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7 Revista Visão Acadêmica Universidade Estadual de Goiás Unidade de Goiás nº 2 - maio de 2011

Revista Visão Acadêmica - docs.academicoo.com Visão... · Hamilton Barbosa Napolitano (UEG - Anápolis/UnUCET) Ricardo Trevisan (UnB - FAU) Rogéria Luzia Wolpp Gonçalves (UEG

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Revista Visão Acadêmica; Universidade Estadual de Goiás; Maio de 2011; ISSN 21777276

Cidade de Goiás ; www.coracoralina.ueg.br

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Dados da Publicação

Revista Visão Acadêmica

Ano 2 - nº 2 – Maio de 2011

Revista Eletrônica - Periodicidade Semestral

ISSN 21777276

Contato e Acesso

Principal: [email protected]

Alternativo: [email protected]

Acesso Via sítio

http//:www.coracoralina.ueg.br

Expediente

Universidade Estadual de Goiás ( UEG)

Reitor: Luiz Antônio Arantes

Unidade Universitária de Goiás

Diretor da Unidade: Flávio Antônio dos Santos

Av. Deusdete Ferreira de Moura S/N Centro

Cidade de Goiás- GO - CEP 76.600

Conselho Editorial

Auristela Afonso da Costa - UEG Goiás

Gabriela Azeredo Santos - UEG Goiás/PUC-GO

Ieda Maria do Carmo - UEG Goiás

Itelvides José de Morais - UEG Goiás

Luciano Feliciano de Lima - UEG Goiás/UNESP-SP

Raquel Miranda Barbosa - UEG Goiás/UEG Jussara

Conselho Consultivo

Ademar Azevedo Soares Júnior (UEG - Goiânia/ESEFFEGO)

Ana Paula Purcina Baumman (UFG - GO/UNESP-SP)

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Carla Rosane Mendanha da Cunha (FMB-GO)

Célia Sebastiana Silva (UFG - Goiânia)

Deis Elucy Siqueira (Universidade de Brasília - UnB)

Ebe Maria de Lima Siqueira (UFG - Goiânia /UEG)

Eduardo Gonçalves Rocha (UFG - Goiás)

Eduardo José Reinato (PUC - GO)

Francisco Alberto Severo de Almeida (UEG - Ensino a Distância)

Geisa Nunes de Souza Mozzer (UFG - Goiânia)

Hamilton Barbosa Napolitano (UEG - Anápolis/UnUCET)

Ricardo Trevisan (UnB - FAU)

Rogéria Luzia Wolpp Gonçalves (UEG - Itaberaí).

Valdeniza Maria Lopes da Barra (UFG - Goiânia)

Membros do Conselho Consultivo Convidados Para a Edição

Cristiane Fensterseifer Brodbeck (Unisinos - RS)

Dominga Correia Pedroso Moraes (UEG - Goiás)

Eliane Marquez da Fonseca Fernandes (UFG - GO)

Jackeline Silva Alves (UEG - Morrinhos)

Liliane Ferreira Neves Inglez de Souza (FAAL - Limeira)

Márcio Luppi (Faculdade Anhanguera Anápolis - GO)

Maria Célia de Oliveira Papa (FAAL - Limeira)

Marta de Paiva Macêdo (UEG - Morrinhos)

Maura Regina Petruski (UEPG - Ponta Grossa)

Miriam Denise Kelm (UNIPAMPA - Bagé)

Rildo Aparecido Costa (UFU - Ituiutaba)

Rodrigo Bastos Daúde (UEG - GO)

Rosane Maria de Castilho (UEG-GO/UEG - Ap. de Goiânia)

Rosangela Patriota (UFU - Uberlândia)

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Administração

Alair Di Silva Peres (UEG - cidade de Goiás).

Correção Gramatical e Ortográfica Pelos Graduandos

Cristiane Aparecida Guimarães de Moraes (UEG - Letras - cidade de Goiás)

Humberto Moreira Barros Filho (UEG - Letras - cidade de Goiás)

Ivani Peixoto dos Santos (UEG - Letras - cidade de Goiás)

Juliana de Fátima Ananias de Jesus (UEG - Letras - cidade de Goiás)

Lívia Rodrigues Barbosa (UEG - Letras - cidade de Goiás)

Renato Garcia Cardoso (UEG - Letras - cidade de Goiás)

Formatação e Diagramação

Heloísio Mendes (UEG - cidade de Goiás).

Itelvides José de Morais (UEG - cidade de Goiás)

Informações Gerais

A revista é especializada na publicação de artigos científicos escritos por graduandos. Sendo

restrito a esse tipo de pesquisadores o direito de publicação nesse periódico.

O conteúdo dos artigos não necessariamente representa as posições dos organizadores da Revista

Editorial

Ser meio de divulgação da produção científica de graduandos dos diferentes ramos é o principal

motivo da organização da Revista Visão Acadêmica. De fato não faltam revistas científicas

dispostas a abrir algum espaço para publicações de graduandos. Porém, frente ao volume das

produções este espaço é aquém do necessário e nem sempre trabalhos de boa qualidade escritos

por graduandos conseguem ser divulgados. Por isso é intenção da Visão Acadêmica se voltar

apenas para este segmento. Contribuindo para que as universidades continuem a ser local de

formação e divulgação de ideias de pensadores com senso crítico em relação às suas crenças e

crenças de outros indivíduos.

Cidade de Goiás, maio de 2011, Conselho Editorial

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Sumário

Artigos

O Revés da Poesia Expressionista Alemã 7 -21. Patrícia Sheyla Bagot de Almeida

O (i)embondeiro e a jindiba: a representação das árvores nas Literaturas Lusófonas....22 - 33 Roselaine Silva Martinez

Em Estado de Sítio: uma análise sobre a peça Moço em Estado de Sítio, de Vianninha, e a ditadura militar 34 - 44 Samita Vieira Barbosa Martins

Caracterização Geoambiental da Bacia Hidrográfica do Ribeirão São Lourenço, Ituiutaba/Prata (MG) 45 - 64 Giliander Allan da Silva

A Espacialização da Folia de Reis no Município de Faina nos Anos de 2009 A 2010 65.- 86

Eulália Maíra Alves Ferreira

O Ensino de Geografia e Conceitos Geográficos: a percepção dos educandos das escolas do campo do município de Iporá-Goiás sobre os conceitos de Meio Ambiente e Cidadania 87 - 104 Silvaci Gonçalves Santiano Rodrigues

Educação Patrimonial: leitura da paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado nas aulas de Geografia 105 - 125 Angélica de Oliveira Ribeiro Xavier

Avaliação do Ensino Aprendizagem por Meio do Material Concreto Geoplano: um estudo de caso com alunos do 6º do ensino fundamental 126 - 137 Adriana Ítala Magri

Traçando Novos Caminhos Para a Formação Docente: A União Entre a Universidade e a Escola. Subprojeto PIBID/UNISINOS Ciências Biológicas 138 - 148 João Alberto Leão Braccini Mariane Cenira Padilha Brizolla

Subsídios metodológicos para o Ensino de Ciências - Uma experiência prática 149 - 161 Renan Alves Conceição Thaís Soares Monero Ceci Erci Rodrigues

Aplicação dos Conceitos de Medidas de Posição e Dispersão: um Estudo de caso em uma Indústria de Embalagens Plásticas Flexível 162 - 170 Thiago George das Dores

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A Timidez Como Entrave Emocional Patológico: levantamento quanti-qualitativo dos relatos de pacientes atendidos na clínica-escola de Psicologia em uma faculdade da rede privada 171 - 185 Keila Cristina Carlos de Souza

Havaianas: Além do Imperativo “Recuse Imitações” Dialogismo e Papéis Desempenhados na Campanha Publicitária 186 - 200 Carolina Di Assis

Pentecostalismo e Sociedade: estudo sobre similaridades e diferenças entre católicos carismáticos e protestantes pentecostais 201 - 218 Rafael Damião Carmo Rosa de Almeida

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O Revés da Poesia Expressionista Alemã Patrícia Sheyla Bagot de Almeida1

A nossa doença é a de vivermos no declinar dum dia universal, num entardecer que se tornou tão sufocante que mal conseguimos já suportar os vapores da sua decomposição... Mas algo existe que é a nossa saúde: dizer três vezes apesar disso, cuspir três vezes nas mãos como velho soldado, e continuar, seguir a nossa estrada, como nuvens puxadas a vento, em direção ao desconhecido... (Georg Heym).

Resumo: A poesia expressionista alemã foi mais do que poderíamos compreender com

teoria críticas. O expressionismo não foi mais um movimento de vanguarda, mesmo

porque os primeiros poetas expressionistas nem assim se autodenominavam e nem houve

um movimento sistemático e uniforme. Acreditavam somente fazer poesia dentro de um

campo de dissolução e de uma muda contestação, na qual, a palavra não era um

apanhado material somente, mas principalmente, uma mostração da falência dos grandes

projetos sociais políticos.

Palavras-chave: Poesia Expressionista Alemã. Realidade. Linguagem. Resistência.

Introdução:

Acusados de desproporção e de não possuírem uma consciência histórica engajada

num forte materialismo marxista e de uma dor da perda pequeno burguesa, os

expressionistas domaram a linguagem com uma mão e, com a outra, deixaram a

materialidade da vida concretamente política fugir. Acusados desta inapreensão e

incompreensão, suas poesias parecem deixar a folha em branco e, por vezes, fazer apenas

um balbuciar messiânico, místico, didático, exortatório e sem concretude e beleza

possíveis. Suas fragilidades estão em suas carências e suas utopias2. Entretanto, se como

1 Patrícia Sheyla Bagot de Almeida é Aluna do sexto período da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás. Professora indicadora Doutora Célia Sebastiana Silva, Universidade Federal de Goiás/CEPAE 2 As críticas esplanadas acima fazem parte de uma crítica mais severa elaborada por Georg Lukács, de posição antivanguardistas. No realismo socialista não havia espaço para as artes de vanguarda, denunciadas

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pensa Heidegger, onde reside o perigo reside também o maior bem, corramos para a boca

do dragão.

Para além das críticas que foram realizadas sobre estes poetas, vale mostrar que

eles criaram exatamente pelo o que lhes faltou e pelo o que não apreenderam, foi

exatamente por onde suas poesias aconteceram, e fez-se poesia como acontecimento

historial. Em outras palavras, os poetas expressionistas deram conta do que se revelou

enquanto acontecimento, a poesia expressionista desvelou no que estruturalmente velou.

Um círculo preciso que põe o entendimento, a vida e a linguagem em movimento.

Secunda o pesquisador João Barrento, que a poesia expressionista está assim, “longe de

ser uma poesia atuante”, porém, ela segue uma trajetória que é inevitável, a do fim dos

dualismos, das quimeras morais, econômicas e das certezas cartesianas. Ao pensar, o

pensamento é ação, é somente desta forma que pode dar-se. Naquilo que silencia é onde

se realiza o melhor diálogo. A onto-epifania destes poetas não é puramente mística, mas

sim, de tempo historial que parece deflagrar uma forte percepção do poder da linguagem

em tempos de barro.

O que se passa depois da morte de Nietzsche em 1900? A morte de deus, mas os

alemães já amarguravam sua ausência muito antes de sua morte, o desencanto e a

banalidade puseram a linguagem fortemente atenta em sua auto defesa, uma defesa

contra o mar de corrosão que passava assolando os modos de ser dos homens e da arte.

Neste contexto, os poetas expressionistas impuseram-se como linguagem vigilante e

como um novo projeto estético em que unem a intensidade do sentimento e a da

expressão. Eis a torção e a tensão que ela fez de si, uma fratura irreconciliável do tempo,

do ser e da história. A linguagem passa a ser a secreta moradia e execução da mais

perfeita revolução já pensada por algum movimento ultra materialista ou vanguardista.

como burguesas e anti-revolucionárias. O que objeta Lukács é que o expressionismo alemão não passa de uma experimentação irracionalista, não crítica e chega, por vezes, a relacionar expressionismo e fascismo.

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O expressionismo pode ser desproporção com os movimentos sociais, porém, é a

plena confluência com o pensamento tido na sua mais profunda atividade, uma arte

sombria, mas resplandecente, que traça em risco cinza os tons azuis de paisagens

esquecidas, e que tem na metáfora a munição necessária para a luta da sobrevivência da

humanidade do ser.3 Isto é fazer poesia no turbilhão das águas.

A consciência do expressionista está no plano individual e não numa ação estética

de conjunto. Eles intuíam, vivenciavam seus acontecimentos e mergulhavam em seus

interiores como tempo necessário para aclaramento de sua arte. Isto animava os poetas,

era este comportamento que era geral e os faziam produzir numa forma semelhante, era

urgente encontrar o homem para poder transfigurá-los em arte universal. E isto foi

realizado por um conjunto de vozes com variados modos de entoar seus cantos.

O expressionismo é resistência à própria realidade, ao mundo obcecado no

progresso, disposto a pagar com a vida as edificações da burguesia e dos centros urbanos

faraonicamente erguidos. Neste sentido é que podemos considerar que o expressionismo

é a entrada da lírica alemã na modernidade, pois o que é o expressionismo alemão senão

a ruptura com o passado, oposição a beleza clássica da métrica, do alvo marfim e da

proporcionalidade, oposição a burguesia, compreensão trágica do homem, da existência e

o que, aqui neste trabalho, chamamos de apreensão, despretensiosa ou pretensiosa, do

paradoxo da linguagem, isto é, uma profunda desconfiança da linguagem usual,

impessoal, inautêntica, mas sendo esta mesma a ponte para a linguagem autêntica,

aquela que em sua estrutura fundamental nomeia na poesia? É o que nos fala Alfred

Wolfenstein no formidável poema A felicidade da comunicação: braços suportam a

3 Apenas um olhar ingênuo pode considerar a poesia expressionista como uma profunda descrição nostálgica da natureza e de uma profunda introspecção humana. Hamburguer exemplifica o típico caso do poeta Ungaretti e de Trakl, no qual, o primeiro espraia-se num subjetivismo, por vezes confessional e Trakl cuja principal preocupação não é mais consigo mesmo, mas com o futuro da Humanidade. Cf. HAMBURGUER, M. A verdade da poesia. Trad. de Alípio Correia de Franca Neto. Cosac & Naify, 1968. p. 216-217.

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palavra, que é levada/ Para os nossos irmãos de face ensoleirada-/ E um mal se apaga: o

do silêncio. Doravante/ O homem chega ao homem mais distante.//.4

Provocar é a natureza do grito de negação, portanto, resistência da poesia

expressionista alemã. Resistir, três vezes apesar disso, resistir nos diz Heimy, mas resistir

ao que? Ao brilhante positivismo da linguagem que alarga os horizontes burgueses de sua

época. O necessário é voltar à nomeação existencial do ser, e isto pode ser feito por um

sussurro, um grito, um silêncio criptográfico, um enigma, mas precisará sempre ser feito à

revelia da linguagem mecânica e ideologizante. Negar-se pela linguagem para firmar-se na

linguagem. Desta forma, o expressionismo é a experiência vivida e sentida na morte de

muitos poetas na guerra e pela guerra. Ernst Stadler, Georg Heimy e Georg Trakl não são

casos isolados.

Trakl consegue seu suicídio depois de uma tentativa frustrada com arma de fogo,

mas antes disso, perturba-se em definitivo pela visita em um pavilhão, no setor em que

servia, de corpos mutilados na guerra. Seu último poema Grodek lamenta: Oh, dor

orgulhosa! Vós, brônzeos altares,/ Uma dor portentosa alimenta hoje a chama escaldante

do espírito,/ os filhos ainda hão de nascer.//.5 Engano, eles não nasceram. A primeira

guerra era apenas uma gestação de um filho cuja fome seria infinda. Secunda Hamburguer

que “a segunda guerra mundial foi a continuação militar dos conflitos ideológicos que a

precederam. (...) Essa é uma razão porque a segunda guerra produziu bem menos poetas

de atrocidades.” (HAMBURGUER, 1968, p. 213).

Este é o maior diferencial desta lírica, seus poetas não são somente escritores,

dândis ou profissionais de algum saber, são antes, indivíduos criadores que possuem

como matéria a realidade que os fere, não importa se direta ou indiretamente. A isto a

crítica pouco ou quase nada compreendeu, ou no mais, acreditou ser a poesia destes uma

consequência natural na criação da poética de resistência, afirmando que tudo era visão

de mundo, interpretação e crise de mundo.

4 Extraído da obra Expressionismo alemão - Antologia poética, trad. João barrento. Lisboa: Ática Sarl, s.d., p.

45. 5 Idem, p. 185.

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Entretanto, não se trata de visar o mundo como o biólogo faz com seus objetos de

estudo e, sim, de ser mundo e isto quer dizer; ser profundamente mundo, com abertura

potencializada, e o inevitável ocorre, a saber; o choque, a queda, a dor, o sofrimento.

Como estou atrelado/ À carroça de carvão de minha dor!/ Repelente como uma aranha/

Rasteja sobre mim o tempo./ Cai-me o cabelo,/ Encanece-me a cabeça para o campo,/

Para lá do qual ceifa/ O último segador./ O sono ensombra-me os ossos./ Morri no sonho

já,/ Erva nascia do meu crânio,/ De negra terra a minha cabeça.//.6 É este o canto

Sofrimento de Albert Ehrenstein.

Encarnado mundo, modos de experienciar que vasa pela existência na qual o poeta

é ser, isto é, abertura inconteste que jamais pode ser apreendida em sua totalidade. Como

afirma Heidegger em sua carta Sobre o humanismo de 1946: “O ser enquanto destino que

destina verdade permanece oculto. Mas o destino do mundo se anuncia na poesia, sem

que ainda se torne manifesto como história do ser.” (HEIDEGGER, 1973, p. 359). O que

assegura o filósofo é que mesmo que seja constituição própria do mundo e da verdade

ocultar-se para não ser objetificada, na poesia, ela salta como a leveza mais pesada, com o

brilho mais escuro e implode o que deseja fugir de si próprio. É da sua essência re-velar

sem que faça do re-velado um conhecimento objetificável, penetrar na verdade como

evento, aberto, descerrado e, por consequência, fundar o historial. Por mais que os poetas

expressionistas pudessem resistir à realidade que os oprimia, o fariam, mesmo na recusa,

pois se encontravam no pensamento mais abissal da concretude do mundo e com a

profunda crença e confiança na existência do acontecer humano.

Todavia, a existência hipostasiada ou postulada por verdades sempiternas, pouco

conta no momento das escolhas e das vivências práticas da vida. A existência que criam

esses poetas era a existência que se erguia de lutas e das dores cotidianas e,

consequentemente, sofriam por outra existência mágica que se arrefeceu, a natureza.

Assim revela a poesia do poeta e tenente médico da frente ocidental na primeira guerra

mundial, Wilhelm Klemm, “não queremos poesia de gênero algum,/ Queremos truques

6 Idem, p. 207.

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mágicos de saco,/ Procuramos tapar na existência um fatal buraco./ E apesar de esforço

insano não tapamos nenhum.//.7 Tapar o buraco da existência, mesmo sabendo não fazê-

lo, é o ápice da mais profunda abertura, aquele do evento iluminador do próprio poeta,

que mesmo no mais profundo conforto e sorriso, jamais esquece que as covas correm

sempre o risco de serem reabertas.

Eis o revés, o oposto que pela estética firmou as forças que se ergueram em

tempos de profunda crise social e espreitaram o homem na sua mais profunda abertura,

era preciso resistir. É neste contexto, que a poesia expressionista materializava o grotesco,

a natureza, a linguagem hermética, patológica e dissoluta. Havia no expressionismo

alemão uma provocação não meramente panfletária8, que se firmou nas ervas daninhas

da linguagem usual, portanto linguagem decaída. Numa suposta negação do mundo por

ausência de luta, estava a criatividade e afirmação dos expressionistas, pois um

estranhamento de mundo, um estar fora de casa, um canto solitário, angustiado,

nostálgico e melancólico é o mais profundo ato de autenticidade. Vejamos a poesia O

poeta e a guerra do alemão Albert Ehrenstein, canta o poeta:

Eu cantei os cânticos de vingança em vermelho

[rasgada,

E cantei o silêncio do lago de baías arborizadas;

Mas ninguém, solitário

Como a cigarra canta,

Cantei o meu canto para mim.

Os meus passos vão-se desvanecendo, extenuados

Na areia do meu esforço.

Os olhos caem-me de cansaço,

7 Extraído da obra Expressionismo alemão - Antologia poética, trad. João barrento. Lisboa: Ática Sarl, s.d., p. 51. 8 Fragoso constata a falta de quaisquer definições programáticas ou de manifestos, ao contrário de outros

movimentos vanguardistas, futurismo, dadaísmo, assim como uma inconsistência completa do

expressionismo nos seus primórdios. Cf. FRAGOSO. A viagem mítica na lírica de Georg Heym. Fundação

Calouste, 2004, p. 32-33.

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Estou cansado dos desconsolados vaus,

De atravessar rios, mulheres e ruas.

Á beira do abismo, não penso

No escudo e na lança.

Assoprado pelas bétulas,

Ensombrado pelo vento,

Adormeço ao som da harpa

De outros,

Para quem ela escorre alegremente.

Não me mexo,

Porque todos os pensamentos e ações

Turvam a pureza do mundo. 9

A profunda evasão e a descrição da paisagem parecem subtrair o canto em

confessionalismo e falta de ação, não fosse o canto de um eu-lírico inconformado que

pensa o mundo em sua angústia e, ao interrogá-lo sem perguntas e a cantá-lo sem hinos,

diz; cantei o silêncio, e mostra que toda ação macula a pureza do mundo. Como podemos

compreender a ação referida? Não mais na guerra, mas na falta de uma materialidade

perspicaz e sensível do ser mundo. A melancolia do eu-lírico parece dizer-nos que todas as

ações e o próprio pensamento já realizados, fragmentaram demais o ser do mundo.

Passos, esforços, olhos, travessias, pensamentos, lanças. Não me mexo.

Em tempos de entulhos, estes poetas não acreditavam mais na ação redentora, no

conhecimento, nos movimentos sociais meramente engajados e, muito menos, na função

do poeta, porém, acreditavam na recondução do homem ao próprio do homem. Daí a

grotesca afirmação de Werner Mittenzwei, 1968, de que o expressionismo é, em seus

traços essenciais, humanista. Porém, acertada é a colação de Claudia Cavalcante para

quem “o expressionismo morria porque queria ser mãe da revolução em nome da

9Op. cit., p.213.

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humanidade, (...) nosso apelo é l’homme pour l’homme ao invés de l’art pour l’art.”

Acreditavam os expressionistas. (CAVALCANTI, 2002, p. 50).

Eis o denominador comum da poesia expressionista e seu maior revés, um todo e a

parte, a maior preocupação; o homem, ou melhor, a decadência do homem. De um

pessimismo trágico eram por isto mesmo, contraditório em suas formas. O pessimismo

trágico é aquele em que a deliberação não é atenuante da fatalidade, mas pode pesá-la

mais. Agir é mover os olhos dos deuses, é ser visto, logo é correr um alto risco.

Insistentemente, o poeta expressionista escolhe deliberar sobre uma humanidade

perdida. É assim com o poema O novo Orfeu de Iwan Goll, único poeta que se

autodenominava expressionista, que terá que ser exposto em sua inteireza.

Orfeu

Músico de outono

Ébrio de mosto estelar

Ouves a rotação da terra

Ranger hoje mais fortemente do que é hábito?

O eixo do mundo enferrujou

À tardinha e pela manhã cotovias disparam para o céu

Procuram em vão o infinito

Leões envelhecem

E os miosótis pensam em suicídio

Está cansada a boa natureza

Rarefeito o oxigênio de eternas florestas

Sufoca-se no ozone dos cumes

Nuvem chove e sente a nostalgia da lama

Homem acaba sempre por voltar aos homens

Eterno permanece para nós o destino

Eurídice:

A mulher a vida incompreendida

Todos são Orfeu

Orfeu: quem o não conhece:

1 m 78 de altura

68 quilos

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Olhos: castanhos

Testa: estreita

Chapéu entretelado

Certidão de nascimento no bolso do casaco

Católico

Sentimental

Pela democracia

E músico de profissão

A Grécia, esqueceu-a

E o canto matutino do alcíone

A sombria tristeza dos cedros

O casamento das flores

E tanta amizade de riachos menineiros

De que lhe servem hoje genciana e camurça

Os homens estão na miséria

Prisioneiros nas profundezas de um submundo

Em cidades de argamassa

De lata e de papel

São estes que ele tem de libertar

Os pobres de lua de vento e de pássaros

Senhor, pára

Tu aí, de fraque impecável

Alto: mostra o coração!

Cultura da Europa Central

Com corações imperiais

Sociedades construtoras

Combates de boxe

Oh, contemporâneo, excelentíssimo senhor!

Orfeu veio até junto de ti

Das colinas gregas

Para a vereda do quotidiano

Desceu o novo poeta

Encontrá-lo em todo o lado onde lábios procuram

[sofregamente

Onde corações passam fome

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Ele cobre com música, como abafo quente,

Todo o teu desengano do mundo

Orfeu canta a primavera para os homens

Quarta-feira entre o meio-dia-e-meia e a uma-e-meia

No papel de tímido professor de piano

Liberta uma jovem da avareza da mãe

À noite nas variedades mundanas

Entre a moça Yankee e o encantador de serpentes

O seu couplet sobre o amor humano é o terceiro

[número

À meia-noite um palhaço

No circo de ouro luminoso

Acorda com um grande tambor os que já dormem

Aos domingos em frente às ligas de combatentes

No salão de dança com painéis de carvalho

O maestro dos cantos de liberdade

Definhado organista

Em silenciosas sacristias

Toca docemente órgão para menino Jesus

Em todos os concertos de assinatura

Com Gustav Mahler

Trespassa horrivelmente os corações

No animatógrafo de bairro, sentado ao martírio do

[piano

Deixa que o coro dos peregrinos

Lamente a morte virgem –

Gramofones

Pianolas

Órgãos

Espalham a música de Orfeu

Na Torre Eiffel

A 11 de setembro

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Dá um concerto para telefonia

Orfeu torna-se um gênio;

De pais para país

Sempre em carruagem-cama

A sua assinatura

Em facsimile para álbuns de poesia

Custa vinte marcos

E de Atenas viaja para Berlim

Através da aurora alemã

Lá está à espera na estação da Silésia

Eurídice! Eurídice!

Lá está a amada da saudade

Com o seu velho chapéu de chuva

E luvas amarrotadas

Tule sobre o chapéu de inverno

E bâton a mais nos lábios

Como outrora

Sem música

Pobre de alma

Eurídice: a humanidade não libertada!

E Orfeu volta-se para trás – e já quer abraçá-la

Libertá-la definitivamente do seu arco

Estende a mão

Levanta a voz

Em vão! A multidão já não o ouve

Regressa ao submundo ao quotidiano e à dor!

Orfeu só na sala de espera

Estoura o coração com uma bala.10

É no outono que o novo Orfeu desce. Outono, estação do ano que fica entre o

verão e o inverno, uma ponte entre o fim do dia quente e o início da noite gélida, tempo

10 Extraído da obra Expressionismo alemão - Antologia poética, trad. João barrento. Lisboa: Ática Sarl, s.d., p.

221- 229.

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de decadência. A terra range mais fortemente porque perdeu o seu eixo, leões perderam

a sua natureza bravia, envelhecimento, fim da natureza mágica, a sua perda total. Em

tempos de derrocadas todos buscam algo que ficou para trás, esquecido ou abandonado.

Somente desta forma, a perspectiva de futuro pôde possuir a força que tem, querer,

desejar, ir em frente, sem o conhecimento de que somos impulsionados ao que foi

perdido de nós em sua inteireza. Por esta razão, o futuro é apenas uma quimera de pés

virados para trás, um tempo de ser perdido. Por isto são todos Orfeus, diz o poeta. Nossa

Eurídice pode ser a natureza, o encontro, a dimensão perdida.

Orfeu, o andarilho comum que sobrevive no cotidiano, longe e esquecido da

primeira intimidade com a natureza. A metáfora mais forte esqueceu o canto matutino do

alcíone, ou seja, acostumou-se distante dos turbilhões e seus ninhos não podem mais

serem feitos sobre as águas mansas, mas sim, sobre concretos e, assim, vagueia pacato e

conformado pelo mundo oposto de si.

A quem Orfeu tem de libertar? Aos prisioneiros do submundo. Os pobres de lua de

vento e de pássaros. Portanto, aqueles que se perderam de si, homem e natureza sem

distinções do mundo e do ser. Mas percebamos que o próprio Orfeu é o desencantado,

profissional banal, e homem comum. 1 m 78 de altura/ 68 quilos/ Olhos: castanhos/ Testa:

estreita/ Chapéu entretelado/ Certidão de nascimento no bolso do casaco/ Católico/

Sentimental/ Pela democracia/ E musico de profissão//. Teria que ser de outra forma?

Não. Como mandar luz para cegos? Orfeu é ninguém, o impessoal que não é visto e nada

pode significar para seres que, somente pelas obras, se sentem gloriosos, com corações

imperiais.

Interpela o eu-lírico, como louco a balbuciar palavras, Oh, contemporâneo,

excelentíssimo senhor!/ Orfeu veio até junto de ti/ Das colinas gregas/Para a vereda do

cotidiano/ desceu o novo poeta//. Palavras vãs. É de um passado portentoso que o poeta

faz de Orfeu o cantor que atravessa o tempo como arauto e guardião e põe-lhe

totalmente decaído na nova modernidade. Fim da aurora, fim do tempo. O músico de

profissão comum, homem de vida ordinária. Somente mutilado pode chegar a vida do

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homem bestial. Onde está este novo poeta? Nos lábios que procuram, onde corações

passam fome, cobrindo com música todo desengano do mundo. Mesmo com horário

marcado, quarta-feira entre o meio dia e meia e uma e meia ele ainda, ele ainda liberta.

Orfeu está no submundo, sua autorização de entrada foi tornar-se banal, estreito,

tacanho, ele que também faz espetáculo para os anômalos da existência e junta sua

encenação sobre o olvidado amor humano aos números de atração vulgar. Ainda na hora,

À meia noite, ele é o palhaço a acordar a tamboriladas os que dormem, é maestro, toca

em concertos, desafinado organista, toca numa igreja qualquer, possivelmente sem deus.

Tantas funções precisa ter este novo Orfeu. Entretanto, mais um golpe lhe assaltará a

existência. Em tempos de novas tecnologias será diminuído, seu trabalho será amenizado

e o contato humano subsumido. Quem tocará e cantará aos homens esquecidos? Eles os

gramofones/ pianolas/ órgãos/ espalham a música de Orfeu//. Sua lira perde a aura.

Orfeu poderá estar agora em muitos lugares, sem que a sua presença seja necessária e, ao

mesmo tempo, experimenta da fama que alguns egos insistem em possuir para idolatria

de suas próprias ruínas. Músico pago, profissional e glorioso em fama. “Orfeu torna-se um

gênio:/ Viaja de país para país/ Sempre em carruagem – cama// A sua assinatura/ Em

facsimile para álbuns de poesia/ Custa vinte marcos//. E assim sendo, ele quase se

esqueceu de si, quase esqueceu sua Eurídice, como finalização deste vagar inoportuno.

Orfeu desembarca em Berlim, é lá que lembrará sua busca e verá sua Eurídice. Mais do

que otimismo alemão, é neste país que o hades está erguido. Podemos observar que o

olhar do poeta sobre a Alemanha e a Europa é de um pessimismo contundente, o mundo

dos mortos é este que se ergueu imperiosamente decaído. Lá está Eurídice, transfigurada

“com seu velho chapéu de chuva/ E luvas amarrotadas/ Tule sobre o chapéu de inverno/ E

bâton a mais nos lábios/ Como outrora/ Sem música/ Pobre de alma//. Mas esta Eurídice é

a própria humanidade e, é nela que o poeta fracassa.

Eurídice é a humanidade irresoluta, inflexível em suas profundas aparências, ela

não responde mais a evocação do poeta, a lira de Orfeu perde as cordas, o piano desafina

por mais que o canto seja belo. Orfeu, o poeta que ama a humanidade quer possuí-la

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novamente, “volta-se para trás – e já quer abraçá-la/ Libertá-la definitivamente do seu

Orco:/ Estende a mão/ levanta a voz/ Em vão! Eurídice, feia, muda e cega não vê seu

amado Orfeu, mas o ouve e, mesmo assim, não se move, a resposta vem em bafos de

embriagada indiferença. Esta Eurídice quer permanecer no submundo, regressa ao

submundo ao cotidiano e a dor! A humanidade desfeita de si, impessoalidade definitiva

quer permanecer no mundo dos mortos. A Orfeu, o peso mais pesado, a escolha no

desespero, a fatídica falha do poeta que, ainda em espera, estoura o coração com uma

bala. Fim do canto, hora das marcas, agora, no verso de Becher, o poeta evita acordes

radiosos. Este é o canto que compreende o poeta expressionista no mundo, preocupação

com o destino do homem, a decadência da humanidade e a impossibilidade de retorno.

E o que nos diz Trakl? Bebi da fonte do bosque/ o silêncio de Deus/ Sobre a minha

fronte cai o frio metal. / Aranhas procuram o meu coração. / Há uma luz que se apaga na

minha boca. // Diz ainda: esgotou-se a fonte de ouro dos dias, / os tons da tarde, azuis e

outonais: / Morreram doces flautas pastorais/ Os tons da tarde, azuis e outonais/ Esgotou-

se a fonte de ouro dos dias.//.11 Atordoado outono da humanidade.

Se é na frágil carência e transmutação dos valores que a poesia se ergue deve ser

cautelosa para que este crescimento não pareça uma breve gravidez, mas que esteja lá

sem ser vista e possa, profundamente, ser sentida e possa provocar e deflagrar, em dias

de alegres e abundantes ofertas, os fossos e as feridas que existem para além dos olhos.

Nisto o expressionismo é constante e não pode resumir-se em mera vanguarda, mas uma

pergunta persiste: em tempos ‘sem trevas’, mudamos o modo de dar passos ou trocamos

de rua? A obviedade - da resposta - é a marca do nosso pensamento. Falta-nos a margem

da turbulenta fecundidade. Afinal, quem fala de vitória? Suportar é tudo.

11 Extraído da obra Expressionismo alemão - Antologia poética, trad. João barrento. Lisboa: Ática Sarl, s.d., p.

155.

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Bibliografia: BARRENTO, J. Expressionismo Alemão, antologia poética. Lisboa: Ática Sarl, n/d. CAVALCANTI, C. O Cabaré do Novo Homem. Cult. São Paulo, n. 39, p. 47-50. 2000. ____________, Poesia Expressionista Alemã. São Paulo: Estação Liberdade, 2000. FRAGOSO, M. A Viagem Mítica na lírica de Georg Heym. Fundação Calouste Gulbenkian, 2004. HAMBURGUER, M. A Verdade da Poesia. Trad. Alípio Correia de Franca Neto. Cosac & Naify, 1968. HEIDEGGER, M. Sobre o Humanismo. São Paulo. Abril cultural, 1973. MACHADO, C. Debate Sobre o Expressionismo: um capítulo da história da modernidade estética, Lukács, Bloch, Brecht, Benjamim e Adorno. São Paulo, Unesp, 1998.

SCHEIDL. L. O pré-expressionismo na Literatura Alemã. Coimbra: Biblioteca Geral da Universidade Coimbra, 1985. ___________, A Renovação da Literatura de Expressão Alemã na Primeira Década do Pós-guerra. Colibri, 1998.

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O (i)embondeiro e a jindiba: A representação das árvores nas Literaturas Lusófonas Roselaine Silva Martinez12

Resumo: Este estudo pretende analisar a simbologia das árvores ‘(i)embondeiro’ e

‘jindiba’ em obras representativas do imaginário africano presentes nas literaturas em

língua portuguesa. A metodologia partiu da (re)leitura do romance Luanda Beira Bahia

(1982), do sul-baiano Adonias Filho, do conto ‘O embondeiro que sonhava pássaros’ do

livro intitulado Cada homem é uma raça (1990), do escritor moçambicano Mia Couto, e do

romance Niketche: uma história de poligamia (2004), da escritora moçambicana Paulina

Chiziane. Para tal análise, consideramos algumas lendas africanas que abarcam a

simbologia das árvores, o Dicionário de símbolos, organizado por Sérgio Biagi Gregório, o

Dicionário de mitos literários (2005) organizado por Pierre Brunel, o Dicionário de termos

literários (2004), de Massaud Moisés e o Novo dicionário banto do Brasil: contendo mais

de 250 propostas etimológicas acolhidas pelo Dicionário Houaiss (2003), de Nei Lopes.

Concluímos nossa análise enfatizando que a simbologia das árvores ‘(i)embondeiro’ e

‘jindiba’, além de aproximar as culturas africana e brasileira, representa o social e o

sagrado e, principalmente, a relação homem/natureza, em que a tradição oral e a cultura

africana são o pano de fundo desse universo mítico/místico presente nas literaturas

lusófonas.

Palavras-chave: Literaturas Lusófonas. Simbologia das árvores (i)embondeiro e jindiba.

Cultura africana. Relação homem/natureza.

Introdução

O presente estudo pretende analisar a simbologia das árvores ‘(i)embondeiro’ e

‘jindiba’ em obras representativas do imaginário africano presentes nas literaturas em

língua portuguesa, a partir da (re)leitura do romance Luanda Beira Bahia (1982), do sul-

baiano Adonias Filho, do conto ‘O embondeiro que sonhava pássaros’ do livro intitulado

12 Roselaine Silva Martinez é Graduanda em Letras Português/Espanhol e respectivas Literaturas pela Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), Unidade Universitária Cidade de Bagé. Professora Indicadora: Doutora Miriam Denise Kelm, da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA); Unidade Universitária Cidade de Bagé; Curso Superior de Licenciatura em Letras Português/Espanhol e respectivas Literaturas.

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Cada homem é uma raça (1990), do escritor moçambicano Mia Couto, e do romance

Niketche: uma história de poligamia (2004), da escritora moçambicana Paulina Chiziane.

As obras referidas nos foram apresentadas ao longo das disciplinas de Literaturas

Lusófonas I, II e III do Curso Superior de Licenciatura em Letras Português/Espanhol e

respectivas Literaturas da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA).

Durante as leituras realizadas nas disciplinas mencionadas anteriormente foi

perceptível a simbiose entre o homem e os elementos da natureza. Essa relação nos

enfeitiçou de certa forma, desvendamos a magia de uma literatura pouco difundida nas

instituições de ensino, no entanto, discutida, valorizada e focalizada no curso de formação

de professores de língua e literatura da UNIPAMPA.

Após nosso primeiro contato com essas obras, além do encantamento pela

diversidade cultural e pelo comprometimento dos autores com a linguagem e a

imaginação, compreendemos que a presença das árvores é um dado recorrente nas

literaturas lusófonas, as quais simbolizam o misticismo, a força da terra, das raízes, da

alma e, principalmente, do imaginário de um povo.

Esse encantamento é resultante da imersão nesse universo repleto de

significações, originárias da tradição oral e do imaginário africano, que buscam resgatar

histórias, mitos e crenças da tradição do povo moçambicano, sobretudo, no que diz

respeito às obras dos escritores Mia Couto e Paulina Chiziane, sendo esta a primeira

mulher moçambicana a escrever um romance.

No que se refere à obra Luanda Beira Bahia (1982), de Adonias Filho, percebemos

não só a presença do ‘embondeiro’, mas especialmente da ‘jindiba’, esta última sendo

apresentada com um tom poético desde o início até o desfecho do romance, como sendo

a testemunha cíclica dos acontecimentos.

Portanto, partimos da (re)leitura das obras citadas para este estudo, buscando

analisar alguns excertos que apresentam a figura da árvore sob diferentes prismas,

inclusive, considerando algumas lendas africanas que abarcam a simbologia das árvores.

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Finalmente, pretendemos destacar a relevância desta análise para uma melhor

compreensão da relação homem/natureza presente nas literaturas lusófonas.

A Simbologia das Árvores e as Lendas Africanas

De acordo com o Dicionário de Símbolos, organizado por Sérgio Biagi Gregório, a

árvore é o tema simbólico mais rico e mais difundido. Símbolo da vida, em perpétua

evolução e em ascensão para o céu, ela evoca todo o simbolismo da verticalidade.

A árvore põe ao mesmo tempo em comunicação os três níveis do cosmo: o

subterrâneo, através de suas raízes sempre a explorar as profundezas onde se enterram; a

superfície da terra, através de seu tronco e de seus galhos inferiores; as alturas, por meio

de seus galhos superiores e de seu cimo, atraídos pela luz do céu. Nessa perspectiva, a

árvore é universalmente considerada como símbolo das relações que se estabelecem

entre a Terra e o Céu.

No que se refere ao (i)embondeiro (Baobá), percebemos que essa árvore é

considerada sagrada por representar a africanidade, inspirando poemas, ritos, lendas,

crenças, mitos, romances, etc. De acordo com uma antiga lenda africana, o (i)embondeiro,

nome científico Adansonia digitata, por ter inveja das outras árvores, foi castigado pelos

deuses e posto de cabeça para baixo, ou seja, a copa foi enterrada e as raízes ficaram para

cima.

Outra lenda africana diz ainda que uma vez que um morto seja sepultado no

interior de um (i)embondeiro, a sua alma irá viver enquanto a árvore existir, inclusive, que

a alma dos mortos se pendura nos seus ramos. Curiosamente, essa árvore tem uma vida

muito longa, podendo chegar até seis mil anos.

Igualmente de origem africana, a árvore ‘jindiba’ que perpassa a obra Luanda Beira

Bahia (1982), possui um tronco colossal, suas raízes são profundas e a copa é imensa.

Segundo Nei Lopes em o Novo dicionário banto do Brasil, a ‘jindiba’ é conceituada da

seguinte forma: “Certa árvore africana (BH) – de provável origem banta. Cp. O quícongo,

ngindiba, nzindiba, pesado, gordo.” (p. 122)

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A partir desses aspectos simbólicos, lendários e conceituais, destacamos que a

representação das árvores nas literaturas lusófonas constitui um elemento mítico/místico

que aproxima as culturas africana e brasileira.

O Elemento Mítico/Místico na Literatura Africana e Algumas Curiosidades

Conforme o Dicionário de mitos literários, organizado por Pierre Brunel, a

importância do mito nas sociedades africanas tradicionais, caracteriza-se pela ligação do

social e do sagrado. “O mito define as origens, funda a crença, explica e legitima as

instituições sociais, dá sentido às realidades cotidianas, constitui o fundo de

conhecimentos úteis aos membros da comunidade étnica.” (p. 677). Além disso, afirma

que o mito literário possui algumas peculiaridades, vejamos:

[...] o mito não é assunto pessoal de alguém, mas de um grupo, de uma

coletividade. Na criação literária, o mito intervém na relação do escritor com sua

época e seu público: um escritor exprime sua experiência ou suas convicções

através das imagens simbólicas que repercutem um mito já ambientado e/ou

são reconhecidas pelo público como exprimindo uma imagem fascinante. (p.

731-732)

Da mesma forma, segundo o Dicionário de termos literários, Massaud Moisés

define mito da seguinte maneira: “Mito – Gr. mythos, fábula*, lenda, narrativa, ação*” (p.

298), além de expor que:

[...] o mito resulta das projeções de um povo; é substancialmente coletivo. Se

desde Freud, se admite que o distúrbio neurótico é um mito pessoal, o mito da

coletividade significa que a visão objetiva da realidade cede lugar às pulsões do

inconsciente coletivo, a um só tempo fruto da história, das tendências estéticas

e das práticas religiosas de um povo. De onde o mito não se reduzir apenas a

uma narrativa, uma vez que é “sobretudo o intercâmbio do pensamento,

sentimento, imaginação e linguagem [...] (p. 302)

Após considerarmos que o mito representa a coletividade, e dessa forma, o

imaginário e a religiosidade/espiritualidade de um povo, focalizamos a simbologia das

árvores mediante a presença do ‘embondeiro’ no conto ‘O embondeiro que sonhava

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pássaros’, um dos contos integrantes do livro Cada homem é uma raça (1990),

mencionado e escrito da mesma forma em Luanda Beira Bahia (1982). Entretanto, essa

árvore é referida como ‘imbondeiro’ na obra Niketche: uma história de poligamia (2004).

Cabe salientar que essa diferença na escrita foi um fato que também nos instigou,

deste modo, buscamos algumas informações a respeito dessa curiosidade, e descobrimos

que há quem escreva ‘embondeiro’, mas em Angola é geralmente escrito ‘imbondeiro’.

Etimologicamente, tem origem na palavra mbondo, do idioma Kimbundu.

A Representação das Árvores (i)embondeiro e jindiba nas Literaturas Lusófonas

Na obra Luanda Beira Bahia, Adonias Filho apresenta como cenário as cidades de

Ilhéus e Salvador (Bahia), Luanda (Angola) e Beira (Moçambique). Os personagens

refletem a miscigenação e o hibridismo característicos dos países colonizados. Além disso,

mostra detalhadamente distintas paisagens, resgatando histórias ligadas à natureza, tais

como o mar, o céu, a terra e a árvore.

Nessa perspectiva, o autor consegue aproximar as culturas brasileira e africana, ex-

colônias portuguesas, que possuem características em comum, principalmente pela

mistura racial originária dessa relação colonizador/ colonizado.

Adonias Filho faz uma constante alusão simbólica ao mar e à árvore ‘jindiba’. O

primeiro é percebido como elemento de ligação entre um território e outro, e a segunda,

de origem africana, foi plantada no Pontal (Bahia), sendo apresentada da seguinte forma

no início da obra:

IDADE IMPOSSÍVEL DE SABER-SE, talvez cem ou duzentos anos, teria visto a praia

ainda selvagem, o Pontal com três choupanas e Ilhéus sem o porto. Canoas,

remos nas mãos de escravos e índios, o mar com a serenidade de um lago. [...].

Os sinos chamavam, pouco antes do anoitecer, para a reza dos padres. Quem a

trouxe, simples muda em pedaço de bambu, e a plantou assim tão perto da

praia, jamais se saberá. E ali já estava, alta e forte, quando se fez a casa.

Uma jindiba, aquela árvore. As raízes vinham do chão, espalhavam-se como

suportes, bases do tronco imenso que, muito encima, se abria em galhos e na

copa gigante. [...] (FILHO, 1982: 3)

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Além disso, a ‘jindiba’ é a testemunha cíclica dos acontecimentos, “A testemunha,

assim de pé e sem voz, a dez metros da casa, mas a testemunha”. (p. 9). Simboliza a

harmonia do homem com a natureza:

AS FOLHAS SECARAM, DEPOIS CAÍRAM, e quando isso aconteceu a jindiba

pareceu um homem. Corpo era o tronco com os galhos secos abertos como cem

braços. Nua, de repente ficara nua, culpa do sol ou do mormaço, talvez uma

praga nas raízes. Aquele seu lugar, a dez metros do jardim, conhecendo a casa

desde o começo, há anos, muito maior então o capinzal. Em cima, bem no alto,

o céu não mudava. Outras nuvens, verdade, com o mesmo vento e as mesmas

estrelas. Difícil dizer – para o menino – quem primeiro chegara, se a árvore ou a

casa. (FILHO, 1982: 7)

A partir do seguinte excerto, percebemos que a ‘jindiba’ também representa a

distância dos homens em relação a sua pátria, lembrar da ‘jindiba’ quando se estava

longe, era de certa forma resgatar suas raízes, suas origens, a família, portanto, simboliza

a tradição e o lugar de reencontro:

– Somos amigos, o Sardento e eu. E ele pediu, dona, pediu um ramo de jindiba.

Um pedido maluco, sei lá!

Não pôde deixar de rir-se. João Joanes pedia um ramo da jindiba, lembrava-se

da árvore, era o que estava vendo. Uma coisa viva, que talvez plantasse como

muda em uma lata com terra de Ilhéus, com a recordação na casa, na mulher e

no filho. Levaria aquilo pelos mares afora, parte de sua bagagem, para não

esquecer o que ficara. (FILHO, 1982: 15)

Além da ‘jindiba’, destacamos a presença do ‘embondeiro’ em Luanda Beira Bahia (1982).

Essa árvore faz parte da paisagem angolana, e é citada mediante um cenário mítico/místico

próprio desse meio, representando a religiosidade/espiritualidade de um povo:

Em Luanda, porém, quando o vermelho do céu se desmancha em escuro, a noite

africana começa. [...] Há terreiros e neles se reúnem para os massembas e os

cantos que não chegam à cidade. Deitam-se muitas vezes na terra, e dormem

debaixo dos embondeiros, parte da noite como o mormaço e o silêncio.

Fogueiras, se existem, podem retirar as mulheres das trevas. Quase nuas,

mostrando os seios e os ventres, apenas de tangas, com jingondos nos pescoços,

negras tão lindas são que as quiandas – as sereias de Luanda – estremecem de

ciúme no fundo do mar. (FILHO, 1982: 40)

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Através dos elementos simbólicos, mítico-místicos e religiosos destacados,

compreendemos que principalmente a ‘jindiba’, a árvore testemunha desde o início até o

desfecho trágico do romance de Adonias Filho, representa a vida e a morte, pois foi

cortada e transformada em caixão para abrigar os corpos dos amantes e irmãos Caúla e

Iuta, e do pai de ambos, João Joanes. Vejamos:

Os mortos na sala, deitados, esperando. Todos escutavam as pancadas do

machado e poderiam ver Pé-de-Vento, nu da cintura para cima, o suor na cara e

nos peitos, a derribar a jindiba. O machado cortara as velas que também eram

raízes e já feria o tronco. Desequilibrava-se a árvore. Pé-de-Vento a inclinara

para que caísse com os galhos no mar. E, quando estremeceu, caindo, o Pontal

soube.

[...] Trouxeram as ferramentas, serraram o tronco, cavaram fundo a jeito de um

grande caixão. [...] João Joanes e seus filhos nela embarcariam para sempre. [...]

(FILHO, 1982: 138)

Passamos à análise da simbologia do embondeiro presente no conto ‘O

embondeiro que sonhava pássaros’, um dos contos que compõe a obra Cada homem é

uma raça (1990), do escritor moçambicano Mia Couto.

O conto mencionado apresenta uma história fascinante, a história de João

Passarinheiro, um vendedor de pássaros, que encantava e alegrava todas as crianças com

seus pássaros coloridos. No entanto, essas crianças eram filhas (os) dos colonizadores, e

“Por trás das cortinas, os colonos reprovavam aqueles abusos”. (p. 29)

Percebemos novamente a relação colonizador/colonizado, pois a aldeia dos

brancos é transformada pela presença do passarinheiro, alguém que vem de outro

espaço, ou seja, o vendedor de pássaros descaracteriza o espaço do colonizador, por esse

motivo:

[...] Ensinavam suspeitas aos seus pequenos filhos – aquele preto quem era?

Alguém conhecia recomendações dele? Quem autorizara aqueles pés descalços

a sujarem o bairro? Não, não e não. O negro que voltasse ao seu devido lugar.

[...] (COUTO,1990: 29)

Entretanto, “Tiago, criança sonhadeira”, desobedecia às ordens dos pais mais do

que qualquer criança, e sempre seguia os passos do misterioso vendedor de pássaros, cuja

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“residência dele era um embondeiro, o vago buraco do tronco. Tiago contava: aquela era

uma árvore muito sagrada, Deus a plantara de cabeça para baixo”. (p. 30)

Nesse sentido, a moradia do passarinheiro está ligada simbolicamente às lendas do

‘embondeiro’ apresentadas no item 2.1 deste estudo, as quais representam o imaginário

africano, uma vez que “Aquela árvore é capaz de grandes tristezas. Os mais velhos dizem

que o embondeiro, em desespero, se suicida por via das chamas. Sem ninguém por fogo”.

[...] (p. 30)

Além disso, o passarinheiro evoca uma lenda que revela a harmonia do homem

com os espíritos, com a natureza e com o embondeiro:

[...] Olhou a enorme árvore, conforme lhe pedisse protecção

– Está a ver a flor? – perguntou o velho.

E lembrou a lenda. Aquela flor era moradia dos espíritos. Quem que fizesse mal

ao embondeiro seria perseguido até o fim da vida. (COUTO, 1990: 32)

A presença do passarinheiro na aldeia incomodava os colonizadores, entretanto,

enfeitiçava as crianças, até que o “vendedeiro” foi impedido de vender seus pássaros. A

partir desse momento, ocorrem algumas situações um tanto sobrenaturais:

Em casa dos Silvas:

– Quem abriu este armário?

Ninguém, ninguém não tinha sido. [...]

Em casa dos Peixotos:

– Quem espalhou alpista na gaveta dos documentos?

O qual, ninguém, nenhum, nada. [...]

No lar do presidente do município:

– Quem abriu a porta dos pássaros?

Ninguém abrira. O governante, em desgoverno de si: ele tinha surpreendido

uma ave dentro do armário. Os sérios requerimentos municipais cheios de

caganitas.

– Vejam este: cagado mesmo na estampilha oficial. (COUTO, 1990: 31).

A partir desses episódios estranhos, os colonos procuram o passarinheiro e “Logo

procederam pancadas, chambocos, pontapés. O velho parecia nem sofrer, vegetável, não

fora o sangue. *...+” (p. 32). Em seguida, levam-no para a prisão, mas o passarinheiro

conseguiu fugir. Essa fuga representa um ato de resistência e podemos relacioná-la ao

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“mito” das forças vivas da natureza, que sempre foram desprezadas pelo

branco/colonizador.

A seguir, o menino Tiago dirige-se até o embondeiro, a morada de João

Passarinheiro, e o desfecho de ‘O embondeiro que sonhava pássaros’ torna-se ainda mais

mítico/místico, já que no final o menino não morre, ele se incorpora a essa natureza,

vejamos:

As tochas se chegaram ao tronco, o fogo namorou as velhas cascas. Dentro, o

menino desatara um sonho: seus cabelos se figuravam pequenitas folhas, pernas

e braços se madeiravam. Os dedos, lenhosos, minhocavam a terra. O menino

transitava de reino: arvorejado, em estado de consentida impossibilidade. E do

sonâmbulo embondeiro subiam as mãos do passarinheiro. Tocavam as flores, as

corolas se envolucravam: nasciam espantosos pássaros e soltavam-se,

petalados, sobre a crista das chamas. As chamas? De onde chegavam elas,

excedendo a lonjura do sonho? Foi quando Tiago sentiu a ferida das labaredas, a

sedução da cinza. Então, o menino, aprendiz da seiva, se imigrou inteiro para

suas recentes raízes. (COUTO, 1990: 33-34)

No que se refere ao romance Niketche: uma história de poligamia, a escritora

moçambicana Paulina Chiziane apresenta a história de Rami, a narradora-protagonista e a

primeira esposa de um marido polígamo chamado Tony. Nesse romance, Chiziane expõe a

cultura de seu povo, apresentando um universo no qual se confrontam os costumes da

sociedade africana com a modernidade.

Além disso, a protagonista Rami tenta refletir sobre o seu próprio eu, buscando

encontrar respostas para seus conflitos existenciais e para as dualidades em oposição

homem/mulher, esposa/amante, tradição/ruptura, e no ritmo da dança Niketche procura

resgatar a sua própria identidade.

A simbologia do ‘imbondeiro’ no romance é representada pelo desejo de mudança

e pela tentativa de resgatar a dignidade perdida, pois Rami e as demais esposas são

desprezadas por Tony. Dessa forma, a alusão à árvore sagrada dá-se com um tom de

esperança e liberdade:

Há um lance de setas envenenadas sobre os nossos peitos. E o nosso sangue

corre em coágulos negros nos caminhos do mundo. Todas ficamos encolhidas

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como avestruzes. Com a cabeça debaixo da asa. Chegou o dia de soltar da terra

a raiz do imbondeiro. Queda-se a árvore da fruta boa. Sobram as fruteiras que

dão frutos azedos como o limão. [...] (CHIZIANE, 2004: 270-271)

No entanto, Rami teme pelo seu destino, porque o seu universo gira em torno do

marido polígamo, e ao mesmo tempo em que avalia sua situação, não consegue libertar-

se dessa cultura opressora, vejamos:

Apetece-me abandonar este lar, agora! Viajar sem rumo por esta vida fora.

Procurar novos solos. Mas dizem que as árvores maltratadas morrem quando

são transplantadas. Eu tenho as asas quebradas, eu tenho medo de voar:

(CHIZIANE, 2004: 271)

Nessa perspectiva, Paulina Chiziane, mulher moçambicana, contadora de histórias

provenientes da tradição oral e do imaginário africano, menciona o ‘imbondeiro’ como um

símbolo de esperança e libertação. Além de representar o elo mítico/místico entre a

mulher e a natureza, comparando as mulheres desprezadas com as árvores maltratadas.

Em Niketche: uma história de poligamia percebemos a relação

colonizador/colonizado a partir da posição cultural de Rami, a esposa submissa e oprimida

que suporta as artimanhas do marido polígamo, visto que “A corda rebenta sempre do

lado mais fraco. É o ciclo da subordinação. O branco diz ao preto: a culpa é tua. O rico diz

ao pobre: a culpa é tua. O homem diz à mulher: a culpa é tua.” (p. 272)

Cabe ressaltar que durante a (re)leitura dessas histórias, sentimos a mesma

sensação da primeira leitura, e a partir de uma imersão no universo literário lusófono,

conseguimos apreender que os elementos da cultura africana estão especialmente ligados

aos elementos do mito.

Conclusão:

Após analisar os fragmentos das obras Luanda Beira Bahia (1982), do conto ‘O

embondeiro que sonhava pássaros’, conto integrante do livro Cada homem é uma raça

(1990), e do romance Niketche: uma história de poligamia (2004), e relacioná-las às

lendas, mitos e crenças oriundas da cultura africana, entendemos que as árvores

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‘(i)embondeiro’ e ‘jindiba’ simbolizam o imaginário coletivo de um povo resgatado e

valorizado nas literaturas lusófonas.

Embora o foco deste estudo fosse a representação das árvores nas três obras

analisadas, destacamos brevemente a condição da África e do Brasil como ex-colônias.

Condição esta que é abordada pelos autores Adonias Filho, Mia Couto e Paulina Chiziane,

uma vez que tanto África quanto o Brasil suportaram e suportam as intensas marcas de

sujeição, inclusive, depois de passarem pelo processo de independência.

Concluímos nossa análise enfatizando que a simbologia das árvores

‘(i)embondeiro’ e ‘jindiba’, além de aproximar as culturas africana e brasileira, representa

o social e o sagrado, e principalmente, a relação homem/natureza, em que a tradição oral

e a cultura africana são o pano de fundo desse universo mítico/místico presente nas

literaturas lusófonas.

Referências:

BRUNEL, P (Org.). Dicionário de Mitos Literários. Tradução: Carlos Sussekind; prefácio à edição brasileira Nicolau Sevcenko; capa e ilustrações Victor Burton]. – 4ª ed. – Rio de Janeiro: José Olympio, 2005. CHIZIANE, P. Niketche: uma história de poligamia. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. COUTO, M. O Embondeiro que Sonhava Pássaros. In:_______Cada homem é uma raça. Lisboa: Editorial Caminho S.A., 1990. FILHO, A. Luanda Beira Bahia. São Paulo: DIFEL Difusão Editorial S.A., 1982. Outras Fontes AngolaPress. Imbondeiro (Baobá). Disponível em: http://www.portalangop.co.ao/motix/pt_pt/portal/angola/Simbolos-Culturais,7264cd38-55b6-44e9-bf67-868387352fc7.html. Acesso em 28/06/2010. GREGÓRIO, S. (Org.). Dicionário de Símbolos. Disponível em: http://sites.google.com/site/dicionariodesimbolos/arvore. Acesso em 30/06/2010.

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LOPES, N. Novo Dicionário Banto do Brasil: contendo mais de 250 propostas etimológicas acolhidas pelo Dicionário Houaiss – R. Janeiro: Pallas, 2003. Disponível em: http://books.google.com.br/books?id=eTggc86Q91UC&pg=PA122&lpg=PA122&dq=origem+da+jindiba&source=bl&ots=Wky2qTbUOL&sig=vGuy1aFhVBgF2IQ6hh137Y2VW8Y&hl=pt-BR&ei=rt8sTI_gC8T68Ab24-T0DQ&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=5&ved=0CCUQ6AEwBA#v=onepage&q=origem%20da%20jindiba&f=false. Acesso em 01/07/2010. MOISÉS, M. Dicionário de Termos Literários. São Paulo: Cultrix, 2004. Disponível em: http://books.google.com.br/books?id=0Pn4qAZ-QyoC&pg=PA301&lpg=PA301&dq=dicionario+de+mitos+literarios+e+a+simbologia+da+natureza&source=bl&ots=3p_UAvUGPs&sig=UEuMSqFHlQfmpm1FW88tzF_HMek&hl=pt-BR&ei=RFwvTN-DFIH7lwfF5_nbCQ&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=10&ved=0CD4Q6AEwCQ#v=onepage&q&f=false. Acesso em 03/07/2010.

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Em Estado de Sítio: uma análise sobre a peça Moço em Estado de Sítio, de Vianninha, e a ditadura militar Samita Vieira Barbosa Martins13

Resumo: O presente artigo tem como foco principal desenvolver uma análise sobre a

importância das manifestações artísticas que se verifica durante a ditadura militar, e a

maneira como estas se inserem no contexto histórico de sua produção, oferecendo-nos

um repertório para análise desta época. O artigo trata em específico da peça Moço em

Estado de Sítio, do dramaturgo Oduvaldo Vianna Filho, por meio da qual se pretende

estruturar este estudo sobre a relação entre o teatro e a conjuntura política do país.

Palavras-chave: Teatro. Vianninha. Ditadura militar.

Introdução

O golpe militar que acontece no ano de 1964, através do qual se instaura o período

de governo ditatorial no Brasil que viria a se manter pelos próximos 21 anos, é sem

dúvidas um momento extremamente marcante para o contexto histórico do país.

Tendo apresentado grande repercussão em todas as vertentes sociais, sendo que

no campo intelectual ressalta-se a forma de resposta que se apresentará a partir dessas

mudanças implementadas no Estado, e as formas de resistência para a maneira opressora

com a qual se colocava essa coerção por parte do governo, principalmente no que se

refere às manifestações que apresentassem posições contrárias ao regime instaurado.

Nesse sentido, ao nos voltarmos para o campo artístico, percebemos a procura por

parte dos representantes dessa vertente da sociedade, de maneiras alternativas para o

desenvolvimento de uma contra-resposta ao novo regime vigente.

Partindo desses pressupostos e voltando-se mais especificamente para o campo

teatral, será tomado como referencial para a análise que desejo desenvolver sobre esse

13 Samita Vieira Barbosa Martins é graduanda do sexto período do curso de História da Universidade Federal de Uberlândia – UFU, cidade de Uberlândia, campus Santa Mônica. Professora Indicadora: Doutora Rosangela Patriota, curso de História da Universidade Federal de Uberlândia.

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período a obra do dramaturgo Oduvaldo Vianna Filho (Vianninha); mais especificamente a

peça Moço em Estado de Sítio, escrita em 1965, através da qual é possível desenvolver

uma compreensão de diversos aspectos sobre os acontecimentos neste contexto tanto

político, quanto social e, principalmente, histórico.

Como dramaturgo, observa-se em suas peças a preocupação com questões

politico-sociais sempre se colocando presentes, e é de grande importância chamar a

atenção para o âmbito e o contexto teatral que se tem neste momento em que Oduvaldo

Vianna Filho irá se formar e começar a despontar realmente tanto como ator quanto

como dramaturgo. Isto significa ressaltar o panorama que se tinha na época, – década de

1950 basicamente - destacando-se em essência todo o trabalho que vinha sendo

desempenhado pelo Teatro de Arena, pelo Teatro Oficina (1958-atual), e também pelo

grupo Opinião (1964-1982) que irá brotar deste contexto. E pode-se dizer que desta

mobilização dentro do contexto repressivo e de grande censura que todo o setor artístico

estava sofrendo, a partir da apresentação da Primeira Feira Paulista de Opinião.

Todos estes grupos supracitados, mesmo antes do golpe de 1964, já apresentavam

preocupações em fazer um teatro que se diferenciasse da estética básica que se tinha em

outros teatros brasileiros, apresentando abordagens mais voltadas às produções de cunho

nacionalistas e que interagissem mais com o público. Como destaca Isaías Almada sobre o

Teatro de Arena:

(...) Era natural que nesse período buscasse a cada momento orientar-se estética

e politicamente de acordo com os ideais dos seus principais integrantes, homens

e mulheres de esquerda, de origem pequeno-burguesa, alguns dos quais ligados

ao Partido Comunista Brasileiro. (Almada, 2004, p 94)

Vianninha se inseria neste contexto, e dessa forma, sua trajetória como um todo

vai se estruturando na perspectiva de um teatro engajado, sempre pautado na

preocupação e na participação política. Assim, com o golpe de 1964, essa sua forma de

abordagem irá se voltar bastante para o foco na realidade brasileira daquele momento.

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Ao tomar-se de uma maneira abrangente a trajetória de Oduvaldo Vianna Filho e a

maneira como sua dramaturgia vai se desenvolvendo, a peça Moço em Estado de Sítio se

encontra inserida em uma perspectiva de ruptura de certa forma; um período no qual

Vianninha mudará seu foco de abordagem. E pode-se dizer que essa mudança se dará no

momento em que o país está passando por certa transição, incluindo a mudança de

regime de governo. E isso não apenas torna propícia a forma por meio da qual o autor

estará produzindo seu trabalho, assim como possibilita uma diferente maneira deste agir

na sociedade. Ou seja, é possível perceber como o contexto histórico do período

influenciava na produção, assim como a peça também irá atuar na sociedade

modificando-a e influenciando-a dessa mesma forma.

A Dramaturgia de Vianninha

É importante ressaltar primeiramente, num panorama mais geral, o fato de que

Oduvaldo Vianna Filho (Rio de Janeiro 4 de Junho de 1936 – 16 de julho de 1974) iniciou

suas atividades no teatro propriamente. Primeiro como ator, por volta de 1955,

participando do grupo do Teatro Paulista do Estudante, e como dramaturgo ele estrea no

ano de 1959 com a peça Chapetuba Futebol Clube. No entanto, Vianinha se encontra

inserido no mundo teatral desde muito antes, sendo filho de Oduvaldo Vianna,

dramaturgo que se destacou muito no teatro e no cinema brasileiros principalmente entre

as decadas de 20 e 30. Além disso, as suas preocupações de cunho politico também serão

algo que Vianinha traz de casa, já que seu pai também fazia parte do Partido Comunista

Brasileiro, sendo que dessa forma, tais aspectos estarão presentes em suas obras de

maneira muito marcante.

Detendo-se na discussão sobre a formação de Oduvaldo Vianna Filho, podemos

verificar estes aspectos relacionados a engajamento político no desenvolvimento de sua

arte quando da própria inserção do dramaturgo no mundo teatral. Primeiramente no

Teatro de Arena, onde participa dos Seminários de Dramaturgia que são organizados por

este, e vai realmente iniciar a estruturação dessa visão. Nele, Vianninha irá consolidar em

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um primeiro momento estas preocupações com a estreia de Chapetuba Futebol Clube, a

qual já apresenta enorme repercussão. Porém, segundo nos apresenta Rosângela Patriota,

apesar de compartilhar o mesmo projeto político e estético do Arena, ele discorda da

maneira como este estava sendo realizado, e acaba se desligando do Teatro de Arena,

indo para o Rio de Janeiro (Patriota, 2004).

A saída de Oduvaldo Vianna Filho do Teatro de Arena por divergências de ideais, o

leva à estruturação, juntamente a outros intelectuais da época que também partilhavam

dessa mesma perspectiva de engajamento artístico no sentido de ser necessária postura

que atingisse mais diretamente a população sem muito contato com as ideias, do Centro

Popular de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes - UNE, no qual se terá essa

atuação voltada entre outros problemas do país para a política. Com isso se voltando para

o que Vianninha almejava e que estava além das possibilidades por ele vislumbradas no

Arena.

Dessa forma, a proposta do CPC em si, apresentava a preocupação no

desenvolvimento de um teatro engajado voltado para a questão popular realmente, e

será, de certa maneira, onde Vianninha encontrará maior espaço para desenvolver e

concretizar suas intenções. Intenções estas voltadas para a discussão acerca da atuação

dos intelectuais na sociedade em que se encontram inseridos. A seguinte reflexão de

Rosângela Patriota nos elucida bastante sobre isso:

A partir da construção de que o intelectual deve exercer sua atividade, apesar

das condições em que ele vive, Vianinha elaborou textos dramáticos,

procurando refletir sobre o engajamento artístico e acerca dos limites da

atividade crítica no mercado de trabalho. O primeiro resultado dessa incursão

foi Moço em Estado de Sítio. (Patriota, 2007, p 32)

A Dramaturgia em Estado de Sítio

A peça Moço em Estado de Sítio narra a história de Lúcio, rapaz de classe média,

formado em direito, que participa de um grupo de teatro com os amigos, se apresentando

em bairros do subúrbio, com peças que levam mensagens de cunho político e de ênfase

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no alerta, por assim dizer, sobre a condição do proletariado. Porém, Lucio possui muitas

divergências com as atividades do grupo, principalmente com Bahia, um dos integrantes, e

que é quem escreve e dirige as apresentações. Suas divergências aparecem não apenas no

sentido das opiniões diferentes a respeito do trabalho que está sendo realizado, mas

também de cunho sentimental, já que Bahia namora Suzana, personagem à qual Lucio

também demonstra ter afeto. Além disso, Lucio também possui divergências com seu pai,

Cristovão, que procura arrumar emprego para o filho em um escritório de advocacia

mesmo contra a vontade deste. A mãe, Cota, é dona de casa e se dedica a cuidar desta e

dos filhos. Lucia, irmã de Lucio, está grávida de Estelita, amigo deles, e que não se mostra

muito inclinado a assumir um filho.

Uma figura que merece destaque é a do personagem Jean Luc, amigo deles, a qual

está sempre mostrando um lado um tanto cômico das situações. Tem-se também a

personagem Noemia, com quem Lucio mantém um caso e a qual sempre procura em seus

momentos de “fuga”.

Na segunda parte da peça, Lucio resolve aceitar as propostas do pai e vai trabalhar

no escritório de advocacia do seu amigo mesmo contra sua vontade. Ele apresenta uma

proposta de uma peça teatral escrita por ele ao grupo, a qual acaba não sendo muito bem

aceita. Apesar disso, Suzana auxilia Lucio a convencer Bahia e os outros integrantes do

grupo a montar a peça. Porém, após conseguirem organizar a montagem da peça, Lucio

desmente toda a situação, e diz para Bahia e para os companheiros do grupo que não

possuía conhecimento de que Suzana estava organizando-a.

Depois de todos estes problemas com o grupo, Lucio resolve buscar emprego em

um jornal, por meio de indicações de Estelita, que também trabalha neste mesmo. Lucio

resolve manter-se trabalhando nas publicações deste jornal, apesar de não lidar muito

bem com as ideias e opiniões com as quais ele lidava e disseminava. Ele se torna amante

da esposa do patrão, Bandeira, e na terceira parte da peça, este decide demitir Estelita e

colocar Lucio ocupando o posto em seu lugar. Apesar de inicialmente não se sentir bem

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com essa decisão, Lucio acaba não fazendo nada para evitar que Estelita seja mandado

embora do emprego no jornal.

Algo interessante que podemos ressaltar, é que o personagem de Jean Luc irá ao

longo da peça, realmente destacar o contexto e o que estava se passando naquela

situação como um todo. Exemplo disso é no momento no qual ele diz:

Jean Luc: Eu disse pro Lucio – pára antes da indignidade... eu disse... Fui na casa

dele, com telefone... 27-8737... me olhou com pena... Aquele pobre coitado,

sitiado, me olhando com pena... Cabe? Dei dinheiro pra ele, quantas vezes ficou

na minha casa? Ele quer ser alguém de qualquer jeito. Pra ter mulher, não entrar

em fita, receber convite de avant-premiére... Humanidade filha da mãe que não

confia nela mesma... Só tem confiança em eleitos... (Vianna Filho, 1965, p 31)

Posteriormente, mais ao final da peça, tem-se um dos pontos bastante chocantes

da mesma, quando Jean Luc é encontrado morto em casa, tendo cometido suicídio. Em

um momento seguinte, Lucio volta a participar do grupo de teatro junto à Bahia e Suzana,

e discutem sobre a adesão ou não à greve de estudantes que está ocorrendo. Lucio

defende que o grupo vá se apresentar e participe da greve. Durante a greve, a polícia

chega, há grande reviravolta, e Lucio acaba por fugir, indo embora para casa e deixando

Suzana no meio da confusão.

Assim, pode-se dizer que Vianninha, com esta peça, irá desenvolver “um amargo

mergulho nas vicissitudes do trabalho intelectual dentro de uma sociedade de classes”

(Ramos, 2004, p 03), e que o protagonista Lúcio, apesar de inicialmente se mostrar um

jovem cheio de sonhos e ambições, acaba se deixando levar pelas exigências do sistema e

deixando de lado seu engajamento e sua visão repleta de idealismo e confiança no

engajamento político, visto como possibilidade de se conseguir mudanças na sociedade.

Moço em Estado de Sítio e a Ditadura

A peça Moço em Estado de Sítio é vista como um divisor de águas na obra de

Vianninha. Muitos críticos da época como Yan Michalski e Sábato Magaldi, irão ressaltar

tão fato, no sentido de que a partir desta peça, Vianninha mostrará amadurecimento

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como dramaturgo, e tal amadurecimento é visto de maneira concreta na própria estrutura

da peça, a qual “em termos de construção narrativa, seria uma de suas mais arrojadas e

inventivas obras. Em três atos, ele estruturou nada menos que 50 breves sequências,

sugerindo locais os mais diversos, numa dinâmica verdadeiramente cinematográfica.”

(Carvalho, 1991, p 150). Essa maturidade como autor irá se comprovando nas sucessivas

obras que virão sendo apresentadas, sendo que Rasga Coração – sua ultima peça, e a qual

será concluída já no hospital pouco antes de seu falecimento – é considerada pela crítica

realmente a sua obra de maior destaque.

Assim, é a partir de Moço, nesse período logo após o golpe de 1964, que ele irá

começar a desenvolver peças que se voltam para a realidade, já que o regime militar se

encontrava instaurado, e assim, a partir desse novo fato, era verdadeiramente necessário

que fossem aplicadas novas questões e propostas com relação à isso. Rosangela Patriota,

em sua abrangente análise sobre a dramaturgia de Vianninha deixa tal fato bastante claro:

Os acontecimentos de 1964 apresentam para Vianinha importantes questões

acerca de sua própria atividade profissional, embora, naquelas circunstâncias,

muitas possibilidades poderiam ser aventuradas. No entanto, para alguém tão

envolvido com a instrumentalização da arte, em favor de uma transformação

social, os novos rumos do país colocaram-lhe, de maneira contundente, a

indagação: o que é ser intelectual e/ou artista em uma sociedade de classes?

(Patriota, 2007, p 30)

Nesse sentido, tentar entender a correlação existente entre a peça que se

encontra como foco deste estudo e o seu contexto, traz a imprescindível necessidade de

se pensar como o ano de 1965, no qual a peça foi produzida, sendo o ano imediatamente

após o golpe militar no Brasil; se articula com as produções e manifestações artísticas que

estavam se dando naquele momento, mais especificamente na dramaturgia. Sobre isso,

vale destacar as palavras do próprio Vianninha a respeito da situação que se enfrentava

naquele momento na conjuntura teatral.

As perspectivas do teatro para 1965 não podem ser desligadas da perspectiva

geral do Brasil em 1965. (...) Não é mais preciso explicar a importância e o que é

a democracia. Sentimos na carne a sua falta. Não é mais preciso explicar o que é

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teatro participante: peças “difíceis” – Moratória, Andorra, Pequenos Burgueses,

Depois da Queda, Tartufo, e o espetacular sucesso de Opinião - explicam tudo.

(...) Então o teatro brasileiro em 1965 ou se empenha na sua libertação,

participando do processo de redemocratização da vida nacional, na consagração

dos sentimentos de soberania e vigor do povo brasileiro – ou, então – alheio a

um dos momentos capitais de nossa história – poderá ficar incluído entre os que

tiveram a responsabilidade de descer sobre o Brasil a mais triste e estúpida de

suas noites. (Peixoto, 2008, p 142)

Um fato muito interessante, ainda pensando nessa relação entre a obra e o seu

contexto de produção e inter-relacionando-os, é o de que a peça só virá a ser encenada

pela primeira vez no ano de 1981, quando ela finalmente passa pela censura; sendo que é

montada uma primeira encenação sua em 1977, mas esta é proibida. Ela passa doze anos

sem vir a público, e até mesmo muitas pessoas próximas de Vianninha também não

tinham conhecimento desta obra. A respeito deste acontecimento, o diretor Aderbal

Júnior que dirigiu uma das montagens da peça no ano de 1981 apresenta informações

nesse sentido, esclarecendo que Moço em Estado de Sítio pode ter sido apresentada para

alguns companheiros e amigos, mas não foi bem aceita devido a sua história, posto que o

protagonista exprime uma crítica afiada aos próprios artistas que vivam aquele momento

e até a si mesmo. E tem-se ainda a questão estrutural de montagem da peça considerada

muito arrojada, o que pode não ter trazido uma grande inclinação em montá-la naquele

momento (Carvalho, 1991).

Além destas reflexões acerca das maneiras como o contexto histórico e as

expressões artísticas conseguem se relacionar e estabelecer um diálogo, na obra,

aprofundando o enfoque na narrativa desenvolvida na peça Moço em Estado de Sítio, é

possível pensar como as ações e o desenrolar da trama em cada personagem se dão e

constituem a totalidade da peça.

Para início desta proposta, pode-se apreender a maneira como o protagonista

Lucio, no decorrer da história, vai perdendo sua busca pelo desenvolvimento de um teatro

engajado e uma atuação na sociedade, e se tornando mais propenso a integrar-se e

compactuar com ideais os quais ele não defendia ou nem mesmo concordava; pensando

na maneira de agir, nas relações que ele estabelece com os outros personagens, com o

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grupo de teatro ao qual ele está vinculado inicialmente e que estabelece influências

bastante fortes na sua ação ao longo de todo o texto, assim como a sua relação com a

família e com os amigos.

Tem-se aí, essencialmente na figura do personagem de Lucio, um caráter bastante

metalinguístico que esta obra traz, pois ela de certa maneira mostra como “o dramaturgo

internalizou, na personagem Lúcio, esses conflitos, isto é, como autor, o protagonista não

tinha ideias bem definidas (...) e essa fragilidade (...) tem seus desdobramentos no

trabalho. Nesse caso, a não consistência temática e narrativa de sua escrita refletia-se na

conduta social e política.” (Patriota, 2007, p 36)

Ainda sobre isso, deve-se refletir no destaque dado ao personagem de Jean Luc,

amigo de Lucio, o qual além de dar à peça tom cômico que destoa da linha mestra da obra

tem também a intenção de analisar de todo o contexto no qual a obra está inserida.

Percebendo as ações de Lucio e enfocando nesse sentido a maneira como se dará o

desenvolver da peça.

Enfim, englobando de forma mais geral as relações que o protagonista estabelece

com todos os personagens que o vão cercando ao longo da trama, podemos perceber que

há destaque para a cobrança de posicionamento mais contundente da parte de Lucio com

relação a suas ações e acontecimentos ao seu redor. E isso é algo que ele não consegue

apresentar. Isso se dá de maneira clara quando a personagem de Suzana resolve se opor

ao restante do grupo para montar a peça de Lucio, e este acaba não conseguindo ele

mesmo defender sua obra quando é posto a prova sobre isso, deixando Suzana sozinha

nesse próprio intento de ajudá-lo. Ou seja, são atos extremamente contraditórios que

permeiam toda a história e as práticas de Lucio, e tal fato é um aspecto que Vianninha nos

deixa nesta obra: a indecisão, o titubear, a dúvida diante das situações. Fatos que de certa

forma estavam permeando os sentimentos de muitos com relação ao desenvolvimento de

seu trabalho nesta conjuntura que o Brasil se encontrava. O que se pode dizer, é que

“Lucio é o anti-herói ou o herói negativo, que, sabendo o caminho certo, se desvirtua por

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interesses menores e desmedida ambição. Aquele que, pela queda, aponta a direção certa

a ser seguida.” (Carvalho, 1991, p 151)

Reflexões Conclusivas

A vasta obra de Vianninha, tanto na dramaturgia quanto também nas suas

incursões na televisão, nos leva inevitavelmente, pensando-se historicamente, a refletir

acerca da conjuntura que permeou toda a sua vida, tanto nos aspectos sociais, como

políticos e, obviamente, culturais; as quais atuaram e influenciaram a estruturação de

tudo que ele produziu, assim como toda a sua produção trouxe irrefutáveis influencias nas

produções artísticas daquele momento, porque não até da atualidade; e não apenas no

âmbito apenas teatral ou artístico, mas no campo cultural do Brasil verdadeiramente.

O que a peça Moço em Estado de Sítio trará como tema central é uma abordagem

que estará presente na dramaturgia de Vianninha em geral: “o indivíduo esmagado por

uma engrenagem hostil ao seu pleno desenvolvimento. A medição de forças o

desfavorece e fragiliza diante de um sistema no qual prevalecem a busca da ascensão

social, os preconceitos e falsos valores morais.” (Carvalho, 1991, p 150)

Dessa forma, Oduvaldo Vianna Filho era integrante de toda uma geração que

apresentava inúmeros anseios e aspirações para uma atuação na sociedade de maneira

efetiva, por meio da cultura, do teatro, e que partilhava do intuito de tentar atingir a

população por meio disso com objetivos de transformação coletiva. Anseios de

transformação estes, que acabaram sendo sitiados com o golpe de 1964. Tem-se uma

geração sitiada, e que verá suas ambições se tornando ao mesmo tempo em que ainda

mais distantes, também ainda mais necessárias do que eram anteriormente.

É importante, por fim, pensar na significância da atuação dessas pessoas

politicamente por meio de sua arte, continuando, apesar das dificuldades e a opressão

cada vez maiores, na tentativa de implementar as mudanças que eram necessárias

naquela conjuntura. Agora não apenas mais de cunho social, de atingir a população e

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conscientizá-la, mas agora é indispensável agir contra um empecilho ainda maior, e buscar

pela mudança de todo um regime político.

Referências:

ALMADA, I. Teatro de Arena: uma estética de resistência. São Paulo: Boitempo, 2004.

MORAES, D. de. Vianinha: cúmplice da paixão. Rio de Janeiro: Nordica, 1991.

PATRIOTA, R. A Crítica de um Teatro Crítico. São Paulo: Perspectiva, 2007.

_______, R. História - Teatro – Política: Vianinha, 30 anos depois. Fênix – Revista de História e Estudos Culturais, Uberlândia, v. l, ano I, n. 1, p. 3 Out./ Nov./ Dez. 2004. Disponível em: www.revistafenix.pro.br, acesso em 25 de Novembro de 2010.

PEIXOTO, F. (org.) Vianninha: Teatro, Televisão, Política. Rio de Janeiro: Funarte, 2008, 2ª Ed.

RAMOS, A. Oduvaldo Vianna Filho e o Cinema Novo: apontamentos em torno de um debate estético-político. Fênix – Revista de História e Estudos Culturais, Uberlândia, v. l, ano I, n. 1, p. 3 Out./ Nov./ Dez. 2004. Disponível em: www.revistafenix.pro.br. acesso em 25 de Novembro de 2010. VIANNA FILHO, O. Moço em Estado de Sítio. cópia digitalizada pelo acervo de peças teatrais da biblioteca da Universidade Federal de Uberlândia. Enciclopédia Itaú Cultural – Teatro, 1965. Disponível em http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_teatro/index.cfm?fuseaction=cias_biografia&cd_verbete=657. Acesso em 15 de Março de 2011.

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Caracterização Geoambiental da Bacia Hidrográfica do Ribeirão São Lourenço, Ituiutaba/Prata (MG) Giliander Allan da Silva14

Resumo: A presente pesquisa objetivou elaborar uma caracterização geoambiental da

bacia hidrográfica do Ribeirão São Lourenço, situada nos municípios de Ituiutaba e Prata -

MG, além de discorrer sobre procedimentos metodológicos adotados para se realizar um

estudo de Fragilidade Ambiental. Esta bacia hidrográfica tem grande importância para a

população de Ituiutaba, pois é fonte de abastecimento primordial para a SAE

(Superintendência de Água e Esgoto de Ituiutaba) (SAE, 2010). A metodologia utilizada na

pesquisa se fundamentou em Tricart (1977), através do conceito de Ecodinâmica. Esse

conceito serviu de base para que Ross, em 1994 escrevesse "Análise empírica da

Fragilidade dos Ambientes Naturais e Antropizados", cuja obra atribui ao ambiente, de

acordo com a correlação de dados naturais e econômicos, diferente classes de fragilidade

frente aos processos degradacionais (erosão) e agradacionais (deposição). Assim sendo, a

caracterização hidrográfica teve apoio em Christofoletti (1980). Obteve-se como

resultado, uma série de mapas (produzidos a partir de análise de Imagens de Satélites,

Consultas Bibliográficas e Trabalhos de Campo, etc.) que foram fundamentais para a

caracterização geoambiental da bacia do Ribeirão São Lourenço. Além disso, pode-se

afirmar que, esta pesquisa servirá de subsídio para a implantação do Plano de

Gerenciamento da bacia, principalmente, devido à sua importância para a cidade de

Ituiutaba – MG.

Palavras-chave: Fragilidade Ambiental. Processos Erosivos. Ribeirão São Lourenço. Ituiutaba. Prata.

14 Giliander Allan da Silva é graduando do nono período do curso de Geografia da Universidade Federal de

Uberlândia - Campus Pontal, na cidade de Ituiutaba-MG.

Professor Indicador: Doutor Rildo Aparecido Costa, curso de Geografia da Universidade Federal de

Uberlândia - Campus Pontal, na cidade de Ituiutaba-MG.

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Introdução

Nos dias atuais, o desenvolvimento científico-tecnológico atrelado ao

aperfeiçoamento das técnicas e ao crescimento econômico, possibilita o homem realizar

tarefas jamais presenciadas ao longo de sua história. Estas atividades culminam com a

modificação no ambiente, seja no campo ou na cidade e, consequentemente com

exploração dos recursos naturais.

Em função disto, a cada dia torna-se mais importante conhecer melhor o meio

natural em que se vive, a fim de planejar e orientar as intervenções geridas pela própria

dinâmica econômica, baseada no desenvolvimento. Como salientou Gerasimov (1980,

apud ROSS, 1991, p. 15), ao se trabalhar com a questão ambiental, o primeiro problema

que o cientista se depara é com a contradição que emerge entre utilizar os recursos

naturais ou proteger a natureza.

Nesse bojo, a técnica e as tecnologias, além de subsidiar a dinâmica econômica,

devem ser elementos auxiliadores para a análise e planejamento das intervenções

humanas na natureza. Este estudo teve as geotecnologias15 como instrumental

indispensável para analisar e espacializar os dados obtidos.

A área dedicada à pesquisa se refere à bacia hidrográfica do Ribeirão São

Lourenço. A escolha desta bacia se deu pela sua importância para a cidade de Ituiutaba,

pois, a água do Ribeirão São Lourenço e do Rio Tijuco que suprem as necessidades hídricas

da cidade. O primeiro tem função constante no abastecimento e o segundo auxilia nos

períodos de estiagem.

A figura 1 ilustra os locais de captação de água.

15 Para Silva (2003), fazem parte da geotecnologia o Processamento Digital de Imagens (PDI), a

Geoestatística e os SIG's (Sistema de Informação Geográfica).

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Figura 1: a) Posto de captação de água no Ribeirão São Lourenço; b) Posto de captação de água no Rio Tijuco. Fonte: SAE - Ituiutaba, 2010.

As características econômicas da cidade também tendem a depender grandemente

deste recurso natural. Ituiutaba possui economia voltada para as atividades agrícolas. É

marcante a presença de frigoríficos e usinas sucroalcooleiras no município. Neste sentido,

o Ribeirão São Lourenço se torna um recurso hídrico importante para estas atividades,

seja na dessedentação de animais e/ou na irrigação de culturas.

A pesquisa faz um paralelo às ideias de Portes et al (2009, p. 2), os quais destacam

que "[...] o conhecimento da fragilidade ambiental presentes no sistema de uma bacia

hidrográfica possibilita compreender a realidade dinâmica da relação homem/natureza e

obter informações relevantes de problemas para subsidiar ações futuras".

Contudo, o desígnio primordial se ateve em tecer uma caracterização

geoambiental (hidrografia, geologia, geomorfologia, climatologia, morfometria –

quantificação das formas da bacia – uso e ocupação, etc.) da bacia hidrográfica e destacar

os procedimentos metodológicos para um estudo sobre a sua fragilidade ambiental.

Metodologia: Várias fontes foram utilizadas na pesquisa. O IBGE (Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística) colaborou com bases cartográficas digitais do Brasil

(formato "shp") e cartas topográficas (Serra de São Lourenço (SE-22-Z-D-I), 1970 e

Ituiutaba (SE-22-Z-B-IV), 1973).

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O site GeoMINAS também contribui substancialmente com a pesquisa. Através

dele, se realizaram o download das bases cartográficas digitais do estado de Minas Gerais

e de solos em formato "shp".

A EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) prestou auxílio

também pelo seu site. A plataforma "EMBRAPA - Brasil em relevo" dispõe de imagens de

radar da missão SRTM (Shuttle Radar Topography Mission), as quais possuem dados

numéricos de relevo e topografia do Brasil. Estas imagens possibilitaram, entre outras

análises, a confecção de mapas morfométricos (hipsometria e declividade).

A assistência dada pelo INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) se ateve às

imagens de satélite. Este órgão forneceu imagens do satélite LANDSAT 5 TM, cuja

resolução é de 30 metros. As datas foram: 02/fev./2010 para órbita/ponto 222/73 e

02/mai./2010 para órbita/ponto 221/73.

O software Google Earth contribuiu por meio de suas imagens orbitais. Os satélites

Quick Bird (Digital Globe) e Spot forneceram dados amostrais de grande valia,

especialmente, pela boa resolução das imagens (0,60 e 2,5 metros) utilizadas durante a

interpretação e confecção do mapa de uso e ocupação do terreno. As datas das imagens

foram: Quick Bird (20/Nov./2006 e 26/mar./2007) e Spot (16/fev./2010 e 16/jul./2010).

O armazenamento, tratamento e cartografação dos dados se realizaram através de

SIG (Sistema de Informação Geográfica) cujo software é o ArcMap, versão 9.2. A

composição colorida (RGB) das imagens do satélite LANDSAT 5 foi realizada pelo mesmo

programa. Já para confeccionar o modelo em três dimensões, utilizou-se o software

ArcScene, versão 9.2.

Também se realizou trabalhos de campo na área. Portando, as cartas topográficas

supracitadas, mapas previamente confeccionados e GPS (Sistema de Posicionamento

Global), realizaram visitas a campo com o intuito de conflitar os dados mapeados à

realidade local, para que, se houvesse necessidade de novas adequações cartográficas que

estas fossem realizadas.

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Quanto às metodologias para estudo da fragilidade ambiental da área pesquisada,

utilizaram-se basicamente dois autores. O primeiro deles é Jean Tricart, cuja obra

"Ecodinâmica" de 1977, deu bases para que, o segundo, Jurandyr Ross, em 1994

escrevesse "Análise empírica da Fragilidade dos Ambientes Naturais e Antropizados".

Posteriormente, Amaral e Ross (2009, p. 60) empregaram o conceito de Unidades

Ecodinâmicas de Instabilidade Potencial e de Instabilidade Emergente, as quais classificam

o ambiente a partir dos diferentes graus de fragilidade que cada área apresenta.

Assim, Ross (1994) considera que as Unidades Ecodinâmicas de Instabilidade

Potencial (estáveis), são aquelas que estão em equilíbrio dinâmico16, devido ao seu estado

natural, porém, traz consigo a possibilidade de mudança caso haja qualquer intervenção

antrópica.

As Unidades Ecodinâmicas de Instabilidade Emergente (instáveis) denotam os

ambientes alterados pelo homem através do desmatamento, plantio, urbanização,

industrialização, entre outros, representando as áreas antropizadas. A correlação entre os

dados naturais e econômicos possibilitaram a Amaral e Ross (2009) atribuir ao ambiente,

classes de fragilidade. Estas se distinguem em: Muito Baixo, Baixo, Médio, Alto e Muito

Alto grau de fragilidade. Nesta pesquisa indica-se este procedimento. Os dados utilizados

para estabelecer a correlação são pedologia, uso e ocupação e declividade.

Caracterização da Área de Estudo

A delimitação da área de estudo é tarefa prioritária em pesquisas de cunho

geográfico-ambiental. Segundo Spörl (2001), a bacia hidrográfica17 possibilita uma análise

integrada das inúmeras variáveis que interferem na potencialidade dos recursos naturais.

No entanto, este estudo torna possível uma melhor visão da realidade local, indicando

suas características e facilitando opções mais adequadas de uso e ocupação.

16 Considera-se como equilíbrio dinâmico um ambiente em que os processos naturais ocorrem em sintonia,

ou seja, de forma equilibrada. 17 Para Suguio (1998, p. 76) bacia hidrográfica e bacia de drenagem são sinônimos. Representam uma "[...]

parte da superfície terrestre que é ocupada por um sistema de drenagem ou contribui com água superficial

para aquele sistema".

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A bacia hidrográfica do Ribeirão São Lourenço está presente nos municípios de

Ituiutaba e Prata, os quais se localizam na Mesorregião do Triângulo Mineiro e Alto

Paranaíba, no Pontal do Triângulo Mineiro. As coordenadas geográficas para localização

da área são: 19º 04’ 22” de latitude Sul e 49º 20' 06" de longitude Oeste. (figura 2) O mapa

de localização a seguir apresenta imagem de satélite da área da bacia hidrográfica. Pode-

se notar a proximidade do ponto de captação de água, no Ribeirão São Lourenço à malha

urbana da cidade, o que denota menor custo para o deslocamento da água.

Figura 2: Localização da Bacia Hidrográfica do Ribeirão São Lourenço, 2010. Autor Giliander A. Silva.

O canal principal da bacia hidrográfica se desloca no sentido SE - NW. Suas

nascentes principais estão a N/NW do município de Prata, a uma altitude de 750 m. Sua

foz se dá no Rio Tijuco, com altitude média de 500 m., contudo, verifica-se uma

declividade próxima de 280 m ao longo dos 36 quilômetros de extensão. A área da bacia é

de 295 km². Baseando-se nas classificações de Christofoletti (1980), o padrão de

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drenagem que melhor caracteriza a bacia em questão é o dentrítico ou arborescente18. Os

canais afluentes/tributários correm em várias direções e ao se unirem formam ângulos

agudos e não retos.

Quanto aos tipos de canais fluviais, observaram-se duas distinções: retilíneo e

meandrante. Os canais retilíneos predominam em quantidade sendo, sobretudo,

tributários. Já os meandros ocorrem principalmente no curso principal, particularmente

no médio o baixo curso.

Os canais retos são caracterizados por Christofoletti (1980, p. 88) sendo "[...]

aqueles em que o rio percorre um trajeto retilíneo, sem se desviar significativamente de

sua trajetória normal em direção à foz".

No caso dos meandros, Christofoletti (1980, p. 88) acrescenta que consistem nos

rios que "[...] descrevem curvas sinuosas, largas, harmoniosas e semelhantes entre si [...]".

Comumente ocorre escavação/erosão na margem côncava e deposição/sedimentação na

margem convexa (figura 3), este processo configura a sinuosidade do canal.

Figura 3: Processo erosão/deposição em um meandro. Fonte: Adaptado de Press, F. & Siever, R. (1997)

Opina Christofoletti (1980, p. 115) que, calcular a densidade de rios (Dr) é

relevante já que consiste na relação entre o número de rios e a área da bacia. Esta

atividade denota o comportamento hidrográfico de determinada área, sobretudo, seu

18 Christofoletti (1980) utiliza este termo para representar o padrão de drenagem que tem semelhança à

galhada de árvore.

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aspecto primordial: "a capacidade de gerar novos cursos de água", ou seja, a

potencialidade de surgir novos canais. Sendo assim, a bacia hidrográfica do Ribeirão São

Lourenço apresenta uma:

Dr = 0,2915 rios/km²

Tratando do cálculo da densidade da drenagem (Dd), este apresenta diferenças

com o conceito anterior e também colabora com outras análises. Este cálculo correlaciona

o comprimento de todos os canais com a área da bacia hidrográfica. Ademais, possui

relação inversa ao comprimento dos rios, ou seja, se aumenta o valor numérico da

densidade, diminui o tamanho dos canais. Sendo assim, a bacia estudada detém uma:

Dd = 0,85 km/km²

Para Sucupira et al (2006, p. 8), ocasiões em que o valor de (Dd) é superior ao valor

de (Dr), revela elevado controle estrutural, com canais em menor número e mais

alongados. Ademais, "uma área com índice elevado de densidade de drenagem é

resultante de baixa transmissibilidade do terreno e, portanto, mais sujeita à erosão".

A hierarquização da drenagem19 foi realizada com base em Strahler (1952, apud

CHRISTOFOLETTI, 1980, p. 106-107). Neste sentido, a tabela 1 apresenta o ordenamento

dos canais, os quais ocorrem até a 4ª ordem. Auxiliando a apresentação dos dados

hidrográficos, a figura 4 ilustra a hierarquização do sistema de drenagem da Bacia

Hidrográfica do Ribeirão São Lourenço.

19 Segundo Crhistofoletti (1980, p. 106), é o processo de se estabelecer a classificação de determinado curso

de água (ou da área drenada que lhe pertence) no conjunto total da bacia hidrográfica na qual se encontra. Isso

é realizado com a função de facilitar e tornar mais objetivo os estudos morfométricos (análise linear, areal e

hipsométrica) sobre as bacias hidrográficas.

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Tabela 1: Quantidade de rios e suas ordens na Bacia Hidrográfica do Ribeirão São Lourenço, em 2011.

Ordem dos canais (Strahler, 1952)

Número de canais

1ª 86 2ª 34 3ª 22 4ª 26

Fonte: IBGE - Cartas topográficas Serra de São Lourenço (SE-22-Z-D-I), 1970 e Ituiutaba (SE-22-Z-B-IV), 1973.

Org. ALLAN-SILVA, G. (2011).

Figura 4: Hierarquização do sistema de drenagem da Bacia Hidrográfica do Ribeirão São Lourenço. Autor Giliander A. Silva.

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Pela imagem nota-se que as nascentes do Ribeirão São Lourenço possuem uma

cabeceira principal com canais de pequena extensão, sendo de primeira e segunda ordem.

Outros canais se unem a este sistema de drenagem no médio curso, com maior número

de nascentes e canais de até terceira ordem. Ainda no médio curso, o canal principal

recebe o atributo de maior nível hierárquico (4º nível). Por toda a extensão do canal

principal, há grande número de afluentes, diferindo das proximidades da foz, a qual

recebe pequena quantidade de tributários.

Examinando o clima da região, Köppen o classificou como Aw (megatérmico:

tropical com verão chuvoso e inverno seco). A estação chuvosa se distribui de Outubro a

Abril e o período seco ocorre de Maio a Setembro. As temperaturas oscilam entre 14º C,

comum no mês de Junho, a 31ºC em Dezembro. A distribuição pluviométrica na

mesorregião do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba apresenta diferenças significativas,

sendo que, na direção sudeste - noroeste a média de chuvas tendem a diminuir. (PRADO e

SOUZA, 2010).

Ainda caracterizando o clima, Prado e Souza (2010) apresentam um mapa

pluviométrico o qual aborda os índices de chuva acumulado entre os anos de 2002 a 2008

(figura 5). Como se pode observar, os municípios que abrangem a bacia hidrográfica do

Ribeirão São Lourenço, Ituiutaba (22) e Prata (28), possuem um dos maiores acúmulos

pluviométricos da região. Compreendem-se no intervalo de 11.800 a 10.200 mm (média

de 1.685 a 1.457 mm/ano), decrescendo na direção sudeste - noroeste, de Prata para

Ituiutaba. Analisando as isoietas especificamente na área da bacia hidrográfica, o índice de

chuvas acumuladas para os sete anos (2002 a 2008) variou de 11.000 a 10.600 mm (média

de 1.570 a 1.515 mm/ano).

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1-Água Comprida, 2-Araguari, 3-Araporã, 4-Cachoeira Dourada, 5-Campina Verde, 6-Campo Florido, 7-

Canápolis, 8-Capinópolis, 9-Carneirinho, 10-Cascalho Rico, 11- Centralina, 12-Comendador Gomes, 13-

Conceição das Alagoas, 14-Conquista, 15-Delta, 16- Fronteira, 17-Frutal, 18-Gurinhatã, 19-Indianópolis,

20-Ipiaçu, 21-Itapagipe, 22-Ituiutaba, 23-Iturama, 24-Limeira do Oeste, 25-Monte Alegre de Minas, 26-

Pirajuba, 27-Planura, 28-Prata, 29-Santa Vitória, 30-São Francisco de Sales, 31-Tupaciguara, 32-Uberaba,

33-Uberlândia, 34-União de Minas e 35- Veríssimo.

Figura 5: Mapa pluviométrico do Triângulo Mineiro, MG de 2002 a 2008. Fonte: Prado e Sousa (2010, p. 15).

Segundo Fernandes e Coimbra, (1996 apud Oliveira et al (2010), os estudos

geológicos mostram que esta região situa-se sobre o basalto da Formação Serra Geral da

Bacia do Paraná (Supersequência Gondwana III) e sedimentos da Formação Marília do

Grupo Bauru (figura 6).

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Figura 6: Bacia Sedimentar do Paraná. Fonte: Ecoturismo/Turismo de Aventura - Brasil, 2011.

A figura apresenta locais de afloramento do basalto na bacia estudada. Material

oriundo de vulcanismo ocorrido entre 127 e 137 milhões de anos e encontra-se

sotoposto/abaixo aos arenitos do Grupo Bauru, e aflora onde o processo erosivo é mais

intenso.

Figura 7: Mapa de Substrato Rochoso da Bacia Hidrográfica do Ribeirão São Lourenço, 2010. Autor Giliander

A. Silva

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O Grupo Bauru é dividido em três formações: Adamantina, Marília e Uberaba. A

região do Pontal Triângulo Mineiro apresenta os sedimentos das formações Adamantina e

Marília. Sendo que, estes estão sobrepostos às rochas vulcânicas da Formação Serra Geral,

da Bacia do Paraná. (OLIVEIRA et al, 2010). Ainda de acordo com Oliveira et al (2010), os

sedimentos característicos da formação Marília se constituem em arenitos de origem

flúvio-lacustre (rios e lagos), com granulométrica fina a média e de coloração vermelho-

claro. Estas particularidades são notadas nos morros testemunhos20 com uma grande

quantidade de cascalho e seixos rolados.

Uma característica peculiar desta bacia é a existência de inúmeros relevos

residuais de altimetria acentuada ao longo de sua extensão (foto 1). Estas formações,

denominadas de Serra do Saltador, Serra de São Lourenço e Serra da Caieira são os

interflúvios (divisores de água) da bacia, delimitando-a, sobretudo ao Sul. Esta morfologia

caracteriza a formação de anfiteatros21, os quais abrigam as principais nascentes do

Ribeirão São Lourenço.

Foto 1: Município de Ituiutaba (MG): Visão parcial do relevo residual. Autor: ALLAN-SILVA, G., out./2009.

20 Termo utilizado para representar áreas de relevos residuais que por algum tipo de cimentação ainda

resistem ao processo erosivo, portanto, não foram dissecados por completo e testemunham o processo erosivo. 21 Forma de morros com aparência arredondada, que abriga as nascentes de um sistema de drenagem.

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Santos e Baccaro (2004) consideram que os variados modelos de cabeceiras de

drenagem em forma de anfiteatros e diferentes níveis de sedimentação são resultados de

ações morfogenéticas oriundas do Terciário e Quaternário. As alternâncias entre clima

úmido e seco favoreceram o rebaixamento do relevo, porém, algumas áreas, mais

resistentes ao processo erosivo se conservaram. Estas feições que permaneceram são os

relevos residuais (figura 6).

Observando a figura 8, podem-se notar com nitidez as áreas de maior elevação do

relevo. Contudo, destacam-se em cores mais quentes, os relevos residuais com altitude de

700 a 760 metros. Por outro lado, no baixo curso do Rib. São Lourenço fica claro o nível de

dissecação empreendido pelo sistema de drenagem, onde as águas correm sobre o

basalto.

Figura 8: Hipsometria da Bacia Hidrográfica do Ribeirão São Lourenço, 2010. Autor Giliander A. Silva.

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Ainda de acordo com os estudos de Santos e Baccaro (2004) o local se caracteriza

por vertentes convexas de média a baixa declividade e relevos residuais com bordas

escarpadas, cuja sustentação é determinada por rochas cimentadas (arenitos e arenitos

conglomeráticos).

Em escala regional, Santos e Baccaro (2004) dizem que a área se insere nos

“Domínios dos Chapadões Tropicais do Brasil Central” de AB’SABER (1971) ou nos

“Planaltos e Chapadas da Bacia Sedimentar do Paraná”, de acordo com o RADAM (1983).

Nos dias atuais, o clima mais úmido com chuvas bem distribuídas dá novas

características à região. Predominam o processo de dissecação do relevo com maior

incisão das drenagens e erosão com retrabalhamento nas vertentes. É sob estas

configurações da paisagem que a rede de drenagem do Ribeirão São Lourenço se instala

(SANTOS e BACCARO, 2004).

Resultados

As bibliografias consultadas mostram que a metodologia proposta por Jurandyr

Ross (1994) tem sido amplamente empregada em estudos ambientais (SPÖRL, 2001;

SPÖRL e ROSS, 2004; SILVEIRA e OKA-FIORI, 2007; SILVA e RODRIGUES, 2009) e

apresentando bons resultados.

As bases digitais disponibilizadas para download pelo IBGE e GEOminas foram de

grande importância para a confecção dos mapas temáticos. Ademais, com auxílio das

cartas topográficas foi possível digitalizar a drenagem.

A análise de imagens de satélite colaborou em grande medida na pesquisa,

sobretudo, no mapeamento das características de uso e ocupação do terreno. A alta

resolução das imagens do satélite Quick Bird, possibilitou verificar os distintos tipos de

usos do solo na área da bacia, inclusive identificar processos erosivos como voçorocas.

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Necessário destaque à colaboração das imagens SRTM (Shuttle Radar Topography

Mission), sobretudo, o Modelo Digital de Elevação (MDE) gerado a partir destas. Este

recurso digital possibilita melhor visão e interpretação da geomorfologia, uma vez que

oferece maior riqueza de detalhes e, por conseguinte melhor percepção do relevo e suas

formas. Além disso, auxiliou na delimitação mais precisa da área da bacia hidrográfica

(figura 9).

Figura 9: Modelo Digital de Elevação: Bacia Hidrográfica do Ribeirão São Lourenço, 2010. Autor Giliander A.

Silva

Portanto, no caso desta pesquisa, indica-se para a elaboração do mapa de

fragilidade ambiental, a sobreposição de três mapas temáticos: declividade, pedologia e

uso e ocupação, exemplificados pela figura 10.

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Figura 10: Mapas temáticos sugeridos para sobreposição no mapeamento de fragilidade ambiental, 2010.

Conclusão

Sem pretensões de esgotar as discussões sobre a área pesquisada, pode-se

considerar que, uma contribuição substancial foi dada para a implantação do Plano de

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Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Ribeirão São Lourenço. A caracterização

geoambiental e o estudo da fragilidade ambiental da área são os procedimentos iniciais

para o gerenciamento da bacia.

Espera-se que a partir desta pesquisa outras novas, poderão se desenvolver, no

sentido de favorecer melhor acompanhamento dos processos naturais e antrópicos

envolvidos nesta área de abrangência, já que, este recurso natural é de extrema

importância para o abastecimento da cidade de Ituiutaba - MG.

Referências:

AMARAL, R.; ROSS, J. As Unidades Ecodinâmicas na Análise da Fragilidade Ambiental do Parque Estadual do Morro do Diabo e Entorno Teodoro Sampaio/SP. Revista Espaço e Tempo, GEOUSP: São Paulo, n. 26, p. 59-78, 2009. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 6023: Informação e Documentação: Referências: Elaboração. Rio de Janeiro, 2002. ______. NBR 10520: Informação e Documentação: Citações em Documentos: Apresentação. Rio de Janeiro, 2002. ______. NBR 14724: Informação e Documentação: Trabalhos Acadêmicos: Apresentação. 2. ed. Rio de Janeiro, 2005. CHRISTOFOLETTI, A. Geomorfologia. 2. ed. São Paulo: Editora Edgard Blücher, 1980, 179 p. COSTA, R. O Uso das Unidades Ecodinâmicas Como Subsídio a Análise da Fragilidade Ambiental do Ribeirão São Lourenço, Ituiutaba/Prata (MG). Projeto de Pesquisa, (Edital Nº. 07/2010 – PIBIC/CNPQ/UFU). UFU, FACIP: Ituiutaba, 2010, 14 p. COSTA, R. Zoneamento Ambiental da Área de Expansão Urbana de Caldas Novas - GO: procedimentos e aplicações. 216 f. Tese; Geografia e Gestão do Território; Instituto de Geografia, UFU, Uberlândia, 2008. Ecoturismo/Turismo de Aventura - Brasil. Disponível em: http://www.brazadv.com.br/brasil-geologia/bacia-do-parana.htm. Acesso em: 01-03-11.

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A Espacialização da Folia de Reis no Município de Faina nos Anos de 2009 a 2010.

Eulália Maíra Alves Ferreira.22

RESUMO: Este trabalho tem o objetivo de conhecer a espacialização da Folia de Reis no

município de Faina nos anos de 2009 a 2010, investigando a religiosidade da população,

suas crenças, a relação do sagrado e do profano em sua cultura. Retrata o espaço

percorrido pela folia, falando da cultura que emana deste povo, cheio de fé e devoção. A

consciência humana é pouco espiritualizada, então o ser humano precisa se apegar a algo

superior, divino, para se contentar, mas acaba misturando as manifestações divinas com

as profanas, em meio a festividades religiosas. A folia faz uma ligação entre a religiosidade

e as festas profanas, misturando a história e transformando o lugar por onde passa.

Devido a essa manifestação religiosa o trabalho foi pautado em conhecer um pouco o

processo de movimentação da Folia, onde foi utilizado o processo de coleta de dados,

como as entrevistas de áudio e vídeo, foi aplicado questionários, a pesquisa em si é de

natureza qualitativa, mas com introduções quantitativas no decorrer do trabalho, pois

investiga as influências da festa na vida do povo Fainense e do município. Com isso,

procura-se mostrar um pouco da religiosidade que envolve a folia, nota-se o perfil dos

foliões, a faixa etária dos participantes e o movimento que os leva a participar deste

evento, dessa forma podem presenciar essa manifestação de fé e devoção a Santo Reis

por este povo simples do povo do interior.

Palavras-chave: Espaço. Paisagem. Cultura. Fé. Sagrado. Folia. Significados.

Introdução

Aqui o objetivo é apresentar os resultados da pesquisa sobre a espacialização da

Folia de Santo Reis no município de Faina - GO, nos anos de 2009 a 2010. Faina está

localizada no Centro-Oeste do país, no noroeste goiano, distante 69 km da cidade de

Goiás, pela GO-164 e 201 km da capital Goiânia, pela GO-070.

22 Graduanda do quarto ano de Geografia da Universidade Estadual de Goiás - Unidade de Goiás. Texto

elaborado a partir da Monografia “A Espacialização da Folia de Reis no Município de Faina nos Anos de

2009 a 2010”,

Com orientação da monografia e indicação para publicação da professora Dominga Correia Pedroso Moraes.

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A finalidade do trabalho foi a de compreender esta “manifestação cultural, cheia

de fé, amor e devoção a um ser Divino, que possui um importante fator histórico religioso

para o povo fainense”. Pessoa (1993) acredita que a folia se faz presente, como um

movimento sócio religioso, cheio de significados culturais para a sociedade.

Acredita–se que a Folia de Reis é uma festa que não pode ficar apenas na memória

do povo, há a necessidade de divulgá-la, deixando documentos para comprovação dessa

manifestação cultural de fé que vem atravessando gerações no município de Faina.

Entende-se que a valorização das crenças e costumes ainda presentes nos

sentimentos do povo é que mantenham viva esta tradição - que é a Folia. As

transformações culturais e religiosas na folia evidenciam a necessidade de compreender

um pouco mais sobre as percepções dos moradores sobre este assunto.

Para Eliade (1996), é de suma importância esta questão das representações

simbólicas, pois é aplicada devido as crenças e os credos das pessoas em relação a festas

religiosas, sendo assim, a folia faz parte deste movimento que ao longo dos anos faz uma

mistura das tradições e dos costumes. Devido à era da globalização e as transformações

tecnológicas, as pessoas deixam de lado as suas tradições e costumes para se conectar e

viver em um mundo virtual, devido a essa nova era os jovens não se importam com a sua

cultura e perdem a sua essência e com isso tudo se torna corrido, as coisas passam

despercebidas diante dos olhos. Por isso é preciso ater-se às mudanças que acontecem a

cada dia no mundo, no país, estado, região e na cidade, para que não se perca a conexão

global e ao mesmo tempo se valorize as manifestações locais. A Folia de Reis tem sua

peculiaridade, pois está repleta de símbolos e significados e, por isso, não se deve deixar

esta tradição morrer.

Origem da Folia de Santos Reis

A folia de Santo Reis iniciou em Portugal, antes do descobrimento do Brasil, pois

naquela época em Portugal já havia homenagens aos três Reis Magos, que eram

organizadas em grupos, fundados no cancioneiro do catolicismo ibérico, como cita

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Moreira (1983, p.136): “*...+ as folias começaram a aparecer nos cancioneiros ibéricos a

partir dos primeiros anos do século XVI, ainda com instabilidade de ritmo ora binário, ora

ternário”.

A folia de Santo Reis foi introduzida no Brasil, pelos jesuítas, em forma de liturgia,

como forma de catequizar os pagãos. Moreira (1983, p.137-138), ressalta que:

A folia entrou no Brasil como uma dança de fundo religioso, mais uma

manifestação paralitúrgica que profana. Seguindo o mesmo costume, as danças

foram incorporadas ao teatro e as procissões promovidas pelos padres jesuítas

mencionando a folia como uma dessas danças.

Quando se fala em folia no Brasil a população entende como apenas um folclore,

não compreendendo que a folia é a expressão da cultura do povo do interior. Para Pessoa

(1993), “a folia se constitui em uma forma própria de saber popular essencial, a

sustentação e reprodução de uma forma subalterna da vida”. Com isso a folia expõe seu

próprio estilo, introduzindo os saberes populares de uma forma simples, mantendo essa

tradição viva, nas paisagens do interior, traduzindo essa expressão religiosa, expondo a

simplicidade da vida interiorana e tornando a folia um movimento social e religioso.

Brandão (1985, p.138), diz:

As folias de reis são a viagem ritual mais difundida no Brasil e a mais rica de

ritmos e crenças próprias .Os devotos e promesseiros saem na noite de Natal ou

Ano Novo é percorrido um território de estradas e casas pré-determinadas até a

tarde do dia 06 de janeiro, a “ Festa dos Três Reis Santos ”, no imaginário

popular. È difícil haver um município ou povoado [...] onde não haja pelo menos

um, ``as vezes alguns “ternos de Folia de Reis” no exercício devoto de “

cumprimento a missão”.

Este ritual faz parte do catolicismo popular, onde as pessoas demonstram sua fé e

devoção, esta festa cria uma ligação com as pessoas transformando suas vidas, seus

costumes, fazendo uma ligação dos indivíduos com a história.

O Centro-Oeste é citado como a segunda região do Brasil com maior concentração

de companhias de Folias. Isto aconteceu devido à influência do movimento das Bandeiras,

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que saiam de São Paulo, em direção ao interior do sertão do país, vindo para Goiás por

volta dos séculos XVI ao século XVIII.

No Estado de Goiás, essa tradição continua presente em várias cidades do interior

como em Itaguaí, Jaraguá, Mossâmedes, Pirenópolis, Itaberaí, Lages em Itapuranga, e em

várias outras cidades do estado, como também em alguns bairros da capital goiana, como

no setor Universitário entre outros, mostrando que o costume e a fé não se extinguem

devido a sua localidade, permanecendo viva nos corações dos foliões.

A folia de Santo Reis em Faina não é diferente das outras; acontece a folia de Reis

duas vezes ao ano, nos meses de maio e de dezembro.

A folia de maio gira do dia 1º ao dia 06 e é feita como um pagamento de voto, ou

seja, a graça alcançada se paga por meio de um pouso ou almoço, e assim vai se

estendendo essa tradição. Já a folia de dezembro, que percorre o espaço da cidade e seus

arredores, começa no dia 27 de dezembro e sua entrega é no dia 06 de janeiro, que é o

dia de Santo Reis.

Os devotos ajudam como podem na realização desta festa, devido à jornada dos

pousos que se estende pela cidade e fazendas vizinhas. O povo, incansavelmente propaga

sua fé na folia, que acontece há mais de cinco décadas, nesta região, tornando a religião

como um sistema mediador entre o sagrado e o profano. Porque nessa mediação implica

uma concepção religiosa, como expõe Raffestin (1993, p.119-120):

Toda concepção religiosa do mundo implica a destinação do sagrado e do

profano, é oposta ao mundo no qual o fiel se dedica livremente as suas

ocupações, exerce uma atividade sem conseqüência para sua salvação, um

domínio no qual o temor e a esperança o paralisam alternadamente, onde como

a beira de um abismo o menor gesto um pouco exagerado pode,

irremediavelmente, faze-lo cair.

Esta tradição que percorre gerações, traz uma manifestação religiosa de

peregrinação e devoção durante um determinado período, onde os devotos saem para

propagar sua fé em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo.

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Brandão (1985), diz que as folias são como grupos de pessoas errantes, mas são

devotos e cheios de fé, elas cantam e tocam instrumentos em homenagem a Santo Reis.

Os Três Reis Magos viajaram a procura do Deus Menino, para adorá-lo, trazendo consigo

presentes, como ouro, incenso, mira; representando as riquezas do mudo.

Então, os foliões fazem este trajeto de peregrinação, para seguir os passos dos Três

Reis Magos, em adoração a Jesus Cristo. Os foliões sabem que o Santo é Jesus, mas

mesmo assim adoram os Três Reis Magos, por crença, fé e devoção. As pessoas os

homenageiam mesmo durante este tempo festivo, pois é a eles que o povo recorre no

momento de desespero, pedindo ajuda, proteção.

Quando suas graças são alcançadas, as pessoas se tornam pagadoras de

promessas: elas podem girar na folia, dar pouso ou almoço, ou pode ser até mesmo o

festeiro daquele ano.

A manifestação da Folia de Santos Reis em Faina – GO

A Folia de Reis em Faina tem todo um ritual, onde se incorporou aos costumes do

lugar, tornando essa festa em uma tradição familiar, cheia de amor, fé, devoção aos Reis

Magos, que já dura mais de 50 anos, como conta Dona Nenzinha (informação verbal) 23

E nossa senhora, põe cinquenta anos nisso, só que meu marido e meu pai

morreu já tem quase cinquenta anos. [...] Tinha folia lá do outro lado do rio e

nesse tempo chovia de mais, ai o rio enchia e não tinha como passar pra lá, meu

marido, ainda nesse tempo não tinha casado ainda, juntou mais meu pai e

parente nosso, e foram assistir a folia, Zé Ramos, mas rodiou por caiçara, pra

chegar lá, não tinha jeito de passar por aqui. Quando meu pai voltou de lá falou

com meu avô e o cumpadre Mane Pedroso (mestre da Folia), o Lua aprendeu

com ele.

Percebe-se que no depoimento de Dona Nenzinha, como é conhecida por todos da

região, ela não consegue lembrar-se da data certa da criação da folia, mas sabe que veio

para ajudar a população, pois quando queria prestigiar a folia tinha que viajar muito para

23 Maria Celestina Ferreira de Brito 85 anos, Foliã, depoimento recolhido em 10 de maio de 2010.

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outro local, então devido à fé e a ideia de alguns homens, resolveram criar a folia no

Município. Mas isso veio e continua até hoje com a família Felix de Brito e mesmo com

tantas dificuldades de manter viva esta tradição, ela ainda faz com que as pessoas possam

demonstrar sua fé e amor a Jesus Cristo e a Santo Reis.

A folia é composta por diferentes momentos como a saída, o giro, os almoços, os

pousos e a chegada ou entrega da Folia. Contudo Pessoa (1993, p.116), diz que:

[...] a folia de Reis é uma representação do cotidiano de trabalho, sofrimento,

investividade e alegrias da gente do campo. Ê um ritual organizado e vivido com

uma grande diversidade de funções que influem todas as pessoas circunscritas

no giro.

Na visão do autor, a folia mostra rotina de fé e devoção, onde os devotos de Santo

Reis homenagear, pois a folia é uma forma de sair da rotina do trabalho, trocando os seus

afazeres costumeiros para se divertirem e com isso homenagearem a Santo Reis.

Entretanto, uma coisa que não pode se esquecer é que o embaixador seja o

conhecedor do espaço a ser percorrido, deve saber algo de geografia, como argumenta

Pessoa e Felix (2007, p.200):

Na saída da folia, é necessário que o embaixador e o gerente façam um pequeno

exercício de geografia. A casa da saída e a casa do arremate, a definição do

conjunto todo do trajeto por onde se vai passar tem de obedecer a uma regra

fundamental. A Folia precisa sair à direita.

De acordo com os autores, é necessário ter pelo menos uma noção geográfica do

espaço percorrido, pois é preciso sair sempre à direita da casa da entrega, fazendo com

Santo Reis, pois se não sair à direita o giro pode dar todo errado e isso acaba com o giro

da folia, fazendo com que uma doença caísse sobre os foliões ou simplesmente eles não

conseguiram terminar o percurso.

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A Folia é vista como a revelação do sagrado, ela destaca um local, tornando-o

diferente e cheio de significado, com um altar erguido na sala, para o terço, durante a

comemoração.

Brandão (1985) expõe que a reza do terço é um momento de participação conjunta

das pessoas na folia, é o momento da louvação e adoração aos Três Reis Magos. Ergue-se

um altar para colocar a Bandeira, com a imagem do Santo e duas velas. Perante este altar

reza-se o terço, para agradecer a graça alcançada. O terço é rezado como uma obrigação

na festa, pois é um dos momentos em que a mulher participa ativamente, à frente do

homem.

Durante o giro a folia não deixa de visitar ninguém, não importa se é rico ou pobre,

o importante é a visita dos Reis Magos a todas as casas. Pessoa (1993, p.137), argumenta

que “a folia não tem separação. Do jeito que trata um pobrezinho que não pode dar café,

trata um rico”. Por que a situação financeira não interessa, pois Jesus nasceu pobrezinho e

não descriminou ninguém.

Para os foliões o giro é uma peregrinação, onde eles revivem a viagem dos Três

Reis Magos, para visitar o Menino Jesus em Belém. Essa Viagem, ou giro, é feita em forma

de agradecimento a Santo Reis, pela sua graças. Essa caminhada é feita durante o dia, em

maio e à noite, em dezembro, onde os foliões passam de casa em casa, cantando e

pedindo esmola e donativos para a realização da festa. O giro acontece até chegar a hora

do almoço ou do pouso, para o descanso.

Após uma longa viagem, os foliões param para descansar e almoçar. Quando

chegam nas casas, pedem para entrar e depois começam a cantar. Uma coisa que se

percebe é a abundância e a diversidade de comida na folia, isso vem quebrando os

costumes simples das pessoas do interior, como é citado por Pessoa (2005 p.32):

Nas festas populares, nas quais a comida é servida coletivamente, como é o caso

das folias de reis, estas incrustam nas pessoas um sentido de comunidade da

comida da festa. Explico melhor. Aquele exagero da comida e a sua gratuidade

vivenciada em um só dia do ano formam um contraste muito acentuado com os

outros trezentos e sessenta e quatro dias do ano. Parece haver ai uma vontade

nas pessoas de estenderem ao Máximo aquele dia e fazem por meio de

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fotografias e filmagens de vídeos, mas também através da comida. Nestas festas

estas ficando cada vez mais difícil de inibir ou cobrir esta pratica – a de

improvisar qualquer vasilha ou recipiente para levar para casa alguma porção da

comida da festa. Essa hipótese explicativa impõem –se pelo fato de que os

sujeitos desta pratica nem sempre são pessoas carentes não é uma questão de

necessidades material da comida, mas um prolongamento simbólico da festa.

De acordo com o autor o almoço adquire uma característica simbólica e algumas

pessoas até carregam a comida para ter mais tempo para se dedicar a esta festa. A comida

é apreciada por todos e com isso acaba sendo levada para casa.

Pouso é uma prévia da festa, não é muito diferente do almoço, pois tem todo

aquele cerimonial como a comida, a reza do terço, o agradecimento da mesa e, em

algumas, casas tem um bom forrozinho.

Pessoa e Felix (2007, p.204), argumentam que há “um grande número de pessoas

na procura pelo puro prazer da festa e da comida – “às custas do santo”, não escondem -,

o que transforma cada pouso em uma previa da festa de encerramento”. Na visão dos

autores, esta prévia da festa, faz com que as pessoas se interajam umas com as outras,

nesta demonstração de fé e tradição.

No encerramento da folia, essa ligação é bem forte, pois é onde se concentra o

fervor de todo o giro. Além de os foliões reproduzirem todas as situações rituais de

chegada em cada pouso, eles fazem outras, cerimônias: “passagem da Coroa e do galho e

adoração do menino Jesus na Lapinha”.

A Coroa é um objeto simbólico, utiliza-se a coroa na festa devido à posição do

ritual, pois tem o mesmo peso das flores e fitas que enfeitam os instrumentos da folia. A

coroa para os foliões é um símbolo da festividade de Reis durante o ano.

Como foi supracitado faz-se uma grande roda, onde os foliões rodam e cantam

passando por debaixo da Bandeira e após todos terem passado, a roda para e o festeiro

que tem uma coroa na cabeça, a pega e gira na roda passando-a de cabeça em cabeça,

para ver quem vai ser o próximo festeiro.

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O Sagrado e o Profano se misturam na Festa.

O sagrado e o profano são manifestações populares, onde se percebe uma ligação

entre as coisas de Deus (sagrado) e as coisas do mundo (profano), pois ambos estão

inseridos na vida dos seres humanos, sendo que o sagrado é um tempo mítico, cheio de

festas religiosas, onde o homem se relaciona diretamente com Deus. Já o profano é

conhecido como o tempo destinado ao lazer, com isso as pessoas vão viver em ritmos

variados, conhecendo tempo e festas diferentes das sagradas, pois o profano é visto como

não sendo o ser absoluto, como é encarado no sagrado. Sendo assim pode- se dizer que o

tempo sagrado é onde Deus se manifesta na suas criações divinas e o tempo profano é

onde acontece o desenrolar da existência humana.

A manifestação do sagrado é conhecida como hierofania, revela-se como um local

sagrado, que assume um dom uma forma de carisma que acaba tomando uma dimensão

espacial, que impõe ao um determinado espaço. O espaço sagrado é o lugar onde se

define o ponto central de sua manifestação.

O ritual da construção do espaço sagrado implica um duplo simbolismo.

Primeiramente na construção do “centro do mundo”, este se constrói em

referencial, cujo prestigio esta bem determinado. Em segundo lugar a

construção do espaço sagrado impõe uma interpretação simbólica da

materialização do centro. (ROSENDALH,1997, p.121.)

O espaço sagrado se forma como o centro do mundo; todo o tempo o ritual se

esbarra com o tempo mítico, assim o sagrado forma um tempo sagrado. Ao seu redor se

vincula o espaço profano, sendo o centro a divindade e ao redor, as festas não religiosas,

voltadas para diversão.

O espaço sagrado coloca o homem em contato direto com Deus. Esta experiência é

o oposto do profano, pois ele é o espaço ao redor, onde ocorrem as manifestações

privadas dos significados religiosos.

O sagrado aflora, criando um caráter, onde tudo se torna algo especial, sem

perder seu valor e sua identidade; tudo toma um ar diferente perante o sagrado. Este

sistema mediador pode definir o sagrado e o profano, como relações que definem uma

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pela outra, como define Eliade, apud Oliveira (2003, p.67), que “só se pode falar do

sagrado a partir e em oposição ao profano. Ora o profano é o normal, o corriqueiro, o que

não tem um significado particular, nada comum, transcendente, absoluto, definitivo”.

O sagrado é visto em sua organização espacial, onde os devotos integram esta

forma entre o tempo e a religião, podendo perceber que os espaços sagrados e profanos

se juntam. O espaço sagrado é onde o Santo está, onde ocorrem os cerimoniais e o

contato do povo diretamente com os santos. Já o espaço profano é geralmente destinado

ao lazer, o comércio, entre outros, tornando estas atividades profanas.

O sagrado é um elemento de uma qualidade absolutamente especial que se

coloca fora de tudo àquilo que chamamos de racional constituindo assim algo

inefável. Este “algo inefável” também é chamado pelo temo latino numen, isto

é, a força divina manifestada na ação pessoal de uma ou de outra divindade. [...]

assim diante do transcendente, do divino, do sagrado, que se manifesta. [...] a

hierofania ou teofania, ou seja, a manifestação do divino em meio ao profano.

(OTTO apud REIMER, 2004, p.79).

De acordo com o autor, estas manifestações são percebidas de uma forma meio

simbólica, pois o homem coloca o sagrado, como algo encantador, divino, ou seja, a

manifestação do sagrado ultrapassa as manifestações profanas, colocando-se como algo

superior e divino.

Na Folia de Reis o momento do sagrado é a peregrinação que os devotos

cumprem até chegar ao pouso, e depois vem o terço, os cânticos para agradecer a mesa, a

dona da casa e o Santo Reis, por mais um ano de festa.

Na folia, o sagrado se aflora transmitindo a sua sacralidade em seus eventos, pois

dá um ar de mistério, de sobrenatural. Sendo assim, ele se mostra através dos ritos, como

por exemplo, a reza do terço ou as canções baseadas na vida de Jesus. O ser humano

busca algo sagrado, no espaço, para se agarrar a ele e, com o tempo tentar transformá-lo

em função do seu próprio benefício.

Vale ressaltar que Silva (2001, p. 24), relata que: “*...+ festas costumavam confundir

as práticas sagradas com as profanas, tanto nas comemorações externas como nas

realizadas dentro da igreja”. No entanto, esta confusão é normal, e por isso o ser humano

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acaba interpretando esta manifestação equivocada e certas expressões, sendo que é

preciso rezar muito para a sociedade. Na visão de Brandão (1985, p.140), os “cultos de

canto e dança e alegria invadem os ritos de fé. O corpo que salvar a alma de ser tão

sagrada que esquece de ser humana”. Torna-se, em meio a esta manifestação, pessoas

mais desligadas da sua religiosidade, querendo apenas se divertir.

Representações do povo sobre a Folia de Santos Reis em Faina

Para Moscovici, apud Moraes (2002 p.74): a representação e a informação são

partes do conhecimento humano de determinados grupos, segundo o autor:

[...] os grupos ou segmentos socioculturais podem variar bastante quando ao

grau e consciência da informação que tenha sobre um dado assunto, quando á

estruturação visualizável, unidade hierarquização desse conhecimento em um

campo de representação, quanto a altitude ou orientação global – favorável/

desfavorável, por exemplo –em relação ao objeto de representação.

Na folia também é assim; as pessoas de um determinado grupo (foliões,

cozinheiras, etc.); tem uma relação diferente uns dos outros com a Folia e com os Santos.

A partir da coleta de dados, foi feito um estudo dos questionários aplicados a 120 pessoas,

com perguntas semiestruturadas, sobre a Folia de Santo Reis no município de Faina. Os

questionários tiveram a intenção de captar, de maneira simples, os conhecimentos e

sentimentos do povo fainense em relação a esta a festa tradicional.

Todas as pessoas pesquisadas são residentes no município de Faina. Contudo há

uma diversidade de idade entre os participantes, autoridades públicas e autoridades

eclesiásticas. Há pessoas que participam da folia por vários motivos, mas principalmente,

pela fé “que move montanha” faz as pessoas não terem medo de pedir ou de se arriscar

por amor a Deus.

Ao analisar os questionários, percebe-se que há certa semelhança nas respostas

dos foliões, dos participantes, e de outros pesquisados. Através das perguntas, as pessoas

demonstram seu jeito simples de adorar Jesus e aos Reis Magos. Percebeu-se, na

pesquisa, que as pessoas entendem o significado da folia de várias formas, como mostra o

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depoimento do Senhor Benedito Ferraz (59) 24. “Pra mim significa muita coisa, por ter

muita fé, pois ano passado eu estava com câncer e com muita dor, então eu pedi pro Três

Reis me dar saúde e eu faria a festa e graças a Deus eu estou realizando a festa”.

O depoimento traz uma forma de demonstrar o amor, onde o sentimento

transmite algo muito forte como uma prestar homenagens aos Reis Magos, repassando

este ato de devoção, mostrando a fé deste povo, que mesmo no sofrimento se faz

presente na folia. A maioria dos pesquisados diz que o significado da folia é “muita coisa”,

pois não sabem ao certo como expressar esse sentimento de pertencimento a esta

tradição.

Pessoa e Felix (2007), Moreira (1983), entre outros autores, acreditam que a

representação da folia está presente no significado adquirido ao longo dos anos. O

significado atribuído pelas pessoas faz parte do cotidiano de cada um, eles criam sua

própria forma de representar perante a comunidade, pois tem raízes enterradas na

tradição, onde as pessoas apreciam a companhia umas das outras, curtindo uma liberdade

durante o giro da folia, livre de preocupações.

Algumas pessoas gostam da folia, acreditando no sentido de que ela possa

preparar o caminho para a chegada do Menino Jesus, com isso cria-se um sentido de

pregar o nascimento de Jesus Cristo e assim fazer com que o objetivo, conscientização

seja feita demonstrando para tosos os corações de todos que Jesus vem para nos salvar,

Adquirindo então um sentido diferente.

Ao notar que a folia possui seu próprio jeito, onde seus devotos são reconhecidos

pela fé, sendo pessoas simples em meio a um mundo em transição, isso não influencia

diretamente na folia, mas a força e a criatividade dos foliões ajudam a definir o seu lugar

na história. Pessoa (2005, p.34-35), discorre que a:

*...+ “Cultura Goiana”, muito bem caracterizada nas manifestações populares,

especialmente nas festas religiosas, que podem, por isso mesmo, ser

compreendidas como representações sociais. Mas a fé popular tem revelado

24 Benedito Ferraz de Lima 59 anos, depoimento recolhido em 04 de Janeiro de 2010.

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historicamente uma instigante e criativa indisciplina religiosa, atraindo a

ritualidade para o meio da rua.

Uma das indagações feitas durante a pesquisa aos foliões e demais participantes

foi a questão da participação da família na folia, onde quase todas as respostas foram

iguais, sendo que 55% dos entrevistados falaram a respeito de ser uma tradição que é

passada de pai para filho e por isso trazem consigo a sua família; enquanto 38% falam

que já nasceram dentro da folia, em meio a esta tradição de muita fé; porém, uma

mínima parcela de 7% de pessoas, disseram que frequentam a folia por que gostam de ver

os festejos a Santo Reis.

Devido essa vontade de fazer parte deste universo mágico, de fé, as famílias

participam dos eventos e acabam se tornando muitas vezes colaboradores da festa, sendo

assim, todos trabalham para que esta tradição não se perca ao longo da história.

Contudo, foliões pesquisados falam que a cada ano que passa fica mais difícil girar

com a folia, pois não é como antigamente. A vida na cidade está ficando muito cara e

muitas vezes as pessoas estão passando por dificuldades e não tem condição de ajudar.

Entretanto, se for pedido um pouso ou almoço, eles não podem negar um pedido de

Santo Reis, porque a festa tem que continuar, então os foliões vão em busca das pessoas

que fizeram votos, promessas para conseguir montar o giro da folia, não importando com

a distância e nem com as dificuldades.

Percebe-se que nesses depoimentos, há uma escolha que gira primeiramente em

volta das promessas das pessoas, que de alguma forma se dispõem em realizar a festa.

Todavia “o que é mais usual nas folias, que realizam o pouso ou pousada *...+ é o giro o dia

e a noite”. (PESSOA, 2007, p.204).

A folia que gira em maio faz sua caminhada durante o dia, e à noite eles

descansam. Já a de Dezembro é ao contrário; ela costuma girar durante a noite e

descansam durante o dia e fazem uma troca de rotina durante os meses, pois em maio a

folia é feita pelos votos das pessoas e a de dezembro é feita em homenagem aos Reis

Magos, fazendo a peregrinação de acordo com a deles.

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Antigamente, quando se oferecia o pouso, realmente era um pouso onde os foliões

dormiam nas casas dos pousos, mas isso foi acabando quando a modernidade chegou aos

nossos meios, pois quase todos hoje têm condições de usufruir algum meio de transporte,

então eles retornam para suas casas e no dia seguinte começam tudo novamente.

Quando se fala do giro da folia fica complicado, pois ela era realizada nas fazendas

e com a expulsão dos camponeses de seu hábitat natural, a folia veio acompanhando-os.

Mas de uns tempos pra cá, o sertanejo está voltando para o campo e com ele a folia segue

rente nesse caminho. Santos, apud Oliveira (2003 p.24), ressalta que:

Cada homem vale o lugar onde está: o seu valor como produtor, consumidor,

cidadão, depende de sua localização no território. Seu valor vai mudando,

incessantemente, para melhor ou para pior, em função das diferenças, de

acessibilidade (tempo, freqüência, preço) independentes de sua própria

condição. Pessoas, com as mesmas virtudes.

Devido a isso, pode-se dizer que a folia vai onde está o seu devoto, para fazer

sempre essa ligação do homem, campo e cidade sem desvalorizar nenhum, pois com isso

valoriza-se a cultura local. Os pesquisados demonstram que isso faz com que o espaço

urbano e o espaço rural permaneçam juntos, cultivando essa manifestação de fé, pois “no

mundo rural, os grupos humanos, são regidos por sistemas próprios e mais ou menos

uniformes de valores, leis e costumes *...+ com certa flexibilidade”. (OLIVEIRA, 2003, p.56).

A folia faz com que as formas do conhecimento humano, sejam baseadas no seu

cotidiano, onde os foliões valorizam suas crenças e costumes, valorizando uns aos outros,

mesmo longe, como dona Maria Celestina de 85 anos, que conta que a folia girava

antigamente nas fazendas e com o passar do tempo foi para cidade, e que agora está

voltando novamente para o campo porque quase todos os foliões estão residindo em

fazendas, então a folia precisa visitá-los. Devido a essa nova valorização do campo, ele

acaba sendo visto como a extensão da cidade, pois incorporou novos valores, e assim a

folia volta a fazer parte dessas mudanças,

Uma prática que já foi falada é a esmola, então os foliões foram indagados para

que serve a esmola recolhida durante o giro da folia. Eles disseram que é para ajudar o

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festeiro do ano na realização da festa. Para Vigilato, apud Silva (2006, p.62), a esmola

possui “duplo sentido: material que são gêneros em grande quantidade para a

propagação da festa. E o sentido religioso: significa presentes ofertados pelos Magos ao

Menino Jesus”.

A festa em si envolve muitas pessoas, a esmola é recolhida justamente para ajudar

na elaboração do evento, pois tudo que é recolhido é usado. E no final do giro da folia é

uma forma de agradecer por todas as graças recebidas durante o ano e o que é recolhido

durante o giro ajuda o festeiro, onde tudo é bem vindo. Como a folia conta a vida de

Jesus, foi perguntado aos foliões se a Igreja Católica ajuda de alguma forma - as respostas

foram unânimes ao dizerem que não.

No final do ano de 2009 surgiu uma rixa entre os foliões e a igreja, pois dona

Nenzinha, juntamente com outros membros da folia ficaram decepcionados com a atitude

da igreja em relação à esmola. De acordo com os foliões, o Bispo da diocese de Rubiataba,

Mozarlândia, veio pedir para que os foliões doassem toda a esmola recolhida durante o

giro para a igreja.

Isso gerou grande discussão entre os membros da folia com os

representantes da igreja no município, pois de acordo com alguns depoimentos, a igreja

nunca ajudou e agora vem e quer tudo e isso não é bom para o festeiro, que muita vezes é

pobre e não consegue fazer a festa sozinho e a esmola o ajuda.

Os foliões reclamaram da falta de bom senso da igreja em pedir tal coisa, pois

todos são católicos e participam da igreja. Com isso, a rivalidade estabelecida acaba

afastando uma tradição de décadas de sua morada santa e devido a isso Brandão (1985,

p.133), diz que: “a história das trocas de ações de serviços e artimanhas de poder entre a

hierarquia católica no Brasil e a massa dos fiéis não fugiu a alguns padrões que a história

das religiões teima em repetir”. Isso não é bem visto, pois os foliões valorizam sua fé,

devoção e amor aos Reis Magos e não aceitam tal imposição, pois a festa é de cunho

religioso e é abençoada por Deus, juntamente com os Três Reis Magos, assim, acredita-se

que eles não permitiram o fim desta tradição.

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Uma coisa que sempre esteve presente na folia é a bebida alcoólica, com os foliões

se embriagando e cantando louvores aos Reis. Muitos foliões trabalham muito e para

aguentar o pique tomam goles de pinga.

[...] muito difícil mandar uma folia quando tá muito desorganizado, muita

cachaça, [...] a pinga é um dos itens mais pesados [...] ao longo do giro, muitos

moradores já esperavam a folia com um litro ou garrafa (600 ml) do produto

para agradar os foliões. (PESSOA, 1993, p.144).

De acordo com o autor, não é só os foliões que são culpados pela bebedeira, mas

também a população, que os recepciona com os goles de pinga.

A Folia de Reis de Faina sabe bem como é esse problema, mas de acordo com dona

Maria Celestina (85) 25, o álcool já não faz mais parte da rotina da folia do povo fainense.

“[...] o álcool já tem dois anos que não tem! Porque os foliões não podem, mas beber,

falavam que a folia dos Pretos só andava bebo e ai pego e dano com eles, e eles

conformaram com as regras”.

Então, este hábito já não é mais parte constante do giro da folia. No entanto,

sempre tem aquela casa que teima em oferecer aguardente - vai de cada um. Mas devido

a pinga, muitos foliões estão doentes ou estão ficando doentes por causa da “branquinha”

e isso foi mais um dos motivos para a sua suspensão. É preciso lembrar que não são

apenas os foliões que gostam da pinga. Ao analisar os questionários dos foliões e de

alguns participantes pode-se notar a relação que as pessoas têm com a folia - algo de

muita fé, devoção e acima de tudo muito amor ao nosso senhor Jesus Cristo e aos Reis

Magos.

Na visão de Dom Adair José de Guimarães, bispo da diocese de Rubiataba e

Mozarlândia, a igreja está tentando reviver esta fé na folia:

A igreja que ajudar a incrementar nossas folias. Elas podem ser uma importante

ferramenta de evangelização em nossos tempos. As folias nem sempre andaram

em comunhão com a igreja, apenas de sua inspiração e efetivação serem

eminentemente católicas. Isso se deve ao fato das folias serem expressões

25(idem)

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religiosas populares, advindas do próprio povo, sem a tutela eclesiástica. Há na

folia um misto de folclore, símbolos religiosos e devoção. Cabe a igreja valorizar

e nunca quere suplantar tais expressões. ( Dom Adair José, 49 anos.) ( sic).

Percebe-se que a igreja está tentando demonstrar um interesse pela folia, valoriza

e incentiva esta tradição, buscando assim interagir com o povo nas suas trocas de saberes,

onde as crenças e os valores estão inseridos na cultura local, pois existe uma ligação do

universo festivo como os rituais religiosos.

Sendo assim, D’Abadia (2003), fala que o fator predominante nestes movimentos

humanos demonstra que as decisões são baseadas no social e são feitas a partir da

influência religiosa. Porque a sociedade em si, não demonstra seus sentimentos de um

único modo, ela usa de artifícios culturais e também religiosos, para representá-los no

espaço.

Moraes (2002, p.71), diz que: “*...+ o lugar vivido é o ponto de partida para

apreender as representações que as pessoas têm do espaço. Estas representações são

reveladoras do significado que os lugares têm para cada individuo e |ou para a

coletividade”. Na visão da autora, esse espaço se torna algo representativo para a pessoa,

possui um significado próprio, onde eles interagem uns com os outros. É o caso da folia,

pois as pessoas, estranhas uma das outras, se interagem normalmente, sem receio ou

preconceito, numa demonstração coletiva de fé e devoção. Devido à representação da

encarnação de Jesus na terra, demonstra uma expressão religiosa que permeia a

população. A folia que gira em Faina demonstra uma fé de décadas, pois é guiada pelo

amor a Jesus Cristo e aos Reis Magos. Com base nisso foram indagados sobre qual seria a

importância da Folia para o município de Faina. A cada pergunta uma resposta

envolvendo a tradição e a fé deste povo simples do interior, como conta Caio Velasco (22)

26·. “È muito importante, pois é uma tradição e traz várias pessoas de fora, para conhecer

um pouco da cultura do povo fainense.

26 Prefeito de Faina,22 anos depoimento recolhido em 15 de maio de 2010.

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Nota-se certa peculiaridade em falar desta tradição tão importante para este povo,

que bravamente conduz este evento com muito amor, para o senhor João Batista(55)27, a

folia; “É uma tradição, onde o Faina é ainda guerreiro nesta arte, é um folclore, alegria.

Sendo assim, pode-se perceber a determinação por parte deste povo, que tem

uma necessidade inconsciente de divulgar a festa, como conta a senhora Juciara

Castelo(40)28.“Eu acho que é divulgar a cultura local e regional.

Com base na pesquisa, pode-se afirmar que a folia fainense é considerada como

uma cultura de caráter guerreiro, como foi expresso pelo senhor João Batista, pois

mesmo com as transformações, ainda continua de pé, pois a sua origem sobrenatural é

revelada durante a viagem dos Reis Magos. Contudo, não se conhece nenhum documento

oficial que registra a folia de Reis, nem na igreja e nem nos órgão públicos, apenas os

depoimentos verbais e alguns arquivos de fotos particulares de pessoas relacionadas a

esta manifestação.

O povo de Deus vive no mundo humano[...] com a mesma tarefa que cristo

ensinou no sermão da Montanha: vós sois o sal da terra, vós sois a luz do mundo

que há de brilhar diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e

glorifiquem vosso Pai, que está nos Céus [...](MT,5.13,16)ser testemunha de

cristo pela vida é condição inerente a graça de ser escolhido como discípulo:

quem der testemunho de mim, diante dos homens, também eu darei

testemunhos dele diante do meu Pai. (LEERS, apud OLIVEIRA 2003,p.27)

Na concepção do autor, o testemunho faz parte da vida do ser humano, na terra,

com a chegada de Cristo Salvador, isso se tornou mais frequente, pois os foliões cantam e

testemunham as boas novas, e a igreja assume o papel de elo entre o sagrado e o

profano..

A Folia de Faina é conhecida regionalmente, é uma festa tradicional do município,

aonde vem pessoas de várias cidades para prestigiar esta festa, assim, foi questionado a

alguns políticos, o que eles estão fazendo para ajudar a propagar esta mensagem de amor

e fé que é a folia e a maioria disse que a folia deveria fazer uma parceria com os órgãos

27 Vereador municipal,55 anos, depoimento recolhido em 20 de maio de 2010. 28

Vereadora Municipal, 40 anos, depoimento recolhido em 18 de maio de 2010.

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públicos para sua divulgação regional. A partir disso se poderia elevar a importância do

turismo religioso.

Devido à divulgação a festa poderia acarretar para si mais seguidores e

participantes onde eles iriam demonstrar sua religiosidade, e com o auxilio dos

governantes essa tradição continuaria, por muito tempo, onde os órgão públicos

poderiam ajudar na sua divulgação, ajudando no transporte da população, conservando as

estradas, nas zonas rurais e com isso esta sempre a disposição das necessidades do povo.

De acordo com os depoimentos dos governantes municipais, a base para que a

festa não venha acabar é a divulgação dela, pois traria benefícios para a mesma e também

para o município. Pois as pessoas iriam conhecer melhor a cidade e assim contemplariam

um pouco desta tradição, que surgiu bem antes do arraial de Faina, estas experiências

religiosas tocam na alma do povo, onde eles transmitem a sua gratidão em forma de

homenagens e da festa, porque o ser humano é guiado pelo amor Divino sagrado, algo

que esta além da sua compreensão.

Então, ao término da pesquisa, todos foram indagados e responderem o que

poderiam fazer para que está festa de mistérios e tradições não se percam na história e

permaneça na vida e na cultura local. Esta festa está na memória das pessoas, invadindo-

as com recordações dos festejos e, devido a isso, pode-se notar uma semelhança na

resposta. “Simplesmente apoiando e acompanhado a pratica da folia. Essa é a intenção

nossa, como igreja, apoiar a prática cultural e religiosa das folias. A humanização e a

seriedade precisam ser propositivas nas praticas de nossas folias”. (Dom Adair José, 49)29

Sendo assim, a igreja irá apoiar cada vez mais a folia e a sua tradição, no entanto, é

preciso que a própria população ajude nesta prática, não é o único apoio que a folia

precisa como conta no depoimento da missionária Deolinda Oliveira(38)30 abaixo:

“Acompanhar, além disso celebrar quando for solicitado mas é preciso mais apoio do

governo municipal”.

29 Bispo da Diocesano de Rubiataba /Mozarlândia. 30

Missionária da Comunidade Nova Aliança.

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A igreja tem uma visão simples desta manifestação, onde o apoio faz toda a

diferença na hora da realização do evento, os foliões mais antigos, precisam entender que

os jovens de hoje tem outro tipo de cultura, mas mesmo assim devem investir neles, para

que esta festa não acabe devido à falta de interesse da juventude do lugar.

Então, precisa-se ter uma formação para os jovens foliões, onde se conte a

histórias as folias, criando assim um movimento cheio de cultura, história, fé e devoção

aos Reis Magos.

Os vereadores juntamente com o prefeito, acreditam que a divulgação é um dos

caminhos, que pode ajudar o povo, pois com isso pode-se fazer uma propagação da festa,

ajudando também financeiramente na realização dos eventos, como os almoços, pousos

ou até mesmo a festa de encerramento da folia.

Contudo, a folia precisa de registros, em arquivos municipais, para que se possa ter

fácil acesso a este documento, onde a população pode ter um registro maior desta festa, o

ensinamento da folia deve ser passado para frente para as futuras gerações para que a

tradição não se perca no esquecimento.

A folia é formada a partir dos saberes populares, onde os foliões dedicam boa

parte das suas vidas na realização dela, eles tentam transmitir uma moral religiosa, social,

ética e produtiva, onde todos se respeitam e possuem as suas obrigações de dar e

retribuir tudo aquilo que lhe foi oferecido.

A folia de Santo Reis do município de Faina é movida pela fé de homens, mulheres

e crianças simples, que acima de tudo acreditam em um Deus vivo, que veio ao mundo

para redimir os pecados da humanidade - se fez carne, pobre e humilde, pois foi através

de seus ensinamentos que mudou o mundo e até hoje muda a vida de muita gente.

Pode-se dizer que a folia é um novo processo de evangelização, neste mundo

globalizado, onde maioria das pessoas não valoriza mais as tradições, e com isso a folia

torna possível uma aproximação maior da festa com o seu público alvo, juntando-os com

as cerimônias religiosas.

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Conclusão

O objetivo do trabalho foi analisar a espacialização da Folia de Reis no município,

conhecendo um pouco da cultura local, desvendando os mistérios da festa de Reis. Pode-

se perceber, através da pesquisa, que o povo fainense se orgulha da sua origem e da sua

Folia de Reis e eles não irão deixar esta tradição acabar, por que ela está impregnada na

vida das pessoas.

Ao acompanhar a folia percebeu-se que esta manifestação de fé, promessa e

devoção, está ligada ao amor aos Três Reis Magos e à fé que o povo tem em Deus.

A folia está presente, na memória cultural do povo fainense, essa mistura de

ritmos, crenças, religiosidade se instala no imaginário popular ganhando novas formas e

arranjos ao longo do tempo. Para que se possa fazer uma separação entre o sagrado e o

profano, precisa-se realizar a materialização do espaço.

A folia faz parte da cultura fainense, o povo trabalhador e devoto propaga sua fé,

não apenas nas igrejas, pois a religião tem sua história e sua tradição, que remontam

acontecimentos bíblicos passados. Na folia é assim, durante um longo período os foliões

fazem a peregrinação como se fosse os Três Reis Magos a caminho do encontro do

Menino Jesus. A folia é uma manifestação cultural que se mantém viva, os devotos

propagam sua fé, fazendo uma peregrinação em homenagem aos Três Reis Magos.

Sabe-se que uma pesquisa tem limitações, assim esta não conseguiu, nem teve a

pretensão de esgotar o assunto, sendo a Folia de Reis em Faina uma fonte de

conhecimentos para outros estudos científicos.

Referências:

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O Ensino de Geografia e os Conceitos Geográficos: a percepção dos educandos das escolas do campo do município de Iporá Goiás sobre os conceitos de Meio Ambiente e Cidadania

Silvaci Gonçalves Santiano Rodrigues31

Resumo: O componente curricular de Geografia tem sido considerado como privilegiado

no tratamento das questões ambientais, contudo ocorre certa dificuldade tanto de

educadores como de educandos em compreender o espaço geográfico como campo de

relações entre ser humano/ser humano e deste com a natureza no processo de

transformação da mesma. A questão ambiental é um problema mundial e

constantemente discutido pela sociedade, principalmente nas últimas décadas.

Entretanto, por mais que haja discussões nesse sentido, os problemas ambientais

continuam existindo e alguns se tornando mais graves e irreversíveis. Portanto, as atitudes

para resolução dos problemas ambientais dependem do exercício da cidadania em seu

sentido pleno. Nesse contexto a Geografia escolar, caracterizada como um componente

curricular que busca formar cidadão crítico, reflexivo e participativo, pode ser uma grande

aliada para auxiliar os educandos na construção dos conceitos acima citados. A orientação

do Ministério da Educação e Cultura – MEC – para ensino de Geografia em relação ao

conceito de Meio Ambiente é que este seja trabalhado como tema transversal, para que

os educandos possam ter uma visão global da questão, porém estes nem sempre ou

raramente são trabalhados de acordo com as orientações do MEC. A efetivação destas

propostas para o ensino de Geografia poderia contribuir consideravelmente para que o

educador saísse das bases tradicionais da educação geográfica, incorporando em seu

trabalho a relação teoria/prática, que pensamos ser essencial para que a Geografia possa

cumprir seu papel de componente curricular formadora de cidadãos.

Palavras-chave: Ensino de Geografia. Cidadão. Questões ambientais. Educação do Campo

Introdução

Se atentarmos para o espaço geográfico, veremos mais claramente o tipo de

transformação que meio ambiente tem sofrido a partir da ação de atores sociais e

entendemos que esta transformação do espaço como meio ambiente onde vive o ser

humano, depende do modo de sentir de pensar e de agir de cada cidadão. Pensamos que

1 Silvaci Gonçalves Santiano Rodrigues é Graduanda em Geografia pela Universidade Estadual de Goiás - Unidade Universitária de Iporá, sendo esta pesquisa realizada para fim de conclusão de curso.

Indicadora do artigo para publicação e orientadora da monografia professora Jackeline Silva Alves do curso de Geografia da UEG Morrinhos-GO.

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estas transformações, dependendo do interesse de cada pessoa podem ocorrer em maior

ou em menor grau. Podendo também ter impacto positivo ou negativo. Ao nosso

entendimento infere-se que atitudes e práticas ambientais corretas dependem da

educação. Não nos referimos aqui apenas à educação escolar, embora seja esta o foco

principal desta pesquisa.

Entendemos que para que ocorra construção do conhecimento é necessária uma

inter-relação entre todos os tipos de educação, o formal e o não formal. Nesse contexto o

ambiente imediato, ou seja, o lugar de vivência deve ser privilegiado para que ocorra a

aprendizagem significativa. Assim poderemos obter uma educação para a formação do

cidadão critico e reflexivo que estão presentes nas propostas educacionais.

O tema “meio ambiente”, no contexto educacional deve ser visto como tema

transversal segundo propostas do Ministério da Educação e Cultura - MEC -, ou seja, deve

abranger todas as áreas do conhecimento.

Nesse sentido o componente curricular de Geografia tem a oportunidade de

trabalhar e cumprir seu papel na formação do cidadão. O propósito da transversalidade

para alguns temas se faz necessário, considerando a preocupação das discussões de

alguns teóricos da educação, cuja preocupação está relacionada com a formação do

educando para vida, o que entendemos como uma formação para o exercício da

cidadania.

Segundo o PCN, 2001, os componentes curriculares não contemplam temas como:

saúde; sexo; meio ambiente; etc. Pensando nestes aspectos, o MEC instituiu os temas

transversais objetivando o estudo desses assuntos em todos os componentes curriculares,

para que se tenha uma visão global das questões.

O debate ambiental parece ser um tema fácil, por envolver o espaço de vivência do

educando, porém o educador ao propor uma educação ambiental, deve estar disposto a

assumir a tarefa de sair das bases tradicionais que ainda caracterizam o ensino de

Geografia, a fim de construir um conhecimento geográfico que permita a compreensão

ambiental de forma que meio ambiente não seja reduzido ao meio natural e que não seja

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apenas pautado na definição de conceitos, como o que é preservar, o que é conservar, o

que é meio ambiente, mas indo além destes.

Acreditamos que para que ocorra a preservação socioambiental é necessário

mudanças de hábitos, atitudes, e também do exercício de cidadania, pois a partir deste

último aspecto, seremos capazes de cobrar o que nos garante a legislação, que é o direito

de viver em ambientes não degradados32.

Trabalhar para esta mudança social é também papel da Geografia enquanto

componente curricular. Este pode contribuir de forma significativa na formação do

cidadão, haja vista que abrange o estudo do espaço e as relações sociais existentes no

mesmo.

Com a intenção de perceber como a geografia escolar tem contribuído para a

construção dos conceitos de Meio Ambiente e Cidadania, a pesquisa aqui apresentada

ocorreu nas escolas do campo do município de Iporá-Goiás, com estudantes do 2º ao 5º

ano do ensino fundamental. Sendo as escolas: Escola Municipal Vilma Batista Teixeira,

localizada na comunidade Jacuba; Escola Mangelo Pedro Borges, localizada na

comunidade Cruzeirinho; Escola Municipal do Bugre, na comunidade do Bugre e Escola

Boaventura Domingues de Araújo33, localizada na comunidade do Buriti.

Para que pudéssemos construir o referencial teórico e também para embasar

nossas ideias fizemos pesquisa bibliográfica. Fizemos ainda entrevistas com nove

educandos do 2º ano, cinco do 3º, um do 4º e nove do 5º, sendo um total de 24

educandos. Entre os educandos apenas uma educanda da Escola Vilma Batista Teixeira

não foi entrevistada34. E o fato de haver somente um educando do quarto ano durante a

pesquisa se deve à forma de organização destas escolas em classes multisseriadas.

2Capítulo VI, artigo 225 “Todos têm direito ao ambiente ecologicamente equilibrado, bem como de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo para as presentes e futuras gerações”. 3 Quando iniciamos a pesquisa a estava em funcionamento, foi fechada no ano de 2008. 4 Por não estar presente no dia em que os questionários foram aplicados.

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Foram feitos questionários fechados para os educandos do 2º e 3º, exceto um

estudante do 2º ano da Escola Mangelo Pedro Borges, que segundo a professora este teria

condições para responder as questões abertas. Fizemos também entrevistas com roteiros

dirigidos às educadoras e para a coordenadora, baseadas em conversa informal.

A todos os educandos pedimos que por meio de desenhos representassem seus

entendimentos sobre meio ambiente, com o objetivo de perceber se as concepções por

meio da representação por imagem e por representação escrita, sobre meio ambiente se

equiparavam.

Por meio dos documentos oficiais do MEC, como exemplo o Projeto Base35

fornecido pela Secretaria Municipal de Educação, pudemos analisar o que ocorre na

prática e o que estão nos documentos do MEC, e entendemos que existe uma digressão

entre o que se propõe e o que se pratica no setor educacional em relação ao tratamento e

ao trabalho com estes conceitos por meio do componente curricular de Geografia.

Assim, ancorados em alguns teóricos que tratam o tema, apresentamos este

trabalho com fim de contribuir para a melhoria do ensino de geografia, em especial no

tratamento dos conceitos de Meio ambiente e Cidadania.

O que motivou o interesse por esta pesquisa foi o fato de participar de um projeto

de pesquisa semelhante, porém em escolas urbanas. Além disso, pensando na

possibilidade de em outro momento realizar um paralelo entre os resultados da pesquisa

nas escolas do campo e na escola urbana onde realizamos a mesma.

Desenvolvimento

As discussões ambientais no século XXI se tornaram motivos de debates em vários

seguimentos sociais. No setor educacional formal escolar, esse tema tem sido

constantemente debatido. Mesmo havendo estes debates, entendemos que ainda não é

5 Projeto Político Pedagógico do Programa Escola Ativa, sendo que o objetivo deste material é estabelecer bases para o programa, preparando gestores e educadores para atuação na Educação do Campo, assim como uma compreensão mais ampliada da escola e dos processos de ensino aprendizagem. (Projeto Base, 2010)

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bem compreendido e constantemente o meio ambiente é considerado como sinônimo de

natureza.

E parte das dificuldades enfrentadas pelos educadores quando trabalham com

esses temas, têm a ver com a falta do material necessário para a correta ministração

destes conteúdos; Além de muitas vezes, na grade curricular, o tempo destinado a eles ser

aquém do que seria necessário. A partir disso, esses temas, muitas vezes são tratados

superficialmente.

Tendo como ferramenta base para o trabalho docente, o livro didático, o educador

deixa de contemplar os temas propostos para a transversalidade, entre eles o meio

ambiente, considerando que para as realidades brasileiras e as diversidades das regiões e

até mesmo intra-regiões, em muitos lugares quando se tem muito, é o livro didático, ou

por vezes, o uso de outros recursos não é permitido pela pouca flexibilidade dos

programas. Podemos perceber na reflexão de Soares que:

A contemporaneidade e reduzido acúmulo de experiências em Educação Ambiental, associado à não-implementação de uma efetiva política de Educação Ambiental, refletem-se na formação do professor que se gradua com pouco conhecimento sobre a temática ambiental e precisando, na prática cotidiana, tratar desse tema, conforme preconiza a política educacional. Os profissionais da educação tentam preencher essa lacuna com o auxílio do livro didático, muitas vezes sua única referência, o que acaba transformando o conteúdo do livro no próprio currículo. (SOARES, 2005, p. 2)

A Geografia escolar por ser um componente curricular que aborda tanto os

aspectos físicos como os humanos, tem privilégio no tratamento das questões ambientais.

Para compreender o papel da educação e da Geografia em especial na formação do

sujeito capaz de resolver problemas ambientais é necessário que se faça a leitura das

propostas educacionais, e em especial as propostas para o ensino de Geografia, ao

entendê-las como pilares para o papel da educação geográfica em relação à educação

ambiental. Um dos objetivos do ensino de Geografia é capacitar o educando a:

Identificar e avaliar as ações dos homens em sociedade e suas consequências, em diferentes espaços e tempos, de modo a construir referenciais que possibilitem

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uma participação propositiva e reativa nas questões socioambientais locais.

(PCN, 1997 p. 89)

Porém o ensino de geografia pautado no tradicionalismo, numa prática

memorativa de conceitos, não se adéqua às propostas feitas pelo MEC, e isto é constatado

na pesquisa, pois o que percebemos a partir da análise dos desenhos foi uma visão de

meio ambiente, relacionado ao entendimento mais aproximado de meio natural (visão

tradicional).

Embora alguns dos estudantes pesquisados apresentem o ser humano como parte

do meio ambiente, ele não é tido nos desenhos e nas respostas escritas como alguém que

possui responsabilidade em relação aos problemas ambientais existentes, aparecendo em

alguns desenhos como mero expectador do meio, como apreciador destes espaços, e ao

mesmo tempo alguns desenhos demonstram a preocupação humana com a natureza.

Isso é passado e repassado no setor educacional escolar há muito tempo e

pensamos que isto deve ser mudado. A ideia de natureza está sempre presente quando se

fala em meio ambiente, e isso não ocorre apenas na escola, mas na sociedade em geral.

Quando falamos em meio ambiente, muito frequentemente essa noção logo

evoca as ideias de “natureza”, “vida biológica”, “vida selvagem”, “fauna e flora”.

Tal percepção é reafirmada em programas de TV como os tão conhecidos

documentários de Jacques Cousteau ou da National Geographic e em tantos

outros sobre a vida selvagem que moldaram nosso imaginário sobre a natureza.

[...] Essas imagens de natureza, não são como pretendem se apresentar, um

retrato objetivo e neutro, um espelho do mundo natural, mas traduzem certa

visão de natureza que termina influenciando bastante o conceito de meio

ambiente disseminado no conjunto da sociedade. (CARVALHO, 2008, p. 35)

Identificamos estas características durante a pesquisa. Acreditamos que

concepções por meio das imagens e as representações escritas pelos educandos são

caracterizadas pelo ambiente natural pelo fato não haver a construção do conhecimento

sobre este conceito, que só é possível a partir de uma aprendizagem significativa.

A partir das figuras a seguir podemos ver exemplos da concepção de meio

ambiente dos educandos destas escolas.

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Figura 1: Alguns dos desenhos confeccionados pelos educandos das escolas do campo do município de Iporá

De acordo com a figura 1, percebemos que predomina a visão naturalista de meio

ambiente, em alguns desenhos se percebe a figura humana, em outros casos o ser

humano não está presente. Quando analisamos as respostas dos educandos do 2º e 3º

ano, quando perguntamos o que é meio ambiente para eles, todos os educandos acham

que meio ambiente é o lugar onde vivem homens, animais e plantas.

Para os educandos do 4º e 5º anos, quando questionados sobre o que entendem

por meio ambiente, em apenas dois questionários encontramos respostas mais

elaboradas, onde o ser humano aparece também como elemento do meio. Eles dizem que

meio ambiente é onde mora os animais e que nós também fazemos parte dele.

Nos demais questionários as respostas muito se aproximam de um meio ambiente

enquanto natural. Segundo eles meio ambiente são: os rios; os peixes; as plantas; lugares

onde vivem os animais; etc. Quando observamos que a ideia de lugar está posta, podemos

compreender que há no entendimento do educando uma separação entre “seu meio e o

meio ambiente”.

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Para compreendermos se veem o ambiente modificado – casas, ruas, praças etc. –

como sendo meio ambiente e se percebem o ser humano como transformador deste,

perguntamos a eles o que consideram fazer parte do meio ambiente. Responderam com

as mesmas palavras que usaram para conceituar Meio Ambiente. Fazem referência ao

homem, aos animais, às plantas, aos rios, às pessoas, etc. Sabemos que como afirma

Penteado:

O meio ambiente é formado pelos elementos pertencentes ao reino mineral,

vegetal, animal que compõem um determinado espaço; [...] Estes elementos são

todos inter-relacionados; destes elementos destaca-se o homem (pertencente

ao reino animal) pela capacidade que tem de interferir em todos estes

elementos, alterando-os, consciente e/ou inconscientemente através das

dimensões econômicas e políticas, das organizações sociais que constroem.

(PENTEADO, 2001, p. 73)

Enquanto elemento e transformador do meio ambiente, o ser humano prejudica

seu espaço de vivência em defluência dessa transformação, que deve ser compreendida

dialeticamente, de modo a entender que ao beneficiar a si e até mesmo outros elementos

do meio, podem ao mesmo tempo, dependendo de suas atitudes, acarretar o

desequilíbrio ambiental e consequentemente degradá-lo.

Percebemos que estas análises não são feitas com os educandos por meio dos

educadores ao ministrar as aulas de Geografia, pois se assim fosse, a visão destes

educandos em relação ao meio ambiente se diferiria do que constatamos na pesquisa.

Segundo a pesquisa, assim como as educadoras, eles se isentam da responsabilidade

de serem causadores de problemas ao meio ambiente em que vivem. Eis as questões e

respostas dos mesmos:

Figura 2: Parte do questionário elaborado aos educandos.

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A exemplo da figura 2, inferimos que na concepção dos mesmos, alguém é

responsável por poluir, queimar e matar os animais, por isso existem problemas

ambientais. Podemos perceber que “alguém polui”. Na figura 3 percebemos que uma

forma deste educando (a) resolver problemas ambientais seria pedir às pessoas para não

fazer queimadas. Ou seja, existe alguém, que não ele, responsável pelos danos

ambientais. É comum entre nós, não nos responsabilizarmos por danos que causamos ao

nosso ambiente, embora seja isto um erro.

Figura 3: Parte do questionário elaborado aos educandos.

Embora a maioria dos entrevistados entenda que meio ambiente é o lugar onde

vivem homens, animais e plantas e que estes consideram sua comunidade como sendo

meio ambiente, quando questionados sobre a existência de problemas ambientais neste

espaço (sua comunidade), a maioria deles desconhecem. Para eles não existem problemas

ambientais no lugar onde vivem.

De acordo com as respostas para as perguntas acima, dizem que são capazes de

resolver problemas ambientais, porém os problemas mencionados nos questionários são

referentes: ao lixo; às queimadas; à poluição ambiental pelo lançamento de fumaça e

matança de animais. Nesse contexto, percebemos que a Geografia escolar não tem

cumprido seu papel de formadora de cidadãos críticos.

Segundo a maioria destes educandos, nas aulas de Geografia sempre falam sobre

meio ambiente e sobre os problemas ambientais e dizem que gostam das aulas de

Geografia. Mas o que percebemos a partir dos materiais analisados é que este

componente curricular é trabalhado de forma tradicional, com ensino baseado apenas no

livro didático, fazendo com que ocorra apenas a transmissão dos conteúdos que nada tem

a ver com a vida do educando. Assim,

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O professor vem atestando o desinteresse, o enfado, a desatenção de crianças e

adolescentes quando colocados diante das exigências do estudo calcado apenas

no ensino livresco; as respostas decoradas que daí resulta para as provas e para

agradar o professor, encerrando na própria escola o ato de aprender. Pouco se

leva para a vida. E assim vai se repetindo, se conservando. Perpetuando e

multiplicando seus problemas. (PENTEADO, 2001, p. 54)

Percebemos os educandos aprendem o que lhes é ensinado, no entanto o que se

ensina, a maneira como se ensina, não corresponde à necessidade do educando. Isso

pode ser observado também a partir da avaliação escrita aplicada por uma das

professoras desta escola. As questões são baseadas no tradicionalismo. Os conceitos são

definidos mecanicamente.

Carvalho (2008) aponta uma educação ambiental, não importa a disciplina,

portanto aconselha que se trabalhe a partir da interdisciplinaridade. Para ela isto significa

ousar. Diz não ser cômodo, nem fácil, porém para ela é a forma de se conseguir uma

sociedade que pense nos problemas socioambientais, de forma a ter condições de

solucioná-los.

Embora as educadoras nos informem que trabalham a geografia a partir também

de aulas campo. Entendemos que se as teorias forem baseadas nos conhecimentos

advindos apenas dos meios de comunicação ou livro didático, pouco adiantará.

É de suma importância que o educador conheça as propostas para o ensino de

Geografia e para o tratamento que o MEC e as Orientações Curriculares dão aos temas

abordados, para proceder na intenção de adaptar estas propostas às realidades destas

escolas.

Todavia o que se identifica ao perguntar sobre as propostas para o ensino de

Geografia, é que estas propostas são desconhecidas por elas. A professora “B” declarou

não conhecer nenhuma das propostas para o ensino de geografia, enquanto a professora

“C”, afirmou conhecer tais propostas, porém ao responder a pergunta refere-se à horta da

escola, aos projetos relacionados ao lixo, poluição do meio ambiente, etc. Eis sua

resposta:

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Olha, nós temos uma que eu acho que vai né...? Você deve é... talvez vai

perguntar mais a frente, mas é a questão aqui da nossa horta, que nós temos na

escola. É uma proposta do MEC, de acordo pela Escola Ativa, já incentivando a

questão de é...cidadania, porque é uma questão em conjunto, cada um vai tá

fazendo sua parte e pra isso vendo a questão do meio ambiente também. [...]

olha das outras tem a questão de... nós fizemos até um projeto em relação a

essa questão do lixo, da jogada do lixo no meio ambiente, então são várias as

atividades de acordo que vem pela proposta do MEC.(informação verbal)36

Assim, podemos afirmar que quando não desconhecem não sabem de fato explicar

quais são estas propostas.

O MEC, por meio dos PCNs diz que:

Desde as primeiras etapas da escolaridade, o ensino de Geografia pode e deve

ter como objetivo mostrar ao aluno que cidadania é também sentimento de

pertencer a uma realidade na qual as relações entre a sociedade e a natureza

formam um todo integrado – constantemente em transformação – do qual ele

faz parte e, portanto, precisa conhecer e sentir-se como membro participante,

efetivamente ligado, responsável e comprometido historicamente. (PCN, 2001,

p. 113)

Subentendemos que os educandos, desde as primeiras séries consigam aprender

Geografia de maneira a apreender seu espaço de vivência, sentindo-se participante, pois

somente desta forma haverá possibilidades deste educando interferir de maneira a

transformar a realidade social por meio de mudanças de hábitos e atitudes

socioambientais corretas.

Pensamos que a forma como estes conceitos são tratados nestas escolas, a

proposta para o ensino de Geografia se torna quase impossível, pois é feito baseado na

educação tradicional. A foto que segue refere-se a uma avaliação feita por um (a)

educando (a) do 5º ano, no terceiro semestre de 2010 (ocultamos o nome para preservar

a identidade do educando (a)).

Podemos perceber por meio da foto, impregnada tanto no educando como no

educador das instituições escolares pesquisadas, a ideia de apenas o lixo como problema

ambiental.

6 Entrevista formal, gravada com a professora “C”.

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Constatamos também a forma mecânica de se ministrar os conteúdos, ilustrado

também pela foto a seguir.

Foto: RODRIGUES, Silvaci Gonçalves Santiano. Fonte: Avaliação referente ao terceiro bimestre em uma das escolas realizada por educando (a) do 5º ano.

As concepções dos educandos estão intimamente relacionadas às concepções das

educadoras. Podemos observar a partir das diversas questões. Por exemplo, quando

interessamos saber o que poderia ser feito para melhorar o meio ambiente, a professora

“B” responde que:

“Uma das principais atitudes de todos nós seria essa reciclagem do lixo. Eu acredito que se a gente aprendesse a usar tudo mesmo assim, e reaproveitar, nós poderíamos é... estar diminuindo esse impacto que está tendo na natureza”.

(informação verbal)37

A partir da foto e das falas das educadoras, concluímos que estas veem o lixo como

um problema, mas não estabelecem o entendimento dialético com o fim de perceber que

este tem sua origem no consumo, que nem todas as pessoas podem consumir e muitas

vezes consumimos o que não temos necessidade, e também que a classe dominante

(ricos) sobrevive nas regalias, enquanto a classe subordinada (pobres) sobrevive de um

7 Entrevista formal gravada com a professora “B”

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tímido consumo. E que também esta última classe (pobres) é explorada para que a

segunda classe (ricos) possa consumir.

O problema do lixo é dado como um fato, parte de uma atividade corriqueira. Se

fosse enfocado nos seus múltiplos aspectos, poderia repercutir melhor na

conduta das crianças e adolescentes das escolas. A abordagem de seu sentido

mais abrangente, de reflexão de uma cultura shopping center dominante,

extremamente consumista, rápida na produção e lenta na recuperação do meio

ambiente que desgasta e destrói, dentro de uma perspectiva estritamente

economicista poderia desenvolver princípios mais sustentáveis. (TRISTÃO, 2004,

p. 129)

Nesse contexto, não podemos classificar o problema do lixo como um pequeno

problema ambiental, pois consideramos importante o tratamento dado a este tema.

Todavia não concordamos com trabalhos sobre meio ambiente e resolução de problemas

ambientais restritos a gerenciamento de resíduos sólidos.

Educar para cidadania exige pessoas críticas, que saibam qual seu papel na

sociedade. Que saibam tomar decisões ante os desafios postos pela complexidade

existente no espaço geográfico, que surge da dinâmica existente entre

sociedade/sociedade e também da relação entre sociedade e natureza.

Portanto, uma tarefa importante para o professor, associada ao tema Meio

Ambiente, é a de favorecer ao aluno o reconhecimento de fatores que

produzam o real bem-estar; ajudá-lo a desenvolver um espírito de crítica às

induções ao consumo e o senso de responsabilidade e solidariedade no uso dos

bens comuns e recursos naturais, de modo a respeitar o ambiente e as pessoas

de sua comunidade. (PCN, 2001, p. 49)

Com relação à proposta de educar para cidadania nestas escolas, segundo a

coordenadora das escolas do campo, é uma prioridade para a secretaria, pois buscam

base nos materiais do Programa Escola Ativa38, que segundo ela, é todo voltado para o

tratamento dos temas, meio ambiente e cidadania.

8 Programa Escola Ativa é a proposta do MEC, para as escolas do campo, adotado pelas escolas do campo em Iporá no ano de 2008.

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As escolas municipais do campo em Iporá se apoiam em um projeto que dá bases

para preparar o educando para a vida, para o exercício da cidadania plena. Segundo as

educadoras, todos os educandos e educandas destas escolas conseguem se organizar a

partir de uma gestão democrática dentro e fora da sala de aula39.

Ao observar algumas aulas e em conversa informal com as educadoras, notamos

que sempre selecionam os educandos responsáveis por algumas atividades diárias na

escola, tais como: determinar quem distribui o lanche; lembrar o horário de regar a horta

da escola; pedir aos responsáveis para regar a horta, entre outras atividades

desenvolvidas no dia-a-dia pelos próprios educandos. São eles que determinam estas

práticas diárias. Pressupomos então, que existam bases para o exercício da cidadania

plena, portanto se a parte teórica não estiver relacionada à prática, não surtirá efeito,

pois,

[...] o desenvolvimento da cidadania e a formação da consciência ambiental tem

na escola um lugar adequado para sua realização através de um ensino ativo,

participativo, capaz de superar os impasses e insatisfações vividas de modo geral

pela escola na atualidade, calcado em modos tradicionais. (PENTEADO, 2001, p.

54)

Quando questionados sobre o entendimento deles sobre o conceito de Cidadania,

a concepção de alguns está relacionada apenas aos direitos e deveres, outros não

conseguem defini-lo. Dentro das salas de aula existem cartazes que mostram quais são

seus deveres. No entanto, não vimos nenhum cartaz com seus direitos. É assim no Brasil,

os deveres sempre são explícitos enquanto os direitos são camuflados.

A concepção destes educandos sobre cidadania está ligada ao direito de votar (que

no Brasil vai além do direito, se tornando quase uma obrigação40), direito de ter carteira

de identidade, enfim, suas concepções sobre cidadania não tem a amplitude que se deve

9Informações adquiridas a partir da observação das aulas no decorrer da pesquisa. Embora não esteja contida na metodologia a proposta de observação das aulas, achei por bem a prática da observação para melhor compreenção de como ocorrem as aulas de geografia. 10 Exemplo dessa obrigação: para ocupar cargos públicos, ingressar nas universidades públicas, temos que ter documentos que comprovem que votamos, portanto, o que é direito acaba se tornando uma obrigação.

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ter ao pensar este conceito. A maioria dos educandos não tem noção do que seja

cidadania, percebemos que não é dada a importância e a dimensão necessária, quando se

trabalha o referido conceito nestas escolas.

Quando T. H. Marshall em 1950 estrutura o conceito de cidadania, a partir dos

direitos sociais – século XX – surge o conceito de cidadania plena, que é o direito de ter

direitos. Por exemplo: o direito não somente ao meio ambiente, mas de tê-lo saudável e

se isso não é concedido ao cidadão este tem direito de reivindicá-lo. Nesse momento

entendemos que há grande avanço no conceito de cidadania, pois reivindicar os direitos

civis, políticos e também os direitos sociais, faz parte do exercício de cidadania e agora de

uma cidadania plena.

Portanto nenhuma das respostas acima se aproxima desta concepção, por isso a

base pedagógica para a prática da cidadania, que ocorre na escola – mesmo se limitando

aos direitos básicos do cidadão – deveria ser aproveitada por estes educadores a fim de

estabelecer relação entre teoria (conceito de cidadania) e prática (exercício de cidadania),

haja vista que este é um conceito tão caro à Geografia escolar.

Quando pensamos nas propostas dos PCNs para o ensino de Geografia e a

digressão entre o que se propõe o que se pratica, entendemos que os resultados não

poderiam ser diferentes. Teoria e prática estão bem distantes.

As concepções simplistas de meio ambiente e cidadania são reflexos da

inexistência de condições suficientes para efetivação dessas propostas, que afetam

diretamente educadores, educandos e a sociedade como um todo. Quando fazemos

avaliações dos documentos oficiais do MEC, percebemos que são ótimas as propostas,

porém ao avaliar a prática dos educadores e a apreensão dos educandos, percebemos que

existem falhas do sistema educacional brasileiro.

Nesse contexto educacional será quase impossível a formação destes cidadãos

críticos, conscientes de suas realidades e prontos para intervir socialmente, que propõe os

PCNs, para o ensino de Geografia.

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Acreditamos que se houver uma mudança nas práticas pedagógicas destas

educadoras, mais formação adequada, para o exercício da função. Assim estes educadores

poderão se tornar cidadãos e consequentemente auxiliar estes educandos a se tornarem

os cidadãos, capazes de resolver problemas socioambientais, e consequentemente

exercer sua cidadania. No entendimento de (Somma, 2003, p. 165)

[...] Nós, professores de Geografia, temos a oportunidade de transformar

essas percepções desordenadas, baseadas em uma dinâmica funcional,

em categorias de conteúdos e habilidades significativas para o

desenvolvimento da inteligência.

Assim, pensamos que uma das formas de mudar esta realidade seria buscarmos os

meios corretos de se trabalhar com estes conceitos, adotando procedimentos

metodológicos adequados. Buscar formação continuada, assim como conhecimentos

científicos específicos para o tratamento dos conceitos com o objetivo de conhecer a visão

de vários autores sobre os temas, o que possibilitaria a transversalidade e também

relacioná-los à vivência diária dos educandos.

Conclusão

Ao concluirmos a pesquisa, observamos quão grande o grau de dificuldade dos

educandos em compreender conceitos que fazem parte de seu dia-a-dia. As escolas do

campo do município de Iporá possuem um projeto relevante estabelecido pelo Programa

Escola Ativa, que se bem trabalhado pela Secretaria Municipal de Educação e pelas

educadoras poderia obter grandes sucessos. Com exceção de uma, estas escolas possuem

boa estrutura física compatível com a quantidade de estudantes, porém os materiais

utilizados pelas educadoras são materiais não suficientes para cumprir o que os PCNs

propõem para o ensino de Geografia.

Percebemos que ano após ano as escolas do campo neste município estão sendo

extintas e para reverter estes e outros problemas socioambientais, é necessário que haja

pessoas aptas a atuar em prol da melhoria destas comunidades nas quais estas escolas se

encontram localizadas.

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Ao mesmo tempo em que enxergamos essa necessidade, vemos também que se

não houver mudanças na forma de trabalhar este componente curricular – Geografia –

nem a médio e longo prazo, isto será possível, pois atitudes para transformação

dependem de pessoas críticas, que sejam capazes de reivindicar direitos, pessoas cientes

de seus direitos e deveres e também comprometidas com a sociedade.

Diagnosticamos que a Geografia escolar pouco tem contribuído para a construção

destes conceitos nas escolas do campo no município de Iporá-Goiás. Pensamos que o

conhecimento referente aos conceitos de Meio Ambiente e Cidadania não podem ser

construídos a partir de noções em nível de senso comum, e/ou a partir de bases científicas

deficientes como o que vimos durante o estudo.

O fato de, as orientações educacionais estabelecerem políticas nacionais com o

objetivo de auxiliar na elaboração de políticas locais é meio que mais atrapalham do que

ajudam, pois o ensino se pauta apenas nessas diretrizes, tomando-as como referência

para balizar seu ensino (como por exemplo, o uso do Projeto do Programa Escola Ativa,

como único projeto a ser seguido), acarretando prejuízo para o educando, educadores e

para a comunidade como um todo.

Notamos que a educação para a cidadania, que o sistema propõe fica quase que

apenas nas teorias. Detectamos que os efeitos obtidos a partir das práticas pedagógicas

ainda são bem são tímidos. Entre os educandos pesquisados não encontramos educandos

que tenham conhecimento razoavelmente elaborado sobre os temas tratados.

No entanto percebemos que se o ensino de Geografia fosse elaborado e abordado

mais responsavelmente por todos os componentes do sistema educacional, poderíamos

solucionar alguns problemas a curto e médio prazo e em longo prazo ter cidadãos de fato

comprometidos com as questões socioambientais, aptos ao exercício da cidadania plena.

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TRISTÃO, M. A educação ambiental na formação de professores: rede de saberes. São Paulo, Anablume, Vitória, Facitec, 2004.

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Educação Patrimonial: leitura da paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado nas aulas de Geografia Angélica de Oliveira Ribeiro Xavier41

RESUMO: O estudo objetivou compreender a paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado, que está inserida no centro histórico da cidade de Goiás. Foram feitas considerações sobre a paisagem cultural, pois a Praça Dr. Brasil Ramos Caiado é rica histórica e culturalmente, portanto deve ser preservada. Isso será possível se as pessoas conhecerem a história dessa Praça e de seus monumentos, para que se desperte o sentimento de pertencimento, e, consequentemente, o de valorização. Assim, é relevante trabalhar a Educação Patrimonial nas escolas para que crianças e adolescentes possam ter contato direto e conhecer melhor esse Patrimônio que é de todos. O estudo propõe algumas sugestões de como abordar a paisagem dessa Praça nas aulas de Geografia através da Educação Patrimonial, para que o Patrimônio Histórico e Cultural da cidade seja preservado e sua existência seja garantida para o usufruto de atuais e futuras gerações.

Palavras-chave: Geografia. Paisagem. Educação Patrimonial. Ensino.

Introdução

A pesquisa propôs uma abordagem da paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado

e seu entorno, inseridos na área considerada centro histórico da Cidade de Goiás. Fez-se

uma análise qualitativa fenomenológica, sendo um estudo de caso da paisagem da Praça

Dr. Brasil Ramos Caiado.

Partiu-se da compreensão da categoria paisagem, desenvolvendo um estudo sobre

paisagem cultural, pois se acredita que é preciso, inicialmente, buscar alguns conceitos

para que se possa fazer a leitura da paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado.

Fizeram-se considerações sobre a paisagem no ensino de geografia e possibilidades

de inserir a paisagem dessa Praça nas aulas de Geografia para alunos de Ensino

41 Graduanda do IV ano do Curso de Geografia da Universidade Estadual de Goiás – UEG da cidade de Goiás. O artigo aqui apresentado é parte da pesquisa de conclusão de curso intitulada Praça Dr. Brasil Ramos Caiado: paisagem como fonte de estudos para aulas de Geografia no ano de 2010, que culminou numa monografia orientada pela professora Dominga Correia Pedroso Moraes, que é a indicadora deste artigo.

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Fundamental, trabalhando a paisagem e inserindo-a como espaço vivido pelos alunos da

cidade de Goiás. Isso pode ser feito através de Educação Patrimonial.

A paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado já foi bastante modificada, desde a

construção de seus primeiros monumentos e residências até os dias atuais. Todas essas

mudanças ocorreram para atender necessidades de pessoas diferentes, em diferentes

momentos da história. Por isso, sua paisagem possui marcas de um passado, que está

representada em cada elemento que a constitui. Portanto, ela é histórica e cultural e deve

ser preservada. Preservando os elementos que constitui sua paisagem também estará

sendo preservada parte da história e da memória do povo da cidade de Goiás.

Paisagem

Na perspectiva da Geografia Crítica, a paisagem tem sido tomada como um

primeiro foco de análise para aproximação do seu objeto de estudo que é o espaço

geográfico. Sendo a paisagem o domínio do visível, ela está na dimensão da percepção e

essa percepção é sempre um processo seletivo de apreensão.

Nessa perspectiva, Santos (1997, p.61), ao definir paisagem afirma que “Tudo

aquilo que nós vemos, o que nossa visão alcança é a paisagem. Esta pode ser definida

como, o domínio do visível, aquilo que a vista abarca. Não é formada apenas de volumes,

mas também de cores, movimentos, odores e sons, etc.”

Geralmente, quando ouvimos falar de paisagem, a primeira ideia que temos é de

um lugar bonito, principalmente relacionado à natureza. No entanto, a paisagem deve ser

vista e compreendida não só como uma imagem, ou uma vista “bela” e “bonita”, mas

também como algo que pode ser “feio” e que está sujeito a um constante processo de

transformação. Além disso, a paisagem é caracterizada não apenas pela natureza e pelos

elementos que a compõe, mas também, por tudo aquilo que é construído pelo homem.

Sobre paisagem, Santos (1997, p. 65), salienta:

A paisagem é um conjunto heterogêneo de formas naturais e artificiais; é

formada por frações de ambas, seja quanto ao tamanho, volume, cor, utilidade,

ou por qualquer outro critério. A paisagem é sempre heterogênea. A vida em

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sociedade supõe uma multiplicidade de funções e quanto maior o número

destas, maior a diversidade de formas e de atores. Quanto mais complexa a vida

social, tanto mais nos distanciamos de um mundo natural e nos endereçamos a

um mundo artificial.

Assim, pode se afirmar que a proporção entre os elementos naturais e artificiais

que estão presentes na paisagem, depende da complexidade da sociedade que a constitui,

porque quanto mais complexa é a organização da sociedade, maior será a presença dos

elementos artificiais na paisagem, e, quanto menor a complexidade maior é a presença de

elementos naturais no meio.

De acordo com Santos a paisagem não se cria de uma só vez, mas sim através de

acréscimos e substituições. “Uma paisagem é uma escrita sobre a outra, é um conjunto de

objetos que têm idades diferentes, é uma herança de muitos diferentes momentos”

(1997, p.66). Sendo assim, a paisagem é objeto de constante mudança. À medida que a

sociedade passa por mudanças, seja na economia, na política, nas relações sociais, entre

outras, a paisagem também muda.

Nesse sentido, Carlos (1994, p. 49) defende a ideia que “a paisagem é uma forma

histórica específica que se explica através da sociedade que a produz, um produto da

história das relações materiais dos homens que a cada momento adquire uma nova

dimensão.” Ainda de acordo com Carlos, dependendo da hora do dia, ou do dia da

semana, a observação de uma determinada paisagem vai mostrar um determinado

momento do cotidiano da vida das pessoas que moram, trabalham e se locomovem num

determinado lugar.

Uma paisagem está sempre sujeita a receber atribuições carregadas de valores,

pois está ligada diretamente à vida do ser humano. Assim podemos dizer que, o ser

humano é o seu agente construtor e transformador. Uma mesma paisagem pode ser

observada e interpretada de forma diferenciada, afinal cada um pode ter sua maneira de

observá-la, atribuindo a ela, novos significados.

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Paisagem Cultural

A ação do homem na paisagem é marcante e transformadora. Através da

observação de uma paisagem é possível conhecer seu processo histórico e sua dimensão

cultural. De acordo com Sauer (apud Ribeiro, R., 2007, p. 22), “a paisagem cultural

expressa o trabalho do homem sobre o espaço e, dessa forma, ela não é estática, está

sujeita a mudar, tanto pelo desenvolvimento da cultura, como pela substituição desta.”

Wagner e Mikesell (2007, p.36), sobre o processo de mudança da paisagem

cultural afirmam:

Poucas paisagens culturais atuais são inteiramente produtos do trabalho de comunidades contemporâneas. A evolução de uma paisagem é um processo gradual e cumulativo – tem uma história. Os estágios nessa história têm significados para paisagem atual, assim como para as do passado. Além disso, as paisagens culturais atuais do mundo refletem não apenas evoluções locais, mas também grande número de influências devido a migrações, difusão, comércio e trocas. Subjacente à maioria das áreas culturais de hoje está uma longa sucessão de diferentes culturas e desenvolvimentos culturais.

Uma paisagem traz a marca da atividade produtiva dos homens, que a modificam e

adaptam-na de acordo com suas necessidades. Ela é marcada pelas técnicas materiais que

a sociedade domina, e contribui desta maneira, para a compreensão das culturas.

As paisagens constituem um importante objeto de estudo, no entanto, sua

interpretação é complexa, na medida em que revela informações dos homens que a

modelam e que as habitam atualmente e daqueles que lhes precederam; revelam as

necessidades do presente e aquelas de um passado muitas vezes difícil de datar.

A paisagem cultural é modelada a partir de uma paisagem natural por um grupo

cultural. Assim, a paisagem natural tem grande importância por fornecer os materiais com

os quais a paisagem cultural é formada. Nesse sentido, Sauer (apud Ribeiro, J., 2006,

p.16), ressalta:

A cultura é o agente, a área natural é o meio, a paisagem cultural o resultado.

Sob a influência de uma determinada cultura, ela própria muda através do

tempo. A paisagem apresenta um desenvolvimento, passando por fases e

provavelmente atingindo no final o término do seu ciclo de desenvolvimento.

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Com a introdução de uma cultura diferente, isto é, estranha, estabelece-se um

rejuvenescimento da paisagem cultural ou uma nova paisagem se sobrepõe

sobre o que sobrou da antiga.

Assim, a paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado, que é o objeto de estudo da

pesquisa, é cultural, pois reflete a cultura do povo, conta a história das pessoas que vivem

e viveram, trabalham e trabalharam, contribuem e contribuíram para a construção dela.

Por isso, é uma paisagem carregada de símbolos e significados para as pessoas que

participaram e participam da sua construção.

Percebe-se que a Praça Dr. Brasil Ramos Caiado, tem, além do seu valor histórico, o

valor cultural. Esses valores se encontram em sua paisagem que é constituída não só pelos

seus monumentos, mas também pelas ruas que a cercam, as casas construídas parede-

meia, as pessoas que residem e as que trabalham neste espaço, bem como, toda a

dinâmica existente ali cotidianamente. Faz-se necessário ressaltar também a bela

paisagem natural desta Praça, que é composta por uma vegetação diversificada, inclusive

oitizeiros centenários.

De acordo com o que foi explanado anteriormente, uma paisagem pode nos

revelar marcas de tempos diferenciados, pois é formada por acréscimos e substituições de

diferentes agentes culturais. A paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado é formada por

elementos que tem grande importância para a história da cidade e do Estado de Goiás.

Praça Dr. Brasil Ramos Caiado – Representações Diferenciadas

A Cidade de Goiás no ano de 2001 recebeu o título de Patrimônio Histórico da

Humanidade, concedido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e

a Cultura (UNESCO). Isso aconteceu devido à preservação do traçado do núcleo urbano

original e de seu harmonioso conjunto arquitetônico. Além disso, a arquitetura da Cidade

de Goiás apresenta particularidades regionais e uma fisionomia cultural específica, que

merecem destaque e preservação.

Esse Patrimônio Histórico de Goiás, hoje é da Humanidade, mas é em primeiro

lugar das pessoas que moram na Cidade, que vivem e relacionam-se cotidianamente com

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esse espaço e tem sentimentos por ele. Segundo Fonseca (apud Moraes, 2002) um

Patrimônio Histórico não vale por si mesmo, o valor dele é atribuído pelos sujeitos que o

construíram e constroem.

Desta forma, pode se afirmar que o valor de uma paisagem que constitui um

Patrimônio Histórico, como é o caso da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado, que está inserida

no centro histórico da cidade de Goiás, é atribuído pelas pessoas e varia de acordo com

preferências e de acordo com a perspectiva de cada observador.

Por isso, justifica-se um estudo para apreender as representações que os

moradores, frequentadores e turistas que visitam os monumentos têm da Praça, pois os

mesmos participam do cotidiano dela, trabalhando, estudando, morando e divertindo-se.

É fundamental conhecer a sensibilidade desses segmentos, com esse intuito foram

aplicados questionários, pois a leitura das representações dessas pessoas pode indicar

alternativas de Educação Patrimonial nas aulas de Geografia para alunos de Ensino

Fundamental.

A particularidade e a beleza do Patrimônio Histórico e Cultural da Cidade de Goiás

fazem com que os turistas visitem constantemente a cidade, movimentando o comércio

local e visitando os museus e monumentos de Goiás. Na Praça Dr. Brasil Ramos existem

alguns monumentos históricos e por isso, os turistas frequentam essa Praça. Desse modo,

é importante compreender a leitura que eles fazem da paisagem desse local.

Foi perguntado aos turistas sobre a importância de se preservar os elementos que

constituem a paisagem da Praça. Diante das respostas, fica claro que ela deve ser

preservada em respeito à história, tanto daqueles que contribuíram para sua construção,

como da história da cidade como um todo, na medida em que preservando os elementos

paisagísticos da Praça, também estará sendo preservada parte da história da cidade de

Goiás. Além disso, cada elemento tem sua importância e história.

A paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado, sobretudo os seus arvoredos

seculares, retratam o caráter histórico da própria cidade de Goiás, portanto, a

preservação desses elementos paisagísticos contribui para a preservação da

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cidade como um todo, eis que denota um ambiente mais primitivo e natural.

(Walter de Paiva Araújo, advogado, 2010)

A principal importância de se preservar a Praça em apreço situa-se no esforço

contínuo dos moradores e visitantes de resgatar fatos que marcaram a história,

legados estes, que além de reforçar as marcas do tempo, atraem o turismo na

região. (Cristiane Dias de Oliveira, Escrivã Judiciária, 2010).

Foi pedido aos entrevistados que apresentassem sugestões para que essa Praça

fosse preservada. Algumas das sugestões foram:

- Conscientizar toda a população sobre a importância dessa Praça na cidade;

- Investimento público na manutenção dos elementos da Praça;

- Implantação de lixeiras seletivas;

- Restauração periódica de seus elementos;

- Trabalhar a Educação Patrimonial com os cidadãos;

- Conscientização das crianças nas escolas, para que elas saibam a importância desses

monumentos para a história da cidade;

- Propor aulas onde o aluno pudesse visitar os monumentos que compõem a paisagem da

Praça e conhecer sua história.

A Praça também é frequentada diariamente, por estudantes, trabalhadores,

crianças e jovens de vários lugares da cidade. Essas pessoas têm sentimentos por essa

Praça, que também são importantes de serem analisados.

Aos frequentadores foi perguntado sobre a importância de se preservar os

elementos que constituem a paisagem dessa Praça. Entre as respostas podemos citar:

É importante a preservação, pois além do fato histórico, que nos remete todos

os dias à nossa formação, tem o fator ambiental que também está em destaque

nessa praça. (André Café Carvalho, funcionário público federal, 2010).

É importante porque ao preservar os elementos constituintes dessa praça,

preserva-se também a história desse lugar e também de nossa cidade. Preserva-

se principalmente, características arquitetônicas dos monumentos que estão

inseridos nessa paisagem. (Jane Dias de Oliveira, auxiliar de coordenação, 2010).

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Também foi questionado se a pessoa considerava importante preservar as

características da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado e de que forma ela acha que isso pode ser

feito. Todos os entrevistados responderam que as características da Praça devem ser

mantidas.

Sim, isso pode ser feito conscientizando os moradores da cidade do valor histórico dessa praça, da importância que ela tem pra gente entender a história de Goiás. Porque aí as pessoas vão gostar dela e querer preservar. (Fernanda Oliveira Ribeiro, estudante, 2010).

Penso que cada pessoa que frequenta a praça ou que é morador ou turista que passa por essa paisagem precisa preservá-la, respeitando cada monumento, cada detalhe, sua história e seu cotidiano. A partir do momento que se preserva essa paisagem, preserva-se também sua história. (Jane Dias de Oliveira, auxiliar de coordenação, 2010).

Os moradores da Praça possuem forte sentimento de pertencimento a esse lugar.

Eles desempenham um importante papel na sua preservação. Isso acontece, porque

existem laços afetivos dos moradores com suas residências o que contribui para a

preservação das mesmas. Além disso, os moradores reconhecem a importância dos

monumentos e defendem sua proteção. Por isso, também se torna relevante perceber a

leitura que eles fazem da paisagem dessa Praça e de que forma eles contribuem para sua

conservação.

Inicialmente, foi perguntado se eles gostavam de morar nessa Praça. Houve

unanimidade nas respostas, que foram sim. Entre as justificativas pode se ressaltar fatores

em comum, como por exemplo, a boa vizinhança que se tem na Praça. Isso mostra que

existe afetividade entre os moradores desse lugar.

É um lugar tranquilo, de boa vizinhança. (Elizete Matos Ribeiro, professora, 2010).

Melhor lugar da cidade para se viver. Amplo, seguro, bonito, boa vizinhança, histórico, silencioso, [...] (Abner Curado, comerciante, 2010).

É um lugar tranquilo, arejado, sem poluição sonora. (Sebastião Curado, professor, 2010).

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Foi interrogado aos moradores sobre o que a Praça representa para eles. Entre as

respostas pode ser ressaltado que os entrevistados mantêm muitas lembranças desse

lugar:

Como falei, ela faz parte da história da minha vida. Se eu contar a minha história, não tem como não falar dessa praça. (Antônio Carlos, professor, 2010).

Para mim, ele representa uma parte da minha infância, trazendo-me fartas e vivas recordações e saudades desse período. (Rafael Bueno de Passos, estudante universitário, 2010).

Também foi discutido sobre qual a importância de se preservar os elementos que

constituem a paisagem dessa Praça e de que forma eles colaboram para que isso seja

feito.

A importância da aludida preservação refere-se à boa qualidade de vida dos seus

moradores, bem ainda, concerne à manutenção deste lugar para as futuras

gerações vilaboenses e para todos os visitantes da nossa cidade. Quanto a essa

preservação, eu colaboro não jogando lixo na praça, nem permitindo que

ninguém jogue, e informo sobre a praça e seus monumentos históricos para que

os turistas os visitem. (Rafael Bueno de Passos, estudante universitário, 2010).

Quando falamos em patrimônio cultural devemos lembrar que o patrimônio

imaterial exerce um papel muito forte na preservação do patrimônio edificado.

Alterar a praça, fazer intervenções, com certeza afetará a relação dos moradores

com seu bem material. Colaboro de forma ativa, tanto na preservação quanto na

manutenção do conjunto. (Sebastião Curado, professor, 2010).

Na última pergunta, foi questionado se as pessoas acreditam que é preciso haver

consciência dos moradores sobre a importância dessa Praça, para que ela seja preservada,

e todos responderam que sim, que a partir do momento que algo é conhecido é que ele

pode ser preservado.

A análise das entrevistas revela que a paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado,

além do seu valor histórico, tem também valor cultural e afetivo. Há uma preocupação em

preservá-la, porque se trata de um espaço de referência e de importância para estas

pessoas.

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Desta forma, serão feitas algumas considerações sobre a paisagem no ensino de

Geografia, sobre Educação Patrimonial, bem como, serão propostas sugestões de como

incluir a paisagem desta Praça nas aulas de Geografia.

A Paisagem no ensino de Geografia

A Geografia utiliza algumas categorias de análise, para desenvolver a leitura da

espacialidade. Essas categorias de análise dão identidade à Geografia e foram sendo

construídas ao longo da sua história. As categorias: lugar, paisagem, território, região,

espaço, natureza, sociedade, são importantes para a análise geográfica.

De acordo com Puntel (2007), percebe-se no ensino da Geografia Escolar a quase

ausência, das categorias e das reflexões espaciais. Muitas vezes, falta relação entre os

temas abordados e as categorias geográficas. Portanto, faz-se necessário articular os

assuntos trabalhados na Geografia Escolar com esses conceitos básicos para, com isso,

relacioná-los com a vida do aluno.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Geografia do Ensino Fundamental

estabelecem que a categoria paisagem:

Tem um caráter específico para a Geografia, distinto daquele utilizado pelo senso comum ou por outros campos do conhecimento. É definida como sendo uma unidade visível, que possui uma identidade visual, caracterizada por fatores de ordem social, cultural e natural, contendo espaços e tempos distintos; o passado e o presente. A paisagem é o velho no novo e o novo no velho. (1998, p. 28)

Os PCNs (1998), também indicam que a Geografia estuda as relações entre o

processo histórico de formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza,

através da leitura do espaço geográfico e da paisagem. A abordagem dos conteúdos da

Geografia insere-se na perspectiva da leitura da paisagem, o que permite aos alunos

conhecerem os processos de construção do espaço geográfico.

A paisagem é considerada um instrumento importante de leitura e de

aprendizagem no ensino da Geografia porque através do seu estudo é possível

compreender, em parte, a complexidade do espaço geográfico em um determinado

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momento. A análise da paisagem deve focar as dinâmicas de suas transformações e não a

descrição e o estudo de um mundo estático.

Para tanto, é preciso observar, buscar explicações para aquilo que numa

determinada paisagem, permaneceu ou foi transformado, isto é, os elementos do passado

e do presente que nela convivem.

Para que o educando veja sentido no estudo da paisagem, é importante trabalhá-la

como algo presente na vida de cada um, algo dinâmico, que está em constante

modificação pelas pessoas que ocupam determinado espaço e interagem constantemente

com ele, e cada um, direta ou indiretamente, ajuda a construir a paisagem que ocupa.

Entende-se que, a partir do estudo da paisagem, é possível vivenciar um primeiro plano de

identificação do lugar, criar elos afetivos e sentir-se parte integrante daquele espaço.

Por isso, para o ensino na cidade de Goiás é importante desenvolver a Educação

Patrimonial nas escolas, para despertar nos estudantes o sentimento de valorização da

paisagem que constitui o Patrimônio Histórico e Cultural existente na cidade.

Educação Patrimonial

A cidade de Goiás tem nos diferentes lugares do seu espaço urbano, testemunhos

materiais e imateriais que lhe conferem singularidade e permitem a compreensão de sua

história e dos modos de vida que a construíram em espaços e tempos diversos. A

existência desses testemunhos dá a cidade relevância cultural e histórica em relação às

outras cidades goianas. (MORAES, 2002).

Diante do exposto é notório que a cidade de Goiás tem elementos que justificam

trabalhar a Educação Patrimonial com os estudantes da cidade, por isso, cabe à escola

desenvolver a consciência patrimonial nas crianças e adolescentes.

Nosso país, inclusive a cidade de Goiás, possui um rico patrimônio histórico e

cultural que deve ser preservado. Para que aconteça a preservação é necessário que haja

inicialmente a valorização desse patrimônio e a valorização depende do conhecimento

que é adquirido através de ações que envolvem a comunidade e principalmente a escola.

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Pontes (2007, p. 72) salienta:

Conhecer com mais propriedade nossa herança cultural é a forma mais viável para trilhar o caminho da preservação, saber que esse patrimônio é parte de sua história e entender o significado que isso tem para si próprio é de uma grande relevância para sua afetividade para com o patrimônio cultural.

Vasques e Valio (1994) na cartilha “Para Preservar” lembram que o Patrimônio

Cultural de uma sociedade, de um país, diz respeito à sua cultura. Trata-se de um conjunto

de objetos ou bens de valor, com significado e importância para um grupo de pessoas. Ele

é um produto coletivo, formado pelo conjunto das realizações de uma sociedade e que

vem sendo construído ao longo de sua história. Pertence desta forma, a todos os

cidadãos.

Lamentavelmente, nem todos possuem plena consciência da importância do seu

patrimônio cultural, levando à destruição e à perda de uma grande quantidade de bens de

incalculável valor, por serem testemunhos insubstituíveis da memória de um povo.

Desta forma, a Educação Patrimonial tem grande importância, na medida em que

capacita as pessoas a exercerem a prática da cidadania, se sentindo mais preparadas para

usufruir o que o nosso país tem enquanto Patrimônio Cultural. (PONTES, 2007).

Segundo Horta (apud Queiroz, 2010), a Educação Patrimonial é interpretada como

um processo permanente de trabalho educacional centrado no Patrimônio Cultural como

fonte primária de conhecimento. Isto significa tomar os objetos e expressões do

Patrimônio Cultural como ponto de partida para a atividade pedagógica, observando-os,

questionando-os e explorando todos os seus aspectos, que podem ser traduzidos em

conceitos e conhecimentos.

A Educação Patrimonial torna-se, assim, um processo constante de

ensino/aprendizagem que tem por objetivo central e foco de ações, o Patrimônio. Através

de ações voltadas à preservação e compreensão do Patrimônio Cultural, a Educação

Patrimonial torna-se um veículo de aproximação, integração e aprendizagem, objetivando

que as pessoas (re)conheçam e (re)valorizem a herança cultural que a elas pertence,

proporcionando a elas uma postura mais atuante na (re)construção de sua identidade.

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É através da Educação Patrimonial:

Que o ser humano passa a valorizar o seu meio e as riquezas que fazem parte de

sua vida e da sociedade, sentindo-se parte desse patrimônio pelo amor que lhe

foi despertado através da pesquisa, do contato direto, de troca de saberes e das

informações recebidas de um modo em geral, proporcionando o conhecimento

e gerando o espírito de preservação. (PONTES, 2007, p. 68)

Segundo Horta (2003), a metodologia da Educação Patrimonial pode ser aplicada a

qualquer manifestação da cultura, seja um objeto ou conjunto de bens, um monumento

ou um sítio histórico ou arqueológico, uma paisagem natural, uma paisagem cultural, um

centro histórico urbano ou uma comunidade da área rural, tecnologias e saberes

populares, e qualquer outra expressão resultante da relação entre os indivíduos e seu

meio ambiente. Outro aspecto de fundamental importância no trabalho da Educação

Patrimonial é que ele pode ser aplicado em várias disciplinas.

É importante ressaltar que para haver uma boa relação entre o indivíduo e a

metodologia aplicada nesse processo educacional, é necessário que o educador tenha a

compreensão sobre patrimônio. Para isso, ele precisa estudar e conhecer o tema a ser

trabalhado, de forma que possa embasar os alunos rumo a novos caminhos do saber e do

conhecimento.

Horta (2003), também aponta que é preciso que o educador defina seus objetivos

educacionais e os resultados pretendidos, além de decidir que habilidades, conceitos e

conhecimentos querem que os educandos adquiram. Também é importante verificar que

outras disciplinas poderiam estar envolvidas na exploração do tema, para realizarem

estudos interdisciplinares.

A Educação Patrimonial pode ser desenvolvida através de aulas expositivas,

iniciando com uma abordagem sobre o tema, para que o aluno tenha uma noção do que

será trabalhado.

O educador poderá prosseguir o trabalho educacional despertando a curiosidade e

o interesse sobre o Patrimônio que o cerca através da aproximação, do contato direto

com o objeto. Pontes (2007, p.71) afirma que “Para valorização do patrimônio é

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necessário que desenvolva um trabalho de aproximação entre o patrimônio e a pessoa,

possibilitando o acesso ao conhecimento a respeito do que está sendo investigado”.

Para isso, o trabalho de campo poderá contribuir muito para o aprofundamento do

tema a ser trabalhado, pois a observação direta do objeto de estudo pode ajudar na

compreensão sobre a sua utilidade e o seu real valor. Através do trabalho de campo e da

pesquisa, o processo de ensino e aprendizagem será enriquecido, pois serão extrapoladas

as barreiras da escola e se buscará novas descobertas.

A Educação Patrimonial seria importante para a cidade de Goiás, pois poderia

ajudar no reconhecimento e valorização da singularidade da paisagem da cidade de Goiás

enquanto cidade tombada e protegida pela União; poderia promover um contato dos

alunos com conceitos como: patrimônio, tombamento e preservação; poderia desenvolver

uma atitude consciente de responsabilidade quanto à preservação desse patrimônio

histórico-cultural; identificar a cidade enquanto cenário de fatos históricos de grande

relevância; compreender que a história pessoal de cada um está relacionada ao passado

da cidade, de tal forma que a salvaguarda do patrimônio local associa-se à preservação e

valorização da identidade de cada um.

Desta forma, trabalhando a Educação Patrimonial nas escolas da cidade de Goiás,

despertará nos alunos a consciência e o entendimento destes com seu patrimônio, no

sentido de conhecer a história e a cultura, para despertar o desejo de preservar o

patrimônio de sua cidade.

Praça Dr. Brasil Ramos Caiado: paisagem como fonte de estudos para as aulas de Geografia

A Geografia sendo uma ciência social, ao ser estudada precisa considerar o aluno e

a sociedade em que vive. Deve ser uma disciplina interessante, que tenha a ver com a vida

e não só fornecer dados e informações que pareçam distantes da realidade do aluno.

A partir do entendimento do mundo em que vive, que é uma parte de um todo

maior e que representa características desse todo, o educando pode ver mais sentido no

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estudo do espaço geográfico, interessando-se pelo assunto por sentir que ele é um agente

participante, um sujeito vivo.

A categoria paisagem pode contribuir nessa compreensão do espaço geográfico,

pois sua leitura se bem conduzida levará à aprendizagem da complexidade da relação da

sociedade com a natureza.

Existem alguns aspectos a serem considerados segundo Cavalcanti (1998), para a

construção do conceito de paisagem no ensino de Geografia. Um deles é considerar esse

conceito como primeira aproximação do lugar, afinal ela é a chave inicial para apreender

as diversas determinações desse lugar. Outro aspecto seria considerar a dimensão estética

da paisagem, porque muitos alunos e até mesmo os professores, fazem forte relação

entre paisagem e beleza. Portanto, este poderia ser um caminho inicial para construção

no ensino do conceito de paisagem pelos alunos.

As orientações atuais para o ensino de Geografia têm dado ênfase para a

necessidade de trabalhar com os conhecimentos prévios dos alunos (CAVALCANTI, 2002).

Nesse sentido, poderiam ser feitas com os alunos algumas reflexões que auxiliariam na

aprendizagem. Essas reflexões poderiam levar os mesmos a pensarem, por exemplo,

porque é tão forte a referência que muitas pessoas fazem de paisagem e beleza; se

paisagem tem a ver com aparência; e ainda, quais seriam as diferenças entre uma

paisagem ideal e uma real; quem constrói a paisagem e para quem ela é construída;

porque as paisagens mudam com o tempo, entre outras.

Cavalcanti (1998, p. 100), salienta que “Parece que esse conceito fica associado a

algo distante de seus lugares, de suas vidas, de suas realidades, pertencendo mais a um

mundo de sonhos”. Percebe-se, desta forma, que não encontrar paisagem no lugar onde

vivem, pode influenciar na atitude em relação a esse lugar, tendendo a desvalorizá-lo, já

que associam paisagem à beleza e não percebem beleza no seu espaço vivido. Segundo

Cavalcanti (1998) isso mostra que a paisagem é transmitida como conteúdo de ensino,

não como algo vivo e construído pelo homem, mas como um conceito, não importando

sua correspondência com o real.

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Nesse sentido, caberia ao ensino, trazer a paisagem para o universo do aluno, para

o lugar vivido por ele, trazendo a paisagem conceitualmente como instrumento que o

ajude a compreender o mundo que vive.

É importante considerar o ensino como um processo de construção de

conhecimentos onde o aluno seja um sujeito ativo. Portanto, é preciso dar ênfase para

atividades de ensino que permitam a construção de conhecimentos a partir da interação

do aluno com os objetos de conhecimento, potencializando oportunidades de um

trabalho que possibilite um envolvimento real dos alunos com as atividades de ensino.

A construção do conhecimento geográfico pelo aluno ocorre na escola, mas

também fora dela. Para trabalhar a paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado, o

professor deverá realizar o procedimento de leitura da paisagem. Para que seja feita a

leitura da paisagem dessa Praça, podem ser utilizadas observações indiretas e diretas. Nas

observações indiretas podem ser utilizadas representações da sua paisagem, através da

observação de fotografias antigas e recentes, para que os alunos possam perceber as

transformações que essa paisagem já sofreu, observando o que mudou e porque mudou

com o passar do tempo.

Também podem ser utilizados prospectos antigos da cidade de Goiás que mostram

como era ocupado o espaço urbano da cidade antigamente, para que os alunos possam

estabelecer comparações de como a Praça foi sendo povoada com o passar dos anos e de

que forma esse povoamento influenciou na mudança de sua paisagem.

Na observação direta, o professor poderá propor uma aula de campo na Praça Dr.

Brasil Ramos Caiado, para observar sua paisagem e analisá-la. O aluno deverá perceber a

paisagem de uma forma dinâmica, como algo que está em constante modificação, numa

perspectiva histórica, em que num mesmo espaço se encontram marcas e testemunhos

que registram diferentes tempos. Seria interessante que o trajeto da escola até o local

fosse feito a pé pelas ruas que fazem parte do Centro Histórico, para que os alunos

percebessem as diferentes paisagens urbanas presentes em uma mesma cidade. Além

disso, poderiam identificar os elementos constituidores dessa parte da cidade, as

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edificações, os aspectos arquitetônicos e urbanísticos, os diferentes espaços do cotidiano,

entre outros.

Ao chegar à Praça o professor pode pedir aos alunos que observem e registrem de

forma escrita e através de registros fotográficos o que mais chamou atenção na paisagem

dessa Praça, percebendo quais as características das casas, prédios e monumentos que

compõem essa paisagem; como são as ruas que dão acesso a essa Praça; quais são os

monumentos históricos que estão inseridos nessa paisagem, entre outros.

Também seria importante que os alunos visitassem os monumentos históricos os

quais fazem parte dessa Praça e constituem sua paisagem cultural, para assim, os alunos

conhecerem a história desses monumentos e reconhecerem a sua importância histórica,

lembrando que é a partir do momento que se conhece algo, que pode ser despertado o

sentimento de valorização e consequentemente o de preservação. Seria interessante o

contato direto dos alunos com os bens patrimoniais locais dentro de um processo criativo

de reconhecimento e reinterpretação desses bens. As informações sobre os imóveis, os

acervos, bem como o significado desse patrimônio seriam de grande relevância nesse

processo.

Em seguida, o professor pode propor aos alunos que produzam textos falando

sobre o que foi observado, suas descobertas, não só no que diz respeito à paisagem da

Praça, mas daquilo que foi constatado ao longo do trajeto, e dar sugestões de como

preservar a Praça Dr. Brasil Ramos Caiado. O professor também pode solicitar aos alunos

que elaborem painéis através de desenhos e fotos que foram obtidas no trabalho de

campo. Esses painéis irão ajudar a despertar a criatividade dos alunos e tornar a aula mais

dinâmica. Além disso, poderá ser organizada uma exposição dos trabalhos desenvolvidos

pelos alunos para mostrar para alunos de outras séries o quanto é rica a paisagem da

Praça Dr. Brasil Ramos Caiado, que constitui parte do patrimônio histórico e cultural da

cidade de Goiás.

Demo (2002, p. 6,7) destaca:

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A base da educação escolar é a pesquisa [...] Tendo se tornado cada vez mais evidente a proximidade entre conhecer e intervir, porque conhecer é a forma mais competente de intervir, a pesquisa incorpora necessariamente a prática ao lado da teoria, assumindo marca política do inicio até o fim. A marca política não aparece apenas na presença inevitável da ideologia, mas, sobretudo, no processo de formação do sujeito crítico e criativo, que encontra no conhecimento a arma mais potente de inovação, para fazer e se fazer oportunidade histórica através dele. Nesse sentido, a cidadania que se elabora na escola não é por sua vez, qualquer uma. Pois é especificamente aquela que sabe fundar-se em conhecimento, primeiro para educar o conhecimento, e segundo, para estabelecer com competência inequívoca uma sociedade ética, mais equitativa e solidária.

Levando em consideração a importância que a pesquisa tem para o ensino, o

professor pode pedir aos alunos que realizem pesquisas em diferentes fontes, como por

exemplo, prospecto de como a cidade era antigamente; obras literárias que mencionem

algo sobre o tema de estudo; entrevistas com moradores e frequentadores da Praça Dr.

Brasil Ramos Caiado, para que através de relatos os estudantes possam obter dados

importantes que não estão registrados de forma escrita, mas apenas na memória de

quem os tem, como por exemplo, como era o cotidiano dessa praça em épocas passadas;

reportagens em jornais recentes e antigos, que tragam alguma informação sobre a Praça,

entre outros.

Cavalcanti (2002) salienta que, entre os conteúdos procedimentais da Geografia

Escolar, que dizem respeito àqueles temas trabalhados nas aulas com o intuito de

desenvolver habilidades e capacidades para se operar com o espaço geográfico, cabe

destacar a cartografia. De acordo com ela os alunos podem construir mapas e

representações de realidades que foram estudadas, através de esquemas já adquiridos,

como nos mapas mentais. Nesse sentido, Simielli (apud Cavalcanti 2002, p. 39):

Traz uma proposta para a cartografia no ensino fundamental e médio, em que destaca como objetivo fundamental ajudar o aluno a tornar-se um leitor crítico e um mapeador consciente, por meio de trabalho com o produto cartográfico já pronto, indo da alfabetização cartográfica à leitura crítica, em que se trabalha com um conjunto de correlações e por meio de sua participação efetiva na confecção de maquetes, croquis e elaboração de mapas mentais.

Para trabalhar a cartografia nas aulas de Geografia, abordando a paisagem da

Praça Dr. Brasil Ramos Caiado, o professor poderia ainda, propor aos alunos que

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mapeassem o percurso que realizaram da escola até a Praça, além de confeccionar

maquetes representando a paisagem da Praça em algum momento da sua história.

Se o trabalho com base nessas e outras propostas for bem realizado, os alunos

poderão compreender com mais facilidade o conceito paisagem, que para alguns é tão

complexo. Isso será possível, porque será trabalhado com algo que faz parte da realidade

deles, seja enquanto moradores ou frequentadores. Será possível identificar a importância

histórica e cultural que essa Praça tem, não só para os moradores dessa cidade, mas para

todos aqueles que conheceram sua paisagem e se encantaram com ela. A partir do

momento que isso acontecer, será despertado um sentimento de pertencimento e

consequentemente de valorização.

Conclusão

A Praça Dr. Brasil Ramos Caiado, também conhecida como Largo ou Praça do

Chafariz, surgiu por decreto do Governador Luiz de Mascarenhas, em 1739, com o

objetivo de ser o principal logradouro da Vila Boa, inclusive comportando o pelourinho.

Com o decorrer dos anos passou por várias modificações e também recebeu vários

nomes. Constituem a paisagem dessa Praça, vários monumentos históricos, como o

Chafariz de Cauda, o Museu das Bandeiras, o Quartel do XX, o Colégio Sant’Ana, além de

residências que advém do período colonial. É importante também destacar a bela

paisagem natural que a Praça tem, lembrada por muitos, pela existência de oitizeiros

centenários. Tudo isso, faz com que a Praça tenha valor histórico e cultural.

Um dos meios para que haja a preservação é desenvolver a consciência dos

moradores da cidade de Goiás sobre o valoroso patrimônio histórico e cultural que a

cidade tem e está representado na sua paisagem. A valorização depende

necessariamente, do conhecimento, do pertencimento das pessoas ao patrimônio que é

delas. Por esse motivo, foram feitas considerações sobre Educação Patrimonial e

apresentadas sugestões de como a paisagem dessa Praça pode ser trabalhada no ensino

de Geografia, para que os alunos de nossa cidade possam ter contato direto com tudo que

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constitui o Patrimônio e possam sentir orgulho de serem vilaboenses. A Educação

Patrimonial é de suma importância para que os Vilaboenses (re)conheçam, participem e

preservem o patrimônio local que é de todos.

Portanto, longe de qualquer análise conclusiva, esta pesquisa é apenas um ponto

de partida para trabalhar a paisagem da Praça Dr. Brasil Ramos Caiado e a mesma abre

possibilidades para o desenvolvimento de outros trabalhos que ajudarão a despertar nos

moradores o sentimento de valorização do Patrimônio da cidade de Goiás.

Referências:

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/geografia.pdf>. Acesso em: 18 de setembro de 2010.

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Avaliação do Ensino-aprendizagem por Meio do Material Concreto Geoplano: um estudo de caso

com alunos do 6º do Ensino Fundamental

Adriana Itala Magri42

Resumo: O ensino-aprendizagem de geometria é um assunto que está sendo tratado há

anos, pois envolve conceitos dos quais os alunos têm muitas dificuldades. Na tentativa de

tornar o ensino-aprendizagem de geometria uma tarefa mais simples, tanto para os

alunos como para os professores, diversas atividades com materiais concretos têm sido

propostas. Dentre esses materiais concretos, existem vários estudos que propõem

atividades ou avaliam a aprendizagem a partir do geoplano. A posposta deste estudo foi

verificar se os alunos de 6º ano, de uma escola pública de uma cidade do interior de São

Paulo, saberiam calcular o perímetro e área de figuras planas por meio do Geoplano. Os

resultados indicaram que os alunos não conseguiriam relacionar as figuras observadas no

material concreto com a forma de se calcular seu perímetro e área.

Palavras-chave: Ensino-aprendizagem de geometria. Material concreto. Geoplano. Perímetro e área de figuras planas.

Introdução:

Nas últimas décadas, o ensino da geometria no ensino fundamental tem sido

deixado de lado, seja pelas dificuldades que os alunos encontram para entender seus

conceitos e abstrair as figuras, seja por não entenderem os conceitos e as propriedades

que compõe o conteúdo de geometria. Segundo Grando, Nacarato e Gonçalves. (2008), é

urgente a necessidade de discutir as atuais tendências didáticas e pedagógicas para o

ensino de geometria, de tal forma, que este ensino seja mais eficaz. Ainda segundo os

autores, apesar da existência de muitas pesquisas e discussões teóricas sobre este tema,

os conteúdos associados à geometria ainda são deficientes ou mesmo ausentes na

maioria das salas de aula.

42 Adriana Itala Magri é graduanda do terceiro ano do Curso de Matemática da Faculdade de Administração e Artes de Limeira - FAAL, da cidade de Limeira

Professora indicadora do artigo Maria Célia de Oliveira Papa, curso de Licenciatura em Matemática da Faculdade de Administração e Artes de Limeira – FAAL, da cidade de Limeira.

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Os primeiros estudos sobre Geometria Plana foram verificados na Grécia Antiga e

datados de 360 a.C. a 295 a.C. Nesta época, esses estudos eram também denominados de

Geometria Euclidiana em homenagem a Euclides de Alexandria, que foi um grande

matemático educado na cidade de Atenas e frequentador da escola fundamentada nos

princípios de Platão (NOÉ, 2010).

De acordo com Lorenzatto (1995) e Lamonato e Passos (2007), verifica-se, em

muitos casos, que a geometria é ensinada como um tópico específico da matemática,

desta forma, não permite estabelecer relações com os demais conteúdos. Essa forma de

ensino prejudica o desenvolvimento do raciocínio dos alunos.

Segundo Grando et al. (2008), o ensino da geometria até a década de 60 estava

pautado no Formalismo, porém, quando o Movimento da Matemática Moderna se

acentuou, a geometria tornou-se um conteúdo com menos destaque, ficando em segundo

plano tanto no currículo escolar como nos livros didáticos.

Este fato resultou no panorama do ensino de geometria que perdura até os

tempos atuais, em que a geometria é pouco trabalhada tanto no ensino fundamental

como no ensino médio. Apesar de o ensino de geometria ocorrer, ele não supre as

necessidades dos alunos, pois ocorre de forma precária e ineficiente. Um dos problemas

do ensino de geometria pode ser atribuído ao fato de que, na maioria das vezes, as aulas

de geometria são expositivas, baseadas somente na utilização de fórmulas e teoremas.

Esse tipo de aula mecanizada, em que os alunos são instruídos a seguir um modelo para a

resolução dos exercícios, é o que impede que ele seja capaz de construir uma

aprendizagem significativa.

De acordo com Lamonato e Passos (2007) pesquisas mostram as potencialidades

decorrentes de realizar trabalhos, com tarefas exploratórias e investigativas, porém, é

importante que este tipo de trabalho seja desenvolvido de forma planejada. As atividades

devem ser bastante elaboradas, caso contrário, esta forma de se trabalhar não terá

resultados satisfatórios e o tempo despendido, tanto do professor como dos alunos, será

desperdiçado.

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Já na década de 70, Freudenthal (1973) afirmou que a geometria deve estar

essencialmente relacionada com a compreensão do espaço que o aluno tem, para que ele

possa relacionar, conquistar e explorar este espaço enquanto assimila os conceitos de

geometria. A fala desse autor é pertinente desde aquela década, pois está estritamente

relacionada com a possibilidade dos alunos conseguirem conectar a geometria com seu

dia a dia, o que facilitaria, por exemplo, a compreensão do aluno sobre figuras, sólidos e

desenhos geométricos. Neste sentido, levanta-se também a problemática de que a

geometria deve ser ensinada a partir de exemplos do cotidiano dos próprios alunos, o que

facilitaria sua compreensão.

Segundo Abrantes (1999) existe uma estreita ligação da geometria com tarefas

exploratórias investigativas que, intuitivamente, permitem aos alunos visualizarem e

manipularem materiais concretos. Isso permite, dentre outras coisas, descobertas e

resoluções de problemas, que podem ocorrer desde os primeiros níveis de escolaridade.

Para Fiorentini (2006), as aulas exploratórias investigativas, que mobilizam e

desencadeiam em sala de aula, tarefas e atividades abertas, exploratórias e não diretivas

do pensamento do aluno, apresentam múltiplas possibilidades de alternativa de

tratamento e significação. Estas aulas podem, após a exploração e problematização,

desencadear investigações matemáticas devido à elaboração de questões, conjecturas e

pela busca de confirmações ou refutações.

Quando se trabalha com um material de manipulação ou desenvolve-se uma

atividade diferenciada, dá-se ao aluno a oportunidade de agir e de refletir sobre suas

ações. Podendo reviver, em pensamento, o que acabou de desenvolver, antecipando o

que poderia vir a acontecer e procurando prever resultados (BERDINNEAU et al., 2001).

Segundo Serrazina e Matos (1988), a formação de conceitos é a essência da

aprendizagem da matemática e ela deve ser baseada na experiência. O geoplano é um

material que pode oferecer excelentes oportunidades no aprendizado da geometria e das

medidas por meio de experiências.

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Desta forma e a partir dos autores apresentados neste estudo, observa-se que a

geometria, apesar de ser um conteúdo de grande importância, tem-se a impressão de que

ela não está sendo trabalhada de forma completa e adequada com os alunos. Diversos

estudos, como por exemplo, Marques, Barbosa, Borbadilha e Tauber.(2007), Tiggemann,

Borbadilha, Marques, Cabrera e Barbosa (2006), Pires, Gomes e Koch .(2006), Grando,

Nacarato e Gonçalves (2008), entre outros, apresentam sobre a utilização de materiais

concretos no auxílio do ensino aprendizagem de geometria e afirmam que esta

metodologia é importante e traz benefícios tanto para os alunos quanto para o professor.

A partir destes estudos e considerando o crescente número de trabalhos que propõe

utilizar materiais concretos em sala de aula, particularmente no ensino de geometria, o

objetivo deste estudo é verificar se alunos do ensino fundamental têm familiaridade com

o cálculo de perímetro e área de figuras planas mais comuns usando o material concreto

geoplano.

Desse modo, o artigo discute temas ligados à Geometria Plana, Geoplano e ensino-

aprendizagem a partir de materiais concretos; descreve o desenvolvimento do estudo e

apresenta o resultado das discussões.

O Ensino-aprendizagem a Partir de Materiais Concretos e a Importância do Geoplano.

A principal motivação deste estudo é verificar se os alunos conseguem reconhecer

e entender conceitos básicos de geometria plana, como perímetro e área, a partir de

materiais concretos. Em sala de aula, é comum observarmos, que muitos alunos

demonstram pouco ou nenhum conhecimento sobre conceitos geométricos elementares.

Em muitos casos, apesar deles conhecerem as definições e enunciados dos teoremas, eles

não conseguem aplicá-los na resolução de problemas, isso porque, o aluno não consegue

relacionar os elementos concretos do problema às questões teóricas do teorema,

impossibilitando-o de construir qualquer relação entre ambos.

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Segundo Pavanello (1989), a geometria é praticamente excluída do currículo

escolar ou passa a ser, em alguns casos restritos, desenvolvida de uma forma muito

formal, este problema se agrava quando aliado a grande dificuldade de percepção espacial

que a maioria dos alunos possui. Esse problema não é verificado somente no ensino

fundamental ou médio, mas também nos cursos superiores de matemática, no qual, os

alunos apresentam muita dificuldade em compreender os processos de demonstração ou

mesmo de utilizar qualquer tipo de representação geométrica para a visualização de

conceitos matemáticos.

A utilização de materiais diferenciados como materiais concretos, softwares, entre

outros, destina-se a auxiliar no processo de ensino-aprendizagem de geometria. O

geoplano é um material didático-pedagógico dinâmico e manipulativo, o mesmo contribui

para explorar problemas geométricos e algébricos, possibilitando a aferição de

conjecturas e podendo registrar o trabalho em papel ou reproduzi-lo em papel

quadriculado (MACHADO, 2010).

Dentre as habilidades que podem ser desenvolvidas com o uso do geoplano,

destacam-se as habilidades espaciais, relações, simetria, reflexão, rotação, perímetro,

área, translação dentre outros. Além disso, sua utilização auxilia no desenvolvimento de

representações mentais e da abstração, que facilitam o entendimento de alguns conceitos

geométricos.

Desta forma, o desenvolvimento deste estudo, deu-se a partir de duas aulas de

matemática, na qual os alunos conheceram e manipularam o Geoplano. Para garantir que

todos os alunos tivessem acesso às mesmas informações sobre o material e às mesmas

condições de utilização, as aulas foram aplicadas pelo mesmo professor, que usou o

mesmo geoplano e as mesmas atividades em todas as séries que seriam avaliadas. O

próximo Capítulo descreve a atividade aplicada, o método usado para sua aplicação e a

forma de avaliar os resultados.

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Desenvolvimento da Proposta

A atividade proposta neste estudo foi aplicada aos alunos do 6º ano do Ensino

Fundamental de uma escola estadual, situada em uma cidade no interior de São Paulo.

Esta escola conta com duas turmas deste ano, dessa forma, as atividades foram propostas

para ambas as turmas.

A atividade foi aplicada em quatro horas aula. Nas duas primeiras aulas, geoplano

foi apresentado a todos os alunos de ambas as turmas. Nessa apresentação, foram

apresentados os conceitos e aplicações do geoplano. Após a explicação, os alunos foram

agrupados em equipes de 5 ou 6 membros para explorar e entender o geoplano. Nessa

atividade, os alunos tiveram total liberdade para explorar o geoplano e construir formas

geométricas diversas, com o auxílio de pequenos elásticos, como, triângulo quadrado,

retângulo, paralelogramo, trapézio e losango, que foram construídos no geoplano.

Após a construção de todas as figuras no geoplano, os alunos desenharam as

mesmas figuras em papel quadriculado. A partir desses desenhos, os alunos calcularam o

perímetro e a área de cada figura, cujos conceitos teóricos eles estudam e aplicam desde

os anos anteriores.

Apesar da exploração do geoplano ter sido realizada em grupos, os desenhos e os

cálculos do perímetro e área foram realizados individualmente. Além disso, todo o

trabalho foi conduzido pela autora deste estudo, assim, o professor de matemática das

turmas, apenas cedeu as aulas, e observou o desenvolvimento, sem se envolver na

atividade.

Para análise dos resultados, atribuiu-se o valor máximo de 1,67 pontos para cada

figura. Assim, para o caso em que o aluno acertou o resultado e a lógica para o cálculo do

perímetro ou da área, ele teve 1,67 pontos para a respectiva figura. A nota total

corresponde à soma de todas as notas de cada figura do perímetro e área. Como

resultado, tem-se uma análise descritiva dos dados, com gráficos boxplot para análise da

mediana e variabilidade das notas dos alunos, para a área e perímetro de cada uma das

figuras, além da nota geral, que corresponde à soma da nota de todas as figuras, para

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cada aluno. Para verificar se houve diferença estatisticamente significativa entre as notas

médias dos alunos das duas turmas, aplicou-se um método não paramétrico para

comparação de médias. Também foi possível verificar se existe relação entre a

aprendizagem dos conceitos de perímetro e área, ou seja, se o aluno que sabe calcular o

perímetro também sabe calcular a área.

Resultados e Discussões

A Figura 1 permite avaliar a mediana e a dispersão das notas dos alunos para o

cálculo do perímetro, de cada uma das figuras, além da nota total, que representa a soma

das notas obtidas por cada aluno, para cada uma das figuras.

Figura 1: Boxplot para as notas do perímetro para cada figura e para a nota total.

Observa-se na Figura 1 que a nota mediana para o cálculo do perímetro do

quadrado, retângulo e paralelogramo é aproximadamente 0,8 que corresponde à nota

máxima atribuída. Já para o trapézio, triângulo e losango, a nota mediana foi zero. Deste

resultado pode-se dizer que, para as figuras, cujo perímetro é dado por quadrados na

malha do geoplano (vide Anexo A), os alunos conseguiram notas maiores, já para os

perímetros, cujo cálculo envolveu a soma de triângulos, os alunos tiveram mais

dificuldades, pois as notas foram menores. A nota mediana total dos alunos foi de

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aproximadamente 3,2 pontos num total de 10 pontos. A distribuição dos dados é

assimétrica à direita, pois os valores estão mais concentrados entre aproximadamente 1,5

pontos e 3 pontos. Outra observação importante é que a nota máxima foi de

aproximadamente 5 pontos, ou seja, metade do valor máximo atribuído para a atividade.

Como resultado geral, observa-se que a maioria dos alunos não conseguiu calcular o

perímetro das figuras, a partir do geoplano.

Figura 2: Boxplot para as notas da área para cada figura e para a nota total.

As notas observadas para o cálculo da área das figuras é similar aos resultados

observados para as notas do cálculo do perímetro das mesmas figuras. A nota mediana

para o quadrado, retângulo, triângulo e paralelogramo foi de aproximadamente 0,8

pontos de 1,67. Já para o trapézio e losango, a nota mediana foi zero. A nota mediana

geral foi de aproximadamente 3,2 pontos de 10 pontos.

Para verificar se existe diferença estatisticamente significativa entre as notas

obtidas para cada figura, usou-se o teste Kruskal-Wallis que avalia a variabilidade entre os

dados, a partir da mediana. Os resultados são observados na Tabela 1

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Tabela 1: Resultado do Teste de Kruskal-Wallis para as notas

Variáveis P-valor

Área 0,001969

Perímetro 0,001220

Nota Total (área e perímetro) 0,01893

Os resultados da Tabela 1 mostram que as notas dos alunos para o cálculo da área

e do perímetro são diferentes para cada uma das figuras, isso porque, o p-valor para cada

uma das variáveis é menor que o nível de significância de 0,05 do teste. O mesmo

resultado é observado para a nota total dos alunos, que não foi significativa ao nível de

5%, indicando que existe diferença significativa entre as notas observadas para os alunos.

Para finalizar, a Tabela 2 apresenta o resultado do teste de correlação entre as

notas do cálculo do perímetro e área para cada figura e para a nota total.

Tabela2: Resultado do Teste de Correlação

Para interpretar os resultados da Tabela 2, os valores dos coeficientes entre 1 e 0,7

(positivo ou negativo) indica forte correlação entre as variáveis, para valores entre 0,7 e

0,3 (positivo e negativo) indica correlação moderada e valores entre 0,3 e 0 (positivo e

negativo) indica fraca correlação. Desta forma, os resultados da Tabela 2indicam que

existe correlação moderada entre todas as notas obtidas pelos alunos para o cálculo do

Variáveis Coeficiente de Correlação

Quadrado 0,4166

Retângulo 0,5120

Trapézio 0,3896

Triângulo 0,3032

Paralelogramo 0,5006

Losango 0,3157

Nota Total (perímetro vs área) 0,5483

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perímetro e da área, para todas as figuras avaliadas. Além disso, a nota total obtida no

cálculo da área possui correlação moderada com as notas obtidas pelos alunos no cálculo

do perímetro. Do ponto de vista prático, pode-se dizer que as notas que os alunos

obtiveram para o cálculo do perímetro estão relacionadas com as suas notas para o

cálculo da área.

Considerações Finais

Para avaliar o ensino aprendizagem dos alunos do 6º ano do ensino fundamental

de uma escola do interior de São Paulo, aplicou-se uma atividade na qual deveriam ser

calculados o perímetro e a área de algumas figuras planas convencionais, como por

exemplo, o quadrado. Os resultados indicaram que os alunos, de forma geral, obtiveram

notas baixas, indicando que os mesmos não conseguiram realizar as atividades, a partir do

material concreto geoplano.

Desse modo, observa-se que mesmo com todo discurso sobre a importância de

utilizar materiais concretos para o ensino de matemática, este estudo, deu indícios de

que, mesmo o material sendo apresentado e manipulado pelos alunos antes da realização

da atividade, eles não conseguiram bons resultados. Assim, pode-se dizer dos resultados

deste estudo que os alunos não conseguiram perceber as figuras no material concreto e

conectar os conceitos teóricos com a atividade, ou então, eles não conseguiram observar

as figuras a partir do geoplano.

Observou-se ainda que o aluno que não sabia calcular o perímetro da figura,

também não soube calcular a área. Sendo assim, este estudo deu indícios da dificuldade

que os alunos possuem diante da utilização de materiais concretos. Porém, a amostra

estudada neste trabalho não pode ser generalizada, pois representa uma pequena parcela

dos alunos de 6º ano de uma cidade, mas serve de base para uma pesquisa mais ampla,

que poderá considerar várias cidades, inclusive avaliar o ensino aprendizagem dos alunos

de escolas da periferia e central.

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Referências:

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GRANDO, R; NACARATO, A; GONCALVES, L, Compartilhando Saberes em Geometria: investigando e aprendendo com nossos alunos, Cadernos do CEDES UNICAMP, v. 28, p. 39-56, 2008

LAMONATO, M; PASSOS, C. Tarefas Exploratório-investigativas de Geometria na Formação Contínua do Professor da Educação Infantil, In: VIII Encontro de Pesquisa em Educação da Região Sudeste, Vitória, p. 01-07, 2007.

LIMA, C; NACARATO, A. A investigação da Própria Prática: mobilização e apropriação de saberes profissionais em Matemática. Educ. rev. [online], v.25, n.2, pp. 241-265, 2009.

MACHADO, R. Explorando o Geoplano. Minicurso. Disponível em: http://www.bien.asbm.ufba.br/M11pdf , Acesso em: 21-10-10.

MARQUES, M; BARBOSA, R; BOBADILHA, K; et al. Segmentos e Cordas: atividades propostas para geoplano triangular isométrico, para geoplano circular ou para redes de pontos impressas em papel. In: IX Encontro Nacional de Educação Matemática- ENEM, Belo Horizonte, 2007.

NOÉ, M. Disponível em ,http://www.brasilescola.com/matematica/geometria-plana.htm Acessado em 10/11/2010.

PAVANELLO, R. M. O Abandono do Ensino da Geometria: uma visão histórica, Dissertação, Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1989.

PIRES, M; GOMES, M; KOCH, N. Prática Educativa do Pensamento Matemático, 2ed. Curitiba: IESDE, Disponível em http://www.portalava.com.br/ava/includes/cursos_atualizacao2/pratica_educativa_do_pensamento_matematico/pratica_educativa_do_pensamento_matematico_capitulo1.pdf, 2006, 2ª ed. Acesso em 15-10-10.

TIGGEMANN, I; BOBADILHA, K; MARQUES, et al., Jogos com uso do Geoplano: uma discussão sobre a possibilidade e conveniência de adaptações”, In: IX Encontro Gaucho de Educação Matemática, Caxias do Sul, 2006.

Anexo

A Figura 3 apresenta um exemplo com figuras planas que foram sugeridas na

atividade deste estudo para serem construídas no geoplano e posteriormente no papel

quadriculado.

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Figura 3: Exemplos de figuras planas construídas na malha quadriculada do geoplano

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Traçando Novos Caminhos Para a Formação Docente: A União Entre a Universidade e a Escola. Subprojeto PIBID/UNISINOS Ciências Biológicas. João Alberto Leão Braccini43 Mariane Cenira Padilha Brizolla44

Resumo: A formação inicial de professores enfrenta grandes dificuldades atualmente, pois

há falta de conectividade entre teoria e prática. Poucos são os momentos em que os

licenciandos se inserem na realidade escolar. Buscando melhorias na formação inicial dos

professores e na formação continuada dos profissionais que exercem o magistério, foi

lançado o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID pela

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES. Neste texto,

serão apresentadas narrativas de experiências de dois bolsistas do Subprojeto Ciências

Biológicas do PIBID UNISINOS – Universidade e Escola na Qualificação da Docência na

Educação Básica. Objetiva-se evidenciar a importância do projeto, uma vez que colabora

para a melhoria da aprendizagem dos licenciandos. Após seis meses de bolsa, conclui-se

que a vivência da realidade da escola torna mais fácil o entendimento da importância da

teoria recebida nas atividades acadêmicas cursadas na universidade. Por sua vez, a escola

também se beneficia com a presença do acadêmico, pois ele traz o conhecimento

científico, fazendo a ponte entre a escola básica e a universidade. Consequentemente,

estes saberes não ficam apenas dentro da escola, os alunos divulgam para a comunidade,

que aos poucos, também se apropria dos conhecimentos.

Palavras-chave: Formação inicial. Formação continuada. Ensino por projetos. Narrativas. Escola básica.

Introdução

O processo de formação de professores atualmente enfrenta dificuldades, pois a

falta de conectividade entre teoria e prática é muito grande, poucos são os momentos em

que os licenciandos se inserem na realidade escolar. Segundo Perrenoud (2002), as

43 João Alberto Leão Braccini é graduando do 6º semestre do curso de Ciências Biológicas da Universidade

do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS da cidade de São Leopoldo, Rio Grande do Sul. Bolsista de Iniciação à Docência – PIBID/CAPES. 44 Mariane Cenira Padilha Brizolla é graduanda do 5º semestre do curso de Ciências Biológicas da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS da cidade de São Leopoldo, Rio Grande do Sul. Bolsista de Iniciação à Docência – PIBID/CAPES. Professora Indicadora: Cristiane Fensterseifer Brodbeck, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS; Curso de Ciências Biológicas.

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atividades práticas exercidas durante a formação dos professores são inferiores à sua

formação conteudista. Não basta apenas saber o conteúdo, é necessário haver articulação

com a prática, mas vale ressaltar que a prática não deve ser apenas mecânica, e sim

reflexiva,

A ação reflexiva é um importante componente na construção do conhecimento

no processo de formação de professores, possibilita a eles verificarem as

dificuldades que enfrentam ao se inserir no mercado de trabalho, de modo a

encontrar alternativas que contribuam para minimizar os desconfortos

provenientes desta nova experiência (ARAUJO, 2010, p. 1).

As ações reflexivas são fundamentais também na formação inicial docente, pois o

licenciando que já realiza as suas práticas na escola passa a atuar como investigador das

ações que desenvolve. Na maioria dos cursos de licenciatura, os acadêmicos primeiro têm

toda a teoria sobre a docência ficando a prática, o “chão” da escola, para o final do curso.

Visando amenizar estas dificuldades, o Ministério da Educação (MEC), em parceria

com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES,

desenvolveu o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID, que iniciou

seu projeto nas Universidades públicas em 2009, estendendo seu trabalho às

Universidades Particulares em 2010. O PIBID tem como foco a valorização do magistério e

a melhoria da qualidade da educação, promovendo a integração da universidade com a

comunidade.

Entende-se que o PIBID, através desta articulação, busca tornar os novos docentes

mais reflexivos em suas práticas pedagógicas, se tornando profissionais realmente

preocupados com a educação. Inserir-se na realidade escolar é vivenciar todo o seu

mundo e entender tudo que está por trás dele e com isso construir aprendizagens.

“Despir-se de concepções prévias sobre o professor/a, a escola, os alunos/as é nos

desarmarmos para aprendermos aspectos da realidade que não conseguiremos ver, pois

não constituem nossos desejos” (AMORIM, 2000, p. 140).

Na Universidade do Vale do Rio dos Sinos, o projeto PIBID UNISINOS –

Universidade e Escola na Qualificação da Docência na Educação Básica teve início em

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agosto de 2010. A universidade foi contemplada com 100 bolsas para alunos dos cursos

das seguintes licenciaturas: Ciências Biológicas, Física, Letras, Matemática e Pedagogia. Os

alunos bolsistas são orientados por cinco professores coordenadores da universidade,

cada um da sua respectiva área, e por vinte professores bolsistas supervisores que atuam

nas escolas públicas. Os acadêmicos realizam uma carga horária mínima de trinta horas

mensais, em quatorze escolas públicas, municipais e estaduais dos municípios de São

Leopoldo e Novo Hamburgo (município vizinho à São Leopoldo, sede da universidade).

Neste texto, serão apresentadas narrativas de experiências de dois bolsistas do

Subprojeto Ciências Biológicas do PIBID UNISINOS, em uma escola da rede municipal de

ensino, de São Leopoldo, RS. O Subprojeto Ciências Biológicas é coordenado na

universidade pela professora Cristiane Fensterseifer Brodbeck e na escola tem a

supervisão da professora bolsista Vitória Regina Casagrande Viel.

Atividades Realizadas Pelo Subprojeto Ciências Biológicas na Escola Municipal de Ensino Fundamental Professor Emílio Meyer

Durante os seis meses de atividades do subprojeto Ciências Biológicas, foram

realizadas diferentes atividades. Primeiramente, foi proposta a realização do diagnóstico

da escola, no qual teria que ser observada toda a escola, no período de 14 de agosto a 14

de outubro de 2010. Essa construção foi feita, sendo analisado o espaço físico, o setor

administrativo da escola, setor técnico-pedagógico, o ensino de ciências, as aulas das

professoras de ciências e os alunos. Os critérios de análise foram pré-estabelecidos pela

coordenação do Subprojeto Ciências Biológicas. O diagnóstico, em um primeiro momento,

foi realizado apenas pelos bolsistas, após pela professora supervisora e, por fim, pela

coordenação do Subprojeto. A partir da conclusão do diagnóstico, com seus pontos

positivos e negativos, foi estruturado um Plano de Ação. Os planos foram diferentes para

cada escola onde ocorre o PIBID. Nelas foram construídos projetos que unem a teoria à

prática de ciências, integrados com o contexto no qual a escola está inserida e de acordo

com as suas necessidades.

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No Plano de Ação, levaram-se em consideração as atividades práticas no ensino de

ciências, a participação da comunidade e a apropriação das atividades desenvolvidas na

escola, a existência de uma sala exclusiva para experimentos de ciências, e de atividades

diferenciadas às séries finais do ensino fundamental. Uma vez que é preciso, além dos

conteúdos escolares,

Desenvolver nos estudantes as habilidades práticas e intelectuais necessárias à

compreensão das ciências biológicas; apresentar aos alunos o conhecimento

biológico através da investigação de seres vivos e do estudo do trabalho dos

cientistas (neste processo, os estudantes consideram o trabalho de investigação

e as implicações da biologia para a sociedade); desenvolver nos jovens a

capacidade para empreender estudo independente e sobretudo dar a eles os

meios para fazerem uma avaliação crítica dos dados e dos fatos, em lugar de

simplesmente os memorizar. (Nuffield 1966, p. 9-10)

Nos relatos, foram fundamentais as observações impressas em “cadernos de

campo”, sendo estas ferramentas essenciais para a construção de um trabalho sólido e de

qualidade. É sabido que as memórias escolares, para os futuros docentes, os constroem

como profissionais, uma vez que a profissão professor se aprende dentro da escola. “O

memorial da vida escolar é um registro. Registro de caderno. Registro em papel, com

lápis, caneta. Registro que desenha a escola” (AMORIM, 2000, 137).

A escolha do desenvolvimento de projetos na escola surgiu como uma forma de

contato com os alunos sem assumir a regência das turmas, pois o PIBID não é estágio, mas

sim uma Bolsa de Iniciação à Docência. Segundo Barcelos (2001), o ensino por projetos

exige uma visão diferenciada da escola e dos alunos, tendo a necessidade de se planejar,

aplicar e avaliar as atividades. Todos esses passos são separados em momentos

diferentes: primeiro, a percepção de problemáticas, sendo possível através do diagnóstico

da escola; o segundo, o planejamento dos projetos, onde é negociado com a escola: datas,

turmas envolvidas, etc.; o terceiro, a aplicação e avaliação.

Após a aplicação dos projetos, são elaborados relatórios de desenvolvimento, a

partir dos “cadernos de campo”. Os relatórios são entregues à coordenação do PIBID na

UNISINOS. A avaliação parte do pressuposto da relevância da atividade para a

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aprendizagem dos alunos. Ela é realizada por todos os que participaram da atividade,

como: bolsistas, professora supervisora e alunos da escola.

Seguem os principais projetos iniciados, as experiências e alguns resultados que

puderam ser percebidos após a implementação dos mesmos:

Mostra Multidisciplinar

A ideia deste projeto teve início em uma das primeiras reuniões com a direção da

escola, quando os bolsistas questionaram quais as atividades extracurriculares que a

escola desenvolvia. Para surpresa deles, a escola, há muito tempo, não proporcionava aos

alunos momentos em que pudessem buscar novos conhecimentos além dos

proporcionados pelos professores em sala de aula. Também não havia nenhuma atividade

que mostrasse o trabalho realizado pela escola para a comunidade escolar.

Pensando nessa problemática, foi decidido implantar uma Feira de Ciências. Os

bolsistas fizeram todo o projeto, falaram com os docentes da disciplina e todos

concordaram. Porém, com o passar do tempo, os professores não deram mais força ao

projeto e ficou claro que apenas os bolsistas não conseguiriam validá-lo. Então eles

mudaram o foco do trabalho e o ampliaram, deixando-o com uma nova estrutura. Foi

decidido que trabalhariam com a multidisciplinaridade para deixar os alunos livres para a

escolha dos temas, não focando apenas em assuntos que envolvessem ciências e para que

os bolsistas tivessem maior apoio do corpo docente.

Infelizmente, esta atividade não pôde ser efetivada. A direção da escola alegou não

haver tempo suficiente para a sua realização e havia poucos trabalhos para serem

apresentados. Acredita-se que por não “valer nota” não tenha havido interesse dos alunos

em participar da feira. Talvez, a própria desmotivação dos professores tenha contagiado

os alunos.

Neste ano de 2011, os bolsistas pretendem, efetivamente, realizar esta atividade,

pois:

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Feira de Ciências é uma forma de a escola criar oportunidades para os alunos

integrarem conteúdos de diferentes disciplinas curriculares, além de abrir espaço

para o estudo e trabalho de conteúdos extracurriculares, ocultos no currículo

(BARCELOS; JACOBUCCI e JACOBUCCI 2010, p. 231).

Desta forma, se o nome do projeto vai continuar sendo “Mostra Multidisciplinar”

ou “Feira de Ciências” não fará diferença, o que importa é que as crianças e adolescentes

tenham esta oportunidade.

Feira das Profissões

O trabalho é um fenômeno intrinsecamente dotado de grande complexidade.

Considerado como conduta humana, vem acompanhando as notáveis

mudanças da vida contemporânea e, consequentemente, vem sofrendo

profundas modificações ao longo do último século (BARRETO e AIELLO-

VAISBERG 2007, s/p).

No momento em que o professor está na escola, ele não analisa e aprende apenas

como dar aula, ou como se portar em frente às turmas. Começa a compreender melhor as

dificuldades das crianças e adolescentes, participa de rodas de conversas, pergunta e é

perguntado sobre vários assuntos e também é questionado sobre o porquê decidiu ser

professor, principalmente pelos alunos dos anos finais do ensino fundamental, os quais já

começaram a preocupar-se com a profissão que desenvolverão no futuro. Assim surgiu a

ideia de organizar uma Feira das Profissões, a qual se tornou um excelente projeto.

Em meados de outubro de 2010, foi iniciada a organização da feira. Os bolsistas

tentaram se colocar no lugar dos alunos e pensar em como poderiam deixar a feira mais

interessante e que fizesse mais sentido para eles. Chegou-se a uma conclusão: o segredo

para este mistério era escolher bem os palestrantes, os quais deveriam ser jovens,

moradores do mesmo bairro da escola, que tivessem estudado em escolas públicas e

trabalhado muito para alcançar seus objetivos profissionais.

Partindo dessas características, foram escolhidas seis pessoas, que, de boa vontade

e voluntariamente, abraçaram a causa e se tornaram palestrantes. Foi realizada uma

reunião na qual eles assinaram um documento assegurando o trabalho voluntário e a

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presença no dia da feira. A Feira de Profissões ocorreu no dia 16 de dezembro de 2010, no

turno da manhã.

Enquanto os palestrantes eram escolhidos, ficou decidido que se focaria o projeto

em uma única série, porque a escola possuía um auditório com capacidade para até 110

pessoas. Dessa forma, foi escolhida a 8ª série, que tinha três turmas com média de 35

alunos cada uma. Essa decisão foi tomada levando em consideração o fato de estes alunos

estarem se formando e era preciso orientá-los. Os regentes das turmas foram avisados,

uma data foi marcada e o convite enviado para todos os alunos participarem.

Os temas das palestras e os devidos ministrantes foram os seguintes: Vantagens

entre ensino médio comum e ensino médio técnico – Regina Reitter, professora convidada

da escola; Mundo gastronômico – Érico Rabelo, consultor gastronômico; Realidade digital

– Robson Machado Rosa, técnico em eletroeletrônica, bolsista de iniciação tecnológica e

estudante do curso superior em jogos digitais pela UNISINOS1; Enfrentando dificuldades –

Cilene Lourdes de Oliveira, estudante do curso normal pelo Colégio Estadual de Ensino

Médio Professor Pedro Schneider; Meio ambiente e suas áreas – João Alberto Leão

Braccini, bolsista de iniciação científica, bolsista de iniciação à docência e estudante do

curso superior em Biologia – Licenciatura pela UNISINOS; Mercado de trabalho – Bianca

Brum de Oliveira, gestora de recursos humanos, estudante do curso de Tecnólogo em

Recursos Humanos pela FEEVALE2.

O foco das apresentações não era em si a profissão que cada um exercia, e sim o

que os levou a chegar onde estão quais os caminhos seguiram, dúvidas, escolhas, o que

deixaram pra trás, do que se arrependem de não ter feito quando tiveram oportunidades.

A intenção era mostrar a realidade da vida de pessoas da comunidade, gente como eles,

para que percebessem que é possível exercer bem qualquer função, sendo importante

gostar de trabalhar na profissão escolhida, sentir prazer em exercê-la.

1 Universidade do Vale do Rio dos Sinos. 2 Universidade FEEVALE.

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O evento foi um grande sucesso. Foram confeccionados certificados e uma turma

da 6ª série fez alguns brindes que foram oferecidos em nome da escola para os

palestrantes. Os alunos fizeram muitas perguntas e foi nítida a empolgação e interesse

deles. Infelizmente, o período de matrículas das escolas públicas do município de São

Leopoldo já havia encerrado, portanto, aqueles que passaram a se interessar mais pelo

ensino técnico concomitante com o médio teriam que aguardar as matrículas do ano de

2011.

De mais significativo, ficou a experiência vivenciada pelos palestrantes e pelos

bolsistas. Essa atividade será desenvolvida no ano de 2011, porém será escolhida uma

data antes das matrículas das escolas públicas.

Revitalização da Horta e Jardins

Analisando o Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola, descobriu-se que nas

suas dependências já teve uma horta escolar. O espaço utilizado anteriormente

permanece, mas sem os devidos cuidados.

Próximo às grades e em canteiros, no meio do pátio da escola haviam espaços

destinados à jardinagem, porém pouco cuidado com esses vegetais. Os alunos

normalmente pisoteavam e jogavam resíduos sobre eles.

Partindo desse contexto, foi elaborado pelos bolsistas o projeto: “Revitalização da

horta e jardins”, em função da importância do contato direto com a terra e da percepção

da influência de cada organismo no ecossistema.

O objetivo foi a reativação das atividades da horta escolar, que eram

desempenhadas no Projeto de Educação Ambiental: Diversidade, Identidade e

Sociabilidade1, buscando sensibilizar as crianças, adolescentes e docentes de que a vida

depende do ambiente e o ambiente depende de cada um.

Além disso, tiveram-se como metas: despertar o interesse das crianças e

adolescentes para o cultivo de horta e o conhecimento do processo de germinação; dar

1Iniciado em 2007 pelo corpo docente da escola, mas, com o passar dos anos, não teve continuidade.

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oportunidades aos alunos de aprender a cultivar plantas utilizadas como alimentos;

conscientizar da importância de saborear um alimento saudável e nutritivo; degustar o

alimento semeado, cultivado e colhido.

O projeto também objetivou criar na escola uma área verde produtiva, em que

todos se sintam responsáveis, estimular os alunos a construírem seu próprio

conhecimento no contexto interdisciplinar; relacionar os conteúdos aos problemas

cotidianos; construir a noção de que o equilíbrio do ambiente é fundamental para a

sustentação da vida em nosso planeta.

Dialogando com o corpo docente da escola, percebeu-se que quando o projeto já

estava em via de ser aplicado, o ano letivo estava próximo do fim e não haveria tempo

suficiente para plantar, ver as hortaliças crescerem e as crianças se alimentarem delas.

Sendo assim, ficou decidido que era melhor deixar os trabalhos relativos à horta para o

ano seguinte (2011). Já se iniciaram as atividades no pátio da escola, mais precisamente,

nos canteiros centrais.

A professora do 4º ano do ensino fundamental auxiliou os bolsistas, e, com sua

turma, foi possível dar início ao projeto. Ela pediu que os alunos trouxessem de casa

plantas que considerassem bonitas e o plantio foi iniciado com esses vegetais. Enquanto

eles eram plantados, eram explicados os seus processos fisiológicos e a importância de

cuidar das plantas e regá-las para a manutenção da vida.

Considerações Finais

Estar dentro da escola proporciona experiências e, com esse conhecimento, as

disciplinas que discutem práticas e teorias pedagógicas passam a adquirir maior sentido

para quem as estuda, pois essa prática faz com que o aluno tenha em que se basear para

refletir. E por estar inserido na realidade escolar, sente-se mais seguro em realizar um

estágio em docência e se torna mais qualificado como futuro docente.

Por sua vez, a escola também se beneficia com a presença do acadêmico, pois ele

traz o conhecimento científico, fazendo a ponte entre a escola básica e a universidade.

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Consequentemente, estes saberes não ficam apenas dentro da escola, os alunos divulgam

para a comunidade, que aos poucos, também se apropria dos conhecimentos.

Apesar do pouco tempo como bolsistas, percebeu-se que os professores da escola

estavam solitários em suas práticas pedagógicas. Algumas dificuldades que foram relatas,

já estão resolvidas, pois foram compartilhadas. Essa interação se torna uma “bola de

neve”, pois não apenas os professores ganham, mas os alunos também, tanto da

educação básica quanto do ensino superior. Com propostas diferenciadas, as aulas

passam a ser mais prazerosas e com isso o ensino se torna mais fácil e agradável, o

ambiente escolar passa a ser mais acolhedor e uma série de índices ruins tende a diminuir

na comunidade, uma vez que o aluno fica mais tempo dentro das dependências escolares.

Como podemos perceber, muito pouco foi realizado na escola, mas houve um bom

aprendizado, e os projetos continuarão e outras propostas serão implementadas ao longo

de mais um ano meio de bolsa.

Como referido na Feira de Profissões, é preciso trabalhar com gosto, ter seriedade,

respeito e honestidade sempre, e levar estes valores para a vida. Há muito ainda para ver,

aprender, pensar, refletir e ouvir, ainda mais na profissão docente em que a formação é

um processo contínuo.

Agradecimentos: À mestranda Marja Braccini, pela ajuda com conhecimento e referências

bibliográficas. À professora mestre Vitória Regina Casagrande Viel, pela paciência e atenção com

que sempre se dispôs a nos ajudar. À professora mestre Cristiane Fensterseifer Brodbeck, pela

indicação da revista e por ter concedido a bolsa de Iniciação à Docência. Aos colegas bolsistas da

escola, que sempre estão ao nosso lado nos apoiando em momentos em que se precisa de um

ombro amigo, e a toda equipe diretiva pela abertura e acolhimento.

Referências:

AMORIM, A. Quando o Currículo não Existe, ele Apenas Acontece. Coleção Educação em Ciências, Ijuí, p.123-160, 2007.

ARAUJO, M. A Investigação no Processo de Formação do Professor de Biologia. In: Anais do XV ENDIPE – Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, Belo Horizonte, 2010, p.1-11.

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BARRETO, M; AIELLO-VAISBERG, T. Escolha Profissional e Dramática do Viver Adolescente. Psicol. Soc., Porto Alegre, v. 19, n. 1, Apr. 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-71822007000100015&lng=e n&nrm=iso. Acesso em 19-01-11.

BARCELOS, N; JACOBUCCI, G; JACOBUCCI, D. Quando o Cotidiano Pede Espaço na Escola, o Projeto da Feira de Ciências “vida em sociedade” se Concretiza. Ciência & Educação, Bauru, v. 16, n. 1, p. 215-233, 2010.

BARCELOS, N. A Prática e os Saberes Docentes na voz de Professores do Ensino Fundamental na Travessia das Reformas Educacionais. Dissertação, Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001.

NUFFIELD, F. Biology – Teachers’ Guide. UK, Longmans Green, 1966.

PERRENOUD, P. A Prática Reflexiva no Ofício de Professor: profissionalização e razão pedagógica. Tradução de Cláudia Schilling. Porto Alegre: Artmed Editora, 2002.

POLINARSKI, C; BONA, A. A prática de Educação Ambiental Escolar e Percepções Ambientais dos Alunos em Instituições do Ensino Médio. In: II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia, Ponta Grossa, 2010, art. n° 156. Disponível em: http://www.pg.cefetpr.br/sinect/anais2010/artigos/Ens_Cien/art156.pdf. Acesso em 26-01-11.

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Subsídios metodológicos para o Ensino de Ciências - uma experiência prática Renan Alves Conceição45 Thaís Soares Monero

46

Ceci Erci Rodrigues47

Resumo: Diante do desafio de trabalhar Botânica no Ensino Fundamental, o presente

trabalho, vinculado ao Programa Institucional de Bolsa Iniciação a Docência (PIBID)/CAPES,

teve como escopo a criação de um eixo metodológico fundamentado na visão sistêmica a

partir de uma aula prática centralizada na diversidade e importância da Botânica, bem

como nas suas relações com o meio ambiente e outros organismos, inclusive o homem,

utilizando uma trilha ecológica da UNISINOS como ferramenta pedagógica, deixando de

lado o paradigma mecanicista/cartesiano. Esse estudo foi desenvolvido junto com a Escola

Municipal de Ensino Fundamental Paul Harris, do município de São Leopoldo, região

metropolitana de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Este artigo revelou que as aulas

práticas desempenham papel importante no desenvolvimento e na construção do

conhecimento dos alunos e, sobretudo destacou-se a necessidade de uma escolha

criteriosa da metodologia empregada nas aulas práticas de Botânica e, principalmente,

que esta escolha considere a heterogeneidade de elementos que possam ser abordados

na prática.

Palavras-chave: Botânica. Aulas práticas. Visão sistêmica. Educação Ambiental.

Ferramentas pedagógicas.

45 Renan Alves Conceição é graduando do sexto semestre do Curso de Ciências Biológicas Licenciatura, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS da cidade de São Leopoldo, RS. 46 Thaís Soares Monero é graduanda do sexto semestre do Curso de Ciências Biológicas Licenciatura, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS da cidade de São Leopoldo, RS. 47 Ceci Erci Rodrigues é graduanda quinto semestre do Curso de Ciências Biológicas Licenciatura, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS da cidade de São Leopoldo, RS.

Professora Indicadora Cristiane Fensterseifer Brodbeck, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Unidade Universitária Sede de São Leopoldo; Curso Ciências Biológicas.

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Introdução

Para muitos professores de Ciências e Biologia do Ensino Fundamental e Médio, é

um desafio despertar em seus alunos algum interesse pela Botânica, principalmente pelo

fato das plantas geralmente não serem dotadas do carisma da movimentação concebida

aos animais (MINHOTO, 2002). O principal aliado no despertar do interesse pela Botânica

são as aulas práticas, que devem fazer parte do cotidiano escolar.

As aulas práticas devem permitir ao aluno observar, vivenciar e discutir um

conjunto de experimentos, fenômenos biológicos e físico-químicos. Este momento

privilegiado no ensino deve ser aproveitado para o aprofundamento de conceitos, tendo

um caráter muito mais qualitativo e formativo (MAJEROWICZ, 2001).

Desse modo, temas tais como Botânica, por exemplo, não deveriam ser estudados

apenas sob o ponto de vista técnico, sim tendo outra dimensão. Segundo Freire (1994), o

treinamento supostamente técnico não é suficiente para compor a formação integral dos

alunos.

Geralmente as aulas práticas de Botânica não atingem a dimensão desejada, pois

são desenvolvidas pelos professores de forma que não visa buscar novos sentidos para a

abordagem dessa ferramenta, restringindo o estudo dos vegetais ao ponto de vista

técnico. Essa ideia aponta para um equívoco fundamental, visto que os temas abordados

nas discussões de estudo de Botânica não podem se pautar apenas no conhecimento

morfológico, estrutural e fisiológico de um determinado grupo vegetal. A verdadeira aula

prática de vegetais precisa instituir condições de rescindir com o paradigma

mecanicista/cartesiano. Segundo Grün (1996), esse modelo é reducionista, fragmentário,

sem vida e mecânico. Em diversas localidades do mundo demanda-se que educadores

abdiquem deste modelo.

Nesta tentativa, optou-se pela trilha interpretativa como ferramenta pedagógica.

Nas trilhas o aluno tem a oportunidade de vivenciar, interpretar e registrar todas as

interações que ocorrem na natureza sejam ecológicas, sociais ou históricas.

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Segundo Andrade (2003), de simples meio de deslocamento, as trilhas surgem

como novo meio de contato com a natureza. Além disso, consoante Saul (2002), as trilhas

são caminhos preexistentes que favorecem a observação de diferentes aspectos do

ambiente. As trilhas interpretativas guiadas levam o visitante, com estímulo do guia, a

observar e interpretar o local e os fatos relacionados à atividade proposta. Sendo assim,

as trilhas são um recurso didático que permitem o processo de ensino e aprendizagem, o

contato organizado do público com o ambiente natural, estabelecendo o vínculo

sociedade-natureza e corroborando para a Educação Ambiental.

É fundamental criar estratégias práticas de aprendizagem no estudo de Botânica a

fim de estabelecer a relação harmônica entre o ser humano e o ambiente. As trilhas,

segundo Saul (2002), valorizamas relações entre os seres vivos e o meio ambiente, bem

como a investigação dos fenômenos naturais, a necessidade de praticar a observação de

forma sistemática e organizada, e o desenvolvimento de habilidades associadas à

investigação científica, tais como: comparação, classificação, obtenção de dados,

formulação de hipóteses, detecção e resolução de problemas.

No entanto, esse universo ambiental e, sobretudo, o universo “vegetal”, muitas

vezes se reduz a conhecimentos morfológicos, fisiológicos e taxonômicos, uma vez que o

conteúdo sobre a cobertura vegetal no ensino básico é abordado de forma superficial,

sem um merecido destaque.

Em virtude disso, esse artigo está vinculado ao Programa Institucional de Bolsa de

Iniciação a Docência – PIBID/CAPES, no qual somos alunos bolsistas e um dos objetivos

deste projeto é contribuir com a melhoria do Ensino de Ciências e Biologia na escola onde

atuamos.

Tendo como escopo uma metodologia fundamentada na visão sistêmica, o

presente trabalho objetiva realizar aulas práticas centralizadas na diversidade e

importância da Botânica, bem como nas suas relações com o meio ambiente e outros

organismos - inclusive o ser humano - utilizando as trilhas ecológicas como ferramenta

pedagógica. O trabalho também pretende buscar a harmonização da relação sociedade-

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natureza a partir do reconhecimento pelo ser humano do seu ambiente, auxiliar na

construção de valores e atitudes voltadas para o respeito a todas as formas de vida e a

melhoria da qualidade desta, e fornecer a conexão entre o conhecimento científico e a

vivência da comunidade.

Desenvolvimento

Esse estudo foi desenvolvido no Campus da Universidade do Vale do Rio dos Sinos

– UNISINOS, em parceria com a Escola Municipal de Ensino Fundamental Paul Harris,

localizada no Bairro Vila Tereza, município de São Leopoldo, região metropolitana de

Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. A UNISINOS é uma instituição que se preocupa

com a gestão do meio ambiente e possui um Sistema de Gestão Ambiental – SGA, o que

lhe garante a certificação do ISO 14001. Abriga alguns sistemas lacustres e uma vasta área

verde que é extremamente relevante para determinadas espécies e para o ciclo da vida.

Por essa característica, a instituição possui trilhas ecológicas demarcadas pelo seu Grupo

de Educação Ambiental148, favorecendo o incremento pedagógico na área de Ciências e

Biologia. Dentre essas, a atividade prática foi realizada na trilha do Muro, localizada a

sudoeste do prédio “Redondo” (Centro Comunitário) do Campus.

Construção e aplicação das atividades

a) Planejamento das atividades

As atividades a serem desenvolvidas foram previamente planejadas sob a supervisão

da coordenadora do Subprojeto Ciências Biológicas do PIBID – UNISINOS.

O planejamento da atividade foi dividido em objetivo e Metodologia:

48 Desde 1993, o projeto de Educação Ambiental conhecido como Caminhos do Campus, que visa à formação de multiplicadores ambientais através de trilhas interpretativas, vem sendo desenvolvido

por um Grupo de Educação Ambiental, conhecido atualmente como o Grupo EA da UNISINOS

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Objetivo:

Interagir permanentemente com o ambiente externo; buscar a harmonização da

relação sociedade-natureza a partir do reconhecimento pelo ser humano do seu

ambiente; incluir a conexão entre o conhecimento científico e a vivência da comunidade e

compreender que o estudo de vegetais não se restringe somente a estrutura anatômica,

fisiologia, e taxonomia.

Metodologia:

Realização de um diagnóstico dos conhecimentos prévios sobre a região a ser trabalhada e

os temas a serem abordados, tais como composição vegetal, relação da cobertura vegetal

com o meio ambiente e os outros organismos (inclusive o ser humano), assim como sobre

preservação ambiental; sondagem do que os alunos entendem por atividade prática, a fim

de caracterizar os sentidos para o termo; instruções de segurança em trilhas, a fim de

minimizar acidentes; entrega de lupa de bolso e monóculos para facilitar a observação dos

dados; entrega de Quadro de Referências para nortear os dados a serem coletados;

realização da atividade “Meditação dos Sentidos”; realização da trilha; coleta de materiais

de vestígio antrópico e de vestígio natural; diálogo sobre os materiais coletados e sobre a

experiência vivenciada; aplicação da atividade “Teia da Vida” realização da atividade

“Meditação dos Sentidos”, para finalização do trabalho.

b) Aplicação da Atividade

Antes de iniciar a atividade, os alunos receberam instruções e regras de segurança

básica e conforto em trilhas, bem como informações sobre atividades que seriam

desenvolvidas durante o percurso. Foram distribuídos materiais de apoio para a

observação e a caracterização dos vegetais e dos organismos que com eles se relacionam

– pranchetas, lupas de bolso e monóculos.

Um quadro de referências foi entregue para cada participante, servindo como eixo

norteador, para que o apontamento dos dados observados durante o percurso da trilha

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não se restringisse à visão técnica e naturalizada. Nele constavam os seguintes itens a

serem preenchidos: “FLORA”, “INTERAÇÕES ENTRE A FLORA E OUTROS ORGANISMOS”, e

“PRINCÍPIOS ANTRÓPICOS”.

A atividade foi realizada no dia 20 de novembro de 2010, com uma turma de

alunos de 5ª série do Ensino Fundamental, dividida em dois momentos:

b.1) Momento I

No inicio e no término da trilha foi realizado um momento de reconhecimento do

ambiente com os alunos, intitulada Meditação dos Sentidos, a fim de perceberem, por

meio dos seus sentidos – principalmente visão, olfato, tato e audição – o local da

atividade.

b.2) Momento II:

Do início ao final do percurso, os alunos observaram as atribuições da trilha e

anotaram nos quadros de referência os dados relevantes.

Por se tratar de uma trilha linear, onde o retorno é realizado pelo mesmo caminho,

na volta ao ponto inicial, os alunos foram orientados a coletar um vestígio natural e um

vestígio antrópico. Ao final da trilha, foi discutida a origem e composição dos vestígios

coletados.

Os participantes dialogaram sobre os materiais coletados e sobre a experiência

vivenciada. Para a finalização da atividade, foi realizada a atividade da teia da vida, na qual

em círculo, de mãos dadas, cada aluno torna-se um dos elementos trabalhados no

encontro. A partir daí, a teia começa a se emaranhar ao máximo e, depois, lentamente,

retorna ao ponto inicial. Esta é uma atividade de integração que possibilita que os

conceitos abordados possam ser experienciados através do corpo.

O planejamento é a previsão de uma ação a ser desenvolvida, com o objetivo de

atingir os fins desejados de maneira eficiente. O planejamento da atividade proporcionou

à aula prática o alcance dos objetivos gerais propostos.

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O diagnóstico do comportamento de entrada dos alunos participantes, ou seja, o

conhecimento prévio dos assuntos que foram abordados era reduzido. Os alunos sabiam

pouco sobre a composição vegetal, sobre a importância real da vegetação – e sua

influência na qualidade de vida, assim como havia muitas dúvidas sobre a interação da

composição vegetal com outras formas de vida. Este último assunto causou maior euforia

e interesse nos educandos. Como se tratava de assuntos já abordados em sala de aula

pôde-se perceber que os alunos constroem o conhecimento a partir da significância

particular atribuída ao assunto, assim como a atratividade da aula auxilia na criação de

hipóteses e de comportamento investigativo, despertando a curiosidade do aluno.

Conforme Barzano (2006) existem quatro tipos de sentido para o termo “prática”:

I) visão pragmática, onde a aula prática é mais valorizada do que a teórica; II)

contraposição à teoria, onde a aula começa por uma atividade prática e posteriormente

por meio do material ou observações tudo pode ser analisado à luz da teoria; III)

exemplificação ou demonstrativa, nessa categoria, o aluno é um mero espectador daquilo

que o professor demonstra e IV) visão diversificada, onde essa categoria abrange a visão

ampliada do termo “prática”, na qual o aluno, de uma só vez, apresenta os vários sentidos

dessa palavra. Por meio dos depoimentos dos alunos sobre a concepção de aula prática de

Botânica, foram encontradas duas categorias baseadas na classificação de Barzano (2006):

exemplificação ou demonstrativa, caracterizada por uma aula prática em que o professor

demonstra exemplos em que ele comentou na aula teórica. Foi percebida também a

presença da visão pragmática, onde, conforme já referido, valoriza-se mais a aula prática,

visto que a prática trata-se de uma visão funcionalista, isto é, serve a um fim utilitário e

determinado, que pode até sobrepor a teoria, inclusive a ponto de gerá-la.

Alguns autores como Barcelos e Noal (1998) criticam atividades práticas e de

Educação Ambiental fora da sala de aula como, por exemplo, em zoológicos, parques e

trilhas, visto que sustentam a ideia de que utilizar somente esse tipo de aula pode

conduzir a um conceito puramente naturalista, assim como a uma atividade de contato

eventual com a ‘natureza’.

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Decerto utilizar exclusivamente essa tipologia de aula prática pode gerar apenas

um pensamento naturalizado. Isso pode ocorrer somente se não forem planejadas

atividades que proporcionem ao aluno a concepção de visão sistêmica e de estimulação

do desenvolvimento do seu espírito crítico e senso de investigação. Ademais, a vida

moderna, mais do que nunca, transforma-se em ritmo acelerado, e diante disso, é cada

vez mais raro o contato com o ambiente natural, tornando-se relevante a adoção de

ferramentas que possam reintegrar o ser humano à natureza, desde que sejam bem

planejadas.

Durante a atividade prática da trilha, os alunos preencheram quadros de referência

sobre o ambiente investigado, produzindo assim conhecimentos. Ao atuar como

investigadores, o estudo dos vegetais não se reduziu a estudos fragmentados, mas

integrados no ciclo natural. A utilização de vários recursos e instrumentos didáticos para

Ensino de Ciências pode possibilitar aos alunos a percepção holística e integrada do

ambiente. Foi possível estabelecer um pensamento sistêmico, pois segundo Krasilchik

(1996), a aula prática confere ao aluno significados próprios, pois a aula dita tradicional

não desenvolve o senso crítico e criativo, constituindo-se apenas em instrução e

treinamento.

O termo “investigadores” justifica-se pelo fato de que experimentar é mais que

aplicar receitas, segundo Clement (1999). Esta afirmação é séria e importante, pois muitas

vezes o professor, ao impor que o aluno siga uma receita em uma aula prática, o impede

de aprender com seus próprios erros e, assim, evoluir em seu aprendizado. Nas aulas

práticas e de experimentação, é fundamental a participação ativa do aluno.

Atualmente, os textos oficiais, como os Parâmetros Curriculares Nacionais49 (PCN)

(BRASIL, 1999), incentivam a formação de alunos críticos e capazes de raciocinar

cientificamente com autonomia. Para que ocorra tal evolução, as aulas práticas são

49 Os PCN,s foram elaborados pelo Ministério da Educação – MEC, em 1998. Há inúmeras críticas a estes,

indo de sua concepção até a sua implementação nas escolas.

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essenciais, a fim de facilitar a compreensão dos conteúdos e de fazer desenvolver nos

alunos as capacidades do saber fazer experimental (PIOCHON, 2002).

Em virtude dos resultados da pesquisa, é importante fazer um resgate histórico,

visto que nas últimas décadas, diversos artigos foram publicados sobre o Ensino de

Ciências e, em sua maioria, sugeriam aulas práticas e experimentação como

fundamentais. Ao encontro das publicações, os PCN também sugerem que o Ensino de

Biologia e de Ciências seja fundamentado sobre o raciocínio científico e o procedimento

experimental. Assim, segundo Piochon (2005), o aluno é levado a aprender dados, bem

como outros procedimentos para desenvolver seu espírito crítico e o senso de

investigação. A autora ressalta, ainda, que as aulas práticas permitem a diversificação do

trabalho pedagógico e, ao mesmo tempo, possibilitam ao aluno o contato com as novas

tecnologias.

A respeito da importância do ensino experimental, Piochon (2002) apontou que as

aulas práticas são decisivas para o aprendizado das Ciências, salientando que elas

contribuem nos procedimentos da formação científica, como a observação, a manipulação

e a construção de modelos, entre outros. Esta realidade estranha e desconhecida ao

discente, que pela primeira vez entra em contato com um estudo mais aprofundado e

interessante, pode ocasionar dificuldades ou até mesmo frustrações em relação ao seu

conhecimento construído, e pode não estar preparado para administrar a diversidade

existente na classe.

Ainda mediante aos resultados, a professora de Ciências responsável pela turma

observou que os alunos nesta aula prática questionaram mais comparativamente às aulas

expositivas, concordando com Bastos (1994) que as aulas práticas promovem e

intensificam a interação entre professor e aluno fora e dentro da sala de aula. O aumento

do nível de participação e questionamento geral da turma aponta que a metodologia

empregada despertou nos alunos um maior interesse nos assuntos abordados, tornando

assim, a atividade atrativa sob a perspectiva dos participantes, auxiliando assim,

provavelmente no processo de ensino e aprendizagem.

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Um grande número de alunos pode não ter ainda participado de aulas práticas de

laboratório, ou vivenciado processos de investigação científica no campo, ainda que em

nível de baixa complexidade, devido ao atual planejamento educacional, ou pelo fato de a

instituição, muitas vezes, não oferecer os recursos e a infra-estrutura adequados para tal.

Porém, as práticas de Ciências e Biologia, mais especificamente de Botânica, visam

incentivar uma avaliação que valorize a compreensão e a interpretação da natureza

(KRASILCHIK, 1996).

A complexidade da tarefa educativa exige dispor de instrumentos e recursos que

favoreçam a tarefa de ensinar. A aprendizagem dos conteúdos de Botânica exige

atividades práticas que permitam aos alunos vivenciar os conteúdos teóricos previamente

trabalhados de forma contextualizada (KRASILCHIK, 1996). Para que o pensamento

sistêmico se faça presente no Ensino de Ciências, o professor deve ter um conhecimento

integrado. Nessa linha, as preocupações sobre a formação docente aproximam-se da

concepção de Comênio, na sua Didática Magna, no qual o “bom professor” seria aquele

capaz de dominar a “arte de ensinar tudo a todos” (AZANHA, 2004). Neste sentido, cabe

ao docente o dever de captar a realidade cotidiana de cada aluno e tentar fazê-lo integrar

essa realidade aos conhecimentos adquiridos durante sua vida, chegando ao

conhecimento formalizado e significativo (HAMBÚRGUER E LIMA, 1989). Como dizem os

nossos pensadores na educação, Delizoicov & Angotti (1994), Krasilchik (1987), Pereira

(1998): “pensar a ciência como um conjunto de fatos científicos socialmente produzidos

numa sociedade historicamente determinada”.

Conclusão

As aulas práticas desempenham papel importante no desenvolvimento e na

construção do conhecimento dos alunos. Sua utilização no ensino e na formação do aluno

pesquisador é preciosa, por isso uma aula prática seja ela na natureza ou na própria sala

de aula, admite a visualização de fenômenos reais que permite ao aluno várias formas de

leituras de sua realidade. Sobretudo, o investimento do professor em uma metodologia

com uma abordagem sistêmica, ou seja, uma visão holística e integrada do mundo pode

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instituir condições de rescindir com o paradigma mecanicista/cartesiano que tudo

fragmenta.

Diante disto, sublinha-se a necessidade de uma escolha criteriosa das aulas

práticas de Botânica e, principalmente, que esta escolha considere a heterogeneidade de

elementos que possam ser abordados na prática, ou seja, a visão integradora deve estar

presente. Esta preparação, segundo Piochon (2002), visa combinar a motivação dos alunos

com a interação destes entre si, assim como destes com o professor em sala de aula ou

fora dela.

A disponibilidade para modificar a organização do conteúdo deve existir,

superando a fragmentação existente, criando novos espaços nos cronogramas,

reestruturando disciplinas/atividades, promovendo o diálogo entre estas, associando mais

intimamente teoria e prática e, principalmente, integrando ensino e pesquisa,

despertando o olhar crítico dos estudantes no Ensino Fundamental, com o objetivo de

superar um dos maiores desafios: dinamizar o ensino de botânica, principalmente no que

toca a visão sistêmica.

Enfim, pode-se afirmar que a abordagem dos conhecimentos científicos por meio

de definições que devem ser decoradas pelo estudante contraria as principais concepções

de aprendizagem humana. Podemos exemplificar através da abordagem que foca a

construção de significados pelo sujeito da aprendizagem, debatida nos Parâmetros

Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental (BRASIL, 1998). Quando há aprendizagem

significativa, a memorização de conteúdos debatidos e compreendidos pelo estudante é

completamente diferente daquela que se reduz à mera repetição automática de textos

cobrados em instrumentos de avaliação.

Considerando a importância ambiental e a visão integrada do mundo, no tempo e

no espaço, a escola deve oferecer meios efetivos para que cada aluno compreenda os

fenômenos naturais não somente por meio de visão reducionista, já que escola é o espaço

social e o local onde o aluno dará sequência ao seu processo de socialização.

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Aplicação dos Conceitos de Medidas de Posição e Dispersão: um Estudo de caso em uma Indústria de Embalagens Plásticas Flexível Thiago George das Dores50

Resumo: O grande desafio de professores das disciplinas teóricas, especialmente, as que

envolvem cálculo é responder a seus alunos a antiga questão de onde aplicar o conteúdo

aprendido. Sendo um dos objetivos do artigo demonstrar mais uma possibilidade de

aplicação dos conceitos da estatística. E para isto este estudo apresenta uma aplicação

dos conceitos de medidas de posição e dispersão, da disciplina de Estatística I, que faz

parte da grade curricular da maioria dos cursos de graduação. Estes conceitos foram

aplicados em um estudo de caso para avaliar a variabilidade de um processo de produção

de embalagens plásticas flexíveis. Os resultados indicam que o processo avaliado é

instável e encontra-se fora de controle estatístico. Além disso, se tem como objetivo

verificar a viabilidade de aplicações práticas de conceitos que, na maioria das vezes, não

fazem sentido para os alunos de graduação, pois são ensinados apenas de forma

conceitual e isolado da prática.

Palavras-chave: Estatística. Produção. Embalagens.

Introdução

Um dos maiores questionamentos dos alunos que ingressam em cursos superiores é

sobre a aplicabilidade dos conteúdos que eles aprendem no decorrer do curso, entre eles

os relacionados às disciplinas de matemática, estatística e física. Além deste

questionamento, alguns alunos do curso de licenciatura em matemática, por exemplo,

buscam aplicações destes conteúdos que vão além de sua área acadêmica, seja porque

estes almejam uma colocação no mercado, diferente da acadêmica, seja para entender o

fenômeno físico que é representado pelo conteúdo gerador do questionamento.

50Thiago George das Dores é graduando do terceiro ano do Curso de Matemática da Faculdade de

Administração e Artes de Limeira - FAAL, da cidade de Limeira. Professora indicadora: Maria Célia de Oliveira Papa, do curso de Licenciatura em Matemática da Faculdade de Administração e Artes de Limeira – FAAL, da cidade de Limeira.

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Este estudo propõe aplicar conceitos sobre medidas de posição e de dispersão que

fazem parte do conteúdo estudado na disciplina de estatística, que compõe o rol de

disciplinas da maioria dos cursos superiores, para analisar as possibilidades de aplicação

do aprendido na sala de aula com as práticas do processo produtivo. Nesse caso de uma

indústria de Embalagem Plástica Flexível. Para atender aos objetivos aqui propostos, este

trabalho está organizado em quatro seções, a segunda seção apresenta as questões

teóricas sobre Controle Estatístico de Processo (CEP) e suas aplicações, a terceira seção

mostra o desenvolvimento do estudo, que compreende o processo produtivo aqui

avaliado e a aplicação do CEP a este processo, os resultados e discussões são

apresentados na seção 4 e finalmente as considerações finais sobre o estudo.

Conceitos Teóricos sobre CEP e suas Aplicações

No caso específico de um processo de fabricação de um determinado produto, tal

variabilidade pode ser devida, por exemplo, a matéria prima, as condições ambientais que

o processo está submetido, aos operadores, entre outros fatores. Em alguns casos, tal

variabilidade pode provocar diferença importante entre os produtos por ele produzidos,

sendo causa de prejuízos financeiros para a indústria, uma vez que os produtos podem

não atender as especificações desejadas. Para avaliar a variabilidade de um processo, e

assim, conhecer e tratar as suas causas, o CEP – Controle Estatístico de Processo é uma

ferramenta poderosa. Sendo o CEP uma ferramenta que pode ser aplicada em vários

setores, especialmente na indústria, com o objetivo de avaliar a variabilidade dos

processos, proporcionando melhorias na qualidade dos produtos, redução dos custos de

produção por meio da diminuição de perdas.

A literatura apresenta diversos estudos de caso que utilizam o CEP, tais estudos

podem ser verificados em diferentes áreas, como por exemplo, Lopes et al (2005) que

realizou um estudo para verificar a variabilidade de filmes plásticos para embalagens

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flexíveis, Souza et al. (2010) que faz uma aplicação do CEP para avaliar a capacidade de

produção de uma empresa siderúrgica, Oliveira et al. (2010), que utilizam o CEP para

monitorar a graduação alcoólica na produção de álcool, dentre outros estudos.

De acordo com Montgomery e Runger (2003), as cartas de controle usadas nos

estudos de CEP somente são capazes de detectar as causas da variabilidade, porém, para

que essa variabilidade seja minimizada necessita de ações do gerente, operadores,

engenheiros, dentre outros responsáveis pelo processo, que deverão ser feitas por meio

de um plano de ação para avaliar e corrigir os pontos indicados nos gráficos de controle.

Existem vários tipos de cartas de controle, cuja utilização depende da aplicação

prática, ou seja, do tipo de processo e dos dados que ele fornece. Porém, segundo

Montgomery e Runger (2003), a análise de um processo deve ser feita considerando dois

tipos de cartas de controle, uma que possibilita avaliar o valor médio das diferentes

observações da mesma amostra ou de observações consecutivas de um mesmo lote e

outra para avaliar a variabilidade entre os valores médios observados, dados pela carta de

amplitude ou de desvio padrão.

De acordo com Martins e Laugeni (2005), um gráfico de controle pode ser

construído nas cinco etapas seguintes:

Determinar os limites de controle inferior (LCI) e superior (LCS) dos gráficos da

amplitude ou desvio padrão;

Estabelecer um plano para a coleta dos dados do processo;

Calcular a média e o desvio padrão para os vários valores observados para a

mesma variável ou para medições consecutivas de variáveis do mesmo lote;

Colocar os valores observados no gráfico de controle;

Verificar se os valores observados no gráfico da média e desvio padrão estão

dentro dos limites de controle e consequentemente, verificar se o processo está

sob controle estatístico, caso não estejam, devem ser tomadas as ações.

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Segundo Montgomery e Runger (2003), existem dois tipos de causas que provocam

variabilidade no processo: causas especiais e causas aleatórias. As causas aleatórias são

inerentes ao processo, mas não geram problemas na produção, mesmo porque, esta

variabilidade está sempre entre os limites de controle do processo. As causas especiais

são indicadas pelos pontos que estão fora dos limites de controle inferior ou superior, e

indicam algum tipo de problema no processo.

De forma sucinta, um estudo de CEP permite avaliar e quantificar a variabilidade

de um processo, que consequentemente, possibilita corrigir ou amenizar as causas desta

variabilidade, que em geral, resulta em ganhos financeiros para as empresas. Sendo

também uma ferramenta de implantação simples que fornece informações importantes

para tomadas de decisões. A próxima Seção apresenta um estudo de caso, em que o CEP

foi aplicado, na tentativa de avaliar o processo em si, porém, com objetivo maior de

aplicar em uma situação real, alguns dos conceitos vistos no curso de Licenciatura em

Matemática.

Desenvolvimento

Este estudo foi desenvolvido em uma empresa de pequeno porte, localizada na

região de Campinas, que produz embalagens flexíveis de plástico. Para que o processo de

produção de embalagens flexíveis, ilustrado na Figura 1 se inicie, primeiramente, uma

ordem de produção é emitida pela diretoria da empresa. Nesta ordem constam as

informações importantes do processo, como o tipo de material a ser utilizado, a

quantidade [kg] que será produzida, as dimensões da embalagem [mm] e a sua espessura

[µ], entre outras características específicas da embalagem que será produzida.

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F

Figura 1: Fluxograma Básico de um Processo de Produção de Embalagens Plástica Flexível. Fonte Lopes et al (2005)

Conforme observado na Figura 1, este processo de produção se inicia com a separação e a

mistura da matéria-prima, que é formada por resina de polímeros granulados. Em seguida, esta

matéria-prima é misturada e colocada na extrusora, que mistura a matéria-prima, a qual

posteriormente será utilizada em diferentes proporções, dependendo do tipo de embalagem a ser

produzida. Na extrusora, a matéria-prima é submetida a temperaturas que variam entre 100º C e

250° C, transformando-a em uma massa homogênea. Desta massa são produzidos filmes plásticos

em forma de bobinas.

Após este processo, as embalagens que deverão ser impressas vão para as impressoras,

que posteriormente são rebobinadas ou cortadas, dependendo do tipo de embalagem, já as que

não possuem impressão vão diretamente para o corte ou são rebobinadas. Após estas etapas, elas

são embaladas, faturadas e finalmente despachadas. Porém, antes disso, o próprio operador da

maquina faz uma inspeção nas embalagens para verificar se elas atendem aos requisitos de

qualidade, especialmente, se elas estão dentro das medidas solicitadas.

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Além das informações do processo que já foram descritas, as máquinas do setor de corte e

solda funcionam em uma velocidade determinada pelo próprio operador, e esta velocidade está

relacionada com o tipo de matéria-prima, com a temperatura ambiente, e com a tensão da

máquina. A temperatura ambiente deve ser monitorada, pois a temperatura de funcionamento da

máquina, que varia entre 140°C e 400°C é estabelecida em função desta temperatura ambiente.

Além da temperatura ambiente, outras características devem ser controladas, como a

velocidade de corte, o ar guia e a temperatura de corte, pois também são fontes potenciais de

variabilidade do processo produtivo de embalagens flexíveis.

Para verificar se as embalagens atendem aos requisitos de qualidade especificados na

ordem de produção, os operadores do setor de corte e solda medem o comprimento [mm] e a

largura [mm], usando uma trena graduada. A próxima seção descreve os dados que foram

coletados, os resultados dos gráficos de CEP e a discussão de cada uma das etapas da análise.

Resultados e Discussões

Neste estudo, verificou-se a estabilidade do processo em longo prazo, para isso, foram

retiradas cinco embalagens seguidas, de manhã e outras cinco embalagens à tarde, durante 15

dias. O gráfico da Figura 2 ilustra os valores médios e os desvios padrão das larguras, observados

amostras com cinco medições consecutivas de embalagens do mesmo lote, para 30 amostras.

Figura 2: Gráfico de Média para a Variável Largura [mm] da Embalagem Plástica Flexível.

Gráfico de Média para a Largura

Amostra

dia

[mm

]

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30

12

0.0

12

1.0

LCL

UCL

CL

Gráfico de Desvio Padrão para a Largura

Amostra

De

svio

Pa

drã

o [m

m]

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30

0.0

0.4

0.8

LCL

UCL

CL

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Observa-se no gráfico de média da Figura 2, que existem vários pontos fora de

controle, que estão indicados pelos pontos vermelhos nos gráficos. Estes pontos estão

fora do limite inferior e superior. Nota-se neste gráfico, que a maioria dos valores médios

observados varia entre os valores de aproximados, de 119 mm e 121 mm, porém, existem

cinco valores acima do limite superior. Desta forma, pode-se dizer que o processo está

fora de controle estatístico. O gráfico de desvio padrão da Erro! Fonte de referência não

ncontrada. também indica pontos fora do limite inferior e superior, Desta forma, pode-se

dizer que existem causas especiais agindo no processo, indicando a necessidade de

tomada de ações para correção de tais causas.

A Figura 3 apresenta os gráficos de controle para a variável comprimento [mm] da

embalagem plástica flexível, para os valores médios e os desvio padrão.

Figura 3: Gráfico de Média e Desvio Padrão para a variável Comprimento [mm] das Embalagens Plásticas

Flexíveis.

Gráfico de Média para o Comprimento

Amostra

dia

[m

m]

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30

26

8.5

26

9.5

27

0.5

LCL

UCL

CL

Gráfico de Desvio Padrão para o Comprimento

Amostra

De

svio

Pa

drã

o [m

m]

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30

0.0

0.4

0.8

1.2

LCL

UCL

CL

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O gráfico das médias dos comprimentos [mm] indica que existem 10 pontos fora

dos limites de controle, o que significa dizer que existem causas especiais agindo no

processo, assim, estes resultados também indicam que ele está instável, ou seja, fora de

controle estatístico. Porém, a variabilidade observada no gráfico do desvio padrão mostra

que não existem causas especiais agindo no processo e interferindo nos comprimentos

medidos para as cinco medições de cada amostra. Então, de forma análoga aos resultados

da largura das embalagens, existem causas especiais agindo no processo, que necessitam

de avaliações e ações.

Considerações Finais

Pode se dizer que a aplicação dos conceitos de variabilidade, estudados na

disciplina de estatística, pode ser realizado com sucesso, consequentemente,

respondendo a uma das questões mais comuns feita pelos alunos de graduação em geral,

que se refere ao fato deles desejarem saber onde aplicarão os conceitos teóricos

aprendidos e a demonstração de possibilidades de aplicação é um caminho para isso. Com

relação aos objetivos do estudo de caso da aplicação de CEP para avaliar a variabilidade de

um processo de produção de embalagens plásticas flexíveis, os resultados indicam que o

processo avaliado é instável, pois possuem vários pontos fora de controle.

Com relação às ações que podem ser tomadas, basicamente, o processo pode ser

considerado em duas partes, o processo de produção das embalagens em si, que

eventualmente pode ter algum problema referente ao corte das embalagens, que

eventualmente está cortando tais embalagens em tamanhos diferentes. Ou então, a

variabilidade pode ser devido ao processo de medição destas embalagens. Para uma

avaliação completa deste processo, poderia ser realizada uma análise do sistema de

medição, para verificar se a variabilidade do processo está relacionada a ele, como por

exemplo, variação causada pelo fato de que diferentes operadores realizaram a medição

das embalagens no decorrer do estudo.

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Referências:

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A Timidez Como Entrave Emocional Patológico: levantamento quanti-qualitativo dos relatos de pacientes atendidos na clínica-escola de Psicologia em uma faculdade da rede privada Keila Cristina Carlos de Souza51

Resumo: O presente estudo tem como objetivo contribuir para a compreensão da timidez

como entrave emocional patológico em indivíduos chamados de tímidos, e prejuízos na

interação social. Tendo como referencial teórico a psicanálise, abordará a timidez

patológica como decorrente do confronto pulsional do Id com o Ego, portanto um

fenômeno na esfera do inconsciente do sujeito, que impede a ação diante do seu desejo.

Propõe também a revisitar os conceitos sobre o assunto e ressignificar a timidez, com

vistas a uma melhora da qualidade de vida para os participantes. A realização da pesquisa

se fará por meio de revisão bibliográfica e análise documental dos protocolos de triagens

realizadas na clínica-escola de pessoas com a queixa de timidez. A pesquisadora

acompanhará a evolução dos casos atendidos por meio dos prontuários de atendimento,

os quais tiverem queixa de timidez.

Palavras chave: Timidez patológica . Recalque . Desejo . Resistência.

Introdução

De acordo com pesquisa realizada recentemente, um estudo da faculdade de

Windson, no Canadá, aponta que cerca da metade da população sofre com a timidez e

esse número aumenta consideravelmente, a timidez não é uma doença, mas traz

sofrimento como se fosse uma. Segundo o psicólogo René Schubert o indivíduo até

apresenta fenômenos físicos desta retração, dores musculares e sensações de mal-estar

generalizado. (2009).

A timidez pode ser definida como desconforto e a inibição em situações de

interação pessoal que interferem na realização dos objetivos pessoais e

profissionais de quem a sofre, caracterizando-se pela obsessiva preocupação

com as atitudes, reações e pensamentos dos outros (Soares, 2008).

51 Keila Cristina Carlos de Souza Graduanda em Psicologia pela Faculdade Anhanguera de Anápolis/GO - Anhanguera Educacional. Professor indicador Márcio Luppi do Curso de Psicologia da Faculdade Anhanguera de Anápolis/GO.

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A timidez é um fenômeno pouco estudado pelos psiquiatras, ao passo que há

extensa literatura sobre o tema elaborado por psicólogos. Apesar de ser um

construto mal definido, de origem leiga, pode ser útil uma vez que a timidez

parece ser altamente prevalente, causando silencioso e devastador sofrimento.

Revemos as conseqüências da timidez subdivididas em somáticas, cognitivas,

comportamentais, sociais e seu papel como fator de risco para doenças mentais

(Camisão, Carlos et al.) ,1994.

Segundo Motta Filho em seu ensaio sobre a timidez: "Todo esforço que o indivíduo

emprega como ser-no-mundo, reduz-se para o tímido numa incapacidade e numa

frustração.” (pag.54, 1969). Assim, pode-se dizer que toda tentativa do indivíduo tímido

resulta num desconforto de querer ir além, o desejo de superação por fim acaba em

frustrações e sentimento de derrota frente à timidez. O indivíduo acometido por timidez

que o impeça de agir, torna sua vida um acúmulo de fracassos angustiantes que o

impossibilita de tentar agir resultando num comportamento do chamado tímido. Ainda

sobre esse estudo feito por Motta Filho, onde cita Cassier que “No homem encontramos

uma sociedade de pensamento e de sentimento, acontece que essa sociedade não

funciona regularmente para o tímido, pois o resultado de suas atividades é uma sequência

de déficits." em que o tímido não vivencia essa sociedade torna-se incompleta e

desajustada voltada para frustrações e angustias principalmente no campo emocional.

Na tentativa de encontrar um nexo causal da timidez buscou-se como referencial

teórico o psicanalítico, pelo qual acredita-se que se possa esclarecer a origem da timidez.

Possivelmente algo que tenha marcado a infância do indivíduo que o impeça de agir uma

castração algo tratado mais adiante.

De acordo com Freud (ano), o recalque ocorre na fronteira entre os sistemas

Inconsciente (Ics), Pré-consciente (Pcs) e Consciente (Cs), que podem se de ordem

primária e recalque de ordem secundária, (ao experenciar algo doloroso no qual o

indivíduo não consegue lidar com a situação, ocorre um recalque que é transformado em

algo inconsciente não percebido pela consciência), levando em consideração a forma

dinâmica do aparelho psíquico, onde as forças entrariam em conflito, fundamentado num

dualismo (antagonismo) instintual. Ele frisa que para descrever esse mecanismo de

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recalque é necessário adotar a ideia econômica de catexia, conceito que se refere ao

quantum de energia psíquica se deposita numa ideia ou grupo de ideias, o recalque

secundário já seria a retração (da energia necessária para a ação reprimida) (Freud apud

Bock ET AL, 1999).

Esse processo de vir ou não à consciência foi o que levou Freud a chamar essa

força psíquica de Resistência e, a este processo de acobertar ou encobrir foi chamado de

Repressão, não deixado que se tornasse cônscias representações insuportáveis e

dolorosas de onde se origina o sintoma, chamando esses conteúdos psíquicos de

inconsciente, surgindo assim uma estrutura do aparelho psíquico e o funcionamento da

personalidade, no qual ele teoriza a existência de três sistemas ou entidades psíquicas sua

primeira tópica que ele chamou de Inconsciente (ICS), Pré-consciente, (PCS) e Consciente

(CS). O inconsciente seria repleto de conteúdos de ordem inconsciente, por vezes

reprimidos pela ação de censuras internas que num dado momento na vida do indivíduo

podem ter sido conscientes, mas que foram enviados para o inconsciente ou podem ser

que nunca foram conscientes e desde a priori sempre foi inconsciente mesmo, aos quais

não se tem acesso aos outros dois sistemas, o Consciente e o Pré-Consciente, (Freud,

1915)

Já o Pré-Consciente diz respeito a aqueles conteúdos que não estão presentes na

consciência, mas que a qualquer momento podem se tornar acessíveis.

O consciente é a parte do aparelho psíquico que está em contato com o mundo

exterior, a realidade no qual o fenômeno da percepção se acha presente, sobretudo o

raciocínio, a atenção. Apud Bock ET AL (1999).

Freud afirmava que o que vai determinar o caráter do indivíduo é a maneira que

ele canaliza a sua libido, ou é governado por ela e frisa que a contenção, a retenção da

libido pode causar histeria, angustia ou a erupção de distúrbios psíquicos, os instintos

podem aparecer mais tarde como um grande problema. (apud OSBORNE, 2001).

Freud define inibições como sendo restrições do Ego que, em dado momento,

foram impostas como medidas de precaução ou, se acarretaram como resultado de um

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empobrecimento de energia, o que a difere de um sintoma, que seria um sinal e um

substituto de uma satisfação instintual que permaneceu posicionado em algum lugar, em

estado jacente é uma consequência do processo de repressão, ocorrendo a partir do Ego

quando este pode ser por ordem do superego, se recusa a associar-se com uma catexia

instintual que foi provocada no Id em forma de desejo ou algo parecido e que não lhe foi

permitido se manifestar (Freud, 1926]1925).

Em Simoda (2009) podemos encontrar a citação:

Em muitos casos, o medo de se relacionar com figuras de autoridade (professor,

chefe, juiz, etc.) está relacionado profundamente com a forma que você reagia

no relacionamento com seus pais. Se o seu pai era muito autoritário, exigente,

severo, crítico, desvalorizante e você reagiam com muito medo e inibição, a

tendência é transferir essa forma de relacionamento subserviente com as

pessoas que ocupam cargos de autoridade ou que tenham um perfil de

personalidade semelhante ao do seu pai.

Freud, o pai da psicanálise chamava este tipo de relacionamento com essas

pessoas, de ‘relação transferencial’.

Desta forma, se você - quando criança - tinha muito medo de fazer uma

pergunta ao seu pai, é provável que vá transferir esse mesmo temor na fase

adulta ao fazer uma pergunta ao seu chefe ou ao seu professor. Em verdade, sua

dificuldade em fazer uma simples pergunta é um mecanismo de defesa contra a

atitude autoritária de seu pai.

Portanto, em muitos casos a timidez é o resultado de uma educação rígida,

severa e desvalorizante por parte dos pais que contribuem para a formação da

auto-imagem negativa da criança. (Osvaldo Shimoda (2009).

Para isso, regras foram instituídas que possibilitem a vida em sociedade, e,

segundo Freud seriam essas regras, paradoxalmente, as responsáveis pelos maiores

sofrimentos, assim constituído seria inevitável, o que pode ser compreendido como sendo

a condição pática (sofrimento, dor, aflição). E que a partir de Freud a civilização trata-se

da regulação pulsional, propondo uma relação intrínseca entre o processo civilizador e o

desenvolvimento pulsional do indivíduo. Segundo Freud o que determina a constituição

do prazer-desprazer será a relação entre a variação da excitação e o tempo.

(Freud1930[1929] apud Zavaroni; Celes, 2004.

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Pode-se fazer um paralelo entre o que diz Shimoda (2009) e Zavorani e Celes

(2004), o receio de se relacionar com pessoas que demonstre autoridade citado por

Simoda (2009), no presente esta relacionado à forma que o indivíduo reagia com inibição

quando criança, e agora na vida adulta trata-se de um mecanismo de defesa em resposta

a identificação daquela pessoa que demonstrou autoridade na infância, contribuindo para

uma autoimagem negativa e até uma autoestima baixa. Por sua vez Zavaroni (2004),

também cita Freud que diz das regras que enquadraria o indivíduo na sociedade um

processo civilizador controlando a pulsão transformando o prazer em desprazer, os dois

autores fala das regras impostas, do modelo que era preciso ser seguido (mas como todos

passamos por este processo civilizador possivelmente um individuo tímido o vivenciou

mais intensamente).

Segundo Freud (1914) o que sugere é que , quando algum incidente fortuito na

vida posterior inibe o desenvolvimento normal da sexualidade, a conseqüência

pode ser o ressurgimento da sexualidade “infantil” indiferenciada, ou seja, há

uma regressão. Ai foi possível compreender o efeito da frustração como causa

da regressão da libido para alguém, ponto de fixação anterior. De acordo com

Freud a regressão seria dividida em três formas: a temporal, a formal e a

material, mas acrescenta em 1914 á Interpretação dos sonhos, como sendo

todos esses tipos de regressão o mesmo, ocorrendo simultaneamente, pois a

que é mais antiga no tempo é a mais primitiva na forma, e na topografia

psíquica situa-se mais próxima da extremidade perceptual.

Pode-se perceber na fala de Freud sobre narcisismo que a parte mais importante,

contudo pode ser isolada sob a forma do complexo de castração (nos meninos, a

ansiedade em relação ao pênis, nas meninas, a inveja do pênis, e tratada em conexão com

o efeito da coerção inicial da atividade sexual.

Sabemos que os impulsos instintuais libidinais sofrem a vicissitude da repressão

patogênica se entram em conflito com as ideias culturais e éticas do indivíduo, a repressão

provém do ego, poderíamos dizer com maior exatidão que provém do amor próprio do

ego. (Freud, 1914). *1

Assim, pode-se dizer que o individuo acometido por Timidez em algum momento

em sua biografia possivelmente passou por um tipo de castração, proibição ou retenção

da energia libidinal, embasando-se que o Ego causa ansiedade para opor-se às vontades

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instintivas do Id, haveria uma catexia e que com a colaboração do Superego através do

meio, cultura, família imposição de regras ascenderia o percurso da Timidez, ou seja, algo

inconsciente impediria o indivíduo de se socializar, tomar atitudes frente a outrem em

consequência á castração inconsciente sofrida em outro momento.

No campo da fantasia, a repressão permanece toda poderosa, ela ocasiona a

inibição de ideias in status nascendi antes que possam ser notadas pela consciência, se a

catexia destas tiver probabilidade de ocasionar uma liberação de desprazer. (Freud, 1911).

Percebe-se na fala de Freud que a repressão age na formação das ideias antes

mesmo que a consciência possa perceber produzindo inibição que no caso dos indivíduos

tímidos poderá causar um não conseguir agir frente às circunstâncias da vida causando

um desprazer no individuo pela energia contida não liberada, energia essa disponível na

Psique.

Percebe-se nesta fala que a repressão em estado de formação, não é percebida

pela consciência, podendo provocar uma liberação de desprazer dependendo da

quantidade e intensidade de energia. Para o indivíduo tímido esse desprazer causa um

desconforto social no qual não consegue agir “normalmente” como outros não

acometidos pela Timidez provocando um entrave emocional que lhe impeça de agir

podendo até provocar patologias, somatizações.

Freud conta a história do homem de areia, que arranca os olhos das crianças, mais

ao final quando fala do sentimento de estranheza, do medo de castração, e fala que, o

que é estranho é familiar, que o que é estranho é repressão, e essa repressão fora vivida

na infância, complexo de castração da infância. Freud (1919).

Possivelmente houve em dado momento a vivência de castração inconsciente pelo

indivíduo tímido que ocasiona inibição ao seu desejo de agir, satisfazer seu desejo que

pulsa sua consciência.

Possibilita-se um link entre o que diz Freud e Dolto (2001):

Na verdade, é a superação da história de cada um e da angústia da mutilação,

ou seja, a angústia de castração que é uma angústia de mutilação, porque não se

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tem confiança naquele que impõe o fracasso do imaginário, fracasso necessário

para que haja sucesso na realidade Dolto (2001) p. 201.

A angústia de castração desencadeada pelo Ego diante do Id citado acima, pode

impossibilitar ao chamado tímido, de ir ao encontro do outro, de agir dentro da sua

realidade tentando evitar o desprazer vivido em outro momento da sua história

promovendo assim todos os sintomas e inibições vividos por pessoas tímidas.

Parafraseando o que Freud diz: que durante o período de latência total ou parcial

erigem-se forças as forças anímicas que mais tarde, surgirão como entraves no caminho

da pulsão sexual e estreitarão seu curso á maneira de diques (o asco, o sentimento de

vergonha as exigências dos ideais estéticos e morais. Freud, 1905.

Objetivos:

- Investigar a relação entre timidez e possíveis incapacidades do Ego.

- Descrever aspectos psíquicos dos chamados tímidos na interatividade com outros

indivíduos e possíveis psicopatologias associadas, baseando-se no modelo estrutural

proposto por Freud, nas instâncias Id, Ego e Superego enquanto determinantes nas suas

ações e reações.

- Realizar um levantamento na clínica-escola de Psicologia em uma faculdade

particular onde se pretende constatar quanti-qualitativamente a procura de indivíduos

com queixa de timidez na clínica-escola, promovendo um estudo local.

Metodologia:

Partindo do referencial presente na teoria psicanalítica, realizar uma revisão

bibliográfica da obra freudiana, buscando a compreensão de como funciona o desejo do

Id em confronto com o Ego, o balizamento de interdição/satisfação dado pelo Super-Ego e

sua correlação com a timidez e suas inibições ocasionadas nos sujeitos.

A pesquisa possui um elemento quantitativo, pois se realizou pesquisas descritivas

que possibilite descobrir e classificar no que se refere à procura de indivíduos com queixa

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de timidez na clínica-escola da Faculdade citada acima e, posteriormente, o quanto a

timidez interfere na vida dos que se sentem incomodados por tal queixa no âmbito social.

Dada a natureza subjetiva do objeto em estudo, a pesquisa se baseia também na

perspectiva qualitativa, na medida em que buscará elementos biográficos,

para compreender aspectos psicológicos, cujos dados não podem ser coletados

de modo completo por outros métodos devido á complexidade que envolve a

pesquisa, neste caso temos estudos á analise de atitudes, motivações,

expectativas, valores, opinião, etc. (Tratado de metodologia cientifica pag.117,

Silvio Luiz de Oliveira).

Instrumento de coleta de dados:

Coleta de dados bibliográficos fundamentando-se em estudos já realizados e

compreensão da teoria.

Análise dos protocolos de triagens realizadas na clínica-escola com a queixa de

timidez no período de Agosto a Dezembro de 2010.

Participante: pacientes em atendimento na clínica-escola com queixa de timidez e

déficit nas habilidades sociais, de ambos os sexos, de faixa etária que compreenda desde

crianças até adultos que se queixe de timidez.

Os dados foram coletados junto ao Setor de Arquivos da clínica-escola onde a

autora fez a seleção de todos os prontuários dos pacientes cujas queixas incluíam a de

timidez.

Logo após categorizou-se as ocorrências descrevendo a relação desses pacientes

no aspecto social, familiar, profissional, emocional, situação socioeconômica, sexo e idade

com possíveis transtornos. E por fim as conclusões teóricas e análises dos dados.

Local de pesquisa: Clínica-Escola da faculdade referida anteriormente.

Deu inicio a algumas atividades em caráter de estágio básico supervisionado no

primeiro semestre de 2008, com atendimento na modalidade de avaliações não

interventivas, e, em 2009, dando continuidade a essas atividades, também

foram acrescentados os atendimentos clínicos com intervenção com a

psicoterapia.

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Sua equipe é composta por: um Supervisor Geral e Coordenador da Clínica; um Professor Assistente; 12 Professores Supervisores; um Recepcionista. Funcionando de segunda á sexta-feira de 13h00 ás 22h00 e aos sábados de 08h00 ás 12h00.

Os atendimentos estão distribuídos em modalidades como: psicoterapia Breve

Adulta e Infantil, psicodiagnóstico Adulto e Infantil, Psicoterapia de Grupo

Infantil e Psicoterapia Suportiva (nomeada no contexto desta instituição como

Clínico-Hospitalar) e Aconselhamento Psicológico. Dentro das perspectivas de

cada abordagem, sendo elas: Psicanálise, Sócio-Histórica, Cognitivo

Comportamental, Comportamental e Gestalt-terapia/Fenomenologia. (Silva

2009).

Foram utilizados recursos como análise documental como prontuários dos

pacientes atendidos, sendo que esta vem respaldada pelo termo de consentimento, onde

o paciente também autoriza pesquisa referente aos dados coletados, desde que haja

manutenção do sigilo de sua história e identificação, observam-se nesta análise variáveis

como: faixa etária, sexo, estado civil, escolaridade, ocupação, renda familiar e a queixa.

No que se refere aos materiais utilizados foram: prontuários de triagem.

Por fim, vale esclarecer que todos os documentos como prontuários utilizados na

pesquisa estão arquivados na clínica-escola em questão e são mantidos trancados e com

acesso restrito aos profissionais que realizam o atendimento e ao supervisor da clínica.

Resultados – Quanti-qualitativos:

A pesquisa em questão demonstra dados sob forma de amostragem da população

atendida na Clínica-Escola de Psicologia, parte integrativa do Curso de Psicologia,

localizada ou inserida em uma Faculdade privada. Especificamente a população

participante será a clientela desta clínica, portanto uma amostra de 463 usuários ou

pacientes nos quais foram evidenciadas 27 queixas de timidez.

Como principal característica a clínica-escola tem como público em seus

atendimentos pessoas da comunidade de baixa renda, sem outro meio de acesso ao

serviço de Psicologia Clínica. A Tabela 1 contém informações sobre o nível de renda

familiar que possibilita a análise dessa categoria.

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No presente estudo verifica-se que de acordo com amostragem de 463 prontuários

analisados encontrou-se 27 queixas de timidez equivalendo á seis por cento entre outras

queixas.

Clínica Escola de Psicologia- Incidência queixa de timidez - 2008-10

Quantidade (amostra) Queixas encontradas Incidência

463

27

6%

Fonte: Base de Dados da Clínica-Escola de Psicologia de uma Faculdade Particular

Na tabela a seguir pode-se analisar que não houve diferença significativa entre

gênero e renda familiar, provavelmente não há relação entre Timidez, gênero ou camada

social abarcando todas as categorias.

Tabela 1:Clínica Escola de Psicologia- Incidência queixa de timidez -renda familiar 2008-10

Renda Familiar Masculino Feminino

600,00 – 2.000,00

600,00 – 4.200,00

06

07

05

09

Fonte: Base de Dados da Clínica-Escola de Psicologia de uma Faculdade Particular

As informações contidas na Tabela 2 evidenciam que a timidez abarca uma faixa

etária que vai desde crianças até a idade adulta, todavia podemos inferir que nessa

amostra, a timidez mostrou-se significativamente prevalente no segmento de 6 a 28 anos.

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Tabela 2: Clínica – Escola de Psicologia- Incidência queixa de timidez faixa etária- 2008-10

Fonte: Base de Dados da Clínica-Escola de Psicologia de uma Faculdade Particular

Os dados dispostos na Tabela 3 possibilitam a análise da variável Escolaridade, dos

pacientes que se queixam de timidez sendo mais frequente entre homens com menor

escolaridade e, entre as mulheres concentrou-se a ocorrência de timidez, com formação

apenas no Ensino Médio.

Tabela 3: Clínica – Escola de Psicologia- Incidência queixa de timidez escolaridade - 2008-10

Escolaridade

Masculino

Feminino

Ensino Fundamental 08 01

Ensino Médio 05 10

Ensino Superior 02 01

Fonte: Base de Dados da Clínica-Escola de Psicologia de uma Faculdade Particular

A Tabela 4 contém informações coletadas na amostragem no que se refere ao

estado civil dos pacientes comumente tímidos participantes da pesquisa, o que permite

sugerir uma investigação futura acerca do quanto a timidez interferiu inibindo a vida

afetiva-relacional dessas pessoas.

Faixa Etária Masculino Feminino

06 I----------- 28

29 I----------- 51

14

01

10

02

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Tabela 4: Clínica – Escola de Psicologia- Incidência queixa de timidez estado civil- 2008-10

Estado civil Masculino Feminino

Solteiro 16 10

Casado --- 1

Fonte: Base de Dados da Clínica-Escola de Psicologia de uma Faculdade Particular

Na Tabela 5 é possível verificar informações de natureza qualitativa, nos quais os

dados referidos na pesquisa possibilitam analise subjetiva dos participantes que sentem

uma “perda” particular em sua vida causada pela timidez, nomeada como prejuízo nas

áreas afetivas, labor-ativo, biopsicossocial e desenvolvimento intelectual por não terem

uma atitude de iniciativa própria causada inconscientemente. Os dados formam lançados

pelo Entrevistador que realizou a triagem com base na percepção que os sujeitos tinham

de si mesmos ou foram depreendidos pelo entrevistador e apontam para as inibições

sofridas pelo sujeito dito tímido.

Tabela 5: Clínica – Escola de Psicologia- Incidência queixa de timidez 2008-10

Área prejudicada Nº Indivíduos

Déficits Afetivos

Dificuldade Falar em público

Déficit Profissional

Déficit Escolar

Dificuldade em se expressar

Relacionamento Pessoal

03

06

03

06

03

06

Fonte: Base de Dados da Clínica-Escola de Psicologia de uma Faculdade Particular

Percebe-se pela amostragem da pesquisa na população da clínica-escola que as

queixas de timidez no referido estudo é um número considerável sendo um assunto

relevante que merece uma atenção maior na área de Psicologia, devendo ser tratada de

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forma a suprimir ou amenizar os efeitos nos sujeitos comumente tímidos para uma

melhor qualidade de vida possibilitando uma resiliência em suas vidas.

Considerações Finais

Atendendo aos objetivos propostos no presente estudo - investigar a relação entre

timidez e possíveis incapacidades do ego, encontramos no aporte teórico revisado na

bibliografia que a fragilidade do ego em suportar uma crítica, o medo do

autoconhecimento pode ter seu substrato no confronto do Id com o Ego, criando-se

inibições frente a situações relacionadas á outrem.

Freud define as inibições como sendo restrições do Ego que, em dado momento,

foram impostas como medidas de precaução ou se como resultado de um

empobrecimento de energia, o que a difere de um sintoma, que seria um sinal e um

substituto de uma satisfação instintual que permaneceu posicionado em algum lugar em

estado jacente. É, uma consequência do processo de repressão, ocorrendo a partir do Ego

quando este, por ordem do superego, se recusa a associar-se com uma catexia instintual

que foi provocada no Id em forma de desejo ou algo parecido, e que não lhe foi permitido

se manifestar. (Freud, ([1926]1925).

Visando elucidar que a timidez decorre do confronto do Id e Ego, fundamentando-

se na teoria freudiana que evidencia que o ego, para evitar futuras frustrações não

permite que o desejo do Id se manifeste, causando assim sintomas somáticos no indivíduo

tímido resultando uma vivência de Ego fragilizado, se mostrando incapaz de receber

críticas alheias frente suas atitudes, ações, resultando num entrave emocional que

dependendo da cronicidade pode lhe causar futuras patologias como perdas sócio afetivas

e laborais, na interatividade com outros indivíduos e possíveis psicopatologias, baseando-

se no método estrutural proposto por Freud, nas instâncias Id, Ego e Superego nos quais

determinam as ações e reações. Assim sendo, o indivíduo tímido pode ser regido por um

Superego rígido confrontando-se com o Ego não permitindo que o desejo e ação do Id se

concretize.

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A proposta da descrição do aparelho psíquico de um sujeito com sintomas de

timidez seria: o Ego criaria um mecanismo de defesa juntamente com o superego para

refutar o desejo do Id evitando assim que ele se manifeste ficando toda sua pulsão de

energia instintiva retida.

Percebe-se a necessidade de que se haja novos estudos específicos sobre Timidez

de natureza mais profunda, haja vista das limitações do presente estudo no que se refere

ao tempo limitado para sua execução talvez ligados ao Ideal de Ego, Id, Ego e Superego,

um estudo histórico sobre Timidez , como foi tratado por diversas áreas , abordagens,

comparando passado e contemporaneidade, por parte de pesquisadores ligados a Psique

para que haja uma melhor qualidade de vida dos indivíduos tímidos resultando de

maneira tal num ganho social, cognitivo, labor-ativo e ideoafetivo e mais aporte cientifico

para futuros profissionais que saberiam como lidar melhor com esse público e não

deixando de mencionar claro os resultados de psicoterapias que desencadeiam mais

vitalidade.

PARECER DE APROVAÇÃO DE COMITÊ Pesquisa autorizada pelo CEP - Comitê de Ética Profissional da Anhanguera Educacional s/a – CEP/AESA- em . 1 de abril de 2010 19:11:48 por meio do parecer: no.: 058/2010 Título: A Timidez Como Entrave Emocional Patológico Resultado aprovado nos termos do CEP.

Referências:

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ZAVARONI; D, CELES, L. O Processo Civilizador: uma leitura da pulsão de morte como excessivo. na compreensão freudiana da cultura. Pulsional; revista de Psicanálise ano XVII, n. 179, 2004.

1 Entende-se que se tratando de um estudo na área da Psicologia se faz necessário a busca como referencial nas obras clássicas. Visto que a obra de Freud como sendo de fundamental importância estudá-la, pois esta se mostra em dias atuais, uma teoria que com o passar dos tempos evidencia-se como atual, buscada como

base para vários estudos.

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Havaianas: Além do Imperativo “Recuse Imitações” Dialogismo e Papéis Desempenhados na Campanha Publicitária Carolina Di Assis

52

Resumo: Este artigo objetiva analisar uma propaganda das sandálias Havaianas, transmitida pela televisão em 2009, a fim de depreender os discursos e os valores presentes na conversa entre avó e neta. Além disso, objetiva-se mostrar os papéis desempenhados pelas duas personagens, explicitando o dialogismo existente na propaganda. Para tanto, foram abordados os conceitos da Análise do Discurso de linha francesa. Espera-se que este trabalho contribua com as indagações levantadas e motive futuras pesquisas na área.

Palavras-chave: Discurso. Ideologia. Memória discursiva. Dialogismo. Ethos.

Introdução

O presente trabalho pretende fazer uma análise de uma propaganda das sandálias

Havaianas, transmitida pela televisão no ano de 2009, com base em alguns teóricos da

Análise do Discurso. Essa propaganda criou polêmica com o público e foi retirada do ar,

sendo substituída por outra que continha uma “justificativa” para a “censura”.

Para desenvolver este artigo, os dois comerciais serão utilizados, sendo que ambos

foram obtidos da internet, no site de vídeos www.youtube.com. Desta forma, objetiva-se

depreender os discursos gerados na conversa entre as protagonistas da campanha

publicitária: uma avó e sua neta. Mais especificamente, pretende-se explicitar os papéis

desempenhados pelas duas personagens – representantes de duas gerações diferenciadas

- e, como consequência, os valores surpreendentes difundidos por meio de suas falas.

A fim de desenvolver os objetivos apresentados, os conceitos bakhtinianos serão

ressaltados, assim como as definições apresentadas por outros pensadores da mesma

linha teórica, tais como Michel Pêcheux e Dominique Maingueneau. Além disso, na

52 Carolina Di Assis é graduanda do sétimo período do curso de Letras da Universidade Federal de Goiás na cidade de Goiânia. Professora Indicadora - Doutora Eliane Marquez da Fonseca Fernandes, da Universidade Federal de Goiás; Campus Samambaia da cidade de Goiânia; Curso de Letras.

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análise, serão considerados tanto os elementos verbais quanto os não-verbais, pois o

objeto escolhido é um recurso audiovisual.

A escrita do artigo se explica devido à curiosidade despertada pela quebra de

expectativa na primeira propaganda e pela intervenção do público, que provocou a

censura. Ademais, o objeto de análise escolhido é riquíssimo na produção de conteúdos

implícitos.

Espera-se, então, que este trabalho contribua com as indagações levantadas e que

tente mostrar um lado diferente, não-dito, da campanha publicitária de uma das

mercadorias mais vendidas e valorizadas no Brasil: as sandálias Havaianas.

Discussões Iniciais

Há várias possibilidades de abordar o estudo da língua. A abordagem que

colocaremos em foco para a fundamentação deste trabalho é a da Análise do Discurso.

Para tanto, as concepções sintetizadas por Ingedore V. Koch (1992) nos parecem bastante

relevantes, mesmo que a autora, aparentemente, não diferencie “língua” de “linguagem”.

Assim, vemos: língua/linguagem como representação do pensamento e do conhecimento

de mundo do homem; língua como um código para comunicação; e língua/linguagem

como forma de (inter)ação.

A partir do que foi sintetizado por Koch (1992), percebemos uma nítida relação e o

aprofundamento teórico, no que tange à língua, por meio de Mikhail Bakhtin. Em Bakhtin

(2006), há alguns apontamentos que melhor esclarecem o nosso mote imediato. Para o

autor, a língua é uma atividade concreta por se constituir na interação de locutores. Ela

sofre um processo constante de evolução, a qual é regida por leis sociológicas, instauradas

pela relação “mundo/sujeito e sujeito/mundo”, isto é, pelo ato de enunciação. Além disso,

Bakhtin (2006) frisa: as características listadas conferem à língua o aspecto da criatividade,

que não pode ser entendido separadamente das ideologias a ela ligadas.

De acordo com esse autor, a língua serve às necessidades enunciativas concretas

do locutor, ou seja, está orientada no sentido de um ato enunciativo. Dessa maneira, a

língua só estabelece sentidos num dado contexto concreto, quando se realiza sob a forma

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de texto. Esse texto, depois de produzido, estabelecerá relações com outros – anteriores

ou posteriores - numa interação dita “dialógica”. O conceito de dialogismo também foi

proposto por Bakhtin (2006).

Retomando o filósofo russo, Orlandi e Lagazzi-Rodrigues (2006) defendem o texto

como uma unidade significativa passível de análise, logo ele é possuidor de

“textualidade”. Tal conceito é apresentado por M. A. K. Halliday (Halliday, 1976 apud

Orlandi e Lagazzi-Rodrigues, 2006) para se referir às relações que o texto apresenta com

ele mesmo e ainda com a exterioridade.

Em Orlandi (2004), há a ampliação do conceito de texto, tendo-o como um objeto

com começo, meio e fim – o que facilitaria a análise – se observado do ponto de vista de

sua “apresentação empírica”, de sua materialidade. Entretanto, o texto visto como

discurso instaura sua incompletude, levando em conta novamente a definição bakhtiniana

de dialogismo que será estudada adiante.

Mikhail Bakhtin e sua Relação com a Análise do Discurso

Para o desenvolvimento de um trabalho coerente na área pretendida, faz-se

indispensável recorrer a Mikhail Bakhtin (2006) e aos conceitos por ele defendidos,

cruciais para o entendimento da análise que será feita neste trabalho.

Primeiramente, o filósofo discute o conceito de ideologia e desta forma o

entendemos: a “elaboração ideológica” se constitui por meio da “atividade mental do

nós”, que assim é nomeada por se referir à coletividade. Logo, a ideologia teria caráter

social. Tal posição se contrapõe à “atividade mental do eu”, voltada para o indivíduo.

Esses dois polos de atividade mental correspondem aos limites da interação entre emissor

e ouvinte no ato de enunciação.

Bakhtin (2006, p. 126) resume seus apontamentos com a afirmação de que “*T+oda

palavra é ideológica e toda utilização da língua está ligada à evolução ideológica”, ou seja,

todo dizer carrega valores que se modificam, influenciando a interação verbal. Numa

forma mais simples, a ideologia é, nas palavras de Cleudemar A. Fernandes (2005, p. 29),

“uma concepção de mundo de determinado grupo social em uma circunstância histórica”,

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pois os valores não podem ser vistos independentemente do contexto social em que eles

se encontram.

Além da ideologia, outra contribuição bakhtiniana diz respeito à ampliação do

conceito de diálogo. Antes, de acordo com José Luiz Fiorin (2008), tal noção era

considerada apenas como a comunicação entre duas pessoas feita em voz alta. Depois, o

diálogo em Bakhtin se transforma em dialogismo. O dialogismo se refere às relações que

podem ser estabelecidas entre enunciados – dizeres veiculadores de discursos e que

podem se repetir, apesar de o ato de enunciação não poder – por causa da abertura de

espaço para a réplica.

Pensando na obra do teórico russo, Fiorin (2008) destaca três definições básicas

para dialogismo. A primeira diz respeito ao fato de todo enunciado ser atravessado por

discursos de outrem, por vozes alheias, sendo possível afirmar, portanto, que todo dizer é

dialógico, ainda que implicitamente. A segunda definição se refere à marcação explícita do

aparecimento das vozes alheias. A terceira retoma o que Bakhtin (2006) comenta sobre

“atividade mental do eu” e “atividade mental do nós”. Para o filósofo russo, ambas as

concepções entrecruzadas levariam a uma terceira, a “atividade mental para si”, na qual o

indivíduo se reconhece como integrante de uma sociedade. Assim, como atesta Fiorin

(2008), o sujeito vai se constituindo na relação com o outro e com a realidade em que se

encontra.

Por último, não podemos ignorar outro princípio-chave da obra de Bakhtin (2006):

a polifonia. De certa maneira, ela já foi discutida neste trabalho, porque a polifonia está

ligada às vozes que atravessam todo dizer e têm origem na consciência social. Segundo

Fernandes (2005), é possível perceber na voz de um sujeito discursivo, isto é, em seu

dizer, vozes provindas de diversos discursos. Seriam elas as responsáveis pela

heterogeneidade do sujeito, pois as vozes não só se conciliam, como também podem se

refutar. Finalmente, polifonia e dialogismo se articulam entre si e também com o conceito

de Michel Pêcheux acerca de memória discursiva, a ser comentada a seguir.

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Michel Pêcheux: primeiras formulações

Como se pôde notar, todas as ideias apresentadas até aqui se voltam para o

mesmo aspecto teórico: o conceito de discurso. Todavia, tal conceito não foi exposto com

mais profundidade por não termos abordado ainda o teórico responsável pelo termo:

Michel Pêcheux. Logo, todos os apontamentos feitos até então nos conduzem à pergunta:

o que a Análise do Discurso concebe como discurso?

Fernandes (2005) discute essa noção, inicialmente, pelo que ela não representa.

Conforme o autor, discurso não é língua, nem texto nem fala, mas necessita da linguagem

para se materializar. Visto isso, o conceito se refere às ideologias veiculadas pelas palavras

num determinado contexto social. O discurso estaria, então, relacionado às escolhas

lexicais feitas pelo sujeito discursivo – voz que se constitui no discurso – a fim de produzir

efeitos de sentido, segundo Fernandes (2005).

Orlandi e Lagazzi-Rodrigues (2006) citam Pêcheux para apresentar a definição de

discurso. Segundo as autoras, Pêcheux criticava o “esquema elementar da comunicação”

que via o discurso como uma simples “transmissão de informação” (Orlandi e Lagazzi-

Rodrigues, 2006, p. 14) e defendia a relevância dos sentidos produzidos entre os locutores

envolvidos na enunciação. Além disso, para Pêcheux, o ato de dizer é importante na

medida em que compreende os locutores, os sentidos produzidos e as condições de

produção, aspectos que remetem para muito além da simples comunicação.

As autoras ainda argumentam, como já dito anteriormente, acerca da

incompletude do discurso, recordando implicitamente o dialogismo de Bakhtin. Tais ideias

estão imbricadas no princípio da memória discursiva, também discutida por Pêcheux.

Segundo Orlandi e Lagazzi-Rodrigues (2006), a memória discursiva está ligada ao

interdiscurso, ou seja, ao que já foi dito antes em outros contextos. Tal noção é marcada

pelo esquecimento porque, conforme as autoras, o sujeito não sabe em quais outras

enunciações o enunciado que produz apareceu.

Podemos concluir, então, que a memória discursiva é formada na coletividade por

acontecimentos que antecederam a enunciação. Agora, diante de todas as informações

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explicitadas, faz-se necessário retomar outra definição de Pêcheux, essencial para o

desenvolvimento deste trabalho: a formação discursiva (FD).

Fernandes (2005) trata a formação discursiva como aquilo que pode ser dito em

determinado contexto sócio histórico. Ou seja, é aquilo que se permite enunciar devido à

presença de determinados valores em uma conjuntura dada e específica. Nas palavras de

Pêcheux (PÊCHEUX, 1990 apud Fernandes 2005, p. 51): “(...) uma FD não é um espaço

estruturalmente fechado, pois é constitutivamente ‘invadido’ por elementos que vêm de

outro lugar (isto é, de outras FD) que se repetem nela, fornecendo-lhe suas evidências

discursivas fundamentais”.

Por estarem estritamente relacionadas com o exterior, as formações discursivas

trazem arraigadas outro conceito que nos remete a Bakhtin: formação ideológica. De uma

forma simples, de acordo com Orlandi e Lagazzi-Rodrigues (2006), a formação ideológica

se projeta, na linguagem, por meio das FD. Assim, toda FD pertence a uma formação

ideológica. Como o discurso é atravessado por muitas FDs, ele também abrange muitas

ideologias e claro, diversas vozes, as quais reinstalam o diálogo com outros enunciados.

Ethos: a investigação de Dominique Maingueneau

A fim de encerrar a primeira etapa deste trabalho no que concerne às formulações

teóricas arroladas até o momento, é indispensável apresentar as reflexões de Dominique

Maingueneau (2008) acerca de ethos. Esse conceito é fundamental para o entendimento

da análise a ser feita adiante, já que nos propusemos a analisar os papéis desempenhados

por uma senhora de idade e por uma jovem numa campanha publicitária.

Maingueneau (2008) inicia sua reflexão afirmando a dificuldade em lidar com a

definição de “ethos”, pois esse termo possui um sentido mais prático. No entanto,

algumas ideias nos são apresentadas. De acordo com Maingueneau (2008), que fez sua

pesquisa com base em outros teóricos, o ethos refere-se ao caráter, ao retrato, ao

comportamento, à imagem emitida pelo locutor no ato de enunciação. O autor defende

não ser possível dizer o ethos no enunciado, pois ele é mostrado no ato de dizer, que é

mais amplo.

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Diante dessas considerações, Maingueneau (2008) enfatiza: produz-se uma

imagem do enunciador antes mesmo que ele fale. Isso se dá por meio da observação de

características não-verbais, tais como as roupas do locutor, sua postura, seus gestos, seu

olhar, a modulação de sua voz, entre outros. Esse “exame” inicial conduz à construção do

ethos pré-discursivo por ser antes da fala. Com a concretização do discurso, outro ethos é

traçado e não necessariamente distinto do primeiro: o discursivo.

É possível perceber que o ethos tem sua razão de ser, conforme Maingueneau

(2008), no contexto social. Primeiro, porque toda a situação (“o aqui e agora”) é levada

em conta e não apenas os dizeres. Segundo, o enunciador imagina um retrato de si

mesmo, mas esse retrato pode ser diferente do que é feito pelo interlocutor. De maneira

resumida: em um ato de enunciação, quem fala faz uma imagem de si próprio e de quem

ouve, e vice-versa.

Ressaltamos ainda um fenômeno comum, atualmente, no meio publicitário e

descrito por Maingueneau (2008): o deslocamento da “propaganda” para a “publicidade”.

Se antes o importante era exibir no comercial as qualidades do produto, atualmente os

argumentos estão voltados para a promoção da marca. Na propaganda a ser analisada

aqui, isso se comprova, como veremos adiante.

A Campanha Publicitária em Foco

Diante de tudo o que foi exposto, é possível perceber ideias-chave que foram

apresentadas na teoria e serão, neste momento, explicitadas na prática. Torna-se

imprescindível, dessa maneira, considerar que o desenvolvimento da interação entre

sujeitos é repleto de “ecos”, ou seja, ditos e não-ditos que vagueiam pelos discursos. Cada

palavra tem, assim, o poder de carregar em si significados outros que não o previsto pelo

locutor enunciativo. Temos então uma arena em que a palavra/texto dá forma a

ideologias e essas perfazem todo o ambiente de disputas. Essa construção de sentidos a

partir de outros e a partir de certas conjecturas será tópico essencial para o trabalho em

questão.

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Como já dito, o objeto de estudo deste artigo diz respeito a duas campanhas

publicitárias das sandálias Havaianas transmitidas na televisão em 2009. A fim de facilitar

a análise nas próximas seções, exporemos agora a transcrição do diálogo oral realizado

pelas protagonistas:

Avó: - Eu não acredito que você veio pro restaurante de chinelo. Neta: - Deixa de ser atrasada, né vó! Isso não é chinelo, é havaianas, oh,

Havaianas Fit. Dá pra usar em qualquer lugar.

Avó: - Que é bonitinha, é.

(Cauã Reymond aparece e diz para quem o atendeu: “Boa tarde, tudo bem?”) Neta: - Olha lá, vó!

Avó: - É aquele menino da televisão! Você tinha que arrumar um rapaz assim pra

você.

Neta: - Ah, mas deve ser muito chato casar com famoso, né?

Avó: - Mas quem falou em casamento? Eu tô falando de sexo.

Neta: - Vó!

Avó: - E depois eu é que sou atrasada?!

A campanha publicitária acabou censurada e, no lugar dela, uma nova foi

transmitida: a mesma avó aparece alegando que houve reclamações de algumas pessoas

e, por isso, a empresa responsável pela venda das sandálias Havaianas decidiu retirar do

ar o comercial anterior. No entanto, ela acrescenta, alguns adoraram tal propaganda e,

por conseguinte, ela foi mantida na internet.

É imprescindível observar os papéis desempenhados pelas personagens do

comercial, pois esse aparece num momento em que ainda se tem, no Brasil, uma

concepção mais ortodoxa e conservadora em relação às pessoas idosas e,

simultaneamente, uma perspectiva mais liberal no que concerne aos jovens. Essas

ideologias, ainda vigentes no país, estabelecem uma relação dialógica com a propaganda

analisada. Por isso, este trabalho partirá desse ponto, a fim de fazer uma investigação dos

implícitos presentes na conversa transcrita anteriormente.

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“Havaianas. Todo Mundo usa. Recuse Imitações.”

O slogan feito título desta seção criou raízes na memória discursiva da população

brasileira devido ao reconhecimento que a mercadoria anunciada ganhou com o passar

dos anos. No início, esse reconhecimento era provavelmente justificado pela qualidade

das sandálias, pois vídeos de propagandas antigas – também encontrados no site

www.youtube.com – ressaltam que as havaianas não tinham cheiro e não soltavam as

tiras. Hoje, o comercial do referido produto trabalha mais com a marca em si: a pessoa é

incentivada a comprar havaianas e não outras, tidas como “imitação”.

Maingueneau (2008) comenta justamente sobre esse fenômeno ao citar o

deslocamento de “propaganda” (ênfase no produto) para “publicidade” (ênfase na

marca). Ou seja, tem ocorrido uma mudança de valor no que diz respeito às mercadorias

atuais: agora, é crucial que a propaganda veicule uma boa imagem do produto/marca; o

ethos deve ser minuciosamente pensado.

Na campanha publicitária analisada neste artigo, por exemplo, pouco se fala acerca

do produto; o único comentário direto é feito por apenas uma das personagens, a avó,

que diz “Que é bonitinha, é” sobre o novo modelo. Assim, há alguma menção sobre a

beleza das sandálias, mas as antigas características que as diferenciavam de outras marcas

não são nem mencionadas.

Os principais argumentos, responsáveis por convencer o telespectador, são ditos

pela outra protagonista, a neta: “Isso não é chinelo, é havaianas, oh, Havaianas Fit, dá

para usar em qualquer lugar”. Ou seja, se ela diz que não é chinelo, houve uma

hipervalorizarão das Havaianas, logo seria possível usar o calçado em qualquer ambiente.

Nesse contexto, o slogan é interessante porque “todo mundo usa” não é um fato;

afinal de contas, nenhuma pesquisa foi feita para se comprovar isso. Tal afirmação

configura-se como um argumento utilizado para convencer o telespectador: se todos

usam, independentemente da classe social à qual se pertence e do local onde se está,

ninguém deveria rejeitar essa moda. Concluímos, então, que há uma tentativa de

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persuadir os consumidores de que todos podem ter acesso ao produto,

independentemente da renda de cada um.

Nesse instante, o conceito bakhtiniano de ideologia começa a aparecer: a

sociedade brasileira preza muito pelo “estar de acordo com a moda” – um valor

estabelecido socialmente.

Papéis Desempenhados

A propaganda ora em análise é muito significativa para se fazer uma discussão

acerca de desempenho de papéis, especialmente se estamos comparando gerações

diferenciadas. Podemos considerar a avó como uma representante das pessoas mais

idosas e a neta representante da juventude como um todo. Temos ainda um diálogo (em

seu conceito mais corrente) entre as protagonistas, o que facilita a identificação de

tomadas de turno, fim de um enunciado e início do outro, alternância de sujeitos.

Portanto, a cada momento que uma delas para de falar, temos um novo dizer, sob o

ponto de vista de outro sujeito.

Considerando essas condições, temos no princípio um comentário conservador por

parte da senhora: ela faz uma reclamação devido ao fato de a neta estar usando “chinelo”

no restaurante. Essa atitude é, frequentemente, esperada de pessoas dessa idade, que

foram acostumadas a sair muito bem arrumadas. No comercial, por exemplo, a

personagem mais velha usa uma roupa sofisticada e séria – por causa da cor escura - salto

alto, colar de pérolas. O traje elegante parece mais adequado ao local onde elas se

encontram, pois é possível ver que o restaurante é de bom gosto: não há copos sobre as

mesas e sim taças, além de um arranjo floral e, por isso, delicado e sutil; o guardanapo é

de pano e não de papel; as cadeiras são maiores e parecem confortáveis; o garçom usa

camisa e gravata; o ator Cauã Reymond frequenta o restaurante e usa, na ocasião, uma

camisa gola polo, e não uma simples camiseta, por exemplo.

A jovem, por sua vez, veste uma roupa colorida e descontraída, afora as Havaianas.

Ela responde à crítica feita pela avó, chamando-a antiquada em “Deixa de ser atrasada, né

vó!”. Essa rotulação é feita de forma implícita, pois o verbo “deixa” pressupõe que, para a

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menina, a mulher de idade avançada tem a característica. Até esse momento, o comercial

evolui normalmente, sem causar surpresa. Porém, a chegada do ator de novelas Cauã

Reymond provoca uma sequência de diálogo responsável pela quebra de expectativa. É

exatamente essa quebra o aspecto mais chamativo e talvez o “culpado” pela censura.

É interessante, antes de tudo, observar um detalhe: a senhora não se lembra do

nome do artista – o chama de “menino” -, esquecimento típico nessa idade. Essa visão nos

conduz à definição de formação discursiva, proposta por Michel Pêcheux. Em relação à

personagem citada, podemos depreender muitas formações discursivas na nossa

sociedade: a FD da saúde (idoso é esquecido, fica doente facilmente, tem dificuldade de

locomoção), a FD do comércio (idoso necessita de muitos remédios), a FD da família

(idoso exige tempo, cuidados e despesas), a FD do trabalho (idoso não tem mais

capacidade para trabalhar), a FD da beleza (idoso perdeu a beleza ao envelhecer), a FD da

moral (idoso é moralista, conservador), e muitas outras.

Cada uma dessas FDs traz consigo uma formação ideológica: pessoas mais velhas

são um fardo para a família e para a sociedade, não têm mais “serventia” em relação ao

aspecto econômico e não acompanham as mudanças sociais. Além disso, cada um desses

pontos de vista constitui uma voz nesse discurso, o que estabelece a polifonia, conceito

bakhtiniano.

É necessário afirmar também que, em geral, ao vermos a imagem de alguém mais

senil, nós nos remetemos a todas aquelas formações discursivas. Isso ocorre porque

estamos inseridos num contexto que propicia tais ideologias. Os valores possuídos pela

sociedade brasileira, infelizmente, mostram que o idoso não tem tanto valor para os

outros, é desrespeitado, abandonado e às vezes sofre maus tratos.

Retomando a propaganda, é relevante nos determos um momento na palavra

“arrumar”, presente em “Você tinha que arrumar um rapaz assim pra você”. Nota-se que

tal verbo constitui, nesse contexto, diferentes interpretações. Foi explicitado

anteriormente o fato de os sentidos serem gerados socialmente, dentro de determinadas

possibilidades promovidas pelas condições de produção (contexto, situação, locutores,

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ethos). Assim, o dizer da senhora já previa um sentido, provavelmente relacionado a sexo.

Todavia, a jovem fez outra suposição e a verbalizou: “arrumar” como sinônimo de casar.

Talvez a menina estivesse apenas tentando dar continuidade ao assunto iniciado. Desta

forma, ao construir um ethos mais ortodoxo da avó, a neta tendeu a desenvolver uma fala

sobre casamento. A outra possibilidade é que ela seja realmente menos “liberal” do que o

esperado.

Pensando nisso, podemos perceber conteúdos implícitos naquela fala da avó. Se a

moça é aconselhada a “arrumar” alguém parecido com o ator Cauã Reymond é porque ela

não tem namorado ou porque o homem que está com ela não é tão bom quanto o ator da

Rede Globo. Além disso, “um rapaz assim” deixa subentendido, por exemplo, que o

escolhido deve ter dinheiro, ser bonito e famoso, assim como o artista mencionado.

Todos os apontamentos feitos até aqui nos conduzem novamente a Maingueneau

(2008) e sua pesquisa acerca de ethos. Nesse sentido, há o ethos pré-discursivo que a avó

constrói da neta antes que essa fale algo, e vice-versa. Esse retrato prévio é justificado

pela observação das roupas e acessórios usados pelas personagens; pela aparência de

cada uma, o que denuncia a idade; pelo olhar de reprovação por causa da escolha de um

calçado dito inadequado; pelo tom de reclamação na voz. Os pormenores citados

contribuem para com os estereótipos preconceituosos estabelecidos na sociedade.

Antes do diálogo, por conseguinte, a mulher idosa faz uma imagem “moderninha”

da menina e essa faz uma imagem antiquada da outra, juntamente com quem assiste à

propaganda. O assunto inicial também comprova as primeiras impressões. Após o diálogo,

entretanto, ocorre a inversão de valores/papéis, surpreendendo as duas e,

simultaneamente, os telespectadores/consumidores. Não é por acaso que, ao final, a

moça mostra espanto e grita “Vó!”, enquanto a senhora diz “E depois eu é que sou

atrasada?!”. A pergunta/exclamação da protagonista deixa transparecer um

subentendido: “a atrasada é você”.

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A Censura: constituição de ecos sociais

Provavelmente, o aspecto mais fascinante de toda a análise se trate da recepção

da campanha publicitária pelo público. Como já foi dito anteriormente, houve a censura e

uma nova propaganda foi transmitida na televisão no lugar da primeira. Nesse contexto, o

questionamento central seria: por quê?

Pudemos observar que há uma inversão de valores/papéis no que se refere à avó e

à neta, personagens representantes de gerações distintas. Foram relatadas aqui as

formações discursivas e ideológicas que atravessam os discursos veiculados no comercial.

Cada ideologia representaria uma voz social: a voz moral de que pessoas mais velhas têm

um comportamento mais recatado; a voz da Igreja Cristã que condena o sexo fora do

casamento; a voz da família que teme o aparecimento precoce desse assunto na vida dos

filhos e também a voz do erotismo que incentiva uma discussão mais aberta do tema.

Todas essas vozes constituem a polifonia, conceito bakhtiniano.

Se a empresa responsável pela venda de Havaianas se viu obrigada a retirar o

comercial do ar, provavelmente a reclamação do público atingiu uma quantidade

significativa. Assim, se houve descontentamento, os valores presentes nas falas da avó e

da neta e analisados no decorrer deste trabalho perturbaram uma parte da população. O

incômodo da inversão de papéis deve ter sido gerado pelos conteúdos recuperados na

memória discursiva, sendo que tais informações estabelecem dialogismo com os discursos

presentes na propaganda, refutando-os.

As ideologias são criadas na sociedade e “internalizadas” durante o nosso

desenvolvimento por causa da interação social, passando a constituir a memória

discursiva de cada ser humano. Desta forma, uma parte da população vivenciou um

estranhamento ao ver na televisão o assunto “sexo” exposto de maneira tão livre e com

tanta naturalidade. Isso ocorreu pelo fato de a memória discursiva ter mostrado que, há

alguns anos, esse tema era tabu para ser tratado em qualquer lugar, ainda mais

publicamente.

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Considerando esses apontamentos, é possível perceber que antes havia um

interdiscurso: “sexo” é um tópico que não deve ser discutido de maneira tão aberta,

principalmente em público e por pessoas idosas. Esse já-dito dialoga com a situação

explicitada na campanha publicitária, sendo por ela rejeitado devido à ruptura do ethos da

avó. Portanto, o dialogismo de Mikhail Bakhtin (2006) marca presença nesse momento: as

diversas vozes sociais dialogam entre si, resgatando discursos antes em voga e indignando

uma parcela dos brasileiros.

No novo comercial transmitido na televisão, há uma breve reprise do que foi

censurado. Não há menção ao motivo, porém o comentário “Eu tô falando de sexo” não é

mostrado. Isso indica que deve ser exatamente essa fala a “culpada”. Por outro lado, a avó

diz que alguns adoraram a propaganda das Havaianas Fit (sendo que, na verdade, o

produto perdeu o posto de centro das atenções) e por isso ela foi mantida na internet. Há

uma ironia provocada pelo enunciado “Democrático, né?” já que não deve ter sido um

processo democrático, e sim imposto, o banimento da propaganda da televisão.

A ressalva de que a campanha publicitária estaria disponível na internet é decisiva

no contexto porque na rede digital há, por convenção, mais liberdade e “democracia”,

talvez por ser uma criação mais recente. A avó encerra ao dizer “Viu como eu sou

moderninha?”, referendando um ethos que corresponderia ao ethos do produto: a

mulher idosa demonstra uma imagem moderna (até mesmo por ter no colo um notebook)

assim como o produto o faz, por causa da presença da internet na promoção das sandálias

Havaianas.

Conclusão

Este artigo foi desenvolvido com a finalidade de investigar a campanha publicitária,

transmitida em 2009, de uma mercadoria bastante conhecida no Brasil: as Havaianas. O

que motivou a pesquisa foi o interesse despertado em relação aos conteúdos implícitos

presentes na propaganda, além da admirável inversão de papéis protagonizada pelas

personagens. Também a censura constituiu-se como um fecho fascinante e intimamente

ligado aos valores veiculados na conversa entre avó e neta.

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Para atingir nossos propósitos, consideramos desde as falas das protagonistas, até

elementos aparentemente secundários, como suas roupas, seus acessórios e o cenário.

Isso se explica pelo fato do nosso objeto se tratar de um recurso audiovisual (vídeos).

Além disso, o fio mestre responsável por guiar o presente estudo foi a Análise do Discurso

de linha francesa, pois nos aproveitamos das definições de dialogismo, ideologia,

polifonia, discurso, formações discursivas, memória discursiva e ethos.

Esperamos que este trabalho dê alguma contribuição para futuras investigações na

mesma área, apesar de termos consciência de que a leitura aqui apresentada é apenas

uma possibilidade, dentre tantas. Outras interpretações podem e devem ser realizadas a

fim de expandir as discussões acerca da constituição de discursos dentro da sociedade.

Referências:

BAKHTIN, M. (Volochinov). Marxismo e Filosofia da Linguagem. Trad. M. Lahud e Y. F. Vieira. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2006. FERNANDES, C. A. Análise do Discurso: reflexões introdutórias. Goiânia: Trilhas Urbanas, 2005. FIORIN, J. Introdução ao Pensamento de Bakhtin. São Paulo: Ática, 2008. KOCH, I. A Inter-ação Pela Linguagem. São Paulo: Contexto, 1992. MAINGUENEAU, D. A Propósito do Ethos. In: MOTTA e SALGADO (Orgs.). Ethos Discursivo. São Paulo: Contexto, 2008. p. 11-29. ORLANDI, E. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. 4ª ed. Campinas: Pontes, 2004. ORLANDI, E; LAGAZZI, S. (Orgs.). Introdução às Ciências da Linguagem: discurso e textualidade. Campinas: Pontes, 2006.

Filme “Avó” com Cauã Reymond – Havaianas. Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=KxgTJMZo8Kg. Acesso em 20 ago. 2010. Havaianas – Vovó pede desculpas (2009). Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=eRajwoZmc1U. Acesso em 20 ago. 2010.

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Pentecostalismo e Sociedade: Estudo Sobre Similaridades e Diferenças Entre Católicos Carismáticos e Protestantes Pentecostais. Rafael Damião Carmo Rosa de Almeida53

Resumo A principal proposta desta pesquisa é observar as similaridades e diferenças das

práticas pentecostais dentro de duas vertentes do pentecostalismo, Renovação

Carismática Católica (RCC) e a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) desde 1979-2009,

na cidade de Inhumas, Goiás. Com essa análise de similaridades e diferenças se quer

compreender principalmente o grau de proximidade dessas práticas religiosas. Práticas

que ao serem analisadas a partir de “olhares apressados” parecem ter menos em comum

do que de fato tem. Durante as pesquisas, concluiu-se que a partir de certos prismas pode

haver mais proximidade entre catolicismo carismático e protestantismo pentecostal do

que as similaridades existentes entre os catolicismos carismático e tradicional, ou

existentes entre os protestantismos tradicional e pentecostal.

Palavras-chave: Religião. História. Católico. Carismático. Protestante. Pentecostalismo.

Religião, História e Sociedade

Pensar os seres humanos inserido numa sociedade traz consigo questionamentos e

dificuldades quando pesquisadas a partir do ponto de vista e do conceito da religião.

Observar as ações desse “homem” a partir de questões ligadas à religiosidade contribuirá

para o campo das Ciências Humanas. E a partir dessas ações humanas discutiram-se

alguns termos como religião, fé, rito.

Nessa perspectiva de Piazza, a religião é dada como manifestações espirituais do

homem, porém reconstruídas a cada geração de forma diferente. Deve-se ao fato que, em

cada época o contexto histórico influenciará bastante os seres humanos e suas práticas

espirituais as mudanças necessárias para tal período ou contexto.

Para Durkheim (1912), a religião é um aspecto “essencial e permanente da

humanidade”, a partir daí, a religião é estabelecida, em um plano geral, elementos dentro

53 Rafael Damião Carmo Rosa de Almeida é aluno do 4º ano do curso de História da UEG Goiás. Professor Indicador do artigo Doutor Itelvides José de Morais do Curso de História da Universidade Estadual de Goiás da cidade de Goiás

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destes segmentos religiosos que são permanentes e comparáveis. Schlesinger e Porto

definem a religião como algo concreto e visível inserido socialmente, tendo

relacionamento do homem com Deus através de práticas ritualísticas, palavras culturais e

um acervo patrimonial escriturístico (Schlesinger & Porto, 1982).

Em seguida ao conceito de religião, podemos abordar neste trabalho a questão da

fé e rito. Tais questões são importantes para o desenvolvimento deste, pois ao ver na

pesquisa as diferenças e similaridades de dois movimentos pentecostais; um baseado

ainda nos dogmas católicos e outro classificado como evangélico, perceberá que há

diferenças, distanciamentos entre opiniões sobre determinados assuntos.

A RCC (Renovação Carismática Católica) segue uma forma diferenciada de fé, se

comparada ao que de repente seja fé para os grupos adeptos do protestantismo. Segundo

Prandi (1997), a fé pregada na RCC é extremamente valorizada, visto que, é utilizada em

todos os grupos de oração e nos grandes encontros realizados pelos carismáticos. É

importante observar que, a fé é diferenciada de acordo com a doutrina, seja cristã,

islâmica, ou qualquer outra. A fé para muitos é necessária e importante, pois como Prandi

(1997) expõe, é expressa a fé, a reza do terço, mesmo sendo de tradição antiga, mas que

ainda vigora nos tempos atuais.

Para Schlesinger e Porto (1982), a questão dá fé é a principal fonte da vida de um

religioso, onde o indivíduo enfrenta com segurança o medo, sua fraqueza e preguiça, e de

acordo com estes autores, a fé é o que faz crer em Deus. Assim, a fé é essencial tanto para

os católicos quanto aos evangélicos. Isto é relacionado na crença total em Deus, nas

bênçãos e conquistas que o indivíduo possa vir a ter conquistado fazendo acreditar mais

em Deus e que o retorno mesmo sendo demorado, vem a qualquer hora. A intenção da fé

seria então, a confiança e segurança em Deus para ter uma resposta esperada pelo

indivíduo.

Tanto a fé e o rito fazem parte de muitas religiões, tanto no catolicismo e

protestantismo, porém, observados aqui no movimento carismático católico e na

denominação pentecostal IURD, estas fazem os seus adeptos florescerem ainda mais a fé,

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explorando o lado sensitivo e emotivo deles, transmitindo assim no final, um resultado

esperado pelos líderes.

O Pentecostalismo

O termo evangélico, muito utilizado na contemporaneidade para afirmar que uma

pessoa é de uma determinada Igreja ou de tal denominação religiosa, ganhou espaço

entre os termos crente e protestante. Tal como explica Morais (2007, p. 15) que, “também

oriundo do latim evangelicus, significa aquele que crê nos evangelhos. Entre outros

motivos a projeção do termo, justifica-se pela busca de uma maneira de designar que

causasse menor impressão de radicalismo”. Os termos aqui abordados serão retomados a

todo instante, visto que haverá um envolvimento entre seguidores da linha evangélica,

porém muitos talvez vão se declarar protestantes ou até mesmo crentes.

Sendo assim, facilitando o entendimento dos conceitos acima expostos, Morais diz

a respeito do pentecostalismo surgido no século XX,

[...] surgiu como referência que em muitos aspectos parecia se aproximar do

termo evangélico. Assim como esse, sua maior ligação seria com as igrejas que

chegaram ou foram fundadas no século XX, em países como Brasil. Além dessa,

outra de suas características é aliar aos rituais já comuns no protestantismo,

como a crença em dois sacramentos, com práticas tais como o batismo pelo

Espírito Santo. (MORAIS, 2007, p. 29)

Baseado em Morais, o termo evangélico está ligado com o movimento pentecostal,

pois tal movimento teve primeiramente influência dentro do “universo” evangélico. Mas

no final da década de 1960, este movimento pentecostal ganhou adeptos católicos.

Em análise à Maria das Dores Campos Machado, observa-se que o

pentecostalismo:

comum a elas seria também o estímulo à participação emocionada e

espontânea nos rituais, ao proselitismo religioso e à rigidez moral, levando os

fiéis a ocuparem lugares separados nos cultos, de acordo com o sexo, e

encarregando toda a comunidade religiosa da vigilância constante de seus

membros. (MACHADO, 1996, p. 45)

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Já Machado (1996), expõe que o pentecostalismo como sistema rígido da moral

tem como objetivo a busca da participação do lado emocional e espontânea, além da

prática nos seus rituais. Neste sentido seria um movimento resgatando os sentidos da

Igreja Primitiva, virtudes mais rígidas.

Perbont (1994) e Morais (2007), afirmam que o batismo no Espírito Santo são

características importantes deste movimento. Se em certos aspectos as características sob

os termos evangélico e pentecostal são de similaridades, por outros aspectos esses

termos podem ser pensados a partir de seu distanciamento. Morais (2007) faz algumas

observações que os separam,

O batismo seria uma das diferenças, somado à constante busca de curas físicas e

espirituais, à oração em voz alta, e na maioria dos casos à preocupação em

estabelecer regras para vestes, adereços e comportamentos de homens e

mulheres, que quando comparadas com os padrões dos demais protestantes,

acabam por se mostrar mais rígidas. (MORAIS, 2007, p. 29)

Como já observado, o batismo é a chave principal e norteadora do

pentecostalismo, mas vale ressaltar aqui uma observação importante de Wrege (2001), o

pentecostalismo se expandiu na classe mais pobre, principalmente entre os de baixa

renda e escolaridade. Torna-se importante esta observação feita por Werge porque

desses segmentos sociais que surgirão os maiores propagadores do movimento

pentecostal no Brasil.

O pentecostalismo se organiza no Brasil por volta de 1910 e 1911 com a fundação

das Igrejas Congregação Cristã do Brasil em São Paulo e Assembleia de Deus no Pará, que

fazem parte da chamada Primeira Onda Pentecostal (Araújo, 2008). Ao longo dos anos, o

pentecostalismo passou por algumas divisões, e é caracterizado em três ondas ou três

fases, de acordo com Morais (2007) apresenta-as da seguinte forma,

[...] a primeira dessas subdivisões é normalmente chamada primeira onda

pentecostal. No caso do Brasil, sob esse termo estaria a maioria das igrejas

surgidas na primeira metade do século XX, tais como a Congregação Cristã do

Brasil, e a Assembléia de Deus (MACHADO, 1996 apud MORAIS, 2007, p. 31).

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A segunda onda pentecostal, o movimento é caracterizado da seguinte forma: é

similar a primeira onda pentecostal, porém surgiu na metade do século XX com outras

igrejas e com aspectos mais radicais. De acordo com Morais (2007),

[...] essa segunda onda pentecostal, além desses pontos de aproximação com as

igrejas da primeira onda, tem como características próprias o radicalismo ainda

maior a respeito da sobriedade e recato das vestimentas e a tendência de maior

distanciamento de outras igrejas. (MORAIS, 2007, p.32)

Já a partir da década de 1970 surgiria a chamada Terceira Onda Pentecostal ou

igrejas neopentecostais. Estando entre as igrejas surgidas neste período a Igreja Universal

do Reino de Deus (1977), Internacional da Graça de Deus (1980), Renascer em Cristo

(1986) e Comunidade Sara Nossa Terra (1992). Sendo assim, definida por Silva:

*...+ iniciada nos anos de 1970, *...+ Pelo acréscimo do prefixo latino “neo”,

pretendeu-se expressar algumas ênfases que as igrejas identificadas nessa fase

assumiram em relação ao campo do qual, em geral, faziam parte: abandono (ou

abrandamento) do ascetismo, valorização do pragmatismo, utilização de gestão

empresarial na condução dos templos, ênfase na teologia da prosperidade,

utilização da mídia para o trabalho de proselitismo em massa e de propaganda

religiosa (por isso chamadas de “igrejas eletrônicas”) e centralidade da teologia

da batalha espiritual contra as outras denominações religiosas, sobretudo as

afro-brasileiras e o espiritismo. (SILVA, 2005, p.152)

A RCC também faz parte deste movimento neopentecostal, porém na dimensão

católica, conhecido como Movimento Carismático Católico (Araújo, 2008). Nela, assim

como nas demais denominações pentecostais surgidas neste período há maior ênfase do

que nas igrejas surgidas nas duas ondas pentecostais anteriores dos chamados meios de

comunicação de massa; com destaque para rádio, jornais, internet e canais de televisão. E

assim como as demais igrejas do período valoriza os cantos, o milagre e o culto baseado

na ligação com o Espírito Santo e o que se considera serem seus dons.

Esses conceitos sobre pentecostalismo são relevantes porque parecem se

aproximar daquilo que provavelmente encontraremos nas manifestações religiosas

pesquisadas, ou seja, essas definições se aproximam do que os fiéis carismáticos e

evangélicos pentecostais acreditam e defendem. Portanto, esses conceitos facilitarão a

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compreensão do nosso objeto de estudo, visto que as definições conceituais apresentadas

estão em sintonia com as práticas diárias dessas formas de expressão religiosa.

Católicos Carismáticos e Protestantes Pentecostais: Similaridades e Diferenças

Nas pesquisas que embasam essa parte do trabalho, utilizou-se de entrevista com

indivíduos adeptos a esses dois fenômenos religiosos, Igreja Universal do Reino de Deus

(IURD) e Renovação Carismática Católica (RCC). Portanto, as fontes orais são elementos

importantes para fazer a análise das semelhanças e diferenças entre a IURD e RCC. E como

essas práticas religiosas são carregadas de símbolos, Bourdieu afirma que “os símbolos

são os instrumentos por excelência da <<integração social>>: enquanto instrumentos de

conhecimento e de comunicação” (BOURDIEU, 1989, p. 10).

Percebe-se que os símbolos são muito utilizados na IURD e RCC, estes símbolos

legitimam parte do poder sobre os adeptos a estes grupos, “é enquanto instrumentos

estruturados e estruturantes de comunicação e de conhecimento que os <<sistemas

simbólicos>> cumprem sua função política de instrumentos de imposição ou de

legitimação da dominação, que contribuem para assegurar a dominação de uma classe

sobre outra. (BOURDIEU, 1989, p. 11)”.

Essa busca por legitimação do grupo religioso se dá nos âmbito de proporção de

número de fiéis. Os símbolos servem também como apoio nos momentos de oração, na

IURD percebe mais o uso de símbolos, pois nos momentos de ofertórios e do dízimo, o

líder da igreja com a ajuda da sua equipe (obreiros) traz o óleo, a água para aspersão e

abençoam os fiéis que estão em dias com seu dízimo e através das ofertas destes, a igreja

consegue estar em dias com suas despesas. Foi notado ainda grande uso do sal tanto

como símbolo de purificação, pois em alguns cultos da IURD foi utilizado o sal para

purificar os fiéis, e também é usado com mais frequência na sextas, pois este é o Dia da

Libertação, e, além disso, é utilizado nos momentos em que se aborda ou se coleta

dízimos e ofertas. Essa prática de uso de símbolos é apresentada na IURD, “porque assim

é e porque não há sujeito social que possa ignorá-lo praticamente, as propriedades

(objetivamente) simbólicas, mesmo as mais negativas, podem ser utilizadas

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estrategicamente em função dos interesses materiais e também simbólicos do seu

portador”. (BOURDIEU, 1989, p. 112)

No grupo de oração da carismática que foi visitado não há uma ênfase em pedir

oferta e dízimo. E quando isto acontece, os carismáticos só fazem nos grandes encontros

anuais (Encontrão e Rebanhão) 54, quando se encerram os eventos é celebrada uma missa,

e neste momento como ritual da missa, é pedido dinheiro no momento de ofertório. E

quando se tem uma passagem bíblica envolvendo o tema dízimo, o celebrante (padre) faz

uma maior apresentação sobre a importância da contribuição tanto da oferta quanto do

dízimo. Mas esses dois momentos não fazem parte da teologia da Igreja Católica, pois há

cobranças na Igreja Católica que não são presentes em outras igrejas, como batismo,

casamento, missa de sétimo dia, cumprimento dos sacramentos e outras celebrações

especiais. Essa diferença é observada na teologia de cada religião, a IURD segue a

tendência da Teologia da Prosperidade, e a religião católica segue a tendência da Teologia

da Libertação. Em que a primeira é observada a grande presença da questão do

enriquecimento econômico e financeiro do fiel, e já a segunda é presente a questão de

libertação da vida mundana, envolve mais o assunto da salvação. Interessante observar a

Teologia da Prosperidade apresentada em Mariano (2005), em que, para ele,

A Teologia da Prosperidade subverte radicalmente o velho ascetismo pentecostal. Promete prosperidade material, poder terreno, redenção da pobreza nesta vida. Ademais, segundo ela, a pobreza significa falta de fé, algo que desqualifica qualquer postulante à salvação. (MARIANO, 2005, p. 159)

É interessante observar que as igrejas de tendência a Teologia da Prosperidade,

como no caso a IURD, tem um público de grande participação oriunda da classe baixa,

muitos não tem escolaridade concluída. Essas pessoas provavelmente buscam nesta igreja

uma solução de seus problemas financeiros e econômicos, pois se não há escolaridade

concluída (mesmo que seja o ensino fundamental), os participantes desta teologia tem

54 Rebanhão e Encontrão: dois grandes encontros realizados pela RCC, praticamente todo ano se tem esses

dois encontros. O primeiro as pessoas se reúnem para louvar ao Senhor Deus nos quatro dias de carnaval. O segundo é uma forma de reunir mais uma vez todos os grupos de oração da cidade.

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empregos em que a remuneração é baixa, e os problemas econômicos são a grande

dificuldade para ascensão e status. Essa questão da Teologia da Prosperidade é complexa,

mais na IURD, atribui – se o que Mariano (2005) diz, “Daí advêm parte da insistência dos

pastores em dizer que somente prosperam os que mantêm fidelidade no pagamento do

dízimo. Os demais são merecedores apenas de graças pontuais, similares à sua

inconstância no “dar”.” (MARIANO, 2005, p. 164).

De acordo com Santana (2001), “o fiel não pode se contentar com a miséria e com

a desgraça. Viver na presença de Deus é ter vida abundante. Portanto, suas reuniões e

rituais são marcados por uma visão teológica de prosperidade.” (SANTANA, 2001, p. 82). E

depois ela nos traz que os discursos que os líderes das duas vertentes religiosas fazem

para seu público alvo são semelhantes. Os discursos para pedirem a oferta e estar em dias

com o dízimo são sempre para fins sociais. Daí tem-se que no dízimo e no ofertório para

esses segmentos religiosos até certo ponto são importantes, mas analisando a forma que

os líderes fazem, torna-se diferente dos carismáticos. Os iurdianos (membros da Igreja

Universal) pedem de forma diferente dos carismáticos, pois há certa cobrança maior no

pagamento do mesmo, e nas ofertas, os iurdianos são mais cobrados em sempre estar

ofertando, principalmente em época de campanha de prosperidade.

Mas em entrevista feita com Antonieta (pioneira da IURD)55 , a questão do dízimo

para ela é o que se percebe na maioria dos fiéis, há uma defesa por parte dela em relação

à contribuição do dízimo e ofertório,

“... A Igreja Universal visa muito assim, que ela pede muito dinheiro. Mas tem as

campanhas, que o povo visa que não está na Bíblia, que não fala sobre dá oferta.

Eles leem na palavra de Deus, fala olha tal lugar foi mandado que dava isso que

dava aquilo, mas não, eles têm as “campanhas”, agora faz a campanha se a

pessoa quiser livre espontânea vontade, o pastor não obriga ninguém, se passa

55 Antonieta Ferreira Oliveira, 76 anos, casada, aposentada. Pioneira da Igreja Universal do Reino de Deus, mas atualmente frequenta a Igreja Maanaim de Inhumas.

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o envelope, passou o envelope. Eu quero pegar eu pego eu não quero não pego.

Se tive necessidade de fazer uma campanha eu faço. Lá também eles não visam

assim: ó você dá porque a pessoa fala: o fulano você pode dá tanto nessa

campanha?...” (entrevista realizada no dia 18/09/10 em Inhumas).

Para dona Antonieta, a questão da contribuição da oferta e do dízimo é algo já

aceito por parcela das pessoas da Igreja, pode - se analisar essa fala como uma forma de

defesa por toda a polêmica que a Igreja Universal tem em relação a suas estratégias de

trabalhos com dízimo e ofertório. Ela elenca também a questão da espontaneidade das

contribuições nas campanhas de orações. A polêmica que a IURD tem em relação a essa

arrecadação e exploração não faz parte desta pesquisa, o que faz parte da pesquisa é a

prática religiosa da igreja e o uso dos símbolos como forma de legitimação desta prática

da igreja.

Chega-se a um ponto de diferença e semelhança neste assunto do dízimo e oferta.

Os iurdianos e carismáticos pedem para o mesmo objetivo: social. Mas os meios

alternativos e criativos que os dois movimentos usam são diferentes. Para os iurdianos a

utilização dos símbolos: passagens bíblicas no boleto do dízimo e a purificação através do

sal vão legitimar e dar condições para os líderes chegarem ao objetivo principal que é a

totalização dos fiéis em cumprimento do pagamento do dízimo e a maior participação na

oferta. Mesmo que os carismáticos pedem para o mesmo objetivo que é o social, não

fazem tanto uso da simbologia para conseguir mais ofertas e cumprimentos do dízimo.

Conclui-se que a IURD e a RCC pedem para a mesma finalidade que é a social,

pautada nas atividades sociais. Mas diferenciam na forma de pedir, e também de

apresentar a importância do dízimo e da oferta, já que a IURD aproveita-se de certa

simbologia para conseguir mais dizimistas e ofertas na perspectiva de quem contribui com

a igreja, terá seu retorno garantido.

No campo carismático, e em algumas visitas aos grupos de oração, percebe-se que

há um segmento linear nos dias de orações. Diferentemente da IURD, os iurdianos, aliás, o

líder da igreja não segue uma linearidade no ritual religioso, porém a cada dia da semana

é trabalhado um tema pertinente e que envolve também os dons carismáticos. Nos

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momentos de participação nos grupos carismáticos, percebe-se que há uma “entrega”

maior dos fiéis durante o período de oração. Diferente dos iurdianos que elevam o tom de

voz quando fazem este tipo de pedido. Em uma das visitas, observou-se que uma parcela

dos pastores praticamente esbravejava com os braços nas orações. Os cânticos das

músicas também eram muito altos. Estes dois aspectos podem ser considerados também

simbólicos exercidos para que seus fiéis tenham maior participação nas orações e

cânticos.

Segundo Santana, “tanto para os pentecostais quanto carismáticos conservam o

apelo à tradição denominacional ou religiosa. Procuram evitar rupturas ou cisões. O

objetivo dos dois grupos é a renovação espiritual de cada fiel per si.”. (SANTANA, 2001, p.

80). Para Santana (2001, p. 79) o que seria o marco tanto para o “Pentecostalismo no

Protestantismo, quanto do movimento Carismático na Igreja Católica” é o batismo de

fogo, em que através deste batizado, os dons carismáticos poderiam desenvolver com

mais praticidade. Este objetivo que Santana expõe, foi notado em algumas participações

tanto nos grupos de oração da RCC e cultos da IURD, pois nos momentos de oração,

pregação os líderes destes grupos apresentavam propostas para uma renovação espiritual

das pessoas que estavam com algum tipo de problema: familiar e/ou financeiro. Estes

problemas são os mais comuns, em que as pessoas procuram estes movimentos

religiosos. Santana (2001) pontua vários assuntos que assemelham e diferenciam os

pentecostais (protestantes) dos carismáticos. A utilização da Bíblia é observada em boa

parte dos grupos evangélicos, protestantes, mas é mais recente e usado com mais vigor

para os católicos quando estes seguem o movimento pentecostal de linha católica. Os

católicos tradicionais por muito tempo não era grande utilizador da Bíblia, por mais que

nas missas, terços, rezas é utilizada para fazer liturgia, só teve maior ênfase após o

surgimento do movimento carismático católico.

Santana levanta outra semelhança, “os grupos religiosos, tanto os pentecostais,

quanto os carismáticos, buscam a cura divina, fruto dos dons do espírito.” (SANTANA,

2001, p. 81). Segundo Prandi, “*...+ ricos, pobres, católicos carismáticos, pentecostais,

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homens, mulheres... procuravam assistência material e espiritual: paz, melhoria nos

relacionamentos pessoais e nos problemas de adaptação e identidade, curas de males

físicos e mentais melhorias financeiras, etc. (PRANDI, 1997, p. 125)”. Os indivíduos em si

parecem buscar certa religião quando estão precisando de ajuda, no campo espiritual,

amoroso, familiar e inclui também o financeiro. Na IURD foi mais notável a participação de

alguns fiéis quando o líder (pastor) começa a tocar nos assuntos aqui destacados, pois são

os pontos chaves que a IURD trabalha para abarcar mais fiéis.

Na pesquisa em campo, percebem-se também diferenças na questão sobre Maria.

Para os carismáticos católicos há uma maior aproximação e divulgação do amor à Maria.

Bem diferente dos carismáticos, os iurdianos não a consideram tão importante quanto

Jesus. Para Santana (2001), em sua observação também entre os pentecostais

(protestantes) e carismáticos católicos, os protestantes consideram Maria como “uma

mulher que recebeu uma graça especial e que deve ser lembrada como exemplo de

conduta, nada mais.” (SANTANA, 2001, p. 80).

Nessa mesma análise ainda de Santana, segundo a autora, “Maria é uma fronteira

instransponível entre os dois territórios, que de outro modo, poderia ser um só”

(SANTANA, 2001, p. 80). E esta fronteira é observada também na entrevista com Maria

Helena (M. H.) - membro da RCC - quando ela comenta sobre a IURD, “Nunca participei da

Igreja Universal, mas pelo pouco que sei, penso que ela não é completa, pois não acredita

na intercessão da Mãe do Filho de Deus, não foi instituída claramente por Deus como a

Igreja Católica e parece se deixar levar muito por interesses humanos” Entrevista realizada

no dia 25/09/10 em Inhumas.

Esta barreira de territórios religiosos, fazendo uma análise da entrevista com M. H.

(membro da RCC). Para a entrevistada a RCC e a IURD são muito diferentes e não é Maria

que as separam, é a constituição das denominações, pois a RCC como movimento

religioso dentro da Igreja Católica, e esta considera a Igreja fundada por Jesus Cristo,

consequentemente qualquer outra religião que não seja a católica não é constituída e

sagrada, pois são fundadas por interesses do “homem”.

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A questão da “reza do terço” é outro marco radical que separam os carismáticos

dos pentecostais (protestantes), em que há uma aversão e condenação, mas que “seria

uma forma de assegurar a presença católica na vida carismática.” (SANTANA, 2001, p. 80).

Em entrevista com M. H. sobre a influência da RCC na vida de seus seguidores ela

diz: “A Renovação influencia totalmente a vida da pessoa que a segue. Ela eleva nossa fé e

proporciona conhecimento sobre a lei de Deus e confiança na misericórdia e no amor de

Deus. Assim nos tornamos pessoas mais seguras” (Entrevista de 25/09/10), deixa nos

claramente que a RCC contribui bastante para ter um contato com Deus.

Um pouco diferente da resposta dada por outra entrevistada da RCC sobre a

influência que a RCC faz na vida dos seus participantes, Aparecida Siqueira (A. S.) -

membro da RCC - considera que “Quando se busca uma experiência pessoal com Espírito

Santo, Ele eleva a pessoa a um desejo de profunda mudança em suas condutas, desperta

para o desejo de sair do egoísmo e ir servir” (Entrevista de 30/09/10). Nesta perspectiva, o

Espírito Santo é importante e influencia bastante na vida de quem o busca.

Sobre os dons carismáticos e o uso deles nesses segmentos religiosos, há

diferenças nas respostas das entrevistadas. Para dona Antonieta (IURD)

“Porque a Igreja Universal, a prática dela que ela traduz pra gente assim, é pela

Bíblia, o que está escrito na Bíblia que eles transmitem pra gente... Eles recebem

também os sete dons né... É usado porque agente tem o ensinamento né, eles

nos ensina dentro da palavra de Deus, dá o estudo pra gente sobre a palavra de

Deus né, dos mais tudo que está baseado dentro da Bíblia. (Entrevista de

18/09/10)”

Portanto, na Igreja Universal, boa parte dos ensinamentos e uso dos dons

carismáticos está no ensinamento da Bíblia. E segundo a outra entrevistada da IURD,

Jéssica da Silva (J. S.) - obreira da IURD -, o uso dos dons possui naturalidade, “É algo

natural, pois é o momento que a pessoa está se libertando, ela abriu o coração para Deus

e o mal que estava dentro dela está saindo” (Entrevista de 05/10/10).

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Já dessemelhante da resposta da M. H. (RCC) que,

“Com a vinda do Pentecostes, Deus nos deu a graça de estar conosco através do

Espírito Santo, nos dando uma imensa intimidade de filhos com o Pai. Para isso

ele nos concede os dons carismáticos que nos conduzem e nos capacitam a

fazermos a sua vontade... e utiliza os dons carismáticos proporcionando aos seus

participantes uma vida movida pelo Espírito Santo.” (Entrevista realizada no dia

25/09/10)

Destaca-se que para a RCC, os dons carismáticos são concessões de Deus para seus

filhos, e estes dons capacitam proporcionando uma vida movida pelo Espírito Santo. Esta

resposta nos leva a entender que os dons carismáticos são sagrados, pois praticando o uso

deles, os fiéis terão maior contato com Deus. E estes dons também são usados com

frequência, segundo A.S. (membro da RCC), pois “fazemos uso dos dons em todas as

nossas atividades, procuramos deixarmos ser conduzidos pelo Espírito Santo” (Entrevista

de 30/09/10).

Quando as entrevistadas são perguntadas sobre as práticas religiosas de seus

segmentos, há novamente diferenças em seus discursos. De acordo com dona Antonieta

(pioneira da IURD),

“Não, eu não digo assim que influencia para seguir ali, porque a Igreja Universal

ela recebe pessoas de toda religião, ela não exclui assim de uma religião de

outra não, lá participa toda pessoa, pode ser um espírita, católica ou pode ser

quem for, procuro a Igreja eles atendi...” (Entrevista de 18/09/10)

E na RCC, as práticas religiosas são vistas novamente como concessões de Deus, e

M. H. (membro da RCC) afirma que,

“Acredito que todos os meios concedidos por Deus para que tenhamos

comunhão com Ele são importantes. As práticas do Pentecostes são os mais uns

desses meios concedidos por Deus, que nos dá condições para vivermos filhos de

Deus, ou seja, para que tenhamos uma vida plena.” (Entrevista de 25/09/10).

Analisando a resposta de A. S. (membro da RCC) sobre as práticas religiosas, “sem

dúvida quem busca exercer os dons, ser conduzido pelo Espírito Santo, realmente estará

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sendo carismático, fazendo a vontade de Deus em todas as áreas de sua vida,

consequentemente viverá com paz e alegria, mesmo nas dificuldades” (Entrevista de

30/09/10). Dessa forma, na RCC, através dos grupos de oração, o exercício e uso dos dons

carismáticos, além de servir como contato com o Espírito Santo, serve também como base

para se viver em paz e alegria.

Percebe-se que a segunda entrevistada da IURD não considera a Igreja Universal

como a melhor, mas na IURD o participante desta igreja terá um encontro real com Deus.

Para ela “o que faz as pessoas irem para IURD é o encontro real e verdadeiro com Deus é o

que Deus faz na vida dela dentro da Igreja Universal”. Então, neste segmento religioso, as

pessoas poderão ter este encontro verdadeiro com Deus, segundo J. S. (obreira da IURD)

(Entrevista de 05/10/10).

Sobre a contribuição que o individuo terá em fazer parte da RCC, M. H. diz que “Ao

participar de um grupo de oração, o sujeito vive uma experiência tão sublime de contato

com Deus, que se torna uma pessoa mais completa e feliz, buscando sempre viver em

intimidade com Deus e também compartilhar essa graça com os outros, evangelizando o

próximo” (Entrevista de 25/09/10). Há uma defesa e uso de um discurso de que na RCC a

pessoa terá felicidade e também intimidade com Deus.

As práticas religiosas dessas manifestações são semelhantes em alguns aspectos

não apresentados pelas entrevistadas. Exemplo destas semelhanças destacou através de

Santana (2001, p. 87), em que ela considera “a percepção do incondicional amor de Deus;

busca de santificação; experiência no Espírito Santo; ideal de igualdade espiritual entre

homens e mulheres; busca da cura divina; emocionalismo e o falar em línguas

(glossolalia)”.

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Tabela 01 - Semelhanças e Diferenças Entre A Renovação Carismática Católica (RCC) e Igreja

Universal do Reino de Deus (IURD).

Características IURD RCC

Maior uso de símbolos nos momentos de oração. X

Dízimo e oferta: discurso com a mesma finalidade: fins sociais. X

Discurso mais visível e incisivo sobre a importância e a

necessidade de dizimar.

X

Forma de pedir dízimo e oferta. X

Linearidade na oração. X

Maior participação dos fiéis. X

Apelo à tradição religiosa ou denominacional. X

Busca por renovação espiritual, melhoria financeira, e familiar. X

Uso da Bíblia* . X

Busca pela cura divina. X

Importância dos santos e da figura de Maria. X

A prática da reza do terço. X

Maior uso dos dons carismáticos X

Autor: Rafael Damião Carmo Rosa de Almeida, 2010

* No caso dos carismáticos a utilização da “Bíblica Católica” com 73 livros enquanto os evangélicos utilizam versões da “Bíblia Protestante” com 66 livros

Considerações Finais

O trabalho pautou-se na busca de pontos os quais poderiam ter essa aproximação

e observando o outro lado, catalogaram-se também as características que distanciavam

esses dois fenômenos crescentes que pudessem ser utilizados também para outras

regiões do Brasil, mas que fossem analisados a partir de acontecimentos da cidade de

Inhumas - Goiás.

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Ao decorrer das pesquisas foi observado que o catolicismo e protestantismo têm

em suas linhas pentecostais (no caso a RCC e o pentecostalismo protestante) semelhanças

em número maior do que a princípio a maioria parece perceber. Ao final das pesquisas,

notou-se que o ambiente e as práticas dos cultos da RCC e da IURD, têm semelhanças em

tal quantidade, que em determinados prismas parecem aproximar a RCC quase na mesma

medida, tanto do catolicismo tradicional quanto do pentecostalismo chamado de Neo

pentecostal ou Terceira Onda Pentecostal. Talvez em parte porque o meio no qual a RCC

se originou é o mesmo do protestantismo pentecostal. Em comunidades com muitas

similaridades do Sul dos Estados Unidos.

Então, em muitos aspectos os carismáticos são semelhantes aos iurdianos. Os

carismáticos seguem a linha pentecostal, que primeiramente surgiu no âmbito

protestante. O avivamento, a imposição das mãos, o uso do “falar em línguas” são

aspectos que na ministração das cerimônias se mostraram praticamente idênticos.

Referências: ARAÚJO, O. Abordagem Historiográfica e Experiência Protestante em Goiás. In: QUADROS, E; SILVA, M; MAGALHÃES, S. (orgs.) Cristianismos no Brasil Central: História e Historiografia. Ed. UCG; Goiânia, 2008. BOURDIEU, P. O Poder Simbólico. Tradução Fernando Tomaz. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1989. DURKHEIM, E. As Formas Elementares da Vida Religiosa. Ed. Falcan, Paris; 1912. GOMES, F. A Igreja e o Poder: Representações e Discursos. In: RIBEIRO, Maria Eurydice de Barros (Org.): A Vida na Idade Média. Brasília: Editora da UnB, 1997. MACHADO, M. Carismáticos e Pentecostais: Adesão Religiosa na Esfera Familiar. Ed. Autores Associados, Campinas; 1996. MARIANO, R. Neopentecostais: Sociologia do Novo Pentecostalismo no Brasil. Edições Loyola, São Paulo, 2ª Edição, 2005. PERBONT, F. O Pentecostalismo “Clássico”: a igreja assembléia de Deus em Ribeirão Preto (1937-1997) In: UNESP. Estudos de História: Revista do Curso de Pós-Graduação em História, Direito e Serviço Social. Ed. UNESP, Franca, 1994.

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PIAZZA, W. Introdução à Fenomenologia Religiosa. Ed. Vozes, Petrópolis; 1976. PRANDI, R. Um Sopro do Espírito: a renovação conservadora do catolicismo carismático. Ed. Edusp/ FAPESP, São Paulo; 1997. SCHLESINGER, H; PORTO, H. As Religiões Ontem e Hoje. Ed. Edições Paulinas, São Paulo; 1982. SILVA, M. Política e Hegemonia na Igreja Católica: um estudo sobre a renovação carismática. Ed. Kelps; Goiânia, 2001. WEBER, M. Economia e Sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Tradução Regis Barbosa e Karen Elsabeth Barbosa. VOLUME 2, Brasília: Editora Universidade de Brasília: São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2004. Fontes Eletrônicas http://www.xr.pro.br/Religiao.html acesso 30/03/10 http://www.portalcarismatico.com.br/menu/carismas/carismas.htm acesso 11/08/10 http://iurdafogadosrecifepe.blogspot.com/2010/04/fotos-da-catedral-mundial-da-fe.html acesso12/08/10 www.rccbrasil.org.br acesso 10/08/10

Revistas Eletrônicas SILVA, F. Pentecostalismo e Pós-Pentecostalismo. Revista Eletrônica Inter-Legere. Número 2 – julho a dezembro de 2007. Disponível em: http://www.cchla.ufrn.br/interlegere/revista/pdf/2/es01.pdf acesso 21/04/10. SILVA, V. Concepções Religiosas Afro-Brasileiras e Neo-Pentecostais: uma análise simbólica. REVISTA USP, São Paulo, n.67, p. 150-175, setembro/novembro 2005. Disponível em: http://www.usp.br/revistausp/67/11-silva.pdf acesso 04/04/10. Teses e Dissertações DÁVILA, B. Renovação Carismática Católica: origens, mudanças e tendências. Mestrado – Universidade Estadual de Capinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Campinas, SP, 1998. Disponível em: http://libdigi.unicamp.br/document/?code=000133271 acesso 04/07/10. MORAIS, I. Protestantes Pentecostais em Goiânia: discurso e ação política. 2007. 206 f. Tese, Sociologia, UnB, Brasília, 2007, disponível em http://repositorio.bce.unb.br/bitstream/10482/1364/1/Tese_2007_ItelvidesMorais.pdf. SALES, I. A Autocompreensão da Igreja e a Renovação Carismática Católica (1966-2000). Mestrado, História, UNESP, Programa de Pós-Graduação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Franca, 2006. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br acesso 19/05/10.

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SANTANA, N. O Mover do Espírito Santo na Virada do Milênio – pentecostais e carismáticos em Goiânia. Mestrado, Ciências da Religião da Universidade Católica de Goiás, Goiânia, 2001. WREGE, R. As Igrejas Neopentecostais: educação e doutrinação. Doutorado, Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001. Disponível em: http://libdigi.unicamp.br/document/?code=vtls000218785 acesso 04/04/10.

Entrevistas

Nome Profissão Data Cidade Igreja

Maria Helena de

Paula Sousa, 50

anos, viúva.

Pensionista 25/09/10 Inhumas Igreja Católica e membro

da Renovação

Carismática Católica

Antonieta Ferreira

Oliveira, 76 anos,

casada.

Aposentada 18/09/10 Inhumas Pioneira da Igreja

Universal do Reino de

Deus, mas atualmente

frequenta a Igreja

Maanaim.

Aparecida Siqueira,

47 anos, casada.

Enfermeira 30/09/10 Inhumas Igreja Católica e atual

Coordenadora da

Renovação Carismática

Católica de Inhumas.

Jessica da Silva, 26

anos, solteira.

Cabeleireira 05/10/10 Inhumas Obreira da Igreja

Universal do Reino de

Deus.