52
Um dia com o ECONOMIA & DESENVOLVIMENTO PARA OS NOVOS TEMPOS EDITORIAL ANO 39 – Nº 281 – Maio/Junho de 2015 Muhammad Yunus Prêmio Nobel da Paz

Rumos 281

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Revista Rumos - Maio/Junho 2015

Citation preview

Page 1: Rumos 281

Um dia com o

E C O N O M I A & D E S E N V O LV I M E N T O P A R A O S N O V O S T E M P O S

EDITORIAL

AN

O 3

9 –

28

1 –

M

aio

/Ju

nh

o d

e 2

01

5

Muhammad Yunus

Prêmio Nobel da Paz

Page 2: Rumos 281
Page 3: Rumos 281

m feito atípico é a nossa capa: um economista ganhador do Prêmio Nobel. Apresentar Muhammad Yunus apenas por essa façanha é fazer pouco da trajetória de um homem que contribui, de forma definitiva, para alterar o quadro de pobreza em seu país. Ao cunhar o termo microcrédito, o

economista deu ao mundo uma nova forma de fazer financiamentos e impactou todo o planeta com a simples filosofia de que é preciso ajudar aqueles que querem empreender, gerando apoio financeiro e oportuni-dades. Em visita ao Brasil, a Rumos acompanhou as duas palestras que ele proferiu no Rio de Janeiro. Confira!

Quem também passou pelo país foi a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde. Ainda que tenha demons-trado entusiasmo pelas últimas conquistas sociais promovidas pelo governo brasileiro, Christine foi enfática ao sinalizar que o ajuste nas con-tas é necessário e que o país estará no caminho certo se seguir à risca as medidas propostas pelo Ministério da Fazenda.

Em nossa seção Expertise, ao comentar sobre a falta de confiança na administração pública, Bianor Cavalcanti, especialista em administração e políticas públicas, demonstra que este é um fenômeno que não aconte-ce apenas no Brasil e aposta no reforço do caráter moderno e participati-vo do nosso arcabouço institucional para reverter a desconfiança.

A Rumos traz ainda uma entrevista com o economista José Cláudio Linhares Pires, do Banco Interamericano de Desenvolvimento, que comenta um estudo inédito realizado pela instituição sobre a efetividade dos mecanismos de apoio às Pequenas e Médias Empresas brasileiras.

Boa leitura!

UAO LEITOR

Seção

RUMOS – 3 – Maio/Junho 2015

S SUMÁRIO

FOMENTO46

28

EMPREENDER14

O mundo que queremos

REPORTAGEM CAPA

LIVROS48

18ENTREVISTAJosé Cláudio Linhares Pires Radiografia de um setor

Am

éri

co V

erm

elh

o

25EM DIAOs novos desafios do compliance no Brasil (parte 1 de 2)

Ita

Kir

sch

No

el J

oa

qu

im F

aia

d

EXPERTISE

Em busca da confiança perdida

ConvênioParceria renovada entre cooperativismo e pequenos negócios

4

38ARTIGO

O cooperativismo financeiro e os canais de (auto) atendimento

Ênio Meinen

12OPINIÃO

Começar do começo em 2017Antonio Delfim Netto

44PELO MUNDO

Nippon Ginko: símbolo da peculiaridade do desenvolvimento capitalista japonês

Jorge Varaschin

36EXTREMO SUL

Alternativas possíveisEnergia

22REPORTAGEM

Elogio à austeridade

Economia

8 ENTREVISTA

Inovação no relacionamento com micro e pequenas empresas

Osmar Dias

Muhammad Yunus

40REPORTAGEM

O passaporte para o desenvolvimento

Inovação

Bianor Cavalcanti

Page 4: Rumos 281

RUMOS – 4 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 5 – Maio/Junho 2015

onfiança na Administração Pública. Este é um assunto que vem preocu-pando e desafiando gestores por todo o mundo. Exatamente por isso o tema foi escolhido como o foco dos debates no Congresso IIAS

2015, encontro anual promovido pelo Internatio-nal Institute of Administrative Sciences (Institu-to Internacional de Ciências Administrativas), e que aconteceu no Brasil, na Fundação Getulio Vargas (FGV/RJ), de 22 a 26 de junho. A opção por dar destaque à (des)confiança foi feita duran-te o congresso de 2014, realizado no Marrocos, por ter sido um grande consenso entre a diretoria do Instituto, responsável por configurar o evento do ano seguinte. Rumos conversou com o especia-lista em administração e políticas públicas Bianor Cavalcanti, diretor Internacional da FGV e um dos principais articuladores e organizadores do congresso no Brasil.

É verdade que o país vive uma crise de confi-ança, com casos como o Mensalão e o da Petro-bras. Mas não foi essa a razão de sua escolha para sediar o Congresso IIAS 2015. “É importante registrar que o problema da confiança não é uma exclusividade brasileira, longe disso!”, garante o especialista em administração e políticas públicas Bianor Cavalcanti. Ele explica que a questão afli-ge profissionais da área em todos os cantos do mundo. “O congresso recebeu representantes de países de todos os portes e graus de desenvolvi-mento”, afirma.

Cavalcanti destaca que existem problemas de confiança tanto da sociedade em relação à admi-

A crise de confiança nas instituições públicas não é só uma questão que está em debate no Brasil, mas em outros países também, é o que mostra nesta entrevista o especialista em administração e políticas públicas Bianor Cavalcanti. Confira!

Por Ana Redig

CEEX

PE

RTI

SE

Em busca da confiança perdida

Bianor Cavalcanti

nistração pública, como pela ótica da administração pública em relação a todos os tipos de representação da sociedade. Ele diz que é importante perceber que o governo, geralmente responsabilizado pelos pro-blemas de confiança, é apenas um ator, dentro de toda a complexidade que é a ambiência pública da atu-alidade. “Hoje temos as parcerias público-privadas, além de diversas formas de participação no exercício das políticas sociais: com Organizações Não Gover-namentais, conselhos, associações. É preciso encon-trar formas eficientes de gestão adequadas para cada uma delas”, observa.

Bianor Cavalcanti, que é doutor em Administra-ção e Políticas Públicas pelo Virginia Polytechnic Institute and State University e já foi diretor da Esco-la Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape) da FGV/RJ, afirma que as mudanças na área da administração pública não se dão de uma hora para outra. “O Brasil é um país extremamente com-plexo. Em alguns momentos históricos específicos, tivemos que fazer acertos mais gerais, as chamadas reformas, para conseguir efetivar mais do que um pro-jeto de governo: um projeto de país. Hoje estamos longe disso, pois parece que não temos projeto algum”, avalia.

O especialista não considera este um bom momento para realizar reformas radicais na adminis-tração pública brasileira. “Qual decisão tomar: refor-mar ou mudar lentamente, é uma questão que acom-panha a comunidade de estudiosos de administração e de políticas públicas há muitos anos. Eu, pessoal-mente, acredito que este é um processo e, como tal, deve ir sofrendo mudanças de forma mais suave, encontrando caminhos e dialogando com os diversos A

rico

Ve

rme

lho

atores que compõe toda essa complexidade”, argumenta. Segundo Bianor Cavalcanti, o Brasil sempre seguiu os Esta-

dos Unidos de perto, quando o assunto é administração públi-ca e gestão. “Neste sentido, o brasileiro costuma achar que pro-blemas como corrupção e burocracia, por exemplo, são exclu-sividades nossas, e isso não é verdade!”, enfatiza. De fato, no início do século passado, a corrupção nos Estados Unidos che-gava a níveis altíssimos. O especialista compara o brasileiro Tenório Cavalcanti, conhecido como o “Homem da Capa Pre-ta”, com o “Homem da Tammany Hall”, de Nova Iorque. Tenório arregimentava nordestinos que chegavam a Duque de Caxias sem dinheiro e à procura de trabalho para oferecer “aju-da”. Este era o futuro eleitorado que seria manipulado confor-me a necessidade. O nova-iorquino fazia o mesmo com os ita-lianos e outros europeus que chegavam à cidade americana com fome, fugidos de guerras e outros conflitos, em busca de um futuro na América. “Até que situações deste tipo chegaram

Há alguns anos, a sociedade e os movimentos sociais faziam reivindicações, cobrando ações do Estado. Hoje esses atores trabalham articulados, participando da definição e implementação de políticas públicas.

a um ponto que foi necessário fazer mudanças mais densas, tan-to lá, como aqui”, ensina.

Reformas – Cavalcanti diz que a reforma promovida em 1937, durante o primeiro governo de Getúlio Vargas, representou uma mudança muito importante na formação do poder e do aparato burocrático central de governo. “Essas medidas foram responsáveis por sedimentar uma administração pública em nível federativo, nacional. A administração pública foi fortale-cida para garantir o desenvolvimento deste projeto de país, que incluía educação, legislação trabalhista com a implantação dos direitos, entre outros”, afirma o especialista. Ainda que ele

Page 5: Rumos 281

RUMOS – 4 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 5 – Maio/Junho 2015

onfiança na Administração Pública. Este é um assunto que vem preocu-pando e desafiando gestores por todo o mundo. Exatamente por isso o tema foi escolhido como o foco dos debates no Congresso IIAS

2015, encontro anual promovido pelo Internatio-nal Institute of Administrative Sciences (Institu-to Internacional de Ciências Administrativas), e que aconteceu no Brasil, na Fundação Getulio Vargas (FGV/RJ), de 22 a 26 de junho. A opção por dar destaque à (des)confiança foi feita duran-te o congresso de 2014, realizado no Marrocos, por ter sido um grande consenso entre a diretoria do Instituto, responsável por configurar o evento do ano seguinte. Rumos conversou com o especia-lista em administração e políticas públicas Bianor Cavalcanti, diretor Internacional da FGV e um dos principais articuladores e organizadores do congresso no Brasil.

É verdade que o país vive uma crise de confi-ança, com casos como o Mensalão e o da Petro-bras. Mas não foi essa a razão de sua escolha para sediar o Congresso IIAS 2015. “É importante registrar que o problema da confiança não é uma exclusividade brasileira, longe disso!”, garante o especialista em administração e políticas públicas Bianor Cavalcanti. Ele explica que a questão afli-ge profissionais da área em todos os cantos do mundo. “O congresso recebeu representantes de países de todos os portes e graus de desenvolvi-mento”, afirma.

Cavalcanti destaca que existem problemas de confiança tanto da sociedade em relação à admi-

A crise de confiança nas instituições públicas não é só uma questão que está em debate no Brasil, mas em outros países também, é o que mostra nesta entrevista o especialista em administração e políticas públicas Bianor Cavalcanti. Confira!

Por Ana Redig

CEEX

PE

RTI

SE

Em busca da confiança perdida

Bianor Cavalcanti

nistração pública, como pela ótica da administração pública em relação a todos os tipos de representação da sociedade. Ele diz que é importante perceber que o governo, geralmente responsabilizado pelos pro-blemas de confiança, é apenas um ator, dentro de toda a complexidade que é a ambiência pública da atu-alidade. “Hoje temos as parcerias público-privadas, além de diversas formas de participação no exercício das políticas sociais: com Organizações Não Gover-namentais, conselhos, associações. É preciso encon-trar formas eficientes de gestão adequadas para cada uma delas”, observa.

Bianor Cavalcanti, que é doutor em Administra-ção e Políticas Públicas pelo Virginia Polytechnic Institute and State University e já foi diretor da Esco-la Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape) da FGV/RJ, afirma que as mudanças na área da administração pública não se dão de uma hora para outra. “O Brasil é um país extremamente com-plexo. Em alguns momentos históricos específicos, tivemos que fazer acertos mais gerais, as chamadas reformas, para conseguir efetivar mais do que um pro-jeto de governo: um projeto de país. Hoje estamos longe disso, pois parece que não temos projeto algum”, avalia.

O especialista não considera este um bom momento para realizar reformas radicais na adminis-tração pública brasileira. “Qual decisão tomar: refor-mar ou mudar lentamente, é uma questão que acom-panha a comunidade de estudiosos de administração e de políticas públicas há muitos anos. Eu, pessoal-mente, acredito que este é um processo e, como tal, deve ir sofrendo mudanças de forma mais suave, encontrando caminhos e dialogando com os diversos A

rico

Ve

rme

lho

atores que compõe toda essa complexidade”, argumenta. Segundo Bianor Cavalcanti, o Brasil sempre seguiu os Esta-

dos Unidos de perto, quando o assunto é administração públi-ca e gestão. “Neste sentido, o brasileiro costuma achar que pro-blemas como corrupção e burocracia, por exemplo, são exclu-sividades nossas, e isso não é verdade!”, enfatiza. De fato, no início do século passado, a corrupção nos Estados Unidos che-gava a níveis altíssimos. O especialista compara o brasileiro Tenório Cavalcanti, conhecido como o “Homem da Capa Pre-ta”, com o “Homem da Tammany Hall”, de Nova Iorque. Tenório arregimentava nordestinos que chegavam a Duque de Caxias sem dinheiro e à procura de trabalho para oferecer “aju-da”. Este era o futuro eleitorado que seria manipulado confor-me a necessidade. O nova-iorquino fazia o mesmo com os ita-lianos e outros europeus que chegavam à cidade americana com fome, fugidos de guerras e outros conflitos, em busca de um futuro na América. “Até que situações deste tipo chegaram

Há alguns anos, a sociedade e os movimentos sociais faziam reivindicações, cobrando ações do Estado. Hoje esses atores trabalham articulados, participando da definição e implementação de políticas públicas.

a um ponto que foi necessário fazer mudanças mais densas, tan-to lá, como aqui”, ensina.

Reformas – Cavalcanti diz que a reforma promovida em 1937, durante o primeiro governo de Getúlio Vargas, representou uma mudança muito importante na formação do poder e do aparato burocrático central de governo. “Essas medidas foram responsáveis por sedimentar uma administração pública em nível federativo, nacional. A administração pública foi fortale-cida para garantir o desenvolvimento deste projeto de país, que incluía educação, legislação trabalhista com a implantação dos direitos, entre outros”, afirma o especialista. Ainda que ele

Page 6: Rumos 281

RUMOS – 6– Maio/Junho 2015 RUMOS – 7 – Maio/Junho 2015

admita os defeitos deste modelo, Bianor diz que ele teve a qualidade de organizar as relações de traba-lho na sociedade brasileira.

No início dos anos 1950, na segunda gestão de Vargas, em seu período mais democrático, foi cri-ada uma série de organismos importantes como a Petrobras, o BNDES, a Capes e a própria Escola de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas. “Foi uma safra de instituições

que tinham como missão formar um quadro na administração pública profissionalizado, de alto nível. Foi outro momento importan-te, mas o modelo de Estado vigente na época tinha uma administração mais hierárquica, mais monolítica. Havia uma clareza maior sobre o que cabe ao governo e o que cabe à iniciativa privada fazer. Era outro cenário”, observa.

Mais tarde, nova reforma, implantada em 1964, levou o país a uma nova forma de fazer a gestão da administração pública, com uma concepção mais sistêmica. Ele lembra que a administração pública se dá dentro do contexto da política, do direito constitucional e da gestão. Estes três fatores represen-tam um sistema de interdependência complexo com interesses bastante diversos. “Veja como a Constituição de 1988 mudou a forma de conceber o público. Precisamos perceber que isso é um processo contínuo. É ingenuidade acreditar que podemos criar um modelo do nada. Não adianta termos as melhores leis, sem a capacidade de implementá-las e fiscalizar seu cumpri-mento”, pondera Cavalcanti.

Segundo o diretor Internacional da FGV/RJ, o Brasil viveu alternâncias de governos mais e menos autoritários, mas sempre foi um país muito aderente ao modelo ocidental de sociedade, vocacionado para a democracia, uma democracia liberal que prevalece no Ocidente. “Hoje vivemos uma pres-são cada vez maior por uma democracia mais direta, mais par-ticipativa e menos representativa, já que a representatividade política passa por uma profunda crise no momento”, observa o diretor da FGV.

De fato, há alguns anos, a sociedade e os movimentos soci-ais faziam reivindicações, iniciativas de cobrança de ações do Estado. Hoje esses atores já se misturam e trabalham articula-dos, participando da definição e implementação de políticas públicas, bem como nas parcerias público-privadas. O especia-lista afirma que a gestão participativa no Brasil já é uma realida-de, mas o desafio está em como lidar com isso, visto que é novo.

Gestão participativa – Bianor Cavalcanti utiliza a questão da água para demonstrar como este processo de mudanças lança

EX

PE

RTI

SE

desafios. Ele lembra que a água, no Brasil, fal-ta onde mais precisa e sobra onde já tem. “A distribuição da água é como a de renda: desi-gual. Trata-se de uma equação invertida entre abundância de água e o desenvolvi-mento. O Norte tem mais água e a maior demanda está no Sudeste”, observa. O espe-cialista afirma que a Constituição de 1988 ali-cerçou a base da Política Nacional de Recur-sos Hídricos, que trata da sua gestão integra-da. “Esta lei deu um salto qualitativo, pois introduziu aspectos de mercado onde antes não havia: precificou-se o valor da água bru-ta, que era gratuita no país. Então, além dos mecanismos de outorga e controle, foi pos-sível passar a cobrar pelo recurso utilizado, gerando responsabilidade por ele”.

Cavalcanti explica que a lei institui uma noção de gestão integrada em nível de bacia e estabelece a obrigatoriedade da formação dos “comitês de bacia”, que contam com a representação de organizações de especiali-

zação acadêmica, da sociedade, de governo, entre outros. “Este é o tipo de arranjo institucional para o qual caminhamos, é este modelo que está à nossa frente e ao qual precisamos nos adaptar”, adverte. Ele destaca que a questão da água ainda envolve a da geração de energia, igualmente estratégica para o país. Para decidir e construir uma hidrelétrica é preciso um pla-nejamento de 10 a 15 anos, cerca de três mandatos diferentes, portanto. Além disso, a questão vai envolver sete a oito setores que participam diretamente da gestão da água envolvida neste empreendimento: governos dos três níveis, grandes usuários, comunidades impactadas, entre outros. “Não é de estranhar que seja necessário administrar interesses conflitantes. Afinal, o que é bom para a geração de energia pode comprometer aspectos ambientais, o consumo industrial ou interferir na for-ma de viver de uma reserva indígena”, ressalta.

Bianor Cavalcanti observa que, ainda que o país tenha cria-do todo este arcabouço institucional – moderno e participati-vo –, quando a crise da água se acirrou o que se viu foram governadores cobrando respostas e brigando uns com os outros. “Veja que isso aconteceu mesmo já existindo os meca-nismos avançados, democráticos e equilibrados capazes de pro-mover negociações inteligentes para se chegar a soluções boas para todos ou pelo menos para a maioria”. Bianor Cavalcanti diz que o desafio é exatamente encontrar essa adequação e administrar conflitos e crises.

Para ele, o mesmo ocorre na área da Saúde que, também impulsionada pela Constituição Cidadã, foi muito debatida e, de certa maneira, uma política pública de Saúde foi formulada. “No entanto, o país enfrenta uma tremenda dificuldade em implementar esta política. E isto inclui a saúde privada”, alerta Bianor Cavalcanti. Ele diz que este problema pode ser encon-trado até nos melhores hospitais particulares do Rio de Janeiro.

“Eles têm bons médicos, enfermagem capaci-tada, mas permanece o gargalo na coordena-ção da interdependência, que é essencial para a gestão. A informação não circula. Se ela é anotada, não é lida ou considerada. O médico prescreve um tipo de dieta, perguntam o que o paciente prefere comer e quando a refeição chega não é o que o paciente escolheu, nem faz parte do tipo de dieta recomendada. É pre-ciso ter alguém que coordene isso com foco no cliente, caso contrário não funciona. Mais importante do que o planejamento, controle e organização é a coordenação das partes que são interdependentes entre si para gerar algum produto”, ensina.

“O Brasil é um país ‘meia boca’. Nossa sor-te é que como a boca é grande, complexa, ain-da temos flagelos para resolver, enquanto administramos áreas extremamente moder-nas e de sucesso para o país”, ironiza Bianor. Ele destaca que, apesar da produção de grãos no Brasil ser fantástica, as estradas, os locais para silagem e portos deixam a desejar. “Nós fazemos as coisas pela metade. O país se desenvolveu, se urbanizou, se moderni-zou, os padrões de consumo aumentaram barbaramente, mas precisamos de um projeto de desenvolvimento claro, pois isso reflete na administração”, avisa.

O especialista diz que a resposta para este autoflagelo está no relacionamento entre esta diversidade de atores – mais de um ministério, algumas secretarias, governos estaduais, muni-cipais, setor privado, movimentos sociais, o próprio cidadão comum.

Corporativismo e controle político – Embora Bianor Cavalcanti procure evitar rankings, por considerar que eles não refletem as realidades dos países, ele afere que, entre os países da América Latina, o Brasil é o mais estruturado em todos os aspectos. “Não se pode comparar um país com a complexida-de do Brasil com um pequeno país asiático, sem cometer gran-des erros. Mas avaliar uma nação observando outras sempre é possível e positivo. Quando comparamos o Brasil a outros paí-ses latino-americanos, os resultados no nível de industrializa-ção, de agropecuária, enfim, no que diz respeito à gestão de coi-sas fundamentais para a economia do país, nossos resultados são bons”, garante.

O especialista afirma que o tamanho da administração pública brasileira, de forma relativa, se comparada a outros paí-ses, não é tão grande assim. E enxugar a burocracia também não é toda a solução. “Veja que às vezes a população e a imprensa criticam o tamanho do Estado e da Administração Pública, ao mesmo tempo que cobram fiscalização e eficiên-cia, o que geralmente exige contratação, e não cortes”, pontua. Bianor lembra que nos Estados Unidos não há candidato à Pre-sidência que não prometa cortar a burocracia pública e, quan-

do assume, é obrigado até a aumentar, como aconteceu por ocasião do 11 de Setembro, quando foi criado o superminis-tério da Segurança Doméstica, para lidar com o problema da ameaça terrorista.

O especialista defende que a burocra-cia é necessária, e quanto mais profissional, mais eficiente. No entanto, ela precisa de controle. “Hoje temos um nível razoável no Brasil como um todo e, em áreas impor-tantes como o Tesouro Nacional, a Polícia Federal e a Receita Federal, temos um qua-dro altamente profissionalizado, gente que enfrentou concursos difíceis, que atraem talentos importantes”, garante. Para ele, este pessoal especializado traz sua contri-buição para que os ocupantes de cargos políticos se mantenham em determinada direção, garantindo a continuidade das polí-ticas. “São estes funcionários de carreira que têm histórico da instituição, a expe-riência do que deu certo e o que não deu.

Por isso, espera-se uma tensão positiva entre os politicamente designados e a burocracia, que faz bem tanto para a adminis-tração pública como para os governantes”, argumenta Bianor Cavalcanti. Ele apenas alerta para que não se exagere no “apa-relhamento”, uma presença excessiva do aparato político designado. “Se o controle político é fraco, o burocrata vai bus-car os interesses dele, que podem não ser o interesse públi-co”, avisa.

O diretor da FGV/RJ explica que, com o sistema político enfraquecido, a burocracia precisa de um controle melhor. Bia-nor lembra que o nosso sistema político requer que escolha-mos alguém para nos representar. Alguém com quem nos afi-namos politicamente, que pensa a sociedade como nós pensa-mos. Esse representante, teoricamente, foi eleito também para exercer um certo controle sobre a burocracia. “Mas não adian-ta dizer que não gosta de política e que não participa. A política está em tudo, na reunião de condomínio, nas decisões coletivas do trabalho. As pessoas precisam participar, interferir, para que seus direitos e desejos sejam atendidos”, recomenda.

Bianor Cavalcanti diz que importância desses congressos é exatamente debater esses temas de forma aprofundada. “Que-remos ver a representação de diversos interesses, trabalhando na negociação pelo legítimo interesse público. O conceito que deve valer é esse. Ninguém tem a clareza de expressar o inte-resse público ou o que é melhor para todos. Isso não está na cabeça de alguém iluminado. Deve ser construído pelo coleti-vo, com foco no interesse público”, defende.

Para tanto, o especialista recomenda o investimento em educação. “Não temos escolha: o país tem recursos estratégi-cos e, se acertarmos a questão da educação, que é a base de tudo, será preciso apenas fazer uma boa gestão para garantir a qualidade da despesa”, finaliza.

Às vezes criticam o tamanho da burocracia, ao mesmo tempo que cobram fiscalização e eficiência, o que geralmente exige contratação, e não cortes.

Há verdadeiras máfias operando negócios pesados, envolvendo e usando a máquina pública. Sem controle, o corporativismo se desenvolve.

Bianor Cavalcanti

Page 7: Rumos 281

RUMOS – 6– Maio/Junho 2015 RUMOS – 7 – Maio/Junho 2015

admita os defeitos deste modelo, Bianor diz que ele teve a qualidade de organizar as relações de traba-lho na sociedade brasileira.

No início dos anos 1950, na segunda gestão de Vargas, em seu período mais democrático, foi cri-ada uma série de organismos importantes como a Petrobras, o BNDES, a Capes e a própria Escola de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas. “Foi uma safra de instituições

que tinham como missão formar um quadro na administração pública profissionalizado, de alto nível. Foi outro momento importan-te, mas o modelo de Estado vigente na época tinha uma administração mais hierárquica, mais monolítica. Havia uma clareza maior sobre o que cabe ao governo e o que cabe à iniciativa privada fazer. Era outro cenário”, observa.

Mais tarde, nova reforma, implantada em 1964, levou o país a uma nova forma de fazer a gestão da administração pública, com uma concepção mais sistêmica. Ele lembra que a administração pública se dá dentro do contexto da política, do direito constitucional e da gestão. Estes três fatores represen-tam um sistema de interdependência complexo com interesses bastante diversos. “Veja como a Constituição de 1988 mudou a forma de conceber o público. Precisamos perceber que isso é um processo contínuo. É ingenuidade acreditar que podemos criar um modelo do nada. Não adianta termos as melhores leis, sem a capacidade de implementá-las e fiscalizar seu cumpri-mento”, pondera Cavalcanti.

Segundo o diretor Internacional da FGV/RJ, o Brasil viveu alternâncias de governos mais e menos autoritários, mas sempre foi um país muito aderente ao modelo ocidental de sociedade, vocacionado para a democracia, uma democracia liberal que prevalece no Ocidente. “Hoje vivemos uma pres-são cada vez maior por uma democracia mais direta, mais par-ticipativa e menos representativa, já que a representatividade política passa por uma profunda crise no momento”, observa o diretor da FGV.

De fato, há alguns anos, a sociedade e os movimentos soci-ais faziam reivindicações, iniciativas de cobrança de ações do Estado. Hoje esses atores já se misturam e trabalham articula-dos, participando da definição e implementação de políticas públicas, bem como nas parcerias público-privadas. O especia-lista afirma que a gestão participativa no Brasil já é uma realida-de, mas o desafio está em como lidar com isso, visto que é novo.

Gestão participativa – Bianor Cavalcanti utiliza a questão da água para demonstrar como este processo de mudanças lança

EX

PE

RTI

SE

desafios. Ele lembra que a água, no Brasil, fal-ta onde mais precisa e sobra onde já tem. “A distribuição da água é como a de renda: desi-gual. Trata-se de uma equação invertida entre abundância de água e o desenvolvi-mento. O Norte tem mais água e a maior demanda está no Sudeste”, observa. O espe-cialista afirma que a Constituição de 1988 ali-cerçou a base da Política Nacional de Recur-sos Hídricos, que trata da sua gestão integra-da. “Esta lei deu um salto qualitativo, pois introduziu aspectos de mercado onde antes não havia: precificou-se o valor da água bru-ta, que era gratuita no país. Então, além dos mecanismos de outorga e controle, foi pos-sível passar a cobrar pelo recurso utilizado, gerando responsabilidade por ele”.

Cavalcanti explica que a lei institui uma noção de gestão integrada em nível de bacia e estabelece a obrigatoriedade da formação dos “comitês de bacia”, que contam com a representação de organizações de especiali-

zação acadêmica, da sociedade, de governo, entre outros. “Este é o tipo de arranjo institucional para o qual caminhamos, é este modelo que está à nossa frente e ao qual precisamos nos adaptar”, adverte. Ele destaca que a questão da água ainda envolve a da geração de energia, igualmente estratégica para o país. Para decidir e construir uma hidrelétrica é preciso um pla-nejamento de 10 a 15 anos, cerca de três mandatos diferentes, portanto. Além disso, a questão vai envolver sete a oito setores que participam diretamente da gestão da água envolvida neste empreendimento: governos dos três níveis, grandes usuários, comunidades impactadas, entre outros. “Não é de estranhar que seja necessário administrar interesses conflitantes. Afinal, o que é bom para a geração de energia pode comprometer aspectos ambientais, o consumo industrial ou interferir na for-ma de viver de uma reserva indígena”, ressalta.

Bianor Cavalcanti observa que, ainda que o país tenha cria-do todo este arcabouço institucional – moderno e participati-vo –, quando a crise da água se acirrou o que se viu foram governadores cobrando respostas e brigando uns com os outros. “Veja que isso aconteceu mesmo já existindo os meca-nismos avançados, democráticos e equilibrados capazes de pro-mover negociações inteligentes para se chegar a soluções boas para todos ou pelo menos para a maioria”. Bianor Cavalcanti diz que o desafio é exatamente encontrar essa adequação e administrar conflitos e crises.

Para ele, o mesmo ocorre na área da Saúde que, também impulsionada pela Constituição Cidadã, foi muito debatida e, de certa maneira, uma política pública de Saúde foi formulada. “No entanto, o país enfrenta uma tremenda dificuldade em implementar esta política. E isto inclui a saúde privada”, alerta Bianor Cavalcanti. Ele diz que este problema pode ser encon-trado até nos melhores hospitais particulares do Rio de Janeiro.

“Eles têm bons médicos, enfermagem capaci-tada, mas permanece o gargalo na coordena-ção da interdependência, que é essencial para a gestão. A informação não circula. Se ela é anotada, não é lida ou considerada. O médico prescreve um tipo de dieta, perguntam o que o paciente prefere comer e quando a refeição chega não é o que o paciente escolheu, nem faz parte do tipo de dieta recomendada. É pre-ciso ter alguém que coordene isso com foco no cliente, caso contrário não funciona. Mais importante do que o planejamento, controle e organização é a coordenação das partes que são interdependentes entre si para gerar algum produto”, ensina.

“O Brasil é um país ‘meia boca’. Nossa sor-te é que como a boca é grande, complexa, ain-da temos flagelos para resolver, enquanto administramos áreas extremamente moder-nas e de sucesso para o país”, ironiza Bianor. Ele destaca que, apesar da produção de grãos no Brasil ser fantástica, as estradas, os locais para silagem e portos deixam a desejar. “Nós fazemos as coisas pela metade. O país se desenvolveu, se urbanizou, se moderni-zou, os padrões de consumo aumentaram barbaramente, mas precisamos de um projeto de desenvolvimento claro, pois isso reflete na administração”, avisa.

O especialista diz que a resposta para este autoflagelo está no relacionamento entre esta diversidade de atores – mais de um ministério, algumas secretarias, governos estaduais, muni-cipais, setor privado, movimentos sociais, o próprio cidadão comum.

Corporativismo e controle político – Embora Bianor Cavalcanti procure evitar rankings, por considerar que eles não refletem as realidades dos países, ele afere que, entre os países da América Latina, o Brasil é o mais estruturado em todos os aspectos. “Não se pode comparar um país com a complexida-de do Brasil com um pequeno país asiático, sem cometer gran-des erros. Mas avaliar uma nação observando outras sempre é possível e positivo. Quando comparamos o Brasil a outros paí-ses latino-americanos, os resultados no nível de industrializa-ção, de agropecuária, enfim, no que diz respeito à gestão de coi-sas fundamentais para a economia do país, nossos resultados são bons”, garante.

O especialista afirma que o tamanho da administração pública brasileira, de forma relativa, se comparada a outros paí-ses, não é tão grande assim. E enxugar a burocracia também não é toda a solução. “Veja que às vezes a população e a imprensa criticam o tamanho do Estado e da Administração Pública, ao mesmo tempo que cobram fiscalização e eficiên-cia, o que geralmente exige contratação, e não cortes”, pontua. Bianor lembra que nos Estados Unidos não há candidato à Pre-sidência que não prometa cortar a burocracia pública e, quan-

do assume, é obrigado até a aumentar, como aconteceu por ocasião do 11 de Setembro, quando foi criado o superminis-tério da Segurança Doméstica, para lidar com o problema da ameaça terrorista.

O especialista defende que a burocra-cia é necessária, e quanto mais profissional, mais eficiente. No entanto, ela precisa de controle. “Hoje temos um nível razoável no Brasil como um todo e, em áreas impor-tantes como o Tesouro Nacional, a Polícia Federal e a Receita Federal, temos um qua-dro altamente profissionalizado, gente que enfrentou concursos difíceis, que atraem talentos importantes”, garante. Para ele, este pessoal especializado traz sua contri-buição para que os ocupantes de cargos políticos se mantenham em determinada direção, garantindo a continuidade das polí-ticas. “São estes funcionários de carreira que têm histórico da instituição, a expe-riência do que deu certo e o que não deu.

Por isso, espera-se uma tensão positiva entre os politicamente designados e a burocracia, que faz bem tanto para a adminis-tração pública como para os governantes”, argumenta Bianor Cavalcanti. Ele apenas alerta para que não se exagere no “apa-relhamento”, uma presença excessiva do aparato político designado. “Se o controle político é fraco, o burocrata vai bus-car os interesses dele, que podem não ser o interesse públi-co”, avisa.

O diretor da FGV/RJ explica que, com o sistema político enfraquecido, a burocracia precisa de um controle melhor. Bia-nor lembra que o nosso sistema político requer que escolha-mos alguém para nos representar. Alguém com quem nos afi-namos politicamente, que pensa a sociedade como nós pensa-mos. Esse representante, teoricamente, foi eleito também para exercer um certo controle sobre a burocracia. “Mas não adian-ta dizer que não gosta de política e que não participa. A política está em tudo, na reunião de condomínio, nas decisões coletivas do trabalho. As pessoas precisam participar, interferir, para que seus direitos e desejos sejam atendidos”, recomenda.

Bianor Cavalcanti diz que importância desses congressos é exatamente debater esses temas de forma aprofundada. “Que-remos ver a representação de diversos interesses, trabalhando na negociação pelo legítimo interesse público. O conceito que deve valer é esse. Ninguém tem a clareza de expressar o inte-resse público ou o que é melhor para todos. Isso não está na cabeça de alguém iluminado. Deve ser construído pelo coleti-vo, com foco no interesse público”, defende.

Para tanto, o especialista recomenda o investimento em educação. “Não temos escolha: o país tem recursos estratégi-cos e, se acertarmos a questão da educação, que é a base de tudo, será preciso apenas fazer uma boa gestão para garantir a qualidade da despesa”, finaliza.

Às vezes criticam o tamanho da burocracia, ao mesmo tempo que cobram fiscalização e eficiência, o que geralmente exige contratação, e não cortes.

Há verdadeiras máfias operando negócios pesados, envolvendo e usando a máquina pública. Sem controle, o corporativismo se desenvolve.

Bianor Cavalcanti

Page 8: Rumos 281

RUMOS – 8 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 9 – Maio/Junho 2015

Por Jorge Diehl

umos – O Banco do Brasil lançou um modelo de agência destinada aos clientes Micro e Pequenas Empresas (MPE). O que são essas unidades? Osmar Fernandes Dias – Chamamos essas

dependências de Agências Especializadas MPE. São unidades que oferecem atendimento especializado e exclusivo aos clien-tes desse segmento que faturam mais de R$ 1 milhão por ano. Nessas agências, os empresários recebem atendimento por meio de profissionais especializados e dedicados.

As estratégias de canais de atendimento do banco direcio-nam para que as agências deixem de ser um local voltado ape-nas para a realização de transações e se tornem, cada vez mais, um ambiente de relacionamento, focado na consultoria financeira e na realização de negócios, com gerentes treina-dos para oferecer soluções adequadas e prestar assessoria aos clientes.

Foi exatamente por isso que o Banco do Brasil criou as Agências Especializadas MPE, como forma de especializar e qualificar o atendimento ao segmento. As instalações dessas dependências contam com nova ambiência e sinalização inter-na, com a criação do balcão de atendimento expresso e salas de reunião para atendimento privativo aos empresários. Além dis-so, oferecem espaço de relacionamento para educação finan-ceira e treinamentos, permitindo um atendimento completo. Contam também com orientação para o uso de canais virtuais, colaborando para a inclusão digital.

OSMAR DIAS

R

de negócios que aumentem a competitividade das empresas. Durante o período do teste, os empresários perceberam a

atenção que o Banco do Brasil estava destinando ao seu aten-dimento, o que refletiu em evolução no índice de satisfação desses clientes. Além disso, a agilidade dos processos garantiu o fluxo adequado de negócios, tanto do ponto de vista dos cli-entes quanto do banco.

Os funcionários dessas agências também foram beneficia-dos pelo fato de trabalharem com foco no público específico. Sem a dispersão com atendimento a diversos segmentos ao mesmo tempo, os processos ficam mais ágeis e mais fáceis de conduzir. Isso propicia um ambiente agradável para ambas as

E ENTREVISTA

Com 2,3 milhões de clientes Micro e Pequenas Empresas (MPE), o Banco do Brasil lança dois modelos de atendimento inovadores para esse público, considerado estratégico para a instituição. É o que explica o vice-presidente de Agronegócios e Micro e Pequenas Empresas do BB, Osmar Fernandes Dias, em entrevista à Rumos. Confira!

Rumos – Mas o que levou o BB a investir neste modelo de agência? Dias – Para corresponder à importância do segmento para o banco e para o país, pensamos: o que mais o BB poderia fazer para melhorar a experiência de seus clientes empresários? Em diversas conversas informais, confirmado posteriormente em pesquisas realizadas pelo banco, era relatado o desejo des-ses clientes em contar com um atendimento mais especializa-do, de preferência em um ambiente diferenciado e exclusivo.

Ao mesmo tempo, percebemos que, com a assessoria financeira adequada, os empresários poderiam evoluir seus empreendimentos de forma mais sustentável e consistente. O que resultaria em um ciclo virtuoso, bom não só para os empresários, mas também para seus clientes, seus funcioná-rios, para o banco e para o país.

Analisamos nossa rede de agências de perfil varejo e perce-bemos que algumas iniciativas favoreciam a implementação desse modelo. Algumas unidades da rede do banco já vinham atendendo os clientes MPE de modo mais focado, com funci-onários especialistas no relacionamento com o segmento. São agências com grande potencial para relacionamento com os empresários, pois geralmente estão localizadas em setores comerciais ou industriais de suas cidades, apresentando alta concentração de empresas como clientes.

Resolvemos transformar as experiências dessas agências em um novo modelo de atendimento, estruturado e com acom-panhamento de resultados e da satisfação dos clientes.

Como teste piloto, o BB inaugurou sete agências para o seg-mento de micro e pequenas empresas: Centro Comercial, em Campo Grande (MS); Praça Sete, em Belo Horizonte (MG); Bauru, em Bauru (SP); Frei Serafim, em Teresina (PI); Avenida Saudade, em Ribeirão Preto (SP); Curitiba, em Curitiba (PR); e Vitória, em Vitória (ES).

Rumos – Quais foram as principais percepções durante o teste piloto? Dias – A principal conclusão diz respeito à disponibilização de respostas mais ágeis e relevantes às necessidades dos clien-tes, ampliando o foco no relacionamento e na concretização

Osmar Fernandes Dias é Vice-Presidente de Agronegócios e Micro e Pequenas Empresas do Banco do Brasil. Engenheiro Agrônomo, foi Senador da República durante 16 anos, Secretário de Estado da Agricultura e do Abastecimento do Estado do Paraná, Gerente Técnico da Fazenda Experimental da Cocamar, Professor e Diretor da Fundação Faculdade de Agronomia Luiz Meneguel, Presidente da Companhia Agropecuária de Fomento Econômico do Paraná.

Div

ulg

açã

o / B

anco

do B

rasi

l

Inovação no relacionamento com micro e pequenas empresas

Page 9: Rumos 281

RUMOS – 8 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 9 – Maio/Junho 2015

Por Jorge Diehl

umos – O Banco do Brasil lançou um modelo de agência destinada aos clientes Micro e Pequenas Empresas (MPE). O que são essas unidades? Osmar Fernandes Dias – Chamamos essas

dependências de Agências Especializadas MPE. São unidades que oferecem atendimento especializado e exclusivo aos clien-tes desse segmento que faturam mais de R$ 1 milhão por ano. Nessas agências, os empresários recebem atendimento por meio de profissionais especializados e dedicados.

As estratégias de canais de atendimento do banco direcio-nam para que as agências deixem de ser um local voltado ape-nas para a realização de transações e se tornem, cada vez mais, um ambiente de relacionamento, focado na consultoria financeira e na realização de negócios, com gerentes treina-dos para oferecer soluções adequadas e prestar assessoria aos clientes.

Foi exatamente por isso que o Banco do Brasil criou as Agências Especializadas MPE, como forma de especializar e qualificar o atendimento ao segmento. As instalações dessas dependências contam com nova ambiência e sinalização inter-na, com a criação do balcão de atendimento expresso e salas de reunião para atendimento privativo aos empresários. Além dis-so, oferecem espaço de relacionamento para educação finan-ceira e treinamentos, permitindo um atendimento completo. Contam também com orientação para o uso de canais virtuais, colaborando para a inclusão digital.

OSMAR DIAS

R

de negócios que aumentem a competitividade das empresas. Durante o período do teste, os empresários perceberam a

atenção que o Banco do Brasil estava destinando ao seu aten-dimento, o que refletiu em evolução no índice de satisfação desses clientes. Além disso, a agilidade dos processos garantiu o fluxo adequado de negócios, tanto do ponto de vista dos cli-entes quanto do banco.

Os funcionários dessas agências também foram beneficia-dos pelo fato de trabalharem com foco no público específico. Sem a dispersão com atendimento a diversos segmentos ao mesmo tempo, os processos ficam mais ágeis e mais fáceis de conduzir. Isso propicia um ambiente agradável para ambas as

E ENTREVISTA

Com 2,3 milhões de clientes Micro e Pequenas Empresas (MPE), o Banco do Brasil lança dois modelos de atendimento inovadores para esse público, considerado estratégico para a instituição. É o que explica o vice-presidente de Agronegócios e Micro e Pequenas Empresas do BB, Osmar Fernandes Dias, em entrevista à Rumos. Confira!

Rumos – Mas o que levou o BB a investir neste modelo de agência? Dias – Para corresponder à importância do segmento para o banco e para o país, pensamos: o que mais o BB poderia fazer para melhorar a experiência de seus clientes empresários? Em diversas conversas informais, confirmado posteriormente em pesquisas realizadas pelo banco, era relatado o desejo des-ses clientes em contar com um atendimento mais especializa-do, de preferência em um ambiente diferenciado e exclusivo.

Ao mesmo tempo, percebemos que, com a assessoria financeira adequada, os empresários poderiam evoluir seus empreendimentos de forma mais sustentável e consistente. O que resultaria em um ciclo virtuoso, bom não só para os empresários, mas também para seus clientes, seus funcioná-rios, para o banco e para o país.

Analisamos nossa rede de agências de perfil varejo e perce-bemos que algumas iniciativas favoreciam a implementação desse modelo. Algumas unidades da rede do banco já vinham atendendo os clientes MPE de modo mais focado, com funci-onários especialistas no relacionamento com o segmento. São agências com grande potencial para relacionamento com os empresários, pois geralmente estão localizadas em setores comerciais ou industriais de suas cidades, apresentando alta concentração de empresas como clientes.

Resolvemos transformar as experiências dessas agências em um novo modelo de atendimento, estruturado e com acom-panhamento de resultados e da satisfação dos clientes.

Como teste piloto, o BB inaugurou sete agências para o seg-mento de micro e pequenas empresas: Centro Comercial, em Campo Grande (MS); Praça Sete, em Belo Horizonte (MG); Bauru, em Bauru (SP); Frei Serafim, em Teresina (PI); Avenida Saudade, em Ribeirão Preto (SP); Curitiba, em Curitiba (PR); e Vitória, em Vitória (ES).

Rumos – Quais foram as principais percepções durante o teste piloto? Dias – A principal conclusão diz respeito à disponibilização de respostas mais ágeis e relevantes às necessidades dos clien-tes, ampliando o foco no relacionamento e na concretização

Osmar Fernandes Dias é Vice-Presidente de Agronegócios e Micro e Pequenas Empresas do Banco do Brasil. Engenheiro Agrônomo, foi Senador da República durante 16 anos, Secretário de Estado da Agricultura e do Abastecimento do Estado do Paraná, Gerente Técnico da Fazenda Experimental da Cocamar, Professor e Diretor da Fundação Faculdade de Agronomia Luiz Meneguel, Presidente da Companhia Agropecuária de Fomento Econômico do Paraná.

Div

ulg

açã

o / B

anco

do B

rasi

l

Inovação no relacionamento com micro e pequenas empresas

Page 10: Rumos 281

E ENTREVISTA

partes, o que estimula a prospecção e concretização de mais negócios com qualidade.

A avaliação do BB é que a experiência é um grande suces-so, isso devido a diversos tipos de melhorias: da experiência e da satisfação dos empresários, da qualidade da interação entre a agência e esses clientes, do conforto e tranquilidade do ambi-ente, do foco na assessoria às necessidades das empresas, entre outras.

Tudo isso obviamente reflete no resultado: desempenho crescente, sustentável e superior à média. Desse modo, todos ganham!

Rumos – O senhor falou rapidamente sobre os diferen-ciais disponibilizados para as micro e pequenas empre-sas nas agências com aten-dimento especializado. Poderia descrever com mais detalhes esses dife-renciais? Dias – Sim, claro! Estamos muito satisfeitos com a qua-lidade do espaço de relacio-namento que essas agências se tornaram em tão curto espaço de tempo. Na estru-turação das agências especia-lizadas, foram pensadas solu-ções para viabilizar uma ambientação diferenciada e propiciar especialização no atendimento, alinhadas às necessidades dos clientes MPE.

Nesse contexto, foram implementadas adequações na ambientação e sinaliza-ção interna. Melhoramos a comunicação visual e os equipa-mentos. Tudo é pensado e adequado às necessidades dos empresários. Isso faz toda a diferença para nosso cliente MPE se sentir à vontade e se tornar o foco da atenção do banco, facilitando a realização de bons negócios.

Além disso, nas Agências Especializadas encontramos espaços de relacionamento para diferentes objetivos. Há, por exemplo, uma sala para educação financeira, onde podem ocorrer palestras, reuniões ou treinamentos. Também existem salas de reuniões para atendimento aos empresários, onde podem ser tratados assuntos financeiros, de forma privativa, garantindo uma maior discrição nas negociações. Também foi implantado balcão de atendimento expresso, onde são recebi-dos os mais diversos tipos de documentos em uma fila especi-al. Esse balcão propicia uma racionalização do atendimento, pois agiliza a entrega de documentos, além de permitir uma dis-ponibilidade maior de tempo para os funcionários focarem na atividade de assessorar os empresários.

Os clientes das agências especializadas podem contar com atendimento especial às suas necessidades, pois os fun-cionários dessas unidades foram capacitados com uma gra-de de treinamento centrada no segmento de micro e peque-

nas empresas. Isso significa maior conhecimento dos negó-cios dos clientes e maior qualidade no relacionamento des-ses funcionários com os empresários. O objetivo geral é pro-mover o atendimento proativo e estabelecer uma maior pro-ximidade com o cliente, seu cotidiano, suas necessidades, seus desafios.

Acreditamos que todas essas características somadas con-tribuem para que as Agências Especializadas MPE se tornem um espaço onde o empresário se sinta mais confortável e pro-picie uma melhor experiência para tomar suas decisões finan-ceiras.

Mas o modelo não é estático, ele está sob constante avali-ação e permanente evolução. Já estamos elaborando estudos para a implantação de outros diferenciais. Posso citar os ter-

minais de autoatendimento do Sebrae, que foram insta-lados em algumas das Agên-cias Especializadas MPE. Em breve, devemos esten-der esses terminais para as demais unidades do mode-lo. Outro serviço em estudo é o uso de courier para trans-porte de documentos, mais um benefício para facilitar o dia a dia de nossos clientes.

Rumos – O senhor citou as sete Agências Especia-lizadas MPE do teste pilo-to. O BB deverá expandir esse modelo para o restan-te do país? Dias – Nós já estamos expandindo. Após analisar os resultados obtidos duran-

te o funcionamento dessas primeiras unidades, o banco deci-diu ampliar o modelo para o restante do país, com inaugura-ções de agências especializadas durante este ano de 2015 por todo o Brasil.

Além das sete agências, que estão em pleno funcionamen-to, possuímos mais duas prontas para serem inauguradas. São elas: Nelson D’Ávila, em São José dos Campos (SP), e Santa Efigênia, em São Paulo (SP).

Está prevista a implantação de mais 42 Agências Especiali-zadas MPE, que estarão distribuídas por todo o país. Haverá pelo menos uma unidade em cada um dos estados da Federa-ção e no Distrito Federal, totalizando 51 unidades. As futuras inaugurações serão amplamente divulgadas. A lista completa das unidades em funcionamento pode ser consultada no site bb.com.br/mpe.

Rumos – As Agências Especializadas MPE atendem as empresas que faturam mais de R$ 1 milhão por ano. E os clientes que faturam abaixo desse patamar, como ficará seu atendimento? Dias – Em 2013, iniciamos um modelo inédito de atendi-mento digital ou remoto para os clientes micro e pequenas

A estratégia é que as agências deixem de ser um local voltado apenas paraa realização de transações e se tornem, cada vez mais, um ambiente de relacionamento. Algumas unidades da rede já vinham atendendo os clientes MPE de modo mais focado. Resolvemos transformar essas experiências em um novo modelo de atendimento.

RUMOS – 10 – Maio/Junho 2015

“”

empresas que faturam menos de R$ 1 milhão por ano. Trata-se de um modelo totalmente inovador, que permite aos cli-entes receber atendimento à distância e em horário estendi-do, das 8h às 18h.

Essa nova plataforma de relacionamento é o começo de um importante processo de mudança e modernização dos modelos adotados pelo banco para se relacionar com seus clientes MPE.

Entre as principais inovações previstas, está o uso de fer-ramentas de conveniência digital, como videoconferência, mensagens instantâneas, e-mail, chat on-line, troca eletrôni-ca de documentos e gravações telefônicas, entre outros. Há também facilidades para transporte de documentos entre a empresa e o banco, como o serviços de courier.

O uso dessas ferramen-tas vai permitir que o cliente possa ser atendido sem a necessidade de ir até uma agência física do Banco do Brasil. Isso está alinhado à evolução do comportamen-to do pequeno empresário: em 2014, o mobile pessoa jurí-dica do BB apresentou cres-cimento de 196% em suas transações mensais e o inter-net banking para empresas evoluiu 34% no mesmo período. Ou seja, os empre-sários estão cada vez mais “conectados” e compare-cem menos ao banco.

O relacionamento com o empresário por meio das ferramentas digitais, não abrindo mão também do atendimento presencial, é um desejo muito forte dos clien-tes. Atender esse anseio significa inovar no atendimento, entregando benefícios, como agilidade, acessibilidade e con-veniência. Tudo isso contribui para melhorar a experiência do empresário, oferecendo-lhe comodidade e modernidade no acesso ao BB e maior tempo para se dedicar ao seu negó-cio. Acreditamos que a disponibilização desse atendimento digital é um enorme passo nessa direção.

Rumos – Entre as ferramentas estão e-mails, chat on-line e videoconferência. Mas quem são os funcionários que prestam o atendimento digital? Dias – O que difere nesse modelo é que os empresários irão contar com mais um ponto de contato. São os gerentes e assistentes especializados, que trabalham em um novo tipo de unidade que o BB criou: o Escritório de Negócios MPE.

Esses gerentes de relacionamento e a equipe especializa-da têm treinamento específico – por vezes até por ramo de atividade das empresas dos clientes – para prestar a melhor assessoria financeira possível e atender as necessidades dos empresários.

Assim, os nossos clientes MPE passam a contar com

especialistas em investimentos, previdência, seguridade e operações de crédito. Ressaltamos que o acesso direto a esses especialistas é pouco frequente nas agência físicas, devido às limitações operacionais. Mas, com os funcionári-os do Escritório de Negócio MPE, esse acesso não só é pos-sível, como também esse relacionamento é feito com toda a conveniência das ferramentas digitais e, além de tudo, com horário estendido. No Escritório, os especialistas também contribuem para acelerar o andamento de operações, mes-mo aquelas contratadas na agência varejo onde o empresário mantém sua conta.

É importante ressaltar que os clientes permanecem com acesso ao atendimento presencial na agência onde mantêm conta-corrente. Também destacamos que eles continuam

podendo utilizar a Central de Atendimento do Banco do Brasil, para obter infor-mações e realizar transa-ções.

Rumos – Todos os clien-tes MPE do banco já estão sendo atendidos por meio desses dois modelos? Dias – Estamos em proces-so de migração dos clientes aptos a serem atendidos nos dois modelos, de forma gra-dual, para garantir uma óti-ma experiência para todos. Para ter uma ideia, mais da metade dos clientes Micro e Pequena Empresa do BB estão aptos para migrarem para o modelo digital. São

muitos empresários! Queremos que todos eles passem a ser atendidos no novo modelo da melhor forma possível.

O modelo digital foi implantado em caráter experimen-tal em 2013. O projeto teve início com a implantação do Escritório de Negócios em São José dos Pinhais (PR). Somente a partir desse escritório são 15 mil clientes atendi-dos em todo o país. Essa experiência demonstrou evolução em vários indicadores, mas quereremos destacar o índice de satisfação dos clientes. A melhoria foi de aproximadamente 10%, o que para nós caracteriza claramente que acertamos na estratégia.

Após obter esses bons primeiros resultados, o Banco do Brasil expandiu, em abril de 2015, o projeto para outro Escritório de Negócios em Joinville (SC). Já em pleno funci-onamento, o escritório atende quase dois mil clientes daque-la cidade catarinense. Além disso, temos a previsão de inau-gurar, ainda este ano, mais um escritório nos mesmos mol-des na cidade de Ribeirão Preto, em São Paulo, por meio do qual deverão ser atendidos centenas de empresários. Nossa expectativa é continuar lançando escritórios continuamente até passar a atender, por meio deste modelo, aproximada-mente 600 mil clientes MPE

OSMAR DIAS

Em 2014, o mobile pessoa jurídica do BB apresentou crescimento de 196% e o internet banking para empresas evoluiu 34%. Ou seja, os empresários estão cada vez mais “conectados”. O relacionamento por meio das ferramentas digitais é um desejo muito forte dos clientes. Atender esse anseio também significa inovar no atendimento.

“”

RUMOS – 11 – Maio/Junho 2015

Page 11: Rumos 281

E ENTREVISTA

partes, o que estimula a prospecção e concretização de mais negócios com qualidade.

A avaliação do BB é que a experiência é um grande suces-so, isso devido a diversos tipos de melhorias: da experiência e da satisfação dos empresários, da qualidade da interação entre a agência e esses clientes, do conforto e tranquilidade do ambi-ente, do foco na assessoria às necessidades das empresas, entre outras.

Tudo isso obviamente reflete no resultado: desempenho crescente, sustentável e superior à média. Desse modo, todos ganham!

Rumos – O senhor falou rapidamente sobre os diferen-ciais disponibilizados para as micro e pequenas empre-sas nas agências com aten-dimento especializado. Poderia descrever com mais detalhes esses dife-renciais? Dias – Sim, claro! Estamos muito satisfeitos com a qua-lidade do espaço de relacio-namento que essas agências se tornaram em tão curto espaço de tempo. Na estru-turação das agências especia-lizadas, foram pensadas solu-ções para viabilizar uma ambientação diferenciada e propiciar especialização no atendimento, alinhadas às necessidades dos clientes MPE.

Nesse contexto, foram implementadas adequações na ambientação e sinaliza-ção interna. Melhoramos a comunicação visual e os equipa-mentos. Tudo é pensado e adequado às necessidades dos empresários. Isso faz toda a diferença para nosso cliente MPE se sentir à vontade e se tornar o foco da atenção do banco, facilitando a realização de bons negócios.

Além disso, nas Agências Especializadas encontramos espaços de relacionamento para diferentes objetivos. Há, por exemplo, uma sala para educação financeira, onde podem ocorrer palestras, reuniões ou treinamentos. Também existem salas de reuniões para atendimento aos empresários, onde podem ser tratados assuntos financeiros, de forma privativa, garantindo uma maior discrição nas negociações. Também foi implantado balcão de atendimento expresso, onde são recebi-dos os mais diversos tipos de documentos em uma fila especi-al. Esse balcão propicia uma racionalização do atendimento, pois agiliza a entrega de documentos, além de permitir uma dis-ponibilidade maior de tempo para os funcionários focarem na atividade de assessorar os empresários.

Os clientes das agências especializadas podem contar com atendimento especial às suas necessidades, pois os fun-cionários dessas unidades foram capacitados com uma gra-de de treinamento centrada no segmento de micro e peque-

nas empresas. Isso significa maior conhecimento dos negó-cios dos clientes e maior qualidade no relacionamento des-ses funcionários com os empresários. O objetivo geral é pro-mover o atendimento proativo e estabelecer uma maior pro-ximidade com o cliente, seu cotidiano, suas necessidades, seus desafios.

Acreditamos que todas essas características somadas con-tribuem para que as Agências Especializadas MPE se tornem um espaço onde o empresário se sinta mais confortável e pro-picie uma melhor experiência para tomar suas decisões finan-ceiras.

Mas o modelo não é estático, ele está sob constante avali-ação e permanente evolução. Já estamos elaborando estudos para a implantação de outros diferenciais. Posso citar os ter-

minais de autoatendimento do Sebrae, que foram insta-lados em algumas das Agên-cias Especializadas MPE. Em breve, devemos esten-der esses terminais para as demais unidades do mode-lo. Outro serviço em estudo é o uso de courier para trans-porte de documentos, mais um benefício para facilitar o dia a dia de nossos clientes.

Rumos – O senhor citou as sete Agências Especia-lizadas MPE do teste pilo-to. O BB deverá expandir esse modelo para o restan-te do país? Dias – Nós já estamos expandindo. Após analisar os resultados obtidos duran-

te o funcionamento dessas primeiras unidades, o banco deci-diu ampliar o modelo para o restante do país, com inaugura-ções de agências especializadas durante este ano de 2015 por todo o Brasil.

Além das sete agências, que estão em pleno funcionamen-to, possuímos mais duas prontas para serem inauguradas. São elas: Nelson D’Ávila, em São José dos Campos (SP), e Santa Efigênia, em São Paulo (SP).

Está prevista a implantação de mais 42 Agências Especiali-zadas MPE, que estarão distribuídas por todo o país. Haverá pelo menos uma unidade em cada um dos estados da Federa-ção e no Distrito Federal, totalizando 51 unidades. As futuras inaugurações serão amplamente divulgadas. A lista completa das unidades em funcionamento pode ser consultada no site bb.com.br/mpe.

Rumos – As Agências Especializadas MPE atendem as empresas que faturam mais de R$ 1 milhão por ano. E os clientes que faturam abaixo desse patamar, como ficará seu atendimento? Dias – Em 2013, iniciamos um modelo inédito de atendi-mento digital ou remoto para os clientes micro e pequenas

A estratégia é que as agências deixem de ser um local voltado apenas paraa realização de transações e se tornem, cada vez mais, um ambiente de relacionamento. Algumas unidades da rede já vinham atendendo os clientes MPE de modo mais focado. Resolvemos transformar essas experiências em um novo modelo de atendimento.

RUMOS – 10 – Maio/Junho 2015

“”

empresas que faturam menos de R$ 1 milhão por ano. Trata-se de um modelo totalmente inovador, que permite aos cli-entes receber atendimento à distância e em horário estendi-do, das 8h às 18h.

Essa nova plataforma de relacionamento é o começo de um importante processo de mudança e modernização dos modelos adotados pelo banco para se relacionar com seus clientes MPE.

Entre as principais inovações previstas, está o uso de fer-ramentas de conveniência digital, como videoconferência, mensagens instantâneas, e-mail, chat on-line, troca eletrôni-ca de documentos e gravações telefônicas, entre outros. Há também facilidades para transporte de documentos entre a empresa e o banco, como o serviços de courier.

O uso dessas ferramen-tas vai permitir que o cliente possa ser atendido sem a necessidade de ir até uma agência física do Banco do Brasil. Isso está alinhado à evolução do comportamen-to do pequeno empresário: em 2014, o mobile pessoa jurí-dica do BB apresentou cres-cimento de 196% em suas transações mensais e o inter-net banking para empresas evoluiu 34% no mesmo período. Ou seja, os empre-sários estão cada vez mais “conectados” e compare-cem menos ao banco.

O relacionamento com o empresário por meio das ferramentas digitais, não abrindo mão também do atendimento presencial, é um desejo muito forte dos clien-tes. Atender esse anseio significa inovar no atendimento, entregando benefícios, como agilidade, acessibilidade e con-veniência. Tudo isso contribui para melhorar a experiência do empresário, oferecendo-lhe comodidade e modernidade no acesso ao BB e maior tempo para se dedicar ao seu negó-cio. Acreditamos que a disponibilização desse atendimento digital é um enorme passo nessa direção.

Rumos – Entre as ferramentas estão e-mails, chat on-line e videoconferência. Mas quem são os funcionários que prestam o atendimento digital? Dias – O que difere nesse modelo é que os empresários irão contar com mais um ponto de contato. São os gerentes e assistentes especializados, que trabalham em um novo tipo de unidade que o BB criou: o Escritório de Negócios MPE.

Esses gerentes de relacionamento e a equipe especializa-da têm treinamento específico – por vezes até por ramo de atividade das empresas dos clientes – para prestar a melhor assessoria financeira possível e atender as necessidades dos empresários.

Assim, os nossos clientes MPE passam a contar com

especialistas em investimentos, previdência, seguridade e operações de crédito. Ressaltamos que o acesso direto a esses especialistas é pouco frequente nas agência físicas, devido às limitações operacionais. Mas, com os funcionári-os do Escritório de Negócio MPE, esse acesso não só é pos-sível, como também esse relacionamento é feito com toda a conveniência das ferramentas digitais e, além de tudo, com horário estendido. No Escritório, os especialistas também contribuem para acelerar o andamento de operações, mes-mo aquelas contratadas na agência varejo onde o empresário mantém sua conta.

É importante ressaltar que os clientes permanecem com acesso ao atendimento presencial na agência onde mantêm conta-corrente. Também destacamos que eles continuam

podendo utilizar a Central de Atendimento do Banco do Brasil, para obter infor-mações e realizar transa-ções.

Rumos – Todos os clien-tes MPE do banco já estão sendo atendidos por meio desses dois modelos? Dias – Estamos em proces-so de migração dos clientes aptos a serem atendidos nos dois modelos, de forma gra-dual, para garantir uma óti-ma experiência para todos. Para ter uma ideia, mais da metade dos clientes Micro e Pequena Empresa do BB estão aptos para migrarem para o modelo digital. São

muitos empresários! Queremos que todos eles passem a ser atendidos no novo modelo da melhor forma possível.

O modelo digital foi implantado em caráter experimen-tal em 2013. O projeto teve início com a implantação do Escritório de Negócios em São José dos Pinhais (PR). Somente a partir desse escritório são 15 mil clientes atendi-dos em todo o país. Essa experiência demonstrou evolução em vários indicadores, mas quereremos destacar o índice de satisfação dos clientes. A melhoria foi de aproximadamente 10%, o que para nós caracteriza claramente que acertamos na estratégia.

Após obter esses bons primeiros resultados, o Banco do Brasil expandiu, em abril de 2015, o projeto para outro Escritório de Negócios em Joinville (SC). Já em pleno funci-onamento, o escritório atende quase dois mil clientes daque-la cidade catarinense. Além disso, temos a previsão de inau-gurar, ainda este ano, mais um escritório nos mesmos mol-des na cidade de Ribeirão Preto, em São Paulo, por meio do qual deverão ser atendidos centenas de empresários. Nossa expectativa é continuar lançando escritórios continuamente até passar a atender, por meio deste modelo, aproximada-mente 600 mil clientes MPE

OSMAR DIAS

Em 2014, o mobile pessoa jurídica do BB apresentou crescimento de 196% e o internet banking para empresas evoluiu 34%. Ou seja, os empresários estão cada vez mais “conectados”. O relacionamento por meio das ferramentas digitais é um desejo muito forte dos clientes. Atender esse anseio também significa inovar no atendimento.

“”

RUMOS – 11 – Maio/Junho 2015

Page 12: Rumos 281

orçamento federal – como todos os orçamentos no Brasil: estaduais, municipais, das empresas esta-tais, fundações, autarquias e até das ONGs (enti-dades nominalmente “não governamentais”, mas

financiadas pelos governos) – tem caráter geológico. A condi-ção suficiente para um programa estar no orçamento de 2015 é que tenha estado no orçamento de 2014... E, para ter estado no de 2014 é porque já estava no de 2013...

Assim, por uma indução regressiva, qualquer programa – seguramente sem avaliação de sua eficácia – terá permaneci-do por ter tido a sorte daquele “jaboti” posto na árvore por um político diligente, que ameaçou não votar o orçamento na undécima hora se ele não fosse aceito... A condição necessá-ria é eleger um bom “caçador” de jabotis!

A estrutura “geológica” se explica por conta dos “progra-mas” que se acumulam em camadas. Nunca terminam. Vão se somando uns sobre os outros adquirindo, quando preciso, novos nomes “fantasia”.

É por isso que é fundamental – pelo menos a cada gera-ção, 25 anos – instituir uma “força-tarefa” para construir o Orçamento de Base Zero: rever e avaliar, objetivamente, os resultados de todos os programas e ordenar os que passaram no teste por suas taxas de retorno social. Por que uma gera-ção? Porque a Câmara dos Deputados terá sido renovada seis vezes, com taxa média de retorno de 60% e menos de 5% dos plantadores de jaboti originais ainda estarão lá para defender suas “criaturas”... Não se trata de reduzir a carga tributária, mas de eliminar o desperdício para ampliar o investimento.

A Constituição de 1988 escolheu construir uma sociedade civilizada, em que a igualdade de oportunidades é o “ideal” a ser perseguido. Isso exige um Estado forte, constitucional-mente controlado, capaz de regular os mercados e usar eficien-temente os recursos apropriados pelo sistema tributário para proporcionar saúde e educação para todos (paga por todos) e mitigar os efeitos da transmissão intergeracional da riqueza acumulada quer pelo mérito, quer pela sorte. Há tempo mais do que suficiente para preparar um Orçamento BASE-ZERO (OB-0) e submetê-lo ao escrutínio do Congresso em agosto de 2016, para vigorar em 2017 destinando 4% ou 5% do Pro-duto Interno Bruto (PIB) para investimento público na infra-estrutura e mantendo o controle da relação Dívida Bruta/PIB.

Isso nos leva a um segundo grande problema. É inegável

que o funcionalismo público de carreira, admitido por concur-so e promovido com a complementação de cursos de aperfei-çoamento internos, tem melhorado de qualidade. Esta só não é otimizada devido à parasitagem dos companheiros de “pas-seata” ou de “tertúlias acadêmicas” de livre nomeação que infestam a administração. Não é possível explicar a ineficiência do Estado brasileiro sem olhar para a sua estrutura. O recente The Global Competitiveness Report – 2014/15, do Word Eco-nomic Forum, analisa o nível de competitividade de 144 países (o melhor tem rank 1º e o pior 144º). Quando separamos os setores privado e público há uma enorme perplexidade: somos o 36º (muito melhor que nossos competidores mais próximos) com relação ao setor privado e, lamentavelmente, o 136º com relação ao setor público (muito pior do que nossos competidores). A ineficiência do setor público leva o Brasil ao 57º lugar no índice geral.

Esses fatos – por mais imprecisos que sejam e por mais amarga que seja sua digestão – não podem ser explicados como uma perseguição mundial às ilusões da nossa grandeza nacional. Sugerem, ao contrário, que temos um grave proble-ma estrutural na organização interna do Estado, cuja percep-ção é cada vez mais gritante, como se vê na sugestão de enfren-tá-lo reduzindo o número de ministérios. Isto, por si só, não eliminaria os programas que satisfazem apenas a grupos orga-nizados e interesses privados disfarçados de públicos.

O Presidente da República pode, por decreto, “dispor sobre a organização e funcionamento da administração fede-ral, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos”. Por que, então, não pensar numa segunda força-tarefa de experimentados administrado-res públicos e privados para estudar formas de colocar o setor público no “estado da arte” e oferecer projeto em 2016 ao exame do Congresso Nacional, para analisar “a criação e extinção de órgãos da administração pública”, como exige a Constituição?

São iniciativas que mobilizariam a inteligência nacional e seriam muito bem-vindas para reconquistar a confiança da so-ciedade brasileira no Estado, essencial para dar suporte a ideias nas quais se pensa o país no longo prazo, sem o que a volta ao crescimento robusto não acontecerá. Por que não começar do começo em 2017, enquanto pomos em ordem a economia em 2015/2016? O Brasil precisa, acima de tudo, de esperança!

RUMOS – 12 – Maio/Junho 2015

Antonio Delfim Netto

Professor Emérito da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA-USP). Ex-ministro da Fazenda, da Agricultura e do Planejamento.

Ma

rcel

o C

orre

a

O OPINIÃO

O

Começar do começo em 2017

Page 13: Rumos 281

AFAP Agência de Fomento do Estado do Amapá S/Awww.afap.ap.gov.br

AFEAM Agência de Fomento do Estado do Amazonas S/A www.afeam.am.gov.br

AFERR Agência de Fomento do Estado de Roraima S/A www.aferr.rr.gov.br

AGEFEPE Agência de Fomento do Estado de Pernambuco S/A www.agefepe.pe.gov.br

AGÊNCIA DE FOMENTO TOCANTINSAgência de Fomento do Estadodo Tocantinswww.fomento.to.gov.br

AGERIO Agência de Fomento do Estado do Rio de Janeiro S/A www.agerio.com.br

AGN Agência de Fomento do Rio Grande do Norte S/A www.agnrn.com.br

BADESC Agência de Fomento do Estado de Santa Catarina S/A www.badesc.gov.br

BADESUL Badesul Desenvolvimento S/A – Agência de Fomento RS www.badesul.com.br

BANCO DA AMAZÔNIA Banco da Amazônia S/A www.bancoamazonia.com.br

BANCOOB Banco Cooperativo do Brasil S/A www.bancoob.com.br

BANDES Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo S/A www.bandes.com.br

BANPARÁ Banco do Estado do Pará S/A www.banparanet.com.br

BB Banco do Brasil S/Awww.bb.com.br

BDMG Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais S/A www.bdmg.mg.gov.br

BNB Banco do Nordeste S/A www.bnb.gov.br

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social www.bndes.gov.br

BRB Banco de Brasília www.brb.com.br

BRDE Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul www.brde.com.br

CAIXA Caixa Econômica Federal www.caixa.gov.br

DESENBAHIA Agência de Fomento do Estado da Bahia S/A www.desenbahia.ba.gov.br

DESENVOLVE Agência de Fomento do Estado de Alagoas S/A www.desenvolve-al.com.br

DESENVOLVE SP Agência de Desenvolvimento Paulista www.desenvolvesp.com.br

FINEP Inovação e Pesquisa www.finep.gov.br

FOMENTO PARANÁ Agência de Fomento doParaná S/Awww.fomento.pr.gov.br

GOIÁSFOMENTO Agência de Fomento do Estado de Goiás S/A www.fomento.goias.com.br

MT FOMENTO Agência de Fomento do Estado de Mato Grosso S/A www.mtfomento.mt.gov.br

PIAUÍ FOMENTO Agência de Fomento e Desenvolvimento do Estado do Piauí S/A www.fomento.pi.gov.br

SEBRAEServiço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas www.sebrae.com.br

SISTEMA NACIONAL DE FOMENTO

Page 14: Rumos 281

ma nova etapa de aproximação entre cooperativas de cré-dito e pequenos n e g ó c i o s , c o m

incentivo para a ampliação do acesso a mercados e à capacita-ção técnica de associados e cola-boradores, foi inaugurada no pri-meiro semestre de 2015. Isto por-que o Serviço Brasileiro de Apo-io às Micro e Pequenas Empre-sas (Sebrae) firmou novas parce-rias com instituições do setor cooperativista brasileiro, com atuação no meio urbano e rural. A celebração de convênio com o Banco Cooperativo Sicredi, em maio de 2015, expande o campo de atuação conjunta já desenvol-vida entre as duas organizações e formalizada no âmbito do Proje-to de Fomento às Boas Práticas em Cooperativas de Crédito. Já o compromisso firmado entre o Sebrae e a Confederação Nacio-nal das Cooperativas Centrais de Crédito e Economia Familiar e Solidária (Confesol), assinado em abril deste ano, prevê ações de acesso ao crédito com foco no pequeno produtor e agricul-tor rural.

RUMOS – 14 – Maio/Junho 2015

Os dois convênios de coo-peração geral definem com-promissos dos signatários com o planejamento e a execução de ações orientadas para a dis-ponibilidade, por parte das coo-perativas de crédito, de produ-tos e de serviços financeiros, em condições favoráveis, des-tinados ao atendimento das necessidades financeiras de investimento e de capital de giro dos pequenos negócios instalados em todo o Brasil. O intuito é promover entre as cooperativas de crédito o apri-moramento do atendimento oferecido ao segmento de negócios com receita bruta anu-al de até R$ 3,6 milhões, faixa em que se encontram micro-empreendedores individuais (MEI), microempresários e pequenas empresas. Com isso, pretende-se facilitar e agilizar, por meio de processos simpli-ficados e desburocratizados, o acesso desses clientes ao crédi-to e aos demais serviços finan-ceiros oferecidos pelas coope-rativas filiadas.

Como parte da estratégia do Sebrae de fortalecer o coo-

RUMOS – 15 – Maio/Junho 2015

nho entre pequenos negócios no período de 2011 a 2014 foi menor percentualmente, com aumento de 31,2% no volume de crédito concedido a pequenos empresários, totalizando R$ 10,1 bilhões. No Sistema Financeiro Nacional (SFN), a taxa de expansão foi modesta: 11,66%, chegando ao patamar de R$ 335 bilhões.

O caminho adotado pelo Sebrae foi a promoção de inter-câmbio de boas práticas para o incremento do acesso a servi-ços financeiros e a redução de custos focados em empresas de pequeno porte. “Nessa fase, as parcerias com entidades cooperativistas estimularam a participação de cooperativas singulares em projetos do Sebrae voltados à inclusão finan-ceira dos pequenos negócios”, explica Heloísa. Outro resul-tado positivo foi a ampliação da participação do Sebrae em eventos e ações diversas de parceiros, como o Congresso Bra-sileiro do Cooperativismo de Crédito (Concred), cuja décima edição aconteceu em Manaus (Amazonas), no ano passado, por iniciativa da Confederação Brasileira das Cooperativas de Crédito (Confebras), e o Prêmio Cooperativa do Ano, pro-movido pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), entre outras. Segundo a diretora-técnica do Sebrae, essa aproximação fez com que a presença do Sebrae se forta-lecesse como instituição de apoio ao cooperativismo.

Novas ações – Os convênios assinados com o Sicredi e a Confesol estão inseridos em um horizonte de dois anos de trabalho, que representam investimentos de R$ 7,1 milhões em dez novos projetos de desenvolvimento do cooperativis-mo financeiro, a segunda fase. Na primeira fase, o valor apli-cado foi de R$ 5,2 milhões. A meta prevista nesta segunda eta-pa é atrair para as cooperativas de crédito conveniadas apro-ximadamente 50,6 mil empresas, garantindo movimentação de R$ 1,865 bilhão em crédito. “Na segunda fase, não são as

perativismo enquanto importante alternativa de inclusão financeira dos pequenos negócios, a entidade, juntamente com suas representações estaduais, se comprometeu, nas par-cerias com o Sicredi e a Confesol, em oferecer mecanismos de estímulo a iniciativas de capacitação, consultoria, elabora-ção de projetos e assistência técnica para que as cooperativas de crédito filiadas possam desenvolver produtos e serviços cujos beneficiários finais sejam os pequenos negócios. O obje-tivo é prover instrumentos e informações técnico-gerenciais ao corpo funcional das cooperativas, no âmbito da atualiza-ção de conteúdos e criação de novas ferramentas para atrair e atender os pequenos negócios. Os convênios contemplam ainda a apresentação de estudos e diagnósticos, nacionais e estaduais, que possam nortear ações das cooperativas de cré-dito em direção ao público atendido pelo Sebrae.

De acordo com a diretora-técnica do Sebrae, Heloísa Menezes, a renovação e ampliação das parcerias para esta segunda fase de fomento ao relacionamento entre o coopera-tivismo de crédito e os pequenos negócios é a consolidação do trabalho realizado na primeira etapa do Projeto de Fomen-to às Boas Práticas em Cooperativas de Crédito, iniciado em 2011. “Além de disseminar boas práticas, o segmento coope-rativista deve se apresentar como uma alternativa importante de acesso a serviços financeiros para os pequenos negócios”, reforça.

Até 2014, o trabalho conjunto do Sebrae com o coopera-tivismo financeiro viabilizou um crescimento de 140% em crédito para pequenos negócios, proveniente das 185 coope-rativas de crédito participantes, em 17 estados, totalizando R$ 8,57 bilhões até agosto do ano passado. No Amapá, por exemplo, o montante saltou de R$ 373,7 mil, em 2011, para R$ 4,3 milhões ao final do primeiro semestre de 2014. Quan-do considerado todo o universo cooperativista, o desempe-

CONVÊNIOE EMPREENDER

U

Sebrae firma novos convênios com entidades do setor de cooperativismo de crédito, consolidando práticas para promover a inclusão financeira e o acesso ao crédito para pequenos negócios

Por Sarah Barros

Atendimento a cooperados no Sicred, que já possuía parceriacom o Sebrae em sete estados e agora eleva integração ao nível nacional.

Ita

Kir

sch

Parceria renovada entre cooperativismo e pequenos negócios

Div

ulg

açã

o

Presidente da Confesol, Ailton Croda, e a diretora-técnica do Sebrae, Heloísa Menezes, na assinatura do convênio.

Page 15: Rumos 281

ma nova etapa de aproximação entre cooperativas de cré-dito e pequenos n e g ó c i o s , c o m

incentivo para a ampliação do acesso a mercados e à capacita-ção técnica de associados e cola-boradores, foi inaugurada no pri-meiro semestre de 2015. Isto por-que o Serviço Brasileiro de Apo-io às Micro e Pequenas Empre-sas (Sebrae) firmou novas parce-rias com instituições do setor cooperativista brasileiro, com atuação no meio urbano e rural. A celebração de convênio com o Banco Cooperativo Sicredi, em maio de 2015, expande o campo de atuação conjunta já desenvol-vida entre as duas organizações e formalizada no âmbito do Proje-to de Fomento às Boas Práticas em Cooperativas de Crédito. Já o compromisso firmado entre o Sebrae e a Confederação Nacio-nal das Cooperativas Centrais de Crédito e Economia Familiar e Solidária (Confesol), assinado em abril deste ano, prevê ações de acesso ao crédito com foco no pequeno produtor e agricul-tor rural.

RUMOS – 14 – Maio/Junho 2015

Os dois convênios de coo-peração geral definem com-promissos dos signatários com o planejamento e a execução de ações orientadas para a dis-ponibilidade, por parte das coo-perativas de crédito, de produ-tos e de serviços financeiros, em condições favoráveis, des-tinados ao atendimento das necessidades financeiras de investimento e de capital de giro dos pequenos negócios instalados em todo o Brasil. O intuito é promover entre as cooperativas de crédito o apri-moramento do atendimento oferecido ao segmento de negócios com receita bruta anu-al de até R$ 3,6 milhões, faixa em que se encontram micro-empreendedores individuais (MEI), microempresários e pequenas empresas. Com isso, pretende-se facilitar e agilizar, por meio de processos simpli-ficados e desburocratizados, o acesso desses clientes ao crédi-to e aos demais serviços finan-ceiros oferecidos pelas coope-rativas filiadas.

Como parte da estratégia do Sebrae de fortalecer o coo-

RUMOS – 15 – Maio/Junho 2015

nho entre pequenos negócios no período de 2011 a 2014 foi menor percentualmente, com aumento de 31,2% no volume de crédito concedido a pequenos empresários, totalizando R$ 10,1 bilhões. No Sistema Financeiro Nacional (SFN), a taxa de expansão foi modesta: 11,66%, chegando ao patamar de R$ 335 bilhões.

O caminho adotado pelo Sebrae foi a promoção de inter-câmbio de boas práticas para o incremento do acesso a servi-ços financeiros e a redução de custos focados em empresas de pequeno porte. “Nessa fase, as parcerias com entidades cooperativistas estimularam a participação de cooperativas singulares em projetos do Sebrae voltados à inclusão finan-ceira dos pequenos negócios”, explica Heloísa. Outro resul-tado positivo foi a ampliação da participação do Sebrae em eventos e ações diversas de parceiros, como o Congresso Bra-sileiro do Cooperativismo de Crédito (Concred), cuja décima edição aconteceu em Manaus (Amazonas), no ano passado, por iniciativa da Confederação Brasileira das Cooperativas de Crédito (Confebras), e o Prêmio Cooperativa do Ano, pro-movido pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), entre outras. Segundo a diretora-técnica do Sebrae, essa aproximação fez com que a presença do Sebrae se forta-lecesse como instituição de apoio ao cooperativismo.

Novas ações – Os convênios assinados com o Sicredi e a Confesol estão inseridos em um horizonte de dois anos de trabalho, que representam investimentos de R$ 7,1 milhões em dez novos projetos de desenvolvimento do cooperativis-mo financeiro, a segunda fase. Na primeira fase, o valor apli-cado foi de R$ 5,2 milhões. A meta prevista nesta segunda eta-pa é atrair para as cooperativas de crédito conveniadas apro-ximadamente 50,6 mil empresas, garantindo movimentação de R$ 1,865 bilhão em crédito. “Na segunda fase, não são as

perativismo enquanto importante alternativa de inclusão financeira dos pequenos negócios, a entidade, juntamente com suas representações estaduais, se comprometeu, nas par-cerias com o Sicredi e a Confesol, em oferecer mecanismos de estímulo a iniciativas de capacitação, consultoria, elabora-ção de projetos e assistência técnica para que as cooperativas de crédito filiadas possam desenvolver produtos e serviços cujos beneficiários finais sejam os pequenos negócios. O obje-tivo é prover instrumentos e informações técnico-gerenciais ao corpo funcional das cooperativas, no âmbito da atualiza-ção de conteúdos e criação de novas ferramentas para atrair e atender os pequenos negócios. Os convênios contemplam ainda a apresentação de estudos e diagnósticos, nacionais e estaduais, que possam nortear ações das cooperativas de cré-dito em direção ao público atendido pelo Sebrae.

De acordo com a diretora-técnica do Sebrae, Heloísa Menezes, a renovação e ampliação das parcerias para esta segunda fase de fomento ao relacionamento entre o coopera-tivismo de crédito e os pequenos negócios é a consolidação do trabalho realizado na primeira etapa do Projeto de Fomen-to às Boas Práticas em Cooperativas de Crédito, iniciado em 2011. “Além de disseminar boas práticas, o segmento coope-rativista deve se apresentar como uma alternativa importante de acesso a serviços financeiros para os pequenos negócios”, reforça.

Até 2014, o trabalho conjunto do Sebrae com o coopera-tivismo financeiro viabilizou um crescimento de 140% em crédito para pequenos negócios, proveniente das 185 coope-rativas de crédito participantes, em 17 estados, totalizando R$ 8,57 bilhões até agosto do ano passado. No Amapá, por exemplo, o montante saltou de R$ 373,7 mil, em 2011, para R$ 4,3 milhões ao final do primeiro semestre de 2014. Quan-do considerado todo o universo cooperativista, o desempe-

CONVÊNIOE EMPREENDER

U

Sebrae firma novos convênios com entidades do setor de cooperativismo de crédito, consolidando práticas para promover a inclusão financeira e o acesso ao crédito para pequenos negócios

Por Sarah Barros

Atendimento a cooperados no Sicred, que já possuía parceriacom o Sebrae em sete estados e agora eleva integração ao nível nacional.

Ita

Kir

sch

Parceria renovada entre cooperativismo e pequenos negócios

Div

ulg

açã

o

Presidente da Confesol, Ailton Croda, e a diretora-técnica do Sebrae, Heloísa Menezes, na assinatura do convênio.

Page 16: Rumos 281

mesmas cooperativas, então, estamos con-siderando que esse incremento é somente nas cooperativas participantes da segunda fase”, explica Heloísa.

No caso do convênio com o Sicredi, a parceria eleva ao nível nacional a integra-ção entre as duas entidades com ações já

desenvolvidas junto a cooperativas de crédito localiza-das no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia e Tocantins. “Além de fortalecer as parcerias locais em andamento, a ampliação do acordo vai criar novas oportunidades de ações conjuntas, o intercâmbio de conhecimento, além de fomentar o desenvolvimento e a capacidade compe-titiva dos pequenos negócios”, afirma o CEO do Banco Cooperativo, da Confederação e da Fundação Sicredi, Edson Nassar. O convênio foi assinado em maio, em Porto Alegre, durante o II Seminário de Lideranças do Cooperativismo Financeiro para Pequenos Negócios.

O Sicredi conta com aproximadamente 300 mil associados pessoas jurídicas, que correspondem a 10% da base de clientes. Destes, 96% são micro e pequenas empresas, que atuam, principalmente, no comércio (46%) e no setor de serviços (40%). O desempenho é atribuído ao atendimento próximo e consultivo, com oferta de soluções que apoiam o empreendedor tanto para aumentar sua rentabilidade quanto na hora de expandir o negócio. Entre maio de 2014 e maio de 2015, a base de pessoa jurídica do Sicredi cresceu 13%. “Os peque-nos negócios assim como as cooperativas de crédito promo-vem o desenvolvimento econômico das regiões onde atuam. A capacitação dos colaboradores que estão mais próximos do segmento, segundo estratégias metodológicas locais, mul-tiplicará o acesso ao conhecimento e qualificará o atendimen-to aos associados pessoa jurídica”, acrescenta o CEO.

Para o Sebrae, a maior abrangência do convênio abre oportunidades para a inclusão financeira dos pequenos negó-cios por meio do cooperativismo financeiro. “Temos a pers-pectiva de ampliar a atuação do Sicredi com pequenos negó-cios e participar de projetos do Sebrae de apoio ao cooperati-vismo em todos os estados onde o Sicredi está presente”, pon-tua Heloísa. Além dos sete estados já citados, o Sicredi tam-bém conta com pontos de atendimento em São Paulo, no Rio de Janeiro, no Pará e em Goiás.

Crédito ao campo – O convênio firmado pelo Sebrae com a Confesol se volta para atender outro público em potencial associado em cooperativas de crédito: o de pequenos agricul-tores e produtores rurais. No caso da Confesol, o perfil de seus associados é o definido pela Lei 11.326/2006, segundo a qual os empreendedores familiares rurais são detentores de área com até quatro módulos fiscais e utilizam, predominan-temente, mão de obra da própria família nas atividades eco-nômicas do seu estabelecimento ou empreendimento. A ren-da deve ser originada, em maior parte, dessas atividades e o estabelecimento deve ser dirigido pela própria família. “Isso nos coloca em uma condição diferente da vivida pelos bancos cooperativos de área urbana, com produtos específicos e mar-

RUMOS – 16 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 17 – Maio/Junho 2015

de crédito tem a função de propiciar o funcionamento das instituições de for-ma online, atendendo as exigências nor-mativas e regulatórias do Banco Cen-tral e demais órgãos governamentais. Desde o ano passado, com a conclusão da migração das cooperativas para o sis-tema, o Colmeia passou a ser a tecnolo-gia utilizada para a gestão de todas as cooperativas de crédito associadas à confederação. “Com essa primeira par-ceria, notamos que o potencial existe e o Sebrae busca crescer nesse campo”, relata a diretora-técnica do Sebrae, Heloísa Menezes.

A nova parceria foi assinada em abril deste ano, no III Seminário Naci-onal do Cooperativismo de Crédito Familiar e Solidário, em Brasília (DF), e já está em plena execução. O acordo já abriu as portas para o Sebrae atuar na Bahia e no Sergipe, com mobilização iniciada junto à Ascoob. Na outra ponta do país, no Rio Grande do Sul (RS), a Central Crenor trabalha na minuta de projeto para o acompanhamen-to ao crédito para 300 agricultores, de seis cooperativas singu-lares. “Também estamos concluindo uma parceria para que cooperativas da Bahia troquem informações com as gaúchas e passem a experiência que têm com a seca, que na Bahia é bem mais extensa e pode apontar soluções para os produto-res do Rio Grande do Sul”, explica Croda.

O acompanhamento oferecido por cooperativas ligadas às seis cooperativas gaúchas se dará nos moldes do projeto de intercooperação entre as instituições do setor. A iniciativa consiste no apadrinhamento de cooperativas de menor porte, por aquelas de maior porte e com mais experiência e serviços adequados para o perfil dos pequenos negócios. Entre as regras do projeto está a obrigatoriedade de que a entidade apa-drinhadora esteja localizada em unidade federativa diferente das apadrinhadas. Para adotar uma cooperativa, a entidade apadrinhadora precisa estar em operação há, pelo menos, cin-co anos e ter, no mínimo, 500 sócios pessoa jurídica. Já entre os requisitos para ser apadrinhada está a comprovação de fun-cionamento há, pelo menos, dois anos e a presença de, ao menos, 50 empresários associados.

Além do Sicredi e da Confesol, outras entidades do setor cooperativista, como a Unicredi e o Sicoob Central Cecresp, estão sendo acionadas para juntar forças com o Sebrae, expan-dir o crédito e promover a inclusão financeira e produtiva de seus associados. “O Sebrae assumiu o papel de estimular o coo-perativismo financeiro para os pequenos negócios e esse papel deve se manter”, reforça Heloísa.

Tal empenho é reconhecido por outras entidades do setor, como o Sicoob, com quem o Sebrae também mantém parceria desde agosto de 2011. A partir de então, são mais de 150 coo-perativas do Sicoob atuantes em projetos do Sebrae em todo o Brasil, respeitando características específicas da região de atua-ção. “A iniciativa do Sebrae em promover a competitividade e o desenvolvimento dos pequenos negócios é de fundamental

importância para fomentar o empreendedoris-mo e estimular a economia”, avalia o superin-tendente de Gestão Estratégica do Bancoob, Cláudio Halley. O Bancoob é um banco comer-cial privado especializado no atendimento a coo-perativas de crédito, cujo controle acionário per-tence a entidades filiadas ao Sicoob.

Para Halley, a sinergia entre pequenos negócios e cooperativas de crédito se baseia em duas características compartilhadas por ambos: a busca pelo desenvolvimento local e a realização de atividades de proximidade e comprometimento com a comunidade. “Sabemos que, em regiões no interior do país, micro e pequenos negócios são pouco assistidos pelo Sistema Financeiro Nacional, talvez pela baixa tecnicidade na gestão dessas empresas. No entanto, os atores do pequeno negócio mostram convergência com o cooperativismo”, afirma. Os bons resultados também são perceptíveis nos números da

instituição: no período de 2011 a 2014, a base de associados pessoa jurídica apresentou um crescimento de 72%, alcançan-do 345 mil associados em dezembro de 2014.

O superintendente ressaltou que a demonstração do comprometimento do Sicoob com o micro e pequeno negócio também pode ser observada na agenda de inovações que tem sido conduzida no âmbito do Sistema. Dentre outras ações voltadas ao pequeno negócio, em 2013 o Sicoob foi o primeiro sistema de cooperativas financeiras a disponibilizar o Cartão BNDES aos cooperados e em 2014 deu mais um importante passo no atendimento às MPEs, lançando uma “maquininha” de pagamentos exclusiva para os lojistas que fazem parte de qualquer cooperativa de crédito no Brasil. A Soluções Integradas de Pagamentos (Sipag), habilita os cooperados a aceitarem pagamentos com cartão de débito e crédito das principais bandeiras de mercado e sem dúvida será mais um grande apoio do Sicoob no desenvolvimento desses negócios.

A continuidade nos esforços para aproximar pequenos negócios e cooperativas de crédito encontra respaldo também no momento atual de baixa atividade econômica. Embora necessárias, as medidas do governo com vistas à convergência da inflação para o centro da meta recaem em elevação da taxa de juros. Segundo Halley, isso provoca um comportamento de conservadorismo por parte dos bancos em relação à oferta de crédito. “Já as cooperativas do Sicoob adotam uma postura que contrapõe esse comportamento. Estamos sempre ao lado de nossos associados apoiando suas atividades. Assim, avançamos também em momentos de dificuldades”, aponta.

Com o atual contexto econômico, ações de parceria como esta com o Sebrae impulsionam as contribuições das cooperativas de crédito para que micro e pequenos negócios possam ampliar sua competitividade por meio da manuten-ção de acesso ao crédito e da prestação de serviços financei-ros de qualidade com preços justos aos associados empreen-dedores.

E EMPREENDER

2,9 miASSOCIADOS

98COOPERATIVAS

1.237UNIDADES DE ATENDIMENTO

COBERTURA SICREDI NO BRASIL

RS

SC

PR

SP RJ

PA

GO

TO

MS

RO

MT

Fonte: Relatório anual 2014 - Sicredi

cos regulatórios específicos. Somos cooperativas de crédito de ramo e não queremos perder essa origem”, frisa o presi-dente da Confesol, Ailton Croda. Atualmente, a Confesol con-grega em cinco centrais (Cresol, Cresol Baser, Crehnor, Asco-ob e Central Cresol Sicoper) o total de 158 cooperativas de cré-dito, instaladas em 20 estados brasileiros, chegando direta-mente aos associados por meio de 504 pontos de atendimen-to. Ao todo, são 394,7 mil associados da agroindústria famili-ar. “Hoje já oferecemos financiamentos, acesso ao crédito rural, assistência técnica, apoio em gestão e regularização e na consolidação de marca dos cooperativados”, elenca Croda.

No âmbito da parceria com o Sebrae, a confederação espe-ra agregar outros serviços tanto para o público atendido quan-to para a própria gestão das cooperativas filiadas. Uma das ações é prover mais capacitação para dirigentes e colaborado-res em áreas como atendimento, papel do cooperativismo para o desenvolvimento regional, legislação e normatização do setor. “O nosso objetivo é continuar fortalecendo o agricultor para que ele continue a produzir e permaneça no campo com qualidade de vida”, destaca Croda. Com a atuação conjunta com o Sebrae, há a perspectiva também de expansão do coo-perativismo de crédito familiar e solidário e de avanços cada vez mais significativos no que se refere a serviços tecnológicos, como sistema de compensação financeira própria – em discus-são com o Banco Central – e atendimento online.

Foi justamente na área de tecnologia que se deu a maior aproximação entre o Sebrae e as cooperativas de crédito no setor da agricultura familiar e economia solidária. Em 2008, o apoio da entidade e do Ministério de Desenvolvimento Agrá-rio (MDA) à Confesol resultou na criação e implementação do Sistema Colmeia. O programa de gestão de cooperativas

CONVÊNIO

Cláudio Halley, superintendente de Gestão Estratégica do Bancoob.

Div

ulg

açã

o

Page 17: Rumos 281

mesmas cooperativas, então, estamos con-siderando que esse incremento é somente nas cooperativas participantes da segunda fase”, explica Heloísa.

No caso do convênio com o Sicredi, a parceria eleva ao nível nacional a integra-ção entre as duas entidades com ações já

desenvolvidas junto a cooperativas de crédito localiza-das no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia e Tocantins. “Além de fortalecer as parcerias locais em andamento, a ampliação do acordo vai criar novas oportunidades de ações conjuntas, o intercâmbio de conhecimento, além de fomentar o desenvolvimento e a capacidade compe-titiva dos pequenos negócios”, afirma o CEO do Banco Cooperativo, da Confederação e da Fundação Sicredi, Edson Nassar. O convênio foi assinado em maio, em Porto Alegre, durante o II Seminário de Lideranças do Cooperativismo Financeiro para Pequenos Negócios.

O Sicredi conta com aproximadamente 300 mil associados pessoas jurídicas, que correspondem a 10% da base de clientes. Destes, 96% são micro e pequenas empresas, que atuam, principalmente, no comércio (46%) e no setor de serviços (40%). O desempenho é atribuído ao atendimento próximo e consultivo, com oferta de soluções que apoiam o empreendedor tanto para aumentar sua rentabilidade quanto na hora de expandir o negócio. Entre maio de 2014 e maio de 2015, a base de pessoa jurídica do Sicredi cresceu 13%. “Os peque-nos negócios assim como as cooperativas de crédito promo-vem o desenvolvimento econômico das regiões onde atuam. A capacitação dos colaboradores que estão mais próximos do segmento, segundo estratégias metodológicas locais, mul-tiplicará o acesso ao conhecimento e qualificará o atendimen-to aos associados pessoa jurídica”, acrescenta o CEO.

Para o Sebrae, a maior abrangência do convênio abre oportunidades para a inclusão financeira dos pequenos negó-cios por meio do cooperativismo financeiro. “Temos a pers-pectiva de ampliar a atuação do Sicredi com pequenos negó-cios e participar de projetos do Sebrae de apoio ao cooperati-vismo em todos os estados onde o Sicredi está presente”, pon-tua Heloísa. Além dos sete estados já citados, o Sicredi tam-bém conta com pontos de atendimento em São Paulo, no Rio de Janeiro, no Pará e em Goiás.

Crédito ao campo – O convênio firmado pelo Sebrae com a Confesol se volta para atender outro público em potencial associado em cooperativas de crédito: o de pequenos agricul-tores e produtores rurais. No caso da Confesol, o perfil de seus associados é o definido pela Lei 11.326/2006, segundo a qual os empreendedores familiares rurais são detentores de área com até quatro módulos fiscais e utilizam, predominan-temente, mão de obra da própria família nas atividades eco-nômicas do seu estabelecimento ou empreendimento. A ren-da deve ser originada, em maior parte, dessas atividades e o estabelecimento deve ser dirigido pela própria família. “Isso nos coloca em uma condição diferente da vivida pelos bancos cooperativos de área urbana, com produtos específicos e mar-

RUMOS – 16 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 17 – Maio/Junho 2015

de crédito tem a função de propiciar o funcionamento das instituições de for-ma online, atendendo as exigências nor-mativas e regulatórias do Banco Cen-tral e demais órgãos governamentais. Desde o ano passado, com a conclusão da migração das cooperativas para o sis-tema, o Colmeia passou a ser a tecnolo-gia utilizada para a gestão de todas as cooperativas de crédito associadas à confederação. “Com essa primeira par-ceria, notamos que o potencial existe e o Sebrae busca crescer nesse campo”, relata a diretora-técnica do Sebrae, Heloísa Menezes.

A nova parceria foi assinada em abril deste ano, no III Seminário Naci-onal do Cooperativismo de Crédito Familiar e Solidário, em Brasília (DF), e já está em plena execução. O acordo já abriu as portas para o Sebrae atuar na Bahia e no Sergipe, com mobilização iniciada junto à Ascoob. Na outra ponta do país, no Rio Grande do Sul (RS), a Central Crenor trabalha na minuta de projeto para o acompanhamen-to ao crédito para 300 agricultores, de seis cooperativas singu-lares. “Também estamos concluindo uma parceria para que cooperativas da Bahia troquem informações com as gaúchas e passem a experiência que têm com a seca, que na Bahia é bem mais extensa e pode apontar soluções para os produto-res do Rio Grande do Sul”, explica Croda.

O acompanhamento oferecido por cooperativas ligadas às seis cooperativas gaúchas se dará nos moldes do projeto de intercooperação entre as instituições do setor. A iniciativa consiste no apadrinhamento de cooperativas de menor porte, por aquelas de maior porte e com mais experiência e serviços adequados para o perfil dos pequenos negócios. Entre as regras do projeto está a obrigatoriedade de que a entidade apa-drinhadora esteja localizada em unidade federativa diferente das apadrinhadas. Para adotar uma cooperativa, a entidade apadrinhadora precisa estar em operação há, pelo menos, cin-co anos e ter, no mínimo, 500 sócios pessoa jurídica. Já entre os requisitos para ser apadrinhada está a comprovação de fun-cionamento há, pelo menos, dois anos e a presença de, ao menos, 50 empresários associados.

Além do Sicredi e da Confesol, outras entidades do setor cooperativista, como a Unicredi e o Sicoob Central Cecresp, estão sendo acionadas para juntar forças com o Sebrae, expan-dir o crédito e promover a inclusão financeira e produtiva de seus associados. “O Sebrae assumiu o papel de estimular o coo-perativismo financeiro para os pequenos negócios e esse papel deve se manter”, reforça Heloísa.

Tal empenho é reconhecido por outras entidades do setor, como o Sicoob, com quem o Sebrae também mantém parceria desde agosto de 2011. A partir de então, são mais de 150 coo-perativas do Sicoob atuantes em projetos do Sebrae em todo o Brasil, respeitando características específicas da região de atua-ção. “A iniciativa do Sebrae em promover a competitividade e o desenvolvimento dos pequenos negócios é de fundamental

importância para fomentar o empreendedoris-mo e estimular a economia”, avalia o superin-tendente de Gestão Estratégica do Bancoob, Cláudio Halley. O Bancoob é um banco comer-cial privado especializado no atendimento a coo-perativas de crédito, cujo controle acionário per-tence a entidades filiadas ao Sicoob.

Para Halley, a sinergia entre pequenos negócios e cooperativas de crédito se baseia em duas características compartilhadas por ambos: a busca pelo desenvolvimento local e a realização de atividades de proximidade e comprometimento com a comunidade. “Sabemos que, em regiões no interior do país, micro e pequenos negócios são pouco assistidos pelo Sistema Financeiro Nacional, talvez pela baixa tecnicidade na gestão dessas empresas. No entanto, os atores do pequeno negócio mostram convergência com o cooperativismo”, afirma. Os bons resultados também são perceptíveis nos números da

instituição: no período de 2011 a 2014, a base de associados pessoa jurídica apresentou um crescimento de 72%, alcançan-do 345 mil associados em dezembro de 2014.

O superintendente ressaltou que a demonstração do comprometimento do Sicoob com o micro e pequeno negócio também pode ser observada na agenda de inovações que tem sido conduzida no âmbito do Sistema. Dentre outras ações voltadas ao pequeno negócio, em 2013 o Sicoob foi o primeiro sistema de cooperativas financeiras a disponibilizar o Cartão BNDES aos cooperados e em 2014 deu mais um importante passo no atendimento às MPEs, lançando uma “maquininha” de pagamentos exclusiva para os lojistas que fazem parte de qualquer cooperativa de crédito no Brasil. A Soluções Integradas de Pagamentos (Sipag), habilita os cooperados a aceitarem pagamentos com cartão de débito e crédito das principais bandeiras de mercado e sem dúvida será mais um grande apoio do Sicoob no desenvolvimento desses negócios.

A continuidade nos esforços para aproximar pequenos negócios e cooperativas de crédito encontra respaldo também no momento atual de baixa atividade econômica. Embora necessárias, as medidas do governo com vistas à convergência da inflação para o centro da meta recaem em elevação da taxa de juros. Segundo Halley, isso provoca um comportamento de conservadorismo por parte dos bancos em relação à oferta de crédito. “Já as cooperativas do Sicoob adotam uma postura que contrapõe esse comportamento. Estamos sempre ao lado de nossos associados apoiando suas atividades. Assim, avançamos também em momentos de dificuldades”, aponta.

Com o atual contexto econômico, ações de parceria como esta com o Sebrae impulsionam as contribuições das cooperativas de crédito para que micro e pequenos negócios possam ampliar sua competitividade por meio da manuten-ção de acesso ao crédito e da prestação de serviços financei-ros de qualidade com preços justos aos associados empreen-dedores.

E EMPREENDER

2,9 miASSOCIADOS

98COOPERATIVAS

1.237UNIDADES DE ATENDIMENTO

COBERTURA SICREDI NO BRASIL

RS

SC

PR

SP RJ

PA

GO

TO

MS

RO

MT

Fonte: Relatório anual 2014 - Sicredi

cos regulatórios específicos. Somos cooperativas de crédito de ramo e não queremos perder essa origem”, frisa o presi-dente da Confesol, Ailton Croda. Atualmente, a Confesol con-grega em cinco centrais (Cresol, Cresol Baser, Crehnor, Asco-ob e Central Cresol Sicoper) o total de 158 cooperativas de cré-dito, instaladas em 20 estados brasileiros, chegando direta-mente aos associados por meio de 504 pontos de atendimen-to. Ao todo, são 394,7 mil associados da agroindústria famili-ar. “Hoje já oferecemos financiamentos, acesso ao crédito rural, assistência técnica, apoio em gestão e regularização e na consolidação de marca dos cooperativados”, elenca Croda.

No âmbito da parceria com o Sebrae, a confederação espe-ra agregar outros serviços tanto para o público atendido quan-to para a própria gestão das cooperativas filiadas. Uma das ações é prover mais capacitação para dirigentes e colaborado-res em áreas como atendimento, papel do cooperativismo para o desenvolvimento regional, legislação e normatização do setor. “O nosso objetivo é continuar fortalecendo o agricultor para que ele continue a produzir e permaneça no campo com qualidade de vida”, destaca Croda. Com a atuação conjunta com o Sebrae, há a perspectiva também de expansão do coo-perativismo de crédito familiar e solidário e de avanços cada vez mais significativos no que se refere a serviços tecnológicos, como sistema de compensação financeira própria – em discus-são com o Banco Central – e atendimento online.

Foi justamente na área de tecnologia que se deu a maior aproximação entre o Sebrae e as cooperativas de crédito no setor da agricultura familiar e economia solidária. Em 2008, o apoio da entidade e do Ministério de Desenvolvimento Agrá-rio (MDA) à Confesol resultou na criação e implementação do Sistema Colmeia. O programa de gestão de cooperativas

CONVÊNIO

Cláudio Halley, superintendente de Gestão Estratégica do Bancoob.

Div

ulg

açã

o

Page 18: Rumos 281

Por Thais Sena

evista Rumos – A questão da regulamenta-ção e do seguimento às normas gera alto custo para as pequenas e médias empresas (PMEs) e, às vezes, as impelem involuntari-amente à informalização. De que forma

essas dificuldades impactam na produtividade das micro e pequenas empresas?José Cláudio Linhares Pires – De fato, a burocracia e o custo de fazer negócios são desafios importantes a serem superados, pois podem levar à informalidade das PMEs. Alguns estados já começaram a simplificar os procedimen-tos para registro de empresas, o que inclui a criação de servi-ços unificados em que múltiplos recursos e serviços são ofe-recidos; mas, na maioria dos casos, o processo continua sen-do demorado e caro. Por exemplo, no Brasil, levam-se 108 dias para abrir uma empresa, enquanto a média latino-americana é de apenas 36 dias. As PMEs também lidam com regimes tributários complexos. As recentes medidas de sim-plificação tributária são boas novas. Eu me refiro à Lei Geral para Micro e Pequenos Negócios, que foi modificada para flexibilizar impostos e introduzir novos setores bene-ficiados, principalmente no setor de serviços, e ao Cadastro Único Simplificado, que irá introduzir um novo modelo tri-butário visando reduzir trâmites burocráticos e acelerar o processo de abertura e fechamento de empresas. Estas

José Cláudio Linhares Pires

R

O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) desenvolveu um grande estudo sobre o impacto dos programas de apoio às micro e pequenas empresas do setor industrial. Nesta entrevista à Rumos, o economista José Cláudio Linhares Pires, um dos autores do estudo, comenta os resultados da pesquisa, que aponta as principais dificuldades enfrentadas pelo segmento e apresenta os canais de apoio aos pequenos empreendedores brasileiros

medidas são importantes para se reverter um quadro em que as empresas brasileiras de menor porte gastam 2.600 horas por ano pagando impostos – quase 10 vezes a média mundial –, segundo um estudo da Corporação Financeira Internacional, do Banco Mundial.

Rumos – O estudo mostra que, no Brasil, há uma “co-laboração” entre as instituições no apoio às PMEs, mas que isso não é suficiente para alavancá-las. O que falta acontecer no plano institucional?Pires – O país necessita criar canais institucionais que não só conectem os atores que executam políticas públicas de apoio as PMEs, mas que também promovam a avaliação, ela-boração e execução dessas políticas. Neste particular, acre-dito que falte ainda um aprofundamento de avaliações do que funciona e do que funciona melhor por meio de ações coordenadas. Em nosso estudo, mostramos que a colabora-ção existe, mas também sabemos que não é feita orientada por resultados. Por exemplo, verificamos que determinados programas são implementados em parceria para promover o apoio às exportações e inovações. Um melhor entendimen-to de como essas e outras parcerias funcionam poderia gerar, como benefício, o desenho de ações integradas para a execução das mesmas. Poderiam ser gerados programas em que as PMEs passariam por diferentes estágios – consultoria

E ENTREVISTA

Radiografiade um setor

RUMOS – 18 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 19 – Maio/Junho 2015

Micro e pequenas empresas no Brasil ainda precisam de ações mais coordenadas, no plano institucional, para continuarem no mercado.

SXC

Ace

rvo

Pe

sso

al

José Cláudio Linhares Pires é economista do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Empresas brasileiras de menor porte

gastam 2.600 horas por ano

pagando impostos – quase 10 vezes a média mundial –

segundo um estudo da Corporação Financeira

Internacional, do Banco Mundial.

SXC

Page 19: Rumos 281

Por Thais Sena

evista Rumos – A questão da regulamenta-ção e do seguimento às normas gera alto custo para as pequenas e médias empresas (PMEs) e, às vezes, as impelem involuntari-amente à informalização. De que forma

essas dificuldades impactam na produtividade das micro e pequenas empresas?José Cláudio Linhares Pires – De fato, a burocracia e o custo de fazer negócios são desafios importantes a serem superados, pois podem levar à informalidade das PMEs. Alguns estados já começaram a simplificar os procedimen-tos para registro de empresas, o que inclui a criação de servi-ços unificados em que múltiplos recursos e serviços são ofe-recidos; mas, na maioria dos casos, o processo continua sen-do demorado e caro. Por exemplo, no Brasil, levam-se 108 dias para abrir uma empresa, enquanto a média latino-americana é de apenas 36 dias. As PMEs também lidam com regimes tributários complexos. As recentes medidas de sim-plificação tributária são boas novas. Eu me refiro à Lei Geral para Micro e Pequenos Negócios, que foi modificada para flexibilizar impostos e introduzir novos setores bene-ficiados, principalmente no setor de serviços, e ao Cadastro Único Simplificado, que irá introduzir um novo modelo tri-butário visando reduzir trâmites burocráticos e acelerar o processo de abertura e fechamento de empresas. Estas

José Cláudio Linhares Pires

R

O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) desenvolveu um grande estudo sobre o impacto dos programas de apoio às micro e pequenas empresas do setor industrial. Nesta entrevista à Rumos, o economista José Cláudio Linhares Pires, um dos autores do estudo, comenta os resultados da pesquisa, que aponta as principais dificuldades enfrentadas pelo segmento e apresenta os canais de apoio aos pequenos empreendedores brasileiros

medidas são importantes para se reverter um quadro em que as empresas brasileiras de menor porte gastam 2.600 horas por ano pagando impostos – quase 10 vezes a média mundial –, segundo um estudo da Corporação Financeira Internacional, do Banco Mundial.

Rumos – O estudo mostra que, no Brasil, há uma “co-laboração” entre as instituições no apoio às PMEs, mas que isso não é suficiente para alavancá-las. O que falta acontecer no plano institucional?Pires – O país necessita criar canais institucionais que não só conectem os atores que executam políticas públicas de apoio as PMEs, mas que também promovam a avaliação, ela-boração e execução dessas políticas. Neste particular, acre-dito que falte ainda um aprofundamento de avaliações do que funciona e do que funciona melhor por meio de ações coordenadas. Em nosso estudo, mostramos que a colabora-ção existe, mas também sabemos que não é feita orientada por resultados. Por exemplo, verificamos que determinados programas são implementados em parceria para promover o apoio às exportações e inovações. Um melhor entendimen-to de como essas e outras parcerias funcionam poderia gerar, como benefício, o desenho de ações integradas para a execução das mesmas. Poderiam ser gerados programas em que as PMEs passariam por diferentes estágios – consultoria

E ENTREVISTA

Radiografiade um setor

RUMOS – 18 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 19 – Maio/Junho 2015

Micro e pequenas empresas no Brasil ainda precisam de ações mais coordenadas, no plano institucional, para continuarem no mercado.

SXC

Ace

rvo

Pe

sso

al

José Cláudio Linhares Pires é economista do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Empresas brasileiras de menor porte

gastam 2.600 horas por ano

pagando impostos – quase 10 vezes a média mundial –

segundo um estudo da Corporação Financeira

Internacional, do Banco Mundial.

SXC

Page 20: Rumos 281

E ENTREVISTA

básica, educação financeira e garantias para a tomada de cré-dito, capacitação para exportação e assim sucessivamente. Isto requer muita articulação institucional e delegação de res-ponsabilidades para a elaboração, execução, monitoramen-to e avaliação dos programas.

Rumos – O apoio de crédito é descrito como o que mais gera impacto. Esse resultado indica que um maior suporte financeiro a esse segmento poderia desenvolvê-lo e alçá-lo a outro patamar? Na sua visão, como as insti-tuições públicas de fomento têm atuado neste sentido?Pires – O principal produto de crédito avaliado – o cartão BNDES – teve um papel preponderante para explicar os impactos positivos do cartão sobre o emprego, salários, expor-tações e inovações. No nosso entender, este sucesso pode estar relacionado ao “desenho” desta linha de crédito. De acor-do com as condições do cartão, as PMEs devem usar os recur-sos não somente para financiar o capital de giro, mas também para investir em bens como equipamentos de transporte e computadores, que impulsionam, em última instância, o seu desempenho. Além disso, o crédito desponta como uma ferra-menta para aumentar as exportações, na medida em que as empresas podem alocar os recursos adicionais necessários para atividades de inovação e para explorar novos mercados. Por sua vez, as instituições públicas de fomento têm sido importantes agentes atuando no “segundo piso”, aumentando a capilaridade do cartão e de outros instrumentos de crédito produtivo, promovendo a inclusão financeira e impulsionan-do a melhoria de desempenho das PMEs.

Rumos – Ainda sobre a questão do financiamento. O cré-dito, quando obtido pelas PMEs, tem “significante impacto positivo sobre emprego e salários”. Logo, a par-tir dessa informação é possível pensar que a expansão do crédito para PMEs seria não só uma política econômica, de estímulo à economia, mas também social?Pires – Sem dúvida. Por um lado, o impacto positivo sobre emprego e salário não implica necessariamente em ganhos de eficiência econômica – esta irá depender do aumento agre-gado na produtividade, ou seja, de que as PMEs se tornem mais eficientes. Em outras palavras, o fato de um programa de crédito contribuir para uma PME crescer e empregar não necessariamente significa que este programa contribui para aumentar a eficiência da economia como um todo. Para que isto ocorra, o crédito precisa ser traduzido em aumento da participação de empresas mais eficientes na economia. Mas, por outro lado, é inegável que, por si, estes programas de cré-dito podem ter um componente social importante, principal-mente em situações de crise, pois traz o aumento de emprego e salá-rios. Neste sentido, a relevância de políticas sociais que têm como alvo as PMEs se justifica pelo fato de que estas, em particular, têm um importante aspecto anticíclico, pois empregam a grande maioria da mão de obra na economia.

Rumos – Os principais desafios das PMEs, listados pelo estudo, se dão no acesso ao financiamento, custo, barrei-ras comerciais e atraso na emissão de marcas e patentes. Como o setor tem superado esses desafios?Pires – Os avanços têm sido desiguais nessas áreas. A evolu-ção recente do crédito para PMEs foi expressiva na última década, muito embora a retração econômica tenda a trazer uma redução do financiamento deste segmento, historica-mente visto como de maior risco creditício pelos bancos. Dados do Banco Central referentes ao crédito em geral mos-tram um aumento da média nacional: de 36% em 2007 para 59% em 2014. Quanto aos custos de fazer negócios, as medi-das que discuti anteriormente de simplificação tributária e de redução de trâmites burocráticos são avanços positivos. No entanto, existem ainda grandes desafios nas outras áreas, que afetam toda a indústria, mas, em maior proporção, as PMEs. Dificuldades de logística e o relativo fechamento da econo-mia brasileira criam dificuldades ao investimento estrangeiro, a participação em cadeias produtivas globais e ao comércio, causando um impacto negativo sobre a economia nacional, particularmente nas taxas de emprego e crescimento econô-mico. O Brasil ocupa o 124º lugar entre 189 economias em todo o mundo em termos de comércio transfronteiriço. O atraso no processamento de registro de marcas e patentes aumenta a incerteza do negócio e afeta os esforços de inova-ção das empresas. Por exemplo, as empresas do Brasil levam quase o dobro do tempo das empresas dos EUA para conse-guir a certificação de marcas e patentes do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI).

Rumos – A avaliação abrange apenas as PMEs do setor industrial. O senhor acredita que no setor de serviços, que concentra a maioria das empresas, o quadro de desa-fios seria muito distinto?

RUMOS – 20 – Maio/Junho 2015

José Cláudio Linhares Pires

RUMOS – 21 – Maio/Junho 2015

SALÁRIOS E OUTRAS REMUNERAÇÕES

MICRO15,7%

PEQUENA16,7%

MÉDIA20,2%

GRANDE47,4%

Pires – Não creio que o quadro de problemas seria muito dis-tinto, mas é possível que os programas de apoio às PMEs deste segmento estejam produzindo impactos distintos. Para res-ponder a esta grande indagação que temos, estamos iniciando outro estudo, incluindo também os setores de serviços e do comércio e ampliando a análise para incorporar empresas de todos os tamanhos. Outra novidade é que estaremos medindo o impacto de programas de apoio empresarial na produtivida-de. Nossa previsão é que este estudo fique pronto no primeiro trimestre do ano que vem.

Rumos – Por que o apoio de aglomeração não gerou um impacto robusto sobre as empresas? O que pode ser revisto neste modelo?Pires – É preciso fazer duas ressalvas importantes em nossa avaliação. A primeira é que os resultados são médios para todo o território nacional, o que significa dizer que podem existir projetos específicos que deram resultados positivos, mas que não aparecem na média nacional. A segunda ressal-va é que não medimos os impactos indiretos dos programas, o que faz com que seja possível que existam efeitos de trans-bordamento que não foram incorporados em nossa análise. No entanto, a inexistência de impacto direto robusto dos pro-gramas de apoio às aglomerações – como os arranjos produ-tivos locais (APLs), encadeamento de cadeias produtivas, por exemplo – justificaria uma análise mais aprofundada des-tes tipos de apoio. Uma explicação possível para a ausência de um efeito médio do apoio à aglomeração pode estar rela-cionada ao fato de que o apoio a APLs, uma das atividades mais importantes segundo a classificação utilizada pelo estu-do dentro dessa categoria, tenha sido fornecido a grupos de empresários em economias que não podem ser caracteriza-das como sendo arranjos. Nesse caso, uma intervenção pro-jetada para desenvolver os APLs não seria efetiva simples-mente pelo fato de que não existiriam ganhos potenciais de aglomeração a serem explorados.

Rumos – Há dados disponíveis, mas não são completos, deixando questões de análise do custo-efetividade, por exemplo, sem avaliação. Qual seria a orientação ou que instituições poderiam trabalhar para gerar esses dados, permitindo assim um estudo mais detalhado?Pires – Não foi possível coletar informações sobre os mon-tantes de receitas, empréstimos ou o exato valor exportado por cada PME. Se estas informações estivessem disponíveis, o ban-co de dados teria permitido uma análise mais refinada sobre os resultados de interesse da avaliação. Além disso, como menci-onado, não existiam informações disponíveis sobre os custos de implementação dos programas, o que impediu uma análise de seu custo-efetividade. Pretendemos avançar nas discussões com os parceiros do nosso estudo para obter estes dados, assim como junto ao governo brasileiro, em particular com a Receita Federal, para a obtenção de dados que complementari-am esta análise. Como todos os programas avaliados são públi-cos e oferecidos sem ônus ou baseados em subsídios, o contri-buinte e a sociedade brasileira poderiam ter informações pre-cisas sobre os tipos de apoio que são mais custo-efetivos.

MICRO PEQUENA MÉDIA GRANDE

17,9

24,726,0

31,4

NÚMEROS DE EMPREGADOS

13,7%

0,6% 2,9%

NÚMEROS DE EMPRESAS

82,9%

NORDESTE

SUDESTE

SUL

CENTRO-OESTE

DISTRIBUIÇÃO DAS PMEsENTRE AS REGIÕES BRASILEIRAS

Fonte dos dados: Estimativas do OVE baseadas no banco de dados do Ministério do Trabalho

NORTE

Micro

Pequena

MédiaGrande

2%

8%

5%

17%

67%

Page 21: Rumos 281

E ENTREVISTA

básica, educação financeira e garantias para a tomada de cré-dito, capacitação para exportação e assim sucessivamente. Isto requer muita articulação institucional e delegação de res-ponsabilidades para a elaboração, execução, monitoramen-to e avaliação dos programas.

Rumos – O apoio de crédito é descrito como o que mais gera impacto. Esse resultado indica que um maior suporte financeiro a esse segmento poderia desenvolvê-lo e alçá-lo a outro patamar? Na sua visão, como as insti-tuições públicas de fomento têm atuado neste sentido?Pires – O principal produto de crédito avaliado – o cartão BNDES – teve um papel preponderante para explicar os impactos positivos do cartão sobre o emprego, salários, expor-tações e inovações. No nosso entender, este sucesso pode estar relacionado ao “desenho” desta linha de crédito. De acor-do com as condições do cartão, as PMEs devem usar os recur-sos não somente para financiar o capital de giro, mas também para investir em bens como equipamentos de transporte e computadores, que impulsionam, em última instância, o seu desempenho. Além disso, o crédito desponta como uma ferra-menta para aumentar as exportações, na medida em que as empresas podem alocar os recursos adicionais necessários para atividades de inovação e para explorar novos mercados. Por sua vez, as instituições públicas de fomento têm sido importantes agentes atuando no “segundo piso”, aumentando a capilaridade do cartão e de outros instrumentos de crédito produtivo, promovendo a inclusão financeira e impulsionan-do a melhoria de desempenho das PMEs.

Rumos – Ainda sobre a questão do financiamento. O cré-dito, quando obtido pelas PMEs, tem “significante impacto positivo sobre emprego e salários”. Logo, a par-tir dessa informação é possível pensar que a expansão do crédito para PMEs seria não só uma política econômica, de estímulo à economia, mas também social?Pires – Sem dúvida. Por um lado, o impacto positivo sobre emprego e salário não implica necessariamente em ganhos de eficiência econômica – esta irá depender do aumento agre-gado na produtividade, ou seja, de que as PMEs se tornem mais eficientes. Em outras palavras, o fato de um programa de crédito contribuir para uma PME crescer e empregar não necessariamente significa que este programa contribui para aumentar a eficiência da economia como um todo. Para que isto ocorra, o crédito precisa ser traduzido em aumento da participação de empresas mais eficientes na economia. Mas, por outro lado, é inegável que, por si, estes programas de cré-dito podem ter um componente social importante, principal-mente em situações de crise, pois traz o aumento de emprego e salá-rios. Neste sentido, a relevância de políticas sociais que têm como alvo as PMEs se justifica pelo fato de que estas, em particular, têm um importante aspecto anticíclico, pois empregam a grande maioria da mão de obra na economia.

Rumos – Os principais desafios das PMEs, listados pelo estudo, se dão no acesso ao financiamento, custo, barrei-ras comerciais e atraso na emissão de marcas e patentes. Como o setor tem superado esses desafios?Pires – Os avanços têm sido desiguais nessas áreas. A evolu-ção recente do crédito para PMEs foi expressiva na última década, muito embora a retração econômica tenda a trazer uma redução do financiamento deste segmento, historica-mente visto como de maior risco creditício pelos bancos. Dados do Banco Central referentes ao crédito em geral mos-tram um aumento da média nacional: de 36% em 2007 para 59% em 2014. Quanto aos custos de fazer negócios, as medi-das que discuti anteriormente de simplificação tributária e de redução de trâmites burocráticos são avanços positivos. No entanto, existem ainda grandes desafios nas outras áreas, que afetam toda a indústria, mas, em maior proporção, as PMEs. Dificuldades de logística e o relativo fechamento da econo-mia brasileira criam dificuldades ao investimento estrangeiro, a participação em cadeias produtivas globais e ao comércio, causando um impacto negativo sobre a economia nacional, particularmente nas taxas de emprego e crescimento econô-mico. O Brasil ocupa o 124º lugar entre 189 economias em todo o mundo em termos de comércio transfronteiriço. O atraso no processamento de registro de marcas e patentes aumenta a incerteza do negócio e afeta os esforços de inova-ção das empresas. Por exemplo, as empresas do Brasil levam quase o dobro do tempo das empresas dos EUA para conse-guir a certificação de marcas e patentes do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI).

Rumos – A avaliação abrange apenas as PMEs do setor industrial. O senhor acredita que no setor de serviços, que concentra a maioria das empresas, o quadro de desa-fios seria muito distinto?

RUMOS – 20 – Maio/Junho 2015

José Cláudio Linhares Pires

RUMOS – 21 – Maio/Junho 2015

SALÁRIOS E OUTRAS REMUNERAÇÕES

MICRO15,7%

PEQUENA16,7%

MÉDIA20,2%

GRANDE47,4%

Pires – Não creio que o quadro de problemas seria muito dis-tinto, mas é possível que os programas de apoio às PMEs deste segmento estejam produzindo impactos distintos. Para res-ponder a esta grande indagação que temos, estamos iniciando outro estudo, incluindo também os setores de serviços e do comércio e ampliando a análise para incorporar empresas de todos os tamanhos. Outra novidade é que estaremos medindo o impacto de programas de apoio empresarial na produtivida-de. Nossa previsão é que este estudo fique pronto no primeiro trimestre do ano que vem.

Rumos – Por que o apoio de aglomeração não gerou um impacto robusto sobre as empresas? O que pode ser revisto neste modelo?Pires – É preciso fazer duas ressalvas importantes em nossa avaliação. A primeira é que os resultados são médios para todo o território nacional, o que significa dizer que podem existir projetos específicos que deram resultados positivos, mas que não aparecem na média nacional. A segunda ressal-va é que não medimos os impactos indiretos dos programas, o que faz com que seja possível que existam efeitos de trans-bordamento que não foram incorporados em nossa análise. No entanto, a inexistência de impacto direto robusto dos pro-gramas de apoio às aglomerações – como os arranjos produ-tivos locais (APLs), encadeamento de cadeias produtivas, por exemplo – justificaria uma análise mais aprofundada des-tes tipos de apoio. Uma explicação possível para a ausência de um efeito médio do apoio à aglomeração pode estar rela-cionada ao fato de que o apoio a APLs, uma das atividades mais importantes segundo a classificação utilizada pelo estu-do dentro dessa categoria, tenha sido fornecido a grupos de empresários em economias que não podem ser caracteriza-das como sendo arranjos. Nesse caso, uma intervenção pro-jetada para desenvolver os APLs não seria efetiva simples-mente pelo fato de que não existiriam ganhos potenciais de aglomeração a serem explorados.

Rumos – Há dados disponíveis, mas não são completos, deixando questões de análise do custo-efetividade, por exemplo, sem avaliação. Qual seria a orientação ou que instituições poderiam trabalhar para gerar esses dados, permitindo assim um estudo mais detalhado?Pires – Não foi possível coletar informações sobre os mon-tantes de receitas, empréstimos ou o exato valor exportado por cada PME. Se estas informações estivessem disponíveis, o ban-co de dados teria permitido uma análise mais refinada sobre os resultados de interesse da avaliação. Além disso, como menci-onado, não existiam informações disponíveis sobre os custos de implementação dos programas, o que impediu uma análise de seu custo-efetividade. Pretendemos avançar nas discussões com os parceiros do nosso estudo para obter estes dados, assim como junto ao governo brasileiro, em particular com a Receita Federal, para a obtenção de dados que complementari-am esta análise. Como todos os programas avaliados são públi-cos e oferecidos sem ônus ou baseados em subsídios, o contri-buinte e a sociedade brasileira poderiam ter informações pre-cisas sobre os tipos de apoio que são mais custo-efetivos.

MICRO PEQUENA MÉDIA GRANDE

17,9

24,726,0

31,4

NÚMEROS DE EMPREGADOS

13,7%

0,6% 2,9%

NÚMEROS DE EMPRESAS

82,9%

NORDESTE

SUDESTE

SUL

CENTRO-OESTE

DISTRIBUIÇÃO DAS PMEsENTRE AS REGIÕES BRASILEIRAS

Fonte dos dados: Estimativas do OVE baseadas no banco de dados do Ministério do Trabalho

NORTE

Micro

Pequena

MédiaGrande

2%

8%

5%

17%

67%

Page 22: Rumos 281

Brasil está claramente no caminho certo”. Com essas palavras, devidamente grifadas nas cópias do discurso entregues previamente aos jornalistas, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacio-nal (FMI), Christine Lagarde, deu aval e demons-

trou entusiasmo com o ajuste fiscal promovido pelo governo federal brasileiro. A fala foi registrada durante o XVII Seminá-rio de Metas da Inflação do Banco Central (BC), onde Lagarde defendeu o reforço dos fundamentos macroeconômicos da economia local e cobrou por reformas estruturais no país, no mesmo dia em que o governo anunciou o corte recorde de R$ 69,9 bilhões no Orçamento de 2015.

Lagarde foi recebida pelo público formado, basicamente, por economistas e por jornalistas brasileiros e corresponden-tes de veículos estrangeiros. Durante cerca de 40 minutos, demonstrou, por mais de uma vez, que o FMI está de acordo com a direção que o país tem tomado no momento em que enfrenta dificuldades econômicas. Classificou de “animador” o caminho, disse que o país o faz “acertadamente”, enxergou sinais de que a política está “surtindo efeito” e declarou que o Brasil deve seguir a receita que já conhece.

“O reforço das políticas macroeconômicas é a melhor abordagem para preservar a estabilidade e aumentar a resiliên-cia a choques externos. É animador ver que o governo brasilei-ro está seguindo essa estratégia. Ele anunciou metas de superá-vit fiscal primário, bem como diversas medidas para atingir essas metas. Esse aumento gradual porém significativo dos superávits primários é necessário para recuperar a credibilida-de das políticas internas”, destacou Lagarde.

As críticas que surgem em diferentes setores, especialmen-te aqueles que apoiaram a reeleição de Dilma Rousseff, pela condução da economia neste início do segundo governo, bas-

RUMOS – 22 – Maio/Junho 2015

tante distinto do adotado no período anterior, não passaram despercebidas por Christine. Também por isso, ela considerou a decisão de promover cortes amplos no orçamento como um ato de coragem política. “É um sinal de que o governo está real-mente determinado a cumprir as metas estabelecidas. Essa é a maneira correta para lidar com a questão: primeiro, estabelecer metas; depois, entregá-las”, orientou a diretora-gerente, mais tarde, em uma conversa com os jornalistas.

Ao fórum lotado do hotel na orla de Copacabana, foi ainda mais enfática. Em crítica indireta às decisões políticas do pri-

RUMOS – 23 – Maio/Junho 2015

dos parceiros comerciais do Brasil, como a China, também estão desacelerando – vai requerer, na opinião de Christine Lagarde, um reforço dos arcabouços de políticas e dos funda-mentos macroeconômicos. “Uma das principais lições da reti-rada do estímulo à economia norte-americana em 2013 é que a resiliência à volatilidade externa se constrói em casa, com polí-ticas sólidas e fundamentos vigorosos”, argumentou.

Para não deixar dúvida sobre quais políticas e fundamen-tos tratava, frisou: “Responsabilidade fiscal, taxa cambial flexí-vel, controle da inflação, esse é o conjunto singular para restau-rar o crescimento e colocar o Brasil de volta ao rumo correto”.

“Claro que o ambiente é distinto, mas o Brasil tem os ingredientes e já identificou a receita. Agora tem que segui-la firmemente, inclusive para manter os programas sociais, que são, com toda razão, o orgulho do país”, reforçou, mais tarde, aos jornalistas. Antes, no plenário, já havia elogiado programas como o Bolsa Família e o Brasil sem Miséria, e contou ter se surpreendido, em visita ao conjunto de favelas do Alemão, na Zona Norte do Rio, com o esforço dos programas governa-mentais para dar autonomia às mulheres, inclusive para que se tornem empreendedoras.

Reformas – Ao lado do reforço às políticas macroeconômi-cas, Lagarde advogou pela urgência da promoção de reformas estruturais para que o país avance e consiga restaurar um cres-cimento sólido nos próximos anos. “É o mix de políticas e reformas que vai proporcionar que o país se fortaleça e tenha um desenvolvimento sustentável”, disse.

Em especial, a diretora do FMI destacou três áreas em que o órgão enxerga necessidade de reformas para elevar a produ-tividade e assegurar um crescimento robusto para o país: a eli-minação das lacunas da infraestrutura; a redução do custo de

meiro governo Dilma, ainda que ressalvando que foi um acer-to responder à crise financeira global implementando políticas anticíclicas, afirmou que uma nova dose de estímulo à econo-mia poderia ameaçar a credibilidade “arduamente conquistada dos esforços da política do passado”.

“De modo geral, o recente fortalecimento das políticas fis-cal e monetária, aliado a uma sólida posição de reservas inter-nacionais e ao regime de câmbio flexível, é crucial para aumen-tar a credibilidade e a resiliência do arcabouço de política eco-nômica do país”, elencou.

Pilares – A defesa dos pilares macroeconômicos – que cha-mou de “Três Fs” – também foi um ponto forte e reiterado das falas da diretora-gerente no Brasil. Em diálogo com o tema do evento promovido pelo BC, ela destacou que o regime de metas da inflação tem sido um dos principais responsáveis pela solidez da economia brasileira nos últimos 15 anos.

“Aliado à responsabilidade fiscal e ao câmbio flexível, ele trouxe benefícios importantes para o país, ao sustentar altas taxas de crescimento e estabilizar a inflação. E isso aconteceu enquanto o país reduzia a dívida pública, acumulava reservas internacionais e, mais importante, tirava milhões de pessoas da pobreza. Trata-se de um feito extraordinário”, comentou.

Para ela, o cenário econômico global ainda inspira cuida-dos. Mesmo com a recuperação de algumas economias impor-tantes, notadamente os Estados Unidos, o crescimento mun-dial segue modesto e desigual. A América Latina, segundo aná-lise do FMI, terá o quinto ano consecutivo de crescimento mais lento do que o ano anterior e deve avançar menos de 1% em 2015. Para o Brasil, a expectativa é ainda menor: o Fundo prevê uma contração de 1% este ano.

Enfrentar os desafios globais – num cenário em que alguns

ECONOMIAR REPORTAGEM

O

Durante seminário de metas para a inflação, promovido pelo Banco Central, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, demonstrou otimismo com a política de ajuste fiscal brasileira, cobrou a realização de reformas estruturais e reafirmou que o país só voltará a crescer se reforçar os fundamentos de sua política macroeconômica

Por Jader Moraes

Lagarde defendeu o reforço do tripé responsabilidade fiscal, taxa cambial flexível e controle da inflação para o país voltar a crescer: “O Brasil já conhece essa receita, deve segui-la firmemente.”

Re

be

ca D

ou

rad

o

Elogio à austeridade

Questionada por jornalistas sobre a influência de casos de corrupção, como o que envolve a Petrobras e algumas das prin-cipais construtoras do Brasil, na imagem e recuperação da con-fiança dos investidores no país, Christine preferiu não pisar for-te nesse terreno. Ampliando o leque, disse que os casos de cor-rupção e a falta de transparência em diversos países latino-americanos tornam o cenário cinzento e servem como freios para o crescimento. Mas ela acredita, mais uma vez, que as auto-ridades brasileiras estão dando a resposta correta ao problema.

“Quando existem questões específicas que podem inter-ferir no crescimento, como é o caso da corrupção, elas preci-sam ser tratadas rapidamente. Qualquer esforço feito para eli-minar esses problemas é muito bem-vindo e deve ser encora-jado. Nós vemos determinação nas autoridades brasileiras para lidar com essa questão e isso pode ajudar a recuperar a confiança do país, sim”, opinou.

Escândalos de corrupção

Page 23: Rumos 281

Brasil está claramente no caminho certo”. Com essas palavras, devidamente grifadas nas cópias do discurso entregues previamente aos jornalistas, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacio-nal (FMI), Christine Lagarde, deu aval e demons-

trou entusiasmo com o ajuste fiscal promovido pelo governo federal brasileiro. A fala foi registrada durante o XVII Seminá-rio de Metas da Inflação do Banco Central (BC), onde Lagarde defendeu o reforço dos fundamentos macroeconômicos da economia local e cobrou por reformas estruturais no país, no mesmo dia em que o governo anunciou o corte recorde de R$ 69,9 bilhões no Orçamento de 2015.

Lagarde foi recebida pelo público formado, basicamente, por economistas e por jornalistas brasileiros e corresponden-tes de veículos estrangeiros. Durante cerca de 40 minutos, demonstrou, por mais de uma vez, que o FMI está de acordo com a direção que o país tem tomado no momento em que enfrenta dificuldades econômicas. Classificou de “animador” o caminho, disse que o país o faz “acertadamente”, enxergou sinais de que a política está “surtindo efeito” e declarou que o Brasil deve seguir a receita que já conhece.

“O reforço das políticas macroeconômicas é a melhor abordagem para preservar a estabilidade e aumentar a resiliên-cia a choques externos. É animador ver que o governo brasilei-ro está seguindo essa estratégia. Ele anunciou metas de superá-vit fiscal primário, bem como diversas medidas para atingir essas metas. Esse aumento gradual porém significativo dos superávits primários é necessário para recuperar a credibilida-de das políticas internas”, destacou Lagarde.

As críticas que surgem em diferentes setores, especialmen-te aqueles que apoiaram a reeleição de Dilma Rousseff, pela condução da economia neste início do segundo governo, bas-

RUMOS – 22 – Maio/Junho 2015

tante distinto do adotado no período anterior, não passaram despercebidas por Christine. Também por isso, ela considerou a decisão de promover cortes amplos no orçamento como um ato de coragem política. “É um sinal de que o governo está real-mente determinado a cumprir as metas estabelecidas. Essa é a maneira correta para lidar com a questão: primeiro, estabelecer metas; depois, entregá-las”, orientou a diretora-gerente, mais tarde, em uma conversa com os jornalistas.

Ao fórum lotado do hotel na orla de Copacabana, foi ainda mais enfática. Em crítica indireta às decisões políticas do pri-

RUMOS – 23 – Maio/Junho 2015

dos parceiros comerciais do Brasil, como a China, também estão desacelerando – vai requerer, na opinião de Christine Lagarde, um reforço dos arcabouços de políticas e dos funda-mentos macroeconômicos. “Uma das principais lições da reti-rada do estímulo à economia norte-americana em 2013 é que a resiliência à volatilidade externa se constrói em casa, com polí-ticas sólidas e fundamentos vigorosos”, argumentou.

Para não deixar dúvida sobre quais políticas e fundamen-tos tratava, frisou: “Responsabilidade fiscal, taxa cambial flexí-vel, controle da inflação, esse é o conjunto singular para restau-rar o crescimento e colocar o Brasil de volta ao rumo correto”.

“Claro que o ambiente é distinto, mas o Brasil tem os ingredientes e já identificou a receita. Agora tem que segui-la firmemente, inclusive para manter os programas sociais, que são, com toda razão, o orgulho do país”, reforçou, mais tarde, aos jornalistas. Antes, no plenário, já havia elogiado programas como o Bolsa Família e o Brasil sem Miséria, e contou ter se surpreendido, em visita ao conjunto de favelas do Alemão, na Zona Norte do Rio, com o esforço dos programas governa-mentais para dar autonomia às mulheres, inclusive para que se tornem empreendedoras.

Reformas – Ao lado do reforço às políticas macroeconômi-cas, Lagarde advogou pela urgência da promoção de reformas estruturais para que o país avance e consiga restaurar um cres-cimento sólido nos próximos anos. “É o mix de políticas e reformas que vai proporcionar que o país se fortaleça e tenha um desenvolvimento sustentável”, disse.

Em especial, a diretora do FMI destacou três áreas em que o órgão enxerga necessidade de reformas para elevar a produ-tividade e assegurar um crescimento robusto para o país: a eli-minação das lacunas da infraestrutura; a redução do custo de

meiro governo Dilma, ainda que ressalvando que foi um acer-to responder à crise financeira global implementando políticas anticíclicas, afirmou que uma nova dose de estímulo à econo-mia poderia ameaçar a credibilidade “arduamente conquistada dos esforços da política do passado”.

“De modo geral, o recente fortalecimento das políticas fis-cal e monetária, aliado a uma sólida posição de reservas inter-nacionais e ao regime de câmbio flexível, é crucial para aumen-tar a credibilidade e a resiliência do arcabouço de política eco-nômica do país”, elencou.

Pilares – A defesa dos pilares macroeconômicos – que cha-mou de “Três Fs” – também foi um ponto forte e reiterado das falas da diretora-gerente no Brasil. Em diálogo com o tema do evento promovido pelo BC, ela destacou que o regime de metas da inflação tem sido um dos principais responsáveis pela solidez da economia brasileira nos últimos 15 anos.

“Aliado à responsabilidade fiscal e ao câmbio flexível, ele trouxe benefícios importantes para o país, ao sustentar altas taxas de crescimento e estabilizar a inflação. E isso aconteceu enquanto o país reduzia a dívida pública, acumulava reservas internacionais e, mais importante, tirava milhões de pessoas da pobreza. Trata-se de um feito extraordinário”, comentou.

Para ela, o cenário econômico global ainda inspira cuida-dos. Mesmo com a recuperação de algumas economias impor-tantes, notadamente os Estados Unidos, o crescimento mun-dial segue modesto e desigual. A América Latina, segundo aná-lise do FMI, terá o quinto ano consecutivo de crescimento mais lento do que o ano anterior e deve avançar menos de 1% em 2015. Para o Brasil, a expectativa é ainda menor: o Fundo prevê uma contração de 1% este ano.

Enfrentar os desafios globais – num cenário em que alguns

ECONOMIAR REPORTAGEM

O

Durante seminário de metas para a inflação, promovido pelo Banco Central, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, demonstrou otimismo com a política de ajuste fiscal brasileira, cobrou a realização de reformas estruturais e reafirmou que o país só voltará a crescer se reforçar os fundamentos de sua política macroeconômica

Por Jader Moraes

Lagarde defendeu o reforço do tripé responsabilidade fiscal, taxa cambial flexível e controle da inflação para o país voltar a crescer: “O Brasil já conhece essa receita, deve segui-la firmemente.”

Re

be

ca D

ou

rad

o

Elogio à austeridade

Questionada por jornalistas sobre a influência de casos de corrupção, como o que envolve a Petrobras e algumas das prin-cipais construtoras do Brasil, na imagem e recuperação da con-fiança dos investidores no país, Christine preferiu não pisar for-te nesse terreno. Ampliando o leque, disse que os casos de cor-rupção e a falta de transparência em diversos países latino-americanos tornam o cenário cinzento e servem como freios para o crescimento. Mas ela acredita, mais uma vez, que as auto-ridades brasileiras estão dando a resposta correta ao problema.

“Quando existem questões específicas que podem inter-ferir no crescimento, como é o caso da corrupção, elas preci-sam ser tratadas rapidamente. Qualquer esforço feito para eli-minar esses problemas é muito bem-vindo e deve ser encora-jado. Nós vemos determinação nas autoridades brasileiras para lidar com essa questão e isso pode ajudar a recuperar a confiança do país, sim”, opinou.

Escândalos de corrupção

Page 24: Rumos 281

fazer um negócio; e a revitalização da integração comercial. A diretora-gerente elogiou o Programa de Concessões de

Infraestruturas do governo federal e criticou o sistema tributá-rio brasileiro, classificado por ela como um “conjunto comple-xo de impostos indiretos”, que gera altos custos para os contri-buintes. No que diz respeito à integração de negócios do Brasil com o mundo, defendeu que é preciso “rejuvenescer” essa relação, pois o país pode colher bene-fício se integrando às cadeias globais de valores. Entre os países emergentes, des-tacou Christine, o país é um dos que tem menor participação nessas cadeias.

“Vejo o Brasil como um forte candi-dato a liderar pelo exemplo. Sem dúvida, o ambiente externo tornou-se menos propício e as restrições internas não são triviais. Mas com perseverança e as polí-ticas corretas, esse futuro promissor esta-rá ao alcance”, finalizou.

Rota – O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, que participou de todo o encontro, apresentou durante o seminário as percepções da instituição sobre o momento econômico que vive o mundo e suas consequências para a eco-nomia brasileira, bem como sobre as medidas adotadas pelo governo federal desde a nomeação da nova equipe eco-nômica do Planalto.

Tombini afirmou, em consonância com o que já havia indi-cado em ata o Comitê de Política Monetária (Copom), que o país passa por uma transição em 2015, para que retorne às suas bases sólidas a partir do ano seguinte. Por isso, o BC tem ado-tado uma política monetária vigilante para que os efeitos do cenário econômico sobre os preços fiquem circunscritos ao curto prazo, e o país retorne já a partir de 2016 para o centro da meta de inflação.

A expectativa para este ano, frisou, é que haja expansão no

RUMOS – 24 – Maio/Junho 2015

E EMPREENDER

setor agropecuário, com possibilidades de safra recorde, cres-cimento modesto nos serviços e retração na indústria, ainda que de forma não homogênea – o segmento extrativo, por exemplo, deve registrar expansão, enquanto a indústria de transformação deve ter queda.

Sobre os esforços do governo federal na área fiscal, lem-brou que há um “profundo e consistente” pacote de medidas em curso, que inclui contenção de despesas correntes e para-fiscais, eliminação de subsídios, realinhamento de tarifas públi-cas, além de medidas de cunho mais estrutural. Ele acredita que esse conjunto de medidas deve levar a um quadro fiscal que permita criar uma percepção positiva sobre o ambiente macroeconômico do país no médio e no longo prazo.

“O fortalecimento da política fiscal por meio de um pro-cesso consistente e crível de consolidação de receitas e despe-sas, rigorosamente conduzido, facilita, ao longo do tempo, a convergência da inflação para o centro da meta. Isto porque tanto a literatura quanto as melhores práticas internacionais identificam que um desenho de política fiscal consistente e sus-tentável contribui para aumentar a potência da política mone-tária”, afirmou.

Especialistas – O Seminário de Metas para a Inflação reuniu durante dois dias representantes de bancos centrais de diferentes partes do mundo, eco-nomistas e especialistas brasileiros e estran-geiros, que debateram temas como as políti-cas monetárias e macroprudenciais, a reali-dade e perspectivas do mercado de trabalho brasileiro e, claro, a maneira com que se comportam as expectativas da inflação.

A palestra de abertura coube ao econo-mista Ricardo Reis, da Universidade Columbia, que destacou as grandes mudan-ças que ocorreram na política monetária em todo o mundo, nos últimos anos, e o novo estilo dos bancos centrais para estarem em consonância com essas mudanças. “O que temos visto são os BCs intervindo para poder lidar com a crise, inicialmente tentan-do eliminá-la, especialmente no que diz res-peito à perda de liquidez dos bancos. Os BCs não podem mais seguir totalmente independentes como antes, precisam res-ponder a esse cenário”, afirmou.

Para Tombini, os temas debatidos no seminário refletem as preocupações tam-bém debatidas em grandes fóruns interna-cionais, especialmente a partir da crise

financeira global iniciada em 2008-2009, em que os bancos cen-trais assumiram papel destacado para lidar com o revés.

“A globalidade e a profundidade dessa crise chamaram a atenção para a necessidade de se avançar celeremente em pes-quisa em diversas áreas voltadas para melhor compreender fatores indutores de crises, instrumentos e políticas para sua prevenção e para sua mitigação de seus efeitos macrofinancei-ros e, mais recentemente, formas de implementar políticas de saída da crise”, destacou.

ECONOMIA

Tombini reafirmou que o país deve retornar para o centro da meta de inflação a partir de 2016.

Re

be

ca D

ou

rad

o

Evento no Rio de Janeiro reuniu economistas e executivos de diferentes bancos centrais ao redor do mundo.

Re

be

ca D

ou

rad

o

Page 25: Rumos 281

Lei Anticorrupção Empresarial e sua regula-mentação precisam ser consideradas pelas Instituições Financeiras de Desenvolvimen-tos (IFDs), sobretudo no que se refere às medi-das preventivas. Essas instituições, enquanto

figurarem somente como tais, não serão solidariamente res-ponsáveis pela prática dos atos previstos na Lei Anticorrup-ção. No entanto, vale notar que segundo o art. 5º, II, da Lei Anticorrupção, também são responsáveis aqueles que com-provadamente financiarem a prática dos atos ilícitos previs-tos nesta Lei. Assim, as IFDs devem estar atentas à destina-ção dos recursos por elas financiados, para que no custo dos projetos não sejam incluídas despesas relacionadas ao paga-mento de corrupção.

A situação é de maior risco quando forem controladoras, no qual a sua responsabilidade passa a ser solidária. De qual-quer forma, mesmo no caso em que detenham participação minoritária, que é a regra, devem zelar pelos seus deveres de acionista, até mesmo para preservar o seu patrimô-nio/investimento, que no caso das Instituições Financeiras de Desenvolvimento tem um caráter público.

Recentemente, a Lei Anticorrupção Empresarial (Lei 12.846/13) foi regulamentada pelo Decreto 8.420, sancio-nado em 18 de março de 2015, para definir de forma mais concreta alguns pontos essenciais.

Dentre esses pontos destaca-se o estabelecimento de cri-térios mais objetivos para a aplicação das sanções previstas na lei, como a multa, publicação extraordinária da decisão administrativa sancionadora e mesmo a restrição ao direito de participar em licitações ou de celebrar contratos com a administração pública.

A confirmação da importância que as empresas estabe-leçam e apliquem um Programa de Integridade é o ponto mais relevante do Decreto. O artigo 41 define o Programa de Integridade (compliance) como “conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incen-tivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com obje-tivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e

atos ilícitos praticados contra a administração pública, naci-onal ou estrangeira”.

O Decreto estabelece os elementos do programa de for-ma bem ampla e abrangente. Prescreve que o programa seja estruturado, aplicado e atualizado por uma instância inde-pendente, de acordo com as características (países onde atua, grau de interação com o setor público), porte da empresa (quantidade de funcionários) e riscos atuais das ati-vidades de cada empresa. Determina ainda que o programa seja constantemente aprimorado e adaptado, a fim de garan-tir sua efetividade.

O Decreto deixa clara a importância de uma cultura éti-ca nas organizações, começando pelo comprometimento da alta direção, evidenciado pelo apoio visível e inequívoco ao programa. Define que os padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade sejam apli-cáveis a todos os empregados e administradores e também terceiros, além da existência de canal de denúncias, e reali-zação de treinamentos periódicos sobre o programa de integridade.

Como trabalhar a cultura ética nas organizações? Além de dar atenção às novas regras, é preciso aperfeiçoar a cons-ciência de todos os membros da organização, em torno de valores sólidos, que devem ser considerados inclusive no dia a dia. Nesse contexto, o papel dos líderes é fundamental: dis-cussões e decisões inspiradas em diretrizes e princípios esta-belecidos no código de conduta da empresa. Essa é uma ten-dência mundial, como mostram as pesquisas internacionais¹ .Mais do que “anticorrupção” o espírito da nova lei é ser “pró-ética. Assim, o Brasil atendeu ao compromisso inter-nacional firmado com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), dispondo agora de mecanismos fundamentais para fortalecer a reputação e desempenho global de suas instituições. A discussão conti-nua na próxima edição.

RUMOS – – Maio/Junho 2015 25

EM DIA

A

Div

ulg

açã

o

Os novos desafios do compliance no Brasil (parte 1 de 2)

¹ The 2014 Ethics & Compliance Programa Effectiveness Report –LRN Corporation.

Marcelo Coimbra – sócio do Fleury & Coimbra Advogados e Coordenador do Grupo de Ética & Governança da Câmara Brasil-Alemanha, representante da LRN Ethics & Compliance Solutions.

– consultor empresarial, diretor da AbissalConsulting e representante da LRN Ethics & Compliance Solutions

Antonio Carlos A. Telles

Page 26: Rumos 281
Page 27: Rumos 281
Page 28: Rumos 281

Por Carmen Nery

o início de maio, os cariocas tiveram a oportunida-de de vivenciar um dia com um ganhador do Prê-mio Nobel da Paz, o bengalês Muhammad Yunus, o único economista a conquistar esse prêmio. Tra-ta-se de um feito e tanto, afinal, geralmente os

ganhadores são ativistas, ex-presidentes ou grupo de pesquisa-dores voltados para a defesa de causas sociais ou ambientais. Nascido em Bangladesh, em 1940, terceiro de uma família de 14 filhos – dos quais cinco morreram nos primeiros anos –, Yunus formou-se em economia na Universidade de Daca, capi-tal do país natal, e doutorou-se na Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos da América (EUA). Em 1972, foi nomea-do professor na Universidade de Chittagong, cidade onde nas-ceu. Diante da pobreza que encontrou no período de grande fome que abateu o país – antigo Paquistão Oriental, que com o apoio da Índia se tornou independente em 1971 –, viu que deveria fazer algo mais do que simplesmente dar aulas.

Bangladesh é um pequeno país de apenas 150 mil km² de área, com uma população de 160 milhões de habitantes, o que dá uma densidade de mais de mil pessoas por km². É uma vida dura segundo Yunus: mais de 85% das pessoas estavam abaixo da linha da pobreza quando ele começou sua jornada. Durante a guerra pela independência da parte oriental do Paquistão, havia 75 milhões de habitantes e o país não conseguia produzir alimentos para todos e dependia de alimentos de fora. Mas as pessoas não tinham como pagar. A guerra de separação tam-bém trouxe grande destruição.

MUHAMMAD YUNUS

N

Ganhador do Prêmio Nobel da Paz e criador do conceito de microcrédito, o bengalês Muhammad Yunus esteve no Brasil, em maio, quando apresentou suas ideias para a redução da pobreza e o incentivo ao empreendedorismo e à criatividade. Rumos acompanhou o dia do economista em dois eventos no Rio de Janeiro

Na época, Yunus estava nos EUA ensinando em uma uni-versidade e decidiu voltar para casa diante da euforia pós-independência. Mas, ao invés de melhorar, o país entrou em declínio econômico. Em 1974, veio a fome geral e as pessoas começaram a morrer. Ele ficou especialmente tocado com o sis-tema de semiescravidão que algumas pessoas sofriam nas mãos de agiotas para sobreviver. Passou a oferecer crédito de peque-nas quantias para que as pessoas passassem a empreender.

Em 2006, recebeu o Prêmio Nobel da Paz por seu trabalho para criar desenvolvimento econômico e social a partir da base das pessoas carentes. É também autor do livro Banker to the poor (O banqueiro dos pobres). Yunus afirma que é impossível ter paz com pobreza e, em sua jornada de auxílio a populações desassistidas por meio de crédito e ações de empreendedoris-mo social, também tem metas ambiciosas.

“À minha frente, tenho uma direção: zero pobreza, zero emissão de carbono e zero desemprego. O mundo tem de esquecer que a pobreza existiu. Espero que um dia a gente crie um museu da pobreza. Zero desemprego porque nós vie-mos de uma tradição de resolução de problemas, não havia empregos na época das cavernas. Nós não trabalhávamos para os outros. No futuro, os jovens vão perguntar: o que era emprego? Tivemos aqui a Rio +20, e espero que, em 2050, atinjamos a meta de zero emissão de carbono”, resumiu Yunus em sua apresentação pela manhã para estudantes de professores de uma universidade, o primeiro evento de que participou no dia 2 de maio, no Rio de Janeiro.

R REPORTAGEM

RUMOS – 28 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 29 – Maio/Junho 2015

O mundo que queremos

“À minha frente, tenho uma direção: zero pobreza, zero emissão de carbono e zero desemprego. O mundo tem de esquecer que a pobreza existiu. Espero que um dia a gente crie um museu da pobreza.”

Page 29: Rumos 281

Por Carmen Nery

o início de maio, os cariocas tiveram a oportunida-de de vivenciar um dia com um ganhador do Prê-mio Nobel da Paz, o bengalês Muhammad Yunus, o único economista a conquistar esse prêmio. Tra-ta-se de um feito e tanto, afinal, geralmente os

ganhadores são ativistas, ex-presidentes ou grupo de pesquisa-dores voltados para a defesa de causas sociais ou ambientais. Nascido em Bangladesh, em 1940, terceiro de uma família de 14 filhos – dos quais cinco morreram nos primeiros anos –, Yunus formou-se em economia na Universidade de Daca, capi-tal do país natal, e doutorou-se na Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos da América (EUA). Em 1972, foi nomea-do professor na Universidade de Chittagong, cidade onde nas-ceu. Diante da pobreza que encontrou no período de grande fome que abateu o país – antigo Paquistão Oriental, que com o apoio da Índia se tornou independente em 1971 –, viu que deveria fazer algo mais do que simplesmente dar aulas.

Bangladesh é um pequeno país de apenas 150 mil km² de área, com uma população de 160 milhões de habitantes, o que dá uma densidade de mais de mil pessoas por km². É uma vida dura segundo Yunus: mais de 85% das pessoas estavam abaixo da linha da pobreza quando ele começou sua jornada. Durante a guerra pela independência da parte oriental do Paquistão, havia 75 milhões de habitantes e o país não conseguia produzir alimentos para todos e dependia de alimentos de fora. Mas as pessoas não tinham como pagar. A guerra de separação tam-bém trouxe grande destruição.

MUHAMMAD YUNUS

N

Ganhador do Prêmio Nobel da Paz e criador do conceito de microcrédito, o bengalês Muhammad Yunus esteve no Brasil, em maio, quando apresentou suas ideias para a redução da pobreza e o incentivo ao empreendedorismo e à criatividade. Rumos acompanhou o dia do economista em dois eventos no Rio de Janeiro

Na época, Yunus estava nos EUA ensinando em uma uni-versidade e decidiu voltar para casa diante da euforia pós-independência. Mas, ao invés de melhorar, o país entrou em declínio econômico. Em 1974, veio a fome geral e as pessoas começaram a morrer. Ele ficou especialmente tocado com o sis-tema de semiescravidão que algumas pessoas sofriam nas mãos de agiotas para sobreviver. Passou a oferecer crédito de peque-nas quantias para que as pessoas passassem a empreender.

Em 2006, recebeu o Prêmio Nobel da Paz por seu trabalho para criar desenvolvimento econômico e social a partir da base das pessoas carentes. É também autor do livro Banker to the poor (O banqueiro dos pobres). Yunus afirma que é impossível ter paz com pobreza e, em sua jornada de auxílio a populações desassistidas por meio de crédito e ações de empreendedoris-mo social, também tem metas ambiciosas.

“À minha frente, tenho uma direção: zero pobreza, zero emissão de carbono e zero desemprego. O mundo tem de esquecer que a pobreza existiu. Espero que um dia a gente crie um museu da pobreza. Zero desemprego porque nós vie-mos de uma tradição de resolução de problemas, não havia empregos na época das cavernas. Nós não trabalhávamos para os outros. No futuro, os jovens vão perguntar: o que era emprego? Tivemos aqui a Rio +20, e espero que, em 2050, atinjamos a meta de zero emissão de carbono”, resumiu Yunus em sua apresentação pela manhã para estudantes de professores de uma universidade, o primeiro evento de que participou no dia 2 de maio, no Rio de Janeiro.

R REPORTAGEM

RUMOS – 28 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 29 – Maio/Junho 2015

O mundo que queremos

“À minha frente, tenho uma direção: zero pobreza, zero emissão de carbono e zero desemprego. O mundo tem de esquecer que a pobreza existiu. Espero que um dia a gente crie um museu da pobreza.”

Page 30: Rumos 281

R REPORTAGEM

Yunus defendeu que o emprego não deveria ser um obje-tivo do cidadão. Para ele, as pessoas não precisam de empre-go, podendo alcançar sua própria subsistência sem ter de tra-balhar para alguém. “Não busquem empregos, criem vocês mesmos os empregos”, disse reiteradas vezes em dois eventos do mesmo dia. À tarde, fez, pela primeira vez, uma palestra aberta ao público do Rio de Janeiro, para uma plateia de cerca de mil pessoas, a maior parte formada por jovens envolvidos em movimentos e empreendimentos sociais. O encontro foi no Centro Cultural da Ação da Cidadania, local mais do que apropriado, por ter sido criado pelo sociólogo Herbert de Sou-za, o Betinho, em sua luta contra a fome e a miséria.

“Estou muito feliz por ver, principalmente, jovens aqui”, disse Yunus, ao subir ao pequeno tablado armado no meio do público, que o aplaudiu de pé como se fosse um popstar das causas sociais. Por quase três horas, Yunus discorreu sobre suas ideias para solucionar problemas sociais, por meio de mecanismos de negócio praticados por ele desde que come-çou a fazer empréstimos a pessoas desassistidas – especial-mente mulheres – de Bangladesh.

Crédito Os empréstimos deram origem ao conceito de – microcrédito termo cunhado por ele e que hoje está presente –em operações financeiras de todo o mundo – e à criação, em 1983, do Grameen Bank, que emprestava dinheiro aos pobres de Bangladesh a juros módicos. Em 20 anos, emprestou mais de US$ 13 bilhões a 8,5 milhões de pessoas que, em sua maio-ria, mal conseguiriam abrir uma conta em um banco comum.

Depois disso, se envolveu diretamente na criação de mais de 50 outros negócios sociais. Atualmente a Yunus Negócios Sociais, com sede em Frankfurt, está presente em seis outros países, além do Brasil: Haiti, Albânia, Tunísia, Togo, Colômbia, Índia, com previsão de abertura de uma unidade no México. Seu objetivo é auxiliar na criação de novos negócios sociais ou no desenvolvimento de iniciativas que já estejam no mercado e desejem receber suporte para acelerar seu crescimento.

Para Yunus, o empreendedorismo é a chave para trazer crescimento econômico, especialmente em tempos de crise. Ele tem especial admiração pelos jovens brasileiros que vão em grande número atuar como voluntários dos empreendi-mentos sociais de sua organização em Bangladesh.

“Estou feliz em ver este grande campus e falar sobre nos-sa experiência em Bangladesh”, disse na abertura da palestra da manhã, na Universidade Estácio de Sá, uma das institui-ções de ensino que integram a rede de universidades parceiras da Yunus Negócios Sociais Brasil. Ele abriu a apresentação dizendo que era um aluno que tentava enxergar o que poderia ser feito em seu país para inverter as condições de extrema pobreza.

“Passei a me questionar por que os bancos não empresta-vam dinheiro para as pessoas pobres. Quando comecei a tra-balhar em uma universidade, passei a perceber que o conheci-mento precisa ter um propósito, senão as palavras se tornam vazias. Havia algo de errado com a universidade; toda aquela teoria não fazia sentido no ambiente em que eu vivia. Eu via a extrema pobreza em torno do campus e estava tentando

RUMOS – 30 – Maio/Junho 2015

MUHAMMAD YUNUS

RUMOS – 31 – Maio/Junho 2015

o país, a Yunus Negócios Sociais Brasil (www.yunusne-gociossociais.com) é o braço local da Yunus Social Busi-

ness Global, fundada pelo Nobel da Paz. Tem como cofunda-dor Rogério Oliveira (foto). Formado em marketing e com MBA pela escola de gestão HBE de Montreal, no Canadá, Oli-veira ocupou diversos cargos em grandes empresas durante muitos anos, até que em 2011 percebeu que sucesso financeiro nunca seria o bastante. Inspirado por Muhammad Yunus, fun-dou o Movimento Buena Onda, consultoria especializada na felicidade no trabalho, um tema que vem ganhando espaço no mundo corporativo.

Rogério se aproximou da equipe de Muhammad Yunus e, após um encontro organizado por ele com 20 CEOs brasilei-ros, foi chamado para ser sócio e implantar a Yunus Negócios Sociais Brasil. A empresa tem como objetivo desenvolver negócios sociais pelo país por meio de dois pilares: o Fundo de Investimentos da Yunus Negócios Sociais Brasil e uma acele-radora. Em maio de 2014, iniciou no Brasil sua incubadora para estimular negócios de impacto social. Em um ano e meio, acelerou 22 negócios sociais e tem sete aprovados para receber investimentos.

“O valor médio de investimento é de R$ 800 mil a R$ 1,5 milhão. Estamos estruturando o fundo e pretendemos captar R$ 40 milhões de investidores filantrópicos e bancos e agên-

cias de desenvolvimento como o Banco Nacional de Desen-volvimento Econômico e Social (BNDES) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)”, diz Oliveira.

A Yunus Brasil também funciona como um negócio social, ou seja, não há distribuição de lucro aos sócios. Havendo lucro, este é totalmente reinvestido no negócio maximizando o impacto social. No Brasil, a ideia é atrair empreendedo-res em criar negócios que tenham como missão tirar pessoas da pobreza e melhorar sua qualida-de de vida.

A incubadora tem sede em São Paulo e atualmente abriga sete projetos: Sanea-mento Sustentável, Finan-duca, Solar Ear, Meu Dou-tor, Nossa Cidade, Hortas Urbanas e Agente Trans-forma. A próxima seleção está prevista para o segun-do semestre, por volta de

agosto, para aceleração entre setembro e novembro.Os empreendimentos são selecionados considerando-se

três critérios: o potencial de impacto social que a iniciativa pode gerar; a solidez da ideia e do plano de negócios, incluindo a sua sustentabilidade financeira; e o empreendedor ou grupo de empreendedores que estarão à frente do negócio.

Os projetos selecionados oficialmente após o período de aceleração, passam, em seguida, por uma fase de due dilligence, e um comitê de investimento decide se ele estará apto a rece-ber aporte do Fundo de Investimentos da Yunus Negócios Sociais Brasil. Esse investimento é realizado em forma de um empréstimo a juros abaixo dos praticados pelo mercado, que são cobrados para cobrir parte dos riscos inerentes ao seu pró-prio negócio e ao de outros do portfólio do fundo, que passa a ter uma participação acionária minoritária. Assim, a Yunus Negócios Sociais Brasil permanece no conselho e na gover-nança da empresa, de forma a garantir que ela continue ali-nhada à sua missão e funcionando como um negócio social.

Em sua página, a empresa define o conceito de negócios sociais: empresas que têm a única missão de solucionar um pro-blema social são autossustentáveis financeiramente e não dis-tribuem dividendos. Como uma ONG, têm uma missão soci-al, mas, como um negócio tradicional, geram receitas suficien-tes para cobrir seus custos. São empresas nas quais o investidor

recupera seu aporte inicial, mas o lucro gerado é reinvestido na própria empresa para ampliação do impacto social. O sucesso do negócio não é medido pelo total de lucro gerado em um determinado período, mas, sim, pelo impacto criado para as pessoas ou para o meio ambiente.

“A Yunus Negócios Sociais Brasil também oferece servi-ços de consultoria para empresas, governos, fundações e ONGs criarem negócios sociais. A meta agora é replicar no Brasil parcerias que já existem em outros países com empresas como a Danone, Adidas, Intel, Basf ”, diz Oliveira.

A Yunus Negócios Sociais Brasil também oferece servi-ços de consultoria para empresas, governos, fundações e ONGs. Promove, ainda, os negócios sociais no meio acadê-mico, realiza palestras, workshops e eventos por todo o Bra-sil. Outro foco de atuação é a educação. Em abril, a empresa lançou, em São Paulo, uma rede de 12 universidades com o objetivo de levar para as pessoas, o mais cedo possível, o conceito de empreendedorismo social, uma nova maneira de empreender no mundo criado a partir das ideias de Yunus.

“O objetivo é promover a criação de cursos de empreen-dedorismo e conscientização social. A meta é termos até o final do ano 20 universidades na rede e que elas se transfor-mem em incubadoras de negócios sociais”, sinaliza.

Yunus Negócios Sociais Brasil

Muhammad Yunus inspira, em palestra para cerca de mil pessoas, no Rio de Janeiro, planos de ação de empreendedores sociais

Re

pro

du

ção

/ Y

un

us

Ne

góci

os

So

cia

is B

rasi

l

Div

ulg

açã

o

N

resolver o problema, mas sem qualquer planejamento. Isso levou a um passo após outro, e cada um independente. Eu ten-tava ver se conseguia fazer algo útil para pelo menos um indi-víduo, por pelo menos um dia”, contou emocionado o início de sua trajetória.

Yunus lembrou que havia um fenômeno social nas vilas

em torno do campus em que as pessoas exploravam umas às outras. Ele não sabia o quer fazer até ter a ideia de emprestar dinheiro de seu próprio bolso para as pessoas deixarem de ser exploradas. Quando seu dinheiro acabou, Yunus foi aos ban-cos. Mas eles não acreditavam na viabilidade do projeto, ale-gando que pessoas pobres têm crédito ruim. Ele conta que

Page 31: Rumos 281

R REPORTAGEM

Yunus defendeu que o emprego não deveria ser um obje-tivo do cidadão. Para ele, as pessoas não precisam de empre-go, podendo alcançar sua própria subsistência sem ter de tra-balhar para alguém. “Não busquem empregos, criem vocês mesmos os empregos”, disse reiteradas vezes em dois eventos do mesmo dia. À tarde, fez, pela primeira vez, uma palestra aberta ao público do Rio de Janeiro, para uma plateia de cerca de mil pessoas, a maior parte formada por jovens envolvidos em movimentos e empreendimentos sociais. O encontro foi no Centro Cultural da Ação da Cidadania, local mais do que apropriado, por ter sido criado pelo sociólogo Herbert de Sou-za, o Betinho, em sua luta contra a fome e a miséria.

“Estou muito feliz por ver, principalmente, jovens aqui”, disse Yunus, ao subir ao pequeno tablado armado no meio do público, que o aplaudiu de pé como se fosse um popstar das causas sociais. Por quase três horas, Yunus discorreu sobre suas ideias para solucionar problemas sociais, por meio de mecanismos de negócio praticados por ele desde que come-çou a fazer empréstimos a pessoas desassistidas – especial-mente mulheres – de Bangladesh.

Crédito Os empréstimos deram origem ao conceito de – microcrédito termo cunhado por ele e que hoje está presente –em operações financeiras de todo o mundo – e à criação, em 1983, do Grameen Bank, que emprestava dinheiro aos pobres de Bangladesh a juros módicos. Em 20 anos, emprestou mais de US$ 13 bilhões a 8,5 milhões de pessoas que, em sua maio-ria, mal conseguiriam abrir uma conta em um banco comum.

Depois disso, se envolveu diretamente na criação de mais de 50 outros negócios sociais. Atualmente a Yunus Negócios Sociais, com sede em Frankfurt, está presente em seis outros países, além do Brasil: Haiti, Albânia, Tunísia, Togo, Colômbia, Índia, com previsão de abertura de uma unidade no México. Seu objetivo é auxiliar na criação de novos negócios sociais ou no desenvolvimento de iniciativas que já estejam no mercado e desejem receber suporte para acelerar seu crescimento.

Para Yunus, o empreendedorismo é a chave para trazer crescimento econômico, especialmente em tempos de crise. Ele tem especial admiração pelos jovens brasileiros que vão em grande número atuar como voluntários dos empreendi-mentos sociais de sua organização em Bangladesh.

“Estou feliz em ver este grande campus e falar sobre nos-sa experiência em Bangladesh”, disse na abertura da palestra da manhã, na Universidade Estácio de Sá, uma das institui-ções de ensino que integram a rede de universidades parceiras da Yunus Negócios Sociais Brasil. Ele abriu a apresentação dizendo que era um aluno que tentava enxergar o que poderia ser feito em seu país para inverter as condições de extrema pobreza.

“Passei a me questionar por que os bancos não empresta-vam dinheiro para as pessoas pobres. Quando comecei a tra-balhar em uma universidade, passei a perceber que o conheci-mento precisa ter um propósito, senão as palavras se tornam vazias. Havia algo de errado com a universidade; toda aquela teoria não fazia sentido no ambiente em que eu vivia. Eu via a extrema pobreza em torno do campus e estava tentando

RUMOS – 30 – Maio/Junho 2015

MUHAMMAD YUNUS

RUMOS – 31 – Maio/Junho 2015

o país, a Yunus Negócios Sociais Brasil (www.yunusne-gociossociais.com) é o braço local da Yunus Social Busi-

ness Global, fundada pelo Nobel da Paz. Tem como cofunda-dor Rogério Oliveira (foto). Formado em marketing e com MBA pela escola de gestão HBE de Montreal, no Canadá, Oli-veira ocupou diversos cargos em grandes empresas durante muitos anos, até que em 2011 percebeu que sucesso financeiro nunca seria o bastante. Inspirado por Muhammad Yunus, fun-dou o Movimento Buena Onda, consultoria especializada na felicidade no trabalho, um tema que vem ganhando espaço no mundo corporativo.

Rogério se aproximou da equipe de Muhammad Yunus e, após um encontro organizado por ele com 20 CEOs brasilei-ros, foi chamado para ser sócio e implantar a Yunus Negócios Sociais Brasil. A empresa tem como objetivo desenvolver negócios sociais pelo país por meio de dois pilares: o Fundo de Investimentos da Yunus Negócios Sociais Brasil e uma acele-radora. Em maio de 2014, iniciou no Brasil sua incubadora para estimular negócios de impacto social. Em um ano e meio, acelerou 22 negócios sociais e tem sete aprovados para receber investimentos.

“O valor médio de investimento é de R$ 800 mil a R$ 1,5 milhão. Estamos estruturando o fundo e pretendemos captar R$ 40 milhões de investidores filantrópicos e bancos e agên-

cias de desenvolvimento como o Banco Nacional de Desen-volvimento Econômico e Social (BNDES) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)”, diz Oliveira.

A Yunus Brasil também funciona como um negócio social, ou seja, não há distribuição de lucro aos sócios. Havendo lucro, este é totalmente reinvestido no negócio maximizando o impacto social. No Brasil, a ideia é atrair empreendedo-res em criar negócios que tenham como missão tirar pessoas da pobreza e melhorar sua qualida-de de vida.

A incubadora tem sede em São Paulo e atualmente abriga sete projetos: Sanea-mento Sustentável, Finan-duca, Solar Ear, Meu Dou-tor, Nossa Cidade, Hortas Urbanas e Agente Trans-forma. A próxima seleção está prevista para o segun-do semestre, por volta de

agosto, para aceleração entre setembro e novembro.Os empreendimentos são selecionados considerando-se

três critérios: o potencial de impacto social que a iniciativa pode gerar; a solidez da ideia e do plano de negócios, incluindo a sua sustentabilidade financeira; e o empreendedor ou grupo de empreendedores que estarão à frente do negócio.

Os projetos selecionados oficialmente após o período de aceleração, passam, em seguida, por uma fase de due dilligence, e um comitê de investimento decide se ele estará apto a rece-ber aporte do Fundo de Investimentos da Yunus Negócios Sociais Brasil. Esse investimento é realizado em forma de um empréstimo a juros abaixo dos praticados pelo mercado, que são cobrados para cobrir parte dos riscos inerentes ao seu pró-prio negócio e ao de outros do portfólio do fundo, que passa a ter uma participação acionária minoritária. Assim, a Yunus Negócios Sociais Brasil permanece no conselho e na gover-nança da empresa, de forma a garantir que ela continue ali-nhada à sua missão e funcionando como um negócio social.

Em sua página, a empresa define o conceito de negócios sociais: empresas que têm a única missão de solucionar um pro-blema social são autossustentáveis financeiramente e não dis-tribuem dividendos. Como uma ONG, têm uma missão soci-al, mas, como um negócio tradicional, geram receitas suficien-tes para cobrir seus custos. São empresas nas quais o investidor

recupera seu aporte inicial, mas o lucro gerado é reinvestido na própria empresa para ampliação do impacto social. O sucesso do negócio não é medido pelo total de lucro gerado em um determinado período, mas, sim, pelo impacto criado para as pessoas ou para o meio ambiente.

“A Yunus Negócios Sociais Brasil também oferece servi-ços de consultoria para empresas, governos, fundações e ONGs criarem negócios sociais. A meta agora é replicar no Brasil parcerias que já existem em outros países com empresas como a Danone, Adidas, Intel, Basf ”, diz Oliveira.

A Yunus Negócios Sociais Brasil também oferece servi-ços de consultoria para empresas, governos, fundações e ONGs. Promove, ainda, os negócios sociais no meio acadê-mico, realiza palestras, workshops e eventos por todo o Bra-sil. Outro foco de atuação é a educação. Em abril, a empresa lançou, em São Paulo, uma rede de 12 universidades com o objetivo de levar para as pessoas, o mais cedo possível, o conceito de empreendedorismo social, uma nova maneira de empreender no mundo criado a partir das ideias de Yunus.

“O objetivo é promover a criação de cursos de empreen-dedorismo e conscientização social. A meta é termos até o final do ano 20 universidades na rede e que elas se transfor-mem em incubadoras de negócios sociais”, sinaliza.

Yunus Negócios Sociais Brasil

Muhammad Yunus inspira, em palestra para cerca de mil pessoas, no Rio de Janeiro, planos de ação de empreendedores sociais

Re

pro

du

ção

/ Y

un

us

Ne

góci

os

So

cia

is B

rasi

l

Div

ulg

açã

o

N

resolver o problema, mas sem qualquer planejamento. Isso levou a um passo após outro, e cada um independente. Eu ten-tava ver se conseguia fazer algo útil para pelo menos um indi-víduo, por pelo menos um dia”, contou emocionado o início de sua trajetória.

Yunus lembrou que havia um fenômeno social nas vilas

em torno do campus em que as pessoas exploravam umas às outras. Ele não sabia o quer fazer até ter a ideia de emprestar dinheiro de seu próprio bolso para as pessoas deixarem de ser exploradas. Quando seu dinheiro acabou, Yunus foi aos ban-cos. Mas eles não acreditavam na viabilidade do projeto, ale-gando que pessoas pobres têm crédito ruim. Ele conta que

Page 32: Rumos 281

R REPORTAGEM

RUMOS – 32 – Maio/Junho 2015

MUHAMMAD YUNUS

RUMOS – 33 – Maio/Junho 2015

subiu todos os níveis hierárquicos, até aos diretores-presidentes, sem sucesso. Então teve a ideia de pegar ele pró-prio o crédito, dando os seus bens como garantia.

Até que decidiu criar seu próprio banco. Esses pequenos empréstimos criaram o conceito de microcrédito e deram ori-gem ao Grameen Bank, que se iniciou em 1975 e em 1983 foi formalizado. Os donos são os próprios clientes, um total de 8,5 milhões de cotistas, 95% mulheres muito pobres. Yunus se incomodava com o fato de que 99% dos empréstimos dos ban-

cos tradicionais destinavam-se a homens. Decidiu que os empréstimos deveriam ser 50% para mulheres e 50% para homens. Mas depois percebeu que a administração das mulhe-res era muito melhor, e elas passaram a ser maioria.

“Eu não conhecia nada sobre bancos, e isso foi o melhor que poderia acontecer; pois, se eu soubesse as regras dos ban-cos, nunca poderia ter feito o banco dos pobres”, diz Yunus. Ele conta que, toda vez que precisava de uma regra, aprendia como os bancos tradicionais faziam e executava exatamente o

contrário, porque tais instituições não estavam atingindo as pessoas que ele queria ajudar.

“O Grameen Bank é o oposto dos bancos tradicionais, que só emprestam para quem já tem dinheiro e querem que o cliente seja um especialista no que está se propondo. No Gra-meen, vamos às mulheres para ver se elas querem dinheiro para empreender. Nosso trabalho é persuadir as que dizem que não sabem o que fazer com o dinheiro”, diz Yunus. Assim, ele criou uma instituição que descartava todas as regras dos

cos dos ricos. Para Yunus, mesmo depois de tantos anos, os bancos não mudaram, e o microcrédito é apenas uma nota de rodapé dessas instituições. Ele lembrou a crise de 2008, quan-do as grandes instituições financeiras entraram em colapso, se derretendo como neve.

“No final das contas, perderam o jogo, milhões de pessoas sofreram perdas, e países entraram em colapso. Mas ninguém questionou o papel dos bancos. Deram bilhões de dólares para recomeçarem seus trabalhos, e a justificativa é de que eram

bancos tradicionais, emprestando dinheiro sem nenhum docu-mento ou garantia.

“Usávamos a confiança das pessoas, e elas pagavam cada centavo. Os banqueiros desdenhavam e diziam que elas só pagavam para pegar mais dinheiro e depois iam parar de pagar. Hoje o microcrédito é um fenômeno mundial, e não existe nenhum efeito colateral”, resumiu Yunus.

Ele disse se incomodar com o fato de ser apresentado como “banqueiro dos pobres”, alegando que, sendo assim, os bancos tradicionais deveriam ser apresentados como os ban-

grandes demais para falir”, advertiu.Ele diz que sempre que se pergunta por que as pessoas são

pobres, as respostas, invariavelmente, se resumem a dizer por-que não há empregos ou porque as pessoas são preguiçosas, não têm disposição e não querem trabalhar. Mas as pessoas tra-balham noite e dia, e, na opinião de Yunus, a explicação está na falta de oportunidade para empreender. Para ele, a pobreza é como um bonsai. Pode-se pegar a melhor semente e colocar num pequeno vaso, ela cresce apenas um pouco, apesar de ser a melhor semente.

uhammad Yunus tem inspirado empreendedores sociais pelo mundo inteiro. Na tarde do dia 2 de maio,

muitos foram ao Centro Cultural da Ação da Cidadania ouvir esse grande líder. Entre os presentes, estava Robson Borges, fundador da Cooperativa de Trabalho Socioambi-ental Eu Quero Liberdade, formada por 35 ex-detentos do sistema prisional para recolher e reciclar resíduos da comu-nidade do Morro do Alemão, no Rio de Janeiro. Ele explica que o conceito do empreendimento é de logística reversa, baseada no cooperativismo e que visa a transformar resídu-os e pessoas. Robson diz que a reciclagem é uma alternativa para resgatar pessoas em situação de risco e cogita que uma das causas do aumento dos assaltos nas ruas pode estar rela-cionada ao fim dos lixões como o de Gramacho, em Duque de Caxias, que deixou dezenas de famílias sem trabalho.

“Encontramos na reciclagem e no cooperativismo a opor-tunidade para nos reinserirmos no mercado de trabalho. A sociedade continua extraindo recursos naturais enquanto há bilhões de matérias-primas enterradas nos lixões gerando cho-rume nos lençóis freáticos e emitindo metano. O deslizamen-to do Morro do Bumba, em Niterói, é um dos exemplos dos danos causados por resíduos não tratados ”, diz Borges. Há cinco anos, 48 pessoas morreram vítimas de um deslizamento de terra em uma comunidade instalada no Morro do Bumba, local de um antigo lixão.

Criada em 2008, a cooperativa recolhe, na comunidade do Alemão e nos estabelecimentos do entorno, resíduos e óleo vegetal para ser tratado, refinado e encaminhado a intermediá-rios que o distribuem como matéria-prima para indústrias de cosméticos, biodiesel, ração animal, manta asfáltica e massa de vidraceiros. Agora eles tentam obter um espaço e um financia-mento do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para comprarem equipamentos e criarem sua própria usina de beneficiamento.

“Hoje vendemos o óleo a R$ 0,80; se tivéssemos a usina, poderíamos obter R$ 2,40. Já estivemos com o governo do estado, que poderá nos ceder um espaço no Jacaré, numa área que está sendo revitalizada. O espaço é fundamental para que consigamos o financiamento do BNDES, que será utilizado para a compra de equipamentos, a capacitação das pessoas e a conscientização da comunidade”.

Também na linha da sustentabilidade social e ambien-tal, o Instituto Eveno é uma ONG que visa a disseminar

novos padrões de produção baseada em fluxos e ciclos de matéria, energia e informação, em oposição ao sistema li-near de produção surgido depois da Revolução Industrial. Segundo Ítalo Ferreira da Conceição, técnico em agricultu-ra e pecuária e cofundador do instituto, a ideia é estimular a criação de negócios que sejam conectados à natureza e com uma visão de economia mais ampla, distribuindo valor por toda a cadeia.

Um exemplo é a Fruti Box, um negócio social que não dis-tribui dividendos e reinveste o lucro para gerar novos bene-fícios sociais. Ela foi criada por Ferreira, pelo analista de siste-mas Pedro Taramelli e pelo engenheiro aeronáutico Pedro Garcia Lopes, tendo como foco a produção de alimentos sau-dáveis – orgânicos e não químicos – e a utilização de resíduos para a produção de compostagem, que também pode ser usa-da para recuperação de flores.

“A missão da empresa é alimentar a vida. Criamos alimen-tos para as pessoas e compostagem para alimentar as plantas, renovando o ciclo. E tudo o que geramos é reinvestido para tra-zer benefícios para toda a comunidade. Nossa ideia é também estimular a produção de alimentos nos grandes centros, melhorando a ecoeficiência e reduzindo a demanda sobre a infraestrutura”, diz Ferreira.

Já a Young Americas Business Trust (Jovens Empreende-dores das Américas) foi criada em Washington, em 2004, para a promoção do empreendedorismo entre pessoas de baixa ren-da. Segundo Tulio Severo, fundador e presidente do conselho da YABT no Brasil, tal qual preconiza Yunus, a organização acredita que a geração de renda dá-se pela criação de empresas, que antecede a criação de empregos.

Entre as ações da YABT, está o Laboratório Empresarial, um programa de 20 horas, cuja proposta é fazer com que o jovem tenha contato com ferramentas de empreendedoris-mo e com empreendedores da própria comunidade – que con-tam como começaram seus negócios –, além de voluntários das áreas de RH, finanças, marketing, produção e profissio-nais de mercado. Um dos módulos é de microcrédito, minis-trado pela agência de financiamento local.

“O laboratório está em todas as Américas, e, no Brasil, já temos operações em Salvador e no Rio de Janeiro. Após um prazo, voltamos ao local para saber os resultados e constata-mos que, de fato, entre 10% e 12% empreenderam ou melho-raram seus negócios”, diz Severo.

Empreendedores Sociais

As mulheres são o foco do atendimento do Grameen Bank , fundado por Yunus. Ele é o criador do conceito de microcrédito, hoje amplamente difundido, que representa a principal forma de atuação de sua instituição financeira.

SX

C

M

Page 33: Rumos 281

R REPORTAGEM

RUMOS – 32 – Maio/Junho 2015

MUHAMMAD YUNUS

RUMOS – 33 – Maio/Junho 2015

subiu todos os níveis hierárquicos, até aos diretores-presidentes, sem sucesso. Então teve a ideia de pegar ele pró-prio o crédito, dando os seus bens como garantia.

Até que decidiu criar seu próprio banco. Esses pequenos empréstimos criaram o conceito de microcrédito e deram ori-gem ao Grameen Bank, que se iniciou em 1975 e em 1983 foi formalizado. Os donos são os próprios clientes, um total de 8,5 milhões de cotistas, 95% mulheres muito pobres. Yunus se incomodava com o fato de que 99% dos empréstimos dos ban-

cos tradicionais destinavam-se a homens. Decidiu que os empréstimos deveriam ser 50% para mulheres e 50% para homens. Mas depois percebeu que a administração das mulhe-res era muito melhor, e elas passaram a ser maioria.

“Eu não conhecia nada sobre bancos, e isso foi o melhor que poderia acontecer; pois, se eu soubesse as regras dos ban-cos, nunca poderia ter feito o banco dos pobres”, diz Yunus. Ele conta que, toda vez que precisava de uma regra, aprendia como os bancos tradicionais faziam e executava exatamente o

contrário, porque tais instituições não estavam atingindo as pessoas que ele queria ajudar.

“O Grameen Bank é o oposto dos bancos tradicionais, que só emprestam para quem já tem dinheiro e querem que o cliente seja um especialista no que está se propondo. No Gra-meen, vamos às mulheres para ver se elas querem dinheiro para empreender. Nosso trabalho é persuadir as que dizem que não sabem o que fazer com o dinheiro”, diz Yunus. Assim, ele criou uma instituição que descartava todas as regras dos

cos dos ricos. Para Yunus, mesmo depois de tantos anos, os bancos não mudaram, e o microcrédito é apenas uma nota de rodapé dessas instituições. Ele lembrou a crise de 2008, quan-do as grandes instituições financeiras entraram em colapso, se derretendo como neve.

“No final das contas, perderam o jogo, milhões de pessoas sofreram perdas, e países entraram em colapso. Mas ninguém questionou o papel dos bancos. Deram bilhões de dólares para recomeçarem seus trabalhos, e a justificativa é de que eram

bancos tradicionais, emprestando dinheiro sem nenhum docu-mento ou garantia.

“Usávamos a confiança das pessoas, e elas pagavam cada centavo. Os banqueiros desdenhavam e diziam que elas só pagavam para pegar mais dinheiro e depois iam parar de pagar. Hoje o microcrédito é um fenômeno mundial, e não existe nenhum efeito colateral”, resumiu Yunus.

Ele disse se incomodar com o fato de ser apresentado como “banqueiro dos pobres”, alegando que, sendo assim, os bancos tradicionais deveriam ser apresentados como os ban-

grandes demais para falir”, advertiu.Ele diz que sempre que se pergunta por que as pessoas são

pobres, as respostas, invariavelmente, se resumem a dizer por-que não há empregos ou porque as pessoas são preguiçosas, não têm disposição e não querem trabalhar. Mas as pessoas tra-balham noite e dia, e, na opinião de Yunus, a explicação está na falta de oportunidade para empreender. Para ele, a pobreza é como um bonsai. Pode-se pegar a melhor semente e colocar num pequeno vaso, ela cresce apenas um pouco, apesar de ser a melhor semente.

uhammad Yunus tem inspirado empreendedores sociais pelo mundo inteiro. Na tarde do dia 2 de maio,

muitos foram ao Centro Cultural da Ação da Cidadania ouvir esse grande líder. Entre os presentes, estava Robson Borges, fundador da Cooperativa de Trabalho Socioambi-ental Eu Quero Liberdade, formada por 35 ex-detentos do sistema prisional para recolher e reciclar resíduos da comu-nidade do Morro do Alemão, no Rio de Janeiro. Ele explica que o conceito do empreendimento é de logística reversa, baseada no cooperativismo e que visa a transformar resídu-os e pessoas. Robson diz que a reciclagem é uma alternativa para resgatar pessoas em situação de risco e cogita que uma das causas do aumento dos assaltos nas ruas pode estar rela-cionada ao fim dos lixões como o de Gramacho, em Duque de Caxias, que deixou dezenas de famílias sem trabalho.

“Encontramos na reciclagem e no cooperativismo a opor-tunidade para nos reinserirmos no mercado de trabalho. A sociedade continua extraindo recursos naturais enquanto há bilhões de matérias-primas enterradas nos lixões gerando cho-rume nos lençóis freáticos e emitindo metano. O deslizamen-to do Morro do Bumba, em Niterói, é um dos exemplos dos danos causados por resíduos não tratados ”, diz Borges. Há cinco anos, 48 pessoas morreram vítimas de um deslizamento de terra em uma comunidade instalada no Morro do Bumba, local de um antigo lixão.

Criada em 2008, a cooperativa recolhe, na comunidade do Alemão e nos estabelecimentos do entorno, resíduos e óleo vegetal para ser tratado, refinado e encaminhado a intermediá-rios que o distribuem como matéria-prima para indústrias de cosméticos, biodiesel, ração animal, manta asfáltica e massa de vidraceiros. Agora eles tentam obter um espaço e um financia-mento do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para comprarem equipamentos e criarem sua própria usina de beneficiamento.

“Hoje vendemos o óleo a R$ 0,80; se tivéssemos a usina, poderíamos obter R$ 2,40. Já estivemos com o governo do estado, que poderá nos ceder um espaço no Jacaré, numa área que está sendo revitalizada. O espaço é fundamental para que consigamos o financiamento do BNDES, que será utilizado para a compra de equipamentos, a capacitação das pessoas e a conscientização da comunidade”.

Também na linha da sustentabilidade social e ambien-tal, o Instituto Eveno é uma ONG que visa a disseminar

novos padrões de produção baseada em fluxos e ciclos de matéria, energia e informação, em oposição ao sistema li-near de produção surgido depois da Revolução Industrial. Segundo Ítalo Ferreira da Conceição, técnico em agricultu-ra e pecuária e cofundador do instituto, a ideia é estimular a criação de negócios que sejam conectados à natureza e com uma visão de economia mais ampla, distribuindo valor por toda a cadeia.

Um exemplo é a Fruti Box, um negócio social que não dis-tribui dividendos e reinveste o lucro para gerar novos bene-fícios sociais. Ela foi criada por Ferreira, pelo analista de siste-mas Pedro Taramelli e pelo engenheiro aeronáutico Pedro Garcia Lopes, tendo como foco a produção de alimentos sau-dáveis – orgânicos e não químicos – e a utilização de resíduos para a produção de compostagem, que também pode ser usa-da para recuperação de flores.

“A missão da empresa é alimentar a vida. Criamos alimen-tos para as pessoas e compostagem para alimentar as plantas, renovando o ciclo. E tudo o que geramos é reinvestido para tra-zer benefícios para toda a comunidade. Nossa ideia é também estimular a produção de alimentos nos grandes centros, melhorando a ecoeficiência e reduzindo a demanda sobre a infraestrutura”, diz Ferreira.

Já a Young Americas Business Trust (Jovens Empreende-dores das Américas) foi criada em Washington, em 2004, para a promoção do empreendedorismo entre pessoas de baixa ren-da. Segundo Tulio Severo, fundador e presidente do conselho da YABT no Brasil, tal qual preconiza Yunus, a organização acredita que a geração de renda dá-se pela criação de empresas, que antecede a criação de empregos.

Entre as ações da YABT, está o Laboratório Empresarial, um programa de 20 horas, cuja proposta é fazer com que o jovem tenha contato com ferramentas de empreendedoris-mo e com empreendedores da própria comunidade – que con-tam como começaram seus negócios –, além de voluntários das áreas de RH, finanças, marketing, produção e profissio-nais de mercado. Um dos módulos é de microcrédito, minis-trado pela agência de financiamento local.

“O laboratório está em todas as Américas, e, no Brasil, já temos operações em Salvador e no Rio de Janeiro. Após um prazo, voltamos ao local para saber os resultados e constata-mos que, de fato, entre 10% e 12% empreenderam ou melho-raram seus negócios”, diz Severo.

Empreendedores Sociais

As mulheres são o foco do atendimento do Grameen Bank , fundado por Yunus. Ele é o criador do conceito de microcrédito, hoje amplamente difundido, que representa a principal forma de atuação de sua instituição financeira.

SX

C

M

Page 34: Rumos 281

R REPORTAGEM

RUMOS – 34 – Maio/Junho 2015

MUHAMMAD YUNUS

RUMOS – 35 – Maio/Junho 2015

“As pessoas pobres são como bonsais: a semente é boa, mas a sociedade não deu espaço para ela crescer. É a estrutura econômica que criamos. O Grameen Bank não cria empregos, empresta recursos para que as pessoas criem seus próprios empregos. Quem falou que você precisa de um emprego?”, questionou para a plateia de universitários.

Para assegurar que as pessoas tenham uma vida melhor, o banco exige que todas as crianças, filhas de pais analfabetos, fre-quentem a escola. Yunus acredita que todo ser humano pos-sui instintos de sobre-vivência, autopreser-vação e uma força cria-tiva que, muitas vezes, pode ser comprometi-da num emprego ruim. Sendo assim, a forma mais efetiva de ajudar essas pessoas é incenti-var o que elas já têm, seu instinto de sobrevi-vência. O microcrédito baseia-se na premissa de que os pobres têm habilidades profissio-nais não utilizadas ou subutilizadas. Assim, não é a falta de habi-lidades que torna as pessoas pobres, mas, sim, as instituições e as políticas que as cercam. Ele defende que, para eliminar a pobreza, é preciso também implementar as mudanças apro-priadas nas instituições e nas políticas, ou criar novas.

Assim, ele criou um fundo de negócios sociais para resol-ver problemas sociais em vez de gerar lucro. Yunus observa que, no mundo convencional, a maximização do lucro é a meta e o motor que leva a sociedade na direção errada. Ele diz que há dois tipos de negócios: o que gera lucro, movido pelo egoísmo e por interesses individuais; e o que gera bons frutos, movido pelo altruísmo, em que tudo o que se faz é para melhorar a vida das pessoas.

“Algumas pessoas são muito ricas, e a grande maioria é mui-to pobre, porque toda a riqueza foi para o topo. Precisamos do contrafluxo do altruísmo para que a riqueza venha para bai-xo”, resumiu Yunus. Para ele, toda empresa pode ter um negó-cio social para tirar os jovens da pobreza extrema. Mas ele afir-ma que suas ações não são estruturadas com o apoio do Esta-do, como subsídios e redução de impostos. “É a pior coisa que pode acontecer. Nos deem apoio moral e digam que estamos fazendo uma boa coisa, mas não venham com apoio financei-ro, porque vai desarticular todo o sistema e gerar negócios soci-ais falsos”, rechaçou Yunus.

Desigualdade Na conferência da tarde, ele afirmou que as –ações do Grameen Bank têm contribuído para reduzir os níveis de pobreza do seu país. E citou um dos Objetivos do Milênio estabelecidos pela Organização das Nações Unidas, em 2000, com o apoio de 191 nações: reduzir pela metade, até

2015, o número de pessoas abaixo da linha da pobreza.“Bangladesh é um dos países que alcançaram essa meta e

vai atingir os 50% restantes em 2030, dois anos antes do pra-zo estabelecido pela ONU. Hoje apenas 25% da população vivem abaixo da linha da pobreza. Foi uma conquista enor-me. Se continuarmos nesse processo de redução, temos um novo desafio: reduzir a zero. Colocamos um anúncio no jor-

nal dizendo que, se em 2030 houver alguém pobre, vamos dar US$ 1 milhão de recom-pensa. Mas não vai haver, e vamos criar o museu da pobreza”, disse Yunus.

Além dos emprés-timos do banco, Yunus encontrou outras for-mas de gerar renda para as mulheres. Em 1996, conquistou uma licença de telefonia celular e criou a Gra-meenphone para dar linhas de celulares a mulheres em vilarejos onde não havia muitos meios de comunica-

ção. As mulheres passaram a oferecer ligações à população local e até às famílias mais ricas, que as chamavam às suas casas, e assim elas podiam cobrar mais pelo serviço. Com isso, passa-ram a ter geração de renda e o serviço ficou tão popular que elas ficaram conhecidas como as “senhoras dos telefones”.

“Nos quatro anos seguintes, havia meio milhão de mulhe-res com telefone em Bangladesh, e elas foram melhorando a sua qualidade de vida. Hoje o país tem mais de 120 milhões de celulares. E, dentro desse processo, a Grameenphone se tor-nou a maior e mais experiente empresa do país”, contou Yunus. Outra empresa foi criada para vender sistemas de ener-gia solar, que inicialmente eram caros para as populações pobres, mas a empresa resolveu aceitar o valor que elas paga-vam, mensalmente, pelo querosene como forma de pagamen-to até que todo o valor fosse quitado. Hoje a empresa tem 50 mil funcionários e mais de 1,5 milhão de residências atendidas pelo sistema.

Yunus disse que esses são exemplos de negócio que não visam a gerar lucro e sim resolver problemas sociais e ambien-tais substituindo o querosene, que é poluente, por energia lim-pa. Outro exemplo foi uma fabricante de iogurte que acrescen-tou ao produto todos os nutrientes que faltavam para resolver o problema de desnutrição que havia em Bangladesh.

“Isso é diferente da caridade, que é um dinheiro que faz bem apenas às pessoas assistidas, mas não retorna. No negócio social, o dinheiro pode ser utilizado de forma ilimitada, rein-vestindo-se o lucro gerado, enquanto a caridade só se usa uma vez”, distingue.

Yunus observou que o ser humano é muito criativo, porém quase sempre essa criatividade é usada para ganhar

dinheiro e criar negócios que deem lucro. Mas a criatividade poderia ser usada para resolver problemas sociais. Ele reco-mendou àqueles que querem criar um negócio social que olhem para um problema para o qual pode ser criado um pla-no de negócios para resolvê-lo. Yunus também afirmou que toda a tecnologia existente hoje poderia ser usada para resol-ver problemas socioambientais. Um exemplo é na saúde: todos os diagnósticos poderiam ser feitos em casa por meio do celular, sem que as pessoas precisassem se deslocar para clínicas e hospitais.

“É claro que temos um longo caminho. As empresas ganham dinheiro com esses equipamentos de diagnóstico caros e não vão querer que as coisas sejam democratizadas des-sa forma. É por isso que precisamos dos jovens para essa

transformação”, observou. Yunus diz que tem lidado com a frustração dos filhos das mulheres que ajudou a empreender, que puderam estudar, mas, apesar de toda a formação, não con-seguem arranjar empregos. E ele os questiona por que preci-sam de empregos se podem empreender como suas mães.

“Eu pergunto a eles se foi a escola que os ensinou que pre-cisam de um emprego. Nós temos de mudar o sistema educa-cional porque ele educa para que você tenha ‘um bom empre-go’. No entanto, o sistema educacional deveria mostrar ao alu-no quem ele é e qual a sua capacidade. As pessoas deveriam dei-xar de achar que não podem fazer nada e não têm utilidade por-que estão desempregadas. Temos de imaginar o mundo da for-ma como o queremos. Se não imaginarmos, ele nunca aconte-cerá”, concluiu.

Brasil também tem um expo-ente com as mesmas motiva-

ções do Prêmio Nobel da Paz Muhammad Yunus. De acordo com o perfil que ilustra a página do Ban-co da Previdência, fundado por ele em 1959, Dom Helder Câmara (foto), foi também indicado para o prêmio por sete vezes e deixou uma contri-buição para a criação de um mundo pautado por uma ordem social mais justa e pela cidadania, tornando-se uma referência para a humanidade. Nascido em Fortaleza, Ceará, em 7 de fevereiro de 1909, foi ordenado padre aos 22 anos. Transferido em 1936 para o Rio de Janeiro, adotou como desafio antecipar soluções pas-torais em prol dos que vivem na pobreza e na indigência. Em 1952, criou a Conferência Nacional dos Bispos do Bra-sil (CNBB), com novas formas de ação do episcopado, visando à promoção da solidariedade e à ampliação da cida-dania. Foi grande defensor dos direitos humanos durante o regime militar no Brasil e pregava uma Igreja simples, volta-da para os pobres, e a não violência. Foi sagrado bispo auxi-liar do Rio de Janeiro e, depois de 1964 e após 28 anos de ação no Rio de Janeiro, transferido para Olinda/Recife.

Dom Helder tinha uma preocupação maior em superar a pobreza. Acreditava na importância da militância dos pequenos grupos e despertava pessoas com capacidades e recursos para contribuir de maneira mais ativa para que os mais pobres tivessem igualmente a oportunidade de des-pertar e melhorar suas condições de vida. Criou, em 1959, o Banco da Providência, para os pobres sem acesso aos bancos do sistema financeiro. Inventou um novo padrão

para a filantropia a partir de três con-ceitos que, só muitos anos depois, vieram a ser exigência de qualifica-ção em projetos sociais. Em primei-ro lugar, a autossustentabilidade, para a qual criou a Feira da Provi-dência, principal fonte de arrecada-ção de recursos. O segundo concei-to é o da sociedade civil organizada. Assim, imprimiu aos seguidores de suas ideias o compromisso da esfera religiosa de atuar como importante articuladora da sociedade civil. E, por fim, o voluntariado, como o prin-cipal eixo de sustentação desses valo-res compartilhados.

Em 56 anos de atuação no muni-cípio do Rio de Janeiro, o Banco da

Providência focou sua ação no auxílio aos mais pobres. Pas-sou por um programa de planejamento estratégico com o apoio da Fundação Brava e do Instituto de Desenvolvi-mento Gerencial. Adotou modernos instrumentos de ges-tão e implementou a cultura de trabalhar com metas de inclusão social.

Em 27 de maio de 2014, o arcebispo de Olinda e Recife, Dom Fernando Saburido, anunciou o envio de uma carta ao Vaticano solicitando a abertura de processo de canoni-zação de Dom Helder. A carta foi recebida pelo Vaticano no dia 16 de fevereiro de 2015, e, menos de dez dias depois, o parecer favorável foi emitido pela Congregação pela Cau-sa dos Santos, pelo qual ele recebeu o título de “servo de Deus”. A abertura do processo de beatificação foi convo-cada para o dia 3 de maio, na catedral de Olinda. A instala-ção do tribunal nessa data marcou o início da fase diocesa-na do processo de beatificação.

O

Um exemplo brasileiro

O economista conversou com universitários do Rio de Janeiro e incentivou os jovens a serem empreendedores – e não ficarem apenas esperando o emprego bater à porta

Div

ulg

açã

o Div

ulg

açã

o/R

ád

io V

ati

can

o

Page 35: Rumos 281

R REPORTAGEM

RUMOS – 34 – Maio/Junho 2015

MUHAMMAD YUNUS

RUMOS – 35 – Maio/Junho 2015

“As pessoas pobres são como bonsais: a semente é boa, mas a sociedade não deu espaço para ela crescer. É a estrutura econômica que criamos. O Grameen Bank não cria empregos, empresta recursos para que as pessoas criem seus próprios empregos. Quem falou que você precisa de um emprego?”, questionou para a plateia de universitários.

Para assegurar que as pessoas tenham uma vida melhor, o banco exige que todas as crianças, filhas de pais analfabetos, fre-quentem a escola. Yunus acredita que todo ser humano pos-sui instintos de sobre-vivência, autopreser-vação e uma força cria-tiva que, muitas vezes, pode ser comprometi-da num emprego ruim. Sendo assim, a forma mais efetiva de ajudar essas pessoas é incenti-var o que elas já têm, seu instinto de sobrevi-vência. O microcrédito baseia-se na premissa de que os pobres têm habilidades profissio-nais não utilizadas ou subutilizadas. Assim, não é a falta de habi-lidades que torna as pessoas pobres, mas, sim, as instituições e as políticas que as cercam. Ele defende que, para eliminar a pobreza, é preciso também implementar as mudanças apro-priadas nas instituições e nas políticas, ou criar novas.

Assim, ele criou um fundo de negócios sociais para resol-ver problemas sociais em vez de gerar lucro. Yunus observa que, no mundo convencional, a maximização do lucro é a meta e o motor que leva a sociedade na direção errada. Ele diz que há dois tipos de negócios: o que gera lucro, movido pelo egoísmo e por interesses individuais; e o que gera bons frutos, movido pelo altruísmo, em que tudo o que se faz é para melhorar a vida das pessoas.

“Algumas pessoas são muito ricas, e a grande maioria é mui-to pobre, porque toda a riqueza foi para o topo. Precisamos do contrafluxo do altruísmo para que a riqueza venha para bai-xo”, resumiu Yunus. Para ele, toda empresa pode ter um negó-cio social para tirar os jovens da pobreza extrema. Mas ele afir-ma que suas ações não são estruturadas com o apoio do Esta-do, como subsídios e redução de impostos. “É a pior coisa que pode acontecer. Nos deem apoio moral e digam que estamos fazendo uma boa coisa, mas não venham com apoio financei-ro, porque vai desarticular todo o sistema e gerar negócios soci-ais falsos”, rechaçou Yunus.

Desigualdade Na conferência da tarde, ele afirmou que as –ações do Grameen Bank têm contribuído para reduzir os níveis de pobreza do seu país. E citou um dos Objetivos do Milênio estabelecidos pela Organização das Nações Unidas, em 2000, com o apoio de 191 nações: reduzir pela metade, até

2015, o número de pessoas abaixo da linha da pobreza.“Bangladesh é um dos países que alcançaram essa meta e

vai atingir os 50% restantes em 2030, dois anos antes do pra-zo estabelecido pela ONU. Hoje apenas 25% da população vivem abaixo da linha da pobreza. Foi uma conquista enor-me. Se continuarmos nesse processo de redução, temos um novo desafio: reduzir a zero. Colocamos um anúncio no jor-

nal dizendo que, se em 2030 houver alguém pobre, vamos dar US$ 1 milhão de recom-pensa. Mas não vai haver, e vamos criar o museu da pobreza”, disse Yunus.

Além dos emprés-timos do banco, Yunus encontrou outras for-mas de gerar renda para as mulheres. Em 1996, conquistou uma licença de telefonia celular e criou a Gra-meenphone para dar linhas de celulares a mulheres em vilarejos onde não havia muitos meios de comunica-

ção. As mulheres passaram a oferecer ligações à população local e até às famílias mais ricas, que as chamavam às suas casas, e assim elas podiam cobrar mais pelo serviço. Com isso, passa-ram a ter geração de renda e o serviço ficou tão popular que elas ficaram conhecidas como as “senhoras dos telefones”.

“Nos quatro anos seguintes, havia meio milhão de mulhe-res com telefone em Bangladesh, e elas foram melhorando a sua qualidade de vida. Hoje o país tem mais de 120 milhões de celulares. E, dentro desse processo, a Grameenphone se tor-nou a maior e mais experiente empresa do país”, contou Yunus. Outra empresa foi criada para vender sistemas de ener-gia solar, que inicialmente eram caros para as populações pobres, mas a empresa resolveu aceitar o valor que elas paga-vam, mensalmente, pelo querosene como forma de pagamen-to até que todo o valor fosse quitado. Hoje a empresa tem 50 mil funcionários e mais de 1,5 milhão de residências atendidas pelo sistema.

Yunus disse que esses são exemplos de negócio que não visam a gerar lucro e sim resolver problemas sociais e ambien-tais substituindo o querosene, que é poluente, por energia lim-pa. Outro exemplo foi uma fabricante de iogurte que acrescen-tou ao produto todos os nutrientes que faltavam para resolver o problema de desnutrição que havia em Bangladesh.

“Isso é diferente da caridade, que é um dinheiro que faz bem apenas às pessoas assistidas, mas não retorna. No negócio social, o dinheiro pode ser utilizado de forma ilimitada, rein-vestindo-se o lucro gerado, enquanto a caridade só se usa uma vez”, distingue.

Yunus observou que o ser humano é muito criativo, porém quase sempre essa criatividade é usada para ganhar

dinheiro e criar negócios que deem lucro. Mas a criatividade poderia ser usada para resolver problemas sociais. Ele reco-mendou àqueles que querem criar um negócio social que olhem para um problema para o qual pode ser criado um pla-no de negócios para resolvê-lo. Yunus também afirmou que toda a tecnologia existente hoje poderia ser usada para resol-ver problemas socioambientais. Um exemplo é na saúde: todos os diagnósticos poderiam ser feitos em casa por meio do celular, sem que as pessoas precisassem se deslocar para clínicas e hospitais.

“É claro que temos um longo caminho. As empresas ganham dinheiro com esses equipamentos de diagnóstico caros e não vão querer que as coisas sejam democratizadas des-sa forma. É por isso que precisamos dos jovens para essa

transformação”, observou. Yunus diz que tem lidado com a frustração dos filhos das mulheres que ajudou a empreender, que puderam estudar, mas, apesar de toda a formação, não con-seguem arranjar empregos. E ele os questiona por que preci-sam de empregos se podem empreender como suas mães.

“Eu pergunto a eles se foi a escola que os ensinou que pre-cisam de um emprego. Nós temos de mudar o sistema educa-cional porque ele educa para que você tenha ‘um bom empre-go’. No entanto, o sistema educacional deveria mostrar ao alu-no quem ele é e qual a sua capacidade. As pessoas deveriam dei-xar de achar que não podem fazer nada e não têm utilidade por-que estão desempregadas. Temos de imaginar o mundo da for-ma como o queremos. Se não imaginarmos, ele nunca aconte-cerá”, concluiu.

Brasil também tem um expo-ente com as mesmas motiva-

ções do Prêmio Nobel da Paz Muhammad Yunus. De acordo com o perfil que ilustra a página do Ban-co da Previdência, fundado por ele em 1959, Dom Helder Câmara (foto), foi também indicado para o prêmio por sete vezes e deixou uma contri-buição para a criação de um mundo pautado por uma ordem social mais justa e pela cidadania, tornando-se uma referência para a humanidade. Nascido em Fortaleza, Ceará, em 7 de fevereiro de 1909, foi ordenado padre aos 22 anos. Transferido em 1936 para o Rio de Janeiro, adotou como desafio antecipar soluções pas-torais em prol dos que vivem na pobreza e na indigência. Em 1952, criou a Conferência Nacional dos Bispos do Bra-sil (CNBB), com novas formas de ação do episcopado, visando à promoção da solidariedade e à ampliação da cida-dania. Foi grande defensor dos direitos humanos durante o regime militar no Brasil e pregava uma Igreja simples, volta-da para os pobres, e a não violência. Foi sagrado bispo auxi-liar do Rio de Janeiro e, depois de 1964 e após 28 anos de ação no Rio de Janeiro, transferido para Olinda/Recife.

Dom Helder tinha uma preocupação maior em superar a pobreza. Acreditava na importância da militância dos pequenos grupos e despertava pessoas com capacidades e recursos para contribuir de maneira mais ativa para que os mais pobres tivessem igualmente a oportunidade de des-pertar e melhorar suas condições de vida. Criou, em 1959, o Banco da Providência, para os pobres sem acesso aos bancos do sistema financeiro. Inventou um novo padrão

para a filantropia a partir de três con-ceitos que, só muitos anos depois, vieram a ser exigência de qualifica-ção em projetos sociais. Em primei-ro lugar, a autossustentabilidade, para a qual criou a Feira da Provi-dência, principal fonte de arrecada-ção de recursos. O segundo concei-to é o da sociedade civil organizada. Assim, imprimiu aos seguidores de suas ideias o compromisso da esfera religiosa de atuar como importante articuladora da sociedade civil. E, por fim, o voluntariado, como o prin-cipal eixo de sustentação desses valo-res compartilhados.

Em 56 anos de atuação no muni-cípio do Rio de Janeiro, o Banco da

Providência focou sua ação no auxílio aos mais pobres. Pas-sou por um programa de planejamento estratégico com o apoio da Fundação Brava e do Instituto de Desenvolvi-mento Gerencial. Adotou modernos instrumentos de ges-tão e implementou a cultura de trabalhar com metas de inclusão social.

Em 27 de maio de 2014, o arcebispo de Olinda e Recife, Dom Fernando Saburido, anunciou o envio de uma carta ao Vaticano solicitando a abertura de processo de canoni-zação de Dom Helder. A carta foi recebida pelo Vaticano no dia 16 de fevereiro de 2015, e, menos de dez dias depois, o parecer favorável foi emitido pela Congregação pela Cau-sa dos Santos, pelo qual ele recebeu o título de “servo de Deus”. A abertura do processo de beatificação foi convo-cada para o dia 3 de maio, na catedral de Olinda. A instala-ção do tribunal nessa data marcou o início da fase diocesa-na do processo de beatificação.

O

Um exemplo brasileiro

O economista conversou com universitários do Rio de Janeiro e incentivou os jovens a serem empreendedores – e não ficarem apenas esperando o emprego bater à porta

Div

ulg

açã

o Div

ulg

açã

o/R

ád

io V

ati

can

o

Page 36: Rumos 281

RUMOS – 37 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 36 – Maio/Junho 2015

Por Danile Rebouças

ENERGIA

O Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) lança programa com o objetivo de estimular e financiar o uso de fontes de energia renováveis e eficiência energética

E EX

TRE

MO

S

UL

om R$ 60 milhões de recursos próprios e repasses de linhas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) aprovou, em maio deste ano, o Programa BRDE

Energia. Uma iniciativa que traz uma questão atual e de grande importância socioambiental: a necessidade de se estimular o uso de fontes de energia renováveis e eficiência energética.

O programa tem caráter permanente e as expectativas são altas. Para garantir a perenidade e disponibilidade adicional de verbas, além dos recursos tradicionais do BNDES, o BRDE negocia a captação em instituições multilaterais de fomento, como o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD). O presidente do banco, Neuto de Conto, relata que a instituição estima que nos próximos quatro anos sejam investidos cerca de R$ 700 milhões no programa.

Neuto de Conto explica que diante do advento de novas tecnologias de geração de energia e das recentes mudanças tarifárias autorizadas pela Agência Nacional de Energia Elétri-ca (Aneel), o BRDE entendeu que esse é o momento propício para investir nesta área, sendo necessários recursos em condi-ções diferentes daqueles atualmente disponíveis. Desta forma, o banco formatou o programa com a utilização complementar de recursos próprios e, futuramente, de instituições multilate-rais de fomento, de tal forma a ampliar as possibilidades de financiamento.

“O volume de recursos destinados dependerá da efetiva demanda dos diferentes setores da economia. De antemão, podemos afirmar que o BRDE não está impondo limite de aplicação neste programa”, afirma o diretor-presidente.

A gerente de planejamento adjunta do banco, que coorde-nou o grupo que criou o BRDE Energia, Lisiane Astarita, ressalta que este é o primeiro programa efetivo de fomento à Eficiência Energética da instituição. “Temos uma vasta expe-riência em projetos de Energia Renováveis como o Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), mas sempre acompanhando as

políticas de aplicação do BNDES. O BRDE Energia traz diferenciais quanto aos itens que poderão ser financiados, como equipamentos importados, e também a modelagem de garantias, que poderá ser modelada para investimentos que se enquadrem no programa”, afirma Lisiane.

Beneficiados – Propostas em diversas modalidades podem ser financiadas dentro do BRDE Energia, que possui duas subdivisões. No subprograma Energia Renovável, conforme destaca o presidente, podem ser apoiados os projetos de implantação ou ampliação de sistemas de geração de vapor ou eletricidade a partir de biomassa, energia eólica, energia solar, pequenas centrais hidrelétricas, geotérmica e mareo-motriz.

No subprograma Eficiência Energética podem receber apoio ações que visem o uso mais eficiente da energia no ambiente produtivo ou comercial; que engloba desde o desen-volvimento de novos produtos, processos ou serviços, até a substituição ou aprimoramento dos já existentes. Os projetos podem estar relacionados, por exemplo, à modernização ou adequação das instalações; aquisição de softwares, máquinas e equipamentos; substituição de sistemas tradicionais de ilumi-nação; implantação de novos sistemas de transmissão e distri-buição de energia; entre outros, desde que o resultado da ação esteja relacionado com o melhor desempenho e eficiência energética.

O presidente Neuto de Conto reforça que, ao valorizar propostas deste tipo, o banco agiliza o processo de investi-mento em geração de energia elétrica, que costuma ser longo, passando por questões fundiárias, de meio ambiente, de cone-xão à rede de distribuição e de comercialização, exigindo muito esforço do empreendedor. “Com o programa, o BRDE

reduz o prazo total para con-cessão do financiamento, facilitando a vida dos empre-endedores”, sinaliza Neuto.

Sobre os investimentos em eficiência energética, Neuto de Conto destaca que nem sempre eles são prioritá-rios para as empresas, que procuram investir em ativos que tragam aumento de recei-ta, e não necessariamente redução de despesas. “Ao propor a eficiência energética, o BRDE incentiva a redução das despesas, tornando as empresas mais competitivas”, destaca.

Apoio nos Estados – As agências do BRDE estão analisando projetos enquadra-dos no programa. Apesar de a divulgação estar na fase inicial, os superintendentes das agên-cias no Paraná, Santa Catarina

e Rio Grande do Sul afirmam que a repercussão já é positiva. “É um assunto moderno e que chama a atenção do empreen-dedor, especialmente aqueles que se sentem ameaçados pela grande elevação do custo da energia ou pela possibilidade de racionamento futuro”, posiciona-se o superintendente da agência do Paraná, Paulo Cesar Starke Junior.

Em Santa Catarina, o superintendente da agência, Nelson Ronnie, afirma que a receptividade do programa foi muito boa junto à Câmara de Energia da Federação das Indústrias (Fiesc) e que fará uma ampla divulgação entre as diversas federações e associações empresariais. No Rio Grande do Sul, o superintendente Paulo Raffin aposta na demanda, principal-mente, pela dificuldade de se encontrar funding adequado para projetos desta natureza.

Raffin acredita que no Rio Grande do Sul o programa deve apoiar projetos de pequena escala e os de infraestrutura envol-vendo geração de energia descentralizada, por meio da instala-ção de micro aerogeradores e placas fotovoltaicas (energia solar). “O programa pode ser muito útil em promover a efi-ciência do uso da energia em clientes onde este componente tem importância em seu custo operacional, como hospitais e supermercados. No Rio Grande do Sul, também já há uma busca pela produção de energia descentralizada no campo, principalmente para o uso em irrigação e resfriamento de leite”, acrescenta.

Em Santa Catarina, Nelson Ronnie acredita que os proje-tos de geração de energia em maior escala (PCHs, CGHs, eólica etc.) consumirão a maioria dos recursos, até porque requerem mais investimentos. No entanto, em termos de quantidade, espera-se que haja uma demanda de propostas de menor valor para microgeração, com destaque também para os fotovoltaicos.

Nelson Ronnie conta que o BRDE Energia vai ao encon-tro do pacote de incentivos do governo estadual, com o objeti-vo de criar mecanismos que priorizem e facilitem a tramitação de processos relacionados a projetos de eficiência e geração de energia a partir de fontes renováveis. “Nesse contexto o BRDE participa intensamente das discussões de um grupo de trabalho formado pelo próprio governador. E o programa BRDE Energia está em perfeita consonância com esse objeti-vo do governo catarinense”, comenta.

No Paraná, Paulo Cesar Starke Junior pondera alguns valores para o programa, apesar de considerar o projeto amplo e difícil de fazer uma estimativa. Na área de eficiência, por exemplo, acredita que serão aplicados, no mínimo, os R$ 20 milhões de recursos próprios destinados ao Paraná para finan-ciar itens ou projetos normalmente não financiados pelas fontes tradicionais. Quanto à produção de energia de fontes renováveis, crê que no estado serão ampliados os financiamen-tos às PCHs e estima com segurança, no mínimo, R$ 100 milhões até o final de 2016.

Desafios – Para a coordenadora do grupo que criou o progra-ma, Lisiane Astarita, o grande desafio neste momento é moti-var os empreendedores a elaborarem seus projetos. “As empresas estão focadas em suas atividades e não enxergam este tipo de investimento como prioritário. Porém, em um cenário de alto custo de energia, procura por ganho de produ-tividade e competitividade, aliada à busca de sustentabilidade, o uso de energia renovável e a eficiência energética são fatores extremamente relevantes para as empresas brasileiras. Nosso papel também será este, de incentivar a reflexão, levando informação aos diversos setores da economia da Região Sul”, pontua.

Outro grande desafio, para Lisiane, é sensibilizar o poder público, para que se tenha uma política que incentive investi-mentos em Eficiência Energética. “Na última pesquisa realiza-da em 2014 pelo Conselho Americano por uma Economia com mais Eficiência Energética (ACEEE), o Brasil aparece em 15º lugar entre 16 países participantes, no ranking de Efi-ciência Energética, portanto temos um longo caminho pela frente”, afirma confiante.

Alternativaspossíveis

C

Div

ulg

açã

o

Projetos que estimulem a geração de energia eólica podem ser financiados pelo programa BRDE Energia.

Page 37: Rumos 281

RUMOS – 37 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 36 – Maio/Junho 2015

Por Danile Rebouças

ENERGIA

O Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) lança programa com o objetivo de estimular e financiar o uso de fontes de energia renováveis e eficiência energética

E EX

TRE

MO

S

UL

om R$ 60 milhões de recursos próprios e repasses de linhas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) aprovou, em maio deste ano, o Programa BRDE

Energia. Uma iniciativa que traz uma questão atual e de grande importância socioambiental: a necessidade de se estimular o uso de fontes de energia renováveis e eficiência energética.

O programa tem caráter permanente e as expectativas são altas. Para garantir a perenidade e disponibilidade adicional de verbas, além dos recursos tradicionais do BNDES, o BRDE negocia a captação em instituições multilaterais de fomento, como o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD). O presidente do banco, Neuto de Conto, relata que a instituição estima que nos próximos quatro anos sejam investidos cerca de R$ 700 milhões no programa.

Neuto de Conto explica que diante do advento de novas tecnologias de geração de energia e das recentes mudanças tarifárias autorizadas pela Agência Nacional de Energia Elétri-ca (Aneel), o BRDE entendeu que esse é o momento propício para investir nesta área, sendo necessários recursos em condi-ções diferentes daqueles atualmente disponíveis. Desta forma, o banco formatou o programa com a utilização complementar de recursos próprios e, futuramente, de instituições multilate-rais de fomento, de tal forma a ampliar as possibilidades de financiamento.

“O volume de recursos destinados dependerá da efetiva demanda dos diferentes setores da economia. De antemão, podemos afirmar que o BRDE não está impondo limite de aplicação neste programa”, afirma o diretor-presidente.

A gerente de planejamento adjunta do banco, que coorde-nou o grupo que criou o BRDE Energia, Lisiane Astarita, ressalta que este é o primeiro programa efetivo de fomento à Eficiência Energética da instituição. “Temos uma vasta expe-riência em projetos de Energia Renováveis como o Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), mas sempre acompanhando as

políticas de aplicação do BNDES. O BRDE Energia traz diferenciais quanto aos itens que poderão ser financiados, como equipamentos importados, e também a modelagem de garantias, que poderá ser modelada para investimentos que se enquadrem no programa”, afirma Lisiane.

Beneficiados – Propostas em diversas modalidades podem ser financiadas dentro do BRDE Energia, que possui duas subdivisões. No subprograma Energia Renovável, conforme destaca o presidente, podem ser apoiados os projetos de implantação ou ampliação de sistemas de geração de vapor ou eletricidade a partir de biomassa, energia eólica, energia solar, pequenas centrais hidrelétricas, geotérmica e mareo-motriz.

No subprograma Eficiência Energética podem receber apoio ações que visem o uso mais eficiente da energia no ambiente produtivo ou comercial; que engloba desde o desen-volvimento de novos produtos, processos ou serviços, até a substituição ou aprimoramento dos já existentes. Os projetos podem estar relacionados, por exemplo, à modernização ou adequação das instalações; aquisição de softwares, máquinas e equipamentos; substituição de sistemas tradicionais de ilumi-nação; implantação de novos sistemas de transmissão e distri-buição de energia; entre outros, desde que o resultado da ação esteja relacionado com o melhor desempenho e eficiência energética.

O presidente Neuto de Conto reforça que, ao valorizar propostas deste tipo, o banco agiliza o processo de investi-mento em geração de energia elétrica, que costuma ser longo, passando por questões fundiárias, de meio ambiente, de cone-xão à rede de distribuição e de comercialização, exigindo muito esforço do empreendedor. “Com o programa, o BRDE

reduz o prazo total para con-cessão do financiamento, facilitando a vida dos empre-endedores”, sinaliza Neuto.

Sobre os investimentos em eficiência energética, Neuto de Conto destaca que nem sempre eles são prioritá-rios para as empresas, que procuram investir em ativos que tragam aumento de recei-ta, e não necessariamente redução de despesas. “Ao propor a eficiência energética, o BRDE incentiva a redução das despesas, tornando as empresas mais competitivas”, destaca.

Apoio nos Estados – As agências do BRDE estão analisando projetos enquadra-dos no programa. Apesar de a divulgação estar na fase inicial, os superintendentes das agên-cias no Paraná, Santa Catarina

e Rio Grande do Sul afirmam que a repercussão já é positiva. “É um assunto moderno e que chama a atenção do empreen-dedor, especialmente aqueles que se sentem ameaçados pela grande elevação do custo da energia ou pela possibilidade de racionamento futuro”, posiciona-se o superintendente da agência do Paraná, Paulo Cesar Starke Junior.

Em Santa Catarina, o superintendente da agência, Nelson Ronnie, afirma que a receptividade do programa foi muito boa junto à Câmara de Energia da Federação das Indústrias (Fiesc) e que fará uma ampla divulgação entre as diversas federações e associações empresariais. No Rio Grande do Sul, o superintendente Paulo Raffin aposta na demanda, principal-mente, pela dificuldade de se encontrar funding adequado para projetos desta natureza.

Raffin acredita que no Rio Grande do Sul o programa deve apoiar projetos de pequena escala e os de infraestrutura envol-vendo geração de energia descentralizada, por meio da instala-ção de micro aerogeradores e placas fotovoltaicas (energia solar). “O programa pode ser muito útil em promover a efi-ciência do uso da energia em clientes onde este componente tem importância em seu custo operacional, como hospitais e supermercados. No Rio Grande do Sul, também já há uma busca pela produção de energia descentralizada no campo, principalmente para o uso em irrigação e resfriamento de leite”, acrescenta.

Em Santa Catarina, Nelson Ronnie acredita que os proje-tos de geração de energia em maior escala (PCHs, CGHs, eólica etc.) consumirão a maioria dos recursos, até porque requerem mais investimentos. No entanto, em termos de quantidade, espera-se que haja uma demanda de propostas de menor valor para microgeração, com destaque também para os fotovoltaicos.

Nelson Ronnie conta que o BRDE Energia vai ao encon-tro do pacote de incentivos do governo estadual, com o objeti-vo de criar mecanismos que priorizem e facilitem a tramitação de processos relacionados a projetos de eficiência e geração de energia a partir de fontes renováveis. “Nesse contexto o BRDE participa intensamente das discussões de um grupo de trabalho formado pelo próprio governador. E o programa BRDE Energia está em perfeita consonância com esse objeti-vo do governo catarinense”, comenta.

No Paraná, Paulo Cesar Starke Junior pondera alguns valores para o programa, apesar de considerar o projeto amplo e difícil de fazer uma estimativa. Na área de eficiência, por exemplo, acredita que serão aplicados, no mínimo, os R$ 20 milhões de recursos próprios destinados ao Paraná para finan-ciar itens ou projetos normalmente não financiados pelas fontes tradicionais. Quanto à produção de energia de fontes renováveis, crê que no estado serão ampliados os financiamen-tos às PCHs e estima com segurança, no mínimo, R$ 100 milhões até o final de 2016.

Desafios – Para a coordenadora do grupo que criou o progra-ma, Lisiane Astarita, o grande desafio neste momento é moti-var os empreendedores a elaborarem seus projetos. “As empresas estão focadas em suas atividades e não enxergam este tipo de investimento como prioritário. Porém, em um cenário de alto custo de energia, procura por ganho de produ-tividade e competitividade, aliada à busca de sustentabilidade, o uso de energia renovável e a eficiência energética são fatores extremamente relevantes para as empresas brasileiras. Nosso papel também será este, de incentivar a reflexão, levando informação aos diversos setores da economia da Região Sul”, pontua.

Outro grande desafio, para Lisiane, é sensibilizar o poder público, para que se tenha uma política que incentive investi-mentos em Eficiência Energética. “Na última pesquisa realiza-da em 2014 pelo Conselho Americano por uma Economia com mais Eficiência Energética (ACEEE), o Brasil aparece em 15º lugar entre 16 países participantes, no ranking de Efi-ciência Energética, portanto temos um longo caminho pela frente”, afirma confiante.

Alternativaspossíveis

C

Div

ulg

açã

o

Projetos que estimulem a geração de energia eólica podem ser financiados pelo programa BRDE Energia.

Page 38: Rumos 281

RUMOS – 39 – Maio/Junho 2015

uito se fala que um dos diferen-ciais ou uma vantagem compa-rativa do cooperativismo finan-ceiro (versus a solução bancária tradicional) está no atendimen-

to qualificado aos associados. Aliás, em diferentes consultas de opinião aos coope-rados esse tem sido um dos atributos mais enaltecidos, justificando de certa forma o entusiasmo com o vínculo cooperativo.

A questão é saber em que medida esse relacionamento virtuoso limita-se ou deve-ria limitar-se ao contato pessoal. A priori, hoje, pode-se dizer que a avaliação do qua-dro social – pelo menos o que se evidencia nas pesquisas – considera prevalentemente o acolhimento presencial, pois evocam-se características como atenção, simpatia e prontidão do quadro funcional ou mesmo dos dirigentes na prestação dos serviços.

Atualizando o cenário, no entanto, há que se admitir que servir bem apenas na “bo-ca do caixa” já não é/será suficiente. Entre outras possíveis variáveis a conduzirem para essa conclusão, duas se sobressaem.

A primeira razão é o fato de que um grande contingente de associados não faz questão de ir até um ponto de atendimento físico (uma “agência”) da cooperativa, espe-cialmente a população do meio urbano, com destaque ao público mais jovem. Pro-va disso é que o Sicoob encerrou dezem-bro/2014 com quase 68% das transações realizadas em canais digitais (via internet – através computadores, tablets e celulares – ou ATMs). Em 2013 a proporção era 57% para 43% (“Retrospectiva SISBR 2014”). De acordo com pesquisa da Federação Brasileira de Bancos (Febraban – ano-base 2014), as transações via mobile banking continuaram apresentando crescimento expressivo

escala na oferta e utilização da rede, com-binado com a eliminação de estruturas de manutenção individualizadas, além de aumentar a eficiência operacional das entidades, permitirá reduzir os custos para os usuários finais.

Sobre o perfil das dependências (“agências”) das cooperativas, a exemplo do que vem ocorrendo em alguns estabe-lecimentos da rede financeira em certas partes do mundo, e até mesmo no Brasil, poderiam, com o tempo, ser redimensio-nadas, passando, de um lado, a contemplar área customizada para abordagens comer-ciais (“balcão de negócios”) e, de outro, para atividades livres (mas identificadas, de alguma forma, com a cooperação) de interesse dos associados e do público em

geral. Aliás, no meio cooperativo nacional, já há pelo menos uma experiência pontual dentro do último conceito, aplicada em Minas Gerais. A iniciativa, batizada de “espaço cooperati-vo”, consiste na oferta de ambiente aos cooperados e à comu-nidade em geral para o desenvolvimento de projetos e ações socioeducativo-culturais.

Com relação, ainda, aos canais virtuais, é desejável que as cooperativas invistam na “preparação” dos associados que ainda não despertaram para as facilidades e a importância do mundo tecnológico. Entre as medidas, a título de exemplo, está a oferta de treinamentos (inclusive com o emprego de recursos do Fates) sobre o uso de computadores e dispositi-vos móveis e a navegação pelo (magnífico) universo virtual. Paralelamente a esse movimento, poder-se-ia, também, con-siderar a possibilidade do financiamento de equipamentos e smartphones, com taxas de juros diferenciadas.

Ação nessa linha, além de aumentar o grau de satisfação, gerar gratidão nos beneficiários (que terão acesso à infor-mação diversificada e atualizada, pelo mundo; diversão; novos amigos etc.) e, assim, contribuir para a sua fidelização, pode ser um meio de atrair associados dentro do universo de pessoas ainda não familiarizadas com a realidade digital.

Por fim, para que não haja uma leitura no sentido da desimportância da mobilização física dos associados, (re)afirma-se a necessidade do relacionamento social direto com os donos das cooperativas, mas fora das filas dos caixas.

Com efeito, da mesma forma que é indispensável acentuar a oferta de facilitadores transacionais/operacionais remotos, também é fundamental para a sustentabilidade do empreendi-mento cooperativo a criação e o aperfeiçoamento de fóruns regulares e institucionalizados de contato pessoal nas entida-des. Daí que, sem que nas sugestões se esgotem as alternativas, é de todo conveniente estimular a formação e a ampliação de núcleos, comitês sociais e outros formatos de agrupamento de associados, e também instituir e densificar as pré-assembleias, vias pelas quais a administração efetivamente vai ao encontro dos donos das cooperativas, promovendo o diálogo, estimu-lando a participação e, assim, dando vida ao princípio univer-sal da gestão democrática.

AARTIGO

em relação a 2013 e já representam 12% do total de transações dos bancos. No Sicoob, destaque entre as institui-ções do sistema financeiro nacional, esse veículo já é responsável por 14% de todas as transações.

A segunda justificativa está no cus-to. De acordo com dados divulgados pelo mercado financeiro (Bradesco – Ciab Day 2013), o atendimento no cai-xa implica, para a cooperativa, dispên-dio da ordem de R$ 2,00 (despesas com funcionários, instalações, material de expediente, luz, tributos etc.); no ATM, R$ 0,50, e pela internet, R$ 0,14.

Ainda quanto aos canais não-presenciais, a sua preferência do lado do usuário está no fato de que o autoatendi-mento representa comodidade, liberda-de (flexibilidade de horário e local), pra-ticidade, agilidade, segurança (no caso de movimentação de recursos) e economia de tempo (pelo não deslocamento até uma unidade física da cooperativa). Esses “recursos” são (cada vez) mais valorizados pelas novas gerações (ínti-mas da tecnologia e do mundo virtual) e por todos aqueles cujo perfil dispensa o contato pessoal ou requer otimização de tempo. Trata-se, portanto, de valores dis-tintos daqueles apreciados pelos coope-rados que buscam a aproximação física.

Daí que, combinando o fator custo (sob a ótica do empreendimento coo-

perativo) e a preferência do cooperado-usuário, não há dúvi-da que investimentos em canais “alternativos” são muito bem-vindos no cooperativismo financeiro. Aqui, por sinal, o “ponto de equilíbrio” é quase que simultâneo!

Segundo, ainda, pesquisa da Febraban, a penetração

M

mais acelerada dos smartphones em todas as classes sociais também contri-bui para o crescimento das transações por esse meio. Como efeito desta ten-dência, quase metade das contas corren-tes são movimentadas pelo internet ban-king e um em cada quatro correntistas uti-liza o mobile banking.

Por conta desse cenário-realidade (utilização acentuada da internet ou “di-gitalização” bancária), em mercados onde o atendimento bancário está con-solidado há mais tempo, sobretudo em termos de rede física, já se inicia um movimento de redução da quantidade de agências, situação mais notada na Euro-pa. No mesmo continente, ainda, os – assim designados – “bancos de internet” ou “bancos móveis” vêm assumindo protagonismo cada vez maior, enquanto as instituições tradicionais aceleram a ampliação das suas redes on-line. Em relação às instalações físicas, há, também, uma grande preocupação sobre torná-las mais atrativas ou otimizadas, o que inclui oferta de servi-ços não bancários, como disponibilização de tablets para livre uso nas dependências (“Bancos europeus fecham 5,3 mil agências em 2013” – Valor Econômico, edição de 15/04/2014).

Nos Estados Unidos, por sua vez, a disponibilização de soluções remotas tem sido fator de retenção/atração de cli-entes nos bancos e de associados nas cooperativas. Prova dis-so é que cerca de 60% dos usuários americanos de smart-phones ou tablets que mudaram de instituição financeira no quarto trimestre de 2013 disseram que o “banco móvel” foi um fator importante na decisão. Os agentes financeiros ame-ricanos também têm nos custos um atrativo a mais para cali-brar o orçamento em TI, especialmente na seara do mobile banking.

Por aqui, igualmente, temos de seguir apertando os pas-sos em relação ao virtualismo bancário. Contudo, paradoxal-mente, ainda carecemos de uma rede de varejo mais densa (agências, correspondentes e ATMs), notadamente no que se refere ao atendimento cooperativo. Assim, para o relaciona-mento operacional com os associados, as duas frentes – rede de dependências e canais de autosserviço – devem andar jun-tas e merecer ênfase, uma vez que, no todo, a despeito dos avanços já computados, ainda estamos consideravelmente “distantes” de nosso público-alvo (atual e potencial).

No que se refere, em particular, aos ATMs, espera-se que o Banco Central do Brasil, rapidamente, logre êxito em seus esforços junto aos interlocutores da indústria financeira para integrar os equipamentos de todos os agentes (coope-rativas e bancos comerciais), de modo que possam ser reci-procamente utilizados em qualquer canto do país pelos asso-ciados e clientes dessas instituições. Os grandes bancos, por sinal, já começam a dar o exemplo, uma vez que recentemen-te decidiram compartilhar todos os seus terminais externos por meio de uma empresa comum, a TecBan. O ganho de

“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”

Camões

Ênio Meinen é advogado, pós-graduado em direito (FGV/RJ) e em gestão estratégica de pessoas (UFRGS), e autor/coautor de vários artigos e livros sobre cooperativismo financeiro – área na qual atua há 31 anos –, entre eles “Cooperativismo financeiro: percurso histórico, perspectivas e desafios”. Atualmente, é diretor de operações do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob).

Asc

om

/Ba

nco

ob

Ênio Meinen

RUMOS – 38 – Maio/Junho 2015

O cooperativismo financeiro e os canais de (auto) atendimento

Da mesma forma que é indispensável acentuar a oferta de

operacionais remotos, também é fundamental para a sustentabilidade

do empreendimento cooperativo a criação e o aperfeiçoamento de fóruns regulares

e institucionalizados de contato pessoal

nas entidades

Page 39: Rumos 281

RUMOS – 39 – Maio/Junho 2015

uito se fala que um dos diferen-ciais ou uma vantagem compa-rativa do cooperativismo finan-ceiro (versus a solução bancária tradicional) está no atendimen-

to qualificado aos associados. Aliás, em diferentes consultas de opinião aos coope-rados esse tem sido um dos atributos mais enaltecidos, justificando de certa forma o entusiasmo com o vínculo cooperativo.

A questão é saber em que medida esse relacionamento virtuoso limita-se ou deve-ria limitar-se ao contato pessoal. A priori, hoje, pode-se dizer que a avaliação do qua-dro social – pelo menos o que se evidencia nas pesquisas – considera prevalentemente o acolhimento presencial, pois evocam-se características como atenção, simpatia e prontidão do quadro funcional ou mesmo dos dirigentes na prestação dos serviços.

Atualizando o cenário, no entanto, há que se admitir que servir bem apenas na “bo-ca do caixa” já não é/será suficiente. Entre outras possíveis variáveis a conduzirem para essa conclusão, duas se sobressaem.

A primeira razão é o fato de que um grande contingente de associados não faz questão de ir até um ponto de atendimento físico (uma “agência”) da cooperativa, espe-cialmente a população do meio urbano, com destaque ao público mais jovem. Pro-va disso é que o Sicoob encerrou dezem-bro/2014 com quase 68% das transações realizadas em canais digitais (via internet – através computadores, tablets e celulares – ou ATMs). Em 2013 a proporção era 57% para 43% (“Retrospectiva SISBR 2014”). De acordo com pesquisa da Federação Brasileira de Bancos (Febraban – ano-base 2014), as transações via mobile banking continuaram apresentando crescimento expressivo

escala na oferta e utilização da rede, com-binado com a eliminação de estruturas de manutenção individualizadas, além de aumentar a eficiência operacional das entidades, permitirá reduzir os custos para os usuários finais.

Sobre o perfil das dependências (“agências”) das cooperativas, a exemplo do que vem ocorrendo em alguns estabe-lecimentos da rede financeira em certas partes do mundo, e até mesmo no Brasil, poderiam, com o tempo, ser redimensio-nadas, passando, de um lado, a contemplar área customizada para abordagens comer-ciais (“balcão de negócios”) e, de outro, para atividades livres (mas identificadas, de alguma forma, com a cooperação) de interesse dos associados e do público em

geral. Aliás, no meio cooperativo nacional, já há pelo menos uma experiência pontual dentro do último conceito, aplicada em Minas Gerais. A iniciativa, batizada de “espaço cooperati-vo”, consiste na oferta de ambiente aos cooperados e à comu-nidade em geral para o desenvolvimento de projetos e ações socioeducativo-culturais.

Com relação, ainda, aos canais virtuais, é desejável que as cooperativas invistam na “preparação” dos associados que ainda não despertaram para as facilidades e a importância do mundo tecnológico. Entre as medidas, a título de exemplo, está a oferta de treinamentos (inclusive com o emprego de recursos do Fates) sobre o uso de computadores e dispositi-vos móveis e a navegação pelo (magnífico) universo virtual. Paralelamente a esse movimento, poder-se-ia, também, con-siderar a possibilidade do financiamento de equipamentos e smartphones, com taxas de juros diferenciadas.

Ação nessa linha, além de aumentar o grau de satisfação, gerar gratidão nos beneficiários (que terão acesso à infor-mação diversificada e atualizada, pelo mundo; diversão; novos amigos etc.) e, assim, contribuir para a sua fidelização, pode ser um meio de atrair associados dentro do universo de pessoas ainda não familiarizadas com a realidade digital.

Por fim, para que não haja uma leitura no sentido da desimportância da mobilização física dos associados, (re)afirma-se a necessidade do relacionamento social direto com os donos das cooperativas, mas fora das filas dos caixas.

Com efeito, da mesma forma que é indispensável acentuar a oferta de facilitadores transacionais/operacionais remotos, também é fundamental para a sustentabilidade do empreendi-mento cooperativo a criação e o aperfeiçoamento de fóruns regulares e institucionalizados de contato pessoal nas entida-des. Daí que, sem que nas sugestões se esgotem as alternativas, é de todo conveniente estimular a formação e a ampliação de núcleos, comitês sociais e outros formatos de agrupamento de associados, e também instituir e densificar as pré-assembleias, vias pelas quais a administração efetivamente vai ao encontro dos donos das cooperativas, promovendo o diálogo, estimu-lando a participação e, assim, dando vida ao princípio univer-sal da gestão democrática.

AARTIGO

em relação a 2013 e já representam 12% do total de transações dos bancos. No Sicoob, destaque entre as institui-ções do sistema financeiro nacional, esse veículo já é responsável por 14% de todas as transações.

A segunda justificativa está no cus-to. De acordo com dados divulgados pelo mercado financeiro (Bradesco – Ciab Day 2013), o atendimento no cai-xa implica, para a cooperativa, dispên-dio da ordem de R$ 2,00 (despesas com funcionários, instalações, material de expediente, luz, tributos etc.); no ATM, R$ 0,50, e pela internet, R$ 0,14.

Ainda quanto aos canais não-presenciais, a sua preferência do lado do usuário está no fato de que o autoatendi-mento representa comodidade, liberda-de (flexibilidade de horário e local), pra-ticidade, agilidade, segurança (no caso de movimentação de recursos) e economia de tempo (pelo não deslocamento até uma unidade física da cooperativa). Esses “recursos” são (cada vez) mais valorizados pelas novas gerações (ínti-mas da tecnologia e do mundo virtual) e por todos aqueles cujo perfil dispensa o contato pessoal ou requer otimização de tempo. Trata-se, portanto, de valores dis-tintos daqueles apreciados pelos coope-rados que buscam a aproximação física.

Daí que, combinando o fator custo (sob a ótica do empreendimento coo-

perativo) e a preferência do cooperado-usuário, não há dúvi-da que investimentos em canais “alternativos” são muito bem-vindos no cooperativismo financeiro. Aqui, por sinal, o “ponto de equilíbrio” é quase que simultâneo!

Segundo, ainda, pesquisa da Febraban, a penetração

M

mais acelerada dos smartphones em todas as classes sociais também contri-bui para o crescimento das transações por esse meio. Como efeito desta ten-dência, quase metade das contas corren-tes são movimentadas pelo internet ban-king e um em cada quatro correntistas uti-liza o mobile banking.

Por conta desse cenário-realidade (utilização acentuada da internet ou “di-gitalização” bancária), em mercados onde o atendimento bancário está con-solidado há mais tempo, sobretudo em termos de rede física, já se inicia um movimento de redução da quantidade de agências, situação mais notada na Euro-pa. No mesmo continente, ainda, os – assim designados – “bancos de internet” ou “bancos móveis” vêm assumindo protagonismo cada vez maior, enquanto as instituições tradicionais aceleram a ampliação das suas redes on-line. Em relação às instalações físicas, há, também, uma grande preocupação sobre torná-las mais atrativas ou otimizadas, o que inclui oferta de servi-ços não bancários, como disponibilização de tablets para livre uso nas dependências (“Bancos europeus fecham 5,3 mil agências em 2013” – Valor Econômico, edição de 15/04/2014).

Nos Estados Unidos, por sua vez, a disponibilização de soluções remotas tem sido fator de retenção/atração de cli-entes nos bancos e de associados nas cooperativas. Prova dis-so é que cerca de 60% dos usuários americanos de smart-phones ou tablets que mudaram de instituição financeira no quarto trimestre de 2013 disseram que o “banco móvel” foi um fator importante na decisão. Os agentes financeiros ame-ricanos também têm nos custos um atrativo a mais para cali-brar o orçamento em TI, especialmente na seara do mobile banking.

Por aqui, igualmente, temos de seguir apertando os pas-sos em relação ao virtualismo bancário. Contudo, paradoxal-mente, ainda carecemos de uma rede de varejo mais densa (agências, correspondentes e ATMs), notadamente no que se refere ao atendimento cooperativo. Assim, para o relaciona-mento operacional com os associados, as duas frentes – rede de dependências e canais de autosserviço – devem andar jun-tas e merecer ênfase, uma vez que, no todo, a despeito dos avanços já computados, ainda estamos consideravelmente “distantes” de nosso público-alvo (atual e potencial).

No que se refere, em particular, aos ATMs, espera-se que o Banco Central do Brasil, rapidamente, logre êxito em seus esforços junto aos interlocutores da indústria financeira para integrar os equipamentos de todos os agentes (coope-rativas e bancos comerciais), de modo que possam ser reci-procamente utilizados em qualquer canto do país pelos asso-ciados e clientes dessas instituições. Os grandes bancos, por sinal, já começam a dar o exemplo, uma vez que recentemen-te decidiram compartilhar todos os seus terminais externos por meio de uma empresa comum, a TecBan. O ganho de

“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”

Camões

Ênio Meinen é advogado, pós-graduado em direito (FGV/RJ) e em gestão estratégica de pessoas (UFRGS), e autor/coautor de vários artigos e livros sobre cooperativismo financeiro – área na qual atua há 31 anos –, entre eles “Cooperativismo financeiro: percurso histórico, perspectivas e desafios”. Atualmente, é diretor de operações do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob).

Asc

om

/Ba

nco

ob

Ênio Meinen

RUMOS – 38 – Maio/Junho 2015

O cooperativismo financeiro e os canais de (auto) atendimento

Da mesma forma que é indispensável acentuar a oferta de

operacionais remotos, também é fundamental para a sustentabilidade

do empreendimento cooperativo a criação e o aperfeiçoamento de fóruns regulares

e institucionalizados de contato pessoal

nas entidades

Page 40: Rumos 281

RUMOS – 41 – Maio/Junho 2015

erceira Revolução Industrial, Revolução Tecno-científica, Advento da Sociedade do Conheci-mento. O estágio presente do desenvolvimento mundial foi definido por diferentes expressões nos últimos anos, todas convergentes no sentido

de apontar para um novo patamar nos padrões de acumula-ção de riqueza e agregação de valor na economia global. A edi-ção de 2015 do Fórum Nacional, evento realizado pelo Insti-tuto Nacional de Altos Estudos (Inae), coordenado pelo eco-nomista João Paulo dos Reis Velloso, apostou na ideia de Nova Revolução Industrial e discutiu a centralidade da inova-ção neste cenário.

Realizado entre os dias 12 e 14 de maio, na sede do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no Rio de Janeiro, o Fórum debateu as grandes questões econômicas nacionais, com especial atenção para o papel que a ciência, tecnologia e inovação desempenham no novo modelo econômico global e como pode impulsionar a economia brasileira, para que o país se transforme em um dos principais ato-res desta nova ordem.

Na presidência do principal órgão de fomento à inovação do país, a Finep, o cientista político Luis Fernandes acredita que a ciência e a tecnologia estão no coração deste novo mode-lo de desenvolvimento, que tem na promoção da inovação um de seus pilares mais importan-tes. Ele garantiu que há, no governo brasileiro, um esforço de promoção de um novo ciclo de desenvolvimento baseado na inovação.

Para isso, Luis Fernandes defende a atua-ção da Finep que tem como visão de futuro jus-tamente transformar o Brasil por meio da ino-vação. Seus eixos de atuação, explicou o presi-dente, obedecem a uma lógica de promoção de toda cadeia da geração de conhecimento e da inovação, desde o apoio às empresas nas-centes de base tecnológica até a operação de crédito em empresas mais consolidadas nas suas atividades de inovação. Esses eixos estão concentrados em três pontos fundamentais: a expansão e consolidação de um Sistema Naci-

RUMOS – 40 – Maio/Junho 2015

T

R REPORTAGEM INOVAÇÃO

Por Jader Moraes

Os caminhos para que o Brasil avance e se transforme em um ator global relevante frente à Nova Revolução Industrial foram esmiuçados durante o Fórum Nacional, tradicional evento da agenda econômica brasileira, em debates comandados pelo ex-ministro da Fazenda João Paulo dos Reis Velloso

onal de Ciência, Tecnologia e Inovação; o apoio aos Projetos “Estratégicos” Nacionais; e a promoção ativa da inovação empresarial, um grande gargalo brasileiro.

“Dispomos de uma série de instrumentos para isso, como a subvenção econômica, a construção de relações cooperati-vas entre as empresas nacionais e as instituições de Ciência e Tecnologia, a atração de centro de Pesquisa e Desenvolvi-mento (P&D) para empresas transnacionais se instalarem e agregarem valor no Brasil, com estruturas de parques tecno-lógicos que possam apoiar essa vinda”, enumera.

Entre 2005 e 2012, a participação do setor de Pesquisa e Desenvolvimento no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro teve crescimento considerável, passando de 0,99% para 1,21%. Esse crescimento, no entanto, foi impulsionado sobretudo pelos investimentos públicos, que correspondem a mais da metade de todo o investimento em inovação realiza-do no país. “É uma evolução positiva, mas aquém das neces-

sidades da promoção do desenvolvimento nacional por meio da inovação”, reconhece Fernandes, lembrando que se os dados forem decompostos, percebe-se que o crescimento no investimento se deu majoritariamente em função da expansão de investimentos gover-namentais, que passaram de 0,51% para 0,68% do Produto Interno Bruto (PIB), enquanto, em ritmo menor, o total desembol-sado pelas empresas foi de 0,48% para 0,53%.

Em termos de investimentos governa-mentais, segundo dados apresentados pela Finep, o descompasso do Brasil em relação a países que estão na fronteira da promoção da inovação não é muito grande. O patamar de investimento governamental brasileiro é, inclusive, maior que o de países como a Espa-nha, o Reino Unido, a China e o Japão. Contu-do, se for analisado pelo ângulo dos investi-mentos empresariais, o descompasso do Bra-sil é, nas palavras de Fernandes, “gigantesco”. A Coreia do Sul, que no início dos anos 1980 estava em posição equivalente ao Brasil, hoje investe mais de 4,5% do seu PIB em P&D – desses, mais de 3% são empresariais. No

Japão, onde o governo investe menos que o brasileiro no setor, o investimento global se aproxima de 3% do PIB, exata-mente por conta do apoio empresarial. “Eu diria que aqui está o grande desafio, que nós não conseguimos ainda superar: cri-ar um sistema de promoção da inovação por meio do qual os investimentos governamentais tenham maior eficácia e efi-ciência na promoção dos investimentos empresariais em ino-vação”, destacou o presidente da Finep.

A meta do governo é que os investimentos em inovação alcancem 1,5% do PIB nos próximos anos. Admitindo que o apoio governamental deva crescer no máximo até um pata-mar de 0,8%, que é uma média dos países que mais investem, o grande objetivo é fazer crescer os investimentos privados. “Temos que vocalizar nosso esforço para a promoção da ino-vação empresarial como locus central do desenvolvimento nacional”, defendeu Fernandes.

Para o presidente do Conselho Superior de Inovação e Competitividade da Fiesp (Conic), Rodrigo da Rocha Loures, as estratégias do governo para envolver o setor privado no esforço de inovação deve se concentrar nos jovens empreen-dedores e nas pequenas empresas. Um estudo realizado pela entidade, que comparou o ambiente do Vale do Silício, região de alta concentração de empresas de tecnologia e startups na Califórnia (EUA), com algumas capitais brasileiras – São Pau-lo, Belo Horizonte e Curitiba –, constatou que os paradigmas de inovação brasileiros estão obsoletos.

De acordo com Loures, a competitividade no mercado brasileiro é espúria, pois não cria novos valores. “Não temos o ambiente adequado nem conhecimento para promover um

empreendedorismo de alto impacto, que é o que realmente transforma a economia”, disse.

Mirando no exemplo de países, como Estados Unidos e Israel, que adotaram políticas públicas de fomento e regula-tórias específicas para o empreendedorismo de base tecnoló-gica, o presidente defendeu que é preciso uma abordagem mais ousada das políticas e práticas hoje vigentes no país. Isso passa por formar um ambiente propício para o cultivo e o flo-rescimento de empreendimentos inovadores. “Nossa defi-ciência não é de capital humano, mas sim dos sistemas em que temos que operar, seja nas empresas, universidades, na área pública, que não dão espaço para que o melhor das pes-soas e das equipes possa vir à tona. Estamos em desvanta-gem, a ponto de talentos brasileiros preferirem ir para fora, porque o ambiente – fiscal, creditício, universitário, burocrá-tico – no Brasil não é propício”, comentou.

Loures concorda que o país ampliou sua atenção à inova-ção nos últimos anos, mas criticou a falta de uma estratégia de longo prazo para o desenvolvimento econômico brasileiro. Até agora, frisou, o que se vê são ações e projetos episódicos. “A inovação tem que ser a estratégia central para o desenvol-vimento, porque ela é fundamental para a melhoria da quali-dade de vida, para repensar as nossas cidades, reindustrializar o país, fazer com que ingressemos em atividades em que ain-da não nos encontramos. Enfim, para recuperar o nosso atra-so”, finalizou.

Exemplos – Quando Reis Velloso apresentou o professor Antonio Paes de Carvalho e sua empresa, a Extracta, fez um breve desafio: “alguém sabe o que essa empresa exporta?” Alguns segundos de silêncio. E então o economista, um tanto triunfante – talvez por “vencer o desafio”, talvez pela surpre-sa que já antevira que a resposta causaria –, tratou logo de dizer: molécula.

A Extracta foi um dos exemplos de investimentos em ino-vação que o Fórum convidou para tornar a discussão um tan-to mais concreta, a partir de experiências reais. Carvalho, dire-tor-presidente da empresa, falou das vantagens competitivas nacionais quando o assunto é biotecnologia, uma vez que o país possui 22% da riqueza biovegetal do mundo.

O Brasil tem buscado implementar uma Rede Nacional de Biotecnologia da Biodiversidade, formada por centros de estu-dos e desenvolvimento tecnológico públicos e privados, para agregar polos regionais, focar projetos concretos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação na área e atrair mão de obra alta-mente qualificada em participar do desenvolvimento do setor.

Para Antonio Paes de Carvalho, a indústria terá papel essencial para consolidação e expansão do setor no país. “De nada adiantaria formar mestres e doutores sem que a indús-

Luis Fernandes, presidente da Finep.

O passaporte para o desenvolvimento

O ex-ministro Reis Velloso abriu os trabalhos da edição 2015 do Fórum Nacional.

Foto

s: D

ivu

lga

ção

/In

ae

Page 41: Rumos 281

RUMOS – 41 – Maio/Junho 2015

erceira Revolução Industrial, Revolução Tecno-científica, Advento da Sociedade do Conheci-mento. O estágio presente do desenvolvimento mundial foi definido por diferentes expressões nos últimos anos, todas convergentes no sentido

de apontar para um novo patamar nos padrões de acumula-ção de riqueza e agregação de valor na economia global. A edi-ção de 2015 do Fórum Nacional, evento realizado pelo Insti-tuto Nacional de Altos Estudos (Inae), coordenado pelo eco-nomista João Paulo dos Reis Velloso, apostou na ideia de Nova Revolução Industrial e discutiu a centralidade da inova-ção neste cenário.

Realizado entre os dias 12 e 14 de maio, na sede do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no Rio de Janeiro, o Fórum debateu as grandes questões econômicas nacionais, com especial atenção para o papel que a ciência, tecnologia e inovação desempenham no novo modelo econômico global e como pode impulsionar a economia brasileira, para que o país se transforme em um dos principais ato-res desta nova ordem.

Na presidência do principal órgão de fomento à inovação do país, a Finep, o cientista político Luis Fernandes acredita que a ciência e a tecnologia estão no coração deste novo mode-lo de desenvolvimento, que tem na promoção da inovação um de seus pilares mais importan-tes. Ele garantiu que há, no governo brasileiro, um esforço de promoção de um novo ciclo de desenvolvimento baseado na inovação.

Para isso, Luis Fernandes defende a atua-ção da Finep que tem como visão de futuro jus-tamente transformar o Brasil por meio da ino-vação. Seus eixos de atuação, explicou o presi-dente, obedecem a uma lógica de promoção de toda cadeia da geração de conhecimento e da inovação, desde o apoio às empresas nas-centes de base tecnológica até a operação de crédito em empresas mais consolidadas nas suas atividades de inovação. Esses eixos estão concentrados em três pontos fundamentais: a expansão e consolidação de um Sistema Naci-

RUMOS – 40 – Maio/Junho 2015

T

R REPORTAGEM INOVAÇÃO

Por Jader Moraes

Os caminhos para que o Brasil avance e se transforme em um ator global relevante frente à Nova Revolução Industrial foram esmiuçados durante o Fórum Nacional, tradicional evento da agenda econômica brasileira, em debates comandados pelo ex-ministro da Fazenda João Paulo dos Reis Velloso

onal de Ciência, Tecnologia e Inovação; o apoio aos Projetos “Estratégicos” Nacionais; e a promoção ativa da inovação empresarial, um grande gargalo brasileiro.

“Dispomos de uma série de instrumentos para isso, como a subvenção econômica, a construção de relações cooperati-vas entre as empresas nacionais e as instituições de Ciência e Tecnologia, a atração de centro de Pesquisa e Desenvolvi-mento (P&D) para empresas transnacionais se instalarem e agregarem valor no Brasil, com estruturas de parques tecno-lógicos que possam apoiar essa vinda”, enumera.

Entre 2005 e 2012, a participação do setor de Pesquisa e Desenvolvimento no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro teve crescimento considerável, passando de 0,99% para 1,21%. Esse crescimento, no entanto, foi impulsionado sobretudo pelos investimentos públicos, que correspondem a mais da metade de todo o investimento em inovação realiza-do no país. “É uma evolução positiva, mas aquém das neces-

sidades da promoção do desenvolvimento nacional por meio da inovação”, reconhece Fernandes, lembrando que se os dados forem decompostos, percebe-se que o crescimento no investimento se deu majoritariamente em função da expansão de investimentos gover-namentais, que passaram de 0,51% para 0,68% do Produto Interno Bruto (PIB), enquanto, em ritmo menor, o total desembol-sado pelas empresas foi de 0,48% para 0,53%.

Em termos de investimentos governa-mentais, segundo dados apresentados pela Finep, o descompasso do Brasil em relação a países que estão na fronteira da promoção da inovação não é muito grande. O patamar de investimento governamental brasileiro é, inclusive, maior que o de países como a Espa-nha, o Reino Unido, a China e o Japão. Contu-do, se for analisado pelo ângulo dos investi-mentos empresariais, o descompasso do Bra-sil é, nas palavras de Fernandes, “gigantesco”. A Coreia do Sul, que no início dos anos 1980 estava em posição equivalente ao Brasil, hoje investe mais de 4,5% do seu PIB em P&D – desses, mais de 3% são empresariais. No

Japão, onde o governo investe menos que o brasileiro no setor, o investimento global se aproxima de 3% do PIB, exata-mente por conta do apoio empresarial. “Eu diria que aqui está o grande desafio, que nós não conseguimos ainda superar: cri-ar um sistema de promoção da inovação por meio do qual os investimentos governamentais tenham maior eficácia e efi-ciência na promoção dos investimentos empresariais em ino-vação”, destacou o presidente da Finep.

A meta do governo é que os investimentos em inovação alcancem 1,5% do PIB nos próximos anos. Admitindo que o apoio governamental deva crescer no máximo até um pata-mar de 0,8%, que é uma média dos países que mais investem, o grande objetivo é fazer crescer os investimentos privados. “Temos que vocalizar nosso esforço para a promoção da ino-vação empresarial como locus central do desenvolvimento nacional”, defendeu Fernandes.

Para o presidente do Conselho Superior de Inovação e Competitividade da Fiesp (Conic), Rodrigo da Rocha Loures, as estratégias do governo para envolver o setor privado no esforço de inovação deve se concentrar nos jovens empreen-dedores e nas pequenas empresas. Um estudo realizado pela entidade, que comparou o ambiente do Vale do Silício, região de alta concentração de empresas de tecnologia e startups na Califórnia (EUA), com algumas capitais brasileiras – São Pau-lo, Belo Horizonte e Curitiba –, constatou que os paradigmas de inovação brasileiros estão obsoletos.

De acordo com Loures, a competitividade no mercado brasileiro é espúria, pois não cria novos valores. “Não temos o ambiente adequado nem conhecimento para promover um

empreendedorismo de alto impacto, que é o que realmente transforma a economia”, disse.

Mirando no exemplo de países, como Estados Unidos e Israel, que adotaram políticas públicas de fomento e regula-tórias específicas para o empreendedorismo de base tecnoló-gica, o presidente defendeu que é preciso uma abordagem mais ousada das políticas e práticas hoje vigentes no país. Isso passa por formar um ambiente propício para o cultivo e o flo-rescimento de empreendimentos inovadores. “Nossa defi-ciência não é de capital humano, mas sim dos sistemas em que temos que operar, seja nas empresas, universidades, na área pública, que não dão espaço para que o melhor das pes-soas e das equipes possa vir à tona. Estamos em desvanta-gem, a ponto de talentos brasileiros preferirem ir para fora, porque o ambiente – fiscal, creditício, universitário, burocrá-tico – no Brasil não é propício”, comentou.

Loures concorda que o país ampliou sua atenção à inova-ção nos últimos anos, mas criticou a falta de uma estratégia de longo prazo para o desenvolvimento econômico brasileiro. Até agora, frisou, o que se vê são ações e projetos episódicos. “A inovação tem que ser a estratégia central para o desenvol-vimento, porque ela é fundamental para a melhoria da quali-dade de vida, para repensar as nossas cidades, reindustrializar o país, fazer com que ingressemos em atividades em que ain-da não nos encontramos. Enfim, para recuperar o nosso atra-so”, finalizou.

Exemplos – Quando Reis Velloso apresentou o professor Antonio Paes de Carvalho e sua empresa, a Extracta, fez um breve desafio: “alguém sabe o que essa empresa exporta?” Alguns segundos de silêncio. E então o economista, um tanto triunfante – talvez por “vencer o desafio”, talvez pela surpre-sa que já antevira que a resposta causaria –, tratou logo de dizer: molécula.

A Extracta foi um dos exemplos de investimentos em ino-vação que o Fórum convidou para tornar a discussão um tan-to mais concreta, a partir de experiências reais. Carvalho, dire-tor-presidente da empresa, falou das vantagens competitivas nacionais quando o assunto é biotecnologia, uma vez que o país possui 22% da riqueza biovegetal do mundo.

O Brasil tem buscado implementar uma Rede Nacional de Biotecnologia da Biodiversidade, formada por centros de estu-dos e desenvolvimento tecnológico públicos e privados, para agregar polos regionais, focar projetos concretos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação na área e atrair mão de obra alta-mente qualificada em participar do desenvolvimento do setor.

Para Antonio Paes de Carvalho, a indústria terá papel essencial para consolidação e expansão do setor no país. “De nada adiantaria formar mestres e doutores sem que a indús-

Luis Fernandes, presidente da Finep.

O passaporte para o desenvolvimento

O ex-ministro Reis Velloso abriu os trabalhos da edição 2015 do Fórum Nacional.

Foto

s: D

ivu

lga

ção

/In

ae

Page 42: Rumos 281

RUMOS – 42 – Maio/Junho 2015

INOVAÇÃO

tria se propusesse a orientar esse movi-mento ao longo de linhas claras de mer-cado. Nas nações emergentes de sucesso, cada novo mestre ou doutor deve estar integrado num plano que lhe garanta o emprego em atividades científicas na uni-versidade ou na indústria”, afirma, res-saltando que a adesão da indústria signifi-caria um crescimento do emprego indus-trial do cientista brasileiro dos atuais 15% para 70% em médio prazo.

O pesquisador Marco Cremona, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), apresentou dados e experiência com a nanoeletrônica no Bra-sil. Assim como na biotecnologia, o país possui uma vantagem que, se bem apro-veitada, pode colocá-lo em situação de destaque neste setor: está apenas atrás da China no que diz respeito ao tamanho do público que se interessa por produtos advindos da nanoeletrônica, também cha-mada de eletrônica do futuro – uma ino-vação industrial que permite o surgimento, a cada dia, de novos dispositivos e aplicações nas áreas da energia, saúde, das comunicações etc.

Cremona destacou que duas características negativas da indústria nanoeletrônica no país é que em geral são apenas seguidoras dos produtos mundiais, o que significa dizer que são pouco inovadoras; e o baixo conteúdo nacional em com-ponentes eletrônicos de maior valor agregado. Para ele, o maior problema não é a capacidade de inovação brasileira, mas sim as regulações, que muitas vezes significam entraves para que o desenvolvimento de produtos inovadores avance e chegue ao mercado.

Atualmente, o país possui cinco institutos nacionais dedi-cados à eletrônica e nanoeletrônica, com um corpo de 400 pes-quisadores, 280 mestres e 180 doutores. Para Cremona, o Bra-sil pode se destacar especialmente nas áreas de iluminação, fotovoltaico e sensores, campos em que já há larga pesquisa e experiência próprias. O apoio do BNDES, que desde 2008, com o Fundo de Desenvolvimento Tecnológico (Funtec), tem tratado a eletrônica orgânica como uma área promissora tec-nologicamente, também é considerado importante. Mas o número de apenas 35 patentes alcançadas pelos institutos até hoje (em contraste com os 1,5 mil artigos publicados) é um indicativo de que o caminho não é simples.

“A competência do Brasil para essa área é muito avançada, está no nível dos demais países e o investimento necessário não é alto como em outros setores. Mas temos que ser capazes de desenhar uma política inteligente e eficaz para que nos tor-nemos líderes dessa nova tecnologia, capaz de impulsionar muitos outros segmentos industriais, como a indústria auto-mobilística, de aeronaves, de sensores aplicados ao agronegó-cio, da energia, e outros mais”, listou.

O economista Claudio Frischtak, presidente da Inter.B

Consultoria Internacional de Negócios, acredita que o esforço de inovação na indústria brasileira está estagnado e isso fica explícito na comparação da partici-pação do Brasil no total de registros de patentes mundial (0,18%) em relação à parte do país no PIB planetário (3,5%). Ele afirma que o impacto das inovações na economia se dá por meio de sua difu-são e neste quesito o país também está atrás – o percentual de empresas que ino-varam ficou praticamente estável ao lon-go da última década, com apenas um ter-ço das empresas incorporando inova-ções em produtos ou processos.

De acordo com o economista, o frá-gil desempenho no plano da inovação e principalmente na sua disseminação na indústria se reflete na produtividade do trabalho, que chegou a recuar nos últi-mos anos. Em termos de políticas públi-cas, o período recente foi farto em finan-ciamentos, desoneração e proteção à

indústria. Mas, ainda assim, ele avalia que as políticas direcio-nadas à geração de inovações e sua difusão pela economia falharam.

“Nos últimos anos, apostou-se que uma rápida expansão do financiamento levaria a uma forte resposta das empresas no plano da inovação. Mas não foi isso que aconteceu. Preci-samos aperfeiçoar o desenho e a lógica das políticas, para per-cebermos se estamos identificando o problema correto. Pre-cisamos, sobretudo, pensar em uma nova agenda para a indústria brasileira, que a tire do isolamento em que se encon-tra, melhore o ambiente de negócios e aperfeiçoe as práticas de governança”, defendeu.

Ajuste – O tema do ajuste fiscal não ficou de fora dos debates do Fórum, uma vez que impacta nas expectativas de investi-mentos dos vários ministérios e também na iniciativa privada. O presidente da Finep lembrou que, embora a instituição tenha um plano traçado para os próximos anos, a condição conjuntural é de dificuldades. “Não é algo novo, em 2003 tam-bém passamos por um ajuste, mas não tínhamos um cenário externo tão desfavorável, como essa crise prolongada que esta-mos vivendo”, afirmou Luis Fernandes. Para ele, o desafio para o país neste momento é o de construir uma agenda pós-ajuste, que pense em uma nova política industrial que recupere a capacidade de investimento e de inovação brasileiro.

O economista Raul Velloso externou sua preocupação de que os cortes propostos pelo ministro da Fazenda Joaquim Levy (boxe) atinjam o investimento, que, em sua visão, é o prin-cipal problema econômico brasileiro hoje. “Enquanto a taxa de investimento disparou na Ásia, no Brasil investimos prati-camente o mesmo das décadas de 1950 e 1960, e com menos eficiência, porque nossa produtividade é baixa”, compara.

Crítico das ações do governo federal na área de infraestru-

R REPORTAGEM

RUMOS – 43 – Maio/Junho 2015

tura, Velloso diz que o país perdeu a capacidade de crescer no curto e no longo prazo, com estímulo a um modelo de cresci-mento do consumo e não do investimento. Contudo, ele acre-dita que este cenário pode mudar, pois a economia tem dado sinais de que o modelo de consumo interno se esgotou, não restando alternativa que não o investimento em infraestrutu-ra. “Infelizmente, o precipício é que nos leva à solução”, comentou.

Organizador do Fórum, o economista e ex-ministro da Fazenda João Paulo dos Reis Velloso acredita que, no curto prazo, o país precisa de um ajuste fiscal, mas que deve se dar principalmente à base de contenção de despesas e não do aumento de impostos. A necessidade mais imperiosa para a economia brasileira neste momento, no entanto, é se integrar à nova revolução industrial e aumentar sua inserção na eco-nomia internacional.

Reis Velloso afirmou que a estratégia de desenvolvimento do país passa pela observância do capital humano e lembrou que o mundo vive, hoje, a economia do conhecimento. “Paí-ses escandinavos eram pobres há 100 anos e usaram ciência e tecnologia, métodos modernos de gestão e qualificação de mão de obra para o desenvolvimento. Já na economia do conhecimento, as tecnologias recondicionam todos os seto-res econômicos e sociais. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) coloca que 50% do PIB dos países desenvolvidos resultam da geração, uso e difu-são do conhecimento”, lembrou, defendendo também uma reforma na educação, com melhores oportunidades de aces-so a todos os segmentos da população. “O conhecimento é um paraíso”, finalizou.

m uma fala registrada em vídeo, o ministro

da Fazenda, Joaquim Levy, defendeu a necessidade do ajuste como condição para a retomada do crescimento econômico, com consoli-dação fiscal, realinhamen-to de preços e ampliação das oportunidades de inversão do capital privado na infraestrutura. Levy des-tacou o papel importante do BNDES na evolução dos mecanismos de financiamento da economia brasileira e lembrou o programa, anunciado recentemente, de incenti-vo à emissão de debêntures pelas companhias que recor-ram ao crédito favorecido do banco.

“Esse programa visa atender à grande demanda de investidores, inclusive institucionais, por títulos de renda fixa de baixo risco, e adequar-se às atuais condições de ofer-ta de crédito do BNDES. Sua execução poderá sinalizar a velocidade com que o setor privado brasileiro, especial-mente os gestores financeiros, responderão aos desafios dessa nova fase da nossa economia, de menor proeminên-cia das commodities”, disse.

O ministro defendeu que diminuir a dualidade do cré-dito, com ampliação do papel do mercado de capitais, é “ta-refa inadiável” para o país voltar a crescer. Ele admitiu que a tarefa não é simples e exigirá aprimoramento das condi-

ções contratuais dos grandes projetos, das regulações existentes e um compromisso per-manente do governo com a estabilidade eco-nômica e o realismo de preços. “Com as opor-tunidades de investi-mentos que existem em nosso país, não há razão de descartar a possibili-dade de que novas for-mas de financiar a infra-

estrutura brasileira – em cuja experiência do setor privado tem sido vitoriosa – proporcionem uma dessas grandes oportunidades para o país se desenvolver”, afirmou.

Levy também comentou sobre os desafios para melho-ria dos serviços públicos brasileiros, em especial os educa-cionais, do fim do superciclo mundial das commodities e das estratégias utilizadas pelo país nos últimos anos para com-bater a crise econômica.

“Enfrentamos as sequelas da crise financeira com polí-ticas de estímulo à demanda doméstica e à canalização de recurso de origem pública para alguns grandes projetos, mas essa estratégia se esgotou. Estou confiante no resulta-do do conjunto de medidas que o governo tem apresenta-do: o ajuste fiscal, protegendo os programas sociais e envol-vendo o setor privado, abrirá o caminho para a recuperação do crescimento econômico em bases novas”, acredita.

Joaquim Levy defende ajuste e maior participação privada nos investimentos

Antonio Paes de Carvalho, da Extracta, falou sobre a biotecnologia

E

Page 43: Rumos 281

RUMOS – 42 – Maio/Junho 2015

INOVAÇÃO

tria se propusesse a orientar esse movi-mento ao longo de linhas claras de mer-cado. Nas nações emergentes de sucesso, cada novo mestre ou doutor deve estar integrado num plano que lhe garanta o emprego em atividades científicas na uni-versidade ou na indústria”, afirma, res-saltando que a adesão da indústria signifi-caria um crescimento do emprego indus-trial do cientista brasileiro dos atuais 15% para 70% em médio prazo.

O pesquisador Marco Cremona, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), apresentou dados e experiência com a nanoeletrônica no Bra-sil. Assim como na biotecnologia, o país possui uma vantagem que, se bem apro-veitada, pode colocá-lo em situação de destaque neste setor: está apenas atrás da China no que diz respeito ao tamanho do público que se interessa por produtos advindos da nanoeletrônica, também cha-mada de eletrônica do futuro – uma ino-vação industrial que permite o surgimento, a cada dia, de novos dispositivos e aplicações nas áreas da energia, saúde, das comunicações etc.

Cremona destacou que duas características negativas da indústria nanoeletrônica no país é que em geral são apenas seguidoras dos produtos mundiais, o que significa dizer que são pouco inovadoras; e o baixo conteúdo nacional em com-ponentes eletrônicos de maior valor agregado. Para ele, o maior problema não é a capacidade de inovação brasileira, mas sim as regulações, que muitas vezes significam entraves para que o desenvolvimento de produtos inovadores avance e chegue ao mercado.

Atualmente, o país possui cinco institutos nacionais dedi-cados à eletrônica e nanoeletrônica, com um corpo de 400 pes-quisadores, 280 mestres e 180 doutores. Para Cremona, o Bra-sil pode se destacar especialmente nas áreas de iluminação, fotovoltaico e sensores, campos em que já há larga pesquisa e experiência próprias. O apoio do BNDES, que desde 2008, com o Fundo de Desenvolvimento Tecnológico (Funtec), tem tratado a eletrônica orgânica como uma área promissora tec-nologicamente, também é considerado importante. Mas o número de apenas 35 patentes alcançadas pelos institutos até hoje (em contraste com os 1,5 mil artigos publicados) é um indicativo de que o caminho não é simples.

“A competência do Brasil para essa área é muito avançada, está no nível dos demais países e o investimento necessário não é alto como em outros setores. Mas temos que ser capazes de desenhar uma política inteligente e eficaz para que nos tor-nemos líderes dessa nova tecnologia, capaz de impulsionar muitos outros segmentos industriais, como a indústria auto-mobilística, de aeronaves, de sensores aplicados ao agronegó-cio, da energia, e outros mais”, listou.

O economista Claudio Frischtak, presidente da Inter.B

Consultoria Internacional de Negócios, acredita que o esforço de inovação na indústria brasileira está estagnado e isso fica explícito na comparação da partici-pação do Brasil no total de registros de patentes mundial (0,18%) em relação à parte do país no PIB planetário (3,5%). Ele afirma que o impacto das inovações na economia se dá por meio de sua difu-são e neste quesito o país também está atrás – o percentual de empresas que ino-varam ficou praticamente estável ao lon-go da última década, com apenas um ter-ço das empresas incorporando inova-ções em produtos ou processos.

De acordo com o economista, o frá-gil desempenho no plano da inovação e principalmente na sua disseminação na indústria se reflete na produtividade do trabalho, que chegou a recuar nos últi-mos anos. Em termos de políticas públi-cas, o período recente foi farto em finan-ciamentos, desoneração e proteção à

indústria. Mas, ainda assim, ele avalia que as políticas direcio-nadas à geração de inovações e sua difusão pela economia falharam.

“Nos últimos anos, apostou-se que uma rápida expansão do financiamento levaria a uma forte resposta das empresas no plano da inovação. Mas não foi isso que aconteceu. Preci-samos aperfeiçoar o desenho e a lógica das políticas, para per-cebermos se estamos identificando o problema correto. Pre-cisamos, sobretudo, pensar em uma nova agenda para a indústria brasileira, que a tire do isolamento em que se encon-tra, melhore o ambiente de negócios e aperfeiçoe as práticas de governança”, defendeu.

Ajuste – O tema do ajuste fiscal não ficou de fora dos debates do Fórum, uma vez que impacta nas expectativas de investi-mentos dos vários ministérios e também na iniciativa privada. O presidente da Finep lembrou que, embora a instituição tenha um plano traçado para os próximos anos, a condição conjuntural é de dificuldades. “Não é algo novo, em 2003 tam-bém passamos por um ajuste, mas não tínhamos um cenário externo tão desfavorável, como essa crise prolongada que esta-mos vivendo”, afirmou Luis Fernandes. Para ele, o desafio para o país neste momento é o de construir uma agenda pós-ajuste, que pense em uma nova política industrial que recupere a capacidade de investimento e de inovação brasileiro.

O economista Raul Velloso externou sua preocupação de que os cortes propostos pelo ministro da Fazenda Joaquim Levy (boxe) atinjam o investimento, que, em sua visão, é o prin-cipal problema econômico brasileiro hoje. “Enquanto a taxa de investimento disparou na Ásia, no Brasil investimos prati-camente o mesmo das décadas de 1950 e 1960, e com menos eficiência, porque nossa produtividade é baixa”, compara.

Crítico das ações do governo federal na área de infraestru-

R REPORTAGEM

RUMOS – 43 – Maio/Junho 2015

tura, Velloso diz que o país perdeu a capacidade de crescer no curto e no longo prazo, com estímulo a um modelo de cresci-mento do consumo e não do investimento. Contudo, ele acre-dita que este cenário pode mudar, pois a economia tem dado sinais de que o modelo de consumo interno se esgotou, não restando alternativa que não o investimento em infraestrutu-ra. “Infelizmente, o precipício é que nos leva à solução”, comentou.

Organizador do Fórum, o economista e ex-ministro da Fazenda João Paulo dos Reis Velloso acredita que, no curto prazo, o país precisa de um ajuste fiscal, mas que deve se dar principalmente à base de contenção de despesas e não do aumento de impostos. A necessidade mais imperiosa para a economia brasileira neste momento, no entanto, é se integrar à nova revolução industrial e aumentar sua inserção na eco-nomia internacional.

Reis Velloso afirmou que a estratégia de desenvolvimento do país passa pela observância do capital humano e lembrou que o mundo vive, hoje, a economia do conhecimento. “Paí-ses escandinavos eram pobres há 100 anos e usaram ciência e tecnologia, métodos modernos de gestão e qualificação de mão de obra para o desenvolvimento. Já na economia do conhecimento, as tecnologias recondicionam todos os seto-res econômicos e sociais. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) coloca que 50% do PIB dos países desenvolvidos resultam da geração, uso e difu-são do conhecimento”, lembrou, defendendo também uma reforma na educação, com melhores oportunidades de aces-so a todos os segmentos da população. “O conhecimento é um paraíso”, finalizou.

m uma fala registrada em vídeo, o ministro

da Fazenda, Joaquim Levy, defendeu a necessidade do ajuste como condição para a retomada do crescimento econômico, com consoli-dação fiscal, realinhamen-to de preços e ampliação das oportunidades de inversão do capital privado na infraestrutura. Levy des-tacou o papel importante do BNDES na evolução dos mecanismos de financiamento da economia brasileira e lembrou o programa, anunciado recentemente, de incenti-vo à emissão de debêntures pelas companhias que recor-ram ao crédito favorecido do banco.

“Esse programa visa atender à grande demanda de investidores, inclusive institucionais, por títulos de renda fixa de baixo risco, e adequar-se às atuais condições de ofer-ta de crédito do BNDES. Sua execução poderá sinalizar a velocidade com que o setor privado brasileiro, especial-mente os gestores financeiros, responderão aos desafios dessa nova fase da nossa economia, de menor proeminên-cia das commodities”, disse.

O ministro defendeu que diminuir a dualidade do cré-dito, com ampliação do papel do mercado de capitais, é “ta-refa inadiável” para o país voltar a crescer. Ele admitiu que a tarefa não é simples e exigirá aprimoramento das condi-

ções contratuais dos grandes projetos, das regulações existentes e um compromisso per-manente do governo com a estabilidade eco-nômica e o realismo de preços. “Com as opor-tunidades de investi-mentos que existem em nosso país, não há razão de descartar a possibili-dade de que novas for-mas de financiar a infra-

estrutura brasileira – em cuja experiência do setor privado tem sido vitoriosa – proporcionem uma dessas grandes oportunidades para o país se desenvolver”, afirmou.

Levy também comentou sobre os desafios para melho-ria dos serviços públicos brasileiros, em especial os educa-cionais, do fim do superciclo mundial das commodities e das estratégias utilizadas pelo país nos últimos anos para com-bater a crise econômica.

“Enfrentamos as sequelas da crise financeira com polí-ticas de estímulo à demanda doméstica e à canalização de recurso de origem pública para alguns grandes projetos, mas essa estratégia se esgotou. Estou confiante no resulta-do do conjunto de medidas que o governo tem apresenta-do: o ajuste fiscal, protegendo os programas sociais e envol-vendo o setor privado, abrirá o caminho para a recuperação do crescimento econômico em bases novas”, acredita.

Joaquim Levy defende ajuste e maior participação privada nos investimentos

Antonio Paes de Carvalho, da Extracta, falou sobre a biotecnologia

E

Page 44: Rumos 281

PPELO MUNDO

O

Japão obteve, durante todo o século XX, uma das maiores taxas de crescimento do produto verificadas até então. Símbolo do capitalismo asiático, sua nova estrutura de organização empresarial, câmbio desvalorizado e uma políti-

ca monetária heterodoxa fizeram da construção do capitalis-mo japonês uma das mais exitosas experiências de desenvol-vimento econômico do século passado. Sua peculiaridade ultrapassa uma suposta vitalidade inerente à economia japo-nesa: associada a uma estratégia de expansão do mercado externo via aumento das exportações, redução dos custos empresariais e uma política deliberada de desvalorização cambial, atrelando o iene ao dólar, a experiência japonesa demonstra que uma perspectiva de desenvolvimento de lon-go prazo exige uma certa dose de paciência e criatividade. Em outras palavras: o Japão nos mostra que os manuais podem não apresentar as melhores soluções para um deter-minado cenário de política econômica. No caso, situações específicas demandam respostas específicas.

Nesse contexto, o principal espaço de elaboração da polí-tica monetária, o Banco do Japão, conhecido como Nippon Ginko, aparece como um dos grandes protagonistas na tra-jetória de crescimento do país, exercendo importante influência nos rumos do processo de formação do capitalis-mo japonês. Criado em 1882 para sedimentar a unificação monetária logo após a Restauração Meiji, que pôs fim à cha-mada Era Tukugawa e à descentralização econômica e polí-tica estabelecida pelos han, a instituição estabeleceu uma ampla reforma financeira e monetária, com base na realoca-ção dos fundos públicos herdados do período anterior. Através, principalmente, da criação de uma dívida pública nacional, lastreou-se a formação de um sistema financeiro com capilaridade nos bancos privados em formação. Apresentando o cenário do final do século XIX: as casas da moeda dos antigos feudos tornaram-se, após a Restauração,

bancos comerciais com poder de emissão que, somado à Lei da Cunhagem de 1871, instituindo o padrão-ouro no país, criou um contexto de desordem monetária. Esse cenário foi minimizado apenas em 1885, quando o recém-criado Banco do Japão passou a emitir suas próprias moedas conversíveis, tornando-se, a partir desse momento, o referencial para a emissão monetária, política de crédito e controle inflacioná-rio. Mais que isso: por meio de uma política de criação de “bancos especiais”, que limitariam a expansão creditícia e atuariam como bancos semioficiais (já que com recursos do banco japonês e sob sua coordenação) de investimentos de longo prazo, centralizaram-se capitais, tendo como perspec-tivas a adoção de políticas industriais seletivas para diferen-tes setores, além, é claro, de atuarem contra o ciclo econômi-co em momentos de recessão. Em outras palavras: o Banco do Japão surgia como responsável por garantir a liquidez para o sistema em sua totalidade. Anos mais tarde, essa polí-tica deliberada do governo japonês, sob a salvaguarda de seu Banco Central, formaria os chamados Zaibatsus, conglome-rados existentes em diversos setores industriais. Com isso, em comparação com bancos europeus, estabelecia similari-dades com o Reichsbank alemão, por meio de um manuseio ativo da política monetária a favor da formação de novas indústrias, marca indelével dos países da Segunda Revolução Industrial. A elasticidade do sistema monetário permane-ceu, regulando-se a partir de 1888, através de uma emenda à Lei do Banco do Japão que impunha regras para a emissão por parte dos bancos, lastreado, principalmente, por títulos da dívida pública. Tendo como pano de fundo a visão de uma moeda endógena, propunha-se garantir a liquidez para as indústrias nascentes, o que, ligado ao então militarismo existente no país, favoreceu amplamente a indústria bélica. O que se depreende nesse momento é a centralidade do papel do banco japonês no processo de industrialização naci-onal, adotando postura ativa e propositiva na condução de

uma política monetária em prol do cresci-mento do produto e da consolidação de um sistema financeiro nacional, com capi-laridade e liquidez em seu sistema bancá-rio. Tal postura tornou-se elemento cultu-ral do próprio banco e mesmo da econo-mia japonesa, permanecendo no pós-Segunda Guerra Mundial, período no qual se inicia uma nova etapa em seu desenvol-vimento.

Após o lançamento de duas bombas nucleares sob Hiroshima e Nagasaki e a con-sequente rendição para os Aliados, em 1945, o Japão estava devastado. Sua indús-tria estava destruída, assim como grande parte da infraestrutura do país. Além disso, nos anos posteriores à guerra, elevou-se a emissão monetária, acarretando uma forte pressão inflacionária. Em 1949, após uma reformulação na chamada Banking Law of 1942, que estruturava a dinâmica interna do banco, o Policy Board tornou-se o órgão decisório, responsável pela elaboração e supervisão das políticas monetária e credití-cia. Juntamente a essas alterações, instituía-se uma reforma orçamentária objetivando a queda das taxas de inflação, paralelamente a um reordenamento da atividade econômica, voltando-se a canalizar recursos para indústrias estratégicas impactadas pela guerra. Nesse sentido, apesar das pressões dos países aliados para que se desmantelassem os Zaibatsus, o banco manteve o direcionamento da poupança para determinados setores industriais, com taxas de juros arti-ficialmente baixas. Essa política se manteve durante as déca-das de 1950 a 1970, quando houve um aumento gradativo da liberalização do mercado financeiro japonês. Durante esse período, fortaleceu-se o sistema bancário do país, com o intu-ito de dar continuidade à supervisão da política creditícia, ope-rada tanto pela taxa de redesconto quanto pelo controle quan-titativo dos empréstimos aos bancos comerciais. Mantinha-se, assim, uma combinação de políticas quantitativas e quali-tativas para o fornecimento de crédito bancário.

O resultado das políticas descritas acima, somadas ao câm-bio fixo, foi um rápido crescimento da economia japonesa, mantendo em patamares moderados o nível geral de preços, o que demonstra um aumento substancial de sua produtivi-dade. Entre os anos de 1960 a 1973, o Produto Nacional

Bruto (PNB) cresceu a uma taxa média anu-al de 9,4%, com índices de inflação em tor-no de 5,8%. Em 1973, com o fim do siste-ma de câmbio fixo, voltou-se a uma política monetária restritiva que, após um período de relaxamento em 1975, se manteve até 1979. Como já referido anteriormente, a década de 1980 representa o início de uma liberalização gradual de seu sistema finan-ceiro, acarretando um fortalecimento do mercado de capitais, com um afastamento entre as empresas e o sistema bancário naci-onal, diminuindo, com isso, o endivida-mento das primeiras. Durante todo o período, o Banco do Japão operou ativa-mente para o fortalecimento da economia japonesa em geral e de sua indústria em par-ticular, com priorização de setores estraté-gicos, via crédito seletivo. É a liberalização financeira, sob a pressão dos Estados Unidos da América (EUA), que põem ter-mo a esse modelo de política econômica.

As décadas de 1980 a 2000 foram de fle-xibilização do sistema financeiro japonês, com feitos no dinamismo de seu sistema

bancário. O baixo crescimento, diretamente relacionado com a valorização do iene, promovida no final da década de 1980, após pressão norte-americana, e seus previsíveis efei-tos nas exportações do país, fizeram o banco japonês manter uma taxa de juros em patamares muito baixos durante todo o período. Com a crise de 2008, a situação se deteriorou, com crescimento perto de zero e ainda o perigo deflacionário. Nessa conjuntura, o início do século XXI tem sido de estag-nação da economia japonesa, a despeito das tentativas de estí-mulo da instituição via política monetária. A liberalização das últimas três décadas retirou parte substancial da capaci-dade de incidência do banco japonês, com aumento da importância do mercado de capitais para o financiamento das empresas, o que impõe limites e reduz a eficácia de sua atuação.

Nesse contexto, sua peculiaridade, baseada em sua polí-tica pró-crescimento, por intermédio de uma certa dose de heterodoxia, desvaneceu a partir do final do século passado. Seu símbolo, porém, se mantém como uma das marcas do capitalismo japonês e da expansão econômica asiática durante o século XX.

RUMOS – 44 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 45 – Maio/Junho 2015

Jorge Varaschin

Arq

uiv

o p

ess

oa

l

O nono artigo da coluna “Pelo Mundo” trata do Banco de Desenvolvimento do Japão, conhecido como Nippon Ginko. O artigo foi escrito por Jorge Varaschin, Bacharel e mestre em Economia do Desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Jorge obteve o 2º lugar no 34º Prêmio BNDES de Economia e no Prêmio do Conselho Regional de Economia do RS 2014 com a dissertação “Para Além do Populismo Econômico: Uma Interpretação da Política Econômica do Governo João Goulart (1961 – 1964)”.

Nippon Ginko: símbolo da peculiaridade do desenvolvimen to capitalista japonês

A experiência japonesa

demonstra que uma

perspectiva de desenvolvimento de longo prazo

exige uma certa dose de paciência e criatividade

““

Page 45: Rumos 281

PPELO MUNDO

O

Japão obteve, durante todo o século XX, uma das maiores taxas de crescimento do produto verificadas até então. Símbolo do capitalismo asiático, sua nova estrutura de organização empresarial, câmbio desvalorizado e uma políti-

ca monetária heterodoxa fizeram da construção do capitalis-mo japonês uma das mais exitosas experiências de desenvol-vimento econômico do século passado. Sua peculiaridade ultrapassa uma suposta vitalidade inerente à economia japo-nesa: associada a uma estratégia de expansão do mercado externo via aumento das exportações, redução dos custos empresariais e uma política deliberada de desvalorização cambial, atrelando o iene ao dólar, a experiência japonesa demonstra que uma perspectiva de desenvolvimento de lon-go prazo exige uma certa dose de paciência e criatividade. Em outras palavras: o Japão nos mostra que os manuais podem não apresentar as melhores soluções para um deter-minado cenário de política econômica. No caso, situações específicas demandam respostas específicas.

Nesse contexto, o principal espaço de elaboração da polí-tica monetária, o Banco do Japão, conhecido como Nippon Ginko, aparece como um dos grandes protagonistas na tra-jetória de crescimento do país, exercendo importante influência nos rumos do processo de formação do capitalis-mo japonês. Criado em 1882 para sedimentar a unificação monetária logo após a Restauração Meiji, que pôs fim à cha-mada Era Tukugawa e à descentralização econômica e polí-tica estabelecida pelos han, a instituição estabeleceu uma ampla reforma financeira e monetária, com base na realoca-ção dos fundos públicos herdados do período anterior. Através, principalmente, da criação de uma dívida pública nacional, lastreou-se a formação de um sistema financeiro com capilaridade nos bancos privados em formação. Apresentando o cenário do final do século XIX: as casas da moeda dos antigos feudos tornaram-se, após a Restauração,

bancos comerciais com poder de emissão que, somado à Lei da Cunhagem de 1871, instituindo o padrão-ouro no país, criou um contexto de desordem monetária. Esse cenário foi minimizado apenas em 1885, quando o recém-criado Banco do Japão passou a emitir suas próprias moedas conversíveis, tornando-se, a partir desse momento, o referencial para a emissão monetária, política de crédito e controle inflacioná-rio. Mais que isso: por meio de uma política de criação de “bancos especiais”, que limitariam a expansão creditícia e atuariam como bancos semioficiais (já que com recursos do banco japonês e sob sua coordenação) de investimentos de longo prazo, centralizaram-se capitais, tendo como perspec-tivas a adoção de políticas industriais seletivas para diferen-tes setores, além, é claro, de atuarem contra o ciclo econômi-co em momentos de recessão. Em outras palavras: o Banco do Japão surgia como responsável por garantir a liquidez para o sistema em sua totalidade. Anos mais tarde, essa polí-tica deliberada do governo japonês, sob a salvaguarda de seu Banco Central, formaria os chamados Zaibatsus, conglome-rados existentes em diversos setores industriais. Com isso, em comparação com bancos europeus, estabelecia similari-dades com o Reichsbank alemão, por meio de um manuseio ativo da política monetária a favor da formação de novas indústrias, marca indelével dos países da Segunda Revolução Industrial. A elasticidade do sistema monetário permane-ceu, regulando-se a partir de 1888, através de uma emenda à Lei do Banco do Japão que impunha regras para a emissão por parte dos bancos, lastreado, principalmente, por títulos da dívida pública. Tendo como pano de fundo a visão de uma moeda endógena, propunha-se garantir a liquidez para as indústrias nascentes, o que, ligado ao então militarismo existente no país, favoreceu amplamente a indústria bélica. O que se depreende nesse momento é a centralidade do papel do banco japonês no processo de industrialização naci-onal, adotando postura ativa e propositiva na condução de

uma política monetária em prol do cresci-mento do produto e da consolidação de um sistema financeiro nacional, com capi-laridade e liquidez em seu sistema bancá-rio. Tal postura tornou-se elemento cultu-ral do próprio banco e mesmo da econo-mia japonesa, permanecendo no pós-Segunda Guerra Mundial, período no qual se inicia uma nova etapa em seu desenvol-vimento.

Após o lançamento de duas bombas nucleares sob Hiroshima e Nagasaki e a con-sequente rendição para os Aliados, em 1945, o Japão estava devastado. Sua indús-tria estava destruída, assim como grande parte da infraestrutura do país. Além disso, nos anos posteriores à guerra, elevou-se a emissão monetária, acarretando uma forte pressão inflacionária. Em 1949, após uma reformulação na chamada Banking Law of 1942, que estruturava a dinâmica interna do banco, o Policy Board tornou-se o órgão decisório, responsável pela elaboração e supervisão das políticas monetária e credití-cia. Juntamente a essas alterações, instituía-se uma reforma orçamentária objetivando a queda das taxas de inflação, paralelamente a um reordenamento da atividade econômica, voltando-se a canalizar recursos para indústrias estratégicas impactadas pela guerra. Nesse sentido, apesar das pressões dos países aliados para que se desmantelassem os Zaibatsus, o banco manteve o direcionamento da poupança para determinados setores industriais, com taxas de juros arti-ficialmente baixas. Essa política se manteve durante as déca-das de 1950 a 1970, quando houve um aumento gradativo da liberalização do mercado financeiro japonês. Durante esse período, fortaleceu-se o sistema bancário do país, com o intu-ito de dar continuidade à supervisão da política creditícia, ope-rada tanto pela taxa de redesconto quanto pelo controle quan-titativo dos empréstimos aos bancos comerciais. Mantinha-se, assim, uma combinação de políticas quantitativas e quali-tativas para o fornecimento de crédito bancário.

O resultado das políticas descritas acima, somadas ao câm-bio fixo, foi um rápido crescimento da economia japonesa, mantendo em patamares moderados o nível geral de preços, o que demonstra um aumento substancial de sua produtivi-dade. Entre os anos de 1960 a 1973, o Produto Nacional

Bruto (PNB) cresceu a uma taxa média anu-al de 9,4%, com índices de inflação em tor-no de 5,8%. Em 1973, com o fim do siste-ma de câmbio fixo, voltou-se a uma política monetária restritiva que, após um período de relaxamento em 1975, se manteve até 1979. Como já referido anteriormente, a década de 1980 representa o início de uma liberalização gradual de seu sistema finan-ceiro, acarretando um fortalecimento do mercado de capitais, com um afastamento entre as empresas e o sistema bancário naci-onal, diminuindo, com isso, o endivida-mento das primeiras. Durante todo o período, o Banco do Japão operou ativa-mente para o fortalecimento da economia japonesa em geral e de sua indústria em par-ticular, com priorização de setores estraté-gicos, via crédito seletivo. É a liberalização financeira, sob a pressão dos Estados Unidos da América (EUA), que põem ter-mo a esse modelo de política econômica.

As décadas de 1980 a 2000 foram de fle-xibilização do sistema financeiro japonês, com feitos no dinamismo de seu sistema

bancário. O baixo crescimento, diretamente relacionado com a valorização do iene, promovida no final da década de 1980, após pressão norte-americana, e seus previsíveis efei-tos nas exportações do país, fizeram o banco japonês manter uma taxa de juros em patamares muito baixos durante todo o período. Com a crise de 2008, a situação se deteriorou, com crescimento perto de zero e ainda o perigo deflacionário. Nessa conjuntura, o início do século XXI tem sido de estag-nação da economia japonesa, a despeito das tentativas de estí-mulo da instituição via política monetária. A liberalização das últimas três décadas retirou parte substancial da capaci-dade de incidência do banco japonês, com aumento da importância do mercado de capitais para o financiamento das empresas, o que impõe limites e reduz a eficácia de sua atuação.

Nesse contexto, sua peculiaridade, baseada em sua polí-tica pró-crescimento, por intermédio de uma certa dose de heterodoxia, desvaneceu a partir do final do século passado. Seu símbolo, porém, se mantém como uma das marcas do capitalismo japonês e da expansão econômica asiática durante o século XX.

RUMOS – 44 – Maio/Junho 2015 RUMOS – 45 – Maio/Junho 2015

Jorge Varaschin

Arq

uiv

o p

ess

oa

l

O nono artigo da coluna “Pelo Mundo” trata do Banco de Desenvolvimento do Japão, conhecido como Nippon Ginko. O artigo foi escrito por Jorge Varaschin, Bacharel e mestre em Economia do Desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Jorge obteve o 2º lugar no 34º Prêmio BNDES de Economia e no Prêmio do Conselho Regional de Economia do RS 2014 com a dissertação “Para Além do Populismo Econômico: Uma Interpretação da Política Econômica do Governo João Goulart (1961 – 1964)”.

Nippon Ginko: símbolo da peculiaridade do desenvolvimen to capitalista japonês

A experiência japonesa

demonstra que uma

perspectiva de desenvolvimento de longo prazo

exige uma certa dose de paciência e criatividade

““

Page 46: Rumos 281

O Banco do Nordeste, em maio, promoveu o circuito FNE Itinerante 2015. O objetivo do projeto é levar a cida-des do interior do Rio Grande do Norte uma série de infor-mações às micro e pequenas empresas (MPEs) sobre o acesso ao crédito por meio do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE). Desde 2009, uma série de encontros já foram cumpridos em todo o estado. No ano passado, nove municípios participaram do circuito e esse ano o número subiu para 18.

Durante os eventos, proprietários e administradores de empreendimentos contam com atendimento do Banco do Nordeste e do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), que realizam a divulgação das linhas de financiamento.

O FNE Itinerante é uma ação que faz parte da parceria entre o Banco do Nordeste, Ministério da Integração Naci-onal e Sudene, que também conta com os apoios do Sebrae, prefeituras, câmaras municipais, Câmaras dos Dirigentes Lojistas (CDLs) locais e sindicatos do comércio varejista.

RUMOS – – Maio/Junho 2015 46 RUMOS – – Maio/Junho 2015 47

A Agência de Fomento do Estado do Paraná (Fomento Paraná) assinou mais um contrato de financiamento pela linha Inovacred, que é destinada a projetos de inovação e desenvolvi-mento tecnológico. A beneficiária do crédito é a empresa Iso-tron Ltda., sediada na Região Metropolitana de Curitiba. A empresa atua no desenvolvimento de máquinas e equipamen-tos para microssoldagem. Apoiada pelas atividades de pesquisa e desenvolvimento, a Isotron passou a atuar também nas áreas de automação, ensaios elétricos e energia.

O objetivo do projeto é desenvolver o Módulo Inversor Digital (MID), voltado para o segmento de solda a ponto, por meio da incorporação de um controle totalmente digital a um módulo de potência de um inversor de solda. A aplicação do produto é voltada principalmente às indústrias do segmento de eletroeletrônica, de autopeças e metalmecânica.

Para o presidente da Fomento Paraná, Juraci Barbosa, a agência tem feito um esforço para apoiar os empreendedores no financiamento à inovação.“Estamos de portas abertas, dispostos a apoiar as empresas, estamos aprimorando nossos processos e esperamos que este seja o primeiro de outros con-tratos que a Isotron possa assinar conosco”, afirmou.

F FOMENTO

Div

ulg

açã

o/F

om

en

to P

ara

A Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE) elegeu no fim de maio sua nova diretoria, para o biênio 2015-2017. O economista Milton Luiz de Melo Santos foi eleito presidente da associação, durante a Assembleia Geral da entidade. Oriundo do Banco Central, onde permaneceu por 36 anos e foi secretário-executivo, Santos é o atual presidente da Agência de Desenvolvimento Paulista (Desenvolve SP), uma das 29 instituições associadas à ABDE – grupo que inclui grandes bancos federais, instituições estaduais e regio-nais de fomento, a Finep, o Sebrae e bancos cooperativos.

Um dos principais desafios do novo presidente será con-duzir o processo de Planejamento Estratégico do Sistema Nacional de Fomento (SNF), que prevê, dentre outros pon-

Empresas capixabas poderão recorrer a fundo para o setor aeroespacial

Banco do Nordeste promove interiorização de crédito com o circuito FNE Itinerante

Fomento Paraná contrata novo financiamento pela linha Inovacred

Milton Luiz de Melo Santos é o novo presidente da ABDE

tos, maior interlocução das instituições de fomento com os ministérios e outros órgãos federais. O SNF é responsável por mais de 55% do saldo de operações de crédito do país, especialmente para projetos de infraestrutura e apoio às micro e pequenas empresas.“É importante aumentarmos o diálogo com o Banco Central e intensificarmos a nossa sinergia com o BNDES, para que os agentes financeiros possam cumprir seu papel de propulsionar a economia regional. Cada instituição representa seu estado, mas somos um conjunto que trabalha em prol do desenvolvimento do país. E acreditamos no Sistema Nacional de Fomento como alicerce desse desen-volvimento”, disse Milton.A reunião foi conduzida pelo presidente

do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, que também preside o Conse-lho dos Associados. Coutinho destacou o esforço realizado nos últimos anos para ampliar o reconhecimento da associa-ção e sua interlocução com outras instituições, e elogiou a plataforma de trabalho apresentada pelo presidente recém-eleito. “Tenho certeza que será exitosa, pois está articulada a um projeto coletivo. Desejo pleno êxito no desenvolvimento de toda essa plataforma e, enquanto BNDES, estamos com-prometidos em buscar uma agenda diferenciada, com mais atenção às agências de fomento, assim como com a institui-ção do Planejamento Estratégico do Sistema Nacional de Fomento”, disse.

A Assembleia Geral da ABDE também elegeu como vice-presidentes da entidade o economista Marco Aurélio Crocco, do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), e o diretor do Banco do Brasil Ilton Luis Schwaab. Outros sete diretores, além do conselho fiscal da insti-tuição, também foram eleitos (boxe).

Novos – A Assembleia Geral também celebrou o retorno da Agência de Fomen-to do Estado de Tocantins ao corpo de associados da ABDE. O presidente da agência, José Carlos Freire Junior, apre-sentou a solicitação, que foi acolhida durante o encontro. O Banco Interameri-cano de Desenvolvimento (BID) também manifestou a intenção de ingressar como associado à ABDE, se comprometendo a enviar nos dias seguintes uma comunica-ção oficial para selar sua entrada no qua-dro da associação.

Nova composição da Diretoria da ABDE

Presidente Milton Luiz de Melo Santos (Desenvolve SP)

1º Vice-PresidenteMarco Aurélio Crocco Afonso (BDMG)

2 º Vice-PresidenteIlton Luis Schwaab (Banco do Brasil)

Diretores:Francisco Soares (Banco do Nordeste)José Henrique Paim (BNDES)Humberto Tannús Junior (Goiás Fomento)Otto Alencar Filho (Desenbahia)Rogério Tavares (Caixa)Susana Kakuta (Badesul)Valmir Rossi (Banco da Amazônia)

Conselho Fiscal – Membros Efetivos: João Carlos Grando (Badesc)André Giovane Canavarro Alves (Bancoob)José Marconi Freire (Desenvolve)

Membros Suplentes: Jackson Antonio da Trindade Rocha (Agefepe) Murilo Diniz (AGN)Deuzi Cristini Nunes da Cunha (MT Fomento)

O Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes) encaminhou ao BNDES o pedido de participação da instituição em um fundo de investimen-tos em participações (FIP) que investe em empresas dos setores aeronáutico, aeroespacial, segurança, defesa e integra-ção de sistemas. O Fundo Aeroespacial, que tem como gestora a Portbank, com patrimônio inicial de R$ 131,3 milhões, tem a Embraer como empresa-âncora e uma das cotistas, além do BNDES, FINEP e DesenvolveSP. O Bandes passará a ser investidor do Fundo com o aporte de R$ 10 milhões ao patrimônio.

O FIP é uma modalidade de apoio a empresas, distinto do crédito tradicional, onde a gestora do Fundo identifica o poten-

cial de crescimento das empresas e adqui-re um percentual de participação no inves-timento. Ou seja, o Fundo entrará como sócio acionista dos empreendimentos selecionados pelo seu potencial de retor-no. O diretor-presidente do Bandes, Luiz Paulo Vellozo Lucas, destacou que a ação faz parte da nova forma de atuar do ban-co. “Por meio da participação em fundos de investimento e participações, o objeti-vo do Bandes é estimular o empreendedo-

rismo, o desenvolvimento de empresas inovadoras, as melho-res práticas de gestão e governança corporativa em parceria com outros investidores. O banco atuará como cotista do Fundo e este, por sua vez, será acionista de empresas capixabas promissoras”, destaca.

Div

ulg

açã

o/B

an

de

s

No

el J

oa

qu

im F

aia

d

SX

C

Page 47: Rumos 281

O Banco do Nordeste, em maio, promoveu o circuito FNE Itinerante 2015. O objetivo do projeto é levar a cida-des do interior do Rio Grande do Norte uma série de infor-mações às micro e pequenas empresas (MPEs) sobre o acesso ao crédito por meio do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE). Desde 2009, uma série de encontros já foram cumpridos em todo o estado. No ano passado, nove municípios participaram do circuito e esse ano o número subiu para 18.

Durante os eventos, proprietários e administradores de empreendimentos contam com atendimento do Banco do Nordeste e do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), que realizam a divulgação das linhas de financiamento.

O FNE Itinerante é uma ação que faz parte da parceria entre o Banco do Nordeste, Ministério da Integração Naci-onal e Sudene, que também conta com os apoios do Sebrae, prefeituras, câmaras municipais, Câmaras dos Dirigentes Lojistas (CDLs) locais e sindicatos do comércio varejista.

RUMOS – – Maio/Junho 2015 46 RUMOS – – Maio/Junho 2015 47

A Agência de Fomento do Estado do Paraná (Fomento Paraná) assinou mais um contrato de financiamento pela linha Inovacred, que é destinada a projetos de inovação e desenvolvi-mento tecnológico. A beneficiária do crédito é a empresa Iso-tron Ltda., sediada na Região Metropolitana de Curitiba. A empresa atua no desenvolvimento de máquinas e equipamen-tos para microssoldagem. Apoiada pelas atividades de pesquisa e desenvolvimento, a Isotron passou a atuar também nas áreas de automação, ensaios elétricos e energia.

O objetivo do projeto é desenvolver o Módulo Inversor Digital (MID), voltado para o segmento de solda a ponto, por meio da incorporação de um controle totalmente digital a um módulo de potência de um inversor de solda. A aplicação do produto é voltada principalmente às indústrias do segmento de eletroeletrônica, de autopeças e metalmecânica.

Para o presidente da Fomento Paraná, Juraci Barbosa, a agência tem feito um esforço para apoiar os empreendedores no financiamento à inovação.“Estamos de portas abertas, dispostos a apoiar as empresas, estamos aprimorando nossos processos e esperamos que este seja o primeiro de outros con-tratos que a Isotron possa assinar conosco”, afirmou.

F FOMENTO

Div

ulg

açã

o/F

om

en

to P

ara

A Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE) elegeu no fim de maio sua nova diretoria, para o biênio 2015-2017. O economista Milton Luiz de Melo Santos foi eleito presidente da associação, durante a Assembleia Geral da entidade. Oriundo do Banco Central, onde permaneceu por 36 anos e foi secretário-executivo, Santos é o atual presidente da Agência de Desenvolvimento Paulista (Desenvolve SP), uma das 29 instituições associadas à ABDE – grupo que inclui grandes bancos federais, instituições estaduais e regio-nais de fomento, a Finep, o Sebrae e bancos cooperativos.

Um dos principais desafios do novo presidente será con-duzir o processo de Planejamento Estratégico do Sistema Nacional de Fomento (SNF), que prevê, dentre outros pon-

Empresas capixabas poderão recorrer a fundo para o setor aeroespacial

Banco do Nordeste promove interiorização de crédito com o circuito FNE Itinerante

Fomento Paraná contrata novo financiamento pela linha Inovacred

Milton Luiz de Melo Santos é o novo presidente da ABDE

tos, maior interlocução das instituições de fomento com os ministérios e outros órgãos federais. O SNF é responsável por mais de 55% do saldo de operações de crédito do país, especialmente para projetos de infraestrutura e apoio às micro e pequenas empresas.“É importante aumentarmos o diálogo com o Banco Central e intensificarmos a nossa sinergia com o BNDES, para que os agentes financeiros possam cumprir seu papel de propulsionar a economia regional. Cada instituição representa seu estado, mas somos um conjunto que trabalha em prol do desenvolvimento do país. E acreditamos no Sistema Nacional de Fomento como alicerce desse desen-volvimento”, disse Milton.A reunião foi conduzida pelo presidente

do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, que também preside o Conse-lho dos Associados. Coutinho destacou o esforço realizado nos últimos anos para ampliar o reconhecimento da associa-ção e sua interlocução com outras instituições, e elogiou a plataforma de trabalho apresentada pelo presidente recém-eleito. “Tenho certeza que será exitosa, pois está articulada a um projeto coletivo. Desejo pleno êxito no desenvolvimento de toda essa plataforma e, enquanto BNDES, estamos com-prometidos em buscar uma agenda diferenciada, com mais atenção às agências de fomento, assim como com a institui-ção do Planejamento Estratégico do Sistema Nacional de Fomento”, disse.

A Assembleia Geral da ABDE também elegeu como vice-presidentes da entidade o economista Marco Aurélio Crocco, do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), e o diretor do Banco do Brasil Ilton Luis Schwaab. Outros sete diretores, além do conselho fiscal da insti-tuição, também foram eleitos (boxe).

Novos – A Assembleia Geral também celebrou o retorno da Agência de Fomen-to do Estado de Tocantins ao corpo de associados da ABDE. O presidente da agência, José Carlos Freire Junior, apre-sentou a solicitação, que foi acolhida durante o encontro. O Banco Interameri-cano de Desenvolvimento (BID) também manifestou a intenção de ingressar como associado à ABDE, se comprometendo a enviar nos dias seguintes uma comunica-ção oficial para selar sua entrada no qua-dro da associação.

Nova composição da Diretoria da ABDE

Presidente Milton Luiz de Melo Santos (Desenvolve SP)

1º Vice-PresidenteMarco Aurélio Crocco Afonso (BDMG)

2 º Vice-PresidenteIlton Luis Schwaab (Banco do Brasil)

Diretores:Francisco Soares (Banco do Nordeste)José Henrique Paim (BNDES)Humberto Tannús Junior (Goiás Fomento)Otto Alencar Filho (Desenbahia)Rogério Tavares (Caixa)Susana Kakuta (Badesul)Valmir Rossi (Banco da Amazônia)

Conselho Fiscal – Membros Efetivos: João Carlos Grando (Badesc)André Giovane Canavarro Alves (Bancoob)José Marconi Freire (Desenvolve)

Membros Suplentes: Jackson Antonio da Trindade Rocha (Agefepe) Murilo Diniz (AGN)Deuzi Cristini Nunes da Cunha (MT Fomento)

O Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes) encaminhou ao BNDES o pedido de participação da instituição em um fundo de investimen-tos em participações (FIP) que investe em empresas dos setores aeronáutico, aeroespacial, segurança, defesa e integra-ção de sistemas. O Fundo Aeroespacial, que tem como gestora a Portbank, com patrimônio inicial de R$ 131,3 milhões, tem a Embraer como empresa-âncora e uma das cotistas, além do BNDES, FINEP e DesenvolveSP. O Bandes passará a ser investidor do Fundo com o aporte de R$ 10 milhões ao patrimônio.

O FIP é uma modalidade de apoio a empresas, distinto do crédito tradicional, onde a gestora do Fundo identifica o poten-

cial de crescimento das empresas e adqui-re um percentual de participação no inves-timento. Ou seja, o Fundo entrará como sócio acionista dos empreendimentos selecionados pelo seu potencial de retor-no. O diretor-presidente do Bandes, Luiz Paulo Vellozo Lucas, destacou que a ação faz parte da nova forma de atuar do ban-co. “Por meio da participação em fundos de investimento e participações, o objeti-vo do Bandes é estimular o empreendedo-

rismo, o desenvolvimento de empresas inovadoras, as melho-res práticas de gestão e governança corporativa em parceria com outros investidores. O banco atuará como cotista do Fundo e este, por sua vez, será acionista de empresas capixabas promissoras”, destaca.

Div

ulg

açã

o/B

an

de

s

No

el J

oa

qu

im F

aia

d

SX

C

Page 48: Rumos 281

RUMOS – 49 – Maio/Junho 2015

as editoras universitárias, geral-mente encontramos títulos que remetem a essa temática: desi-gualdade. O que a obra traz de dife-

rente para o debate? Marta Arretche – Esta obra desafia a tese segun-do a qual o Brasil teria vivido uma “inaceitável esta-bilidade” da desigualdade. Em 14 ensaios, que abordam educação e renda, políticas públicas, demografia, mercado de trabalho e participação política, o livro demonstra que, na verdade, as desi-gualdades entre os brasileiros foram muito reduzi-das nas últimas décadas, embora o país continue entre os mais desiguais do planeta. Os textos ainda deixam claro que o processo esteve estreitamente vinculado a decisões políticas, das quais, portanto, depende sua continuidade. O período analisado é um dos mais distintos econômica e politicamente já vivenciados no país, os 50 anos compreendidos entre 1960 e 2010. Os textos evocam imagens que refletem uma transição acelerada de um país de perfil rural e homogeneamente empobrecido, em que apenas 20% dos jovens de até 15 anos concluíam os quatro anos de ensino básico, para um país urbano, que praticamente uni-versalizou o acesso ao ensino fundamental, ampliou significativa-mente o alcance dos serviços públicos e aumentou em 11 anos a expectativa de vida média de sua população.

Rumos – O livro é robusto, com mais de 489 páginas, que abordam vários aspectos: educação, renda, mercado de tra-balho, em um intervalo de tempo considerável (1960-2010). Várias conquistas são apontadas, mas também desigualda-des persistem, principalmente, para mulheres, pretos e par-dos. É possível identificar por que esses grupos não acompa-nharam a evolução do país?Arretche – Na verdade, mulheres, pretos e pardos não tiveram o mesmo sucesso. Elas entraram de forma massiva no mercado de trabalho, mas em 2010, assim como os brasileiros do segundo gru-po, obtinham menores rendimentos que os homens brancos, mes-mo quando possuíam o mesmo nível de escolaridade. Os não bran-cos avançaram ainda menos, relativamente às mulheres, que se dis-tribuem por todos os extratos sociais. Embora tenha aumentado o ingresso de pretos e pardos na universidade nas últimas décadas, em 2010 os brancos ainda eram 75% da população universitária, e estavam matriculados em geral nas carreiras de maior prestígio. Em consequência, a redução das desigualdades em relação aos não brancos dentro do sistema escolar permaneceu restrita ao nível de ensino em que o acesso tornou-se universal, isto é, no ensi-no fundamental. De um lado, estes dados evidenciam que a redu-ção do “prêmio da educação” não é o único fator explicativo da

Estabilidade da desigualdade

L LIVROS

queda da desigualdade no mercado de trabalho. De outro lado, mostra que a desigualdade vai sen-do reduzida por um mecanismo de saturação, isto é, quando políticas são universalizadas em um dado patamar, tendem a se deslocar para o patamar seguinte. Rumos – Foram utilizadas como base de dados seis edições dos censos demográficos do IBGE. Qual a maior dificuldade em tra-balhar com tamanho volume de dados? Arretche – Este é um trabalho volumoso, que exigiu muito cuidado em sua montagem, bem como uma equipe tecnicamente competente. Mas, como demonstrado, não é impossível de ser realizado. Na verdade, temos hoje no Brasil uma grande disponibilidade de dados, que nos permi-tem avançar em nossa compreensão sobre os grandes fenômenos de interesse da sociedade bra-sileira.

Rumos – No livro, evidencia-se que as políti-cas públicas têm desempenhado um papel central na redu-ção das desigualdades. É uma sinalização de que somente com políticas perenes, com continuidade, é possível reverter o quadro de desigualdade?Arretche – Não apenas. É preciso continuidade nas políticas redistributivas, porque as distintas políticas têm efeitos diferentes sobre a desigualdade. A previdência pública aumenta a desigualda-de, porque paga benefícios elevados a uma pequena parcela de beneficiários, ao passo que a previdência privada reduz a desigual-dade, porque a maior parte destes aposentados recebe até dois salá-rios mínimos. Quando o salário mínimo é valorizado, há um impacto positivo sobre a queda de desigualdade. O Programa Bol-sa Família reduz a pobreza assim como reduz um pouquinho a desi-gualdade. Parte da controvérsia sobre a trajetória da desigualdade no Brasil é que muitos estudos se concentram em apenas uma dimensão e extrapolam por dedução suas inferências para as dema-is. Parte expressiva das interpretações que concluem que pouco mudou no Brasil nos últimos 50 anos é derivada de um viés negati-vo de seleção dos indicadores com pior desempenho e, sobretudo, de uma métrica móvel segundo a qual exigências mais elevadas são adotadas à medida que progressos são obtidos. O viés de seleção também afeta a interpretação que sustenta que um novo Brasil emergiu das mudanças recentes. Esta está baseada na seleção das dimensões cuja inflexão positiva foi mais destacada. Na prática, você pode enviesar a seleção das políticas que examina e concluir o que você quiser sobre o impacto do Estado. Por esta razão, em nos-so livro, destacamos um conjunto bem amplo de dimensões rele-vantes, que foram examinadas separadamente.

Livro reúne 14 ensaios que procuram criticar a ideia, bastante difundida, de que há, no país, uma estabilidade da desigualdade. Ao abordar vários aspectos, a obra mostra que foram muitos os avanços, mas alguns grupos sociais não conseguiram se beneficiar do crescimento do Brasil. Confira os destaques da publicação em uma entrevista com a cientista política Marta Arretche, organizadora do livro.

RUMOS – 48 – Maio/Junho 2015

N

Tendo como um de seus orga-nizadores o ministro do Planeja-mento Nelson Barbosa, e fruto de discussões realizadas em seminá-rio promovido pela Fundação Getulio Vargas, o livro busca mos-trar os desafios enfrentados pelo setor industrial brasileiro, além de propor formas de recuperá-lo da estagnação. Os organizadores defendem que a indústria é um setor vital para o desenvolvimento do país e deve estar no centro da matriz produtiva de qualquer nação continental como o Brasil. Nos últimos dez anos, o setor foi beneficiado pela expansão do mer-cado interno e pelo crescimento da economia, mas por outro lado perdeu competitividade devido à apreciação cambial decorrente da evolução do preço das commodities e da política macroeconômica ado-tada no Brasil e em todo o mundo. Em 24 capítulos, 36 autores discu-

Vitalidade para a indústria

tem os caminhos para o país aumentar seu desen-volvimento produtivo num cenário internacio-nal de lento crescimento e forte concorrência industrial.

Indústria e Desenvolvimento Produtivo no BrasilNelson Barbosa, Nelson Mar-coni, Mauricio Canêdo Pinheiro e Laura Carvalho (orgs.)Elsevier, 712 p., 2015.

Organizada pelo professor Ricardo Dathein, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a obra traz uma rele-vante contribuição para o debate teórico e político sobre o desen-volvimento econômico. Ao partir de concepções sobre o desenvol-vimentismo e o Estado desenvol-vimentista, os autores, divididos em dez capítulos, analisam as dife-rentes e possíveis bases teóricas atuais do tema, que, muitas vezes, são complementares. Os artigos trazem abordagens institucionalis-tas, as concepções evolucionárias ou neoschumpeterianas, a teoria keynesiana e a visão marxista, sem-pre levando em conta as experiên-cias internacionais e a história do desenvolvimento. É uma obra de referência, elaborada por profes-sores e pesquisadores ligados à área de Desenvolvimento Econô-mico do Programa de Pós-

Uma visão histórica

Desenvolvimentismo: o Conceito, as Bases Teóricas e as Políticas Ricardo Dathein (org.) UFRGS, 379 p., 2015.

Graduação em Econo-mia da UFRGS, que traz o resultado de pesquisas teóricas, com uma carac-terística comum de visão crítica ao liberalismo.

Empreendedorismo é um ter-mo só para os negócios? Não é assim que pensa Carlos Hilsdorf, que propõe que empreender é sonhar com conhecimento e ati-tude e, por este caminho, impri-mir a marca pessoal na história da humanidade e das pessoas que nos são caras. Pós-graduado em Marketing pela FGV, consultor e pesquisador dos temas que inter-ligam negócios e comportamento humano, Hilsdorf trata o empre-endedorismo de modo inovador, com consequências e repercus-sões transcendentes. Para ele: “em-preendedores e empreendedoras são pessoas comuns que aprende-ram a conhecer as suas forças e, com elas, transformar ideias, pro-jetos e sonhos em realidade. Divi-dida em três capítulos, a obra começa com uma desconstrução dos mitos envolvendo a questão

Empreender a vida

de empreender. Em seguida, o autor aponta o que seriam os dez man-damentos para dar início ao empreendedorismo de sucesso, e, por último, apresenta quatro histó-rias de pessoas que já per-correram esse caminho.

Atitudes Empreendedoras Carlos Hilsdorf Penguin Classics, 240 p., 2015.

Faltando pouco mais de um ano para os Jogos Olímpicos, o Brasil – e especialmente o Rio de Janeiro – tem inúmeros desafios para assegurar que o evento pro-pulsione desenvolvimento para a cidade, no plano econômico, esportivo e também social. Desde a escolha da sede, em 2009, pairou sobre os gestores uma série de ris-cos: o maior deles era o de que a preparação para os Jogos deixasse apenas uma sequela de dívidas enormes, com pesados ônus impostos para os habitantes da cidade durante muitos anos após a realização do evento; outro, era o de 2016 passar sem um legado rele-vante para a cidade. As Olimpía-das, no entanto, também repre-sentam uma série de oportunida-des, e é o que este livro traz em suas 320 páginas: por meio de uma série de artigos, faz uma reflexão

O Rio pós-2016

acerca dos rumos do Rio de Janeiro depois das Olimpíadas, apontando para a necessidade de um projeto de transformação para que a cidade se pre-pare para o futuro que virá.

Depois dos Jogos – Pensando o Rio para o pós-2016Fabio GiambiagiEditora Campus/Elsevier, 320p., 2015.

Trajetória das DesigualdadesMarta Arretche (org.) Unesp, 489 p., 2015.

Page 49: Rumos 281

RUMOS – 49 – Maio/Junho 2015

as editoras universitárias, geral-mente encontramos títulos que remetem a essa temática: desi-gualdade. O que a obra traz de dife-

rente para o debate? Marta Arretche – Esta obra desafia a tese segun-do a qual o Brasil teria vivido uma “inaceitável esta-bilidade” da desigualdade. Em 14 ensaios, que abordam educação e renda, políticas públicas, demografia, mercado de trabalho e participação política, o livro demonstra que, na verdade, as desi-gualdades entre os brasileiros foram muito reduzi-das nas últimas décadas, embora o país continue entre os mais desiguais do planeta. Os textos ainda deixam claro que o processo esteve estreitamente vinculado a decisões políticas, das quais, portanto, depende sua continuidade. O período analisado é um dos mais distintos econômica e politicamente já vivenciados no país, os 50 anos compreendidos entre 1960 e 2010. Os textos evocam imagens que refletem uma transição acelerada de um país de perfil rural e homogeneamente empobrecido, em que apenas 20% dos jovens de até 15 anos concluíam os quatro anos de ensino básico, para um país urbano, que praticamente uni-versalizou o acesso ao ensino fundamental, ampliou significativa-mente o alcance dos serviços públicos e aumentou em 11 anos a expectativa de vida média de sua população.

Rumos – O livro é robusto, com mais de 489 páginas, que abordam vários aspectos: educação, renda, mercado de tra-balho, em um intervalo de tempo considerável (1960-2010). Várias conquistas são apontadas, mas também desigualda-des persistem, principalmente, para mulheres, pretos e par-dos. É possível identificar por que esses grupos não acompa-nharam a evolução do país?Arretche – Na verdade, mulheres, pretos e pardos não tiveram o mesmo sucesso. Elas entraram de forma massiva no mercado de trabalho, mas em 2010, assim como os brasileiros do segundo gru-po, obtinham menores rendimentos que os homens brancos, mes-mo quando possuíam o mesmo nível de escolaridade. Os não bran-cos avançaram ainda menos, relativamente às mulheres, que se dis-tribuem por todos os extratos sociais. Embora tenha aumentado o ingresso de pretos e pardos na universidade nas últimas décadas, em 2010 os brancos ainda eram 75% da população universitária, e estavam matriculados em geral nas carreiras de maior prestígio. Em consequência, a redução das desigualdades em relação aos não brancos dentro do sistema escolar permaneceu restrita ao nível de ensino em que o acesso tornou-se universal, isto é, no ensi-no fundamental. De um lado, estes dados evidenciam que a redu-ção do “prêmio da educação” não é o único fator explicativo da

Estabilidade da desigualdade

L LIVROS

queda da desigualdade no mercado de trabalho. De outro lado, mostra que a desigualdade vai sen-do reduzida por um mecanismo de saturação, isto é, quando políticas são universalizadas em um dado patamar, tendem a se deslocar para o patamar seguinte. Rumos – Foram utilizadas como base de dados seis edições dos censos demográficos do IBGE. Qual a maior dificuldade em tra-balhar com tamanho volume de dados? Arretche – Este é um trabalho volumoso, que exigiu muito cuidado em sua montagem, bem como uma equipe tecnicamente competente. Mas, como demonstrado, não é impossível de ser realizado. Na verdade, temos hoje no Brasil uma grande disponibilidade de dados, que nos permi-tem avançar em nossa compreensão sobre os grandes fenômenos de interesse da sociedade bra-sileira.

Rumos – No livro, evidencia-se que as políti-cas públicas têm desempenhado um papel central na redu-ção das desigualdades. É uma sinalização de que somente com políticas perenes, com continuidade, é possível reverter o quadro de desigualdade?Arretche – Não apenas. É preciso continuidade nas políticas redistributivas, porque as distintas políticas têm efeitos diferentes sobre a desigualdade. A previdência pública aumenta a desigualda-de, porque paga benefícios elevados a uma pequena parcela de beneficiários, ao passo que a previdência privada reduz a desigual-dade, porque a maior parte destes aposentados recebe até dois salá-rios mínimos. Quando o salário mínimo é valorizado, há um impacto positivo sobre a queda de desigualdade. O Programa Bol-sa Família reduz a pobreza assim como reduz um pouquinho a desi-gualdade. Parte da controvérsia sobre a trajetória da desigualdade no Brasil é que muitos estudos se concentram em apenas uma dimensão e extrapolam por dedução suas inferências para as dema-is. Parte expressiva das interpretações que concluem que pouco mudou no Brasil nos últimos 50 anos é derivada de um viés negati-vo de seleção dos indicadores com pior desempenho e, sobretudo, de uma métrica móvel segundo a qual exigências mais elevadas são adotadas à medida que progressos são obtidos. O viés de seleção também afeta a interpretação que sustenta que um novo Brasil emergiu das mudanças recentes. Esta está baseada na seleção das dimensões cuja inflexão positiva foi mais destacada. Na prática, você pode enviesar a seleção das políticas que examina e concluir o que você quiser sobre o impacto do Estado. Por esta razão, em nos-so livro, destacamos um conjunto bem amplo de dimensões rele-vantes, que foram examinadas separadamente.

Livro reúne 14 ensaios que procuram criticar a ideia, bastante difundida, de que há, no país, uma estabilidade da desigualdade. Ao abordar vários aspectos, a obra mostra que foram muitos os avanços, mas alguns grupos sociais não conseguiram se beneficiar do crescimento do Brasil. Confira os destaques da publicação em uma entrevista com a cientista política Marta Arretche, organizadora do livro.

RUMOS – 48 – Maio/Junho 2015

N

Tendo como um de seus orga-nizadores o ministro do Planeja-mento Nelson Barbosa, e fruto de discussões realizadas em seminá-rio promovido pela Fundação Getulio Vargas, o livro busca mos-trar os desafios enfrentados pelo setor industrial brasileiro, além de propor formas de recuperá-lo da estagnação. Os organizadores defendem que a indústria é um setor vital para o desenvolvimento do país e deve estar no centro da matriz produtiva de qualquer nação continental como o Brasil. Nos últimos dez anos, o setor foi beneficiado pela expansão do mer-cado interno e pelo crescimento da economia, mas por outro lado perdeu competitividade devido à apreciação cambial decorrente da evolução do preço das commodities e da política macroeconômica ado-tada no Brasil e em todo o mundo. Em 24 capítulos, 36 autores discu-

Vitalidade para a indústria

tem os caminhos para o país aumentar seu desen-volvimento produtivo num cenário internacio-nal de lento crescimento e forte concorrência industrial.

Indústria e Desenvolvimento Produtivo no BrasilNelson Barbosa, Nelson Mar-coni, Mauricio Canêdo Pinheiro e Laura Carvalho (orgs.)Elsevier, 712 p., 2015.

Organizada pelo professor Ricardo Dathein, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a obra traz uma rele-vante contribuição para o debate teórico e político sobre o desen-volvimento econômico. Ao partir de concepções sobre o desenvol-vimentismo e o Estado desenvol-vimentista, os autores, divididos em dez capítulos, analisam as dife-rentes e possíveis bases teóricas atuais do tema, que, muitas vezes, são complementares. Os artigos trazem abordagens institucionalis-tas, as concepções evolucionárias ou neoschumpeterianas, a teoria keynesiana e a visão marxista, sem-pre levando em conta as experiên-cias internacionais e a história do desenvolvimento. É uma obra de referência, elaborada por profes-sores e pesquisadores ligados à área de Desenvolvimento Econô-mico do Programa de Pós-

Uma visão histórica

Desenvolvimentismo: o Conceito, as Bases Teóricas e as Políticas Ricardo Dathein (org.) UFRGS, 379 p., 2015.

Graduação em Econo-mia da UFRGS, que traz o resultado de pesquisas teóricas, com uma carac-terística comum de visão crítica ao liberalismo.

Empreendedorismo é um ter-mo só para os negócios? Não é assim que pensa Carlos Hilsdorf, que propõe que empreender é sonhar com conhecimento e ati-tude e, por este caminho, impri-mir a marca pessoal na história da humanidade e das pessoas que nos são caras. Pós-graduado em Marketing pela FGV, consultor e pesquisador dos temas que inter-ligam negócios e comportamento humano, Hilsdorf trata o empre-endedorismo de modo inovador, com consequências e repercus-sões transcendentes. Para ele: “em-preendedores e empreendedoras são pessoas comuns que aprende-ram a conhecer as suas forças e, com elas, transformar ideias, pro-jetos e sonhos em realidade. Divi-dida em três capítulos, a obra começa com uma desconstrução dos mitos envolvendo a questão

Empreender a vida

de empreender. Em seguida, o autor aponta o que seriam os dez man-damentos para dar início ao empreendedorismo de sucesso, e, por último, apresenta quatro histó-rias de pessoas que já per-correram esse caminho.

Atitudes Empreendedoras Carlos Hilsdorf Penguin Classics, 240 p., 2015.

Faltando pouco mais de um ano para os Jogos Olímpicos, o Brasil – e especialmente o Rio de Janeiro – tem inúmeros desafios para assegurar que o evento pro-pulsione desenvolvimento para a cidade, no plano econômico, esportivo e também social. Desde a escolha da sede, em 2009, pairou sobre os gestores uma série de ris-cos: o maior deles era o de que a preparação para os Jogos deixasse apenas uma sequela de dívidas enormes, com pesados ônus impostos para os habitantes da cidade durante muitos anos após a realização do evento; outro, era o de 2016 passar sem um legado rele-vante para a cidade. As Olimpía-das, no entanto, também repre-sentam uma série de oportunida-des, e é o que este livro traz em suas 320 páginas: por meio de uma série de artigos, faz uma reflexão

O Rio pós-2016

acerca dos rumos do Rio de Janeiro depois das Olimpíadas, apontando para a necessidade de um projeto de transformação para que a cidade se pre-pare para o futuro que virá.

Depois dos Jogos – Pensando o Rio para o pós-2016Fabio GiambiagiEditora Campus/Elsevier, 320p., 2015.

Trajetória das DesigualdadesMarta Arretche (org.) Unesp, 489 p., 2015.

Page 50: Rumos 281

CARTAS DO LEITOR

Redação e AdministraçãoAvenida Nilo Peçanha, 50, 11º andar Grupo 1109 Rio de Janeiro - RJ - CEP: 20020-906Telefone (21) 2109.6041Fax (21) 2109.6004

[email protected] Gerente de Comunicação - Editora Thais Sena Schettino

EquipeJader MoraesLivia Marques PimentelNoel Joaquim Faiad

Revisão Renato R. Carvalho

E C O N O M I A & D E S E N V O L V I M E N T O P A R A O S N O V O S T E M P O S

Sede: SCN – Qd. 2 - Lote D, Torre A Salas 431 a 434Centro Empresarial Liberty Mall - Brasília - DF – CEP 70712-903Telefone: (61) 2109.6500E-mail: [email protected]

Escritório: Avenida Nilo Peçanha, 50 -11º andarGrupo 1109 - Rio de Janeiro - RJ - CEP 20020-906Telefone: (21) 2109.6000Fax: (21) 2109.6004E-mail: [email protected]

CONSELHO DOS ASSOCIADOSPresidente: Luciano Coutinho

DIRETORIAPresidente: Milton Luiz de Melo Santos

1º Vice-Presidente: Marco Aurélio Crocco Afonso

2º Vice-Presidente: Ilton Luis Schwaab

Diretores: Francisco Soares, José Henrique Paim, Humberto Tannús Junior, Otto Alencar Filho, Rogério Tavares, Susana Kakuta, Valmir Rossi Secretário-Executivo: Marco Antonio A. de Araujo Lima

Publicação bimestralISSN 1415-4722

Instituições Associadas à ABDE

AFAP – Agência de Fomento do Estado do Amapá S.A.AFEAM – Agência de Fomento do Estado do Amazonas S.A.AFERR – Agência de Fomento do Estado de Roraima S.A.AGÊNCIA DE FOMENTO TOCANTINS – Agência de Fomento do Estado de TocantinsAGEFEPE – Agência de Fomento do Estado de Pernambuco S.A.AGN – Agência de Fomento do Rio Grande do Norte S.A.AGERIO – Agência Estadual de FomentoBADESC – Agência de Fomento do Estado de Santa Catarina S.A.BADESUL Badesul Desenvolvimento S.A. Agência de Fomento – – BANCO DA AMAZÔNIA – Banco da Amazônia S.A.BANCOOB – Banco Cooperativo do Brasil S.A.BANDES – Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo S.A.BANPARÁ – Banco do Estado do Pará S.A.BB – Banco do Brasil S.A.BDMG – Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais S.A.BNB – Banco do Nordeste S.A.BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e SocialBRDE – Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo SulBRB – Banco de BrasíliaCAIXA – Caixa Econômica FederalDESENBAHIA – Agência de Fomento do Estado da Bahia S.A.DESENVOLVE – Agência de Fomento de Alagoas S.A.DESENVOLVE SP – Agência de Desenvolvimento PaulistaFINEP – Inovação e PesquisaFOMENTO PARANÁ – Agência de Fomento do Paraná S.A.GOIÁSFOMENTO – Agência de Fomento de Goiás S.A.MT FOMENTO – Agência de Fomento do Estado de Mato Grosso S.A.PIAUÍ FOMENTO – Agência de Fomento e Desenvolvimento do Estado do Piauí S.A.SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

Capa Noel Joaquim Faiad

Impressão e CTP J. Sholna Reproduções Gráficas

Distribuição SVD/Sistemas de Venda Direta

Conselho EditorialMilton Luiz de Melo Santos, João Paulo dos Reis Velloso, Maurício Borges Lemos e Thais Sena Schettino.

As matérias assinadas são de responsabilidade de seus autores, não refletindo, necessariamente, a opinião da ABDE. Sua reprodução é livre em qualquer outro veículo de comunicação, desde que citada a fonte.

RUMOS – – Maio/Junho 2015 50

@

Ano 39 – Nº 281 Maio/Junho 2015

EstudanteSou estudante de Ciências Sociais, da Universidade de São Paulo (USP), e estou interessada em um artigo publicado por vocês no volu-me v. 29, nº 222, da revista Rumos. Trata desse artigo: LIMONGI, Fer-nando. Reforma política: verdades e sofismas. Rumos, Brasília, DF, v. 29, nº 222, p. 4-8, jul/ago 2005. Como no site da ABDE só está dispo-nível a partir do nº 257, por gentileza, vocês tem algum material refe-rente a este artigo para compartilhar comigo? É de extrema importân-cia para completar a minha pesquisa bibliográfica sobre o tema. Roberta Borges. Instituto Ethos. São Paulo (SP)

BibliotecáriaRecebemos e agradecemos revista Rumos, v. 39, n. 280, mar/abr 2015.Solicitamos receber regularmente por doação, para compor o acervo da nossa biblioteca.Maria Socorro Oliveira Campos. Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Salvador (BA).

Errata: Reproduzimos abaixo o quadro que foi publicado de forma incompleta em nossa última edição, no artigo “Microcrédito e Desen-volvimento Produtivo na Bolívia”, páginas 44 e 45, de autoria do eco-nomista Andrej Slivnik.

Participação das operações de microcrédito no setor bancário e no PIB – Bolívia

Fonte: Instituto Nacional de Estatística, Bolívia. Elaboração própria.

3,5 4,0 5,8 5,9 7,5 8,3

13,9 14,2 18,7 18,3 21,5 22,2

2008 2009 2010 2011 2012 2013

Carteira bruta de operações de microcrédito / PIB (%)

Carteira bruta de operações de microcrédito / carteira bruta total do setor bancário (%)

Acesse: www.abde.org.br

Leia a revista e consulte as edições passadas.

DIGITAL

Page 51: Rumos 281

Edição 2015

Prêmio ABDE-BID

Veja o regulamento em:www.abde.org.br

Inscreva sua monogra�aaté o dia 23 de agosto

Realização

Page 52: Rumos 281