Washington de Barros Monteiro - Curso de Direito Civil - Direitos da Obrigações - 1ª Parte - Vol.4 - 2003 - fcknwrath.k6.com.br

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CURSO DE DIREITO CIVILDIREITO DAS OBRIGA ES 1? ParteWashington de Barros Monteiro.C/xpoente da bibliografia jur dica nacional, o Curso de Direito Civil, do Prof. Washington de Barros Monteiro, vem, h anos, educando geraes universitrias. Desnecessrio lembrar a importncia da matria na cincia jurdica ou no cotidiano; o Direito Civil o ramo de mais bela e slida formao histrica, formulando e emprestando conceitos para diversas reas jurdicas, e que, na verdade, acompanha o homem antes de seu nascimento, durante sua vida e aps sua prpria morte. magnitude da tarefa de quem se pro pe elaborar obra sistemtica nesta complexa c vasta disciplina acresce a dificuldade de se conseguir seja to didtica quanto informativa. Transportar o futuro ba charel para aquilo que o Direito tem de mais belo e til, faz-lo captar o que o Direito realmente lhe pode oferecer constitui, qui, o grande mrito do autor. No foi menos consagradora a acolhida que esta notvel coleo obteve junto aos pre -trios, onde constitui valioso auxiliar do causdico, do magistrado e do promotor. que a prpria carreira profissional do autor f -lo, talvez, perceber as agruras do acadmico e do advogado no estudo e na pesquisa de gabinete ou no foro. Iniciada em 1935, quando ingressou na magistratura paulista, aps brilhante aprovao em primeiro lugar no concurso res pectivo, prosseguiu em vrias comarcas do interior, como So Jos do Rio Preto, Presidente Wenceslau, Barretos e Itapetininga. Em 1945, o Prof. Washington de Ba rros Monteiro assumiu a Primeira Vara da Famlia e Sucesses, onde permaneceu at 1951. De 1947 a 1951 exerceu o cargo de juiz do Tribunal Regional Eleitoral e, com a criao do Tribunal de Alada, para este foi promovido, exercendo a presidncia nos binios 1952/53 e 1956/57. Em 1959 assumiu o cargo de desembargador do Tribunal de Justia do Estado, sendo colocado em disponibilidade por foraCURSO DIREITO CIVILDEsaraivajur.com.brVisite nosso portalWashington de Barros MonteiroProfessor emrito da Faculdade de Direito da Universidade de So PauloCURSO DE DIREITO CIVILDIREITO DAS OBRIGAES V ParteDAS MODALIDADES DAS OBRIGAES DA TRANSMISSO DAS OBRIGAES DO ADIMPLEMENTO E DA EXTINO DAS OBRIGAES DO INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAES322 edio, revista e atualizada por Carlos Alberto Dabus Maluf de acordo com o Novo Cdigo Civil (Lein. 10.406, de 10-1-2002)2003EditoraSaraivaISBN 85-02-02298-9 obra completa ISBN 85-02-04312-9 volume 4Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Monteiro, Washington de Barros, 1910-1999. a Curso de direito civil, v. 4 : direito das obrigaes, 1 parte : das modalidades das obrigaes, da transmisso das obrigaes, do adimplemento e da extino das obrigaes, do inadimplemento das obrigaes / Washington de Barros Monteiro. 32. ed. atual, por Carlos Alberto Dabus Maluf. So Paulo : Saraiva, 2003. 1. Direito civil 2. Direito civil - Brasil I. Maluf, Carlos Alberto Dabus. II. Ttulo.03-1618CDU-347 ndice para catlogo sistemtico: 1. Direito civil 347C9123Editora' SaraivaAvenida Marqus de So Vicente, 1697 CEP 01139-904 Barra Funda So Paulo - SP Tel.: PABX (11) 3613-3000 Fax: (11) 3611-3308 Fone Vendas: (11) 3613 -3344 Fax Vendas: (11) 3611 -3268 Endereo Internet: http://www.editorasaraiva.com.brFiliais AMAZONAS/RONDNIA/RORAIMA/ACRE Rua Costa Azevedo, 56 Centro Fone/Fax: (92) 633-4227/633-4782 Manaus BAHIA/SERGIPE Rua Agripino Drea, 23 Brotas Fone: (71) 381 -5854 / 381 -5895 Fax: (71) 381-0959 Salvador BAURU/SO PAULO Rua Monsenhor Claro, 2-55/2-57 Centro Fone: (14) 3234-5643 Fax: (14) 3234-7401 Bauru CEAR/PIAU/MARANHO Av. Filomeno Gomes. 670 Jacarecanga Fone: (85) 238-2323 Fax: (85) 238-1331 Fortaleza DISTRITO FEDERAL SIG QD 3 BI. B - Loja 97 Setor Industrial Grfico Fone: (61) 344-2920 / 344-2951 Fax: (61) 344-1709 Braslia GOIS/TOCANTINS Av. Independncia. 5330 Setor Aeroporto Fone: (62) 225-2882 / 212-2806 Fax: (62) 224-3016 Goinia MATO GROSSO DO SUL/MATO GROSSO Rua 14 de Julho, 3148 Centro Fone: (67) 382-3682 Fax: (67) 382-0112 Campo Grande MINAS GERAIS Rua Alfpio de Melo, 151 Jd. Montanhas Fone: (31) 3412-7080 Fax: (31) 3412-7080 Belo Horizonte PAR/AMAP Travessa Apinags, 186 Batista Campos Fone: (91) 222-9034 / 224-9038 Fax: (91) 241-0499 Belm PARAN/SANTA CATARINA Rua Conselheiro Laur ndo, 2895 Prado Velho Fone/Fax: (41) 332-4894 Curitiba PERNAMBUCO/PARABA/R. G. DO NORTE Rua Corredor do Bispo, 185 Boa Vista Fone: (81) 3421-4246 Fax: (81} 3421-4510Recife RIBEIRO PRETO/SO PAULO Av. Francisco Junqueira, 1255 Centro Fone: (16) 610-5843 Fax: (16) 610-8284 Ribeiro Preto RIO DE JANEIRO/ESPRITO SANTO Rua Visconde de Santa Isabel, 113 a 119 Vila Isabel Fone: (21) 2577-9494 Fax: (21) 2577-8867 / 2577-9565 Rio de Janeiro RIO GRANDE DO SUL Av. Cear, 1360 So Geraldo Fone: (51) 3343-1467 / 3343-7563 Fax: (51) 3343-2986 / 3343-7469 Porto Alegre SO PAULO Av. Marqus de So Vicente. 1697 (antiga Av. dos Emissrios) Barra Funda Fone: PABX (11) 3613-3000 So PauloAgradecimento A Mrcio Antero Motta Ramos Marques, advogado militante, meu companheiro de escritrio e parceiro na atualizao e reviso desta obra clssica do Direito brasileiro. Ao advogado Lair da Silva Loureiro Filho, pela colaborao na atualizao da jurisprudncia. Carlos Alberto Dabus MalufNDICE PRIMEIRA PARTE DAS MODALIDADES DAS OBRIGAES CONCEITO DE OBRIGAO. Idias gerais. Definio. Sua anlise....................................................................................... 3 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA OBRIGAO. Sujeito ativo. Sujeito passivo. Objeto. Vnculo jurdico. Da causa na obrigao............................................................................ 12 FONTES DAS OBRIGAES. Definio e generalidades. Fontes no direito romano. Sistema do Cdigo Napoleo e de outras legislaes contemporneas. Direito positivo brasileiro. Do risco profissional.................................................... 34 CLASSIFICAO DAS OBRIGAES. No direito francs. No direito romano. No direito brasileiro. Obrigaes simples e conjuntas. Obrigaes nicas e mltiplas. Obrigaes de meio e obrigaes de resultado. Outras classificaes . 49 DAS OBRIGAES DE DAR. Compreenso. Das obrigaes de dar coisa certa. Seu contedo. Obrigaes complexas. Obrigaes de entregar. Do princpio aliud pro alio. Compreenso dos acessrios. Perda da coisa. Deteriorao da coisa. Direito aos melhoramentos e acrescidos. Da obrigao de restituir. Da obrigao de contribuir. Das obrigaes pecunirias.............................................................................. 58 DAS OBRIGAES DE DAR COISA INCERTA. Conceito e compreenso. Preceitos legais que as regem. Direito de escolha. Outras disposies.................................................. 80 VIIDAS OBRIGAES DE FAZER. Conceito. Cumprimento pelo prprio devedor. Impossibilidade da prestao. Prestaes infungveis. Execuo por terceiro. Execuo pelo juiz 90 DAS OBRIGAES DE NO FAZER. Noo. Princpios legais. Disposies processuais............................................... 104 DAS OBRIGAES ALTERNATIVAS. Generalidades. Conceito. Unidade ou pluralidade de obrigaes. Direito de escolha. Da concentrao. Impossibilidade das prestaes. Escolha pelo credor. Legado alternativo. ltimas disposies ........................................................................................ 109 DAS OBRIGAES FACULTATIVAS. Generalidades. Conceito. Como se distinguem das obrigaes alternativas. Como se distinguem da clusula penal. Da dao em pagamento. Outras disposies............................................................ 128 DAS OBRIGAES DIVISVEIS E INDIVISVEIS. Noo e compreenso. Espcies de indivisibilidade. Da indivisi-bilidade em relao s vrias modalidades de obrigaes. Disposies legais................................................................... 134 DAS OBRIGAES SOLIDRIAS. Generalidades. Distino entre solidariedade e co-realidade. Unidade ou pluralidade de obrigaes. Natureza jurdica da solidariedade. Elementos componentes da relao solidria. Da necessidade de ser expressa a solidariedade. Modalidades de obrigaes solidrias.............................................................. 150 DA SOLIDARIEDADE ATIVA. Generalidades. Caracteres. Extino da obrigao solidria. Direito de regresso........ 171 DA SOLIDARIEDADE PASSIVA. Generalidades. Dos direitos do credor. Da solidariedade na obrigao alimentar. Responsabilidade do herdeiro. Conseqncias do pagamento parcial. Impossibilidade da prestao. Responsabilidade pelos juros. Direito de ao. Renncia da solidariedade. Direito de regresso. Outras disposies.............. 181 DA OBRIGAO NATURAL. Seu conceito no direito romano. Posio do problema em face do direito contemporVIIIneo. Conceituao em face do direito ptrio. Casos de obrigao natural perante o direito brasileiro.................... 205 DAS OBRIGAES PRINCIPAIS E ACESSRIAS. Generali dades. Conseqncias jurdicas. Espcies.......................... 216 DAS OBRIGAES LQUIDAS EILQUIDAS. Conceito. Aplicaes prticas no direito civil. Aplicaes no direito processual. No direito falimentar............................................... 221 DAS OBRIGAES CONDICIONAIS, MODAIS E A TERMO. Das obrigaes condicionais. Das obrigaes modais. Das obrigaes a termo................................................................. 226 SEGUNDA PARTE DA TRANSMISSO DAS OBRIGAES DA CESSO DE CRDITO. Generalidades. Crditos suscetveis de cesso. Espcies de cesso. Suas formas. Notificao do devedor. Responsabilidade do cedente. Outras disposies................................... ........................................... 235 DA ASSUNO DE DVIDA. Generalidades. Formas de constituio. Seus efeitos....................................................... 245 TERCEIRA PARTE DO ADIMPLEMENTO E DA EXTINO DAS OBRIGAES DO PAGAMENTO. Generalidades. Quem deve pagar. Daqueles a quem se deve pagar. Do objeto do pagamento e sua prova. Do lugar do pagamento. Do tempo do pagamento........................................................................................ 253 DO PAGAMENTO POR CONSIGNAO. Generalidades. Casos de consignao. Seus requisitos. Levantamento do depsito. Outros preceitos. Disposies processuais........ 269 DO PAGAMENTO COM SUB-ROGAO. Generalidades. Natureza jurdica. Definio e espcies. Sub-rogao legal. Sub-rogao convencional. Outras disposies......... 276 DA IMPUTAO DO PAGAMENTO. Definio e elementos. Imputao do devedor. Imputao do credor. Imputao legal............................................................................. ............. 283 IXDA DAO EM PAGAMENTO. Generalidades. Natureza jurdica. Definio e elementos. Seu objeto. Disposies legais a respeito....................................................................... 287 DA NOVAO. Histria. Definio e espcies de novao. Seus requisitos. Efeitos da novao..................................... 290 DA COMPENSAO. Utilidade do instituto e seu desenvolvimento histrico. Definio e pressupostos. Espcies de compensao. Casos de excluso da compensao. Outros princpios peculiares compensao.......................... 297 DA CONFUSO. Conceito e pressupostos. Espcies de confuso. Seus efeitos................................................................... 307 DA REMISSO DAS DVIDAS. Definio e notcia histrica. Remisso expressa e tcita. Entrega do objeto empenhado. Outras disposies........................................................... 310 QUARTA PARTE DO INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAES DO INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAES. No-cumpri-mento das obrigaes. Contratos unilaterais e bilaterais. Excluso da responsabilidade por caso fortuito e fora maior........................................................................................ 315 DA MORA. Definio e espcies. Requisitos da mora do devedor e da mora do credor. Efeitos jurdicos. Mora ex re e mora ex persona. Mora do credor e mora de ambos os contratantes. Purgao da mora. Diferena entre mora e inadimplemento.................................................................. 320 DAS PERDAS E DANOS. Seu conceito. Dano emergente e lucro cessante. Outras disposies.......................................... 327 DOS JUROS LEGAIS. Definio e classificao. Juros compensatrios. Juros moratrios. Outras disposies.................. 331 DA CLUSULA PENAL. Generalidades. Funo da clusula penal. Suas afinidades com outras obrigaes. Espcies.XValor da clusula penal. Momento em que ela se torna devida. Nulidade desta. Resoluo da obrigao principal. Reduo da clusula penal. Possibilidade de sua agra-vao. Pluralidade de devedores na obrigao com clusula penal. Prova do prejuzo. Ultimas consideraes 335 DAS ARRAS OU SINAL. Analogias e diferenas com a clusula penal e com as obrigaes alternativas. Conceito e espcies. Arras confirmatrias. Arras penitenciais. Possibilidade de cumulao das arras com outras indenizaes 356XIPRIMEIRA PARTEDAS MODALIDADES DAS OBRIGAESCONCEITO DE OBRIGAOIDIAS GERAIS. DEFINIO. SUA ANLISE.Idias gerais Todo direito, seja qual for sua natureza, pessoal ou real, encerra sempre uma idia de obrigao, como anttese natural. Direito e obrigao constituem, realmente, os dois lados da mesma medalha, o direito e o avesso do mesmo tecido. Sob esse aspecto, numa imagem feliz, houve quem afirmasse que as obrigaes so como as sombras que os direitos projetam sobre a vasta superfcie do mundo. Podemos deixar assentado, efetivamente, que no existe direito sem a respectiva obrigao, nem obrigao sem o correspondente direito. Bem exprime essa idia velho adgio jurdico: jus et obligatio sunt correlata. Mas, evidentemente, no sob to ampla acepo que se emprega o vocbulo no estudo do direito das obrigaes. As relaes obrigacionais, disciplinadas pelo Livro I da Parte Especial do Cdigo Civil de 2002, tm sentido peculiar e prprio, mais restrito e mais tcnico. As obrigaes a reguladas so as que vinculam uma pessoa a outra, atravs das declaraes de vontade e da lei, tendo por objeto determinada prestao. No prprio Cdigo Civil de 2002, bem como em outras leis, a palavra obrigao comporta vrios sentidos. Pode, com efeito, designar-lhe o lado ativo, tambm chamado crdito\ e o lado passivo, tambm denominado dbito, assim como o conjunto da relao jurdica, a abranger, destarte, o duplo aspecto (ativo e passivo), o vnculo e a prestao. Assim, por exemplo, no art. 27, n. IV, a palavra obrigaes pe em relevo o lado ativo da relao jurdica; nos arts. 24, 46, n. V, 75, 1. Obrigao o crdito considerado sob o ponto de vista jurdico; crdito a obri gao sob o ponto de vista econmico (GAUDEMET, Thorie Gnrale es Obligatinns, pg. 10).22,174,404,1.659, n. III, 1.668, n. II, 1.691,1.697,1.735, n. II, e 1.753, 32, o legislador salienta o lado passivo. Mais comumente, porm, o vocbulo designa o conjunto de todos os seus elementos constitutivos. Algumas vezes, embora impropriamente, como assevera BUTERA2, a palavra indica o instrumento que d vida ou o documento que comprova a obrigao, quando se diz, por exemplo, os documentos redigidos em lngua estrangeira (Cd. Civil de 2002, art. 224), obrigaes ao portador, obrigaes da dvida pblica, obrigaes emitidas pelos Estados ou Municpios (Const. Federal, art. 151, n. II), obrigaes de guerra (Dec.-lei n. 4.789, de 5-10-1942), obrigaes porturias (Dec.-lei n. 9.681, de 30-8-1946), obrigaes do reaparelhamento econmico (Lei n. 2.973, de 26-11-1956, art. 2) e obrigaes do Tesouro (Lei n. 3.337, de 12-12-1957, e Lei n. 4.357, de 16-7-1964). Finalmente, o vocbulo designa ainda, outras vezes, a causa geradora do vnculo jurdico, isto , o fato que serve de fundamento ao direito do credor e ao dbito do devedor3. Muitas so, portanto, suas acepes, utilizando-se o legislador ora de uma, ora de outra; alis, na linguagem jurdica, tornam-se freqentes essas polissemias. Cabe-nos, em seguida, feita essa breve digresso, definir a relao obrigacional, no seu sentido tcnico e especfico. Definio A definio mais antiga remonta s Institutas (Liv. 3-, Tt. XIII): Obligatio estjris vinculum, quo necessitate adstringimur alicujus solvendae rei, secundum nostrae civitatis jura.Esta definio, como observa DEMOGUE4, fez fortuna. Nela transparece uma extraordinria qualidade, sua conciso. A relao entre credor e devedor caracterizada como vinculum jris; evidencia-lhe o contedo como uma prestao (alicujus solvendae rei); externa-lhe, outrossim, a natureza ntima atravs da coercibilidade (necessitate adstring)5. Contudo, tornam-se tambm patentes seus defeitos: ressalta em demasia o lado passivo da relao obrigacional e deixa na sombra o2. 3. 4. 5. Cdice Civile Italiano Commentato, Delle Obbligazioni, 1/4. MACKELDEY, Manuel de Droit Romain, pg. 186; POLACCO, Le Obbligazioni nel Diritto Civile Italiano, pg. 21. Trait des Obligations en General, \- vol., pg. 3. RUGGIERO-MAROI, Istituzioni di Diritto Privato, 2/2.lado ativo. Alm disso, como adverte CLVIS6, no estabelece diferena especfica entre obrigao, no sentido tcnico, e qualquer dever juridicamente exigvel. Cresce assim sua deficincia na parte nuclear, as expresses alicujus solvendae rei. Outro conceito, igualmente bastante difundido, o atribudo a P AULO, que no chega propriamente a definir a obrigao, limitando-se to-somente a pr em relevo seus elementos: Obligationum substantia non in eo consistit ut aliquo corpus nostrum aut servitutem nostramfacial, sed ut alium nobis obstringat ad dandum aliquid vel faciendum vel praestandum (Dig. 44, 7, 3).Salientam RUGGIERO-MAROI7 as vantagens dessa definio: a) estabelece mais perspcua contraposio entre direitos reais e obrigacionais; b) descreve com maior preciso o contedo e o objeto do vnculo; c) revela a essncia ou substncia da obrigao (vnculo entre duas pessoas). Recentes pesquisas, levadas a efeito por SILVIO PEROZZI8, ALBER-TARIO 9 e ARANGIO -RUIZ10, trouxeram dvida acerca de tais conceitos, at agora pacficos. Sustentaram eles que referidas definies no so genuinamente romanas, correspondentes ao perodo clssico, mas interpolaes realizadas pela legislao de JUSTINIANO . O primeiro dos citados autores conclui mesmo seus estudos afirmando que, malgrado cdigos, leis, tratados e ensinamentos sobre obrigaes, dorme o respectivo conceito, h sculos, o sono da morte, encerrado em seu sarcfago romano. E remata: essa figura, que hoje lhe toma o nome, no seno sua sombra; mas da sombra tem a vaidade e a impreciso; a vaidade, porque no lhe do corpo a vida e o pensamento social; a impreciso, porque inutilmente se tenta, atravs de declaraes de ndole escolstica, traar-lhe os contornos. A palavra obligatio , com efeito, relativamente recente. No a empregou a Lei das XII Tbuas, nem ela figurava na terminologia jurdica mais remota. O vocbulo primitivo, empregado para externar o vnculo obrigacional, era nexum, derivado do verbo nectere (atar, unir, vincular)' 1.6. 7. 8. 9. 10. 11. Cdigo Civil Comentado, 4/7. Ob. e loc. cits. "Le obbligazioni romane", in Scritti Giuridici, 2/436. "Le definizioni dell'obbligazioni romane", in Studi di Diritto Romano, 3/3. Istituzioni di Diritto Romano, pg. 283. J. ORTOLAN, Explication Historique des Instituis, 2/129.Nexum representava a sujeio de si mesmo. O direito do credor contra o devedor era quase um direito real. A obigatio primitiva caracterizava-se como direito de garantia sobre a pessoa fsica do obrigado. A soma por este devida constitua o preo do resgate12. Se o credor no era pago em determinado prazo, assistia-lhe o direito de recorrer a um processo executivo extremamente violento, exercido contra a prpria pessoa do devedor. A obrigao implicava, assim, primitivamente, sujeio deste vingana sobre o seu corpo, em detrimento da prpria liberdade, qui mesmo da vida. S posteriormente surgiu a palavra obigatio (do latim ob ligatio), expresso que traduz idia de liame. Inicialmente, ela significava o vnculo que sujeitava a pessoa dada emfiduca ou nexum13. Paulatinamente, alterou-se-lhe a fisionomia, tornando-se mais humana e menos rigorosa e transformando-se assim num direito sobre os bens do devedor. Esse o aspecto da obrigao hodierna, muito diferente, pois, daquele que possua, quando se iniciou tal evoluo histrica. Com Uco BRASIELLO podemos repetir que a histria da obigatio a histria do progressivo abrandamento da fora do vnculo14. O vocbulo obigatio tem, portanto, origem numa poca mais prxima; entretanto, sua idia central conservou-se a mesma: submisso do devedor ao credor, pessoal a princpio, patrimonial aps a vigncia da lei Poetelia Papiria15, que, no sculo IV a. O, ao vnculo corporal substituiu a responsabilidade patrimonial. Os bens e no o corpo do devedor deveriam responder pelas suas dvidas (pecuniae creditae bona debitoris non corpus ob noxiumesse).Alguns Cdigos contemporneos deram-se ao trabalho de definir a obrigao. Assim, o Cdigo de Obrigaes da Polnia16, no12. BETTI, La Stnittura deWObbligazione Romana, pg. 77. 13. ARANCIO-RUIZ, Historia dei Derccho Romano, pgs. 85 e 86. 14. Nuovo Digesto Italiano, voe. "Obbligazione". 15. Antes da lei Poetelia Papiria, os devedores estavam expostos a dur ssima execuo pessoal, por intermdio da manus injectio. A condio do devedor era anloga do escravo. Com o advento da citada lei, que, segundo ARANCIO-R UIZ (Historia dei Derecho Romano, pg. 165), se inspirou em altos sentimentos humanitrios, o vnculo transfe riu-se do corpo do devedor para o respectivo patrimnio, o que levou TITO Lfvio a dizer a seu respeito que era "a aurora de uma nova liberdade" (CARLOS IBARGURN, Las Obligaciones y ei Contrato, pg. 18). 16. O Cdigo Polons, que entrou em vigor a 1 --7-1934, teve por base projeto preli minar de Parte Geral do Direito das Obrigaes, de que foi relator ERNEST T HIEL, coadjuvado por DOI. INSKI, STEFKO e LONGCHAMPS DE BRRER . NO dizer de CAHTANT, esse Cdigo, cujo valor cientfico ineg vel, representa, juntamente com o projeto franco -italiano de Cdigo das Obrigaes, o ltimo estgio da cincia jurdica em direito privado.art. 2-, l2, declara que ela consiste "dans le fait par le dbiteur de s'engager envers le crancier effectuer une prestation"17. Nessa definio, como se v, pe-se em evidncia o lado passivo da obrigao, isto , a relao jurdica que sujeita o devedor ao credor, o vnculo que prende o primeiro ao segundo. Diverso o critrio do Cdigo Civil Alemo, que, a exemplo dos economistas, prefere conceituar a obrigao pelo lado oposto18, isto , do credor em relao ao devedor, o direito de crdito, e assim estatui, no art. 241: "Em virtude da obrigao o credor tem o direito de exigir do devedor uma prestao"19. Entre ns, pretendeu CARLOS DE CARVALHO20 definir a obrigao, fazendo-o nos seguintes termos: "As obrigaes consistem em dar ou entregar bens, em fazer alguma obra, coisa ou ato, e em abster-se de algum fato; estabelecem um vnculo entre o credor e devedor". O Cdigo Civil Brasileiro de 2002 escusou-se, porm, de tentar o empreendimento, no que, sem dvida, andou bem. Realmente, pergunta RAV21, por que definir um conceito do qual o prprio homem comum tem intuio? No funo do legislador ministrar definies. Elas devem ser evitadas, porque de nada adiantam num texto e refogem misso simplesmente normativa deste. Definir constitui tarefa que pertence doutrina e no a um corpo de leis. Como diz ADOLFO REINACH 22, implica ausncia de formao filosfica exigirem-se definies onde ou no sejam possveis ou para nada sirvam. A comisso nomeada para reforma do Cdigo Civil Francs repeliu igualmente a idia da definio, por entender que est fora da tarefa do legislador estabelecer definies23.17. Code des Obligations de Ia Republique de Pologne, trad. de STEFAN SIECKOWSKI e JEAN WASILKOWSKI. 18. O Cdigo Civil Alemo, comumente designado pelas iniciais BGB (Biirgerliches Cesctzbuch), em que colaboraram WINDSCHEID e ROTH, entrou em vigor em 11-1900. o mais cientfico de todos os Cdigos, sendo muito pronunciada sua preocupao dogmtica. Houve quem o equiparasse a verdadeira obra de arte, e enorme foi a influ ncia que exerceu no pensamento jurdico moderno. 19. Code Civil Allemand, trad. de O. MEULENAERE. 20. Direito Civil Brasileiro Recop lado ou Nova Consolidao das Leis Civis, art. 856. 21. Istituzioni di Diritto Privato, pg. 410. 22. Los Fundamentos Apriorsticos dei Derecho Civil, trad. de JOS Lufs LVAREZ, pg. 116. No mesmo sentido, diz BARASSI (Propriet e Compropriet): "Non compito delia legge Ia ricostruzione sistemtica di un istituto. La legge comanda, non teoriza" (pg. 106). 23. Travaux de Ia Commission de Reforme du Code Civil, ano 46/47, pg. 130. Tal comisso foi nomeada logo aps a terminao da guerra, por iniciativa da Associao Capitant e dela fizeram parte as mais altas expresses da intelectualidade jurdica francesa.Dentre as ministradas pelos nossos autores, sobreleva a de CL-VIS: "Obrigao a relao transitria de direito, que nos constrange a dar, fazer ou no fazer alguma coisa economicamente aprecivel, em proveito de algum, que, por ato nosso, ou de algum conosco juridicamente relacionado, ou em virtude de lei, adquiriu o direito de exigir de ns essa ao ou omisso". Peca essa definio porque no alude ao elemento responsabilidade, ressaltado pela doutrina dualista, e que entra em jogo quando o devedor deixa de honrar seu compromisso. Nesse elemento tem a obrigao moderna um de seus sustentculos. Preferimos, por isso, por mais completa, a seguinte: obrigao a relao jurdica, de carter transitrio, estabelecida entre devedor e credor e cujo objeto consiste numa prestao pessoal econmica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo, ga-rantindo-lhe o adimplemento atravs de seu patrimnio. Sua anlise Efetivamente, obrigao relao jurdica. Com esse qualificativo, excluem-se do direito obrigacional deveres estranhos ao direito, como os do homem para com Deus, do homem para consigo mesmo e do homem para com os seus semelhantes, pertencentes ao domnio da Moral e assim desprovidos de sano. Dever de gratido, de urbanidade, de cortesia e de solidariedade, impostos pela lei moral, escapam incidncia da lei civil. Seu adimplemento confiado, exclusivamente, espontaneidade do agente, que no pode ser compelido a qualquer prestao24. Obrigao relao jurdica de carter transitrio. Satisfeita a prestao prometida, quer amigavelmente, quer pelos meios judiciais disposio do credor, exaure-se a obrigao; o devedor fica ento liberado e o credor assiste extino de seu direito. No h obrigaes perptuas. Como tudo quanto no mundo existe, elas nascem, vivem e morrem. Consoante afirma RADBRUCH25, O direito de crdito traz em si o germe de sua morte. Exercer-se, para ele, morrer. obligatio sempre se contrape a solutio (do verbo solvere, desatar, soltar), isto , a exonerao do devedor atravs do pagamento. A obligatio liga, a solutio desata. Por isso, a durao dela sempre transitria, estando fadada a desaparecer, quando intervier a segunda.24. Entretanto, a ingratid o do donatrio pode ocasionar a revogao da liberali-dade (Cd. Civil de 2002, arts. 555 e 556). O mdico que salva a vida do enfermo no pode invocar o dever de gratido deste para pleitear melhor remunerao. De outra forma, estaria a tarifar o dever moral (Rev. For., 158/227). 25. Filosofia do Direito, trad. de CABRAL DE MONCADA, 2/50.No pode, pois, ocorrer a perpetuidade da obrigao. Ainda que ela incidisse sobre atos contnuos, prolongados e reiterados, cuja persistncia fosse indeterminada, como na locao de servios, sempre haveria um limite sua durao. Nemo potest locare opus in perpetuum. Alocao indefinida poderia degenerar em servido. Por isso, fixa-lhe a lei durao mxima (Cd. Civil de 2002, art. 598). Da mesma forma, contrato de sociedade, embora destinado a durao indefinida, chega um dia a seu termo, pela ocorrncia de algum dos motivos legais de dissoluo (art. 869). O prprio usufruto, constitudo em favor de pessoa jurdica, extingue-se com esta, e, se ela sobreviver, aos trinta anos da data em que se comeou a exercer (art. 1.410, n. III). A efemeridade, maior ou menor, , assim, inerente a todas as obrigaes. J os direitos reais, sobretudo a propriedade, tm um sentido de perenidade. Constituem-se para durar indefinidamente. No dizer de RADBRUCH , precisamente no respectivo exerccio se manifesta sua permanente afirmao. Exercerem-se, para eles, a prpria vida. A obrigao constitui ainda uma relao que se estabelece entre duas pessoas, credor e devedor, que compem o inevitvel binmio de todas as relaes obrigacionais. Tambm nesse ponto o direito obrigacional distingue-se dos direitos reais. Exercem-se estes erga omnes, contra todos os membros da coletividade, indistintamente, ao passo que aquele atua contra determinada pessoa exclusivamente, vinculada relao jurdica. A obrigao corresponde assim relao de natureza pessoal, mas com esta particularidade: no caso de inadimplemento, ela induz responsabilidade patrimonial do devedor. Por isso mesmo, GAUDEMET e POLACCO26 vislumbraram na obrigao um vnculo entre dois patrimnios, de preferncia a um vnculo entre duas pessoas ou duas vontades. Chegaram eles assim despersonalizao do vnculo; olha-se a corrente, no as pessoas que seguram suas extremidades27. Deve ser arredada essa teoria, que faz abstrao da personalidade do credor e do devedor. Como advertem PLANIOL-RIPERT28, a idia que procura encerrar a obrigao num vnculo entre dois patrimnios implica manifesto exagero da abstrao jurdica. Cumpre no perder de vista que o direito disciplina relaes humanas, relaes dos homens entre si, no relaes entre coisas, singulares ou coletivas.26. 27. 28. Thorie Gnrale des Obligations, pg. 13; Le Obbligazioni, pg. 69. TRABUCCHI, Istituzioni di Diritto Civile, pg. 433; DEMOGUE , ob. cit., 1/17. Trait Pratique de Droit Civil, 6/3.Essa teoria, dizem ainda MAZEAUD ET MAZEAUD 29, apresenta interesse doutrinrio certo e prope explicao cmoda para determinadas instituies (fundao, estipulao em favor de terceiro, declarao unilateral da vontade, cesso de dvida). Mas, no plano prtico, torna-se duvidoso que a tese apresente o mesmo interesse. O objeto da obrigao consiste numa prestao pessoal. S a prpria pessoa vinculada, ou seu sub-rogado, adstrita est ao cumprimento da prestao. A obrigao submete exclusivamente o devedor, ou seu sucessor. Como, porm, ela no pode exercer-se diretamente sobre a prpria pessoa, por atentatrio dignidade humana, torna-se efetiva mediante atuao sobre o respectivo patrimnio. Em tais condies, embora a obrigao objetive uma prestao pessoal do devedor, na execuo por inadimplemento desce-se aos seus bens. Nota-se, a propsito, assinala TRABUCCHI30, principalmente nos ltimos tempos, quanto a essa tutela judicial, visvel aproximao entre os direitos reais e os obrigacionais. Com efeito, atravs da execuo, sob forma especfica, embora em certas obrigaes de carter pessoal, obtm o credor, na prtica, em alguns casos, proteo jurisdicional correspondente que obteria titular de um direito real, com poder imediato sobre a coisa. Distintas permanecem, todavia, as duas formas de tutela: a sentena condenatria em forma especfica deciso declaratria, com um pressuposto de natureza constitutiva, ao passo que a reivindicao tem carter preponderantemente declaratrio. A obrigao ainda relao de natureza econmica; seu objeto exprime sempre um valor pecunirio. Obrigao cujo contedo no seja economicamente aprecivel refoge ao domnio dos direitos patrimoniais. A prestao h de ser sempre suscetvel de aferio monetria; ou ela tem fundo econmico, pecunirio, ou no obrigao, no sentido tcnico e legal. Como ensinam ENNECCERUS-KIPP-WOLFF31, O Estado no se ocupa da satisfao de simples caprichos, nem tem a misso de realizar atos puramente religiosos e morais, que se subtraem rbita do direito. Existem, sem dvida, prestaes cujo substractum meramente afetivo ou moral. Mas, reconhecida judicialmente sua exigibilidade, adquirem para logo expresso econmica, valor patrimonial. O dano moral s era ressarcvel quando produzia reflexos de or29. 30. 31. Leons de Droit Civil, 2/12. Ob. cit., p g. 428. Derccho de Oblgaciones, 1/5.10dem patrimonial. Fora desse caso, dizia LAFAYETTF32, haveria mera extravagncia do esprito humano33. A patrimonialidade constitui assim o carter especfico da obrigao. Atravs desse elemento, distingue-se a obrigao, no sentido tcnico, dos deveres de outra natureza, morais, religiosos, sociais e at jurdicos de ndole diversa (dever de fidelidade entre cnjuges, art. 231, n. I; dever do falido de proceder com zelo e lealdade durante o processo de falncia, Dec.-lei n. 7.661, de 21-6-1945, art. 34, n. VII). Quanto ao objeto da prestao, pode ele ser positivo ou negativo (dar, fazer ou no fazer). Nessa frmula, encerradas se acham as vrias modalidades de obrigao, na sua infinita diversidade: simples, condicionais, modais, a termo; principais e acessrias; lquidas e ilquidas; divisveis e indivisveis; conjuntas, alternativas e facultativas; obrigaes com pluralidade de sujeitos. Esse objeto da prestao, positivo ou negativo, constitui precisamente a coisa ou o fato devido pelo obrigado ao credor; o elemento objetivo, a ser prestado pelo primeiro ao segundo, ou que este tem direito de exigir daquele. Como garantia do adimplemento, o credor tem sua disposio o patrimnio do devedor. O direito creditrio torna-se efetivo mediante atuao sobre os bens do obrigado. A incluso desse elemento na definio projeta a obligatio, que, juntamente com o debitum, integra a obrigao jurdica. Se quisssemos abreviar o conceito, diramos que obrigao o direito do credor contra o devedor, tendo por objeto determinada prestao.32. Direito das Coisas, 305, nota 8. 33. A propsito do tema, cumpre assinalar a evoluo que se verificou com a Cons tituio Federal de 1988, que contempla a viabilidade de indenizao para o dano moral, ainda que dele no advenham prejuzos materiais.11ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA OBRIGAOSUJEITO ATIVO. SUJEITO PASSIVO. OBJETO. V NCULO JURDICO. DA CAUSA NA OB RIGAO.Sujeito ativo Definida a obrigao, cabe agora, em seguida, analisar os vrios elementos em que ela se desdobra. So eles: duplo sujeito (credor e devedor), objeto da prestao e vnculo jurdico. Nenhuma relao obrigacional pode existir, ou sobreviver, sem a inevitvel presena de todos esses elementos. Estudemos primeiramente a figura do sujeito ativo ou credor, isto , a pessoa a quem deve ser fornecida, ou tem direito de exigir, a prestao, em suma, o beneficirio da obrigao. A palavra credor vem de creitor, do verbo credere, que quer dizer: confiar, crer, ter f. Trata-se de vocbulo relativamente recente, que no figurava na linguagem jurdica mais remota. Primitivamente, nas fontes, designava-se o sujeito ativo da relao obrigacional pelo substantivo rus. Qualquer pessoa, maior ou menor, capaz ou incapaz, casada ou solteira, nacional ou estrangeira, tem qualidade para apresentar-se ativamente numa relao obrigacional; de modo geral, restrio alguma existe a respeito. Tambm as pessoas jurdicas, de qualquer natureza, civil ou comercial, de direito pblico ou privado, de fins econmicos ou no econmicos, podem legitimamente figurar como sujeito ativo de um direito obrigacional. Nas mesmas condies encontram-se as sociedades irregulares ou de fato, que podem demandar e ser demandadas, salvo se a questo versar sobre a existncia da prpria sociedade. O sujeito ativo pode ser individual, como nas obrigaes simples, e coletivo, como nas conjuntas e solidrias. Admite-se, outros-sim, seja um no comeo da relao jurdica e outro na execuo, como 12nos casos de herana e cesso, salvo nas obrigaes personalssimas1. Mas podem as partes convencionar que o crdito no seja cedido (Cd. Civil de 2002, art. 286). A transmisso das obrigaes constitui fato normal, porm no essencial, nada impedindo, pois, se convencionepactum de non cedendo.Por fim, a obrigao pode existir em favor de pessoas ou entidades futuras, ou ainda no existentes, como nascituros e pessoas jurdicas em formao. Em casos expressos, o credor pode ser substitudo, como no de estipulao em favor de terceiro (Cd. Civil de 2002, art. 438). Cabvel, outrossim, sua transformao, incorporao, fuso e ciso como nas sociedades annimas, segundo o disposto na Lei n. 6.404, de 15-12-1976, arts. 220 e segs. De outro lado, geralmente, desde o comeo, conhecido, certo e individuado o credor. H casos, porm, em que, ab initio, ele no se identifica claramente. Tal circunstncia, bem de ver, no afetar estruturalmente a essncia ou a sntese da obrigao. Por exemplo, num cheque ao portador, credor ser aquele que, tendo a posse do ttulo, se apresenta ao sacado para o respectivo pagamento (Lei n. 7.357, de 2-9-1985). Numa cambial em branco, ser aquele que preencher o saque, credenciando-se assim ao recebimento da quantia representada pelo ttulo2. Em suma, em todos1. Obrigaes personalssimas so as inerentes pessoa do credor, ou do deve dor. Acham-se elas de tal modo agregadas ao sujeito (ativo ou passivo) que se no pode compreender sejam transmitidas a outrem. No passam, portanto, da pessoa dos respectivos titulares. So as seguintes: a) obrigao de fazer, quando a prestao for infung vel (art. 247 do Cd. Civil de 2002); b) preempo (art. 520); c) obrigao origi nada da ingratido do donatrio (art. 560); d) do locador de servios (art. 607); e) do mandato, salvo existindo poder de substabelecer (art. 682, n. II); f) do usufruto vitalcio; g) benefcio da justia gratuita (Lei n. 1.060, de 5 -2-1950, art. 10). Digna de registro a notvel evoluo que a respeito se processou no direito. Antigamente prevalecia a intransmissibilidade das obrigaes. Constituam estas vnculo inseparvel da pessoa do credor, ou do devedor. Seu corretivo, no antigo direito, eram a novao e o mandato in rem suam. Hoje, porm, desapareceu a primitiva intransmissibilidade. Presentemen te, o direito procura favorecer a transmisso, desenvolvendo, assim, ao mx imo a funo econmica da relao obrigacional. 2. Ningum pe mais em dvida que a letra de cmbio pode ser emitida em bran co, cabendo assim ao portador preench-la. Como diz FERRUCIO BOLCHINI (La Cambiale in Bianco, "Studi in onore de Vittorio Scial oja", 2/773), a validade cambiaria da letra em branco, ainda que preenchida aps a emisso do ttulo, indiscutvel e decorre dos prprios princpios do direito cambirio. Exige -se apenas que tal preenchimento se realize antes do ingresso do portador em j uzo (Rev. dos Tribs., 134/169-188/703-204/ 466-207/446-211/410-239/450-245/440-310/536-320/455-356/179-358/350). A Smula n. 387 do STF assim dispe: "A cambial emitida ou aceita com omisses, ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa f antes da cobrana ou do protesto".13os ttulos ao portador, como ttulos de capitalizao (Dec.-lei n. 261, de 28-2-1967), bilhetes de rifas ou de loterias (Dec.-lei n. 6.259, de 10-2-1944, art. 23, e Dec.-lei n. 204, de 27-2-1967, art. 62), aes ao portador das sociedades annimas (Lei n. 6.404, de 15-12-1976, art. 20, modificado pelo art. 42 da Lei n. 8.021, de 12-4-1990, ficando as aes nominativas apenas), credor ser sempre aquele que tiver a posse respectiva. Como diz CLVIS3, nessas relaes jurdicas, o credor pessoa incerta, que se determina pela apresentao do ttulo. Numa promessa de recompensa, formulada atravs de anncios pblicos, credor vem a ser aquele que, tendo prestado o servio reclamado, assim se recomenda ao recebimento do prmio prometido (Cd. Civil de 2002, art. 855) 4. Finalmente, para que se no alongue em demasia a enumerao, em contrato de seguro de vida (arts. 789 a 802 do Cd. Civil de 2002), na falta das pessoas indicadas no Decreto-lei n. 5.384, de 8-4-1943, beneficirias sero as que, dentro de seis meses, reclamarem o pagamento, provando que a morte do segurado as privou de meios para sua subsistncia. Como bem se v por esses exemplos, hauridos em nossa prpria legislao, no se exige que o credor seja inicialmente determinado. Basta seja ele determinvel, adiando-se ou prorrogando-se sua identificao para o momento da execuo5; ento sim, no instante em que se satisfizer a prestao, ou no instante em que se exigir o cumprimento, determinado dever estar o respectivo credor0. Esse princpio subsiste ainda que a obrigao seja inicialmente impessoal, ou no exista documento cuja deteno possibilite a identificao do credor, como nos exemplos apontados por CARMELO SCUTO7,3. Cdigo Civil Comentado, 5/263. 4. Existe controvrsia na doutrina sobre a natureza jurdica da promessa de re compensa. Nela vislumbram alguns negcio jurdico unilateral, que obriga o promitente desde o instante em que se torna pblica sua declara o de vontade, independente de aceitao. Sustentam outros que nela subsiste simples oferta de contrato, endereada ao pblico, isto , a pessoas indeterminadas, s se constituindo o vinculo obrigatrio no momento em que a proposta aceita. Para a primeira corrente, a promessa toma -se irrevogvel desde o instante de seu anncio; para a segunda, ela pode ser revogada, enquanto no se aperfeioa o contrato (ALBERTO M ONIEL , Amniario di Diritto Comparato, vol. 6-, Parte 1, fases. II e IIT, pg. 558). O nosso C digo Civil de 2002 inclui a promessa de recompensa entre as obrigaes por declarao unilateral da vontade (arts. 854 e 860). 5. DEMOGUE, Trai t des Obligations, 1/15. 6. ALVES M OREIRA, Institui es de Direito Civil Portugus, vol. 2-, pg. 16. 7. Istituzhmi di Diritto Privnto, vol. II, Parte I, pg. 15.14da oferta de mercadoria ao pblico, mediante emprego de aparelhos automticos, ou de bolsa de estudos em favor do aluno de certa escola que mais se distinguir durante o curso. Em ambos os casos, inexiste individualizao do credor, que, no entanto, posteriormente, se determina. A obrigao torna-se assim juridicamente perfeita. Encarada do ponto de vista do credor, isto , do ponto de vista ativo, a relao obrigacional constitui um direito, que, comumente, se denomina direito de crdito, ou, mais simplesmente, crdito, apenas8. Ao seu titular confere-se o direito de exigir a prestao, fun-dando-se simultaneamente na confiana do devedor e na sua idoneidade financeira. Sujeito passivo Relativamente ao sujeito passivo, ou devedor, por igual, qualquer pessoa, natural ou jurdica, bem como as sociedades de fato9, pode assumir essa posio. A palavra advm de debitor, exprimindo idia de carga, liame, dvida, sujeio. Como acontece com o credor, no se torna necessrio que o sujeito passivo seja rigorosamente determinado, de modo certo e inconfundvel, logo que nasce a relao. A exemplo do que sucede com o credor, embora em menor escala, basta a simples possibilidade de sua ulte-rior determinao10. A hiptese mais comum dimana das chamadas obrigaes reais (propter rem, ob rem, rei cohaerens ou cohaerentes). J no direito romano, por lei, elas achavam-se jungidas a uma relao real, como a propriedade, a posse e a enfiteuse. O longo decurso dos sculos no lhes alterou a fisionomia primitiva. Nessas obrigaes, o sujeito, ativo ou passivo, mutvel, de acordo com as sucessivas transmisses experimentadas pelo direito real. Nelas, ser credor, ou ser devedor, depende fundamentalmente8. Nos primeiros tempos, limitava -se o credor a escrever sobre tabuinhas o nome do devedor. Eis por que ent o se adotou o vocbulo iiomen para designar o crdito (LOMONACO, stituzkmi di Diritto Civilc Italiano, 7/186). 9. Os credores de uma sociedade de fato, escreveu PEDRO LHSSA (Dissertaes e Polmicas, pg. 130), acham-se na feliz posio jurdica de poder valer -se da existncia da sociedade, ou desconhec-la, segundo lhes convier. Se provam a existncia da sociedade, podem agir contra ela, como entidade distinta das pessoas dos scios, e at re -querer-lhe a falncia. Nas sociedades irregulares, ensina CARVALHO DE MENDONA (Tratado de Direito Comercial, vol. 3-, n. 785), respondem todos os scios, solidariamente, pe las operaes e atos praticados. Decises h sufragando esse entendimento (Rei', dos Tribs., 117/564-152/599). A prova de sua existncia pode ser feita pelos meios probatrios comuns de direit o. Mas elas no esto inibidas de comparecer em juzo, em litgio con tra terceiros, a menos que a questo verse sobre a prpria existncia da sociedade. 10. AI.BF.RTO TRABUCOU, Istituzioni di Diritto Civilc, pg. 449.15da posio da pessoa com referncia a determinada coisa. No dizer de MESSINEO", O devedor torna-se tal, porque investido de um direito real. So obrigaes a cargo de uma pessoa enquanto proprietria de determinada coisa, ou titular de certo direito real de gozo sobre ela. Identifica-se o sujeito passivo segundo a posio da pessoa em relao coisa. A situao do devedor acha-se presa a uma posio de direito real12. Veja-se o clssico exemplo do condomnio sobre determinado muro ou parede. Por fora de lei (Cd. Civil de 2002, art. 1.327, c/c o art. 1.297), responde o condmino, proporcionalmente, pelas despesas respectivas de conservao. Mas tal responsabilidade subsiste apenas enquanto ele seja proprietrio. Se, porventura, aliena o imvel em que se encontre a parede, ou o muro, transfere tambm ao adquirente a obrigao de contribuir nos dispndios de sua manuteno. Medite-se ainda no exemplo de SCUTO13, acerca da obrigao a cargo do proprietrio do prdio serviente, oriunda do contrato ou da lei, de custear os gastos para uso e conservao de servido real (Cd. Civil de 2002, art. 1.382). Alienado o imvel, o alienante transfere conjuntamente questionada obrigao. De natureza idntica a obrigao de indenizar benfeitorias (Cd. Civil de 2002, art. 1.219), que passa de uma pessoa para outra, com a transferncia do domnio14. Por isso mesmo se diz que tais obrigaes so ambulatrias, expresso que Ferrini extraiu das fontes romanas15. Costumam os autores apontar outros exemplos de obrigaes reais: a de reparar parede na servido onerisferendi, a que d origem ao quod metus causa e ao acquae pluviae arcendae. s vezes, menciona-se tambm a obrigao de pagar o canon enfitutico (Cd. Civil de 1916, art. 678, nas enfiteuses ainda existentes; art. 2.038 do Cdigo Civil de 2002). Em nosso modo de ver, entretanto, tal encar11. lstituzioni di Diritto Privato, pg. 311. 12. BETTI , Teoria Gencrale delle Obbligazkmi, 1/22. 13. Ob. cit., pg. 450. 14. ALBERTO TRABCCHI, ob. cit., pg. 450. Entretanto, a jurisprudncia tem entendi do que "no pode o locatrio exercer direito de reteno contra o adquirente do prdio, por benfeitorias realizadas; deve voltar -se contra o alienante" (Rev. dos Tribs., 188/722-190/723-195/419-218/528-230/444-236/469-240/204 e 405-244/252-248/233; Rev. For., 139/316; Smula n. 158). 15. ANDRA TORRENTE, Manuale di Diritto Privato, pg. 300.16go no constitui obrigao real, mas nus real, porque incide diretamente sobre a coisa16. Nosso direito positivo muito rico em obrigaes reais. Assim, o proprietrio de apartamento, num edifcio em condomnio, sujeita-se s numerosas obrigaes mencionadas no art. 1.336 do Cdigo Civil de 2002, no podendo, destarte, alterar a forma externa da fachada, decorar as partes e esquadrias externas com tonalidades ou cores diversas das empregadas no conjunto da edificao, destinar a unidade a utilizao diversa de finalidade do prdio, ou us-la de forma nociva ou perigosa ao sossego, salubridade e segurana dos demais condminos e embargar o uso das partes comuns. Outro exemplo tirado de nossa legislao diz respeito ao proprietrio de coisas incorporadas ao patrimnio histrico e artstico nacional. De acordo com o Decreto-lei n. 25, de 30-11-1937, no pode ele, sem prvia autorizao da autoridade competente, destru-las, demoli-las ou mutil-las, nem realizar obras que lhes modifiquem a aparncia (art. 17). A infrao configura delito previsto no art. 166 do Cdigo Penal, acarretando ainda outras sanes de natureza civil. Ultimo exemplo: qualquer rvore poder ser declarada imune a corte, mediante ato do poder pblico, por motivo de sua localiza16. No se confundem as obrigaes reais com os nus reais. Efetivamente, quem est sujeito ao nus real responde por toda a dvida, inclusive pelas prestaes vencidas anteriormente, sob a responsabilidade de outros titulares; ao inverso, sujeito passivo de obrigao propter rem responde exclusivamente pelo dbito atual; pelas prestaes precedentemente vencidas s podem ser responsabilizados pessoalmente os prprios devedores, sendo inadmissvel sua transmisso ao atual detentor da coisa. Por isso mesmo, ensina MESSINEO (ob. cit., pg. 31 1) que no nus real a coisa que se encontra gravada, enquanto na obrigao real a pessoa que se acha vinculada. Conseqente mente, no primeiro caso, uma vez que s a prpria coisa est onerada, segue-se que o proprietrio no responde alm dos limites do respectivo valor; j nas obrigaes propter rem, consoante a regra geral, responde o devedor com todos os seus bens (ANDRA TORRENTE, ob. cit., pg. 300, nota 1). Outro trao distintivo: nos nus reais existe em regra para o devedor direito de abandono , a fim de subtrair -se ao gravame. o que acontece, por exemplo, com a servido (Cd. Civil de 2002, art. 1.382). O mesmo no acontece com as obrigaes propter rem, porque, de outra forma, estar -se-ia a admitir, disfaradamente, uma dao em pagamento, q ue no pode ser efetivada sem expressa anuncia do credor (Cd. Civil de 2002, art. 356). Finalmente, o derradeiro sinal diferenciador repousa na diversa natureza das aes que tutelam um e outro encargo. Nas obrigaes propter rem, a ao de ndole pessoal e nos nus reais, in rem scriptae. Importantes efeitos prticos resultam dessa diferenciao, quanto ao foro competente, necessidade de outorga uxria etc. No se perca de vista, porm, que na obrigao real, malgrado o qualificativo, conserva sempre o vnculo sua natureza pessoal, porquanto nela subsiste, predominantemente, a relao entre credor e devedor, o jurs vinculum. Inegvel, todavia, que constitui figura similar ao nus real (BUTERA, Cdice Civile Italiano Commeittato, 1 /4).17o, raridade, beleza ou condio de porta-sementes (Lei n. 4.771, de 15-9-1965, art. 7). Fiquemos por aqui, embora ainda pudssemos prosseguir com a enumerao (Cd. de Minerao, art. 27; Lei n. 8.245, de 18-10-1991, art. 72; Cd. Civil de 2002, arts. 1.281 e 1.285, entre outros). Em todas essas obrigaes, que se oferecem sob as mais diversas roupagens, o sujeito passivo no determinado, porque transeunte, varivel; mas, em dado instante, torna-se determinado, indivi-dualizando-se ento o elemento pessoal passivo da relao jurdica. Objeto Examinado o elemento pessoal da obrigao, cabe-nos passar agora ao material, o objeto, que o devedor tem de fornecer ao credor e que este pode exigir daquele. Como diz BETTI17, na relao jurdica, aquela obrigao do sujeito passivo o prius; a correlata expectativa do sujeito ativo, o posterius. Na definio das Institutas, mencionada anteriormente, esse elemento objetivo desponta sob a expresso alicujus solvendae rei. Nela vem externada sua substncia, seu contedo, que, na linguagem moderna, mais expressivamente, se traduz por prestao. Pode esta consistir num dar, fazer ou no fazer. Dare, facere, praestare so palavras sacramentais que, nas fontes e nos textos, indicam e abrangem, em sua generalidade e complexidade, o objeto que as obrigaes podem ter18. Hoje, como ontem, em nosso direito positivo, como em todas as legislaes, a esto as diversas modalidades, em seus tipos tradicionais, em suas formas mais gerais, que ou so impostas pela lei, ou ento vm modeladas pelas partes, ao influxo de suas convenincias ou de seus interesses. Antes de mais nada, urge no confundir objeto da obrigao com objeto do contrato. Distinguiu-os BEUDANT19, com a habitual clareza: a) objeto da obrigao aquilo que o devedor se compromete a fornecer, aquilo que o credor tem direito a exigir, em suma, a prestao devida; objeto do contrato constitui a operao que as partes visaram a realizar, o interesse que o ato jurdico tem por fim regular; b) objeto da obrigao isolado, concreto, singular, o do contrato, idntico em todas as estipulaes da mesma espcie; c) objeto da obrigao vem a ser especfico, individuado, o do contrato, mais amplo e mais genrico.17. 18. 19. Ob. cit., 1/16. J. ORTOLAN, Explication Historique des hist tuts, 2/130. Cours de Droit Civil, Lcs Contrats et les Obligatious, pg. 101.18Trs predicados h de reunir o objeto da obrigao: possvel, lcito e suscetvel de estimao econmica. O primeiro diz respeito possibilidade da prestao, mesmo porque a impossibilia nulla obligatio ou nemo potest ad impossibe obligari. A impossibilidade pode ser fsica ou material e legal ou jurdica. Haver impossibilidade fsica ou material sempre que a esti-pulao concernir a prestao que jamais poder ser obtida ou efetuada, por contrariar as leis da natureza (por exemplo, trazer o oceano at So Paulo impossibe habetur id, cui natura impedimento est quominus existat), ultrapassar as foras humanas (por exemplo, a realizao de viagem a outras galxias) ou ser irreal sua existncia pro non adjectis habentur (como no exemplo de BHLIME20: prometo-lhe um centauro para a sua coleo de histria natural). Estipulaes desse jaez, formuladas tipicamente jocandi causa, no obrigam o promi tente. Ocorre impossibilidade legal ou jurdica sempre que a estipu-lao se refira a objeto proibido por lei, como, por exemplo, a alienao de bens pblicos (Cd. Civil de 2002, arts. 100 e 101), de bem de famlia (art. 1.717 do Cd. Civil de 2002) e de bens onerados com clusula de inalienabilidade, salvo com observncia das exigncias legais (art. 1.911). Nas mesmas condies: cesso de herana de pessoa viva (art. 426), disposio concernente a loteria no autorizada (Dec.-lei n. 6.259, de 10-2-1944, art. 69; Dec.-lei n. 204, de 27-2-1967, art. 32) e alienao de aes de sociedades de seguros, com infrao ao art. 92 do Decreto-lei n. 2.063, de 7-3-1940. Em todos esses casos, e em muitos outros que se poderiam indefinidamente enumerar, a estipulao colide com terminantes disposies legais, estando por isso, de antemo, condenada. No se imagine, porm, que a impossibilidade legal dependa de texto expresso, que a proclame ou consagre. Muitas vezes, existe impossibilidade jurdica, sem que explcita haja sido a lei. o caso, por exemplo, da cesso a terceiros ou estranhos das vantagens outorgadas aos agricultores pelas leis do reajustamento econmico21, ou do marido que pretenda adquirir do prprio casal, consorciado pelo regime da comunho universal, bem pertencente ao fundo comum22.20. 21. 22. Philosophie du Droit, 2/461. Revista dos Tribunais, 146/696. Revista dos Tribunais, 148/195.19Tenha-se presente que a impossibilidade deve ser real e absoluta; se se trata de mera dificuldade (difficultas praestandi), super-vel com algum esforo, desgio ou maior dispndio; se se trata at mesmo de impossibilidade, porm relativa, vale dizer, circunscrita ao devedor to-somente, no incide o objeto em condenao, nem acarreta eventual exonerao do devedor23. O direito no toma em considerao, no leva conta de impossibilidade, capaz de liberar o devedor, simples incapacidade ou insuficincia patrimonial. No o exonera, pois, falta de meios para pagar. O devedor responde sempre em tal hiptese. O credor no pode perder seu direito por incapacidade do devedor em sol ver o que deve24. No se perca de vista, outrossim, que a impossibilidade anterior no desobriga o devedor, mas apenas a superveniente25. Esta, no entanto, isenta o devedor; assim como a obrigao no pode surgir se impossvel a respectiva prestao, da mesma forma se extingue o vnculo se a impossibilidade sobrevm posteriormente (poena rei impossibilis non committitur)26 . Cabe ao devedor comprovar a impossibilidade. Se esta decorre de circunstncia que ele prprio criou, a obrigao subsiste, alterando-se embora o respectivo contedo27. Em segundo lugar, a prestao deve ser lcita, isto , conforme moral, ordem pblica e aos bons costumes. Ilcitas so as convenes que objetivem usura, contrabando, cmbio negro e lenocnio, que incrementem a advocacia administrativa ou fomentem o concubinato. Nesse caso estar o chamado casamento por contrato. Por seu intermdio, duas pessoas de sexo oposto combinam viver debaixo do mesmo teto, durante certo tempo, como marido e mulher, em troca de determinadas vantagens materiais. Caso digno ainda de realce julgou o Supremo Tribunal Federal, em que certo Estado da Federao outorgou concesso a um particular para explorao de jogos de azar no respectivo territrio28.23. Tratando-se de obrigao a termo, em que o prazo haja sido estabelecido em favor do devedor (Cd. Ci vil de 2002, art. 133), a impossibilidade, para ter efeito liberatrio, h de perdurar durante todo o termo. Em sentido contrrio: GIUSEITE ANDREOLI, Studi in onore de Antnio Cicu, 1/3. 24. CROME, Teorie Fondamentali dei Diritto Civile, pg. 119. 25. Revista Forense, 135/71. 26. VON TUHR, Tratado de Ias Obligaciones, 2/81. 27. CROME, ob. cit., pg. 118. 28. Revista dos Tribunais, 119/367.20Mencione-se, outrossim, contrato preso a arrendamento de cartrio, nulo por imoral29, bem como o de sociedade, em que se estipule comunicao de lucros ilcitos, ou de seguro, quando o risco de que se ocupa se filia a atos ilcitos do segurado, do beneficiado pelo seguro, ou dos representantes e prepostos, quer de um, quer de outro (art. 762 do Cd. Civil de 2002). E o caso, tambm, de contrato que tenha por objeto a comercializao de rgos humanos para transplante. Freqentemente, a ilicitude no se apresenta com a evidncia dos exemplos apontados. Bastas vezes, ela no se desvenda de relance, a um simples exame, como a corretagem matrimonial ou a claque. A relao obrigacional dever ser ento convenientemente sopesada, impondo-se-lhe condenao sempre que ofenda o sentimento mdio de moralidade, os interesses gerais da nao e o conjunto dos preceitos que garantem a dignidade das relaes jurdicas. No se exige que a lei conceitue o objeto como criminoso ou desonesto; se este contraria as regras da moral universal, o hbito do bem e a parte mais fundamental da legislao, numa palavra, a ordem pblica e os bons costumes, ter-se- ostentado a ilicitude, que h de bani-lo do direito. Ilcito ou impossvel o respectivo objeto, nula ser a obrigao, ex vi do art. 166, n. II, da lei civil de 2002. Causa de nulidade, que diga respeito ao objeto, vicia integralmente a obrigao acerca de todos os interessados, ainda que no tenham sido partes no feito, circunstncia de grande relevo no tema da solidariedade. Finalmente, o objeto da prestao h de ser economicamente aprecivel. o elemento que mais controvrsias suscita. O objeto deve ser realmente suscetvel de avaliao pecuniria; se ele no representa um valor, deixa de interessar ao mundo jurdico. Nesse caso est, por exemplo, venda de um s gro de caf, porque tal quantidade, evidentemente, nada representa. Nenhum interesse legtimo mover o credor a reclamar implemento de to exgua prestao. Excluem-se, outrossim, obrigaes que, conquanto jurdicas, no tm, por natureza, contedo patrimonial, como o dever de fidelidade entre os cnjuges na constncia do casamento (Cd. Civil de 2002, art. 1.566, n. I) e o dever de proteo da pessoa dos filhos (art. 1.690 e pargrafo nico).29. 30. Revista dos Tribunais, 161/721. Sobre as duas correntes em torno da daque, ver SAICFT, Le Contra Immoral, pgs. 78 e segs.21Mais delicada a questo relativa s prestaes cujo fundo seja de ordem moral. Algum, exemplificativamente, adquire certo apartamento num edifcio em condomnio, comprometendo-se a no tocar piano em suas dependncias. A primeira vista, falece o requisito da patrimonialidade a essa obrigao de no fazer; mas nada impede se convencione semelhante prestao, perfeitamente vlida, porque dela advm reflexos patrimoniais ponderveis. No h dvida qu, no caso de inadimplemento, difcil ser, talvez, a fixao ou determinao dos danos. Simples obrigao moral, todavia, insuscetvel de aferio monetria, no constitui obrigao no sentido tcnico-legal. Prosseguindo no estudo do objeto da obrigao, cabe acentuar ainda que deve ele ser determinado, ou, pelo menos, determinvel. No preciso que, ao surgir a relao obrigacional, se encontre materializado ou concretizado o objeto. Essa materializao ou concretizao pode vir a posteriori. Efetivamente, podem ser objeto de obrigao no s coisas presentes, j corporificadas, como futuras, ainda no conhecidas ou existentes. o que acontece nos contratos aleatrios (Cd. Civil de 2002, arts. 458 e 459 direitos de herana ignorada, riquezas de navio afundado, compra de peixe que vier na rede do pescador e da caa morta na tapada do vendedor, contrato de sociedade ficando ativo e passivo para o scio que sobreviver, venditio sine re, venda per aversionem). Assim sucede ainda com o penhor das safras futuras, em vias de formao, permitido expressamente pela Lei n. 492, de 30-8-1937, art. 6-, n. I. Em muitas obrigaes, o objeto comporta prestao instantnea, exaurindo-se num nico ato todo o seu contedo (quae nico actu perficiuntur), como a entrega de determinado objeto, ou a restituio da coisa emprestada no contrato de comodato. Mas a prestao pode ser, igualmente, de execuo prolongada ou de execuo progressiva (tempus sucessivum habet), no de locao de coisas (art. 565 do Cd. Civil de 2002) e no de seguro (art. 757) 31. Nas obrigaes genricas, somente se admite a generalizao na primeira fase da relao jurdica; ao tempo do pagamento, porm, determinado h de estar, necessariamente, seu contedo, sob pena de se lhe reconhecer a inexeqibilidade. De qualquer forma, a generalizao comporta limitaes porque, de outro modo, inexistiria obrigao, como no caso em que o devedor se obrigasse a dar algum caf, sem precisar, no entanto, a31. TRABUCCHI, ob. cit., pg. 444.22qualidade e quantidade. Faltaria seriedade a essa estipulao, e, no caso de inadimplemento, ver-se-ia o credor sem meios para demandar-lhe o cumprimento. Se o objeto consistir numa prestao em dinheiro, o respectivo montante pode ser fixo (uma quantia precisa e certa), ou sujeito a flutuaes e reajustamentos (como nos contratos de abertura de crdito e financiamento, bem como nos de aquisio de apartamentos em prdios de condomnio, desde que o preo comporte reajuste). Todos os princpios ora enunciados foram aprovados e sancionados pela Comisso de Reforma do Cdigo Civil Francs32. Correspondem, assim, s idias mais modernas sobre o assunto. Vnculo jurdico A obrigao constitui um vnculo que sujeita o devedor a determinada prestao em favor do credor. Qual a essncia desse vnculo, qual a substncia de que se compe a relao obrigacional? Vivo o dissdio que a respeito lavra entre os juristas. A opinio mais antiga, que se pode dizer tradicional, vislumbra na obrigao o dever de prestar, por parte do devedor, e o direito de exigir, por parte do credor. Nesse binmio esgota-se o substractum da obrigao, em todas as suas modalidades. Tal a orientao que incontestadamente prevaleceu at o sculo XIX, quando se iniciou sua reviso dogmtica, por intermdio de BRINZ, que postulou nova estrutura e novos conceitos para a relao obrigacional. Realmente, essa segunda corrente, que se tornou conhecida pelo nome de doutrina do dbito e da responsabilidade, identifica em todas as obrigaes duplo vnculo jurdico entre devedor e credor, um, de ordem espiritual, outro, de ordem material. O vnculo espiritual constitudo pelo comportamento que ao sujeito passivo sugere a lei, no sentido de satisfazer pontualmente a obrigao, honrando seus compromissos e conformando-se, de tal arte, aos altos princpios de direito, que mandam viver honestamente, dar a cada um o que seu e no prejudicar a ningum33.32. Trnvaux de Ia Commission de Reforme, ano 46/47, pg. 195. 33. Honeste vivere: a manuteno da dignidade moral do indivduo, quanto a seus atos exteriores; nennem laederc: o respeito aos outros homens, como pessoas, ou o reconheci mento dos direitos chamados originais; suum cuique tribuere: o reconhecimento de todos os direitos adquiridos por nossos semelhantes (SAVICNY, Trait de Droit Roniain, 1/396).23O vnculo material constitui-se pelo poder que a lei d ao credor, que no foi satisfeito, de acionar o devedor, promover em seguida execuo de sentena contra ele exarada, penhorar-lhe os bens e lev-los praa, assim obtendo, com o seu produto, valor correspondente prestao devida e no espontaneamente cumprida. Esse segundo elemento apenas se projeta se o sujeito passivo no solve voluntariamente a obrigao assumida. O vnculo jurdico que une os dois sujeitos por causa da prestao compreende, portanto, de um lado, o dever da pessoa obrigada (debitum), e, de outro, a responsabilidade, em caso de inadimplemento (obligatio). Na linguagem dos juristas tedescos, que procederam a essa reviso, correspondem tais deveres, respectivamente, ao Schuld e Haftung, sendo o primeiro uma relao de puro dbito, no sentido de dever prestar, e o segundo, uma relao de responsabilidade, sujeio quele dever prestar. O devedor obriga-se; seu patrimnio responde. Se ele paga, desaparece o Schuld; se no paga, surge a Haftung, meio de constrangimento que permite ao credor passar execuo. O mrito de BRINZ, afirma BARASSI34, foi o de pr em relevo a importncia do elemento patrimonial da obrigao. Como ensina PACCHIONI, que se constituiu na Itlia no mais ardoroso paladino da concepo dualista ou binaria, o debitum vem a ser o elemento social, a obligatio o elemento tipicamente jurdico; o primeiro, espontneo; o segundo, coativo; aquele, psquico e ideal; este, material e positivo35. Essa doutrina distingue, pois, sempre e invariavelmente, em toda obrigao, o dbito e a responsabilidade, a obrigao e a garantia, o dever de prestar e o dever de reparar, um, referente pessoa do devedor, outro, relativo ao seu patrimnio. Geralmente, ambos os elementos esto reunidos ou concentrados na mesma pessoa: o sujeito passivo deve e tambm responde pelo cumprimento da obrigao. Todavia, em certos casos, eles se desmembram, passando a coexistir em pessoas diferentes, como acontece, por exemplo, no caso de fiana ou de hipoteca, para garantia de dvida de terceiro. Em tal hiptese, uma pessoa est adstrita ao comportamento (debitum), enquanto outra responde, em confor34. Teoria Genernle delle Obbligazioni, 1/43. 35. Elementi di Diritto Civile, pg. 485; Obbligazioni in Generale, pgs. 2 e 3; Rivista di Diritto Commerciale, 1917, Parte 1, pg. 753.24midade com o elemento material, sem estar obrigada por uma prestao prpria (obligatio). Casos existem, outrossim, em que apenas remanesce um dos elementos (dbito sem responsabilidade), como sucede na obrigao natural, em que h a dvida, porm privada de responsabilidade36. Por outro lado, para BONFANTE, nas obrigaes alternativas existe duplo dbito, mas com uma nica responsabilidade (quando houver eledio creditoris)37 . Essa concepo dualista no mereceu geral aprovao. Como diz BUZAID, ela no alcanou resultados plenamente satisfatrios38. Por isso mesmo, numerosos juristas contra ela se levantaram, tachan-do-a de obscura e apregoando-lhe a completa inutilidade. Assim, POLACCO39 mostra-se receoso de seus exageros. PEROZZI, por seu turno40, combatendo-a, procurou evidenciar que sua idia no fez seno turvar toda a viso histrica do desenvolvimento das obrigaes, acrescentando ainda, noutro passo, que ela constitui no s anacronismo como o pior dos anacronismos, mera especulao doutrinria a que nega qualquer merecimento e utilidade. No direito brasileiro, a questo no chegou a preocupar nossos juristas, que ou fazem por ignor-la, ou apenas lhe dedicam poucas palavras. Recentemente, porm, em trabalho intitulado "Conceito da Obrigao", publicado na Revista Forense, vol. 128, pg. 23, ALCINO PINTO FALCO ventila o problema, mostrando-se adepto da posio dualista. Igualmente SERPA LOPES, no Curso de Direito Civil41, estuda a essncia das obrigaes, examinando a distino entre dbito e responsabilidade; o mesmo acontece com SYLVIO MARCONDES MACHADO , com a sua dissertao sobre a Limitao da responsabilidade do comerciante individual,pg. 250.As duas correntes rivais, nemine dissentiente, admitem a coexistncia dos dois elementos, o espiritual e o material; mas, aceitando-os, a teoria clssica ou tradicional pe em relevo o primeiro, que, no seu entender, se acha sempre na plana mais avanada, incorporan-do-se nele o segundo.36. 37. 38. 39. 40. 41. CALOGERO GANCI, "Le obbligazioni naturali", Rivista di Diritto Commerciale, XV, I, pg. 520. Lezioni sulle Obbligazioni, pgs. 172/173. Do Concurso de Credores no Processo de Execuo, pg. 17. Obbligazioni, pg. 91. "La distinzione fra debito ed obbligazione", in Scritti Giuridici, 2/553. Obrigaes em Geral, pg. 12.25A teoria dualista, ao contrrio, situando-se em outro ngulo, sublinha ambos os elementos, ressaltando, porm, a importncia do material ou patrimonial (a responsabilidade), relegando a plano secundrio o elemento espiritual. Parece-nos que a verdade se encontra numa posio intermdia. Os dois elementos so igualmente essenciais, tanto o pessoal, que vincula o devedor ao credor, como o patrimonial, que submete os bens do primeiro, para sujeit-los disposio do segundo. O exemplo ministrado por BARASSI clareia devidamente os termos da questo: Tcio deve mil liras a Caio. Segundo a teoria clssica, a essncia da obrigao repousa no dever primrio, que toca ao devedor, de satisfazer mencionada prestao, com o correlato direito do credor de demand-la. J para a teoria dualista, ela consistir precipuamente na responsabilidade do devedor, que garantir a execuo com os prprios bens. Finalmente, para a teoria ecltica, a obrigao sustentar-se- na conjunta ao dos dois elementos (espiritual e moral), que se renem e se completam42. Por outras palavras, o conceito que melhor exprime a essncia a vantagem que o vnculo oferece ao credor e a limitao que sofre o devedor43. Essa terceira corrente, que corresponde na atualidade communis opinio, a mais satisfatria, sobretudo perante o Cdigo Civil Brasileiro de 2002, constantemente preocupado com o aspecto cultural e moral das relaes jurdicas. Ela no faz, como a teoria dualista, abstrao dos valores humanos, ideais e espirituais, mas, ao inverso, reconhece-lhes a importncia e significao. Efetivamente, a doutrina binaria rebaixa o elemento espiritual, valorizando em demasia o patrimonial, esquecida de que, por fortuna, o adimplemento da obrigao a regra, o inadimplemento, a exceo44. Sempre que a regra se faz sentir, por voluntria disposio do devedor, o elemento material perde seu relevo, ofusca-se mesmo. Mas, por outro lado, a teoria ecltica no amesquinha e no despreza questionado elemento material, colocando os bens do devedor disposio do credor, no caso de inadimplemento da obrigao. Muito recentemente, MAZEAUD ET MAZEAUD45 passaram a distinguir trs elementos: a dvida, a responsabilidade em caso de42. 43. 44. 45. Ob. cit., pg. 43. RUGGIERO-MAROI, Istituzioni di iritto Privato, 2/5. AGOSTINHO ALVIM, Da Inexecuo das Obrigaes e suas Conseqncias, pg. 14. Leons de Droit Civil, 2/9.26inexecuo e o constrangimento. Os dois ltimos constituem, portanto, simples desdobramento do elemento material. Desejamos ainda, antes de encerrar tal estudo, mencionar originalssimo ponto de vista sustentado por S LVIO PEROZZI, alis inteiramente superado, bem como a moderna teoria publicstica, de base fundamentalmente processual. Afirmou realmente o primeiro que o jris vinculum no quer dizer o elo ideal que submete o devedor ao credor, mas a vinculao do devedor em contraste com a liberdade dos demais cidados. Em outros termos, a obrigao constitui jris vinculum no porque ligue uma e outra pessoa, mas porque liga uma e no liga outras46. Como pondera WALTER D'AVANZO47, conquanto genial, se acha presentemente abandonada semelhante concepo. Em posio muito mais interessante colocaram-se os processua-listas. Procuram estes afastar a controvrsia do campo do direito privado para lev-la para o campo do direito judicirio civil, e, pois, para o campo do direito pblico. No negam seus adeptos a presena na obrigao dos dois elementos, dbito e responsabilidade; apenas contestam que o segundo, isto , o fenmeno da responsabilidade, seja privatstico, de direito subjetivo material. Ao inverso, afirmam, esse elemento constitui vnculo de direito judicirio, implica uma realidade processual, destinada a satisfazer o credor atravs da prestao jurisdicional. A responsabilidade, elemento integrante da obrigao, no advm do direito privado, mas constitui expresso do poder soberano do Estado, o direito do credor direito ao do Estado. Eis, em linhas gerais, os fundamentos da teoria publicstica, preconizada na Itlia por ENRICO TULLIO LIEBMAN48 e BRUNETTI49, alm de CARNELUTTI50, que lobriga, no direito do credor, interesse ao gozo de um bem do devedor, garantido por sanes e cuja aplicao depende de sua vontade. No direito a essas sanes ele entrev todas as formas destinadas colocao da mscara civilstica a um direito processual. Essa nova concepo merece, sem dvida, seja meditada: ressente-se, porm, do exclusivismo inerente aos processualistas, que,46. "Le obbligazioni romane", in Scritti Ciuridici. 47. Cdice Civile, Libro delle Obbligazioni, 1/31, nota 4. 48. Processo de Execuo, pgs. 62 e segs. 49. Apud CARNELUTTI, "Obbligo dei debitore e diritto dei creditore", in Rivista di Diritto Commerciale, vol. 25, Parte I, pg. 295. 50. Ob. cit., p g. 325.ambiciosamente, tudo ou quase tudo querem atrair para a sua rbita, procurando assim, na frase de ALCINO PINTO F ALCO, construir a grandeza de sua disciplina custa de matrias que sempre pertenceram ao direito civil. Alis, a essa escola no faltam juristas que apregoam completa absoro do direito subjetivo material no direito processual, extremo condenado pelo prprio CARNELUTTI, que, todavia, deixa escapar o mvel profundo dessa nova corrente: "Non senza giustizia che il diritto processuale, per tanto tempo e in tante parti compresso ed oppresso, si stia prendendo Ia rivincita". Entre ns, s novas idias filia-se o Prof. ALIRHDO BUZAID, que condena o erro da concepo privatstica, enterreirando exclusivamente no campo do direito civil o elemento sano, o direito de excutir os bens do devedor, que , antes, um poder do Estado. Aos civilistas no agrada, porm, a nova corrente, que lhes arrebata institutos que sempre foram, tradicionalmente, de direito privado e cujo aparente sucesso mais se deve ao cunho de novidade com que se apresenta no mundo jurdico. De nossa parte, preferimos encarar o problema ao velho estilo. No nos agrada essa hipertrofia do elemento publicstico, a transportar para a primeira plana elemento que no seno contingente, eventual, e que apenas surge e se manifesta numa situao anormal, em que o devedor se furta ao voluntrio cumprimento da obrigao. Mas isso constitui patologia jurdica. Nessa matria, como diz BHTTI51, O direito substancial acha-se ligado por um nexo indissolvel ao processo e execuo. Mas o vnculo faz parte do direito substancial. Da causa na obrigao A causa nas obrigaes constitui tema que largo dissdio doutrinrio tem provocado, originando duas correntes, antagnicas e irreconciliveis, a causalista e a anticausalista. Para esta ltima, causa noo parasita na tcnica jurdica; corresponde a um enxerto, que prima pela sua inutilidade e que, por isso, no dizer de PLANIOI M, no merece figurar nos tratados, nem muito menos ocupar a ateno dos juristas. Realmente, dizem os anticausalistas, nos contratos sinalag-mticos, a obrigao de uma das partes a causa da obrigao da outra parte. Assim, no contrato de locao, a obrigao que o loca-dor tem de garantir ao locatrio o uso e gozo da coisa locada constitui causa da obrigao que o segundo tem de pagar ao primeiro o51. 52. La Strutiira deli' Obbligazionc Romana, prefcio. Trait lmentaire de Dwit Civil, vol. 2-, n. 1.039.28aluguel convencionado; na doao, a causa do contrato repousa no animus donandi, a vontade de beneficiar o gratificado. Nessas condies, a causa vem a ser, para os anticausalistas, criao artificial, inteiramente suprflua, que nenhum papel desempenha no quadro das instituies obrigacionais. Ela no passa de nova maneira de designar, conforme o caso, um dos pressupostos da obrigao. J para a corrente causalista, toda obrigao, desde que voluntariamente assumida por uma pessoa, ou imposta pelo testador ao herdeiro testamentrio, deve ter uma causa. Como diz CAPITANT, um de seus adeptos53, a causa integra o ato de vontade e, pois, o contrato. Muitas as complexidades que se antolham no estudo desse tema, por si mesmo um casus belli em todas as ordens do direito54. Em primeiro lugar, cumpre ser naturalmente salientada sua equvoca terminologia, que abre espao a dvidas e ambigidades. Com efeito, num sentido vulgar, causa motivo, razo, mvel determinante de um ato, antecedente de certo evento (por exemplo, quando se diz que determinada molstia foi a causa da morte do de cajus). Na linguagem jurdica, porm, causa no se confunde com motivo. Este subjetivo, ntimo, psicolgico, flexvel e mutvel de indivduo para indivduo. Tome-se o exemplo da compra e venda, sugerido pelo mesmo CAPITANT : um vende porque precisa de dinheiro, porque quer especular, ou porque a coisa no lhe interessa mais; outro compra porque deseja fazer uma especulao, porque precisa da coisa, ou porque quer oferec-la a um parente. Esse mvel, que determina o agente, assim varivel e contingente, no constitui a causa da obrigao. Como diz ANDRA TORRENTE55, so motivos individuais, que a parte nem sequer precisa comunicar pessoa com a qual contrata. Permanecem na esfera psquica e escapam cognio do outro contratante. A causa, ao inverso, objetiva, externa, rgida e inaltervel em todos os atos jurdicos da mesma natureza. No citado exemplo da compra e venda, a causa que leva o vendedor a alienar se resume no seu propsito de receber o preo, enquanto para o comprador vem a ser o desejo de obter o objeto alienado. Por outras palavras, o motivo constitui a causa impulsiva; a causa, a causa final56.53. 54. 55. 56. De Ia Cause des Obligatons, pg. 12. COUTUKE, Fundamentos dei Derecho Procesal, pg. 271. Ob. cit., pg. 163. NORBERTO GOROSTIAGA, La Causa en Ias Obligaciones, pg. 185.29V-se, por conseguinte, que, em ltima anlise, causa nas obrigaes no outra coisa seno o fim visado pelo agente, o ponto de apoio em que se fundamenta a obrigao voluntria. O vocbulo causa poderia assim, com vantagem, ser substitudo pela palavra/zm. Manteve-se, todavia, a primeira expresso, embora ambgua, porque tem em sua defesa a tradio ao lado de constante uso. De acordo com o Cdigo Napoleo, toda obrigao convencional deve ter uma causa, indispensvel sua validade, devendo a mesma ser lcita (art. 1.108, n. 4). Acrescenta em seguida o legislador francs que todo contrato cuja causa seja inexistente, falsa ou ilcita nulo (art. 1.131). Outras legislaes, entretanto, omitem qualquer referncia teoria da causa. Assim, o Cdigo Suo57 ps inteiramente de lado a imprescindibilidade de uma causa real e lcita para as obrigaes, limitando-se a dizer que o seu objeto no deve ser nem ilcito, nem impossvel, nem contrrio aos bons costumes (art. 20). O Cdigo Civil Brasileiro de 2002, a exemplo do Suo, e tambm do Cdigo Alemo, no considera a causa entre os requisitos das obrigaes convencionais. Pelo nosso direito civil, a causa constitui o prprio contrato, ou o seu objeto. Quando se diz, assim, que a causa ilcita vicia o ato jurdico porque seu objeto vem a ser ilcito. Todavia, de modo indireto ou oblquo, a lei civil refere-se causa quando dispe, no captulo relativo ao pagamento indevido, art. 876 do Cdigo Civil de 2002, que todo aquele que recebeu o que lhe no era devido fica obrigado a restituir. Vale dizer: exige o Cdigo Civil de 2002 justa causa para o enriquecimento. Se lhe falta esse requisito, impe-se a repetio. No art. 373, a nova lei civil refere-se tambm causa, quando estatui: "A diferena de causa nas dvidas no impede a compensao, exceto: I se provier de esbulho, furto ou roubo; II se uma se originar de comodato, depsito ou alimentos; III se uma for de coisa no suscetvel de penhora". Igualmente, no art. 140, preceitua ainda o Cdigo de 2002 que "o falso motivo s vicia a declarao de vontade quando expresso como razo determinante"58.57. O Cdigo Federal das Obrigaes, cujo anteprojeto elaborou EUCNE HUBER, foi incorporado ao Cdigo Civil Suo, em virtude de lei de 30 -3-1911, nele vindo a formar o Livro V (Direito das Obrigaes), iniciando-se em 1--1-1912 a respectiva vigncia (cf. Annuaire de Lgislation Etrangciz>, 1912, pg. 520). 58. O primeiro anteprojeto de C digo das Obrigaes substitua a palavra causa pela palavra motivo no preceito legal correspondente (art. 18).30Por ltimo, de acordo com os arts. 476 e 477 do Cdigo Civil de 2002, nos contratos bilaterais, nenhum dos contraentes, antes de cumprida a sua obrigao, pode exigir o implemento da do outro. V-se, portanto, diante desses textos, que, embora o Cdigo de 2002 no houvesse includo a causa entre os requisitos das obrigaes convencionais, no prescinde desse elemento. Mas o nosso legislador no faz dele um elemento autnomo, dotado de individualidade prpria. Ao inverso, identifica-o com o prprio contrato, ou com o seu objeto. O negcio jurdico tem eficcia independentemente de sua causa. Basta a vontade, devidamente manifestada, para dar origem ao ato. Num contrato de mtuo, por exemplo, para o mutuante, a causa reside no desejo de auferir a prestao relativa ao servio de juros; j para o muturio, a causa repousa no intuito de obter o capital mutuado. A percepo dos juros pelo primeiro pressupe entrega ao segundo do capital emprestado. Percebidos aqueles sem a correlata entrega deste, ocorrer desequilbrio na relao jurdica, verificar-se- enriquecimento sem causa por parte do mutuante, suscetvel de repetio atravs da condictio indebi (Cd. Civil de 2002, art. 876). Existe, como se percebe, interpenetrao entre a causa e os elementos constitutivos do contrato. Se este ilcito, se o seu objeto se reveste de imoralidade ou contraria os bons costumes, se no h contraprestao, ressentir-se- a causa dos mesmos vcios que lhe arrebatam a eficcia jurdica. Contrato sem causa no se executa co-ercitivamente59. Algum se prope a adquirir uma casa de prostituio; a causa obligandi, isto , o fim que leva o agente a contratar, caracteriza-se pela ilicitude. A imoralidade da causa confunde-se com a prpria ilicitude do objeto, de que decorre a nulidade da avena, em consonncia com o art. 166, n. II, do Cdigo Civil de 2002. V-se do exposto que, perante o direito positivo ptrio, no se justifica a incluso da causa entre os elementos componentes da relao obrigacional. Pela nossa lei, a noo de causa torna-se suprflua constituio da obrigao, porque ela se dispersa entre os demais extremos da relao. Com mais freqncia, em matria cambial, surge a alegao concernente falta de causa. Desvendada esta, foroso concluir pela improcedncia da respectiva ao de cobrana.59. Revista dos Tribunais, 227/261.31Efetivamente, os ttulos de crdito caracterizam-se pelos seguintes elementos: a) a cartularidade, pela qual o documento passa a representar a relao jurdica que lhe deu causa; V) a literalidade, por meio da qual o ttulo exprime a existncia e extenso do negcio jurdico subjacente; c) a autonomia, que confere ao adquirente direito autnomo e independente. Todos os ttulos de crdito devem ter causa, ainda que no declarada, em alguma relao jurdica; a abstrao da causa facilita a circulao do ttulo, de tal sorte que, quando se verifica no haver correspondncia com um negcio fundamental, evidenciando a inexistncia de causa, no poder ensejar ao de cobrana. Tratando-se, porm, de ttulo formalmente perfeito, cujo aceite no negado pelo ru, desde que este no consegue demonstrar, de maneira clara e convincente, aquela defesa in rem, de mister subsista a fora vinculatria, que naturalmente emerge do prprio documento. A assinatura do aceitante implica, assim, presuno jris tantum de existncia real da obrigao60. Se a cambial se acha ligada a contrato de compra e venda, por exemplo, cujo preo represente, no se pode dizer que ao ttulo falte causa enquanto no se rescindir a avena61. Da mesma forma, no se pode afirmar carea de causa ttulo aceito por liberalidade ou doao pelo executado62. Tambm no obrigao sem causa a representada por ttulo cambial, aceito como garantia da soluo do dbito de terceiro63. Mas, se o ttulo se acha ligado a contrato de locao, tendo sido aceito como complemento de aluguel no previsto no ajuste por escrito, ostenta-se a ausncia de causa debendi64. De modo idntico se corresponde a emprstimo fictcio65. Contudo, s se admite defesa fundada em falta de causa entre as prprias partes, no por terceiros66. Quanto a estes, aquela pre60. Revista dos Tribunais, 236/465. 61. Revista dos Tribunais, 154/713-181/286-196/428-207/446. 62. Revista dos Tribunais, 134/215. 63. Revista dos Tribunais, 223/184. 64. Revista dos Tribunais, 222/266. 65. Revista dos Tribunais, 225/294. "CONTRATO Compromisso de compra e venda Nulidade Negcio jurdico que encobre mtuo Pacto comissrio configurado Violao ao artigo 765 do Cdigo Civil Adjudicatria improcedente" (LEXLI, JTJ, 203/246). 66. Revista dos Tribunais, 89/355-158/113-204/272-207/162-224/286-238/503; Revista Forense, 132/136.32suno vem a ser jris et de jure. Para o seu acolhimento, insista-se, torna-se indispensvel apresentao de prova concludente e que no deixe margem a dvidas. Na cobrana de cheque prescrito, que no tem fora executiva, mas traduz prova escrita de dvida, deve o autor declinar o negcio subjacente embasador da emisso dos cheques67.67. Ia TACSP, 11- Cm., Ap. Cvel n. 745.140 -5, rei. Juiz Silveira Paulilo, Boi. AASP n. 2.070, 1998.33FONTES DAS OBRIGAESDEFINIO E GENERALIDADES. FONTES NO DIREITO ROMANO. SISTEMA DO CDIGO NAPOLEO E DE OUTRAS LEGISLAES CONTEMPORNEAS. DIREITO POSITIVO BRA SILEIRO. DO RISCO PROFISSIONAL.Definio e generalidades Fonte de obrigao constitui o ato ou fato que lhe d origem, tendo em vista as regras de direito. Com sua atuao e reiterada incidncia, produzindo sempre idnticas reaes, acaba o direito por lhe reconhecer fora criadora, outorgando-lhe por isso a necessria tutela legal. Fonte de obrigao , assim, seu elemento gerador ou seu fator gentico, o ato ou fato, idneo a criar obrigaes, em conformidade com o ordenamento jurdico1. Emprega-se a expresso/onfe das obrigaes no mesmo sentido que fontes do direito, meios pelos quais se estabelecem as normas jurdicas. Mas, como adverte SCUTO2, sensvel diferena existe entre fontes do direito e fontes das obrigaes. Das primeiras brotam os preceitos jurdicos (normas gerais e abstratas, que disciplinam a vida social), enquanto das segundas apenas surgem relaes concretas e particulares, entre duas ou mais pessoas, tendo por objeto determinada prestao. Por outro lado, merece preferncia a expresso/onte, que , tradicional, universalmente consagrada, palavra causa, que, alm de ambgua, tem em matria obrigacional sentido especfico, restrito e prprio. H, assim, clara dissemelhana entre causa obligationis (fontes das obrigaes) e causa obligandi (elemento integrante das obrigaes, segundo a teoria causalista).. COLACROSSO, Libro delle Obbligazioni, pg. 11; SILVIO DE SALVO VENOSA, Direito Civil Teoria Geral das Obrigaes e Teoria Geral dos Contratos, So Paulo, Atlas, 2001, pgs. 62 e segs.2.34Istituzioni di Diritto Privato, vol. II, Parte I, pg. 125.Fontes no direito romano No antigo direito grego, as obrigaes nasciam do contrato, do delito ou de outro fato jurdico, por direta disposio da lei. A esse direito primitivo, como observa FUL-VIO MAROI3, parece ser estranha a noo do quase-contrato. No direito romano, segundo texto de GAIO (Institutas, III, 88), omnis vero obligatio vel ex contractu nascitur vel ex delido. De acordo, pois, com esse preceito, duas apenas seriam as fontes das obrigaes, o contrato e o delito. Sucede, porm, que no Digesto (44, 7,1) outro texto se depara, nas Res cotidianae, e atribudo ao mesmo jurisconsulto, a figura mais enigmtica que a jurisprudncia romana apresenta4, em que se dispe: Obligationis aut ex contractu nascuntur aut ex maleficio aut prprio quodam jure ex variis causarum figuris. Como se v desse fragmento, novas causas geradoras de obrigaes foram contempladas, atravs da expresso genrica ex variis causarum figuris. Finalmente, num terceiro texto, igualmente atribudo a GAIO, vem expresso: Obligatio ex contractu, quasi ex contractu, ex delido, quasi ex delido (Institutas, 3, 13, 2), o qual serviu de base para muitas legislaes modernas. A presena de semelhantes divergncias na compilao justiniana abriu ensejo a numerosas contendas histricas e doutrinrias. Procurando explic-las, afirma BONFANTF, que, com o texto do Digesto, GAIO expunha o direito vigorante em seu tempo, ao passo que com o das Institutas se reportava a um direito j superado pelo decurso do tempo. Outros, ao contrrio, como ARANGIO -RUIZ, sustentam que a adio da terceira fonte fruto de interpolao5. Segundo esse ltimo ponto de vista, que parece o mais acertado, as fontes da obrigao romana, no direito clssico, foram exclusivamente o contrato e o delito. As demais no passaram de meras construes da fase ps-clssica6. Malgrado essa reviso crtica a que ora se procede na legislao de Justiniano e em que se procuram escandir as interpolaes bizantinas (no sentido prprio do vocbulo), o certo que mais difundida se tornou a diviso quadripartida das fontes no direito romano, tal o gosto do homem pela simetria: contrato, quase-contrato,3. 4. 5. 6. Nuovo Digesto Italiano, voe. "Obbligazione", pg. 1195. ARANGIO-RUIZ, Istituzioni di D ritto Romano, pg. 11. DEGNI, Studi sul Dritto delle Obbligazioni, pg. 8. UGO BRASIELLO, NUOVO Digesto Italiano, voe. "Obbligazione".35delito e quase-delito. Fonte ex lege, com carter autnomo, no existia entre os romanos, sem embargo da opinio em contrrio de FHRRINI. Como bem observam ALEXANDRE CORREIA e GAETANO SCIASCIA7, infeliz essa classificao, porque inclui entre os quase-contratos obrigaes que no oferecem a menor analogia com os contratos, acordo de vontades, como a obrigao do tutor para com o pupilo e a obrigao do herdeiro em satisfazer o legado. Alm disso, ela considera quase-delitos alguns atos ilcitos de origem pretoriana, que seriam verdadeiros delitos, segundo o jus civile. Analisemo-la, porm, comeando pelos contratos, que, de todas as fontes, eram e continuam sendo a mais rica e a mais fecunda. Conventio era a expresso genrica empregada pelos romanos e que compreendia simultaneamente no s os contratos propriamente ditos, isto , as convenes reconhecidas pelo direito civil, providas de obrigatoriedade e de tutela judicial, como tambm os pactos, isto , as convenes no sancionadas pelo direito civil, despidas de fora obrigatria e de tutela processual8. Os contratos filiavam-se a quatro grupos: Obligationes, quae sunt ex contractu, aut consensu contrahuntur, aut re, aut verbis, aut litteris (Institutas, III, 89). Por outras palavras, os contratos eram consensuais, reais, verbais e literais, segundo resultas