Upload
others
View
2
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
A MEDIAÇÃO COMO FERRAMENTA MINIMIZADORA DA ALIENAÇÃO
PARENTAL
IGOR EMANUEL DE SOUZA MARQUES1
CARLINEIA DE ARAÚJO FIGUEIREDO COSTA2
APONTAMENTOS SOBRE ALGUNS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO
DIREITO DE FAMÍLIA
Para início da análise do tema, é importante considerar o Direito de Família no contexto das
transformações ocorridas nas relações sociais nos últimos tempos sob risco de, se assim não for
feito, chegar a conclusões distantes da realidade.
Neste cenário, convém observar que o modelo tradicional de família, onde predominava a
hierarquia, tem cedido espaço para relações de igualdade, tendo como traço fundamental a
lealdade (DIAS, 2015, p. 32).
A Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988), foi muito importante na
transformação do Direito de Família, tanto que estabeleceu no artigo 226 que, além de ser “base
da sociedade”, a família “tem especial proteção do Estado”3.
Com um capítulo próprio no texto constitucional, a família ganhou ênfase e proteção especial
para os seus membros, em evidência os mais fragilizados nessa relação, os idosos e as crianças.4
1 Doutorando em Direito na FADISP (Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo). Mestre em Ciências
da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). Especialista em Docência do Ensino Superior pelo
Centro Universitário Adventista de São Paulo. Bacharel em Direito e em Teologia pelo Centro Universitário Adventista
de São Paulo (UNASP-EC). É advogado e atua como professor do curso de Direito no Centro Universitário Adventista
de São Paulo, Campus Engenheiro Coelho (UNASP-EC), com concentração na faculdade de Direito. É também
mediador e conciliador judicial credenciado junto ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), atuando no
Centro Judicial de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) da Comarca de Artur Nogueira/SP. E-mail:
[email protected]. 2 Bacharelanda em Direito, no Centro Universitário Adventista de São Paulo, Campus Engenheiro
Coelho. E-mail: [email protected]. 3 Na Constituição de 1967, não trazia a qualificação de ser a base da sociedade, nem havia menção à
proteção especial, como se depreende: “Art 167 - A família é constituída pelo casamento e terá direito à
proteção dos Poderes Públicos”.
4 (BRASIL, 1988) Capítulo VII - Da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso. Art. 226
a 230.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
Apesar da família não existir por causa do Direito, este traça linhas gerais e impõe
regramentos que visam assegurar a prometida proteção constitucional (OLIVEIRA, 2012, p.
14). Assim, os regramentos impostos à família, possuem como objetivo a proteção familiar e,
consequentemente, de seus membros também. Sobre isto, Gustavo Tepedino (2004, p. 398)
esclarece:
a família, embora tenha ampliado, com a Carta de 1988, o seu
prestígio constitucional, deixa de ter valor intrínseco, como instituição
capaz de merecer tutela jurídica pelo simples fato de existir, passando
a ser valorada de maneira instrumental, tutelada na medida em que – e
somente na exata medida em que – se constitua em um núcleo
intermediário de desenvolvimento dos filhos e promoção da dignidade
de seus integrantes.
Como demonstração da anunciada proteção, a Constituição promoveu a consagração de
importantes princípios, como da dignidade humana5, pluralidade familiar
6, igualdade entre os
cônjuges7, igualdade dos filhos
8, entre outros, conforme se demonstrará a seguir.
Princípio da Dignidade Humana
A dignidade da pessoa humana constitui-se em um dos fundamentos da República
Federativa do Brasil, previsto no artigo 1º, III, da Constituição Federal de 1988 e consiste no
direcionamento para elaboração de todas as normas do ordenamento jurídico.
O Código de Processo Civil9 (Lei 13.105/15), estabelece que o juiz, quando em sua
atividade jurisdicional, deve atender aos fins sociais e às exigências do bem comum, de modo
que resguarde e promova a dignidade da pessoa humana.
5 (BRASIL, 1988) Art. 226, § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade
responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos
educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de
instituições oficiais ou privadas.
6 (BRASIL, 1988) Art. 226, § 4º: Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por
qualquer dos pais e seus descendentes.
7 (BRASIL, 1988) Art. 226, § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos
igualmente pelo homem e pela mulher
8 (BRASIL, 1988) Art. 226, § 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão
os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
Todos os princípios e regras relativos aos direitos fundamentais derivam do princípio da
dignidade humana, e, vale observar, serve de base para a Lei de alienação parental (Lei
12.318/10)10
.
Maria Berenice Dias (2016, p. 45) apresenta a relação entre direito de família e a
dignidade humana:
O direito das famílias está umbilicalmente ligado aos direitos
humanos, que têm por base o princípio da dignidade da pessoa
humana, versão axiológica da natureza humana [...]. A dignidade da
pessoa humana encontra na família solo apropriado para florescer. A
ordem constitucional dá-lhe especial proteção independentemente de
sua origem.
Sendo assim, em qualquer conflito envolvendo relações familiares, deve-se resguardar a
dignidade da pessoa humana, pois este princípio tem centralidade no Direito de Família atual.
Princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros
A história humana nos últimos séculos tem como uma de suas marcas a luta por
igualdade. Sendo historicamente discriminadas, as mulheres conseguiram grandes avanços na
proteção legislativa. E a igualdade entre os cônjuges e companheiros é um dos mais relevantes
do Direito de Família,11
extirpando o tradicional caráter patriarcal, que era inerente à estrutura
familiar.
9 CPC, Art. 8º - “Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do
bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a
proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.”
10 Art. 3º - A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de
convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo
familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes
à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda.
11 Segundo Mário Henrique Castanho Prado de Oliveira (2012, p. 15) “após um longo período de
preponderância do ―pai da família‖ (claro resquício romano), a igualdade (ao menos formal) finalmente
se fez entre o homem e a mulher, de forma integral”.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
A Constituição Federal (BRASIL, 1988) estabeleceu a igualdade entre homens e
mulheres, no artigo 5º, quando afirma que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza”. E, inciso primeiro já ressalta que “homens e mulheres são iguais em direitos
e obrigações”12
.
Ainda em sede constitucional, o artigo 226, §5º estabelece: “os direitos e deveres
referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”.
E o Código Civil reproduz a mesma ideia no artigo 1.511, nos seguintes termos: “o
casamento estabelece comunhão de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos
cônjuges”, compreensão extensiva e aplicável às também às uniões estáveis.13
Sobre os efeitos deste princípio da igualdade no Direito de Família, afirma Maria
Helena Diniz (2008, p. 19):
Com este princípio da igualdade jurídica dos cônjuges e
companheiros, desaparece o poder marital, e a autocracia do chefe de
família é substituída por um sistema em que as decisões devem ser
tomadas de comum acordo entre conviventes ou entre marido e
mulher, pois os tempos atuais requerem que marido e mulher tenham
os mesmos direitos e deveres referentes à sociedade conjugal, o
patriarcalismo não mais se coaduna com a época atual, nem atende aos
anseios do povo brasileiro;
Mais recentemente, a Lei nº 13.257/2016 (lei da primeira infância), alterou o artigo 22
do Estatuto da Criança e do Adolescente, incluindo o parágrafo único com a seguinte redação:
Parágrafo único. A mãe e o pai, ou os responsáveis, têm direitos iguais
e deveres e responsabilidades compartilhados no cuidado e na
educação da criança, devendo ser resguardado o direito de transmissão
familiar de suas crenças e culturas, assegurados os direitos da criança
estabelecidos nesta Lei.
Dessa maneira, nota-se um desenvolvimento legislativo e doutrinário no sentido de
romper com a ideia de primazia de gênero, compreendendo que o princípio da isonomia deve
nortear as relações familiares.
12
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros
e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
13 § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como
entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE PARENTAL E O PLANEJAMENTO
FAMILIAR
Este princípio está apresentado no artigo 226, §7º da Constituição Federal:
Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da
paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do
casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e
científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma
coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.
O mesmo entendimento é encontrado no artigo 1.565 do Código Civil, quando afirma que “pelo
casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e
responsáveis pelos encargos da família”.14
Portanto, as decisões sobre planejamento familiar cabem de modo isonômico ao casal. O
Estado, por sua vez, assume a responsabilidade de disponibilizar meios para “evitar a formação
de núcleos familiares sem as necessárias condições de sustento e de manutenção”
(ROSENVALD; FARIAS, 2010, p. 47).
Desse modo, pode-se perceber que a responsabilidade parental consiste nos deveres e direitos
dos pais em relação aos filhos com o objetivo de prover a assistência afetiva, moral, intelectual e
material aos filhos.
Esse princípio não se limita aos aspectos reprodutores na escolha de ter filhos, que deve ser uma
decisão compartilhada, mas se entende às necessidades advindas dessa atitude, afinal, um filho
requer atenção material, física, psíquica, emocional e moral (GOMES, 2013, p. 54)
Este princípio sob comento ganha maior relevo em casos de rompimento do vínculo conjugal,
situação que reclama uma postura positiva dos pais, que devem se preocupar em preservar o
ambiente mais saudável possível ao desenvolvimento dos filhos especialmente. Pois, se por um
lado os pais têm a liberdade do exercício do poder familiar, “a legitimidade desse exercício está
condicionada ao respeito dos direitos fundamentais dos filhos” (DELGADO, 2008, p. 43).
14
O Enunciado 99 da I Jornada de Direito Civil assegura que este dispositivo normativo é aplicável
também à união estável, nos seguintes termos: “O art. 1.565, § 2º, do Código Civil não é norma destinada
apenas às pessoas casadas, mas também aos casais que vivem em companheirismo, nos termos do art.
226, caput, §§ 3º e 7º, da Constituição Federal de 1988, e não revogou o disposto na Lei n. 9.263/96.”
Disponível em: https://bit.ly/2tsEglj, acesso em 21 de junho de 2018.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE
Este princípio é corolário do princípio dignidade da pessoa humana, que é fundamento
da República Federativa do Brasil.
Apesar de não constar expressamente em textos legislativos15
, uma interpretação
sistemática da Constituição Federal brasileira possibilita vislumbrar que o princípio da
afetividade tem lastro constitucional, que se reconhece a partir do processo evolutivo da família.
Paulo Luiz Netto Lôbo (2001, p. 8-9) identifica os seguintes pressupostos:
a) todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem (art.
227, § 6º);
b) a adoção, como escolha afetiva, alçou-se integralmente ao plano da
igualdade de direitos (art. 227, §§ 5º e 6º);
c) a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes,
incluindo-se os adotivos, e a união estável têm a mesma dignidade de
família constitucionalmente protegida (art. 226, §§ 3º e 4º);
d) o casal é livre para extinguir o casamento ou a união estável,
sempre que a afetividade desapareça (art. 226, §§ 3º e 6º).
Este princípio ajuda a compreender também a noção atual de família, na qual prevalecem os
laços afetivos em relação ao vínculo biológico para definir o conceito de família e se apresenta
como direito fundamental que decorre da dignidade humana.
A jurisprudência brasileira também tem compreendido o valor jurídico das relações de afeto,
com o objetivo de promover a felicidade e o bem-estar dos membros da família. Exemplo desse
entendimento pode ser constatado nos julgamentos dos Tribunais Superiores. No julgamento da
ADI 427716
pelo Supremo Tribunal Federal (2011), ao reconhecer a união homoafetiva como
entidade familiar, e no julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça (2012), do REsp
1.159.242-SP17
, ao admitir a responsabilidade civil nos casos de abandono afetivo.
15
No contexto de afetividade, só há uma menção expressa no Código Civil, no § 6º do artigo 1.584:
§ 5o Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda
a pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de
parentesco e as relações de afinidade e afetividade.
16 STF. ADI 4.277. Disponível em: https://bit.ly/1JBYbBy, acesso em 13 de maio de 2018.
17 STJ. REsp 1.159.242-SP. Disponível https://bit.ly/2KcYvxq, acesso em 15 de maio de 2018.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
De acordo com Paulo Luiz Netto Lôbo (2012, p. 70) o princípio da afetividade,
específico do Direito de Família, entrelaça os princípios constitucionais fundamentais da
dignidade da pessoa humana, da solidariedade, além dos princípios da convivência familiar e da
igualdade entre cônjuges, companheiros e filhos. Portanto, pode-se concluir que hodiernamente
família “é acima de tudo um núcleo sócioafetivo destinado à plena realização da individualidade
e da dignidade de seus membros” (HERKENHOF, 2005, p. 235).
Evidente, assim, que a família que ganhou espaço privilegiado na Constituição é aquela
baseada no afeto.
PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DO MENOR E O DIREITO À
CONVIVÊNCIA FAMILIAR
Na mesma esteira de amparar e regulamentar as transformações na estrutura
familiar, encontra-se o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, que no
dizer de Guilherme Calmon Nogueira da Gama (2008, p. 80)
representa importante mudança de eixo nas relações paterno-materno-
filiais, em que o filho deixa de ser considerado objeto para ser alçado
a sujeito de direito, ou seja, a pessoa humana merecedora de tutela do
ordenamento jurídico, mas com absoluta prioridade comparativamente
aos demais integrantes da família de que ele participa. Cuida-se,
assim, de reparar um grave equívoco na história da civilização
humana em que o menor era relegado a plano inferior, ao não
titularizar ou exercer qualquer função na família e na sociedade, ao
menos para o direito.
Assim, o menor passa a ter função primordial na família, precisando do apoio e auxílio
no seu desenvolvimento e por isso a ordem jurídica passou a valorizar a dignidade de todos os
membros da família, especialmente, das crianças e adolescentes.
Este pensamento não é novo. Em 1989, foi aprovada na Assembleia Geral das Nações
Unidas a Convenção Internacional dos Direitos da Criança. Esta convenção foi ratificada pelo
Brasil através do Decreto 99.710/90, ao dispor no item 1 do artigo 3, nos seguintes termos:
Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições
públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades
administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar,
primordialmente, o interesse maior da criança.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
Estes ideais foram esposados no artigo 227 da Constituição Federal, com redação dada
pela Emenda Constitucional nº 65, como se depreende:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à
criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito
à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão.
Em nível infraconstitucional a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente
(Lei nº 8.069/9018
) também representou um importante avanço da legislação ao regulamentar de
forma específica os direitos das crianças e dos adolescentes, reconhecendo-os como titulares de
direitos.
O princípio do melhor interesse do menor, de difícil conceituação como todo princípio,
mas de observância indispensável para concretização dos direitos fundamentais da criança e do
adolescente, foi plenamente incorporado pelo nosso ordenamento jurídico e deve ser aplicado.
Diretamente relacionado ao melhor interesse da criança e do adolescente,
princípio encontra-se o direito à convivência familiar. Tanto que aparece entre os
direitos de toda criança do artigo 227 da Constituição Federal, quando dispõe que é
dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança o direito à convivência
familiar.
O artigo 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente determina também que “é
direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e,
excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e
comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral”.
18
ECA, Art. 5º - “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por
ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
O tema é tão importante que o princípio deve ser concretizado mesmo em casos
de privação de liberdade dos pais, onde por meio de visitas periódicas os filhos poderão
buscar ter a idealizada convivência.19
De notar-se que o direito à convivência familiar demonstra ser uma necessidade
vital do menor assim como os direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito e
à liberdade.
E a concretização de todos estes princípios diretamente orientadores do Direito
de Família buscam conferir proteção integral à família, especialmente aos menores, que
são os mais vulneráveis. E certamente inviabilizariam a ocorrência da alienação
parental, que será vista com detalhamento adiante, mas representa a transgressão destes
princípios fundamentais.
MÉTODOS AUTOCOMPOSITIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS:
CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO
O direito de acesso à Justiça é um direito fundamental brasileiro, assegurado no artigo
5º, XXXV da Constituição Federal, mas a prática jurídica indica que há um longo caminho para
ser percorrido em busca de sua efetividade.
Com a promulgação do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15) e a Lei de
Mediação (Lei 13.140/15), renovaram-se as expectativas quanto à previsão legislativa que
mitigasse o espírito de litigiosidade cada vez mais crescente na sociedade brasileira e
favorecesse o encontro de soluções consensuais e menos impositivas, possibilitando um acesso
mais efetivo a uma solução jurídica justa.
Tais iniciativas ganham relevo quando se considera o número elevado de ações
submetidas à apreciação do Poder Judiciário , somados às possibilidades de procedimentos e
manobras legítimas que podem ser utilizados para impedir a marcha do curso processual, e da
frequente insatisfação de uma das partes, ou até de ambas.
19
ECA, Artigo 19. §4º Será garantida a convivência da criança e do adolescente com a mãe ou o pai
privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável ou, nas hipóteses de
acolhimento institucional, pela entidade responsável, independentemente de autorização judicial.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
Nesse sentido, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) reconhece a importância de
métodos consensuais de solução de conflitos, quando na Resolução 125 afirmou:
CONSIDERANDO que a conciliação e a mediação são instrumentos
efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, e que a
sua apropriada disciplina em programas já implementados no país tem
reduzido a excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a
quantidade de recursos e de execução de sentenças;
Desse modo, evidente que estes meios alternativos surgem como uma tentativa de
pacificação social e como resposta à crescente complexidade das sociedades modernas, na qual
se pretende alcançar a solução mais justa para ambas as partes, superando o paradigma que em
uma situação de interesses conflitantes é preciso haver um ganhador e um perdedor. Sendo
assim, torna-se possível que as partes de polos opostos tenham seus interesses satisfeitos
(MAGALHÃES, 2014, p. 11). Por tal razão importa estabelecer algumas diferenciações
conceituais, pois são institutos que se aproximam mas a doutrina não permite serem
confundidos.
CONCILIAÇÃO
A conciliação, que pode ocorrer tanto de maneira judicial quanto extrajudicial, segundo
Fernanda Tartuce (2015, p. 48) pode ser definida como uma técnica autocompositiva em que
um profissional imparcial intervém para, mediante atividades de
escuta e investigação, auxiliar os contendores a celebrar um acordo, se
necessário expondo vantagens e desvantagens em suas posições e
propondo saídas alternativas para a controvérsia, sem, todavia, forçar
a realização do pacto.
Em termos pragmáticos caracteriza-se a conciliação como a resolução do conflito que se dá pela
participação ativa de um terceiro, que intermediará a relação conflituosa, aconselhando,
emitindo opiniões, sugerindo soluções, e até mesmo induzindo as partes para a celebração de
um acordo (FERREIRA, 2009).
Nesta tarefa o conciliador exerce influência direta na solução do conflito, ao contrário da
mediação, onde são as próprias partes responsáveis pela construção da melhor solução para o
caso posto em discussão, refletindo uma verdadeira transformação comportamental
(MOREIRA, 2013, p. 79).
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
Para Tatiana Robles (2009, p. 34), durante o procedimento de conciliação, o conciliador tem
uma atuação persuasiva, ao tentar “convencer uma das partes a aceitar a proposta da outra e,
caso isso não ocorra, ele próprio formula soluções, tentando fazer com que as partes aceitem
essas soluções”.
Carlos Eduardo de Vasconcelos (2008, p. 38) aponta que “a conciliação é apropriada para lidar
com relações eventuais de consumo e outras relações casuais em que não prevalece o interesse
comum de manter um relacionamento, mas apenas o objetivo de equacionar interesses
materiais.20
Diversas legislações têm conferido importante papel à conciliação na resolução de conflitos.21
No Novo Código de Processo Civil, as sessões de tentativa de autocomposição receberam
destaque,22
sendo dever do juiz promover, a qualquer tempo a autocomposição,23
o que acontece
geralmente em uma ou duas sessões de conciliação, de acordo com Fernanda Tartuce (2015, p.
54)
MEDIAÇÃO
A mediação também se apresenta como um meio consensual para resolver
controvérsias, em que um terceiro isento atua com vistas a facilitar a comunicação entre pessoas
envolvidas “para propiciar que elas possam, a partir da restauração do diálogo, encontrar formas
produtivas de lidar com as disputas” (TARTUCE, 2015, p. 51).
No ensino de Rodrigues Júnior (2006, p.75) à semelhança da conciliação, a mediação se
apresenta como um método autocompositivo que tem por objetivo “desarmar as partes
envolvidas no conflito”. Neste sentido, o mediador também se apresenta como um terceiro
imparcial, com a “atribuição de mover as partes da posição em que se encontram, fazendo-as
chegar a uma solução aceitável”, mas que diferentemente do conciliador, não deve influenciar
as decisões por meio de sugestões, opiniões ou conselhos.
20
Art. 165 § 2o: O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo
anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo
de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.
21 Podem ser citados a título exemplificativo: o art. 21 da Lei nº 9.099/95; art. 1º da Lei nº 10.259/01.
22 CPC, art. 334: “Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de
improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com
antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de
antecedência.”
23 Art. 139, V.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
A distinção fundamental entre a conciliação e a mediação está na responsabilidade das
partes envolvidas. Nesta última, a forma natural de regular os conflitos de interesse é de
responsabilidade de cada um, que assume as consequências de seus atos ou omissões. Só
recorrem ao Judiciário aqueles que forem incapazes de regular diretamente suas diferenças ou,
mais raramente, por se tratar de questão de alta indagação jurídica a depender de interpretação
do Judiciário (BARBOSA, 2003, p.342).
Sendo assim, a mediação se demonstra adequada para solução de controvérsias que
envolvam vínculos de caráter mais permanente ou ao menos mais prolongados, pois para Daniel
Amorim Assumpção Neves (2017, p.64) a mediação centra-se nas causas, fazendo as partes
enxergarem as raízes da controvérsia, retirando o foco do problema em si. Segundo Águida
Arruda Barbosa (2014, p. 12) a mediação atua no nascedouro do conflito, portanto, não visa
necessariamente ao acordo, mas a compreensão da forma de comunicação reinante entre os
conflitantes.
De acordo com o Código de Processo Civil, o mediador deve atuar preferencialmente
nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a
compreender as questões e os interesses em conflitos, de modo que eles possam, pelo
restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem
benefícios mútuos.24
Evidente que esta previsão identifica facilmente com controvérsias
familiares.
Para Maria Berenice Dias (2016, p.87) a mediação busca transformar uma situação
adversarial em um processo colaborativo, estimulando o diálogo e a construção criativa da
solução pelas próprias partes. É uma forma de solução de conflito na qual uma terceira pessoa,
neutra e imparcial, facilita o diálogo para que os mediandos construam, com autonomia e
solidariedade, uma melhor solução.
Fernanda Tartuce (2015, p. 54) esclarece que, geralmente a mediação “conta com
diversas sessões em que o mediador trava contato com os envolvidos e, por meio de perguntas
apropriadas, contribui para o alívio das resistências dos contendores, de modo que estes
protagonizem saídas consensuais para o impasse”.
Deve-se levar em conta o respeito aos sentimentos conflitantes, pois coloca os
envolvidos frente a frente na busca da melhor solução, permitindo que os envolvidos percebam
o que podem fazer para se reorganizarem. Dessa maneira, a decisão é tomada pelas partes e não
pelo mediador, pois a finalidade da mediação é permitir que os interessados resgatem a
responsabilidade por suas próprias escolhas, o que é ideal para conflitos originários das relações
familiares.
24
CPC, Art. 165, § 3º
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO NO DIREITO DE FAMÍLIA
Como qualquer tipo de relação interpessoal, as famílias também estão suscetíveis a
diversos tipos de conflitos. Todavia, devido à importância já demonstrada da instituição familiar
e seus membros no texto constitucional e legislação complementar, importa que tais conflitos
sejam tratados de uma maneira mais cuidadosa, considerando que os vínculos são anteriores e
precisam ser mantidos.
Todavia, nos tempos atuais, os conflitos familiares, como o divórcio, a dissolução da
união estável, guarda dos filhos e pensão alimentícia, segundo Roberta Brasiliense Marcantonio
(2014, p. 62), em vez de serem solucionados dentro do próprio seio familiar, têm sido
prontamente submetidos ao Poder Judiciário, para que uma sentença judicial decida os rumos
familiares. Tal constatação apresenta perigosa, pois no âmbito do Direito de Família, pela falta
de estrutura aliada à alta demanda, é inviável acreditar que o Poder Judiciário faça uma análise
minuciosa e cuidadosa de questões tão complexas e sensíveis, o que resulta em decisões
judiciais que desagradam aos polos em litígio.
Neste sentido, como já apontado, a mediação familiar se apresenta como meio
complementar ou alternativo ao Poder Judiciário para que as partes alcancem um entendimento
sobre os conflitos oriundos de suas relações familiares de modo mais célere, econômico e
satisfatório a todos os envolvidos.
Lilia Maia de Morais Sales (2010, p. 77) afirma que, ainda que a mediação possa servir
para dirimir controvérsias de diversas esferas, é na esfera familiar que sua aplicação é ainda
mais adequada, posto que há sentimentos envolvidos, relações duradouras. Sob este prisma
torna-se evidente que o exercício da mediação familiar requer maior preparo e sensibilidade do
mediador. Sob este panorama, importante esclarecimento faz Edwirges Elaine Rodrigues (2017,
p. 98):
É fato que, os desentendimentos, em especial, no âmbito familiar, têm
origem na dificuldade de comunicação dos seus membros, que se
inicia pela difícil compreensão dos próprios sentimentos, decorrente
da não identificação das funções que cada um deve exercer no sistema
familiar. O evento separação, especialmente quando acompanhado da
litigiosidade, evidencia ainda mais a comunicação inadequada,
permeada pela linguagem do conflito, refletindo assim, na dificuldade
enfrentada pelos filhos em dialogar com os pais litigantes, fazendo
com que aqueles se sintam em verdadeira situação de abandono.
Nesse sentido, a postura do mediador deve permitir que os participantes da mediação
tenham ampla liberdade para conversar, sem sentirem-se invadidos pela intervenção do
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
mediador, que não pode, de forma alguma, emitir juízo de valor em relação a situação
vivenciada na mediação.
De acordo com Eliana Riberti Nazareth (2008, p. 21), o modelo multidisciplinar
apresentaria os melhores resultados, quando envolvesse mediadores profissionais das áreas de
psicologia, serviço social e da advocacia. Por essa lógica, Euclides de Oliveira (2001, p. 107)
afirma que seria possível alcançar um ponto de equilíbrio de modo que as partes “encontrem
uma solução que lhes garanta condições para projeção de um futuro saudável e feliz”.
Esta percepção faz muito sentido, especialmente ao constatar que os conflitos familiares
antes de questões de ordem jurídica, são primeiramente desordens afetivas e psicológicas
permeadas de sofrimento. É por tal razão que a mediação familiar é tão importante, pois
“referem-se a casais que, mesmo diante da ruptura, necessitam imperativamente manter as
relações de pais, em seu próprio interesse e fundamentalmente em proveito dos filhos”
(RODRIGUES, 2017, p. 99).
Diante do exposto pode-se definir a mediação familiar como:
um acompanhamento das partes na gestão de seus conflitos, para que
tomem uma decisão rápida, ponderada, eficaz, com soluções
satisfatórias no interesse da criança, mas, antes, no interesse do
homem e da mulher que se responsabilizam pelos vários papéis que
lhe são atribuídos, inclusive de pai e mãe (BARBOSA, 2003, p. 342).
ALIENAÇÃO PARENTAL: NOÇÕES CONCEITUAIS DO PROBLEMA
O tema da alienação parental não é recente, certamente existente desde que o ser
humano desenvolve relações interpessoais. Segundo Maria Berenice Dias (2016, p. 462), não
obstante sua origem remota, somente nos tempos atuais é que tem despertado a atenção. Tal
análise adquire importância quando se considera que é no rompimento do vínculo conjugal que
a alienação parental encontra solo fértil para se desenvolver, especialmente na situação de
disputas pela guarda dos filhos.25
Inicialmente cabe observar que a expressão “alienação parental” não é brasileira, sendo
originária do psiquiatra norte-americano Richard Gardner, sendo relacionada ao exercício
25
Maria Berenice Dias (2016, p. 462) justifica sua ideia a partir da mudança de estrutura das
responsabilidades familiares: “como os papeis parentais eram bem divididos, quando da separação, os
filhos ficavam sob a guarda materna e ao pai cabia o encargo de pagar alimentos e visitá-los
quinzenalmente, se tanto. Com a significativa mudança de costumes, o homem descobriu as delícias da
paternidade e começou a ser muito mais participativo no cotidiano dos filhos. Quando da separação, ele
não mais se conforma com o rígido esquema de visitação, muitas vezes boicotado pela mãe, que se sente
‘proprietária’ do filho, exercendo sobre ele um poder absoluto”.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
abusivo do direito de guarda dos filhos (OLIVEIRA, 2014, p. 24). Tal descrição ganha sentido
quando consumada a separação do casal e determinada a guarda dos filhos a um dos genitores,
cabendo ao outro apenas o direito de visitas como uma forma de assegurar a convivência entre o
filho e o genitor não guardião, embora seja frequente a imposição de barreiras à visitação por
parte do genitor guardião.
Fábio Vieira Figueiredo e Georgios Alexandridis (2011, p. 45,46) explicam a ideia por
trás desse conceito tão prejudicial às relações familiares:
a alienação parental consubstancia-se na atuação inquestionável de um
sujeito, denominado alienador, na prática de atos. Que envolvam uma
forma depreciativa de se lidar com um dos genitores. Trata-se,
portanto, de atuação do alienador que busca turbar a formação da
percepção social da criança ou do adolescente. Assim, o alienador
procede de maneira a instalar uma efetiva equivocidade de percepção
no alienado (criança ou menor) quanto aos elementos que compõem a
personalidade do vitimado. Evidente que a criança ou o adolescente
são vítimas da situação de alienação parental, contudo, isto é assim
sob a perspectiva ex parteprincipi (Estado), posto que adentrando à
relação familiarista, por passar a ter uma noção equivocada da
situação, a criança ou o menor serão considerados alienados e aquele
sobre quem se deturpa a realidade será o vitimado.
Portanto, diante dessa situação, o divórcio traz efeitos emocionais sobre os filhos, muitas vezes
afetando seu desenvolvimento, simplesmente por questões que envolvem os genitores e a
dificuldade em perceber a responsabilidade que possuem na formação saudável dos filhos, o que
evidencia que uma mera análise jurídica é insuficiente para compreender.
Como resultado de atos de alienação, Jorge Trindade (2007, p. 102), busca conceituar a
Síndrome de Alienação Parental com sendo um
transtorno psicológico que se caracteriza por um conjunto de sintomas
pelos quais um genitor, denominado cônjuge alienador, transforma a
consciência de seus filhos, mediante diferentes formas e estratégias de
atuação, com o objetivo de impedir, obstaculizar ou destruir seus
vínculos com o outro genitor, denominado cônjuge alienado, sem que
existam motivos reais que justifiquem essa condição. Em outras
palavras, consiste num processo de programar uma criança para que
odeie um de seus genitores sem justificativa, de modo que a própria
criança ingressa na trajetória de desmoralização desse mesmo genitor.
Dessa maneira, podemos dizer que o alienador ― educa os filhos no
ódio contra o outro genitor, seu pai ou sua mãe, até conseguir que eles,
de modo próprio, levem a cabo esse rechaço.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
Devido à condição especial das crianças e adolescentes, eles são alvos de tutela jurídica
pelo fato de serem pessoas em desenvolvimento. Para protegê-los sob o aspecto em comento,
houve a promulgação da Lei nº 12.318/10, que dispõe sobre a alienação parental. E a definição
legal encontra-se no caput do artigo 2º, nos seguintes termos:
Art. 2o – Considera-se ato de alienação parental a interferência na
formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou
induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a
criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para
que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à
manutenção de vínculos com este.
Assim, embora evidentemente seja mais frequente a alienação parental realizada por um
dos genitores, nada impede que a campanha depreciativa seja promovida até mesmo por avós
que assumem o papel de educar seus netos em função da necessidade do trabalho do genitor que
detém a guarda do menor.
Fábio Vieira Figueiredo e Georgios Alexandridis (2011, p. 49) mostram ser possível a
alienação promovida por tutor do menor ou curador do incapaz, quanto a outros parentes do
menor, o que deixa claro que a figura do alienador não é exclusivo da pessoa de um dos
genitores, mas pode direcionar o repúdio contra qualquer parente próximo desse menor (irmãos,
avós, tios etc.).
Mas quais condutas são tidas como alienadoras? De maneira exemplificativa, o
parágrafo único do mesmo dispositivo apresenta situações que podem ser caracterizadas como
alienação parental:
I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no
exercício da paternidade ou maternidade;
II - dificultar o exercício da autoridade parental;
III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência
familiar;
V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes
sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e
alterações de endereço;
VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste
ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a
criança ou adolescente;
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando
a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro
genitor, com familiares deste ou com avós.
Vale notar que a norma não traz critérios excludentes para a verificação da
conduta do alienador: a prática de atos com o intuito de que o menor repudie genitor
(portanto necessitando demonstrar a finalidade específica da conduta, ainda que de
maneira indireta) é caracterizadora de alienação parental; também o é a simples conduta
que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos entre o filho e o
genitor. O legislador conferiu, portanto, juízo de desvalor tanto à conduta de visar a
obstrução da convivência familiar, como ao resultado de alcançar tal obstrução, ainda
que não tenha havido a intenção específica de se perpetrá-la.
A razão para que a legislação reprima tais condutas é apresentada no artigo 3º da
Lei 12.318/10, pois a alienação parental “fere direito fundamental da criança ou do
adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas
relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o
adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou
decorrentes de tutela ou guarda”.
Asseverando o texto legal que a prática alienadora consiste em abuso moral,
Mario Henrique Castanho Prado de Oliveira (2012, p. 148) afirma que caberia a
determinação de indenização por dano moral em favor do genitor alienado.
Ainda mais relevante que a previsão expressa da configuração de abuso moral
contra o menor, a parte final do mencionado dispositivo caracteriza a prática de atos de
alienação parental também como descumprimento dos deveres inerentes à autoridade
parental ou decorrentes de tutela ou guarda (OLIVEIRA, 2012, p. 148), ferindo
princípio de esteio constitucional, como já apresentado neste trabalho.
Convém observar que o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990),
já estabelecia as consequências para o descumprimento paterno dos deveres legais, como se
depreende
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos
filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação
de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.
Art. 24. A perda e a suspensão do poder familiar serão decretadas
judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na
legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento
injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22.
O texto do artigo 6º da Lei 12.318/10 estabelece que a primeira medida após a
confirmação da alienação seria advertir o alienador. Com a insistência na conduta alienadora
configura claro descumprimento de determinação judicial (art. 22 do ECA), o que, por sua vez,
enquadra-se nas hipóteses de perda e suspensão do poder familiar previstas no artigo 24 acima
transcrito.
Cumpre indicar, ainda, que a declaração da existência de indícios de alienação parental,
conforme determina o caput deste art. 4.º, pode se dar em ação autônoma visando
especificamente tal declaração, ou mesmo incidentalmente a ações em que esteja se discutindo a
guarda e/ou a regulamentação do regime de visitas.
Todavia, Mario Henrique Castanho Prado de Oliveira (2012, p. 148) assegura que
geralmente alienação parental tem início após o estabelecimento da guarda e do regime de
visitas, quando o alienador, então, passará criar dificuldades à convivência dos filhos com o
genitor alienado. (OLIVEIRA, 2012, p. 149)
A MEDIAÇÃO FAMILIAR PARA EVITAR A ALIENAÇÃO PARENTAL
Diante da análise apresentada é possível ter uma noção clara sobre a complexidade da
questão. Avanços foram realizados no sentido de coibir práticas alienadoras com o texto da Lei
12.318/10. Mas o texto legal também é passível de críticas, especialmente no que diz respeito ao
objeto deste trabalho, pois certamente a mediação familiar é ferramenta fundamental para
alcançar a almejada pacificação familiar.
O texto apresenta dois vetos presidenciais, onde o veto ao artigo 9º merece ser analisado
pela estreita relação com a ideia deste trabalho. O texto proposto declarava o seguinte:
Art. 9º As partes, por iniciativa própria ou sugestão do juiz, do
Ministério Público ou do Conselho Tutelar, poderão utilizar-se do
procedimento da mediação para a solução do litígio, antes ou no curso
do processo judicial.
§ 1o O acordo que estabelecer a mediação indicará o prazo de
eventual suspensão do processo e o correspondente regime provisório
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
para regular as questões controvertidas, o qual não vinculará eventual
decisão judicial superveniente.
§ 2o O mediador será livremente escolhido pelas partes, mas o juízo
competente, o Ministério Público e o Conselho Tutelar formarão
cadastros de mediadores habilitados a examinar questões relacionadas
à alienação parental.
§ 3o O termo que ajustar o procedimento de mediação ou o que dele
resultar deverá ser submetido ao exame do Ministério Público e à
homologação judicial.”
Importante observar que, segundo o texto proposto, seria possível fazer uso da mediação
tanto na fase pré-processual quanto judicial, onde um acordo não vincularia uma decisão
judicial futura (§1º), mesmo depois de homologado pelo Poder Judiciário (§3º). Ou seja, o
Estado não perderia o controle, mas estaria favorecendo os métodos de pacificação, o que
potencializaria a chance de as partes envolvidas encontrarem uma solução satisfatória a ambos.
Pode-se afirmar, com certa segurança, que o veto a esse artigo 9º, da Lei nº 12.318/10,
significou um grande retrocesso26
na solução de conflitos familiares decorrentes de práticas
alienadoras. Segundo Silva (2011) a expectativa era no sentido oposto: “esperava-se que
houvesse a obrigatoriedade da co-mediação em casos de família, com a presença de psiquiatra,
psicólogo ou assistente social nos conflitos judiciais”. Qual seria o prejuízo em se possibilitar
que os próprios pais de filhos menores discutam autonomamente, facilitados por um mediador,
as questões relevantes a seus filhos? A mesma autora conclui: “inconstitucional é a interferência
excessiva do Estado, através do Judiciário, que já extrapola os limites do tolerável se pensarmos
somente nos litígios judiciais, que se dirá em relação à exclusividade da mediação judicial como
única forma de dirimir os conflitos”.
Como já demonstrado, os procedimentos de conciliação e mediação são métodos
alternativos ao Poder Judiciário para solução de conflitos, pois processos judiciais são morosos,
custosos financeiramente e emocionalmente, favorecendo o distanciamento da necessária paz
entre as partes envolvidas de modo a minimizar os efeitos deletérios aos menores, vítimas dessa
situação. Ademais, importa destacar que os juízes, diante da alta demanda, não dispõem de
tempo para o diálogo, nem mesmo formação para solução de conflitos, que se repisa, estão além
da esfera estritamente jurídica (OLIVEIRA, 2012, p. 163).
26
A opinião de Oliveira (2012, p. 163) difere, ao concordar com o veto ao dispositivo legal, e afirmar que
a mediação familiar, envolvendo profissionais com experiência em ajudar a solucionar as disputas
decorrentes de perturbações no seio da família, devem ser utilizados, de forma complementar ao Poder
Judiciário, e não alternativa à atuação do Estado-juiz.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
O procedimento de mediação previsto no artigo 9º, da lei de alienação parental seria
uma maneira de imprimir maior celeridade aos processos cujo objeto seja a alienação parental e
de “humanização” das relações conflituosas no cenário familiar.
José Renato Nalini (2012), ao ser questionado sobre o que seria necessário ser mudado
no sistema judicial brasileiro, afirmou:
Teria que reservar a Justiça para coisas realmente sérias e criar na
população uma cultura de diálogo. Os advogados precisariam ter outra
formação, não a formação adversarial, mas um advogado para
aconselhar o cliente antes dele fazer bobagem — antes de fazer
contrato, casar, separar, antes de adotar, antes de entrar no emprego,
sair do emprego. É necessário um profissional do aconselhamento, da
orientação, da prevenção.
O que se torna perceptível com o veto presidencial do artigo 9º da Lei sobre Alienação
Parental, é que foi desperdiçada uma grande oportunidade para fomentar a mudança de
mentalidade carregada de litigiosidade. Por mais que consideremos os avanços conquistados,
pouco ainda se fala em conciliação, em movimentos por conciliação, em cultura do diálogo.
Segundo Kazuo Watanabe (2002, p. 46), em conflitos familiares, à semelhança da
alienação parental, o objetivo principal é a paz, pois a mediação visa não só resolver o passado,
mas também pavimentar o caminho para a relação futura pacífica e para isto a mediação é a
melhor ferramenta:
Se as partes não forem pacificadas, se não se convencerem de que elas
devem encontrar uma solução de convivência, isto é, se a técnica não
for a de pacificação dos conflitantes, e sim a da solução dos conflitos,
as mesmas partes retornarão ao tribunal outras vezes. Então, existe
diferença no tratamento de conflitos entre duas pessoas em contato
permanente e entre aquelas que não se conhecem. Numa batida de
carro numa esquina qualquer, por exemplo, o problema, muitas vezes,
resolve-se no pagamento de uma indenização; nessa hipótese, a
solução do conflito resolve o problema, mas em outras, nas quais as
partes necessitem de uma convivência futura, continuada, há
necessidade muito mais de pacificação do que de solução de conflito.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Transformações significativas ocorreram nas últimas décadas na sociedade, afetando o modo
como o Direito regula as relações sociais, especialmente, as relações familiares. A Constituição
Federal de 1988 exerceu importante papel conferindo a proteção não somente à entidade
familiar, mas também protegendo seus membros individualmente.
A Carta Magna passou a contemplar e priorizar os aspectos existenciais do ser humano, ao
escolher a dignidade da pessoa humana como valor fundamental da sociedade. A Constituição
Federal também proporcionou a igualdade entre homens e mulheres, a proibição de qualquer
forma de discriminação contra os filhos, além de priorizar o melhor interesse da criança. Desse
modo, o foco consiste em proteger a criança e propiciar meios que beneficiem seu
desenvolvimento sadio. E naturalmente, isto inclui o direito à convivência familiar.
A nova postura constitucional e legislativa demonstra preocupação na postura dos cônjuges
após a dissolução do vínculo conjugal, ao enfatizar que mesmo assim ambos devem manter um
papel ativo e presente na vida dos filhos, dando continuidade ao seu papel parental, cumprindo
suas obrigações e direitos.
Mas a realidade cotidiana demonstra a falta de maturidade e responsabilidade dos genitores com
o desenvolvimento saudável dos filhos, pois aquele cônjuge que fica com a guarda,
costumeiramente, começa a criar obstáculos ao convívio dos filhos com o outro cônjuge,
fazendo uma espécie de “lavagem cerebral”, atitude que influencia diretamente no
desenvolvimento dos menores.
Daí a razão do legislador tratar na Lei 12.318/2010 sobre a alienação parental, que apresentou
medidas com vistas a definir a alienação, exemplificando condutas e estabelecendo medidas
inibidoras.
Todavia, a mais adequada ferramenta para pacificação desses conflitos familiares, a mediação,
que consiste num método autocompositivo para solucionar litígios, em que proporciona uma
mudança na relação dos ex-cônjuges, com o objetivo de buscarem uma visão comum na
educação dos filhos, foi vetada no texto desta lei.
Como já mencionado ao longo de todo o trabalho, a principal ressalva a ser feita à Lei nº
12.318/10 é no que tange ao veto ao artigo 9º, que previa a possiblidade de aplicação das
técnicas de mediação para solução dos litígios de alienação parental. Contudo, a despeito desse
veto, pode-se afirmar que as técnicas de mediação devem ser utilizadas em alguns casos que
envolvam alienação parental, pois o Poder Judiciário não apresenta estrutura e nem preparo para
dar a atenção que tais casos requerem.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARBOSA, Águida Arruda. Mediação familiar: uma vivência interdisciplinar. In:
GROENINGA, Giselle Câmara; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). Direito de família e
psicanálise. Rio de Janeiro: Imago, 2003. p.339-346.
_________. Guarda compartilhada e mediação familiar – uma parceria necessária.
Disponível em: http://www.fernandatartuce.com.br/wp-content/uploads/2016/01/Aguida-
Arruda-Barbosa-Guarda-Compartilhada-e-media%C3%A7%C3%A3o-familiar-parceria.pdf
BARBOSA, Maria Claudia Jardini. As práticas de alienação parental e o papel do estado-
juiz para coibi-las. Dissertação (Mestrado em Direito). Franca: UNESP, 2013.
DELGADO, Mario Luiz. Direito da Personalidade nas Relações de Família. In: Rolf Madaleno;
Mariângela Guerreiro Milhoranza. (Org.). Atualidade do Direito de Família e Sucessões. 2ªed.
Sapucaia do Sul: Nota dez, 2008.
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. Ed. Revistas dos Tribunais. 4ª, 2016.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. v.5. 23.ed. São
Paulo: Saraiva, 2008.
FERREIRA, João Bosco Dutra. Autonomia privada e direitos fundamentais: mediação em
direito de família e estado democrático de direito. Dissertação (Mestrado em Direito). Belo
Horizonte: PUC/MG, 2009.
FIGUEIREDO, Fábio Vieira; ALEXANDRIDIS, Georgios. Alienação parental: aspectos
materiais e processuais da Lei n. 12.318, de 26-8-2010. São Paulo: Saraiva, 2011.
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Princípios Constitucionais de Direito de Família:
guarda compartilhada à luz da Lei 11.698/08, família, criança, adolescente e idoso. 1º ed. São
Paulo: Atlas. 2008.
GOMES, Cristina Maria Nascimento. Alienação parental: uma análise sociojurítica – da
proteção à infância a sua aplicação no município de Maceió. Mestrado em Direito. Maceió:
UFAL, 2013.
HERKENHOFF, Henrique Geanquinto. Do patriarcalismo à democracia: evolução dos
princípios constitucionais do direito de família. In: Revista EPD, ano I – n. I . São Paulo:
Escola Paulista de Direito, 2005.
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerus
clausus. 2001. Disponível em: https://bit.ly/2xE7ove, acesso em 21 de junho de 2018.
__________. Direito civil: famílias. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
MARCANTONIO, Roberta Brasiliense. A implementação da mediação como política
pública de pacificação dos conflitos familiares por meio da Resolução n º125 do Conselho
Nacional de Justiça. Dissertação (Mestrado em Direito). Santa Cruz do Sul: Universidade de
Santa Cruz do Sul – UNISC, 2014.
REVISTA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS- ESTADO DE SÃO PAULO VOLUME 18 – Nº 01 - 2018
Revista Jurídica do Centro Universitário ”Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v.18, n.01, p.75-88, nov.2018. DOI: 10.18762/1983-5019.20180004
MOREIRA, Luciana Maria Reis. Alienação parental: uma análise dos meios de resolução do
conflito para além da Lei n. 12.318/2010. Dissertação (Mestrado em Direito). Belo Horizonte:
PUC/MG, 2013.
NAZARETH, Eliana Riberti. Guia de mediação familiar. In: PAULINO, Analdino Rodrigues
(Org.). Mediação familiar. São Paulo: Equilíbrio, 2008.
OLIVEIRA, Eliane Moreira de Almeida. A responsabilidade civil na alienação parental sob
a ótica neoconstitucional. Dissertação (Mestrado em Direito). Rio de Janeiro: UFRJ, 2014.
OLIVEIRA, Mário Henrique Castanho Prado de. A alienação parental como forma de abuso
à criança e ao adolescente. Dissertação em Direito. São Paulo: USP, 2012.
ROBLES, Tatiana. Mediação e direito de família. São Paulo: Ícone, 2009.
RODRIGUES, Edwirges Elaine. Políticas públicas como instrumento facilitador do
consenso parental e a busca pela efetividade da guarda compartilhada. Dissertação
(Mestrado em em Direito) Franca: UNESP, 2017.
RODRIGUES JR., Walsir Edson. Mediação, autonomia e responsabilidade na dissolução da
sociedade conjugal. In: LEITE, Eduardo de Oliveira. (Org.). Mediação, arbitragem e
conciliação. Rio de Janeiro: Forense, 2008. v.7, p.363-383.
ROSENVALD, Nelson; FARIAS, Cristiano Chaves. Direito das famílias. 2ª Ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2010.
SALES, Lilia Maia de Moraes. Mediare: um guia prático para mediadores. [s. l.]: GZ, 2010.
SILVA, Denise Maria Perissini da. A nova lei da alienação parental. In: Âmbito Jurídico, Rio
Grande, XIV, n. 88, maio 2011. Disponível em: <http://www.ambito-
juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9277>. Acesso em set 2018.
SPENGLER, Fabiana Marion. O estado-jurisdição em crise e a instituição do consenso: por
uma outra cultura no tratamento de conflitos. Tese (Doutorado em Direito). São Leopoldo/RS:
UNISINOS, 2007.
TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos sociais. 2ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:
Método, 2015.
TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. 3ª edição atualizada. Rio de Janeiro: Renovar,
2004.
TRINDADE, Jorge. Síndrome da Alienação Parental. In: DIAS, Maria Berenice (coord.).
Incesto e Alienação Parental – realidades que a Justiça insiste em não ver. São Paulo: RT,
2007.
VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de conflitos e práticas restaurativas:
modelos, processos, ética e aplicações. São Paulo: Método, 2008.
WATANABE, Kazuo. Modalidades de mediação. Cadernos do CEJ, Brasília, DF, v. 22, p. 42-
50, 2002.