Teoria Do Estado Moderno

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    TEORIA DO ESTADO MODERNO: LEITURAS ECONMICAS E CULTURALISTAS

    Wanilton Dudek

    Resumo: As linhas tericas do campo das cincias sociais sempre colocaram em pauta a discusso referente Teoria do Estado Moderno. O problema central da minha pesquisa implica em fazer uma tnue ligao entre as Teorias do Estado Moderno dos autores clssicos das cincias sociais (Marx, Weber, entre outros), que optaram mais pelo vis materialista para construrir seus discursos, com teorias balizadas pela chamada Nova Histria Cultural. Mas importante elucidar que se trata de uma pesquisa sobre o Estado racional moderno, ou seja, o Estado nacional ocidental.

    Palavras-chave: Estado Moderno, teoria, Histria.

    As linhas tericas do campo das cincias sociais sempre colocaram em pauta a discusso referente a teoria do Estado Moderno. Tomando por base os chamados autores clssicos podemos classificar e indicar diversas definies sobre o tema. O problema central da minha pesquisa implica em fazer uma tnue ligao entre as Teorias do Estado Moderno dos autores clssicos das cincias sociais (Marx, Weber, entre outros), que optaram mais pelo vis materialista para construrir seus discursos, com teorias balizadas pela chamada Nova Histria Cultural, quando a mesma faz uso de aspectos culturalistas para analisar o mesmo Estado Moderno.

    Importa afirmar, que no se trata de uma pesquisa com o intuto de encontrar a melhor maneira de se estudar o Estado Moderno, e nem de fazer um confronto de teorias, mas sim de fazer uma releitura bibliogrfica mostrando os diversos ngulos de anlise. Ao passo que desta forma faremos um trabalho de interdisciplinaridade entre Histria e as Cincias Sociais.

    A idia de desenvolver um trabalho sobre este tema veio das leituras sobre o papel e a organizao do Estado Moderno, apresentadas nas disciplinas do curso de Especializao em Sociologia Poltica do departamento de Cincias Sociais da UFPR, aliada as minhas pr-leituras na rea de Teoria da Histria, onde esto includos os

    Professor de Histria e Especialista em Sociologia Poltica pela Universidade Federal do Paran.

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    temas de Histria Cultural. A princpio pergunto: h uma teoria de aspectos unicamente culturais sobre o Estado? Ou ainda: h uma teoria de aspectos apenas econmicos sobre o Estado? Um dos objetivos deste trabalho mostrar que em todas as anlises encontramos tanto aspectos culturais quanto econmicos, o que acontece uma

    relevncia maior, hora para um, hora para outro.

    A FORMAO DE ESTADOS MODERNOS

    As discusses que norteiam o debate que proponho esto notavelmente ligadas aos estudos histricos relativos a formao dos Estados Modernos europeus. O presente trabalho toma como ponto de partida uma observao histrica para a anlise da gnese do Estado Moderno, o que pretendemos discutir neste captulo.

    O Estado, enquanto instituio humana, muito antigo. Data de cerca de 10 mil anos, perodo em que surgiram as primeiras sociedades rurais na Mesopotmia, com uma certa organizao em torno de uma representao de poder. Podemos citar tambm a China, onde existiu um Estado dotado de aparato burocrtico durante sculos na antiguidade. Mas o que nos interessa analisar muito mais recente, ou seja, o Estado moderno europeu, com burocracia centralizada que podia exercer a soberania e autoridade em um vasto territrio; que detm poder de taxao e ainda a formao de grandes exrcitos para a proteo nacional. O surgimento destes Estados, com sua capacidade de prover segurana, ordem, leis, direitos a propriedade, deu incio ao mundo econmico moderno, que passa tambm revolucionar o campo das idias. (FUKUYAMA, 2004)

    Existem divergncias entre os historiadores a cerca da gnese dos Estados modernos. Uma parcela de estudiosos datam do sculo XVI, outra do sculo XV 1 o surgimento de aparelhos burocrticos e opressores que compem os Estados Modernos. Existe uma idia plausvel entre a historiografia do fim do sculo XIX e comeo do sculo XX de que a origem e o desenvolvimento dos Estados modernos esto entre a

    1 No que diz respeito a essa parcela de historiadores que citam o sculo XV como sendo o princpio dos

    Estados modernos, muitos atribuem aos Estados italianos do Quattrocento o mrito desta primazia, baseados principalmente nos movimentos humanistas e renascentistas deste perodo. E por outro lado, h aqueles que retormam mais ainda na histria para explicar a origem destes Estados modernos, tomando como base as disputas entre reinados da Europa nos anos de 1280 e 1360, como afirmou Jean Philippe Genet, em seu livro Estados Modernos: gnese e perpectiva. p. 362.

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    questo da formao do sentimento nacional e da nacionalidade, mas simultaniamente, com o advento da modernidade, quem tem o Estado como portador e realizador de ambos os casos. Contudo, como este Estado que se forma no perodo do sculo XV caracterizado pelo modelo absolutista de governo, ou seja, com o advento da modernidade percebemos a ascendncia deste modelo monrquico e absolutista de Estado, mas com as revolues burguesas do sculo XVIII2 podemos observar o declnio desta forma de governo. Alm do mais, ainda em fins do sculo XVIII, o modo-de-produo feudal e todas as suas implicaes na ordem social, ainda estavam muito presentes no cotidiano de alguns pases europeus, no entanto, rumo ao declneo, causando crises internas nos Estados monrquicos absolutistas.3 Portanto, se pegarmos como ponto de partida o surgimento dos Estados modernos a partir do advento da Modernidade (mercantilismo, absolutismo, etc), observaremos o seu fim com a queda dos arcaicos modelos absolutistas de governos denunciados pela Revoluo fracesa; pois, a partir deste perodo h um efeito domin, gerando a queda dos antigos regimes absolutos, comeando pela prpria Frana no fim do sculo XVIII, e terminando na Rssia, no princpio do sculo XX.

    No entanto, as transformaes j viam sendo anunciadas no sculo XII. Na medida em que as cidades cresciam, as relaes comerciais e monetrias davam os alicerces para uma nova concepo de poder. O historiador Jacques Le Goff afirmou que (...)a afirmao da cidade medieval entre os sculos X e XIII, produzia um dos mais encorpados movimentos de urbanizao que a Europa conheceu.(GOFF, 2002, p.221). Muito alm de apenas um espao para a circulao e aglomerao de pessoas ou mercadorias, as cidades europias haviam se transformado em lugares de discusso e participao poltica. A centralizao do poder nos mandos do monarca comea a tomar forma e estabilidade com a especializao administrativa que crescia naquele momento. Desta maneira, os administradores de terras senhoriais das provncias tornaram-se mais

    2 Mais precisamente a Revoluo Francesa.

    3 No primeiro captulo de A era das Revolues , o historiador Eric J. Hobsbawn afirma: Na maioria dos

    pases da Europa Ocidental, a nordem feudal implcita nessa maneira de pensar estava ainda muito viva politicamente, embora fosse cada vez mais obsoleta em termos econmicos. De fato, sua prrpria obsolescncia econmica, que fazia com que os rendimentos dos nobres e cavalheiros fossem ficando cada vez mais para trz em relao ao aumento dos preos e dos gastos, levava a aristocracia a explorar com intencidade cada vez maior seu bem nico inalienvel, os privilgios de status e de nascimento.(HOBSBAWN, 1977, p. 35)

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    eficientes na arrecadao dos impostos, que significavam tambm mais recursos para os prncipes e monarcas.(STRAYER, 1969)

    Esta falta de consenso entre os historiadores referente ao surgimento dos Estados Modernos s vem a enrriquecer mais ainda a pesquisa sobre o assunto. Contudo, podemos afirmar que estes Estados se revelaram mais influntes nas decises a cerca de um Novo Mundo que se anunciava apenas no advento das novas relaes comerciais a partir da conquista das amricas e do estabelecimento do mercantilismo.

    CULTURAS, IDEOLOGIAS E REPRESENTAES NA ANLISE DO ESTADO MODERNO.

    Na medida em que pretendemos compreender o funcionamento e as relaes do Estado Moderno com o poder, e a capacidade de aplicar sua poltica, faz-se necessrio apontar quais so as formas para tanto. Neste captulo pretendo fazer esta anlise, partindo de uma perspectiva culturalista, atrelada ao conceito de Histria Cultural, na qual podemos observar algumas alternativas para entender o problema do Estado Moderno.

    Sem ater-se ao processo cronolgico da formao dos Estados Modernos europeus, em que no limiar das discusses vem balizar a gnese destas instituies, realizaremos um exerccio de observao do problema a partir de autores que produziarm algo sobre o tema. A primeira obra selecionada para dar continuidade ao trabalho um texto de Roger Chartier4, que foi publicado no livro Histria Cultural: entre prticas e representaes. A idia de Chartier propor uma releitura do colquio Culturas e ideologias no Estado Moderno. Para tanto, ele inicia analisando os dois mecanismos que constroem o Estado Moderno em longo prazo so eles: o primeiro o monoplio fiscal que centraliza o imposto e da ao soberano a possibilidade de retribuir em dinheiro, e j no em terras, aos seus fiis e servidores. O segundo o monoplio estabelecido sobre a violncia legtima que atribui ao rei a fora militar, tornando-o senhor e garante da pacificao da sociedade. (CHARTIER, 1988, p.215). Os monoplios fiscais e militares definem as linhagens do Estado Moderno, juntamente com a conscincia da prpria histria e as condies para que ela seja

    4 Roger Chartier historiador francs, considerado idealizador do conceito de Histria Cultural,

    produzindo uma vasta obra sobre o assunto.

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    escrita. A gnese do Estado Moderno se encontra justamente na competio de vrios pretendentes hegemonia. Dois exemplos de monarquias modernas so a Frana e Inglaterra. Chartier discute que as formaes dos Estados Modernos, segundo Bloch, se encontram na feudalidade e a consolidao dos mesmos, j segundo Elias, esto nas sociedades industriais. O autor parte de trs pressupostos bsicos para tanto: ... quais as condies culturais requeridas para se desenvolver e se perpetuar o Estado de finana e de justia, absoluto e hegemnico? Quais as expresses ideolgicas, rituais e simblicas? Quais os efeitos, sobre as formas de sociabilidade e a economia psquica dos indivduos, destas transformaes que definem a forma prpria do poder do Estado? (CHARTIER, 1988, p.217). Admite o crescimento pela busca pela legitimao pela histria, citando o exemplo dos Royal Writ na Inglaterra. A imbricao entre o escrito do Estado, simblico e institucional. Interpretar estas questes implica em apreender no campo da prtica a eficcia simblica do Estado. A interpretao do simbolismo do Estado expresso em cerimnias, ritos e gestos que constroem e respaldam o Estado. Segundo o autor, ... o Estado Moderno define o terreno onde podem ser travadas as lutas simblicas entre os grupos isto , lutas onde a posio cerimonial visvel identificada com a posio social real, em que as distines manifestadas so tidas por desigualdades essenciais do ser social (GOFF, 1988, p.222). Em que ou, como a construo do Estado Moderno modifica a estrutura dos homens em conjunto? O prprio autor responde: nas sociedades de corte. As sociedades de corte so formas especficas de Estados, caracterizadas pelas propriedades particulares de funcionamento.

    Entender os Estados Modernos pela sociedade de corte exige entender as formas de vida da corte bem como, os hbitos criados pela mesma. Os Estados Modernos so apoiados na escrita deles mesmos, o que exige formao para tanto. Tal conseguido atravs de duas maneiras: primeiramente direto nas universidades, ou, fundando e apoiando novas instituies formadoras. A construo do Estado Moderno tem conseqncias culturais que no dependem apenas da sua ao voluntria sobre as instituies ou prticas designadas como tais. Ao transformar as prprias percepes do devir social possvel, ao produzir escolhas educativas ou profissionais inditas, essa construo revolve a sociedade nas suas profundezas, pois permite xitos anteriormente impossveis embora crie decepes indelveis.

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    Mas como o Estado estabelece esta relao de poder simblico e cultural? Eis uma hiptese: atravs dos seus discursos e polticas pblicas abrangentes. Os discursos mantm o Estado Moderno em controle e cuidado normativo. Nas polticas pblicas h uma efetivao da relao mais estreita entre a populao e o Estado, seja com suas polticas para a educao, cultura, etc; embora no sejam estas as nicas formas normativas do Estado. Nas palavas de Chartier: Examinar as condies culturais do Estado moderno , para comear, interrogar os laos existentes entre seu desenvolvimento e os progressos da alfabetizao das populaes. ( 1988 p. 217). Portanto, uma anlise da pespectiva cultural, que automaticamente recai sobre a anlise da representao, do Estado moderno, tambm deve manter um exerccio de anlise das populaes deste Estado.

    Contudo, as formas de representatividades do Estado apresentam-se com um aspecto muito peculiar no monento do absolutismo monrquico. Peter Burke caracteriza de forma maestral este aspecto em sua obra intitulada A fabricao do Rei: a construo da imagem pblica de Lus XIV.(BURKE, 1994) Nela, Burke coloca em pauta a problemtica do poder absolutista na figura central do rei, usando como base um estudo sobre a construo da imagem de Luis XIV, um dos mais notveis e respeitados reis da Frana, a quem atribuda a frase: O Estado sou eu!. O quanto de Lus havia em Lus XIV? Lus era baixo (1,60 metro) e calvo, no entanto, a imagem mais marcante que se tem dele no condiz com tal realidade. Alm destas discrepncias fsicas do mito com a realidade os crticos de Lus XIV sim, porque haviam imagens bem menos lisonjeiras de Lus encontravam mote nos feitos que ressaltavam sua ambio, sua falta de escrpulos, sua tirania, seu imenso amor prprio, suas fragilidades militar e sexual : foges da guerra, mas persegues as belas (BURKE, 1994, p.157). At a sua falta de religio, crtica esta feita por sua unio com os Otomanos e pelo culto oficial ao Rei Sol. Ademais, vale lembrar, que mesmo o que atribudo a Lus no pode ser confirmado como dele porque a imagem de Lus XIV no emanava, como a luz do sol, de um nico centro. Era a produo conjunta de escritores, artistas e patrocinadores oficiais e no-oficiais (BURKE, 1994, p.115). Mas que o ttulo da obra fabricao no iluda ao ponto de se acreditar que Lus tenha sido artificial, fabricado. Ele no tomou todas as decises que lhe foram atribudas na poca, mas tomou algumas delas

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    (BURKE, 1994, p.22). O que percebemos nesta obra a grande capacidade e necessidade de produzir uma imagem construtiva do Estado, ou do poder.

    Portanto, os grupos polticos - tanto aqueles que esto no poder, quanto aqueles que esto no poder- buscam os meios de comunicao como um dos meios para alcanar e manter tal poder5; isto implica tambm em um simbolismo das formas de atuao e mantenimento do poder do Estado bandeiras, heris nacionais, tradies, nacionalismo, etc.6

    ANLISE SOCIOLGICA E POLTICA DO ESTADO MODERNO

    As teorias de anlise do Estado Moderno, notadamente, so foco de pesquisa das cincias sociais e polticas. Pretendo, neste momento, discutir o Estado atravs desta perspectiva; para tanto, minha discusso tem como base dois autores clssicos das cincias sociais: Karl Marx e Max Weber. Comearemos por Marx.

    Discutir o Estado Moderno em Marx exige mais do que apenas o cuidado atento nas leituras sobre o assunto que podemos encontrar, pois no est claramente disposto onde Marx discutiu o Estado. Para fazer este debate se faz necessrio uma busca em suas chamadas obras histricas e perceber quando Marx escreve sobre o tema. No entanto, para se chegar no problema do Estado em Marx, torna-se interessante a observao das crticas atribudas a teoria marxista do Estado. Portanto, cito aqui o artigo denominado O Estado como instituio: Uma leitura das obras histricas de Marx, de autoria dos professores Adriano Codato e Renato Monseff Perissinoto, no qual discutido onde e como Marx construiu uma teoria sobre o Estado Moderno.

    Uma das crticas ao pensamento poltico do Estado em Marx est relacionada a sua concepo instrumental de Estado. Nas palavras de Norberto Bobbio: Marx tem uma concepo instrumental de Estado. O Estado como aparato do servio da classe dominante que a virada radical da concepo tica segundo a qual a fora do Estado antes de tudo uma fora moral e espiritual. (BOBBIO, 1979, p.29) Este centro da crtica a doutrina marxista do Estado a concepo instrumental de Estado. Mas logo podemos notar tambm, que os prprios crticos admitem a importncia da obra de

    5 Nas palavras de Nicolau Maquiavel:Os fins justificam os meios.

    6 6 Importa afirmar que no pretendo aqui discutir casos especficos de Estados Modernos, pois poderia entrar na discuso sobre populismo, nacionalismo ou totalitarimos que tm casos diferenciados entre si na formao de uma forma de governo; e que no entanto o Poder simblico est muito presente nestes casos.

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    Marx: A originalidade de Marx consiste no fato de que ele talvez,o primeiro escritor poltico que une uma concepo realista do Estado a uma teoria revolucionria da sociedade.(BOBBIO, 1979, P.29)

    Esta concepo crtica da teoria de marxista se fundamenta na afirmao de que Marx pensava o Estado como uma fora repressiva, fora esta que seria emanada pura e simplesmente da classe dominante (burguesia). Portanto, o Estado como um instrumento da classe burguesa (economicamente dominante) para atingir suas metas e interesses particulares.(CODATO/PERISSINOTO, 2000, p.13) De tal modo, o problema centra-se no lapso de Marx em analisar as diversas instituies que compem as formas de governo dentro de um determinado Estado. Basta observarmos esta passagem para compreendermos melhor:

    Marx e Engels (e sobre sua linha, um chefe revolucionrio como Lnim), convencidos como estavam de que a esfera da poltica fosse a esfera da fora (e nisso tinham perfeitamente razo), colocaram-se sempre o problema do argumento histrico desta fora, individualizado na classe dominante de tempos em tempos, em vez do problema dos diversos modos pelos quais essa fora podia ser exercida (que o problema das instituies).(BOBBIO, 1979, p.28-29)

    Portanto, estas crticas, em linhas gerais, colocam a teoria marxista do Estado (e tambm os seguidores do marxismo) como uma teoria incompleta na medida em que no se atm a discutir como se d a dominao poltica, mas estaria apenas preocupado em observar quem domina o Estado.

    No rebate estas crticas consta o texto de Perissinoto e Codato, onde feito uma leitura das obras histricas de Marx apontando o Estado com a devida diferena entre aparelho de Estado e fora do Estado. Segundo os autores:

    Assim que procuramos realizar uma leitura das obras histricas de Marx conjunto de ttulos, certo, bastante heterogneo, redigidos em circunstncias distintas e dirigidos a um pblico variado circunscrevendo, dentre e muitos possveis, um tema em especial, o Estado.(CODATO/PERISSINOTO, 2000, p. 18)

    Desta forma, o exerccio de anlise da teoria do Estado em Marx requer muito mais do que uma leitura de algum texto metodolgico sobre o assunto, mas sim uma [re]leitura de seus textos histricos para se trazer a luz a discusso do Estado.

    Marx compreendia o Estado como uma instituio complexa, dotada de processos e micro-instituies. Vejamos, por exemplo, esta passagem selecionada do 18

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    Brumrio de Lus Bonaparte: A burguesia francesa viu-se assim competida por sua posio de classe a aniquilar, por um lado, as condies vitais de todo o poder parlamentar e portanto o seu prprio, e, por outro, a tomar o Poder Executivo que lhe era hostil(MARX, 1971, p.23). E estas micro-instituies do Estado tm sua burocracia sustentada atravs da prpria organizao, prevista por determinada classe que a conduz. Na medida em que Marx fala em poder parlamentar percebemos as instituies que compem o Estado. Portanto, para Marx. o Estado tem uma funo, que a do poder decisrio, seja atravs da classe burguesa, ou da classe operria.

    Enquanto Marx define o Estado como a forma final de poder, ou seja, o Estado j o poder em si, percebemos na anlise de Max Weber o Estado como um meio para se chegar ao poder efetivo. Na perspectiva weberiana a poltica o campo onde so travadas as lutas pelo poder legtimo e o controle sobre o Estado seria um meio para se obter este poder. E qual seria a forma de aplicao e atuao deste poder? Atravs do uso legtimo da violncia, que nico e exclusivo do Estado esta legitimao7. Contudo, Weber indica ainda a importncia do Estado nacional fechado para o mantenimento e consolidao do capitalismo ocidental moderno, que seria este baseado na classe burguesa nacional e as instituies estatais:

    A luta constante, em forma pacfica e blica, entre Estados nacionais concorrentes pelo poder criou as maiores oportunidades para o moderno capitalismo ocidental. Cada Estado particular tinha que concorrer pelo capital, que estava livre de estabelecer-se em qualquer lugar e lhe ditava as condies sob as quais o ajudaria a tornar-se poderoso.(WEBER, 1999, p.517)

    Portanto, Estado Moderno em Weber est intimamente ligado ao advento do capitalismo moderno tambm, e nisto perceptvel que a preocupao dele estava em analisar toda a estrutura que foma a burocracia estatal, e da maneira que as formas de poder no Estado, em quanto meio para tanto, ligam-se ao prprio modelo capitalista de sociedade. Entretanto, alerta que esta luta constante pelo poder atravs da poltica gera o capitalismo, o que ele escreve mais adiante em seu texto. (...) , portanto, o Estado nacional fechado que garante ao capitalismo as possibilidades de sua subsistncia e,

    7 Para esta compreenso em Weber podemos consultar a obra Economia e sociedade: fundamentos de sociologia compreensiva, mais especificamente o captulo 8: A instituio estatal racional e os modernos partidos polticos e parlamentos (sociologia do Estado).

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    enquanto no cede lugar a um imprio universal, subsistir tambm o capialismo(WEBER, 1999, p.517)

    Consideraes finais A cincia poltica, em seu aspecto realista, tem como primeiro representante

    Nicolau Maquiavel, que escreveu no sculo XVI. Desde ento, o olhar sobre a poltica e sobre os soberanos esteve em constante mudana, em suas mais diversas formas de anlise. Contudo, o Estado Moderno, que tm sua gnese neste mesmo perodo, tornou-se o habitat das lutas polticas, no sentido de que, pelo controle deste mesmo Estado que se travam estas lutas. Isto faz com que as teorias do Estado Moderno sejam estudadas pelas mais variadas cincias sociais, seja Histria, Sociologia, Economia, ou qualquer outra que se proponha a analisar as relaes humanas. No entanto, como

    percebemos, esta anlise implica em um panorama abrangente sobre a poltica e a cultura deste Estado.

    Meu objetivo neste artigo jamais foi indicar um melhor modo de teorizar e analisar os Estados Modernos. Portanto, seja na perspectiva econmica, ou seja na perspectiva culturalista, os Estados Modernos fornecem, para as cincias sociais, um leque abrangente para compreender as relaes de Cultura e Poder que compe as relaes humanas.

    Referncias bibliogrficas

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