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TRABALHO COOPERATIVO E ORGANIZAÇÕES EM REDE NA EXECUÇÃO DE SERVIÇOS DE ENGENHARIA Alexandre Koji Takimoto (COPPE-UFRJ) [email protected] Ricardo Manfredi Naveiro (COPPE-UFRJ) [email protected] O presente artigo tem como finalidade discorrer sobre a necessidade de cooperação entre organizações para prestar serviços de natureza complexa através de uma organização virtual em rede. A argumentação teórica tem base na formação de redess de cooperação e na ótica de produtos complexos. O caso analisado é o empreendimento que possibilitou o Período de Manutenção do Submarino Timbira dentro da Oficina de Construção de Submarinos no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ). Palavras-chaves: Rede de organizações, trabalho cooperativo, complexidade, XXX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO Maturidade e desafios da Engenharia de Produção: competitividade das empresas, condições de trabalho, meio ambiente. São Carlos, SP, Brasil, 12 a15 de outubro de 2010.

TRABALHO COOPERATIVO E ORGANIZAÇÕES EM REDE NA EXECUÇÃO DE ...abepro.org.br/biblioteca/enegep2010_tn_stp_119_779_15393.pdf · O submarino é uma das armas de defesa mais complexa

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TRABALHO COOPERATIVO E

ORGANIZAÇÕES EM REDE NA

EXECUÇÃO DE SERVIÇOS DE

ENGENHARIA

Alexandre Koji Takimoto (COPPE-UFRJ)

[email protected]

Ricardo Manfredi Naveiro (COPPE-UFRJ)

[email protected]

O presente artigo tem como finalidade discorrer sobre a necessidade

de cooperação entre organizações para prestar serviços de natureza

complexa através de uma organização virtual em rede. A

argumentação teórica tem base na formação de redess de cooperação

e na ótica de produtos complexos. O caso analisado é o

empreendimento que possibilitou o Período de Manutenção do

Submarino Timbira dentro da Oficina de Construção de Submarinos

no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ).

Palavras-chaves: Rede de organizações, trabalho cooperativo,

complexidade,

XXX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO Maturidade e desafios da Engenharia de Produção: competitividade das empresas, condições de trabalho, meio ambiente.

São Carlos, SP, Brasil, 12 a15 de outubro de 2010.

2

1.1

2 Introdução

O submarino é uma das armas de defesa mais complexa existentes. Além de ter um ambiente

extremamente hostil ao seu redor que é a profundeza dos oceanos, tem um projeto de

engenharia muito complexo onde todos os elementos necessários ao seu funcionamento são

compactados em um espaço exíguo dentro de um casco resistente feito de aço de alta

resistência e grande dificuldade de soldagem.

O ciclo de vida de um submarino prevê a sua docagem com a retirada de motores a cada

período de aproximadamente 7 anos, nesta época é feito uma manutenção geral de todos os

sistemas e o submarino volta após este período como em uma situação de novo. O grande

problema deste tipo de manutenção é a necessidade de retirada de grandes equipamentos que

são inseridos no submarino durante a sua construção e somente com um novo corte do casco,

separando novamente o casco, que podem ser retirados os motores. Este Período de

Manutenção (PM) dura em torno de 2 a 3 anos dependendo da forma optada para a sua

execução.

A limitação financeira fez com que houvesse a necessidade de buscar novas alternativas mais

econômicas e de melhor resultado para os processos de manutenção dos submarinos e dentro

deste contexto surgiu o projeto de se colocar o submarino inteiro dentro da oficina de

construção de submarinos em uma manobra chamada de “load-in”. Cabe ressaltar que no caso

da construção o submarino sai em quatro grandes seções para um dique flutuante onde são

unidos para posterior lançamento e desta forma este tipo de operação nunca tinha sido

executada.

O projeto para se chegar a esta manobra é um caso onde se pode verificar a importância dos

conceitos de produtos complexos, entendendo a sua natureza específica e as características

que o tornam complexos; a criação de redes de organizações para juntar esforços no sentido

de atingir um objetivo comum e a necessidade de cooperação entre todos os atores como

forma de haver uma troca de informações relevantes e assim otimizar o tempo e qualidade das

decisões tomadas.

3 Produtos e sistemas complexos

A idéia de que uma categoria de produtos industriais poderia ser definida como complexa

vem da literatura militar de sistemas (WALKER ET AL, 1988) e abrange uma grande

quantidade de sistemas técnicos (KLINE, 1990). Para Hobday (1998) os produtos complexos

podem ser definidos como qualquer produto que tenha alto custo, seja intensivo em

engenharia, com subsistemas, sistemas ou construção fornecidos por uma unidade de

produção (pode ser uma única empresa, uma unidade de produção, um grupo de empresas ou

uma organização temporária baseada em projeto). Alguns elementos de tecnologia nova são

freqüentemente envolvidos nos produtos e sistemas complexos, que são normalmente

adquiridos por um ou mais dos participantes e que estão debaixo de um contrato formal que

são reconhecidos em um único projeto.

Existem várias dimensões a serem analisadas no caso dos produtos complexos e elas devem

ser vistas como um indicativo da complexidade do produto ou sistema. Hobday (1998) cita

uma série de indicadores para serem analisados de acordo com uma pesquisa realizada entre

diversos engenheiros participantes de projetos que podem ser considerados complexos. A

análise feita leva em consideração níveis que variam de muito baixo a muito alto e a gradação

dos mesmos irá fornecer os indicativos da complexidade, cabe ressaltar que esta não é uma

3

lista fechada e que outros parâmetros podem ser adicionados na análise de produtos

complexos.

Custo da unidade em escala financeira

Inverso do volume de produção

Grau de desenvolvimento tecnológico

Extensão de software envolvido no produto

Quantidade de sub-sistemas e componentes

Grau de customização dos componentes

Complexidade e escolha da arquitetura de sistemas

Quantidade de alternativas de projetos de componentes

Ciclos de realimentação de informações dos estágios posteriores para os anteriores

Variedade de bases distintas de conhecimento

Variedade de habilidades e entradas de engenharia

Intensidade de envolovimento do usuário final

Incertezas e mudanças nos requisitos dos usuários

Intensidade de envolvimento dos fornecedores

Intensidade de envolvimento regulatório

É importante enfatizar que a complexidade, hierarquia e outros fatores críticos é uma questão

de grau. A maioria dos produtos e sistemas complexos é por definição compostos de um

grande grau de complexidade e risco em pelo menos em alguns aspectos. Compondo as

dimensões críticas é possível ter uma idéia da complexidade de um determinado produto e

sugere a dificuldade da tarefa de coordenação. A diferenciação entre produto e

empreendimento não pode ser feita de forma muito exata porque as características dos

mesmos estão profundamente interligadas.

Por todas estas características, o submarino está no nível mais elevado de grau de

complexidade, bem como toda a sistemática que o envolve na sua manutenção também tem

este elevado grau de complexidade.

3.1 Coordenação de atividades para produtos e sistemas complexos

Normalmente as implicações da coordenação são colocadas como uma dicotomia entre os

mecanismos de custos de transação do mercado e os custos internos e os limites entre a

empresa e o mercado podem ser determinados pelos custos relativos (COASE, 1937).

Observando além do que seria um planejamento consciente entre empresas e os mecanismos

espontâneos de preço de mercado, existe uma ampla margem de tipos de transação

intermediária que podem ser baseadas na cooperação através de grupos e alianças. Nestes

casos a comunicação entre os parceiros se dá de forma mais rápida e próxima e acabam

gerando economias externas a esta aliança.

Tipicamente, os sistemas e produtos complexos estão ligados através de uma densa rede que

molda a estrutura e coordenação, há tendência de poucas transações, politicisadas e reguladas.

Algumas vezes aparecem redes de produtos e sistemas complexos que são bastante estáveis,

especialmente para os casos de integradores de sistemas (DAVIES e HOBDAY, 2005).

O empreendimento costuma ser a forma principal de coordenação em redes de produtos

complexos. Neste caso o empreendimento está sendo visto como um substituto da palavra em

inglês project. O empreendimento é uma forma organizacional temporária que possibilita os

4

diferentes tipos de empresas participantes do empreendimento uma forma de acordo sobre os

detalhes do desenvolvimento e produção de um produto ou sistema complexo

(TUNZELMAN, 2004).

A rede de suprimentos de produto ou sistema complexo é organizada estrategicamente e

estruturalmente em torno das necessidades de projetos que normalmente atravessam as

fronteiras convencionais da estrutura industrial (PYKA e KÜPPERS 2002; MALERBA

2005).

Outro ponto importante a salientar é o papel que o cliente do produto ou serviço complexo

tem na produção do mesmo. Ao contrário dos bens de produção em massa os clientes no caso

de produtos complexos tem grande participação e um considerável interesse nos resultados de

um projeto desta natureza e freqüentemente participa ativamente dos processos que estão

sendo desenvolvidos (TUNZELMANN, 2004).

4 Redes de organização e cooperação

A concepção de cooperação via redes não é algo verdadeiramente novo no cenário das

organizações. Várias formas de alianças estratégicas entre empresas e organizações (joint-

ventures, consórcios, alianças oportunistas, terceirização, subcontratação e outras) já se

constituem em práticas empresariais há algum tempo.

As redes estratégicas interorganizacionais constituem-se em uma alternativa quanto à forma

de organizar a produção de bens e/ou serviços e podem ser utilizadas pelas empresas na busca

de melhoria de sua posição competitiva. Segundo Filo e Banahan (2005), o essencial no

conceito de redes é a figura da empresa-centro (hub-firm), ou ainda empresa-mãe (no caso de

um complexo industrial), em torno da qual se constrói toda a rede.

Além da forma proposta por Filo e Banahan (2005), Nakano (2005) propõem que é possível

montar redes de organizações virtuais com a utilização intensa de recursos de tecnologia de

informação e comunicação que está trazendo uma nova dinâmica para as estratégias

empresariais, possibilitando a formação estratégica de redes de cooperação entre organizações

que podem estar distantes.

Um outro ponto importante no caso de formação de redes de organizações apontado por

Amato Neto (2005) para o caso das Pequenas e Médias Empresas (PME) é que elas não

possuem competência para gerir todas as etapas da cadeia de valor e que atuando

isoladamente têm baixo poder de barganha em relação às grandes. Através de redes de

cooperação, as PME adquirem maior confiabilidade junto a seus clientes e ampliam o poder

de negociação com grandes empresas.

Considerando os fatores das PME, a necessidade de projetar um alcance maior para as

competências e a complexidade do produto ou serviço a ser desenvolvido existe a

possibilidades de junção de várias empresas em uma rede que pode gerar uma nova

organização virtual montada para um propósito específico. As razões estratégicas que levam

as organizações/empresas a adotar este modelo virtual na análise da competitividade podem

ser descritos como:

a) Compartilhar recursos, instalações e eventualmente competências a fim de ampliar o

alcance geográfico ou tamanho aparente que um concorrente pode oferecer a um cliente.

b) Dividir os riscos e os custos de infra-estrutura para candidatar-se à concorrência.

A organização virtual, ou mais precisamente uma organização com uma estrutura de

organização virtual, é apenas uma das muitas formas que a cooperação pode assumir. É

5

particularmente interessante atribuir grande importância à cooperação, para se alcançar maior

produção (GOLDMAN et al, 1995). A estrutura de uma organização virtual consiste em uma

aliança oportunista de principais competências distribuídas entre várias entidades operacionais

distintas, dentro de uma única grande empresa ou dentre um grupo de empresas

independentes. Seu objetivo é criar produtos-solução com tempo de vida tão longo quanto o

permitido pelo mercado. Alguns participantes terão que sair e se unir a outros grupos, assim

que suas competências não mais adicionarem valor suficiente para a obtenção da melhor

lucratividade possível na organização virtual.

Segundo Goldman et al. (1995), há seis motivos fundamentais que justificam a criação de

uma empresa virtual, consideradas pelo autor todos eles de caráter estratégico:

1. A formação de uma organização virtual para comercializar um novo produto permitira que

sua empresa compartilhasse de recursos de infra-estrutura, P&D, custos e riscos;

2. Uma organização virtual valorizaria oportunidades de desenvolvimento de produtos para

sua empresa, unindo as principais competências internas às principais competências de outras

empresas;

3. Ela reduziria o conceito de tempo através da integração de conhecimentos e habilidades

além dos limites da empresa em operações simultâneas;

4. Ela aumentaria o tamanho aparente ou a escala das operações – em primeiro lugar, em

relação às pessoas envolvidas (em termos de acesso à experiência e recursos) a um custo

menor do que o emprego na conquista desta escala por meios internos; e, em segundo lugar,

em relação aos clientes;

5. Uma organização virtual daria a sua empresa acesso a novos mercados por meio da

formação de parcerias, que permitam compartilhar das bases de fidelidade do cliente de outras

empresas, através do valor agregado ao novo produto desenvolvido em conjunto;

6. Uma organização virtual aceleraria a migração de sua empresa, da venda de produtos para a

venda de soluções.

Face aos argumentos apresentados a configuração de organizações virtuais para PME tendem

a se tornar mais fortes e tem grande relevância para a consecução de produtos complexos.

Estas organizações virtuais seriam como redes empresariais que podem ser um novo

paradigma industrial. Existem alguns critérios utilizados para tentar classificar as redes

empresariais e podem ser citados basicamente três trabalhos em relação às mesmas.

O sucesso no estabelecimento de uma rede eficiente de empresas/organizações virtuais

depende, segundo vários autores (GOLDMAN; NAGEL;PREISS, 1995; BREMER,

1996), de uma série de fatores, podendo destacar os seguintes:

a) Existência de parceiros qualificados;

b) Um mecanismo para a identificação de competências reais ou potenciais dos parceiros da

rede;

c) A existência de meios para projetar “grandes competências”, que estão em constante

mudança;

d) Formas de identificar e qualificarem rapidamente novas oportunidades para a constituição

de organizações virtuais;

e) Critérios objetivos para a escolha de parceiros que deverão compor as novas organizações

virtuais;

6

f) Critérios objetivos e formas para a distribuição dos benefícios gerados pelas atividades

dos parceiros das organizações virtuais constituídas.

Segundo Casarotto et al (1998) há dois tipos de redes para PMEs. Um primeiro modelo

denominado top-down que se caracteriza pelo fato de que empresas de menor porte fornecem

direta e indiretamente sua produção para uma empresa-mãe, através de subcontratações,

terceirizações, parcerias e outras formas de repasse de produção. Neste caso tanto a empresa-

mãe quanto suas dependentes competem pela liderança de custo. O segundo tipo de rede é a

rede flexível de pequenas empresas, que acontece quando PMEs reúnem-se através da

formação de um consórcio com objetivos comuns, com cada uma das empresas sendo

responsável por uma parte do processo de produção, ou seja, o conjunto das atividades deste

consórcio e a sua forma de funcionamento fariam com que as PMEs atuassem como uma

grande empresa. Neste caso, as empresas conseguem competitividade por obterem boa relação

entre flexibilidade e custo.

Autores como Wood Jr. e Zuffo (1998), pregam que há três tipos de estruturas para as redes.

Estes autores apresentam a estrutura modular como aquela na qual a organização mantém as

atividades essenciais da cadeia de valores e terceiriza as atividades de suporte, mantendo

controle sobre as mesmas, a estrutura virtual que liga temporariamente as redes de

fornecedores, clientes, concorrentes e a estrutura livre de barreiras que define funções, papéis

e tarefas menos rígidas dentro das organizações.

Conforme Corrêa (1999), apud Verri (2000), existe três tipos de redes de empresas. A rede

estratégica é aquela que se desenvolve a partir de uma empresa, que controla todas as

atividades. É o caso, por exemplo, das montadoras de veículos e de sua rede de fornecedores,

ou de empresas líderes em empreendimentos imobiliários, de vestuário e calçados esportivos.

A rede linear existe em torno da cadeia de valor, sendo seus participantes os elos da cadeia,

indo dos fornecedores de matéria-prima até o cliente. E na rede dinâmica existe um

relacionamento intenso e variável das empresas entre si. A liderança também não é fixa. É o

modelo mais flexível e aberto de rede, assim como o que melhor adapta para a conformação

de empresas virtuais, em que cada participante contribui com suas competências essenciais de

modo que a rede apresenta vantagens competitivas significativas como um todo.

O que se pode ver em comum em todos os trabalhos é a necessidade de cooperação entre

todos os atores da rede para que se possam ter as vantagens que são decorrentes da mesma.

Pode-se ressaltar que com a crescente reestruturação produtiva e os movimentos de

“cooperação” as pressões por redução de custos e aumento de produtividade geram a

formação de novos arranjos entre as empresas, com especial ênfase nas empresas que são

fornecedoras das grandes companhias. Esses agrupamentos estão voltados para maior

cooperação, oferecendo novos elementos para uma possível formulação de políticas

industriais.

4.1 Cooperação e projeto

De acordo com Naveiro (2003), o termo trabalho cooperativo tem sido utilizado em diversas

situações de trabalho e em todas elas envolvendo diversos individuos trabalhando juntos em

uma direção planejada e com tarefas interrelacionadas. O trabalho “cooperativo” envolve uma

série de de atividades coordenadas relativamente independentes e não hierárquicas,

caracterizadas pela construção conjunta de um artefato e a divisão de responsabilidades nesta

construção. Em um trabalho cooperativo, um grupo de pessoas está engajada em uma

comunicação direta e contínua para executar tarefas ligadas a produção de um produto ou

7

serviço em particular.

Um time de projeto é um grupo de especialistas em diferentes áreas de conhecimento com um

objetivo em comum. A sua maior necessidade é um apoio funcional para melhorar o seu

trabalho colaborativo. Como em qualquer lugar onde se tem atividades coletivas, o local de

projeto é um ambiente para a negociação de restrições e tomada de decisões. É também o

local onde a identificação de tarefas e relacionamentos que permitem lidar com diferentes

domínios e definir os papéis de cada participante.

5 Transporte do submarino para o interior da oficina de construção de submarinos

5.1 Objetivos da manobra

Conforme descrito por Pinto Correa, et al (2005) a manobra de transporte do submarino

“Timbira” para o interior da oficina de construção de submarinos realizada em maio de 2005

foi efetuada com a finalidade de se executar as atividades necessárias para o período de

manutenção geral programado do submarino. Este tipo de manutenção envolve a retirada de

todos os principais equipamentos de bordo para uma completa avaliação e manutenção dos

mesmos. Os motores de combustão principal e o motor elétrico de propulsão devido as suas

dimensões somente podem ser retirados de bordo se o casco do submarino for secionado para

ficar em condições semelhantes à de sua construção. Este tipo de corte somente é possível ser

efetuado em condições especiais necessitando que o submarino permaneça com o casco

secionado por um longo tempo até que os equipamentos retirados sejam colocados de volta

reparados e testados.

A realização deste corte para a retirada de equipamentos é demorada e necessita de cuidados

técnicos especiais devido à complexidade de soldagem do aço empregado no casco do

submarino e das estreitas faixas de tolerância dimensional. Este tipo de manutenção já tinha

sido executado pelo AMRJ de duas formas diferentes, uma em dique seco, e outra sobre um

dique flutuante. Cada uma destas opções acarreta uma série de inconvenientes com seus prós

e contra, e após extenso estudo a respeito de como realizar este reparo chegou-se à conclusão

que a possibilidade de colocar o submarino inteiro de volta a oficina de construção de

submarinos seria uma alternativa que poderia minimizar o período de reparo com mais

segurança e menor custo. Foi estimado e após a execução do reparo constatado uma redução

de custos da ordem de R$ 6.500.000,00 (seis milhões e quinhentos mil reais), para o Período

de Manutenção (PM) realizado no interior da Oficina de Construção de Submarinos

decorrentes da dispensa de contratação de guindastes para manobras de peso e da redução do

HH necessário para a realização do PM. Também não se pode deixar de considerar que a

realização do PM do Submarino “Timbira” na Oficina permitiu a utilização do dique seco ou

flutuante do AMRJ para a docagem e manutenção de outros meios navais, inclusive extra-

marinha

O grande problema desta manobra estava justamente em como colocar o submarino dentro da

oficina. Na construção, a técnica empregada é da construção modular, onde cada módulo é

composto de uma seção com todos os equipamentos em seu interior já instalados e

posteriormente estas seções são unidas. O projeto prevê a construção de 4 grandes seções com

pesos em torno de 250 toneladas e estas são colocados em um dique flutuante através de uma

cábrea e lá são unidas para posterior lançamento do submarino a partir deste dique. A

manobra de colocar um submarino inteiro, com um peso de aproximadamente 1200 toneladas,

dentro da oficina nunca tinha sido tentada e apresentava uma série de empecilhos técnicos e

gerenciais para a sua execução.

8

5.2 Planejamento da manobra

Uma vez definida a linha de ação a ser seguida, o AMRJ desenvolveu um projeto de

engenharia com a criação, pela direção do AMRJ, de um Grupo de Trabalho Multifuncional,

composto por engenheiros de diversas especialidades. A missão deste grupo foi desenvolver

um projeto que viabilizasse o transporte do Submarino “Timbira” da água, na condição de

flutuação, para o interior da oficina com o menor custo possível e priorizando a utilização dos

recursos existentes no parque industrial nacional.

Em novembro de 2004, após sete meses de desenvolvimento, o Grupo de Trabalho apresentou

um projeto preliminar da manobra que tem a sua concepção sintetizada na Figura 1. Este

grande envolvimento de engenharia para o planejamento do projeto é uma das características

dos produtos e serviços complexos em que há um grande envolvimento do cliente em todas as

fases.

Figura 1 – Concepção inicial da manobra

A concepção deste projeto baseava-se em três etapas principais. A primeira consistia na

docagem de uma balsa diretamente no piso de um dique seco do AMRJ. No alagamento do

dique, a balsa permaneceria no fundo, o que possibilitaria a docagem do submarino sobre a

balsa e posteriormente, a flutuação do conjunto balsa-submarino. Com este conjunto alinhado

ao cais seriam empregadas carretas com suspensão hidráulicas para movimentar o submarino

para o interior da oficina desenvolvendo um grande arco para compensar a inclinação do cais

existente em frente ao edifício.

Com base neste projeto inicial foi possível fazer uma licitação e a partir deste ponto ter

discussões a respeito do serviço.

5.3 Projeto de execução da manobra

A definição da empresa vencedora do certame representou um marco nesse processo, pois a

partir deste momento, surgiram dificuldades técnicas, função das limitações dos recursos

disponíveis, que tiveram que ser abordadas em uma parceria MB/Empresas

privadas/Universidade. Essas dificuldades, bem como as soluções adotadas mostram a

9

importância da cooperação, troca de informações e da organização da rede e são abordadas a

seguir:

5.3.1 Inclinação do cais com a oficina

A princípio, as carretas, com suspensão hidráulica independente em cada eixo, deveriam

desenvolver uma trajetória curva, conforme apresentado na Figura 1. Porém, em virtude do

grande comprimento, superior a setenta metros, as carretas não poderiam executar tal

trajetória, fato que gerou o projeto de duas estruturas metálicas (rampas de transição) entre a

balsa e o cais, de forma a permitir a passagem das carretas com segurança. Esta solução foi

encontrada de comum acordo após várias reuniões em que cada um apresentava as soluções

possíveis em relação às limitações técnicas existentes. Estas rampas podem ser visualizadas

na Figura 4 sob os caminhões.

5.3.2 Deslocamento do conjunto linhas hidráulicas e berços

Devido à geometria dos apoios, as carretas deveriam suspender o submarino pelos berços em

uma distância vertical superior ao curso permitido pela suspensão hidráulica. A fim de

eliminar interferências com os picadeiros centrais montados sobre o convés da balsa durante o

deslocamento do submarino para a oficina, foram projetados complementos de quilha em

madeira, a serem instalados sobre os picadeiros centrais e unidos aos berços, de forma a

reduzir substancialmente a distância vertical a ser vencida. Tal solução eliminou as

interferências dos berços de apoio do submarino com os picadeiros centrais da balsa, no

momento em que os berços e o submarino foram transportados pelas carretas para o interior

da oficina, evitando, inclusive, a interferência dos berços com os picadeiros centrais

previamente montados no interior da oficina. Vale ressaltar que, em função dos equipamentos

disponíveis, o problema descrito poderia inviabilizar a operação. Esta solução foi fruto da

união da experiência da equipe do AMRJ em docagens com a experiência da Superpesa no

transporte de cargas nas suas carretas e é apresentada nas figuras 2 e 3.

Figura 2 – Berços e complementos de quilha Figura 3 – Complementos de quilha

5.3.3 Nivelamento da balsa com o cais

A balsa deveria possuir um sistema de sensores que permitisse medir o alinhamento e o

nivelamento em relação ao cais e um sistema de lastro capaz de mantê-la alinhada e nivelada

durante toda a manobra, corrigindo os efeitos de trim e banda que certamente ocorreriam

durante o transporte do submarino da balsa para a oficina. Para garantir um controle mais

preciso da distribuição de lastros na balsa foram necessários vários cálculos efetuados pela

Suporte engenharia, conversados com o AMRJ e verificados independentemente pela USP.

Todo este processo foi agilizado graças à troca de documentos eletrônicos entre os

10

participantes que conseguiam em pouco tempo ter todas as informações disponíveis e

uniformizadas.

5.3.4 Características dimensionais e estruturais da balsa

A balsa deveria ser capaz de resistir estruturalmente aos esforços solicitantes resultantes da

docagem do submarino e do posicionamento das duas carretas sobre seu convés. Além disso,

deveria possuir pontal e calado que permitissem a docagem do submarino no dique seco do

AMRJ e também manter o nivelamento do seu convés em relação ao cais durante a manobra

de “load-in”.

A balsa foi reforçada estruturalmente na linha de centro e no fundo, a partir de um estudo que

gerou um projeto certificado pela Sociedade Classificadora “American Bureau of Shipping”

(ABS).

5.3.5 Capacidade dos tanques de lastro da balsa

A balsa deveria possuir capacidade de armazenar lastro suficiente para mantê-la nivelada ao

cais após o início da manobra, em qualquer condição de maré.

Um procedimento elaborado pela Suporte, encaminhado pela Superpesa, certificado pela

ABS, aprovado pelo AMRJ e verificado pela USP descreveu em pormenores a manobra, a

amarração, as forças envolvidas, o sistema de controle de lastro, os sensores, tanques e

bombas utilizados e a estabilidade do conjunto submarino-balsa.

5.3.6 Resistência do cais

O cais deveria resistir aos esforços decorrentes da passagem das duas carretas transportando o

submarino durante a manobra. Até então, as movimentações de carga no Cais Sul,

especialmente na região próxima à cantaria, eram realizadas por guindastes e cábreas, de

forma suspensa.

Após estudo detalhado, o cais foi reforçado por uma empresa contratada pelo AMRJ, de modo

a resistir com segurança aos esforços solicitantes calculados por ocasião da passagem do

submarino, carretas e demais acessórios [4].

5.3.7 Papel da universidade na rede formada

Concluídas as definições acerca das pendências técnicas geradas por limitações do

equipamento e do cais, fez-se necessário executar alguns estudos, com alto grau de

dificuldade, que pudessem entre outros aspectos, simular o comportamento dinâmico do

conjunto balsa-submarino, levando em consideração a ação das condições ambientais

reinantes no local.

O local escolhido, Tanque de Provas Numérico (TPN), da Escola Politécnica da Universidade

de São Paulo (EPUSP), é um laboratório pioneiro em hidrodinâmica aplicada e fruto da

colaboração entre a indústria brasileira e as principais instituições de pesquisa do país. Seu

principal objetivo é atuar como uma poderosa ferramenta para projeto e análise de sistemas

flutuantes, o que permitiu executar as análises de estabilidade do conjunto balsa-submarino,

tensões nas linhas de amarração, comportamento dinâmico da balsa quando atracada, análise

da resistência estrutural da balsa, simulação visual com realidade virtual que serviu para o

treinamento das equipes participantes da manobra, entre outros.

11

Figura 4 – comparação entre simulação virtual e manobra realizada

5.4 Organização da rede de empresas

O AMRJ, como principal interessado na execução da manobra, assumiu a coordenação dos

trabalhos e também a estruturação dos principais atores envolvidos neste projeto. A forma de

contratação se deu através de processo licitatório para a empresa que realizaria o transporte e

através de parcerias com a Universidade de São Paulo para a validação dos cálculos de

engenharia. Nesta configuração inicial, o AMRJ procurou organizar uma estrutura em que o

principal contratado fosse também responsável pela subcontratação de outras empresas e

todos os meios que se fizesse necessário para a execução deste serviço. Desta forma se

caracteriza uma rede do tipo estratégica onde o AMRJ assume o papel de coordenador e

também pode ser considerada como top-down com a Superpesa com a função de empresa mãe

prestando serviços para o AMRJ. Mesmo considerando estas classificações, observa-se que

por ser um serviço complexo, o AMRJ assumiu diversos outros papéis por ser um dos grandes

interessados no sucesso deste empreendimento.

A pesquisa feita pelo AMRJ encontrou a possibilidade de parceria com a empresa Superpesa

por ter balsas e equipamentos de transporte de pesos compatíveis com a necessidade da

manobra, apesar de não ter um corpo técnico habilitado para este tipo de serviço. Para

aumentar a segurança e conhecimento técnico nacional o AMRJ exigiu que a empresa fizesse

um detalhamento técnico de toda a manobra e que tivesse a mesma certificada por uma

sociedade classificadora. Desta forma a Superpesa montou uma parceria com o escritório de

projeto Suporte que montou os detalhamentos técnicos da manobra, atuando em uma das suas

áreas de experiência. Neste primeiro elo já se verifica a viabilidade de redes para este tipo de

atividade, já que cada uma das empresas concentrou-se no que sabia fazer de melhor.

Os dados apresentados pela Suporte Engenharia ao AMRJ foram conferidos por seu

Departamento Técnico e também por uma equipe da Universidade de São Paulo que teve

finalidade de garantir a confiabilidade dos dados e executar cálculos mais avançados de

comportamento da balsa no mar e análises mais sofisticadas de engenharia naval que o

escritório Suporte não estava habilitado a fazer, além de um modelo virtual da manobra para

poder treinar as equipes participantes da manobra. Formou-se então outra rede de informações

que apesar das distâncias funcionou bem devido à comunicação via Internet.

O projeto também foi acompanhado por uma sociedade classificadora que através das

experiências realizadas em outros países pode trazer uma confiabilidade maior para a

execução através da conferência dos cálculos apresentados pela Suporte engenharia. Desta

forma houve uma conferência extremamente rígida dos cálculos através de quatro órgãos

independentes fornecendo experiências e informação a todos os outros participantes da rede

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que foi elaborada.

AMRJ

Coordenador

Superpesa

Contratada Principal

Universidade de São Paulo

Verificação de resultados

Suporte Engenharia

Cálculos de engenharia

ABS

Sociedade Classifcadora

Symetry

Instrumentação

Meta

Medições especiais

Figura 5- Configuração da rede de organizações do empreendimento

Apesar de haver um contrato especificando as diversas questões que deveriam ser efetuadas

por cada empresa, houve desde o início um clima de colaboração entre todas as organizações

envolvidas e que muitas vezes foi além do que estava especificado no contrato de forma a

melhorar a performance do projeto como um todo. Ressalta-se o papel do cliente, no caso o

AMRJ como ponte de contato entre todas as organizações como acontece normalmente em

produtos complexos.

A coordenação de atividades necessárias para a execução do projeto envolveu equipes

compostas por integrantes das organizações envolvidas de forma a melhorar o fluxo de

informações, cada uma destas atividades pode ser desmembrada de forma a cada equipe poder

trabalhar de forma quase autônoma e isso foi importante para que as informações pudessem

circular de forma mais fácil e ágil. Este tipo de interação somente foi possível devido ao alto

grau de colaboração envolvido nesta atividade.

Além das empresas Superpesa e Suporte ainda participaram da rede de organizações para a

execução deste trabalho as empresas Symmetry, responsável pela instalação de equipamentos

de medição necessário na balsa; a Meta, que foi responsável pela medição de desnível da

balsa em relação ao cais utilizando teodolitos.

6 Conclusão

A criação de uma rede de organizações virtuais para um propósito específico pode se mostrar

como uma das formas para se chegar a um resultado expressivo em empreendimentos

complexos sem a mobilização de grandes capitais em equipamentos que serão utilizados

poucas vezes. Cabe ressaltar que no caso de serviços e produtos complexos o papel do cliente

é de fundamental importância, tanto na definição quanto na condução do empreendimento.

A colaboração de cada integrante das organizações envolvidas serve para mostrar a

necessidade de cooperação entre empresas para que se atinja um objetivo comum maior e que

sem este fato, e se todas as atividades fossem levadas apenas pelo que estava escrito no

contrato, não seria possível a conclusão desta operação.

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