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Revista Portal da Ciencia 2012

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Revista de Divulgação Cientifica da Universidade Federal do Maranhão | Edição Especial SBPC | Ano 2 | Número 2 | Julho de 2012

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2 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

Estamos de volta com uma edição especial da Revista Portal da Ciência. Neste número, a revista tem como enfoque principal o tema escolhido para abrigar a 64ª Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência: Ciência, Cultura e Saberes Tradicionais para Enfrentar a Pobreza. Um tema instigante que exigiu da equipe de produção um trabalho de mineração de projetos de pesquisas, ofícios e temas que relacionam as duas áreas de investigação.

Não foi uma tarefa fácil porque o tema ainda é um tabu pelo fato do saber tradicional não ser considerado, no trabalho acadêmico, um conhecimento com epistemologia própria. Mas, o desafio valeu a pena! Temos aqui uma revista diferente que demonstra, em todas as suas páginas, como é possível conjugar narrativas e experiências díspares com o propósito de criar conhecimento em que a criatividade, a inovação, a diversidade, a geração de renda e a inclusão social são recorrentes.

CIÊNCIA E CULTURA: SABERES QUE SE ENTRECRUZAM PARA GARANTIR A EXISTÊNCIA HUMANA

Natalino SalgadoReitor da Universidade Federal do Maranhão

REALIZAÇÃO

APOIO

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3Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

Forno solar: uma alternativa viável de enfrentamento à pobreza

Solar oven: a viable alternative to cope the poverty

Inventado no século XVIII, a técnica de produção e utilização do Forno Solar tem sido ensinada e utilizada no Núcleo de Extensão da Vila Embratel (NEVE). O forno tem se apresentado como uma ferramenta útil por sua praticidade para a população de baixa renda.

Invented in the 18th century, the production and use of Solar Oven technique has been taught and used in the Vila Embratel Center Extension . The oven has presented is a useful tool for low-income population by practicality.

Praias de São Luís: Patrimônio Perdido?

São Luís beaches: Lost heritage?

O Maranhão, um dos Estados do Nordeste com o maior número de praias, vive uma crise: toda a orla marítima de São Luís está imprópria para banho. Pesquisadores da UFMA analisam as condições de uso de praias e de mangues e apresentam as possíveis soluções para enfrentar esse problema.

Maranhao, one of the northeastern states with the largest number of beaches, is experiencing a depression: the São Luís’ entire coastline is unfit for bathing. UFMA’s researchers analyze the conditions of beaches’ use and mangroves’ and they present possible solutions to address this problem.

A SBPC no Maranhão

The SBPC in Maranhão

Conheça a história da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência no Maranhão e como a sua unidade regional tem se organiza-do e atuado em prol do desenvolvi-mento do Estado.

Learn the history of the Brazilian Society for the Advancement of Science in Maranhão, and how their regional unit has organized and worked towards the development of the state.

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Cobre em aguardentes: estudo revela a presença da substância em grande

quantidade na produção de cachaças no interior do Estado

Cuprum in brandy: study reveals the presence of the substance in large quantities in the production of cachaça

in the State of Maranhão

Pesquisador da UFMA afirma que os problemas vão muito além de questões estruturais ou de capacitação, mas também de higiene durante a produção do produto, e, o pior, é que muitos não sabem as complicações que isso pode trazer ao organismo.

UFMA researcher says that the problems go far beyond structural issues or training, but also of hygiene during production of the product, and many people do not know the complications it can bring to the body.

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O equilíbrio entre o saber científico e o saber tradicional

The balance between scientific knowledge and traditional knowledge

A jornalista e pesquisadora em cultura, Ester Marques, realiza uma análise sobre a relação entre o saber científico e o saber tradicional, e confirma a importância da coexistência entre os dois diálogos. The journalist and researcher in culture, Ester Marques, analysis of the relationship between scientific knowledge and traditional knowledge, and confirms the importance of coexistence between two dialogues.

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Sumário

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4 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

The Solar Pump Project, developed by UFMA, won the title of world’s best water treatment emergency system optimization powered by the sun. The product can be a good option for water supply problems, but it has yet to be marketed for social benefit.

Dream In: o despertar para um mundo de sonhos

Dream In: awakening to a world of dreams

Projeto inspira participantes a criar so-luções inovadoras e criativas por meio de sonhos. A Universidade Federal do

Higiene bucal e Meio Ambiente: uma parce-ria que deu certo

Oral Hygiene and Environment: a partnership that worked

Pesquisadores desenvolvem utensílios sustentáveis e de baixo custo para combater a placa bacteriana e manter a higiene bucal da população em dias. São escovas, fios dentais, abridores de boca e até porta--escovas feitos com material reciclado e vegetal.

Researchers develop sustainable and low cost tools to fight plaque and maintain oral hygiene of the population. They are brushes, dental floss, mouth openers and even a brush holder made from recycled material and plant.

Com criatividade é possível produzir energia limpa e sustentável

With creativity you can produce clean and sustainable energy

Capaz de armazenar energia por meio de pai-néis solares, o Poste Solar criado no Instituto de Energia Elétrica da UFMA pode ser uma alternativa para o enfrentamento do pro-blema de escassez das fontes energéticas. Desenvolvido em 2009, o projeto começa a perceber os primeiros olhares de empresas interessadas na implantação da tecnologia.

Capable of storing energy via solar panels, the Post Solar Energy created by UFMA’s Electrical Institute can be an alternative to facing the shortage of energy sources problem. Developed in 2009, the project begins to realize the first looks for companies interested in technology deploying.

Embarcando em um sonho

Embarking on a dream

Escola pioneira no Brasil e de referência internacional na construção naval demonstra poten-cial do Maranhão na fabricação artesanal de embarcações. O Estaleiro Escola que começou na década de 80, por meio de um projeto de pesquisa, apresenta peculiaridades que che-gam a se elevar ao nível artístico e tem ajudado a manter vivo um saber diferenciado e único.

Pioneer school in Brazil and internationally shipbuilding renowned demonstrates the Ma-ranhão potential in homemade boats. The Estaleiro School, that began in the 80s through a research project, has peculiarities that come to raise the artistic level and it has helped to keep alive a different and unique knowledge.

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Sistema de bombeamento solar da UFMA é o melhor do mundo em tratamento emergen-cial de água

UFMA’s solar system pumping is the best emergency water treatment in the world

O Projeto de Bombeamento Solar, desenvolvido pela UFMA, ganhou o título de melhor do mundo em oti-mização de sistemas de tratamento emergencial de água acionados por sistemas solares. O produto pode ser uma boa opção para problemas de abastecimento de água, mas ainda falta ser comercializado para benefício social.

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Maranhão é a instituição que tem representado a região nordeste do Bra-sil e vem realizando um trabalho para que sonhos possam integrar vários atores da sociedade pautada nos conceitos de economia criativa.

Project inspires participants to create innovative and creative solutions through dreams. The Federal University of Maranhão is the institution that has represented the northeast region of Brazil and it has been working for dreams can integrate various society actors based on the creative economy concepts.

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Dê bom dia, ganhe um sorriso!

Have a good day, get a smile!

Estimular e manter o bom relacionamento entre estudantes e servidores é o foco do projeto de pesquisa e extensão Hospitalidade no Campus da UFMA. O projeto ganhou visibilidade e atraiu a atenção de pessoas para discussões que há muito já tomavam conta principalmente das salas de aula dos cursos de Turismo e Hotelaria. Agora o projeto se prepara para a 64º Reunião Anual da SBPC, na qual além do acolhimento dos participante do evento, vai oferecer oficinas sobre hospitalidade.

Acadêmica de Engenharia de Alimentos da UFMA apresen-ta hambúrguer de caju

UFMA’s Food Engineering Academic presents the cashew burger

Entrevista

Interview

A secretária de Estado do Trabalho e Economia Solidária, Mariana Nascimento, fala em entrevista à Revista “Portal da Ciência” sobre o Projeto da Feira de Saberes e Sabores da Economia Solidária no Maranhão a ser apresentado pela primeira vez durante a 64ª Reunião Anual. In an interview to Science Portal Periodical, Special Issue SBPC, the secretary of State for Labour and Solidarity Economy, Mariana Nascimento talks about the design of the Knowledge and Taste Fair of the Maranhão Solidarity Economy will be first introduced during the 64th Annual Meeting.

SBPC inclusiva

SBPC Inclusive

Entenda como a reunião anual da Sociedade Brasilei-ra para o Progresso da Ciência na Universidade Fede-ral do Maranhão tem sido pensada para que pessoas com deficiência possam transitar livremente e ter acesso à toda programação do evento científico.

Understand how the annual meeting of the Society for the Advancement of Science at the Federal University of Maranhão has been designed for people with disabilities can move freely and have access to the entire scientific program event.

Raízes, cascas e ervas: saberes que curam

Roots, barks and herbs: healing knowledge

Pesquisa realizada com um grupo de idosos entre 51 e 90 anos mostra a preferência pelos remédios caseiros feitos com plantas que possuem princípios medicinais. Razão da escolha: ótimos resultados e baixo custo. Os pesquisadores alertam que quando utilizadas de forma correta, as plantas medicinais têm o mesmo efeito positivo que os medicamentos industrializados.

Research conducted to an elderly group at about 51 and 90 years shows a preference for herbal medicines. Reason for choice: good results and low cost. The researchers warn that when used correctly, medicinal plants have the same positive effect that the manufactured drugs.

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Amazônia maranhense: Ecossistema vulnerável

Maranhão Amazon: Vulnerable ecosystem

Incluído junto a mais oito estados brasileiros dentro do espaço considerado Amazônia Legal, o Maranhão enfrenta um processo acentuado de devastação de sua área verde original, que tem acontecido com celeridade e onde a falta de informação e recursos humanos especiali-zados nesta região são problemas que dificultam a implantação de políticas e ações em prol da conservação da Amazônia maranhense. Neste sentido, o programa de pós-graduação em rede recentemente implantado, o Bionorte, pretende formar pesquisadores que desenvolvam pesquisas e estudos específicos sobre a Amazônia, capazes de apontar novos rumos para os trabalhos de preservação da Amazônia Legal.

Included among the eight Brazilian states within the Legal Amazon space, Maranhão faces a severe case of destruction of its original green area, which has happened quickly and where the lack of information and human resources in this region are problems which hindering the politics implementation and actions to conserve Amazonian Maranhão.In this sense, the graduate program recently deployed network, the Bionorte, aims to train researchers to develop research and specific studies on the Amazon, able to point to new directions for the preservation work of the Legal Amazon.

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Acadêmica do 10º período do curso de Engenharia de Alimentos do campus da UFMA - Imperatriz desenvolveu um hambúrguer feito do pedúnculo do ca-ju. A novidade foi aprovada na amostra sensorial realizada com acadêmicos, professores e servidores da própria Instituição. Rico em fibras e vitamina C, o hambúrguer de caju é fácil de fazer e pode ter um custo mais baixo que o tradicional.

The 10th period of the Food Engineering Academic Course, campus UFMA – Imperatriz, developed a burger made of cashew beef. The news was passed in the sample sensory held with academics, teachers and servants of the institution. Rich in fiber and C vitamin, the cashew burger is easy to make and can have a lower cost than the traditional beef.

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Encouraging and maintaining good relationships among students and servers is the UFMA Campus Hospitality research and extension project focus. The project came to life and drew attention to discussions that have long been mainly took care of the Tourism and Hospitality Academic courses classrooms. Now, the project is preparing to carry out the 64th Annual Meeting of the SBPC.

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6 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

Nossos cumprimentos aos leitores e leitoras da Revista Portal da Ciência.

Em sua segunda edição, a Portal da Ciência traz um exemplar especial sobre alguns temas relacionados à 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. 2012 é um ano de muitas comemorações para São Lu-ís e para a Universidade Federal do Maranhão. A cidade celebra dois grandes

momentos que prometem marcar a história da capital maranhense. São 400 anos de história, de cultura, de derrotas e de vitórias. São Luís comemora em grande e típico estilo seus 400 anos de fundação com toda a alegria e aconchego que o povo mara-nhense sempre teve.

Motivo de alegria também para a UFMA - que faz parte da história desta ilha encan-tada-, e que presenteia a cidade sediando o maior evento científico da América Latina e do Caribe, a 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), cujo tema Ciência, Cultura e Saberes Tradicionais para o Enfrentar a Pobreza não poderia ser mais oportuno diante da diversidade de saberes da nossa gente.

Buscamos retratar, nesta publicação, o que a Universidade tem de melhor em relação ao ensino, à pesquisa e à extensão, e como o nosso saber científico está direta ou indiretamente relacionado com o saber popular. Destacamos a situação atual de praias e mangues de São Luís, decorrentes da ação humana. Apresenta-mos como as fontes de energia limpa são mais viáveis e eficazes do que se ima-gina, como é o caso do Bombeamento Solar, considerado no ano de 2011 como o melhor do mundo na categoria de otimização emergencial de água acionados por sistemas solares.

Apresentamos também projetos que vão desde o mapeamento de manifestações culturais; uso de plantas medicinais por idosos; experiências mais saudáveis como o hambúrguer de caju e, também, projetos que visam trabalhar com o bom relacio-namento na Universidade, como é o caso do projeto Hospitalidade no Campus. Não deixamos de pautar, os principais eventos que marcam a SBPC, como a Expotec, o Enapet, a SBPC Cultural e a SBPC Jovem, sem deixar de abordar a SBPC Inclusiva, que promete ser o grande diferencial desse evento.

Ao longo das páginas desta revista, nós apresentamos uma série de ofícios, uma extensão do artigo primeiro desta publicação que aborda de forma direta a condição dos saberes tradicionais. Orientados pela afirmação do educador e filósofo brasilei-ro, Paulo Freire, de que "Não há saber mais ou saber menos: Há saberes diferentes”, conduzimos a produção do presente material, trabalho que nos permitiu o encontro com especialistas e pessoas que dominam um saber que não está na academia.

O resultado final deste encontro entre o saber científico e o popular pode ser con-ferido no Portal da Ciência – Especial SBPC, que foi planejada com muito carinho e respeito às tradições, sempre buscando o diálogo e a troca de saberes para amenizar os problemas que assolam a sociedade, um encontro entre gente simples que man-tém viva a cultura, os costumes transmitidos de geração em geração e a produção de tecnologias e a sistematização do conhecimento.

Por fim, gostaríamos de agradecer a toda a equipe de produção desta revista, re-pórteres, fotógrafos, colaboradores, revisores e professores que contribuíram imen-samente para o produto final. Esperamos que cada um possa absorver nesta revista as pesquisas e os detalhes da cultura maranhense, em um ambiente propício para discutir como a ciência, a cultura e os saberes tradicionais podem, juntos, contribuir para o enfrentamento da pobreza, na 64ª Reunião Anual da SBPC. Uma boa leitura e um bom encontro!

ESTRUTURA ORGANIZACIONAL

PRESIDENTE DA REPÚBLICADilma Rousseff

MINISTRO DA EDUCAÇÃOAloizio Mercadante

SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DO MECAmaro Henrique Pessoa Lins

UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO

REITORNatalino Salgado Filho

VICE-REITORAntônio José Silva Oliveira

PRÓ-REITOR DE ENSINOSônia Maria Corrêa Pereira Mugschl

PRÓ-REITOR DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃOFernando Carvalho Silva

PRÓ-REITOR DE EXTENSÃOAntônio Luiz Amaral Pereira

PRÓ-REITORA DE RECURSOS HUMANOSMaria Elisa Lago Braga Borges

PRÓ-REITOR DE GESTÃO E FINANÇASJosé Américo da Costa Barroqueiro

CIDADE UNIVERSITÁRIA Av. dos Portugueses, Nº 1966 – CEP 65085-580

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7Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

On its second edition, the Science Portal brings a special issue about the 64th Brazilian Society for the Progress of Science’s meeting. Two thousand and twelve is a year of many celebrations for Sao Luis and the Federal University of Maranhao. The town celebrates two great moments that promise to mark

the history of the capital of Maranhao. There are 400 years of history, culture, defeats and victories. In a typical style, São Luís celebrates its 400 years of foundation with all the joy and warmth that the people of Maranhao has always had.

THE ANNUAL SBPC MEETINGUFMA, as part of the history of this enchanting island, hosts, as a gift to the city, the

largest scientific event of Latin America and the Caribbean: the 64th Annual Meeting of the Brazilian Society for the Progress of Science (SBPC), which theme “Science, culture and traditional knowledge to cope against poverty” could not be more timely due the diversity of knowledges of our people.

We seek to portray in this publication, what the University has to offer when it co-mes to the best teaching, researching and extension practices, and how our scienti-fic knowledge is directly or indirectly related to the popular wisdom. The publication also highlights the current status of beaches and mangroves of Sao Luis, due to hu-man actions, and even shows how clean energy sources are more viable and effecti-ve than you may think, as it is the case of Solar Pumping, considered, in 2011, as the world's best in the emergency water optimization category driven by solar systems.

We also present projects ranging from the cultural events mapping, the use of medicinal plants for the elderly; healthier experiences as the cashew burger and also projects that aim to work the relations on the University’s area, as the Campus Hospitality. Are also included on this publication, the major events that mark the SBPC, as much as the Expotec, the Enapet, the Cultural SBPC and Jovem SBPC, while addressing the SBPC Inclusive, which promises to be the most distinguishing point of this event.

Throughout the pages of this magazine, we present a series of letters, an extension of the first article of this publication that directly addresses the status of traditional knowledge. Guided by the assertion of the Brazilian philosopher and educator, Paulo Freire, that "Nobody is smarter than others: There are different knowledges," we con-ducted the production of this material, work that allowed us to meet with experts and people who have knowledges not found in the academy.

The final result of this encounter between the popular and scientific knowledge can be seen on the Portal of Science - SBPC Special, which was planned with great care and respect for traditions, always seeking dialogue and knowledge exchange to soften the problems facing - a encounter between ordinary people that keeps alive the culture, customs handed down from generation to generation and the technology production and knowledge systematization.

Finally, we would like to thank the entire production team of this periodical: re-porters, photographers, contributors, reviewers and teachers who contributed im-mensely to this final product. We hope everyone absorb a little bit of the researches and experience details of the Maranhao’s culture, in an opportune environment to discuss how science, culture and traditional knowledge can together contribute to the fight against poverty, at the SBPC’s 64th Annual meeting. A good reading and a good encounter!

Our greetings to the Science Portal Magazine readers

Portal da CiênciaUma publicação da Universidade Federal do Maranhãowww.ufma.br

IDEALIZAÇÃO E PRODUÇÃO [email protected]

ASSESSORA DE COMUNICAÇÃO E EDIÇÃO GERALFrancisca Ester de Sá MarquesProf ª Adjunta do Departamento de Comunicação/UFMA

ASSISTENTE DE EDIÇÃOAnissa Ayala Cavalcante, Roberth Meireles

PROJETO GRÁFICO E EDITORAÇÃO ELETRÔNICAAndré Souza, Larissa Régia

REPORTAGENSAline Alencar, Amy Loren, Ana Paula Coelho, Anissa Ayala Cavalcante, Anna Caroline Guimarães, Camila Carneiro, Carla Rejane Dutra, Caroline Ribeiro, Daniela Ribeiro, Emerson Machado, Ester Marques, Gutemberg Feitosa, Hemerson Pinto, Jonatan Cardoso, Letícia Maciel, Lígia Guimarães, Luciano dos Santos, Liliane Cutrim, Mariana Salgado, Murilo Azevêdo, Roberth Meireles, Rayssa Oliveira, Sansão Hortegal, Welbert Queiroz

REVISÃO DE TEXTOCarla Morais

FOTOSAna Paula Coelho, André Souza, Áurea Everton, Caroline Ribeiro, Cláudio Mendes, Diniz Costa, Érica Muniz, Josiane Mendes, Marileide Lima, Sansão Hortegal, Thais Fernanda

TRADUÇÃOCarol Veloso, Murilo Azevêdo

COLABORAÇÃORaila Maciel

IMPRESSÃOGráfica Ronda

Tiragem30 mil exemplares

EXPEDIENTE

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8 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

Em maio de 1948, um grupo de cientistas e amigos da ciência decidiu fundar no Brasil uma sociedade que, baseada na noção de progresso, pensasse a ciência nos moldes das que já existiam em outros países. O movimento em prol do Progresso da Ciência,

iniciado na cidade de São Paulo, se propagou rapidamente, e, anos depois, possuía unidades regionais espalhadas por todo o país. Atualmente, existem, no Brasil, 98 sociedades científicas associadas e sociedades regionais que, juntas, totalizam 6 mil sócios ativos, entre pesquisadores, docentes, estudantes e amigos da ciência.

No Maranhão, a unidade regional da SBPC foi inaugurada em 1982 e, desde então, vem desempenhando um papel fundamental para o avanço e o fomento das pesquisas, e da própria construção de uma cultura científica no Estado. O atual secretário regional da SBPC no Maranhão, Luiz Alves, relembra dois momentos considerados por ele célebres, em que a regional cumpriu seu papel de forma persistente. Um deles foi o caso da manutenção da Fundação de Amparo à Pesquisa (FAP) e, o outro, a realização da 47 ª Reunião Anual da SBPC que aconteceu em São Luís no ano de 1995.

A SBPC no Maranhão

Um instrumento do desenvolvimento científico no Estado

TEXTO: ROBERTH MEIRELESFOTOS: ARQUIVO PESSOAL DO ENTREVISTADO

1 - A Secretária Executiva da 47ª Reunião da SBPC em visita às obras do evento científico2 - Avaliação do concurso Jovem Cientista3 - Abertura da 47ª Reunião Anual da SBPC no Maranhão4 - Stand de divulgação e promoção da 64ª Reunião Anual da SBPC na Multifeiras5 - O então Secretário Regional da SBPC José Maurício Bezerra e o Reitor da UFMA Natalino Salgado, na inauguração da atual sede da Secretaria Regional da SBPC em 2011

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Especial SBPC

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Luiz Alves conta que o segundo momento, em que a regional obteve um grande destaque, foi a realização da reunião em 1995 e, posteriormente, o seu legado. “A cultura do fazer ciência, em 1995, ainda era muito incipiente, já que a própria imagem do cientista era algo muito distante da realidade”. A partir da reunião entre diversos profissionais, estudiosos e atores da sociedade, providenciada pela SBPC de 1995, São Luís deu um salto no que diz respeito ao desenvolvimento de ciência e tecnologia. “A troca positiva entre estes atores deu força para que a regional mantivesse sua existência e fizesse com que a sociedade maranhense entendesse de uma vez por todas que a ciência deve contribuir diretamente para o desenvolvimento do povo, sendo que esta não deve estar presente apenas na academia, mas desde as primeiras séries da educação básica”, completa o secretário regional da SBPC no Maranhão.

Foi durante a 47 ª reunião da SBPC que a regional ganhou sua sede própria, localizada no antigo Centro de Estudos Básicos (Ceb). A mudança definitiva para atual sede, situada no prédio Castelo Branco, na Cidade Universitária da UFMA, só ocorreu em 2011. De acordo com o conselheiro da regional no Maranhão, José Maurício Dias Bezerra, a Reunião Anual da SBPC de 1995 promoveu a reorganização da Instituição para o progresso da ciência no Estado. Ele exemplifica que a Caravana da Ciência foi uma atividade em que alunos e professores percorreram o interior do Estado levando experimentos práticos e realizando eventos de divulgação em prol da ciência.

A própria realização do já consagra-do evento anual de ciência do Brasil, a Semana Nacional de Ciência e Tecnolo-gia (SNCT), foi um dos primeiros eventos fomentados pela regional da SBPC no Maranhão, que continua até hoje dando total apoio à realização da semana cien-tífica no Estado. Por isso, o Estado vem alcançando destaque pelo envolvimento de um número cada vez maior de pesso-as na pesquisa científica.

Os cursos de pós-graduação são ou-tro legado, frutos da reunião da SBPC. Eles surgiram, em maior número, após a realização da Reunião Anual de 1995, que, com incentivo da regional, propu-seram um novo cenário para a ciência no Estado. O resultado da proposta, que usava como base sustentadora a carên-cia de uma cultura científica no Mara-nhão, pode ser observado atualmente no aumento contínuo de especialistas,

mestres e doutores que não necessitam sair de suas cidades para realizarem seu aperfeiçoamento. A consequência disto tudo é o crescente volume de pesquisas desenvolvidas por estes profissionais que, agora, mais qualificados, preten-dem mostrar a ciência produzida no Ma-ranhão quando todos os olhares interes-sados no progresso da ciência no Brasil estarão voltados para o Estado, durante a 64 ª reunião anual da SBPC.

In memorian,o presidente de honra da SBPC, Aziz Ab’Saber, na abertura de uma das mesas que compôs a programação da SBPC em 1995

Inauguração da atual Secretaria Regional da SBPC, em 2011, com a

presença dos conselheiros e do então secretário (à esq. na foto)

Inauguração da unidade regional da SBPC no Maranhão, durante a 47ª Reunião da SBPC (foto à esq.)

O escritor Josué Montello (à dir.) e o antropólogo Darcy Ribeiro (à esq.) durante a realização da 47ª Reunião da SBPC em São Luís

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SBPC JOVEMA SBPC Jovem é realizada desde 1993 e nasceu da necessidade de aproximar a ciência e a escola. Na 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), o espaço da SBPC Jovem trará uma programação com diversas atividades que objetivam proporcionar o desenvolvimento científico e cultural aos jovens, alunos das escolas públicas e privadas do ensino básico, médio ou técnico. Com o tema “Trilhando saberes e saberes e sabores”, a SBPC Jovem promoverá intercâmbio de conhecimentos por meio de oficinas, minicursos, ciclo de palestras, exposições, mostras de vídeos, entre outras.

ESPAÇOS DA 64ª REUNIÃO ANUAL DA SBPC

SBPC CulturalA valorização da cultura é um dos focos centrais da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Dessa forma, as atividades culturais terão lugar especial durante os cinco dias da reunião da SBPC em São Luís. Privilegiando a expressão regional, a reunião trará neste espaço diversas atividades que incluem shows, apresentações e manifestações locais.Para os participantes da 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, será uma oportunidade de entrar em contato com a cena cultural do Estado em um momento em que esta se encontra aquecida devido às festividades pelo quarto centenário de São Luís.

ExpoT&CUma das maiores mostras de ciência também fará parte da 64ª Reunião Anual da SBPC. A ExpoT&C reunirá ciência, tecnologia e inovação (C,T&I), com a participação de centenas de expositores, como universidades, institutos de pesquisa, agências de fomento, entidades governamentais e outras organizações interessadas em apresentar novas tecnologias, produtos e serviços.

Com espaço de 6 mil metros quadrados e capacidade para 64 stands, serão montadas tendas para a exposição de mostras científicas de inovação e tecnologia. A ExpoT&C é, sem dúvida, uma excelente oportunidade para divulgação de produtos e serviços, socialização e compartilhamento de tecnologias.

O acesso às exposições deste espaço da SBPC são gratuitas, livres para inscritos ou não inscritos, com exceção dos minicursos, que requerem matrícula antecipada devido ao limite de vagas.

ENAPETO Encontro Nacional do Programa de Educação Tutorial (ENAPET) é um evento anual que reúne todos os grupos PET para discussões e deliberações acerca do programa. Participam do ENAPET todos os integrantes discentes do programa (bolsistas e não bolsistas), tutores e interlocutores, além de representantes do ministério da educação responsáveis pela sua gestão.

O XVII ENAPET, que será sediado este ano na Universidade Federal do Maranhão, traz o tema “Educação Tutorial: novos rumos, novas fronteiras”. O evento conta com uma programação que inclui palestras, debates, oficinas, apresentação de trabalhos (painéis e simpósios) e grupos de discussão.

Por razões históricas, o ENAPET ocorre concomitantemente com a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Sua primeira edição aconteceu em 1996, durante a 48ª Reunião da SBPC, na cidade de São Paulo, cujo objetivo era ampliar os conhecimentos entre os grupos e possibilitar a troca de ideias sobre o Programa.

Em termos de organização e estrutura o ENAPET é autônomo. A programação do evento é toda voltada para questões internas do grupo, como produção acadêmica dos estudantes dentro dos grupos PET ao qual estão inseridos, mesas-redondas para discussão de questões institucionais e/ou de relevância para os PETs, grupos de trabalho para discutir a gestão do programa, entre outras atividades.

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O equilíbrio entre o saber científico e o saber tradicionalTEXTO: ESTER MARQUES

Desde sempre, a relação entre o saber tradicional e o saber científico foi uma relação tensional e, considerada por muito tempo, narrativas incompatíveis por terem naturezas diversas, sistematizações e regras de legitimação dife-rentes, assim como comprovações diferenciadas - definidas pelo século das

Luzes -, como o século da razão. A necessidade de separação dos saberes foi uma exi-gência dos enciclopedistas Diderot, D’Alembert, Rousseau e Montaigne, por exemplo, que exigiam um saber focado somente na razão humana e eram contra todas as narra-tivas orais, tradicionais ou consideradas místicas e religiosas, originárias, sobretudo, dos grupos sociais populares.

É o Iluminismo que dá expressão à modernização cultural com o seu inconfor-mismo revolucionário por meio da fundamentação da autonomia da razão, institu-ída como instrumento capaz de libertar o homem da ignorância, do fanatismo, do obscurantismo e da superstição; que promove uma aversão profunda ao princípio da autoridade tradicional por esta se apoiar, muitas vezes, em pretensas tradições históricas não comprovadas; que acredita na crença de uma ciência universal como um imperativo de regulação da natureza física e da natureza humana e, que conside-ra como norma última da conduta humana, as paixões em toda a sua pureza original.

Deste modo, com o movimento progressivo de secularização e racionalização da experiência, do desencantamento das concepções tradicionais do mundo e do esta-

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Especial SBPC

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A mudança de visão restabeleceu o saber

tradicional que passou a ser pensado pelas ciências

humanas e sociais, a partir de uma epistemologia ou fenomenologia do senso

comum.

belecimento das diferentes esferas de valor tão bem formula-dos por Weber, a noção de cultura deixa de estar relacionada ao trabalho com a terra na sua relação biológica com a natureza para ser pensada como sinônimo de sociedade e de civilização, e consequentemente, vinculada à noção de cultivo do corpo, mas também à noção de espírito ilustrado. Ao longo desse pro-cesso, uma dicotomia torna-se habitual: de um lado, as ativida-des denominadas nobres ou superiores, consideradas como cul-turais e, do outro, as coisas cotidianas e práticas, desprovidas de qualquer aura intelectual e consideradas práticas populares.

Essa separação, além de desqualificar os saberes tradicio-nais vistos como patrimônio material/imaterial original do ho-mem em favor de uma lógica científica, também desqualificou a criatividade, a diversidade e a pluralidade desse tipo de sa-ber que sempre esteve vinculado à cultura local como base de sua funcionalidade e existência. A situação só começou a mu-dar no século XIX com o movimento romântico, que passou a utilizar esses saberes como fonte de inspiração e de criação e, posteriormente, na década de 60 do século XX, quando houve por parte da academia uma reviravolta na forma de interpretar esses saberes – já não mais com o caráter positivista da época, mas a partir de um viés interpretativo ou hermenêutico, naqui-lo que passamos a denominar de virada linguística.

A mudança de visão restabeleceu o saber tradicional que passou a ser pensado pelas ciências humanas e sociais a par-tir de uma epistemologia ou fenomenologia do senso comum. Nesta perspectiva, o saber científico com as suas característi-cas – produzido, sistemático, controlado, contínuo e com ne-cessidade de comprovação –, passou a dialogar com o saber tradicional, cuja lógica é a da funcionalidade de um tempo e de um espaço atemporais.

DOIS DIÁLOGOS, DUAS LÓGICASO diálogo cultivado pelas duas lógicas se tornou a base fun-

damental para pensar problemas como a cultura, o meio am-biente, a sustentabilidade econômica, as tecnologias sociais, a inovação e a promoção de novas áreas do saber e o desenvol-vimento de mecanismos para a superação das desigualdades sociais, políticas e culturais, por exemplo. Mas, se para nós, o saber científico é uma narrativa racional, baseada nos argu-mentos da observação e da interpretação da realidade, o que identifica e legitima o saber tradicional?

Inicialmente, o saber tradicional é resultante da experiência baseada na palavra oral ou na palavra viva como bem a definiu Platão, porque cada um dos momentos da cadeia de narração é um processo sempre renovado e de reinterpretação da tradi-ção, o que permite, ao mesmo tempo, mantê-la atual, impedin-do a sua fixação e o seu imobilismo. Daí, a narrativa tradicional ser a maneira privilegiada de transmissão dos saberes e das normas herdadas do passado.

Deste modo, aquele que transmite os saberes é também o que dá o testemunho da experiência, se legitimando como

uma autoridade enunciativa, representante fiel dos ante-passados de quem recebeu a responsabilidade e o po-

der para falar em nome de todos. Por isso, o discurso da experiência tradicional impõe-se a todos de forma indiscutível e incontestável porque se fundamenta no senso comum e, também, no bom senso.

Por isso, o saber tradicional é sempre coletivo, fundamentado na capacidade que cada um pos-sui de se tornar testemunha e elo da cadeia de transmissão dos saberes que a memória coloca

nas suas bocas, num ciclo que alimenta permanen-temente a experiência. Esta força enunciativa funciona como uma característica do processo de pertencimento dos sujeitos a uma comunidade concreta e particular de mundo, uma comunidade de vida e de destino porque só é válido no quadro dessa comunidade para os que nela

foram iniciados e assim adquiriram as suas marcas identitárias.

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“Aquele que transmite os saberes é também o que dá o testemunho da experiência,

se legitimando como uma autororidade enunciativa,

representante fiel dos antepassados de quem recebeu

a responsabilidade e o poder para falar em nome de todos”

Francisca Ester de Sá Marques

Atualmente é Assessora de Comunicação da UFMA e Pro-fessora Adjunta do Departa-mento de Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão. Possui Mestrado em Comunicação e Cultura pela Universidade de Brasília e é Doutoranda em Ciências da Comuni-cação pela Universidade de Lisboa, em Portugal. É autora de vários artigos e do livro Mídia e Expe-riência Estética na Cultura Popular. Faz parte da Comissão Maranhense de Folclore e do Conselho Estadual de Cultura. Também é Produtora Cultural e presta serviços nas áreas de elaboração de projetos, consultoria, organização de eventos e análise de perfis e cenários culturais.

SABEDORIA SIMBÓLICAÉ da sua natureza oral que o discurso da tradição tem a força

de se renovar e de se atualizar em cada processo de transmis-são. Por isso, o que valoriza este discurso não é a exatidão e o rigor material das formas discursivas, mas a capacidade de atualização e de renovação de um sentido que se mantém inal-terado através das variantes produzidas por cada uma das su-as enunciações. Desta maneira, o saber tradicional é baseado na sabedoria, não uma sabedoria formal baseada numa com-petência pragmática e racional, mas uma sabedoria baseada, segundo o antropólogo americano Clliford Geertz, “na vida co-mo um todo, já que o mundo é a sua autoridade”, disse.

Assim, apesar de estar fundamentado na experiência co-tidiana da qual se retira a sua substância principal, o saber tradicional se caracteriza por seu conteúdo sagrado, ou seja, por sua capacidade de fundar o mundo a cada transmissão, constituindo, desta forma, uma ruptura na homogeneidade do tempo e do espaço comum, permitindo a cada um re-conhecer--se como igual, a partir do re-conhecimento do outro, dentro da vida grupal, de uma vivência coletiva que é preenchida no decorrer da produção simbólica, envolvendo fortes laços de solidariedade e identidade.

O saber tradicional parte de uma epistemologia do senso comum, visto por Geertz como um sistema cultural, construído historicamente e, portanto, sujeito a padrões de juízo também historicamente definidos e validados pela convicção de quem o possui. Uma epistemologia oriunda filosoficamente do que Husserl, Schütz e Merleau-Ponty denominam de uma fenome-nologia do cotidiano, trabalhada sob as bases da experiência comum. Neste caso, a sabedoria coloquial julga e avalia a rea-lidade com bom senso, ou seja, lida com os problemas cotidia-nos com critério, inteligência, discernimento e reflexão prévia.

O bom senso, assim, é uma capacidade que o sujeito possui de captar as realidades básicas por meio da experiência e de chegar às conclusões sensatas, sem fazer distinções entre a ordem natural, o domínio da linguagem, o mundo da cultura e a esfera da consciência individual. Não há diferenciação brusca e racional entre um universo material e um universo simbólico, visto que as necessidades orgânicas e as morais confundem--se no cotidiano da vida grupal, dando-lhe um realismo práti-co, um senso vivo dos limites e das possibilidades de ação que converge para uma sabedoria cotidiana.

Esta sabedoria coloquial tem como características, segun-do Geertz, a naturalidade, a praticabilidade, a leveza, a não--metodicidade, a acessibilidade e a simplicidade, o que dão ao bom senso uma lógica própria de interpretação do mundo. Assim, por exemplo, a praticabilidade não tem a ver necessa-

riamente com utilidade, no sentido pragmático do termo, mas com sagacidade. Ser prático, nesta lógica, não significa obter resultados materiais das situações, mas apreender estas situ-ações como demandas do intelecto, como resultados de um esforço da razão para construção de uma consciência prática dos fatos; para que o sujeito saiba exatamente o que é quê, quem é quem em cada contexto.

O bom senso permite, então, traduzir o sistema cultural por meio de um sistema de persistência, no qual símbolos, significados, concepções, formas e textos constituem uma estrutura imaginativa da sociedade. Representa um esforço para aceitar a diversidade entre as várias maneiras que os seres humanos têm de construir suas vidas, no processo de vivê-las. É neste contexto que a Ciência e a Cultura podem desenvolver processos de sedimentação de suas memórias, que reconheçam seus certos rituais de celebração, que iden-tifiquem as suas trocas simbólicas, que reavaliem as suas contradições internas e dinamizem o seu fundo arcaico, e que reforcem cada vez mais o seu processo de reconhecimento diante do mundo, dos outros e de si mesmos.

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Parteira: Ofício de dedicação e resistênciaMãe Sinhá, entre muitos sorrisos, diz que já perdeu a conta de quantos partos já fez

O ofício é antigo e todo mundo conhece. As partei-ras existem há muitos anos e têm em suas mãos um compromisso com a vida. Em algumas regiões viajam a pé, a cavalo, por rios ou no meio da mata.

Às vezes, devido às dificuldades de locomoção, passam vários dias na casa da parturiente, esperando pelo parto.

Assim é a história de dona Maria de Lurdes Macedo que, com 91 anos de idade, já perdeu a conta de quantos partos realizou. Hoje, com as mãos calejadas, relembra da sua primei-ra experiência, com o parto de sua amiga Conceição. Daí por diante não parou mais: vizinhos, netos e bisnetos vieram ao mundo por suas mãos.

Apesar das dificuldades na hora do nascimento, dona Si-nhá, como é conhecida, conta com orgulho que nunca perdeu uma criança, mas passou por situações difíceis em gravidez de risco. Nessa hora, clamava por sua mãe, em pedido de ajuda: “Valei-me minha mãe, valei-me minha mãe”, como sinal de fé naquela que lhe prometeu, em vida, sempre lhe atender.

Parteira por opção e por amor ao ofício, mãe Sinhá, como é chamada por aquelas que ela ajudou a dar à luz, recebia pelo serviço cerca de cinco tostões (moeda da época). A maioria das pessoas não tinha condições de pagar pelo “serviço” e dona Sinhá aceitava agrados ou, às vezes, quando a amizade era muito forte, não recebia nada.

Hoje, nas grandes cidades, em tempos de maternidades e mecanismos cada vez mais sofisticados, as parteiras estão de-saparecendo e sendo substituídas por profissionais da medici-na. Na família de dona Sinhá, por exemplo, os filhos deixaram

de lado a tradição de continuar o ofício da mãe e seguiram por caminhos bem diferentes. Ela, em contrapartida, não se entris-tece: “cada qual representa o seu papel na Terra e cada um tem o seu dom”, afirma.

Por outro lado, as parteiras ainda são encontradas nas cida-des do interior, que não possuem hospitais e nem maternida-des para atender a população. São elas que dão assistência às mulheres que, mesmo tendo o direito constitucional de assis-tência ao parto, não o possuem.

TEXTO: CAROLINE RIBEIRO

“Tenho orgulho

de ser parteira”,

revela mãe Sinhá.

“Cada qual representa o seu papel na Terra e cada um tem o seu dom

Mais do que um parto, as parteiras ajudam a trazer ao mun-do quem há muito era esperado. É um trabalho de dedicação, zelo e responsabilidade. O compromisso da parteira não é só com a mãe, pois é ela quem cuida do recém-nascido durante os oito primeiros dias de vida. É ela quem dá os primeiros banhos e orienta as parturientes nos cuidados com a criança.

Para dona Sinhá, ser parteira é um dom que está fadado ao esquecimento, mas que tem o seu valor reconhecido por quem ainda prefere ou precisa desses serviços. E, para ela, esse re-conhecimento é a maior recompensa que pode receber. “O que vale é a amizade que fica”, conta sorrindo.

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A UFMA sediou dois grandes eventos sobre religiões que movimentaram toda a comuni-dade acadêmica, um deles foi o

I Colóquio Internacional com tema Cem Anos de Publicação da Obra: As Formas Elementares da Vida Religiosa, cujo ob-jetivo era relembrar a importância do trabalho de Émile Durkheim e, assim, discutir a sua aplicabilidade no mundo contemporâneo. Outro evento marcante foi o XIII Simpósio Nacional da Associa-ção Brasileira de História das Religiões – ABHR, que reuniu estudiosos da área das Ciências Sociais de vários Estados. Um momento de discussão e comparti-lhamento de estudos científicos sobre religião, promovendo o intercâmbio en-tre investigadores e estudantes das dife-rentes áreas.

Destacamos, também, o I Encontro de Rádios Comunitárias – ABRAÇO; o lançamento do novo Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas – SIGAA; a acolhida da Cruz e do Ícone de Nossa Senhora, principais símbolos da Jornada Mundial da Juventude – JMJ; o VI Congresso Brasileiro Científico de Comunicação Organizacional e de Rela-ções Públicas – ABRAPCORP; a IX Con-

ferência sobre a Prevenção da Doença Renal em populações desfavorecidas na América do Sul e do Caribe; a 10ª Sema-na Nacional de Museus, com participa-ção do memorial Cristo Rei; I Microsoft Day; a 19ª edição da Ação Global; o IV Seminário Internacional de Educação Fenomenológica e Filosofias Existen-ciais; 35º Festival Guarnicê de Cinema; II Oficina UFMA-UFF/ONU Habitat; a 5ª Conferência Brasileira de Comunicação e Tecnologias Digitais, que contou com a participação de renomados pesquisa-dores da área de tecnologia e inovação, dentre eles Sebastião Squirra (UMESP); entre tantos outros eventos importantes para o fomento do conhecimento.

Um dos momentos que ficaram na lembrança dos pesquisadores do Cen-tro de Ciências Sociais da UFMA foi o lançamento de doze livros, frutos de teses e dissertações desenvolvidos por meio do Programa de Apoio à Pu-blicação de Livros do CCSo, que visou incentivar a editoração e a publicação de livros. Todas as obras abarcam as inquietações, estudos e resultados de pesquisadores que contribuíram para a pesquisa científica no estado do Mara-nhão e no Brasil.

Grandes eventos guardados na história da UFMA e dos 400 anos de São LuísNeste primeiro semestre, a Universidade Federal do Maranhão foi palco de uma série de eventos que marcaram a história da Instituição e de São Luís, que comemora seus 400 anos de fundação

>> Rádios Comunitárias no Maranhão: história, avanços e contradições na luta pela democratização da comunicação – Ed Wilson Ferreira Araújo

>> Os fluxos internacionais de capitais e a fragilidade fiscal da União no período de 1990/2011 – José Lúcio Silveira

>> Singularidades do espaço transitório: um estudo a partir de quebradeiras de coco babaçu – João Claudino Tavares

>> Concepções de Matemática do professor em formação: outro olhar sobre o fazer matemático – Raimundo S. de Castro

>> Diluindo Fronteiras: hibridizações entre o real e o ficcional na narrativa da telenovela – Larissa Lêda Fonseca Rocha

>> Pobreza, resistência e enfrentamento no Estado do Maranhão – Lília Penha Viana Silva

>> A Ciência da Informação em revista nos anos 90 no Brasil – Cláudia Maria Pinho de Abreu Pecegueiro

>> Políticas de formação do educador no Maranhão – Cacilda Rodrigues Cavalcanti

>> Hospitalidade: perspectiva de uma nova abrangência para o campo das relações públicas – Esnel José Fagundes

>> Jovens imaginários de paz e televisão – Vera Lúcia Rolim Salles

>> O desenvolvimento desigual da agricultura: a dinâmica do agronegócio e da agricultura familiar – Benjamin Alvino de Mesquita

>> Discurso jornalístico, política e liderança no Brasil (1985-1990) – Joanita Mota de Ataíde

LIVROS LANÇADOS NO CCSo

TEXTO: ANISSA AYALAFOTOS: ASCOM/UFMA

I Colóquio Internacional 19ª edição do Programa Ação Global

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Apesar da longa tradição da cachaça, no Maranhão, não há uma produção de destaque nos grandes circuitos por conta de uma série de fatores, sendo que o principal deles é que os produtores não possuem registro junto aos centros reguladores. Existe produção, existe demanda, porém não há o

registro desses produtos nos órgãos públicos, o que gera desconfiança no mercado. Falta também a padronização dos produtos e a regulamentação dos alambiques.

A maior parte desses alambiques fica na região do Médio Sertão do Maranhão, local no qual o Sebrae tem uma maior atuação de incentivo à produção de cachaça dentro das normas e da legislação do produto. Segundo Mauro Borralho, gerente do Sebrae, o maior desafio para o Estado é a regulamentação dos produtos, um processo difícil por envolver diversos fatores. Ele aponta que muitos produtores não possuem recursos próprios para investir em melhores estruturas e nem todos têm a capacitação exigida, tanto para gerenciar o negócio quanto para produzir o destilado. Estudos ainda assinalaram características desses produtores participantes dos projetos da instituição e mostraram o perfil deles. A maioria não tem a produção de cachaça como principal atividade, o que pode prejudicar a questão do investimento e atenção à qualidade do produto.

Pesquisador da UFMA afirma que os problemas vão muito além de questões estruturais ou de capacitação, mas também de higiene durante a produção do produto, e o pior, é que muitos não sabem as complicações que isso pode trazer ao organismo

Cobre em aguardentes: estudo revela a presença da substância na produção de cachaças no Maranhão

TEXTO: ANA PAULA COELHO

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Produção de Alimentos

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Os problemas vão muito além de questões estruturais ou de capacitação, há também a falta de higienização. O químico industrial e professor da Universidade Federal do Maranhão, Sílvio Marinho, realizou pesquisas sobre a presença de cobre nas cachaças da região do Médio Sertão. Ele observou que a não higienização do destilador, que geralmente é de cobre, resulta no acúmulo de uma substância dentro do próprio aparelho chamada azinhavre (didróxido de Cu-II), que é tóxica e tem cor azul-esverdeada, e libera o cobre durante o processo de destilação. Várias amostras

desse estudo mostraram altos índices do metal, todas com níveis acima do que a legislação brasileira permite. “A legislação é tolerante, pois permite até 5 ppm (partes por milhão por litro da bebida). Isso já é um agravante porque a legislação internacional diz que esse quantitativo deve descer para 2 ppm. Então, se quisermos escoar a nossa produção para o exterior, temos que tomar as medidas cabíveis e produzir uma bebida de qualidade”, ressalta. Das 30 amostras do pesquisador, a menor quantidade de cobre encontrada foi de 9 ppm e a maior foi 43 ppm, tendo uma média de 15 ppm.

Os trabalhos de incentivo visam às questões de licenciamento do produtor para a comercialização de forma segura e legal. Para obter o registro e as licenças, é necessário ter um alambique dentro das normas da legislação de produção de cachaça. São documentos que exigem investimento para o negócio, bem como é de extrema importância a capacitação dos produtores. Como muitos deles não são regularizados, por diversos motivos (falta de recursos, de documentação, ou, até mesmo, de interesse), a cachaça acaba escoando para as cidades próximas para o consumo local ou mesmo para cidades do Piauí.

Esse comércio de bebidas não regis-trado no Maranhão revela um perigo à saúde, a partir do momento que as pro-duções de diversos lugares são mistura-das ou até mesmo diluídas e vendidas em outras embalagens, chegando ao consumidor com um preço bem acima do inicial, feito pelo pequeno produtor. Des-ta forma, cachaças contaminadas e de má qualidade se misturam com cachaças não contaminadas e de melhor qualidade, e as pessoas não sabem o que consomem.

A qualidade de muitos alambiques

é realmente discutível, porém, há quem produza cachaça dentro dos padrões exigidos. Muitos produtores estão buscando o registro e se especializando, e, dessa forma, valorizam o seu produto. Alguns chegam a apresentar cachaças com variedade de cor, aroma e idade. Muitas são envelhecidas em barris de madeiras especiais, como o jatobá e o carvalho. Os esforços para valorizar a produção de cachaça no Estado estão dando cada vez mais resultados.

A última vitória do setor foi com a primeira cachaça registrada do Estado em março de 2011. É a cachaça Vale do Riachão, produzida na região do município de Sucupira do Riachão. Segundo o próprio dono do negócio, Seu Erivan, a produção da cachaça é um hobby que começou pela história da cachaça produzida pela família de sua esposa e que ele deu prosseguimento por gostar do trabalho. Ele disse que para conseguir o registro investiu na modernização do alambique e contou com a ajuda de consultores de Minas Gerais. O resultado é uma cachaça comercializada na região e no Piauí, e vem se expandindo para outras regiões, inclusive para São Luís.

Na capital, as cachaças mais consu-midas vêm de outras regiões, como Santo Antônio dos Lopes, na região do Médio Mearim, no centro do Estado. São cacha-ças que passam pela mesma situação das outras. Porém, a forma de consumo é dife-rente. A cachaça, além de ser consumida pura, é usada também em preparos com frutas ou em licores. Nesses preparos, a fruta e os demais ingredientes como a cachaça, passam meses em processo de infusão, e depois, para serem consumida, é necessário colocar mel ou algum outro elemento açucarado, deixando-a doce e mais licorosa, e assim, encontramos uma diversidade maior de sabores.

A produção da cachaça teve um au-mento considerável em decorrência dos incentivos para se aumentar a qualidade do destilado. De certa forma, houve avan-ços no setor, porém a realidade predomi-nante é de alambiques precários. Ainda há muito que avançar para que o Maranhão tenha mais e mais cachaças registradas, até porque o Estado tem que saber pro-duzir e tem que saber apreciar. O mercado deve se expandir nos próximos anos e os circuitos de cachaças já possuem lugar para os sabores maranhenses.

COMPLICAÇÕES DA INGESTÃO DO METAL PRESENTE NAS CACHAÇAS

LEGISLAÇÃO DA PRODUÇÃO DE CACHAÇA

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O cobre é um metal que, em grandes quantidades no organismo, altera o me-tabolismo, por meio de reações enzimá-ticas, e, com o passar do tempo, afeta o fígado, causando doenças como a cirro-se, levando a óbito. O que ocorre é que a eliminação do metal não é realizada de forma imediata pelo corpo, acarretando o seu acúmulo no organismo. O profes-sor Sílvio aponta para o fato de que o maior perigo está no consumo frequente de altas quantidades do metal, como é o caso das pessoas da região que conso-mem frequentemente o destilado.

O que poderia solucionar esse proble-ma seria uma maior preocupação com a higiene dos equipamentos e da própria estrutura. Além disso, deve haver uma

atenção especial com a água utilizada no processo, que deve ser bem tratada e livre de contaminações e impurezas. São cuidados que parecem simples, mas que representam muito, tanto para a qualida-de do produto e sua viabilidade no merca-do quanto para a saúde da população que consome esses produtos.

A própria produção da cachaça é algo cultural em muitas regiões do Es-tado, porém, como não houve avanço tecnológico no processo de produção e, consequentemente, não houve especia-lização dos produtores.A bebida é pro-duzida sem a devida separação do que é cabeça, coração e calda. A cabeça, a primeira parte, possui maior teor alcoó-lico e grande quantidade de impurezas,

já a calda, última parte, possui menor teor alcoólico (por volta de 14 por cento) e uma maior quantidade também de im-purezas. O coração é a principal parte, pois possui maior equilíbrio em relação ao teor alcoólico, acidez e poucas impu-rezas (em uma boa cachaça, nenhuma), e é ela que deve chegar ao consumidor. Quando essa diferenciação e divisão não são feitas, compromete a qualidade do produto de forma significativa e pode, inclusive, aumentar o teor de cobre, e também o teor alcoólico, que pode che-gar a mais de 50 por cento na bebida.

Silvio Carvalho Marinho Doutor em Química (Universi-dade Federal da Paraíba-2010), Mestre em Química pela Uni-versidade Federal do Maranhão (2005). Especialista em Tecno-logia de Alimentos (Universida-de Federal do Maranhão-2011), Especialista em Educação a Distância (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial-2012) e Graduado em Química Industrial (Universi-dade Federal do Maranhão-2001). Pesquisador do Grupo de Química de Óleos Essenciais e Alimentos da UFMA. Tem experiência na área Química, com ênfase em alimentos e bebidas (Bromatologia), águas de recreação (piscinas) e Química dos Produtos Naturais (plantas medici-nais). Professor Substituto do Departamento de Tecnologia Química da UFMA. Professor do Curso de Nutrição da Faculdade Santa Teresinha-CEST. Professor do Curso de Especialização Lato Sensu "Gestão da Segurança de Alimentos" (Pós-Graduação da Rede em EAD do SENAC).

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No centro de São Luís, mais precisamente na Rua Humberto Campos, número 25, encontra-se uma placa que diz: Ambulatório Santos. Trata-se de um casarão com porta larga que dá para uma pequena

sala de comércio, onde trabalha Seu Santos, figura carimbada da cidade. É ali que vende as bebidas que ele mesmo produz manipulando frutas, especiarias e cachaças. Como é um am-bulatório, é claro que ele também trabalha com alguns medi-camentos, aplica injeções e, também, mede pressão. Muitos chegam lá sentindo dores e Seu Santos logo tenta identificar o problema e curá-los. A maioria dos seus pacientes são velhos conhecidos, mas, nem por isso, ficam sem levar bronca por não se cuidarem como deveriam.

A história de Seu Santos é longa e cheia de reviravoltas. Ele nasceu na cidade de Arari, filho de libaneses comerciantes. Co-meçou um curso de farmácia na capital, na antiga Faculdade de Farmácia e Odontologia de São Luís, mas teve que abandoná--lo para cuidar dos sobrinhos e da família, voltando, posterior-mente, para a cidade natal. Lá, trabalhou como enfermeiro du-rante 27 anos, chegando a ser o médico e o cirurgião da cidade. Fez várias cirurgias, partos, receitou medicamentos e, sozinho, cuidou da saúde do município como médico, enfermeiro, cirur-gião e farmacêutico.

Seu Santos: “O alquimista do Maranhão”Organização e esmero pelo o ofício fazem dele um personagem intrigante do centro

de São Luís

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Em 1976, retornou a São Luís com sua família e montou o ambulatório. Paralelo às suas atividades na pequena enferma-ria, que mantém até hoje, ele possui, também, uma pequena fábrica de bebidas, localizada em sua casa, na qual prepara licores e outros produtos utilizando cachaças de Santo Antônio dos Lopes, Colinas e outras cidades próximas. Em sua casa há várias prateleiras com bebidas em processo de infusão ou cur-tição – processo no qual as frutas e ervas ficam durante meses ou até anos dentro de garrafas com cachaça –; caixas de ma-teriais, como livros e outros objetos que ele guarda com muito cuidado, bem separadas e todas com etiquetas.

Mais adiante, no fundo da casa, ele tem uma pequena edí-cula, onde ficam guardados mais materiais, mas estes são dife-rentes. Logo se vê nas prateleiras potes com tampas plásticas separadas por cor, diferentes tipos de rolha, várias garrafas vazias, algumas sacolinhas de papel – que ele mesmo faz para empacotar as bebidas vendidas –e uma série de detalhes que ele cuida pessoalmente. Seu Santos é dono e único funcionário da fábrica, ou seja, não há mais ninguém além dele. Ele é uma pessoa muito exigente e prefere fazer tudo sozinho. Ninguém que ouse mexer em seu trabalho! Esse é um dos detalhes mais interessante nesse senhor: a sua organização e carinho com o trabalho são surpreendentes, notados rapidamente quando se vê o capricho com que faz seus produtos e as embalagens

TEXTO: ANA PAULA COELHO

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em sua pequena fábrica. O esmero é tamanho no ofício de Seu Santos. O ofício de um produtor de bebidas não é nada fácil. Onde se consegue encontrar, hoje em dia, um licor de gengibre feito na medida certa, sem ardor e com o sabor surpreendente da raiz? Mesmo estando mais velho e trabalhando menos do que costumava, ele não consegue deixar de ser cuidadoso com seu trabalho.

O OFÍCIOO processo de fabricação de bebidas parece simples. Se-

guindo o passo a passo, seria apenas misturar as frutas com a cachaça, deixar descansar por alguns meses e depois colocar um mel ou um xarope de açúcar. Mas é bem mais complicado. É necessário um tratamento especial com as ervas, paciência e conhecimento sobre a cachaça e a manipulação dos ingre-dientes.

Durante uma conversa, ele revela a fórmula secreta da “Ca-tuaba”, uma de suas cachaças mais vendidas. A sua filha, a poetisa Lúcia Santos, protesta, mas ele mesmo fala: “Muita gente já tentou fazer, mas ninguém acertou!”. São ingredientes simples, como cravo, canela, erva doce, catuaba e jatobá. Mas essa simplicidade engana, pois o ofício demanda trabalho e tempo. O açúcar colocado por meio do xarope após meses que o produto passa em curtição é o segredo para uma bebida doce com o sabor da cana e do álcool suavizado. Os licores contêm mais xarope, ao contrário de outras cachaças que levam bem menos, já que devem ser menos licorosas.

A cachaça mais famosa de Seu Santos é feita seguindo uma receita que herdou da mãe e que depois a aperfeiçoou. É uma bebida que muitos conhecem como Meladinho, mas o seu cunhado foi quem a batizou com o nome Bom que Dói. Primeiramente, ele começou a fazer a bebida para uso caseiro e, anos depois, começou a vendê-la conquistando clientes de

diferentes paladares. Existem várias formas de se apreciar a ca-chaça: pura, envelhecida num barril de pequi ou de jatobá, ou mesmo em preparos, como é o caso dos licores. Homens com esse trabalho e conhecimento são os que valorizam a cachaça e o seu potencial.

É isso que faz com que sempre se tenha boas histórias para contar sobre a cachaça. São anos de luta e muita expe-riência em tudo que faz. Mesmo com quase 90 anos de histó-ria e comemorando 62 anos de casado, Seu Santos continua trabalhando, bem menos do que antes, é verdade, mas, com certeza, feliz: “Até hoje eu tô aí, mais feliz, mais pobre, mas, com certeza, feliz do que eu era antigamente!”, confessou Seu Santos, “o alquimista do Maranhão”.

Nas prateleiras do Seu Santos há diversidade de gostos.

“Até hoje eu tô aí, mais feliz,

mais pobre, mas, com

certeza, feliz do que eu era antigamente! confessou Seu

Santos, “o alquimista do

Maranhão”.

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Forno solar: uma alternativa viável de enfrentamento à pobreza

Uma caixa de papelão é dividida e forrada com papel, retalhos e palhas de banana e, no final, é coberta com papel alumínio.

Nela, são colocadas panelas pretas tam-padas, com o alimento desejado, tais como arroz, feijão, carne, frango, ovos, entre outros. A caixa é tampada com um plástico grosso, enlaçada com uma liga em volta e, posteriormente, posta ao sol durante cerca de 6 horas, e voilà: a comida está completamente preparada, quente e pronta para ser consumida. Esta narrativa parece mentira, mas não é. Trata-se do forno solar, uma cozinha sustentável de baixo custo e com simpli-

Além do baixo custo para a fabricação, o forno solar torna possível cozer alimentos sem que eles percam as suas propriedades nutricionais

cidade de fabricação, que torna possível cozer alimentos sem que eles percam as propriedades nutricionais. Não é usado gás, lenha, nem energia elétrica. O calor que cozinha o alimento vem diretamente do sol.

Inventado pelo naturalista Horace de Saussure, o primeiro modelo de forno data do ano de 1767, levando séculos para ser popularizado. Em São Luís, o Núcleo de Extensão da Vila Embratel (NEVE), interligado à Universidade Fe-deral do Maranhão (UFMA), vem desen-volvendo este experimento e tem conse-guido resultados muito positivos. As res-ponsáveis pela produção e utilização do

forno solar são as próprias moradoras do bairro da Vila Embratel. “Este trabalho é muito importante para as comunidades mais necessitadas, pois poupa o tempo de quem precisa dar atenção à comida. Para quem não pode manter um forno a gás o tempo todo, este projeto é uma alternativa bastante viável, uma ótima forma de economizar durante grande parte do ano”, explica a coordenadora do NEVE, Maria de Fátima Costa Lobão.

SUSTENTABILIDADE E ECONOMIAAlém do baixo custo, o forno solar

tem muita importância para a sustenta-bilidade. Segundo o Instituto Brasileiro

PREPARANDO A CAIXA MENOR

1. Começar colando no fundo da caixa todas as abas descoladas. Espa-lhar a cola com pincel ou espátula (ou um pedaço de papelão dobrado). Usar pesos como tijolos ou livros até a cola fixar.

2. Marcar a caixa nos 4 lados, por dentro e por fora, com uma linha ponti-lhada 20 centímetros acima do fundo.

3. Cortar com faca serrilhada ou estilete os quatro cantos da caixa até a linha pontilhada.

4. Depois de cortar, fazer vincos sobre as linhas pontilhadas usan-do régua e uma co-

Desenho em corte mostrando a caixa com as abas dobradas e coladas nas la-terais e no fundo da caixa.

lher (Isso facilita as dobraduras).Passar a ponta da colher fazendo

pressão ao longo da linha pontilhada.

5. Depois de criar os vincos sobre as linhas pontilhadas, dobrar para o la-do de fora da caixa todas as abas, colan-do nos quatro lados.

Depois de espalhar a cola com uma espátula, fixar as partes a serem coladas aplicando um peso até a cola segurar. (Usar cola branca ou até mesmo cola ca-seira).

6. Se ainda sobrarem pedaços das abas, criar vincos, dobrar e colar no fundo da caixa.

FORRANDO A CAIXA MENOR COM PAPEL DE ALUMÍNIO

1. Aplicar cola nos 2 lados de ca-da canto interno da caixa. Aplicar tam-bém na base do canto.

2. Cortar 4 faixas de papel de alu-mínio de mais ou menos 8 centímetros de largura por 25 centímetros de compri-mento. Dobrar ao meio com uma régua e aplicar sobre cada canto com a parte fosca do alumínio em contato com a cola

3. Cortar no canto da faixa de alu-mínio. Dobrar e colar nos lados de fora da caixa.

4. Com os 4 cantos já forrados, espalhar cola no fundo e nas paredes laterais internas da caixa, colando, em seguida, o papel de alumínio. Aplicar o papel de alumínio com a parte mais fos-ca para baixo, sobre a cola e a parte mais brilhante para cima.

TEXTO: RAYSSA OLIVEIRA • ILUSTRAÇÃO: ANDRÉ SOUZA

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de Geografia e Estatística (IBGE), a uti-lização deste produto por 30 por cento da população brasileira reduziria anu-almente a extração de lenha para cozi-mento de alimentos em 5 milhões e 370 metros cúbicos, uma quantidade bas-tante significativa para o ecossistema, que sofreria menos com a colheita e com os gases de carbono liberados com sua queima. A moradora da Vila Embratel, Maria das Graças Araújo, é agricultora e frequentadora do NEVE, além de usuária do forno solar.

Para ela, que passa o dia na rua, o suporte é muito vantajoso. “Deixo a co-mida dentro do fogão, no quintal, e saio para resolver meus problemas, fazer consultas, entre outras coisas. Quando volto, a comida está pronta. Economizo bastante com o uso do forno, apesar de ele poder ser usado somente quando há sol. O gás que guardo é usado durante a época de chuva. Se não houvesse o forno solar, gastaria duas vezes mais”, afirma. É assim, uma solução prática, econômica e sustentável para atender às famílias mais carentes.

Além do forno solar, o NEVE oferece uma série de cursos e atendimentos à comunidade, em parceria com a UFMA, como o acompanhamento de adolescen-tes grávidas até o nascimento da criança e, também, cursinho pré-vestibular, que acontecia até ano passado, ministrado por alunos da Universidade, gratuita-mente. Fora isso, há vários cursos profis-

sionalizantes, como de manicure, de ca-mareira, de mecânico; e cursos básicos, como informática básica, informática avançada e capoeira, entre outros. A in-tenção do núcleo é sempre ocupar os jo-vens e moradores da comunidade e dar a eles uma forma de aprendizado, para livrá-los da violência e das drogas, que são estigmas no bairro da Vila Embratel.

5. Passar sobre o alumínio um pa-no seco para reduzir as rugas e as bolhas de ar. Melhorando, ao mesmo tempo, a aderência da cola.

6. O papel de alumínio deve ser dobrado sobre as bordas da caixa e co-lado também nas laterais externas da caixa, pelo menos até a metade.

FAZENDO A CHAPA COLETORA QUE VAI NO FUNDO DA CAIXA MENOR

No fundo da caixa me-nor vai a chapa metá-

lica pintada de pre-to fosco sobre a

qual colocam--se as pane-

las. Essa chapa coletora absorve a luz transformando-a em calor.

A chapa coletora deve medir um cen-tímetro a menos no comprimento e na

largura do que o tamanho do fundo da caixa menor para não ferir o forro de pa-pel de alumínio.

Furos e pregos de cima para baixo.Arredondar os 4 cantos para não ras-

gar o forro de alumínio.Essa chapa não deve encostar direta-

mente no fundo da caixa para não trans-mitir parte do seu calor para o fundo. Para garantir o isolamento térmico entre a chapa e o fundo, pregar em baixo no sentido do comprimento 3 pedaços de cabos de vassouras fixados por pregos que atravessam a chapa de cima para baixo através de pequenos furos. No ca-so de uma chapa de metal mais fina os cabos de vassoura ajudam a manter a chapa mais plana e mais resistente.

PREPARANDO A CAIXA MAIOR

1. Come-ce colando no fundo todas as abas que este-jam descoladas. Use um peso (ti-jolos ou livros) até fixar.

2. Marcar a caixa nos 4 lados por dentro e por fora, com uma linha ponti-lhada, 28 centímetros acima do fundo.

3. Cortar nos 4 cantos até a altura

da linha pontilhada.4. Depois de fazer vincos sobre as

linhas pontilhadas usando uma régua e uma colher, dobrar as abas para dentro formando uma tampa sobre a caixa.

1. Colocar a caixa menor já for-rada de alumínio centralizada sobre a tampa da caixa maior.

2. Marcar o contorno fazendo uma linha pontilhada com lápis ou cane-ta. Fazer is-so sobre to-das as abas de papelão que cobrem a caixa.

3. Fazer vincos sobre as li-nhas pontilhadas com uma régua e uma colher e, em seguida, dobrar para dentro da caixa cortando os excessos - as abas dobradas para dentro não devem ser maiores do que a profundidade da caixa menor, isto é, 20 centímetros.

Dica: Para fazer os vincos com maior faci-lidade, emborcar a caixa (com a boca pa-ra baixo) sobre uma mesa com as abas abertas para os 4 lados.

JUNTANDO AS CAIXAS

Maria de Fátima Costa Lobão

Técnica em educação na Universidade Federal do Maranhão. Formada em Pedagogia pela UFMA e especialista em Educação Infantil pela Universida-de Estadual do Maranhão. Coordena o Núcleo de Extensão da Vila Embratel (NEVE), desde 2003, junto a mais de dez professores, desenvolvendo atividades voltadas para a comunidade.

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4. Duas das abas em lados opos-tos devem ser cortadas nas laterais para permitir o fechamento das 4 abas. Ao fe-char as abas, fechar primeiro as inteiras e depois as cortadas.

5. A caixa maior deve ainda ser pintada para tornar o papelão imper-meável, aumentado assim sua vida útil.Pode-se também decorar a caixa fazen-do desenhos ou colando figuras sobre as laterais pintadas (Nesse caso é bom aplicar um verniz transparente ou uma solução fina de cola branca para imper-meabilizar as figuras).

FAZENDO A TAMPA DO FORNO SOLAR

A tampa é feita com 4 pedaços de ca-bos de vassoura aparafusados e prega-dos nos 4 cantos. O uso de cola branca além do parafuso pode tornar desneces-sário o uso de pregos.

Furo para a instalação dos barbantes de apoio da tampa.

Barbantes esticados em forma de cruz criam um apoio para o plástico da sobretampa, evitando o contato com o plástico da tampa esticando abaixo. Isso garante a manutenção de um colchão de ar entre os dois plásticos criando isola-mento térmico.

Detalhe do corte a ser dado em cada ponta do pedaço mais longo dos cabos de vassoura. É aconselhável furar antes de usar pregos e parafusos.

O uso de cola ou de um prego ao lado do parafuso evita que a outra peça gire livremente. Essa fixação extra é impor-tante na hora de esticar os barbantes de apoio da sobretampa e na hora de pre-gar o plástico na moldura.

Esticar o plástico transparente por baixo na moldura de cabos de vassoura dobrando e pregando por coma com ta-chinhas de sapateiro, grampos de pisto-la ou de grampeador de papel.

FAZENDO A SOBRETAMPA DE PLÁSTICO TRANSPARENTE

Com a tampa colocada sobre as pa-redes da caixa grande, tomam-se as medidas para cortar o plástico da so-bretampa.

Atenção: Usar fita métrica ou trenaÉ interessante arredondar os 4 can-

tos para evitar o efeito “ponta de gra-vata” que se prolonga além da base da caixa, quando a sobretampa está montada.

O plástico transparente da sobre-tampa é idêntico ao plástico transpa-rente que está pregado na moldura da tampa.

USANDO A SOBRETAMPA

Retângulo de plástico transparente cobrindo todo o forno solar ( a sobretam-pa).

Tampa com o plástico transparente esticado em baixo da moldura e pregan-do por cima com tachinhas.

A sobretampa de plásticos transpa-rente deve cobrir a tampa e descer pelos 4 lados da caixa maior até sua base onde é fixada por elástico, barbante, corda ou uma liga de borracha cortada de uma câ-mera de ar de pneu.

Tira de borracha fixando a sobretam-pa de plástico em redor da base da caixa maior.

CORTE ESQUEMÁTICO DO FORNO SOLAR

1. Espaço de ar criando isolamen-to térmico entre a tampa pregada em baixo da moldura de cabos de vassoura e a sobretampa esticada por cima.

2. Sobretampa de plástico trans-parente descendo sobre os 4 lados da caixa grande preso perto da base com uma liga de borracha de câmera de ar ou elástico.

3. Tampa de plástico transparen-te esticado por baixo de uma moldura de cabos de vassoura.

4. Panela preta com tampa de en-caixe para reduzir a perda de vapor.

5. Liga de borracha de câmera de ar prendendo a sobretampa de plástico transparente.

6. Cabos de vassoura dando apoios para a chapa coletora, isolando-a do contato com o fundo da caixa.

7. Chapa preta de metal –coletora de luz que transforma a luz em calor.

8. Sacos plásticos contendo tiras de papel de jornal amassadas criando um isolamento térmico entre as paredes da caixa menor e as de caixa maior.

9. Pedaços de papelão empilha-das no fundo da caixa criando o isola-mento térmico na base do forno.

HORÁRIO DE MAIOR EFICIÊNCIA PARA O USO DO FORNO SOLAR

Esse horário pode variar conforme a latitude e a época do ano. De maneira geral, vale a regra que diz que o melhor horário para o uso do forno solar come-ça quando a sombra do seu corpo atinge o mesmo comprimento da sua altura.Quanto mais alto o sol, menor será a sua sombra e maior será a incidência da luz gerando maior calor dentro do forno.

Ao nascer do sol, a sombra projetada pelo seu corpo é muito comprida, me-dindo muito mais do que a sua altura. É cedo demais para iniciar o cozimento solar.

Assim mesmo é bom já colocar o for-no no sol, para que ele vá acumulando calor. Pode-se aproveitar o fato de ainda não ter panelas dentro e inclinar a caixa apoiada numa parede ou num tamborete e com a tampa voltada diretamente para o sol. De manhã cedo, essa é a posição ideal para o aquecimento do forno.

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Eline Rocha da Silva é um rosto que se confunde aos de outros tantos maranhenses que migraram do interior do Estado para a capital. Mas, ela não é uma pessoa comum. Aos 62 anos, D. Eline é uma benzedeira de-

dicada a uma missão que recebeu desde criança. Natural da cidade de Caxias, distante a 360 km da capital maranhense, D. Eline afirma ter um dom especial, o dom da cura.

Suas primeiras experiências como curandeira aconteceram quando ainda morava em Caxias, geralmente com mulheres grávidas na ânsia do parto. Ao presenciar essas situações, D. Eline imediatamente se põe a rezar e, em poucos minutos, uma nova criança vem ao mundo. Sobre este seu dom mediúnico, ela afirma: “Sou devota das Almas Santas e Benditas”. D. Eline ora pelas Santas Almas todas as segundas-feiras e os pedidos, segundo a benzedeira, são para obter força, coragem e para abrir as portas de sua casa para a felicidade. “Tenho Deus ao meu lado também. Oro a ele e a Nossa Senhora. Rezo o Pai- Nosso, o Credo, a Ave-Maria e a Salve-Rainha. Sem a presença de Deus, em conjunto com as Benditas Almas, não há cura”, conta a benzedeira.

D. Eline é portadora de um saber específico e tradicional, longe da academia e de qualquer laboratório. Suas receitas de remédios não estão guardadas em livros ou cadernos, mas na sua memória privilegiada. Sobre o início de seu ofício como benzedeira ela conta que o ritual de iniciação durou cerca de seis anos e ressalta que a cura depende também do doente, pois só tem a cura quem realmente crê nas Almas Santas e tem fé em Deus. Gente de longe visita Eline e sua fama ultrapassa a pequena comunidade onde a benzedeira mora com seus netos e seu esposo há mais de vinte anos. No seu bairro não são pou-cos os seus afilhados. “O que me deixa mais triste é ver uma criança sofrer, é uma coisa que me parte o coração, eu sofro junto com ela. Se a mãe dessa criança permitir, faço uma prece e benzo,” explica D. Eline sobre o trabalho de benzimentos em crianças que lhe levou a ser madrinha de inúmeras delas no bairro onde mora.

Todo este cuidado, principalmente com os pequenos, tem uma justificativa, pois seriam frutos das suas experiências

A devoção que curaA devota das Almas Santas e Benditas é especialista na cura. Eline Rocha da Silva é a

mulher que cura pela fé e faz desse ofício uma missão

Além de todas as atividades de mulher, mãe, avó e ma-drinha, D. Eline exerce também o seu principal ofício: a pro-dução de remédios caseiros e lambedores. Ela diz que usa qualquer tipo de planta que dê para curar: urucum, eucalip-to, babosa, entre outros. Segundo a benzedeira, os remédios caseiros dão certo. “Elas me dizem tudo o que tenho de fazer no momento em que as pessoas procuram a minha ajuda. Não posso errar em uma só palavra. Oro por essas Almas San-tas”, disse.

quando ainda era criança. “Sou de família pobre e meu pai morreu quando eu e meus irmãos éramos muito pequenos. Nós tínhamos mãe, mas como a vida era muito difícil, cedo tivemos que trabalhar. Na sua visão, ela nasceu para ajudar o próximo sem pedir nada em troca. “Não pego dinheiro de ninguém”, conta D.Eline ao afirmar que não tem ambições. Casada há vin-te e dois anos com o agricultor aposentado José Benedito, diz que tem o suficiente para viver. “Tenho um bom marido, bons filhos e três netos maravilhosos. Sou muito grata pela vida que tenho, sobretudo pela grande ligação com as Almas Santas e Benditas e pela presença de Deus em mim. É isso, sou feliz por ter esse dom e por fazer dele uma missão, que é ajudar a curar o sofrimento das pessoas”, afirma Dona Eline.

EUCALIPTO, URUCUM E BABOSA: O CONHECIMENTO POPULAR EM UMA ABORDAGEM MEDICINAL

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TEXTO: ANNA CAROLINE GUIMARÃES

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Assim, já tirei muito quebrante de criança

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Sistema de Bombeamento Solar da UFMA é o melhor do mundo em tratamento emergencial de águaTEXTO: LILIANE CUTRIM

Problemas como a falta de água, infraestrutura, precariedade na educação e tratamento do lixo são alguns dos pesadelos que atormentam o mundo e exigem soluções de toda a natureza. Uma dessas soluções é a proposta de bombear água utilizando apenas a energia solar. O projeto ganhou, em 2011, o

título de melhor produto do mundo na categoria Otimização de sistemas de tratamento emergencial de água acionados por sistemas solares, durante o International Future Energy Challenge (IFEC). O equipamento de baixo custo e eficiente foi criado pelo professor do Departamento de Engenharia Elétrica, Luiz Antonio de Souza Ribeiro, orientador do projeto que é composto também por três alunos. Um equipamento eleito o melhor do mundo em energia renovável foi produzido em um Estado do Nordeste que, como os demais, enfrenta sérios problemas de abastecimento de água.

O equipamento foi fruto de um desafio lançado pelo Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE), que criou uma disputa bienal visando premiar as melhores pesquisas relacionadas às questões relevantes para o mundo. O desafio era desenvolver um conversor eletrônico capaz de acionar uma bomba de água a partir de um painel solar de 205 Watts, o suficiente para abastecer uma família de quatro pessoas. Alguns problemas como a falta de equipamentos; o desafio de unir uma ideia à prática; a falta de recursos financeiros e muitos estudos para encontrar o modelo mais ajustado às condições locais foram desafios à parte enfrentados pela equipe. “Sem dúvida, a falta de investimento foi um obstáculo para o desenvolvimento do projeto, mas nós acabamos conseguindo vencer essa e outras barreiras”, ressaltou Luíz Antonio.

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No Maranhão, várias cidades sofrem com a falta de abastecimento de água. Nas regiões mais distantes, onde a po-pulação sobrevive da agricultura fami-liar, o problema com a irrigação chega a comprometer a sobrevivência das famí-lias. O gerente de inclusão produtiva da Secretaria de Desenvolvimento Social e Agricultura Familiar, Paulo Roberto Lo-pes, diz já conhecer o Bombeamento Solar e acredita que ele possa ser uma solução viável para o problema da falta de água. O produto, além de não preci-sar de energia elétrica, tem as vantagens de ser uma solução de baixo custo, pois não precisa de assistência técnica, sen-do útil para as regiões distantes.

O construtor civil José Ayres, que ainda não tinha ouvido falar desse tipo de sistema, achou a ideia maravilhosa e disse que deveria ser mais divulgada e utilizada. “É um absurdo que projetos como esse feitos no Maranhão não te-

nham o reconhecimento que merecem. Os líderes políticos devem observar me-lhor esses tipos de projetos para ajudar a população carente”, declarou. O vice--governador Washington Luís alega que o Maranhão está enfrentando sérios problemas, não só com relação à água, e ressalta que é necessário buscar solu-ções inovadoras para enfrentá-los. “Eu estou disponível para conhecer o projeto e ver a viabilidade dele para o Estado, principalmente para São Luís, que é uma capital com sérios problemas de abaste-cimento de água”, defendeu.

Ainda segundo o vice-governador, o Estado está formando parcerias com pro-jetos de sustentabilidade e de energias re-nováveis, que hoje são uma necessidade para o planeta, e frisou a importância de eventos que contribuam para enriquecer pesquisas científicas, como a Reunião Anual da SBPC. “É de fundamental impor-tância que haja uma relação estreita entre

o governo e os pesquisadores. A reunião da SBPC serve para que nós, gestores, es-tejamos atentos aos conhecimentos que serão passados, pois eles serão úteis para que façamos um governo melhor”, desta-cou o vice-governador.

O projeto do Bombeamento Solar com energia limpa e de baixo custo, reconhecido internacionalmente, assim como outros produtos desenvolvidos, ainda precisam ser reconhecidos dentro do seu próprio país. Em um tempo de discussões ambientalistas e de combate à pobreza no mundo, a reunião científica é um excelente espaço para aprofundar os conhecimentos sobre as produções científicas e de que modo elas podem melhorar o planeta. É importante também discutir a utilização desses produtos em benefício da sociedade para que soluções como o Bombeamento Solar não caiam no esquecimento. A ciência é válida se acontecer em benefício da sociedade.

Luiz Antonio RibeiroPossui graduação em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal do Maranhão (1990), mestrado em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal da Paraíba (1994) e doutorado em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal da Paraíba (1998). Atu-almente é professor adjunto da Universidade Federal do Maranhão. Tem experiência na área de Engenharia Elétrica, com ênfase em Eletrônica Industrial, atuando principalmente nos seguintes temas: ac drives, induction motors, acionamentos estáticos, parameter estimation e máquina de indução.

UMA SOLUÇÃO SUSTENTÁVEL PARA O ABASTECIMENTO DE ÁGUA

O Bombeamento Solar foi desen-volvido no Instituto de Energia Elé-trica (IEE) no laboratório de energias renováveis. O equipamento consiste, basicamente, em um conversor que é capaz de bombear 8 metros cúbicos de água ou o equivalente a oito mil litros de água por hora com energia solar. Durante o International Future Energy Challenge (IFEC), o projeto da UFMA concorreu com outros 29 proje-tos de instituições de ensino superior internacionais que se inscreveram na competição. No entanto, diferen-temente dos outros, obteve grande êxito em todos os testes e avaliações. Na competição, foi provado que o pro-tótipo brasileiro, orçado em R$ 139 re-ais, é capaz de gerar água duas vezes

mais do que o protótipo alemão, orça-do em R$ 1.235 reais.

Mesmo tendo recebido o prêmio, o projeto ainda está sem a devida utilização. Os alunos Luís Felipe Teixeira, Guilherme Farias e João Victor Caracas, que fazem parte do projeto, se mostram satisfeitos com o produto final. “Foi muito bom par-ticipar da criação do Bombeamen-to Solar, mas o fato de ainda estar parado nos deixa triste. Quando ga-nhamos o prêmio, recebemos a pro-posta de vender o projeto para outro país. Nós não fizemos isso porque queremos que seja algo nosso, bra-sileiro, mas até agora ninguém se mostrou interessado”, afirmou João Victor Caracas.

O SISTEMA DE BOMBEAMENTO SOLAR

Acadêmicos de Engenharia Elétrica apresentam o projeto do Bombeamento Solar na Semana do Meio Ambiente na Vale

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Rezadeira: Motivando a fé de uma comunidade“Sancta Trinitas, unus Deus, miserere nobis; Sancta Maria, ora pro nobis; Sancto Dei

Genitrix, ora pro nobis; Sancta Virgo virginum, ora pro nobis”

Estrada sem asfalto, onde a poeira sobe alto quando algum automóvel passa por ali, casualmente. Ar puro, sem poluição. Águas limpas, sem contaminação. Ba-rulho? Somente do vento batendo nas árvores ou da

cantoria dos pássaros que voam livremente pelo céu azul. A atividade preferida das pessoas? Bem, depois de um dia de trabalho na plantação ou no rebanho, nada melhor do que aco-modar uma cadeira pertinho da porta e admirar o pôr do sol e, logo mais, apreciar um céu estrelado e uma lua brilhante.

Pode parecer exagero ou mesmo impossível, mas, sim, es-se lugar existe. Localizado a três quilômetros do município de Santo Antônio dos Lopes, Pau Ferrado é um povoado bastante conhecido pelos moradores da região, principalmente pelo fes-tejo de São Francisco das Chagas, que acontece todos os anos na Igreja do Pau Ferrado na Fazenda São José, assim identifica-da pelos moradores.

A família de Dona Socorro chega a 4 ª geração realizando os festejos que já se tornaram famosos na região onde mora

TEXTO: ANISSA AYALA CAVALCANTE

Uma capela simples, com bancos de madeira sem encos-to, uma cruz de cimento na entrada, um sino que emite um som forte ao anunciar a hora das celebrações e imagens de três santos: Santo Antônio, São Francisco das Chagas e Nossa Senhora da Conceição. Maria do Socorro, de 78 anos, viúva, mãe de oito filhos – Ednalda, Edna, Ednalva, Edneuza, Edma, Edileuza (in memoriam), Evaldo e Erivaldo (filho de criação) e, aproximadamente, quatorze netos – é a responsável pe-la administração da igreja e pela reza, em latim, desses três santos. A igreja é uma herança de Antônio Tibúrcio Rocha, pai

de dona Socorro e fundador dos festejos na comunidade do Pau Ferrado. Ela mantém a capela até hoje com as doações dos fiéis e dos noitaros, pessoas responsáveis por uma deter-minada noite no período dos festejos.

SAGRADO E PROFANOO primeiro festejo da capela data no ano de 1850. Antônio

contava com seus filhos, que se dividiam nas funções, e, den-tre eles, D. Socorro. Uns “tiravam” a novena, que até hoje é toda rezada em latim, outros tocavam o sino e ainda tinham os que se encarregavam de soltar os foguetes. Uma banda com bateria, guitarra, clarinete e saxofone animava as noites no pe-ríodo festivo.

Antônio festejava os três santos todos os anos. O mais po-pular era o festejo de São Francisco das Chagas, padroeiro de várias famílias que, atraídas pelos pedidos atendidos, partici-pavam todas as noites para agradecer, por meio de promessas, vestidos de marrom, descalços nas noites de festejo, doando velas e foguetes, entre outros.

Seu Antônio nunca pediu a nenhum de seus filhos que con-tinuassem com os festejos quando viesse a falecer. No entanto, D. Socorro, com a morte do seu pai em 1958, resolveu continuar com os ensinamentos que ele deixou. Sua criação foi rígida e, como ainda era de costume na sua época, também criou os filhos com toda a rigidez. Assim como D. Socorro ajudou o pai nos fes-tejos, hoje, são os seus filhos que desempenham essa função.

Com 60 anos ininterruptos festejando os santos, dona So-corro ressalta: “enquanto vida eu tiver, os festejos vão continu-ar e, assim como meu pai, não vou pedir a nenhum filho meu que continue a fazê-los, a não ser que seja por livre e espon-tânea vontade, e compromisso com Deus, como eu e meu pai tivemos 60 anos atrás”, explica. Esta já é a quarta geração da família de Socorro que vem mantendo a tradição das festas re-ligiosas, uma forma de manter os traços culturais e a devoção de toda uma comunidade viva.

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Desde maio do ano de 2011, estudantes e professores da Universidade Federal do Maranhão uniram esforços

para o desenvolvimento de um projeto de extensão, criado para discutir e conscientizar as pessoas sobre a importância de analisar a hospitalidade no mundo universitário. O projeto Hospitalidade no Campus cresceu, atraindo a atenção para discussões que há muito já tomavam conta principalmente das salas de aula dos cursos de Turismo e Hotelaria.

Motivado pelo interesse de seus alunos em pensar a hospitalidade na Instituição que frequentam, o professor Davi Andrade iniciou o projeto que coordena. A necessidade de desenvolver a maneira como os públicos da Universidade se relacionam foi, inclusive, detectada numa pesquisa de opinião realizada pelos envolvidos. “Fizemos campanhas para incentivar a gentileza e multiplicar a boa receptividade na UFMA. Foi algo muito interessante pensar em práticas da nossa profissão e interferir na realidade em que estamos inseridos”, relatou a aluna participante do projeto, Ana Isabel Bílio.

A partir do reconhecimento de todo o trabalho desenvolvido, foi criado um segundo projeto intitulado Hospitalidade na SBPC. Segundo o professor Davi Andrade, o projeto tem prestado todo o apoio necessário às comissões organizadoras do 64ª Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. “Neste segundo projeto, estamos tendo a oportunidade de realmente envolver os estudantes na

recepção de um evento de grande porte como é a SBPC. Eles têm se mobilizado e realmente levado a sério os trabalhos para bem receber os 20 mil visitantes que aportarão no Maranhão para participar da Reunião”, lembrou.

De acordo com o professor, várias são as vertentes de atuação do projeto no evento. Estão sendo feitos planeja-mentos para a recepção dos participan-tes do evento no interior do Campus, assim como treinamentos para todos os alunos que estão inscritos na monitoria da SBPC. “Estamos pensando em manei-ras de mobilizar todo o trade turístico da cidade. Já fechamos a construção de bu-reaus em hotéis de São Luís para atrair a atenção ao evento”, comentou.

Davi Andrade discorreu ainda sobre os trabalhos de logística que tem recebido orientação dos membros do Hospitalidade na SBPC. “Estamos nos reunindo diretamente com as comissões de Infraestrutura e Alimentação para oferecer nossas contribuições. Ofereceremos aos vendedores informais de alimentos, treinamentos de manipulação e de atendimento ao público, bem como uma oficina sobre o evento voltada para os taxistas, no intuito de torná-los aptos a bem informar os visitantes.

Durante a Reunião Anual da SBPC, além de todo o trabalho de acolhimento, o projeto também irá oferecer oficinas que acontecerão no espaço da SBPC Jovem. Serão duas oficinas, sendo uma dirigida às crianças e adolescentes so-bre as práticas de gentileza e a outra vol-tada para os professores e diretores de escolas, atores que vão entender de que forma poderão desenvolver nos seus

próprios ambientes escola-res um projeto de hospitali-dade semelhante ao que é atualmente instruído pelo Departamento do curso de Turismo e Hotelaria da Universidade Federal do Maranhão. “Os pro-fessores e diretores da rede de educação bási-ca serão qualificados para replicar um projeto de hos-pitalidade nas suas próprias escolas. Esperamos que eles já saiam da oficina com um roteiro de como desenvolver a hospitalidade no ambiente escolar”, explica o professor e coordenador do projeto Hospi-talidade no Campus.

Dê bom dia, ganhe um sorriso!

Conheça mais sobre o projeto Hospitalidade no Campus, acesse o sítio www.hospitalidadenocampus.blogspot.com e www.nuppho.blogspot.com.br

TEXTO: MURILO AZEVÊDOFOTOS: ARQUIVO DO PROJETO

Projeto Hospitalidade no Campus em frente à Universidade

Participação do projeto na Ação Global,

junho de 2012

Davi Alysson da Cruz Andrade É Bacharel em Turismo pela Universidade Federal da Paraíba e Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente pelo Programa Regional de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Atualmente é Professor Assistente do Departamento de Turismo e Hotelaria da Universidade Federal do Maranhão, onde vem ministrando disciplinas e desenvolvendo estudos e pesquisas sobre hospitalidade, qualificação profissional e planejamento, e gestão do turismo. Coordena projetos de extensão que tratam da temática da hospitalidade cultural e profissional.

Especial SBPC

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Com criatividade é possível produzir energia limpa e sustentávelProjeto de baixo custo é capaz de armazenar energia solar e ajudar a resolver o problema da produção de energia sem que haja impacto ambiental

As modificações que o planeta vem sofrendo nos últimos 100 anos, tais como o aumento da

temperatura, o descongelamento das calotas polares e o consequente au-mento do nível dos mares, são fenô-menos que têm sido motivo de discus-sões fomentadas em todo o planeta. O objetivo é que sejam criadas políticas capazes de rever ou de reter o quadro de destruição do planeta e de estimu-lar cada cidadão para o desafio da mudança, visando à sobrevivência da espécie humana no planeta. Dentre as preocupações que compõem este cenário está a escassez das fontes de energia, que é, em especial, um desa-fio mundial, pois é preciso encontrar novas fontes que possam ser usadas em abundância com uma prerrogati-va: elas têm que ser fontes limpas e sustentáveis.

Da superação deste desafio de-pende o conforto e o bem-estar da população. A pergunta que instiga cientistas, políticos, pesquisadores é como será possível lidar com um pla-neta onde crianças nascem no mesmo ritmo em que as principais fontes de energia estão acabando? Foi pensan-do nisso que surgiu o projeto Poste Solar, desenvolvido em 2009, pelo Departamento de Engenharia Elétri-ca, da Universidade Federal do Mara-nhão. Trata-se de um protótipo de bai-xo custo, capaz de armazenar energia solar, a partir de painéis solares que realizam a captação da luz.

TEXTO: JONATAN CARDOSO

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Tecnologias Sociais

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Inicialmente pensado para ser instala-do em áreas remotas onde não há energia elétrica, o poste sofreu várias adaptações e tem sido projetado como uma ferramenta para enfrentar o problema de escassez das fontes energéticas, agora e no futuro. Assim, após a captação de luz, um controlador de carga, que é responsável pela carga e des-carga de uma bateria, e o inversor de tensão transformam a energia contida em bateria de 220 Vca, apropriada para uso em lâmpa-das compactadas de 15 Watts. O projeto une em um só o controlador de carga e o inversor de tensão com um custo de produção de R$ 850 reais em média, destacando-se pela sua integração, baixo custo, eficiência e tecnolo-gia totalmente nacional.

O mestrando João Victor Caracas é pesquisador e membro integrante do Instituto de Energia Elétrica da UFMA (IEE/UFMA), um núcleo de pesquisas que visa explorar as vocações energé-ticas do Maranhão desenvolvendo ex-perimentações e propostas de novas tecnologias para a produção de energia elétrica. O Instituto já realizou várias publicações e, também, conquistou prêmios nacionais – Prêmio excelência em P&D na categoria sistemas e pe-riféricos e o Prêmio CNI na categoria desenvolvimento sustentável da con-federação nacional das indústrias – e internacionais – International Future Energy Challenge (IFEC).

O IEE tem vários projetos que pensam a questão das energias renováveis, sendo o Poste Solar o irmão mais novo de outro pro-jeto bem prático que saiu dos laboratórios do Instituto e que ganhou repercussão, o Projeto Lençóis Maranhenses. Este novo empreendimento leva energia limpa para comunidades muito distantes, por meio de um siste-ma que combina torres eólicas e painéis solares com um gerador a diesel. O interessante do Ins-tituto é que além de professores e pós-graduandos, os alunos do curso de Engenharia também po-dem participar da produção de projetos como estes. É o caso de Igor Lopes de Castro, aluno do 4° período de Engenharia Elétrica que, por meio do IEE, tem aces-so aos projetos que lhe permitem colocar em prática o que aprende em sala de aula. “É muito gratifi-cante poder levar energia de boa qualidade a quem não a tem”, comenta o aluno sobre a possi-bilidade da experimentação e elaboração de novas tecnologias dentro do Centro de Energia Elé-trica da UFMA.

Tanto João Victor quanto Igor concordam que a falta de incen-tivos para que as boas ideias saiam do laboratório é o que inviabiliza a comercialização de projetos como os citados e, por conseguinte, a produção de novas tecnologias. “Existem in-centivos, mas são incompletos e contraditórios. Disponibilizam bolsas de estudo, materiais, mas não dão amparo aos proce-dimentos metodológicos e não fazem a comunicação com as empresas que poderiam patro-cinar e comercializar o produ-to”, contam. O resultado disso é que alguns projetos correm o risco de ficarem trancados nos laboratório, quando poderiam estar servindo, em especial, à população que mais precisa.

O Parque Botânico da Vale, locali-zado a poucos quilômetros da IEE, foi a primeira empresa que mostrou interesse em adquirir essa tecnologia. Renato de Jesus dos Reis, orientador ambiental do Parque Botânico, afirma que o Poste So-lar deve ser pensado como um produto viável e que pode melhorar a qualidade de vida no planeta. “As discussões em todo o mundo giram em torno da ques-tão da sustentabilidade. Então, como não poderia ser diferente, o Parque Botânico mostra interesse em adquirir, conscientizar e disponibilizar para a so-ciedade um produto tão interessante.”

Segundo o secretário adjunto da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Sectec ), João Torres, o interesse da instalação do Poste Solar no Parque Botânico da Vale é um exemplo que encabeça o cenário de incentivos das empresas que estão vindo para o Estado. Ele considera que

as ideias como a do Poste Solar são bem vindas e que ainda há muito a ser feito sobre este assunto no país. Torres ilustra isso citando um exemplo de programa modelo para o assunto, que é o Projeto Alcântara, Cidade Sustentável, em parceria com a Agência Espacial Brasileira (AEB), que tenta atender as comunidades quilombolas do município de Alcântara por intermédio da conscientização e das ações da rotina dos cidadãos, partindo do princípio sustentável em todas as áreas.

Há várias ideias para serem desen-volvidas e conhecidas sobre as energias renováveis. A ciência tem um papel fun-damental nesse movimento, pois proje-tos como o do Poste Solar podem sig-nificar uma mudança na concepção do consumo de energia. Mudança esta que interfere diretamente no enfrentamento à pobreza, representando uma solução social e econômica para as questões atuais e futuras.

TECNOLOGIA QUE VALE

Parque Botânico da Vale em São Luís

ENERGIAS RENOVÁVEIS

Possui graduação em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal do Ma-ranhão (2010). Atualmente é mestrando da UFMA, bolsista pelo CNPq. Tem experiência na área de Engenharia Elétri-ca, com ênfase em Eletrônica de Potência, Inversores e Conversores de Energia, Fontes Renováveis.

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Praias de São Luís: patrimônio perdido?TEXTO: SANSÃO HORTEGAL

Com 640 quilômetros de litoral, o Maranhão é um dos estados do Nordeste com o maior nú-mero de praias. Esse é um dos

atrativos turísticos mais procurado em São Luís para além do seu patrimônio cultural e da sua memória fundacional. Na capital, o metro quadrado mais caro é o que fica próximo das praias e, tam-bém ligada a elas, há uma economia que movimenta milhões de reais em hotéis, pousadas, restaurantes, bares, clubes, academias, danceterias e outros atra-tivos que aproximam o homem do mar, sobretudo nas férias e em épocas festi-vas. Apesar de gerar bastante riqueza e

trabalho, as praias do Maranhão, mas especificamente as de São Luís, estão agonizando de tanta poluição – tornan-do-se impróprias para o banho e para outras atividades balneárias –, à espera de ações públicas que consigam reverter esse quadro.

Esse quadro não é novo. Desde que os primeiros fluxos migratórios chega-ram aqui, como, por exemplo, o grupo do português Jerônimo de Albuquerque, em 1615, que expulsou os franceses da capital, que as praias são poluídas. Se-gundo a professora e pesquisadora do curso de Oceanografia, Flávia Mochel, de lá para cá, nunca foi desenvolvido um

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Meio Ambiente

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projeto de saneamento que levasse em consideração todas as condições de bal-neabilidade. “A poluição sempre existiu. Hoje, nós temos um problema de escala, já que o número de pessoas aumentou e a produção de lixos despejados tam-bém. Estamos completando 400 anos e ainda não fizemos nada para resolvê-lo. O problema não é novo, mas agora ele se intensificou”, afirma.

O efeito mais direto resultante desse processo é que todas as praias próxi-mas do centro de São Luís estão impró-prias para o banho. Segundo a Secreta-ria de Estado do Meio Ambiente - SEMA, as praias da Ponta d’Areia e do Olho d’Água estão com altos índices de po-luição, enquanto que as do Calhau, São Marcos, do Meio e Araçagi estão ina-dequadas para os banhistas. Destas, a praia do Olho d’Água é a mais poluída e a que oferece maiores possibilidades das pessoas contraírem doenças, tais como problemas intestinais e respirató-rios causados por bactérias e protozoá-

rios. Apesar de a SEMA distribuir placas de sinalização de uso próprio ou impró-prio para banho, as pessoas as ignoram e continuam utilizando as praias para as mais diversas atividades, conviven-do com escoamentos de esgotos de vá-rias origens. O pior disso tudo, é que a praia do Olho d’Água continua sendo a mais procurada pelas classes populares de São Luís.

OLHOS DA MÃE D’ÁGUAConhecida pela beleza de seus olhos

d’água que minavam água doce e pura em toda a sua extensão, a praia do Olho d’Água é frequentada desde a década de 50 do século XX. Nas décadas seguintes passou a ser o maior ponto de lazer de São Luís. Tornou-se conhecida também como o cemitério da juventude devido ao registro de muitos afogamentos no local, passando a ser considerada pela religião afro-maranhense como praia en-cantada, a praia de Iemanjá. Até hoje, to-dos os rituais – próprios da religião afro

–, são feitos nessa praia pelos mistérios e segredos que guarda.

É nesse contexto que a praia do Olho d’Água, desde então, foi a mais enfati-zada nos estudos acadêmicos. Primeiro, por sua popularidade e, segundo, pela má utilização. Atualmente, é possível perceber a intensificação da urbaniza-ção junto ao descaso, principalmente dos poderes públicos municipais e es-taduais em não coletar e não tratar os efluentes líquidos que chegam à praia dos muitos condomínios, bares e res-taurantes que existem no local, gerando uma situação que os estudiosos cha-mam de condição inóspita. “Fala-se mui-to em praia deserta, mas no Maranhão nós falamos de praia inóspita”, destaca o professor do Curso de Geografia Mar-celino Farias Filho.

Ele e mais três estudantes do curso de Geografia - Jaílson Ferreira, Zélia Ma-ria Nunes e Irismar Brito - fizeram um estudo focado nos problemas da praia do Olho d’Água. No projeto, eles cons-

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tataram que, com a instalação de gran-des projetos industriais e de pequenas empresas como restaurantes, pousadas, hotéis, entre outros, houve um aumento populacional na cidade e, consequen-temente, um aumento da produção de resíduos sólidos que é diretamente pro-porcional à demanda gerada por esses investimentos. Uma proposta dada pelos geógrafos seria a intervenção de iniciativas no âmbito da educação ambiental, por meio de campanhas de conscientização sobre o uso do espaço público a fim de que sejam minimiza-dos os impactos causados pelo acúmu-lo de lixo.

Durante a pesquisa, eles observa-ram que os usuários são os principais agentes de poluição das praias. Por isso, dizem que o poder público de-veria colocar lixeiras ao longo da orla para que o lixo produzido pelas pes-soas tenha um destino correto, assim como containers de coleta seletiva em pontos estratégicos para facilitar a separação dos resíduos sólidos pro-veniente dos bares e barracas. Esse mesmo alerta é confirmado pela pro-fessora Flávia Mochel ao analisar que

a capital maranhense está vivendo um fenômeno mundial, em um planeta que possui uma população de sete bilhões de habitantes. “Não se pode ignorar que há um fluxo migratório enorme de pessoas das grandes cidades vindo pa-ra São Luís, à procura de novas possi-bilidades de empregos, de geração de trabalho e de uma renda sustentável, movida pelo ecoturismo”, ressalta.

SANEAMENTO E QUALIDADE DE VIDA

Atualmente, existem em São Luís du-as estações de tratamento de esgoto – uma na área do Itaqui-Bacanga e outra na área do Jaracati – que foram constru-ídas na década de 90 e pensadas dentro dos padrões mais modernos da época, porém não funcionam completamente. “Sempre faltando uma peça ou outra pa-ra fazer o equipamento funcionar”, expli-ca a pesquisadora. “A planta do Bacanga trabalha com aproximadamente 20 por cento da sua capacidade e a do Jaracati com mais ou menos 30 por cento”, ana-lisa. A professora ressalta que, além do descaso em relação às estações, nunca houve um trabalho sério de educação ambiental que envolvesse a Sociedade

Civil para fazê-la entender que cada um tem que fazer a sua parte, pois o proble-ma é de todos e é, sobretudo, uma ques-tão de qualidade de vida.

Basta andar pelas ruas da capital ma-ranhense que é fácil encontrar bueiros estourados a céu aberto, que perma-nentemente vazam material de esgoto para a superfície, contaminando o len-çol freático e as praias. Outro exemplo, também, é o Rio Anil, que concentra grande parte de coliformes fecais, cujos principais prejudicados são os bairros circunvizinhos e as pessoas que moram nessas localidades. “O problema é que está tudo interligado. A maré mistura tudo e não há nada que fique parado porque ela enche e seca. Nosso golfão é muito grande e consegue diluir essa sujeira”, completa. Como a maré alcan-ça até oito metros, o lixo que já existe no mar pode ser diluído. “Essa sujeira vai sendo reciclada automaticamen-te. Tudo se transforma, até as próprias bactérias vão se degradando”. Todos os dias, toneladas de resíduos sólidos são despejados nas praias e, nem mesmo a construção de canais de esgoto, ligados a uma estação de tratamento, resolveu

Com o aumento populacional na cidade, a produção de resíduos sólidos também aumenta

Placas de sinalização advertem banhistas

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o problema. É possível que hoje alguns quiosques das praias ainda não este-jam ligados a esta rede ou, mesmo os que já estão, não possuem a manuten-ção devida e acabam colocando esses resíduos sólidos no mar.

O MANGUE E O DESMATAMENTOAlém das praias, os mangues sofrem

o mesmo problema, mas com um agra-vante: o desmatamento. Com o objetivo de realizar a recuperação desses man-guezais, visto que são eles que evitam enchentes em regiões próximas ao mar, a professora Flávia Mochel coordena o Centro de Recuperação de Manguezais (Cermangue), no qual realiza um estudo da região em que o mangue foi desma-tado e verifica se é possível recuperar ou não a área afetada. Segundo disse, existem extensões de mangues que já estão tão degradados que são irrecupe-ráveis. “A recuperação de uma área de manguezais, assim como de qualquer área degradada, não é um panaceia. Não devemos ter em mente a ideia de que é só desmatar que depois alguém recupera, porque o procedimento não funciona assim. Para realizar este tra-

balho, é necessário verificar a escala do problema e o tipo de degradação. Alguns ecossistemas já estão irreversivelmente danificados, mas outros ainda podem ser recuperados”, alerta.

Os principais agentes da degradação dos manguezais na Ilha de São Luís são o desmatamento, o corte e o aterro, que vêm acontecendo em zonas urbanas pa-ra a construção de residências e comér-cios, bem como áreas industriais. Com a instalação destes novos edifícios, o des-matamento, além do corte e do aterro, ocorre de forma indireta, ou seja, todos os resíduos são jogados nos mangues, o que tem prejudicado toda a área de manguezais. “Grande parte dos nossos resíduos sólidos de construção civil são jogados no mangue”.

O Maranhão é uma região coberta por mangues. Além de São Luís, é pos-sível destacar também o município de Apicum-Açú, localizado a 147 quilôme-tros da capital, área muito rica em man-guezais e que já sofre o mesmo proble-ma. Assim, a professora e sua equipe ampliaram as suas pesquisas para esta área, onde ministra palestras, oficinas, minicursos e outros caminhos que ve-

No dia 06 de junho, o LAMA/Cerman-gue (Laboratório de Manguezais do Cen-tro de Recuperação dos Manguezais), do Departamento de Oceanografia e Limno-logia da UFMA, recebeu um prêmio de reconhecimento, concedido pela Funda-ção Alcoa, pelo trabalho que desenvolve no ecossistema dos manguezais e pelas ações de educação ambiental na comu-nidade. O cheque simbólico, no valor de U$ 150 mil, foi entregue pelo presidente mundial da Alcoa, Klaus Kleinfeld, à co-ordenadora do Centro de Recuperação, professora Flávia Mochel.

O Cermangue, fundado no laboratório com o objetivo de recuperar os mangue-zais, será destaque na 64ª Reunião Anual da SBPC, quando a professora Flávia Mo-chel coordenará o Simpósio dos Mangue-zais Brasileiros, que será realizado nos dias 26 e 27 de julho durante a Reunião.

Erosão provocada pelo avanço do mar já tomou conta de parte da avenidaResíduos sólidos se misturam à diversão dos banhistas

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nham alertar a comunidade local sobre a questão. É importante lembrar que os mangues são fundamentais para prote-ger a região de erosões, enchentes ou outros fenômenos do ecossistema que acabam afetando lugares como a ilha de Cajual dos Pereiras, que antes possuía mais de 600 moradores com aproxima-damente 150 famílias.

Cajual era uma ilha intocável, mas, com o desmatamento da região, a ero-são das marés foi separando as praias. A água invadiu a ilha dividindo-a em duas partes: uma denominada Ilha de Cajual dos Pereiras e a outra ainda sem nome definido. Para a pesquisadora Flávia, is-to acontece pelo fato de que uma parte da erosão está ligada à dinâmica natural

MARCELINO SILVA FARIAS FILHO

Doutorando em Ciência do Solo pela Universidade Estadual Paulista de Jaboticabal, Mestre em Agroecologia, Licenciado em Geografia pela Universidade Estadual do Maranhão e licenciado em História pela Universidade Federal do Maranhão. Atualmente é professor assistente do Departamento de Geociências da Universidade Federal, desenvolvendo atividades de pesquisa e de extensão nas áreas de ciência do solo, geomorfologia, educação ambiental e senso-riamento remoto. É Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisa em Edafologia e Pedologia (GEPEPE) vinculado ao Departamento de Geociências, sendo responsável interinamente pelo Laboratório de Cartografia - LABOCART. É coordenador adjunto do Grupo de Pesquisa em Educação Ambiental em Unidades de Conservação do Maranhão - GPEAMA, vinculado ao Departamento de Química e Biologia da Universidade Estadual do Maranhão.

JAÍLSON FERREIRA MOREIRA

Graduando em Geografia Bacharelado e Licenciatura pela Universidade Federal do Maranhão. É membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Edafologia e Pedo-logia (GEPEPE) vinculado ao Departamento de Geociências da UFMA. Faz parte da Divisão Técnica de Pesquisa do GEPEPE desenvolvendo atividades ligadas à Pedologia, Edafologia, Geomorfologia e ao Meio Ambiente.

ZÉLIA MARIA NUNES

Graduanda em Geografia pela Universidade Federal do Maranhão. É membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Edafologia e Pedologia (GEPEPE) vinculado ao Departamento de Geociências, atuando na Divisão Técnica de Extensão, participa do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID).

IRISMAR DA SILVA BRITO

Graduanda em Geografia pela Universidade Federal do Maranhão. Atualmente é componente do Grupo de Estudos e Pesquisa em Edafologia-GEPEPE do qual é bolsista IEX-CNPq e participante do Projeto de Extensão.

FLÁVIA REBELO MOCHEL

Possui Graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1981), Mestrado em Zoologia - Museu Nacional / UFRJ (1987) e Dou-torado em Geociências (Geoquímica) pela Universidade Federal Fluminense (1999). Atualmente é professora adjunta da Universidade Federal do Maranhão, responsável pelo LAMA- Laboratório de Manguezais e fundadora/coordenadora do CERMANGUE- Centro de Recuperação de Manguezais na UFMA. Possui experiência na área de Ecologia e Oceanografia Biológica, com ênfase em Ecologia e Recuperação Ecológica de Manguezais, atuando principalmente nos seguintes temas: manguezais, educação ambiental, macrofauna bêntica, sensoriamento remoto e ecossistemas costeiros.

de fluição da areia, já que esta é joga-da em cima dos mangues, fazendo-os secarem e morrerem. É por causa deste desmatamento – e com o aumento do nível do mar – que a água avançou tanto a ponto de “cobrir” a Ilha do Cajual dos Pereiras, o que obrigou a retirada dos moradores para outras regiões. “Hoje, a ilha não existe mais como era conhecida na década de 90”, lamenta.

Em São Luís não é diferente e, um exemplo disso, é a praia da Ponta D’Areia, onde a água avança sobre a zo-na urbana destruindo tudo à sua volta: prédios e muros de proteção. É preciso, portando, estabelecer a importância desses ecossistemas para a sobrevivên-cia da própria ilha e, a partir daí, recupe-rar o que ainda é possível recuperar. O mar não perdoa. A resposta que ele tem dado por conta do lixo que ele recebe to-dos os dias é o aumento da sua violência pelo espaço violado. Até onde, nós que-remos ou poderemos ir?

Registro de esgoto sendo despejado nas praias

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Muito mais que um conto: O ofício solitário de um ser pescador

No litoral da Raposa, encontro Esterclides Ribeiro Marques, de 59 anos, trajando camisa de man-ga longa azul, bermuda escura, com os pés des-calços sob a lama do mangue e um chapéu para

se proteger do sol forte. Ele é um senhor de fala direta, bem articulada e foge à regra de que pessoas de baixa renda não sabem se expressar de maneira correta. Mais conhecido como Ester (apelido dado pelos amigos desde sua adolescência), o personagem é casado há mais de 30 anos e é pai de seis filhos, de idades que variam entre 37 e 23 anos. Seu ofício? Ele é pes-cador há 51 anos.

Natural da cidade de Axixá, localizada a 90 km de São Luís, Seu Ester saiu do município para morar em São José de Riba-mar, quando tinha 10 anos. Seis anos depois, mudou de locali-dade, fixando, desde então, residência no município de Rapo-sa, onde vive até hoje. O pescador, que começou no ofício aos oito anos de idade, conta que o mesmo trabalho era exercido pelo seu pai, com quem aprendeu tudo sobre a pesca. Seu Es-ter se mostra uma pessoa polivalente, pois, além de pescador, é pintor, carpinteiro e veleiro (profissional que trabalha na con-

fecção de velas para barcos, lanchas e outros tipo de embarca-ções), porém, a sua renda principal sempre foi a pesca e dela obteve recursos para criar seus filhos. Ester estudou somente o ensino básico, até a 8ª série, atual 9º ano, porém acumulou um conhecimento que não é possível ser aprendido na escola.

Esterclides que iniciou o ofício aos oito anos de idade, reconhece a importânca do seu trabalho e desabafa: “A profissão está abandonada”

TEXTO: EMERSON MACHADO

Apesar de ter seguido a profissão do pai, ele nunca quis que seus filhos enveredassem pelo mesmo caminho. “Meu filho mais velho me falou uma vez que não queria ser pescador. Por isso, ele estudou, se tornou marinheiro e hoje é vereador daqui do município. Já meus filhos mais novos também são pescado-

“ A atividade pesqueira não é apenas ir para o mar e jogar a rede. Há toda uma estrutura e um saber específico

para realizar o ofício

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Esterclides Ribeiro Marques é associado da colônia de pesca-dores da Raposa há mais de 34 anos e já chegou a ser presi-dente da entidade por duas gestões (1984-1986 e 1990-1992). Na comunidade, co-nhece as dificulda-des do órgão por não

ter uma boa estrutura financeira. Como associado da colônia, ele paga R$ 9,00 mensais e tem direito às consultas médicas--odontológicas e oftalmológicas. “Sei que muito se reclama pe-la colônia não fazer mais, mas, como já trabalhei lá, pude ver

que temos que nos empenhar bastante para fazê-la caminhar, perceber que o trabalho que ela faz é importante para todos nós (pescadores)”, diz sobre a importância de fazer parte da colônia.

Atualmente, a Ferrari, embarcação de Seu Ester, é movida a motor e a velas, um modo preventivo contra qualquer desven-tura que possa surgir. Seu barco leva este nome em homena-gem à escuderia italiana de Fórmula 1, da qual o pescador é fã. Sobre o seu ofício, ele é breve e direto: “O pescador lida com o mar, é um trabalho bonito, mas também, às vezes, é um traba-lhador solitário. A nossa atividade é muito solitária, egoísta”, relata com certo desencantamento. Mas, por outro lado, ele diz que ainda está longe de se aposentar, pois ainda quer muito navegar mar adentro, só que agora, na companhia de seu filho, a quem pretende repassar a experiência e o saber acumulado em mais de 50 anos no exercício do ofício de pescador.

res. Um tem o próprio barco e o outro trabalha comigo (aponta para o filho que está trabalhando dentro da embarcação). En-tão, já que eles resolveram isso para a vida, só me resta ensi-ná-los, não é mesmo?” pergunta.

Questionado sobre a visão da sociedade perante a sua profis-são, ele afirma que o preconceito já diminuiu bastante, porém, o pescador ainda é visto como uma pessoa que optou por não estudar e que, assim como o pedreiro e o pintor, ele é visto co-mo um profissional de baixa escolaridade. Ele acha que o ofício merecia um pouco mais de atenção dos órgãos governamentais.

Na sua opinião, faltam recursos para a profissão, como cur-sos profissionalizantes ou técnicos, até para que as pessoas mais novas que desejam seguir a profissão comecem a ver que a atividade pesqueira não é apenas ir para o mar e jogar uma rede. Há toda uma estrutura por trás e um conhecimento es-pecífico para realizar tal ofício. Seu Ester reconhece que existe

uma carência no número de pescadores na região, consideran-do ser esta uma atividade básica para a população maranhen-se, já que é ligada à alimentação. Ele cita que essa necessida-de sempre vai existir. “Se o ofício de pescador acabar, como vai ser? Essa profissão está abandonada”, desabafa.

Mesmo com a Lei de Apoio ao Pescador, Lei Nº 10.799, que estabelece que durante o período de defeso - tempo de repro-dução de peixes e mariscos - o profissional que exerce a ati-vidade pesqueira de forma artesanal tem direito a ganhar um salário mínimo, ele não acha que a lei facilita a vida de quem tem a pesca como ofício. “Projetos como esse do governo, de amparo ao pescador, são importantes, mas essa lei precisa de uma reforma, uma ampliação, porque cada tipo de pesca tem um período de desova. Há a desova do camarão, do peixe. Portanto, esse projeto deveria ser revisto”, analisa o pescador sobre o projeto do governo.

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De costas para o norte do País, o Maranhão possui o bioma Amazônico como o terceiro maior do Estado

Amazônia maranhense: Ecossistema vulnerávelTEXTO: ROBERTH MEIRELES

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Geograficamente localizado entre o Norte e o Nordeste do Brasil, o Maranhão possui 640 quilômetros de extensão

de praias tropicais, floresta amazônica, cerrados, mangues e o único deserto do mundo com milhares de lagoas de águas cristalinas. Essas belezas naturais compõem um ecossistema rico em diversidade e que chama atenção principalmente pelo número de espé-cies endêmicas, ou seja, espécies de fauna e flora que só são encontrados neste local. A conservação deste patri-mônio depende de uma cadeia que se relaciona diretamente com as questões do desenvolvimento econômico, polí-tico e, por conseguinte, com as identi-dades sociais e culturais do Brasil en-quanto nação.

O maranhense se considera nordes-tino, pelo menos culturalmente, e isso é um fato inquestionável. Mas, basta alguns apontamentos para perceber que tanto a posição física quanto a compo-sição ambiental do Maranhão propõem novos parâmetros que precisam ser visu-alizados. O Maranhão está incluído, jun-to com mais oito estados brasileiros, na chamada Amazônia Legal, área geografi-camente delimitada e que corresponde a

espaços onde há ocorrência de vegeta-ções tipicamente amazônicas. Sozinho, o Estado corresponde a 25 por cento de toda esta área, que, de acordo com as mais recentes pesquisas, é a mais des-matada com maior celeridade.

A região maranhense que correspon-de à chamada Amazônia Legal localiza--se na Mesorregião Oeste do Maranhão, que é composta pelas microrregiões do Gurupi, Pindaré e de Imperatriz, e inclui 62 municípios do Maranhão. Segundo pesquisas do geógrafo e Presidente de honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Aziz Ab’sabér, o oeste maranhense é uma área onde há incidência predominante da vegetação amazônica, composta por florestas exu-berantes, porém frágeis e que sofrem com o intenso processo de devastação.

Esse intenso processo de devas-tação, ao qual Ab’Sabér se refere, são os desmatamentos e instalação de atividades extrativistas, práticas ligadas ao desenvolvimento econômico e que vêm, segundo o geógrafo e pesquisador da UFMA José de Ribamar Campos Neto, sendo praticadas de forma indiscrimina-da, desrespeitando as normas ambien-tais e contribuindo para a devastação da Floresta Amazônica.

De acordo com um estudo intitulado A Sustentabilidade Ambiental no Oeste Maranhense, desenvolvido pelos pesquisadores do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais da Universidade Federal do Maranhão, a ocupação desta região foi desencadeada com a construção da BR-010, popularmente conhecida como Rodovia Belém-Brasília, em meados do Século XX. Na época, o extrativismo vegetal se transformou na principal atividade econômica da área, desenvolvida pelos trabalhadores envolvidos na construção da própria rodovia, acompanhada pela implantação de outra atividade propagada por lavradores vindos de outros Estados do Nordeste, que deram início à cultura da pecuária na região Oeste do Maranhão.

Com uma localização estratégica, beneficiada pela rodovia 010, a região Oeste do Maranhão despertou o interesse de várias indústrias que passaram a desenvolver atividades relacionadas à extração mineral ou vegetal da área, a qual compreende a Amazônia Maranhense. Atualmente, são a Siderurgia, a maior empregadora da região e a maior geradora de divisas na região Oeste do Maranhão, seguida pela Serralheria, isto é, extração de madeiras por meio da derrubada de árvores; e a Silvicultura, ou seja, extração de madeiras em toras para produção de carvão vegetal. Logo, é possível somar todas essas atividades econômicas, considerando o seu desenvolvimento histórico de devastação, juntamente com a atividade de pecuária, para dimensionar o comprometimento que estas atividades juntas têm gerado à cobertura florestal nativa.

O conceito político pelo qual fez nascer a chamada Amazônia Legal surgiu por meio da Lei 1806 de 6 de Janeiro de 1953. O objetivo da delimitação referente às áreas cobertas por vegetação Amazônica era delimitar para melhor investir. A partir de então, foram criados fundos de desenvolvimento e políticas capazes de levar o progresso à região. Entretanto, é preciso considerar que historicamente não podemos dizer que é na década de 50 que começam as atividades exploratórias da mata amazônica, pois antes disso outras políticas governamentais já davam conta do desenvolvimento a todo custo, com um ponto em comum: a falta de preocupação com a sustentabilidade e a intensificação de uma lógica capitalista na exploração da vegetação original da região.

RODOVIA BELÉM-BRASÍLIA: O INÍCIO DA DEVASTAÇÃO

Aziz Ab’Saber (1924 -2012)Graduou-se em Geografia pela USP em 1944. Como especialista em geomorfologia foi considerado ainda em vida um dos mais importantes ambientalistas do país. Teve cerca de 300 artigos publicados assim como vários livros e ocupou cargos como o de Presidente Executivo da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) entre 1994 e 1995. Aziz Ab’Saber foi autor de estudos e teorias fundamentais para o conhecimento dos aspectos naturais do Brasil e desenvolveu pesquisas nas áreas de ecologia, geologia, arqueologia e geografia. Nascido em São Luiz do Paraitinga, no interior de São Paulo, Aziz Ab’Saber faleceu no dia 16 de março de 2012.

Nos quiósques distribuídos por todo o Parque, é possível visualizar toda a diversidade de ecossistemas que conpõem o bioma maranhense

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Em se tratando da atual situação da Amazônia maranhense, é preciso manter vivo o que resta do bioma, investir em recursos humanos e aumentar o número de unidades de conservação, uma responsabilidade que tem sido assumida por empresas conscientes do seu papel social e ambiental em relação à manutenção da flora e fauna da região maranhense. Pensando desta forma, é que a empresa Vale vem realizando ações em prol da proteção e conservação do meio ambiente. No Maranhão, estas ações podem ser melhor visualizadas por meio do Parque Botânico da Vale, uma iniciativa de criação de um espaço composto por área de preservação e visitação com cerca de 100 hectares, onde é possível encontrar além de espécies animais, vegetação de todos os biomas do Estado.

PARQUE BOTÂNICO OFERECE A PROTEÇÃO ECOSSISTÊMICA DE UM DOS ÚLTIMOS FRAGMENTOS FLORESTAIS DA ILHA DE SÃO LUÍS

De todos os Estados da Amazônia Legal, o Maranhão foi o último a ter seus dados detalhados de acordo com a pesqui-sadora do Museu Paraense Emílio Goeldi, Marlúcia Bonifácio Martins. “Apesar das informações que já se tem, ainda faltam outras mais detalhadas, além de pesquisas científicas com o foco específico na Amazônia Maranhense. Esta carência de produção focal é o que in-fluencia bastante a falta de pertencimento que o maranhense tem em relação à par-te que lhe cabe da Amazônia”, ressalta.

Marlúcia conta que, por falta de da-dos e pesquisas na área, a Amazônia maranhense, inclusive, já foi tratada como Pré-Amazônia, discurso que jus-tificou durante muito tempo a explora-ção dos recursos naturais. Segundo os pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi, que é referência internacional na in-vestigação científica sobre a Amazônia, o termo que se referia e tratava à parte o Oeste maranhense como Pré-Amazônia tinha o objetivo de “legalizar” o desma-tamento, pois era considerado como área de Cerrado, como é proposto pelo conceito de Pré-Amazônia. A área de conserva-ção legal é de apenas 50 por cento, enquanto que na proprie-

dade amazônica é obrigatório ser mantida a reserva local de 80 por cento, ou seja, só poderiam desmatar, por lei, 20 por cento da área total.

Para modificar este cenário da produção científica na Amazônia Legal, uma das iniciativas mais significan-

tes tem sido o Programa de Pós-Graduação Bio-norte, que visa qualificar pesquisadores na

área da biotecnologia e biodiversidade. No Maranhão, foram 17 alunos aprova-

dos no processo seletivo, via edital do programa de pós-graduação em rede, que prevê a formação de pelo menos mais 100 doutores a partir de 2016 em toda Amazônia Legal. Um investimen-to de mais de R$ 20 milhões, feito pelo

Ministério da Ciência e Tecnologia e das Fundações de Amparo a Pesquisa da re-

gião que será revertido em ganhos sociais, ambientais e culturais para todo o país, e, em

especial, para o Maranhão, como afirmou a coorde-nadora do Bionorte no Estado e professora da Universidade Federal do Maranhão, Patrícia Albuquerque, durante o lança-mento do Programa de Pós-Graduação Bionorte, que aconte-ceu na UFMA no dia 15 de março deste ano.

POUCA INFORMAÇÃO DIFICULTA AÇÕES DE CONSERVAÇÃO

“O programa vai ampliar os recursos

humanos e os conhecimentos nas

áreas de biotecnologia e biodiversidade por meio da formação de doutores nos Estados da Amazônia Legal”

Criado em 2008, o Parque é uma re-gião remanescente de floresta secun-dária, ou seja, que está passando por um processo de reconstituição de seu ecossistema, como afirma o Biólogo do Parque, Renato de Jesus. “A maioria das espécies que podemos ver aqui já estavam no Parque quando chegamos. O nosso trabalho é cuidar, plantar novas espécies e perceber quais estão amea-çadas.”, contou o Biólogo.

Além da proteção de ecossistemas essencialmente maranhenses, o Parque Botânico também é um espaço de lazer, educação ambiental e atividades físicas. De acordo com a Assessora de Imprensa da Vale, Natália Machado, o parque já recebeu mais de 360 mil visitantes.

Na programação mensal do Parque estão incluídas apresentações culturais, oficinas e minicursos, atividades relacio-

nadas sempre com a temática do meio ambiente e de conservação. Para a pro-fessora de uma turma de terceiro ano do ensino infantil em visita ao Parque Botâ-nico, Célia Souza, a visita das crianças ao local permite que elas vivenciem e toquem a vegetação que elas veem ape-nas nos livros. Esta não foi a primeira vez que a escola onde Célia trabalha levou os alunos ao Parque. “As visitas com as turmas acontecem sempre e já fazem parte do calendário escolar.”, declarou a professora.

O Parque Botânico Vale em São Luís funciona de terça à domingo, das 8h à 16h, e está localizado na Avenida dos Portugueses, s/n, bairro Anjo da Guar-da. As visitas podem ser agendadas pelo telefone 3218-6245.

Crianças em visita ao Parque Botânico da Vale. Oportunidade de entrar em contato com uma parte da Amazônia que normalmente eles so vêem nos livros

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Espécie endêmica da região Ama-zônica, a palmeira que alcança até 20 metros de altura, possui tronco múlti-plo, formando touceiras que produzem até 20 plantas. Sua madeira é utilizada, localmente, para construções rústicas e do fruto se faz um vinho muito nutritivo e apreciado pelas populações, servindo de complemento alimentar e que pode ser consumido com açúcar e farinha de mandioca ou tapioca, com camarão ou peixe seco, ou como alimento energéti-co em outras regiões do Brasil.

Estudos demonstram que o suco de açaí é essencialmente energético (Ca-valcante, 1996, IBGE, 1982), pois possui elevada concentração de fibra alimen-tar, alto teor calórico e concentrações de ferro. O palmito da juçara é muito estimado e largamente explorado pela indústria de conservas e os frutos da Ju-çara são atrativos para diversas aves.

Além das propriedades nutritivas e energéticas, a espécie amazônica está intimamente ligada ao contexto cultural de algumas comunidades do Maranhão e do Pará, servindo inclusive de objeto de estudo para pesquisadores, den-

tre eles os da Universidade Federal do Maranhão, que realizaram um estudo Semântico-lexical dos termos específi-cos da Juçara falados pela comunidade do Distrito de Maracanã, zona rural de São Luís.

Sob a orientação da professora do Departamento de Letras da UFMA, Con-ceição de Maria Ramos, as estudantes do curso de Letras - Ana Carla Gomes Morais, Maria Natália Cavalcante, Késia Rafaella Andrade e Liana Suellen Pe-nha- realizaram uma pesquisa de cam-po e produziram um glossário com ex-pressões que comprovam a diversidade linguística presente no Estado.

O trabalho das pesquisadoras esta-rá na SBPC e será uma oportunidade de pessoas de todo o país, participantes da Reunião Anual da SBPC, conhecerem a espécie endêmica da Amazônia em uma abordagem diferenciada. ”A partir do mo-mento que desenvolvemos um estudo deste tipo, tornamos visíveis os traços lo-cais, mostrando a multiplicidade tanto da cultura quando do universo linguístico da região”, afirmou Ana Carla Morais, uma das integrantes do grupo.

Açaí /JuçaraEuterpe oleracea Mart

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No mês de junho deste ano, alunos do Curso de Design e Tecnologia parti-ciparam de um Conclave Regional que, em um dia de trabalho, discutiu, criou, formatou e transformou sonhos em realidade. O grupo se reuniu com outros estudantes, entrevistados sonhadores e especialistas da

área para juntos pensarem em soluções para ideias em movimento. Em meio a me-sas recheadas de lápis de cor, papel e pincéis, os alunos puderam pensar em solu-ções possíveis para os sonhadores que foram entrevistados pelos participantes do projeto Dream In. Um outro encontro, em agosto deste ano, vai reunir num evento nacional todos os parceiros para a identificação das oportunidades contidas nos sonhos coletados nas diversas regiões do Brasil.

Dream In:o despertar para um mundo de sonhosTEXTO: CAMILA CARNEIRO

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Economia Criativa

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O evento contará com a presença de grandes sonhadores brasileiros e interna-cionais que irão inspirar os participantes a criar soluções inovadoras e criativas. “No Conclave Nacional, os sonhos cap-tados durante o primeiro semestre pelos alunos das universidades serão a base para a identificação de oportunidades e geração de soluções inovadoras nas es-feras privada, social e pública”, explicou o coordenador do projeto no Maranhão, Delano Rodrigues. O Dream In Brasil é um desdobramento do projeto que acon-teceu em 2011, na Índia, realizado pelo escritório Idiom Design and Consulting, com o patrocínio de um dos maiores gru-pos de varejo da Índia, o Future Group e da maior universidade privada indiana, a Manipal University. O objetivo do projeto é a aplicação do design thinking na iden-tificação, desenvolvimento e implemen-tação de políticas públicas e negócios empreendedores, com a aplicação de um método inovador e de dinâmica distinta.

Apesar de ter sido criado na Índia e de ser um método recente, o design thinking, método utilizado pelo projeto Dream In, já é uma iniciativa global. A prova disso, é que ele tem acontecido quase simultaneamente e, de forma similar, em outros países como a

Austrália e Estados Unidos. O Dream In é realizado pelo Instituto Vivarta, uma ONG que participou ativamente do projeto piloto na Índia e, posteriormente, passou a deter os seus direitos no Brasil, desde maio de 2011, quando deu início às atividades planejadas.

Para o desenvolvimento do projeto no Brasil, o Instituto Vivarta elaborou parcerias com a Universidade Federal do Maranhão, a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, a ESPM-São Paulo, a Universidade Estadual de Minas Gerais (UFMG), a Universidade do Vale do Rio dos Sinos de Porto Alegre (Unisinos) e a Universidade de Brasília (UnB). Estas instituições representam as cinco regiões do país que aceitaram o desafio de implementar o método proposto pelo Dream In em uma disciplina do curso de Design desde o primeiro semestre de 2012, envolvendo mais de 200 acadêmicos e centenas de participantes voluntários. “O Curso de Design e Tecnologia da Universidade Federal do Maranhão é o representante da região norte-nordeste no Dream In com a participação de 30 estudantes do curso de Design da instituição”, identificou o Coordenador do projeto, Carlos Delano Rodrigues.

Após a parceria efetivada, os alunos do curso de Design envolvidos no proje-to realizaram entrevistas com moradores de diversos bairros, tais como o Maio-bão, o São Francisco, o Centro, e até al-gumas áreas de São José de Ribamar. Os sonhos coletados durante os três meses de entrevistas retrataram a diversidade de ideias da Sociedade Civil sobre como tornar melhor o lugar em que se vive, independente de gênero, classe social e nível educacional. Assim, sonhos sim-ples, tais como ser feliz, ter mais saúde, educação e segurança, foram bastante citados pelos entrevistados revelando um cenário coletivo na constituição da cidadania.

Contudo, apesar da recorrência de temas sobre a garantia de direitos so-ciais e políticos, o Dream In descobriu sonhos mais ousados, como o do mora-dor do bairro da Liberdade, Sebastião de Jesus Barros, que pensou em reativar o Estaleiro-Escola para dar às crianças de seu bairro uma oportunidade futura de trabalho. Sonhos como esses foram reu-nidos para serem pensados, refletidos e, posteriormente, utilizados no planeja-mento de políticas públicas mais próxi-mas dos grupos sociais.

SONHOS INICIAM NEGÓCIOS

Participantes do Conclave Regional do Dream In Brasil, no Maranhão, apresentam experiência de sonhadores

Discussão de um dos grupos para construção de propostas a serem implementadas pelo

Dream In

Sonhadores inspiram os participantes do Dream In a criar soluções criativas

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A realização do Dream In consiste em três etapas chamadas de sonhar, acre-ditar e realizar. Na fase SONHAR, sonhos de pessoas comuns são captados a partir de uma série de entrevistas que são regis-tradas por meio de uma câmera de vídeo. O método define três níveis de sonhos. É preciso ultrapassar os dois primeiros ní-veis para captar o sonho mais significativo e criativo do sonhador. Deste modo, o pri-meiro nível, refere-se a medos e anseios – quem não tem medos? Sonhos deste tipo são os primeiros que vem à mente das pessoas. O segundo nível de sonho trata dos desejos e vontades – dinheiro, edu-cação, saúde, e, o terceiro nível identifica o centro profundo e criativo que todo ser humano tem.

Na fase ACREDITAR, os sonhos são as-sistidos por dezenas de pessoas, entre elas estudantes, empre-endedores, acadêmicos, líderes da iniciativa priva-da, governo e o terceiro setor, que se reúnem em um Conclave para iden-tificar as oportunidades de negócios e as polí-ticas públicas contidas nestes sonhos. Finalmente, na fase REALIZAR, empreen-dedores, investidores e sonha-dores se conectam para implementar as oportunidades que surgiram na etapa anterior, durante o Conclave. Estas oportu-nidades são disponibilizadas em platafor-ma aberta para que os empreendedores possam implementá-las.

O Portal é o ambiente online no qual estes empreendedores, investidores e sonhadores poderão se conectar para re-alizar as oportunidades. Além do Portal, o projeto tem parcerias com várias empre-

sas e institutos que trazem as ferramentas, conheci-mentos e conexões para que os empreendedores explorem com suces-so as oportunidades

identificadas. Assim, por exemplo, o sonho de Ja-

nice Ferlato Baldo se tornou realidade quando ela foi entre-

vistada pelo grupo e sua ideia foi iden-tificada como promissora. No condomínio da fisioterapeuta, a coleta seletiva de lixo tornou-se algo real. Motivada pelo Dream In, Janice, que mora há 11 anos em São Luís, voltou a se reunir com os condôminos para tornar o seu sonho uma possibilidade real. Hoje, Janice é conhecida como “a menina do lixo” por seu engajamento, já que, além de promover a coletiva seletiva em seu próprio condomínio, ela também recolhe lixo em

seu trabalho e, sempre que pode, atende as necessidades de quem a procura.

A fisioterapeuta gaúcha veio para São Luís em busca da oportunidade de viver em um lugar mais tranquilo. Mas logo que chegou, algo lhe chamou atenção: a cidade não realizava coleta seletiva, o que já era comum em sua cidade natal. A princípio tentou implantar o sistema de coletas seletivas em seu condomínio, mas não obteve êxito. “No início, todos se predispuseram a ajudar, mas depois foram se queixando do trabalho que dava separar o lixo, resultando em poucos os interessados que ainda realizavam a coleta seletiva”, aponta Janice. Anos depois, Janice foi surpreendida por um grupo de estudantes da UFMA que vieram perguntar: “qual é o seu sonho?”. A gaúcha então despertou o seu antigo sonho de viver em uma cidade mais sustentável.

DREAM IN: BRASIL MAIS INOVADOR, CRIATIVO E SUSTENTÁVEL

Carlos Delano RodriguesDesigner, professor e consultor de Branding e Naming. Diretor Nacional da ADG (Associação de Designers Gráficos do Brasil) na gestão 2007-2009. É MBA em Marketing, Mestre em design pela PUC-Rio. Atualmente é professor do curso de Design da Universidade Federal do Maranhão e colaborador do CRIED do IED – Instituto Europeo di Design.

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Higiene bucal e Meio Ambiente:uma parceria que deu certo

Pesquisadores comprovam que é possível manter a saúde bucal utilizando materiais biodegradáveis e de fácil acesso, uma chance de reverter o quadro do baixo nível da

saúde odontológica no país

A realidade da saúde da população, em especial dos moradores do interior do estado do Maranhão, con-tinua sendo motivo de preocupação de inúmeros especialistas das mais diversas áreas da saúde. Na

Universidade Federal do Maranhão, a tarefa diária de alguns pesquisadores é buscar propostas de políticas públicas e criar tecnologias que sejam capazes de reverter o cenário de baixa atenção à saúde pública, presente em dados estatísti-cos de carência do país.

No que se refere à saúde bucal, a pesquisadora Kátia Ma-ria Veloso revela que a do maranhense não está entre as me-lhores. Durante sua longa vivência no Programa Nacional de Atenção Básica à População, o Programa de Saúde da Família (PSF), Veloso recorda ter visto de perto todos os problemas enfrentados por quem não tem recursos e nem orientação para realizar a higiene bucal de forma adequada. “O Estado possui um histórico de pouca preocupação com a cavidade oral, e essa característica é percebida de forma mais acentua-da nas camadas sociais mais baixas. Ter uma escova de den-te ou um fio dental convencional não é um hábito presente na maioria das casas das pessoas de baixa renda”, relatou.

Foi por meio do serviço pelo PSF, da vontade de propor uma solução viável e do encontro com o estudante do curso de Odontologia da Universidade Federal do Maranhão, Ro-berto César Gondin, que surgiu, no ano passado, um projeto diferenciado que chamou atenção por sua simplicidade e por sua eficiência comprovada. Juntos, Veloso e Gondin ga-nharam reconhecimento internacional e provaram que, para

manter a cavidade oral sadia, não é preciso grandes recur-sos financeiros. A metodologia da proposta veio explícita no título do trabalho: A inserção dos Métodos Alternativos de Higiene Bucal no Programa de Saúde da Família (PSF) no In-terior do Maranhão: Uma Nova Estratégia de Prevenção em Saúde Pública.

HIGIENE SEM FERIR A NATUREZAPara o início do projeto, os pesquisadores utilizaram ve-

getais presentes na região Nordeste do país, como o bambu, a bucha e outros materiais de fácil acesso, a exemplo de sa-cos de náilon e garrafas plásticas. Após a higienização e a esterilização de todo o material, eles conseguiram fabricar utensílios para a prática da higiene bucal sem gastar nenhu-ma verba para isso. Escovas de dente, porta-escovas, fios dentais, abridores de boca e a seleção de uma variedade de fitoterápicos com forte potencial para o tratamento e a pre-venção das principais doenças odontológicas da cavidade bucal, foram alguns dos materiais desenvolvidos a baixo cus-to. Uma solução barata, confiável e biodegradável.

Roberto César Gondin explica que a biodegradação, ca-racterística diferenciada dos produtos, ocorre porque as es-covas de dente, por exemplo, são projetadas com pedaços de bambu e bucha, ou seja, materiais totalmente biodegra-dáveis e presente em grande quantidade na natureza. Estes utensílios podem ir para o lixo sem agredir a natureza e, em pouco tempo, são absorvidos naturalmente pelo ambiente. “Uma vez descartados, o próprio meio-ambiente trata de fa-

TEXTO: EMERSON MACHADO • ILUSTRAÇÃO: ANDRÉ SOUZA

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Saúde

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zer a sua reciclagem de maneira natural, sem causar degra-dação”, declara o jovem cientista. Veloso considera um para-doxo o alto custo de utensílios de higiene bucal e cita que os experimentos são “uma saída criativa, possível a um custo zero e à disposição de toda a sociedade”.

Na opinião dos pesquisadores, os produtos criados por Gondin e Veloso são tão eficazes quanto os métodos con-vencionais, pois possuem comprovação científica atestada anteriormente. “Quando fomos realizar a pesquisa, desco-brimos que a técnica de substituir a cerda das escovas de dente pela bucha não é nova”, contou Veloso. Trabalhando como agente do Programa de Saúde da Família (PSF), a pes-quisadora descobriu que moradores mais velhos de algumas regiões sabiam de métodos mais antigos de higiene bucal com materiais alternativos, mas também comprovou que não estavam atualizados. “O que eles realmente não sabiam é que a bucha possui efeito igual ao das cerdas das escovas tradicionais no combate e na prevenção da placa bacteria-na”, recordou.

O TRATAMENTO ODONTOLÓGICO POR MEIO DOS FITOTERÁPICOS

As doenças odontológicas que afetam a população tam-bém geraram preocupação nos pesquisadores, o que oca-sionou uma ampla procura dos fitoterápicos - medicamentos oriundos das plantas medicinais - como tratamento alterna-tivo da gengivite, por exemplo. De acordo com Gondin, estas plantas são conhecidas no Maranhão e possuem grande efi-cácia, como é o caso da hamamelis e da malva, usadas es-pecificadamente no tratamento da afta. Além delas, também são utilizadas a entrecasca do caju, para o tratamento da ci-catrização oral, e a romã, que é usada para o tratamento de infecções em geral, gengivite e periodontite, causadas pelo acúmulo da placa bacteriana devido à falta de higiene bucal.

REPERCUSSÃO CIENTÍFICA

A nova estratégia de prevenção em saúde pública, por meio de utensílios de higiene bucal alternativos, rendeu o segundo lugar na categoria Mesa Clínica Demonstrativa no 30º Congresso Internacional de Odontologia de São Paulo

(CIOSP), realizado de 28 a 31 de janeiro deste ano. “Enquan-to a maioria dos trabalhos estava ligado ao desenvolvimento de tecnologias sofisticadas como soluções para problemas na área da odontologia, nós despertamos o interesse de toda a comunidade ao propormos uma experimentação diferen-ciada e com forte apelo social”, conta Veloso. Ela afirma que os japoneses, os argentinos e os uruguaios foram os mais in-teressados nos experimentos. Para o futuro, a pesquisadora pretende colocar em prática o projeto e levá-lo para o interior do Maranhão, onde se concentra a maior parte da população carente do Estado e local em que acredita que o projeto po-derá ser melhor aproveitado.

Roberto César Gondim

Estudante do 10º período de Odon-tologia da Univer-sidade Federal do Maranhão.Participou de dois projetos de iniciação científica e tam-bém do primeiro projeto de extensão do Hospital Universitário Presidente Dutra voltado para a higiene bucal em pacien-tes. Paralelamente à conclusão de sua graduação, o aluno também está prestes a concluir sua especialização. Preten-de fazer Mestrado em Saúde Pública e seguir carreira na área da saúde pública, linha pela qual sempre optou desde o início de sua formação.

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Utensílios de higiene bucal produzidos na pesquisa

Medicamentos fitoterápicos em exposição durante o 30º CIOSP em janeiro deste ano

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Acadêmicas de Enfermagem estudam o uso de plantas medicinais por idosos em Imperatriz

Erva cidreira e capim santo. Ao suspeitar que a pressão arte-rial está elevada, a aposentada Maria dos Santos Mota, de 69

anos, recorre ao chá que prepara utili-zando os dois tipos de plantas e garante que o resultado é imediato. Quando o problema é a dor na altura do estômago, indicando que há uma possível inflama-ção no fígado, é ao chá de boldo que ela pede socorro. Para mais de cinco proble-mas de saúde, a idosa tem um remédio caseiro à base de plantas medicinais e garante “não gastar um centavo”, disse.

O uso de plantas medicinais para o tratamento de algumas doenças é co-mum, principalmente entre pessoas mais idosas no município de Imperatriz, localizado a 650 km de São Luís. Inte-ressadas em avaliar como essa prática é desenvolvida por idosos como D. Maria Mota, cinco acadêmicas do curso de En-fermagem, sob a orientação do profes-sor Paulo Roberto da Silva Oliveira, do Campus de Imperatriz da UFMA, inicia-ram uma pesquisa intitulada A Prática do Saber Popular na Utilização de Plan-tas Medicinais por Idosos.

O grupo de pesquisa escolheu o Centro de Convivência da Melhor Idade

TEXTO: HEMERSON PINTO, LÍGIA GUIMARÃES

Esperança para entrevistar idosos com idade entre 51 e 90 anos. Na casa situa-da na periferia de Imperatriz, no bairro Parque das Estrelas, o grupo ouviu, en-tre os meses de abril e maio de 2011, 54 idosos (37 mulheres e 17 homens). Dos 253 cadastrados no Centro, 75,9 por cento declararam fazer uso de plantas medicinais.

De acordo com as estudantes de En-fermagem, 48 plantas foram lembradas pelos idosos como remédios eficazes e utilizados por eles. Entre as preferidas, estão a erva cidreira, com 17,8 por cento; a laranja [folha ou casca] e o noni com 8,7 por cento, respectivamente; enquanto o boldo e a erva doce possuem o mesmo nível de 4,9 por cento. As pesquisadoras ainda descobriram que a forma mais co-mum de preparo dos medicamentos são os chás das folhas de erva cidreira, bol-do, casca de laranja e do fruto da erva doce. Já o noni é preparado como suco e depois misturado ao suco de uva.

Quanto às indicações de cada uma das plantas, a erva cidreira e a erva do-ce foram apontadas como calmante e para a manutenção da pressão arterial, enquanto a casca da laranja e o boldo ficaram responsáveis pela regulariza-

ção da função digestiva. O noni foi cita-do como eficiente no tratamento de pa-tologias como diabetes, cardiopatias, inflamações e dores, e classificado pe-los idosos como a planta “que serve pa-ra todas as doenças”. Hortelã, mastruz, chanana, malva do reino, as cascas de jucá, aroeira, a folha de amêndoa e ja-lapa também foram citadas, porém, em menor destaque.

DOSAGEM IDEALUma preocupação levantada pelas

pesquisadoras é quanto à dosagem do medicamento natural usado pelos pa-cientes. “Existe o conceito comum en-tre as pessoas de que o uso de plantas medicinais é inofensivo, uma vez que a população em geral, especialmente os idosos, acredita que por serem natu-rais, não causam nenhum prejuízo ao organismo. Mas vale ressaltar que estas também contêm princípios ativos e po-dem vir a complicar o quadro clínico de um idoso e provocar reações adversas”, pondera a estudante do 7º período, Ivo-ne Pereira da Silva. O grupo responsá-vel pela pesquisa defende que, quando utilizadas de forma correta, as plantas medicinais têm o mesmo efeito positivo

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Saúde

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que os medicamentos industrializados. Ivone declara que esse tipo de conhe-cimento, adquirido ao longo do tempo, representa, em muitos casos, o único recurso terapêutico disponível que a população tem ao seu alcance. "Uma forma de tratar doenças quando o re-curso financeiro é insuficiente ou indis-ponível", define.

Ivone também destaca o poder de cura descrito pelos entrevistados, que garantem a dose certa de cada medi-camento. "Calmante, para controlar a pressão arterial, como digestivo, para processos inflamatórios, diabetes e do-enças cardíacas. Cada planta é utilizada individualmente ou associada para de-terminadas doenças ou processos infla-matórios". Segundo o professor Paulo Roberto, orientador do grupo de pesqui-sa, os principais motivos para o uso ca-seiro das plantas medicinais são o baixo custo e a facilidade de aquisição, além da indicação de outros usuários e da dificuldade de se obter outros medica-mentos nos serviços públicos de saúde. “Muitas pessoas não têm dinheiro para comprar medicamentos nas farmácias ou não os encontram no serviço público de saúde. Se torna mais fácil e econô-mico o uso dessas plantas medicinais", observa.

QUANDO OS SABERES SE ENCONTRAM

Há quase sete décadas sendo cura-da ou controlando algumas doenças à base de plantas medicinais, a cearense Maria Mota participou da pesquisa do grupo da UFMA, e, mesmo com toda a sua experiência, garante que ouviu aten-ta algumas dicas das estudantes sobre a forma mais adequada no preparo de alguns remédios. "A mocinha disse que

é melhor preparar o chá em uma vasilha de esmalte do que numa de alumínio. A de alumínio pode soltar alguma coisinha que prejudica a saúde", lembra.

Melhor informada sobre as precau-ções na hora de produzir e se automedi-car com os medicamentos caseiros, do-na Maria segue alguns cuidados com as plantas medicinais que cultiva no quin-tal. "Aprendi com minha mãe a plantar, zelar e fazer as receitas caseiras. Casei, tenho cinco filhos. Para eles e para o meu marido sempre fiz e ainda faço re-médios com elas. Minha neta sempre me procura quando a filhinha dela adoece. 'Vó, me dá umas folhinhas pra fazer um chá pra neném'. Eu ensino qual é a me-lhor". A aposentada diz que os vizinhos também recorrem aos santos remédios que ela tem. "Eu não me incomodo e fico feliz por poder ajudar as pessoas. Tenho muita fé nas minhas plantinhas, e nem preciso gastar na farmácia".

Existe o conceito comum entre as pessoas de que o uso de plantas medicinais é inofensivo, uma vez que a população em geral,

especialmente os idosos, acredita que por serem naturais, não causam nenhum prejuízo ao organismo

Paulo Roberto da Silva Ribeiro

Professor Adjunto do Centro de Ciências Sociais, Saúde e Tecnologia da Universidade Federal do Maranhão, Imperatriz MA. Possui Graduação em Farmácia com Habi-litação em Análises Clínicas (Bioquímica) e Farmácia In-dustrial pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2000), Mestrado em Agroquímica (Química Analítica Ambiental) pelo Departamento de Química da Universidade Federal de Viçosa e Doutorado em Química (Química Analítica) pelo Instituto de Química da Universidade Estadual Pau-lista Júlio de Mesquita Filho.

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Ofíc

io -

Raiz

eiro

Chico Raizeiro: O doutor do Mercadinho de Imperatriz

A banca oferece várias garrafadas, raízes e cascas para o tratamento dos mais diversos tipos de doenças

TEXTO: LETÍCIA MACIEL , LÍGIA GUIMARÃES • FOTOS: LETÍCIA MACIEL

“Seu Chico, o que o senhor tem pra enxaqueca aí?” Pergunta um rapaz de semblante cansado, ao adentrar na pequena banca de raízes do senhor Francisco de Assis. Mais conhecido como Chico

Raizeiro, o pernambucano de 74 anos vende remédios naturais no Mercado Vicente Fritz, o famoso Mercadinho de Imperatriz, segunda maior cidade do Maranhão.

Vendedor há 26 anos, o ofício lhe rendeu o título de “Doutor do Mercadinho”. Nascido na pequena cidade de Triunfo, no in-terior de Pernambuco, o agricultor teve que se mudar para uma cidade maior e começou a trabalhar no ramo do comércio de temperos, ervas e raízes. Com o estudo formal realizado pelo supletivo, o doutor do Mercadinho lembra que todo o conhe-cimento sobre plantas medicinais foi adquirido por meio da leitura de livros sobre o assunto na década de 80.

Chico trabalha de segunda a sábado, das 06h às 18h, aten-dendo pessoas com os mais diversos tipos de doenças, às quais o raizeiro analisa e, baseado na experiência e nos ensi-namentos que aprendeu, faz o diagnóstico e receita o produto mais adequado para o problema.

“Angico é bom pra gripe. Se for gripe com tosse ou dor na garganta, é bom misturar com sucupira e romã. Já quem sofre de gastrite deve misturar mangabeira com casca de ameixa”, prescreve o raizeiro enquanto abastece um pequeno depósito de vidro com rapé, um pó fino e escuro resultante da mistura de ervas como alecrim, quina-quina, noz-moscada, buchinha

e cravo-da-índia, torrados e moídos para inalação e indicado para o tratamento de problemas respiratórios, como rinite e sinusite.

As prateleiras repletas de garrafas de vidro ou de plástico, médias e pequenas, recobrem as paredes da banca de aproxi-madamente 6 m2. Nos rótulos rústicos, são descritas as indica-

Mandei ele tomar raiz da planta caninana e foi a última vez que ele

teve problema de coluna

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Com solução para quase todas as doenças, Chico Raizei-ro assegura que possui saúde de ferro: “Tenho 74 anos e nem óculos eu uso”, diz com orgulho, recordando a única vez em que precisou ir ao médico, há cinco anos, por causa de uma hérnia: “Era do tamanho de um coco, pensei que eu ia morrer”. Ele conta que uma semana após a cirurgia de re-tirada da hérnia, surgiram complicações e foi preciso abrir o corte, deixando-o cicatrizar dessa maneira. “A cirurgia não sarava de jeito nenhum, então eu preparei uma garrafada com sumo de gervão, mastruz e folha de algodão. Tomei só um litro e sarei”.

A vitalidade de Chico é refletida na sua descendência. Ao todo são 42 filhos: 16 do primeiro casamento, três do segundo e o restante fruto de relacionamentos extra-con-

jugais. “Eu tenho contato com todo eles, do mais velho ao mais novo”, assegura explicando que, quando tinha dúvidas sobre a paternidade, se rendia aos avanços da tecnologia na área da Medicina e recorria aos exames de DNA: “Quando surgia uma história de que tinha uma mulher grávida de um filho meu, eu esperava a criança nascer e ia fazer o exame, porque eu só assumo se for meu mesmo”.

Entre um cliente e outro, ele destaca o prazer que tem no trabalho: “Eu gosto de trabalhar com isso porque as cascas que a gente passa pro pessoal serve e eles voltam satisfei-tos”. Depois de um tempo em silêncio acrescenta: “A coisa melhor que existe numa pessoa é a saúde. Quem tem saúde tem tudo”.

DIALOGANDO COM A MEDICINA CONVENCIONAL

ções, composição e posologia de cada tipo de garrafada, nome dado às misturas de ervas e raízes esmagadas e conservadas nas garrafas ali expostas. Apesar do estoque variado, que in-clui até banhas de animais como quati, mucura e sucuri (esta última indicada para dores nas juntas), o forte do negócio de Seu Chico é a venda de ervas, raízes e cascas de pau in natura, que os clientes adquirem juntamente com a receita de preparo e consumo.

Os que sofrem com dores na coluna são os que mais recor-rem aos santos remédios do Doutor do Mercadinho: “Um dia desses, o pai do rapaz que trabalha ali na outra banca ia pas-sando aqui nos corredores e, do nada, a coluna dele travou”, conta o raizeiro, relembrando os gritos de dor que o doente emitia. “Mandei ele tomar raiz da planta caninana e foi a última vez que ele teve problema de coluna”.

A casca de aroeira também está entre os produtos mais pro-curados pelos pacientes de Chico Raizeiro. Recomendada para o tratamento dos “problemas de mulher”, conforme ele mesmo denomina, a casca é imersa em água e deixada de molho até que se obtenha um líquido de coloração avermelhada. A ingestão da bebida promete acabar com qualquer tipo de inflamação, inclusi-ve nos ovários e problemas no útero. O mesmo produto, misturado com amei-xa, é indicado para o tratamento de doenças mais graves como o câncer. “A única doença que eu encaminho direto pro médico é a dor de cabeça, porque ela pode ter origem de várias mazelas”, enfatiza.

Ele relembra também o caso de uma moça de 17 anos, que morava no interior e cuja barriga crescia co-mo se estivesse grávida: “O povo ta-va falando mal da coitadinha, mas eu logo percebi que era barriga d’água”. Para ajudá-la, descascou cem laran-jas e pôs as cascas de molho, reco-mendando à mãe da garota que esta bebesse apenas dessa água durante 90 dias: “Foi tiro e queda, a moça fi-cou boa. Hoje em dia ela já é casada, mãe de família”.

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Desde que a Universidade Federal do Maranhão foi escolhida como sede da 64ª Reunião Anual da Sociedade

Brasileira para o Progresso da Ciência, em 2011, a questão da acessibilidade para as pessoas com deficiência tem sido tratada como uma das prioridades pelos organizadores da reunião. A formulação da SBPC Inclusiva é uma iniciativa que visa à inclusão e o oferecimento das atrações da 64ª Reunião Anual da SBPC, de 22 a 27 de julho, na Cidade Universitária, a todas as pessoas com deficiências físicas e sensoriais. É a primeira vez que a reunião anual da SBPC é pensada com perfil inclusivo.

A acessibilidade é um direito garantido às pessoas com deficiência, previsto pela Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, a qual “estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação”. Para garantir este

direito na UFMA, inclusive durante a Reunião da SBPC, foram investidos mais de R$ 2 milhões voltados para as modificações estruturais e a aquisição de equipamentos que possibilitem o acesso ao conteúdo acadêmico-científico.

De acordo com Evandro Guimarães, diretor do Núcleo de Acessibilidade da UFMA, “o pontapé inicial” da SBPC Inclusiva se deu em uma reunião ocorrida no dia 28 de fevereiro entre o Núcleo de Acessibilidade da UFMA e instituições como Centro de Atendimento Especializado na Área da Surdez (CAES), o Centro de Apoio Pedagógico (CAP), a Escola de Cegos do Maranhão e o Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência, cujas contribuições revelaram-se determinantes na elaboração das estratégias a serem empregas na construção da SBPC Inclusiva. Evandro Guimarães divide o projeto da SBPC Inclusiva em dois níveis: “macro” e “micro”. No nível “macro”, o foco é dado à acessibilidade do espaço físico e eliminação de barreiras arquitetônicas. Em nível “micro”, o projeto consiste na criação das condições para disponibilização de conteúdo acadêmico e científico. Por exemplo, as pessoas

com deficiência auditiva terão acesso aos conteúdos de palestras e minicursos por meio de intérpretes de Libras (Língua Brasileira de Sinais), além da impressão de textos em braile, enquanto os participantes cegos acompanharão a programação da reunião anual por meio de áudiodescrição e serviço de descrição de imagens.

O Diretor do Núcleo de Acessibilidade acrescenta que cada pessoa com total ausência de visão terá acesso a um artigo científico por dia em braile, bastando apenas o comparecimento ao Núcleo de Acessibilidade, que fica no prédio Castelo Branco, na Cidade Universitária da UFMA ou no NAPNEE (Núcleo de Apoio à Pessoa com Necessidades de Ensino Especiais), localizado no Colégio Universitário, situado também na Cidade Universitária da UFMA. Ele ressalta que, embora os participantes cegos tenham esta possibilidade, todos os inscritos na Reunião Anual da SBPC com deficiência sensorial terão acesso ao conteúdo disponível no evento. “Vamos disponibilizar um CD com o conteúdo da SBPC, entre artigos e palestras apresentadas, o que vai possibilitar aos participantes cegos e com baixa visão

SBPC InclusivaUFMA vai proporcionar acessibilidade inédita às pessoas com deficiência física e

sensorial durante a reunião anual da SBPC

TEXTO: LUCIANO DOS SANTOSFOTOS: AUREA EVERTON, THAIS FERNANDA

Especial SBPC

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ouvir todo o material no computador. Mas, o material também vai ser adaptado a outros tipos de deficiência sensorial e vamos montar uma espécie de ‘quartel-general’ do Núcleo de Acessibilidade na SBPC para solucionar os imprevistos”, afirmou Guimarães.

Como participante ativo, o Núcleo de Acessibilidade da UFMA possui um stand na ExpoT&C, exposição de tecnologia e ciência, no qual o setor de auxílio à pessoa com deficiência vai mostrar seus serviços, os quais têm permitido a acessibilidade e permanência de pessoas com deficiência na Universidade, além de equipamentos desenvolvidos pelo núcleo, como a lupa eletrônica de baixo custo às pessoas com baixa visão, a almofada também de baixo custo para cadeirantes e um mapa tátil que servirá para que o participante com deficiência visual localize os locais da programação da SBPC na Instituição.

“É a primeira vez que a acessibilidade é incluída na reunião da SBPC. É uma satisfação sermos a primeira Universidade a fazer uma SBPC Inclusiva e desejamos que isso se mantenha, que faça parte da programação não apenas desta reunião, mas também das próximas. Queremos que outras universidades abracem a ideia e façam com que a pessoa com deficiência tenha acesso ao evento de maneira integral, não só de comparecer, mas também de poder ver e ouvir o que eles desejam”, contou o Diretor do Núcleo de Acessibilidade.

Se de um lado a construção da Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência com caráter inclusivo perpassa pela preocupação com a questão da segurança, trânsito e a disponibilização de material acadêmico e científico, do outro, pessoas com deficiência da UFMA esperam que haja uma mudança social e comportamental mais significativa com a chegada do evento na Universidade. “Minha expectativa é que, por meio da SBPC, se possa

propagar a questão das necessidades que a pessoa com deficiência possui e que a sociedade possa garantir as condições de acessibilidade a essas informações”, disse Gilson Nascimento dos Santos, aluno do 5º período de Administração da UFMA, que possui baixa visão. O estudante que, em todo início de período ou cadeira de férias, tem que avisar aos professores das disciplinas sobre sua deficiência, afirma que consegue estudar por meio de conteúdos digitalizados oferecidos pelos próprios docentes e por lupas eletrônicas do Núcleo de Acessibilidade. Entretanto, considera que mais ações precisam ser feitas para que possa ser reconhecido pessoal e

profissionalmente por todos que não têm deficiência. “Aos poucos, a questão da acessibilidade está sendo tratada, mas falta conscientização da população para não considerar as pessoas com deficiência como ‘coitadinhas’. É preciso que deem condições igualitárias para que nos desenvolvamos como qualquer outra pessoa. Somos pessoas também e temos nossas capacidades”, explica o estudante.

João Brito, aluno do 4º período de licenciatura em Música, cego desde

a infância, é otimista sobre o evento. “Eu acho que a SBPC Inclusiva é boa, assim como tudo o que diz respeito à inclusão. Tudo o que vem para facilitar nossa vida é bem vindo, não só para mim, mas para todos os colegas que vivenciam essa situação”, disse. Apesar de ter a contribuição de muitos amigos na Universidade, ele também espera que pessoas sem deficiência tenham flexibilidade em relação às necessidades das pessoas com deficiências: “Alguns ainda não refletiram sobre a importância da solidariedade para com a pessoa com deficiência e a SBPC pode ser este momento de despertar, ou, pelo menos, o começo do processo de sensibilização”, finaliza.

Nos deixa felizes sermos a primeira Universidade a fazer uma SBPC Inclusiva e

desejamos que isso se mantenha

Gilson utiliza a lupa eletrônica, tecnologia criada pela UFMA e

disponibilizada na biblioteca central do campus para alunos com baixa visão

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Tânia Soares: a artesã de todos os bumba boisNo ateliê, ela borda durante o ano inteiro, produzindo arte e beleza para os arraiais

maranhenses

Tânia Lúcia Soares é uma mulher de 50 anos, nascida em São Luís, e que começou cedo a trabalhar para cuidar da família. Casada com Carlos Alberto Soares e mãe de Elaine Barbosa Soares Santos, D. Tânia é

uma artesã que borda couros de Bumba-Meu-Boi há mais de 30 anos e desenvolveu uma técnica própria para o seu traba-lho. Numa tarde de quarta-feira, a bordadeira, cheia de bom humor, abriu as portas de sua casa, um sobrado erguido nas proximidades do bairro Madre Deus, onde funciona o seu local de trabalho.

Descontraída e de conversa fácil, D. Tânia contou que, antes de ser artesã, trabalhou como lavadeira, babá e até empregueti, como ela mesma diz, mas não realizou o sonho de ser profes-sora por que precisou parar os estudos para cuidar da filha e da casa. A sua paixão pelos bordados começou quando foi encar-regada pela produção de um espetáculo de Bumba-Meu-Boi. Ela topou o desafio e o resultado foi uma paixão que virou um ofício que ela exerce até hoje.

CRIATIVDADE E IMAGINAÇÃO“Curiosidade nunca me faltou”, revela D. Tânia após ser per-

guntada se teve algum professor que lhe ensinou o ofício. Uma curiosidade resultante de muita observação e pesquisa sobre a arte do bordado, mas também da influência recebida da Com-panhia Barrica, com sede na Madre Deus. Hoje, D.Tânia vive dos bordados e estes ganharam uma nova dimensão depois que passaram a ser feitos por ela, que é muito procurada pela maioria dos organizadores do folguedo.

A arte de D.Tânia já ultrapassou as fronteiras do Maranhão. Ela já expôs no Rio de Janeiro e as indumentárias que produ-ziu já estiveram em diversos palcos internacionais. Com tanta demanda de trabalho não sobra muito tempo para ela passear, mesmo durante a temporada de arraiais. Mas, apesar disso,

Ofíc

io -

Arte

D.Tânia afirma que costuma escolher um dia para passear pelos arraiais e apreciar as brincadeiras, ver suas próprias produções nos terreiros e observar ainda o trabalho dos colegas.

ESTÉTICA E IMAGINAÇÃODona Tânia explica calmamente os passos do processo

criativo. O primeiro passo é pensar no tema, e, em seguida, sentar-se com o desenhista da equipe, Marco Antônio, para a elaboração da arte. Feito o desenho, Tânia o colore e inicia a confecção. A finalização do bordado se dá no bastidor, espécie de mesa na qual se confecciona o bordado. Segundo a borda-deira, a parte mais difícil é a finalização.

A bordadeira tem seu pai como uma grande referência. Aprendeu com ele que é o cliente que põe o arroz e o feijão na mesa. Por isso, zela pelo bom atendimento e pela qualidade do seu trabalho, e afirma que para se alcançar os objetivos pre-tendidos é preciso ser disciplinado, aprender sempre e melho-rar cada vez mais. Tamanha é a arte revelada pelas suas mãos de ouro. São desenhos quase perfeitos, frutos de uma estética simbólica nos quais se misturam o esforço de um trabalho do-loroso e paciente com a fé de que vale a pena continuar fazen-do o que faz.

O resultado de muito trabalho poderá ser compartilhado em breve, pois a artesã dará oficinas de bordado com o apoio do Governo do Estado no bairro onde mora. Um passo importan-te para que as novas gerações possam entrar em contato com uma produção artesanal diferenciada e uma forma de manter viva a tradição. Dona Tânia Lúcia Soares, a artesã de todos os bumba bois, se orgulha, pois sabe que o seu ofício permite que o Bumba-meu-boi possa sair nas ruas, dançar e encantar crianças e adultos submersos no universo simbólico do folclo-re maranhense. “Arte se ensina, se vende, se passa”, finaliza a bordadeira.

TEXTO: GUTEMBERG FEITOSA

““O trabalho de bordar é muito importante,

mas não é uma tarefa fácil. Ainda

me emociono quando vejo meu trabalho nos

arraiais

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Pão, carne e vegetais são os ingredientes comuns utilizados em um hambúrguer, mas, no Campus da Universidade Federal

do Maranhão de Imperatriz, a acadêmica Aline Leme, do 10º período do curso de Engenharia de Alimentos, teve uma ideia diferente. A estudante manteve o pão e os vegetais, mas substituiu a carne por caju numa pesquisa de conclusão de curso, em 2009, sob a orientação da professora Virlane Kelly, da disciplina Microbiologia de Vegetais.

O novo sabor do lanche já foi experimentado por 80 provadores durante uma mostra sensorial realizada com professores, alunos de graduação e técnico-administrativos da própria instituição. “Conseguimos constatar que foi um produto bem aceito. De uma escala de 1 a 9, a menor nota que o hambúrguer conseguiu foi 01, ou seja, desgostei muitíssimo, e a maior foi 9, isto é, gostei muitíssimo. Tivemos uma média de mais de 7”, comemora.

O hambúrguer de caju é resultado de uma ideia cujo objetivo era investigar a possibilidade de utilização da fibra da fruta para a fabricação de vários alimentos. Aline faz os últimos preparativos com o novo sabor de hambúrguer para o Trabalho de

Conclusão de Curso, que deve apresentar no segundo semestre de 2012. “Era uma pesquisa que estava bem desenvolvida e a gente já tinha feito uma análise sensorial com adolescentes que têm o costume de consumir hambúrgueres. A gente resolveu trazer a pesquisa para o nível de graduação, para que outras pessoas pudessem conhecer e fazer uma análise mais aprofundada do produto. O hambúguer foi muito bem aceito por quem provou”, ressaltou.

A pesquisadora explica que os ali-mentos embutidos como os hambúrgue-res têm grande quantidade de sódio, e que, de acordo com ela, podem ser pre-judiciais à saúde. “Um alimento que vem de uma fruta é mais saudável. O caju é rico em fibras e em vitamina C, perdendo apenas para a acerola, tem baixa quan-tidade de lipídios e é fácil de ser encon-trado”, afirma.

Acadêmica de Engenharia de Alimentos da UFMA apresenta hambúrguer de cajuOs mesmos temperos utilizados na carne comum estão presentes no novo sabor

A preparação do hambúrguer de caju é fácil. Na pesquisa de Aline, em vez da utilização da carne, que é bo-vina, é utilizado o pedúnculo do caju, a parte carnosa usada na preparação de suco e que costuma ser jogada no lixo pelas grandes indústrias. “Nós utilizamos o bagaço, ou seja, a sobra da fruta quando é retirado o suco. Esse bagaço é refogado e temperado como uma carne normal, com cebola, tomate, pimentão, alho, os mesmos temperos da carne do hambúrguer tradicional. Quando a fibra esfria, é--lhe adicionado ovos e farinha de tri-go para modelar os hambúrgueres”, explica Aline. Ela conta que após ser modelado e ganhar a forma do ham-búrguer tradicional, o hambúrguer de caju pode ser levado ao forno, grelhado ou frito no óleo. “Substituir a carne pela fibra do caju, além de saudável, tem um sabor agradável, e até para vender sairia mais barato”, recomenda. A novidade é apontada por Aline como uma nova opção de lanche, principalmente de famílias

mais carentes. “Tem gente que passa fome com um pé de caju no quintal de casa”, analisou.

A orientadora considera o projeto interessante, principalmente do ponto de vista nutricional. “O hambúrguer de caju vem agregar valor à fibra do caju que é descartada pela indústria, além de oferecer um novo produto à população. E, se a gente for pesquisar mais, descobriremos que da fibra é possível fazer outros produtos, como almôndegas, carne básica para macarronada, omelete”, informa a professora Virlane Kelly, acrescentando outros tipos de cozimentos que também poderiam ser testados, como em microondas e a vapor. “Nós formulamos esse hambúrguer e avaliamos as características químicas: pH, acidez, proteínas, umidade, lipídios, análises microbiológicas e análise sensorial com consumidores, na UFMA. As médias mostraram boa aceitação do produto”, completou a orientadora.

PREPARO

TEXTO: LÍGIA GUIMARÃESFOTOS: ASCOM/UFMA - IMPERATRIZ

Virlane Kelly L. da Silva

Professora Assistente I do Curso de Engenharia de Alimentos da Universidade Federal do Maranhão- Campus de Imperatriz- MA. Graduada em Engenharia de Alimentos pela UFC (2005), Mestrado em Tecnologia de Alimentos pela Universidade Federal do Ceará - UFC (2008). Atualmente é Doutoranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos pela Universidade Federal do Ceará - UFC. Tem experiência na área de Ciência e Tecnologia de Alimentos, com ênfase em Engenharia de Alimentos, atuando principalmente nos seguintes temas: Tecnologia e Processamento de Frutas Tropicais (manga, melão, goiaba, bacuri e castanha de caju).

Produção de Alimentos

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A paixão de D. Francisca pela dança do Lindô começou aos cinco anos de idade, no município de Caxias, cidade onde nasceu. A manifestação cultural, muito popular na sua infância, era dançada em qualquer período festivo quase como uma obrigação, e D. Lindô, de tanto dançar, incorporou

o nome da manifestação ao seu. Atualmente, Francisca do Lindô é casada e mora em Imperatriz. Ensinou a dança para seus filhos, vizinhos e para todos que queriam aprender.

O grupo que hoje lidera teve início em primeiro de abril de 1984, em comemoração ao seu 40º aniversário. A partir daí, surgiu o grupo Batalhão Real formado por seus filhos, netos e vizinhos. Com ritmo lento, homens e mulheres, em pares, dançam e entrelaçam os braços, cantando música de versos improvisados e balançando os corpos em forma de círculo, bem parecido com a quadrilha junina.

Com saias coloridas e godês, bem rodadas e floridas, as moças embelezam a dança e contagiam o público. Bem marcante na Dança é a presença do tambor, considerado instrumento indispensável. A alegria dos brincantes começa quando Dona Francisca, sentada com o tambor sobre as pernas, inicia a batucada e a cantoria. O ritmo e o som contribuem na marcação dos passos durante o bailado.

Lindô, a dança que entra na 4ª geração da família de Dona Francisca

TEXTO: CARLA REJANE DUTRA, WELBERT QUEIROZ, LÍGIA GUIMARÃES, DANIELA RIBEIRO FOTOS: CONCULTURA, CARLA REJANE DUTRA

Maria Francisca Pereira da Silva, 68 anos, mais conhecida como Francisca do Lindô, é incentivadora

e amante da manifestação cultural popular Dança do Lindô, no município de Imperatriz

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gente, danço o Lindô

Cultura

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Dona Francisca conta que seu pai relatou que a avó dele aprendera a dançar o Lindô com os escravos. Ela explica ainda que essa dança veio para o Brasil em 1772, trazida por dois irmãos que vieram de Portugal e chegaram a Caxias, município situado no Leste do estado do Maranhão.

Francisca do Lindô continua liderando o grupo Batalhão Real com a ajuda dos filhos. De acordo com a filha Maria Nilda Pereira da Silva, de 38 anos, a dança já está entrando na quarta geração em Imperatriz. A fim de não deixar a manifestação cultural morrer, Maria pretende dar continuidade ao trabalho da mãe. Em 2004, Francisca do Lindô gravou seu primeiro CD com todas as músicas de sua autoria e pretende gravar o segundo CD ainda em 2012, com algumas músicas inéditas.

Além da intimidade com o tambor, as mãos de Dona Francisca também operam bênçãos em crianças com dor de barriga, quebrante, dor de cabeça e ventre caí-do. Benzedeira, ela assegura que todas as crianças por quem reza são curadas. Diante de várias dificuldades, como a

luta de cinco anos contra um câncer, a líder da brincadeira não desiste de seus projetos. Ela sonha ter um espaço cultural para ensinar a Dança do Lindô às crianças e adolescentes de Imperatriz, pois enten-de que é uma forma de perpetuar essa manifestação cultural na cidade e ajudar

os jovens a sair da marginalidade à qual alguns estão submeti-dos. “Muitos jovens já saí-ram das drogas, viraram cidadãos de bem depois que vieram para Dança do Lindô”, afirma Dona Francisca.

Situada na divisa com o estado de Tocantins, Imperatriz é a segunda maior cidade do estado do Maranhão. Por estar localizada entre três regiões do Brasil (Nor-deste, Centro – oeste e Norte) e ser con-siderada uma cidade de trabalho e passa-gem, assume uma tendência multicultural e plural, sendo influenciada pelas culturas indígena, cabocla, sertaneja e agropecuá-ria, trazidas pelas recentes migrações do Tocantins, Goiás e Sul do país.

Dentro desta perspectiva, foi inaugu-rado, em outubro de 2009, o projeto de pesquisa Concultura. Coordenado pelos professores do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Maranhão, Mar-cos Túlio e Letícia Cardoso, o projeto é considerado atualmente uma referência regional na promoção de articulações entre práticas de comunicação e movi-mentos culturais locais.

O ponto de partida do projeto foi uma pesquisa intitulada Qual a cara de Impe-ratriz? Trabalho balizado por leitura de textos teóricos e abordagem etnográfica (observação participante, descrição e entrevistas), visando registrar e difundir produções culturais nativas que não têm grande visibilidade no espaço público, apesar de tradicionais. Com o resultado das pesquisas em mãos, o grupo está editando todo o material coletado e pre-tende lançar, em breve, um livro-catálo-go e um documentário.

O Concultura analisa que a cidade de Imperatriz tem uma produção cultural diferente e isso se deve à sua diversidade. A preocupação do projeto é trazer à tona manifestações da cultura local que são desconhecidas para a maior parte da população, visando desconstruir alguns

discursos reducionistas e apressados sobre a cidade, como de que Imperatriz não tem cultura ou que é a cidade do sertanejo. Entre as manifestações e produções artísticas presentes, destacam-se o Teatro, a cultura Hip hop, a Festa do Divino, além da Dança do Lindô. O cenário musical também traz seus representantes, intérpretes, compositores e ganhadores de vários festivais de música do país, como Nenê Bragança e Zeca Tocantins.

Para a coordenadora do projeto Letícia Cardoso, as identidades construídas em Imperatriz têm uma ligação muito forte com a ideia de região, mais especifica-mente a Tocantina. “Parte significativa da população, que hoje vive em Imperatriz, não nasceu aqui. Muitos vieram de outros Estados, mas notamos que essas pessoas trazem consigo seus costumes e tradições, que se misturam com as culturas locais. Pense aí, no resultado? Agora é que a po-pulação urbana nativa da cidade está se desenvolvendo e criando vínculos com os traços culturais da região,” explica.

Outra atividade realizada pelo grupo é a concretização de eventos científico--culturais na própria UFMA, que visam dar voz aos agentes da cultura local que fazem parte da pesquisa. O proje-to Concultura realiza debates e mesas--redondas com os produtores culturais e pesquisadores para discutir temas polê-micos e necessários à organização e pro-fissionalização da cultura local. “Dessa maneira, o projeto contribui para o for-talecimento das identidades locais, que também são maranhenses, apesar de também se identificarem com a região Tocantina”, afirma Letícia.

MAPEAMENTO DA CULTURA NA REGIÃO TOCANTINA

Letícia Conceição Martins CardosoProfessora Assistente do curso de

Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão , onde desenvolve

estudos sobre cultura popular e convergência. É idealizadora e coordena

o Projeto de Extensão CONCULTURA (MEC/Proext/2010). Graduou-se em

Comunicação Social - Jornalismo (2004) na UFMA e em Letras (2003) na Universidade Estadual do Maranhão. É

Mestre em Ciências Sociais (2008) pela Universidade Federal do Maranhão.

Marcus Túlio Borowiski LavardaProfessor da UFMA- campus de

Imperatriz. Atua na área de imagem e iconografia, especialmente em

fotografia documental, fotojornalismo e fotografia publicitária. É coordenador

do Projeto de Extensão CONCULTURA (MEC/Proext/2010). Possui graduação

em Publicidade e Propaganda; Especialização em Imagem e Som e Mestrado em História, tendo

a imagem como ponto central para suas reflexões.

MÃOS TALENTOSAS

Manifestação da cultura do Lindô

no campus de Imperatriz

Dona Francisca e os percussores da

dança do Lindô

O GRUPO ORGANIZA REPERTÓRIO PARA O SEGUNDO CD

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Quem poderia imaginar que de uma simples observação surgiria uma escola pioneira no Brasil e de referência internacional na construção de embar-cações artesanais? Este é um dos tesouros tradicionais que o Maranhão esconde, mas, por questões sociais e econômicas, não havia sido revelada

sua importância e complexidade.A história teve início há 35 anos, quando o engenheiro Luiz Phelipe Andrès perce-

beu detalhes únicos nas embarcações aportadas na Praia Grande: velas vermelhas e amarelas, cascos de cores vigorosas, engenharias diversas, adaptadas às caracterís-ticas marítimas da região. “Quando eu cheguei aqui, o que chamou a minha atenção foi a beleza das embarcações. Tirei fotos e acabei me aproximando dos pescadores que me explicaram, por exemplo, que as velas coloridas eram tingidas para proteger o tecido”, conta o engenheiro. Phelipe acabou descobrindo que tais atributos pode-riam ser encontrados apenas em um lugar do mundo: no Maranhão.

Estaleiro-escola: técnica, arte e tradição que só se encontram no Maranhão

Embarcando em um sonho

TEXTO: AMY LORENFOTOS: ÉRICA MUNIZ, JOSIANE MENDES

Educação

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Phelipe chegou a São Luís no final da década de 1970 e percebeu a riqueza da tradição dos estaleiros artesanais. Mas foi nos anos 1986 e 1987 que a ideia de expor estes conhecimentos se desenvolveu, com o projeto de pesquisa “Embarcações do Mara-nhão”, capitaneada pelo engenhei-ro. A pesquisa foi realizada por meio de um convênio entre o Governo do Estado do Maranhão e a FINEP (Fi-nanciadora de Estudos e Projetos, do Ministério da Ciência e Tecnologia), com o objetivo de recuperar e preser-var as técnicas populares de constru-ção de embarcações de madeira.

A pesquisa confirmou a existência de uma diversidade de modelos e técnicas para a construção de barcos, mas, como nem tudo são flores, também revelou uma situação preocupante. Apesar da forte representatividade que a navega-ção exerce sobre a base da economia regional, a carpintaria naval estava em uma situação deplorável de abandono, além das péssimas condições de salu-bridade e segurança nas quais os mes-tres eram obrigados a trabalhar. “De fato, todo este conhecimento transmiti-do de forma empírica, de pai para filho, há mais de 400 anos, corria o risco de desaparecimento”, explica Phelipe.

A contribuição da pesquisa para o res-gate desta tradição alcançou horizontes que resultaram na fundação, em dezem-

bro de 2006, do Centro Vocacional Tecno-lógico Estaleiro-Escola. A Instituição carre-ga a filosofia de valorização e transmissão deste conhecimento e da categoria destes profissionais. “Aqui os velhos mestres carpinteiros navais podem hoje transmi-tir seus ensinamentos às novas gerações como forma de assegurar a valorização e, por conseguinte, a perpetuação dos co-nhecimentos tradicionais”.

Para o professor de Direito Ambiental e Marítimo, Luiz Francisco Andrès, a divulgação do ofício de carpinteiro naval introduz no mercado de trabalho um profissional que irá garantir a perpetuação da técnica, além da geração de novos empregos e a melhoria de renda para todos os profissionais envolvidos nas etapas de construção naval artesanal maranhense. “Nós pensamos bastante em transformar o estaleiro em uma escola de nível superior. Acreditamos e sonhamos que um dia o estaleiro seja uma referência para o ensino de engenharia naval no Brasil, assim como o ITA é para o ensino da tecnologia aeronáutica”, declara.

Atualmente, o estaleiro-escola é pio-neiro no país por oferecer cursos técnicos de nível médio relacionados à engenharia naval, a exemplo dos cursos de Constru-ção Naval Artesanal e Velejador. Também são ministrados cursos como Introdução à Informática, Preservação Ambiental, Marcenaria e Eletrotécnica, entre outros. “Além da preocupação em transmitir estes conhecimentos tradicionais, nós também nos preocupamos em oferecer ensino so-bre outras áreas que consideramos funda-mentais para o desenvolvimento destes profissionais e, inclusive, da comunida-de”, acrescenta Phelipe. O diretor revela que, no Estaleiro, ainda existem outras atividades como a produção de pequenos modelos e até oficinas de reciclagem com garrafas pet que chegam à praia, trazidas pela maré.

O SONHO

A TRADIÇÃO A CRIAÇÃO

Oficineiro constrói miniatura de embarcação com as técnicas ensinadas no Estaleiro-Escola

Barcos de todos os tamanhos são fabricados na escola

Aqui podem ser encontradas peculiaridades na produção de embarcações que chegam a se elevar ao nível artístico. Um exem-plo são as cores utilizadas nos barcos. Dispostas intuitivamente, porém, de acordo com a indicação acadêmica, elas são responsáveis pela harmonia cromática dos ar-ranjos.

A simplicidade do método e, ao mesmo tempo, sua complexidade são o que torna o carpinteiro naval um verdadeiro artista, capaz de fazer um meio de transporte seguro que serve, por exemplo, para levar alimento a milhares de pessoas.

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>> O Barco Estandarte, que está aberto à visitação durante a SBPC 2012, é um projeto de divulga-ção do estaleiro-escola. O barco foi completamente restaurado e adaptado para que pudessem ser realizadas apresentações sobre as embarcações do Estado. Ele pertenceu a Sebastião Barros, que hoje faz parte da equipe do estaleiro-escola. O seu interior é climatizado e tem capacidade para 25 pessoas. A apresentação inclui a exibição de um vídeo em uma TV de LCD e luzes de LED instalados dentro do barco.

>> O Estaleiro-Escola fica localizado no Sítio Tamancão (área Itaqui-Bacanga), em um antigo moinho de arroz do século XVIII, quando o auge da economia maranhense se baseava na exportação de arroz e algodão. O moinho era utilizado para otimizar o processo de debulha do arroz, feito, até então, pelos escravos nos pilões de madeira. Até hoje ainda é possível ver as ruínas do engenho.

>> A canoa-costeira é um tipo de embarcação cujas características, em todo o mundo, podem ser encontradas apenas no Maranhão. Em junho deste ano, a canoa-costeira chamada Dinamar foi tombada como Patrimônio Cultural Brasileiro.

>> A escola possui um pequeno museu onde peças raríssimas de embarcações do Maranhão e do Brasil podem ser observadas, além de apresentar dezenas de tipos de canoas e barcos marítimos e fluviais que existem no Estado.

>> A economia de subsistência no Maranhão ainda depende essencialmente da atividade naval. Pesca-dores e velejadores fazem a ponte no transporte de alimentos e passageiros, bem como a pesca.

O técnico de marinha, velejador ama-dor e modelista, Sebastião de Jesus Bar-ros, trabalha com a atividade de navega-ção há 10 anos e fala sobre o quanto a carpintaria naval artesanal é importante para a população maranhense. “O Mara-nhão possui muitos rios, sendo este um dos cursos pelo qual navega o meio de transporte como o barco, que é fabricado

pelo mestre carpinteiro. Sem a simpli-cidade e praticidade que a carpintaria naval traz para a vida das pessoas, a di-ficuldade aqui e no interior seria muito maior para a população”, explica. Hoje, trabalha com a equipe do estaleiro-esco-la e fabrica modelos de barcos e canoas em miniaturas, que podem ser encontra-dos na galeria da escola.

Apesar de possuir uma estrutura completa e organizada para a aplicação dos cursos, o estaleiro - escola esteve recentemente sem oferecê-los à co-munidade, mantendo apenas algumas atividades ativas. Entretanto, os cursos reabriram inscrições e devem retornar com suas atividades a partir do segundo semestre deste ano.

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Seu Magno, o homem que faz barcosMesmo tendo começado o ofícios aos 41 anos de idade, ele não dispensou os

ensinamentos do pai

Magno Garcez de Oliveira é um homem franzino de 62 anos, mas de perceptível vitalidade. Qualifica--se profissionalmente como carpinteiro naval, mas não esconde o orgulho de ser chamado de

artesão. Em seu modesto, porém funcional local de trabalho – que prefere denominar de oficina a estaleiro ou fábrica – cons-trói variados tipos de embarcações. Diz que já perdeu a conta da quantidade de barcos a vela e motorizados, canoas, bianas e igaratés que construiu ou ajudou a construir quando auxilia-va o pai, de quem herdou a profissão. Ele tem 10 filhos – dos quais seis são homens – todos adultos e também carpinteiros, que lhe ajudam, mas sem o compromisso de lhe suceder na tarefa de construir embarcações. “São bons filhos, inteligentes e não os aconselho a seguirem a minha profissão. Prefiro que estudem e consigam outra forma de ganhar a vida”, observa.

Magno continua a fabricar barcos. “Faço embarcações no-vas e reformo velhas, de todos os tamanhos e modelos. Monto a estrutura, instalo o motor e ainda pinto”, diz o carpinteiro naval na oficina instalada no quintal de sua casa, no Porto de Mocajituba, povoado banhado pela Baía de São José e perten-cente ao município de Paço do Lumiar, encravado na Grande Ilha de São Luís.

TRABALHO E PRAZERA oficina de Magno Garcez está situada numa comunidade

bucólica, que acomoda pescadores, marisqueiros, catadores de caranguejos e trabalhadores rurais. Ele é o único construtor de embarcações da área. Seu trabalho é praticamente artesa-nal e, quando a demanda é grande, contrata vizinhos tempora-riamente. Ele assegura que sua receita financeira dá para sus-tentar a família e acumular algum patrimônio. Ele não releva, com precisão, quanto cobra pela construção de um barco de tamanho médio, mas adianta que pede em torno de R$ 10 mil para um trabalho que dura, em média, três meses.

TEXTO: MARIANA SALGADO

Embora tenha herdado do pai a profissão, assumiu o con-trole da produção somente aos 41 anos. Antes, trabalhou na lavoura, foi pescador e até barbeiro na Marinha. Estudou ape-nas dos seis aos oito anos de idade, período em que apren-deu a assinar o nome, pois abandonou a escola para ajudar a família na roça. Define-se como autodidata, já que conhece as quatro operações matemáticas e aprendeu o seu ofício ape-nas observando e auxiliando na produção. “Eu gosto da minha profissão. Para mim, é um prazer terminar a construção de um barco e vê-lo no mar”, confessa Magno, acrescentando que irá trabalhar “enquanto tiver saúde e Deus quiser”.

““Eu gosto da minha profissão. Para

mim, é um prazer terminar a construção de um barco e vê-lo no mar

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Oficina de Seu Magno no porto de Mocajituba

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Economia, cultura e sustentabilidadeProjeto da Feira de Saberes e Sabores da Economia Solidária no Maranhão, que será apresentado durante a 64ª Reunião Anual, propõe o desenvolvimento da economia

maranhense de forma sustentável por meio da economia criativa e solidária

Provocar a comunidade científico--acadêmica para a busca do de-senvolvimento da economia ma-ranhense de forma sustentável

e de combate à pobreza. Esse é um dos objetivos da Secretaria de Estado do Tra-balho e Economia Solidária a ser alcan-çado com a apresentação do Projeto da Feira de Saberes e Sabores da Economia Solidária no Maranhão durante a 64ª Reunião Anual da SBPC. Representando o setor de Economia Solidária e combate ao trabalho escravo, a secretária Maria-na Nascimento ressalta a importância deste tipo de economia para o desenvol-vimento do Estado e combate à pobreza. Mariana frisa a colaboração de estudan-tes e pesquisadores na empreitada que é consolidar a Economia Solidária, que existe há mais de 200 anos no mundo, como um modelo válido de economia.

TEXTO: ALINE ALENCAR

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Primeiramente, o que é economia criativa e solidária e qual a sua na-tureza no contexto econômico atual?

Mariana: A economia criativa e soli-dária vem da criatividade das pessoas que buscam formas alternativas de gerar trabalho e renda. É um trabalho de gru-pos, de associações e cooperativas para comercializar e produzir. A cooperação entre eles nos ajuda a quebrar alguns gargalos que sozinhos não consegui-riam. São vários os grupos de coopera-tivas pelo Estado, mas há trabalhadores informais, portanto, é necessária essa solidariedade.

O que o Maranhão produz e exporta de bens e serviços criativos?

Mariana: Os produtos vão desde o artesanato até a produção do babaçu, que é o produto mais importante. Aliás, o que o Estado tem de mais forte está na área do extrativismo: o mel, bastan-te produzido, e o babaçu e seus deri-vados, como o azeite, o sabonete e o mesocarpo.

Como é a articulação entre o governo federal, o estadual e a Universidade?

Mariana: Com a Universidade, es-tamos buscando agora uma interação aproveitando o momento da SBPC, pois, infelizmente, não temos ainda no Mara-nhão essa integração com as universida-des e os grupos da economia solidária. É preciso que haja a encubação de em-preendimentos para que os pesquisado-res das universidades possam divulgar o trabalho com esses grupos, situação que, enquanto Secretaria de Estado, não sabemos se existe, apesar de em outros Estados como a Paraíba, a Bahia e o Ce-ará já haver esse tipo de trabalho. Entre o Governo Federal e Estadual há uma

parceria muito grande entre as PNAE’s (Programa Nacional de Alimentação Escolar), Secretaria Nacional de Econo-mia Solidária e a Secretaria Nacional do Trabalho, em que é desenvolvido um trabalho de apoio aos grupos pro-dutivos, buscando o fortalecimento dos mesmos.

De que forma cientistas e produto-res culturais podem trabalhar em conjunto, deixando a competitivi-dade dar lugar à solidariedade?

Mariana: Devolvendo para as comu-nidades os trabalhos de pesquisa feitos com esses grupos, situação difícil de ocorrer. Nós queremos é a devolução. Hoje, por exemplo, temos várias máqui-nas que podem facilitar a produção das quebradeiras de coco, mas nenhuma de-las consegue chegar ao produto final co-mo as quebradeiras de coco conseguem. É um trabalho que chega à universidade, mas não volta ou fica incompleto. Por isso, durante a 64ª Reunião Anual da SBPC, nós queremos instigar os cursos universitários, como, por exemplo, o de Administração para trabalhar temas co-mo a autogestão, e assim ajudar a secre-taria a dar apoio a todos esses grupos, que, em média, são 1.040 cadastrados,

““Durante a 64ª Reunião Anual da SBPC, nós queremos instigar a

comunidade acadêmica a ajudar a secretaria, de forma que estes possam

dar apoio a todos os grupos que trabalham

com economia solidária

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além de dar um subsídio aos estudantes na forma de estágio.

Quais os programas do governo do Estado são exemplos de economia solidária?

Mariana: Os programas que temos no momento são voltados para a comercia-lização e, entre eles, temos o Programa Estadual de Feiras, que busca facilitar a comercialização, e o Programa de Aquisi-ção de Alimentos do PNAE. Ambos orien-tam os grupos para que eles se organi-zem e possam comercializar e adquirir produtos para a alimentação escolar. E, muito em breve, haverá um Programa de Assistência Técnica aos grupos produti-vos de economia solidária.

Quais as diferenças entre economia tradicional e economia solidária? Porque a segunda é considerada melhor para o desenvolvimento da economia local?

Mariana: A economia solidária não se preocupa só com o lucro pelo lucro, principal ideal do contexto capitalista em que vivemos. A economia solidária se preocupa com a sustentabilidade, o meio ambiente, o respeito ao próximo e a não exploração ao ser humano. O trabalhador solidário tem tempo para fa-mília e trabalha em seu local de origem, agregando valores diferenciados.

De que forma, a união entre econo-mia criativa e solidária contribuem para o desenvolvimento do Estado no que concerne ao combate à po-breza e a preservação dos saberes populares (principal tema da SBPC)?

Mariana: O combate à pobreza de-pende da manutenção dos trabalhado-res em seus locais de origem, ao con-trário do que vemos hoje. Há alguns projetos que tiram a pessoa do seu local de origem e, geralmente, ela acaba na periferia da cidade. Toda a produção da

economia solidária parte de um saber popular.

Quais os desafios do Estado a serem superados para a fixação desse mo-delo de economia?

Mariana: Reconhecer a economia so-lidária, dar valor ao que temos em nos-so Estado e mostrar o que nós temos de melhor na nossa cultura. A economia so-lidária visa desenvolver o Estado de for-ma sustentável. A troca de produtos, de saberes e de tecnologias ajuda e muito a divulgar este tipo de economia.

Há um levantamento de dados no sentido de permitir uma compreen-são ampla das características e po-tenciais criativos do Estado?

Mariana: O trabalho de levantamento dos grupos foi feito com a UFMA, há al-gum tempo, desde 2005. Alguns dados constatados são em relação ao número

de grupos produtivos, quantidade de mulheres (a maioria podem, pela natu-reza do trabalho, estar mais próximas às famílias) e quantidade de homens. Ou-tro dado já conseguido refere-se à ordem de seguimento da economia solidária: em primeiro lugar, a agricultura familiar, logo depois o artesanato e, por último, está dentro de confecção de produtos entre outros.

De acordo com o Ministério da Cul-tura, os desafios para a implantação da economia solidária são: Levan-tamento de informações e dados da economia Criativa; Articulação e estímulo ao fomento de empreen-dimentos criativos; Educação para competências criativas; Infraestru-tura de criação, produção, distri-

buição/circulação e consumo/frui-ção de bens e serviços; e a Criação/adequação de Marcos Legais para os setores criativos. Na sua opinião, qual é o maior desafio no âmbito es-tadual?

Mariana: O maior desafio, com certe-za, é o marco legal. Se nos basearmos na lei do cooperativismo de 1975, en-tão uma cooperativa da economia soli-dária tem os mesmos impactos sociais de uma grande empresa. Porém, nossa produção não tem uma escala continu-ada do primeiro ao último mês do ano, entre outras questões que nos impedem de regulamentar a economia solidária no contexto do sistema capitalista. Atu-almente, nós estamos com 18 leis trami-tando no Congresso Nacional e, durante a SBPC, coletaremos assinaturas para agilizar esse processo de reconhecimen-to do trabalho criativo e solidário como modelo econômico.

Ainda de acordo com o Ministério, o não reconhecimento de determi-nadas atividades como profissões impede o trabalhador criativo de ter acesso aos benefícios, direitos tra-balhistas e previdenciários. Quais as atividades aqui do Estado já são reconhecidas como profissão?

Mariana: As únicas que tem reconhe-cimento são as quebradeiras de coco, não enquanto empreendimento, mas sim, por causa das lutas e das conquis-tas que já tiveram. Porém, o artesão e outros não tem esse reconhecimento, muito menos regularização. O que bus-caremos com os 40 grupos que estarão na feira é divulgar e mostrar o que temos no Maranhão de produção de economia solidária, bem como a nossa organi-zação. Além disso, lançaremos o livro Comercialização em rede - uma estraté-gia da economia solidária, contendo os pontos de comercialização que estão sendo espalhados pelo país e a insta-lação das budegas no Médio Mearim do Maranhão, por exemplo. Por meio des-sas redes, o produtor coloca à venda seu produto, podendo também trocá-lo por algum de seu interesse. O livro contém oito exemplos de comercialização soli-dária no Maranhão e no país. Teremos também, durante a apresentação da Feira na SBPC, os espaços temáticos da pesca, produção oriunda do babaçu, da mandioca e da juçara e suas variações. Produtos esses de onde as famílias tiram seu sustento produzindo doces, bom-bons e afins.

““A economia solidária não se preocupa só

com o lucro pelo lucro, ela se preocupa com a

sustentabilidade, o meio ambiente e o respeito ao

próximo

““Na SBPC traremos 40 grupos que trabalham

com economia solidária, eles vão divulgar para

todo o Brasil o que temos no Maranhão, e ainda vamos realizar o lançamento de um

livro sobre a estratégia de comercialização da

Economia Solidária

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“A UFMA se orgulha em sediar o maior evento de pesquisadores da América Latina e Caribe, a SBPC. Sejam bem vindos!”