Delimitao do Tema

A estruturao do espao urbano pressupe a definio de formas especficas de uso e aproveitamento. Contudo, as formas de ocupao e uso dos espaos vo sendo redefinidas pelos indivduos no seu quotidiano em funo das suas necessidades e seus interesses. So estas formas quotidianas de ocupao e uso dos espaos que originam conflitos entre os indivduos. Neste estudo, pretendemos estudar o conflito existente entre os diferentes actores sociais no que diz respeito a ocupao e uso dos passeios nas cidades. Pretendemos argumentar que a ocorrncia dos conflitos no uso dos passeios no deriva da forma como o espao estruturado, mas sim do choque dos interesses dos actores sociais quanto a sua ocupao.

O estudo ser feito na baixa da cidade de Maputo, especificamente nas avenidas 25 de Setembro e Guerra Popular. Nestes espaos encontramos passeios sendo ao mesmo tempo ocupados pelos vendedores informais, pelos automobilistas, assim como pelos pees, o que vai nos permitir compreender a relao conflitual que estes tm ao procurarem ocupar o usar o passeio como um espao dentro do contexto urbano.

O estudo ser feito entre os anos 2014 a 2015, sendo estas balizas cronolgicas nas quais se vai realizar o trabalho de campo, pois vamos trabalhar com aqueles indivduos que sero encontrados a ocupar a fazer uso dos passeios no momento em que formos a realizar o trabalho de campo. Os indivduos que constituem o universo populacional so os vendedores informais que estaro a disputar os passeios com os automobilistas, sero estes automobilistas, assim como pees que disputam a ocupao e uso dos passeios uns com os outros.

Reviso de Literatura

Nesta parte do trabalho vamos trazer seis autores que falam sobre a ocupao do espao nas cidades. Muitos destes autores fizeram seus estudos em Brasil e alguns fizeram seus estudos em Moambique.

Barroso (2011), fez um estudo que tinha como tema Conquistei meu espao dia-a-dia estudo etnogrfico sobre a ocupao do espao pblico pelos vendedores ambulantes no Brasil. O autor defende que a ocupao do espao que se d atravs de prticas sociais do trabalho informal, reflecte uma negociao da realidade que organiza esse espao atravs de diferentes vises de mundo, estetizando o comrcio popular.

Neste estudo, o autor afirma que o passeio um espao onde os vendedores ocupam constituindo o que designam de aura esttica de comrcio popular. Assim, o primeiro passo do vendedor procurar um espao vazio que ainda no tenha sido ocupado por outro vendedor. A conquista do espao est directamente ligada conquista dos indivduos, pois atravs do repasse de mercadoria, apoio emocional e ajudas no dia-a-dia, as trocas sociais vo se intensificando numa srie de redes de solidariedades que alocam e acomodam o novo vendedor na rua.

Neste estudo, o autor conclui que neste caso, o palco do desenrolar das prticas sociais desses trabalhadores urbanos a rua, de maneira ampla, l um lugar de luta, confuso e insegurana. Assim, os vendedores ambulantes se apropriam dos passeios numa espcie de "contra-uso do que se pretendia como uso do espao pblico. No espao pblico so construdas fronteiras simblicas que ordenam as relaes entre os diferentes agrupamentos sociais e, assim, os vendedores ambulantes atravessam diferentes territorialidades flexveis.

Podemos notar que o facto de os vendedores fazerem contra-uso do espao que faz com que ocorram conflitos entre os diferentes actores sociais. Neste sentido, o significado que estes vendedores atribuem ao espao urbano, tornando-o sua propriedade define os limites e as possibilidades de outros ocuparem.

Bezerra (2009), no seu estudo Representaes e classificaes de um espao urbano requalificado tinha como objectivo analisar os usos, as apropriaes espaciais e as disputas simblicas num bairro requalificado. Neste estudo, a autora defendia a ideia de que as classificaes, a respeito de um espao urbano, so fundamentais para a construo de representaes sociais sobre esse mesmo espao. Assim, forma como espao estruturado que define as diferentes formas de usos e apropriaes dos espaos urbanos.

importante ressaltar que as intervenes aliceradas nesse apelo bomio geraram disputas simblicas quanto aos usos e s apropriaes espaciais do bairro. De um lado, havia os frequentadores habituais e os moradores, que, atravs de suas prticas sociais e lembranas baseadas na representao de um bairro buclico e bomio, construram um sentimento de pertena ao bairro; de outro, a poltica de requalificao, que transformou a tradio na city marketing.

Deste modo, segundo Bezzera (2009) a insero de grupos com identidade partilhada gerou a emergncia de dissenses nos diversos lugares que recortaram simbolicamente esse bairro. A autora conclui que os usos e as apropriaes considerados lcitos ou ilcitos esto associados ao lugar que eles ocupam na cidade. Esse facto ocorre porque no processo de interveno urbana, para fins de turismo, o contacto directo com o outro, o diferente, implica um realce no sentimento de pertena, principalmente dos moradores. Assim, vimos como os espaos requalificados passam a contemplar praticantes e apropriaes espaciais apontados como responsveis pela degradao.

Paviani (2009), fez um estudo com o tema Demandas sociais e ocupao do espao urbano. O caso de Braslia, DF, onde procurava analisar e entender como a sociedade, por seus agentes, apropria-se do territrio e o organiza para o desempenho de inmeras actividades necessrias ao ser humano.

Este autor afirma que os territrios demarcados para usos futuros so vistos, na actualidade, como vazios urbanos (terras desocupadas ou vagas) e so vulnerveis por conta dos ataques de agentes econmicos que visam lucros imediatos com terras valorizadas. As aces para modificar territrios e aglomerados urbanos ocorrem com uma conjuno de foras.

Assim, esses movimentos, no interior da dinmica urbana, so concomitantes e no-concorrentes, pois cada qual toma para si uma parte do territrio: a disperso com alargamento das periferias propicia a dissoluo do tecido urbano para limites cada vez mais amplos, enquanto que as foras concentradoras buscam comprimir actividades e servios em estritos territrios dos centros metropolitanos, ocupando o espao areo, ganhando as alturas com arranha cus, valorizando a terra dos ncleos centrais.

Nesse caso, h duas sadas: uma a desapropriao de propriedades privadas, como acontece na abertura de novas avenidas ou construo de escolas e hospitais; a segunda aco liga-se improvisao e mesmo acordo com entidades privadas ou rgos federais que incluem permutas ou convnios de mtuo interesse.

De acordo com Paviani (2009), a falta de polticas pblicas de mdio e longo prazo para atender demanda reprimida provocou a ocupao de terras no DF, por vezes ao arrepio de leis ambientais. Outros actores que ocupam o espao urbano so os automobilistas que crescem a cada dia pela insuficincia de autocarros, o que dificulta o estacionamento ao longo das avenidas e ruas da cidade. O que se agrava pelo crescente nmero de vendedores informais que aumenta a cada dia que passa, pois face ao desemprego este sector tornou-se uma alternativa de muitos cidados.

No seu estudo Apropriao do espao urbano e as polticas de interveno urbana e habitacional no Centro de So Paulo, Ferreira (2007) tinha como objectivo desenvolver uma reflexo crtica a respeito das formas de apropriao actuais e desejveis nos moldes de um uso democrtico e socialmente justo dos espaos pblicos na rea central de So Paulo, dentro do contexto de re-apropriao da rea por diferentes actores sociais. Neste trabalho, o autor argumenta que a forma como feita a estruturao do espao faz com que seja impossvel a criao de espaos complementares para formas de apropriao fundamentais para habitar na zona urbana.

De acordo com Ferreira (2007), seriam causas dessa impossibilidade, dentre outras, a luta pela valorizao fundiria da regio, a limitao ao financiamento pblico, a interferncia de grupos empresariais, mais interessados em financiar uma gentrificao coerente com seus investimentos, e a susceptibilidade dos grupos polticos que se alternam frente do poder municipal.

Assim, o autor afirma que a precariedade do espao (sub) urbanizado limita as possibilidades de uso pela populao; no entanto a necessidade de encontrar alternativas leva a populao a transgredir o uso das ruas, de terrenos baldios, de praas abandonadas. A riqueza de usos e actividades, a variedade de pessoas, de equipamentos, enfim, a diversidade desses espaos acaba por configurar situaes em que o espao do lazer, do cio, compartilhado. Em algumas situaes percebe-se uma separao tanto espacial quanto temporal; diversas funes se alternam e se complementam nos exguos espaos livres.

Enfim, para Ferreira (2007), ao contrrio do que ocorre nos espaos comuns privados, nas ruas d-se a necessidade de se pactuar, mesmo que no deliberadamente, um cdigo prprio. A negociao uma constante nesses espaos, os cidados inserem-se involuntariamente em um processo poltico.

Baia (2009), realizou um estudo com o tema Os contedos da urbanizao em Moambique: consideraes a partir da expanso da cidade de Nampula, no qual defendeu que a urbanizao enquanto momento de difuso do modo de vida ocidental obedece a uma lgica excludente, e assente no urbanismo, que produz hierarquias scio-espaciais vinculadas a reproduo das relaes sociais. Essa lgica induz para a recusa das prticas culturais locais ou africanas, consideradas rurais, tradicionais e inferiores, e promove o modo de vida europeu ou ocidental considerado superior e moderno. Essa lgica leva o sujeito africano, moambicano, ao seu desenraizamento e negao de si, fazendo dele um estranho na pretendida pelos urbanistas e pelos grupos sociais que o sustentam.

Nesta ordem de ideias, o conflito que vive nos diferentes cantos do espao urbano deve a este encontro entre formas de apropriao ocidentais e africanas, podendo-se apontar a informalidade como uma forma especfica de apropriao e utilizao do espao seguidas por uma lgica africana.

De acordo com Baia (2009), a realidade urbana em Moambique constituda pela simultaneidade de ritmos diferenciados, que evocam a justaposio de espaos e tempos diferenciados e interpretados, e por estruturas e relaes sociais cuja historicidade explica as desigualdades, as diferenas e desencontros que caracterizam a especificidade do urbano. Sendo este um dos factores que explica a conflitualidade entre os diferentes autores que fazem o uso e utilizao do espao urbano. Pode-se ver que o processo de urbanizao que influencia na resignificao do espao urbano.

O ltimo estudo da nossa reviso de literatura de Ferreira (S/d) com o tema Efeitos positivos gerados pelos parques urbanos: o caso do passeio pblico da Cidade do Rio de Janeiro, feito no contexto brasileiro. O objectivo deste autor neste estudo era de analisar os feitos positivos gerados pelos parques urbanos. Este autor defende no seu trabalho que a percepo factor fundamental para a avaliao da relao do homem com o espao onde ele vive e como ele visualiza o mundo externo.

De acordo com Ferreira (S/d), a ligao entre a cidade assume um carcter representativo, o espao urbano recebe a conotao de lugar. Assim, os cidados ao fazerem o uso e aproveitamento do espao nas cidades adquirem uma ligao efectiva com este. No se pode usar para o uso do espao como uma aco desprovida de ligaes ntimas, como se tratando de pleno uso racional, visto que algumas pessoas se encontram nesses espaos porque se identificam com eles.

Referncias Bibliogrficas

BAIA, Alexandre Hilrio Monteiro. Os contedos da urbanizao em Moambique: consideraes a partir da expanso da cidade de Nampula, So Paulo, 2009.

BARROSO, Priscila Farfan. Conquistei meu espao dia a dia estudo etnogrfico sobre a ocupao do espao pblico pelos vendedores ambulantes, Revista Habitus IFCS/UFRJ Vol. 9 N. 1, 2011.

BEZERRA, Roselane GomeS. Representaes e classificaes de um espao urbano requalificado, Configuraes, 2009.

FERREIRA, Adjalme Dias. Efeitos positivos gerados pelos parques urbanos: o caso do passeio pblico da Cidade do Rio de Janeiro, Brasil, S/d.

FERREIRA, Paulo Emlio Buarque. Apropriao do espao urbano e as polticas de interveno urbana e habitacional no centro de so paulo, So Paulo, 2007.

PAVIANI, Aldo. Demandas sociais e ocupao do espao urbano. O caso de Braslia, DF, cadernos metrpole 21 pp. 75-92 10 sem. 2009.

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