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73 Revista de Análise Internacional, Curitiba, Vol.1, n.1, ago./dez.,2016, p.73-88. Trienal de Yokohama: a arte como visibilidade internacional Yokohama’s Triennial: art as international visibility Tomoko Miyazono Coelho 1 Leonardo Mèrcher 2 RESUMO O presente artigo problematiza a Trienal de Yokohama como mecanismo de visibilidade internacional da cidade de Yokohama, no Japão. O resultado obtido e exposto no presente artigo é de que, apesar das lacunas de pesquisa na interseção entre os campos da Arte e das Relações Internacionais, o estudo de caso demonstra os conceitos de city branding como estratégia de ganhos no âmbito da paradiplomacia da cidade. Palavras Chave: Paradiplomacia; Arte; Visibilidade. ABSTRACT This article discusses the Yokohama’s Triennial as an international visibility mechanism uses by Yokohama City, Japan. The result obtained and exposed in this article is that, despite the research gaps at the intersection between the fields of Art and International Relations, the case study shows the city branding concepts as gains strategy within the city paradiplomacy. Keywords: Paradiplomacy; Art; Visibilidade. 1 Graduada em Relações Internacionais pelo Centro Universitário Internacional, UNINTER, Curitiba, Brasil. 2 Doutorando em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná e professor UNINTER, Curitiba, Brasil.

Trienal de Yokohama: a arte como visibilidade internacional · 2016-12-01 · O mercado de cidades, ... para cidades aos quais denomina: ... e suas forças competitivas dependem das

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73 Revista de Análise Internacional, Curitiba, Vol.1, n.1, ago./dez.,2016, p.73-88.

Trienal de Yokohama: a arte como visibilidade internacional

Yokohama’s Triennial: art as international visibility

Tomoko Miyazono Coelho1

Leonardo Mèrcher2

RESUMO

O presente artigo problematiza a Trienal de Yokohama como mecanismo de visibilidade internacional da cidade de Yokohama, no Japão. O resultado obtido e exposto no presente artigo é de que, apesar das lacunas de pesquisa na interseção entre os campos da Arte e das Relações Internacionais, o estudo de caso demonstra os conceitos de city branding como estratégia de ganhos no âmbito da paradiplomacia da cidade.

Palavras Chave: Paradiplomacia; Arte; Visibilidade.

ABSTRACT

This article discusses the Yokohama’s Triennial as an international visibility mechanism uses by Yokohama City, Japan. The result obtained and exposed in this article is that, despite the research gaps at the intersection between the fields of Art and International Relations, the case study shows the city branding concepts as gains strategy within the city paradiplomacy.

Keywords: Paradiplomacy; Art; Visibilidade.

1 Graduada em Relações Internacionais pelo Centro Universitário Internacional, UNINTER, Curitiba, Brasil. 2 Doutorando em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná e professor UNINTER, Curitiba, Brasil.

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INTRODUÇÃO

Este artigo tem como finalidade expor a Trienal de Yokohama (TY), ou seja,

uma exibição de arte internacional, como uma ferramenta por maior visibilidade

internacional da cidade de Yokohama, no Japão. Essa percepção surge a partir da

aplicação do conceito de city branding, ou seja, da marca visual da cidade como uma

possível estratégia de ganhos internacionais. Ao se estudar cidades nas Relações

Internacionais, optamos pelo campo da paradiplomacia e dos novos agentes para

auxiliar no recorte e na identificação das fontes de pesquisa: informativos oficiais da

cidade, da TY, dos demais eventos de arte internacionais e suas instituições. Os dados

coletados foram tratados como informação de forma qualitativa, o que possibilitou maior

reflexão sobre seus conteúdos junto à literatura especializada.

O presente artigo tem como objetivo geral compreender os processos de

internacionalização municipal por meio da visibilidade internacional levantada por

pesquisadores, como Michalis Kavaratzis (2004) e Fernanda Sánchez (2007), diante do

mercado internacional de cidades. Para aplicar o conceito de marca de cidade (city

branding), onde cidades criam estratégias de políticas públicas urbanas de forma a

ofertar uma imagem convidativa da cidade, analisa-se o caso da Cidade de Yokohama

e sua TY, realizada no Japão desde o ano 2001. Na medida em que se atrela a imagem

da TY à imagem da Cidade, como um caminho à obtenção de ganhos locais, o campo

da Arte se aproxima do campo das Relações Internacionais e traz em si um vasto leque

de problemáticas a serem investigadas. Contudo, delimita-se no presente artigo as

realizações da TY e seu reconhecimento externo, tanto pelos indicadores dos ganhos

locais, como pelo turismo na Cidade, como pelo reconhecimento das demais

instituições artísticas internacionais sobre o seu modelo e conteúdo.

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Trienal de Yokohama e a estratégia por visibilidade

A cidade de Yokohama, a segunda mais populosa do Japão e centro portuário

de Tóquio, guarda uma história extensa, tanto pela proximidade da nova capital

japonesa, quanto pela diversidade cultural de sua população. Historicamente,

Yokohama foi um dos agentes subgovernamentais indispensáveis na abertura

internacional do Japão oitocentista na Era Meiji. Atualmente, a proximidade com a

capital nacional Tóquio, considerada por Saskia Sassen (1991) e diversos outros

pesquisadores e indexadores como a terceira maior cidade global no mundo, também a

ajuda economicamente e a insere nos diversos circuitos e dinâmicas internacionais no

século XXI. A própria cidade se coloca como parte da Grande Tóquio e beneficiária das

políticas da capital3. Contudo, a busca por uma valorização de sua tradição e imagem,

levou a Cidade de Yokohama a fomentar práticas de visibilidade local e internacional,

dentre elas a Trienal de Yokohama (TY).

Imagem 1 : Vista de Yokoma, 2015. Fonte: City of Yokohama4

Diversos foram os grandes eventos com visibilidade internacional que a Cidade

sediou nos últimos anos, como: a Copa Mundial de Futebol (2002); a Conferência

Internacional de Tóquio para o Desenvolvimento Africano (2008); e o Encontro da

3 Disponível em <http://www.city.yokohama.lg.jp/>. Acesso: 26/09/2015. 4 Disponível em<http://www.city.yokohama.lg.jp/>. Acesso: 24/02/2016

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Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (2010). Contudo, esses eventos acabam por se

misturar com a imagem de Tóquio, a capital metropolitana. Para que a cidade então

pudesse ganhar visibilidade associada à Cidade foi preciso investir em ações

internacionais, como na Cidades e Governos Locais Unidos (CGLU) e em eventos que

levassem seu nome. Dessa forma a paradiplomacia da cidade, ou seja, a diplomacia

paralela ao governo nacional – e, neste caso, também à cidade de Tóquio – é vista em

múltiplas frentes de ação nos últimos anos.

A CGLU, importante organização sobre o tema do desenvolvimento de cidades

no mundo, tem registrado a atuação da Cidade de Yokohama nas questões ambientais,

gestão de riscos urbanos e políticas urbanas (CGLU, 2016). A participação nessas

agendas se deve à natureza geológica e natural da cidade, que reconhece em si as

ameaças naturais, como terremoto e tsunamis. Mas sua paradiplomacia não limita-se

apenas às necessidades de gestão locais, como as questões ambientais.

Especialmente no caso da ação por visibilidade, a Cidade de Yokohama, dentre outras

iniciativas, optou por investir na TY como um meio já posto como imagem – artes

visuais – em diálogo com um circuito internacional já estabelecido das grandes bienais

e feiras de exposição de arte contemporânea.

No que se estende à temática de cidades nas relações internacionais, a criação

de uma agenda cultural paradiplomática por visibilidade, por meio da TY, seria

resultante do reconhecimento por parte do governo local sobre quais aspectos seriam

de melhor relevância para a criação e efetivação de projetos locais que irradiariam uma

imagem publicitária no cenário internacional. Esse processo dá origem, segundo

Kavaratzis (2004) à incorporação na agenda local da estratégia de city branding (mrca

da cidade). A criação de uma marca para a cidade giraria hoje em torno de uma nova

dinâmica do capitalismo, ou seja, uma nova modalidade no acúmulo e fluxo de capitais

que seria a mercantilização de cidades (SÁNCHEZ, 2001; KAVARATZIS, 2004). Essa

estratégia de ganhos por visibilidade seria resultante dos modelos de desenvolvimento

econômico neoliberal, especialmente após os anos 1990. Deste modo, convergindo

com os novos fluxos globais econômicos, no pós-neoliberalismo dos anos 1990,

agentes locais, como as cidades, buscaram criar imagens sínteses (KAVARATZIS,

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2004), às quais facilitam a inserção dos mercados locais no grande mercado

globalizado de cidades.

O mercado de cidades, tratado por Fernanda Sánchez (2001), estabelece

categorias onde cada cidade, diante de suas intervenções políticas e interesses, podem

se enquadrar como competidoras em um determinado nicho de mercado. Para Sánchez

(2001) existiram, por exemplo, os mercados para empresas com interesses localizados,

onde as cidades se adaptam estruturalmente para atender aos fluxos financeiros,

industriais, comerciais e de logística internacional. A autora também fala do mercado

imobiliário como um desses nichos do mercado de cidades, seguido por mais quatro: os

de consumo; turismo; de boas práticas; e, finalmente, o de consultoria em planejamento

e políticas públicas (SÁNCHEZ, 2001).

Em convergência, Anttiroiko (2014) sustenta a ideia de que regiões asiáticas

desenvolvidas necessitaram passar por um processo de reestruturação e revitalização

de suas economias e indústrias em um cenário pós-Guerra Fria, argumentando também

que as escolhas dessas regiões justificam-se por estarem entre as maiores cidades na

hierarquia urbana global. O autor analisar a lógica de atração na competição entre

cidades: explorando o perfil econômico da cidade associada à era pós-industrial;

identificando as cidades em etapas mais avançadas, considerando-se os critérios

citados anteriormente; e, finalmente, discutindo as dimensões sociais e estratégicas

para cidades aos quais denomina: attraction-oriented economic city branding (marcas

de cidades orientadas à atração econômica).

Desta forma, a economia urbana de cidades como Yokohama não deve ser

estudada desatrelada à economia global, como apontam as considerações de

Anttiroiko. Logo, mesmo diante de um cenário onde as cidades são questionadas se

relevantes para as Relações Internacionais, sublinha-se o processo de globalização

que as justificam como unidades de análise e o recorte ao nível local e interno de suas

políticas municipais. Na globalização (SASSEN, 2010), fatores econômicos colocam

novos agentes na arena mundial, ao qual todos, inclusive as cidades, passam a

disputar recursos como por meio da visibilidade. De forma intencional ou indireta –

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demandada por outros agentes externos, as cidades absorvem o conceito de

Karavatzis sobre criar uma marca municipal para ampliar os ganhos locais diante do

cenário internacional. Esse fato é melhor elucidado por Harvey (1985, p. 158):

[…] cada região urbana possui uma autonomia para alcançar quaisquer cursos que tomem, mas ao fim cada uma é disciplinada por leis externas coercitivas de competição. Suas indústrias devem competir dentro de uma divisão internacional do trabalho, e suas forças competitivas dependem das qualidades da força de trabalho; da eficiência e da profundidade de infraestruturas sociais e físicas; da "racionalidade" dos estilos de vida, culturas e processos políticos; do estado da luta de classes e tensão social; da posição geográfica e dotação da recursos naturais.5

Desta maneira, Yokohama demonstra que a TY promove a reprogramação da

visibilidade local por meio das políticas de incentivo cultural cultivadas em início dos

anos 1980, dando continuidade aos dias de hoje. Em 1982, a cidade de Yokohama

criou o Escritório de Cultura Cidadã, responsável por criar políticas de iniciativa e

promoção artística e intercultural, e o passou a ser, em 2004, a na Sede da Cidade

Criativa da Cultura e Promoção da Arte. Essa sede estabeleceu metas de “estratégia de

cidade criativa e de turismo” para um período de quatro anos, além de, consolidar o

Departamento de Promoção de Cidade Criativa, o Departamento de Promoção da

Cultura e o Departamento de Promoção de Turismo e Convenção em um novo órgão

denominado Escritório de Cultura e Turismo.

Dessa forma, é evidente a importância dada às políticas culturais pela cidade

de Yokohama, o que também é perceptível pela Secretaria de Turismo com o

Departamento de Cultura, que demonstra o interesse municipal em se destacar no

cenário nacional e internacional. Em justificativa ao incentivo à cultura, destacam-se o

crescimento de fatores interpessoais, o cultivo da marca municipal e a maior presença

internacional em um cenário globalizado. Justifica-se também que a transmissão da

cultura de Yokohama para trazer maior aquecimento econômico resultando, portanto,

5 Tradução livre dos autores: […] each urban region has the autonomy to pursue whatever course it will, but in the end each is disciplined by external coercive laws of competition. Its industry has to compete within an international division of labor, and its competitive strength depends upon the qualities of labor power; the efficiency and depth of social and physical infrastructures; the 'rationality' of life-styles, cultures, and political processes; the state of class struggle and social tension; and geographical position and natural resource endowments. (HARVEY, 1985, p. 158).

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no maior bem-estar aos cidadãos. (Secretaria de Cultura e Turismo de Yokohama,

2012). Esses princípios básicos da política de Yokohama são apresentados na figura 2.

Figura 2: Princípios políticos básicos. Secretaria da Cultura e Turismo da Cidade de Yokohama, 2012.6

Estes princípios básicos evoluem para as quatro políticas básicas, que

convergem e promovem a cultura, a arte e as medidas de cidade criativa. Assim, a

6 YOKOHAMA. Yokohama. Secretaria da Cultura e Turismo. Yokohama City’s Policy Regarding Culture, Art and Creative City Measures. Yokohama: Open Yokohama, 2012, p. 18.

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política básica um traduz-se em apoiar atividades artísticas e culturais para que

enriqueçam a vida dos cidadãos. A próxima política básica estabelece cultivar nutrir as

crianças e outros membros de gerações futuras, a terceira política básica determina

apoiar artistas e criadores de arte e executar desenvolvimento urbano que utilize a

criatividade. Finalmente, o último ponto aponta para transmitir a arte e cultura inovadora

e única pelo Japão e ao mundo, de maneira que se gere prosperidade e promova a

Convenção de Incentivos de Eventos e Reuniões de Yokohama.

A Figura 3 aponta o fortalecimento das funções de apoio de artistas e criadores

artísticos, o primeiro ponto descreve que com os esforços centrados no Centro Cidade-

Criativa Yokohama , o município irá colaborar com empreendedores e várias

companhias e organizações que apoiem indústrias criativas para que sejam fortalecidas

as funções de apoio à artistas e criadores artísticos. O segundo ponto, irá

estrategicamente se utilizar de várias formas de mídia para transmitir informações em

Yokohama de forma efetiva, além de assuntos relativos as medidas da Cidade Criativa

de Yokohama.

Figura 3: Terceiro ponto Política 3 “Trienal de Yokohama”, 2012.7

7 YOKOHAMA. Yokohama. Secretaria da Cultura e Turismo. Yokohama City’s Policy Regarding

Culture, Art and Creative City Measures. Yokohama: Open Yokohama, 2012, p. 18.

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Esta imagem demonstra a promoção das artes que são enumeradas em quatro

políticas, as quais pontuam objetivamente os projetos e os objetivos do incentivo

municipal ao projeto, assim, a TY ocupa a política básica número 03, na qual destaca a

característica criativa singular da cidade, de modo a demonstrar o crescimento da

comunidade artística no município. Portanto, a política 03 enumera a promoção do

influxo de artistas e criadores, a construção de redes em conexão com indústrias

criativas, o fortalecimento das funções de apoio dos artistas e criadores. Nessa política

sublinha-se a iniciativa municipal na divulgação do evento em inúmeros meios-

midiáticos, nos quais também se compromete a apoiar os empresários e demais

organismos de caráter privado que estejam envolvidos na indústria criativa para

consolidar a Comissão artística que apoia artistas e a comunidade criativa. Assim, a

figura 3 mostra a característica especial número 04, em que explica a TY destacando

ser uma exibição de arte moderna internacional em que movimenta toda a cidade de

Yokohama através de esforços cooperativos entre cidadãos locais, comunidades e as

últimas tendências das artes modernas no mundo que são postas em exibição através

da Trienal. Logo, tais políticas básicas e características especiais demonstram tanto a

preocupação de Yokohama em promover a cidade, tanto quanto a justificativa do uso

da arte para o desenvolvimento da cidade.

A TY objetiva reunir o máximo de artistas possíveis em sua amostra que

acontece a cada três anos na cidade de Yokohama no Japão, tendo como objetivo

expor a arte contemporânea mundial8 e, por resultados secundários, acaba por fundir

com a arte contemporânea japonesa. A exposição de grandes artistas internacionais,

juntamente com artistas japoneses, coloca a arte regional no cenário do circuito

internacional das artes9, ampliando a visibilidade cultural, não só dos artistas

participantes, mas também da própria cidade e do Japão. Nota-se, também, que a

Trienal de Yokohama possui um público plural, indo de cidadãos da própria cidade até

turistas internacionais, mídias, críticos e galeristas de arte, os quais transporiam o

8 Disponível em <http://www.yokohamatriennale.jp/english/>. Acesso: 15/08/2014. 9 Disponível em <https://news.artnet.com/art-world/worlds-top-20-biennials-triennials-and-miscellennials-18811>. Acesso: 25/10/2015.

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modelo de gestão levando-o para outras execuções, como no caso da Bienal de São

Paulo nos últimos anos10.

Externamente, a TY, apesar de ter sido criada apenas em 2001, é destaque em

críticas de arte de renome internacional e categorizada em exibições bienais e trienais

mundiais como uma das principais mostras de arte. A Bienal de Veneza, como

precursora, continua em primeiro lugar de destaque, e, atualmente divide espaço no

cenário internacional das artes com a Bienal de São Paulo, como a sétima em

destaque, e a própria TY, em décimo sétimo lugar. Isso significa que, mesmo a TY

sendo a 17ª em destaque e estar abaixo da Bienal de São Paulo, frisa-se que a trienal

tem um histórico recente de apenas 15 anos e já alcançou um espaço ocupado por

exposições tradicionais com mais de 50 anos. Logo, nota-se o intenso esforço da

própria TY e da cidade de Yokohama a incentivar e processar de maneira correta a

trienal, resultando em uma maior visibilidade da TY em si, e o destaque da cidade de

Yokohama (ARTNET, 2014).

Sua execução é resultante do apoio de diversos níveis intergovernamentais, da

mobilização e DOS esforços do próprio governo nacional japonês e, sobretudo, da

Cidade de Yokohama em conjunto com o Ministério da Cultura do Japão. Isso mostra

que a ação internacional da cidade de Yokohama não se dá de forma autônoma e

isolada dos demais agentes infranacionais, mas sim seria um resultado da ação

conjunta. Nesse sentido, sua paradiplomacia não ocorreria como forma tradicional,

apontada por Stéphane Paquin (2004), mas como uma dinâmica multinível, apoiada

pelo próprio Estado. Contudo, como aponta Panayotis Soldatos (1990), desde que a

ação seja da cidade e não do Estado, é possível identificar a prática da paradiplomacia,

mesmo que com a ação conjunta de outros agentes.

Logo que se expõe o interesse municipal em manter, viabilizar e promover a

marca da TY, e, portanto, de Yokohama, também pontua-se a amplitude da exibição

que se apropria de múltiplos locais de Yokohama como parte da exibição. Nota-se

ainda diversos meios de expressão, que a TY se mantém aberta; desta forma, a TY

10 Disponível em <www.fjsp.org.br/aquarela/cult_30a.htm>. Acesso: 25/09/2015.

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mostra interesse em manter-se atual e, dessa forma a cidade atrai atenção a exibição,

consequentemente para a própria Yokohama e aos agentes envolvidos em processos

artísticos.

Tal como Jorge Lasmar (2001) expõe-se a interrelação entre as relações

internacionais e a arte, defendendo que o fluxo de arte e as relações internacionais são

postas em um mesmo cenário. Logo, por meio deste estudo analisa-se o fluxo das artes

e o contexto das Artes em um cenário pluralista pós-westphaliano, ou seja, a mudança

dos temas da agenda influencia diretamente na autenticidade, circulação, valoração da

arte que faz com que o objeto de arte adquira um novo caráter: o de commodity cultural.

De tal maneira que um objeto de arte poderá ter um valor de commodity alto em um

momento analisado e em outro momento poderá estar desvalorizado. Mas no caso da

TY o relevante é ascender como um eixo de exposição do próprio circuito internacional

de mercado das artes, que se soma à visibilidade da Cidade como ponto de referência.

Imagem 4 : Tsubaki.N.; Muroi. H “O mundo-inseto: Gafanhoto”, 200111

Segundo dados coletados de 2001 até 2014, a TY recebeu 34% de artistas

japonese, 15% de outros artistas asiáticos e 51% de artistas ocidentais. Assim, a TY

11 Disponível em: http://www.yokohamatriennale.jp/english/archive/2001/ Acesso: 10/10/15

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recebe notoriedade pelo seu grau de internacionalização sem perder a exposição do

local para o mundo. As instalações, site specific e outras linguagens da arte

contemporânea ao redor da cidade criam cartões-postais sazonais que divulgam a

cidade. A presença oriental na TY também aponta como um contraste às demais

exposições no mundo. Mesmo que sendo minoria (49%) é quase a metade de todos os

participantes da TY, algo diferente das demais exposições no mundo que tem uma

baixa participação asiática12.

Dessa forma, a temática da imagem de uma cidade é relevante como componente

de estudo tanto quanto o turismo por exemplo. Frisa-se, portanto, a importância deste

estudo por este representar a moeda da cidade, ou seja, o valor que a cidade dá para

se projetar no cenário global (RICHARDS; WILSON, 2004). Dessa maneira, o processo

de promoção de uma cidade envolve recursos políticos que devem dar continuidade de

uma gestão à outra para a ascensão de uma maior visibilidade da cidade.

(HANKINSON, 2015). Yokohama demonstra-se ser uma cidade contemporânea e de

receptividade às ações estratégicas de reciclagem quanto à imagem local, como

apontado pelos investimentos e ganhos por meio de sua Trienal.

Considerações Finais

O presente estudo de caso aponta que é necessário pesquisar mais a Arte como

campo dinâmico que intercomunica agentes e atores do campo das Relações

Internacionais. Assim, mesmo entendendo que essa realidade é relativamente nova no

movimento de cidades, especialmente no caso da paradiplomacia que se utiliza das

artes para ganhar visibilidade internacional, é preciso estuda-la. Podemos sublinhar a

estratégia de Yokohama de projeção como um redimensionar de sua imagem no

cenário global por meio das práticas culturais, colocadas pela prefeitura como um de

seus objetivos principais nos últimos anos. A diferenciação de sua marca municipal em

relação à Tóquio, como por meio dos eventos que levam seu nome, como a Trienal de

12 Uma exceção foi a Bienal de Veneza de 1999, onde grande contingente artístico constituía-se de nacionais chineses.

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Yokohama, foi utilizada para se destacar no mercado competitivo internacional de

cidades. A TY também passa a servir como uma outra alternativa à imagem de

desastres naturais para a Cidade.

As resultantes positivas sobre esta estratégia podem ser encontradas no

reconhecimento externo ao Japão, como pelas: Art Gallery NSW; Artnews; Universes in

Universe; Artillerymag; Bienal de São Paulo, entre outras. Conforme também é listada

em ranking especializado internacional, a TY está entre as 20 primeiras em

proeminência internacional no meio de exibições de arte contemporânea global. Sendo

assim, lê-se a concordância entre artistas, curadores, críticos e instituições em admitir a

TY como unidade de referência no campo das artes. Já a importância da TY para o

local aos ganhos no turismo da cidade e valorização de determinados modelos de

gestão, como o que incorpora o conceito de city branding em sua paradiplomacia.

Portanto, a relação entre monumentos, ou seja, entre marcos celebrativos e a

imagem da cidade nas interferências artísticas da TY, se coloca como parte da

estratégia de competição no mercado internacional de cidades, conforme apontam

Karavatzis (2004) e Fernanda Sánchez (2001). Logo, no presente estudo de caso foi

possível perceber nas práticas e pronunciamentos da gestão local de Yokohama,

preocupações e modelos apontados pelos estudos de city branding e mercado

internacional de cidades. Como resultados, não apenas pôde-se explorar o conceito de

marcas municipais, como também identificar na arte uma estratégia por visibilidade e

obtenção de ganhos que garantem à paradiplomacia novas práticas a serem melhor

compreendidas pela academia.

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