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Teoria Geral dos Contratos 1. Introdução: foi a parte mais modificada com o CC/02, o qual inspirou-se no CDC. Vide o Enunciado 167 do CJF. No que tange a relação contratual, o CC/02 adotou os princípios do CDC e apresentou o principio da função social da propriedade, ideia essa genuinamente brasileira. Ver Artigo 423 do CC (cópia do artigo 51 do CDC): “Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.”. 2. Crise da vontade: Será que se consegue manifestar a vontade em relação às grandes empresas? Em razão da diferença econômica entre as partes, a vontade resta desfavorecida, privilegiando a parte mais rica. Consoante o autor do livro The Death of Contract, este afirma que a ideia de que o contrato é um acordo de vontades, está morta, tendo em vista a proliferação dos contratos, exemplificando os contratos de adesão, em razão do capitalismo. A ideia, atualmente, é que o contrato deva estar estruturado, conforme as reais necessidades dos contratantes. 3. Conceito de Contrato: Um negócio jurídico bilateral ou plurilateral que visa criar, modificar ou extinguir direitos e deveres de cunho patrimonial. O contrato exige alteridade, ou seja, a presença de, pelo menos, 2 pessoas. Contrato Consigo Mesmo (117, CC): em regra, é anulável no prazo de 2 anos (179, CC) 1 . Excepcionalmente, tendo um mandato com uma cláusula que libere o mandatário a negociar, inclusive, com ele mesmo, através do mandato em causa própria. Exemplo: procuração de A para B, em que B passe para seu nome a propriedade de A. Obs.: o casamento se amolda até certa parte ao conceito de contrato, mas no que tange o caráter patrimonial, considerando o conteúdo afetivo, prevalece a teoria mista/eclética, em que o casamento é um contrato especial sui generis. 4. Classificação dos Contratos: a) UNILATERAL: aquele que gera obrigação para apenas uma das partes. Exemplo: doação pura; b) BILATERAL/SINALAGMÁTICO (reciprocidade de direitos e deveres para a mesma pessoa, em uma relação contratual): aquele que gera obrigações para ambas as partes. Exemplo: compra e venda. c) GRATUITO/BENÉFICO: aquele que gera vantagens para apenas uma das partes. Exemplo: doação pura; d) ONEROSO: gera vantagens para ambas as partes. Exemplo: compra e venda; e) COMUTATIVO: prestação certa e conhecida; 1 Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato.

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Teoria Geral dos Contratos 1. Introdução: foi a parte mais modificada com o CC/02, o qual inspirou-se no CDC.

Vide o Enunciado 167 do CJF.

No que tange a relação contratual, o CC/02 adotou os princípios do CDC e apresentou o principio da função social da propriedade, ideia essa genuinamente brasileira. Ver Artigo 423 do CC (cópia do artigo 51 do CDC): “Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.”.

2. Crise da vontade:

Será que se consegue manifestar a vontade em relação às grandes empresas? Em razão da diferença econômica entre as partes, a vontade resta desfavorecida, privilegiando a parte mais rica.

Consoante o autor do livro The Death of Contract, este afirma que a ideia de que o contrato é um acordo de vontades, está morta, tendo em vista a proliferação dos contratos, exemplificando os contratos de adesão, em razão do capitalismo. A ideia, atualmente, é que o contrato deva estar estruturado, conforme as reais necessidades dos contratantes. 3. Conceito de Contrato:

Um negócio jurídico bilateral ou plurilateral que visa criar, modificar ou extinguir direitos e deveres de cunho patrimonial. O contrato exige alteridade, ou seja, a presença de, pelo menos, 2 pessoas.

Contrato Consigo Mesmo (117, CC): em regra, é anulável no prazo de 2 anos (179, CC)1. Excepcionalmente, tendo um mandato com uma cláusula que libere o mandatário a negociar, inclusive, com ele mesmo, através do mandato em causa própria. Exemplo: procuração de A para B, em que B passe para seu nome a propriedade de A.

Obs.: o casamento se amolda até certa parte ao conceito de contrato, mas no que tange o caráter patrimonial, considerando o conteúdo afetivo, prevalece a teoria mista/eclética, em que o casamento é um contrato especial sui generis.

4. Classificação dos Contratos:

a) UNILATERAL: aquele que gera obrigação para apenas uma das partes. Exemplo: doação pura;

b) BILATERAL/SINALAGMÁTICO (reciprocidade de direitos e deveres para a mesma pessoa, em uma relação contratual): aquele que gera obrigações para ambas as partes. Exemplo: compra e venda.

c) GRATUITO/BENÉFICO: aquele que gera vantagens para apenas uma das partes. Exemplo: doação pura;

d) ONEROSO: gera vantagens para ambas as partes. Exemplo: compra e venda;

e) COMUTATIVO: prestação certa e conhecida;

1 Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato.

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f) ALEATÓRIO (álea=sorte; contrato de risco): as prestações apresentam riscos de não acontecerem, pois dependem da ocorrência de um evento futuro e incerto;

· Empitio Rei Speratae: venda de coisa esperada: o risco assumido é de quantidade. Seja um quilo ou uma tonelada, paga-se a mesma coisa. Senão houver nada, não se paga.

· Empitio Spei: venda da esperança: tem-se um risco de existência. Exemplo: compra e venda de safra futura.

g) TÍPICO: são aqueles que possuem regulamentação legal específica;

h) ATÍPICOS OU INOMINADOS: são os que não possuem regulamentação legal específica; exemplo: art. 425; ex: contrato de hospedagem é um contrato misto de contratos típicos: prestação de serviços, locação de coisas e depósito.

i) PRINCIPAIS: são aqueles que existem por si sós, ou seja, não dependem de outro contrato;

j) ACESSÓRIOS: são os cuja existência dependem de um contrato principal;

l) REAL: aperfeiçoa-se somente com a entrega da coisa; ex.: comodato;

m) CONSENSUAL: são aqueles que independem de forma especial, ou seja, se aperfeiçoam com o simples consentimento. Exemplo: compra e venda.

n) NÃO SOLENE (art. 107 do CC)2: não depende de escritura pública.

o) SOLENE: depende de escritura pública. Deve haver imposição legal. Ex. art. 108 do CC3;

p) NÃO FORMAL: não dependem de forma escrita. Podem ser feitos verbalmente. Compra e venda de móvel.

q) FORMAL: depende de forma escrita obrigatoriamente. Ex.: art. 819, CC4 (fiança);

r) PARITÁRIO: as partes podem alterar o conteúdo.

s) ADESÃO: a parte não pode alterar, substancialmente, o seu conteúdo. Cuidado: é possível discutir cláusulas. As cláusulas periféricas são passíveis de alteração. Ex.: cláusula do vencimento;

t) EXECUÇÃO INSTANTÂNEA: esgotam-se num só instante, ou seja, as obrigações são cumpridas instantaneamente. Ex: compra e venda de lanche.

u) EXECUÇÃO FUTURA: são aqueles que se prolongam no tempo. Podem ser: · EXECUÇÃO DIFERIDA: cumprido no futuro em uma única vez; · EXECUÇÃO CONTINUADA/TRATO SUCESSIVO: cumprido no futuro de forma gradativa. Ex.: locação residencial

urbana.

v) Contrato de Massa: o regulamento individual é substituído por um regulamento coletivo. Exemplos (4): · Contrato Coativo: realiza-se contra a vontade de uma pessoa. Ex.: seguro obrigatório; · Contrato Necessário: tem a obrigação legal de contratar. Ex.: art. 1467, CC5: penhor legal: as bagagens de

hóspedes ficam empenhadas para o cumprimento da obrigação. · Contrato Normativo: o conteúdo é imposto pela lei, mas há livre consentimento. Ex.: contrato de trabalho. · Contrato Tipo (Formulário): comercializado em formulários. Ex.: contrato de locação, disponível em

papelarias. 2 Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir. 3 Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País. 4 Art. 819. A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva. 5 Art. 1.467. São credores pignoratícios, independentemente de convenção: I - os hospedeiros, ou fornecedores de pousada ou alimento, sobre as bagagens, móveis, jóias ou dinheiro que os seus consumidores ou fregueses tiverem consigo nas respectivas casas ou estabelecimentos, pelas despesas ou consumo que aí tiverem feito; II - o dono do prédio rústico ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, pelos aluguéis ou rendas.

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5. Princípios Contratuais

Princípios são regramentos básicos, com eficácia normativa, que têm por objetivo complementar o conceito de um instituto jurídico, com base em padrões doutrinários, jurisprudenciais, e de aspectos políticos, econômicos e sociais. Ou seja, costuma-se dizer que o princípio funciona como o atualizador de uma lei.

Cumpre notar que a visão moderna da doutrina é no sentido de que o princípio tem força normativa, pois no momento de dizer o Direito o intérprete deve somar preceito e princípio.

Com a constitucionalização do Direito Civil os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da solidariedade social (art. 3º, I, da CF) e da isonomia (art. 5º da CF) também se aplicam ao Direito Civil, e, consequentemente, ao contrato.

Os princípios que norteiam a relação contratual são: autonomia privada; função social do contrato; boa-fé objetiva; força obrigatória; e relatividade dos efeitos do contrato.

I. Princípio da Autonomia Privada: é a liberdade que as partes possuem de se autorregulamentarem. Porém, é necessário impor limites. Assim, apresentam-se as fundamentações da autonomia privada:

· A personificação do direito privado: Atualmente se entende que a autonomia não é da vontade, mas sim da pessoa, o que reforça a tese de que saímos da era de patrimonialização (valorização do patrimônio) e estamos num momento de personificação (valorização da pessoa humana);

· Crise da vontade: a crise que impera na manifestação da vontade em razão de vários fatores: a) a imposição da contratação ou de algumas cláusulas contratuais pela lei e pelo Estado, o que se denomina DIRIGISMO CONTRATUAL. Como exemplo, podemos citar o seguro obrigatório, contrato que deve obrigatoriamente ser celebrado por proprietários de veículos automotores; b) a imposição de cláusulas pela parte economicamente mais forte, já que na maioria das relações contratuais encontramos desigualdades sociais entre elas, o que facilita o abuso da parte mais favorecida economicamente; c) condutas de comportamento impostas pelo meio social, que geram a conhecida “sede de consumo”, onde as pessoas celebram o contrato em razão de buscarem uma valorização no meio social em que vivem, como, por exemplo, a aquisição de roupas de grife ou de equipamentos eletrônicos de última geração; d) a exploração dos meios de marketing com mensagens subliminares (subliminar é qualquer estímulo não captado no nível de consciência por estar abaixo dos limites sensoriais receptores) para induzir à aquisição de produtos e serviços pelos consumidores; e) os fatores políticos também influenciam, pois se não há consumo não há investimento estrangeiro. Sem o investimento estrangeiro não há arrecadação de impostos. Se não houver pagamento de impostos, haverá desemprego. Com isso a economia desacelera e gera um efeito cascata na sociedade;

· Proliferação dos contratos de adesão: O Código de Defesa do Consumidor assim conceitua o contrato de adesão: Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. Existe contrato de adesão civil? Enunciado n. 171 do CJF: podem ser de consumo ou civil, ex.: franquia. Os arts. 423 e 424 do CC6 (DECORAR: é nula a renúncia feita pelo aderente, considerando que é outra pessoa que está renunciado em nome daquela) são aplicados nos contratos de adesão no âmbito civil.

6 Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente. Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio.

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II. Princípio da Função Social do Contrato: faz com que o contrato seja interpretado e visualizado dento de um contexto social. Exemplo atual: contrato de namoro: tem o fito de afastar as regras da união estável. Obs.: não é possível, pois não se pode fazer contrato para afastar normas, leis, súmulas, contrariando texto expresso em lei (art. 421, CC).

Quais são os dois erros insertos no artigo 421 do CC?

1º erro: liberdade de contratar (o correto é: liberdade contratual ou de contratação): é a liberdade de tomar a decisão com quem se quer contratar. Essa liberdade de contratar não está atrelada à função social, pois a segunda está ligada ao objeto e não a pessoa.

2º erro: a razão do contrato não é a função social e sim os limites dele. Esse princípio foi elevado à categoria de preceito de ordem pública (art. 2035, § único, CC). Tendo como consequência a possibilidade de o juiz poder agir de ofício.

Obs.: em caso de contratos que se iniciou antes do CC/02, o princípio da função social terá o caráter retroativo (retroatividade justificada), agindo nos referidos contratos.

Exemplos práticos de aplicação do princípio da Função Social do Contrato:

Artigo 108, CC: O representante é obrigado a provar às pessoas, com quem tratar em nome do representado, a sua qualidade e a extensão de seus poderes, sob pena de, não o fazendo, responder pelos atos que a estes excederem.

Artigo 413, CC: redução da cláusula penal. Dever do magistrado de reduzir a penalidade. Vide os Enunciados 355 e 356 do CJF: o juiz pode agir de ofício, em razão de caráter cogente.

Artigo 423 e 424 do CC;

Artigo 425, CC: a possibilidade de contratos atípicos (não estão nominados na lei);

Artigo 426,CC: vedação do Pacta Corvina;