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Universidade de Brasília – UnB Departamento de Filosofia A ESTÉTICA DE LUKÁCS UM OLHAR SOBRE O HOMEM E O MUNDO POR MEIO DA OBRA DE ARTE Autor: Renato de Souza Neves – Mat: 0839574 Orientador: Wilton Barroso Filho Brasília, 2011

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Universidade de Brasília – UnB

Departamento de Filosofia

A ESTÉTICA DE LUKÁCS UM OLHAR SOBRE O HOMEM E O MUNDO POR MEIO DA OBRA DE ARTE

Autor: Renato de Souza Neves – Mat: 0839574

Orientador: Wilton Barroso Filho

Brasília, 2011

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Universidade de Brasília

Departamento de Filosofia

Monografia de Conclusão do Curso de Graduação em Filosofia

A ESTÉTICA DE LUKÁCS UM OLHAR SOBRE O HOMEM E O MUNDO POR MEIO DA OBRA DE ARTE

Autor: Renato de Souza Neves – Mat: 0839574

Orientador: Wilton Barroso Filho

Banca Avaliadora Dr. Wilton Barroso Filho - Presidente (FIL/UnB) Dr. Rogério da Silva Lima- Avaliador - (TEL/UnB)

Brasília, 2011

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Universidade de Brasília – UnB

Departamento de Filosofia

A ESTÉTICA DE LUKÁCS UM OLHAR SOBRE O HOMEM E O MUNDO POR MEIO DA OBRA DE ARTE

Autor:Renato de Souza Neves – Mat: 0839574

Orientador: Wilton Barroso Filho

Monografia de conclusão de curso,

apresentada ao Departamento de

Filosofia da Universidade de Brasília/UnB

como parte dos requisitos para a

obtenção do grau de graduação.

Brasília, 2011

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A todos os amigos, professores e familiares sem os quais este trabalho não seria possível.

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Resumo

Enquanto um dos principais pensadores da estética marxista, Georg Lukács, contribuiu

de forma peculiar para fundamentar as bases de uma arte voltada para a emancipação do

homem. Diante dessa compreensão, o presente trabalho visa fazer uma exposição da estética

lukacsiana. Nesse sentido, aborda a questão do conteúdo e da liberdade artística em relação a

duas correntes estéticas: arte engajada e arte pela arte. Em seguida, envereda pela discussão

acerca de três finalidades da arte destacadas pelo próprio autor, quais sejam: arte e

conhecimento, arte e autoconsciência e arte e educação. Por fim, propõe-se uma aplicação

prática das discussões formuladas no que se refere ao conteúdo, à liberdade artística e às

finalidades sugeridas por Lukács. O filme de Nelson Pereira dos Santos, baseado no romance

Vidas Secas de Graciliano Ramos, apresenta-se como um objeto estético capaz de contemplar

as reflexões propostas ao longo do trabalho.

Palavras -chaves: arte engajada, arte pela arte, estética, homem e realidade.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................................................07 CAPÍTULO I - Os pressupostos teóricos da Estética de Lukács...........................................08 I.I-Arte e Estética.....................................................................................................................08 I.II-Arte e Conhecimento.........................................................................................................11 I.III- As características da Estéica de Lukács..........................................................................13 • Da primeira característica...................................................................................................13 • Da segunda característica....................................................................................................17I.IV- O conceito de liberdade na Estética de Lukács...............................................................20 CAPÍTULO II- As duas teses de Lukács: um olhar sobre a arte enquanto formadora e transformadora da percepção humana...................................................................................24 II.I -Arte e realidade: do particular ao universal....................................................................24 II.III- Arte e a autoconsciência:uma discussão sobre fetiche, base e superestrutura.............29 II.III -Arte e educação.............................................................................................................37 CAPÍTULO III – Um breve diálogo entre Vidas Secas e a estética de Lukács....................43 CONCLUSÃO.......................................................................................................................49 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................50

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INTRODUÇÃO

Partindo dos estudos estéticos realizados por Lukács, será problematizado, ao

longo deste trabalho, o conceito de arte. No primeiro capítulo, serão expostas as

principais características da arte, quais sejam: a relação da arte e o conhecimento, a arte

enquanto forma de pensar e refletir sobre os problemas que afligem a humanidade em

âmbito geral, assim como, a relação da criação artística e a liberdade do autor frente a

sua necessidade de representar a realidade no processo de criador.

Além disso, ainda no capítulo introdutório, será observada a relação de duas

escolas artísticas em relação às noções conceituais de arte pensada neste trabalho. Aqui,

tem-se, por um lado, uma escola que defende a arte gratuita e, por outro lado, uma

escola de arte que defende uma arte participativa ou engajada. Neste momento do

trabalho, procura-se observar como essas escolas relacionam-se com o conceito de arte

proposto por Lukács.

No segundo capítulo, o trabalho busca pensar e propor algumas possibilidades

de intervenção da arte na formação sensível da percepção humana. De acordo com os

tópicos deste capítulo tais possibilidades da arte decorrem: a relação da arte e o

conhecimento e da relação da arte e a autoconsciência do individual, o que por sua vez,

permitem estabelecer a relação final: arte e educação.

As possibilidades da arte, o que Lukács denomina de finalidades da arte, estão

expressas em duas grandes teses sobre a arte do ponto de vista lukacsiano. Assim, o

segundo capítulo foi onde me propus a argumentar sobre a importância da arte, na vida

do homem. Seja enquanto instrumento de representação do mundo - obtido por meio do

diálogo entre o particular e o universal – seja por meio da transformação nos modos de

ver e perceber essa realidade - por meio da autoconsciência -, em fim, seja pelo papel

educador que desempenha no âmbito social, é correto afirmar que tais possibilidades

talvez, sejam algumas das razões da existência do artístico.

Por fim, na última parte deste trabalho, será realizada uma breve análise do filme

Vidas Secas. A análise do filme será fundamentada nos elementos que serão

desenvolvidos ao longo deste texto. Essa análise será feita dentro de uma ótica da

estética lukacsiana, e, procurar-se-á mostrar a relação do filme com as três teses

defendidas ao longo do segundo capítulo.

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CAPÍTULO I

Os pressupostos teóricos da estética de Lukács

Tomando como referência o pensamento de Georg Lukács a respeito da estética,

o capítulo que se inicia procura desenvolver uma reflexão em quatro momentos

distintos, porém, complementares.

Num primeiro momento, a fim de evitar maiores confusões, discorre-se a cerca

de noções conceituais referentes à arte e à estética. Em seguida, num segundo momento,

aproximando arte e epistemologia, busca-se por uma reflexão concernente a arte como

aspecto de conhecimento.

As reflexões em torno das duas grandes características da estética lukacsiana,

tomam a maior parte desse capítulo introdutório. Dispostas nesse terceiro momento da

discussão, a primeira busca pela relação da arte versus o humano e a segunda, pauta-se

na relação arte versus realidade.

Finalmente, nesta primeira incursão pela estética de Lukács, procura-se pela

definição de liberdade, mais especificamente, busca-se a contraposição entre “liberdade

moderna” e “liberdade autêntica”.

I.I - Arte e Estética

De antemão, gostaria de definir ou expor, com maior rigor, dois termos que irão

aparecer constantemente ao longo deste trabalho. São eles: estética e arte. Os dois

termos em questão são extremamente remotos. Pode-se dizer, no mínimo, que já

aparecem em Platão, ou seja, a mais de dois mil anos antes de cristo.

Ao longo da história da filosofia tanto a arte quanto a estética tiveram várias

definições. De acordo com Nicola Abbagnano, em seu Dicionário de Filosofia, na

antiguidade, Platão já advogava o conceito de arte como mimese, ou seja, como

imitação. Nesse caso, “o pintor não faz senão reproduzir a aparência do objeto

construído pelo artífice” (PLATÃo Apud. ABBAGNANO: 2003,p.349).

Se em Platão a mimese é reconhecida como uma “reprodução imperfeita do

Absoluto”, em Aristóteles, ela se configura enquanto “representação superior do

sensível.” (MONTEIRO apud SUASSUNA,2009, p.57). Ariano Suassuna observa que

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além de reconhecer as imperfeições (o feio) como possibilidade do artístico, para

Aristóteles, “a arte é, mais um depoimento do mundo, contido numa outra realidade

transfigurada.” (2009, p. 58). Se para Platão, o valor da arte estava na capacidade dela

se abstrair do mundo material para um mundo ideal, para Aristóteles, a arte é o lugar de

reconhecimento do mundo material, o qual é recriado pela imaginação do artista.

Embora retome aspectos do pensamento aristotélico sobre a harmonia das partes

na constituição do belo, ou platônico sob a transcendência, na Idade Média com

Agostinho e Tomás de Aquino, a arte tende a ser entendida como revelação, sendo uma

linha que liga o mundano ao divino, a arte estaria a serviço do Bem e da Verdade.

Já na Idade Moderna, Kant, no século XVIII, vê a arte como construção. Na

acepção kantiana, é o sujeito que confere status de belo ou agradável ao objeto artístico.

O sujeito faz isso através da forma como rearranja e reorganiza as particularidades

apresentadas pelo objeto nas suas propriedades transcendentais da sensibilidade do

contemplador. Em seu livro Iniciação à estética, Ariano Suassuna compreende que,

para Kant, “A beleza é, assim, não uma propriedade do objeto, uma certa construção

que se realiza dentro do espírito contemplador, uma certa harmonização de suas

faculdades” (2008, p. 31).

No século XIX, a arte continuará sendo objeto de inúmeras reflexões,

principalmente com Hegel. Ao reconhecer o belo artístico como superior ao belo

natural, Hegel, de certa forma, dá um status diferenciador para a arte. Para ele, a

grandiosidade da arte está no fato de ela passar pelas várias faculdades humanas na

tentativa de estabelecer uma relação do espiritual com o material. Segundo Ariano

Suassuna, para esse pensador do Idealismo Alemão “a Arte é um acordo entre o sensível

e o espiritual; e é o espírito que se toma a si mesmo por objeto” (2009, p. 209).

De acordo com que foi exposto nesse breve percurso histórico, a arte pode

assumir varias definições. Ela pode ser vista como imitação e recriação da realidade,

assim como, uma construção que o sujeito faz, a partir do seu aparato cognitivo, como

sugere alguns pensadores do idealismo alemão. Pode-se dizer, que essas definições

sobre a arte ou o modo de concebê-la variam de acordo com cada pensador, uma vez,

que os pressupostos filosóficos assumidos por eles, implicará numa determinada

concepção sobre a arte.

A arte, quando pensada filosoficamente, será vista dentro de um sistema de

explicação geral do mundo. Onde se encontra a política, a metafísica, a religião e a arte.

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Assim sendo, não tem sentido, por exemplo, Kant falar de arte como imitação, uma vez

que a sua filosofia privilegia o sujeito em relação ao objeto. Na concepção kantiana, é

através do sujeito que o mundo se organiza em um todo coerente.

Entretanto, seja qual for a definição de arte, faz parte da preocupação artística “a

relação entre a arte , natureza, homem e o mundo” ( ABBAGNANO, 2003, p. 348).

O conceito de Arte adotado no trabalho será aquele apresentado por Abbagnano,

segundo o qual, “a mais antiga definição da arte na filosofia ocidental, a de imitação,

entendendo subordinar a arte à natureza ou à realidade em geral” (2003, p.349). Desse

modo, a arte será aqui reconhecida como mimise.

Embora o termo tenha recebido várias atribuições ao longo da história do

pensamento, aqui nos interessa fundamentalmente a compreensão lukacsiana. A mimise

em Lukács dá se através da tentativa de exprimir de forma mais descritiva possível a

realidade, sem, no entanto, deixar de fora, as influências que o artista possa exercer

sobre essa realidade que se reproduz. Então, pode-se afirmar que a arte como imitação

da natureza e do mundo, de acordo com a percepção de Lukács, tem que ser vista como

um jogo, em que se tem, de um lado, a descrição da realidade e, do outro, as

contribuições do artista na reprodução de tal realidade.

O conceito estético, assim como a arte, pode variar de definição de acordo com a

filosofia que é exposta. De acordo com Abbagnano, a estética, de um modo geral, foi

pensada e continua sendo como “qualquer análise, investigação ou especulação que

tenha por objeto a arte e o belo, prescindindo de toda doutrina ou diretriz especifica”

(2003, p. 348).

Assim, a partir da proposição de Abbagnano, opta-se, neste trabalho, pelo

conceito de estética defendido por Kathrin Holsermayr Rosenfield, o qual se encontra

exposto em seu livro Estética. Segundo ela, “estética” é

Uma disciplina filosófica que analisa o complexo das sensações e dos sentimentos, investiga sua integração nas atividades físicas e mentais do homem, debruçando-se sobre as produções (artísticas ou não) da sensibilidade, com o fim de determinar suas relações com o conhecimento, a razão e a ética (ROSENFIELD, 2009, p.7).

Este conceito será usado com a finalidade de separar os modos de investigação

da arte e do belo na filosofia em relação às outras áreas do conhecimento, como: crítica

literária e a historia da arte. Ao mesmo tempo, esseconceito, deixa explicito a relação da

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estética com o conhecimento metafísico que tanto interessa à filosofia. Ou seja, a

estética é pensada como um meio de acesso “as coisas mesmas”.

Embora a preocupação com a arte e o belo já remonte aos antigos filósofos, foi

apenas no ano de 1750 que foi cunhado o termo estética. “Com esse termo designa-se a

ciência (filosófica) da arte e do belo. O nome foi introduzido por Baumgarten, por volta

de 1750 em seu livro Asthetica” (ABBAGNANO, 2003, p.348. É interessante notar, que

Baumgarten mantém, no conceito de estética, a idéia de vê-la como uma disciplina

filosófica que tem como preocupação uma via de acesso ao real, ou seja, uma

preocupação epistemológica. Segundo ainda Abbagnano, “o nome designa propriamente

“doutrina do conhecimento sensível” (2003, p. 348).

Desse modo, pode-se perceber que as inferências de Abbagnano, sobre as

proposições filosóficas de Baumgarten acerca da estética, conduzem a uma relação

inevitável: a relação arte e conhecimento.

I.II - Arte e Conhecimento

Ver a estética pelo viés epistemológico será algo bastante usado por Lukács. Ou

seja, a arte como via de acesso ao Ser e à essência das coisas. Para esse pensador, ela (a

arte) consegue adentrar a realidade por uma via própria, a sensibilidade.

Nesse sentido, penso ser a distinção entre estética e arte aqui relevante, pois

além de evitar confusões de significados entre os dois termos, delimita claramente o

campo de atuação desses dois conceitos. Uma vez que é muito comum pensar que a

estética restringe ou delimita a liberdade da criação artística. Ou então, que ela irá emitir

juízos de valores sobre uma obra de arte, por exemplo.

Não é só a filosofia que se interessa pela arte e o belo. A crítica literária e a

história da arte também tem como objetos de estudo a arte e o belo. Por isso, de acordo

com Raymond Bayer, em seu livro Historia da Estética, “A estética esteve sempre

ligada a reflexão filosófica, à critica literária ou à historia da arte” (1995, p.13). Assim,

creio que, através da definição do termo estética que foi expresso anteriormente pelo

pensamento de Rosenfield, pode-se delimitar o campo de atuação da estética e da crítica

literária.

É muito comum devido à proximidade entre estética e crítica literária, acreditar

que aquela restringe a liberdade do artista. No entanto, é um engano pensar de tal forma.

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Pois uma das preocupações demonstradas pelo campo estético é refletir sobre o conceito

de belo. Isto é, analisar, problematizar ou mesmo definir o que é o belo. Não é a

preocupação maior da estética se debruçar sobre um objeto particular, para analisar se

ouve ou não há encarnação do belo nesse objeto. Mas antes, pensar sobre a definição de

beleza. Diz Suassuna, A estética, além de não ser uma critica de arte, não pode nem poderia legislar sobre a arte, porque é somente uma atividade reflexiva efetuada sobre os primeiros princípios do campo estético; sobre o geral da beleza e da Arte, e não sobre o particular. [...] já se disse que não compete á Estética julgar os romances de Zola; compete-lhe definir o que é um romance, em geral (SUASSUNA, 2008, p. 39).

Em outras palavras, o esteta não tem como preocupação analisar obras

individuais, para dizer se esta ou aquela obra é bela. Pois esta não é sua função, talvez

seja a do crítico literário. O que o esteta se propõe é analisar o conceito geral de belo, e

não se desbruçar para responder se uma obra de arte aplicou corretamente o conceito de

belo pensado por ele.

No processo de criação é fundamental a relação do artista com o esteta. Pois

muito embora a liberdade, a criatividade e a inspiração sejam elementos primordiais no

processo de construção do artístico, existem elementos reguladores desse processo, são

eles que exigem do artista o deslocamento da pura criação para a transpiração. A

elaboração que requer trabalho e normatização da obra para que ela seja reconhecida

como objeto estético, são, em geral, elementos propostos pelo esteta. De acordo com

Abbagnano retomando as palavras de Carlos Bizarro Morais, “a estética propõe-se

determinar o conjunto de caracteres que se encontram na percepção de todos aqueles

objectos que provocam a experiência e emoção estéticas” ( 1989, p.274). Daí

depreende-se que não há motivos para ter nenhum tipo de melindre entre o esteta e

artista, uma vez que aquele se preocupa em definir conceitos, enquanto este cria ou se

orienta a partir dos conceitos fornecidos pelo esteta.

É importante salientar, entretanto, que embora haja inegável proximidade entre

artista e esteta, a estética não emite juízos de valores sobre as obras de arte. Não é do

interesse do esteta analisar, por exemplo, se um escritor obedece ou não às regras de

estilo ou de conteúdo de uma determinada escola literária. Contudo, para o esteta, o que

faz a obra receber a denominação de objeto estético ou não refere ao conceito de beleza

por ele pensado.

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I.III - As características da estética de Lukács

Diante do que foi exposto aqui, neste momento da discussão, pergunta-se: o que

Édipo Rei de Sófocles, Dom Quixote de La Mancha de Miguel de Cervantes tem em

comum? Por que essas obras conseguem perdurar ao longo da história da humanidade e

continuar atuais? Em outras palavras, por que elas são um clássico da literatura

universal?

Essas obras têm em comum, pelo menos, o fato de colocar o homem no centro

de sua criação artística e os problemas que afligem a humanidade de uma forma geral.

Seja através de um parricídio, que mesmo sendo cometido de forma inconsciente, o

herói Édipo levará até as ultimas conseqüências o seu ato. Seja colocando um agir

altruísta, que tem como fim ajudar o próximo, agir que Cervantes representa através do

personagem Dom Quixote com suas ações ou quando nos diz, “colha aqui a execução

do meu ofício: desfazer forçosamente e socorrer e acudir os miseráveis” (SAAVEDRA,

2004, p. 284).

Ou seja, independentemente de ser um problema moral ou de um idealismo

envolvendo condutas humanas representado pela amizade, essas obras investigam a

natureza humana, pois colocam o homem no centro de sua criação bem como os

problemas que afligem a humanidade de forma universal. Esta preocupação em

investigar a natureza humana encontra-se nos maiores clássicos da criação em geral.

Pois de acordo com Georg Lukács, no livro Introdução a uma estética marxista, diz que

“a humanitas- ou seja, o estudo apaixonado da natureza humana do homem, faz parte da

essência de toda literatura e de toda arte autêntica; daí que toda boa arte e toda boa

literatura sejam humanistas” (1965, p. 23).

1-Da primeira característica

Com essa idéia de humanitas, Georg Lukács apresenta aqui o que poderíamos

chamar de a primeira e uma das principais características de sua estética: aquela que

demonstra forte preocupação em investigar a natureza humana ou a essência do homem.

Preocupação essa que pode se dar nos vários âmbitos da criação artística. Na música, na

pintura, no teatro e na literatura. Assim, de acordo com o que nos fala o pensador

húngaro, é possível inferir que, independentemente do meio de expressão artística, uma

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obra, para ser grandiosa, tem que ter como um dos seus temas centrais a preocupação

em pensar o homem.

Dessa primeira característica decorrem duas orientações que perfazem a estética

lukacsiana, as duas estão centradas, sobretudo, na preocupação em pensar as causas

humanas.

A primeira orientação pode ser reconhecida pela preocupação em mostrar o

homem na sua integridade humana, em sua totalidade. O homem em Lukács não é

fracionada como uma máquina que desempenha uma função ou posição já determinada

no mundo. Mas sim, um ser que só pode ser entendido como alguém que se faz a si

mesmo constantemente em relação aos outros.

Lukács demonstra a preocupação em ver o homem na sua totalidade. Um bom

exemplo disso, seria verificar o homem na sociedade capitalista atual. Ele está cada vez

mais fracionado. É um ser de crença, racionalidade, ciência, afetividade... não é mais

visto dessa forma. Pois o homem deixou de ser visto em sua totalidade, onde as partes

racionais e emocionais se interagem mutuamente, em detrimento da particularidade,

onde ouve a preponderância da racionalidade em frente à emoção.

O homem é como uma máquina, para que ela funcione todas as partes têm que

trabalharem juntas e harmoniosamente. Se uma parte for privilegiada em detrimento da

outra, então terá uma visão distorcida da máquina humana. E essa forma de vê o homem

como fragmentos é fruta da divisão de trabalho, onde o homem deixou de ser visto

como um todo, e passou a ser visto em partes.

A fragmentação é própria das sociedades capitalistas e, nos dias atuais há uma

intensificação disso. Em se tratando do conhecimento, por exemplo, pode-se dizer que o

homem está cada vez mais deixando de enxergar o todo para se especializar apenas

numa pequena área do conhecimento. A fragmentação dos conteúdos nas Universidades

pode ser tomada como um bom exemplo disso. Se o conhecimento foi dividido em

disciplinas, no âmbito das disciplinas, eles ainda sofrem separações. Temos bons

professores que sabem muito, mas apenas de uma pequena parte de suas áreas de

formação. É muito comum o professor saber muito sobre hermenêutica e

existencialismo, mas não conhecer razoavelmente a filosofia analítica. Isto equivale a

dizer que se cada vez mais o homem é visto por partes, cada vez menos ele será

percebido em sua totalidade.

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Uma das leituras possíveis para explicar essa alteração, deturpação do homem,

de não mais vê-lo como um ser social, de acordo com Lukács, é decorrente do

capitalismo. O capitalismo deturpa o conceito de homem. Pensa o homem como um

produto, uma mercadoria da qual se pode obter lucro, como qualquer outra mercadoria

ou produto. O homem é visto como um fator econômico e não mais social. Dessa forma,

ao subtrair do indivíduo as propriedades humanas e sociais, o capitalismo transforma o

homem em algo que ele não é, em mercadoria.

Assim, a relação entre os seres humanos não é mais regida pelo bem comum ou

a fraternidade. Mas sim pela vantagem que um indivíduo pode tirar do outro. O outro é

visto como um meio para se atingir um fim, não o fim em si mesmo. Ou seja, o homem

é uma mercadoria que pode ser descartada e usada ao bel prazer de outro homem.

Desse modo, a segunda orientação decorrente da preocupação com as causas

humanas, volta-se para a constante vigília da não adulteração da essência ou a natureza

humana. Para Lukács,

Todo verdadeiro artista e todo verdadeiro escritor é um adversário instintivo de qualquer alteração do princípio do humanismo, independentemente do grau ( maior ou menor) em que seja alcançado a consciência disso nos espíritos individualmente considerados ( LUKÁCS, 1965, p, 23).

Ao pensar a arte como um produto social que é construído nas relações entre os

meios materiais (econômicos) e sociais, Lukács, mostra ser impossível pensá-la sem

considerar a relação sócio- histórica que a constitui.

Dessa forma, Georg Lukács, a fim de conceber a arte como sendo constituída de

elementos sócio-históricos, de alguma forma, questiona a tese kantiana, de que ela é

uma criação inata, que independe do objeto para se pensar a beleza, pois,

Ao dizer que a Beleza não está no objeto mas, sim, é uma construção do espírito de quem olha para o objeto , Kant tornou impossível qualquer julgamento das obras de arte. De fato, se a beleza é construída pelo espírito do contemplador, os objetos não são mais nem belos, nem feios. Não existirá mais um quadro feio e outro belo: o quadro será feio ou belo de acordo com a reação de quem se ponha diante dele” (SUASSUNA, 2008, p.79).

Aqui temos duas concepções de arte. Uma defendida por Georg Lukács, que a

concebe como sendo uma construção sócio-histórica. E a outra defendida por Kant,

segundo a qual ela é construída pelo sujeito através de seu aparato sensitivo

transcendental.

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Essas duas concepções conflitantes de ver a arte- a primeira que a vê como

construção histórica e a segunda como criação inatista -, leva Nicolas Tertulian em seu

livro Georg Lukács, etapas de seu pensamento estético (2008) a dizer o seguinte, em

relação ao inatismo kantiano:

Derrubar a tese, latente ou explicita, própria a todo idealismo filosófico, que faz da atividade estética ( a produção do belo ou “instinto do belo”) uma faculdade apriorística ou um dom inato, de caráter antropológico, do espírito humano. ( TERTULIAN, 2008, p. 210).

Logo, segundo Tertulian, uma das implicações do modo lukacsiano de ver a arte

choca-se com a forma kantiana de concebê-la. Uma vez que a arte para Lukács é fruto

de uma relação histórica, enquanto para Kant esta se dá numa construção abstrata

realizada pelo sujeito.

Mais do que isso, para Lukács, só é possível pensar a obra de arte, através de sua

relação com público. Sem o diálogo com o interlocutor, a arte não se constituiria, nada

representaria. Ela só pode receber status de bela ou sublime por ter nascido no seio

social e ser, portanto, representação dele.

De acordo com que foi dito acima, a tese lukacsiana implica na

contraditoriedade da tese defendida por Kant. Embora o sujeito colabore na construção

da arte, ela só pode ser pensada no contexto social. Portanto, o que possibilita a

construção do artístico é o contexto social e histórico em que o homem esta imerso.

Logo, o status de belo e gracioso não se dá através de um único sujeito afastado

do convívio social. Mas sim mediado por uma relação sócio-histórica. É claro que

Lukács pensa também na relação sujeito e objeto. Nicolas Tertulian, salienta que “por

diversas vezes, Lukács destacou que a gênese da Estética está estreitamente ligada ao

estabelecimento definitivo de sua concepção filosófica quanto á relação sujeito-objeto”

(2008, p. 189). No entanto, em sua opinião, o homem individual, isolado, não tem força,

autonomia para conferir status de belo há uma obra de arte. Apenas quando a obra passa

pelo juízo coletivo é que ela pode receber valorações.

Uma das formas, segundo Lukács, para reaproximar arte e público está

relacionada com a habilidade do artista em extrair da vida cotidiana, elementos

artísticos que darão suporte as suas futuras criações. Assim, celebra o fato de que

Os partidários da democracia popular estão, com efeito, convencidos de que a vida operária e camponesa está cheia de possibilidades novas que podem

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criar relações novas, que podem estabelecer relações diretas entre o artista e o público (LUKÁCS, 1965, p. 272).

2-Da segunda característica

A partir disso chegamos ao que poderia ser a segunda grande característica da

estética de Lukács. Ela pode ser pensada pelos grandes realista na “tentativa apaixonada

e espontânea de captar e reproduzir a realidade tal como ela é, objetivamente na sua

essência” (1965, p, 51).

Através dessa orientação, a estética de Lukács reforça uma de suas importantes

compreensões, ou seja, a arte como via de acesso ao conhecimento. A estética é uma via

de acesso privilegiado da busca da verdade. Pois como diz Platão, “a beleza é o brilho

ou esplendor da Verdade” (SUASSUNA, 2008, p.47. Platão deu esta importante

contribuição á estética. A arte concebida como instrumento possibiltador do

conhecimento será incorporada pelos grandes estetas ao longo da história, sejam eles

idealistas, Hegel por exemplo, sejam eles realistas, Aristóteles ou o próprio Lukács.

Embora muitos filósofos, Heidegger, por exemplo, dirão que a ciência investiga

o ente e não o Ser, ou seja, a superfície do mundo. Independentemente dessa polêmica

envolvendo a ciência e a epistemologia, o fato é, que a arte é uma via de acesso à

realidade, pois,

De acordo com os (estetas) metafísicos, a arte é, portanto, a revelação de uma realidade superior que não pode ser atingida pelos métodos científicos e que se afirma em virtude de um pensamento que busca o Absoluto a realidade ultima´´ ( Bruyne Apud. SUASSUNA, 2008, p. 34 ).

Pelo que foi dito acima, depreende-se que existem pelo menos, três maneiras de

conhecer a realidade: a via científica que tem como método, a experimentação e a

verificação para comprovar ou refutar uma tese, a via filosófica que usa do instrumental

da lógica para construir suas teorias metafísicas (a respeito do Ser), e, por fim, o

caminho estético, que usa da sensibilidade para penetrar na realidade.

Baumgarten, como já foi dito anteriormente, expõe que a arte é uma via de

acesso à realidade pela sensibilidade. Platão também concordaria com esta tese, quando

diz que, “ o belo é a manifestação evidente das Idéias ( isto é, dos valores) e é, por isso,

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a via de acesso mais fácil e óbvia de tais valores (ABBAGNANO: 2003, p. 349). A

Idéia, o mundo, ou seja, a metafísica em Platão é pensada de forma fixa, imutável,

intransitória. Nessa concepção, a realidade não muda com o passar do tempo e da

história.

Considerando tais possibilidades sobre a arte, Lukács também vê na estética

uma via de acesso à realidade. Mas para que haja um caminho em busca da essência

mesma das coisas, o artista deve representar em suas obras, de forma fiel1, a realidade.

A meta de quase todos os grandes escritores foi a reprodução artística da realidade: a fidelidade ao real, o esforço apaixonado para reproduzi-lo na sua integridade e totalidade, tem sido para todo grande escritor ( Shakespeare, Goethe, Balzac, Tolstoi) o verdadeiro critério da grandeza literária (LUKÁCS, 1965, p. 29).

Através das mãos do artista e da sua representação fiel da realidade é possível

levar o seu interlocutor à realidade. Logo, a representação fiel da realidade é outra das

características centrais da estética de Lukács. Ora, se a arte é uma via de acesso à

realidade, então quanto mais descritiva essa realidade se torne para o seu interlocutor,

mais ele se aproximará da essência das coisas.

Mas afinal, como Georg Lukács concebe a realidade? A grosso modo, a

realidade é objetiva, real, pois pode ser penetrada por qualquer homem e independe da

consciência humana para existir. Ao mesmo tempo, só através do materialismo histórico

e da dialética será possível investigar a Realidade. Pois estes dois conceitos

(materialismo histórico e dialética) são as leis que possibilitam vê uma constância da

relativização entre aparência e realidade que faz parte do conceito de realidade.

Sendo uma das principais características da estética lukacsiana a representação

fiel da realidade, como fica a liberdade artística diante dessa característica? Ou ainda,

qual é a importância do artista dentro da estética do pensador húngaro?

Embora mantenha relações diretas com o mundo real, o artístico, segundo

Hermenegildo Bastos, “guarda relativa autonomia frente a seu autor e também a seus

leitores. Ele não é o mundo, mesmo porque renega o mundo de “aflições” e projeta um

mundo de liberdades”(2011,p.14).

1 Embora a palavra fiel seja tomada do pensamento lukacsiano, é importante esclarecer que ela não significa em Lukács - como veremos mais adiante -, a fotocópia de uma realidade estática. Mesmo com a utilização da palavra fiel, em Lukács pode-se perceber que ao mesmo tempo em que a obra traz em si o mundo, ela não se prende a ele, não está restrita a ele.

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Assim, através das criações do artista, da música, do teatro, da literatura, da

pintura e etc, o público terá contato, por uma via sensitiva, com o real. “A essência se

revela no fenômeno (obra de arte)” (SUASSUNA, 2008, p. 32). Logo, uma das

importâncias do artista é o seu papel de intermediário entre a realidade (essência das

coisas) e o que não é real (o fenômeno).

Se partirmos da afirmação lukacsiana segundo a qual, “a estética marxista

identifica o maior valor da atividade criadora do sujeito artístico no fato dele assumir

nas suas obras o processo universal e torná-lo sensível (1965, p. 35), “ é correto afirmar

que, o artista consegue captar elementos da realidade, e transferi-los para a obra de arte.

Tais elementos não são apenas figurativos, eles comportam em si uma carga semântico-

idológica, que inviabiliza uma contemplação passividade. Ou seja, a obra de arte ao

inspirar o belo no seu interlocutor, incita-o a pensar sobre a sua realidade sócio-

histórica. Uma vez, que o belo só pode ser construída através de um conteúdo que

retrate de alguma forma a realidade do seu interlocutor. Para Lukács, o grande artista

consegue captar a essência das coisas, aquilo que é universal e traduzi-lo em suas obras.

Através do belo artístico, instiga o público a refletir sobre o mundo que o circunda.

Essa é, em sua opinião, uma das características que os grandes artistas possuem:

traduzir um conceito, pensamento através da obra de arte.

A estética lukacsiana rejeita qualquer tentativa de pensar o artista como mero

“fotógrafo” da realidade, ou seja, como uma figura que apenas descreve ou copia a

realidade em suas obras. “A estética marxista se preocupa e combate qualquer espécie

de naturalismo, qualquer tendência presa a preocupação fotográfica da superfície

imediatamente perceptível do mundo exterior” (LUKÁCS, 1965, p. 40).

Ver o artista como mero “fotografo” da realidade é algo muito comum nos

termos de uma estética como a de Lukács, já que ela sugere que o artista deve captar de

forma mais objetiva possível a realidade. Entretanto, reduzir o artista a um mero

reprodutor da realidade é não entender o papel que desempenha no pensamento de

Aristóteles e, nem tão pouco do filosofo húngaro. Aqueles que fazem tal crítica

esquecem que o grande artista, o gênio coloca sempre a sua singularidade,

particularidade, ou se preferir, sua “ marca” na obra. Balzac, Tolstoi e Machado de

Assis foram escritores realistas. Pois dialogavam com a realidade de seu tempo. No

entanto, eles davam vida própria aos seus personagens. Pois de acordo com Lukács,

“não há grande artista em cuja representação da realidade não se exprimem, ao mesmo

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tempo, também as suas opiniões, desejos, aspirações apaixonadas e nostálgicas” (1965,

p. 37).

Como fica a liberdade do artista, sua autonomia criadora frente a essa constante

preocupação em representar a realidade, imposta pela segunda grande característica da

estética lukacsiana? Sem dúvida essa é uma pergunta que se impõe neste momento da

discussão.

I.IV - O conceito de liberdade na estética de Lukács

O próprio Lukács, em suas digressões, nos fala de dois modos de liberdade: a

liberdade moderna e a liberdade autêntica.

O conceito de liberdade moderna pode ser formulado a partir das ações

desenvolvidas por diversos artistas no processo criativo. Esses artistas são movidos pelo

princípio da subjetividade. O produto da criação resulta da combinação entre: a

liberdade da forma e do conteúdo, a subjetividade, a interioridade do artista e,

sobretudo, resulta da independência do artista frente a qualquer ideologia (verdade,

moral, conhecimento e etc). Em última instância, nessa concepção de liberdade

criadora, o artista é a sua própria bússola.

Pode-se dizer que a Arte pela arte é a corrente estética que mais se identifica

com o conceito de liberdade moderna, nesse sentido, segundo Jacques Maritain,

A arte é gratuita, ou desinteressada, como tal; isto é, na criação da obra a virtude da Arte somente procura uma coisa, o bem da obra por fazer, a Beleza que é preciso fazer brilhar na matéria, a coisa que é preciso criar segundo as leis próprias, independentemente de tudo o mais (MARITAIN Apud. SUASSUNA, 2008, p. 250).

Na medida em que esta corrente estética não se prende a qualquer tipo de

ideologia, em que se apregoa total liberdade do artista, em que o principal objetivo

estético se volta para a busca da beleza, talvez seja possível afirmar que, aquilo que

Lukács denomina de arte moderna se aproxima sobremaneira da corrente de

pensamento que defendia o conceito de Arte pela arte. Que se define pela busca da

beleza á todo custo.

Contrapondo-se a essa idéia subjetivista de liberdade moderna, Lukács defende e

toma para si o conceito de liberdade autêntica. Na percepção lukacsiana, a liberdade no

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processo de criação artística deve ser movida por uma orientação mais objetiva. Nesse

sentido, ele dirá que “a personalidade do artista- ou mais exatamente: seu humor

particular no instante dado da criação- é o princípio último da arte” (1968, p. 256). A

liberdade autêntica, que Lukács propõe ao artista, pode ser depreendida de suas palavras

na seguinte passagem:

dar ao universo real da humanidade a expressão mais profunda, mais completa dentre todas as manifestações humanas. A estreita relação com a essência objetiva da realidade, a fidelidade inabalável a esta realidade: eis a liberdade verdadeira, objetiva, da arte. (LUKÁCS, 1968, p. 268).

É possível inferir, das palavras acima, que a liberdade do artista é delimitada,

objetiva frente a sua necessidade de representar o real. No processo de criação, o artista

deve captar as condições materiais e sociais que constituem a realidade. Diferenciando,

portanto, da liberdade moderna, aqui, ele não concebe a possibilidade de o artista ter

total liberdade de criar ou produzir uma obra ao seu bel prazer e, na maioria das vezes,

mostrando-se alheio aos problemas sociais.

Na abordagens Lukacsiana a respeito da liberdade, fica claro, que para esse

pensador, o valor artístico de uma determinada obra está diretamente relacionado com o

poder que ela tem em captar a realidade social, e, muitas vezes, levar às classes sociais a

consciência frente a tal realidade.

De acordo com a concepção de liberdade autêntica desenvolvida por Lukács, o

artista deve captar e traduzir em sua obra os componentes que constituem a realidade.

Sejam esses elementos materiais (econômicos) ou sociais. Na constituição que o artista

faz da realidade, ele se envolve com os problemas sociais e, por consequência, tem uma

relação com o público. Isso acontece porque a realidade só pode ser pensada num

contexto sócio-histórico, ou seja, nas relações entre os homens em uma determinada

sociedade. Sem essa relação social, que é constitutiva da realidade, Lukács acredita ser

impossível ao artista representar a realidade em suas obras.

Nesse sentido, o conceito de arte engajada ou participativa é a percepção

estética que mais se identifica com o conceito de liberdade defendido por Lukács. A

respeito da arte engajada Suassuna nos diz que nessa concepção “a arte está sempre a

serviço de uma idéia, de uma causa, ela é sempre participante, com uma função social

definida, engajada, alistada a serviço de alguma coisa” ( 2008, p. 250).

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O que se compreende então por Arte engajada relaciona-se com a idéia de

liberdade autêntica defendida pela teoria lukacsiana, na medida em que ambas tem em

comum, á preocupação de refletir sobre o mundo e o homem, seja representando-o, seja

mostrando que a arte carrega em sua criação uma concepção da realidade vivida no seio

da coletividade social.

Em contraposição à liberdade autêntica, a liberdade moderna pode ser definida

como “a liberdade subjetiva soberana da expressão individual imediata de experiências

artísticas individuais imediatas” (LUKÁCS, 1968, p.267). Ou seja, uma liberdade em

que a autonomia do artista é total em que as suas inspirações e imaginações são

suficientes para pensar e construir um novo mundo.

Já o processo criativo em Lukács, que tenta mostrar a realidade da forma mais

objetiva possível, só pode ser pensado (o processo criativo) originário da sociedade,

como um elemento sócio- histórico. E não como uma inspiração que simplesmente

surge no interior do artista.

Embora a liberdade moderna seja distinta da liberdade autêntica, o artista que

segue os pressupostos daquela liberdade , tenta reconstruir um novo mundo por uma via

subjetiva e introspectiva, um mundo em que a exploração do homem pelo homem não

seja seu principal alicerce. Embora ache esta reconstrução perigosa, Lukács a respeita.

Segundo ele, “voltar para dentro de si é um protesto digno de respeito” (1968, p. 266).

Mas que fique claro, Lukács respeita essa introspecção como meio de protesto, mas não

acredita na eficácia dela.

O esteta húngaro não concorda com a forma de luta introspectiva característica

da liberdade moderna para mudar o mundo, na medida em que para ele, mesmo que

uma nova visão de mundo seja dada por um artista que faça uso da liberdade moderna,

nada garante que a visão ali proposta consiga superar a visão de mundo capitalista, uma

vez que este mundo novo sugerido tem um componente fortemente subjetivo ou

pessoal. Dessa maneira, o problema da concepção de liberdade moderna para Lukács,

consiste na promoção do sujeito individual em detrimento do social, do coletivo.

Na verdade, Lukács vai mais longe. Ele não apenas mostra o perigo da liberdade

que tenha como fonte de inspiração esta introspecção do sujeito para a criação artística,

como coloca o próprio conceito de liberdade moderna em xeque, ao afirmar que, “o que

caracteriza, na literatura capitalista, o abacaxi “qualificador” e “Superior” é,

precisamente, o exagero da originalidade, da invenção artística livre” ( 1968, p. 264).

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Para ele, invenção artística e genialidade só tem sentido se forem advindas de uma

relação direta com a sociedade. Se a subjetividade exacerbada for tomada como

“iluminação” ou “genialidade”, como criação autônoma do artista frente à sociedade,

então o artista não compreendeu que a sua liberdade é fruto das relações econômicas e

sociais de seu tempo.

Em outras palavras, Lukács desconstrói a idéia de uma liberdade moderna. Pois

mostra que a liberdade como tal só pode existir quando for condicionada pelas

estruturas materiais e dialéticas constitutivas do mundo. E que será através dessas

estruturas que a visão de mundo e a ideologia do sujeito serão formadas. Fora dessa

condição, não há e não pode haver obra de arte.

Por fim, Lukács defende uma idéia de liberdade objetiva. Em outras palavras,

diferentemente do que prega a liberdade moderna “a arte mais livre é justamente aquela

que mais capta a essência da realidade” (LUKÁCS, 1968, p. 259). Assim, em sua busca

pela representação do mundo, o artista toma consciência de que a sua autonomia,

enquanto criador, é concedida por fatores materiais (econômicos) e sociais.

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CAPÍTULO II

As duas teses de Lukács

Um olhar sobre a arte enquanto formadora e transformadora da percepção humana

A partir dos pressupostos de Georg Lukács, neste capítulo, discute-se dois

posicionamentos acerca da arte, os quais são denominados teses. Estabelecer uma

discussão em torno dessas teses permite ampliar a compreensão do pensamento de

Lukács em relação à arte, e fundamentalmente, possibilita um olhar mais atento sobre a

ação do artístico sobre a percepção do homem frente à realidade vivida.

Assim, o primeiro momento da discussão será pautado na tese de que,

utilizando-se do preceito de que por meio do particular pode-se apreender o universal, a

arte consegue penetrar na realidade. A partir dessa tese, será exposto o conceito de

realidade, do típico, como sendo umas das características centrais da estética para

construir o conhecimento artístico.

A segunda tese pauta-se na compreensão da arte como possibilitadora da

autoconsciência. Nesse momento da discussão serão tomados os conceitos de fetiche,

base e superestrutura, enquanto elementos de criação e recepção do artístico.

Por fim, a partir das duas teses apresentadas por Lukács, discute-se a ideia de

que a obra de arte comporta em si um fim educador. Levando em conta a sua

capacidade educativa no que se refere à sensibilidade humana, de acordo com essa

proposição, a arte é analisada como difusora de conhecimento e como produto que

resulta do homem e da condição social dele.

II.I -Arte e realidade: do particular ao universal

No terceiro livro da estética, Lukács, salienta que “ el arte y la ciência reflejan

la mesma realidade objetiva.”(1967, p. 341)2. De acordo com tal afirmativa nos é

permitido considerar que a arte consegue refletir a realidade. Notadamente, além de ser

um importante canal de difusão de saberes humanos, a arte consegue apreender e

2 A arte e a ciência refletem a mesma realidade. (Tradução nossa).

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conhecer a realidade. Daí ser possível afirmar que outra importante finalidade da arte se

faz notar: suas relações com epistemologia.

Como já foi dito no capítulo anterior, Platão talvez seja o primeiro a ligar a arte

ao conhecimento. Tal proposição pode ser lida no dicionário de filosofia de Nicola

Abbagnano, quando este cita as seguintes palavras do filósofo grego “o belo é a

manifestação evidente das Idéias” (2003, p. 349). Ou seja, desde a antiguidade já era

possível compreender que a arte tem acesso à realidade por uma via sensitiva, ao

contrário da ciência que o faz por uma via experimental.

Mas para melhor compreender como a arte consegue penetrar na realidade, faz-

se importante apreender o que Lukács entende por realidade. Na verdade, essa discussão

foi rapidamente desenvolvida no primeiro capítulo, uma vez que ali não se fazia

necessário uma exposição mais longa, ao contrário do que se dá agora.

Diz Georg Lukács a respeito da liberdade:

La práctica del arte ( la que no quiere decir necessariamente la concepción consciente del mundo de los diversos artistas) combate con sus proprios medios esas tendencias que amenazan con esquematizar y congelar el mundo circundante y sensible de los hombres,” ( LUKÁCS, 1967, p.386)3.

A realidade para Lukacs é dinamica, transitória, fruta das relações sensíveis e

intelectivas dos homens na história. Ele rejeita qualquer idéia fixa e substancializada de

pensar á história e a realidade humana. Para Lukács, a realidade vem ao encontro dessa

concepção fixa e imutável.

Segundo Lukács a realidade se faz nas relações entre os homens, onde os meios

matérias e econômicos, são indispensáveis para a construção do homem frente a si e em

relação ao mundo.

Ao contrário de algumas correntes filosóficas (a idealista, por exemplo) que

pensa a realidade de forma imutável, fixa, substancializada, ou seja, metafisicamente,

Lukács vê a realidade como algo em movimento, por isso sugere, “descobren al hombre

la realidade tal como ésta se ofrece em cada caso...” (1967, p.428)4. Logo, para este

3 A prática da arte ( a que não quer decidir necessariamente a concepção consciente do mundo dos diversos artistas) combate com seus próprios meios essas tendências que ameaçam esquematizar e congelar o mundo circundante e sensível dos homens. (Tradução nossa). 4 Descobre o homem a realidade que se mostra em cada momento. (Tradução nossa).

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pensador, a realidade não tem uma essência estática, que consiga ficar imóvel frente à

evolução histórica da humanidade.

Por fim, a última característica da realidade, a que permite dizer que Lukács é

um realista, pode ser percebida em suas palavras quando faz a seguinte observação “Ese

mundo es para la consciencia de la personalidad individual um mundo em si, una

realidad independiente de ella”. (1967, p.308)5. Aqui, vemos que, mais do que

relacionar homem e realidade, Lukács advoga a tese de uma realidade que existe

independentemente da consciência humana.

Como já foi dito no início deste capítulo, há pelo menos dois modos de conhecer

a realidade: o científico e o artístico. Aquele constrói seus saberes através de um

acúmulo de quantitativo do conhecimento. Nesse sentido, as descobertas no período de

Pitágoras, foram incorporadas pela matemática do século XXI. Já no que se refere à

arte, o acúmulo não se dá assim, ele não é linear. Embora a forma barroca de escrever

literatura não possa preponderar nos dias atuais, o conteúdo das obras desse estilo

continua vivo e pode ainda refletir a sociedade do século XXI. Logo, a forma e o

conteúdo de uma obra artística não são lineares nem acumulativos, como o são no

campo científico.

De acordo com Lukács, a principal diferença da arte e da ciência está no grau de

importância que cada uma dá ao indivíduo (particular) na construção do conhecimento,

pois

Mientras que todas las demás formaciones producidas por los hombres com la finalidad de reflejar y dominar la realidad objetiva possen necessariamente la tendencia a eliminar, neutralizar, suspender la subjtividad en la medida de lo necessário y posible, la esencia de la individualidad de la obra consiste precisamente no sólo en evocar sinplesmente la subjetividad, sino, además, en darle anchura, profundidad, intensidad, etc., que sin ella no alcanza em la vida. ( LUKÁCS, 1967, p. 338)6.

A ciência tenta construir o conhecimento abstraindo o máximo possível do

sujeito frente ao conhecimento. Tanto maior for tal abstração, maior será a legitimidade

dada ao conhecimento. Para a ciência, o grau de legitimidade conferido a um saber, é 5 Esse mundo é para a consciência da personalidade individual um mundo em si, uma realidade independentemente dela. (Tradução nossa). 6 Enquanto que todas as demais formações produzidas pelos homens com a finalidade de refletir e dominar a realidade objetiva possuir necessariamente a tendência a eliminar, neutralizar, suspender a subjetividade na medida do necessário e possível, a essência da individualidade da obra consiste precisamente não somente em expressar simplesmente a subjetividade, sim também, em dar-lhe voz, profundidade, intensidade, etc., que sem ela não alcança na vida. (Tradução nossa).

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proporcional à neutralidade conseguida em relação à subjetividade do sujeito. Já a arte,

reivindica tal subjetividade, uma vez que necessita das vivências do indivíduo na

construção do conhecimento por uma via sensitiva. Sem o sujeito com suas experiências

objetivas e subjetivas não se pode pensar em arte.

Não é por acaso, então, que Lukács vai colocar o particular no centro da

discussão estética. Desse modo, um dos capítulos do livro Introdução a uma Estética

Marxista tem o seguinte título: O particular como categoria central da estética. Pois,

para ele,

No que diz respeito à própria particularidade, devemos recordar o que dissemos anteriormente: que os dois extremos ( universalidade e singularidade) são pontos cada vez mais impulsionados para o exterior, mas que em dado momento são apesar de tudo pontos, ao passo que o particular como têrmo médio é antes um traço intermediário uma tensão, um campo. (LUKÁCS: 1978, p. 167).

Ou seja, o particular é algo que pertence ao indivíduo de forma única. Seja um

sentimento, emoção, vivência ou memória. É aquilo que o sujeito vive e experimenta de

forma individual, própria. E por sua vez, esta categoria da estética se encontra entre o

universal e o subjetivo.

Assim, de acordo com que foi exposto, pergunta-se: Qual a importância do

particular para a obra de arte?

Segundo Lukács “lo estético debe considerarse como un fenômeno histórico-

social, no sólo em su génesis, sino em todo el curso de su despliegue” (1967, p.369)7.

Ora, se o homem é um ser social construído de vivências, de emoções, de memórias e

em sua história e, se a arte bebe de tais experiências, as quais foram caracterizadas

como domínio do particular, é possível responder à indagação inicial dizendo que o grau

de importância do particular em relação à obra de arte é toda. Reafirmando, inclusive,

que a arte uma atividade humana e historicamente construída. De acordo com as

proposições Lukacsianas, até aqui, infere-se que, se o homem fosse uma tabula rasa,

sem uma vivência histórica, não seria possível existir arte, pois ela nasce exatamente

dessas experiências humanas.

Sendo um fenômeno histórico, portanto, uma construção humana, o grande

artista é aquele que consegue, a partir de suas vivências históricas, condensar no objeto

7 O estético deve considerar-se como um fenômeno histórico- social, não somente em sua gênesis, mas tem todo o curso de seu desenvolvimento. (Tradução nossa).

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artístico, por meio do particular, o universal. Essa capacidade do artista é nomeada por

Lukács de “tipo”. “Na representação do tipo, na criação artística típica, fundam-se o

concreto e a norma, o elemento humano eterno e o historicamente determinado, o

momento individual e o momento universal social”. (LUKÁCS, 1978, p.33). Em

resumo, o tipo é uma propriedade da estética em que o artista consegue exprimir algo

universal no particular. Um bom exemplo do universal contido no particular pode ser

dado, entre outros, pela personagem literária ou pela fotografia.

Quando vemos uma fotografia de um corpo mutilado de uma criança na guerra,

temos aí uma fotografia que retrata apenas um caso particular. Mas, dentro de um

contexto, conseguimos captar o horror de um determinado momento histórico. Ou seja,

é possível compreendermos o horror que faz parte da humanidade, dentro de um caso

particular.

Outro exemplo, de observar esta característica da estética Lukács, de falar do

universal dentro de um universo particular, pode ser observado na literatura. Ao criar

uma personagem literária, em geral, o escritor busca elementos internos e externos aos

indivíduos. Para ser crível, a personagem ficcional deverá conter em si aspectos

objetivos e subjetivos que o identifiquem aos seres reais, tais aspectos integram o ser

ficcional à realidade vivida. Desse modo, no interior do texto, ele é um ser particular a

partir do qual é permitido reconhecer aspectos da universalidade. As angústias, medos,

solidões, os conflitos vividos, de modo geral, pelas personagens são de ordem

particular, pertence aquele indivíduo, mas, por outro lado, são facilmente identificados

nas experiências humanas, como um todo.

Assim, quando pensamos nas personagens de Umberto Eco em o Nome da Rosa,

por exemplo, percebemos que os conflitos, os medos, a rigidez, a tensão entre viver o

mundano e o celestial, são sentimentos que habitam o universo particular das várias

personagens do romance, mas no seu todo, esses sentimentos são , mais do que próprios

de uma época, estendem-se ao humano em geral.

O mesmo acontece se pensamos nas personagens de Graciliano Ramos em

Vidas Secas, por exemplo. A aridez, a rusticidade, a ausência da voz e a opressão

vividas por Fabiano extrapolam a individualidade da personagem e se estendem a todo

um grupo constitutivo da sociedade brasileira, mas mais do que isso, Fabiano representa

a opressão vivida pelos homens em qualquer época ou lugar do planeta.

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Mais do que representar uma consciência individual, Umberto Eco e Graciliano

Ramos, nos dois romances citados, colocam-nos frente ao fluxo das consciências (ou

inconsciências) em geral. Esses sentimentos são atemporais e não locais. Em se tratando

do literário, Hermenegildo Bastos dirá que “a obra literária se desloca da referência

particularizada para a ela retornar.” De acordo com ele, “o particular se universaliza” e,

“pela obra literária, passa-se a ter outra dimensão da história, que não se reduz ao

registro factual. É uma maneira outra de falar da vida e do mundo.”

(BASTOS,2011,p.10)

Mediante as exemplificações, torna-se permitido afirmar que, por meio do

particular o artista é capaz de captar significativos aspectos sociais de um determinado

momento histórico. É exatamente esse atributo do artístico, que Lukács denomina de

típico. Essa propriedade da arte dada pelo típico é o que permitiria ao recebedor uma

leitura mais aprofundada e sensível da realidade vivida, de perceber nela o que não é

dito, que não é explicitado pelas instituições. Ao promover essa interação sensível do -

recebedor com a realidade vivida, a arte estaria então contribuindo efetivamente para a

formação do sujeito social, formação essa dada por meio da relação objetividade versus

subjetividade.

II.II- Arte e a autoconsciência:uma discussão sobre fetiche, base e superestrutura

Uma das preocupações mais recorrentes no pensamento universal refere-se ao

desejo de compreender as relações do homem com a história, com o mundo e,

principalmente, a preocupação que este demonstra de se auto-conhecer enquanto

indivíduo no mundo. Sobre o assunto, no livro quatro da estética, Georg Lukacs,

considera que

Todas las exigências formales de la estética, previamente estudiadas, son simples condiciones que possibilitan el cumplimiento de la vivencialidad espontánea de esa profundísima aspiración de la humanidad: conecerse a sí misma, conerce su relación con el mundo externo y consigo mismo, mediante um autorreflejo activo y creador, em correspodencia com la verdade; o sen: apropriar-se la propria realidad, la propria esencia, como reprodución del mundo independizado en ser proprio. ( LUKACS, 1967, p. 539)8.

8 Todas as exigências formais da estética, previamente estudadas, são simplesmente condições que possibilitam o comprimento da vivencia espontânea dessa profunda aspiração da humanidade: conhecer a si mesmo, conhecer sua relação com o mundo e consigo mesmo, mediante um autoreflexo ativo e creador,

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Se partirmos do pressuposto lukacsiano segundo o qual, ainda que não seja essa

sua finalidade última, a arte possui em si uma propriedade formadora-educadora da

sensibilidade humana frente aos aspectos históricos e sociais, nos é permitido afirmar

que mais do que conhecer a si mesmo, por meio da arte, o homem consegue

autoconscientizar-se enquanto sujeito histórico. Se lembrarmos ainda do típico

lukacsiano que nos diz ser a criação um espaço da realidade universal subjetiva e

objetiva que se mostra por intermédio do particular, poder-se-ia dizer que, na relação

com objeto de fruição, o homem toma consciência de sua condição enquanto ser

histórico. Nessa relação, ele poderá vir a se conscientizar de que, a realidade não é um

fetiche, não e um mundo rígido. Poderá enfim, tomar ciência de que são os elementos

constitutivos da realidade que influenciam seu agir político, social e ético.

Segundo Lukács a autoconsciência é extremamente importante, na medida em

que se vive em um mundo fetichizado, em que o próprio homem e sua realidade foram

deformados, modificados. Para Lukács,

En la época de su dominio y de su difusión general se utilizan en realidad como sustitutivo de la conformación artisitica, porque su mera presencia suscita ilusiones de determinación estética que a menudo existe en absoluto. Pero, con mayor ou menor rapidez, aparecen luego outros fetiches en primer término, y el arte grande o vanguadista de ayer resulta hoy rígido, muerto y vacia. ( LUKÀCS: 1967, p. 413)9.

Ao contrário do conceito de realidade movente, que foi desenvolvido neste

trabalho – aquela que pode ser observado na relação entre essência e aparência - a

realidade fetichada é substancializada, rígida, imóvel. Neste momento, Lukács nos

coloca diante de outra possibilidade da realidade, aquela deformada, transformada em

algo que ela não é.

A mesma afirmação, pode ser observada em relação ao conceito de homem que

é causada pelo fetiche, diz Lukács,

em correspondência com a verdade; o seja, apropriar-se da realidade, da própria essência, como produção do mundo independentemente de ser próprio. (Tradução nossa). 9 Na época de seu domínio e de sua difusão geral se utilizam na realidade como conformação artística, porque sua mera presença suscita ilusões de determinação estética que a pouco existe em absoluto. No entanto, com maior ou menos rapidez, aparecem logo outros fetiches em primeiro momento, e a arte grande ou vanguardista de hoje resulta rígida, morta e vazia. (Tradução nossa.).

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Si se separe del hombre mismo la estructura del mundo en que vive, el mundo cobra el aspecto de una falsa existencia independiente en la cual el hombre no és más que un huésped fugaz, um viajero de paso: y, como inevitable contrapolo ou esa tendência, el sujeito humano circundante, se imagina pode llevar uma vida baseada exclusivamente en si mismo.... (LUKÁCS, 1967, p. 429)10.

De acordo com que foi exposto acima, o conceito de homem que foi

desenvolvido neste trabalho, agora é invertido pelo fetichismo. O homem deixa de ser

visto como ser histórico, em que só poderia ser explicado numa relação sócio histórica

entre os homens e o mundo e, passa agora, a ser concebido de forma não relacional, e

sim, subjetiva, “autônoma”, frente aos outros seres humanos.

A partir do momento que o homem se torna indiferente frente ao mundo e aos

outros seres humanos, quando ele se fecha em si, tornando-se “autônomo” frente ao

mundo, e não se vê mais mediado por uma relação histórica social em relação ao mundo

circundante, ele se aliena do mundo real e cai no fetichismo.

De acordo com o que nos fala Lukács até aqui, pode-se inferir que a arte é capaz

de desautomatizar a visão do homem frente a sua realidade social, em suma, de levá-lo a

autoconsciência. Dentro dessa perspectiva, através da arte é possível tirar o homem do

mundo fetichizado e trazê-lo de “volta a sua essência”11. Isso ocorreria por meio da

aquisição da autoconsciência de que a realidade não é algo fixo, substancializado e, tal

qual o homem, não está fechada em si mesma, os dois são produtos históricos. A

relação entre a arte e a autoconsciência, assim como algumas características dessa

autoconsciência, podem ser observadas pela seguinte citação de Georg Lukács, no livro

Introdução a uma Estética Marxista, quando ele diz:

na eficácia exercida por tais obras, desperta e se eleva a autoconsciência humana, a qual não está separada de uma maneira hostil do mundo exterior, mas antes significa uma relação mais rica e profunda de um mundo externo concebido com a riqueza e profundidade, do homem enquanto membro da sociedade, da classe, da nação... . ( LUKÀCS, 1978, p. 296).

10 Se o homem se encontra diante da estrutura do mundo em que vive, o mundo cobre o aspecto de uma falsa existência independentemente no qual o homem não é mais do que um hospede fugaz, um viajante de passagem: e, como inevitável contraponto ou essa tendência, o sujeito humano circundante, se imagina pode levar uma vida baseada exclusivamente em si... . (Tradução nossa). 11 Não ignoramos o fato de que para alguns pensadores, tais como Adorno, essa possibilidade não exista posto que a arte seria também já automatizada como produto do capital, entretanto, aqui nos interessa o pensamento tomado como base de referência, o pensamento Lukacsiano, tomado como referência no curso do trabalho. ( Tradução nossa).

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Nesse caso, a arte torna visível o fato de ser o homem não um ser puramente

subjetivo, fechado. Seja em uma comunidade, seja em uma sociedade, seja em âmbito

maior, globalizado, o homem vive em relação constante com os outros. Nesse sentido é

impossível pensar o homem dissociado da história, imerso em si mesmo.

Por sua vez, o próprio homem só se torna autoconsciente, quando percebe que é

um ser histórico, que a realidade não é fixa, imutável, mas sim, um constante

movimento entre essência e fenômeno, quando se conscientiza enfim, dessas questões,

atinge a autoconsciência sugerida por Lukács.

Diante da constatação de que o homem só conseguirá se libertar da alienação

imposta pelo fetichismo mediante a consciência de que é um ser relacional, histórico e

socialmente construído, surgem a seguinte questão: Como pode a arte trazer o homem

de suas características não subvertidas? Ou seja, como pode a arte autoconscientizá-lo

desse mundo subvertido em que se encontra?

Por meio de uma linguagem específica, da interação com o mundo exterior e

interior e do conteúdo a arte começa a desfetichizar os conceitos de homem e mundo

difundidos e socialmente estabelecidos e naturalizados como verdades. De acordo

Lukács, “ la desfetización es primariamente algo relativo al contenido, puesto que

produce una relación entre los fenómenos vitales, rechaza o desmascara algunos como

deformaciones de la verdad y situa outros el lugar que lês corresponde” (1967 p. 430-

431)12. Então ao relacionar quais os elementos mais vitais, mais importantes que devem

entrar na obra, o artista já está ajudando ou não a conscientizar o homem em relação ao

mundo que o circunda.

Se a arte escolhe os conteúdos para serem representados na obra, quais então são

os principais conteúdos, os mais fundamentais para que haja essa autoconscientização

do homem?

Para Lukács, os principais conteúdos são aqueles que falam dos problemas

concretos do homem, os que falam da situação histórica política e social na qual se

encontra no mundo. Incisivamente, ele afirma que, “as obras originais são aquelas nas

quais aparecem tomadas de posição juntas, conteudisticamente, em face dos grandes

problemas da época”. (1978, p. 216). Logo, os conteúdos que devem figura nas obras

artísticas são aqueles direcionados a humanidade de uma forma geral, tais como, a 12 A desfetichização é primeiramente algo relativo ao conteúdo, posto que produz uma relação entre os fenômenos vitais, rechaça ou desmascara algumas deformações da verdade e situa outros no lugar que lhes correspondem.

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miséria, a corrupção, a fome, o desemprego... Na concepção lukacsiana, a arte, ou o

conteúdo dela não pode ser alheio a esses problemas, pois são eles que fazem parte e

constituem a vida da humanidade.

Se até aqui, alavancamos uma discussão, nos molde de Lukács, sobre a

necessidade de uma arte participativa, de uma arte que, por meio do conteúdo, interage

com os problemas sociais; o que diria então esse pensador frente aos ideais propagados

pela corrente que defendia “A arte pela arte”? Certamente Lukács diria que, ao buscar a

beleza a todo custo, ignorando os problemas que concretamente atingem a humanidade,

o processo criativo que move o artista adepto da Arte pela arte, pode sacrificar o

homem.

Diferentemente da arte pela arte, as concepções lukacsianas se aproximam bem

mais de uma arte de caráter engajado. Tal concepção de arte, parte da situação histórica

para dela tirar o conteúdo que lhe é constitutivo. Para essa concepção artística, o belo da

arte se adquire com a junção da forma artística com o conteúdo histórico ali

representado.

O fato de a arte falar dos problemas humanos, de ela não ser alheia ao mundo,

permite-lhe aproximação com o homem. Em relação à abordagem que requer interação

homem-mundo, no terceiro livro da estética, Lukács, assevera que “Pues la evocación

artística se propone ante tudo que el receptor viva como cosa própria la refiguración del

mundo objetivo de los hombres”. (1967, p. 309)13. Além da linguagem sedutora da arte,

da sua fantasia e ludicidade, ao representar o homem em suas obras, consegue puxá-lo

para dentro dela. E nesse vínculo de aproximação com o conteúdo artístico, o homem

consegue modificar-se, transformar-se.

Para Lukács, a arte consegue autoconscientizar o sujeito histórico por meio do

choque que ela causa nele, isso se evidencia em suas palavras,

Recordaremos aqui anteriores exposiciones, hechas en outros contextos, en los cuales llamamos la atención sobre el choque que produce la nominación adecuada, peculiar y acertada, de um objeto, uma situacióm etc, etc. ((LUKÁCS, 1967, v. 4, p.463)14.

13 Pois a evocação artística se propõe antes de tudo que o receptor viva como a coisa própria se mostra na representação do mundo objetivo dos homens. (Tradução nossa). 14 Recordaremos aqui anteriores exposições, feitas em outros contextos, nos quais chamamos a atenção sobre o choque que produz a dominação adequada, peculiar e acertada, de um objeto, uma situação etc, etc. (Tradução Nossa).

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Seja qual for a ideologia de mundo e do homem que a arte representa, ao propor

um conteúdo, ela irá mostrar uma concepção de mundo em relação a de seu interlocutor

- caso eles tenham posições de mundo distintos. Então, o choque se dá por meio desse

diálogo entre concepções diferenciadas de mundo. Ou ainda, esse choque se dá perante

o inusitado, quando ao artista coloca em cena algo que choca, que desestabiliza

convicções histórica e socialmente construídas. Esse choque só é possível devido às

vivências, as emoções, as experiências do homem adquiridas ao longo de sua vida. Se o

homem, não fosse um ser histórico, se fosse uma tabula rasa, não seria possível esse

abalo, posto que não teria as concepções de mundo histórica e socialmente construídas

que se confrontariam com aquelas contidas na obra de arte.

Logo, a arte autoconscientiza o homem, pois através dos efeitos do choque,

numa espécie de catarse, de purificação dos sentimentos, faz o homem pensar e, por

vezes, rever suas concepções de mundo e da própria existência.

Mesmo reconhecendo em todo o seu valor a força evocadora da forma artística, deve estar claro que qualquer sujeito receptivo coloca incessantemente em confronto com a realidade refletida pela arte com as experiências que ela mesma adquiriu”. ( LUKÁCS: 1978, p.293).

Ou seja, no contato com o artístico, o homem é levado a reconhecer e a repensar

suas visões de mundo “congelado”, estático e imutável. Assim como a concepção

possível de homem desfetichizado, como homem fechado, subjetivo. Ao representar

fielmente a realidade - como foi exposto no capitulo primeiro -, a arte possibilita o

homem perceber que muitas visões ou opiniões sobre o homem, o mundo e seus juízos

de valores a respeito da política, ética e da sociedade em geral, não passam de uma

ilusão. Pois a realidade representada, mostra que as opiniões que não sejam próximas a

essa realidade, são opiniões fetichizadas.

Ao representar fielmente a realidade, a arte traz um conteúdo que por ser

verdadeiro, objetivo, e na confrontação com este conteúdo, ela permite ao homem

reconhecer-se e reconhecer a própria ignorância. A partir daí, a esse interlocutor será

possível enxergar o mundo para além do que foi transformado, para além do fetiche. Em

síntese poder-se-ia dizer que passa a vê-lo de uma forma autêntica, como

verdadeiramente é, com todos os problemas que lhe são constitutivos.

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Dessa forma, mais do que desfetichizar a realidade e o homem, a arte consegue

mostrar os elementos constitutivos dela os quais influenciam diretamente as relações

históricas e sócias.

O universal, por seu turno, é tanto a encarnação de uma das fôrças que determinam a vida dos homens, como ainda- caso em que ele se manifesta subjetivamente, como conteúdo de uma consciência no mundo figurado- um veiculo da vida dos homens, da formação da sua personalidade e do seu destino. (LUKÁCS:1978, p. 283).

O que equivale a dizer que, existe uma lei que consegue explicar as relações

sócio- históricas ao longo da história. E essa explicação, segundo Lukács, - seguindo os

preceitos marxistas - vem do materialismo histórico. Ela se torna clara quando da

analisa de conceitos tais como base e superestrutura.

A base é constituída pelo fator econômico, tais como: a produção de

mercadorias, as leis de mercado (oferta e procura) e os estudos de mercados

consumidores. Já a superestrutura é constituída pela filosofia, política, direito, literatura,

ou seja, ela se sustenta nas as ideologias e nas áreas dos saberes humanos. Mas é

importante frisar que, ambas atuam constantemente umas sobre as outras. Retomando as

palavras de Engels, Lukács faz nos compreender melhor tais relações, pois de acordo

com Engels, “o desenvolvimento político, jurídico, filosófico, religioso, literário, etc.,

baseia no econômico. Mas todos reagem mutuamente uns sobre os outros e, também

sobre a base econômica”. (ENGELS Apud LUKÁCS: 1978, p. 17).

Com isso pode-se inferir que, para explicar como se dão as interações sociais

entre os homens é necessário ter em mente a relação entre base e superestrutura. Uma

vez que, por exemplo, a ética que se encontra na superestrutura, guia as condutas

humanas.

Através, da sua linguagem e dos conteúdos os quais suscitam, o estranhamento,

o choque, enfim, o confronto no recebedor, a arte pode levar esse interlocutor a

apreender as leis que o influenciam enquanto sujeito histórico. Isto por que, acredita-se,

terá condições de perceber que seus “pré- conceitos” e sua visão fetichizada do mundo

se deram em parte, também, pela falta de consciência no que se refere ao

desenvolvimento da história da humanidade, especialmente, a incompreensão de que

esse desenvolvimento é regido pela relação entre base e superestrutura.

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De acordo com o que expõe Lukács, acredita-se que, a partir do momento que o

homem capta as estruturas que regem o desenvolvimento da humanidade, ele muda seu

comportamento, sua sensibilidade e a sua percepção de mundo torna-se mais refinada.

Na influência direta e indireta exercida pelo prazer artístico sôbre o sujeito receptivo, o elemento comum é a transformação sujeito que descrevemos, o seu enriquecimento, o seu aprofundamento, o seu reforçamento e a sua emoção. (LUKÁCS, 1978, p. 295).

Pode-se dizer, então, que a partir do momento que a arte representa as estruturas

( base e superestruturas) que constituem a historia da humanidade, ela tende a interferir

e modificar o comportamento e a concepção do homem em relação a si e o sobre o

mundo. Ela altera a sensibilidade do sujeito, permitindo-lhe uma visão mais profunda e

refinada a respeito do mundo e do próprio homem.

Conseqüentemente, com uma percepção mais refinada, há mudanças no

comportamento na medida em que, há uma apropriação melhor da história, ela se dá de

modo mais sensível. Há, por conseguinte, uma percepção mais clara em relação às

transformações históricas. Nesse sentido, as relações do homem com a humanidade

tornam-se mais fraternas, pois se reconhece enquanto ser social, toma consciência de

que sem o “outro” ( homem) não há possibilidade da existência humana.

Em suma, através da purificação (catarse) da arte e pelo confronto que ela causa

no homem, este consegue desfetichizar o mundo e as ilusões que o cercam, passando,

dessa forma, a se apropria melhor da história, da sua relação de conhecimento com

mundo, e principalmente, da sua condição enquanto ser social. Em outras palavras, o

homem se torna autoconsciente

y en la medida em que el Ser-para-sí de las individualidades de las obras rechaza todo lo que no procede de esse manantial, toda transcedencia absoluta, se expressa en ello como categoría la más profunda aceptación del mundo, del gênero humano, su autoconsciência de ser- em cuanto espécie- dueño de su proprio destino”. ( LUKÁCS,1967, p. 533)15.

Se até aqui dissemos que a arte carrega em si a capacidade de deslocar-se do

particular para o universal permitindo, portanto, uma percepção mais apurada e sensível

15 Na media em que o Ser-para-sí das individualidades das obras rechaçam todo o que não procede desse manancial, toda transcendência absoluta, se expressa nele como categoria da mais profunda acepção do mundo, do gênero humano, sua autoconsciência de Ser- em quanto espécie- dona de seu próprio destino. (Tradução minha).

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da realidade, que por meio dessa propriedade ela permite a autoconsciência individual,

poder-se-ia dizer então que arte comporta em si um fim transformador, educador.

II.III - Arte e educação

É primordial ter claro que a arte não apresenta em si um fim didático-orientador,

não é pensada para servir aos propósitos pedagógicos. Contudo, se há algo que

identifica a arte é a capacidade que ela tem para - a partir da autoconsciência frente à

representação da realidade vivida - instruir, educar, socializar e integrar o homem à

sociedade em que vive.

Em suma, a arte, ainda que não seja este seu fim último, na medida em que

assinala e, muitas vezes, ilumina as contradições, desempenha um papel de formação

educativa geral do homem. Isso fica explicito nas palavras de Gianni Carchia, no livro

Dicionário de Estética, quando ele diz que “a noção de educação estética diz respeito a

um problema muito mais geral: o da função que os componentes estéticos

desempenham na aprendizagem e na formação global do indivíduo” (1999, p.101).

Ou seja, a arte não só educa o homem a respeito de valores sociais, políticos,

mas também, no que se refere aos valores morais e ao gosto. “Por vezes, pela expressão

educação estética entende-se de maneira redutora, a educação do gosto ou a educação da

produção artística” (CARCHIA, 1999, p.101). Uma vez que a arte consegue abranger

várias áreas do conhecimento humano - epistemologia, estética, hermenêutica -, por

meio das contradições que ilumina e ressalta pode-se dizer que ela consegue alcançar

globalmente a formação do indivíduo.

Através da arte é possível apresentar uma mensagem, um conteúdo, um

pensamento que não passa necessariamente por um livro, ou melhor, pela comunicação

escrita.

A respeito da arte como meio de educação, Georg Lukács, no quarto volume da

estética, nos diz que [...] las artes figurativas complen desde el primer momento la missión social formulada por el papa Gregoriano Magno : las imágenes se ponen em la iglesia para insturicción de los incultos, para que los que no entienden las letras lean em los libros (LUKÁCS, 1967, p. 391)16.

16 As artes figurativas cumprem desde o primeiro momento a missão social formulada pelo papa Gregoriano Magno: as imagens se põem na igreja para instrução dos incultos, para que os que não entendem as letras, lêem através dos livros. (Tradução minha).

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Logo, de acordo com Lukács, a arte, seja ela plástica ou literária, desempenha

uma função educativa na sociedade, uma vez que pode ser um meio de difusão de

conhecimento e cultura17.

Um dos êxitos da arte, referentes a sua capacidade educativa, está, como diz

Lukács, no fato de ela trazer o seu interlocutor para dentro da obra. “La fuerza del

lenguage, evocadora de objetidad, hace aqui algo que recuerda lo que es en las artes

platicas esa vivencia de realidad que es prueba de si mesma, aunque dentro de las

diversas artes”(LUKÁCS, 1967, p. 463)18.

Através da sedução da sua linguagem, seja ela visual, cênica ou escrita, o

interlocutor da arte tem uma maior tendência a adentrar e compreender aquilo que é

transmitido enquanto conhecimento.

Pode-se dizer que quanto mais nos relacionamos com um objeto artístico, mais

fácil e maior é a absorção do conteúdo desse objeto. Ao nos enxergarmos no objeto, e

adentrarmos no mundo da arte, é possível fazermos a aplicação do conhecimento ou do

conteúdo nele contido, assim como, dele nos apropriarmos em diferentes contextos.

Logo, a relação de “intimidade” com o objeto artístico é de fundamental importância

para compreendê-lo e para que essa compreensão resulte em conhecimento.

Além da capacidade de sedução característica da arte, o fato dela nascer no seio

social ajuda na transmissão do conhecimento. Isto, não significa que arte deve ser vista

como documento factual, pois se analisada apenas como registro cronológico de um

tempo, fatalmente ela perderia seu valor quando esses fatos forem esquecidos. Significa

apenas que os problemas que ela suscita, tem uma relação com os aspectos histórico-

culturais que a circunda. A respeito do nascimento da obra de arte, no livro Introdução a

uma estética marxista, Lukács assevera que

De fato, para o nascimento de qualquer obra de arte, é decisivo precisamente a concreticidade da realidade refletida. Uma arte que pretende ultrapassar objetivamente as suas bases nacionais, a estrutura classista de sua sociedade, a fase da luta de classe que é nela presente, bem como, subjetivamente, a

17 No Brasil em que se tem analfabetos, a arte poderia ser usada para instruir as comunidades mais carentes. Através do folclore de cada comunidade ou da história peculiar de cada região, é possível mostrar como surgiu aquela cultura historicamente, assim como, mostrar que a forma de agir e pensar de uma determinada sociedade está diretamente relacionado a sua historia. Ou seja, através do folclore, dos costumes é possível educar á sociedade. 18 A força da linguagem, que invoca a objetividade, faz aqui algo que recordas o que é nas artes plásticas essa vivencia de realidade que é prova de si mesma, ainda que dentro das diversas artes. (Tradução minha).

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tomada de posição do autor em face de todas estas questões, destruir-se-ia como arte” ( LUKÁCS: 1978, p. 286).

Logo, do modo sugerido por Lukács, a arte só pode ser pensada e concebida a

partir do contexto de seu nascimento. Fora dessa relação, ela corre o risco de

desaparecer.

Mas qual a relação existente entre o fato de arte ser social e historicamente

construída e recebida com a sua capacidade inata de educar? Certamente tal relação

decorre do fato de o conteúdo, e os problemas constitutivos dele, surgirem dentro do

contexto do vivido. E, tal como foi exposto no capítulo anterior, por falar dos principais

problemas que afligem a humanidade - miséria, corrupção, ética e política - a arte

instiga o interlocutor ao ato de pensar, de refletir acerca da própria condição e do outro

que nela figura. Não seria, portanto, nenhuma arbitrariedade, afirmar que isso por si só,

já, e por conseqüência, é uma forma de educação.

A partir do momento que o interlocutor vê seus problemas concretos, diários,

sendo representados e refletidos na e pela arte, mais sua atenção se volta para ela. É

comum o aluno de história, por exemplo, se desinteressar por uma aula quando ela

aborda temas distantes de sua realidade. No entanto, quando a aula aborda fatos e

problematiza questões mais próximas do aluno, certamente, a aula tende a receber maior

atenção.

Logo, depreendemos que, o fato da arte ser histórica e problematizar as questões

do seu tempo, ela consegue ter uma forte aceitação, pois representa o homem e

consequentemente, a sociedade de um determinado período histórico. O ganho nesse

sentido, decorre pelo fato de que, mais do que aprender sobre fatos históricos e sociais

do passado, a obra de arte nos impõe uma fruição sensível desse passado, ela nos

permite, assim, um contato sensível com o mundo interior e exterior de mim e do outro

que nela se apresenta.

Na medida em que a arte se mostra eficaz enquanto transmissora de conteúdos

vividos pelo sujeito na coletividade, necessariamente, ela também interfere na educação

da sensibilidade do sujeito interlocutor. Marx já chamava á atenção para a importância

da arte na sociedade, quando dizia que, “o objeto artístico - bem como qualquer outro

produto - cria um público sensível (Marx Apud. LUKÁCS: 1978, p. 294). O que vale

dizer que o conteúdo da arte consegue seja, na pintura, na música, na literatura, aguçar a

sensibilidade do homem, e por conseguinte, interferir na formação de um ser sensível.

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De acordo com as proposições lukacsianas, pode-se inferir que a arte aguça a

sensibilidade, pois trabalha constantemente com a emoção e os sentidos. Por meio da

educação artística consegue-se levar à percepção sobre coisas do mundo e da própria

natureza humana as quais, dificilmente, seriam apreendidas por um indivíduo sem tal

formação. Quanto maior o contato com o universo da arte, com a linguagem artística,

maior nossa capacidade de apreensão e de percepção da realidade vivida. Se colocarmos

um artista para analisar uma obra, ele certamente enxergará coisas para “além da obra”

detalhes que fatalmente serão ignorados pelos os leigos.

Ancorado ainda nas leituras lukacsianas, sinto-me a vontade para afirmar que

essa percepção aguçada do artista não se deve apenas a um maior ou menor grau de

instrução do observador, mas, também e necessariamente, ao desenvolvimento sensitivo

que é peculiar dos artistas, que Hegel certamente atribuiria à categoria do “gênio”. Se

assim não fosse, pergunto eu, como poderia Cartola, sendo um músico que não

frequentou a academia, compor obras musicais que falam com tanto profundidade do

homem?

Ora, talvez uma das formas de explicar as obras de Cartola passe primeiro por

sua condição de gênio nos termos hegelianos e, segundo, por sua constante presença no

meio musical, o que certamente o ajudou a desenvolver a habilidade sensitiva, o que por

sua vez, possibilitou-lhe composições musicais notórias.

Até aqui, foi defendida a tese de que a arte desempenha um importante papel

educativo na formação intelectual e sensitivo do homem. No entanto, ao considerar que

“a arte é uma finalidade de si próprio”, Kant poderia objetar, pois como expõe M.

Antunes, em seu dicionário de filosofia logos (1989, p. 478), Kant poderia me indagar

dizendo que a arte não deve ser vista como instrumento, mas como uma criação

autotélica, cujo fim se encontra em si mesma.

Embora possa educar e difundir conhecimento, jamais a arte deverá ser pensada

como instrumento pedagógico. De acordo com a proposição lukacsiana, mesmo que a

arte haja diretamente na formação de seus recebedores, ela não é e não pode ser

concebida como um mero instrumento educativo. Assim, o próprio conceito de arte,

desenvolvido neste trabalho, nos mostra que naturalmente, ela reflete e nos faz refletir

sobre as experiências humanas. Por ser constitutivamente reflexiva, ela nos leva a

autoconsciência, Ela é, por conseqüência, educativa sem, no entanto, fazer-se

instrumento pedagógico.

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Sobre a relação arte educação, Kant talvez tenha sido um dos primeiros

pensadores modernos a falar efetivamente da relação do sujeito com o objeto artístico.

Entretanto, se tomamos como referência as proposições de Lukács, diremos que o

conceito de arte exposto por Kant é problemático. Em Kant, a arte passa por uma

“autonomia” do sujeito para valorá-la, ou seja, para emitir juízo de valores dizendo se

ela e bela ou não. Ao discorrer sobre o pensamento estético em Kant, em seu livro

Iniciação à Estética, Ariano Suassuna observa que ao emitir um juízo estético, o sujeito

“não está exprimindo um conceito decorrente das propriedades do objeto, mas apenas

uma sensação de prazer ( ou desprazer) que ele experimenta diante do objeto” (2008,

p.72). De acordo com tal proposição pode-se inferir que, em Kant o sujeito tem uma

“autonomia” frente ao objeto estético. Pois é ele, em ultima instância, que dirá se algo é

belo ou não.

Mas para melhor adentrar a esta discussão talvez fosse relevante retomar o

conceito de homem expresso nas palavras de Georg Lukács. No livro segundo da

estética ele afirma que La aparicón de la especifidad em las relaciones sociales de los hombres no es pues uma contraposición tajantes y metafísica de princípios meramente históricos com principios supratemporales, no és ningún abandono de sus determinaciones histórico- sociales, ningún asceno por encima de éstas para penetrar em outra esfera “más pura” de la existencia, sino que es um momento indistinguible a priori ( LUKÁCS, 1966, v. 2, p. 270)19.

Depreende-se daí que o homem é ontologicamente histórico, é próprio do

humano ser social. O homem é pensado na sua essência como um ser que se relaciona

como outros homens e como o mundo. Sem a existência do “outro” não é possível falar

em homem. É interessante notar, que a relação social não se dá depois que o homem se

encontra no mundo, mas é anterior , é apriori.

Isso significa que, ao dizer que o belo na arte passa necessariamente pelo juízo

“autônomo” do homem, na concepção de Lukács. Por isso, é possível dizer que Kant

comete um erro, uma vez que ele, não percebe que o homem não pode emitir juízo de

forma individual, mas apenas de uma forma coletiva dentro de um do contexto que ele

se encontra. No pensamento lukacsiano, não há sentido em falar de homem autônomo,

na medida em que ele só pode ser pensado dentro de um contexto sócio-histórico.

19 A aparição da especificidade nas relações sociais dos homens não é pois, uma contradição tangente e metafisica de princípios meramente históricos com princípios supratemporais, não é nenhum abandono de suas determinações histórico- sociais, nenhum aceno por cima destas para penetrar em outra esfera “ mais pura” da existência, sim, que é um momento indistinguível a priori. (Tradução minha).

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Conclui-se daí, que sendo a arte um produto humano e o homem um ser

histórico, ela só poderá ser pensada em sua relação social, ou seja, quando se relaciona

com o homem e o mundo. Nessa concepção, ao contrário do que propunha Kant, jamais

a arte poderá ser fechada em si própria, pois ela só pode ser pensada dentro de um

contexto sócio histórico. Só concebida dessa maneira, ela terá sentido e exercerá papel

educador, transformador.

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CAPÍTULO III

Um breve diálogo entre Vidas Secas e a estética de Lukács

Neste momento do trabalho, pretende-se uma breve análise do filme Vidas Secas

do Diretor Nelson Pereira dos Santos, inspirado do livro de Graciliano Ramos.

Buscando aspectos referentes aos problemas humanos, ao conceito de grande

arte e arte engajada, a análise tenta estabelecer um diálogo com primeiro capítulo. Já na

segundo parte dessa análise, será observado como se dá a relação do filme com as teses

contidas no segundo capítulo: arte e realidade, arte e autoconsciência e arte e educação.

Em relação a esta última tese, será mostrado como o filme pode ser aplicado como

instrumento didático em sala de aula.

Por meio da abordagem dos problemas que a afligem a vida de Fabiano e de sua

família, já no início do filme, pode-se observa como o diretor, pensa o homem, ou

melhor, como o humano e algumas de suas aflições serão trazidos para o mundo

recriado na imaginação primeiro de Graciliano e agora de seu leitor e diretor.

A partir da ambientação especial constituída por imagens significativas, o diretor

coloca diante do espectador aspectos da vida de Fabiano que podem bem ser lidos na

vida de muitos outros tantos Fabianos. O contexto do filme, constituído por um cenário

expressivo como pano de fundo, revela uma terra árida, árvores secas de troncos

retorcidos, casas paupérrimas ... Nesse ambiente a miséria material se mescla à miséria

espiritual. A composição do cenário, as cenas criadas no filme, deixa o espectador ver

um ambiente, inóspito, miserável, desumano, típico de um serão nordestino, mas, ao

mesmo tempo, também típico da aridez da vida de muitos outros seres humanos.

Não há dúvidas de que os problemas que afligem Fabiano e sua família nascem

do contexto em que eles estão inseridos, mas é inegável também, o fato de que a parca

vida de miséria, de ausência, de silêncio na qual estão submetidos os personagens, se

desloca continuamente dessas personagens para nos fazer ver o universal. E, certamente,

as imagens, criadas no filme reforçam tal universalização.

Muito embora, a ambientação do filme, reforce a identificação com os sertões

nordestinos onde a propagação de elementos tais como a miséria e opressão permitem

ao interlocutor maior identificação com as personagens e com os problemas que elas

representam, é importante, como nos mostrou Lukács, extrapolar o particular e buscar o

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universal que nele se apresenta. Pois não se pode esquecer que, na linguagem da arte, a

relação particualar-universal é um jogo em que o particular está constantemente se

deslocando para o universal e retornando a si mesmo.

A escolha do ambiente do cenário nesse caso, não é aleatória, pois se no

romance a paisagem se entrelaça á vida, às ações das personagens, no filme, a cor ( o

preto e branco no filme, da a sensação para o telespectador de pobreza tanto ambiental,

quanto espiritual), a música reforçam a percepção de uma paisagem dura, como a vida

de Fabiano e sua família. Também no filme, a paisagem completa a constituição das

personagens, constitui-se em signos. Ao entrelaçar a vida das personagens à paisagem,

ao ambiente local, fazendo dela um código semântico, Nelson dos Santos, faz ver aquilo

que é caro no pensamento de Lukács sobre arte e realidade. Quando nos revela os

problema que afligem Fabiano e sua família só podem ser percebidos se observados em

relação ao diálogo do exterior com o interior.

Por meio do diálogo com o mundo objetivo e subjetivo, fazendo uso de uma

linguagem própria da arte e buscando uma relação do particular com o universal, Vidas

Secas traz para dentro da discussão do artístico aspectos da vida social. Dentre esses

aspectos é possível destacar alguns no momento em que ocorrem.

• A desigualdade social, entre vários outros momentos este aspectos nos é

revelado pela contradição entre a vida de Fabiano e do coronel. Enquanto, se

por um lado temos a filha do coronel que estuda música clássica, por outro

temos Fabiano que sequer é alfabetizado e incapaz de articular um enunciado

completo, apenas emite grunhidos.

• O poder do Estado que se por um lado, omite-se de obrigações básicas como o

fornecimento de saúde, educação.... por outro, age de forma abusiva no interior

da sociedade. Tais aspectos podem ser observados ao longo de todo o filme e

mais especificamente, no momento em que Fabiano tenta vender a galinha e é

impedido pelo policial. O motivo da proibição, segundo este, era o fato de

Fabiano não ter contribuído com Estado através do pagamento de imposto

referente à galinha. Nesse momento da narrativa a ironia proposta pela cena em

relação à ação do Estado se mescla à dor e humilhação de Fabiano.

• Além desses dois problemas que afligem a humanidade expostos no filme, a

miséria que talvez seja, humana e social, um dos temas centrais do filme.

Aparecem em toda narrativa, basicamente em todos os elementos dela

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constitutivos, entretanto aqui, destaca-se um momento em que essa situação é

elevada ao extremo. O momento em que Sinhá Vitória, a mulher de Fabiano,

mata seu próprio animal de estimação (o papagaio), quase um membro da

família, para matar a fome de sua família. Através desta cena, o diretor nos

coloca frente aquilo que Graciliano narrou como uma espécie de clímax da

miséria humana. Matar um “membro” da família para sobreviver.

Então através das abordagens da desigualdade social, do poder abusivo do

Estado, e principalmente, do tema da miséria que é central no filme, pode-se ver

aplicado ao filme Vidas Secas, algumas das características de Lukács discutidas no

primeiro capítulo desse trabalho, entre as quais se destaca a capacidade que a arte

apresenta para pensar o homem e os problemas que afligem a humanidade de forma

geral.

De acordo com as temáticas do filme e a maneira escolhida para representá-las é

possível afirmar que ele se encontra dentro do que foi denominado e reconhecido por

Lukács como uma grande obra. Isso se dá porque na concepção desse trabalho, ao

retratar a temática de Gracilinao ramos, O filme Vidas Secas, opta por elementos

cinematográficos capazes de colocar o interlocutor frente - aquilo de Lukács considera

fazer parte de uma grande obra de arte - aos problemas recorrentes a humanidade.

Se lembrarmos aqui da idéia de Arte pela Arte e Arte Participativa,

desenvolvidos no interior do trabalho, poderíamos afirmar que longe de buscar o belo

pelo belo da arte, Vidas Secas se configura enquanto uma obra de arte participativa nos

moldes de Lukács, a opção pelas imagens, pela música em relação ao tema, mostram o

não distanciamento das causas humanas e sociais, o artista nesse caso, interage com o

mundo vivido e dele se desprende regularmente. Na narrativa não há como se isentar

de uma posição de crítica de denuncia frente aos problemas sociais, políticos e

econômicos de uma parte, ou de grande parte, das esferas das sociedades,

especialmente, as sociedades capitalistas.

O drama de Fabiano e de sua família se estende e extrapola o universo da família

ou do meio nordestino em que habita a personagem, nesse caso, os dramas de Fabiano

são representativos do universo das sociedades que oprimem e humilham o indivíduo

frente à força do capital.

Daí pode-se ver, de que modo o “Típico proposto” pela estética de Lukács é

observado e aplicado no filme de Nelson Pereira dos Santos. Em uma releitura do

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romance de Graciliano, o cineasta consegue, por meio, de uma outra linguagem, que

não a literária, e recorrendo aos elementos cinematográficos, criar um ambiente em que

os problema sócio- econômico de um determinado período histórico brasileiro, os quais

ainda se fazem presentes, sejam evidenciados através do universo particular do

personagem de Fabiano.

Nesse sentido, acredita-se que a tese lukacsiana defendida no segundo capítulo,

na qual arte é capaz de autoconscientizar o homem é corroborado pelo filme Vidas

Secas, na medida em que ele leva o seu interlocutor a refletir e ter uma percepção mais

crítica do mundo.

Ao efetuar a escolha das imagens, do cenário como um todo, em suma, dos

elementos essências do filme, Nelson Pereira dos Santos reforça aquilo a narrativa

pretendida por Graciliano em relação ao conteúdo: a miséria, a pobreza, o

analfabetismo, o colonialismo.

O entrelaçamento do humano com o social, tal sua aspereza, levam ao choque, e,

tal como apregoa Lukács, forçam o interlocutor uma reflexão sobre a vida e os valores

que a permeiam (políticos, éticos, religiosos) em geral. Um bom exemplo desse choque

pode ser reconhecido no filme, na cena em que uma vaca cai no chão e morre de fome, e

logo depois, todo o seu rosto estava coberto por mosquitos e bichos. É difícil permanece

alheio ou passivo frente à agressividade da cena.

O choque causa incomodo no seu interlocutor, ao ver, por exemplo, uma vaca

cair no chão devido a extrema pobreza de um contexto sócio- histórico e por

conseguinte, permite a tomada de consciência política e social por parte do sujeito. Pois

faz o individuo pensar sobre as causas da pobreza ou injustiça, que muitas vezes são

conseqüências de ideologias ou valores da classe dominante.

Aliada à força das imagens, as poucas falas das personagens – tal como na voz

da esposa de Fabiano quando esta diz que “queria morrer para acabar com isso” - são

também impactantes, incomodam, causam choque. E ao fazer isso, desmitificam a

relação do sujeito com a realidade e, por sua vez, cobram releitura dos conceitos dos

interlocutores do filme.

Por tudo que foi exposto, pode-se dizer que, através dos conteúdos selecionados

no filme Vidas Secas, Nelson dos Santos consegue chocar o seu interlocutor, e por

conseqüência, fazer com que ele pense seus conceitos e valores a respeito do homem e

do mundo.

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Por isso, é possível dizer, pensando nos pressuposto de Luckács, que esta obra,

ratifica a tese lukacsina de que arte tem a capacidade de, por meio da escolha dos

elementos, da estrutura escolhidos para a representação, interferir diretamente na

percepção humana frente aos problemas humanos. A arte é capaz de autoconscientizar,

de transformar para formar, por meio da sensibilidade, outra percepção em seu

interlocutor.

Embora não seja um instrumento pedagógico, nem seja essa sua finalidade

última, como já foi mencionado sobre a obra arte em geral, Vidas Secas, tanto o filme,

quanto romance têm sido reivindicados constantemente pelos educadores. Uma vez que

pode ser visto como denuncia da realidade histórica do inicio do XX. Pode-se notar

também, neste filme, uma boa descrição da vegetação do sertão nordestino. Além do

mais, o filme, é baseado em um escritor influente da literatura brasileiro, o que leva os

estudandes de literatura no mínimo, a assisti-lo para conhecer a obra de Graciliano

Ramos.

Pois ao dizer que consegue trazer para seu interlocutor, elementos que o façam

pensar a realidade, no espaço mínimo de uma música, Beethoven, mostra a eficácia da

arte em contraposição à ciência e a filosofia que para fazer o mesmo necessitariam de

inúmeras páginas. Embora, talvez não de modo consciente é que os educadores estão

sempre a reivindicar a arte para seu fazer pedagógico. Pois arte não só consegue captar

aspectos históricos, sociais e científicos, estruturas da realidade que envolvem o

indivíduo, como também permite uma acessibilidade aos aspectos da sensibilidade

humana.

Por tudo que foi exposto, pode-se concluir que o filme de Nelson Pereira dos

Santos consegue aplicar as principais características da estética lukacsiana, uma vez que

o filme pensa os problemas gerais do homem, como: fome, corrupção e o poder

exacerbado do Estado.

Além do mais, as teses desenvolvidas no capitulo dois, pode ser vista no filme.

Uma vez, que essa obra de arte, consegue gerar uma indignação do seu interlocutor em

frente aos problemas enfrentados por Fabiano e sua família. Indignação essa, que o

levará a pensar os seus valores e crenças, e por conseguencia, levará o seu interlutor ter

uma visão mais refinada do mundo.

Por último, este filme como foi mostrado ao longo do capitulo, pode ser usado

como uma ferramenta didática em sala de aula. Uma vez ele que consegue trazer

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elementos de varias disciplinas para sala de aula. O que permite o professor da uma aula

interdisciplinar e mais dinâmica em sala de aula.

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CONCLUSÃO

De acordo com que foi exposto ao longo do trabalho, pautando– se nos

pressuposto de Lukács, conclui-se que a arte sempre assume uma posição no mundo.

Seja quando dá um enfoque à câmera de cinema, seja quando escolhe este ou aquele

conteúdo que deve participar do enredo de um filme, enfim, toda escolha do artista

requer uma tomada de posição. Neste sentido, conclui-se, não perceber que a arte

sempre se posiciona, através de uma escolha, seja de valor ou de uma forma de encarar

o mundo, é não compreender que a arte é histórica, que nasce dentro de um contexto de

ideologia e lutas de classe.

Conclui-se também, que o conceito de arte só tem sentido quando, ela se refere à

humanidade. Seja para falar de valores morais, políticos, religiosos, ou até mesmo

outros mais fundamentais ao homem, como a miséria e a fome. Logo, pensando em

Lukács, conclui-se que, a arte que é alheia aos problemas humanos é uma arte oca, sem

vida, que nada fala ou reflete sobre a condição humana. Na verdade, o conceito de arte,

que foi desenvolvido neste trabalho, não pode ser aplicada a uma produção humana

indiferente ao próprio homem.

Por fim, pode-se dizer, que uma das finalidades atribuídas a arte por Lukács,

refere-se a sua capacidade de levar o seu interlocutor a se indagar a respeito de suas

concepções metafísicas ( Deus, alma) de suas concepções morais( bom, mau, justo) e de

sua existência. Através da sua linguagem e sedução, a arte choca, abala o seu

interlocutor e tenta mostrar que o homem não é um ser fechado, pré-destinado, mas sim,

um ser histórico, que se faz a si mesmo e, assim, constrói a história da humanidade.

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