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1 Transversalidade e ensino: o que falta para ser realidade? Érica P. Conde Universidade Federal do Piauí - UFPI Resumo A transversalidade permite que a educação seja interdisciplinar, mas o que percebemos são professores temerosos por invadir assuntos referentes à outra área. Falta uma educação crítica direcionada ao aluno, na qual a curiosidade seja o ponto de partida e a participação, a chegada. Do outro lado, precisamos de professores que estejam aptos a refletir sobre o fazer constante em sala de aula. Palavras-chave: Transversalidade, Interdisciplinaridade, Ensino. Abstract Transversality allows education to be interdisciplinary, but what we observe is that teachers are reluctant to teach topics from other disciplinary areas. There is a lack of a critical education directed to the student, in which curiosity is the starting point and participation is the goal. At the same time, we need teachers who are able to reflect on their everyday practice in the classroom. Key-words: Transversality, Interdisciplinarity, Education. INTRODUÇÃO O professor, em sala de aula, é responsável pela formação de pessoas. Partindo desse enfoque, podemos dizer que a educação vai além dos conteúdos ministrados. No que se refere a temas transversais, a grande questão a ser discutida é o fato de professores de algumas disciplinas, Ciências, História, Geografia, por exemplo, acharem-se exclusivamente capazes de comentar assuntos como saúde, ética e pluralidade cultural, ou seja, consideram-se os únicos competentes para fazerem uma discussão sobre essas temáticas. De certa forma, não tiramos o mérito dessas questões das disciplinas específicas. No entanto, acreditamos que os temas transversais, inseridos nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) trazem a possibilidade de temas como ética, meio ambiente, sexo, além de outros, serem enfatizados em qualquer disciplina.

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    Transversalidade e ensino: o que falta para ser realidade?

    rica P. Conde

    Universidade Federal do Piau - UFPI

    Resumo

    A transversalidade permite que a educao seja interdisciplinar, mas o que

    percebemos so professores temerosos por invadir assuntos referentes

    outra rea. Falta uma educao crtica direcionada ao aluno, na qual a

    curiosidade seja o ponto de partida e a participao, a chegada. Do outro

    lado, precisamos de professores que estejam aptos a refletir sobre o fazer

    constante em sala de aula.

    Palavras-chave: Transversalidade, Interdisciplinaridade, Ensino.

    Abstract

    Transversality allows education to be interdisciplinary, but what we observe

    is that teachers are reluctant to teach topics from other disciplinary areas.

    There is a lack of a critical education directed to the student, in which

    curiosity is the starting point and participation is the goal. At the same time,

    we need teachers who are able to reflect on their everyday practice in the

    classroom.

    Key-words: Transversality, Interdisciplinarity, Education.

    INTRODUO

    O professor, em sala de aula, responsvel pela formao de pessoas.

    Partindo desse enfoque, podemos dizer que a educao vai alm dos contedos

    ministrados. No que se refere a temas transversais, a grande questo a ser discutida o

    fato de professores de algumas disciplinas, Cincias, Histria, Geografia, por exemplo,

    acharem-se exclusivamente capazes de comentar assuntos como sade, tica e

    pluralidade cultural, ou seja, consideram-se os nicos competentes para fazerem uma

    discusso sobre essas temticas.

    De certa forma, no tiramos o mrito dessas questes das disciplinas

    especficas. No entanto, acreditamos que os temas transversais, inseridos nos

    Parmetros Curriculares Nacionais (PCN) trazem a possibilidade de temas como tica,

    meio ambiente, sexo, alm de outros, serem enfatizados em qualquer disciplina.

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    Assim, nossa proposta consiste em discutir o porqu de os professores de

    diferentes disciplinas poderem tratar de temas que envolvem questes de interesse

    comum. Partimos do pressuposto de que no deve haver omisses em relao a

    temticas sociais que podem permear os assuntos tratados por professores em suas aulas

    ou serem colocados por alunos de acordo com seus interesses e at afinidades com o

    ministrante de uma disciplina especfica.

    Garcia [s.d., s.p], ao discorrer sobre a transversalidade, faz um trabalho que

    une esse tema com a interdisciplinaridade, pois afirma serem os temas transversais

    pontos de convergncias entre os saberes:

    Existem temas cujo estudo exige uma abordagem particularmente ampla e

    diversificada. Alguns deles foram inseridos nos parmetros curriculares nacionais,

    que os denomina Temas Transversais e os caracteriza como temas que "tratam de

    processos que esto sendo intensamente vividos pela sociedade, pelas comunidades,

    pelas famlias, pelos alunos e educadores em seu cotidiano. So debatidos em

    diferentes espaos sociais, em busca de solues e de alternativas, confrontando

    posicionamentos diversos tanto em relao interveno no mbito social mais

    amplo quanto atuao pessoal. So questes urgentes que interrogam sobre a vida

    humana, sobre a realidade que est sendo construda e que demandam

    transformaes macrossociais e tambm de atitudes pessoais, exigindo, portanto,

    ensino e aprendizagem de contedos relativos a essas duas dimenses" (PCN). Estes

    temas envolvem um aprender sobre a realidade, na realidade e da realidade,

    destinando-se tambm a um intervir na realidade para transform-la. Outra de suas

    caractersticas que abrem espao para saberes extra-escolares. Na verdade, os

    temas transversais prestam-se de modo muito especial para levar prtica a

    concepo de formao integral da pessoa.

    O que Garcia [s.d., s.p.] prope consiste em desconsiderar as fragmentaes

    de conhecimentos a partir dos temas transversais, visto que eles permeiam toda a prtica

    educativa, exigindo um trabalho sistemtico, contnuo, abrangente e integrado no

    decorrer de toda a educao.

    Os PCN tambm estabelecem aproximaes entre a transversalidade e a

    interdisciplinaridade:

    A interdisciplinaridade questiona a segmentao entre os diferentes campos de

    conhecimento produzidos por uma abordagem que no leva em conta a inter-relao

    e a influncia entre eles questiona a viso compartimentada (disciplinar) da

    realidade sobre a qual a escola, tal como conhecida, historicamente se constituiu.

    A transversalidade diz respeito possibilidade de se estabelecer, na prtica

    educativa, uma relao entre aprender conhecimentos teoricamente sistematizados

    (aprender sobre a realidade) e as questes da vida real e de sua transformao

    (aprender na realidade e da realidade). E a uma forma de sistematizar esse trabalho e

    inclu-lo explcita e estruturalmente na organizao curricular, garantindo sua

    continuidade e aprofundamento ao longo da escolaridade. (BRASIL, 1998:30)

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    Pelo exposto, podemos dizer que a transversalidade surge nos PCN com o

    intuito de viabilizar o uso da interdisciplinaridade, visto que, como j expusemos, os

    temas transversais aproximam as disciplinas. Assim, no h como dizer que a

    interdisciplinaridade est longe de se tornar realidade. O que de fato falta comearmos

    a criar situaes de uso dessa possibilidade no mbito escolar.

    Acreditamos que o comeo de um bom trabalho com os temas transversais

    d-se, inicialmente, com a busca da educao crtica. O sentido do aprendizado s

    atingido a partir do momento em que o aluno envolvido na construo do saber

    formalizado. A criticidade deve ser estimulada a partir de questionamentos,

    independente de qualquer disciplina existente em uma grade curricular, em relao aos

    temas transversais.

    O ser crtico valorizado por Freire (1999) ao mostrar a necessidade de o

    aluno inquietar-se diante do desconhecido. Ser curioso surge como ponto de partida

    para novas descobertas.

    A curiosidade como inquietao indagadora, como inclinao ao desvelamento de

    algo, como pergunta verbalizada ou no, como procura de esclarecimento, como

    sinal de ateno que sugere e alerta faz parte integrante do fenmeno vital. No

    haveria criatividade sem a curiosidade que nos move e que nos pe pacientemente

    impacientes diante do mundo que no fizemos, acrescentando a ele algo que

    fazemos. (FREIRE, 1999:35)

    Em outras palavras, curiosidade e criticidade esto bem prximas na viso

    freiriana: a primeira pode ser vista como o ponto inicial para a adquirio de um

    conhecimento; a segunda, sem prescindir da primeira, apresenta-se como consequncia,

    resultado.

    No h ainda como falar de criticidade, sem falar de tica. Aqui a palavra

    tica indica respeito, considerao, reconhecimento do que feito pelo outro. Assim, a

    tica d respaldo curiosidade, limitando-a. A tica, no sentido de ser capaz de produzir

    e respeitar essa produo, outro aspecto defendido por Freire (1999):

    Uma crtica permanente aos desvios fceis com que somos tentados, s vezes ou

    quase sempre, a deixar dificuldades que os caminhos verdadeiros podem nos

    colocar. Mulheres e homens, seres histrico-sociais, nos tornamos capazes de

    comparar, de valorar, de intervir, de escolher, de decidir, de romper, por tudo isso,

    nos fizemos seres ticos. S somos, porque estamos sendo. Estar sendo a condio,

    entre ns, para ser. No possvel pensar os seres humanos longe, sequer, da tica,

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    quanto mais fora dela. Estar longe ou pior, fora da tica, entre ns, mulheres e

    homens, uma transgresso. (FREIRE, 1999:36 37)

    perfeitamente compreensvel perceber, aps a leitura de Freire (1999), o

    caminho da educao crtica: curiosidade criticidade - tica. Entretanto, a

    concretizao desse percurso o exemplo.

    Esse outro ponto bem controverso: a questo do exemplo. O exemplo

    sustenta o discurso, segundo Freire (1999). No h criticidade sem prtica:

    No h como pensar certo fora de uma prtica testemunhal que o re-diz em lugar de

    desdiz-lo. No possvel ao professor pensar que pensa certo, mas, ao mesmo

    tempo, pergunta ao aluno se ele sabe "com quem est falando".

    O clima de quem pensa certo o de quem busca seriamente a segurana na

    argumentao, o de quem, discordando do seu oponente, no tem por que contra

    ele ou contra ela nutrir uma raiva desmedida, bem maior, as vezes, do que a razo

    mesma da discordncia. Uma dessas pessoas desmedidamente raivosas proibiu, certa

    vez, de um estudante que trabalhava dissertao sobre alfabetizao e cidadania que

    me lesse. "J era", disse com ares de quem trata com rigor e neutralidade o objeto,

    que era eu. "Qualquer leitura que voc faa deste senhor pode prejudic-lo". No

    assim que se pensa certo nem a assim que se ensina certo. Faz parte do pensar

    certo o gosto da generosidade que, no negando a quem o tem o direito raiva, a

    distingue da raivosidade irrefreada. (FREIRE, 1999:38-39)

    Pelo exposto, percebemos que fazer uma prtica pedaggica, fundamentada

    pela criticidade, sem a prtica, o exemplo, como suporte do que dito, cria uma

    educao sem sentido de existir. Dessa maneira, no podemos valorar o discurso em

    detrimento do exemplo, mas fazer com que um justifique o outro. Isso de fundamental

    importncia para entender a transversalidade.

    A criticidade, partindo do princpio que pode ser construda, concretiza-se

    perante o outro. Ento, aqui, podemos falar do papel dos professores nessa questo.

    Estaramos diante de uma reflexo quanto importncia dos temas transversais no

    contexto escolar, a fim de viabilizar a existncia da viso crtica de nossos alunos.

    Ensinar a questionar, a ter respeito perante os outros, ter conscincia de

    nossos direitos e deveres refere-se ao termo criticidade. Exercit-la j se torna bem mais

    trabalhoso, pois requer empenho, participao e, principalmente o querer fazer, o que h

    pouco chamamos de exemplo, tendo por base os ensinamentos de Freire (1999). Desse

    modo, parece-nos que os aspectos referentes criticidade ficam, apenas, na teoria, pois

    mobilizar a escola para fazer requer preparao e envolvimento de todos.

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    A participao que aqui defendemos uma participao efetiva e tambm

    poltica, no sentido de dar voz ao aluno em sala de aula. A transversalidade,

    acreditamos, possibilita o desenvolvimento da criticidade, mas para que isso se

    concretize, precisamos de professores mediadores e alunos sujeitos do processo ensino-

    aprendizagem.

    A concretizao da criticidade d-se, dessa forma, com a efetiva

    participao. Encontramos, ento, a educao poltica, tendo como ponto de partida no

    apenas os contedos formais, mas, principalmente, os assuntos pertinentes ao nosso dia

    a dia.

    Outro aspecto que no podemos esquecer o fato de essa participao

    depender da forma como as pessoas percebem os valores. Valores como a aceitao de

    culturas diferentes, atitudes perante a democracia, o poder de gerir, o uso do bem

    comum. Alguns desses comportamentos esto extintos. O grande desafio das escolas

    consiste em comear a identificar a maneira como as pessoas percebem os valores.

    Para que isso se efetive na prtica, discusses que envolvam normas,

    crenas e valores devem ser retomadas na escola. J que as disciplinas encarregadas

    pelos estudos da cultura e da poltica no comportam em sua carga horria ampla

    discusso, cabem, ento, projetos interdisciplinares, trabalhos com assuntos

    complementares e comuns e, por que no a incluso de textos com temticas distintas

    nas aulas de portugus?

    A fim de realizarmos um trabalho bem fundamentado em sala de aula sobre

    a investigao e at a discusso e construo de valores, normas e crenas, lembramos

    as possveis maneiras de abordarmos os contedos inseridos nos temas transversais em

    sala de aula.

    A educao envolve pilares, que podem ser resumidos nas vrias formas de

    trabalharmos o ensino-aprendizado: factual (memorizar), conceitual (conhecer),

    procedimental (fazer) e atitudinal (ser e viver juntos), conforme nos instrui Coll (apud

    Zabala,1996).

    Para Coll (apud Zabala,1996) pensar na forma de abordagem de contedos

    consiste em pensar na aprendizagem. O autor defende que o contedo factual aquele

    que apresenta estratgias de aprendizagem simples, requer memorizao; o conceitual,

    por sua vez, exige um trabalho cognoscitivo por parte do aprendiz, consiste no

    conhecimento de conceitos e princpios; o procedimental, por sua vez, est atrelado ao

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    fazer, por isso podemos falar em aes; por fim, o atitudinal, o conhecimento de

    valores, normas e atitudes, envolve aspectos subjetivos que englobam os cognitivos,

    comportamentais e at afetivos.

    Nosso enfoque nos contedos atitudinais, os quais oportunizam um

    trabalho com a aprendizagem consciente. Viabilizam o uso dos temas transversais.

    Nesse ponto, acreditamos existir a possibilidade de realizao de um trabalho voltado

    para temas como tica, meio ambiente, pluralidade cultural, dentre outros.

    Que o professor formador de opinio, no h dvida. Dessa forma, no

    possvel abster-se de trabalhar com temas que podem transformar a realidade: ensinar

    educao no trnsito, abordar direitos e deveres, respeito ao prximo e s diferenas,

    dentre outros.

    Gadott (1998), mais radicalmente, menciona que o professor precisa tomar

    partido, ou seja, engajar-se politicamente, estar a favor ou contra os oprimidos. Para ele,

    ao assumir-se politicamente, esse profissional pode usar a educao como um

    instrumento de luta, pois, atravs dela, cria-se a conscincia crtica capaz de superar o

    senso comum.

    Nessa mesma linha, Ruiz (2003) expe que qualquer transformao s

    ocorre atravs do conhecimento. No caso do professor, precisa haver o conhecimento da

    realidade em que se inserem seus alunos:

    Educadores e educadoras precisam engajar-se social e politicamente, percebendo as

    possibilidades da ao social e cultural na luta pela transformao das estruturas

    opressivas da sociedade classista. Para isso, antes de tudo necessitam conhecer a

    sociedade em que atuam e o nvel social, econmico e cultural de seus alunos e

    alunas. (RUIZ, 2003:56)

    Freire (1999:110), no entanto, diz ser o ato de educar uma outra forma de

    transformao:

    Outro saber de que no posso duvidar um momento sequer na minha prtica

    educativo-crtica o de que, como experincia especificamente humana, a educao

    uma forma de interveno do mundo. Interveno que alm dos conhecimentos

    dos contedos bem ou mal ensinados e/ou aprendidos implica tanto o esforo de

    reproduo da ideologia dominante quanto o seu desmascaramento. Dialtica e

    contraditria, no poderia ser a educao s uma ou s outra dessas coisas. Nem

    apenas reprodutora nem apenas desmascaradora da ideologia dominante.

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    Com o exposto, vemos a relao entre conhecer e poder mudar. Isso pode

    ser direcionado para professores e alunos. No entanto, o grande desafio comear a

    fazer sem temer interferncias.

    preciso, pois, enfatizar que os PCN abordam os temas transversais,

    mostrando-os como uma possibilidade de os professores enfatizarem assuntos diversos

    em suas aulas; na verdade, nesse documento, esses temas esto abertos, dando

    flexibilidade aos currculos. Portanto, no de competncia, apenas, do professor de

    cincias, por exemplo, falar de assuntos como a preservao do meio ambiente.

    Os Parmetros Curriculares Nacionais incorporam essa tendncia e a incluem no

    currculo de forma a compor um conjunto articulado e aberto a novos temas,

    buscando um tratamento didtico que contemple sua complexidade e sua dinmica,

    dando-lhes a mesma importncia das reas convencionais. O currculo ganha em

    flexibilidade e abertura, uma vez que os temas podem ser priorizados e

    contextualizados de acordo com as diferentes realidades locais e regionais e outros

    temas podem ser includos.

    O conjunto de temas aqui propostos (tica, Meio Ambiente, Pluralidade Cultural,

    Sade e Orientao Sexual) recebeu o ttulo geral de Temas Transversais, indicando

    a metodologia proposta para sua incluso no currculo e seu tratamento didtico.

    Esse trabalho requer uma reflexo tica como eixo norteador, por envolver

    posicionamentos e concepes a respeito de suas causas e efeitos, de sua dimenso

    histrica e poltica. (Brasil, 1998:25)

    preciso entender o que vem a ser transversalidade, para comear a

    perceber que diferentes reas de conhecimentos podem fazer abordagens de assuntos

    diversos, por serem considerados como questes sociais. Os PCN colocam que temas

    transversais so temas complexos que permitem ser abordados por reas diversas:

    Por tratarem de questes sociais, os Temas Transversais tm natureza diferente das

    reas convencionais. Sua complexidade faz com que nenhuma das reas,

    isoladamente, seja suficiente para abord-los. Ao contrrio, a problemtica dos

    Temas Transversais atravessa os diferentes campos do conhecimento. Por exemplo,

    a questo ambiental no compreensvel apenas a partir das contribuies da

    Geografia. Necessita de conhecimentos histricos, das Cincias Naturais, da

    Sociologia, da Demografia, da Economia, entre outros. Por outro lado, nas vrias

    reas do currculo escolar existem, implcita ou explicitamente, ensinamentos a

    respeito dos temas transversais, isto , todas educam em relao a questes sociais

    por meio de suas concepes e dos valores que veiculam. No mesmo exemplo, ainda

    que a programao desenvolvida no se refira diretamente questo ambiental e a

    escola no tenha nenhum trabalho nesse sentido, Geografia, Histria e Cincias

    Naturais sempre veiculam alguma concepo de ambiente e, nesse sentido, efetivam

    uma certa educao ambiental. (BRASIL, 1998:29)

    O dilogo, fazendo parte da prtica do professor, poder abrir caminhos para

    o trabalho com os temas transversais, pois aproxima as diferenas, alm de permitir a

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    criao de novas posturas e, por que no dizer, para a construo de pessoas mais

    conscientes. Deveras, nesse tpico, podemos falar, mais uma vez, de Freire (1997) que

    afirma ser a educao um lugar para a elaborao coletiva e crtica da vida das pessoas,

    um lugar para a diversidade e diferena.

    Um dos ensinamentos mais difundidos de Freire a concepo de ensinar.

    Ensinar no transmitir conhecimento:

    Saber que ensinar no transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a

    sua prpria produo ou a sua construo. Quando entro em uma sala de aula devo

    estar sendo um ser aberto a indagaes, curiosidade, s perguntas dos alunos, a

    suas inibies, um ser crtico e inquiridor, inquieto em face da tarefa que tenho - a

    ele ensinar e no a de transferir conhecimento.

    preciso insistir: este saber necessrio ao professor - que ensinar no transferir

    conhecimento - no apenas precisa ser apreendido por ele e pelos educandos nas

    suas razes de ser - ontolgica, poltica, tica, epistemolgica, pedaggica, mas

    tambm precisa ser constantemente testemunhado, vivido. (FREIRE, 1999:52)

    Assim, ensinar est diretamente relacionado a construir. Envolve questes

    polticas, ticas, sociais. Aprender a aprender para depois ensinar a aprender.

    Precisamos rever as posturas de educadores que individualizam saberes.

    Necessitamos de posicionamentos crticos fundamentados, e no de palavras soltas e

    desmotivadoras, para colocarmos em prtica a transversalidade. A respeito da crtica,

    Freire (2000:59) diz que: preciso aceitar a crtica sria, fundada, que recebemos, de

    um lado, como essencial ao avano da prtica e da reflexo terica, de outro, ao

    crescimento necessrio do sujeito criticado.

    Consideramos possuir despreparo e desconhecimento dos temas transversais

    aqueles que afirmam serem alguns assuntos como a sexualidade, o meio ambiente, a

    tica, dentre outros, especficos de disciplinas.

    No h como negar que o que existe a ausncia de leituras e treinamentos

    dos professores para tratar dessas questes em sala de aula. Assim, deparamo-nos com a

    questo da formao do professor, que deve ser contnua, uma vez que as rpidas

    transformaes sociais exigem deste um posicionamento mais poltico. Os alunos

    instigam-nos com temas que envolvem a transversalidade e, diante desses temas,

    costumamos adiar discusses. urgente admitirmos esse despreparo. Acreditamos que

    a soluo seria a constante indagao: h reflexo na prtica docente?

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    REFERNCIAS

    AMORIM, M. S. S. (2007). Cidadania e participao democrtica. Anais do II

    Seminrio Nacional. Movimentos Sociais, Participao e Democracia. 25 a 27 de abril

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    ZABALA, A. (1998). A prtica educativa: como ensinar. Porto Alegre: Artmed.

    A AUTORA

    rica Pires Conde licenciada em Letras (Portugus) pela Universidade Estadual do

    Piau e em Pedagogia pela Universidade Paulista - UNIP; Mestre em Educao pela

    Universidade So Marcos So Paulo, e em Lingustica pela Universidade Federal do

    Cear - UFC. Atualmente, professora assistente da Universidade Federal do Piau -

    UFPI.

    E-mail: [email protected]