Subjetividade Na Escrita de Montaigne

Embed Size (px)

Citation preview

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    1/20

    kriterion, Bl Hz, º 126, Dz./2012, p. 559-578

     MÉTODO E ESTILO, SUBJETIVIDADE E CONHECIMENTO NOS ENSAIOS

     DE MONTAIGNE 

    Celso Martins Azar Filho*[email protected]

    RESUMO  A característica mais notável da losoa renascentista foitambém o que tornou sua assimilação pela história da losoa tão difícil:a interação entre forma e conteúdo, entre ideia e sua expressão. Tal resultada tentativa de realizar outra inter-relação que lhe é ainda mais essencial:

    aquela entre teoria e prática, pensamento e ação. Nos esas de Montaigne,o método constitui antes de tudo um estilo de vida: a linguagem é aí o meio pelo qual a implicação entre mundos externos e internos, o eu e a realidade –assim entre intelecto e sensibilidade, arte e natureza, fato e valor, identidadee alteridade etc. – busca tornar-se evidente, permitindo a percepção de seu permanente remodelar recíproco.

    Palavras-chave  Montaigne; método; estilo.

    ABSTRACT The most remarkable characteristic of Renaissance philosophy was also what made its assimilation by History of Philosophy so difcult: the interaction between form and content, between idea and itsexpression. This results from trying to achieve another inter-relationshipwhich is even more essential: that between theory and practice, thought andaction. In Montaigne’s essays  the method is primarily a lifestyle: there thelanguage is the means by which the implication between external and internal

    * Professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro. Textorecebido em 30 de maio de 2012 e aprovado em 26 de julho de 2012.

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    2/20

    Celso Martins Azar Filho560

    worlds, self and reality – and so between intellect and sensibility, art andnature, fact and value, identity and otherness, etc – seeks to become apparent,allowing the perception of its permanent reciprocal remodeling.

    Keywords  Montaigne; method; style.

     n quadam mdlógc da aáls a sgu, a çã d slsá ulzada, ã xaam cm caga láa, mas cm macad dca dspsçã óca dsva d psam ascsa. tal dspsçã pd s dda cm uma va cmpsã das laçõs a

     páca qu m p causa csquêca uma asfmaçã smulâa,fácl d dvsa a laua lsóca d píd, das laçõs fma cúd.

    Fac às bas lsócas da rascça, a paçã sgud mdls puam aalícs d cêca csã ssmáca d sua ssauaccual pd smplsm mpd um julgam jus d sua vdadavgadua lsóca. A aáls ds xs dv, a cá, aá-ls, acm vículs, qua ambs, sums, bm cm ms, m

    apcaçõs qu pssam lva m ca a mbcaçã aí csuva da fuçã d fucam ds dscuss. tas, ccs, quads, buas, buas, pauas, salas d cc, casls, camps d baalha, c., s é, fmas,a d apsaçã, cm d alzaçã dsvlvm d psam – assm sã s Ensaios d Mag, s Discursos d Maquavl, s dálgsd Bu, s cmás d Fc, as Cartas d Paca, s Colóquios deasm, s cs d Bccacc, as ss d Pc1.

    1 Outros exemplos sobre outros domínios culturais poderiam ser citados: os madrigais são uma espécie demúsica descritiva que tenta adaptar a melodia ao sentido do texto poético para exprimi-lo representandofoneticamente o sentimento de cada linha; The Canterbury Tales narram uma peregrinação que a próprianarrativa constrói em nos conduzindo e acompanhando; os poemas de John Donne ou de Maurice Scèvesnão são simplesmente filosóficos, mas constituem eles mesmos práticas meditativas – em todos estescasos, e em muitos outros, é sempre o liame íntimo, interativo e simbiótico, entre forma e funcionalidadeque deve ser realçado. É claro que estamos diante de algo presente também na Idade Média: um exemploexcelente são as Cantigas de Santa Maria narrativas de milagres da virgem que também são vistas comoorações miraculosas; o gótico, que faz das igrejas orações em pedra arrastando o espírito dos visitantespara a elevação e contemplação, etc – mas a chave está em perceber como ao longo do tempo estaencarnação da função na forma se faz de maneira cada vez mais cuidadosa do ponto de vista formal,e crítica com relação às suas próprias pretensões teóricas. Que se note, porém, que estes exemplos

    medievais não são retirados da filosofia propriamente dita, a qual permanece marcada em geral pelodivórcio entre pensamento e expressão.

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    3/20

    561 MÉTODO E ESTILO, SUBJETIVIDADE E CONHECIMENTO NOS enSAioS DE MONTAIGNE 

    Lga rascm idad Méda a xpcava d qu as das a vdas lacm d mu p: pfssa ca dua é cssaamvvê-la u c sc d s csdad mal, hpóca, m suma, umafaud. As açõs d um hmm dvm s a xpssã d su psam,

    vc-vsa. ea, cada vz mas, Mdv rascça, ã saaá apas d -fêca, mas d açã, d ma-s d a páca – aí sá a gad dfça a lsa ascsa qulh pcdu s sguá. P um lad, ã s aa mas d m splha daaçã a cmplaçã, u vsam, mas d a x um sumqu ppaa pssbla sua açã; d u, al sum ã é algd x, pém m msm dsa busca, a p m qu s auxlam aba sca a val, cfudd-s m sua alzaçã.

    ecams s psads ascsas a busca d uma a, ãapas vlada paa a páca, mas qu m s msma a csua, paa afazd ag lsa, plíca laua, agumaçã lógca cussócs, u a aquua das das cm a sua apsaçã. Ca-s ds mduma fma d xpssã qu ã smplsm sgca u smblza, pémxpma maalza psam cm u ã só d psuad,mas ambém d sv a apfçam da psaldad a d au,cm d sus ls, cduzd-s à açã pla u a cmplaçã. talapmam mal dá-s sd d uma cmpsã mas apuada ds

     pssívs camhs pls quas a azã humaa pd apd a s msma a mud, afa cmum d qu csumams chama lsa. Agas sgca pô m qusã a pssbldad msma d da cmpsã laba csa ds ms fudamas m qu s quaca.Paa ab camh m dçã à vud, à vdad, à blza, à jusça ua Bm, s hms d rascm dm a as fmas d dê-ls sgcá-ls, cm s pcdms dspsçõs qu s pmam acss a ss, fmulad ms s paa alcaça a xpssã quxpma abacá-ls m sua alzaçã. Assm, s Ensaios, ba xmplada rascça ada, sl csu uma çã qu, svd d p a séca, a éca a plíca, pmá sud d qu s pda chama dfuçã mafísca d sa.

    expêca psqusa sã avdads smulâas sômas sa.o ccsm maga é um chamad à psqusa a xpmacsa ds sus sulads. É m um sad dubav psv – pvcad smula da vsgaçã – qu dvms s acca da lsamagaa, pqua saísa xg ssa açã ss gajam

     paa s pm acmpahá-l. nã s aa apas d dz, mas d faz –

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    4/20

    Celso Martins Azar Filho562

    é pcs lva m ca cm pm pd clusv falsa u puba acmpsã d sgud. nã p acas, Mag va pô m dsaqu asaculaçõs lógcas d su dscus. Mas scdms cas csas paa qus msm (iii, 5, 880B; i, 26, 172AC)2. e mlh xmpl ds csu

    um ds mas cas dsas lhas: a apa cusa óca da mafísca é pa d dsvlvm d uma psqusa sb a mafísca qu csu sl saísc m s msm. A a mafísca sa ã é um pd pada, mas um alv: la ã s ca xpsa dam pqu sa é uma maa d pcua xpma – p aí msm d ca –, ã uma xbçã d vdads das p gaadas muávs. o ccsmmaga é um sum d busca, ã apas d chcmvdad, mas d sua alzaçã páca. n a, as d s umacaçã láa, sa maga a um méd paa a lsa mal;sua pcpal caacísca é qu sl da aí fmam um d. A lsasaísca clca m jg uma xgêca séca aavés da qual s pja axã, ud a afa aísca pblma mal a sca a vda.

    Mu as d msa bm, a vdad u bl aa-s d alzá-lsm ssa vda – u msá-ls, alzad-s – x saísc pcua umcamh paa al. o mud é um x qu dv s ld cam; s Ensaios sã mud. rpsa mud é psa hmm, vc-vsa. o psam a rascça busca quas smp, além da xpssã absaa,

    uma “bjvaçã” smbólca gáca: s é um d sus açs sscas.os Ensaios já fam cmpaads a casl d Seigneur de Montaigne cmsus fsss, ps lvadças, splhs, paós, passags scas cdadlasculas. escv é csu, csu cadas, falzas, csu a smsm a csms. o sa é um pla um pj aquôc paa avda; mas ã sm: scv já é m s msm ag.

    Vv aavés da sca faz pa da pópa çã d sa – çãxplíca dsd avs “Au lcu”, d Mag dz ambém mdaa xpssam paa qum scv.  esa qusã é cucal: a qum sdçams? É pcs dxa d saída s mu cla, ps daí a fma ddscus, d pcd a busca vlvda, s dla d. Quas sãs bjvs; qu qums m? e s s vla a mas vdad,quad ams qu, paa Mag, m já sá csc dsd íc

    2 A edição dos Ensaios utilizada é a de P. Villey, PUF. As referências indicam o livro em algarismos romanos,seguido do capítulo e da página em arábicos. As traduções são de minha responsabilidade, sempreconsultadas, e seguidas quando possível, as já publicadas em língua portuguesa (principalmente a de

    R. C. Abílio). Citarei, contudo, certas passagens no original, crendo que sua compreensão ficará assimmelhor assegurada.

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    5/20

    563 MÉTODO E ESTILO, SUBJETIVIDADE E CONHECIMENTO NOS enSAioS DE MONTAIGNE 

    d d pj, ã só ad camh, mas csud- a pa dssas sclhas. Dz paa qum s scv é dz ambém p qu s scv.

    e, ã, paa qum scvs [ pour qui ecrivez vous]? os sábs a qum cmp a jusdçã lvsca só chcm val a cêca ã apvam u pcdm

    m sss spís qu ã da udçã da a: s mass um ds Cpõs plu, qu vs sa a dz qu valha? Qum ga Asóls, sgud ls, amsm mp ga a s msm. As almas cmus vulgas ã vm a gaça ps d um dscus lvad sul. oa ssas duas spécs cupam mud. Aca, d qu fazs pa, das almas gadas ajusadas p s msmas, é ã aaqu pcsam ã m m m m psçã ós; é quas mp pddaspa sfça-s p agada-lh (ii, 17, 657C). 3

    S scv é a d alguma fma cmuca alg a alguém, pgua paa qum s scv é pgua ambém “ quê” “ pquê”. Pqu da

    mpsa s ss d su bjv: s a mdla, s sus as. nóssms ssas açõs; csum, a maa d vv, sl “é” hmm. emsm quad máscaas s sã mpsas, cab a ós dcd cm vgá-las. A fma d pcd u d chc ã é alg qu pudéssms sclhapas cm xs a ós msms: sms ssa maa d chc,d avala, d psa; qu vms é qu sms; – açã – s qusms, ós ambém vms aavés d qu sms. Mldams ss mud msm pass m qu mldams a ós msms – msm s dvdms

    sa aua cm ds, a scdad, s duss, c., m uma palava, cma fua (i, 47, 286A; i, 24, 127A). o méd, m dpd ucamd ssa vad, m é um smpls sum; assm cm vdadchcm, aqul qu vdadam mpa, ã é um m pdu,um sulad dv a s amazad a mmóa.

    Lms ch cad uma classcaçã a; as dvsõs pas sãcmus m Mag. também m Plaã sã fqum pss.Cud, cusam, ca d plasm, cm suas paçõs mgal subv au ds Ensaios da haqua , m vz d ab camhm dçã à clássca sluçã mísca ascsal p m d qualqu

    3 Notemos o “vous”: de um lado, Montaigne fala, tanto de si mesmo, como a si mesmo; de outro, ele nosfala e fala de nós. Há aqui uma ironia endereçada a si mesmo, mas sobretudo àquele leitor (se este écapaz de compreender) que ousa se colocar no nível mais elevado, mostrando já assim não ter entendidoo parágrafo anterior à última citação: “(...) se acusar seria se escusar neste assunto; e se condenar seriase absolver” (II, 17, 656A). Autor e leitor estão implicados no processo de descoberta através do qual aironia montaigniana nos conduz. Este procedimento, presente desde o primeiro ensaio (cf. AZAR FILHO,2005) é particularmente importante no capítulo que será nosso principal objeto aqui, “De la praesumption”

    (II, 17), no qual a retórica montaigniana torna-se um instrumento de equilíbrio entre as exigências éticas epolíticas de seu tempo (cf. FARQUHAR, 1995).

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    6/20

    Celso Martins Azar Filho564

    scala u scada ccual, pac a cada vz pd fcha camh ada ascs dda cm xalaçã. Ada qu sja u p d ascsmqu s ppõ aqu, bm mas dfícl d qu smplsm scapa mdçã a al. o mdl d agumaçã é mas u ms d cusa

    dalcam duas psçõs qu apam s põm, mas fud sdcam, maca uma ca cuja lvaçã é dda p um sb s msma: a mada da ascdêca a maêca, msm quads aa sm d psçõs u capsçõs, pac s a fuçã báscasmp fçada.

     na sua fma gal, sa dvsã ca ca classcaçã ds spís Discours de La Méthode4: mas s a dspsçã ascd é vd(msm s há ambém uma a vlada qu dssmula úlm gau, a qualvdm Dscas cê pc). o paall sas classcaçõsalvz ã fss ad, s a fas qu s sgu à úlma caçã fa aqud x ds  Ensaios  ã fss ã smlha à fas cal d lv dDscas: “L b ss s la chs du md la mux paagé”. o paallqu s pd aça s sa “Da psuçã” é basa úl paa apaçã aqu ppsa. escums Mag:

    [A] Csuma-s dz qu a palha mas jusa qu a auza s fz d suas gaçasé a d ss; ps ã há guém qu ã s c cm qu la lh abuu.[C] nã é lógc? Qum xgass além xgaa além d sua vsa. [A] C

    qu mhas das sã bas cas, mas qum ã cê msm das suas? (ii, 17,657-658).

    Apas apam dêcas, as dclaaçõs m um u x sb bm ss mafsam um dm dvs sb sua mpâca,csuçã, u aplcaçã. Vja-s aí, m pm luga, aqula pssã dhumldad ã csa m Mag: cla qu uma saéga d sduçã,afíc pdagógc bm a sl scác, qu ã dxaá d lmba al mas a a caacísca humldad ôca d Dscas  Discurso.

    em ambs s cass, paallam a ducad, há ambém a

    4 Segunda parte, terceiro parágrafo: “Et le monde n’est quasi composé que de deux sortes d’espritsauxquels il ne convient aucunement: à savoir de ceux qui, se croyant plus habiles qu’ils ne sont, ne sepeuvent empêcher de précipiter leurs jugements, ni avoir assez de patience pour conduire par ordre toutesleurs pensées, d’où vient que, s’ils avoient une fois pris la liberté de douter des principes qu’ils ont reçus,et de s’écarter du chemin commun, jamais ils ne pourraient tenir le sentier qu’il faut prendre pour aller plusdroit, et demeureraient égarés toute leur vie; puis de ceux qui, ayant assez de raison ou de modestie pour

     juger qu’ils sont moins capables de distinguer le vrai d’avec le faux que quelques autres par lesquels ils

    peuvent être instruits, doivent bien plutôt se contenter de suivre les opinions de ces autres, qu’en cherchereux-mêmes de meilleures”. Citarei o Discours segundo a edição de É. Gilson (1938, p. 60-61).

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    7/20

    565 MÉTODO E ESTILO, SUBJETIVIDADE E CONHECIMENTO NOS enSAioS DE MONTAIGNE 

    cssdad d pçã da ds pgs qu ccam ã us fac daslas. Mas pcsam m s sguadad, mlh s msam ambs saus. Ps a um cm u ã s lmam a dz qu dv s f,mas, a dz, já fazm. ou sja, a sca a-s a um mp xmpl

    sum d psqusa – as dmsõs fd csam umacm a ua. Smlha a cm méd já sá m açã mp d acsuçã msma d Discurso, bgaa lcual cujas çõs d svcm xmpl apaa as  Ensaios, a pa d Mag busca u dz a faz. e pcsam p ss aa-s p vzs d esconder paramostrar 5, ps s vículs au l, ms dscípul, cscêca mud, a páca, cêca a, m suma, s vículs a vda as las, só s pdm csu /u pva m a, ps vv. Cmamam amúd s humasas, a sabda u a vud só xsm almas açõs, ã s dxad psa sã dam. em uas palavas, sas dpdam d uma aud qu ã pd s dsca, masapas vlada pl gs. Ps s sula ds cs cm a fua,d ssa auza a m sua açã csuva cm as auzasxas, das dspsçõs mvms públcs, uvsas, m laçã cms sss, paculas, pssas. o qu, cla, clu ambém a lguagm. nsa s sujs bjs cam pdm sua udad m um ux qua acmpaha cm s fua a mp d s. n apac sã smp s

    ss a alza sua ssêca fulc d uma subjvdad qu é ambémsmulaam laçã d suj csg ds cm mud – udad, pqu smp já dada, smp mpssívl, ps cuam pssbladaapas hz d sua busca msma.

    A dúvda saísca, abd spaç da psqusa susad mph d julgam a busca da vdad, maca csa xpcada mbldad sluçã d ssa cscêca vaa das mags qufazms d mud cm d ós msms. tas magaçõs uca pdams sm subjvas, dad qu sã já causa sulad d ssas laçõscm as csas csc. É s qu pcpalm afasa Mag dDscas: x “Da psuçã” – cm, alás, m da ba magaa – sá m jg um xam d s msm qu, smp duvdad d s msm,  p m dsa dúvda msma, jusca sua mpâca. É pcs xama as msm cssam, cm máxm g. Ps, ã apas é pssívls “humld p vadad” (ii, 17, 633A), mas pdms ã pcb qu s

    5 “Mas certas outras coisas há que se escondem para se mostrarem” (III, 5, 880B).

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    8/20

    Celso Martins Azar Filho566

    gaams, pqu gaams a ós msms. S Dscas qu juscasu méd gad qu sja psuçs, pcdd paa dmsá-la cudads xam d sus pssívs s d (au)avalaçã, Mag jusca su pcsam p d qu d sfç d gam u

    daçã c smp sc d s a psuçs pcsam p m pcíp ã s pcb cm al: aí s xpssa alg d básc paa a lsasaísca. Mas as ds há ua dvgêca, aga d çã, sds gascõs qu é fácl d pcb x cad: lá dz saísa qu ud qu s us dsspam m úms afazs “(...) u p apus d mu spí a mm. o qu m scapa alhus ã é ppamda dm d mu dscus, pois viver e valer, eis aí minha ciência” 6.

    oa, é bm cla qu Dscas pd mu fqum m susscs spd a Mag: fa d su m s mcad apas acspdêca daqul, uma úca vz7, só fça a cza da mpâcada uêca d um sb u; a mas pqu, paa um l d séculXVii dcaçõs xpssas cam ã am cssáas paa s pcba lgaçã as duas bas8, a ssêca m d saísa aé pudssmsm alvz s pcbda cm uma spéc d dudâca. is ãsgca qu s ps cssaam um advsá: a qu pac, paa Dscas, a lsa magaa csuu uma spéc d bas u ds a s supad, qu svu paa auxlá-l a sclha d sus camhs,

    mas u ms alvz cm Hum ha sd paa ka. na csuçã dméd u da cêca casaas, Mag ã pac s csdad,m aagsa, m m xmpl d uma sclha ôa d méd as cgda a busca d camh c. A cá, pc s Ensaios d m vsa  Discurso do Método, mas spccam sa sba psuçã, é a a cada pága qua s sá ps aqul, ãcm dua, mas cm maéa qu Dscas mpgaá m fav d sus pjs. P su lad, Mag cam ccbu a cssdad d umméd xpmal pcbd das as suas dculdads, s d pd lvu a qusã ã a cssá mas qu um pass paa gazas méd9, s pass sá svad a gê casa. e aé pqu sa, cm méd, vms, vsa alhus.

    6 II, 17, 657-658. Portanto, o objetivo montaigniano não é a criação de uma ciência semelhante à cartesianaou à moderna em geral. Uso por vezes o termo “ciência” (mesmo correndo o risco de ser acusado deanacronismo pelo leitor mais desatento) para traduzir o termo “ science” em Montaigne.

    7 Correspondência com o Marquês de Newcastle a respeito dos animais-máquina (AT 4:573-75).

    8 BRUNSCHVICG, 1995, p. 115.9 LANSON, 1958, p. 280.

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    9/20

    567 MÉTODO E ESTILO, SUBJETIVIDADE E CONHECIMENTO NOS enSAioS DE MONTAIGNE 

    os ms “daçã” (ordonnance), “gulam” (reglement ) u amsm “dm” (ordre) qu Mag mpga pdam capíul“D la Pasump”10 ã fazm pa d um squma ccual vsad acsuçã d qualqu cêca sã aqula qu s f dam à éca;

    mas cucal a s a s é qu paa saísa al ã a sulad duma sclha. em m a uma aldad uda, é das laçõs muds hms qu m pm luga dpd ssa cêca. os ss ls msmssã sulad d cf d fças pspcvas qu vaam sgud umacma caldscópca, qu a s msma s ca cuam; a spaçad qualqu hama, paz, sguaça, cáca, flcdad c. humaassdd a csuçã csa d s msmas. A pcpçã aguda d qudas as csas s mvm s asfmam sm cssa é alg à pópacsuçã d sd d uma ba pa da laua ascsa. Msm avla-s paa passad dsa, s psads d al d mdv êm mvsa mp ps; s sus dscuss smp pssum um vés plícxmam pucad é pqu ss já cmçam a a cscêcamda da aualzaçã cuzada, lacal, das suas pssbldads d vdad – cmucaçã, cf, xã x, msm u.Mas mas ssa é cm p aí msm, p um lha csama às laçõs éca plíca, s xs ascsas ulzaã admsã séca cm um md d psqusa psmlógca mafísca

     – é jusam s qu, cm dmasada fquêca, passu dspcbdas mds. Éca, plíca séca sã pfudam mplcadas aqusã psmlógca a pa da va pcpçã da subjvdad cmauf, paa a qual é pssívl cscm s apaa d suaslaçõs cm mud fuda-s, cam d maa ccula, m sua pssbldad d dscçã dçã d s msma – pla sguladadmsma d suas laçõs cm mud fuca cm caga uvsal. Dmaa ccula, u dss, aqu s apsa a qusã da psuçã.

    A pma csa a maca a cíca da psã a chcm é qusa a sb s msma: ada mas pss qu aaca a psuçãalha; aa-s, m suma, d ama sua cêca, gad-a a um (ii, 17,633AC), pcdm padã d da sfísca. Mas, cm s lmba uafamsa passagm ds sa (ii, 17, 634-635A), chcm d mud d s msm sã lgads: suj qu chc sá lgad às csas plasua pópa fma d chc, da spaça d ca uma cêca qu ã

    10 É interessante notar que os correlatos são também numerosos: “regra” ( règle) e seus derivados contamaí 10 ocorrências; “ordem” (ordre) e derivados, onze.

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    10/20

    Celso Martins Azar Filho568

    lv m ca sa csaaçã fudamal sá vã pgsa. nada dssgca, pém qu cams dds am m alguma spéc ddúvda hpbólca lógca. Sd ssa psuçã, ã ssa cêca,qu s lga a mud, pcsam aavés daqula s apxmams dsa.

    Lg d ga qualqu pssbldad d sab, Mag pd buscaa vdad cad a azã póp julgam: “L jugm du pa u ma s d: c’s as qu’l vy c subjc, cmmallus, c qu la vé luy ps” (ii, 17, 632A).

    A aldad d Dscas cm a ppsçã cal d Discours (sb a jusa palha d bm ss) sa ppaa a amaçã da xsêca d umaluz aual qu gua a azã humaa, ppcad uma uçã lcualqu fc psaçõs claas dsas, assm cf a hmm acssà dm uvsal acal qu faz pa d sua auza é m s msmadva11 – s é qu Mag, ã xaam ga, pém dxa msusps. ou mas xaam, m vz d smplsm ama, a aavésd s msa hmm, lg, pacula, uvsal, fazd d sa umm d psqusa das pssbldads, ms camhs pls quas auza,azã dvdad pdm s ca as açõs humaas. Paa a lsasaísca, ã é xaam a luz aual m s qu sa alcaçávl, massua gaaa; bm ss ã é um sum qu ds pssum qu pd s usad d qualqu maa, mas us é pa da csuçã d bm

    ss, a maa fma a maéa. É ssa psuçã, ã ssa cêca, qus lga a mud: é sb sa qu é pcs abalha, ps é sa, ã a luzaual, qu sá smp ps.

    em Mag, m  sens pssu dvsas aduçõs, mas pd, mgal, s dcad cm a azã. Cud, a da d um bm ss, duma azã aual, cmum a ds s hms, é caada cm svas pMag. É cm s saísa qusss faza d fma adcal quDscas dz pm paágaf d sua ba: “(...) ã é suc spí bm, pcpal é aplcá-l bm”. Paa psad ascsa écm s s bm mpg, pcdm c, fss alg d csuva caá u à cscêca ã alg d x qu pudss s (u ã)mpgad dsa u daqula fma: méd é sl, u sja, a maamsma d s. Assm, s aqula dvsã ds spís qu cams asduas bas é smlha, sb cs aspcs, m sus cs çõs – p xmpl, Dscas, cm Mag, aaca a udçã vaza –, ambém

    11 Por exemplo, Discours, terceira parte, quinto parágrafo: “ (…) : car Dieu nous ayant donné à chacunquelque lumière pour discerner le vrai d’avec le faux, (…)” (1938, p. 78).

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    11/20

    569 MÉTODO E ESTILO, SUBJETIVIDADE E CONHECIMENTO NOS enSAioS DE MONTAIGNE 

    dfm, suad-s a dvgêca pcsam a dçã d médmpgad; m aspcs, a lsócs, cm ócs, ds mpg.equa qu cas d Discours é as d ud uma haqua ds spísqu s apsa (umad-s aquls qu s pdm, s qu sgum s

    qu sum), s Ensaios a gadaçã é sgulam daléca: s uds,as almas cmus ppulas as almas p s msmas fs gadas –as duas pmas pssbldads, a fuadas, cm udas, a ca pssbldad. idca-s assm uma dcaçã a mal (s sçavants sãvulgas) qua bm, ps a udçã “dscus haua délé”12 ãdvm m s msm s cusads s s csdams sgud a pspcvad uma alma qu s saba mpga cam, s é, sgud a mdda acasã. Paallam, s p d alma é l msm dd cm pdud uma spéc d uã a auza – sã “âms glés fsd’lls-mêms”, sgud a xpssã d x cad (ii, 17, 657C).

    Msm s a fua faz pa d sss accís (i, 47, 286A), dsígs dcsõs, é smp ssa alma qu dcd13  – ada qu fqummalgad la. tms aqu uma cclusã qu, mada m su sd básc,csu p assm dz um ag d fé paa a ma pa das bas dsqu chamams lsa cdal; a alma pd, quad bm fmada cvm suída, supa a fua u acas. É ambém mada ca ga da mal pvsóa casaa14. Mas, paa Mag, s

    cf cm a fua ã é uma qusã sm d vad u d azã – s pda msm dz d lsa, cm s vá –, mas d magaçã,ssbldad, vud hábs, quad ss sã gads cduzds paqula alma f. Mas ada ds qu é amad sb al bza d almam a v cm qualqu ascasm: s pms mdls d gadza cdua dada sã s campss.

    A ms dspzívl cdçã das pssas pac-m s a qu pla smplcdadcupa a úlma psçã, fc-s um cméc mas gad. Habualm

    ach s csums as cvsas ds campss mas dads sgud a pscçã da vdada lsa d qu sã s ds lósfs (ii, 17, 660C).

    12 Deve-se manter em mente o que foi dito sobre a polissemia terminológica ensaística: discurso e razão sãosinônimos em muitas passagens dos Ensaios como é comum em outras línguas vulgares no século XVI;por isso a expressão citada refere-se também a bom uso da razão. É interessante notar como Descartesutiliza também o título “essais” para designar seu livro: A Mersenne, mars 1637 (AT 1:349).

    13 I, 14, 67C, Deixemos implícito o enfrentamento da questão tão discutida e disputada acerca da descobertarenascentista do indivíduo, reenviando a um artigo que procura abrangê-la: MARTIN, 1997. Com efeito, vê-se muito bem nas últimas passagens citadas, de um lado, como se mostra a preeminência do indivíduo,e de outro, como esta preeminência é relacionada a fatores “ambientais” (sejam políticos, religiosos,

    fisiológicos, etc) de maneira inextrincável.14 DESCARTES, 1938, p.76.

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    12/20

    Celso Martins Azar Filho570

    É sa vdada lsa qu saísa, a, cfssa, m uma passagm mu cada, ã csgu sgu: “eu ã su lósf: s mals magm sgud qu psam; (...)” (iii, 9, 950C). Msad ambém assm qua valzava a dmaçã d lósf, saísa busca alça su

     póp caá, paa faz a cm camh qu sclhu é pssal – pss msm uvsal m su méd (ii, 17, 657A-658B). É s sd qu,sm chcm d s, ã pd hav vdad chcm. e alcaçá-l dpd ada d uma páca cdaa, cm dz Dscas, “(...) d umlg xcíc, d uma mdaçã fqum ada”15, sm s quasa supaçã da fua ã pda s alzada. Dsd sgud capíuld su lv, Mag alud à sua páca lsóca cdaa (i, 2, 14B); a, a çã magaa d xcíc é sgula, ps a “cdçã aual”d saísa “(...) ã pd susa uma pmdaçã vm labsa.S la ã ag alg lvm, ada faá qu valha” (i, 10, 40A; cf. ii,17, 644, 649). Ds md, supa a fua sgca sgu-la (p xmpl,iii, 12, 1060BC), saísa dvá s “(...) um lósf mpmdad fu” (ii, 12, 546C; iii, 2, 805B). Paa d mlh pqu, lmbmsqu, caam as çõs gas da lsa casaa, s Ensaios chcm d s ã csu um m paa a csuçã d uma cêcaqu lh fss x ps; póp xcíc – u a xpêca pssal d psa ag cam paa bm vv – csu m s msm

    uma aldad paa a lsa saísca. “Aqu ã sá mha dua, ému sud; ã é a lçã d u, é a mha” (ii, 6, 377A). Mas saum c qu Mag cmda smplsm s dxa : a vda  psam dvm s gads; ã s pd faz fac à fua cm amaslas msmas fuas; é cm ssas pópas amas – aqulas qu sulamd ssa busca pssal da sabda dm ss s ds – qu é pcs cmbaê-la (i, 14, 66C). Assm, s lsfa, s psa u julgasgud a fua, paadxalm ã é m s fu. Mas cm dscã as gas paa su xcíc s já dvíams pm ê-l xcd paa chcê-las? tcams aqu um pblma qu, s  Ensaios, pssu umlad plaôc, u, céc – qu é sab? – pblma d cé.

    [A] em suma, paa vla a mm, s só p d u m sm qualqu csa, é qu jamas hmm algum s smu dc: mu lg é vulga, cmum ppula, ps qum jamas s du ca d fala d ss? esa sa uma ppsçã qu mplcaa m s cadçã: [C] é uma dça qu ã sá jamasd la vê a s msma; la é bm az f, mas a qual, pém, pm

    15 DESCARTES, 1938, p. 77; terceira parte, quarto parágrafo,

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    13/20

    571 MÉTODO E ESTILO, SUBJETIVIDADE E CONHECIMENTO NOS enSAioS DE MONTAIGNE 

    a da vsã d pac aavssa dsspa, cm lha d sl a um vpac; [A] ss assu acusa-s sa scusa-s; s cda sa abslv-s (...) rchcms faclm s us a supdad da cagm, da fça[C] físca, [A] da xpêca, da ba dspsçã, da blza; mas a supdad d julgam ã cdms a guém; as azõs qu pam d smpls bm ssaual (discours naturel ) d um, pac-s qu só pcsávams lha daqullad as íams cad. A cêca, sl, cas qualdads qu vms mbas sagas, pcbms bm faclm s supam as ssas; mas as smpls pduçõs d dm, cada qual psa qu sava m s d lhs caguas, cm dculdad apcb-lhs ps a dculdad, [C] s ã cm pa,s a dsâca f xma cmpaávl. [A] Assm, é uma spéc d xcícda qual dv spa mu puca glóa luv, uma maa d cmpsçã d puc m (ii, 17, 656).

    o xcíc d julgam é pcsam sa (ii, 17, 653A).esaa é busca a mdda ca – “g a mm msm” (ii, 17, 644B) – paa pcb alza ss acd duu cm as fças sâcas qum ós s afam cmbam. nã s aa d apas xc a pudêca,a azã u bm ss: é pcs xcê-ls paa sab cm s mpga;azê-ls à aa d cda aí s sa paa apmá-ls. Cud, aqusã d cm fazê-l sm pd s spdda ccusacalm, ps açã chcm, méd cêca, xpêca cmucaçã, sãdpds paa a lsa saísca.

    Pdms s ppaa a m d ma as mlhs dcsõs sgud a

    casã, s csdams as pssbldads d adquaçã “m” mud d p d vsa d sa: é pcsam a cscêca d fa dqu a fua já sá m ós – accams ã smplsm da ds fas,mas as ccusâcas – qu fuda a pssbldad da açã ca, s dvs p d pada d da lsa mal. rms algumas págasds ag paa l um ds chs já cads d “D la Pasump”(ii, 17, 634-635) – qu csu, d fa, ma d d sa – paa vcm, da dúvda da dscaça cm laçã a s msm, daí a ss

    chcm da aldad16

    , sgu-s xam d ssa faquza, cm smplca a cscêca a amaçã d ssa pópa fça. o “chcm pls fs” – qu Mag cmda aqu alhus s Ensaios (ii, 17,

    16 A investigação no domínio da teoria do conhecimento propriamente dita, no sentido que poderíamosefetivamente chamar moderno, permanece estranha ao pensamento montaigniano justamente porque ateoria ensaística do conhecimento não se distingue como domínio de investigação da busca da melhorforma de viver que funda sua filosofia. Por pensar sempre do interior da ação, das circunstâncias atuais,

     in media res, o ceticismo montaigniano retém uma especificidade que não deve ser descurada. Em uma

    perspectiva semelhante, S. Gaukroger (2011, 678-679) vai diferenciar a “dúvida epistemológica” deDescartes da dúvida montaigniana, associada a um estilo de vida.

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    14/20

    Celso Martins Azar Filho572

    634C; ii, 12, 546C; i, 20, 84A) – ã s csu cm smpls xam dascsas, mas cm xam smulâ d s msm das csas: lva m caas laçõs gécas u mud, paa pcb qu, msm d julgam, julgam s vla – “(...): ã jamas fuam”

    (ii, 17, 653A).td méd é p dçã “psuçs”, ps qu pa já psumdd va chga; é assm, cm s vu, qu s dv ga ssa pópa psuçã: jamas falhams fuam – ssa apsã d ssa pópaauza da auza d mud vlam uma à ua; s é, vlam suamplcaçã aual /u culual. A cclusã qu asbda d capíulsb a psuçã, s ada sb da a ba, é qu méd sá dvsa smp s suuad: sa. o ds sms ós: “m” é afua. A sacaçã d cada capíul m sua cmpsçã cspdas dvss ívs d cmbaçã ds pcsss d julgam cm s pcsss auas. e alvz ã s pssa fala m msm d um úcméd s Ensaios, assm cm a çã msma d “sa” cém mussds qu ã pdm s duzds a um úc qu fss fudamal;, cm a cíca aual s du ca dsd algus as, cada sa m sudsla mdcaa su pcdm fac às qusõs paculas suasdmaçõs casas. Mas a cusa m aplca a çã d méd as Ensaios ã s sablca m fuçã d ca dçã d méd qu ã

    m luga a lsa saísca – lsa fua?Dz qu sua lsa é fua, mas ã a falha d julgam, sgca paa Mag ama qu a va paa s cs afuads cm dvdas csas sá a cmpsã d s msm, sud d ssas claçõs,dspsçõs, pduçõs, c; camh paa a cmpsã d s p mda açã sa, u sja, aavés d sa d ssas psçõs, sluçõs, julgams, c: “(...); s css m mvm açã. Pl qu cada umsá d algum md m sua ba” (ii, 8, 386C). nã smplsm suspd julgam, mas xamá-l m a: “(...), j m gus” (ii, 17, 657A). Asca é m pvlgad paa a, pcpalm pla psaçã d“m” – a célb pua d s17, qu é um ds bjvs mas ds Ensaios  – a qual pd ã sm gua sc, mas ambém abalha aslaçõs au, l dscus. P xmpl, aavés da mdésa d

    17 II, 17, 653A. Com relação ao projeto da pintura, sempre houve certa controvérsia sobre sua constânciae lugar na filosofia montaigniana (principalmente por causa da relativização de sua importância nocomentário de Villey ao “Avis au Lecteur” em sua edição dos Ensaios). Mas creio, como outros, que há

    aí qualquer coisa de crucial na redação da obra (e sua presença e relevância em todas as “fases” destaparece corroborar tal impressão).

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    15/20

    573 MÉTODO E ESTILO, SUBJETIVIDADE E CONHECIMENTO NOS enSAioS DE MONTAIGNE 

    duvda d s msm, dsla “gs da hama”18 qu s pdspõ aapd sa: dspsçã dspbldad qu csu um ds gadsbjvs lçõs d psam maga.

    P sua csâca, xcíc da dúvda s  Ensaios  pda s

    qualcad d módc. tdava, a dúvda saísca ã é, cm adúvda módca casaa, um s a das das paa ag czasabalávs, mas mplca ca dssã nonchalance  (p xmpl, ii,17: 643A, 649A, 652A), sscas sgud Mag, paa chga a vv bm – úc ss, vms, qu qualqu cêca pda . Padda xpêca cmum d qu ssa azã malm ã é aualu dvam spada, saísa alça ssa laçã mas mdaa, baal cdaa cm mud, p aí cm ssa humadad (ii, 12,601-604; ii, 14, 611A; ii, 20, 675AB; c). É s sd ambém qu alsa pd s chamada fua, casual. Cud, s s duvda macaambém vdca d uma lbdad dda cm fudamal, ãcsu jamas uma glgêca (ii, 17, 652A; iii, 9, 994BC). A cá,cmda-s um xcíc qu ca a lguagm um m paa sdsvlv: ã é vdm p acas qu csdaçõs sb slcam-s ã pss capíul sb a psuçã19. Magé “challa d l’a” (i, 26, 172B), mas jusam p causa da a – a qu dv s aual basa paa va d sfç xagad

    u afaçã. nvam, sams aqu dmí d “scd paamsa”, sabms bm qu s pdm ca dvsas azõs paa saaud, sja a lgâca qu Casgl cmda a csã, sja f pdagógc (mas ambém plíc u lav à sua caa) qu saísa qua sb sus ls, mas ambém sa cvêca cmsua auza pssal qu sa busca alcaça cm um ds bjvs pcpas d sua démach lsóca. Cm a auza é sa cvêca,msm s smp a s cada m ssas açõs, ã s pd psumsu chcm: chcê-la é ã dfícl qua chc a s msm, psfazms pa dla, vc-vsa. Um méd qu s pmss lda cma fua sa um méd ds csc m sus pcdms, gas daçõs. Mas sa pssívl? n sd ds qu s acsumams

    18 RUEL, 1970, p. 323.19 No texto montaigniano, onde se cruzam política, filosofia e literatura, combinam-se argumentação lógica

    e recursos retóricos. A ironia, a prolepse, a sátira, são exemplos de figuras que se tornam tanto estilísticascomo filosóficas no “De la Praesumption”. As anotações sobre a poesia no fim deste ensaio (661A) devem

    ser também levadas em conta no enquadramento de uma discussão da forma do método – tema ao qualDescartes prestou igualmente atenção (DESAN, 1987, p. 155).

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    16/20

    Celso Martins Azar Filho574

    a chama d “cíc” dps d sécul XVii, ã. n a, famascsas s pms mvms m sua dçã, s cm laçãa muas d suas caacíscas, as quas mcad dsacamsubjv qu Mag cusa. oa, é jusam m fuçã dsa cusa

    qu ã s aa d da as gas d méd, mas d sa: uma pcpçãd fa d qu, s s cés sã csuíds a msm mp m qu sab camh, s vdad méd sã lgads, ã s pd chcsã pls fs. S s chcm xpmal mmâsula ambém smp ccula, sua fça sd a cscêca d suacabam qu a fçaá a um csa sb s. oa, um médmal csuíd pd msm s mpd d v ag lvm (ii, 17,649-650): a cêca sula s mpadaa m ssa psuçã.

     na lsa saísca, pblma psmlógc ã pd sxamad sm ccus da dmsã éca qu lh é . e a qusãd méd ã pd s spaada da dscussã d sl. Ps ã s pdscca mvm d suuaçã d “u” d mvm d suuaçãda aldad a qual aqul sá smp ab dsd su . A buscada xpssã ã apas ca, mas cmpsva pa, lógca  péca, da lgâca dz assm ag m gal, é a busca d mappad, d acd flz psam a vda, ss s pacula s das csas. em suma, é d uma a d dsp da casã, d

    clca m sca sa s vs s xs pl md bm dz, vs cm um camh paa bm psa bm ag – ma qumas qu qualqu u dca humasm.

    Vja-s a máfa da caça s  Ensaios (p xmpl:  iii, 8, 928BC):magm aga paa dsga a busca d chcm, qu pm clcam qusã ã apas a aud d caçad, mas gualm s ambs uas pudads m qu caças caçads agm. tal cm a líguafacsa, ssa palava pugusa “méd” é calcada m ggméthodos qu é um cmps dvad d hodos cuj sgcad pmdalé “camh, a, vagm” lg, p máfa, “va, m, méd”. nã pacas sd pm d méthodos f “psguçã” uma das máfasmas cs a hsóa d psam paa a busca d chcm fa da caça: aa-s d apa paa as caacíscas d uma mpsa qu ãm fmas xas cujs ms dvm smp s vads d acdcm as ccusâcas; qu ã sgca d maa huma pcddsdadam. e assm cmpdms ada pqu, a ma aacpçã d “méd d psqusa”, aqul vcábul gg dsgaá ambém

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    17/20

    575 MÉTODO E ESTILO, SUBJETIVIDADE E CONHECIMENTO NOS enSAioS DE MONTAIGNE 

    a psqusa, a cêca, a dua, m s msmas20: aí s vê qu ms s dvm d d csam us as us (assm, paa daalgus xmpls d dfs pas ccuas m suaçã smlha dsquas s cupams aqu, fma cúd, val azã, a páca,

    c) – cm caçad, camh caça m sua açã m asfmamus as us21.S as çõs d au ds Ensaios sã d acd cm a dclaaçã m

    qu calm s dclaa bjv d Discurso – “Assm mu dsíg ãé sa aqu méd qu cada um dv sgu paa bm cduz sua azã,mas sm faz v d qu maa u mpd cduz a mha”22  –,é pcsam aqu qu s ca caçã d pblma d chcm paa saísa: cm s pd, pla azã sa a azã sm s cfa cm asdculdads sumdas m da “Aplga” s agums d cícul dc hmm? oa, “saa” é um méd qu vsa cduz-s a uma psçã d a qusã adcal d cé ã m mas luga: slé sg d mlh d camh paa aí chga – a maéa a qua sulad d apfçam – cuzad sus aspcs lógcs éc- plícs pla séca.

    esaa-s – s é, m ssas xpêcas, m ssas avas msmas, já s ppaams – paa alcaça um sab qu s pda chama gâc al: lgad s póp, pacula d au a mud pla sua xpêca

    val pssal, vcula ambém l xgd ds su gajam sablcm da cmucaçã qu ú, mvm da sca, smvms d mud. Aqu a çã d sduz (ps dsd apadscud da das apaêcas d públc qu da advêca “Au Lcu”aavssa a ba) pssu um u pdagógc qu ã só s msa a

    20 Para as informações linguísticas relativas à méthodos cf.: LIDDELL, H.G. e SCOTT, R., 1996; CHANTRAINE,P., 1984.

    21 Giordano Bruno (2008, segunda parte, primeiro diálogo) serve-se do mito de Acteon para demonstrarum ponto de vista bastante semelhante. De passagem, que se veja como por esta ideia da caça aoconhecimento as tradições platônica e neoplatônica se fazem presentes nos Ensaios. No neoplatonismoestá em questão a busca de um saber divino em si inatingível (ao menos em sua forma perfeita), e daí anecessidade de uma noção de método particular; mas é curioso como, além de uma conexão óbvia coma mística cristã, temos aí uma interação com a forma como o ceticismo antigo é recebido na Renascença:uma desconfiança generalizada com relação a toda forma de comprovação do saber que não inclua otestemunho direto da experiência; ou uma descrença nas forças da razão humana, percebida então comoalgo que impediria a si mesmo em seu próprio funcionamento. É a confiança na capacidade do intelectohumano que Descartes tenta recuperar: quando Gassendi propõe o clássico exemplo (Platão, Alcibíades,132-133), que podemos encontrar também em Nicolau de Cusa (2003, p. 126), da impossibilidade da vistaver a si mesma, como forma de mostrar nossa dificuldade natural em nos examinarmos e corrigirmos,o autor das Meditações responde que não é o olho que deve ver a si mesmo, mas o espírito (apud

    BRUNSCHVICG, 1995, p. 141-142).22 DESCARTES, 1938, p. 44; primeira parte, quinto parágrafo.

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    18/20

    Celso Martins Azar Filho576

    aldad u dv, mas s cduz cm habldad láa à cmpsãd ssa lgaçã aísca cm a xsêca: lg d um méd mamác,mas ã ms mculs, é m uma spéc d damauga lsóca qus clca m qusã bm, a vdad, a blza, saad a apua

    ss gs dspsçã paa cá-ls s apca 23

    .o sa bvam ã é um méd sd adcal d m:ã s ppõ cm um camh suj bj, pém cm umafma d suda a maa pla qual ss s lacam m s csudcpcam; sgca a xpêca d aa al pcss l vd,u d v, aad. Uma ba cmpaaçã paa auxla a cmpsãd cs aspcs d méd maga é xmpl d uma pça dd ua pça, a d d a qu Shaspa s faz asss, ã p acas, m Haml24: uma spéc d cmplaçã a cmplaçã, pl públc, au s as ls msms – assm cmplaçã açã scfudm. S cmpaams aga a um x lá – um sa uum c a sua cmpsçã clássca –, é cm s sa maga subx aguadass s vlad, ã pl au, mas pl su pópdsvlvm. A csuçã d sd ã cab a au d amã,assm cm a l ã sa apas capá-l: sa sv cm um mu pcss d vlaçã fmaçã smulâs, sd p ss ambém umaspéc d capad d pspcvas, mmóas, caacs, c, paa aalsá-

    ls m su pcss d csuçã; daí um m d aa s pcsss dcsuçã da aldad ss f. Aqu subx ã é sd dahsóa adam vlad, mas da pópa sca qu, lg d s smuma fma d mdaçã, dxa-s l cm laçã d au cm mud csg msm, mas pla mdaçã d l – qu faz cm qu au l s cfudam m suas avdads. É um camh d fmaçã qu sdsvlv p uma ava d mada d cscêca sb as dspsçõs fucams ds sa csc l msm, am d qu ssas laçõscm mud (psclógcas, slógcas, dlógcas, c) m-s vsívsm su ux paall à caçã láa. o au ã s cmpa cmum dus qu chc ca ds, mas s camha m dçã a s pla sca, u sja, aé s msm pl abalh a ba. o subx ã é sd pfud da aava qu a s dsla s vla: qu s vlasã pcpalm as azõs pfudas das auds d au, dsvlad sua psaldad as fmas d abalha sb sa paa apfçá-la. Mas sua

    23 É interessante lembrar a estima que Montaigne tinha pelo teatro: cf. NAVAUD, 2012; ELLRODT, 2011.24 Muito já se comparou a irresolução montaigniana (II, 17, 653-654) com o caráter do herói de Shakespeare.

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    19/20

    577 MÉTODO E ESTILO, SUBJETIVIDADE E CONHECIMENTO NOS enSAioS DE MONTAIGNE 

    xpssã dv smp s da d fma scudáa da, ps aqula qué fudamal – a busca da flcdad, da ba açã – só pd s fc cmum dal u aud qu ã s dxa dscv dam.

     n sl saísc, a msm mp m qu as palavas xpssõs

    adqum um aspc smbólc, quas côc, maém-s uma dspsçãlúdca a qual as fmas algócas sã psas m pspcva vlad-s sb s msmas paa uma cíca da qualdad da xpêca qu las pssblam. o sa pssu uma csuçã afsmáca a qual – alcm paa Bac25, La rchfucauld u nzsch – sgca uma sclhamdlógca d cusa csc d ssma cm falsad: da avad psaçã da d fucam d csms u d abaca da azãuvsal pla azã humaa pssupõ alg qu pcsaa s pvad,dvd-s va qu psam ssmác sva cm ma camuagmlógca – , jusam, séca – d suas lacuas cadçõs. oa, vdad chcm é pác daí a mpâca da xpssã. Cm sa, é pcs p, ps s é alg d pm dam lógcd dscus saísc, Mag ã sá apas dzd, sá fazd. es pqu l ã sá apas sad, mas ambém – , sgud l, pcpalm – apdd. o saísa ã apas pd dmsalgcam a vdad pla ccual, mas xpma s camhsaé sa: suas fmas, cés hsóas. o m dsa xpêca é a vda,

    a lguagm saísca csu su luga pvlgad pqu apa paaalém d s msma. e p ss msm sa s a m m qu s fc mud, a pô m qusã a açã u a aldad, xamad afmaçã da subjvdad m su v a s lacal.

    Referências bibliográcas

    AZAr FiLHo, C. M. “L pm chap ds essas”.  Bulletin de la Société des Amis de Montaigne, vl. 37-38, p. 15-30, 2005.BrUno, G. De gli heroici furori – Des Fureurs Héroïques. Pas: Ls Blls Ls,2008.BrUnSCHViCG, L. Descartes et Pascal lecteurs de Montaigne. Pas: Pc, 1995[1942].CAStiGLioni, B. Le Livre du Courtisan. tad. d Ala Ps (sgud a vsã dGabl Chapus d 1580). Pas: Flamma, 1991.

    25 Sobre Francis Bacon ver: ROSSI, 2006, p. 308.

  • 8/16/2019 Subjetividade Na Escrita de Montaigne

    20/20

    Celso Martins Azar Filho578

    CHAntrAine, P. Dictionnaire Étymologique de la Langue Grecque – Histoire desmots. Pas: klcsc, 1984.CUSA, n. d. De venatione sapientiae – Die Jagd nach Weisheit . HAMBUrG: FlxM, 2003.DeSAn, P. Naissance de la Méthode. Pas: nz, 1987.DeSCArteS. Discours de la Méthode. ed. d É. Gls. Pas: V, 1938 [1637].eLLroDt, r.  Montaigne et Shakespeare: l’émergence de la conscience moderne.Pas: Jsé C, 2011.FArQUHAr, S. W. “iy ad h ehcs f Slf-Pau Mag’s D laPasump”. The Sixteenth Century Journal , vl. 26, º 4, p. 791-803, 1995.GAUkroGer, S. “Dscas”. i: BerneCker, S.; PritCHArD, D. (ogs.).ruldg Cmpa epsmlgy. Lds nva iqu: ruldg, 2011. p.678-686.HADot, P. La Philosophie comme manière de vivre. Pas: Alb Mchl, 2001.

    -------------------.  Exercices spirituels st philosophie antique. Pas: Alb Mchl,2002.LAnSon, G. Les Essais de Montaigne. Pas: Mllé, 1958.LiDDeLL, H.G. SCott, r. Greek-English Lexicon. oxfd: Clad Pss, 1996MArtin, J. “ivg Scy, rfashg Pudc: th Dscvy f hidvdual rassac eup”. The American Historical Review, vl. 102, º 5,

     p. 1309-1342, 1997.MontAiGne, M. d. Les Essais. ed. d P. Vlly. Pas: PUF, 2004.-------------------. Os Ensaios. tad. d r. C. Abíl da d. d P. Vlly. Sã Paul:

    Mas Fs, 2001. nAVAUD, G.  Le théâtre comme métaphore théorique de Socrate à Shakespeare.Gèv: Dz, 2010.PLAtÃo. Œuvres Complètes (tm i – Alcibiade). Pas: Ls Blls Ls: 1985.roSSi, P. Francis Bacon: da magia à ciência. tad. d A. F. Bad. Lda:eda da UFPr, 2006.rUeL, É. Du Sentiment Artistique dans la Morale de Montaigne. Gèv: Sla,1970.