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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ JOSIANE BENEVENUTE AGÊNCIAS REGULADORAS E SUA COMPETÊNCIA REGULATÓRIA: ASPECTOS DESTACADOS Tijucas 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

JOSIANE BENEVENUTE

AGÊNCIAS REGULADORAS E SUA COMPETÊNCIA REGULATÓRIA:

ASPECTOS DESTACADOS

Tijucas

2010

2

JOSIANE BENEVENUTE

AGÊNCIAS REGULADORAS E SUA COMPETÊNCIA REGULATÓRIA:

ASPECTOS DESTACADOS

Monografia apresentada como requisito parcial para a

obtenção do título de Bacharel em Direito, pela

Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências

Sociais e Jurídicas, campus Tijucas.

Orientador: Profa. MSc. Eunice Pelizzaro

Tijucas

2010

3

JOSIANE BENEVENUTE

AGÊNCIAS REGULADORAS E SUA COMPETÊNCIA REGULATÓRIA:

ASPECTOS DESTACADOS

Esta Monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em Direito e

aprovada pelo Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas.

Área de Concentração: Direito Público

Tijucas, 10 de dezembro de 2010.

Profa. MSc. Eunice Pelizzaro

Orientadora

Prof. MSc. Marcos Alberto Carvalho de Freitas

Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica

4

Ao meu esposo “Junior”, ao Amor da minha vida, dedico este

trabalho, por ser parte fundamental da minha caminhada, que sempre

esteve ao meu lado, me apoiando, acreditando no meu potencial e

acima de tudo me incentivando para que eu jamais desistisse...

5

A Deus, uma força inigualável.

Ao meu esposo e grande amigo “Antonio Carlos Machado Junior” por todo amor, carinho,

paciência e compreensão.

Aos meus adorados pais “José e Ivone” por todo amor, carinho e principalmente pela pessoa

que me fizeram ser... agradeço a Deus que me permitiu ser filha deles, pois jamais mediram

esforços para me dar apoio e que de todas as formas sempre procuro retribuir.

Aos meus irmãos que amo muito “Jânio e Jeisiane” que torcem por mim sempre e que ao lado

deles sempre estarei.

À minha sogra “Márcia” pela qual eu tenho muito amor, carinho e pela confiança que sempre

depositou em mim.

Às minhas cunhadas “Karine e Kamilla” que estão sempre torcendo por mim e que em mim

sempre acreditaram.

Aos meus patrões “Dr. Serafim e Dona Inia” quero agradecer de forma especial pela

oportunidade que sempre me deram para que eu pudesse chegar até aqui. Pessoas pelas quais

tenho um enorme carinho e gratidão.

À Professora “Eunice Pelizzaro”, minha Orientadora que com muito carinho não mediu

esforços para me transmitir conhecimentos e pela qual tenho uma admiração, pela pessoa

extraordinária que é, agradeço de coração na certeza de que Deus sempre me cerca de pessoas

maravilhosas.

Ao Professor “Renato Samir de Mello”, Professor que sempre me incentivou e pelo qual

tenho um carinho enorme e muita consideração.

Aos Professores do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, campus Tijucas, que

muito contribuíram para a minha formação jurídica.

Aos meus amigos de toda a “Vida”, impossível citar todos aqui, estes que não importa a

distância, perto ou longe, mas que sempre torceram por mim...

Aos que colaboraram com suas críticas e sugestões para a realização deste trabalho.

Aos colegas de classe, admiração pelos momentos que passamos juntos e pelas experiências

trocadas.

A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização desta pesquisa.

6

"Se tiver que amar, ame hoje. Se tiver que sorrir, sorria hoje. Se tiver

que chorar, chore hoje. Pois o importante é viver hoje. O ontem já foi

e o amanhã talvez não venha."

André Luis por Chico Xavier

7

ERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca

do mesmo.

Tijucas, 10 de dezembro de 2010.

Josiane Benevenute

Graduanda

8

RESUMO

O presente trabalho monográfico tem a finalidade de analisar o papel das agências reguladoras

frente a sua competência regulatória, buscando demonstrar somente os motivos da sua

existência e importância que a mesma possui para o controle dos serviços públicos. Em

primeiro momento, analisa-se sobre a Administração Pública no seu sentido estrito, bem

como nos seus aspectos objetivo e subjetivo, com intuito de entender a forma pela qual ela

funciona, o regime jurídico seguido e os serviços públicos prestados face às necessidades da

coletividade. No capítulo subseqüente, tem-se por finalidade o estudo sobre os entes

denominados autarquias bem como seu conceito, características, privilégios e controle, a fim

de compreender a existência desses entes e qual o seu papel na Administração Pública. E

finalmente, o terceiro e último capítulo têm por objetivo explanar acerca das agências

reguladoras que são órgãos que fazem parte da Administração Pública Indireta, denominadas

autarquias de regime especial, que tem a função de regular e controlar as atividades

econômicas que constituem objetos de concessão, permissão e autorização de serviços

públicos, com o propósito de saber o limite da sua competência regulatória bem como

conhecer como a mesma surgiu, suas principais características e o seu poder normativo, no

intuito de demonstrar a sua importância e necessidade da sua existência junto à sociedade. A

pesquisa não se ateve nos aspectos funcionais das agências reguladoras, logo, buscou-se

demonstrar somente os motivos da sua existência e importância para o controle dos serviços

públicos prestados pelos particulares em substituição ao Estado.

Palavra-chave: Administração Pública Autarquias Agências Reguladoras.

9

ABSTRACT

This monograph is intended to analyze the role of regulators in the face of regulatory

jurisdiction, seeking only to demonstrate the reasons for its existence and importance it has

for the control of public services. At first, we analyze on the Public Administration in its strict

sense, and in its objective and subjective aspects, aiming to understand the way it works,

followed the legal and public services meet the needs of the community. In a subsequent

chapter, it has been conducted for the study of entities called authorities as well as its concept,

facilities, privileges and control in order to understand the existence of these entities and what

their role in public administration. And finally, the third and final chapter are intended to

explain about the regulatory agencies are agencies that are part of the Public Administration

Indirect, local authorities called special regime, which has the function of regulating and

controlling the economic activities which are subject to concession, permission and

authorization of public services, in order to know the limit of its regulatory jurisdiction as

well as know how it arose, its main characteristics and its normative power in order to

demonstrate its importance and necessity of their existence in society. The search is not stuck

in the functional aspects of the regulatory agencies, so we tried to show only the reasons for

its existence and importance for the control of public services rendered by individuals to

replace the State.

Keyword: Public administration. Autarchy Regulating agencies.

10

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLA

art. arts.

ADI

ANA

ANATEL

ANEEL

ANP

ANTAQ

ANTT

ANS

ANVISA

CADE

CDI ou CDII

CLT

CPC

CTN

CRFB

D.O.U.

EC

MARE

p.

PND

Dec.-Lei

Artigo, Artigos

Ação Direta de Inconstitucionalidade

Agência Nacional de Águas

Agência Nacional de Telecomunicações

Agência Nacional de Energia Elétrica

Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis

Agência Nacional de Transportes Aquaviários

Agência Nacional de Transportes Terrestres

Agência Nacional de Saúde Suplementar

Agência Nacional de Vigilância Sanitária

Conselho Administrativo de Defesa Econômica

Conselho Diretor

Consolidação das Leis do Trabalho

Código de Processo Civil

Código Tributário Nacional

Constituição da República Federativa do Brasil

Diário Oficial da União

Emenda Constitucional

Ministério da Administração e da Reforma do Estado

página ou páginas

Programa Nacional de Desestatização

Decreto Legislativo

11

LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS

Lista de categorias1 que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com

seus respectivos conceitos operacionais2.

Administração Pública

Administração Pública é definida como a atividade concreta e imediata que o Estado

desenvolve, sob regime jurídico total ou parcialmente público, para a consecução dos

interesses coletivos3.

Administração Pública Direta

A expressão Administração Pública, ou abreviadamente, a Administração, como também

comumente se usa, grafada com maiúsculas, não é designativa da atividade, mas do ente que

exerce a gestão, na acepção subjetiva de Estado-administrador ou, apenas, Governo, aqui

tomado no seu sentido mais estrito, excludente das atividades legislativas e jurisdicionais4

Administração Pública em Sentido Estrito

Compreende em sentido subjetivo: as pessoas jurídicas, os órgãos e agentes públicos que

exercem a função administrativa; em sentido objetivo: a atividade administrativa exercida por

aqueles entes5.

Administração Pública em Sentido Objetivo

A Administração Pública em sentido objetivo, material ou funcional consiste na própria

função administrativa6.

Administração Pública em Sentido Subjetivo

É o conjunto de pessoas, públicas e privadas, e de órgãos que exercitam atividade

administrativa. Essa definição se refere ao sujeito que faz parte da estrutura do Estado e que

exerce a função administrativa7.

Administração Pública Indireta

É composta por entidades detentoras de personalidade jurídica própria, podendo ser de direito

público (autarquias e agências reguladoras) ou de direito privado (empresas públicas,

1 Denomina-se “categoria” a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia. Cf.

PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. 8. ed.

Florianópolis: OAB Editora, 2003, p. 31. 2 Denomina-se “Conceito Operacional” a definição ou sentindo estabelecido para uma palavra ou expressão, com

o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas ao longo do trabalho. Cf. PASOLD,

Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito, p. 43. 3 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. 2. reimp. São Paulo: Atlas, 2009, p. 57.

4 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 57.

5 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 54.

6 BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum,

2007, p. 50. 7 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 90.

12

fundações públicas e sociedades de economia mista), criadas por lei para, as de direito

público, executarem atividades próprias do Estado, com maior liberdade e agilidade, e as de

direito privado para atuarem na economia ou em atividade que a presença do Estado não seja

obrigatória8.

Agências Reguladoras

No sistema brasileiro, agências reguladoras correspondem a autarquias em regime especial

com função de, dependendo do estabelecido em sua lei instituidora, disciplinar e fiscalizar

matérias sob sua competência; assumir os poderes que, na concessão, na permissão e na

autorização, eram antes desempenhados pela própria Administração Pública Direta, na

qualidade de poder concedente; compor conflitos de interesses, dentre outras inúmeras

atribuições9.

Autarquia

As Autarquias são entidades administrativas autônomas, criadas por lei específica, com

personalidade jurídica de direito público, patrimônio e atribuições estatais determinadas10

.

Autarquia em Regime Especial

É toda aquela a que a lei instituidora conferir privilégios específicos e aumentar sua

autonomia comparativamente com as autarquias comuns, sem infringir os preceitos

constitucionais pertinentes a essas entidades de personalidade pública11

.

Poder Regulamentar

Poder de emitir atos normativos é inerente a atividade de regulação, seja ela desenvolvida

diretamente pela Administração Pública ou por entidade semi-independente ou totalmente

independente. Não se trata de algo privativo do modelo das agências reguladoras, mas comum

a toda e qualquer atividade de regulação12

.

Serviço Público

É aquele concernente à prestação de atividade e comodidade material fruível singularmente

pelo administrado, desde que tal prestação se conforme a um determinado e específico

regime: o regime de Direito Público, o regime jurídico-administrativo13

.

8 MORAES, Isaias Fonseca. Manual de direito administrativo. Curitiba: Juruá, 2008, p. 76.

9 BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum,

2007, p.67. 10

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 18. ed. rev. e atual.

SãoPaulo: Métodos, 2010, p. 38 11

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, 35. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2009, p.

355 12

CUÉLLAR, Leila. Introdução às agências reguladoras brasileiras. Belo Horizonte: Fórum, 2008, p.56. 13

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 25. ed. rev. e atual. até a Emenda

Constitucional 56, de 10.12.2007, 2. tir. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 661.

13

SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................................................. ..8

ABSTRACT .............................................................................................................................. 9

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ........................................................................... 10

LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS ............................ 11

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 15

2 DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA .................................................................................. 18

3.1 DEFINIÇÕES GERAIS ..................................................................................................... 18

2.1.1 Sentido estrito .................................................................................................................. 22

2.1.1.1 Aspecto Objetivo ........................................................................................................... 23

2.1.1.2 Aspecto Subjetivo .......................................................................................................... 25

2.2 REGIME JURÍDICO .......................................................................................................... 27

2.2.1 Princípios da Administração Pública ............................................................................... 29

2.3 SERVIÇOS PÚBLICOS .................................................................................................... 35

2.3.1 Formas e modos de prestação de serviço público ........................................................... 36

3 DAS AUTARQUIAS ........................................................................................................... 38

3.1 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS ............................................................................... 38

3.1.1 Conceito ........................................................................................................................... 38

3.1.2 Características ................................................................................................................ 40

3.2 PRIVILÉGIOS ................................................................................................................... 50

3.3 CONTROLE ....................................................................................................................... 52

3.4 AUTARQUIAS DE REGIME ESPECIAL ........................................................................ 54

4 DAS AGÊNCIAS REGULADORAS E SUA COMPETÊNCIA REGULATÓRIA ...... 55

4.1 BREVE HISTÓRICO ......................................................................................................... 55

4.2 CONCEITO DE AGÊNCIA REGULADORA .................................................................. 59

4.3 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS ................................................................................. 63

4.3.1 Independência político-administrativa, financeira e técnica ........................................... 65

4.3.2 Estruturação peculiar do quadro gerencial ...................................................................... 66

4.3.3 Capacidade normativa técnica ......................................................................................... 67

4.3.4 Capacidade sancionatória e de dirimir conflitos.............................................................. 67

14

4.4 PODER REGULAMENTAR E ATIVIDADE NORMATIVA ......................................... 68

4.5 COMPETÊNCIA REGULATÓRIA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS ..................... 72

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 77

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 82

15

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objeto14

o estudo das Agências Reguladoras e sua

competência regulatória, em seus aspectos destacados.

A importância deste tema reside em conhecer qual a competência da função

regulatória das agências reguladoras, analisando alguns institutos, elencados pela corrente

doutrinária majoritária, como sendo os mais importantes para sua atuação.

Ressalte-se que, além de ser requisito imprescindível à conclusão do curso de Direito

na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, o presente relatório monográfico também vem

colaborar para o conhecimento de um tema que, apesar de não poder ser tratado como

novidade no campo jurídico, na dimensão social-prática ainda pode ser tratado como elemento

novo e repleto de nuances a serem destacadas pelos intérpretes jurídicos.

O presente tema, na atualidade, encontra-se previsto no artigo 21, XI, da Constituição

da República, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 8/95, e no artigo 177, § 2º,

III, da Constituição da República, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 9/95,

bem como o artigo 174, da Constituição da República que serve de base para a delegação dos

poderes do Estado, e a conseqüente elaboração das leis criadoras das agências reguladoras.

A escolha do tema é fruto do interesse pessoal da pesquisadora em demonstrar o

funcionamento das agências reguladoras como pessoa jurídica de fundamental importância no

sentido de zelar pelos serviços prestados de maneira satisfatória à coletividade, assim como

para instigar novas contribuições para estes direitos na compreensão dos fenômenos jurídicos-

políticos, especialmente no âmbito de atuação do Direito Público.

Em vista do parâmetro delineado, constitui-se como objetivo geral deste trabalho

investigar a competência regulatória das agências reguladoras.

O objetivo institucional da presente Monografia é a obtenção do Título de Bacharel

em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas,

campus de Tijucas.

14

Nesta Introdução cumpre-se o previsto em PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e

ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 170-181.

16

Como objetivos específicos pretende-se descrever a estrutura que dispõe a

Administração Pública; identificar o papel dos entes autárquicos pertencentes à

Administração Indireta; e verificar os postulados principais das agências reguladoras,

identificando sua capacidade normativa, as atividades exercidas pelas mesmas, englobados

em sua competência regulatória.

A análise do objeto do presente estudo incidirá sobre as diretrizes teóricas propostas

por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, na obra Direito Administrativo, Marcelo Alexandrino e

Vicente Paulo, na obra Direito Administrativo Descomplicado. Estes serão, pois, os marcos

teóricos que nortearão a reflexão a ser realizada sobre o tema escolhido.

Não é o propósito deste trabalho, adentrar nos aspectos funcionais internos das

agências reguladoras, buscando somente demonstrar os motivos existentes da sua existência e

importância que a mesma possui para o controle dos serviços públicos. Por certo não se

estabelecerá um ponto final em referida discussão. Pretende-se, tão-somente, aclarar o

pensamento existente sobre o tema, circunscrevendo-o ao interessado, as características

marcantes e relevantes à referida pesquisa.

Para o desenvolvimento da presente pesquisa foram formulados os seguintes

questionamentos:

a) Como se caracteriza a estrutura da Administração Pública brasileira?

b) Qual é a atuação da autarquia frente o Estado?

c) Como se caracteriza o poder regulatório das agencias reguladoras?

Já as hipóteses consideradas foram as seguintes:

a) A Administração Pública não comporta uma estrutura capaz de atender ao interesse

público, face a burocratização instaurada na sua atual conjuntura, utilizando-se para amenizar

sua incapacidade de entes e órgãos independentes bem como da iniciativa privada.

b) As autarquias executam serviços delegados pelo Estado, possuindo liberdade de

atuação, apesar da vinculação estatal, as mesmas desenvolvem o papel do Estado, limitadas

legalmente à sua área de atuação.

c) Apesar de ser um instituto relativamente novo em nosso ordenamento jurídico, as

agências reguladoras desenvolvem o papel de suma importância, haja vista, que a sua função

prima é substituir o Estado em matérias específicas, atuando como agente normativo e

regulador da atividade econômica, sendo esta um dever constitucional do Estado.

17

Todos esses questionamentos, hipóteses e variáveis serão confirmados ao longo do

texto a ser desenvolvido

O relatório final da pesquisa foi estruturado em três capítulos, podendo-se, inclusive,

delineá-los como três molduras distintas, mas conexas: a primeira, atinente a Administração

Pública; a segunda, Das Autarquias; e, por derradeiro, Das Agências Reguladoras e sua

competência regulatória.

Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na fase de investigação foi utilizado

o método indutivo, e, o relatório dos resultados expresso na presente monografia é composto

na base lógica indutiva15

, já que se parte de uma pesquisa e identificação do problema,

buscando um conjunto de informações, para ao final apresentar a conclusão geral da questão.

Nas diversas fases da pesquisa, foram acionadas as técnicas do referente, da categoria,

do conceito operacional e da pesquisa bibliográfica16

.

Os acordos semânticos que procuram resguardar a linha lógica do relatório da pesquisa

e respectivas categorias, por opção metodológica, estão apresentados na Lista de Categorias e

seus Conceitos Operacionais, muito embora algumas delas tenham seus conceitos mais

aprofundados no corpo da pesquisa.

A estrutura metodológica e as técnicas aplicadas nesta monografia estão em

conformidade com o padrão normativo da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)

e com as regras apresentadas no Caderno de Ensino: formação continuada, Ano 2, número 4;

assim como nas obras de Cezar Luiz Pasold, Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas

úteis ao pesquisador do Direito e Valdir Francisco Colzani, Guia para redação do trabalho

científico.

A presente monografia se encerra com as Considerações Finais, nas quais são

apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos

estudos e das reflexões sobre agências reguladoras, seu funcionamento interno e a sua

utilização pela sociedade.

15

Sobre os “Métodos” e “Técnicas” nas diversas fases da pesquisa científica, vide PASOLD, Cesar Luiz.

Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 99-125. 16

Quanto às “Técnicas” mencionadas, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e

ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 61-71, 31- 41, 45- 58, e 99-125, nesta ordem.

18

2 DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Este capítulo tem por objetivo, mostrar como se comporta a Administração Pública no

seu sentido estrito, bem como nos seus aspectos objetivo e subjetivo, com intuito de entender

a forma pela qual ela funciona, o regime jurídico seguido e os serviços públicos prestados

face às necessidades da coletividade.

2.1 DEFINIÇÕES GERAIS

O conceito de Administração Pública deve ser observado de forma singular, como

base do presente trabalho, é de máxima importância que se explore as minuciosidades da

matéria para a sequencia e entendimento do trabalho.

Verifica-se primariamente, que a Administração Pública está relacionada a todo o

sistema de funcionamento do Estado, que abrange os órgãos de governo na sua função política

(sentido amplo) bem como os órgãos e pessoas jurídicas na sua função meramente

administrativa (sentido estrito). (destacou-se)

A doutrina traz por conceito de Administração Pública nas palavras de Cretella Júnior

como sendo “[...] Administração é a atividade que a máquina do Estado desenvolve, mediante

o desempenho de atos concretos e executórios, para a consecução direta, ininterrupta e

imediata do interesse público.”17

Importante também, destacar a composição da estrutura da Administração Pública,

pois é necessário que a mesma esteja legalmente estruturada para o fiel cumprimento de suas

atividades, em benefício da coletividade.

Assim, destaca-se da doutrina de Alexandrino e Paulo a composição da estrutura da

Administração Pública:

[...] A Administração pública, segundo nosso ordenamento jurídico, é

integrada exclusivamente: (a) pelos órgãos integrantes da denominada

administração direta (são os órgãos integrantes da estrutura de uma pessoa

17

CRETELLA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.16.

19

política que exercem função administrativa); e (b) pelas entidades da

administração indireta18

.

Estando a Administração Pública dividida em direta e indireta, mister se faz saber que

da primeira faz parte as pessoas políticas, que são a União, os Estados, o Distrito Federal e os

Municípios; e da segunda são as pessoas ou entidades jurídicas, que são as autarquias, as

fundações públicas, as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

A estrutura da Administração Pública conforme demonstrada acima é regida pela

Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), em seu artigo 37, que deve obedecer

ao seguinte preceito:

Art. 37. A administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes

da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos

princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e

eficiência e, também ao seguinte19

:

Assim, observa-se que a nossa Constituição deixa explícito que a Administração

Pública, em seu sentindo amplo, abrange os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário,

porém, não pode ser confundida com estes poderes na organização estrutural do Estado, no

exercício da função típica dos dois últimos.

Dessa forma, pode-se concluir que a Administração Pública apesar de aparentemente

ser exercida pelo Poder Executivo, abrange também as atividades dos demais poderes,

respeitando obviamente o fato que somente pode se considerar atos da Administração Pública,

aqueles que se referem a organização dos poderes, e não os de exercício da sua função.

Acerca da Administração Pública, observa-se o apontamento da doutrina:

A Administração Pública, sob o ângulo subjetivo, não deve ser confundida

com qualquer dos Poderes estruturais do Estado, sobretudo o Poder

Executivo, ao qual se atribui usualmente a função administrativa. Para a

perfeita noção de sua extensão é necessário pôr em relevo a função

administrativa em si, e não o Poder em que é ela exercida. Embora seja o

Poder Executivo o administrador por excelência, nos Poderes Legislativo e

Judiciário há numerosas tarefas que constituem atividade administrativa,

como é o caso, por exemplo, das que se referem à organização interna dos

seus serviços e dos seus servidores. Desse modo, todos os órgãos e agentes

18

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 18. ed. rev. e atual.

São Paulo: Métodos, 2010, p.19. 19

NERY JUNIOR, Nelson; ANDRADE, Rosa Maria de. Constituição federal comentada e legislação

constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 212.

20

que, em qualquer desses Poderes, estejam exercendo função administrativa,

serão integrantes da Administração Pública20

. (destaque no original)

Destarte, conforme citado acima, o exercício da Administração Pública acaba sendo

exercido pelos três poderes de nosso ordenamento. Cada poder dentro da sua competência

acaba exercendo a função necessária para o seu andamento interno.

No mesmo entendimento, preceitua Furtado:

A divisão das funções do Estado – executiva, legislativa e judicial – constitui

aspecto fundamental do Estado moderno e o ponto de partida o estudo do

Direito Administrativo. Este tem por objetivo disciplinar a atuação da

Administração Pública, tanto em relação a suas atividades internas – quando

cuida do regime jurídico dos servidores públicos, por exemplo - , quanto em

relação às relações estabelecidas entre a Administração e os particulares –

concessão de licenças, regime jurídico de contratos administrativos,

concessões e permissões, etc21

.

Assim, entende-se que a Administração Pública, nada mais é, que o conjunto de atos

praticados pelo Estado, buscando a satisfação das necessidades da coletividade, que para

tanto, utiliza-se de sua estrutura regulamentada.

Consoante ensina, Moreira Neto, sobre o significado da expressão Administração

Pública:

A expressão Administração Pública, ou abreviadamente, a Administração,

como também comumente se usa, grafada com maiúsculas, não é designativa

da atividade, mas do ente que exerce a gestão, na acepção subjetiva de

Estado-administrador ou, apenas, Governo, aqui tomado no seu sentido mais

estrito, excludente das atividades legislativas e jurisdicionais22

. (destaque no

original)

Na doutrina de Di Pietro, também são dois os sentidos encontrados para tal expressão:

a) em sentido subjetivo, formal ou orgânico, ela designa os entes que

exercem a atividade administrativa: compreende pessoas jurídicas, órgãos e

agentes públicos incumbidos de exercer uma das funções em que se triparte

a atividade estatal: a função administrativa;

b) em sentido objetivo, material ou funcional, ela designa a natureza da

atividade exercida pelos referidos entes; nesse sentido, a Administração

20

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 20. ed. rev. , amp. e atual. Rio de

Janeiro: Lúmen Júris, 2008, p. 10. 21

FURTADO. Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 150. 22

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 111.

21

Pública é a própria função administrativa que incube,

predominantemente, ao Poder Executivo23

. (destaque no original)

Ressalta-se que a doutrina não é pacífica quanto ao tema, existindo uma corrente com

diferente entendimento que afirma ser improvável definir a matéria, ante a grandiosidade da

mesma.

Segundo Carvalho Filho e outros autores, a expressão Administração Pública por

apresentar mais de um sentido, se torna controvertida, como se pode observar:

Há um consenso entre os autores no sentido de que a expressão

“administração pública” é de certo modo duvidosa, exprimindo mais de um

sentido. Uma das razões para o fato é a extrema gama de tarefas e atividades

que compõem o objetivo do Estado. Outra é o próprio número de órgãos e

agentes públicos incumbidos de sua execução. Exatamente por isso é que,

para melhor precisar o sentido da expressão, devemos dividí-lo sob a ótica

dos executores da atividade pública, de um lado, e da própria atividade, de

outro24

. (destaque no original)

Destacam-se, conforme exposto sobre o sentido dado à expressão Administração

Pública, vários autores com várias interpretações acerca da expressão, pois a maioria encontra

no mínimo dois sentidos.

A partir das explanações feitas sobre o significado do vocábulo Administração

Pública, nos parágrafos seguintes se explanará o conceito da Administração Pública, ou seja,

especificamente o seu papel de atuação.

A Administração Pública possui o papel de prestar serviços públicos por meio de seus

órgãos e entidades, de forma direta bem como por meio de outras pessoas jurídicas, portanto,

de forma indireta.

No sentido estrito que se pretende abranger, a Administração Pública como ente que

exerce a gestão exclui dela as atividades legislativas e jurisdicionais, com acepção

administrativa somente.

Para o doutrinador Moreira Neto, a Administração Pública significa “[...] atividades

preponderantemente executórias, definidas por lei como funções do Estado, gerindo recursos

para a realização de objetivos voltados à satisfação de interesses especificamente definidos

como públicos.”25

23

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 49. 24

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 10. 25

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo, p. 111.

22

Nas palavras de Di Pietro, “[...] a Administração Pública pode ser definida como a

atividade concreta e imediata que o Estado desenvolve, sob regime jurídico total ou

parcialmente público, para a consecução dos interesses coletivos”26

. (destaque no original)

No mesmo sentido, para o doutrinador Gasparini, a Administração Pública pode ser

conceituada como “[...] um complexo de atividades concretas e imediatas desempenhadas

pelo Estado sob os termos e condições da lei, visando o atendimento das necessidades

coletivas.”27

Em face das explicações dadas do significado tanto da expressão quanto do conceito

da Administração Pública, passa-se aos tópicos seguintes para detalhar a Administração

Pública no seu sentido estrito e seus aspectos objetivo e subjetivo.

2.1.1 Sentido estrito

Administração de responsabilidade do Estado é a denominada Administração Pública

compreendida como a atividade de administrar quando grafada com “a” minúsculo, e como

máquina administrativa, quando grafada com “A” maiúsculo.

Di Pietro considera Administração Pública em sentido estrito como:

a) em sentido subjetivo: as pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos que

exercem a função administrativa;

b) em sentido objetivo: a atividade administrativa exercida por aqueles

entes28

. (destaque no original)

No sentido estrito, a Administração Pública é a forma pela qual a Administração

executa suas atividades administrativas, ou seja, a administração em si, excluindo dela o papel

político de governo.

Assim, preceitua Blanchet acerca dos sentidos dados à Administração Pública:

[...] Pode designar a própria estrutura da Administração, o sujeito de direitos,

quando empregada no sentido subjetivo. Pode ser utilizada também no

sentido objetivo, quando se refere à atividade administrativa. [...] no primeiro

26

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 57. 27

GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 44. 28

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 54.

23

caso, escrever com inicial maiúscula, e minúscula no segundo29

. (destaque

no original)

Nota-se que a questão gráfica também é de fundamental importância, dando a

diferenciação necessária para o melhor entendimento da matéria.

O doutrinador Moreira Neto segue na mesma linha de pensamento dizendo:

A expressão Administração Pública, ou, abreviadamente, a Administração,

como também comumente se usa, grafada com maiúsculas, não é designativa

da atividade, mas do ente que exerce a gestão, na acepção subjetiva de

Estado-administrador ou, apenas, de Governo, aqui tomado em seu sentido

mais estrito, excludente das atividades legislativas e jurisdicionais30

.

(destaque no original)

Ante o exposto, nota-se que a Administração Pública em sentido estrito são tão

somente os órgãos e pessoas jurídicas que exercem a função meramente administrativa.

Contudo, para melhor compreensão dos diferentes significados da Administração

Pública, serão analisados os seus dois aspectos: objetivo e subjetivo.

2.1.1.1 Aspecto Objetivo

A Administração Pública, no sentido estrito e aspecto objetivo, trata das atividades

praticadas pelas pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos no intuito de atender todas as

necessidades por parte da coletividade.

Estas pessoas possuem o importante papel de exercer suas atividades de acordo com a

necessidade dos cidadãos sem que se eximam das suas obrigações por se tratar justamente de

Poder Público.

Di Pietro fala que no sentido objetivo da Administração Pública, ela abrange “[...] as

atividades exercidas pelas pessoas jurídicas, órgãos e agentes incumbidos de atender

concretamente às necessidades coletivas: corresponde à função administrativa, atribuída

preferencialmente aos órgãos do Poder Executivo.”31

29

BLANCHET, Luiz Alberto. Curso de direito administrativo, 5. ed. rev. e atual. Curitiba: Juruá, 2008, p. 40. 30

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo, p. 111. 31

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 54

24

Sublinhe-se que muitos autores, entre eles Bittencourt, consideram que “A

Administração Pública em sentido objetivo, material ou funcional consiste na própria função

administrativa.”32

(destaque no original)

Perfilhando este entendimento, afirma o doutrinador Blanchet que “na acepção

objetiva, funcional ou material, a expressão administração pública designa a própria

atividade administrativa [...].”33

(destaque no original)

O mesmo doutrinador observa algumas características nesta acepção, conforme segue:

[..] a administração apresenta certas características, tais como a legalidade, a

discricionariedade, a auto-executoriedade, e a coercibilidade. A legalidade

é considerada de integrar a administração pública stricto sensu, cujo

exercício subordina à lei [...]34

. (destaque no original)

Ressalta o autor, que as características da Administração Pública, por si só, deixam

claro aspectos de executabilidade da atividade administrativa, sendo o embasamento legal dos

atos praticados pelo Estado.

Com relação às características da Administração Pública, entende-se:

Por discricionariedade a permissão que o agente público tem para resolver o

caso concreto sempre que a lei não apresentar resposta; por auto-

executoriedade, a administração tem autonomia para agir por meios próprios

sem ser pelo judiciário e a coercibilidade é a força coativa que a

administração pode impor no intuito de preservar o interesse público35

.

Quanto a questão do aspecto objetivo da Administração Pública, necessário

providenciar uma verificação, ante a importância no contexto geral do trabalho.

Gasparini fala do aspecto objetivo da seguinte forma:

[...] De acordo com critério material, também chamado de objetivo, é um

complexo de atividades concretas e imediatas desempenhadas pelo Estado

sob os termos e condições da lei, visando o atendimento das necessidades

coletivas. Nesse complexo, estão as atividades, de fomento, polícia

administrativa ou poder de polícia e os serviços públicos. [...] pelo material,

32

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 50. 33

BLANCHET, Luiz Alberto. Curso de direito administrativo, p. 39. 34

BLANCHET, Luiz Alberto. Curso de direito administrativo, p. 40. 35

BLANCHET, Luiz Alberto. Curso de direito administrativo, p. 40.

25

equivale a atividade administrativa (administração pública)36

. (destaque no

original)

Alguns doutrinadores mencionam somente as atividades como fomento, polícia

administrativa ou poder de polícia e os serviços públicos; outros incluem a intervenção como

sendo a quarta atividade desse complexo de atividades.

Discorrendo sobre as atividades, Alexandrino e Paulo afirmam que “Nessa concepção

material, a administração pública abrange as seguintes atividades administrativas: o fomento,

a polícia administrativa, o serviço público e a intervenção administrativa.”37

Em resumo, pode-se afirmar que o sentido objetivo da Administração Pública quer

dizer a maneira pela qual o Estado executa sua função de acordo com os interesses da

coletividade, é a própria execução das atividades.

Contudo, não importa por qual atividade administrativa o Estado irá agir, e sim, que

todas as ações do Estado sejam voltadas para a resolução dos interesses coletivos com a

intenção de proteger a todos.

Passa-se ao próximo tópico, onde será tratado sobre o aspecto subjetivo da

Administração Pública.

2.1.1.2 Aspecto Subjetivo

Inicia-se este tópico falando sobre o aspecto subjetivo da Administração Pública. Este

engloba as pessoas que exercem a atividade administrativa, pois a Administração Pública

compreende todas as pessoas as quais a lei atribui a prática dessa função, conforme segue.

No sentido subjetivo, Di Pietro relata que a Administração Pública é composta por

“[...] todos os órgãos integrantes das pessoas políticas (União, Estados, Municípios e Distrito

Federal), aos quais a lei confere o exercício de funções administrativas. São os órgãos da

Administração Direta do Estado”38

. (destaque no original)

Contudo, a doutrinadora também menciona que além desses órgãos existem outros

entes “Às Vezes a lei opta pela execução indireta da atividade administrativa, transferindo-a a

36

GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo, p. 44. 37

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. p. 21. 38

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 57.

26

pessoas jurídicas com personalidade de direito público ou privado, que compõe a chamada

Administração Indireta do Estado.”39

(destaque no original)

Destarte, Di Pietro define a “Administração Pública como o conjunto de órgãos e de

pessoas jurídicas aos quais a lei atribui o exercício da função administrativa do

Estado.”40

(destaque no original)

Em conformidade com o que foi exposto acima, Justen Filho define Administração

Pública em sentido subjetivo como “o conjunto de pessoas, públicas e privadas, e de órgãos

que exercitam atividade administrativa. [...] Essa definição se refere ao sujeito que faz parte

da estrutura do Estado e que exerce a função administrativa.” 41

Tal entendimento, vem ao encontro com a grande maioria dos doutrinadores, que

entendem Administração Pública em sentido subjetivo, como o conjunto do Estado, destinado

ao exercício das suas funções.

Nos ensinamentos de Medauar, a Administração Pública nesse sentido representa:

[...] o conjunto de órgãos e entes estatais que produzem serviços, bens e

utilidades para a população, coadjuvando as instituições políticas de cúpula

no exercício das funções de governo. Nesse enfoque predomina a visão de

uma estrutura ou aparelhamento articulado, destinado à realização de tais

atividades; pensa-se, por exemplo, em ministérios, secretarias,

departamentos, coordenadorias, etc42

.

Segundo Gasparini, “pelo critério formal, também denominado orgânico ou subjetivo,

a expressão sub examine indica um complexo de órgãos responsáveis por funções

administrativas.”43

Carvalho filho também segue o mesmo pensamento, como se observa:

A expressão pode também significar o conjunto de agentes, órgãos e pessoas

jurídicas que tenham a incumbência de executar as atividades

administrativas. Toma-se aqui em consideração o sujeito da função

administrativa, ou seja, quem a exerce de fato. Para diferenciar esse sentido

da noção anterior, deve a expressão conter as iniciais maiúsculas:

Administração Pública44

. (destaque no original)

39

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 57. 40

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 57 41

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 90. 42

MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2004, p. 48. 43

GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo, p. 44. 44

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 10.

27

Na doutrina de Alexandrino e Paulo, “[...] a Administração Pública, em sentido

formal, subjetivo ou orgânico é o conjunto de órgãos, pessoas jurídicas e agentes que o

nosso ordenamento identifica como administração pública, não importa a atividade que

exerçam (como regra, evidentemente, esses órgãos, entidades e agentes desempenham função

administrativa).”45

Assim, pode-se verificar que toda a função administrativa praticamente é exercida

pelos órgãos do Poder Executivo. No entanto, fala-se que a Administração Pública não deve

ser confundida com este Poder, pois “como a nossa Constituição não adotou o princípio da

separação absoluta de atribuições, os demais Poderes do Estado também exercem, além de

suas atribuições típicas, algumas funções administrativas.”46

Carvalho Filho se refere da mesma forma dizendo:

Administração Pública, sob o ângulo subjetivo, não deve ser confundida com

qualquer dos Poderes estruturais do Estado, sobretudo o Poder Executivo, ao

qual se atribui usualmente a função administrativa. Para a perfeita noção de

sua extensão é necessário pôr em relevo a função administrativa em si, e

não o Poder em que é ela. Embora seja o Poder Executivo o administrador

por excelência, nos Poderes Legislativo e Judiciário há numerosas tarefas

que constituem atividade administrativa, como é o caso, por exemplo, das

que se referem à organização interna dos seus serviços e dos seus

servidores[...]47

. (destaque no original)

Após estudos sobre os aspectos objetivo e subjetivo da Administração Pública, passa-

se ao item seguinte no qual será explanado sobre o regime jurídico da Administração Pública.

2.2 REGIME JURÍDICO

Entende-se por regime jurídico o conjunto de normas que regem a forma de conduta

que os entes da Administração Pública se utilizam para exercer os atos administrativos.

Especificamente ao regime jurídico administrativo aplicável à Administração Pública,

existem dois tipos, regime de Direito Público e regime de Direito Privado, explicados da

seguinte forma por Justen Filho:

O regime de direito público consiste num conjunto de princípios e regras

jurídicas que disciplinam poderes, deveres e direitos vinculados diretamente

45

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 19. 46

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 15-16. 47

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 10.

28

à supremacia e à indisponibilidade dos direitos fundamentais. O regime de

direito público caracteriza-se pela criação de órgãos e funções na esfera

pública, a quem é atribuída competência para promover a satisfação de

interesses indisponíveis. Em contrapartida, o regime de direito privado é

norteado pela autonomia privada na escolha dos valores a realizar e na

disponibilidade dos interesses em conflito, reconhecendo-se a legitimidade

de condutas de satisfação egoística das necessidades48

.

Apesar desta subdivisão, o regime jurídico como conjunto norteador do regramento da

Administração Pública deve sempre agir como tal, dando o suporte necessário aos atos

administrativos, buscando manter a convivência pacífica da coletividade

Mas como se chega ao regime jurídico ideal para a coletividade?

O que se verifica na prática, é que a Administração Pública exerce poder político na

escolha do regime jurídico que será utilizado pelo Estado, pois apesar de ser obrigatória a

previsão legal e aprovação por parte do Poder Legislativo, a Administração Pública é quem

elabora o texto legal e o envia para aprovação, embutindo em seu texto, elementos de seu

interesse.

Todavia não poderá a Administração Pública decidir por si só um ou outro regime

jurídico que não esteja autorizado por lei.

Insere-se aqui oportuna observação de Di Pietro no significado da expressão regime

jurídico administrativo, dizendo que “é reservada tão-somente para abranger o conjunto de

traços e conotações, que tipificam o Direito Administrativo, colocando a Administração

Pública numa posição privilegiada, vertical, na relação jurídico-administrativa.”49

Como delineado acima, nas palavras de Bittencourt se observa:

Apresenta-se o regime jurídico administrativo como um sistema especial que

coloca a Administração Pública numa posição de supremacia perante os

administrados para satisfazer as necessidades coletivas, mas, por outro lado,

estabelece uma série de restrições ao modo de agir do Poder Público50

.

Em seu texto, o mesmo autor explica a representação do regime jurídico

administrativo por meio “do binômio, prerrogativas/restrições, uma vez que são dadas

algumas prerrogativas, quase privilégios para que possa o administrador executar seus atos,

48

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo, p. 43. 49

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 60. 50

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 26.

29

sendo barrado, entretanto com certas restrições, para garantir os direitos dos administrados

ante ao Estado.”51

Assim, para garantir a supremacia do interesse público, o regime jurídico

administrativo assegura prerrogativas (como o poder de expropriar, o poder

de alterar e rescindir unilateralmente os contratos administrativos e o

exercício do poder de polícia) e “privilégios” (por exemplo, prazos judiciais

mais dilatados e presunção de veracidade de seus atos)52

. (destaque no

original)

Em suma, busca o regime jurídico administrativo assegurar o interesse público,

impondo aos agentes da Administração uma diretriz a ser seguida na execução de seus atos,

com restrições e prerrogativas próprias.

Para finalizar, passa-se novamente a palavra a Di Pietro nos seguintes termos:

Mas, ao lado das prerrogativas, existem determinadas restrições a que está

sujeita a Administração, sob pena de nulidade do ato administrativo e, em

alguns casos, até mesmo a responsabilização da autoridade que o editou. [...]

Ao mesmo tempo em que as prerrogativas colocam a Administração em

posição de supremacia perante o particular, sempre com o objetivo de atingir

o benefício da coletividade, as restrições a que está sujeita limitam a sua

atividade a determinados fins e princípios que, se não observados, implicam

desvio de poder e consequentemente nulidade dos atos da Administração.

O conjunto das prerrogativas e restrições a que está sujeita a Administração

e não se encontram nas relações entre particulares constitui o regime

jurídico administrativo53

. (destaque no original)

Contudo, com base no que foi citado acima, mister se faz tecer alguns comentários

acerca das prerrogativas e restrições, pois muitas são expostas por princípios e por eles se

entende que “[...] são as proposições básicas, fundamentais, típicas que condicionam todas as

estruturações subseqüentes. Princípios, neste sentido, são os alicerces, os fundamentos da

ciência.”54

2.2.1 Princípios da Administração Pública

Inicia-se falando sobre os princípios constitucionais explícitos no caput do Art. 37 da

CRFB, e em seguida os implícitos.

51

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 26. 52

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 26. 53

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 62. 54

CRETELLA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro, p. 44.

30

O princípio da legalidade, é basicamente a garantia fundamental da coletividade em ter

a Administração Pública limitada as determinações legais, aos preceitos constitucionais que

asseguram os direitos individuais e coletivos da sociedade.

Sendo assim, a Administração Pública age de acordo com o que a lei a autoriza.

Neste diapasão, transcreve-se da doutrina de Gasparini:

O princípio da legalidade significa estar a Administração Pública, em toda a

sua atividade, presa aos mandamentos da lei, deles não se podendo afastar,

sob pena de invalidade do ato e responsabilidade de seu autor. Qualquer ação

estatal sem o correspondente calço legal, ou que exceda ao âmbito

demarcado pela lei, é injurídica e expõe-se à anulação55

.

Conforme citado acima, tem-se explícito até aonde a Administração Pública pode

conduzir suas ações administrativas, já por outro lado, em se tratando do particular, este pode

ir até aonde a lei autoriza ou o que ela proíbe.

Cabe ressaltar que, com a Administração Pública, não funciona dessa forma, haja vista

que “se a lei não dispuser, não pode a Administração Pública agir, salvo em situações

excepcionais (grave perturbação da ordem e guerra quando irrompem inopinadamente).”56

Di Pietro observa o seguinte a respeito do tema:

O princípio do interesse público está expressamente previsto no artigo 2º,

caput, da Lei n.º 9.784/99, e especificado no parágrafo único, com a

exigência de “atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total

ou parcial de poderes, ou competências, salvo autorização em lei” (inciso

II) 57

[...] . (destaque no original)

O princípio da impessoalidade impõe como o administrador deve atuar, pois este

“impede que o administrador execute a autopromoção pessoal, isto é, aparecer imagens,

nomes, etc. Quanto aos atos praticados pelos agentes públicos no exercício de suas funções,

estes praticam como se fossem da Administração e jamais em seu nome.”58

O princípio da moralidade, diz respeito ao administrador no que tange ao seu modo de

atuação que deve ser com ética e moralidade, ou seja, tudo de acordo com a lei, integra um

conceito de legalidade, tendo em vista que com isso um ato imoral venha a ser também ilegal

e, logo, sob fiscalização do Judiciário.

55

GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo, p. 7. 56

GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo, p. 8. 57

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 67. 58

ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 55-56.

31

A moralidade se encontra prevista no inciso LXXIII, do artigo 5º da CRFB que assim

menciona:

Art. 5º [...]

LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que

vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o

Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao

patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé,

isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência59

;

O princípio da publicidade como já mencionado, leciona que a Administração Pública

“pelo fato de tutelar interesses de terceiros, deve imprimir transparência em toda a sua

atuação, que permita conhecimento e controle real por parte da sociedade a respeito da

condução de seus interesses.”60

Todavia, ficam a livre conhecimento de todos os atos praticados pela Administração

Pública com base na Constituição da República:

Art. 5º [...]

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de

seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas

no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo

seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado61

;

O princípio da eficiência, com a reforma administrativa promovida especialmente pela

Emenda Constitucional nº 19/98, foi incluído no art. 37, caput, da Constituição. Observe-se

que o princípio da eficiência já se encontrava previsto no Decreto-Lei nº 200/67, buscando

disciplinar o comportamento dos servidores públicos e o controle da Administração

Pública[...]62.

Este princípio está ligado à diminuição de custos financeiros das atividades exercidas

pelo Estado, ao mesmo tempo em que se obtenha os melhores resultados na qualidade de

serviços para satisfazer a coletividade. Assim, Silva assevera quanto ao princípio da

eficiência:

[...] consiste na organização racional dos meios e recursos humanos,

materiais e institucionais para a prestação de serviços públicos de qualidade

59

BRASIL.Constituição (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/

constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em: 04 abr. 2010. 60

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 33. 61

BRASIL.Constituição (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/

constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em: 04 abr. 2010. 62

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 34.

32

com razoável rapidez, consoante previsão do inciso LXXVIII do art. 5º (EC-

45/2004) e em condições econômicas de igualdade dos consumidores63

.

O princípio da supremacia do interesse público é o princípio no qual as atividades

desenvolvidas pelo Estado devem beneficiar a todas as pessoas, ou seja, o Estado não pode

desviar sua atuação que não seja com finalidade ao interesse público e, sempre que houver

conflitos entre o interesse público e privado, irá prevalecer o de interesse coletivo64

.

Pelo princípio da indisponibilidade do interesse público, “o Estado, titular do interesse

público e somente ele enquanto síntese da coletividade, pode dele dispor, e assim, mesmo nas

hipóteses e limites constitucionais, legais, com estrita observância do princípio da legalidade

(restritividade).”65

Isto posto, pode-se sintetizar a questão, explicando que é ilícito aos agentes

administrativos dispor em benefício próprio, ou a sua mera vontade, dos interesses públicos,

vez que os mesmos são apenas detentores deste poder, e não titulares deste, assim, todo e

qualquer ato, deve buscar o interesse coletivo.

Segue o autor, afirmando que, “[...] A consequencia imediata da indisponibilidade é

que os direitos concernentes a interesses públicos são em princípio inalienáveis,

impenhoráveis, intransigíveis, intransferíveis particulares, ou em uma palavra:

indisponíveis.”66

(destaque no original)

O princípio da continuidade dos serviços públicos diz respeito a garantia, em prol da

coletividade, que as atividades da Administração Pública devem permanecer em

funcionamento continuadamente, visa principalmente conter qualquer interferência do âmbito

político na Administração Pública.

Neste norte leciona Gasparini:

Os serviços públicos não podem parar, porque não param os anseios da

coletividade. Os desejos dos administrados são contínuos. Daí dizer que a

atividade da administração pública é ininterrupta. Assim, não se admite, por

63

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 33. ed. rev. e atual. São Paulo:

Malheiros,2010, p. 671-672. 64

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 105 65

ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo, p. 52. 66

ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo, p. 52.

33

exemplo, a paralisação dos serviços de segurança pública, de distribuição de

justiça, saúde, de transporte e de combate a incêndios [...]67

.

Entretanto, cabe ressaltar que em alguns casos, para que seja respeitado tal princípio,

deve-se averiguar a possibilidade de o mesmo desrespeitar outros preceitos constitucionais,

em vindo a ocorrer tal situação, deve a Administração Pública primar pelos interesses

coletivos.

Destarte, Medauar chama a atenção para o seguinte ponto:

Durante muito tempo o princípio da continuidade justificou a proibição de

greve dos servidores públicos. Hoje, em muitos ordenamentos já se

reconhece o direito de greve dos servidores públicos; a Constituição de

1988, no art. 37, inc. VII, remete a lei específica os termos e limites em que

o direito de greve na Administração Pública será exercido; em geral, a

conciliação do direito de greve com o princípio da continuidade se realiza

pela observância de antecedência mínima na comunicação do início da greve

e pela manutenção de um percentual de funcionamento das atividades. O

princípio da continuidade informa também as figuras da substituição,

interinidade, suplência, “o responder pelo expediente” nos casos de vacância

na chefia de órgãos e entidades68

. (destaque no original)

O princípio da finalidade tem como objetivo o atendimento direcionado com

finalidade pública, isto é, a aplicação correlata da lei para um fim de interesse público.

Neste diapasão, transcreve-se da doutrina de Moreira Neto, segundo o qual, o

princípio da finalidade, “como a orientação obrigatória, de toda a atividade administrativa

pública, ao interesse público que se disponha, especificamente explícito ou implícito na lei,

para ser por ela atendido69

.

O princípio da autotutela é o princípio pelo qual a Administração, no uso desse

princípio, possui o dever de resguardar o interesse público no que tange agir com legalidade

perante seus atos e condutas. Conforme esclarece Moreira Neto ao afirmar que:

Este princípio exprime o duplo dever da Administração Pública de controlar

seus próprios atos quanto à juridicidade e à adequação ao interesse público, o

que corresponde aos controles, a seu cargo, de legalidade, de legitimidade e

de licitude, que são vinculados, e ao controle e mérito, que é discricionário70

.

67

GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo, p. 17. 68

MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno, p. 151. 69

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo, p. 94. 70

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo, p. 107.

34

Pelo princípio da razoabilidade, a Administração Pública, dentro de um caso concreto

deve agir sempre de acordo os padrões corretos da sociedade e de modo racional.

Doutrinariamente, Bittencourt leciona que:

Claramente se percebe que uma atitude desarrazoada não se coaduna à

finalidade da lei e será passível de anulação pelo Poder Judiciário. Verifica-

se desde logo que, apesar de não estar expressamente previsto na

Constituição, o princípio da razoabilidade tem como fundamento o próprio

princípio da legalidade71

.

O princípio da proporcionalidade dá um limite à liberdade de atuação do

administrador, impondo uma proibição ao excesso dos poderes exercidos pela Administração.

Di Pietro sustenta que “Trata-se de princípio aplicado ao Direito Administrativo como mais

uma das tentativas e impor-se limitações à discricionariedade administrativa, ampliando-se o

âmbito de apreciação do ato administrativo pelo Poder Judiciário.”72

O princípio da motivação determina que a Administração Pública tenha por dever

expor os motivos, isto é, apresentar os pressupostos de fato e de direito que a levaram a

expedir determinado ato administrativo73

.

Nesse sentido, o art. 50 da Lei nº 9.784/99, que trata do processo administrativo no

âmbito federal, prescreve que os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação

dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:

Art. 50 [...]

I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;

II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;

III - decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;

IV - dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;

V - decidam recursos administrativos;

VI - decorram de reexame de ofício;

VII - deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem

de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;

VIII - importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato

administrativo74

.

O princípio da segurança jurídica vem elencado no art. 2º, caput da Lei n.º 9.784 de

1999.

Assim, Di Pietro justifica a validade desse princípio, com se observa:

71

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 36 72

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 79. 73

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 37. 74

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 37.

35

O princípio se justifica pelo fato de ser comum, na esfera administrativa,

haver mudança de interpretação de determinadas normas legais, com a

conseqüente mudança de orientação, em caráter normativo, afetando

situações já reconhecidas e consolidadas na vigência de orientação anterior.

Essa possibilidade de mudança de orientação é inevitável, porém gera

insegurança jurídica, pois os interessados nunca sabem quando a situação

será passível de contestação pela própria Administração Pública. Daí a regra

que veda a aplicação retroativa75

.

Por fim, destacaram-se os princípios que regem o Direito Administrativo e que

norteiam os passos da Administração Pública para que suas ações sejam realizadas com

amparo legal.

A seguir, passa-se ao próximo e último item desse capítulo em que será tratado sobre

os serviços públicos.

2.3 SERVIÇOS PÚBLICOS

Obter uma definição exata do que realmente é serviço público se torna muito

complexo em meio a diferentes opiniões de alguns autores. Uns tratam como serviço público

em conceito amplo e outros em conceito restrito. Ambos os conceitos em geral expressam os

elementos: material que são as atividades de interesse coletivo, o subjetivo que é a presença

do Estado e o formal que é o procedimento de Direito Público, e a partir desses conseguem

chegar a uma definição mais concreta do serviço público.

Doutrinariamente, Di Pietro conceitua o serviço público como:

[...] toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça

diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer

concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou

parcialmente público76

. (destaque no original)

Nas palavras de Mello serviço público “é aquele concernente à prestação de atividade

e comodidade material fruível singularmente pelo administrado, desde que tal prestação se

conforme a um determinado e específico regime: o regime de Direito Público, o regime

jurídico-administrativo.”77

No mesmo norte Blanchet leciona:

75

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 84. 76

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 102. 77

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 661.

36

Serviço Público é toda atividade que, considerada como serviço público pela

Constituição ou pela lei, é executada de forma permanente (ou contínua),

submetendo-se ao regime de direito público, prestada de forma concreta e

direta pelo Estado, ou por aqueles a quem for delegada a concessão ou

permissão para tal prestação, objetivando tal atividade o atendimento de

necessidades públicas ou a criação de utilidades de interesse coletivo78

.

(destaque no original)

Assim, conclui-se que há a necessidade da previsão legal para que atividade seja

considerada serviço público, bem como a necessidade que seu fim principal seja buscar a

satisfação da coletividade.

2.3.1 Formas e modos de prestação de serviço público

Tão importante quanto a conceituação de serviço público é a forma e o modo de

prestação pelo qual o Estado atinge o objetivo da prestação de serviço, sendo que a forma

pode ser centralizada, descentralizada ou desconcentrada e seu modo de execução pode ser

direto ou indireto.

Na prática a prestação ou execução dos serviços é efetuado diretamente pelo Estado,

por meio de órgãos ou entes públicos, que podem executar tais atividades por sua estrutura

própria, ou por terceiros que agem sob sua inteira responsabilidade.

Bittencourt assim leciona acerca das formas de prestação de serviços públicos:

O Poder Público busca encontrar a maneira mais eficiente de satisfazer as

necessidades do cidadão. Com esse objetivo, as competências

administrativas podem ser exercidas de forma centralizada, quando a própria

esfera política (União, Estados, Municípios ou Distrito Federal) exerce

diretamente suas atribuições, ou de forma descentralizada, quando

particulares ou pessoas jurídicas criadas pelo Estado desempenham atividade

administrativa. [...] Chama-se de desconcentração administrativa a partilha

de atribuições entre vários órgãos que pertencem a uma pessoa jurídica79

.

Assim, o mesmo autor se refere a dois tipos de descentralização: política e

administrativa, portanto, no referido trabalho importa a descentralização administrativa, pois “

a entidade descentralizada detém apenas a capacidade de auto-administração, ou seja, poder

78

BLANCHET, Luiz Alberto. Curso de direito administrativo, p. 40. 79

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 51-52.

37

de gerenciar seus próprios interesses, de acordo, entretanto, com as determinações legais

expedidas pela entidade central”80

. (destaque no original)

Dessa forma, Di Pietro sustenta que “a descentralização Administrativa pode ser

dividida em descentralização geográfica (territorial), descentralização por serviços (funcional

ou técnica) e descentralização por colaboração.”81

As agências reguladoras, tema da presente monografia, são autarquias do tipo de

descentralização administrativa por serviços, pois “[...] o Estado, por lei específica, institui

uma pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, à qual transfere a titularidade e a

execução de certo serviço público.”82

Quanto à competência para prestação de serviços públicos, Gasparini destaca que “os

serviços públicos são instituídos pela Constituição da República e, segundo ela, distribuídos à

cura da União, dos Estados-Membros, do Distrito Federal e dos Municípios, a quem cabe,

conforme a competência a regulamentação, a execução e controle.”83

Destarte, a Constituição reservou à União entre outros serviços, os arrolados no art.

21; aos Municípios reservou todos os serviços arrolados no art. 30, I, isto é, os de interesse

local; aos Estados-Membros reservou os serviços remanescentes de acordo com o art. 25, § 1º,

ou seja, os serviços que não sejam nem do Município e nem da União; e, ao Distrito Federal

os serviços distritais conforme o art. 32, § 1º.

Por fim, o controle e fiscalização dos serviços públicos são de acordo com o art. 3º da

Lei 8.987 de 1995, “Art. 3o.

As concessões e permissões sujeitar-se-ão à fiscalização pelo

poder concedente responsável pela delegação, com a cooperação dos usuários.”84

Assim, encerra-se o presente capítulo sobre a Administração Pública e passa-se ao

próximo capítulo em que será explanado sobre autarquias.

80

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 52. 81

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p, 410. 82

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 53. 83

GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo, p. 296. 84

BRASIL. Lei 8.987 de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação

de serviços públicos previstos no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. Publicado no

D.O.U. no dia 14/02/1995. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8987cons.htm>.

Acesso em 09 out. 2010.

38

3 DAS AUTARQUIAS

O presente capítulo tem por finalidade o estudo sobre os entes denominados autarquias

bem como seu conceito, características, privilégios e controle, a fim de compreender a

existência desses entes e qual o seu papel na Administração Pública.

A importância do tema se deve ao fato do presente trabalho se destinar ao estudo de

uma autarquia específica, pois, por serem as agências reguladoras autarquias em regime

especial, como será explanada adiante, é necessário que se tenha o fundamento básico para o

estudo da matéria.

3.1 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

As autarquias são entes que fazem parte da Administração Pública Indireta. Esses

entes, dotados de personalidade jurídica própria, foram instituídos com a reforma

administrativa federal a partir do Decreto-Lei n.º 200 de 25 de fevereiro de 196785

.

3.1.1 Conceito

Primeiramente, em análise à doutrina especializada, encontra-se pacificado a questão

conceitual das autarquias, e ocorrendo uma mesma e única corrente doutrinária, pode-se dizer

que autarquia é uma pessoa jurídica de direito público, com autonomia de atuação, na

condição de ente público.

Cabe esclarecer rapidamente que a diferença entre ente e órgão figura na sua

localização dentro da estrutura governamental, vez que o órgão é membro integrante da

Administração, a ela ligada umbilicalmente, os entes estão ligados a mesma apenas por

vinculação, possuindo sua autonomia em razão da sua função, contudo, ante ao fato da Lei

maior tratar as agências reguladoras como “órgão regulador”, neste trabalho por vezes irá se

usar esta terminologia em respeito à CRFB. (destacou-se)

85

BRASIL. Decreto-Lei nº 200 de fevereiro de 1967. Dispõe sôbre a organização da Administração Federal,

estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/Del0200.htm> Acesso em: 20 jun. 2010.

39

Dado tais esclarecimentos, passa-se à questão conceitual das autarquias, vez que

necessário embasar doutrinariamente o conceito destacado alhures.

No mesmo sentido, posiciona-se Carvalho Filho dizendo que “pode-se conceituar

Autarquia como a pessoa jurídica de direito público, integrante da Administração Indireta,

criada por lei para desempenhar funções que, despidas de caráter econômico, sejam próprias e

típicas do Estado.”86

(destaque no original)

Nesta mesma linha de raciocínio, Moreira Neto conceitua a autarquia como:

[...] uma entidade estatal da administração indireta, criada por lei, com

personalidade de direito público, descentralizada funcionalmente, para

desempenhar competências administrativas próprias e específicas, com

autonomia patrimonial, administrativa e financeira87

. (destaque no original)

Assim, verifica-se uma complementação entre os doutrinadores quanto ao conceito,

mister se faz portanto, para total compreensão da matéria uma análise ampla e irrestrita da

doutrina, para poder chegar a um conceito único, evitando qualquer desvio de entendimento.

Neste diapasão, transcreve-se da doutrina de Justen Filho a definição de autarquia

como “[...] uma pessoa jurídica de direito público, instituída para desempenhar atividades

administrativas sob o regime de direito público, criada por lei que determina o grau de sua

autonomia em face da Administração direta.”88

Di Pietro conceitua “autarquia como a pessoa jurídica de direito público, criada por

lei, com capacidade de autoadministração, para o desempenho de serviço público

descentralizado, mediante controle administrativo exercido nos limites da lei.”89

Sobre as autarquias ainda, a doutrina traz análises mais aprofundadas, que mesmo

classificada nas obras como conceito, nos dão um horizonte mais amplo sobre o tema que

uma simples conceituação.

Observa-se a doutrina de Alexandrino e Paulo:

As autarquias integram a Administração Indireta, representando uma forma

de descentralização administrativa mediante a personificação de um serviço

retirado da Administração centralizada. Por esse motivo, como regra geral,

somente devem ser outorgados serviços públicos típicos às autarquias, e não

86

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 440. 87

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial, p. 253. 88

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo, p. 160. 89

PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 429.

40

atividades industriais ou econômicas, ainda que estas possam ser

consideradas de interesse social [...]90

.

Como delineado acima, encontra-se consubstanciado no inciso I do artigo 5º do

Decreto-Lei n.º 200, a autarquia como “o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade

jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração

Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira

descentralizada.91

Até o referido decreto, tem-se verificado uma falha no que tange ao tipo de

personalidade jurídica, pois de certa forma o decreto omitiu tal

personalidade, sendo assim, esta foi entendida de forma plena a partir do

novo Código Civil em seu artigo 41, IV, no qual menciona que são pessoas

jurídicas de Direito Público interno92

.

Adepto desse ponto de vista é Meirelles, ao sustentar que:

Autarquias são entes administrativos autônomos, criados por lei específica,

com personalidade jurídica de Direito Público interno, patrimônio próprio e

atribuições estatais específicas. São entes autônomos, mas não são

autonomias. Inconfundível é autonomia com autarquia: aquela legisla para

si; esta administra-se a si própria, segundo as leis editadas pela entidade que

a criou93

. (destaque no original)

Depois de explanado a questão conceitual da autarquia, de forma esclarecedora, pode-

se dar continuidade ao estudo, a fim de complementar o entendimento geral da matéria,

analisando em sequencia suas características.

3.1.2 Características

Tão importante quanto o conceito de autarquia, são as características que compõe sua

estrutura, pois delas se extrai a forma de composição e funcionamento que qualifica o ente

como autarquia.

90

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 38. 91

BRASIL. Decreto-Lei nº 200 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a organização da Administração Federal,

estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/Del0200.htm> Acesso em: 20 jun. 2010. 92

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 441 93

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 346-347.

41

A doutrina diz haver certo consenso entre os autores ao apontarem as características

das autarquias, pode-se utilizar as palavras de Di Pietro que afirma como sendo elas: “criação

por lei; personalidade jurídica pública; capacidade de autoadministração; especialização dos

fins ou atividades e sujeição a controle ou tutela.”94

Assim, a criação por lei é exigência que vem desde o Decreto-lei n.º 6.016/43,

repetindo-se no Decreto-lei nº 200/67 e constando agora do artigo 37, XIX, da Constituição,

como se verifica:

Art. 37 [...]

XIX - somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a

instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de

fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de

sua atuação95

.

A criação da autarquia se dá por lei infraconstitucional, isto é, não é pela Constituição

e nem por ato infralegislativo que ela é criada e sim, por lei específica “a qual determina seus

atributos essenciais, tais como denominação, estrutura organizacional, competências, receitas

e submissão ao controle de uma entidade da Administração Direta.”96

Ou seja, a autarquia não é órgão primário da Administração Pública, ela vem sendo

sistematicamente criada em nosso ordenamento jurídico, ante a necessidade que se insurge

frente a fragilidade de atendimento as demandas por parte do Estado.

Sendo assim, Alexandrino e Paulo reafirmam que a criação é por lei dizendo que “as

autarquias são entidades administrativa autônomas, criadas por lei específica, com

personalidade jurídica de direito público, patrimônio próprio e atribuições estatais

determinadas.” 97

Com relação ao mencionado acima, faz-se necessário expor que “[...] Na esfera

federal, a lei de criação das autarquias deve ser de iniciativa privativa do Presidente da

República, em face do disposto no art. 61, § 1º, inciso II, alínea “e”, da Carta da República.

[...] é aplicável aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios [...].”98

Da mesma forma que a autarquia é instituída por lei específica, sua extinção será

também por lei específica.

94

PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 428. 95

BRASIL. Constituição (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/

constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em: 04 abr. 2010. 96

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo, p. 162. 97

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 38. 98

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 41.

42

Conforme relatado acima, Araújo explana “que pelo princípio do paralelismo das

formas só outra lei de igual ou superior hierarquia pode extinguí-las, [...]. Por isso, não pode a

autarquia extinguir-se por vontade própria.”99

(destaque no original)

Conceitua Meirelles:

[...] a instituição das autarquias, ou seja, sua criação, faz-se por lei

específica (art. 37, XIX), mas a organização se opera por decreto, que

aprova o regulamento ou estatuto da entidade, e daí por diante sua

implantação se completa por atos da diretoria, na forma regulamentar ou

estatutária, independentemente de quaisquer registros públicos100

. (destaque

no original)

Não poderá ser criada de outra forma senão por lei específica, pois “Para as pessoas

jurídicas de direito público, como as autarquias, a regra tem estreita conexão com o princípio

da legalidade, visto que, sendo criadas por lei, têm o início de sua existência no mesmo

momento em que se inicia a vigência da lei criadora [...]”101

Quanto à sua personalidade jurídica própria, significa dizer que “Quando o Estado cria

as autarquias, por lei, lhes atribui personalidade jurídica, diversa da sua própria (Fazendas

federal, estadual, municipal, etc.), definindo suas competências específicas, seu patrimônio,

receitas e outras particularidades.”102

Por ser de personalidade jurídica pública, necessário se faz observar que “as autarquias

estão submetidas integralmente ao regime jurídico administrativo aplicado à Administração

Direta, ou seja, possuem as mesmas prerrogativas e restrições do Poder Central.”103

Corroborando com o autor, o doutrinador Justen Filho observa que “[...] A

personalidade de direito público significa que a autarquia exercita competências inerentes e

próprias do Estado, sendo-lhe vedado atuar de modo equiparado aos particulares.”104

A autarquia possui uma relação de vinculação com o ente estatal, haja vista que é pela

vinculação o seu caráter autárquico e não por subordinação105

.

Tem-se, portanto o entendimento que a autarquia, ante ao fato de tratar-se de um ente

do Estado, apesar de não ser órgão do estado, “na condição de pessoa jurídica de direito

99

ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo, p. 174. 100

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 349. 101

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 442. 102

ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo, p. 173. 103

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 58. 104

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo, p. 161. 105

ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo, p. 173.

43

público interno, goza, de prerrogativas estatais, mesmo quando a sua lei criadora não defina

tais prerrogativas.”106

Segundo Di Pietro, a autarquia “Sendo pessoa jurídica, ela é titular de direitos e

obrigações próprios, distintos daqueles pertencentes ao ente que a instituiu; sendo pública,

submete-se a regime jurídico de direito público, quanto à criação, extinção, poderes,

prerrogativas, privilégios, sujeições [...].”107

(destaque no original)

Destaca-se que, que as autarquias “possuem apenas capacidade de auto-

administração, que significa administrar a si próprias segundo as regras constantes na lei que

as instituiu. ”108

(destaque no original)

Ainda com relação ao que foi citado acima, Alexandrino, chama a atenção para o

seguinte ponto:

[...] A autarquia é uma entidade meramente administrativa, não possui

natureza política. O seu caráter exclusivamente administrativo é o que a

distingue dos entes federados, das chamadas pessoas políticas (União,

estados, Distrito Federal e municípios), dotadas de autonomia política [...]109

.

Nesta mesma linha de raciocínio, sustenta Di Pietro:

Falando-se em capacidade de autoadministração, diferencia-se a autarquia

das pessoas jurídicas públicas políticas (União, Estados e Municípios), que

têm o poder de criar o próprio direito, dentro de um âmbito de ação fixado

pela Constituição. Não é demais repetir que se deve evitar o termo

autonomia em relação às autarquias, porque estas não têm o poder de criar o

próprio direito, mas apenas a capacidade de se autoadministrar a respeito das

matérias específicas que lhes foram destinadas pela pessoa pública política

que lhes deu a vida110

. (destaque no original)

Como se pode observar, a capacidade de autoadministração que a autarquia possui está

ligada a uma certa independência, porém, não foge do controle que o Estado tem sobre ela, ou

seja, a sua capacidade de autoadministração é submissa aos limites da lei do Poder que a

criou.

106

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial, p. 254. 107

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 428. 108

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 48. 109

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 47-48. 110

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 428-429.

44

No que tange à especialização dos fins ou atividades desenvolvidas pela autarquia,

tem-se essa forma como ponto fundamental para alcançar o objetivo pelo qual ela foi criada,

ou seja, de solucionar com agilidade e conhecimento as demandas de sua alçada.

Alexandrino reafirma-o citando que “[...] A autarquia, portanto, deve ser criada para

atuar em serviços típicos do Estado, que exijam uma maior especialização, com organização

própria, administração mais ágil e pessoal especializado.”111

Nesse sentido, é o que justifica a existência da autarquia, pois a especialização de

serviços que ela deve ter é algo que a difere do Estado, haja vista que o Estado na sua

amplitude tem resultados mais demorados.

Dessa forma, Meirelles leciona que:

Embora identificada com o Estado, a autarquia não é entidade estatal; é

simples desmembramento administrativo do Poder Público. E, assim sendo,

pode diversificar-se das repartições públicas para adaptar-se às exigências

específicas dos serviços que lhe são cometidos. Para tanto, assume as mais

variadas formas e rege-se por estatutos peculiares à sua destinação. Essa

necessidade de adaptação dos meios aos fins é que justifica a criação de

autarquias, com estrutura adequada, autonomia de determinados serviços

públicos especializados112

.

Pode-se concluir assim, que em razão da necessidade do Estado, o mesmo cria as

autarquias para que elas assumam determinadas questões específicas, lhe sendo permitidas

para tanto, adaptarem-se as necessidades que a matéria trata, inclusive com possibilidade de

criação de regras próprias.

Na forma pela qual se encontra a autarquia, esta funciona com autonomia em exercer a

titularidade e a execução de determinados serviços públicos.

Segundo Justen Filho, com relação à autonomia da autarquia posiciona-se:

Há uma margem mínima de autonomia, no sentido de que a autarquia é

dotada de personalidade jurídica própria. Isso significa que pratica atos em

nome próprio e é titular de competência e de patrimônios específicos. [...]

Cada lei, ao instituir a autarquia, determina o grau de sua autonomia.

Há, então, uma margem máxima de autonomia possível para autarquia. Não

pode ser titular de poderes que a tornem imune ao controle e tutela da

Administração direta. A autarquia se encontra subordinada necessariamente,

à Administração direta113

.

111

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 43. 112

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 349. 113

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo, p. 162.

45

Assim sendo, a autarquia possui capacidade específica para a prestação de serviços

determinados de forma que isso lhe confere uma autonomia administrativa.

O patrimônio inicial das autarquias é constituído pela entidade que a criou. Consiste na

transferência de bens móveis e imóveis que farão parte do ente criado:

A transferência de imóveis ou é feita diretamente pela lei instituidora, caso

em que dispensa o registro, ou a lei apenas autoriza a incorporação, a qual se

efetivará por termo administrativo ou por escritura pública, para a necessária

transcrição no registro imobiliário competente114

.

Sendo assim, é inadmissível por decreto ou outro ato administrativo que seja feita a

transferência, senão as únicas formas de transferência de imóveis citadas acima.

Os bens e rendas das autarquias fazem parte de seu patrimônio, são considerados bens

públicos e funcionarão de acordo com os objetivos do ente que os incorporou.

O artigo 98 do Código Civil diz que: “São públicos os bens do domínio nacional

pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares,

seja qual for a pessoa a que pertencerem.”

Portanto, sendo a autarquia um ente de Direito Público, a natureza de seus bens

consequentemente é a de bens públicos, haja vista a impossibilidade de execução sobre eles,

pois seus bens são inalienáveis, imprescritíveis e impenhoráveis.

Os bens públicos das autarquias são os de uso especial como se refere o inciso II do

artigo 99 do Código Civil: “os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a

serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal,

inclusive os de suas autarquias;”

Quanto à alienação dos bens, não são suscetíveis de alienação de acordo com o artigo

100, do Código Civil que assim diz: “Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso

especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei

determinar.”

Os bens públicos não podem ser usucapidos, portanto, com relação aos imóveis os

artigos 183, § 3º, e 191, parágrafo único, da Constituição da República, e 102 do Código

Civil, proíbem que estes bens sejam usados como garantias.

114

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 350.

46

Quanto ao orçamento das autarquias, este é igual ao das entidades estatais, com as

peculiaridades indicadas nos artigos 107 a 110, da Lei nº 4.320/64 e adequação ao disposto no

artigo. 165, § 5º, da Constituição da República115

.

A maneira pela qual são nomeados os dirigentes das autarquias deverá estar prevista

na lei que a instituiu ou pelo que dispõe o seu estatuto. No âmbito federal, é de competência

do Presidente da República a nomeação dos dirigentes, conforme previsto no art. 84, XXV, da

Constituição da República, e, sucessivamente com relação ao Estado e Distrito Federal, pelo

governador e no Município pelo prefeito.

Contudo, para a nomeação das autarquias federais, o Senado poderá exigir uma

aprovação prévia do nome que o Presidente da República escolheu de acordo com o artigo 84,

XIV, da Constituição da República, pois certas situações a própria Constituição já definiu no

seu artigo 52, III, “d” e “e” com relação a nomeação dos diretores e presidente do Banco

Central e de Procurador Geral da República e ainda na alínea “f” do mesmo artigo a

nomeação dos dirigentes de agências reguladoras federais.

Tendo em vista o que dispõe a alínea “f” do inciso III, do artigo 52 da Constituição da

República, segue-se a ordem hierárquica para os Estados, Distrito Federal e Municípios

quanto à nomeação dos dirigentes com base na Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal,

a qual exige que estas passem pela Assembleia Legislativa, como se pode observar:

EMENTA: Separação e independência dos poderes: submissão à Assembléia

Legislativa, por lei estadual, da escolha de diretores e membros do conselho

de administração de autarquias, fundações públicas e empresas estatais:

jurisprudência do Supremo Tribunal. 1. À vista da cláusula final de abertura

do art. 52, III, f da Constituição Federal, consolidou-se a jurisprudência do

STF no sentido da validade de normas locais que subordinam a nomeação

dos dirigentes de autarquias ou fundações públicas à prévia aprovação da

Assembléia Legislativa. 2. Diversamente, contudo, atento ao art. 173 da

Constituição, propende o Tribunal a reputar ilegítima a mesma intervenção

parlamentar no processo de provimento da direção das entidades privadas,

empresas públicas ou sociedades de economia mista da administração

indireta dos Estados. (ADI 2225 MC, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA

PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 29/06/2000, DJ 29-09-2000 PP-

00070 EMENT VOL-02006-01 PP-00067)116

.

115

BRASIL. Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964. Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração

e contrôle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Publicada no

D.O.U. de 23/03/1964. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4320.htm

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4320.htm> Acesso em 05 nov. 2010. 116

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Medida cautelar na ação direta de inconstitucionalidade, do

Tribunal Pleno, Brasília, DF, 29 de junho de 2000. Disponível em: <

http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=ADI+2225&base=baseAcordaos>

47

Sendo assim, no âmbito estadual, distrital e municipal, seguindo a Jurisprudência

supracitada, pode-se exigir a aprovação de nomeação dos dirigentes das autarquias, pelas

respectivas casas legislativas.

No que diz respeito a exoneração dos dirigentes das autarquias, o Supremo Tribunal

Federal julgou que não há lei que possa permitir que antes do Chefe do Executivo exonerá-

los, passe por aprovação prévia no Legislativo e muito menos que o Legislativo a faça

diretamente, como segue:

EMENTA: I. Agências reguladoras de serviços públicos: natureza

autárquica, quando suas funções não sejam confiadas por lei a entidade

personalizada e não, à própria administração direta. II. Separação e

independência dos Poderes: submissão à Assembléia Legislativa, por lei

estadual, da escolha e da destituição, no curso do mandato, dos membros do

Conselho Superior da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos

Delegados do Rio Grande do Sul - AGERGS: parâmetros federais impostos

ao Estado-membro. 1. Diversamente dos textos constitucionais anteriores, na

Constituição de 1988 - à vista da cláusula final de abertura do art. 52, III -,

são válidas as normas legais, federais ou locais, que subordinam a nomeação

dos dirigentes de autarquias ou fundações públicas à prévia aprovação do

Senado Federal ou da Assembléia Legislativa: jurisprudência consolidada do

Supremo Tribunal. 2. Carece, pois, de plausibilidade a argüição de

inconstitucionalidade, no caso, do condicionamento à aprovação prévia da

Assembléia Legislativa da investidura dos conselheiros da agência

reguladora questionada. 3. Diversamente, é inquestionável a relevância da

alegação de incompatibilidade com o princípio fundamental da separação e

independência dos poderes, sob o regime presidencialista, do art. 8º das leis

locais, que outorga à Assembléia Legislativa o poder de destituição dos

conselheiros da agência reguladora autárquica, antes do final do período da

sua nomeação a termo. 4. A investidura a termo - não impugnada e

plenamente compatível com a natureza das funções das agências reguladoras

- é, porém, incompatível com a demissão ad nutum pelo Poder Executivo:

por isso, para conciliá-la com a suspensão cautelar da única forma de

demissão prevista na lei - ou seja, a destituição por decisão da Assembléia

Legislativa -, impõe-se explicitar que se suspende a eficácia do art. 8º dos

diplomas estaduais referidos, sem prejuízo das restrições à demissibilidade

dos conselheiros da agência sem justo motivo, pelo Governador do Estado,

ou da superveniência de diferente legislação válida. III. Ação direta de

inconstitucionalidade: eficácia da suspensão cautelar da norma argüida de

inconstitucional, que alcança, no caso, o dispositivo da lei primitiva,

substancialmente idêntico. IV. Ação direta de inconstitucionalidade e

impossibilidade jurídica do pedido: não se declara a inconstitucionalidade

parcial quando haja inversão clara do sentido da lei, dado que não é

permitido ao Poder Judiciário agir como legislador positivo: hipótese

excepcional, contudo, em que se faculta a emenda da inicial para ampliar o

objeto do pedido. (ADI 1949 MC, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA

Acesso em: 20 jun. 2010.

48

PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 18/11/1999, DJ 25-11-2005 PP-

00005 EMENT VOL-02215-1 PP-00058)117

.

Contudo, a Constituição da República em seu artigo 52, XI, permite somente a

exoneração legislativa do Procurador-Geral da República.

Os dirigentes das autarquias devem agir de acordo com as normas da instituição,

“sujeitando-se aos controles internos e ao exame de legalidade pelo Judiciário, pelas vias

comuns (ações ordinárias) ou especiais (mandado de segurança e ação popular).”118

Sobre os contratos, Araújo leciona que estes estão sujeitos à licitação, conforme segue:

Uma vez que as autarquias são integrantes da Administração Indireta,

estão integralmente sujeitas ao princípio e às normas de licitação para

realização de despesas (obras, serviços, compras, locações), alienações e

concessões (CF, art. 37, caput, e XXI; arts. 1º, parágrafo único, e 2º da Lei nº

8.666, de 21 de-6-1993)119

. (destaque no original)

No mesmo sentido, Mello leciona a exigência de licitação dos contratos das

autarquias, por serem contratos administrativos, pela determinação da Lei 8.666/93, “salvo

nos casos ali previstos como dispensa ou inexigibilidade de tal procedimento.”120

Quanto ao regime jurídico de pessoal da autarquia, este havia deixado de ser único

com a alteração dada pela Emenda Constitucional nº 19/98 que implantou a reforma

administrativa do Estado, sendo regido pela lei que a instituiu, e com a opção de ser o mesmo

regime dos servidores da Administração Direta ou um regime próprio.

Meirelles relata que, “após a EC/19, que suprimiu a obrigatoriedade de um regime

único, a lei federal, estadual, distrital ou municipal poderá estabelecer o mesmo regime dos

servidores da Administração direta ou regime próprio, para todas ou determinadas

autarquias.”121

Neste sentido posiciona-se Carvalho Filho:

Extinto o regime jurídico único e, por conseguinte, desvinculado da

Administração Direta o regime de pessoal das autarquias, poderá ser

117

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Medida cautelar na ação direita de inconstitucionalidade, do

Tribunal Pleno, Brasília, DF, 18 de novembro de 1999. Disponível em: <

http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(ADI+1949.NUME.+OU+ADI+1949.AC

MS.)&base=baseAcordaos>. Acesso em: 20 jun. 2010. 118

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 351. 119

ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo, p. 169. 120

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 165. 121

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 351.

49

estatutário ou trabalhista, conforme a lei estabelecer. Em outras palavras,

embora o regime possa ser o mesmo para os servidores da pessoa federativa

e de suas autarquias, nada impedirá que sejam diversos os regimes

funcionais. Assim, por exemplo, pode ocorrer que seja estatutário o regime

de servidores da Administração Direta, e trabalhista o adotado em algumas

ou em todas as autarquias122

.

Contudo, ante a decisão do Supremo Tribunal Federal, referente a Ação Direta de

Inconstitucionalidade n.º 2.135-4, que buscou verificar a legalidade da Emenda Constitucional

n.º 19, decidiu o Supremo pela irregularidade da referida Emenda, determinando que o caput

do artigo 39 anteriormente modificado, voltasse a vigorar com o texto original que reza: “A

União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua

competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração

pública direta, das autarquias e das fundações públicas.”

Alguns doutrinadores como Medauar, seguem esta linha de raciocínio, conforme se

encontra consubstanciado em seu texto, como segue:

No tocante ao regime do pessoal, na esfera da União e em Estados e

Municípios (minoria) que adotaram como regime jurídico único o

estatutário, é este que rege os direitos e deveres dos servidores autárquicos.

Na administração de Estados e Municípios que não instituíram regime

jurídico único nesses termos, pode haver nas autarquias um quadro de

servidores estatutários, sem impedimento de haver empregados contratados

pela CLT123

.

Por derradeiro, há de se prevalecer o texto atual do artigo 39 da Constituição da

República, haja vista que a Constituição possui supremacia legal, não podendo sofrer em

momento algum, qualquer intervenção legal, senão por sua própria previsão legal.

Conclui-se, portanto, que as características das autarquias, lhes dão uma diferenciação

incontroversa dos demais entes governamentais, o que lhes qualificam com uma condição

especial de autoadministração, e lhes posicionam em um patamar diferenciado na

Administração Pública.

3.2 PRIVILÉGIOS

No presente item, serão explanados os privilégios que possuem as autarquias,

privilégios que são derivados da sua forma e suas características, e que são utilizados na

122

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 456. 123

MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno, p.80.

50

execução dos serviços efetuados pelas autarquias, cabe ressaltar que tais privilégios, é a forma

legal encontrada pelo legislador, para dar poderes às autarquias.

Pode-se dizer que as autarquias possuem os privilégios administrativos do Poder que

as criaram, tais privilégios são somente administrativos e não se confundem com os

privilégios políticos, assim, elas “possuem as regalias tributárias bem como benefícios

processuais da Fazenda Pública, além dos poderes que lhe forem instituídos por lei especial,

sob a tutela de buscar sempre a melhor forma de cumprir suas determinações legais.”124

A doutrina se encontra pacificada quanto aos tipos de privilégios que as autarquias

possuem desde sua constituição, assim, em se tratando dos privilégios não há forma de

resumir ou extirpar qualquer deles do rol doutrinário, para tanto serão citados a frente todos os

privilégios elencados pela doutrina.

Cita Araújo os principais privilégios, que são adotados pelos Administrativistas:

h.1. .Imunidade de impostos (não abrangendo taxas e outras contribuições)

sobre seu patrimônio, rendas e serviços vinculados às suas finalidades

essenciais ou delas decorrentes (CF, art. 150, § 2º);

h.2. Prescrição qüinqüenal de suas dividas, salvo disposição diversa

constante de lei especial (Dec.-Lei Federal n. 4.597/42);

h.3. Execução fiscal de seus créditos (CPC, art. 578);

h.4. Ação regressiva contra seus servidores, em caso de responsabilidade

civil por danos causados a terceiros (CF, art. 37, § 6º);

h.5. Impenhorabilidade de seus bens e rendas (CF, art. 100 e §§);

h.6. Prazos em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer (CPC, art.

188 e Dec.- Lei n. 7.659/45);

h.7. Ampliação do prazo para desocupação de prédio locado para seus

serviços, quando decretado despejo (Lei n. 4.449/64, art. 11, § 5º);

h.8 Imperatividade, auto-executoriedade e presunção de legitimidade dos

atos administrativos, extensíveis aos ajustes para extinção de contrato de

trabalho (Dec.- Lei Federal n. 779/69);

h.9. Pagamentos de custas só a final, quando vencidas judicialmente (CPC,

art. 27);

h.10 Impossibilidade de usucapião de seus bens imóveis (Dec.-Lei n.

9.760/46, art. 200);

h.11 Dispensa de exibição ou juntada de instrumento de mandato em Juízo,

pelos Procuradores de seu quadro, para os atos ad judicia;

h.12. Recurso ex officio das sentenças que as condenarem ou julgar

improcedentes a execução de seus créditos fiscais (CPC, art. 475, III)

h.13 Juízo privativo da entidade estatal a quem pertencem (CF, art. 109, I );

h.14 Não sujeição a concurso de credores ou habilitação de créditos em

falência, concordata ou inventário, salvo para o estabelecimento de

preferência entre as Fazendas públicas. (art. 187, parágrafo único, I a III, do

CTN, Lei n. 5.172, de 25-10-1966);

h.15. Proibição, para seus servidores, de acumular cargos, empregos ou

funções públicos (CF, art. 37, XVII);

124

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p.351.

51

h.16 Sujeição de seus servidores às disposições e penalidades (como

indisponibilidade e perda de bens, demissão etc.) sobre improbidade

administrativa, da Lei n. 8.429/91125

. (destaque no original)

Meirelles ainda complementa informando que além dos privilégios acima elencados,

poderá haver outros “[...] expressos ou implícitos nas leis vigentes, reputamos extensíveis às

autarquias-federais, estaduais ou municipais- quaisquer outros de caráter administrativo (não

político) que sejam concedidos às entidades estatais, tendo em vista facilitar o desempenho da

função pública.”126

Dentre os privilégios acima citados, verifica-se que alguns merecem maior destaque,

haja vista possuírem maior importância tanto pelo fato de facilitar a administração das

autarquias, quanto pelo fato de dar embasamento jurídico e legal às ações e atos por elas

executados.

Carvalho Filho qualifica como principais privilégios das autarquias: “imunidade

tributária; impenhorabilidade de seus bens e de suas rendas; imprescritibilidade de seus bens;

prescrição qüinqüenal, créditos sujeitos à execução fiscal e principais situações processuais

especificas.”127

Assim, faz-se necessário a elucidação dos principais privilégios para que se possa

entender melhor seu funcionamento e aplicação real no dia a dia das autarquias, conforme

explana Carvalho Filho:

a) imunidade tributária: o art. 150, § 2º, da CF, veda a instituição de

impostos sobre o patrimônio, a renda e serviços das autarquias, desde que

vinculados a suas finalidades essenciais ou às que delas decorram. [...];

b) impenhorabilidade de seus bens e de suas rendas: não pode ser usado o

instrumento coercitivo da penhora como garantia do credor. A garantia se

estabelece como regra, pelo sistema de precatórios judiciais, e a execução

obedece a regras próprias da legislação processual;

c) imprescritibilidade de seus bens: caracterizando-se como bens públicos,

não podem eles ser adquiridos por terceiros através de usucapião. Em

relação aos bens imóveis, a vigente Constituição é peremptória nesse

sentido. Mas não são só os imóveis. Quaisquer bens públicos, seja qual for a

sua natureza, são imprescritíveis. Essa orientação, aliás, está consagrada na

Súmula 340 do Supremo Tribunal Federal;

d) prescrição qüinqüenal: dívidas e direitos em favor de terceiros contra

autarquias prescrevem em cinco anos. Significa dizer que, se alguém tem

credito contra autarquia, deve promover a cobrança nesse prazo, sob pena de

prescrever seu direito de acioná-la com tal objetivo;

125

ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo, p. 176-177. 126

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 352. 127

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 456-457.

52

e) créditos sujeitos à execução fiscal: os créditos autárquicos são inscritos

como dívida ativa e podem ser cobrados pelo processo especial das

execuções fiscais, tal como os créditos da União, Estados e Municípios;

f) principais situações processuais específicas:

- a autarquia se considera como fazenda pública, razão por que nos processos

em que é parte tem prazo em quádruplo para contestar e em dobro para

recorrer (art. 188, CPC);

- estão sujeitas ao duplo grau de jurisdição, só produzindo efeito após

confirmação pelo Tribunal, as sentenças proferidas contra autarquias (art.

475, I, CPC) e as que julgarem procedentes embargos à execução de dívida

ativa promovida pela Fazenda Pública, nesta, como já mencionado acima,

incluídas as autarquias (art. 475, II, CPC)128

;

Contudo, quanto ao duplo grau de jurisdição, a autarquia perderá o privilégio quando

estiver em uma ação ou na execução de dívida ativa onde o valor será menor do que sessenta

salários mínimos, ou se o juiz decidir por jurisprudência ou súmula sem que vá para a

instância superior, tendo a autarquia que interpor recurso em sua defesa.

Resumidamente, denota-se que os privilégios das autarquias são os sustentáculos legal

das atividades inerentes às mesmas. Portanto, não se trata de um simples mimo do legislador,

mas sim de institutos necessários, sem os quais as autarquias não figurariam como entes

autônomos do Estado.

3.3 CONTROLE

Com relação à sujeição ao controle ou tutela, a autarquia não pode se desviar das

finalidades pelas quais ela foi criada, haja vista possuir por parte do Poder ao qual ela é

vinculada um controle ou tutela para assegurar que não cometa esse desvio.

Para Mello, tal controle “[...] é o poder que assiste à Administração Central de influir

sobre elas com o propósito de conformá-las ao cumprimento dos objetivos públicos em vista

dos quais foram criadas, harmonizando-as com a atuação administrativa global do Estado.”129

(destaque no original)

Para tanto, tal controle deve estar consubstanciado em texto legal bem como os limites

que ele possui sobre ela.

O mesmo autor menciona dois tipos de controle, o de legitimidade e de mérito, como

se observa:

128

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 456-457. 129

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 26. ed. rev. e atual. até a Emenda

Constitucional 57, de 18.12.2008, São Paulo: Malheiros, 2008, p. 162.

53

Será de legitimidade quando a lei haja habilitado o controlador a examinar a

conformidade do comportamento autárquico com os ditames legais; e será de

mérito quando, por força de lei, ao controlador assista apreciá-lo também sob

o ângulo da conveniência e oportunidade, caso em que, evidentemente, seus

poderes terão intensidade maior130

. (destaque no original)

Mello também fala sobre “controle preventivo ou repressivo, quanto a análise do

momento em que tal controle é exercido, pois a autarquia exerce o controle preventivo a partir

do momento em que busca do poder controlador um aval para praticar seus atos; repressivo

quando já foi praticado o ato.”131

Meirelles trata como controle autárquico, que significa “a vigilância, orientação e

correção que a entidade estatal exerce sobre os atos e a conduta dos dirigentes de suas

autarquias.”132

Assim, o controle sempre que exercido pelo Poder Central deve ir até o limite

estabelecido por lei para que não ultrapasse e afete a autonomia da autarquia

Figueiredo destaca “que o controle não poderá interferir diretamente na vida da

autarquia, sob pena de desconhecimento de que sua criação por lei lhe outorga uma série de

direitos e deveres. Direito e deveres, esses, a serem respeitados, inclusive e principalmente,

pelo ente que a criou.”133

(destaque no original)

Medauar ressalta que “O Tribunal de Contas auxilia o Legislativo na fiscalização

financeira, orçamentária, patrimonial, contábil nas atribuições descritas nos artigos 70,71 e 75

da Constituição da República.”134

Já, o “Poder Legislativo, além da fiscalização financeira e orçamentária, é dotado da

competência de fiscalizar e controlar os atos editados no âmbito das autarquias (CF, 49, X;

Constituição do Estado de São Paulo, art. 20, X).”135

Pode-se dizer que o controle exercido pelo ente que criou a autarquia significa uma

vigilância sobre seus atos e de seus dirigentes.

130

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 164. 131

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 164. 132

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 353. 133

FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. 7. ed. rev. atual e ampl. São Paulo: Malheiros,

2004, p. 136. 134

MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno, p.82. 135

MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno, p.82.

54

3.4 AUTARQUIAS DE REGIME ESPECIAL

Entende-se por autarquias de regime especial, àquelas que possuem alguns privilégios

a mais que as ditas autarquias de regime comum.

Nas palavras de Meirelles, autarquia de regime especial “é toda aquela a que a lei

instituidora conferir privilégios específicos e aumentar sua autonomia comparativamente com

as autarquias comuns, sem infringir os preceitos constitucionais pertinentes a essas entidades

de personalidade pública.”136

Assim, denota-se que o que forma essa diferença são realmente as vantagens que a lei

instituidora pode conceder às autarquias para exercer determinadas finalidades, assim,

enquadrando-se nesse tipo de regime as chamadas Agências Reguladoras. (destacou-se)

Para Mello, “a única particularidade marcante do tal regime especial é a nomeação

pelo Presidente da República, sob aprovação do Senado, dos dirigentes da autarquia, como

garantia, em prol destes, de mandato a prazo certo [...].”137

Conforme citado acima, essa nomeação feita de mandato por prazo certo significa

dizer que se finaliza no mesmo encerramento do mandato da autoridade que a fez, pois se

assim não fosse, estaria violando constitucionalmente as prerrogativas do próximo Governo.

Após, toda explanação feita sobre as autarquias, passa-se ao próximo e último

capítulo, denominado Agências Reguladoras, objeto fundamental do presente trabalho.

136

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 355. 137

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 169.

55

4 DAS AGÊNCIAS REGULADORAS E SUA COMPETÊNCIA

REGULATÓRIA

O presente e último capítulo têm por objetivo explanar acerca da competência

regulatória que possui uma agência reguladora, bem como conhecer como a mesma surgiu,

suas principais características e o seu poder normativo, no intuito de demonstrar a sua

importância e necessidade da sua existência junto à Sociedade.

4.1 BREVE HISTÓRICO

O Estado, durante algum tempo exerceu a figura de Estado empresário devido à

incapacidade financeira que os particulares possuíam para desempenhar atividades que

demandavam muito investimentos financeiros e demora de retorno dos mesmos, conforme

ensinamentos de Neves, “[...] Foi assim que se justificou a atividade empresarial do Estado

em determinados setores, tais como a siderurgia, a mineração, produção de gás e petróleo, o

desempenho de serviços públicos que são telecomunicações, água, energia elétrica,

saneamento básico etc.”138

Destaca-se, outrossim, que o Estado passou a corresponder de forma insatisfatória na

prestação de tais serviços, deixando a desejar como administrador e empresário por alguns

problemas enfrentados pelos usuários que prestavam aqueles serviços, tais como: “i)

ineficiência na prestação de serviço; ii) defasagem no aprendizado de novas técnicas, o que

prejudicava a qualidade dos serviço; iii) morosidade.”139

Todavia, o Estado sofre uma transformação no seu papel quanto à função de produção

direta de bens e prestação de serviços, passando essa prerrogativa aos particulares, porém,

deixa de ser o Estado empresário, mas não perdendo o controle que, pode-se dizer então que é

a partir dessa transformação, ou melhor, cessão de direitos que entram as agências

reguladoras, fazendo o papel do Estado intervencionista.

138

NEVES, Rodrigo Santos. Função normativa e agências reguladoras: uma contribuição da teoria dos

sistemas à regulação jurídica da economia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 3. 139

NEVES, Rodrigo Santos. Função normativa e agências reguladoras: uma contribuição da teoria dos

sistemas à regulação jurídica da economia, p. 4.

56

Neste sentido posicionam-se Alexandrino e Paulo:

Este é um ponto de grande importância: o aumento da necessidade de

regulação é consequencia da opção política e econômica do Estado de, em

vez de assumir diretamente o exercício de atividade empresarial, intervir

ativamente nessas atividades, utilizando instrumentos de autoridade. Não

significa uma redução quantitativa obrigatória da atividade do Estado, mas

uma alteração no perfil dessa atividade: ao deixar de assumir a tarefa de

produção direta de bens e serviços, o Estado, na mesma proporção,

intensifica o exercício de suas prerrogativas de intervenção no domínio

econômico140

.

Assim, corroborando com o texto acima, vislumbra-se que a Constituição da

República em seu artigo 173, caput, assim dispõe: “Ressalvados os casos previstos nesta

Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida

quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo,

conforme definidos em lei.”

Tem-se então, afirmada pela Constituição da República que o Estado somente irá

desempenhar atividades econômicas quando o particular se encontrar impossibilitado de

desempenhá-las, por conta de que deve a Administração Pública ficar voltada às suas

atividades-fim.

Portanto, em 12 de abril de 1990, o Governo Federal implantou o Programa Nacional

de Desestatização (PND), por meio da Lei nº 8.031, posteriormente revogada pela Lei nº

9.491, de 9 de setembro de 1997,com o intuito de, entre outros:

Art. 1º [...]

I - reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à

iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público;

V - permitir que a Administração Pública concentre seus esforços nas

atividades em que a presença do Estado seja fundamental para a consecução

das prioridades nacionais141

;

Assim, a referida lei deixa explícita que a intenção do Estado, é de que a máquina da

Administração Pública Direta esteja voltada de forma geral aos interesses nacionais de sua

alçada, como, saúde, educação, saneamento básico, etc., deixando por conta dos particulares a

prestação dos serviços públicos e estes sob controle da Administração Pública Indireta, ou

seja, diretamente exercidos pelo ente regulador denominado de agência reguladora.

140

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 160. 141

BRASIL. Lei nº 9.491 de 09/09/1997. Altera procedimentos relativos ao Programa Nacional de

Desestatização, revoga a Lei n° 8.031, de 12 de abril de 1990, e dá outras providências. Publicada no D.O.U. de

10/09/1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9491.htm>. Acesso em 05 de Nov.

2010.

57

Dropa, em seu artigo sobre Estado gerencial e controle social, explana sobre a criação

do PND, conforme segue:

[...] diante dos desafios impostos pela economia mundial, do aumento da

concorrência, da ampliação de mercados altamente globalizados, avanços

tecnológicos, modernização do Estado com a necessidade de se reduzir as

dificuldades fiscais do governo, reestruturando e tornando eficiente os

serviços públicos prestados à sociedade, foi criado o Programa Nacional de

Desestatização (PND)142

.

O processo de reforma do Estado que se iniciou no Brasil na década de 90, obrigou o

Estado a inovar o relacionamento jurídico-econômico com os prestadores de serviços. Houve

a necessidade de se fortalecer e propor mudanças no que diz respeito ao seu papel regulatório

frente à economia, pois o modelo até então utilizado para desempenhar suas atribuições se

tornou inconsistente e ineficaz, haja vista o excesso delas e consequentemente uma velocidade

cada vez mais lenta do sistema devido à burocracia estatal.

Assim, com a preocupação de o Estado ser mais eficiente, o então Ministério da

Administração e da Reforma do Estado (MARE), propôs a reforma do Estado pelo motivo

que segue:

[...] ressaltou a necessidade de redução do tamanho do Estado, para que ele

pudesse ser mais eficiente. Isso resultou sobremodo do fato de o Estado ter-

se alargado por demais (com incremento da carga tributária)[...]. Foram

delimitadas (e reduzidas) as áreas de atuação exclusiva do Estado, bem como

foram alargadas as hipóteses de atuação exclusiva dos particulares em

setores nos quais ao Poder Público é reservado o papel de supervisor e

garantidor (seja em regime de liberdade de iniciativa, seja nos de autorização

ou concessão e permissão de serviços públicos, seja nos regimes peculiares

ao terceiro setor)143

. (destaque no original)

Contudo, a ideia da reforma foi para que o Estado deixasse de intervir

economicamente de forma direta, passando a intervir de forma indireta, isto é, incentivando

ou disciplinando as ações dos particulares, de modo a ser um Estado regulador e garantidor.

Assim, o Estado deixa de ter a responsabilidade da produção direta de bens e serviços e ao

mesmo tempo intensifica seus poderes de intervenção no domínio econômico por meio das

agências reguladoras.

142

DROPA, Romualdo Flávio. Estado gerencial e controle social. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 17,

31/05/2004. Disponível em < HTTP://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos-

leitura&artigo_id=3877>. Acesso em 01.11.2010. 143

CUÉLLAR, Leila. Introdução às agências reguladoras brasileiras, p. 33.

58

Destarte, as agências reguladoras foram criadas a partir do ano de 1996, com a

implementação das leis sobre a Reforma do Estado, com o propósito de fazer com que os

serviços públicos prestados pelos particulares não deixem de atender à sua função social, sem

que ao mesmo tempo prejudiquem os lucros dos particulares.

As agências reguladoras podem ser criadas no âmbito federal, estadual e municipal,

sempre por lei específica, sendo uma lei ordinária, e esta tratará sempre de sua criação, sendo

prerrogativa privativa do chefe do Poder Executivo, e sua instituição sempre será por meio de

decreto bem como por lei específica será a sua extinção.

O doutrinador Efing, observa que entre a criação e a instituição das agências

reguladoras existe uma diferença, como segue:

Deve-se diferenciar o ato de criação e de instituição de uma Agência, pois o

primeiro, é o nascimento jurídico do ente, enquanto o segundo, é o

surgimento concreto do mesmo. Sua extinção também deverá ser através de

lei específica, vez que o ato administrativo não pode ou não tem a força para

desfazer o que se estabeleceu por norma de hierarquia superior144

.

Baseado em outros países, especialmente nos da Europa Continental, como França e

Portugal, o Brasil instituiu a partir do ano de 1996, a criação da primeira agência reguladora,

denominada Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, contudo cabe salientar que o

termo agência reguladora foi trazido do direito norte-americano, onde a expressão agência é

comumente utilizada.

Contudo, antes mesmo da criação especificamente do termo agência reguladora, no

direito brasileiro já existiam outros entes com a função regulatória, porém com outra

denominação, destarte haver confusão entre agências reguladoras e processo de privatização

de empresas estatais, sendo assim, para dirimir tal confusão, jus se faz saber os tipos de

regulação que existem em nosso ordenamento brasileiro, conforme segue:

A regulação não é exercida somente sobre os serviços públicos

desestatizados. O Estado regula atividades econômicas as mais diversas, em

setores como sistema financeiro, o mercado de petróleo e combustíveis, o

sistema portuário, os serviços suplementares de saúde (“planos de saúde”)

etc. Muitos desses setores jamais foram explorados diretamente pelo Estado

e outros podem continuar sendo, como é o caso do petróleo, que, embora

explorado por uma sociedade de economia mista federa (não mais em regime

de exclusividade), está submetido a uma agência reguladora instituída nos

moldes atuais;

144

EFING, Antônio Carlos. Agências reguladoras e a proteção do consumidor brasileiro. Curitiba: Juruá,

2009, p. 62.

59

a atividade regulatória não é exclusiva das denominadas agências

reguladoras, instituídas nos moldes atuais. Basta mencionarmos o caso do

Sistema Financeiro Nacional, regulado pelo Banco Central do Brasil e pelo

Conselho Monetário Nacional, e o da regulação do mercado de capitais,

efetuada pela Comissão de Valores Mobiliários. Além disso, a atividade

regulatória, em sentido amplo, é exercida também pela Administração

Centralizada e, ainda, pelo Poder Legislativo; e

a atividade regulatória não obrigatoriamente incide sobre um setor específico

da economia ou sobre um serviço público determinado. Há órgãos

encarregados de exercer atividade de regulação que, além de não revestirem

a forma jurídica típica das agências reguladoras, atuam sobre um extenso

espectro de setores e atividades, como é o caso dos órgãos de defesa da

concorrência (Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE,

existente desde 1962 e reestruturado em 1994), dos órgãos de defesa do

consumidor e dos órgãos de defesa do meio ambiente145

. (destaque no

original)

Dessa forma, na Administração Pública, existem vários órgãos de regulação como

citado acima, logo, o que se busca compreender no presente trabalho é a competência que

cabe a uma agência reguladora, agência esta denominada na Constituição da República como

órgão regulador.

A respeito deste tema, oportuno se faz apresentar alguns conceitos doutrinários de

agências reguladoras, os quais serão explanados no próximo item do presente trabalho.

4.2 CONCEITO DE AGÊNCIA REGULADORA

Neste item, buscar-se-á saber o significado de agências reguladoras, ou seja, o

conceito propriamente dito, pois muitos são os conceitos dados pela doutrina, porém, a

mesma é unânime em dizer que não há uma definição legal quanto ao seu conceito, haja vista,

não existir uma lei geral de criação, pois a constituição fala somente em órgão regulador,

deixando, portanto, em aberto para definição conforme sua lei criadora específica.

A instituição dos órgãos reguladores passou a constar no artigo 21, XI, da CF, com a

redação dada pela Emenda Constitucional nº 8/95, e no artigo 177, § 2º, III, da CF, com a

redação dada pela Emenda Constitucional nº 9/95, como se verifica:

Art. 21 Compete à União:

[...]

XI - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão,

os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a

145

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 161

60

organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos

institucionais;

Art. 177 Constituem monopólio da União:

[...]

§ 2º A lei a que se refere o § 1º disporá sobre

III - a estrutura e atribuições do órgão regulador do monopólio da União;

Conforme já citado, o termo “agência reguladora” não se encontra especificado na

Constituição da República, consta somente como órgão regulador, como assim esclarece

Cuéllar:

É o legislador infraconstitucional que tem conferido o nome “agência

reguladora” às entidades reguladoras independentes que estão sendo criadas,

provavelmente importando o termo do Direito norte-americano, onde

entidades com natureza e funções semelhantes são denominadas regulatory

angencies ou independent regulatory agencies146

. (destaque no original)

As agências reguladoras são qualificadas como autarquias de regime especial, porém,

para essa denominação não existe lei que a defina, entretanto, como regime especial dispõe de

maior liberdade dos que as autarquias comuns, e se diferem pela particularidade como por

exemplo, o fato de que “Os Diretores de tais agências são nomeados pelo Presidente da

República, após aprovação do Senado para cumprir mandatos.”147

(destaque no original)

Cabe salientar que a lei 9.986, de 18 de julho de 2000, que dispõe sobre a gestão de

Recursos Humanos das agências reguladoras e outras providências é o que na legislação

brasileira mais se aproxima de uma normatização geral sobre o tema148

.

Quanto ao modo de criação das agências reguladoras, estas podem ser criadas por lei

ou medida provisória quando se tratar de âmbito federal; já no âmbito estadual, poderá ser

criada agência reguladora por meio de lei ou decreto, conforme leciona Cuéllar:

Outra peculiaridade do Direito brasileiro refere-se ao fato de que a criação

das agências reguladoras federais tem sido efetuada através de lei (diploma

normativo elaborado pelo Poder Legislativo, segundo tramitação específica)

ou de medida provisória.

Já as agências estaduais, distritais e municipais existentes foram instituídas

por meio de lei ou decreto [...]149

.

146

CUÉLLAR, Leila. Introdução às agências reguladoras brasileiras, p. 36. 147

MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno, p.85. 148

BRASIL. Lei nº 9.986 de 18 de julho de 2000. Dispõe sobre a gestão de recursos humanos das Agências

Reguladoras e dá outras providências. Publicada no D.O.U. de 19/07/2000. Disponível em: <

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9986.htm>. Acesso em 05 de Nov 2010. 149

CUÉLLAR, Leila. Introdução às agências reguladoras brasileiras, p. 47-48.

61

Assim, “pela natureza da função a ser exercida, foram criadas, sob a forma de

autarquias (agências autárquicas ou governamentais), denominadas agências reguladoras,

entidades com típica função de controle.”150

(destaque no original)

Moreira Neto define como Autarquias reguladoras e fala que sua abrangência vai de

acordo com a lei criadora, como se pode observar:

São autarquias que recebem por lei tal qualificação, quando de sua criação,

para atuar como órgãos autônomos, destinados a administrar setores em que

são desenvolvidas atividades privadas de interesse público, tais como o são

os serviços públicos, por delegação (concessões e permissões e institutos

afins), bem como as atividades profissionais ou empresariais, que venham a

estar legalmente submetidas a um regime especial de controle destinado a

salvaguardar valores específicos, como ocorre com a vigilância sanitária,

com o regime hídrico e tantos outros, em listagem em expansão, na medida

em que atividades privadas, em áreas econômicas ou sociais

constitucionalmente definidas como de relevância coletiva, recebam

específico ordenamento público regulador151

. (destaque no original)

Nas palavras de Justen Filho, “Agência reguladora independente é uma autarquia

especial, sujeita a regime jurídico que assegure sua autonomia em face da Administração

direta e investida de competência para a regulação setorial.”152

(destaque no original)

O doutrinador Bittencourt assevera que:

No sistema brasileiro, agências reguladoras correspondem a autarquias em

regime especial com função de, dependendo do estabelecido em sua lei

instituidora, disciplinar e fiscalizar matérias sob sua competência; assumir os

poderes que, na concessão, na permissão e na autorização, eram antes

desempenhados pela própria Administração Pública Direta, na qualidade de

poder concedente; compor conflitos de interesses, dentre outras inúmeras

atribuições153

.

Di Pietro sintetiza sua definição expondo que “Agência reguladora, em sentido amplo,

seria, no direito brasileiro, qualquer órgão da Administração Direta ou entidade da

Administração Indireta com função de regular a matéria específica que lhe está afeta.”154

No mesmo sentido que as opiniões formuladas pela doutrina, o Poder Judiciário já se

manifestou quanto o seu entendimento sobre o conceito de agência reguladora afirmando:

150

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 459. 151

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial, p. 256-257. 152

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p.

554. 153

BITTENCOURT, Marcus Vinícius Corrêa. Manual de direito administrativo, p. 67 154

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 466

62

[...] As Agências reguladoras consistem em mecanismos que ajustam o

funcionamento da atividade econômica do País como um todo,

principalmente da inserção no plano privado de serviços que eram antes

atribuídos ao ente estatal. Elas foram criadas, portanto, com a finalidade de

ajustar disciplinar e promover o funcionamento dos serviços públicos,

objetos de concessão, permissão e autorização, assegurando um

funcionamento em condições de excelência tanto para o fornecedor/produtor

como principalmente para o consumidor/usuário [...]155

.

Alexandrino e Paulo entendem que ainda não existe uma definição jurídica de agência

reguladora até o presente momento, pelo motivo de ainda não existir uma lei geral e nem

mesmo uma definição legal sobre elas.

Para tanto, os doutrinadores supracitados, explanam acerca das agências reguladoras

atuais:

[...] trata-se de entidades administrativas com alto grau de especialização

técnica, integrantes da estrutura formal da Administração Pública, instituídas

como autarquias sob regime especial, com a função de regular um setor

específico de atividade econômica ou um determinado serviço público, ou de

intervir em certas relações jurídicas decorrentes dessas atividades, que

devem atuar com a maior autonomia possível relativamente ao Poder

Executivo e com imparcialidade perante as partes interessadas (Estado,

setores regulados e sociedades)156

. (destaque no original)

São muitas as discussões acerca da conceituação jurídica das agências reguladoras,

pois o legislador definiu como autarquia especial, muitos diferenciando-as das autarquias

comuns pela investidura e estabilidade do mandato dos seus dirigentes.

O que se verifica, no entanto, são vários doutrinadores em busca de um conceito

esclarecedor do que realmente significa uma agência reguladora bem como sua diferença dita

como autarquia de regime especial.

Para Mazza, as “Agências reguladoras são autarquias com autonomia qualificada

frente à Administração Direta, criadas para atuar no controle, fiscalização ou fomento de

determinados setores.”157

Sendo assim, tem-se a certeza de que as agências reguladoras foram criadas no

ordenamento jurídico brasileiro para assumir o papel de poder concedente, até então feito pela

Administração Direta, no que tange a concessão, permissão e autorização de serviços públicos

155

BRASIL. Tribunal de Justiça Mato Grosso do Sul. Disponível em:

http://www.tjms.jus.br/cposg/pcpoResultadoConsProcesso2Grau.jsp. Acesso em 10 out. 2010. 156

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 15 ed. Rio de

Janeiro: Impetus, 2008, p.162 157

MAZZA, Alexandre. Agências reguladoras. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 39.

63

prestados por empresas particulares, exercendo sobre elas o controle e fiscalização dos

serviços de interesse coletivo.

Como delineado acima, Cal considera:

Este poder ou é assumido pela Administração Pública ou pelas agências

reguladoras, tais como os de fixar e alterar unilateralmente as cláusulas

regulamentares, os de encampação, intervenção, uso compulsório de

recursos humanos e materiais de empresas concessionárias, poder de direção

e controle sobre a execução do serviço, poder sancionatório, poder de

decretar a caducidade e de fazer reversão de bens da concessionária ao

término da concessão158

.

As agências reguladoras passam a exercer a função de zelar pela boa qualidade dos

serviços prestados pelas empresas particulares, função esta que sempre foi desenvolvida pelo

Estado, ou seja, até a criação das agências, o Estado fazia o papel de controlador e

fiscalizador, porém, não com total eficiência exercia essa função, assim, por abranger todas as

funções de forma geral, sentiu-se a necessidade de que outra pessoa jurídica fosse cuidar

prioritariamente dos serviços prestados em favor da coletividade.

Dessa forma, necessário se faz saber quais as principais características das agências

reguladoras, objeto de análise no próximo item.

4.3 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS

As agências reguladoras possuem um papel de grande importância em nosso

ordenamento jurídico pelo fato de exercerem atividades específicas que as diferenciam de

outros órgãos do Estado. Elas foram instituídas com características peculiares para que

pudessem promover a execução dos serviços à que foram destinadas.

Por não existir uma lei específica de criação das agências reguladoras, vários são os

apontamentos com relação às características de cada agência.

A doutrina especializada não define quais são as principais características das agências

reguladoras, entretanto, vários autores apontam características semelhantes em seu texto as

quais podem se extrair como sendo as principais, segundo o doutrinador França, com base nas

leis instituidoras das agências reguladoras federais, pode-se classificar como suas principais

características:

158

CAL, Arianne Brito Rodrigues. As agências reguladoras no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Renovar,

2003, p. 86.

64

independência política – administrativa, financeira e técnica; detém

autonomia funcional, não estando hierarquicamente condicionada a nenhum

outro órgão público; possui receitas próprias e tem discricionariedade de

decisão sobre o setor que atua:

estruturação peculiar do quadro gerencial, tendo seus diretores tratamentos

diferenciados quanto aos mandatos específicos, maneira de atuar, suas

prerrogativas e deveres;

capacidade normativa técnica, regula o setor que atua no sentido da

manutenção do bom serviço e de proteção dos respectivos usuários, além de

delimitar e gerir a atividade dos concessionários de atividades e serviços

públicos;

capacidade sancionatória e de dirimir conflitos – via mediação e arbitragem

entre particulares, Estado e concessionários. Para tanto, possui poder de fixar

deveres e obrigações, bem como punições administrativas aos infratores,

concedendo à população a segurança da devida fiscalização dos serviços das

atividades públicas delegadas aos concessionários159

.

É imprescindível dizer que basicamente todos os autores estudados seguem como

sendo as principais características as acima elencadas, apenas com algumas modificações

quanto a nomenclatura dos termos por exemplo, porém, com a mesma essência.

No mesmo norte Cal aponta que “As agências reguladoras têm a característica de

serem autarquia em regime especial e possuírem autonomia administrativa, ausência de

subordinação hierárquica, mandato fixo, estabilidade de seus dirigentes e autonomia

financeira.”160

Da mesma forma, Meirelles assevera que:

Como se disse, todas essas agências foram criadas como autarquias sob

regime especial, considerando-se o regime especial como o conjunto de

privilégios específicos que a lei outorga à entidade para a consecução de

seus fins. No caso das agências reguladoras até agora criadas no âmbito da

Administração Federal esses privilégios caracterizam-se basicamente pela

independência administrativa, fundamentada na estabilidade de seus

dirigentes (mandato fixo), autonomia financeira (renda própria e liberdade

de sua aplicação) e poder normativo (regulamentação das matérias de sua

competência) [...]161

. (destaque no original)

Dada a complexidade de cada característica, e a importância delas na conjuntura da

organização das agências reguladoras, faz-se necessária a explanação individualizada das

mesmas, respeitando a diferenciação doutrinária da nomenclatura, como se analisa a seguir:

159

FRANÇA, Philipp Gil. O controle da administração pública: tutela jurisdicional, regulação econômica e

desenvolvimento. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2008, p. 136. 160

CAL, Arianne Brito Rodrigues. As agências reguladoras no direito brasileiro, p. 87. 161

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p.357.

65

4.3.1 Independência político-administrativa, financeira e técnica

As agências reguladoras, no desempenho de sua atividade normatizadora e reguladora,

para poder desenvolver suas funções de forma imparcial e ilibada, precisa estar desapegada de

qualquer vínculo hierárquico com o Estado, necessita funcionar autonomamente em

praticamente todos os aspectos.

Assim, verifica-se o entendimento de Meirelles:

Sendo as autarquias serviços públicos descentralizados, personalizados e

autônomos, não se acham integradas na estrutura orgânica do Executivo,

nem hierarquizadas a qualquer chefia, mas tão-somente vinculadas à

Administração direta, compondo separadamente, a Administração indireta

do Estado com outras entidades autônomas (fundações, empresas públicas e

sociedade de economia mista). Por este motivo não se sujeitam ao controle

hierárquico mas, sim, a um controle diverso, finalístico, atenuado,

normalmente de legalidade e excepcionalidade de mérito, visando

unicamente a mantê-las dentro de suas finalidades institucionais,

enquadradas no plano global da Administração a que se vinculam e fiéis a

suas normas regulamentares [...]162

. (destaque no original)

Não obstante a independência que se referiu o doutrinador, é necessário que se tenha

bem claro o entendimento que tal independência ou autonomia não deve ir contra o regime

constitucional brasileiro, pois assim estaria violando o art. 5º, inciso XXXV, da Constituição

da República onde diz que “ a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou

ameaça de direito”. Portanto, quando alguma agência reguladora tomar decisão que cause

lesão ou ameaça de lesão a direito de qualquer pessoa, o Poder Judiciário poderá intervir de

modo que não prevaleça a decisão dada administrativamente.

Faz-se necessário que a característica de independência seja adequada ao que cabe em

nossa lei maior, pois, todas devem obedecer a Constituição da República, motivo pelo qual no

ordenamento jurídico brasileiro tal característica é de fundamental importância, destacando a

doutrina quase que unanimemente como sendo esta a principal característica que diferenciam

as agências reguladoras.

Conforme lecionam Alexandrino e Paulo, a forma jurídica dada às agências

reguladoras brasileiras, qual seja, a criação das mesmas por meio de autarquias, reduz sua

independência político-administrativa, financeira e técnica consideravelmente, diferente do

que ocorre em outros países, como segue:

162

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p.353.

66

No Brasil, como já vimos, as agências reguladoras têm sido criadas sob a

forma jurídica de autarquia, fato que, por si só, reduz significativamente a

possibilidade de conferir-lhes independência”, pois toda a Administração

Pública está sujeita à direção superior do Chefe do Poder Executivo (na

esfera federal, o Presidente da República) e todas as entidades da

Administração Indireta federal devem estar vinculadas a um ministério, que

sobre ela exerce supervisão (especialmente o denominado controle

finalístico)163

.

Assim, com base no que diz a doutrina se pode concluir que apesar de ser a principal

característica das agências reguladoras, sua independência ou autonomia não é total, vez que a

Constituição da República impõe aos órgãos da Administração Indireta uma vinculação

obrigatória aos três poderes.

4.3.2 Estruturação peculiar do quadro gerencial

Os administradores das agências reguladoras detêm um privilégio com relação ao

mandato que investirem bem como do desligamento dele, sendo que os administradores são

nomeados na esfera federal, por exemplo, pelo Presidente da República com a aprovação do

Senado Federal, e o mandato não coincide com o mandato do Presidente.

Nesse aspecto, é plausível o modo pelo qual são nomeados os dirigentes, haja vista a

indicação feita pelo Chefe do Poder Executivo com aprovação do Poder Legislativo, como

prevê o art. 5º da lei 9.986/2000, que assim assevera:

Art. 5º O Presidente ou o Diretor-Geral ou o Diretor-Presidente (CD I) e os

demais membros do Conselho Diretor ou da Diretoria (CD II) serão

brasileiros, de reputação ilibada, formação universitária e elevado conceito

no campo de especialidade dos cargos para os quais serão nomeados,

devendo ser escolhidos pelo Presidente da República e por ele nomeados,

após aprovação pelo Senado Federal, nos termos da alínea f do inciso III do

art. 52 da Constituição Federal164

.

Quanto ao desligamento do cargo dos dirigentes, a legislação é pacífica na forma que

trata, sendo que somente podem perder o cargo antes do término do mandato em caso de

renúncia, em processo administrativo, em que lhe seja garantido o preceito constitucional da

ampla defesa e do contraditório, ou por processo judicial desde que transitado em julgado.

163

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p. 169. 164

BRASIL. Lei nº 9.986 de 18 de julho de 2000. Dispõe sobre a gestão de recursos humanos das Agências

Reguladoras e dá outras providências. Publicada no D.O.U. de 19/07/2000. Disponível em: <

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9986.htm>. Acesso em 05 de Nov 2010.

67

Todavia, cabe salientar que a legislação da criação da agência reguladora poderá

prever outros meios para a perda do mandato dos dirigentes, entretanto, em havendo lacuna

acerca desta matéria na lei instituidora, vigora a previsão da lei 9.986/2000, que em seu artigo

9º reza:

Art. 9º Os Conselheiros e os Diretores somente perderão o mandato em caso

de renúncia, de condenação judicial transitada em julgado ou de processo

administrativo disciplinar.

Parágrafo único. A lei de criação da Agência poderá prever outras condições

para perda do mandato165

.

Em análise, pode-se dizer que essa característica é a principal diferenciação entre as

agências reguladoras das demais autarquias, servindo também como uma garantia de evitar

que interesses político-partidários se sobreponham ao objeto principal da agência reguladora,

que é o de imparcialmente regular as relações entre Estado, prestadores de serviços e usuários.

4.3.3 Capacidade normativa técnica

A presente característica possui grande importância nas relações que envolvem as

agências reguladoras, merecendo uma análise mais aprofundada que será feita no item

subseqüente.

Contudo, pode-se adiantar que a capacidade normativa concede à agência reguladora

poderes especiais para regular a matéria específica para qual ela foi criada, sendo, no entanto

uma característica que suscita muita controvérsia, vez que foi dado à agência reguladora o

poder de criar normas com força de lei.

4.3.4 Capacidade sancionatória e de dirimir conflitos

As agências reguladoras detêm em sua capacidade sancionatória a possibilidade de

punir aqueles que descumprirem com as normas vinculadas ao serviço ou atividades

econômicas que regulam. Tal capacidade evidencia a função à que se destina a entidade, qual

seja a regulação das atividades de acordo com o que foi contratado.

165

BRASIL. Lei nº 9.986 de 18 de julho de 2000. Dispõe sobre a gestão de recursos humanos das Agências

Reguladoras e dá outras providências. Publicada no D.O.U. de 19/07/2000. Disponível em: <

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9986.htm>. Acesso em 05 de Nov 2010.

68

Entretanto, esbarra a capacidade sancionatória das agências reguladoras com a

competência jurisdicional do Poder Judiciário, uma vez que esta é exclusividade do mesmo,

em conformidade com o art. 5º, XXXV, da Constituição da República.

Tal divergência é explanada por França, como segue:

[...] Neste aspecto, cabe considerar a discussão no que tange à

constitucionalidade das agências reguladoras como detentoras de poder

punitivo, função primordial do Poder Judiciário, e, no mesmo prisma, como

detentoras do poder normativo, função precípua do Poder Legislativo166

.

Portanto, é necessário que se entenda que para atender às necessidades dos cidadãos

no que tange a competência das agências reguladoras, estas regulam as atividades de modo

que não fujam do que lhes competem, tomando cuidado para que não infrinjam outros

Poderes. Por outro lado, faz-se necessário saber que as agências reguladoras dentro de sua

competência técnica devem prezar pelos serviços prestados de forma adequada de acordo com

o que foi contratado, solucionar conflitos provenientes de queixas dos usuários, conforme

disposto no artigo 29, inciso VII da Lei 8.987/95, e, são capazes de dirimir conflitos entre os

prestadores de serviço público e entre esses e o usuário e aplicar sanções com respaldo legal.

Destarte, na falta do atendimento conforme contrato, leciona o artigo 38, da lei citada

acima que: “A inexecução total ou parcial do contrato acarretará, a critério do poder

concedente, a declaração de caducidade da concessão ou a aplicação das sanções contratuais,

respeitadas as disposições deste artigo, do art. 27, e as normas convencionadas entre as

partes.”

Assim, depois de discutidas as principais características, serão analisadas no próximo

item como funciona a regulamentação e a atividade normativa das agências reguladoras.

4.4 PODER REGULAMENTAR E ATIVIDADE NORMATIVA

Inicialmente para melhor esclarecimento da questão do Poder regulamentar cabe

explicar a diferença entre regulação e regulamentação, até porque ante o fato da ligação das

agências reguladoras com o direito norte-americano, o termo regulation remete a algumas

traduções, onde se confundem regulação e regulamentação. (destacou-se).

166

FRANÇA, Philipp Gil. O controle da administração pública: tutela jurisdicional, regulação econômica e

desenvolvimento, p. 154.

69

Em nosso sistema jurídico o instituto da regulamentação, ligado a figura do

regulamento é tratado na Constituição da República em seu artigo 84, IV, classificado como

ato privativo do Chefe do Poder Executivo, utilizado em forma de decreto, com sua finalidade

e limite determinados por lei, conforme cita Neves que “Este ato normativo emitido pelo

chefe do Executivo tem por finalidade aclarar, pormenorizar ou explicar uma lei para sua fiel

execução. Seu limite é o de garantir a fiel execução de uma lei, não podendo extrapolá-lo.”167

Em análise ao termo regulação, objeto principal do estudo das agências reguladoras, se

verifica que o Poder Regulamentar das mesmas, lhe proporciona a capacidade de

primeiramente normatizar ou analogicamente falando, regulamentar, posteriormente

implementar tal regulamentação, e por fim, se necessário, aplicar sanções aos descumpridores

de suas normas.

Quanto a questão da regulação, pode-se citar o mesmo autor que em suas bem

colocadas palavras explica:

Já a regulação, que se apresenta como atividade exercida por entidades

estatais, com a finalidade de induzir comportamentos dos agentes

econômicos e corrigir falhas do mercado, que para isso pode atuar de

diversas maneiras, criando normas, fiscalizando, aplicando sanções,

compondo conflitos, o que está muito além de tão somente criar normas para

o fiel cumprimento da lei168

.

A citação acima deixa claro o que significa o termo regulação no direito brasileiro, tal

regulação utilizada pelas agências reguladoras é principalmente exercida pela norma

reguladora por um processo de deslegalização, embasada em um poder previamente

concedido pelo Legislador quando da criação da própria agência reguladora.

Neste mesmo sentido leciona Cuéllar:

[...] é imperioso esclarecer que o poder de emitir atos normativos é inerente a

atividade de regulação, seja ela desenvolvida diretamente pela

Administração Pública ou por entidade semi-independente ou totalmente

independente. Não se trata de algo privativo do modelo das agências

reguladoras, mas comum a toda e qualquer atividade de regulação169

.

167

NEVES, Rodrigo Santos. Função normativa e agências reguladoras: uma contribuição da teoria dos

sistemas à regulação jurídica da economia, p. 12. 168

NEVES, Rodrigo Santos. Função normativa e agências reguladoras: uma contribuição da teoria dos

sistemas à regulação jurídica da economia, p.12 169

CUÉLLAR, Leila. Introdução às agências reguladoras brasileiras, p.56.

70

Esclarecida tal matéria e após análise minuciosa da doutrina especializada, o presente

trabalho segue a corrente doutrinária que entende que as agências reguladoras produzem sim o

regulamento necessário para condução de suas atividades em sua área específica, desde que

não ultrapasse os limites impostos pela lei, ou seja, pode a agência reguladora normatizar

questões secundárias conforme citam Alexandrino e Paulo:

A discussão, portanto, deve-se ater à possibilidade de edição de atos

normativos secundários pelas agências reguladoras, isto é, atos que sejam

editados, sempre, em função de uma lei, visando a dar efetividade às

diretrizes nela traçadas, e respeitando sempre os limites por ela impostos.

Tais atos são conhecidos como “regulamentos delegados”, ou “

regulamentos autorizados”, e têm como características estar a sua edição

expressamente prevista na lei que eles devam regulamentar, bem como o

fato de não se limitarem a “ dar fiel execução à lei” (não são meros

regulamentos de execução), mas sim completarem as disposições da lei,

observadas as diretrizes e os limites nela traçados170

.

Para tanto, utiliza-se no preceito constitucional citado no artigo 21, XI, que prevê a

criação da ANATEL171

e 177, § 2º, III, que prevê a criação da ANP172

, no que concernem as

agências reguladoras previstas na Constituição, e no artigo 174 quanto às agências criadas por

lei esparsas sem previsão constitucional expressa.

Cabe salientar, que o poder regulamentar exercido pelas agências reguladoras,

encontrou no início muita rejeição por parte da doutrina especializada, que entendia ser

impossível a delegação dos poderes de regulamentar, (seria competência somente do Chefe do

Poder Executivo), mas, com a implementação das agências reguladoras, verificou-se a

possibilidade e a necessidade de conferir tais poderes às agências reguladoras.

Destarte, o fato de delegar o poder regulamentar as agências reguladoras, é

preponderante para o funcionamento das mesmas, bem como para a desburocratização do

Estado, que com a delegação, alivia a carga administrativa, facilitando a execução de funções

mais abrangentes.

170

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p.174. 171

Lei 9.472, de julho de 1997, ou Lei Geral de Telecomunicações como ficou conhecida. Com a Anatel,

autarquia especial administrativamente independente e financeiramente autônoma, o Estado passou da função de

provedor para a de regulador dos serviços, cabendo à agência as funções de regular, fiscalizar e outorgar, de

modo a - como preceitua sua missão - promover o desenvolvimento das telecomunicações do País de modo a

dotá-lo de uma moderna e eficiente infra-estrutura de telecomunicações, capaz de oferecer à sociedade serviços

adequados, diversificados e a preços justos, em todo o território nacional. 172

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), implantada pelo Decreto nº 2.455,

de 14 de janeiro de 1998, é o órgão regulador das atividades que integram a indústria do petróleo e gás natural e

a dos biocombustíveis no Brasil. Autarquia federal, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, a ANP é

responsável pela execução da política nacional para o setor energético do petróleo, gás natural e

biocombustíveis, de acordo com a Lei do Petróleo (Lei nº 9.478/1997).

71

Assim, após o esclarecimento da possibilidade de regulamentação ou regramento, ou

ainda normatização, por parte das agências reguladoras, sendo tal função parte primária da sua

atividade de regular, é necessário entender a atividade normativa, antes, contudo, cumpre

esclarecer sua diferenciação com atividade legislativa.

A atividade legislativa se diferencia da atividade normativa, principalmente pela

origem, sendo que a primeira é originária do Poder Legislativo, e a segunda do Poder

Executivo, mas a mais importante diferenciação é que a competência normativa produz

normas destinadas a organizar a conduta de determinada matéria administrativa, gerando os

comandos necessários para tal fim, e a competência legislativa dá ao Poder Legislativo a

capacidade de criar normas jurídicas.

A atividade normativa das agências reguladoras dá-se em conformidade com a sua lei

criadora, que lhe impõe limites e regras para a condução de sua atividade normativa, como

inclusive, impõe limite a todas as suas demais atividades.

Neste sentido, cabe a própria agência reguladora, após sua criação, estruturar-se a fim

de buscar sua capacidade funcional para desenvolver suas atividades e entre elas a atividade

normativa, entendimento verificado no estudo da Lei da Anatel, quando determina que

compete ao Conselho Diretor editar normas sobre matérias de competência da agência,

previsto no artigo 22, IV da Lei nº. 9.472, de 16 de julho de 1997.

Em suma, verifica-se que a atividade normativa das agências reguladoras, exercida de

forma limitada por especificações legais, deve ser conduzida pela própria agência, que

obrigatoriamente deverá se autoestruturar, para buscar a melhor forma de exercer seu papel

normativo.

Em análise da doutrina, se pode destacar a síntese apresentada pelos doutrinadores

Alexandrino e Paulo, da seguinte forma:

As leis que instituíram as atuais agências reguladoras conferiram-lhes o

exercício de um abrangente poder normativo no que respeita às áreas de sua

atuação;

esse exercício de poder normativo pelas agências (que são autarquias) exige

que determinados dispositivos constitucionais sejam interpretados com

algum grau de elasticidade, o que com que a corrente mais tradicional de

nossa doutrina considere totalmente inconstitucionais essas atribuições,

especialmente no caso das agências criadas exclusivamente pela lei (ou seja,

todas, exceto a ANATEL e a ANP, únicas que encontram base constitucional

expressa);

os autores que entendem possível essa atribuição de poder normativo às

agências reguladoras, aos quais nos juntamos, ressaltam que ele não poderá

ser exercido quanto às matérias ressalvadas à lei, pela Constituição;

72

além disso, as agências somente podem editar atos secundários; tais atos

serão atos normativos delegados ou autorizados pela lei, restritos às áreas

técnicas de competência da agência (discricionariedade técnica); é inegável

que esses atos criam, modificam ou extinguem direitos (são mais do que

meros regulamentos de execução), mais devem sempre ser editados nos

termos da lei e observando as balizas legais;

os atos normativos editados pelas agências não são, entretanto, atos

primários, tampouco regulamentos autônomos, pois defluem da lei, e não da

Constituição;

é inconstitucional a delegação legislativa em branco;

os atos normativos das agências reguladoras estão sujeitos ao permanente

controle legislativo e, sempre que provocado, ao controle judicial, [...]173

.

A Lei de criação da agência, deverá criar a estrutura organizacional da mesma,

entretanto, a forma de funcionamento, incluído aí a estrutura de setor responsável pela

atividade normativa, deverá se dar por normatização da própria agência, normalmente por

meio de um regimento interno, que estipulará toda a sequencia de atos necessários para a

criação das normas.

Verificados o Poder Regulamentar e a Atividade Normativa das agências reguladoras,

tem-se a base para a análise das atividades regulatórias das mesmas, vez que se trata da mais

importante questão acerca da regulação, que engloba as demais atividades das agências

reguladoras.

4.5 COMPETÊNCIA REGULATÓRIA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS

Primeiramente cabe ressaltar que a atividade regulatória das agências reguladoras

engloba o Poder Normativo, quase legislativo e o Poder Jurisdicional, quase judicial que lhes

são conferidos por Lei, ao tempo de sua criação, de acordo com as palavras de Monteiro, em

artigo quando explica:

[...] a agência reguladora como ente aglomerador de funções típicas dos 3

Poderes: Executivo, quando da fiscalização e controle do cumprimento das

normas editadas; Legislativo, em face da formulação normativa; e Judiciário,

no que pertine à aplicação de reprimendas em casos de descumprimento das

regras por elas impostas174

.

Conforme previsto na Constituição da República, ao Estado cabe atuar na economia

como agente normativo e regulador, logo, sua deficiência no atendimento a toda coletividade,

173

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado, p.177. 174

MONTEIRO, Adriana Carneiro. Agências Reguladoras. http://www.jfpb.gov.br/esmafe/Pdf_Doutrina /

Ag%C3%AAncias%20Reguladoras%20Artigo.pdf. acesso em 07/11/2010.

73

torna necessário, como já mencionado anteriormente, que ele delegue essa função a uma

agência reguladora que possui as prerrogativas de agente normativo e regulador, assim,

“Quando o Estado deixa de prestar serviço público essencial, passando-o para a iniciativa

privada, contudo, mantém para si o poder de regular o setor.175

O entendimento doutrinário dá conta que a competência regulatória das agências

reguladoras, vai muito além de seu poder normativo, sendo este apenas uma das

características do funcionamento da competência regulatória, que possui ainda as funções de

fiscalizar, dirimir conflitos, sancionar, entre outras, conforme leciona Cuéllar, se observa:

A implementação das normas e a supervisão administrativa se concretizam

através de várias medidas que podem ser adotadas pelas agências

reguladoras, como a emissão de autorizações; fiscalização da execução das

autorizações, permissões e concessões que possibilitam aos particulares o

desenvolvimento de determinado serviço público; utilização dos meios para

controlar a qualidade dos serviços ou bens ofertados; monitorização dos

preços; poderes de investigação, de vistoria etc176

.

Em se tratando da capacidade normativa, verifica-se que as agências reguladoras

possuem ampla autonomia, podendo estabelecer regras acerca da matéria abrangida na sua

estruturação, encontrando, entretanto, em razão da disposição hierárquica das normas e dos

poderes existentes da legislação brasileira uma forte resistência quanto à criação de regras.

Tendo em vista, que a criação das agências reguladoras se dá na forma de lei, devendo

assim ser aprovada pelo Poder Legislativo, bem como sancionada pelo Poder Executivo, que

também obrigatoriamente deverá ser o criador da lei (competência exclusiva do Chefe do

Poder Executivo), tal lei deverá conter “normas gerais e abstratas, conhecidas também como

standards, que serão utilizadas na prática e operacionalizada pelo ente regulador criado”177

.

(destaque no original)

Quanto à capacidade regulatória em si, que engloba a totalidade das atividades das

agências reguladoras, é importante frisar que apesar da flexibilidade e da imparcialidade

intrínsecas às mesmas, não há de se falar de competência exclusiva das agências reguladoras,

não podendo em momento algum excluir o crivo dos Poderes Legislativo, Executivo e Poder

Judiciário.

175

MORAES, Isaias Fonseca. Manual de direito administrativo, p. 84. 176

CUÉLLAR, Leila. Introdução às agências reguladoras brasileiras, p. 60. 177

LEHFELD, Lucas de Souza. Controle das agências reguladoras. São Paulo: Atlas, 2008, p. 264.

74

Como já explanado no item anterior, a questão normativa das agências reguladoras é a

parte mais controversa de sua formação e atuação, talvez por enfrentar literalmente a parte

textual da Constituição da República, e necessitar de entendimentos análogos a Lei Maior,

entretanto é necessário se analisar as demais funções dos entes reguladores.

No tocante ao poder de fiscalização das agências reguladoras, que alguns autores

tratam por supervisão, este é desempenhado somente na área de atuação, com o intuito de

garantir a ordenação de um setor ou de uma atividade, buscando a garantia do direito coletivo.

Nas palavras de Mastrangelo, quando cita o doutrinador espanhol, Herrero, “cuida-se

de ação que se realiza “em parte mediante atuações materialmente semelhantes às que

desenvolve com normalidade os órgãos jurisdicionais”, caracterizando-se, porém, por “uma

faceta de controle prévio”(prevenção).”178

Pode-se se exemplificar a condição fiscalizadora nas palavras de Efing:

Independente da classificação das agências quanto às atividades reguladas,

todas as leis que as criaram prevêem a competência de fiscalização, perante

os agentes econômicos. Assim, a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás

Natural e Biocombustíveis), por exemplo, exerce a atividade fiscalizadora

tanto no que se refere a exploração privada das jazidas públicas, ou que

constitui atividade monopolizada da União, como, no que tange à venda no

varejo de combustíveis, atividade econômica privada. Denota-se Dessa

forma, que atividade ora tratada desenvolve tanto no setor público quanto no

privado179

.

Portanto, tem-se o ato fiscalizatório, como um ato preventivo de controle dos serviços

coordenados pelas agências reguladoras, que busca amenizar erros ou desvios de quem, de

uma forma ou de outra, possui a legitimidade de exploração de serviços públicos.

Quanto a questão sancionatória das agências reguladoras, cabe salientar que o modo

de atuação de cada agência é único, determinado pelo seu regimento interno, e aplicado na

forma da normatização da mesma, conforme preceitua Efing:

[...] com a exceção a ANA (Agência Nacional de Águas), todas as Agências

Reguladoras têm em suas leis alguma previsão expressa das suas atribuições

de aplicar sanções (ex: Lei 9.427/96, art. 3º, X). Em relação às Agências

Reguladoras de serviços públicos e da exploração de monopólios e bens

178

HERRERO, Mariano Magide. Límites Constitucionais de lás Administraciones Independeties, p. 356 apud

MASTRANGELO, Claudio. Agências reguladoras e participação popular. Porto Alegre: Livraria do

Advogado, 2005, p. 70. 179

EFING, Antônio Carlos. Agências reguladoras e a proteção do consumidor brasileiro, p. 68-69.

75

públicos, até mesmo a Lei 8.666/93 (arts. 86 a 88) e, para as primeiras, a Lei

8.987/95 (art. 29, II), servem de esteio às suas funções sancionatórias180

.

Assim, compreende-se que atividade sancionatória decorre consequentemente dos atos

fiscalizatórios desempenhados pelas agências reguladoras, que verificando algum

descumprimento dos preceitos legais, regulamentares e contratuais aplicam a pena

determinada legalmente a fim de coibir o prejuízo dos serviços.

Assiste ainda, a capacidade regulatória das agências reguladoras a possibilidade de

dirimir conflitos em âmbito administrativo, tendo o poder legal de instaurar um processo

administrativo, que após, respeitado as fases do devido processo legal, decidirá exercendo a

função decisória tal como um arbítrio.

Exemplifica-se com as palavras do autor acima citado:

Ademais, as Agências Reguladoras possuem competências decisórias, ou

seja, resolvem conflitos, em âmbito administrativo, entre os agentes

econômicos que atuam no setor e entre eles e os consumidores. Por exemplo,

a Lei da Anatel, prevê que ela comporá administrativamente os conflitos de

interesses entre as prestadoras dos serviços de telecomunicações (art. 19); a

Lei da Aneel atribui a essa agência o poder de dirimir divergências entre os

delegatários, bem como entre eles e seus consumidores (art. 3º, V)181

.

Ainda, existem agências federais que foram incumbidas de capacidade da cobrança de

tributos, como taxas e contribuições de intervenção no domínio econômico, transformando os

tributos na principal fonte de receita para a mantença das atividades desempenhadas. Nesse

sentido, a ANEEL, a ANATEL, ANVISA, ANS, ANTT e ANTAQ, a legislação permite a

cobrança de fiscalização, consoante previsto, respectivamente, nos artigos: 12 e 13 da Lei nº

9.427, de 26 de dezembro de 1996; 47 da Lei nº 9.472, de julho de 1997; 23 a 26 da Lei nº.

9.782, de 26 de janeiro de 1999; 18 a 23 da Lei nº 9.961, 28 de janeiro de 2000; 77, III, da Lei

nº 10.233, de 05 de junho de 2001.

Assim, mesmo com essa liberdade de atuação as agências reguladoras respondem por

seus atos, que são controlados pelo Poder Judiciário, anota-se o texto de Lehfeld:

Porém, esse controle judicial deve ser realizado com a finalidade de

resguardar a ordem jurídica e, por conseguinte, evitar abusos e ilegalidades

no processo decisório das agências reguladoras, sob pena de prejudicar a

autonomia dessas entidades frente aos agentes econômicos submetidos à sua

regulação. É imprescindível que o Judiciário reconheça e legitime as

180

EFING, Antônio Carlos. Agências reguladoras e a proteção do consumidor brasileiro, p. 69. 181

EFING, Antônio Carlos. Agências reguladoras e a proteção do consumidor brasileiro, p. 69.

76

competências atribuídas às agências, agindo com relativa autocontenção e

parcimônia, no intuito de não dotar sua intervenção de incertezas e

subjetivismos182

.

Verifica-se então, que a capacidade de atuação das agências reguladoras fica no

entremeio da legislação que a criou e dos preceitos constitucionais presentes na atual

legislação brasileira, respeitando sempre os usuários e os prestadores de serviços, devendo

desempenhar suas funções dentro da mais pura e lídima justiça.

Por fim, extraem-se dos estudos feitos, que as agências reguladoras são entes de

fundamental importância existentes em nosso ordenamento jurídico, com a finalidade de zelar

pelos serviços prestados por particulares de forma que estes façam de acordo com o objetivo

do Estado, sendo este responsável pelo atendimento adequado aos usuários.

Como se pode observar, a capacidade de autoadministração que a autarquia possui está

ligada a uma certa independência, porém, não foge do controle que o Estado tem sobre ela, ou

seja, a sua capacidade de autoadministração é submissa aos limites da lei do Poder que a

criou.

No que tange à especialização dos fins ou atividades desenvolvidas pela autarquia,

tem-se essa forma como ponto fundamental para alcançar o objetivo pelo qual ela foi criada,

ou seja, de solucionar com agilidade e conhecimento as demandas de sua alçada.

182

LEHFELD, Lucas de Souza. Controle das agências reguladoras, p. 269.

77

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

No primeiro momento, o objeto de estudo foi acerca da Administração Pública, pois,

estando a Administração Pública dividida em direta e indireta, mister se faz saber que da

primeira faz parte as pessoas políticas, que são a União, os Estados, o Distrito Federal e os

Municípios; e da segunda são as pessoas ou entidades jurídicas, que são as autarquias, as

fundações públicas, as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

A estrutura da Administração Pública conforme demonstrada acima é regida pela

Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), em seu artigo 37.

Assim, observa-se que a nossa Constituição deixa explícito que a Administração

Pública, em seu sentindo amplo, abrange os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário,

porém, não pode ser confundida com estes poderes na organização estrutural do Estado, no

exercício da função típica dos dois últimos.

Desta forma, se pode concluir que a Administração Pública apesar de aparentemente

ser exercida pelo Poder Executivo, abrange também as atividades dos demais poderes,

respeitando obviamente o fato que somente pode se considerar atos da Administração Pública,

aqueles que se referem a organização dos poderes, e não os de Exercício da sua função.

Assim, entende-se que a Administração Pública, nada mais é, que o conjunto de atos

praticados pelo Estado, buscando a satisfação das necessidades da coletividade, que para

tanto, se utiliza de sua estrutura regulamentada.

A Administração Pública possui o papel de prestar serviços públicos por meio de seus

órgãos e entidades, de forma direta bem como por meio de outras pessoas jurídicas, portanto,

de forma indireta.

No sentido estrito que se pretende abranger, a Administração Pública como ente que

exerce a gestão, exclui dela as atividades legislativas e jurisdicionais, com acepção

administrativa somente.

78

Administração de responsabilidade do Estado é a denominada Administração Pública

compreendida como a atividade de administrar quando grafada com “a” minúsculo, e como

máquina administrativa, quando grafada com “A” maiúsculo.

Nota-se que a questão gráfica também é de fundamental importância, dando a

diferenciação necessária para o melhor entendimento da matéria.

No sentido estrito e aspecto objetivo, trata das atividades praticadas pelas pessoas

jurídicas, órgãos e agentes públicos no intuito de atender todas as necessidades por parte da

coletividade.

Estas pessoas possuem o importante papel de exercer suas atividades de acordo com a

necessidade dos cidadãos sem que se eximam das suas obrigações por se tratar justamente de

Poder Público.

Em resumo, pode-se afirmar que o sentido objetivo da Administração Pública quer

dizer a maneira pela qual o Estado executa sua função de acordo com os interesses da

coletividade, é a própria execução das atividades.

Contudo, não importa por qual atividade administrativa o Estado irá agir, e sim, que

todas as ações do Estado sejam voltadas para a resolução dos interesses coletivos com a

intenção de proteger a todos.

Já no sentido estrito e aspecto subjetivo, Este engloba as pessoas que exercem a

atividade administrativa, pois a Administração Pública compreende todas as pessoas as quais

a lei atribui a prática dessa função.

No que compete o regime jurídico O que se verifica na prática, é que a Administração

Pública exerce poder político na escolha do regime jurídico que será utilizado pelo Estado,

pois apesar de ser obrigatória a previsão legal e aprovação por parte do Poder Legislativo, a

Administração Pública é quem elabora o texto legal e o envia para aprovação, embutindo em

seu texto, elementos de seu interesse.

Todavia não poderá a Administração Pública decidir por si só um ou outro regime

jurídico que não esteja autorizado por lei.

Sãos pertinentes à Administração Pública, os princípios constitucionais explícitos no

caput do Art. 37 da CRFB, e outros fora dela chamados de implícitos.

79

Resta respondida, portanto a questão de como se caracteriza a estrutura da

Administração Pública brasileira, confirmando a hipótese de que é necessário ao bom

funcionamento da Administração Pública a delegação de poderes à entes vinculados.

Na prática a prestação ou execução dos serviços é efetuado diretamente pelo Estado,

através de órgãos ou entes públicos, que podem executar tais atividades por sua estrutura

própria, ou por terceiros que agem sob sua inteira responsabilidade.

No segundo momento, buscou-se conhecer as autarquias que são entes que fazem

parte da Administração Pública Indireta. Esses entes, dotados de personalidade jurídica

própria, foram instituídos com a reforma administrativa federal a partir do Decreto-Lei n.º 200

de 25 de fevereiro de 1967.

Em análise à doutrina especializada, encontra-se pacificado a questão conceitual das

autarquias, e ocorrendo uma mesma e única corrente doutrinária, pode-se dizer que autarquia

é uma pessoa jurídica de direito público, com autonomia de atuação, na condição de ente

público.

Ela não é órgão primário da Administração Pública, vem sendo sistematicamente

criada em nosso ordenamento jurídico, ante a necessidade que se insurge frente a fragilidade

de atendimento as demandas por parte do Estado.

A autarquia possui uma relação de vinculação com o ente estatal, haja vista que é pela

vinculação o seu caráter autárquico e não por subordinação.

Nesse sentido, é o que justifica a existência da autarquia, pois a especialização de

serviços que ela deve ter é algo que a difere do Estado, haja vista que o Estado na sua

amplitude tem resultados mais demorados.

Pode-se concluir assim, que em razão da necessidade do Estado, o mesmo cria as

autarquias para que a mesma assuma determinadas questões específicas, lhe sendo permitidas

para tanto, adaptarem-se as necessidades que a matéria trata, inclusive com possibilidade de

criação de regras próprias.

Observou-se que os privilégios das autarquias são os sustentáculos legal das atividades

inerentes as mesmas. Portanto, não trata-se de um simples mimo do legislador, mas sim de

institutos necessários, sem os quais as autarquias não figurariam como entes autônomos do

Estado.

80

Com relação à sujeição ao controle ou tutela, a autarquia não pode se desviar das

finalidades pelas quais ela foi criada, haja vista possuir por parte do Poder ao qual ela é

vinculada um controle ou tutela para assegurar que não cometa esse desvio.

Entende-se por autarquias de regime especial, àquelas que possuem alguns privilégios

a mais que as ditas autarquias de regime comum. Assim, denota-se que o que forma essa

diferença são realmente as vantagens que a lei instituidora pode conceder as autarquias para

exercer determinadas finalidades, assim, enquadrando-se nesse tipo de regime as chamadas

Agências Reguladoras.

Fica respondido aqui o questionamento de qual é a atuação da autarquia frente o

Estado, e confirmada a hipótese de que ela desenvolve o papel do próprio Estado, dentro de

suas limitações legais.

O processo de reforma do Estado que se iniciou no Brasil na década de 90, obrigou o

Estado a inovar o relacionamento jurídico-econômico com os prestadores de serviços. Houve

a necessidade de se fortalecer e propor mudanças no que diz respeito ao seu papel regulatório

frente à economia, pois o modelo até então utilizado para desempenhar suas atribuições se

tornou inconsistente e ineficaz, haja vista o excesso delas e conseqüentemente uma velocidade

cada vez mais lenta do sistema devido à burocracia estatal.

Contudo, a ideia da reforma foi para que o Estado deixasse de intervir

economicamente de forma direta, passando a intervir de forma indireta, isto é, incentivando

ou disciplinando as ações dos particulares, de modo a ser um Estado regulador e garantidor.

Assim, o Estado deixa de ter a responsabilidade da produção direta de bens e serviços e ao

mesmo tempo intensifica seus poderes de intervenção no domínio econômico através das

agências reguladoras.

As agências reguladoras passam a exercer a função de zelar pela boa qualidade dos

serviços prestados pelas empresas particulares, função esta que sempre foi desenvolvida pelo

Estado, ou seja, até a criação das agências, o Estado fazia o papel de controlador e

fiscalizador, porém, não com total eficiência exercia essa função, assim, por abranger todas as

funções de forma geral, sentiu-se a necessidade de que outra pessoa jurídica fosse cuidar

prioritariamente dos serviços prestados em favor da coletividade.

Sua atividade normativa dá-se em conformidade com a sua lei criadora, que lhe impõe

limites e regras para a condução de sua atividade normativa, como inclusive, impõe limite a

todas as suas demais atividades.

81

Neste sentido, cabe a própria agência reguladora, após sua criação, estruturar-se a fim

de buscar sua capacidade funcional para desenvolver suas atividades e entre elas a atividade

normativa.

Diante de todo o estudo, Primeiramente cabe ressaltar que a atividade regulatória das

agências reguladoras engloba o Poder Normativo, quase legislativo e o Poder Jurisdicional,

quase judicial que lhes são conferidos por Lei, ao tempo de sua criação.

Em se tratando da capacidade normativa, verifica-se que as agências reguladoras

possuem ampla autonomia, podendo estabelecer regras acerca da matéria abrangida na sua

estruturação, encontrando, entretanto, em razão da disposição hierárquica das normas e dos

poderes existentes da legislação brasileira uma forte resistência quanto à criação de regras.

Verifica-se então, que a capacidade de atuação das agências reguladoras fica no

entremeio da legislação que a criou e dos preceitos constitucionais presentes na atual

legislação brasileira, respeitando sempre os usuários e os prestadores de serviços, devendo

desempenhar suas funções.

Em suma, se extrai dos estudos feitos, que as agências reguladoras são entes de

fundamental importância existentes em nosso ordenamento jurídico, com a finalidade de zelar

pelos serviços prestados por particulares de forma que estes façam de acordo com o objetivo

do Estado, sendo este responsável pelo atendimento adequado aos usuários.

Resta, portanto, respondida a questão de como se caracteriza o poder regulatório das

agencias reguladoras, e confirmada a hipótese de que a as agências reguladoras, substituem o

estado na esfera econômica, agindo como ente controlador, e atuando como agente normativo

e regulador.

Por fim, apesar da explanação efetuada no presente trabalho ter atingido horizontes

abrangentes acerca da matéria, este não põe termo ao assunto, que, em face da sua

grandiosidade e importância, merece e carece de aprofundamentos maiores, de pesquisa mais

detalhadas, principalmente por se tratar de um tema relativamente novo no cenário jurídico

administrativo brasileiro, e de grande importância para a sociedade.

82

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