifying the service´s records, and calculate the Time
Therapeutic Range (TTR), in order to identify the time spent in the therapeutic range for the patient
before and after pharmacotherapeutic follow, which should be greater than 60%. Factors identified
as determinants to reduce TTR and infer a possible non-adherence were forgetfulness; difficult to
self-administer medications; no understanding of the treatment; illiteracy. Interventions include:
drafting tape sealed with instructions on use of medicines; conducting health education to the
patient / companion; elaboration of organizing medicine box; scheduling ambulance to facilitate
access to the clinic. The mean values of RTT for the periods before and after the following were
respectively 40.8% and 60.9%. Considering the results it was observed that after
pharmacotherapeutic follow-TTR was increased, demonstrating that monitoring of anticoagulation
should be effective.
KEY WORDS
Warfarin, Medication Adherence, Health Education.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1162 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
INTRODUÇÃO
A varfarina é um anticoagulante oral cumarínico amplamente utilizado na terapêutica. Esse
fármaco é um antagonista da vitamina K epóxido redutase e ao realizar a inibição dessa enzima,
também inibe a ativação de importantes fatores da coagulação, sendo utilizado na prevenção e
tratamento de distúrbios da coagulação (Ageno et al., 2012).
Em doses adequadas, esse anticoagulante é eficaz em diminuir a mortalidade por
cardiopatias associadas com fatores de risco para doenças tromboembólicas, tromboembolismo
venoso e arterial e fibrilação atrial (FA) (Lorga et al., 2013).
A resposta ao uso da varfarina varia de paciente para paciente, sendo que alterações
individuais são comuns. Além disso, esse medicamento apresenta interações consideráveis com
alimentos, fármacos, além de ser influenciado por doenças de base e variações individuais, o que
contribui para complexa relação dose-resposta (Brunton, Lazo & Parker, 2012). A varfarina está na
lista dos medicamentos com alto risco de causar danos consideráveis aos pacientes quando não
utilizada de forma recomendada (Ahouagi et al., 2012). Mesmo com o acompanhamento contínuo
de pacientes em uso desse medicamento, eventos hemorrágicos são ainda frequentes (Escobar,
Barrios & Jimenez, 2010). Essas características são desafios para o tratamento adequado de
pacientes em uso de varfarina, sendo a adesão à terapêutica imprescindível para efetividade do
tratamento (Kimmel et al., 2007).
Ao considerar os diversos interferentes na terapia anticoagulante, verifica-se que a
compreensão sobre o tratamento medicamentoso e adesão ao tratamento são essenciais para a
efetividade do tratamento (Mansoor & Dowaw, 2006), o que justifica a implementação de
estratégias que objetivem a participação e compreensão dos pacientes em relação à farmacoterapia.
Ao considerar o exame Relação Normatizada Internacional (RNI) como referência para
monitorizar a farmacoterapia da varfarina (Brunton, Lazo & Parker, 2012) e ao identificar a
existência de pacientes que não obtinham o controle do RNI no atendimento convencional em um
ambulatório de anticoagulação, um grupo de farmacêuticas residentes, vinculadas a um programa de
residência multiprofissional em saúde do idoso implementou o Serviço de Promoção da Adesão ao
Uso de Varfarina (SPAUV). O intuito foi elaborar estratégias educacionais individuais com a
participação dos pacientes, a fim de fortalecer a adesão e o tempo de permanência do RNI na faixa
terapêutica, e consequente melhoria no Time Therapeutic Range (TTR). Esse é realizado a partir de
série histórica de resultados do RNI e consiste em uma proporção de tempo em que o paciente
permaneceu dentro da faixa de RNI recomendada no período analisado (Rosendaal et al., 1993).
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1163 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
O presente estudo tem por objetivo descrever as contribuições do SPAUV na promoção da
efetividade do tratamento com varfarina por meio da análise do Time in Therapeutic Range (TTR).
MATERIAL E MÉTODO
Delineamento do estudo
Trata-se de um estudo observacional descritivo, em que a experiência relacionada ao
acompanhamento de pacientes idosos em uso de varfarina, e com dificuldade de adesão ao
tratamento foi retratada.
Local em estudo
O estudo foi desenvolvido em um Ambulatório de Anticoagulação de um Hospital público e
geral, localizado em uma cidade de grande porte de Minas Gerais, em que os pacientes atendidos
nesse ambulatório são os egressos do hospital, ou referenciados pela rede de Atenção Primária em
Saúde.
A equipe do ambulatório é composta por cinco profissionais, sendo eles um médico, um
farmacêutico e um enfermeiro, um técnico de enfermagem e um auxiliar administrativo. O serviço
também conta com o suporte do laboratório de análises clínicas da instituição.
Ao chegar ao ambulatório, o paciente é encaminhado ao processo de retirada de amostra de
sangue para mensuração de RNI. Após liberação do resultado, ocorre discussão multiprofissional
sobre as especificidades de cada paciente e necessidade de ajustar a dose do medicamento.
O ajuste de dose da varfarina é realizado mediante o protocolo adotado pela prefeitura do
município. Em relação ao retorno ao ambulatório, pacientes que apresentam mensurações do RNI
fora da faixa terapêutica, são agendados para retorno em sete dias, e a cada RNI na faixa, é
fornecido um acréscimo de sete dias de retorno, sendo que o prazo máximo para agendamento é de
28 dias.
Estruturação do Serviço de Promoção da Adesão ao Uso da Varfarina
Ao identificar pacientes que apresentavam dificuldade de adesão e não obtinha estabilidade
no controle do RNI nos atendimentos convencionais, farmacêuticas vinculadas a um programa de
residência multiprofissional foram inseridos no ambulatório e propuseram o atendimento desses
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1164 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
pacientes por meio da implantação de um serviço de acompanhamento e orientação individual
denominado Serviço de Promoção da Adesão ao Uso da Varfarina (SPAUV).
Os critérios para encaminhamento do paciente para o serviço foram percepção dos
profissionais do ambulatório sobre a dificuldade de entendimento das informações pelo paciente na
primeira consulta, associado ao analfabetismo, ou presença de 03 resultados de RNI fora da faixa
terapêutica. Os profissionais encaminharam os pacientes para as farmacêuticas residentes e
preceptora, que assumiram a responsabilidade pelos atendimentos.
O acompanhamento ocorreu por meio da realização de uma entrevista inicial em que as
especificidades de cada paciente eram identificadas. O intuito era detectar o nível de conhecimento
e as necessidades em relação à farmacoterapia anticoagulante. Para isso foi elaborado um roteiro de
entrevista inicial, que continha informações referentes ao grau de dependência para o uso de
medicamentos, analfabetismo, demais medicamentos em uso, e dificuldade de entendimento da
terapia anticoagulante. A partir da identificação das necessidades farmacoterapêuticas foram
desenvolvidas estratégias educacionais individualizadas para cada paciente.
Para a realização de cada atendimento, foi desenvolvida uma ficha para registro dos valores
diários de RNI, ocorrência de reações adversas, além da ocorrência de fatores denominados como
agravantes da adesão, sendo eles: relato pelo paciente de não entendimento da farmacoterapia,
indisponibilidade dos demais medicamentos utilizados na Unidade Básica de Saúde (UBS),
dificuldade de acesso ao ambulatório de anticoagulação, paciente prefere não tomar os
medicamentos, não entendimento da forma de uso dos demais medicamentos, dificuldade para
autoadministração dos medicamentos, relatos de inexistência de apoio familiar, alterações
frequentes nos hábitos alimentares, esquecimento, e não administração da varfarina durante
episódios de internação que possam ter ocorrido durante o acompanhamento ambulatorial. A cada
atendimento no ambulatório os fatores agravantes da adesão eram identificados, e estratégias
educacionais eram implementadas.
Os pacientes passaram a ser acompanhados pelos mesmos profissionais, com o intuito de
fortalecer o vínculo no processo de acompanhamento e cada atendimento teve um tempo médio de
duração de aproximadamente 25 minutos.
Variáveis do estudo
Para o presente estudo foram consideradas as variáveis: idade; indicação de uso de varfarina;
número de atendimentos realizados; registro de demais medicamentos em uso e respectivas
interações com varfarina; fatores agravantes da adesão identificados nas consultas, e intervenções
realizadas. Para cada paciente, foram calculados dados de CHADS2, por meio da identificação de
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1165 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
Insuficiência Cardíaca Congestiva, Hipertensão Arterial, Idade maior ou igual a 75 anos, Diabetes
Mellitus, AVE ou ataque isquêmico transitório, CHA2DS2VASC, por meio da identificação de
Insuficiência Cardíaca Congestiva, Hipertensão Arterial, Idade maior ou igual a 75 anos, Diabetes
Mellitus, AVE ou ataque isquêmico transitório, Doença vascular, Idade entre 65 – 74 anos e sexo
feminino; e HAS-BLED, sendo identificadas a existência Hipertensão Arterial, Insuficiência
renal/hepática, AVE, História ou predisposição a sangramento, Idade, Uso de medicamentos e
álcool concomitantemente.
Os escores CHADS2 e CHA2DS2VASC são sistemas de pontuação que consideram
algumas características em relação ao risco cerebrovascular, sendo que quanto maior a pontuação,
maior o risco de ter complicação tromboembólica (Sandhu et al., 2011). O HAS-BLED é um escore
que avalia o risco de sangramento dos pacientes em uso de varfarina, sendo que quanto maior o
valor desse escore, maior o risco de sangramento (Lip et al., 2011).
Foram coletados valores de RNI relacionados aos atendimentos convencionais no
ambulatório, antes e após a implantação do SPAUV. A partir da identificação dos valores de RNI
antes e após o atendimento do serviço de promoção da adesão, foram calculados o TTR de cada
paciente, em cada período de atendimento. O cálculo foi realizado empregando-se o método de
Rosendaal et al., 1993. Esse é realizado a partir de uma série histórica de resultados do RNI e
consiste em uma proporção de tempo em que o paciente permaneceu dentro da faixa de RNI
recomendada no período analisado (Rosendaal et al., 1993). Para isso, utilizou-se instrumento
eletrônico específico disponível em <www.inrpro.com>.
Aspectos éticos
O projeto do estudo foi aprovado pelo Núcleo de Ensino e Pesquisa da Instituição em
estudo, recebendo o parecer 17/2012.
Obtenção, coleta e análise dos dados
Os dados foram obtidos por meio de consulta aos registros de prontuário dos pacientes. Eles
foram coletados e registrados em uma planilha do programa Microsoft Excel®, a partir da qual se
realizou análise estatística univariada. Todos os pacientes encaminhados ao serviço desde a
implantação até o momento da coleta dos dados, tempo correspondente a 18 meses, foram incluídos
no estudo. Para os pacientes que não possuíram um mínimo de 03 atendimentos, com um intervalo
de realização de exames inferior a 50 dias, o cálculo do TTR não foi realizado, devido à existência
de pouca confiabilidade nos dados que extrapolam essa recomendação. Essas situações foram
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1166 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
evidenciadas quando os pacientes apresentaram poucos atendimentos ambulatoriais no período
anterior ao acompanhamento no SPAUV, sendo que o TTR nesse período foi considerado como
zero. Para o cálculo do TTR médio antes e após o acompanhamento no SPAUV, esses pacientes
foram excluídos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Um total de 12 pacientes foi acompanhado pelo SPAUV e apresentavam média de idade de
61,4 anos, dos quais sete eram do sexo feminino. Esses pacientes foram acompanhados por um
período de 18 meses, sendo nesse período realizados um total de 234 atendimentos. Os pacientes
apresentaram um tempo médio de acompanhamento prévio no ambulatório de três meses, e um
tempo médio de acompanhamento no SPAUV de 13 meses.
Do total de pacientes acompanhados, três (25%) necessitavam de ajuda para
autoadministração dos medicamentos. Com relação às Atividades de Vida Diária (AVD), sete
(58%) apresentavam independência para AVD básicas e instrumentais e cinco (42%) eram
independentes para AVD básicas e dependentes para as instrumentais. A predominância do sexo
feminino e de pessoas com idade avançada são fatores de risco para doenças cardiovasculares
(Feliciano, Moraes & Freitas, 2004). Atrelado a isso a maior prevalência de indivíduos com
dependência completa para AVD é indicativo de que os pacientes acompanhados pelo SPAUV são
mais frágeis e vulneráveis e necessitam de maiores cuidados pela equipe do ambulatório de
anticoagulação.
Considerando a indicação do uso da varfarina, a maioria dos pacientes (50%) possuía
indicação de anticoagulação devido à ocorrência de Acidente Vascular Encefálico (AVE) isquêmico
com Fibrilação Atrial (FA); seguidos de FA como critério único (cinco pacientes); e
Tromboembolismo Pulmonar (uma paciente). Uma das principais metas do tratamento de FA é a
prevenção de eventos tromboembólicos. A taxa de acidente vascular encefálico isquêmico (AVEi)
em pacientes com FA não valvar aumenta de 2 a 7 vezes se comparada com aqueles sem FA (5%
por ano) (Escobar, Barrios & Jimenez, 2010), o que justifica o estabelecimento de estratégias que
visem níveis adequados de anticoagulação e o acompanhamento contínuo desses pacientes.
Detectou-se que a média de CHADS2 e CHA2DS2VASC dos pacientes acompanhados foi
de, respectivamente, 3,4 e 5,2 e a média de HAS-BLED do pacientes acompanhados foi de 2,1
(Tabela 1). As pontuações elevadas dos escores de CHADS2, CHA2DS2VASC e HAS-BLED
alertam para o elevado risco de doenças cerebrovasculares e suas complicações (Sandhu et al.,
2011) e de sangramentos (Lip et al., 2011), o que justifica ainda mais a necessidade de tratamento
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1167 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
personalizado com estratégias que visem melhorar o entendimento desses pacientes sobre a
farmacoterapia anticoagulante a fim de alcançar um tratamento efetivo e seguro.
Tabela 01: Especificação do CHADS2, CHADSVASC e HAS-BLED dos pacientes
acompanhados, Belo Horizonte/MG, 2014, N = 12.
Com relação aos demais medicamentos em uso, identificou-se registro de uso de 68
medicamentos, equivalente a uma média de 5,7 medicamentos/paciente, sendo que a maioria são
fármacos que atuam no sistema cardiovascular (45; 66%), e sistema nervoso central (7; 10%);
seguidos dos medicamentos que atuam no trato gastrointestinal (6; 9%); sistema músculo
esquelético (3; 4,5%); sistema respiratório (3; 4,5%); sangue e órgãos hematopoiéticos (2; 3,0%); e
preparações hormonais sistêmicas com exceções dos hormônios sexuais e insulinas (2; 3,0%). O
consumo elevado de medicamentos nessa população já era esperado uma vez que com o aumento da
idade há aumento do número de doenças crônicas e consequentemente do número de medicamentos
(Novaes, 2007). A alta prevalência de medicamentos que atuam no sistema cardiovascular também
foi encontrada em estudo com idosos (Santos, 2013). Além disso, fica evidente o uso de
polifarmácia pela maioria dos pacientes, o que pode aumentar o risco do uso da varfarina ao
considerar as interações medicamentosas potenciais e dificuldades de uso contínuo de todos os
medicamentos. A terapia com varfarina é considerada complexa e o conhecimento dos pacientes a
respeito do tratamento é um componente importante para promover e manter um controle adequado
do RNI, além de reduzir efeitos adversos relacionados ao uso da varfarina (Marin, Cecílio & Perez,
2008). Desse modo, o conhecimento dos demais medicamentos em uso, assim como o
Codificação
do paciente CHADS CHADSVASC HASBLED
1 4 6 5
2 2 4 1
3 3 4 1
4 2 4 1
5 4 5 1
6 5 7 2
7 2 5 1
8 5 7 4
9 2 4 3
10 4 5 3
11 5 6 2
12 3 5 1
Média 3,4 5,2 2,1
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1168 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
acompanhamento de possíveis modificações na farmacoterapia torna-se estratégia de interesse para
prevenção de agravos relacionados à polifarmacoterapia.
As interações entre os demais medicamentos em uso e a varfarina apresentaram uma
frequência de 27, e envolveram 13 princípios ativos, sendo as mais prevalentes a interações da
varfarina com sinvastatina e espironolactona (Tabela 2).
Tabela 02: Especificação das interações entre varfarina e demais medicamentos em uso, Belo
Horizonte/MG, 2014.
Ao associarmos as interações medicamentosas com as suspeitas de problemas de adesão
apresentados pelos pacientes, sugere-se a possibilidade de aumento da ocorrência de agravos à
saúde e riscos de segurança quando coexistirem essas duas características simultâneas. O efeito
anticoagulante deve ser monitorizado frequentemente em pacientes que utilizam diversos
medicamentos (Teles, Fukuda & Feder, 2012).
Em relação aos fatores agravantes e ou favorecedores da não adesão ocorreram 50 registros
durante os atendimentos, sendo estes: esquecimento (38%), relato de dificuldade para
autoadministração dos medicamentos (14%), não compreensão sobre o tratamento anticoagulante
(12%), dificuldade em acessar o ambulatório (10%), não entendimento da forma de utilização dos
demais medicamentos em uso (8%), paciente prefere não tomar os medicamentos (4%),
Medicamento N % Descrição da interação
com varfarina
Sinvastatina 7 26 Aumento do risco de
hemorragia e rabdomiólise.
Espironolactona 5 19 Redução da efetividade do
anticoagulante.
Ácido
acetilsalicílico 2 7
Aumento do risco de
hemorragia.
Alopurinol 2 7 Aumento do risco de
hemorragia.
Atenolol 2 7 Risco de aumento do RNI.
Omeprazol 2 7
Aumento do RNI e
potencialização do efeito
anticoagulante.
Amitriptilina 1 4 Aumento do risco de
hemorragia.
Citalopram 1 4 Aumento do risco de
hemorragia.
Fenitoína 1 4 Aumento do risco de
hemorragia.
Fluoxetina 1 4 Aumento do risco de
hemorragia.
Levotiroxina 1 4 Aumento do risco de
hemorragia.
Propafenona 1 4 Aumento do risco de
hemorragia.
Propiltiouracil 1 4 Redução da efetividade do
anticoagulante.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1169 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
analfabetismo (4%), não administração da varfarina durante internação ocorrida no intervalo entre
encontros (4%), não utilização dos demais medicamentos com indicação de uso crônico devido à
indisponibilidade na Unidade Básica de Saúde de referência (2%), relato de inexistência de apoio
familiar no uso dos medicamentos (2%), alterações drásticas nos hábitos alimentares (2%).
O prognóstico do paciente em uso da varfarina não depende apenas da terapia
farmacológica, mas também de aspectos não farmacológicos, o que justifica a importância e a
necessidade de acompanhamento constante da efetividade do medicamento, orientações a respeito
do autocuidado, posologia, além de programas de educação em saúde para otimizar a
conscientização e adesão à terapia medicamentosa (Esmerio et al, 2009). Desse modo, entende-se
que ao realizar a identificação do grau de dependência para as AVD, dependência para
autoadministração dos medicamentos, demais medicamentos em uso e interações medicamentosas
potenciais, os profissionais obtiveram um olhar mais amplo em relação aos possíveis riscos
apresentados por cada paciente em relação ao uso da varfarina, o que pode ter facilitado a
implementação de estratégias que propiciaram a efetividade da farmacoterapia.
Ao analisarmos os fatores agravantes da não adesão, entende-se que a maioria poderia ser
solucionada por meio de estabelecimento de estratégias que diminuam o esquecimento do uso da
varfarina, assim como realização de ações educacionais.
Apesar da importância da farmacoterapia para prevenção e agravos de problemas de saúde,
entende-se que esta é comprometida por problemas de adesão, que envolvem fatores como
polifarmácia, regime terapêutico complexo, comprometimento cognitivo-funcional e redução da
destreza manual, que se encontram ainda mais comprometidos nos pacientes idosos, o que é o
perfil de pacientes acompanhados nesse estudo (Elliott, 2012; Sengstock et al, 2012). Outros fatores
que contribuem para a não adesão ao tratamento são o desconhecimento sobre as indicações dos
medicamentos e possíveis efeitos colaterais e complicações decorrentes de interações
medicamentosas. Esses fatores, ao serem associados ao baixo grau de escolaridade, frequente entre
os idosos acompanhados, assim como alterações no estado cognitivo e níveis variados de
dependência contribuem para dificultar a adesão ao tratamento com anticoagulante oral assim como
aos outros medicamentos (Nasse, Mullan & Beata, 2012).
Não foi frequente no presente estudo, a identificação de alterações drásticas nos hábitos
alimentares dos pacientes acompanhados. Isso pode estar relacionado ao fato de que essa é uma das
principais informações oferecidas de forma ampla no ambulatório em estudo, e ao serem inseridos
no SPAUV, os pacientes possivelmente já tinham tido acesso a essa informação.
A interação da varfarina com alimentos ricos em vitamina K é amplamente conhecida na
literatura e de grande relevância para o tratamento, sendo essa uma informação de relevância para
os serviços de anticoagulação (Martins et al, 2011).
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1170 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
Ao considerar os pontos principais de atuação dos profissionais para proporcionar maior
entendimento da população idosa em relação à varfarina, o uso de recursos que possibilitam a
exposição de informações simples e de fácil entendimento, com linguagem acessível, além de
recursos audiovisuais com figuras apropriadas são ferramentas úteis no aprimoramento do
entendimento dos idosos sobre a terapia com a varfarina (Marin, Cecílio & Perez, 2008).
Para facilitar a administração dos medicamentos e otimizar a adesão, comprimidos de
varfarina foram entregues aos pacientes cadastrados no SPAUV separados por dia, conforme o
esquema recomendado. A organização era feita em fitas plásticas termoseladas (Figura 1). Ao longo
do acompanhamento foram entregues
Figura 01: Fita termoseladas com instruções sobre o esquema terapêutico da varfarina.
As intervenções realizadas durante o período de acompanhamento foram elaboração de fitas
termoseladas com instruções sobre o esquema terapêutico da varfarina (209; 56,8%), realização de
educação em saúde ao paciente e/ou acompanhante por meio de estratégia verbal ou escrita (116;
31,6%), orientação telefônica ao familiar sobre o tratamento anticoagulante (19; 5%), agendamento
de ambulância para facilitar o acesso ao ambulatório (18; 4,9%), realização de contato com Unidade
Básica de Saúde para discutir especificidades sobre o tratamento (1; 0,3%) e elaboração de caixa
organizadora para os demais medicamentos em uso (5; 1,4%) (Figura 2).
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1171 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
Figura 02: Caixa organizadora de medicamentos.
Em relação às intervenções farmacêuticas realizadas, as mais prevalentes foram elaboração
de fitas termoseladas e realização de educação em saúde, entende-se que a elaboração de estratégia
para a promoção da autoadministração da varfarina assim como seu uso correto podem ter sido
essenciais para obtenção de melhores resultados no tratamento. Como o uso da varfarina requer
frequentes ajustes no regime posológico, a elaboração das fitas termoseladas pode torna-se uma
estratégia facilitadora do entendimento e adesão para os pacientes acompanhados.
Ao entender que o tratamento com varfarina requer mudanças frequentes no regime
medicamentoso devido à necessidade de ajustes de doses conforme o RNI, e que múltiplas
mudanças levam a complicações na adesão à farmacoterapia por parte de pacientes idosos,
estratégias que promovam melhor adaptação desses pacientes em relação aos anticoagulantes
devem ser consideradas (Sengstock et al, 2012).
Além disso, o considerável número de ações relacionadas à educação em saúde indica que
essa ação deve ser realizada de forma contínua, identificando as necessidades e ou especificidades
apresentadas pelos pacientes em cada encontro.
As intervenções de realização de contato telefônico com o familiar para realizar orientações,
e realização de contato com a unidade básica de saúde para informar sobre especificidades do
tratamento indicam possíveis necessidades de estabelecimento de vínculo e envolvimento da família
no processo de cuidado, assim como realização de maior inserção da equipe de saúde da família em
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1172 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
relação aos cuidados na farmacoterapia anticoagulante. Em relação a esse último item, é importante
destacar que o ambulatório de anticoagulação responsabiliza-se somente pelos cuidados
relacionados ao uso da varfarina, sendo que a realização de contato constante com a equipe de
atenção primária pode ser entendida como uma estratégia de relevância para a garantia da
integralidade do cuidado.
A elaboração de caixas organizadoras indica a identificação pelos profissionais da
necessidade do estabelecimento de estratégias para a garantia do uso correto dos demais
medicamentos em uso, o que pode comprometer a efetividade da farmacoterapia devido à possível
ocorrência de interações medicamentosas.
A necessidade de agendamento de ambulância reflete possíveis problemas relacionados à
acessibilidade geográfica. Esse fator pode intervir na assiduidade dos pacientes às consultas, e
também comprometer a terapia anticoagulante.
Também foi possível identificar a ocorrência de internações durante o acompanhamento no
SPAUV, sendo que 15 pacientes foram hospitalizados. Do total de internações, duas estavam
relacionadas a eventos tromboembólicos, sendo ocorrência de acidente vascular encefálico. As
demais hospitalizações foram decorrentes de condições clínicas não relacionadas com eventos
tromboembólicos, tais como dengue, pneumonia, descompensarão de insuficiência cardíaca e
outros. A ocorrência dos eventos tromboembólicos durante o acompanhamento indica a necessidade
não somente do acompanhamento dos pacientes, mas da manutenção do RNI na faixa terapêutica de
forma contínua. Os demais motivos de internações refletem a fragilidade fisiológica dos pacientes
acompanhados, representada pela existência de outros problemas de saúde, e maior susceptibilidade
às complicações clínicas, que ressaltam a necessidade de acompanhamentos clínicos direcionados.
Ao analisar o TTR dos pacientes identificou-se desse escore médio de 40,8% no período
prévio às ações educacionais individualizadas, para 60,9% após a realização das ações. O TTR
médio individual de cada paciente nos períodos prévio e após a realização das ações educacionais
estão apresentados no Gráfico 1.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1173 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
Gráfico 01: TTR médio de cada paciente nos períodos antes e após a o acompanhamento no
SPAUV, Belo Horizonte/MG, 2014, N = 12.
No que se refere à análise do Time Therapeutic Range (TTR) com o intuito de determinar
tempo de permanência do RNI na faixa terapêutica pelos pacientes antes e após o acompanhamento
pelo SPAUV, tem-se que o valor do TTR deve ser acima de 60% para que a terapia anticoagulante
seja superior à terapia isolada com antiagregante plaquetário (Nasse, Mullan & Beata, 2012).
O aumento do valor médio do TTR dos pacientes acompanhados no serviço de 40,8% para
60,9% indica uma maior contribuição do SPAUV para a efetividade e segurança da farmacoterapia,
pois se entende que ao aumentar o tempo médio de valores de RNI da faixa terapêutica, não
somente o risco de ocorrência de eventos tromboembólicos, mas também de sangramentos graves
associados à valores de RNI acima da faixa, estariam minimizados.
Em relatórios gerenciais da instituição em estudo, detectou-se que o TTR médio do total de
pacientes acompanhados no primeiro ano de funcionamento do ambulatório e não acompanhados
pelo SPAUV foi 54,6%. Ao considerar esse valor, identifica-se que nove pacientes apresentaram
TTR, apesar de apresentarem perfis relacionados a não adesão, e serem encaminhados ao SPAUV
por difícil controle, apresentaram um TTR médio igual ou superior a esse valor, quando analisados
individualmente, após serem encaminhados a esse serviço.
Os dois pacientes cujos TTR não puderam ser calculados no período prévio ao oferecimento
do serviço devido à inexistência de três mensurações de RNI estão representados no gráfico pelo
valor zero, e não foram incluídos no cálculo do TTR médio. Não foi possível comparar melhorias
ocasionadas pelo SPAUV quando comparadas ao atendimento convencional. Entretanto, para cada
P2 P1 P3 P4 P5 P6 P7 P8 P9 P10
P11 P12
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1174 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
um desses pacientes, identifica-se TTR médio após inserção no serviço de promoção de adesão nos
valores de 85%, e 55%, que são semelhantes ao encontrado na análise dos demais pacientes
inseridos no estudo.
Ressalta-se que dois pacientes apresentavam TTR médio acima de 60% ao serem inseridos
no serviço, e mantiveram valores acima de 60% após o acompanhamento. Nesses casos entende-se
que o serviço contribuiu para a continuidade do TTR médio acima de 60%, em um tempo de
acompanhamento superior ao realizado antes da inserção no SPAUV.
Ao analisar os valores médios do TTR antes e após a entrada dos pacientes no SPAUV,
sugere-se que as intervenções farmacêuticas contribuíram para a melhora dos resultados clínicos
dos pacientes no estudo. Outras práticas com intervenções do farmacêutico comprovam para
melhoria de resultados clínicos em pacientes com outros perfis, não sendo encontrados estudos que
tiveram como objeto de estudo pacientes com problemas de adesão e em uso de anticoagulantes
(Flores, 2005; Werlang, 2006).
O presente estudo apresenta limitações relacionadas ao tamanho da amostra, à busca
secundária de dados, que foi realizada por meio de consulta em prontuários o que não permite a
realização de aprofundamento das informações referentes ao perfil dos pacientes em
acompanhamento, e à identificação dos pacientes com dificuldade de adesão, que se limitou à
identificação desses pacientes a partir das percepções dos profissionais envolvidos no serviço e não
sendo utilizada ferramenta validada para identificação dos pacientes. Isso pode ter subestimado o
número de pacientes que necessitaram do SPAUV.
CONCLUSÃO
A implementação do SPAUV envolveu o acompanhamento e implementação de estratégias
educacionais individualizadas como educação em saúde, elaboração de fita selada e caixas
organizadoras, sendo essas as intervenções realizadas com maior frequência.
Diante dos resultados encontrados foi observado que após o seguimento farmacoterapêutico
houve aumento do tempo de permanência de RNI na faixa terapêutica por meio da análise do TTR,
demonstrando que a monitorização da anticoagulação nos pacientes acompanhados pelo SPAUV foi
efetiva, sugerindo que as estratégias implementadas para melhorar adesão ao tratamento foram
adequadas e propiciaram maior efetividade e segurança no tratamento desses pacientes.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1175 Groia, R.C.S. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1160 – 1177, 2015.
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Bacal F, Ganem F, Gomes FLT, Mattos FR, Moraes Neto FR, Tarasoutchi F, Darrieux FCC,
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Estudos brasileiros sobre automedicação: uma análise da literatura
Amanda Luzia De Araújo1, Camila Alves Areda2, Emília Vitória da Silva2, Micheline Marie
Milward de Azevedo Meiners2 & Dayani Galato2*
1Curso de Farmácia - Faculdade da Ceilândia - Universidade de Brasília. 2Grupo de Pesquisa em Acesso e Uso Racional
de Medicamentos – AMUR- Curso de Farmácia - Faculdade da Ceilândia - Universidade de Brasília
* Dayani Galato – ([email protected]) - Curso de Farmácia - Faculdade da Ceilândia (FCE), Universidade de Brasília
- UnB- Centro Metropolitano, conjunto A lote 01, Brasília - DF. CEP: 72220-900. Fone/Fax: 055(61) 3107-8933
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1179 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
RESUMO
Objetivo: Realizar uma análise da literatura científica brasileira para conhecer o perfil da prática da
automedicação no país. Métodos: Realizou-se uma revisão da literatura adotando como descritores
"automedicação" e "Brasil", em português e inglês, sem restrição de período nas bases de dados
Scielo, Medline e Lilacs. Resultados: Foram identificados pela estratégia de busca 577 trabalhos que
depois de excluídos os repetidos e aplicados os critérios de exclusão resultaram em 33 trabalhos
realizados em diferentes grupos populacionais. De maneira geral o conceito adotado nesses trabalhos
se referiu a iniciativa da pessoa em utilizar medicamentos sem prescrição, sendo esta prática realizada
por 6,0% a 86,4% dos sujeitos investigados. As regiões Sul e Sudeste se destacaram com quase 80%
dos estudos sobre o tema. Apesar de 39,3% dos artigos não mencionarem o período recordatório, uma
proporção importante dos autores (27,2%) adotou um período de 15 dias. O principal problema
motivador foi a dor, o que é coerente com a maior proporção de uso de analgésicos como o
paracetamol e a dipirona. Houve uma grande diversidade de fatores associados, entre eles idade, sexo,
escolaridade, dificuldade de acesso aos serviços e acesso facilitado aos medicamentos. Conclusão:
A automedicação no Brasil é uma prática comum e adotada por vários estratos da sociedade, com a
dor se destacando como o principal problema motivador e os analgésicos como os principais
medicamentos utilizados. Existe uma diversidade de fatores relacionados com essa ação, bem como,
encontrou-se diferentes métodos e conceitos adotados nos estudos avaliados.
Palavras-chave: Automedicação, Brasil, Uso de Medicamentos.
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1180 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
ABSTRACT
Objective: To analysis the Brazilian scientific literature to identify the level of self-medication in this
country. Methods: We completed a literature review adopting using the descriptors as "self-
medication" and “Brazil " in Portuguese and English in Scielo, Medline and Lilacs databases, without
restriction of publication time. Results: It were found 577 papers. After excluding repeated articles
and applying the exclusion criteria, we found in 33 studies conducted in different population groups
were analyzed. In general, the concept adopted in these studies mentioned the initiative of the person
using drugs without a prescription, and this practice was carried out by 6.0% to 86.4 % of subjects.
Almost 80 % of the studies were concentrated in the South and Southeast region. Although 39.3 %
of the articles did not mention the recall time, a substantial proportion of authors (27.2 %) adopted
15 days. The main motivating problem was pain, which is consistent with the higher proportion of
analgesics such as paracetamol and dipyrone. There was a great diversity of associated factors,
including age, sex, education, lack of access to services and easy access to medicines. Conclusion:
Self-medication in Brazil is common practice and adopted by various groups of society, with the pain
as one of the main motivators and analgesics as the main drugs used. There is also many diverse
factors related with this practice. We observed the methods and concepts adopted in the studies are
not homogeny.
Key words: Brazil, Drug Utilization, Self-medication,
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1181 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
INTRODUÇÃO
Entre as estratégias que devem ser estimuladas para manter a saúde estão àquelas relacionadas
ao autocuidado, o qual compreende ações desempenhadas pelo próprio indivíduo para manter a saúde,
prevenir e lidar com a doença. Engloba fatores como: higiene, nutrição, estilo de vida, fatores
socioeconômicos e ambientais bem como a automedicação. Para que o autocuidado seja exitoso é
necessário informação e conhecimento por parte do indivíduo, cabendo aos profissionais de saúde a
função de orientar e acompanhar esse processo, focando-se na manutenção da saúde, em especial
quando envolve a automedicação (Silva et al., 2009; WHO, 1998).
Neste contexto, as ações de autocuidado devem ser exercidas, de forma voluntária e
intencional, em benefício próprio de forma a manter a saúde e o bem estar de si e do ambiente. Fatores
como idade, sexo, estado de desenvolvimento e de saúde, modalidades de diagnóstico e de tratamento,
fatores familiares e padrões da vida podem influenciar nessas ações (Bubet al., 2006).
Como já mencionado, no autocuidado e em outras ações relacionadas à prevenção de doenças
e recuperação da saúde pode-se utilizar medicamentos. Assim, esta tecnologia pode ser considerada
um importante aliado no cuidado à saúde (WHO, 1998; WHO, 2012).
A escolha dos medicamentos pode se dar por seleção de profissionais da saúde como médicos
e dentistas ou de outras formas. Quando os medicamentos são utilizados sem prescrição de
profissionais autorizados constitui-se a prática da automedicação (Goulart et al., 2012; Souza et al.,
2011; Barros et al., 2009). Contudo, para alguns autores a reutilização de antigas prescrições,
modificações na forma de uso, bem como a adoção de outras estratégias terapêuticas como plantas
medicinais e remédios caseiros também constituem a automedicação (Oliveira et al., 2010; Chaves et
al., 2009; Cascaes et al., 2008).
De acordo com Vilarino et al. (1998) seria inviável socioeconomicamente o atendimento
médico para todos os sintomas da população. Assim, devido aos benefícios que essa prática pode
trazer para a sociedade, a automedicação é estimulada por entidades como a Organização Mundial da
Saúde (OMS) (WHO, 1998). Contudo, uma boa alternativa seria munir a população de mais
informação sobre o uso racional de medicamentos, em especial dos isentos de prescrição médica
(MIPs), ao mesmo tempo em que fosse estimulada a procura de um profissional de saúde para
resolução dos problemas, em especial quando os problemas não são autolimitados ou existem sinais
de alerta. Ou seja, promover o uso racional e seguro de MIPs para o manejo de problemas de saúde
autolimitados, promovendo a prática da automedicação responsável (Federatión Internacional de
Farmácia, 1999).
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1182 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
Nesse contexto, é preciso alertar para a automedicação quando utilizada de forma inadequada.
Nestas condições esta prática pode estar relacionada com consequências, como doenças iatrogênicas,
efeitos indesejáveis e mascaramento de doenças (Associação Médica Brasileira, 2001).
Portanto, deve-se compreender que o processo de automedicação constitui-se de um
fenômeno complexo e que pode estar associado com diferentes fatores, entre eles à facilidade de
acesso ao medicamento (Souza et al., 2011; Munhoz et al., 2010). No Brasil a dificuldade de acesso
às redes básicas de saúde, associada à falta de informação sobre os medicamentos e à facilidade de
acesso a esta tecnologia em estabelecimentos farmacêuticos configuram situações que devem ser
avaliadas no processo de promoção do uso racional de medicamentos (Padoveze et al., 2012; Cascaes
t al., 2008; Vilarino et al., 1998).
Soma-se a esse quadro a propaganda de medicamentos que geralmente enfatizam os
benefícios e minimizam as possíveis reações adversas e outros riscos. Neste contexto, a propaganda
transmite uma visão inofensiva do produto para o público leigo, tornando-se necessário maior
informação aos indivíduos, para que os mesmos tenham conhecimento dos problemas que a
automedicação pode vir a causar se não adotada adequadamente (Aquino, 2008).
Segundo Naves et al. (2010) em lugares onde o sistema de saúde é insatisfatório e os aspectos
contextuais das enfermidades passam despercebidos, o medicamento assume um papel central e
começa a ser visto como resolução do problema.
Sendo assim, o objetivo deste estudo foi realizar uma revisão da literatura com vistas a
identificar a frequência desta prática, os problemas de saúde que a motivam, os medicamentos
adotados e os fatores que influenciam a sua realização. De forma que, os resultados deste estudo
buscam demonstrar o cenário da prática da automedicação no Brasil, de forma que possam ser
adotados no planejamento de ações para a promoção do uso racional dos medicamentos e o
desenvolvimento de novos estudos.
PERCURSO METODOLÓGICO
Foi realizado um estudo de revisão integrativa da literatura através da Biblioteca Virtual em
Saúde nas bases de dados: Literatura Latino-Americana em Ciências da Saúde (Lilacs); Scientific
Eletronic Library OnLine (Scielo) e Medical Literature Analysis and Retrieval System Online
(Medline).
Adotaram-se como descritores os termos "automedicação" e "Brasil" em português e "self-
medication" e "Brazil" em Inglês.
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1183 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
A busca dos trabalhos foi realizada em 28 de abril de 2014, buscando todos os artigos
publicados independente do ano de publicação (sem restrição de período) publicados em português,
inglês e espanhol. Como critérios de inclusão adotaram-se estudos quantitativos que contivessem
medidas de automedicação e coleta de dados realizada no Brasil.
A análise dos trabalhos encontrados deu-se em etapas, sendo os resultados destas etapas
apresentadas no fluxograma da pesquisa. Na primeira foram excluídos os trabalhos repetidos. Na
segunda foram analisados os títulos e resumos excluindo-se os trabalhos que não abordavam o tema,
os realizados exclusivamente em outros países, os artigos de revisão, os artigos qualitativos e aqueles
que não disponibilizaram o resumo. Todos os resultados de cada uma das etapas foi consensuado por
pelo menos duas pessoas.
Na terceira etapa foram excluídos aqueles que não foram disponibilizados na íntegra assim
como os que não tinham a automedicação como tema central, mesmo que tenham sido mantidos na
etapa anterior. Dos que foram incluídos no trabalho foram extraídas informações sobre a definição de
automedicação, o período recordatório, a caracterização da população investigada, o local de
realização do estudo, a frequência desta prática, os problemas de saúde que motivaram a
automedicação, os fatores associados à realização deste cuidado.
O acesso aos resumos foi obtido nas bases de dados pesquisadas, o mesmo ocorreu com os
artigos na íntegra. Quando não disponíveis nestas bases também foram realizadas a procura no portal
de periódicos da CAPES e no PROQUEST, e inclusive realizou-se a solicitação aos autores. Quando
não foi possível acessar o texto na íntegra por nenhuma destas ações o trabalho foi excluído da
pesquisa.
Por tratar-se de um estudo de revisão da literatura este trabalho não foi submetido a um Comitê
de Ética em Pesquisa (CEP).
RESULTADOS
A Figura 1 apresenta o fluxograma seguido durante a revisão, por meio do qual se pode
verificar a identificação inicial de 577 artigos entre os quais 33 foram incluídos neste estudo.
A Tabela 1 sistematiza os 33 artigos analisados, de acordo com a ordem cronológica de
publicação e autores, os objetivos do estudo, o conceito de automedicação adotado e os principais
resultados alcançados.
Observou-se que a publicação dos trabalhos com este tema no Brasil iniciaram no final dos
ano 90, sendo intensificadas a partir de 2010. Quanto à distribuição geográfica observa-se uma
concentração de estudos em especial nas regiões Sul e Sudeste.
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1184 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
Figura 1. Fluxograma da revisão da literatura realizada
Trabalhos localizados através dos critérios definidos para a busca
(N= 577)
Exclusão dos Repetidos (N=242)
Análise dos títulos e resumos (N=335)
Exclusão baseada no tema e tipo de pesquisa (N=261)
Exclusão por falta de acesso ao resumo (N=17)
Análise dos textos completos (N=57)
Exclusão por falta de acesso ao texto completo (N=7)
Exclusão por não ter como tema central a automedicação (N=17)
Exclusão po Trabalhos incluídos na revisão (N=33)
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1185 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
Quadro 1. Resultados da análise dos artigos selecionados sobre o perfil da automedicação no Brasil.
Artigo Objetivo do
estudo
Conceito de
automedicação
Período
recordatório
População
investigada
Local do
estudo
Frequên
cia
Principais
problemas
motivadores
Principais classes e
medicamentos adotados
Fatores associados e
relacionados
1997 - Arrais et al
Traçar um perfil da automedicação
através da análise
da procura de medicamentos em
farmácias
sem prescrição
médica ou
aconselhamento
do farmacêutico / balconista.
Procedimento caracterizado
fundamentalmente pela
iniciativa de um doente, ou de seu responsável, em
obter ou produzir e utilizar
um produto que acredita
lhe trará benefícios no
tratamento de doenças ou
alívio de sintomas.
Não Descrito. Pessoas de todas as faixas etárias
que se
automedicam.
Fortaleza (CE);
Belo
Horizonte (MG);
São Paulo
(SP).
- Principais motivos: infecção respiratória
alta (19,0%), dor de
cabeça (12,0%) e dispepsia/má
digestão (7,3%).
Analgésicos, antirreumáticos / anti-
inflamatórios, antibióticos/
quimioterápicos sistêmicos, hormônios
sexuais e antiasmáticos.
Prescrições antigas e sugestão de pessoas não
qualificadas.
1998- Vilarino
et al
Caracterizar o
usuário de
medicamento, especialmente
aquele que se
automedica.
Uso de medicamentos sem
prescrição médica,
reutilização de receitas antigas sem que elas
tenham sido emitidas para
uso contínuo.
30 dias. Todos os
integrantes do
domicílio, independentement
e da idade.
Santa
Maria
(RS).
76,1% Cefaleia (28,8%),
sintomas
respiratórios (14,7%) e digestivos (9,6%).
Analgésicos/antitérmico/AI
NES (49.2%),
Idade, grau de
escolaridade e acesso
aos serviços de saúde.
2002 - Loyola
Filho et al
Determinar a
prevalência e os
fatores associados
ao uso de
automedicação.
Consumo de produto com
o objetivo de tratar ou
aliviar sintomas ou
doenças percebidas, ou
mesmo de promover a
saúde, independentemente da prescrição profissional.
90 dias. Pessoas com 18
anos ou mais.
Bambuí
(MG).
28,8% Não Descrito. Analgésicos/antipiréticos
(47,6%), ação no aparelho
digestivo (8,5%),
antibióticos ou
quimioterápicos (6,2%) e
vitaminas, tônicos ou antianêmicos (4,7%).
Percepção da saúde,
história de hipertensão
arterial, história de
doença coronariana,
história de diabetes,
história de doença de Chagas, história de
artrite ou reumatismo,
ter deixado de realizar atividades de rotina nas
duas últimas semanas
por problemas de saúde e ter estado acamado no
período.
2005 - Loyola Filho et al
Investigar a prevalência e
fatores associados
ao consumo de medicamentos
prescritos e não
prescritos.
Não Descrito. 90 dias. Idosos. Bambuí- (MG).
17,1% Não Descrito Ação no sistema nervoso (37,1%), destacando os
analgésicos, medicamentos
do trato alimentar e metabolismo (21,3%),
especialmente vitaminas e
antiácidos. Ação no sistema
musculoesquelético.
Sexo, consulta a um farmacêutico/atendente
nos últimos 12 meses e
consultas médicas nos últimos 12 meses.
2006 –
Kovacs et al
Verificar a
percepção que os pacientes de
escabiose têm da
Uso de medicamentos
sem prescrição médica, quando o próprio paciente
Não Descrito. Pacientes acima de
18 anos.
Recife
(PE).
55,4% Não Descrito. Antissépticos
(permanganato de potássio, água boricada, clorexidina
Não Descrito.
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1186 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
doença e conhecer a automedicação
por eles utilizada.
decide qual fármaco vai usar.
e iodo) e sabões (amarelo, de enxofre).
2006 - Mendoza-
Sassi et al
Determinar a prevalência de
sinais e sintomas
na população adulta, os fatores
sociodemográfico
s associados e a atitude diante
desses sintomas
segundo o sexo.
Intervenção visando o desaparecimento ou
diminuição do problema
de saúde, incluindo, portanto o uso de
medicamentos sem
prescrição ou com prescrição antiga,
medicação caseira e
fitoterápica, entre outros.
60 dias. Pessoas com 15 anos ou
mais residentes no
Município.
Rio Grande (RS).
31,6% Dor de cabeça, prisão de ventre,
febre e
dor de garganta.
Não Descrito. Sexo.
2007 - Pereira
et al
Determinar a
prevalência da
automedicação
correlacionando-a a indicadores
sociodemográfico
s e utilização de serviços de saúde.
Forma pela qual o
indivíduo ou responsável
decide, sem avaliação
médica, o medicamento e como ira utilizá-lo para
alívio sintomático e
"cura".
15 dias. Crianças e
adolescentes.
Limeira e
Piracicaba
(SP).
56,6%
Tosse, resfriado
comum, gripe,
congestão nasal ou
broncoespasmo, febre, cefaleia,
diarreia, cólica
abdominal.
Analgésicos/antipiréticos e
anti-inflamatórios não
hormonais (52,9%), ação
no trato respiratório (15,4%) e gastrointestinal
(9,6%), antibióticos
sistêmicos (8,6%).
Faixa etária de 7-18
anos, usuários de
serviços públicos
de saúde.
2007 - Sá et al Identificar os
determinantes associados ao
perfil da
automedicação.
Iniciativa do doente ou de
seu responsável em obter ou produzir e utilizar um
produto que acredita que
lhe trará benefícios no tratamento de doenças ou
alívio dos sintomas.
Não Descrito. Idosos. Salgueiro
(PE)
60% Dor (38,3%), febre
(24,4%), diarreia (8,0%), pressão
alta (8,0%) e tosse
(5,2%).
Analgésicos (30,0 %),
antipiréticos (29%), anti-inflamatório (7,4%),
vitaminas (7,4%),
antiespasmódico (3,7%), antiácido (2,9%), antigripal
(2,4%), anti-hipertensivo
(1,8%), antibiótico (1,6%), broncodilatador (1,3%),
ansiolítico (1,1%),
antidiabético (1,0%) e outros (11,0%).
Atividade Física.
2008 –
Bortolon et al
Investigar a
ocorrência da automedicação e
realizar uma
avaliação de risco dessa prática.
Uso de medicamento sem
a prescrição, orientação e/ou acompanhamento do
médico ou dentista.
30 dias. Idosos. Distrito
Federal.
26% Não Descrito. Analgésicos, antipiréticos e
anti-inflamatórios (44,7%), ação no trato gastrintestinal
(10,6%),
Suplementos minerais e vitamínicos (7,1%),
Cardiovasculares (7,1%),
Antialérgicos (5,9%), Outros (alopáticos) (10,6%)
Medicamentos caseiros ou
fitoterápicos (14%).
Não está associado à
condição socioeconômica.
2008 - Carvalho et al
Identificar o padrão
de utilização de
medicamentos, nos últimos seis
meses, em
Adquirir o medicamento sem receita, compartilhar
os medicamentos
com outros membros da família ou círculo social e
utilizar sobras de
prescrições, reutilizar
180 dias. Crianças entre zero e seis anos.
Tubarão (SC).
59% Febre, amigdalite, gripe, bronquite,
tosse, otite e outros.
Ação no sistema músculo esquelético, anti-infecciosos
gerais para uso sistêmico,
ação no aparelho respiratório, preparações
hormonais, aparelho
digestivo e metabólico,
Não Descrito.
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1187 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
crianças em quatro creches.
antigas receitas e descumprir a prescrição
profissional, prolongando
ou interrompendo precocemente a dosagem e
o período de tempo
indicados na receita.
produtos antiparasitários, medicamentos
dermatológicos, ação no
sistema nervoso, órgãos dos sentidos, ação no aparelho
cardiovascular.
2008-
Cascaes et al
Avaliar a
automedicação em
um grupo da terceira idade.
Prática pela qual os
indivíduos selecionam e
usam medicamentos para tratar sintomas ou
pequenos problemas de
saúde assim reconhecidos pelos mesmos.
Não Descrito. Idosos. Tubarão
(SC).
80,5% Dor (38%),
problemas no
estômago (10,6%), depressão (8%),
gripe (6,6%),
infecções (6,6%).
Plantas (47,4%),
medicamentos de venda livre
(30,8%), tarjados sem controle (6,6%), tarjados
com controle (2,9%), outros
(3,6%).
Praticidade, problemas
de saúde simples, falta
de acesso.
2008 -
Tourinho et al
Analisar as
características das
farmácias domiciliares e sua
relação com a
automedicação.
Não Descrito. 15 dias. Crianças e
Adolescentes.
Limeira e
Piracicaba
(SP).
- Não Descrito. Analgésicos e antipiréticos
(26,8%), antibióticos
sistêmicos (15,3%).
Cômodo de estoque do
medicamento, grau de
instrução dos responsáveis.
2008 - Vitor et
al
Descrever o
padrão de
consumo de medicamentos
sem prescrição
médica.
Uso de medicamentos sem
prescrição médica, na qual
o próprio paciente decide qual fármaco utilizar.
Não Descrito. Pessoas entre 18 e
70 anos.
Porto
Alegre
(RS).
- Dor de cabeça, febre,
gripe e náuseas /
enjoo.
Não Descrito. Experiência com o
medicamento,
indicação de outra pessoa.
2009 - Barros
et al
Prevalência de
automedicação e
fatores associados entre
trabalhadores de
enfermagem
Uso de medicamentos sem
receita médica, orientação
médica ou acompanhamento.
7 dias. Enfermeiros,
técnicos e
auxiliares de enfermagem.
Rio de
Janeiro
(RJ).
24,2 % Não Descrito. Ação no sistema nervoso
(46,7 %), ação no trato
digestivo (15,4 %) e produtos naturais (10,0 %).
Analgésico (43,4 %), anti-
inflamatória e antirreumática (7,3 %) e vitaminas (6,2%).
Transtornos
psiquiátricos menores,
atividade física, padrões de sono,
doença ou ferimento
nos últimos 15 dias.
2009 -
Carvalho et al
Identificar
práticas de
automedicação no tratamento de
emergências
oculares.
Não Descrito. Não Descrito. Pacientes de uma
unidade de
oftalmologia.
São Paulo
(SP)
40,5% Olhos lacrimejantes,
corpo estranho no
olho, produtos químicos
no olho, prurido,
sintomas oculares.
Preparações caseiras
(29,4%), produtos
manufaturados (11,1%).
Não descrito.
2009 - Chaves
et al
Investigar a
prática da
automedicação em nutrizes,
principais
fármacos utilizados e
influência sobre a
duração do aleitamento
materno.
Consumo de produtos
medicinais com o objetivo
de tratar doenças ou sintomas ou mesmo
promover saúde,
independentemente da prescrição profissional.
Não Descrito. Mulheres. Itaúna
(MG).
52,4% Não Descrito. Analgésicos/antipiréticos
(54,4%), anti-inflamatórios
não-esteroides (15%), espasmolíticos (6,2%),
laxantes (3,5%),
benzodiazepínicos (3%), descongestionantes nasais
(1,4%), antibióticos (0,9%) e
diversos (15,6%). Dipirona (31,5%) e
paracetamol (17,9%).
Não Descrito.
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1188 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
2010 – Beckhauser et
al
Conhecer a automedicação em
crianças.
Iniciativa de um sujeito ou de seu responsável em usar
um medicamento que
poderá trazer benefícios no tratamento de doenças ou
alívio imediato de seus
sintomas.
30 dias.
Crianças de zero a 14 anos.
Tubarão (SC)
75% Febre (57,6%), dor (27,2), gripe (4,3%)
e outros (10,9%).
Ação no sistema nervoso (75,5%) destacando
paracetamol (45,0%) e
dipirona (15,4%).
Não descrito.
2010 -
Munhoz et al
Verificar a
prevalência da
automedicação em ambiente
hospitalar.
Iniciativa do doente ou de
seu responsável em obter
ou produzir e utilizar um produto que acredita que
lhe trará benefícios no
tratamento de doenças ou alívio dos sintoma.
Não Descrito. Profissionais das
áreas de
enfermagem e farmácia.
São José
do Rio
Preto (SP).
56% Não descrito. Analgésico, antitérmico,
anti-inflamatório, relaxante
muscular, descongestionante nasal, outros.
Autoconfiança,
descuido com a
própria saúde, facilidade de acesso.
2010 -
Oliveira et al
Descrever a
utilização de
medicamentos em crianças de três,
12 e 24 meses de
idade.
Utilização de
medicamento a partir de
uma prescrição médica para tratamento anterior ou
indicação por outra pessoa
que não um médico.
15 dias. Crianças de três a
24 meses.
Pelotas
(RS).
De 11%,
a 34%
dependendo da
idade.
Não Descrito. Aos três meses:
Medicamentos
dermatológicos (31%), analgésicos e antipiréticos
(13,5%), ação no trato
gastrointestinal (11,8%) e ação no sistema
respiratório (11,0%).
Aos 12 meses: ação no sistema respiratório (23,5%),
analgésicos e antipiréticos
(20,5%), antianêmicos e vitaminas (16,3%), produtos
dermatológicos (9,7%) e anti-
infecciosos para uso
sistêmico (8,7%).
Aos 24 meses: analgésicos e antipiréticos (26,0%), ação
no sistema respiratório
(24,5%), antianêmicos e vitaminas (11,6%) e anti-
infecciosos de uso sistêmico
(10,0%).
Idade.
2010 - Schmid et al
Estimar a proporção de
automedicação
em adultos de baixa renda e
identificar fatores
associados.
Seleção e uso de medicamentos por pessoas
para tratar doenças
autodiagnosticadas ou sintomas.
15 dias. Adultos. São Paulo (SP)
27% a 32%
Morbidade aguda. Ação no sistema nervoso, como os analgésicos.
Sexo, idade, trabalho, escolaridade, renda,
forma de acesso ao
medicamento e tipo de morbidade.
2011 -
Mastroianni et
al
Identificar
domicílios
atendidos pela estratégia saúde
da família (ESF)
que possuíam estoque de
Uso de medicamentos sem
prescrição, orientação ou
acompanhamento do médico ou do dentista.
7 dias. Pessoas com 18
anos ou mais.
Município
do Estado
de São Paulo, que
se encontra
a 360 km
13,4% Não descrito. Analgésicos e anti-
inflamatórios não
esteroidais, antiulcerosos, antitérmicos,
antiespasmódicos, relaxantes
musculares e diuréticos tiazídicos.
2011 - Mastroianni et
al
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1189 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
medicamentos, avaliar as
condições de
armazenamento e conhecer o seu
modo de uso.
da capital paulista.
2011 - Moraes et al
Estimar a prevalência de uso
de medicamentos
e proporção de automedicação,
além de explorar a
associação de uso de medicamentos
com variáveis
demográficas, socioeconômicas
e
comportamentais.
Não descrito. 15 dias. Adolescentes dos 14 aos 18 anos.
Maringá (PR)
52,6 % Problemas eventuais e problemas
crônicos.
Não Descrito. Viver com os pais, emprego, uso de álcool
e fumar.
2011 - Silva et al
Analisar o conhecimento dos
estudantes sobre o
uso de medicamentos e
suas implicações
para a saúde.
Uso de medicamentos sem prescrição médica, sendo o
próprio paciente quem
decide qual é o fármaco a ser utilizado, com o
objetivo de tratar ou
aliviar sintomas ou mesmo de promover a saúde.
60 dias. Alunos de treze a dezoito anos.
Fortaleza (CE).
20,8 % Não Descrito. Analgésicos (65,4%), antigripal (12,3%),
antitérmico (11,7%),
antimicrobiano (9,8%) polivitamínico (4,4%), anti-
inflamatório (3,8%)
vermífugo (3,3%), antialérgico (2,1%),
anticoncepcional (1,9%),
antianênicos (1,5%).
Meios de comunicação como televisão, jornal
e rádio.
2011 - Souza
et al
Estimar a
prevalência de
automedicação entre estudantes
de enfermagem de
graduação que buscam aliviar a
dor.
Uso de medicamentos
industrializados ou
caseiros sem prescrição médica buscando tratar os
sintomas ou condições de
saúde autodiagnosticados.
Não Descrito. Alunos entre 18 e
29 anos.
Goiânia
(GO).
38,8% Dor de cabeça e dor
crônica.
Dipirona (59,2%)
,paracetamol (19,8%).
Falta de tempo para ir
a um médico,
conhecimento próprio e acesso ao atendente
da drogaria.
2012 - Bertoldiet al
Rastrear o uso de medicamentos e
automedicação,
desde a infância até a adolescência.
Uso de qualquer medicamento sem
prescrição médica.
15 dias. Crianças de um mês a 15 anos.
Pelotas (RS).
12,4 a 29,0%
Não descreve. Não descreve. Idade.
2012 - Corrêa et al
Identificar a prevalência e
fatores associados à automedicação.
Uso de medicamentos sem prescrição, orientação
ou supervisão de um médico ou dentista.
Não Descrito. Universitários. Rio Grande (RS).
86,4% Dor de cabeça (89,7%), frio
(82,9%), dor de garganta (58,1%),
febre (56,2%),
cólicas menstruais (47,6%), dor
muscular (41,0%),
Paracetamol, dipirona, aspirina, compostos
fitoterápicos e chá.
Estoque domiciliar de medicamentos,
conhecimento sobre a medicação, ter
filhos, ter emprego,
possuir um parceiro,idade, sexo.
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1190 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
tosse (36,4 %) e azia (29,4%);
2012 -
Demétrio et al
Estimar a
prevalência de
automedicação por medicamentos
para tratamento de
dor e fatores associados.
Não Descrito. Não Descrito. Pessoas com 18
anos ou mais.
Laguna
(SC).
78,3% Dor Paracetamol (51,8%),
dipirona (36,2%), ácido
acetilsalicílico (6,0%), benzocaína, (2,4%),
cetorolaco (1,2%).
Intensidade da dor.
2012 – Galato
et al
Investigar a
influência da área
de formação de universitários na
prática da
automedicação.
Prática de utilizar
medicamentos sem
prescrição, estando inclusa dentro do conceito de
autocuidado.
15 dias. Universitários. Tubarão
(SC).
37,0% Dor em geral
(90,4%), gripes e
resfriado (20%), dor de estomago (20%),
rinite (4%) e tosse
(3,2%).
Paracetamol (14,3%),
paracetamol em associação
(6,5%), dipirona (12%), dipirona em associação
(8,8%), orfenadrina com
dipirona (6%), belladona e derivados (2,3%).
Gênero, possuir plano
de saúde.
2012 - Goulart
et al
Medir a
prevalência e identificar fatores
associados à
automedicação.
Utilização de
medicamentos sem a devida prescrição,
orientação e/ ou
acompanhamento médico.
15 dias. Crianças menores
de cinco anos.
Caracol
(PI) e Garrafão
do Norte
(PA).
Caracol
30% Garrafão
do Norte
25%
Não Descrito. Não Descrito. Caracol: idade
materna, distância da residência aos serviços
de saúde e, dificuldade
de consulta médica nos últimos 15 dias.
Trabalho materno nos
últimos 12 meses e,
atendimento médico
nos últimos 15 dias.
2012 - Oliveira et al
Avaliar a prevalência e
fatores associados
à automedicação em idosos e
identificar os
principais fármacos
consumidos sem
prescrição.
Seleção e uso de medicamentos para
manutenção da saúde,
prevenção de enfermidades, tratamento
de doenças ou sintomas
percebidos pelas pessoas, sem a prescrição,
orientação ou o
acompanhamento do médico ou dentista.
3 dias. Idosos. Campinas (SP).
8,9% Não Descrito. Ação no sistema nervoso (dipirona -25,7%,
Ginkgobiloba - 9,6%,
paracetamol - 8,8% e AAS - 15,9%), ação no sistema
musculoesquelético
(diclofenaco - 13%), homeopáticos (6%), ação no
aparelho digestivo e
metabolismo (vitaminas e sais minerais - 4,1% e
hioscina - 3,7%) e
fitoterápicos (3,4%).
Idade, hipertensão arterial, presença de
doenças crônicas, uso
de serviços de saúde, realização de consultas
odontológicas e
filiação a plano médico de
saúde.
2012 – Padoveze et al
Identificar a ocorrência da
automedicação tópica no
tratamento de
dermatoses.
Maneiras pela qual os indivíduos ou os
responsáveis por eles decidem sobre qual droga
administrar para o alívio
sintomático ou "cura", sem procurar uma avaliação
Não Descrito. Indivíduos menores de 18
anos.
Taubaté (SP).
6,0 % Foliculose, eczema, micoses superficiais,
eritêmato-escamosa e
condições
parasitárias.
Preparações antiacne (27,5%),
corticosteroides ( 20,7%), combinações (corticoides ,
antibióticos e antifúngicos)
(20,7%).
Confiança na própria capacidade,
dificuldade de acesso aos serviços e
profissionais médicos.
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1191 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
médica profissional de sua condição.
2012 - Pinto et
al
Investigar o uso
inadequado de medicamentos
através da
avaliação do consumo,
automedicação,
polifarmácia e interações
medicamentosas
dos membros da
população.
Utilização de medicação
por iniciativa própria.
Não Descrito. Pessoas com 18
anos ou mais.
Diamantina
(MG)
63,3 % Não Descrito. Analgésicos / antitérmicos
(91,8 % em adultos e 88,9 % em crianças), anti-
inflamatórios (31,7 % em
adultos e 33,3% em crianças) e antibióticos (14,6 % em
adultos e 17,2 % em
crianças).
Nível educacional,
sexo.
2014 –
Bertoldi et al
Estimar a
prevalência da automedicação e
avaliar o tipo de
medicamentos utilizados.
Seleção e uso de
medicamentos por pessoas para tratar problemas
autorreconhecido ou
condições e sintomas auto - diagnosticada.
15 dias. Adolescentes de
18 anos de idade.
Pelotas
(RS)
26,7 %
(25,4 - 28,1%)
Dor de cabeça
(30,9%), dor em geral (17,1%),
contracepção (8,8%),
infecção (6,8%), gripes e resfriados
(6,3%),
Analgésicos (56, 1%), como
paracetamol e a dipirona, anti-histamínicos sistêmicos
(7,4%), anti-inflamatório e
produtos antirreumáticos (7,1%).
Percepção de saúde,
sexo.
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
Os conceitos de automedicação adotados são bastante amplos, os quais incluem geralmente a
contextualização do uso de medicamentos sem prescrição médica ou odontológica. Contudo, há
diversos estudos que avaliam a reutilização de antigas prescrições. Há também de se destacar que
alguns estudos consideram automedicação apenas o uso de medicamentos e outros extrapolam este
conceito incluindo plantas medicinais e outras alternativas (remédios) como, por exemplo, o uso de
mel.
Outro achado importante deste trabalho refere-se ao período de recordatório, o qual nem foi
citado em alguns estudos (39,3%). Naqueles trabalhos onde esta informação foi localizada, a mesma
variou de sete a 180 dias.
Foram investigados diversos grupos populacionais sendo observados valores que variaram de
6,0 a 86,4% de prevalência de adoção desta prática. Esta variação depende da amplitude do conceito
adotado, da população analisada, dos problemas de saúde presentes e do período recordatório
investigado.
A apresentação dos medicamentos utilizados e as classificações terapêuticas não puderam ser
uniformizados uma vez que apenas alguns trabalhos adotaram a Classificação Anatômica Terapêutica
e Química recomendada pela Organização Mundial da Saúde.
Outras informações relacionadas aos fatores de motivam à realização desta prática, aos
problemas de saúde, medicamentos e fatores associados encontram-se descritos na Tabela 1.
DISCUSSÃO
A estratégia de busca adotada conseguiu identificar muitos trabalhos que, no entanto, se
repetiram devido à indexação em mais de uma base. A falta de acesso a alguns artigos, tanto aos
resumos quanto aos textos na íntegra, foi um fato importante, que constituiu uma limitação desta
pesquisa, entretanto sem inviabilizar os achados desta revisão.
Os estudos analisados tinham como objetivo a investigação da automedicação, podendo variar
quanto à faixa etária da população estudada, problema de saúde ou estratos da população (como o
caso de estudantes e profissionais da saúde). Se por um lado esta heterogeneidade dificulta a
comparação dos dados, por outro consegue apresentar um perfil de automedicação mais amplo para
o país.
O conceito de automedicação utilizado pela maior parte dos autores foi representado pela
iniciativa da pessoa em utilizar medicamentos sem prescrição. Contudo, alguns trabalhos também
consideraram automedicação a reutilização de antigas prescrições (Carvalho et al., 2008; Mendoza-
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1193 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
Sasi et al., 2008; Vilarino et al., 1998) e o uso de plantas medicinais ou remédios caseiros (Souza et
al., 2011; Mendoza-Sasi et al., 2008). Segundo a OMS (WHO, 1998) a automedicação faz parte do
autocuidado e deve ser considerado nesta prática o uso de diferentes estratégias com finalidade
terapêutica. Entre estas se devem incluir os remédios caseiros e as plantas medicinais e a reutilização
de antigas prescrições. Neste contexto, se considerarmos a automedicação inserida na prática do
autocuidado e, ademais, que o uso de outras terapias alternativas pode estar associado aos eventos
adversos, o mais adequado seria incluir nos estudos de automedicação o uso de plantas medicinais,
fitoterápicos, medicamentos homeopáticos, florais entre outros.
Analisando a frequência da automedicação encontrada nos trabalhos, notou-se uma grande
variação de percentuais nessa prática, com valores entre 6% (Padoveze et al., 2012) até índices
impressionantes como 86,4% (Corrêa et al., 2012). Estas diferenças se devem, provavelmente, a
diversos fatores como as características da população investigada, o tipo de problema de saúde (se
geral ou específico) e o período recordatório, além da amplitude do conceito adotado.
Dos artigos examinados apenas três não forneciam dados relacionados a essa frequência
(Tourinho et al., 2008; Vitor et al., 2008; Arrais et al., 1997). Isto ocorreu em função de que nestes
trabalhos o critério de inclusão adotado pelos autores foi estar em uso de automedicação. É importante
destacar, que estes estudos foram mantidos na presente revisão por auxiliar na caracterização desta
conduta.
Os períodos de tempo em que se solicitou que os pacientes relatassem a utilização de
medicamentos por automedicação, período recordatório, foram muito variados entre três a cento e
oitenta dias, o que demonstra não haver homogeneidade neste critério. Este fato deve ser analisado
com cautela, pois em curtos períodos há menor viés de memória, no entanto, também é esperado
menor frequência de uso de medicamentos por esta prática. Assim, períodos maiores predispõe a
maior exposição à automedicação, contudo, as informações coletadas não são tão precisas. Há ainda
autores que não estipularam período recordatório, devendo o entrevistado responder a questão
baseando-se na sua experiência de vida (Pinto et al., 2012; Munhoz et al., 2010; Cascaes et al., 2008;
Sá et al., 2007; Arrais et al., 1997) ou em todos os momentos de ocorrência de um referido problema
de saúde (Corrêa et al., 2012; Demétrio et al., 2012; Carvalho et al., 2009). Além disso, observaram-
se também trabalhos em que este dado não foi apresentado (39,3%), configurando uma limitação para
a presente revisão.
Vale destacar que o período recordatório mais adotado foi de quinze dias (aproximadamente
um terço dos trabalhos), o que parece ser um tempo adequado para minimizar o viés de memória e ao
mesmo tempo possibilitar a observação do desfecho investigado (Yang &West-Strum; 2013).
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1194 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
Quanto aos locais de realização dos estudos houve prevalência das regiões Sul e Sudeste do
país, totalizando aproximadamente 80% dos estudos. Isto provavelmente ocorreu em função da
concentração nestes locais dos grupos de pesquisa em farmacoepidemiologia, bem como, dos cursos
de farmácia, os quais geralmente criam as demandas de pesquisa neste tema. Sugere-se que seja
estimulada a realização de novas pesquisas sobre a temática, em especial, nas regiões Norte e
Nordeste, pois o perfil de automedicação nestas regiões pode diferir das demais em função das
questões culturais, sobretudo relacionadas ao uso de plantas medicinais.
Analisando-se a população investigada, percebeu-se grande heterogeneidade como já
abordado anteriormente. As populações de estudo variaram de pessoas idosas, adultos, adolescentes,
crianças, recém-nascidos, puérperas, universitários, moradores locais, profissionais da saúde, entre
outros. De modo que, esta diversidade de população limita as possibilidades de comparação dos dados
obtidos, mas por outro lado mostra abrangência dos estudos realizados no Brasil e ao mesmo tempo
confirma que a prática da automedicação é comum a todos os estratos da população brasileira.
Devemos ressaltar que a automedicação ao mesmo tempo em que contribui para o cuidado da
saúde da população (OMS, 1998; Vilarino et al., 1998) pode também trazer danos às pessoas que a
adotam (Associação Médica Brasileira 2001). Mesmo que a maior parte dos autores que investigam
este tema aborde este paradoxo, não há estudos no Brasil que discutam o quão racional ou danosa é
esta prática. Ou seja, os artigos restringem-se a quantificar esta conduta e a descrever os problemas
de saúde, medicamentos utilizados e fatores associados, além de extrapolar possíveis malefícios desta
prática.
Em relação aos problemas motivadores, foi observada a maior prevalência de automedicação
mediante sintomas de dor. Isto ocorre por este sintoma ser comum a muitos problemas de saúde
(Falgás, 1999) e o acesso aos medicamentos para o manejo deste sintoma, analgésicos e anti-
inflamatórios, ser facilitado. Esta facilidade se deve ao fato dos analgésicos serem, na sua maioria,
isentos de prescrição médica (Anvisa, 2003) e comporem o estoque domiciliar na maior parte das
residências (Beckhauser et al., 2012, Shenkel et al., 2005). Sendo assim, esta é a classe de
medicamentos mais utilizada na automedicação, como observado na maioria dos trabalhos
identificados.
Foram identificados, também, sintomas relacionados aos sistemas respiratório, digestivo e
dermatológico o que pode ser explicado pela ocorrência de problemas autolimitados de saúde
(Blenkinsopp et al., 2004; Belon, 2002). Porém, mesmo que tenham sido citadas em menor
frequência, algumas indicações levam a questionar a racionalidade deste comportamento, como por
exemplo, o uso no manejo das infecções, de doenças crônicas e da prevenção da gravidez.
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1195 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
Quanto a esta última indicação, anticoncepção, há um documento da OMS (WHO, 2004) que
descreve que deve haver critérios para a seleção desta medicação. Contudo, políticas internacionais
relacionadas à prevenção da gravidez não planejada discutem a liberação das pílulas do dia seguinte
para a categoria de medicamentos isentos de prescrição, o que já é realidade em diversos países
(Payakachat et al., 2010).
Cabe destacar que se observou a falta de uniformidade na apresentação dos medicamentos e
de suas classes o que prejudica em parte a comparação dos resultados, para minimizar este problema
sugere-se a adoção da classificação ATC na realização de estudos farmacoepidemiológicos.
Levando-se em consideração os fatores associados e relacionados à automedicação, destacou-
se a idade, o sexo, a escolaridade, a falta de acesso aos serviços de saúde e o acesso facilitado aos
medicamentos. Em relação à idade observou-se maior frequência de automedicação em crianças
menores (Beckhauser et al., 2010) e pessoas com idade mais avançada (Oliveira et al., 2012; Loyola
et al., 2005), isso pode estar relacionado ao fato desses grupos etários estarem mais predispostos aos
problemas de saúde que motivam a realização da automedicação, própria ou por iniciativa de seus
cuidadores e também a reutilização de antigas prescrições.
Quanto ao gênero, relata-se que esta prática é geralmente mais comum nas mulheres em
função do maior cuidado à saúde (Bertoldi et al., 2014; Loyola et al., 2005). Entretanto, no estudo
com adultos de baixa renda em São Paulo (Schmid et al., 2010) observou-se que não houve diferença
significativa entre os sexos.
Em relação à escolaridade observou-se que a automedicação aumenta com a escolaridade
(Loyola et al., 2005; Vilarino et al., 1998), porém alguns autores não conseguiram relacionar esta
variável com a automedicação (Beckhauser et al., 2010; Cascaes et al., 2008;).
A falta de acesso aos serviços de saúde foi observada em diferentes estudos como um fator
que motiva a automedicação, este dado representa um problema que deve ser contornado, pois se por
um lado a OMS recomenda a automedicação dentro do processo de autocuidado (WHO, 1998), por
outro lado esta mesma instituição defende o uso responsável de medicamentos (WHO, 2012).
De outro modo, o acesso facilitado aos medicamentos, como já abordado anteriormente foi
identificado como outro importante fator motivador da automedicação. Contudo, este uso deve ser
realizado com segurança, uma vez que, os medicamentos representam a maior causa de intoxicação
no Brasil (29,5%) (Sistema Nacional de Informações Toxicológicas, 2011) o que muitas vezes é
gerado pelo uso de MIPs.
Recentemente foi publicada pelo Conselho Federal de Farmácia a Resolução nº 586 de 29 de
agosto de 2013 que regulamenta a prescrição farmacêutica como uma atribuição clínica do
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1196 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
farmacêutico (Conselho Federal de Farmácia, 2013), esta publicação talvez modifique o perfil da
automedicação no Brasil, o que poderá ser objeto de novas pesquisas neste tema.
A partir deste estudo observou-se a necessidade da realização de estudos epidemiológicos que
busquem avaliar os impactos da automedicação na saúde das pessoas, bem como, avaliar a
racionalidade desta prática. Além disso, deve ser estimulada a investigação deste tema em outras
regiões brasileiras. Sugere-se, também, a realização de novas revisões que busquem identificar
trabalhos publicados em congressos e na forma de monografias, dissertações e teses, bem como, de
trabalhos não publicados (literatura cinza). Da mesma forma, a adoção de outras estratégias de busca
poderão ser testadas.
Há limitações nesta revisão, podendo ser citadas à falta de acesso a alguns trabalhos, bem
como a falta de padronização dos estudos quanto aos aspectos como o período recordatório e a questão
de que alguns estudos apenas quantificaram esta prática. Contudo, estas limitações não inviabilizam
os achados que demonstram que a automedicação é uma prática muito comum. Além disso, os
resultados observados demonstram que mesmo que a Organização Mundial da Saúde recomende para
o manejo de problemas de saúde autolimitados e por sujeitos considerados saudáveis, observou-se o
uso em diversas populações, inclusive nas consideradas especiais (idosos e crianças), sendo adotada
para o manejo tanto de problemas de saúde crônicos como com medicamentos tarjados. Contudo,
pelos trabalhos realizados, dada sua diversidade e baixa padronização, a revisão não permitiu apontar
se realmente a automedicação é um problema de saúde pública nos pais.
Mesmo assim é importante que artifícios sejam criados no sentido de garantir que esta prática
seja adotada apenas em situações consideradas autolimitadas e quando os MIPS foram indicados,
efetivos e seguros. Neste cenário, destacam-se a importância dos profissionais da saúde, em especial
dos médicos e dentistas que podem orientar para o uso de medicamentos se necessário, bem como,
os farmacêuticos que podem orientar no momento da dispensação e no manejo de problemas
autolimitados nos estabelecimentos farmacêuticos e em outros locais de saúde.
ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW
1197 Araújo, A. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1178 – 1201, 2015
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ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
Exposição ocupacional a material biológico envolvendo trabalhadores que
atuam em drogarias e medidas adotadas para prevenção
Vivian Etienne Gonçalves e Silva1, Michele Sousa1, Debora Heloisa Quadros Araujo1, Priscila do
Carmo Freitas de Carvalho1, Elucir Gir2, Silmara Elaine Malaguti Toffano*
1 Universidade Federal de São João del Rei. Divinópolis-MG. 2 Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Ribeirão Preto - SP
1 Professora Adjunta do Curso de Enfermagem da Universidade Federal de São João del Rei. Endereço: Rua Sebastião Gonçalves Coelho, 400. Chanadour. Divinópolis-MG. E-mail: [email protected]
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1203 Silva, V G. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1202 – 1215, 2015
RESUMO
Este artigo teve como objetivo identificar a ocorrência de exposição ocupacional envolvendo
material biológico entre trabalhadores que atuam em drogarias e as medidas de prevenção de
acidentes adotadas. Trata-se de um estudo descritivo e transversal, com 90 farmacêuticos e
balconistas que atuavam em drogarias e que realizavam aplicação de medicamentos injetáveis. Desse
total, 17 (18,9%) responderam ter sofrido exposição a material biológico, sendo a maioria (58,9%)
percutânea. Quanto às medidas adotadas para prevenção de acidentes, foram citadas: vacinação contra
hepatite B, capacitação, uso de dispositivos seguros, equipamento de proteção individual e descarte
correto de perfurocortantes. Trabalhadores que atuam em drogarias e que realizam procedimentos
com risco biológico devem ser capacitados periodicamente quanto às medidas de prevenção e pós-
exposição ocupacional, principalmente os balconistas, por não terem uma formação específica na área
da saúde.
Descritores: Ferimentos Penetrantes Produzidos por Agulha. Prevenção de Acidentes. Farmacêuticos.
Aids. Exposição Ocupacional.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1204 Silva, V G. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1202 – 1215, 2015
ABSTRACT
This aimed to identify the occurrence of occupational exposure involving biological material
potentially among workers who work in pharmacies and the measures adopted to prevent accidents.
It is a descriptive and cross-sectional study with 90 pharmacists and clerks who worked in drugstores
and they performed administering injectable medications were interviewed. Of this total, 17 (18,%)
reported having suffered exposure to biological material, the majority (58,9%), percutaneous. On the
measures taken to prevent accidents, were cited: hepatitis B vaccination, training, use of secure
devices, personal protective equipment and proper disposal of sharps. Workers who work in
drugstores and perform procedures with biohazardous should be trained periodically on the measures
of prevention and occupational post-exposure, mainly by the clerks have no specific training in
healthcare.
Key Words: Needlesticks. Accident Prevention. Health Care Workers. Pharmaceutics. Aids.
Occupational Exposure.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1205 Silva, V G. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1202 – 1215, 2015
INTRODUÇÃO
A exposição ocupacional envolvendo material biológico potencialmente contaminado entre
trabalhadores da área de saúde tem sido amplamente estudada, principalmente em ambientes
hospitalares, com procedimentos envolvendo sangue e outros fluidos corporais (Wicker et al., 2014;
Menezes et al., 2014).
Observa-se um grande avanço na produção científica abordando a questão da exposição
ocupacional com material biológico em trabalhadores da área de saúde, no entanto a enfermagem
ainda é citada como a categoria profissional mais atingida (Perry et al., 2012; Wright et al., 2014).
Diversos procedimentos que envolvem agulhas, como a administração de medicamentos
injetáveis ou endovenosos que envolvem a manipulação de agulhas pode levar o trabalhador da área
da saúde a sofrer exposições ocupacionais com material biológico (Perry et al, 2012; Wright et al.,
2014; Siegel et al., 2007).
Nas farmácias e drogarias, a administração de medicamentos injetáveis e a execução de outros
procedimentos envolvendo agulhas e material biológico, como a perfuração de orelhas para uso de
brincos e glicosimetria capilar, são realizadas por farmacêuticos ou por profissional habilitado (Brasil,
2009; Brasil, 2012). Dados de uma pesquisa brasileira com 461 participantes apontaram que 15% das
exposições com material biológico acometeram farmacêuticos (Almeida et al., 2015)
Assim como em outros serviços de saúde, por se tratar de um procedimento envolvendo
agulhas contaminadas, os trabalhadores que realizam procedimentos que envolvem material
biológico, também, estão vulneráveis à transmissão de patógenos veiculados por via sanguínea, como
o vírus da imunodeficiência humana (HIV), vírus das hepatites B (VHB) e C (VHC) (Tin &
Wiwanitkit, 2015; Siegel et al., 2007).
Um estudo sobre exposições percutâneas com farmacêuticos e atendentes (N=2.150), que
atuaram em uma campanha de vacinação contra influenza em uma rede drogarias norte-americana,
apontou 33 ocorrências de exposição ocupacional envolvendo agulhas; entre as exposições, 15%
envolveram agulhas usadas para a realização de glicosimetria, que, na ocasião, também foram
executadas (De Perio, 2012).
Entre as medidas de prevenção de exposição a material biológico, destacam-se as Precauções-
Padrão (PP), que contemplam o uso de equipamentos de proteção individual (EPI) e outras medidas
para evitar exposição ocupacional a material biológico (Siegel et al., 2007; Pereira et al., 2013). O
Ministério do Trabalho do Brasil, por meio da Portaria 485, de 2005, mais conhecida como NR 32,
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1206 Silva, V G. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1202 – 1215, 2015
estabeleceu diretrizes básicas para a proteção à saúde dos trabalhadores de todos os serviços de saúde,
com o objetivo de reduzir o número de acidentes de trabalho, com destaque à importância do uso das
PP, higienização das mãos e descarte de perfurocortantes (Brasil, 2005).
Posteriormente, a legislação também contemplou a obrigatoriedade do uso de dispositivos
seguros com controle de engenharia pelos trabalhadores; fornecimento desses por parte dos
empregadores; responsabilidade de capacitação para a correta utilização desses dispositivos pelas
empresas que produzem ou comercializam tais materiais e ainda a garantia de acesso a tais
capacitações (Brasil, 2008).
Os dispositivos de segurança com controle de engenharia são materiais destinados à coleta de
sangue, fluidos, administração de medicamentos e possuem travas, capas de segurança ou
mecanismos retráteis, com isso, visando à redução dos riscos durante a manipulação de
perfurocortantes (Jagger et al., 2013).
O uso desses materiais, na substituição de dispositivos comuns, e programas de treinamento
têm se mostrado uma estratégia bastante eficaz na redução de acidentes envolvendo trabalhadores da
área da saúde (Phillips et al., 2013; Hoffmann et al., 2013, Sossai et al., 2010).
Dados apontam que houve redução significativa (40 a 73%) das exposições envolvendo
material biológico, potencialmente, nos Estados Unidos da América, após a introdução de uma
legislação de segurança dos trabalhadores de saúde que tornou obrigatório o uso dos dispositivos
seguros com controle de engenharia (Jagger 2007; Perry & Jagger, 2012). Tal redução também foi
associada às políticas organizacionais e institucionais que envolveram programas de prevenção e
vacinação dos trabalhadores (Perry et al., 2012).
Embora o uso desses materiais seja obrigatório em todo o Brasil, na prática, ainda não estão
disponíveis a todos os trabalhadores e os motivos ainda carecem de estudos, sendo os mais prováveis
o custo e a falta de conhecimento sobre a obrigatoriedade do uso e fiscalização efetiva (Menezes et
al., 2014).
Ao considerar a legislação brasileira que contempla medidas de prevenção à exposição a
material biológico e após identificar lacunas na literatura que retratem tais exposições em drogarias,
este estudo foi realizado com o objetivo de identificar a ocorrência de exposição ocupacional
envolvendo material biológico potencialmente entre trabalhadores que atuam em drogarias e a adoção
de medidas preventivas.
METODOLOGIA
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1207 Silva, V G. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1202 – 1215, 2015
Trata-se de um estudo descritivo, transversal, cuja população de estudo foi composta por 102
trabalhadores que atuavam como atendentes de farmácia ou farmacêuticos, em 76 drogarias
cadastradas em um município do interior de Minas Gerais, em fevereiro de 2013.
Para a inclusão dos estabelecimentos, adotou-se como critério a permissão do proprietário ou
responsável pelo estabelecimento comercial; aqueles que não autorizaram a participação dos
trabalhadores na pesquisa foram excluídos.
Para a inclusão dos participantes, considerou-se: atuar como atendentes de farmácia ou
farmacêuticos durante o período de coleta de dados; ter idade maior que 18 anos e realizar aplicação
de medicamentos injetáveis na prática profissional. Trabalhadores afastados durante o período de
coleta de dados e aqueles que atuam somente em vendas ou gestão do estabelecimento pesquisado
foram excluídos.
Os dados foram coletados por meio de entrevista individual, norteada por um instrumento
semiestruturado, elaborado pelos pesquisadores, com questões abertas e fechadas sobre as medidas
de prevenção adotadas para a aplicação de injetáveis, uso de dispositivos seguros e exposição
ocupacional envolvendo material biológico potencialmente contaminado.
A coleta de dados foi realizada no período de agosto a outubro de 2013, nas drogarias, e contou
com a ajuda de 11 alunos de enfermagem designados e capacitados para tal procedimento. Os dados
foram obtidos durante o horário de trabalho do profissional, em momentos mais adequados, após
assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São João
Del Rei, Campus Centro Oeste - Dona Lindu, Processo nº328.926/2013 e contemplou todas as
diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos, segundo a Resolução
466, de 2012, do Conselho Nacional de Saúde, assim, garantindo o total anonimato e sigilo dos
participantes.
Ao fim da coleta, foi construído um banco de dados no programa Excel for Windows, pelos
pesquisadores. Os dados foram duplamente digitados e, então, validados. A estatística descritiva foi
analisada pelo software IBM SPSS®, versão 15.0.
RESULTADOS
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1208 Silva, V G. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1202 – 1215, 2015
De 76 drogarias visitadas, 71 estabelecimentos permitiram a participação de seus
funcionários, portanto, de 102 trabalhadores, 90 participaram do estudo; 08 recusas e 04 licenças por
tempo indeterminado.
Do total de trabalhadores, metade (N=45; 50%) era do sexo feminino; 45 (50%)
farmacêuticos; 45 (50%) balconistas ou atendentes de farmácia. A maioria dos farmacêuticos
(84,9=0%) formou-se em instituições privadas; entre o grupo de balconistas e atendentes, a maioria
(67,8%) informou ter concluído o ensino médio, 24,2%, o ensino fundamental e 8,0%, o ensino
superior.
Quanto ao tempo de experiência profissional na função, 50 (55,6%) responderam ter entre três
a cinco anos, 34 (37,8%), entre um e três anos, 03 (3,3%), menos de um ano e 03 (3,3%), acima de
cinco anos.
Com relação à carga horária semanal, 53,3% responderam trabalhar entre 30 a 40 horas
semanais e apenas dois participantes informaram ter dois vínculos de trabalho, com carga horária de
20 horas semanais em cada drogaria. Quanto ao turno de trabalho, 61 (67,8%) responderam que
realizam escala de revezamento de horários, enquanto outros 14 (15,5%) no turno da manhã, 07
(7,7%) à tarde e 08 (8,8%) à noite.
Do total de participantes, 17 (18,9%) citaram terem sido expostos a material biológico nos
últimos dois anos, entre estes, 16 (94,1%) se acidentaram com agulhas contaminadas durante
aplicação de injetáveis e 01 (5,9%), com lanceta para glicosimetria capilar.
A frequência diária de aplicação de medicamentos injetáveis variou de uma a 15 vezes; a
maioria (82,2%) respondeu uma frequência menor que cinco aplicações. Entre os medicamentos
foram citados como os mais comuns anticoncepcionais, insulinas, vitaminas e anti-inflamatórios.
Além de injetáveis, os participantes responderam também que já realizaram outros procedimentos
com risco biológico, como a glicosimetria (23%) capilar e a perfuração de orelhas (2,2%).
No município onde a investigação foi realizada, os trabalhadores da área de saúde são
orientados a buscar imediatamente atendimento médico em uma unidade de pronto atendimento,
aberta em tempo integral; os casos que demandam avaliação e seguimento clínico por infectologista
são atendidos em um serviço público, especializado em Aids e doenças sexualmente transmissíveis.
Do total de participantes expostos (N=17), apenas 06 (100%) responderam ter procurado
atendimento médico imediato após a exposição ocupacional, sendo 03 (50,0%/N=06), na unidade de
referência e 03 (50,0%/N=06), em hospitais privados, por iniciativa própria.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1209 Silva, V G. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1202 – 1215, 2015
Os participantes informaram as seguintes medidas adotadas para a prevenção de exposição a
material biológico: vacinação contra hepatite B, capacitação/treinamento; uso de dispositivos
seguros; uso de EPI; descarte correto de perfurocortantes e higiene das mãos.
A vacinação contra hepatite B foi citada por 78 (86,7%) dos participantes; 09 (10,0%)
responderam não ter sido vacinados e 03 (3,3%) não se lembravam. Quanto ao número de doses,
notou-se que 39 (N=78) participantes vacinados responderam ter recebido o esquema completo, 16
(17,8%), duas doses; 11 (12,2%) uma dose e 24 (30,7%), não se lembravam.
A respeito da capacitação para a aplicação de injetáveis, 80 (88,9%) informaram terem
realizado cursos teóricos e práticos, 04 (4,5%) referiram apenas palestras, 01 (1,1%), apenas curso
teórico e 05 (5,5%) não responderam. A maioria (45,6%) informou ter recebido treinamento sobre
aplicação de injetáveis há menos de cinco anos. Sobre esse aspecto, 22 (24,4%) participantes
responderam que o farmacêutico responsável técnico realizou a capacitação.
Quanto ao uso de dispositivos seguros com controle de engenharia para a aplicação de
medicamentos injetáveis e outros procedimentos com risco biológico em seu local de trabalho, 77
(85,6%) dos sujeitos informaram que algum tipo de dispositivo estava disponível no estabelecimento
para prevenir picadas de agulhas. Os dispositivos citados foram: 66 (73,4%) indicaram seringas com
tampa de proteção da agulha, 06 (6,6%), seringas retráteis (2,2%) e 05, (6,4%) lancetas para
glicosimetria capilar com dispositivo automático para proteção da agulha.
Com relação à capacitação ou treinamento específico para o uso adequado de dispositivos
seguros com controle de engenharia, 62 (68,9%) informaram ter recebido treinamento para uso; 21
(23,3%) não receberam e 07 não informaram. A maioria (66,2%) citou que o fabricante ou o
fornecedor do produto foi o responsável pela capacitação, outros 07 (11,2%), a faculdade e 14
(22,6%), outros locais, como cursos e palestras.
Os participantes que responderam ter dispositivos seguros com controle de engenharia em seu
local de trabalho, também, informaram algumas facilidades e dificuldades quanto ao uso desses
materiais. Quanto às facilidades de uso das seringas com dispositivo de segurança, retráteis ou com
tampas protetoras, 37 (41,1%) responderam proteção contra a picada de agulha e contato com sangue,
31 (34,5%), proteção da agulha, 12 (13,3%), praticidade, 02 (2,2%), proteção contra o sangue e 08
(8,8%), outras facilidades, como descarte protegido, segurança no procedimento e segurança para o
paciente. Por sua vez, em relação às dificuldades, 29 (32,2%) referiram que a tampa protetora dificulta
a técnica de aplicação, 18 (20,%), a falta de habilidade no manuseio da seringa, 16 (17,8%), a quebra
da tampa protetora, 14 (15,6%), a quebra da haste (parte interna) durante a aplicação, com as seringas
com tampa protetora, 12 (13,3%), a retração e proteção da agulha antes de terminar a aplicação do
medicamento nas seringas com mecanismo retrátil e 01 sujeito não informou dificuldades.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1210 Silva, V G. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1202 – 1215, 2015
Outras medidas de prevenção utilizadas também foram citadas: a higiene das mãos por 50
(50%) dos participantes, o uso de coletor rígido para o correto descarte de perfurocortante por 30
(33,3%) e o uso de luvas de procedimentos como EPI por 30 (33,3%).
DISCUSSÃO
Quanto à formação e escolaridade dos trabalhadores, os resultados também foram encontrados
em uma pesquisa realizada com balconistas de drogarias, em uma cidade do interior paulista, onde a
maioria não tinha curso superior ou formação específica na área da saúde (Gir et al., 2003).
Nesta investigação, houve predomínio das exposições percutâneas, assim como em outros
estudos com trabalhadores da área da saúde (Wicker et al., 2014; Menezes et al., 2014; De Perio,
2012).
A capacitação em serviço é importante para que os trabalhadores possam ter informações
quanto às condutas pré e pós-exposição, principalmente, vacinação contra hepatite B e condutas a
serem adotadas após a ocorrência de um acidente (Toffano-Malaguti et al., 2012)
A vacinação contra hepatite B é disponível gratuitamente no Brasil, no entanto observam-se
trabalhadores de saúde ainda não vacinados ou sem esquema completo de vacinação (Toffano-
Malaguti et al., 2012). Estudo realizado com 1.249 trabalhadores de unidades básicas de saúde
apontou que 64,6% foram vacinados com esquema completo de três doses; trabalhadores de nível
superior, como assistentes sociais, psicólogos, fonoaudiólogos, farmacêuticos e nutricionistas,
apresentaram menores taxas de esquema completo de vacinação que outros grupos, como OU
profissionais da enfermagem, dentistas e médicos (Garcia & Facchini, 2008).
Mesmo em exposições envolvendo agulhas desconhecidas, a procura por atendimento médico
é extremamente importante, pois, desse modo, será possível avaliar as circunstâncias do acidente e
iniciar, o mais rápido possível, a profilaxia com antirretrovirais quando recomendados (Cardo et al.,
1997).
O uso de dispositivos seguros com controle de engenharia foi apontado como uma medida de
prevenção de acidentes com material biológico e, segundo os participantes, tais materiais estão
disponíveis em seu local de trabalho. A análise das respostas dos sujeitos permitiu identificar três
tipos de dispositivos seguros em uso nas drogarias: seringa com tampa protetora, com mecanismo de
ativação manual para a proteção da agulha; seringa com mecanismo retrátil (automático) de proteção
da agulha e lancetas com mecanismo automático de proteção da agulha.
Os dados desta investigação apontaram dificuldades quanto ao manuseio da seringa com
tampa protetora, como tampa que dificulta a técnica de aplicação e quebra da tampa protetora. Nesse
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1211 Silva, V G. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1202 – 1215, 2015
aspecto, observa-se a necessidade de conhecer as recomendações de uso do fabricante quanto ao
manuseio do produto, de modo a posicionar corretamente a tampa durante a aplicação e realizar a
ativação manual da mesma após o uso.
Quebra da haste da seringa com tampa protetora foi apontada por 14 (15,6%) participantes;
ativação precoce do mecanismo automático de proteção da agulha da seringa retrátil, também, foi
apontada. Embora este estudo não tenha tido o objetivo de identificar os problemas decorrentes de
uso de dispositivos seguros, essa informação é relevante, pois confirma a importância da capacitação
para o uso de dispositivos seguros, que envolve aspectos técnicos específicos de cada tipo de produto,
de modo a prevenir erros no procedimento e medicação, desperdício de material, dor e desconforto
ao paciente e, principalmente, na ocorrência com material biológico.
Os dispositivos seguros com controle de engenharia podem ser classificados de acordo com
seu mecanismo de funcionamento, ou seja, a forma pela qual o sistema de proteção da agulha é
ativado. Assim, os dispositivos podem ser divididos em agulhas de segurança com técnica de ativação
ativa, em que o profissional aciona o dispositivo de segurança que protege a ponta da agulha após a
sua utilização, e dispositivos com técnica de ativação passiva, cujo dispositivo de segurança é
acionado imediatamente após o uso e não requer a ativação do dispositivo pelo profissional de saúde
(Wright et al., 2014; Shelton & Rosenthal, 2004).
A legislação brasileira (NR 32) não determina o tipo ou modelo de dispositivo seguro com
controle de engenharia que deverá ser utilizado pelos serviços de saúde, desse modo, os profissionais
podem escolher aqueles que melhor se ajustem aos procedimentos a serem realizados (Brasil 2005;
Brasil 2008).
Inicialmente, esses materiais foram desenvolvidos apenas com mecanismos de proteção da
agulha, recentemente, outros dispositivos foram melhorados com o intuito de proteger não só a ponta
da agulha, mas, também, o contato com o sangue, assim, evitando respingos de sangue após a retirada
de uma agulha da veia (Haiduven, 2009). Independente do modelo adotado, capacitação e
treinamentos específicos são fundamentais, pois o uso indevido poderá acarretar desperdícios,
múltiplas punções, desconforto para o paciente e frustração para os trabalhadores (Jagger & Perry,
2013).
Nos EUA, após a legislação de segurança ocupacional, um estudo apontou que, mesmo após
a introdução dos dispositivos seguros com controle de engenharia, os acidentes ainda ocorreram,
porém com menor incidência de acidentes ocorridos após o procedimento, no momento em que a
agulha está contaminada e com grande volume de sangue (Perry & Jagger, 2012).
A decisão para a escolha do produto deve ser de ampla discussão e depende de vários fatores,
como custo, tipo de procedimento a ser realizado e técnica adequada. Torna-se fundamental que a
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1212 Silva, V G. L. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1202 – 1215, 2015
escolha tenha a participação dos trabalhadores que atuam diretamente na assistência, de modo que o
tipo de dispositivo selecionado seja compatível com as necessidades do serviço (Leiss, 2010;
Rapparini & Reinhardt, 2010).
Os participantes citaram ainda o uso de luvas e descarte seguro como outras medidas de
prevenção. A adesão às PP, que inclui o uso de luvas e outros EPI, assim como o descarte correto dos
materiais perfurocortantes são fundamentais para evitar exposição a material biológico, bem como os
trabalhadores devem receber capacitação contínua para o uso (Brasil 2005; Brasil 2010; Toffano-
Malaguti et al., 2012)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Trabalhadores que atuam em drogarias e que realizam procedimentos com risco biológico
devem ser capacitados, periodicamente, quanto às medidas de prevenção e pós-exposição
ocupacional, principalmente ao considerar que balconistas, em sua grande maioria, não realizaram
cursos de formação em nível técnico ou superior específico na área da saúde. Identificou-se que os
trabalhadores tiveram contato, em sua prática profissional, com algum tipo de dispositivo seguro com
controle de engenharia e receberam capacitação para o uso, todavia relatos de dificuldades quanto ao
uso foram identificados, o que reforça a necessidade de uma capacitação técnica específica.
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ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
Comparação de métodos de preparo de amostras de sangue para determinação
de chumbo e cádmio por ICP-MS
Comparison of blood samples preparation methods for lead and cadmium
determination using ICP-MS
Luciana Juncioni de Arauz1*, Lidiane Raquel Verola Mataveli1, Maria de Fátima Henriques
Carvalho1, Márcia Liane Buzzo1 & Paulo Tiglea1
1Núcleo de Contaminantes Inorgânicos, Instituto Adolfo Lutz, São Paulo/SP, Brasil. 1*Endereço para correspondência: Núcleo de Contaminantes Inorgânicos, Centro de Contaminantes, Instituto Adolfo
Lutz, Av. Dr. Arnaldo, 355, Cerqueira César, São Paulo, SP, Brasil, CEP 01246-902. Tel.: (11)3068-2924. E-mail:
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1217 Arauz, L. J. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1216 – 1227, 2015
RESUMO
O sangue tem sido amplamente utilizado como matriz para monitorar a exposição da população a
metais tóxicos. O objetivo deste estudo foi comparar dois procedimentos de preparação de amostras
para determinação de chumbo e cádmio em sangue fortificado: (i) diluição em solução de Triton X-
100/HNO3 (oxidação utilizando HNO3 e H2O2 ) e (ii) digestão por radiação micro-ondas. As
amostras preparadas foram analisadas por Espectrometria de Massas com Plasma Indutivamente
Acoplado (ICP-MS). Com relação aos valores alvo, as recuperações totais de amostras fortificadas
de Cd foram encontradas nas faixas de 93,6-111,7% e 96,3-113,5%, e Pb de 96,3-113,5% e 93,5-
113,2%, para os procedimentos de preparo de amostras (i) e (ii), respectivamente. A exatidão foi
verificada por meio da análise de amostras do Programa Lead and Multi-Element Proficiency
(LAMP-CDC/EUA), que indicou uma boa concordância entre a concentração média relatada pelo
Programa e as concentrações determinadas para Cd e Pb, em ambos os procedimentos de
preparação de amostras. Assim, este trabalho apresenta dados para auxiliar profissionais de saúde
sobre a escolha de procedimentos de preparação da amostra com o objetivo de investigar metais no
sangue.
Palavras-chaves: Chumbo, Cádmio, ICP-MS, Sangue, Preparação de amostras.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1218 Arauz, L. J. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1216 – 1227, 2015
ABSTRACT
Blood has been widely used as matrix to monitor population exposure to toxic metals. The aim of
this study was to compare two sample preparation procedures for the determination of lead and
cadmium in fortified blood: (i) dilution in a solution containing Triton X-100/HNO3; (ii)
microwave oven digestion (oxidation using HNO3 and H2O2). Prepared samples were analyzed
using Inductively Coupled Plasma-Mass Spectrometry (ICP-MS). Regarding the target values,
overall recoveries of fortified samples of Cd were found to be in the range of 93.6 – 111.7% and
96.3 – 113.5%, and Pb of 96.3 – 113.5% and 93.5 – 113.2%, for sample preparation procedures (i)
and (ii), respectively. Accuracy was checked by analyzing samples from the Lead and Multi-
Element Proficiency Program (LAMP-CDC/USA), which indicated good agreement between the
mean concentration reported by the Program and the determined concentrations of Cd and Pb in this
work, considering both sample preparation procedures. This study presents data to guide health
professionals regarding the choice of sample preparation procedures, aiming to investigate metal
concentrations in blood.
Keywords: Lead, Cadmium, ICP-MS, Blood, Sample preparation.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1219 Arauz, L. J. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1216 – 1227, 2015
INTRODUÇÃO
Entre os diferentes contaminantes encontrados no meio ambiente, os metais tóxicos como
chumbo e cádmio geram grandes preocupações devido a seus efeitos na saúde da população. Os
efeitos toxicológicos relacionados à exposição a estes metais incluem doenças pulmonares, renais,
cardíacas e do sistema ósseo, entre outros (Nunes, 2009). O aumento à exposição ocupacional e
ambiental a estes elementos tóxicos mostra a necessidade de monitoramento e diagnóstico clínico
da exposição humana.
Sangue, plasma, soro e urina são matrizes utilizadas para o monitoramento biológico da
exposição a estes metais, pois são importantes em termos bioquímicos e possuem fácil
acessibilidade (Soldá, 2011), sendo que o sangue constitui-se como matriz indicada para medir as
exposições recentes a cádmio e chumbo. Os níveis de chumbo sanguíneo apresentam
representatividade na legislação brasileira junto ao Ministério do Trabalho e Emprego pela Portaria
GM nº 3214, de 08 de junho de 1978 (Norma Regulamentadora 7), revista pela Portaria SSST nº 24,
de 29 de dezembro de 1994 (Brasil, 1978). Esta Legislação estabelece como parâmetro para
controle biológico da exposição ocupacional ao chumbo o valor de referência de 40 µg/100mL e
índice biológico máximo permitido de 60 µg/100mL para chumbo em trabalhadores expostos,
porém não prevê limites para o elemento cádmio no mesmo tipo de matriz. O organismo
internacional American Conference of Governamental Industrial Hygienists (ACGIH), que
estabelece guias orientativos para o controle de riscos à saúde nos locais de trabalho, adota o valor
de 5 µg/L para cádmio em sangue como índice biológico de exposição (ACGIH, 2014). Para
avaliação da exposição ambiental ao chumbo, o Centro de Controle de Doenças (CDC) dos EUA,
recomenda o valor de referência de chumbo em sangue para crianças menores que 5 µg/100mL,
como limite de exposição ao contaminante e prevenção de doenças neurológicas (CDC, 2012).
A evolução das técnicas espectrométricas permitiu a determinação de elementos químicos
em concentrações cada vez menores (em níveis de µg/L, e ng/L), em fluidos biológicos como, por
exemplo, chumbo e cádmio em sangue por emprego da técnica de Espectrometria de Massas com
Plasma Acoplado Indutivamente (ICP-MS).
Devido à alta complexidade de matrizes como o sangue, torna-se imprescindível a escolha
de um método de preparo de amostra compatível com a técnica de determinação escolhida. Dentre
os diversos métodos propostos na literatura para determinação destes elementos em sangue (Nunes,
2009; Kim et al., 2013; Forte et al., 2011; Nascimento et al., 2014; Heitland & Koster, 2006; Gajek
et al., 2013), os tratamentos de diluição com Triton X-100 em ácido nítrico, e digestão por micro-
ondas, são bastante empregados devido à simplicidade e rapidez na execução do preparo de
amostras.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1220 Arauz, L. J. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1216 – 1227, 2015
Os processos de digestão por micro-ondas usando recipientes fechados em meio ácido
contendo peróxidos têm sido empregados para decompor as matrizes orgânicas de amostras
biológicas em temperaturas e/ou pressões elevadas. Já foi demonstrado que a digestão de amostras
por radiação micro-ondas apresenta rápido aquecimento e menor propensão a contaminação e
perdas de analitos voláteis, como o mercúrio (Barbosa et al., 2015). Frequentemente esta técnica é
utilizada para amostras clínicas sólidas como cérebro e fígado (Batista, 2009).
Já a diluição das amostras de sangue é necessária para reduzir os efeitos de interferência de
matriz bem como evita o entupimento do sistema de introdução de amostras de espectrômetros, tais
como o ICP-MS. Para isto, um diluente amplamente utilizado é o surfactante não iônico Triton X-
100, cuja função é o de solubilizar melhor o sangue no meio e evitar o depósito do mesmo no
sistema de introdução de amostras do ICP-MS. Esta solução é preparada em meio ácido, como o
ácido nítrico, que têm como função a estabilização dos metais no meio. A concentração do ácido
nítrico na solução é de extrema importância, pois concentrações superiores a 0,5% (v/v) podem
ocasionar precipitação das proteínas presentes no sangue, prejudicando a homogeneidade da
amostra (Batista, 2009).
Assim, diante do exposto, o objetivo deste trabalho foi comparar dois procedimentos de
preparo de amostra de sangue: (i) diluição em solução de Triton X-100/HNO3 e (ii) digestão por
micro-ondas, para posterior quantificação de chumbo e cádmio por ICP-MS. Este estudo tem como
meta colaborar na melhoria da rotina de laboratórios que atuam na área de toxicologia,
apresentando o desempenho de dois métodos distintos de preparo de amostras de sangue para a
determinação de chumbo e cádmio, visando o atendimento da Saúde Pública no monitoramento
ambiental e ocupacional a que a população está exposta.
MATERIAL E MÉTODOS
As vidrarias e frascos de Teflon® utilizados nas análises foram submetidos ao processo de
descontaminação química em dois banhos consecutivos de solução de ácido nítrico a 20 % (P.A.)
(Merck), e enxaguados em água desionizada com resistividade de 18,2 MΩ.cm (Merck-Millipore).
Os reagentes utilizados foram peróxido de hidrogênio a 30% (H2O2), ácido nítrico (HNO3)
Suprapur® (Merck), e Triton X-100 (Sigma Aldrich).
As soluções padrões intermediárias de chumbo (Pb) e cádmio (Cd) foram preparadas em
meio aquoso em HNO3 a 1% (v/v), a partir de diluições de soluções padrão contendo 1000 mg/L
(Inorganic Venture) de cada elemento. As curvas analíticas foram preparadas com concentrações de
5 a 40 µg/L para Pb e 0,3125 a 2,5 µg/L para Cd, por meio de ajuste de matriz com sangue bovino.
O sangue bovino é considerado similar ao sangue humano, devido à complexidade deste material
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1221 Arauz, L. J. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1216 – 1227, 2015
biológico e as várias mudanças físicas e químicas que podem ocorrer devido a fatores como idade,
sexo, presença de doenças e alimentação (Cox, 1989). Além disso, o sangue bovino pode ser
utilizado por produtores de materiais de referência de reconhecimento internacional (Cox et al.,
1989). Todas as soluções foram preparadas com água desionizada com resistividade de 18,2 MΩ/cm
(Merck-Millipore).
As análises das amostras foram realizadas utilizando ICP-MS (modelo ELAN DRC-II,
marca Perkin-Elmer) equipado com nebulizador Meinhard® e câmara nebulizadora ciclônica,
ambos de vidro. Para a determinação de cádmio utilizou-se o isótopo 111Cd e para chumbo utilizou-
se a média dos isótopos 206Pb, 207Pb, 208Pb. Os padrões internos utilizados foram 187Re e 115In para
chumbo e cádmio, respectivamente, na concentração de 5 µg/L.
Um sistema de digestão por micro-ondas (modelo ETHOS ONE, Milestone), equipado com
rotor SK-10 foi usado para o preparo de amostras, nas seguintes condições: pressão máxima de 45
bar, temperatura máxima de operação de 180 ºC. Para o procedimento proposto foram pipetados 1
mL da amostra de sangue, 2 mL de HNO3 Suprapur®, 2 mL de H2O2 a 30% (v/v) e 4,5 mL de água
desionizada. Após a digestão, as soluções foram transferidas para frascos de polipropileno graduado
e o volume foi completado com água desionizada para 25 mL.
Para o procedimento de preparo de sangue por diluição, as amostras foram diluídas na razão
1:20 em solução de Triton X-100 a 0,05% em HNO3 a 0,2%.
Em ambos os métodos de preparo de amostras, as análises foram realizadas em três
replicatas. Para cada tomada de ensaio, foram preparados dois brancos das amostras dos reagentes.
Para comparação dos resultados entre os métodos de preparo de amostras propostos, foram
analisadas amostras de sangue bovino fortificadas com chumbo e cádmio, em três níveis de
concentrações distintos: A, B e C; amostras de sangue bovino provenientes do Programa de Ensaio
de Proficiência de Chumbo em Sangue (PEP-Pbs), do Instituto Adolfo Lutz (denominadas PEP 1 e
PEP 2), e amostras de sangue provenientes da participação do laboratório no Programa
Interlaboratorial Lead and Multielement Proficiency (LAMP), coordenado pelo Center for Disease
Control (CDC/EUA) (designadas como LAMP 1 e LAMP 2). Para os casos dos Programas
Interlaboratoriais, os valores considerados para chumbo e cádmio em cada rodada foram obtidos por
valores de consenso entre os laboratórios participantes.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As Tabelas 1 e 2 apresentam os valores alvos referentes às fortificações realizadas em
amostras de sangue bovino com cádmio e chumbo (A, B e C), valores designados para o Programa
de Ensaio de Proficiência de Chumbo em Sangue (PEP-Pbs) e Lead and Multielement Proficiency/
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1222 Arauz, L. J. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1216 – 1227, 2015
Centers for Disease Control and Prevention (LAMP/CDC), respectivamente, bem como os
resultados de concentração dos metais em sangue, obtidos empregando-se a técnica de ICP-MS e
respectivas recuperações, para cada tipo de procedimento de preparo de amostras.
Tabela 1 - Valores alvos, concentrações obtidas e respectivas recuperações para a determinação
de cádmio em amostras de sangue por ICP-MS, para os métodos propostos de preparo de
amostras: digestão por micro-ondas e diluição com Triton X-100/ HNO3
Amostra
Valor alvo*
µg/L
Concentração
obtida
µg/L
Recuperação
(%)
Digestão Diluição Digestão Diluição Digestão Diluição
Fortificação
A
0,4 0,5 0,4 0,5 106,0 112,7
Fortificação
B
1,0 1,3 0,9 1,2 93,6 96,3
Fortificação
C
2,0 2,5 2,1 2,6 103,3 106,2
LAMP 1 4,0 4,0 4,3 4,1 108,9 103,3
LAMP 2 2,1 2,1 2,3 2,4 111,7 113,5
* Valor alvo – os valores alvos referem-se às fortificações das amostras de sangue bovino com cádmio (A, B e C) e valores de
consenso designados para o Programa Interlaboratorial Lead and Multielement Proficiency (LAMP), do CDC (LAMP 1 e LAMP 2).
A análise dos resultados indica que os métodos de preparo de amostras de sangue por
digestão por micro-ondas e por diluição com Triton X-100/ HNO3, utilizados para determinação de
cádmio e chumbo por ICP-MS nos diferentes tipos de amostras analisadas (fortificações com
padrão de cádmio e chumbo, PEP-Pbs e LAMP) fornecem resultados compatíveis. Os valores de
recuperação obtidos para cádmio encontram-se na faixa entre 93,6 a 111,7% e de 96,3 a 113,5 %,
para os métodos de preparo de amostras por digestão por micro-ondas e por diluição com Triton X-
100/ HNO3, respectivamente. Com relação à determinação de chumbo em sangue por ICP-MS nos
diferentes tipos de amostras analisadas, a comparação entre os resultados mostra que a recuperação
obtida apresenta valores de 96,3 a 113,5% e de 93,5 a 113,2%, para os métodos de digestão por
micro-ondas e por diluição com Triton X-100/HNO3, respectivamente. Os valores de recuperação
obtidos estão de acordo com aqueles preconizados pelo guia AOAC (2012), que recomenda faixa de
recuperação aceitável de 60 a 115%, indicando que ambos os métodos de preparo de amostras de
sangue são adequados para determinação de chumbo e cádmio por ICP-MS, presentes em baixos
níveis de concentração em sangue
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1223 Arauz, L. J. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1216 – 1227, 2015
Tabela 2 - Valores alvos, concentrações obtidas e respectivas recuperações para a determinação de
chumbo em amostras de sangue por ICP-MS, para os métodos propostos de preparo de amostras:
digestão por micro-ondas e diluição com Triton X-100/ HNO3
Amostra
Valor alvo*
µg/100mL
Concentração
obtida
µg/100mL
Recuperação (%)
Digestão Diluição Digestão Diluição Digestão Diluição
Fortificação
A
0,6 0,8 0,6 0,9 98,2 113,2
Fortificação
B
1,5 1,9 1,3 1,8 87,8 96,5
Fortificação
C
3,0 3,8 2,9 3,9 97,8 102,9
PEP-IAL 1 40,0 40,0 37,8 41,9 94,4 104,8
PEP-IAL 2 74,9 74,9 72,0 77,6 96,2 103,6
LAMP 1 17,5 17,5 15,8 16,4 90,4 93,5
LAMP 2 10,3 10,3 9,1 9,8 88,2 94,8
* Valor alvo – os valores alvos são referem-se às fortificações das amostras de sangue bovino com chumbo (A, B e C) e valores de
consenso designados para o Programa de Ensaio de Proficiência de Chumbo em Sangue (PEP-Pbs) (PEP-IAL 1 PEP-IAL 2) e para o
Programa Interlaboratorial Lead and Multielement Proficiency (LAMP), do CDC (LAMP 1 e LAMP 2).
O teste t de Student foi usado para verificar a significância estatística dos valores médios
entre os dois procedimentos de preparo de amostras. Para 95% de confiança, a diferença entre as
médias dos métodos propostos não apresentou significância estatística, tanto para chumbo (p =
0,23), quanto para cádmio (p = 0,67), indicando, mais uma vez, que ambos os métodos de preparo
de amostras propostos apresentam resultados compatíveis para determinação de chumbo e cádmio
por ICP-MS presentes em baixos níveis de concentração em sangue.
Resultados semelhantes foram encontrados por Kira et al. (2014), que apresentou faixa de
recuperação entre 96,7 a 109,1%, no desenvolvimento de método para determinação de
contaminantes inorgânicos em sangue por ICP-MS empregando preparo de amostra por diluição de
sangue com solução de Triton X-100 e HNO3.
Já Haghlock-Adler & Strathmann (2015) desenvolveram um procedimento de diluição de
amostras de sangue total para análise de Sb, Bi, Mn e Zn, e compararam o mesmo com um
procedimento de digestão utilizado HNO3 e HCl em bloco digestor. Os autores concluíram que o
procedimento desenvolvido por eles se mostrou eficiente e pode substituir o extenso procedimento
de digestão (4 horas) empregado por eles. Ainda, quando as recuperações dos dois métodos
utilizados são comparadas, o procedimento de diluição obteve recuperações que variaram entre 96 e
104%, enquanto que o procedimento de digestão obteve recuperações entre 48 e 74%. Os valores de
recuperação do método de digestão foram atribuídos a efeitos de matriz e supressão iônica, que
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1224 Arauz, L. J. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1216 – 1227, 2015
influenciam a eficiência do método. É importante ressaltar que o método de digestão em micro-
ondas, utilizado neste trabalho, permite que os valores de concentração obtidos sejam mais exatos e
mais precisos do que os obtidos usando um bloco digestor (Amorim, 2006), o que justifica as boas
recuperações encontradas neste estudo.
Lu et al. (2015) analisaram 25 elementos em sangue total, dentre eles Pb e Cd, utilizando
para o preparo da amostra diluição alcalina e digestão em bloco digestor. Baseados nos valores de
recuperação obtidos para os materiais de referência analisados, os autores concluíram que ambos os
procedimentos de preparo de amostra geraram resultados que estavam em concordância com os
valores de recuperação recomendados pelos produtores dos materiais, mesma conclusão obtida no
presente estudo.
Outros autores (Forte et al., 2013) estudaram os níveis de Cr, Co, Fe, Mn, Hg, Ni, Pb, Se e
Zn em sangue de pacientes com diabete por ICP-MS de duplo foco (SF-ICP-MS), após a digestão
das amostras em micro-ondas. Os valores das recuperações de todos os analitos obtidos foram de
92-101% dos valores certificados, que estão em concordância com aqueles valores obtidos no
presente estudo.
Ambas as técnicas de preparo apresentam vantagens e desvantagens. A digestão de amostras
em forno micro-ondas é limitada a massas de amostras reduzidas, considerando a elevada pressão
gerada no interior dos vasos, devido aos gases gerados durante a decomposição (Amais, 2014). Já a
diluição do sangue no Triton X-100 em meio ácido, pode apresentar limitações no que se refere ao
efeito de matriz, como por exemplo, viscosidade da amostra e a supressão ou aumento do sinal do
analito, entre outros (Batista, 2009). De acordo com os resultados obtidos neste estudo, ambas as
técnicas de preparo podem ser aplicadas nas análises de sangue para a quantificação de Pb e Cd.
Porém, para a escolha do método a ser empregado nos laboratórios de toxicologia, deve ser levado
em consideração à finalidade da amostra para a qual se destina: estudo, pesquisa, diagnóstico
clínico, etc. Deste ponto de vista, o método de digestão inviabiliza análises de rotina com grande
número de amostras, devido à demanda de tempo exigida para este método. Já para a área clínica, o
método escolhido para análise deve ser simples, robusto e rápido, oferecendo a possibilidade de um
rápido diagnóstico clínico, que poderia ser obtido pelo preparo de amostra por diluição, devido à
rapidez da técnica. Por outro lado, para fins de pesquisa científica e acadêmica, conforme dados da
literatura citados acima, ambas as técnicas de preparo são amplamente utilizadas para vários
estudos.
Este trabalho apresentou dados para auxiliar profissionais de saúde na escolha de
procedimentos de preparação de amostra com o objetivo de investigar e monitorar metais no sangue
da população.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1225 Arauz, L. J. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1216 – 1227, 2015
CONCLUSÃO
Os métodos de preparo de sangue para determinação de chumbo e cádmio por emprego de
técnica de ICP-MS em sangue: digestão por micro-ondas e diluição com solução de Triton X-
100/HNO3, apresentaram médias estatisticamente iguais e mostraram-se adequados, com
recuperações compatíveis para os níveis de concentrações avaliados. Estes resultados podem
contribuir na melhoria da rotina de laboratórios que atuam na área de toxicologia, para o
atendimento da Saúde Pública, no monitoramento ambiental e ocupacional de metais prejudiciais à
saúde aos quais, a população está exposta.
AGRADECIMENTOS
À Rede de Serviços Tecnológicos para Sangue e Hemoderivados – REDSANG/SIBRATEC/FINEP,
pelo suporte proporcionado para o desenvolvimento deste trabalho.
À Luci Elaine Machado pelos auxílios prestados no laboratório.
REFERÊNCIAS
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ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
Desenvolvimento e validação de método analítico para determinação de
anlodipino em comprimidos e avaliação da equivalência farmacêutica
Development and validation of an analytical method for determination of
amlodipine tablets and evaluation of pharmaceutical equivalence
Aline Marques Rosa1, Teófilo Fernando Mazon Cardoso1, Rúbia Adrieli Sversut1, Joslaine
de Oliveira Nunes1, Marcos Serrou do Amaral2 & Nájla Mohamad Kassab1
1Curso de Farmácia do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo
Grande, MS, Brasil. 2Instituto de Física da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande, MS, Brasil.
Autor correspondente: Nájla Mohamad Kassab, Avenida Costa e Silva, Cidade Universitária, Caixa Postal 549, CEP:
79070-900, telefone: (67) 3345-7367, Campo Grande – MS, Brasil, e-mail: [email protected]
ARTIGO ORIGINAL /RESEARCH
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RESUMO
Esse trabalho teve como objetivo validar uma metodologia analítica para determinação quantitativa
de anlodipino em comprimidos e verificar a equivalência farmacêutica entre os medicamentos
referência, genéricos e similares contendo anlodipino. O método foi desenvolvido empregando-se
espectrofotometria ultravioleta, comprimento de onda de 366 nm e etanol:HCl 0,01M (50:50 v/v)
como solvente. Para a determinação da equivalência farmacêutica executou-se os ensaios de peso
médio, dureza, friabilidade, desintegração, doseamento e dissolução. Foi verificada a similaridade
dos perfis de dissolução e a bula dos medicamentos genéricos (G1 e G2), similares (S1 e S2) e
referência (R). O método desenvolvido mostrou-se linear (r2 > 0,99), preciso (DPR < 1,0%), seletivo
e robusto. A recuperação média foi 99,86% e os limites de quantificação e detecção foram 1,0 e 0,2
µg/mL, respectivamente. Os resultados dos ensaios de controle de qualidade demonstraram que as
amostras G2 e S2 podem ser consideradas equivalentes farmacêuticos, enquanto que as amostras G1
e S1 reprovaram no ensaio de dureza. As amostras G1, S1 e S2 apresentaram perfis de dissolução
estatisticamente diferentes. Diante desses resultados, verificou-se a necessidade de um sistema de
fiscalização da qualidade e equivalência dos medicamentos mais atuante e rigoroso para prevenir
possíveis danos à saúde da população.
Palavras-chave: Controle de qualidade, Anlodipino, Método analítico, Perfil de dissolução,
Espectrofotometria.
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1230 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1228 – 1247, 2015
ABSTRACT
This study aimed to validate an analytical method for quantitative determination of amlodipine in
tablets and assess the pharmaceutical equivalence between pharmaceutical drug reference, generic
and similar drugs containing amlodipine. An ultraviolet spectrophotometric method was developed
with a detection wavelength of 366 nm; ethanol:HCl 0.01M (50:50 v/v) was used as solvent. Quality
control tests of uniformity of weight, hardness, friability, disintegration, test and dissolution profile
and analysis of leaflet were performed for commercially available reference (R), generic (G1 and
G2), and similar drugs (S1 and S2) containing amlodipine, to determine their equivalence. The
developed method was linear (r2 > 0.99), precise (RSD < 1.0%), selective and robust. The average
recovery was 99.86% and the limits of detection and quantification were 0.2 and 1.0 µg/mL,
respectively. The results of the quality control tests showed that the samples G2 and S2 can be
considered pharmaceutically equivalent, while the samples G1 and S1 were rejected in the hardness
test. The samples G1, S1 and S2 showed statistically different dissolution profiles. Given these
results, there is a need for a system that monitor the quality and equivalence of drugs more active and
rigorous to prevent possible harm to the health of the population.
Keywords: Quality control, Amlodipine, Analytical Method, Dissolution Profile,
Spectrophotometry.
ARTIGO ORIGINAL /RESEARCH
1231 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1228 – 1247, 2015
INTRODUÇÃO
A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é uma condição clínica multifatorial caracterizada por
níveis elevados e sustentados de pressão arterial, a qual está frequentemente associada a alterações
funcionais e/ou estruturais de órgãos como coração, encéfalo, rins e vasos sanguíneos e a alterações
metabólicas, com consequente aumento do risco de doenças cardiovasculares (Sociedade Brasileira
de Cardiologia, 2010; Brasil, 2006).
A alta prevalência e as baixas taxas de controle da HAS trazem grande impacto econômico e
social pelo ônus imposto ao sistema de saúde e pelo reflexo na qualidade e expectativa de vida dos
indivíduos, tornando-a um problema de saúde pública (Brondani et al., 2012; Sociedade Brasileira de
Cardiologia, 2010; Brasil, 2006).
Apesar da gravidade da doença e da exigência de um rigoroso controle de qualidade dos
medicamentos usados para o tratamento da HAS, estudos recentes encontraram medicamentos anti-
hipertensivos com desvio de qualidade (Abido & Knorst, 2014; Rigobello et al., 2013; Bianchin et
al., 2012). Medicamentos produzidos inadequadamente, em desacordo com as normas e os
procedimentos adotados pelos órgãos controladores, podem gerar danos incalculáveis na saúde dos
usuários. O grande benefício da adequada produção de medicamentos é a garantia de que a população
terá acesso a produtos seguros e eficazes (Andrade, Carvalho & Freitas, 2013).
O besilato de anlodipino, classificado como dihidropiridina de terceira geração, é um agente
amplamente utilizado no tratamento da HAS e da angina. Atua principalmente nos canais de cálcio
das arteríolas periféricas. O bloqueio do influxo de cálcio nas células musculares lisas das arteríolas
promove vasodilatação e, consequentemente, redução da resistência vascular periférica (Malesuik et
al., 2006; Grahame-Smith & Aronson, 2002).
Embora o anlodipino seja um fármaco extensamente empregado na terapêutica anti-
hipertensiva em combinação com outros anti-hipertensivos (Sociedade Brasileira de Cardiologia,
2010), ainda não há monografia inscrita nas Farmacopeias Brasileira (2010) e Britânica (2013) para
formas farmacêuticas. Métodos de identificação e doseamento para anlodipino em comprimidos é
descrito apenas nas Farmacopeias Indiana (2007) e Americana (2011), sendo a cromatografia líquida
de alta eficiência (CLAE) a metodologia de escolha para a determinação quantitativa de anlodipino
na forma farmacêutica de comprimidos.
Atualmente, existe um mercado competitivo de medicamentos, com uma diversidade de
marcas que beneficia a sociedade devido à possibilidade de escolha e à redução de custos do produto.
No entanto, além de metodologias analíticas confiáveis para atestar a qualidade desses medicamentos,
ARTIGO ORIGINAL /RESEARCH
1232 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1228 – 1247, 2015
é necessário a realização de testes para verificar a equivalência farmacêutica entre medicamentos de
referência, genéricos e similares (Bortoluzi & Laporta, 2008).
A intercambialidade entre os medicamentos baseia-se no conceito de equivalência terapêutica
entre os mesmos. Esta é assegurada pela comprovação da equivalência farmacêutica, bioequivalência,
boas práticas de fabricação e controle de qualidade (Pugens, Donaduzzi & Melo, 2008).
A equivalência farmacêutica entre dois medicamentos relaciona-se à comprovação de que
ambos contêm o mesmo fármaco (mesma base, sal ou éster da molécula terapeuticamente ativa),
dosagem e forma farmacêutica e devem cumprir com os mesmos requisitos da monografia individual,
o que pode ser avaliado por meio de testes in vitro (Brum et al., 2012; Bortoluzi & Laporta, 2008;
Linsbinski, Musis & Machado 2008; Pugens, Donaduzzi & Melo, 2008; Storpirtis et al., 2004).
A capacidade de um fármaco estar disponível para ser absorvido é avaliada através de estudos
de dissolução, que permite inferir sobre o perfil de liberação de um fármaco de sua forma
farmacêutica de origem, através da análise em tempos pré-determinados. A dissolução pode ser
afetada significativamente pelas características do próprio fármaco, bem como pela presença de
excipientes que favorecem ou dificultam a dissolução, além das técnicas de fabricação empregadas
(Brum et al., 2012).
Apesar da importância do anlodipino no tratamento da hipertensão arterial sistêmica, poucos
trabalhos foram encontrados na literatura científica sobre desenvolvimento de metodologias analíticas
e avaliação da qualidade desse fármaco. Além disso, as metodologias disponíveis apresentam
desvantagens como alto custo dos equipamentos, utilização de solventes orgânicos de difícil descarte,
emprego de reações químicas e longo tempo de análise (Basavaiah, Chandrashekar & Nagegowda,
2005; Malesuik, 2005; Baranda, Jiménez & Alonso, 2004).
Dessa forma, o objetivo desse trabalho foi desenvolver e validar uma metodologia analítica
empregando a espectrofotometria na região do ultravioleta (UV) para determinação quantitativa de
anlodipino em formas farmacêuticas sólidas de uso oral, verificar a equivalência farmacêutica e
comparar os perfis de dissolução entre amostras de medicamento referência, genéricos e similares
contendo anlodipino.
MATERIAL E MÉTODOS
Substância química de referência e amostras comerciais
A matéria-prima besilato de anlodipino com teor 100,9%, fator de correção de 1,39, lote
ALK1MLJ53A procedente da indústria farmacêutica Gemini e fabricada pela indústria Cadila
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1233 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1228 – 1247, 2015
Healthcare, foi adquirida de farmácia magistral do comércio local, sendo caracterizada de acordo com
os testes descritos na Farmacopeia Indiana (2007) e foi utilizada como substância química de
referência (SQR) sem purificação ulterior. As amostras comerciais, designadas como referência (R),
genérico 1 (G1), genérico 2 (G2), similar 1 (S1) e similar 2 (S2) foram adquiridas de farmácias e
drogarias também do comércio local.
Equipamentos, reagentes e solventes
Para a realização desse estudo foram empregados como solventes: água destilada, ácido
clorídrico (Vetec®), etanol (Cromoline®), acetonitrila (Vetec®), metanol (Vetec®) e hidróxido de
sódio (Vetec®). Os equipamentos utilizados foram: ultrassom (Unique®), durômetro (Nova Ética®),
friabilômetro (Marconi®), desintegrador (Nova Ética®), dissolutor (Logen Scientific®), balança
analítica (Shimadzu® AY220), espectrofotômetro UV/VIS (Thermo scientific®) e cubetas de quartzo
de 10 mm de caminho óptico.
Validação da metodologia analítica
Para o desenvolvimento do método foi empregado espectrofotometria na região do
ultravioleta, utilizando comprimento de onda de 366 nm e como solvente a mistura de ácido clorídrico
0,01 M e etanol na proporção 50:50 v/v.
O método proposto foi validado conforme a International Conference on Harmonization (ICH,
2005), a Association of Official Analytical Chemists (AOAC, 2006) e a Resolução 899/2003 (Brasil,
2003) avaliando parâmetros como: seletividade, linearidade, precisão, exatidão, robustez, limites de
quantificação (LQ) e detecção (LD).
Seletividade
Preparou-se uma solução de placebo, utilizando os excipientes presentes na amostra comercial
referência, na concentração usualmente empregada em comprimidos (celulose microcristalina,
fosfato de cálcio dibásico, amidoglicolato de sódio, estearato de magnésio) a fim de determinar
possíveis interferências dos excipientes contidos nesta formulação, em relação à metodologia
analítica desenvolvida (Rowe, Sheskey e Quinn, 2009).
Linearidade
A linearidade foi determinada através da curva de calibração preparada da seguinte forma:
diluiu-se 27,8 mg da SQR besilato de anlodipino (equivalente a 20,0 mg de anlodipino) com o
solvente (HCl 0,01 M : etanol, 50:50 v/v) em balão volumétrico de 100 mL e obteve-se a solução
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estoque de 200,0 µg/mL. Diluições seriadas foram realizadas a fim de resultar nas concentrações de
2,0; 6,0; 10,0; 14,0; 18,0; 22,0; 26,0 e 30,0 µg/mL.
Com os valores das absorbâncias resultantes plotados no eixo y em função da concentração
(eixo x) foi calculado o coeficiente de correlação e a equação da reta.
Precisão
Este parâmetro foi avaliado através dos métodos de repetibilidade e precisão intermediária. A
repetibilidade foi determinada pela análise de seis determinações da mesma solução preparada a partir
da amostra comercial, de concentração 10,0 µg/mL. A precisão intermediária foi determinada em
sextuplicata, durante três dias, na concentração anteriormente mencionada. A partir dos resultados
obtidos foram calculados o desvio padrão (DP) e o desvio padrão relativo (DPR).
Exatidão
A exatidão expressa, em porcentagem, foi avaliada a partir da adição e recuperação de
quantidades conhecidas de anlodipino (SQR), na amostra. Foram preparadas soluções contendo
anlodipino SQR e proveniente da amostra comercial nas concentrações finais de 10,0; 14,0; 16,0 e
18,0 µg/mL, sendo a concentração da amostra constante de 10,0 µg/mL.
O teste foi realizado em triplicata e a porcentagem de recuperação foi calculada como indicado
pela Association of Official Analytical Chemists (AOAC, 2006).
Robustez
Para a avaliação da robustez do método as condições consideradas ideais (comprimento de
onda de 366 nm, proporção do solvente 50:50 v/v (etanol:ácido clorídrico 0,01 M), temperatura de
25 ºC e 10 minutos de tempo de sonicação) foram alteradas da seguinte forma: comprimento de onda,
364 e 368 nm, proporção do solvente, 45:55 e 55:45 ácido clorídrico 0,01M: etanol, temperatura, 20
e 30 ºC, e tempo de sonicação, 5 e 15 minutos.
As análises foram realizadas em triplicata e ao final foi calculado o teor de anlodipino para
cada variação e verificado se este se manteve ou não dentro do preconizado pelas Farmacopeias
Indiana e Americana, isto é, 90 a 110% (Farmacopeia Americana, 2011; Farmacopeia Indiana, 2007).
Limite de detecção e quantificação
Os limites de quantificação (LQ) e detecção (LD) foram determinados por meio de cálculos
conforme equações (a) e (b) descritas abaixo (Brasil, 2003). O LQ experimental foi obtido através da
diluição seriada a partir da menor concentração da curva de calibração e estabeleceu-se como o LQ a
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concentração cuja leitura espectrofotométrica apresentou desvio padrão relativo (DPR) máximo de
5,0%. Todas as leituras foram realizadas em triplicata.
𝑎) 𝐿𝑄 = (𝐷𝑃 ÷ 𝑎) × 10
O limite de detecção foi determinado a partir de cálculos:
𝑏) 𝐿𝐷 = (𝐷𝑃 ÷ 𝑎) × 3
Onde: DP = Desvio padrão da curva de calibração, ɑ = inclinação da reta.
Estudos de equivalência farmacêutica
A qualidade das amostras comerciais foi verificada através dos ensaios de peso médio,
friabilidade, dureza, desintegração, doseamento, teste e perfil de dissolução. Os quatro primeiros
testes foram realizados de acordo com o estabelecido pela Farmacopeia Brasileira (2010). Para a
determinação do teor de anlodipino presente nas amostras empregou-se as condições do método
validado neste trabalho.
O teste e perfil de dissolução foram realizados simultaneamente conforme recomendado pela
Farmacopeia Indiana (2007), empregando 6 comprimidos de cada produto acabado, meio de
dissolução 900 mL de HCl 0,01 M a 37 ºC, aparato cesta e velocidade de 75 rpm. Foram coletadas e
repostas alíquotas de 10 mL nos tempos 1, 3, 5, 10, 15, 30 e 45 minutos. As porcentagens dissolvidas
foram determinadas utilizando a equação da reta (y = 0,0428x + 0,0077) da curva de calibração (r2 =
0,9999) construída para esse ensaio em espectrofotômetro a 239 nm, empregando ácido clorídrico
0,01 M para zerar o equipamento. Os perfis de dissolução foram comparados estatisticamente,
utilizando os valores de Eficiência de Dissolução (ED%), por Análise de Variância (ANOVA fator
único), para avaliar se existia diferença significativa entre os resultados obtidos e, logo após, o Teste
t foi aplicado para determinar quais formulações eram semelhantes e quais eram estatisticamente
diferentes.
As informações das bulas dos medicamentos também foram verificas de acordo com o
preconizado pela RDC nº 47/2009 (Brasil, 2009).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Validação do método analítico
Para a escolha do solvente e comprimento de onda empregados, preparou-se uma solução de
besilato de anlodipino na concentração de 20,0 µg/mL (equivalente a 14,4 µg/mL de anlodipino base)
e vários testes foram realizados com diferentes solventes, como ácido clorídrico 1,0 M, 0,1 M e 0,01
M; hidróxido de sódio 1,0 M, 0,1 M e 0,01 M; acetonitrila, acetonitrila:água (50:50 v/v); metanol,
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metanol:água (50:50 v/v); etanol, etanol:água (50:50 v/v) e etanol:HCl 0,01 M (50:50 v/v), realizando
varredura na região do ultravioleta de 200 a 400 nm. A maior absorbância e o menor DPR foram
obtidos em 366 nm com a mistura de etanol e ácido clorídrico 0,01 M na proporção de 50:50 v/v.
Após a análise dos excipientes dos comprimidos, comprovou-se a seletividade e
especificidade do método, pois as substâncias inertes não apresentaram valor de absorbância no
comprimento de onda de 366 nm, como pôde ser observado na Figura 1, o que possibilitou a
continuidade dos ensaios para a validação sem interferências por parte dos excipientes.
Figura 1: Representação gráfica do espectro de absorção na região do UV dos excipientes (placebo
- linha vermelha) e da solução de anlodipino na concentração de 14,0 µg/mL (linha azul escura).
A linearidade do método foi demonstrada através da curva de calibração, com equação da reta
y = 0,0174x – 0,0027 e coeficiente de correlação r2 = 0,9997, uma vez que a RE 889/2003 considera
como critério aceitável coeficiente de correlação igual ou maior que 0,99. A curva analítica obtida,
utilizando-se as concentrações de 2,0 a 30,0 µg/mL, demonstrou que os valores de absorbância são
diretamente proporcionais às concentrações do analito, o que permitiu a utilização dessa curva para a
interpolação dos valores obtidos com as amostras comerciais.
A precisão do método foi avaliada através da repetibilidade e precisão intermediária, ambas
apresentadas na Tabela 1.
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Como pôde ser observado, ambos os testes comprovaram a precisão do método, uma vez que
o desvio padrão relativo (DPR) foi inferior a 1% e a RE 899/2003 estabelece 5% como limite para o
DPR no ensaio da precisão (Brasil, 2003).
Os resultados experimentais obtidos para o teste de exatidão encontram-se na Tabela 2.
De acordo com os dados encontrados, verificou-se que para todas as concentrações
experimentais utilizadas os teores percentuais de recuperação encontram-se dentro dos limites
especificados, 98-102%, confirmando a adequada exatidão do método (ICH, 2005).
O método mostrou-se robusto, pois as mudanças propositais realizadas neste ensaio
proporcionou uma pequena variação no teor do fármaco de 96,94 a 99,01%, mantendo-se dentro do
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1238 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1228 – 1247, 2015
estabelecido pelas monografias oficiais (Farmacopeia Indiana, 2007; Farmacopeia Americana, 2011).
Nas condições normais o teor encontrado foi de 97,94%. Portanto, os parâmetros variados no estudo
de robustez do método não alteraram significativamente este resultado.
O limite de quantificação teórico e experimental foi de 0,6 µg/mL e 1,0 µg/mL,
respectivamente e o limite de detecção teórico para o método proposto foi de 0,2 µg/mL. A realização
do ensaio experimental teve como intuito checar se o valor teórico obtido pode ser mesmo alcançado.
Os resultados demonstraram uma pequena discrepância entre os valores.
Esses resultados demonstram o quão sensível foi o método desenvolvido, pois conseguiu
detectar o fármaco em concentrações muito menores do que outros métodos já desenvolvidos, mesmo
utilizando o comprimento de onda de 366 nm, que não é o de absorção máxima. Um exemplo é o
método desenvolvido por Malesuik (2005) também por espectrofotometria ultravioleta, onde os
limites de quantificação e detecção encontrados foram 4,4 e 1,4 µg/mL, respectivamente.
Outra vantagem do método proposto e validado neste trabalho foi a utilização de
equipamentos e solventes de baixo custo e de baixa toxicidade, enquanto a maioria dos métodos
encontrados na literatura para determinação de anlodipino utilizam equipamentos de alto valor
econômico e solventes tóxicos, como acetonitrila e metanol (Paramita et al., 2012; Kondawar et al.,
2011; Patil et al., 2009; Pedroso, 2009; Barman et al., 2007; Basavaiah, Chandrashekar &
Nagegowda, 2005; Malesuik, 2005; Baranda, Jiménez & Alonso, 2004).
Estudos de equivalência farmacêutica
De acordo com a RDC 47/2009 deve estar descrito na bula dos medicamentos a composição
qualitativa, conforme DCB, quantitativa e a equivalência sal-base, quando aplicável do(s) princípio(s)
ativo(s). Ao analisar as bulas das amostras comerciais, constatou-se que a quantidade de besilato de
anlodipino foi omitida na descrição da composição do medicamento referência, constando apenas a
quantidade de anlodipino base, o que caracteriza uma não conformidade em relação à legislação
(Brasil, 2009).
Todas as amostras foram aprovadas nos ensaios de variação de peso, friabilidade e
desintegração (Tabela 3), pois cumpriram o especificado pela Farmacopeia Brasileira (2010). No
doseamento, os produtos acabados também foram aprovados, uma vez que o teor de anlodipino
encontrado esteve dentro do intervalo de 90 a 110%, conforme estabelece as Farmacopeias
Americana e Indiana (Farmacopeia Americana, 2011; Farmacopeia Indiana, 2007).
Na determinação da resistência mecânica dos comprimidos pelo ensaio da dureza, as amostras
G1 e S1 foram reprovadas, pois os comprimidos racharam e/ou quebraram a uma força menor que 30
N (Buttow et al., 2012; Farmacopeia Brasileira, 1988). Durante a realização dos estudos de
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1239 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1228 – 1247, 2015
equivalência farmacêutica, alguns comprimidos da amostra G1 se quebraram ao serem removidos
manualmente da embalagem primária, demonstrando a fragilidade do produto.
Na análise das bulas das amostras comerciais, foi observado que as amostras G1 e S1 não
possuem a mesma composição de excipientes do medicamento referência, o que pode explicar a
reprovação no ensaio da dureza, já que ambas possuem dióxido de silício como um dos excipientes
diferentes e esse adjuvante diminui a fricção interparticular e a tendência à coesão (Sausen, 2007).
Outro fator que pode ter diminuído a dureza e aumentado a friabilidade da amostra S1, é a
concentração utilizada do estearato de magnésio, pois de acordo com Sausen (2007) quanto maior a
proporção desse excipiente na formulação, maior será o efeito negativo na dureza, diminuindo-a,
enquanto que na friabilidade o efeito será positivo, aumentando-a. Dessa forma, dependendo da
concentração utilizada, o adjuvante em questão, pode ter influenciado negativamente na resistência
mecânica.
No teste de dissolução todas as amostras foram aprovadas, pois ao final dos 45 minutos, já
haviam liberado 100% do fármaco, sendo considerado aprovado pela monografia oficial quando ao
final do tempo de 45 minutos, 70% ou mais da quantidade de princípio ativo for liberada
(Farmacopeia Indiana, 2007).
A comparação de perfis de dissolução é útil para se conhecer o comportamento dos
medicamentos antes de submetê-los ao estudo de bioequivalência e é obrigatório para solicitação de
ARTIGO ORIGINAL /RESEARCH
1240 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1228 – 1247, 2015
registro de produtos (Rigobello et al., 2013). Os perfis de dissolução das amostras referência (R),
genérico 1 (G1), genérico 2 (G2), similar 1 (S1) e similar 2 (S2) estão apresentados na Figura 2.
De acordo com a RDC 31/2010 que dispõe sobre a realização dos Estudos de Equivalência
Farmacêutica e de Perfil de Dissolução Comparativo, a comparação da curva obtida no ensaio de
perfil de dissolução é comparada empregando-se o Método Modelo Independente Simples em que se
emprega um fator de similaridade (F2). Entretanto, as amostras analisadas nesse trabalho são
consideradas de dissolução muito rápida, ou seja, quando ocorre dissolução média de no mínimo 85%
da substância ativa em até 15 minutos. Para estes casos o fator F2 perde o seu poder discriminativo
e, portanto, não é necessário calculá-lo. Entretanto, o coeficiente de variação no ponto de 15 minutos,
relativo às médias de liberação do fármaco nas seis cubas, não pode exceder 10%, confirmando a alta
solubilidade do composto (Brasil, 2010).
Dessa forma, a determinação da similaridade foi feita pela Eficiência de Dissolução (ED%),
calculada pela medida das áreas sob a curva dos perfis de dissolução de cada produto. Os valores de
ED% obtidos foram: 96,11, 102,02, 98,04, 89,81 e 93,23% para as amostras R, G1, G2, S1 e S2,
respectivamente. Os coeficientes de variação encontrados no ponto de 15 minutos foram 1,90, 1,86,
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1241 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1228 – 1247, 2015
2,71, 0,92 e 1,42% para as amostras R, G1, G2, S1 e S2, respectivamente, todos abaixo de 10%,
conforme preconizado pela RDC 31/2010 (Brasil, 2010).
A análise de variância (ANOVA) e o Teste t, foram realizados a partir dos dados de
ED% para comparar os medicamentos genéricos e similares com o medicamento referência
separadamente. As amostras G1, S1 e S2 apresentaram diferenças estatisticamente significativas com
relação à amostra R (referência), sendo p < 0,05 (0,00026, 9,83x10-6 e 0,0051 para G1, S1 e S2,
respectivamente). Para determinar se as diferenças encontradas entre os perfis de dissolução
acarretam ou não em alterações da resposta clínica ao tratamento, é necessário a realização dos testes
de biodisponibilidade relativa in vivo (ANVISA, 2014).
Já a amostra G2 não apresentou diferença estatisticamente significativa em relação ao
medicamento referência, uma vez que o valor de p encontrado para essa amostra foi 0,098.
A RDC nº 134, publicada em 02 de junho de 2003, determina que todas as classes de
medicamentos similares sejam submetidas aos testes de equivalência farmacêutica e
biodisponibilidade relativa até 2014 para comprovação científica de que produzem o mesmo efeito,
na mesma dosagem e no mesmo tempo gasto pelo medicamento de referência (Brasil, 2004).
A RDC nº 58 de 10 de outubro de 2014 determina que será considerado intercambiável o
medicamento similar cujos estudos de equivalência farmacêutica, biodisponibilidade
relativa/bioequivalência ou bioisenção tenham sido apresentados, analisados e aprovados pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Essa resolução já entrará em vigor em 1º de
janeiro de 2015 (Brasil, 2014), entretanto, a partir dos resultados encontrados, pode-se afirmar que
apenas uma das amostras de medicamentos similares analisadas nesse estudo pôde ser considerada
equivalente farmacêutico.
Também foi possível evidenciar, com esse trabalho, que o sistema atual de fiscalização da
equivalência farmacêutica entre medicamentos genéricos e referência pode ser falho, uma vez que a
amostra comercial G1 foi reprovada no teste de dureza. O resultado encontrado para a amostra S1
nesse mesmo ensaio também coloca em dúvida a eficiência do laboratório de controle de qualidade
da indústria farmacêutica.
Vários estudos de equivalência farmacêutica de medicamentos genéricos e similares
comercializados no mercado nacional têm demonstrado diferença significativa no perfil de liberação
do fármaco das diferentes preparações, alertando para a possível falta de intercambialidade (Brum et
al., 2012; Mahle et al., 2007).
Malesuik et al. (2006) realizaram um estudo comparativo visando avaliar a equivalência de
dez medicamentos (comprimidos e cápsulas) contendo anlodipino por meio de testes físicos e físico-
ARTIGO ORIGINAL /RESEARCH
1242 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1228 – 1247, 2015
químicos, tais como: variação de peso, desintegração, dureza, friabilidade, identificação, teor,
uniformidade de conteúdo, teste e perfil de dissolução. Uma das amostras na forma farmacêutica
cápsula foi reprovada no teste de uniformidade de conteúdo, enquanto uma amostra de comprimido
foi reprovada no ensaio de dureza.
Linsbinski, Musis e Machado (2008) avaliaram a equivalência farmacêutica de comprimidos
de captopril distribuídos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) da cidade de Cuiabá-MT. Nos ensaios
para determinação de peso médio, tempo de desintegração e dissolução todas as amostras foram
aprovadas. No entanto, um medicamento genérico foi reprovado no teste de friabilidade e um similar
não cumpriu as especificações estabelecidas pela Farmacopeia Brasileira no teste de uniformidade de
conteúdo e ambos, genérico e similar, não apresentaram perfil de dissolução semelhante ao
medicamento de referência.
Bianchin et al. (2012) avaliaram a qualidade dos comprimidos de enalapril e propranolol
distribuídos na rede pública de saúde de um município catarinense durante um ano. De um total de
sete lotes, cinco apresentaram desvio de qualidade no aspecto visual, peso médio, friabilidade e teor
de princípio ativo.
Em 2013, Rigobello e colaboradores avaliaram comprimidos de cloridrato de propranolol 40
mg, por meio de testes físicos e físico-químicos de qualidade. Os resultados obtidos no perfil de
dissolução demonstraram que nem os dois lotes distintos analisados do medicamento referência eram
estatisticamente semelhantes.
Um estudo recente desenvolvido por Abido e Knorst (2014) avaliou oito especialidades
farmacêuticas de comprimidos de captopril, incluindo o medicamento de referência, genéricos e
similares, em relação ao peso médio, friabilidade, desintegração, uniformidade de conteúdo,
quantificação da substância ativa e dissolução. Ao final das análises, uma amostra de medicamento
genérico foi reprovada no teste de friabilidade e uma amostra de medicamento similar não cumpriu o
teste de dissolução.
A qualidade para medicamentos é um atributo de caráter não apenas comercial, mas também,
legal, ético e moral. Enquanto a qualidade para muitos produtos é uma questão de competitividade,
no campo da saúde deve ser obrigatoriamente atendida e o não cumprimento de especificações de
qualidade consideradas imprescindíveis, pode ter sérias implicações (Linsbinski, Musis & Machado,
2008).
ARTIGO ORIGINAL /RESEARCH
1243 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1228 – 1247, 2015
CONCLUSÕES
O método desenvolvido mostrou-se confiável para a determinação de anlodipino em formas
farmacêuticas sólidas de uso oral, uma vez que não houve interferência dos solventes e excipientes
no comprimento de onda de 366 nm. O método apresentou-se linear, preciso, exato, eficiente e
econômico, o que possibilita seu uso nas análises de rotina dos laboratórios de controle de qualidade.
No estudo de equivalência farmacêutica, as amostras G1 e S1 foram reprovadas no teste de
dureza. As amostras G2 e S2 podem ser consideradas equivalentes farmacêuticos, pois foram
aprovadas em todos os ensaios. Quanto ao perfil de dissolução, apenas a amostra G2 não apresentou
diferença estatisticamente significativa quando comparada ao referência. O medicamento referência
apresentou desvio de qualidade na bula por omitir a quantidade de besilato de anlodipino e o fator de
equivalência empregado na formulação.
Quando se trata de medicamentos, a falta de qualidade pode acarretar em danos incalculáveis
e irreparáveis à saúde da população. Diante dos resultados encontrados, pôde-se verificar a
necessidade de um sistema de fiscalização da qualidade e equivalência dos medicamentos mais
atuante e rigoroso, uma vez que apenas duas das cinco amostras foram aprovadas em todos os testes
realizados.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a FUNDECT (Fundação De Apoio ao Desenvolvimento do Ensino,
Ciência e Tecnologia do Estado De Mato Grosso Do Sul) pelo apoio financeiro concedido (processo
nº23/200.265/2014), Chamada FUNDECT N° 11/2014 – UNIVERSAL-MS.
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ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
Avaliação e comparação da qualidade de medicamentos contendo cloridrato
ranitidina
Vanessa Bellini Espindola1, Teófilo Fernando Mazon Cardoso1, Rúbia Adrieli Sversut1, Aline
Regina Hellmann Carollo1, Marcos Serrou do Amaral2 & Nájla Mohamad Kassab1
1Curso de Farmácia do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo
Grande, MS, Brasil. 2Instituto de Física da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande, MS, Brasil.
Autor correspondente: Nájla Mohamad Kassab, Avenida Costa e Silva, Cidade Universitária, Caixa Postal 549, CEP:
79070-900, telefone: (67) 3345-7367, Campo Grande – MS, Brasil, e-mail: [email protected]
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1249 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
RESUMO
A ranitidina é um agente antiulceroso, inibidor de receptores H2 da histamina, o qual diminui a
secreção ácida gástrica. Assim como outros medicamentos, a ranitidina também é comercializada sob
várias marcas, tais como similares, genéricas e de referência (Antak®). Por isso, é importante que a
qualidade destes medicamentos seja assegurada para que haja equivalência farmacêutica entre elas e,
consequentemente, para serem intercambiáveis. Desta forma, o presente trabalho teve como objetivo
realizar diversos testes de controle de qualidade, bem como verificar a equivalência farmacêutica e o
perfil de dissolução entre dois genéricos e dois similares contendo cloridrato de ranitidina 150mg,
comparando-os com o medicamento de referência. Foram feitas análises qualitativas e quantitativas
nos medicamentos, e determinado o perfil de dissolução juntamente com tratamento estatístico para
uma comparação com o medicamento referência. Todos os testes foram realizados conforme o
preconizado na monografia para cloridrato de ranitidina comprimidos descritos na Farmacopeia
Brasileira 5ª edição (2010). Nos ensaios físicos todas as amostras foram aprovadas e, no perfil de
dissolução os genéricos 1 e 2 e, o similar 1 foram considerados equivalentes farmacêuticos. O similar
2 cumpriu o teste de desintegração, mas não o teste de dissolução o que pode ser explicado pela
presença de ácido metacrílico, empregado como um dos excipientes dessa formulação, o qual é
insolúvel em meio aquoso. Desta forma, esta amostra não apresentou equivalência farmacêutica.
Palavras-chave: Equivalência farmacêutica, Antiulcerosos, Intercambialidade.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1250 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
ABSTRACT
Ranitidine is an anti-ulcer agent that, inhibits histamine H2 receptor, thereby reducing gastric acid
secretion. Like other drugs, ranitidine is marketed under various generic brands, which are similar for
the reference product (Antak®). Therefore, it is important that the quality of these products be
guaranteed so that they are pharmaceutically equivalent and interchangeable. In this study, we
evaluated the pharmaceutically equivalence and dissolution profile of two generic and two similar
products containing 150mg ranitidine, and compared the findings to results for the reference product.
The drugs were analyzed qualitatively and quantitatively and their dissolution profiles were obtained
statistical analyses were conducted for comparison with the reference drug. All tests were performed
as recommended in the monograph of ranitidine hydrochloride tablets described in the Brazilian
Pharmacopoeia (2010) edition. In the physical testing the dissolution profile of generic drugs 1 and 2
and similar pharmaceutical equivalents were considered. The second similar pharmaceutical
equivalent fulfill the disintegration but not the dissolution test, likely due to the presence of
methacrylic acid as an excipient, which is insoluble in aqueous test mediums. Thus, this sample was
not pharmaceutically equivalent to the reference product.
Keywords: Pharmaceutical equivalence, Anti-Ulcer Agents, Interchangeability
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1251 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
INTRODUÇÃO
A úlcera péptica é uma doença caracterizada por uma ferida na parede do estômago e duodeno,
causada principalmente pela bactéria conhecida como Helicobacter pylori, como também pelo uso
regular de medicamentos anti-inflamatórios não esteroidais e raramente por outras doenças
(Carvalho, 2013).
O cloridrato de ranitidina (N-[2-[[[-5-(dimetilamino)]-2-furanil]metil]tio]etil]-N’-1,1-
etenodiamina) é um pó cristalino de cor branca solúvel em meio aquoso. A ranitidina é um antagonista
dos receptores H2, indicada para o tratamento de úlceras, refluxo gastroesofagiano e esofagite erosiva.
Apresenta uma rápida absorção por via oral e sofre metabolização hepática antes de alcançar a
circulação sistêmica (metabolismo de primeira passagem), sua biodisponibilidade, isto é, fração de
fármaco que atinge a circulação sistêmica, é de aproximadamente 50%, sendo excretado pela urina e
bile (Rang et al., 2011; Júnior, 2007).
Os antagonistas de receptores H2 são responsáveis por inibir a secreção de ácido gástrico
estimulada pela histamina, através do mecanismo de competição pelos mesmos receptores. Além
disso, diminuem a secreção deste ácido estimulada por alimentos, e agem na cicatrização das úlceras
(Rang et al., 2011).
A seletividade da ranitidina se deve à semelhança estrutural com a molécula de histamina,
melhorando seu efeito farmacológico e reduzindo os efeitos colaterais. O protótipo do grupo de
bloqueadores H2 foi à cimetidina, a qual passou por alterações estruturais, resultando então na
ranitidina que apresenta maior potência e seletividade em relação ao seu protótipo (Barreiro & Fraga,
2005; Nunes et al., 2005).
Atualmente, há uma diversidade de medicamentos no comércio brasileiro contendo ranitidina,
pois além do medicamento de referência surgiram também os medicamentos similares e genéricos,
visando à redução de preços e intercambialidade com o de referência. Em farmacologia, a
intercambialidade indica a possibilidade de por outro equivalente terapêutico (medicamentos
farmaceuticamente equivalentes que, após administração na mesma dose, seus efeitos em relação a
eficácia e segurança são essencialmente os mesmos) indicado pelo prescritor (Rumel, Nishioka &
Santos, 2006). O medicamento de referência é o chamado inovador, o qual possui o 1º registro junto
à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), onde deve ser comprovada a eficácia,
qualidade e segurança dos medicamentos testados (Storpirtis et al., 2004).
O medicamento genérico é a cópia do medicamento de referência, pois apresenta testes de
biodisponibilidade e equivalência farmacêutica semelhante. Equivalentes farmacêuticos são
medicamentos que possuem mesma forma farmacêutica, via de administração e quantidade da mesma
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1252 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
substância ativa, podendo ou não conter excipientes idênticos (Araújo et al., 2010). Devem cumprir
com os mesmos requisitos da monografia individual da Farmacopeia Brasileira (2010),
preferencialmente, ou com os de outros compêndios oficiais. A garantia da equivalência farmacêutica
e biodisponibilidade são realizadas através de testes in vitro, e in vivo, respectivamente (Brasil, 2010;
Rumel, Nishioka & Santos, 2006).
Quanto aos medicamentos similares, sua comprovação de qualidade também exige os mesmos
ensaios, estando regulamentada pela Resolução de Diretoria Colegiada, chamada RDC 58/2014, a
qual estabelece os procedimentos para a intercambialidade de medicamentos similares com o
medicamento de referência aumentando sua confiabilidade, pois determina a apresentação dos
mesmos ensaios necessários para registro de medicamento genérico. De acordo com a RDC 58/2014,
os medicamentos similares com equivalência farmacêutica, biodisponibilidade
relativa/bioequivalência ou bioisenção (isenção de realização de estudos de bioequivalência ou
substituição destes por outros testes) comprovadas poderão declarar na bula que são substitutos ao
medicamento de referência (Brasil, 2014).
As formas farmacêuticas sólidas requerem diferentes estudos para confirmar sua qualidade,
tais como: testes de resistência mecânica que avaliam a estabilidade física de comprimidos e os
ensaios que visam determinar a biodisponibilidade do fármaco, como o tempo de desintegração, e o
perfil de dissolução.
O perfil de dissolução é um teste realizado in vitro que fornece dados sobre a velocidade e a
extensão da cedência do fármaco de sua forma farmacêutica ao longo do tempo. A Resolução 310 de
2004 estabelece que o delineamento do perfil de dissolução deva ser feito com o mínimo de 5 tempos
de coleta, onde em 4 tempos a cedência deve ser inferior a 85% e 1 tempo com cedência superior a
este valor (Pianetti, Cesar & Nogueira, 2009).
Quando um medicamento apresenta cedência maior que 85% do teor rotulado em tempo
superior a 15 minutos, a comparação entre os perfis de dissolução de medicamentos teste com o
referência deve ser realizada através dos fatores de diferença (f1) e semelhança (f2) para poder afirmar
ou não sua equivalência farmacêutica (Chorilli et al., 2010; Gil, 2007).
A dissolução de um medicamento pode ser afetada por características físico-químicas do
próprio fármaco, do tamanho e capacidade de dispersão das partículas sólidas desintegradas e pelos
componentes da formulação farmacêutica (excipientes). Desta forma, a necessidade de se realizar os
estudos de dissolução in vitro é cada vez mais importante para garantia da qualidade de formas
farmacêuticas sólidas orais, além de ampliar o desenvolvimento industrial (Brum et al., 2012;
Rodrigues et al., 2006).
Sendo assim, devido à ampla utilização dos medicamentos sólidos orais antiulcerosos pela
população brasileira e a possibilidade de ocorrer problemas de bioequivalência nas formas
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1253 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
farmacêuticas contendo cloridrato de ranitidina, este trabalho tem como objetivo realizar os testes de
controle de qualidade de medicamentos de referência, genéricos e similares comercializados no
mercado nacional.
MATERIAL E MÉTODOS
Material
Solventes e equipamentos
Água previamente purificada pelo sistema de purificação de água Direct-Q3 (Millipore®) foi
empregada como solvente em alguns testes de controle de qualidade descritos abaixo.
Espectrofotômetro modelo Evolution 60® da Thermo Scientific com intervalo de aquisição dos
espectros de 200 – 400 nanômetros (nm) em cubetas de quartzo de 1 cm de caminho ótico; dissolutor
de comprimidos com 8 cubas da marca Logen Scientific®; durômetro de molas modelo 298 Nova
Ética®; balança analítica modelo AY220 Shimadzu®; friabilômetro modelo MA 791 Marconi®;
desintegrador da marca Nova Ética® e ultrassom modelo ultra cleaner 1400 Unique® foram os
equipamentos empregados neste trabalho.
Substância química de referência (SQR) e amostras comerciais
A matéria-prima de cloridrato de ranitidina, comercializada pela Genix® Indústria
Farmacêutica com teor declarado de 99,0%, lote: RH4491112 foi adquirida de uma farmácia
magistral do comércio local e, utilizada como substância química de referência (SQR) sem ulterior
purificação. Foram analisados dois medicamentos similares (S1 e S2) e dois medicamentos genéricos
(G1e G2) rotulados como comprimidos revestidos contendo 150 mg de cloridrato de ranitidina. Para
comparação dos resultados foi usado o medicamento de referência (R) comercializado por nome de
Antak®. Todas as amostras foram adquiridas em drogarias do comércio local.
Métodos
As análises foram realizadas conforme a monografia descrita na Farmacopeia Brasileira 5ª
edição (2010) para cloridrato de ranitidina comprimidos.
Identificação da matéria-prima empregada como SQR e amostras comerciais
Para confirmação da identidade da matéria-prima utilizada como SQR foi verificado as
características organolépticas (aparência, cor e odor), a faixa de fusão e o espectro de absorção na
região do ultravioleta.
Identificação do fármaco nas amostras comerciais
A identificação do fármaco nas amostras comerciais deu-se por espectrofotometria na região
do ultravioleta na faixa de 200 a 400nm.
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1254 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
Determinação de peso médio
A determinação de peso foi realizada por meio da pesagem individual de 20 comprimidos em
balança analítica modelo AY220 Shimadzu®, com posterior determinação da média aritmética, desvio
padrão e coeficiente de variação.
Teste de resistência mecânica (dureza)
Foram submetidos 10 comprimidos, separadamente, a uma força necessária para o
esmagamento ou ruptura radial, a qual foi medida em Newton (N), sendo utilizado durômetro de
molas modelo 298 Nova Ética® para esta medida.
Teste de friabilidade
Inicialmente foram pesados 20 comprimidos, simultaneamente, ao quais foram submetidos ao
teste de friabilidade no friabilômetro modelo MA 791 Marconi®, com velocidade de 20rpm por 5
minutos. Finalizado o teste, todos os comprimidos foram novamente pesados, em conjunto, e a
diferença de peso resultante entre o inicio e o final do teste foi calculada e determinada à porcentagem
(%) de perda de massa.
Teste de desintegração
O teste foi realizado com 6 comprimidos onde cada um foi colocado, separadamente, em cada
tubo da cesta do desintegrador Nova Ética®, que por sua vez foi suspensa no suporte do equipamento,
de tal maneira que os comprimidos foram submetidos a movimentos verticais com imersão e ascensão
em banho de água a 37±1ºC por tempo máximo de 30 minutos.
Curva analítica e doseamento
Foi preparada uma solução da SQR de ranitidina (125,0µg/mL) em água destilada. Foram
feitas 7 diluições a partir da solução-mãe da SQR, sendo que a concentração do ponto médio da curva
foi de 12,5µg/mL conforme definido em estudos prévios. A curva analítica foi construída no intervalo
de concentrações de 5,0 a 20,0µg/mL. Todas as determinações espectrofotométricas foram realizadas
em triplicata em 314nm à temperatura ambiente (25 ± 2ºC).
O doseamento foi realizado por espectrofotometria de absorção na região do ultravioleta, onde
foram pesados e pulverizados 20 comprimidos de cada amostra comercial, e uma quantidade
equivalente a 125mg de ranitidina foi transferida para balão volumétrico de 500mL. O volume foi
completado com água destilada e submetido a banho ultrassônico por 30 minutos e, logo após, todo
conteúdo foi filtrado em papel de filtro qualitativo. A partir da solução obtida (250,0g/mL) diluições
sucessivas foram realizadas até a obtenção da concentração de 12,5µg/mL, a qual foi lida em triplicata
no espectrofotômetro empregando em 314nm e utilizando água para ajuste do zero. Por fim, foi
calculado o teor em cada amostra a partir da equação da reta obtida pela curva analítica.
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Uniformidade de doses unitárias
Este ensaio foi realizado através do método de variação de peso descrito pela Farmacopeia
Brasileira (2010), visto que todas as amostras analisadas possuem revestimento do tipo filme. Foi
calculado o valor de aceitação (VA) a partir das médias dos conteúdos individuais (X), conforme as
equações abaixo, onde, DP corresponde ao desvio padrão de (X):
o Se 98,5% < (X) < 101,5%VA=2,4DP
o Se (X) < 98,5%VA=98,5 – (X) + 2,4DP
o Se Se (X) > 101,5%VA= (X) –101,5 + 2,4DP
Teste de dissolução
O teste de dissolução foi realizado no equipamento Logen Scientific® com seis comprimidos,
empregando o método 2 da Farmacopeia Brasileira (2010), nas seguintes condições: aparelhagem
pás, velocidade de rotação de 50 rpm, meio de dissolução água purificada, volume de 900mL e
temperatura do banho de 37 + 0,5ºC. Ao final do tempo de 45 minutos foram coletadas alíquotas de
10 mL do meio de dissolução e em seguida, o mesmo volume de água foi reposto com igual
temperatura. A Figura 1 apresenta um esquema ilustrativo da dissolução dos comprimidos de
cloridrato de ranitidina empregando o método 2 (pás) da farmacopeia brasileira. As alíquotas retiradas
foram filtradas e diluídas empregando água purificada, e as absorbâncias foram determinadas por
espectrofotometria no ultravioleta (UV), em 314nm. A quantificação do percentual de fármaco
dissolvido nas alíquotas foi calculada através da equação da reta obtida de uma curva analítica
construída no intervalo de concentração de 5,0 a 20,0µg/mL, empregando água purificada como
solvente.
Perfil de dissolução
Para a realização do perfil de dissolução no equipamento Logen Scientific®, foram utilizadas
as mesmas condições descritas para o teste de dissolução, com alíquotas coletadas nos tempos 5, 10,
15, 30, 45 e 60 minutos. Alíquotas de 10mL foram retiradas para análise e volume igual de meio foi
reposto na mesma temperatura do sistema. Diluições convenientes foram realizadas com intuito de
alcançar a faixa de linearidade determinada pela curva analítica e a quantidade de fármaco liberado
no meio de dissolução foi calculada a partir da equação da reta anteriormente obtida. Partindo dos
perfis de dissolução foram realizadas as análises estatísticas, utilizando modelos independentes como
cálculo da eficiência da dissolução (ED%) e os fatores diferença e similaridade, f1 e f2,
respectivamente. A ED% foi calculada a partir da relação área sob a curva pela área total do gráfico
e a análise estatística foi determinada através da análise de variância (ANOVA) fator único, utilizando
o teste-t para comparação entre as amostras.
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RESULTADOS E DISCUSSÃO
Identificação da matéria-prima empregada como SQR e amostras comerciais
As características organolépticas e a faixa de fusão aceitável (130 a 133ºC) estiveram de
acordo com o preconizado na monografia farmacopeica, e o espectro de absorção no ultravioleta foi
semelhante ao proposto na literatura (Moffat, Osselton & Widdop, 2011). Todas as amostras
comerciais analisadas apresentaram espectros de absorção semelhantes à SQR, quando lidas na faixa
de 200 a 400 nm, desta forma comprovando que se tratam do mesmo princípio ativo.
Determinação de peso médio
Os valores obtidos na determinação do peso dos comprimidos de ranitidina 150mg, estão
descritos na Tabela 1. Conforme preconizado pela Farmacopeia Brasileira 5ª edição (2010),
comprimidos com peso médio acima de 250mg é aceitável uma variação de ± 5%, não podendo ser
aceito mais do que duas unidades fora deste limite. Este teste não é útil para comparação entre as
amostras de diferentes fabricantes, porém indica eficiência no processo de fabricação. Todas as
amostras avaliadas se apresentaram em conformidade com as especificações farmacopeicas.
Teste de resistência mecânica (dureza)
O teste de dureza determina a resistência do comprimido ao esmagamento ou à ruptura sob
pressão radial e, conforme da Farmacopeia Brasileira 5ª edição (2010), não são aceitáveis
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1257 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
comprimidos que se rompem com força inferior a 30N, desta forma todos os comprimidos analisados
cumpriram o teste, conforme descrito na Tabela 1.
Teste de friabilidade
Este teste consiste na determinação da resistência a abrasão dos comprimidos, quando estes
são submetidos à ação mecânica de aparelhagem específica, não podendo perder mais que 1,5% de
seu peso, conforme especificações farmacopeicas. A Tabela 1 mostra os valores obtidos, confirmando
a aprovação das amostras analisadas nesse teste.
Teste de desintegração
A desintegração é dada pelo estado no qual nenhum resíduo de comprimido permanece
na tela metálica do aparelho de desintegração. De acordo com a Farmacopeia Brasileira (2010),
comprimidos revestidos com filme devem estar totalmente desintegrados em até 30 minutos
utilizando água mantida a 37 + 1 ºC como líquido de imersão.
O tempo gasto para desintegração dos comprimidos das amostras analisadas está apresentado
na Tabela 1 e, pode-se observar que somente o similar 2 não desintegrou em 30 minutos no líquido
de imersão acima mencionado. Na bula desse medicamento, o ácido metacrílico é listado como um
dos excipientes presentes na composição do produto. Este excipiente apresenta diferentes
solubilidades em água e é usado para revestimento de comprimidos com diversas finalidades e ainda
em formulações de liberação retardada tipo gastrorresistentes (Villanova, Oréfice & Cunha, 2010;
Rowe, Sheskey & Quinn, 2009).
Com o intuito de verificar se o ácido metacrílico do similar 2 foi empregado para conferir
gastrorresistência ao produto, foi realizado o teste de desintegração em meio ácido com solução de
HCl (ácido clorídrico) 0,1M e meio básico com solução de tampão fosfato pH=6,8. Entretanto,
verificou-se que após 30 minutos em meio básico não houve desintegração, enquanto que no meio
ácido em menos de 10 minutos o comprimido estava completamente desintegrado.
Segundo a Farmacopeia Brasileira 5ª edição (2010) o medicamento com revestimento entérico
(gastrorresistente) deve resistir ao meio de HCl 0,1 M por 60 minutos e se desintegrar-se totalmente
em meio básico composto por tampão fosfato pH=6,8, em até 45 minutos. O similar 2 não se
classificou como tal por não atender aos requisitos farmacopeico para o teste de desintegração de
medicamentos com revestimento entérico.
O similar 2, é um medicamento revestido com filme não gastrorresistente e para este tipo de
medicamento, a Farmacopeia Brasileira 5ª edição (2010) recomenda que o teste de desintegração seja
feito também em HCl 0,1M a 37 + 1 ºC, caso os comprimidos não se desintegrem por completo em
água destilada mantida a 37 + 1 ºC. Desta forma, pode-se dizer que o similar 2 foi aprovado no teste
de desintegração, uma vez que cumpriu as recomendações farmacopeicas.
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1258 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
Tabela 1. Resultados obtidos da variação de peso médio (PM), dureza, friabilidade e tempo de
desintegração dos medicamentos referência (R), genéricos G1 e G2 e similar S1 e S2, contendo
cloridrato de ranitidina 150mg.
Parâmetros Amostras
R G1 G2 S1 S2
PM(a) (gramas) 0,3135 0,3060 0,2610 0,3622 0,3270
DPR(b) (%) 1,045 0,929 0,708 1,261 1,154
Dureza (N) 74,0 28,0 56,0 55,0 48,5
Friabilidade (%) 0,09 0,13 0,11 0,22 0,03
TD(c) (minutos) 7 2 8 8 >30
8(c) (a) PM: Peso médio (b) DPR: Desvio padrão relativo dos pesos médios. (c) TD: Tempo de desintegração em meio de HCl 0,1 M.
Curva analítica e doseamento
Segundo a Farmacopeia Brasileira (2010), comprimidos de cloridrato de ranitidina devem ter
no mínimo 90,0% e, no máximo 110,0% da quantidade declarada de princípio ativo. O teor de
ranitidina de cada amostra foi calculado através da equação da reta
(y =0,0477x + 0,0207) obtida por intermédio da curva de calibração construída no intervalo de 5,0 a
20,0 µg/mL, com coeficiente de correlação (r)=0,998. Todas as amostras foram aprovadas no
doseamento, conforme mostrado na Tabela 2. Entretanto, G1 e G2 apresentaram teores próximos ao
limite inferior aceitável.
Uniformidade de doses unitárias
Este teste avalia a quantidade de componente ativo em cada comprimido individualmente, e a
partir disto confirma a uniformidade do fármaco nas unidades avaliadas. Conforme preconizado pela
Farmacopeia Brasileira 5ª edição (2010), o valor de aceitação (VA) obtido para as 10 unidades não
deve ser maior que L1 (valor máximo permitido para o valor de aceitação), que neste caso é igual a
15. Todos os valores de aceitação calculados foram menores que 15, desta forma todos cumprem o
teste, conforme ilustrado na Tabela 2.
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1259 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
Tabela 2. Determinação do teor (%), uniformidade de conteúdo (UC%) e valor de aceitação (VA)
dos medicamentos referência (R), genéricos G1 e G2 e similar S1, contendo cloridrato de ranitidina
150mg.
Parâmetros
Amostras
R G1 G2 S1 S2
Teor (a)
± DPR(b)
98,4
± 0,25
90,3
± 0,47
90,1
± 0,28
93,8
± 0,26
96,3
±0,99
UC
± DPR(b)
96,7-99,8
± 0,95
89,1-91,7
± 1,34
89,4-91,8
± 0,94
91,4-95,3
± 1,5
95,7-98,0
± 0,73
VA 2,5 13,4 9,8 11,2 3,1
(a) Média de três determinações.
(b) DPR: desvio padrão relativo.
Teste de dissolução
De acordo com a Farmacopeia Brasileira 5ª edição (2010), em 45 minutos não menos que 80%
da quantidade declarada de ranitidina devem se dissolver. O medicamento referência (R) liberou
97,48%, G1 84,17%, G2 90,63% e S1 91,46%. Sendo assim, estas amostras foram aprovadas no teste
de dissolução.
O similar 2 praticamente não liberou o princípio ativo no decorrer do teste de dissolução, fato
este atribuído a presença do ácido metacrílico como um dos excipientes deste produto, e como pôde
ser observada no teste de desintegração, a presença deste composto na formulação diminui
drasticamente a solubilidade do medicamento no meio aquoso. Para o teste de desintegração a
Farmacopeia Brasileira (2010) recomenda executá-lo também em meio ácido, caso os comprimidos
não se desintegrarem em água. Já para o teste de dissolução procedimento semelhante não é
mencionado.
O teste de dissolução para comprimidos de cloridrato de ranitidina descrito na Farmacopeia
Brasileira 5ª edição (2010) preconiza como meio dissolutor, água em volume de 900 mL,
aparelhagem tipo pás e tempo máximo de 45 minutos. Todavia, este teste da forma como está
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1260 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
recomendado não atende àqueles medicamentos que contêm polímeros de revestimentos pouco
solúveis em água, tal como o similar 2 analisado, não oferecendo alternativas, caso isso ocorra. Sendo
assim, o similar 2 foi classificado como medicamento com desvio de qualidade, pois foi reprovado
no teste de dissolução por se manter praticamente integro ao final do tempo estabelecido na
monografia.
Perfil de dissolução
Os perfis obtidos para as amostras analisadas, exceto para o similar 2, estão apresentados na
Figura 2. Todas as avaliações tiveram desvio padrão relativo (DPR) inferior a 20% nos primeiros 15
minutos, e inferior a 10% após este tempo, estando assim em conformidade com a RDC 31/2010.
Como pode ser observado na Figura 2, somente o medicamento referência ao final de 60
minutos liberou praticamente 100% do princípio ativo, enquanto que nas demais amostras o conteúdo
de fármaco liberado variou de 85 a 93 %. Fato este que pode ser explicado pelo baixo teor encontrado
no doseamento.
O similar 2 não apresentou equivalência farmacêutica, por não cumprir com requisitos
farmacopeicos, devido a pobre solubilização do comprimido no meio de dissolução. Problemas como
este, onde o revestimento do comprimido é muito pouco solúvel no solvente recomendado para o
teste dissolução, devem ser observadas quando da elaboração da monografia oficial, de tal maneira
que haja flexibilidade na escolha do solvente, elegendo o mais adequado para o medicamento em
questão.
Se a Farmacopeia Brasileira recomendasse a troca do solvente, isto é, água para ácido, tal qual
a mesma propõe no teste de desintegração, para comprimidos revestidos com filme que não se
desintegram em meio aquoso, teria sido possível, pelo menos, obter o perfil de dissolução do similar
2 para ser comparado com o de referência.
A legislação atual determina que para um medicamento ser intercambiável é necessário que
seja equivalente terapêutico e, para tanto, deve primeiramente ser um equivalente farmacêutico (RDC
31/2010). Se não cumprir a equivalência farmacêutica o teste de bioequivalência não é realizado.
Porém, cabe questionar a aplicabilidade do método farmacopeico para este tipo de formulação. O
mais adequado, neste caso, seria alterar a monografia farmacopeica descrita para o teste de dissolução
de comprimidos de cloridrato de ranitidina revestidos for filmes, trocando o meio dissolutor água
para HCl 0,1 M.
Desta forma, o similar 2 não pode ser intercambiável com a referência, logo não é um
equivalente terapêutico. Entretanto, não é esperada total falha terapêutica para este medicamento,
tendo em vista que o meio ácido estomacal possibilitaria a dissolução da forma farmacêutica e,
propiciaria a absorção da forma não ionizada no intestino. Assim, a equivalência terapêutica poderia
ser comprovada in vivo através do teste de bioequivalência.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1261 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
Figura 2: Perfis de dissolução das amostras analisadas: referência (R), genéricos (G1 e G2) e
similar (S1).
Para estabelecer a comparação entre os perfis e o grau de semelhança entre eles foram
calculados os fatores de diferença (f1) e similaridade (f2), onde estes devem estar entre 0 e 15, e entre
50 e 100, respectivamente. Como apresentado na Tabela 3, os valores obtidos para f1 e f2 encontram-
se dentro dos valores estabelecidos pela RDC 31/2010, comprovando assim a equivalência
farmacêutica das amostras, e a intercambialidade com o medicamento referência. A eficiência de
dissolução (ED%) é dada em porcentagem e determinada através da área sobre a curva do perfil de
dissolução, e os resultados obtidos estão descritos na Tabela 3.
Tabela 3. Fatores de diferença (f1), de similaridade (f2) e eficiência de dissolução (ED) dos
medicamentos referência (R), genéricos G1 e G2 e similar S1, contendo cloridrato de ranitidina
150mg.
Parâmetros Amostras
R G1 G2 S1
f1 (%) ----- 7,9 11,1 3,2
f2 (%) ----- 53,0 53,2 63,9
ED (%) 80,7 70,6 71,5 75,6
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1262 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
A ED% foi avaliada estatisticamente por meio da análise de variância (ANOVA) fator único,
resultando em um valor de p<0,05, além de o F calculado (razão das variâncias) ser maior que o F
crítico (F calculado= 5,92, e F crítico= 3,09), o que mostra que existe uma diferença entre as amostras.
Posteriormente, foi aplicado o teste-t para comparação individual de cada amostra com o
medicamento referência, onde verificou a diferença somente entre as amostras G1 e G2 (p<0,05), as
quais apresentaram f2 igual a 53,0 e 53,2, respectivamente. Apesar de apresentarem valores próximos
ao limite inferior, ainda assim G1 e G2 podem ser considerados semelhantes ao medicamento de
referência, o que comprova suas equivalências, visto que o f2 determina esta característica. Tais
resultados devem-se também aos métodos utilizados, uma vez que f1 e f2 são calculados a partir das
quantidades liberadas, e a ED% é obtida através da área do perfil de dissolução, além de se tratarem
de métodos estatísticos diferentes. No entanto, a amostra S1 apresentou p>0,05, comprovando que
não existe diferença significativa comparada ao medicamento referência (Brum et al., 2012; Brasil,
2010).
Junior e colaboradores (2014) realizaram trabalho semelhante a este, onde três diferentes
amostras de comprimidos revestidos de cloridrato de ranitidina comercializadas na Bahia (Brasil)
foram analisadas e concluíram que todas as amostras cumpriram o teste de dissolução, mas
apresentaram perfis de dissolução diferentes. No presente estudo, com exceção do similar 2, todas as
amostras analisadas foram equivalentes farmacêuticos do medicamento de referência.
CONCLUSÕES
Todas as amostras analisadas foram aprovadas nos testes físicos (identidade, peso médio,
dureza, friabilidade e desintegração) e também na determinação da uniformidade de dose e teor de
fármaco.
Os genéricos G1 e G2 e o similar 1foram aprovados no teste de dissolução, visto que ao final
do tempo estabelecido na monografia farmacopeica (45 minutos) liberaram acima de 80% do
fármaco.
Somente o medicamento referência aproximou-se de 100% de liberação do fármaco ao final
de 60 minutos de dissolução, enquanto que para G1, G2 e S1 a quantidade total de fármaco liberado
variou entre 85 a 90%, valores estes que são condizentes com o ter de substância ativa encontrado.
A análise estatística mostrou que há diferença na eficiência de dissolução (ED%) entre as
amostras G1, G2 e S1 e o fator semelhança (f2) calculado indicou que estas amostras são equivalentes
farmacêuticos, já que f2 de cada amostra foi maior que 50,0. Isto pode ser explicado pelo fato de que
a ED% é calculada com base na área sob a curva e o f2 é calculado a partir das quantidades de fármaco
liberado em função do tempo.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1263 Espindola, V. B. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1248 – 1265, 2015
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a FUNDECT (Fundação De Apoio ao Desenvolvimento do Ensino,
Ciência e Tecnologia do Estado De Mato Grosso Do Sul) pelo apoio financeiro concedido (processo
nº23/200.265/2014), Chamada FUNDECT N° 11/2014 – UNIVERSAL-MS.
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ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
Avaliação da equivalência farmacêutica de comprimidos de hidroclorotiazida
disponíveis no mercado do Rio de Janeiro
Evaluation of pharmaceutical equivalence of hydrochlorothiazide tablets available in the Rio de
Janeiro market
Larissa Ferreira Correia1, Marcos Martins Gouvêa1, Elizabeth Valverde Macedo1,2, Carlos Augusto
de Freitas Peregrino1,2 & Samanta Cardozo Mourão1,2*
¹Laboratório Universitário Rodolpho Albino / Laboratório de Desenvolvimento de Novas Formulações, Universidade
Federal Fluminense, RJ 2Departamento de Tecnologia Farmacêutica, Faculdade Farmácia, Universidade Federal Fluminense, RJ.
*[email protected] / Rua Doutor Mário Viana, 523 - Santa Rosa, Niterói, Rio de Janeiro. CEP: 24241-000. Fone:
(21) 2629-9561
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1267 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
RESUMO
A hidroclorotiazida é um diurético tiazídico indicado para o tratamento de hipertensão
arterial. A fim de verificar a qualidade e a equivalência farmacêutica de comprimidos de
hidroclorotiazida disponíveis no mercado do Rio de Janeiro, realizou-se um estudo comparativo por
meio de testes físico-químicos e análises de diferentes parâmetros dos perfis de dissolução. O
estudo foi realizado com medicamentos de referência, genérico e similar, sendo testados dois lotes
diferentes de cada laboratório. Todas as amostras foram aprovadas nos testes físico-químicos,
entretanto, os medicamentos similares apresentaram diferenças significativas na desintegração e
dureza em relação ao medicamento de referência. Nas análises dos perfis de dissolução, apenas os
medicamentos genéricos demonstraram equivalência farmacêutica com o medicamento de
referência, de acordo com o Método Modelo Independente Simples (f1 e f2). Contudo, foram
encontradas algumas diferenças entre essas duas especialidades farmacêuticas ao se comparar os
perfis de dissolução a partir da eficiência de dissolução (ED) e dos parâmetros derivados da cinética
de dissolução. Os resultados indicam a necessidade de monitoramento constante da qualidade e
equivalência farmacêutica dos medicamentos comercializados para garantir a manutenção das
especificações e a equivalência terapêutica.
Palavras-chave: Hidroclorotiazida, Medicamento genérico, Medicamento similar, Controle de
qualidade, Dissolução
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1268 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
ABSTRACT
Hydrochlorothiazide is a thiazide diuretic drug indicated for treatment of hypertension. In
order to verify the quality and the pharmaceutical equivalence of hydrochlorothiazide tablets
available in the Rio de Janeiro market, a comparative study performing physical-chemical assays
and dissolution profiles analyses was carried out. The study was conducted with the reference,
generic and similar medicines, which have been analyzed by two different batches from each
laboratory. All samples were approved in physical-chemical assays, however, similar medicines
showed significant differences in hardness and disintegration compared with the reference one. The
dissolution profiles showed that only generic medicines presented pharmaceutical equivalence with
the reference medicines, according to Model-Independent Method (f1 and f2). Nevertheless, some
differences were found between them throught dissolution efficiency (DE) and the parameters
derived from the dissolution kinetic. Thus, these results indicate that a continuous product quality
monitoring program is required to ensure the specifications and the therapeutic equivalence.
Keywords: Hydrochlorothiazide, Generic medicines, Similar medicines, Quality control,
Dissolution
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1269 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
INTRODUÇÃO
A hipertensão arterial é uma doença crônica classificada como um dos maiores problemas de
saúde pública mundial, devido ao grande fator de risco para doenças cardiovasculares e a
possibilidade de acarretar graves consequências a outros órgãos (Corrêa et al., 2005). A
hidroclorotiazida é um diurético tiazídico que atua nos rins com a função de diminuir a reabsorção
de sais e água, provocando um aumento da eliminação de líquidos do organismo. Sendo assim, este
fármaco é indicado para o tratamento da hipertensão arterial, insuficiência cardíaca e edema de
diferentes causas (Katzung, 2003).
O tratamento farmacológico da hipertensão é realizado, principalmente, pelo uso de formas
farmacêuticas sólidas, em especial, os comprimidos. Esse tipo de produto apresenta vantagens em
relação à estabilidade e produtividade, porém deve ser assegurada a biodisponibilidade da
substância ativa por meio de ensaios in vitro e in vivo (Ansel, 2007).
Os comprimidos podem variar em relação a propriedades físico-químicas que influenciam
diretamente a ação terapêutica esperada, como dureza, friabilidade, desintegração, teor de princípio
ativo, uniformidade de doses unitárias e dissolução. Portanto, a análise desses fatores é de extrema
importância para verificar a adequabilidade da dose, tempo de liberação do princípio ativo no
organismo e resistência da forma farmacêutica, garantindo a eficácia e segurança do tratamento
(Lachman, Lieberman & Kanig 2001).
O fármaco hidroclorotiazida está disponível no mercado sob a forma de medicamento de
referência, similar e genérico. Deste modo, testes de equivalência farmacêutica e bioequivalência
são necessários para o registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) (Brasil,
2010a).
A avaliação da equivalência farmacêutica para formas sólidas consiste na verificação da
adequação quanto às especificações farmacopeicas e no estudo comparativo dos perfis de
dissolução (Storpirtis et al., 2004). O ensaio de dissolução permite avaliar a liberação do princípio
ativo de sua forma farmacêutica e sua solubilização em condições fisiológicas. (Azarmi, Roa &
Löbenberg, 2007).
O estudo comparativo dos perfis de dissolução é realizado com o objetivo de conhecer o
comportamento dos medicamentos de escolha antes de submetê-los a testes de biodisponibilidade
relativa, pois pode indicar a possibilidade de bioequivalência. A comparação dos perfis de
dissolução pode ser avaliada através de métodos modelos dependentes e independentes (Yuksel,
Kanik & Baykara, 2000).
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1270 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
No Método Modelo Independente Simples determina-se o fator de diferença (ƒ1) e o fator
de semelhança (ƒ2) entre dois perfis de dissolução, utilizando tratamentos matemáticos dos
resultados encontrados no teste (Brasil, 2010a). Já os modelos dependentes são baseados em
funções matemáticas para a determinação da cinética da dissolução, tendo como exemplos os
modelos cinéticos de ordem zero, primeira ordem, Higuchi, Hixson-Crowell e Korsmeyer-Peppas
(Costa & Lobo, 2001).
A eficiência de dissolução (ED) é outro modelo utilizado para a comparação entre as
formulações. Esse parâmetro consiste na avaliação integral comparativa da área sob a curva (ASC)
do perfil de dissolução em relação à área representada pelo tempo total de ensaio. A ED apresenta
valores que podem estar mais bem relacionados com o desempenho in vivo, uma vez que a
biodisponibilidade também é determinada pelo cálculo da área sob a curva. Além disso, sabe-se que
em estudos comparativos de perfis de dissolução, a ED é capaz de representar diferenças que não
são detectadas somente pelo modelo independente (Serra & Storpirtis, 2007).
Os testes que asseguram a equivalência farmacêutica dos medicamentos são realizados com
o lote empregado no registro, sendo que vários fatores da rotina produtiva podem impactar nos
resultados obtidos. Problemas de equivalência farmacêutica com lotes de medicamentos do mercado
são observados em diferentes estudos (Rigobelo et al., 2013; Pugens, Donaduzzi & Melo, 2008;
Libinsky, Musis & Machado, 2008; Rodrigues et al., 2006). Assim, o monitoramento, por meio de
testes comparativos, de lotes subsequentemente produzidos e comercializados é importante, pois
pode garantir a qualidade e intercambialidade dos produtos.
De acordo com a ANVISA, para que os medicamentos sejam considerados equivalentes,
devem apresentar a mesma forma farmacêutica, via de administração e princípio ativo. Os
medicamentos também devem cumprir os mesmos requisitos exigidos na monografia individual
descrita na Farmacopeia Brasileira. Além disso, a equivalência farmacêutica pode ser avaliada a
partir do estudo comparativo dos perfis de dissolução. Neste ensaio, utiliza-se o Método Modelo
Independente Simples, no qual o valor do fator de semelhança (f2) deve ser maior que 50 para que
os perfis sejam considerados semelhantes. (Brasil, 2010a).
Este trabalho teve como objetivo realizar um estudo comparativo, por meio das análises
físico-químicas previstas nos compêndios oficiais, e a avaliação dos perfis de dissolução, de
comprimidos de hidroclorotiazida, de diferentes lotes e fornecedores, disponíveis no mercado do
Rio de Janeiro.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1271 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
MATERIAL E MÉTODOS
As análises físico-químicas dos comprimidos foram realizadas a partir de amostras oriundas
do mercado, contendo 25 mg de hidroclorotiazida. O estudo comparativo foi realizado entre um
medicamento de referência, um genérico e um similar, sendo testados dois lotes diferentes de cada
laboratório (R1 e R2, G1 e G2 e S1 e S2). A Substância Química de Referência (SQR), com teor
99,7%, foi obtida da Fiocruz/INCQS (Lote:V2F01). Todo o estudo foi realizado com as amostras
comerciais dentro do prazo de validade.
A qualidade foi verificada pelos testes de peso médio, dureza, friabilidade, desintegração,
doseamento, uniformidade de doses unitárias e dissolução, conforme descrito na Farmacopeia
Brasileira – 5ª edição, volumes 1 e 2.
Peso médio
Para a determinação do peso médio, pesou-se individualmente 20 comprimidos de cada lote
em uma balança analítica (Shimadzu – Modelo: AUY220). Em seguida, determinou-se a média, o
desvio padrão e os limites entre o menor e o maior peso.
Dureza
O teste foi realizado com 10 comprimidos de cada lote, sendo eliminado anteriormente
qualquer resíduo superficial. Utilizou-se um durômetro manual (Nova Ética – Modelo: 298) para
determinar a força necessária para quebrar o comprimido no eixo vertical. Calculou-se a média e o
desvio padrão dos valores obtidos para cada amostra.
Friabilidade
Pesou-se 20 comprimidos de cada lote, os quais foram adicionados em um friabilômetro
(Pharma Test – Modelo: D-63512 Hainburg) e submetidos a 100 rotações durante 4 minutos (25
rpm). Após o término da ação do aparelho, foram removidos os resíduos de pó dos comprimidos e,
em seguida, foram pesados novamente. Determinou-se o percentual de peso perdido a partir da
diferença entre o peso inicial e o peso final.
Desintegração
Foram utilizados 6 comprimidos de cada lote e cada unidade foi colocada em um dos seis
tubos da cesta do desintegrador (Nova Ética – Modelo: 301/AC), com um disco cilíndrico de 20
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1272 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
mm de diâmetro e 9,50 mm de espessura na superfície, utilizando água a 37 ± 1°C como líquido de
imersão. As amostras foram submetidas ao movimento da cesta e à imersão de maneira a observar o
tempo necessário para que os 6 comprimidos se desintegrassem completamente.
Doseamento
Para a avaliação do teor de hidroclorotiazida, pesou-se e pulverizou-se 20 comprimidos de
cada lote. Transferiu-se uma quantidade de pó equivalente a 30 mg de princípio ativo para um balão
volumétrico de 100 mL, adicionou-se 50 mL de solução de hidróxido de sódio 0,1 mol L-1 e, em
seguida, agitou-se durante 20 minutos. Após a agitação, completou-se o volume para 100 mL com o
mesmo solvente, homogeneizou-se e filtrou-se. Na sequência, transferiu-se 5 mL para um balão
volumétrico de 100 mL e diluiu-se com água de maneira a atingir uma concentração de 0,0015%
(p/v). Por fim, determinou-se a absorvância da solução por espectrofotometria de UV em 273 nm
(PerkinElmer – Modelo: Lambda 35 UV/VIS Spectrometer), utilizando água para ajuste do zero. A
concentração foi calculada a partir da curva analítica obtida em água (y = 50,631x - 0,007; r² =
0,9997).
Uniformidade de doses unitárias por variação de peso
Pesou-se 10 comprimidos de cada lote individualmente. A partir do resultado do doseamento
e do peso individual de cada comprimido, estimou-se a quantidade de componente ativo em cada
unidade, considerando distribuição homogênea. Os resultados individuais foram expressos em
porcentagem da quantidade declarada. Em seguida, o Valor de Aceitação (VA) foi calculado de
acordo com a Farmacopeia Brasileira (Brasil, 2010b).
Dissolução
O procedimento para determinação dos perfis de dissolução foi realizado com 6
comprimidos de cada lote, que foram dispostos individualmente em cada aparato tipo cesta do
dissolutor (Nova Ética – Modelo: 299), tendo como meio de dissolução 900 mL de solução de ácido
clorídrico 0,1 mol L-1, em temperatura de 37 ± 0,5 °C. O teste foi realizado de maneira comparativa
nas velocidades de rotação de 100 rpm, de acordo com o método farmacopeico, e de 50 rpm, como
ensaio adicional. Para a obtenção do perfil de dissolução, coletou-se e filtrou-se alíquotas de 5 mL
nos tempos de 5, 10, 15, 20, 30 e 40 minutos. Em seguida, analisou-se todas as amostras em
espectrofotômetro (PerkinElmer – Modelo: Lambda 35 UV/VIS Spectrometer) em 272 nm,
utilizando o mesmo solvente para ajuste do zero. A concentração foi calculada a partir da curva
analítica obtida em ácido clorídrico 0,1 mol L-1 (y = 61,795x + 0,0333; r² = 0,9999).
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1273 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
Os resultados obtidos foram analisados por meio do programa Statistica©, utilizando os
parâmetros comparativos de ƒ1 (fator de diferença) e ƒ2 (fator de semelhança) (Brasil, 2010a),
eficiência de dissolução e modelos cinéticos.
Para a análise a partir do Método Modelo Independente Simples, foram calculados ƒ1 e ƒ2
de acordo com as seguintes equações (Costa & Lobo, 2001):
Onde: n = número de coletas; t = tempo; Rt = quantidade de fármaco liberado do medicamento
referência no tempo t; Tt = quantidade de fármaco liberado do medicamento teste no tempo t.
Como método dependente de avaliação, os resultados do ensaio foram submetidos a cálculos
matemáticos para determinar a cinética de dissolução (Costa & Lobo, 2001). Deste modo, calculou-
se a constante de velocidade (K) e o tempo de dissolução de 50% (t50%), de acordo com a equação
da reta de regressão que melhor definiu o perfil de dissolução.
A eficiência de dissolução (ED) foi calculada a partir dos valores obtidos de área sob a curva
do perfil de dissolução de hidroclorotiazida no intervalo de tempo (t), através do método dos
trapezoides (Khan & Rhodes, 1975). Determinou-se a porcentagem da ED pela razão entre a área
sob a curva no intervalo de tempo de 0 a 30 minutos (ASC0-30minutos) e a área total do retângulo
(ASCTR), definido pela ordenada (100% de dissolução) e pela abcissa (tempo = 30 minutos),
conforme equação abaixo:
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nos ensaios de qualidade realizados, todos os lotes apresentaram resultados semelhantes em
relação ao peso médio e demonstraram baixos valores de desvio padrão. De acordo com a
Farmacopeia Brasileira 5ª edição (Brasil, 2010b), comprimidos não revestidos com peso médio
maior que 80 mg e menor que 250 mg podem apresentar limite de variação de ± 7,5%. Desta forma,
observa-se na Tabela 1 que todas as amostras estão dentro do especificado.
Em relação à friabilidade, os comprimidos das três especialidades farmacêuticas obtiveram
alta resistência a abrasão, pois apresentaram resultados abaixo de 1,5%, como preconizado (Brasil,
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1274 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
2010b), e sem diferenças significativas. O teste é um importante parâmetro a ser avaliado para
garantir a integridade da forma farmacêutica quando submetida a impactos mecânicos gerados pelo
transporte e manuseio das embalagens.
A desintegração está relacionada com a desagregação da forma farmacêutica no organismo,
assim os testes são realizados com o objetivo de determinar o tempo em que o comprimido se
desfaz após ser ingerido via oral. Segundo a Farmacopeia Brasileira (Brasil, 2010b), o tempo
máximo para a desintegração de comprimidos não revestidos é 30 minutos. A desintegração ocorreu
em tempo inferior a 30 minutos para todas as amostras, sendo aprovadas conforme a especificação.
Entretanto, pôde-se verificar que os dois lotes do medicamento similar apresentaram tempo muito
inferior quando comparados ao medicamento de referência, enquanto o medicamento genérico, em
ambos os lotes, apresentou tempo de desintegração superior ao medicamento de referência (Tabela
1).
As diferenças observadas no tempo de desintegração podem ser justificadas pelos tipos de
desintegrantes presentes na composição de cada especialidade. Além dos lubrificantes, o
medicamento de referência e o medicamento genérico apresentam lactose monoidratada, amido de
milho e amido de milho pré-gelatinizado como excipientes. Deste modo, as diferenças nos testes de
desintegração e demais testes, entre o medicamento genérico e o de referência pode ser devido a
diferenças quantitativas entre os componentes. Já o medicamento similar, por sua vez, apresenta
lauril sulfato de sódio, croscarmelose sódica, amidoglicolato de sódio, lactose e celulose
microcristalina. A croscarmelose e o amidoglicolato de sódio apresentam alta eficiência de
desintegração (Pessanha et al., 2012), o que pode justificar o tempo de desintegração muito baixo
observado para este medicamento.
Outro aspecto a ser observado é em relação aos valores de dureza. Os comprimidos do
medicamento similar apresentaram dureza inferior a 30 N, sendo estatisticamente diferentes (p <
0,05) dos medicamentos de referência e genéricos, o que também pode ter impactado nas diferenças
entre os tempos de desintegração.
As análises de teor dos três medicamentos em ambos os seus lotes demonstraram resultados
satisfatórios no teste de doseamento, contendo uma quantidade de fármaco de no mínimo 93% e no
máximo 107% (Brasil, 2010c). Os resultados encontrados para os Valores de Aceitação para a
uniformidade de doses unitárias por variação de peso são observados na Tabela 1. Nota-se que todas
as amostras de hidroclorotiazida cumpriram com a especificação (Brasil, 2010b), pois apresentaram
VA menores que 15 (L1 - valor máximo permitido para o valor de aceitação).
No ensaio de dissolução, a Farmacopeia Brasileira (Brasil, 2010c) determina na monografia
de comprimidos de hidroclorotiazida que a porcentagem de fármaco dissolvida deve ser superior a
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1275 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
60% em 30 minutos. Dessa maneira, todas as amostras atenderam à especificação descrita na
literatura em ambas as velocidades de dissolução testadas, embora o medicamento similar tenha
apresentado percentual de dissolução bastante inferior em relação aos medicamentos de referência e
genérico.
Tabela 1: Resultados encontrados nos testes físicos e físico-químicos dos comprimidos de
hidroclorotiazida.
*Média ± desvio padrão **R1 e R2 = medicamento de referência lote 1 e lote 2; S1 e S2 = medicamento similar lote 1 e lote 2; G1 e
G2 = medicamento genérico lote 1 e lote 2
O impacto das diferenças encontradas nos testes físicos entre as três especialidades
farmacêuticas foi avaliado a partir da comparação dos perfis de dissolução (Brasil, 2010a). Na
velocidade de 50 rpm, demonstrado na Figura 1, as curvas do perfil do medicamento similar, tanto
no lote 1 quanto no lote 2, são as que mais se afastam das curvas do medicamento referência. Essa
diferença também ocorreu ao se realizar a dissolução na velocidade de 100 rpm (Figura 2).
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1276 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
Figura 1: Comparação dos perfis de dissolução dos medicamentos de referência (R1 e R2),
genérico (G1 e G2) e similar (S1 e S2) de hidroclorotiazida na velocidade de 50 rpm.
Figura 2: Comparação dos perfis de dissolução dos medicamentos de referência (R1 e R2),
genérico (G1 e G2) e similar (S1 e S2) de hidroclorotiazida na velocidade de 100 rpm.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1277 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
Os resultados da dissolução foram analisados pelo Método Modelo Independente Simples,
determinando-se o fator de diferença (ƒ1) e o fator de semelhança (ƒ2) entre dois perfis de
dissolução. Para que os perfis sejam considerados semelhantes e haja equivalência farmacêutica das
demais especialidades com o medicamento de referência, ƒ1 deve ser menor que 15 (0-15) e ƒ2
maior que 50 (50-100).
O modelo independente demonstrou que apenas o medicamento similar, em ambos os lotes e
nas duas velocidades de dissolução, apresentou perfis diferentes do medicamento referência, uma
vez que o fator de diferença (ƒ1) foi maior do que 15, e o fator de semelhança (ƒ2) menor que 50,
enquanto o medicamento genérico apresentou valores dentro do preconizado, como pode ser
observado na Tabela 2.
Tabela 2: Valores de ƒ1 e ƒ2 dos comprimidos de hidroclorotiazida em velocidade de 50 rpm e 100
rpm.
Produto** 50 rpm 100 rpm
ƒ1 ƒ2 ƒ1 ƒ2
S1 x R1 22,35* 37,46* 22,02* 36,21*
S2 x R1 13,47 47,59* 24,60* 33,88*
G1 x R1 8,07 61,91 11,10 50,22
G2 x R1 7,09 62,93 8,48 52,30
S1 x R2 25,95* 34,53* 21,12* 36,38*
S2 x R2 17,46* 43,09* 23,73* 34,09*
G1 x R2 10,41 56,13 10,07 52,08
G2 x R2 9,45 58,57 7,43 58,58
*Valores fora da especificação
**R1 e R2 = medicamento de referência lote 1 e lote 2; S1 e S2 = medicamento similar lote
1 e lote 2; G1 e G2 = medicamento genérico lote 1 e lote 2
Para a avaliação do método dependente, realizou-se a linearização do perfil de dissolução
dos medicamentos de hidroclorotiazida obtendo a constante de liberação (K) e o coeficiente de
determinação (r²) de cada amostra, em ambas as velocidades, seguindo os modelos de Ordem zero,
Primeira ordem, Higuchi e Hixson-Crowell. De acordo com os resultados da Tabela 3, observa-se
que os comprimidos do medicamento de referência e genérico apresentaram cinética de liberação
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1278 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
mais próxima do modelo Hixson-Crowell, com exceção do lote 2 do medicamento genérico em 100
rpm, que apresentou cinética melhor representada pelo modelo de Higuchi. Em concordância com
os valores de f1 e f2, esse método também encontrou uma diferença entre os medicamentos
similares e os de referência, uma vez que os similares apresentaram o modelo de Higuchi como
predominante.
Tabela 3: Constante de liberação (K) e coeficiente de determinação (r²) obtidos a partir do perfil de
dissolução dos comprimidos de hidroclorotiazida nas velocidades de 50 e 100 rpm.
Ordem zero Primeira ordem Higuchi Hixson-Crowell
50 rpm
Produto** Ko r² K1 r² KH r² KS r²
S1 1,009 0,945 0,019 0,884 8,986 0,991* -0,026 0,976
S2 1,445 0,931 0,027 0,866 11,550 0,982* -0,039 0,970
R1 2,922 0,993 0,054 0,962 19,650 0,999 -0,081 0,999*
R2 3,337 0,972 0,064 0,915 22,640 0,995 -0,094 0,997*
G1 3,113 0,985 0,067 0,939 21,000 0,997 -0,078 0,998*
G2 3,296 0,971 0,073 0,908 22,360 0,994 -0,083 0,993*
100
rpm
S1 1,461 0,952 0,024 0,904 11,600 0,992* -0,044 0,987
S2 1,490 0,963 0,025 0,922 11,780 0,994* -0,043 0,989
R1 2,522 0,981 0,034 0,962 17,02 0,994 -0,106 0,996*
R2 3,139 0,954 0,045 0,913 21,39 0,986 -0,129 0,998*
G1 2,036 0,937 0,03 0,866 16,25 0,986 -0,082 0,998*
G2 3,397 0,913 0,057 0,87 23,3 0,956* -0,111 0,947
*Melhor modelo cinético
**R1 e R2 = medicamento de referência lote 1 e lote 2; S1 e S2 = medicamento similar lote 1 e lote 2; G1 e
G2 = medicamento genérico lote 1 e lote 2
Na Tabela 4, estão descritos os valores de ED e o tempo de dissolução de 50% (t50%), que
foram calculados a partir da equação da reta de regressão que melhor definiu o perfil de dissolução
de cada medicamento e em cada velocidade. Ambos os resultados foram submetidos à análise de
variância (ANOVA) e ao teste de Tukey para comparar as diferenças entre as médias obtidas, onde
valores p < 0,05 diferem estatisticamente.
Em relação ao t50% e à ED, observou-se resultados diferentes dependendo da velocidade de
rotação do aparato. Em 100 rpm, analisando t50%, pode-se observar que os medicamentos similares
foram estatisticamente diferentes dos medicamentos de referência, enquanto os lotes dos
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1279 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
medicamentos genéricos foram semelhantes apenas aos medicamentos de referência do lote 2. Os
resultados de ED, nesta mesma velocidade, demonstraram que o lote 1 do medicamento genérico foi
estatisticamente diferente dos dois lotes do medicamento de referência e o lote 2 do genérico foi
estatisticamente diferente apenas do lote 1 do medicamento de referência.
A redução da velocidade de rotação reduz a velocidade de dissolução e esse efeito, analisado
pela comparação de ED, fez o perfil do medicamento similar do lote 2 se aproximar do perfil de
ambos os lotes do medicamento genérico sem, no entanto, permitir a igualdade com o medicamento
de referência. Na análise de t50%, os perfis de ambos os lotes do medicamento similar se
aproximaram dos perfis dos lotes do genérico sendo que, neste caso, o perfil do lote 2 do similar
também se aproximou do lote 1 do medicamento de referência.
Outros estudos também avaliaram a equivalência de diversos medicamentos genéricos,
similares e de referência. Comprimidos genéricos e similares de diclofenaco de sódio e de dipirona
sódica disponíveis no mercado não foram considerados equivalentes ao medicamento de referência
na análise dos fatores f1 e f2 (Kohler et al., 2009; Castro et al., 2005). Do mesmo modo, no estudo
de Rodrigues e colaboradores (2006) também não se observou equivalência de comprimidos de
propranolol genérico e similar após avaliação da dissolução, utilizando, além da análise de f1 e f2, a
comparação de ED.
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1280 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
Rigobello e colaboradores (2013) avaliaram a qualidade e o perfil de dissolução de
comprimidos de cloridrato de propranolol, sendo dois lotes distintos de cada especialidade
farmacêutica. Neste estudo, a ED também encontrou diferença entre os lotes do mesmo
medicamento como, por exemplo, o perfil de dissolução dos similares que, quando comparados com
o medicamento de referência do lote 1, foram estatisticamente diferentes, enquanto não se
mostraram estatisticamente diferentes ao lote 2. No estudo de Aguiar e colaboradores (2005), a
avaliação de lotes diferentes de comprimidos de referência (R1 e R2) e testes (T1 e T2) de
doxiciclina demonstrou, pela comparação de ED, que T2 foi estatisticamente diferente de R1, R2 e
T1, e ainda, que T1 foi estatisticamente diferente de R1.
Mahle e colaboradores (2007) avaliaram a equivalência farmacêutica também entre
comprimidos de hidroclorotiazida genéricos, similares e de referência disponíveis no mercado,
quando compararam o perfil de dissolução por meio de f1 e f2, e todos os medicamentos foram
aprovados. No entanto, as análises comparativas de ED demonstraram que o similar e um dos
genéricos avaliados foram estatisticamente diferentes do medicamento de referência. Em relação ao
Q45 (quantidade dissolvida em 45 min), apenas o similar diferiu-se significativamente do
medicamento de referência, enquanto que em t50%, todos os medicamentos foram diferentes. Em
outro estudo com comprimidos de hidroclorotiziada, foi observado que o medicamento genérico
não foi equivalente ao medicamento de referência. Isso foi atribuído a diferenças dos excipientes da
formulação dos medicamentos, tendo em vista que em conjunto com os ensaios preconizados para
equivalência farmacêutica, foi também realizado o ensaio de calorimetria diferencial de varredura
no qual se identificou uma incompatibilidade entre um excipiente presente no medicamento
genérico e o fármaco (Oliveira et al., 2014)
O não cumprimento das especificações farmacopeicas e as diferenças nos perfis de
dissolução de medicamentos genéricos, similares ou de referência, de lotes distintos e disponíveis
no mercado, apontam para uma necessidade de melhoria dos métodos e critérios de aprovação de
lote de todas as especialidades farmacêuticas para que as variáveis do processo produtivo possam
ser correlacionadas com a eficiência terapêutica.
Segundo a Lei 9787/99 do Ministério da Saúde (Brasil, 1999), o medicamento genérico,
sendo comprovada a sua eficácia, segurança e qualidade, pretende ser intercambiável com o
medicamento de referência. A ANVISA instituiu que, a partir de janeiro de 2015, todos os
medicamentos similares devem apresentar estudos de bioequivalência, de modo a também serem
considerados intercambiáveis com os medicamentos de referência (Brasil, 2014). Essas medidas
visam garantir que os medicamentos oferecidos à população apresentem a comprovação sobre as
mesmas especificações farmacoterapêuticas para o registro dos novos medicamentos.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1281 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
Os medicamentos similares, que apresentam as inconformidades mais frequentes nos
estudos comparativos realizados, representam a principal fonte de acesso a medicamentos no setor
público brasileiro. Conforme observado por Miranda e colaboradores (2009), os medicamentos
genéricos nas cinco regiões brasileiras apresentaram disponibilidade inferior a 10%, em relação aos
similares, em 71,4% dos medicamentos analisados. A avaliação associativa desses dados leva à
suposição de geração de grande impacto na saúde pública como resultado do uso desses
medicamentos e corrobora a importância da avaliação periódica para verificação da qualidade e
equivalência farmacêutica dos medicamentos disponíveis à população.
Portanto, o monitoramento constante da equivalência de produtos farmacêuticos
comercializados é uma medida que visa controlar a qualidade dos medicamentos do mercado. A
detecção de inconformidades entre os objetos de estudo pode ser um indicativo de diferenças
significativas na terapêutica dos pacientes, uma vez que a bioequivalência pode ser afetada por
essas falhas. A verificação de alterações no perfil de dissolução dos fármacos, por exemplo, pode
estar associada a uma concentração plasmática insuficiente para a geração dos efeitos terapêuticos.
Concentrações plasmáticas baixas do fármaco, decorrentes da alteração físico-química apresentada
podem fazer com que o tratamento esteja em uma faixa subterapêutica para a ação farmacológica,
proporcionando prejuízo aos resultados esperados.
CONCLUSÃO
Os resultados encontrados neste estudo permitem concluir que o medicamento similar de
hidroclorotiazida, obtido no mercado do RJ, é estatisticamente diferente do medicamento de
referência, pois foram encontradas grandes diferenças em todos os parâmetros analisados a partir do
teste de dissolução comparativa. Além disso, os testes físicos demonstraram diferenças
consideráveis dessa especialidade em relação aos medicamentos de referência e genérico.
De acordo com a avaliação realizada pela ANVISA, a comparação dos perfis de dissolução é
feita apenas por meio do Método Modelo Independente Simples. Deste modo, o medicamento
genérico estudado apresentou equivalência farmacêutica com o medicamento de referência, visto
que seus valores de f1 e f2 foram aprovados. Entretanto, a análise dos outros parâmetros do perfil de
dissolução demonstrou algumas diferenças entre o medicamento genérico e o de referência,
inclusive em relação a lotes diferentes do medicamento de referência. Essas observações indicam a
necessidade de aprofundamento de estudos sobre os critérios de comparação empregados e um
monitoramento periódico da qualidade dos medicamentos comercializados para garantir a
intercambialidade terapêutica.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1282 Correia, L. F. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1266 – 1284, 2015
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ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
Dislipidemias em usuárias de anticoncepcionais orais
Dyslipidemia in oral contraceptive pill users
Kisnielly Lacerda Alves de Moura1, Diego Uchoa Viana1, Luana Lucena Ramalho1, Emanuela
Machado Silva Saraiva2, Fernando Figueredo Gomes3 & Natalia Bitu Pinto 4*
1 Discente do Curso de Pós-Graduação de Análises Clínicas da Faculdade Leão Sampaio.
2 Mestranda em Ciências da Saúde pela FMABC.
3 Mestre em Bioprospecção molecular pela Universidade Regional do Cariri (URCA) 4 Doutora em Farmacologia pela Universidade Federal do Ceará. Autor correspondente: Natalia Bitú Pinto - Faculdade de Medicina Estacio Juazeiro do Norte (ESTACIO/FMJ). Av.
Tenente Raimundo Rocha, 515 – Cidade Universitária – Juazeiro do Norte – Ceará – CEP: 63.048-080
Tel./Fax: (88) 3572-7817 ou (88)97142726 CNPJ: 02.608.755/0031-14
EMAIL: [email protected]
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1286 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
RESUMO
O uso de anticoncepcionais orais (ACO) é um importante fator de risco para o desenvolvimento de
dislipidemias, e essa pode ocasionar o aparecimento de doenças cardiovasculares (DCVs), como a
aterosclerose. Sendo assim, a dislipidemia é considerada um grande problema de saúde pública. O
objetivo desse estudo foi investigar o aparecimento de dislipidemias em usuárias de anticoncepcionais
orais atendidas em unidades básicas de saúde. Foi realizado um estudo de natureza aplicativa, de
campo, com objetivo exploratório-descritivo, e abordagem quali-quantitativa. A amostra foi
composta por 35 mulheres com idade entre 20 e 38 anos. Do total das usuárias, 54,3% apresentaram
dislipidemia, sendo a maior parte decorrente da diminuição de HDL-C associada ao aumento de TG.
O tempo de uso do contraceptivo foi maior que 6 anos em 52,0% das usuárias, e 88,6% afirmaram
que a indicação foi realizada por um médico. O sedentarismo estava presente em 22,0% das mulheres
analisadas e 8,3% mantinham o hábito de fumar. Diante dos resultados obtidos, verifica-se a
importância de analisar o perfil lipídico em usuárias de ACOs como medida de prevenção, e orientar
essas mulheres a adotarem estilo de vida mais saudável, com a finalidade de reduzir o
desenvolvimento de DCVs.
Palavras-chave: Anticoncepcionais orais, Aterosclerose, Dislipidemias, Doenças Cardiovasculares.
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1287 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
ABSTRACT
The use of oral contraceptives (OCP) is a major risk factor for the development of dyslipidemia, and
this can cause the appearance of cardiovascular diseases (CVD), such as atherosclerosis. Thus,
dyslipidemia is considered a major public health problem. This study aims to investigate the
occurrence of dyslipidemia in users of oral contraceptive pill assisted at primary health care units,
for this, an applied field study was conducted, exploratory and descriptive purpose, qualitative and
quantitative approach. The sample consisted of 35 women aged 20 to 38 years. Of the total users,
54.3% had dyslipidemia, with most due to lower HDL-C associated with increased TG. The
contraceptive use was greater than 6 years in 52.0% of users, and 88.6% reported that the indication
of OCPs was made by a doctor. Sedentary lifestyle was present in 22.0% of the analyzed women and
8.3% had the habit of smoking. Based on the results, this study evidences the importance of the lipid
profile analysis in patients of OCPs as prevention, and to guide these patients to adopt a healthier
lifestyle, in order to reduce the development of CVDs.
Keywords: Oral Contraceptive Pill, Atherosclerosis, Dyslipidemia, Cardiovascular Diseases.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1288 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
INTRODUÇÃO
A Dislipidemia é um quadro clínico que está relacionado com alterações nos níveis séricos de
colesterol e/ou triglicérideos repercurtindo sobre as lipoproteínas plasmáticas (Santos et al., 2015).
Ela pode ocasionar o aparecimento de doenças cardiovasculares (DCVs), como a aterosclerose
(Moreira et al., 2006) e eventos cardiovasculares importantes induzidas por ela, como acidente
vascular encefálico (AVE) e infarto agudo do miocárdio (Ketelheth & Bäck, 2011).
A aterosclerose (AS) é uma doença degenerativa crônica, de lenta progressão, que acomete as
artérias de grande e médio calibre, causando lesões chamadas de ateromas. A AS tem inicio na
infância e sua evolução intercala com períodos de atividade e de repouso (Martelli, 2014), podendo
progredir para uma estenose significativa (Almeida & Dias, 2008).
De acordo com o Conselho Federal de Medicina (2013), morrem por ano no Brasil, mais de
320 mil pessoas vítimas de DCVs, sendo a dislipidemia um dos mais importantes fatores para o
desenvolvimento dessas doenças. O alto índice colocou o Brasil entre os 10 países com maior número
de mortes por DCVs (Brasil, 2012), ocasionando alta frequência de internações, que proporcionam
custos médicos e socioeconômicos elevados.
Do ponto de vista fisiológico os triglicérides (TG) e o colesterol (CT) estão entre os lipídios
mais importantes biologicamente (Sociedade Brasileira de Cardiologia, 2013). Por serem substâncias
lipossolúveis, as lipoproteínas plasmáticas são responsáveis pelo transporte de lipídios no plasma.
Com base na heterogenicidade da forma, tamanho, composição e função, as lipoproteínas são
divididas em classes: lipoproteínas de densidade muito baixa (VLDL-C), lipoproteínas de densidade
intermediária (IDL-C), lipoproteínas de baixa densidade (LDL-C) e lipoproteínas de alta densidade
(HDL-C) (Daniels et al., 2009).
O aumento do CT é considerado um importante fator preditivo para o desenvolvimento da
aterosclerose, sendo o LDL-C responsável pelo transporte de 70% do colesterol plasmático. Assim,
a redução dos níveis de CT, principalmente nos níveis de LDL-C, são fatores determinantes para a
redução de doenças cardiovasculares. Já o aumento do HDL-C está relacionado com um efeito
protetor, que desfavorece o aparecimento da aterosclerose. Níveis inferiores a 40mg/dL de HDL-C é
considerado um fator de risco para DCVs, principalmente em mulheres (Sociedade Brasileira de
Cardiologia, 2013).
O aparecimento de dislipidemias pode ser determinado pela avaliação laboratórial do perfil
lipidico. Laboratoriamente, de acordo com a V Diretrizes Brasileiras sobre Dislipidemias e Diretrizes
de Prevenção da Aterosclerose (Sociedade Brasileira de Cardiologia, 2013), a dislipidemia pode ser
classificada como: hipercolesterolemia isolada - ocorre devido o aumento isolado de LDL-C;
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1289 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
hipertrigliceridemia isolada - há um aumento isolado de triglicerídio, refletindo nas lipoproteinas ricas
em TG (VLDL-C e quilomicróns); hiperlipidemia mista - ocasionada devido o aumento da LDL-C e
TG. Em casos do TG ≥ 400mg/dL, deve-se considerar a hiperlipidemia mista quando o CT ≥
200mg/dL; HDL-C baixo - há uma redução do HDL-C isolado ou em associação com o aumento de
LDL-C ou de TG.
Diversos são os fatores que podem ocasionar o desenvolvimento das dislipidemias, tais como:
genética (etiologia primária), hábitos de vida inadequados (dieta, tabagismo, sedentarismo, consumo
de álcool), doenças (obesidade, diabetes mellitus, síndrome dos ovários policísticos, hipotireoidismo),
e pelo uso de medicamentos, como os anticoncepcionais orais (Moreira et al., 2010; Sociedade
Brasileira de Cardiologia, 2007; Mendes et al., 2006; Lachtermacher, 2004).
Os anticoncepcionais orais (ACO) ou contraceptivos orais (CO) são bastante utilizados como
método contraceptivo de escolha entre as mulheres. De acordo com Sheehy (2010), mais de 100
milhões de mulheres em idade fértil no mundo, fazem uso desse método contraceptivo.
Os ACOs são fármacos compostos de progestogênios (progesterona), associados ou não a
estrogênios. Assim, a contracepção oral pode ser realizada através de dois métodos: com a utilização
de ACOs combinados (estrogênio + progestogênio), ou pelo uso de ACOs contendo apenas
progestogênio, denominadas de minipílulas (Organização Mundial de Saúde, 2007). Os ACOs atuam
através de mecanismo de feedback negativo para prevenir a ovulação e/ou implantação do óvulo
(Costa, 2011). O estrogênio inibe a secreção do FSH (hormônio folículo estimulante), e o
progestogênio inibe a secreção do LH (hormônio luteinizante), prevenindo a ovulação.
Em estudos realizados, o uso de ACO tem sido apontado como fator de risco que pode
ocasionar o desenvolvimento de DCVs (Sandie et al., 2010). As doses elevadas de esteroides
aumentam a incidência de DCVs, como AVE, infarto agudo do miocárdio e aterosclerose (Esteves,
2011). Estudos também mostram que o risco de desenvolvimento de trombose venosa e arterial
aumenta com o uso de ACOs combinados, sendo que este risco é mais acentuado no primeiro ano de
uso,e que aumenta em duas vezes quando o progestogênio utilizado pertence à terceira geração
(Vieira, 2004). Segundo Bousser e Kittner (2000), o risco de morte por AVE dobra com o uso
continuo dessas pílulas, sendo que possui um risco menor aquelas que apresentam uma dose hormonal
mais baixa.
No Brasil ainda são escassos os estudos que visam analisar o aparecimento de dislipidemias
em mulheres que fazem uso de ACOs. Dessa forma, este trabalho é importante, pois o uso desse
medicamento é frequente, e esse pode desencadear o aparecimento das dislipidemias e
consequentemente de DCVs. Sabendo disso, este trabalho teve como objetivo investigar o
aparecimento de dislipidemias em usuárias de anticoncepcionais orais atendidas em unidades básicas
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1290 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
de saúde, a fim de diagnosticar precocemente esta doença, evitando suas complicações, melhorando
assim, a qualidade de vida das pacientes.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa de natureza do tipo aplicada, com objetivo descritivo e exploratório.
Com relação ao procedimento técnico a pesquisa realizada foi de campo e os dados foram abordados
de forma qualitativa e quantitativa. A pesquisa foi realizada em duas Unidades Básicas de Saúde
(UBSs), ambas na zona urbana da cidade de Brejo Santo no interior do estado do Ceará. Possui uma
população com 45.193 habitantes e uma área territorial de 663, 428 km², de acordo com os dados
extraídos do censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2010). A escolha do
local aconteceu em virtude da facilidade de acesso e a disponibilidade dos profissionais das UBSs.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade Santa Maria,
Cajazeiras/PB, conforme parecer número 374.385. A amostra não probabilística foi composta pelas
voluntárias das UBSs, sendo critério de inclusão fazer uso de anticoncepcional oral e aceitar participar
da entrevista respondendo ao formulário adaptado e realizar exames laboratoriais. As participantes
assinaram o Termo de Consentimento e Livre Esclarecimento.
A população em estudo foi composta por 35 usuárias de anticoncepcional oral, com idade
entre 20 e 38 anos. O instrumento para coleta de dados foi um questionário com perguntas
estruturadas de forma objetiva e subjetiva, elaborada e adaptada aos objetivos do presente estudo. Os
questionários foram aplicados durante o mês de setembro de 2013. Após o preenchimento do
questionário, as pacientes foram submetidas à realização de testes laboratoriais de colesterol total,
triglicerídeos, HDL-C, LDL-C e VLDL-C, no laboratório do município de Brejo Santo-CE, e os
resultados foram registrados no questionário de cada paciente. Todas as participantes relataram que
cumpriram jejum de 12 a 14 horas antes da coleta de sangue para a determinação do perfil lipídico.
O kit da LABTEST® foi utilizado para a realização das dosagens, sendo que para pacientes com valor
do TG menor que 400mg/dL, os valores de LDL-C e VLDL-c foram obtidos pela fórmula de
Friedewald (CT – HDL-C – TG/5 = LDL-C), onde o valor de VLDL-C é representado pela fração
TG/5. Para determinar se as pacientes apresentavam ou não dislipidemias foram adotados pontos de
cortes de acordo com os valores de referência estabelecidos de V Diretrizes Brasileiras sobre
Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose do Departamento de Aterosclerose da Sociedade
Brasileira de Cardiologia (2013) (Quadro 1).
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1291 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
Quadro 1 - Pontos de corte utilizados de acordo com as metas estabelecidas para a classificação de
dislipidemias
LIPÍDEOS
(mg/dL)
SEM
DISLIPIDEMIAS
COM
DISLIPIDEMIAS
TG < 150 ≥ 150
HDL-C para
mulheres ≥ 50 < 50
LDL-C < 160 ≥ 160
CT* < 200 ≥ 200
CT, colesterol total; TG, triglicerídeos; HDL-C, lipoproteína de alta densidade. LDL-C, lipoproteína
de baixa densidade.
* Utilizado, apenas, quando os triglicerídeos estiverem acima de 400 mg/dL.
Fonte: adaptado de Sociedade Brasileira de Cardiologia, 2013.
Os valores foram tratados e expostos através de planilhas no Microsoft Office Excel. Através
da análise das informações, os resultados obtidos foram interpretados de acordo com a literatura
pertinente e temática.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O presente estudo teve sua amostra composta por 35 mulheres usuárias de anticoncepcionais
orais com idade entre 20 e 38 anos (idade média 29,5 anos), sendo que a maioria encontra-se entre a
faixa etária de 32 a 38 anos (40,0%).
Analisar a idade dessas pacientes é de suma importância, pois o uso de ACOs, assim como
uma idade mais avançada são associados na literatura como indicadores de risco das DCVs (Moreira
et al., 2010; Coelho et al., 2005). O uso de ACO é o método contraceptivo reversível mais utilizado
entre as mulheres, no mundo mais de 100 milhões delas em idade reprodutiva utilizam esse método
(Sheehy, 2010).
O nível de escolaridade variou do Ensino fundamental incompleto (5,7%) a pós-graduado
(14,3%), com predomínio para o Ensino Médio completo, com 25,7%. Em relação à ocupação, 27,0%
são funcionários públicos. Isto implica que a maioria trabalha em torno de 40 horas semanais, o que
dificulta o cuidado com a saúde, pois o tempo livre para a realização de atividades físicas é pequeno,
associado a isso temos a prática de alimentação menos saudável, fatores que favorecem o
aparecimento de DCVs.
Em relação às concentrações dos níveis lipídios das 35 participantes analisadas, o Gráfico 1
mostra a prevalência de CT, TG, HDL-C, LDL-C e VLDL-C obtidos conforme os parâmetros que
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1292 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
indicam valores de referência para a classificação de dislipidemias. Podemos observar o aumento do
CT, TG e VLDL-C em 29,0%, 20,0% e 20,0% das usuárias respectivamente e uma redução nos níveis
de HDL-C em 51,0% das usuárias. Os níveis de LDL-C foram favoráveis na maioria das usuárias.
Gráfico 1 - Percentual das concentrações do perfil lipídico das usuárias de ACOs quanto às metas
estabelecidas para a classificação de dislipidemias
CT, colesterol total; TG, triglicerídeos; HDL-C, lipoproteína de alta densidade. LDL-C, lipoproteína
de baixa densidade; VLDL-C, lipoproteína de densidade muito baixa.
Estudos vêm corroborar com os dados apresentados neste trabalho, onde em um estudo
realizado por Coelho et al. (2005), nas mulheres que faziam uso de ACO (50,6%) constatou-se um
aumento significativo nos níveis de CT, LDL-C, VLDL-C e TG e valores reduzidos nas não usuárias.
Em um estudo realizado por Berenson et al. (2009), usuárias de ACOs apresentaram aumento nos
níveis de TG, CT, VLDL-C.
Pesquisas mostram que a administração prolongada das pílulas contraceptivas causa
alterações nas concentrações lipídicas no plasma sanguíneo, causando dislipidemias (Kim & Park,
2012). Ribeiro (2013) afirma que o descontrole no perfil lipídico impacta na aterosclerose e na
diminuição da sobrevida. O risco de morte por problemas cardiovasculares como AVE, dobra com o
uso prolongada dos contracepticos (Bousser & Kittner, 2000). Em um estudo realizado por Moreira
et al. (2010) com pacientes que sobreviveram ao AVE, 47,1% eram mulheres, e destas 14,5% faziam
uso de ACO.
Quando analisamos individualmente os índices lipídicos de cada paciente para classifica-lo
como dislipidêmico ou não dislipidêmico, observamos que 54,3% delas apresentam algum tipo de
dislipidemias, como mostra o Gráfico 2. Assim, os resultados encontrados demonstram uma
71,0%80,0%
49,0%
97,0%
80,0%
29,0%20,0%
51,0%
3,0%
20,0%
0,0%
20,0%
40,0%
60,0%
80,0%
100,0%
120,0%
CT TG HDL-C para
mulheres
LDL- C VLDL-C
Não Alterado Alterado
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1293 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
problemática na saúde dessas mulheres, já que estas encontram-se pré-dispostas a desenvolverem
DCVs.
Gráfico 2 - Percentual das usuárias de ACOs que se encontra com e sem dislipidemias
Em mulheres jovens que usam contraceptivo oral, estudos apontam a ocorrência de alterações
no metabolismo lipídico, sendo essas relacionadas às dosagens de estrogênio e progestogênio
(Schueller et al., 2006). Além disso, o etinilestradiol causa alterações na cascata de coagulação,
aumentando os seguintes fatores: fibrinogênio, VII, VIII, IX, X, XII e XIII, e aumentando a geração
de trombina (Rosendaal, 2003). Este fato ajuda no desenvolvimento de eventos tromboembólicos
venosos e arteriais.
Lidegaard et al. (2009) verificou em seu estudo que, 49,0% das mulheres com
tromboembolismo venoso usavam ACOs, e obtiveram o dobro do risco absoluto em comparação as
mulheres que não usavam (6,2 contra 3,1 por 10.000 mulheres por ano).
Nesse estudo das 54,3% das mulheres que apresentaram dislipidemias, 94,7% delas possuem
dislipidemias classificada como HDL-C baixo e 5,3% classificada como hiperlipidemia mista, como
mostra o Gráfico 3. Não houve mulheres com hipercolesterolemia isolada, nem hipertrigliceridemia
isolada.
45,7%
54,3%
40,00%
42,00%
44,00%
46,00%
48,00%
50,00%
52,00%
54,00%
56,00%
Sem Dislipidemia Com Dislipidemias
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1294 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
Gráfico 3 - Classificação laboratorial das dislipidemias apresentadas pelas usuárias de ACOs
O maior índice da classificação de HDL-C baixo foi resultante do aumento e diminuição do
TG e HDL-C, respectivamente. O aumento nos níveis de TG também foi encontrado em outros
estudos, e segundo Lidegaard et al. (2012) isto está associado ao uso de ACOs. A mortalidade
ocasionada por DCVs prevalece nas mulheres, e este fato é favorecido devido a um dos fatores que
desencadeia essas doenças: o uso de anticoncepcionais orais (Steffens, 2003). O risco de
desenvolvimento de dislipidemias aumenta significativamente com o uso prolongado desse
medicamento.
No estudo de Kim e Park (2012), observou-se uma elevação dos níveis de HDL-C, resultado
que se mostra contrario ao nosso estudo. Nesse caso, o tipo de anticoncepcional pode interferir no
perfil lipídico por sua influência nos níveis de diferentes hormônios, como estrógeno e progesterona,
assim como seu tempo de uso (52,0% das usuárias analisadas fazem uso de ACO por mais de 6 anos).
Além disso, essa diferença nos resultados pode estar relacionada a fatores como etnia, já que o estudo
de Kim e Park (2012) foi composto por mulheres coreanas.
É importante que essas pacientes façam acompanhamento médico e farmacêutico para o
monitoramento do perfil lipídico. Vale ressaltar que muitas mulheres recebem a prescrição de ACOs
independente da avaliação do seu perfil lipídico. A Organização Mundial de Saúde (OMS) não
considera a dislipidemia como uma contraindicação para o uso de ACOs, porém a partir deste
diagnóstico deve-se ter mais cautela na hora da prescrição desse medicamento.
Das pacientes analisadas 88,6% teve a indicação do ACO realizada pelo médico, 5,7% por
enfermeiros e 5,7% por amigo ou vizinho. Isto mostra um dado satisfatório, porém é importante que
94,7%
5,3%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%
80,0%
90,0%
100,0%
HDL-C baixo Hiperlipidemia mista
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1295 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
além da indicação, as pacientes frequentem periodicamente um sistema de saúde para avaliação dos
índices lipídicos para prevenir o aparecimento de dislipidemias e complicações decorrentes.
Os anticoncepcionais orais são divididos em dois grupos: os ACOs combinados (estrogênio +
progestogênio) e as minipílulas (contém apenas progestogênio). Das usuárias, 94,2% utilizam ACOs
combinados e apenas 5,8% usam minipílulas (Norestin® e Juliet®). No Quadro 2 encontram-se os
anticoncepcionais orais usados pelas pacientes. Todos eles são monofásicos, isto é, todos os
comprimidos ativos têm a mesma composição e dose de progestogênio e estrogênio, e são
considerados de baixa dosagem em relação ao nível de etinilestradiol (valor menor ou igual a 0,035
mg). Os ACOs com doses mais baixas de estrogênio estão relacionados ao aparecimento de menos
efeitos colaterais do que aqueles com doses mais elevadas.
Quadro 2 - Frequência e percentual dos ACOs utilizados pelas participantes, com seus respectivos
princípios ativos
NOME COMERCIAL PRINCIPIO ATIVO/DOSAGEM PERCENTUAL
Adolles® Etinilestradiol 0,015 mg
Gestodeno 0,06 mg
2,9%
Level® Etinilestradiol 0,02 mg
Levonogestrel 0,10 mg
2,9%
Femina®; Primera 20® Etinilestradiol 0,02 mg
Desogestrel 0,15 mg
5,7%
Alestra 20®; Previane® Etinilestradiol 0,02 mg
Gestodenol 0,75 mg
5,7%
Ciclo 21®; Clicofemme®;
Gestrilan®; Microvlar®
Etinilestradiol 0,03 mg
Levonorgestrel 0,15 mg
42,8%
Primera 30® Etinilestradiol 0,03 mg
Desogestrel 0,15 mg
2,9%
Fertnon®; Gestinol 28®;
Tâmisa 30®
Etinilestradiol 0,03 mg
Gestodeno 0,075 mg
2,9%
Belara® Etinilestradiol 0,03 mg
Acetato de Cloromadinona 2 mg
8,5%
Elani Ciclo®; Elani Ciclo 28®;
Yasmin®
Etinilestradiol 0,03 mg
Drospirenona 3 mg
8,5%
Artemides 35®; Diane 35®;
Selene®
Etinilestradiol 0,035 mg
Acetato de Ciproterona 2,0 mg
11,4%
Norestin® Noretisterona 0,35 mg 2,9%
Juliet® Desogestrel 0,075 mg 2,9%
TOTAL 100%
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1296 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
Com relação ao progestogênio presente, os ACOs são classificados em 1º, 2º, 3º e 4º geração.
Das usuárias analisadas, 45,7% usam ACOs de 2º geração, 28,4% de 4º geração, 23,0% de 3 º geração
e 2,9% de 1º geração. Esta classificação está relacionada ao grau de aparecimento de efeitos
indesejáveis. Castelli (1999) diz que o uso de ACOs de 3º geração aumenta o índice de
tromboembolismo e Vieira (2004) completa afirmando que esse risco aumenta duas vezes com o uso
de ACOs de 3º geração. Das pacientes, 23,0% usam ACOs de 3º geração, assim, elas devem manter
um cuidado redobrado com a saúde para evitar o aparecimento de doenças relacionadas ao uso desse
medicamento
Os dados desse estudo estão de acordo com os encontrados em um estudo realizado por Santos
et al. (2008), onde das mulheres analisadas, todas usavam ACOs do tipo monofásica e de baixa
dosagem. Um estudo realizado por Sandie et al. (2010) revelou que as mulheres utilizam
preferencialmente contraceptivos da terceira e da quarta geração.
Entre os ACOs mais utilizados estão o Ciclo 21®, Ciclofemme®, Gestrilan® e Microvlar®, eles
são utilizados por 42,8% das pacientes, isto está relacionado ao fato de que esses ACOs são
distribuídos nas Unidades Básicas de Saúde
Além do uso do ACO, outros fatores de riscos eram apresentados pelas usuárias: 22,0% eram
sedentárias e 8,3% fumantes. O ato de fumar é considerado uma prática negativa, uma vez que ele é
um importante fator para o desenvolvimento de DCVs, eles reduzem os níveis de HDL-C. A prática
de exercícios físicos é uma ferramenta bastante importante para prevenir o aparecimento de
dislipidemias e outras doenças secundárias a esta (Fonseca et al., 2002).
Diante dos fatores de riscos, é de suma importância fazer o monitoramento do perfil lipídico
para evitar complicações vasculares. O farmacêutico no ato da dispensação dos medicamentos deve
prestar a atenção farmacêutica, com ênfase em estimular os pacientes a fazerem um monitoramento
constante e esclarecer os possíveis riscos que o uso desses medicamentos pode causar. Do total das
pacientes 51,4% só dosam as taxas lipídicas uma vez ao ano e 34,3% quando o médico solicita.
As pacientes foram alertadas do risco de desenvolver dislipidemia devido o uso de ACOs e
da importância de avaliar constantemente os níveis lipídicos, tanto para os que já possuem
dislipidemias, como para aquelas que não possuem. É importante fazer a prevenção para evitar as
complicações que a dislipidemia pode desencadear, como um maior risco de desenvolvimento da
doença arterial coronariana, hipertensão e acidente vascular cerebral.
Tanto os médicos quanto os farmacêuticos devem orientar as pacientes a adotarem estilos de
vida mais saudáveis, como uma dieta equilibrada, não fumar, não beber e praticar atividades físicas.
O diagnostico precoce de dislipidemias é importante para evitar complicações. Neste sentido, a
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1297 Moura, K. L. A. et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1285 – 1301, 2015
implantação da atenção farmacêutica a essas pacientes pode ajudar a reduzir os gastos públicos, pois
implica em um menor número de internações devido a complicações cardiovasculares.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A dislipidemia é uma doença silenciosa e assintomática, na maioria das vezes só é descoberta
após um problema cardiovascular. Identificar os fatores de riscos e diagnosticar o mais rápido
possível o aparecimento de dislipidemias é de fundamental importância para evitar complicações
decorrentes dessa doença.
O uso de medicamentos como os anticoncepcionais orais, enquadra-se nos fatores
modificáveis que podem desencadear a dislipidemia. Todas as pacientes tiveram o seu perfil lipídico
analisado para descobrir se apresentavam ou não dislipidemias. Mais da metade delas eram portadoras
dessa doença, que está em grande parte associada ao uso prolongado do medicamento em análise,
sendo o HDL-C baixo o tipo de dislipidemia mais comum. Além do uso de ACOs, algumas pacientes
apresentavam outros fatores de risco como: sedentarismo e tabagismo.
Este estudo se torna um importante sinalizador para o fato de que o uso de ACOs pode
desencadear o aparecimento de dislipidemias, mostrando assim o quanto é importante o
monitoramento do perfil lipídico, a fim de evitar complicações decorrentes do uso desses
medicamentos. Isto é importante, pois a partir daí pode-se reduzir os gastos com a saúde, através da
diminuição de internações desses pacientes, além de reduzir o número de óbitos devido a DCVs.
O farmacêutico atua estimulando a população a fazer um monitoramento constante do perfil
lipídico e orientando com relação ao tipo de medicamento utilizado, buscando prevenir e solucionar
problemas relacionados com o uso desses medicamentos, sendo possível fazer um diagnóstico
precoce de dislipidemias e evitar o aparecimento de DCVs. É importante que outros trabalhos sejam
realizados neste campo, a fim de esclarecer melhor as alterações que esses medicamentos podem
causar nos índices lipídicos, assim como todos os mecanismos que levam a esses efeitos.
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ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
Validação de metodologia analítica para quantificação de Boldina em um fitoterápico
composto contendo Peumus boldus Molina e Solanum paniculatum L.
Luciene de Oliveira Morais1, Jéssica Salvador Areias de Araújo2& Elizabeth Valverde Macedo3
1Farmacêutica, Doutoranda da Pós-Graduação do Instituto Nacional de Controle da Qualidade em Saúde da Fundação
Oswaldo Cruz – FIOCRUZ 2Farmacêutica, Mestranda da Pós-Graduação do Instituto Nacional de Controle da Qualidade em Saúde da Fundação
Oswaldo Cruz – FIOCRUZ 3Docente e Vice-Diretora do Laboratório Universitário Rodolpho Albino – LURA, da Universidade Federal Fluminense
- UFF 1Laboratório Químico Farmacêutico da Aeronáutica – LAQFA. Estrada do Galeão, 4001 – Ilha do Governador, Rio de
Janeiro. CEP:21.941-292. E-mail: [email protected], Tel./Fax +55-21-21017407 3Laboratório Universitário Rodolpho Albino – LURA. Rua Mário Viana, 523 – Santa Rosa, Niterói, RJ. CEP. 24241-
002. E-mail: [email protected], Tel./Fax +55-21-26299597
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1303 Moraes, L.O.; Araujo, J. S. A.; Macedo, E. V. Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1302 – 1314, 2015
RESUMO
Com a aprovação no Brasil da Política Nacional de Plantas Nacionais e Fitoterápicos em 2006, as
empresas produtoras foram estimuladas a desenvolver e comercializar medicamentos fitoterápicos,
e consequentemente à validar as respectivas metodologias analíticas. Tais métodos validados
contribuem para o alcance da confiabilidade dos resultados obtidos. Entre as plantas medicinais
mais populares no Brasil se destacam o boldo (Peumus boldus Molina) e a jurubeba (Solanum
paniculatum L.), indicado para tratamento de distúrbios digestivos. Sendo assim, o objetivo deste
estudo foi desenvolver e validar uma metodologia analítica empregada para a quantificação do
marcador boldina presente em comprimido fitoterápico composto, que contém 10mg de extrato seco
de boldo (Peumus boldus Molina) e 120mg de extrato seco de jurubeba (Solanum paniculatum L.).
Inicialmente procedeu-se a extração ácido-base dos ativos, seguida da separação e quantificação por
Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE). Os parâmetros determinados foram:
especificidade/seletividade, linearidade, intervalo, precisão, exatidão e robustez. Todos os
resultados foram satisfatórios, e o método demonstrou-se adequado para a quantificação de boldina
presente no comprimido fitoterápico composto, conforme guia para validação de métodos analíticos
estabelecido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA através da Resolução
899/2003.
Palavras-chave: Peumus boldus, CLAE, validação.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1304 Moraes, L.O.; Araujo, J. S. A.; Macedo, E. V. Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1302 – 1314, 2015
ABSTRACT
After approval in Brazil the National Domestic Plants and Herbal Policy in 2006, the production
companies were required to research and produce herbal medicines and also perform validation of
these analytical methodologies. Validated methods meet the requirements of applications, ensuring
the reliability of the results. Among the most popular medicinal plants in Brazil we can highlights
the Boldo (Peumus boldus Molina) and the Jurubeba (Solanum paniculatum L.), which are
indicated for the treatments of digestive disorders. Thus, the aim of this study was to develop and
validate an analytical methodology used to quantify the marker boldine in herbal tablets that
contains 10mg of boldo dry extract (Peumus boldus Molina) and 120 mg dry extract of jurubeba
(Solanum paniculatum L .). Initially we proceeded to extract the acid-base of assets, followed by
separation and quantification by Liquid Chromatography of High Efficiency (HPLC). The
parameters determined were: specificity / selectivity, linearity, range, precision, accuracy and
robustness. All results were satisfactory, and the method was demonstrated suitable for
quantification of this boldine in herbal tablets as established in guide for validation of analytical
methods from National Health Surveillance Agency - ANVISA through Resolution 899/2003.
Keywords: Peumus boldus, HPLC, validation.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1305 Moraes, L.O.; Araujo, J. S. A.; Macedo, E. V. Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1302 – 1314, 2015
INTRODUÇÃO
Em 2006 o governo brasileiro, através do Ministério da Saúde, tornou oficial a Política
Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos levando em consideração a necessidade do
reconhecimento da medicina tradicional como parte integrante dos sistemas de saúde do Brasil
(Brasil, 2006). Entre as plantas medicinais mais populares no Brasil se destacam o boldo (Peumus
boldus Molina) e a jurubeba (Solanum paniculatum L.).
A boldina ((S) – 2,9 – dihidroxi – 1,10 – dimetoxiaporfina) é um alcaloide extraído do boldo
tradicionalmente indicado para distúrbios no sistema digestivo com comprovada ação antioxidante
(Speisky & Cassels, 1994; Ruiz et al., 2008; O´Brien, Carrasco-Pozo & Speisky, 2006;
Klimaczewski et al., 2014). Preparações a base de boldo já são descritas em compêndios oficiais
como a Farmacopeia Brasileira (FB), assim como preparações com base na jurubeba, que também
são utilizadas em distúrbios hepáticos e digestivos (Brasil, 2011; Nurit, Agra & Basílio, 2007).
Para garantir a eficácia destas formulações o controle de qualidade da indústria farmacêutica
precisa utilizar métodos validados, capazes de garantir por meio de estudos experimentais o
atendimento às exigências legais (Brasil, 2003), assegurando a confiabilidade dos resultados.
Orsi et al., (1997) desenvolveram um método de análise de boldina em formulações
farmacêuticas utilizando a técnica de Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE). O método
proposto para extração, separação, identificação e quantificação do ativo apresentou uma exatidão
acima de 98%, porém, com uma variação de 6% nos ensaios de precisão.
Câmara et al., (2010) determinaram quantitativamente o percentual de boldina em boldo por
ensaio de voltametria cíclica. A validação do método proposto mostrou-se eficaz com custos
reduzidos em comparação a metodologias CLAE.
Por último, Han et al., (2008) desenvolveram uma metodologia de determinação simultânea
de quatro alcaloides presentes em Lindera aggregata (boldina, noboldina, reticulina e
linderegatina). O método proposto utilizou Cromatografia Líquida de Ultra Eficiência (CLUE)
acoplada a espectrômetro de massas e mostra-se eficiente para as determinações.
Desta forma o objetivo do presente trabalho foi desenvolver e validar uma metodologia
analítica simples e de baixo custo empregada para a quantificação do marcador boldina presente em
comprimido fitoterápico composto, indicado para o tratamento de distúrbios digestivos, que contém
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10mg de extrato seco de boldo (Peumus boldus Molina) e 120mg de extrato seco de jurubeba
(Solanum paniculatum L.), correspondente a 0,01mg de boldina e 4mg de solanina,
respectivamente.
METODOLOGIA
Os materiais e reagentes utilizados foram: comprimidos do fitoterápico composto, contendo
10mg de extrato seco de boldo (Peumus boldus Molina) e 120mg de extrato seco de jurubeba
(Solanum paniculatum L.), correspondente a 0,01mg de boldina e 4mg de solanina,
respectivamente, padrão primário de boldina (Chromodex), clorofórmio P.A, solução de ácido
clorídrico 0,1M, hidróxido de amônio P.A, e solução de ácido fosfórico 0,1%. Os reagentes
utilizados para a CLAE (acetonitrila, metanol e água purificada) apresentaram grau compatível com
a técnica.
A extração do alcalóide foi feita por adição de ácido clorídrico 0,1M à amostra e posterior
aquecimento a 80°C. A suspensão resultante foi filtrada, seguida de extrações do filtrado com
clorofórmio. A fase clorofórmica foi reservada e ao meio aquoso foi adicionado hidróxido de
amônio até alcançar pH 9. Após essa etapa foi feita nova adição de clorofórmio e a fase
clorofórmica resultante, reunida com a anterior foi levada para rotovaporização. Após evaporação
completa do clorofórmio o resíduo foi suspenso em metanol e estocado para análise.
A solução padrão de boldina foi preparada dissolvendo 10 mg do padrão primário em
metanol obtendo uma solução padrão de 50μg/mL. A solução padrão foi sonicada por 5 min.
Os ensaios foram realizados utilizando cromatógrafo líquido de alta eficiência (CLAE) da
marca Shimadzu (Kyoto, Japão) série LC-20A, equipado com um controlador de bombas Série LC-
20AT, injetor manual RHEODYNE 7725, degaseificador modelo DGU20A3, detector UV-VIS
modelo SPD-20A, gerenciado pelo controlador CBM-20. No estudo foi utilizada a coluna Hypersil
BDS RP-C18 de 250 mm de comprimento com 4,6 mm de diâmetro interno e tamanho de partícula
5μm, a qual foi mantida a temperatura ambiente (aproximadamente 25ºC). A fase móvel foi
constituída de acetonitrila e solução de ácido fosfórico 0,1% (77:23 v/v) e filtrada por membrana
0,45μm. O fluxo do eluente foi de 2,1mL/min, sob condição isocrática. O volume de amostra
injetada foi de 20μL. A detecção foi realizada em comprimento de onda de 304nm.
Para a validação da metodológica foram respeitados os parâmetros de
especificidade/seletividade, linearidade, intervalo, precisão, exatidão e robustez.
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A especificidade / seletividade foi determinada pela injeção do padrão, amostra, placebo e
placebo fortificado com padrão na concentração de 10ppm utilizando os procedimentos de
preparação e condições analíticas descritas para o composto em estudo. A amostra também foi
submetida às condições de estresse. O critério de aceitação para este parâmetro foi a ausência de
sinais analíticos nos tempos de retenção do analito e do padrão nas análises cromatográficas. Foram
usados como agentes de degradação: a) a luz, através de exposição das amostras por 72 horas; b) o
calor, através de aquecimento a 60°C pelo mesmo intervalo; c) hidrólise alcalina, através da adição
de solução de NaOH 0,1M nas amostras; d) hidrólise ácida, através da adição de solução de HCl
0,1M nas amostras; e e) oxidação através da adição de H2O2.
A linearidade foi determinada através da construção de uma curva de calibração utilizando a
solução padrão de boldina, nas concentrações de 40μg/mL, 45μg/mL, 50μg/mL, 55μg/mL e
60μg/mL, compreendendo o intervalo de análise de 80% a 120% de quantificação do valor rotulado
no produto. Este parâmetro foi avaliado pelo coeficiente de correlação linear, entre as relações de
áreas do ativo nos padrões e as concentrações correspondentes deste composto na curva de resposta.
Para a elaboração da curva conjugada foram utilizadas as áreas individuais de injeções em triplicata.
O critério de aceitação considerado foi r ≥ 0,99, conforme preconizado na Resolução RDC
899/2003 da ANVISA.
O parâmetro precisão foi avaliado a partir da análise de 6 determinações de igual
concentração teórica (10μg/mL), efetuadas em diferentes dias, analistas diferentes, porém com o
mesmo equipamento. Os resultados foram expressos como desvio padrão relativo (DPR).
Para a determinação da exatidão, foram calculados os valores de recuperação em três faixas
de concentração: baixa (80%), média (100%) e alta (120%). A recuperação foi determinada, através
de análise em triplicata do placebo fortificado, e calculado considerando-se a concentração da
solução-amostra (mg/mL). A recuperação foi obtida pelo cálculo da concentração percentual obtida
em relação à concentração teórica do estudo.
A robustez do método cromatográfico foi determinada por análises das amostras em
diferentes condições de temperatura (ambiente e 40°C) e diferentes lotes dos solventes. Os efeitos
nos parâmetros tempo de retenção e área dos picos foram observados.
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RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após a extração e as análises por CLAE, o cromatograma típico observado apresentou um
sinal com tempo de retenção de 3,52 minutos referente à boldina, conforme ilustrado na Figura 1.
Figura 1 – Cromatograma típico das análises.
Especificidade / seletividade
Durante os ensaios observou-se que no comprimento de onda de 304 nm ocorreu maior
absorção do analito. A fase móvel constituída por acetonitrila e solução de ácido fosfórico 0,1%
(77:23 v/v), assim como o solvente metanol não apresentaram absorção neste comprimento de onda.
A coluna Hypersil BDS RP-C18 de 250 mm de comprimento com 4,6 mm de diâmetro interno e
tamanho de partícula 5μm, foi a que proporcionou melhores parâmetros cromatográficos.
Nos cromatogramas resultantes das amostras contendo somente os componentes da matriz
do comprimido, não foram observados sinais analíticos nos tempos de retenção da boldina,
indicando ausência de interferentes detectáveis.
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Quanto aos resultados do teste de estresse, estes demonstraram que nas amostras submetidas
à hidrólise alcalina e hidrólise ácida não foram registradas degradações. A degradação das amostras
submetida à luz, ao calor e ao agente oxidante foi inferior a 6,0%, e não foram observadas
interferências detectáveis, o que demonstrou a estabilidade intrínseca do analito frente a condições
extremas ao qual foi submetido.
O método proposto mostrou-se específico e seletivo para o marcador boldina, mesmo na
presença de outros componentes da matriz do comprimido.
Linearidade e Intervalo
A curva analítica traçada, conforme visto na figura 2, por padronização externa para boldina,
demonstrou excelente linearidade na faixa de 40-60 μg/mL com coeficiente de correlação (r) de
0,9975. Isto demonstra a linearidade do método, pois obedece a uma correlação linear nos
intervalos de concentração avaliados.
Figura 2 – Resultado dos ensaios de linearidade.
Exatidão
A exatidão foi avaliada por meio do percentual de recuperação utilizando o método de
adição padrão. A média do percentual recuperado foi de 98,9% (baixa), 100,6% (média) e 100,4%
(alta) em três níveis de concentrações e em triplicata. Como o resultado médio obtido para
recuperação foi compreendido entre 90 e 110 % do valor teórico, o método foi considerado exato,
evidenciando a consistência do mesmo. O ótimo fator de recuperação do analito pode ser explicado
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1310 Moraes, L.O.; Araujo, J. S. A.; Macedo, E. V. Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1302 – 1314, 2015
por meio das condições otimizadas do processo de extração, tais como, escolha do solvente extrator,
temperatura e tempo.
Tabela 1 – Resultado dos ensaios de exatidão.
Precisão
A precisão do método foi analisada por meio das determinações de repetibilidade (intra-
corrida) e precisão intermediária (inter-corridas) da solução extrativa. Para avaliar a repetibilidade
analítica da metodologia empregada na análise, foram preparadas 6 amostras que foram injetadas
em triplicata no mesmo dia, nas mesmas condições cromatográficas e pelo mesmo analista. As
respostas foram expressas como desvio padrão relativo (DPR). Para avaliar a precisão
intermediária, utilizou-se o mesmo procedimento anterior e instrumento analítico, repetindo os
ensaios com analista em dias diferentes. Segundo a RE 899/2003 - ANVISA (Brasil, 2003), o valor
máximo aceitável deve ser definido de acordo com a metodologia empregada, concentração do
analito na amostra, tipo da matriz, não se admitindo valores maiores que 5%.
A Tabela 2 apresenta os resultados obtidos nesta análise. O desvio padrão relativo (DPR)
encontrado foi de 1,45%, demonstrando boa precisão nas análises para quantificação de boldina,
visto que os valores de DPR estão abaixo dos critérios aceitáveis pela legislação vigente (Brasil,
2003).
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Tabela 2 – Resultado dos ensaios de precisão.
Robustez
Os testes de robustez, em geral, servem para indicar os fatores que podem interferir,
significantemente, na resposta do método utilizado. Tal fato fornece a dimensão do problema que
ocorre quando o método é repetido em diferentes condições ou é transferido, por exemplo, para
outro laboratório ou equipamento. No teste de robustez foram feitas variações dos parâmetros de
temperatura e lotes dos solventes utilizados. Como resposta observou-se que estes parâmetros não
alteraram de forma significativa os valores de área sob a curva das amostras que continham boldina
na concentração de 10μg/mL, diluídas com metanol. As quantificações realizadas mantiveram-se na
faixa de aceitação (90-110% do valor rotulado) mesmo variando-se temperatura e lotes dos
solventes utilizados, demonstrando que o método é robusto nas condições avaliadas.
Comparando-se o método apresentado neste estudo aos desenvolvidos por Orsi et al.,
(1997), Câmara et al., (2010), Han et al., (2008) e o inscrito na Farmacopeia Brasileira (2010) pôde-
se verificar que somente o de Orsi et al., (1997) e o da Farmacopeia Brasileira (2010) empregaram
CLAE. O método desenvolvido por Câmara et al., (2010) utilizou voltametria cíclica e o de Han et
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al., (2008) a CLUE. Assim, verificou-se que os três métodos que utilizaram métodos
cromatográficos líquidos realizaram as leituras no comprimento de onda 304nm, o que significa que
todos analisaram a mesma emissão oriunda da boldina. Quanto aos sistemas cromatográficos
somente Orsi et al., (1997) empregou método com gradiente de polaridade. Os demais operaram
métodos isocráticos, inclusive o apresentado neste estudo. Quanto às colunas cromatográficas
utilizadas todas foram de fase reversa. Orsi et al., (1997) empregou uma RP-C8 e a Farmacopeia
Brasileira (2010) uma RP-C18. Neste estudo foi utilizada uma RP-C18. Quanto às fases móveis
escolhidas e aos fluxos implementados, estes fatores são diretamente relacionados aos componentes
presentes na amostra analisada porque por meio deles é possível alcançar a resolução dos sinais. O
que há de comum em todos os métodos cromatográficos líquidos observados é o caráter ácido da
fase móvel, em torno de pH 3,0. No método da Farmacopeia Brasileira (2010), que é aplicável à
droga Peumus boldus Molina verificou-se que o ácido empregado foi o ácido fórmico, enquanto que
no método de Orsi et al., (1997) utilizou-se solução de perclorato de sódio. No presente trabalho foi
utilizado o ácido fosfórico.
Diante do exposto, observou-se que a fundamentação teórica foi a mesma nos diversos
sistemas cromatográficos líquidos apresentados. De modo global, quando comparado o presente
método aos anteriormente já desenvolvidos e também validados observaram-se diferenças que
retratam a necessidade da adequação do método analítico ao produto farmacêutico analisado.
Portanto, não há melhor ou pior método analítico. Espera-se sempre um método analítico adequado
ao material a ser analisado e que atenda aos requisitos apontados como imprescindíveis para o
desenvolvimento da validação do referido método. No Brasil, atualmente a norma que apresenta o
Guia para realização de estudos de validação de métodos analíticos é a RE 899/2003 – ANVISA.
CONCLUSÃO
A metodologia analítica desenvolvida para quantificação de boldina presente em
comprimido fitoterápico composto contendo Peumus boldus Molina e Solanum paniculatum L.
utilizando cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE) mostrou-se satisfatória sendo
específica, seletiva, linear, exata, precisa e robusta, portanto, atendendo as exigências requeridas na
validação. A Tabela 3 mostra de forma sucinta os resultados obtidos e os critérios utilizados.
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Tabela 3 – Sumário dos parâmetros de aceitação e valores encontrados.
Sendo assim, conclui-se que a metodologia analítica apresentada foi validada por atender
aos requisitos da RDC 899/2003 – ANVISA. Tal metodologia pode e deve ser utilizada na
quantificação do marcador boldina presente em comprimido fitoterápico composto contendo
Peumus boldus Molina e Solanum paniculatum L.
.
REFERÊNCIAS
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Colegiada (RDC) n° 899, de 29 de maio de 2003. Diário Oficial da União: Poder Executivo,
Brasília, DF, 02 jun. 2003. Seção 1.
Brasil. Decreto n°5.813 de 22 de junho de 2006. Diário Oficial da União: Poder Executivo, Brasília,
DF, 23 jun. 2006. Seção 1, p. 2.
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1314 Moraes, L.O.; Araujo, J. S. A.; Macedo, E. V. Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1302 – 1314, 2015
Brasil. Farmacopéia Brasileira. 5.ed. Brasília: Anvisa, 2010. v. 2, 899p.
Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Formulário de Fitoterápicos da Farmacopéia
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Han Z, Zheng Y, Chen N, Luan L. Zou, C, Gan L, Wu Y. Simultaneous determination of four
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Klimaczewski CV, Saraiva RA, Roos DH, Boligon A, Athayde ML, Kamden JP, Barbosa NV,
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ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
Caracterização fitoquímica, toxicidade e avaliação preliminar da atividade
antibacteriana das folhas de Bauhinia ungulata L.
Phytochemical characterization, preliminary toxicity and evaluation of the
antibacterial activity of the leaves of Bauhinia ungulata L.
Cristiane da Silva Paula1,*, Maria Christina dos Santos Verdam1, Beatriz Cristina Konopatzki
Hirota1, Angela Maria de Souza1, Cristiane Bezerra da Silva1, Obdúlio Gomes Miguel2 & Marilis
Dallarmi Miguel1.
1Universidade Federal do Paraná, Programa de Pós Graduação em Ciências Farmacêuticas, Laboratório de
Farmacotécnica, Curitiba, PR, Brasil 2Universidade Federal do Paraná, Programa de Pós Graduação em Ciências Farmacêuticas, Laboratório de Fitoquímica,
Curitiba, PR, Brasil
Contato: *e-mail: [email protected]. Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas. Universidade
Federal do Paraná. Av Pref. Lothário Meissner, 632. Jardim Botânico CEP: 80210-170 – Curitiba – Pr.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1316 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
RESUMO
A Bauhinia ungulata L. (Fabaceae), conhecida como “pata-de-vaca”, apresenta características
ornamentais e propriedades medicinais, utilizada pela população para o tratamento do diabetes e
diarreia. Neste trabalho foi realizada uma caracterização fitoquímica preliminar para determinar as
principais classes de metabólitos secundários presentes no extrato e frações provenientes das folhas,
utilizando reações clássicas de caracterização de grupamentos químicos. A atividade antibacteriana
foi avaliada utilizando o método da micro diluição frente a algumas cepas, a citotoxicidade
utilizando modelo de toxicidade sobre náuplios de Artemia salina, e atividade hemolítica por
método descrito na Farmacopeia Brasileira, que é indicador de toxicidade geral e bioatividade de
extratos de plantas. Os resultados da caraterização fitoquímica sugerem a presença no extrato das
folhas principalmente de alcaloides, flavonoides, antraquinonas, esteroides, triterpenos e taninos
condensados. As amostras testadas não foram ativas frente às cepas bacterianas utilizadas e também
não se mostraram tóxicas frente à Artemia salina além da ausência de atividade hemolítica. Estes
ensaios preliminares sugerem que as folhas de Bauhinia ungulata podem ser fonte de compostos
com atividades medicinais importantes e com ausência de toxicidade.
PALAVRAS CHAVE
Fabaceae, Bauhinia, Flavonoides.
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1317 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
ABSTRACT
The Bauhinia ungulata L. (Fabaceae), known as “cow’s paw ", shows ornamental and medicinal
properties, used by the population for the treatment of diabetes and diarrhea. In a preliminary study
phytochemical characterization was carried out to determine the major classes of secondary
metabolites present in the extract and fractions from the leaves, using conventional chemical
reactions of characterization of groups. We evaluated the antibacterial activity by the micro-dilution
method against some strains, the cytotoxicity using models of toxicity to Artemia salina nauplii and
hemolytic activity by the method described in the Brazilian Pharmacopoeia, which is indicative of
general toxicity and bioactivity of plant extracts. The results of the phytochemical characterization
suggest the presence in the extract of the leaves mainly alkaloids, flavonoids, anthraquinones,
steroids, triterpenes and tannins. The samples tested were not active against the bacterial strains
used and are not toxic against on Artemia salina with absence of hemolytic activity. These
preliminary experiments suggest that the leaves of Bauhinia ungulata can be a source of important
medicinal compounds with activity and not toxic.
KEY WORDS
Fabaceae, Bauhinia, Toxicity, Flavonoids.
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1318 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
INTRODUÇÃO
Plantas do gênero Bauhinia L. (Fabaceae) são conhecidas popularmente como “pata-de-
vaca”, “pé-de-boi” ou “unha-de-boi” (Corrêa, 1952) além de “mororó do sertão”, "miroró”, “pata de
cabra”, “mão de vaca”, "pata de veado” (Lorenzi & Matos, 2008) em alusão ao formato das folhas
que lembram o rastro de animais. Algumas espécies podem ser utilizadas na recuperação de áreas
degradadas (Lorenzi, 1991) e na arborização pública como ornamentais, entretanto, representantes
deste gênero se destacam por suas propriedades medicinais, sendo utilizados na forma de chás e
outras preparações fitoterápicas para o tratamento de várias enfermidades, principalmente com
finalidade hipoglicemiante, hipocolesterolêmica, expectorante, depurativa, diurética, antidiarreica,
anti-infecciosa e em processos dolorosos (Silva & Cechinel-Filho, 2002).
O uso popular medicinal mais comum do gênero é na redução da glicemia observado com
várias espécies que são geralmente utilizadas na forma de chá obtido das folhas. Diante do fato de
que todas as plantas do gênero recebem a mesma denominação popular, elas muitas vezes são
utilizadas indistintamente por grande parte da população (Lorenzi & Matos, 2008) e em alguns
casos os resultados esperados nem sempre são obtidos, tendo em vista a diferente composição
química. Este fato reforça a necessidade de estudo das diversas espécies na busca por informações
químicas e biológicas.
Uma pesquisa realizada com idosos assistidos em uma Unidade Básica de Saúde de
Pelotas-RS demonstrou que espécies de Bauhinia estiveram entre as plantas medicinais mais
utilizadas (Feijó et al., 2012) fato este observado também em uma cidade do estado de Pernambuco
(Santos, Nunes & Martins; 2012) e no Mato Grosso (Da Silva et al., 2010; Macedo & Ferreira,
2004). Em Maracanaú (Ceará), em 2002, a B. forficata na forma de tintura para uso interno era
produzida e distribuída através do Programa Farmácias Vivas no sistema público de Saúde para
tratamento do diabetes, sendo considerado o segundo fitoterápico mais prescrito no período
analisado (Silva et al., 2006). A casca do caule e raiz de B. reticulata é utilizada pela população na
lavagem de feridas e as folhas e frutos (secos) da B. rufescens é aplicado na forma de pó em
micoses na cabeça de crianças (Inngjerdingen et al., 2004).
Uma das espécies, a Bauhinia ungulata foi pouco estudada com relação à constituição
química e atividades biológicas. É planta que se apresenta como arbusto, arvoreta ou subarbusto que
em média possui de 2-4 m de altura (Dutra et al., 2009), podendo alcançar até 10 metros (Mena-Ali
& Rocha, 2005). Apresentam flores actinomorfas, brancas e nectaríferas com polinização noturna
realizada por morcegos (quiropterófila) que são atraídos pelo seu forte odor. É uma angiosperma
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1319 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
cuja principal característica é a existência de um fruto que envolve e protege a semente e com
folhas uni folioladas e bilobadas características do gênero (Dutra et al., 2008).
A Bauhinia ungulata é utilizada pela população por sua ação hipoglicemiante (Morais et
al., 2005) no tratamento do diabetes e para diarreia (Bieski et al., 2012). Paula et al. (2014)
demonstraram que extrato e frações obtidas das folhas apresentam elevado potencial antioxidante,
sugerindo que a planta possa ter ação no tratamento de várias doenças associadas ao estresse
oxidativo como câncer, aterosclerose e inflamação (Ferreira & Matsubara, 1997).
Recente trabalho que investigou o potencial de inibição da acetilcolinesterase demonstrou
resultados preliminares promissores com o uso do extrato hexano da flor desta espécie no
tratamento da doença de Alzheimer (Santos et al., 2011). Ainda são poucas as pesquisas que
relatam as propriedades biológicas dessa espécie, que podem favorecer o desenvolvimento e a
descoberta de novas drogas vegetais para contribuição significativa no campo da saúde em nível
mundial (Barbosa-Filho et al., 2007). Nesta perspectiva, este trabalho objetiva fornecer informações
preliminares sobre o potencial de toxicidade e antibacteriano, bem como a investigação fitoquímica
das folhas de B. ungulata L.
METODOLOGIA
As folhas da espécie Bauhinia ungulata L. foram coletados em janeiro de 2007 na cidade
de Campo Grande – MS coordenadas geográficas 20º30`37,5” S e 54º36`46,6” W, 545m. A planta
foi identificada e uma exsicata foi depositada no Herbário da Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul – UFMS sob o número CGMS 19754.
CARACTERIZAÇÃO FITOQUÍMICA PRELIMINAR
A identificação qualitativa dos grupos químicos presentes nas folhas foi realizada de
acordo com a metodologia desenvolvida por Moreira (1979) e adaptada por Miguel (2003),
utilizando o extrato hidro alcoólico 20% e extrato aquoso. Para o preparo do extrato hidro alcoólico
20%, 40 g das folhas foram submetidas à maceração (banho Maria 70 oC / 1 hora) em 200 mL de
álcool etílico a 70% (v/v). Posteriormente realizou-se o fracionamento do extrato em funil de
separação com os solventes orgânicos hexano, clorofórmio e acetato de etila, obtendo-se as frações
hexano (FH), clorofórmio (FCL), acetato de etila (FAE) e a porção residual, chamada fração hidro
alcoólica residual (FR). O extrato aquoso foi obtido a partir de 40 g do material vegetal, macerados
(banho-maria a 70 °C) com 200 mL de água destilada por duas horas com agitação ocasional.
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1320 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
Para o extrato aquoso realizou-se reações de caracterização para pesquisa de heterosídeos
antociânicos, heterosídeos saponínicos, heterosídeos cianogênicos, amino grupos e taninos. Para o
extrato hidro alcóolico 20% foram realizadas reações para pesquisa de flavonoides (reação de
Taubock, ensaio de Pacheco, reação de Shinoda), leucoantocianidinas, esteroides e triterpenoides
(reação de Liebermann-Burchard), cumarinas (extração com éter e verificação em câmara de luz
ultravioleta), alcaloides (reativos de Mayer, Dragendorff, Bouchardat e Bertrand), antraquinonas
(reação de Borntraeger) (Paula et al., 2013).
AVALIAÇÃO DA TOXICIDADE FRENTE À Artemia salina
A água do mar artificial foi preparada com 38 g de sal marinho (23 g NaCl, 11 g
MgCll2·6H2O, 4 g Na2SO4; 1,3 g CaCl2·2H2O ou CaCl2·6H2O; 0,7 g KCl) e 1.000 mL de água
destilada. O pH foi ajustado para 9,0 com Na2CO3, mantendo-o na faixa de 6-10,5 (Lewan,
Andersson & Morales et al., 1992). Os ovos de Artemia salina (200 mg/400 mL) foram colocados
na água do mar artificial para eclodir por 48 horas sob aeração contínua e expostos à luz diurna e
temperatura controlada (27-30 ºC). Paralelamente, prepararam-se as amostras do EB, FH, FCL FAE
e FR a serem analisadas, nas concentrações de 10, 100 e 1000 μg.mL-1. As amostras foram diluídas
em metanol e colocadas em frascos adequados para a realização do teste. O solvente foi evaporado
em estufa a 40 ºC, 24 horas antes do teste. Como controle positivo, foi utilizado sulfato de
quinidina, nas mesmas concentrações das amostras e como controle negativo foi utilizado o
metanol. Todos os testes foram realizados em triplicata.
Após a eclosão dos ovos, 10 náuplios de Artemia salina foram transferidas para cada
frasco contendo as amostras e controles. O volume de todos os tubos foi então ajustado com água
do mar artificial para 2,5 mL. Após 24 horas, foi realizada a contagem das larvas mortas e vivas. Os
dados foram analisados com o método estatístico Probitos e determinados os valores de CL50 com
95% de intervalos de confiança. As frações foram consideradas tóxicas quando CL50 foi menor que
1000 μg.mL-1 (Meyer et al., 1982).
AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE HEMOLÍTICA
Teste da atividade hemolítica com hemácias em suspensão
A atividade hemolítica das amostras foi avaliada seguindo metodologia descrita na
Farmacopeia Brasileira 5ª edição (Brasil, 2010) com adaptações. Foi utilizado no ensaio uma
suspensão de sangue de carneiro (Newprov®) a 2% e solução de saponina (controle positivo).
Partindo de uma concentração das amostras do EB, FH, FCL FAE e FR de 1000 μg.mL-1, uma
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diluição em série foi preparada com tampão fosfato pH 7,4 e suspensão de sangue 2%, usando 4
tubos de ensaio, conforme a Tabela 1.
Tabela 1 – Esquema da diluição em série das amostras
TUBO 1 2 3 4
Extrato vegetal
(ml)
0,10 0,20 0,50 1,00
Tampão fosfato
pH 7,4 (ml)
0,90 0,80 0,50 -
Suspensão de
sangue (2%) (ml)
1,00 1,00 1,00 1,00
Fonte: Brasil (2010).
Logo que os tubos foram preparados, os mesmos foram invertidos cuidadosamente
evitando a formação de espuma. Após 30 minutos foram novamente agitados com cuidado e então
deixados em repouso por 150 minutos. Posteriormente, foram centrifugados por 5 minutos a 3000
rpm. Observou-se então se dentre eles existia algum na qual foi detectada a presença de hemólise
total, ou seja, ocorreu solução límpida, vermelha e sem depósito de eritrócitos.
Teste de Atividade Hemolítica em Placas de Ágar Sangue
Em discos de papel filtro Whatman (no1), com aproximadamente 7mm de diâmetro, foram
aplicados 20 μL da amostra a ser testada, na concentração de 1000 μg.mL-1. Após secagem, os
discos foram colocados em placas de ágar sangue e incubadas por 24 horas a 35 °C em estufa. Após
este período verificou-se a existência de halo de hemólise ao redor do disco de papel. Como
controle positivo foi utilizada solução de saponina 1000 μg, e como controle negativo, discos
impregnados com os solventes utilizados foram submetidos ao teste para descartar a influência
destes (Kalegari, 2011).
AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ANTIBACTERIANA
Para avaliação da atividade antibacteriana foi utilizada a técnica de micro diluição em
caldo para a determinação da concentração inibitória mínima (CIM). Os microrganismos utilizados
na pesquisa foram: Staphylococcus aureus ATCC® 25923, Escherichia coli ATCC® 25922,
Pseudomonas aeruginosa ATCC® 27853 e Enterococcus faecalis ATCC® 29212. As linhagens de
referência permaneceram armazenadas a - 80°C em TSB com glicerol a 15%, até o momento do
uso. Para reativação, as cepas conservadas em condições de congelamento foram subcultivadas
em ágar TSA (Difco), a temperatura de 37 °C por 20-24 horas. O preparo dos inóculos para as
linhagens referência foram realizadas suspensões em tubo contendo salina estéril (NaCl a 0,85%) na
concentração de 1,0 x 108 UFC.mL-1, equivalente ao tubo 0,5 de McFarland.
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1322 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
Concentração inibitória mínima (CIM)
Os valores da concentração inibitória mínima foram determinados pelo método da micro
diluição em caldo (CLSI, 2008). Os extratos e frações foram preparados em etanol 10% e DMSO
2% e filtrados através de membrana milipore 0,22 µm (TPP, Trasadingen, Suíça). Na sequência o
extrato e frações foram preparados através de diluição seriada em 100 µL de caldo Mueller-Hinton
(MHB), em um intervalo de concentração de 5000 a 39 µL e as frações de 200 a 1,56 µL em
microplacas estéreis de 96 cavidades com fundo em forma de “U. As suspensões bacterianas foram
preparadas em solução salina fisiológica na concentração de 1,0 x 108 UFC/mL, equivalente ao tubo
0,5 de McFarland e em seguida inoculados em um volume de 5 µL nos orifícios, permanecendo
uma concentração final de 104 UFC/mL. O controle negativo da atividade inibitória dos diluentes,
etanol e DMSO, foram realizados adicionando-se 100 µL de solução de etanol 10% e DMSO 2%
em 100 µL de MHB e 5 µL dos inóculos bacterianos. Para o controle de esterilidade, foram
utilizados 100 µL de MHB e 100 µL dos extratos e frações. O controle positivo foi preparado com
100 µL de MHB e 5 µL dos inóculos bacterianos. As microplacas foram incubadas a 35 °C por 16 a
20 horas e posteriormente foram adicionados 20 µL de solução aquosa de Cloreto de Trifenil
Tetrazolium (Merck, Darmstadt, Alemanha) a 0,5%. As microplacas foram reincubadas por três
horas a 35 °C, e após este período foi realizada a leitura dos resultados. A formação de coloração
vermelha nos orifícios foi interpretada como ausência de atividade antibacteriana, enquanto que a
não formação da coloração vermelha foi considerada como presença de atividade antibacteriana.
Cada teste foi realizado em duplicata (Ayres et al., 2008).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
CARACTERIZAÇÃO FITOQUÍMICA PRELIMINAR
Resultados obtidos a partir das análises fitoquímicas de caráter qualitativo para o material
vegetal constituído por folhas de Bauhinia ungulata L. podem ser visualizadas nas Tabelas 2 e 3.
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Tabela 2 – Resultados da caracterização fitoquímica para as frações do extrato hidro alcoólico
20% obtido a partir das folhas de Bauhinia ungulata L.
METABÓLITO
VEGETAL
Fração
FH FCL FAE FR
Alcaloides Reativo Mayer
- - - -
Reativo Dragendorff
- + +
+
Reativo Bouchardat
- - - -
Reativo Bertrand - - - -
Leucoantocianidinas
+ - + -
Flavonoides Heterosídeos
flavônicos
- - + -
Oxálico-Bórico - + + -
Cumarinas Tubo - - - -
Papel - - - -
Heterosídeo
Antraquinonico
+ - - -
Esteroides/
triterpenos
Liebermann-Burchard cor
amarela
cor
rosa
cor
amarela
cor
verde
Keller Kelliani - - - -
Legenda: (+) positivo; (-) negativo. FH=Fração Hexano,
FCL=Fração Clorofórmio, FAE=Fração Acetato de Etila,
FR=Fração Hidro alcoólica Residual.
Algumas classes de substâncias podem ser caracterizadas diretamente em tecidos vegetais,
porém, na maioria das vezes é necessário a extração de um determinado grupo de compostos com
solventes adequados, e então caracterizá-los. Essa caracterização foi realizada pelo emprego de
reações químicas que resultaram no desenvolvimento de coloração e/ou precipitação característicos
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(Paula et al., 2003), sugerindo a presença de flavonoides e alcaloides, que já haviam sido
encontrados nas folhas da B. ungulata (Maia Neto et al., 2008).
Com relação à metodologia utilizada, as reações qualitativas para caracterização de
alcaloides baseiam-se na formação de complexos insolúveis (precipitados), e na avaliação quanto à
presença desta classe as amostras demonstraram positividade para o teste, ocorrendo o
aparecimento de precipitado de cor laranja avermelhado para o reagente de Dragendorff. Este
reagente constitui uma solução de iodo bismutado de potássio K(BiI4) em ácido diluído que forma
precipitados laranja avermelhados quando em contato com alcaloides e compostos nitrogenados.
Como se trata de uma reação não específica para alcaloides, resultados falso-positivos
podem ser comuns (Santos, 2003), portanto, o resultado é apenas sugestivo. Quando a reação foi
realizada utilizando outros reagentes para a detecção de alcaloides os resultados foram negativos. A
presença destes compostos foi detectada em outras plantas do gênero, de acordo com a literatura,
como a B. candicans que contém o alcaloide trigonelina (Silva & Cechinel Filho, 2002) e alcaloides
β-carbolínicos harmano e eleagnina já foram identificados na B.ungulata (Maia Neto et al., 2008).
Positividade ocorreu com a FAE e FR na pesquisa de leucoantocianidinas, em que se
observou o aparecimento de coloração vermelha. Resultados positivos foram demonstrados também
através da coloração vermelha para a pesquisa de heterosídeos flavônicos na fração acetato de etila
da B. ungulata e no aparecimento de coloração amarela fluorescente sob luz ultravioleta, no teste
que utiliza oxálico bórico, para a fração hexano e fração acetato de etila, sugerindo a presença de
flavonóis. Estudos realizados com outras plantas do gênero mostram a presença de quercetina e
quercitrina, exemplos de flavonóis observados na B. purpúrea e B. tomentosa, respectivamente
(Silva & Cechinel Filho, 2002). Os flavonoides são compostos encontrados no gênero Bauhinia e
vários estudos com plantas do gênero reportam o isolamento e identificação de compostos
pertencentes a esta classe (Silva & Cechinel Filho, 2002; Reddy et al., 2003; Estrada et al., 2005;
Wu et al., 2009).
Ocorreu a formação de coloração vermelha com as frações hexano e fração acetato de etila
quando realizada a pesquisa por heterosídeos antraquinônicos, sugerindo desta forma a presença de
naftoquinonas e/ou antraquinonas.
Para a pesquisa de esteroides/triterpenos foi observada a formação de coloração amarela
com as frações hexano e acetato de etila, e este resultado indica a possível presença de um
composto que apresenta um grupamento metila no carbono 14 em sua fórmula estrutural (Miguel,
2003). Para a fração clorofórmio foi observado a formação de coloração rosa que possivelmente
sugere a presença de um composto que apresenta na sua fórmula estrutural uma função carbonila na
posição 3 e dupla ligação entre os carbonos 5 e 6. Para a fração hidro alcoólica residual foi
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1325 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
observada a formação de coloração verde que sugere também a presença de um composto que
apresenta na sua fórmula estrutural uma função carbonila na posição 3 e dupla ligação entre os
carbonos 5 e 6 (Miguel, 2003). Esteroides são uma classe de compostos químicos encontrados
muito comumente em plantas do gênero pesquisadas, é o caso da B. candicans, B. forficata, B.
guianensis, B. manca, B. splendens, B.uruguayensis, B.vahlii, B. variegata. Com relação aos
triterpenos a literatura reporta a presença na B.vahlii e B. variegata (Silva & Cechinel Filho, 2002).
A pesquisa utilizando o extrato aquoso (Tabela 3) obteve resultado negativo para a
presença de heterosídeos antociânicos e heterosídeos saponínicos, pois não houve formação de
espuma maior ou igual a um centímetro.
Tabela 3 - Resultados da caracterização fitoquímica com o extrato aquoso obtido a partir
das folhas de Bauhinia ungulata L.
ANÁLISE EXTRATO AQUOSO
Heterosídeos antociânicos -
Heterosídeos saponínicos -
Heterosídeos cianogênicos -
Taninos hidrolisáveis -
Taninos condensados +
Aminogrupos +
Ácidos fixos +
Ácidos voláteis -
Legenda: (+) positivo; (-) negativo.
Não foi detectada a presença de heterosídeos cianogênicos no ensaio tendo em vista a
ausência de coloração vermelha na tira de papel picro-sódico utilizado.
Na pesquisa de taninos não foi observado a presença de taninos hidrolisáveis e polifenóis,
tendo em vista a não ocorrência de coloração azul e marrom respectivamente, utilizando como
reagente o cloreto férrico. Quando a busca foi pela presença de taninos condensados, o resultado foi
considerado positivo tendo em vista ocorrência de coloração verde quando o resíduo do papel de
filtro foi lavado com solução de álcool 50% e gotejadas algumas gotas de KOH a 5%.
Na pesquisa de ácidos voláteis o valor do pH observado na fita foi superior a 7 sugerindo a
ausência destes compostos. Na pesquisa de ácidos fixos houve formação de coloração marrom
quando o reativo de Nessler foi gotejado sobre uma das manchas do resíduo amoniacal do extrato
em tira de papel de filtro, conferindo positividade ao teste e sugerindo a presença de ácidos fixos.
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1326 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
Os ensaios fitoquímicos preliminares foram realizados com o objetivo de servirem de guia
para o isolamento de substâncias, informando quais são os principais grupos de metabólitos
presentes na amostra. Os resultados obtidos coincidem com a composição da família descrita na
literatura, com a presença principalmente de alcaloides, flavonoides, esteroides e triterpenos. A
partir destes ensaios será possível estabelecer estratégias para a obtenção de compostos isolados
pertencentes à determinados grupamentos químicos, principalmente os flavonoides.
AVALIAÇÃO DA TOXICIDADE FRENTE À Artemia salina
Os resultados obtidos referentes à avaliação da toxicidade sobre a A. salina são
apresentados na Tabela 4.
Tabela 4 – Mortalidade de Artemia salina e CL50 utilizando o extrato e frações das folhas de
Bauhinia ungulata L.
AMOSTRA CONCENTRAÇÃO µg.mL-1 /
MORTALIDADE
CL50 µg.mL-
1
IC de 95%
μg.mL-1
10 100 1000
EB 4 6 5 > 1000 -
FH 1 0 2 > 1000 -
FCL 0 6 2 > 1000 -
FAE 1 2 2 >1000 -
FR 0 2 3 > 1000 -
Metanol 0 0 0 > 1000 -
Sulfato de quinidina 16 10 18 50,12
35,80-70,16
Extrato Bruto (EB), Fração Hexânica (FH), Fração Clorofórmio (FCL),
Fração Acetato de Etila (FAE), Fração Hidro alcoólica Residual (FR).
IC= Intervalo de Confiança. CL50= concentração letal.
De acordo com Meyer et al. (1982), as amostras são consideradas ativas quando a CL50 for
menor que 1000 µg.mL-1, portanto, de acordo com os valores obtidos nenhuma das amostras
testadas apresentaram toxicidade sobre A. salina. Apesar de algumas mortes terem sido observadas
com as amostras no experimento, o número total não foi estatisticamente significativo quando
comparados ao sulfato de quinidina utilizado como controle positivo do teste e nem com o controle
negativo (metanol / solvente utilizado para solubilização das amostras).
O ensaio de toxicidade frente aos náuplios de A. salina, que são microcrustáceos de água
salgada empregados como alimento vivo para peixes, pode ser utilizado para a determinação
preliminar de toxicidade de extratos vegetais por meio da estimativa da concentração letal (CL50)
capaz de matar 50% dos náuplios (Cavalcante et al., 2000; Parra et al., 2001; Nascimento et al.,
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1327 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
2008), tendo como principais vantagens a fácil obtenção, rapidez de realização do ensaio além do
baixo custo (Meyer et al., 1982) e simplicidade de execução (Siqueira et al., 2001; Nascimento et
al., 2008).
Outras plantas do gênero Bauhinia foram analisadas e também não demonstraram efeitos
tóxicos, como por exemplo, a B. forficata que apresentou CL50 1780 µg.mL-1 (Figueira et al., 2012),
a B. purpurea que apresentou CL50 > 5000 µg.mL-1 (Krishnarajua et al., 2005) e o extrato bruto da
B. variegata com CL50>1000 mg.mL-1, porém este autor encontrou atividade quando testou
alcaloides totais isolados desta planta (Martínez et al., 2011). Por outro lado, o extrato acetato de
etila e o metanólico obtido das folhas e da B. rufescens foram tóxicos (0,059 e 0,389 mg.mL-1
respectivamente) (Muhammad & Sirat, 2013).
AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE HEMOLÍTICA
Para avaliação da atividade hemolítica proposta pela Farmacopeia Brasileira 5ª edição,
foram testados o EB e frações obtidas a partir das folhas da B. ungulata L., sendo que não foi
observada formação de hemólise total para nenhuma amostra em nenhuma diluição. Em todos os
tubos ocorreu a formação de depósitos de eritrócitos, demonstrando que as amostras não foram
capazes de promover hemólise total in vitro.
Resultado semelhante foi observado com a avaliação da atividade hemolítica em placas de
ágar sangue ou teste de difusão em discos, em que também não foram observados a formação de
halos de hemólise ao redor do disco de papel, característico deste método, para nenhuma amostra
analisada.
A avaliação de atividade hemolítica é considerada um indicador de toxicidade geral e
bioatividade, sendo importante na investigação da ação de extratos de plantas sobre o sangue
humano. Os testes in vitro para determinar a ação hemolítica têm sido utilizados como um dos
métodos de triagem para os diferentes agentes tóxicos (Kublik et al., 1996), incluindo a avaliação
de plantas (Gandhi & Cherian, 2000).
Os resultados obtidos confirmaram a reação negativa de Lieberman Bouchardt da marcha
fitoquímica, sugerindo a ausência de saponinas e podem indicar não toxicidade das amostras nestes
modelos, no entanto outros estudos de toxicidade in vitro e in vivo devem ser realizados.
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1328 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
ATIVIDADE ANTIBACTERIANA
Concentração Inibitória Mínima
A Tabela 5 apresenta os resultados obtidos na técnica de micro diluição em caldo para a
determinação da concentração inibitória mínima (CIM). A determinação da CIM vem sendo
bastante utilizada, principalmente devido à sua maior sensibilidade e uso de quantidade mínima de
reagentes, o que possibilita um maior número de réplicas, aumentando a confiabilidade dos
resultados (Ostrosky et al., 2008).
Tabela 5 - Atividade antibacteriana do extrato e frações de Bauhinia ungulata avaliada a partir do
teste de microdiluição em caldo MICRO-ORGANISMO µg.mL-1
AMOSTRA S. aureus
ATCC 25923
E. coli
ATCC 5922
P. aeruginosa
ATCC
27853
E. faecalis ATCC
29212
EB 1250 5000 5000 1250
FH >200 >200 >200 >200
FAE >200 >200 >200 >200
FCL >200 >200 >200 >200
FR >200 >200 >200 >200
Legenda: Extrato Bruto (EB), Fração Hexânica (FH), Fração Clorofórmio
(FCL), Fração Acetato de Etila (FAE), Fração Hidro alcoólica Residual (FR).
ATCC - American Type Culture Collection; CIM – Concentração
Inibitória mínima (µg.mL-1). > = superior a. Interpretação da atividade:
CMI ≥ 100 µg.mL-1 = inativo; CMI ≤ 100 µg.mL-1= ativo.
A maior parte dos trabalhos considera extratos obtidos de plantas com bom potencial
inibitório se demonstram atividade em concentrações de até 100 µg.mL-1, atividade inibitória
moderada de 100-500 µg.mL-1, atividade fraca de 500-1000 µg.mL-1 e inativos maiores que 1000
µg.mL-1 (Dall'Angol et al., 2003; Ayres et al., 2008). Por outro lado Mitscher et al. (1972)
considera inativo quando os valores da CIM estão acima de 100 µg.mL-1, pois não apresentam
interesse para uso clínico. Portanto, baseado no interesse clínico, não foi observada atividade do
extrato e frações sobre as espécies analisadas, pois ao avaliar a atividade antibacteriana do EB foi
observada CIM acima de 1000 µg.mL-1 e para as frações as CIMs obtidas encontraram-se acima de
200 µg.mL-1, que foram as maiores concentrações testadas.
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1329 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
Outras espécies de Bauhinia também foram analisadas com relação a atividade
antibacteriana. Martínez et al. (2011) testaram a atividade do extrato etanólico de B. variegata sobre
Escherichia coli utilizando o método da difusão em ágar sem observação de inibição do
crescimento bacteriano. O mesmo ocorreu com Enterobacter aerogenes, Providencia spp,
Pseudomonas aeruginosa, S. aureus e Klebsiella spp que se mostraram resistentes ao contato com o
extrato hidro alcoólico de B. forficata também utilizando o método da difusão em disco (Gonçalves
et al., 2013). Folhas e casca do caule de B. rufecsens foram submetidas a extração com éter de
petróleo, acetato de etila e metanol e os extratos resultantes submetidos a avaliação do potencial
antibacteriano utilizando MIC e difusão em disco. De acordo com os autores (Muhammad & Sirat,
2013) foi observada uma maior atividade da fração acetato de etila das folhas e cascas do caule
contra P.aeuroginosa e B. subtilis e do extrato metanólico contra P. aeruginosa. Eficácia
antibacteriana também foi observada com os extratos acetato de etila, n-butanol e metanol da casca
do caule de B. rufescens contra S. auereus e P. aeuroginosa (Usman, 2009). Adicionalmente, o
extrato n-hexano e metanol de B. racemosa e B. variegata foram investigados contra Bacillus
cereus, E. coli, S. aureus e P. aeruginosa, sendo o extrato metanólico mais ativo. Souza et al.
(2004) utilizaram o método da difusão em ágar para avaliar atividade dos extratos e frações da B.
forficata e B. microstachya, encontrando que somente uma fração da B. forficata foi capaz de inibir
crescimento da E. coli e S. aureus na concentração de 1.000 µg.mL-1. A B. microstachya não
apresentou atividade antibacteriana.
CONCLUSÃO
A análise fitoquímica qualitativa preliminar apontou a presença de alcaloides, flavonoides,
antraquinonas, esteroides, triterpenos e taninos condensados. As amostras testadas não foram ativas
frente às cepas bacterianas utilizadas e também não se mostraram tóxicas frente à Artemia salina
além da ausência de atividade hemolítica. A ausência de toxicidade estimula a realização de
estudos adicionais para a determinação de propriedades biológicas e terapêuticas desta
espécie.
AGRADECIMENTOS
A Capes pelo suporte financeiro e bolsas de doutorado, a Sra. Geciane Mirian da Silva pelo auxílio
com a coleta do material e ao Herbário da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul pela
identificação da espécie.
ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH
1330 Paula, C. S et al Rev. Bras. Farm. 96 (2): 1315 – 1334, 2015
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Revista Brasileira de Farmácia – ISSN 2176 – 0667 (on line)
Brazilian Journal of Pharmacy
Volume 96 Número 2 Maio – Junho – Julho - Agosto / 2015
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