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Revista Trimestral de Jurisprudência volume 203 – número 3 janeiro a março de 2008 páginas 933 a 1402

Revista Trimestral de Jurisprudência

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Revista Trimestral de Jurisprudência

volume 203 – número 3janeiro a março de 2008

páginas 933 a 1402

Diretoria-Geral Sérgio José Américo Pedreira

Secretaria de DocumentaçãoAltair Maria Damiani Costa

Coordenadoria de Divulgação de JurisprudênciaNayse Hillesheim

Seção de Preparo de Publicações Leide Maria Soares Corrêa Cesar

Seção de Padronização e Revisão Rochelle Quito

Seção de Distribuição de Edições Leila Corrêa Rodrigues

Diagramação: Joyce Ferreira e Rodrigo Melo Cardoso

Capa: Núcleo de Programação Visual

(Supremo Tribunal Federal — Biblioteca Ministro Victor Nunes Leal)

Revista trimestral de jurisprudência / Supremo Tribunal Federal, Coordenadoria de Divulgação de Jurisprudência. – Ano 1, n. 1 (abr./jun. 1957)- . – Brasília: Imprensa Nacional, 1957-.

v. 203-3; 22 cm.

Três números a cada trimestre.

Editores: Editora Brasília Jurídica, 2002-2006; SupremoTribunal Federal, 2007- .

ISSN 0035-0540

1. Direito - Jurisprudência - Brasil. I. Brasil. Supremo Tribunal Federal (STF).

CDD 340.6

Solicita-se permuta. Pídese canje. On demande l’échange. Si richiede lo scambio. We ask for exchange. Wir bitten um Austausch.

STF/CDJU SAAN Qd. 3, Lt. 915, 1º andar 72220-000 – Brasília-DF [email protected] Fone: (0xx61) 3403-3795

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Ministra ELLEN GRACIE Northfleet (14-12-2000), PresidenteMinistro GILMAR Ferreira MENDES (20-6-2002), Vice-PresidenteMinistro José CELSO DE MELLO Filho (17-8-1989)Ministro MARCO AURéLIO Mendes de Farias Mello (13-6-1990)Ministro Antonio CEzAR PELUSO (25-6-2003)Ministro CARLOS Augusto Ayres de Freitas BRITTO (25-6-2003)Ministro JOAQUIM Benedito BARBOSA Gomes (25-6-2003)Ministro EROS Roberto GRAU (30-6-2004)Ministro Enrique RICARDO LEWANDOWSKI (16-3-2006)Ministra CÁRMEN LÚCIA Antunes Rocha (21-6-2006)Ministro Carlos Alberto MENEzES DIREITO (5-9-2007)

COMPOSIÇÃO DAS TURMAS

PRIMEIRA TURMA

Ministro MARCO AURéLIO Mendes de Farias Mello, PresidenteMinistro CARLOS Augusto Ayres de Freitas BRITTOMinistro Enrique RICARDO LEWANDOWSKIMinistra CÁRMEN LÚCIA Antunes RochaMinistro Carlos Alberto MENEzES DIREITO

SEGUNDA TURMA

Ministro José CELSO DE MELLO Filho, PresidenteMinistro GILMAR Ferreira MENDESMinistro Antonio CEzAR PELUSO Ministro JOAQUIM Benedito BARBOSA GomesMinistro EROS Roberto GRAU

PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

Doutor ANTONIO FERNANDO BARROS E SILVA DE SOUzA

COMISSÃO DE REGIMENTO

Ministro CELSO DE MELLOMinistro GILMAR MENDESMinistro MENEzES DIREITOMinistra CÁRMEN LÚCIA – Suplente

COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA

Ministro MARCO AURéLIOMinistro JOAQUIM BARBOSAMinistro RICARDO LEWANDOWSKI

COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO

Ministro CEzAR PELUSOMinistro CARLOS BRITTOMinistro EROS GRAU

COMISSÃO DE COORDENAÇÃO

Ministro GILMAR MENDESMinistro CEzAR PELUSOMinistra CÁRMEN LÚCIA

COMPOSIÇÃO DAS COMISSÕES

SUMÁRIO

Pág.

ACÓRDÃOS ................................................................................ 941

ÍNDICE ALFABéTICO ................................................................. 1345

ÍNDICE NUMéRICO .................................................................... 1399

ACÓRDÃOS

QUESTÃO DE ORDEM NA MEDIDA CAUTELAR NAAÇÃO CAUTELAR 1.084 — AP

Relator: O Sr. Ministro Gilmar Mendes

Requerente: Instituto de Desenvolvimento Rural do Amapá – RURAP — Requerida: União

Questão de ordem em medida cautelar em ação cautelar. 2. Autarquia estadual. Inscrição no Sistema Integrado de Adminis-tração Financeira do Governo Federal (SIAFI). 3. Impedimento de repasse de verbas federais. Risco para a continuidade da execução de políticas públicas. 4. Precedentes: AC 259-QO/AP, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 3-12-04; AC 266-QO/SP, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 28-10-04; e AC 39-AgR/PR, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 5-3-04. 5. Cautelar, em questão de ordem, referendada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência da Ministra Ellen Gracie, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, referendar a decisão, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 1º de junho de 2006 — Gilmar Mendes, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Eis o teor da decisão (DJ de 4-4-06) que proferi ao apreciar o pedido de medida liminar (fls. 92-95):

Decisão: Trata-se de ação cautelar inominada, com pedido de medida liminar, ajuizada pelo Instituto de Desenvolvimento Rural do Estado do Amapá (RURAP), au-tarquia estadual, em face da União Federal, com fulcro no art. 102, I, f, da Constituição Federal (CF).

R.T.J. — 203944

Na espécie, argumenta-se que o Autor teria firmado, em dezembro de 1997, o Con-vênio 35/97 com a Secretaria de Apoio Rural e Cooperativismo, vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, com o objetivo de implementar o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF).

Após constatadas diversas anomalias quanto à aplicação das verbas federais repassadas em período anterior à atual gestão da autarquia-autora, o Ministério da Agricultura solicitou a inscrição da autarquia-convenente no Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI) – na condição de inadimplente.

Alega-se, ainda, que esse registro de inadimplência estaria a impedir o repasse de verbas decorrentes de outro convênio firmado entre a autarquia-autora e o Instituto Nacional de Coloni-zação e Reforma Agrária – no valor de R$ 2.110.957,45 (dois milhões cento e dez mil novecentos e cinqüenta e sete reais e quarenta e cinco centavos) – com o objetivo de beneficiar cerca de 1.777 (um mil setecentos e setenta e sete) famílias assentadas no Estado do Amapá/AP.

Pretende-se a concessão de liminar para a imediata suspensão de registro de inadim-plência da autarquia no Siafi, de forma a possibilitar a obtenção de recursos junto a órgãos ou entidades federais. A ação cautelar consiste, portanto, em medida preparatória para o ajuiza-mento de ação ordinária de cancelamento de registro da referida autarquia no Siafi.

Quanto à plausibilidade jurídica do pedido (fumus boni juris), a petição inicial (fls. 2-8) sustenta que:

“O lançamento no Siafi é ato unilateral e discricionário e importa, para a Enti-dade inscrita, na imediata penalização, pois a impossibilita de operações de crédito, celebração de convênios, acordos etc., de vez que a comprovação da não inscrição é uma exigência de controle para todas as operações de natureza financeira.

Essa inscrição é, também, uma forma de forçar a Requerente a se sujeitar a atos praticados pela administração anterior, os quais estão sendo apurados para uma conse-qüente responsabilização daqueles que deram causa às irregularidades que se mostrarem insanáveis após a análise conclusiva da Prestação de Contas pelo TCU.” (Fl. 4.)Com referência à urgência da pretensão cautelar (periculum in mora), afirma-se:

“Caso não seja desde logo determinada em favor da requerente a suspensão da sua inscrição no Siafi e, conseqüentemente, lhe conferir o direito de receber os recursos do Incra, oriundos da celebração de convênio, esta, juntamente com a população rural destinatária dos benefícios do referido convênio, sofrerá enorme abalo em razão da paralisação da execução do seu objeto.” (Fl. 6.)Por fim, o autor requer:

“A concessão de liminar initio litis e inaudita altera pars no sentido de determi-nar à União Federal a imediata suspensão do registro de inadimplência do Rurap, para que o mesmo possa movimentar os recursos advindos do convênio celebrado com o Incra, bem assim a possibilidade de firmar, eventualmente, novos convênios com os órgãos da administração federal.

(...)Ao final, seja julgada procedente a ação para tornar definitiva a suspensão da

inscrição da autora no Siafi, confirmando a medida liminar concedida.” (Fl. 8.)Passo a decidir tão-somente o pedido de medida cautelar.Preliminarmente, constato a existência de conflito entre a União e a autarquia de Esta-

do da Federação, razão pela qual reconheço a competência do Supremo Tribunal Federal para julgar e processar esta ação cautelar, nos termos do art. 102, I, f, da CF.

No caso concreto, a concessão da medida liminar implica a continuidade dos repasses de verbas federais para, no âmbito dos convênios firmados pela Rurap, possibilitar o cumpri-mento das políticas públicas envolvidas, sem prejuízo da devida apuração, em momento oportuno, das supostas irregularidades perpetradas pela gestão anterior da referida autarquia.

Em que pese o cuidado necessário que a gestão dos recursos públicos demanda no contexto dos princípios norteadores da atuação da administração pública federal, distrital, estadual e municipal (CF, art. 37, caput), vislumbro um risco maior na permanência do quadro de impedimento dos repasses, uma vez que ainda não ocorreu a apreciação pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

R.T.J. — 203 945

Ademais, considerado o quadro de dependência orçamentária da autarquia para viabi-lizar serviços públicos na área de fomento ao desenvolvimento agrário em consonância com as diretrizes da política fundiária, da política agrícola e da reforma agrária (CF, arts. 184 e se-guintes), creio ser o caso de deferimento do pedido de medida liminar. Nesse sentido, arrolo os seguintes precedentes firmados pelo Plenário, nos quais, em circunstâncias similares às destes autos, o Tribunal confirmou ou referendou os efeitos de cautelar deferida monocraticamente: i) AC 259-QO/AP, Relator o Ministro Marco Aurélio, DJ de 3-12-04; ii) AC 266-QO/SP, Relator o Ministro Celso de Mello, DJ de 28-10-04; e iii) AC 39-AgR/PR, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJ de 5-3-04.

Por entender presentes os requisitos legais, e salvo melhor juízo do exame da matéria quando do julgamento do mérito, defiro a medida liminar para determinar à União, até julga-mento final desta ação cautelar, a imediata suspensão do registro de inadimplência do Rurap no Siafi.(Fls. 92-95.)

Assim, submeto-a ao Plenário, para referendo.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Pelos próprios fundamentos da decisão concessiva da cautelar, em que considerei presentes a plausibilidade jurí-dica do pedido (fumus boni iuris) e a urgência da pretensão cautelar (periculum in mora), meu voto é no sentido de que seja ela referendada por este Plenário.

EXTRATO DA ATA

AC 1.084-MC-QO/AP — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Requerente: Instituto de Desenvolvimento Rural do Amapá – RURAP (Advogado: Edilson Cabral Tork). Requerida: União (Advogado: Advogado-Geral da União).

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, referendou a decisão, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau. Presidência da Ministra Ellen Gracie.

Presidência da Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Pe-luso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos.

Brasília, 1º de junho de 2006 — Luiz Tomimatsu, Secretário.

R.T.J. — 203946

AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO RESCISÓRIA 1.469 — SP

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio

Agravante: Nilo Amorim — Agravada: União

Ação rescisória – Acórdão rescindendo em harmonia com precedentes do Plenário do Supremo Tribunal Federal – Afas-tamento da ofensa a texto constitucional. Estando o acórdão res-cindendo em sintonia com reiterados precedentes do Supremo Tribunal Federal, inclusive do Plenário, descabe dar seguimento a ação rescisória ajuizada a partir do disposto no inciso V do art. 485 do Código de Processo Civil.

Ação rescisória – Documento novo – Informações prestadas em mandado de segurança. Uma vez em questão tema exclusiva-mente de direito – alcance de texto constitucional –, impossível é cogitar de campo propício ao ajuizamento de rescisória com base no permissivo do inciso VII do art. 485 do Código de Processo Civil, valendo notar que não consubstanciam documento novo informações prestadas por autoridade coatora em mandado de segurança.

Ação rescisória – Aditamento à petição inicial – Decadência. Uma vez formalizado o aditamento após o biênio decadencial, cumpre desconsiderá-lo.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência da Ministra Ellen Gracie, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator. Ausentes, justificadamente, os Ministros Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau.

Brasília, 20 de setembro de 2007 — Marco Aurélio, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Mediante a decisão de fls. 316 e 317, neguei seguimento ao pedido formulado na rescisória, consignando:

Processo – Chamamento à ordem – Pedido – Negativa de seguimento.1. Eis a ementa do acórdão rescindendo (fl. 21):

Militares. Anistia. Art. 8º do ADCT.- Já se firmou o entendimento desta corte no sentido de que as promoções asse-

guradas pelo art. 8º do ADCT da Constituição Federal são apenas aquelas a que teriam direito os militares se houvessem permanecido em atividade, e não as sujeitas a critérios subjetivos ou competitivos, como o da avaliação de merecimento ou o do aproveitamento em cursos que não chegaram a concluir (assim, a título exemplificativo, nos RE 140.626, RE 141.319, RE 134.686 e RE 141.367).

R.T.J. — 203 947

- Dessa orientação divergiu o acórdão recorrido.Recurso extraordinário conhecido e provido.

O voto condutor do julgamento é idêntico à ementa.2. Verifica-se a impossibilidade de ter-se como contrariada a literalidade do preceito

constitucional, pois a decisão proferida mostra-se harmônica com jurisprudência pacificada – que, por sinal, não contou com o meu convencimento sobre a espécie. Descabe a esta altura, uma vez que o tema já passou até mesmo pelo crivo do Plenário, assentar o enquadramento da rescisória no permissivo do inciso V do art. 485 do Código de Processo Civil – violência à literalidade de disposição de lei. Confira-se com as seguintes decisões: AR 940-1/RJ, AR 966-5/PR, AR 1.008-6/MG e AR 1.037-0/SP.

é certo que se evocou na inicial o permissivo do inciso VII do citado artigo, viabilizador da rescisória se, “depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável”. En-trementes, conforme esclarecido e demonstrado na contestação, o Aviso Confidencial 20, de 27 de fevereiro de 1989, de autoria do Ministro do Exército, consubstanciou tão-somente informa-ções prestadas no Mandado de Segurança 156.793/DF, impetrado por João Evangelista Mendes da Rocha. Daí a impropriedade de considerar tal aviso como documento novo, mesmo porque não teria o condão de afastar a premissa do acórdão rescindendo que é justamente o alcance do art. 8º do Ato das Disposições Transitórias da Carta de 1988. Nem se diga que o aditamento de fls. 147 a 149 estaria a dar sobrevida à rescisória. A formalização ocorreu quando já esgotado o biênio decadencial, próprio ao direito à rescisão.

3. Por tais razões, chamo o processo a ordem e aciono o disposto no art. 21, § 1º, do Regimento Interno para negar seguimento ao pedido, por ser manifestamente improcedente.

4. Publique-se.

No agravo de fls. 343 e 344, o Autor da rescisória insiste em que a decisão objeto do pleito de desconstituição “contraria entendimento desse Egrégio Tribu-nal” (fl. 343). Sustenta que observou todos os requisitos exigidos para a propositura da ação, havendo juntado os documentos comprobatórios do direito alegado. Afir-ma estar a rescisória embasada não só em ofensa literal a texto de lei, mas também no inciso VII do art. 485 do Código de Processo Civil. Defende que “a obtenção de documento essencial à prova da alegação deveria ser requisitado ao órgão ao qual pertencia o Autor, não obtido por se tratar de documento sigiloso, justificando a re-quisição no curso do processo” (fl. 344). De acordo com o Agravante, a negativa de seguimento ao pedido “fere o direito posto em discussão e o próprio fundo do direito, bem como o consagrado princípio da ampla defesa” (fl. 344).

A União, instada a manifestar-se, apresentou a impugnação de fls. 352 a 356. Ressalta que, além de o aditamento à inicial ter sido feito após o encerramento do biênio decadencial, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre as pro-moções de militares anistiados é contrária aos interesses do autor. Com relação ao suposto documento novo, diz que as informações prestadas no MS 156.793/DF não se conformam ao conceito de documento novo previsto no art. 485, inciso VII, do Código de Processo Civil.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Na interposição deste recurso, fo-ram observados os pressupostos de recorribilidade que lhe são inerentes. A peça,

R.T.J. — 203948

subscrita por profissional da advocacia credenciado por meio dos documentos de fls. 15 e 92, restou protocolada no qüinqüídio. Publicada a decisão atacada no Diário de 24 de setembro de 2003, quarta-feira (fl. 339), veio à balha a irresigna-ção em 29 imediato, segunda-feira (fl. 343).

Salta aos olhos a impertinência do inconformismo do Agravante. Conforme ressaltado, o Plenário assentou o entendimento de que a anistia prevista no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Carta de 1988 apenas gerou as promoções alusivas a antiguidade, excluídas aquelas decorrentes de me-recimento ou aproveitamento em cursos que pressupõem a atividade. No mais, tem-se a impropriedade da articulação, no que se insiste em ver, em simples informações, documento novo a ser veiculado à luz do inciso VII do art. 485 do Código de Processo Civil, quando o acórdão prolatado, e que se pretende res-cindir, está lastreado em pronunciamentos do Plenário sobre o alcance do texto constitucional, e não em simples fatos. Desprovejo o agravo.

EXTRATO DA ATA

AR 1.469-AgR/SP — Relator: Ministro Marco Aurélio. Agravante: Nilo Amorim (Advogados: Clorinda Letícia Lima Silva de Amorim e outros, e Saulo Ladeira e outro). Agravada: União (Advogado: Advogado-Geral da União).

Decisão: Retirado da mesa do Plenário por indicação do Relator. Presidên-cia do Ministro Nelson Jobim. Plenário, 1º-7-04.

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao agravo regi-mental, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, os Ministros Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Presidiu o julgamento a Ministra Ellen Gracie.

Presidência da Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Menezes Direito. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos.

Brasília, 20 de setembro de 2007 — Luiz Tomimatsu, Secretário.

R.T.J. — 203 949

MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO CAUTELAR 1.781 — SC

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio

Requerente: Rosana de Fátima Lôndero da Silva Heleno — Requeridos: Estado de Santa Catarina e Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina

Ação cautelar – Recurso extraordinário – Empréstimo de eficácia suspensiva. Estando submetido ao Plenário o tema versado no extraordinário, com voto favorável à tese sustentada pela au-tora, cumpre concluir pela relevância do pedido de empréstimo suspensivo ao extraordinário e do risco de manter-se com eficácia quadro decisório.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, referendar a decisão liminar do Relator na ação cautelar. Ausentes, justificadamente, o Ministro Carlos Britto e a Ministra Cármen Lúcia.

Brasília, 6 de novembro de 2007 — Marco Aurélio, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Eis o teor da decisão mediante a qual conferi efeito suspensivo ao recurso extraordinário:

Ação cautelar – Recurso extraordinário – Submissão do exame da matéria de fundo ao Supremo – RE 355.856-1/SC – Voto favorável – Empréstimo de eficácia sus-pensiva ativa.

1. Eis as informações prestadas pelo Gabinete:Na inicial, a fls. 2 a 16, alega a autora ter sido nomeada para exercer o cargo

de Escrevente Juramentada da Escrivania de Paz do Distrito da sede do Município de Ibicaré, Comarca de Joaçaba, Estado de Santa Catarina. Na condição de substituta legal, passou a responder interinamente, com regular freqüência, pela serventia e, com base no artigo 14 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição estadual, foi efetivada no cargo em 12 de junho de 1990 (fl. 19). Afirma que, em decorrência do julgamento do Supremo relativo à ADI 363-1, formalizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, em que declarado o conflito do referido artigo com a Carta Federal, o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decre-tou a nulidade dos atos de efetivação em serventias, inclusive o dela (fl. 20). Noticia que, impetrado mandado de segurança, a ordem foi indeferida. O Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso ordinário interposto, e o recurso extraordinário protocolado, autuado sob o número 387.426-1/SC, foi distribuído a V. Exa. (fl. 27). Assevera que, nada obstante não ter sido levado o recurso a julgamento, trata-se de situação análoga à da AC 1.755/SC, incidente ao RE 355.856-1/SC, também da relato-ria de V. Exa., em que, na assentada de 22 de fevereiro de 2005, foi proferido voto no sentido do conhecimento e provimento do recurso, declarando-se a nulidade da decisão impugnada (fl. 28).

R.T.J. — 203950

A Autora informa que, em 13 de junho deste ano, o Tribunal de Justiça fez publicar edital de abertura de concurso público para ingresso e remoção na atividade notarial e de registro (fls. 36 a 48), constando, no anexo em que apresentado o rol de serventias, a Escrivania de Paz do Município de Ibicaré/SC, apesar de o Presidente do Tribunal de Justiça ter sido cientificado do fato de encontrar-se sub judice a titularidade do cargo de escrivã da citada serventia. Sustenta que a deflagração do certame ofende o princípio da razoabilidade, tendo em conta pendência de pronunciamento judicial definitivo à questão, daí a necessidade de garantir-se, por meio de concessão de medida acauteladora, incidental, a eficácia plena de decisão positiva que vier a ser proferida no recurso extraordinário. Ressalta que a pretensão preenche os pressupostos indispensá-veis para a cautela, pois há o perigo iminente de ser afastada da serventia. A relevância da tese jurídica estaria revelada nos fundamentos do voto proferido no mencionado recurso, apontado como análogo, e o risco da demora na solução da controvérsia resi-diria na circunstância de o Presidente do Tribunal publicar edital de convocação para ingresso nas serventias e serviços cartorários.

Requer, então, a concessão de liminar, no mesmo sentido da decisão proferida na AC 1.755/SC, para excluir, do certame disciplinado pelo Edital 84/07, a Escrivania de Paz do Município de Ibicaré, enquanto pendente de julgamento final o extraordiná-rio. No mérito, pleiteia a confirmação da medida cautelar deferida, até que seja decla-rada a vacância do cargo, e o apensamento desta ação cautelar ao recurso.

Registramos que, diversamente do caso, apontado como paradigma, a AC 1.755/SC é incidental ao RE 355.856-1/SC.2. Está-se diante de ação cautelar. Observem, na autuação, as nomenclaturas próprias

do processo, autor e réu. Tal como ocorrido em relação à AC 1.755-6/SC, por meio da qual implementei eficá-

cia suspensiva ativa ao RE 355.856-1/SC – ante o início de julgamento com voto favorável à Recorrente, seguindo-se pedido de vista do Ministro Carlos Ayres Britto –, impõe-se im-primir, também neste caso, a eficácia suspensiva. Conforme consta do acórdão impugnado mediante o RE 387.426-8/SC – que inclusive já conta com parecer da Procuradoria-Geral da República –, em jogo faz-se automaticidade a suscitar dúvidas quanto ao devido processo legal administrativo. Entendeu-se que poderia a Autora desta cautelar ser afastada da titu-laridade de certa escrivania, ocupada desde 1990, de forma imediata, considerado o que decidido pelo Supremo em processo objetivo.

3. Defiro a medida acauteladora para, emprestando a eficácia suspensiva ativa ao RE 387.426-8/SC, afastar, enquanto pendente o citado recurso, a eficácia do edital para preen-chimento de vaga relativamente ao cargo ocupado – titularidade da Escrivania de Paz do Município de Ibicaré.

4. Procedam à apensação deste processo ao do RE 387.426-8/SC.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Proponho o referendo da Turma à mencionada decisão.

EXTRATO DA ATA

AC 1.781-MC/SC — Relator: Ministro Marco Aurélio. Requerente: Rosana de Fátima Lôndero da Silva Heleno (Advogados: Rangel Gonçalves Monteiro e outros). Requeridos: Estado de Santa Catarina (Advogado: PGE/SC – Gian Marco Necolini) e Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina.

Decisão: A Turma referendou a decisão liminar do Relator na ação caute-lar. Unânime. Ausentes, justificadamente, o Ministro Carlos Britto e a Ministra Cármen Lúcia.

R.T.J. — 203 951

Presidência do Ministro Marco Aurélio. Presentes à sessão os Ministros Ricardo Lewandowski e Menezes Direito. Ausentes, justificadamente, o Minis-tro Carlos Britto e a Ministra Cármen Lúcia. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner de Castro Mathias Neto.

Brasília, 6 de novembro de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 203952

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.104 — DF

Relatora: A Sra. Ministra Cármen Lúcia

Requerente: Associação Nacional dos Membros do Ministério Público – CONAMP — Requerido: Congresso Nacional — Interessados: Sindicato Nacio-nal dos Docentes das Instituições de Ensino Superior – ANDES, Federação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social – FENAFISP, Federação Nacional dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do Ministério Público da União – FENAJUFE, Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do Ministério Público da União no Distrito Federal – SINDJUS/DF e Sindicato Na-cional dos Auditores Fiscais da Receita Federal – UNAFISCO

Constitucional. Previdenciário. Art. 2º e expressão “8º” do art. 10, ambos da Emenda Constitucional 41/03. Aposentadoria. Tempus regit actum. Regime jurídico. Direito adquirido: não-ocorrência.

1. A aposentadoria é direito constitucional que se adquire e se introduz no patrimônio jurídico do interessado no momento de sua formalização pela entidade competente.

2. Em questões previdenciárias, aplicam-se as normas vi-gentes ao tempo da reunião dos requisitos de passagem para a inatividade.

3. Somente os servidores públicos que preenchiam os requi-sitos estabelecidos na Emenda Constitucional 20/98, durante a vi-gência das normas por ela fixadas, poderiam reclamar a aplicação das normas nela contida, com fundamento no art. 3º da Emenda Constitucional 41/03.

4. Os servidores públicos que não tinham completado os requisitos para a aposentadoria quando do advento das novas normas constitucionais passaram a ser regidos pelo regime pre-videnciário estatuído na Emenda Constitucional 41/03, posterior-mente alterada pela Emenda Constitucional 47/05.

5. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência da Ministra Ellen Gracie, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria, julgar improcedente a ação direta, vencidos os Ministros Carlos Britto, Marco Aurélio e Celso de Mello. Votou a Presidente. Ausente, justificadamente, o Mi-nistro Eros Grau.

Brasília, 26 de setembro de 2007 — Cármen Lúcia, Relatora.

R.T.J. — 203 953

RELATÓRIO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia: 1. Ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, ajuizada pela Associação Nacional dos Mem-bros do Ministério Público (CONAMP), em 31-12-03, em face do art. 2º e da expressão “8º” do art. 10, ambos da Emenda Constitucional 41/03, que dispõem:

Art. 2º Observado o disposto no art. 4º da Emenda Constitucional 20, de 15 de dezem-bro de 1998, é assegurado o direito de opção pela aposentadoria voluntária com proventos calculados de acordo com o art. 40, §§ 3º e 17, da Constituição Federal, àquele que tenha ingressado regularmente em cargo efetivo na Administração Pública direta, autárquica e fundacional, até a data de publicação daquela Emenda, quando o servidor, cumulativamente:

I - tiver cinqüenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de idade, se mulher;

II - tiver cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria;III - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:a) trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; eb) um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que,

na data de publicação daquela Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea a deste inciso.

§ 1º O servidor de que trata este artigo que cumprir as exigências para aposentadoria na forma do caput terá os seus proventos de inatividade reduzidos para cada ano antecipado em relação aos limites de idade estabelecidos pelo art. 40, § 1º, III, a, e § 5º da Constituição Federal, na seguinte proporção:

I - três inteiros e cinco décimos por cento, para aquele que completar as exigências para aposentadoria na forma do caput até 31 de dezembro de 2005;

II - cinco por cento, para aquele que completar as exigências para aposentadoria na forma do caput a partir de 1º de janeiro de 2006.

§ 2º Aplica-se ao magistrado e ao membro do Ministério Público e de Tribunal de Contas o disposto neste artigo.

§ 3º Na aplicação do disposto no § 2º deste artigo, o magistrado ou o membro do Mi-nistério Público ou de Tribunal de Contas, se homem, terá o tempo de serviço exercido até a data de publicação da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, contado com acréscimo de dezessete por cento, observado o disposto no § 1º deste artigo.

§ 4º O professor, servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que, até a data de publicação da Emenda Constitucio-nal nº 20, de 15 de dezembro de 1998, tenha ingressado, regularmente, em cargo efetivo de magistério e que opte por aposentar-se na forma do disposto no caput, terá o tempo de serviço exercido até a publicação daquela Emenda contado com o acréscimo de dezessete por cento, se homem, e de vinte por cento, se mulher, desde que se aposente, exclusivamente, com tempo de efetivo exercício nas funções de magistério, observado o disposto no § 1º.

§ 5º O servidor de que trata este artigo, que tenha completado as exigências para aposentadoria voluntária estabelecidas no caput, e que opte por permanecer em atividade, fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no art. 40, § 1º, II, da Constituição Federal.

§ 6º Às aposentadorias concedidas de acordo com este artigo aplica-se o disposto no art. 40, § 8º, da Constituição Federal.

(…)Art. 10. Revogam-se o inciso IX do § 3º do art. 142 da Constituição Federal, bem como

os arts. 8º e 10 da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998.

2. Assevera a Autora que “o art. 8º da Emenda Constitucional 20, de 1998, não estabelece regime jurídico objetivo aplicável a todos os servidores públicos,

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mas sim assegura direito subjetivo já incorporado ao patrimônio jurídico de deter-minada classe de servidores públicos, [razão pela qual seria] forçosa a conclusão de que o art. 2º da Emenda Constitucional 41, de 2003, não poderia, como fez, retroagir (...) e prejudicar ocupantes de cargos efetivos até 16 de dezembro de 1998” (fls. 7-8).

Defende, ainda, que “o art. 2º da Emenda Constitucional n. 41, de 2003, des-respeitou a garantia individual do direito adquirido, estabelecida no inciso XXXVI do art. 5º da Constituição, e, conseqüentemente, afrontou a cláusula pétrea inscrita no inciso IV do § 4º do art. 60 da Constituição” (fl. 8).

Requer, por isso, a suspensão liminar das normas impugnadas e pede, no mérito, a declaração de inconstitucionalidade do art. 2º da Emenda Constitucional 41/03.

3. Em 5-1-04, o então Relator, Ministro Maurício Corrêa, adotou o rito do art. 12 da Lei 9.868/99.

4. Em 22-1-04, em suas informações, o Senado Federal sustentou que a pre-sente ação “não comporta conhecimento, mas se conhecida, [deveria] de ser jul-gada improcedente” (fl. 215), em razão: a) da ilegitimidade ativa ad causam da Autora; b) da falta de interesse de agir; c) da impossibilidade jurídica do pedido diante da inexistência de afronta a direito adquirido pelos servidores públicos; e d) de “o art. 8º da Emenda Constitucional 20/98 nunca [ter criado] direito subje-tivo para os servidores que à data de sua publicação não cumprissem os requisitos nele expressos, mas apenas mera expectativa de direito. Portanto, nada impede que esse artigo seja hoje modificado” (fl. 214).

5. O Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República manifes-taram-se pela improcedência do pedido.

6. Em 27-2-04, sobreveio pedido de emenda à inicial, formulado pela Autora para fazer constar “no pedido final a declaração de inconstitucionalidade da expres-são ‘8º’, do artigo 10, da Emenda Constitucional n. 41/03” (fl. 303). O aditamento foi deferido pela Ministra Ellen Gracie, então Relatora desta ação.

7. Em 24-9-04, o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior – Andes – Sindicato Nacional (fls. 305-328) foi admitido como amicus curiae, reiterando, então, o pedido da Autora e pleiteando, ainda, a declaração de inconstitucionalidade da norma contida no art. 2º da Emenda Constitucional 41/03.

8. Em 17-2-06, o Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do Ministério Público da União do Distrito Federal – Sindjus/DF (fls. 383-411), a Federação Nacional dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do Ministério Pú-blico da União – Fenajufe (fls. 439-467) e o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (fls. 496-524) foram admitidos como amici curiae no feito (fl. 381).

9. Em 27-6-06, determinei a juntada de petição protocolizada em 8 de agos-to de 2005 (fl. 592), na qual constam informações sobre a existência da Instrução

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Normativa da Secretaria de Estado da Administração e do Patrimônio 5, de 28 de abril de 1999, relativa a direito adquirido (fls. 578-591).

10. Em 29-6-06, vieram-me os autos conclusos.

é o relatório, do qual deverão ser encaminhadas cópias aos eminentes Mi-nistros do Supremo Tribunal Federal (art. 9º da Lei 9.868/99 c/c art. 87, inciso I, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal).

VOTO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): 1. Questiona-se, na presente ação direta de inconstitucionalidade, a validade constitucional do art. 2º e da expressão “8º” do art. 10 da Emenda Constitucional 41/03.

Da legitimidade ativa da Autora

2. A legitimidade ativa ad causam da Autora para ajuizar ação direta de inconstitucionalidade contra normas afetas aos interesses de seus representados, nos limites previstos em seu Estatuto, está devidamente demonstrada, tal como se deu nos autos da ADI 2.874/GO, Relator o Ministro Marco Aurélio; da ADI 3.472-MC/DF, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence; da ADI 3.105/DF, Re-lator o Ministro Cezar Peluso; da ADI 2.797/DF, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence; e da ADI 2.794/DF, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence.

Rejeito, portanto, a preliminar sobre o item argüida pelo Senado Federal, em suas informações.

No mérito

3. A despeito de toda a argumentação expendida pela Autora, não há de se falar em inconstitucionalidade nas normas impugnadas.

4. A questão objeto da presente ação não é nova no Supremo Tribunal Federal, que tem consolidada jurisprudência sobre a inexistência de direito ad-quirido a regime jurídico previdenciário.

Na sessão plenária de 18-8-04, por ocasião do julgamento conjunto das ADI 3.105 e 3.128, ambas de relatoria da Ministra Ellen Gracie, o Supremo Tri-bunal Federal decidiu que:

Ementas: 1. Inconstitucionalidade. Seguridade social. Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária. Ofensa a direito adquirido no ato de aposentadoria. Não-ocorrência. Contribuição social. Exigência patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade tributária absoluta. Emenda Constitucional 41/03 (art. 4º, caput). Regra não retroativa. Incidência sobre fatos geradores ocorridos depois do início de sua vigência. Precedentes da Corte. Inteligência dos arts. 5º, XXXVI; 146, III; 149; 150, I e III; 194; e 195, caput, II e § 6º, da CF e art. 4º, caput, da EC 41/03. No ordenamento jurídico vigente, não há norma, expressa nem sistemática, que atribua à condição jurídico-subjetiva da aposentadoria de servidor público o efeito de lhe gerar direito subjetivo como poder de subtrair ad aeternum a percepção dos respectivos proventos e pensões à incidência de lei tributária que, anterior ou ulterior, os submeta à incidência de

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contribuição previdencial. Noutras palavras, não há, em nosso ordenamento, nenhuma norma jurídica válida que, como efeito específico do fato jurídico da aposentadoria, lhe imunize os proventos e as pensões, de modo absoluto, à tributação de ordem constitucional, qualquer que seja a modalidade do tributo eleito, donde não haver, a respeito, direito adquirido com o aposentamento. (...)(DJ de 18-2-05, grifos nossos.)

5. A aposentadoria constitui-se em direito constitucional que se adquire e que se introduz no patrimônio jurídico do interessado no momento de sua formalização pela entidade competente.

Incide sobre ela o direito vigente no momento de seu reconhecimento for-mal, pelo que lei posterior não pode alterá-la, em face do aperfeiçoamento do ato jurídico, resguardado constitucionalmente em sua configuração e em seus efeitos (art. 5º, inciso XXXV).

Como consignei em outra oportunidade, “o direito constitucional funda-mental à aposentadoria configura-se para o beneficiário no momento em que lhe é, formal e publicamente, reconhecido o seu direito, tendo ele cumprido todos os requisitos constitucionais e infraconstitucionais para o seu exercício na forma da legislação vigente.” (Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 438.)

6. Na espécie em pauta, a Autora insiste em que a Emenda Constitucional 20/98 teria estabelecido direitos subjetivos previdenciários que passariam a compor o patrimônio jurídico de seus representados, ainda que não estivessem eles aposentados, quer dizer, ainda que não tivessem titularizado o direito, nem aperfeiçoado o ato pelo qual se aposentassem.

A assertiva da Autora de que o “direito subjetivo, garantido constitucio-nalmente aos servidores, detentores de cargo efetivo que ingressaram no serviço público até 16 de dezembro de 1998, [se teria incorporado] ao patrimônio jurídi-co deles, de modo definitivo, como direito adquirido” (fl. 7) não pode prosperar.

7. Com o advento da Emenda Constitucional 20/98, o sistema de previdên-cia social foi modificado, instituindo-se novo regime jurídico de aposentação para os servidores públicos, e, ao seu lado, normas de transição foram estabele-cidas para regular as situações específicas daqueles servidores que, na data da publicação daquela emenda constitucional, 16-12-98, já tivessem cumprido os requisitos exigidos para a obtenção dos benefícios com base nos critérios pre-vistos na legislação antes vigente (art. 3º – “é assegurada a concessão de aposen-tadoria e pensão, a qualquer tempo, aos servidores públicos e aos segurados do regime geral de previdência social, bem como aos seus dependentes, que, até a data da publicação desta Emenda, tenham cumprido os requisitos para a obtenção destes benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente.”)

Os servidores públicos que não preencheram tais critérios passaram a ter a sua condição submetida ao novo regime previdenciário, sem terem adquirido direito à manutenção do anterior, o que somente ocorreria no momento da implementação dos requisitos exigidos e segundo o regime vigente no exato momento em que se

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aperfeiçoasse a aposentação. Isso porque, em questões previdenciárias, aplicam-se as normas vigentes ao tempo da reunião dos requisitos de passagem para a inativi-dade, conforme reiterada jurisprudência desta Casa.

8. O art. 8º da Emenda Constitucional 20/98, como ponderado pelo ilustre Vice-Procurador-Geral da República, em seu parecer, “limitou-se a fixar regras de transição de regime jurídico, (pelo que) a situação dos seus destinatários perma-neceu a de titulares de expectativa de direito. Como ensinava Pontes de Miran-da, ‘as expectativas são, certamente, expectativas de direito: não são direitos. (...) Quando falo de expectativa (pura) estou necessariamente aludindo à posição de alguém em que se perfizeram elementos do suporte fáctico, de que sairá fato jurídico, produtor de direito e outros efeitos, porém ainda não todos os elemen-tos do suporte fáctico: a regra jurídica, a cuja incidência corresponderia o fato jurídico, ainda não incidiu, porque suporte fáctico ainda não há’.” (Fl. 299, grifos no original.)

Assim, somente os servidores públicos que preenchiam os requisitos esta-belecidos na Emenda Constitucional 20/98, durante a vigência das normas por ela fixadas, poderiam reclamar a aplicação das normas nela contida, com fundamento no art. 3º da Emenda Constitucional 41/03.

Este, à sua vez, resguardou os direitos na forma seguinte:

Art. 3º é assegurada a concessão, a qualquer tempo, de aposentadoria aos servidores pú-blicos, bem como pensão aos seus dependentes, que, até a data de publicação desta Emenda, tenham cumprido todos os requisitos para obtenção desses benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente.

§ 1º O servidor de que trata este artigo que opte por permanecer em atividade tendo completado as exigências para aposentadoria voluntária e que conte com, no mínimo, vinte e cinco anos de contribuição, se mulher, ou trinta anos de contribuição, se homem, fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no art. 40, § 1º, II, da Constituição Federal.

§ 2º Os proventos da aposentadoria a ser concedida aos servidores públicos referidos no caput, em termos integrais ou proporcionais ao tempo de contribuição já exercido até a data de publicação desta Emenda, bem como as pensões de seus dependentes, serão calculados de acor-do com a legislação em vigor à época em que foram atendidos os requisitos nela estabelecidos para a concessão desses benefícios ou nas condições da legislação vigente.

Todos os demais, que não se enquadraram na situação prevista, haveriam de se submeter aos novos parâmetros ditados pela alteração constitucional sub-seqüente.

9. Sobre a aplicação da lei previdenciária no tempo, inúmeros precedentes deste Supremo Tribunal sedimentaram o entendimento quanto à validade da aplicação do princípio tempus regit actum nas relações previdenciárias. São exemplos disso:

Ementa: Constitucional. Previdenciário. Aposentadoria: proventos: direito adquirido. I - Proventos de aposentadoria: direito aos proventos na forma da lei vigente ao tempo da reunião dos requisitos da inatividade, mesmo se requerida após a lei menos favorável. Súmula 359/STF: desnecessidade do requerimento. Aplicabilidade à aposentadoria previdenciária. Precedentes do STF. II - Agravo não provido.(RE 269.407-AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ de 2-8-02.)

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Ementa: Aposentadoria previdenciária. Direito adquirido. Súmula 359. - Esta Primeira Turma (assim, nos RE 243.415, 266.927, 231.167 e 258.298) firmou o entendimento que assim é resumido na ementa do acórdão do primeiro desses recursos: “Aposentadoria: proven-tos: direito adquirido aos proventos conforme à lei regente ao tempo da reunião dos requisitos da inatividade, ainda quando só requerida após a lei menos favorável (Súmula 359, revista): aplicabilidade a fortiori à aposentadoria previdenciária.” - Dessa orientação divergiu o acór-dão recorrido. Recurso extraordinário conhecido e provido nos termos do voto do Relator.(RE 258.570, Rel. Min. Moreira Alves, Primeira Turma, DJ de 19-4-02.)

E, ainda,

Ementa: Servidor público: aposentadoria: proventos: direito adquirido aos proventos conformes à lei regente ao tempo da reunião dos requisitos da inatividade, ainda quando só requerida na vigência da lei posterior menos favorável (Súmula 359, revista).(RE 382.631-AgR/RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ de 11-11-05.)

No mesmo sentido: AI 621.196/SE, Rel. Min. Gilmar Mendes, decisão mo-nocrática, DJ de 30-4-07; RE 473.394-AgR/CE, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ de 7-12-06; RE 432.192-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ de 12-5-06; RE 301.159-AgR/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ de 6-8-04; RE 262.496/RS, Rel. Min. Moreira Alves, Primeira Turma, DJ de 14-12-01; RE 266.927/RS, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ de 10-11-00; RE 243.415/RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ de 11-2-00; RE 231.167/RS, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ de 3-3-00; RE 258.298/RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ de 17-3-00; RE 231.167-ED/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, DJ de 20-10-00.

10. Acompanhando o que acima exposto, pode-se afirmar que os servidores públicos que tiverem preenchido os requisitos previstos na Emenda Constitu-cional 20/98, antes do advento da Emenda Constitucional 41/03, adquiriram o direito a aposentar-se segundo as normas previstas naquela emenda, tal como reconhecido no art. 3º da Emenda Constitucional 41/03.

Isso porque só se adquire o direito quando o seu titular preenche todas as exigências previstas no ordenamento jurídico vigente, de forma a habilitá-lo ao seu exercício.

Se, ao tempo de aplicação das normas de transição da previsão normativa constitucional, o interessado não tinha cumprido a condição exigida, por óbvio não há cogitar em aquisição do direito, como pretendido.

é o que assevera Luis Roberto Barroso, em parecer juntado aos autos pela União (fls. 236-285):

a) Expectativa de direito: o fato aquisitivo teve início, mas não se completou; b) Direito adquirido: o fato aquisitivo já se completou, mas o efetivo previsto na norma

ainda não se produziu;c) Direito consumado: o fato aquisitivo já se completou e o efeito previsto na norma já

se produziu integralmente.

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11. Pretende a Autora, secundada pelos nobres amici curiae, contrariamente ao entendimento pacificado neste Supremo Tribunal Federal, mantenha-se a apli-cação das normas previstas na Emenda Constitucional 20/98, parcialmente revo-gada pela Emenda Constitucional 41/03, aos servidores que, durante a vigência daquela, não tinham ainda cumprido os requisitos exigidos para a aposentadoria.

As normas previstas na Emenda Constitucional 20/98 configurariam uma possibilidade de virem os servidores a ter direito, se ainda não tinham preenchido os requisitos nela exigidos antes do advento da Emenda Constitucional 41/03.

Os servidores públicos – que não tinham completado os requisitos para a aposentadoria quando do advento das novas normas constitucionais – passaram a ser regidos pelo regime previdenciário estatuído na Emenda Constitucional 41/03, posteriormente alterada pela Emenda Constitucional 47/05.

12. Não me parece haja, por isso mesmo, inconstitucionalidade no art. 2º, tampouco na expressão “8º” do art. 10 da Emenda Constitucional 41/03. Não há, no caso em apreciação, direito que possa mostrar-se como adquirido antes de se cumprirem os requisitos imprescindíveis à aposentadoria, cujo regime constitucio-nal pode vir a ser alterado, na forma reconhecida pelos precedentes deste Supremo Tribunal, que adoto em observância à pacífica jurisprudência assentada.

Ademais, as normas que cuidam das situações transitórias dos servidores públicos vigoram para aqueles que se inserem nas situações nelas descritas, sendo regras de exceção, as quais impõem interpretação e aplicação restritivas, na forma da melhor doutrina e assentada jurisprudência.

Não há óbice, nem vislumbro desobediência do constituinte reformador ao alterar os critérios que ensejam o direito à aposentadoria por meio de nova elabo-ração constitucional ou de fazê-las aplicar àqueles que ainda não atenderam aos requisitos firmados pela norma constitucional. Os critérios e requisitos para a aqui-sição do direito à aposentadoria não se petrificam para os que, estando no serviço público a cumprir, no curso de suas atribuições, os critérios de tempo, contribuição, exercício das atividades, dentre outros, ainda não os tenham aperfeiçoado, de modo a que não pudesse haver mudança alguma nas regras jurídicas para os que ainda não titularizam o direito à sua aposentadoria.

Diferente é o direito genérico à aposentadoria, como um dos direitos so-ciais, e o direito à sua aposentadoria, esse aperfeiçoado quando completados todos os itens legalmente estatuídos para fazer nascer o direito e a capacidade de exercê-lo a partir daí.

13. Pelo exposto, voto no sentido de julgar improcedente a presente ação direta de inconstitucionalidade.

VOTO(Aditamento)

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): Senhora Presidente, Srs. Ministros, registro apenas, em atenção ao que foi dito da tribuna pelos nobres advogados, quanto ao princípio da proibição do retrocesso social, que este seria o caso se

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houvesse negativa no sistema constitucional brasileiro de ser extinta a possibili-dade de aposentadoria, já que a aposentadoria é um direito social que o constitu-cionalismo contemporâneo abriga, o que não aconteceu neste caso. Aqui aconte-ceu uma adaptação dos critérios de transição para o novo modelo previdenciário que se veio a estabelecer.

Também registro, ao que foi alertado inicialmente pelo Dr. Pedro Maurício, de que não estaríamos a tratar de caso análogo àquele tratado por este Supremo Tribunal Federal, na ADI 3.105, relativamente ao pedido de declaração de in-constitucionalidade por afronta ao § 4º do art. 60, mas uma questão de justiça, que a análise jurídica que se põe neste caso é rigorosamente da validade jurídica ou não, cotejando-se a norma emendada com aquilo que foi previsto na Constitui-ção da República.

Lamentavelmente, ainda que como cidadã pudesse ter qualquer outro en-tendimento, uma questão de justiça em face da norma constitucional não permite que eu subjetive o meu entendimento.

Por tudo isso, Senhora Presidente, Srs. Ministros, encaminho a votação no sentido de julgar improcedente a presente ação direta de inconstitucionalidade.

VOTO

O Sr. Ministro Menezes Direito: Senhora Presidente, como disse a eminen-te Ministra Relatora, a questão é eminentemente técnica.

Verifico que esta Corte, já em outras oportunidades, examinou essa maté-ria, por essa razão vou resumir o meu voto em três observações.

A primeira, no sentido de entender que a observação feita pela Advocacia-Geral da União, no que concerne ao art. 60, § 4º, inciso IV, da Constituição Federal, ou seja, no sentido de que a inconstitucionalidade com relação ao direito adquirido exigiria uma reforma do próprio art. 5º, não se levando em considera-ção a substância do próprio Direito, não pode ser aceita pela Corte, porque isso inviabilizaria todo o mecanismo de proteção dos direitos individuais, a teor da disciplina do próprio art. 5º da Constituição Federal.

A segunda observação diz com as belíssimas sustentações feitas da tribuna, no sentido de que ninguém discute mais hoje que o regime previdenciário tem na-tureza contributiva e solidária e, ao mesmo tempo, que deve levar em conta o equi-líbrio financeiro e atuarial. Daí, endogenamente, pela própria regra, a possibilidade de alteração desse regime para que ele tenha a natureza contributiva e solidária e, ao mesmo tempo, leve em consideração o equilíbrio financeiro e atuarial, que lhe dá viabilidade.

Terceira observação e última, Senhora Presidente, Srs. Ministros, é que, a levar-se em consideração a impossibilidade de alteração no regime de transição, nós estaríamos de fato a reconhecer que o regime de transição é, ele próprio, um direito adquirido. Isso, a meu sentir, seria, no plano jurídico, uma verdadeira con-tradição, porque o direito adquirido está vinculado diretamente ao preenchimento do suporte fático que autoriza o evento aposentadoria, e não ao regime que leva

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à aposentadoria. Estamos diante de uma transição que, como disse a eminente Relatora e o parecer da douta Procuradoria-Geral da República sublinhou, está subordinada ao critério da expectativa de direito, e esta expectativa de direito não gera, ela própria, um direito adquirido. Veja-se que não se cuida aqui de pensão, mas, sim, de transição para a própria aposentadoria.

Por essas razões, Senhora Presidente, louvando as intervenções dos amici curiae, acompanho o voto da eminente Relatora e julgo improcedente a ação direta de inconstitucionalidade.

VOTO

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Senhora Presidente, também acom-panho o voto da eminente Relatora e rapidissimamente declino três argumentos nesse sentido.

Em primeiro lugar, para dizer que o Supremo Tribunal Federal tem assen-tado reiteradamente que não há direito adquirido a regime remuneratório em se tra-tando de servidores que mantêm com a administração pública vínculo estatutário.

Em segundo lugar, ainda que assim não fosse, o art. 8º da Emenda Constitu-cional 20, como foi assentado, aqui, não só pela eminente Relatora, mas também pelo douto Ministro Carlos Alberto Direito e ainda pelo Advogado-Geral da União, simplesmente estabeleceu regras de transição para os servidores que ain-da não haviam logrado implementar o tempo necessário para a sua aposentadoria.

Em terceiro lugar, assento que muitos deles foram colhidos pela superveni-ência da Emenda Constitucional 41, que, em seu art. 2º, alterou novamente essas regras de transição no momento em que servidores tinham mera expectativa de direito, e não direito adquirido como se pretende, enfim, consignar, afirmar da tribuna.

Portanto, Senhora Presidente, como explicitado em meu voto, acompanho integralmente o voto da eminente Relatora.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhora Presidente, tenho posição conhecida. Vou tentar fazer uma síntese.

Estamos diante de uma relação jurídica extremamente complexa em que várias categorias mentais de direito constitucional, lógico, se imbricam, se en-trelaçam. Não é simplesmente uma relação jurídica do tipo estatutário, pura e simplesmente. é, ao mesmo tempo, a relação jurídica estatutária, tributária, para quem enxerga na contribuição previdenciária um ortodoxo tributo, e previdenciária ou securitária, porque o fato é que, quando a Constituição cuida de previdência social, já não se refere à contribuição senão num contexto de filiados ao sistema e segurados do sistema. A relação securitária me parece ressair desse contexto constitucional a conferir à própria relação estatutária, por paradoxal que pareça, um traço de contratualidade. Não que a relação estatutária seja contratual, mas,

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em termos de contribuição – vamos chamar – securitária, há um traço de contra-tualidade, porque, para gozar desse benefício securitário, o servidor desembolsa, financia sua futura aposentadoria e a futura pensão dos seus dependentes.

Da tribuna, foi anotado que, no meu voto anterior, ressaltei que não há um só direito subjetivo de servidor público que demande, da parte dele, autocusteio, autofinanciamento. Férias, 13º salário, repouso semanal remunerado, aquele terço ferial, para cujo gozo o servidor não desembolsa absolutamente nada, porém não é o caso da sua própria aposentadoria. Ele contribui, paga, financia, custeia a sua aposentadoria. Parece-me que não é da lógica do sistema colocar à disposição da entidade mantenedora do sistema todo o futuro, toda a situação jurídica do servidor público estatutário. Ele não fica inteiramente à mercê dos humores le-gislativos do Estado. Por isso, venho acentuando o caráter heterodoxo da própria exação, da própria contribuição previdenciária, a ponto de me permitir afirmar, na última assentada, que, também por incrível que pareça, quem é contribuinte de contribuição previdenciária não é contribuinte no sentido fiscal, no sentido tributário: é segurado. O segurado é que contribui previdenciariamente e até previdentemente, porque a contribuição previdenciária implica uma previdência daquele que almeja os benefícios da aposentadoria para si mesmo e a pensão para os seus dependentes.

Enquanto a Ministra Cármen Lúcia fazia o seu magnífico voto, na linha, aliás, das brilhantes sustentações que se fizeram aqui da tribuna, eu me lembrava de uma observação do Ministro Celso de Mello, numa vertente doutrinária também muito seguida pelo professor Sérgio Monte Alegre, um administrativista, para mim, de primeira grandeza. O Ministro Celso de Mello, sempre que pode, lembra o caráter substantivo do devido processo legal – de matriz constitucional para incorporar os postulados da proporcionalidade e da razoabilidade. Logo, comuni-cando à razoabilidade e à proporcionalidade o caráter pétreo do inciso IV do § 4º do art. 60 da CF. é dizer, essa petrealidade se estende à dimensão substantiva do devido processo legal. De sorte que não me parece nem razoável nem proporcio-nal admitir que servidores públicos ingressem, por concurso público, no serviço público, debaixo de certas regras assecuratórias de uma dada aposentadoria ou pensão, e tudo isso fique inteiramente à disposição da entidade mantenedora do sistema de previdência. Ainda que, faltando quatro, cinco ou um mês para a aposentadoria, o servidor pode ser colhido por uma nova regra, agravando extre-mamente a sua situação e aumentando o tempo de contribuição, com certo caráter arbitrário, além do tempo de idade para a respectiva aposentação.

Como diria o poeta português José Régio:

Não sei por onde vou, (...)Sei que não vou por aí!

Não me parece lógico, até porque um dos sentidos das cláusulas pétreas é impedir o retrocesso. é garantir o avanço. Esse o significado último de uma cláu-sula pétrea. A nova Constituição traz uma conquista política, social, econômica e fraternal, de que natureza for, e a petrealidade passa a operar como uma garantia do avanço, então obtido. Uma interdição ao retrocesso.

R.T.J. — 203 963

Mas não é o caso de postular aqui interpretação conforme, não é isso. Ape-nas quero mostrar como juristas de forte compleição intelectual, da elevada esta-tura científica de um Celso Antônio Bandeira de Mello, também não aceitam esse tipo de precariedade extrema do servidor, que às vésperas de obter um benefício se vê numa situação extremamente agravada a partir, muitas vezes, de uma polí-tica previdenciária açodada, equivocada, como se não estivéssemos diante de um instituto que a própria Constituição categoriza como um benefício. Não malefício.

é a síntese que tentei fazer para pedir vênia à eminente Relatora e julgar procedente a ação direta de inconstitucionalidade.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Senhora Presidente, eu faria duas apreciações sobre a matéria, das quais a primeira é do ponto de vista metajurídico. E, perante ela, reconheço preocupante a situação dos servidores públicos, que, por força do advento dessa emenda e de outras, se vêem submetidos a um tratamento jurídico-constitucional da aposentadoria menos benéfico. é coisa que integra e, de certo modo, reproduz ou perpetua a chamada crise da previdência, fruto de vários fa-tores, entre os quais se podem apontar a má administração da previdência, certa negligência ou desleixo em relação à sonegação e à corrupção dentro dos órgãos destinados à arrecadação das contribuições, soluções precárias e, até, propostas demagógicas e cujo conjunto evidentemente impede que se dê solução definitiva ou pelo menos aceitável a essa crise que se vai tornando eterna e a cada período, por mudança de governo e de ventos políticos, acaba recebendo respostas precá-rias às demandas do tempo.

Provavelmente, esse aspecto preocupante da situação dos servidores, perante a labilidade dessas propostas, é que justifica, a meu ver, com o devido respeito, que esta Corte ainda reserve ao tratamento deste tema considerações que, do ponto de vista – e essa é a segunda apreciação que faço – jurídico, sequer se justificam perante a simplicidade como as coisas devem resolver-se no quadro jurídico-nor-mativo. Do ponto de vista jurídico, cujos termos dão a solução à causa, a questão é muito simples: a Corte tem-se defrontado – e cada vez mais me vejo a braços com essas posturas – freqüentemente e em especial, em matéria que diz respeito a servidores públicos, com conceitos de direito adquirido que são produtos de opi-niões personalíssimas sem nenhum compromisso com o ordenamento jurídico. São opiniões. Isto é, a pessoa tem certa idéia de direito adquirido e sustenta que o caso é de direito adquirido e, como tal, não pode ser afrontado.

Ora, a idéia e o conceito de direito subjetivo não podem ser senão os que resultem do ordenamento jurídico. No quadro do ordenamento jurídico, o que é um direito adquirido? Até peço escusa à Corte para recordar coisas tão elemen-tares da teoria geral do direito. é nada mais nada menos que o produto de uma norma jurídica em cujo enunciado lingüístico – como toda norma tem duas cláu-sulas –, da segunda cláusula, aparece como efeito jurídico do preenchimento ou da realização histórica de todos os elementos previstos na primeira cláusula. Em outras palavras, toda norma jurídica se expressa mediante enunciado lingüístico

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que tem, na primeira cláusula, a descrição hipotética de uma situação composta por vários elementos, cuja realização leva à previsão do objeto da segunda cláusula como efeito jurídico. Para que surja um direito subjetivo, é preciso que se tome em consideração a norma jurídica que concerne ao direito considerado e que se veri-fiquem quais são os elementos ou dados típicos que constam da primeira cláusula da norma. Isto é, para que surja o direito subjetivo “x”, e a partir do direito sub-jetivo é que se pode encontrar qual é a sua fattispecie ou qual é o seu suporte fá-tico, e que se verifique, no suporte fático da norma, o que precisa acontecer para que surja o efeito jurídico a título de direito subjetivo. é preciso que aconteçam a+b+c+d, até “n”. Quando todos esses elementos se reúnem historicamente, isto é, se realizam no mundo dos fatos, diz-se que o efeito jurídico do direito subjeti-vo aparece no mundo jurídico. Em suma, todo direito subjetivo só é considerado como tal quando todos os dados, todos os elementos da sua fattispecie ou do seu suporte fático normativo se realizam simultaneamente, sem que nenhum falte.

Aliás, o parecer da douta Procuradoria é muito claro nesse sentido, quando se reporta a Pontes de Miranda, demonstrando que, para haver direito subjetivo, é preciso que todos os elementos hipotéticos da norma se realizem simultaneamen-te, que coexistam, portanto. Quando alguns desses elementos estejam presentes no mundo dos fatos, mas falte um ou alguns, não temos nenhum direito subjetivo, senão mera expectativa de direito, porque há insuficiência do suporte fático. O suporte fático não foi totalmente preenchido, de modo que não há direito subje-tivo.

Ora, o que é direito subjetivo adquirido? é aquele em que, tendo sido reali-zada toda a cadeia dos dados ou elementos factuais prevista no primeiro membro da norma, já pode ser exercido pelo titular. Não é aquele que já foi exercido, por-que, se o foi, é já direito exaurido; direito adquirido é aquele que pode ser exerci-do e pode sê-lo a qualquer tempo, porque entrou no patrimônio jurídico do titular.

Ora, trazendo essas noções básicas da teoria geral do direito para o caso, o que temos? Temos, que, em relação à primeira emenda, foram previstos de-terminados elementos, cujo conjunto, uma vez realizado historicamente, dá a cada um dos servidores um direito subjetivo. Direito subjetivo de quê? De poder aposentar-se a qualquer tempo.

Aqueles que, na data do advento da Emenda Constitucional 41, não haviam ainda completado todos os elementos da fattispecie, não podem invocar nenhum direito subjetivo, porque até então não poderiam exercer direito de aposentado-ria, pois não tinham ainda adquirido direito à aposentadoria. O que fez a emenda? Eminente Relatora, não temos cópia, mas V. Exa. disse que a própria emenda fez ressalva à situação jurídica daqueles que preencheram todos os requisitos cons-titucionais anteriores ao início de sua vigência. Todos aqueles que adquiriram direito até a data do advento da Emenda Constitucional 41 têm direito subjetivo adquirido de se aposentarem nos termos do regime anterior. Os que ainda não os tinham completado e foram alcançados pela Emenda Constitucional 41 tinham mera expectativa, que poderia ser atingida por um regime jurídico novo.

A inobservância dessa distinção extremamente simples leva a alguns parado-xos, o primeiro dos quais é que nenhuma norma jurídica que crie direito subjetivo

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poderia ser modificada, porque sempre se poderia alegar que as pessoas que esta-vam em processo de aquisição de um direito baseado em certa norma vão ser atin-gidas por outra norma. Nenhuma norma jurídica poderia ser modificada, porque as pessoas estariam em processo de aquisição de direito! Nenhuma norma poderia interromper esse processo de aquisição, pois ofenderia direito adquirido. Isso não tem propósito. E não o tem mais, se levado para o caso concreto, onde teríamos a seguinte conclusão: o regime de aposentadoria previsto originariamente pelo constituinte jamais poderia ser modificado, porque, sempre que se modificasse, teríamos a objeção de que houve violação de direito adquirido, ainda que nenhum dos servidores atingidos tivesse adquirido coisa nenhuma em termos jurídicos.

São as razões por que peço vênia à divergência e acompanho integralmente o voto da Relatora.

VOTO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Senhora Presidente, mais uma vez o Tribu-nal se defronta com essa fascinante questão do controle de constitucionalidade de emenda constitucional.

Como já tive oportunidade de destacar, isso é quase uma singularidade do direito constitucional brasileiro. Toda a doutrina do direito comparado se ocupa com esse tema, todavia são pouquíssimos os casos, nas Cortes constitucionais, de verificação e, sobretudo, de declaração de inconstitucionalidade de emenda constitucional.

Já temos aqui um elenco que compõe a crônica do direito comparado. São inúmeros os casos a partir daquele célebre caso do antigo IPMF, agora CPMF.

Antes mesmo desse debate, Senhora Presidente, já havia impugnações de emenda constitucional. A própria emenda constitucional que tratou do prazo para a revisão constitucional foi objeto de impugnação com argumento segundo o qual se tratava de uma cláusula transitória e, como tal, seria imutável. Ali, talvez, os argüentes tomaram a nuvem por Juno; na verdade, imaginaram uma cláusula transitória já totalmente concretizada ou aplicada. Neste caso, de fato, teríamos uma situação totalmente consolidada, imutável, portanto. Mas a doutrina, quando registra a imutabilidade das cláusulas transitórias, tem em vista exatamente essas situações já totalmente verificadas ou concretizadas.

Aqui, porém, a situação é outra, conforme demonstrou a eminente Ministra Relatora, porque se tratava de uma cláusula de transição, que agora sofreu mu-dança e para aplicação ex nunc, ou pro futuro. Não se trata de fazer repercutir a decisão sobre situações concretas já verificadas, até porque, aí, sim, discutiríamos direito adquirido.

Então, parece-me que sob essa perspectiva não há invocar direito adquirido, segundo a velha doutrina do Supremo Tribunal Federal, materializada inclusive em súmula, como aquela que tratava de resgate, ou a possibilidade de resgate da enfiteuse.

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Assim, não há que falar sobre esse tema. Isso, na verdade, tem um grande desenvolvimento na literatura: as referências de Gabba, Robier, anti-Savigny, sobre, especialmente, essas situações em trânsito. Savigny tem uma passagem histórica no tratado de direito romano sobre a abolição da escravatura. Então, dizia que esse tema não integrava o conceito jurídico, mas, na época, se dizia o conceito de política legislativa.

Eu, todavia, Senhora Presidente, como já fiz na outra assentada quando julgamos o caso da previdência social, a questão da contribuição dos inativos, gostaria de dizer que já não consigo subscrever em toda integralidade esse distinguishing que se faz ou essa formulação apodítica entre direito adquirido e expectativa de direito, como se isso fosse um abre-te-sésamo, que resolvesse todas as questões.

Já não consigo subscrever no direito brasileiro, e há boas achegas no direito comparado para se fazer uma reflexão sobre esse assunto. Imaginemos – não foi o caso aqui desta emenda, porque sabemos que a Emenda 41 alterou apenas o mo-delo de cálculo dos proventos, mas poderia ter alterado, por exemplo, os critérios de idade; poderia ter tornado esse prazo mais alongado, com surpresas várias para os eventuais atingidos. E isso poderia transformar-se, inclusive, numa corrida de obstáculo com obstáculo móvel.

é preciso que meditemos sobre isso. Será que não há remédio na farmaco-péia jurídica para esse tipo de discussão? Há, sim. A idéia de segurança jurídica, a idéia de que, neste caso, pode haver fraude ao sistema. Portanto, parece-me que necessitamos cada vez mais de dizer que há alguma pobreza nesse modelo biná-rio: direito adquirido/expectativa de direito. Pode ser, sim, que a própria emenda constitucional ou a própria legislação, no caso de legislação ordinária, porque em geral sói acontecer esse tipo de mudança no plano da legislação ordinária, que a própria legislação ordinária venha a fraudar, a frustrar uma condição que seria implementável desde logo, constituindo uma lei de perfil arbitrário.

Ora, será que não sabemos responder a isso? Claro que sabemos. Temos aqui, no próprio Plenário, consagrado a segurança jurídica como expressão de Estado de direito. Em alguns sistemas jurídicos é muito comum dizer: esta norma é válida, porém ela tem de ter uma cláusula de transição, porque senão ela des-respeita de forma arbitrária situações jurídicas que estavam em fieira, estavam constituindo-se. Claro, vamos precisar de um conceito de razoabilidade ou de pro-porcionalidade.

Por isso, Senhora Presidente, acompanharei a eminente Relatora, porque não vislumbro aqui essa arbitrariedade passível de se verificar, mas me permitiria fazer esses registros porque de fato, em se tratando da chamada não-existência de direito adquirido a um dado regime jurídico, podemos ter abusos notórios. Em re-gime de aposentadoria, é muito fácil imaginar. O indivíduo que esteja a inaugurar a sua vida funcional, se se altera o regime jurídico, pouco se lhe dá. Isso não tem nenhum reflexo em nenhum aspecto do seu patrimônio sequer afetivo.

Outra é a situação para aquele que está em fim de carreira e, eventualmente, esperando cumprir os últimos dias, quando se dá a mudança do regime, eventual-mente, acrescentando dez novos anos.

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Daí ter o Ministro Carlos Britto chamado a atenção para a necessidade quase que imperativa de cláusula de transição.

Aqui no contexto, tivemos uma situação diversa, a própria cláusula de tran-sição já está a sofrer mudança, porque estamos a falar de período muito longo.

De modo, Senhora Presidente, com essas considerações, permitiria fazer o registro da necessidade de começarmos a refletir sobre a insuficiência da teoria do direito adquirido, tal como adotamos, tendo em vista critérios de justiça material.

Até diria que hoje, talvez, devêssemos tratar como categoria geral a segu-rança jurídica. Aí, aparecem as espécies: direito adquirido, ato jurídico perfeito, a coisa julgada e a própria idéia de segurança jurídica em sentido estrito, tal como aqui referido.

Portanto, gostaria de pontuar esses aspectos, porque espero que, amanhã, já não venha uma nova emenda fazendo nova alteração, em se tratando de cláusula de transição, ou que se anime até a mudar outros critérios, consolidando aquilo que chamei aqui de corrida de obstáculo com obstáculo em movimento.

DEBATE

O Sr. Ministro Carlos Britto: Muito boa a metáfora da corrida de obstáculo. A pessoa está prestes a implementar uma condição, as regras são alteradas e com um agravamento sensível para o servidor que se encontrava na iminência da aposenta-doria, ele fica a se perguntar: de que serve o princípio da lealdade ou da proteção da confiança? De que serve o princípio da segurança jurídica?

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Nesse caso, não temos de fugir das teorias ju-rídicas tradicionais sob pretexto de que não respondem aos problemas atuais. Elas respondem. A questão é ter compreensão exata do quadro dessas categorias.

Num dos casos em que o eminente Ministro Gilmar Mendes se referiu a ex-pedientes fraudulentos, a idéia de fraude é própria do sistema, dentro da fisionomia, do perfil das concepções tradicionais, e com ela resolve-se o problema.

Não é este o caso; aliás, S. Exa. reconheceu que não é o caso. E eu jamais chamaria à colação aqui conceitos tradicionais a respeito da figura do direito adqui-rido, enfim, os termos dogmáticos da chamada dinâmica jurídica, para legitimar ou convalidar um expediente fraudulento, por exemplo, do legislador infraconstitucio-nal e, até, do legislador constitucional. Mas, repito, não é o caso.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Mas aqui é uma medida legislativa também in-sólita porque se trata da sucessividade de medidas transicionais. A primeira transi-ção foi ela mesma, que, pela lógica, deveria dotar-se, apesar do nome de fixidez, já foi alterada pela Emenda 41. E o Ministro Gilmar Mendes lembrou muito bem que a categoria da segurança jurídica é um continente de que tudo o mais é conteúdo. As mesmas três estelares figuras do direito adquirido, do ato jurídico e da coisa jul-gada são expressões ou manifestações tópicas, manifestações pontuais, embora as mais eminentes do princípio da segurança, que tudo permeia, tudo involucra. E é preciso mesmo, na provocação do Ministro Gilmar Mendes, de uma teoria.

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O Sr. Ministro Cezar Peluso: Mas não é só o problema de segurança jurídica, o problema, também, é avaliar o custo e a viabilidade econômica de certas pres-tações estatais...

O Sr. Ministro Carlos Britto: é, mas esse é um problema não de previdência, mas de providência. é de gerenciamento do sistema.

O Sr. Ministro Cezar Peluso: ...que podem aniquilar os sistemas e pôr a perder os próprios direitos reconhecidamente adquiridos.

V. Exa. imagine uma situação de caos – não diria estar próxima ou longín-qua, mas concebo hipoteticamente que a ela se possa um dia chegar –, em que fosse decretada a falência prática do sistema previdenciário, a ponto de que o Es-tado já não pudesse responder pela aposentadoria daqueles que, há tanto tempo, dependem dela para sobreviver. Como fazemos?

O Sr. Ministro Menezes Direito: Ministro Cezar Peluso, por essa razão mesma que o caput do art. 40 estabelece o critério de viabilidade, como já anunciei.

Por outro lado, como disse o Ministro Gilmar Mendes, o fato de en-quadrarmos no caso concreto a categoria do direito adquirido não significa que esta Corte – a qual tem avançado em matéria constitucional ao aplicar outros princípios, como o da proporcionalidade e da ponderação – não possa recorrer às mesmas categorias jurídicas tradicionais para enfrentar uma situação que pode significar uma lesão em concreto ao direito dos que se vão aposentar. Contudo, como V. Exa. acabou de indicar na sua intervenção, o caput mesmo do artigo revela a necessidade de ponderarmos a concessão de direitos em relação à capa-cidade do Estado de prestar essa contribuição previdenciária.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Apenas lembro que essa categoria binária – direito adquirido/expectativa de direito – levou o Tribunal, por exemplo, num célebre caso X, a dizer que não haveria direito adquirido à propriedade industrial ou de marcas. Era um caso bastante singelo em que a legislação superveniente estabeleceu a exigência de que mesmo os detentores do direito de marca agora deveriam ter um procurador habilitado a responder as ações no Brasil. A legis-lação estabeleceu essa regra. Tratava-se de uma providência curial para evitar todas as delongas que, na verdade, acabam por ocorrer nos processos relativos à propriedade industrial. Mas mandava aplicar aos registros já realizados – a norma seria estatutária se se tratasse de implementação para os registros a serem feitos –, sob pena de caducidade do direito verificado.

A questão chegou ao Supremo Tribunal e foi discutida à luz do princípio do direito adquirido. é o caso clássico conhecido. Este Tribunal respondeu que, nele, não se podia falar em direito adquirido porque não há direito adquirido a um instituto jurídico, no caso a propriedade industrial.

Perguntamos então: Não há proteção para esse caso?

O Sr. Ministro Cezar Peluso: V. Exa. não subscreveria, e tampouco eu.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Com certeza. Estou a dizer exatamente que não há direito adquirido a um instituto jurídico. No entanto, não se lesou, por exem-plo, o direito de propriedade em um caso como esse?

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O Sr. Ministro Cezar Peluso: Sim, tranqüilamente.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Por isso estou a chamar a atenção para a necessária meditação em torno do assunto.

O Sr. Ministro Cezar Peluso: é caso de verdadeira desapropriação do direi-to de propriedade.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Exatamente.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Presidente, contam – e isso já faz parte do folclore brasileiro – que, certo dia, um cidadão ingressou em uma livraria e pro-curou adquirir uma Constituição brasileira. O rapaz que estava no balcão, sim-plesmente, respondeu que aquela livraria não trabalhava com periódicos.

Temos uma Constituição que ainda não completou dezenove anos e foi emendada, até aqui, sessenta e uma vezes, sendo seis mediante emendas de revisão. Com isso, o povo brasileiro vive aos solavancos, à base de sobressaltos. Esses sola-vancos e sobressaltos mostram-se ainda maiores quando se vivencia o que poderia enquadrar-se como um período de encantamento: a primeira parte de um mandato, quando mais fácil a aprovação de novas leis. Todo governante que alcança o po-der, principalmente o poder maior, tem o seu plano de governo, as suas medidas milagrosas para chegar-se a novos dias. Sempre se imagina a necessidade de nova normatização – a meu ver, o que nós precisamos, no Brasil, é de homens, principal-mente de homens públicos, que observem o ordenamento jurídico em vigor.

Constatamos que – e cogito do âmbito federal – nem sempre houve o siste-ma atual, contributivo. Até 1993, a previdência, quanto aos servidores públicos federais, não se fazia calcada no sistema contributivo. Proventos e pensões eram proporcionados pela União com ônus exclusivo para ela própria.

Quanto aos parâmetros constitucionais, essa é a minha primeira observa-ção. A segunda, até mesmo para esclarecer o que veiculado da tribuna, diz respeito, ainda no âmbito federal, à natureza jurídica da relação que aproxima prestador de tomador de serviços.

Asseverei – e continuo a asseverar até que se declare inconstitucional certo preceito – que a relação jurídica é contratual. E o é porque assim está revelado em bom vernáculo, em bom português, no art. 13 da Lei 8.112, de 1990:

Art. 13. A posse dar-se-á pela assinatura do respectivo termo, no qual deverão constar as atribuições, os deveres, as responsabilidades [vem a contrapartida] e os direitos inerentes ao cargo ocupado [segue a cláusula a revelar, a mais não poder, o caráter contratual], que não poderão ser alterados unilateralmente, por qualquer das partes, ressalvados os atos de ofício previstos em lei.

é possível a modificação do regime jurídico, mas não cabe levar às últimas conseqüências essa admissão, sob pena de ingressarmos na seara do fascismo, com supremacia, sem balizas, do próprio Estado.

Uma coisa é afirmar que não há direito à permanência de certo regime ju-rídico. Algo diverso é colocar em segundo plano direitos adquiridos. Digo mais,

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com amparo na Constituição Federal, mais precisamente no art. 60, § 4º, inciso IV, nela contido: direito adquirido e, também, situações subjetivas já reconhecidas. Se formos ao inciso IV do § 4º do art. 60, constataremos uma dualidade: a proteção, consideradas emendas, faz-se presente, considerados direitos e garantias.

No Governo anterior, anterior ao que assumiu em 2003 – neste, foi promul-gada a Emenda Constitucional 41 –, houve, mediante a Emenda Constitucional 20/98, uma cláusula de transição. Possui ela um bill de indenidade sob o ângulo constitucional? Não. Não possui. Não é imutável. Realmente, não é imutável uma cláusula de transição, pouco importando o respectivo conteúdo. A ordem natural das coisas, porém, direciona no sentido de – presumindo-se o que normalmente ocorre, não o extravagante, o excepcional, o teratológico – não existir modificação de cláusula de transição, a menos que salte aos olhos o conflito dessa mesma cláu-sula com o texto da Lei Maior do País.

Digo que não é regra alterar uma cláusula de transição via idêntica medida, pelo menos para que se possa cogitar de um mínimo de segurança jurídica – e o Estado está organizado para proporcionar aos cidadãos segurança jurídica. Não é aconselhável a mudança de uma cláusula de transição.

Vejamos o que encerrou essa cláusula de transição. Não lerei a íntegra – não se preocupem – do art. 8º da Emenda Constitucional 20/98; lerei apenas a cabeça do artigo:

Art. 8º Observado o disposto no art. 4º desta Emenda e ressalvado o direito de opção a aposentadoria pelas normas por ela estabelecidas [opção de quem poderia fazê-la, do servidor público, e, para que se cogite de opção, há de se ter, no mínimo duas coisas], é assegurado o direito à aposentadoria voluntária com proventos calculados de acordo com o art. 40, § 3º, da Constituição Federal, àquele que tenha [aqui houve a especificação] ingressado regularmente em cargo efetivo na Administração Pública, direta, autárquica e fundacional, até a data de publicação desta Emenda, quando o servidor, cumulativamente:

Então vêm as condições.

O que ocorreu com esse preceito? Não estamos, aqui, a cogitar de direito adquirido, porque, se houvesse direito adquirido à aposentadoria à época, não existiria a necessidade dessa norma de transição. é inconcebível que uma emenda constitucional possa violar direito adquirido. Houve uma opção político-legisla-tiva, afinada com o corpo permanente da Carta, do constituinte derivado em 1998, gerando – e, a meu ver, isso está muito claro – o que o Ministro Sepúlveda Pertence, no julgamento do MS 23.047-3/DF, apontou como preservação das situações sub-jetivas favoráveis e já constituídas. Atendidos os requisitos da cabeça do art. 8º, os servidores passaram a contar em patrimônio com uma situação jurídica, com uma garantia, considerados os termos da Emenda Constitucional 20/98. Num período que já apontei como de encantamento – e, na época, não havia sequer o troca-troca de partido –, poderia uma outra emenda, em um arrependimento eficaz do legislador, afastar, sem ofensa ao Diploma Maior, mais precisamente ao inciso IV do § 4º do art. 60, essa situação jurídica? Enquanto acreditar no direito posto, no direito subordinante, nos ditames constitucionais, responderei que não. E, no dia em que não acreditar mais nesse direito posto, nos ditames constitucionais, já não estarei envergando esta toga.

R.T.J. — 203 971

Articulou-se com a situação da previdência. Volto a contar uma história, mas esta é verdadeira: em 1993, quando da criação de um tributo que surgiu mas-culino e, depois, se tornou feminino, o Imposto Provisório sobre a Movimentação Financeira, um emérito varão desta República – Ministro da Saúde, o professor Jatene – veio em peregrinação ao Supremo – não esteve em meu Gabinete e não sei por quê – para ressaltar que o IPMF visava a salvar a saúde.

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Era provisório.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Provisório, mas já se disse que o pê contido na sigla é o pê de permanente. A saúde foi salva? Será que o sacrifício de um valor maior que é a estabilidade, a segurança jurídica, será que mediante o sacrifício dos servidores públicos, bodes expiatórios, haverá a salvação da previdência social? Será que, com o sacrifício de um valor básico – e paga-se um preço por se viver em uma democracia, e ele é módico, ao alcance de todos –, o respeito às regras estabelecidas, ter-se-á a salvação da previdência? O ministro Cezar Peluso apon-tou que o problema da previdência é multifacetário. O problema da previdência é muito mais sério. E aludo não só ao que mencionado por S. Exa., em termos de administração e outras coisitas mais, como também ao problema da assistência social, que foi sendo implementada, criada, multiplicada, sem aporte de recursos, sem fonte de custeio, olvidando-se que o sistema da previdência é atuarial.

Presidente, não tenho a menor dúvida: a Emenda Constitucional 41/03, quando editada cinco anos após a promulgação da Emenda 20/98, como se ressaltou da tri-buna, em época, repito, de encantamento, e não se imaginava reforma da previdência com a profundidade havida, inclusive com a incidência de contribuição em proventos e pensões que vinham sendo observados, realmente se mostrou em conflito com o inciso IV do § 4º do art. 60 da Constituição Federal. Não estou aqui, reitero, a cogitar de direito adquirido, ou não, quando da edição da Emenda Constitucional 20/98 à aposentadoria. Estou simplesmente a perceber que se assegurou aos servidores inte-grados ao quadro da administração pública, na ocasião, uma certa situação jurídica. E situação jurídica encontra-se no gênero “garantias”, vocábulo contido, com todas as letras, no inciso IV do § 4º do art. 60 da Constituição no que esse dispositivo, tão olvidado, tão mitigado, revela que não pode haver tramitação de emenda voltada a afastar garantia. E a garantia, em termos – repito – de situação jurídica, situação subjetiva, que passou a integrar – como ressaltei – o patrimônio dos servidores, foi menosprezada pela Emenda Constitucional 41.

Peço vênia à maioria formada para, no caso, acompanhar o Ministro Carlos Ayres Britto – e diria que S. Exa. tem uma dimensão muito maior do que a retratada no “Painel”, hoje, da Folha de São Paulo – e julgar procedente o pedido formulado na inicial.

VOTO

A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente): Meu voto, dessa feita, não acom-panha aquela minoria verificada no caso anterior e que acabou de ser mencionado pelo Ministro Celso de Mello.

R.T.J. — 203972

Na hipótese, acompanho o voto da eminente Relatora e a maioria já formada. Com vênia renovada aos votos brilhantes proferidos nesta assentada pelos Minis-tros Carlos Britto, Marco Aurélio e Celso de Mello, voto pela improcedência da ação. Entendo que, no caso, não se verificou nenhuma agressão a direito adquirido.

EXTRATO DA ATA

ADI 3.104/DF — Relatora: Ministra Cármen Lúcia. Requerente: Associação Nacional dos Membros do Ministério Público – CONAMP (Advogados: Aristides Junqueira Alvarenga e outros). Requerido: Congresso Nacional. Interessados: Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior – ANDES, Federação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social – FENAFISP (Advogados: Damares Medina e outros), Federação Nacional dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do Ministério Público da União – FENAJUFE (Advogado: Pedro Mauricio Pita Machado), Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do Ministério Público da União no Distrito Federal – SINDJUS/DF (Advogados: Ibaneis Rocha Barros Júnior, Arenaldo França Guedes Filho, Marlucio Lustosa Bon-fim e Renato Borges Barros) e Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal – UNAFISCO (Advogados: José Luis Wagner e outros).

Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou improcedente a ação direta, nos termos do voto da Relatora, vencidos os Ministros Carlos Britto, Marco Aurélio e Celso de Mello. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. Ausente, justifica-damente, o Ministro Eros Grau. Falaram, pelos amici curiae Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES) e Federação Nacio-nal dos Auditores Fiscais da Previdência Social (FENAFISP), o Dr. Mauro de Aze-vedo Menezes, e Federação Nacional dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do Ministério Público da União (FENAJUFE) e Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (UNAFISCO), o Dr. Pedro Maurício Pita Machado; e, pela Advocacia-Geral da União, o Ministro José Antônio Dias Toffoli.

Presidência da Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Menezes Direito. Vice-Procura-dor-Geral da República, Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos.

Brasília, 26 de setembro de 2007 — Luiz Tomimatsu, Secretário.

R.T.J. — 203 973

PETIÇÃO 3.631 — SP

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Requerente: Ministério Público do Estado de São Paulo — Requerido: Mi-nistério Público do Estado de Mato Grosso do Sul

1. Competência. Atribuições do Ministério Público. Conflito negativo entre Ministério Público de dois Estados. Caracterização. Magistrados que se limitaram a remeter os autos a outro juízo a re-querimento dos representantes do Ministério Público. Inexistência de decisões jurisdicionais. Oposição que se resolve em conflito en-tre órgãos de Estados diversos. Feito da competência do Supremo Tribunal Federal. Conflito conhecido. Precedentes. Inteligência e aplicação do art. 102, I, f, da CF. Compete ao Supremo Tribunal Federal dirimir conflito negativo de atribuição entre representan-tes do Ministério Público de Estados diversos.

2. Competência criminal. Atribuições do Ministério Público. Ação penal. Formação de opinio delicti e apresentação de eventual denúncia. Delito teórico de receptação que, instantâneo, se consu-mou em órgão de trânsito do Estado de São Paulo. Matéria de atri-buição do respectivo Ministério Público estadual. Conflito negativo de atribuição decidido nesse sentido. É da atribuição do Ministério Público do Estado em que, como crime instantâneo, se consumou teórica receptação, emitir a respeito opinio delicti, promovendo, ou não, ação penal.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência do Ministro Gilmar Mendes, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, conhecer do conflito de atribuição, vencido o Ministro Carlos Britto, e, no mérito, por unanimidade, reconhecer a competência do Ministério Público do Estado de São Paulo, nos termos do voto do Relator. Votou o Presiden-te. Ausentes, justificadamente, a Ministra Cármen Lúcia e, neste julgamento, a Ministra Ellen Gracie (Presidente) e o Ministro Celso de Mello.

Brasília, 6 de dezembro de 2007 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Trata-se de conflito negativo de atribuições entre membros do Ministério Público dos Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, e autuado, aqui, como petição, a fim de apreciar suposto crime de receptação imputado a Agnaldo Roseno de Lima.

O investigado, na condução do veículo Kia Besta, placa CST 7038, São Paulo, foi abordado pela Polícia Rodoviária Federal, em 25-3-02, nas imediações da cidade de Nova Alvorada do Sul/MS.

R.T.J. — 203974

Apurou-se que o Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV) constava da lista de documentos furtados do Ciretran de Jundiaí/SP.

Iniciada a audiência preliminar no Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Rio Brilhante/MS, a representante do Ministério Público suscitou conflito de atribuições, nos seguintes termos:

Noticia o presente procedimento a ocorrência do delito de receptação culposa praticado por Agnaldo Roseno de Lima, em setembro de 2001, quando adquiriu o certificado de registro de licenciamento de seu veículo, produto de roubo da Ciretran de Jundiaí, nas dependências do Detran em São Paulo, pagando pelo mesmo a quantia de R$ 700,00, que, pelas condições do negócio entabulado, deveria presumir ter sido obtido por meio criminoso.

A receptação na modalidade adquirir é crime instantâneo, que se consuma com a aqui-sição do bem de origem ilícita.

Assim sendo, verifica-se que o crime de receptação culposa consumou-se na comarca de São Paulo, onde o documento foi adquirido.

Destarte, declinamos de nossa atribuição para o feito e requeremos a remessa dos autos ao Juizado Especial Criminal da comarca de São Paulo, competente para apreciar o feito, nos termos do artigo 70 do Código de Processo Penal.

(Fl. 16.)

Deferido o pedido pelo magistrado local, remeteram-se os autos ao Juizado Especial Criminal de São Paulo/Capital, onde foram distribuídos ao juízo de direito da 4ª Vara Criminal.

O representante do Ministério Público do Estado de São Paulo requisitou instauração de inquérito policial. Concluído e relatado este, manifestou-se o Mi-nistério Público:

Da análise dos autos concluo que a aquisição de um documento falso tem como única finalidade o seu uso.

Assim, entendo que o crime de receptação de tal documento, funcionou como crime meio para a prática do crime de uso de documento falso, que se consumou no Estado de Mato Grosso do Sul.

Para confirmar este entendimento, observo ainda que o documento, por si só, não tem valor patrimonial.

Com base no exposto, entendo que as providências sobre o caso devem ser tomadas no local em que ocorreu o uso documento, mas, uma vez que este fato ocorreu em outro Estado, suscito o conflito de atribuições e requeiro a remessa destes autos a Câmara Especial do Su-perior Tribunal de Justiça.

(Fl. 44.)

Daí a remessa dos autos (IP 03.002521-4) ao Superior Tribunal de Justiça.

A então Relatora, Ministra Laurita Vaz, não conheceu do conflito e deter-minou remessa dos autos a esta Corte, com fundamento na alínea f do inciso I do art. 102 da Constituição Federal.

O Ministério Público Federal manifesta-se, preliminarmente, pelo não-co-nhecimento do conflito e, no mérito, é pela atribuição da 6ª Promotoria de Justiça Criminal da Comarca de São Paulo, para o eventual ajuizamento de ação penal (fls. 77-82).

é o relatório.

R.T.J. — 203 975

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. Trata-se de conflito negativo de atribuições entre o Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul e o Ministério Público do Estado de São Paulo, que dissentem acerca de qual órgão deva formular opinio delicti com base no IP 03.002521-4.

2. Relevo, preliminarmente, que assiste razão à Ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça, quando remeteu os autos de conflito de atribuição a esta Corte, sob este fundamento:

A teor do art. 105, inciso I, alínea g, da Constituição Federal, compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar, originariamente, “os conflitos de atribuições entre auto-ridades administrativas e judiciárias da União, ou entre autoridades judiciárias de um Estado e administrativas de outro ou do Distrito Federal, ou entre as deste e da União”.

No caso em apreço, o conflito se instaurou entre duas autoridades exclusivamente administrativas. Verifica-se, portanto, que o deslinde da controvérsia não está inserido na competência constitucionalmente atribuída a esta Corte Superior.(Fls. 63-65.)

A peculiaridade do caso está em que, embora evidente a divergência entre os Ministérios Públicos, às suas manifestações sucederam as decisões judiciais. Daí a aparência de conflito negativo de competência, e não de atribuição.

Ocorre que a atuação do Poder Judiciário, tanto no Estado de Mato Grosso do Sul (fl. 21), como no de São Paulo (fl. 45), se limitou a decisões que acolheram os pedidos do Ministério Público, nos exatos termos que constam dos autos (i), e a fa-zer chegar ao Superior Tribunal de Justiça o conflito negativo de atribuições (ii).

Noutras palavras, não foi praticado nenhum ato de conteúdo jurisdicional com força bastante para atrair a tipificação de conflito negativo de competência.

A decisão do magistrado paulista encontra apoio na manifestação do Mi-nistério Público, cujo conteúdo está em suscitar conflito de atribuições acerca do órgão que deva formular opinio delicti com base no IP 03.002521-4. Nada proveu a respeito de competência jurisdicional.

Como se vê, o Poder Judiciário não foi provocado a definir competência de nenhum de seus órgãos, senão que apenas atendeu a requerimento do Ministério Público para fazer chegar ao Superior Tribunal de Justiça o incidente administra-tivo já mencionado, que caracteriza mero conflito de atribuições.

E, no que tange à competência para apreciar conflito de atribuições do Mi-nistério Público, a jurisprudência recente desta Corte é firme, no seguinte sentido:

Competência – Conflito de atribuições – Ministério Público Federal versus Ministério Público estadual. Compete ao Supremo a solução de conflito de atribuições a envolver o Mi-nistério Público Federal e o Ministério Público estadual.

Conflito negativo de atribuições – Ministério Público Federal versus Ministério Pú-blico estadual – Roubo e descaminho. Define-se o conflito considerado o crime de que cuida o processo. A circunstância de, no roubo, tratar-se de mercadoria alvo de contrabando não desloca a atribuição, para denunciar, do Ministério Público estadual para o Federal.(Pet 3.528, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 3-3-06.)

R.T.J. — 203976

E, ainda:

1. Competência. Atribuições do Ministério Público. Conflito negativo entre Ministério Público Federal e estadual. Feito da competência do Supremo Tribunal Federal. Conflito conhecido. Precedentes. Aplicação do art. 102, I, f, da CF. Compete ao Supremo Tribunal Fe-deral dirimir conflito negativo de atribuição entre o Ministério Público Federal e o Ministério Público estadual.

2. Competência criminal. Atribuições do Ministério Público. Ação penal. Formação de opinio delicti e apresentação de eventual denúncia. Fatos investigados atribuídos a ex-governador de Estado. Incompetência do Superior Tribunal de Justiça. Matéria de atribuição do Ministério Público estadual. Inconstitucionalidade dos parágrafos do art. 84 do CPP, introduzidos pela Lei 10.628/02. Conflito negativo de atribuição conhecido. é da atribuição do Ministério Público estadual analisar procedimento de investigação de atos supostamente delituosos atribuídos a ex-governador e emitir a respeito opinio delicti, promovendo, ou não, ação penal.(ACO 853, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 27-4-07.)

Conheço, assim, do conflito negativo de atribuições, e passo à análise do mérito.

3. O ora investigado, na condução do veículo Kia Besta, placa CST 7038, São Paulo, foi abordado pela Polícia Rodoviária Federal, em 25-3-02, nas imedia-ções da cidade de Nova Alvorada do Sul/MS.

Apurou-se, na oportunidade, que o Certificado de Registro e Licenciamen-to de Veículo (CRLV) constava da lista de documentos furtados do Ciretran de Jundiaí/SP.

Daí a remessa dos autos ao Juizado Especial Criminal de São Paulo/Capital, para apuração de suposta prática do delito de receptação culposa.

Concluído o inquérito policial ali instaurado, a representante do Ministério Público entendeu que os fatos narrados configuram, em tese, delito de uso de do-cumento falso, cuja apuração se submete ao foro do local em que teria ocorrido o uso, razão pela qual suscitou o conflito de atribuições.

Neste ponto, tenho por irretocável o minucioso parecer da Procuradoria-Geral da República, da lavra da Subprocuradora-Geral da República Cláudia Sampaio Marques, verbis:

Com efeito, assiste razão à Promotoria de Justiça da Comarca de Rio Brilhante/MS. O delito de receptação, previsto no art. 180 do Código Penal, na modalidade de adquirir, é instantâneo, consumando-se no momento em que o agente realiza, efetivamente, a conduta descrita no tipo penal.

In casu, conforme se apurou, Agnaldo Roseno de Lima teria adquirido o CRLV, por intermédio de um despachante, em São Paulo/SP, que lhe garantiu tratar-se de documento “quente”, ou seja, originário, diretamente, das dependências do Detran/SP (fl. 4).

Verificou-se, por conseguinte, que o Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo nº 4772833683, referente ao automóvel Kia Besta, placa CST-7038/São Paulo/SP, constava na listagem de documentos furtados do Ciretran de Jundiaí/SP (fl. 10).

Portanto, o fato narrado retrata um suposto delito de receptação, praticado por Agnaldo Roseno de Lima, em decorrência da aquisição de CRLV autêntico, produto de crime anterior (furto), ocorrido nas dependências do Ciretran de Jundiaí/SP.

Nesse contexto, não é defensável a tese de que o suposto delito de receptação teria funcionado apenas como crime-meio para a prática do crime de uso de documento falso no Estado de Mato Grosso do Sul, uma vez que o citado documento, de acordo com a investigação,

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trata-se, na realidade, de Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo originário, dire-tamente, das dependências do órgão de trânsito competente para a sua expedição.

Desse modo, versando a investigação, tão-somente, sobre a possível prática de crime de receptação, que teria se consumado em São Paulo/SP, local onde Agnaldo Roseno de Lima, supostamente, adquiriu o CRLV pelo preço de R$ 700,00 (setecentos reais), à Justiça Paulista compete, nos termos do art. 70 do Código de Processo Penal, o processo e julgamento da infração penal e seu autor. Assim já decidiu esse Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 74007/MS, Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ de 11-04-1997.(Fls. 77-82.)

4. Assim, conheço do conflito e determino, com apoio na manifestação da Procuradoria-Geral da República, a remessa dos autos à 6ª Promotoria de Justiça Criminal da Comarca de São Paulo, para prosseguimento da causa, nos termos que lhe pareçam de direito.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, nos defrontamos com si-tuação semelhante, conforme mencionado pelo Relator, após sinalizar divergência, na Pet 3.528-3, do Estado da Bahia. E, naquele caso, houve o envolvimento de um conflito entre o Ministério Público do Estado da Bahia e o Ministério Público Federal.

No voto que proferi – e tive a satisfação de ser acompanhado pelos Cole-gas –, ressaltei o fato de não existir, concretamente, um conflito envolvendo órgãos investidos do ofício judicante, mas apenas o Ministério Público do Estado da Bahia e o Federal. Então, passei a analisar a espécie, citando, inclusive, lição de Paulo Cezar Pinheiro Carneiro específica quanto a essa espécie, quanto a esse tipo de conflito de atribuições. E, mais ainda, um precedente do Tribunal segundo o qual, quando não se pode definir o órgão competente para julgar a espécie, incumbe ao próprio Tribunal fazê-lo. é uma situação semelhante àquela da conclusão sobre a incompetência e declinação para um certo órgão, especificando-se esse órgão.

Tem-se a peculiaridade de o caso envolver Ministérios Públicos estaduais. Mas, se formos ao texto básico da Constituição Federal, que serviu ao deslinde do conflito anterior, ao precedente, na Pet 3.528-3/BA, constataremos que o preceito engloba não só as causas e os conflitos – a dualidade é eloqüente para revelar coisas diversas, institutos diversos – entre União e Estados, como também entre uns e outros. Então está agasalhada a hipótese de conflito de atribuições entre Ministérios Públicos estaduais. Admito que há o precedente citado no voto do Relator. Afasto a preliminar que suscitei de não-conhecimento.

Concluo, portanto, no sentido de adentrar a matéria de fundo e, fazendo-o, subscrevo o voto de S. Exa. tal como proferido.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhor Presidente, estive reexaminando aqui as minhas anotações e observei que fui Relator de uma ação cível originária, em agosto de 2005, sobre conflito de atribuições entre Ministério Público estadual e o Ministério Público Federal. E decidimos que a Constituição Federal não inclui,

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na competência judicante do Supremo Tribunal Federal, conflito de atribuições entre nenhuma autoridade: nem entre autoridades judiciárias nem entre membros do Ministério Público. A matéria também não estaria na competência do Superior Tribunal de Justiça, a não ser por analogia, se admitíssemos uma espécie de con-flito virtual.

Por isso, dissemos o seguinte (leio a ementa do acórdão proferido em agos-to de 2005, na ACO 756, oriunda de São Paulo):

Ementa: Constitucional. Conflito negativo de atribuições. Ministério Público Federal e Ministério Público estadual. Representação destinada à apuração de supostas irregula-ridades na privatização do Sistema de Transporte Ferroviário Nacional. Incompetência do Supremo Tribunal Federal. De acordo com a letra d do inciso I do art. 105 da Magna Carta, compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar originariamente os conflitos entre juízes vinculados a tribunais diversos. No caso, transparece um virtual conflito de jurisdição entre os juízos federal e estadual perante os quais funcionam os órgãos do Parquet ora em divergência. Tal situação impõe uma interpretação extensiva do dispositivo constitucional aci-ma referido, de sorte a fixar a competência daquela Corte Superior para solucionar o dissenso instaurado nos presentes autos. Precedente: Pet 1.503, Rel. Min. Maurício Corrêa. Conflito de atribuições não conhecido.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): V. Exa. mandaria para o STJ?

O Sr. Ministro Carlos Britto: Eu não conheceria e declinaria a competência para o STJ. Se vencido, acompanharei, no mérito, o Ministro Cezar Peluso.

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): Senhor Presidente, gostaria de con-signar que, depois da decisão do Ministro Carlos Britto, o Tribunal reformulou esse ponto de vista, não apenas no acórdão do Ministro Marco Aurélio, mas também no acórdão da ACO 853, da qual fui Relator, em 27 de abril deste ano.

O Sr. Ministro Carlos Britto: V. Exa. pode ler, por favor, a ementa?

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): Leio a ementa:

Ementa: 1. Competência. Atribuições do Ministério Público. Conflito negativo entre Ministério Público Federal e estadual. Feito da competência do Supremo Tribunal Federal. Conflito conhecido. Precedentes. [Citei, inclusive, um precedente do Ministro Marco Auré-lio.] Aplicação do art. 102, I, f, da CF. Compete ao Supremo Tribunal Federal dirimir conflito negativo de atribuição entre o Ministério Público Federal e Ministério Público estadual. 2. Competência criminal. Atribuições do Ministério Público. Ação penal. Formação de opinio delicti e apresentação de eventual denúncia. Fatos investigados atribuídos a ex-governador de Estado. Incompetência do Superior Tribunal de Justiça. Matéria de atribuição do Ministério Público estadual. Inconstitucionalidade dos parágrafos do art. 84 do CPP, introduzidos pela Lei 10.628/02. Conflito negativo de atribuição conhecido. é da atribuição do Ministério Público estadual analisar procedimento de investigação de atos supostamente delituosos atribuídos a ex-governador e emitir a respeito opinio delicti, promovendo, ou não, ação penal.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Qual a alínea da Constituição Federal que V. Exa. citou?

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): Art. 102, inciso I, alínea f. Dirimir conflitos.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Na alínea f não há essa competência.

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O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Tem-se entendido que aqui há um conflito federativo. Foi isso que o Ministro Marco Aurélio disse. Conflito entre entidade de Estados diversos.

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): Exatamente. é um conflito entre Es-tados, entre instituições de Estados; entre o Ministério Público de um Estado e o Ministério Público do outro.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Essa foi a construção que fizemos para apre-sentar uma solução ao conflito.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Mas entre agentes públicos?

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Sim. Agentes públicos de Es-tados diferentes. Foi essa a orientação. Na verdade, o que se está aqui a criar, de fato, é um tipo de conflito reconhecido entre órgãos.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: A alínea f se refere a causas e conflitos – gênero. O autor que citei, professor da UERJ e ex-integrante do Ministério Público, Dr. Paulo Cézar Pinheiro Carneiro, consignou:

O juiz, quando determina o encaminhamento dos autos do inquérito para outro órgão do Ministério Público, o faz exercitando unicamente a atividade administrativa como chefe que é dos serviços administrativos do cartório.

Não há um ato jurisdicional.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Ministro Carlos Britto, neste caso, V. Exa. não conhece?

O Sr. Ministro Carlos Britto: Peço vênia para não conhecer.

EXTRATO DA ATA

Pet 3.631/SP — Relator: Ministro Cezar Peluso. Requerente: Ministério Público do Estado de São Paulo. Requerido: Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul.

Decisão: O Tribunal, por maioria, conheceu do conflito de atribuição, vencido o Ministro Carlos Britto, e, no mérito, por unanimidade, reconheceu a competência do Ministério Público do Estado de São Paulo, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente. Ausentes, justificadamente, a Ministra Cármen Lúcia e, neste julgamento, a Ministra Ellen Gracie (Presidente) e o Ministro Celso de Mello. Presidiu o julgamento o Ministro Gilmar Mendes (Vice-Presidente).

Presidência da Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Ministros Celso do Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Eros Grau e Menezes Direito. Procurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.

Brasília, 6 de dezembro de 2007 — Luiz Tomimatsu, Secretário.

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MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.823 — DF

Relatora: A Sra. Ministra Cármen Lúcia

Requerente: Procurador-Geral da República — Requeridos: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios e Conselho Nacional de Justiça — Inte-ressado: Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil

Ação direta de inconstitucionalidade.

1. Ato Regimental 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribu-nal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, sobre o regime de férias dos membros daquele Tribunal e dos juízes a ele vinculados, pelo qual os magistrados indicados “gozarão as férias do ano de 2007 nos períodos de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho de 2007”.

2. Resolução 24, de 24 de outubro de 2006, editada pelo Con-selho Nacional de Justiça, que revogou o art. 2º da Resolução 3, de 16 de agosto de 2005, fundamento do Ato Regimental 5, de 10 de novembro de 2006.

3. Afronta aos arts. 93, inciso XIII, e 103-B da Constituição da República.

4. Princípio da ininterruptabilidade da jurisdição.

5. As regras legais que estabeleciam que os magistrados go-zariam de férias coletivas perderam seu fundamento de validade pela promulgação da Emenda Constitucional 45/04. A nova norma constitucional plasmou paradigma para a matéria, contra a qual nada pode prevalecer. Enquanto vigente a norma constitucional, pelo menos em exame cautelar, cumpre fazer prevalecer a vedação de férias coletivas de juízes e membros dos tribunais de segundo grau, suspendendo-se a eficácia de atos que ponham em risco a efe-tividade daquela proibição.

6. Suspensão, a partir de agora, da eficácia dos dispositivos do Ato Regimental 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, e da Resolução 24, de 24 de outubro de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, mantendo-se a observância estrita do disposto no art. 93, inciso XII, da Cons-tituição da República.

7. Medida cautelar deferida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supre-mo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência do Vice-Presidente,

R.T.J. — 203 981

Ministro Gilmar Mendes, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, deferir a medida cautelar, nos termos do voto da Relatora. Votou o Presidente. Ausente, justificadamente, neste julgamento, a Ministra Ellen Gracie (Presidente).

Brasília, 6 de dezembro de 2006 — Cármen Lúcia, Relatora.

RELATÓRIO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia: 1. O Procurador-Geral da República ajuíza a presente ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, “em face do Ato Regimental 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justi-ça do Distrito Federal e Territórios e da Resolução 24, de 24 de outubro de 2006, editada pelo Conselho Nacional de Justiça” (fl. 2).

Os atos normativos questionados dispõem sobre as férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, nos termos seguintes:

Resolução 24, de 24 de outubro de 2006.Revoga o disposto no art. 2º da Resolução nº 3 do Conselho Nacional de Justiça.Resolve:Art. 1º Revogar o art. 2º da Resolução nº 3, de 16 de agosto de 2005.

O art. 2º da Resolução 3/05, revogada, por sua vez, dispõe:

O Presidente do Conselho Nacional de Justiça, no uso de suas atribuições, tendo em vista o decidido em Sessão de 16-8-05, e com base no disposto no inciso II do § 4º do art. 103-B da Constituição Federal, com a redação da Emenda Constitucional nº 45, de 8-12-04, publicada no Diário Oficial da União de 31-12-04,

Resolve:(...)Art. 2º Cientificar os Tribunais que serão inadmissíveis quaisquer justificativas

relativas a período futuro, ficando definitivamente extintas as férias coletivas, nos termos fixados na Constituição.Ato Regimental nº 005, de 10 de Novembro de 2006.O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, no uso de suas atribuições legais,Considerando que o Conselho Nacional de Justiça, pela Resolução nº 24, de 24 de outu-

bro de 2006, revogou o artigo 2º da Resolução nº 3, de 16 de agosto de 2005, que, na interpre-tação então dada pelo Conselho ao artigo 93, XII, da Constituição Federal, extinguira as férias coletivas dos membros do Tribunal e dos juízes a ele vinculados;

Considerando que, até a entrada em vigor do Estatuto da Magistratura, previsto no ar-tigo 93 da Constituição Federal, encontra-se em vigor o § 1º do artigo 66 da Lei Complemen-tar nº 35, de 14 de março de 1979, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 202-3/Bahia, julgada em 5 de setembro de 1996;

Considerando a necessidade de assegurar mais eficiente e pronta prestação jurisdícional;Considerando, por fim, o decidido em sessão extraordinária realizada no dia 10 de

novembro de 2006, Resolve assim disciplinar as férias dos magistrados da Justiça do Distrito Federal rela-

tivas ao ano de 2007:Art. 1º. Os membros do Tribunal de Justiça e os juízes de primeiro grau gozarão as

férias do ano de 2007 nos períodos de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho de 2007.§ 1º. Para assegurar a continuidade da atividade jurisdicional em primeiro e segundo grau,

nos períodos de 20 de dezembro de 2006 a 31 de janeiro de 2007 e de 2 a 31 de julho de 2007: a) o Presidente do Tribunal estabelecerá, em ato próprio, a escala dos membros do Conselho da Magistratura que, individualmente, despacharão e decidirão os pedidos liminares e as medidas

R.T.J. — 203982

que reclamem urgência, inclusive as de que cuidam os artigos 173 e 174 do Código de Processo civil, as relativas aos processos criminais com réus presos ou ameaçados de prisão e as atinentes a crianças e adolescentes, praticando os atos processuais necessários; b) o Corregedor da Justiça do Distrito Federal estabelecerá, em ato próprio, a escala e a localização dos juízes de direito que despacharão e decidirão os pedidos liminares e as medidas que reclamem urgência, inclusive as de que cuidam os artigos 173 e 174 do Código de Processo Civil, as relativas aos processos criminais com réus presos ou ameaçados de prisão, as atinentes a crianças e adolescentes e as referentes ao sistema dos juizados especiais, praticando os atos processuais necessários, inclusive realização de audiências.

§ 2º. Os membros do Conselho da Magistratura e juízes de direito escalados na forma do § 1º deste artigo gozarão os períodos de férias trabalhados em datas diversas, a serem concedidas pelo Vice-Presidente do Tribunal.

§ 3º Os membros do Tribunal e os juízes de direito com férias individuais já deferidas para períodos diversos dos estabelecidos no caput do artigo 1º poderão mantê-las, para tanto fazendo comunicação escrita ao Vice Presidente do Tribunal até o dia 30 de novembro de 2006. Na falta tempestiva desta comunicação, entrarão de férias conforme o caput do artigo 1º.

Art. 2º. Nos períodos de 20 de dezembro de 2006 a 31 de janeiro de 2007 e de 2 a 31 de julho de 2007, excetuadas disposições legais em contrário, ficam suspensos os prazos processuais.

Art. 3º. Este ato regimental entra em vigor na data de sua publicação, ficando suspensas, durante sua vigência, as normas, resoluções e atos regimentais que com ele conflitem, inclu-sive a Resolução 6, de 6 de setembro de 2005.

Desembargador Lécio Resende da SilvaPresidente

2. O nobre Procurador-Geral da República sustenta que as normas questio-nadas afrontam, flagrantemente, a Constituição pois “a Resolução 24 deu sinal aos órgãos do Poder Judiciário de que as férias coletivas estariam restauradas. Produto dessa corrente, editou-se o Ato Regimental 5, de 10 de novembro de 2006, pelo TJDFT, que restabeleceu a prática das férias, a serem obrigatoriamente gozadas pelos magistrados nos meses de janeiro e julho. (...). A norma procedi-mental ditada no dispositivo constitucional (art. 93, XII), que vaticina ser ‘a ati-vidade jurisdicional (...) ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juízes e tribunais de segundo grau (...)’, teve sua eficácia nítida e frontalmente esvaziada pela mencionada Resolução 24, do CNJ, e, em seqüência, pelo Ato Regimental 5, do TJDFT” (fl. 6).

Requer o Procurador-Geral da República seja deferida “medida cautelar, com eficácia ex nunc, nos termos previstos no art. 10 da Lei 9.868/99 e no art. 170, § 1º e § 3º do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal” (fl. 8) para sus-pender os efeitos do Ato Regimental 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, e da Resolução 24, de 24 de outubro de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, por ofensa aos arts. 93, inciso XII, e 103-B da Constituição da República.

No mérito, pede seja julgada procedente a presente ação para se declarar a inconstitucionalidade dos dispositivos impugnados.

Nos termos do § 3º do art. 10 da Lei 9.868/99, considerando-se a urgência que o caso impõe, por cuidarem as normas questionadas de férias coletivas dos magistrados, cujo período próximo de fruição se daria a partir de 2 de janeiro de 2007 – com todas as providências antecipatórias que teriam de ser adotadas pelos juízos e tribunais se aquelas prevalecerem – e, ainda, pela necessidade de se dotar

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de segurança jurídica os profissionais que compõem a comunidade jurídica além dos magistrados, tais como os advogados e membros do Ministério Público, e, principalmente, os jurisdicionados, adotei a providência de deixar de determinar a audiência prévia das autoridades das quais emanaram os atos aqui impugnados em razão da excepcionalidade da situação.

é o relatório, do qual deverão ser extraídas cópias para encaminhamento aos eminentes Senhores Ministros deste Supremo Tribunal (art. 87, inciso I, do RISTF).

VOTO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora):

Do objeto da ação

1. A presente ação tem como objeto atos infralegais consubstanciados no Ato Regimental 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, e na Resolução 24, de 24 de outubro de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, que cuidam: a) o primeiro, do regime de férias dos membros daquele Tribunal e dos juízes a ele vinculados, após a revogação do art. 2º da Resolução 3/05 pela Resolução 24, do Conselho Nacional de Justiça. Naquele ato se definiu que os magistrados indicados “gozarão as férias do ano de 2007 nos períodos de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho de 2007”; b) o segundo, da revogação do mencionado art. 2º da Resolução 3, de 16 de agosto de 2005, que possibilitou a prática daquele primeiro.

A Resolução 24, de 24 de outubro de 2006, e as férias coletivas de magistrados

2. A Resolução 24/06 do Conselho Nacional de Justiça foi expedida pela digna Presidente do Conselho Nacional de Justiça, Ministra Ellen Gracie, a qual, “no uso de suas atribuições conferidas pela Constituição Federal, especialmente o que dispõe o inciso I, § 4º, de seu artigo 103-B, e tendo em vista o decidido na Sessão do dia 24 de outubro de 2006 (...) Resolve: art. 1º – Revogar o art. 2º da Resolução 3, de 16 de agosto de 2005.”

3. O art. 2º da Resolução 3/05 determinava:

Art. 2º Cientificar os Tribunais que serão inadmissíveis quaisquer justificativas, relati-vas a período futuro, ficando definitivamente extintas as férias coletivas, nos termos fixados na Constituição;

4. O art. 93, inciso XII, da Constituição da República, modificado pela Emenda Constitucional 45, de 31 de dezembro de 2004, preceitua:

Art. 93. Lei Complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

(...)XII - a atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juízos

e tribunais de segundo grau, funcionando, nos dias em que não houver expediente forense normal, juízes em plantão permanente;

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5. A norma do art. 2º da Resolução 3/05 repetiu, pois, a regra proibitiva de férias coletivas de juízes e tribunais de segundo grau, estabelecida na norma cons-titucional. Nada mais.

6. Havia, contudo, é certo, uma justificativa para a sua expedição. A Emen-da Constitucional 45, pela qual se introduziu a norma proibitiva no sistema, foi promulgada em 8 de dezembro de 2004, na iminência das férias coletivas dos magistrados, o que era tradicional. As férias do período de janeiro de 2005 es-tavam preparadas, os serviços e servidores devidamente organizados para a sua fruição, pelo que não se poderia dar imediato cumprimento àquela norma consti-tucional sem o devido planejamento.

Pela renitência de alguns órgãos e servidores em dar atendimento ao quanto determinado constitucionalmente, com a apresentação de justificativas que arre-daram a aplicação da norma também em julho de 2005, a saber, seis meses após o início de vigência da regra proibitiva de férias coletivas, o Conselho Nacional de Justiça expediu a Resolução 3, de 16 de agosto daquele ano.

Seu art. 1º dá bem a razão de ser da norma que poderia parecer desnecessária à primeira vista. Resolveu, então, o Presidente do Conselho Nacional de Justiça:

Art. 1º Acolher as justificativas apresentadas pelos Tribunais que mantiveram as férias coletivas marcadas para julho de 2005, uma vez que demonstrada a transitória força maior.

Na seqüência da acolhida das justificativas, entretanto, cientificou, naquela data, o Presidente do Conselho serem “inadmissíveis quaisquer justificativas re-lativas a período futuro, ficando definitivamente extintas as férias coletivas, nos termos fixados na Constituição”.

Assim, a razão de ser daquela norma do Conselho Nacional de Justiça (art. 2º da Resolução 3/05) estava na recalcitrância de alguns órgãos do Poder Judiciário em dar cumprimento à norma constitucional proibitiva de férias coletivas, a qual, pelo seu conteúdo mesmo, de vedar determinado comportamento ou providência, é auto-aplicável.

O que se teve, pois, com a norma expedida pelo Conselho Nacional de Jus-tiça, na Resolução 3/05, foi, de uma parte, a aceitação das justificativas quanto ao não-cumprimento imediato da nova regra constitucional até julho de 2005 e, de outro lado, dar ciência a todos os tribunais da não-admissão de qualquer nova justificativa que se pretendesse apresentar quanto ao não-cumprimento da Cons-tituição da República.

7. Assim, a revogação do art. 2º da Resolução 3, de 2005, pelo art. 1º da Resolução 24, de 2006, agora posta em questão, não teria conseqüências jurídicas substanciais, porque não teria – como é óbvio – o alcance de revogar a norma constitucional proibitiva das férias coletivas.

Dá-se, entretanto, que aquela revogação importa em fazer supor, erronea-mente, aos órgãos judiciais que seria admissível providência no sentido contrário ao quanto disposto na norma do inciso XII do art. 93 da Constituição.

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Não tem, entretanto, o Conselho Nacional de Justiça ou qualquer outro órgão, do Judiciário ou de qualquer outro poder, competência para tolerar, admitir ou considerar aceitável prática de inconstitucionalidade.

8. Pela norma constitucional estabelecida no art. 93, inciso XII, os magis-trados, incluídos os integrantes de tribunais de segundo grau, continuam titulari-zando direito individual a férias anuais remuneradas. Não estatui a Constituição a duração das férias dos integrantes do Poder Judiciário, o que se dá por lei complementar.

Todavia, as regras legais, que estabeleciam que os magistrados gozariam de férias coletivas, perderam seu fundamento de validade quando da promulgação da Emenda Constitucional 45/04.

Nem poderia ser diferente, uma vez que a norma constitucional plasmou novo paradigma para a matéria, contra a qual nada pode prevalecer.

9. Daí o art. 2º da Resolução 3/05, que, ao dar ciência aos tribunais de serem “inadmissíveis quaisquer justificativas relativas a período futuro, ficando definiti-vamente extintas as férias coletivas, nos termos fixados na Constituição”, apenas releva a impossibilidade de ser admitida transigência a descumprimento da norma constitucional em referência por parte do Conselho Nacional de Justiça.

10. A revogação do art. 2º da Resolução 3/05 pelo Conselho Nacional de Justiça conduz à suposição – reitere-se, equivocada – de que esse órgão admitiria justificativas relativas a férias coletivas dos magistrados, em confronto exemplar com o ditame constitucional vigente há praticamente dois anos (a se completar em dois dias).

11. Nos consideranda apostos na resolução em causa, a eminente Ministra Ellen Gracie afirma que atende o quanto decidido na sessão do dia 24 de outubro de 2006.

A ata daquela sessão noticia que, “aberta a sessão, a Presidente do Conse-lho, Ministra Ellen Gracie, deu ciência ao Plenário de manifestações recebidas do Colégio Permanente de Presidentes de Tribunais de Justiça, do Fórum Per-manente de Corregedores-Gerais da Justiça Federal, de Presidentes de Tribunais Regionais Federais e da Ordem dos Advogados do Brasil no sentido de que a suspensão das férias coletivas tem causado graves prejuízos à prestação jurisdi-cional nos Juízos e Tribunais de 2º grau, comprometendo os princípios consti-tucionais da celeridade e da eficiência, causando o desmantelamento dos órgãos julgadores, gerando dificuldades para manter a continuidade da jurisprudência, causando forte comprometimento orçamentário da Justiça Federal além de acar-retar a perda de produtividade nos julgamentos de primeiro grau e comprometer o interesse de inúmeros advogados que estão sendo prejudicados pelo critério vigente e reclamam satisfatória revisão. Em seguida, a Presidente do Conselho, Ministra Ellen Gracie, face às diversas manifestações recebidas, propôs a alteração da Resolução 3 deste Conselho, com a revogação de seu art. 2º. Dada a palavra ao Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral da República, este não se opôs à referida revogação, desde que se mantenha a prestação jurisdicional ininterrupta, como determina a Constituição Federal. Não tendo havido divergência, restou aprovada, por unanimidade, a Resolução 24 (...)”.

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12. A motivação do ato exarado pela eminente Presidente do Conselho Nacional de Justiça explicita razões aceitáveis, a serem submetidas ao Congresso Nacional, a fim de que ali se verifique a possibilidade e a conveniência de modi-ficação do quanto introduzido no texto constitucional, na forma do art. 93, inciso XII, pela Emenda Constitucional 45/04.

Mas aquelas não são razões bastantes, menos ainda autorizativas para se ad-mitir descumprimento de norma constitucional. Nem se dá, ali, base que afaste a divergência que ressai – pelo menos numa análise preliminar – entre as normas de-correntes do quanto contido na Resolução e o quanto disposto na norma-paradigma constitucionalmente posta.

13. O advento de uma norma jurídica a inovar o sistema pode demonstrar, em sua aplicação, inconvenientes e condições indesejáveis que impõem a sua mudan-ça. Mas eventuais inconvenientes que se demonstrem não são razões suficientes para se deixar de cumprir a norma jurídica enquanto ela estiver em vigor, menos ainda quando se cuidar de norma constitucional.

Tanto significaria renunciar ao princípio da juridicidade, que há de prevale-cer quanto aos agentes públicos, entre os quais os magistrados, para que se mante-nha o estado de direito.

O caminho jurídico único para se alterar a Constituição do Brasil está esta-belecido, expressa e restritivamente, em seu texto mesmo, estatuindo-se, em seu art. 60, as regras da atuação da competência constituinte reformadora.

Decisão estabelecendo que se admitirá descumprimento da norma constitu-cional por outra, de categoria infralegal, é deixar de observar não apenas aquela regra, mas o sistema constitucional por completo, que não tolera imposição de providências contrárias ao quanto nele estatuído.

14. Ademais, a proibição de férias coletivas dos magistrados – a ser repen-sada pelo constituinte reformador se tanto ele assim entender e deliberar – con-figura forma de dar eficácia ao princípio da ininterruptabilidade da jurisdição.

é certo que há outras formas para se assegurar aquele princípio, mas somente a própria Constituição poderá afastar o óbice por ela posto, expressamente, a que o legislador ou os órgãos judiciais pudessem eleger diferentes alternativas para se dar cumprimento ao princípio.

Enquanto vigorar a norma, pelo menos no quanto apurado neste exame cau-telar, cumpre fazer prevalecer a proibição de férias coletivas de juízes e membros dos tribunais de segundo grau, suspendendo-se a eficácia de atos que ponham em risco a efetividade daquela vedação constitucional.

15. A Resolução 24/06, do Egrégio Conselho Nacional de Justiça, é ques-tionado na presente ação também em face do art. 103-B, § 4º, da Constituição da República (norma igualmente introduzida pela Emenda Constitucional 45/04).

16. Dispõe aquela norma:

Art. 103- B (...)§ 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder

Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

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I - zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magis-tratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;

II - zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a le-galidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, po-dendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União;

III - receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciá-rio, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços nota-riais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou pro-ventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa;

IV - representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso de autoridade;

V - rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e mem-bros de tribunais julgados há menos de um ano;

VI - elaborar semestralmente relatório estatístico sobre processos e sentenças prolata-das, por unidade da Federação, nos diferentes órgãos do Poder Judiciário;

VII - elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias, sobre a situação do Poder Judiciário no País e as atividades do Conselho, o qual deve integrar men-sagem do Presidente do Supremo Tribunal Federal a ser remetida ao Congresso Nacional, por ocasião da abertura da sessão legislativa.

Órgão de controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, não se nota, pelo menos em análise preliminar para decisão sobre o pedido de medida cautelar, o embasa-mento para expedir normas sobre o direito dos magistrados, menos ainda para se admitir como providência legítima o gozo de férias coletivas daqueles agentes públicos.

17. Assim, também este fundamento apresentado pelo Procurador-Geral da República há de ser, cautelarmente, tido por aceitável para o deferimento da medi-da cautelar requerida.

O Ato Regimental 25, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios

18. Como transcrito, as normas do Ato Regimental 25/06, do Egrégio Tri-bunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios dispõem, exata e repetida-mente, sobre férias coletivas dos membros daquele digno órgão e dos juízes a ele vinculados. São os termos literais do art. 1º daquela Resolução: “Os membros do Tribunal de Justiça e os juízes de primeiro grau gozarão as férias do ano de 2007 nos períodos de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho de 2007.”

Como se cuidam “dos membros do Tribunal (...) e os juízes de primeiro grau” a fruir, coletivamente, as férias, tem-se por inequívoco que aquele ato res-tabeleceu as férias coletivas dos magistrados, em afronta modelar ao disposto no art. 93, inciso XII, da Constituição da República.

19. Nem se põem em questão, ainda uma vez, as conveniências e as incon-veniências administrativas daquela vedação para os membros do Poder Judiciá-rio e para os demais profissionais da comunidade jurídica, conforme antes se acentuou.

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Mas não há conveniência administrativa que possa prevalecer contra texto literal da Constituição.

20. Como guarda da Constituição (art. 102, caput), ao Supremo Tribunal compete tão-somente o julgamento – enfatize-se, ainda aqui, em fase preliminar para a apreciação da medida cautelar requerida na ação – da validade constitucio-nal de norma de hierarquia inferior, a que se chega pelo cotejo entre a norma-paradigma e a outra, impugnada como inválida.

No caso ora apreciado, pelo menos em primeiro exame, sustenta-se a ale-gação de estarem os atos normativos questionados eivados do vício de inconsti-tucionalidade.

Da medida cautelar

21. O requerimento de medida cautelar (art. 102, inciso I, alínea p, da Consti-tuição) aponta elementos consistentes a demonstrar a possibilidade de haver riscos para a eficácia da decisão que, ao final, vier a ser proferida nesta ação direta, se não houver a suspensão imediata dos efeitos das normas questionadas.

Afirma o Procurador-Geral da República que “os reflexos dessas decisões sobre todo o âmbito do Judiciário são evidentes. Avizinha-se o encerramento do ano de 2006, e com ele a aplicação imediata da resolução do TJDFT, assim como a adoção dos termos da manifestação do CNJ por outros tribunais, a expandir o quadro de inconstitucionalidade. A informação de que os trabalhos forenses serão, ou não, interrompidos demanda, para resguardo da segurança jurídica, imediata consolidação. A declaração de inconstitucionalidade pode, inclusive, ver-se pre-judicada no que se refere ao mês de janeiro, considerando que o ato regimental do TJDFT demarca dois períodos específicos (janeiro e julho de 2007)” (fl. 8).

22. Pelo exposto, Srs. Ministros, voto no sentido de deferir a medida cau-telar na forma requerida pelo eminente Procurador-Geral da República, para se suspender, a partir de agora, a eficácia dos dispositivos do Ato Regimental 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, e da Resolução 24, de 24 de outubro de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, mantendo-se a observância estrita do quanto disposto no art. 93, inciso XII, da Constituição da República.

23. Na oportunidade processual própria, serão colhidas informações do Conselho Nacional de Justiça (art. 170 do RISTF) bem como manifestações do Advogado-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República (art. 103, § 1º e § 3º, da Constituição do Brasil).

VOTO

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Senhor Presidente, antes de proferir meu voto, peço vênia para fazer algumas considerações de ordem geral sobre o Conselho Nacional de Justiça.

Inicialmente, é preciso estabelecer qual a natureza jurídica do Conselho Nacional de Justiça. Verifico que o Conselho, embora esteja inserido no Título IV, que trata da Organização dos Poderes, Capítulo III, Seção I, da Constituição

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Federal, figurando, no art. 92, como um dos órgãos do Poder Judiciário, apre-senta, a meu ver, natureza eminentemente administrativa, e não legislativa ou judiciária.

Da mesma forma o Tribunal de Contas da União; embora seja mencionado no mesmo Título IV, Capítulo I, que trata do Poder Legislativo, Seção IX, ninguém atribui poder legislativo ao Tribunal de Contas. Trata-se de mero órgão auxiliar do Congresso Nacional, como reconhecem, pacificamente, a jurisprudência e a doutrina.

Então, órgão administrativo que é, o Conselho Nacional de Justiça não pode inovar em matéria legislativa nem tomar decisões de caráter judicial ou jurisdicio-nal. Cumpre a ele respeitar o princípio da reserva legal e da reserva de jurisdição, que, evidentemente, não foi quebrado pelo constituinte derivado em favor do CNJ na Emenda Constitucional 45. Logo, por meio de atos regulamentares, o Conselho não pode substituir-se à vontade geral que é expressa, como disse a eminente Mi-nistra Cármen Lúcia, em conformidade com os preceitos constitucionais.

Não é possível, Senhor Presidente, que, no estado democrático de direito, um órgão administrativo expeça resoluções, decretos ou portarias com força de lei, ou, o que é pior, com força de norma constitucional.

O Conselho Nacional de Justiça – isso, a meu ver, vale também para o Con-selho Nacional do Ministério Público – enfrenta duas limitações bem claras: em primeiro lugar, uma stricto sensu, pela qual não podem expedir regulamentos com caráter geral e abstrato em face do princípio da reserva legal; em segundo lugar, uma limitação lato sensu, a qual diz respeito à impossibilidade de cercearem, por meio de atos que expedem, de direitos e garantias fundamentais dos cidadãos.

Também penso não poder limitar a prerrogativa dos magistrados nem a au-tonomia administrativa e financeira que a Constituição atribui aos tribunais e aos magistrados, salvo nas hipóteses de correição e de controle, estritamente balizadas no texto constitucional.

Senhor Presidente, aproveito também a ocasião para expressar uma preo-cupação relativamente à adoção de certos procedimentos de natureza judi-cialiforme pelo CNJ e também pelo Conselho Nacional do Ministério Público, notadamente a concessão de liminares, sustando atos dos mais diversos, cujas conseqüências acabam onerando o Supremo Tribunal Federal.

Cito dois exemplos recentes que passaram pelo meu Gabinete e entendo oportuno fazê-lo neste momento, embora não estritamente ligados à matéria em questão, para podermos pensar coletiva e conjuntamente sobre a natureza jurídica desse novo órgão que a Emenda Constitucional 45 introduziu na Constituição.

No primeiro deles, o Conselho Nacional do Ministério Público, por meio de uma liminar, sustou a posse de alguns promotores aprovados em concurso pú-blico num Estado do norte do País. No outro caso, também mediante liminar, o Conselho Nacional de Justiça garantiu a classificação de uma candidata a juíza do Trabalho em concurso público porque não teria havido lá uma revisão de pro-vas, etc. E essas liminares foram concedidas sem que tivessem sido esgotadas as

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instâncias administrativas inferiores, pois os interessados per saltum reclamaram diretamente a esses dois conselhos nacionais. Os interessados também não bus-caram amparo nos órgãos competentes do Poder Judiciário. Os prejudicados, relativamente a essas liminares, ingressaram com mandado de segurança direta-mente no Supremo, pois as autoridades coatoras eram os Conselhos Nacionais do Ministério Público e da Justiça, significando que o Supremo Tribunal Federal, daqui por diante, será o foro adequado para dirimir questões relativas a concur-sos públicos de ingresso no Ministério Público ou na magistratura em todos os rincões deste País.

Parece que isso também se passa relativamente aos cartórios, porque tenho notícia de que há decisões do CNJ, de caráter liminar, interferindo em concursos de cartório. Nós que recentemente nos livramos de constituirmos uma instância recursal dos juizados especiais criminais.

Por essas e por todas as razões expendidas no notável voto da Ministra Cármen Lúcia, também defiro a liminar.

VOTO

O Sr. Ministro Eros Grau: Senhor Presidente, não há mais o que dizer, pois o texto da Constituição é extremamente claro.

Acompanho o voto da Ministra Cármen Lúcia, sem dúvida.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhor Presidente, considero essa ação direta de inconstitucionalidade emblemática e uma boa oportunidade para se discutir o próprio papel do Conselho Nacional de Justiça, conforme, aliás, fez a Ministra Relatora, no seu magnífico voto, na companhia do Ministro Ricardo Lewandowski. O fato é que o inciso XII do art. 93 da Constituição, por efeito da Emenda 45, de dezembro de 2004, trouxe a novidade da ininterrupção da atividade jurisdicional, e, para torná-la efetiva, vedou férias coletivas aos juízes e tribunais de segundo grau. Fazendo-o numa norma de eficácia plena e aplicabilidade imediata, para usar de uma linguagem, tão conhecida na doutrina, de José Afonso da Silva. Trouxe mais, exigiu que juízes ficassem em plantão permanente; reafirmou o Conselho de Justiça Federal e criou o Conselho de Justiça do Trabalho, assim como o Conselho Nacional do Ministério Público; instituiu a chamada justiça itinerante nos tribunais regionais federais e nos tribunais de justiça; aparelhou bem melhor as defensorias públicas; aportou os institutos da súmula vinculante e da repercussão geral. Ou seja, uma nova cultura jurídica foi concebida. Evidente que todo esse novo conjunto normativo, visando a fazer da duração razoável do processo e da celeridade na sua tramitação um efetivo direito individual, con-forme agora estampado no inciso LXXVIII do art. 5º da Magna Carta, tende a efetivar o princípio da universalização da Justiça ou do acesso desembaraçado à jurisdição. Ocorre que isso provocou um choque de cultura. Havia uma cultura enraizada nos fatos e a Emenda 45 introduziu novidades que postulam mudanças estruturais, de comportamento, dando-se, nesses dois primeiros anos, um choque

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dos fatos com as normas. Mas é um tipo de choque factual-normativo que só há de ser resolvido em prol das normas, a menos que se modifique a Constituição, disse bem a eminente Relatora, Cármen Lúcia.

O que se chama de percalço, de dificuldades irremovíveis, muitas vezes não passa de uma falta de disposição para se adaptar à nova ordem jurídica, e, no caso, uma nova ordem de matriz constitucional. Às vezes nos esquecemos de que a luz no fim do túnel dificilmente está no fim do túnel, está nas nossas cabeças. Quer dizer, é preciso uma predisposição, uma mudança de mentalidade para que essa nova ordem constitucional, debatida por 13 anos no Congresso Nacional, torne-se uma realidade, e, aí, há de funcionar a imaginação, a criatividade, a dis-posição para conviver com o novo.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Apenas uma observação de natureza histórica: debatida no Congresso Nacional e convertendo-se em preceito da Emenda Constitucional 45, na linha do que prevalecera no Supremo Tribunal, em 1992, gestão Sydney Sanches, na proposta de Lei Orgânica da Magistratura e curiosamente como uma reivindicação da Ordem dos Advogados do Brasil.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Perfeito, uma reivindicação da Ordem dos Advogados do Brasil.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): No próprio projeto de lei or-gânica?

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sim, no projeto da lei orgânica em que discutimos, nele propunha-se uma eliminação e dissemos que para os tribunais superiores não, por causa da sua função de uniformização jurisprudencial; gera-ria o caos num tribunal como o Supremo, tão propenso às votações seis a cinco.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Essa é exatamente a queixa que agora vem sendo feita também em relação aos tribunais de justiça por conta da composição das turmas.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Há inconvenientes indubitáveis. Por exemplo, não me havia ocorrido – vi na declaração de um desembargador, na imprensa nos últimos dias – o problema do revisor na apelação.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Quanto às férias individuais.

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): Por isso, chamei à atenção para as inconveniências que se constataram depois da aplicação da norma; agora, en-quanto a norma estiver em vigor...

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Para reforçar o que V. Exa. está dizendo e o que já observou o eminente Ministro Sepúlveda Pertence, recordo-me precisa-mente do eco e da intensidade de vozes autorizadas da advocacia, as quais, coin-cidentemente, tinham assento no Congresso Nacional, contra as falhas da magis-tratura, em particular contra o absurdo de, perante o acumulo de serviço, haver férias anuais. Isso mostra bem que nem sempre a opinião pública e pretensões de ordem corporativa correspondem às necessidades coletivas e ao bem público.

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): Sr. Ministro Cezar Peluso, eu mes-ma, como membro da Comissão de Estudos Constitucionais do Conselho Federal,

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fui instada junto com Paulo Bonavides e José Afonso a redigir uma proposta exata-mente no período indicado pelo Senhor Ministro. Quando a norma entra em vigor, experimenta-se, se não der certo, tem-se que mudar a Constituição.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Nas discussões legislativas, dentro ou fora do Congresso Nacional, muitas propostas confiam no juízo da maioria para rejeitá-las, e, às vezes, a maioria não corresponde à expectativa dos dissidentes confiantes e as aprova.

O Sr. Ministro Carlos Britto: O fato é que as normas constitucionais estão aí. A eminente Relatora fez um voto de proclamação de fé na Constituição e de respeito irrestrito aos seus comandos. Eu também direciono o meu pensamento para esse respeito integral à Constituição e vou terminar, se V. Exas. me permi-tem, contando uma pequeníssima história pela sua carga simbólica diante desse choque cultural que estamos a vivenciar: Uma garotinha de 7 ou 8 anos foi fazer uma prova de desenho na escola e desenhou uma galinha voando perto das nuvens, com todo desembaraço, como se fosse um pássaro, e a galinha tinha três pernas. A professora foi corrigir o exercício, a prova, e com todo jeito, para não traumatizar a criança, disse que o desenho estava tecnicamente perfeito, mas a mensagem era ilógica e censurou a aluna dizendo: galinha não tem três pernas e não voa como os pássaros. A menina respondeu: eu sei, professora, que galinha não voa como os pássaros, nem tem três pernas. Eu só coloquei a terceira perna para dar o im-pulso. é esse tipo de criatividade que faz a diferença.

Acompanho a Relatora.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Senhor Presidente, não tenho nada por acres-centar ao denso voto jurídico da eminente Ministra Relatora. Realmente, trata-se de norma ou de ato com pretensões normativas absolutamente incompatíveis com a Constituição, uma diretamente, e a outra porque suscita a falsa impressão de que o Conselho tem poderes para baixar atos com pretensões de inibir ou atenuar a eficácia de normas constitucionais. Evidentemente – sem me compro-meter com a extensão das observações, que considero ponderáveis, do eminente Ministro Ricardo Lewandowski –, o Conselho Nacional não tem poder de criar direitos, nem de extinguir ou restringir obrigações da magistratura.

De modo que acompanho, com essas observações, o voto da eminente Re-latora.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, não sou bruxo, mas, quan-do das discussões relativas à Emenda 45/04, que introduziu no cenário o Conselho Nacional de Justiça, apontei que estaríamos diante de uma previsão criadora de um superórgão e discorri a respeito, mostrando-me estarrecido quanto à mesclagem de um dispositivo da Constituição Federal, o art. 99, que revela a autonomia adminis-trativa e financeira dos tribunais e a previsão atinente às atribuições do Conselho, que pode, de ofício, avocar processos administrativos encerrados, nos tribunais, a

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menos de um ano. Não se trata da instauração de um processo no Conselho para apurar possível desvio de conduta implementado, ocorrido no desenvolvimento do processo administrativo findo na origem, mas de avocação para a revisão. Vive-mos uma fase, já disse com desassombro neste Plenário, de perda de parâmetros. Evidentemente, surge, com eficácia maior, a previsão do art. 102 da Constituição Federal, segundo a qual cabe ao Supremo a guarda dessa Carta, tão mal-amada.

Estou convencido de que é rígida, de que a alteração pressupõe observação irrestrita ao que se contém nela própria, às balizas do art. 60. Vejo que nem todos pensam assim. Imagina-se que o Conselho, apontado como superórgão, pode, até mesmo, postergar norma de eficácia imediata contida no corpo permanente da Constituição. A clareza do inciso XII do art. 93 salta aos olhos, é meridiana. Tem-se em bom vernáculo:

Art. 93 (...)(...)XII - a atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juí-

zos e tribunais de segundo grau, funcionando, nos dias em que não houver expediente normal, juízes em plantão permanente.

O Conselho defrontou-se, em 2005, com realidade alusiva à programação de férias coletivas dos tribunais sob o ângulo da fixação no tempo e, então, bai-xou o ato referido pela Relatora, pretérito, prevendo e placitando, diria eu, as férias coletivas já verificadas nos tribunais, consignou: acolher as justificativas apresentadas pelos tribunais que mantiveram as férias coletivas marcadas para julho de 2005, uma vez que demonstrada a transitória força maior.

Ele próprio, o Conselho, atuou de forma pedagógica ao inserir um outro artigo, estabelecendo e cientificando os tribunais que seriam inadmissíveis quais-quer justificativas relativas a período futuro, ficando definitivamente extintas as férias coletivas, nos termos fixados na Constituição. Mais claro do que a dispo-sição? Passado o período de um ano, houve a revogação desse art. 2º, abrindo-se margem ao restabelecimento das férias coletivas, colocando-se em plano secun-dário os ditames maiores da Carta de 1988, como se o inciso XII do art. 93 fosse um simples penduricalho, sem concretude maior.

Estou a viver, Presidente, como administrador do Tribunal Superior Eleitoral, um incidente com o Conselho Nacional de Justiça no que, atropelando a direção de um tribunal superior da Nação, do País, certo magistrado, qualificando-se como juiz auxiliar da Presidência, secretário-geral do superórgão, veio a endereçar – ainda bem que não se dirigiu ao Presidente, porque o ofício seria devolvido – ao Diretor-Geral do Tribunal Superior Eleitoral ofício dando conta de negociação a implicar redução de verba para custeio de pessoal e – pasmem os Colegas – consignando: “Por oportuno, informo a Vossa Senhoria que, para quitação de despesas não pre-vistas na lei orçamentária e nos créditos adicionais, faz-se necessária a manifes-tação prévia deste Conselho” – como se o Conselho também pudesse autorizar, à margem da lei orçamentária, como se o Conselho também tivesse a chave da Casa da Moeda, para aportar créditos adicionais visando a fazer frente a despesas.

Tenho uma história de vida que confirma que sempre entendi prerrogativa como dever, e não como direito. Daí haver encaminhado ofício – vou lê-lo para

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que fique nos anais desta Corte – à Presidente do Conselho – tomando-a em tal qualidade, e não como Presidente do Supremo. A reação ao juiz auxiliar do Con-selho foi imediata:

Em atenção ao ofício nº 769/SG, estranha e equivocadamente dirigido ao Diretor-Geral do Tribunal Superior Eleitoral, consigno que:

1. Os valores anteriormente acordados para atender a despesas com pessoal e encargos sociais da Justiça Eleitoral neste exercício foram alterados sem o prévio conhe-cimento desta Corte.

2. Tal procedimento afronta cabalmente o texto do artigo 99 da Constituição Fe-deral, que assegura autonomia administrativa e financeira ao Poder Judiciário, carecendo o Conselho de competência para atuar em substituição aos presidentes dos Tribunais Superiores.

3. Consoante dispõe o § 4º do artigo 103-B da Carta da República, a competên-cia do Conselho Nacional de Justiça restringe-se ao “controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes (...)”, não abrangendo o desempenho da atividade administrativa em si mesma. Res-salto que a administração do Tribunal Superior Eleitoral cabe ao Presidente da Corte, afigurando-se de todo desnecessário o assessoramento desse Conselho.

Não tive que lançar o “devida vênia” no início desse ofício, mas o terminei com urbanidade: Atenciosamente, Ministro Marco Aurélio, Presidente da Corte.

Estamos a ver a quadra vivida, e penso que é hora de o Supremo começar a atuar. Eu próprio, há dois dias, deferi liminar contra um ato do Conselho Nacional do Ministério Público que estaria, pelo menos à primeira visão, a implicar subs-tituição de requisitos para promoção de integrantes do Ministério Público por merecimento, requisitos legais.

Senhor Presidente, as instituições hão de funcionar sempre e sempre, con-siderado o estado democrático de direito existente neste País, e o Supremo será a última trincheira do cidadão, a última trincheira em que se buscará a prevalência do direito subordinante, do direito posto.

Nada justifica a colocação em plano inferior da Constituição da República. A forma de alterar o que inserido na Carta pela Emenda 45/04 é própria. Mostra-se necessária, consoante os parâmetros do art. 60 dessa mesma Carta, a tramitação de emenda constitucional, até que seja promulgada. Não cabe ao Conselho, por melhor que seja a intenção – e o mundo está cheio de pessoas bem-intencionadas –, simplesmente driblar a norma maior para chegar ao resultado visado.

Urge providência que reponha as coisas nos seus devidos lugares, para que não reine a babel.

Defiro a cautelar e suspendo a eficácia do ato, acompanhando S. Exa. a Re-latora no voto proferido.

VOTO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Senhor Presidente, acolho integralmente o voto da eminente Relatora, Ministra Cármen Lúcia, que dispensa achegas.

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O art. 93, XII, da Constituição, na conformidade da Emenda Constitucional 45 – a chamada “reforma constitucional do Judiciário” –, que, no ponto, passou incólume por mais de uma década de discussões, é inequívoco.

E toda norma infraconstitucional – nem discuto, em tese, a competência do Conselho Nacional de Justiça para dispor a respeito – que tenda a converter a proibição incondicionada do inciso XII do art. 93 em permissão total ou parcial, sob qualquer pretexto ou justificativa, é patentemente inconstitucional.

O memorial do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil pro-põe uma “destrinça entre férias coletivas e férias forenses”, argumentando que estas últimas seriam matéria da lei processual. Com todas as vênias, a distinção é artificiosa.

é evidente que, quando se fez uma reforma constitucional do Judiciário, e, mal ou bem, não apenas se determinou que não haveria férias coletivas, mas se vinculou essa proibição ao funcionamento ininterrupto da atividade jurisdicio-nal – não foi, como sugere a Ordem, para que os juízes, sem entrar em férias, se dedicassem ao estudo de processos que não tivessem tido tempo de resolver –, mas não à prática de atos processuais, pois esses estariam interrompidos, não por força de férias coletivas, mas por força de férias processuais.

Compreendo as razões de conveniência que levam a Ordem a esse raciocí-nio: é, porém, um esforço advocatício que não chegou a abalar minimamente a minha convicção.

Aqui já se repetiu à exaustão que a verificação de inconveniências de uma solução constitucional não é motivo para descumpri-la: sobretudo em um país tão acostumado a emendas constitucionais, seria apenas razão para suscitar uma nova emenda, e não para dispensar onde a Constituição não admitiu dispensas.

Uma breve observação de pura tecnicalidade em uma discussão que chegou a ficar emocionante. Vou esfriar um pouco o ambiente.

Causou-me, de início, certa perplexidade o cabimento da ação direta contra o tal art. 2º da Resolução 24 do Conselho Nacional de Justiça, na linha, aliás, do que hoje ponderava o eminente Procurador-Geral da República ao explicar que não se tenha manifestado contra a resolução no Plenário do Conselho: é que, por ele, revogava-se uma norma, a rigor dispensável para fazer cumprir uma norma auto-aplicável da Constituição e, por isso, nada se inovava no império da norma constitucional fundante.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Atribuiu-se um significado diverso.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Pois é. Efetivamente, conforme demons-trou a Ministra Cármen Lúcia, o art. 93, XII, no ponto que interessa, sendo tipi-camente uma norma proibitiva, é um exemplar típico de regra constitucional de eficácia plena e aplicabilidade imediata.

O Tribunal teve oportunidade de assentá-lo, em uma das questões de massa que mais nos atormentaram nessas quase duas décadas de vigência da Constitui-ção; a propósito do art. 195, § 5º, da Constituição, que veda que qualquer benefí-cio previdenciário continuado seja inferior ao salário mínimo.

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Ao argumento da autarquia previdenciária de que isso dependeria de disci-plina infraconstitucional para estabelecer a fonte de custeio, a resposta do Tribu-nal, unânime e reiterada cerca de doze mil vezes – segundo o último levantamento do qual tive conhecimento –, é que, em se tratando de norma proibitiva, a sua eficácia era imediata e independia de qualquer disciplina financeira infraconsti-tucional.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Se V. Exa. me permite, toda norma constitucio-nal veiculadora de vedação, se ela não contém em si mesma nenhuma ressalva, é absolutamente plena e de incidência imediata; é o caso do artigo.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Por isso me impressionou essa indagação que me pus, pois, em princípio, uma norma que se limita revogar outra só será in-constitucional se, em razão dessa revogação, criar-se, dado o ordenamento jurídico restante, uma situação de inconstitucionalidade antes inexistente.

Os anais do Tribunal registram, a propósito, um voto antológico do eminente Ministro Celso de Mello na ADI 769, na qual discutia lei que revogava uma norma que vinculava subsídios de deputados estaduais aos reajustes gerais dos servidores públicos do Estado.

Mostrou S. Exa. que:

A análise isolada do dispositivo em questão, (...) [dispositivo meramente revocatório] não permite que nele se vislumbre a indigitada eiva de inconstitucionalidade, eis que o comando negativo que dele emerge não opera instauração, no âmbito do sistema normativo, de qualquer conflito hierárquico com o texto da Lei Fundamental.

Depois de outras considerações, recorda um exemplo claro não só de cabi-mento de controle direto de inconstitucionalidade de norma meramente derroga-tória, mas também de sua chapada inconstitucionalidade. E relembra acórdão do Tribunal Constitucional de Portugal – Acórdão 39/84 – do qual foi Relator o emi-nente professor e então Conselheiro daquele tribunal, Vital Moreira, que acentua:

Que o Estado não dê a devida realização às tarefas constitucionais, concretas e determi-nadas, que lhe estão cometidas, isso só poderá ser objecto de censura constitucional em sede de inconstitucionalidade por omissão. Mas quando desfaz o que já havia sido realizado, para cumprir essa tarefa, e, com isso atinge uma garantia de um direito fundamental, então a censura constitucional já se coloca no plano da própria inconstitucionalidade por ação.

Se a Constituição impõe ao Estado a realização de uma determinada tarefa – a criação de uma certa instituição – pensemos, entre nós, na criação da defensoria pública – uma deter-minada alteração na ordem jurídica –, então, quando ela seja levada a cabo, o resultado passa a ter a proteção direta da Constituição. O Estado não pode voltar atrás, não pode descumprir o que cumpriu, não pode tornar a colocar-se na situação de devedor (...)

Se o fizesse, incorreria em violação positiva (...).

O Sr. Ministro Carlos Britto: Proibição de retrocesso.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Seria, em termos, corolário da proibição de retrocesso com um espectro mais amplo: qualquer mandato de legislar, uma vez cumprido, pode ser substituído por norma infraconstitucional de teor diverso, mas não, simplesmente, por disposição que faça voltar as coisas ao vácuo constitucional anterior.

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Ler o texto do aresto português – muito bem invocado pelo Ministro Celso de Mello – recordou-me a situação da Defensoria Pública, que a Constituição impõe aos Estados estabelecer e que, não obstante o Estado de São Paulo, só no começo do ano passado ou deste ano veio a implementar. Seria possível, nesse momento, não lhe substituir a organização por outra, mas simplesmente revogar e extinguir uma instituição que a Constituição impôs ao Estado que criasse?

Mas, o caso concreto não tem essa grandeza: revela outra hipótese de contro-le admissível e de juízo positivo de inconstitucionalidade de uma norma simples-mente derrogatória, na medida em que a revogação induza, em cotejo com o quadro normativo anterior a ela, a uma violação da Constituição.

é o que sucede. O art. 2º da Resolução 3 do CNJ era a rigor inócuo, mera-mente pedagógico, conforme aduziu o Ministro Marco Aurélio. Aceitou o Conse-lho, em face de a EC 45/04 só ter sido publicada em 31 de dezembro, uma situação de força maior, que o levou a garantir as férias já programadas para janeiro do ano seguinte e, para não criar o tumulto no restante, que o segundo mês de férias se cumprisse em julho. Mas, aí, pedagogicamente, se explicitou que aí cessariam as tolerâncias, e nenhuma outra justificativa seria aceita. A resolução, ora ques-tionada, do CNJ apenas revogou a anterior. Em princípio, nada se alterou, porque invalidar aquela declaração do CNJ de que não tolerará nenhuma justificativa para perseverar nas férias coletivas não revoga obviamente a proibição constitucional delas.

Mas demonstra o segundo ato normativo questionado, o do colendo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que efetivamente essa revogação posta em cotejo com o quadro normativo anterior – o qual afirmava que a Constituição estava em vigor e devia ser cumprida – gerou uma situação, pelo menos uma dúvida objetiva, sobre se seriam possíveis, de novo, atos de preservação das tradicionais férias fo-renses nos tribunais de segundo grau.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Ou seja, o ato revocatório ou revogatório afas-tou a inadmissibilidade de quaisquer justificativas.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Não existisse o ato do Conselho, o Tribunal de Justiça não teria deliberado jamais.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Por isso digo: em cotejo com a situação normativa criada anteriormente. Eu me indaguei apenas se, sendo assim, o caso não seria de interpretação conforme. Mas é uma questão puramente técnica que deixo à sabedoria dos que venham a participar do julgamento definitivo desta ação direta. Ficarei observando, respeitosamente, da platéia ou pela TV Justiça.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Aguardaremos a sua participação com ele-vação da idade para expulsória.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: V. Exa. está contra mim hoje. Não fiz nada, não tirei verba do TSE.

Senhor Presidente, ante observações extrajurídicas, inevitavelmente feitas hoje, eu me permito uma breve observação: fui defensor, quando Presidente do

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Tribunal, da necessidade de um órgão central que, para evitar a carga negativa da locução “controle externo”, eu chamava de um órgão central de administração superior do Poder Judiciário nacional.

A minha restrição, posta na ação direta contra a sua criação pela Emenda Constitucional 45, reduziu-se, por questões de princípio, à investidura a termo de dois dos membros do CNJ pelas Casas do Congresso Nacional. (E, entre parên-teses, digo que, no primeiro exercício dessa incumbência, houveram-se as Casas do Congresso Nacional, com grande sabedoria, investindo duas figuras da maior respeitabilidade.)

Incidentemente depois, não me recordo em que caso, disse que o Conselho Nacional de Justiça poderia aliviar a pressão sobre o Supremo Tribunal Federal, para exercer certos atos de controle sobre decisões administrativas de outros órgãos judiciários, com base na letra n do rol constitucional de competências do Tribunal.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Deixaríamos, segundo o Ministro Francisco Rezek, de cuidar da clientela interna.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Devo dizer que certos atos recentes do novo Conselho aumentam o meu temor de que o tiro haja saído pela culatra. En-quanto a competência da letra n estava sujeita a uma série de condicionantes, cuja craveira do Tribunal apertou o quanto pôde, partindo a decisão administrativa do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, não há salvação: a competência será nossa, seja em ação direta, seja, pelo menos, em mandado de segurança. Em ação popular, felizmente, o Tribunal me acompanhou e decidiu que aí também era demais (Pet 3.674, Pertence, 4-10-06).

São apenas temores e espero não se venham a confirmar.

Acompanho, integralmente, o voto da eminente Ministra Relatora para deferir a medida cautelar.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Srs. Ministros, também tenho voto na matéria e fiz breves anotações, registrando aquela perplexidade agora destacada pelo Ministro Sepúlveda Pertence. Mas confortou-me a idéia de que o importante aqui era o significado que o Conselho atribuiu à própria revogação, ressaltando aquilo que tem sido cantado em prosa e verso pelos filósofos do di-reito, a partir do nosso destacado Reale, de que a norma é a sua interpretação. E, no caso, o intérprete autêntico atribuiu esse efeito, perplexidade que também foi traduzida na manifestação do Procurador-Geral com as cautelas de estilo.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Na situação criada é até uma forma de tranqüilizar a magistratura, de evitar percalços que uma futura declaração de in-constitucionalidade das férias coletivas poderia acarretar...

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Qual será a situação que regulará o quadro existente. Mas, claro, esse sistema poderá ser depois agitado em sede de julgamento.

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A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): Se V. Exa. me permite, apenas um dado: isso que foi objeto da preocupação, agora manifestada por V. Exa. e pelo Mi-nistro Sepúlveda Pertence, num primeiro momento, há dez dias, quando me chegou esta petição, também verifiquei.

Sempre penso a Constituição não como um texto, porém como um contexto.

Não há estado de direito no qual se possa pegar rigorosa e simplesmente a letra da lei. Aliás, sempre disse que o texto constitucional sem o contexto consti-tucional é mero pretexto para todo tipo de descumprimento. Quando o caput do art. 102 prevê que somos guarda da Constituição, não entendo assim, não estamos aqui para ser guarda de um texto, mas, sim, para sermos juízes da Constituição brasileira, que é tudo.

Apenas, Ministro, eu quis dizer que esta também foi uma preocupação minha quando me chegou a petição inicial e tive que, com tanta rapidez, elaborar isso.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Eu levantei uma pura tecnicalidade, mas, conforme observou bem o Ministro Presidente, estamos numa situação de urgência em que o importante é realmente uma declaração imediata.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Até porque, se fôssemos rigo-rosos, aquela primeira norma parecia – o que temos chamado de norma de efeito concreto – uma situação que já foi até superada, mas é claro que há consenso quanto a isso.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Não está sendo aqui colocado em discussão a competência normativa do Conselho se é primário ou não. Tudo isso foi uma discussão lateral.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Não.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sem fugir do texto, mas no contexto da situação de fato gerado pela norma, é preciso que o Supremo Tribunal dê uma solução, a mais rápida possível.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Estou anotando todos os aspec-tos: a impugnação do Procurador-Geral, a questão posta no art. 93, XII, e o pedido de cautelar.

Digo o seguinte:

Não vejo como não concordar com a pretensão cautelar do Procurador-Geral da Repú-blica, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.

A Emenda Constitucional 45, de 2004, ao alterar o art. 93 da Constituição, especificou, basicamente, três normas constitucionais, a saber:

a) a atividade jurisdicional será ininterrupta; b) são vedadas férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau;c) nos dias em que não houver expediente forense normal, juízes funcionarão em

plantão permanente.A primeira delas traduz o que se poderia denominar de “princípio da continuidade da

atividade jurisdicional”, que possui lastro nas garantias fundamentais do devido processo legal e dos direitos fundamentais à prestação jurisdicional efetiva e à duração razoável do processo.

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é bem verdade que o princípio da continuidade da atividade jurisdicional não impede que o legislador ou os tribunais, por seus regimentos internos, instituam férias forenses coleti-vas e periódicas, desde que adotadas medidas asseguradoras da não-interrupção da prestação jurisdicional.

No entanto, a Emenda Constitucional 45/04 foi mais longe: além de tornar expresso o princípio da continuidade da atividade jurisdicional, criou norma específica que a ele dá concre-tude, qual seja, a da proibição de férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau.

A nova norma constitucional vem acompanhada de outras reformas tendentes a assegurar a prestação jurisdicional efetiva e a duração razoável do processo. Assim, além do inciso XII, fo-ram também incluídos no art. 93 os incisos XIII, XIV e XV, que dispõem, respectivamente, que:

a) o número de juízes na unidade jurisdicional será proporcional à efetiva demanda judi-cial e à respectiva população;

b) os servidores receberão delegação para a prática de atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório;

c) a distribuição de processos será imediata, em todos os graus de jurisdição.A teleologia da mudança constitucional pode ser apreendida pela análise da justifica-

tiva apresentada pelo Senado Federal para a votação da matéria, verbis: “Esta emenda pretende fazer retomar ao texto da Proposta de Emenda à Consti-

tuição sobre a reforma do judiciário, as normas a respeito da vedação de férias coletivas e recesso forense nos termos aprovados pela Câmara dos Deputados. Entendemos ser esta opção mais razoável e consentânea com o interesse público porque assegura a con-tinuidade da prestação jurisdicional nos tribunais superiores.

Importa destacar que a presente proposta de emenda à Constituição faz incluir, entre os direitos e garantias individuais enumerados no art 5º da Constituição, como di-reito público subjetivo, o que denomina duração razoável do processo, além dos meios que garantam a celeridade de sua tramitação (do processo).

A concessão aos tribunais superiores de norma peculiar, distinta daquela dos juízes de primeira instância e dos tribunais de segunda instância, além de implicar inex-plicável quebra do princípio isonômico entre os magistrados, contribuirá, certamente, para retardar o andamento dos processos sob apreciação dos tribunais superiores.

Por tais razões, conclamamos às Senhoras e aos Senhores Senadores a aprovara presente emenda, a qual, simplesmente, faz retomar ao texto o entendimento sobre a matéria adotado pela Câmara dos Deputados.”Não é preciso muito esforço hermenêutico para concluir que a norma constitucional da

proibição de férias coletivas nos juízos e tribunais só poderá ser revogada por emenda consti-tucional, respeitado o art. 60 da Constituição.

Não poderia o Conselho Nacional de Justiça, por mera resolução, dispor da norma consti-tucional proibitiva das férias coletivas, baseando-se em protestos de juízos e tribunais no sentido de que ela (a) “tem causado graves prejuízos à prestação jurisdicional nos juízos e tribunais de segundo grau, comprometendo os princípios da celeridade e da eficiência”; ou que (b) “implica no desmantelamento não apenas das Turmas de Julgamento, como também das Seções Especia-lizadas e do próprio órgão Especial, ficando praticamente impossível concluir o julgamento dos feitos já iniciados, porque sempre mais de um membro do Colegiado estão de férias, o que gera dificuldade para manter a continuidade da jurisprudência em determinada matéria, por força da sucessiva composição diferenciada”; ou mesmo que (c) “tem causado forte comprometimento orçamentário para a Justiça Federal, decorrente do pagamento de diárias, passagens e diferenças remuneratórias de substituição de juízes de primeiro grau convocados, além de acarretar perda de produtividade nos julgamentos de primeiro grau”.

A análise de fatos e prognoses legislativos, assim como o controle de resultados, ou seja, das conseqüências produzidas pela aplicação da norma, é tarefa privativa do legislador, no caso, do legislador constitucional.

Como bem acentuado pelo Procurador-Geral da República, se o legislador constitucional baseou-se em prognósticos legislativos equivocados para estabelecer a norma constitucional da vedação de férias coletivas em juízos e tribunais, essa é uma questão que deve ser submetida no-vamente à apreciação do próprio legislador constitucional, respeitado o art. 60 da Constituição.

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De fato, o cumprimento desse novo comando constitucional, que proíbe as férias cole-tivas nos juízos e tribunais de segundo grau, tem causado entraves à própria prestação jurisdicio-nal efetiva. Dentre outros, sobressaem a dificuldade de produção de julgamentos regulares devido ao constante câmbio na composição das Turmas e os custos elevados com diárias, passagens e diferenças de remuneração de juízes de primeiro grau convocados.

Em outros termos, o cumprimento dessa norma, que veio para dar maior efetividade aos direitos fundamentais à prestação jurisdicional efetiva e à razoável duração do processo, está, ao contrário, subvertendo a lógica em que se baseou o legislador constitucional.

A aplicação prática da nova norma constitucional tem demonstrado que, de fato, o legis-lador constitucional baseou-se em fatos e prognoses legislativos equivocados.

Nesse sentido, nunca é demasiado enfatizar a delicadeza da tarefa constitucional confiada ao legislador. A generalidade, a abstração e o efeito vinculante que caracterizam a lei revelam não só a grandeza, mas também a problemática que marcam a atividade legislativa. A despeito dos cuidados tomados na feitura da lei (os estudos minudentes, os prognósticos realizados com base em levantamentos cuidadosos, etc.), não há como deixar de caracterizar o seu afazer como uma experiência. Trata-se, porém, da mais difícil das experiências, a “experiência com o destino humano”.

Essas peculiaridades do processo de elaboração legislativa foram percebidas por Victor Nunes Leal, que anotou, a propósito:

“Tal é o poder da lei que a sua elaboração reclama precauções severíssimas. Quem faz a lei é como se estivesse acondicionando materiais explosivos. As conse-qüências da imprevisão e da imperícia não serão tão espetaculares, e quase sempre só de modo indireto atingirão o manipulador, mas podem causar danos irreparáveis.”Os riscos envolvidos no afazer legislativo exigem peculiar cautela de todos aqueles que

se ocupam do difícil processo de elaboração normativa. Eles estão obrigados a colher variada gama de informações sobre a matéria que deve ser regulada, pesquisa esta que não pode ficar limitada a aspectos estritamente jurídicos. é certo que se faz mister realizar minuciosa investiga-ção no âmbito legislativo, doutrinário e jurisprudencial. Imprescindível revela-se, igualmente, a análise da repercussão econômica, social e política do ato legislativo.

Somente a realização dessa complexa pesquisa, que demanda a utilização de conhe-cimentos interdisciplinares, poderá fornecer elementos seguros para a escolha dos meios adequados para atingir os fins almejados.

Ademais, é preciso enfatizar que, além do processo legislativo disciplinado na Cons-tituição (processo legislativo “externo”), identifica a doutrina o chamado processo legislativo “interno”, que se refere ao modus faciendi adotado para a tomada da decisão legislativa.

Assim, segundo essa perspectiva “interna”, o processo legislativo está caracterizado como um procedimento de atos ou atividades que se iniciam com a identificação do problema, passa pela formulação de soluções ou de ações tendentes a alcançar os objetivos ou fins per-seguidos, e terminam com a avaliação e controle dos resultados.

Essa ênfase na identificação e análise do problema e na busca de soluções faz com que o processo legislativo seja o campo mais apropriado para o desenvolvimento de um pensa-mento tópico. Como explica García Amado, na doutrina de Viehweg a lei representa mais um entre os topoi que na resolução de problemas jurídicos entram em ação.

Assim, antes de decidir sobre as providências a serem empreendidas, cumpre identificar o problema a ser enfrentado. Realizada a identificação do problema, em virtude de impulsos externos (manifestações de órgãos de opinião pública, críticas de segmentos especializados) ou graças à atuação dos mecanismos próprios de controle, cumpre delimitá-lo, de forma precisa. A reunião de informações exatas sobre uma situação considerada inaceitável ou proble-mática é imprescindível tanto para evitar a construção de falsos problemas, quanto para afastar o perigo de uma avaliação errônea (superestimação ou subestimação).

Portanto, a complexidade do processo de elaboração de lei e as sérias conseqüências que podem advir do ato legislativo exigem que a instauração do processo de elaboração legislativa seja precedido de rigorosa análise dos fatos relevantes (apontar as distorções existentes, suas eventuais causas), do exame de todo o complexo normativo em questão (análise de julgados, pareceres, críticas doutrinárias, etc.), bem como de acurado levantamento de dados sobre a questão (audiência de entidades representativas e dos atingidos ou afetados pelo problema, etc.).

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A análise da situação questionada deve contemplar as causas ou complexo de causas que eventualmente determinaram ou contribuíram para o seu desenvolvimento. Essas causas podem originar-se de influências diversas, tais como condutas humanas, desenvolvimentos so-ciais ou econômicos, influências da política nacional ou internacional, conseqüências de novos problemas técnicos, efeitos de leis antigas, mudanças de concepção, etc.

Para verificar a adequação dos meios a serem utilizados deve-se proceder a uma análise dos objetivos que devem ser atingidos com a aprovação da proposta. A ação do legislador, nesse âmbito, não difere, fundamentalmente, da atuação do homem comum, caracterizando-se mais por saber exatamente o que não quer, sem precisar o que efetivamente pretende.

A avaliação emocional dos problemas, a crítica generalizada e, às vezes, irrefletida sobre o estado de coisas dominante acabam por permitir que predominem as soluções negativistas, que têm, fundamentalmente, por escopo suprimir a situação questionada sem contemplar, de forma detida e racional, outras possíveis alternativas ou as causas determinantes desse estado de coisas negativo. Outras vezes deixa-se orientar por sentimento inverso, buscando, pura e simplesmente, a preservação do status quo.

Essas duas posições podem levar, nos seus extremos, a uma imprecisa definição dos objetivos a serem alcançados. A definição da decisão legislativa deve ser precedida de uma rigorosa avaliação das alternativas existentes, seus prós e contras. A existência de alternativas diversas para a solução do problema não só amplia a liberdade do legislador, como também permite a melhoria da qualidade da decisão legislativa.

Outrossim, a metodologia empregada para obtenção da decisão legislativa estaria incom-pleta se entendêssemos que a tarefa do legislador se encerra com a edição do ato normativo. Uma planificação mais rigorosa do processo de elaboração legislativa exige um cuidadoso controle das diversas conseqüências produzidas pelo novo ato normativo.

Mencionem-se algumas formas de controle a posteriori dos resultados da lei:a) afirma-se, ordinariamente, que o legislador está submetido não só ao dever de legislar,

mas também a um dever geral de aferição e de adequação dos atos legislativos já em vigor. Esse dever de adequação manifesta-se, especialmente, naquelas decisões legislativas tomadas com base em prognósticos ou em juízos de probabilidade, tal como ocorre com os planos econômicos e com as leis que disciplinam realidades técnico-científicas;

b) outra forma convencional de controle são os chamados “relatórios de experiências”, elaborados com a finalidade de avaliar e sistematizar os resultados e experiências colhidos com a aplicação da lei. No tocante à execução orçamentária, houve por bem o próprio constituinte estabelecer exigência de elaboração e publicação de relatório circunstanciado (CF, art. 165, § 3º). A elaboração desses relatórios pode ser prevista, igualmente, em lei ou ser requerida por iniciativa parlamentar (CF, art. 58, III);

c) a análise das decisões judiciais, proferidas no âmbito do controle judicial da constitu-cionalidade das leis e da legitimidade dos atos administrativos, permite, igualmente, aferir os resultados obtidos na aplicação e execução da lei;

d) outras modalidades de controle devem ser contempladas, tais como as críticas cientí-ficas, as manifestações dos cidadãos, por meio de órgãos de representação ou isoladamente, críticas de órgãos de imprensa, etc.

A realização de um controle de resultados nesses termos pode dar ensejo, no caso em questão, a uma possível reforma do texto do art. 93, inciso XII, da Constituição.

Cabe ao Conselho Nacional de Justiça, além dos órgãos do Poder Judiciário e da Ordem dos Advogados do Brasil, levar ao legislador os dados da experiência com a aplicação da norma constitucional proibitiva das férias coletivas, postulando uma eventual revogação.

Porém, enquanto permanecer vigente a norma constitucional que veda as férias coleti-vas nos juízos e tribunais de segundo grau, deve ela ser cumprida pelo Poder Judiciário, prin-cipalmente pelo Conselho Nacional de Justiça, órgão constitucional incumbido de zelar pela legalidade e constitucionalidade da atuação administrativa de juízos e tribunais.

A proximidade do período de férias coletivas previsto nos atos normativos impugnados (janeiro de 2007) revela a patente urgência da pretensão cautelar.

Nesses termos, voto pela concessão da medida cautelar, para suspender a vigência (a) do Ato Regimental 5, de 10 de novembro de 2006, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios e (b) da Resolução 24, de 24 de outubro de 2006, do Conselho Nacional de Justiça.

R.T.J. — 203 1003

Então, aqui há uma série de considerações sobre essa questão.

E o que estamos a ver nessa discussão suscitada pela norma agora questiona-da é um pouco a aferição ou a tentativa de desenvolvimento de formas de controle da decisão a posteriori.

Todavia, é claro, que a solução encontrada pelo Conselho desborda dos para-digmas constitucionais como já aqui destacados, se de fato a solução alvitrada pelo constituinte se revela absolutamente inadequada, inidônea para os fins propostos, cabe ao próprio legislador constituinte fazer essa correção.

Com essas considerações e também destacando que o que estamos aqui a fazer não implica um juízo de desvalia quanto à importância do trabalho realizado pelo Conselho.

Todos sabemos e conhecemos a situação antes da instituição do Conselho, a dificuldade de integração administrativa e disciplinar no âmbito do Poder Judiciá-rio, que se tornou um megapoder, com uma megaestrutura. é necessário, portanto, que façamos essa reflexão.

Gostaria de lembrar também que, no caso do nepotismo, julgamento daquele leading case, Relator o Ministro César Peluzo, o Tribunal já deixou assente, embo-ra com manifestação divergente do Ministro Marco Aurélio, que o Conselho não dispunha de um poder ilimitado nem de um poder legislativo.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Discrepância não quanto a esse enfoque.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Não, desculpe-me, quanto à própria atividade do Conselho.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: E fui um pouco adiante ao julgarmos a ação direta de inconstitucionalidade formalizada contra a Emenda Constitucional 45/04.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Exatamente, a dúvida quanto à própria constitucionalidade.

Mas, no que concerne ao poder legislativo regulatório, ficou assente que o Conselho não dispõe de poder legislativo.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Aí o consenso é unânime.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Isso ficou assente, inclusive, consta da ementa da decisão que foi proferida. Portanto, não há dúvida em relação a isso, e o Tribunal está apenas a reiterar essa orientação neste momento.

Por outro lado e para finalizar, se pudéssemos ter dúvida – apenas para ficar nesse seminário – sobre o caráter normativo...

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Veja V. Exa. que ironia, o Conselho nos dando trabalho.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Apenas para deixar uma nota mnemônica sobre isso. Se houvesse qualquer dúvida sobre o sentido normativo desta resolução, a leitura dos considerandos seria suficiente para deixar claro o intuito do Conselho que se lhe atribuía.

R.T.J. — 2031004

Assim, também acompanho o voto da Ministra Cármen Lúcia e dos que a seguiram, pontuando também aspectos já destacados na introdução do voto do Ministro Ricardo Lewandowsky.

EXTRATO DA ATA

ADI 3.823-MC/DF — Relatora: Ministra Cármen Lúcia. Requerente: Pro-curador-Geral da República. Requeridos: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios e Conselho Nacional de Justiça. Interessado: Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (Advogado: Marcelo Mello Martins).

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, deferiu a cautelar, nos termos do voto da Relatora. Votou o Presidente. Ausente, justificadamente, neste julgamento, a Ministra Ellen Gracie (Presidente). Presidiu o julgamento o Ministro Gilmar Mendes (Vice-Presidente). Falou pelo Ministério Público Federal o Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza, Procurador-Geral da República.

Presidência da Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Ministros Se-púlveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa, Eros Grau, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Procurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.

Brasília, 6 de dezembro de 2006 —Luiz Tomimatsu, Secretário.

R.T.J. — 203 1005

AGRAVO REGIMENTAL NA MEDIDA CAUTELAR NARECLAMAÇÃO 4.785 — SE

Relator: O Sr. Ministro Gilmar Mendes

Agravante: Ministério Público do Trabalho — Agravados: Município de Aracaju e Juiz do Trabalho da 3ª Vara do Trabalho de Aracaju (Processo 00841.2006.003.20.00.0)

Agravo regimental em reclamação. Definição do alcance material da decisão liminar proferida na ADI 3.395-MC/DF. 2. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República não abrange as causas instauradas entre o poder público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária, entendida esta como a relação de cunho jurídico-administrativo originada de investidura em cargo efetivo ou em cargo em comissão. Tais premissas são suficientes para que este Supremo Tribunal Federal, em sede de reclamação, verifique se determinado ato judicial confirmador da competência da Justiça do Trabalho afronta sua decisão cautelar proferida na ADI 3.395/DF. 3. A investidura do servidor em cargo em comissão define esse caráter jurídico-administrativo da relação de trabalho. 4. Não compete ao Supremo Tribunal Federal, no âmbito estreito de cognição próprio da reclamação constitucional, analisar a regularidade constitucional e legal das investiduras em cargos efetivos ou comissionados ou das contratações temporárias realizadas pelo poder público. 5. Agravo regimental desprovido, por unanimidade, nos termos do voto do Relator.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência da Ministra Ellen Gracie, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 17 de dezembro de 2007 — Gilmar Mendes, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Em 14 de novembro de 2006, proferi nestes autos (fls. 73-76) a seguinte decisão:

Trata-se de reclamação, com pedido de liminar, ajuizada pelo Município de Aracaju/SE, em face da sentença proferida na Ação Civil Pública 841-2006-003-20-00-0, em trâmite perante a 3ª Vara do Trabalho de Aracaju/SE, que reconheceu a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a referida ação civil pública, a qual discute a exoneração de todos os ocupantes de cargo em comissão no âmbito da Guarda Municipal de Aracaju.

Alega o Reclamante que o Juiz da 3a Vara do Trabalho de Aracaju/SE, ao conhecer da ação civil pública e proferir sentença favorável à pretensão do Ministério Público do Trabalho,

R.T.J. — 2031006

contrariou de forma expressa o comando exarado na decisão liminar proferida na ADI 3.395-MC/DF, Relator o Ministro Nelson Jobim, DJ de 4-2-05.

A título de plausibilidade jurídica do pedido (fumus boni juris), o Reclamante sustenta que a liminar concedida na ADI 3.395-MC/DF afastou qualquer interpretação de que a Justiça do Trabalho é competente para dirimir controvérsias advindas da relação de trabalho entre o Município e servidores públicos estatutários.

No que tange à urgência da pretensão cautelar (periculum in mora), afirma que a sentença determinou a exoneração de 66 (sessenta e seis) guardas municipais, além da aplicação de multa diária, fixada no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), e de condenação ao pagamento de indenização no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) perante as Varas do Trabalho de Aracaju/SE.

Registre-se que a decisão supostamente afrontada é aquela proferida na ADI 3.395-MC/DF, na qual o Ministro Nelson Jobim concedeu a liminar (DJ de 4-2-05), com efeito ex tunc, dando interpretação conforme ao art. 114, I, da Constituição Federal e suspendendo toda e qualquer interpretação dada ao inciso I do art. 114 da CF, na redação dada pela EC 45/04, que inclua, na competência da Justiça do Trabalho, a “(...) apreciação (...) de causas que (...) sejam instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo.”

A decisão impugnada, proferida por juiz do trabalho, em ação civil pública, determinou que o Município de Aracaju exonerasse os ocupantes de cargo em comissão no âmbito da Guarda Municipal de Aracaju no prazo de 90 (noventa) dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais), e condenou o Município ao pagamento de indenização no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) por danos genéricos. Eis a parte dispositiva do ato impugnado (fl. 69):

“Diante do exposto, e de tudo o mais que dos autos consta, resolve o juízo o seguinte:

1 - Rejeitar as preliminares argüidas pelo reclamado, nos termos dos itens 1.1 e 1.2, da fundamentação retro;

2 - Julgar procedente a presente demanda, para condenar o Município de Aracaju na obrigação de fazer, consistente em exonerar os atuais ocupantes de cargo em comissão no âmbito da Guarda Municipal de Aracaju que não se encontram em conformidade com o preceituado no artigo 37, inciso V, da Constituição Federal, no prazo de noventa dias, tendo em vista que ainda há candidatos aprovados no último concurso público realizado para provimento de tal cargo; bem como na obrigação de não fazer, consistente na proi-bição de contratação diretamente ou através de empresas interpostas, intermediadoras de mão-de-obra, sob qualquer modalidade, de profissionais para prestarem serviços relacio-nados à atividade de Guarda Municipal de Aracaju, tanto no que se refere à atividade fim como para o exercício de atividades de natureza meramente administrativa, sem prévia aprovação em concurso público, consoante vaticina o art. 37, incisos I, II, III, IV e VII, da Lex Fundamentalis, ressalvadas as hipóteses de nomeações para cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e demissão destinados exclusivamente às atribui-ções de chefia, direção e assessoramento, nos termos do art. 37, V, da Carta Maior, e as contratações por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, desde que nas duas últimas hipóteses sejam efetivamente observados os requisitos formais e materiais para que as contratações não sejam inquinadas de vício, sob pena de pagamento de multa diária por trabalhador contratado em situação irregular no importe de R$ 1.000,00, nos termos do art. 461, § 4º, do Caderno Processual Civil, cuja aplicação supletória ao Processo Laboral se impõe.

3 - Condenar o réu ao pagamento de indenização por danos genéricos, no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), valores estes que deverão ser revertidos ao FAT (Fundo de Amparo ao Traalhador), nos termos do art. 13 da Lei 7.347/85.

Tudo em fiel observância à fundamentação supra, a qual passa a fazer parte inte-grante deste dispositivo como se nele estivesse transcrito”. (Fl. 69.) Sem avançar, nesta oportunidade liminar, em considerações sobre o mérito da ação civil

pública, entendo presentes os pressupostos para a concessão da medida cautelar.

R.T.J. — 203 1007

Em um primeiro exame, o ato reclamado proveniente de juiz do Trabalho que se deu por competente para julgar ação civil pública, na qual se discute a exoneração de todos os ocupantes de cargo em comissão no âmbito da Guarda Municipal de Aracaju, parece afrontar a decisão desta Corte na ADI 3.395-MC/DF, verbis:

“Concedo a liminar, com efeito ex tunc. Dou interpretação conforme ao inciso I do art. 114 da CF, na redação dada pela EC 45/04, que inclua, na competência da Justiça do Trabalho, a (...) apreciação (...) de causas que (...) sejam instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativa.”(ADI 3.395/DF.)Essa decisão foi posteriormente referendada pelo Plenário deste Tribunal, nos termos

do voto do Relator, Ministro Cezar Peluso (ADI 3.395/DF, Rel. Min. Cezar Peluso, 5-4-06). Nesses termos, defiro a medida liminar requerida, para suspender a tramitação do Pro-

cesso 841-2006-003-20-00-0 (Ação Civil Pública) perante a 3ª Vara do Trabalho de Aracaju/SE, até o julgamento final desta reclamação. Comunique-se, com urgência, à autoridade recla-mada. Requisitem-se informações (RISTF, art. 157). Após, abra-se vista dos autos à Procura-doria-Geral da República (RISTF, art. 160). Publique-se. Brasília, 14 de novembro de 2006.

Contra essa decisão, o Ministério Público do Trabalho, por meio de seu Vice-Procurador-Geral, interpôs o presente agravo regimental, alegando a “inaplicabili-dade do precedente liminar na ADI 3.395 nas causas instauradas entre a Fazenda Pública e trabalhadores não investidos regularmente em cargos públicos efetivos ou em comissão”.

Afirma que “o julgamento da liminar na ADI 3.395 tomou em consideração o âmbito preciso de incidência do art. 114, I (relações de trabalho), o que, por con-seqüência, afasta a aplicação do precedente nos casos que não envolvam relações de trabalho estatutário, ou seja, entre administração pública e trabalhadores não investidos regularmente em cargos públicos efetivos ou em comissão”.

Isso porque, segundo entende o Ministério Público do Trabalho, “para fins de caracterização da relação estatutária, o servidor público deve estar regularmente investido em cargo público, o que somente ocorre quando a investidura é precedida de concurso público para provimento de cargos públicos efetivos, conforme deter-minação expressa do art. 37, inciso II, da CF (...)”. Assim, “no tocante à ressalva, verifica-se que é admitida pelo texto constitucional a nomeação para cargos em comissão que se destinem exclusivamente às atribuições de direção, chefia e asses-soramento. Logo – afirma o Ministério Público – para o correto estabelecimento de uma relação estatutária em função dos cargos públicos em comissão, é necessário que a contratação ocorra em estrita obediência a estes limites” (fl. 98).

Sobre o caso concreto, o Ministério Público tece as seguintes considerações:

Uma vez patente o desvirtuamento nas nomeações de ocupantes de “cargos em comis-são” cujas atribuições consistem no exercício das funções típica-administrativas da Guarda Mu-nicipal de Aracaju, sem que se afigure possível cogitar-se do desempenho de atividades de dire-ção, chefia e/ou assessoramento, (valendo-se acrescentar que o desvirtuamento foi devidamente confessado pelos representantes legais do Município de Aracaju, sem olvidarmos, ainda, a farta documentação que escolta a inicial da ação civil pública, a exemplo dos depoimentos de diversos ocupantes de tais cargos), demonstra-se a violação ao preceito constitucional acima mencionado.

Logo, os trabalhadores admitidos pelo reclamante, em evidente violação ao dispositivo constitucional, não podem ser entendidos como servidores públicos regulamente investidos em cargos públicos em comissão, já que desrespeitado o limite imposto na Carta Magna para este tipo de nomeação, violando-se, por conseqüência lógica inafastável, o princípio do concurso público.

R.T.J. — 2031008

Assim, conclui o Ministério Público do Trabalho que, “uma vez que a con-tratação sem concurso público não permite a incidência do regime estatutário, pela ausência de regular investidura, logo, inexiste relação estatutária entre a municipa-lidade reclamante e os trabalhadores por ela admitidos nestes moldes, subsistindo, porém, liame celetista, o que somente pode ser verificado pela Justiça Especializada, inclusive para verificação dos efeitos desta contratação”.

Tendo em vista a relevância da matéria e os efeitos que a decisão da Corte neste agravo regimental pode gerar sobre as centenas de reclamações que chegam ao Tribunal versando sobre esta mesma matéria, submeto a questão ao Plenário da Corte.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): O julgamento deste agravo regi-mental abre ao Plenário do Tribunal a oportunidade para definir o alcance mate-rial da decisão liminar proferida na ADI 3.395-MC/DF, Relator o Ministro Cezar Peluso, DJ de 10-11-06, cuja ementa possui o seguinte teor:

Ementa: Inconstitucionalidade. Ação direta. Competência. Justiça do Trabalho. In-competência reconhecida. Causas entre o poder público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas de relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da competência da Justiça comum. Interpretação do art. 114, inciso I, da CF, introduzido pela EC 45/04. Precedentes. Liminar deferida para excluir outra interpretação. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República não abrange as causas instauradas entre o poder público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária.

A importância do julgamento tem em vista, em primeira linha, a pletora de reclamações que têm chegado ao Tribunal, a maioria questionando a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar ações em que estejam sendo discuti-dos direitos e vantagens decorrentes de contratos temporários firmados pelo poder público – na maioria dos casos, o poder público municipal – e vínculos estabeleci-dos por ocupação de cargos comissionados.

A questão apresentada ao Tribunal diz respeito, portanto, à definição do significado do período descrito na ementa da decisão: “O disposto no art. 114, I, da Constituição da República não abrange as causas instauradas entre o poder público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária”; ou, mais especificamente, da expressão “relação jurídico-estatutária”; para saber se nela estão abrangidas as relações jurídicas originadas pela investidura em cargos em comissão.

Segundo a interpretação do Ministério Público do Trabalho (Agravante), a decisão cautelar proferida na ADI 3.395/DF apenas exclui da competência da Justiça do Trabalho a apreciação das causas que envolvam servidores públicos re-gularmente investidos em cargos públicos efetivos ou em comissão, o que não en-globaria as investiduras irregulares nesses cargos. As razões de reforma da decisão levantadas pelo Ministério Público do Trabalho estão bem sintetizadas no seguinte trecho da petição do recurso de agravo regimental:

R.T.J. — 203 1009

Portanto, conforme definido pelo Plenário da Corte Suprema, somente estão excluídas da competência da Justiça do Trabalho a apreciação das causas instauradas entre a Fazenda Pública e seus servidores estatutários, assim entendidos os agentes públicos regularmente investidos em cargos públicos efetivos, ou, então, em cargos de provimento em comissão, desde que, neste úl-timo caso, vislumbrem-se presentes os requisitos constitucionais aplicáveis à espécie, a exemplo do desempenho de atribuições de direção, chefia ou assessoramento. Cuidando-se de hipóteses de nomeações irregulares, o que torna sem efeito o próprio ato de investidura, é de se reconhecer a competência da Justiça Especializada. (Fl. 112.)

No entanto, entendo que essa interpretação é assaz restritiva do conteúdo da decisão proferida na ADI 3.395, além de também contrariar a decisão na ADI 492 (Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 12-3-93), que ainda traz em seu bojo o en-tendimento do Tribunal a respeito do significado da expressão relação de trabalho contida no art. 114, inciso I, da Constituição.

O Ministro Cezar Peluso, no julgamento em que se referendou a decisão limi-nar proferida pelo Ministro Nelson Jobim na ADI 3.395/DF, bem ressaltou que “o Supremo Tribunal Federal já decidiu, no julgamento da ADI 492 (Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 12-3-93), ser inconstitucional a inclusão, no âmbito de competência da Justiça do Trabalho, das causas que envolvam o poder público e seus servidores estatutários. A razão é porque entendeu alheio ao conceito de ‘relação de trabalho’ o vínculo jurídico de natureza estatutária, vigente entre servidores públicos e a ad-ministração”.

Na ocasião, o Ministro Cezar Peluso assim se manifestou:

A decisão (na ADI 492) foi que a Constituição da República não autoriza conferir à ex-pressão relação de trabalho alcance capaz de abranger o liame de natureza estatutária que vincula o poder público e seus servidores. Daí ter-se afirmado a incompetência da Justiça do Trabalho para julgar litígios entre ambos.

E prosseguiu em seu voto o Ministro Peluso:

Ora, ao atribuir à Justiça do Trabalho competência para apreciar “as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”, o art. 114, inci-so I, da Constituição não incluiu, em seu âmbito material de validade, as relações de natureza jurídico-administrativa dos seus servidores públicos.

Sobre o significado da expressão “relação estatutária ou de natureza jurídico-administrativa”, o Ministro Peluso deixou claro que ela remonta ao voto proferido pelo Ministro Celso de Mello na ADI 492, no qual a expressão “relação jurídico-administrativa” foi utilizada como sinônimo de “relação estatutária”. E o Ministro Carlos Britto, na ocasião, defendeu que essa expressão somente poderia compre-ender, exclusivamente, a investidura em cargo efetivo ou em cargo em comissão.

Essas premissas já permitem indicar o âmbito de abrangência da decisão na ADI 3.395: o disposto no art. 114, I, da Constituição da República não abrange as causas instauradas entre o poder público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária, entendida esta como a relação de cunho jurídico-admi-nistrativo originada de investidura em cargo efetivo ou em cargo em comissão.

R.T.J. — 2031010

Tais premissas também são suficientes para que este Supremo Tribunal Fe-deral, em sede de reclamação, verifique se determinado ato judicial confirmador da competência da Justiça do Trabalho afronta sua decisão cautelar proferida na ADI 3.395, a qual ocorrerá, sem sombra de dúvidas, nas ocasiões em que a causa seja oriunda de relação de ordem jurídico-administrativa mantida entre servidor e poder público. E, como afirmado, a investidura do servidor em cargo em comissão define esse caráter jurídico-administrativo da relação de trabalho.

O Agravante entende que a decisão na ADI 3.395 abrange apenas os casos em que as investiduras em cargos em comissão cumprem os requisitos constitucio-nais. Há que deixar bem claro, no entanto, que essa tese acaba vinculando o jul-gamento da reclamação à prévia análise da regularidade do vínculo estabelecido entre o servidor e a administração. E, parece óbvio que não cabe ao Tribunal, no âmbito estreito de cognição próprio da reclamação constitucional, analisar a regularidade constitucional e legal das investiduras em cargos efetivos ou co-missionados ou das contratações temporárias realizadas pelo poder público.

Não se faz necessário adentrar na discussão travada no âmbito do CC 7.201-6, Relator o Ministro Marco Aurélio (atualmente com pedido de vista da Ministra Ellen Gracie), ou seja, se o pedido inicial da ação determinaria a competência da Justiça comum ou da Justiça Trabalhista. A questão debatida aqui é diversa: se o significado da expressão “relação jurídico-estatutária” presente na decisão da ADI 3.395 estaria restrito às relações originadas de investiduras regulares em cargos efetivos e em comissão, é dizer, conforme à Constituição (art. 37, II), como entende o Ministério Público do Trabalho (Agravante). A resposta a essa questão, como já analisado, é negativa. Não pode o Tribunal, em sede de reclamação, adentrar na análise do próprio mérito da questão quanto à regularidade dos contratos firmados pelo poder público.

Assim, com base nessas considerações, voto pelo desprovimento do agravo regimental.

EXTRATO DA ATA

Rcl 4.785-MC-AgR/SE — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Agravante. Ministério Público do Trabalho. Agravados: Município de Aracaju (Advogado: Luiz Carlos Oliveira de Santana) e Juiz do Trabalho da 3ª Vara do Trabalho de Aracaju (Processo 00841.2006.003.20.00.0).

Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, ne-gou provimento ao recurso de agravo. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. Ausentes, justificadamente, o Ministro Eros Grau e a Ministra Cármen Lúcia.

Presidência da Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski e Menezes Direito. Procurador-Geral da Repú-blica, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.

Brasília, 17 de dezembro de 2007 — Luiz Tomimatsu, Secretário.

R.T.J. — 203 1011

AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO 5.450 — AM

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio

Agravantes: Lélio Antônio dos Santos Corrêa e outros — Agravado: Tribu-nal de Justiça do Estado do Amazonas (Agravo de Instrumento 2005.001153-4) — Interessados: Cássio André Borges dos Santos e Ministério Público do Estado do Amazonas

Diligência – Cumprimento. A diligência há de estar cumpri-da, com a notícia ao Tribunal, no prazo assinado, não cabendo to-mar de empréstimo a data em que apresentado o postado, visando ao implemento, na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.

Reclamação – Descumprimento de pronunciamento for-malizado em idêntica medida – Impropriedade. A reclamação é inadequada quando se busca a observância de decisão prolatada em idêntica medida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental na reclamação, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificamente, o Minis-tro Carlos Britto e a Ministra Cármen Lúcia.

Brasília, 6 de novembro de 2007 — Marco Aurélio, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Por meio da decisão de fls. 47 e 48, formali-zada em 13 de setembro de 2007, indeferi a inicial da reclamação, consignando:

Inicial – Endereço – Ausência – Intimação da parte interessada – Silêncio – In-deferimento.

1. À fl. 44, assim despachei, buscando o saneamento do processo:Reclamação – Usurpação da competência do Supremo – Contraditório – In-

formações – Medida liminar – Exame postergado.1. Dêem ciência desta reclamação aos interessados, indicando os Reclamantes

o endereço de Cássio André Borges dos Santos, sob pena de indeferimento da inicial.2. Sanado o defeito, solicitem informações. Com o recebimento, apreciarei o

pedido de concessão de medida acauteladora formulado.3. Publiquem.

A certidão de fl. 45 revela haver sido publicado o pronunciamento judicial no Diário de 30 de agosto de 2007 – quinta-feira –, constando certificado que não foi adotada a providência.

2. Ante a inércia dos Reclamantes, indefiro a inicial, fazendo-o a partir do disposto no art. 284, parágrafo único, do Código de Processo Civil.

3. Arquivem.4. Publiquem.

Em 14 subseqüente, ante manifestação do Reclamante, proferi a seguinte decisão (fl. 50):

R.T.J. — 2031012

Petição – Prejuízo – Devolução.1. Eis as informações prestadas pelo Gabinete:

Lélio Antônio dos Santos Corrêa informa o endereço do Interessado. Registro a existência de decisão – cópia anexa – formalizada por Vossa Exce-

lência, na qual indeferiu a inicial, ante a inércia dos Reclamantes.2. Ante o quadro, devolvam a peça ao Requerente.3. Publiquem.

Sobreveio o pedido de reconsideração de fls. 61 a 63, no qual se pretende afastar a inércia apontada, sustentando-se que a informação requisitada foi pos-tada em 5 de setembro – sexto dia do prazo –, consoante estaria a demonstrar o documento, anexado às razões, da Empresa de Correios e Telegráfos. Alude-se à ausência de danos e ao princípio da economia processual.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Na interposição deste agravo, foram atendidos os pressupostos de recorribilidade. A peça, subscrita pelo primeiro Re-clamante, que atua em causa própria, restou protocolada no qüinqüídio. Conheço.

O cumprimento de diligência, mediante dado a ser fornecido, há de observar o protocolo do Tribunal, e não o guichê da Empresa Brasileira de Correios e Telé-grafos. Daí ter-se a prevalência da certidão de fl. 45. Os Reclamantes, intimados, deixaram de providenciar o endereço do Interessado na dilação legal.

A par desse aspecto, nesta reclamação, aponta-se como desrespeitado ato formalizado em idêntica medida. Pois bem, de duas, uma: ou os Reclamantes são beneficiários do que decidido na outra reclamação – e, aí, caberia acionar o pro-nunciamento judicial – ou não o são – e o possível descumprimento não gera a procedência do pleito inicial.

Os precedentes desta Corte são no sentido de não admitir sobreposição de medidas, são no sentido de que não respalda reclamação o descumprimento de decisão prolatada em igual medida – Rcl 2.693-1-AgR/RS e Rcl 2.720-1-AgR/PR, de minha relatoria, tendo sido a ementa do primeiro publicada no Diário da Justiça de 1º de abril de 2005:

Reclamação – Autoridade de pronunciamento em idêntica medida – Inadequação. A reclamação não é meio hábil a pretender-se a observância de julgado formalizado em idêntica medida, sob pena de se admitir a sobreposição de atos.

Reclamação – Autoridade de pronunciamento. Descabe adentrar o campo da busca da autoridade de pronunciamento quando a decisão final, em certo processo, foi pela negativa de seguimento do pedido e almeja-se tornar prevalecente o alcance deste último como se tivesse sido acolhido.

Nego provimento ao agravo.

EXTRATO DA ATA

Rcl 5.450-AgR/AM — Relator: Ministro Marco Aurélio. Agravantes: Lélio Antônio dos Santos Corrêa e outros (Advogados: Lélio Antônio dos Santos Corrêa e

R.T.J. — 203 1013

outros). Agravado: Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas (Agravo de Instru-mento 2005.001153-4). Interessados: Cássio André Borges dos Santos (Advogado: Fernando Neves da Silva) e Ministério Público do Estado do Amazonas.

Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental na reclamação, nos termos do voto do Relator. Unânime. Ausentes, justificadamente, o Ministro Carlos Britto e a Ministra Cármen Lúcia.

Presidência do Ministro Marco Aurélio. Presentes à sessão os Ministros Ricardo Lewandowski e Menezes Direito. Ausentes, justificadamente, o Ministro Carlos Britto e a Ministra Cármen Lúcia. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner de Castro Mathias Neto.

Brasília, 6 de novembro de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031014

MEDIDA CAUTELAR NO MANDADO DE SEGURANÇA 25.579 — DF

Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence

Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Joaquim Barbosa

Impetrante: José Dirceu de Oliveira e Silva — Impetrados: Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, Conselho de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados e Relator do Conselho de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados

Mandado de segurança. Medida liminar. Decisão do Co-legiado. Possibilidade. Mandato parlamentar. Tramitação e pro-cessamento de representação por quebra de decoro parlamentar. Deputado federal licenciado e investido no cargo de ministro de Estado. Liminar indeferida.

1. Nos órgãos jurisdicionais de composição múltipla, em re-gra a colegialidade deve primar sobre a individualidade no proces-so de tomada de decisões. Assim, é faculdade do Relator, sempre que considerar relevante a matéria, submeter ao Colegiado o jul-gamento de pedido de concessão de medida liminar em mandado de segurança.

2. Na qualidade de guarda da Constituição, o Supremo Tri-bunal Federal tem a elevada responsabilidade de decidir acerca da juridicidade da ação dos demais Poderes do Estado. No exercício desse mister, deve esta Corte ter sempre em perspectiva a regra de autocontenção que lhe impede de invadir a esfera reservada à de-cisão política dos dois outros Poderes, bem como o dever de não se demitir do importantíssimo encargo que a Constituição lhe atribui de garantir o acesso à jurisdição de todos aqueles cujos direitos individuais tenham sido lesados ou se achem ameaçados de lesão. À luz deste último imperativo, cumpre a esta Corte conhecer de im-petração na qual se discute se os atos ministeriais do parlamentar licenciado se submetem à jurisdição censória da respectiva câmara legislativa, pois a matéria tem manifestamente estatura constitu-cional, e não interna corporis. Mandado de segurança conhecido.

3. O membro do Congresso Nacional que se licencia do man-dato para investir-se no cargo de ministro de Estado não perde os laços que o unem, organicamente, ao Parlamento (CF, art. 56, I). Conseqüentemente, continua a subsistir em seu favor a garantia constitucional da prerrogativa de foro em matéria penal (Inq 777-3-QO/TO, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 1º-10-93), bem como a faculdade de optar pela remuneração do mandato (CF, art. 56, § 3º). Da mesma forma, ainda que licenciado, cumpre-lhe guardar estrita observância às vedações e incompatibilidades inerentes ao estatuto constitucional do congressista, assim como às exigências

R.T.J. — 203 1015

ético-jurídicas que a Constituição (CF, art. 55, § 1º) e os regimentos internos das casas legislativas estabelecem como elementos carac-terizadores do decoro parlamentar.

4. Não obstante, o princípio da separação e independência dos poderes e os mecanismos de interferência recíproca que lhe são inerentes impedem, em princípio, que a Câmara a que per-tença o parlamentar o submeta, quando licenciado nas condições supramencionadas, a processo de perda do mandato, em virtude de atos por ele praticados que tenham estrita vinculação com a função exercida no Poder Executivo (CF, art. 87, parágrafo único, incisos I, II, III e IV), uma vez que a Constituição prevê modali-dade específica de responsabilização política para os membros do Poder Executivo (CF, arts. 85, 86 e 102, I, c).

5. Na hipótese dos autos, contudo, embora afastado do exer-cício do mandato parlamentar, o Impetrante foi acusado de haver usado de sua influência para levantar fundos junto a bancos “com a finalidade de pagar parlamentares para que, na Câmara dos De-putados, votassem projetos em favor do Governo” (Representação 38/05, formulada pelo PTB). Tal imputação está adequada, em tese, ao que preceituado no art. 4º, inciso IV, do Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, que qualifica como suscetíveis de acarretar a perda do mandato os atos e pro-cedimentos levados a efeito no intuito de “fraudar, por qualquer meio ou forma, o regular andamento dos trabalhos legislativos para alterar o resultado de deliberação”.

6. Medida liminar indeferida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência do Ministro Nelson Jobim, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, rejeitar a preliminar suscitada pelo Ministro Marco Aurélio de que o pedido de liminar retornasse ao Relator para sua apreciação e, por unanimidade, excluir do pólo passivo o Relator do Conselho de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados. Em seguida, o Tribunal, por votação majoritária, conheceu da seguran-ça, vencido o Ministro Marco Aurélio. Também por votação majoritária, negou a liminar, vencidos os Ministros Sepúlveda Pertence (Relator), Eros Grau e Nelson Jobim (Presidente).

Brasília, 19 de outubro de 2005 — Joaquim Barbosa, Relator para o acórdão.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Os antecedentes do caso são notórios.

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2. O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), em 29-7-05, representou ao Con-selho de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados contra o Deputado José Dirceu de Oliveira e Silva, ora Impetrante, porque:

Em depoimentos prestados ao Procurador-Geral da República, em poder da egrégia Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Correios e perante a própria CPMI, respec-tivamente, por Marcos Valério Fernandes de Souza, a 14 Jul 2005 e d. Renilda Maria Santiago Fernandes de Souza, a 26 Jul 2005, deram conta de que o Representado, José Dirceu, enquanto licenciado dessa Casa para exercer as funções do cargo de Ministro-Chefe da Casa Civil do Presidente da República, em conluio com o Secretário de Finanças do Partido dos Trabalhadores – PT, Delúbio Soares, levantou fundos junto ao Banco Rural e Banco de Minas Gerais – BMG, tomados sob a intervenção e responsabilidade de Marcos Valério, com a finalidade de pagar parlamentares para que, na Câmara dos Deputados, votassem projetos em favor do Governo.

À sua vez, tais fundos levantados como se empréstimos fossem, eram compensados pelo favorecimento aos Bancos mencionados – com cujos diretores, entre eles, Flávio Guimarães (BMG) e Kátia Rabelo (Rural), esteve reunido José Dirceu – e empresas de que participa Marcos Valério, em contratos governamentais, de sua administração indireta ou autárquica, garantidos pela influência do Representado, de modo a que, embora tais mútuos não tenham sido honrados pelos tomadores, tampouco houvesse cobrança daquelas instituições financeiras de seu crédito.

Assim agindo, o Representado quebrou o decoro parlamentar, porquanto membro titular de mandato legislativo aí, valeu-se daquela atividade junto ao Poder Executivo, para interferir e fraudar o regular andamento dos trabalhos legislativos, alterando o resultado de deliberações em favor do Governo, infringindo a Constituição Federal, art. 55, inciso II e § 1º, o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, art. 244 e o Código de ética e Decoro Parlamentar, art. 4º, inciso IV, pelo que se formula a presente Representação, a fim de que apresente a defesa que tiver, até final perda do mandato que detém.

3. Da representação do PTB originou-se o Processo Disciplinar 4, daquele Conselho, Relator o Deputado Júlio Delgado, cuja instrução se deu por encerrada em 11 de outubro corrente.

4. O Deputado José Dirceu de Oliveira e Silva impetra mandado de se-gurança, com pedido liminar, contra o recebimento e o processamento da repre-sentação no referido Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, e a eventual e conseqüente cassação do seu mandato parlamentar, obtido, enfatiza a petição, pelo voto de mais de 500 mil eleitores do Estado de São Paulo.

5. A petição, de fina lavra, ocupa-se:

a) em preliminar, do cabimento do “mandado de segurança para discutir violação a direitos líquidos e certos do Impetrante, os quais se materializam (1) diante da natureza jurídica e não política da questão ora discutida; (2) na iminente violação a direitos subjetivos de parlamentar; (3) na iminente possibilidade do Impetrante vir a ser privado de seus direitos por autoridade incompetente, em deso-bediência ao devido processo legal e com inobservância do princípio da separação e independência dos Poderes (art. 5º, incisos XXXV, XXXVII, LIII e LIV; art. 102, I, c e art. 2º, todos da CF).”

b) no mérito, da inadmissibilidade da submissão do Impetrante à perda de seu mandato de congressista, dado que a conduta – aliás, inverídica, acentua – que a ele se atribui não diz respeito à sua atividade parlamentar, mas, pelo contrário, teria supostamente ocorrido ao tempo em que, licenciado do mandato de depu-tado, ocupava o cargo de ministro de Estado, no exercício do qual teria praticado

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o fato imputado, o que, em tese, o submeteria a diverso regime constitucional de responsabilidade (CF, art. 102, I, c);

c) e, finalmente, da desproporcionalidade das sanções a que se pretende su-jeitar o Requerente – perda do mandato (CF, art. 55, II) e inelegibilidade pelos oito anos subseqüentes (LC 64/90, art. 1º, I, b), mais rigorosas que aquelas que lhe advi-riam de eventual condenação por crime de responsabilidade (Lei 1.079/50, art. 2º).

6. O Impetrante requer liminar “para o fim de se determinar a imediata sus-pensão da tramitação e processamento da Representação nº 38/2005, apresentada pelo PTB contra o ora Impetrante, atualmente correndo perante o Conselho de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, até o julgamento final do presente mandamus”.

7. Despachei, em 10 de outubro:

Assim como tem sido admitido (v.g., MS 21.564-QO, 10-9-92, Gallotti, RTJ 169/45; MS 22.864-QO, 4-6-97, Sydney, RTJ 182/148; MS 23.047-MC, 11-2-98, Pertence, DJ de 11-2-98), atento à relevância institucional da questão versada, submeto ao Plenário do Tribunal o pedido liminar deste mandado de segurança.

8. No dia seguinte, 11 de outubro, o Impetrante, conforme certidão do Con-selho de ética e Decoro Parlamentar, noticia o encerramento, naquela data, da instrução probatória do processo disciplinar questionado e reitera “a urgência do pedido de liminar formulado haja vista a iminência da apresentação e votação do parecer do Relator”.

9. Não obstante, já submetido o caso ao Plenário, deixei de decidir da liminar, de um lado, porque assumira o Requerente os riscos decorrentes da demora no ajui-zamento da impetração do mandado de segurança e, de qualquer sorte, a medida cautelar poderá ser eficazmente examinada pelo Tribunal antes do desfecho do processo disciplinar.

10. é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator):

I

Sedimentou-se, na jurisprudência do Supremo Tribunal, poder o Relator do mandado de segurança – atento à relevância das questões envolvidas e às circuns-tâncias do caso – submeter ao Plenário o pedido de liminar1.

2. Estou em que o caso concreto – dado o ineditismo, ao menos sob a ordem normativa vigente, e as implicações constitucionais do tema aventado – alça-se a patamar de relevância que, a exemplo dos precedentes, recomenda que a decisão liminar seja confiada de logo ao Colegiado.

1 MS 21.564-MC, 10-9-92, Gallotti, RTJ 169/45, e STF – Impeachment, 1996, p. 71, 75; MS 22.864, 4-6-97, Sydney, RTJ 182/148; MS 23.047, 11-2-98, Pertence, DJ de 14-11-03, impedido, no primei-ro, e vencido, nos dois últimos, o eminente Ministro Marco Aurélio.

R.T.J. — 2031018

3. De resto, controvérsias como a presente trazem sempre ao proscênio o tema da demarcação entre a esfera da jurisdição do Poder Judiciário e a arena polí-tica do Congresso e, pois, da admissibilidade do mandado de segurança, a respeito do qual – ao contrário do que sucede a propósito simplesmente do deferimento, ou não, da liminar, no caso concreto –, se entende ser a decisão individual susceptí-vel de reexame pela Corte, mediante agravo regimental2.

4. Essas, em síntese, as razões pelas quais me decidi a pôr em Mesa o pedi-do liminar e, com ele, a admissibilidade do mandado de segurança.

II

5. Pretende o Impetrante obter o trancamento do processo disciplinar, que ainda tramita no Conselho de ética e Decoro Parlamentar, cujo parecer conclusivo deve ser encaminhado à Mesa e por ela incluído na ordem do dia para a deliberação do plenário da Câmara3.

6. Tenho, assim, por legitimados para figurar no processo como autoridades coatoras tanto aquele Conselho – que instaurou e dá curso ao processo discipli-nar – quanto, em caráter preventivo, a Mesa da Câmara dos Deputados, à qual incumbiriam os passos ulteriores do procedimento.

7. Diferentemente, entendo carecer de legitimação – ad processum ou ad causam, conforme se entenda – o Relator do processo disciplinar, órgão do Con-selho, sem atribuições decisórias próprias: excluo-o, portanto, do mandado de segurança.

III

8. Tanto a renitente questão preliminar da jurisdição do Tribunal e a conse-qüente possibilidade do provimento mandamental pleiteado, quanto – admitido o mandado de segurança – a concorrência em concreto dos pressupostos da medida liminar reclamam aviventar algumas premissas acerca do instituto da perda do mandato do congressista pela chamada “quebra do decoro parlamentar”.

9. Embora sem novidades a estadear a propósito, sou constrangido a rogar a paciência da Corte para fincar os alicerces do meu raciocínio.

IV

10. Parto da distinção, presente na obra de José Afonso4 entre a cassação e a simples extinção do mandato: “cassação” – dilucida o mestre, com definição de Hely Lopes Meirelles – “é a decretação da perda de mandato, por ter o seu titular incorrido em falta funcional, definida em lei e punida com esta sanção”; já a “extinção do mandato” – define – “é o perecimento do mandato pela ocorrên-cia do fato ou ato que torna automaticamente inexistente a investidura eletiva, tais como a morte, a renúncia, o não comparecimento a certo número de sessões

2 V.g., MS 21.754-AgR, 7-10-93, Rezek, DJ de 21-2-97.3 Cf. Código de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados (Resolução 25, de 2001), arts. 14, § 4º, IX, e 16, § 2º.4 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. Malheiros, 2005. p. 539.

R.T.J. — 203 1019

expressamente fixado (desinteresse que a Constituição eleva à condição de re-núncia), perda ou suspensão dos direitos políticos”.

11. “A utilidade e a razão da distinção” – colho de precioso estudo inédito de Eduardo Fortunato Bim5, que o autor teve a fineza de enviar-me – “reside na necessidade ou não de votação da Câmara ou do Senado para a perda do mandato do parlamentar e, ipso facto, na existência (cassação) ou inexistência (extinção) de juízo político do parlamento”.

12. “Para os casos de cassação (incisos I, II e VI do art. 55 da CF), há neces-sidade de votação secreta pela maioria absoluta dos membros da casa, mediante a provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada a ampla defesa. Nos de extinção do mandato (CF, art. 55, incs. III, IV e V) haverá apenas a declaração da Mesa, não votação secreta por maioria absoluta”.

13. “Na cassação” – infere daí o autor –, “a decisão tem natureza constitutiva; na extinção, meramente declaratória”.

14. Dos casos de extinção, não é preciso cuidar-se aqui: sua declaração pela Mesa é ato vinculado à existência do fato objetivo que a determina, cuja realidade, ou não, o interessado pode induvidosamente submeter ao controle jurisdicional.

15. Já no tocante à cassação do mandato, a sua decretação, na maioria das hipóteses, é deliberação na qual se conjugam um juízo objetivo – e, assim, vincu-lado – de verificação de um fato – a infringência de regras expressas de incompati-bilidade e vedação (no Brasil, enumeradas no art. 54 da Constituição) – e um juízo discricionário da Câmara respectiva.

16. Dessa modalidade comum de cassações parcialmente vinculadas ao acer-tamento de um motivo típico objetivo, é que se impõe diferençar aquela outra – presente em alguns ordenamentos constitucionais –, na qual a cassação do mandato parlamentar resta confiado, no final das contas, ao juízo subjetivo e incontrolável da maioria, mais ou menos qualificada, da Câmara respectiva, dada a utilização, como suposto normativo de sua decretação, de um “conceito indeterminado” – ou, em preito devido à lucidez de Eros Grau6, à extrema imprecisão dos termos em que expresso o conceito na regra de direito.

17. Nessa última categoria é que se enquadrava – a par de outras similares no direito comparado – a previsão original, na Constituição de 1946 (art. 48, § 2º), da perda do mandato do deputado ou senador “cujo procedimento seja reputado, pelo voto de dois terços dos membros de sua Câmara, incompatível com o decoro parlamentar”.

V

18. Desconheço, a esse propósito, em outras ordens positivas, locução de termos tão imprecisos quanto essa, a do “decoro parlamentar”, cujas conotações vão da sublimidade da ética às frivolidades da etiqueta.

5 BIM, Eduardo Fortunato. A Cassação do Mandato por Quebra de Decoro Parlamentar: Sindica-bilidade Jurisdicional e Tipicidade. Inédito, recebido por correio eletrônico.6 GRAU, Eros Roberto. Direito, Conceito de Normas Jurídicas. RT, 1988, p. 72.

R.T.J. — 2031020

19. Mas, é sabido, a pesquisa no direito comparado desvela que expressões de ambigüidade ou polissemia comparáveis têm sido utilizadas por outros do-cumentos constitucionais para, ao fim e ao cabo, outorgar a uma maioria parlamen-tar – em geral, é certo, altamente qualificada – o poder de cassar o mandato de um membro das Câmaras.

20. Os exemplos, contudo, são pouco mais que raridades.

21. A fonte histórica mais notória é a Constituição dos Estados Unidos7 – se se faz a abstração devida de práticas britânicas, em relação às quais seria preciso levar em conta o caráter ambivalente da Casa dos Lordes, a um tempo, Câmara Alta do Parlamento e Corte Suprema da Justiça.

22. é da Constituição americana que a da Argentina recebeu regra semelhan-te, ainda hoje em vigor8.

23. Na América Latina – afora o Brasil de ontem –, só identifiquei instituição similar na Constituição da Bolívia, de 19679.

24. Na Europa continental, a partir dos países aos quais mais se afina a nossa cultura jurídica – França, Portugal, Espanha, Itália e Alemanha –, são desconheci-das cassações assim discricionárias de mandatos parlamentares.

25. Claro, não faz sentido mencionar textos constitucionais de regimes revo-lucionários de “partido único” – com marcante protagonismo na cassação –, entre os quais se situam os de alguns países africanos recém-libertados, quando de sua promulgação10.

26. Trabalho recente e precioso editado pela União Interparlamentar dá testemunho eloqüente da raridade, em todo o mundo, dessa categoria de cassação de mandatos11.

7 Art. 1º, s. 5, n. 2: “Each House may determine its members for disorderly behaviour and, with the Concurrence of

two thirds, expel a member”.8 Const. de La Nación Argentina, art. 66:

“Cada Cámara hará su reglamento y podrá, con dos tercios de votos, corregir a cualquiera de sus miembros por desorden de conducta em el ejercicio de sus funciones, o removerlo por inhabilidad física o moral sobreviniente a su incorporación, y hasta excluirle de su seno; pero basta la mayoria de uno sobre la mitad de los presentes para decidir en las renuncias que voluntariamente hicieren de sus cargos.”9 Constituição da Bolívia, art. 67:

“In atribuciones de cada Câmara (...) 4. Separar temporal o definitivamente, com el acuerdo de dos tercios de votos, a cualesquiera de sus miembros por graves faltas cometidas em el ejercicio de sus funciones.”10 V.g., Argélia (1976), art. 135, 2; São Tomé e Príncipe, art. 23, 2; Guiné-Bissau (1973), art. 32, 2.11 HULST, Marc Van Der. The Parliamentary Mandate: A global comparative study. Inter-Parla-mentary Union, Genova, 2000, p. 20:

“Parliaments in Many countries are not authorized to expel members permanently (Cyprus, France, Gabon, Lesotho, Norway, Romania and the European Parliament). Temporary suspension, on the other hand, is allowed in many cases as a disciplinary measure.

R.T.J. — 203 1021

27. A raridade da adoção de medidas similares não tem causado espécie, dados os riscos que traz consigo, de abusos do poder das maiorias.

28. “Basear no decoro parlamentar, para fazer o deputado ou senador perder o mandato” – advertira, entre nós, Sampaio Dória –, “é dar asas a vinditas políticas. Porque no conceito específico de decoro, há parcela de apreciação individual, de fugidio e de imponderável, no precisar a conveniência, a propriedade, a relação do ato com as circunstâncias. E daí o arbitrário no voto, ainda que por dois terços da Câmara ou do Senado (...)”

29. “Daí a excepcionalidade do remédio” – acentua o mestre Reale12 –, “cujo caráter obsoleto é reconhecido pela maioria dos autores, exatamente pelo perigo de abusos que enseja, inclinando-se a legislação e a doutrina cada vez mais para outros processos de apuração de responsabilidade, nos casos de infração de deveres polí-ticos, conferindo-se ao Parlamento a função de ‘denunciar’, mas não a de ‘julgar’ os próprios pares (Cf. Biscaretti di Ruffia, ‘Diritto Costituzionale’, Nápoles, 1965, pág. 404 e segs.)”

VI

30. No Brasil, as duas primeiras constituições republicanas reduziram a perda do mandato parlamentar à hipótese de violação de expressas incompatibilidades e proibições impostas ao congressista13, sendo certo que, na de 1934, a competência para o decreto de cassação se confiou ao “Tribunal Superior de Justiça Eleitoral, mediante provocação do Presidente da Câmara dos Deputados, de Deputados ou de eleitor, garantindo-se plena defesa ao interessado”.

31. A cassação de mandatos, a juízo da câmara respectiva sobre a quebra do decoro parlamentar, só viria a surgir na Constituição de 194614, que adotou fórmula tão aberta quanto as precedentes dos Estados Unidos e da Argentina.

32. À resistência daqueles que, como Milton Campos, insistiam na solução judiciarista, similar à de 1934, de modo a subtrair das câmaras a cassação do

In countries where permanent expulsion is allowed, the grounds invoked are quite varied. In general, they fall into three categories: disciplinary penalties, loss of eligibility, and an activity that is incompatible with the mandate. Other grounds may also be invoked, for example in Latvia, where members can be expelled if their knowledge of the national language is found to be inadequate for the purpose of exercising their parliamentary mandate. And in the Thai Senate, where there is a procedu-re for expulsion of a member suspected of unlawful enrichment or corruption.

Procedures for expulsion from parliament are also extremely varied. The decision is often taken by a two-thirds majority of the assembly (Argentina, Israel, Jordan, United States of America). In Thailand, a majority of three quarter is required and in Finland one of five sixths. The expulsion procedure is usually based on a recommendation by a committee assigned to consider the case and report to the assembly.”12 REALE, Miguel, ob. cit., RDP 10/90.13 Cf. Constituição de 1891, art. 24, parágrafo único; Constituição de 1934, art. 33, § 5º.14 Constituição de 1946, art. 48, § 2º:

“Perderá, igualmente, o mandato o Deputado ou Senador cujo procedimento seja reputado, pelo voto de dois terços dos membros de sua Câmara, incompatível com o decoro parlamentar.”

R.T.J. — 2031022

mandato de seus próprios membros15, prevaleceu, no particular, o argumento de Aliomar Baleeiro, para quem o quorum de dois terços era garantia bastante16:

Não é possível que uma Câmara que se presume, até prova em contrário, constituída de homens sensatos não possa eliminar um membro pelo voto de 2/3 de seus componentes.

33. A mesma lógica do quorum como requisito necessário e suficiente à validade da cassação preside à exegese apodítica de Pontes de Miranda17: nela, a asserção implacável da exclusão do controle judicial, senão o que versasse sobre a existência dos dois terços – ainda que, ao tempo, viesse a sofrer, no Supremo, a contestação veemente de Nelson Hungria18 –, tinha por si a literalidade da norma constitucional de 1946, a qual é de notar, ao contrário da de 1934, sequer reveren-ciava a garantia de defesa do mandatário ameaçado de cassação.

34. O que muitos não têm notado, entretanto, na doutrina como na jurispru-dência, é que, no ponto – a proposição de Pontes de Miranda – correta, ou não, à luz da Constituição de 1946, sob a qual se elaborou –, já não se sustenta, desde a Carta de 1969, no tópico, acolhida pela Constituição: que, não obstante, se continue a repisá-la, é mais um exemplo da terrível força inercial da malsinada interpretação retrospectiva.

35. Surgem, de fato, com a Carta de 69, inovações radicais no tema19: as-sim, de um lado, como causa da perda do mandato, à incompatibilidade “com o decoro parlamentar” se equiparou o procedimento “atentatório das instituições vigentes”20; de outro, subtraiu-se a exigência, para a cassação, do quorum de 2/3 dos membros da Casa (art. 35, III e § 3º); de outra banda, porém – desapercebida-mente, ou não –, o terceto constituinte de 1969 ditou que – afora os dois de logo previstos – os casos de incompatibilidade com o decoro parlamentar seriam os definidos no regimento interno das câmaras.

36. No escólio ao § 1º do art. 35 da Carta outorgada, o d. Ferreira Filho21 realça a inovação substancial (embora a critique), para aduzir:

15 “E Milton Campos” – relata José Duarte (A Constituição Brasileira de 1946, 1947, 2/67) – “não aceita essas razões porque não são convenientes aos objetivos da moralidade visados pelo texto, de se entregar ao próprio Legislativo o julgamento do processo de perda do mandato. Bem sabemos que, via de regra, as questões desse caráter, submetidas ao Poder Legislativo, assumem feição política e no domínio da respectiva confiança costumam ser resolvidas. Haveria, ainda, natural constrangi-mento entre os pares para julgarem o processo, que, de certo modo, envolve o crime funcional ou de responsabilidade do representante da nação. Verifica-se, como tendência habitual das Constituições, retirar-se dos pares do acusado o julgamento dos crimes funcionais, dos processos de responsabili-dade. Porque, então, iríamos entregar ao próprio Legislativo, à própria corporação de que faz parte o acusado, o julgamento do seu caso?”16 Apud DUARTE, José, ob. cit., 2/69.17 MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1946. 2. ed., 1953, II/257:

“O elemento ‘incompatibilidade com o decoro parlamentar’ é apreciado como quaestio facti. Com ele compõe-se o suporte fáctico da regra de direito material sobre perda do mandato: incom-patibilidade com o decoro parlamentar mais votação de dois terços, que a enuncie, igual a perda do mandato.”18 RMS 2.319, de 1954, Nelson Hungria, RT 285/889.19 A Constituição de 1967 – art. 37, II e § 1º – reproduzira no ponto, sem alterações, a de 1946.20 Constituição de 1969, art. 35, II.21 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira. Saraiva, 1974, 2/229.

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Este parágrafo foi uma inovação introduzida pela Emenda nº 1. Não constava do direito anterior. Procedeu, segundo parece, da intenção de precisar o campo do decoro parlamentar, tornando inquestionável abranger o abuso de prerrogativas e a percepção de vantagens ilícitas ou imorais.

é de se indagar, porém, se foi feliz a inovação. Por um lado, era ela dispensável. Nin-guém, em sã consciência, recusaria o caráter de infração ao decoro parlamentar a todo ato que visasse à percepção de vantagens, ilícitas ou imorais. Por outro lado, ela restringiu o âmbito do decoro parlamentar. De fato, à luz deste parágrafo, cumpre afirmar, que não há infração ao decoro parlamentar apta a ensejar a perda do mandato, senão quando configurar ação ou omis-são descrita como tal, na Constituição ou no regimento interno. Adotou-se, pois, aqui, o rígido princípio da legalidade criminal.

37. Em 1988, a Constituição – além de varrer o adendo ideológico da Carta de 69 – retornou à exigência do quorum especial, que, no entanto, reduziu, dos dois terços de 1946 e 1967, à maioria absoluta, e, sob o prisma substancial, manteve, nos mesmos termos de 1969, o iniludível requisito de tipificação regimental das condutas que, a título de incompatibilidade com o decoro parlamentar, induzam à perda do mandato por decreto da câmara respectiva.

38. é recordar a letra em vigor da Constituição:

Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador: (...)II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;(...)§ 1º é incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento

interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.

39. A cassação do mandato eletivo por força da declaração da incompatibi-lidade do comportamento do mandatário com o decoro parlamentar – conforme o texto brasileiro de 1946 e as fontes históricas das quais fora transplantado – real-mente constituía, segundo o communis opinio doctorum, uma cláusula aberta à decisão política das Câmaras legislativas, cujo controle havia de adstringir-se à verificação do quorum qualificado exigido para a sua validade.

40. No contexto normativo vigente, porém, não é mais assim: decoro par-lamentar – antes, um conceito expresso em termos indeterminados, que servia de frouxa demarcação dos únicos limites constitucionais à vontade legislativa – reduz-se, no texto vigente, a circunscrever o bem jurídico a ser protegido, mediante a san-ção de perda do mandato, cominada apenas às hipóteses típicas de sua violação: duas, definidas na Constituição mesma, e as demais, de definição reservada ao regimento da Casa Legislativa.

41. “Percebe-se” – acentuou Eduardo Bim22, à luz do preceito em vigor – “que existem três hipóteses constitucionais de quebra de decoro parlamentar:

(i) os casos previstos no regimento (a mais ampla de todas);

(ii) o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional, Assembléias Legislativa e Câmara de Vereadores e

(iii) percepção de vantagens indevidas”.

22 BIM, Eduardo Fortunato. A Cassação do Mandato por Quebra de Decoro Parlamentar: Sindica-bilidade Jurisdicional e Tipicidade. Inédito, recebido por correio eletrônico, p. 3-4.

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42. “Quando a acusação do comportamento incompatível com o decoro parlamentar, seja no Senado, seja na Câmara dos Deputados, for formalizada” – conclui o autor, com precisão –, “é preciso que ela, sob pena de ofensa à Consti-tuição, descreva conduta prescrita em uma daquelas três hipóteses constitucionais. A maior amplitude acusatória certamente residirá nos regimentos internos e nos seus respectivos códigos de ética e decoro parlamentar (como no caso da Câmara dos Deputados, que instituiu o Código de ética e Decoro Parlamentar como uma extensão do seu regimento interno”.

43. Do tipo de linhas fluidas, que era, o conceito de decoro parlamentar, como observa com agudeza o mesmo autor, passou a ter agora, ao contrário, uma função limitadora da tipificação regimental de suas violações puníveis.

44. Por isso, quando a Constituição alude a decoro parlamentar – acentua ele, em passagem que não hesito em subscrever23 –, “ainda que remeta a sua definição ao regimento, não o faz de forma ilimitada, não passa um cheque em branco ao le-gislador regimental. Ainda que haja amplitude na definição dos atos incompatíveis com o decoro parlamentar não há como ignorar o conteúdo mínimo da expressão como algo que minimamente fira a dignidade, a imagem, a respeitabilidade do parlamento, sob pena de transformar-se a cassação pela quebra de decoro em uma desculpa para revogar mandatos legitimamente conferidos pelo povo”.

45. Essa solução – a da tipificação das condutas indignas da representação parlamentar, que, afora a infringência de incompatibilidades e vedações explícitas, autorizem a cassação do mandato – corresponde, vale notar, à tendência do direito comparado, pouco afeito à admissão de hipóteses indiscriminadas de perda da investidura eletiva24.

46. Sob essa perspectiva constitucional – à qual, embora vigente há mais de três décadas, não se tem dado a atenção devida – é que se hão de examinar, no caso concreto, primeiro, a admissibilidade do mandado de segurança e, segundo, a viabilidade da pretensão deduzida.

VII

47. Essas considerações acerca do espectro normativo sob o qual há de ser vista hoje a questão aventada pelo Impetrante dispensa, a meu ver, de maiores

23 BIM, Eduardo Fortunato. A Cassação do Mandato por Quebra de Decoro Parlamentar: Sindica-bilidade Jurisdicional e Tipicidade. Inédito, recebido por correio eletrônico, p. 3-4.24 Assinala Van der Hulst, ao cabo da síntese da pesquisa já mencionada (supra, n. 11):

“Needless to say, permanent expulsion must remain an exceptional procedure confined to cases that are strictly specified in the relevant legal instruments. Otherwise, it could become a dangerous weapon – comparable to verification of credentials – in the hands of the majority.” (Tradução livre: “Desnecessário dizer que a expulsão permanente deve permanecer como procedimento excepcional, confinado a casos que estão estritamente especificados nos instrumentos legais relevantes. Caso con-trário, poderia se tornar uma arma perigosa – comparável à verificação de credenciais – nas mãos da maioria.”) Confira-se, por exemplo, a explícita previsão do Código de ética, na Constituição do Equador, de 1998 (“Art. 136. Los diputados que incurran em violaciones al Código de ética serán sancionados com el voto de la mayoria de los integrantes del Congreso. La sanción podrá ocasionar da pérdida de la calidad de diputado.”).

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indagações ser a instauração do processo disciplinar questionada, suscetível ou não, de controle jurisdicional pelo Poder Judiciário e, em concreto, de possível deslinde no presente mandado de segurança.

48. é de realçar que o processo disciplinar discutido teve seu objeto definido e adstrito à imputação de fato veiculada na representação que lhe deu início: é de-rivação, que parece óbvia, de um lado, da circunstância de estar ele submetido, por disposição explícita, à garantia constitucional da ampla defesa, e, de outro, de que a legitimação para provocá-lo esteja constrita à Mesa da Casa ou a partido político representado no Congresso25.

49. Ressalte-se que o Impetrante, declaradamente, não pretende controverter neste processo a veracidade da imputação nem a suficiência das provas delas, pontos nos quais a jurisprudência do Tribunal – na cassação do mandato, como no impeachment presidencial – tende efetivamente a reservar à Casa legislativa o “monopólio da última palavra” (tendência, à qual, na espécie, não me animo a aventar temperamentos).

50. O que a impetração submete ao Tribunal é só e unicamente que, dadas as circunstâncias inequívocas dos fatos imputados – o tempo em que teriam ocorrido e a qualificação funcional de ministro de Estado, no exercício e em razão da qual os teria ele cometido –, não haveria na representação, sequer em tese, objeto idôneo para a incriminação de ofensa ao decoro parlamentar, sujeita, como tal, à tipificação e à conseqüente perda do mandato eletivo.

51. No ponto específico, desde a textura aberta das Constituições de 1946 e 1967 até a exigência, surgida a partir de 1969, de tipificação das infrações ao deco-ro parlamentar – acolhida pela Constituição de hoje –, a jurisprudência do Supremo Tribunal não tem seguido uma trilha unívoca acerca da possibilidade e dos lindes do controle judiciário das deliberações congressionais.

52. A resenha das vacilações do Tribunal a respeito – muitas vezes, sutis – seria de valioso interesse acadêmico – desde a abertura do notável acórdão de Nelson Hungria, de 195426, até a linha ortodoxa da indevassável autoridade das

25 Constituição, art. 55 (...), § 2º: “Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou

pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de Partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.”26 Supremo Tribunal, RMS 2.319, 5-1-54, Nelson Hungria, RT 285/891:

“Tenho para mim que é insustentável a tese do acórdão recorrido, segundo a qual não há indagar, sequer, se está comprovado o procedimento reputado incompatível com o decoro parlamentar.

Redundaria isso no reconhecimento do mais descontrolado arbítrio, flagrantemente irreconciliável com o art. 141, § 4º, da Constituição, desde que esteja em jogo a violação de direito individual. Em matéria de questões de natureza política, a apreciação destes pelo Poder Judiciário se impõe indepen-dentemente de tal natureza, toda vez que envolvam a lesão de um direito subjetivo individual.

Nem mais se controverte a respeito, notadamente em face do nosso vigente Direito Constitucional, que já não repete, por ocioso ou propiciador de confusões, o princípio de inacessibilidade das ‘ques-tões exclusivamente políticas’ à órbita de competência do Poder Judiciário.

Na espécie, a própria exigência legal do ‘motivo’ de incompatibilidade do procedimento do senador, deputado ou vereador com o decoro parlamentar, está a evidenciar que não se trata de ato puramente arbitrário, nem mesmo apenas discricionário.

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Casas do Parlamento na matéria, defendida, com eloqüência, em votos preciosos de Paulo Brossard27: a diversão, contudo, excederia as necessidades da decisão da causa e, por isso, poupo dela o Tribunal.

53. Tenho, no ponto – a respeito, em geral, dos limites do controle jurisdi-cional da Corte sobre as deliberações das Casas do Congresso Nacional –, posição conhecida e manifestada em mais de uma oportunidade28, no sentido de que o deci-sivo – cuide-se de questão de hierarquia constitucional ou simplesmente de alçada regimental – é saber se há, ou não, a pretensão de um direito subjetivo lesado ou ameaçado, o que, sendo a resposta afirmativa, é bastante para tornar sem sentido – “um peso morto”, no dizer de Castro Nunes – a indagação sobre se a questão é, ou não, interna corporis e tem, ou não, caráter político.

54. E essa pretensão de direito subjetivo – suficiente a legitimar o controle jurisdicional sobre as deliberações do Poder Legislativo – “não precisa ser de al-guém estranho às Casas do Parlamento. O congressista não sofre nenhuma capitis diminutio em seus direitos subjetivos. Pelo contrário, precisamente porque con-gressista, tem uma série de direitos-função, que pode defender por todas as vias judiciais cabíveis.” (RTJ 169/241.)

55. Exemplos marcantes – acentuei, de outra feita29 – são aqueles relativos a processos de cassação de mandatos parlamentares, nos quais – para aferir da procedência, ou não, da alegada ofensa à garantia da ampla defesa – jamais se tem furtado o Tribunal ao deslinde de questões regimentais.

56. Na espécie, contudo, a revivescência dessa quizília – com a qual tenho, por vezes, acicatado a maioria – seria de rotunda ociosidade: o ponto nuclear da

Não é exato que o reconhecimento dessa incompatibilidade atende a critério meramente subjetivo. Admiti-lo valeria por admitir, obliquamente, o arbítrio que a Constituição e a lei ordinária repelem.

Não fica ao puro capricho da Câmara Legislativa esse reconhecimento, pois, de outro modo, qual-quer atitude de um de seus membros, por mais alheia ao decoro parlamentar, poderia ser considerada ofensiva deste, com a mais intolerável desgarantia à função do representante do povo.”27 Cf. voto de Brossard no MS 21.443, 22-4-91; Gallotti, RTJ 142, 791, 797:

“(...) 11. Trata-se de uma competência exclusiva da Câmara e só ela, bem ou mal, pode exercitar. Se-gundo a Constituição, ‘perderá o mandato o Deputado ou Senador (...) cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar’, art. 55, II; declarado por quem? Pela Câmara a que pertencer o parlamentar, Câmara dos Deputados ou Câmara dos Senadores, observados os requisitos taxativamente indicados no § 2º do mesmo artigo: voto secreto, maioria absoluta, provocação da Mesa ou de partido político com representação no Congresso, assegurada ampla defesa. (...) 14. Aliás, em princípio, das de-cisões da Câmara, como do Senado, relativas a atribuições constitucionais privativas, não cabe recurso ao Poder Judiciário. Melhor seria dizer, não cabe recurso. Se as Casas do Congresso procederem mal, em assunto de sua competência exclusiva, só caberá o remoto e incerto recurso para a opinião pública e o eleitorado. Como disse Rui Barbosa, ‘em todas as organizações políticas ou judiciais há sempre uma autoridade extrema para errar em último lugar. (...) O Supremo Tribunal Federal, não sendo infalível, pode errar, mas a alguém deve ficar o direito de errar por último, de decidir por último, de dizer alguma cousa que deva ser considerada como erro ou como verdade. Isto é humano’, Obras Completas, XLI, 1914, III, p. 259. (...) O STF também erra. E errando em último lugar, só escassamente haverá meio de corrigir o erro, por meio da rescisória ou revisão criminal.”28 V.g., votos no MS 21.754-AgR, Rezek, e no MS 22.503, Maurício, RTJ 169/181, 240.29 V.g., voto no MS 21.754-AgR.

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questão suscitada – a submissão, ou não, à jurisdição censória das câmaras legisla-tivas dos atos ministeriais do parlamentar licenciado para ocupar ministério – é de colorido constitucional evidente.

57. A regra constitucional que, hoje, reclama a tipificação constitucional ou regimental das ofensas ao decoro parlamentar indutoras da perda do mandato ele-tivo é um dado adicional que, apenas, torna mais ofuscante a sua clareza planaltina.

58. Sinto-me à vontade no particular, uma vez que a tipificação hoje imposta à perda de mandato por falta de decoro parlamentar deu-lhe, ao processo, feições ainda mais próximas do impeachment presidencial, a respeito do qual, ao meio de maturada reflexão, já pude me manifestar (MS 21.564-QO, 10-9-92, Gallotti, em Impeachment, ed. STF, 1996, p. 71, 83 e RTJ 169/45).

59. “Continuo a não negar” – asseverei – “que as Casas do Congresso Na-cional exerçam jurisdição, verdadeira jurisdição, quando, nos limites materiais que lhes demarca a Constituição, processam e julgam as acusações dos chamados crimes de responsabilidade. E mais: à conseqüente exclusividade dessa jurisdi-ção, de modo a repelir a interferência do Poder Judiciário, não se poderia opor à regra – repetida em nossas Constituições, desde 1946, e hoje objeto do inciso XXXV do art. 5º –, segundo a qual a lei não poderá subtrair do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça de lesão a direito. Acentuou, com precisão antológica, no ponto, o Ministro Paulo Brossard no MS 21.443: ‘a lei é que não pode subtrair, a própria Constituição pode’.”

60. “O problema assim” – ponderei – “é saber se, podendo fazê-lo, a Consti-tuição efetivamente subtraiu a matéria, de modo absoluto, de qualquer modalidade de controle do Judiciário. Acabei por me convencer, Senhor Presidente, de que a Constituição não excluiu do Poder Judiciário o exame de algumas questões rele-vantes que – in procedendo, não, in judicando, podem surgir no desenvolvimento do impeachment.”

61. “O primeiro deles” – concluí, então, com inteira pertinência à espécie – “é tudo aquilo que diga com a demarcação da jurisdição do impeachment. De fato, ainda que se reconheça o caráter jurisdicional do processo e do julgamento do im-peachment pelas Casas do Congresso, é evidente que se trata de uma área restrita, de uma área excepcional de jurisdição; de tal modo que não se pode jamais negar, no nosso regime, ao Judiciário, a possibilidade de indagar se em determinado caso se respeitam os limites desta competência excepcionalmente jurisdicional das Casas do Congresso, particularmente do Senado Federal.”

62. “é significativo, aliás” – recordei, para findar –, “que nos Estados Unidos, onde dogmaticamente parece mais forte a negativa radical da interferência do Ju-diciário no impeachment, se tenha, em caso similar, célebre decisão da Suprema Corte – Powell v. Mc Cormack, de 1969, quando o exercício, pela Câmara, do poder, diz a Constituição, ‘de julgar da qualificação de seus membros’, levou a Casa dos Representantes a cassar o mandato de deputado, por serious misconducts: A Corte Suprema anulou a decisão, por entender que a imputação de mau comportamento excedia dos limites das qualificações em relação às quais a Constituição dera, sim, verdadeiro poder jurisdicional às Casas do Congresso.”

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63. Aqui, insista-se outra vez, a impetração não põe em xeque o dogma da jurisprudência dominante, que afirma ser indene à jurisdição do Tribunal o mérito estrito da decisão parlamentar: questiona, tão-somente, se as imputações irrogadas ao Requerente se compreendam, em tese, no seu âmbito e isso é tema puramente constitucional.

64. Não desconheço a delicadeza inerente à questão: no sistema brasileiro de universalidade da jurisdição do Judiciário (Constituição, art. 5º, XXXV), corre a Justiça e, em particular, o Supremo Tribunal, sobre um fio da navalha, entre a usurpação do poder alheio e a demissão do seu próprio poder-dever de prestar jurisdição.

65. Guarda da Constituição, o Supremo Tribunal tem a responsabilidade cotidiana de decidir da juridicidade da ação dos demais Poderes do Estado, no de-sempenho da qual há de manter atuação escrupulosa aos dois prismas da limitação de sua função institucional: o primeiro – negativo e óbvio – é de não lhe ultrapassar as raias e invadir a órbita da livre decisão política dos demais Poderes; o segundo – positivo e não menos importante – é o de ocupar integralmente o seu espaço, de modo a não se demitir do poder que é seu – não para afirmar orgulhosamente a própria força –, mas, sim, para não sonegar a garantia constitucional de acesso à jurisdição de quem quer que se pretenda lesado ou ameaçado de lesão a direito seu.

66. Esse o quadro, Senhor Presidente, afirmo a jurisdição do Tribunal no caso e, portanto, conheço do mandado de segurança.

VIII

67. Ao termo de horas e horas de meditação, resumo de afogadilho as con-clusões sobre o tema principal e mais fascinante para a opinião excitada em torno do caso e da figura do seu protagonista: o da procedência da liminar, à base da viabilidade dos fundamentos da impetração (escuse-me o Tribunal, se imprevistas razões de saúde forçaram-me ao desatavio destas páginas).

68. A partir de quando a Constituição de 1946 deixava ao talante da maioria qualificada das câmaras a cassação de mandatos parlamentares pela identificação, em algum fato do mandatário, da incompatibilidade com o decoro parlamentar, os ensaios teóricos de dar densidade ao conceito fluido ganharam particular fas-cínio30.

69. Tópico tormentoso de tais dissertações teóricas, assim como da discussão parlamentar de casos concretos, com alguns reflexos jurisprudenciais, foi o de saber se poderiam substantivar quebra do decoro parlamentar fatos não coincidentes com o tempo de exercício do mandato em causa.

30 V.g., Miguel Reale, Decoro parlamentar e cassação, ob. cit., RDP 10/87; Rubem Nogueira, Consi-derações em torno de um Código de ética e Decoro Parlamentar. Rev. Informação Legislativa, Senado Federal, 118/349; e, sobretudo – embora sem se preocupar da visceral alteração da norma constitucio-nal –, os admiráveis ensaios de Carla da Costa Teixeira, entre eles, A Honra da Política: Decoro Parla-mentar e Cassação de Mandato no Congresso Nacional (1949-1994), Relume Dumará, 1998) e Decoro Parlamentar: A legitimidade da esfera privada no mundo público (Série Antropologia), UnB, n. 76, Brasília, 1995).

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70. Resisto uma vez mais à tentação de aventurar-me às disceptações abstratas, uma vez que, para mim, o episódio vertente tem singularidades que lhe emprestam conotações institucionais específicas.

71. Cinjo-me a anotar que, efetivamente, não lhe são adequados os preceden-tes parlamentares, aos quais se apegou o parecer da Consultoria Jurídica da Câmara dos Deputados para asseverar a irrelevância, na espécie, de estar o Deputado impe-trante, ao tempo dos fatos imputados, licenciado da Casa para exercer o cargo de ministro de Estado.

72. A petição do mandado de segurança evidencia, com lastro documental inequívoco, a impertinência dos precedentes invocados31.

73. Um desses casos – o do ex-Deputado Talvane Albuquerque – chegou ao Supremo na MC 233, no qual se assentou, de um lado, o cabimento do controle jurisdicional da questão, mas, de outro, sua improcedência, conforme o voto con-dutor do eminente Ministro Néri da Silveira32.

74. Situou-se na mesma linha, no que interessa, no MS 24.458 (DJ de 12-3-03), a douta e exauriente decisão individual do eminente Ministro Celso de Mello.

31 Da impetração – fls. 16 e seguintes: “Ora, no processo de cassação do Deputado Hildebrando Pascoal, essa discussão sequer chegou

efetivamente a ser travada, pois o Deputado Inaldo Leitão, Re-lator, destacou que a circunstância de um dos fatos imputados ao então representado ter ocorrido ‘já no exercício deste mandato, nos livra de incômoda e exaustiva discussão teórica sobre se é possível ao parlamentar perder o mandato por atos cometidos antes de sua diplomação. No processo de cassação do Deputado Talvane Albuquerque, o Senhor Relator, Deputado Aloysio Nunes Ferreira, após esclarecer que se sustentava ‘a impossibili-dade de, numa nova legislatura, cassar-se o mandato de Deputado Federal, a pretexto de falta de decoro parlamentar, por fatos supostamente ocorridos na legislatura anterior’, observou que: ‘Seria absurdo que não restasse outra alternativa à Câmara, a não ser a de admitir a permanência em seu seio de quem já houvesse, no exercício do mandato, demonstrado comportamento indigno, desmerecedor do cargo, incompatível com a respeitabilidade exigível de um representante popular’. E, mais adiante, voltou a ressaltar a necessidade do ato investigado estar ligado ao exercício do mandato: ‘Na verdade, se a Câmara dos Deputados constata que alguém – por sua conduta ao exercer o mandato parlamentar – manchou a dignidade de todo o corpo legislativo, tem ela o dever de impedir a sua permanência na Casa do povo brasileiro’. Finalmente, no terceiro suposto precedente, o processo de cassação do Deputado Feres Nader, mais uma vez o que se discutiu foi a possibilidade de o suplente de parlamentar responder, em uma legislatura, por ato praticado em outra, anterior, no exercício de mandato de Deputado Federal, que configuraria, em tese, falta de decoro. Vejam-se as seguintes elucidativas passagens do voto do Senhor Relator, Deputado José Abraão: ‘(...) é certo que somente o Deputado ou o Senador que integra o corpo legislativo, poderia agir ilicitamente, apresentando conduta incompatível com o decoro parla-mentar’. ‘Salta à evidência que somente quem estiver no exercício do mandato parlamentar poderá agir de forma a agredir a honorabilidade da Casa Legislativa, expondo-se à execração pública.’ Destarte, plena razão assistiria à Defesa, se a questão enfrentada fosse tão singela. Entretanto a situação apresenta complexidade cujo deslinde demanda esforço analítico maior, em face das características que o caso con-creto oferece. Eis que a imputação oposta ao hoje Suplente Feres Nader refere-se à sua conduta não como mero suplente, e sim como Deputado Federal. As irregularidades apontadas pela CPMI que teriam sido praticadas pelo Sr. Feres Nader – e ensejadoras da caracterização da falta de decoro parlamentar – ocor-reram quando do exercício de seu mandato.”32 MS 23.388, 25-11-99, Néri da Silveira, RTJ 177/209, 213:

“Se, porventura, no mérito, a Corte houvesse de dar pela inviabilidade jurídica do procedimento de que resultou a perda do mandato, eis que referente a fatos sucedidos na legislatura anterior, qual constitui a tese maior da impetração, a conseqüência seria, com o deferimento do writ, a cassação da de-liberação parlamentar da Câmara dos Deputados, com o retorno do Requerente ao exercício do mandato que concerne à legislatura em curso.

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75. Certo, há vetusta decisão do Tribunal, o RMS 3.430, 6-7-56, Afrânio Costa, na qual, sem demorar-se mais na questão, se entendeu válida a cassação do mandato de vereador licenciado, à base, porém, de episódio escandaloso na sala de sessões da própria câmara: “o Recorrente Vereador à Câmara Municipal de Corumbá, às 17 horas do dia 12 de março de 1955, alcoolizado e em trajes impróprios, durante a sessão, penetrou no recinto, armado de revólver, dirigindo injúrias pesadas aos colegas e, em particular, ao presidente, que lhe reverberavam o comportamento”.

76. De qualquer sorte, repito, o que denota o caso presente é cuidar-se de uma modalidade específica de licença parlamentar – a destinada a propiciar, conforme a Constituição (art. 56, I), que o deputado ou senador exerça altas funções de agente político do Poder Executivo –, a começar pela de ministro de Estado.

77. Insiste-se em que, não obstante, o congressista não perde o seu mandato, mas apenas interrompe o exercício dele, enquanto dure a licença: essa obviedade não pode, contudo, ser levada às últimas conseqüências, sem a indevida abstração de que – não em razão da licença em si mesma, mas, sim, da investidura em função de outro Poder – o deputado – enquanto for ministro de Estado – insere-se no regime político e jurídico de seu status ministerial, ao qual é mais que duvidoso se pudesse simultaneamente somar prerrogativas e responsabilidades da sua quali-dade de congressista, inextrincavelmente vinculadas ao exercício do mandato le-gislativo.

Não se trata, aqui, de discussão sobre a falta de decoro parlamentar, matéria em que se exauriu o juízo da Câmara dos Deputados, mas há quaestio juris prévia relativa à jurídica viabilidade do proce-dimento, eis que vinculado esse a fatos, segundo a inicial, que não autorizariam a instauração do juízo, no âmbito parlamentar, que logrou curso, com a definitiva decisão de perda de mandato por falta de decoro parlamentar. Cumpre, pois, examinar, qual já o anotei, nos limites da decisão cautelar, esse ponto de mérito.

A esse respeito, o Dr. Procurador-Geral da República assim se pronunciou (fls. 719/720): ‘Alega o impetrante manifesta ilegalidade e inconstitucionalidade do procedimento de cassação, visto que os atos considerados ofensivos ao decoro parlamentar – ‘relacionamento com pessoas do submundo do crime’ – ocorreram em momento anterior à atual legislatura; portanto, não poderiam ensejar a cassação de seu mandato atual, por ser ‘Impossível falar-se em perda de mandato inexistente; ou em cassação de mandato anteriormente extinto’ (fl. 06). Traz como principal fundamento do presente mandamus a tese já invocada na defesa apresentada na CCJR, na qual pede a sustação do processo político-administra-tivo, em face da decadência do direito de punir, por inexistir contemporaneidade entre o fato típico e a competência da atual legislatura, em decorrência da extinção do mandato legislativo de então, do ora impetrante. Entretanto, como também anotado pelo Ministro-Relator em sua decisão de fls. 710/713, essa tese já foi recusada no parecer exarado pelo Ilustre relator do procedimento da cassação do mandato do ora impetrante, entendendo haver contemporaneidade entre os fatos que se apuram e a posse dos Deputados que compõem a presente legislatura, da qual participa o Impetrante. Ademais, sustenta com absoluta propriedade: ‘A cristalizar-se o entendimento de que determinada legislatura não pode conhe-cer de fatos ocorridos na anterior, estaremos estabelecendo período de verdadeiro vale-tudo nos últimos meses de todas as legislaturas. Se restarem provados os fatos a ele imputados, deverá esta Casa agir, lançando mão dos princípios constitucionais colocados à sua disposição (quais sejam, o da razoabilida-de e o da máxima efetividade da norma constitucional), além de valer-se dos princípios que lastreiam o sistema jurídico nacional para emitir juízo político, declarando a perda do cargo de Deputado Federal, por parte do Representado’.”

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78. Na esfera da mais eminente das prerrogativas parlamentares, o Tribunal chegou a consagrar – é certo que à base de precedente tomado no intervalo parla-mentarista33 – a figura bifronte do ministro com imunidades de deputado, conforme a Súmula 434.

79. O enunciado, no entanto, veio a ser cancelado no julgamento do Inq 10435, 26-8-81, Djaci Falcão, orientação que fundamentaria, em seguida, a nova restrição assentada no Inq 105, 21-10-81, Néri da Silveira36.

80. Não ignoro a diferença dos institutos, mas é indiscutível que as imunida-des e prerrogativas, de um lado, e a sujeição à jurisdição censória da sua câmara, de outro, representam dados parciais do mesmo estatuto constitucional do titular do mandato eletivo: à primeira vista, pelo menos, não me convenço de que seja admissível cindi-lo, de modo a despir das imunidades o mandatário licenciado e, ao mesmo tempo, mantê-lo jungido ao estatuto de decoro da Casa que não o protege, com as imunidades, da investida dos outros poderes.

81. é patente, de sua vez, que a cassação do mandato é uma modalidade de responsabilidade política do congressista; diverso, contudo, é o regime, também constitucional, da responsabilidade política do ministro de Estado, pela comissão dos chamados crimes de responsabilidade, pelos quais responde, conforme a hipótese, perante o Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, c) ou o Senado Federal (CF, art. 52, I).

33 QC 140, 11-5-62, Pedro Chaves, RTJ 14/355.34 Súmula 4:

“Não perde a imunidade parlamentar o congressista nomeado Ministro de Estado.”35 Inq 104, RTJ 99/477, 479:

“No exercício de função administrativa na esfera do Poder Executivo, o deputado ou senador não goza de imunidade processual, de modo a poder invocá-la em razão do cometimento de fato delituoso no exercício da nova função (às vezes, a ela inerente). A prerrogativa da imunidade decorre do critério funcional da divisão do poder. A exegese que se adota não se contrapõe à locução ‘desde a expedição do diploma até a inauguração da legislatura seguinte’, constante do § 1º do art. 32 da Carta Política. Estabeleceu-se aí um marco temporal, de caráter genérico, prevendo o início e o término da imunidade. é um princípio de extensão temporal, a ser interpretado em consonância com o sistema adotado na Constituição. Por isso mesmo não constitui óbice a situações como a dos autos, ou de incorporação às forças armadas, desempenho de missão temporária de caráter diplomático ou cultural, em que o parla-mentar, depois da investidura, afasta-se do exercício do mandato, havendo convocação do seu suplente, que passa a gozar da prerrogativa da imunidade. Não se deve esquecer o exato alcance da imunidade parlamentar, inerente ao exercício da função, como garantia em prol do Poder Legislativo. Ademais, a imunidade constitui exceção e, por isso, deve merecer interpretação stricto senso. Em conclusão, o deputado ou senador investido na função de Ministro de Estado não perde o mandato, porém não leva consigo a imunidade, material ou processual, de modo a poder invocá-la no caso de cometimento de crime quando no exercício da nova função. Impõe-se, em conseqüência, a rejeição da preliminar e o cancelamento da Súmula 4.”36 Do acórdão, RTJ 99/487, 490:

“Ora, no caso, o parlamentar, denunciado por tentativa de homicídio e lesões corporais, teria pratica-do os delitos que se lhe imputam, quando, voluntariamente, se encontrava afastado do Parlamento, no exercício do cargo de Secretário de Estado-membro. Não dispunha, então, de imunidade, material ou processual. Ocorre, todavia, que, denunciado, o parlamentar retornou ao exercício do mandato. Nes-sas circunstâncias, não é possível que, por mero ato de vontade, o parlamentar possa dispor da imuni-dade processual, garantia institucional do Parlamento, estabelecido para a defesa do interesse público indisponível, como se fosse simples garantia individual, por ele exercitável, a qualquer momento.”

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82. Na espécie, é inquestionável que os fatos irrogados ao Requerente – além de eventual infração penal comum, quiçá, a de corrupção ativa, entre outras – con-figurariam, em tese, crime de responsabilidade37.

83. De saber elementar, contudo, é que a punibilidade dos crimes de respon-sabilidade – sem prejuízo, é claro, da responsabilidade penal pelo mesmo fato – cessa com o término da investidura do agente.

84. Não obstante, a cassação cogitada do mandato legislativo do Impetrante, a pretexto de impor sanção à quebra do decoro parlamentar, teria verdadeira-mente como motivo o seu comportamento como ministro de Estado, artifício no mínimo esdrúxulo para ressuscitar a punibilidade já extinta de eventuais crimes de responsabilidade, que na mesma conduta se tivessem configurado.

85. Esse não é, todavia, o vício mais sério da cassação questionada, que sur-ge, sim, das implicações da questão com o princípio fundamental da separação e independência dos poderes, de cuja positivação constitucional é parte integrante o regime de responsabilidade dos membros de cada um deles.

86. Ora, na medida em que se pudesse submeter alguém ao juízo censório da Câmara dos Deputados por fatos praticados no exercício da função de ministro de Estado, estaria criado um mecanismo não tolerado pela Constituição de responsa-bilização política póstuma de dignitários do Poder Executivo, por deliberação de uma das Casas do Congresso Nacional.

87. é escusado frisar como, assim, estaria aberta uma via para a manifestação dos ressentimentos de toda a sorte, que, no exercício da função governamental, o ex-Ministro houvesse gerado.

88. Muito mais haveria a dizer; creio, no entanto, que as considerações aven-tadas são suficientes, neste juízo de delibação adequado à decisão liminar, para evidenciar a densa plausibilidade constitucional da tese nuclear da impetração.

IX

89. De sua vez, cuidando-se da ameaça de cassação de um mandato, a sua consumação – ainda que não prejudique, por si só, o pedido de segurança38 – gera prejuízos essencialmente irreversíveis à investidura temporária do Impetrante.

X

90. De tudo, Senhor Presidente, defiro a liminar para suspender o curso do processo disciplinar instaurado contra o Requerente, até a decisão definitiva do mandado de segurança: é o meu voto.

PRELIMINAR

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, de acordo com o Códi-go de Processo Civil e também com o Regimento Interno, questões preliminares

37 Lei 1.079/50, art. 13, 1, c/c art. 6º, 2, in fine.38 MS 23.388, Néri, RTJ 177/209.

R.T.J. — 203 1033

devem ser enfrentadas separadamente do mérito, muito embora se adentre este último campo considerado o pedido de tutela antecipada ou de concessão de liminar.

Reafirmo a óptica – já a revelei em processos anteriores – de que não cabe distinguir as causas de pedir desta ou daquela impetração, o envolvimento deste ou daquele órgão, deste ou daquele cidadão, para, então, definir-se se a competência é do Plenário ou do Relator.

O direito é uno em termos de lei em sentido formal e material ou lei simples-mente em sentido material, e me refiro ao Regimento Interno.

Temos decidido, nós, Relatores, na Corte, sob o ângulo da liminar, situações diversificadas, a partir do momento em que o mandado de segurança nos é distri-buído, como deve ser, e precisamos, em nome do próprio Estado, atuar.

Nessa última semana, e creio que nesta mesma, em situação semelhante à dos autos, envolvendo também a Câmara dos Deputados e deputados, em ação plú-rima – no caso, a ação é individual –, o Relator de sorteio, Ministro Carlos Ayres Britto, enfrentou o pleito de concessão de medida acauteladora, e foi adiante para extinguir o próprio processo revelador do mandado de segurança.

O que nos vem do Regimento Interno? Uma regra geral, segundo a qual o Relator pode e deve submeter ao Plenário medida cautelar em processo da com-petência do Plenário. Essa norma está no inciso IV do art. 21. Especificamente, porém, afastando a regra geral da competência do Plenário, tem-se disciplina quanto ao mandado de segurança – preceitua o art. 203, § 1º, do Regimento Interno, que, nesse caso, a competência para, mediante decisão interlocutória positiva ou negativa, apreciar o pleito de concessão de liminar é do Relator.

Mais que isso, os diversos dispositivos devem ser interpretados sem caminhar-se para uma incongruência. Vislumbro incoerência, com a devida vênia, quando se admite que o Relator, em um juízo todo próprio, possa atuar na via direta ou trazer a matéria de sua competência ao Plenário e, em contrapartida, se acionar a atuação individual, monocrática, torna-se impossível deslocar-se o merecimento do ato formalizado para o Colegiado mediante agravo, muito embora – e a matéria está sumulada – tenha-se, na verdade, no ato do Relator, uma decisão interlocu-tória.

Continuo na minha crença de se julgar o que colocado com base no direito posto, sem distinguir-se a situação em face da repercussão do ato ou – tenho certeza de não ser este o caso, em relação ao Relator – da capa do processo.

Por isso, peço vênia para concluir que incumbe – e estará em ótimas mãos – ao próprio Relator enfrentar o pedido de concessão de medida liminar. A competência não é do Plenário.

VOTO(Sobre preliminar)

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Senhor Presidente, com todas as vênias, reporto-me aos três precedentes referidos: no primeiro, o Ministro Marco Aurélio estava impedido; S. Exa. ficou vencido nos dois últimos.

R.T.J. — 2031034

Não tenho razão para alterar o entendimento do Plenário, que deixa ao Rela-tor acudir a situações em que a relevância do problema posto ou as circunstâncias aconselham entregar de logo ao Tribunal decidir sobre a liminar.

VOTO (Sobre preliminar)

(Aditamento)

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, apenas para aditar o voto que proferi: não posso caminhar num sentido que acabe por conferir, à distribui-ção do processo, quase um sabor lotérico. Se há processo a mim distribuído, en-frento o pedido de concessão de liminar; se processo distribuído a outro integrante, é possível colher, de imediato, num tratamento diferenciado, inobservando-se o princípio isonômico, a manifestação do Plenário.

Creio que, de duas, uma: ou o ato, em si, pelo arcabouço normativo, é da competência do Plenário, ou é da competência do Relator. Não há, aqui, com a devida vênia, campo para a discricionariedade, para o Relator ser o senhor da sub-missão do tema ao Colegiado ou da decisão individual, monocrática.

VOTO(Sobre preliminar)

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Senhor Presidente, em um dos mandados de segurança do então Presidente Fernando Collor, quis trazer também o pedido da liminar ao Plenário, porque entendia de grande relevância. Mas o Tribunal não permitiu. Isso não quer dizer que eu ficaria com aquela posição da Corte. Não. Creio que o Relator, dependendo da relevância da questão – naquele caso eu entendia relevante –, pode submeter ao Plenário o pedido e o seu entendimento.

Segundo penso, se a questão é relevante, o Relator, a seu juízo, que age em nome do Tribunal, pode trazer o pedido à consideração do Plenário.

Peço licença, então, ao eminente Ministro Marco Aurélio para entender que é possível ao Plenário examinar o pedido de liminar.

VOTO(Sobre preliminar)

O Sr. Ministro Eros Grau: Senhor Presidente, tenho dito sempre que a tare-fa de aplicação do direito é uma prudência. A mim parece que todos os casos têm exata e precisamente a mesma importância em termos de prudência.

Melhor seria que todas as liminares fossem apreciadas pelo Plenário. For-mamos um Colegiado e como tal nos manifestamos. Entendo que a prudência recomenda à Corte examinar a questão, como proposto pelo Ministro Sepúlveda Pertence. Aliás, entendo que em todos os casos haveria de ser assim, para que não prevaleçam as individualidades.

R.T.J. — 203 1035

EXPLICAÇÃO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, apenas para registrar nos anais, e não me dirijo ao Ministro Eros Grau: atuo com absoluta prudência!

VOTO(Sobre preliminar)

O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Senhor Presidente, peço vênia ao Ministro Marco Aurélio para acompanhar o Relator, por uma razão muito simples: decisões monocráticas, sobretudo em matérias de alta relevância, a meu ver, não apenas são temerárias como beiram a excrescência.

Lembro-me de um axioma do direito europeu em geral, e do francês em particular: juge unique, juge inique, ou seja, juiz singular, juiz iníquo.

A regra é a decisão colegiada. Portanto, vejo como algo extremamente sa-lutar a decisão desse ou daquele Relator de trazer à consideração do Colegiado o exame de medidas liminares.

Acompanho o voto do Ministro Relator.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, não vejo como temerário o ato do Ministro Carlos Ayres Britto, na última segunda-feira, em processo que envolvia não um deputado, mas cinco.

O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Não quis dizer isso. Externei apenas minha visão geral do problema.

VOTO(Sobre preliminar)

O Sr. Ministro Carlos Britto: Devo observar que decidi sozinho, movido, sobretudo, pela premência do tempo. Não havia como esperar a sessão plenária da Casa para proferir uma decisão liminar sem a irreparabilidade até do prejuízo alegado pelos Impetrantes. O Ministro Sepúlveda Pertence, neste caso, como fundamento da entrega da jurisdição ao nosso Tribunal Pleno, alega não apenas a relevância jurídica do problema posto em julgamento, como as circunstâncias do caso, conhecidas e peculiares, e ainda o fato de que a medida cautelar – cito S. Exa. – “poderá ser eficazmente examinada pelo Tribunal antes do desfecho do processo disciplinar”.

Com esses fundamentos, e compreendendo muito bem a sempre brilhante intervenção do Ministro Marco Aurélio, peço vênia para acompanhar o voto do Relator.

VOTO(Sobre preliminar)

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Senhor Presidente, também já tive a oportu-nidade de me manifestar em outra assentada, quando discutimos aqui a aplicação

R.T.J. — 2031036

da Súmula 506, que o princípio da colegialidade deve ser a regra. Até dizia eu que aquela competência não só do Relator, mas também do Presidente, decorria de uma metonímia processual; atribuíamos à parte aquilo que deveria ser concedido ao todo.

De modo que, com essas considerações, e pedindo vênias ao Ministro Marco Aurélio, acompanho o voto do eminente Relator.

VOTO(Sobre preliminar)

A Sra. Ministra Ellen Gracie: Senhor Presidente, também peço licença ao Ministro Marco Aurélio para acompanhar o Relator. O Tribunal é sempre um só por todos os seus membros. Ele atua parceladamente, fracionariamente em Turmas, ou pelos Relatores, por necessidades de ordem prática. Na realidade, somos sempre uma manifestação colegiada.

Esse caso trazido agora pelo eminente Relator é exatamente uma das hipó-teses previstas pelo Regimento Interno na qual ao Relator é facultado, se assim entender, trazer ao conhecimento do Plenário a decisão que poderia tomar mono-craticamente.

VOTO(Sobre preliminar)

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Também tenho voto na espécie. A questão já foi enfrentada em mandados de segurança anteriores, mas eu não usaria a linguagem do Ministro Celso de Mello, porque poderia surgir daí a possibilidade de haver um dever por parte do Relator na hipótese de a matéria ter relevância. En-tendo que este é um direito potestativo do Relator; emitido um juízo da necessidade de trazer o pedido ao Plenário, por ser relevante, e é juízo exclusivo do Relator, não é um dever do Relator de trazê-lo.

O Sr. Ministro Celso de Mello: Não disse, Senhor Presidente, ao contrário do que afirma V. Exa., que o Relator tem o dever de submeter, ao Plenário desta Corte, o exame do pedido de medida liminar formulado em sede mandamental. Afirmei, claramente, que se trata de mera faculdade do Relator, sempre que este – entendendo relevante a controvérsia em discussão – reconhecer prudente submeter o tema ao princípio da colegialidade.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): é só para deixar claro, sei que V. Exa. não afirma; reconheço que é uma faculdade do Relator, e tal faculdade de trazê-lo impede, inclusive, que o Tribunal possa imiscuir-se nesse juízo.

VOTO(Sobre segunda preliminar)

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, peço a compreensão dos Colegas para suscitar uma preliminar que diz respeito a condição da própria ação, que é a preliminar de carência da ação proposta.

R.T.J. — 203 1037

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Ministro Marco Aurélio, estamos examinando a legitimidade ad processum.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Entendo que se trata de legiti-midade ad processum.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sim, quanto à parte passiva.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Vamos deixar para examinar no exato momento.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): O mandado de segurança é im-petrado contra o Conselho, contra a Mesa e contra o Relator. Estou dizendo apenas que o Relator não tem poder decisório próprio, donde, excluí-lo do processo.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Não se está decidindo sobre a carência da ação, apenas legitimação do processo.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: No ponto, acompanho o Relator no voto pro-ferido.

VOTO(Sobre conhecimento)

O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Senhor Presidente, estou plenamente con-vencido de que a matéria é eminentemente jurídico-constitucional, e não política. Para tanto, basta-me o fundamento essencial da impetração, segundo o qual o Impetrante estaria sendo submetido a julgamento por órgão desprovido de compe-tência constitucional.

Com efeito, argumenta-se que os fatos imputados ao Impetrante ocorreram na época em que ele se encontrava afastado do mandato parlamentar para exercer cargo de ministro de Estado. Por isso, alega-se que competente para julgá-lo seria esta Corte, e não a Câmara dos Deputados.

A controvérsia, a meu ver, é de índole manifestamente jurídico-constitucional, razão por que também conheço do mandado de segurança.

VOTO(Sobre conhecimento)

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhor Presidente, há poucos dias, decidindo no MS 25.594, eu também trilhei por esse delicado terreno da demarcação de espaços da nossa jurisdição à face do que seja matéria interna corporis, no caso da Câmara dos Deputados – ou matéria externa corporis, e, entre outras considerações, louvei-me num critério que me pareceu seguro: quando já existe um processo, e é o caso dos autos –, tem-se também um acusado; mesmo que não se trate de um processo rigorosamente administrativo nem judicial, mas ético-parlamentar, que tem carac-terísticas próprias, inconfundíveis com os outros dois, ainda assim existe a figura do acusado; e o fato é que a Constituição, no art. 5º, LV, assegura aos acusados em geral o contraditório e a ampla defesa. De sorte que, a partir desse vínculo – o qual me parece indissociável – entre a abertura de um processo e a figura de um

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acusado, isso faz atrair a incidência da garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa e, por conseqüência, suscita a intervenção do Poder Judiciário no conhecimento da causa.

Por essas razões acompanho o voto do eminente Relator.

VOTO(Sobre conhecimento)

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Presidente, cabe indagar: o que tramita na Câmara dos Deputados? A resposta é única. Tramita, ainda no seu início, um pro-cesso simplesmente disciplinar que envolve um instituto que, ante o Regimento daquela Casa, tem contornos subjetivos. é um instituto político, o instituto do decoro parlamentar.

é possível, na fase praticamente embrionária, chegar-se ao Judiciário, jurisdicionalizando, portanto, uma matéria de economia interna da Casa, do Parlamento, para questionar-se tema que ainda não sofreu o crivo da Câmara dos Deputados? Hoje mesmo temos a notícia de que o relator, na Comissão de Constituição e Justiça, apresentou peça contrária – por isso ou por aquilo, não cabe perquirir – à seqüência desse simples processo administrativo, embora com conseqüências de vulto, no que pode desaguar na cassação do parlamentar.

Em situação mais favorável do que essa, o Plenário, contra o meu voto, sinto-me muito à vontade para exteriorizar o entendimento no caso concreto, concluiu que não cabia o controle jurisdicional preventivo de constitucionalidade, e é justamente esse controle que se busca na impetração – saber se aquele que está licenciado, a partir do disposto na Constituição Federal, pode, ou não, incidir na quebra do decoro parlamentar.

O Supremo Tribunal Federal defrontou-se com a ADI 466-2, que teve relato-ria das mais proficientes, do Ministro Celso de Mello, e, no caso, combatia-se algo que surgia vedado pela Constituição Federal: a tramitação de uma emenda constitu-cional para introduzir, de forma linear, a pena de morte.

O caso, para mim, mostrou-se de repercussão maior, porque não envolveu apenas um cidadão, mas o interesse de muitos cidadãos, embora não detentores de mandato. O caso era mais favorável ao controle jurisdicional do Tribunal, porque a própria Constituição Federal, no art. 60, § 4º, revela que emenda tendente a abolir o que se contém nos incisos desse parágrafo não será objeto de deliberação.

Senhor Presidente, não tenho como concluir – de forma que, para mim, seria precoce, temporã, açodada, implicando substituir-se o Supremo à Câmara dos De-putados – pela propriedade da impetração.

Há de se aguardar que a própria Casa, em matéria ligada à economia interna, que é a tratada em processo administrativo, no tocante a um de seus integrantes, pronuncie-se a respeito, homenageando-se, com isso, a separação dos poderes, a harmonia entre os poderes.

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Quem pode, a esta altura – não cogito aqui de simpatia ou arrogância, porque não cabe perquirir nesse campo –, diante mesmo do parecer que a muitos surpre-endeu quanto ao alcance, no dia de hoje, na Comissão de Constituição e Justiça, asseverar que o que talvez façamos a seguir não será feito pela Câmara, assentando mesmo que, em se tratando de deputado licenciado, não se tem como versar a que-bra de decoro, considerados os atos praticados, muito embora, talvez, quem sabe...

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Esta é a questão de mérito, não é?

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Não. O que estou querendo dizer é que se jurisdicionalizou para se abreviar, para se queimar uma etapa importantíssima, a etapa do pronunciamento da Câmara dos Deputados, num verdadeiro, quem sabe, atalho, drible à atuação da Casa, pois somente a ela compete concluir esse processo administrativo que, mediante apelo ao que seria cláusula de ingresso no Judiciário, não pode ser transformado, sob a minha óptica, em um processo jurisdicional. Não há como o Judiciário brecar uma atuação que, de início, é precípua da Casa a que integrado o parlamentar.

é certo que, de acordo com o inciso XXXV do rol das garantias constitucio-nais, a lei não pode afastar do Judiciário “lesão” a direito ou “ameaça” de “lesão” a direito. Essa última cláusula tem, contudo, de ser percebida no contexto, pois não encerra, em relação ao Judiciário, uma “carta em branco” para simplesmente tran-car um processo administrativo que ainda não chegou ao Colegiado de origem e que tem a incumbência constitucional de definir se configurada, ou não, a quebra do decoro parlamentar.

Peço licença, respeitando, e assim penso que o estou fazendo, o próprio sistema da Constituição Federal, a existência de Poderes independentes, para não exercer tutela quanto à atuação da Câmara dos Deputados, proclamando que ela não pode dar seqüência a um processo administrativo, que ela não pode deliberar quanto ao âmago desse processo administrativo.

Concluo pela carência da ação proposta.

VOTO(Sobre conhecimento)

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Senhor Presidente, as questões interna cor-poris dos parlamentos não estão sujeitas ao controle judicial; de regra, constituem interna corporis, por exemplo, as questões atinentes ao Regimento Interno das Câmaras. Repito, esta é a regra. Ocorrendo, todavia, alegação de ofensa a direito subjetivo, o ato estará sujeito ao exame judicial, à fiscalização judicial. No caso, há alegação de ofensa a direito, convindo ressaltar, aliás, o que, com muita precisão, disse o eminente Ministro Carlos Britto: há um processo disciplinar com acusado. De regra, sempre que há um acusado, seja em que processo for, há direito ao con-traditório, à defesa.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Ministro Carlos Velloso, para usar a linguagem da Constituição, um processo que visa ou que pode levar à perda do mandato, espe-cificamente.

R.T.J. — 2031040

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Exatamente. Se há alegação de ofensa a di-reito subjetivo, o Judiciário conhecerá da ação; seguir-se-á, depois, num segundo tempo, vamos dizer assim, o exame, ou a verificação se realmente ocorre a ofensa alegada, ou se se trata simplesmente de uma questão interna corporis.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Não se permite que o processo administrativo tenha seqüência, para, talvez, a Câmara chegar a essa conclusão, de que não have-ria ocorrido a quebra.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Veja, Ministro Marco Aurélio, o processo está em andamento; conhecemos, para examiná-lo. Se entendermos que houve, realmente, lesão a direito, temos que curar essa lesão.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Em última análise, isso implica o desloca-mento para o Supremo de um tema que teria de ser decidido pela Câmara.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Se, realmente, lesão ocorreu, temos que curá-la, esta é a nossa obrigação primeira; ocorrendo uma lesão a um direito individual, a um direito constitucional, a uma garantia constitucional, a Corte, como guardiã da Constituição e, assim, desses direitos e garantias, há de conhecer do pedido.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: No mandado de segurança preventivo, a ponto de cercear atividade da Câmara dos Deputados.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Essa é a segunda parte, aquilo que o eminente Ministro Gilmar Mendes lembrou, é o mérito.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: O meu voto, o meu ponto de vista é de que não cabe ao Supremo avocar o que ainda será objeto de deliberação pela Câmara dos Deputados.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sim, analisaremos essa questão agora; conhe-cendo do writ, vamos examinar se realmente ocorreu uma lesão a direito subjetivo ou se se trata, simplesmente, de uma questão interna corporis.

De modo que, peço licença ao meu eminente colega, Ministro Marco Auré-lio, para conhecer da ação nos termos do voto do Senhor Ministro Relator.

VOTO(Sobre conhecimento)

O Sr. Ministro Celso de Mello: A controvérsia suscitada na presente causa subsume-se, com plena adequação, à esfera de cognoscibilidade do Poder Judi-ciário, eis que, no processo sob apreciação desta Suprema Corte, a parte impetrante sustenta a ocorrência de transgressão constitucional que teria sido praticada por órgãos da Câmara dos Deputados.

Vê-se, daí, na perspectiva do caso ora em exame, que a intervenção judi-cial, nas hipóteses de suposta lesão a direitos subjetivos amparados pelo orde-namento jurídico do Estado, reveste-se de plena legitimidade constitucional, ainda que essa atuação institucional do Judiciário se projete na esfera orgânica do Poder Legislativo.

R.T.J. — 203 1041

Uma decisão judicial – que restaure a integridade da ordem jurídica e que torne efetivos os direitos assegurados pelas leis e pela própria Constituição da República – não pode ser considerada um ato de interferência na esfera do Poder Legislativo, consoante já proclamou, em sucessivas decisões, o Plenário do Su-premo Tribunal Federal (RTJ 175/253, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI – RTJ 176/718, Rel. Min. NéRI DA SILVEIRA, v.g.):

A essência do postulado da divisão funcional do poder, além de derivar da necessidade de conter os excessos dos órgãos que compõem o aparelho de Estado, representa o princípio conservador das liberdades do cidadão e constitui o meio mais adequado para tornar efetivos e reais os direitos e garantias proclamados pela Constituição.

Esse princípio, que tem assento no art. 2º da Carta Política, não pode constituir nem qualificar-se como um inaceitável manto protetor de comportamentos abusivos e arbitrários, por parte de qualquer agente do Poder Público ou de qualquer instituição estatal.

- O Poder Judiciário, quando intervém para assegurar as franquias constitucionais e para garantir a integridade e a supremacia da Constituição, desempenha, de maneira plena-mente legítima, as atribuições que lhe conferiu a própria Carta da República.

O regular exercício da função jurisdicional, por isso mesmo, desde que pautado pelo respeito à Constituição, não transgride o princípio da separação de poderes.

Desse modo, não se revela lícito afirmar, na hipótese de desvios jurídico-constitucio-nais nas quais incida uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que o exercício da atividade de controle jurisdicional possa traduzir situação de ilegítima interferência na esfera de outro Poder da República. (...).(RTJ 173/806, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)

Essa compreensão do tema, que se tem refletido, historicamente, na prática jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, ao longo do período republicano, em torno da cognoscibilidade das denominadas questões políticas, encontra perfeita tradução em douto voto proferido, em 1922, pelo saudoso e eminente Ministro GUIMARÃES NATAL, quando do julgamento do HC 8.584/DF, Rel. Min. Muniz Barreto (“Revista do Supremo Tribunal Federal”, volume 42/135-221, 192-194):

Nunca professei a doutrina que considera as questões políticas como absolutamente impenetráveis aos olhos investigadores da Justiça, que deverá ter sempre por impecáveis, na sua constitucionalidade e na sua conformidade à Lei, as soluções que lhe houverem dado os po-deres políticos a cuja competência constitucional pertencerem. Nos regimes, como o nosso, de constituição escrita, os poderes são limitados, e as limitações excluem a discrição e o arbítrio. Se, no exercício de suas funções, qualquer dos poderes políticos exorbita, lesando um direito, o direito lesado pela exorbitância poderá reclamar a sua reintegração ao Judiciário, o poder es-pecialmente preposto pela Constituição a tais reintegrações. E a ação do Judiciário não se po-derá deter diante de uma questão política, sob o pretexto de que é ela atribuída privativamente a um poder político, porque privativa do Congresso Nacional é a decretação das leis e o Judi-ciário declara-as inaplicáveis, quando contrárias à Constituição; privativos do Executivo são atos que o Judiciário anula, quando, contrariando a Constituição e as leis, lesam um direito.

(...)Nos regimes de Constituição escrita, de poderes limitados, a Lei Fundamental é, na

frase de “Cooley”, a regra absoluta de ação e decisão para todos os poderes públicos e para o povo, e tudo quanto em oposição a ela se faz é substancialmente nulo.

Mas para que a Constituição mantivesse esta preeminência de regra absoluta de ação e decisão, que lhe dera o povo, decretando-a, era necessário criar um órgão que fosse dela a en-carnação viva, que a interpretasse soberanamente, irrecorrivelmente, que com ela confrontasse as leis e os atos dos poderes públicos e até do próprio povo e que tivesse o poder de declarar tais

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leis e tais atos insubsistentes quando desconformes aos princípios nela consagrados. Esse órgão no nosso regime, como nos semelhantes ao nosso, é o Poder Judiciário federal (...).

(...)Dada uma violação da Constituição, parta de quem partir, verse sobre que matéria

versar, desde que contra ela se insurja um direito individual lesado e invoque, em processo regular, o amparo e proteção do Judiciário, é este, sob pena de incorrer em denegação de Justiça, obrigado a conhecer do caso e julgá-lo. (...).(Grifei.)

Se é certo, de um lado, que os atos “interna corporis” e os de índole polí-tica, em princípio, enquanto atos parlamentares, são abrangidos pelos círculos de imunidade que excluem a possibilidade de sua revisão judicial, não é menos exato, de outro, que essa particular qualificação das condutas legislativas (sejam positivas ou negativas) não pode justificar ofensas a direitos públicos subjetivos que o congressista, como no caso, alega titularizar.

Não obstante o caráter político dos atos parlamentares, é essencial pro-clamar que a discrição dos corpos legislativos não pode exercer-se – conforme adverte CASTRO NUNES (“Do Mandado de Segurança”, p. 223, item n. 103, 5. ed., 1956, Forense) – nem “(...) fora dos limites constitucionais (...)”, nem “(...) ultrapassar as raias que condicionem o exercício legítimo do poder” (grifei).

Lapidar, sob tal aspecto, o magistério, erudito e irrepreensível, de PEDRO LESSA (“Do Poder Judiciário”, p. 65/66, 1915, Livraria Francisco Alves):

Em substância: exercendo atribuições políticas, e tomando resoluções políticas, move-se o Poder Legislativo num vasto domínio, que tem como limites um círculo de extenso diâme-tro, que é a Constituição Federal. Enquanto não transpõe essa periferia, o Congresso elabora medidas e normas, que escapam à competência do Poder Judiciário. Desde que ultrapassa a circunferência, os seus atos estão sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, que, declarando-os inaplicáveis por ofensivos a direitos, lhes tira toda eficácia jurídica.(Grifei.)

É por essa razão que a jurisprudência constitucional do Supremo Tri-bunal Federal, reafirmada em julgamentos recentes (MS 24.831/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO – MS 24.846/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), jamais tolerou que a invocação da natureza “interna corporis” do ato emanado das Casas legislativas pudesse constituir um ilegítimo manto protetor de compor-tamentos abusivos e arbitrários do Poder Legislativo.

Cumpre relembrar, neste ponto, a procedente observação de PONTES DE MIRANDA (“Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda n. 1, de 1969”, tomo III/644, 3. ed., 1987, Forense), cujo magistério – embora acen-tuando a incognoscibilidade judicial das questões políticas no que se refere à oportunidade, conveniência, utilidade ou acerto do ato emanado do órgão estatal –, adverte, no entanto, a propósito do tema, que, “sempre que se discute se é cons-titucional ou não, o ato do poder executivo, ou do poder judiciário, ou do poder legislativo, a questão judicial está formulada, o elemento político foi excedido, e caiu-se no terreno da questão jurídica” (grifei).

Vale insistir, portanto, na asserção feita pelo eminente Ministro PAULO BROSSARD, em voto proferido no julgamento do MS 21.443/DF (RDA 189/271,

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276), quando advertiu, na matéria, que o Supremo Tribunal Federal, ao exa-minar o ato de cassação de mandato, por falta de decoro parlamentar, não pode indagar “se a decisão da Câmara foi justa, sábia, oportuna ou adequada”, eis que “a apreciação, sob esse ponto-de-vista, compete à Câmara e a ninguém mais (...)”, assinalando, ainda:

A Constituição reserva à Câmara e ao Senado a competência para decretar a perda do mandato de deputado ou senador, “cujo procedimento for declarado incompatível com o deco-ro parlamentar”. A decisão há de ser tomada “por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”, art. 55, II, § 2º. Observadas as formalidades constitucionalmente enunciadas, a decisão, da Câmara ou do Senado, poderá ser discutível, poderá ser injusta, poderá ser desacertada, mas será definitiva e irrecorrível; será insuscetível de revisão judicial. Porque a Constituição deu à Câmara e só à Câmara, ao Senado e só ao Senado, a competência para decidir algo que à Câmara e ao Senado diz respeito. De mais a mais, os tribunais julgam segundo critérios de legalidade e decidir que um procedimento é decoroso, ou não, transcende os limites da pura legalidade. Esta não exclui, mas não se esgota nesse critério, pois depende de mil e uma circunstâncias extralegais.

Trata-se de uma competência exclusiva da Câmara e só ela, bem ou mal, pode exercitar. Segundo a Constituição, “perderá o mandato o deputado ou senador (...) cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar”, art. 55, II; declarado por quem? Pela Câmara a que pertencer o parlamentar, Câmara dos Deputados ou Câmara dos Senadores, observados os requisitos taxativamente indicados no § 2º do mesmo artigo: voto secreto, maio-ria absoluta, provocação da Mesa ou de partido político com representação no Congresso, assegurada ampla defesa.(Grifei.)

A presente impetração mandamental, contudo, como inicialmente por mim ressaltado neste voto, objetiva discutir, unicamente, aspectos de índole jurídico-constitucional, o que se mostra plenamente viável na matéria ora em análise, posto que o autor desta ação mandamental sustenta que os órgãos estatais ora apontados como coatores teriam vulnerado o próprio texto da Constituição da Re-pública, infligindo, ao ora Impetrante, consoante por este afirmado, grave lesão a direito subjetivo que alega titularizar.

Com estas razões, Senhor Presidente, conheço do presente mandado de segurança.

É o meu voto.

VOTO(Sobre conhecimento)

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Também entendo que o Ministro Sepúlveda Pertence, nessa parte do seu voto, fixou as premissas nítidas de que a regra do art. 55, inciso II, da Constituição não dá uma carta em branco a qualquer uma das Casas do Congresso Nacional para poder preencher ao bel prazer da discri-cionariedade, ou mesmo do arbítrio da maioria, o conceito de incompatível com o decoro parlamentar, senão teríamos, por uma forma canhestra, o retorno daquilo que, na Velha República, chamou-se degola. A verificação dos poderes, no art. 18, inciso I, parágrafo único, da Constituição de 1988, em que tínhamos o repúdio absoluto da Revolução de 1930, uma das causas, inclusive, em que os partidos republicanos

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majoritários inviabilizavam, de forma absoluta, o surgimento das oposições parla-mentares nascentes, exatamente, através da verificação de poderes e da confirmação da eleição em que o Congresso a confirmava, ou não, e, aí, o cortava – por isso a expressão degola – a possibilidade da participação dessas oposições. O Ministro Sepúlveda Pertence deixou nítido isso.

O Ministro Marco Aurélio refere-se à questão do momento do ajuizamento, o que, também, discordo de S. Exa., por entender que poderá haver essa fiscalização preventiva do Congresso nas ações estabelecidas. Parece-me, efetivamente, na medida em que esta Corte...

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Em ação direta não, porque não se tem ainda um ato normativo.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Claro, é lógico, isso é um outro problema.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): O Supremo construiu, para isso, a partir do caso Itamar Franco, a legitimidade do deputado ou do senador para questionar preventivamente a constitucionalidade da emenda constitucional proposta. Creio que a única fórmula de controle jurisdicional preventivo de cons-titucionalidade, que temos, foi essa construção da jurisprudência do Tribunal, a partir do MS 20.257, Moreira Alves (RTJ 99/1031).

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: No direito comparado tem-se discutido a questão dos tratados.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Como em Portugal e na Ale-manha, com questão prévia à ratificação do tratado.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Respeitando as digressões erudi-tas, acadêmicas, mais germânicas e idealistas do Ministro Gilmar Mendes, volto a dizer que o Tribunal está na linha correta, no sentido de conhecer da segurança nesse ponto, exatamente porque, se não for assim, e deixando o inciso II, repito, do art. 55, sobre a total e absoluta discrição das casas legislativas, estaríamos voltando de forma indireta e muito nítida ao sistema da degola. Daí por que, também, conheço da segurança.

VOTO

O Sr. Ministro Eros Grau: Acompanho o voto, impecável, do Ministro Per-tence.

2. O art. 55, II, da Constituição do Brasil diz que perderá o mandato o depu-tado ou senador cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parla-mentar. Essa última expressão, “decoro parlamentar”, refere o recato, a postura, a decência no Parlamento ou do parlamentar.

3. O art. 56, I, da Constituição afirma que não perderá o mandato o deputado ou senador investido no cargo de ministro de Estado. O § 1º desse art. 56 estabelece que o suplente será convocado em algumas hipóteses, entre as quais a de investi-dura no cargo de ministro de Estado.

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4. O deputado investido no cargo de ministro de Estado será substituído pelo seu suplente. Isto é: quem era deputado deixa de exercer as funções próprias ao parlamentar, outra pessoa, o suplente, passando a ocupar o seu antigo lugar. Isso por razões de ordem física e política. Física porque um só corpo não pode ocupar concomitantemente dois espaços distintos: o deputado não pode ao mesmo tempo ser ministro e o ministro não pode a um tempo só ser deputado. Política porque ainda que isso fosse materialmente possível, o princípio da divisão e equilíbrio entre os poderes veda o desempenho concomitante, pela mesma pessoa, de funções do Executivo e do Legislativo.

5. O deputado investido no cargo de ministro é substituído, na Câmara dos Deputados, pelo suplente. Isto é, ele já lá não está, um outro ocupa o seu lugar. Este, o suplente – porque atua como parlamentar, no Parlamento – poderá eventualmen-te adotar comportamento incompatível com o recato, a postura, a decência par-lamentar, isto é, com o decoro parlamentar. Já o deputado substituído pelo suplen-te – que enquanto investido no cargo de ministro deixa de ter atuação parlamentar, já não exerce mandato parlamentar – deste não se poderá dizer, se eventualmente adotar comportamento incompatível com o recato, a postura, a decência, deste não se poderá dizer que adotou procedimento passível de ser declarado incompatível com o decoro parlamentar.

6. Comportamento como tal, incompatível com o recato, a postura, a decên-cia, haverá de ser questionado, coibido, punido na esfera do Executivo, não do Legislativo. Na esfera do Executivo, o deputado no exercício do cargo de ministro de Estado deverá responder, em relação aos atos praticados no período desse exercício, seja desde a perspectiva puramente ética (Código de Conduta da Alta Administração Federal), seja sujeitando-se a apuração de eventual ato de improbi-dade administrativa, nos termos da Lei 8.429/92, ou de crime de responsabilidade.

Concedo a liminar.

VOTO

O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Inicialmente, gostaria de externar meu en-tendimento no sentido de que o membro do Congresso Nacional, uma vez licencia-do do mandato e investido no cargo de ministro de Estado, não pode, em princípio, e enquanto estiver no exercício da função ministerial, ser submetido a processo de perda de mandato com base no art. 55, inciso II, da CF, sobretudo se as acusações que lhe são feitas disserem respeito a fatos e atos estreitamente vinculados ao exercício da função executiva. Admiti-lo redundaria não apenas em violação ao art. 102, inciso I, c, da Constituição Federal, mas também em inserir nas relações entre Legislativo e Executivo um elemento de fragilização e desestabilização dos princípios da independência e harmonia por que devem pautar-se os Poderes da República (CF, art. 2º).

Cessada, porém, a investidura do parlamentar no cargo executivo, reassu-me ele plenamente a sua condição de membro do Congresso Nacional. Despe-se, pois, das prerrogativas que detinha em razão do exercício do cargo no Executivo,

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entre as quais a de ser julgado por esta Corte nos crimes comuns e de responsabi-lidade, embora continue submetido à jurisdição da Corte por crime comum, mas aí a título de parlamentar. Lembre-se que, ao julgar recentemente a ADI 2.797, o Supremo Tribunal Federal afastou, por inconstitucionalidade, dispositivo da Lei 10.628/02 que garantia foro por prerrogativa de função a ex-ocupantes de deter-minadas funções públicas. Logo, não basta a alegação de que os fatos imputados supostamente teriam ocorrido em momento em que o Impetrante gozava da prer-rogativa de ser julgado por esta Corte, por ser ministro de Estado, para lograr-se a perenidade das prerrogativas inerentes a tal cargo.

Senhor Presidente, eu não hesitaria um instante em conceder, ainda que por pura cautela, a liminar postulada pelo Impetrante caso as acusações que lhe são feitas tivessem cerrada pertinência com atos da competência exclusiva de ministro de Estado, tais como os elencados no art. 87 da Constituição. Mas não é disso que se trata. A representação formulada contra o Impetrante pelo Partido Trabalhista Brasileiro não diz respeito a fatos que se possam qualificar como inerentes ao exercício da função de ministro de Estado. Ao contrário. Acusa-se o Impetrante de haver praticado atos que tinham por finalidade “interferir e fraudar o regular andamento dos trabalhos legislativos, alterando o resultado de deliberações em favor do Governo”.

Ou seja, a acusação é juridicamente vinculada à primitiva condição de parla-mentar do Impetrante, em suma, à sua influência política. Irrelevante, a meu ver, o fato de que formalmente não haja contemporaneidade entre tais fatos e o exercício efetivo do mandato parlamentar.

Indefiro o pedido de liminar.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhor Presidente, quero lembrar que todos esses temas aqui agitados – mandato parlamentar, decoro parlamentar, perda de mandato, seja por extinção, seja por cassação, licença de parlamentar, in-vestidura – são temas que, na Constituição, têm um sentido não inteiramente coincidente com outras esferas do direito, notadamente o direito administrativo. Vale dizer, a Constituição nos ministra elementos conceituais próprios para o entendimento de cada uma dessas figuras, levando-nos a uma postura de análise marcantemente heterodoxa. Assim, para um parlamentar se investir no cargo de ministro de Estado, ele já o faz no gozo de uma prerrogativa que a Constituição confere ao parlamentar federal para investir-se no cargo de ministro de Estado, entre outros. E uma prerrogativa até múltipla, porque, ainda por desígnio cons-titucional, implica o direito de o investido no segundo cargo optar pela melhor remuneração, e até não se licenciar do cargo. A Constituição separa, a meu juízo, os institutos da investidura, da licença e da vaga, e o faz em dois dispositivos, não apenas em um: art. 56, inciso I, e § 1º desse mesmo artigo, deixando claro, para mim, que o parlamentar “investido no cargo de Ministro” não decai do seu status de parlamentar e conserva a condição de membro do parlamento. Isso suscita contraditas, é verdade. Mas V. Exa., Ministro Carlos Ayres Britto, está defendendo

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o instituto da co-titularidade? Como ficaria o suplente? Ou, na linguagem do Ministro Eros Grau, de lógica formal, de base aristotélica, não é possível que um corpo ocupe dois espaços ao mesmo tempo.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Conforme seja o caso, não é metafísica: é física.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Ou física, não tenha dúvida. Olhe como V. Exa. está certo: a física quântica já provou que é possível o objeto ser e não ser. Max Planck, notável precursor da física quântica, já se opôs, mais até do que à lógica formal, à própria lógica dialética, mostrando como é possível uma coisa ser e não ser ao mesmo tempo.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Mas isso vale para os quasares; deputado e ministro não é quasar.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Prossigo. O ministro de Estado que se investe nesse cargo de primeiro escalão do Poder Executivo, porém oriundo do Parla-mento federal, continua membro do Parlamento. Aliás, a Constituição rompe com o princípio da contemporaneidade em diversas passagens, a começar pelo art. 53, § 1º, em que vocaliza:

Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos.§ 1º Desde a expedição do diploma (...)

Ou seja, eles nem são deputados e senadores ainda, não tomaram posse, não entraram no exercício, e, no entanto, já são aquinhoados, já são forrados com prerrogativa de foro, fazendo a Constituição descoincidir, portanto, a prática do ato com o exercício da função parlamentar. E, assim, muitos outros dispositivos. Por exemplo, no art. 54:

Art. 54. Os Deputados e Senadores não poderão:I - desde a expedição do diploma:a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica (...)

Vale dizer, a Constituição realmente rompe com a ortodoxia do princípio da atualidade, ou da contemporaneidade da função parlamentar com a prática, no caso, de um ato tido por incompatível com o decoro parlamentar.

No direito administrativo é diferente. Basta lembrar que o servidor aprovado em concurso público é nomeado e, em seguida, é empossado; mas o exercício não coincide com a posse. Ele tem trinta dias para tomar posse, prorrogáveis por trinta dias. Aqui, quando se trata do instituto da posse de um parlamentar, não se dá essa separação entre posse e exercício; tomar posse já é entrar em exercício. De maneira que chamo a atenção de V. Exas. para a ontologia genuinamente constitucional de todos esses institutos com os quais estamos a trabalhar na presente causa. Esta Casa reconhece que, quando o parlamentar se licencia, seja por motivo de doença, seja por interesse particular, se praticar, durante o interregno do licenciamento, um ato teoricamente definido como criminoso ou, mais especificamente, incompatível com o decoro parlamentar, está sujeito, sim, a processo de julgamento pela Casa Legislativa de que faça parte.

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Seria de se perguntar: e o deputado investido num cargo de ministro de Estado não deve satisfação à Casa a que pertence e da qual está afastado apenas temporariamente, no exercício de uma prerrogativa do afastamento que não chega a ser propriamente um licenciamento? Parece-me que sim. Dirão os Senhores que a pureza do Princípio da Separação dos Poderes ficaria tisnada.

Não se pode esquecer também o seguinte, até historicamente: a Constitui-ção não protege, propriamente, o Executivo contra as arremetidas antijurídicas do Poder Legislativo. Ocorre o contrário: o Princípio da Separação dos Poderes, na sua pureza, no seu núcleo significativo, seja de Direito Positivo, seja histórico, reside na necessidade de proteção ao Poder Legislativo contra as investidas inde-vidas do Poder Executivo.

Tanto assim que, no art. 49, X, está dito:

Art. 49. é da competência exclusiva do Congresso Nacional:(...)X - fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder

Executivo, incluídos os da administração indireta;

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Não as políticas públicas do Executivo. Trata-se dos atos no sentido da legalidade. Não cabe ao Legislativo suspender política pública da competência do Executivo.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Mas, Senhor Presidente, a Constituição foi além no seu torniquete. Ela chega a dizer, em seu art. 50, que quaisquer das Casas do Poder Legislativo, inclusive comissão, podem convocar ministro de Estado, podem pedir informação a ministro de Estado. A irresignação do Ministro caracteriza, também por expressa vocalização constitucional, crime de responsabilidade. A recíproca não é verdadeira.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Não quanto a atos administrativos praticados pelas Casas Legislativas.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Excelência, quando a Constituição, no art. 85, trata de crime de responsabilidade, tem o cuidado de dizer:

Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que aten-tem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:

(...)II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário (...)

Não existe uma norma em contrário porque, historicamente, o compro-misso das Constituições é em preservar o Poder Legislativo contra os ímpetos autoritários do Poder Executivo. Ainda está muito vivo, em nossa memória, o que significou o absolutismo monárquico de Luís IV, o famoso autor da bravata “o Estado sou eu” ou “o Estado está em mim”.

Não me impressiona muito a defesa que se faz da integridade dos ministros de Estado e demais autoridades de primeiro escalão, à luz do princípio da sepa-ração dos poderes. Até porque, na legislação infraconstitucional e, mais de perto, no código de ética e decoro parlamentar, são muitas as oportunidades de contra-ditório e ampla defesa. Até as instâncias julgadoras, se não condenado, mas se

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indicado, num projeto de resolução, para a perda do mandato, ainda na comissão de ética e decoro, o parlamentar processado pode recorrer à Comissão de Cons-tituição e Justiça, da qual pode recorrer ao Plenário. Em todas as instâncias são assegurados o contraditório e a ampla defesa. De maneira que esse argumento de intromissão ou de amesquinhamento do Poder Executivo em face do Legislativo não me impressiona muito.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Na verdade, já foi uma quebra da divisão de poderes a concessão para que parlamentar pudesse exercer a função de ministro de Estado. é uma evolução nesse sistema.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Já é uma evolução nesse sistema.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): V. Exa. admitiria, então, que o deputado, no exercício da função de ministro de Estado, pudesse, por atos prati-cados como ministro – e que poderiam ser praticados, inclusive, por ministros não-deputados –, ter o seu mandato cassado por decisão da Câmara dos Deputados? Refiro-me ao mandato, não à função de ministro.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Trata-se, aí, de outra situação, não é exatamente igual. Pensei que V. Exa. fosse perguntar-me outra coisa.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Prefiro a resposta à pergunta que fiz, e não a que V. Exa. achou que eu deveria fazer.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Mas o caso é diferente do que estamos colo-cando.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Não, pergunto sobre se os atos praticados por ministro de Estado são suscetíveis de se incluir no conceito de decoro parlamentar.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Respondo a V. Exa. com tranqüilidade: se ele estivesse no exercício singelo do cargo de ministro de Estado, não. Ele se subme-teria, em princípio, pelo cometimento de crime de responsabilidade, aos ditames da Lei 1.079.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): O deputado licenciado, então, não responde por crime de responsabilidade que haja cometido como ministro de Estado?

O Sr. Ministro Carlos Britto: Não é bem isso.

O Sr. Ministro Eros Grau: Pela linha do seu raciocínio é isso; ele não res-ponde. Lógico.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Não.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Confesso que estou muito es-pantado.

O Sr. Ministro Eros Grau: é um “princípio da separação de poderes” que pri-vilegia alguns poderes...

O Sr. Ministro Carlos Britto: Veja, Excelência, o caso dos autos é delicado.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Ministro Carlos Ayres Britto, não abra a guarda.

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O Sr. Ministro Carlos Britto: Não estou abrindo a guarda; falo com muita tranqüilidade.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Cuidado com as alianças.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Está certo. Vejam como a questão que nos é colocada sob o nosso prudente julgamento é delicada.

O art. 15 da Lei 1.079 diz o seguinte:

Art. 15. A denúncia só poderá ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo.

Vejam que coisa delicada, parece uma pecinha de cristal: se o parlamentar ministro se desinveste do cargo de ministro, retorna à sua Casa parlamentar, come-teu um crime enquanto ministro, e se não puder – no caso de falta de decoro – ser cobrado pelo parlamento, ele não poderá ser julgado por nenhum dos dois.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Isso não é crime de responsabili-dade.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): E, se não for nem deputado, nem vereador, Excelência, como se faz?

O Sr. Ministro Carlos Britto: Aí já é outra coisa.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Não é outra coisa, não. é mi-nistro de Estado também! Há um paradoxo no raciocínio de V. Exa. – enfim, eu até me recolho.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Excelência, a minha tese é de que, em matéria de direito constitucional, os institutos com que estamos a lidar têm sua própria ontologia, de sorte que podem descoincidir exercício e titularidade de cargo, como podem não descoincidir. No caso de Ministro, ele continua parlamentar, continua membro do Congresso Nacional.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Parlamentar sem imunidades?

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Sem imunidades.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Sem as imunidades próprias do parlamentar en-quanto proferir votos, palavras e opiniões. Demarquemos os campos.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): E a formal?

O Sr. Ministro Carlos Britto: Mas ele tem prerrogativas.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Já temos reconhecido imuni-dade em entrevista a jornal, em discursos. Eu só queria entender o raciocínio de V. Exa.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Aliás, o Ministro Sepúlveda Pertence fez um voto magistral. Eu até dizia no intervalo que, quando alguém fala com o brilho, com a consistência do Ministro Sepúlveda Pertence, é muito mais prudente ouvir, simplesmente, e deixar para falar quando o insuperável mestre concluir o voto. Fiz até uma metáfora: canto de passarinho é para se ouvir sem dar um pio; quanto mais quando o passarinho é um sabiá-laranjeira do quilate do Ministro Sepúlveda Pertence. O Ministro Pertence, porém, baseou-se muito no conceito que chamo de

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direito administrativo de licença, o qual considero um conceito constitucional de licença que não coincide com o de direito administrativo, de sorte a me levar a concluir que o parlamentar investido no cargo de ministro não se licencia, hipótese de licenciamento é outra coisa.

Concluo, Senhor Presidente, que é possível, sim, o Parlamento processar e julgar um membro seu que, durante algum tempo, exerceu o cargo de ministro de Estado.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Por crime de responsabilidade de ministro de Estado?

O Sr. Ministro Carlos Britto: Agora, obedecidos os conceitos constitucionais. A Constituição diz que o parlamentar incorre em falta de decoro quando recebe vantagens ilícitas, quando abusa das prerrogativas e nos casos previstos no Regi-mento Interno. Obedecida essa pauta constitucional de apenação e de discrição das figuras delituosas, entendo que o caso...

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Só que o Regimento Interno da Câmara teve a prudência de não arrolar os crimes de responsabilidade de ministro de Estado como a quebra de decoro parlamentar.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Depende da interpretação que, por exemplo, se dê ao inciso III do art. 244 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados:

III - A prática de irregularidades graves no desempenho do mandato ou de encargos dele decorrentes.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Mas isso está revogado pela resolução que editou o Código de Decoro.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Sim, mas a regra é essa. Isso é da natureza do sistema: abuso das prerrogativas constitucionais asseguradas a membros.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Ministro Gilmar, V. Exa. deve pegar a edição mais nova, a sua é antiga. Isso foi revogado no Regimento Interno da Câmara.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Mas são fórmulas genéricas. E não altera nada.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhor Presidente, para concluir.

O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Ministro Britto, V. Exa. me permite um aparte?

V. Exa. não seria sensível à distinção que fiz no meu voto. Nele, distingui bem aqueles casos em que o parlamentar-ministro é processado por fatos relaciona-dos à sua competência enquanto ministro de Estado e fatos outros que não tenham nenhuma pertinência com essa condição, ou seja, os relacionados com a função parlamentar.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Eu mesmo sou Relator de um processo, por sucessão, do ex-Senador Luis Estevão. E a discussão básica, central, era de fatos ligados à vida privada, stricto sensu, antes do exercício do mandato. Depois, no Congresso, quando se deliberou sobre a cassação, entendeu-se que também ele

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faltara com a verdade e, aí, então, aduziu-se um elemento adicional. Mas, se fez essa distinção. Agora, os fatos básicos, que deram ensejo à cassação – diferente-mente até daqueles casos da continuidade da legislatura, na linha da jurisprudên-cia consagrada pelo Ministro Celso de Mello –, estavam estritamente vinculados à vida privada fora do parlamento.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Foram praticados enquanto licenciado.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Enquanto licenciado, nem enquanto parla-mentar.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): O fundamento da cassação foi o de que mentiu nas informações.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Por isso é que não se sabe. Daí o Ministro Joaquim Barbosa ter advertido que os fundamentos eram diversos. No mínimo, era uma matéria controvertida para conceder a liminar, porque não se sabe qual será a imputação.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Comecei o meu relatório lendo a imputação, que é um exemplo escolar do crime de responsabilidade do art. 6º, 2, da Lei 1.079.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: As esferas penal, administrativa e cível são independentes.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Não sabia: hoje, estou apren-dendo cada coisa...

O Sr. Ministro Marco Aurélio: V. Exa. é que sempre sustentou isso na Casa.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Mas o que eu confundi?

O Sr. Ministro Marco Aurélio: V. Exa. aponta: bem, se a situação configura crime de responsabilidade, não há quebra de decoro, como se a natureza da quebra de decoro fosse a mesma do crime de responsabilidade.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhor Presidente, para concluir, assim como devemos interpretar a expressão, tão cediça em direito administrativo, “servidor público” como “servidor do público”, também “decoro parlamentar” devemos interpretar como decoro do parlamentar, esteja ele onde estiver.

Por isso, peço vênia ao eminente Relator para não conceder a liminar.

VOTO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Trata-se de mandado de segurança preven-tivo impetrado pelo Deputado Federal José Dirceu requerendo suspensão e arqui-vamento do processo disciplinar instaurado contra ele no âmbito do Conselho de ética da Câmara dos Deputados (Processo Disciplinar 4/05).

Processo disciplinarO Processo Disciplinar 4/05 tem origem na Representação 38/05 oferecida

pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).

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A alegação investigada no referido processo disciplinar é a de que o Depu-tado Federal José Dirceu, quando provia o cargo de Ministro de Estado Chefe da Casa Civil, teria “fraudado” o regular andamento dos trabalhos legislativos, “visan-do à alteração do resultado das deliberações configurativas de atos incompatíveis com o decoro parlamentar” (participação ativa no esquema de corrupção que ficou conhecido como “mensalão”).

Essa alegação foi extraída dos depoimentos do Sr. Marcos Valério Fernandes de Souza e de sua esposa, Sra. Renilda Maria Santiago Fernandes de Souza, pres-tados à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito – Correios.

Argumentos do mandado de segurançaAs principais alegações do mandado de segurança são:

a) a suposta participação do Deputado José Dirceu no esquema de corrupção constitui questão jurídica, de forma que deve ser apurada em foro apropriado;

b) há iminente risco de violação de direitos fundamentais do Impetrante na condição de parlamentar;

c) há possibilidade de haver julgamento político sem observância dos prin-cípios do devido processo legal e da separação e independência dos poderes (art. 5º, XXXV, XXXVII, LIII e LIV; art. 102, I, c; e art. 2º da CF/88), bem como dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade;

d) o Impetrante está submetido ao Código de ética da Alta Administração Pública e à Comissão de ética Pública (Decreto de 26 de maio de 1999) e não às regras do Código de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados.

Questão principal do casoA questão principal posta para julgamento do Supremo Tribunal Federal é a

constitucionalidade do processamento e julgamento, na Casa Legislativa respec-tiva, de processo disciplinar instaurado contra deputado federal, em virtude da denúncia de que ele estaria supostamente envolvido em esquema de corrupção re-lacionado com a compra de votos de parlamentares (em favor do Governo Federal), quando exercia o cargo de ministro de Estado.

Em suma: resta saber se é regular o processo ético-disciplinar junto à Câmara dos Deputados para apurar e, eventualmente, punir fatos imputados a deputado referentes a período em que ele estava investido no cargo de ministro de Estado Chefe da Casa Civil.

Objetiva-se averiguar, no presente feito, sobre o regime disciplinar a que está submetido o parlamentar quando afastado para exercer cargo expressamente autorizado pela Constituição: se estará submetido ao regime específico do cargo em que está investido ou se continua vinculado ao regime constitucional de depu-tado ou senador.

Direito líquido e certo invocadoOs dispositivos que o Impetrante invoca como violados são os seguintes:

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Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;(...)XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção;(...)LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Consti-tuição, cabendo-lhe:

I - processar e julgar, originariamente:(...)c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Esta-

do e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente;

Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Art. 56. Não perderá o mandato o Deputado ou Senador:I - investido no cargo de Ministro de Estado, Governador de Território, Secretário de

Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de capital ou chefe de missão diplo-mática temporária;

Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:(...)II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;(...)

§ 1º é incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percep-ção de vantagens indevidas.

Cassação de mandato parlamentar – foro competenteA perda de mandato parlamentar está prevista no art. 55 da Constituição

Federal de 1988. Na modalidade cassação, a perda do mandato pode ocorrer, entre outras hipóteses, quando o parlamentar comete falta funcional tipificada na própria Constituição ou em norma específica.

A cassação depende de processo disciplinar-político na Casa Legislativa res-pectiva, cujo processamento deve obedecer às normas regimentais. Há previsão constitucional expressa de votação secreta, pela maioria absoluta dos membros da Casa, após provocação da Mesa ou de partido político representado no Con-gresso Nacional. Está constitucionalmente assegurada ao acusado a ampla defesa (art. 55, § 2º, da CF/88).

A perda de mandato parlamentar é instituto que não foi disciplinado pela Carta de 1824. Na Carta de 1891, apresentava-se como sanção imposta pela afronta à proibição de exercer cargos incompatíveis entre si. Tratava-se de penalidade im-posta como conseqüência da cumulação proibida dos cargos. Eis os dispositivos:

Art. 23. Nenhum membro do Congresso, desde que tenha sido eleito, poderá celebrar contratos com o Poder Executivo nem dele receber comissões ou empregos remunerados.

§ 1º Excetuam-se desta proibição: 1º as missões diplomáticas;

R.T.J. — 203 1055

2º as comissões ou comandos militares; 3º os cargos de acesso e as promoções legais. § 2º Nenhum Deputado ou Senador, porém, poderá aceitar nomeação para missões,

comissões ou comandos, de que tratam os n. I e II do parágrafo antecedente, sem licença da res-pectiva Câmara, quando da aceitação resultar privação do exercício das funções legislativas, salvo nos casos de guerra ou naqueles em que a honra e a integridade da União se acharem empenhadas.

Art. 24. O Deputado ou Senador não pode também ser Presidente ou fazer parte de Diretorias de bancos, companhias ou empresas que gozem favores do Governo federal defi-nidos em lei.

Parágrafo único. A inobservância dos preceitos contidos neste artigo e no antecedente importa em perda do mandato.

Art. 25. O mandato legislativo é incompatível com o exercício de qualquer outra função durante as sessões.

(...)Art. 50. Os Ministros de Estado não poderão acumular o exercício de outro emprego ou

função pública, nem ser eleitos Presidente ou Vice-Presidente da União, Deputado ou Senador.Parágrafo único. O Deputado ou Senador que aceitar o cargo de Ministro de Estado per-

derá o mandato e proceder-se-á imediatamente a nova eleição, na qual não poderá ser votado.

A expressão constitucional “perda de mandato” passou a ser utilizada pela doutrina de direito constitucional e eleitoral a partir da Constituição de 1934. Em seu art. 33, § 5º, a Constituição de 1934 dispunha: “A infração deste artigo e seu § 1º importa a perda do mandato, decretada pelo Tribunal Superior de Justiça Eleitoral, mediante provocação do Presidente da Câmara dos Deputados, de Depu-tados ou de eleitor, garantindo-se plena defesa ao interessado.”

Alguns doutrinadores afirmam que o instituto da perda do mandato foi pre-visto pela primeira vez na Constituição de 1934 (CRETELLA JR., J. Comentários à Constituição de 1988, p. 2659). é certo que, a partir de 1934, a disciplina do instituto da perda do mandato passou a ser explícita no ordenamento constitucional brasileiro.

A Constituição de 1937, no art. 43, parágrafo único, outorgava competên-cia para qualquer das Câmaras declarar vago o lugar de deputado ou membro do Conselho Federal que fizesse manifestação contrária à existência ou independência da Nação ou promovesse o incitamento à subversão violenta da ordem política ou social.

Porém, é na Constituição de 1946 que o regime da perda de mandato ganha a conformação que tem atualmente. O art. 48, nos seus § 1º e § 2º, da Constituição de 1946, estabeleciam que faltas sem licença às sessões, bem como o procedimen-to incompatível com o decoro parlamentar implicavam a perda do mandato. Essa Constituição foi a primeira a prever de forma expressa a decretação da perda de mandato por falta de decoro parlamentar:

Art 48. (...)§ 1º A infração do disposto neste artigo, ou a falta, sem licença, às sessões, por mais de

seis meses consecutivos, importa perda do mandato, declarada pela Câmara a que pertença o Deputado ou Senador, mediante provocação de qualquer dos seus membros ou representação documentada de Partido Político ou do Procurador-Geral da República.

§ 2º Perderá, igualmente, o mandato o Deputado ou Senador cujo procedimento seja reputado, pelo voto de dois terços dos membros de sua Câmara, incompatível com o decoro parlamentar.

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O texto constitucional de 1967, no seu art. 37, assim disciplinava a questão: “Perde o mandato o Deputado ou Senador: I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior; II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar; III - que deixar de comparecer a mais de metade das sessões ordinárias da Câmara a que pertencer em cada período de sessão legisla-tiva, salvo doença comprovada, licença ou missão autorizada pela respectiva Casa ou outro motivo relevante previsto no Regimento Interno; IV - que perder os direitos políticos.”

A Emenda Constitucional 1, de 1969, ao disciplinar a matéria no art. 35, deu nova conformação ao instituto, passando a conformá-lo com a seguinte disposição:

Perderá o mandato o deputado ou senador: I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior; II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar ou aten-

tatório das instituições vigentes; III - que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa anual, à terça parte das sessões

ordinárias da Câmara a que pertencer, salvo doença comprovada, licença ou missão autorizada pela respectiva Casa;

IV - que perder ou tiver suspensos os direitos políticos; ou V - que praticar atos de infidelidade partidária, segundo o previsto no parágrafo único

do art. 152. § 1º Além de outros casos definidos no regimento interno, considerar-se-á incompatível

com o decoro parlamentar o abuso das prerrogativas asseguradas ao congressista ou a percepção, no exercício do mandato, de vantagens ilícitas ou imorais.

§ 2º Nos casos dos itens I e II, a perda do mandato será declarada pela Câmara dos Depu-tados ou pelo Senado Federal, mediante provocação de qualquer de seus membros, da respectiva Mesa ou de partido político.

§ 3º No caso do item III, a perda do mandato poderá ocorrer por provocação de qualquer dos membros da Câmara, de partido político ou do primeiro suplente do partido, e será declarada pela Mesa da Câmara a que pertencer o representante, assegurada plena defesa e podendo a de-cisão ser objeto de apreciação judicial.

§ 4º Nos casos previstos nos itens IV e V deste artigo e no § 5º do art. 32, a perda ou suspensão será automática e declarada pela respectiva Mesa. (Redação dada pela EC n. 11, de 13 de outubro de 1978.)

O texto de 1988 também foi expresso e inequívoco, ao disciplinar a matéria:

Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior;II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;III - que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordi-

nárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;IV - que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;V - quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.§ 1º é incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento

interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percep-ção de vantagens indevidas.

§ 2º Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.

§ 3º Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa res-pectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.

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§ 4º A renúncia de parlamentar submetido a processo que vise ou possa levar à perda do mandato, nos termos deste artigo, terá seus efeitos suspensos até as deliberações finais de que tratam os §§ 2º e 3º.

Assim, pelo próprio lastro constitucional que possui, não há dúvidas de que é possível, ao menos pelo prisma do procedimento, que, em sede de jurisdição constitucional, o Judiciário venha a se manifestar sobre a constitucionalidade do processo e julgamento que, eventualmente, poderá culminar com a cassação do mandato parlamentar. Nesse sentido os precedentes: MS 8.893/SC, MS 21.443-1, MS 24.458-5.

O Ministro Celso de Mello afirmou, em decisão monocrática no MS 24.458-5, que há um direito subjetivo público do cidadão brasileiro de “exigir que o Estado seja dirigido por administradores íntegros, por legisladores probos e por juízes incorruptíveis”, os quais, ao desempenhar suas mais nobres funções, tem o dever constitucional de respeitar os postulados ético-jurídicos que condicionam o exercí-cio legítimo da atividade pública. Eis a íntegra de trecho de sua decisão:

O sistema democrático e o modelo republicano não admitem, nem podem tolerar a exis-tência de regimes de governo sem a correspondente noção de fiscalização e de responsabilidade.

Nenhum membro de qualquer instituição da República está acima da Constituição, nem pode pretender-se excluído da crítica social ou do alcance da fiscalização da coletividade.

A imputação, a qualquer membro do Congresso Nacional, de atos que importem em transgressão ao decoro parlamentar revela-se fato que assume, perante o corpo de cidadãos, a maior gravidade, a exigir, por isso mesmo, por efeito de imposição ética emanada de um dos dogmas essenciais da República, a plena apuração e o esclarecimento da verdade, tanto mais se se considerar que o Parlamento recebeu, dos cidadãos, não só o poder de representação política e a competência para legislar, mas, também, o mandato para fiscalizar os órgãos e agentes dos demais Poderes.

Qualquer ato de ofensa ao decoro parlamentar culmina por atingir, injustamente, a pró-pria respeitabilidade institucional do Poder Legislativo, residindo, nesse ponto, a legitimidade ético-jurídica do procedimento constitucional de cassação do mandato parlamentar, em ordem a excluir, da comunhão dos legisladores, aquele – qualquer que seja – que se haja mostrado indigno do desempenho da magna função de representar o Povo, de formular a legislação da República e de controlar as instâncias governamentais do poder.

Não se poderá jamais ignorar que o princípio republicano consagra o dogma de que todos os agentes públicos – legisladores, magistrados, e administradores – são responsáveis perante a lei e a Constituição, devendo expor-se, plenamente, às conseqüências que derivem de eventuais comportamentos ilícitos.

Cumpre insistir na asserção de que a prática de atos atentatórios ao decoro parlamentar, mais do que ferir a dignidade individual do próprio titular do mandato legislativo, projeta-se, de maneira altamente lesiva, contra a honorabilidade, a respeitabilidade, o prestígio e a integridade político-institucional do Parlamento, vulnerando, de modo extremamente grave, valores consti-tucionais que atribuem, ao Poder Legislativo, a sua indisputável e eminente condição de órgão da própria soberania nacional.

Inclusive, nos presentes autos, o próprio Impetrante, para sustentar a tese de que a cassação do mandato político não constitui questão exclusivamente política e reforçar a tese de que a mesma deve ser enfrentada a partir de seus limites jurídicos, ínsitos ao próprio Estado Democrático de Direito, afirma:

Com efeito, o procedimento de cassação de um mandato legislativo não constitui tema exclusivamente interna corporis, sob pena de se consagrar a tese de que uma maioria parla-mentar, com absoluta discricionariedade, pode anular a vontade dos eleitores, manifestada por

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meio do voto. O mandato concedido pela população a um deputado ou senador não pode estar sujeito a um juízo de ratificação pelos seus pares, como se estes tivessem a faculdade política de expurgar um parlamentar que tenha se tornado inconveniente. (Fl. 6.)

Entretanto, se é certo que a cassação de mandato político não constitui procedimento estritamente político, estando, portanto, sob o pálio do controle de legitimidade pelo Poder Judiciário, por outro lado, não se pode negar a sua natureza eminentemente política, tendo em vista que tal procedimento está jungido a parâ-metros éticos e político-disciplinares da respectiva Casa Legislativa.

Não se sustenta, pois, o argumento de que o Impetrante não poderia estar sob o crivo de seus pares, sob a justificativa de que os fatos apurados são jurídicos, e não políticos.

Tal afirmação apresenta-se insubsistente, no contexto de um Estado Consti-tucional e Democrático de Direito, em que as responsabilidades políticas e públicas são as mais amplas possíveis, ou seja, podem e devem ser investigadas tanto no âmbito político, quanto no foro tipicamente jurisdicional.

Outrossim, por força da própria natureza dos fatos e atos investigados – suposto envolvimento no esquema de corrupção parlamentar que ficou conhecido como “mensalão” – em processo disciplinar que tramita na Câmara dos Deputados, sob o fundamento de quebra de decoro parlamentar, não há como corroborar a tese de que a Câmara dos Deputados não é o foro competente para processo e julgamen-to dos supostos atos infracionais do ora Impetrante.

Violação a direitos públicos subjetivos de parlamentarConforme demonstrado, a história constitucional brasileira é bastante pacífica

no reconhecimento do poder-dever do Estado de investigar e, se for o caso, conde-nar o parlamentar à pena de perda do mandato político, por infração ético-funcio-nal. Tal procedimento visa assegurar que as autoridades da República sejam afas-tadas quando suas condutas não estiverem consentâneas com o mais alto padrão ético necessário para o desempenho da elevada função de representação política.

Por outro lado, também é de ser reconhecido o direito subjetivo público do parlamentar (bem como de seus eleitores) de que sejam resguardados os direitos fundamentais inerentes a qualquer processo de investigação de que possa resultar perda ou restrição de direitos individuais.

Isso porque, a par de ser legítimo processar e julgar o parlamentar, nesse foro especial, punindo-o disciplinarmente por falta ética, se for o caso, este pro-cedimento há de ser informado pelos princípios da ampla defesa e do contradi-tório assegurados a todos pela Constituição.

Não seria razoável admitir que confrontos e divergências políticas, tão co-muns nos ambientes estritamente ideológico-politizados, pudessem guiar o processo ético-disciplinar pelas sendas da arbitrariedade e da injustiça.

Todas as instituições públicas têm o dever de respeitar a Constituição, respei-tar os seus princípios fundamentais e garantir aos cidadãos condições para exercer os seus direitos individuais.

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Assim sendo, conforme remansosa jurisprudência desta Corte, deve ser asse-gurado ao parlamentar processado, no âmbito administrativo-político da respectiva Casa Parlamentar, o direito de defesa, com todos os meios a ele inerentes. Nesse sentido, os seguintes precedentes: MS 21.360-4, MS 21.846-1, MS 21.849, MS 21.861-4.

No caso dos autos, o Processo Disciplinar 4 de 2005, ao que indicam os do-cumentos dos autos, está tramitando de forma regular. Tanto é que o Impetrante não tornou concretas as acusações de que estaria sendo desrespeitado o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, afirmando apenas que “também a violação das normas regimentais constitui ofensa a direito líquido e certo do impetrante, justifi-cando, também por essa razão, o presente mandado de segurança” (fl. 13).

Assim sendo, diante dos documentos acostados aos autos, não há compro-vação de ofensa ao princípio do juiz natural (art. 5º, XXXVII e LIII; art. 102, I, c; ou art. 5º, XXXV, c/c art. 129, I, todos da CF/88) nem de afronta ao princípio da separação dos poderes (art. 2º da CF/88).

Suspensão de mandato – não-submissão ao Código de Ética e Decoro da Câmara dos Deputados

Invocando o fato de a representação se referir a fatos ocorridos quando o Impetrante estava investido no cargo de ministro de Estado (pelo permissivo do art. 56, I, da CF/88), alega-se que o Deputado José Dirceu não se submete, por tais fatos, ao Código de ética e Decoro da Câmara dos Deputados, mas ao Código de ética da Alta Administração Pública e à Comissão de ética Pública (Decreto de 26 de maio de 1999).

A discussão, sob esse prisma, envolve tema constitucional que também me-rece esclarecimentos históricos.

Conforme anota o Professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho, a possibili-dade de investidura de parlamentar em cargo do Executivo provocou muita po-lêmica, daí a discussão no plenário, uma vez que significativa corrente entendia que o exercício de cargo de outro Poder pelo parlamentar implicava quebra e afron-ta ao princípio da separação de poderes (Comentários à Constituição brasileira de 1988, vol. 1, arts. 1º a 103, 3. ed., atual., 2000, p. 345).

Desde a Constituição de 1824, há disciplina para a questão:

Art. 29. Os Senadores, e Deputados poderão ser nomeados para o Cargo de Ministro de Estado, ou Conselheiro do Estado, com a diferença de que os Senadores continuam a ter assento no Senado, e o Deputado deixa vago o seu lugar da Câmara, e se procede a nova eleição, na qual pode ser reeleito e acumular as duas funções.

A Constituição de 1891 previa:

Art. 50. Os Ministros de Estado não poderão acumular o exercício de outro emprego ou função pública, nem ser eleitos Presidente ou Vice-Presidente da União, Deputado ou Senador.

Parágrafo único. O Deputado ou Senador que aceitar o cargo de Ministro de Estado perderá o mandato e proceder-se-á imediatamente a nova eleição, na qual não poderá ser votado.

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Em 1934, a Carta Magna prescreveu:

Art. 62. Os membros da Câmara dos Deputados nomeados Ministros de Estado, não perdem o mandato, sendo substituídos, enquanto exerçam o cargo, pelos suplentes respectivos.

A Carta de 1946 assim disciplinou a questão:

Art. 51. O Deputado ou Senador investido na função de Ministro de Estado, interventor federal ou Secretário de Estado não perde o mandato.

A Constituição de 1967 prescreveu:

Art. 38. Não perde o mandato o Deputado ou Senador investido na função de Ministro de Estado, Interventor Federal, Secretário de Estado ou Prefeito de Capital.

§ 1º No caso previsto neste artigo, no de licença por mais de quatro meses ou de vaga, será convocado o respectivo suplente; se não houver suplente, o fato será comunicado ao Tribu-nal Superior Eleitoral, se faltarem mais de nove meses para o término do mandato. O congres-sista licenciado nos termos deste parágrafo não poderá reassumir o exercício do mandato antes de terminado o prazo da licença.

§ 2º Com licença de sua Câmara, poderá o Deputado ou Senador desempenhar missões temporárias de caráter diplomático ou cultural.

A redação da Emenda Constitucional 1 de 1969 à Constituição de 1967 sobre o tema resultou no seguinte texto constitucional:

Art. 36. Não perderá o mandato o deputado ou senador investido na função de Ministro de Estado.

§ 1º Dar-se-á a convocação do suplente apenas no caso de vaga em virtude de morte, renúncia ou investidura na função de Ministro de Estado. Não havendo suplente, só será feita a eleição do substituto em caso de vaga, se faltarem mais de quinze meses para o término do mandato.

§ 2º Com licença de sua Câmara, poderá o deputado ou senador desempenhar missões temporárias de caráter diplomático ou cultural.

Conforme se pode notar, desde a Constituição de 1934, admite-se que o deputado ou senador seja investido no cargo de ministro de Estado, sem que isso implique perda de seu mandato. Essa é a fórmula também expressa no texto cons-titucional de 1988:

Art. 56. Não perderá o mandato o Deputado ou Senador:I - investido no cargo de Ministro de Estado, Governador de Território, Secretário de

Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de Capital ou chefe de missão diplo-mática temporária;

Assim, o que era celeuma no início do século, em virtude de uma interpreta-ção estrita do princípio da separação de poderes, deixou de ser por opção expressa do legislador constituinte brasileiro.

Mas, se hoje a questão é pacífica, sob o ponto de vista da compatibilidade dos cargos, longe está de sê-lo quanto ao regime disciplinar a que se submete o parlamentar pelos atos praticados no período em que se encontra afastado de suas atribuições parlamentares.

Na hipótese dos autos, o Impetrante, deputado federal, está sendo processado, no âmbito da respectiva Casa Legislativa, por fatos que supostamente teriam ocorrido na época em que estava afastado da função parlamentar, investido no

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cargo de ministro de Estado. Alega ofensa a direito líquido e certo por estar sen-do processado em foro incompetente, uma vez que estaria submetido a regime disciplinar de ministro de Estado, e não a regime disciplinar próprio dos parla-mentares.

O texto constitucional, ao tratar dos direitos e deveres dos parlamentares (arts. 53 a 56), indica o caminho para se responder ao questionamento dos pre-sentes autos. Ora, se o deputado investido no cargo de ministro de Estado, por força expressa do texto constitucional, não perde o mandato parlamentar (art. 56, I, da CF/88) é porque continua ostentando essa condição. O texto constitucional é inequívoco:

Art. 56. Não perderá o mandato o Deputado ou Senador:I - investido no cargo de Ministro de Estado, Governador de Território, Secretário de

Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de capital ou chefe de missão diplomática temporária;

Pontes de Miranda, ao comentar dispositivo equivalente da Constituição de 1967/69 (art. 36), ressaltava:

O deputado ou senador que aceitou, ou que exerce a função de Ministro de Estado, não perde o cargo, mas é substituído enquanto exerce a função administrativa. Processado como ocupante do cargo de Ministro de Estado e condenado, pode perder os dois cargos. As incompatibilidades costumam ser de proteção ao cargo; esse caso do art. 36 não deixa de ser incompatibilidade pelo meio, incompatibilidade de exercício, e só de exercício: dá-se substi-tuição temporária.(MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967. 2. ed. rev. e amp. com a Emenda 1, de 1969. São Paulo: Revista dos Tribunais. Tomo III, arts. 32-117, p. 43.)

A condição de parlamentar do deputado afastado para ser investido no cargo de ministro de Estado também deve ser reconhecida por força dos arts. 54 e 55 da Constituição, verbis:

Art. 54. Os Deputados e Senadores não poderão:I - desde a expedição do diploma:a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa

pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes;

b) aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis ad nutum, nas entidades constantes da alínea anterior;

II - desde a posse:a) ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente

de contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada;b) ocupar cargo ou função de que sejam demissíveis ad nutum, nas entidades referidas

no inciso I, a;c) patrocinar causa em que seja interessada qualquer das entidades a que se refere o

inciso I, a;d) ser titulares de mais de um cargo ou mandato público eletivo.Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior;II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;III - que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordi-

nárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;IV - que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;

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V - quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.§ 1º É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regi-

mento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.

§ 2º Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.

§ 3º Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa res-pectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.

§ 4º A renúncia de parlamentar submetido a processo que vise ou possa levar à perda do mandato, nos termos deste artigo, terá seus efeitos suspensos até as deliberações finais de que tratam os §§ 2º e 3º.

Regras de impedimentoExtrai-se do texto constitucional, notadamente do art. 55, § 1º, que os repre-

sentantes políticos estão vinculados ao dever de respeitar o decoro parlamentar, sendo-lhes defeso o “abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congres-so Nacional ou a percepção de vantagens indevidas”.

O fato de o deputado federal ou o senador estarem afastados do exercício das funções tipicamente parlamentares, para exercício de cargo compatível no Poder Executivo, não o exime de observar os impedimentos constitucionais previstos no art. 54 da Constituição de 1988.

O parlamentar, porque investido no mandato político, apesar de afastado de seu exercício, deverá ser submetido aos comandos dos arts. 54 e 55 da Constitui-ção. Subsistem para ele, portanto, os impedimentos funcionais e negociais e profis-sionais previstos nos referidos dispositivos constitucionais.

Tais impedimentos visam a proteger a independência do próprio Parlamento e a própria reputação política desta que é a instituição típica do estado democrático de direito.

Regra de privilégio de foroA jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica ao reconhecer pro-

teção especial à pessoa do parlamentar, independentemente do exercício do man-dato e mesmo estando ele afastado para exercer cargo público constitucionalmente permitido, garantindo-lhe prerrogativa de foro. Nesse sentido: Inq 1.070, Inq 777, Inq 780.

Inquérito penal. Foro por prerrogativa de função. Deputado licenciado para exercer cargo de secretário de Estado. No sistema da Constituição Federal, a proteção especial à pessoa do parlamentar, independentemente do exercício do mandato, reside no foro por prerrogativa de função que lhe assegura o art. 53, § 4º, da Carta Magna, ainda quando afastado da função legislativa para exercer cargo público constitucionalmente permitido. Questão de ordem que se resolve com a rejeição da preliminar de incompetência do Supremo Tribunal Federal levantada pela Procuradoria-Geral da República.(Inq 777.)

Ora, tais precedentes estão a demonstrar que, muito embora o parlamentar esteja afastado do exercício de suas funções parlamentares, ainda está vinculado ao regime que lhe garante prerrogativas inerentes ao mandato no qual está investido.

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A prerrogativa de foro, conforme tenho sustentado, constitui garantia obje-tiva, inerente à liberdade e independência do ocupante de cargo.

Regra do decoroAssim, o regime disciplinar do parlamentar investido no cargo de ministro

de Estado também deve respeito ao decoro.

José Cretella Júnior ensina: “Conduta decorosa ou com decoro é o procedi-mento conforme padrões de elevado grau de moralidade. A contrario sensu, falta de decoro é o procedimento humano que contraria os normais padrões ético-jurídicos, vigentes em determinado lugar e época.(...) Decoro parlamentar é a con-duta do congressista conforme os parâmetros morais e jurídicos, que vigoram em determinada época e no grupo social em que vive.” (Comentários à Constituição Brasileira de 1988, v. V, arts. 38-91, p. 2660-2661.)

Decoro, portanto, é a garantia da moralidade política e que deve ser perse-guida em todos os regimes de poder, em todas as circunstâncias políticas, não se podendo admitir que o parlamentar, ainda que temporariamente afastado de suas funções no Poder Legislativo, possa dele descuidar.

[Exclusão do direito à imunidade] – Súmula 4 (cancelada)E não procede o argumento de que o não-reconhecimento pelo Supremo

Tribunal Federal de imunidades aos parlamentares afastados para o exercício de cargo constitucionalmente permitido seria uma premissa para a conclusão de que tais parlamentares não se submetem ao controle de decoro pela respectiva Casa Legislativa.

Muito embora a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tenha cancela-do a Súmula 4, firmando entendimento de que o afastamento de deputado ou se-nador do exercício do mandato, para exercer cargo permitido pela Constituição, suspende-lhe a imunidade formal e material (cf. Inq 104, RTJ 99/477), permaneceu firme o entendimento de que o parlamentar continua com prerrogativa de foro por função (cf. Inq 780, RTJ 153/503).

Assim sendo, a exceção aberta pela jurisprudência pela exclusão da prerro-gativa da imunidade formal ao parlamentar afastado para exercer cargo compatí-vel, não pode ser considerada regra, para efeitos de sustentar o argumento de que o deputado ou senador está infenso ao regime disciplinar da Casa Legislativa à qual permanece vinculado. Ainda mais quando a ela retorna, após pedir exoneração do cargo no Poder Executivo!

A própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal advertiu, nas razões de seus precedentes, evidenciando em ressalva expressa que as imunidades são ga-rantias de independência do Poder Legislativo, de forma que, por guardarem íntima relação com o exercício do mandato parlamentar, não pode ser dele desvinculada, uma vez que visa a preservar a independência do mandato representativo.

As imunidades parlamentares, é oportuno repetir, constituem garantia necessária ao exercício do mandato representativo. Daí a cláusula inserida no art. 32 da Constituição: “no exercício do mandato”.

A proteção constitucional somente alcança os atos praticados pelo parlamentar que se encontre no exercício do seu mandato. A garantia existe em razão da função e não da pessoa. é

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inerente ao exercício do mandato. Por isso, quando o deputado ou o senador é incorporado às forças armadas, ou desempenha missão temporária de caráter diplomático ou cultural, cessam as imunidades.

(...)Ante o sentido finalístico do instituto, se o parlamentar se encontra afastado do exercício

do mandato (substituído por suplente), investido na função de ministro de Estado, secretário de Estado, prefeito de capital, como permite o art. 36 da Carta Política, o ato que haja praticado durante o desempenho de função no Executivo, estranho ao exercício do mandato, não dá ensejo ao pedido de prévia licença à sua Câmara, para responder a processo criminal (§ 1º do art. 32).(Inq 104, fl. 4.)

Se vencedora a tese sustentada pelo Impetrante (de que deve ser submetido ao regime disciplinar próprio do cargo do Executivo que ocupava), poder-se-ia admitir uma situação absurda: o ministro de Estado – que continua sendo parla-mentar por não perder o mandato; que pode decidir retornar a qualquer tempo ao exercício de seu cargo; e que também pode fazer a opção, durante todo o período da investidura, pela remuneração que lhe seja mais vantajosa entre a dos dois cargos (art. 56, § 3º, da CF/88) – não está submetido ao regime de prerrogativas e impedimentos (deveres éticos) especificamente dirigido aos detentores de man-dato político.

Proceder a esta interpretação seria o mesmo que reconhecer que o texto constitucional conferiu ao parlamentar investido nos cargos previstos no art. 56, I, da CF/88 um regime híbrido: a) francamente mais vantajoso, por contar com privilégios que não são próprios nem do regime a que está vinculado o ministro de Estado, nem daquele regime específico do parlamentar; e b) evidentemente odioso, por consagrar privilégios não condizentes com a relevante função de representação política que exerce no Estado Democrático de Direito.

é bem verdade que a tese do regime híbrido (ou especial) revela-se sustentável. Entretanto, ao contrário do que defende o ora Impetrante, este regime somente pode ser admitido para se reconhecer, a partir dele, uma responsabilização ainda mais ampla do agente político que dele se beneficia, pois, do contrário, o referido regime servirá apenas para desmoralizar o texto constitucional e, conseqüente-mente, o próprio Estado Democrático de Direito.

Para evitar essa desmoralização e reafirmar a força normativa da Constitui-ção, é que deve prevalecer o entendimento de que há direitos, mas também deveres, no regime disciplinar do ministro de Estado que está investido neste cargo pela prerrogativa constitucional do art. 56, I, da Constituição Federal.

Registre-se que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem consoli-dado o princípio da unidade da legislatura.

O princípio da unidade de legislatura não impede a instauração de procedimento de cas-sação de mandato legislativo, ainda que por atos atentatórios ao decoro parlamentar cometidos, por titular de mandato legislativo, na legislatura anterior. (...) Cumpre insistir na asserção de que a prática de atos atentatórios ao decoro parlamentar, mais do que ferir a dignidade individual do próprio titular do mandato legislativo, projeta-se, de maneira altamente lesiva, contra a hono-rabilidade, a respeitabilidade, o prestígio e a integridade político-institucional do Parlamento, vulnerando, de modo extremamente grave, valores constitucionais que atribuem, ao Poder Legislativo, a sua indisputável e eminente condição de órgão da própria soberania nacional. “(...) Conquanto o deputado ou senador tenha todas as condições para continuar em seu cargo, a própria Câmara ajuíza que ele é indesejável ou intolerável, surgindo a cassação como uma medida

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disciplinar. (...) A desqualificação do parlamentar não impede que ele venha a candidatar-se novamente. Eventualmente pode reeleger-se. Mas sobra, ainda, à Câmara, o exercício do seu poder para cassar novamente o mandato do dito membro.”(MS 24.458-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 21-2-03. No mesmo sentido: MS 23.388, Rel. Min. Néri da Silveira, DJ de 20-4-01.)

O caso dos autos apresenta situação que pode ser enfrentada sob o prisma do princípio da unidade de legislatura, pois a Constituição permitiu que o depu-tado ou senador, mesmo investido no cargo de ministro de Estado (art. 56, I, da CF/88), pudesse continuar investido no seu mandato parlamentar, conferindo-lhe, inclusive, o direito de optar pela remuneração mais vantajosa (art. 56, § 3º, da CF/88), e, se exonerado do referido cargo do Poder Executivo, retornar às suas funções parlamentares. Se retorna, é porque a legislatura teve sua continuidade confirmada.

Ante o exposto, indefiro a medida liminar, por não restar caracterizado o fumus boni juris.

VOTO(Aditamento)

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Senhor Presidente, aproveito para destacar que nesses casos, em geral, não se tem com clareza – por isso suscitei, logo no iní-cio, esse debate – o tipo de imputação. Fossem essas as imputações, aquelas ligadas ao exercício do cargo, mas certamente não sabemos o que vai constar do relatório e o que será aprovado pela Comissão de ética. Exemplifiquei o MS 23.801, do ex-Senador Luiz Estevão, que houve outra fundamentação, fundamentação adicional, para a decretação da perda do mandato. Só isso já geraria controvérsia suficiente para, eventualmente, indeferir a liminar.

Acompanho os votos que me precederam no sentido do indeferimento da liminar.

VOTO

A Sra. Ministra Ellen Gracie: Senhor Presidente, com a vênia daqueles que pensam de maneira diversa, entendo que quem está ministro pode responder, como congressista que é, por quebra de decoro parlamentar.

Os atos que, no caso concreto, são imputados ao Impetrante pela relatoria pe-rante o Conselho de ética não são atos ministeriais, são atos ilícitos, ou pelo menos irregulares, que não se inserem, nem de longe, nas regulares atividades da chefia da Casa Civil. Poderia admitir a tese da impetração se os atos considerados pelo Con-selho de ética fossem atos próprios da Casa Civil. Nesse caso, diversa seria a ação proposta, diverso seria o foro, enfim, responderia perante esta Casa, não diante da Câmara dos Deputados; responderia por crime de responsabilidade, não por quebra de decoro; responderia como ministro de Estado, não como parlamentar.

No entanto, por se haver tornado ministro, que é necessariamente uma si-tuação temporária e precária (já que é demissível ad nutum), o parlamentar não está dispensado de guardar comportamento compatível com a ética do Parlamento,

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até porque o conteúdo, ainda que impreciso desse conceito de decoro parlamentar, não se ajusta, não parece tolerar o tipo de comportamento que é imputado ao Impe-trante e relativamente ao qual haverá de se defender.

Por isso, e considerando ainda o freqüente trânsito entre as posições de Executivo e Legislativo, muito bem caracterizado e revelado pelas possibilidades existentes, e que estão postas na Constituição, de, por exemplo, optar pelo venci-mento de parlamentar ou pelas licenças-relâmpagos, que volta e meia ocorrem quando retornam os ministros à Casa Parlamentar para votar projetos de interesse do Governo, e também pela circunstância da contagem de tempo, que não se inter-rompe para efeito da chamada “aposentadoria parlamentar” durante o período em que os membros do Congresso Nacional exercem temporária e precariamente função de ministro de Estado, mais se reforça minha convicção no sentido da au-sência de um direito líquido e certo a eximir o Impetrante do resguardo do decoro correspondente à casa legislativa. Valho-me das razões postas pelos Colegas que inauguraram a divergência, iniciada pelo voto do Ministro Joaquim Barbosa, para também indeferir a liminar, com a vênia do eminente Ministro Relator e dos que o acompanham.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, eis aí o caleidoscópio da vida. Nas duas votações anteriores, votei pelo agasalho do que se avizinha como interesse do próprio Impetrante. Assentei que, de início, caberia ao Relator decidir. Se ele o houvesse feito, a liminar estaria concedida sem recurso ao Pleno.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Por enquanto ainda sou mem-bro de um colegiado, Excelência.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Votei por se concluir que não teria o Impe-trante a ação constitucional ajuizada, e fiquei vencido nessa matéria. O Tribunal está muito próximo de exarar um parecer que certamente será considerado pela Câmara dos Deputados. Sim, o que vier a ser assentado repercutirá naquela Casa como óptica do Supremo, e, ante as discussões havidas, tem-se praticamente a antecipação de uma decisão definitiva sobre a matéria.

Presidente, o Ministro Carlos Ayres Britto analisou, a meu ver, de forma con-vincente, a questão alusiva ao mandato, à detenção, em si, do mandato e ao exercí-cio do mandato. E aí fez ver que se trata, no caso, de direitos, prerrogativas, deveres que se fazem presentes, considerada a simples detenção do mandato, exigindo-se a detenção do mandato e o próprio exercício. Começou S. Exa. apontando que depu-tados e senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.

E aí há precedente da Corte – o que trago à colação é da lavra do Ministro Moreira Alves – no sentido de que a prerrogativa de foro permanece íntegra, em que pese ao exercício de cargo de Secretário de Estado. Assim foi decidido no Inq 777-3/TO, revelando-se que não se despe o parlamentar licenciado dessa condição de parlamentar, e tanto não se despe que, no caso concreto, o Impetrante optou, porque autorizado pela Constituição Federal, a revelar, portanto, que a qualificação

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permanece íntegra, pela percepção da remuneração própria ao mandato, acionando o § 3º do art. 56 da Constituição Federal.

Existem vedações previstas não a partir do exercício, em si, do mandato, mas da simples expedição do diploma:

Art. 54. (...)I - (...)a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa

pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes;

b) aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis ad nutum, nas entidades constantes da alínea anterior;

Há vedações que pressupõem a posse.

Segue-se o art. 55:

Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:I - que infringir qualquer das proibições [antes ou depois da posse], estabelecidas no

artigo anterior;

Não cito o inciso referente ao decoro parlamentar:

III - que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordi-nárias da Casa a que pertencer [e aqui, pedagogicamente, se disse o desnecessário], salvo licença ou missão por esta autorizada;

Licença até mesmo para assumir a pasta da Casa Civil.

Vem um outro item, Presidente, que também deságua na perda do mandato, revelando neutro o exercício:

IV - que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;

Há outro, e aí já ocorre a atuação da Justiça Eleitoral, que também não pres-supõe estar ele no exercício:

V - quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;

Poderia, Presidente, prosseguir no exame da Carta, mas vou substituir a fala, a partir da Carta, por um trabalho que recebi de Eduardo Fortunato Bim, que não é jurista – pelo menos não o conhecia como jurista –, mas que revela uma visão fide-digna, como deve ser toda visão da Constituição Federal – convencido o intérprete, e a interpretação é um ato de vontade –, sobre essa problemática:

O fundamento do poder punitivo por atos incompatíveis com o decoro parlamentar está na maculação que o comportamento do parlamentar causa ou pode causar à dignidade da instituição parlamentar.

Revelou-se o objeto do instituto, a quebra do decoro parlamentar, que é proteger – e a sociedade vem acompanhando os trabalhos da Câmara – a própria instituição.

Consigna o autor do artigo ainda não publicado, mas que espero o seja em breve:

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Pouco importa se o parlamentar está ou não exercendo mandato, estando afastado para assumir algum cargo executivo, em licença saúde ou para tratar de interesse particular. A dig-nidade do parlamento pode ser maculada de qualquer maneira enquanto o parlamentar for um membro do parlamento, ainda que esteja afastado ou licenciado (CF, art. 56). Lapidares as palavras de Carla Teixeira:

Na identidade parlamentar, o anonimato inexiste, seja enquanto ideal ou prática, pois a valorização do sujeito se dá a partir do seu [aqui temos um neologismo] per-tencimento ao corpo de parlamentares; a pretensão/reconhecimento de uma imagem (prestígio e dignidade) é fundamental no desempenho de sua função; a condição de deputado federal integra todas as demais inserções sociais do sujeito, pois é imprescin-dível à honra/decoro parlamentar que o sujeito tenha uma conduta digna em todas as circunstâncias da vida cotidiana: nas obrigações como pai, marido, filho, empresário/trabalhador, contribuinte e, por fim, representante político. Não é possível postular meia-honra – em apenas uma esfera social –, pois a honra rejeita a fragmentação do sujeito; a honra é sempre pessoal.

E conclui:

Admitir que o afastamento para assumir funções executivas exime o parlamentar de se comportar com decoro, seria negar a própria condição de parlamentar, fato inocorrente (sic), uma vez que a Constituição fala em afastamento e não em renúncia do mandato ou aposenta-doria compulsória.

Há mais, Senhor Presidente: o pano de fundo diz respeito diretamente à ati-vidade do Parlamento; a interferência – e não digo que ocorreu, não estou aqui a julgar, não estou aqui a assumir a cadeira de deputado federal, julgando o mandado de segurança quanto à procedência, ou improcedência, da imputação que ocorreu de forma extravagante, a mais não poder – se procedente, visando a distorções, vo-tações, e sei lá quantos projetos e emendas constitucionais teriam sido aprovadas, se procedente o que asseverado.

Por isso, e a esta altura já ocorre pelo menos o empate, peço vênia para, na terceira votação, pronunciar-me de forma contrária aos interesses do Impetrante.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Senhor Presidente, a questão aqui discutida é esta: contra o Impetrante foi instaurado procedimento disciplinar por quebra do de-coro parlamentar, sustentando o Impetrante que não poderia ter ocorrido a quebra desse decoro parlamentar, pois estava ele, Impetrante, licenciado da Câmara para exercer o cargo de ministro de Estado.

A Constituição Federal, art. 55, inciso II, dispõe:

Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:(...)II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;

O abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional e a percepção de vantagens indevidas constituem condutas incompatíveis com o de-coro parlamentar, as quais estão expressamente tipificadas na Constituição Federal (CF, art. 55, § 1º). Os demais casos estão no Regimento Interno, que se reporta ao Código de ética dos parlamentares. A questão é saber, repito, se o Impetrante, no exercício do cargo de ministro de Estado, poderia incorrer na quebra do decoro

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parlamentar. Vimos que a alegação do Impetrante é esta: estava no exercício do cargo de ministro de Estado, portanto, não sujeito às regras atinentes aos parla-mentares. A alegação, entretanto, não me parece razoável. A acusação formulada contra o Impetrante, no procedimento administrativo, diz respeito ao exercício do mandato de deputado federal.

Leio, e me impressionou à primeira vista, o relatório apresentado pelo eminente Ministro Sepúlveda Pertence, como sempre esclarecedor, proporcio-nando aos seus colegas o mais amplo conhecimento das questões postas em julgamento:

Em depoimentos prestados ao Procurador-Geral da República, em poder da egrégia Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Correios e perante a própria CPMI, respecti-vamente, por (...) (ler fls. 1 e 2 do relatório) (...) infringindo a Constituição Federal, art. 55, inciso II e § 1º, o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, art. 244, e o Código de ética e Decoro Parlamentar, art. 4º, inciso IV, pelo que se formula a presente representação, a fim de que apresente a defesa que tiver, até final perda do mandato que detém [soube, agora mesmo, que está revogado esse art. 244].

O parlamentar investido no cargo de ministro de Estado não perde a con-dição de parlamentar. Investido no cargo de ministro de Estado – o Sr. Ministro Carlos Britto trouxe esclarecimentos valiosos –, nem licenciado está o parlamentar.

Realmente, dispõe o art. 56 da Constituição que:

Art. 56. Não perderá o mandato o Deputado ou Senador:I - investido no cargo de Ministro de Estado, Governador de Território, Secretário de

Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de capital ou chefe de missão diplo-mática temporária;

O Ministro Carlos Britto, na interpretação que fez desses textos, mostrou que nem licenciado está o deputado.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Licenciado está, porque foi convocado o su-plente.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Realmente, defesa melhor, desse ponto de vista, foi feita pelo Ministro Carlos Britto. Porém, vou também dar resposta à objeção:

§ 1º O suplente será convocado nos casos de vaga [primeiro caso], de investidura em funções previstas neste artigo [segundo caso] ou de licença superior a cento e vinte dias [terceiro caso].

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Sim, Ministro, porque a pri-meira não tem prazo, depende da confiança do Presidente da República; e, por isso, se teve de falar da “licença superior a cento e vinte dias”.

Mas hoje eu já aprendi: não é licença. Então, perde o mandato se não com-parecer à Câmara todos os dias. Estou aprendendo muita coisa hoje.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: V. Exa. não está aprendendo, nós é que apren-demos com V. Exa. Não tenha dúvida. E digo isso com a maior sinceridade e, no que toca a mim, há 50 anos que isso se realiza – estou sempre aprendendo com V. Exa.

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O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Muito obrigado, Ministro!

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Acrescenta o § 3º do mesmo artigo:

§ 3º Na hipótese do inciso I, o Deputado ou Senador poderá optar pela remuneração do mandato.

Ora, se ele está recebendo remuneração pelo mandato, é porque ele tem mandato e é deputado, é parlamentar.

O Sr. Ministro Carlos Britto, no ponto, fez nítida distinção entre investidura de parlamentar, licença de parlamentar, com investidura de quem não é agente político na administração pública, na administração em geral.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Há todo um regime próprio.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Exatamente, os dispositivos constitucionais autorizam esse tipo de interpretação.

Li, nos jornais, por exemplo, que o Impetrante continuou percebendo o sub-sídio de deputado. Há uma declaração, nesse sentido, de um eminente senador. E não houve desmentido.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Ministro, só para um esclareci-mento de uma questão histórica: essa regra da opção pela remuneração de parla-mentar só entrou na Constituição de 1988. Sabe por quê? Porque, quando votáva-mos no Congresso Nacional a Constituição de 1988, a remuneração dos deputados era superior à de ministro de Estado.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Mas está na Constituição de 1988, sob a qual julgamos.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Isso é um adminículo.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Isso é um adminículo, bem disse o Ministro Gilmar Mendes, para formar uma convicção.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Ministro, só para fechar o argu-mento, é o Poder Executivo que remete ao Tribunal de Contas a declaração de renda desse parlamentar no exercício do Ministério, ou é a Câmara dos Deputados?

O Sr. Ministro Carlos Velloso: é a Câmara dos Deputados, se ele fez a opção.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Não é a Câmara dos Deputados, é o Ministério.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Vamos deixar esses adminí-culos. Não perde o mandato porque não comparece.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Ministro, eu vou aceitar o conselho de V. Exa., porém esse adminículo é constitucional, está escrito na Constituição, com as galas, portanto, de preceito constitucional.

Outra coisa: a qualquer momento o parlamentar investido no cargo de minis-tro de Estado pode voltar ao exercício do mandato. Aliás, isso ocorre, comumente, principalmente nas assembléias legislativas: o deputado que exerce um cargo de secretário, quando há uma votação de muito interesse do governo, ele retorna e, depois, assume novamente. Isso tem ocorrido. Já ocorreu no parlamento nacional.

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O Sr. Ministro Gilmar Mendes: No próprio plano federal.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Exatamente, no parlamento nacional.

Senhor Presidente, na verdade, os Colegas que me antecederam na diver-gência já disseram tudo, mas quero encerrar dizendo que o parlamentar, embora investido no cargo de ministro de Estado, não está dispensado de guardar compor-tamento compatível com a ética do parlamento. E decoro parlamentar diz respeito, fundamentalmente, com a ética do parlamento. é nesse sentido, aliás, o voto da eminente Ministra Ellen Gracie.

Peço licença ao meu eminente colega, Ministro Sepúlveda Pertence e aos demais Ministros que o acompanharam, para ficar com a divergência.

VOTO(Sobre medida liminar)

O Sr. Ministro Celso de Mello: O exame da plausibilidade jurídica da pre-tensão mandamental ora deduzida pelo Impetrante impõe algumas reflexões que entendo imprescindíveis, no que me concerne, à formulação de um juízo de de-libação em torno da controvérsia suscitada no presente mandado de segurança.

A desejável convergência entre ética e política nem sempre tem ocorrido ao longo do processo histórico brasileiro, cujos atores – e não me refiro ao caso concreto –, ao protagonizarem episódios lamentáveis e moralmente reprováveis, parecem haver feito uma preocupante opção preferencial por práticas de poder e de governo que se distanciam, gravemente, do necessário respeito aos valores de probidade, de decência, de impessoalidade, de compostura e de integridade pessoal e funcional.

Tais comportamentos, porque motivados por razões obscuras, por desígnios inconfessáveis ou por interesses escusos, em tudo incompatíveis com a causa pública, são guiados e estimulados por exigências subalternas resultantes de um questionável pragmatismo político, que, não obstante o profundo desvalor ético dos meios empregados, busca justificá-los, assim mesmo, em face de uma suposta e autoproclamada legitimidade dos fins visados pelos governantes.

Os membros do Poder Legislativo, quando assim atuam, transgridem as exigências éticas que devem pautar e condicionar a atividade política, que só se legitima quando efetivamente respeitado o princípio da moralidade, que traduz valor constitucional de observância necessária na esfera institucional de qualquer dos Poderes da República.

A ordem jurídica não pode permanecer indiferente a condutas de membros do Congresso Nacional – ou de quaisquer outras autoridades da República – que hajam eventualmente incidido em censuráveis desvios éticos no desempenho da elevada função de representação política do Povo brasileiro.

Foi por tal motivo que o Plenário desta Suprema Corte, atento aos altíssimos valores que informam e condicionam todas as atividades governamentais – não importando o domínio institucional em que elas tenham lugar –, veio a proferir o

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seu “dictum”, reconhecendo a possibilidade jurídico-constitucional de qualquer das Casas do Congresso Nacional adotar medidas destinadas a reprimir, com a cassação do mandato de seus próprios integrantes, fatos atentatórios à dignidade do ofício legislativo e lesivos ao decoro parlamentar, mesmo que ocorridos no curso de anterior legislatura, desde que, já então, o infrator ostentasse a condição de membro do Parlamento.

É que a Carta Política não exige que haja necessária relação de contem-poraneidade entre o fato típico e a legislatura sob cujo domínio temporal teria ocorrido o evento motivador da responsabilização política do congressista por falta de decoro parlamentar, sendo inaplicável, por isso mesmo, a tal situação, o princípio da unidade de legislatura (MS 23.388/DF, Rel. Min. NéRI DA SIL-VEIRA – MS 24.458/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ de 12-3-03).

Sabemos todos que o cidadão tem o direito de exigir que o Estado seja dirigido por administradores íntegros, por legisladores probos e por juízes incorruptíveis, que desempenhem as suas funções com total respeito aos postu-lados ético-jurídicos que condicionam o exercício legítimo da atividade pública. O direito ao governo honesto – nunca é demasiado reconhecê-lo – traduz uma prerrogativa insuprimível da cidadania.

O sistema democrático e o modelo republicano não admitem, nem podem tolerar a existência de regimes de governo sem a correspondente noção de fisca-lização e de responsabilidade.

Nenhum membro de qualquer instituição da República está acima da Constituição, nem pode pretender-se excluído da crítica social ou do alcance da fiscalização da coletividade.

A imputação, a qualquer membro do Congresso Nacional, de atos que importem em transgressão ao decoro parlamentar revela-se fato que assume, perante o corpo de cidadãos, a maior gravidade, a exigir, por isso mesmo, por efeito de imposição ética emanada de um dos dogmas essenciais da República, a plena apuração e o esclarecimento da verdade, tanto mais se se considerar que o Parlamento recebeu, dos cidadãos, não só o poder de representação política e a competência para legislar, mas, também, o mandato para fiscalizar os órgãos e agentes dos demais poderes.

Qualquer ato de ofensa ao decoro parlamentar culmina por atingir, in-justamente, a própria respeitabilidade institucional do Poder Legislativo, residindo, nesse ponto, a legitimidade ético-jurídica do procedimento constitucional de cassa-ção do mandato parlamentar, em ordem a excluir, da comunhão dos legisladores, aquele – qualquer que seja – que se haja mostrado indigno da magna função de representar o Povo, ou de ostentar a condição de membro do Congresso Nacional, ou de formular a legislação da República ou, ainda, de controlar as instâncias go-vernamentais de poder.

Não se poderá jamais ignorar que o princípio republicano consagra o dogma de que todos os agentes públicos – legisladores, magistrados, e adminis-tradores – são responsáveis perante a lei e a Constituição, devendo expor-se, plenamente, às conseqüências que derivem de eventuais comportamentos ilícitos.

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Cumpre insistir na asserção de que a prática de atos atentatórios ao deco-ro parlamentar, mais do que ferir a dignidade individual do próprio titular do mandato legislativo, projeta-se, de maneira altamente lesiva, contra a honora-bilidade, a respeitabilidade, o prestígio e a integridade político-institucional do Parlamento, vulnerando, de modo extremamente grave, valores constitucionais que atribuem, ao Poder Legislativo, a sua indisputável e eminente condição de órgão da própria soberania nacional.

É por essa razão que o eminente Professor MIGUEL REALE (“Decoro Parlamentar e Cassação de Mandato Eletivo”, “in” Revista de Direito Públi-co, vol. X/89), ao versar o tema em questão, adverte que o ato indecoroso do parlamentar importa em falta de respeito à própria dignidade institucional do Poder Legislativo:

O “status” do deputado, em relação ao qual o ato deve ser medido (e será comedido ou decoroso em razão dessa medida) implica, por conseguinte, não só o respeito do parlamentar a si próprio, como ao órgão ao qual pertence (...).

No fundo, falta de decoro parlamentar é falta de decência no comportamento pessoal, capaz de desmerecer a Casa dos representantes (incontinência de conduta, embriaguez, etc.) e falta de respeito à dignidade do Poder Legislativo, de modo a expô-lo a críticas infundadas, injustas e irremediáveis, de forma inconveniente.

Não é por outro motivo que PINTO FERREIRA (“Comentários à Cons-tituição Brasileira”, vol. 3/28, 1992, Saraiva), em magistério lapidar sobre a matéria, assinala:

Outro motivo mencionado pela Constituição do País para a perda do mandato de depu-tado ou senador é o procedimento reputado incompatível com o decoro parlamentar. É, então, um poder discricionário que tem a Câmara de expulsar os seus membros, quando sua conduta venha a ferir a própria honorabilidade da Assembléia. Conquanto o deputado ou senador tenha todas as condições para continuar em seu cargo, a própria Câmara ajuíza que ele é indesejável ou intolerável, surgindo a cassação como uma medida disciplinar.

(...)(...) A desqualificação do parlamentar não impede que ele venha a candidatar-se nova-

mente. Eventualmente pode reeleger-se. Mas sobra, ainda, à Câmara, o exercício do seu poder para cassar novamente o mandato do dito membro.(Grifei.)

Em suma: a submissão de todos à supremacia da Constituição e aos princí-pios que derivam da ética republicana representa o fator essencial de preserva-ção da ordem democrática, por cuja integridade devemos todos velar, enquanto legisladores, enquanto magistrados ou enquanto membros do Poder Executivo.

O aspecto central do presente mandado de segurança reside na alegada im-possibilidade constitucional – consoante sustentado pelo Impetrante – de o mem-bro do Congresso Nacional, regularmente licenciado de seu mandato para exercer cargo de ministro de Estado (CF, art. 56, I), incidir, quando no desempenho dessa função no Poder Executivo, em conduta atentatória ao decoro parlamentar e sujei-tar-se, em conseqüência, em virtude do fato supostamente indecoroso, à perda do mandato legislativo, nos termos do art. 55, inciso II, da Constituição da República.

O Impetrante sustenta, presente tal contexto, ter “(...) direito líquido e certo de não ser submetido a julgamento pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar

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da Câmara dos Deputados quanto a atos praticados na função de Ministro de Es-tado (...)”, devendo estar sujeito, ao contrário, a regime constitucional de respon-sabilidade diverso daquele a que ora está sendo submetido, pois entende que inci-de, na espécie, a norma de competência inscrita no art. 102, I, “c”, da Constituição.

O Sr. Deputado JÚLIO DELGADO, Relator do Processo 4/05 (oriundo da Representação 38/05), instaurado contra o Impetrante e ora em tramitação perante o Conselho de ética e Decoro Parlamentar, ao justificar a questionada competência da Câmara dos Deputados para o exame dos atos alegadamente atentatórios ao decoro parlamentar atribuídos ao Autor do presente “writ” manda-mental, assim fundamentou, no ponto, o seu entendimento:

A licença para o desempenho de múnus governamental não afasta nem restringe o vínculo do parlamentar com a instituição, senão estritamente no que concerne à prática dos atos inerentes ao exercício parlamentar no âmbito da respectiva Casa.

Inquestionável, porém, é que, se as prerrogativas continuam, também perduram as obrigações e os ônus.

Semelhante condição situará, sempre, o respectivo titular sob os ônus e as conseqüên-cias anteriormente listadas no art. 55, que sujeita à perda de mandato em caso de abuso dessas prerrogativas, e de outras mais, que compõem o elenco próprio da Representação.

Em se cuidando da violação do decoro parlamentar, a caracterização dessa conduta prescinde de que o congressista se encontre no efetivo exercício do mandato no âmbito da Casa na qual tem assento, porque o atributo há de ser averiguado em relação à investidura, ou seja, à representação ou mandato eletivo, não somente quando no exercício deste, em função estrita-mente legislativa ou parlamentar, mas também quando esteja desempenhando cargo político no Poder Executivo, ou seja, no exercício de uma prerrogativa do mandato.

Ao fazer uso de qualquer prerrogativa, o agente público deve considerar que elas são ex-cepcionalidades dentro do sistema de representação, diante do que ele certamente responderá pelo abuso das mesmas. Ainda que essa exorbitância ocorra nos lindes do Poder Executivo, no qual temporariamente se encontra o acusado, estará sujeito à perda do mandato que detém no Legislativo.

(...)Por essa forma, em razão de sua investidura parlamentar e do conjunto de prerrogativas

do mandato representativo, o congressista que ocupa cargo de Ministro de Estado não fica isen-to da responsabilização ético-disciplinar, no que pertine ao decoro parlamentar.

Quando se cuida de violação do decoro parlamentar, a averigüação dessa infringência está condicionada tão-somente à condição de ser detentor de mandato parlamentar, como fato próprio da investidura congressual, ou seja, conseqüente à diplomação e posse, que reper-cute sobre a Instituição e o corpo legislativo, não estando adstrito à hipótese de o infrator se achar no efetivo exercício do mandato na respectiva Casa do Congresso Nacional.

(...)Ao assumir o ônus de Ministro de Estado, jamais poderia abandonar a conduta, a pos-

tura imposta pelo Regimento Interno da Câmara dos Deputados, devendo obrigatoriamente atentar para a questão da dignidade e da honra a qual todo homem está sujeito, principalmente o homem público. Isso porque a questão do decoro parlamentar encontra-se ligada diretamente a esses dois campos, sendo questão ética e moral, necessariamente.

A honra do homem público, especialmente o do que exerce mandato político, represen-tação máxima da democracia, não é somente a imagem pessoal do próprio Representado para consigo mesmo. A questão da honra é muito mais ampla. Envolve a imagem perante terceiros, perante a sociedade e seus pares da Casa Legislativa. Assim, mesmo estando temporariamente fora do exercício do mandato, seus atos atingem diretamente todas as inserções sociais do sujeito – homem público – haja vista a necessidade premente de, em todas as circunstâncias da vida quotidiana, ter o mesmo uma conduta digna.

Mesmo afastado do cargo de Deputado Federal, não deixou de ser representante do povo, estando apenas temporariamente licenciado. Ainda que estivesse fora das atividades parlamentares por motivo de saúde ou qualquer outro, não deixaria de ser membro da Câmara dos Deputados e do Congresso Nacional.

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Logo, não há que se falar em impossibilidade de punição do Representado por quebra do decoro parlamentar porque não estava no exercício do cargo. Se o Deputado José Dirceu estivesse afastado do cargo, não de forma temporária, mas definitiva, aí, sim, poderíamos concordar com sua argumentação de que não houve quebra do decoro parlamentar, pois não mais seria Deputado Federal.(Grifei.)

Essa compreensão do tema, tão bem exposta pelo eminente Ministro PAULO BROSSARD no doutíssimo voto que proferiu no julgamento do MS 21.360/DF (RTJ 146/153, 166-174), e que se apóia no reconhecimento de que é prescindível o exercício do mandato legislativo para efeito de configuração do ato indecoroso, permite relembrar, a respeito de tal questão, entendimento anteriormente expendido pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, que opinou, em 24 de maio de 1949, pela cassação do mandato legislativo do então Deputado EDMUNDO BARRETO PINTO, por haver este incidido, em 29-6-46 (em momento anterior, portanto, ao da própria vigência da Constituição de 1946), em procedimento incompatível com o decoro parlamentar:

“Procedimento incompatível com o decoro parlamentar” é a conduta daquele que se torna indigno de participar da Casa do Parlamento.

A Constituição não se refere àquele que “praticar ato incompatível com o decoro parla-mentar”, mas àquele que tiver “procedimento”, com essa incompatibilidade.

Também não restringe a aplicação da penalidade aos que tiverem tal procedimento “dentro da Câmara” ou “no exercício do mandato” e, por isso, não têm razão os que entendem não poder a Câmara se preocupar com “conduta social” do Deputado. Desde que o membro do Congresso tenha conduta que atente contra a respeitabilidade, a dignidade, o decoro, enfim, do parlamento, fica sujeito à perda do mandato. (Grifei.)

Essa mesma percepção do significado de procedimento infringente do decoro parlamentar foi igualmente manifestada pelo então Deputado Federal MONSENHOR ARRUDA CÂMARA, que assim se pronunciou sobre o tema (“Inviolabilidade Parlamentar e Imunidade Processual”, p. 9, 1968, Imprensa Nacional):

Mas que é decoro parlamentar? O Regimento ainda não o definiu. Deverá fazê-lo em Projeto de Resolução, em que poderiam incluir-se propaganda de guerra ou contra regime, injúrias graves, ultraje à moral pública, calúnias, defesa de interesses próprios inconfessá-veis – e aí estaria o caso de corrupção, ou lá fora comprando eleitores ou subornando cabos eleitorais – processos de corrupção, insulto a membros de outros Poderes.

Enfim, ao nosso ver modesto, contrário ao decoro é tudo aquilo que empana a essên-cia, a dignidade, a majestade e a compostura do mandato parlamentar, dentro do seu exer-cício ou fora dele, mas tudo isto julgado pela própria câmara a que pertence o Congressista, não pelos outros Poderes.(Grifei.)

O membro do Congresso Nacional pode exercer, excepcionalmente, sem perda do mandato parlamentar, determinados cargos na esfera institucional do Poder Executivo, dentre os quais o de ministro de Estado (CF, art. 56, I), hipótese em que a própria Constituição da República, em norma expressa, permite-lhe op-tar pela remuneração do mandato legislativo (CF, art. 56, § 3º).

O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, firmou orientação no sentido de que o congressista, quando licenciado para exercer cargo no âmbito do Poder

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Executivo, perde, temporariamente, durante o período de afastamento do Poder Legislativo, a garantia constitucional da imunidade parlamentar material e formal (RTJ 99/477, Rel. Min. DJACI FALCÃO – RTJ 99/487, Rel. Min. NéRI DA SILVEIRA – RTJ 166/133, Rel. Min. NELSON JOBIM – Inq 681/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO – Pet 1.113/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).

De outro lado, esta Corte Suprema também deixou estabelecido que, no sistema constitucional brasileiro, o membro do Congresso Nacional, mesmo afas-tado para exercer cargo público constitucionalmente permitido, preserva, em seu benefício, a garantia referente à prerrogativa de foro, perante este Supremo Tribunal, nas infrações penais comuns, ainda quando cometidas na condição de ocupante de funções junto ao Poder Executivo (RTJ 153/503, Rel. Min. MO-REIRA ALVES – RTJ 153/760, Rel. Min. MOREIRA ALVES).

Se é certo, de um lado, que o efetivo exercício do mandato legislativo traduz pressuposto essencial ao gozo da imunidade parlamentar (material ou formal), pois esta existe para proteger o desempenho independente do ofício congressual (PONTES DE MIRANDA, “Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda nº 1 de 1969”, tomo III/10 e 43, 2. ed., 1970, RT; JOÃO BAR-BALHO, “Constituição Federal Brasileira”, p. 64, edição fac-similar, 1992, Senado Federal; PINTO FERREIRA, “Comentários à Constituição Brasileira”, vol. 2/625, 1990, Saraiva; JOSé CRETELLA JÚNIOR, “Comentários à Cons-tituição de 1988”, vol. V/2624-2625, item n. 204, 1991, Forense Universitária; MICHEL TEMER, “Elementos de Direito Constitucional”, p. 129/130, item n. 5, 18. ed., 2002, Malheiros, v.g.), não é menos exato, de outro, considerada a teleologia da norma constitucional garantidora da prerrogativa de foro, que a cláusula que a instituiu tem por finalidade dispensar “proteção especial à pessoa do parlamentar, independentemente do exercício do mandato” (RTJ 153/503, Rel. Min. MOREIRA ALVES).

O membro do Congresso Nacional – que se licencia para exercer determi-nados cargos no Poder Executivo (como o de ministro de Estado), podendo, até mesmo, como já assinalado, optar pela remuneração do mandato legislativo – não se desvincula da Casa a que pertence, pois, embora temporariamente afastado do exercício da função congressional, não rompe os laços que o unem, organica-mente, ao Parlamento, tanto que continua a subsistir, em seu favor, a garantia constitucional da prerrogativa de foro em matéria penal, circunstância esta – consoante ressaltou, em seu voto, no Conselho de ética e Decoro Parlamentar, o Deputado JÚLIO DELGADO – que torna ainda mais visíveis, quanto ao parla-mentar licenciado, “a integridade e a continuidade do vínculo que se estabelece entre este e a Casa Legislativa a que pertence”.

Não é difícil concluir, desse modo, assentada tal premissa, que o fato de os deputados ou senadores estarem licenciados não os exonera da necessária observância dos deveres constitucionais (tanto os de caráter ético quanto os de natureza jurídica) inerentes ao próprio estatuto constitucional dos congressistas, que representa um complexo de normas disciplinadoras do regime jurídico a que estão submetidos os membros do Poder Legislativo, nele compreendidas –

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como ressalta o magistério da doutrina (ALEXANDRE DE MORAES, “Consti-tuição do Brasil Interpretada”, p. 1045, item n. 54.1, 2. ed., 2003, Atlas; JOSé AFONSO DA SILVA, “Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 536/537, item n. 17, 23. ed., 2004, Malheiros; UADI LAMMÊGO BULOS, “Constituição Federal Anotada”, p. 770, 5. ed., 2003, Saraiva; AURO AUGUSTO CALIMAN, “Mandato Parlamentar – Aquisição e Perda Antecipada”, p. 123/134, item n. 1.3.1, 2005, Atlas, v.g.) – as incompatibilidades negociais (ou contratuais), funcionais, políticas e profissionais definidas no art. 54 da Constituição.

Examinada a questão sob tal perspectiva, torna-se lícito reconhecer a pos-sibilidade de perda do mandato legislativo, se e quando o parlamentar, embora exercendo cargo de ministro de Estado, vier a incidir nas situações de incompa-tibilidade (CF, art. 54) e naquelas referidas no art. 55 da Lei Fundamental, com exclusão, unicamente, da hipótese a que alude a parte final do inciso III do art. 55 da Carta Política, eis que, por razões óbvias, o desempenho de funções no Poder Executivo não se mostra compatível com a exigência de simultâneo compareci-mento às sessões ordinárias do Parlamento.

É por tal motivo, Senhor Presidente, que tenho por adequada a interpre-tação dada pelo eminente Advogado EDUARDO FORTUNATO BIM, em valio-so trabalho, ainda inédito, que versa, precisamente, o tema ora em análise (“A Cassação de Mandato por Quebra de Decoro Parlamentar: Sindicabilidade Jurisdicional e Tipicidade”):

O poder de expulsar um membro não está reduzido a ofensas cometidas durante a sessão parlamentar (ou durante a legislatura), mas se estende a todos os casos nos quais a ofensa é tamanha que, a juízo da casa legislativa, desapropria-o de seus deveres parlamen-tares. A imposição de decoro parlamentar é uma defesa do parlamento, razão pela qual a condição de parlamentar é a que importa, não a temporariedade ou qualidade do ato tido como indecoroso.

(...)O fundamento do poder punitivo por atos incompatíveis com o decoro parlamentar

está na maculação que o comportamento do parlamentar causa ou pode causar à dignidade da instituição parlamentar. Pouco importa se o parlamentar está ou não exercendo o man-dato, estando afastado para assumir algum cargo executivo, em licença saúde ou para tratar de interesse particular. A dignidade do parlamento pode ser maculada de qualquer maneira enquanto o parlamentar for um membro do parlamento, ainda que esteja afastado ou licen-ciado (CF, art. 56). Lapidares as palavras de Carla Teixeira:

“Na identidade parlamentar, o anonimato inexiste, seja enquanto ideal ou prática, pois a valorização do sujeito se dá a partir do seu pertencimento ao corpo de parlamentares; a pretensão/reconhecimento de uma imagem (prestígio e dignidade) é fundamental no desempenho de sua função; a condição de deputado federal integra todas as demais inserções sociais do sujeito (...). Pois é imprescindível à honra/decoro parlamentar que o sujeito tenha uma conduta digna em todas as circunstâncias da vida cotidiana: nas obrigações como pai, marido, filho, empresário/trabalhador, con-tribuinte e, por fim, representante político. Não é possível postular meia honra – em apenas uma esfera social –, pois a honra rejeita a fragmentação do sujeito; a honra é sempre pessoal.”Admitir que o afastamento para assumir funções executivas exime o parlamentar de se

comportar com decoro seria negar a própria condição de parlamentar, fato inocorrente, uma vez que a Constituição fala em afastamento e não em renúncia do mandato ou aposentadoria compulsória.

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O argumento do STF é claro: os atos não foram praticados no exercício do mandato (que ainda existe), então não autorizam a imunidade constitucional, que só serve para quem está exercendo as funções de parlamentar. Quem está no executivo não exerce as funções de parlamentar, mas não perde o mandato, podendo ferir o decoro do parlamento, uma vez que ainda está vinculado ao parlamento. Não há que se confundir a imunidade com o poder disci-plinar do parlamento.

Argumento que deve ser visto com cuidado é o risco de haver uma ingerência do Poder Legislativo através do processo de cassação do mandato, na política do Executivo, ferindo a separação de poderes. Não existe a alegada interferência, uma vez que a política do Executivo estará a salvo, não havendo como o parlamento influenciar nisso. Se o parlamentar for cas-sado, a pena não atingirá o cargo executivo, uma vez que a cominação de inelegibilidade não alcança cargos de confiança – cargos não elegíveis por natureza. O Executivo continuará com o seu ministro ou secretário, se quiser, não havendo nenhuma interferência entre os poderes da República.

(Grifei.)

Reconheço, ainda, tal como relembrado pelo ilustre Advogado EDUARDO FORTUNATO BIM, em seu já referido trabalho, que, hoje, ao contrário do que sucedia sob a égide da Constituição de 1946, quando a tipicidade em torno da noção de decoro parlamentar era extremamente aberta (art. 48, § 2º), o vigente ordenamento constitucional (art. 55, § 1º) “preceitua que o decoro parlamentar ‘tem’ que estar definido no regimento ou consistir em atos caracterizadores de abuso das prerrogativas asseguradas aos parlamentares ou em percepção de vantagens indevidas, aquelas que contrariam o direito. Sem a subsunção do ato tido como incompatível com o decoro parlamentar às definições constitucionais, ainda que indireta, no caso da previsão regimental, impossível a cassação de qualquer parlamentar à luz do inciso II do artigo 55 da CF/88. Existe, dessa forma, uma ‘tipicidade constitucional’ dos atos indecorosos perfeitamente con-trolável pelo Judiciário” (grifei).

Por tal motivo, esse mesmo autor, examinando a questão da tipicidade constitucional pertinente aos atos indecorosos, salienta, com absoluto acerto, que a Constituição de 1988, ao referir-se ao “decoro parlamentar, ainda que remeta a sua definição ao regimento, não o faz de forma ilimitada, ‘não passa um cheque em branco ao legislador regimental’. Embora haja amplitude na definição dos atos incompatíveis com o decoro parlamentar, não há como ignorar o conteúdo mínimo da expressão como algo que minimamente fira a dignidade, a imagem ou a respeitabilidade do parlamento, sob pena de transformar a cassação pela quebra de decoro em uma desculpa para revogar mandatos legitimamente con-feridos pelo povo. A teoria do cheque em branco ignora a força normativa dos vocábulos constitucionais, uma vez que o decoro parlamentar não pode ser en-carado como uma desculpa qualquer para cassar o mandato parlamentar pela maioria; tal proceder compactua com a onipotência da maioria e com o arbítrio, violando diversos corolários do princípio democrático: proteção das minorias contra a maioria, contenção ao arbítrio estatal e preservação da representação do parlamentar eleito” (grifei).

A Representação 38/05, oferecida pelo PTB, que deu origem ao Processo 4/05, imputa, ao ora Impetrante, a prática de conduta que o art. 4º, inciso IV, do

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Código de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados qualifica como procedimento incompatível com o decoro parlamentar, punível com a perda do mandato, fazendo-o nos seguintes termos:

Art. 4º Constituem procedimentos incompatíveis com o decoro parlamentar, puníveis com a perda do mandato:

(...)IV - fraudar, por qualquer meio ou forma, o regular andamento dos trabalhos legisla-

tivos para alterar o resultado de deliberação; (...).(Grifei.)

Eis, no ponto, a imputação deduzida contra o ora Impetrante:

Em depoimentos prestados ao Procurador-Geral da República, em poder da egrégia Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Correios e perante a própria CPMI, respectiva-mente, por MARCOS VALÉRIO FERNANDES DE SOUZA, a 14 Jul 2005 e d. RENILDA MARIA SANTIAGO FERNANDES DE SOUZA, a 26 Jul 2005, deu-se conta de que o Repre-sentado, JOSÉ DIRCEU, enquanto licenciado desta Casa para exercer as funções do cargo de Ministro-Chefe da Casa Civil do Presidente da República, em conluio com o Secretário de Finanças do Partido dos Trabalhadores – PT, DELÚBIO SOARES, levantou fundos junto ao Banco Rural e Banco de Minas Gerais – BMG, tomados sob a intervenção e responsabilidade de MARCOS VALÉRIO, com a finalidade de pagar parlamentares para que, na Câmara dos Deputados, votassem projetos em favor do Governo.

À sua vez, tais fundos levantados como se empréstimos fossem, eram compensados pelo favorecimento aos Bancos mencionados – com cujos diretores, entre eles, FLÁVIO GUIMA-RÃES (BMG) e KÁTIA RABELO (Rural), esteve reunido JOSÉ DIRCEU – e empresas de que participa MARCOS VALÉRIO, em contratos governamentais, de sua administração indireta ou autárquica, garantidos pela influência do Representado, de modo que, embora tais mútuos não tenham sido honrados pelos tomadores, tampouco houvesse cobrança daquelas instituições financeiras de seu crédito.

Assim agindo, o Representado quebrou o decoro parlamentar, porquanto membro titular de mandato legislativo aí, valeu-se daquela atividade junto ao Poder Executivo, para interferir e fraudar o regular andamento dos trabalhos legislativos, alterando o resultado de deliberações em favor do Governo, infringindo a Constituição Federal, art. 55, inciso II e § 1º, o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, art. 244 e o Código de Ética e Decoro Parla-mentar, art. 4º, inciso IV, pelo que se formula a presente Representação, a fim de que apresente a defesa que tiver, “até final perda do mandato” que detém.(Grifei.)

O exame de tal imputação não parece evidenciar que se teria registrado, no caso, transgressão à exigência de tipicidade concernente aos atos configuradores de quebra de decoro parlamentar.

Registre-se, finalmente, neste ponto, na linha do magistério jurispruden-cial firmado por esta Suprema Corte (RDA 189/271, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI), que a eventual qualificação criminal dos fatos imputados ao con-gressista não inibe o exercício, pela Casa legislativa a que pertence, de seu poder disciplinar, legitimando-se, em conseqüência, ainda que com base nesses mes-mos fatos, a instauração de processo de cassação de mandato por transgressão à cláusula do decoro parlamentar.

Por tais razões, Senhor Presidente, é que entendo descaracterizada a plausibilidade jurídica da pretensão mandamental ora deduzida pelo Impetrante.

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Desse modo, e não obstante as doutas ponderações do eminente Relator, peço vênia para indeferir o pedido de medida liminar.

É o meu voto.

VOTO

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Sendo matéria constitucional, a Presidência tem voto.

Tenho por hábito, Srs. Colegas, não procurar fazer um exame dogmático das estruturas constitucionais, mas verificar que elas servem para o funcionamento de instituições; e não a partir de pressupostos, como, por exemplo, o Ministro Celso de Mello referiu-se ao voto, abreviadamente, do meu antigo professor Paulo Bros-sard de Sousa Pinto, que disse que “a incompatibilidade se caracterizava pela indignidade dos atos praticados”. é o tipo da definição circular: é indigno porque é incompatível; é incompatível porque é indigno, ou seja, não diz absolutamente nada.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Na verdade, homenageemos o nosso eminente colega Paulo Brossard, que era absolutamente sincero quando dizia: “em matéria de impeachment e de cassação, há apenas uma garantia: a exi-gência do quorum de dois terços.”

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): é claro. é aí que quero chegar. Na medida em que se reconhece isso, reconhece-se que a fundamentação... E vejam, se examinarmos a história das cassações internas, digamos, intestinal, dos processos de cassações que se deram no Congresso Nacional, verificaremos que todo aquele discurso no sentido da dignidade, no sentido do juízo, que o Con-gresso emite um juízo de terço e o parlamentar – como diria este autor, referido pelo eminente Ministro Relator – desapropria-se das condições de parlamentar, na verdade, não é nada disso. As circunstâncias políticas é que determinam. E o exemplo mais clássico deste assunto foi a cassação do Deputado Ibsen Pinheiro, a que assisti com clareza, participei nitidamente e verifiquei que todos aqueles argumentos deduzidos pelo eminente Ministro Celso de Mello, não ocorreram. Foram exatamente situações conjunturais específicas que o consideraram indig-no para o exercício do parlamento. Creio que, ao se identificar, precisamos deixar absolutamente claro que, como diria o eminente Ministro Brossard, lembrado pelo Ministro Sepúlveda Pertence: a garantia é de dois terços.

Lembro claramente que esta... que, agora, já a maioria formada determinou, também se aplica ao art. 39 da Lei 10.079, de 1950, pela qual o Senado Federal poderá julgar Ministro do Supremo Tribunal Federal pela falta de decoro no exer-cício das suas funções, ou seja, nós poderemos ter, com esta abertura que se dará ao conceito de decoro no exercício das suas funções, a possibilidade do Senado Federal, através de denúncia de qualquer personagem, cassar desses eventuais titulares de funções no Supremo Tribunal Federal, tendo em vista, efetivamente, a discordância substancial com votos eventualmente aqui proferidos.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Com votos?

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O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Estou dizendo que a denúncia se dará e os votos que se dariam dentro do Congresso teria esse fundamento. V. Exa. não perderá por esperar eventualmente essa situação.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Desculpe, mas não houve nenhuma decisão nesse sentido aqui, hoje.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): A decisão não é aqui, é lá.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: V. Exa. diz que, em decorrência de nossa decisão hoje, o Senado tomará determinada providência. Não, o Senado Federal sempre pode ter juízo discricionário sobre a questão do processo-crime contra Ministro do Supremo Tribunal Federal.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Eu não disse isso, mas pura e simplesmente que retornou o processo de degola em relação ao Executivo. Evi-dentemente que, no momento em que o Poder Executivo, que o parlamentar no exercício, por exemplo, de função diplomática temporária, for lá, neste parlamento, e ao cumprimento de decisões do Presidente da República, formular, nessa missão diplomática temporária, a posição e votar pela posição do País, fixada pelo Exe-cutivo, contrariamente aos interesses da Câmara – numa manifestação de guerra, por exemplo, da adoção do País em relação a determinados tratados internacio-nais ou funções estabelecidas –, vamos ter problemas terríveis.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Felizmente, Senhor Presidente, fiz um levan-tamento dos casos verificados, e o Tribunal até agora não conseguiu anular.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Não me refiro aos casos, mas digo do que acontecerá em relação aos poderes que se estão concedendo ao Congresso Nacional.

Vejam, por exemplo: se tivéssemos, no Ministério da Fazenda, um titular de mandato eletivo – embora hoje não seja titular de mandato eletivo, porque renun-ciou à sua função como municipal –, não haveria a possibilidade de ser cassado o seu mandato sob o argumento da falta de decoro parlamentar – por qualquer outro fato – justificadamente para obter a alteração da política econômica do próprio Governo? Claro que sim.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Senhor Presidente, deixamos expresso nos nossos votos que há de ter relação com o exercício do mandato; isto está no rela-tório do Ministro Sepúlveda Pertence.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Não deixaram expresso. Basta estabelecer uma discrição abstrata, basta descrever. V. Exa. está discutindo abs-tratamente, e estou falando do mundo, no real, do que se passa nas relações entre maioria e minoria.

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Não entro no mérito da questão, mas a Câma-ra acusa que houve manipulação na votação.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Tráfico de influência.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): As afirmações podem ser todas; elas, em tese, poderão ser qualquer uma para colocar uma umbrela sobre uma

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decisão política, e isso se passa normalmente. A realidade conta essa história. Os processos de cassação ocorridos principalmente a partir de 1988 – porque para trás tivemos muito poucos –, principalmente a partir do Governo Collor, tinham como forma proteger o Congresso, inclusive, contra “uma espécie de opinião pu-blicada” nacional.

Quero dizer aos Senhores que acompanho integralmente o Ministro Relator, com elogios à posição assumida por S. Exa., considerando a possibilidade de vol-tarmos, por vias transversas, e com apanágio da maioria do Tribunal, ao sistema de degola da Constituição de 1891. De outra parte, há a possibilidade de o Con-gresso Nacional intervir nas políticas do Executivo na medida em que tiver, nos seus quadros, um parlamentar que possa ser cassado em retaliação às ações e políticas formuladas pelo Executivo, no conflito com a maioria. Ou seja, estaría-mos caminhando, por uma tentativa transversa, de estabelecer alguma coisa não permitida pela Constituição, mas que o sistema americano permite: a necessidade de apoio para o exercício da função ministerial.

Teríamos a possibilidade, inclusive, e, agora, de forma invertida, de mudar-mos a decisão por essa fórmula e, conforme o Inq 104 – referido pelo Ministro Sepúlveda Pertence –, Relator Djaci Falcão, se reconhecer a nulidade formal, não a material, à qual não me referi – faço referência à nulidade formal. Teremos, então, de admitir a possibilidade de a Câmara dos Deputados suspender o andamento de processo-crime a que responda, nesta Casa, parlamentar que, no exercício da fun-ção de ministro de Estado, teria praticado eventualmente crime, pelo qual denun-ciado, mas que, sendo parlamentar, poderá ser suspenso o andamento do processo por decisão da maioria.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): V. Exa. não quis falar em imunidade material, mas penso no caso de o Ministro ser acusado de ter mentido.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Não quis falar nisso para não chegar tão longe.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Excelência, se me permite, há o outro lado da medalha: esta nossa decisão será também um marco histórico no sentido de que, a partir de agora, cada parlamentar federal investido no cargo de ministro de Estado tomará muito mais cuidado no plano da intocabilidade tanto da honra objetiva do Congresso quanto da sua própria honra subjetiva.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Exatamente me refiro a essa deci-são num sentido contrário ao dito agora por V. Exa., cuja leitura típica e velhamen-te udenista – sei que não é o caso de V. Exa. – levou ao suicídio de Getúlio Vargas. Isso se dá exatamente pela outorga de poder à maioria do Congresso.

Ao passo dessa leitura, faço outra: essa situação só dá força à maioria da Câmara para inviabilizar eventualmente ações do próprio Executivo, na medida em que possa cassar parlamentares em exercício no Congresso e coagi-los a não fazer a política do Executivo, mas a da maioria da Câmara. Esse é o problema que V. Exa., Ministro Celso de Mello, se conhecesse efetivamente o exercício par-lamentar, saberia ser a regra do jogo, e não a regra desse imperativo categórico kantiano da segunda formulação que nos trouxe V. Exa.

R.T.J. — 203 1083

O Sr. Ministro Carlos Britto: Mas podemos inaugurar uma nova era, com novas regras de um jogo muito mais democrático.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): O imperativo categórico kantiano da segunda formulação leva exatamente ao reino dos fins, que, V. Exa. sabe, era uma mera utopia kantiana que nunca efetivamente se realizou e nunca irá realizar-se. O próprio Nietzsche disse isso muito claramente, e Schopenhauer também, para exatamente negar esses essencialismos e idealismos kantianos, principalmente na segunda formulação do imperativo categórico.

Nessas linhas, quero acompanhar o Ministro Relator para sustentar a necessi-dade de termos, neste caso, a acusação contida na representação feita pelo Partido dos Trabalhadores de que – diz claramente a expressão, reproduzida pelo Ministro Sepúlveda Pertence –: “O Representado quebrou o decoro parlamentar, porquanto membro titular de mandado legislativo aí, valeu-se daquela atividade junto ao Po-der Executivo, para interferir e fraudar o regular andamento dos trabalhos legisla-tivos”. Aqui se pressupõe que a condição de parlamentar lhe autorizou a afirmação de fraudar o regular andamento dos trabalhos legislativos.

Lembro aos Colegas que mesmo o § 1º do art. 55 da Constituição, que pre-tendeu tipificar o decoro parlamentar, novamente remeteu à maioria parlamentar – na época de dois terços, hoje referida por Paulo Brossard –, mera e simplesmente. V. Exas. podem verificar o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, no Códi-go de ética, não naquela redação referida pelo Ministro Gilmar Mendes e revogada pela superveniência de novas normas regimentais. Já fiz chegar ao Ministro Gilmar Mendes uma nova edição do Regimento.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Não preciso do Regimento Interno para isso. Agora, ele desmente V. Exa.

O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): A perda do mandato poderá dar-se pelo abuso de prerrogativas parlamentares, que é a mesma coisa de dizer que abuso das prerrogativas parlamentares é aquele que for indigno do mandato. E aquele indigno do mandato é aquele que abusou das prerrogativas parlamentares. Ou seja, é aquilo que a maioria entender como tal.

EXTRATO DA ATA

MS 25.579-MC/DF — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Relator para o acórdão: Ministro Joaquim Barbosa. Impetrante: José Dirceu de Oliveira e Silva (Advogados: Roberta Maria Rangel e outros). Impetrados: Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, Conselho de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados e Relator do Conselho de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados.

Decisão: O Tribunal, por maioria, rejeitou a preliminar suscitada pelo Mi-nistro Marco Aurélio de que o pedido de liminar retornasse ao Relator para sua apreciação e, por unanimidade, excluiu do pólo passivo o relator do Conselho de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados. Em seguida, o Tribunal, por

R.T.J. — 2031084

votação majoritária, conheceu da segurança, vencido o Ministro Marco Aurélio. Também por votação majoritária, negou a liminar, vencidos os Ministros Sepúlveda Pertence (Relator), Eros Grau e Nelson Jobim (Presidente). Redigirá o acórdão o Ministro Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Cezar Peluso.

Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes, Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Procura-dor-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.

Brasília, 19 de outubro de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.

R.T.J. — 203 1085

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS 83.799 — CE

Relator: O Sr. Ministro Celso de MelloAgravante: Hoover Ferreira da Costa — Agravado: Ministério Público Federal

Decisão do Relator que julga prejudicado recurso ordinário, fundada na existência de ulterior concessão, por outro órgão ju-diciário, de liberdade provisória ao paciente – Situação de preju-dicialidade configurada – Inovação material do pleito, em sede de “agravo regimental”, motivada por restrições impostas ao paciente na decisão que lhe concedeu liberdade provisória – Inadmissibili-dade de tal inovação perante o STF – Hipótese em que a coação, se existente, emanaria do magistrado de primeira instância – Recurso de agravo improvido.

- A superveniente modificação do quadro processual, resul-tante de inovação do estado de fato ou de direito ocorrida poste-riormente à impetração do habeas corpus, faz instaurar situação configuradora de prejudicialidade (RTJ 141/502), justificando-se, em conseqüência, a extinção anômala do processo.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por votação unânime, conhecer do recurso de agravo, a que, no entanto, também por unanimidade, negam provimento, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Eros Grau.

Brasília, 7 de agosto de 2007 — Celso de Mello, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de recurso de agravo interposto contra decisão que julgou prejudicado o recurso ordinário deduzido pelo Pa-ciente, ora Recorrente, por efeito de superveniente concessão, em seu benefício, da liberdade provisória.

O Ministério Público Federal, em pronunciamento sobre o presente recurso de agravo (fls. 164/167), formulou parecer assim ementado (fl. 164):

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM “HABEAS CORPUS”. RECURSO OR-DINÁRIO JULGADO PREJUDICADO. CONCESSÃO SUPERVENIENTE DE LIBERDA-DE PROVISÓRIA PELO JUÍZO DA ORIGEM. PEDIDO DE NOVA ORDEM DE SOLTURA.

- O prazo para a interposição de agravo regimental, conforme a legislação de regência, é de cinco dias. Apelo intempestivo.

- Falta interesse recursal ao agravante que postula benefício com o qual já foi agra-ciado.

- Parecer pelo não conhecimento e pelo não provimento do agravo regimental.(Grifei.)

R.T.J. — 2031086

Por não me haver convencido das razões expostas pela parte ora agra-vante, submeto, à apreciação desta colenda Segunda Turma, o presente recurso de agravo.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Rejeito a preliminar de intempesti-vidade, eis que o presente recurso ordinário não se revela extemporâneo.

É que, publicada a decisão em 6-4-04, terça-feira (fl. 148), o termo inicial do prazo para a interposição do recurso de agravo – que recairia no dia 7-4-04, quarta-feira – foi prorrogado para o dia 12-4-04, segunda-feira, considerada a intercorrência, nesse período, do feriado da Semana Santa (7-4 a 9-4-04), findan-do-se, referido lapso recursal, em 16-4-04, sexta-feira, data em que interposto o presente “agravo regimental” (fl. 151).

Conheço, desse modo, do presente recurso de agravo. E, ao fazê-lo, nego-lhe provimento, mantendo, em conseqüência, a decisão nele questionada.

Tem plena razão, quanto ao mérito desta postulação recursal, a douta Pro-curadoria-Geral da República, cujo parecer apóia-se em fundamentos que bem respondem à impugnação ora deduzida pela parte recorrente (fls. 166/167).

Na realidade, o ora Agravante buscava, com o recurso ordinário que inter-pôs (fls. 106/117), a concessão de liberdade provisória (fl. 117), o que efetivamen-te veio a obter, em decorrência de decisão emanada do magistrado de primeira instância (fls. 130/131).

Pretende, agora, em clara inovação de seu pleito, seja reformado o ato de-cisório de primeiro grau, para que não subsistam as condições nele estabelecidas e consistentes em (1) não se ausentar da comarca sem autorização judicial, (2) não se embriagar nem se apresentar embriagado publicamente, (3) não portar ar-mas, (4) não freqüentar bares, casas de jogos, boates e congêneres, (5) comunicar ao Juízo processante qualquer mudança de endereço e, finalmente, (6) comparecer a todos os atos processuais, sob pena de o desatendimento de tais requisitos im-plicar a revogação do benefício da liberdade provisória.

Conclui-se, desse modo, que, se injusto constrangimento houver, será ele imputável, não ao E. Superior Tribunal de Justiça, mas, sim, ao próprio ma-gistrado estadual de primeira instância, pois as alegadas restrições ao “status libertatis” do Paciente têm, agora, fundamento em decisão emanada do Juízo de Direito de primeiro grau, o que torna aplicável, ao caso, em face da superve-niente alteração do quadro processual, a jurisprudência desta Suprema Corte (RTJ 193/367-368, v.g.).

Registre-se que as questões somente agora introduzidas nesta sede de “agravo regimental”, considerada a inovação delas resultante, sequer foram ob-jeto de exame, seja pelo E. Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, seja pelo E. Superior Tribunal de Justiça, pois – insista-se – o Paciente, ora Recorrente, apenas

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pretendia a obtenção da liberdade provisória, o que veio efetivamente a ocorrer no curso deste procedimento recursal.

Mostra-se processualmente correto, pois, o ato decisório objeto do presente recurso de agravo, eis que a ocorrência do fato nele referido – a concessão de liber-dade provisória ao Paciente, ora Recorrente – fez instaurar, na espécie, situação de prejudicialidade apta a gerar a extinção do procedimento recursal em causa.

Enfatize-se, por oportuno, que esse entendimento encontra apoio na ju-risprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 132/1185, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI – HC 55.437/ES, Rel. Min. MOREIRA ALVES – HC 58.903/MG, Rel. Min. CUNHA PEIXOTO – HC 64.424/RJ, Rel. Min. NÉRI DA SILVEI-RA – HC 69.236/PR, Rel. Min. PAULO BROSSARD – HC 74.107/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA – HC 74.457/RN, Rel. Min. NÉRI DA SILVEI-RA – HC 80.448/RN, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – HC 84.077/BA, Rel. Min. GILMAR MENDES – RHC 82.345/RJ, Rel. Min. MAURÍCIO COR-RÊA, v.g.), cabendo destacar, dentre outras, a seguinte decisão que esta Corte proferiu a propósito do tema ora em exame:

Superados os motivos de direito ou de fato que configuravam situação de injusto constrangimento à liberdade de locomoção física do paciente, e afastada, em conseqüência, a possibilidade de ofensa ao seu “status libertatis”, reputa-se prejudicado o “habeas corpus” impetrado em seu favor. Precedentes.(RTJ 141/502, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)

Sendo assim, em face das razões expostas, e acolhendo, ainda, no que concerne ao mérito da controvérsia, o parecer da douta Procuradoria-Geral da República, nego provimento ao presente recurso de agravo.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

RHC 83.799-AgR/CE — Relator: Ministro Celso de Mello. Agravante: Hoover Ferreira da Costa (Advogados: Ricardo Rodrigues Figueiredo e outro e João Estenio Campelo Bezerra e outros). Agravado: Ministério Público Federal.

Decisão: A Turma, por votação unânime, conheceu do recurso de agravo, a que, no entanto, também por unanimidade, negou provimento, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Eros Grau.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gil-mar Mendes, Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Mi-nistro Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo da Rocha Campos.

Brasília, 7 de agosto de 2007 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

R.T.J. — 2031088

HABEAS CORPUS 85.198 — MA

Relator: O Sr. Ministro Eros Grau

Paciente: Adauto Viana Guajajara da Silva — Impetrante: Helenita Caiado de Acioli (Subprocuradora-Geral da República) — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Crimes de tráfico de entorpecentes, asso-ciação para o tráfico e porte ilegal de arma praticados por índio. Laudo antropológico. Desnecessidade. Atenuação da pena e regi-me de semiliberdade.

1. Índio condenado pelos crimes de tráfico de entorpecentes, associação para o tráfico e porte ilegal de arma de fogo. É dispen-sável o exame antropológico destinado a aferir o grau de integra-ção do paciente na sociedade se o juiz afirma sua imputabilidade plena com fundamento na avaliação do grau de escolaridade, da fluência na língua portuguesa e do nível de liderança exercida na quadrilha, entre outros elementos de convicção. Precedente.

2. Atenuação da pena (art. 56 do Estatuto do Índio). Preten-são atendida na sentença. Prejudicialidade.

3. Regime de semiliberdade previsto no parágrafo único do art. 56 da Lei 6.001/73. Direito conferido pela simples condição de se tratar de indígena.

Ordem concedida, em parte.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, deferir, em parte, o pedido de habeas corpus, para que o Juiz da Execução observe, quanto possível, o parágrafo único do art. 56 do Estatuto do Índio.

Brasília, 17 de novembro de 2005 — Eros Grau, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Eros Grau: O Paciente, índio guajajara, foi condenado pelo Juiz Federal da 2ª Vara Criminal da Seção Judiciária do Maranhão a 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão por infringir os arts. 12, caput e § 1º, II; e 14, todos da Lei 6.368/76, e o art. 10 da Lei 9.437/97.

2. A Subprocuradora-Geral da República Deborah Macedo Duprat de Brito Pereira, então Procuradora Regional no Estado do Maranhão, impetrou habeas corpus no TRF da 1ª Região, alegando, em síntese, que “a persecução criminal do

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Estado contra membros das comunidades indígenas haveria de se fazer em respeito à pluralidade étnica e cultural da nação brasileira, o que demandaria a necessária intervenção antropológica em todos os atos do processo” (fl. 3), advertindo que, sem observância dessa formalidade, o julgador não teria como chegar à exata com-preensão dos fatos. As normas garantidoras desse direito, segundo a Impetrante, devem ser extraídas dos arts. 215, caput, e § 1º, e 216, I e II, da Constituição do Brasil1, bem como dos arts. 1º, a e b, e 2º da Convenção 169 da OIT sobre povos indígenas e tribais, promulgada pelo Decreto 5.051, de 2004 (fl. 6).

3. Alegou ainda que “[o] artigo 56 da Lei 6.001/732 (Estatuto do Índio) prevê a necessidade do referido exame antropológico para a avaliação do ‘grau de inte-gração do silvícola’, com reflexo, inclusive, na atenuação da pena, na hipótese de condenação” (fl. 10). Sustentou, por fim, que basta o Paciente ser índio para fazer jus à atenuação da pena e ao regime especial de semiliberdade em local próximo da habitação.

4. As razões são reiteradas nesta impetração.

5. A Impetrante deste habeas corpus, Subprocuradora-Geral da República Helenita Caiado, formula pedido alternativo para (i) anular, ab initio, o processo, a fim de que se realize o exame antropológico ou (ii) para atenuar a pena nos termos do parágrafo único do art. 56 da Lei 6.001/73, bem como para garantir seu cumpri-mento no regime semi-aberto em local próximo da habitação do Paciente.

6. O Ministério Público Federal, atuando como custos legis, manifesta-se pela concessão da ordem (fls. 87/93).

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): O parecer da Procuradoria-Geral da República no habeas corpus julgado pelo TRF da 1ª Região reproduz trecho da sentença que revela estar o Paciente incorporado à sociedade:

A autoridade coatora, em suas informações, afastou a tese de nulidade, sob o argu-mento de que o paciente, embora identificado como índio, encontrava-se definitivamente incorporado à comunhão nacional.

1 “Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.

§ 1º O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, to-mados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: (EC 42/03)

I - as formas de expressão;II - os modos de criar, fazer e viver;”

2 Lei 6.001/73:“Art. 56. No caso de condenação do índio por infração penal, a pena deverá ser atenuada e na sua

aplicação o juiz atenderá também ao grau de integração do silvícola.Parágrafo único. As penas de reclusão e de detenção serão cumpridas, se possível, em regime es-

pecial de semi-liberdade, no local de funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximos da habitação do condenado.”

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Informou a autoridade coatora que:“Além de contar com certo grau de escolaridade e fluência em língua portuguesa,

a prova da instrução apontava como alguém que se mantinha à frente da quadrilha pela imposição de clima de terror aos demais membros e à própria aldeia onde morava, tanto que há indícios de que trabalhadores tenham sido ali mantidos em regime de escravidão para trabalhar no preparo da droga. Digno de nota, a esse respeito, é o relato da teste-munha José Ribamar Araújo, segundo a qual um garoto teria sido preso nesta cidade de São Luiz, portando 2 Kg (dois quilos) de maconha e, ao ser ouvido pela autoridade policial estadual, afirmou ter sido mantido em regime de escravidão em uma área des-tinada ao cultivo de maconha pertencente ao paciente.

Igualmente relevante o fato de que as investigações realizadas o apontavam como alguém que participava de todas as reuniões realizadas pelos traficantes na caso do chefe do bando, seu pai e utilizava para seus deslocamentos na aldeia de uma moto roubada.”Ora, não há como se considerar sem cultura uma pessoa capaz de praticar tais atos cri-

minosos, os quais, exigem sim, muita perspicácia por parte dos membros da quadrilha à qual integra o paciente.

Convém ressaltar que a atuação da quadrilha era estruturada para o cultivo e comerciali-zação de substância entorpecente, sendo assim, a atuação do paciente e de seus comparsas não pode ser considerada como mera atividade característica de uma tradição grupal. Ao contrário, as ações do paciente e de seu bando revelam-se cruéis e ameaçadoras dos valores próprios da cultura indígena.

2. Esta Corte, ao julgar o HC 79.530, Relator o Ministro Ilmar Galvão, DJ de 25-2-00, decidiu pela “[s]ujeição do índio às normas do art. 26 e parágrafo único do CP, que regulam a responsabilidade penal, em geral, inexistindo razão para exames psicológico ou antropológico, se presentes, nos autos, elementos suficientes para afastar qualquer dúvida sobre sua imputabilidade”.

3. é o que ocorre no caso. Não são necessárias, aqui, avaliações psicológicas ou antropológicas. O grau de escolaridade, a fluência na língua portuguesa, o nível de liderança exercida na quadrilha, entre outros, formaram a convicção judicial de que o Paciente era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito dos fatos ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. São, sem dúvida, circunstân-cias que o colocam na condição de plenamente imputável. Daí ser dispensável o laudo pericial para comprovação de seu nível de integração na sociedade.

4. Observei que o Paciente foi condenado ao total de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, quando o somatório das penas mínimas cominadas para os crimes descritos nos arts. 12 e 14 da Lei 6.368/76 (três anos para cada um) e art. 10 da Lei 9.437/97 (um ano), perfaz o total de 7 (sete) anos. Essa diferença para menor entre a pena aplicada e a pena cominada levou-me a supor que a regra do parágrafo único do art. 56 da Lei 6.001/73 (Estatuto do Índio) teria sido aplicada. Por isso requisitei cópia da sentença ao Juiz Federal da 2ª Vara Criminal do Ma-ranhão. Leio na parte dispositiva:

Tendo em conta o art. 56 do Estatuto do Índio (Lei n. 6001/73), diminuo as penas im-postas em 1/3 (um terço), deixando as privativas de liberdade definitivas em 06 (seis) anos de reclusão e 08 (oito) meses de detenção, respectivamente, e a de multa em 207 (duzentos e sete) dias-multa (...)

5. Constando a aplicação dessa regra do Estatuto do Índio como uma das causas de pedir do habeas corpus impetrado pelo Ministério Público Federal, bem como da manifestação da Procuradoria-Geral da República, como custos legis, pelo

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seu acolhimento, dei nova vista ao Parquet, vindo este a ratificar o parecer que sustenta a necessidade do laudo pericial e a propor a prejudicialidade no que tange ao parágrafo único do art. 56 da Lei 6.001/73.

6. O parágrafo único do art. 56 da Lei 6.001/73 dispõe que “[a]s penas de reclusão e de detenção serão cumpridas, se possível, em regime especial de semi-liberdade, no local de funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximos da habitação do condenado”.

Concedo para determinar que o Juiz da Execução cumpra, dentro do possível, o comando legal.

EXTRATO DA ATA

HC 85.198/MA — Relator: Ministro Eros Grau. Paciente: Adauto Viana Guajajara da Silva. Impetrante: Helenita Caiado de Acioli (Subprocuradora-Geral da República). Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma deferiu, em parte, o pedido de habeas corpus, para que o Juiz da Execução observe, quanto possível, o parágrafo único do art. 56 do Estatuto do Índio. Unânime.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra. Delza Curvello Rocha.

Brasília, 17 de novembro de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

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HABEAS CORPUS 85.661 — DF

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio

Paciente: Carlos Alexandre Vasconcelos Guerra — Impetrantes: Délio Lins e Silva e outros — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Crime fiscal – Contribuição social – Ausência de recolhi-mento – Refis – Art. 9º da Lei 10.684/03 – Aplicação no tempo. O art. 9º da Lei 10.684/03, a versar sobre a suspensão da pretensão punitiva do Estado no caso de adesão ao Refis, aplica-se aos pro-cessos criminais pendentes, ou seja, ainda que já se tenha decisão condenatória, desde que não coberta pela preclusão na via recursal.

Suspensão da pretensão punitiva – Regência. A regência da suspensão da pretensão punitiva faz-se sob o ângulo do princípio da unidade, do conglobamento, descabendo aplicar a cabeça do art. 9º da Lei 10.684/03 sem a observação do que previsto, no § 1º nele contido, a respeito da prescrição.

Suspensão da pretensão punitiva – Contribuições previden-ciárias descontadas e não recolhidas – Art. 9º da Lei 10.684/03. O veto ao § 2º do art. 5º da Lei 10.684/03 é desinfluente, para efeito da suspensão da pretensão punitiva, quando o contribuinte haja logrado, quer em período anterior à citada lei, quer no posterior, a adesão ao Refis.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade, conceder a ordem, de ofício, para declarar a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva, e, em conseqüência, julgar prejudicado o habeas corpus. Não participaram, justificadamente, do julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski e a Ministra Cármen Lúcia, por não pertencerem à Turma na época do início do julgamento. Ausentes, justificadamente, os Ministros Cezar Peluzo e Eros Grau.

Brasília, 3 de agosto de 2007 — Marco Aurélio, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Ao proceder ao exame do pedido de conces-são de medida acauteladora e acolhê-lo, assim sintetizei a situação retratada neste processo:

Pleiteia-se, a título de medida acauteladora, a suspensão de execução da pena, consubs-tanciada na restrição da liberdade pelo período de três anos, em regime aberto, vindo a ser subs-tituída pela de multa e de prestação de serviços à comunidade. O Superior Tribunal de Justiça teria vislumbrado óbice à concessão da ordem a partir do disposto no art. 9º da Lei 10.684, de 30 de maio de 2003:

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Art. 9º é suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei nº 848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.

§ 1º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.

§ 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.Proclamou aquela Corte, mediante o acórdão que se encontra a fls. 145 a 151:

Criminal. HC. Omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias. Lei 10.684/03. Parcelamento. Suspensão da punibilidade. Inexistência de previsão legal. Impossibilidade. Ordem delegada.

I - Da análise da Lei 10.684/2003, incluindo as razões do veto do art. 5º, § 2º, e do art. 7º da Lei 10.666/2003, verifica-se não ser cabível a suspensão da punibilidade prevista no art. 9º, caput, da Lei 10.684/2003 ao regime de parcelamento de contribui-ções previdenciárias. Precedentes.

II - Ordem denegada.Na inicial, articula-se com os seguintes fatos: a) em abril de 2000, o Paciente logrou o

parcelamento do débito previdenciário; b) a Lei 10.684/03 mostrou-se mais benéfica, atraindo a incidência do art. 2º do Código Penal, especialmente o que contido no parágrafo único do citado preceito; c) o trânsito em julgado do decreto condenatório ocorreu em 9 de agosto de 2004; d) o veto ao disposto no § 2º do art. 5º da Lei 10.666/03 não alcança a situação em análise, no que são excluídos do parcelamento os débitos decorrentes de contribuições dos segurados e não recolhi-das pelo empregador; e) a sentença foi proferida em 17 de maio de 2001, ou seja, antes do veto.

Afirma-se o direito à suspensão da pretensão punitiva, de modo a declarar-se insubsis-tentes o acórdão e a sentença proferidos na ação penal, tendo em conta o fato de se haver obtido parcelamento em data anterior à Lei 10.684/03 e ao veto verificado, sob o ângulo do parcelamen-to, relativamente à Lei 10.666/03. Requer-se a concessão de medida acauteladora que suspenda a execução da pena imposta até o julgamento final deste habeas, concluindo-se, alfim, pela insub-sistência de sentença e acórdão prolatados na Ação Penal 1999.34.00.000081-8/DF, da 12ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, e pela suspensão da pretensão punitiva a partir de 25 de abril de 2000, para se aguardar o desenrolar do refinanciamento, vindo-se, com a quita-ção do débito, a extinguir a punibilidade. À inicial juntaram-se os documentos de fls. 13 a 153.

A Procuradoria-Geral da República propugnou o sobrestamento deste ha-beas, consignando que a ADI 3.002-7/DF envolve a inconstitucionalidade do art. 9º da Lei 10.864/03.

À fl. 206, abri vista aos Impetrantes, para dizerem sobre o que preconizado acerca do sobrestamento, com o qual alfim concordaram (fl. 213). Daí a decisão de fl. 215.

O juiz federal substituto da 12ª Vara – Seção Judiciária do Distrito Federal, Dr. Ronaldo Desterro, encaminhou à Corte ofício do Ministério da Previdência Social, retratando a situação da empresa CPA Indústria e Comércio de Alimentos Ltda., da qual o Paciente é sócio-proprietário e administrador.

Os Impetrantes voltaram a peticionar, em 3 de agosto de 2005, consignando que, em aditamento à petição inicial, requereram fosse concedida a ordem para, à luz do disposto no art. 9º da Lei 10.684/03, viesse a ser afastado o que previsto no § 1º do citado artigo, ou seja, a suspensão do curso da prescrição, por se tratar de norma de direito material. Considerado precedente da lavra do Ministro Eros Grau – HC 85.452-4/SP –, pronunciaram-se pela seqüência do habeas, para vir-se a conceder a ordem, observando-se tão-somente a cabeça do art. 9º citado.

R.T.J. — 2031094

À fl. 234, prolatei decisão, afastando o sobrestamento e consignando a exis-tência, no processo, de manifestação do Ministério Público quanto ao mérito. O órgão reiterou os fundamentos da ação direta de inconstitucionalidade referida.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Afastei o sobrestamento deste ha-beas considerando a manifestação dos Impetrantes e a vigência da Lei 10.864/03, mais precisamente do art. 9º nela contido, muito embora haja impugnação me-diante processo objetivo – no caso, a ADI 3.002-7/DF. Situação diversa ocorreria se suspensa a eficácia do texto atacado.

Cabe uma breve panorâmica da evolução do trato da matéria, tendo em vista os tributos, cuja satisfação é o alvo dos vários diplomas, especialmente os editados nos últimos dez anos. Nota-se opção político-legislativa no sentido de, tanto quanto possível, alcançar-se a liquidação da dívida ativa da Fazenda. A Lei 4.729/65, no art. 2º, previu a extinção da punibilidade dos crimes de sonegação fiscal nela versa-dos quando o contribuinte promovesse o recolhimento do tributo antes do início do processo administrativo-fiscal, da ação fiscalizadora. Essa lei sofreu modificação em 1967. O Decreto-Lei 157/67, no art. 18, cabeça, dispôs sobre a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo mesmo depois de iniciada a ação fiscal. O § 2º desse artigo implicou ampliação da extinção da punibilidade para outros crimes, além dos inicialmente referidos na Lei 4.729/65.

A Lei 8.137/90 disciplinou a extinção da punibilidade relativamente aos crimes mencionados nos arts. 1º a 3º, quando o contribuinte promovesse o paga-mento do tributo ou contribuição social antes do recebimento da denúncia – art. 14.

Com a Lei 8.383/91 – art. 98 –, revogou-se o art. 2º da Lei 4.729/65 e o art. 14 da Lei 8.137/90, afastando-se o trato da matéria favorável ao contribuinte.

Em 1995, veio à balha a Lei 9.249, prevendo, no art. 34, o que se tinha no art. 14 da Lei 8.137/90, revogado, ou seja, a extinção da punibilidade dos crimes previstos na Lei 8.137/90 pelo pagamento do tributo ou contribuição antes do recebimento da denúncia. Deu-se a aplicação retroativa para beneficiar réus que haviam cometido crimes entre o período da Lei 8.383/91 até a vinda desse diploma. Na Medida Provisória 1.571, nas versões 6ª e 7ª, previu-se que, no caso de apro-priação de contribuições descontadas dos empregados, ter-se-ia o parcelamento do débito em até 18 meses, ficando afastada a incidência da alínea d do art. 95 da Lei 8.212/91, enquanto verificada a adimplência. Na 8ª versão, expungiu-se essa disci-plina. O diploma que resultou dessa medida provisória – Lei 9.639/98 – implicou a convalidação dos atos decorrentes de todas as versões.

A Lei 9.964/00, criadora do Programa de Recuperação Fiscal (REFIS), no art. 15, cabeça, veio a reger suspensão da pretensão punitiva do Estado, enquanto a pessoa jurídica estivesse incluída no programa, desde que o fenômeno houvesse ocorrido antes do recebimento da denúncia. Estabeleceu-se, mais, a suspensão, durante o período de adesão ao Refis, da prescrição punitiva – § 1º – bem como a extinção da punibilidade com o efetivo pagamento do valor devido – § 3º.

R.T.J. — 203 1095

A Lei 9.983/00 resultou na derrogação da Lei 8.212/91, deixando com isso de figurar no ordenamento jurídico o art. 95, que versava sobre modalidades de sonegação fiscal, presente o tributo “contribuição previdenciária”. A disciplina do tema passou a figurar no Código Penal – arts. 168-A e 337-A. No tocante ao crime de apropriação indébita de contribuição previdenciária, a nova regência vinculou a extinção da punibilidade à satisfação do tributo antes da ação fiscal – art. 168-A, § 2º –, sendo que, se efetuado o pagamento até o oferecimento da denúncia, ao juiz cabe deixar de aplicar a pena ou fazê-lo tão-somente quanto à de multa – § 3º, inciso I, do mesmo artigo.

Sob o ângulo do art. 337-A, acerca de condutas específicas alusivas à sonega-ção de contribuição previdenciária, previu-se a extinção da punibilidade se o con-tribuinte espontaneamente declarar e confessar as contribuições, importâncias ou valores e prestar informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal – § 1º –, facultando o § 2º, ao juiz, deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa, se o agente for primário e de bons antecedentes.

Este se mostrou o quadro normativo apanhado pela Lei 10.684/03. O novo diploma veio a viabilizar o parcelamento de débitos perante a Secretaria da Re-ceita Federal e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Dispôs o art. 9º:

Art. 9º é suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.

§ 1º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.

§ 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa ju-rídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.

O arcabouço normativo abrange os crimes, conforme referência expressa, que dizem respeito ao não-recolhimento de contribuições descontadas de empre-gados.

Quanto à problemática alusiva ao parcelamento, em si, no caso deste proces-so, há elemento que em muito a mitiga. é que o parcelamento ocorreu em data ante-rior ao veto ao § 2º do art. 5º da Lei 10.684/03. Confira-se com a peça de fl. 29. De qualquer maneira, conforme decidido por esta Turma no HC 85.452-4/SP, relatado pelo Ministro Eros Grau em 17 de maio último, cuja ementa será transcrita adiante, o fenômeno do parcelamento é uma realidade e, antes de fulminado via o proce-dimento próprio, surte as conseqüências mencionadas no art. 9º da Lei 10.684/03.

Relativamente à aplicação no tempo dessa lei, conta-se, a norteá-la, com regras dos Códigos Penal e de Processo Penal:

Art. 2º A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior. (Código de Processo Penal.)

Art. 2º Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.

R.T.J. — 2031096

Parágrafo único. A lei posterior que, de qualquer modo, favorecer o agente aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. (Código Penal.)

A interpretação sistemática e teleológica dos dispositivos é conducente, como já decidiu esta Turma, a ter-se a incidência do novo diploma legal, como deflui dos seguintes precedentes:

Ação penal – Adesão ao Programa de Recuperação Fiscal (REFIS) – Lei 9.964/00 – Art. 15 – Denúncia já recebida – Suspensão da pretensão punitiva – Viabilidade. A interpretação do art. 15 da Lei 9.964/00 há de se fazer à luz da garantia constitucional da retroação da norma mais benéfica ao réu, afastando-se a cláusula final do artigo, no que impõe, como condição, o fato de se ter aderido ao Refis em data anterior ao recebimento da denúncia, quando esta o foi antes da vigência da nova norma legal. A condição impossível é tida como não escrita.(RE 409.730-3/PR, por mim relatado, acórdão publicado no Diário da Jus-tiça de 29 de abril de 2005.)

Ação penal. Crime tributário. Tributo. Pagamento após o recebimento da denúncia. Extinção da punibilidade. Decretação. Habeas corpus concedido de ofício para tal efeito. Apli-cação retroativa do art. 9º da Lei federal 10.684/03, c/c o art. 5º, XL, da CF e o art. 61 do CPP. O pagamento do tributo, a qualquer tempo, ainda que após o recebimento da denúncia, extingue a punibilidade do crime tributário.(HC 81.929-0/RJ, Relator para o acórdão o Ministro Cezar Peluso, acórdão publicado no Diário da Justiça de 27 de fevereiro de 2004.)

(...)As regras referentes ao parcelamento são dirigidas à autoridade tributária. Se esta

defere a faculdade de parcelar e quitar as contribuições descontadas dos empregados, e não repassadas ao INSS, e o paciente cumpre a respectiva obrigação, deve ser beneficiado pelo que dispõe o art. 9º, § 2º, da citada Lei 10.684/03. Esse preceito, que não faz distinção entre as contribuições previdenciárias descontadas dos empregados e as patronais, limita-se a autorizar a extinção da punibilidade referente aos crimes ali relacionados. Nada importa se o parcela-mento foi deferido antes ou depois da vigência das leis que o proíbem: se de qualquer forma ocorreu, deve incidir o mencionado art. 9º.(HC 85.452-4/SP, relatado pelo Ministro Eros Grau, acórdão publicado no Diário da Justiça de 3 de junho de 2005.)

(...)II - Lei penal: retroatividade in melius: inteligência.Lei superveniente, que atribuiu efeito extintivo da punibilidade de determinados crimes

ao pagamento de tributos, desde que anterior ao recebimento da denúncia; inaplicabilidade ao pagamento só efetivado posteriormente ao recebimento da denúncia e, no caso, ao próprio trânsito em julgado da condenação.

A retroatividade da lei penal mais favorável consiste basicamente em imputar as con-seqüências jurídicas benéficas aos fatos nela previstos, embora ocorridos anteriormente à sua vigência, sem, contudo, poder fazer retroceder o próprio curso do tempo.

A lei invocada, malgrado posterior ao recebimento da denúncia, é certo que poderia aplicar-se ao pagamento de tributos efetivado antes da instauração do processo, para atribuir-lhe o efeito extintivo da punibilidade, que não tinha, ao tempo em que sucedeu.

Nisso, porém, se esgota a sua retroatividade: condicionado o efeito extintivo à satisfação do crédito tributário antes do recebimento da denúncia, uma vez recebida esta, a lei posterior, malgrado retroativa, não tem mais como incidir, à falta de correspondência entre a anterior situa-ção do fato e a hipótese normativa a que subordinada a sua aplicação.(HC 70.641-0/SP, relatado pelo Ministro Sepúlveda Pertence, acórdão pu-blicado no Diário da Justiça de 26 de agosto de 1994.)

R.T.J. — 203 1097

A conclusão quanto à incidência do art. 9º da Lei 10.684/03 leva à necessária solução da controvérsia sobre a incidência do preceito, afastada a possibilidade de se deixar em segundo plano o § 1º nele contido, ou seja, a previsão de que, durante o período de suspensão da pretensão punitiva, não flui o curso do prazo prescri-cional.

O ordenamento jurídico pátrio consagra o princípio apontado por Deveali como da unidade, do conglobamento. Vale dizer: tem-se regência global fechada, não cabendo, seja qual for o prisma, pinçar do trato conjunto da matéria apenas os preceitos que se mostrem mais favoráveis ao acusado, sob pena de se criar sistema diverso. A isso se soma a ordem natural das coisas, a circunstância de a prescrição estar ligada à existência de ação passível, sob o ângulo do interesse, de ser propos-ta. Sem o nascimento da ação, não se pode cogitar de conseqüência relacionada à inércia do titular, como é a prescrição. Daí não ser acolhível a defesa apresentada no sentido de se ter a proclamação da incidência do art. 9º da Lei 10.684/03, ante a adesão ao Refis, afastando-se a pretensão punitiva do Estado e, ao mesmo tempo, assentar-se o curso da prescrição. Aliás, se pudesse haver conclusão diversa, ter-se-ia, ante a extensão do parcelamento – geralmente a alcançar período dilatado pela multiplicação da unidade de tempo “ano” –, sempre a prescrição.

Afaste-se a possibilidade de se adotar interpretação da ordem normativa que encerre verdadeiro contra-senso, verdadeiro paradoxo e este está em, a um só tempo, admitir-se inexistente a pretensão punitiva do Estado e dizer-se que contra ele corre o prazo prescricional, no que lhe incumbe o ajuizamento da ação penal.

Concedo parcialmente a ordem para fulminar o acórdão da Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que confirmou a condenação do Pa-ciente no julgamento da Apelação Criminal 1999.34.00.000081-8, suspendendo a pretensão punitiva, o curso da prescrição, ficando sobrestado o processo movi-do contra o Paciente.

EXTRATO DA ATA

HC 85.661/DF — Relator: Ministro Marco Aurélio. Paciente: Carlos Ale-xandre Vasconcelos Guerra. Impetrantes: Délio Lins e Silva e outros. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: Após os votos dos Ministros Marco Aurélio, Relator, Cezar Peluso e Eros Grau, deferindo, em parte, o pedido de habeas corpus, pediu vista dos autos o Ministro Sepúlveda Pertence. Ausente, justificadamente, o Ministro Carlos Britto. Primeira Turma, 25-10-05.

Decisão: Renovado o pedido de vista do Ministro Sepúlveda Pertence, de acordo com o art. 1º, § 1º, in fine, da Resolução 278/03. Primeira Turma, 6-12-05.

Decisão: Adiado o julgamento por indicação do Ministro Sepúlveda Pertence.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 7 de fevereiro de 2006 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031098

VOTO(Vista)

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Trata-se de habeas corpus – substituti-vo de recurso ordinário –, contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça, assim ementado (fls. 146/149):

Criminal. HC. Omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias. Lei 10.684/03. Parcelamento. Suspensão da punibilidade. Inexistência de previsão legal. Impos-sibilidade. Ordem denegada.

Da análise da Lei 10.684/2003, incluindo as razões do veto do art. 5º, § 2º, e do art. 7º da Lei 10.666/2003, verifica-se não ser cabível a suspensão da punibilidade prevista no art. 9º, caput, da Lei 10.684/2003 ao regime de parcelamento de contribuições previdenciárias. Prece-dentes.

Ordem denegada.

O em. Ministro Marco Aurélio, Relator, assim resumiu as teses inicialmen-te suscitadas pelo Impetrante, verbis:

Na inicial, articula-se com os seguintes fatos: a) em abril de 2000, o Paciente logrou o parcelamento do débito previdenciário; b) a Lei 10.684/03 mostrou-se mais benéfica, atraindo a incidência do art. 2º do Código Penal, especialmente o que contido no parágrafo único do citado preceito; c) o trânsito em julgado do decreto condenatório ocorreu em 9 de agosto de 2004; d) o veto ao disposto no § 2º do art. 5º da Lei 10.666/03 não alcança a situação em análise, no que são excluídos do parcelamento os débitos decorrentes de contribuições dos segurados e não recolhi-dos pelo empregador; e) a sentença foi proferida em 17 de maio de 2001, ou seja, antes do veto.

Afirma-se o direito à suspensão da pretensão punitiva, de modo a declarar-se insubsis-tentes o acórdão e a sentença proferidas na ação penal, tendo em conta o fato de se haver obtido parcelamento em data anterior à Lei 10.684/03 e ao veto verificado, sob o ângulo do parcelamen-to, relativamente à Lei 10.666/03. Requer-se a concessão de medida acauteladora que suspenda a execução da pena imposta até o julgamento final deste habeas, concluindo-se, alfim, pela insubstência de sentença e acórdão prolatados na Ação Penal 1999.34.00.000081-8/DF, da 12ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, e pela suspensão da pretensão punitiva a partir de 25 de abril de 2000, para se aguardar o desenrolar do refinanciamento, vindo-se, com a quitação do débito, a extinguir a punibilidade. (...)

Posteriormente foi aditada a inicial, para requerer a concessão da ordem tão-somente à vista do caput do art. 9º da Lei 10.684/03: alegou-se que o § 1º daquele dispositivo – que determina a suspensão do curso da prescrição enquanto a pessoa jurídica estiver incluída no regime de parcelamento – contém norma de direito material, que não poderia, portanto, retroagir.

Afastado o sobrestamento anteriormente determinado considerando-se a pen-dência de julgamento da ADI 3.002 – na qual se discute a constitucionalidade do art. 9º da Lei 10.864/03 –, foi o feito incluído em Mesa para julgamento.

O em. Ministro Marco Aurélio votou pela concessão parcial da ordem, verbis:

Cabe uma breve panorâmica da evolução do trato da matéria, tendo em vista os tributos, cuja satisfação é o alvo dos vários diplomas, especialmente os editados nos últimos dez anos. Nota-se opção político-legislativa no sentido de, tanto quanto possível, alcançar-se a liquidação da dívida ativa da Fazenda. A Lei 4.729/65, no art. 2º, previu a extinção da punibilidade dos crimes de sonegação fiscal nela versados quando o contribuinte promovesse o recolhimento do tributo antes do início do processo administrativo-fiscal, da ação fiscalizadora. Essa lei sofreu

R.T.J. — 203 1099

modificação em 1967. O Decreto-Lei 157/67, no art. 18, cabeça, dispôs sobre a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo mesmo depois de iniciada a ação fiscal. O § 2º desse artigo implicou ampliação da extinção da punibilidade para outros crimes, além dos inicialmente referidos na Lei 4.729/65.

A Lei 8.137/90 disciplinou a extinção da punibilidade relativamente aos crimes mencio-nados nos arts. 1º a 3º, quando o contribuinte promovesse o pagamento do tributo ou contribui-ção social antes do recebimento da denúncia – art. 14.

Com a Lei 8.383/91 – art. 98 –, revogou-se o art. 2º da Lei 4.729/65 e o art. 14 da Lei 8.137/90, afastando-se o trato da matéria favorável ao contribuinte.

Em 1995, veio à balha a Lei 9.249, prevendo, no art. 34, o que se tinha no art. 14 da Lei 8.137/90, revogado, ou seja, a extinção da punibilidade dos crimes previstos na Lei 8.137/90 pelo pagamento do tributo ou contribuição antes do recebimento da denúncia. Deu-se a aplica-ção retroativa para beneficiar réus que haviam cometido crimes entre o período da Lei 8.383/91 até a vinda desse diploma. Na Medida Provisória 1.571, nas versões 6ª e 7ª, previu-se que, no caso de apropriação de contribuições descontadas dos empregados, ter-se-ia o parcelamento do débito em até 18 meses, ficando afastada a incidência da alínea d do art. 95 da Lei 8.212/91, enquanto verificada a adimplência. Na 8ª versão, expungiu-se essa disciplina. O diploma que resultou dessa medida provisória – Lei 9.639/98 – implicou a convalidação dos atos decorrentes de todas as versões.

A Lei 9.964/00, criadora do Programa de Recuperação Fiscal (REFIS), no art. 15, cabeça, veio a reger suspensão da pretensão punitiva do Estado, enquanto a pessoa jurídica estivesse incluída no programa, desde que o fenômeno houvesse ocorrido antes do recebimento da de-núncia. Estabeleceu-se, mais, a suspensão, durante o período de adesão ao Refis, da prescrição punitiva – § 1º – bem como a extinção da punibilidade com o efetivo pagamento do valor devido – § 3º.

A Lei 9.983/00 resultou na derrogação da Lei 8.212/91, deixando com isso de figurar no ordenamento jurídico o art. 95, que versava sobre modalidades de sonegação fiscal, presen-te o tributo “contribuição previdenciária”. A disciplina do tema passou a figurar no Código Penal – arts. 168-A e 337-A. No tocante ao crime de apropriação indébita de contribuição previdenciária, a nova regência vinculou a extinção da punibilidade à satisfação do tributo antes da ação fiscal – art. 168-A, § 2º –, sendo que, se efetuado o pagamento até o oferecimento da denúncia, ao juiz cabe deixar de aplicar a pena ou fazê-lo tão-somente quanto à de multa – § 3º, inciso I, do mesmo artigo.

Sob o ângulo do art. 337-A, acerca de condutas específicas alusivas à sonegação de contribuição previdenciária, previu-se a extinção da punibilidade se o contribuinte esponta-neamente declarar e confessar as contribuições, importâncias ou valores e prestar informações devidas à Previdência Social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal – § 1º –, facultando o § 2º, ao juiz, deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa, se o agente for primário e de bons antecedentes.

Este se mostrou o quadro normativo apanhado pela Lei 10.684/03. O novo diploma veio a viabilizar o parcelamento de débitos perante a Secretaria da Receita Federal e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Dispôs o art. 9º:

Art. 9º é suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.

§ 1º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.

§ 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.O arcabouço normativo abrange os crimes, conforme referência expressa, que dizem

respeito ao não-recolhimento de contribuições descontadas de empregados. Quanto à problemática alusiva ao parcelamento, em si, no caso deste processo, há ele-

mento que em muito a mitiga. é que o parcelamento ocorreu em data anterior ao veto ao § 2º do art. 5º da Lei 10.684/03. Confira-se com a peça de fl. 29. De qualquer maneira, conforme

R.T.J. — 2031100

decidido por esta Turma no HC 85.452-4/SP, relatado pelo Ministro Eros Grau em 17 de maio último, cuja ementa será transcrita adiante, o fenômeno do parcelamento é uma realidade e, antes de fulminado via o procedimento próprio, surte as conseqüências mencionadas no art. 9º da Lei 10.684/03.

Relativamente à aplicação no tempo dessa lei, conta-se, a norteá-la, com regras dos Códigos Penal e de Processo Penal:

Art. 2º A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior. (Código de Processo Penal.)

Art. 2º Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condena-tória.

Parágrafo único. A lei posterior que, de qualquer modo, favorecer o agente aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. (Código Penal.)A interpretação sistemática e teleológica dos dispositivos é conducente, como já decidiu

esta Turma, a ter-se a incidência do novo diploma legal, como deflui dos seguintes precedentes:Ação penal – Adesão ao programa de recuperação fiscal – Refis – Lei 9.964/

00 – Art. 15 – Denúncia já recebida – Suspensão da pretensão punitiva – Viabilidade. A interpretação do art. 15 da Lei 9.964/00 há de se fazer à luz da garantia constitucional da retroação da norma mais benéfica ao réu, afastando-se a cláusula final do artigo, no que impõe, como condição, o fato de se ter aderido ao Refis em data anterior ao recebi-mento da denúncia, quando esta o foi antes da vigência da nova norma legal. A condição impossível é tida como não escrita.(RE 409.730-3/PR, por mim relatado, acórdão publicado no Diário da Justiça de 29 de abril de 2005.)

Ação penal. Crime tributário. Tributo. Pagamento após o recebimento da denún-cia. Extinção da punibilidade. Decretação. Habeas corpus concedido de ofício para tal efeito. Aplicação retroativa do art. 9º da Lei federal 10.684/03, c/c o art. 5º, XL, da CF e o art. 61 do CPP. O pagamento do tributo, a qualquer tempo, ainda que após o recebimento da denúncia, extingue a punibilidade do crime tributário.(HC 81.929-0/RJ, Relator para o acórdão o Ministro Cezar Peluso, acórdão publicado no Diário da Justiça de 27 de fevereiro de 2004.)

(...)As regras referentes ao parcelamento são dirigidas à autoridade tributária. Se esta

defere a faculdade de parcelar e quitar as contribuições descontadas dos empregados, e não repassadas ao INSS, e o paciente cumpre a respectiva obrigação, deve ser beneficia-do pelo que dispõe o art. 9º, § 2º, da citada Lei 10.684/03. Esse preceito, que não faz dis-tinção entre as contribuições previdenciárias descontadas dos empregados e as patronais, limita-se a autorizar a extinção da punibilidade referente aos crimes ali relacionados. Nada importa se o parcelamento foi deferido antes ou depois da vigência das leis que o proíbem: se de qualquer forma ocorreu, deve incidir o mencionado art. 9º.(HC 85.452-4/SP, relatado pelo Ministro Eros Grau, acórdão publicado no Diário da Justiça de 3 de junho de 2005.)

(...)II - Lei penal: retroatividade in melius: inteligência.Lei superveniente, que atribuiu efeito extintivo da punibilidade de determinados

crimes ao pagamento de tributos, desde que anterior ao recebimento da denúncia; ina-plicabilidade ao pagamento só efetivado posteriormente ao recebimento da denúncia e, no caso, ao próprio trânsito em julgado da condenação.

A retroatividade da lei penal mais favorável consiste basicamente em imputar as conseqüências jurídicas benéficas aos fatos nela previstos, embora ocorridos anterior-mente à sua vigência, sem, contudo, poder fazer retroceder o próprio curso do tempo.

A lei invocada, malgrado posterior ao recebimento da denúncia, é certo que pode-ria aplicar-se ao pagamento de tributos efetivado antes da instauração do processo, para atribuir-lhe o efeito extintivo da punibilidade, que não tinha, ao tempo em que sucedeu.

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Nisso, porém, se esgota a sua retroatividade: condicionado o efeito extintivo à sa-tisfação do crédito tributário antes do recebimento da denúncia, uma vez recebida esta, a lei posterior, malgrado retroativa, não tem mais como incidir, à falta de correspondência entre a anterior situação do fato e a hipótese normativa a que subordinada a sua aplicação.(HC 70.641-0/SP, relatado pelo Ministro Sepúlveda Pertence, acórdão publicado no Diário da Justiça de 26 de agosto de 1994.)A conclusão quanto à incidência do art. 9º da Lei 10.684/03 leva à necessária solução da

controvérsia sobre a incidência do preceito, afastada a possibilidade de se deixar em segundo plano o § 1º nele contido, ou seja, a previsão de que, durante o período de suspensão da pretensão punitiva, não flui o curso do prazo prescricional.

O ordenamento jurídico pátrio consagra o princípio apontado por Deveali como da unida-de, do conglobamento. Vale dizer: tem-se regência global fechada, não cabendo, seja qual for o prisma, pinçar do trato conjunto da matéria apenas os preceitos que se mostrem mais favoráveis ao acusado, sob pena de se criar sistema diverso. A isso se soma a ordem natural das coisas, a cir-cunstância de a prescrição estar ligada à existência de ação passível, sob o ângulo do interesse, de ser proposta. Sem o nascimento da ação, não se pode cogitar de conseqüência relacionada à inércia do titular, como é a prescrição. Daí não ser acolhível a defesa apresentada no sentido de se ter a proclamação da incidência do art. 9º da Lei 10.684/03, ante a adesão ao Refis, afastando-se a pretensão punitiva do Estado e, ao mesmo tempo, assentar-se o curso da prescrição. Aliás, se pudesse haver conclusão diversa, ter-se-ia, ante a extensão do parcelamento – geralmente a alcançar período dilatado pela multiplicação da unidade de tempo “ano” –, sempre a prescrição.

Afaste-se a possibilidade de se adotar interpretação da ordem normativa que encerre ver-dadeiro contra-senso, verdadeiro paradoxo e este está em, a um só tempo, admitir-se inexistente a pretensão punitiva do Estado e dizer-se que contra ele corre o prazo prescricional, no que lhe incumbe o ajuizamento da ação penal.

Concedo parcialmente a ordem para fulminar o acórdão da Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que confirmou a condenação do Paciente no julgamento da Apelação Criminal 1999.34.00.000081-8, suspendendo a pretensão punitiva, o curso da pres-crição, ficando sobrestado o processo movido contra o Paciente.

O Ministro Marco Aurélio foi acompanhado pelos eminentes Ministros Cezar Peluso e Eros Grau.

Pedi vista para melhor exame da questão.

II

Quando da análise dos autos, verifiquei uma nulidade sequer aventada pelos Impetrantes.

O Paciente foi condenado à pena de 2 anos de reclusão – acrescida de metade pela continuidade delitiva (fls. 73/74) –, por fatos ocorridos entre outubro de 1991 e abril de 1997 (fls. 61/75).

Somente a Defesa apelou (fls. 76/80), hipótese em que a prescrição se regula pela pena aplicada (Código Penal, art. 110, § 1º).

Operou-se, portanto, a prescrição retroativa – Código Penal, arts. 10; 109, V; e 110, § 1º e § 2º – com relação a todos os fatos ocorridos até 4 anos antes do recebimento da denúncia (em 24-12-98 – fl. 63), ou seja, antes de 25-12-941.

1 Ressalte-se que, como se trata de crime continuado, “a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação” (Súmula 497 do STF).

R.T.J. — 2031102

Disso resulta que deveria o TRF/1ª Região, quando do julgamento da apela-ção interposta pelo Paciente, ter reduzido – como entendesse de direito – o acrés-cimo de 1 ano imposto na sentença pela continuidade delitiva, o que não ocorreu.

Assim, reconheço a referida nulidade e, em conseqüência, afasto o trânsito em julgado da condenação imposta ao Paciente.

Aqui, contudo, entendo não ser o caso de determinar que o TRF/1ª Região refaça a aplicação da pena: uma vez afastado o trânsito em julgado, é inevitável o reconhecimento da prescrição – desta vez intercorrente – com relação aos demais fatos imputados ao Paciente.

Com efeito, a última causa interruptiva da prescrição passa a ser a publicação da sentença condenatória, em 16-6-01 (fl. 78), ou seja, há mais de 4 anos.

Vale dizer, a prescrição ocorreu em 15-6-05, antes da inclusão do presente habeas corpus em Mesa para julgamento (fl. 241).

III

Esse o quadro, defiro ordem de habeas corpus de ofício para, inicialmente, anular o tópico da apelação que manteve a pena imposta ao Paciente e, em con-seqüência, declarar a extinção da punibilidade quanto aos fatos objeto da conde-nação que lhe fora imposta.

De outro lado, julgo prejudicado o presente habeas corpus, por falta de inte-resse processual.

é o meu voto.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Presidente, não levei em conta os aspectos mencionados por V. Exa. Confesso que, se tivesse atentado para a pas-sagem do tempo, não teria gasto o meu latim com a pesquisa e o voto. Claro que guardarei essa pesquisa para casos semelhantes.

Agora, presentes as premissas lançadas por V. Exa., forçoso é concluir pela prescrição.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhor Presidente, sinto-me habilitado a votar e acompanho V. Exa.

EXTRATO DA ATA

HC 85.661/DF — Relator: Ministro Marco Aurélio. Paciente: Carlos Ale-xandre Vasconcelos Guerra. Impetrantes: Délio Lins e Silva e outros. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

R.T.J. — 203 1103

Decisão: Prosseguindo o julgamento, a Turma concedeu a ordem, de ofício, para declarar a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva, e, em conseqüência, julgou prejudicado o habeas corpus. Unânime. Não participa-ram desta sessão os Ministros Cezar Peluso e Eros Grau, transferidos para a Segun-da Turma. Não participaram deste julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski e a Ministra Cármen Lúcia, por não pertencerem à Turma na época do início do julgamento.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Mi-nistros Marco Aurélio, Carlos Britto, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Subprocurador-Geral da República, Dr. Edson Oliveira de Almeida.

Brasília, 3 de agosto de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031104

HABEAS CORPUS 85.958 — SP

Relator: O Sr. Ministro Eros Grau

Paciente e Impetrante: Milton José Miguel — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Tráfico de entorpecentes. Absolvição. Ree-xame de provas.

A pretensão de ser o paciente absolvido do crime de tráfico de entorpecentes é inviável em habeas corpus, dada a necessidade de aprofundado reexame do acervo probatório coligido na instrução criminal.

Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, indeferir o pedido de habeas corpus.

Brasília, 15 de dezembro de 2005 — Eros Grau, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Eros Grau: Trata-se de habeas corpus impetrado pelo próprio Paciente contra ato do Superior Tribunal de Justiça.

2. O Paciente foi condenado a 4 (quatro) anos e 1 (um) mês de reclusão pela prática do crime tipificado no art. 12 da Lei 6.368/76.

3. Alega, em singela petição manuscrita, que a droga apreendida em seu carro pertencia ao outro Co-réu, amigo seu, a quem dera carona. Ademais, a maconha teria sido encontrada nas vestes do Co-réu, o que evidenciaria o desconhecimento de sua existência por parte dele, Paciente.

4. Requer o deferimento do writ para decretar a nulidade do feito.

5. Atenta à possibilidade de o Paciente ter sido injustamente condenado, a Subprocuradora-Geral da República Delza Curvello Rocha solicitou-me a requi-sição dos autos da ação penal, protestando por nova vista. Em nova manifestação, opina pelo não-conhecimento da impetração.

é relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Leio o seguinte trecho do parecer da Procuradoria-Geral da República:

R.T.J. — 203 1105

Consta dos autos que o impetrante foi processado e condenado à pena de 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão, em regime integralmente fechado, pela prática do delito previsto no artigo 12 da Lei nº 6.368/76.

Em síntese, alega que a droga apreendida no interior do seu veículo pertencia a co-réu a quem ofereceu uma “carona”, sendo tal afirmação por este confirmada. Afirma que não sabia que o companheiro carregava a substância entorpecente, razão pela qual, face à negativa de autoria, não pode ser responsabilizado pelo crime praticado por outrem.

As informações de praxe foram apresentadas às fls. 16/21.é o breve relato.Sem razão o paciente. é que o habeas corpus, por conta de seu rito sumário, não

comporta o aprofundamento de material fático-probatório que estaria a depender o deslinde da controvérsia ora apresentada, posto que objetiva o recorrente ser absolvido contestando os elementos de provas que foram apresentadas no momento de sua condenação, que aliás, em sede de apelação, foi confirmada.

Acolho os fundamentos do parecer da Procuradoria-Geral da República, para denegar a ordem.

EXTRATO DA ATA

HC 85.958/SP — Relator: Ministro Eros Grau. Paciente e Impetrante: Milton José Miguel. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus. Unânime. Não parti-ciparam deste julgamento os Ministros Cezar Peluso e Carlos Britto.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Edson Oliveira de Almeida.

Brasília, 15 de dezembro de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031106

HABEAS CORPUS 85.969 — SP

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio

Paciente: Paulo Eufrásio da Silva — Impetrante: Andre Pires de Andrade Kehdi — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Defesa – Gravidade do crime. Quanto mais grave o crime, deve-se observar, com rigor, as franquias constitucionais e legais, viabilizando-se o direito de defesa em plenitude.

Processo penal – Júri – Defesa. Constatado que a defesa do acusado não se mostrou efetiva, impõe-se a declaração de nulida-de dos atos praticados no processo, proclamando-se insubsistente o veredicto dos jurados.

Júri – Crimes conexos. Uma vez afastada a valia do Júri rea-lizado, a alcançar os crimes conexos, cumpre a realização de novo julgamento com a abrangência do primeiro.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, conceder a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, o Ministro Ricardo Lewandowski.

Brasília, 4 de setembro de 2007 — Marco Aurélio, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: O acórdão que se aponta como a configurar constrangimento tem a seguinte síntese (fl. 201):

Não há falar em nulidade de julgamento pelo Conselho de Sentença com base única no tempo de 24 minutos utilizado pela defesa para deduzir sustentação oral em plenário, posto que a qualidade da defesa não se traduz pelo uso integral do limite concedido às partes pela lei processual. Precedentes.

A conexão probatória, fundada em prova testemunhal, não determina a unicidade do julgamento pelo Conselho de Sentença, em protesto por novo júri, de crimes contra a liberdade sexual, se a sentença condenatória fixa pena inferior a 20 (vinte) anos.

O protesto por novo júri alcança tão somente os crimes que tenham sido apenados com reclusão igual ou superior a 20 (vinte) anos (art. 607 do CPP).

Ordem denegada.

Segundo dados constantes da inicial, o Paciente foi submetido ao Júri, vindo a ser apenado com cinqüenta anos de reclusão, em regime fechado, como incurso nos arts. 121, § 2º, incisos I e IV; 213; e 214 do Código Penal. As penas foram fixadas considerado o teto previsto para os tipos. A defesa protestou por outro Júri no tocante ao homicídio e interpôs recurso de apelação quanto aos crimes conexos.

R.T.J. — 203 1107

Então, ficou sobrestado o exame da apelação para data posterior ao novo Júri. Este foi adiado tendo em conta a falta de intimação das testemunhas e a ausência do defensor, que, a seguir, renunciou a defesa. Tal fato motivou a designação do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) para patrocinar os interesses do então condenado. Nova defesa veio a constatar vícios insanáveis, razão pela qual peticionou requerendo que o novo Júri alcançasse toda a acusação, e não apenas a imputação do homicídio. Foi impetrado habeas junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo visando à anulação do primeiro julgamento por ausência de defesa técnica – Habeas Corpus 385.494-3/3. Inicialmente, o relator acolheu o pedido, vindo a Câmara julgadora, não obstante reconhecer a desídia do defensor em plenário, a denegar a ordem, assentando não caber a discussão acerca da nulida-de por ausência de defesa, uma vez que, com a extensão do protesto por novo Júri, até mesmo relativamente aos crimes conexos, restara desfeita a validade do julgamento. Objetivando afastar a extensão, sob o ângulo de novo Júri, quanto aos crimes conexos, o Ministério Público impetrou mandado de segurança, que acabou deferido. Daí haver sido formulado junto ao Superior Tribunal de Justiça o habeas que resultou no ato ora atacado. Buscou-se, segundo as razões expendi-das, fosse garantido o direito de defesa na plenitude. O fato novo – a concessão do mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público – desaguou na formalização de um subseqüente habeas junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo – Habeas Corpus 419.866-3/2. Então a Corte, embora não conhecendo da impetração, determinou que se sustasse a realização do Júri relativo ao homicídio qualificado até a decisão da apelação, evitando, com isso, o julgamento parcelado das acusações. Em 29 de novembro de 2004, a Corte paulista, suplantando o que consignara sobre a desídia do defensor do Réu em plenário, veio a dar parcial provimento à apelação, para reduzir a pena aplicada pela suposta prática dos crimes conexos. Perante o Superior Tribunal de Justiça, o Ministério Público pronunciou-se pela concessão do habeas, para que fosse anulado o julgamento verificado. Aponta-se, então, que o Réu esteve indefeso. Considerando-se a cir-cunstância de o julgamento ser procedido por leigos, mostrara-se insuficiente o tempo com o qual contara o defensor para estudo do caso, a envolver homicídio qualificado, estupro e atentado violento ao pudor.

Em retrospecto da tramitação do processo, no tocante à deficiência por parte da defesa, assevera-se que o Paciente acabou interrogado sem a presença de ad-vogado, vindo a ser nomeados defensores para as audiências em que ouvidas as testemunhas. Daí a conclusão de que, em tempo algum, esteve o Paciente assistido de defensor que conhecesse previamente os elementos coligidos. O julgamento pe-rante o Tribunal do Júri foi marcado para 16 de agosto de 2001. Aproximando-se a data, em 27 de julho anterior, o Juízo nomeou a Dra. Jaqueline do Prado para a de-fesa do acusado. A defensora somente teve ciência da nomeação em 31 do mesmo mês de julho e, no dia seguinte, declinou. Em 6 de agosto subseqüente, nomeou-se o Dr. Severiano Aparecido da Silva. Houvesse ele tomado conhecimento da nome-ação no mesmo dia, ter-se-ia interregno de dez dias para a realização do Júri. Ocor-re que a ciência somente se verificou em 14 de agosto – dois dias antes da sessão de julgamento –, e, mesmo assim, por telefone. Daí afirmar-se que não houve tempo

R.T.J. — 2031108

hábil para elaboração de defesa, deixando de ser pleiteado o adiamento do Júri. Diz-se que, em processo de complexidade maior, a ciência dois dias antes do jul-gamento não reflete o período necessário ao domínio dos aspectos envolvidos. Cita-se o art. 8ª da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, a prever, na alínea c nele contido, como garantia judicial, a concessão ao acusado do tempo e dos meios adequados para a preparação da defesa. Abordam-se, então, dados que, segundo apontado, bem revelam que a defesa se mostrou simplesmente for-mal, não expondo o indispensável conteúdo. Consoante as razões expendidas, na ata da sessão de julgamento no Júri, está registrado que a defesa respondeu du-rante vinte e quatro minutos às duas horas e dois minutos ocupados pela acusação para sustentar o libelo acusatório. Na réplica, o Ministério Público teria utilizado a palavra por trinta e um minutos enquanto a defesa haveria apresentado resposta em apenas seis minutos.

Enfocando-se a complexidade dos fatos e a gravidade das imputações, menciona-se a proposição de três séries de quesitos. Alega-se que, em dois dias, o defensor, por mais competente que fosse, por mais espaço que tivesse, não conseguiria estudar convenientemente a prova a fim de patrocinar a defesa do Paciente. As questões envolvidas não poderiam ser examinadas e expostas peran-te os membros do Júri em vinte e cinco minutos na primeira manifestação e em seis minutos na tréplica. Daí todas as peças da acusação haverem sido acolhidas à unanimidade, condenando-se o Paciente à pena máxima por todos os delitos. Ainda assim, a defesa ocupou espaço de tempo substancial em preliminar de conversão do julgamento em diligência com o intuito de instaurar-se incidente de insanidade que já havia sido afastado pelo Juiz-Presidente no início da sessão. Aduz-se que o corpo de jurados, destinatário do que alegado, não poderia vir a tratar do tema.

Informa que, além disso, ao ser ouvido em plenário, o Paciente negou a au-toria do homicídio e do atentado violento ao pudor, asseverando que a conjunção carnal com a vítima Mayara fora consentida. Entrementes, a defesa técnica, via defensor dativo, sustentou a negativa de autoria para todas as imputações e, ante a frontal colidência com a autodefesa, gerou a perplexidade dos jurados. O defen-sor também teria deixado de veicular a negativa de autoria de atentado violento ao pudor e do homicídio com base na ausência de espermatozóides no corpo e nas roupas da vítima, tese de conteúdo científico e harmônica com o que asseve-rado pelo Paciente a respeito do comprometimento de um certo amigo, Edilson. Afirma-se que o Paciente, pai de dois filhos, é fértil e que somente foi encontrada liquidez seminal, sem espermatozóides. Entende-se que apenas a exposição des-se tema tomaria quarenta minutos, razão pela qual os vinte e quatro utilizados mostraram-se insuficientes a concluir-se que o Paciente esteve perante o Tribunal do Júri devidamente defendido. O defensor não teria buscado afastar as qualifica-doras. Então se considera que o Paciente restou indefeso ante os seguintes fatos:

a) a exigüidade do prazo tanto para o estudo do processo – ciência da nome-ação por telefone somente dois dias antes do julgamento –, quanto para a própria defesa em plenário – trinta e um minutos para responder às mais de duas horas e meia utilizadas pela acusação para sustentar o libelo;

R.T.J. — 203 1109

b) o tempo gasto para se enveredar por matéria preliminar que, àquela altura, já estava totalmente superada, visto que indeferida pelo Juiz-Presidente da sessão;

c) a ausência de defesa no tocante à tipicidade do crime de estupro, suscita-da pelo Paciente na autodefesa;

d) a falta de defesa relativa à autoria quanto aos crimes de estupro e homi-cídio com base nos laudos técnicos que atestaram não haverem sido encontrados espermatozóides no corpo de delito;

e) a inexistência de sustentação quanto ao afastamento das qualificadoras.

Transcreve-se trecho de acórdão da lavra do Desembargador Dante Busa-na, quando abordada a questão da exigüidade no tempo utilizado para rebater o discurso acusatório. Discorre-se sobre o pronunciamento, prolatado por força da apelação, para mostrar-se a divergência de ópticas da própria Câmara julgadora. O Colegiado, em um primeiro passo, reconhecera a desídia do defensor do Réu em plenário, mas indeferira o habeas ante a realização de um novo Júri, e, em um segundo momento, apreciando o recurso alusivo aos crimes conexos, examinados na mesma assentada do julgamento relativo ao homicídio, entendera válido esse julgamento. Conclui-se que tudo resultou do acolhimento do mandado de segu-rança impetrado pelo Ministério Público quanto à abrangência do segundo Júri. Afirma-se que, no julgamento procedido, o relator registrou a dupla acepção da palavra desídia, que, “antes de significar ‘inexistência’, ‘falta’ ou ‘inocorrência’, traduz ‘preguiça’, ‘indolência’, ‘negligência’ ou ‘desleixo’”, e, embora reconhe-cendo que o Paciente foi defendido de forma preguiçosa, indolente, negligente e desleixada, não caminhou para a anulação do julgamento.

Busca-se demonstrar que o quadro conflita com as noções próprias ao devido processo legal, à plenitude da defesa e ao contraditório, solapando direito funda-mental como é o que encerra a preservação da dignidade da pessoa humana. Evoca-se o Verbete 523 da Súmula deste Tribunal, revelando-se oposição à assertiva de que a defesa com desídia é deficiente, e não inexistente. Sob o ângulo do prejuízo resultante da deficiente defesa, cita-se a apenação a cinqüenta anos de reclusão em regime integralmente fechado. Pleiteia-se seja concedida a ordem para anular o julgamento verificado em 16 de agosto de 2001, vindo a ser submetido o Paciente a novo Júri, viabilizado o exercício do direito de defesa.

Acompanharam a inicial as peças de fls. 33 a 273.

No parecer de fls. 279 a 288, o Subprocurador-Geral da República Dr. Ha-roldo Ferraz da Nóbrega manifesta-se pelo indeferimento da ordem. Afirma que “não é o tempo de sustentação que marca a eficiência ou não da defesa” e que os argumentos da Corte de Justiça de São Paulo e do Superior Tribunal de Justiça são irrespondíveis.

O Impetrante veio a esclarecer que os embargos infringentes interpostos contra o acórdão relativo à apelação vieram a ser providos para permitir a pro-gressão do regime de cumprimento da pena, tendo o Ministério Público protoco-lado recurso especial, ainda pendente de julgamento. Ressalta que possível con-cessão da ordem neste habeas corpus prejudicará o quadro decisório e recursal.

R.T.J. — 2031110

Em 24 de fevereiro de 2007, lancei visto no processo e designei, como data em que liberado para julgamento na Turma, 13 de março de 2007, isso objetivando dar conhecimento ao Impetrante, no que lhe assiste o direito de assomar à tribuna e distribuir memoriais, alfim, de tomar as providências cabíveis. Ante pedido de adiamento deferido, a apreciação do habeas foi transferida para hoje, 20 de março subseqüente.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): De início, consigno que duas maté-rias passaram pelo crivo do Superior Tribunal de Justiça, a saber: a primeira liga-se à deficiência da defesa e a segunda direciona-se ao alcance da conexão probatória considerado o protesto por novo Júri, ou seja, saber se, além do crime de homicídio, há a extensão do instituto aos outros crimes em relação aos quais as penas fixadas foram inferiores a vinte anos. Neste primeiro passo, conheço da impetração ante este balizamento. Lanço mão do que asseverado na inicial deste habeas quanto à diferença entre imputação e observância irrestrita do devido processo legal (fl. 30):

O problema principal é que a imputação de homicídio seguido de estupro e atentado violento ao pudor causa repulsa, asco.

Por isso, para julgar um caso deste e anular o júri é necessária muita serenidade. é preciso fazer uma “fissura” no que será apreciado, separando a imputação e deixando-a de lado, apre-ciando-a exclusivamente para aferir a inépcia da defesa. Fora disso, na verdade, pouco importa a imputação: o essencial é saber que ela é complexa e que não houve defesa minimamente apta a refutá-la, como manda a Constituição Federal.

Se em jogo o devido processo legal, pouco importa a acusação envolvida no processo. Aliás, quanto mais grave, maior deve ser a atenção com as franquias constitucionais, viabilizando-se o direito de defesa à exaustão, atentando-se para o figurino instrumental, tão indispensável a preservar a liberdade. Sob esse ângulo, passo a examinar a espécie, alcançando de início a boa procedência do que se contém no art. 5º, inciso LXXIV, da Carta Federal, segundo o qual o Estado há de prestar assistência jurídica, integral e gratuita, aos que comprovarem insuficiência de recurso. Essa assistência, vale frisar, deve ser dada pela Defensoria Pública, conforme previsto na própria Lei Fundamental.

Eis a que pode levar a constituição de defensor dativo em prazo exíguo para a implementação de atos, ou seja, para utilizar o linguajar popular, “na bucha”:

1. Na assentada em que interrogado o Paciente, determinou o Juízo fosse remetido ofício à PAJ, para que indicasse defensor dativo (fls. 213 e 214);

2. Em audição de testemunhas realizada um mês após, esteve ausente o de-fensor – Dr. Ricardo Constante Soares –, sendo nomeado pela juíza defensor ad hoc o Dr. Davi Eduardo Depiné Filho (fl. 216);

3. Em 27 de julho de 2001, próximo à data de julgamento, veio a ser nomeada defensora dativa a Dra. Jaqueline do Prado (fl. 228);

R.T.J. — 203 1111

4. A citada profissional da advocacia declinou da designação, afirmando que participaria de outra sessão plenária (fl. 230);

5. Então procedeu o Juízo à designação do Dr. Severiano Aparecido da Silva (fl. 232);

6. A ciência respectiva ocorreu, conforme certidão de fl. 232v., em 14 de agosto de 2001 – dois dias antes da data marcada para a sessão no Tribunal do Júri.

O açodamento na realização do Júri desaguou no quadro retratado na inicial e que consta da ata de julgamento de fls. 234 a 236. Nos debates, a acusação manifes-tou-se das onze horas e vinte e oito minutos às treze horas e trinta, ocupando, por-tanto, duas horas e dois minutos. Sustentou integralmente o libelo crime acusatório. A defesa falou das quatorze horas e dezenove minutos às quatorze horas e quarenta e três – somente durante vinte e quatro minutos –, pedindo, em preliminar, que os jurados reconhecessem a necessidade da conversão do julgamento em diligência para a feitura do exame de verificação da sanidade mental do acusado.

Até mesmo esse requerimento bem revela a distância da defesa implementada do que admitido e exigido pela ordem jurídica em vigor. Está registrado na ata que, no tocante ao mérito, foi pedida simplesmente a absolvição, por negativa de auto-ria. Passando-se à réplica, o Ministério Público, mais uma vez, utilizou tempo subs-tancial, comparado com o que utilizado pela defesa. Usou da palavra das quatorze horas e quarenta e quatro minutos às quinze horas e quinze minutos – trinta e um minutos. Na tréplica, a defesa fez sustentação das quinze horas e quinze minutos às quinze horas e vinte e um minutos, ou seja, pelo exíguo tempo de seis minutos.

Esse quadro sinaliza, a mais não poder, que, em última análise, o Réu esteve indefeso, considerada a complexidade do julgamento, que pode ser bem compre-endida nas séries de quesitos apresentados conforme consta à fl. 238. Em síntese, o diminuto espaço de tempo revelou a falta do domínio desejável do processo pelo defensor dativo, motivo pelo qual deixou de implementar, como deveria fazer, a defesa do acusado. Esse dado foi bem percebido quando o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou o Habeas Corpus 385.494-3/3. Na ocasião, embora indeferida a ordem ante ao que seria a realização de um novo Júri com amplitude a alcançar os crimes conexos, o relator consignou (fls. 86 a 91):

Contudo, pesem, não obstante, os doutos argumentos que compõem a impetração, nas circunstâncias, e a despeito da induvidosa desídia revelada pelo defensor do réu em plenário, não é caso, por aqui, de se deferir a ordem impetrada para o fim de anular o julgamento acontecido.

é que, segundo se percebe, proferida a decisão condenatória, de pronto formulou a defesa, à vista da quantidade da pena fixada para o homicídio qualificado – 30 anos de reclu-são – regular protesto por novo júri, valendo-se, para tanto, da faculdade a que alude o art. 607, do Código de Processo Penal. E, uma vez acolhido o protesto pelo Meritíssimo Juiz Presidente, que, aliás, estendeu esse deferimento, de forma altamente duvidosa, também aos crimes conexos de estupro e atentado violento ao pudor, já restara desfeita a validade do julgamento colegiado que, em razão disso, não pode, agora, merecer nova anulação, em sede de habeas corpus.

Vale dizer: somente não foi declarada a insubsistência do primeiro Júri em razão de se haver vislumbrado o efeito que seria próprio – a realização do segundo Júri, o que veio a ser afastado, com a plenitude cabível, via concessão de ordem

R.T.J. — 2031112

em mandado de segurança da acusação. Ora, a ordem jurídica viabiliza um se-gundo Júri quando a pena imposta chega a tempo igual ou superior a vinte anos, pressupondo-se que o julgamento primeiro tenha ocorrido de modo regular, o que, a toda evidência, não foi o caso.

Em síntese, a esta altura, entende-se que, de forma válida, somente acontece-rá uma sessão de julgamento, não se podendo, ante a verificação do segundo Júri, ter como que placitado o primeiro. Daí a concessão do habeas ser um imperativo decorrente da ordem jurídica. Não se trata aqui de medir o tempo da defesa, mas de constatar-se, em face dos parâmetros em que realizada, a eficácia minimamente aceitável.

Quanto à afirmação do Superior Tribunal de Justiça de que o protesto por novo Júri não alcança os crimes conexos, porquanto, em relação a cada qual, fi-xada pena inferior a vinte anos, o acórdão não está a merecer censura. No tocante à abrangência do Júri, impõe-se, no entanto, a concessão da ordem de ofício, para que englobe os citados temas, no que o desprovimento da apelação, considerado o vício relativo à defesa, implicou constrangimento ilegal. Vale notar ser inacei-tável o que consignado sobre a desídia do defensor (fl. 172):

Isso não obstante, como se apegue o apelante, de forma insistente, à observação contida em acórdão desta Câmara, no sentido de que “a despeito da induvidosa desídia revelada pelo defensor do réu em plenário (...)” (fls. 479), nada custa acrescentar, para mais evidenciar a improcedência da alegação de nulidade por ausência de defesa que “desídia”, antes de significar “inexistência”, “falta” ou “inocorrência”, traduz “preguiça”, “indolência”, “negligência” ou “desleixo” (cf. Novo Dicionário Aurélio, p. 565). Pelo que, defesa exercida com “desídia” não corresponde a defesa inexistente, mas a defesa desenvolvida com descaso, pouco empenho, até com deficiência. Tal como poderá caracterizar uma fala de pouco mais de vinte minutos nos debates no plenário do júri, mas que, nem por isso, evidencia cerceamento de defesa, por ausência dela.

Concedo a ordem para que o Paciente seja submetido a novo Júri, conside-radas as imputações constantes da sentença de pronúncia, e certamente, já agora, ante a atuação do Impetrante, a compor o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), estará plenamente representado sob o ângulo técnico-processual.

A Sra. Ministra Cármen Lúcia: Senhor Presidente, faço duas brevíssimas observações.

Primeira, conforme muitíssimo bem-lançado no relatório do Ministro Marco Aurélio, parece-me claro ter havido uma defesa formal, mas não a defesa material, técnica, assegurada a todos pela Constituição.

Segunda, esse fato foi todo o tempo admoestado e ponderado, mas não foi atentado devidamente, de modo a se tomarem as devidas providências e garantir o direito constitucional fundamental à defesa, como prescrito.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Se V. Exa. me permite, o defensor, intimado por telefone dois dias antes da data designada para o julgamento, não pretendeu sequer o adiamento.

R.T.J. — 203 1113

A Sra. Ministra Cármen Lúcia: Ministro Marco Aurélio, eu já lembrei aqui, em outra ocasião, do caso mais célebre no Brasil, na década de cinqüenta, do Dr. Sobral Pinto. Quando da indicação de um defensor ad hoc, de início, no Rio de Janeiro, todos os advogados aceitavam e imediatamente cumpriam a formalidade de comparecer. Ele foi o primeiro a dizer que precisava do adiamento, pois, caso contrário, não seria um advogado, mas apenas uma pessoa que lê e faz uma figu-ração. A partir dele, a figura do defensor realmente adquiriu outra dimensão.

Por essas razões, acompanho o Ministro Relator.

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Senhor Presidente, também considero que não é o tempo exíguo que leva à inépcia da defesa, porque, às vezes, uma defesa de dez minutos pode lograr êxito e ser brilhante.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): O próprio advogado, aqui, não esgo-tou o tempo para a sustentação da tribuna e fez uma belíssima defesa.

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Exatamente. V. Exa. aparteou-me em momento oportuno que ia observar esse fato.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente): A maior defesa a que assisti no Tribunal do Júri, do meu saudoso Mestre, Evandro Lins e Silva, durou cinqüen-ta minutos, contra quatro horas da acusação. Não é esta a hipótese, mas a soma de circunstâncias do caso é realmente impressionante.

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: A inépcia da defesa revela-se, tam-bém, na prática, na pena máxima por homicídio e dez anos por cada crime sexual. Realmente, demonstra esse resultado a inépcia da defesa.

Portanto, acompanho integralmente o eminente Ministro Relator, para de-ferir o habeas corpus.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): E não houve, no caso, atuação de um juízo federal, que, geralmente, tem mão pesada.

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Sim. As mulheres também, em caso de crimes contra costumes, tendem a ser bastante severas.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente): O segundo Júri foi sustado?

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Não tenho notícia.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente): Temo um retardamento sem que se suste o Júri, porque V. Exa. defere a ordem para que todos os crimes, dada a nulidade, sejam levados novamente ao Tribunal do Júri.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Sim, um julgamento linear.

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Interessante, entendi que V. Exa. ex-cluía os crimes de estupro.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Não, porque, se o julgamento pri-meiro é merecedor da pecha, ele o é quanto aos três crimes.

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Sim. Há uma contaminação.

R.T.J. — 2031114

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente): O Tribunal de São Paulo decidiu corretamente o protesto.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Àquela altura, como havia o pro-testo, e o Tribunal de Justiça entendeu que alcançaria também o julgamento dos crimes conexos – como transcrevi –, ele declarou que não poderia haver sobre-posição em termos de proclamação de nulidade.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente): No relatório do Ministro Paulo Medina, há uma referência ao adiamento do Júri, mas não sei como está. O Advogado pode esclarecer?

O Sr. Cláudio Demczuk de Alencar (Advogado): O julgamento, no caso, do protesto do novo Júri está designado para o próximo 18 de junho. A apelação, quanto aos crimes conexos, já transitou em julgado.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente): Então, há tempo. Sugeriria, se fosse o caso, mandar sustar esse Júri.

EXTRATO DA ATA

HC 85.969/SP — Relator: Ministro Marco Aurélio. Paciente: Paulo Eufrásio da Silva. Impetrante: Andre Pires de Andrade Kehdi. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: Após os votos dos Ministros Marco Aurélio, Relator; Ricardo Lewandowski; e Cármen Lúcia, que deferiam o pedido de habeas corpus, pediu vista dos autos o Ministro Carlos Britto. Falou pelo Paciente o Dr. Cláudio Demczuk de Alencar.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco Aurélio, Carlos Britto, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Subpro-curador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 20 de março de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

VOTO (Vista)

O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Cuida-se de habeas corpus, impetrado em favor de Paulo Eufrásio da Silva, contra acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça. Acórdão que afastou a nulidade apontada pela defesa, por entender que “não há falar em nulidade de julgamento pelo Conselho de Sentença com base única no tempo de 24 minutos utilizado pela defesa para deduzir sustentação oral em plenário” (fl. 201).

2. Pois bem, o Ministro Marco Aurélio, Relator, votou pelo deferimento da ordem. E o fez porque o caso dos autos sinaliza que o Réu esteve indefeso no jul-gamento plenário do Júri. Considerou S. Exa. que, ante a complexidade da causa, o diminuto espaço de tempo (apenas 24 minutos) de que se valeu a defesa dativa revelou a falta de um domínio técnico mínimo do processo. O que foi anotado

R.T.J. — 203 1115

pelo Tribunal de Justiça paulista, ao assentar que seria “induvidosa” a desídia revelada pelo defensor do Réu em plenário (embora o writ ali ajuizado haja sido indeferido).

3. Pedi vista dos autos para uma análise mais detida da matéria. Pelo que passo a fazer o retrospecto dos fatos.

4. Colhe-se dos autos que o Paciente foi condenado, pelo Tribunal do Júri, à pena total de 50 (cinqüenta) anos de reclusão, a saber: 30 (trinta) anos pelo crime de homicídio qualificado (incisos I e IV do § 2º do art. 121 do CP), 10 (dez) anos pelo crime de estupro (art. 213 do CP) e 10 (dez) anos pela prática do crime de atentado violento ao pudor (art. 214 do CP). Bem se vê que as reprimendas foram fixadas nos seus limites máximos, o que levou o defensor então constituído (Dr. Severiano Aparecido da Silva) a protestar por novo Júri quanto ao homicídio e interpor recurso de apelação quanto aos crimes conexos (estupro e atentado violento ao pudor).

5. Prossigo para anotar que esse mesmo defensor renunciou ao patrocínio da causa. Renúncia que permitiu aos novos causídicos postular, perante o Juízo de primeiro grau, que o novo Júri abrangesse toda a acusação, dada a completa au-sência de defesa do Réu em plenário. Pelo que ajuizaram habeas corpus perante o Tribunal de Justiça paulista, visando à integral anulação do julgamento que se fez pelo Tribunal do Júri, fazendo-o com idêntica fundamentação.

6. Diante disso, o magistrado reapreciou a abrangência do protesto por novo Júri e decidiu que todos os crimes seriam submetidos a nova apreciação pelo Conselho de Sentença. Fato que ensejou a impetração de mandado de segurança pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, para que apenas o delito de ho-micídio fosse reapreciado por um novo Júri. O que foi atendido pelo Tribunal de Justiça paulista, com a determinação de que “o novo julgamento relativo ao réu Paulo Eufrásio da Silva refira-se, exclusivamente, ao homicídio qualificado con-sumado” (fl. 101). Decisão que se apoiou na interpretação conferida aos arts. 607 e 608 do Código de Processo Penal1, concluindo-se que as condenações pelos crimes de estupro e de atentado violento ao pudor só poderiam receber reforma por meio de recurso de apelação.

7. Calha referir que os novos advogados, ao insistir na fragilidade da defesa no Júri, impetraram mais um habeas corpus no Tribunal de Justiça de São Paulo. Habeas corpus que não foi conhecido, ao argumento de que se deveria aguardar o julgamento do recurso de apelação, tendo em conta que a matéria reclamaria um exame aprofundado do conjunto probatório.

1 “Art. 607. O protesto por novo júri é privativo da defesa, e somente se admitirá quando a sentença condenatória for de reclusão por tempo igual ou superior a 20 (vinte) anos, não podendo em caso algum ser feito mais de uma vez (...)” “Art. 608. O protesto por novo júri não impedirá a interposição da apelação, quando, pela mesma sentença, o réu tiver sido condenado por outro crime, em que não cabia aquele protesto. A apelação, entretanto, ficará suspensa, até a nova decisão provocada pelo protesto.”

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8. Na seqüência, impetrou-se novo habeas corpus para o Superior Tribunal de Justiça. Ação constitucional em que se renovou o objetivo de ver “integral-mente anulado o primeiro julgamento do paciente, em que restou indefeso, ou, subsidiariamente, para que o protesto por novo júri alcance também os crimes conexos” (fl. 107).

9. Presente esta moldura, tenho que a ordem é mesmo de ser concedida. Isso porque, neste caso, houve uma confluência de fatores que prejudicaram a defesa material do Paciente, a exigir mesmo que se refaça o julgamento no Tribunal Po-pular.

10. De saída, porém, penso que não se mostra cabível o pedido subsidiário de se conferir maior abrangência ao protesto por novo Júri. Digo isto pela conside-ração de que, nos termos do art. 607 do CPP, o protesto só é admitido quando “a sentença condenatória for de reclusão por tempo igual ou superior a 20 (vinte) anos”2. O que não se enquadra no caso dos autos, já que o Réu foi condenado a 10 (dez) anos pelo crime de estupro e a 10 (dez) anos pelo crime de atentado violento ao pudor. Leia-se o comentário de Guilherme de Souza Nucci (Código de Processo Penal Comentado, 6. ed., Editora Revista dos Tribunais, p. 943 – comentário ao art. 608 do CPP): “(...) quando o réu tiver várias condenações, proferidas no mesmo julgamento pelo Tribunal do Júri, é possível que muitas delas não comportem o protesto, porque não preenchem os seus requisitos. Assim, exemplificando, se o acusado for condenado a vinte anos, pela prática de homicídio, e a seis anos, por estupro, em concurso material, caberá protesto quanto ao primeiro crime, mas não quanto ao segundo”. Comentário que bem se encaixa no caso que estamos a apreciar e que só confirma, neste ponto, o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça.

11. Todavia, o mesmo não se é de dizer com relação ao pedido principal dos Impetrantes: nulidade do primeiro julgamento no Tribunal do Júri, por cercea-mento de defesa. Aqui, a decisão impugnada se limitou a afirmar que “a qualidade da defesa não se traduz pelo uso integral do limite concedido às partes pela lei processual” (fl. 207). O que, em linha de princípio, seria aceitável, não fossem as peculiaridades desta causa. Causa a envolver, é certo, a apuração de crimes extre-mamente graves e complexos, mas que, nem por isso, deixam de exigir um atuar defensivo apegado às normas constitucionais tutelares da ampla defesa.

12. Nesta situação, começo dizendo que a nomeação do defensor dativo (Dr. Severiano Aparecido da Silva) para a defesa em plenário se deu em 8-8-01. No-meação que só foi cumprida no dia 14-8-01, ou seja, apenas dois dias antes da rea-lização do julgamento no Júri, ocorrido em 16-8-01. Ainda assim, tal chamamento se materializou mediante ligação telefônica, que foi certificada à fl. 232v. Quadro que já começa a sugerir que o defensor, nomeado às vésperas da assentada de jul-gamento, teve prazo reduzidíssimo para o estudo da matéria. Matéria de grande complexidade, repita-se.

2 “Art. 607. O protesto por novo júri é privativo da defesa, e somente se admitirá quando a sentença condenatória for de reclusão por tempo igual ou superior a 20 (vinte) anos, não podendo em caso algum ser feito mais de uma vez (...)”

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13. Não é tudo. Em plenário, enquanto a acusação sustentou integralmente o libelo acusatório por quase duas horas (das 11h28 às 13h30), o defensor dativo se limitou a suscitar a necessidade de conversão do julgamento em diligência, para a realização de exame de sanidade mental do acusado e, no mérito, requereu a absolvição, por negativa de autoria. Tudo isso em apenas 24 minutos (das 14h19 às 14h43). Já por ocasião da réplica, o órgão acusador fez uso da palavra por mais 31 minutos (das 14h44 às 15h15), reiterando o pedido inserto na inicial. Sendo que a defesa, em tréplica, renovou a frágil tese defensiva em estreitos 6 minutos (das 15h15 às 15h21).

14. Bem vistas as coisas, fica evidente que a exigüidade de tempo, longe de ser a razão única do pedido veiculado neste writ, gerou reflexos inescondivelmente prejudiciais à defesa do Réu. Até porque se cuidou, nesse curtíssimo e valioso espaço temporal, de preliminar que nem sequer foi analisada pelo Juízo, devido à pouca intimidade do defensor com o objeto dos autos. Tudo a configurar verda-deira confluência de fatores prejudiciais à defesa, bastando ver que o Réu foi con-denado em pena máxima para todos os delitos. Prejuízo defensivo que também se extrai das respostas dos jurados aos quesitos, já que praticamente não houve divergência entre eles (única exceção feita ao 2º quesito da 2ª série – 6 a 1; os demais quesitos obtiveram o escore de 7 a 0 – fl. 239).

15. Não bastasse tudo isso, é de se ressaltar o descompasso entre a tese lançada pelo defensor (“negativa de autoria”, com relação ao crime de estupro) e o próprio depoimento do Réu em juízo. Depoimento em que o acusado admitiu ter mantido relação sexual com a vítima, embora de modo consentido. Fato que só corrobora a fragilidade com que se houve a defesa material do Réu, a exigir a proclamação da nulidade do julgamento. Nulidade que, volto a dizer, não resulta exclusivamente do acanhado tempo gasto pela defesa em plenário; mas, sim, do conjunto de fatores que prejudicaram materialmente a defesa do Réu.

16. Tais conclusões afinam até mesmo com o entendimento do Tribunal de Justiça paulista (órgão judicante de maior proximidade dos fatos). Tribunal que, de um lado, deu como “induvidosa” a “desídia revelada pelo defensor do réu em plenário” (fls. 88 e 172), embora, de outro, tenha afastado a nulidade, ao apreciar mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público paulista (fl. 172). A sig-nificar, então, que a presente causa está a merecer, desta Suprema Corte de Justiça, a necessária correção. Tudo em observância à garantia constitucional da ampla defesa (inciso LV do art. 5º da CF/88).

17. Por tudo quanto posto, acompanho o Relator para deferir o habeas corpus e determinar que outro julgamento se realize perante o Conselho de Sentença.

EXTRATO DA ATA

HC 85.969/SP — Relator: Ministro Marco Aurélio. Paciente: Paulo Eufrásio da Silva. Impetrante: Andre Pires de Andrade Kehdi. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

R.T.J. — 2031118

Decisão: Adiado o julgamento por indicação do Ministro Carlos Britto. Pri-meira Turma, 15-5-07.

Decisão: Após o voto do Ministro Carlos Britto, a Turma concedeu a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Unânime. Ausente, justificada-mente, o Ministro Ricardo Lewandowski.

Presidência do Ministro Marco Aurélio. Presentes à sessão o Ministro Carlos Britto e a Ministra Cármen Lúcia. Ausente, justificadamente, o Ministro Ricardo Lewandowski. Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 4 de setembro de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

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AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS 86.148 — MG

Relator: O Sr. Ministro Gilmar Mendes

Agravante: Bruno Diniz Antonini — Agravado: Superior Tribunal de Justiça

Agravo regimental em recurso ordinário em habeas corpus. 2. Recurso incompreensível, sem fundamentação e, portanto, ma-nifestamente improcedente. Hipótese de negativa de seguimento. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 14 de março de 2006 — Gilmar Mendes, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Trata-se de agravo regimental interposto por Bruno Diniz Antonini contra decisão que negou seguimento a recurso ordi-nário (RISTF, art. 21, § 1º).

Nas confusas razões do presente agravo, aduz o Recorrente que o processo deve ser redistribuído, e declarada a ilegalidade dos atos nele combatidos, “pre-servando-se direitos, prevenindo responsabilidades face repetição deles, em curso contra o recorrente, conhecido deste Juízo nos autos de RHC 86.806/STF desde 20-10-05, portanto antes do despacho combatido evitando precedente ilegal (fl. 281)”.

Vale registrar um resumo do presente feito.

O habeas corpus originariamente foi impetrado contra ato do Desembar-gador Vice-Presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, tendo o Ministro Néri da Silveira declinado da competência ao Superior Tribunal de Justiça por força do art. 105, I, c, da Constituição Federal (fl. 112).

O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o habeas corpus, dele conheceu parcialmente e denegou a ordem, confirmando o parecer da Procuradoria-Geral da República. Eis o teor da ementa (fl. 222):

Habeas corpus. Direito processual penal. Inquérito policial. Notificação para compa-recimento à polícia. Constrangimento ilegal inexistente. Supressão de instância. Ocorrência.

1. é da autoridade policial, no sistema de direito vigente, a atribuição para instauração e presidência de inquérito policial, procedimento investigatório de infrações penais e preparatório

R.T.J. — 2031120

da ação penal, não havendo ilegalidade qualquer na intimação de pessoa, para que venha pres-tar depoimento ou declaração relativamente ao fato-crime em apuração.

2. Não se conhece do pedido de habeas corpus na parte em que a matéria que dá subs-tância à sua motivação não se constituiu em objeto do decisum impugnado, pena de supressão de um dos graus de jurisdição.

3. Ordem parcialmente conhecida e denegada.

Contra essa decisão foi interposto recurso ordinário, vindo o processo no-vamente para a apreciação do Supremo Tribunal Federal (fls. 228-229).

Remetidos os autos à Procuradoria-Geral da República, esta opinou pelo desprovimento do recurso ordinário, “mesmo porque a irresignação, a rigor ininteligível, não traz qualquer argumento capaz de infirmar a fundamentação do acórdão do Superior Tribunal de Justiça (fl. 262)”.

A petição 104.563 foi juntada aos autos, requerendo a anulação do parecer da Procuradoria-Geral da República. Porém, a ela neguei seguimento por não ser habeas corpus via legítima para decretação de nulidade (fl. 266).

Conforme já noticiado supra, neguei seguimento ao recurso ordinário (fls. 272-273).

Foi interposto o presente agravo regimental (fls. 280-281).

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): O Agravante limitou-se a afirmar, de forma confusa e desordenada, a ilegalidade do despacho proferido, requeren-do a redistribuição do processo para que seja declarada a ilegalidade dos atos nele combatidos (fls. 281-282).

Dessa forma, mais uma vez, o recurso apresenta-se incompreensível, des-fundamentado e, portanto, manifestamente improcedente.

Conforme já destacado na decisão agravada, a jurisprudência desta Corte vem negando seguimento às petições desfundamentadas e/ou ininteligíveis. Nes-se sentido: HC 60.759, Rel. Min. Rafael Mayer, DJ de 12-8-93; HC 80.211, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 19-6-00; Pet 3.089-AgR, Rel Min. Eros Grau, DJ de 1º-2-05; e HC 72.054, Rel. Min. Francisco Rezek, DJ de 8-9-95.

Assim, nego provimento ao presente agravo regimental.

EXTRATO DA ATA

RHC 86.148-AgR/MG — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Agravante: Bruno Diniz Antonini. Agravado: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, a Ministra Ellen Gracie.

R.T.J. — 203 1121

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, a Ministra Ellen Gracie. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner Gonçalves.

Brasília, 14 de março de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coorde-nador.

R.T.J. — 2031122

HABEAS CORPUS 86.166 — CE

Relator: O Sr. Ministro Eros Grau

Paciente: Manuel de Jesus Ribeiro Dias — Impetrante: Marcelo Fragoso Ponte — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Tráfico de entorpecentes. Rito da Lei 10.409/ 02. Inobservância. Nulidade absoluta ou relativa. Exigência da demonstração de prejuízo.

1. Tráfico de entorpecentes. Inobservância do rito da Lei 10.409/02, no que tange à realização de dois interrogatórios: um antes do recebimento da denúncia (art. 38) e outro na audiência de instrução e julgamento (art. 41).

2. A juíza sentenciante concentrou, em um só ato, os dois interrogatórios, possibilitando ao Paciente e a seu advogado es-clarecimentos a propósito dos fatos imputados, na forma do art. 185 do Código de Processo Penal. A defesa técnica fez todos os questionamentos a seu juízo pertinentes, sem nada reclamar.

3. A alegação de nulidade, relativa ou absoluta, deve ser acompanhada da demonstração de prejuízo, o que não ocorreu na espécie.

Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, indeferir o pedido de habeas corpus.

Brasília, 17 de novembro de 2005 — Eros Grau, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Eros Grau: O Paciente foi condenado a 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime integralmente fechado, sob a acusação da prática do delito tipificado no art. 12, c/c o art. 18, III, da Lei 6.368/76, pelo fato de ter sido surpreendido com 995 comprimidos de ecstasy.

2. Impetrou habeas corpus no Tribunal de Justiça do Ceará e, contra a de-negação, recurso ordinário no Superior Tribunal de Justiça, ao qual foi negado provimento em acórdão assim ementado:

Processual penal. Recurso ordinário em habeas corpus. Arts. 12 e 18, III, da Lei nº 6.368/76. Inobservância do rito procedimental previsto na Lei nº 10.409/2002. Ausência de demonstração do efetivo prejuízo.

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A inobservância do procedimento estabelecido no art. 38, da Lei nº 10.409/02, quando do processamento de ação penal cujo objeto é a prática de delito previsto no art. 12, da Lei nº 6.368/76, por si só, não importa em nulidade. Com efeito, a declaração de eventual nulidade advinda da não-aplicação do referido dispositivo reclama a prova do efetivo prejuízo sofrido pelo réu, hipótese não ocorrente na espécie. (Precedentes).

Recurso desprovido.

3. O Impetrante alega que a não-observância dos procedimentos previstos nos arts. 38 e 41 da Lei 10.409/021 afronta os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. Ademais, sustenta tratar de nulidade absoluta, ainda que não fosse, cumpriria reconhecer-se prejuízo à defesa, por inobservância de formalidade legal.

4. Traz à colação excertos doutrinários favoráveis à tese defendida.

5. Requer a concessão da ordem a fim de que a ação penal seja anulada, garantindo-se ao Paciente o segundo interrogatório, bem como a expedição de alvará de soltura.

6. A Procuradoria-Geral da República opina no sentido do indeferimento.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): A Lei 10.409/02 prevê, em seus arts. 38 e 41, a realização de dois interrogatórios. O primeiro antes do recebimento da denúncia e o segundo no curso da instrução criminal.

2. Percebe-se que a lei possibilita, com o primeiro interrogatório, a rejeição, de plano, da denúncia. Essa preocupação faz sentido em se tratando de persecução penal por crime de tráfico de entorpecentes, sobretudo porque não raramente – a experiência o revela – há, por interesses inconfessáveis, flagrantes forjados e a introdução de drogas em residências e automóveis por maus policiais.

3. Na verdade, o que ocorreu no caso concreto foi a concentração de atos em audiência única, como se observa das informações prestadas pela juíza pro-latora da sentença, transcritas no voto do habeas corpus julgado pelo Superior Tribunal de Justiça:

Pela redação do art. 38 conclui-se que haveria uma data anterior à audiência de instrução e julgamento para a realização do interrogatório, todavia, para conciliar-se tais dispositivos e aproveita-los integralmente seria preciso concluir que a data designada para o

1 “Art. 38. Oferecida a denúncia, o juiz, em 24 (vinte e quatro) horas, ordenará a citação do acu-sado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias, contado da data da juntada do mandato aos autos ou da primeira publicação do edital de citação, e designará dia e hora para o interrogatório, que se realizará dentro dos 30 (trinta) dias seguintes, se o réu estiver solto, ou em 5 (cinco) dias, se preso.

Art. 41. Na audiência de instrução e julgamento, após o interrogatório do acusado e a inquirição das testemunhas, será dada a palavra, sucessivamente, ao representante do Ministério Público e ao defensor do acusado, pelo prazo de 20 (vinte) minutos para cada um, prorrogável por mais 10 (dez), a critério do juiz, que, em seguida, proferirá a sentença.”

R.T.J. — 2031124

interrogatório, por ocasião do despacho a que se refere o art. 38, deveria ser aproveitada para instrução e julgamento, conforme se determina em segundo despacho, a ser proferido do rece-bimento da inicial acusatória, (art. 40) já que a audiência é uma e a inquirição das testemunhas era realizada após o interrogatório, na mesma audiência (art. 41).

4. Adotou-se, pois, interpretação que conduziria à realização de ato único, concentrando-se, indevidamente, os interrogatórios de que tratam os arts. 38 e 41 da Lei 10.409/02.

5. Ao proferir voto no HC 84.835-4, o Ministro Sepúlveda Pertence ob-servou que “[n]ão se adstringe ao das nulidades relativas o domínio do princípio fundamental da disciplina das nulidades processuais – o velho pas de nullité sans grief – corolário da natureza instrumental do processo (v.g., HC 81.510, Primeira Turma, Pertence, DJ de 12-4-02; HC 74.671, Segunda Turma, Velloso, DJ de 11-4-97): donde – sempre que possível – ser exigida a prova do prejuízo, ainda que se trate de nulidade absoluta”. Na oportunidade, o Relator observou que, independentemente de ter havido nulidade relativa ou absoluta, não houve a pre-clusão por inércia, já que a defesa argüiu a nulidade desde a defesa prévia. Além disso, afirmou que, “não bastassem o recebimento da denúncia e a superveniente condenação do Paciente, é de prova impossível a demonstração de que, se apre-sentada a defesa preliminar, no caso, a denuncia não teria sido recebida”. Con-cluindo, a Turma concedeu a ordem para anular a ação penal desde o recebimento da denúncia e determinar que se observasse o rito da Lei 10.409/92.

6. No citado HC 84.835, a tese foi a de nulidade por não-realização do primeiro interrogatório, em que o acusado teria a oportunidade de fulminar a denúncia no nascedouro.

Aqui o primeiro interrogatório implicou a dispensa do segundo. A questão agora é saber, independentemente de tratar-se de nulidade relativa ou absoluta, se houve prejuízo à defesa do Paciente.

Entendo que não. Lê-se do ato impugnado que “ao paciente, por ocasião de seu interrogatório, foi assegurada a oportunidade para requerer esclarecimentos nos termos do artigo 185, do CPP, com a nova redação dada pela Lei 10.792/03, cujo advogado, sem nada reclamar, fez todos os questionamentos que entendeu pertinentes, restando-lhe assegurados, assim, a ampla defesa e o contraditório.” Esse entendimento foi corroborado pela Procuradoria-Geral da República:

No entanto, os autos dão conta de que logo após a oferta da defesa preliminar, seguido do recebimento da denúncia, o paciente foi devidamente interrogado, não advindo qualquer prejuízo para a defesa o fato de não ter sido realizado, pela segunda vez, na audiência de ins-trução e julgamento, o interrogatório do réu, sobretudo, quando comprovado o pleno exercício do contraditório.

No extenso e único interrogatório, a defesa teve a oportunidade de expor a sua versão dos fatos e apresentar, na dimensão prevista pela norma legal, todas as questões que conside-rou relevantes, nada requerendo ao seu termo.

A inobservância do rito procedimento adotado pela Lei nº 10.409/02, por si só, em relação à falta do segundo interrogatório do réu (art. 41) ou mesmo a defesa preliminar escrita (art. 38), não enseja, de pronto, a nulidade do feito. A alegação, pertinente à existência de nulidade (absoluta ou relativa), deve vir acompanhada da demonstração de efetivo prejuízo para a defesa.

Denego a ordem.

R.T.J. — 203 1125

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Presidente): Peço vênia ao Relator para divergir.

O rito previsto na Lei 10.409/02 é essencial à valia do próprio processo a que responde o acusado. Evidentemente, não se tem norma inócua nessa lei ao prever que haverá dois interrogatórios: o anterior ao recebimento da denúncia e o posterior. No caso, não houve o primeiro interrogatório. Então, colocou-se em plano secundário o que previsto quanto à instrução criminal.

O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Perdão, houve o primeiro, não houve o segundo.

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Não, o contrário: houve o segundo, não houve o primeiro.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Presidente): E, aí, o segundo ganha impor-tância maior, porque ele ocorre justamente quando já há elementos no processo.

Preceitua o art. 41 da Lei 10.409/02:

Art. 41. Na audiência de instrução e julgamento, após o interrogatório do acusado e a inquirição das testemunhas, será dada a palavra, sucessivamente, ao representante do Ministé-rio Público e ao defensor do acusado (...)

O interrogatório do acusado revela a autodefesa, que pode ser implementada independentemente da defesa técnica. O prejuízo, para mim, está estampado na condenação a seis anos e oito meses de reclusão. Presume-se que, se a norma é imperativa, é cogente, e foi inobservada, vindo a ser condenado o réu, houve o prejuízo.

Por isso, peço vênia para conceder a ordem, anulando o processo a partir do momento em que não foi observado o disposto no art. 41 da Lei 10.409, de 2002.

EXTRATO DA ATA

HC 86.166/CE — Relator: Ministro Eros Grau. Paciente: Manuel de Jesus Ribeiro Dias. Impetrante: Marcelo Fragoso Ponte. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: Por maioria de votos, a Turma indeferiu o pedido de habeas corpus, vencido o Ministro Marco Aurélio, que presidiu este julgamento na au-sência, ocasional, do Ministro Sepúlveda Pertence.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra. Delza Curvello Rocha.

Brasília, 17 de novembro de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031126

RECURSO EM HABEAS CORPUS 86.253 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Eros Grau

Recorrente: Leandro Alves Ferreira — Recorrido: Ministério Público Militar

Recurso ordinário em habeas corpus. Militar. Deserção. Prescrição: inocorrência. Nova deserção. Trânsfuga.

1. Crime de deserção. Sentença transitada em julgado. Incidência da regra geral do art. 125 do Código Penal Militar. Pena de seis meses não executada, em virtude de nova deserção. Prescrição da pretensão executória, pelo transcurso do prazo de um ano, considerado o cômputo pela metade em razão da meno-ridade do Recorrente à época do fato. Improcedência: quando da interposição do recurso ordinário, não havia transcorrido o prazo prescricional, o que somente veio a ocorrer entre a data da interposição e a do julgamento. Prescrição que não se declara, levando-se em conta a possibilidade da captura ou do compareci-mento do Recorrente antes do transcurso do prazo prescricional, facultado o requerimento na origem.

2. Quanto à segunda deserção, a extinção da punibilidade somente ocorrerá quando o trânsfuga atingir quarenta e cinco anos de idade, conforme previsão contida no art. 132 do Código Penal Militar.

Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provi-mento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso ordinário em habeas corpus.

Brasília, 4 de outubro de 2005 — Eros Grau, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Eros Grau: Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus, interposto contra acórdão do Superior Tribunal Militar assim ementado:

Ementa: Habeas corpus. Deserção (CPM, art. 187). Prescrição. Paciente condenado pelo crime de deserção, mas cuja execução da pena não se iniciou em virtude da prática de nova deserção. Insuficiência do lapso temporal para o reconhecimento da prescrição da pre-tensão executória. A circunstância de o Acusado permanecer na condição de trânsfuga, em relação a outra deserção, faz incidir-lhe a regra especial da prescrição contida no art. 132 do CPM. Denegada a ordem. Decisão unânime.

R.T.J. — 203 1127

2. O Recorrente foi condenado, em 12-6-03, a 6 (seis) meses de detenção como incurso no art. 187 do CPM. O Superior Tribunal Militar negou provimento à apelação da defesa em 29-4-04, mantendo a sentença pelos próprios fundamen-tos. O trânsito em julgado ocorreu em 16-8-04 para o Ministério Público Militar e em 14-9-04 para a defesa. O mandado de prisão expedido em 30-9-04 não foi cumprido porque o Recorrente se encontra em estado de deserção desde 25-9-04, dando ensejo a outra Instrução Provisória de Deserção (IPD 297/03).

3. Alega estar extinta a punibilidade, porque: (i) a pena cominada para o crime de deserção por praças varia de seis meses a dois anos de detenção (CPM, art. 187); e (ii) o art. 129 prevê a redução do prazo prescricional pela metade quando o agente for menor de vinte e um anos à época do fato.

4. Sustenta, ademais, que não se apresentou no quartel por causa de ameaças a sua vida, advindas de traficantes revoltados com a morte de dois companheiros em troca de tiros com militares.

5. Requer seja provido o recurso, a fim de que seja “extinta a punibilidade e trancada [sic] o derradeiro procedimento”.

6. O Ministério Público Federal é pelo não-provimento.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Leio do voto condutor do acórdão recorrido:

Em relação ao Processo de Execução 509/03-3, da 2ª Auditoria da CJM, verifica-se que a última causa interruptiva da prescrição ocorreu em 12-6-03 (sentença condenatória re-corrível), sendo certo que o Acórdão desta Corte data de 29-4-04. é fácil verificar que, mesmo levando-se em conta a metade do prazo, em razão da menoridade para o cálculo da prescrição (CPM, art. 129), o lapso temporal que medeia as mencionadas datas é inferior a 01 (um) ano, insuficiente, portanto, para reconhecer-se a prescrição.

Aliás, nem mesmo há falar em prescrição retroativa, porquanto, qualquer que seja o marco a ser considerado, todos eles também têm prazo inferior a 01 (um) ano.

De igual modo não há cogitar em prescrição da pretensão executória, haja vista que o trânsito em julgado para a Defesa, da sentença condenatória, ocorreu em 14-9-04, sendo certo que entre esse dia e a presente data não decorreu, ainda, o prazo de 01 (um) ano.

Por derradeiro, há que se ter em conta, também, a circunstância de o Acusado permane-cer na condição de desertor (IPD 297/03, da 1ª Auditoria da 1ª CJM), fazendo-se incidir, por-tanto, a regra especial da prescrição contida no art. 132 do CPM. Vale dizer que, nesse caso, só caberia reconhecer a prescrição quando o Paciente (desertor) atingisse a idade de 45 anos.

2. O Recorrente permanece na condição de trânsfuga, o que acarreta a inci-dência do art. 132 do CPM1 quanto ao segundo procedimento contra ele instaura-do, de modo que a prescrição da pretensão punitiva ocorrerá somente quando ele completar 45 anos de idade.

1 “Art. 132. No crime de deserção, embora decorrido o prazo da prescrição, esta só extingue a punibilidade quando o desertor atinge a idade de quarenta e cinco anos, e, se oficial, a de sessenta.”

R.T.J. — 2031128

3. Quanto à condenação transitada em julgado, há precedentes desta Corte no sentido de que “[a] norma geral do art. 125 do CPM é aplicável ao militar desertor que se apresenta ou é capturado, contando-se daí o prazo prescricional” (HC 79.432, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ de 15-10-99; e HC 82.075, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 11-10-02).

4. Ante o quadro, afigura-se perfeita a conclusão do Subprocurador-Geral da República no sentido de que, “considerada a pena de seis meses de detenção, ainda não houve o decurso do prazo de dois anos desde o trânsito em julgado da condenação, 14-9-04”.

5. No que tange ao lapso prescricional da pretensão executória, cumpre notar o seguinte trecho do voto condutor do acórdão recorrido:

De igual modo não há cogitar em prescrição da pretensão executória, haja vista que o trânsito em julgado para a Defesa, da sentença condenatória, ocorreu em 14-9-04, sendo certo que entre esse dia e a presente data não decorreu, ainda, o prazo de 01 (um) ano.

6. Vê-se, assim, que entre a data do trânsito em julgado (14-9-04) e a do julgamento do habeas corpus no STM (2-6-05) não havia transcorrido o prazo de 1 (um) ano. No entanto, entre o trânsito em julgado e o dia de hoje, perfez-se tempo superior a 1 (um) ano, o que autorizaria decretar a extinção da pretensão executória. Contudo, não é prudente prover o recurso para esse fim, uma vez que entre o julgamento do habeas corpus no STM e o deste recurso pode ter ocorrido a prisão ou o comparecimento do Recorrente antes do prazo prescricional, de modo que o não-provimento não lhe acarretará prejuízo, já que pode pleitear a extinção da pretensão executória na origem.

Nego provimento ao recurso.

EXTRATO DA ATA

RHC 86.253/RJ — Relator: Ministro Eros Grau. Recorrente: Leandro Alves Ferreira (Advogados: Wellington Mousinho Lins dos Santos e outros). Recorrido: Ministério Público Militar.

Decisão: A Turma negou provimento ao recurso ordinário em habeas corpus. Unânime.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra. Cláudia Sampaio Marques.

Brasília, 4 de outubro de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 203 1129

HABEAS CORPUS 86.501 — SP

Relator: O Sr. Ministro Eros Grau

Paciente: Adinelson Aparecido da Silva Prado ou Adinelson Aparecido da Silva — Impetrante: Raimundo Oliveira da Costa — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Estupro e atentado violento ao pudor. Mi-litar em serviço. Alegação de incompetência da Justiça comum. Improcedência.

Estupro e atentado violento ao pudor praticados por mi-litar. Sentença condenatória prolatada pela Justiça comum. Alegação de incompetência, sob o argumento de que o Paciente, no dia e na hora dos fatos, fazia o patrulhamento motorizado. Improcedência: não demonstrado, de forma incontestável, que ele estava em situação de serviço quando da prática dos crimes, descabe declarar, em habeas corpus, a incompetência da Justiça comum. A alegada circunstância de que estava em seu horário de expediente não é suficiente, por si só, para declarar a competên-cia da Justiça Militar.

Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primei-ra Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Marco Aurélio, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, indeferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 29 de novembro de 2005 — Eros Grau, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Eros Grau: O Paciente foi condenado a 11 (onze) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime fechado, sob a acusação da prática dos crimes tipificados nos arts. 213 e 214 c/c com os arts. 226 e 71, todos do Código Penal. A pena tornou-se definitiva 15 anos após o reconhecimento do concurso material em recurso de apelação do Ministério Público.

2. O Impetrante alegou, no habeas corpus denegado pelo STJ, incompetên-cia da Justiça comum, sob o argumento de que o Paciente é militar e estava em serviço na data e no horário em que ocorreram os fatos a ele imputados, o que atrai a competência da Justiça Militar.

3. Reproduz os argumentos refutados pelo Tribunal a quo e requer seja decla-rada a incompetência da Justiça comum, anulando-se a ação penal desde o início.

4. O Ministério Público Federal opina no sentido do indeferimento.

é o relatório.

R.T.J. — 2031130

VOTO

O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): O Paciente foi condenado como incur-so nas penas dos arts. 213 e 214, c/c o art. 226, III, por ter praticado, mediante grave ameaça exercida com emprego de arma de fogo, estupro e atentado violen-to ao pudor contra uma menor de 17 anos de idade.

2. O Impetrante alega que o Paciente é militar e estava em serviço na data e no horário em que os fatos aconteceram, decorrendo daí a incompetência da Justiça comum para julgá-lo, nos termos do previsto pelo art. 9º, III, c, do Código Penal Militar1.

3. Leio no voto condutor do ato impugnado, da lavra do Ministro Paulo Gallotti, que, “[n]ão restando demonstrado de forma incontestável nos autos que o paciente estava em situação de serviço quando do cometimento dos delitos, não há como, na via sumária do rito – ele já está condenado –, reconhecer a incompetência. Ainda que assim não fosse, o simples fato de estar o paciente, policial militar, em seu horário de expediente quando praticou os crimes contra a liberdade sexual, tal fato não seria suficiente, em tese, para se caracterizar como crime militar”.

4. De fato. O que se extrai dos autos é a controvérsia entre as afirmações de que o Paciente estava, na oportunidade, na escala do serviço motorizado (patru-lhamento com motocicleta) e o relato dos fatos constantes da denúncia, da sen-tença e do acórdão da apelação, dando conta de que ele estava em um automóvel Gol, cor branca, quando abordou a vítima, apontando-lhe a arma e obrigando-a a entrar no carro. Ademais, a vítima disse que ele provavelmente usava camiseta, o que enfraquece a tese da impetração. Também não há alusão a que tenha usado a arma da corporação para render a vítima.

5. Aliás, foi tendo em vista esse quadro de incertezas que a Procuradoria-Geral da República opinou no sentido do indeferimento da ordem:

O impetrante pretende o reconhecimento da incompetência da Justiça Comum para apreciar e julgar o feito, alegando que o paciente estava em horário de serviço quando do cometimento do crime, verificação esta a ser efetuada em escala de serviço, e se ao tempo do delito usava barba, e qual o veículo que utilizava.

Entretanto, é cediço que não cabe habeas corpus para a análise de prova, nem para discutir matéria fática decidida de maneira ampla.

(...)

1 “Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:(...)II - os crimes previstos neste Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal

comum, quando praticados:(...)c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou

em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou reformado ou civil.”

R.T.J. — 203 1131

No mesmo passo, não vejo motivo para obtenção de um salvo conduto em habeas cor-pus, uma vez que restou bem demonstrado, tanto na sentença como no acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, a materialidade e a autoria do crime.

Some-se a isso, o fato de que o paciente já havia confessado o cometimento do mesmo crime com o mesmo modus operandi “Estou preso de um outro delito da mesma espécie que lá admito tive minha parcela de responsabilidade” (fls. 22), o que demonstra a necessidade de manutenção de sua prisão.

Denego a ordem.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhor Presidente: “Some-se a isso” – diz o Ministério Público ao final de seu parecer – “o fato de que o paciente já havia confessado o cometimento do mesmo crime com o mesmo modus operandi ‘Es-tou preso de um outro delito da mesma espécie que lá admito tive minha parcela de responsabilidade’ (fls. 22), o que demonstra a necessidade de manutenção da sua da prisão.”

Acompanho o voto do Relator.

EXTRATO DA ATA

HC 86.501/SP — Relator: Ministro Eros Grau. Paciente: Adinelson Apa-recido da Silva Prado ou Adinelson Aparecido da Silva. Impetrante: Raimundo Oliveira da Costa. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidiu o julgamento o Ministro Marco Aurélio, na ausência, ocasional, do Ministro Sepúlveda Pertence.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo de Tarso Braz Lucas.

Brasília, 29 de novembro de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031132

HABEAS CORPUS 86.533 — SP

Relator: O Sr. Ministro Eros Grau

Paciente: Alex Benedito da Silva — Impetrante: PGE/SP – Patrícia Helena Massa Arzabe (assistência judiciária) — Coator: Colégio Recursal da Comarca de São Bernardo do Campo

Habeas corpus. Colégio Recursal de Juizado Especial. Ape-lação. Não-provimento. Remissão aos fundamentos da sentença. Ausência de fundamentação. Inocorrência.

O § 5º do art. 82 da Lei 9.099/95 faculta ao Colégio Recursal do Juizado Especial a remissão aos fundamentos adotados na sentença, sem que isso implique afronta ao art. 93, IX, da Cons-tituição do Brasil.

Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, indeferir o pedido de habeas corpus.

Brasília, 8 de novembro de 2005 — Eros Grau, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Eros Grau: O Ministério Público estadual ofereceu denúncia contra o Paciente pela prática do crime tipificado no art. 309 do Código de Trân-sito Brasileiro. Contemplado com a suspensão condicional do processo, veio a cometer outro delito no período de prova, dando ensejo à revogação do benefício, na forma do que prevê o § 3º do art. 89 da Lei 9.099/95. Sobreveio recurso de apelação, não provido, e habeas corpus contra o respectivo acórdão, sustentando afronta ao princípio da presunção de inocência, o qual foi denegado pela Turma Recursal da Comarca.

2. Daí este habeas corpus, sob o argumento de que o Colégio Recursal da Comarca de São Bernardo do Campo afrontou o art. 93, IX, da Constituição do Brasil, ao adotar os fundamentos da decisão que revogou a suspensão do proces-so como razão de decidir, para negar provimento ao recurso de apelação.

3. A Impetrante requer a concessão da ordem a fim de que se anule o acór-dão da Turma Recursal, impondo-se-lhe o dever de proferir outro devidamente fundamentado.

4. O Ministério Público Federal opina no sentido do indeferimento.

é o relatório.

R.T.J. — 203 1133

VOTO

O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): O § 5º do art. 82 da Lei 9.099/95 dispõe que, “[s]e a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão”. O preceito legal prevê, expressamente, a possi-bilidade de o órgão revisor adotar como razão de decidir os fundamentos do ato impugnado, o que não implica violação do art. 93, IX, da Constituição do Brasil.

2. é fora de dúvida que o acórdão da apelação, ao reportar-se aos funda-mentos do ato impugnado, não é carente de fundamentação, como sustentado pela Impetrante. Aludindo à motivação da sentença, delimita a causa de pedir de eventual recurso extraordinário ou de habeas corpus. Esta Corte firmou o en-tendimento de que “[a] adoção integral do parecer do Ministério Público – que, de sua vez, transcreve as razões da apelação –, não compromete a idoneidade da motivação do acórdão que a provê, se, nas peças adotadas, a decisão encontra fundamentação formalmente idônea, não cabendo indagar, em habeas corpus, da sua adequação substancial à prova” (HC 77.583, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 18-9-98).

3. No caso sob exame, os fundamentos da decisão que revogou a suspensão condicional do processo, adotados para negar provimento ao recurso de apelação, aludem à incompatibilidade desse benefício com a prática superveniente de outro crime; isso, aliás, na linha de entendimento desta Corte (HC 85.106, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 4-3-05).

Denego a ordem.

EXTRATO DA ATA

HC 86.533/SP — Relator: Ministro Eros Grau. Paciente: Alex Benedito da Silva. Impetrante: PGE/SP – Patrícia Helena Massa Arzabe (assistência judiciá-ria). Coator: Colégio Recursal da Comarca de São Bernardo do Campo.

Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus. Unânime.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo de Tarso Braz Lucas.

Brasília, 8 de novembro de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031134

HABEAS CORPUS 87.111 — RS

Relator: O Sr. Ministro Gilmar Mendes

Paciente: Ingrid Schmidt — Impetrantes: Simone Schroeder e outros — Coator: Presidente do Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. 2. Crime de roubo qualificado. 3. Inversão da apresentação das alegações finais. 4. Alegação de cerceamento de defesa pela não-apresentação das razões de alegações finais, após a reabertura do prazo. 5. Aplicação do princípio da proteção judicial efetiva. 6. Violação do direito de defesa e do princípio da dignidade humana. 7. Ordem deferida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, preli-minarmente, acolhendo questão de ordem, invalidar o julgamento anteriormente realizado e, por unanimidade de votos, deferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 21 de fevereiro de 2006 — Gilmar Mendes, Relator.

QUESTÃO DE ORDEM

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Senhor Presidente, este é um da-queles casos em que havia pedido de sustentação. Por essa razão, gostaria de sub-metê-lo a novo julgamento, formulando questão de ordem para tornar sem efeito o julgamento anterior, em razão de pedido de sustentação oral feito ao Gabinete.

O Sr. Ministro Celso de Mello (Presidente): Consulto os eminentes Minis-tros da Turma.

Na verdade, a Turma julgou este habeas corpus, denegando-o, embora houvesse prévia solicitação de sustentação oral.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Na última sessão administrativa tivemos uma resolução.

O Sr. Ministro Celso de Mello (Presidente): Exatamente.

VOTO(Sobre questão de ordem)

A Sra. Ministra Ellen Gracie: Senhor Presidente, na sessão anterior tivemos um caso análogo – não exatamente idêntico –, em que haviam sido proferidos apenas o meu voto e um pedido de vista.

R.T.J. — 203 1135

O advogado também havia solicitado sustentação oral, e o Gabinete, por alguma falha, deixou de avisar a data do julgamento. Procedemos da mesma forma; renovei o relatório, oportunizou-se a palavra ao defensor, e, depois, seguiu-se a votação.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Trata-se de habeas corpus, com medida liminar, impetrado, em favor de Ingrid Schmidt, contra decisão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça assim ementada:

Processual penal – Roubo – Inversão na ordem de apresentação das alegações finais – Intimação do magistrado para sanar o vício – Ausência de constrangimento ilegal.

- Tendo sido constatado o equívoco cartorário na intimação da defesa para apresen-tação das alegações finais e tendo o magistrado corrigido tal erro, não há que se falar em nulidade, mormente quando não houve qualquer prejuízo para a defesa.

- Ordem denegada.

(Fl. 181 – apenso 1.)

A Paciente foi condenada à pena de 6 (seis) anos de reclusão, em regime semi-aberto, pela prática do crime previsto no art. 157, § 2º, I e II, do Código Penal (roubo qualificado pelo emprego de arma e em concurso de pessoas).

Os Impetrantes postulam como se segue:

A defesa da paciente demonstrou interesse na oitiva desta testemunha, indicando, inclusive, três endereços onde poderia ser encontrada, bem como telefones (fl. 195). Con-forme certidão de folha 405/verso, a testemunha foi procurada em dois endereços diferentes, inclusive, indicados pela paciente. Tendo em vista o não comparecimento da testemunha, o MP desistiu da oitiva, passando a magistrada a encerrar a instrução criminal sem consultar a defesa sobre a desistência (fl. 406 e verso).

Foi aberto o prazo do 499 do CPP para o MP (fl. 406, verso) e, conjuntamente, para a assistência de acusação e defesa (fl. 417).

Intempestivamente, o Ministério Público apresentou alegações finais justificando o atraso (fl. 424), abrindo-se o prazo do artigo 500 do CPP para a defesa (fl. 437).

Em 29/07/98, a nota de expediente nº 103/98 foi publicada, abrindo-se então o prazo para defesa.

O escrivão do cartório verificou erro na ordem da apresentação das alegações finais, uma vez que a autoridade judiciária prineiro abriu vista à defesa e, após, para o assis-tente de acusação (fl. 438). Por conseqüência, expediu nova nota (nº 110/98), abrindo vista ao assistente de acusação.

Entretanto, como a nota já havia sido publicada, a defesa apresentou as suas ale-gações finais em 31.07.1998 (fls. 439/445), e a assistência da acusação em 17.08.1998 (fls. 447/461). Dessa forma, ocorreu a inversão na apresentação das alegações finais.

Novamente, foi aberto prazo para as alegações finais da defesa, não havendo as partes as oferecido (fl. 462).

Diante disso, a autoridade judiciária intimou o defensor constituído para que ratifi-casse as alegações já apresentadas e apresentasse alegações finais para o co-réu Rogério, sob pena de ser nomeado defensor dativo (fl. 462-v e 463).

Em face da ausência de apresentação das alegações finais para o co-réu Rogério, bem como da ratificação ou não daquelas apresentadas de maneira inversa, a autoridade judiciária nomeou defensor dativo (fl. 463, verso).

R.T.J. — 2031136

Porém, tal despacho restringiu-se apenas a intimação da defesa dativa para apre-sentação das alegações finais, sendo omisso no que tange à ratificação ou não daquelas que já haviam sido juntadas aos autos de forma inversa (fl. 463/verso e fl. 468).

Por conseqüência, o defensor dativo veio a apresentar alegações finais somente para o co-réu Rogério Severo Marques (fls. 469/470), não vindo a ratificar ou aditar as alegações finais já apresentadas (fl. 469), caracterizando ausência de defesa.(Fls. 4-6.)

Indeferi o pedido de liminar (fls. 33-36).

O parecer da Procuradoria-Geral da República é pelo indeferimento do writ (fls. 39-42).

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Tal como salientei por ocasião do indeferimento do pedido de liminar (fls. 33-36), do exame dos autos verificou-se, num primeiro momento, a inércia do defensor constituído, que, embora devida-mente intimado: i) não se pronunciou acerca das alegações finais do então Co-réu Rogério e ii) tampouco ratificou ou aditou as alegações finais da ora Paciente (fl. 84 – apenso 1).

Em um segundo momento, após nomeado defensor dativo (fls. 86-87 – apenso 1), observou-se que a defesa dativa não se pronunciou especificamente sobre a ratificação ou aditamento das alegações finais apresentadas pelo defensor anteriormente constituído com relação ao caso específico da ora Paciente.

Em que pese o fato da ocorrência intimação do defensor anteriormente constituído, o direito de defesa constitui pedra angular do sistema de proteção dos direitos individuais e materializa uma das expressões do princípio da digni-dade da pessoa humana.

Como se sabe, na sua acepção originária, esse princípio proíbe a utilização ou a transformação do homem em objeto dos processos e das ações estatais. O Estado está vinculado ao dever de respeito e proteção do indivíduo contra exposição a ofensas ou humilhações. A propósito, em comentários ao art. 1º da Constituição alemã, afirma Günther Dürig que a submissão do homem a um pro-cesso judicial indefinido e sua degradação como objeto do processo estatal atenta contra o princípio da proteção judicial efetiva (“rechtliches Gehör”) e fere o princípio da dignidade humana [“Eine Auslieferung des Menschen an ein staatliches Verfahren und eine Degradierung zum Objekt dieses Verfahrens wäre die Verweigerung des rechtlichen Gehörs.”] (MAUNz-DÜRIG, Grundgesetz Kommentar, Band I, München, Verlag C.H.Beck, 1990, 1I 18).

A premissa acima é suficiente a fazer incidir, automaticamente, a essência dos direitos argüidos na impetração. E, se há justo receito de serem eles infringi-dos, eles devem assumir máxima efetividade na ordem constitucional.

R.T.J. — 203 1137

Destarte, diante da constatação da inversão da ordem de apresentação das alegações finais e em razão da inércia dos defensores constituídos, constata-se que, no caso concreto, as peculiaridades indicam que não é possível subordinar o direito de defesa da ora Paciente aos efeitos da ausência de apresentação de efetiva defesa técnica.

Nestes termos, meu voto é pela concessão do presente habeas corpus.

VOTO(Retificação)

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Senhor Presidente, vou evoluir. Concedo a ordem.

PROPOSTA

O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Senhor Presidente, acompanho o voto do Relator, indo até além: penso ser o caso de se comunicar à Ordem.

O Sr. Ministro Celso de Mello (Presidente): Não teria havido, Senhor Mi-nistro Joaquim Barbosa, uma errônea compreensão, pelo ilustre advogado, de suas funções como defensor ou, até mesmo, de sua designação dativa?

O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Errônea com o objetivo preciso.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): A impressão dada é que houve um retardamento, uma não-ação leal.

O Sr. Ministro Celso de Mello (Presidente): Acolheria a proposta feita pelo eminente Ministro Joaquim Barbosa, se ficasse evidente, no caso, a ocorrência de deslealdade processual.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Nós não temos elementos. Mas o conjunto todo sugere pouca lealdade no procedimento.

EXTRATO DA ATA

HC 87.111/RS — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Paciente: Ingrid Schmidt. Impetrantes: Simone Schroeder e outros. Coator: Presidente do Supe-rior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma, por unanimidade, denegou o habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Celso de Mello. Presidiu este julgamento a Ministra Ellen Gracie. Segunda Turma, 14-2-06.

Decisão: A Turma, preliminarmente, acolhendo questão de ordem, in-validou o julgamento anteriormente realizado, nos termos do voto do Relator. Prosseguindo no julgamento, a Turma, por votação unânime, deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Falou pela Paciente a Dra. Simone Schroeder.

R.T.J. — 2031138

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão a Ministra Ellen Gracie e os Ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo da Rocha Campos.

Brasília, 21 de fevereiro de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coor-denador.

R.T.J. — 203 1139

HABEAS CORPUS 87.157 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Paciente e Impetrante: Bruno Thiago Cury Saba — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Ação penal. Homicídio doloso. Sentença de pronúncia. Fundamentação adstrita aos requisitos do art. 408 do Código de Processo Penal. Excesso de eloqüência acusatória. Não-ocor-rência. Nulidade que, ademais, só se caracterizaria, e apenas em relação ao respectivo julgamento, se, na sessão do Júri, fossem lidas ou referidas expressões que revelassem tal excesso. Habeas corpus denegado. Não há nulidade em sentença de pronúncia que, atendo-se aos requisitos do art. 408 do Código de Processo Penal, não incorre no chamado excesso de eloqüência acusatória, o qual, quando caracterizado e invocado na sessão, pode marear o vere-dicto do Tribunal do Júri.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segun-da Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, indeferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Joaquim Barbosa.

Brasília, 28 de novembro de 2006 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: 1. Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de Bruno Thiago Cury Saba, contra ato da Quinta Turma do Superior Tri-bunal de Justiça que, apreciando pedido de writ com o mesmo objeto, o indeferiu nos termos desta ementa:

Habeas corpus. Processual penal. Homicídio qualificado. Tribunal do Júri. Sentença de pronúncia. Nulidade. Fundamentação excessiva. Inocorrência. Exposição motivada do juízo de convencimento. Precedentes do STJ.

1. Não padece de nulidade a sentença de pronúncia em que o julgador se limita a expli-citar os fundamentos de sua convicção a respeito da existência da justa causa penal e de dúvi-das quanto à tese defensiva de legítima defesa e da inimputabilidade do acusado – observância do princípio in dubio pro societate, em termos sóbrios e comedidos, extremando-se no exame perfunctório e restrito do conjunto probatório coligido. Precedentes do STJ.

2. Ordem denegada.(Fl. 84.)

R.T.J. — 2031140

Alega o Impetrante: “A decisão de pronúncia conforme fora proferida pelo MM. Juízo se revela como verdadeira supressão da soberania dos Jurados, revelando aos juízes leigos qual a posição do Juiz de Direito sobre o caso (...)” (fl. 20).

Indeferi o pedido liminar às fls. 95-96.

Requer o Impetrante concessão da ordem, para declarar a nulidade da deci-são de pronúncia e, por conseguinte, determinar a expedição de alvará de soltura em favor do ora Paciente (fls. 27-28).

O Ministério Público Federal opina pelo não-conhecimento do pedido de writ ou, se conhecido, pela denegação da ordem (fls. 99-102).

é o breve relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. A questão deste habeas corpus está em saber se a decisão que pronunciou o Paciente excede os limites da razoável fundamentação, a ponto de subtrair a imparcialidade dos jurados.

Analiso-a, então, sobretudo nos trechos em que o Impetrante aponta exces-so de eloqüência acusatória:

O acusado, em seu interrogatório e nas alegações finais, suscita a possível existência de excludente de legítima defesa, ao afirmar que a vítima teria tentado sacar uma arma, para alvejá-lo.

A apreensão de fls. 96/97 e o Laudo de Local de fls. 259/262 indicam a possível existência da legítima defesa. Contudo, inexistem outros elementos nos autos que possam comprovar cabalmente tal excludente.

(...)Não existem maiores detalhes e, mesmo que houvesse uma concordância na versão,

seria impossível saber se Maria Luiza tomou a iniciativa de pegar a arma, para alvejar o Réu, ou se estava colocando a mão na bolsa com a finalidade de Defesa da agressão que a vitimou.

(...)Outro fato a dificultar a admissão da legítima defesa é a versão apresentada pelos de-

poimentos do sumário de que a vítima teria sido executada friamente com seis tiros, na frente de todos os empregados e clientes, em presumível excesso de execução.

(...)Edson, além disso, afirma que a vítima também teria sofrido um atentado poucos dias

antes de ser morta, mencionando ainda, diversas ameaças e agressões de Thereza e Bruno contra a vítima e seu pai.

(...)Devemos destacar que, em tal registro, Marthy Cury esclarece que Bruno estaria por-

tando ilegalmente uma arma de fogo já naquela época, ou seja, em 05/08/2000, o que reforça os indícios de premeditação do delito e de motivação torpe.

(...)Tais fatos anteriores indiciam a premeditação do delito, como já referido.(...)Os depoimentos prestados relatam diversas atividades ilícitas praticadas supostamente

por Bruno, dentro do estacionamento da família, inclusive tráfico de entorpecentes.(Fls. 9-11.)

R.T.J. — 203 1141

Como esta Corte tem reiteradamente decidido (cf. HC 68.606, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 21-2-92; HC 77.044, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 7-8-98; HC 81.959, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 7-6-02; HC 86.460, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 11-11-05), a fundamentação da decisão de pronúncia há de adscrever-se aos requisitos do art. 408 do Código de Processo Penal, sem incorrer naquilo que o primeiro desses precedentes sintetiza como “excesso de eloqüência acusatória”.

Não quadra, todavia, impor às decisões de pronúncia um padrão teórico de fundamentação, perante o qual as decisões sejam nulas por excesso ou por escassez de razões decisórias (cf. AI 406.566, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 30-9-02; AI 482.807, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 28-11-03). é preciso examinar cada caso.

Ora, a decisão aqui atacada equilibra-se entre o dever de motivação, cons-tante do art. 93, inciso IX, da Constituição da República, e o de não exceder os li-mites próprios do juízo de pronúncia. Fundamenta com suficiência a impossibili-dade de, ao menos nesse juízo, desclassificar a imputação formulada contra o ora Paciente, e, por conseqüência, remete a causa ao julgamento do Tribunal do Júri.

O convencimento necessário do juiz não é obviamente a convicção íntima do jurado, que os princípios repeliriam, mas convencimento fundado na prova. Donde a exigência conseqüente – que aí cobre tanto a existência do crime quanto a ocorrência de indícios de autoria – de que o juiz decline, na decisão “os motivos do seu convencimento” (cf. HC 81.646, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 9-8-02).

Limitou-se o juiz, no caso, após apreciar questões jurídicas argüidas pelas partes, a demonstrar a existência da materialidade do crime e os indícios de que o Paciente seria seu autor, nos exatos termos do citado art. 408 do Código de Processo Penal.

Ademais, ainda que, por hipótese, estivera configurado eventual excesso, cumpre consignar que a doutrina tem sustentado, com acerto, que:

Bem analisadas as coisas, o juiz que se excede na justificação da pronúncia não está invadindo a esfera de competência do júri, o que só ocorreria se, por absurdo, condenasse o réu ou o absolvesse por precariedade de provas. Tal excesso parece caracterizar, antes disso, uma impropriedade ligada ao estilo da motivação, ou seja, trata-se do emprego de expressões lingüísticas não apropriadas para um tipo de decisão que, apresentada em plenário, pode re-presentar uma indevida influência na formação da convicção dos jurados. Sob esse enfoque, haverá também, nulidade, mas não da decisão de pronúncia e sim do julgamento em plenário, se aos jurados forem lidas ou referidas as expressões que revelam uma opinião judicial pe-remptória sobre questões relacionadas ao próprio mérito da causa.(GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A motivação das decisões penais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 234.)

Destaco, ainda, o parecer da Procuradoria-Geral da República:

No caso em tela, diante da comprovada materialidade do delito e havendo suficientes indícios de autoria, sobretudo face à confissão do próprio paciente em sede de interrogatório

R.T.J. — 2031142

(relatório às fls. 55/56), restou ao magistrado esclarecer os elementos que o levaram a concluir pela existência das qualificadoras, que justificaram o seu entendimento sobre a não existência da excludente de ilicitude alegada (legítima defesa).

O art. 408, caput, do Código de Processo Penal dispõe que se “o juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu convencimento”, não havendo na decisão de fls. 51/61 qualquer termo ou expressão excessiva, constatando-se apenas a fundamentação necessária à admissibilidade da acusação quanto ao homicídio duplamente qualificado e ao afastamento da excludente de ilicitude, o que atende, igualmente, ao previsto no art. 93, inciso IX, da Constituição Federal.

Certo é que, nos crimes dolosos contra a vida, o juízo de certeza sobre a autoria é da competência exclusiva do Tribunal do Júri, estando vedado ao juízo singular, ao proferir a sentença de pronúncia, fazer incursões suscetíveis de influenciar o corpo de jurados sobre a autoria e culpabilidade do réu. Todavia, tal influência não é constatada na decisão em comen-to, merecendo transcrição alguns de seus trechos, que revelam o equilíbrio na exposição dos argumentos do Juízo:

“Assim, havendo fundada dúvida sobre a existência da legítima defesa, não pode ser a mesma acolhida nessa fase processual, devendo o fato ser levado ao julgamento do tribunal popular, que analisará todos os elementos colhidos nos autos para formar sua convicção íntima sobre a existência da excludente, pesando e quantificando depoimentos, laudos, etc., inclusive sobre eventual excesso” (fl. 57) – destaque nosso.

“Tendo em vista tais evidências, considero patente o indiciamento das qualificadoras, que deverão ser devidamente apreciadas pelo Juiz Natural, ou seja, o Tribunal do Júri, da mesma forma que a excludente de legítima defesa” (fl. 58) – destaque nosso.

“Por isso, a alegação de inimputabilidade é outra questão a ser decidida pelo Júri, já que configura excludente de culpabilidade, não havendo, no momen-to, como reconhecê-la, diante dos elementos existentes no processo” (fl. 59) – destaque nosso.Da análise da decisão recorrida não se extrai, portanto, termos que revelem um juízo

de certeza, ou mesmo exageros indevidos na fundamentação empregada, de modo a poder influenciar o corpo de jurados, razão pela qual deve ser mantida a sentença de pronúncia.

Por fim, verifica-se que, nos autos do presente writ, foram acostadas apenas cópias da sentença de pronúncia e dos acórdãos do recurso em sentido estrito e do habeas corpus impetrado perante o STJ, de modo a inviabilizar o conhecimento dos argumentos de defesa na instrução criminal, o que só se faria possível pela análise da defesa prévia e das alegações finais dos réus. Diante dessas circunstâncias, essa Corte Suprema também já se manifestou no sentido de que “não tendo sido reproduzido nos autos de habeas corpus o teor da defesa prévia e das alegações finais da defesa, não é possível verificar se o Juiz, em face delas, pre-cisou, ou não, ser mais minucioso na fundamentação da sentença de pronúncia. Enfim, se se excedeu ou não”. (Fls. 99-102.)

2. Assim, denego a ordem.

EXTRATO DA ATA

HC 87.157/RJ — Relator: Ministro Cezar Peluso. Paciente e Impetrante: Bruno Thiago Cury Saba (Advogado: Luiz Carlos da Silva Neto). Coator: Supe-rior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma, por votação unânime, indeferiu o pedido de habeas cor-pus, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Joaquim Barbosa.

R.T.J. — 203 1143

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Eros Grau. Ausente, justificadamente, o Ministro Joaquim Barbosa. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mário José Gisi.

Brasília, 28 de novembro de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coorde-nador.

R.T.J. — 2031144

HABEAS CORPUS 87.293 — PE

Relator: O Sr. Ministro Eros Grau

Paciente: Ivan Martiniano de Oliveira — Impetrantes: Fernando José Alves de Souza e outros — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Homicídio qualificado. Inépcia da denúncia. Trancamento da ação penal. Improcedência. Autoria. Controvér-sia. Matéria probatória.

1. Não é inepta a denúncia que qualifica os acusados, des-creve o fato criminoso e suas circunstâncias e apresenta o rol de testemunhas. Hipótese em que o Ministério Público qualificou o Paciente e outros e lhes imputou os fatos que culminaram no crime de homicídio, perfazendo o nexo causal entre as condutas e o resultado finalístico.

2. Quanto ao Paciente, em particular, a sentença de pronún-cia alude a declarações de testemunha, afirmando tê-lo visto no local e no momento do disparo que atingiu a vítima. A contradita a esse depoimento torna os fatos controversos, exigindo dilação probatória, incabível em habeas corpus.

Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, indeferir o pedido de habeas corpus.

Brasília, 7 de fevereiro de 2006 — Eros Grau, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Eros Grau: Os Impetrantes apontam o Superior Tribunal de Justiça como coator, por ter denegado o HC 33.130, impetrado contra decisão do TJPE que indeferira pleito idêntico. O acórdão está assim ementado:

Processual penal. Habeas corpus. Homicídio qualificado. Pretensão de trancamento da ação penal. Alegação de falta de justa causa para a persecução criminal. Fato típico e indícios de autoria demonstrados. Inépcia da denúncia não caracterizada. Instrução probatória indis-pensável. Ordem denegada.

- Não há falar-se em trancamento de ação penal, na via estreita do habeas corpus, quando os fatos a serem apurados se revestem de tipicidade e os indícios de autoria estão devidamente demonstrados, inexistindo causa para a extinção da punibilidade.

- é entendimento pacífico desta corte Superior de Justiça que o trancamento da ação penal em sede de habeas corpus reveste-se de absoluta evidência de que, nem mesmo em tese, o fato imputado ao paciente constitui crime.

R.T.J. — 203 1145

- A estreita via eleita não se presta como instrumento processual para exame da pro-cedência ou improcedência da acusação, com incursões em aspectos que demandam dilação probatória e valoração do conjunto de provas produzidas, o que só poderá ser feito após o en-cerramento da instrução criminal, sob pena de violação ao princípio do devido processo legal.

- Não se vislumbrando de imediato a ausência de justa causa (atipicidade, negativa de autoria e extinção da punibilidade), dependendo da instrução probatória para ser aferida, não há como obstar liminarmente a pretensão acusatória.

- Não demonstrada a inépcia da exordial acusatória, tendo em vista que expõe o fato tido como delituoso em todas as suas circunstâncias, de forma concreta e determinada, permi-tindo o exercício da ampla defesa. Poderá o paciente, no momento oportuno e na sede própria, defender-se das referidas imputações com os meios e recursos inerentes ao devido processo legal.

- Ordem denegada.

2. O Paciente e outros foram denunciados e pronunciados pela prática do crime descrito no art. 121, § 2º, incisos II e IV, c/c os arts. 29 e 61, todos do Código Penal.

3. Os Impetrantes pugnam pelo reconhecimento da ausência de justa causa para a ação penal, argumentando com a inépcia da denúncia. Alegam, em síntese, “que na peça vestibular acusatória há (...) apenas os nomes dos denunciados, ora Pacientes, com as suas respectivas qualificações, sem que haja, na des-crição fática do evento criminoso, sequer os seus nomes, para que possam plenamente exercerem o direito constitucional da ampla defesa, resultando, destarte, em prejuízo para o contraditório, e por via de conseqüência para o devido processo legal, o que clausula, dita peça vestibular, de inepta, exata-mente por faltar-lhe justa causa” (fl. 4).

4. Sustentam, por fim, não haver “legitimidade para se perquirir qualquer responsabilidade do Paciente, nos termos elencados na exordial acusatória guer-reada, quer por não ter havido conduta típica punível, quer por não ter existido dolo ou culpa, elemento subjetivo indispensável que, obrigatoriamente, deve fi-car demonstrado pelo órgão acusador quando da narrativa contida na denúncia”.

5. Requerem a concessão da ordem, a fim de que a ação penal seja trancada.

6. O Ministério Público opina no sentido da denegação (fls. 136/143).

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): A Promotora de Justiça de Garanhuns/PE qualificou os acusados, descreveu os fatos embasadores da denúncia e apresen-tou o rol de testemunhas (fls. 27/29). Colhe-se da peça acusatória que a vítima e seus amigos foram abordados pelos seguranças de um evento que tinha como atração principal o Trio Elétrico Chiclete com Banana. Ao tentar transpor o cor-dão de isolamento, o grupo foi agredido pelo Paciente e seus colegas. Escaparam, mas foram abordados em outro local e novamente espancados, sendo que a víti-ma ainda foi alvejada com tiros no abdome, vindo a falecer.

R.T.J. — 2031146

2. Os Impetrantes apegam-se à circunstância de que nem o nome do Pacien-te nem de qualquer outro agressor constaram da descrição dos fatos, de modo que a denúncia seria inepta.

3. Não têm razão, contudo.

4. O Ministério Público qualificou os acusados e imputou-lhes os fatos que culminaram no homicídio de Ricardo Alexandre Barros Dantas, perfazendo, assim, o nexo causal entre as condutas e o resultado finalístico.

5. A denúncia preenche as condições previstas no art. 41 do CPP: descreve o fato criminoso e suas circunstâncias, qualifica os acusados, classifica o crime e apresenta o rol de testemunhas.

6. Observe-se, quanto ao Paciente, em particular, que a sentença de pro-núncia alude a declarações da testemunha José Francisco da Silva, a revelarem a existência de indícios de autoria, quando afirma que ele, Paciente, estava presen-te no local e no momento do disparo que atingiu a vítima (fl. 94). O protesto da defesa, contraditando a testemunha, torna os fatos controversos, exigindo dilação probatória insuscetível de exame em habeas corpus.

7. O entendimento pacificado nesta Corte é o de que o trancamento da ação penal, como providência excepcional que é, somente é possível quando não houver dúvidas a propósito da atipicidade, da ausência de autoria, da exclusão de ilicitude e da extinção da punibilidade (cf., entre outros, os HC 84.232-AgR, Pleno, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 25-2-05; e HC 85.184, Primeira Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 8-4-05).

8. O acórdão impugnado está em harmonia com o entendimento deste Tribunal.

Denego a ordem.

EXTRATO DA ATA

HC 87.293/PE — Relator: Ministro Eros Grau. Paciente: Ivan Martiniano de Oliveira. Impetrantes: Fernando José Alves de Souza e outros. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus. Unânime. Não participaram deste julgamento os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 7 de fevereiro de 2006 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 203 1147

HABEAS CORPUS 87.379 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Eros Grau

Paciente: Maria Isabel Andrés Villanueva Lopes — Impetrantes: Luis Car-los da Silva Neto e outros — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Prisão em flagrante. Ilegalidade. Relaxa-mento. Matéria probatória.

O habeas corpus não é a via adequada à análise de questões fáticas, das quais decorreria a conclusão de ilegalidade da prisão em flagrante e, em conseqüência, de seu relaxamento.

Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, indeferir o pedido de habeas corpus.

Brasília, 7 de fevereiro de 2006 — Eros Grau, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Eros Grau: O Superior Tribunal de Justiça negou provimen-to a recurso ordinário em habeas corpus, afastando a alegação de nulidade do auto de prisão em flagrante e repelindo a tese do excesso de prazo da instrução criminal, em acórdão assim ementado:

Recurso ordinário em habeas corpus. Artigo 12 da Lei 6368/76. Prisão em flagran-te. Nulidade do auto de prisão em flagrante. Inadequação da via eleita: profundo reexame probatório. Excesso de prazo. Constrangimento ilegal não configurado: Súmula 52 do STJ. Recurso improvido.

1. O recurso ordinário em habeas corpus não é a via adequada para reconhecer nulida-de de auto em flagrante que requer profundo exame probatório, quando a insurgência reside na quantidade de substância apreendida, a quantia paga aos policiais e o reconhecimento da recorrente como autora do crime.

2. Alegado excesso de prazo no término da instrução criminal: incidência do enunciado 52 da Súmula deste STJ (“encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de cons-trangimento ilegal por excesso de prazo”).

3. Recurso ordinário a que se nega provimento.

2. A Paciente foi presa em flagrante pela prática do crime do art. 12 da Lei 6.368/76. Segundo os Impetrantes, dois policiais receberam denúncia anônima de que ela fazia parte de um esquema conhecido como “disque-drogas”. Após mencionarem o nome Leandro, senha para o atendimento, os agentes encomen-daram dez saquinhos de cocaína e dirigiram-se à residência da Paciente para bus-cá-los, recebendo sete saquinhos ao preço total de R$ 35,00 (trinta e cinco reais).

R.T.J. — 2031148

3. Os Impetrantes alegam que a prisão em flagrante é ilegal, porquanto: (i) a Paciente não sabe quem é Leandro, nem possui qualquer ligação com ele; (ii) “não é razoável que, se tal comércio existisse, se concretizaria com cifras tão pequenas”; (iii) os policiais não teriam visto a mulher que os atendeu, porque a droga e o dinheiro teriam sido passados por baixo do portão; (iv) ante a recusa em abrir o portão, os policiais teriam pulado o muro e invadido a residência, sem mandado judicial e sem testemunhas; (v) quando da invasão, a Paciente estaria no segundo andar da casa, na janela, e somente nessa oportunidade é que foi vista pelos policiais; (vi) a residência teria sido vasculhada, sem apreensão de drogas ou qualquer quantia em dinheiro; (vii) enfim, havendo dúvidas a propósito da imputação por tráfico de entorpecentes, há de incidir o princípio in dubio pro reo.

4. Os Impetrantes requerem o relaxamento da prisão.

5. O Ministério Público Federal manifesta-se pela denegação da ordem.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Leio o parecer do Subprocurador-Geral da República Edson Oliveira de Almeida:

1. Resume a decisão que indeferiu a liminar (fls. 90-91):“O Superior Tribunal de Justiça negou provimento a recurso ordinário em habe-

as corpus, tendo o acórdão a seguinte ementa:‘Recurso ordinário em habeas corpus. Artigo 12 da Lei 6368/76. Prisão

em flagrante. Nulidade do auto de prisão em flagrante. Inadequação da via eleita: profundo reexame probatório. Excesso de prazo. Constrangimento ilegal não configurado: Súmula 52 do STJ. Recurso improvido.

1. O recurso ordinário em habeas corpus não é a via adequada para re-conhecer nulidade de auto em flagrante que requer profundo exame probatório, quando a insurgência reside na quantidade de substância apreendida, a quantia paga aos policiais e o reconhecimento da recorrente como autora do crime.

2. Alegado excesso de prazo no término da instrução criminal: incidên-cia do enunciado 52 da Súmula deste STJ (‘encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo’).

3. Recurso ordinário a que se nega provimento.’2. Os impetrantes alegam que a quantidade de droga, o pequeno valor cobrado

aos policiais e a impossibilidade de reconhecer-se a paciente como autora do tráfico de entorpecentes descaracterizam a prisão em flagrante.

3. Requerem seja concedida a liminar para relaxar a prisão.4. é o breve relatório. Decido.5. Sem prejuízo do exame aprofundado das razões da impetração, não tenho, à

primeira vista, como satisfeito o requisito do fumus boni iuris.Indefiro o pedido de liminar.”

2. A paciente foi presa em flagrante, em 7.12.2004, portando cocaína, sendo denun-ciada como incursa no art. 12 da Lei n. 6.368/76. A impetração pede a expedição de alvará de soltura.

3. Não prospera a pretensão.4. Conforme bem elucidado no acórdão impugnado, não como revogar a prisão em

flagrante, pois o “habeas corpus não é a via adequada para reconhecer nulidade que requer

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profundo exame probatório, pois sua insurgência reside na quantidade de substância apreen-dida, a quantia paga aos policiais e o reconhecimento da recorrente como autora do crime. Percebe-se que são matérias insuscetíveis de análise em uma ação de cognição sumária”.

5. Por outro lado, tratando-se de crime de tráfico de entorpecentes, descabe a concessão de liberdade provisória (art. 2º, II, da Lei 8.072/90).

6. Isto posto, opino pela denegação do pedido.

2. Afasto – porque contrário ao entendimento desta Turma – o fundamento no sentido de que o crime de tráfico de drogas não comporta liberdade provisória. De outra banda, observo que os depoimentos policiais dão conta de que a Pacien-te foi presa em flagrante vendendo cocaína, versão por ela contestada. Logo, não há como reconhecer a ilegalidade da prisão sem o necessário cotejo probatório.

Acolho a manifestação da Procuradoria-Geral da República e denego a ordem.

EXTRATO DA ATA

HC 87.379/RJ — Relator: Ministro Eros Grau. Paciente: Maria Isabel Andrés Villanueva Lopes. Impetrantes: Luis Carlos da Silva Neto e outros. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus. Unânime. Não participaram deste julgamento os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 7 de fevereiro de 2006 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

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HABEAS CORPUS 88.284 — SC

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Paciente: Luiz Alberto Dias — Impetrante: Daisy Cristine Neitzke Heuer — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Ação penal. Sentença condenatória. Pena. Dosimetria. Ma-joração ou aumento. Circunstâncias legais desfavoráveis conside-radas. Fundamentação suficiente. Ilegalidade não caracterizada. Habeas corpus denegado. Aplicação dos arts. 59 e 68 do Código Penal. Não aparece como ilegal a sentença condenatória que eleva a pena à vista de circunstâncias desfavoráveis que, com apoio na lei, enuncia expressamente.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segun-da Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Gilmar Mendes, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, denegar a ordem. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Ministros Celso de Mello e Eros Grau.

Brasília, 24 de abril de 2007 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: 1. Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de Luiz Alberto Dias, contra ato do Superior Tribunal de Justiça que lhe concedeu, parcialmente, ordem no HC 48.559.

Denunciado como incurso nas sanções dos arts. 12, caput, e 14, ambos da Lei 6.368/76, foi condenado à pena de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de re-clusão, em regime integralmente fechado. Interpôs recurso de apelação ao TJSC, que manteve a sentença condenatória.

Impetrou-se, então, habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça, que conheceu parcialmente do pedido, para afastar o óbice à progressão de regime prisional. A ementa é do seguinte teor:

Habeas corpus. Penal. Tráfico. Crime hediondo (artigo 2º da Lei 8.072/90). Pena superior à do co-réu. Circunstâncias judiciais. Situações diversas. Análise dos fatos. Não conhecimento nessa parte. Progressão de regime prisional. Afastamento do óbice imposto na lei de crimes hediondos.

1. Se a pretensão de ver alterada a pena corporal implicar, necessariamente, em rea-valiação das circunstâncias judiciais e, conseqüentemente em profunda análise do conjunto fático-probatório, inviável o conhecimento do writ nesta parte.

2. A constitucionalidade do artigo 2º, §1º, da Lei 8.072/90 já restou declarada pelo Supremo Tribunal Federal, inexistindo qualquer decisão plenária infirmando sua adequação à atual Carta Constitucional (posição vencida);

3. Ordem parcialmente conhecida e, no ponto, concedida, para afastar o óbice à pro-gressão de regime contido na Lei de Crimes Hediondos.(Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJ de 6-11-06.)

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Alega o Impetrante que “não se trata de análise de mérito, pois não há necessidade de análise de matéria de fato, mas tão somente de direito, afinal o objeto da impetração limita-se a requerer a adequação da pena, com base nos critérios que foram estabelecidos em relação aos demais co-réus, pois carente de fundamentação a fixação da pena em relação ao paciente” (fl. 5).

Requer a concessão da ordem, “para que se determine que o Superior Tribunal de Justiça conheça da impetração, uma vez que o pleito se resume a constatação da ausência de fundamentação, na aplicação da pena e sua despro-porcionalidade em relação aos demais co-réus, o que não implica em necessidade de análise de matéria de fato, mas tão somente de direito” (fl. 14).

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo indeferimento da ordem (fls. 56-62).

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. Insurge-se o Impetrante contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça que conheceu, parcialmente, do HC 48.559, tão-só para afastar o óbice à progressão de regime previsto na Lei dos Crimes Hediondos.

Alega que, ao não conhecer do pedido referente à mitigação da pena, teria denegado prestação jurisdicional.

2. A rigor, por não ter o Superior Tribunal de Justiça conhecido do habeas corpus, no ponto em que o Impetrante alegara ausência de fundamentação e desproporcionalidade da pena imposta ao Paciente, estaria a Corte impedida de apreciar a matéria, sob pena de supressão de instância.

Não vislumbro, todavia, nem incongruência nem omissão que comprome-tam a integridade lógica da fundamentação da pena (cf. HC 67.791, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 24-4-90) e sejam aptas a justificar eventual nulidade, seja da sentença condenatória, seja do acórdão do TJSC que a confirmou.

A exacerbação da pena não decorreu de ilegalidade nem abuso de poder suscetível de verificação objetiva, mas de mero juízo de valor confiado ao juiz sentenciante.

Alega o Impetrante desproporcionalidade na fixação das penas impostas aos co-réus, sobretudo à luz dos critérios considerados pelo magistrado na análise do art. 59 do Código Penal.

Ora, escusa dizer que a individualização da pena tem o alcance de eleger a justa e adequada sanção penal, quanto ao montante, ao perfil e aos efeitos in-cidentes sobre cada sentenciado, tornando-a, nesse sentido, única e distinta dos demais infratores, ainda que co-autores ou co-réus.

Transcrevo trecho da sentença no qual o juiz fixa a pena do ora Paciente:

No que tange às circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, tem-se que a culpabilidade do acusado, no sentido da reprovabilidade de sua conduta, deve ser considerada grave, tendo em vista que é pessoa com instrução e de recursos, de modo que lhe ainda mais exigível conduta diversa.

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Com efeito, é pessoa de quase quarenta anos de vida, tem carro próprio, família, se-gundo grau completo e curso de turismo e hotelaria, e, além disso, é sócio de uma cooperativa da qual aufere cerca de R$ 30.000,00 por temporada (conforme consta de seu interrogatório às fls. 208/211 dos autos); não possui antecedentes aptos a lhe gerar uma dosagem adversa da pena; sua conduta social não pode ser tida como desfavorável, pois além dos poucos elemen-tos a respeito, consta que é integrante e fundador da Associação dos Barqueiros de Transporte da praia do Campeche, em Florianópolis, na qual exercia a função de Conselheiro Fiscal (fl. 645/653); sua personalidade é desvirtuada para o crime, já que mesmo com sua favorável condição pessoal, vinha praticando o comércio de cocaína em larga escala, consciente dos perversos efeitos que o consumo de droga acarreta na sociedade; quanto aos motivos do crime, verifica-se que foi a vontade de obter vantagem ilícita com a venda de drogas, o que também é reprovável; no que tange às circunstâncias do crime, são altamente desfavoráveis ao acusado, haja vista que se trata da apreensão, num total de 55 quilos de cocaína, a qual seria repassada a outros traficantes (mais de um), havendo indícios, conforme dito, que a droga seria inclusive remetida ao exterior. Além disso, a ação criminosa envolveu arremesso da droga através de aeronave, e aliciamento de pessoas com parcos recursos da região para o recolhimento da dro-ga, atingindo graves proporções, tanto é que, ao final, acabaram sendo acusadas nove pessoas envolvidas com os fatos; em relação às conseqüências do crime, foram também graves, na medida em que seriam distribuídos a consumo (e foram em outras ocasiões, já que o próprio acusado admitiu que já comprou cocaína para vender por inúmeras vezes) grande quantidade de entorpecente; sendo vítima a saúde pública, não há que se falar no seu comportamento para efeito da ocorrência do delito.

Em atenção a tais considerações, considerando que foram desfavoráveis cinco circuns-tâncias judiciais (dentre elas as preponderantes – art. 67 do CP), com base nos arts. 59 e 60 do Código Penal, fixo a pena base em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão (salientando que na cominação estipulada pelo legislador apenas nesta primeira fase a pena poderia ir até 15 anos!), e multa no valor de 120 dias-multa.

Na segunda fase da dosimetria constato que há em favor do acusado a atenuante da confissão-espontânea (art. 65, III, d, do CP). Assim, diminuo a pena em 6 meses, tornando-a provisória em 6 (seis) anos de reclusão, mantendo o valor e a quantidade da multa.

Na terceira fase da pena há a causa de aumento descrita no art. 18, III, da Lei nº 6.368/76. Por tal razão, considerando que, dentre as duas causas de aumento descritas em tal inciso, só se verificou a ocorrência de uma, aumento a pena em um terço, de modo a ficar estabelecida em 8 (oito) anos de reclusão, e 160 dias multa.

Contudo, também na terceira fase reconheço a causa de diminuição descrita no art. 14 da Lei nº 9.807/99, afinal, conforme reconhecido anteriormente, o acusado colaborou na identificação dos demais co-autores ao prestar seus depoimentos. Como se retratou em Juízo em relação àquilo que disse na fase policial, diminuo a pena em um terço, de modo a torná-la definitiva em 5 (cinco) anos 4 (quatro) meses de reclusão, e 107 dias-multa, já que não há outras causas de aumento ou diminuição.

Em atenção ao disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, fixo o regime integral-mente fechado para o cumprimento da pena.

(Fls. 678-680 do apenso.)

Vê-se, pois, que (i) a majoração da pena-base está lastreada em circunstân-cias judiciais claramente desfavoráveis ao ora Paciente, e (ii) a fixação da pena aparece devidamente fundamentada, nos exatos termos dos arts. 59 e 68 do Código Penal.

Manifestou-se, com acerto, o Ministério Público Federal:

No que tange à dosimetria da pena, excepcionalmente, admite-se o manejo do remédio heróico quando destinado à correção de erro manifesto da sentença na fixação da pena.

Na espécie, inobstante o esforço do impetrante em dar fundamentos para sua assertiva, trazendo ao autos, inclusive, quadro comparativo entre o quantum da pena base fixada para o

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paciente e a imposta aos demais co- réus, inexiste qualquer ilegalidade a ser corrigida pela via do habeas corpus.

Com efeito, a jurisprudência desta Suprema Corte reiteradamente têm manifestado-se pela possibilidade de fixação da pena base acima do mínimo legal, desde que as circunstâncias judiciais do art. 59, do Código Penal, estejam devidamente fundamentadas, ou seja, mostrem-se baseadas em elementos concretos colhidos do processo de conhecimento.

Nessa linha, temos os seguintes precedentes:Ementa: Habeas corpus. Pena-base. Fixação acima do mínimo legal. Circuns-

tâncias judiciais. O juiz de primeira instância, em razão das circunstâncias judiciais desfavoráveis ao paciente, pode elevar a pena-base. Precedentes. Habeas corpus indeferido1.

Ementa: Penal. Processual penal. Habeas corpus. Dosimetria da pena. Irregu-laridade. Improcedência. Reincidência. Prescrição. Consideração como maus antece-dentes. Código Penal, art. 64, I.

I - Por conter questões novas, não apreciadas pelo Superior Tribunal de Justiça, o habeas corpus não pode ser conhecido, sob pena de supressão de instância.

II - O juiz observou, na fixação da pena, os critérios estabelecidos nos arts. 59 e 68 do Código Penal, certo que a grande quantidade de droga apreendida constitui motivação idônea para fixação da pena-base acima do mínimo legal.

III - A condenação atingida pelo prazo previsto no art. 64, I, do Código Penal, pode ser levada em consideração no processo de dosimetria da pena para caracteriza-ção dos maus antecedentes.

IV - Habeas corpus conhecido em parte e, na parte conhecida, indeferido2.

Ementa: Habeas corpus – Caso Abílio Diniz – Crimes contra o patrimônio, contra a paz pública, contra a administração pública e contra a pessoa – Delitos prati-cados em co-autoria – Condenação – Pena in concreto atribuída em igual quantidade para todos os réus – Decisão plenamente motivada – Fundamentação proporcional ao rigor utilizado na aplicação da pena – Inocorrência de ofensa ao art. 29 do Código Penal – Inadmissibilidade da discussão, em habeas corpus, dos critérios de índole pessoal subjacentes à dosimetria da pena – Pretendida descaracterização do crime de quadrilha – Inadmissibilidade – Pedido indeferido. Imposição de pena criminal – Ri-gor penal – Necessidade de motivação do ato decisório. - Os sentenciados têm direito público subjetivo à fundamentação individualizadora das penas que venham a sofrer por efeito de condenação criminal. Satisfaz integralmente a exigência constitucional de motivação dos atos decisórios a condenação penal que, ao optar pelo limite máximo das penas impostas, expõe os elementos de fato em que se apoiou o juízo de especial exacerbação da pena, explicitando dados da realidade objetiva aos quais se conferiu, com extrema adequação, a pertinente valoração judicial procedida com estrita obser-vância dos parâmetros fixados pelo ordenamento positivo. A jurisprudência do Supre-mo Tribunal Federal – tratando-se de decisão penal condenatória que se revela impreg-nada, em toda a sua estrutura formal, de coerência lógico-jurídica – tem ressaltado ser inviável o habeas corpus, quando utilizado para impugnar o ato de fixação da pena, que, apoiado nas diretrizes dos arts. 59 e 68 do Código Penal, tenha derivado de valora-ção efetuada pelo Tribunal no que concerne ao grau de culpabilidade dos agentes (...)3.Na situação em apreço, não se constata qualquer vício relativo à motivação da decisão

judicial que fixou a pena base do paciente em quantitativo diverso daquele firmado para os de-mais co-reús. Tal resultado decorre das condições pessoais de cada acusado que são distintas, conduzindo, fatalmente, a quantitativos diferenciados.

1 HC 86.301, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ de 16-12-05.2 HC 86.415, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 18-11-05.3 HC 72.992, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 14-11-96.

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Remata adiante:

Depreende-se, que inexiste qualquer vício manifesto a invalidar o ato judicial de dos-agem da pena, vez que extensa e coerentemente motivado. Logo, não há, por sua vez, qualquer ilegalidade na decisão do Colegiado do Superior Tribunal de Justiça que deixou de conhecer do pedido de redução da pena, ao entendimento que a sua apreciação demandaria análise do mérito da causa.

O acórdão hostilizado mostra-se em harmonia com a copiosa jurisprudência desta Corte que, repetidas vezes, tem firmado ser inviável em sede de habeas corpus, “questionar os critérios que levaram o Tribunal, em ato decisório consistentemente motivado, a impor sanção objetivamente mais grave a determinados comportamentos delituosos”4.(Fls. 56-62.)

3. Assim, é por não vislumbrar hipótese que caracterize injusto cons-trangimento à liberdade do ora Paciente que, adotando o minucioso parecer da Procuradoria-Geral da República, denego a ordem.

EXTRATO DA ATA

HC 88.284/SC — Relator: Ministro Cezar Peluso. Paciente: Luiz Alberto Dias. Impetrante: Daisy Cristine Neitzke Heuer. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: Denegada a ordem. Decisão unânime. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Ministros Celso de Mello e Eros Grau. Presidiu este julga-mento o Ministro Gilmar Mendes.

Presidência do Ministro Gilmar Mendes. Presentes à sessão os Ministros Cezar Peluso, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Ausente, justificadamente, o Minis-tro Celso de Mello. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner Gonçalves.

Brasília, 24 de abril de 2007 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

4 HC 72.992, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 14-11-96.

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HABEAS CORPUS 88.520 — AP

Relatora: A Sra. Ministra Cármen Lúcia

Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Marco Aurélio

Paciente: Benedito Dias de Carvalho — Impetrantes: Eduardo Antonio Lu-cho Ferrão e outros — Coator: Delegado de Polícia Federal da Superintendência Regional no Estado do Amapá

Habeas corpus – Prejuízo – Ambigüidade e necessidade de pronunciamento do Supremo. Surgindo ambíguo o prejuízo da impetração, e sendo o tema de importância maior, considerado o Estado Democrático de Direito, impõe-se o pronunciamento do Supremo quanto à matéria de fundo.

Inquérito – Sigilo – Alcance – Acesso por profissional da ad-vocacia. O sigilo emprestado a autos de inquérito não obstaculiza o acesso por profissional da advocacia credenciado por um dos envolvidos, no que atua a partir de visão pública, a partir da fé do grau detido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência da Ministra Ellen Gracie, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria, conceder a ordem de habeas corpus, vencida a Relatora, que a julgava prejudicada. Votou a Presidente. Ausentes, justificadamente, os Ministros Sepúlveda Pertence e Eros Grau.

Brasília, 23 de novembro de 2006 — Marco Aurélio, Relator para o acórdão.

RELATÓRIO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia: Cuida-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por Eduardo Antonio Lucho Ferrão e outro em favor de Bene-dito Dias Carvalho, atualmente exercendo o cargo de Deputado Federal, contra ato do Delegado da Polícia Federal da Superintendência Regional no Estado do Amapá, que, nesta ação, comparece como autoridade coatora.

Tem-se nos autos que o Paciente é investigado perante este Supremo Tribu-nal, no Inq 2.213, em razão da prerrogativa de foro constitucionalmente prevista, decorrente do cargo de Deputado Federal no qual está atualmente investido. Em autos apartados ao inquérito estão juntadas as informações sigilosas provenien-tes das interceptações telefônicas realizadas pela Polícia Federal.

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Os Impetrantes informam que, após terem agendado a oitiva do Paciente, para o dia 19-4-06, com o Delegado Federal responsável pelas diligências deter-minadas no referido inquérito, solicitaram vista, para exame prévio, dos autos do inquérito e do conteúdo dos autos nos quais se contêm informações sigilosas, tendo, naquela oportunidade, a referida autoridade denegado o pedido, nos ter-mos seguintes:

O presente inquérito contém informações de caráter sigiloso, provenientes de intercep-tação telefônica.

Os diálogos interceptados servem, neste caso, como principal critério de orientação do percurso investigativo, notadamente das inquirições realizadas.

Permitir que o investigado tenha acesso a tais informações, antes de sua oitiva equi-valeria a fornecer-lhe, antecipadamente, um roteiro das possíveis indagações que lhe seriam formuladas, o que, a meu ver, frustaria (sic) o objetivo da investigação.(Fl. 3.)

Sustentam eles, portanto, que tal decisão “viola flagrantemente o direito do Paciente de ter conhecimento da acusação contra si formulada, assim como de ser assistido por advogado constituído que possa, garantida a ampla defesa, orientar-lhe, o que gera flagrante constrangimento ilegal passível de ser reparado pela via do habeas corpus” (fl. 3).

Requereram fosse liminarmente concedida a presente ordem de habeas corpus, “para o fim de permitir que os advogados constituídos pelo Paciente tenham acesso ao inquérito antes da realização de sua oitiva, inclusive das grava-ções telefônicas ali existentes, podendo realizar anotações e obter cópia integral do caderno inquisitorial” (fl. 12).

Em 18-4-06, a Ministra Ellen Gracie, a quem sucedi na relatoria desta ação, deferiu parcialmente a liminar, para que os advogados constituídos pelo Paciente pudessem examinar os autos do inquérito sem, contudo, terem acesso ao produto das interceptações telefônicas (fl. 24).

Solicitadas informações, foram elas prestadas no dia 9-8-06 (fls. 38-39).

A Procuradoria-Geral da República emitiu parecer, em 16-8-06, da lavra do ilustre Subprocurador-Geral Dr. Wagner Gonçalves, no qual opinou pela extin-ção do processo por perda de objeto (fls. 62-64).

é o relatório.

VOTO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): Conforme relatado, o presente habeas corpus tem o objetivo precípuo de “permitir que os advogados consti-tuídos pelo Paciente tenham acesso ao inquérito antes da realização de sua oitiva, inclusive das gravações telefônicas ali existentes, podendo realizar anotações e obter cópia integral do caderno inquisitorial” (fl. 12).

De plano verifico que o deferimento da medida liminar satisfez, em parte, o quanto requerido, já se tendo passado sete meses da ocorrência daquela oitiva.

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A impetração parece-me, pois, prejudicada, como bem explicitado no pa-recer do Subprocurador-Geral da República, cujas razões acolho apenas na parte concernente ao prejuízo da ação, sem aceitar ou comprometer-me com os demais itens do seu arrazoado.

Em efeito. Tem-se nas informações prestadas pela autoridade ora tida como coatora que, em 19-4-06, data em que o Paciente foi inquirido em Brasília, os advogados do Impetrante tiveram acesso aos autos do inquérito para vista e extração das cópias necessárias (fls. 38-39).

Realizado o quanto originariamente pretendido na impetração, tenho por prejudicado o presente habeas corpus, em razão da perda superveniente de objeto (art. 659 do Código de Processo Penal).

Deixo de apreciar, então, as razões expostas pelo Subprocurador-Geral da República quanto à circunstância de não terem sido livremente franqueadas aos Impetrantes determinadas informações, que constavam das interceptações telefônicas, em razão exclusivamente da especificidade do pedido formulado no habeas, a saber, “permitir que os advogados constituídos pelos Pacientes tenham acesso ao inquérito antes da realização de sua oitiva, inclusive, das gravações telefônicas ali existentes, podendo realizar anotações e obter cópia integral do caderno inquisitorial” (fl. 12).

Tendo tido eles acesso – conquanto restrito, em razão de ter sido a liminar deferida apenas parcialmente – aos dados, e já tendo ocorrido a oitiva para a qual se pretendia o acesso, tenho como incidente, na espécie, a perda de objeto da ação.

Por essas razões, Srs. Ministros, voto no sentido do prejuízo do presente habeas corpus.

é o voto.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhora Presidente, a regra é a publicidade dos atos, inclusive daqueles praticados em procedimento revelador de inquérito, e assusta, pelo menos à primeira vista – deixo registrada a óptica –, o sigilo abso-luto, que por vezes se pretende impor a certas peças do processo, sigilo absoluto a inviabilizar, até mesmo, o acesso do envolvido.

Já tivemos, no próprio Supremo, um caso em que houve deferimento de liminar em mandado de segurança, quando se obstaculizou, em comissão par-lamentar de inquérito, o acesso do interessado a dados relativos à quebra do próprio sigilo bancário; houve a concessão de liminar e não sei se chegamos ao julgamento de fundo. Relatei esse mandado de segurança.

Agora, no caso concreto, não fosse esse aspecto, caminharia no sentido da concessão da ordem, pouco importando o desdobramento quanto ao interroga-tório, à oitiva do envolvido. O pedido formulado por profissional da advocacia se mostrou específico, ou seja, o acesso aos dados antes da oitiva do deputado federal. A esta altura, ele já foi ouvido e, como ressaltado pela Relatora, já teve acesso às peças.

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A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): Registro, Sr. Ministro, que a ne-gativa, tal como veio nas informações que me foram prestadas – baseada, inclu-sive, na jurisprudência que tem sido reiterada na Primeira Turma, tenho vários votos de relatoria, por exemplo, do Ministro Sepúlveda Pertence –, não integrava ainda o inquérito e ainda estava em fase de diligência, que seria desdobrada até à oitiva, com outras possibilidades, e não se fizesse, mas imediatamente na se-qüência...

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Estou, aqui, a repetir o que já sustentei na Turma e, por último, no Tribunal Superior Eleitoral. E lá há ainda uma pendên-cia em que, numa representação, o partido, a coligação representante, pretendeu a requisição de peças de um inquérito. O Relator deferiu a requisição, mas, ao chegarem, indeferiu o pedido de vista das mesmas peças pela coligação que plei-teara a diligência.

Vejo um pouco preocupado esse obstáculo, esse sigilo absoluto a ponto de não se dar vista sequer a quem tenha requerido uma diligência. Mas, no caso, não. No caso, tem-se o prejuízo da impetração.

Registrando apenas o ponto de vista, acompanho S. Exa.

DEBATE

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Senhora Presidente, também tenho acompa-nhado e decidido nesse sentido, mas, tanto em habeas corpus, quanto em mandado de segurança, em que asseguramos determinadas providências, eu me pergunto – e isso também me coloca em dúvida, agora – se não seria o caso, de fato, de de-ferir a ordem. Isso tem acontecido, por exemplo, nos casos em que temos esses embates nas Comissões Parlamentares de Inquérito. Então, realmente, tenho-me perguntado se não era o caso de confirmar a liminar.

O Sr. Ministro Carlos Britto: O acesso aos autos já se franqueou ao Paciente.

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Porque é para deixar declarada a jurisdicidade da liminar concedida.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Tem acontecido muito isso no que diz respeito às Comissões Parlamentares de Inquérito, porque, por exemplo, assegu-ramos o direito ao silêncio, etc., e depois dizemos: não, mas isso já se encerrou, está prejudicado. Parece-me que há uma contradição.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Fica como que perpetuada uma violência.

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): Mas o direito que ele postulou já obteve.

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Mas é só para declarar, em definitivo, que aquilo que postulou era direito dele.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Nesse caso, houve o deferimento da liminar?

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): Houve o deferimento da liminar. Ele teve acesso, então, àquelas peças antes; a Ministra Ellen Gracie deferiu a

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liminar no dia 18; e ele foi ouvido no dia 19. Nesse dia, a medida tinha natureza satisfativa.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Penso que o recomendável é, realmente, irmos adiante para confirmar essa liminar, sob pena de uma medida precária e efêmera perder o sentido. Quer dizer, temos que placitar o ato primeiro; e a forma de fazermos isso é conceder a ordem, declarando-a, portanto, legítima.

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Até porque, na verdade, a liminar é a chama-da antecipação da tutela, de modo que o direito à tutela final tem que ser agora reconhecido.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Claro que não há possibilidade de se retor-nar ao statu quo ante, mas me permito, então, ir adiante para conceder a ordem, calcado, até mesmo, nos fundamentos da liminar, que penso merecedores de encômios.

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): Sim, porque, aliás, já se cumpriu, ela tinha natureza satisfativa.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: A própria liminar foi satisfativa, mas essa circunstância não é um óbice ao julgamento de fundo da impetração. Ao contrá-rio, recomenda.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: A matéria está pendente, com o voto favorá-vel do Relator ao óbice em um tribunal superior, o Tribunal Superior Eleitoral. é preciso que o Supremo sinalize quais são os ares vividos atualmente.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Senhora Presidente, vou pedir vênia para conceder a ordem, pelos exatos fundamentos da liminar.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Eu tenho várias decisões no mesmo senti-do, por conta da repetição.

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Eu também.

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Para tornarmos definitivo, sob o ângulo legal, o acesso.

O Sr. Ministro Cezar Peluso: E significar que há um pronunciamento do Plenário.

VOTO

A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente): Já que a liminar é minha, tam-bém vou conceder a ordem, com vênia da Ministra Cármen Lúcia.

Eu não teria nenhuma dificuldade em adotar as razões esposadas pela Ministra Cármen Lúcia, que tem sido a praxe nesta Casa de julgar prejudicados aqueles habeas corpus em que já se tenha extinguido inteiramente a medida pleiteada.

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EXTRATO DA ATA

HC 88.520/AP — Relatora: Ministra Cármen Lúcia. Relator para o acór-dão: Ministro Marco Aurélio. Paciente: Benedito Dias de Carvalho. Impetrantes: Eduardo Antonio Lucho Ferrão e outros (Advogados: Marcelo Leal de Lima Oliveira e outros). Coator: Delegado de Polícia Federal da Superintendência Regional no Estado do Amapá.

Decisão: O Tribunal, por maioria, concedeu a ordem de habeas corpus, vencida a Relatora, que a julgava prejudicada. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. Lavrará o acórdão o Ministro Marco Aurélio. Ausentes, justificadamen-te, os Ministros Sepúlveda Pertence e Eros Grau.

Presidência da Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Vice-Procurador-Geral da Re-pública, Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos.

Brasília, 23 de novembro de 2006 — Luiz Tomimatsu, Secretário.

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HABEAS CORPUS 88.950 — RS

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio

Paciente: Lucas Eduardo dos Santos — Impetrante: Bruno Seligman de Menezes — Coator: Ministro Relator do HC 200601034195 do Superior Tribu-nal Militar

Inquérito – Direito de permanecer em silêncio – Advertên-cia. A necessidade de a autoridade policial advertir o envolvido sobre o direito de permanecer em silêncio há de ser considerada no contexto do caso concreto. Sobressaindo o envolvimento de cidadão com razoável escolaridade – 2º Tenente da Aeronáu-tica –, que, alertado quanto ao direito à presença de advogado, manifesta, no inquérito, o desejo de seguir com o interrogatório, buscando apenas gravá-lo, sendo o pleito observado, e, na ação penal, oportunidade na qual ressaltada a franquia constitucional do silêncio, confirma o que respondera, inclusive relativamente à negativa de autoria, não cabe concluir por vício, no que a ação pe-nal fora ajuizada a partir do que contido nos autos do inquérito.

Ação penal – Conselho de justificação – Esferas penal e administrativa – Independência. A independência das esferas penal e administrativa é conducente a ter-se como neutra, no tocante à primeira, concessão de ordem, sujeita ainda a reexame necessário, pelo Juízo Federal, devendo seguir normalmente o processo penal em curso na circunscrição militar.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supre-mo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, indeferir o pedido de habeas corpus.

Brasília, 25 de setembro de 2007 — Marco Aurélio, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Ao proceder ao exame do pedido de con-cessão de medida acauteladora e indeferi-lo, considerada à época a circunstância de ainda não se ter a decisão do Colegiado do Superior Tribunal Militar, assim resumi as balizas deste processo (fl. 106):

1. Este habeas visa à conclusão sobre a insubsistência do interrogatório do Paciente em inquérito policial militar. Em síntese, aponta o Impetrante que o Relator de idêntica medida no Superior Tribunal Militar indeferiu o pedido acautelador, em que pese à verificação de nuli-dade no inquérito. é que não houve tempo razoável, entre a intimação do Paciente e a data do interrogatório, para contactar com profissional da advocacia. Afirma que o acompanhamento de advogado serviria para evitar a prática de irregularidades. A intimação do Paciente, para ser ouvido no início da tarde de 13 de fevereiro de 2006 – segunda-feira –, ocorreu em 10 anterior,

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sexta-feira. Este compareceu ao ato quando, também, não foi alertado quanto ao direito de permanecer em silêncio. O Impetrante pleiteava, na peça primeira, à qual juntou documentos, a concessão de liminar visando a suspender a audiência designada para 8 de junho de 2006, na Primeira Auditoria da Terceira Circunscrição da Justiça Militar.

O processo veio-me concluso em 7 de junho de 2006, às 17h (fl. 105).

Acrescento que o Impetrante juntou documentos, entre eles a cópia da inicial do habeas impetrado no Superior Tribunal Militar e da intimação para comparecimento considerado o inquérito policial militar. Apontou, então, o julgamento do habeas pelo Superior Tribunal Militar, que prestou informações e encaminhou documentos, complementados após com o acórdão proferido.

O Ministério Público emitiu parecer, de fls. 173 a 177, no sentido do inde-ferimento da ordem. Eis o que consignado na ementa (fl. 173):

Habeas corpus substitutivo. Crime militar. Inquérito policial militar. Procedimento de natureza informativa. Não contaminação da ação penal. Precedentes STF. Ausência de advogado durante o interrogatório policial. Indiciado que não foi alertado sobre o direito de permanecer calado. Não ocorrência de cerceamento. Ausência de demonstração de prejuízo.

Ao processo veio a notícia de haver o Juízo da 2ª Vara Federal de Canoas, em mandado de segurança, afastado os efeitos de atos realizados no Conselho de Justificação. Por último, ante audiência de julgamento designada para 14 de se-tembro de 2007, pleiteou o Impetrante a concessão de liminar visando suspendê-la, mas não logrou êxito.

Lancei visto no processo em 13 de setembro de 2007, liberando-o para julgamento na Turma, a partir de 18 de setembro de 2007, isso objetivando a ciência do Impetrante.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): A esta altura, inexiste o óbice do Verbete 691 da Súmula do Supremo, que, de qualquer forma, há de ter alcance definido à luz da Constituição Federal, sem obstaculizar o acesso a este Tribunal, presente situação reveladora de constrangimento ilegal.

Quanto ao tema de fundo, observem as peculiaridades da espécie. O Paciente é 2º Tenente da Aeronáutica, pessoa suficientemente esclarecida. Compareceu para ser interrogado em virtude de inquérito. Então, o encarregado desse ins-trumental, consoante se verifica a fls. 25 a 28, o advertiu de que teria direito a presença de advogado, mas, mesmo assim, o Paciente declarou que não havia necessidade porquanto tudo seria gravado em vídeo, passando a responder as per-guntas veiculadas. Se, de um lado, é certo que se deve conferir a maior eficácia à garantia constitucional do inciso LXIII do art. 5º da Carta de 1988 – “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada assistência da família e de advogado;” –, não limitando o preceito o vocábulo preso, de outro, não menos correto é que a situação concreta há de ser considerada, sobressaindo o grau de escolaridade do envolvido e a postura que assuma no inquérito. Conforme já consignado, tem-se a qualificação do Paciente

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como 2º Tenente da Aeronáutica e, na assentada em que interrogado no inquérito policial militar, foi alertado quanto ao direito a assistência de advogado, mas manifestou desejo de ser de imediato interrogado e de ter gravada a sessão. Eis o registro do acontecimento (fls. 89 a 93):

Apresentou ofício solicitando que a audiência fosse gravada em vídeo, em virtude da ausência de um advogado e do tempo disponível entre a intimação e a data da oitiva. pergun-tado: se deseja a presença de advogado, respondeu: que não, que apenas gostaria de filmar a inquirição. Esclareceu-se ao indiciado que a presença de um advogado seria um direito seu, ao que o indiciado consentiu, ainda assim, em prosseguir na oitiva sem a referida presença, sendo autorizada a gravação em vídeo; além do que será fornecida ao indiciado cópia do presente Termo de Inquirição.

Mais do que isso, ante a 1ª Auditoria da 3ª Circunscrição da Justiça Militar, o Paciente, advertido quanto aos direitos constitucionais, incluído, evidente-mente, o de permanecer calado e, ao que tudo indica, assistido pelo defensor que constituíra – o agora Impetrante –, foi ouvido e confirmou o inteiro teor do depoimento que prestara no inquérito, mantendo a negativa de autoria (fl. 147).

Dessa forma, quanto ao processo penal, não cabe cogitar de vício, ficando afastada a possibilidade de se ter o ato do Superior Tribunal Militar como reve-lador de constrangimento ilegal. Vale frisar, por oportuno, que as esferas penal e cível são independentes, não cabendo a consideração, a esta altura, da decisão do Juízo Federal, que se encontra sujeita, como noticiado, a reexame necessário no Tribunal Regional Federal. Consigno o que apontado pelo Juízo Federal ao deferir a medida acauteladora no mandado de segurança (fl. 200):

Ademais, não estava o impetrante a ser acusado da prática de crime perante o Conselho de Justificação, mas, sim, da prática de ato que afeta a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe. Se de tal ato pode decorrer – como de fato possível – a caracterização de conduta delituosa no âmbito militar, isto não acarreta a duplicidade ou identidade de respon-sabilização.

Ante o quadro, indefiro a ordem.

EXTRATO DA ATA

HC 88.950/RS — Relator: Ministro Marco Aurélio. Paciente: Lucas Eduardo dos Santos. Impetrante: Bruno Seligman de Menezes. Coator: Ministro Relator do HC 200601034195 do Superior Tribunal Militar.

Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus. Unânime.

Presidência do Ministro Marco Aurélio. Presentes à sessão os Ministros Carlos Britto, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Menezes Direito. Subpro-curador-Geral da República, Dr. Wagner de Castro Mathias Netto.

Brasília, 25 de setembro de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031164

HABEAS CORPUS 88.978 — DF

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Paciente: Jaime Pereira Sardinha — Impetrante: Gilsomar Silva Barbalho — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Ação penal. Crime de quadrilha ou bando. Delito formal contra a paz pública. Circunstâncias elementares do tipo. Con-curso de, pelo menos, quatro pessoas, finalidade específica dos agentes e estabilidade do consórcio. Exigência da prática ulterior de delito compreendido no projeto criminoso. Desnecessidade. Figura autônoma. Descrição suficiente dos fatos elementares. De-núncia apta. Impossibilidade de aprofundar a cognição dos fatos à luz da prova. Habeas corpus denegado. Inteligência do art. 288 do Código Penal. Precedentes. Crime formal, o delito de quadrilha ou bando consuma-se tanto que aperfeiçoada a convergência de vontade dos agentes e, como tal, independe da prática ulterior de qualquer delito compreendido no âmbito de suas projetadas ativi-dades criminosas.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, indeferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Falou, pelo Paciente, o Dr. Gilsomar Silva Barbalho e, pelo Ministério Público Federal, o Dr. Francisco Adalberto Nórbrega. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Gilmar Mendes.

Brasília, 4 de setembro de 2007 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: 1. Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, em favor de Jaime Pereira Sardinha, contra ato da Sexta Turma do Su-perior Tribunal de Justiça, que, apreciando writ com o mesmo objeto, o indeferiu, nos termos desta ementa:

Habeas corpus. Direito processual penal. Quadrilha. Trancamento da ação penal. Au-sência de justa causa. Inépcia da denúncia. Inocorrência.

1. A prova inicial que instrui a denúncia há de assegurar a viabilidade da ação penal, não se exigindo, contudo, que predefina a prova bastante à condenação.

2. A alegação da falta de indícios bastantes de autoria e materialidade dos fatos impu-tados na denúncia, enquanto requisitam aprofundado exame do conjunto da prova, não pode ser apreciada na via augusta do habeas corpus.

3. Ajustada ao artigo 41 do Código de Processo Penal, porque descreve a conduta im-putada ao paciente, definindo, com suficiência, a tarefa que lhe cabia na quadrilha, de forma a

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permitir-lhe o exercício da ampla defesa, não há falar em inépcia da denúncia, até porque, de qualquer modo, a lei processual penal admite que as suas omissões possam ser supridas até a sentença (Código de Processo Penal, artigo 569).

4. Ordem denegada.(Fls. 142-143.)

Alega o Impetrante que a denúncia recebida contra o ora Paciente carece de justa causa, sobretudo de indícios mínimos de autoria (fl. 2).

Aduz, ainda, que a ação penal se baseia em meras suposições, pois “afir-mam que o paciente estaria participando de uma suposta organização criminosa, devido ao fato de ter sido mencionado em ligação de terceiros que estava tudo combinado com o ‘peixe’. Como o paciente tem o sobrenome Sardinha, associa-ram, sem nenhum indício de ato próprio, que se tratava de Jaime Sardinha” (fl. 4).

Requer o Impetrante, por derradeiro, o trancamento da ação penal (fl. 6).

Indeferi o pedido liminar às fls. 189-190.

O Ministério Público Federal é pelo indeferimento da ordem (fls. 193-197).

é o breve relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. O pedido, aqui, envolve a questão de saber se a acusação oferecida contra o Paciente é apta, e provida de justa causa a ação penal.

Alega o Impetrante, em síntese, que o Ministério Público não descreveu nenhuma conduta delituosa que justificasse a denúncia oferecida contra o Paciente. Menciona, ainda, precedente da Corte, no sentido de que: “Não coaduna com os postulados básicos do Estado de Direito e viola o princípio da dignidade da pessoa humana denúncias genéricas que não descrevem os fatos na sua devida conformação, nem apresenta sequer indícios de fato ou ato de autoria do acusado descrito como crime na lei penal” (HC 84.768, Rel. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, DJ de 27-5-05) (fl. 3).

Transcrevo, a respeito, trechos da denúncia:

O grupo integrado pelos Denunciados, todos de forma livre e com consciência da ilici-tude, agindo, desde o ano de 2002 no Distrito Federal, organizaram-se, com divisão de tarefas e de forma coordenada, com o fim de praticar inúmeros crimes e auferir vantagem econômica ilícita para si e para outrem, utilizando para atingir os seus objetivos, o poder-dever do Estado na autuação do Fisco.

Os denunciados Sami e Sônia passaram a integrar o mesmo grupo de trabalho na Secretaria de Fazenda do Distrito Federal em março de 2001. A partir daí, paulatinamente, e de acordo com a necessidade associaram-se a eles para cometer crimes de forma livre e consciente, de maneira estável e para auferir lucros ilícitos os auditores aposentados, Tomaz Canabrava e Vicente de Paulo, o Presidente da 1ª câmara e do pleno do TARF-DF (Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais do Distrito Federal) Jaime Sardinha, a advogada e filha do 1º denunciado, Tamara Kuperchimit, o amásio da 2ª denunciada, Lincoln, bem como os técnicos em contabilidade Antônio dos Santos, Helton Correia, Francisco Lúcio, Waldemar Walter e Luiz Papa.

(...)

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é de se ressaltar que as negociações visavam produzir a diminuição do valor da multa acessória, do próprio valor do tributo devido, bem como facilitar a antecipação do pagamento da dívida tributária como se fosse denúncia espontânea, tudo em prejuízo do Erário Público e com o fim de obter vantagem ilícita, como de fato ocorreu no caso da Web Editora fls. 526/528, Transquadros fls. 173/174 e da Adler, fls. 150/160 e outras.

Não satisfeito, o grupo criminoso, do qual faziam parte Sami e Sônia, utilizando das funções públicas que exerciam, exigiam vantagem indevida dos empresários para que con-feccionassem as defesas administrativas e recursos e recursos em 2ª instância, com garantia de êxito, dado que aí entraria em ação o denunciado Jaime Sardinha que é presidente da 1ª câmara e do pleno do Tarf-DF, o qual utilizando de sua função pública assegurava o resultado prometido na negociação a fim de receber para si vantagem indevida.

(...)O grupo liderado pelos auditores, realizava venda de serviços ilícitos de defesa ad-

ministrativa para as empresas, praticando, assim o patrocínio direto e indireto de interesses privados perante a administração fazendária, valendo-se da qualidade de auditores tributários dos dois primeiros denunciados, bem como das pessoas de Tomaz Canabrava e de Jaime Sardinha, os quais eram responsáveis também em garantir o êxito do recurso em 2ª instância, cujo denunciado Jaime era o Presidente da 1ª Câmara e do Pleno do Tarf-DF.

O quinto denunciado, Tomaz Canabrava também era o responsável em conseguir informações privilegiadas de processos e em levar ao Jaime Sardinha, sexto denunciado, as propostas de negociações do grupo com empresas que possuíam processos em andamento no Tarf, sendo eles os responsáveis em traçar as estratégias de atuação do grupo criminoso para garantir êxito na causa e poderem receber o dinheiro da propina.(Fls. 14-25 – Grifei.)

2. A denúncia, como se vê, imputa ao Paciente a prática do delito de qua-drilha ou bando. E dispõe o art. 288 do Código Penal:

Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes:Pena – reclusão, de um a três anos.

Busca o tipo penal garantir a paz pública, “aí tomada em sentido subjetivo, isto é, como sentimento coletivo de paz que a ordem jurídica assegura”, leciona Nelson Hungria1. E, para que exista o delito, completa o renomado autor, “é suficiente o mero fato de se associarem mais de três pessoas (no mínimo, quatro) para o fim de cometer crimes, sem necessidade, sequer, do começo da atuação do mais ou menos extenso plano criminoso que os associados se hajam proposto”2.

Daí os elementos do crime de quadrilha ou bando:

(a) concurso necessário de pelo menos quatro (4) pessoas (RT 582/348 – RT 565/406), (b) finalidade específica dos agentes voltada ao cometimento de delitos (RTJ 102/614 – RT 600/383) e (c) exigência de estabilidade e de permanência da associação criminosa (RT 580/328 – RT 588/323 – RT 615/272).(HC 72.992, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 14-11-96.)

Tiro do voto do Relator desse precedente:

O crime de quadrilha é juridicamente independente daqueles que venham a ser prati-cados pelos agentes reunidos na societas delinquentium (RTJ 88/468). O delito de quadrilha subsiste autonomamente, ainda que os crimes para os quais foi organizado o bando sequer venham a ser cometidos.

1 Comentários ao Código Penal. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1958, p. 163. 2 Idem, p. 177.

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é este o entendimento adotado no julgamento do HC 81.260, pelo Plenário desta Corte, em acórdão da lavra do Ministro Sepúlveda Pertence e de cuja ementa consta:

1. O crime de quadrilha se consuma, em relação aos fundadores, no momento em que aperfeiçoada a convergência de vontades entre mais de três pessoas, e, quanto àqueles que venham posteriormente a integrar-se ao bando já formado, no (sic) adesão de cada qual; crime formal, nem depende, a formação consumada de quadrilha, da realização ulterior de qualquer delito compreendido no âmbito de suas projetadas atividades criminosas, nem, conseqüentemente, a imputação do crime coletiva a cada um dos partícipes da organização reclama que se lhe possa atribuir participação concreta na comissão de algum dos crimes-fim da associação.

(Grifei.)

3. Como dito, o Impetrante aduz inépcia formal da denúncia oferecida contra o ora Paciente, nomeando-a genérica, por não individualizar a conduta que lhe é atribuída.

Diversamente do sustentado pelo Impetrante, a acusação é apta.

A Constituição da República, no art. 5º, inciso LV, assegura ao acusado o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Entre tais meios, cumpre consignar que o Pacto de São José da Costa Rica prevê, no art. 8º, 2, b, a garantia judicial da comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da imputação formulada.

Consectário lógico do exercício da defesa é o direito fundamental de o acusado ser informado da imputação que pesa contra si. O direito de conhecer a acusação que lhe é imputada constitui, dessa forma, requisito necessário ao pleno exercício do direito de defesa do acusado e ao próprio contraditório. A fim de cumprir a exigência, a informação deve ser clara, precisa, completa, minuciosa, explícita e, portanto, efetiva.

Em consonância com tal orientação constitucional, posto lhe sendo anterior, o Código de Processo Penal determina, no art. 41, que a acusação – denúncia ou queixa – deve conter a exposição do fato criminoso, com todas as suas cir-cunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol de testemunhas.

Deve, desta forma, responder às chamadas sete questões do injusto penal, na lição clássica de João Mendes de Almeida Júnior, “é uma exposição narrati-va e demonstrativa. Narrativa, por que deve revelar o fato com todas as suas cir-cunstâncias, isto é, ‘não só a ação transitiva, como a pessoa que a praticou (quis), os meios que empregou (quibus auxiliis), o malefício que produziu (quid), os motivos que a determinaram a isso (cur), a maneira por que a praticou (quomo-do), o lugar onde praticou (ubi), o tempo (quando). Demonstrativa, porque deve descrever o corpo de delito, dar as razões de convicção ou presunção e nomear as testemunhas e informante”.3

3 O processo criminal brasileiro. 4. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1959, p. 183.

R.T.J. — 2031168

Sabedor da imputação fática que lhe é feita, imersa em toda a sua circuns-tancialidade, e ciente de que a sentença somente poderá apreciar aquela realidade, o acusado pode bem preparar a defesa, prefigurando-se as conseqüências jurídicas do que lhe é argüido.

A denúncia formulada contra o Paciente responde a todas as questões do injusto. A descrição não é genérica, nem de outro modo ofensiva à regra do art. 41 do Código de Processo Penal.

Em casos semelhantes, esta Corte já decidiu:

Habeas corpus. Trancamento da ação penal. Inépcia da denúncia. Inocorrência. Pedi-do indeferido. A denúncia descreve os fatos imputados à Paciente e aponta o fato típico crimi-nal, atendendo ao disposto no art. 41 do Código de Processo Penal. Conduta suficientemente delineada e apta a proporcionar o exercício da defesa. Habeas corpus indeferido.(HC 89.433, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ de 6-11-06.)

1. A denúncia que descreve os fatos delituosos e aponta seus autores não é inepta. Na espécie, o Paciente e sua sócia foram denunciados pelo não-repasse à Previdência Social das contribuições previdenciárias descontadas dos empregados, omissão de que o Paciente con-fessou ter conhecimento.(RHC 88.144, Rel. Min. Eros Grau, DJ de 2-6-06.)

Por isso, reputo-a formalmente apta.

4. Aduz, por fim, o Impetrante serem inverídicos os fatos imputados ao ora Paciente. Questiona o conjunto probatório que integra a primeira fase da perse-cução penal, notadamente o conteúdo das diligências referentes à interceptação telefônica e aos depoimentos do Agente e do Delegado de Polícia, que isentaram o Paciente de qualquer conduta “que pudesse ser considerada indício de crime” (fl. 5).

é certo que a só obediência ao art. 41 do Código de Processo Penal não basta a fazer válida a acusação. A denúncia deve ser, além de formal, também materialmente apta. A acusação que não tenha apoio em elementos retóricos, precários que sejam, é inepta e, de igual modo, impede exercício do direito de defesa.

Não há, porém, o que reparar na decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça. Relevo trecho do voto condutor:

De um lado, pois, há, diversamente do alegado, lastro probatório mínimo que assegura a viabilidade da actio poenalis, valendo, gizar, de qualquer modo, que “(...) A inexistência de indícios de autoria e materialidade dos fatos imputados na denúncia, por requisitar aprofun-dado exame do conjunto da prova, não pode ser apreciada na via angusta do habeas corpus” (HC 14.146/RJ, da minha Relatoria). D’outro, ao que se tem, descreveu o Parquet a conduta imputada ao paciente, definindo, com suficiência, a tarefa que lhe cabia na quadrilha, nada obstando o exercício do direito à ampla defesa, constitucionalmente assegurado, o que afasta a possibilidade de declaração de inépcia da denúncia. (HC 45.553, Rel. p/ o ac. Min. Hamilton Carvalhido.)

R.T.J. — 203 1169

Do voto-vista proferido pelo Ministro Hélio Quaglia Barbosa, tiro:

Em síntese, não basta a simples narrativa das condutas; deve possuir a denúncia ele-mentos mínimos, verificáveis de plano, no que toca à autoria e à materialidade dos delitos praticados, permitindo-se, assim, a inauguração da persecução penal em sua fase judicial.

No ponto, destaco o seguinte trecho do decreto de prisão preventiva do paciente (fls. 68/88):

“Além disso, os auditores Sami e Sônia, aliados ao auditor aposentado Tomaz Canabrava Júnior e ao Presidente do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais Jaime Pereira Sardinha, mantiveram negociações com Victor Rodrigues Costa e o advogado da empresa Tio Jorge, a fim de propiciar ganho da causa a esta nos Processos Administrativos Fiscais 040.003368/2003 e 040.003369/2003, conforme constatado nas interceptações telefônicas (fls. 121/122).

De tal interceptação, infere-se o vínculo existente entre Tomaz Júnior, Sami, Sônia e Jaime Sardinha, pois conversaram sobre a promoção da defesa do Tio Jorge, tendo Sami comparecido a tal empresa para visitá-la e afirmando que a coisa já estava certa com o Peixe (Jaime Sardinha).

Ressalte-se que Jaime Sardinha (Presidente do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais) chegou a afirmar, em comunicação telefônica, que não poderia con-versar, pois a linha estava grampeada.”Como demonstrado, elementos indiciários há, fundados na interceptação telefônica

realizada, concretizando, a meu sentir, conjunto probatório suficiente para, ao menos por ora, manter-se o curso normal da persecução penal. (Fonte: sítio eletrônico do Superior Tribunal de Justiça.)

Ora, sob pretexto de aparente inépcia material da denúncia não se pode perder, a meio caminho, a velha e aturada jurisprudência da Corte, a qual “tem advertido que o exame aprofundado das provas não encontra sede juridicamente adequada na via sumaríssima do processo de habeas corpus. Precedentes” (HC 69.958, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 10-8-06).

Do voto do Relator consta ainda:

No ponto concernente à alegada insuficiência de provas, não vislumbro possibilidade de apreciar essa objeção na presente sede processual, posto que isso demandaria um exame aprofundado de fatos e uma ampla discussão em torno dos demais elementos de caráter ins-trutório, o que se mostra vedado, por incompatibilidade absoluta, na via estreita do habeas corpus, consoante iterativa jurisprudência desta Corte. (RTJ 129/1169 – RTJ 135/557.)

Observo, por fim, que se trata de processo complexo, cuja denúncia fora oferecida contra 12 (doze) acusados, entre auditores fiscais tributários, contado-res e advogados. Segundo informações prestadas pelo Juízo da 3ª Vara Criminal de Brasília/DF, diversos são os procedimentos incidentais apensos aos autos, tais como: Autos 44.106-6/05 (quebra de sigilo bancário, com dezesseis volumes); 112.904-7/04 (escuta telefônica, com seis volumes) e 44.621-5/05 (busca e apre-ensão) (fls. 165-166).

O caso demandaria, portanto, análise cautelosa e aprofundada dos fatos im-putados ao ora Paciente, coisa de todo incompatível com a estreita via cognitiva deste pedido de writ.

5. Ante o exposto, denego a ordem.

R.T.J. — 2031170

EXTRATO DA ATA

HC 88.978/DF — Relator: Ministro Cezar Peluso. Paciente: Jaime Pereira Sardinha. Impetrante: Gilsomar Silva Barbalho. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma, por votação unânime, indeferiu o pedido de habeas cor-pus, nos termos do voto do Relator. Falou, pelo Paciente, o Dr. Gilsomar Silva Barbalho e, pelo Ministério Público Federal, o Dr. Francisco Adalberto Nóbrega. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Gilmar Mendes.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Cezar Peluso, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Ausente, justificadamente, o Minis-tro Gilmar Mendes. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega.

Brasília, 4 de setembro de 2007 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

R.T.J. — 203 1171

HABEAS CORPUS 89.054 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence

Paciente: Willian de Aguiar — Impetrante: Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Adolescente: ato infracional: imposição de medida socioe-ducativa de semiliberdade: restrições judiciais às atividades ex-ternas (visita à família): necessidade de fundamentação própria.

1. A opção pelo regime menos gravoso – o de semiliber-dade –, posto que com restrições que não lhe são próprias – forma progressiva e condicionada para a visitação à família –, se traduziu num benefício ao Paciente, considerando que a alternativa que o ato infracional, em tese, admitiria – o da internação – submeteria o adolescente a limitações ainda maiores.

2. Pode o magistrado em casos excepcionais e quando cabí-vel a medida de internação, optar pelo regime de semiliberdade, sem a cláusula para este prevista (ECA, art. 120) de prescindibi-lidade da autorização judicial quanto ao exercício de atividades externas, aí incluída a visitação aos familiares: para tanto, con-tudo, há a necessidade de fundamentação própria, dado que, em linha de princípio, as medidas socioeducativas têm como objetivo o fortalecimento das relações familiares, para o que, de regra, a restrição imposta ao Paciente não contribuiria.

3. Habeas corpus deferido, para subtrair da sentença as res-trições relativas ao direito de visita à família.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, deferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 19 de setembro de 2006 — Sepúlveda Pertence, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Trata-se de habeas corpus – substitu-tivo de recurso ordinário – contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça, que manteve a aplicação de medida de semiliberdade imposta ao Paciente (art. 103 da Lei 8.069/90, c/c arts. 157, § 2º, e 14, II, do Código de Processo Penal), mediante sentença que permitiu a visitação à família de forma “progressiva e condicionada ao bom comportamento”, “tolerando-se a sua concessão por 2 dias de cada vez, até o máximo de 14 (quatorze) dias por semestre” (fls. 13/14).

R.T.J. — 2031172

Extrato da ementa do julgado (fl. 20):

1. O disposto no art. 120 do Estatuto da Criança e do Adolescente não afasta o poder do magistrado de primeiro grau de condicionar as atividades externas de menor, sujeito à me-dida sócio-educativa, ao seu bom comportamento e à forma progressiva. Precedentes do STJ.

2. Habeas corpus denegado.

Alega-se, em suma, que a visitação à família constitui espécie de atividade externa, a qual, por força do art. 120 do Estatuto da Criança e do Adolescente, não se sujeita a nenhuma autorização judicial1.

Aduz-se, de outro lado, que é “inadmissível a aplicação analógica da Lei de Execução Penal no que diz com a ‘saída temporária’ (ut artigos 122/125 da Lei 7.210/84) à medida sócio-educativa de semiliberdade”, dado que referida inter-pretação, no Estatuto da Criança e do Adolescente, somente é permitida “quando houver omissão ou lacuna na lei”, que não existe.

Requer a Impetrante que sejam retiradas da sentença “as restrições judiciais às atividades externas”.

Indeferida a liminar, sobreveio o parecer do Ministério Público Federal, da lavra do Il. Subprocurador-Geral Edson de Almeida, que opinou pela concessão da ordem (fls. 63/66).

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator):

I

Consta dos autos a informação de que “o paciente se evadiu”, descumprin-do a medida imposta, motivo pelo qual aventou o Juízo local a possibilidade de estar prejudicada a presente impetração.

O descumprimento da medida, contudo, não implica imediato prejuízo da impetração, dado que, recapturado o menor, continuará ele – salvo se houve nova decisão a respeito, do que não se tem notícia – a cumprir a medida de semiliber-dade anteriormente imposta, com as restrições contidas na sentença.

Conheço do habeas corpus.

II

No mérito, estou convencido de que a ordem deve ser deferida.

1 “Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial.”

R.T.J. — 203 1173

Certo, a prática de ato infracional mediante “grave ameaça ou violência à pessoa” (art. 122, I), justifica, per se – após o procedimento de apuração do ato –, a aplicação da medida socioeducativa originária de internação (Lei 8.069/90, art. 122, I e II2) – v.g., HC 84.603, Primeira Turma, 9-11-04, Pertence, DJ de 3-12-04.

Daí que, como a conduta praticada pelo Paciente está descrita na legislação penal comum como crime de roubo – que se pratica, sempre, com emprego de violência ou grave ameaça à pessoa (art. 103 da Lei 8.069/90, c/c arts. 157, § 2º, e 14, II, do Código Penal) –, nada impediria, no caso, a aplicação da medida de internação (ECA, art. 122, I).

E, aplicada esta, sequer se cogitaria da incidência do art. 120 do Estatuto, segundo o qual é possível, sob o regime de semiliberdade, “a realização de ativi-dades externas independentemente de autorização judicial”.

Ocorre que a sentença, para melhor individualizar a aplicação da medida, afastou a medida de internação.

Leio, da sentença, verbis (fls. 13/14):

No que pertine à situação peculiar individual do adolescente, observa-se que, apesar de não se poder dizer que é recomendável a aplicação de medida mais branda do que a sugerida pelo MP [semiliberdade], não há necessidade imediata de se impor o cumprimento de medida mais extrema. O contexto social, as circunstâncias do fato e suas conseqüências, bem como a personalidade do adolescente indicam que é possível e viável a aplicação de medida que serviria como forma de transição para o meio aberto (...)

Essa opção pelo regime menos gravoso, posto que com restrições que não lhe são próprias – forma progressiva e condicionada para a visitação à família –, traduziu-se num benefício ao Paciente, considerando que a alternativa seria inter-nação, que submete o menor a limitações ainda maiores.

Pode o magistrado, por isso, em casos excepcionais e quando cabível a me-dida de internação, optar pelo regime de semiliberdade, sem a cláusula para este prevista (ECA, art. 120) de prescindibilidade da autorização judicial quanto ao exercício de atividades externas, aí incluída a visitação aos familiares.

Para tanto, contudo, parece induvidosa a necessidade de fundamentação própria, sobretudo no presente caso, pois em linha de princípio, as medidas so-cioeducativas têm como objetivo o fortalecimento das relações familiares, para o que, de regra, a restrição imposta ao Paciente não contribuiria.

Aqui, contudo, não houve a referida fundamentação, o que basta para o deferimento da ordem.

Em caso semelhante, relativo ao direito de o menor privado de sua liber-dade receber a visita dos seus pais ou responsáveis, a suspensão temporária desse direito também depende do reconhecimento pela autoridade judiciária da existência de “motivos sérios e fundados de sua prejudicialidade aos interesses

2 “Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando: I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa; II - por reiteração no cometimento de outras infrações graves;”

R.T.J. — 2031174

do adolescente” (Lei 8.069/90, art. 124, § 2º), o que reforça – conforme acentuou o parecer do Ministério Público Federal – a necessidade de fundamentação para limitar, na sentença, o exercício de atividades externas que, no regime de semili-berdade – aplicado ao Paciente –, independem de autorização judicial.

Ressalte-se que, salvo quando as atividades externas sejam necessárias para a escolarização e a profissionalização (art. 120, § 1º), da afirmação contida no caput do art. 120 do Estatuto – segundo a qual é “possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial” – não se extrai que elas não estejam sob o crivo da autoridade administrativa: cabe à Direção da Unidade onde o menor se encontra analisar a sua conveniência.

De outro lado, malgrado num contexto punitivo não se possa dizer, sem contestações, que a visitação à família constitua modalidade de atividade externa, ela o é no regime da medida de semiliberdade, que tem caráter socioeducativo.

Esse o quadro, defiro a ordem para subtrair da sentença (fls. 13/14) as res-trições relativas ao direito de visita à família: é o meu voto.

EXTRATO DA ATA

HC 89.054/RJ — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Paciente: Willian de Aguiar. Impetrante: Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Unânime. Ausentes, justificadamente, o Ministro Marco Aurélio e a Ministra Cármen Lúcia.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Carlos Britto e Ricardo Lewandowski. Ausentes, justificadamente, o Ministro Marco Aurélio e a Ministra Cármen Lúcia. Subprocuradora-Geral da República, Dra. Cláudia Sampaio Marques.

Brasília, 19 de setembro de 2006 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 203 1175

HABEAS CORPUS 89.090 — GO

Relator: O Sr. Ministro Gilmar Mendes

Paciente: José Antonio de Palinhos Jorge Pereira Cohen — Impetrante: Pedro Xavier Coelho Sobrinho — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Fundamentação do decreto de prisão pre-ventiva. Custódia cautelar lastreada na garantia da ordem pú-blica e para assegurar a aplicação da lei penal (CPP, art. 312). Excesso de prazo. Não-configuração. Contribuição da defesa. Processo complexo. Ordem indeferida.

1. Crimes do art. 12 c/c os arts. 18, I, e 14 da Lei 6.368/76 e o art. 304 do Código Penal. A impetração alega: i) ausência de fundamentação do decreto de prisão preventiva e ii) excesso de prazo na instrução criminal.

2. Na espécie, a decretação da preventiva lastreou-se nos fundamentos da garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal, nos termos do art. 312 do CPP.

3. Quanto ao requisito da garantia da ordem pública, em linhas gerais e sem qualquer pretensão de exaurir todas as pos-sibilidades normativas de sua aplicação judicial, destaco as se-guintes circunstâncias principais: i) a necessidade de resguardar a integridade física do próprio Paciente ou dos demais cidadãos; ii) o imperativo de impedir a reiteração das práticas criminosas, desde que tal objetivo esteja lastreado em elementos concretos expostos fundamentadamente no decreto de custódia cautelar; e iii) para assegurar a credibilidade das instituições públicas, em especial do Poder Judiciário, quanto à visibilidade e transpa-rência de políticas públicas de persecução criminal e desde que diretamente relacionadas com a adoção tempestiva de medidas adequadas e eficazes associadas à base empírica concreta que tenha ensejado a custódia cautelar. Precedentes: HC 82.149/SC, Primeira Turma, unânime, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 13-12-02; HC 82.684/SP, Segunda Turma, unânime, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 1º-8-03; HC 83.157/MT, Pleno, unânime, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 5-9-03; e HC 84.680/PA, Primeira Turma, unânime, Rel. Min. Carlos Britto, DJ de 15-4-05.

4. O Juiz de 1º grau apresentou elementos concretos su-ficientes para respaldar a regularidade do decreto cautelar: a função de “direção” desempenhada pelo Paciente na organização (o Paciente é considerado o “2º homem dentro da organização”), a ramificação das atividades criminosas em diversas unidades da Federação e a alta probabilidade de reiteração delituosa conside-rando-se a potencialidade da utilização do meio sistematicamente

R.T.J. — 2031176

empregado pela quadrilha, a saber, o uso de artifícios para camu-flar o transporte de entorpecentes no interior de cortes de carne destinada à exportação.

5. Quanto à alegação de excesso de prazo, constata-se a existência de elementos que sinalizam para a complexidade da causa (elevado número de crimes e de acusados). Em princípio, desde que devidamente fundamentada, e atendido o parâmetro da razoabilidade, admite-se a excepcional prorrogação de mais de 81 dias para o término de instruções criminais de caráter com-plexo. Precedentes: HC 71.610/DF, Pleno, unânime, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 30-3-01; HC 82.138/SC, Segunda Tur-ma, unânime, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 14-11-02; HC 81.905/PE, Primeira Turma, maioria, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 16-5-03; HC 85.679/PE, Primeira Turma, maioria, Rel. Min. Carlos Britto, DJ de 31-3-06; HC 86.577/ES, Rel. Min. Ricardo Lewandowisk, Primeira Turma, maioria, julgado em 12-9-06; e HC 88.905/GO, de minha relatoria, Segunda Turma, unânime, DJ de 13-10-06.

6. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem deferido a ordem de habeas corpus somente em hipóteses excep-cionais, nas quais a mora processual: i) seja decorrência exclusiva de diligências suscitadas pela atuação da acusação (cf. HC 85.400/PE, Rel. Min. Eros Grau, Primeira Turma, unânime, DJ de 11-3-05; e HC 89.196/BA, Rel. Min. Ricardo Lewandowisk, Primeira Turma, maioria, julgado em 3-10-06); ii) resulte da inércia do próprio aparato judicial em atendimento ao princípio da razo-ável duração do processo, nos termos do art. 5º, LXXVIII (cf. HC 85.237/DF, Pleno, unânime, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 29-4-05; HC 85.068/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, unânime, DJ de 3-6-05; HC 86.346/SP, Rel. Min. Joa-quim Barbosa, Segunda Turma, unânime, julgado em 18-4-06; HC 87.910/SP, Rel. Min. Eros Grau, decisão monocrática, DJ de 25-4-06; HC 86.850/PA, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, unânime, julgado em 16-5-06; e HC 87.164/RJ, de minha relatoria, Segunda Turma, unânime, DJ de 29-9-06); e, por fim, iii) seja incompatível com o princípio da razoabilidade (cf. HC 84.931/CE, Rel. Min. Cezar Peluso, Primeira Turma, unânime, DJ de 16-12-05), ou, quando o excesso de prazo seja gritante (cf. HC 81.149/RJ, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, unânime, DJ de 5-4-02; RHC 83.177/PI, Rel. Min. Nelson Jobim, Segunda Turma, unânime, DJ de 19-3-04; HC 84.095/GO, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, unânime, DJ de 16-12-05; e HC 87.913/PI, Rel. Min. Carmen Lúcia, Primeira Turma, unânime, julgado em 5-9-06).

R.T.J. — 203 1177

7. Dos documentos acostados aos autos, verifica-se também haver contribuição da defesa para a demora processual, não se configurando a ilegalidade alegada por excesso de prazo, por não haver mora injustificada. Precedentes: HC 86.947/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, decisão monocrática, DJ de 26-10-05; HC 86.618/MT, Segunda Turma, unânime, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 28-10-05; HC 85.298/SP, Primeira Turma, maioria, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ o ac. Min. Carlos Britto, DJ de 4-11-05; HC 86.789/SP, de minha relatoria, Segunda Turma, unânime, DJ de 24-3-06; HC 88.229/SE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, maioria, julgado em 10-10-06; e HC 88.905/GO, de minha relatoria, Segunda Turma, unânime, DJ de 13-10-06.

8. Decreto de prisão preventiva devidamente fundamen-tado, nos termos do art. 312 do CPP e do art. 93, IX, da CF. Existência de razões suficientes para a manutenção da prisão preventiva.

9. Ordem indeferida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos este autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, acolhendo questão de ordem suscitada pelo Relator, invalidar o julgamento ocorrido na sessão de 14-11-06 e, renovando-o, indeferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 21 de novembro de 2006 — Gilmar Mendes, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Trata-se de habeas corpus, com pedido de medida liminar, impetrado por Pedro Xavier Coelho Sobrinho, em favor de José Antonio de Palinhos Jorge Pereira Cohen, de nacionalidade portuguesa, em face de decisão proferida pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) nos autos do HC 55.209/GO, Rel. Min. Paulo Medina, julgado em 18-5-06. Eis o teor da ementa desse julgado:

Penal e processual. Habeas corpus. Tráfico internacional de entorpecente. Crime hediondo. “Operação Caravelas”. Organização criminosa. Elevado número de crimes e de acusados. Fortes indícios de liderança do paciente. Excessiva quantidade de entorpecente. Prisão preventiva. Suficiente fundamentação. Garantia da aplicação da lei penal e da ordem pública. Requisitos do art. 312 do CPP demonstrados. Ausência de constrangimento ilegal. Ordem denegada.

A prisão preventiva é medida excepcional, cabível diante de prova da existência de crime e indícios suficientes de autoria, para garantir a ordem pública, por conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal.

R.T.J. — 2031178

Paciente apontado como “2º homem” dentro da organização, que utiliza nome falso, possuidor de documentos falsos, detentor de grande patrimônio e indícios fortes de seu envol-vimento no tráfico internacional.

Decreto fundamentado sobretudo na justificativa da medida para assegurar a aplicação da lei penal e garantir a ordem pública. Requisitos do art. 312 do CPP demonstrados. Inexis-tência de constrangimento ilegal.

Habeas corpus denegado. (Fl. 18.)

O Paciente foi denunciado perante a 11ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Goiás por suposta prática dos crimes previstos no art. 12 c/c os arts. 18, inciso I, e 14, todos da Lei 6.368/76, e o art. 304 do Código Penal (apenso – fls. 1-21).

Preso em flagrante no dia 15 de setembro de 2005 (fl. 11), o Paciente teve o flagrante convertido em prisão preventiva pelo juízo de origem em 7 de dezem-bro de 2005, com o objetivo de assegurar a aplicação da lei penal e garantir a ordem pública (apenso – fl. 1264).

O Impetrante alega constrangimento ilegal tendo em vista os seguintes fa-tores: a) falta de fundamentação no decreto de prisão preventiva, uma vez que é “especulativo e totalmente sem base legal” (fl. 6) e as justificativas apontadas no decreto prisional encontram-se “sem lastro na lei e sem fundamentação vincula-da” (fl. 5); e b) excesso de prazo na instrução criminal (fls. 11/12).

Com relação à falta de fundamentação no decreto de prisão preventiva (item “a” acima), a defesa alega que:

O juízo valorativo sobre a gravidade genérica dos delitos imputados ao paciente, como insinua o decreto de prisão preventiva, mais precisamente o clamor público e a comoção so-cial, não constitui fundamentação idônea a autorizar a prisão de uma pessoa para garantia da ordem pública se desvinculados de qualquer fato concreto que o justifique. Assim, afigura-se totalmente ilegal a prisão preventiva do paciente em razão de que seus fundamentos não têm amparo jurídico idôneo que a justifique. (Fl. 11.)

Quanto à alegação de excesso de prazo na instrução criminal (item “b” acima), o Impetrante sustenta que:

o paciente está preso, sem que tenha ocorrido a conclusão da instrução criminal e sem que ele tenha dado causa para tal, desde o dia 15 de setembro de 2005, conforme se vê da certidão expedida pela Secretaria da 11ª Vara Federal de Goiás.(Fl. 11.)

Por fim, o Impetrante requer:

(...) seja deferida em favor do paciente medida liminar, a fim de colocá-lo, incontinenti, em liberdade, sendo ao final deferida em definitivo a presente ordem de habeas corpus, a fim de que lhe seja assegurado o direito de responder ao processo em liberdade ou garantir-lhe, de igual modo, o direito de recorrer em liberdade acaso ocorra fato processual superveniente a esta impetração, em decorrência de eventual sentença condenatória pelo r. juízo singular.

(Fl. 13.)

A medida liminar foi indeferida, em decisão de 29 de junho de 2006 (fls. 35-41).

R.T.J. — 203 1179

O Subprocurador-Geral da República Dr. Cláudio Lemos Fonteles, em parecer de fls. 57-65, opinou pelo indeferimento do pleito.

Na petição 104.791/06, de 3-8-06, a defesa postulou a reconsideração da decisão que indeferiu o pedido de medida liminar.

Alega que o pedido de reconsideração se baseia em dois pontos:

5. (...) um, direcionado à reiteração do pedido anteriormente feito, corroborando o pleito por meio dos precedentes juntados, que demonstram a pertinência da medida, inclusive em caráter monocrático; dois, superveniência do manifesto excesso de prazo, ante a passagem do tempo sem que haja condenação pelo Juízo processante, a fim de pleitear a concessão da medida inaudita et altera pars, presentes os requisitos autorizadores da tutela cautelar, em sede de liminar.(Fl. 119.)

Ainda, quanto à plausibilidade jurídica do pedido (fumus boni iuris), sus-tenta:

12. Cotejando os casos trazidos à apreciação de Vossa Excelência, tem-se como con-cretizada a demonstração da plausibilidade do direito invocado, materializado em manifesto excesso de prazo na prestação jurisdicional identificada, a olho nu, ou como bem ilustra os arestos acima enumerados, perceptível primus ictus oculi, de modo a não acarretar neces-sidade de maior elucubração, posto que materializada, de plano, no juízo pré-cognitivo, de natureza provisória, mas que encerra o crivo de probabilidade e possibilidade de viabilizar a pretensão.

(...)17. A ilegalidade está, de fato, intrínseca ao procedimento que se estabelece sem a

observância dos regramentos mínimos, tidos como necessários para que toda e qualquer per-secução criminal se encerre em um prazo razoável. Afinal, Excelência, estamos sob a égide de um Estado Democrático de Direito, sendo que o Judiciário, como guardião imperativo, deve ser o primeiro a respeitar os ritos e procedimentos, ainda mais quando relacionados à tutela de liberdade.(Fl. 123.)

No que concerne à urgência da pretensão cautelar (periculum in mora), aduz-se que:

18. O perigo da demora reside na existência de dano potencial, um deflagrado risco para o interesse do Paciente, pois, se concretizado o dano que se teme, inútil seria o processo que se destina à defesa daquilo que se entendeu como direito plausível do paciente, in casu, o restabelecimento de seu status libertatis.

(...)20. Ainda se evidencia o periculum in mora da manutenção do Paciente conscrito em

sua liberdade a quase 1 ano, sem que haja sentença condenatória, no que diz ao ataque à sua integridade física e moral, mormente em se tratando da dura realidade do cárcere, um aporta de entrada, sem volta, para aqueles que lá se instalam. (Fl. 124.)

Por fim, em seu pedido de reconsideração, requer:

Ante todo o exposto, requer o Impetrante que Vossa Excelência receba o presente pe-dido de reconsideração a medida precária antes indeferida, a fim de que seja atendido o pleito ora deduzido, para que, junto com os pedidos outrora ventilados, seja in limine litis deferida a ordem de habeas corpus em favor do Paciente, eis que está sendo constrangido ilegalmente

R.T.J. — 2031180

em sua liberdade de ir e vir. Compromete-se o senhor José Antônio de Palinho Jorge Pereira Cohen, desde já ao ulterior comparecimento ao juízo monocrático, para acompanhar o proces-samento do feito, requerendo, por conseguinte, a expedição de alvará de soltura, em caráter de urgência, para que o Paciente seja incontinenti liberado das dependências de onde quer que se encontre. Requer, por derradeiro, seja concedida e confirmada a ordem, para tornar definitiva a liberdade do Paciente até o trânsito em julgado de eventual pronunciamento condenatório na origem.(Fl. 124.)

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): O parecer do Ministério Público Federal, da lavra do Subprocurador-Geral da República Dr. Cláudio Lemos Fon-teles, é pelo indeferimento do writ, nos seguintes termos:

7. Depreende-se dos autos que o paciente, juntamente com outras onze pessoas, foi de-nunciado pelo Ministério Público Federal, em razão de investigações que a Polícia Federal ini-ciou em virtude de informações prestadas pela Polícia Judiciária Portuguesa, segundo as quais os acusados seriam membros de extensa e complexa estrutura criminosa liderada por Antônio dos Santos Damaso, a qual foi desenvolvida para operar no ramo do tráfico internacional de entorpecentes, associação criminosa, lavagem de dinheiro, falsidade documental, falsidade ideológica, sonegação fiscal e outros crimes contra a ordem tributária. As investigações culmi-naram na apreensão de 1,6 tonelada de cocaína ocultada em carne bovina (doc. 2 – fls. 46/66).

(...)10. O MM. Juiz da 5ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Goiás ressalta que

José Antônio de Palinhos Jorge Pereira é considerado o “o 2º homem dentro da organização”. De se ler:

“Apesar de ser Damaso quem, aparentemente, detém o poder de comando das operações ilícitas sob investigação, é também de grande importância participação dos irmãos José Antônio de Palinhos Jorge Pereira e Antônio Palinhos Jorge Pereira.

José Antônio de Palinhos Jorge Pereira é considerado o “2º homem” dentro da organização. Trata-se de empresário de nacionalidade portuguesa, residente no Brasil, proprietário de vasto patrimônio, que inclui veículos importados, residências de luxo e diversas empresas.” (fls. 148).11. Conforme expõe o il. colega em sua manifestação de fls. 210/219:

“O conceito de ordem pública não se limita a prevenir a reprodução de fatos criminosos, mas também a acautelar o meio social e a própria credibilidade da justiça em face da gravidade do crime e de sua repercussão. A conveniência da medida deve ser regulada pela sensibilidade do juiz à reação do meio ambiente à prática delituosa.

No caso dos autos, a medida mostra-se mais do que conveniente, uma vez se trata de fatos envolvendo uma organização criminosa complexa e ramificada no Brasil e em países da Europa, abarcando várias pessoas que atacavam de formas diferentes em várias funções escusas, todas a fim de se praticarem crimes contra o sistema financeiro nacional, contra a ordem tributária e crimes de tráfico internacional de entorpecente. No caso do último crime, a operação culminou em uma das maiores apreensões já realizadas no Brasil, ocasião em que foi encontrada 1,6 toneladas de cocaína escondida em carne bovina congelada.

Ademais, pelo que se depreende dos documentos que baseavam o decreto prisional, há indícios de que o paciente integrava a mencionada organização crimi-nosa com posições de liderança, tendo inclusive participado da compra de imóveis de valores vultosos em negociações que indicam ocultação de bens e crimes de lavagem de dinheiro, bem como contratações com doleiros e outras operações relacionadas ao tráfico de entorpecentes.

(...)

R.T.J. — 203 1181

Nesse contexto, embora o conceito de “garantia de ordem pública’ seja subje-tivo, é legítimo o entendimento segundo o qual a prisão preventiva baseada nesse fun-damento tenha por justificativas a instabilidade no meio social e os enormes prejuízos não só materiais, mas também institucionais causados por ações delituosas desse porte e complexidade. Assim, não há como se negar que a paz pública esteja ameaçada caso não sejam tomadas as medidas segregacionais necessárias para dissipar a atuação dos membros da organização.” (fls. 212/214).12. No tocante ao excesso de prazo, vejo que não se caracteriza o constrangimento ilegal

sustentado pela defesa, à vista da complexidade do processo, a envolver vários acusados, mui-tas testemunhas residentes em lugares distintos, entre outras peculiaridades.

13. Além disso, conforme consta das informações de fls. 45/53, “os acusados, inclusive ora paciente, são os únicos responsáveis pela demora processual, em prejuízo à tão desejada celeridade e duração razoável do processo.”

14. Prossegue o MM. Juiz Federal Gilton Batista Brito: “Oportuno ainda asseverar o esforço deste Juízo em conferir celeridade ao feito, como o deslocamento de vários servidores para realizar longas audiências e diversas diligências provocadas pela defesa, em razão da complexidade da ação penal, que envolve delito transfronteiriço, e gerou, até agora, quatorze volumes de autos principais e onze volumes de apensos até o presente momento, sendo digno de nota o elevado número de acusados.” (fls. 52/3).

15. Diante das informações prestadas, verifica-se que os autos estão aguardando cumprimento de devolução de Cartas Precatórias, expedidas para inquirição de testemunhas arroladas pelas defesas dos acusados, portanto, segundo firme jurisprudência dessa Suprema Corte “não se caracteriza o excesso de prazo quando o processo está na fase da oitiva das testemunhas da defesa.” (HC 86.329/PA, Rel. Min. Carlos Britto, DJ 5.5.2006, p. 00018).

16. Pelo indeferimento do pleito.(Fls. 57-65.)

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, denegou a ordem de habeas corpus impetrada em favor do Paciente em 30 de janeiro de 2006. Transcrevo trechos do acórdão, verbis:

Da leitura dos autos e, sobretudo, da decisão judicial que determinou a busca e apreen-são (fls. 132/33/57), proferida pela autoridade judiciária federal do Goiás, assim está exposta a conduta do paciente:

“1.b) José Antônio de Palinhos Jorge Pereira ou George Cohen.Apesar de ser Damaso quem, aparentemente, detém o poder de comando das

operações ilícitas sob investigação, é também de grande importância a participação dos irmãos José Antônio de Palinhos Jorge Pereira e Antônio Palinhos Jorge Pereira.

José Antônio de Palinhos Jorge Pereira é considerado o “2º homem” dentro da organização. Trata-se de empresário de nacionalidade portuguesa, residente no Brasil, proprietário de vasto patrimônio, que inclui veículos importados, residências de luxo e diversas empresas.

Não raro, utiliza-se do nome falso George Cohen, com o qual abriu pelo menos duas empresas: Torres Vedras Consultoria e Participação Ltda. e Lakenosso Bar e Restaurante Ltda. Possui documentos falsos com os seguintes nomes: José Antônio Palinhos Jorge Pereira Cohen, George Manoel de Paranhos Cohen, José de Palinhos Jorge Pereira e Antônio Palinhos Jorge Pereira.

José Antônio de Palinhos Jorge Pereira mantém contato direto com Damaso, via telefone e também em reuniões.

Sua ex-mulher, Sandra Tolpiakow, com quem tem dois filhos menores, Bárba-ra e Daniel, também está sob investigação. Descobriu-se que Sandra atua como “testa-de-ferro” de seu ex-marido, uma vez que mantém em seu nome redes de restaurantes que, na realidade, pertencem a ele.

Tudo indica que Sandra não aufere lucros desses negócios.

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José Antônio Palinhos também mantém, com muita freqüência, contato direto com seu irmão Antônio Palinhos, igualmente de nacionalidade portuguesa e detentor de grande patrimônio. Ambos se utilizam de códigos em conversações telefônicas, o que reforça a idéia de que evitam expor-se na tentativa de burlar eventual trabalho de investigação.

(...)Outra gravação de conversa telefônica de José Antônio Palinhos demonstra ne-

gociação de compra com “bucho” e filé mignon, isso imediatamente após reunião entre ele e Damaso para acertarem detalhes da participação de cada um antes da remessa de droga para o exterior.

(...)Como se vê José Antônio Palinhos é pessoa de confiança de Damaso e, aparen-

temente, pela riqueza que parece ter e pelo teor das conversas que mantém com este e com seu irmão Antônio Palinhos, aufere altos lucros da atividade ilícita, sendo um de seus financiadores.”De todo o exposto, ao contrário do que aduz o impetrante, restou concretamente de-

monstrada a prática do crime, com indícios fortes e suficientes de autoria. Assim, presentes os requisitos objetivos para a decretação da custódia cautelar nos termos do art. 312 do CPP.

Em relação à necessidade da prisão, para a garantia da ordem pública, o il. Magistrado de 1ª Instância a justificou na magnitude do caso e, ainda, no envolvimento de pessoas influen-tes e possuidoras de notável poderio econômico, a ponto de criar embaraços à instrução do feito, sob os seguintes fundamentos:

“Ressalte-se ainda que, com relação aos denunciados Antônio dos Santos Da-maso, José Antônio de Palinhos Jorge Pereira, Antônio Palinhos Jorge Pereira, Luiz Manuel Neto Chagas, Jorge Manuel Rosa Monteiro e Manoel Horácio Kleiman, todos de nacionalidade portuguesa, exceto o último, de nacionalidade Argentina, acentua-se a necessidade da decretação da medida cautelar para assegurar a aplicação da lei penal, ante a possibilidade de os mesmos fugirem em regresso a seus países de origem.

Não se trata, no caso, o referido temor de fuga de mera suposição, estando ali-cerçado em uma base empírica, qual seja, o freqüente trânsito realizado pelos acusados entre o Brasil e seus países de origem, conforme se verificou durante as apurações. Assim, mostra-se bastante claro que, caso em liberdade, os denunciados, na primeira oportunidade que tiverem, certamente retornarão aos referidos países, onde possuem uma vida já estruturada”. (fl. 63).é sabido que tais circunstâncias não ensejariam, por si só, a custódia cautelar ou a sua

manutenção.Entretanto, no caso em análise, houve a apreensão de uma quantidade considerável de

cocaína, 1,6 t (uma tonelada e 600 quilos), droga camuflada no interior de cortes de carne des-tinada à exportação. Está sendo apurada a participação de cidadãos estrangeiros que atuavam comercialmente no Brasil, adquirindo fazendas e empresas, auxiliados por profissionais do ramo, no caso, supostamente com o auxilio do paciente.

Circunstâncias que, considerando a magnitude da empreitada criminosa, os valores envolvidos e os fortes indícios da participação do paciente, bem como a necessidade de se ga-rantir a ordem pública e por conveniência da instrução criminal, autorizam a custódia cautelar. Mesmo porque, embora o paciente afirme ter profissão lícita, como bem aduz o Ministério Público em seu parecer, ‘o paciente é de fato o proprietário de diversas empresas (de fachada), nas quais utiliza o nome de Sandra Tolpiakow, sua ex-mulher, como sócia e testa-de-ferro em seus quadros sociais...’

Quanto ao alegado excesso de prazo na manutenção do paciente na prisão, não vis-lumbro a ilegalidade apontada na inicial, considerando que o prazo fixado para o término da instrução criminal, quando há réu preso, está fundamentado em construção jurisprudencial, não sendo sua contagem puramente aritmética, ou seja, absoluta, mas analisada com fulcro nos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e a necessidade de se aferir a complexidade da causa, pelo número de acusados, de crimes praticados e da produção das provas requeridas, sobretudo a prova testemunhal.

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Conforme se verifica das informações de fls. 19/198, os autos encontram-se aguardando cumprimento e devolução de Cartas Precatórias, expedidas para inquirição de testemunhas ar-roladas pelas defesas dos acusados, não havendo que se falar em demora da instrução criminal, que se encontra em estado adiantado.

Além do mais, o paciente foi denunciado por crimes cuja complexidade em razão do número de pessoas envolvidas e de condutas executadas em diversas fases e em vários Estados demanda maior tempo, permitindo extrapolação de prazos, desde que atendido o princípio da razoabilidade, como acima exposto, e desde que verificados os requisitos do art. 312 do CPP. O que se verifica in casu.(Apenso – fls. 236-238.)

O Superior Tribunal de Justiça também denegou a ordem, no HC 55.209/GO, sustentando que “os indícios apontam o paciente como autor dos fatos, não só como participante da organização criminosa, mas como um dos líderes, com função específica nas atividades ilícitas pontadas” (fl. 25).

Conforme se observa, neste habeas corpus, discute-se:

a) falta de fundamentação no decreto de prisão preventiva; e

b) excesso de prazo na instrução criminal.

Quanto à alegação de falta de fundamentação no decreto prisional (item “a” acima), observo que o decreto de custódia provisória atendeu ao disposto nos arts. 41 e 43 do CPP. A prisão preventiva também indicou, de modo expresso, os seguintes fundamentos para a decretação da prisão cautelar, nos termos do art. 312 do CPP: i) garantia da ordem pública e ii) garantia da aplicação da lei penal.

O Juízo Federal da 11ª Vara da Seção Judiciária do Estado de Goiás, ao receber a denúncia, por sua vez, converteu a prisão em flagrante em prisão pre-ventiva, adotando os seguintes fundamentos em sua decisão:

Como se não bastassem as razões trazidas pela Procuradoria da República, que servem per si de fundamento para o decreto cautelar, tem-se que a conversão é necessária também por outro lastro.

Trata-se do fundamento referente à credibilidade das instituições e do alto grau de probabilidade na ocultação de provas.

Com efeito, causaria sério gravame à credibilidade das instituições públicas permitir a liberdade dos acusados diante dos fortes indícios de presença de organização criminosa espe-cializada em tráfico internacional de drogas.

Os elementos indiciários até aqui produzidos apontam a existência de verdadeira em-presa criminosa, com ramificação em vários Estados brasileiros e participação dos réus, cada um deles, a tempo e modo, auxiliando a prática de crimes.

Em trabalho custoso e demorado, a Polícia Federal efetuou diversas diligências na apuração das atividades, tudo indica, criminosas desenvolvidas pelos membros da quadrilha. A extensa e complexa investigação objetivou descobrir rede de tráfico de entorpecentes instalada no Brasil para remeter substâncias entorpecentes para países da Europa, tais como Portugal e Espanha.

Aparentemente, a quadrilha agia em perfeita divisão de tarefas, sendo que as atividades de cada investigado são precedidas de decisões tomadas pelos líderes, entre os quais Antônio dos Santos Damaso, José Antonio Palinhos [ora paciente] e Jorge Manuel Rosa Monteiro.

A investigação indicou ainda na estruturação da quadrilha um escalonamento entre seus integrantes, sendo que nem todos se conhecem, embora ajam em conjunto objetivando a mesma finalidade. Enquanto uns cuidavam da aquisição e transporte da substância entor-pecente, outros emprestavam seu auxílio de forma indireta, mas sempre cientes de que estão colaborando com a prática criminosa.

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Entre os artifícios utilizados, sinaliza a investigação que o grupo se valia do transporte da droga escondida em containers de carne congelada. Tais containers, por transportarem alimentos, dificilmente são abertos para fiscalização depois de lacrados, pois, por força de rígidos tratados internacionais, podem ter o seu conteúdo recusado para comercialização nos países destinatários, o que geraria para a União o dever de indenizar o vendedor. Daí a defla-gração da chamada ‘Operação Caravelas’, que resultou na apreensão de expressiva quantidade de entorpecentes (1,6 t).

Aliado a isso, é preciso considerar o poder econômico dos acusados, como evidenciam os valiosos bens seqüestrados (automóveis de luxo, lancha, apartamentos, fazendas, moedas estrangeiras em grande quantidade, entre outros), o que torna provável o uso de suas posses para quebrantar a ordem pública, comprometer a eficácia do processo, dificultar a instrução criminal ou voltar a delinqüir.

(...)Mostra-se necessária e útil a prisão cautelar dos acusados, remarque-se, com o fim de

estancar a ação criminosa, tudo indica, por eles reiteradamente praticada, e, de conseguinte, proteger o meio social das conseqüências danosas que tais condutas provocam.

Assim, é preciso considerar a forte sinalização de que a liberdade dos denunciados continuará a ofender a ordem pública mediante a prática reiterada dos crimes em apreço, não custa lembrar, um deles equiparado a hediondo (art. 2º da Lei 8.072/1990).

Ainda no que tange ao risco de ocultação de provas, o fato é que, numa atividade tão organizada e complexa, a extensão das infrações penais nunca é plenamente conhecida, existindo, muito provavelmente, outros elementos de convicção a serem descobertos, o que restaria impedido, tudo indica, com a soltura dos acusados.

Diante do exposto:(...)VIII - converto o flagrante em prisão preventiva com relação aos acusados

Antônio dos Santos Damaso, José Antônio de Palinhos Jorge Pereira [ora paciente], Carlos Roberto da Rocha e Márcio Junqueira de Miranda. Expeça-se mandado de prisão, salvo em relação a Vânia Oliveira Dias e Estilaque Oliveira Reias, porque já decretada a preventiva.

(Fls. 110-114).

Com relação ao tema da garantia da ordem pública, faço menção à manifes-tação já conhecida desta Segunda Turma em meu voto proferido no HC 88.537/BA acerca da conformação jurisprudencial do requisito dessa garantia. Naquela assentada, pude asseverar que o referido requisito legal envolve, em linhas gerais e sem qualquer pretensão de exaurir todas as possibilidades normativas de sua aplicação judicial, as seguintes circunstâncias principais:

i) a necessidade de resguardar a integridade física do Paciente;

ii) o objetivo de impedir a reiteração das práticas criminosas, desde que lastreado em elementos concretos expostos fundamentadamente no decreto de custódia cautelar; e

iii) o propósito de assegurar a credibilidade das instituições públicas, em especial do Poder Judiciário, no sentido da adoção tempestiva de medidas ade-quadas e eficazes, desde que devidamente fundamentadas, com indicação de elementos concretos, quanto à visibilidade e transparência da implementação de políticas públicas de persecução criminal.

Da leitura do decreto prisional, são inúmeros os elementos e fatos concretos que dão ensejo à regularidade da prisão preventiva. Apenas para fins exemplifi-cativos arrolo os seguintes: a função de “direção” desempenhada pelo Paciente

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na organização (o Paciente é considerado o “2º homem dentro da organização”), a ramificação das atividades criminosas em diversas unidades da Federação e a alta probabilidade de reiteração delituosa considerando-se a potencialidade da utilização do meio sistematicamente empregado pela quadrilha, a saber, o uso de artifícios para camuflar o transporte de entorpecentes no interior de cortes de carne destinada à exportação.

Entendo, portanto, que há razões bastantes para a custódia preventiva, tanto pela garantia da ordem pública quanto pela aplicação da lei penal, as quais se revelam, no caso concreto, intimamente vinculadas.

Quanto à alegação de excesso de prazo (item “b” acima), o Supremo Tri-bunal Federal tem deferido a ordem de habeas corpus somente em hipóteses excepcionais, nas quais a mora processual:

i) seja decorrência exclusiva de diligências suscitadas pela atuação da acusação (cf.: HC 85.400/PE, Rel. Min. Eros Grau, Primeira Turma, un-ânime, DJ de 11-3-05; e HC 89.196/BA, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, maioria, julgado em 3-10-06);

ii) resulte da inércia do próprio aparato judicial em atendimento ao princí-pio da razoável duração do processo, nos termos do art. 5º, LXXVIII (cf.: HC 85.237/DF, Pleno, unânime, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 29-4-05; HC 85.068/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, unânime, DJ de 3-6-05; HC 86.346/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, unânime, julgado em 18-4-06; HC 87.910/SP, Rel. Min. Eros Grau, decisão monocrática, DJ de 25-4-06; HC 86.850/PA, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, unânime, julgado em 16-5-06; e HC 87.164/RJ, de minha relatoria, Segunda Turma, unânime, DJ de 29-9-06); e, por fim,

iii) seja incompatível com o princípio da razoabilidade (cf.: HC 84.931/CE, Rel. Min. Cezar Peluso, Primeira Turma, unânime, DJ de 16-12-05), ou, quando o excesso de prazo seja gritante (cf.: HC 81.149/RJ, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, unânime, DJ de 5-4-02; RHC 83.177/PI, Rel. Min. Nelson Jobim, Segunda Turma, unânime, DJ de 19-3-04; HC 84.095/GO, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, unânime, DJ de 16-12-05; e HC 87.913/PI, Rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, unânime, julgado em 5-9-06).

Ademais, esta Corte tem o entendimento de que a defesa não poderá argüir excesso de prazo quando ela própria der causa a demora no término da instrução criminal. Nesse sentido, vale destacar os seguintes precedentes: HC 86.947/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, decisão monocrática, DJ de 26-10-05; HC 86.618/MT, Segunda Turma, unânime, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 28-10-05; HC 85.298/SP, Primeira Turma, maioria, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ o ac. Min. Carlos Britto, DJ de 4-11-05; HC 86.789/SP, de minha relatoria, Segunda Turma, unâ-nime, DJ de 24-3-06; HC 88.229/SE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, maioria, julgado em 10-10-06; e HC 88.905/GO, de minha relatoria, Segunda Turma, unânime, DJ de 13-10-06.

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No presente caso, há indícios de que a própria defesa deu causa ao excesso de prazo, verbis:

Anoto, outrossim, que os acusados têm impetrado inúmeras ordens de habeas corpus em diversas instâncias judiciais, e, não raro, simultaneamente a incontáveis pedidos de revo-gação de prisão preventiva, com argumentos idênticos e sem fatos novos que os justifiquem, o que resulta em embaraço à marcha processual. Tal reiteração de pleitos, por certo, também deve ser levada à conta das causas que estão a obstar uma maior celeridade na tramitação da ação penal sob foco, sujeita a quatro instâncias judiciais, inclusive na via estreita do writ.(Fl. 76.)

Outrossim, verifico a existência de elementos que sinalizam a complexi-dade da causa. A exordial acusatória (apenso 1, fls. 46-66) foi oferecida contra doze denunciados, pela suposta prática de tráfico internacional de entorpecentes cometida em associação. Considerando o caráter complexo da instrução, creio ser possível admitir, em princípio, a excepcional prorrogação de mais de 81 dias para o término da instrução criminal.

A jurisprudência deste Tribunal, para o caso de processos complexos, re-conhece a possibilidade de dilação do prazo da instrução processual, sem que a prisão do envolvido configure inequívoco constrangimento ilegal. Nesse sentido, vale destacar os seguintes precedentes da Corte: HC 71.610/DF, Pleno, unânime, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 30-3-01; HC 82.138/SC, Segunda Turma, unânime, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 14-11-02; HC 81.905/PE, Primeira Turma, maioria, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 16-5-03; HC 85.679/PE, Primeira Turma, maioria, Rel. Min. Carlos Britto, DJ de 31-3-06; HC 86.577/ES, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, maioria, julgado em 12-9-06; e HC 88.905/GO, de minha relatoria, Segunda Turma, unânime, DJ de 13-10-06.

Neste caso, considerada a contribuição da defesa para a mora processual, assim como verificada a complexidade da causa, não vislumbro patente situação de constrangimento ilegal apta a ensejar o deferimento da ordem.

Nesses termos, meu voto é pelo indeferimento deste habeas corpus. En-tretanto, considerando a necessidade de razoável duração do processo no âmbito judicial e os efeitos prejudiciais que podem ser causados ao Paciente na esfera penal, determino que esta decisão seja comunicada ao Juízo da 11ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Goiás com a maior brevidade possível, a fim de que a Ap 2005.35.00.018057-7 seja apreciada e julgada nos termos do art. 5º, LXXVIII, da CF.

EXTRATO DA ATA

HC 89.090/GO — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Paciente: José Anto-nio de Palinhos Jorge Pereira Cohen. Impetrante: Pedro Xavier Coelho Sobrinho. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: Denegada a ordem, decisão unânime. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Celso de Mello. Presidiu este julgamento o Ministro Gilmar Mendes. Segunda Turma, 14-11-06.

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Decisão: A Turma, por votação unânime, indeferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Falou pelo Paciente o Dr. Pedro Xavier Coelho Sobrinho. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Eros Grau.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mário José Gisi.

Brasília, 21 de novembro de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coorde-nador.

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HABEAS CORPUS 89.735 — SP

Relator: O Sr. Ministro Menezes Direito

Paciente: Rubens Micael Arakelian — Impetrante: Valdir Vicente Bártoli — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Crimes contra o meio ambiente (Lei 9.605/98) e de loteamento clandestino (Lei 6.766/79). Inépcia formal da denúncia. Tipicidade da conduta criminosa inscrita no art. 40 da Lei 9.605/98. Caracterização da área degradada como “unidade de conservação”. Reexame de provas. Auto-aplicabilidade do art. 40 da Lei 9.605/98. Dosimetria da pena. Questão não apreciada no acórdão impugnado. Supressão de instância. Precedentes.

1. Não se reputa inepta a denúncia que preenche os requi-sitos formais do art. 41 do Código de Processo Penal e indica mi-nuciosamente as condutas criminosas em tese praticadas pelo pa-ciente, permitindo, assim, o exercício do direito de ampla defesa.

2. A declaração de atipicidade da conduta capitulada no art. 40 da Lei 9.605/98, sob a alegação de que a área degradada não seria uma “unidade de conservação” demandaria reexame de provas, o que não se admite no rito estreito do habeas corpus.

3. De outra parte, não é possível subordinar a vigência do dispositivo legal em referência à edição da Lei 9.985/00 ou do Decreto 4.340/02. O art. 40 da Lei 9.605/98, independentemente das alterações inseridas pela Lei 9.985/00 ou da regulamentação trazida pelo Decreto 4.340/02, possuía, já em sua redação origi-nal, densidade normativa suficiente para permitir a sua aplicação imediata, sendo certo que essas alterações não implicaram aboli-tio criminis em nenhuma medida.

4. A dosimetria da pena cominada para o crime de loteamen-to clandestino não merece reparo. A exasperação da reprimenda para além do mínimo legal está lastreada em elementos diversos daqueles que já compõem o tipo penal em referência e plenamen-te compatíveis com a espécie.

5. No caso concreto, não cabe apreciar os alegados vícios na dosimetria da pena cominada pela prática do crime ambiental porque o acórdão impugnado, do Superior Tribunal de Justiça, não enfrentou essa questão, nem constam dos autos elementos que permitam aferir que ela foi submetida àquela Corte. O exa-me do tema, neste ensejo, configuraria supressão de instância não autorizada.

6. Habeas corpus conhecido em parte e, nessa parte, dene-gado.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primei-ra Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Carlos Britto, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, conhecer, em parte, do pedido de habeas corpus mas, nessa parte, indeferi-lo.

Brasília, 20 de novembro de 2007 — Menezes Direito, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Menezes Direito: Habeas corpus, sem pedido de liminar, impetrado pelo advogado Valdir Vicente Bártoli em favor de Rubens Micael Arakelian, buscando a anulação dos atos processuais havidos na ação penal ins-taurada em desfavor do Paciente pela prática, em tese, de crime ambiental e de crime de loteamento clandestino.

Aponta como autoridade coatora a Quinta Turma Superior Tribunal de Justiça, que deferiu parcialmente a ordem no HC 49.607/SP, impetrado naquele Tribunal com objetivo idêntico ao perseguido nesta oportunidade, “tão-somente no tocante à dosimetria da pena de multa aplicada ao paciente Rubens Micael Arakelian, a fim de que outra seja fixada com a adequada e proporcional fun-damentação, conforme já estabelecido para a reprimenda privativa de liberdade, mantida a condenação do paciente, à exceção do paciente Dorivaldo Xerfan, que teve reconhecida a extinção da sua punibilidade pelo Tribunal a quo, estando prejudicada a impetração em relação à sua pessoa” (fl. 113).

Alega que a denúncia oferecida pelo Ministério Público é inepta, porque a) não teria particularizado a conduta do Paciente; b) não teria esclarecido se essa conduta estaria tipificada na Lei 477/65 ou na Lei 9.605/98; c) teria afirmado que o local do loteamento era área de conservação, quando o laudo oficial declarava o contrário; e d) não teria precisado a data do cometimento do crime ambiental.

Acrescenta que:

O artigo 4º do Código Penal considera cometido o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado. Assim, como a denúncia afirma que o loteamento foi iniciado em 1996, esse ano é o único parâmetro temporal que pode ser conside-rado como da consumação do ilícito ambiental. Como então poderia a conduta ser classificada na Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998?(Fl. 7.)

Aduz que a conduta do Paciente não se subsume ao tipo inscrito no art. 40 da Lei 9.605/98 porque tal dispositivo visa a preservar danos perpetrados contra “unidades de conservação”, sendo que o local em que realizado o loteamento, segundo afirmado pela perícia técnica realizada, não revestiria essa natureza.

Ainda quanto a este tema, o Impetrante afirma que foi a Lei 9.985/00 que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) e estabeleceu os critérios e normas para a criação, a implantação e a gestão das

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unidades de conservação. Essa lei, por seu turno, teria sido regulamentada pelo Decreto 4.340, de 2002, que em seu art. 2º teria definido os procedimentos para o ato de criação de uma unidade de conservação. Somente a partir da edição dessa norma, portanto, é que se poderia cogitar da existência de uma “unidade de conservação”. Assim, “aplicar-se contra o paciente a conduta definida no art. 40, da Lei 9.605/98, significa inaceitável violação ao princípio da irretroatividade da Lei” (fl. 13).

De outra parte, segundo sustenta, a área também não poderia ser conside-rada uma “reserva ecológica” porque o laudo ambiental apresentado não seria conclusivo quanto à extinção da flora e da fauna locais.

Pugna, igualmente, pelo reconhecimento de erro na dosimetria da pena quanto aos crimes de loteamento clandestino (art. 50 da Lei 6.766/79) e de dano ambiental (art. 40 da Lei 9.605/98). Argúi:

22.c. O paciente é réu primário, conforme expressamente reconhecido na sentença de primeiro grau, e pela prática do crime de loteamento clandestino (art. 50, incisos I e III da Lei 6.766/79) foi condenado à pena de três anos de reclusão.

(...)24.c. Com todo o respeito, houve claro excesso no cálculo das penas. Os motivos ado-

tados pela Juíza são, na verdade, elementos e circunstâncias compositivas dos próprios crimes. Eles já foram considerados na fase de fixação das margens penais pelo legislador e não podem ser valorizados novamente, na fase de aplicação judicial da reprovação penal. é inegável a incidência no proibido bis in idem.

25.c. Os motivos invocados pela autoridade sentenciante, são, com todo respeito, “forçados”.

A situação econômica do adquirente de lotes (rico ou pobre) não pode sustentar o agra-vamento da pena; da mesma forma o preço do lote.

O crime de parcelamento do solo é crime contra a Administração Pública e não crime contra a economia popular.

Na essência, o crime de parcelamento do solo configura tipo de desobediência à ordem legal emanada do Poder Público. De sorte que, “total descaso para com os Poderes Públicos” já é elemento compositivo do tipo. Considerar o fato como agravante, significa inaceitável dupla valoração.

Não há residências com perigo de desmoronamento. Mesmo que ouvesse, imputar o fato ao paciente, com todo respeito, é leviandade juridicamente inaceitável. Por outro lado, a rigor, o crime é de consumação instantânea (STF, Marco Aurélio, RT. 727/410), não dá lugar à incidência de crime continuado ou concurso de crimes, como bem esclarece Ruy Rosado de Aguiar Júnior (Normas penais sobre o parcelamento do solo urbano, pg. 218).

26.c. é evidente, data venia, que a fundamentação elaborada para a fixação da pena acima do mínimo legal no crime de loteamento clandestino não é suficiente para atender às exigências do artigo 59 do Código Penal.

A elevação da pena mínima está errada, porque todas as circunstâncias elencadas pela MM. Juíza sentenciante são ‘efeitos produzidos pela lesão que constitui a materialidade do delito punido’, como já decidiu esse Excelso Tribunal, no HC 82.058, relatado pelo ilustre Ministro Ilmar Galvão (RT 810/514).

27.c. Relativamente ao crime ambiental a ilegalidade é gritante. Com efeito, o decreto condenatório, em primeira instância, assim consigna:

“Relativamente ao disposto no artigo 40 da Lei 9.605/98 e atenta às mesmas circunstâncias que ensejaram a exacerbação da pena supra mencionada, fixo a pena base dos acusados em 03 (três) anos de reclusão.”

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Ou seja, com base nas circunstâncias que motivaram a exacerbação da pena no crime de loteamento clandestino, a MM. Juíza fixou a pena base no crime ambiental em três anos, quando a mínima cominada é de 1 (um) ano.

O procedimento é teratológico e absolutamente ilegal, com todo o respeito. Como definir como agravantes do crime ambiental, elementos que compõem o tipo do crime de loteamento clandestino?(Fls. 19 a 22.)

Requer, ao final, a concessão da ordem, a fim de que seja “decretada a inépcia da denúncia, anulando-se todo o processo a partir daí, ou, a anulação das sentenças condenatórias, determinando que sejam elas refeitas, com a des-classificação do crime definido no art. 40 da Lei 9.605/98, para a contravenção prevista na Lei 4.771/65, em face da atipicidade da conduta, fixada a proibição da elevação da pena mínima, no caso de condenação, em face da primariedade e da ausência de circunstâncias agravantes que não integram os tipos penais” (fl. 24).

Dispensadas informações pelo Ministro Sepúlveda Pertence (fl. 135), manifestou-se o Subprocurador-Geral da República Dr. Edson Oliveira de Al-meida pela denegação da ordem.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Menezes Direito (Relator): O Paciente foi denunciado, jun-tamente com outros Co-réus, pela prática de crime contra o meio ambiente (art. 40, c/c art. 53, ambos da Lei 9.605/98, na forma do art. 69 do Código Penal) e crime de loteamento clandestino (arts. 50, incisos I e III, e parágrafo único, incisos I e II, c/c art. 51, ambos da Lei 6.766/79) (fls. 26 a 34).

O Juízo da 29ª Vara Criminal da São Paulo/SP julgou parcialmente pro-cedente a denúncia, condenando o Paciente a 3 anos de reclusão pelo delito de loteamento clandestino e a 4 anos de reclusão pelo crime ambiental, a serem cumpridos em regime fechado (fls. 53 a 79).

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou provimento ao recurso de apelação interposto pelo Ministério Público e deu parcial provimento àquele interposto pela defesa para fixar o regime semi-aberto para o cumprimento das penas impostas, determinando fosse expedido mandado de prisão após o trânsito em julgado (fls. 81 a 92).

Impetrou-se, então, no Superior Tribunal de Justiça, o HC 49.607/SP, em que se deferiu parcialmente o pedido apenas para determinar a fixação de pena de multa em expressão proporcional à da pena privativa de liberdade (fls. 96 a 113).

A irresignação apresentada no presente habeas corpus não prospera.

No que diz respeito à inépcia da denúncia, verifico que, ao contrário do que sustenta o Impetrante, ela indica satisfatoriamente as condutas criminosas que imputa ao Paciente, não apresentando nenhuma omissão capaz de obstar o exer-cício do seu direito de ampla defesa. Tal conclusão se extrai do simples exame do documento em referência:

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Rubens Micael Arakelian, proprietário da gleba (fls. 51/54), constituiu seu bastante procurador, o sogro, Dorivaldo Xerfan com a tarefa de promover o loteamento clandestino da referida gleba.

Dorivaldo, munido de procuração, ingressou no mês de maio de 1996 com ação de reintegração de posse contra invasores que se haviam apossado indevidamente de parte do imóvel (fls. 28/32 e 33/38), tendo obtido a liminar.

Os denunciados Rubens e Dorivaldo, com o propósito de viabilizar o empreendimento e dar às vendas a aparência de negócio honesto e seguro, valeram-se de uma sociedade civil denominada Sociedade Organizadora Amigos do Jardim Joamar (fls. 818/832 e 840/841), ten-do como testa-de-ferro, na função de “presidente”, Thomas Cassiano Pontes (fls. 45 e 1067). Em 9 de junho de 1996, Rubens, representado por Dorivaldo, comprometeu-se a vender para essa Associação parte da gleba, num total de 80.000m2 (instrumento particular às fls. 46/47).

Em 14 de julho de 1997, também por instrumento particular de compra e venda, Ru-bens, por seu procurador, comprometeu-se a vender mais 60.000m2 da gleba, desta vez, à Associação Flor de Maio (estatuto às fls. 1011/1024), substituta aparente da outra associação, em que figura como presidente o denunciado Armando (fls. 42/44).

Essas “associações”, especialmente a última – que acompanhou a implantação do lote-amento e a venda dos terrenos – tinham por finalidade levar os adquirentes a acreditar que se tratavam de entidades voltadas ao bem-estar social e à defesa dos interesses dos adquirentes dos lotes e ao incremento urbanístico do lugar que veio a ser habitado por pessoas, na maioria, trabalhadores com baixo nível de ingressos e que viam na aquisição dos lotes uma possibilida-de de estabelecer-se numa moradia digna com a família.

Em verdade, a Associação Flor de Maio, tendo à frente o denunciado Armando, admi-nistrava o loteamento clandestino por delegação de Rubens Dorivaldo. Este último, mandatá-rio do proprietário da gleba, além de fiscalizar a administração feita por Armando, era uma espécie de tesoureiro, responsável pelo recebimento das prestações mensais. Permanecia com freqüência no local.

Dessa forma, Rubens Micael, em conluio com Dorivaldo, Thomas Cassiano Pontes (falecido – fls. 1067) e, posteriormente, com a colaboração do denunciado Armando, iniciaram a venda dos lotes, no ano de 1996.

Fuad Demétrio, concunhado de Dorivaldo, também passou a fazer parte da implanta-ção do loteamento. Sua função era (....).

(...)Os denunciados, cada qual com uma função determinada, convenceram o público de

que a compra dos lotes era um bom negócio e utilizaram para isso prospectos (fls. 65), que ocultavam o principal: a falta de legalização do empreendimento.

Juntos, ludibriaram numerosas pessoas ao longo de quatro anos (...).O loteamento não está registrado no Registro de Imóveis da Capital, o que impediria

a venda ou promessa de venda de lotes, sem a autorização formal da Prefeitura Municipal de São Paulo (...); da Cetesb (...); e da Secretaria do Meio Ambiente.

Os denunciados, mostrando descaso com o Poder Público e dolo intenso em suas condutas, já que tendo conhecimento de que havia inquérito policial e ação civil pública em tramitação perante a 16.ª Vara Cível da Capital – proc. n.º 651/96 – fls. 55/62, deram continui-dade ao comércio ilegal de venda de lotes, abrindo ruas e implantando outros lotes.

As seguidas vistas dos autos do inquérito policial instaurado, abertas aos advogados dos denunciados Dorivaldo e Armando, concedidas pela delegada de polícia que presidia o inquérito referido, dra. Juliana Pereira Godoi, comprovam o interesse deles em acompanhar o andamento das diligências. A existência do inquérito em andamento não os dissuadiu, con-tudo, de prosseguir no comércio criminoso (fls. 92, 146, 241, 256 e 313).

(...)Os denunciados causaram ainda e, deliberadamente, com sua omissão, danos ao meio

ambiente. Com as obras de implantação do loteamento, deram causa ao assoreamento das malhas de vários córregos que cortam a região e lagos nas proximidades, aterrando-os por completo, principalmente em razão da inexistência de obras de drenagem. Com as chuvas,

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partículas do solo – sem proteção da camada de vegetação, retirada para a implantação do loteamento – acabaram se sedimentando nas partes baixas da bacia hidrográfica. Um aterro de detritos orgânicos e entulhos diversos ali se instalou (v. fotografias às fls. 162, que mostra o assoreamento de um lago e as de fls. 217/220, 226/230).

A região, na qual se encontra implantado o loteamento, é protegida pela Lei Federal nº 4771/65 (Código Florestal):

art. 2º: “Consideram-se de preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação natura”.

a. ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima seja de 30m, para os cursos d’água desde o seu nível de menos de 10m.

b. ao redor de lagoas, ou reservatórios naturais ou artificiais.art. 19: “a exploração de florestas ou de formações sucessoras, tanto de domínio público

como de domínio privado, dependerá de aprovação prévia do Instituto Brasileiro do Meio Am-biente e dos Recursos Naturais Renovávies – IBAMA, bem como da adoção de técnicas de condução, exploração, reposição floresta e manejo compatíveis com os variados sistemas que a cobertura arbórea forme”.

Frise-se que a exploração de vegetação de preservação permanente é proibida em quaisquer condições, excetuando-se os casos de utilidade pública ou interesse social (art. 2º, 3º, do Código Florestal).

Todos os denunciados, assim, com as condutas descritas acima, causaram dano dire-to à unidade de conservação, considerada área de proteção ambiental, já que o loteamento encontra-se inserido numa das encostas da Serra da Cantareira, que por sua vez faz parte do “Cinturão Verde de São Paulo”. Considerada como a maior floresta urbana do mundo, foi reconhecida pela Unesco como “Patrimônio da Humanidade”.

Assim dispõe o art. 2º da Lei Estadual nº 898/75:“São declaradas áreas de proteção e, como tais, reservadas, as referentes aos

seguintes mananciais, cursos e reservatórios de água e demais recursos hídricos de interesse da Região Metropolitana da Grande São Paulo: III - reservatórios de Cantareira, no Rio Cabuçu de Baixo, até as barragens no muni-

cípio de São Paulo”Frise-se, por fim, que os denunciados causaram, quer por ação, quer por omissão

deliberada – como acima exposto – a diminuição de águas naturais, com o assoreamento de córregos e lagos, e com o seu posterior aterramento.

(...)Pelo exposto, denuncio a V. Exa. Rubens Micael Arakelian, Dorivaldo Xerfan, (...),

Geneton Bezerra Farias, (...) como incursos nos arts. 50, inc. I e III, e paráfrago único, inc. I e II, c.c. o art. 51 ambos da Lei nº 6766/79, e art. 40 c.c. o art. 53, ambos da Lei nº 9605/98, na forma do art. 69, do C. Penal.(Fls. 26 a 33 e 102 a 103.)

Parece-me, portanto, que a denúncia, a par de preencher todos os requisi-tos formais estatuídos no art. 41 do Código de Processo Penal, não incide, por outro lado, nas hipóteses do art. 43 do mesmo diploma, que determinariam a sua rejeição.

Com efeito, a exordial acusatória particularizou adequadamente a conduta criminosa imputada ao Paciente: subsumiu-a claramente aos tipos dos arts. 40 e 53 da Lei 9.605/98 no que diz respeito ao crime ambiental e indicou satisfatoria-mente a época em que crime teria ocorrido.

Quanto ao fato de a denúncia ter afirmado que o local do loteamento era área de conservação, contradizendo o que se teria apurado no laudo técnico, res-salto que essa incompatibilidade, se existente, não caracteriza inépcia da inicial.

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Embora a circunstância possa vir a ter conseqüências no processo, não pode ser argüida com a finalidade de anular todos os atos processuais desde o recebimento da denúncia.

Não é possível, de outra parte, tomar como data do crime o ano de 1996 para afastar a incidência da Lei 9.605, promulgada somente em 1998. Isso por-que, nos termos da denúncia, as condutas danosas ao meio ambiente começaram em 1996, mas avançaram, pelo menos, até o ano de 1999.

Nesse sentido esclarece o acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

E nem se diga, quanto a este delito, que teria ocorrido violação ao princípio da anterio-ridade penal. O crime ambiental praticado ocorreu já na vigência da Lei nº 9.605/98, porquan-to, como já observado, os fatos delituosos se estenderam até o ano de 1999.

(Fls. 86/87.)

Quanto à possibilidade de enquadramento da conduta do agente no tipo do art. 40 da Lei 9.605/98, ressalto que a norma em comento tutela, em seus arts. 38 e 40, bens jurídicos distintos:

Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:

Pena – detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.Art. 40. Causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e às áreas de

que trata o art. 27 do Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990, independentemente de sua localização:

§ 1º Entende-se por Unidades de Conservação de Proteção Integral as Estações Ecoló-gicas, as Reservas Biológicas, os Parques Nacionais, os Monumentos Naturais e os Refúgios de Vida Silvestre.

§ 2º A ocorrência de dano afetando espécies ameaçadas de extinção no interior das Unidades de Conservação de Proteção Integral será considerada circunstância agravante para a fixação da pena.

Art. 40-A. Vetado§ 1º Entende-se por Unidades de Conservação de Uso Sustentável as Áreas de Proteção

Ambiental, as Áreas de Relevante Interesse Ecológico, as Florestas Nacionais, as Reservas Extrativistas, as Reservas de Fauna, as Reservas de Desenvolvimento Sustentável e as Reser-vas Particulares do Patrimônio Natural.

Vê-se, assim, que Lei 9.605/98 protege, no art. 38, as florestas consideradas de preservação permanente e, no art. 40, as Unidades de Conservação (de Prote-ção Integral ou de Uso Sustentável) e as áreas de que trata o art. 27 do Decreto 99.274/90 (áreas circundantes das Unidades de Conservação).

O Impetrante sustenta que o laudo técnico elaborado afirmou expressamente que a área loteada não constituía Unidade de Conservação. Além disso, aduz que o art. 40 da lei em comento teria sido regulamentado por decreto editado apenas em 2002, antes do que não se poderia falar em Unidade de Conservação.

Quanto ao primeiro argumento, constato que a sentença condenatória, indiretamente, afirmou que a área loteada era uma Unidade de Conservação ao encampar a denúncia oferecida; o que fez nos seguintes termos:

R.T.J. — 203 1195

Consoante denúncia formulada contra os acusados, que restou comprovada ao término da instrução criminal, imputa-se aos acusados a prática de dano direto, confira-se: “(...) Todos os denunciados, assim, com as condutas descritas acima, causaram dano direto à unidade de conservação, considerada área de proteção ambiental, já que o loteamento encontra-se inse-rido numa das encostas da Serra da Cantareira, que por sua vez faz parte do ‘Cinturão Verde de São Paulo’. Considerada como a maior floresta urbana do mundo, foi reconhecida pela Unesco como ‘Patrimônio da Humanidade’.”(Fl. 67.)

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por seu turno, exarou:

Da mesma forma, a comprovação material do delito ambiental pode ser extraída dos laudos de fls. 22239 e 64/73, do apenso II, e dos autos de infração ambiental de fls. 623/624, 279 e 78/85, do apenso II, que foram inclusive assinados pelo co-réu Dorivaldo.

(...) Em sendo assim, não é possível sustentar que o dano direito e indireto à unidade de conservação teria ocorrido anteriormente à vigência da citada Lei. Isso inviabiliza, inclusive que se cogite de desclassificação para as figuras previstas na Lei nº 4.771/65.(Fls. 86/87.)

Quanto ao conflito que o Impetrante alega existir entre as decisões referidas e o laudo técnico que põe em destaque, verifico que as instâncias de origem não afirmaram a existência do dano à Unidade de Conservação com fundamento na perícia mencionada. Não se trata, portanto, de uma possível má valoração de prova. A pretensão formulada desafia, ao contrário, verdadeira reapreciação do conjunto fático probatório, o que não admite a via estreita do habeas corpus, conforme reiterada jurisprudência (HC 91.334/PA, Primeira Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJ de 17-8-07; HC 90.292/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ de 25-5-07; HC 88.978/DF, Segunda Turma, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 21-9-07; HC 84.278/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 22-10-04).

Como não se revela viável discutir, nesta sede, se a área degradada, segun-do seu aspecto material, configura ou não “unidade de conservação”, preservan-do-se o posicionamento firmado pelas instâncias de origem em sentido positivo, impende reputar prejudicada alegação de que a área também não constituiria “reserva ecológica”.

Sob o outro ângulo em que se apresenta a questão da qualificação jurídica da área loteada, assinalo que não se pode subordinar a vigência do art. 40 da Lei 9.605/98 à do Decreto 4.340/02, que regulamentou a Lei 9.985/00.

A questão merece análise detida.

O acórdão recorrido cuida do tema como se segue:

Não merecem prosperar os argumentos no sentido de que a área em que se realizou o loteamento clandestino não seria ‘Unidade de Conservação’ à época do oferecimento da denúncia (20/01/2000), sob o fundamento de que o art. 225, § 1º, incisos I, II, e III da Consti-tuição Federal somente teria sido regulamentado em 18/07/2000.

Com efeito. Diversamente do alegado pelo impetrante, a Lei n.º 9.605/98 já trazia no texto original do § 1º do artigo 40 a definição de ‘Unidades de Conservação’, conforme se vê da sua redação original:

(...)

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Todavia, a fim de regulamentar o art. 225, § 1º, incisos I, II e III e VII da Constituição Federal, o legislador originário editou a Lei n.º 9.985, de 18/07/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC).

No referido diploma legal, determinou-se a divisão das Unidades de Conservação inte-grantes do SNUC em dois grupos: Unidades de Conservação de Proteção Integral e Unidades de Conservação de Uso Sustentável.

Assim o fazendo, a referida lei fez constar a definição de ambos os grupos na nova redação dada ao § 1º do art. 40, bem como no § 1º do novo art. 40-A, da Lei n.º 9.605/98, respectivamente:

(...)Todavia, o caput dos referidos artigos com a nova redação dada pela Lei n.º 9.985/00

foi objeto de veto Presidencial (Mensagem nº 967 de 18/07/2000), de modo que foi mantida a redação original dada pela Lei n.º 9.605/98 ao art. 40, caput, o qual concede proteção mais ampla às referidas ‘Unidades de Conservação’, nos termos propostos pelo art. 225, § 1º, inciso III, da CF/88.

Desta forma, a divisão em dois grupos feita pela nova lei às “Unidades de Conserva-ção” não possui qualquer utilidade para fins penais, eis que prevaleceu a sua definição mais abrangente e que mais se coaduna com a ampla proteção visada pelo legislador constitucional.

Sobre a matéria, vale destacar as lições de Luis Regis Prado, in Direito Penal do Am-biente, Ed. RT, pgs. 315/316):

“A criação das Unidades de Conservação, substancialmente impulsionada a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988 (art. 225, § 1º, III) constitui hoje importante instrumento de prevenção da ocorrência de danos aos ecossistemas.

Recentemente, a Lei 9.985/2000 (art. 7º, I e II) determinou a divisão das uni-dades de conservação integrantes do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) em dois grupos, com características específicas: o primeiro é composto pelas Unidades de Proteção Integral (v.g., estação ecológica); o segundo, pelas Unidades de Uso Sustentável (v.g., reserva ecológica).

Para efeitos jurídicos-penais, porém, essa diferenciação é de reduzido significa-do, pois o caput do artigo 40 da Lei 9.605/1998, ainda em vigor, refere-se às Unidades de Conservação em sentido amplo. Isso porque sua nova redação, conforme o artigo 39 da Lei 9.985/2000, acabou sendo vetada. Assim, a descrição típica do artigo em tela não acolhe a distinção feita pelo parágrafo 1º e reiterada pelo artigo 40-A, parágrafo 1º. Aliás, essa interpretação (sistemática/teleológica) é a que mais se coaduna com a finalidade de reforço de tutela presente na lei nova.” (G.n.)

(Fls. 105 a 107.)

O art. 40 da Lei 9.605/98, como já ressaltado, visa a tutelar áreas que denomina de “unidades de conservação”. De acordo com Herman Benjamin, a Lei 9.605/98 tem sua gênese na contravenção prevista no art. 26, letra d, da Lei 4.771/65 (Código Florestal), mas, em vez de fazer referência a Parques Na-cionais, Estaduais ou Municipais e Reservas Biológicas, como se tem no texto dessa última norma, usou expressão mais ampla – “unidade de conservação” – que designava, segundo a redação original do § 1º do art. 40: Reservas Biológicas, Reservas Ecológicas, Estações Ecológicas, Parques Nacionais, Estaduais e Municipais, Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais, Áreas de Proteção Ambiental, Áreas de Relevante Interesse Ecológico e Reservas Extrativistas ou outras a serem criadas pelo poder público. A Lei 9.605/98 veio a possibilitar, também nessa medida, portanto, maior proteção penal ao meio ambiente (BEN-JAMIN, Antônio Herman V. Crimes e Infrações Administrativas Ambientais. 2. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2001, p. 240).

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A criação dessas unidades de conservação encontra fundamento constitu-cional no art. 225, § 1º, inciso III, da Constituição Federal, que compete ao poder público a tarefa de “definir, em todas as unidades da Federação, espaços terri-toriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção”.

Posteriormente, com a finalidade de regular o mesmo art. 225, § 1º, da Constituição Federal, foi editada a Lei 9.985/00, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) e modificou a redação original do § 1º e do § 2º do art. 40 da Lei 9.605/98, além de inserir um artigo, o art. 40-A, com três parágrafos, cujo caput foi vetado.

Com isso imprimiu-se nova estrutura às Unidades de Conservação, que passaram a ser classificadas em Unidades de Conservação de Proteção Integral e Unidades de Conservação de Uso Sustentável, admitindo-se, nas primeiras, a intervenção humana apenas para uso indireto (aquele que não envolve consumo, coleta, dano ou destruição) dos recursos naturais; e objetivando as segundas com-patibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela de seus recursos naturais (art. 7º, § 1º e § 2º, da Lei 9.985/00).

é preciso ter presente, porém, que a lei nova foi vetada não apenas na parte relativa ao caput do art. 40-A, mas também na parte em que propunha uma nova redação ao caput do art. 40. Dessa forma, o caput do art. 40 da Lei 9.605/98, em sua redação original, passou a encimar, além dos seus próprios parágrafos, também os do art. 40-A.

Como bem sintetiza Carlos Constantino, “o art. 40-A tornou-se um des-dobramento necessário do art. 40; não se pode admitir a absurda interpretação de que os dois dispositivos (40 e 40-A), após o veto, ficaram acéfalos, com parágrafos soltos, vagando pelo ar” (CONSTANTINO, Carlos Ernani. Delitos Ecológicos 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 153).

A distinção feita entre Unidades de Conservação de Proteção Integral e Unidades de Conservação de Uso Sustentável, por conseqüência dessas conside-rações, não tem, na minha compreensão, efeitos penais de ordem prática. Sobre o tema, Delmanto consigna expressamente: “Com esse veto, permaneceu a re-dação antiga do art. 40, que se refere às Unidades de Conservação, não fazendo distinção entre proteção integral e de uso sustentável” (DELMANTO, Roberto; DELMANTO JÚNIOR, Roberto; DELMANTO, Fábio M. de Almeida. Leis Pe-nais Especiais Comentadas. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 473).

Além disso, é preciso considerar que o § 1º do art. 40 e o § 1º do art. 40-A, ao definirem o que se deve entender por Unidade de Conservação de Proteção In-tegral e de Uso Permanente, repetiram praticamente todas as hipóteses previstas na redação original do § 1º do art. 40, que dispunha: “Entende-se por Unidades de Conservação as Reservas Biológicas, Reservas Ecológicas, Estações Ecológi-cas, Parques Nacionais, Estaduais e Municipais, Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais, Áreas de Proteção Ambiental, Áreas de Relevante Interesse Ecológico e Reservas Extrativistas ou outras a serem criadas pelo Poder Público.”

R.T.J. — 2031198

Dessa forma, a edição da Lei 9.985/00 não tem o condão de subtrair o ca-ráter delituoso da conduta que, anteriormente a sua edição, preenchia o tipo do art. 40 da Lei 9.605/98. Esse texto legal, vigente à época dos fatos, já definia, ele próprio, o que se deveria entender por “unidade de conservação”, sendo, portan-to, auto-aplicável, como bem advertiu o acórdão recorrido.

A Lei 9.985/00, por outro lado, ao estender a abrangência do conceito jurídico de “unidade de conservação”, não prejudicou de forma alguma os fatos anteriormente tipificados a partir de uma compreensão mais restrita da expressão contida na lei.

Não há, deste modo, falar em abolitio criminis, em ofensa ao princípio da irretroatividade na aplicação do art. 40 da Lei 6.905/98, ou, tampouco, em des-classificação para o tipo previsto na Lei 4.771/65, Código Florestal.

No que diz respeito à dosimetria das penas cominadas para o crime de lo-teamento clandestino qualificado, que tem pena mínima de 1 ano e máxima de 5 anos, assim procedeu a sentença condenatória:

Atento ao preceito sancionador do artigo 50, inciso I e III, e paráfrago único, incisos I e II, c.c. o artigo 51 ambos da Lei nº 6766/79, e considerando o dolo dos agentes que tive-ram por alvo pessoas humildes, leigas e de boa-fé; os motivos do crime que cingiram-se na ganância desmedida, haja vista que dividiram a gleba em 1.250 lotes, que foram vendidos a R$ 18.000,00 cada um; a conduta dos acusados que demonstraram total descaso para com os Poderes Públicos vez que não se contiveram diante da ação civil pública proposta no ano de 1996, do inquérito policial instaurado no ano de 1998 e mesmo após a busca e apreensão de todo o material existente no escritório da associação, que inclusive foi fechado, decorridas duas semanas já se encontrava em franco funcionamento; bem ainda as conseqüências do cri-me para algumas das vítimas cujas residências correm risco de desmoronamento, fixo a pena base dos acusados nos termos do artigo 59 do Código Penal, em 03 (três) anos de reclusão e multa (...)(Fl. 77.)

Ao contrário do que sustenta o Impetrante, não vislumbro excesso na apli-cação dessa pena-base, que, por sinal, veio a se converter em definitiva. A exas-peração da reprimenda para além do mínimo legal, com efeito, está lastreada em elementos diversos daqueles que já compõem o tipo penal, refletindo verdadeiro juízo de razoabilidade realizado pelo Magistrado a partir da valoração negativa que fez das circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal. Nessa tarefa foram destacadas, com especial relevo, cinco circunstâncias: a culpabilidade (conduta dolosa que vitimou pessoas humildes, leigas e de boa-fé); os motivos do crime (ganância); a conduta social e a personalidade do agente (descaso com os poderes públicos); e as conseqüências do delito (risco de desmoronamento).

Também não vejo motivo para não ser considerada a situação econômica das pessoas que adquiriram os lotes, já que, embora não se cuide de crime contra a economia popular, sua prática repercute, sem dúvida, na vida das famílias en-volvidas, bem como nas respectivas economias.

Da mesma forma, embora seja ínsito ao tipo penal em debate o desrespeito à ordem legal, não merece censura a reprovação especial que, no caso, adveio da circunstância assim destacada: “não se contiveram diante da ação civil pública

R.T.J. — 203 1199

proposta no ano de 1996, do inquérito policial instaurado no ano de 1998 e mesmo após a busca e apreensão de todo o material existente no escritório da associação, que inclusive foi fechado” (fl. 77).

A nosso aviso, o mencionado perigo de desmoronamento, bem como a sua imputação ao Paciente, malgrado o protesto do Impetrante, não pode ser afasta-do nesta sede processual porque demandaria o revolvimento de matéria fático probatória.

De outra parte, no que diz respeito à qualificação jurídica do delito, o Impetrante não esclarece de que modo o fato de ele ser um crime instantâneo, como alega, revelaria uma incorreção na aplicação da pena na forma como foi realizada.

Quanto à dosimetria da pena aplicada para o crime ambiental, verifico que o Superior Tribunal de Justiça, autoridade apontada como coatora, não se mani-festou sobre o tema. Por outro lado, não constam dos autos elementos que per-mitam aferir se ele chegou mesmo a ser submetido ao julgamento daquela Corte. Dessa forma, apreciar a questão, nesta sede, configuraria supressão de instância não autorizada. é o que se extrai dos seguintes precedentes:

I - STJ e STF – Habeas corpus – Competência originária. 1. Não pode o Superior Tribunal de Justiça conhecer de questão suscitada pelo impetrante – excesso de prazo – que não foi enfrentada pelo Tribunal de origem, ao qual, em conseqüência, não se pode atribuir a alegada coação. 2. Pelo mesmo fundamento – impossibilidade de supressão de instância –, também não cabe ao Supremo Tribunal conhecer originariamente da questão. II - Denúncia: aptidão: descrição suficiente do delito de associação para o tráfico imputado aos pacientes. 1. é da jurisprudência do Tribunal, na linha do que se tem decidido quanto ao crime de qua-drilha ou bando (Código Penal, art. 288), que a configuração do delito de associação para o tráfico independe “da realização ulterior de qualquer delito compreendido no âmbito de suas projetadas atividades criminosas” (v.g., Ext 966, Pleno, 29-6-06, Pertence, DJ de 10-8-06). 2. Daí que, para a aptidão da denúncia, o que se “exige, sobretudo, é que a imputação descreva concretamente os elementos essenciais à realização do tipo cogitado” (v.g., HC 70.290, Pleno, 30-6-93, Pertence, RTJ 162/559), o que, no caso, não foi descumprido. (HC 90.654/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 25-5-07.)

Habeas corpus. Prisão preventiva. Carência de fundamentação. Excesso de prazo para a prestação jurisdicional. Julgamento de recurso defensivo em sentido estrito. Supressão de instância. Decreto de prisão fundamentado na aplicaçâo da lei penal. Fuga do paciente após a prática do delito que lhe é imputado. Ordem denegada. A tese do excesso de prazo para a prestação jurisdicional não foi suscitada nas instâncias inferiores, o que impede o julgamento do feito diretamente pelo Supremo Tribunal Federal, sob pena de indevida supressão de instância. Precedentes: HC 86.990, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski; HC 84.799, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence; HC 82.213, Relatora a Ministra Ellen Gracie; e HC 83.842, Relator o Ministro Celso de Mello. Recurso defensivo em sentido estrito já denegado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Co-réu já julgado e condenado pelo Tribunal do Júri. A gravidade (em abstrato) do delito não se presta, ao ver desta Suprema Cor-te, como fundamento idôneo para a prisão preventiva. Precedentes. A evasão após a prática delitiva é fundamento idôneo para a segregação cautelar para resguardar a aplicação da lei penal. Ordem denegada.(HC 90.162/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Carlos Britto, DJ de 29-6-07.)

R.T.J. — 2031200

Habeas corpus. Processual penal. Prisão preventiva. Conveniência da instrução cri-minal. Paciente afastado do cargo de auditor fiscal após as impetrações de habeas corpus no TJPR e no Superior Tribunal de Justiça. Alegação de que com o afastamento não mais remanesceria a necessidade da prisão cautelar. Fato superveniente não examinado nas ins-tâncias precedentes. Supressões de instâncias. A prisão preventiva do Paciente foi decretada em 13-7-06, sob o fundamento de que ele, em liberdade, poderia, considerada sua condição funcional, influir na instrução do processo. Em 14-9-06, foi impetrado habeas corpus no STJ, sustentando o exaurimento da necessidade da constrição cautelar, em virtude de o Paciente ter sido afastado do cargo de Auditor Fiscal em 23-11-06. Essa ordem cronológica evidencia que a tese da cessação dos fundamentos da custódia cautelar não foi submetida ao Juízo de primeiro grau, nem ao TJPR, muito menos ao STJ. O conhecimento da impetração, sem que a questão superveniente tenha sido posta a exame do Juízo de primeiro grau, do TJPR e do STJ, implica supressões de instâncias, em três níveis. Habeas corpus não conhecido.(HC 90.312/PR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, DJ de 27-4-07.)

Penal. Processual penal. Habeas corpus. Questão nova. I - Por conter questão nova, não apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, o habeas corpus não pode ser conhecido, sob pena de supressão de instância. II - Habeas corpus não conhecido.

(HC 86.997/DF, Segunda Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 3-2-06.)

Ante o exposto, conheço do habeas corpus em parte e, nessa parte, denego a ordem.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Britto (Presidente): Também acompanho o voto do eminente Relator, solicitando, se possível, uma cópia de seu brilhante voto – esse tema o seduz há décadas.

Nos últimos dez anos, passei a me interessar muito pela temática do meio ambiente e a compreender que ele é multiplamente protegido pela Constituição Federal, especialmente. Se atentarmos bem para o discurso normativo do art. 225, perceberemos com toda facilidade que o meio ambiente, ecologicamente equili-brado, é um direito de todos. Prevê a Constituição: “Todos têm direito ao meio ambiente.” Mas ela própria se faz explicativa, porque o qualifica como “bem de uso comum do povo e essencial à qualidade sadia de vida” e protege-o “para as presentes e futuras gerações” – interessante como é um discurso constitucional enfático, atualizadíssimo, da contemporaneidade mais enxuta.

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Se V. Exa. me permitir, na verdade, a proteção do meio ambiente, hoje, transcende as fronteiras nacionais, porque é patrimônio comum da humanidade, protegido inclusive em diversos documentos internacionais.

O Sr. Ministro Carlos Britto (Presidente): Muito bem observado. Assim como a água e a democracia, o meio ambiente se tornou uma questão planetária.

De sorte que o voto de V. Exa., Menezes Direito, me parece de excelente qualidade; todos estão comungando dessa opinião e gostaríamos de receber uma cópia do seu voto.

R.T.J. — 203 1201

EXTRATO DA ATA

HC 89.735/SP — Relator: Ministro Menezes Direito. Paciente: Rubens Micael Arakelian. Impetrante: Valdir Vicente Bártoli. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma conheceu, em parte, do pedido de habeas corpus mas, nessa parte, o indeferiu. Unânime. Presidiu o julgamento o Ministro Carlos Brit-to. Ausente, justificadamente, o Ministro Marco Aurélio, Presidente.

Presidência do Ministro Carlos Britto. Presentes à sessão os Ministros Ri-cardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Menezes Direito. Ausente, justificadamente, o Ministro Marco Aurélio, Presidente. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner de Castro Mathias Netto.

Brasília, 20 de novembro de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031202

AGRAVO REGIMENTAL NA MEDIDA CAUTELAR NO HABEAS CORPUS 89.837 — DF

Relator: O Sr. Ministro Celso de MelloAgravante: Emanoel Loureiro Ferreira — Agravado: Presidente do Supe-

rior Tribunal de Justiça Habeas corpus – Condenação penal imposta a delegado de

polícia – Crime de tortura – Suposta ilegitimidade constitucional dos poderes investigatórios do Ministério Público – Medida cau-telar indeferida – Interposição de recurso de agravo – Inadmissi-bilidade – Agravo não conhecido.

- Não se revela suscetível de conhecimento, por incabível, re-curso de agravo contra decisão do Relator, que, motivadamente, defere ou indefere pedido de medida liminar formulado em sede de habeas corpus originariamente impetrado perante o Supremo Tribunal Federal. Precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supre-mo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, não conhecer, por incabível, do recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Ministros Gilmar Mendes e Eros Grau.

Brasília, 21 de novembro de 2006 — Celso de Mello, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de recurso de agravo, que, inter-posto a fls. 28/31, insurge-se contra decisão denegatória de medida liminar requerida em sede de “habeas corpus”.

Eis o teor da decisão, que, proferida a fls. 17/20, indeferiu o pedido de provimento liminar deduzido em favor do ora Agravante:

A presente impetração insurge-se contra decisão, que, emanada do E. Superior Tribu-nal de Justiça, acha-se consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 491 – apenso 4):

“HABEAS CORPUS’. CRIME DE TORTURA IMPUTADO A DELEGA-DO DA POLÍCIA CIVIL. INVESTIGAÇÃO REALIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. COLHEITA DE DEPOIMENTOS. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. INQUÉRITO POLICIAL. PRESCINDIBILIDADE.

1. A teor do disposto no art. 129, VI e VIII, da Constituição Federal, e no art. 8º, II e IV, da Lei Complementar nº 75/93, o Ministério Público, como titular da ação penal pública, pode proceder a investigações, inclusive colher depoimentos, sendo-lhe vedado, tão-somente, presidir o inquérito policial, que é prescindível para a propositura da ação penal.

R.T.J. — 203 1203

2. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal.3. Ordem denegada.”

(Grifei.)O exame dos fundamentos em que se apóia o julgamento ora impugnado parece des-

caracterizar, ao menos em sede de estrita delibação, a plausibilidade jurídica da pretensão deduzida pelos ilustres Impetrantes.

A decisão emanada do E. Superior Tribunal de Justiça – que reconhece, ao Ministério Público, a prerrogativa de promover, por direito próprio, sob sua autoridade e direção, in-vestigações penais – parece legitimar-se em face da Constituição da República promulgada em 1988.

É certo que o ordenamento positivo outorga, à autoridade policial, a atribuição para presidir o inquérito policial, consoante assinala JULIO FABBRINI MIRABETE (“Código de Processo Penal Interpretado”, p. 86, item n. 4.3, 7. ed., 2000, Atlas).

Essa especial regra de competência, contudo, não impede que o Ministério Público, que é o “dominus litis” – e desde que indique os fundamentos jurídicos legitimadores de suas manifestações (CF, art. 129, VIII) –, determine a abertura de inquéritos policiais, ou, então, requisite diligências investigatórias, em ordem a prover a investigação penal, quando conduzida pela Polícia Judiciária, com todos os elementos necessários ao esclarecimento da verdade real e essenciais à formação, por parte do representante do “Parquet”, de sua “opinio delicti”.

Todos sabemos que o inquérito policial, enquanto instrumento de investigação penal, qualifica-se como procedimento administrativo destinado, ordinariamente, a subsidiar a atuação persecutória do próprio Ministério Público, que é – nas hipóteses de ilícitos penais perseguíveis mediante ação penal de iniciativa pública – o verdadeiro destinatário das di-ligências executadas pela Polícia Judiciária (RTJ 168/896, Rel. Min. CELSO DE MELLO).

Trata-se, desse modo, o inquérito policial, de valiosa peça informativa, cujos elemen-tos instrutórios – precipuamente destinados ao órgão da acusação pública – visam a possibi-litar a instauração da “persecutio criminis in judicio” pelo Ministério Público (FERNANDO DE ALMEIDA PEDROSO, “Processo Penal – O Direito de Defesa”, p. 43/45, item n. 12, 1986, Forense; VICENTE DE PAULO VICENTE DE AZEVEDO, “Direito Judiciário Penal”, p. 115, 1952, Saraiva; JOSÉ FREDERICO MARQUES, “Elementos de Direito Processual Penal”, vol. I, p. 153, 1961, Forense).

É certo, no entanto, que, não obstante a presidência do inquérito policial incumba à autoridade policial (e não ao Ministério Público), nada impede que o órgão da acusação penal possa solicitar, à Polícia Judiciária, novos esclarecimentos, novos depoimentos ou novas diligências, sem prejuízo de poder acompanhar, ele próprio, os atos de investigação realizados pelos organismos policiais.

Essa possibilidade – que ainda subsiste sob a égide do vigente ordenamento consti-tucional – foi bem reconhecida por este Supremo Tribunal Federal, quando esta Corte, no julgamento do RHC 66.176/SC, Rel. Min. CARLOS MADEIRA, ao reputar legítimo o ofe-recimento de denúncia baseada em investigações acompanhadas pelo Promotor de Justiça, salientou, no que se refere às relações entre a Polícia Judiciária e o Ministério Público, que este pode “requisitar a abertura de inquérito e a realização de diligências policiais, além de solicitar esclarecimentos ou novos elementos de convicção a quaisquer autoridades ou funcionários (...)”, competindo-lhe, ainda, “acompanhar atos investigatórios junto aos ór-gãos policiais”, embora não possa “intervir nos atos do inquérito e, muito menos, dirigi-lo, quando tem a presidi-lo a autoridade policial competente” (RTJ 130/1053).

Cabe salientar, finalmente, sem prejuízo do exame oportuno da questão pertinente à legitimidade constitucional do poder investigatório do Ministério Público, que o “Parquet” não depende, para efeito de instauração da persecução penal em juízo, da preexistência de inquérito policial, eis que lhe assiste a faculdade de apoiar a formulação da “opinio delicti” em elementos de informação constantes de outras peças existentes “aliunde”.

Esse entendimento – que se apóia no magistério da doutrina (DAMÁSIO E. DE JE-SUS, “Código de Processo Penal Anotado”, p. 7, 17. ed., 2000, Saraiva; FERNANDO DA

R.T.J. — 2031204

COSTA TOURINHO FILHO, “Código de Processo Penal Comentado”, vol. I/111, 4. ed., 1999, Saraiva; JULIO FABBRINI MIRABETE, “Código de Processo Penal Interpretado”, p. 111, item n. 12.1, 7. ed., 2000, Atlas; EDUARDO ESPÍNOLA FILHO, “Código de Processo Penal Brasileiro Anotado”, vol. I/288, 2000, Bookseller, v.g.) – tem, igualmente, o benepláci-to da jurisprudência dos Tribunais em geral (RT 664/336 – RT 716/502 – RT 738/557 – RSTJ 65/157 – RSTJ 106/426, v.g.), inclusive a desta Suprema Corte (RTJ 64/342 – RTJ 76/741 – RTJ 101/571 – RT 756/481):

“- O inquérito policial não constitui pressuposto legitimador da válida ins-tauração, pelo Ministério Público, da ‘persecutio criminis in judicio’. Precedentes.

O Ministério Público, por isso mesmo, para oferecer denúncia, não depende de prévias investigações penais promovidas pela Polícia Judiciária, desde que dispo-nha, para tanto, de elementos mínimos de informação, fundados em base empírica idônea, sob pena de o desempenho da gravíssima prerrogativa de acusar transformar-se em exercício irresponsável de poder, convertendo, o processo penal, em inaceitável instrumento de arbítrio estatal. Precedentes.”(RTJ 192/222-223, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)Sendo assim, e sem prejuízo da ulterior apreciação da controvérsia em referência,

notadamente em face do julgamento plenário, ainda em curso, do Inq 1.968/DF (em cujo âmbito está sendo rejeitada, por três votos a dois, a tese ora exposta na presente impetração), indefiro o pedido de medida liminar.

2. Achando-se adequadamente instruída a presente impetração, ouça-se a douta Procuradoria-Geral da República.

(...)Ministro CELSO DE MELLO

Relator

Sendo esse o contexto, submeto o presente “agravo regimental” ao exame desta colenda Turma.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Trata-se de “agravo regimental”, que, interposto contra decisão por mim proferida, insurge-se contra o indeferi-mento de medida liminar requerida em sede de “habeas corpus”.

Cumpre assinalar, desde logo, que não se revela cabível a interposição do presente recurso, eis que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de reconhecer a inadmissibilidade do recurso de agravo, quando deduzido contra ato do Relator, que, em sede de “habeas corpus”, inde-fere, motivadamente, como no caso, medida liminar requerida pelo Impetrante do remédio heróico (RTJ 145/211, Rel. Min. CÉLIO BORJA – RTJ 168/521, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RTJ 169/567-568, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 72.323-AgR/RJ, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA – HC 72.567-AgR/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – HC 72.651-AgR/MG, Rel. Min. MOREIRA ALVES – HC 72.783-AgR/SP, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – HC 73.004-AgR/GO, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – HC 74.131-AgR/MG, Rel. Min. MOREIRA ALVES – HC 75.189-AgR/MS, Rel. Min. MAURÍCIO COR-RÊA – HC 77.449-AgR/PR, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI, v.g.).

R.T.J. — 203 1205

O Pleno do Supremo Tribunal Federal, ao acentuar a irrecorribilidade da decisão monocrática que denega provimento cautelar em processo de “habeas corpus”, culminou por não conhecer de “agravo regimental” deduzido contra ato decisório que indeferira a outorga de medida liminar no âmbito do “writ” constitucional em questão:

HABEAS CORPUS. MEDIDA LIMINAR. INDEFERIMENTO. AGRAVO REGI-MENTAL.

Não cabe agravo regimental contra despacho que, em “habeas corpus”, indefere liminar. Precedentes do Supremo Tribunal Federal.

Agravo regimental não conhecido.(HC 70.937-AgR/PA, Rel. Min. FRANCISCO REZEK – Grifei.)

O eminente Ministro FRANCISCO REZEK, no precedente em questão, assim justificou a incognoscibilidade do recurso de agravo, quando inter-posto, como no caso, contra decisão denegatória de liminar em sede de “habeas corpus”:

A questão posta em mesa, apesar de controvertida, é de extrema simplicidade: saber se o despacho com que o Relator indefere medida liminar postulada em autos de “habeas corpus” é atacável com agravo regimental.

Entendo, em atenção à jurisprudência do Supremo Tribunal, que não é cabível o agravo regimental. Assim, à vista de que o tema já foi discutido em outras ocasiões, limito-me a sustentar o ponto de vista que o meu antecessor imediato nesta cadeira, Ministro Célio Borja, pôde enfatizar no julgamento, pela Segunda Turma, do HC 68.740, cuja ementa foi assim redigida:

“EMENTA: ‘HABEAS CORPUS’. Agravo regimental. Não cabe agravo re-gimental contra decisão do Relator que, em ‘HABEAS CORPUS’, indefere medida liminar.Agravo regimental não conhecido.”Tais as circunstâncias, o meu voto, a propósito da preliminar que justificou a con-

dução dos autos do presente “habeas corpus” a este Plenário, é pelo não-conhecimento do agravo regimental.”(Grifei.)

Impende ressaltar, finalmente, que esse mesmo entendimento vem de ser reafirmado, por esta colenda Segunda Turma, no recentíssimo julgamento do HC 89.555-AgR/SP, do HC 89.649-MC-AgR/SP e do HC 89.651-MC-AgR/SP, todos da relatoria do eminente Ministro CEZAR PELUSO.

Sendo assim, e tendo em consideração essa diretriz jurisprudencial, não conheço, por incabível, do presente recurso de agravo.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

HC 89.837-MC-AgR/DF — Relator: Ministro Celso de Mello. Agravante: Emanoel Loureiro Ferreira (Advogados: Jason Barbosa de Faria e outros). Agravado: Presidente do Superior Tribunal de Justiça.

R.T.J. — 2031206

Decisão: A Turma, por votação unânime, não conheceu, por incabível, do recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Ministros Gilmar Mendes e Eros Grau.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mário José Gisi.

Brasília, 21 de novembro de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coorde-nador.

R.T.J. — 203 1207

QUESTÃO DE ORDEM NO HABEAS CORPUS 90.326 — RS

Relator: O Sr. Ministro Menezes Direito

Paciente: Francisco Simeão Rodrigues Neto — Impetrante: Mauro Machado Chaiben — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Questão de ordem em habeas corpus. Pedido de comunica-ção da data do julgamento para sustentação oral. Inobservância. Cerceamento de defesa caracterizado. Cancelamento do julga-mento. Precedentes da Corte.

1. Ocorre cerceamento de defesa do paciente quando, em-bora requerido explicitamente, não haja sido comunicado ao impetrante, com antecedência, a data do julgamento do feito para que sustentasse oralmente as razões da impetração (art. 192, parágrafo único-A, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal).

2. A comunicação poderá ocorrer por qualquer meio idô-neo, sem necessidade de intimação do impetrante pelos meios oficiais.

3. Questão de ordem concedida para tornar sem efeito o julgamento do habeas corpus.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Marco Au-rélio, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, tornar insubsistente o julgamento do presente habeas corpus realizado em 20-11-07 e publicado no DJ de 30-11-07.

Brasília, 11 de dezembro de 2007 — Menezes Direito, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Menezes Direito: Questão de ordem suscitada pelo Impetran-te, o advogado Mauro Machado Chaiben, buscando a anulação do julgamento do presente habeas corpus, realizado na sessão do dia 20-11-07, na qual esta Primeira Turma, por unanimidade, denegou a ordem.

O suscitante aduz, em síntese, que, mesmo tendo requerido, explicitamente, mediante a petição registrada sob o número 30.715/07, não foi informado pre-viamente da data do julgamento do feito, ficando impossibilitado de sustentar oralmente as razões da impetração.

Ante o exposto, submeto a presente questão de ordem para que seja apre-ciado o pedido de anulação do julgamento realizado em 20-11-07.

é o relatório.

R.T.J. — 2031208

VOTO

O Sr. Ministro Menezes Direito (Relator): Tem razão o Impetrante.

Entendo que, no caso presente, houve cerceamento de defesa do Paciente, por não ter o Impetrante sido comunicado com antecedência da data do julga-mento do feito, conforme requerido.

Verifico que, de fato, o Impetrante não foi comunicado da data do julga-mento, frustrando-se sua intenção de sustentar oralmente as razões da impetração.

Foi por isso que a Emenda Regimental 17, de 9-2-06, incluiu o parágrafo único-A ao art. 192 do Regimento Interno desta Corte, para que o impetrante não fosse surpreendido da data de julgamento do habeas corpus, quando não levado em mesa na primeira sessão da Turma ou do Plenário, conforme o caso, após a manifestação da Procuradoria-Geral da República, in verbis:

Art. 192. Instruído o processo e ouvido o Procurador-Geral em dois dias, o Relator o colocará em mesa para julgamento na primeira sessão da Turma ou do Plenário, observando-se, quanto à votação, o disposto nos arts. 146, parágrafo único, e 150, § 3º.

(...)Parágrafo único-A. Não ocorrendo a apresentação em mesa na sessão indicada no

caput, o impetrante do habeas corpus poderá requerer seja cientificado pelo Gabinete, por qualquer via, da data do julgamento.

Nesse sentido, os seguintes julgados:

Questão de ordem em habeas corpus. 2. Habeas corpus. Pedido expresso do impetran-te para ser comunicado da data de julgamento para fins de sustentação oral. 3. Comunicação não efetivada. 4. Aplicação do art. 192, parágrafo único-A, do RISTF. 5. Anulação de julga-mento. 6. Questão de ordem decidida tão-somente no sentido de tornar sem efeito o julgamen-to realizado na sessão da Segunda Turma de 14-11-06.(HC 89.090-QO/GO, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 5-10-07.)

Embargos de declaração em habeas corpus. 2. Habeas corpus. Pedido do impetrante para ser comunicado da data de julgamento. Art. 192, parágrafo único-A, do RISTF. Comu-nicação não efetivada. Anulação de julgamento. 3. Embargos de declaração acolhidos tão-somente para tornar sem efeito o julgamento realizado na sessão da Segunda Turma de 8-8-06.(HC 88.262-ED/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 30-3-07.)

Ressalto, entretanto, que essa providência só deverá ser observada pelo Gabinete quando requerida, explicitamente, pelo advogado, e que a comunicação poderá ser feita por qualquer meio idôneo (por exemplo: telefone, fac-símile, correio eletrônico), sem necessidade de que haja a intimação do impetrante pelos meios oficiais.

Registro, por oportuno, que a petição do Impetrante que requer a comunica-ção foi protocolada em 9-3-07, quando o processo ainda não estava sob a minha relatoria, e encontrava-se grampeada na contracapa dos autos, embaixo de cópia do andamento processual, inviabilizando que o Gabinete tomasse a providência ali solicitada.

R.T.J. — 203 1209

Ante o exposto, voto no sentido de tornar sem efeito o julgamento deste habeas corpus, ocorrido na sessão desta Turma do dia 20-11-07.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Presidente): Normalmente, esperaríamos os embargos declaratórios para suscitar essa matéria, mas estamos diante de uma ação de envergadura maior, o habeas corpus, em que não há parte antagônica que pudesse ter interesse em desfecho diverso.

Submeto à Turma a questão de ordem e a solução preconizada pelo Relator, já me pronunciando em harmonia com a colocação de S. Exa.

EXTRATO DA ATA

HC 90.326-QO/RS — Relator: Ministro Menezes Direito. Paciente: Fran-cisco Simeão Rodrigues Neto. Impetrante: Mauro Machado Chaiben. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma tornou insubsistente o julgamento do presente habeas corpus, realizado em 20-11-07 e publicado no DJ de 30-11-07. Unânime. Não participou, justificadamente, deste julgamento o Ministro Carlos Britto.

Presidência do Ministro Marco Aurélio. Presentes à sessão os Ministros Carlos Britto, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Menezes Direito. Sub-procurador-Geral da República, Dr. Wagner de Castro Mathias Netto.

Brasília, 21 de novembro de 2006 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031210

RECURSO EM HABEAS CORPUS 90.981 — GO

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Recorrentes: Pedro Paulo Guerra de Medeiros e outros — Recorrido: Mi-nistério Público Federal — Paciente: Willer da Silveira

Ação penal. Habeas corpus. Julgamento pelo Superior Tri-bunal de Justiça. Data da sessão. Intimação do patrono. Neces-sidade. Requerimento escrito de sustentação oral. Julgamento realizado sem comunicação prévia. Cerceamento de defesa. Nuli-dade processual caracterizada. Preliminar acolhida. Provimento parcial do recurso. Aplicação do art. 5º, LV, da CF. Precedentes. Requerida intimação ou ciência prévia para tanto, deve ser ga-rantido à defesa, sob pena de nulidade, o exercício do ônus de comparecer à sessão de julgamento de habeas corpus e expor oralmente as razões da impetração.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segun-da Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Gilmar Mendes, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Falou, em causa própria, o Dr. Pedro Paulo Guerra de Medeiros. Ausente, justi-ficadamente, neste julgamento, o Ministro Celso de Mello.

Brasília, 24 de abril de 2007 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: 1. Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus impetrado em favor de Willer da Silveira, contra ato da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça.

O Recorrente foi acusado, com Co-réus, perante o juízo da 5ª Vara da Circunscrição Judiciária Federal do Estado de Goiás, e ao final condenado, pela prática do delito previsto no art. 14 da Lei 6.368/76, à pena de 7 (sete) anos e 5 (cinco) meses de reclusão e ao pagamento de 204 (duzentos e quatro) dias-multa.

Sob argumento de que lhe não foi dada oportunidade para apresentação de defesa prévia, nos termos do art. 38 da Lei 10.409/02, impetrou habeas corpus no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, pleiteando a nulidade da ação penal, mas a ordem foi denegada (fls. 616-620).

Contra tal decisão foi impetrado habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça, que, em julgamento iniciado em 8 de agosto p.p. e concluído em 17 de agosto p.p., lhe denegou a ordem, nos seguintes termos:

Processo penal. Habeas corpus. Operação Diamante. Tráfico. Lavagem de dinheiro. Falsidade ideológica. Delitos sujeitos a procedimentos diversos. Art. 38 da Lei 10.409/2002. Rito ordinário. Aplicação. Nulidade. Inexistência. Denegação da ordem.

R.T.J. — 203 1211

Imputados aos réus delitos sujeitos a procedimentos diferentes, é possível a adoção do rito ordinário previsto para os delitos apenados com reclusão, pois é o mais abrangente, pró-prio a garantir ao paciente e aos co-réus a forma mais irrestrita de ampla defesa.

A complexidade do feito, seja em razão da quantidade de imputações, pelo número de co-réus, pela extensão dos negócios realizados pelo tráfico organizado – que se estendia por países diversos, justificam a adoção do rito ordinário.

A concessão da delação premiada não está atrelada à existência, ou não, da defesa preliminar, prevista no art. 38 da Lei n. 10.409/2002, eis que pode ser concedida em razão do acordo ou proposta do Ministério Público, atendidos os requisitos legais.

Ordem denegada.(Fl. 985.)

Alegam os Recorrentes que o julgamento do Superior Tribunal de Justiça é nulo, porque cerceado o direito da defesa de sustentar oralmente as razões da impetração.

é que, na própria impetração, a defesa requereu fosse previamente cientifi-cada da data do julgamento (fl. 28), mas o pedido não foi observado.

Vencida a preliminar, pleiteiam seja reconhecida a nulidade da ação penal movida contra o Paciente, por desrespeito ao rito especial previsto no art. 38 da Lei 10.409/02.

A Procuradoria-Geral da República é pelo provimento parcial do recurso (fls. 1048-1050):

3. Alegam os recorrentes, preliminarmente, nulidade do julgamento realizado pelo Superior Tribunal de Justiça, pois, apesar de expressamente consignado na inicial de habeas corpus (fl. 28, vol. 1), os recorrentes não foram comunicados da data do julgamento, para que pudessem proferir sustentação oral. No mérito, em resumo, pretendem a anulação de todos os atos processuais desde o início, em razão do descumprimento do rito previsto no art. 38 da Lei nº 10.409/02 – não apresentação de defesa preliminar.

4. Em relação à preliminar argüida, assiste razão aos recorrentes.5. De acordo com precedentes desse Supremo Tribunal Federal, sobre a ausência de ci-

ência prévia da sessão de julgamento em habeas corpus, quando “requerida a notificação para tanto, deve ser garantido à defesa o exercício do ônus de comparecer à sessão de julgamento e expor oralmente as razoes da impetração. Frustrando-se tal ônus, nulo é o julgamento (cf. HC nº 85.138, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 09.08.2005; HC nº 86.550, Rel. Min. Carlos Britto, j. em 25.04.2006” (RHC nº 89.135/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 29.09.2006).

6. Sobre o mérito – inobservância do disposto no art. 38 da Lei 10.409/2002, reporto-me à manifestação do HC nº 90.311-8/GO, do mesmo paciente, opinando pela denegação da ordem.

7. Isto posto, opino pela concessão parcial da ordem, para que seja renovado o julga-mento pelo Superior Tribunal de Justiça.(Fls. 1049-1050.)

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. Consistente a preliminar.

O julgamento do Superior Tribunal de Justiça foi realizado com cerceamento de defesa e, em conseqüência, é nulo.

R.T.J. — 2031212

Por ter havido requerimento para que os Impetrantes fossem cientificados da data em que o processo seria apresentado em mesa, para efeito de permitir-lhes sustentar oralmente razões da impetração, o julgamento do habeas corpus não poderia ter-se realizado sem que os Impetrantes fossem notificados, com antecedência necessária, da data da sessão.

Como, aliás, o sugeriram os Impetrantes à inicial, a comunicação poderia ter-se dado até sem formalidades, para não comprometer a celeridade e a urgên-cia que caracterizam o processo de habeas corpus.

Ao que se vê dos autos, porém, o requerimento foi desconsiderado. Não consta nenhum documento que prove tenham sido os Impetrantes cientifica-dos da data da sessão. E, da certidão de julgamento (fl. 973), colhe-se que o Subprocurador-Geral da República Dr. Brasilino Pereira dos Santos “ofertou parecer oral pela concessão da ordem”, mas nada há sobre eventual sustentação por qualquer dos Impetrantes, o que pode tomar-se por indício suficiente de que não foram intimados para tanto.

Tolhido, pois, o exercício da defesa.

2. Consagrada no art. 5º, inciso LV, da Constituição da República, a ampla defesa tem como consectário a faculdade, concedida ao defensor, de sustentar oralmente as razões da impetração. Sem informação, a participação da defesa no processo é ilusória, pois não tem como influenciar, como o poderia em tese, o julgamento (cf. GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal. 8. ed. São Paulo: RT, 2004, p. 121).

Assim, sem o conhecimento prévio da data do julgamento, tal prerrogativa torna-se inconseqüente.

é certo que a sustentação oral não constitui propriamente ato essencial da defesa (RHC 86.085, Rel. Min. Carlos Britto, DJ de 31-3-06; HC 84.655, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 4-2-05; HC 83.792, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 30-4-04). Isso, porém, não autoriza inferir que a defesa possa ser cerceada em razão da falta de ciência prévia da sessão em que o feito será julgado, quando a tenha pedido a tempo e a hora.

Requerida a notificação prévia, deve garantir-se à defesa o exercício do ônus de comparecer à sessão de julgamento e expor oralmente as razões da impetração. Frustrando-se tal ônus, nulo é o julgamento, como esta Corte tem decidido:

Ação penal. Habeas corpus. Julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça. Data da sessão. Intimação do patrono. Necessidade. Requerimento escrito de sustentação oral. Julgamento realizado sem comunicação prévia, nem relacionamento da causa entre os feitos que seriam julgados no dia. Cerceamento de defesa. Nulidade processual carac-terizada. Habeas corpus concedido para pronunciá-la. Aplicação do art. 5º, LV, da CF. Precedentes. Requerida intimação ou ciência prévia para tanto, deve ser garantido à defesa, sob pena de nulidade, o exercício do ônus de comparecer à sessão de julgamento de habeas corpus e expor oralmente as razões da impetração.(RHC 89.135, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 29-9-06.) No mesmo senti-do, cf. HC 85.138, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 9-8-05; HC 86.550, Rel. Min. Carlos Britto, j. 25-4-06.

R.T.J. — 203 1213

3. Ante o exposto, acolho a preliminar e dou parcial provimento ao recurso, para anular o julgamento do Superior Tribunal de Justiça, a fim de que proceda a outro, cientes os Impetrantes, com antecedência, da data que venha a ser designada.

EXTRATO DA ATA

RHC 90.981/GO — Relator: Ministro Cezar Peluso. Recorrentes: Pedro Paulo Guerra de Medeiros e outros (Advogados: Pedro Paulo Guerra de Medei-ros e outros). Recorrido: Ministério Público Federal. Paciente: Willer da Silveira.

Decisão: Dado provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. De-cisão unânime. Falou, em causa própria, o Dr. Pedro Paulo Guerra de Medeiros. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Celso de Mello. Presidiu este julgamento o Ministro Gilmar Mendes.

Presidência do Ministro Gilmar Mendes. Presentes à sessão os Ministros Cezar Peluso, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Ausente, justificadamente, o Minis-tro Celso de Mello. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner Gonçalves.

Brasília, 24 de abril de 2007 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

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HABEAS CORPUS 91.615 — RS

Relatora: A Sra. Ministra Cármen Lúcia

Paciente: Adroaldo Mendes da Rosa — Impetrante: Defensoria Pública da União — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Penal. Ação única que tem como resultado lesão a vítimas diversas: concurso formal (art. 70, parte final, do Código Penal). Ordem denegada.

1. Roubo qualificado consistente na subtração de dois apa-relhos celulares, pertencentes a duas pessoas distintas, no mesmo instante.

2. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é fir-me no sentido de configurar-se concurso formal a ação única que tenha como resultado a lesão ao patrimônio de vítimas diversas, e não crime único: Precedentes.

3. Habeas corpus denegado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, sob a Presidência do Ministro Marco Aurélio, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, indeferir o pedido de habeas corpus.

Brasília, 11 de setembro de 2007 — Cármen Lúcia, Relatora.

RELATÓRIO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia: 1. Habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pela Defensoria Pública da União em favor de Adroaldo Mendes da Rosa contra acórdão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que, em 24 de abril de 2007, deu provimento ao recurso especial do Ministério Público do Rio Grande do Sul (REsp 690.760, Rel. Min. Laurita Vaz), nos termos seguintes:

Recurso especial. Penal. Roubo. Concurso formal impróprio. Única conduta. De-sígnios autônomos. Bens juridicamente tutelados distintos. Mera reiteração criminosa. Não-incidência do art. 71 do Código Penal.

1. Quando o Réu inicia a conduta delituosa com o escopo de lesar o patrimônio de mais de uma vítima com uma só ação deve-se aplicar o art. 70, segunda parte, do Código Penal.

2. A mera reiteração criminosa não configura a continuidade delitiva prevista no art. 71 do Código Penal.

3. Recurso conhecido e provido.(Fl. 68.)

2. Tem-se, nos autos, que o Paciente foi condenado, pelo Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Rio Grande/RS, à pena de quinze anos de reclusão, em regime inicialmente fechado, e ao pagamento de quarenta e cinco dias-multa,

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pela prática de roubo qualificado (art. 157, § 2º, inciso I, do Código Penal), pelo primeiro fato, e dois roubos simples (art. 157, caput, c/c art. 70, segunda parte, do Código Penal), pelo segundo fato.

3. Contra a sentença condenatória, a defesa do Paciente interpôs recurso de apelação, parcialmente provido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, para reconhecer, na espécie, a ocorrência de crime único pelos dois fatos crimi-nosos imputados na denúncia e, por conseqüência, diminuir a pena para sete anos de reclusão e o pagamento de quinze dias-multa (fls. 26-34).

4. Contra essa decisão, o Ministério Público do Rio Grande do Sul interpôs recurso especial (fls. 35-61), conhecido e provido, por unanimidade, pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (fls. 62-68), para determinar “a incidência do art. 70, 2ª parte, do Código Penal [concurso formal impróprio] no que se refere ao 2º fato criminoso e, posteriormente, a aplicação do concurso material para os delitos cometidos” (fl. 66).

é contra essa decisão o presente habeas corpus.

5. A Impetrante sustenta, basicamente, que, quanto ao segundo fato crimi-noso, o Paciente teria “praticado uma só ação e a um só tempo, ou seja, a ameaça foi direcionada a duas vítimas de uma só vez para subtrair os valores” (fl. 4). Conclui, portanto, que “é incontroverso a existência de crime único, haja vista (...) que o concurso formal somente ocorre quando o agente, mediante uma só ação, pratica dois ou mais crimes, o que não houve no presente caso” (fl. 5).

Requer liminar para que “seja reduzida a pena aplicada [ao Paciente], de-clarando inexistir o concurso formal impróprio no presente caso” (fl. 6). No mérito, pede seja concedida a ordem (fl. 6).

6. Em 15 de junho de 2007, solicitei informações ao Superior Tribunal de Justiça, na pessoa da Ministra Laurita Vaz, Relatora do Recurso Especial 690.760 (fl. 72), as quais foram prestadas em 1º de agosto de 2007 e encaminha-das a este Supremo Tribunal em 9 de agosto de 2007 (fl. 80).

7. Em 9 de agosto de 2007, determinei a manifestação da Procuradoria-Geral da República, que opinou pela denegação da ordem (fls. 91-94).

é o relatório.

VOTO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): 1. Conforme relatado, o presente habeas corpus é impetrado contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça pro-ferido no Recurso Especial 690.670, que, dando provimento ao recurso, declarou a existência de concurso formal impróprio na segunda conduta praticada pelo Paciente.

2. A Impetrante sustenta que a conduta do Paciente teria consistido na subtração de dois aparelhos celulares, pertencentes a duas pessoas distintas, no mesmo instante, sendo, portanto, impossível cogitar a hipótese de crime formal impróprio, senão caso de crime único.

R.T.J. — 2031216

3. Tem-se, na denúncia, a descrição do segundo fato delituoso imputado ao Paciente:

2º Fato:No dia 26 de fevereiro de 2003, por volta das 11h30 min, na Rua João Manoel esquina

Carlos Pinto, bairro Cidade Nova, nesta Cidade, em via pública, o denunciado Adroaldo, subtraiu pra si, mediante grave ameaça, consistente em apontar arma de fogo para as vítimas, 01 (um) aparelho celular, marca Nokia 5125, nº 053-91168648, pertencente a Cintia Bonilha Ulgim e 01 (um) aparelho celular, marca Nokia 5125, nº 053-91251046, pertencente a Camila Vieira da Rosa, avaliados em R$ 380,00 (trezentos e oitenta reais), conforme auto de avaliação indireta.(Fl. 10 – Grifo no original.)

4. A exposição dos fatos e a verificação das circunstâncias presentes e com-provadas na ação conduzem à denegação da ordem de habeas corpus.

A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de configurar-se concurso formal a ação única que tenha como resultado a lesão ao patrimônio de vítimas diversas, e não crime único.

Nesse sentido, por exemplo, o HC 68.728, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 12-6-92:

Concurso formal: ação única, ainda que desdobrada em atos diversos, da qual resultou a lesão patrimonial de vítimas diferentes: jurisprudência do STF, firmada para elidir a tese do crime único, mas que afasta também a existência em tais hipóteses do crime continuado, que reclama pluralidade de ações: conseqüente descabimento da duplicação da pena-base, fundada no art. 71, parágrafo único, da qual, em se tratando de concurso formal, só poderia resultar da autonomia de desígnios (CP, art. 70, in fine), da qual não se cogitou na espécie.

No mesmo sentido: RvC 4.839, Relator o Ministro Néri da Silveira, DJ de 29-11-1991; HC 63.747, Relator o Ministro Sydney Sanches, DJ de 25-5-86; entre outros.

5. é nesse sentido a manifestação da Procuradoria-Geral da República, pelo parecer de lavra do Subprocurador-Geral Dr. Cláudio Lemos Fonteles:

4. Discute-se no presente writ se a conduta atribuída ao paciente, relativamente ao 2º fato, acima transcrito, configura-se em crime único, ou trata-se de aplicar a regra contida no art. 70, última parte, do Código Penal, que define concurso formal impróprio.

5. Não merece reparo a decisão recorrida, daí por que a presente ordem não deve prosperar.

6. Segundo destaca a Ministra Laurita Vaz no seu voto: “o Réu iniciou a prática criminosa com a intenção de lesar o patrimônio de mais de uma vítima com uma só ação, aplicando-se, portanto a 2ª parte do art. 70 do estatuto penal, não sendo possível considerar crime único.” (fls. 84)

7. Como se vê do 2º fato, narrado no item 3, deste parecer, o ora paciente atuou com desígnios autônomos, querendo, dolosamente, a produção de ambos os resultados.

8. Ocorre a autonomia de desígnios, segundo o prof. Damásio de Jesus, in Código Pe-nal Anotado, 10ª ed., p.242, 2000: “quando o sujeito pretende praticar não só um crime, mas vários, tendo consciência e vontade em relação a cada um deles, considerado isoladamente.”

9. Assim, aplica-se, ao caso, o concurso formal imperfeito, para o qual há imposição legal de que as penas devem ser somadas, tal como ocorre no concurso material, daí por que somos pela denegação da ordem.(Fls. 93-94 – Grifos no original.)

R.T.J. — 203 1217

6. Não se verifica plausibilidade jurídica dos fundamentos apresentados na inicial a fundamentar a concessão da ordem, razão pela qual voto no sentido de denegar a ordem ora pleiteada.

EXTRATO DA ATA

HC 91.615/RS — Relatora: Ministra Cármen Lúcia. Paciente: Adroaldo Mendes da Rosa. Impetrante: Defensoria Pública da União. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus. Unânime.

Presidência do Ministro Marco Aurélio. Presentes à sessão os Ministros Carlos Britto, Ricardo Lewandowski, Menezes Direito e Cármen Lúcia. Subpro-curador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 11 de setembro de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031218

HABEAS CORPUS 91.675 — PR

Relatora: A Sra. Ministra Cármen Lúcia

Paciente: Sílvio Rodrigues de Lima — Impetrante: Genilson Pereira — Coa-tor: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Constitucional. Processual penal. Condena-ção pelo crime de atentado violento ao pudor. Execução provi-sória da pena: possibilidade. Precedentes. Não-configuração de reformatio in pejus. Habeas corpus denegado.

1. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é fir-me no sentido de ser possível a execução provisória da pena pri-vativa de liberdade, quando os recursos pendentes de julgamento não têm efeito suspensivo.

2. Não configurada, na espécie, reformatio in pejus pelo Tri-bunal de Justiça do Paraná. A sentença de primeiro grau conce-deu ao Paciente “o benefício de apelar” em liberdade, não tendo condicionado a expedição do mandado de prisão ao trânsito em julgado da decisão condenatória.

3. Habeas corpus denegado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, sob a Presidência do Ministro Marco Aurélio, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria, indeferir o pedido de habeas corpus. Vencido o Ministro Marco Auré-lio, Presidente.

Brasília, 4 de setembro de 2007 — Cármen Lúcia, Relatora.

RELATÓRIO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia: 1. Habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em 14 de junho de 2007 por Genilson Pereira, em favor de Silvio Rodrigues de Lima, contra acórdão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que, em 22 de maio de 2007, denegou a ordem no HC 76.445, Relator o Ministro Arnaldo Esteves Lima (fl. 2).

2. Tem-se, nos autos, que o Paciente foi condenado, em 16 de dezembro de 2005, pelo Juízo da Única Vara Criminal da Comarca de Prudentópolis/PR, à pena de oito anos e nove meses de reclusão mais o pagamento de trinta e sete dias-multa, pela prática do crime de atentado violento ao pudor, praticado com violência presumida contra menor de quatorze anos (sete anos de idade à época do início dos fatos), com as causas de aumento de pena, por ser o Paciente padrasto

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da vítima e casado (art. 214 c/c arts. 224, alínea a, e 226, incisos II e III, do Código Penal – fls. 116-127 do apenso). O regime de cumprimento da pena fixado na sentença foi o fechado, tendo sido concedido ao Paciente o “benefício de apelar” em liberdade (fl. 126 do apenso).

3. Contra a sentença condenatória, a defesa interpôs apelação, à qual o Tri-bunal de Justiça do Paraná negou provimento, tendo, na seqüência, determinado a expedição de mandado de prisão contra o Paciente (fls. 206-221 do apenso). Contra essa decisão, foram interpostos recursos especial e extraordinário (fls. 47-59 e 37-45, respectivamente), ainda pendentes de admissibilidade.

O Ministério Público não recorreu, tendo sido certificado o trânsito em julgado para essa instituição (fl. 178 do apenso).

4. Na presente ação, o Impetrante sustenta, em síntese, que o Tribunal de Justiça paranaense não poderia ter determinado a expedição de mandado de pri-são contra o Paciente, por ser ele primário, ter bons antecedentes, residência fixa e ter respondido ao processo em liberdade. Alega, portanto, ser a ordem de prisão inconstitucional e ilegal, em razão de o art. 5º, inciso LVII, da Constituição da República estabelecer que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”.

Requer liminar, “para suspender – até o julgamento do presente writ – a ordem de prisão do paciente, tendo em vista (...) [a] iminente possibilidade de expedição e/ou cumprimento do mandado de prisão”, e, no mérito, pede “a revogação da ordem de prisão do paciente (...), autorizando-se que (...), por con-seguinte, aguarde [ele] em liberdade o julgamento do RE e do Resp” (fls. 12-13).

5. Em 15 de junho de 2007, indeferi o pedido de liminar e solicitei informa-ções à autoridade coatora, para que, na seqüência, fosse dada vista à Procurado-ria-Geral da República (fls. 93-96).

6. As informações foram prestadas em 27 de junho de 2007 e recebidas neste Supremo Tribunal em 2 de julho de 2007 (fl. 118), tendo encaminhado os documentos de fls. 119-124.

7. Em 6 de agosto de 2007, a Procuradoria-Geral da República opinou pela “denegação do writ” (fls. 126-132).

é o relatório.

VOTO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia (Relatora): 1. A presente impetração trata da questão de saber se a falta de trânsito em julgado da sentença condenatória pode-ria permitir a execução, mesmo que provisória, da pena. Mais especificamente, busca-se saber se a pendência de recursos especial e extraordinário impediria a execução provisória da pena.

2. A exposição dos fatos e a verificação das circunstâncias presentes e com-provadas na ação conduzem à denegação da ordem de habeas corpus pleiteada.

R.T.J. — 2031220

A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de ser possível a execução provisória da pena privativa de liberdade, quando os recursos pendentes de julgamento não têm efeito suspensivo.

Nesse sentido, por exemplo, o RHC 85.024, Relatora a Ministra Ellen Gra-cie, DJ de 10-12-04:

Execução provisória. Condenação mantida no segundo grau de jurisdição.1. Confirmada a condenação, em segundo grau de jurisdição, e considerando que os re-

cursos, eventualmente cabíveis, especial e extraordinário, não têm efeito suspensivo, legítima é a expedição do mandado de prisão.

2. Recurso em habeas corpus improvido.

No mesmo sentido: HC 85.616, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJ de 17-11-06; HC 85.886, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJ de 28-10-05; RHC 84.846, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 5-11-04; entre outros.

3. Importante ressaltar, ainda, não ser o caso de reformatio in pejus pelo Tribunal de Justiça do Paraná. A sentença de primeiro grau concedeu ao Paciente “o benefício de apelar” em liberdade, não tendo condicionado a expedição do mandado de prisão ao trânsito em julgado da decisão condenatória.

4. Não se verifica plausibilidade jurídica dos fundamentos apresentados na inicial a fundamentar a concessão da ordem, razão pela qual voto no sentido de denegar a ordem ora pleiteada.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Presidente): Peço vênia à Relatora para reiterar pronunciamentos desta Corte.

Antes do trânsito em julgado da decisão – e acabamos de nos pronunciar assim –, não há como partir para a execução da pena.

As franquias constitucionais são acionadas geralmente em benefício da-queles que tenham claudicado. O cidadão comum não precisa dessas franquias, o cidadão comum que atua na vida gregária, considerado o padrão próprio ao homem médio.

A bandeira é horrorosa, admito: o padrasto acusado de atentado violento ao pudor contra vítima de sete anos. é horrorosa a bandeira. Mas o que aconteceu na espécie? Ele respondeu ao processo em liberdade, e o Juízo cogitou do recurso, presente essa situação jurídica. O Tribunal, ante o recurso da defesa, confirmou o decreto condenatório, mas este, até aqui, não se fez precluso na via da recorri-bilidade.

Qual o contorno da prisão, a esta altura, após ele haver respondido ao pro-cesso em liberdade? Qual a natureza dessa prisão? Qual a origem dessa prisão? A execução da pena imposta.

Dir-se-á: os recursos especial e extraordinário não possuem eficácia suspen-siva. Realmente, não possuem eficácia suspensiva. Mas o que ocorre no campo patrimonial, em que é possível o retorno ao estado anterior, inclusive? A execução

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dita provisória – e não existe execução provisória no campo penal – vai até a garantia do juízo e pode ultrapassar essa fase, chegando aos atos expropriatórios, mas desde que o credor, aquele que tem o título a favorecê-lo, preste caução.

Aqui não. No campo penal, se, por isso ou aquilo – e não podemos julgar nem o especial nem o extraordinário na via do habeas corpus –, vier a ser refor-mado o decreto condenatório, quem devolverá a esse paciente que respondeu solto ao processo – esse dado, para mim, é importante – a liberdade de ir e vir?

A que título, indago, está sendo executada a decisão condenatória? A título provisório? E como fica o princípio da não-culpabilidade?

Esta Turma tem, ainda neste ano – e conheço os pronunciamentos mencio-nados pela Relatora –, precedentes formalizados com os votos de alguns Colegas – não me lembro como V. Exa., Relatora, votou, nem como o Ministro Carlos Ayres Britto – no sentido de entender que a simples circunstância de os recursos cabíveis, em tese, não possuírem eficácia suspensiva não leva à execução da pena, porque essa execução pressupõe, segundo o texto constitucional, a culpa formada, que só passa a existir quando irrecorrível o título judicial.

Por isso vou pedir vênia para, no caso, conceder a ordem.

EXTRATO DA ATA

HC 91.675/PR — Relatora: Ministra Cármen Lúcia. Paciente: Sílvio Ro-drigues de Lima. Impetrante: Genilson Pereira. Coator: Superior Tribunal de Justiça.

Decisão: Por maioria de votos, a Turma indeferiu o pedido de habeas cor-pus; vencido o Ministro Marco Aurélio, Presidente. Ausente, justificadamente, o Ministro Ricardo Lewandowski.

Presidência do Ministro Marco Aurélio. Presentes à sessão o Ministro Carlos Britto e a Ministra Cármen Lúcia. Ausente, justificadamente, o Ministro Ricardo Lewandowski. Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 4 de setembro de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031222

HABEAS CORPUS 92.536 — GO

Relator: O Sr. Ministro Menezes Direito

Paciente: Marcelo Pereira de Souza — Impetrante: José Francisco de Souza Fernandes — Coator: Superior Tribunal de Justiça

Habeas corpus. Apelação criminal. Desistência. Alegação de vício na manifestação de vontade exarada do paciente. Dila-ção probatória não autorizada no rito estreito do habeas corpus. Colisão de defesas apresentadas por co-réus patrocinados pelo mesmo advogado. Nulidade processual. Questão jurídica não debatida no acórdão impugnado. Omissão. Precedentes da Corte.

1. No caso dos autos, a desistência do recurso de apelação foi apresentada pelo advogado constituído em petição instruída com declaração firmada pelo próprio Réu.

2. Em habeas corpus não se admite dilação probatória.3. O acórdão impugnado não se manifestou sobre a nulidade

processual expressamente manifestada com base na colisão entre as defesas apresentadas pelos co-réus patrocinados pelo mesmo procurador, cabendo ao Tribunal de origem enfrentá-la.

4. Habeas corpus concedido, em parte, para determinar ao Superior Tribunal de Justiça que se manifeste sobre a omissão apontada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primei-ra Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Carlos Britto, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, deferir, em parte, o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 27 de novembro de 2007 — Menezes Direito, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Menezes Direito: Habeas corpus com pedido de liminar, impetrado pelo advogado José Francisco de Souza Fernandes em favor de Mar-celo Pereira de Souza, buscando a anulação do julgado proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás em sede de apelação criminal (fls. 22 a 43) e a conseqüente expedição de alvará de soltura para que o Réu possa aguardar o novo julgamento em liberdade.

Aponta como autoridade coatora a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que, no julgamento do HC 64.695/GO, Relatora a Ministra Laurita Vaz, denegou a ordem, reputando válida a desistência do recurso apresentada nos au-tos e acolhida pelo Tribunal estadual.

R.T.J. — 203 1223

Alega o Impetrante que:

Por sentença proferida em 28 de junho de 2005 pelo M.Mº Juiz de direito da Comarca de Nazário, GO, o Paciente Marcelo Pereira de Souza foi condenado à pena de 20 (vinte) anos de reclusão, em regime “fechado desde o início”, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, à base de trigésimo do salário mínimo por unidade, como incurso nas sanções do art. 157, § 3º, do Código Penal (doc. Anexo).

Não se conformando com a prolação da r. sentença condenatória, o Paciente ofertou tempestivamente, por intermédio de advogada constituída, a petição do recurso de apelação no dia 04 de julho de 2005, contudo, Eminente Relator, sua defensora deixou de ofertar no prazo legal as razões respectivas, fato considerado pelo Preclaro Tribunal de Justiça do Estado de Goiás por Sua Excelência, o Eminente Desembargador Geraldo Salvador de Moura, que à fl. 295 dos autos, determinou por despacho a baixa do processo ao juízo “a quo”, para a cientificação do sentenciado da “desídia de sua defensora e ensejar-lhe a opor-tunidade de constituição de novo advogado para a apresentação das razões do recurso de apelação, ou havendo omissão da sua parte, seja-lhe nomeado defensor dativo” – do-cumentos anexos.

Contudo, doutos Ministros, no juízo de primeiro grau, a advogada constituída pelo Paciente, parecendo querer justificar a perda do prazo para a apresentação das razões do recurso, em vez de ofertar as razões da apelação de seu cliente (condenado à pena de 20 (vinte) anos de reclusão, em regime (fechado), simplesmente “elaborou” uma petição, que datou em 1º de dezembro de 2005, afirmando que deixou de apresentar as razões porque o apelante teria desistido do recurso (doc. Anexo).

é necessário consignar neste writ, que a petição da defensora foi datada em 1º de dezembro de 2005, porém, a “desistência” propriamente dita foi elaborada posteriormente, e datada em 13 de dezembro de 2005, sendo subscrita somente pelo ora paciente, sem a assistência de defensor – Súmula 705, STF, indicando data maxima venia que foi a advogada que desistiu do recurso primeiramente, e depois obteve a formalização do sentenciado à sua vontade.

Eméritos julgadores: o paciente proclama que fora traído por sua defensora, pois jamais desistiu da apelação, confirmando, porém, que assinou um papel que lhe foi entregue por interposta pessoa, a mando da sua advogada à época, com a ameaça que se não assinas-se, a situação ficaria ainda pior.

Tanto é verdade que da simples análise da “desistência” em comento, se percebe com clareza solar que o Paciente sequer sabia onde assinar, tendo começado a apor a sua assina-tura no canto inferior esquerdo, quando lhe “orientaram” a assinar no lugar correto, acima do seu nome impresso (doc. anexo).

Direito também é bom senso! Não é sobremodo estranhável que o sentenciado à pena de 20 (vinte) anos de reclusão, em regime fechado, disporia da única possibilidade jurídica de reverter a sua situação, nesse contexto de ser semi-analfabeto e de ter a sua advogada perdido o prazo para a apresentação das razões do recurso interposto?

Após o ocorrido, e tendo havido a quebra de confiança entre o cliente e a advogada, o Paciente constituiu novo defensor que pugnou junto ao MD. Relator do Recurso de Apelação Criminal no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, com fundamento no Enunciado nº 705, da súmula da jurisprudência deste Pretório Excelso, a abertura de vista para a apresentação das razões do recurso, tendo a Corte Estadual de Justiça, indferido o pleito e homologado a desistência da apelação interposta (...)

(...)Porém, dignos julgadores, o Paciente foi denunciado com outros co-autores, sendo que

a sua defesa e a de Emerson Santos Roccheto foi patrocinada desde o início pela mesma defensora, mas exsurge cristalinamente a nulidade insanável decorrente deste fato, pois as defesas são conflitantes e não poderiam ter sido exercidas pela mesma advogada, em prejuízo de algum deles.

(...)

R.T.J. — 2031224

Posto isto, considerando a conflitância das defesas, e a ausência de assistência de defensor por ocasião da subscrição da “renúncia” à apelação, data máxima vênia o Pa-ciente Marcelo Pereira de Souza esteve indefeso durante todo o processo, estando privado da liberdade de locomoção em virtude de um processo manifestamente nulo desde a defesa prévia, impondo-se a decretação da nulidade, e a expedição de alvará de soltura, para em liberdade se ver processar sob a garantia do due process of law.

Irresignadíssimo com a prolação do v. acórdão pela 4ª Turma Julgadora do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, que homologou a “desistência” apresentada por sua ex-de-fensora, o Paciente bateu às portas do Colendo Superior Tribunal de Justiça, com fundamento nestes mesmos argumentos, na impetração do Habeas Corpus nº 64695-GO, que julgado pela 5ª Turma daquela Corte, no dia 28 de junho de 2007, foi denegado à unanimidade.

(Fls. 3 a 6.)

Ao final requer, em liminar, a expedição de alvará de soltura para que o Pa-ciente, à vista das nulidades processuais apontadas, possa aguardar em liberdade por novo julgamento. No mérito, requer a confirmação da liminar e a decretação da nulidade do processo a partir da defesa prévia.

O pedido de liminar foi indeferido a fls. 80 a 84.

A autoridade apontada como coatora prestou informações (fls. 90 a 103).

O ilustre Subprocurador-Geral da República Dr. Mário José Gisi manifes-tou-se pelo parcial deferimento do writ “para que seja restituído ao recorrente o prazo para apresentar razões de apelo, sem prejuízo da manutenção da segrega-ção cautelar” (fls. 107 a 111).

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Menezes Direito (Relator): O Paciente foi condenado, por sentença proferida na Comarca de Nazário/GO, à pena de 20 anos de prisão em regime fechado, pela prática de latrocínio (fls. 44 a 50).

Irresignado, interpôs recurso de apelação cujo termo foi apresentado em 4-7-05 (fl. 16), mas, como no dia 13-10-05 ainda não houvessem sido colacionadas as razões respectivas, o Desembargador Relator determinou a intimação do Pa-ciente “para cientificá-lo da desídia de sua defensora e ensejar-lhe a oportunidade da constituição de novo advogado para a apresentação das razões do recurso de apelação, ou havendo omissão de sua parte, seja-lhe nomeado defensor dativo” (fl. 17).

No dia 15-12-05, a então advogada do Paciente atravessou a petição de fls. 18/19, datada de 1º-12-05, comunicando que não apresentara as razões de apelação porque seu cliente havia “desistido do recurso”. Essa petição está acom-panhada de declaração assinada pelo Réu (fl. 20), datada de 13-12-05.

O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás homologou o pedido, afirman-do, na oportunidade, a irretratabilidade da desistência manifestada pelo Réu em termo próprio e com a assistência de procurador munido de poderes especiais, regularmente constituído (fls. 25 a 27).

R.T.J. — 203 1225

No habeas corpus que se seguiu (fls. 11 a 15), alegou-se a invalidade do pe-dido de desistência, porque o Réu não teria querido verdadeiramente desistir do apelo, e, ainda, a nulidade do processo, porque colidentes as defesas apresentadas em benefício do Paciente e de outro Co-réu pela mesma advogada.

O Superior Tribunal de Justiça denegou a ordem em acórdão assim emen-tado:

Habeas corpus. Processual penal. Crime de latrocínio. Condenação. Interposição de recurso de apelação. Ausência de razões recursais. Saneamento, pelo relator, da formalidade do recurso. Desistência do apelo manifestada expressamente pelo réu em resposta ao despa-cho saneador. Ausência de colidência ou vício de vontades. Fato extintivo. Impossibilidade de retratação posteriormente.

1. O relator, verificando a inexistência de razões recursais, em observância ao princípio da ampla defesa, determinou a intimação do réu para que constituísse novo patrono ou que a advogada constituída oferecesse as razões do recurso e, havendo omissão de sua parte, fosse nomeado defensor dativo para o ato.

2. Em resposta ao despacho saneador, a advogada constituída do réu aduziu que não ofereceu as razões recursais, pois o réu havia desistido do apelo e juntou prova inequívoca da vontade do paciente, o qual expressamente manifestou a sua desistência quanto ao recurso.

3. Não houve, no caso, colidência de vontades, ao contrário, a defensora agiu conforme o desejo expresso do réu.

4. A desistência se traduz na livre disposição da vontade de não se prosseguir com o recurso, sendo, todavia, irretratável depois de ser consignada em juízo.

5. Ordem denegada.

(Fl. 103.)

Ao contrário do que sustentado pelo Impetrante, os autos não dispõem de elementos suficientes para concluir que a desistência manifestada estaria viciada.

Com efeito, tem-se a fls. 18/19 dos autos uma petição protocolada pela então advogada do Paciente (a qual, segundo informa o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, ostentava poderes especiais para desistir) informando que as ra-zões do recurso de apelação não foram apresentadas porque seu cliente não teria mais interesse naquele recurso. Essa petição veio instruída com uma declaração firmada pelo próprio Paciente, confirmando essa notícia (fl. 20).

Nenhum dos aspectos argüidos pelo Impetrante para sustentar a nulidade da referida manifestação de vontade tem envergadura suficiente para desconstituir a força probatória dos documentos apresentados.

A circunstância de a declaração exarada pelo Paciente ter sido firmada em data posterior à da petição elaborada pela advogada não prova coisa alguma, já que a sua vontade de não recorrer poderia ter sido manifestada apenas oralmente à sua advogada que, ainda em hipótese, apenas se teria preocupado em colher essa intenção, por escrito, após baixados os autos em diligência. A presunção de que todos os réus condenados a penas elevadas têm interesse em recorrer da sen-tença carece de força diante da expressa manifestação do próprio Réu. A alega-ção de que a referida declaração teria sido apresentada ao Paciente por interposta pessoa, que não lhe teria explicado o seu conteúdo, também não serve porque não há motivo para se inferir que o Paciente seja analfabeto, ausentes quaisquer

R.T.J. — 2031226

elementos de prova para confirmar a alegação. A afirmação de que o Paciente teria sido constrangido a assinar referido documento, sob a ameaça de que, se não assinasse, dar-se-ia o agravamento de sua situação processual, também não está corroborada por nenhuma prova.

Na minha avaliação, o que se pretende com a presente impetração é des-constituir, com apoio em meras alegações, uma prova documental formalmente válida. Nesse compasso, verifico que o debate em questão, na forma como se apresenta, é de todo avesso ao rito estreito do habeas corpus, em que não se admite dilação probatória. (HC 91.334/PA, Primeira Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJ de 17-8-07; HC 90.292/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ de 25-5-07; HC 88.978/DF, Segunda Turma, Rel. o Min. Ce-zar Peluso, DJ de 21-9-07; HC 84.278/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 22-10-04).

De outra parte, no que diz respeito à nulidade dos atos processuais pra-ticados desde a defesa prévia, alegada com fundamento na colisão das defesas apresentas pelos Co-réus, que foram patrocinados por uma advogada comum, verifico que o acórdão impugnado não cuidou do tema, embora submetida a questão ao seu exame.

Nas razões do habeas corpus impetrado perante o Superior Tribunal de Justiça, está consignado expressamente:

Porém, dignos julgadores, o Paciente foi denunciado com outros co-autores, sendo que a sua defesa e a de Emerson Santos Roccheto foi patrocinada desde o início pela mesma defensora, mas exsurge cristalinamente a nulidade insanável decorrente deste fato, pois as defesas são conflitantes e não poderiam ter sido exercidas pela mesma advogada, em prejuízo de algum deles.(Fl. 13.)

O aresto impugnado, a seu turno, na única oportunidade em que usa a ex-pressão “colidência”, o faz para afirmar que não houve colidência de vontades entre o Paciente e sua defensora, que apresentou o pedido de desistência.

Não é possível conhecer originariamente do tema em debate neste ensejo, sob pena de se incorrer em supressão de instância não autorizada. Nesse sentido:

I - STJ e STF – Habeas corpus – Competência originária. 1. Não pode o Superior Tribunal de Justiça conhecer de questão suscitada pelo impetrante – excesso de prazo – que não foi enfrentada pelo Tribunal de origem, ao qual, em conseqüência, não se pode atribuir a alegada coação. 2. Pelo mesmo fundamento – impossibilidade de supressão de instância –, também não cabe ao Supremo Tribunal conhecer originariamente da questão. II - Denúncia: aptidão: descrição suficiente do delito de associação para o tráfico imputado aos pacientes. 1. é da jurisprudência do Tribunal, na linha do que se tem decidido quanto ao crime de quadrilha ou bando (CP, art. 288), que a configuração do delito de associação para o tráfico independe “da realização ulterior de qualquer delito compreendido no âmbito de suas projetadas ativida-des criminosas” (v.g., Ext 966, Pleno, 29-6-06, Pertence, DJ de 10-8-06). 2. Daí que, para a aptidão da denúncia, o que se “exige, sobretudo, é que a imputação descreva concretamente os elementos essenciais à realização do tipo cogitado” (v.g., HC 70.290, Pleno, 30-6-93, Perten-ce, RTJ 162/559), o que, no caso, não foi descumprido. (HC 90.654/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 25-5-07.)

R.T.J. — 203 1227

Habeas corpus. Prisão preventiva. Carência de fundamentação. Excesso de prazo para a prestação jurisdicional. Julgamento de recurso defensivo em sentido estrito. Su-pressão de instância. Decreto de prisão fundamentado na aplicaçâo da lei penal. Fuga do paciente após a prática do delito que lhe é imputado. Ordem denegada. A tese do excesso de prazo para a prestação jurisdicional não foi suscitada nas instâncias inferiores, o que impede o julgamento do feito diretamente pelo Supremo Tribunal Federal, sob pena de indevida supressão de instância. Precedentes: HC 86.990, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski; HC 84.799, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence; HC 82.213, Relatora a Ministra Ellen Gracie; e HC 83.842, Relator o Ministro Celso de Mello. Recurso defensivo em sentido estrito já denegado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Co-réu já julgado e condenado pelo Tribunal do Júri. A gravidade (em abstrato) do delito não se presta, ao ver desta Suprema Corte, como fundamento idôneo para a prisão preventiva. Precedentes. A eva-são após a prática delitiva é fundamento idôneo para a segregação cautelar para resguardar a aplicação da lei penal. Ordem denegada.(HC 90.162/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Carlos Britto, DJ de 29-6-07.)

Habeas corpus. Processual penal. Prisão preventiva. Conveniência da instrução cri-minal. Paciente afastado do cargo de auditor fiscal após as impetrações de habeas corpus no TJPR e no Superior Tribunal de Justiça. Alegação de que com o afastamento não mais remanesceria a necessidade da prisão cautelar. Fato superveniente não examinado nas ins-tâncias precedentes. Supressões de instâncias. A prisão preventiva do Paciente foi decretada em 13-7-06, sob o fundamento de que ele, em liberdade, poderia, considerada sua condição funcional, influir na instrução do processo. Em 14-9-06, foi impetrado habeas corpus no STJ, sustentando o exaurimento da necessidade da constrição cautelar, em virtude de o Paciente ter sido afastado do cargo de auditor fiscal em 23-11-06. Essa ordem cronológica evidencia que a tese da cessação dos fundamentos da custódia cautelar não foi submetida ao Juízo de primeiro grau, nem ao TJPR, muito menos ao STJ. O conhecimento da impetração, sem que a questão superveniente tenha sido posta a exame do Juízo de primeiro grau, do TJPR e do STJ, implica supressões de instâncias, em três níveis. Habeas corpus não conhecido.(HC 90.312/PR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, DJ de 27-4-07.)

Penal. Processual penal. Habeas corpus. Questão nova. I - Por conter questão nova, não apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, o habeas corpus não pode ser conhecido, sob pena de supressão de instância. II - Habeas corpus não conhecido.(HC 86.997/DF, Segunda Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 3-2-06.)

Constatada, porém, a omissão do julgado impugnado no enfrentamento do tema, cumpre que seja desafiado, cabendo ao Tribunal, então, decidir a questão que foi expressamente posta ao seu julgamento.

Ante o exposto, concedo a ordem, em parte, para que o Superior Tribunal de Justiça desafie a questão relativa à colidência de defesa.

EXTRATO DA ATA

HC 92.536/GO — Relator: Ministro Menezes Direito. Paciente: Marcelo Pereira de Souza. Impetrante: José Francisco de Souza Fernandes. Coator: Supe-rior Tribunal de Justiça.

Decisão: A Turma deferiu, em parte, o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidiu o julgamento o Ministro Carlos Britto. Ausente, justificadamente, o Ministro Marco Aurélio, Presidente. Não par-ticipou, justificadamente, deste julgamento a Ministra Cármen Lúcia.

R.T.J. — 2031228

Presidência do Ministro Carlos Britto. Presentes à sessão os Ministros Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Menezes Direito. Ausente, justificada-mente, o Ministro Marco Aurélio, Presidente. Subprocurador-Geral da Repú-blica, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 27 de novembro de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 203 1229

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DEDECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NOS

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NORECURSO EXTRAORDINÁRIO 175.531 — SP

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio

Embargante: Vera Lúcia Sabatini — Embargado: Município de São Ber-nardo do Campo

Embargos declaratórios sucessivos – Adequação. A adequa-ção dos seguidos declaratórios pressupõe o surgimento do vício com a apreciação dos embargos anteriormente interpostos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência da Ministra Ellen Gracie, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, não conhecer dos embargos. Votou a Presidente. Ausentes, justificadamente, os Ministros Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau.

Brasília, 20 de setembro de 2007 — Marco Aurélio, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: A servidora interpôs embargos de declara-ção ao acórdão de fls. 312 a 317, formalizado pelo Ministro Maurício Corrêa, assim sintetizado:

Embargos de declaração nos embargos de divergência nos embargos de declaração no recurso extraordinário. Consonância da decisão embargada com o acórdão proferido pelo Tribunal Pleno. Inadmissibilidade do recurso. Omissão. Inexistência.

Embargos de divergência. Não-cabimento. A teor do disposto no art. 332 do Regimen-to Interno desta Corte, não cabem embargos se a jurisprudência do Plenário estiver firmada no sentido da decisão embargada. Omissão do julgado. Inexistência.

Embargos de declaração rejeitados.

Na peça de fls. 336 a 350, a Embargante questiona a pertinência do Ver-bete 339 à espécie, que resultou na não-apreciação do pedido contido na inicial. Sustenta que a isonomia prevista no art. 39, § 1º, da Constituição Federal “tem aplicação autorizada no Município de São Bernardo do Campo, quer seja pelo art. 115 da sua Lei Orgânica, quer seja pelo art. 360 de sua Lei Base 2.240/76”, o que estaria a afastar a adequação do citado verbete (fl. 338). Discorre longamente sobre o tema de fundo, defendendo o direito à isonomia pleiteada e o equívoco cometido por esta Corte.

O Município de São Bernardo do Campo, apesar de instado, não apresentou impugnação.

é o relatório.

R.T.J. — 2031230

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Na interposição destes embargos, foram observados os pressupostos de recorribilidade. A peça, subscrita por profissional da advocacia regularmente credenciado, restou protocolada no qüin-qüídio. Houve a veiculação da notícia do acórdão impugnado no Diário de 2 de maio de 2003, sexta-feira (fl. 318), ocorrendo a manifestação do inconformismo em 9 imediato, sexta-feira (fl. 336).

A Corte desproveu os primeiros embargos de declaração interpostos pela Recorrente, porque, consoante dispõe o art. 332 do Regimento Interno do Supre-mo, são incabíveis os embargos de divergência se a jurisprudência do Plenário estiver firmada no sentido do pronunciamento atacado. Fez-se ver que, à época da admissão dos embargos, 9 de dezembro de 1998, verificava-se a dissonância entre as decisões das Turmas quanto ao direito, ou não, de vantagem concedida a servidor ocupante de um cargo ser estendida a outro que estivesse lotado em secretaria de governo distinta daquela em que se encontrava o servidor-paradigma (fls. 278 a 280). No entanto, o Colegiado Maior, no julgamento do RE 173.252-1/SP, pacificou a tese jurídica revelada no ato impugnado. Os embargos de diver-gência foram conhecidos e desprovidos.

Esses fundamentos restaram esclarecidos por ocasião da apreciação dos primeiros declaratórios interpostos pela servidora municipal. Nesses segundos embargos de declaração, versa-se, mais uma vez, sobre o tema discutido no extraordinário. A Recorrente não atentou para o fato de o conhecimento dos segundos embargos declaratórios estar condicionado à existência de vícios no julgamento dos primeiros.

Ante o exposto, não conheço dos segundos embargos de declaração.

EXTRATO DA ATA

RE 175.531-ED-EDv-ED-ED/SP — Relator: Ministro Marco Aurélio. Em-bargante: Vera Lúcia Sabatini (Advogados: Antonio Octavio de Abreu e outros). Embargado: Município de São Bernardo do Campo (Advogado: José Romeu Teixeira Ceroni).

Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, não conheceu dos embargos. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. Ausentes, justificadamente, os Ministros Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau.

Presidência da Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Menezes Direito. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Ro-berto Monteiro Gurgel Santos.

Brasília, 20 de setembro de 2007 — Luiz Tomimatsu, Secretário.

R.T.J. — 203 1231

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 306.938 — RS

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Agravante: Márcia Lamberti Doval — Agravada: União

1. Recurso. Extraordinário. Inadmissibilidade. Concurso Público. Nomeação. Ordem de classificação. Observância. Pre-terição. Inexistência. Aplicação da Súmula 15. A aprovação em concurso público não gera, em princípio, direito à nomeação, constituindo mera expectativa de direito. Esse direito surgirá se houver o preenchimento de vaga sem observância de ordem classificatória.

2. Recurso. Extraordinário. Inadmissibilidade. Servidor público. Provimento derivado. Aproveitamento de servidores de outro órgão à disposição dos TRF nos termos da Lei 7.227/89. Possibilidade. Precedentes. A jurisprudência fixada a partir da ADI 231, DJ de 13-11-92, de que o ingresso nas carreiras públicas se dá mediante prévio concurso público, não alcança situações fáticas ocorridas anteriormente ao seu julgamento, mormente em período cujo entendimento sobre o tema não era pacífico nesta Corte.

3. Recurso. Agravo. Regimental. Jurisprudência assentada sobre a matéria. Caráter meramente abusivo. Litigância de má-fé. Imposição de multa. Aplicação do art. 557, § 2º, c/c os arts. 14, II e III, e 17, VII, do CPC. Quando abusiva a interposição de agravo, manifestamente inadmissível ou infundado, deve o Tri-bunal condenar o agravante a pagar multa ao agravado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segun-da Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo e, por considerá-lo manifestamente infundado, impor, à parte agravante, multa de 1% sobre o valor da causa, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Eros Grau.

Brasília, 18 de setembro de 2007 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Trata-se de agravo interposto contra decisão do teor seguinte:

R.T.J. — 2031232

1. Trata-se de recurso extraordinário contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região assim ementado:

“Constitucional e administrativo. Candidato aprovado em concurso público. Aproveitamento de servidores de outros órgãos. Preterição inexistente. O candidato aprovado em concurso público tem mera expectativa de direito à nomeação. Não é ilegal ou inconstitucional o aproveitamento de servidores de outros órgãos públicos, com base em lei específica, nem tal medida não importa em preterição dos candidatos aprovados em processo seletivo. Apelação improvida.”Sustenta o Recorrente, com base no art. 102, III, a, ter havido violação aos arts. 37, II

e IV, e 96, I, da Constituição Federal. 2. Inconsistente o recurso. O aresto impugnado está em conformidade com a jurisprudência assentada da Corte e

bem refletida nesta ementa:“Constitucional. Administrativo. Servidor público: concurso público. Direito à

nomeação. Súmula 15/STF. I - A aprovação em concurso público não gera, em princí-pio, direito à nomeação, constituindo mera expectativa de direito. Esse direito surgirá se for nomeado candidato não aprovado no concurso, se houver o preenchimento de vaga sem observância de classificação do candidato aprovado (Súmula 15/STF) ou se, indeferido pedido de prorrogação do prazo do concurso, em decisão desmotivada, for reaberto, em seguida, novo concurso para preenchimento de vagas oferecida no concurso anterior cuja prorrogação fora indeferida em decisão desmotivada. II - Pre-cedentes do STF: MS 16.182/DF, Ministro Evandro Lins (RTJ 40/02); MS 21.870/DF, Ministro Carlos Velloso, DJ de 19-12-94; RE 192.568/PI, Ministro Marco Aurélio, DJ de 13-9-96; RE 273.605/SP, Ministro Néri da Silveira, DJ de 28-6-02. III - Negativa de seguimento ao recurso extraordinário. Agravo não provido.”(RE 419.013-AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 25-6-04.)3. Ante o exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário (art. 21, § 1º, do RISTF;

art. 38 da Lei 8.038, de 28-5-90; e art. 557 do CPC).(Fls. 309/310.)

Requer a parte agravante seja provido o recurso, insistindo na alegação de que os atos de aproveitamento realizados com base na Lei 7.727/98, além de ilegais, implicaram sua preterição ao provimento de cargo para o qual havia prestado concurso público.

Fundamenta sua insistência na ADI 231, Relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 13-11-92, e na ADI 951, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, julgamento em 18-11-04 – Informativo STF 370).

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. Abusivo o recurso.

Os precedentes invocados não guardam pertinência ao caso em exame.

A uma, porque está na sentença (fls. 154/158), mantida pelo acórdão im-pugnado, como incontroversos: os servidores – que teriam preterido à nomeação da Agravante, foram aproveitados de outros órgãos da administração pública e encontravam-se à disposição do TRF, com base na Lei 7.727, de 9-1-89, que dispõe sobre a composição inicial destes tribunais e cria os respectivos quadros de pessoal. A legislação teve como finalidade dar condições efetivas à instalação e funcionamento dos TRF criados pela Constituição de 1988.

R.T.J. — 203 1233

A duas, o acórdão (fls. 188/191) conclui que o certame questionado admitiu “a existência de vagas destinadas ao preenchimento por outras formas que não o concurso público. Formas legalmente previstas, e que se fundam em relação preexistente. Logo, a expectativa de direito à nomeação, nascida da aprovação em concurso, não se espraia por sobre a totalidade das vagas, como crê a ape-lante.” E, mais, que “dentro das vagas destinadas ao preenchimento pela via do concurso, manteve-se a ordem de preferência”. Incide, pois, mutatis mutandis, a Súmula 15:

Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem direito à nomea-ção, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação.

A três, quanto à forma de provimento derivado, esta Corte, ao apreciar o RE 442.683, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 24-3-06, asseverou que, não obstante a Constituição de 1988 tenha instituído o concurso público como forma de ingresso nos cargos públicos, “o entendimento a respeito do tema não era pacífico, certo que, apenas em 17-2-93, é que o Supremo Tribunal Federal suspendeu, com efeito ex nunc, a eficácia do art. 8º, III; do art. 10, parágrafo úni-co; do art. 13, § 4º; do art. 17 e do art. 33, IV, da Lei 8.112, de 1990, dispositivos esses que foram declarados inconstitucionais em 27-8-98 (ADI 837, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 25-6-99); aplicando, assim, os princípios da segurança jurídica e o da boa-fé para manter situação fática ocorrida em período que se encontrava a controvérsia (1987/1992).

Ainda que se considere a jurisprudência indicada pela parte agravante, firmada a partir da ADI 231, onde se apontou que “o critério do mérito auferível por concurso público de provas ou de provas e títulos é, no atual sistema consti-tucional, (...) indispensável para cargo ou emprego público isolado ou em carreira”, melhor sorte não lhe assistiria. é que o julgamento desta ação direta ocorreu em 5-8-92 e o acórdão foi publicado em 13-11-92. Os 21 atos de aproveitamento im-pugnados ocorreram entre março de 1990 e setembro de 1991 (fls. 35/37).

Assim, não logrou a parte agravante convelir os fundamentos da decisão agravada, que invocou e resumiu os fundamentos do entendimento invariável da Corte e cujo teor subsiste invulnerável aos argumentos do recurso, os quais nada acrescentaram à compreensão e ao desate da quaestio iuris.

Ao presente agravo, que não traz argumentos consistentes para ditar even-tual releitura da orientação assentada pela Corte, não sobra, pois, senão caráter só abusivo. Há aqui, além da violação específica à norma proibitiva inserta no art. 557, § 2º, do Código de Processo Civil, desatenção séria e danosa ao dever de lealdade processual (art. 14, II e III, e art. 17, VII), até porque recursos como este roubam à Corte, já notoriamente sobrecarregada, tempo precioso para cuidar de assuntos graves. A litigância de má-fé não é ofensiva apenas à parte adversa mas também à dignidade do Tribunal e à alta função pública do processo.

2. Posto isso, nego provimento ao agravo, mantendo a decisão agravada por seus próprios fundamentos, e condeno a parte agravante a pagar à parte agravada a multa de 1% (um por cento) do valor corrigido da causa, ficando condicionada

R.T.J. — 2031234

a interposição de qualquer outro recurso ao depósito da respectiva quantia, tudo nos termos do art. 557, § 2º, c/c o art. 14, II e III, e o art. 17, VII, do Código de Processo Civil.

EXTRATO DA ATA

RE 306.938-AgR/RS — Relator: Ministro Cezar Peluso. Agravante: Márcia Lamberti Doval (Advogados: Marília do Couto e Silva e outros). Agravada: União (Advogado: Advogado-Geral da União).

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo e, por considerá-lo manifestamente infundado, impôs à parte agravante multa de 1% sobre o valor da causa, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Eros Grau.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega.

Brasília, 18 de setembro de 2007 — Carlos Alberto Cantanhede, Coor-denador.

R.T.J. — 203 1235

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 364.304 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Gilmar Mendes

Agravante: Município do Rio de Janeiro — Agravado: Lino Ramos Cun-dines

Agravo regimental em recurso extraordinário 2. IPTU. Município do Rio de Janeiro. Pretensão de declaração de não-recepção com efeitos meramente prospectivos. Impossibilidade. Não-demonstração da repercussão econômica, da gravíssima lesão à ordem pública ou à segurança jurídica ou da violação a qualquer outro princípio constitucional relevante para o caso. 3. Norma pré-constitucional. Não-recepção. Efeitos retroativos à data da promulgação da Constituição. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 3 de outubro de 2006 — Gilmar Mendes, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Ao apreciar o RE 364.304, proferi a seguin-te decisão (fls. 541/542):

Decisão: Trata-se de recurso extraordinário interposto com fundamento no art. 102, III, a, da Constituição Federal, contra acórdão que decidiu pela inconstitucionalidade da alíquota progressiva do Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), bem como pela ilegalidade da cobrança das taxas de coleta de lixo e limpeza urbana e de iluminação pública instituídas pelo Município do Rio de Janeiro.

Com relação às taxas de conservação e limpeza de rua, a jurisprudência deste Tribunal firmou orientação no sentido da sua inconstitucionalidade, por possuírem base de cálculo pró-pria de imposto (ofensa ao § 2º do art. 145 da Constituição Federal) e por não serem divisíveis os serviços públicos que elas pretendem custear (ofensa ao inciso II do mesmo art. 145), v.g., o RE 196.550/RJ, Segunda Turma, Relator Maurício Corrêa, DJ de 26-3-99; o RE 206.777/SP, Pleno, Relator Ilmar Galvão, DJ de 30-4-99.

Nesse sentido, decidiram monocraticamente: RE 357.651/MG, Relator Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ de 25-11-02; RE 278.549/RJ, Relator Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ de 19-9-01; RE 219.520/RJ, Relator Maurício Corrêa, Segunda Turma, DJ de 12-2-01; RE 351.435/MG, Relator Ellen Gracie, Primeira Turma, DJ de 18-11-02.

No que concerne à taxa de iluminação pública, o Plenário desta Corte, ao julgar o RE 233.332, Relator Ilmar Galvão, DJ de 14-5-99, decidiu que esta não pode ser remunerada me-diante taxa, pois não configura serviço público específico e divisível prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

R.T.J. — 2031236

é relevante notar que a discussão é anterior à Emenda Constitucional 39, de 19 de dezembro de 2002 (art. 149-A da Constituição Federal), que possibilitou a instituição de con-tribuição para custeio do serviço de iluminação pública nos Municípios e no Distrito Federal.

No que diz respeito à alíquota progressiva do IPTU, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 153.771, Relator para o acórdão Moreira Alves, DJ de 5-9-97, decidiu que “é inconstitucional qualquer progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao disposto no art. 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos § 2º e § 4º do art. 182, ambos da Constituição Federal”. No mesmo sentido, v.g., o RE 204.827, Relator Ilmar Galvão, DJ de 25-4-97.

Ressalta-se, também, que a discussão é anterior à Emenda Constitucional 29, de 13 de setembro de 2000, que conferiu nova redação ao § 1º do art. 156 do texto constitucional, o qual possibilitou a progressividade do IPTU em razão do valor do imóvel.

Assim, nego seguimento ao recurso (art. 557, caput, do CPC).

O Agravante, Município do Rio de Janeiro, interpôs, por fax, o agravo re-gimental de fls. 545-549, e apresentou o original dentro do prazo estipulado pela Lei 9.800, de 26 de maio de 1999, (fls. 551-555), no qual sustenta:

Nessa esteira de consideração do tema, urge destacar que pendiam de decisão nessa Excelsa Corte os Embargos de Divergência nos Embargos de Declaração nos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário 256.588/RJ, sendo a Min. Ellen Gracie a relatora dos embargos, sendo os mesmos recentemente providos por essa Corte (19-3-03).

E em assim ocorrendo, não se pode deixar de mencionar o voto de S. Exa., Relator deste Recurso Extraordinário, o Min. Gilmar Mendes que mandava aplicar efeitos ex nunc à questão da referida Taxa, haja vista à sua final declaração de inconstitucionalidade.

E para evitar que possa parecer conduta não revestida de plausibilidade, impende res-saltar que essa Corte vem sobrestando julgados, cujo teor é semelhante ao dos presentes autos, onde se discute a inconstitucionalidade da legislação tributária municipal (relativamente ao IPTU e Taxas de serviço).

(...)Por fim, em relação à espécie tributária taxa, existe ainda outro argumento apto a

ensejar a atribuição de eficácia prospectiva à declaração de inconstitucionalidade, que é de-corrência da própria natureza deste tributo. Isso porque em se tratando de taxas, o serviço foi efetivamente prestado ao contribuinte, que foi beneficiado por esta prestação.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Ressalte-se que o Agravante recor-re tão-somente no que concerne ao pedido de que a declaração de invalidade da norma municipal tenha efeitos ex nunc, o que levaria à improcedência do pedido de repetição do indébito.

Esta Corte firmou entendimento no sentido de que a Constituição Federal de 1988 não recepcionou o art. 67 da Lei municipal 691, de 1984, que estabele-cia a cobrança do IPTU progressivo no Município do Rio de Janeiro (v.g., o RE 248.892, Segunda Turma, Rel. Maurício Corrêa, DJ de 31-3-00; e o RE 265.907, Primeira Turma, Rel. Ilmar Galvão, DJ de 7-12-00).

No tocante aos efeitos e ao alcance do entendimento do Supremo, a Segunda Turma desta Corte, quando do julgamento do RE 395.902-AgR, relatado por Cel-so de Mello, decidiu que o caso seria de não-recepção de norma pré-constitucio-nal, e que conseqüentemente não se aplicaria a regra do art. 27 da Lei 9.868/99.

R.T.J. — 203 1237

Naquela ocasião, determinou-se a “inaplicabilidade, ao caso em exame, da técnica de modulação dos efeitos, por tratar-se de diploma legislativo, que editado em 1984, não foi recepcionado, no ponto concernente à norma ques-tionada, pelo vigente ordenamento constitucional” (grifos e ênfases no original).

Acompanho Celso de Mello, porém quero deixar consignado que, no meu entender, a técnica de modulação dos efeitos pode ser aplicada em âmbito de não-recepção.

O dogma da nulidade da lei inconstitucional pertence à tradição do direito brasileiro. A teoria da nulidade tem sido sustentada por importantes constitu-cionalistas. Fundada na antiga doutrina americana, segundo a qual “the incons-titutional statute is not law at all”, significativa parcela da doutrina brasileira posicionou-se pela equiparação entre inconstitucionalidade e nulidade. Afirma-va-se, em favor dessa tese, que o reconhecimento de qualquer efeito a uma lei inconstitucional importaria na suspensão provisória ou parcial da Constituição.

Razões de segurança jurídica podem revelar-se, no entanto, aptas a justifi-car a não-aplicação do princípio da nulidade da lei inconstitucional.

Não há negar, ademais, que aceita a idéia da situação “ainda constitucio-nal”, deverá o Tribunal, se tiver que declarar a inconstitucionalidade da norma, em outro momento, fazê-lo com eficácia restritiva ou limitada. Em outros termos, o “apelo ao legislador” e a declaração de inconstitucionalidade com efeitos limi-tados ou restritos estão intimamente ligados.

Afinal, como admitir, para ficarmos no exemplo de Walter Jellinek, a declaração de inconstitucionalidade total com efeitos retroativos de uma lei elei-toral tempos depois da posse dos novos eleitos em um dado Estado? Nesse caso, adota-se a teoria da nulidade e declara-se inconstitucional e ipso jure a lei, com todas as conseqüências, ainda que entre elas esteja a eventual acefalia do Estado?

Questões semelhantes podem ser suscitadas em torno da inconstituciona-lidade de normas orçamentárias. Há de admitir, também aqui, a aplicação da teoria da nulidade tout court? Dúvida semelhante poderia suscitar o pedido de inconstitucionalidade, formulado anos após a promulgação da lei de organização judiciária que instituiu um número elevado de comarcas, como já se verificou entre nós.1 Ou, ainda, o caso de declaração de inconstitucionalidade de regime de servidores aplicado por anos sem contestação.

Essas questões – e haveria outras igualmente relevantes – parecem sufi-cientes para demonstrar que, sem abandonar a doutrina tradicional da nulidade da lei inconstitucional, é possível, e muitas vezes inevitável, com base no princípio da segurança jurídica, afastar a incidência do princípio da nulidade em determi-nadas situações.

Não se nega o caráter de princípio constitucional ao princípio da nulidade da lei inconstitucional. Entende-se, porém, que tal princípio não poderá ser aplicado

1 Cf. RE 104.393/GO, Relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 24-5-85.

R.T.J. — 2031238

nos casos em que se revelar absolutamente inidôneo para a finalidade perseguida (casos de omissão ou de exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade), bem como nas hipóteses em que a sua aplicação pudesse trazer danos para o próprio sistema jurídico constitucional (grave ameaça à segurança jurídica).

Configurado eventual conflito entre os princípios da nulidade e da seguran-ça jurídica, que, entre nós, tem status constitucional, a solução da questão há de ser, igualmente, levada a efeito em processo de complexa ponderação.

O princípio da nulidade continua a ser a regra também. O afastamento de sua incidência dependerá de severo juízo de ponderação que, tendo em vista análise fundada no princípio da proporcionalidade, faça prevalecer a idéia de segurança jurídica ou outro princípio constitucionalmente relevante manifestado sob a forma de interesse social preponderante. Assim, aqui, a não-aplicação do princípio da nulidade não se há de basear em consideração de política judiciária, mas em fun-damento constitucional próprio.

No caso presente, não se cuida de inconstitucionalidade originária decor-rente do confronto entre a Constituição e norma superveniente, mas de contraste entre lei anterior e norma constitucional posterior, circunstância que a juris-prudência do STF classifica como de não-recepção. é o que possibilita que se indague se poderia haver modulação de efeitos também na declaração de não-recepção, por parte do STF.

Transita-se no terreno de situações imperfeitas e da “lei ainda constitucio-nal”, com fundamento na segurança jurídica.

Em decisão de 23 de março de 1994, teve o Supremo Tribunal Federal oportunidade de ampliar a já complexa tessitura das técnicas de decisão no con-trole de constitucionalidade, admitindo que lei que concedia prazo em dobro para a Defensoria Pública era de ser considerada constitucional enquanto esses órgãos não estivessem devidamente habilitados ou estruturados.2

Assim, o Relator, Sydney Sanches, ressaltou que a inconstitucionalidade do § 5º do art. 5º da Lei 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, acrescentado pela Lei 7.871, de 8 de novembro de 1989, não haveria de ser reconhecida, no ponto em que confere prazo em dobro, para recurso, às Defensorias Públicas, “ao menos até que sua organização, nos Estados, alcance o nível da organização do respec-tivo Ministério Público”.

Da mesma forma pronunciou-se Moreira Alves, como se pode depreender da seguinte passagem de seu voto:

A única justificativa que encontro para esse tratamento desigual em favor da Defenso-ria Pública em face do Ministério Público é a de caráter temporário: a circunstância de as De-fensorias Públicas ainda não estarem, por sua recente implantação, devidamente aparelhadas como se acha o Ministério Público.

2 HC 70.514, julgamento em 23-3-94.

R.T.J. — 203 1239

Por isso, para casos como este, parece-me deva adotar-se a construção da Corte Cons-titucional alemã no sentido de considerar que uma lei, em virtude das circunstâncias de fato, pode vir a ser inconstitucional, não o sendo, porém, enquanto essas circunstâncias de fato não se apresentarem com a intensidade necessária para que se tornem inconstitucionais.

Assim, a lei em causa será constitucional enquanto a Defensoria Pública, concretamen-te, não estiver organizada com a estrutura que lhe possibilite atuar em posição de igualdade com o Ministério Público, tornando-se inconstitucional, porém, quando essa circunstância de fato não mais se verificar.

Afigura-se, igualmente, relevante destacar o voto de Sepúlveda Pertence, que assim feriu a questão:

No HC 67.930, quando o Tribunal afirmou a subsistência, sob a Constituição de 88, da legitimação de qualquer do povo, independentemente de qualificação profissional e capacida-de postulatória, para a impetração de habeas corpus, tive oportunidade de realçar essa situação de fato da Defensoria Pública.

E, por isso, ao acompanhar o eminente Relator, acentuei que, dada essa pobreza dos serviços da Assistência Judiciária, e até que ela venha a ser superada, a afirmação da indispen-sabilidade do advogado, para requerer habeas corpus, que seria o ideal, viria, na verdade, a ser um entrave de fato, à salvaguarda imediata da liberdade.

Agora, em situação inversa, também esse mesmo estado de fato me leva, na linha dos votos até aqui proferidos, com exceção do voto do Ministro Marco Aurélio – a quem peço vênia –, a acompanhar o eminente Relator e rejeitar a prejudicial de inconstitucionalidade rebus sic stantibus.3

Ressalvou-se, portanto, de forma expressa, a possibilidade de que o Tribu-nal pudesse vir a declarar a inconstitucionalidade da disposição em apreço, uma vez de que a afirmação sobre a legitimidade da norma assentava-se em circuns-tância de fato que se modifica no tempo.

Posteriormente, no RECr 147.776, da relatoria de Sepúlveda Pertence, o tema voltou a ser agitado de forma pertinente. A ementa do acórdão revela, por si só, o significado da decisão para atual evolução das técnicas de controle de constitucionalidade:

Ministério Público: Legitimação para promoção, no juízo cível, do ressarcimento do dano resultante de crime, pobre o titular do direito à reparação: Código Processo Penal, art. 68, ainda constitucional (cf. RE 135.328): Processo de inconstitucionalização das leis.

1. A alternativa radical da jurisdição constitucional ortodoxa entre a constitucionali-dade plena e a declaração de inconstitucionalidade ou revogação por inconstitucionalidade da lei com fulminante eficácia ex tunc faz abstração da evidência de que a implementação de uma nova ordem constitucional não é um fato instantâneo, mas um processo, no qual a pos-sibilidade de realização da norma da constituição – ainda quanto teoricamente não se cuide de preceito de eficácia limitada – subordina-se muitas vezes a alterações da realidade fáctica que a viabilizem.

2. No contexto da Constituição de 1988, a atribuição anteriormente dada ao Ministério Público pelo art. 68 do Código de Processo Penal – constituindo modalidade de assistência judiciária – deve reputar-se transferida para a Defensoria Pública: essa, porém, para esse fim, só se pode considerar existente, onde e quando organizada, de direito e de fato, nos moldes do art. 134 da própria Constituição e da lei complementar por ela ordenada: até que – na União ou

3 HC 70.514, Relator o Ministro Sydney Sanches, DJ de 27-6-97.

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em cada Estado considerado –, se implemente essa condição de viabilização da cogitada trans-ferência constitucional de atribuições, o art. 68 do Código Processo Penal. Será considerado ainda vigente: é o caso do Estado de São Paulo, como decidiu o Plenário no RE 135.328.4

Como mencionado, fica evidente o expressivo passo dado pelo Supremo Tribunal com relação à flexibilização das técnicas de decisão no juízo de controle de constitucionalidade, ao reconhecer um estado insuficiente para justificar a declaração de ilegitimidade da lei ou bastante para justificar a sua aplicação provisória.

é inegável que a opção desenvolvida pelo Supremo Tribunal se inspira di-retamente no uso que a Corte Constitucional alemã faz do “apelo ao legislador”, especialmente nas situações imperfeitas ou no “processo de inconstitucionali-zação”. Nessas hipóteses, avalia-se, igualmente, que, tendo em vista razões de segurança jurídica, a supressão da norma poderá ser mais danosa para o sistema do que a sua aplicação temporária.

Não há negar, ademais, que aceita a idéia da situação “ainda constitucio-nal”, deverá o Tribunal, se tiver que declarar a inconstitucionalidade da norma, em outro momento, fazê-lo com eficácia restritiva ou limitada. Em outros termos, o “apelo ao legislador” e a declaração de inconstitucionalidade com efeitos limi-tados ou restritos estão intimamente ligados.

Assim, razões de segurança jurídica podem revelar-se, igualmente, aptas a justificar a adoção da modulação de efeitos também em sede de declaração de não-recepção da lei pré-constitucional pela norma constitucional superveniente. Mas não as vejo no caso presente, e adiante justifico.

Entendo que o alcance no tempo de decisão judicial determinante de não- recepção de direito pré-constitucional pode ser objeto de discussão. E os prece-dentes citados comprovam a assertiva.

Como demonstrado, há possibilidade de se modularem os efeitos da não-recepção de norma pela Constituição de 1988, conquanto que juízo de pondera-ção justifique o uso de tal recurso de hermenêutica constitucional.

Não obstante, não vislumbro justificativa que ampare a pretensão do Re-corrente, do ponto de vista substancial, e no caso presente, bem entendido. Na discussão travada nos autos, apontou-se a não-recepção de norma tributária, que suscitou lançamento e cobrança de exação, indevidamente exigida.

Alguns elementos fáticos devem informar a decisão. Entendo que a argüi-ção deduzida pelo Agravante se fez a destempo. é que o interessado poderia ter manejado embargos de declaração quando do julgamento originário em 18 de novembro de 2003, postulando a modulação agora pretendida. E não o fez.

Não há indicação objetiva de repercussão financeira eventualmente sofrida pela municipalidade. O acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro é de 18 de novembro de 2003. O recurso extraordinário foi protocolado em 18 de maio

4 RECr 147.776-8, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, Lex-JSTF, 238, p. 390.

R.T.J. — 203 1241

de 2004. O agravo foi protocolado pelo interessado por volta de 1º de setembro do mesmo ano de 2004; é de presumir que a distância temporal não qualifica aspec-to fático que justifique modulação dos efeitos de não-recepção, como pretendido pelo Agravante.

E o que é mais importante, as decisões do STF contrárias à forma como o Município do Rio de Janeiro lançava e cobrava o IPTU são de 31 de março e de 7 de dezembro de 2000 (RE 248.892 e RE 265.907).

Portanto, não outorgo efeitos meramente prospectivos à referida não-recep-ção, porque não tenho como demonstrada a repercussão econômica, a gravíssima lesão à ordem pública ou à segurança jurídica, bem como a qualquer outro prin-cípio constitucional relevante para o caso.

Reitero, porém, que, diferentemente do que restou assentado pelo eminente Ministro Relator, Celso de Mello, no RE 395.902-AgR, o meu entendimento no sentido da plena compatibilidade técnica para modulação de efeitos com a decla-ração de não-recepção de direito ordinário pré-constitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

Assim, nego provimento ao agravo regimental.

EXTRATO DA ATA

RE 364.304-AgR/RJ — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Agravante: Município do Rio de Janeiro (Advogado: José Eduardo Cavalcanti de Albuquer-que). Agravado: Lino Ramos Cundines (Advogados: Rômulo Cavalcante Mota e outros).

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra. Sandra Verônica Cureau.

Brasília, 3 de outubro de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

R.T.J. — 2031242

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 364.631 — RS

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso

Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Gilmar Mendes

Recorrente: Mônica Mota da Silva — Recorrida: Universidade Federal de Santa Maria

Recurso extraordinário. 2. Indeferimento de pedido de registro de matrícula pela Universidade Federal de Santa Ma-ria (UFSM), ante a ausência de requisito exigido para tal ato. 3. Responsabilidade civil do Estado. Indenização. 4. Dano material. Ausência de elementos seguros para configuração do nexo de causalidade. 5. Dano moral. Inexistência do nexo de causalidade entre o ato do agente público – negativa de matrícula – e o abalo psíquico supostamente suportado pela Recorrente. 6. O indefe-rimento do pedido de matrícula não implica, como decorrência natural, a contratação de empréstimo junto à Caixa Econômica para custear os estudos em instituição de ensino superior priva-da. 7. Recurso extraordinário a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, negar provimento ao recurso ex-traordinário.

Brasília, 29 de agosto de 2006 — Gilmar Mendes, Presidente e Relator para o acórdão (RISTF, art. 37, II).

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Carlos Velloso: O acórdão recorrido, em ação sob o rito ordinário, proferido pela Terceira Turma do Eg. Tribunal Regional Federal da 4ª Região, está assim ementado:

Administrativo. Ensino superior. Decisão judicial permitindo matrícula sem conclusão de estágio profissionalizante. Danos materiais e morais. Descaracterização.

1. Mantida a sentença que julgou improcedente o pedido de ressarcimento de danos materiais e morais, pois não obstante o provimento judicial no sentido de ser viável a matrí-cula em curso superior sem a conclusão de estágio em curso profissionalizante, a autora colou grau em estabelecimento de ensino privado por iniciativa própria. Poderia, por exemplo, ter prestado novo vestibular assim que concluído o estágio.

2. Descaracterizado o nexo causal entre a conduta (negativa de matrícula em estabele-cimento público) e o dano (despesas com estabelecimento particular), requisito necessário à responsabilidade objetiva do Estado.

3. O dano moral também não ocorreu, pois o desconforto da situação não chega a sig-nificar abalo moral, dor profunda.

4. Apelação improvida.(Fl. 137.)

R.T.J. — 203 1243

Rejeitaram-se os embargos de declaração opostos.

Daí o recurso extraordinário, interposto por Mônica Mota da Silva, fundado no art. 102, III, a, da Constituição Federal, com alegação de ofensa ao art. 37, § 6º, da mesma Carta, sustentando, em síntese, a existência de nexo de causalidade entre o ato de rejeição da matrícula da Recorrente pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e o prejuízo decorrente das despesas efetuadas com o custeio de seus estudos em instituição particular, sendo certo que, “sem a conduta da recorrida, de negar a inscrição no curso superior, os danos moral e material inexistiriam, ou seja, não haveria agressão psicológica sem justo motivo e não haveria débito com a Caixa Econômica Federal, eis que a recorrente teria concluído seu curso na universidade pública e gratuita” (fl. 157).

Admitido o recurso, subiram os autos.

A Procuradoria-Geral da República, em parecer lavrado pelo ilustre Sub-procurador-Geral da República, Dr. Paulo da Rocha Campos, opinou pelo parcial provimento do recurso.

Autos conclusos em 29-11-04.

é o relatório.

VOTO

Ementa: Constitucional: Dano moral. Indenização. CF, art. 5º, X.

I - O dano moral, a partir da CF/1988, adquiriu status constitucional (CF, art. 5º, X). A sua concretização dá-se quando a pessoa tem ofendido, por ato de terceiro, o seu decoro ou a sua auto-estima, causando-lhe a ofensa desconforto, aborrecimento ou constrangimento, que resulta sofrimento, não importando, em princípio, o tamanho do constrangimento, do aborreci-mento, do desconforto ou do sofrimento.

II - Negativa de matrícula de aluno aprovado em exame vestibular para ingresso na universidade pública com base em exigência considerada ilegal pelo Poder Judiciário. Dano moral configurado.

III - Recurso extraordinário conhecido em parte e, na parte conhecida, provido.

O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Destaco do parecer da Procurado-ria-Geral da República, fls. 177-180, lavrado pelo ilustre Subprocurador-Geral Dr. Paulo da Rocha Campos:

5. Merece prosperar, em parte, o presente apelo extremo.6. Impõe-se observar, inicialmente, quanto à alegação de ocorrência de dano material,

não restar configurada, de fato, a presença do indispensável nexo de causalidade entre as des-pesas levadas a efeito pela recorrente com o custeio de curso por ela concluído em entidade particular e a negativa da universidade recorrida em efetuar, como deveria, sua matrícula, circunstância que inviabiliza qualquer reparação desta ordem.

7. Por outro lado, a par da ilegitimidade do pleito no que concerne à pleiteada indeniza-ção por danos materiais, o ordenamento jurídico pátrio é peremptório ao reprimir a lesão aos direitos dos indivíduos, mesmo que exclusivamente morais.

R.T.J. — 2031244

8. Com efeito, quanto à indenização por danos morais, impõe-se salientar que, confor-me expressamente registrado no acórdão ora impugnado, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em sede de ação cautelar também apresentada pela recorrente, acabou por entender, em decisão transitada em julgado, configurar-se dispensável a conclusão de estágio profissio-nalizante para o ingresso em curso superior, reconhecendo, conseqüentemente, a ilegalidade do ato que por tal motivo indeferiu a matrícula de quem, como no presente caso, fora regular-mente aprovado em concurso vestibular.

9. Ora, considerado tal contexto, denota-se inegável, ao revés do entendimento preva-lecente na Corte a quo, a dor íntima, o abalo psíquico e o trauma suportados pela recorrente que, após alcançar árdua aprovação em exame vestibular para ingresso em universidade pú-blica federal, aspiração máxima de considerável parcela dos estudantes secundaristas, viu seu anseio frustrado em decorrência de exigência posteriormente considerada dispensável pelo próprio Poder Judiciário.

III10. Em face do exposto, o parecer é pelo parcial provimento do presente recurso

extraordinário, porquanto amplamente configurado, em razão do comportamento da Universidade recorrida, o dano moral sofrido pela recorrente.(Fls. 179-180.)

Correto o parecer.

Realmente, no que toca ao dano material, somente o exame da prova possi-bilitaria afirmar a ocorrência, na hipótese, do nexo de causalidade entre as despesas realizadas pela Recorrente e a negativa da Recorrida em efetuar a sua matrícula.

Não conheço do recurso, no ponto.

O mesmo não ocorre com o dano moral.

O dano moral, a partir da Constituição de 1988, adquiriu status constitu-cional: CF, art. 5º, X. A sua concretização dá-se quando a pessoa tem ofendido, por ato de terceiro, o seu decoro, a sua auto-estima, causando-lhe referido ato desconforto, aborrecimento ou constrangimento, não importando, em princípio, o tamanho desse constrangimento, desse aborrecimento ou desse desconforto. Desde que isso ocorra, há o dano moral, que deve ser reparado, manda a Consti-tuição, art. 5º, X.

é que, do ato que causa constrangimento, resulta aborrecimento ou des-conforto, sofrimento para a pessoa. Esse sofrimento é que precisa ser reparado.

No RE 215.984/RJ, por mim relatado, decidiu o Supremo Tribunal que a publicação da fotografia de alguém, com intuito comercial ou não, pode causar desconforto, aborrecimento ou constrangimento suficiente para a caracterização do dano moral.

Assim a ementa do acórdão do mencionado RE 215.984/RJ:

Constitucional. Dano moral: Fotografia: Publicação não consentida: Indenização: Cumulação com o dano material: Possibilidade. Constituição Federal, art. 5º, X.

I - Para a reparação do dano moral não se exige a ocorrência de ofensa à reputação do indivíduo. O que acontece é que, de regra, a publicação da fotografia de alguém, com intuito comercial ou não, causa desconforto, aborrecimento ou constrangimento, não importando o tamanho desse desconforto, desse aborrecimento ou desse constrangimento. Desde que ele exista, há o dano moral, que deve ser reparado, manda a Constituição, art. 5º, X.

II - Recurso extraordinário conhecido e provido.(DJ de 28-6-02.)

R.T.J. — 203 1245

No caso, bem o demonstrou o Ministério Público Federal, no parecer da lavra do ilustre Subprocurador-Geral Paulo da Rocha Campos, a negativa de matrícula da Recorrente, com base em exigência ilegal, ilegalidade que foi reconhecida pelo Tribunal a quo, em acórdão que passou em julgado, causou-lhe “dor íntima”, “abalo psíquico”, “e o trauma suportado pela recorrente que, após alcançar árdua aprovação em exame vestibular para ingresso em universidade pública federal, aspiração máxima de considerável parcela dos estudantes secun-daristas, viu seu anseio frustrado em decorrência de exigência posteriormente considerada dispensável pelo próprio Poder Judiciário”.

Do exposto, conheço em parte do recurso e, na parte conhecida, dou-lhe provimento, para deferir a reparação pelo dano moral, o que será apurado em li-quidação. Sem honorários advocatícios, já que ambas as partes foram vencedoras e vencidas.

VOTO

O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Senhor Presidente, acompanho com mui-ta satisfação o voto de S. Exa. Sem conhecer nenhum detalhe do caso, apostaria tratar-se de medida discriminatória criada com a intenção de bloquear o ingresso de pessoa determinada. é indicação clara de que isso tinha endereço certo.

EXTRATO DA ATA

RE 364.631/RS — Relator: Ministro Carlos Velloso. Recorrente: Mônica Mota da Silva (Advogados: José Luis Wagner e outros). Recorrida: Universidade Federal de Santa Maria (Advogada: Procuradoria-Geral Federal).

Decisão: Depois dos votos dos Ministros Relator e Joaquim Barbosa, que conhecem, em parte, do recurso extraordinário e, nesta parte, lhe dão provimento, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista formulado pelo eminente Ministro Gilmar Mendes.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Subprocura-dora-Geral da República, Dra. Sandra Verônica Cureau.

Brasília, 28 de junho de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

VOTO(Vista)

O Sr. Ministro Gilmar Mendes:

1. Fundamentos do recurso extraordinárioTrata-se de recurso extraordinário interposto com fundamento no art. 102,

III, a, da Constituição Federal, sob a alegação de ofensa ao art. 37, § 6º, da Cons-tituição Federal. Os argumentos principais do recurso são:

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a) existência do nexo de causalidade entre o ato de rejeição da matrícula da Recorrente pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e o prejuízo decorrente das despesas efetuadas com o custeio de seus estudos em instituição particular; e

b) caracterização de agressão psicológica sem justo motivo causada pela conduta da Recorrida de negar a inscrição da Recorrente no curso superior (fls. 151-157).

2. Entendimento do RelatorO Ministro Carlos Velloso, Relator, conheceu parcialmente do recurso

extraordinário, e na parte conhecida deu-lhe provimento, para deferir a reparação pelo dano moral, argumentando que:

a) quanto ao dano material, não conhecia do recurso, pois somente o exame da prova possibilitaria afirmar a caracterização, no caso, do nexo de causalidade entre as despesas realizadas pela Recorrente e a negativa da Recorrida em efetuar a sua matrícula;

b) no que tange ao dano moral, o recurso merecia ser provido, pois a nega-tiva de matrícula da Recorrente causou-lhe “dor íntima” e “abalo psíquico” pelo trauma suportado de, após alcançar árdua aprovação em exame vestibular para ingresso na universidade pública, ver seu anseio frustrado, em decorrência de exigência posteriormente considerada dispensável pelo próprio Poder Judiciário.

O Ministro Joaquim Barbosa, acompanhando o Ministro Relator, afirmou, na ocasião do primeiro julgamento, que, mesmo sem conhecer maiores detalhes do caso, “apostaria tratar-se de medida discriminatória criada com a intenção de bloquear o ingresso de pessoa determinada”.

3. Controvérsia dos autosPedi vista dos autos para melhor analisar a questão do dano moral, princi-

palmente levando em consideração que se trata de responsabilidade civil do Esta-do, a qual, conforme tenho defendido, apresenta-se como uma das expressões do próprio estado de direito, merecendo cuidado teórico e prático peculiar.

Quanto ao dano material, acompanho o Relator, não conhecendo do recurso extraordinário, por entender não estarem presentes nos autos elementos seguros para caracterizar o imprescindível nexo de causalidade apto a fazer concluir pela existência de dano material.

Já sob o aspecto do dano moral, a discussão dos autos enfrenta tormentosa combinação temática, ainda não claramente delineada pela doutrina e jurispru-dência pátrias: responsabilidade civil do Estado e indenização por dano moral.

4. Responsabilidade civil do EstadoTal qual o próprio conteúdo material do estado de direito passou por trans-

formações históricas significativas, também a responsabilidade civil do Estado passou por diversas fases. Atualmente, a responsabilidade do Estado está entre as

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hipóteses de responsabilidade objetiva, porém, isso nem sempre foi assim, tendo havido uma longa evolução até chegar-se ao estágio atual.

Assim, já na fase civilista, o Brasil sempre reconheceu a responsabilidade da administração pública por danos advindos de atos de gestão, desde que carac-terizada a culpa ou o dolo do agente público. A responsabilidade civil do Estado estava fundada na culpa do funcionário e na responsabilidade por fato de terceiro.

Passou-se, então, para a fase publicística da responsabilidade civil do Esta-do, desenvolvendo-se, nesse âmbito, a chamada teoria objetiva do risco adminis-trativo, segundo a qual a idéia de culpa administrativa é substituída pela de nexo de causalidade, perquirindo-se tão-somente a relação entre a conduta do agente administrativo e o dano causado ao administrado.

Maria Sylvia zanella de Pietro registra: “O tema da responsabilidade civil do Estado tem recebido tratamento diverso no tempo e no espaço; inúmeras teo-rias têm sido elaboradas, inexistindo dentro de um mesmo direito uniformidade de regime jurídico que abranja todas as hipóteses. Em alguns sistemas, como o anglo-saxão, prevalecem os princípios do direito privado; em outros como o europeu-continental, adota-se o regime publicístico. A regra adotada por muito tempo foi a da irresponsabilidade; caminhou-se, depois, para a responsabilidade subjetiva, vinculada à culpa, ainda hoje aceita em várias hipóteses; evoluiu-se, posteriormente, para a teoria da responsabilidade objetiva, aplicável, no entanto, diante de requisitos variáveis de um sistema para outro, de acordo com normas impostas pelo direito positivo.” (Direito Administrativo. 11. ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 501.)

A par de se reconhecerem e constatarem as diversidades e singularidades de cada sistema, bem como de seus diferentes ritmos históricos, é de preocupar o caminho trilhado pela doutrina que conduz à banalização da idéia de responsa-bilidade civil do Estado.

Aqueles que se debruçam sobre o tema sabem que é preciso haver uma particularidade para que seja reconhecido o direito à indenização em virtude de dano ou prejuízo causado pelo poder público.

Isso porque, se assim não se entender, corre-se o risco de usurpar os direitos e garantias fundamentais dos cidadãos, transformando-as em instrumentos des-tinados a proteger privilégios e interesses corporativos. O que não significa, por razões óbvias, que os agentes públicos não cometem erros, nem muito menos que tais abusos não devam ser fatos geradores de responsabilidade civil do Estado. Não é isso!

Entretanto, também não se pode perder de vista o que está implícito em uma decisão que condena o Estado, ou seja, a consciência de que se trata de res-ponsabilidade civil da própria sociedade pelo malfeito do agente público.

Por isso, inclusive, conexa à idéia de responsabilidade civil do Estado, é imprescindível desenvolver e aprofundar o conceito de direito de regresso (art. 37, § 6º, CF/88), para permitir que o agente público também seja acusado e tenha a noção dessa responsabilidade.

R.T.J. — 2031248

Aliás, não se pode olvidar que, como garantia do próprio Estado Constitu-cional e Republicano, a responsabilidade do agente público apresenta-se na sua vertente subjetiva, exigindo da administração pública o dever de provar que a sua conduta foi motivada por dolo ou culpa.

5. Indenização por dano moralConforme ensina Yussef Said Cahali, é assente na dogmática jurídica (dou-

trina e legislações) a distinção, no âmbito dos danos, da categoria de danos patri-moniais, de um lado, e danos extrapatrimoniais (ou morais), de outro. Por danos patrimoniais entende-se o próprio prejuízo econômico sofrido; já por danos extrapatrimoniais tem-se o sofrimento psíquico ou moral, as dores, as angústias e as frustrações suportadas pelo ser humano. (CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 20-21.)

Já a própria dificuldade de definir/delimitar o conteúdo material das ex-pressões “sofrimento psíquico”, “dores”, “angústias” e “frustrações”, em virtude da abertura semântica e do grau de subjetividade que possuem, a caracterização do dano moral tem sido deduzida por grande parte dos doutrinadores de forma negativa. Dessa forma, o dano moral é reconhecido em contraposição ao dano patrimonial, conforme reconhece Pontes de Miranda: “dano patrimonial é o dano que atinge o patrimônio do ofendido; dano não patrimonial é o que é, só atingin-do o devedor (sic) como ser humano, não lhe atinge o patrimônio”. (MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado, XXVI, § 3.108, p. 30, apud CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 21.)

Segundo doutrina de Carlos Alberto Bittar, para quem se qualificam como morais aqueles danos que atingem a esfera de subjetividade, individual ou socialmente considerada, somente aqueles danos que “atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social)” é que podem ser classificados como danos morais. (BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. Atualizado por Eduardo Carlos Bianca Bittar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 45.)

Não se pode olvidar, nesse contexto, a lição de Dalmartello, lembrada por Yussef Cahali, segundo a qual o dano moral resulta da privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem, como a paz, a tran-qüilidade de espírito, a liberdade e a integridade individual, a integridade física, a honra e demais sagrados afetos. (DALMARTELLO. Danni morali contrattuali, Riv. Dir. Civ., 1933, p. 55 et seq., apud CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 22.)

As dificuldades de se conformar o âmbito de proteção do instituto do dano moral está na própria dificuldade de se assegurar a proteção objetiva aos direitos fundamentais relacionados à honra e à moral, ou, em grande medida, a proteção e garantia da própria dignidade da pessoa humana.

Em verdade, ao considerar o ser humano em todas as dimensões de sua personalidade (física, psíquica e moral), o direito contemporâneo ocupou-se

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também de resguardar os danos provocados por ações e reações que melindrem sensações, emoções, sentimentos e paixões.

Assim, na linha do pensamento de Carlos Alberto Bittar, em virtude da com-plexidade dos valores que se inserem na vida de relações, diferentes são os con-ceitos, as qualificações e as reações possíveis, a serem reconhecidos como danos morais, incluindo-se, nesse âmbito, tanto aqueles que agridem genericamente os atributos da personalidade, quanto as considerações pejorativas, menosprezos, ou outros juízos depreciativos, em relação específica com a pessoa atingida. (BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. Atualizado por Eduardo Carlos Bianca Bittar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 51.)

6. Responsabilização do Estado por dano moralzannoni nos ensina que “dano moral não é a dor, a angústia, o desgosto, a

aflição espiritual, a humilhação, o complexo que sofre a vítima do evento danoso, pois estes estados de espírito constituem conteúdo, ou melhor, a conseqüência do dano (...). O direito não repara qualquer padecimento, dor ou aflição, mas aqueles que forem decorrentes da privação de um bem jurídico sobre o qual a vítima teria interesse reconhecido juridicamente” (zANNONNI, Eduardo A. El daño en la responsabilidad civil. Buenos Aires: Astrea, 1982).

A Constituição de 1988, ao elevar a reparabilidade dos danos morais à con-dição de garantia fundamental dos direitos individuais (art. 5º, V e X, da CF/88) consagrou, no plano do direito constitucional positivado – ainda que de forma específica e atrelada ao direito de resposta, intimidade, vida privada, honra e imagem –, proteção jurídica aos danos morais. A doutrina de direito público tem ressaltado que a viabilidade da reparação jurídica do dano moral, em tese, exige a concorrência dos seguintes requisitos:

a) ato ilícito do agente público;

b) ocorrência de dano;

c) existência de nexo causal entre o ato e o dano.

7. Análise do caso concreto No caso dos autos, discute-se o direito à indenização por dano moral de

uma estudante que, aprovada no vestibular para o curso de Pedagogia da Uni-versidade Federal de Santa Maria, teve o seu pedido de matrícula negado, por ausência do diploma de 2º grau no momento de sua habilitação para a inscrição.

Sustenta-se, nos autos, que o prejuízo e dano à estudante decorreria direta-mente do ato praticado por funcionário da Universidade Federal de Santa Maria que negara seu pedido de matrícula no curso superior de Pedagogia.

Sucede que, à época, o referido ato administrativo era de ser considerado legítimo e dentro dos parâmetros de legalidade (Lei 7.044/82 e Edital 2/92 (CO-PERVES), item 8.9). Segundo consta dos autos, assim dispunha o referido edital, em seu item 8.9:

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8.9 Conforme estabelece a Lei 7.044, de 18 de outubro de 1982, e a Resolução 192, de 29 de dezembro de 1987, do Conselho Estadual de Educação do RS, não poderá se ma-tricular o candidato aprovado que não tenha cumprido estágio nos cursos em que o mesmo é obrigatório.

Revela-se importante consignar que a estudante, ora Recorrente, teve dene-gado o seu pedido de habilitação para a matrícula no curso superior de Pedagogia na Universidade Federal de Santa Maria porque ainda não tinha concluído o 2º grau, ou seja, não dispunha de requisito exigível para a sua matrícula na referida instituição federal de ensino superior.

O fato de o Judiciário, posteriormente (cinco anos depois), ter entrado no mérito desse ato administrativo, para afirmar legítima a pretensão de matricular-se, mesmo não tendo a estudante concluído o 2º grau (por entender que, sendo o estágio profissionalizante a única exigência faltante, ela teria direito à matrícula), não respalda o pleito da ora Recorrente.

Tal decisão do Tribunal Regional da 4ª Região apenas seguiu a jurisprudên-cia do Tribunal segundo a qual “não cabe a exigência de estágio profissionalizan-te para efeito de matrícula em curso superior” (Súmula 29 do TRF da 4ª Região). Tal entendimento se firmou a partir da premissa de que “a conclusão, com apro-veitamento, dos créditos correspondentes ao ensino de segundo grau é que habili-ta o candidato a ingressar nos estabelecimentos de ensino universitário. O estágio profissional tem por objetivo aparelhar o estudante para o exercício da profissão que, já naquele nível de preparação, poderá desempenhar” (TRF 4ª – Remessa Ex Officio 89.04.08307-9/RS, Relatora Juíza Ellen Gracie, DJ de 22-5-91).

Assim foi registrado, no acórdão da Apelação Cível 97.04.48405-4/RS, o direito à matricula da ora Recorrente:

Primeiramente, cumpre-me fixar que, em ações como a presente, este Regional já fixou entendimento no sentido de que não cabe a mencionada exigência quando é caso de matrícula em curso superior.

(...)Sem dúvida é um caso de profunda injustiça, ainda mais se o raciocínio que se aplica é

o de que, hoje, quando da apreciação deste recurso, se já possibilitada a freqüência, provavel-mente a requerente se encontraria em fase final do curso.

Por fim, como última consideração, há de se registrar que hoje a postulante já detenha o competente comprovante de 2º grau, apesar dos autos silenciarem a tal respeito.

Isso posto, voto no sentido de dar provimento às apelações, reformando a sentença proferida no Juízo a quo a fim de declarar o direito da autora a matricular-se no curso de Pedagogia da Universidade Federal de Santa Maria podendo usufruir de todas as atividades discentes. Inversão dos ônus sucumbenciais.

Entretanto, não se pode deixar de registrar que, à época do ato impugnado (1993) e nas condições em que a estudante se encontrava (sem a devida compro-vação da conclusão do nível escolar 2º grau), não havia a possibilidade de sua matrícula em curso de nível superior. A Universidade Federal de Santa Maria tinha regras bem definidas, as quais foram observadas.

Eis os fundamentos da decisão recorrida, analisando-se o pedido da ora Recorrente, em sede de apelação cível em ação indenizatória, perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

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O objeto dos presentes autos é saber se, com essa decisão, está caracterizada a ocorrên-cia de dano material e moral, enfim, responsabilidade objetiva do Estado.

A doutrina exige, para a caracterização dessa responsabilidade objetiva, três requisitos: a conduta ilícita, ilegal do Poder Público, o dano e o nexo causal entre ambos.

Nas razões de apelo, a conduta está identificada como sendo a negativa da UFSM em realizar a matrícula de aluno aprovado em vestibular; há, contudo, de se ver que a UFSM cum-pria a legislação específica sobre a matéria. é de se ver que o proceder lícito da Administração também pode configurar a obrigação de indenizar, mas é de se ver que aí, neste caso, o preju-ízo deve ser extraordinário, de molde a comprometer o princípio da igualdade, da isonomia. O fato de ter que freqüentar curso particular, o não poder freqüentar Universidade pública não causa extraordinário dano, basta ver que só uma minoria dos brasileiros consegue uma vaga em uma Universidade pública.

Quanto ao prejuízo, seriam as despesas tidas com os estudos em instituição particular de ensino.

O nexo causal entre a negativa de matrícula e as despesas, entretanto, não existe. A apelante, no afã de cursar a universidade, escolheu por si própria um estabelecimento de natu-reza privada, não havendo como atribuir à ré as despesas obtidas a esse título. Compreendo a ansiedade de uma jovem que quer progredir, estudar, qualificar-se. Essa iniciativa é elogiável, mas se a autora, para isso, contraiu dívida que sabia não ter condições de saldar, isso foi uma decisão pessoal, sem qualquer influência da ré. A apelante poderia ter prestado novo vesti-bular após ter concluído estágio profissionalizante, quando, então, não haveria motivos para outra negativa de matrícula. A questão legalmente rígida foi flexionada por decisão judicial, o que é de ser considerado para a solução desta demanda.

Também não vejo como considerar a ocorrência de dano moral, tendo em vista que a autora sabia não ter concluído o curso. Ademais, não há porque se envergonhar com a situa-ção, que, apesar de desconfortável, não pode ser considerada como causadora de dano moral, abalo profundo.

Dessa forma, descaracterizados o nexo causal bem como o dano material e o dano moral, não há como modificar a sentença que julgou improcedente o pedido.(Fls. 134-135.)

Dessa decisão, na qual os fatos estão postos de forma clara e lógica, não é possível inferir a alegada contrariedade ao art. 37, § 6º, da CF/88, nem muito menos os fatos descritos, nem os documentos juntados aos autos induzem à con-clusão de que teria havido qualquer atitude propositalmente discriminatória, por parte do funcionário da universidade federal que indeferiu o pedido de matrícula da ora Recorrente

Ao contrário, os documentos dos autos (especialmente a decisão recorrida) permitem inferir que o ato administrativo praticado pelo funcionário da Univer-sidade Federal de Santa Maria estava amparado na Lei 7.044/82 (que cuidava da profissionalização do ensino de 2º grau, alterando a Lei 5.692/71 – antiga Lei de Diretrizes e Bases da Educação) e no Edital 2/92 da Coperves, especificamente em seu item 8.9, já referido.

Outrossim, diante dos argumentos recursais e dos fundamentos da decisão recorrida, verifica-se que o dano moral alegado pela ora Recorrente decorreria de suposto sofrimento psíquico da estudante por ter visto frustrada a sua intenção de se matricular no curso superior em uma universidade federal.

Alega-se também que a caracterização do dano moral, de inteira respon-sabilidade da administração pública, seria decorrente do sofrimento moral por que passa a Recorrente, por ter assumido, junto à Caixa Econômica Federal, empréstimo (crédito educativo) para custear seus estudos em instituição privada de ensino superior, que sabia de difícil adimplemento.

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8. ConclusõesOra, tais argumentos não socorrem à Recorrente, pois o fato de ter sido

indeferido o seu pedido de matrícula na universidade federal não implica, como decorrência natural, a contratação de empréstimo junto à Caixa Econômica Fe-deral. Outrossim, o dando moral indenizável é aquele que atinge a esfera íntima da vítima, que agride seus valores, que causa humilhações e dor (RE 387.014-AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 25-6-04).

Mesmo que se considere caracterizada a ilicitude do ato do agente público, no caso, não está caracterizado o imprescindível nexo de causalidade entre o ato do agente público da universidade federal e o suposto dano moral.

Conforme já ressaltado, para que haja responsabilização da administração pública por dano decorrente dos atos de seus agentes, revela-se imprescindível que se firme o nexo de causalidade entre ato e dano, ou seja, entre a negativa de matrícula e o suposto dano moral (aquele que atinge a esfera peculiar e sensível da vítima, agredindo seus valores e causando-lhe dor e humilhação).

A decisão do Poder Judiciário que reconheceu o direito à matrícula da estu-dante na universidade federal não lhe dá automaticamente o direito à indenização por dano moral. Para ser devida a indenização por dano moral, revela-se impres-cindível perquirir a relação de causalidade entre o ato do agente público e o abalo psíquico supostamente suportado pela ora Recorrente.

No caso analisado, não há como reconhecer tal liame. De resto, sequer afiguram-se presentes, no caso, os elementos que compõem o conceito de dano moral.

Diante do exposto, pedindo vênia ao eminente Ministro Relator, nego pro-vimento ao recurso extraordinário.

EXTRATO DA ATA

RE 364.631/RS — Relator: Ministro Carlos Velloso. Relator para o acór-dão: Ministro Gilmar Mendes. Recorrente: Mônica Mota da Silva (Advogados: José Luis Wagner e outros). Recorrida: Universidade Federal de Santa Maria (Advogado: Procuradoria-Geral Federal).

Decisão: Negado provimento ao recurso extraordinário, vencidos os Mi-nistros Carlos Velloso e Joaquim Barbosa. Lavrará o acórdão o Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Ministros Celso de Mello e Joaquim Barbosa. Presidiu este julgamento o Ministro Gilmar Mendes.

Presidência do Ministro Gilmar Mendes. Presentes à sessão os Ministros Cezar Peluso, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Ausente, justificadamente, o Minis-tro Celso de Mello. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner Gonçalves.

Brasília, 29 de agosto de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOAGRAVO DE INSTRUMENTO 376.614 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello

Embargante: Elizabeth Reis Silva de Medeiros — Embargado: Banco ABN Amro Real S.A.

Agravo de instrumento – Embargos de declaração recebidos como recurso de agravo – Ausência de registro da data de inter-posição do recurso extraordinário – Inexistência de autenticação pelo protocolo da Secretaria do Tribunal a quo – Impossibilidade de aferição da tempestividade do apelo extremo – Recurso im-provido.

Não se presume a tempestividade dos recursos em geral, pois incumbe, a quem recorre, o ônus processual de produzir, com base em dados oficiais inequívocos, elementos que demonstrem que a petição recursal foi efetivamente protocolada, em tempo oportuno, na Secretaria do Tribunal a quo.

A ausência de registro da data de interposição do recurso extraordinário – a que corresponde a falta de autenticação do lançamento efetuado na petição recursal – impede a aferição da tempestividade do apelo extremo, pois, sem esse dado objetivo, torna-se inviável verificar se o direito de recorrer, por parte do interessado, foi exercido, ou não, em tempo oportuno.

A deficiente formação do traslado do agravo de instrumento constitui insuperável obstáculo formal ao seu provimento. Incum-be, à parte agravante, o exercício da obrigação de proceder à integral formação do instrumento perante o Tribunal a quo. As omissões constatadas no traslado não mais poderão ser supridas, quando o recurso de agravo já se achar no Supremo Tribunal Federal. Precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, preliminarmente, por votação unânime, conhecer dos embargos de declaração como recurso de agravo, a que, também por unanimidade, negam provimento, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 21 de março de 2006 — Celso de Mello, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de embargos de declaração opos-tos a decisão monocrática, que, proferida em sede de agravo de instrumento, interposto pela parte ora Embargante, não conheceu do mencionado recurso.

R.T.J. — 2031254

Eis o teor da decisão, que, por mim proferida, sofreu a interposição do presente recurso de agravo:

O recurso extraordinário – a que se refere o presente agravo de instrumento – é insus-cetível de conhecimento. É que a petição recursal não registra a autenticação mecânica do Protocolo do Tribunal de origem, impossibilitando, desse modo, a verificação da tempestivi-dade do ato de interposição do apelo extremo.

Na realidade, a falta da autenticação mecânica na petição recursal impede a segura aferição da tempestividade do recurso extraordinário, circunstância esta que – além de in-duzir ao não-conhecimento do apelo extremo – revela um claro descumprimento, por parte do agravante, da obrigação processual que lhe incumbe, em tema de formação do traslado.

Sem que a parte agravante promova a adequada e integral formação do instrumento, com a apresentação de todas as peças que dele devem constar obrigatoriamente, ou com qualquer outra que seja essencial à compreensão da controvérsia, ou, até mesmo, que se revele imprescindível à aferição da própria tempestividade do recurso extraordinário (RTJ 131/1403, Rel. Min. CELSO DE MELLO), torna-se inviável conhecer do recurso de agravo (AI 214.562-AgR/SC, Rel. Min MOREIRA ALVES), cabendo enfatizar, ainda, que a composi-ção do traslado deve processar-se, necessariamente, perante o Tribunal a quo (RTJ 144/948, Rel. Min. CELSO DE MELLO – AI 199.935-AgR/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA).

Sendo assim, e pelas razões expostas, não conheço do presente agravo de instrumento (Súmula 288/STF).

(...)Ministro CELSO DE MELLO

Relator

Inconformada com esse ato decisório, opõe, a parte ora recorrente, os presentes embargos de declaração, alegando, em síntese a ocorrência dos vícios a que se refere o art. 535 do CPC.

Submeto, à apreciação desta Colenda Turma, os presentes embargos de-claratórios.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Cumpre acentuar, preliminar-mente, que o Supremo Tribunal Federal – embora sempre enfatizando que não cabem embargos declaratórios contra decisão singular proferida por Juiz desta Corte – tem conhecido desse recurso, quando deduzido, como “agravo regi-mental” (RTJ 145/664 – RTJ 153/834 – AI 243.159-ED/DF, Rel. Min. NéRI DA SILVEIRA – AI 243.832-ED/MG, Rel. Min. MOREIRA ALVES, v.g.).

Sendo assim, e considerando a jurisprudência de ambas as Turmas desta Suprema Corte, conheço do presente recurso como recurso de agravo e, em conseqüência, assim passo a apreciá-lo.

E, ao fazê-lo, reconheço que não assiste razão à parte ora recorrente, eis que o recurso extraordinário por ela interposto – precisamente em face da au-sência de elementos evidenciadores de sua tempestividade – revela-se insusce-tível de conhecimento.

R.T.J. — 203 1255

é que a ausência de registro da data de interposição do recurso extraor-dinário, que deveria ter sido lançada pelo Protocolo do Tribunal de jurisdição inferior, não permite a constatação da tempestividade do ato de interposição do apelo extremo.

Na realidade, a ausência desse dado relevante – a que corresponde a falta de autenticação do lançamento efetuado na petição recursal – impede a segura aferição da tempestividade do recurso extraordinário, circunstância esta que importa em descumprimento de ônus processual, que, em tema de formação do traslado, incumbe, exclusivamente, ao agravante.

Impende ressaltar, por oportuno, que o agravo de instrumento interposto contra ato veiculador do juízo negativo de admissibilidade do apelo extremo tem por finalidade, por única finalidade, viabilizar a aferição, por esta Suprema Cor-te, das condições de admissibilidade do recurso extraordinário, exaurindo-se, em conseqüência, no exame exclusivo desses requisitos mínimos, a específica função jurídico-processual para a qual foi aquele recurso concebido. Daí a preci-sa observação feita pelo eminente Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, que, na condição de Relator, fez consignar, em decisão monocrática, que “o agravo de instrumento contra a denegação de recurso extraordinário só devolve ao STF a questão de admissibilidade deste” (Pet 944/SP – grifei).

Na realidade, o “thema decidendum” que se projeta na apreciação do agravo de instrumento concerne, especificamente, à análise dos fundamentos – efetivamente deduzidos ou potencialmente invocáveis – em que se apóia o juízo negativo de admissibilidade que incidiu sobre o recurso extraordinário ma-nifestado pela parte agravante, tanto que a esta se impõe o dever de questionar, em sede de agravo, não o conteúdo do acórdão impugnado pela via do apelo extremo, mas, exclusivamente, as razões impeditivas do trânsito e do processa-mento dessa modalidade de impugnação excepcional (RTJ 126/864, Rel. Min. FRANCISCO REzEK – RTJ 133/485, Rel. Min. CéLIO BORJA).

Note-se, pois, que o agravo de instrumento, na hipótese de recusa de pro-cessamento do recurso extraordinário, possui conteúdo temático próprio e específico, de tal modo que nele se justifica o exercício, pelo Supremo Tribunal Federal, do seu incontrastável poder de verificação dos pressupostos – de todos os pressupostos – inerentes ao apelo extremo, dentre os quais avulta, por sua extrema relevância, aquele concernente ao requisito da tempestividade, ainda que não invocado por qualquer dos sujeitos da relação processual.

O controle da tempestividade do apelo extremo – precisamente por cons-tituir pressuposto recursal de ordem pública – revela-se matéria suscetível, até mesmo, de conhecimento “ex officio” por este Tribunal, independendo, em con-seqüência, de qualquer formal provocação dos sujeitos que intervêm no procedi-mento recursal (NELSON NERY JÚNIOR, “Princípios Fundamentais – Teoria Geral dos Recursos”, p. 52, 1990, RT; JOSé CARLOS BARBOSA MOREIRA, “Comentários ao Código de Processo Civil”, vol. V/235, item n. 146, 6. ed., 1993, Forense).

R.T.J. — 2031256

Essa é a razão pela qual o traslado deve também consubstanciar a de-monstração inequívoca da plena tempestividade do recurso extraordinário, fundada em ato revestido de comprovada autenticidade, eis que é ao processa-mento do apelo extremo – devidamente satisfeitos todos os pressupostos inerentes à sua admissibilidade – que se destina, em última análise, a utilização do agravo de instrumento.

Não se pode desconsiderar, na perspectiva da finalidade para a qual se acha vocacionado o agravo de instrumento – interponível contra decisão que nega trânsito ao recurso extraordinário –, que o juízo de admissibilidade mani-festado pela Presidência do Tribunal “a quo”, qualquer que seja o seu conteúdo, reveste-se de caráter preliminar, qualificando-se, em conseqüência, como ato jurisdicional meramente provisório e instável, posto que sujeito, sempre, à confirmação ulterior do Supremo Tribunal Federal, que poderá, por isso mesmo, reconhecer inexistentes determinados requisitos considerados satisfeitos, ainda que implicitamente, pelo órgão judiciário que efetuou, num primeiro momento, o controle de admissibilidade do apelo extremo.

Torna-se necessário proclamar, desse modo, que o juízo de admissibilida-de – seja ele positivo ou negativo – jamais importará em preclusão da faculdade processual, que assiste ao Tribunal “ad quem” (ao Supremo Tribunal Federal, no caso), de reapreciar, em toda a sua extensão, a ocorrência, ou não, dos pressu-postos legitimadores da interposição do recurso extraordinário.

Nesse contexto, e tendo em vista o caráter meramente provisório do juízo de admissibilidade proferido pela Presidência do Tribunal “a quo”, assiste ao Supremo Tribunal Federal – e a este Tribunal, apenas – o monopólio da última palavra sobre a questão da tempestividade do recurso extraordinário.

O Supremo Tribunal Federal, no entanto, para exercer a atividade de controle sobre esse específico pressuposto recursal, necessita de dados objetivos – no caso, a indicação precisa da data de interposição do recurso extraordinário, lançada pelo Protocolo do Tribunal “a quo” – que lhe permitam a efetiva constatação da tempestividade do recurso extraordinário.

é que, sem esse dado objetivo, a ser comprovado por dado revestido de au-tenticidade quanto à sua origem oficial, tornar-se-á inviável verificar se o direito de recorrer, por parte do interessado (o ora Agravante), foi exercido, ou não, em tempo oportuno.

Registre-se, por necessário, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que a exigência formal de autentica-ção mecânica legível não pode ser substituída por declarações vazadas em termos genéricos, ainda que emanadas de agentes públicos:

A certidão exarada por serventuário de Justiça, atestando, genericamente, que o re-curso extraordinário foi interposto “tempestivamente” ou “dentro do prazo legal” – sem mi-nistrar elementos objetivos que permitam, ao Supremo Tribunal Federal (Tribunal ad quem), a aferição da tempestividade do apelo extremo – não atende a exigência fundada na jurispru-dência desta Suprema Corte, legitimando, em conseqüência, a aplicação da Súmula 288/STF.

R.T.J. — 203 1257

O poder certificante dos serventuários de Justiça, não obstante o privilégio da fé pública que lhes é inerente, não tem o condão de substituir a atividade de controle jurisdi-cional sobre os pressupostos recursais, notadamente sobre aquele concernente ao requisito da tempestividade.

Tratando-se de recurso extraordinário, compete ao Supremo Tribunal Federal – e não ao Presidente do Tribunal de origem e nem ao Serventuário da Corte judiciária inferior – o reconhecimento definitivo sobre a tempestividade, ou não, desse meio excepcional de impug-nação recursal.(AI 207.769-AgR/SC, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)

Vê-se, pois, que a pretensão recursal em causa revela-se inacolhível, eis que conflitante com a diretriz jurisprudencial firmada pelo Supremo Tribunal Federal na matéria ora em exame.

De outro lado, impende destacar que impor-se-ia, ao Recorrente, com-provar a tempestividade recursal mediante inclusão, no traslado, da pertinente certidão comprobatória da data em que deduzido o apelo extremo em questão.

A produção dessa certidão revela-se essencial, pois, sem ela, não se pode aferir – considerada a inexistência de peça revestida de autenticidade – o caráter tempestivo da petição recursal.

É que não se presume a tempestividade dos recursos em geral, pois in-cumbe, a quem recorre, o ônus processual de produzir, com base em dados oficiais inequívocos e revestidos de autenticidade, elementos que demonstrem que a petição recursal foi efetivamente protocolada, em tempo oportuno, na Secretaria do Tribunal “a quo”.

Torna-se necessário considerar, ainda, que, com a superveniência da Lei 8.950/94, que alterou o art. 544 do CPC, outorgou-se, exclusivamente, à parte agravante, a obrigação processual de, ela própria, proceder à formação integral do traslado, perante o Tribunal “a quo”, incumbindo-lhe o dever de providen-ciar todas as peças reputadas imprescindíveis, quer pelo ordenamento positivo, quer pela jurisprudência deste Tribunal (AI 240.049/SC, Rel. Min. CELSO DE MELLO – AI 245.321-AgR/PB, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).

Sendo assim, e pelas razões expostas, nego provimento ao presente recur-so de agravo.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

AI 376.614-ED/RJ — Relator: Ministro Celso de Mello. Embargante: Elizabeth Reis Silva de Medeiros (Advogado: Cosme Paulo Sturm da Cunha). Embargado: Banco ABN Amro Real S.A. (Advogados: Jefferson Ramos Ribeiro e outros).

Decisão: A Turma, preliminarmente, por votação unânime, conheceu dos embargos de declaração como recurso de agravo, a que, também por unanimidade, negou provimento, nos termos do voto do Relator.

R.T.J. — 2031258

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão a Ministra Ellen Gracie e os Ministros Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Subpro-curador-Geral da República, Dr. Wagner Gonçalves.

Brasília, 21 de março de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordena-dor.

R.T.J. — 203 1259

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 387.271 — SP

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio

Recorrente: Dagmar Cesar Miranda — Recorrido: Kikue Kojima

Separação judicial – Divórcio – Conversão – Prestações alimentícias – Inadimplemento – Neutralidadade. O inadimple-mento de obrigação alimentícia assumida quando da separação judicial não impede a transformação em divórcio.

Norma – Conflito com texto constitucional superveniente – Resolução. Na dicção da ilustrada maioria, vencido o Relator, o conflito de norma com preceito constitucional superveniente re-solve-se no campo da não-recepção, não cabendo a comunicação ao Senado prevista no inciso do art. 52 da Constituição Federal.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência da Ministra Ellen Gracie, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimida-de, conhecer e dar provimento ao recurso extraordinário e, por maioria, resolver a questão de ordem no sentido de assentar a não-recepção da norma impugnada em face da Constituição Federal de 1988, vencido o Relator, que declarava a sua inconstitucionalidade e propugnava a comunicação formal ao Senado Federal. Votou a Presidente. Impedido o Ministro Cezar Peluso. Ausentes, justificada-mente, os Ministros Celso de Mello e Eros Grau.

Brasília, 8 de agosto de 2007 — Marco Aurélio, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: Ajuizada ação de conversão de separação em divórcio, o Juízo acolheu o pedido inicial. Ao fazê-lo, colocou em plano secundário a circunstância de o Autor não vir adimplindo as obrigações alimen-tícias. Teve presente o lapso temporal exigido em lei para a separação (fls. 61 e 62). O Colegiado revisor alterou o que decidido, consignando a recepção do art. 36 da Lei 6.515/77 pela Carta de 1988. Procedeu à interpretação do que contido no § 6º do art. 226 da Constituição Federal, assim sintetizando a espécie (fl. 96):

Conversão de separação judicial em divórcio – Descumprimento de obrigação assumida na separação ainda continua sendo causa impeditiva da conversão de separação em divórcio, uma vez que a regra do art. 36, II, da Lei 6.515/77 foi recepcionada pela atual Cons-tituição Federal. Sentença cassada, com retorno dos autos ao juízo de origem para apreciação da questão envolvendo inadimplemento de obrigação alimentar.

No extraordinário de fls. 102 a 107, o Recorrente alega desrespeito ao art. 226, § 6º, da Carta da República. Sustenta que a matéria alusiva aos alimentos deve ser objeto de processo próprio, não consubstanciando óbice à transformação pretendida.

R.T.J. — 2031260

A Ré apresentou as contra-razões de fls. 112 a 116, evocando o disposto nos arts. 35 e 36 da Lei 6.515/77 e citando jurisprudência.

O Ministério Público emitiu o parecer de fls. 129 a 131, pelo desprovimento do recurso.

Lancei visto no processo, liberando-o para julgamento e afetando-o ao Ple-no, ante a questão da inconstitucionalidade do inciso III do art. 36 da citada lei, em 21 de agosto de 2006.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Na interposição deste extraordiná-rio, foram atendidos os pressupostos gerais de recorribilidade. A peça, subscrita por profissional da advocacia regularmente credenciado pela procuração de fl. 5, restou protocolada no prazo legal. Examino a alegada transgressão do art. 226, § 6º, da Constituição Federal.

A Lei 6.515, de 26 de dezembro de 1977, veio a prever a transformação da separação judicial em divórcio mediante pedido de qualquer dos cônjuges. Impôs, por meio do art. 36, alterado pela Lei 7.841, de 17 de outubro de 1989, que a defesa, em face de requerimento de conversão, somente poderia basear-se na falta do decurso de um ano da separação judicial e no descumprimento das obrigações assumidas, pelo Requerente, na separação. O disposto no citado arti-go resultou da Emenda Constitucional 9 à Carta anterior, que deu nova redação ao art. 175 dela constante, cujo § 1º passou a viger com o seguinte teor:

§ 1º O casamento somente poderá ser dissolvido, nos casos expressos em lei, desde que haja prévia separação judicial por mais de três anos.

O art. 2º da aludida emenda versou sobre a separação de fato:

Art. 2º A separação de que trata o § 1º do art. 175 da Constituição poderá ser de fato, devidamente comprovada em juízo, e pelo prazo de cinco anos, se for anterior à data desta Emenda.

Há de se observar a ordem natural das coisas. O divórcio diz respeito à dissolução do casamento, da relação jurídica que aproximava os cônjuges. A referência, contida no § 6º do art. 226 da Constituição Federal de 1988, aos casos expressos em lei concerne à separação em si. Confiram com o teor do preceito:

O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada a separação de fato por mais de dois anos.

Pois bem, a separação verificou-se, tanto assim que se disse, no julgamento da apelação, do descumprimento do que ajustado à época. Segundo a contestação apresentada ao pedido inicial, o casamento ocorrera em 1975, tendo o casal três filhos. Em 1996, houve a homologação da separação.

R.T.J. — 203 1261

Indaga-se: é possível, ante o dispositivo constitucional, erigir como óbice à transformação pretendida o inadimplemento de prestações alimentícias? A res-posta é desenganadamente negativa, porquanto a satisfação dessas projeta-se no tempo, cobrindo período que pode ser posterior, até mesmo, à conversão da sepa-ração em divórcio. Esse dado direciona a entender-se, como neutra, no tocante a este último, a não-observação do que acordado no campo dos alimentos, porque tal fato não implicará a insubsistência da dissolução do vínculo.

Concluindo, a exigência prevista no inciso II do art. 36 da Lei 6.515/77, de não haver ocorrido descumprimento das obrigações assumidas, pelo Requerente, na separação, não se sobrepõe ao texto do Diploma Maior. Surge, então, a incons-titucionalidade do dispositivo em comento. A não se entender assim, ainda que a separação judicial tenha obedecido a legislação de regência e mesmo que decor-rido mais de um ano desse acontecimento – requisitos estabelecidos pela Carta de 1988 –, verificada a não-satisfação de parcela alimentícia, o preceito constitucional não surtirá efeito.

O caso deste processo é emblemático no que se questiona não a pensão devi-da ao cônjuge, mas aos filhos. Mostra-se incoerente proceder à leitura do § 6º do art. 226 da Lei Fundamental de forma não simplesmente estrita, e sim restritiva, jungindo a transformação em divórcio à circunstância de estarem em dia as pres-tações alimentícias. Sejam as parcelas anteriores à separação, sejam anteriores ou posteriores ao divórcio, o respectivo inadimplemento deságua – conforme ressaltado pelo Juízo, com endosso, inclusive, do Ministério Público, ao atuar como curador – na execução do que devido.

Conhecendo e provendo este recurso extraordinário, assento o conflito do inciso II do art. 36 da Lei 6.515/77 com a Constituição Federal, restabelecendo o entendimento sufragado pelo Juízo.

VOTO

A Sra. Ministra Cármen Lúcia: Senhora Presidente, acompanho o Relator, apenas acentuando que, no levantamento que fiz, curiosamente, notei uma nítida diferença na exposição feita pelos constitucionalistas, que, em geral, dizem que foi recepcionada, achei apenas um comentador da Constituição que dizia o con-trário e todos os civilistas e a jurisprudência dizem que não, realmente, nos termos do voto de S. Exa.

Acompanho o Relator.

VOTO

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Senhora Presidente, também acom-panho o eminente Relator, assentando que a própria Constituição tem uma sanção autônoma no art. 5º, LXVII, no caso de inadimplemento inescusável e voluntário de obrigação alimentícia, que é a prisão civil.

Portanto, acompanho S. Exa. integralmente.

R.T.J. — 2031262

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhora Presidente, o Ministro Lewandowski trouxe um fundamento que pretendia também argüir: é o tratamento autônomo, conferido pela Constituição, ao inadimplemento de obrigação alimentícia. Por-tanto, esse tema, esse instituto tem disciplina constitucional em apartado, em separado.

De outra parte, o Ministro Marco Aurélio me convence, plenamente, ao fundamentar o seu voto no § 6º do art. 226 da Constituição Federal, porque, efeti-vamente, é uma norma de eficácia plena, não precisa da lei, só precisa do tempo.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Assentei em voto que os chamados casos previstos em lei são para o divórcio.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Não, para a separação judicial.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Para a separação e, posteriormen-te, a conversão em divórcio.

O Sr. Ministro Carlos Britto: A referência que a Constituição faz à lei é para a separação judicial, que se dará nos termos previstos em lei. No mais, o § 6º do art. 226 não precisa dessa normação intercalar ou comando legislativo de segundo escalão para incidir plenamente.

Acompanho o eminente Relator.

PROPOSTA(Sobre questão de ordem)

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: é a não-recepção?

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): é porque, como o processo é sub-jetivo, tem-se utilizado a técnica da declaração de inconstitucionalidade.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Mas é em relação à Constituição de 1988.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Surgiu a figura da não-recepção no processo objetivo, para não se admitir o ataque, isso considerado o precedente.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: é que a Constituição é posterior.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Seria classicamente o fenômeno da não-recepção.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Se chegamos ao mesmo resultado – comunicação ao Senado – para a suspensão...

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: é porque, neste caso, não há sequer comu-nicação ao Senado.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Entendo que deve haver, porque a conclusão sobre o conflito da norma com a Constituição surte efeitos concre-tos entre muros do processo, considerado o balizamento subjetivo do próprio processo. Para que ocorra a suspensão da execução no território nacional, faz-se necessária a atuação do Senado da República.

R.T.J. — 203 1263

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Esse foi um dos argumentos de prag-matismo judicial pelo qual me bati no processo. Estabeleceu-se que é uma mera revogação, tanto que pode ser declarada pela Turma.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: é por isso que estou dizendo se caberia o recurso pela alínea b do art. 102.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sim, cabe para verificar, segundo a ju-risprudência do Tribunal, a desconformidade da lei com a constituição do tempo de sua edição.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Mas, no processo subjetivo, sob o ângulo de uma figura nova: a não-recepção. Para mim, a não-recepção torna inconstitucional o diploma legal, presente o conflito.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Lembro-me, de acordo com a jurispru-dência dominante, da discussão entre os Ministros Sepúlveda Pertence e Paulo Brossard em que se assentou que a questão era de incompatibilidade, mas não de inconstitucionalidade.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Incompatibilidade vertical, que caracteriza o fenômeno da não-recepção.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Mas a não-compatibilidade desá-gua no conflito. Se há conflito, há inconstitucionalidade.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Se é vertical, é inconstitucionalidade.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Refiro-me a vertical no sentido de conteúdo. Os conteúdos são incompatíveis.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Está de bom tamanho o julgamento, senão continuaremos nessa discussão praticamente infindável.

A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente): Como precisamos dar conse-qüência a esse julgado, é preciso saber se vamos fazer a comunicação ao Senado ou não.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Este é o célebre caso discutido na ADI 2, em que o Tribunal manteve a distinção entre o direito pré-constitucional e o direito.

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Isso pode ser decisão de Turma; então, creio que não cabe a comunicação ao Senado.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Hoje, mais ou menos, esse tema está acomodado nos processos subjetivos, com a argüição de descumprimento de preceito fundamental.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Afetei o julgamento do recurso extraordinário ao Plenário porque sustento que a situação se resolve mediante o reconhecimento, quanto ao diploma, da pecha de inconstitucional.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Poderia afetar pela relevância da matéria, para que o Plenário realmente se pronuncie de forma definitiva.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): é um caso escoteiro.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Acho que é importante colocar a questão de ordem.

R.T.J. — 2031264

VOTO(Sobre questão de ordem)

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Presidente, respeito o pragmatismo daqueles que chegam, até mesmo de forma implícita, à conclusão de suspensão da execução da lei sem o pronunciamento do Senado da República. Mas a atri-buição do Senado continua constando do Diploma Maior. Se consigno que um preceito, anterior ou posterior à Carta, com ela conflita, tenho-o por via de conse-qüência – considerada a ordem natural das coisas a que me referi no voto – como inconstitucional. é inconstitucional ante o atrito, ante o conflito à que aludi.

Tudo recomenda – e volto ao pragmatismo – a comunicação ao Senado da República, que de minha parte continua merecedor do maior deferimento possí-vel, para que não venham – acredito que se passe a observar a suspensão pelo Senado – à bancada outros casos envolvendo a mesma matéria.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: A questão não é a comunicação ao Senado, mas de saber se esse juízo é declaração de inconstitucionalidade.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Assento, portanto – e por esse mo-tivo não levei o processo à Turma, órgão fracionado –, que se resolve a questão sob o ângulo da inconstitucionalidade e por isso preconizo a comunicação ao Senado da República.

VOTO(Sobre questão de ordem)

A Sra. Ministra Cármen Lúcia: Senhora Presidente, peço vênia ao Ministro Marco Aurélio, mas me filio à jurisprudência assentada pelo Supremo Tribunal Federal, na linha, portanto, de que não houve a recepção; a incompatibilidade resolve-se pela não-recepção da norma pela Constituição de 1988, não pela in-constitucionalidade declarada por este Plenário.

VOTO(Sobre questão de ordem)

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Senhora Presidente, data venia, entendo que não foi recebida a norma.

VOTO(Sobre questão de ordem)

O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Senhora Presidente, também eu entendo que não houve recepção da norma.

VOTO(Sobre questão de ordem)

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhora Presidente, também entendo que o juízo de declaração de inconstitucionalidade pressupõe a produção do comando estatal após a edição da Constituição.

R.T.J. — 203 1265

Resolvo a questão de ordem no sentido da não-recepção, na linha do pensa-mento inicialmente exposto pelo Ministro Gilmar Mendes.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Se V. Exa. conclui de forma posi-tiva pela constitucionalidade, admite que se examine, sob esse ângulo, o diploma anterior à Carta.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Não, o diploma anterior à Carta eu simples-mente equaciono pelo juízo da não-recepção, se há compatibilidade ou não. Se não há, não há recepção.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Caso se concluísse pela harmonia, dir-se-ia da constitucionalidade. Como se assenta o conflito, cogita-se dessa figura que, para mim, no processo supletivo é um pouco estranha: a não-recepção?

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Aceita essa premissa – é claro que isso tem caráter prático –, teríamos de rever, também, a prática na ação direta de inconstitucionalidade, que foi objeto da belíssima discussão entre os Ministros Paulo Brossard e Sepúlveda Pertence, porque, afirmado que é juízo de inconsti-tucionalidade, teríamos de admitir a impugnação de leis pré-constitucionais, pois passamos a ter um juízo unitário, apenas para efeito de abrangência.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Estou coerente com o ponto de vista anterior. Quando discutimos essa matéria, fiquei vencido porque admitia o controle.

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Não, só estou a dizer quanto às conseqüên-cias do juízo completo que se desenha.

VOTO(Sobre questão de ordem)

O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Senhora Presidente, doutrinariamente também subscreveria os argumentos aqui já expendidos pelo Ministro Marco Aurélio – isso eu já disse em escritos –, na linha do sustentado pelo Ministro Sepúlveda Pertence, mas S. Exa. anotava, em seu voto, que essa questão é mar-cada, nos vários modelos, também por um certo pragmatismo. O próprio modelo italiano – que sabemos – da chamada inconstitucionalidade superveniente, na verdade se inspirou em razão também de índole pragmática. Se a Corte constitu-cional, naquele momento, afirmasse que ela não tinha competência para conhecer da inconstitucionalidade em relação ao direito anterior, ela não teria nada que fazer, por isso a célebre construção da “incostituzionalità sopravvenuta”.

Entre nós isso teria conseqüências, como apontei, inclusive no que diz respeito à ação direta de inconstitucionalidade, e esse tema é delicado porque nós acabamos por fazer um controle muito complexo. Nós o fazemos com rela-ção à Constituição anterior – nosso sistema difuso permite isso –, portanto, nós admitimos o controle de constitucionalidade da lei em face da Constituição sobre a qual ela foi editada – é normal –, e ainda fazemos em face da Constituição superveniente.

Hoje temos até um certo conforto espiritual diante do surgimento da argüi-ção de descumprimento de preceito fundamental, que vem tendo utilização neste âmbito, de modo que se resolve o problema nesta questão.

R.T.J. — 2031266

Também não me impressiona o argumento do Senado – processo de perfil objetivo –, porque, claro, para aceitar a tese, nós teríamos de admitir que aqui es-taríamos celebrando uma declaração de inconstitucionalidade, e a jurisprudência do Tribunal assentou-se no sentido de que, aqui, é um mero juízo de incompati-bilidade, na linha do lex posterior derogat priori.

Pedindo vênias ao Ministro Marco Aurélio, fico com a jurisprudência tra-dicional assentada.

VOTO(Sobre questão de ordem)

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Também eu, Senhora Presidente, pedindo vênia ao Ministro Marco Aurélio, que me honrou acompanhando-me na longa discussão da ADI 2. Mas é um ponto que, eu creio, não deve ser revivido após tanto tempo, até porque venho de verificar a referência ao cumprimento das obri-gações assumidas na separação judicial da Lei 6.515, que não foi reafirmada pelo Código Civil e, por isso, teria apenas um efeito residual no tempo corrido entre a Constituição e o Código Civil.

De qualquer maneira, creio que esta decisão unânime do Plenário resolve o problema.

Por isso, sem me divorciar do longo casamento doutrinário com a tese, agora revivido pelo Ministro Marco Aurélio, aplico a jurisprudência e entendo descabida a comunicação ao Senado.

EXTRATO DA ATA

RE 387.271/SP — Relator: Ministro Marco Aurélio. Recorrente: Dagmar Cesar Miranda (Advogados: Marcelo Pablo Olmedo e outros). Recorrido: Kikue Kojima (Advogados: Anderson Luiz Fernandes Ribeiro e outros).

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, conheceu e deu provimento ao recurso extraordinário. Em seguida, o Tribunal, por maioria, resolveu a questão de ordem no sentido de assentar a não-recepção da norma impugnada em face da Constituição Federal de 1988, vencido o Relator, que declarava a sua inconsti-tucionalidade e propugnava a comunicação formal ao Senado Federal. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. Impedido o Ministro Cezar Peluso. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello e Eros Grau.

Presidência da Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Ministros Se-púlveda Pertence, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Procurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.

Brasília, 8 de agosto de 2007 — Luiz Tomimatsu, Secretário.

R.T.J. — 203 1267

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 388.024 — RS

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello

Agravante: Banco do Brasil S.A. — Agravada: Cleiva B. C. Cândido – ME

Recurso extraordinário e recurso especial – Modalidades de recursos excepcionais que possuem domínios temáticos pró-prios – Acórdão emanado de tribunal de jurisdição inferior que se apóia em duplo fundamento (um, de índole constitucional e outro, de caráter infraconstitucional) – Preclusão que se operou, na espécie, em relação ao fundamento de índole meramente legal – Súmula 283/STF – Recurso de agravo improvido.

- O recurso extraordinário e o recurso especial são institu-tos de direito processual constitucional. Trata-se de modalidades excepcionais de impugnação recursal, com domínios temáticos próprios que lhes foram constitucionalmente reservados.

Assentando-se, o acórdão emanado de tribunal inferior, em duplo fundamento, e tendo em vista a plena autonomia e a intei-ra suficiência daquele de caráter infraconstitucional, mostra-se inadmissível o recurso extraordinário em tal contexto (Súmula 283/STF), eis que a decisão contra a qual se insurge o apelo extre-mo revela-se impregnada de condições suficientes para subsistir autonomamente, considerada, de um lado, a preclusão que se operou em relação ao fundamento de índole meramente legal e, de outro, a irreversibilidade que resulta dessa específica situação processual. Precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Gilmar Mendes.

Brasília, 14 de junho de 2005 — Celso de Mello, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de recurso de agravo, tempestiva-mente interposto, contra decisão que não conheceu do recurso extraordinário deduzido pela parte ora recorrente.

A decisão agravada, com fundamento na jurisprudência desta Corte, re-conheceu a incidência da Súmula 283/STF, diante da existência, no acórdão

R.T.J. — 2031268

recorrido, de fundamento infraconstitucional autônomo, tornado irreversível em face de sua preclusão, motivada, no caso, pelo insucesso processual resul-tante do julgamento do recurso especial.

Inconformada com esse ato decisório, a parte ora agravante interpõe o presente recurso, postulando o conhecimento e o provimento do apelo extremo que deduziu (fls. 283/291).

Por não me convencer das razões expostas, submeto, à apreciação desta Colenda Turma, o presente recurso de agravo.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Não assiste razão à parte ora recorrente, eis que a decisão agravada ajusta-se, com integral fidelidade, à dire-triz jurisprudencial firmada pelo Supremo Tribunal Federal na matéria ora em exame.

É que está a incidir, na espécie, como obstáculo insuperável ao conhe-cimento do recurso extraordinário em causa, o enunciado inscrito na Súmula 283/STF, cujo teor revela ser inadmissível o apelo extremo, quando a decisão recorrida – como no caso – assenta-se em mais de um fundamento suficiente, apto, por si só, a conferir, a tal ato decisório, existência autônoma.

Com efeito, o acórdão em questão, não obstante o fundamento de nature-za constitucional, também possui outro, de índole meramente ordinária, que, embora questionado em sede de recurso especial, tornou-se irreversível em face do trânsito em julgado da decisão proferida pelo E. Superior Tribunal de Justiça, que examinou, em caráter definitivo, esse fundamento de extração le-gal, viabilizando, desse modo, a subsistência autônoma da decisão questionada em sede recursal extraordinária.

Cumpre enfatizar, por necessário, que esse entendimento vem sendo ob-servado em sucessivos julgamentos proferidos no âmbito desta Suprema Corte (RTJ 151/261-262 – RTJ 155/609 – AI 156.829-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RE 168.517/RS, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – RE 169.074/RJ, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI – RE 199.400-AgR/SC, Rel. Min. SYDNEY SANCHES – RE 221.215/RJ, Rel. Min. NéRI DA SILVEIRA, v.g.):

O recurso extraordinário e o recurso especial são institutos de direito processual constitucional. Trata-se de modalidades excepcionais de impugnação recursal, com domí-nios temáticos próprios, que lhes foram constitucionalmente reservados.

Assentando-se, o acórdão do Tribunal inferior, em duplo fundamento, impõe-se à parte interessada o dever de interpor tanto o recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça (para exame da controvérsia de caráter meramente legal) quanto o recurso extraor-dinário para o Supremo Tribunal Federal (para apreciação do litígio de índole essencial-mente constitucional), sob pena de, em não se deduzindo qualquer desses recursos, o recor-rente sofrer as conseqüências indicadas na Súmula 283/STF, motivadas pela existência de fundamento inatacado, apto a dar, à decisão recorrida, condições suficientes para subsistir autonomamente.(RTJ 173/689-690, Rel. para o acórdão Min. CELSO DE MELLO.)

R.T.J. — 203 1269

Do sistema constitucional vigente, que prevê o cabimento simultâneo de recurso ex-traordinário e de recurso especial contra o mesmo acórdão dos tribunais de segundo grau, decorre que da decisão do STJ, no recurso especial, só se admitirá recurso extraordinário se a questão constitucional objeto do último for diversa da que já tiver sido resolvida pela instância ordinária.

Não se contesta que, no sistema difuso de controle de constitucionalidade, o STJ, a exemplo de todos os demais órgãos jurisdicionais de qualquer instância, tenha o poder de declarar incidentemente a inconstitucionalidade da lei, mesmo de ofício; o que não é dado àquela Corte, em recurso especial, é rever a decisão da mesma questão constitucional do tribunal inferior; se o faz, de duas uma: ou usurpa a competência do STF, se interposto para-lelamente o extraordinário ou, caso contrário, ressuscita matéria preclusa.

Ademais, na hipótese, que é a do caso – em que a solução da questão constitucional, na instância ordinária, constitui fundamento bastante da decisão da causa e não foi impugnada mediante recurso extraordinário, antes que a preclusão da matéria, é a coisa julgada que inibe o conhecimento do recurso especial.(RTJ 153/684, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE.)

Recurso extraordinário interposto de decisão do STJ, que não conheceu de recurso especial, dado que o acórdão do Tribunal de 2º grau assentou-se em fundamento constitucional e infraconstitucional, certo que o fundamento constitucional utilizado é bastante e suficiente para manter o acórdão do 2º grau. Não tendo havido recurso extraordinário deste último (o recurso extraordinário foi indeferido e resultou irrecorrida a decisão indeferitória), a matéria constitucional precluiu – preclusão máxima –, o que inibe o conhecimento do recurso especial.(AI 149.518-AgR/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO.)

Assentando-se, o acórdão do Tribunal inferior, em duplo fundamento, impõe-se à parte interessada o dever de interpor tanto o recurso especial para o STJ quanto o recurso extraordinário para o STF, sob pena de, em omitindo o apelo extremo, sofrer, por força de sua própria inércia, os efeitos jurídico-processuais da preclusão pertinente à motivação constitucional.

É inadmissível o recurso especial, quando, apoiando-se o acórdão recorrido também em fundamento constitucional suficiente, não vem ele, neste ponto, a ser objeto de impug-nação pela via recursal extraordinária ou, ainda que utilizada esta, o apelo extremo deixa, qualquer que tenha sido o motivo, de ter seguimento em virtude de ato decisório transitado em julgado.

A existência de fundamento constitucional inatacado revela-se bastante, só por si, para manter, em face de seu caráter autônomo e subordinante, a decisão proferida por Tri-bunal inferior.

- O acórdão do Superior Tribunal de Justiça somente legitimará o uso da via recursal extraordinária, se, nele, se desenhar, originariamente, a questão de direito constitucional. Surgindo esta, contudo, em sede jurisdicional inferior, a impugnação, por meio do recurso extraordinário, deverá ter por objeto a decisão emanada do Tribunal de segundo grau, pois terá sido este, e não o STJ, o órgão judiciário responsável pela resolução incidenter tantum da controvérsia de constitucionalidade. Precedentes.(AI 155.696-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)

Se não interposto recurso extraordinário contra o acórdão do Tribunal de Justiça, deu-se a preclusão das demais questões constitucionais, que não podem ser suscitadas, pela primeira vez, em recurso extraordinário ajuizado contra a decisão do Superior Tribunal de Justiça (...)(AI 256.572/GO, Rel. Min. MOREIRA ALVES.)

Em suma: assentando-se, o acórdão emanado de tribunal inferior, em duplo fundamento, e tendo em vista a plena autonomia e a inteira suficiência

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daquele de caráter infraconstitucional, mostra-se inadmissível o recurso extraor-dinário em tal contexto (Súmula 283/STF), eis que a decisão contra a qual se insurge o apelo extremo revela-se impregnada de condições suficientes para subsistir autonomamente, considerada, de um lado, a preclusão que se operou em relação ao fundamento de índole meramente legal e, de outro, a irreversibi-lidade que resulta dessa específica situação processual.

Sendo assim, tendo em consideração as razões expostas, nego provimento ao presente recurso de agravo, mantendo, em conseqüência, por seus próprios fundamentos, a decisão ora agravada.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

RE 388.024-AgR/RS — Relator: Ministro Celso de Mello. Agravante: Banco do Brasil S.A. (Advogados: Patrícia Netto Leão e outros). Agravada: Cleiva B. C. Cândido – ME (Advogados: Air Paulo Luz e outros).

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Gilmar Mendes.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos Velloso, Ellen Gracie e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Gilmar Mendes. Subprocuradora-Geral da República, Dr. Sandra Ve-rônica Cureau.

Brasília, 14 de junho de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

R.T.J. — 203 1271

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NORECURSO EXTRAORDINÁRIO 402.904 — PE

Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence

Agravante: União — Agravado: Espólio de Cornélio Souza e Silva

1. Recurso extraordinário: conhecimento. Caso em que, apesar de constar da interposição do recurso

extraordinário a alusão ao art. 102, III, da Constituição Federal como regra constitucional a autorizar o seu cabimento, pelas ra-zões recursais depreende-se claramente a alegação de violação do art. 5º, XXXIV, a, e LV, da Constituição pelo acórdão recorrido, bem como a exposição dos fatos pertinentes ao deslinde da con-trovérsia.

2. Processo administrativo: depósito da multa. Em recente julgamento, o Supremo decidiu que a exigência do depósito do valor da multa, como condição de admissibilidade do recurso na esfera administrativa, é inconstitucional, por violar as garantias constitucionais do direito de petição, do contraditório e da ampla defesa (RE 388.359, RE 389.383 e RE 390.513, Marco Aurélio; e ADI 1.922 e ADI 1.976, Joaquim, Informativo 461 e 462).

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo regimental no agravo regi-mental no recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 14 de agosto de 2007 — Sepúlveda Pertence, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: é este o teor da decisão agravada:

Agravo regimental de decisão pela qual neguei seguimento ao recurso extraordinário do Agravante, assentando ser constitucional a exigência do depósito prévio para a admissão de recurso administrativo.

Alega o Agravante, em suma, violação do art. 5º, XXXIV, a, e LV, da Constituição Federal.

Decido.Em julgamento recente, o Supremo Tribunal Federal, contra o meu voto, pacificou que

a exigência do depósito prévio é inconstitucional, por violar as garantias constitucionais do direito de petição, do contraditório e da ampla defesa (RE 388.359, RE 389.383 e RE 390.513, Marco Aurélio; e ADI 1.922 e ADI 1.976, Joaquim, Informativo 461 e 462).

O acórdão objeto do referido extraordinário não se ajusta a esse entendimento.Reconsidero a decisão de fl. 126 e, desde logo, dou provimento ao recurso extraor-

dinário (art. 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil) para reformar o acórdão recorrido e conceder a segurança. Custas ex lege.

R.T.J. — 2031272

Aduz a Agravante, em suma, ausência de regularidade formal do recurso extraordinário do Agravado nos termos do art. 541 do CPC e do art. 321 do RISTF, pois não teria sido indicado o permissivo constitucional que autoriza a sua inter-posição, ou essa indicação teria sido feita erroneamente.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Não tem razão a Agravante.

Leio cum grano salis as exigências previstas no art. 541 do Código de Pro-cesso Civil e no art. 521 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (“O recurso extraordinário para o Tribunal será interposto no prazo estabelecido na lei processual pertinente, com indicação do dispositivo que o autorize, dentre os casos previstos nos arts. 102, III, a, b, c, e 121, § 3º, da Constituição Federal”).

Entendo que se deve extrair da peça recursal, como um todo, os fundamen-tos de fato e de direito que viabilizam o cabimento do recurso extraordinário, bem como se deva cotejar o seu conteúdo com as premissas assentadas pelo acórdão recorrido, concluindo assim pela deficiência ou não da fundamentação exposta.

No caso, apesar de constar no recurso extraordinário do Agravado (fl. 93) a alusão ao art. 101, III, da Constituição Federal como regra constitucional a auto-rizar o seu cabimento, pelas razões recursais depreende-se claramente a alegação de violação do art. 5º, XXXIV, a, e LV, da Constituição pelo acórdão recorrido, bem como a exposição dos fatos pertinentes ao deslinde da controvérsia. Daí ser inviável não conhecer do extraordinário por ausência de regularidade formal.

Nego provimento ao agravo regimental. é o meu voto.

VOTO

O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Senhor Presidente, seria eu flexível em adaptar-me a esse entendimento também. Confesso que um certo preciosismo talvez se insira dentro desta jurisprudência defensiva que temos praticado.

Não me oporia a essa conclusão.

EXTRATO DA ATA

RE 402.904-AgR-AgR/PE — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Agra-vante: União (Advogado: PFN – Fabrício Sarmanho de Albuquerque). Agravado: Espólio de Cornélio Souza e Silva (Advogados: Adolfo Moury Fernandes e outros).

Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental no agravo regimental no recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator. Unânime. Ausente, justificadamente, o Ministro Marco Aurélio.

R.T.J. — 203 1273

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Carlos Britto, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Ausente, justificada-mente, o Ministro Marco Aurélio. Compareceram os Ministros Cezar Peluso e Eros Grau, a fim de julgarem processos a eles vinculados, assumindo as cadeiras da Ministra Cármen Lúcia e do Ministro Ricardo Lewandowski, respectivamente. Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 14 de agosto de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031274

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 417.019 — SE

Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence

Agravante: Estado de Sergipe — Agravado: Edmilson Ferraz de Souza

1. Concurso público: além da necessidade de lei formal prevendo-o como requisito para o ingresso no serviço público, o exame psicotécnico depende de um grau mínimo de objetividade e de publicidade dos atos em que se desdobra: precedentes.

2. Recurso extraordinário: inviabilidade para o reexame dos fatos da causa, que devem ser considerados na versão do acórdão recorrido (Súmula 279): precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo regimental no recurso extraor-dinário, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 14 de agosto de 2007 — Sepúlveda Pertence, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: é este o teor da decisão agravada:

Recurso extraordinário, a, de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, assim ementado (fl. 95):

“Mandado de segurança – Concurso público – Dilação probatória – Litisconsor-tes necessários – Exame psicológico – Critérios sigilosos.

I - Os critérios estabelecidos pela Administração Pública na seleção dos agentes públicos podem ser analisados pelo Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, CF/88);

II - A análise da omissão do edital sobre a fase de avaliação psicológica não requer dilação probatória, além de o impetrante ter trazido todos os documentos neces-sários para o embasamento de seu pleito;

III - Se a avaliação psicológica constitui fase exclusivamente eliminatória, a situação dos demais candidatos não é afetada pela decisão judicial, sendo desnecessária a citação deles para figurarem como litisconsortes passivos;

IV - A omissão do edital em divulgar prévia e detalhadamente os critérios e mé-todos utilizados na avaliação psicológica torna ilegal a eliminação de candidato nesta fase, violando o art. 37, II, da Constituição Federal;

V - Mandamus concedido.”Alega o recurso extraordinário, em síntese, violação do art. 37, I e II, da Constituição

Federal.O Supremo Tribunal entende necessária a existência de lei formal prevendo o exame

psicotécnico como requisito para o ingresso no serviço público (v.g., RE 330.546-AgR, 25-6-02, Segunda Turma, Velloso; e RE 344.880-AgR, 8-10-02, Primeira Turma, Ellen).

R.T.J. — 203 1275

E, mesmo quando prescrito em lei, o exame psicotécnico depende de um grau mínimo de objetividade e de publicidade dos atos em que se desdobra, sendo inconstitucional a ava-liação realizada com base em critérios não revelados, como no caso dos autos (RE 243.926, 16-5-00, Primeira Turma, Moreira; e RE 342.074, 17-9-02, Segunda Turma, Maurício).

O acórdão recorrido está em harmonia com o entendimento deste Tribunal.Ademais, para divergir, seria necessário, além da análise de legislação infracons-

titucional, o reexame das provas e dos fatos que permeiam a lide, o que encontra óbice na Súmula 279.

Na linha dos precedentes, nego seguimento ao recurso extraordinário (art. 557, caput, do CPC).

Alega o Agravante que não há falar, no caso, em reexame de provas e que o exame psicotécnico realizado utilizou critérios objetivos para selecionar os candidatos ao cargo público.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Não tem razão o Agravante.

é da jurisprudência deste Tribunal que no recurso extraordinário devem ser considerados os fatos da causa “na versão do acórdão recorrido” (AI 130.893-AgR, Velloso, RTJ 146/291; RE 140.265, Marco Aurélio, RTJ 148/550), e o Tribunal a quo assentou que houve omissão do edital na divulgação dos critérios utilizados no exame psicotécnico, motivo pelo qual se manteve o Agravado no concurso.

Dessa forma, conforme afirmei na decisão agravada, o acórdão recorrido ajusta-se ao entendimento do Supremo Tribunal Federal de que, além de prescrito em lei, o exame psicotécnico depende de grau mínimo de objetividade e de pu-blicidade dos atos em que se desdobra.

Nego provimento ao agravo regimental. é o meu voto.

EXTRATO DA ATA

RE 417.019-AgR/SE — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Agravante: Estado de Sergipe (Advogado: PGE/SE – Antônio José de Oliveira Botelho). Agravado: Edmilson Ferraz de Souza (Advogados: Márcia Menezes Nascimento e outros).

Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental no recurso ex-traordinário, nos termos do voto do Relator. Unânime. Ausente, justificadamente, o Ministro Marco Aurélio.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Carlos Britto, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Ausente, justificada-mente, o Ministro Marco Aurélio. Compareceram os Ministros Cezar Peluso e Eros Grau, a fim de julgarem processos a eles vinculados, assumindo as cadeiras

R.T.J. — 2031276

da Ministra Cármen Lúcia e do Ministro Ricardo Lewandowski, respectivamente. Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 14 de agosto de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 203 1277

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 460.880 — RS

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio

Recorrente: Lauro Silveira Maciel — Recorridos: Edgar Pacheco Gravana e Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul

Domicílio – Inviolabilidade noturna – Crime de resistência – Ausência de configuração. A garantia constitucional do inciso XI do art. 5º da Carta da República, a preservar a inviolabilidade do domicílio durante o período noturno, alcança também ordem judicial, não cabendo cogitar de crime de resistência.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, conhecer do recurso extraordinário e lhe dar provimento, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 25 de setembro de 2007— Marco Aurélio, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Marco Aurélio: O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, reformando sentença em que absolvido o Réu por inexigibilidade de conduta diversa, condenou-o pelo crime de resistência. Asseverou configura-da a oposição à “execução de ato legal, mediante violência a funcionário compe-tente para executá-lo” (fl. 356).

Com os embargos declaratórios, buscou-se manifestação do Tribunal de origem quanto à violação do domicílio, porquanto o oficial de justiça, em um sábado à noite, tentara entrar na residência do ora Recorrente, contra a vontade deste, ofendendo garantia constitucional. Os declaratórios foram desprovidos, assentando-se haver constado do mandado autorização expressa para cumpri-mento em domingo ou em dia útil, em horário diverso do estabelecido no art. 172 do Código de Processo Civil, nos termos do § 2º desse mesmo artigo.

Nas razões do extraordinário, aponta-se como desrespeitado o inciso XI do art. 5º da Carta da República, alegando-se que, no acórdão recorrido, foi evo-cada legislação ordinária para afastar a aplicação de tal garantia constitucional. Ressalta-se que o oficial de justiça, em um sábado, durante o repouso noturno, pretendera entrar no domicílio para intimar a mulher – cônjuge – que estava en-ferma, agindo em flagrante abuso de autoridade.

O Juízo primeiro de admissibilidade afirmou não ser possível o reexame de matéria fática (fls. 391 e 392), decorrendo o processamento do extraordinário da decisão de fls. 410 a 411, mediante a qual dei provimento ao agravo.

R.T.J. — 2031278

O parecer da Procuradoria-Geral da República, de fls. 417 e 418, é pelo desprovimento do recurso.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Na interposição deste extraordiná-rio, foram atendidos os pressupostos gerais de recorribilidade. A peça, subscrita por profissional da advocacia regularmente credenciado pelo termo de interroga-tório de fl. 110 e pelo substabelecimento de fl. 334, restou protocolada no prazo legal.

A espécie apresenta peculiaridades que não foram afastadas quando pro-vida a apelação interposta pelo Ministério Público. O Colegiado simplesmente consignou que não poderia o ora Recorrente desacatar o oficial de justiça, fazendo-o mediante violência. Colocou em plano secundário a defesa do próprio domicílio e, portanto, o esforço a configurar, conforme registrado na sentença do Juízo, a inexigibilidade de conduta diversa. Buscou o oficial cumprir o mandado de intimação, em que pese a acerto para fazê-lo em dia útil anteriormente entabu-lado, no sábado à noite. Então, houve a resistência no espaço do próprio domicílio.

Tenho como caracterizada a ofensa ao preceito da Carta que versa a in-violabilidade noturna do domicílio, pouco importando a existência de ordem judicial. é em relação a esta última mesmo que ocorre a limitação constitucional. Confiram com o teor do inciso XI do art. 5º da Carta Federal:

XI - A casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem con-sentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.

Conheço do extraordinário e o provejo para, reformando o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, restabelecer o entendi-mento sufragado na sentença.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhor Presidente, foi durante a noite, por-tanto.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Presidente e Relator): Foi em um sábado à noite.

A violência estaria consubstanciada em um empurrão, no recinto da casa.

O Sr. Ministro Carlos Britto: V. Exa. pegou bem: o bem jurídico, tutelado pela Constituição, é a própria casa; a casa é o asilo inviolável do indivíduo.

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Presidente e Relator): A Constituição abre as exceções: flagrante delito, desastre, ou para prestar socorro a terceiro, durante o dia, por determinação judicial.

O Sr. Ministro Carlos Britto: Ou seja, nem por determinação judicial a violabilidade é admitida à noite.

R.T.J. — 203 1279

O Sr. Ministro Marco Aurélio (Presidente e Relator): Por isso é que o Juízo entendeu que estaria configurada a inexigibilidade de conduta adversa.

O Sr. Ministro Carlos Britto: é interessante como o direito de resistência consta, expressamente, da Constituição portuguesa. O nosso direito de resistên-cia é implícito, lá é explícito.

EXTRATO DA ATA

RE 460.880/RS — Relator: Ministro Marco Aurélio. Recorrente: Lauro Silveira Maciel (Advogados: Ricardo Cunha Martins e outros). Recorridos: Edgar Pacheco Gravana (Advogado: Olímpio Simões Pires) e Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul.

Decisão: A Turma conheceu do recurso extraordinário e lhe deu provimento, nos termos do voto do Relator. Unânime.

Presidência do Ministro Marco Aurélio. Presentes à sessão os Ministros Carlos Britto, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Menezes Direito. Subpro-curador-Geral da República, Dr. Wagner de Castro Mathias Netto.

Brasília, 25 de setembro de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031280

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 473.218 — SP

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello

Agravante: Chalú Imóveis Ltda. — Agravada: União

Recurso extraordinário – Cofins – Majoração de alíquota de 2% para 3% – Desnecessidade, para tal efeito, de lei complemen-tar – Validade jurídico-constitucional do art. 8º da Lei 9.718/98 – Exigibilidade a partir de 1º-2-99 – A questão da compensação da cofins com a CSLL – Precedentes – Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Gilmar Mendes.

Brasília, 16 de maio de 2006 — Celso de Mello, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de recurso de agravo, tempestiva-mente interposto, contra decisão, que, ao conhecer do recurso extraordinário deduzido pela parte ora agravante, deu-lhe parcial provimento, para afastar, considerada a base de cálculo do PIS/COFINS, a aplicação do § 1º do art. 3º da Lei 9.718/98, por inconstitucional (RE 357.950/RS).

A decisão ora agravada, por sua vez, também observando precedente firmado pelo Plenário desta Corte (RE 336.134/RS), confirmou a validade jurídico-constitucional do art. 8º da Lei 9.718/98.

Inconformada com esse ato decisório, a parte ora agravante interpõe o presente recurso, postulando o provimento integral do apelo extremo que de-duziu (fls. 443/447).

Por não me convencer das razões expostas, submeto, à apreciação desta Colenda Turma, o presente recurso de agravo.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Não assiste razão à parte recor-rente, eis que a decisão agravada ajusta-se, com integral fidelidade, à diretriz ju-risprudencial firmada pelo Supremo Tribunal Federal na matéria ora em exame.

R.T.J. — 203 1281

Com efeito, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar a con-trovérsia jurídica pertinente à ampliação da base de cálculo do PIS/COFINS (RE 357.950/RS, Rel. Min. MARCO AURéLIO), declarou, “incidenter tan-tum”, a inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º da Lei 9.718/98, por entender que a noção de faturamento referida no art. 195, I, da Constituição da República, na redação anterior à EC 20/98, não legitimava a incidência de tais contribui-ções sobre a totalidade das receitas auferidas pelas empresas contribuintes, advertindo, ainda, que a superveniente promulgação da EC 20/98 não teve o condão de validar legislação ordinária anterior, que se mostrava originaria-mente inconstitucional.

Esta Suprema Corte, por sua vez, também em julgamento plenário (RE 336.134/RS, Rel. Min. ILMAR GALVÃO), confirmou a validade jurídico-constitucional do art. 8º da Lei 9.718/98, no que concerne à majoração da alí-quota de 2% para 3% (COFINS), assinalando que esse aumento – considerada a cláusula constitucional da anterioridade mitigada (CF, art. 195, § 6º) – tornou-se exigível a partir de 1º-02-1999, afastada, no entanto, para efeito de incidência da referida alíquota (3%), a base de cálculo ampliada resultante do já mencio-nado § 1º (inconstitucional) do art. 3º da Lei 9.718/98.

Cabe acentuar, neste ponto, por oportuno, que o Supremo Tribunal Fe-deral, no julgamento plenário do RE 357.950/RS, Relator o Ministro MARCO AURéLIO, em passagem concernente à pretensão de inconstitucionalidade do art. 8º, “caput”, da Lei 9.718/98 – pretensão de inconstitucionalidade que foi rejeitada por esta Corte – reafirmou tal orientação, por entender que o tratamento dispensado à exação tributária em causa não exige a edição de lei complementar, legitimando-se, desse modo, a disciplinação normativa do tema mediante legislação meramente ordinária, inclusive para efeito de majoração da alíquota prevista no já referido preceito legal.

Mostra-se importante registrar que esta Corte, bem antes do julgamento plenário do RE 357.950/RS, Relator o Ministro MARCO AURéLIO, já havia assinalado, a propósito das contribuições a que se refere o art. 195 da Consti-tuição (RTJ 143/313-314 – RTJ 143/684), que a lei ordinária revelava-se tipo normativo juridicamente adequado à veiculação dessa modalidade de tributo, o que permite reconhecer que a regulação de tais espécies tributárias – notada-mente dos elementos estruturais que lhes compõem a hipótese de incidência – não se acha incluída no domínio normativo da lei complementar.

Não foi por outra razão que o Supremo Tribunal Federal, em pronun-ciamento concernente à própria COFINS, deixou assentado que a Lei Comple-mentar 70/91, a despeito de seu caráter formalmente complementar, veiculou matéria não submetida à reserva constitucional de lei complementar, a permi-tir, por isso mesmo, que eventuais alterações no texto desse diploma legislativo possam ser introduzidas mediante simples lei ordinária (RTJ 156/721-722).

Ao assim decidir, esta Corte, examinando a delicada questão concernente às relações entre a lei complementar e a lei ordinária, teve presente o magistério da doutrina (GERALDO ATALIBA, “Lei Complementar na Constituição”,

R.T.J. — 2031282

p. 58, 1971, RT; JOSé SOUTO MAIOR BORGES, “Lei Complementar Tri-butária”, p. 27, 1975, RT/EDUC), segundo o qual as normas inscritas em lei complementar, que extravasarem o âmbito de incidência material dessa espécie normativa, qualificam-se como regras legais meramente ordinárias, subsumindo-se, em conseqüência, ao regime constitucional das leis ordinárias (RTJ 113/392, v.g.).

Cumpre assinalar, ainda, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 336.134/RS, Relator o Ministro ILMAR GALVÃO, reco-nheceu a plena constitucionalidade da compensação, de até um terço (1/3), da COFINS com a CSLL, apenas assegurada ao contribuinte sujeito à incidência de ambas as espécies tributárias ora mencionadas, rejeitando, desse modo, a alegação de que o § 1º do art. 8º da Lei 9.718/98 teria importado em ofensa ao postulado da isonomia tributária, porque excluídos de tal benefício os contri-buintes unicamente tributados pela COFINS:

TRIBUTÁRIO. COFINS. ART. 8.º E § 1.º DA LEI N.º 9.718/98. ALÍQUOTA MAJO-RADA DE 2% PARA 3%. COMPENSAÇÃO DE ATÉ UM TERÇO COM A CONTRIBUI-ÇÃO SOBRE O LUCRO LÍQUIDO (CSLL), QUANDO O CONTRIBUINTE REGISTRAR LUCRO NO EXERCÍCIO. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA.

Por efeito da referida norma, o contribuinte sujeito a ambas as contribuições foi contemplado com uma bonificação representada pelo direito a ver abatido, no pagamento da segunda (COFINS), até um terço do “quantum” devido, atenuando-se, por esse modo, a carga tributária resultante da dupla tributação.

Diversidade entre tal situação e a do contribuinte tributado unicamente pela COFINS, a qual se revela suficiente para justificar o tratamento diferenciado, não havendo que falar, pois, de ofensa ao princípio da isonomia.

Não-conhecimento do recurso.(RTJ 185/352, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – Grifei.)

Impende registrar, finalmente, que a diretriz jurisprudencial que venho de referir, considerados os precedentes em questão, tem sido observada, no âmbito desta Suprema Corte, em reiteradas decisões proferidas na resolução de controvérsia idêntica à suscitada na presente causa (RE 301.868/SC, Rel. Min. MARCO AURéLIO – RE 308.066/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – RE 356.471/MG, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – RE 372.627/DF, Rel. Min. ELLEN GRACIE – RE 388.039/MG, Rel. Min. GILMAR MENDES – RE 413.257/RJ, Rel. Min. CEzAR PELUSO – RE 451.348/SP, Rel. Min. CARLOS BRITTO – RE 469.023/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).

Sendo assim, tendo em consideração as razões expostas, nego provimento ao presente recurso de agravo, mantendo, em conseqüência, por seus próprios fundamentos, a decisão ora agravada.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

RE 473.218-AgR/SP — Relator: Ministro Celso de Mello. Agravante: Chalú Imóveis Ltda. (Advogados: Adirson de Oliveira Junior e outros). Agravada: União (Advogada: PFN – Miriam Aparecida Peres Silva).

R.T.J. — 203 1283

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Gilmar Mendes.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Joaquim Barbosa e Eros Grau. Ausente, justificadamente, o Ministro Gilmar Mendes. Subprocuradora-Geral da República, Dra. Sandra Verônica Cureau.

Brasília, 16 de maio de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

R.T.J. — 2031284

AGRAVO REGIMENTAL NORECURSO EXTRAORDINÁRIO 477.315 — SP

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello

Agravante: Município de Santo André — Agravado: Ministério Público de São Paulo

Recurso extraordinário – Razões recursais que não infir-mam os argumentos da decisão agravada – Impugnação recur-sal que não guarda pertinência com os fundamentos em que se assentou o ato decisório questionado – Ocorrência de divórcio ideológico – Inadmissibilidade – Recurso improvido.

O recurso de agravo deve impugnar, especificadamente, todos os fundamentos da decisão agravada.

- O recurso de agravo a que se referem os arts. 545 e 557, § 1º, ambos do CPC, deve infirmar todos os fundamentos jurídicos em que se assenta a decisão agravada. O descumprimento dessa obrigação processual, por parte do recorrente, torna inviável o recurso de agravo por ele interposto. Precedentes.

- A ocorrência de divergência temática entre as razões em que se apóia a petição recursal, de um lado, e os fundamentos que dão suporte à matéria efetivamente versada na decisão recorrida, de outro, configura hipótese de divórcio ideológico, que, por com-prometer a exata compreensão do pleito deduzido pela parte re-corrente, inviabiliza, ante a ausência de pertinente impugnação, o acolhimento do recurso interposto. Precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste jul-gamento, os Ministros Gilmar Mendes e Cezar Peluso.

Brasília, 5 de setembro de 2006 — Celso de Mello, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de recurso de agravo, tempestiva-mente interposto, contra decisão que não conheceu do recurso extraordinário deduzido pela parte ora recorrente.

Eis o teor da decisão, que, por mim proferida, sofreu a interposição do presente recurso de agravo (fl. 243):

O presente recurso extraordinário insurge-se contra acórdão que se apóia em dois (2) fundamentos, um dos quais possui caráter infraconstitucional.

R.T.J. — 203 1285

Cabe acentuar, neste ponto, que, em situações nas quais o tema de índole meramente legal deixa de ser apreciado pelo E. Superior Tribunal de Justiça – seja porque não interpos-to o pertinente recurso especial, seja porque, embora deduzido o apelo excepcional em ques-tão, a parte recorrente nele não impugna o referido fundamento de natureza infraconstitucio-nal, seja, ainda, porque denegado processamento ao recurso especial (a que não se seguiu a utilização do cabível agravo de instrumento), seja, finalmente, porque o recurso especial não foi conhecido ou provido –, a jurisprudência desta Suprema Corte, em ocorrendo qualquer dessas hipóteses, tem aplicado a doutrina constante da Súmula 283/STF.

Isso significa, portanto, presente o contexto em exame, que a ausência de impugnação do fundamento legal subjacente ao acórdão recorrido, que se revelava suscetível de impug-nação em sede recursal adequada, basta para conferir, por si só, em qualquer das situações acima referidas, subsistência autônoma à decisão ora questionada nesta causa, precisamen-te em decorrência da preclusão do fundamento infraconstitucional mencionado, tal como ad-verte o magistério jurisprudencial que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria (RTJ 151/261-262 – AI 237.774-AgR/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA – RE 168.517/RS, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – RE 273.834/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).

Sendo assim, considerando as razões expostas, e atento à Súmula 283 desta Suprema Corte, não conheço do presente recurso extraordinário.

(...)Ministro CELSO DE MELLO

Relator

A parte ora agravante, ao insurgir-se contra o ato decisório em causa, não só não infirmou os fundamentos em que se assentou a decisão recorrida, como, também, tratou, nesta sede de agravo, de modo impertinente, de questões abso-lutamente estranhas àquelas que realmente constituíram objeto de análise pelo ato ora questionado.

Sendo esse o contexto, submeto, à apreciação desta Colenda Turma, o presente recurso de agravo.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): A pretensão recursal deduzida é inacolhível. é que a parte agravante, ao veicular o presente recurso, deixou de impugnar os fundamentos jurídicos em que se assentou o ato decisório ora questionado.

Ao assim proceder, a parte agravante descumpriu uma típica obrigação processual que lhe incumbia atender, pois, como se sabe, impõe-se ao Recorrente afastar, pontualmente, cada uma das razões invocadas como suporte da decisão agravada (AI 238.454-AgR/SC, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).

O descumprimento desse dever jurídico – ausência de impugnação de cada um dos fundamentos em que se apóia o ato decisório agravado – conduz, nos ter-mos da orientação jurisprudencial firmada por esta Suprema Corte, ao im-provimento do agravo interposto (RTJ 126/864 – RTJ 133/486 – RTJ 157/541):

O RECURSO DE AGRAVO DEVE IMPUGNAR, ESPECIFICADAMENTE, TO-DOS OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA.

- O recurso de agravo a que se referem os arts. 545 e 557, § 1º, ambos do CPC, na redação dada pela Lei nº 9.756/98, deve infirmar todos os fundamentos jurídicos em que se

R.T.J. — 2031286

assenta a decisão agravada. O descumprimento dessa obrigação processual, por parte do recorrente, torna inviável o recurso de agravo por ele interposto. Precedentes.(AI 257.310-AgR/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)

Na realidade, a parte ora agravante, de maneira absolutamente impertinente, tratou de questões que sequer foram versadas na decisão ora agravada, pondo-se a discutir temas inteiramente diversos dos que deveriam constituir objeto de sua impugnação recursal.

O fato irrecusável, no caso ora em exame, é um só: a petição veiculadora do presente recurso de agravo limitou-se a tratar de questão absolutamente estra-nha àquela que constituiu objeto de análise pelo ato decisório que não conheceu do recurso extraordinário deduzido pela parte ora recorrente.

Essa incoincidência temática – que se evidencia pela ocorrência de diver-gência entre as razões em que se apóia a petição recursal e os fundamentos que dão suporte à matéria efetivamente versada na decisão impugnada – configura hipótese de divórcio ideológico, circunstância esta que inviabiliza a exata com-preensão do pleito deduzido pela parte agravante, impedindo, desse modo, o acolhimento do recurso de agravo.

Cabe assinalar, por necessário, que a ocorrência de divórcio ideológico tem levado a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a repelir petições recursais – mesmo aquelas veiculadoras de recurso extraordinário – que tenham incidido nesse vício de ordem lógico-formal (RTJ 164/784-785, Rel. para o acórdão Min. CELSO DE MELLO – RE 122.472/DF, Rel. Min. MOREIRA ALVES – AI 145.651-AgR/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – AI 165.769/MG, Rel. Min. FRANCISCO REzEK).

Sendo assim, e pelas razões expostas, nego provimento ao presente recur-so de agravo.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

RE 477.315-AgR/SP — Relator: Ministro Celso de Mello. Agravante: Município de Santo André (Advogado: Beverli Teresinha Jordão). Agravado: Ministério Público de São Paulo.

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julga-mento, os Ministros Gilmar Mendes e Cezar Peluso.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Joaquim Barbosa e Eros Grau. Ausentes, justificadamente, os Ministros Gilmar Mendes e Cezar Peluso. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner Gon-çalves.

Brasília, 5 de setembro de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

R.T.J. — 203 1287

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NOS EMBARGOS DE

DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NOAGRAVO DE INSTRUMENTO 481.829 — SP

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello

Embargante: José Carlos Tallarico Junior — Embargado: Ministério Público do Estado de São Paulo

Embargos de declaração – Inocorrência de contradição, obscuridade ou omissão – Pretendido reexame da causa – Ca-ráter infringente – Inadmissibilidade – Embargos de declaração rejeitados.

A função jurídico-processual dos embargos de declaração.- Os embargos de declaração, quando regularmente utili-

zados, destinam-se, precipuamente, a desfazer obscuridades, a afastar contradições e a suprir omissões que se registrem, even-tualmente, no acórdão proferido pelo Tribunal. Os embargos declaratórios, no entanto, revelam-se incabíveis, quando a parte recorrente – a pretexto de esclarecer uma inexistente situação de obscuridade, omissão ou contradição – vem a utilizá-los com o objetivo de infringir o julgado e de viabilizar, assim, um indevido reexame da causa, com evidente subversão e desvio da função jurídico-processual para que se acha especificamente vocaciona-da essa modalidade de recurso. Precedentes.

- Acórdão plenário que, no caso em exame, não revela qual-quer dos defeitos a que alude o art. 535 do CPC. Utilização inade-quada, na espécie, dos presentes embargos de declaração. Intuito protelatório, contudo, que não resultou plenamente evidenciado. Conseqüente impossibilidade de imposição de multa (CPC, art. 538, parágrafo único).

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a Presidência do Ministro Nelson Jo-bim, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unani-midade de votos, rejeitar os embargos, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 15 de março de 2006 — Celso de Mello, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de embargos de declaração opostos ao acórdão de fls. 393/399, que, emanado do Egrégio Plenário desta Suprema Corte, negou provimento ao recurso de agravo deduzido pela parte ora embargante.

R.T.J. — 2031288

O acórdão, contra o qual se insurge a parte ora recorrente, está assim ementado (fl. 399):

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – INTERPOSIÇÃO CONTRA ACÓRDÃO PRO-FERIDO EM SEDE DE “AGRAVO REGIMENTAL” – INADMISSIBILIDADE – SUBSIS-TÊNCIA DA SÚMULA 599/STF – SUPERVENIÊNCIA DA LEI 8.950/94 – PODER DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR – AUSÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE COM O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA – AGRAVO IMPROVIDO.

- Subsiste íntegro o enunciado constante da Súmula 599/STF, especialmente em face do que prescreve o art. 546, II, do CPC, na redação dada pela Lei 8.950/94, de tal modo que não se revelam cabíveis embargos de divergência quando opostos a decisões emanadas de Turmas do Supremo Tribunal Federal proferidas no julgamento de agravos ou de “agravos regimentais”. Precedentes.

- A inadmissibilidade dos embargos de divergência ainda mais se evidencia quando o acórdão, proferido no julgamento de “agravo regimental”, sequer aprecia o mérito da questão. Hipótese ocorrente na espécie (traslado insuficiente).

Sustenta, o Embargante, em suas razões recursais (fls. 566/569), o que se segue (fls. 567/568):

Nos moldes do art. 535, I, do CPC, havendo contradição no acórdão, possibilita-se o ajuizamento de embargos de declaração. “In casu”, permissa vênia, a r. decisão afronta e mostra-se absolutamente contraditória e até omissa “em relação a um dos mais elementares direitos individuais” do cidadão (art. 5º, LV, da Carta Magna), afinal, o direito à ampla defesa restou ferido de morte.

“A priori”, impende lembrar que o “rigorismo instrumental” que levou o AGRAVO a ser rejeitado ante a ausência da procuração (“Apesar de junto o substabelecimento”) e impediu a apreciação dos fatos ocorridos e argüidos, novamente ocorreu neste procedimento.

“Ad argumentandum”, embora não se negue a relação de acessoriedade entre o instrumento de mandato judicial e o ato de substabelecimento dos poderes contidos na pro-curação, também não se pode negar o excesso de rigorismo em não aceitar como regular a representação em prejuízo da apreciação do mérito e do próprio embargante.

Num segundo passo, ao considerar inadmissível o cabimento dos embargos de diver-gência em face do que se contém no art. 335, “caput”, do RISTF, c.c. o ART. 546, II, do CPC, na redação dada pela Lei n. 8.950/94, também houve o rigor formal.

E novamente cerceou-se a defesa, afinal, admitindo-se tratar-se de peça errônea, nos moldes da Lei Instrumental, “haveria de se aceitá-la como outro recurso admissível”, já que, tempestiva.

Concessa máxima vênia, cabe lembrar que esta Colenda Corte tem sempre proposto o respeito e obediência aos ditames da nossa Carta Magna, como Lei Maior. E principalmente no que tange à defesa dos direitos individuais é indiscutível seu esforço e fazê-los prevalecer sobre regras menores.

Nesta esteira, ressalta-se que, ao considerar inadmissível o cabimento dos embargos de divergência, “o rigor formal” que impediu o seguimento de recurso não merece preva-lecer, porque foge do razoável ao ferir de morte o princípio constitucional da mais ampla defesa.

Data vênia, entendemos necessário o aclaramento da fundamentação do Acórdão (in-teresse recursal), determinando V. Exa. a retificação do mesmo, “no sentido de harmonizá-lo com o mais elementar princípio constitucional” que é o da ampla defesa (CF 5º. LV).(Grifei.)Submeto, pois, ao exame do Egrégio Plenário do Supremo Tribunal Fe-

deral, os presentes embargos de declaração.

É o relatório.

R.T.J. — 203 1289

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Trata-se de embargos de de-claração opostos ao acórdão plenário de fls. 393/399, consubstanciador de julgamento que negou provimento ao recurso de agravo deduzido pela parte ora embargante.

A decisão objeto dos presentes embargos declaratórios acha-se consubs-tanciada em acórdão assim ementado (fl. 399):

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – INTERPOSIÇÃO CONTRA ACÓRDÃO PRO-FERIDO EM SEDE DE “AGRAVO REGIMENTAL” – INADMISSIBILIDADE – SUBSIS-TÊNCIA DA SÚMULA 599/STF – SUPERVENIÊNCIA DA LEI 8.950/94 – PODER DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR – AUSÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE COM O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA – AGRAVO IMPROVIDO.

- Subsiste íntegro o enunciado constante da Súmula 599/STF, especialmente em face do que prescreve o art. 546, II, do CPC, na redação dada pela Lei 8.950/94, de tal modo que não se revelam cabíveis embargos de divergência quando opostos a decisões emanadas de Turmas do Supremo Tribunal Federal proferidas no julgamento de agravos ou de “agravos regimentais”. Precedentes.

- A inadmissibilidade dos embargos de divergência ainda mais se evidencia quando o acórdão, proferido no julgamento de “agravo regimental”, sequer aprecia o mérito da questão. Hipótese ocorrente na espécie (traslado insuficiente).

O exame da pretensão recursal ora deduzida evidencia não assistir razão à parte ora embargante, eis que o acórdão contra o qual ela se insurge não se mostra infirmado por qualquer dos vícios a que alude o art. 535 do CPC.

Na realidade, o que a parte ora embargante pretende – e pretende de modo absolutamente inadequado – é proceder a um novo reexame da causa, o que não se viabiliza processualmente (RTJ 154/223 – RTJ 158/264 – RTJ 159/638, v.g.), consideradas, de um lado, as razões constantes do próprio acórdão objeto destes embargos de declaração (fls. 393/399) e, de outro, a orientação jurispru-dencial que esta Suprema Corte firmou em tema de insuficiência de traslado, quando dele ausente a procuração de que se originou o substabelecimento de poderes (RTJ 139/269 – RTJ 190/681, v.g.).

Como se sabe, os embargos de declaração destinam-se, precipuamente, a desfazer obscuridades, a afastar contradições e a suprir omissões que even-tualmente se registrem no acórdão proferido pelo Tribunal. Essa modalidade recursal só permite o reexame do acórdão embargado, quando utilizada com o específico objetivo de viabilizar um pronunciamento jurisdicional de caráter integrativo-retificador, vocacionado a afastar as situações de obscuridade, omissão ou contradição, e a complementar e esclarecer o conteúdo da decisão proferida, consoante tem enfatizado esta Suprema Corte (RTJ 175/315-316).

Desse modo, a decisão recorrida – que apreciou, como no caso, com plena exatidão e em toda a sua inteireza, determinada pretensão jurídica – não permite o emprego da via recursal dos embargos de declaração, sob pena de gra-ve disfunção jurídico-processual dessa modalidade de recurso (RTJ 155/964), eis que inocorrentes, em tal situação, os pressupostos que justificariam a sua adequada utilização.

R.T.J. — 2031290

Cumpre enfatizar, de outro lado, que não se revelam cabíveis embargos de declaração, quando a parte recorrente – a pretexto de esclarecer uma inexis-tente situação de obscuridade, omissão ou contradição – vem a utilizá-los, como na espécie, com o objetivo de infringir o julgado e de viabilizar, assim, um inde-vido reexame da causa (RTJ 191/694-695, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).

É por tal razão que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ao versar os aspectos ora mencionados, assim se tem pronunciado:

Embargos declaratórios. Inexistência de omissão, contradição, obscuridade ou dúvi-da, no acórdão embargado (art. 337 do RISTF).

Embargos rejeitados.O que pretenderam os Embargantes foi sustentar o desacerto do julgado e obter sua

desconstituição. A isso não se prestam, porém, os embargos declaratórios.(RTJ 134/1296, Rel. Min. SYDNEY SANCHES – Grifei.)

- A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem ressaltado que os embargos de declaração não se revelam cabíveis, quando, utilizados com a finalidade de sustentar a incorreção do acórdão, objetivam, na realidade, a própria desconstituição do ato decisório proferido pelo Tribunal. Precedentes: RTJ 114/885 – RTJ 116/1106 – RTJ 118/714 – RTJ 134/1296.(AI 153.147-AgR-ED/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)

- O recurso de embargos de declaração não tem cabimento, quando, a pretexto de esclarecer uma inocorrente situação de obscuridade, contradição ou omissão do acórdão, vem a ser utilizado com o objetivo de infringir o julgado.(RE 177.599-ED/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)

Embargos declaratórios só se destinam a possibilitar a eliminação de obscuridade (...), contradição ou omissão do acórdão embargado (art. 337 do RISTF), não o reconhecimento de erro de julgamento.

E como, no caso, é esse reconhecimento que neles se reclama, com a conseqüente reforma do acórdão, ficam eles rejeitados. (RTJ 134/836, Rel. Min. SYDNEY SANCHES – Grifei.)

O exame dos autos evidencia que os presentes embargos declaratórios revestem-se de nítido caráter infringente, circunstância esta que, por si só, con-siderados os precedentes anteriormente referidos, basta para tornar incabível a espécie recursal ora em análise.

Em suma, nada justifica a utilização, no caso, dos presentes embargos de declaração, pois – não custa insistir – não se registra, quanto ao acórdão plenário ora impugnado, a ocorrência de qualquer dos pressupostos legais de embargabilidade.

As razões que venho de expor, Senhor Presidente, levar-me-iam a vislum-brar possível intuito procrastinatório na utilização destes embargos de declara-ção, o que legitimaria a aplicação da sanção processual prevista no parágrafo único do art. 538 do CPC (RTJ 190/711 – RTJ 192/1114-1115, v.g.).

Ocorre, no entanto, que esse propósito não resultou plenamente eviden-ciado na espécie ora em exame, motivo pelo qual deixo de reconhecer, “hic et nunc”, o caráter protelatório destes embargos de declaração, o que afasta a

R.T.J. — 203 1291

possibilidade de imposição, ao ora Recorrente, da multa a que se refere o art. 538, parágrafo único, do CPC.

Sendo assim, tendo presentes as razões expostas, rejeito, por incabíveis, estes embargos de declaração, eis que inocorrente, na espécie, qualquer dos pressupostos de embargabilidade a que alude o art. 535 do CPC, restando pre-judicado, em conseqüência, o exame do pedido de fls. 410/454.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

AI 481.829-AgR-ED-EDv-AgR-ED/SP — Relator: Ministro Celso de Mello. Embargante: José Carlos Tallarico Junior (Advogados: José Roberto Cerqueira Burckauser e outros). Embargado: Ministério Público do Estado de São Paulo.

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, rejeitou os embargos, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Ministro Nelson Jobim.

Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Se-púlveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Procurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.

Brasília, 15 de março de 2006 — Luiz Tomimatsu, Secretário.

R.T.J. — 2031292

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 491.863 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence

Agravante: União — Agravado: José Soares Botelho

I - Contribuição para o Fundo de Saúde de Militares: ilegi-timidade: ausência de previsão da respectiva alíquota na lei que a instituiu: recurso extraordinário: descabimento: controvérsia restrita ao âmbito infraconstitucional: a alegada violação dos dis-positivos constitucionais invocados, se ocorresse, seria reflexa ou indireta: incidência, mutatis mutandis, da Súmula 636.

II - Agravo regimental: inviabilidade para o exame de ques-tões novas, que não foram objeto da decisão impugnada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo regimental no recurso extraor-dinário, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 14 de agosto de 2007 — Sepúlveda Pertence, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Agravo regimental contra decisão pela qual neguei seguimento ao recurso extraordinário da União contra acórdão que determinou a restituição ao Agravado dos valores referentes à cobrança de con-tribuição destinada a fundo de saúde de militares, sob o fundamento de que esta teria natureza tributária, faltando na lei que a instituiu a definição da respectiva alíquota.

Alegou o recurso extraordinário violação de diversos dispositivos constitu-cionais, sob os fundamentos que seguem:

a) foi violado o art. 5º, LIII e LIV, da Constituição, em razão da incompe-tência absoluta do juizado especial federal para o exame do caso, nos termos do art. 3º, I, da Lei 10.259/01;

b) houve violação dos arts. 142, 149 e 150, I, da Constituição, uma vez que a contribuição para o Fundo de Saúde dos Militares não tem natureza jurídica de tributo. Segundo a Recorrente, a obrigatoriedade da contribuição é limitada àqueles que optem pela carreira militar;

c) ante o princípio da eventualidade, ainda que a contribuição tenha natu-reza jurídica de tributo, sua cobrança seria legítima, tendo em vista o fato de a

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Constituição Federal ter recebido a Lei 5.787/72 e o Decreto 92.512/86. Aduz que, embora a Lei 8.237/91 tenha revogado a Lei 5.787/72, continuou válido o Decreto 92.512/86.

A Agravante insiste nos dois últimos argumentos e alega que houve nuli-dade na citação porque o órgão competente para representar a União nas causas de natureza fiscal é a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, e não a Procura-doria-Geral da União.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Não tem razão a Agravante.

Reafirmo os fundamentos da decisão agravada:

Os itens a e b são adstritos à legislação infraconstitucional; a alegada violação dos dispositivos constitucionais invocados seria, se ocorresse, indireta ou reflexa, que não enseja reexame no recurso extraordinário: incide, mutatis mutandis, o princípio da Súmula 636.

Quanto ao item c, assim dispunham o art. 81 da Lei 5.787/72 e o art. 14 do Decreto 92.512/86:

“Lei 5.787/72, art. 81. Os recursos para a assistência médico-hospitalar aos dependentes dos militares provirão de verbas consignadas no Orçamento da União e de contribuições estabelecidas na forma do disposto no § 1º.

§ 1º Poderá ser estabelecida a contribuição de até 3% (três por cento) do soldo do militar, para constituição de um Fundo de Saúde de cada Força Armada, regulamen-tado pelo respectivo ministério.”

“Decreto 92.512/86, art. 14. As contribuições mensais, para a constituição e manutenção dos fundos de saúde de cada Força Armada, corresponderão:

I - a 3% (três por cento) do valor do soldo, para os militares da ativa e na ina-tividade;”Desse modo, o fundamento de validade do Decreto 92.512/86 estava na Lei 5.787/72;

ora, independentemente de ter sido ou não recebida a lei pela Constituição Federal, revogada pela Lei 8.237/91, como afirma a própria Recorrente, o decreto perdeu a base legal na qual se sustentava.

Por fim, não há falar em recebimento como lei ordinária do Decreto 92.512/86, por-quanto este nunca deixou de ser mero regulamento do que dispunha a Lei 5.787/72.

Quanto à nulidade da citação por se tratar de matéria fiscal, a Agravante apenas inova processualmente. Apesar de o acórdão recorrido haver reconhecido a natureza tributária da contribuição ao Funsa, o tema suscitado não foi examina-do pelo Tribunal a quo. Inviável, nesta fase, inovar a causa com questões que não foram objeto da decisão impugnada (v.g., RE 216.936-AgR, 22-1-99, Segunda Turma, Néri; RE 121.025-AgR, 8-10-02, Primeira Turma, Ellen).

Nego provimento ao agravo regimental: é o meu voto.

EXTRATO DA ATA

RE 491.863-AgR/RJ — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Agravante: União (Advogado: Advogado-Geral da União). Agravado: José Soares Botelho (Advogados: José Roberto Soares de Oliveira e outros).

R.T.J. — 2031294

Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental no recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator. Unânime. Não participou, justifi-cadamente, deste julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski. Ausente, justifi-cadamente, o Ministro Marco Aurélio.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Carlos Britto, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Ausente, justificada-mente, o Ministro Marco Aurélio. Compareceram os Ministros Cezar Peluso e Eros Grau, a fim de julgarem processos a eles vinculados, assumindo as cadeiras da Ministra Cármen Lúcia e do Ministro Ricardo Lewandowski, respectivamente. Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 14 de agosto de 2007 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 203 1295

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 501.661 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello

Agravante: Petróleo Brasileiro S.A. – PETROBRAS — Agravado: Estado do Rio de Janeiro

Recurso extraordinário e recurso especial – Modalidades de recursos excepcionais que possuem domínios temáticos pró-prios – Acórdão emanado de tribunal de jurisdição inferior que se apóia em duplo fundamento (um, de índole constitucional e outro, de caráter infraconstitucional) – Preclusão que se operou, na espécie, em relação ao fundamento de índole meramente legal – Súmula 283/STF – Recurso de agravo improvido.

- O recurso extraordinário e o recurso especial são institu-tos de direito processual constitucional. Trata-se de modalidades excepcionais de impugnação recursal, com domínios temáticos próprios que lhes foram constitucionalmente reservados.

Assentando-se, o acórdão emanado de Tribunal inferior, em duplo fundamento, e tendo em vista a plena autonomia e a intei-ra suficiência daquele de caráter infraconstitucional, mostra-se inadmissível o recurso extraordinário em tal contexto (Súmula 283/STF), eis que a decisão contra a qual se insurge o apelo extre-mo revela-se impregnada de condições suficientes para subsistir autonomamente, considerada, de um lado, a preclusão que se operou em relação ao fundamento de índole meramente legal e, de outro, a irreversibilidade que resulta dessa específica situação processual. Precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 21 de março de 2006 — Celso de Mello, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de recurso de agravo, tempestiva-mente interposto, contra decisão que negou provimento ao agravo de instru-mento deduzido pela parte ora recorrente.

A decisão agravada, com fundamento na jurisprudência desta Corte, re-conheceu a incidência da Súmula 283/STF, diante da existência, no acórdão recorrido, de fundamento infraconstitucional autônomo, tornado irreversível

R.T.J. — 2031296

em face de sua preclusão, motivada, no caso, pelo não-conhecimento do agravo de instrumento deduzido pela parte recorrente.

Inconformada com esse ato decisório, a parte ora agravante interpõe o presente recurso, postulando o provimento do agravo de instrumento que de-duziu (fls. 341/342).

Por não me convencer das razões expostas, submeto, à apreciação desta Colenda Turma, o presente recurso de agravo.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Não assiste razão à parte ora recorrente, eis que a decisão agravada ajusta-se, com integral fidelidade, à dire-triz jurisprudencial firmada pelo Supremo Tribunal Federal na matéria ora em exame.

É que está a incidir, na espécie, como obstáculo insuperável ao conhe-cimento do recurso extraordinário em causa, o enunciado inscrito na Súmula 283/STF, cujo teor revela ser inadmissível o apelo extremo, quando a decisão recorrida – como no caso – assenta-se em mais de um fundamento suficiente, apto, por si só, a conferir, a tal ato decisório, existência autônoma.

Com efeito, o acórdão em questão, não obstante o fundamento de nature-za constitucional, também possui outro, de índole meramente ordinária, que se tornou irreversível, viabilizando, desse modo, a subsistência autônoma da decisão questionada em sede recursal extraordinária.

Cumpre enfatizar, por necessário, que esse entendimento vem sendo ob-servado em sucessivos julgamentos proferidos no âmbito desta Suprema Corte (RTJ 151/261-262 – RTJ 155/609 – AI 156.829-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RE 168.517/RS, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – RE 169.074/RJ, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI – RE 199.400-AgR/SC, Rel. Min. SYDNEY SANCHES – RE 221.215/RJ, Rel. Min. NéRI DA SILVEIRA, v.g.):

O recurso extraordinário e o recurso especial são institutos de direito processual constitucional. Trata-se de modalidades excepcionais de impugnação recursal, com domí-nios temáticos próprios, que lhes foram constitucionalmente reservados.

Assentando-se, o acórdão do Tribunal inferior, em duplo fundamento, impõe-se à parte interessada o dever de interpor tanto o recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça (para exame da controvérsia de caráter meramente legal) quanto o recurso extraor-dinário para o Supremo Tribunal Federal (para apreciação do litígio de índole essencial-mente constitucional), sob pena de, em não se deduzindo qualquer desses recursos, o recor-rente sofrer as conseqüências indicadas na Súmula 283/STF, motivadas pela existência de fundamento inatacado, apto a dar, à decisão recorrida, condições suficientes para subsistir autonomamente.(RTJ 173/689-690, Rel. p/ o ac. Min. CELSO DE MELLO.)

Do sistema constitucional vigente, que prevê o cabimento simultâneo de recurso ex-traordinário e de recurso especial contra o mesmo acórdão dos tribunais de segundo grau, decorre que da decisão do STJ, no recurso especial, só se admitirá recurso extraordinário se a questão constitucional objeto do último for diversa da que já tiver sido resolvida pela instância ordinária.

R.T.J. — 203 1297

Não se contesta que, no sistema difuso de controle de constitucionalidade, o STJ, a exemplo de todos os demais órgãos jurisdicionais de qualquer instância, tenha o poder de declarar incidentemente a inconstitucionalidade da lei, mesmo de ofício; o que não é dado àquela Corte, em recurso especial, é rever a decisão da mesma questão constitucional do tribunal inferior; se o faz, de duas uma: ou usurpa a competência do STF, se interposto para-lelamente o extraordinário ou, caso contrário, ressuscita matéria preclusa.

Ademais, na hipótese, que é a do caso – em que a solução da questão constitucional, na instância ordinária, constitui fundamento bastante da decisão da causa e não foi impugnada mediante recurso extraordinário, antes que a preclusão da matéria, é a coisa julgada que inibe o conhecimento do recurso especial.(RTJ 153/684, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE.)

Recurso extraordinário interposto de decisão do STJ, que não conheceu de recurso es-pecial, dado que o acórdão do Tribunal de 2º grau assentou-se em fundamento constitucional e infraconstitucional, certo que o fundamento constitucional utilizado é bastante e suficiente para manter o acórdão do 2º grau. Não tendo havido recurso extraordinário deste último (o recurso extraordinário foi indeferido e resultou irrecorrida a decisão indeferitória), a matéria constitucional precluiu – preclusão máxima – o que inibe o conhecimento do recurso especial.(AI 149.518-AgR/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO.)

Assentando-se, o acórdão do Tribunal inferior, em duplo fundamento, impõe-se à parte interessada o dever de interpor tanto o recurso especial para o STJ quanto o recurso extraordinário para o STF, sob pena de, em omitindo o apelo extremo, sofrer, por força de sua própria inércia, os efeitos jurídico-processuais da preclusão pertinente à motivação constitucional.

É inadmissível o recurso especial, quando, apoiando-se o acórdão recorrido também em fundamento constitucional suficiente, não vem ele, neste ponto, a ser objeto de impug-nação pela via recursal extraordinária ou, ainda que utilizada esta, o apelo extremo deixa, qualquer que tenha sido o motivo, de ter seguimento em virtude de ato decisório transitado em julgado.

A existência de fundamento constitucional inatacado revela-se bastante, só por si, para manter, em face de seu caráter autônomo e subordinante, a decisão proferida por Tri-bunal inferior.

- O acórdão do Superior Tribunal de Justiça somente legitimará o uso da via recursal extraordinária, se, nele, se desenhar, originariamente, a questão de direito constitucional. Surgindo esta, contudo, em sede jurisdicional inferior, a impugnação, por meio do recurso extraordinário, deverá ter por objeto a decisão emanada do Tribunal de segundo grau, pois terá sido este, e não o STJ, o órgão judiciário responsável pela resolução incidenter tantum da controvérsia de constitucionalidade. Precedentes.(AI 155.696-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)

Se não interposto recurso extraordinário contra o acórdão do Tribunal de Justiça, deu-se a preclusão das demais questões constitucionais, que não podem ser suscitadas, pela primeira vez, em recurso extraordinário ajuizado contra a decisão do Superior Tribunal de Justiça (...)(AI 256.572/GO, Rel. Min. MOREIRA ALVES.)

Em suma: assentando-se, o acórdão emanado de tribunal inferior, em duplo fundamento, e tendo em vista a plena autonomia e a inteira suficiência daquele de caráter infraconstitucional, mostra-se inadmissível o recurso extraor-dinário em tal contexto (Súmula 283/STF), eis que a decisão contra a qual se insurge o apelo extremo revela-se impregnada de condições suficientes para subsistir autonomamente, considerada, de um lado, a preclusão que se operou

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em relação ao fundamento de índole meramente legal e, de outro, a irreversibi-lidade que resulta dessa específica situação processual.

Sendo assim, tendo em consideração as razões expostas, nego provimento ao presente recurso de agravo, mantendo, em conseqüência, por seus próprios fundamentos, a decisão ora agravada.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

AI 501.661-AgR/RJ — Relator: Ministro Celso de Mello. Agravante: Petróleo Brasileiro S.A. – PETROBRAS (Advogados: Candido Ferreira da Cunha Lobo e outros). Agravado: Estado do Rio de Janeiro (Advogado: PGE/RJ – Roberto Duarte Butter).

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão a Ministra Ellen Gracie e os Ministros Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Subpro-curador-Geral da República, Dr. Wagner Gonçalves.

Brasília, 21 de março de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coorde-nador.

R.T.J. — 203 1299

AGRAVO REGIMENTAL NOAGRAVO DE INSTRUMENTO 502.333 — SP

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Agravante: Ricardo Sérgio de Olivera — Agravado: Josias Pereira de Souza

1. Recurso. Extraordinário. Inadmissibilidade. Interposição contra decisão interlocutória. Retenção nos autos. Reiteração. Falta. Pedido de processamento imediato. Decisão agravada. Reconsideração. Sendo o pedido de processamento imediato do recurso extraordinário, não deve ser inadmitido por falta de reiteração.

2. Recurso. Extraordinário. Interposição contra decisão interlocutória. Retenção nos autos. Processamento imediato. Inadmissibilidade. Dano irreparável. Inexistência. Precedentes. Agravo não provido. É inadmissível processamento imediato de recurso extraordinário retido na forma do art. 542, § 3º, do Có-digo de Processo Civil, quando manifesta a inviabilidade jurídica do mesmo extraordinário.

3. Recurso. Extraordinário. Inadmissibilidade. Alegação de ofensa ao art. 5º, LV, da Constituição Federal. Ofensa cons-titucional indireta. Decisão mantida. Agravo regimental não provido. Não cabe recurso extraordinário que tenha por objeto alegação de ofensa que, irradiando-se de má interpretação, apli-cação, ou, até, de inobservância de normas infraconstitucionais, seria apenas indireta à Constituição da República.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Eros Grau.

Brasília, 18 de setembro de 2007 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Trata-se de agravo interposto contra decisão do teor seguinte:

1. Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que, na instância de origem, não admitiu processamento de recurso extraordinário retido.

2. Inviável o agravo.

R.T.J. — 2031300

Dispõe o art. 542, § 3º, do CPP, com a redação dada pela Lei 9.756, de 17-12-98:“O recurso extraordinário, ou o recurso especial, quando interpostos contra

decisão interlocutória em processo de conhecimento, cautelar, ou embargos à execução ficará retido nos autos e somente será processado se o reiterar a parte, no prazo para a interposição do recurso contra a decisão final, ou para as contra-razões.”Escusaria, pois, observar que é pacífica a jurisprudência desta Corte, no sentido de não

admitir recurso extraordinário retido, sem reiteração (cf. RE 242.120/MA, Rel. Min. Sepúl-veda Pertence, DJ de 24-5-04; cf. RE 420.040/ES, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 19-5-04; AC 17/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 19-5-04).

3. Ante o exposto, nego seguimento ao agravo (art. 21, § 1º, do RISTF; art. 38 da Lei 8.038, de 28-5-90; e art. 557 do CPC).(Fl. 256.)

Insiste a parte agravante no provimento do agravo, sustentando que “não se quis discutir no agravo de instrumento a admissibilidade de recurso extraordi-nário retido sem reiteração. O que se pretendia com o agravo de instrumento, e ainda se pretende, era a reforma da decisão do Vice-Presidente do Tribunal Local que determinou a retenção do Recurso Extraordinário, de maneira que o apelo raro subisse imediatamente para a apreciação dessa Casa de Justiça”, e que “não há se falar aqui em reiteração, visto que o processo em Primeira Instância sequer foi sentenciado, não havendo até a presente data, portanto, recurso extraordinário contra decisão final (ou contra-razões), momento oportuno para a prática de tal ato (reiteração)” (fls. 263/264).

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. Não subsiste, deveras, o funda-mento da decisão agravada quanto à ausência de reiteração para admissão do recurso extraordinário. Mas nem por isso vinga o agravo de instrumento.

Com efeito, trata-se de agravo de instrumento contra decisão que indeferiu processamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e assim ementado:

Recurso – Agravo de instrumento – Indenização por danos morais – Interposição con-tra ato judicial que indeferiu a produção de prova testemunhal requerida pelo réu conforme o que dispõe disposto no art. 57, § 3º, da Lei 5.250/67 – Cabimento – Modificação implícita pela regra geral – Inteligência do art. 407 do Código de Processo Civil – Conflito existente entre a Lei de Imprensa e a Carta Magna concernente à ampla defesa – Aplicabilidade do princípio geral e não especial – Recurso provido.(Fl. 182.)

Sustenta o Recorrente, com base no art. 102, III, a, a ocorrência de violação ao disposto no art. 5º, LV, da Constituição Federal.

2. Admissível a via eleita.

Ao propósito, a Corte ainda não firmou posição definitiva, oscilando entre considerar adequada ora a reclamação, ora medida cautelar, e até o agravo de ins-trumento, para que a parte prejudicada com a retenção de recurso extraordinário,

R.T.J. — 203 1301

com apoio no art. 542, § 3º, do Código de Processo Civil, lhe obtenha o proces-samento imediato (Pet 2.460, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 11-10-01; AC 410, Rel. Min. Carlos Britto, DJ de 10-9-04; Rcl 2.510, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 21-5-04; AI 498.260, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 13-10-04; AI 406.983, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 9-5-03; AI 455.842, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 19-3-04).

Na trilha dos dois primeiros precedentes, que admitem a reclamação e a cautelar incidental, reputo admissível qualquer das três vias. Em primeiro lugar, porque, diante da incerteza da jurisprudência do Tribunal, não seria lícito preju-dicar a parte com eventual repulsa da via que, entre todas, se entenda imprópria. Em segundo lugar, porque a pretensão de que se cuida – o desbloqueio de recurso extraordinário contra decisão interlocutória, cujo julgamento compete à Corte – parece caber no raio de admissibilidade das três medidas processuais, que, para esse efeito, devem ter-se por fungíveis.

é que comporta agravo de instrumento para este Tribunal a decisão de inadmissibilidade de recurso de sua competência (art. 544, caput, do CPC; art. 313, inciso II, do RISTF). A ordem para que o extraordinário fique retido, nos termos do art. 542, § 3º, do CPC, não deixa de caracterizar juízo atinente à ad-missibilidade da impugnação, designadamente a seu aspecto temporal. Afinal, reter o recurso equivale a reputá-lo provisoriamente inadmissível, até que venha a ser reiterado pela parte a quem aproveite. Daí a propriedade do agravo de ins-trumento do art. 544 do CPC nas hipóteses em que se aponte indevida a retenção.

3. Mas é, no mérito, inconsistente.

O art. 542, § 3º, do CPC determina que os recursos extraordinário e es-pecial, interpostos contra decisão interlocutória em processo de conhecimento satisfativo (inclusive embargos à execução) ou cautelar, fiquem retidos nos autos até que, sobrevinda decisão final da causa, sejam porventura reiterados pela parte interessada no julgamento. Com isso, o dispositivo subverteu a regra geral de imediato processamento dos recursos ditos extraordinários (art. 543 do CPC), estipulando que, em certos casos, permaneçam retidos até eventual reiteração.

Nesse sentido, a Lei 9.756/98 pretendeu contribuir para o desafogo dos tribunais superiores, inibindo-lhes o acesso de recursos que, não tendo sido rei-terados pela parte no prazo e condições legais, acabam revelando-se pouco úteis ou sérios.1

é bem verdade que essa norma não pode ser lida de modo absoluto (cf. Pet 2.260, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 28-6-01; AI 345.244-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 2-6-03). Afinal, há casos em que sua incidência levaria a situações absurdas, causadoras de grave dano à parte ou à função jurisdicional, o que se lhe não ajusta à ratio iuris.

1 Cf. MOREIRA, José Carlos Barbosa. Reformas do CPC em matéria de recursos. In: Temas de direito processual. 8ª série. São Paulo: Saraiva. p. 147.

R.T.J. — 2031302

A norma do art. 542, § 3º, do CPC acode a hipóteses em que o julgamento ulterior do recurso permanecerá apto a produzir efeitos úteis à parte, ou seja, não exporá esta nem a função jurisdicional a prejuízo irremediável. Tal se dá, por exemplo, nos casos de decisões sobre admissibilidade de meio de prova, preli-minares, incidentes processuais, etc., onde, após o desenvolvimento do processo e ratificação do recurso, subsistirá sempre interesse jurídico no julgamento deste.

Na hipótese dos autos, o ora Agravante impugna decisão do Tribunal a quo que reformou a sentença indeferitória de produção de prova testemunhal requeri-da conforme o disposto no art. 57, § 3º, da Lei 5.250/67.

Cuida-se, portanto, de decisão que se acomoda plenamente à hipótese nor-mativa do art. 542, § 3º, do CPC. Vê-se que a decisão não expôs de forma alguma a parte nem a atividade jurisdicional a dano irreparável, já que a situação criada com o trancamento do extraordinário é de todo reversível.

Entendimento contrário esvaziaria o alcance da norma, pois não há sequer uma situação hipotética em que, provido ao depois o recurso contra decisão interlo-cutória que se reteve, não se produziria nenhuma alteração no contexto litigioso, nem se desconstituiria nenhum ato processual. A estender a leitura excepcional da regra do art. 542, § 3º, a casos como este, o resultado seria o aniquilamento do âmbito material de validade dessa mesma norma.

Ademais, o tema constitucional suscitado no recurso extraordinário não foi objeto de consideração no acórdão recorrido, faltando-lhe, assim, o requisito do prequestionamento, que deve ser explícito (Súmulas 282 e 356).

Ressalte-se, ainda, que o acórdão impugnado decidiu a causa com base só na interpretação da legislação infraconstitucional, de modo que eventual ofensa à Constituição Federal seria, aqui, apenas indireta. Ora, é pacífica a jurisprudência desta Corte, no sentido de não tolerar, em recurso extraordinário, alegação de ofensa que, irradiando-se de má interpretação, de aplicação ou, até, de inobser-vância de normas infraconstitucionais, seria apenas indireta à Constituição da República.

Por fim, suposta ofensa às garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa configuraria, aqui, ofensa meramente reflexa à Constituição da República, porque sua eventual caracterização dependeria de exame prévio de norma infraconstitucional, o que também é inadmissível, como já notou a Corte em caso análogo: “em regra, as alegações de desrespeito aos postulados da legalida-de, do devido processo legal, da motivação dos atos decisórios, do contraditório, dos limites da coisa julgada e da prestação jurisdicional podem configurar, quando muito, situações de ofensa meramente reflexa ao texto da Constituição, circuns-tância essa que impede a utilização do recurso extraordinário” (AI 372.358-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 11-6-02. Cf. ainda AI 360.265-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 20-9-02).

4. Posto isso, nego provimento ao agravo regimental.

R.T.J. — 203 1303

EXTRATO DA ATA

AI 502.333-AgR/SP — Relator: Ministro Cezar Peluso. Agravante: Ricardo Sérgio de Olivera (Advogados: Luiz Rodrigues Corvo e outros e Walker Orlovi-cin Cassiano Teixeira). Agravado: Josias Pereira de Souza (Advogados: Mônica Filgueiras da Silva Galvão e outros).

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Eros Grau.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega.

Brasília, 18 de setembro de 2007 — Carlos Alberto Cantanhede, Coor-denador.

R.T.J. — 2031304

AGRAVO REGIMENTAL NORECURSO EXTRAORDINÁRIO 503.452 — SP

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Agravante: Ford Motor Company Brasil Ltda. — Agravado: Arlindo Balbino

Recurso. Agravo. Regimental. Acidente de trabalho. Inde-nização. Competência. Decisão mantida. Agravo regimental não provido. É competente a Justiça do Trabalho para julgar ação de indenização decorrente de acidente do trabalho quando não há sentença de mérito na lide.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Eros Grau.

Brasília, 18 de setembro de 2007 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Trata-se de agravo regimental interposto con-tra decisão do teor seguinte:

1. Trata-se de recurso extraordinário contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, em sede de agravo de instrumento, reconheceu a competência da Justiça do Trabalho para ação de indenização por danos decorrentes de acidente de trabalho.

2. Inconsistente o recurso.Com efeito, em data recente, o Plenário da Corte, com voto declarado nosso, reviu

sua jurisprudência para assentar que, quaisquer que sejam os danos, “as ações de indenização propostas por empregado contra empregador, fundadas em acidente do trabalho, são da com-petência da Justiça do Trabalho” (CC 7.204, Rel. Min. Carlos Britto, cf. Informativo STF 394/05).

Na mesma oportunidade, ficou ainda decidido que “as ações que tramitam perante a Justiça comum dos Estados, com sentença de mérito anterior à promulgação da EC 45/04, lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente execução. Quanto àquelas cujo mérito ainda não foi apreciado, hão de ser remetidas à Justiça do Trabalho, no estado em que se en-contram, com total aproveitamento dos atos praticados até então.”

No caso, não existe sentença de mérito. Desse modo, o acórdão recorrido está de acor-do com a jurisprudência desta Corte.

3. Do exposto, nego seguimento ao recurso (art. 21, § 1º, do RISTF; art. 38 da Lei 8.038, de 28-5-90; e art. 557 do CPC).(Fl. 189.)

Insiste o Agravante em que: a) a sentença que decretou a extinção do pro-cesso sem julgamento de mérito acolheu transação extrajudicial realizada entre as partes e, desse modo, implica decisão de mérito que, publicada antes da vi-gência da EC 45/04, deve manter a competência jurisdicional da Justiça comum;

R.T.J. — 203 1305

b) há decisões divergentes nesta Corte relacionadas com o critério de aplicação do novo entendimento jurisprudencial aos processos em trâmite; e c) a vontade do legislador que deu origem à EC 45/04 foi de manter a competência da Justiça comum para processar e julgar a presente causa, quando retirou do texto da PEC 96/92 a expressão: “as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, de-correntes da relação de trabalho”.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. Inconsistente o recurso.

2. A decisão agravada invocou e resumiu os fundamentos do entendimento invariável da Corte, cujo teor subsiste invulnerável aos argumentos do recurso, os quais nada acrescentaram à compreensão e ao desate da quaestio iuris.

No tocante à sentença proferida pela Justiça estadual e publicada em 16-5-00, relata o próprio Agravante, nas razões do recurso extraordinário (fl. 149), ter sido extinto o processo, sem julgamento de mérito, por carência de ação, por falta de interesse de agir, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil:

Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: VI - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurí-

dica, a legitimidade das partes e o interesse processual;

Ademais, a notícia da reforma da sentença pelo Tribunal, em recurso de apelação, com reabertura da fase instrutória e conseqüente retorno dos autos ao Juízo de origem, confirma a ausência de análise do mérito em primeiro grau de jurisdição.

Alega ainda o Agravante que suposta transação extrajudicial entre as partes teria sido o motivo da extinção do feito, e, portanto, a sentença seria de mérito, na forma do disposto no art. 269, III, do CPC. Tal fato não encontra, nos autos, elementos capazes de o confirmar.

Aponta, também, o Agravante divergência entre decisões proferidas por esta Corte no que tange ao critério utilizado para a aplicação da orientação fir-mada no julgamento do CC 7.204 (Rel. Min. Carlos Britto, DJ de 9-12-05) aos processos em trâmite.

Naquela assentada ficou estabelecido como marco temporal da competên-cia da Justiça Trabalhista o advento da EC 45/04, bem como que a nova orienta-ção alcança os processos em curso na Justiça estadual, desde que sem julgamento de mérito.

Não obstante, há decisões que, pautadas na jurisprudência predominante à época da promulgação da emenda (v.g., RE 349.160, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, RTJ 188/740), mantiveram sob a competência da Justiça estadual ações propostas antes do seu advento, independentemente da existência de sen-tença de mérito.

Mas, hoje, é unânime a adoção do critério de deslocamento da competência estabelecido no CC 7.204, como se lê nas seguintes ementas:

R.T.J. — 2031306

Primeira Turma:

Recurso. Agravo. Regimental. Acidente de trabalho. Indenização. Competência. Deci-são mantida. Agravo regimental não provido. é competente a Justiça do Trabalho para julgar ação de indenização decorrente de acidente do trabalho quando não há sentença de mérito na lide.(AI 506.325-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 16-6-06.)

Constitucional. Ação de indenização por acidente de trabalho. Competência. Art. 114, VI, da CF/88, redação dada pela EC 45/04. Orientação firmada pelo STF no julgamento do CC 7.204/MG. Efeitos temporais.

I - O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o CC 7.204/MG, Rel. Min. Carlos Britto, decidiu que a competência para processar e julgar ação de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho é da Justiça do Trabalho. Precedentes.

II - A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça comum estadual, desde que pendentes de julgamento de mérito.

III - Agravo improvido.(RE 465.742-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ de 27-10-06.)

Competência. Justiça do Trabalho. Ação de indenização por danos resultantes de acidente do trabalho, proposta contra o empregador perante a Justiça estadual, que pendia de julgamento de mérito quando do advento da EC 45/04.

1. Ao julgar o CC 7.204, 29-6-05, Britto, Informativo STF 394, o Supremo Tribunal, revendo entendimento anterior, assentou a competência da Justiça do Trabalho para julgar as ações de indenização por danos, morais ou materiais, decorrentes de acidente de trabalho, ajuizadas após a EC 45/04.

2. A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça comum estadual, desde que pendentes de julgamento de mérito (v.g., AI 506.325-AgR, 23-5-06, Primeira Turma, Peluso; e RE 461.925-AgR, 4-4-06, Segunda Turma, Celso), o que ocorre na espécie.(RE 495.353-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda pertence, DJ de 25-5-07. No mesmo sentido: RE 502.607-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 25-5-07; RE 501.927-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 25-5-07; RE 501.285-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 25-5-07; RE 491.889-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 25-5-07; RE 501.128-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 25-5-07; e RE 505.485-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 25-5-07.)

Constitucional. Competência. Art. 114, inciso VI, da Constituição da República. Ação de indenização por acidente de trabalho. Agravo regimental desprovido. O Supremo Tribunal Federal decidiu, no julgamento do CC 7.204, que a competência para julgar as ações de in-denização por acidente de trabalho é da Justiça do Trabalho. Esse entendimento aplica-se aos processos em trâmite na Justiça comum nos quais ainda não tenha sido proferida sentença de mérito. Precedentes. Imposição de multa.(RE 516.170-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJ de 18-5-07. No mesmo sentido: RE 465.387-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJ de 7-12-06.)

Agravo regimental em recurso extraordinário. Constitucional. Competência em razão da matéria. Ação de indenização por acidente de trabalho, proposta contra o (ex-)empregador.

R.T.J. — 203 1307

Competência da Justiça especial. Ações em trâmite na Justiça comum dos Estados antes da EC 45/04. Prorrogação da competência, se já apreciado o mérito do pedido. Direito adqui-rido processual.

Compete à Justiça do Trabalho apreciar e julgar pedido de indenização por acidente de trabalho, deduzido contra o (ex-)empregador, nos termos da redação originária do art. 114 c/c o inciso I do art. 109 da Lei Maior.

As ações em trâmite na Justiça comum estadual e com sentença de mérito anterior à promulgação da EC 45/04 lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente execução. Quanto àquelas cujo mérito ainda não foi apreciado, devem ser remetidas à Justiça laboral, no Estado em que se encontram, com total aproveitamento dos atos já praticados. “Consideram-se de interesse público as disposições atinentes à competência em lides contenciosas; por este motivo, aplicam-se imediatamente; atingem as ações em curso. Excetuam-se os casos de haver pelo menos uma sentença concernente ao mérito; o veredictum firma o direito do Autor no sentido de prosseguir perante a Justiça que tomara, de início, conhecimento da causa.” (Carlos Maximiliano.)

Precedente plenário: CC 7.204. Outros precedentes: RE 461.925-AgR, RE 485.636-AgR, RE 486.966-AgR e RE 502.342-AgR. Agravo regimental desprovido.(RE 450.504-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Carlos Britto, DJ de 2-2-07.)

Segunda Turma:

Acidente do trabalho – Indenização por danos materiais e/ou morais – Ação ajuizada em face do empregador, com fundamento no direito comum – Superveniência da EC 45/04 – Competência da Justiça do Trabalho – Recurso improvido.

- Compete à Justiça do Trabalho, e não mais à Justiça dos Estados-membros e do Distrito Federal, o julgamento das ações de indenização por danos materiais e/ou morais resultantes de acidente do trabalho, desde que fundadas no direito comum e ajuizadas em face do empregador.

- Inocorrência, na espécie, da situação excepcional – prolação de sentença de mérito, pela Justiça estadual, em momento anterior ao marco temporal definido no julgamento plená-rio do CC 7.204/MG, Rel. Min. Carlos Britto (data da promulgação da EC 45/04) – que, pre-sente, justificaria o reconhecimento da competência do Poder Judiciário do Estado-membro para o processo e julgamento da causa acidentária. Conseqüente inaplicabilidade, ao caso, da ressalva feita no precedente referido.(RE 461.925-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 8-9-06.)

Agravo regimental no recurso extraordinário. Acidente do trabalho. Ação de indeniza-ção. Competência. Justiça do Trabalho Redação conferida pela EC 45/04. Efeitos temporais.

1. A Justiça do Trabalho é competente para julgar ação de indenização decorrente de acidente do trabalho. Precedentes.

2. A orientação alcança os processos em trâmite na Justiça comum, desde que penden-tes de julgamento de mérito.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.(RE 491.690-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, DJ de 2-2-07. No mesmo sentido: RE 507.861-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, DJ de 18-5-07.)

Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Ação de indenização. Acidente de trabalho. Competência. Justiça trabalhista. Precedente. 3. Efeitos temporais. Ação proposta em data anterior à EC 45/04. Ausência de julgamento de mérito.

Determinação da competência de acordo com os marcos temporais fixados no julga-mento do CC 7.204. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.(RE 477.710-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 8-9-06.)

R.T.J. — 2031308

Por fim, no que concerne à alegada intenção do legislador, que, com o projeto da emenda constitucional, teria pretendido atribuir à Justiça estadual o processo e julgamento das ações que versam sobre indenização por danos materiais e morais decorrentes de acidente do trabalho, sufrago o entendimento esposado na decisão do AI 401.337 (Rel. Min. Celso de Mello), que transcrevo na parte que interessa:

é preciso advertir, neste ponto, que a mens legislatoris representa fator secundário no processo hermenêutico, pois, neste, o que se mostra relevante é a indagação em torno da mens legis, vale dizer, a definição exegética do sentido que resulta, objetivamente, do texto da lei.

Ninguém ignora que a lei nada mais é do que a sua própria interpretação, consoante tem proclamado a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

“A interpretação do ordenamento positivo não se confunde com o processo de produção normativa.

- O ordenamento normativo nada mais é senão a sua própria interpretação, notadamente quando a exegese das leis e da Constituição emanar do Poder Judiciário, cujos pronunciamentos qualificam-se pela nota da definitividade.

A interpretação, qualquer que seja o método hermenêutico utilizado, tem por objetivo definir o sentido e esclarecer o alcance de determinado preceito inscrito no or-denamento positivo do Estado, não se confundindo, por isso mesmo, com o ato estatal de produção normativa. Em uma palavra: o exercício de interpretação da Constituição e dos textos legais – por caracterizar atividade típica dos Juízes e Tribunais – não importa em usurpação das atribuições normativas dos demais Poderes da República. Precedente.”(RE 258.088-AgR/SC, Rel. Min. Celso de Mello.)Daí a procedente advertência que Geraldo Ataliba faz em lapidar magistério (Revisão

Constitucional, in Revista de Informação Legislativa, vol. 110/87-90, 87):“Em primeiro lugar, o jurista sabe que a eventual intenção do legislador nada

vale (ou não vale nada) para a interpretação jurídica. A Constituição não é o que os constituintes quiseram fazer; é muito mais que isso: é o que eles fizeram. A lei é mais sábia que o legislador. Como pauta objetiva de comportamento, a lei é o que nela está escrito (e a Constituição é lei, a lei das leis, a lei máxima e suprema). Se um grupo maior ou menor de legisladores quis isto ou aquilo, é irrelevante, para fins de interpre-tação. Importa somente o que foi efetivamente feito pela maioria e que se traduziu na redação final do texto, entendido sistematicamente (no seu conjunto, como um todo solidário e incindível).

(...)(...) O que o jurista investiga é só a vontade da lei (...).”

(Grifei.)Em suma: a lei vale por aquilo que nela se contém e que decorre, objetivamente, do

discurso normativo nela consubstanciado, e não pelo que, no texto legal, pretendeu incluir o legislador, pois, em havendo divórcio entre o que estabelece o diploma legislativo (mens legis) e o que neste buscava instituir o seu autor (mens legislatoris), deve prevalecer a vontade objetiva da lei, perdendo em relevo, sob tal perspectiva, a indagação histórica em torno da intenção pessoal do legislador.

Esse entendimento – que proclama a prevalência da vontade objetiva da lei sobre a intenção do legislador – reflete-se em preciso magistério doutrinário, como resulta claro das lições de José de Oliveira Ascensão (O Direito: Introdução e Teoria Geral, p. 414, item n. 228, 2. ed., 2001, Renovar), de Carlos Maximiliano (Hermenêutica e Aplicação do Direito, p. 23/25, itens n. 32, 33 e 35, 19. ed., Forense) e de Pontes de Miranda (Comentários à Constituição de 1946, tomo VI/478-479, 3. ed., 1960, Borsoi), dentre outros.

Em igual sentido, firmou-se a jurisprudência dos Tribunais, como o evidenciam as seguintes decisões:

“(...) o que vale verificar é a mens legis e não a vontade, a mente do legislador, de que a lei se desprende para adquirir conteúdo próprio.

Nenhuma dúvida, por outro lado, em que a lei reside na parte do mandamento do legislador e não na em que se expõem considerações e motivações.

R.T.J. — 203 1309

Estas apenas valem, relativamente, para a inteligência da lei, do texto que encer-ra a ordem, a regra de conduta.

Valem apenas relativamente porque interpretar a lei não é indagar a vontade subjetiva do legislador, sendo o significado real e objetivo da norma (...)”(RE 2.010/DF, Rel. Min. Orozimbo Nonato – Grifei.)

“Na interpretação da lei prevalece a mens legis sobre a mens legislatoris.” (RT 305/964, Rel. Min. Aguiar Dias – Grifei.)

3. Do exposto, nego provimento ao agravo.

EXTRATO DA ATA

RE 503.452-AgR/SP — Relator: Ministro Cezar Peluso. Agravante: Ford Motor Company Brasil Ltda. (Advogados: Caio Antônio Ribas da Silva Prado e outros). Agravado: Arlindo Balbino (Advogados: José Gilberto Ducatti e outros).

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Eros Grau.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega.

Brasília, 18 de setembro de 2007 — Carlos Alberto Cantanhede, Coor-denador.

R.T.J. — 2031310

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 503.651 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello

Embargantes: zap Têxtil Industrial Ltda. e outros — Embargado: Municí-pio do Rio de Janeiro

Agravo de instrumento – Embargos de declaração, que, opostos pelas empresas contribuintes, foram recebidos como recurso de agravo – Não-conhecimento de tal recurso, por au-sência de interesse de recorrer, eis que inocorrente, quanto aos contribuintes, o estado de sucumbência – Pretendida imposição de multa – Descabimento – Inocorrência de comportamento abusivo – Recurso das empresas contribuintes não conhecido.

- O estado de sucumbência – que reflete situação de maior ou de menor lesividade gerada pela decisão judicial – qualifica-se como pressuposto recursal genérico e comum a todos os recursos, ordinários ou extraordinários, de tal modo que, inocorrendo qualquer gravame causado pelo ato decisório, deixa de existir o interesse de recorrer, cujo reconhecimento, para legitimar a inter-posição recursal, impõe a cumulativa satisfação, pela parte que recorre, dos requisitos da necessidade e da utilidade do recurso deduzido. Ausência, na espécie, do estado de sucumbência. Con-seqüente incognoscibilidade do recurso interposto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, não conhecer do recurso interposto, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste jul-gamento, o Ministro Cezar Peluso.

Brasília, 15 de agosto de 2006 — Celso de Mello, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: A decisão por mim proferida a fls. 253/255 negou provimento ao recurso de agravo de instrumento interposto pelo Muni-cípio do Rio de Janeiro/RJ, apoiando-se, para tanto, (a) na Súmula 668/STF (impossibilidade constitucional de instituição, antes da EC 29/00, de alíquotas progressivas para o IPTU), (b) na inconstitucionalidade da remuneração do serviço de iluminação pública mediante taxa (Súmula 670/STF) e, ainda, (c) na inviabi-lidade da criação e cobrança da taxa de coleta de lixo e limpeza pública.

Cabe-me assinalar que o ato decisório em questão tem por suporte legiti-mador inúmeros precedentes firmados pela jurisprudência desta Corte.

R.T.J. — 203 1311

As empresas contribuintes deduziram embargos de declaração (fls. 259/ 314), nos quais postularam a correção de erros de fato, o suprimento de omissão e a eliminação de contradição que sustentam existir na decisão em causa.

Sendo esse o contexto, submeto o recurso à apreciação desta Colenda Turma.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Trata-se de embargos de declara-ção tempestivamente opostos à decisão monocrática proferida a fls. 253/255.

Cumpre acentuar, preliminarmente, que o Supremo Tribunal Federal – embora sempre enfatizando que não cabem embargos declaratórios contra decisão singular proferida por Juiz desta Corte – tem conhecido desse recurso, quando deduzido, como recurso de agravo (RTJ 145/664 – RTJ 153/834 – AI 243.159-ED/DF, Rel. Min. NéRI DA SILVEIRA – AI 243.832-ED/MG, Rel. Min. MOREIRA ALVES, v.g.).

Sendo assim, e considerando a jurisprudência de ambas as Turmas desta Suprema Corte, conheço do presente recurso como recurso de agravo e, em conseqüência, assim passo a apreciá-lo.

E, ao fazê-lo, observo que a decisão de fls. 253/255 foi inteiramente favo-rável às empresas contribuintes, ora Recorrentes, pois o ato decisório em questão reconheceu, com apoio da Súmula 668/STF, a impossibilidade constitucional de instituição, antes da EC 29/00, de alíquotas progressivas para o IPTU, além de haver assinalado a inconstitucionalidade da taxa de iluminação pública (Sú-mula 670/STF) e da taxa de coleta de lixo e limpeza pública.

Com efeito, tal como assinalei na decisão mencionada, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em contexto normativo que precedeu a promul-gação da EC 29/00, e tendo presente a controvérsia pertinente à progressividade das alíquotas em tema de IPTU, firmou orientação que restou consubstanciada na Súmula 668 desta Corte, que possui o seguinte enunciado:

É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Cons-titucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana.(Grifei.)

Vê-se, portanto, que a progressividade constitucionalmente possível, em tema de IPTU, é apenas aquela que se reveste de caráter extrafiscal, achando-se vinculada, por isso mesmo, à concretização da função social da propriedade (RTJ 167/661, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RTJ 169/362, Rel. Min. ILMAR GALVÃO, v.g.).

Cabe referir que esse entendimento jurisprudencial encontra apoio em autorizado magistério doutrinário (RICARDO LOBO TORRES, “Curso de Direito Financeiro e Tributário”, p. 328, 2. ed., 1995, Renovar; MARCO AU-RéLIO GRECO, “Os Tributos Municipais”, “in” “A Constituição Brasileira de

R.T.J. — 2031312

1988 – Interpretações”, p. 332/337, 1988, Forense Universitária; BERNARDO RIBEIRO DE MORAES, “O IPTU e as Limitações do Legislador Municipal”, Repertório IOB de Jurisprudência 4/56-62, 1990; CELSO RIBEIRO BASTOS, “Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário”, p. 269/270, 1991, Saraiva; IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, “Comentários à Constitui-ção do Brasil”, vol. 6º, tomo I/548-552, 1990, Saraiva; AIRES FERNANDINO BARRETO, “Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU”, “in” “Curso de Direito Tributário”, vol. 2/299-303, 4. ed., 1995, Cejup, v.g.).

Ao proferir a decisão de que ora se recorre, também ressaltei, nela, a inconstitucionalidade da taxa de iluminação pública, salientando, então, no que concerne à cobrança de referida exação, que a controvérsia constitucional objeto do presente litígio já foi dirimida pelo Supremo Tribunal Federal, que, ao julgar causas semelhantes à que emerge do processo ora em análise, fixou entendimento no sentido de que, não se tratando de serviço público específico e divisível, torna-se inexigível a cobrança desse tributo (RTJ 182/755-756, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – AI 270.006/MS, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTEN-CE – AI 272.149/MS, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA – AI 288.527/MS, Rel. Min. NELSON JOBIM – AI 527.900/MG, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RE 228.029/RJ, Rel. Min. MOREIRA ALVES – RE 233.332/RJ, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – RE 278.945/RJ, Rel. Min. NéRI DA SILVEIRA, v.g.).

Acentuei, ainda, quando da prolação do mencionado ato decisório, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal formulou enunciado sumular que consubstancia esse entendimento (Súmula 670):

O serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa.(Grifei.)

Registrei, de outro lado, na decisão em causa – que desatendeu a preten-são recursal então deduzida pelo Município do Rio de Janeiro/RJ – que não se revelava igualmente acolhível tal postulação, no ponto em que o Município em questão sustentava, sem razão, a constitucionalidade da taxa de coleta de lixo e limpeza pública, pois o Supremo Tribunal Federal, ao pronunciar-se sobre esse específico aspecto da controvérsia, já assentara o entendimento de que a instituição dessa exação tributária mostra-se incompatível com o texto da Constituição da República (RTJ 192/336 – RTJ 193/790 – AI 449.535-AgR/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – RE 370.106-AgR/RJ, Rel. Min. EROS GRAU, v.g.):

Tratando-se de taxa vinculada não somente à coleta domiciliar de lixo, mas, também, à limpeza de logradouros públicos, que é serviço de caráter universal e indivisível, é de se reconhecer a inviabilidade de sua cobrança.

Precedente: RE 206.777. (...)(RE 256.588-ED-EDv/RJ, Rel. Min. ELLEN GRACIE – Grifei.)

As razões que venho de expor evidenciam a manifesta ausência do in-teresse de recorrer das empresas contribuintes em questão, pois – insista-se – a decisão de fls. 253/255 lhes foi inteiramente favorável, não se registrando, por isso mesmo, quanto a elas, o estado de sucumbência, necessário a legitimar, em

R.T.J. — 203 1313

cada caso, o interesse de recorrer, que se qualifica como um dos pressupostos recursais objetivos, cuja ausência torna insuscetível de cognição o recurso in-terposto pela parte que não sucumbiu.

Com efeito, o estado de sucumbência – que reflete situação de maior ou de menor lesividade gerada pela decisão judicial – qualifica-se como pressu-posto recursal genérico e comum a todos os recursos, ordinários ou extraordiná-rios, de tal modo que, inocorrendo qualquer gravame causado pelo ato decisó-rio, deixa de existir o interesse de recorrer, cujo reconhecimento, para legitimar a interposição recursal, impõe a cumulativa satisfação, pela parte que recorre, dos requisitos da necessidade e da utilidade do recurso deduzido.

Finalmente, não vejo como impor, ao Município do Rio de Janeiro/RJ e aos seus Procuradores, a sanção processual aplicável ao “improbus litigator”, eis que o ato de recorrer não traduz, só por isso, ilicitude de comportamento, nem revela conduta maliciosa por parte do Município, cujo ilustre representan-te judicial não agiu com intuito procrastinatório ou fraudulento, visando, antes, ao regular desempenho das atribuições legais que são inerentes ao seu cargo.

De qualquer maneira, cabe enfatizar que não se pode presumir o caráter malicioso, procrastinatório ou fraudulento da conduta processual da parte – espe-cialmente da parte pública – que recorre, valendo referir, no ponto, por oportuno, decisão desta Suprema Corte, consubstanciada em acórdão assim ementado:

(...) - A mera circunstância de os embargos de declaração haverem sido opostos com o objetivo de infringir o julgado não basta, só por si, para autorizar a formulação, contra a parte recorrente, de um juízo de desrespeito ao princípio da lealdade processual.

É que não se presume o caráter malicioso, procrastinatório ou fraudulento da condu-ta processual da parte que recorre, salvo se se demonstrar, quanto a ela, de modo inequívoco, que houve abuso do direito de recorrer. Comprovação inexistente na espécie.(RTJ 189/734, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)

A pretensão da parte ora recorrida, manifestada na petição de fls. 259/314, seria legítima, se o Município do Rio de Janeiro/RJ exercesse, irresponsavel-mente, o seu direito de recorrer, o que, a meu juízo – consideradas as razões precedentemente expostas – inocorre no caso ora em exame.

Sendo assim, pelas razões expostas, e considerando a evidente ausência, na espécie, do interesse de recorrer das empresas contribuintes, não conheço do recurso por elas deduzido.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

AI 503.651-ED/RJ — Relator: Ministro Celso de Mello. Embargantes: zap Têxtil Industrial Ltda. e outros (Advogados: Rômulo Cavalcante Mota e outros). Embargado: Município do Rio de Janeiro (Advogado: Heraldo Motta Pacca).

Decisão: A Turma, por votação unânime, não conheceu dos embargos de declaração, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste jul-gamento, o Ministro Cezar Peluso.

R.T.J. — 2031314

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo da Rocha Campos.

Brasília, 15 de agosto de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

R.T.J. — 203 1315

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 513.262 — SP

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Agravante: Banco Bozano Simonsen S.A. — Agravado: Paulo Alfredo Lombello

Recurso. Extraordinário. Dispositivo violado. Ausência. Tese constitucional. Ocorrência. Provimento. Possibilidade. De-cisão mantida. Agravo regimental improvido. É possível dar pro-vimento a recurso extraordinário, quando a tese constitucional é tratada na peça recursal, ainda que não haja indicação expressa do dispositivo constitucional violado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Eros Grau.

Brasília, 18 de setembro de 2007 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Trata-se de agravo regimental interposto con-tra decisão do teor seguinte:

Decisão: 1. Trata-se de agravo regimental oposto à decisão que não conheceu de agra-vo de instrumento por falta de procuração do advogado do Agravante.

Há essa procuração nos autos. Assim, passo ao exame do mérito.2. Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que, na instância de origem, in-

deferiu processamento de recurso extraordinário a acórdão do Tribunal Superior do Trabalho que julgou indevida a indenização de 40% sobre o FGTS da parte agravante, uma vez que, diante da aposentadoria espontânea, teria sido extinto o contrato de trabalho, conforme Orien-tação Jurisprudencial 177/SDI-I, daquela Corte.

3. Consistente o recurso.é que se assentou a jurisprudência da Corte no sentido de que, como a aposentadoria

espontânea pode, ou não, ser acompanhada de afastamento do empregado do trabalho, “a interpretação conferida pelo TST ao art. 453 da CLT viola a garantia constitucional contra a despedida arbitrária” (cf. RE 449.420, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Boletim Informativo 401, p. 4. No mesmo sentido, AI 570.250 e RE 451.480, Rel. Min. Sepúlveda Pertence).

4. Do exposto, atendo ao agravo regimental e reconsidero a decisão de fl. 57 e, valendo-me do disposto no art. 544, § 3º e § 4º, do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei 9.756/98 e pela Lei 8.950/94, acolho o agravo de instrumento para desde logo conhecer do recurso extraordinário e dar-lhe provimento, a fim de que, cassado o acórdão impugnado, o Tribunal rejulgue o recurso, sem a premissa de que a aposentadoria teria, auto-maticamente, extinguido o contrato de trabalho.(Fl. 60.)

R.T.J. — 2031316

Alega o Agravante ter havido violação ao princípio do contraditório, pela ausência de vista dos autos para defesa no primeiro agravo regimental. Aduz, ainda, que a decisão agravada deu provimento ao recurso extraordinário de forma equivocada, pois, além de não indicar o dispositivo constitucional que teria sido violado, tal dispositivo não constaria do recurso interposto pelo Agravado.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. Inconsistente o agravo.

Não há previsão legal que conceda à parte apresentação de defesa em agravo regimental. é da jurisprudência da Corte:

Agravo regimental no agravo de instrumento. Princípio da ampla defesa e do contra-ditório. Ofensa. Ausência. Servidor público. Militar. Adicional de insalubridade. Lei Com-plementar 432/85. Art. 40, § 4º, da CF. Inaplicabilidade. 1. O Código de Processo Civil não prevê a concessão de vista para que a parte interessada apresente contraminuta em eventual interposição de agravo regimental contra decisão monocrática do relator. Não-ofensa ao art. 5º, LV, da Constituição do Brasil. (...)

(AI 416.699-AgR/SP, Rel. Min. Eros Grau, Primeira Turma, DJ de 15-10-04.)

Ademais, ao negar seguimento ao recurso de revista, com fundamento na Orientação Jurisprudencial 17, da SBDI-I, o Tribunal Superior do Trabalho deci-diu, na verdade, com fundamento constitucional. é o que já decidiu esta Corte, no julgamento do AI 565.894-AgR/RS, Primeira Turma, DJ de 10-11-06, Relator para o acórdão o Ministro Sepúlveda Pertence. Consta do voto condutor: “Fui às referências da súmula aplicada do TST, entre as quais está o inciso I do art. 7º da Constituição. Entendi, então, que a matéria era constitucional. E depois, em diversos precedentes, firmamos que a aposentadoria voluntária não implica a cessação da relação de trabalho.”

Outrossim, ainda que o recurso extraordinário interposto pelo Agravado não tenha indicado expressamente o dispositivo constitucional violado – no caso, o art. 7º, I, da Carta Magna –, a tese constitucional foi tratada no recurso extraor-dinário. Foi invocada, inclusive, a interpretação do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 1.721, Relator o Ministro Carlos Britto, cuja decisão se fundamentou no referido inciso do art. 7º. No recurso extraordinário, alegou-se que “interpretar de forma distinta da que fora dada por nossa Corte Constitucio-nal, acabou o C. TST por violar os princípios insculpidos em nossa Constituição Federal no tocante ao direito do cidadão trabalhador em se aposentar sem qual-quer restrição”.

é situação diferente daquela em que, além de não haver indicação expres-sa do dispositivo violado, a petição de recurso extraordinário não trata da tese constitucional, circunstância que atrai a incidência da Súmula 284 desta Corte.

R.T.J. — 203 1317

Por fim, em data recente (11-10-06), o Plenário desta Corte, no julgamento da ADI 1.770 (Rel. Min. Joaquim Barbosa) e da ADI 1.721 (Rel. Min. Carlos Britto), declarou, por maioria, a inconstitucionalidade do § 1º e do § 2º do art. 453 da Consolidação das Leis do Trabalho (Informativo STF 444).

2. Nesses termos, nego provimento ao agravo.

EXTRATO DA ATA

AI 513.262-AgR-AgR/SP — Relator: Ministro Cezar Peluso. Agravante: Banco Bozano Simonsen S.A. (Advogados: José Alberto Couto Maciel e ou-tros). Agravado: Paulo Alfredo Lombello (Advogados: José Eymard Loguercio e outros).

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Eros Grau.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega.

Brasília, 18 de setembro de 2007 — Carlos Alberto Cantanhede, Coor-denador.

R.T.J. — 2031318

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 516.241 — RS

Relator: O Sr. Ministro Carlos Britto

Agravantes: Instituto Assistencial Sulbanco – IAS e outros — Agravado: Alcibiades Antunes Pereira

Agravo regimental. Acórdão que decidiu a controvérsia ex-clusivamente à luz da legislação infraconstitucional.

Caso em que ofensa à Carta da República, se existente, dar-se-ia de forma reflexa ou indireta, não ensejando a abertura da via extraordinária.

Incide, ademais, no caso, o óbice da Súmula 282 desta colenda Corte.

Agravo desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo regimental no agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 13 de junho de 2006 — Carlos Ayres Britto, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Trata-se de agravo regimental contra decisão que negou seguimento a agravo de instrumento, ao fundamento de que somente seria possível caracterizar ofensa à Magna Carta de forma reflexa ou indireta, bem como por incidir, no caso, o óbice da Súmula 282 desta colenda Corte.

2. Pois bem, os Agravantes reiteram a alegação de ofensa ao inciso XXX do art. 7º da Constituição Federal. Para tanto, sustentam que a matéria possui caráter constitucional e encontra-se devidamente prequestionada.

3. Havendo mantido a decisão agravada, submeto o presente recurso à apreciação da Turma.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto (Relator): Tenho que não assiste razão aos Agravantes.

R.T.J. — 203 1319

6. No caso, o Tribunal de Justiça do Estado Rio Grande do Sul deu provi-mento à apelação, em acórdão de cuja fundamentação se colhe, in verbis (fls. 55/56):

Procede o recurso. Com efeito, é assente nesta Corte que, havendo previsão nas disposições estatutárias, – das

associações de funcionários do antigo e extinto Banco Meridional, antecessor do réu, de com-plementação pela associação dos funcionários, se concedidas vantagens aos ativos, produz o mesmo efeito quanto aos inativos.

De modo que a relação jurídica entre as partes há de ser resolvida à luz das normas e da situação pactuada e vigente.

Dispõe o art. 10 do Regulamento do Departamento de Complementação de Aposenta-doria do Instituto Assistencial Sulbanco (fl. 86), in verbis:

“A complementação estabelecida neste regulamento será revista sempre que houver alteração da remuneração paga pelo Banco a seus funcionários, em virtude de lei, de dissídio coletivo ou de acordo inter-sindical, aplicando-se à soma de vantagens de aposentadoria paga pela Previdência Social e da complementação paga pelo D.C.A a mesma porcentagem de aumento, estabelecida para os funcionários, em atividade.”Assim, por força de previsão regular estatutária, os aposentados do Banco réu fazem

jus às diferenças de complementação de aposentadoria e diferenças salariais relativas a reajus-tes concedidos aos funcionários em atividade, de forma que o associado perceba, na inativida-de, o que perceberia se estivesse no serviço ativo do banco.

A matéria já está suficientemente discutida nesta Corte:Ementa.“Previdência Privada. Associação de Funcionários de Instituições Bancárias.

Aposentadoria. Complementação. Direito de os associados perceberem na inatividade o que perceberiam se estivessem no serviço ativo. O princípio a ser preservado e o da isonomia de tratamento entre funcionário em atividade aposentado, ao menos no aspec-to financeiro. Apelação desprovida. Ramo – Direito Civil – obrigações.

Assunto bancário. Aposentadoria. Proventos. - Complementação pela asso-ciação dos funcionários. Disposições estatutárias. - Vantagens concedidas aos ativos. Efeitos quanto aos inativos. - Associação dos Funcionários do Banco da Província do Rio Grande do Sul S.A. - Caixa de Auxílio dos Funcionários do Banco Nacional do Comércio Caciban Instituto Assistencial Sulbanco.”(Apelação Cível nº 597056084, TJRGS, Data 02.09.97, Sexta Câmara Cível, Rel. Des. Antônio Janyr Dall’Agnol Júnior)Portanto, é de se julgar procedente a ação, reconhecendo o direito de os associados per-

ceberem na inatividade o que perceberiam se estivessem no serviço ativo, conforme previsão estatutária da Ré.

7. Opostos embargos declaratórios, foram eles rejeitados, por não haver omissão, obscuridade ou contradição no acórdão atacado.

8. Muito bem. O decisum a quo entendeu que os ora Agravados fazem jus, na inatividade, ao que receberiam se ainda estivessem no serviço ativo. E o fez exclusivamente à luz do Regulamento do Departamento de Complementação de Aposentadoria do Instituto Assistencial Sulbanco. De se ver, portanto, que en-tendimento diverso do adotado pelo aresto impugnado exigiria, além da análise da legislação infraconstitucional pertinente, o reexame do mencionado regula-mento. Dessa forma, somente indiretamente, por via reflexa, é que se chegaria à violação constitucional sustentada, circunstância que inviabiliza o recurso ex-traordinário.

R.T.J. — 2031320

9. Acrescento que o aresto impugnado não tratou do dispositivo constitucio-nal (inciso XXX do art. 7º) tido por violado. Falta-lhe, portanto, o requisito do prequestionamento.

10. Com efeito, ao atribuir aos embargos declaratórios o condão de suprir a ausência de prequestionamento, a Súmula 356 desta colenda Corte pressupõe que a decisão embargada tenha sido omissa a respeito, não cabendo falar em omissão se a matéria não foi posta anteriormente ao exame do Tribunal a quo (RE 205.455, Rel. Min. Sepúlveda Pertence).

11. Observe-se que, “para haver prequestionamento das questões constitu-cionais invocadas no recurso extraordinário, e não ventiladas no acórdão recorrido, é preciso que este se haja omitido a apreciá-las – o que implica dizer que elas têm de ser levantadas no recurso ou nas contra-razões a ele –, e, portanto, os em-bargos de declaração se baseiam nessa omissão. Por isso não se prestam, para o prequestionamento, embargos de declaração em que originariamente sejam essas questões invocadas” (RE 119.352, Rel. Min. Moreira Alves). No mesmo sentido, os AI 311.129 e 265.938 e os RE 327.717-AgR, 268.553 e 264.966-AgR.

12. No presente caso, não lograram demonstrar os Recorrentes em que momento a matéria constitucional fora suscitada, a fim de que não se tenham por inovadores os embargos opostos.

13. Ante o exposto, meu voto é pelo desprovimento do agravo regimental.

EXTRATO DA ATA

AI 516.241-AgR/RS — Relator: Ministro Carlos Britto. Agravantes: Ins-tituto Assistencial Sulbanco – IAS e outros (Advogados: Eduardo Mariotti e outros). Agravado: Alcibiades Antunes Pereira (Advogados: Adalberto Libório Barros Filho e outros).

Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental no agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator. Unânime. Não participou, justifica-damente, deste julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco Aurélio, Cezar Peluso e Carlos Britto. Ausente, justificadamente, o Minis-tro Ricardo Lewandowski. Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 13 de junho de 2006 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 203 1321

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 533.565 — SP

Relator: O Sr. Ministro Carlos Britto

Agravantes: Administradora de Planos de Saúde e Odontológicos S/C Ltda. – AMESP e outros — Agravados: João Paulo Moreira da Silva e outros

Pretensão recursal que demandaria o exame de cláusulas do contrato de plano de saúde.

Caso em que ofensa à Carta da República, se existente, dar-se-ia de forma reflexa ou indireta, não ensejando a abertura da via extraordinária.

Incidência, no caso, das Súmulas 454 e 636 desta colenda Corte.

Agravo desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo regimental no agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 21 de fevereiro de 2006 — Carlos Ayres Britto, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Cuida-se de agravo regimental contra despacho que negou seguimento a agravo de instrumento, ao fundamento de que eventual ofensa à Magna Carta, se existente, dar-se-ia de forma claramente reflexa ou indireta, bem como por incidirem, no caso, as Súmulas 282, 454 e 636 desta colenda Corte.

2. Pois bem, os Agravantes reiteram as razões expendidas no apelo extremo e sustentam a inaplicabilidade dos óbices sumulares 282, 454 e 636 do STF.

3. Havendo mantido a decisão agravada, submeto o presente recurso à apreciação da Turma.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto (Relator): Tenho que não assiste razão aos Agravantes.

R.T.J. — 2031322

6. Com efeito, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou pro-vimento ao recurso, em acórdão de cuja fundamentação se colhe, in verbis (fls. 78/79):

A ação promovida contra as agravantes é de perdas e danos, tendo como causa de pedir a isquemia cerebral sofrida pela menor Fernanda, quando internada em unidade de terapia intensiva, não se fulcrando, pois, na interpretação do contrato de plano de saúde firmado entre elas e os agravados, donde não caber falar em ausência de correlação entre o serviço prestado e o valor pago pelos agravados para esse fim.

Mais a mais, deferida que foi a antecipação de tutela e não mera medida cautelar, a r. decisão agravada tem cunho evidentemente satisfativo, não se justificando, de qualquer sorte, a exigência de caução, até para não se inviabilizar a própria execução da providência antecipatória.

Dito isto, tenho que se impõe a manutenção do julgado.Como ponderou a douta Procuradoria, sendo a relação de consumo, a responsabilidade

das agravadas é objetiva, a teor do artigo 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor. No caso, não só os danos sofridos pela menor não são questionados, como é verossímil

a alegação de terem ocorrido na unidade de terapia intensiva do Hospital Jaraguá, onde se achava internada.

Em tais condições, necessitando ela de cuidados médico-hospitalares desde logo, era mesmo de rigor a antecipação de tutela, posto presentes os pressupostos do artigo 273 do Código de Processo Civil.

Ante o exposto, e também pelos fundamentos contidos no ilustrado parecer da douta Procuradoria, nego provimento ao recurso.

7. Pois bem, a concessão de tutela antecipada é questão que se restringe ao âmbito infraconstitucional, de forma que somente indiretamente, por via reflexa, é que se chegaria à violação constitucional sustentada, circunstância que inviabi-liza o recurso extraordinário.

8. Melhor sorte também não assiste aos Recorrentes quando alegam que “pretendiam os recorridos obter os serviços hospitalares de forma gratuita e além do que estipulava o contrato firmado entre eles e o que é pior, serviço sequer existentes e, tal pretensão foi deferida e mantida em sede de Tribunal, não restam dúvidas de que diversos princípios constitucionais foram violados” (sic, fl. 98). Ora, além de a discussão possuir contorno nitidamente infraconstitucional, ina-fastável seria o óbice sumular 454 desta Casa de Justiça.

9. Por fim, no tocante ao inciso II do art. 5º da Carta de Outubro, eventual violação, se existente, dar-se-ia de forma claramente reflexa ou indireta, não ensejando, assim, o cabimento do recurso extraordinário, a teor da Súmula 636 desta colenda Corte.

10. Com essas considerações, voto pelo desprovimento do presente agravo regimental.

EXTRATO DA ATA

AI 533.565-AgR/SP — Relator: Ministro Carlos Britto. Agravantes: Ad-ministradora de Planos de Saúde e Odontológicos S/C Ltda. – AMESP e outros (Advogados: Marilene Morelli Dario e outros). Agravados: João Paulo Moreira da Silva e outros (Advogados: Eliana Saad Castello Branco e outros).

R.T.J. — 203 1323

Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental no agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator. Unânime.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Minis-tros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo de Tarso Braz Lucas.

Brasília, 21 de fevereiro de 2006 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 2031324

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 556.121 — PB

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello

Agravante: Sistemas, Métodos e Processamento Eletrônico Ltda. – SIM-PLES — Agravada: IBM Brasil Leasing Arrendamento Mercantil S.A.

Agravo de instrumento – Conteúdo ilegível da autenticação mecânica lançada na petição de recurso extraordinário – Impos-sibilidade de aferição da tempestividade do apelo extremo – Re-curso de agravo improvido.

- Não se presume a tempestividade dos recursos em geral, pois incumbe, a quem recorre, o ônus processual de produzir, com base em dados oficiais inequívocos, elementos que demons-trem que a petição recursal foi efetivamente protocolada em tempo oportuno.

O conteúdo absolutamente ilegível dos elementos de or-dem temporal constantes da autenticação mecânica lançada na petição recursal, especialmente daquele que concerne à data de interposição do recurso extraordinário, impede a aferição da tempestividade do apelo extremo, equivalendo, por isso mesmo, para os fins a que alude a Súmula 288/STF, à própria ausência, no traslado, de dado objetivo relevante, imprescindível ao con-trole jurisdicional desse específico pressuposto recursal, cabendo enfatizar que a composição do traslado deve processar-se, neces-sariamente, perante o Tribunal a quo e não, tardiamente, perante o Supremo Tribunal Federal. Precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Gilmar Mendes.

Brasília, 7 de março de 2006 — Celso de Mello, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de recurso de agravo, tempestiva-mente interposto, contra decisão que não conheceu do agravo de instrumento deduzido pela parte ora recorrente.

Eis o teor da decisão, que, por mim proferida, sofreu a interposição do presente recurso de agravo:

R.T.J. — 203 1325

O recurso extraordinário deduzido pela parte agravante é insuscetível de conhecimen-to. É que a autenticação mecânica, lançada pelo Protocolo do Tribunal “a quo” na petição recursal, não permite – por ser totalmente ilegível a data dela constante – a aferição da tempestividade do ato de interposição do apelo extremo.

Na realidade, o conteúdo absolutamente ilegível da autenticação mecânica lançada na petição recursal – precisamente porque impede a segura aferição da tempestividade do recurso extraordinário, inviabilizando-a por completo – equivale à ausência desse dado de inquestionável relevância, circunstância esta que importa em descumprimento de ônus processual, que, em tema de formação do traslado, incumbe, exclusivamente, ao Agravante, consoante adverte a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

“A autenticação do protocolo na petição de interposição do recurso extraordi-nário deve ser legível para permitir a aferição da tempestividade do recurso.”(AI 229.960-AgR/DF, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA.)

“Agravo de instrumento. Para efeito de declaração da insuficiência do trasla-do, equivale, à falta de certidão, a existência daquela que se mostre ilegível.”(AI 201.348-AgR-ED/MG, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI.)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – CONTEÚDO ILEGÍVEL DA AUTENTI-CAÇÃO MECÂNICA LANÇADA NA PETIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁ-RIO – IMPOSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DA TEMPESTIVIDADE DO APELO EXTREMO – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.

- Não se presume a tempestividade dos recursos em geral, pois incumbe, a quem recorre, o ônus processual de produzir, com base em dados oficiais inequívocos, elementos que demonstrem que a petição recursal foi efetivamente protocolada em tempo oportuno.

O conteúdo absolutamente ilegível dos elementos de ordem temporal constan-tes da autenticação mecânica lançada na petição recursal, especialmente daquele que concerne à data de interposição do recurso extraordinário, impede a aferição da tempestividade do apelo extremo, equivalendo, por isso mesmo, para os fins a que alude a Súmula 288/STF, à própria ausência, no traslado, de dado objetivo relevante, imprescindível ao controle jurisdicional desse específico pressuposto recursal. Pre-cedentes.”(AI 345.188-AgR/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)Sendo assim, e pelas razões expostas, não conheço do presente agravo de instrumento.(...)

Ministro CELSO DE MELLORelator

Inconformada com esse ato decisório, a parte ora agravante interpõe o presente recurso, postulando o conhecimento e o provimento do recurso de agra-vo de instrumento que deduziu, em ordem a permitir o regular processamento do recurso extraordinário, obstado pela Presidência do Tribunal de origem (fls. 287/295).

Por não me convencer das razões expostas, submeto, à apreciação desta Colenda Turma, o presente recurso de agravo.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Não assiste razão à parte ora recorrente, eis que “o conteúdo absolutamente ilegível dos elementos de ordem temporal constantes da autenticação mecânica lançada na petição recursal,

R.T.J. — 2031326

especialmente daquele que concerne à data de interposição do recurso extra-ordinário, impede a aferição da tempestividade do apelo extremo, equivalendo, por isso mesmo, para os fins a que alude a Súmula 288/STF, à própria ausência, no traslado, de dado objetivo relevante, imprescindível ao controle jurisdicional desse específico pressuposto recursal” (AI 268.316-AgR/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO).

Torna-se relevante enfatizar, neste ponto, que, sem a indicação legível da data de interposição do recurso extraordinário, lançada pelo Protocolo do Tri-bunal “a quo” – que permita a efetiva constatação da tempestividade do apelo extremo –, revela-se inviável o próprio conhecimento do recurso extraordinário.

Registre-se, por necessário, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que a exigência formal de autentica-ção mecânica legível não pode ser substituída por declarações vazadas em termos genéricos, ainda que emanadas de agentes públicos:

A certidão exarada por serventuário de Justiça, atestando, genericamente, que o re-curso extraordinário foi interposto “tempestivamente” ou “dentro do prazo legal” – sem mi-nistrar elementos objetivos que permitam, ao Supremo Tribunal Federal (Tribunal ad quem), a aferição da tempestividade do apelo extremo – não atende a exigência fundada na jurispru-dência desta Suprema Corte, legitimando, em conseqüência, a aplicação da Súmula 288/STF.

O poder certificante dos serventuários de Justiça, não obstante o privilégio da fé pública que lhes é inerente, não tem o condão de substituir a atividade de controle jurisdi-cional sobre os pressupostos recursais, notadamente sobre aquele concernente ao requisito da tempestividade.

Tratando-se de recurso extraordinário, compete ao Supremo Tribunal Federal – e não ao Presidente do Tribunal de origem e nem ao Serventuário da Corte judiciária inferior – o reconhecimento definitivo sobre a tempestividade, ou não, desse meio excepcional de impug-nação recursal.(AI 207.769-AgR/SC, Rel. Min. CELSO DE MELLO.)

Vê-se, pois, que a pretensão recursal em causa revela-se inacolhível, eis que conflitante com a diretriz jurisprudencial firmada pelo Supremo Tribunal Federal na matéria ora em exame.

Sendo assim, tendo em consideração as razões expostas, nego provimento ao presente recurso de agravo, mantendo, em conseqüência, por seus próprios fundamentos, a decisão ora agravada.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

AI 556.121-AgR/PB — Relator: Ministro Celso de Mello. Agravante: Sistemas, Métodos e Processamento Eletrônico Ltda. – SIMPLES (Advogados: Francivaldo Moreno Praxedes e outros). Agravada: IBM Brasil Leasing Arrenda-mento Mercantil S.A. (Advogados: Arlindo Carolino Delgado e outros).

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Gilmar Mendes.

R.T.J. — 203 1327

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão a Ministra Ellen Gracie e o Ministro Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Gilmar Mendes. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner Gonçalves.

Brasília, 7 de março de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

R.T.J. — 2031328

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 584.155 — RS

Relator: O Sr. Ministro Carlos Britto

Agravante: Syngenta Proteção de Cultivos Ltda. (nova denominação social de Novartis Agribusiness Ltda.) — Agravados: KE Soja Comércio de Insumos e Máquinas Agrícolas Ltda. e outros

Agravo regimental em agravo de instrumento. Alegada au-sência de fundamentação do decisum a quo. Ofensa ao inciso IX do art. 93 da Magna Carta. Insubsistência.

A alegação de ofensa ao inciso IX do art. 93 da Lei das Leis não merece acolhida. Isso porque a decisão recorrida, em que pese haver dissentido dos interesses da parte agravante, está de-vidamente fundamentada.

Agravo desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo regimental no agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 20 de junho de 2006 — Carlos Ayres Britto, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Trata-se de agravo regimental contra despacho que negou seguimento a agravo de instrumento, por não se verificar, no caso, ausência de fundamentação.

2. Pois bem, a Agravante reitera a alegação de ofensa direta ao inciso IX do art. 93 da Constituição Federal.

3. Havendo mantido a decisão agravada, submeto o presente recurso à apreciação da Turma.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto (Relator): Tenho que não assiste razão à parte agravante. é que a controvérsia foi debatida, encontrando-se o acórdão devidamente fundamentado, embora em sentido contrário aos interesses da Re-corrente, o que não caracteriza a alegada violação ao inciso IX do art. 93 da Carta da República.

R.T.J. — 203 1329

6. Consoante já decidiu esta Turma (cf. RE 140.370, Rel. Min. Sepúlveda Pertence), “o que a Constituição exige, no art. 93, IX, é que a decisão judicial seja fundamentada, e não que a fundamentação seja correta, na solução das questões de fato ou de direito da lide: declinadas no julgado as premissas, corretamente assentadas ou não, mas coerentes com o dispositivo do acórdão, está satisfeita a exigência constitucional”. No mesmo sentido, o AI 177.283-AgR, Relator o Ministro Carlos Velloso.

7. Muito bem. A parte agravante insiste na alegação de ofensa ao inciso IX do art. 93 da Carta Magna. Para tanto, sustenta que o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul não desenvolvera funda-mentação própria. Acórdão cujos fundamentos consistiriam, tão-somente, na transcrição de precedentes daquela Corte em casos análogos.

8. Anoto que, em casos semelhantes, este excelso Tribunal entendeu não violar o inciso IX do art. 93 acórdão que adota, como razões de decidir, os fun-damentos expendidos em precedentes do Tribunal. A propósito, confiram-se os seguintes julgados:

A Constituição não exige que o juiz ou o Tribunal dê as razões de seu convencimento em decisão extensamente fundamentada. Não há dúvida de que se encontra suficientemente fundamentada a decisão que adota, como razões de decidir, os fundamentos de precedente do Tribunal, transcrevendo-o. Nesse sentido: AI 218.658-AgR/RS (DJ de 13-11-98), HC 77.583/PR (DJ de 18-9-98) e RE 179.557/SP (DJ de 13-2-98.)(RE 339.534, Rel. Min. Carlos Velloso.)

Ademais, este Tribunal entende que não existe nulidade de acórdão, por falta de fun-damentação, se ele se reportou ao parecer do Procurador-Geral de Justiça adotando-lhe os fundamentos.(HC 79.090, Rel. Min. Maurício Corrêa.)

Agravo regimental em agravo de instrumento. Alegação de ausência de fundamenta-ção. Improcedência. Matéria não prequestionada.

1. Tem-se por devidamente fundamentado o acórdão que adota as razões de decidir constantes da sentença. Precedentes.

2. Matéria constitucional não abordada no acórdão recorrido. Incidência da Súmula 282/STF.

Agravo regimental a que se nega provimento.(AI 292.823-AgR, Rel. Min. Maurício Corrêa.)

Não se pode dizer não embasado o acórdão que adota os fundamentos da sentença de primeira instância, incorporados como razão de decidir, e, por isso, a confirma. Ademais, a regra do art. 93, IX, da Constituição não permite que se declare anulável a decisão de segunda instância que confirma a da primeira, pelos seus fundamentos.(RE 179.557, Rel. Min. Ilmar Galvão.)

9. Ante o exposto, meu voto é pelo desprovimento do agravo regimental.

EXTRATO DA ATA

AI 584.155-AgR/RS — Relator: Ministro Carlos Britto. Agravante: Syngen-ta Proteção de Cultivos Ltda. (nova denominação social de Novartis Agribusiness

R.T.J. — 2031330

Ltda.) (Advogados: Osmar A. Maggioni e outros). Agravados: KE Soja Comércio de Insumos e Máquinas Agrícolas Ltda. e outros (Advogados: Sergio Holstak e outros).

Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental no agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator. Unânime. Não participou, justifica-damente, deste julgamento o Ministro Marco Aurélio.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Mi-nistros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Ricardo Lewandowski. Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Brasília, 20 de junho de 2006 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.

R.T.J. — 203 1331

AGRAVO REGIMENTAL NOAGRAVO DE INSTRUMENTO 584.745 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Agravante: Maria Tereza Martins de Faria — Agravados: Município do Rio de Janeiro e outros

Recurso. Agravo regimental. Interposição. Uso de fac-sí-mile. Original apresentado após o decurso do qüinqüídio subse-qüente ao termo do prazo recursal. Intempestividade. Caracte-rização. Recurso não conhecido. Aplicação do art. 2º, caput, da Lei 9.800/99. Precedentes. É intempestivo o recurso interposto mediante fac-símile, quando o original da petição seja entregue ou protocolado após o decurso do prazo adicional previsto no art. 2º, caput, da Lei 9.800/99.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segun-da Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, não conhecer do recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Eros Grau.

Brasília, 18 de setembro de 2007 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Trata-se de agravo regimental interposto con-tra decisão do teor seguinte:

Decisão: 1. Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que, na instância de ori-gem, indeferiu processamento de recurso extraordinário contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

Sustenta a Recorrente, com base no art. 102, III, a, ter havido violação ao disposto nos arts. 5º, XXXV, e 37, II, da Constituição Federal.

2. Inadmissível o recurso.é que o acórdão encontra fundamentação na legislação infraconstitucional, de modo

que eventual ofensa à Constituição seria, aqui, apenas, indireta. Ora, é pacífica a jurisprudência desta Corte, no sentido de não tolerar, em recurso

extraordinário, alegação de ofensa que, irradiando-se de má interpretação, aplicação, ou, até, de inobservância de normas infraconstitucionais, seria apenas indireta à Constituição da República, nem para reexame de provas a cuja luz decidiu o acórdão recorrido (Súmula 279), aplicando-se, ainda, quanto ao princípio da legalidade, a Súmula 636.

De igual modo, suposta ofensa às garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa configuraria, aqui, ofensa meramente reflexa à Constituição da República, porque sua eventual caracterização dependeria de exame prévio de norma infraconstitucional, o que também é inadmissível, como já notou a Corte em casos análogos: “em regra, as alegações de desrespeito aos postulados da legalidade, do devido processo legal, da motivação dos atos decisórios, do contraditório, dos limites da coisa julgada e da prestação jurisdicional podem

R.T.J. — 2031332

configurar, quando muito, situações de ofensa meramente reflexa ao texto da Constituição, circunstância essa que impede a utilização do recurso extraordinário” (AI 372.358-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 11-6-02. Cf. ainda AI 360.265-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 20-9-02).

3. Ante o exposto, nego seguimento ao agravo (art. 21, § 1º, do RISTF; art. 38 da Lei 8.038, de 28-5-90; e art. 557 do CPC).(Fls. 200-201.)

Insiste a Agravante no processamento do agravo de instrumento, pelas ra-zões expostas às fls. 212-218.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. Incognoscível o agravo.

A parte ora agravante apresentou, intempestivamente, o original da petição transmitida por fac-símile, infringindo a norma do art. 2º, caput, da Lei 9.800/99, que determina sejam os originais entregues em juízo até cinco dias da data do término do prazo para interposição do recurso:

A utilização de fac-símile, para a veiculação de petições recursais, não exonera a parte recorrente do dever de apresentar, dentro do prazo adicional a que alude a Lei 9.800/99 (art. 2º, caput), os originais que se referem às peças transmitidas por meio desse sistema, sob pena de não-conhecimento, por intempestividade, do recurso interposto mediante fax. Precedentes.(AI 299.089-AgR/MG, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, DJ de 9-3-01.)

Agravo regimental nos embargos de declaração no agravo regimental no recurso extraordinário. Lei 9.800/99. Fac-símile. Prazo adicional. Originais entregues extempora-neamente.

1. O prazo adicional de 5 dias, previsto na Lei 9.800/99, é contínuo e peremptório, ainda que o seu início não recaia em dia útil. Precedentes.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.(RE 456.666-AgR-ED-AgR, Rel Min. Eros Grau, Segunda Turma, DJ de 28-11-06.)

Segundo o disposto no art. 2º da lei especial, os originais devem ser entregues em cartório até cinco dias depois do vencimento dos prazos, sob pena de o ato reputar-se não realizado. Não se trata de novo prazo, cujo termo inicial fosse o último dia do prazo ordinário, mas mero alongamento deste. Conseqüentemente, não se aplica a essa hipótese a regra do art. 184, § 2º, do Código de Processo Civil: ainda quando o prazo ordinário tenha vencimento na véspera de um feriado, a contagem prosseguirá sem quebra de continuidade, incluindo-se esse dia sem expediente forense. O vencimento da prorrogação é no entanto regido pelo disposto no § 1º do art. 184, não ocorrendo nas hipóteses ali consideradas. (DINAMARCO, Candido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 87.)

2. Posto isso, não conheço do agravo.

Em face do trânsito em julgado certificado à fl. 203, nada resta a decidir.

Baixem os autos ao Tribunal de origem.

R.T.J. — 203 1333

EXTRATO DA ATA

AI 584.745-AgR/RJ — Relator: Ministro Cezar Peluso. Agravante: Maria Tereza Martins de Faria (Advogados: José Manuel Duarte Correia e outros). Agravados: Município do Rio de Janeiro e outros (Advogada: Roberta Gobert Torres).

Decisão: A Turma, por votação unânime, não conheceu do recurso de agra-vo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Eros Grau.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega.

Brasília, 18 de setembro de 2007 — Carlos Alberto Cantanhede, Coorde-nador.

R.T.J. — 2031334

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 589.281 — RJ

Relator: O Sr. Ministro Celso de MelloAgravante: Município do Rio de Janeiro — Agravados: Arno Oscar Markus

e outrosRecurso extraordinário interposto pelo Município do Rio

de Janeiro/RJ – Pleito recursal que busca a aplicação, no caso, da técnica da modulação dos efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade – Impossibilidade, pelo fato de o Supremo Tribunal Federal não haver proferido decisão de inconstitucio-nalidade pertinente ao ato estatal questionado – Julgamento da Suprema Corte que se limitou a formular, na espécie, mero juízo negativo de recepção – Não-recepção e inconstitucionalidade: noções conceituais que não se confundem – Recurso improvido.

1. Considerações sobre o valor do ato inconstitucional – Os diversos graus de invalidade do ato em conflito com a Constitui-ção: Ato inexistente? Ato nulo? Ato anulável (com eficácia ex tunc ou com eficácia ex nunc)? – Formulações teóricas – O status qua-estionis na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

2. Modulação temporal dos efeitos da decisão de inconstitu-cionalidade: técnica inaplicável quando se tratar de juízo negati-vo de recepção de atos pré-constitucionais.

- A declaração de inconstitucionalidade reveste-se, ordina-riamente, de eficácia ex tunc (RTJ 146/461-462 – RTJ 164/506-509), retroagindo ao momento em que editado o ato estatal reco-nhecido inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

- O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido, excepcio-nalmente, a possibilidade de proceder à modulação ou limitação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, mesmo quando proferida, por esta Corte, em sede de controle difuso. Precedente: RE 197.917/SP, Relator o Ministro Maurício Corrêa (Pleno).

- Revela-se inaplicável, no entanto, a teoria da limitação temporal dos efeitos, se e quando o Supremo Tribunal Federal, ao julgar determinada causa, nesta formular juízo negativo de recepção, por entender que certa lei pré-constitucional mostra-se materialmente incompatível com normas constitucionais a ela supervenientes.

- A não-recepção de ato estatal pré-constitucional, por não implicar a declaração de sua inconstitucionalidade – mas o reco-nhecimento de sua pura e simples revogação (RTJ 143/355 – RTJ 145/339) –, descaracteriza um dos pressupostos indispensáveis à

R.T.J. — 203 1335

utilização da técnica da modulação temporal, que supõe, para in-cidir, dentre outros elementos, a necessária existência de um juízo de inconstitucionalidade.

- Inaplicabilidade, ao caso em exame, da técnica da modula-ção dos efeitos, por tratar-se de diploma legislativo, que, editado em 1984, não foi recepcionado, no ponto concernente à norma questionada, pelo vigente ordenamento constitucional.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste jul-gamento, os Ministros Gilmar Mendes e Cezar Peluso.

Brasília, 5 de setembro de 2006 — Celso de Mello, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Celso de Mello: A decisão por mim proferida às fls. 511/513 negou provimento ao agravo de instrumento deduzido pelo Município do Rio de Janeiro, apoiando-se, para tanto, (a) na Súmula 668/STF (impossibilidade constitucional de instituição, antes da EC 29/00, de alíquotas progressivas para o IPTU), (b) na inconstitucionalidade da remuneração do serviço de iluminação pública mediante taxa (Súmula 670/STF) e, ainda, (c) na inviabilidade da cria-ção e cobrança da taxa de coleta de lixo e limpeza pública.

Cabe-me assinalar que o ato decisório em questão tem por suporte legiti-mador inúmeros precedentes firmados pela jurisprudência desta Corte.

O Município do Rio de Janeiro/RJ, no entanto, inconformado com essa decisão, interpôs recurso de agravo (fls. 523/532).

Sendo esse o contexto, submeto, à apreciação desta Colenda Turma, o presente recurso de agravo.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Não assiste razão ao Município do Rio de Janeiro/RJ, eis que se revela inviável o pleito por ele deduzido, que objetiva sejam conferidos efeitos “ex nunc” à declaração de inconstituciona-lidade que teria resultado – segundo sustenta – do acórdão confirmado nesta sede recursal.

O exame da postulação recursal em questão impõe algumas considerações prévias que se mostram essenciais à exata compreensão do tema – modulação temporal dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade – que o Município do Rio de Janeiro/RJ suscitou nesta sede processual.

R.T.J. — 2031336

Sabemos – como tive o ensejo de salientar em decisão proferida na ADI 2.215-MC/PE, Relator o Ministro CELSO DE MELLO (Informativo/STF 224/01) – que a supremacia da ordem constitucional traduz princípio essen-cial que deriva, em nosso sistema de direito positivo, do caráter eminentemente rígido de que se revestem as normas inscritas no estatuto fundamental.

Essa posição de eminência da Lei Fundamental – que tem o condão de desqualificar, no plano jurídico, o ato em situação de conflito hierárquico com o texto da Constituição – estimula reflexões teóricas em torno da natureza do ato inconstitucional, daí decorrendo a possibilidade de reconhecimento, ou da inexistência, ou da nulidade, ou da anulabilidade (com eficácia “ex nunc” ou com eficácia “ex tunc”), ou, ainda, da ineficácia do comportamento estatal incompatível com a Constituição.

Tal diversidade de opiniões, Srs. Ministros, nada mais reflete senão vi-sões doutrinárias que identificam, no desvalor do ato inconstitucional, “vários graus de invalidade” (MARCELO REBELO DE SOUSA, “O Valor Jurídico do Acto Inconstitucional”, vol. I/77, 1988, Lisboa).

As várias concepções teóricas existentes sobre o tema – como destaca autorizado magistério doutrinário (CARLOS ROBERTO DE SIQUEIRA CASTRO, “Da Declaração de Inconstitucionalidade e seus Efeitos”, “in” Revista Forense, vol. 335/17-44; MARCELO NEVES, “Teoria da Inconsti-tucionalidade das Leis”, p. 68/85, 1988, Saraiva; JOSÉ AFONSO DA SILVA, “Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 54/58, item n. 15, 15. ed., 1998, Malheiros) – permitem a formulação de teses que buscam definir a real natu-reza dos atos incompatíveis com o texto da Constituição, qualificando-os, em função de abordagens diferenciadas, como manifestações estatais tipificadas pela nota da inexistência (FRANCISCO CAMPOS, “Direito Constitucional”, vol. I/430, 1956, Freitas Bastos), ou pelo vício da nulidade (ALEXANDRE DE MORAES, “Direito Constitucional”, p. 599/602, 9. ed., 2001, Atlas; OSWAL-DO LUIZ PALÚ, “Controle de Constitucionalidade”, p. 75/76, 1999, RT), ou, ainda, pelo defeito da anulabilidade (REGINA MARIA MACEDO NERY FERRARI, “Efeitos da Declaração de Inconstitucionalidade”, p. 181/183, 2. ed., 1990, RT; JOÃO LEITÃO DE ABREU, “A Validade da Ordem Jurídi-ca”, p. 156/165, item n. 11, 1964, Globo).

Cumpre enfatizar, por necessário, que, não obstante essa pluralidade de visões teóricas, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal – apoiando-se na doutrina clássica (ALFREDO BUZAID, “Da Ação Direta de Declaração de Inconstitucionalidade no Direito Brasileiro”, p. 132, item n. 60, 1958, Saraiva; RUY BARBOSA, “Comentários à Constituição Federal Brasileira”, vol. IV/135 e 159, coligidos por Homero Pires, 1933, Saraiva; ALEXANDRE DE MORAES, “Jurisdição Constitucional e Tribunais Constitucionais”, p. 270, item n. 6.2.1, 2000, Atlas; ELIVAL DA SILVA RAMOS, “A Inconstitucio-nalidade das Leis”, p. 119 e 245, itens n. 28 e 56, 1994, Saraiva; OSWALDO ARANHA BANDEIRA DE MELLO, “A Teoria das Constituições Rígidas”, p. 204/205, 2. ed., 1980, Bushatsky) – ainda considera revestir-se de nulidade a manifestação do Poder Público em situação de conflito com a Carta Política (RTJ 87/758 – RTJ 89/367 – RTJ 146/461 – RTJ 164/506, 509).

R.T.J. — 203 1337

Impõe-se reconhecer, no entanto, que se registra, no magistério jurispru-dencial desta Corte, e no que concerne a determinadas situações (como aque-las fundadas na autoridade da coisa julgada ou apoiadas na necessidade de fazer preservar a segurança jurídica, em atenção ao princípio da boa-fé), uma tendên-cia claramente perceptível no sentido de abrandar a rigidez dogmática da tese que proclama a nulidade radical dos atos estatais incompatíveis com o texto da Constituição da República (RTJ 55/744 – RTJ 71/570 – RTJ 82/791, 795):

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. EFEITOS DA DECLARAÇÃO DE INCONSTI-TUCIONALIDADE EM TESE PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ALEGAÇÃO DE DIREITO ADQUIRIDO.

Acórdão que prestigiou lei estadual à revelia da declaração de inconstitucionalidade desta última pelo Supremo. Subsistência de pagamento de gratificação mesmo após a deci-são erga omnes da Corte. Jurisprudência do STF no sentido de que a retribuição declarada inconstitucional não é de ser devolvida no período de validade inquestionada da lei de origem – mas tampouco paga após a declaração de inconstitucionalidade.

Recurso extraordinário provido em parte.(RE 122.202/MG, Rel. Min. FRANCISCO REZEK, DJU de 8-4-94 – Grifei.)

Mostra-se inquestionável, no entanto, a despeito das críticas doutri-nárias que lhe têm sido feitas (CELSO RIBEIRO BASTOS, “Comentários à Constituição do Brasil”, 4º vol., tomo III/87-89, 1997, Saraiva; CARLOS ALBERTO LÚCIO BITTENCOURT, “O Controle Jurisdicional da Constitu-cionalidade das Leis”, p. 147, 2. ed., Ministério da Justiça, 1997, reimpressão fac-similar, v.g.), que o Supremo Tribunal Federal vem adotando posição ju-risprudencial, que, ao estender a teoria da nulidade aos atos inconstitucionais, culmina por recusar-lhes qualquer carga de eficácia jurídica.

Embora o “status quaestionis” esteja assim delineado no Supremo Tribu-nal Federal (ADI 2.215-MC/PE, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Informativo/STF 224/01), não há dúvida de que o relevo dessa matéria impõe novas refle-xões sobre o tema (MÁRCIO AUGUSTO DE VASCONCELOS DINIZ, “Con-trole de Constitucionalidade e Teoria da Recepção”, p. 43, 1995, Malheiros; INOCÊNCIO MÁRTIRES COELHO, “Constitucionalidade/Inconstituciona-lidade: Uma Questão Política?”, “in” RDA 221/47-69, 64-66, item n. 4), espe-cialmente se se tiver em consideração a experiência constitucional de outros países, cujas Leis Fundamentais – como ocorre em Portugal (art. 282, n. 4, na redação dada pela 4ª Revisão/97), na Espanha (art. 164) e na Itália (art. 136), p. ex. – dispõem sobre a amplitude e o regime jurídico inerentes aos efeitos que resultam da declaração de inconstitucionalidade.

Essa nova percepção do tema, Srs. Ministros, reflete, de certa maneira, nítida influência decorrente da prática jurisprudencial do Tribunal Constitu-cional Federal germânico, como ressalta PAULO BONAVIDES (“Curso de Direito Constitucional”, p. 308, item n. 9, 10. ed., 2000, Malheiros), cujo au-torizado magistério sustenta a necessidade de criar-se, no plano do controle de constitucionalidade dos atos estatais, “um espaço de tempo, intermediário, que assegure a sobrevivência provisória da lei declarada incompatível com a Constituição”.

R.T.J. — 2031338

É certo que, no sistema normativo brasileiro, com a edição da Lei 9.868/99 (art. 27), introduziu-se inovação claramente inspirada nos modelos constitucionais positivados no direito português e no direito alemão.

Impõe-se registrar, no entanto, que o art. 27 da Lei 9.868/99 – que intro-duziu, em nosso sistema de direito positivo, a técnica da manipulação tempo-ral dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade – é objeto de impugnação em sede de ação direta promovida, respectivamente, perante o Supremo Tribunal Federal, pela Confederação Nacional das Profissões Liberais (ADI 2.154/DF, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE) e pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (ADI 2.258/DF, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE), sob a alegação de que a matéria versada em tal preceito normativo está sujeita à reserva de Constituição, não podendo, por isso mesmo, segundo sustentam os autores de referidos processos, ser disciplinada pelo legislador comum.

Cabe observar, por oportuno, consoante acentua o magistério da doutrina (OCTAVIO CAMPOS FISCHER, “Os Efeitos da Declaração de Inconstitucio-nalidade no Direito Tributário Brasileiro”, 2004, Renovar, v.g.), que o tema concernente à possibilidade de modulação temporal dos efeitos da declara-ção de inconstitucionalidade tem provocado ampla controvérsia doutrinária.

Existem, de um lado, autores – como LUCIANA DE ASSUNÇÃO MA-CIEIRA (“A Inconstitucionalidade do art. 27 da Lei nº 9.868/99 quanto ao regulamento processual dos efeitos do provimento final em sede de controle abstrato”, “in” Revista da ESMAPE, vol. 6, N-13, jan/jun/01, p. 291/309), OLAVO ALVES FERREIRA (“Controle de Constitucionalidade e seus Efei-tos”, p. 93/98, item n. 3.5.3, 2003, Editora Método) e INGO WOLFGANG SARLET (“Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental: Alguns Aspectos Controversos”, “in” “Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental: Análises à Luz da Lei nº 9.882/99”, p. 150/171, 164/165, 2001, Atlas) – que sustentam a inconstitucionalidade do art. 27 da Lei 9.868/99, não admitindo, em qualquer hipótese, a utilização da técnica da modulação (ou da manipulação) dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade emanada do Supremo Tribunal Federal, quer se trate de fiscalização abstrata, quer se cuide de controle meramente incidental de constitucionalidade.

Há, também, aqueles – como RONALDO REDENSCHI (“Eficácia ex nunc da Declaração de Inconstitucionalidade em Via Direta – Modifica-ções trazidas pelo artigo 27 da Lei nº 9.868/99 – Relações com o método da ponderação de bens”, “in” “Temas de Interpretação do Direito Tributá-rio”, p. 369/418, 2003, Renovar), CARLOS ROBERTO SIQUEIRA CASTRO (“Da Declaração de Inconstitucionalidade e seus Efeitos em Face das Leis nºs 9.868/99 e 9.882/99”, “in” “O Controle de Constitucionalidade e a Lei 9.868/99”, p. 39/99, 2001, Lumen Juris), OSWALDO LUIZ PALU (“Controle de Constitucionalidade – Conceitos, Sistemas e Efeitos”, p. 162/180, itens n. 9.3, 9.3.1, 9.3.2, 2. ed., RT), WALTER CLAUDIUS ROTHENBURG (“Velhos e Novos Rumos das Ações de Controle Abstrato de Constitucionalidade à Luz da Lei nº 9.868/99”, “in” “O Controle de Constitucionalidade e a Lei 9.868/99”, p. 282/285, item n. 3.6, 2001, Lumen Juris), ALEXANDRE SANTOS DE ARA-GÃO (“O Controle da Constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal à

R.T.J. — 203 1339

Luz da Teoria dos Poderes Neutrais”, “in” Revista Forense, vol. 373, p. 24/27, item IV, maio-junho de 2004), LUÍS ROBERTO BARROSO (“O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro”, p. 160/165, item n. 5.4, 2004, Saraiva) e LENIO LUIZ STRECK (“Jurisdição Constitucional e Hermenêu-tica”, p. 693/698, 697, item n. 11.6, 2. ed., 2004, Forense) – cujo magistério reconhece a possibilidade jurídica de aplicação da técnica da modulação temporal dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade, desde que se restrin-ja ao plano do controle abstrato.

Registra-se, ainda, uma terceira posição doutrinária, cuja percepção do tema – tal como exposta por JÚLIO CÉSAR ROSSI (“A Reforma do Judi-ciário e suas Implicações nos Modelos Concentrado e Difuso de Controle de Constitucionalidade”, “in” Revista Dialética de Direito Processual, 31, outu-bro-2005, p. 51/71), RUI MEDEIROS (“A Decisão de Inconstitucionalidade”, p. 743, 1999, Universidade Católica Editora) e GILMAR FERREIRA MENDES (“Jurisdição Constitucional”, p. 365/368, item n. 6.2.2, 4. ed., 2004, Saraiva), dentre outros – admite ser viável o emprego da manipulação (ou modulação), no tempo, dos efeitos jurídicos resultantes da declaração de inconstitucionali-dade proferida pela Suprema Corte, não importando que tal pronunciamento se dê no âmbito da fiscalização concentrada ou no plano do controle meramente incidental de constitucionalidade.

Assentadas tais premissas, cabe assinalar que não se revela acolhível a postulação recursal ora deduzida pelo Município do Rio de Janeiro/RJ, que pleiteia, desta Suprema Corte, a outorga de eficácia prospectiva à decisão que proclamou, no caso ora em exame, em juízo negativo de recepção, a incom-patibilidade material da norma legal editada em 1984, contestada em face de ordenamento constitucional superveniente (a Constituição de 1988).

A razão desse entendimento, Srs. Ministros, apóia-se no fato de que a modulação temporal supõe, para incidir, a necessária existência de um juízo de inconstitucionalidade, inocorrente no caso, por se cuidar de ato pré-constitucional (anterior, portanto, à promulgação da vigente Constituição) e que deixou de ser recepcionado pela nova Carta Política, por ser, com esta, materialmente incompatível.

Com a formulação de um juízo negativo de recepção – inconfundível, em seus aspectos básicos (pressupostos e conseqüências), com a declaração de in-constitucionalidade –, torna-se inaplicável, por tal específico motivo, a técnica da modulação temporal, consoante já se pronunciou, no tema, esta Suprema Corte:

IPTU: progressividade: Lei 691/84 do Município do Rio de Janeiro: não-recebimento pela nova ordem constitucional (CF/1988), conforme entendimento do STF firmado a partir do julgamento do RE 153.771, Pleno, 20-11-96, Moreira Alves, que surte efeitos a partir da promulgação da Constituição Federal.(RE 370.734-AgR/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – Grifei.)

1. IPTU: progressividade: Lei 691/84 do Município do Rio de Janeiro.(...)

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No caso – norma municipal anterior à Constituição de 1988 – não houve declaração de inconstitucionalidade, mas declaração de que a mesma não foi recebida pela nova ordem constitucional, que surte efeitos a partir da promulgação da Constituição Federal. (...)(AI 482.017-AgR/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – Grifei.)

2. Norma municipal anterior à Constituição de 1988. Não houve declaração de inconstitucionalidade, mas declaração de que a mesma não foi recebida pela nova ordem constitucional, que surte efeitos a partir da promulgação da Constituição de 1988.

Embargos de declaração acolhidos apenas para prestar esclarecimentos.(AI 478.398-ED-AgR/RJ, Rel. Min. EROS GRAU – Grifei.)

É que, em tal situação, por tratar-se de lei pré-constitucional (porque anterior à Constituição de 1988), o único juízo admissível, quanto a ela, con-siste em reconhecer-lhe, ou não, a compatibilidade material com a ordem constitucional superveniente, resumindo-se, desse modo, a solução da con-trovérsia, à formulação de um juízo de mera revogação (em caso de conflito hierárquico com a nova Constituição) ou de recepção (na hipótese de confor-midade material com a Carta Política).

Esse entendimento nada mais reflete senão orientação jurisprudencial consagrada nesta Suprema Corte, no sentido de que a incompatibilidade vertical de atos estatais examinados em face da superveniência de um novo ordenamento constitucional “traduz hipótese de pura e simples revogação dessas espécies jurídicas, posto que lhe são hierarquicamente inferiores” (RTJ 145/339, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RTJ 169/763, Rel. Min. PAULO BROSSARD, v.g.).

Vê-se, portanto, na linha de iterativa jurisprudência prevalecente nes-ta Suprema Corte e em outros Tribunais (RTJ 82/44 – RTJ 99/544 – RTJ 124/415 – RTJ 135/32 – RT 179/922 – RT 208/197 – RT 231/665, v.g.), que a incompatibilidade entre uma lei anterior (como a norma ora questionada inscrita na Lei 691/84 do Município do Rio de Janeiro/RJ, p. ex.) e uma Consti-tuição posterior (como a Constituição de 1988) resolve-se pela constatação de que se registrou, em tal situação, revogação pura e simples da espécie normati-va hierarquicamente inferior (o ato legislativo, no caso), não se verificando, por isso mesmo, hipótese de inconstitucionalidade (RTJ 145/339 – RTJ 169/763).

Isso significa que a discussão em torno da incidência, ou não, do postulado da recepção – precisamente por não envolver qualquer juízo de inconstitucio-nalidade (mas, sim, quando for o caso, o de simples revogação de diploma pré-constitucional) – dispensa, por tal motivo, a aplicação do princípio da reserva de Plenário (CF, art. 97), legitimando, por isso mesmo, a possibilidade de reconhecimento, por órgão fracionário do Tribunal, de que determinado ato estatal não foi recebido pela nova ordem constitucional (RTJ 191/329-330), além de inviabilizar, porque incabível, a instauração do processo de fiscalização normativa abstrata (RTJ 95/980 – RTJ 95/993 – RTJ 99/544 – RTJ 143/355 – RTJ 145/339, v.g.).

Sob a perspectiva que se vem de examinar, portanto, revela-se inad-missível a adoção da doutrina da prospectividade, tal como pretendido pelo

R.T.J. — 203 1341

Município do Rio de Janeiro/RJ, eis que essa diretriz teórica supõe, para efeito de sua aplicabilidade, a necessária formulação de um juízo prévio de incons-titucionalidade, inocorrente na espécie, pois – insista-se – a norma em questão foi editada em momento anterior (1984) ao da vigência da Constituição de 1988, o que significa que a decisão que pronunciou esse juízo negativo de recepção somente “surte efeitos a partir da promulgação da Constituição Fe-deral” (AI 482.017-AgR/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – Grifei).

Concluo o meu voto, Srs. Ministros, assim resumindo os aspectos que lhe são essenciais:

(a) a declaração de inconstitucionalidade reveste-se, ordinariamente, de eficácia “ex tunc” (RTJ 146/461-462 – RTJ 164/506-509), retroagindo ao momento em que editado o ato estatal reconhecido inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal;(b) o Supremo Tribunal Federal tem reconhecido, excepcionalmente, a possibilidade de proceder à modulação ou limitação temporal dos efei-tos da declaração de inconstitucionalidade, mesmo quando proferida, por esta Corte, em sede de controle difuso (RE 197.917/SP, p. ex.);(c) revela-se inaplicável, no entanto, a teoria da limitação temporal dos efeitos, se e quando o Supremo Tribunal Federal, ao julgar determinada causa, nesta formular juízo negativo de recepção, por entender que certa lei pré-constitucional mostra-se materialmente incompatível com nor-mas constitucionais a ela supervenientes;(d) a não-recepção de ato estatal pré-constitucional, por não implicar a declaração de sua inconstitucionalidade – mas o reconhecimento de sua pura e simples revogação (RTJ 143/355 – RTJ 145/339) –, descaracteriza um dos pressupostos indispensáveis à utilização da técnica da modulação temporal, que supõe, para incidir, dentre outros elementos, a necessária existência de um juízo de inconstitucionalidade.Desse modo, Srs. Ministros, e tendo em consideração as razões expostas,

nego provimento ao recurso de agravo deduzido pelo Município do Rio de Janeiro/RJ, mantendo, em conseqüência, por seus próprios fundamentos, a decisão ora recorrida, assinalando a inaplicabilidade, ao caso em exame, da técnica da modulação temporal dos efeitos, por tratar-se de norma legal pré-constitucional que não foi recebida pela vigente Constituição da República.

É o meu voto.

EXTRATO DA ATA

AI 589.281-AgR/RJ — Relator: Ministro Celso de Mello. Agravante: Município do Rio de Janeiro (Advogado: Gustavo da Gama Vital de Oliveira). Agravados: Arno Oscar Markus e outros (Advogados: Ricardo Cidade Baptista e outros).

R.T.J. — 2031342

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julga-mento, os Ministros Gilmar Mendes e Cezar Peluso.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Joaquim Barbosa e Eros Grau. Ausentes, justificadamente, os Ministros Gilmar Mendes e Cezar Peluso. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner Gonçalves.

Brasília, 5 de setembro de 2006 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.

R.T.J. — 203 1343

AGRAVO REGIMENTAL NOAGRAVO DE INSTRUMENTO 662.972 — PR

Relator: O Sr. Ministro Cezar Peluso

Agravantes: Moval Móveis Arapongas Ltda. e outros — Agravado: Instituto Ambiental do Paraná – IAP

Recurso. Agravo de instrumento. Inadmissibilidade. Pe-tição de recurso extraordinário. Data de protocolo. Carimbo ilegível. Prova da tempestividade. Falta. Agravo regimental não provido. O carimbo de protocolo na petição do recurso extraor-dinário deve estar legível, para efeito de verificação da tempesti-vidade.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por una-nimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Eros Grau.

Brasília, 11 de setembro de 2007 — Cezar Peluso, Relator.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cezar Peluso: Trata-se de agravo interposto contra decisão do teor seguinte:

Decisão: 1. Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que, na instân-cia de origem, não admitiu o processamento de recurso extraordinário.

2. Incognoscível o recurso.O carimbo do protocolo, que indica a data de interposição do recurso extraordinário,

reproduzido à fl. 104, está ilegível, não permitindo, assim, o exame de sua tempestividade, que deve ser comprovada pela parte agravante no ato da interposição do recurso (Súmula 639).

3. Ante o exposto, nego seguimento ao agravo (art. 21, § 1º, do RISTF; art. 38 da Lei 8.038, de 28-5-90; e art. 557 do CPC).(Fl. 210.)

Insiste o Agravante no provimento do agravo, aduzindo que “o prazo de interposição do recurso extraordinário passou pelo crivo da Presidência do Tribu-nal de Justiça do Estado do Paraná, onde foi averiguado o cumprimento do prazo de interposição, haja vista que foi negado seguimento ao Recurso Extraordinário por outro motivo que não a intempestividade do mesmo”.

é o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cezar Peluso (Relator): 1. Inconsistente o agravo.

R.T.J. — 2031344

é orientação assente em ambas as Turmas desta Corte que o carimbo aposto na petição do recurso extraordinário deve estar legível, para efeito de verificação da tempestividade não só do agravo, mas ainda do recurso extraordinário dene-gado, sob pena de incidência da Súmula 288, pois que cabe ao STF, e não ao Tribunal a quo, o juízo último sobre a tempestividade do recurso extraordinário.

Nesse sentido, confiram-se os acórdãos: AI 137.922-AgR/RS, Rel. Min. Celso de Mello, e AI 445.320-AgR/ES, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, o último assim ementado:

Agravo de instrumento: traslado deficiente: carimbo com a data de protocolo do recur-so extraordinário ilegível, impossibilitando a verificação da tempestividade do recurso pelo Supremo Tribunal, que não pode ser suprida por certidão emanada da Secretaria do Tribunal a quo: incidência da Súmula 288.

A exigência, que pesava ao Agravante como ônus, havia de estar satisfeita no ato de interposição do recurso, sob pena de não-conhecimento. E não o esteve aqui, onde o mesmo Agravante tampouco alegou nem provou intercorrência de justa causa, que o tivesse impedido de obter cópia legível. A ilegibilidade não é atribuível a defeito da chancela mecânica, mas a deficiência da reprodução gráfica, de responsabilidade do Agravante.

2. Posto isso, nego provimento ao presente agravo.

EXTRATO DA ATA

AI 662.972-AgR/PR — Relator: Ministro Cezar Peluso. Agravantes: Moval Móveis Arapongas Ltda. e outros (Advogados: Nestor Freschi Ferreira e outros). Agravado: Instituto Ambiental do Paraná – IAP (Advogados: Cecy Thereza Cercal Kreutzer de Goes e outros).

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julga-mento, o Ministro Eros Grau.

Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega.

Brasília, 11 de setembro de 2007 — Carlos Alberto Cantanhede, Coor-denador.

ÍNDICE ALFABéTICO

AAdm Abalo psíquico decorrente de empréstimo para custeio de ensino

privado. (...) Responsabilidade civil do Estado. RE 364.631 RTJ 203/1242

Pn Abolitio criminis: inocorrência. (...) Crime ambiental. HC 89.735 RTJ 203/1188

Cv Ação de depósito: desnecessidade. (...) Prisão civil. HC 69.922 RTJ 203/213

Ct Ação mandamental. (...) Mandado de injunção. MI 721 RTJ 203/11

PrPn Ação penal. Denúncia: momento de oferecimento. Ministério Público: prerrogativa. Materialidade do crime e indícios de autoria. Inquérito policial: desnecessidade. Caso “Mensalão”. CPP/41, art. 39, § 5º. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Ação penal. Instâncias penal e administrativa: independência. Con-selho de Justificação: decisão sujeita a reexame necessário. Processo penal militar: prosseguimento. HC 88.950 RTJ 203/1161

PrPn Ação penal: confirmação do depoimento. (...) Inquérito policial mili-tar. HC 88.950 RTJ 203/1161

PrSTF Ação penal privada. (...) Recurso extraordinário. AI 579.988-AgR RTJ 203/431

Pn Ação policial: posterioridade ao roubo. (...) Roubo. HC 91.696 RTJ 203/306

PrCv Ação rescisória. Decadência. Aditamento à inicial após o biênio. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

1348 Açã-Adm — ÍNDICE ALFABéTICO

PrCv Ação rescisória. Descabimento. Informações prestadas por autori-dade coatora em mandado de segurança. Documento novo: não-con-figuração. CPC/73, art. 485, VII. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

PrCv Ação rescisória. Descabimento. Violação a literal disposição de lei. Decisão rescindenda conforme precedente do Plenário do STF. CPC/73, art. 485, V. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

PrTr Acidente de trabalho. (...) Competência jurisdicional. RE 503.452-AgR RTJ 203/1304

PrCv Acórdão. Fundamentação suficiente. Decisão desfavorável ao recor-rente. CF/88, art. 93, IX: ofensa inocorrente. AI 584.155-AgR RTJ 203/1328

PrCv Acórdão. Fundamentação suficiente. Fundamentos da sentença: ado-ção. CF/88, art. 93, IX. AI 550.979-AgR-ED RTJ 203/422

PrPn Acórdão criminal. Turma Recursal de Juizado Especial. Motivação: remissão ao fundamento da sentença. Lei 9.099/95, art. 82, § 5º. CF/88, art. 93, IX. HC 86.533 RTJ 203/1132

PrSTF Acórdão de Turma Recursal de Juizado Especial. (...) Recurso extra-ordinário. AI 418.610-AgR RTJ 203/399

Pn Acórdão do Tribunal de Justiça: observância. (...) Regime prisional. HC 91.663 RTJ 203/303

PrCv Acórdão recorrido. Duplo fundamento (constitucional e infracons-titucional). Recurso especial: preclusão. Recurso extraordinário: inadmissibilidade. Súmula 283. RE 388.024-AgR RTJ 203/1267 – AI 501.661-AgR RTJ 203/1295

Int Acordo internacional. Assistência Judiciária em Matéria Penal. Brasil e Estados Unidos da América. Conta bancária no exterior. Sigilo bancário: afastamento pelo Poder Judiciário norte-americano. Polícia Federal e Ministério Público: ausência de restrição de uso. Órgão diverso: impossibilidade de compartilhamento. Decreto 3.810/01. Inq 2.245 RTJ 203/473

Adm ADCT da Constituição do Estado do Ceará/89, art. 29-A, redação da EC 35/06: inconstitucionalidade. (...) Ex-governador. ADI 3.853 RTJ 203/139

PrCv Aditamento à inicial após o biênio. (...) Ação rescisória. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

PrPn Administrador da empresa: oferecimento de quantia em dinheiro ao presidente da Câmara dos Deputados. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

1349ÍNDICE ALFABéTICO — Adm-Agr

Adm Admissibilidade. (...) Recurso administrativo. RE 311.900 RTJ 203/312 – RE 402.904-AgR-AgR RTJ 203/1271

PrPn Advogado constituído: acesso. (...) Inquérito policial. HC 88.520 RTJ 203/1155

PrPn Agente político: ausência de indício de participação. (...) Competên-cia criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrCv Agravo. Inovação temática. Decisão agravada e petição recursal. Divórcio ideológico. CPC/73, arts. 545 e 557, § 1º: inobservância. RE 477.315-AgR RTJ 203/1284

PrCv Agravo de instrumento. Juízo de admissibilidade na origem: descabi-mento. Remessa automática ao STF. Rcl 4.484 RTJ 203/211

PrCv Agravo de instrumento. Litigância de má-fé: ausência. Multa: desca-bimento. AI 503.651-ED RTJ 203/1310

PrCv Agravo de instrumento. Traslado deficiente. Petição de RE: ausência da data do protocolo. Tempestividade: impossibilidade de verifica-ção. AI 376.614-ED RTJ 203/1253

PrCv Agravo de instrumento. Traslado deficiente. Petição de RE: proto-colo ilegível. Tempestividade: impossibilidade de verificação. Sú-mula 288. AI 556.121-AgR RTJ 203/1324 – AI 662.972-AgR RTJ 203/1343

PrSTF Agravo de instrumento: cabimento. (...) Recurso extraordinário. AI 502.333-AgR RTJ 203/1299

PrCv Agravo regimental. Caráter abusivo. Litigância de má-fé. Multa. CPC/73, art. 557, § 2º, c/c arts. 14, II e III, e 17, VII. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231 – RE 543.237-AgR RTJ 203/419

PrPn Agravo regimental. Descabimento. Decisão de relator. Medida li-minar em habeas corpus: indeferimento. HC 89.837-MC-AgR RTJ 203/1202

PrCv Agravo regimental. Intempestividade. Interposição por fac-símile. Original apresentado fora do prazo. Lei 9.800/99, art. 2º, caput. AI 584.745-AgR RTJ 203/1331

PrCv Agravo regimental. Intempestividade. Interposição por fax. Original apresentado fora do prazo. Destempo: caracterização. Lei 9.800/99. AI 503.651-AgR RTJ 203/416

PrCv Agravo regimental. Negativa de seguimento. Fundamentação: ausên-cia. RHC 86.148-AgR RTJ 203/1119

PrCv Agravo regimental. Questão nova. Exame: inviabilidade. RE 491.863-AgR RTJ 203/1292

1350 Agr-Aut — ÍNDICE ALFABéTICO

PrCv Agravo regimental. Vista dos autos para contraminuta: descabimen-to. Previsão legal: ausência. CF/88, art. 5º, LV: ofensa inocorrente. AI 513.262-AgR-AgR RTJ 203/1315

PrPn Alegações finais: inversão da ordem de apresentação. (...) Defesa criminal. HC 87.111 RTJ 203/1134

Adm Alíquota: ausência de previsão legal. (...) Militar. RE 491.863-AgR RTJ 203/1292

Trbt Alíquota: majoração. (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

PrSTF Amicus curiae: deferimento. (...) Recurso extraordinário. RE 416.827 RTJ 203/314

PrPn Apelação criminal: desistência apresentada por advogado constituí-do. (...) Habeas corpus. HC 92.536 RTJ 203/1222

Adm Aposentadoria. Servidor público. Novo regime jurídico. Requisitos e critérios. Direito adquirido: conceito. CF/88, art. 40, redação da EC 20/98. CF/88, art. 40, redação da EC 41/03 e da EC 47/05. ADI 3.104 RTJ 203/952

Adm Aposentadoria. Servidor público. Regência: lei vigente ao imple-mento das condições. Súmula 359. ADI 3.104 RTJ 203/952

PrSTF Aposentadoria: complementação. (...) Recurso extraordinário. AI 516.241-AgR RTJ 203/1318

Ct Aposentadoria especial. (...) Mandado de injunção. MI 721 RTJ 203/11

PrPn Área degradada. (...) Habeas corpus. HC 89.735 RTJ 203/1188

Int Argüição prejudicada. (...) Extradição. HC 90.154 RTJ 203/277

Int Assistência Judiciária em Matéria Penal. (...) Acordo internacional. Inq 2.245 RTJ 203/473

Pn Atividade externa. (...) Medida socioeducativa. HC 89.054 RTJ 203/1171

Ct Atividade insalubre. (...) Mandado de injunção. MI 721 RTJ 203/11

Pn Ato infracional: roubo. (...) Medida socioeducativa. HC 89.054 RTJ 203/1171

Ct Ato omissivo: autoridade ou órgão. (...) Competência originária. MI 721 RTJ 203/11

Ct Ato Regimental 5/06-TJDFT: suspensão cautelar. (...) Magistrado. ADI 3.823-MC RTJ 203/980

PrCv Autarquia estadual (Rurap). (...) Medida cautelar. AC 1.084-MC-QO RTJ 203/943

1351ÍNDICE ALFABéTICO — Ban-Car

BCt Banco: porta eletrônica. (...) Competência legislativa. AI 491.420-

AgR RTJ 203/409

Trbt Base de cálculo. (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

TrPrv Benefício previdenciário. Pensão por morte. Salário-de-benefício: revisão indevida. Princípio tempus regit actum: aplicação. Conces-são anterior à Lei 9.032/95. CF/88, arts. 5º, XXXVI, e 195, § 5º. RE 416.827 RTJ 203/314

TrPrv Benefício previdenciário. Pensão por morte: perfil institucional. Valor real: garantia de manutenção. Fonte de custeio: exigência ope-racional. Princípio da solidariedade e da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial. CF/88, arts. 3º, I, e 201, caput. RE 416.827 RTJ 203/314

Adm Benefício, vantagem e proventos: distinção. (...) Ex-governador. ADI 3.853 RTJ 203/139

Ct Bloqueio e seqüestro de verba: inadmissibilidade. (...) Precatório. Rcl 3.219-AgR RTJ 203/127

Int Brasil e Estados Unidos da América. (...) Acordo internacional. Inq 2.245 RTJ 203/473

CPrSTF Cabimento. (...) Recurso extraordinário. RE 402.904-AgR-AgR RTJ

203/1271 – AI 513.262-AgR-AgR RTJ 203/1315

Pn Cálculo. (...) Pena. HC 91.615 RTJ 203/1214

PrCv Caráter abusivo. (...) Agravo regimental. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231 – RE 543.237-AgR RTJ 203/419

PrCv Caráter infringente. (...) Embargos de declaração. AI 481.829-AgR-ED-EDv-AgR-ED RTJ 203/1287

PrCv Caráter protelatório: não-comprovação. (...) Embargos de declara-ção. AI 481.829-AgR-ED-EDv-AgR-ED RTJ 203/1287

Adm Cargo de natureza transitória. (...) Ex-governador. ADI 3.853 RTJ 203/139

PrSTF Cargo efetivo, cargo em comissão ou contratação temporária: impos-sibilidade de análise da regularidade constitucional ou legal. (...) Reclamação. Rcl 4.785-MC-AgR RTJ 203/1005

Ct Cargo público: provimento. (...) Processo legislativo. ADI 2.873 RTJ 203/89

1352 Cas-CF/ — ÍNDICE ALFABéTICO

PrPn Caso “Mensalão”. (...) Ação penal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Caso “Mensalão”. (...) Competência criminal. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

Ct Cassação de mandato. (...) Processo administrativo parlamentar. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

PrCv Cerceamento de defesa: inocorrência. (...) Decisão judicial. AI 557.623-AgR RTJ 203/425

PrPn Cerceamento: inocorrência. (...) Defesa criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

Adm CF/88, arts. 1º; 5º, caput; 25, § 1º; 37, caput e XIII; 169, § 1º, I e II; e 195, § 5º: ofensa. (...) Ex-governador. ADI 3.853 RTJ 203/139

TrPrv CF/88, arts. 3º, I, e 201, caput. (...) Benefício previdenciário. RE 416.827 RTJ 203/314

Ct CF/88, art. 5º, XI. (...) Garantia constitucional. RE 460.880 RTJ 203/1277

Adm CF/88, art. 5º, XXXIV, a, e LV. (...) Recurso administrativo. RE 402.904-AgR-AgR RTJ 203/1271

TrPrv CF/88, arts. 5º, XXXVI, e 195, § 5º. (...) Benefício previdenciário. RE 416.827 RTJ 203/314

PrPn CF/88, art. 5º, LV. (...) Habeas corpus. RHC 90.981 RTJ 203/1210

Adm CF/88, art. 5º, LV. (...) Recurso administrativo. RE 311.900 RTJ 203/312

PrCv CF/88, art. 5º, LV: ofensa inocorrente. (...) Agravo regimental. AI 513.262-AgR-AgR RTJ 203/1315

PrPn CF/88, art. 5º, LXXVIII. (...) Inquérito. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

Ct CF/88, art. 22, XX. (...) Competência legislativa. ADI 3.189 RTJ 203/103

Ct CF/88, art. 30, I. (...) Competência legislativa. AI 491.420-AgR RTJ 203/409

Ct CF/88, art. 37, XI, redação da EC 41/03: interpretação conforme à Constituição. (...) Magistrado. ADI 3.854-MC RTJ 203/184

Ct CF/88, art. 37, § 12, redação da EC 47/05: interpretação conforme à Constituição. (...) Magistrado. ADI 3.854-MC RTJ 203/184

Adm CF/88, art. 39, § 4º. (...) Subsídio. ADI 3.771-MC RTJ 203/133

Adm CF/88, art. 40, redação da EC 20/98. (...) Aposentadoria. ADI 3.104 RTJ 203/952

1353ÍNDICE ALFABéTICO — CF/-Co-

Adm CF/88, art. 40, redação da EC 41/03 e da EC 47/05. (...) Aposentado-ria. ADI 3.104 RTJ 203/952

Ct CF/88, art. 40, § 1º. (...) Mandado de injunção. MI 721 RTJ 203/11

Ct CF/88, arts. 55, § 1º; 56, I; 85; 86; 87; e 102, I, c. (...) Comissão Par-lamentar de Inquérito (CPI). MS 25.579-MC RTJ 203/1014

Ct CF/88, arts. 55, § 1º; 56, I; 85; 86; 87; e 102, I, c. (...) Processo admi-nistrativo parlamentar. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

Ct CF/88, art. 61, § 1º, II, c: ofensa. (...) Processo legislativo. ADI 2.873 RTJ 203/89

PrCv CF/88, art. 93, IX. (...) Acórdão. AI 550.979-AgR-ED RTJ 203/422

PrPn CF/88, art. 93, IX. (...) Acórdão criminal. HC 86.533 RTJ 203/1132

PrCv CF/88, art. 93, IX: ofensa inocorrente. (...) Acórdão. AI 584.155-AgR RTJ 203/1328

Ct CF/88, art. 93, XII, redação da EC 45/04. (...) Magistrado. ADI 3.823-MC RTJ 203/980

Ct CF/88, art. 100, § 2º. (...) Precatório. Rcl 3.219-AgR RTJ 203/127

PrPn CF/88, art. 102, I, b. (...) Competência criminal. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

Ct CF/88, art. 102, I, f. (...) Competência originária. AC 1.084-MC-QO RTJ 203/943

Ct CF/88, art. 102, I, f: inteligência. (...) Competência originária. Pet 3.631 RTJ 203/973

Ct CF/88, art. 102, I, q. (...) Competência originária. MI 721 RTJ 203/11

Ct CF/88, art. 103-B, § 4º. (...) Conselho Nacional de Justiça (CNJ). ADI 3.823-MC RTJ 203/980

PrTr CF/88, art. 114, VI. (...) Competência jurisdicional. RE 503.452-AgR RTJ 203/1304

Pn CF/88, art. 225, § 1º. (...) Crime ambiental. HC 89.735 RTJ 203/1188

PrPn Chamada de co-réus: fundamento complementar. (...) Pronúncia. HC 90.708 RTJ 203/282

Pn Circunstância judicial. (...) Pena-base. HC 88.284 RTJ 203/1150 – HC 89.735 RTJ 203/1188

PrPn Co-denunciado: extensão excepcional. (...) Competência criminal. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

1354 Cód-Com — ÍNDICE ALFABéTICO

Ct Código de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, art. 4º, IV. (...) Processo administrativo parlamentar. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

PrPn Colisão de defesa: alegação. (...) Habeas corpus. HC 92.536 RTJ 203/1222

Ct Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Fato novo relacionado. Objeto inicial: possibilidade de ampliação. Inq 2.245 RTJ 203/473

Ct Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Questão interna corpo-ris: inocorrência. Controle jurisdicional: possibilidade. Regimento Interno da Câmara dos Deputados, art. 244. CF/88, arts. 55, § 1º; 56, I; 85; 86; 87; e 102, I, c. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

Ct Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI). Quebra de sigi-lo. Fundamento exclusivo em matéria jornalística: ausência. Decisão judicial autônoma: existência. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Competência criminal. Conexão de processos. Sentença definitiva em um dos processos. Julgamento simultaneus processus. CPP/41, art. 82: inteligência. HC 84.908 RTJ 203/235

PrPn Competência criminal. Juízo a quo. Quebra de sigilo bancário e fiscal. Agente político: ausência de indício de participação. Fato novo: au-toridade com prerrogativa de foro. Magistrado: declinação de compe-tência. Supremo Tribunal Federal (STF): ratificação do ato. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Competência criminal. Justiça comum. Estupro e atentado violento ao pudor praticados por militar. Militar em serviço: ausência de pro-va. CPM/69, art. 9º, III, c: inaplicabilidade. CP/40, arts. 71, 213, 214 e 226. HC 86.501 RTJ 203/1129

PrPn Competência criminal. Justiça Militar. Estelionato. Militar contra militar. Local sujeito à administração militar. Lesão ao estabeleci-mento bancário: ausência. CPM/69, art. 9º, II, a. HC 86.867 RTJ 203/248

PrPn Competência criminal. Receptação: crime instantâneo. Local da con-sumação do delito. Opinio delicti e eventual denúncia: atribuição do Ministério Público estadual. Pet 3.631 RTJ 203/973

PrPn Competência criminal. Supremo Tribunal Federal (STF). Parla-mentar e ministro de Estado: prerrogativa de foro. Co-denunciado: extensão excepcional. Caso “Mensalão”. CF/88, art. 102, I, b. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

PrSTF Competência de Juizado Especial federal. (...) Recurso extraordiná-rio. RE 491.863-AgR RTJ 203/1292

1355ÍNDICE ALFABéTICO — Com-Com

PrSTF Competência do órgão prolator da decisão. (...) Recurso extraordiná-rio. AI 418.610-AgR RTJ 203/399

PrTr Competência jurisdicional. Justiça do Trabalho. Indenização por dano moral ou patrimonial. Acidente de trabalho. Sentença de méri-to: ausência. CF/88, art. 114, VI. Emenda Constitucional 45/04. RE 503.452-AgR RTJ 203/1304

Ct Competência legislativa. Município. Banco: porta eletrônica. Interes-se local. CF/88, art. 30, I. AI 491.420-AgR RTJ 203/409

Ct Competência legislativa. União Federal. Sistemas de consórcios e sorteios: jogo de azar, loteria e similares. CF/88, art. 22, XX. Lei esta-dual 6.140/99/AL: inconstitucionalidade. Lei estadual 6.183/00/AL: inconstitucionalidade. Lei estadual 6.225/01/AL: inconstitucionali-dade. Lei estadual 6.263/01/AL: inconstitucionalidade. Lei Delegada estadual 13/03/AL: inconstitucionalidade. ADI 3.189 RTJ 203/103

Ct Competência originária. Incompetência do STF: alegação. Prerroga-tiva de foro: ausência. Matéria: preclusão. Inq 2.245 RTJ 203/473

Ct Competência originária. Supremo Tribunal Federal (STF). Conflito negativo de atribuições. Ministério Público de Estados diversos. Ma-gistrado: remessa dos autos a outro juízo. Decisão judicial: inexistên-cia. CF/88, art. 102, I, f: inteligência. Pet 3.631 RTJ 203/973

Ct Competência originária. Supremo Tribunal Federal (STF). Processo e julgamento. Mandado de injunção. Ato omissivo: autoridade ou órgão. CF/88, art. 102, I, q. MI 721 RTJ 203/11

Ct Competência originária. Supremo Tribunal Federal (STF). União e autarquia estadual. CF/88, art. 102, I, f. AC 1.084-MC-QO RTJ 203/943

PrPn Competência territorial: manutenção. (...) Júri. HC 89.849 RTJ 203/265

PrSTF Complementação de aposentadoria. (...) Recurso extraordinário. AI 569.103-AgR RTJ 203/428

PrPn Complexidade da causa. (...) Inquérito. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

PrPn Complexidade da causa e pluralidade de réus. (...) Prisão preventiva. HC 89.479 RTJ 203/260

PrPn Complexidade da causa: pluralidade de réus e delitos. (...) Prisão preventiva. HC 89.090 RTJ 203/1175

PrPn Complexidade dos fatos. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Compra de apoio político. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

1356 Com-Con — ÍNDICE ALFABéTICO

PrSTF Comunicação ao Senado Federal: descabimento. (...) Recurso extra-ordinário. RE 387.271 RTJ 203/1259

PrPn Comunicação prévia: ausência. (...) Habeas corpus. HC 87.111 RTJ 203/1134 – HC 90.326-QO RTJ 203/1207 – RHC 90.981 RTJ 203/1210

TrPrv Concessão anterior à Lei 9.032/95. (...) Benefício previdenciário. RE 416.827 RTJ 203/314

PrPn Concessão da ordem. (...) Habeas corpus. HC 89.479 RTJ 203/260

PrPn Concessão de ofício. (...) Habeas corpus. HC 91.111 RTJ 203/296

Pn Concurso formal. (...) Pena. HC 91.615 RTJ 203/1214

Adm Concurso público. Exame psicotécnico. Critério objetivo, previ-são legal e publicidade dos atos: requisitos. RE 417.019-AgR RTJ 203/1274

Adm Concurso público. Nomeação: expectativa de direito. Ordem de classificação: observância. Preterição inocorrente. Súmula 15. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231

Ct Concurso público: limite de idade. (...) Processo legislativo. ADI 2.873 RTJ 203/89

Pn Condição do paciente. (...) Crime militar. RHC 86.253 RTJ 203/1126

PrPn Conduta típica: participação. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Conexão. (...) Habeas corpus. HC 84.908 RTJ 203/235

PrPn Conexão de processos. (...) Competência criminal. HC 84.908 RTJ 203/235

Ct Conflito negativo de atribuições. (...) Competência originária. Pet 3.631 RTJ 203/973

PrCv Conhecimento de ofício: possibilidade. (...) Recurso. AI 376.614-ED RTJ 203/1253

PrPn Conhecimento parcial. (...) Habeas corpus. HC 90.708 RTJ 203/282

Adm Cônjuge supérstite. (...) Ex-governador. ADI 3.853 RTJ 203/139

PrPn Conselho de Justificação: decisão sujeita a reexame necessário. (...) Ação penal. HC 88.950 RTJ 203/1161

Ct Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Natureza administrativa. Con-trole administrativo, financeiro e disciplinar do Judiciário. CF/88, art. 103-B, § 4º. Emenda Constitucional 45/04. ADI 3.823-MC RTJ 203/980

Ct Constituição do Estado do Piauí/89, art. 54, VI: inconstitucionali-dade. (...) Processo legislativo. ADI 2.873 RTJ 203/89

1357ÍNDICE ALFABéTICO — Con-Con

PrPn Constrangimento ilegal: caracterização. (...) Prisão preventiva. HC 89.479 RTJ 203/260

PrPn Constrangimento ilegal inocorrente. (...) Inquérito policial militar. HC 88.950 RTJ 203/1161

PrCv Consulta ao Judiciário: inadmissibilidade. (...) Recurso. AI 605.573-ED RTJ 203/434

Pn Consumação do crime. (...) Roubo. HC 91.696 RTJ 203/306

Int Conta bancária no exterior. (...) Acordo internacional. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Conta bancária no exterior em nome da empresa e não dos denuncia-dos: irrelevância. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Pn Continuidade delitiva: consideração. (...) Extinção da punibilidade. HC 85.661 RTJ 203/1092

PrPn Contrapartida: ausência. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Contrato de publicidade. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Trbt Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS). (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

Adm Contribuição para o Fundo de Saúde de Militares (FUNSA): ilegiti-midade. (...) Militar. RE 491.863-AgR RTJ 203/1292

Trbt Contribuição social. Contribuição para o Financiamento da Seguri-dade Social (COFINS). Alíquota: majoração. Lei complementar: des-necessidade. Lei 9.718/98, art. 8º. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

Trbt Contribuição social. Contribuição para o Financiamento da Seguri-dade Social (COFINS). Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL): compensação. Princípio da isonomia: ofensa inocorrente. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

Trbt Contribuição social. Contribuição para o Financiamento da Se-guridade Social (COFINS). Programa de Integração Social (PIS). Base de cálculo. Faturamento. Receita bruta: ampliação do conceito. Lei 9.718/98, art. 3º, § 1º: inconstitucionalidade declarada no RE 357.950. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

Trbt Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL): compensação. (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

Ct Controle administrativo, financeiro e disciplinar do Judiciário. (...) Conselho Nacional de Justiça (CNJ). ADI 3.823-MC RTJ 203/980

Ct Controle de constitucionalidade. Norma anterior à CF/88. Lei esta-dual 4.493/83/AL: não-recepção. ADI 3.189 RTJ 203/103

1358 Con-CPC — ÍNDICE ALFABéTICO

Ct Controle jurisdicional: possibilidade. (...) Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). MS 25.579-MC RTJ 203/1014

PrCv Conversão em agravo regimental. (...) Embargos de declaração. AI 376.614-ED RTJ 203/1253 – AI 503.651-ED RTJ 203/1310

Cv Conversão em divórcio. (...) Separação judicial. RE 387.271 RTJ 203/1259

PrPn Corrupção ativa (Item III.1). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Corrupção ativa (Item III.3). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Corrupção ativa (Item VI). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Corrupção ativa (Itens VI.1.a, VI.2.a, VI.3.a e VI.4.a). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Corrupção ativa (Itens VI.2.a e VI.4.a). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Corrupção passiva (Item III.1). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Corrupção passiva (Item VI). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Corrupção passiva e lavagem de dinheiro (Item III.3). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn CP/40, art. 29. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Pn CP/40, art. 59. (...) Pena-base. HC 89.735 RTJ 203/1188

Pn CP/40, arts. 59 e 68. (...) Pena-base. HC 88.284 RTJ 203/1150

Pn CP/40, art. 70, parte final. (...) Pena. HC 91.615 RTJ 203/1214

PrPn CP/40, arts. 71, 213, 214 e 226. (...) Competência criminal. HC 86.501 RTJ 203/1129

PrPn CP/40, art. 288. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn CP/40, art. 312. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn CP/40, art. 317. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Pn CP/40, art. 330: inteligência. (...) Crime de desobediência. HC 86.254 RTJ 203/243

PrPn CP/40, art. 333. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn CPC/73, art. 87. (...) Júri. HC 89.849 RTJ 203/265

PrCv CPC/73, art. 485, V. (...) Ação rescisória. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

PrCv CPC/73, art. 485, VII. (...) Ação rescisória. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

1359ÍNDICE ALFABéTICO — CPC-Cri

PrCv CPC/73, art. 535, I e II. (...) Embargos de declaração. AI 480.290-AgR-ED-AgR-ED RTJ 203/404

PrCv CPC/73, art. 538, parágrafo único. (...) Embargos de declaração. AI 481.829-AgR-ED-EDv-AgR-ED RTJ 203/1287

PrCv CPC/73, arts. 545 e 557, § 1º: inobservância. (...) Agravo. RE 477.315-AgR RTJ 203/1284

PrCv CPC/73, art. 557, § 2º, c/c arts. 14, II e III, e 17, VII. (...) Agravo regimental. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231 – RE 543.237-AgR RTJ 203/419

PrPn CPM/69, art. 9º. (...) Processo criminal. HC 87.869 RTJ 203/253

PrPn CPM/69, art. 9º, II, a. (...) Competência criminal. HC 86.867 RTJ 203/248

PrPn CPM/69, art. 9º, III, c: inaplicabilidade. (...) Competência criminal. HC 86.501 RTJ 203/1129

Pn CPM/69, arts. 125 e 132. (...) Crime militar. RHC 86.253 RTJ 203/1126

PrPn CPMI dos Correios: autorização. (...) Prova criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn CPMI dos Correios: requisição. (...) Prova criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn CPP/41, art. 39, § 5º. (...) Ação penal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn CPP/41, art. 41. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473 – HC 87.293 RTJ 203/1144 – HC 88.978 RTJ 203/1164 – HC 89.735 RTJ 203/1188

PrPn CPP/41, art. 80. (...) Inquérito. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

PrPn CPP/41, art. 82: inteligência. (...) Competência criminal. HC 84.908 RTJ 203/235

PrPn CPP/41, art. 408. (...) Pronúncia. HC 87.157 RTJ 203/1139

PrPn CPP/41, arts. 421 e 423. (...) Júri. HC 89.849 RTJ 203/265

Pn CPP/41, art. 637. (...) Pena. HC 91.675 RTJ 203/1218

Adm Criação: descabimento. (...) Ex-governador. ADI 3.853 RTJ 203/139

PrPn Crime ambiental. (...) Habeas corpus. HC 89.735 RTJ 203/1188

Pn Crime ambiental. Tipificação. Abolitio criminis: inocorrência. Uni-dade de conservação: qualificação jurídica. Decreto 4.340/02. Lei 9.985/00. Lei 9.605/98, art. 40: eficácia plena e aplicabilidade ime-diata. CF/88, art. 225, § 1º. HC 89.735 RTJ 203/1188

1360 Cri-Dec — ÍNDICE ALFABéTICO

PrPn Crime contra a ordem tributária. (...) Habeas corpus. HC 84.908 RTJ 203/235

PrPn Crime de deserção: excludente de culpabilidade. (...) Habeas corpus. RHC 88.542 RTJ 203/257

Pn Crime de desobediência. Não-configuração. Decisão judicial: comi-nação de multa. Medida penal: não-aplicação. CP/40, art. 330: inteli-gência. HC 86.254 RTJ 203/243

Ct Crime de resistência: inocorrência. (...) Garantia constitucional. RE 460.880 RTJ 203/1277

PrPn Crime de tráfico de entorpecente, associação para o tráfico e porte ilegal de armas. (...) Prova pericial. HC 85.198 RTJ 203/1088

Pn Crime hediondo. (...) Regime prisional. RE 472.584 RTJ 203/402

Pn Crime militar. Deserção. Prescrição inocorrente. Condição do pa-ciente. Trânsfuga: nova deserção. CPM/69, arts. 125 e 132. RHC 86.253 RTJ 203/1126

Pn Crime praticado por indígena. (...) Regime prisional. HC 85.198 RTJ 203/1088

PrPn Crimes conexos: pena máxima. (...) Júri. HC 85.969 RTJ 203/1106

PrPn Critério objetivo: ausência de efeito prático. (...) Inquérito. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

Adm Critério objetivo, previsão legal e publicidade dos atos: requisitos. (...) Concurso público. RE 417.019-AgR RTJ 203/1274

PrPn Critério subjetivo: afastamento. (...) Inquérito. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

DPrPn Dados de empréstimo fornecidos pelo Bacen e pelo Banco BMG. (...)

Prova criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Dano material: nexo de causalidade. (...) Recurso extraordinário. RE 364.631 RTJ 203/1242

Adm Dano moral: conceito. (...) Responsabilidade civil do Estado. RE 364.631 RTJ 203/1242

Adm Dano moral: não-configuração. (...) Responsabilidade civil do Esta-do. RE 364.631 RTJ 203/1242

PrCv Decadência. (...) Ação rescisória. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

PrSTF Decisão. (...) Recurso extraordinário. RE 364.304-AgR RTJ 203/1235 – RE 387.271 RTJ 203/1259 – AI 589.281-AgR RTJ 203/1334

1361ÍNDICE ALFABéTICO — Dec-Dec

PrCv Decisão agravada e petição recursal. (...) Agravo. RE 477.315-AgR RTJ 203/1284

PrPn Decisão de relator. (...) Agravo regimental. HC 89.837-MC-AgR RTJ 203/1202

PrCv Decisão de relator. (...) Embargos de declaração. AI 376.614-ED RTJ 203/1253 – AI 503.651-ED RTJ 203/1310

PrCv Decisão de relator: referendo da Turma. (...) Medida cautelar. AC 1.781-MC RTJ 203/949

PrCv Decisão de relator: referendo do Plenário. (...) Medida cautelar. AC 1.084-MC-QO RTJ 203/943

PrSTF Decisão de Turma Recursal de Juizado Especial. (...) Recurso extra-ordinário. RE 416.827 RTJ 203/314

PrCv Decisão desfavorável ao recorrente. (...) Acórdão. AI 584.155-AgR RTJ 203/1328

PrCv Decisão do Plenário: possibilidade. (...) Medida liminar. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

PrPn Decisão do STJ em recurso especial. (...) Habeas corpus. HC 90.708 RTJ 203/282

PrSTF Decisão em ação civil pública. (...) Reclamação. Rcl 4.785-MC-AgR RTJ 203/1005

PrSTF Decisão em medida idêntica: descumprimento. (...) Reclamação. Rcl 5.450-AgR RTJ 203/1011

PrSTF Decisão interlocutória. (...) Recurso extraordinário. AI 502.333-AgR RTJ 203/1299

PrCv Decisão judicial. Fundamentação suficiente. Diligência probatória: indeferimento. Cerceamento de defesa: inocorrência. AI 557.623-AgR RTJ 203/425

Ct Decisão judicial autônoma: existência. (...) Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI). Inq 2.245 RTJ 203/473

Pn Decisão judicial: cominação de multa. (...) Crime de desobediência. HC 86.254 RTJ 203/243

Ct Decisão judicial: inexistência. (...) Competência originária. Pet 3.631 RTJ 203/973

PrSTF Decisão na ACi 9.621: ausência de descumprimento. (...) Reclama-ção. Rcl 2.540-AgR-AgR RTJ 203/84

PrSTF Decisão na ADI 1.232: descumprimento não demonstrado. (...) Re-clamação. Rcl 3.779-AgR RTJ 203/136

1362 Dec-Den — ÍNDICE ALFABéTICO

PrSTF Decisão na ADI 3.395-MC: definição do alcance material. (...) Recla-mação. Rcl 4.785-MC-AgR RTJ 203/1005

PrCv Decisão recorrida: alteração parcial. (...) Embargos de declaração. AI 498.456-AgR-ED-ED RTJ 203/412

PrCv Decisão rescindenda conforme precedente do Plenário do STF. (...) Ação rescisória. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

PrPn Declaração firmada pelo réu. (...) Habeas corpus. HC 92.536 RTJ 203/1222

Int Decreto 3.810/01. (...) Acordo internacional. Inq 2.245 RTJ 203/473

Pn Decreto 4.340/02. (...) Crime ambiental. HC 89.735 RTJ 203/1188

PrPn Defensor dativo: desídia. (...) Júri. HC 85.969 RTJ 203/1106

PrPn Defesa criminal. Cerceamento: inocorrência. Denúncia: oferecimen-to. Juntada posterior de documento: desconsideração. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Defesa criminal. Defesa técnica: ausência. Alegações finais: in-versão da ordem de apresentação. Princípio da dignidade da pessoa humana: ofensa. HC 87.111 RTJ 203/1134

PrPn Defesa criminal. Gravidade do crime. Princípio da ampla defesa. HC 85.969 RTJ 203/1106

PrPn Defesa material: ausência. (...) Júri. HC 85.969 RTJ 203/1106

PrPn Defesa técnica: ausência. (...) Defesa criminal. HC 87.111 RTJ 203/1134

PrPn Denúncia. Inépcia inocorrente. Descrição suficiente do fato. Lei 9.605/98, arts. 40 e 53. CPP/41, art. 41. HC 89.735 RTJ 203/1188

PrPn Denúncia. Inépcia inocorrente. Descrição suficiente do fato. Qua-drilha ou bando: crime formal. CPP/41, art. 41. HC 88.978 RTJ 203/1164

PrPn Denúncia. Inépcia inocorrente. Descrição suficiente do fato. Tranca-mento da ação penal: descabimento. CPP/41, art. 41. HC 87.293 RTJ 203/1144

PrPn Denúncia. Não-recebimento. Corrupção ativa (Itens VI.1.a, VI.2.a, VI.3.a e VI.4.a). Individualização da conduta: ausência. CPP/41, art. 41. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Não-recebimento. Corrupção ativa (Itens VI.2.a e VI.4.a). Individualização da conduta: ausência. CPP/41, art. 41. Inq 2.245 RTJ 203/473

1363ÍNDICE ALFABéTICO — Den-Den

PrPn Denúncia. Não-recebimento. Evasão de divisas (Item VIII). Indi-vidualização da conduta: ausência. CPP/41, art. 41. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Não-recebimento. Falsidade ideológica (Item II). Dolo específico: ausência. CPP/41, art. 41. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Não-recebimento. Lavagem de dinheiro (Itens III.1, III.3, VI.2.a e VI.4.a). Individualização da conduta: ausência. CPP/41, art. 41. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Não-recebimento. Peculato (Item III.3). Individualização da conduta: ausência. CPP/41, art. 41. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Não-recebimento. Peculato e corrupção ativa (Itens III.1.a.3, III.1.b.2, III.2.b, III.3.c.1 e III.3.c.2). Individualização da conduta: ausência. CPP/41, art. 41. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Narração genérica. Recebimento. Gestão fraudulenta de instituição financeira: crime próprio. Responsabilidade diferenciada de sócio e gerente: impossibilidade de verificação de plano. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Corrupção ativa (Item III.1). Serviço de publicidade: contratação irregular. Administrador da empresa: ofere-cimento de quantia em dinheiro ao presidente da Câmara dos Depu-tados. CP/40, art. 333. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Corrupção ativa (Item III.3). DNA Propa-ganda Ltda.: beneficiária da antecipação irregular. Conduta típica: participação. CP/40, art. 333. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Corrupção ativa (Item VI). Compra de apoio político. Voto de parlamentar: ato de ofício. Complexidade dos fatos. Individualização da conduta: suficiência. CP/40, art. 333. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Corrupção passiva (Item III.1). Serviço de publicidade: contratação irregular. Presidente da Câmara dos Depu-tados: atos de ofício potenciais ou efetivos. CP/40, art. 317. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Corrupção passiva (Item VI). Propina em troca de apoio político. Destinação lícita dos recursos: irrelevância. CP/40, art. 317. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Corrupção passiva e lavagem de dinheiro (Item III.3). Recebimento de recursos provenientes de organização criminosa: “Valerioduto”. Interposta pessoa: utilização. Lei 9.613/98, art. 1º, V, VI e VII. CP/40, art. 317. Inq 2.245 RTJ 203/473

1364 Den-Den — ÍNDICE ALFABéTICO

PrPn Denúncia. Recebimento. Evasão de divisas (Item VIII). Núcleo pu-blicitário-financeiro: remessa de dinheiro supostamente ilegal ao ex-terior. Lei 7.492/86, art. 22, parágrafo único. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Evasão de divisas (Item VIII). Solicitação de repasses em dinheiro e manutenção de depósito não declarado no exterior. Conta bancária no exterior em nome da empresa e não dos denunciados: irrelevância. Lei 7.492/86, art. 22, parágrafo único. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Gestão fraudulenta de instituição financeira (Item V). Dirigente: operação de crédito de risco elevado. Emprésti-mo bancário: garantia insuficiente. Fiscalização: burla. Lei 7.492/86, arts. 4º e 25. CP/40, art. 29. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Lavagem de dinheiro (Item III.1.a.2). Pro-pina: ocultação da origem, natureza e destinatário. Lei 9.613/98, art. 1º, V, VI e VII. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Lavagem de dinheiro (Item IV). Núcleo publicitário-financeiro. Transferência de elevada soma em dinheiro. Notas fiscais frias: simulação de prestação de serviço. Empresa de publicidade: fraude na contabilidade. Lei 9.613/98, art. 1º, V, VI e VII. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Lavagem de dinheiro (Item VI). Ocultação e dissimulação da origem, movimentação, localização e propriedade de valores. Exaurimento do crime de corrupção passiva: improce-dência. Lei 9.613/98, art. 1º, V, VI e VII. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Lavagem de dinheiro (Item VII). Entrega de elevada soma em dinheiro aos acusados. Registro formal: ausên-cia. Destinação dada aos recursos: irrelevância. Interposta pessoa: procedimento diverso da praxe bancária. Lei 9.613/98, art. 1º, V, VI e VII. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Lavagem de dinheiro (Item VIII). Transfe-rência de elevada soma em dinheiro. Registro formal: ausência. Praxe bancária: inobservância. Lei 9.613/98, art. 1º, V, VI e VII. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Peculato (Itens III.1.a.3 e III.1.b.2). Re-cursos públicos: desvio. Empresa de consultoria em comunicação: contratação. Contrapartida: ausência. CP/40, art. 312. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Peculato (Itens III.2 e III.3). Contrato de publicidade. Diretor do Banco do Brasil e dirigente da empresa bene-ficiária: desvio de recursos públicos. CP/40, art. 312. Inq 2.245 RTJ 203/473

1365

PrPn Denúncia. Recebimento. Peculato (Item III.3). Diretor do Banco do Brasil e ministro da Secretaria de Comunicação e Gestão Estratégica: discricionariedade para alocar bens do Fundo de Incentivo Visanet. Ordem de desembolso: indícios. CP/40, art. 312. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Quadrilha ou bando (Item II). Estabilidade da associação e elemento subjetivo especial do tipo. Individualização da conduta: suficiência. Vínculo subjetivo entre os acusados: inúme-ras reuniões. CP/40, art. 288. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia. Recebimento. Quadrilha ou bando (Item VI). Estabilidade da associação e elemento subjetivo especial do tipo. Envolvido be-neficiado por acordo de delação premiada: irrelevância. Princípio da indivisibilidade: inaplicabilidade à ação penal pública. Individualiza-ção da conduta: suficiência. CP/40, art. 288. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia: momento de oferecimento. (...) Ação penal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Denúncia: oferecimento. (...) Defesa criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

Cv Depositário infiel. (...) Prisão civil. HC 69.922 RTJ 203/213

Adm Depósito prévio do valor da multa: inconstitucionalidade declarada pelo STF. (...) Recurso administrativo. RE 402.904-AgR-AgR RTJ 203/1271

Adm Depósito prévio: inexigibilidade. (...) Recurso administrativo. RE 311.900 RTJ 203/312

Ct Deputado federal licenciado: investidura no cargo de ministro de Es-tado. (...) Processo administrativo parlamentar. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

PrCv Descabimento. (...) Ação rescisória. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

PrPn Descabimento. (...) Agravo regimental. HC 89.837-MC-AgR RTJ 203/1202

PrCv Descabimento. (...) Embargos de declaração. AI 503.651-ED RTJ 203/1310

PrPn Descabimento. (...) Habeas corpus. HC 91.111 RTJ 203/296

PrSTF Descabimento. (...) Reclamação. Rcl 2.540-AgR-AgR RTJ 203/84 – Rcl 3.472-AgR RTJ 203/130 – Rcl 5.450-AgR RTJ 203/1011

PrCv Descabimento. (...) Recurso. AI 605.573-ED RTJ 203/434

PrPn Descrição suficiente do fato. (...) Denúncia. HC 87.293 RTJ 203/1144 – HC 88.978 RTJ 203/1164 – HC 89.735 RTJ 203/1188

ÍNDICE ALFABéTICO — Den-Des

1366

Pn Deserção. (...) Crime militar. RHC 86.253 RTJ 203/1126

PrPn Desídia dos depositários na guarda dos bens. (...) Habeas corpus. HC 69.922 RTJ 203/213

PrPn Desmembramento do processo: negativa. (...) Prisão preventiva. HC 89.479 RTJ 203/260

PrPn Desmembramento: inocorrência. (...) Inquérito. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

PrCv Destempo: caracterização. (...) Agravo regimental. AI 503.651-AgR RTJ 203/416

PrPn Destinação dada aos recursos: irrelevância. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Destinação lícita dos recursos: irrelevância. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Diligência. (...) Reclamação. Rcl 5.450-AgR RTJ 203/1011

PrCv Diligência probatória: indeferimento. (...) Decisão judicial. AI 557.623-AgR RTJ 203/425

Adm Direito adquirido: conceito. (...) Aposentadoria. ADI 3.104 RTJ 203/952

PrPn Direito ao silêncio: falta de advertência. (...) Inquérito policial mili-tar. HC 88.950 RTJ 203/1161

PrPn Direito de recorrer em liberdade até o trânsito em julgado. (...) Sen-tença condenatória. HC 91.139 RTJ 203/299

PrPn Diretor do Banco do Brasil e dirigente da empresa beneficiária: des-vio de recursos públicos. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Diretor do Banco do Brasil e ministro da Secretaria de Comunicação e Gestão Estratégica: discricionariedade para alocar bens do Fundo de Incentivo Visanet. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Dirigente: operação de crédito de risco elevado. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Dispositivo constitucional violado: indicação errônea. (...) Recurso extraordinário. RE 402.904-AgR-AgR RTJ 203/1271

PrCv Divórcio ideológico. (...) Agravo. RE 477.315-AgR RTJ 203/1284

PrPn DNA Propaganda Ltda.: beneficiária da antecipação irregular. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrCv Documento novo: não-configuração. (...) Ação rescisória. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

PrPn Dolo específico: ausência. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Des-Dol — ÍNDICE ALFABéTICO

1367

Ct Domicílio: inviolabilidade noturna. (...) Garantia constitucional. RE 460.880 RTJ 203/1277

Int Dupla tipicidade. (...) Extradição. Ext 1.042 RTJ 203/24

PrPn Duplicidade de processos. (...) Processo criminal. HC 87.869 RTJ 203/253

PrCv Duplo fundamento (constitucional e infraconstitucional). (...) Acór-dão recorrido. RE 388.024-AgR RTJ 203/1267 – AI 501.661-AgR RTJ 203/1295

EPrCv Efeito suspensivo a recurso extraordinário. (...) Medida cautelar. AC

1.765-MC RTJ 203/32 – AC 1.781-MC RTJ 203/949

PrCv Embargos de declaração. Caráter protelatório: não-comprovação. Multa: impossibilidade de aplicação. CPC/73, art. 538, parágrafo único. AI 481.829-AgR-ED-EDv-AgR-ED RTJ 203/1287

PrCv Embargos de declaração. Decisão de relator. Conversão em agravo regimental. AI 376.614-ED RTJ 203/1253 – AI 503.651-ED RTJ 203/1310

PrCv Embargos de declaração. Descabimento. Interesse recursal: au-sência. Estado de sucumbência: inocorrência. AI 503.651-ED RTJ 203/1310

PrCv Embargos de declaração. Obscuridade, contradição e omissão: au-sência. Recurso extraordinário. Perda do objeto: ausência. Decisão recorrida: alteração parcial. Execução provisória: manutenção. AI 498.456-AgR-ED-ED RTJ 203/412

PrCv Embargos de declaração. Pressupostos. Novos embargos de declara-ção: ausência de vício no julgamento anterior. RE 175.531-ED-EDv-ED-ED RTJ 203/1229

PrCv Embargos de declaração. Pressupostos inocorrentes. Caráter infrin-gente. AI 481.829-AgR-ED-EDv-AgR-ED RTJ 203/1287

PrCv Embargos de declaração. Pressupostos inocorrentes. Obscuri-dade, contradição e omissão: ausência. CPC/73, art. 535, I e II. AI 480.290-AgR-ED-AgR-ED RTJ 203/404

PrTr Emenda Constitucional 45/04. (...) Competência jurisdicional. RE 503.452-AgR RTJ 203/1304

Ct Emenda Constitucional 45/04. (...) Conselho Nacional de Justiça (CNJ). ADI 3.823-MC RTJ 203/980

PrPn Empresa de consultoria em comunicação: contratação. (...) Denún-cia. Inq 2.245 RTJ 203/473

ÍNDICE ALFABéTICO — Dom-Emp

1368

PrPn Empresa de publicidade: fraude na contabilidade. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Empréstimo bancário: garantia insuficiente. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Endereço: falta. (...) Reclamação. Rcl 5.450-AgR RTJ 203/1011

PrSTF Entidade de previdência privada. (...) Recurso extraordinário. AI 516.241-AgR RTJ 203/1318

PrPn Entrega de elevada soma em dinheiro aos acusados. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Envolvido beneficiado por acordo de delação premiada: irrelevância. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Estabilidade da associação e elemento subjetivo especial do tipo. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrCv Estado de sucumbência: inocorrência. (...) Embargos de declaração. AI 503.651-ED RTJ 203/1310

Pn Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), art. 124, § 2º. (...) Me-dida socioeducativa. HC 89.054 RTJ 203/1171

PrPn Estelionato. (...) Competência criminal. HC 86.867 RTJ 203/248

Int Estelionato. (...) Extradição. Ext 1.042 RTJ 203/24

PrPn Estelionato: atipicidade da conduta. (...) Habeas corpus. HC 86.867 RTJ 203/248

PrPn Estupro e atentado violento ao pudor praticados por militar. (...) Com-petência criminal. HC 86.501 RTJ 203/1129

PrPn Evasão de divisas (Item VIII). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Adm Evolução histórica: teorias. (...) Responsabilidade civil do Estado. RE 364.631 RTJ 203/1242

PrCv Exame: inviabilidade. (...) Agravo regimental. RE 491.863-AgR RTJ 203/1292

PrPn Exame psicológico ou antropológico: desnecessidade. (...) Prova pericial. HC 85.198 RTJ 203/1088

Adm Exame psicotécnico. (...) Concurso público. RE 417.019-AgR RTJ 203/1274

PrPn Exaurimento do crime de corrupção passiva: improcedência. (...) De-núncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Excesso de eloqüência acusatória: inocorrência. (...) Pronúncia. HC 87.157 RTJ 203/1139

Emp-Exc — ÍNDICE ALFABéTICO

1369

PrPn Excesso de prazo. (...) Habeas corpus. HC 91.111 RTJ 203/296

PrPn Excesso de prazo. (...) Prisão cautelar. HC 83.773 RTJ 203/225

PrPn Excesso de prazo. (...) Prisão preventiva. HC 89.479 RTJ 203/260

PrPn Excesso de prazo justificado. (...) Prisão preventiva. HC 89.090 RTJ 203/1175

PrSTF Execução. (...) Recurso extraordinário. RE 488.858-AgR RTJ 203/406

Pn Execução provisória. (...) Pena. HC 91.675 RTJ 203/1218

PrCv Execução provisória: manutenção. (...) Embargos de declaração. AI 498.456-AgR-ED-ED RTJ 203/412

Adm Ex-governador. Subsídio: conceito. Pensão: requisitos. Benefício, vantagem e proventos: distinção. ADI 3.853 RTJ 203/139

Adm Ex-governador. Subsídio mensal vitalício. Criação: descabimento. Cargo de natureza transitória. Cônjuge supérstite. Pensão na metade do valor. CF/88, arts. 1º; 5º, caput; 25, § 1º; 37, caput e XIII; 169, § 1º, I e II; e 195, § 5º: ofensa. ADCT da Constituição do Estado do Ceará/89, art. 29-A, redação da EC 35/06: inconstitucionalidade. ADI 3.853 RTJ 203/139

PrSTF Expressão “relação jurídico-estatutária”: abrangência. (...) Reclama-ção. Rcl 4.785-MC-AgR RTJ 203/1005

PrPn Extensão a co-réus. (...) Habeas corpus. HC 89.479 RTJ 203/260

Pn Extinção da punibilidade. Prescrição. Pena imposta na sentença: anulação. Continuidade delitiva: consideração. Habeas corpus: con-cessão de ofício. HC 85.661 RTJ 203/1092

Int Extradição. Extradição instrutória. Dupla tipicidade. Estelionato. Suspensão do prazo prescricional. Prescrição: não-consumação. Ext 1.042 RTJ 203/24

Int Extradição. Prescrição da pretensão executória. Pena remanescente. Lei brasileira: aplicação. Ext 1.042 RTJ 203/24

Int Extradição. Prisão preventiva: excesso de prazo. Formalização do pedido. Argüição prejudicada. HC 90.154 RTJ 203/277

Int Extradição instrutória. (...) Extradição. Ext 1.042 RTJ 203/24

FPrPn Falsidade ideológica (Item II). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Fato novo: autoridade com prerrogativa de foro. (...) Competência criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

ÍNDICE ALFABéTICO — Exc-Fat

1370

Ct Fato novo relacionado. (...) Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Fato típico e antijurídico: indícios. (...) Investigação criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

Trbt Faturamento. (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

PrSTF Fazenda Pública. (...) Recurso extraordinário. RE 488.858-AgR RTJ 203/406

Ct Férias coletivas: vedação. (...) Magistrado. ADI 3.823-MC RTJ 203/980

PrPn Fiscalização: burla. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Pn Fixação acima do mínimo legal. (...) Pena-base. HC 88.284 RTJ 203/1150 – HC 89.735 RTJ 203/1188

TrPrv Fonte de custeio: exigência operacional. (...) Benefício previdenciá-rio. RE 416.827 RTJ 203/314

Int Formalização do pedido. (...) Extradição. HC 90.154 RTJ 203/277

PrCv Fundamentação: ausência. (...) Agravo regimental. RHC 86.148-AgR RTJ 203/1119

Pn Fundamentação: necessidade. (...) Medida socioeducativa. HC 89.054 RTJ 203/1171

PrCv Fundamentação suficiente. (...) Acórdão. AI 550.979-AgR-ED RTJ 203/422 – AI 584.155-AgR RTJ 203/1328

PrCv Fundamentação suficiente. (...) Decisão judicial. AI 557.623-AgR RTJ 203/425

Pn Fundamentação suficiente. (...) Pena-base. HC 88.284 RTJ 203/ 1150 – HC 89.735 RTJ 203/1188

PrPn Fundamentação suficiente. (...) Prisão preventiva. HC 89.090 RTJ 203/1175 – HC 89.849 RTJ 203/265

PrPn Fundamentação suficiente. (...) Pronúncia. HC 87.157 RTJ 203/ 1139 – HC 90.708 RTJ 203/282

Ct Fundamento exclusivo em matéria jornalística: ausência. (...) Comis-são Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI). Inq 2.245 RTJ 203/473

PrCv Fundamentos da sentença: adoção. (...) Acórdão. AI 550.979-AgR-ED RTJ 203/422

PrSTF Fundo de Saúde de Militares (FUNSA): natureza jurídica. (...) Recur-so extraordinário. RE 491.863-AgR RTJ 203/1292

PrPn Furto dos bens penhorados: comprovação. (...) Habeas corpus. HC 69.922 RTJ 203/213

Fat-Fur — ÍNDICE ALFABéTICO

1371

GCt Garantia constitucional. Domicílio: inviolabilidade noturna. Ordem

judicial autorizadora: irrelevância. Crime de resistência: inocorrên-cia. CF/88, art. 5º, XI. RE 460.880 RTJ 203/1277

PrPn Garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal. (...) Prisão preventiva. HC 89.090 RTJ 203/1175 – HC 89.849 RTJ 203/265

Ct Garantia do direito. (...) Mandado de injunção. MI 721 RTJ 203/11

PrPn Gestão fraudulenta de instituição financeira (Item V). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Gestão fraudulenta de instituição financeira: crime próprio. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Adm Governador e vice-governador. (...) Subsídio. ADI 3.771-MC RTJ 203/133

PrPn Gravidade do crime. (...) Defesa criminal. HC 85.969 RTJ 203/1106

HPrPn Habeas corpus. Concessão da ordem. Extensão a co-réus. HC 89.479

RTJ 203/260

PrPn Habeas corpus. Concessão de ofício. Prisão preventiva. Excesso de prazo. HC 91.111 RTJ 203/296

PrPn Habeas corpus. Conhecimento parcial. Decisão do STJ em recurso especial. Matéria: devolução restrita. HC 90.708 RTJ 203/282

PrPn Habeas corpus. Descabimento. Medida liminar indeferida por relator do STJ. Situação excepcional: ausência. Súmula 691. HC 91.111 RTJ 203/296

PrPn Habeas corpus. Liminar deferida. Prejudicialidade: dúvida. Pronun-ciamento do STF: necessidade. HC 88.520 RTJ 203/1155

PrPn Habeas corpus. Matéria de prova. Apelação criminal: desistência apresentada por advogado constituído. Declaração firmada pelo réu. HC 92.536 RTJ 203/1222

PrPn Habeas corpus. Matéria de prova. Crime ambiental. Área degradada. Unidade de conservação: discussão. HC 89.735 RTJ 203/1188

PrPn Habeas corpus. Matéria de prova. Crime contra a ordem tributária. Procedimento penal. Conexão. HC 84.908 RTJ 203/235

PrPn Habeas corpus. Matéria de prova. Estelionato: atipicidade da condu-ta. HC 86.867 RTJ 203/248

ÍNDICE ALFABéTICO — Gar-Hab

1372

PrPn Habeas corpus. Matéria de prova. Furto dos bens penhorados: com-provação. Desídia dos depositários na guarda dos bens. HC 69.922 RTJ 203/213

PrPn Habeas corpus. Matéria de prova. Prisão em flagrante: ilegalidade. HC 87.379 RTJ 203/1147

PrPn Habeas corpus. Matéria de prova. Tráfico de entorpecente: pedido de absolvição. HC 85.958 RTJ 203/1104

PrPn Habeas corpus. Prejudicialidade. Interesse processual: ausência. HC 85.661 RTJ 203/1092

PrPn Habeas corpus. Prejudicialidade. Liberdade provisória: concessão por outro órgão. Inovação temática: descabimento. RHC 83.799-AgR RTJ 203/1085

PrPn Habeas corpus. Prejudicialidade inocorrente. Medida socioeduca-tiva: aplicação. Menor: fuga. Recapturação: continuidade do cumpri-mento da sentença. HC 89.054 RTJ 203/1171

PrPn Habeas corpus. Questão não apreciada pelo STJ. Supressão de ins-tância. Colisão de defesa: alegação. Manifestação do órgão compe-tente: necessidade. HC 92.536 RTJ 203/1222

PrPn Habeas corpus. Questão não apreciada pelo STJ. Supressão de ins-tância. Crime ambiental. Pena: dosimetria. HC 89.735 RTJ 203/1188

PrPn Habeas corpus. Sessão de julgamento. Comunicação prévia: ausên-cia. Pedido expresso nos autos. Sustentação oral: impossibilidade. Prejuízo à defesa. HC 87.111 RTJ 203/1134

PrPn Habeas corpus. Sessão de julgamento. Comunicação prévia: ausên-cia. Pedido expresso nos autos. Sustentação oral: impossibilidade. Prejuízo à defesa. Lei 10.409/02, art. 38. CF/88, art. 5º, LV. RHC 90.981 RTJ 203/1210

PrPn Habeas corpus. Sessão de julgamento. Comunicação prévia: ausên-cia. Pedido expresso nos autos. Sustentação oral: impossibilidade. Prejuízo à defesa. Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), art. 192, parágrafo único-A. HC 90.326-QO RTJ 203/1207

PrPn Habeas corpus. Substitutivo de recurso ordinário. Matéria de prova. Crime de deserção: excludente de culpabilidade. RHC 88.542 RTJ 203/257

PrPn Habeas corpus. Trancamento da extradição: impossibilidade. Im-procedência prima facie do pedido: inocorrência. HC 90.154 RTJ 203/277

Pn Habeas corpus: concessão de ofício. (...) Extinção da punibilidade. HC 85.661 RTJ 203/1092

Hab-Hab — ÍNDICE ALFABéTICO

1373

PrSTF Hora extra: forma de pagamento. (...) Recurso extraordinário. RE 543.237-AgR RTJ 203/419

IPrPn Imparcialidade dos jurados. (...) Pronúncia. HC 87.157 RTJ

203/1139

PrPn Improcedência prima facie do pedido: inocorrência. (...) Habeas corpus. HC 90.154 RTJ 203/277

Cv Inadimplemento de obrigação alimentícia: ausência de impedimento. (...) Separação judicial. RE 387.271 RTJ 203/1259

PrSTF Incidente de execução: suspensão dos efeitos. (...) Reclamação. Rcl 2.540-AgR-AgR RTJ 203/84

Ct Incompetência do STF: alegação. (...) Competência originária. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Indeferimento de liminar em ação direta de inconstitucionalidade. (...) Reclamação. Rcl 3.472-AgR RTJ 203/130

PrTr Indenização por dano moral ou patrimonial. (...) Competência juris-dicional. RE 503.452-AgR RTJ 203/1304

PrSTF Indicação do dispositivo violado: ausência. (...) Recurso extraordi-nário. AI 513.262-AgR-AgR RTJ 203/1315

PrPn Índio: imputabilidade plena. (...) Prova pericial. HC 85.198 RTJ 203/1088

PrPn Individualização da conduta: ausência. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Individualização da conduta: suficiência. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Inépcia inocorrente. (...) Denúncia. HC 87.293 RTJ 203/1144 – HC 88.978 RTJ 203/1164 – HC 89.735 RTJ 203/1188

PrCv Informações prestadas por autoridade coatora em mandado de segu-rança. (...) Ação rescisória. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

PrCv Inovação temática. (...) Agravo. RE 477.315-AgR RTJ 203/1284

PrPn Inovação temática: descabimento. (...) Habeas corpus. RHC 83.799-AgR RTJ 203/1085

PrPn Inquérito. Desmembramento: inocorrência. Complexidade da causa. Critério subjetivo: afastamento. Critério objetivo: ausência de efeito prático. CPP/41, art. 80. CF/88, art. 5º, LXXVIII. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

ÍNDICE ALFABéTICO — Hor-Inq

1374

PrPn Inquérito policial. Sigilo. Advogado constituído: acesso. Prerroga-tiva profissional. HC 88.520 RTJ 203/1155

PrPn Inquérito policial: desnecessidade. (...) Ação penal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Inquérito policial militar. Interrogatório: ausência de advogado. Paciente com escolaridade razoável: declaração de desnecessidade. Direito ao silêncio: falta de advertência. Sessão: gravação em vídeo. Ação penal: confirmação do depoimento. Constrangimento ilegal inocorrente. HC 88.950 RTJ 203/1161

PrPn Instâncias penal e administrativa: independência. (...) Ação penal. HC 88.950 RTJ 203/1161

PrPn Integração à sociedade: convicção judicial. (...) Prova pericial. HC 85.198 RTJ 203/1088

PrCv Intempestividade. (...) Agravo regimental. AI 503.651-AgR RTJ 203/416 – AI 584.745-AgR RTJ 203/1331

Ct Interesse local. (...) Competência legislativa. AI 491.420-AgR RTJ 203/409

PrPn Interesse processual: ausência. (...) Habeas corpus. HC 85.661 RTJ 203/1092

PrCv Interesse recursal: ausência. (...) Embargos de declaração. AI 503.651-ED RTJ 203/1310

PrCv Interposição por fac-símile. (...) Agravo regimental. AI 584.745-AgR RTJ 203/1331

PrCv Interposição por fax. (...) Agravo regimental. AI 503.651-AgR RTJ 203/416

PrPn Interposta pessoa: procedimento diverso da praxe bancária. (...) De-núncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Interposta pessoa: utilização. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Interpretação de cláusula contratual. (...) Recurso extraordinário. AI 533.565-AgR RTJ 203/1321

PrPn Interrogatório. (...) Processo criminal. HC 86.166 RTJ 203/1122

PrPn Interrogatório: ausência de advogado. (...) Inquérito policial militar. HC 88.950 RTJ 203/1161

PrPn Interrupção do lapso temporal: ausência. (...) Prisão preventiva. HC 89.479 RTJ 203/260

PrPn Investigação criminal. Fato típico e antijurídico: indícios. Julgamen-to político: inocorrência. Inq 2.245 RTJ 203/473

Inq-Inv — ÍNDICE ALFABéTICO

1375

JCt Juiz e membro de tribunal de segundo grau. (...) Magistrado. ADI

3.823-MC RTJ 203/980

PrPn Juízo a quo. (...) Competência criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrCv Juízo de admissibilidade. (...) Recurso. AI 376.614-ED RTJ 203/1253

PrSTF Juízo de admissibilidade. (...) Recurso extraordinário. AI 418.610-AgR RTJ 203/399

PrCv Juízo de admissibilidade na origem: descabimento. (...) Agravo de instrumento. Rcl 4.484 RTJ 203/211

Adm Julgamento da ADI 231: situação anterior. (...) Servidor público. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231

PrPn Julgamento político: inocorrência. (...) Investigação criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Julgamento simultaneus processus. (...) Competência criminal. HC 84.908 RTJ 203/235

PrPn Juntada posterior de documento: desconsideração. (...) Defesa crimi-nal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Júri. Nova divisão judiciária. Competência territorial: manutenção. Princípio da perpetuatio jurisdictionis: aplicação analógica. CPP/41, arts. 421 e 423. CPC/73, art. 87. HC 89.849 RTJ 203/265

PrPn Júri. Nulidade. Defensor dativo: desídia. Defesa material: ausência. Crimes conexos: pena máxima. Novo julgamento: abrangência do primeiro. HC 85.969 RTJ 203/1106

PrPn Justiça comum. (...) Competência criminal. HC 86.501 RTJ 203/1129

PrTr Justiça do Trabalho. (...) Competência jurisdicional. RE 503.452-AgR RTJ 203/1304

PrSTF Justiça do Trabalho: definição de competência. (...) Reclamação. Rcl 4.785-MC-AgR RTJ 203/1005

PrPn Justiça estadual: extinção da punibilidade. (...) Processo criminal. HC 87.869 RTJ 203/253

PrPn Justiça Militar. (...) Competência criminal. HC 86.867 RTJ 203/248

PrPn Justiça Militar: extinção da ação penal em curso. (...) Processo crimi-nal. HC 87.869 RTJ 203/253

LPrPn Lavagem de dinheiro (Item III.1.a.2). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ

203/473

ÍNDICE ALFABéTICO — Jui-Lav

1376

PrPn Lavagem de dinheiro (Itens III.1, III.3, VI.2.a e VI.4.a). (...) Denún-cia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Lavagem de dinheiro (Item IV). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Lavagem de dinheiro (Item VI). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Lavagem de dinheiro (Item VII). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Lavagem de dinheiro (Item VIII). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Adm Lei 5.787/72: revogação pela Lei 8.237/91. (...) Militar. RE 491.863-AgR RTJ 203/1292

Pn Lei 6.001/73, art. 56, parágrafo único. (...) Regime prisional. HC 85.198 RTJ 203/1088

Adm Lei 7.227/89. (...) Servidor público. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231

PrPn Lei 7.492/86, arts. 4º e 25. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Lei 7.492/86, art. 22, parágrafo único. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Pn Lei 8.072/90, art. 2º, § 1º: inconstitucionalidade declarada no HC 82.959. (...) Regime prisional. RE 472.584 RTJ 203/402

Ct Lei 8.213/91, art. 57, § 1º. (...) Mandado de injunção. MI 721 RTJ 203/11

PrPn Lei 9.099/95, art. 82, § 5º. (...) Acórdão criminal. HC 86.533 RTJ 203/1132

Pn Lei 9.605/98, art. 40: eficácia plena e aplicabilidade imediata. (...) Crime ambiental. HC 89.735 RTJ 203/1188

PrPn Lei 9.605/98, arts. 40 e 53. (...) Denúncia. HC 89.735 RTJ 203/1188

PrPn Lei 9.613/98, art. 1º, V, VI e VII. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Trbt Lei 9.718/98, art. 3º, § 1º: inconstitucionalidade declarada no RE 357.950. (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

PrCv Lei 9.718/98, art. 3º, § 1º: inconstitucionalidade declarada no RE 357.950. (...) Medida cautelar. AC 1.765-MC RTJ 203/32

Trbt Lei 9.718/98, art. 8º. (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

PrCv Lei 9.800/99. (...) Agravo regimental. AI 503.651-AgR RTJ 203/416

Lav-Lei — ÍNDICE ALFABéTICO

1377

PrCv Lei 9.800/99, art. 2º, caput. (...) Agravo regimental. AI 584.745-AgR RTJ 203/1331

Pn Lei 9.985/00. (...) Crime ambiental. HC 89.735 RTJ 203/1188

PrSTF Lei 10.259/01, arts. 14, § 7º, e 15. (...) Recurso extraordinário. RE 416.827 RTJ 203/314

PrPn Lei 10.409/02. (...) Processo criminal. HC 86.166 RTJ 203/1122

PrPn Lei 10.409/02, art. 38. (...) Habeas corpus. RHC 90.981 RTJ 203/1210

Int Lei brasileira: aplicação. (...) Extradição. Ext 1.042 RTJ 203/24

Trbt Lei complementar: desnecessidade. (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

Ct Lei Delegada estadual 13/03/AL: inconstitucionalidade. (...) Compe-tência legislativa. ADI 3.189 RTJ 203/103

Ct Lei estadual 4.493/83/AL: não-recepção. (...) Controle de constitu-cionalidade. ADI 3.189 RTJ 203/103

Ct Lei estadual 6.140/99/AL: inconstitucionalidade. (...) Competência legislativa. ADI 3.189 RTJ 203/103

Ct Lei estadual 6.183/00/AL: inconstitucionalidade. (...) Competência legislativa. ADI 3.189 RTJ 203/103

Ct Lei estadual 6.225/01/AL: inconstitucionalidade. (...) Competência legislativa. ADI 3.189 RTJ 203/103

Ct Lei estadual 6.263/01/AL: inconstitucionalidade. (...) Competência legislativa. ADI 3.189 RTJ 203/103

PrPn Lesão ao estabelecimento bancário: ausência. (...) Competência cri-minal. HC 86.867 RTJ 203/248

PrPn Liberdade provisória: concessão por outro órgão. (...) Habeas corpus. RHC 83.799-AgR RTJ 203/1085

PrPn Liminar deferida. (...) Habeas corpus. HC 88.520 RTJ 203/1155

PrSTF Limitação temporal dos efeitos: impossibilidade. (...) Recurso extra-ordinário. RE 364.304-AgR RTJ 203/1235 – AI 589.281-AgR RTJ 203/1334

PrCv Litigância de má-fé. (...) Agravo regimental. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231 – RE 543.237-AgR RTJ 203/419

PrCv Litigância de má-fé: ausência. (...) Agravo de instrumento. AI 503.651-ED RTJ 203/1310

PrPn Local da consumação do delito. (...) Competência criminal. Pet 3.631 RTJ 203/973

ÍNDICE ALFABéTICO — Lei-Loc

1378

PrPn Local sujeito à administração militar. (...) Competência criminal. HC 86.867 RTJ 203/248

MCt Magistrado. Juiz e membro de tribunal de segundo grau. Férias cole-

tivas: vedação. Princípio da ininterruptabilidade da jurisdição. Reso-lução 24/06-CNJ: suspensão cautelar. Ato Regimental 5/06-TJDFT: suspensão cautelar. CF/88, art. 93, XII, redação da EC 45/04. ADI 3.823-MC RTJ 203/980

Ct Magistrado. Remuneração. Magistratura federal e estadual. Teto constitucional: fixação diferenciada. Princípio da isonomia. Poder Judiciário: caráter nacional. Resoluções 13/06-CNJ, art. 2º, e 14/06-CNJ, art. 1º, parágrafo único: suspensão. CF/88, art. 37, XI, redação da EC 41/03: interpretação conforme à Constituição. CF/88, art. 37, § 12, redação da EC 47/05: interpretação conforme à Constituição. ADI 3.854-MC RTJ 203/184

PrPn Magistrado: declinação de competência. (...) Competência criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

Ct Magistrado: remessa dos autos a outro juízo. (...) Competência origi-nária. Pet 3.631 RTJ 203/973

Ct Magistratura federal e estadual. (...) Magistrado. ADI 3.854-MC RTJ 203/184

Ct Mandado de injunção. Ação mandamental. Servidor público. Apo-sentadoria especial. Atividade insalubre. Norma regulamentadora: necessidade. Garantia do direito. Lei 8.213/91, art. 57, § 1º. CF/88, art. 40, § 1º. MI 721 RTJ 203/11

Ct Mandado de injunção. (...) Competência originária. MI 721 RTJ 203/11

PrCv Mandado de segurança. (...) Medida liminar. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

PrPn Manifestação do órgão competente: necessidade. (...) Habeas corpus. HC 92.536 RTJ 203/1222

PrPn Manipulação da defesa. (...) Prisão preventiva. HC 89.849 RTJ 203/265

PrSTF Matéria constitucional suscitada em embargos de declaração. (...) Recurso extraordinário. AI 516.241-AgR RTJ 203/1318

PrCv Matéria de ordem pública. (...) Recurso. AI 376.614-ED RTJ 203/1253

Loc-Mat — ÍNDICE ALFABéTICO

1379

PrPn Matéria de prova. (...) Habeas corpus. HC 69.922 RTJ 203/213 – HC 84.908 RTJ 203/235 – HC 85.958 RTJ 203/1104 – HC 86.867 RTJ 203/248 – HC 87.379 RTJ 203/1147 – RHC 88.542 RTJ 203/257 – HC 89.735 RTJ 203/1188 – HC 92.536 RTJ 203/1222

PrSTF Matéria de prova. (...) Recurso extraordinário. RE 364.631 RTJ 203/1242 – AI 533.565-AgR RTJ 203/1321

PrPn Matéria: devolução restrita. (...) Habeas corpus. HC 90.708 RTJ 203/282

PrSTF Matéria infraconstitucional. (...) Recurso extraordinário. RE 488.858-AgR RTJ 203/406 – RE 491.863-AgR RTJ 203/1292 – AI 516.241-AgR RTJ 203/1318 – AI 533.565-AgR RTJ 203/1321 – RE 543.237-AgR RTJ 203/419 – AI 557.623-AgR RTJ 203/425 – AI 569.103-AgR RTJ 203/428 – AI 579.988-AgR RTJ 203/431

PrCv Matéria pendente de julgamento no STF: RE 355.856. (...) Medida cautelar. AC 1.781-MC RTJ 203/949

Ct Matéria: preclusão. (...) Competência originária. Inq 2.245 RTJ 203/473

Ct Matéria reservada à iniciativa do Executivo. (...) Processo legislativo. ADI 2.873 RTJ 203/89

PrPn Materialidade do crime e indícios de autoria. (...) Ação penal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Materialidade do crime e indícios de autoria. (...) Pronúncia. HC 90.708 RTJ 203/282

PrCv Medida cautelar. Autarquia estadual (Rurap). Siafi: suspensão da inclusão. Política pública: risco na execução. Decisão de relator: refe-rendo do Plenário. AC 1.084-MC-QO RTJ 203/943

PrCv Medida cautelar. Efeito suspensivo a recurso extraordinário. Matéria pendente de julgamento no STF: RE 355.856. Decisão de relator: referendo da Turma. AC 1.781-MC RTJ 203/949

PrCv Medida cautelar. Efeito suspensivo a recurso extraordinário. PIS e Cofins: incidência. Lei 9.718/98, art. 3º, § 1º: inconstitucionalidade declarada no RE 357.950. AC 1.765-MC RTJ 203/32

PrCv Medida liminar. Mandado de segurança. Decisão do Plenário: possi-bilidade. Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), arts. 21, I, e 203, § 1º. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

PrPn Medida liminar em habeas corpus: indeferimento. (...) Agravo regi-mental. HC 89.837-MC-AgR RTJ 203/1202

PrPn Medida liminar indeferida por relator do STJ. (...) Habeas corpus. HC 91.111 RTJ 203/296

ÍNDICE ALFABéTICO — Mat-Med

1380

Pn Medida penal: não-aplicação. (...) Crime de desobediência. HC 86.254 RTJ 203/243

Pn Medida socioeducativa. Ato infracional: roubo. Semiliberdade: substituição de internação. Atividade externa. Visitação à família: restrição. Fundamentação: necessidade. Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), art. 124, § 2º. HC 89.054 RTJ 203/1171

PrPn Medida socioeducativa: aplicação. (...) Habeas corpus. HC 89.054 RTJ 203/1171

PrPn Menor: fuga. (...) Habeas corpus. HC 89.054 RTJ 203/1171

Ct Mens legis (vontade da lei): prevalência. (...) Poder Judiciário. RE 503.452-AgR RTJ 203/1304

Adm Militar. Contribuição para o Fundo de Saúde de Militares (FUNSA): ilegitimidade. Alíquota: ausência de previsão legal. Lei 5.787/72: revogação pela Lei 8.237/91. RE 491.863-AgR RTJ 203/1292

PrPn Militar contra militar. (...) Competência criminal. HC 86.867 RTJ 203/248

PrPn Militar em serviço: ausência de prova. (...) Competência criminal. HC 86.501 RTJ 203/1129

Ct Ministério Público de Estados diversos. (...) Competência originária. Pet 3.631 RTJ 203/973

PrPn Ministério Público: prerrogativa. (...) Ação penal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Motivação: remissão ao fundamento da sentença. (...) Acórdão crimi-nal. HC 86.533 RTJ 203/1132

PrCv Multa. (...) Agravo regimental. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231 – RE 543.237-AgR RTJ 203/419

PrCv Multa: descabimento. (...) Agravo de instrumento. AI 503.651-ED RTJ 203/1310

PrCv Multa: impossibilidade de aplicação. (...) Embargos de declaração. AI 481.829-AgR-ED-EDv-AgR-ED RTJ 203/1287

Ct Município. (...) Competência legislativa. AI 491.420-AgR RTJ 203/409

NPn Não-configuração. (...) Crime de desobediência. HC 86.254 RTJ

203/243

PrPn Não-recebimento. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Med-Não — ÍNDICE ALFABéTICO

1381

PrPn Narração genérica. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Ct Natureza administrativa. (...) Conselho Nacional de Justiça (CNJ). ADI 3.823-MC RTJ 203/980

PrCv Negativa de seguimento. (...) Agravo regimental. RHC 86.148-AgR RTJ 203/1119

Adm Nexo de causalidade: ausência. (...) Responsabilidade civil do Esta-do. RE 364.631 RTJ 203/1242

Adm Nomeação: expectativa de direito. (...) Concurso público. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231

Ct Norma anterior à CF/88. (...) Controle de constitucionalidade. ADI 3.189 RTJ 203/103

PrSTF Norma anterior à CF/88 (pré-constitucional): não-recepção. (...) Re-curso extraordinário. RE 364.304-AgR RTJ 203/1235 – RE 387.271 RTJ 203/1259 – AI 589.281-AgR RTJ 203/1334

Ct Norma regulamentadora: necessidade. (...) Mandado de injunção. MI 721 RTJ 203/11

PrPn Notas fiscais frias: simulação de prestação de serviço. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Nova divisão judiciária. (...) Júri. HC 89.849 RTJ 203/265

PrPn Novo julgamento: abrangência do primeiro. (...) Júri. HC 85.969 RTJ 203/1106

Adm Novo regime jurídico. (...) Aposentadoria. ADI 3.104 RTJ 203/952

PrCv Novos embargos de declaração: ausência de vício no julgamento an-terior. (...) Embargos de declaração. RE 175.531-ED-EDv-ED-ED RTJ 203/1229

PrPn Núcleo publicitário-financeiro. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Núcleo publicitário-financeiro: remessa de dinheiro supostamente ilegal ao exterior. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Nulidade. (...) Júri. HC 85.969 RTJ 203/1106

PrPn Nulidade inocorrente. (...) Processo criminal. HC 86.166 RTJ 203/1122

OCt Objeto inicial: possibilidade de ampliação. (...) Comissão Parlamen-

tar de Inquérito (CPI). Inq 2.245 RTJ 203/473

ÍNDICE ALFABéTICO — Nar-Obj

1382

PrCv Obscuridade, contradição e omissão: ausência. (...) Embargos de declaração. AI 480.290-AgR-ED-AgR-ED RTJ 203/404 – AI 498.456-AgR-ED-ED RTJ 203/412

PrPn Ocultação e dissimulação da origem, movimentação, localização e propriedade de valores. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Opinio delicti e eventual denúncia: atribuição do Ministério Público estadual. (...) Competência criminal. Pet 3.631 RTJ 203/973

Ct Ordem cronológica: quebra inocorrente. (...) Precatório. Rcl 3.219-AgR RTJ 203/127

Adm Ordem de classificação: observância. (...) Concurso público. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231

PrPn Ordem de desembolso: indícios. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Ct Ordem judicial autorizadora: irrelevância. (...) Garantia constitu-cional. RE 460.880 RTJ 203/1277

Ct Ordenamento normativo. (...) Poder Judiciário. RE 503.452-AgR RTJ 203/1304

PrSTF Órgão de origem: juízo provisório. (...) Recurso extraordinário. AI 418.610-AgR RTJ 203/399

Int Órgão diverso: impossibilidade de compartilhamento. (...) Acordo internacional. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrCv Original apresentado fora do prazo. (...) Agravo regimental. AI 503.651-AgR RTJ 203/416 – AI 584.745-AgR RTJ 203/1331

PPrPn Paciente com escolaridade razoável: declaração de desnecessidade.

(...) Inquérito policial militar. HC 88.950 RTJ 203/1161

PrPn Parlamentar e ministro de Estado: prerrogativa de foro. (...) Compe-tência criminal. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

PrPn Peculato (Itens III.1.a.3 e III.1.b.2). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Peculato (Itens III.2 e III.3). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Peculato (Item III.3). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Peculato e corrupção ativa (Itens III.1.a.3, III.1.b.2, III.2.b, III.3.c.1 e III.3.c.2). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Pedido de processamento imediato. (...) Recurso extraordinário. AI 502.333-AgR RTJ 203/1299

Obs-Ped — ÍNDICE ALFABéTICO

1383

PrPn Pedido expresso nos autos. (...) Habeas corpus. HC 87.111 RTJ 203/1134 – HC 90.326-QO RTJ 203/1207 – RHC 90.981 RTJ 203/1210

Pn Pena. Cálculo. Roubo contra vítimas diversas. Concurso formal. CP/40, art. 70, parte final. HC 91.615 RTJ 203/1214

Pn Pena. Execução provisória. Recurso sem efeito suspensivo. Princí-pio da não-culpabilidade: ofensa inocorrente. CPP/41, art. 637. HC 91.675 RTJ 203/1218

PrPn Pena: dosimetria. (...) Habeas corpus. HC 89.735 RTJ 203/1188

Pn Pena imposta na sentença: anulação. (...) Extinção da punibilidade. HC 85.661 RTJ 203/1092

Pn Pena máxima em abstrato: cumprimento de um sexto. (...) Regime prisional. HC 90.893 RTJ 203/289

Int Pena remanescente. (...) Extradição. Ext 1.042 RTJ 203/24

Pn Pena-base. Fixação acima do mínimo legal. Fundamentação sufici-ente. Circunstância judicial. CP/40, art. 59. HC 89.735 RTJ 203/1188

Pn Pena-base. Fixação acima do mínimo legal. Fundamentação sufi-ciente. Tráfico de entorpecente. Circunstância judicial. CP/40, arts. 59 e 68. HC 88.284 RTJ 203/1150

Adm Pensão na metade do valor. (...) Ex-governador. ADI 3.853 RTJ 203/139

TrPrv Pensão por morte. (...) Benefício previdenciário. RE 416.827 RTJ 203/314

TrPrv Pensão por morte: perfil institucional. (...) Benefício previdenciário. RE 416.827 RTJ 203/314

Adm Pensão: requisitos. (...) Ex-governador. ADI 3.853 RTJ 203/139

PrCv Perda do objeto: ausência. (...) Embargos de declaração. AI 498.456-AgR-ED-ED RTJ 203/412

Ct Pessoas jurídicas distintas. (...) Precatório. Rcl 3.219-AgR RTJ 203/127

PrCv Petição de RE: ausência da data do protocolo. (...) Agravo de instru-mento. AI 376.614-ED RTJ 203/1253

PrCv Petição de RE: protocolo ilegível. (...) Agravo de instrumento. AI 556.121-AgR RTJ 203/1324 – AI 662.972-AgR RTJ 203/1343

PrSTF Petição de RE: tese constitucional. (...) Recurso extraordinário. AI 513.262-AgR-AgR RTJ 203/1315

PrCv PIS e Cofins: incidência. (...) Medida cautelar. AC 1.765-MC RTJ 203/32

ÍNDICE ALFABéTICO — Ped-PIS

1384

PrSTF Plano de saúde. (...) Recurso extraordinário. AI 533.565-AgR RTJ 203/1321

Ct Poder Judiciário. Ordenamento normativo. Mens legis (vontade da lei): prevalência. RE 503.452-AgR RTJ 203/1304

Ct Poder Judiciário: caráter nacional. (...) Magistrado. ADI 3.854-MC RTJ 203/184

Int Polícia Federal e Ministério Público: ausência de restrição de uso. (...) Acordo internacional. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrCv Política pública: risco na execução. (...) Medida cautelar. AC 1.084-MC-QO RTJ 203/943

Pn Posse tranqüila por breve tempo. (...) Roubo. HC 91.696 RTJ 203/306

PrPn Praxe bancária: inobservância. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Prazo decadencial: termo inicial. (...) Recurso extraordinário. AI 579.988-AgR RTJ 203/431

PrSTF Prazo legal: descumprimento. (...) Reclamação. Rcl 5.450-AgR RTJ 203/1011

Ct Precatório. Ordem cronológica: quebra inocorrente. Pessoas jurídicas distintas. Bloqueio e seqüestro de verba: inadmissibilidade. Quantia retida: devolução. CF/88, art. 100, § 2º. Rcl 3.219-AgR RTJ 203/127

Pn Precedente mencionado: inaplicabilidade. (...) Roubo. HC 91.696 RTJ 203/306

PrPn Prejudicialidade. (...) Habeas corpus. RHC 83.799-AgR RTJ 203/1085 – HC 85.661 RTJ 203/1092

PrPn Prejudicialidade: dúvida. (...) Habeas corpus. HC 88.520 RTJ 203/1155

PrPn Prejudicialidade inocorrente. (...) Habeas corpus. HC 89.054 RTJ 203/1171

PrPn Prejuízo à defesa. (...) Habeas corpus. HC 87.111 RTJ 203/1134 – HC 90.326-QO RTJ 203/1207 – RHC 90.981 RTJ 203/1210

PrPn Prejuízo não demonstrado. (...) Processo criminal. HC 86.166 RTJ 203/1122

PrSTF Prequestionamento: ausência. (...) Recurso extraordinário. AI 516.241-AgR RTJ 203/1318

Ct Prerrogativa de foro: ausência. (...) Competência originária. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Prerrogativa profissional. (...) Inquérito policial. HC 88.520 RTJ 203/1155

Pla-Pre — ÍNDICE ALFABéTICO

1385

Pn Prescrição. (...) Extinção da punibilidade. HC 85.661 RTJ 203/1092

PrSTF Prescrição. (...) Recurso extraordinário. AI 569.103-AgR RTJ 203/428

Int Prescrição da pretensão executória. (...) Extradição. Ext 1.042 RTJ 203/24

Pn Prescrição inocorrente. (...) Crime militar. RHC 86.253 RTJ 203/1126

Int Prescrição: não-consumação. (...) Extradição. Ext 1.042 RTJ 203/24

PrPn Presidente da Câmara dos Deputados: atos de ofício potenciais ou efetivos. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Presidente do STF: deferimento do compartilhamento. (...) Prova criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Pressuposto ausente: juízo de inconstitucionalidade. (...) Recurso extraordinário. RE 364.304-AgR RTJ 203/1235 – AI 589.281-AgR RTJ 203/1334

PrCv Pressupostos. (...) Embargos de declaração. RE 175.531-ED-EDv-ED-ED RTJ 203/1229

PrCv Pressupostos inocorrentes. (...) Embargos de declaração. AI 480.290-AgR-ED-AgR-ED RTJ 203/404 – AI 481.829-AgR-ED-EDv-AgR-ED RTJ 203/1287

PrSTF Pressupostos inocorrentes. (...) Reclamação. Rcl 3.779-AgR RTJ 203/136

Adm Preterição inocorrente. (...) Concurso público. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231

PrCv Previsão legal: ausência. (...) Agravo regimental. AI 513.262-AgR-AgR RTJ 203/1315

PrPn Princípio da ampla defesa. (...) Defesa criminal. HC 85.969 RTJ 203/1106

PrPn Princípio da dignidade da pessoa humana: ofensa. (...) Defesa crimi-nal. HC 87.111 RTJ 203/1134

Pn Princípio da individualização da pena: nova inteligência em evolução jurisprudencial. (...) Regime prisional. RE 472.584 RTJ 203/402

PrPn Princípio da indivisibilidade: inaplicabilidade à ação penal pública. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Ct Princípio da ininterruptabilidade da jurisdição. (...) Magistrado. ADI 3.823-MC RTJ 203/980

Ct Princípio da isonomia. (...) Magistrado. ADI 3.854-MC RTJ 203/184

ÍNDICE ALFABéTICO — Pre-Pri

1386

Trbt Princípio da isonomia: ofensa inocorrente. (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

PrSTF Princípio da legalidade. (...) Recurso extraordinário. AI 533.565-AgR RTJ 203/1321

Pn Princípio da não-culpabilidade: ofensa inocorrente. (...) Pena. HC 91.675 RTJ 203/1218

PrPn Princípio da perpetuatio jurisdictionis: aplicação analógica. (...) Júri. HC 89.849 RTJ 203/265

PrPn Princípio da razoável duração do processo: ofensa inocorrente. (...) Prisão preventiva. HC 89.090 RTJ 203/1175

TrPrv Princípio da solidariedade e da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial. (...) Benefício previdenciário. RE 416.827 RTJ 203/314

TrPrv Princípio tempus regit actum: aplicação. (...) Benefício previdenciá-rio. RE 416.827 RTJ 203/314

PrPn Prisão cautelar. Relaxamento. Excesso de prazo. Responsabilidade do aparelho judiciário. HC 83.773 RTJ 203/225

Cv Prisão civil. Depositário infiel. Ação de depósito: desnecessidade. Súmula 619. HC 69.922 RTJ 203/213

PrPn Prisão em flagrante: ilegalidade. (...) Habeas corpus. HC 87.379 RTJ 203/1147

PrPn Prisão preventiva. Excesso de prazo. Pronúncia: superveniência. Interrupção do lapso temporal: ausência. Complexidade da causa e pluralidade de réus. Desmembramento do processo: negativa. Cons-trangimento ilegal: caracterização. HC 89.479 RTJ 203/260

PrPn Prisão preventiva. Excesso de prazo justificado. Complexidade da causa: pluralidade de réus e delitos. Princípio da razoável duração do processo: ofensa inocorrente. HC 89.090 RTJ 203/1175

PrPn Prisão preventiva. Fundamentação suficiente. Garantia da ordem pú-blica e conveniência da instrução criminal. HC 89.090 RTJ 203/1175

PrPn Prisão preventiva. Fundamentação suficiente. Garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal. Manipulação da defesa. HC 89.849 RTJ 203/265

PrPn Prisão preventiva. (...) Habeas corpus. HC 91.111 RTJ 203/296

Int Prisão preventiva: excesso de prazo. (...) Extradição. HC 90.154 RTJ 203/277

PrPn Procedimento penal. (...) Habeas corpus. HC 84.908 RTJ 203/235

Ct Processo administrativo parlamentar. Cassação de mandato. Depu-tado federal licenciado: investidura no cargo de ministro de Estado.

Pri-Pro — ÍNDICE ALFABéTICO

1387

Quebra de decoro. Processo disciplinar: cabimento. Regimento In-terno da Câmara dos Deputados, art. 244. Código de ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, art. 4º, IV. CF/88, arts. 55, § 1º; 56, I; 85; 86; 87; e 102, I, c. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

PrPn Processo criminal. Duplicidade de processos. Justiça estadual: extin-ção da punibilidade. Transação penal: cumprimento. Justiça Militar: extinção da ação penal em curso. CPM/69, art. 9º. HC 87.869 RTJ 203/253

PrPn Processo criminal. Nulidade inocorrente. Tráfico de entorpecente. Interrogatório. Rito procedimental: inobservância. Prejuízo não de-monstrado. Lei 10.409/02. HC 86.166 RTJ 203/1122

Ct Processo disciplinar: cabimento. (...) Processo administrativo parla-mentar. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

Ct Processo e julgamento. (...) Competência originária. MI 721 RTJ 203/11

Ct Processo legislativo. Matéria reservada à iniciativa do Executivo. Cargo público: provimento. Concurso público: limite de idade. CF/88, art. 61, § 1º, II, c: ofensa. Constituição do Estado do Piauí/89, art. 54, VI: inconstitucionalidade. ADI 2.873 RTJ 203/89

PrPn Processo penal militar: prosseguimento. (...) Ação penal. HC 88.950 RTJ 203/1161

Trbt Programa de Integração Social (PIS). (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

Pn Progressão. (...) Regime prisional. HC 91.663 RTJ 203/303

Pn Progressão: possibilidade. (...) Regime prisional. HC 90.893 RTJ 203/289 – RE 472.584 RTJ 203/402

PrPn Pronúncia. Fundamentação suficiente. Excesso de eloqüência acusa-tória: inocorrência. Imparcialidade dos jurados. CPP/41, art. 408. HC 87.157 RTJ 203/1139

PrPn Pronúncia. Fundamentação suficiente. Materialidade do crime e in-dícios de autoria. Prova plena: inexigibilidade. Chamada de co-réus: fundamento complementar. HC 90.708 RTJ 203/282

PrPn Pronúncia: superveniência. (...) Prisão preventiva. HC 89.479 RTJ 203/260

PrPn Pronunciamento do STF: necessidade. (...) Habeas corpus. HC 88.520 RTJ 203/1155

PrPn Propina em troca de apoio político. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

ÍNDICE ALFABéTICO — Pro-Pro

1388

PrPn Propina: ocultação da origem, natureza e destinatário. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Prova criminal. Dados de empréstimo fornecidos pelo Bacen e pelo Banco BMG. CPMI dos Correios: requisição. Presidente do STF: deferimento do compartilhamento. Relator do inquérito: afastamento posterior do sigilo bancário. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Prova criminal. Prova emprestada: CPMI do Banestado. CPMI dos Correios: autorização. Presidente do STF: deferimento do comparti-lhamento. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Prova emprestada: CPMI do Banestado. (...) Prova criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Prova pericial. Exame psicológico ou antropológico: desnecessi-dade. Crime de tráfico de entorpecente, associação para o tráfico e porte ilegal de armas. Índio: imputabilidade plena. Integração à so-ciedade: convicção judicial. HC 85.198 RTJ 203/1088

PrSTF Prova pericial: desnecessidade. (...) Recurso extraordinário. AI 557.623-AgR RTJ 203/425

PrPn Prova plena: inexigibilidade. (...) Pronúncia. HC 90.708 RTJ 203/282

Adm Provimento derivado. (...) Servidor público. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231

QPrPn Quadrilha ou bando (Item II). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Quadrilha ou bando (Item VI). (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Quadrilha ou bando: crime formal. (...) Denúncia. HC 88.978 RTJ 203/1164

Ct Quantia retida: devolução. (...) Precatório. Rcl 3.219-AgR RTJ 203/127

Ct Quebra de decoro. (...) Processo administrativo parlamentar. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

Ct Quebra de sigilo. (...) Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI). Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Quebra de sigilo bancário e fiscal. (...) Competência criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

Ct Questão interna corporis: inocorrência. (...) Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). MS 25.579-MC RTJ 203/1014

Pro-Que — ÍNDICE ALFABéTICO

1389

PrPn Questão não apreciada pelo STJ. (...) Habeas corpus. HC 89.735 RTJ 203/1188 – HC 92.536 RTJ 203/1222

PrCv Questão nova. (...) Agravo regimental. RE 491.863-AgR RTJ 203/1292

RPrSTF Razões recursais: superação. (...) Recurso extraordinário. RE

402.904-AgR-AgR RTJ 203/1271

PrPn Recapturação: continuidade do cumprimento da sentença. (...) Ha-beas corpus. HC 89.054 RTJ 203/1171

PrPn Recebimento. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Recebimento de recursos provenientes de organização criminosa: “Valerioduto”. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Trbt Receita bruta: ampliação do conceito. (...) Contribuição social. RE 473.218-AgR RTJ 203/1280

PrPn Receptação: crime instantâneo. (...) Competência criminal. Pet 3.631 RTJ 203/973

PrSTF Reclamação. Decisão em ação civil pública. Justiça do Trabalho: definição de competência. Expressão “relação jurídico-estatutária”: abrangência. Cargo efetivo, cargo em comissão ou contratação tem-porária: impossibilidade de análise da regularidade constitucional ou legal. Decisão na ADI 3.395-MC: definição do alcance material. Rcl 4.785-MC-AgR RTJ 203/1005

PrSTF Reclamação. Descabimento. Decisão em medida idêntica: descum-primento. Rcl 5.450-AgR RTJ 203/1011

PrSTF Reclamação. Descabimento. Indeferimento de liminar em ação direta de inconstitucionalidade. Rcl 3.472-AgR RTJ 203/130

PrSTF Reclamação. Descabimento. Trânsito em julgado da decisão. Inci-dente de execução: suspensão dos efeitos. Decisão na ACi 9.621: ausência de descumprimento. Rcl 2.540-AgR-AgR RTJ 203/84

PrSTF Reclamação. Diligência. Endereço: falta. Reclamante: intimação para apresentação. Prazo legal: descumprimento. Rcl 5.450-AgR RTJ 203/1011

PrSTF Reclamação. Pressupostos inocorrentes. Decisão na ADI 1.232: des-cumprimento não demonstrado. Rcl 3.779-AgR RTJ 203/136

PrSTF Reclamante: intimação para apresentação. (...) Reclamação. Rcl 5.450-AgR RTJ 203/1011

ÍNDICE ALFABéTICO — Que-Rec

1390

PrCv Recurso. Descabimento. Consulta ao Judiciário: inadmissibilidade. AI 605.573-ED RTJ 203/434

PrCv Recurso. Juízo de admissibilidade. Tempestividade. Matéria de or-dem pública. Conhecimento de ofício: possibilidade. AI 376.614-ED RTJ 203/1253

Adm Recurso administrativo. Admissibilidade. Depósito prévio do valor da multa: inconstitucionalidade declarada pelo STF. CF/88, art. 5º, XXXIV, a, e LV. RE 402.904-AgR-AgR RTJ 203/1271

Adm Recurso administrativo. Admissibilidade. Depósito prévio: inexigi-bilidade. CF/88, art. 5º, LV. RE 311.900 RTJ 203/312

Pn Recurso da acusação: pendência de julgamento. (...) Regime prisio-nal. HC 90.893 RTJ 203/289

PrCv Recurso especial: preclusão. (...) Acórdão recorrido. RE 388.024-AgR RTJ 203/1267 – AI 501.661-AgR RTJ 203/1295

PrSTF Recurso extraordinário. Cabimento. Indicação do dispositivo viola-do: ausência. Petição de RE: tese constitucional. Súmula 284: ofensa inocorrente. AI 513.262-AgR-AgR RTJ 203/1315

PrSTF Recurso extraordinário. Cabimento. Requisitos formais: inobservân-cia. Dispositivo constitucional violado: indicação errônea. Razões recursais: superação. RE 402.904-AgR-AgR RTJ 203/1271

PrSTF Recurso extraordinário. Decisão. Limitação temporal dos efeitos: impossibilidade. Pressuposto ausente: juízo de inconstitucionali-dade. Norma anterior à CF/88 (pré-constitucional): não-recepção. AI 589.281-AgR RTJ 203/1334

PrSTF Recurso extraordinário. Decisão. Limitação temporal dos efeitos: impossibilidade. Pressuposto ausente: juízo de inconstitucionalidade. Norma anterior à CF/88 (pré-constitucional): não-recepção. Ressalva do relator: juízo de ponderação. RE 364.304-AgR RTJ 203/1235

PrSTF Recurso extraordinário. Decisão. Norma anterior à CF/88 (pré-constitucional): não-recepção. Comunicação ao Senado Federal: des-cabimento. RE 387.271 RTJ 203/1259

PrSTF Recurso extraordinário. Decisão de Turma Recursal de Juizado Es-pecial. Amicus curiae: deferimento. Sustentação oral: possibilidade. Lei 10.259/01, arts. 14, § 7º, e 15. RE 416.827 RTJ 203/314

PrSTF Recurso extraordinário. Decisão interlocutória. Retenção. Agravo de instrumento: cabimento. AI 502.333-AgR RTJ 203/1299

PrSTF Recurso extraordinário. Decisão interlocutória. Retenção. Reitera-ção: ausência. Pedido de processamento imediato. AI 502.333-AgR RTJ 203/1299

Rec-Rec — ÍNDICE ALFABéTICO

1391

PrCv Recurso extraordinário. (...) Embargos de declaração. AI 498.456- AgR-ED-ED RTJ 203/412

PrSTF Recurso extraordinário. Juízo de admissibilidade. Acórdão de Tur-ma Recursal de Juizado Especial. Competência do órgão prolator da decisão. AI 418.610-AgR RTJ 203/399

PrSTF Recurso extraordinário. Juízo de admissibilidade. Órgão de origem: juízo provisório. Supremo Tribunal Federal (STF): último juízo. AI 418.610-AgR RTJ 203/399

PrSTF Recurso extraordinário. Matéria de prova. Dano material: nexo de causalidade. RE 364.631 RTJ 203/1242

PrSTF Recurso extraordinário. Matéria de prova. Interpretação de cláu-sula contratual. Plano de saúde. Súmula 454. AI 533.565-AgR RTJ 203/1321

PrSTF Recurso extraordinário. Matéria infraconstitucional. Ação penal pri-vada. Prazo decadencial: termo inicial. AI 579.988-AgR RTJ 203/431

PrSTF Recurso extraordinário. Matéria infraconstitucional. Competência de Juizado Especial federal. Fundo de Saúde de Militares (FUNSA): natureza jurídica. RE 491.863-AgR RTJ 203/1292

PrSTF Recurso extraordinário. Matéria infraconstitucional. Entidade de previdência privada. Aposentadoria: complementação. AI 516.241-AgR RTJ 203/1318

PrSTF Recurso extraordinário. Matéria infraconstitucional. Execução. Fa-zenda Pública. Título executivo extrajudicial. RE 488.858-AgR RTJ 203/406

PrSTF Recurso extraordinário. Matéria infraconstitucional. Hora extra: forma de pagamento. RE 543.237-AgR RTJ 203/419

PrSTF Recurso extraordinário. Matéria infraconstitucional. Prescrição. Complementação de aposentadoria. AI 569.103-AgR RTJ 203/428

PrSTF Recurso extraordinário. Matéria infraconstitucional. Princípio da legalidade. Súmula 636. AI 533.565-AgR RTJ 203/1321

PrSTF Recurso extraordinário. Matéria infraconstitucional. Prova pericial: desnecessidade. AI 557.623-AgR RTJ 203/425

PrSTF Recurso extraordinário. Prequestionamento: ausência. Matéria cons-titucional suscitada em embargos de declaração. AI 516.241-AgR RTJ 203/1318

PrCv Recurso extraordinário: inadmissibilidade. (...) Acórdão recorrido. RE 388.024-AgR RTJ 203/1267 – AI 501.661-AgR RTJ 203/1295

PrPn Recurso pendente. (...) Sentença condenatória. HC 91.139 RTJ 203/299

ÍNDICE ALFABéTICO — Rec-Rec

1392

Pn Recurso sem efeito suspensivo. (...) Pena. HC 91.675 RTJ 203/1218

Pn Recurso sem efeito suspensivo. (...) Regime prisional. HC 91.663 RTJ 203/303

PrPn Recursos públicos: desvio. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Adm Regência: lei vigente ao implemento das condições. (...) Aposentado-ria. ADI 3.104 RTJ 203/952

Pn Regime prisional. Progressão. Acórdão do Tribunal de Justiça: ob-servância. Recurso sem efeito suspensivo. HC 91.663 RTJ 203/303

Pn Regime prisional. Progressão: possibilidade. Crime hediondo. Prin-cípio da individualização da pena: nova inteligência em evolução jurisprudencial. Lei 8.072/90, art. 2º, § 1º: inconstitucionalidade de-clarada no HC 82.959. RE 472.584 RTJ 203/402

Pn Regime prisional. Progressão: possibilidade. Recurso da acusação: pendência de julgamento. Pena máxima em abstrato: cumprimento de um sexto. Súmula 716. HC 90.893 RTJ 203/289

Pn Regime prisional. Semiliberdade. Crime praticado por indígena. Lei 6.001/73, art. 56, parágrafo único. HC 85.198 RTJ 203/1088

Ct Regimento Interno da Câmara dos Deputados, art. 244. (...) Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). MS 25.579-MC RTJ 203/1014

Ct Regimento Interno da Câmara dos Deputados, art. 244. (...) Processo administrativo parlamentar. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

PrCv Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), arts. 21, I, e 203, § 1º. (...) Medida liminar. MS 25.579-MC RTJ 203/1014

PrPn Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), art. 192, parágrafo único-A. (...) Habeas corpus. HC 90.326-QO RTJ 203/1207

PrPn Registro formal: ausência. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Reiteração: ausência. (...) Recurso extraordinário. AI 502.333-AgR RTJ 203/1299

PrPn Relator do inquérito: afastamento posterior do sigilo bancário. (...) Prova criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Relaxamento. (...) Prisão cautelar. HC 83.773 RTJ 203/225

PrCv Remessa automática ao STF. (...) Agravo de instrumento. Rcl 4.484 RTJ 203/211

Ct Remuneração. (...) Magistrado. ADI 3.854-MC RTJ 203/184

Adm Requisitos e critérios. (...) Aposentadoria. ADI 3.104 RTJ 203/952

Rec-Req — ÍNDICE ALFABéTICO

1393

PrSTF Requisitos formais: inobservância. (...) Recurso extraordinário. RE 402.904-AgR-AgR RTJ 203/1271

Ct Resolução 24/06-CNJ: suspensão cautelar. (...) Magistrado. ADI 3.823-MC RTJ 203/980

Ct Resoluções 13/06-CNJ, art. 2º, e 14/06-CNJ, art. 1º, parágrafo único: suspensão. (...) Magistrado. ADI 3.854-MC RTJ 203/184

Adm Responsabilidade civil do Estado. Dano moral: não-configuração. Universidade federal: negativa de matrícula. Abalo psíquico decor-rente de empréstimo para custeio de ensino privado. Nexo de causali-dade: ausência. RE 364.631 RTJ 203/1242

Adm Responsabilidade civil do Estado. Evolução histórica: teorias. Dano moral: conceito. RE 364.631 RTJ 203/1242

PrPn Responsabilidade diferenciada de sócio e gerente: impossibilidade de verificação de plano. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrPn Responsabilidade do aparelho judiciário. (...) Prisão cautelar. HC 83.773 RTJ 203/225

PrSTF Ressalva do relator: juízo de ponderação. (...) Recurso extraordiná-rio. RE 364.304-AgR RTJ 203/1235

PrSTF Retenção. (...) Recurso extraordinário. AI 502.333-AgR RTJ 203/1299

PrPn Rito procedimental: inobservância. (...) Processo criminal. HC 86.166 RTJ 203/1122

Pn Roubo. Consumação do crime. Posse tranqüila por breve tempo. Ação policial: posterioridade ao roubo. Precedente mencionado: ina-plicabilidade. HC 91.696 RTJ 203/306

Pn Roubo contra vítimas diversas. (...) Pena. HC 91.615 RTJ 203/1214

STrPrv Salário-de-benefício: revisão indevida. (...) Benefício previdenciário.

RE 416.827 RTJ 203/314

Pn Semiliberdade. (...) Regime prisional. HC 85.198 RTJ 203/1088

Pn Semiliberdade: substituição de internação. (...) Medida socioeducati-va. HC 89.054 RTJ 203/1171

PrPn Sentença condenatória. Direito de recorrer em liberdade até o trânsi-to em julgado. Recurso pendente. HC 91.139 RTJ 203/299

PrTr Sentença de mérito: ausência. (...) Competência jurisdicional. RE 503.452-AgR RTJ 203/1304

ÍNDICE ALFABéTICO — Req-Sen

1394

PrPn Sentença definitiva em um dos processos. (...) Competência crimi-nal. HC 84.908 RTJ 203/235

Cv Separação judicial. Conversão em divórcio. Inadimplemento de obrigação alimentícia: ausência de impedimento. RE 387.271 RTJ 203/1259

PrPn Serviço de publicidade: contratação irregular. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Adm Servidor de outro órgão à disposição de TRF: possibilidade de apro-veitamento. (...) Servidor público. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231

Adm Servidor público. (...) Aposentadoria. ADI 3.104 RTJ 203/952

Ct Servidor público. (...) Mandado de injunção. MI 721 RTJ 203/11

Adm Servidor público. Provimento derivado. Servidor de outro órgão à disposição de TRF: possibilidade de aproveitamento. Julgamento da ADI 231: situação anterior. Lei 7.227/89. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231

PrPn Sessão de julgamento. (...) Habeas corpus. HC 87.111 RTJ 203/ 1134 – HC 90.326-QO RTJ 203/1207 – RHC 90.981 RTJ 203/1210

PrPn Sessão: gravação em vídeo. (...) Inquérito policial militar. HC 88.950 RTJ 203/1161

PrCv Siafi: suspensão da inclusão. (...) Medida cautelar. AC 1.084-MC-QO RTJ 203/943

PrPn Sigilo. (...) Inquérito policial. HC 88.520 RTJ 203/1155

Int Sigilo bancário: afastamento pelo Poder Judiciário norte-americano. (...) Acordo internacional. Inq 2.245 RTJ 203/473

Ct Sistemas de consórcios e sorteios: jogo de azar, loteria e similares. (...) Competência legislativa. ADI 3.189 RTJ 203/103

PrPn Situação excepcional: ausência. (...) Habeas corpus. HC 91.111 RTJ 203/296

PrPn Solicitação de repasses em dinheiro e manutenção de depósito não declarado no exterior. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Adm Subsídio. Governador e vice-governador. Verba de representação: pagamento em parcela distinta. CF/88, art. 39, § 4º. ADI 3.771-MC RTJ 203/133

Adm Subsídio: conceito. (...) Ex-governador. ADI 3.853 RTJ 203/139

Adm Subsídio mensal vitalício. (...) Ex-governador. ADI 3.853 RTJ 203/139

Sen-Sub — ÍNDICE ALFABéTICO

1395

PrPn Substitutivo de recurso ordinário. (...) Habeas corpus. RHC 88.542 RTJ 203/257

Adm Súmula 15. (...) Concurso público. RE 306.938-AgR RTJ 203/1231

PrCv Súmula 283. (...) Acórdão recorrido. RE 388.024-AgR RTJ 203/1267 – AI 501.661-AgR RTJ 203/1295

PrSTF Súmula 284: ofensa inocorrente. (...) Recurso extraordinário. AI 513.262-AgR-AgR RTJ 203/1315

PrCv Súmula 288. (...) Agravo de instrumento. AI 556.121-AgR RTJ 203/1324 – AI 662.972-AgR RTJ 203/1343

Adm Súmula 359. (...) Aposentadoria. ADI 3.104 RTJ 203/952

PrSTF Súmula 454. (...) Recurso extraordinário. AI 533.565-AgR RTJ 203/1321

Cv Súmula 619. (...) Prisão civil. HC 69.922 RTJ 203/213

PrSTF Súmula 636. (...) Recurso extraordinário. AI 533.565-AgR RTJ 203/1321

PrPn Súmula 691. (...) Habeas corpus. HC 91.111 RTJ 203/296

Pn Súmula 716. (...) Regime prisional. HC 90.893 RTJ 203/289

PrPn Supremo Tribunal Federal (STF). (...) Competência criminal. Inq 2.245-QO-QO RTJ 203/34

Ct Supremo Tribunal Federal (STF). (...) Competência originária. MI 721 RTJ 203/11 – AC 1.084-MC-QO RTJ 203/943 – Pet 3.631 RTJ 203/973

PrPn Supremo Tribunal Federal (STF): ratificação do ato. (...) Competên-cia criminal. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrSTF Supremo Tribunal Federal (STF): último juízo. (...) Recurso extraor-dinário. AI 418.610-AgR RTJ 203/399

PrPn Supressão de instância. (...) Habeas corpus. HC 89.735 RTJ 203/1188 – HC 92.536 RTJ 203/1222

Int Suspensão do prazo prescricional. (...) Extradição. Ext 1.042 RTJ 203/24

PrPn Sustentação oral: impossibilidade. (...) Habeas corpus. HC 87.111 RTJ 203/1134 – HC 90.326-QO RTJ 203/1207 – RHC 90.981 RTJ 203/1210

PrSTF Sustentação oral: possibilidade. (...) Recurso extraordinário. RE 416.827 RTJ 203/314

ÍNDICE ALFABéTICO — Sub-Sus

1396

TPrCv Tempestividade. (...) Recurso. AI 376.614-ED RTJ 203/1253

PrCv Tempestividade: impossibilidade de verificação. (...) Agravo de instrumento. AI 376.614-ED RTJ 203/1253 – AI 556.121-AgR RTJ 203/1324 – AI 662.972-AgR RTJ 203/1343

Ct Teto constitucional: fixação diferenciada. (...) Magistrado. ADI 3.854-MC RTJ 203/184

Pn Tipificação. (...) Crime ambiental. HC 89.735 RTJ 203/1188

PrSTF Título executivo extrajudicial. (...) Recurso extraordinário. RE 488.858-AgR RTJ 203/406

Pn Tráfico de entorpecente. (...) Pena-base. HC 88.284 RTJ 203/1150

PrPn Tráfico de entorpecente. (...) Processo criminal. HC 86.166 RTJ 203/1122

PrPn Tráfico de entorpecente: pedido de absolvição. (...) Habeas corpus. HC 85.958 RTJ 203/1104

PrPn Trancamento da ação penal: descabimento. (...) Denúncia. HC 87.293 RTJ 203/1144

PrPn Trancamento da extradição: impossibilidade. (...) Habeas corpus. HC 90.154 RTJ 203/277

PrPn Transação penal: cumprimento. (...) Processo criminal. HC 87.869 RTJ 203/253

PrPn Transferência de elevada soma em dinheiro. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

Pn Trânsfuga: nova deserção. (...) Crime militar. RHC 86.253 RTJ 203/1126

PrSTF Trânsito em julgado da decisão. (...) Reclamação. Rcl 2.540-AgR-AgR RTJ 203/84

PrCv Traslado deficiente. (...) Agravo de instrumento. AI 376.614-ED RTJ 203/1253 – AI 556.121-AgR RTJ 203/1324 – AI 662.972-AgR RTJ 203/1343

PrPn Turma Recursal de Juizado Especial. (...) Acórdão criminal. HC 86.533 RTJ 203/1132

UCt União e autarquia estadual. (...) Competência originária. AC

1.084-MC-QO RTJ 203/943

Tem-Uni — ÍNDICE ALFABéTICO

1397

Ct União Federal. (...) Competência legislativa. ADI 3.189 RTJ 203/103

PrPn Unidade de conservação: discussão. (...) Habeas corpus. HC 89.735 RTJ 203/1188

Pn Unidade de conservação: qualificação jurídica. (...) Crime ambiental. HC 89.735 RTJ 203/1188

Adm Universidade federal: negativa de matrícula. (...) Responsabilidade civil do Estado. RE 364.631 RTJ 203/1242

VTrPrv Valor real: garantia de manutenção. (...) Benefício previdenciário.

RE 416.827 RTJ 203/314

Adm Verba de representação: pagamento em parcela distinta. (...) Subsí-dio. ADI 3.771-MC RTJ 203/133

PrPn Vínculo subjetivo entre os acusados: inúmeras reuniões. (...) Denún-cia. Inq 2.245 RTJ 203/473

PrCv Violação a literal disposição de lei. (...) Ação rescisória. AR 1.469-AgR RTJ 203/946

Pn Visitação à família: restrição. (...) Medida socioeducativa. HC 89.054 RTJ 203/1171

PrCv Vista dos autos para contraminuta: descabimento. (...) Agravo regi-mental. AI 513.262-AgR-AgR RTJ 203/1315

PrPn Voto de parlamentar: ato de ofício. (...) Denúncia. Inq 2.245 RTJ 203/473

ÍNDICE ALFABéTICO — Uni-Vot

ÍNDICE NUMéRICO

ACÓRDÃOS

1.084 (AC-MC-QO) Rel.: Min. Gilmar Mendes ....................... 203/9431.469 (AR-AgR) Rel.: Min. Marco Aurélio ........................ 203/9461.781 (AC-MC) Rel.: Min. Marco Aurélio ........................ 203/9493.104 (ADI) Rel.: Min. Cármen Lúcia ......................... 203/9523.631 (Pet) Rel.: Min. Cezar Peluso ........................... 203/9733.823 (ADI-MC) Rel.: Min. Cármen Lúcia ......................... 203/9804.785 (Rcl-MC-AgR) Rel.: Min. Gilmar Mendes ..................... 203/10055.450 (Rcl-AgR) Rel.: Min. Marco Aurélio ...................... 203/1011

25.579 (MS-MC) Rel. p/ o ac.: Min. Joaquim Barbosa ...... 203/101483.799 (RHC-AgR) Rel.: Min. Celso de Mello ...................... 203/108585.198 (HC) Rel.: Min. Eros Grau .............................. 203/108885.661 (HC) Rel.: Min. Marco Aurélio ...................... 203/109285.958 (HC) Rel.: Min. Eros Grau .............................. 203/110485.969 (HC) Rel.: Min. Marco Aurélio ...................... 203/110686.148 (RHC-AgR) Rel.: Min. Gilmar Mendes ..................... 203/111986.166 (HC) Rel.: Min. Eros Grau .............................. 203/112286.253 (RHC) Rel.: Min. Eros Grau .............................. 203/112686.501 (HC) Rel.: Min. Eros Grau .............................. 203/112986.533 (HC) Rel.: Min. Eros Grau .............................. 203/113287.111 (HC) Rel.: Min. Gilmar Mendes ..................... 203/113487.157 (HC) Rel.: Min. Cezar Peluso ......................... 203/113987.293 (HC) Rel.: Min. Eros Grau .............................. 203/114487.379 (HC) Rel.: Min. Eros Grau .............................. 203/114788.284 (HC) Rel.: Min. Cezar Peluso ......................... 203/115088.520 (HC) Rel. p/ o ac.: Min. Marco Aurélio .......... 203/115588.950 (HC) Rel.: Min. Marco Aurélio ...................... 203/116188.978 (HC) Rel.: Min. Cezar Peluso ......................... 203/1164

ÍNDICE NUMéRICO1402

89.054 (HC) Rel.: Min. Sepúlveda Pertence .......... 203/117189.090 (HC) Rel.: Min. Gilmar Mendes ................ 203/117589.735 (HC) Rel.: Min. Menezes Direito ............... 203/118889.837 (HC-MC-AgR) Rel.: Min. Celso de Mello ................. 203/120290.326 (HC-QO) Rel.: Min. Menezes Direito ............... 203/120790.981 (RHC) Rel.: Min. Cezar Peluso .................... 203/121091.615 (HC) Rel.: Min. Cármen Lúcia ................... 203/121491.675 (HC) Rel.: Min. Cármen Lúcia ................... 203/121892.536 (HC) Rel.: Min. Menezes Direito ............... 203/1222

175.531 (RE-ED-EDv- Rel.: Min. Marco Aurélio .................. 203/1229 ED-ED) 306.938 (RE-AgR) Rel.: Min. Cezar Peluso .................... 203/1231364.304 (RE-AgR) Rel.: Min. Gilmar Mendes ................ 203/1235364.631 (RE) Rel. p/ o ac.: Min. Gilmar Mendes .... 203/1242376.614 (AI-ED) Rel.: Min. Celso de Mello ................. 203/1253387.271 (RE) Rel.: Min. Marco Aurélio .................. 203/1259388.024 (RE-AgR) Rel.: Min. Celso de Mello ................. 203/1267402.904 (RE-AgR-AgR) Rel.: Min. Sepúlveda Pertence .......... 203/1271417.019 (RE-AgR) Rel.: Min. Sepúlveda Pertence .......... 203/1274460.880 (RE) Rel.: Min. Marco Aurélio .................. 203/1277473.218 (RE-AgR) Rel.: Min. Celso de Mello ................. 203/1280477.315 (RE-AgR) Rel.: Min. Celso de Mello ................. 203/1284481.829 (AI-AgR-ED- Rel.: Min. Celso de Mello ................. 203/1287 EDv-AgR-ED) 491.863 (RE-AgR) Rel.: Min. Sepúlveda Pertence .......... 203/1292501.661 (AI-AgR) Rel.: Min. Celso de Mello ................. 203/1295502.333 (AI-AgR) Rel.: Min. Cezar Peluso .................... 203/1299503.452 (RE-AgR) Rel.: Min. Cezar Peluso .................... 203/1304503.651 (AI-ED) Rel.: Min. Celso de Mello ................. 203/1310513.262 (AI-AgR-AgR) Rel.: Min. Cezar Peluso .................... 203/1315516.241 (AI-AgR) Rel.: Min. Carlos Britto ..................... 203/1318533.565 (AI-AgR) Rel.: Min. Carlos Britto ..................... 203/1321556.121 (AI-AgR) Rel.: Min. Celso de Mello ................. 203/1324584.155 (AI-AgR) Rel.: Min. Carlos Britto ..................... 203/1328584.745 (AI-AgR) Rel.: Min. Cezar Peluso .................... 203/1331589.281 (AI-AgR) Rel.: Min. Celso de Mello ................. 203/1334662.972 (AI-AgR) Rel.: Min. Cezar Peluso .................... 203/1343