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Revista Brasileira de Sementes, vol. 28, nº 1, p.72-78, 2006 72 SECAGEM E ARMAZENAMENTO DE SEMENTES DE Eugenia brasiliensis LAM. (GRUMIXAMEIRA) 1 SUELI KOHAMA 2 , ANGELA MARIA MALUF 3 , DENISE AUGUSTA CAMARGO BILIA 4 , CLAUDIO JOSÉ BARBEDO 5 RESUMO - Há grande demanda por pesquisas com espécies arbóreas nativas do Brasil, principalmente quanto à qualidade fisiológica de suas sementes. Visando avaliar o grau de tolerância à dessecação e a capacidade de armazenamento das sementes de grumixameira (Eugenia brasiliensis), frutos maduros foram coletados em Mogi-Guaçu, SP. Após a colheita, as sementes foram extraídas, lavadas e secas a 36ºC, reduzindo seu teor de água inicial de 48,9% (base úmida) para até 23,6% (última secagem), totalizando cinco níveis de secagem. Amostras de sementes de cada nível de secagem foram armazenadas em sacos plásticos, a 7ºC, até 270 dias. Os resultados mostraram que a redução do teor de água para valores inferiores a 43,1% prejudicou tanto a germinabilidade quanto a capacidade de conservação em armazenamento das sementes. Sementes com 48,9% de água apresentaram 60% de germinação após 180 dias de armazenamento e 19% após 270 dias, quando mantidas em sacos plásticos e em câmara fria. Concluiu-se que sementes de E. brasiliensis podem ser armazenadas por 180 dias a 7ºC e são sensíveis à secagem a 36ºC. Termos para indexação: conservação, dessecação, germinação, Myrtaceae. DRYING AND STORAGE OF Eugenia brasiliensis LAM. (“GRUMIXAMEIRA”) SEEDS ABSTRACT - There is an increasing need for investigations of the Brazilian native tree species, mainly the physiological quality of their seeds. To evaluate the desiccation tolerance and storability of Eugenia brasiliensis seeds, mature fruits collected at Mogi-Guaçu, SP, Brazil and their seeds were removed by washing and were dried at 36ºC until their water content was reduced from 48.9% (fresh seeds, wet basis) to 23.6% (final drying), totaling five drying levels. Samples of each drying level were stored at 7ºC in plastic bags for 270 days. Results showed that water content lower than 43.1% decreased both germinability[germination potential] and storability. Seeds with 48.9% water content showed 60% germination after 180 days and 19% after 270 days of storage inside plastic bags in a cold chamber. We concluded that E. brasiliensis seeds can be stored for 180 days at 7ºC and are intolerant to drying at 36ºC. Index terms: conservation, desiccation, germination, Myrtaceae. 1 Submetido em 08/03/2004; Aceito para publicação em 02/06/2005; 2 Bióloga, ex-bolsista PIBIC/CNPq; 3,4 Eng. Agrônomo, Dr., Pesquisador do Instituto de Botânica, Caixa Postal 4005, São Paulo, SP, CEP 01061-970. [email protected]; [email protected]; 5 Eng. Agrônomo, Dr., bolsista Produtividade CNPq, Pesquisador do Instituto de Botânica. [email protected]. Autor para correspondência. INTRODUÇÃO O Brasil possui considerável área de mata nativa com grande variedade de árvores frutíferas ainda pouco estudadas, muitas com potencial de aproveitamento pouco explorado e com falta de estudos que permitam a implantação de pomares comerciais. Na família Myrtaceae encontram-se várias espécies nessa condição, especialmente dentro do gênero Eugenia (Bülow et al., 1994). Apesar de alguns estudos já desenvolvidos visando à conservação da viabilidade de sementes de espécies desse gênero (Rizzini, 1970; Bülow et al., 1994; Barbedo et al., 1998; Anjos e Ferraz, 1999; Gentil e Ferreira, 1999; Maluf et al., 2003), muitas ainda não apresentam tecnologia que permita seu armazenamento por períodos prolongados (Lorenzi, 1992, 2002). A qualidade inicial das sementes, entendida como

Secagem e Armazenamento de Sementes de Eugenia Brasiliensis

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  • S. KOHAMA et al.

    Revista Brasileira de Sementes, vol. 28, n 1, p.72-78, 2006

    72

    SECAGEM E ARMAZENAMENTO DE SEMENTES DE Eugenia brasiliensis LAM.(GRUMIXAMEIRA)1

    SUELI KOHAMA2, ANGELA MARIA MALUF3, DENISE AUGUSTA CAMARGO BILIA4, CLAUDIO JOS BARBEDO5

    RESUMO - H grande demanda por pesquisas com espcies arbreas nativas do Brasil,principalmente quanto qualidade fisiolgica de suas sementes. Visando avaliar o grau de tolerncia dessecao e a capacidade de armazenamento das sementes de grumixameira (Eugeniabrasiliensis), frutos maduros foram coletados em Mogi-Guau, SP. Aps a colheita, as sementesforam extradas, lavadas e secas a 36C, reduzindo seu teor de gua inicial de 48,9% (base mida)para at 23,6% (ltima secagem), totalizando cinco nveis de secagem. Amostras de sementes decada nvel de secagem foram armazenadas em sacos plsticos, a 7C, at 270 dias. Os resultadosmostraram que a reduo do teor de gua para valores inferiores a 43,1% prejudicou tanto agerminabilidade quanto a capacidade de conservao em armazenamento das sementes. Sementescom 48,9% de gua apresentaram 60% de germinao aps 180 dias de armazenamento e 19% aps270 dias, quando mantidas em sacos plsticos e em cmara fria. Concluiu-se que sementes de E.brasiliensis podem ser armazenadas por 180 dias a 7C e so sensveis secagem a 36C.

    Termos para indexao: conservao, dessecao, germinao, Myrtaceae.

    DRYING AND STORAGE OF Eugenia brasiliensis LAM. (GRUMIXAMEIRA) SEEDS

    ABSTRACT - There is an increasing need for investigations of the Brazilian native tree species,mainly the physiological quality of their seeds. To evaluate the desiccation tolerance and storabilityof Eugenia brasiliensis seeds, mature fruits collected at Mogi-Guau, SP, Brazil and their seedswere removed by washing and were dried at 36C until their water content was reduced from 48.9%(fresh seeds, wet basis) to 23.6% (final drying), totaling five drying levels. Samples of each dryinglevel were stored at 7C in plastic bags for 270 days. Results showed that water content lower than43.1% decreased both germinability[germination potential] and storability. Seeds with 48.9% watercontent showed 60% germination after 180 days and 19% after 270 days of storage inside plasticbags in a cold chamber. We concluded that E. brasiliensis seeds can be stored for 180 days at 7Cand are intolerant to drying at 36C.

    Index terms: conservation, desiccation, germination, Myrtaceae.

    1 Submetido em 08/03/2004; Aceito para publicao em 02/06/2005;2 Biloga, ex-bolsista PIBIC/CNPq;3,4 Eng. Agrnomo, Dr., Pesquisador do Instituto de Botnica, Caixa Postal

    4005, So Paulo, SP, CEP 01061-970. [email protected];[email protected];

    5Eng. Agrnomo, Dr., bolsista Produtividade CNPq, Pesquisador do Institutode Botnica. [email protected]. Autor para correspondncia.

    INTRODUO

    O Brasil possui considervel rea de mata nativa comgrande variedade de rvores frutferas ainda pouco estudadas,muitas com potencial de aproveitamento pouco explorado ecom falta de estudos que permitam a implantao de pomarescomerciais. Na famlia Myrtaceae encontram-se vriasespcies nessa condio, especialmente dentro do gnero

    Eugenia (Blow et al., 1994). Apesar de alguns estudos jdesenvolvidos visando conservao da viabilidade desementes de espcies desse gnero (Rizzini, 1970; Blow etal., 1994; Barbedo et al., 1998; Anjos e Ferraz, 1999; Gentil eFerreira, 1999; Maluf et al., 2003), muitas ainda noapresentam tecnologia que permita seu armazenamento porperodos prolongados (Lorenzi, 1992, 2002).

    A qualidade inicial das sementes, entendida como

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    intrnseca s mesmas por ocasio de sua colheita, deve serpreservada, tanto quanto possvel, at que sejam utilizadaspara semeadura (Carneiro e Aguiar, 1993). A preservao daqualidade fisiolgica das sementes fundamental para amanuteno dos bancos de germoplasma e no processo derepovoamento da vegetao em reas degradadas, pois permiteo uso de espcies vegetais em pocas e locais diferentes aosde sua origem.

    Diversas tcnicas so, com freqncia, estudadas embusca de melhores condies de armazenamento, sendo quea principal tcnica de conservao de sementes durante oarmazenamento , ainda, a reduo do seu metabolismo, sejaatravs da remoo da gua ou da diminuio da temperatura.Contudo, vrias espcies tropicais, principalmente arbreasnativas do Brasil, so intolerantes dessecao aos nveisdesejveis para conservao em armazenamento, o que requero desenvolvimento de tecnologias especficas para suaconservao.

    Sementes de grumixameira (Eugenia brasiliensis Lam.,Myrtaceae) so consideradas de curta longevidade, sendorecomendada sua semeadura imediatamente aps sua coleta(Lorenzi, 1992). Contudo, no h estudos cientficos queavaliem o grau de sensibilidade dessas sementes dessecaoou, ainda, s baixas temperaturas.

    A grumixameira ocorre nas regies da mata litornea doBrasil, desde o sul da Bahia at Santa Catarina. Possui folhasgrandes e coriceas, flores com ovrio liso, florescendo apartir do final do ms de setembro at novembro, comamadurecimento dos frutos em novembro e dezembro. Asrvores apresentam boas caractersticas para o paisagismo,devido ao pequeno porte e forma estreita da copa. Os frutos,amarelos ou pretos, so saborosos, com bom potencial tantopara consumo in natura quanto para a industrializao. Estacaracterstica interessante, tambm, para seu uso emreflorestamentos heterogneos, pois facilita a recuperao daavifauna (Lorenzi, 1992).

    Considerando a dificuldade atual em se conservar aviabilidade das sementes de grumixameira durante seuarmazenamento, no presente trabalho visou-se avaliar o graude tolerncia dessecao dessas sementes e ampliao dasua capacidade de armazenamento atravs da secagem e dareduo da temperatura.

    MATERIAL E MTODOS

    Obteno e beneficiamento do material vegetal -Frutos de grumixameira (Eugenia brasiliensis Lam.), de dois

    bitipos (frutos amarelos e frutos roxos), foram coletados dervores plantadas em pomar na Reserva Biolgica e EstaoExperimental de Moji-Guau, SP (2215-16S, 478-12W),apresentando colorao totalmente amarelo intenso e roxaescura, respectivamente para aqueles dois bitipos.

    Aps as coletas, os frutos foram transportados aoLaboratrio da Seo de Sementes e Melhoramento Vegetal,do Instituto de Botnica, em So Paulo. A extrao dassementes foi feita manualmente com auxlio de peneira e guacorrente. Aps a lavagem, as sementes foram colocadas sobrepapel filtro por 12 horas para retirar o excesso de gua e,ento, submetidas a pr-seleo dos lotes, visando padronizao de tamanho das sementes, por meio de peneirade crivo circular de 7mm, utilizando-se apenas as sementesretidas.

    Avaliao da qualidade das sementes - Paradeterminao do teor de gua, foram tomadas quatro repetiescom 20 sementes cada, sendo utilizado o mtodo da estufa a1053C, durante 24 horas (Brasil, 1992). Os resultados foramexpressos em porcentagem, em base mida.

    O teste de germinao foi realizado em cmarasincubadoras BOD, reguladas para temperatura constante de30C e regime de 12 horas dirias de luz. As sementes foramacondicionadas em rolos de papel (Brasil, 1992), umedecidoscom gua destilada at o limite de saturao. Foram instaladasquatro repeties de 20 sementes. A germinao foi avaliadaaos 30 e aos 45 dias, registrando-se as sementes com protrusode raiz primria (sementes germinveis) e as plntulas normais(germinao), estas caracterizadas pela presena de raizprimria desenvolvida e parte area proporcional ao tamanhoda raiz primria, ambas sem defeitos aparentes, produzidas apartir de cada semente. Com estas avaliaes obtiveram-se,respectivamente, as porcentagens de sementes germinveis(somatria das sementes que emitiram raiz primria at a ltimaavaliao), de germinao (plntulas normais obtidas at altima avaliao) e da primeira contagem da germinao(plntulas normais obtidas na avaliao aos 30 dias).

    A condutividade eltrica da soluo de embebio (CESE)das sementes foi avaliada por meio de quatro repeties de 20sementes, pesadas e colocadas em copos plsticos contendo75mL de gua destilada e deionizada, mantidas em cmarastipo BOD a 251C por 24 horas. Aps esse perodo, acondutividade eltrica da soluo foi medida emcondutivmetro de bancada para solues aquosas modeloCA-150, com medidor tipo caneta e faixa de leitura de 0 a20.000mS em quatro escalas. Os resultados foram divididospelo peso inicial das amostras de sementes e expressos em

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    mS.g-1.cm-1.Secagem das sementes - As amostras das sementes

    retiradas de cada lote inicial (lote do bitipo de frutos amarelose do bitipo de frutos roxos) foram denominadas controlee o restante de cada lote foi submetido a secagem em estufacom circulao forada de ar, regulada para 362C, parareduzir o teor de gua das sementes para valores prximos a40, 35, 30 e 25%, denominados nveis de secagem. Umaamostra de cada lote foi utilizada para controle da perda depeso e clculo do teor de gua provvel do lote ao longo dasecagem. Os tempos necessrios para atingir valoresaproximados queles teores de gua foram, respectivamente,20, 40, 65 e 95 horas.

    Armazenamento das sementes - amostras de sementesde cada nvel e de cada lote foram armazenadas em sacosplsticos (PVC) perfurados (10 furos de, aproximadamente,1mm cada), em cmara fria (71C, 457% UR). Essassementes foram avaliadas quanto sua qualidade fisiolgicaimediatamente aps a secagem e aos 45, 90, 180 e 270 diasde armazenamento.

    Delineamento experimental e anlise estatstica -Os experimentos foram instalados em delineamentointeiramente casualizado, com quatro repeties, em esquemafatorial 2x5x5 (bitipo x nvel de secagem x perodo dearmazenamento), exceto para o teor de gua das sementesque teve esquema 2x5x4, em razo da falta de sementes paraa avaliao do teor de gua no ltimo perodo dearmazenamento (270 dias). Os resultados foram submetidos anlise de varincia (p = 0,05) e as mdias foram comparadasentre si pelo teste de Tukey, com os valores em porcentagemsendo analisados aps transformao para arc sen (%/100)0,5,conforme Steel e Torrie (1980). Os dados de germinao,sementes germinveis e primeira contagem da germinaoem funo do perodo de armazenamento foram submetidos

    anlise de regresso polinomial.

    RESULTADOS E DISCUSSO

    A anlise dos valores obtidos para teor de gua desementes de grumixameira no apresentou interaosignificativa entre os trs fatores. Apenas a interao duplaentre nveis de secagem e perodos de armazenamento foisignificativa. Assim, considerou-se que o teor inicial de guadas sementes de ambos os bitipos foi 48,9% (Tabela 1).Esse elevado valor situa-se entre os verificados em sementesde outras espcies de Eugenia nativas do Brasil, tais como E.involucrata (61-63%), conforme Barbedo et al. (1998) e Malufet al. (2003), E. dysenterica DC (47-53%), segundo Andradeet al. (2003) e E. stipitata ssp. sororia (58,8% e 59-66%), deacordo com Gentil e Ferreira (1999) e Anjos e Ferraz (1999),respectivamente.

    O primeiro nvel de secagem obtido resultou em teor degua de 43,1% (Tabela 1), ligeiramente acima do programado(40%); contudo, o segundo nvel resultou em teor de gua de35,1% (Tabela 1), conforme pretendido. Os dois ltimos nveisde secagem resultaram em teores de gua de 27,2% e 23,6%(Tabela 1), ligeiramente abaixo daqueles pr-estabelecidos (30e 25%, respectivamente).

    O armazenamento em sacos plsticos perfurados,mantidas em cmara fria, permitiu que as sementesapresentassem pequenas variaes no teor de gua queatingiram aps a secagem, sendo de 1,8 pontos percentuaisno 4 nvel e de 3,5 pontos percentuais no 2 nvel (Tabela 1).Em razo da falta de suficiente quantidade de sementes aofinal dos 270 dias de armazenamento, optou-se por no avaliaro teor de gua das sementes no ltimo perodo dearmazenamento.

    A secagem das sementes de grumixameira temperatura

    Nveis de Perodo de armazenamento (dias) CESE

    secagem Zero 45 90 180 ( S.g-1.cm

    -1)

    Teor de gua (%)Controle 48,9 aAB 48,3 aB 49,4 aAB 51,0 aA 5,14 a1 nvel 43,1 bA 43,0 bA 44,3 bA 45,1 bA 6,73 a

    2 nvel 35,1 cB 37,3 cAB 37,8 cA 38,6 cA 11,21 b3 nvel 27,2 dAB 28,9 dA 25,5 dB 28,9 dA 17,24 c4 nvel 23,6 eA 22,0 eA 22,5 eA 21,8 eA 20,46 d

    CV (%) 4,9 % 37,4 %

    TABELA 1. Teor de gua (%) e condutividade eltrica da soluo de embebio (CESE, sem armazenamento) de sementes desementes de dois bitipos de grumixameira (Eugenia brasiliensis Lam.), em funo dos nveis de secagem e armazenadaspor 0 (inicial), 45, 90 e 180 dias

    Mdias seguidas pela mesma letra, minscula na coluna e maiscula na linha, no diferem entre si pelo teste de Tukey, em nvel de probabilidade de 5%.

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    de 362C, de maneira geral, prejudicou tanto a capacidadede iniciar a germinao (sementes germinveis) quanto a deproduzir plntulas normais (germinao), conforme observadona Tabela 2. As sementes de grumixameira amarelamostraram-se mais sensveis primeira reduo no teor degua (de 48,9 para 43,1%) do que as da grumixameira roxaque s apresentaram reduo significativa na germinao apartir do segundo nvel de secagem, ou seja, quando houvereduo do teor de gua para valores iguais ou inferiores a35,1%.

    Analisando-se a influncia dos nveis de secagem eperodos de armazenamento na germinao (Figura 1) e nassementes germinveis (Figura 2), verificou-se que, para ambosos bitipos, o prejuzo qualidade fisiolgica das sementesocorreu imediatamente aps a secagem. Tal efeito prejudicialfoi evidente a partir do segundo nvel de secagem e, ento,foi tanto maior quanto mais intensa a secagem, atingindovalores praticamente nulos quando o teor de gua atingiu 23,6%(Tabela 2 e Figura 1). Assim sendo, sementes de grumixameirapodem ser classificadas como no anidrobiticas (Hoekstraet al., 2001), ou seja, so intolerantes dessecao ou aexposio temperatura de a 362C por perodos prolongadoscausou efeitos fisiolgicos prejudiciais.

    Sementes de espcies brasileiras de Eugenia apresentam-se como sensveis secagem, mesmo ao sofrerem pequenasredues do teor de gua. Alm dos resultados apresentadosneste trabalho, para sementes de grumixameira de dois bitipos(roxo e amarelo), as sementes de E. involucrata (Barbedo etal., 1998; Maluf et al., 2003), E. dysenterica (Andrade et al.,2003) e E. stipitata ssp. sororia (Gentil e Ferreira, 1999)mostraram tambm acentuada sensibilidade secagem.

    A reduo na capacidade germinativa das sementes coma secagem tambm foi acompanhada por aumento nos valoresde condutividade eltrica da soluo de embebio (Tabela1), para ambos os bitipos, a partir do 1 nvel de secagem

    nas sementes sem armazenamento. Tal fato sugere que asecagem pode ter danificado a integridade do sistema demembranas celulares, conforme descrito por Vieira (1994).Alm disso, os resultados de CESE indicam que esse testetem potencial para ser utilizado em avaliaes rpidas daqualidade das sementes de grumixameira, como demonstradopara sementes de Inga uruguensis (Barbedo e Cicero, 1998).

    Embora a germinao das sementes de grumixameira roxano tenha sido reduzida aps o primeiro nvel de secagem, osresultados da primeira contagem do teste de germinaoevidenciaram que a qualidade fisiolgica das sementes foisignificativamente prejudicada j nesse nvel (Tabela 3), ouseja, ao reduzir o teor de gua de 48,9 para 43,1%. As sementesno submetidas secagem produziram 52% de plntulasnormais, 30 dias aps o incio do teste de germinao,porcentagem cerca de uma vez e meia maior que as do primeironvel de secagem (35%). Dessa forma, pode-se considerarque o teor de gua crtico, entendido como aquele abaixo doqual se inicia a reduo da qualidade fisiolgica (em sementesno anidrobiticas), seja superior a 43% para sementes degrumixameira que, segundo observaes em sementes deespcies arbreas tropicais brasileiras (Barbedo et al., 1998;Bilia et al., 1999; Martins et al., 1999; Andrade, 2001; Andradeet al., 2003; Maluf et al., 2003), estaria situado entre os maiselevados.

    Por sua vez, o teor de gua letal, entendido como aquelemnimo para a manuteno da viabilidade das sementes noanidrobiticas, inferior a 23,6% para sementes degrumixameira, uma vez que 8% das sementes submetidas secagem at o quarto nvel ainda iniciaram a germinao eapresentaram protruso de raiz primria (dados noapresentados), imediatamente aps a secagem. importantesalientar, contudo, que a elevada temperatura de secagem(362C) pode ter exercido alguma influncia, ainda que tenhasido prxima recomendada para a secagem de sementes

    Nveis de Teor de gua Bitipos Bitipos

    secagem (%) Amarelo Roxo Amarelo Roxo

    Germinao (%) Sementes germinveis (%)Controle 48,9 54 aB 64 aA 69 aB 76 aA1 nvel 43,1 37 bB 55 aA 52 bB 70 aA

    2 nvel 35,1 9 cA 11 bA 22 cA 22 bA3 nvel 27,2 2 dA 1 cA 4 dA 2 cA4 nvel 23,6 0 dA 0 cA 0 eA 0 cA

    CV (%) 29,3 23,0

    TABELA 2. Germinao (%) e sementes germinveis (%) de grumixameira (Eugenia brasiliensis Lam.), de dois bitipos (amareloe roxo), submetidas a diferentes nveis de secagem (mdias dos cinco perodos de armazenamento)

    Mdias seguidas pela mesma letra, minscula na coluna e maiscula na linha, no diferem entre si pelo teste de Tukey, em nvel de probabilidade de 5%.

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    com mais de 18% de gua (32C), conforme Carvalho eNakagawa (2000).

    A longevidade das sementes de grumixameira emarmazenamento considerada bastante curta e, em razo disso,recomendvel a semeadura logo que colhidas (Lorenzi, 1992).Contudo, os resultados obtidos no presente trabalho mostramque, desde que mantidas sob baixa temperatura (7C), possvel armazenamento por, no mnimo, seis meses (Figura1), com 60% das sementes podendo produzir plntulas

    normais e por at nove meses (Figuras 1 e 2), com cerca de30% das sementes podendo ainda iniciar a germinao e 20%produzir plntulas normais. Embora estes perodos sejam aindacurtos quando comparados com sementes anidrobiticaslongevas, so suficientemente longos para no exigir asemeadura de todo o lote de sementes imediatamente apssua colheita, o que permite o emprego de estratgias desemeadura e armazenamento dos lotes de sementes.

    Durante o armazenamento das sementes ficou ainda maisevidente o prejuzo qualidade fisiolgica decorrente dassecagens. Se, por um lado, as sementes submetidas aoprimeiro nvel de secagem no apresentaram reduesexpressivas quanto qualidade fisiolgica em relao s nosubmetidas secagem, por outro sua capacidade dearmazenamento foi prejudicada, principalmente quandoanalisados os resultados de germinao aos 270 dias (Figura1) e os de primeira contagem aos 180 dias (Figura 3). interessante notar que a partir do terceiro nvel de secagem,ao reduzir o teor de gua de 48,9 para 27,2% (Tabela 1), assementes perderam a capacidade de conservao da suaviabilidade, apresentando germinao praticamente nula a partirdos primeiros 45 dias de armazenamento. Alm disso, mesmono segundo nvel de secagem, com reduo do teor de guade 48,9 para 35,1% (Tabela 1), a germinao foi bastante

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    armazenamento (dias)

    Germ

    inao(%

    )

    FIGURA 1. Germinao de sementes de grumixameira (Eugeniabrasiliensis Lam.), submetidas a diferentes nveisde secagem e armazenadas por 270 dias. Controle(linha contnua, o): Y=70,754+0,078X-0,0096X2,r2=0,83; 1 nvel (linha tracejada, ): Y=65,311-0,032X-0,0006X2, r2=0,87; 2 nvel (linhapontilhada, +): Y=48,578-0,528X-0,0013X2, r2=0,87;3e 4 nveis: valores nulos a partir do primeiroperodo de armazenamento. Mdias dos dois bitipos,Amarelo e Roxo. Coeficiente de variao = 17,63%.

    Nveis de Teor de gua Bitipos

    secagem (%) Amarelo Roxo

    Controle 48,9 41 aB 52 aA1 nvel 43,1 18 bB 35 bA2 nvel 35,1 5 cA 5 cA

    3 nvel 27,2 0 dA 0 dA4 nvel 23,6 0 dA 0 dA

    CV (%) 33,6

    TABELA 3. Primeira contagem do teste de germinao (%) desementes de grumixameira (Eugenia brasiliensisLam.) de dois bitipos (amarelo e roxo), submetidasa diferentes nveis de secagem (mdias dos cincoperodos de armazenamento)

    Mdias seguidas pela mesma letra, minscula na coluna e maiscula na linha,no diferem entre si pelo teste de Tukey, em nvel de probabilidade de 5%.

    0

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    0 90 180 270

    armazenamento (dias)

    Sementesgerm

    inveis(%

    )

    FIGURA 2. Sementes germinveis de grumixameira (Eugeniabrasiliensis Lam.), submetidas a diferentes nveisde secagem e armazenadas por 270 dias. Controle(linha contnua, o): Y=82,632+0,105X-0,0011X2,r2=0,91; 1 nvel (linha tracejada, ): Y=81,639-0,091X-0,0005X2, r2=0,87; 2 nvel (linhapontilhada, +): Y=68,740-0,616X-0,0014X2, r2=0,90;3e 4 nveis: valores nulos a partir do primeiroperodo de armazenamento. Mdias dos dois bitipos,Amarelo e Roxo. Coeficiente de variao = 13,19%.

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    reduzida j a partir dos primeiros perodos de armazenamento(Figura 1). Para a obteno de lotes de sementes, prticaainda comum, em se tratando de sementes de espciesarbreas tropicais, recomendar a colheita de frutos logo apsa sua queda e, em alguns casos, extrair e expor as sementesao sol para uma ligeira secagem inicial. Os resultadosapresentados no presente trabalho evidenciam que, parasementes de grumixameira, tal prtica poderia ser prejudicial qualidade fisiolgica das sementes e, talvez por isso, taissementes sejam consideradas de curta viabilidade emarmazenamento. O prejuzo desta secagem inicial das sementestambm foi observado em outras espcies arbreas tropicaisbrasileiras (Barbedo et al., 1998; Maluf et al., 2003).

    Sementes intolerantes dessecao, muitas vezesdenominadas recalcitrantes, so freqentementeconsideradas tambm intolerantes a temperaturas inferiores a15C (Chin e Roberts, 1980; Ellis, 1984). Pelos resultadosobtidos neste trabalho, verifica-se que as sementes degrumixameira, embora intolerantes dessecao, mantiveramsua capacidade germinativa quando submetidas temperaturainferior a 15C por perodos prolongados (Figura 1),contrariando o comportamento descrito acima. Deve-sesalientar que os estudos com sementes de espcies arbreas

    tropicais so relativamente recentes. Porm, h suficienteinformao na literatura para que a associao entre intolerncia dessecao e sensibilidade a baixas temperaturas sejaquestionvel. Apenas como exemplos de sementes intolerantes dessecao que se conservaram bem sob baixa temperaturapodem ser citadas as das espcies Inga edulis (Bacchi, 1961),Euterpe espiritosantensis (Martins et al., 2000), Ingauruguensis (Bilia et al., 1999; Barbedo e Cicero, 2000),Eugenia dysenterica (Andrade et al., 2003) e E. involucrata(Barbedo et al., 1998; Maluf et al., 2003).

    Finalmente, novos estudos de secagem com diferentestemperaturas so importantes para verificar tanto os efeitosda temperatura elevada quanto os da velocidade de secagem,como os realizados para cerejeira (Eugenia involucrata), porBarbedo et al. (1998) e Maluf et al. (2003), bem como sistemascontnuos e alternados de secagem.

    CONCLUSES

    Sementes de grumixameira (Eugenia brasiliensisLam.), com teor de gua prximo a 50%, mantidas em cmarafria a 7C, preservam a viabilidade por at 180 dias.

    As sementes de grumixameira so sensveis secagem a temperatura de 362C.

    AGRADECIMENTOS

    Aos funcionrios da Fazenda Campininha, em Mogi-Guau, pela coleta dos frutos; aos funcionrios e estagiriosdo Laboratrio de Sementes do Instituto de Botnica, peloauxlio nos experimentos; ao CNPq, pelas bolsas de iniciaocientfica de S. Kohama e de produtividade de C.J. Barbedo; FAPESP, pelo apoio financeiro ao projeto.

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    0

    20

    40

    60

    80

    100

    0 90 180 270

    armazenamento (dias)

    Primeiracontagem

    dagerm

    ina,co(%

    )

    FIGURA 3. Primeira contagem do teste de germinao desementes de grumixameira (Eugenia brasiliensisLam.), submetidas a diferentes nveis de secagem earmazenadas por 270 dias. Controle (linha contnua,o): Y=57,156+0,162X-0,0012X2, r2=0,87; 1 nvel(linha tracejada, ): Y=40,244+0,094X-0,0009X2,r2=0,80; 2 nvel (linha pontilhada, +): Y=26,918-0,260X-0,0006X2, r2=0,77; 3e 4 nveis: valoresnulos a partir do primeiro perodo de armazenamento.Mdias dos dois bitipos, Amarelo e Roxo. Coeficientede variao = 24,31%.

  • S. KOHAMA et al.

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