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RUY D’ATHOUGUIA a modernidade em aberto Prefácio de EDUARDO SOUTO DE MOURA GRAÇA CORREIA

Y ruY d’atHouGuIa · Ruy Jervis d’Athouguia – A Modernidade em Aberto, sob a orientação do arquitecto Hélio Piñón, obtendo a classificação máxima, por unanimidade do

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Eduardo souto mouraNasceu no Porto em 1952. De 1974 a 1979, colabora com o arquitecto Álvaro Siza Vieira. Licencia-se em Arquitectura pela Escola Superior de Belas-Artes do Porto em 1980. Inicia a actividade como profissional liberal no mesmo ano e no ano seguinte é assistente do curso de Arquitectura na FAUP. Professor convidado na Faculdade de Arquitectura de Paris-Belleville (1988). Professor convidado nas Escolas de Arquitectura de Harvard e Dublin (1989). De 1990 a 1991 é professor convidado na ETH de Zurich. Professor convidado na Escola de Arquitectura de Lau-sanne (1954).Prémios: Prémio Fundação António de Almeida (1980); 1.º Prémio no concurso para o Centro Cultural da S.E.C., Porto (1981); 1.º Prémio no concurso para a reestruturação da Praça Giraldo, Évora (1982); Prémio Fundação Antero de Quental (1984); 1.º Prémio no concurso para os Pavilhões C.I.A.C (1986); 1.º Prémio no concurso para um Hotel, Salzburg(1987); 1.º Prémio no concurso “IN/ARCH 1990 para a Sicília” (1990); Prémio SECIL de Arquitectura (1992); 1.º Prémio para a Construção de Auditório e Biblioteca Infantil da Biblioteca Pública Municipal do Porto (1992); 2.º Prémio no concurso “A Pedra na Arquitectura” (1993); Prémio Secil de Arquitectura – Menção Honrosa para a Casa de Miramar (1993); Prémios Nacionais de Arquitectura – Menção Honrosa para o Centro Cultural da S.E.C. e Casa de Alcanena (1993); Prémio Internacional da Pedra na Arquitectura para a Casa em Braga, Feira de Verona (1995); Prémio Anual da Secção Portuguesa da Associação Internacional de Críticos de Arte (1996); Prémio Heinrich-Tessenow Medal in Gold (2001); Prémio Secil de Arquitectura (2004); Prémio FAD de Arquitectura, Barcelona, com o projecto do Estádio de Braga (2005); 1.º Prémio no Concurso para um crematório em Kortrijk, Bélgica (2005); Galardão para o Estádio Municipal de Braga com o Prémio Internacional de Arquitectura atribuído pelo Chicago Athenaeum Museum, U.S.A.(2006); Menção Honrosa na categoria de “Melhor Janela” – Estádio Municipal de Braga, atribuído pela Associa-ção Espanhola de Fabricantes de Janelas e Fachadas Ligeiras (ASEFAVE) – Veteco na Feira de Madrid, Espanha (2006); Prémio FAD “Ciutat i Paisatge” com o Projecto “Metro do Porto” (2006).

ruY d’atHouGuIaa modernidade em aberto

Prefácio de EDUARDo SoUTo DE MoURA

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GraÇa CorrEIaNasce no Porto a 24 de Junho de 1965.Licencia-se em Arquitectura pela Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, em 1989, e colabora com o arquitecto Eduardo Souto de Moura até 1995. É professora associada no Departamento de Arquitectura da Universidade Lusíada do Porto, na cadeira de Projecto do 5.º ano e instala-se em 1995 em escritório próprio, iniciando actividade individual e estabelecendo algumas par-cerias.Inicia, a partir de 2000, a realização de projectos em sociedade com o arquitecto Eduardo Souto de Moura, designadamente o Projecto de Reconversão da Companhia Aurifícia e Estudo de Viabilidade dos terrenos adjacentes; o Projecto da Escola Superior de Hotelaria em Portalegre (em construção) e o Estudo para os Edifícios Históricos da Fábrica Robinson. Fundou em 2005, juntamente com Roberto Ragazzi, a Correia/Ragazzi arquitectos, onde desenvolvem projectos de natureza individual ou em parceria, designadamente a Casa do Gerês.Esta foi finalista na V Bienal Iberoamericana de Arquitectura Y Urbanismo em representação de Portugal na Mostra de Jovens Arquitectos, em Montevideo 2006 , obteve o 1º Lugar (ex-aequo) do III Premio ENoR Portugal e recebeu a Medalha de ouro da Bienal Miami+Beach 2007.Participou em vários Seminários e Conferências em Portugal e estrangeiro e o seu trabalho aparece em diversas publi-cações e exposições.Foi bolseira da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, Ministério da Ciência e Tecnologia, tendo defendido, em 2006, na Escola Superior Técnica de Arquitectura da Universidade Politécnica da Catalunha, a tese de doutoramento: Ruy Jervis d’Athouguia – A Modernidade em Aberto, sob a orientação do arquitecto Hélio Piñón, obtendo a classificação máxima, por unanimidade do júri, de EXCELLIENTE, Cum Laude.Participa em vários concursos públicos, tendo obtido o 1.º prémio por duas vezes, e os seus trabalhos têm sido distin-guidos de várias formas, designadamente com a Selecção HABITAR PoRTUGAL 2003-2005, com a obra Externato S. João de Brito (2003-05) e a Selecção ATELIER ABERTo da “ordem dos Arquitectos SRN“.

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RUY JERVIS D’ATHOUGUIAA MODERNIDADE EM ABERTO

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2 AGRADECIMENTOS:

Ministério da Ciência e do Ensino Superior

(A investigação foi financiada por uma Bolsa de Investigação atribuída em Concurso Público em 1997, no âmbito do Programa

Operacional “Ciência Tecnologia e Inovação”)

Câmara Municipal de Lisboa, Divisão de Arquivos

Câmara Municipal de Cascais, Divisão de Arquivos

Para além dos apoios institucionais, este livro contou ainda com o contributo inestimável das seguintes pessoas, às quais não posso deixar de agradecer: Ruy Jervis d’Athouguia, Hélio Pinón, Eduardo Souto de Moura, Ana Neto Vieira, Alberto Plácido, Duarte Pinto Coelho, Jorge Nunes da Silva (em representação do GOP), Carlos Carvalho Dias, Roberto Ragazzi, Catarina, Madalena, Francesco e os meus pais.

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3FICHA TÉCNICA

TítuloRuy Jervis d’Athouguia - A Modernidade em Aberto

AutorGraça Correia Ragazzi

PrefácioEduardo Souto de Moura

EditorJosé Manuel das Neves

Coordenação GeralGraça Correia Ragazzi, José Manuel das Neves

Coordenação Editorial

Tratamento de imagemEstúdio Goma

Imagem da CapaDesenho de Ruy Athouguia

Pré-Impressão e Impressão

Depósito Legal

ISBN

Data de Edição

Edição

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ÍNDICE

PREFÁCIO 6HIATOUGUIA E O “MAPA”

POR EDUARDO SOUTO DE MOURA

INTRODUÇÃO 13

A ESCOLHA DO TEMA

O MAL-ENTENDIDO HISTÓRICO-CRÍTICO

A VISUALIDADE: MODO DE REPRESENTAÇÃO COMO TAL

O ELOGIO DA MODERNIDADE 21

A IDENTIFICAÇÃO DO(S) ERRO(S) DE INTERPRETAÇÃO

A VISUALIDADE CRIATIVA

A DESMITIFICAÇÃO DOS CONCEITOS

A VISUALIDADE FORMATIVA E COMUNICANTE

O CONTEXTO 33

ENQUADRAMENTO CULTURAL

SÍNTESE BIOGRÁFICA

A ARQUITECTURA MODERNA

E A CRÍTICA DA ARQUITECTURA MODERNA EM PORTUGAL

A OBRA 57

ANOS 40: A PROCURA DA LINGUAGEM 63

CASA MARIA AMÉLIA BURNAY

BAIRRO S. JOÃO DE DEUS

ANOS 50: A PRECISÃO DA FORMA 123

ESCOLA DO BAIRRO S. JOÃO DE DEUS

CASA SANDE E CASTRO

LICEU PADRE ANTÓNIO VIEIRA

ANOS 60: ACTUALIZAÇÃO 193

PRAÇA DE ALVALADE

FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN

A MODERNIDADE EM ABERTO 303

A POUSADA DA NAZARÉ

A VIGÊNCIA DA MODERNIDADE

ÍNDICE DE OBRAS 344

BIBLOGRAFIA 356

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PREFÁCIO

Este livro sobre o arquitecto Ruy Athouguia, corres-ponde à publicação da Tese de Doutoramento que a arquitecta Graça Correia desenvolveu e defendeu na Escola Técnica Superior de Arquitectura da Universidade Politécnica da Catalunha, sob a direcção do arquitecto Hélio Piñón.

O título acima indicado refere-se a uma estranha au-sência, apenas algumas breves referências em dois títu-los (1), sobre a obra de Ruy Athouguia pela crítica da dis-ciplina e pela docência nas Escolas de Arquitectura.

Poder-se-á dizer que a minha cultura sobre a História da Arquitectura Portuguesa é deficitária, mas prefiro a tese de que R.A. foi voluntariamente esquecido, para que se possam salientar as novas linguagens do pós-Inqué-rito à Arquitectura Portuguesa, contra a “pífia e mesqui-nha” (2) arquitectura moderna que se tinha feito até aí em Portugal.

E porque é que Ruy Athouguia não foi ao I Congresso Nacional de Arquitectura, nem participou no Inquérito? (3) - Responde o próprio: “Não influenciou o que eu esta-va a fazer, porque eu já o estava a fazer…”(4). Também o estavam a fazer Godinho, Viana de Lima, João Andresen, Siza e muitos outros…

E o que é que Ruy Athouguia andou a fazer entre 1947 e 1969? E o que é que não andou a fazer depois de 1969, depois da Gulbenkian, “obra exemplar de uma arquitectura ao serviço da comunidade e da cultura” (5)

A estas questões e a muitas outras sobre o “Passado e o Presente” da arquitectura, serve este livro, para nos fazer entender não só o caso pessoal de R. A., mas tam-bém o porquê da produção actual, especialmente a de uma geração que, quer no Porto, quer em Lisboa, se ren-deu ou se acondicionou a este tipo de fala ou dialecto.

Folheando inúmeras revistas de decoração, design, arquitectura, engenharia ou construção em geral, assisti-mos a uma proliferação de edifícios que em “lugares” e com programas distintos, se apresentam como “caixas”.

As caixas são contentores que recebem programas plurais. Geralmente são brancas por influência vernacu-lar, em betão aparente por influência helvética, ou se ti-verem uma cobertura inclinada (que não é telhado), po-deríamos arriscar a importância de uma nova geração de influência anglo-saxónica (6) que começa pontual-mente a surgir em Portugal.

Estes contentores possíveis de se instalar em vários portos, são geralmente fechados nos topos e abertos em vidro na sua maior dimensão, para norte, sul, nascente ou poente! Nalguns casos recebem texturas, brise-soleils, portadas, grelhas ou estores para filtrar a luz e o calor por necessidade real, ou noutros casos para dissimular uma ou outra janela, que o “conceito” não pode tolerar, mas a que o programa e a ética nos obrigam, tal como no anexo do Pavilhão de Barcelona do Mies (fig.1).

Este reportório de linguagens, falas ou dialectos, como

HIATOUGUIA E O “MAPA”

“Sou furiosamente moderno no interior da pós-moderni-dade…” disse Eduardo Prado Coelho, que morreu ontem, a 25 de Agosto de 2007.

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7lhe queiram chamar, assenta num repertório directo da axiologia do Movimento Moderno e a atitude de o ci-tar, transcrever ou repor, não é mais do que um pós do Pós-Moderno, por reacção cíclica e porque não, endé-mica? (7)

Esta postura corrente hoje em dia, é aceite e opor-tuna, basta ver as referidas publicações e apresenta-se como uma heterodoxia conforme os autores, os luga-res, as regiões, e tornou-se prática corrente devido a uma fragmentação “ideológica” que não conseguimos ultrapassar.

Segundo Jean Louis Cohen, o conceito de “Internacionalismo Crítico” deveria ser o mais ajus-tado para entender a situação actual, em lugar do “Regionalismo Crítico” de K. Frampton…ou então, o mais oportuno seria o cruzamento dos dois, já que o Internacionalismo do Movimento Moderno estava cheio de regionalismos...“é que não há língua em si, nem uni-versalidade da linguagem, mas um concurso de dialec-tos, de patois, de calão, de línguas especiais” (8)

Mas não me vou alargar sobre este tema num prefá-cio sobre Ruy Athouguia. Só quis mostrar e relembrar que o que se produz hoje, independentemente do seu valor e da maneira como se faz, tem a ver com o Movimento Moderno, o Movimento Moderno em Portugal e muito com o Ruy Athouguia e muito pouco com beirais de telha canudo em prédios urbanos em altura!

E sobre o que se faz, não resisto a dizer, o que eu gos-taria de fazer era: desenhar, construir por conexões, por cruzamentos, multiplicidades, heterogeneidades… escre-ver como Deleuze: “escrever a n, n-1, escrever por slo-gans…, nunca plantem, não semeiem, piquem! Façam linhas, nunca um ponto. A velocidade transforma o pon-to em linha (…) Seja rápido, mesmo no sítio! Linha de sorte, linha de corte, linha de fuga (…) nada de ideias precisas, mas uma ideia só (como Godard). Tenham ideias curtas. Façam MAPAS e nada de fotografias nem desenhos.” (8)

Algum tempo antes de R.A. morrer, almocei com ele e com a Graça Correia no Bairro Alto, e em conversa re-feriu que se tinha formado no Porto, mas que para ele o Porto era a Granja, a Sophia e o Joni (9). Falamos da Sophia e dos seus versos, da Granja, do mar, da navega-ção “sem o mapa que fazia” (10). R. A. contou-nos que também ele nos tempos livres, fora da arquitectura, fazia vela em Cascais.

Por coincidência, há um mês, visitando as suas casas em Cascais, encontrei a sua própria casa habitada por um coleccionador de mapas. No seu escritório, o de Ruy Atouguia, intacto, desenhado à escala 1:1, descobrimos mapas sobrepostos aos desenhos do arquitecto, que es-tranhamente permanecem aí…

Desse almoço guardo na memória a imagem de um homem tímido, reservado, com um porte aristocrático

fig.1

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8 mas sem precisar de o ser, porque já o era, tal como no Inquérito…”não influenciou o que eu estava a fazer, por-que eu já o estava a fazer” (tudo num só).

Durante a nossa conversa notava-se uma fragilidade exterior, própria de quem é forte, de quem lutou pelo que acreditava e não cedeu. O certo é que passadas déca-das outras gerações o tenham seguido, usado, cruzado, tal como eu e lhe tenham ouvido o seu silêncio, a sua fala omissa.

Ruy Athouguia entendeu que deveria ser, tal como Rimbaud, “absolutamente moderno” até ao fim. Talvez por isso depois da Gulbenkian (1969) não tenha tido mais encomendas. Sem ser um homem político (declara-do) incomodou o sistema, o politicamente correcto, por-que fez pensar, alterou códigos e isso não era nada opor-tuno para o sistema. R. A. foi o “mapa e não o decal-que”, num território fechado e isso paga-se caro.

Numa entrevista a Isabel Salema, publicada na rubri-ca Testemunhas do Século Português do Jornal Público em 1999, afirmou com mágoa, que o projecto que gos-tava de ver construído era a Pousada da Nazaré, penso eu na 1ª versão. É que na terceira há terraços inclinados com tijoleiras (“não telhados”) e nas empenas algumas janelas.

Nesse almoço falamos ainda de arquitectura moder-na e antiga, e não resisti a perguntar-lhe qual a obra e o arquitecto português de que mais gostava. A resposta

foi imediata: “A piscina de Leça do Siza Vieira… mas só não percebo porque é que o Siza em pleno séc.XX insiste em fazer janelas!”

Ruy Athouguia morreu já no séc.XXI e no seu enterro não havia ninguém que soubesse ou não soubesse dese-nhar janelas. Partiu, e como dizia Sophia, “sem o mapa que fazia” (10)…,”navegação abstracta,…,vista de cima, tornou-se a terra um mapa”. (11), “mantiveste em dia os teus cadernos todos / com meticulosa exactidão dese-nhaste os mapas”. (12)

É que como diz Deleuze, “O mapa opõe-se ao de-calque, porque está completamente voltado para uma experimentação directa sobre o real…o mapa…é aber-to, é aberto, é conectável, em todas as dimensões, des-montável, invertível, susceptível de receber modificações em toda a parte. O mapa pode rasgar-se, ser virado do avesso, adaptar-se a montanhas de qualquer natureza, … Pode-se desenhá-lo numa parede, concebê-lo como uma obra de arte, construí-lo como uma acção política ou como uma meditação”. (8)

Desenhar “o mapa e não o decalque”, é esse o seu legado

Alvor, 27-08-2007Eduardo Souto de Moura

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91. Ana Tostões, “Os Verdes Anos na Arquitectura Portuguesa dos

Anos 50” / Nuno Portas, “A Evolução da Arquitectura Moderna em

Portugal”

2. Francisco Keil do Amaral publica na revista Arquitectura, Lisboa, 2ª

série, entre Agosto de 1947 e Maio/Junho de 1948, um conjunto

de textos como título “As Maleitas da Arquitectura Nacional”

3. “Arquitectura Popular em Portugal”, Sindicato Nacional dos

Arquitectos, 1961

4. Depoimentos do Autor: Ruy Jervis d’Athouguia em entrevista grava-

da no seu escritório, em Abril de 1999, por Graça Correia

Ruy Jervis d’Athouguia em entrevista ao Jornal Público de

24/10/99, na rubrica Testemunhas do Século Português-41, “Ruy

Jervis d’Athouguia, 82 anos - um arquitecto demasiado moderno”,

por Isabel Salema

5. Ana Tostões, “Os Verdes Anos na Arquitectura Portuguesa dos Anos

50” op. Cit.

6. Sergison / Bates

7. Endémica -enfermidade que grassa numa região e que tem cau-

sas exclusivamente locais, no Dicionário da Língua Portuguesa

6ªEdição, Dicionários Editora, Porto Editora

8. Gilles Deleuze e Felix Guattari, Rizoma, Assírio & Alvim

9. Sophia de Mello Breyner Andresen (escritora) e João Andresen

(arquitecto)

10. Sophia de Mello Breyner Andresen, “Mar - As Ilhas VI”, Editorial

Caminho

11. Sophia de Mello Breyner Andresen, “Mar - As Ilhas II”, Editorial

Caminho

12. Sophia de Mello Breyner Andresen, “Mar – Cíclades”, Editorial

Caminho

NOTAS

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11“As três qualidades fundamentais do artista são:1) a originalidade2) a construtividade, e3) o poder de sugestão

É vulgar haver confusões que obscurecem de todo o verdadeiro sentido destas palavras, e é absolutamente importante que estas confusões se desfaçam. Elas resul-tam, em geral, da adopção de um ideal artístico restrito, por via do qual se vicia a interpretação das coisas. As-sim, muitos não sabem propriamente distinguir a origina-lidade da excentricidade; uma caracteriza o génio, outra manifesta o louco. E, no mesmo ponto, o mais frequente é não se saber avaliar bem a originalidade de um autor, por não se saber em geral, medir o valor das influências que ele recebe, de onde sucede, bastas vezes, o ser dado como plágio, o que é legítima influência. Ora a origina-lidade é de três espécies:a) de pensamento, b) de modo de manifestar esse pensamentoc) de modo de manifestar essa manifestação temos, portanto:a) originalidade ideativab) originalidade formal

Os românticos confundem em geral o poder de cons-trução com o poder de desenvolvimento, o qual, me-ramente por si, e desprovido da base de construção propriamente dita, não passa de uma mera facilidade

retórica sem grande valor, salvo episódico.Se nesses dois pontos são grandes os erros que se co-

metem, muito maiores são os que enferma, quase sem-pre, o conceito geral de “poder de sugestão”. Por esse termo desejo exprimir aquilo que no artista permite tornar inteiramente perspícua a sua intenção e a sua emoção. Importa muito – a distinção é de relevo capital – não confundir “poder de sugestão” com compreensibilidade, como importa não confundir perspicuidade com clareza.(1916)

in: Fernando Pessoa:Páginas de Estética e de Teoria e Crítica Literárias, Textos estabelecidos e prefaciados por: Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho, Edições Ática, Lisboa 1966

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INTRODUÇ ÃO

Após a realização do curso de Arquitectura na cha-mada “Escola do Porto”, trabalhei vários anos com o ar-quitecto cuja obra considero exemplar da negação da falência do projecto da modernidade, Eduardo Souto de Moura.

Ao longo deste percurso, nunca ouvi qualquer referên-cia, numa aula ou discussão arquitectónica, ao nome de Ruy Jervis d’Athouguia, senão quando decidi em 1997, no âmbito do curso de doutoramento, fazer um trabalho de pesquisa da única fonte de divulgação arquitectóni-ca que existiu em Portugal com carácter de regularidade – a revista Arquitectura. A pesquisa resultou em termos operacionais, na elaboração de um ficheiro, uma espé-cie de inventário ou arquivo das obras, textos e aconte-cimentos de significativo interesse para a caracterização da época.

Estas fichas permitiram relacionar a produção arqui-tectónica em Portugal com os acontecimentos internacio-nais; nesta perspectiva, o papel da revista revelou-se fun-damental como testemunho de continuidade cultural em relação à realidade portuguesa. Permitiu ainda o cruza-mento desta informação com o singular “Percurso” que Sérgio Fernandez faz pela Arquitectura Portuguesa entre 1930/1974, publicado em 1988 e onde faz uma peque-na referência ao autor do bairro S. João de Deus. (1)

Ao percorrer estas páginas, rapidamente o olhar se reteve nos três únicos projectos de Ruy Athouguia por ela

publicados; de tal forma, que decidi verificar se o nome ainda constava da lista telefónica e marcar um encon-tro em Lisboa com esta personagem cuja arquitectura me fascinava.

Vagamente perdida na entrada quase sinistra do Palacete dos Andrades, feita através de uma antiga loja de ferragens, encontro inesperadamente uma sumptuosa escadaria barroca parcialmente derrocada, com um pé-direito de 20 metros e uma iluminação tão desarmante quanto o desenho e mobiliário do escritório, desactiva-do há cerca de quinze anos, onde Athouguia continuava, obstinadamente, a ir duas vezes por semana.

Não foi necessário muito mais para perceber que se-ria este o objecto da minha futura investigação: um ar-quitecto de quem não se falava, a quem não se entrega-vam mais trabalhos e que surpreendentemente tem vindo a ser reencontrado.

A (re)descoberta da sua obra e consequentes contac-tos pessoais permitiram a análise da sua produção ar-quitectónica e o encontro com um período de tempo em que se formulou nesta actividade disciplinar uma matriz de renovação determinante para a memória actual da nossa actividade projectual.

Pensando desta forma e estando ligada ao arquitecto Eduardo Souto de Moura pelos seis anos de colaboração profissional, logo se tornou clara a existência (conscien-te ou inconsciente) de um testemunho de continuidade. Incentivada por esta espécie de afinidade em termos de postura ética e estética dos dois personagens, não resta-ram dúvidas acerca da urgência em realizar uma investi-gação séria e exaustiva da obra de Ruy Jervis d’Athouguia o que para além do mais se revelava pertinente pelo seu carácter de originalidade.

Souto de Moura, o dito miesiano da terceira gera-ção da Escola do Porto, curioso com alguns desenhos que Athouguia gentilmente me cedeu para a elabora-ção de um paper, acompanhou-me na última visita que tive oportunidade de fazer ao arquitecto no seu escri-tório, depois de longas horas ali passadas na inventa-riação do seu acervo já que, em Dezembro de 1999 o

A ESCOLHA DO TEMA

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edifício desaba parcialmente, ficando o escritório total-mente destruído.

Actualmente, o referido acervo está à guarda do Arquivo Municipal da Câmara de Lisboa, que por sua vez se encontra encerrado (e selado por motivo de uma contaminação por legionelas, através do ar condiciona-do). Tem sido assim tortuoso o percurso de um dos pou-cos arquitectos cuja produção se dá num período que me parece determinante para a compreensão da nossa própria contemporaneidade.

Ruy Athouguia aguardou até à sua morte, com inusi-tada esperança, a atribuição de um escritório prometi-do pela Câmara de Lisboa à data da derrocada do seu e onde possa, secretamente, esperar a construção da Pousada da Nazaré...

Relativamente a esta personalidade nunca houve, inexplicavelmente uma vez que possui uma obra vastíssi-ma e um conjunto de Prémios atribuídos (nacionais e in-ternacionais) - que constituíram na época algo de inédito no panorama da arquitectura portuguesa - nunca houve, como dizia, um estudo detalhado.

Note-se que tão pouco existe uma clara consciência da divulgação internacional que a sua obra teve na dé-cada de 50, quer pelo facto de ter ganho um prémio in-ternacional na II Bienal de S. Paulo, quer pela publicação de obras suas em revistas como a BAUEN + WOHEN, de origem Suíça ou a INNENDKORATION/ARCHITEKTUR UND WOHNFORM, de Stuttgart, ou ainda na revista francesa L’ARCHITECTURE D’AUJOURD’HUI.

O âmbito da tese tornou-se claro, portanto, há dez anos, desde a tal triagem pelas revistas e o encontro em Lisboa com o arquitecto Athouguia. Mas para a escre-ver, para lhe dar corpo de tese e enquadrar todo o le-vantamento e catalogação feitos, e ainda, seleccionar as obras mediante o diagramático esquisso do arquitecto (e orientador da tese) Hélio Pinón, que define claramente o que há de importante a fazer, pensava ainda: o âmago da mesma qual é?

A noção que tenho hoje é de que a ideia subjacente à tese que reflecte sobre a obra de Ruy Athouguia começou

antes: algures no momento em que se definiu a vincula-ção ao tema, ou seja a falta de casualidade no momen-to em que os meus olhos se detiveram na página da re-vista que continha a fotografia da maqueta da Pousada da Nazaré. E a sua determinação é talvez o que assinala o ponto de partida. Agora sei que a análise desta obra representa um contributo para o balanço de um projec-to que, tal como o da pousada, está inacabado – o da modernidade.

Algumas considerações sobre os temas que deter-minam esta falta de casualidade deverão adiante ficar claras.

Este cruzamento ideológico, a tal ciclicidade e os constantes encontros aparentemente casuais entre de-terminadas figuras que se descobre estarem afinal, de alguma forma relacionadas, era inevitável esclarecer. Sobretudo para adiantar o corpo de um trabalho cuja natureza não é nem nunca pretendeu ser alheia à assimi-lação das ideias expostas ao longo do Curso na ETSAB, La Línea Moderna, onde encontrei no discurso do profes-sor Hélio Piñón, a verbalização das inquietações sentidas no decurso da formação e na leitura da crítica vigente que denota claros equívocos na compreensão da mo-dernidade cultural.

A escolha do tema deste curso foi, assim, mais um destes felizes encontros, tão útil às aulas de Projecto que lecciono no Ensino Superior de Arquitectura, como às decisões que diariamente tomo ao projectar.