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DOI: http://dx.doi.org/10.15602/1983-9480/cmbs.v15n30p17-25
Artigo de revisão
Células Natural Killer e seu potencial na imunoterapia contra o câncer Natural Killer cells and its potential in cancer immunotherapy
Bianca Prates Bortoncello1
Felipe Borges Almeida2
Alessandra Peres3
RESUMO
As células Natural Killer (NK) fazem parte do sistema imunológico, mais especificamente da resposta inata,
sendo importantes no reconhecimento de células infectadas por patógenos intracelulares e de células tumo-
rais. Sua função efetora se dá através da liberação de substâncias que levam à indução da morte por apopto-
se da célula alvo. Neste sentido, as células NK são alvo de estudos com o objetivo de utilizar tais células como
ferramentas no combate ao câncer através da imunoterapia. Vários estudos têm trazido estratégias promis-
soras para atingir este objetivo, que vão desde a obtenção das células NK por diferentes fontes e metodologias
até a potencialização do seu efeito quando associadas a outros tratamentos. Tais estudos apontam que as
células NK, juntamente com outras ferramentas e substâncias, podem ser efetivas no combate ao câncer. O
objetivo da presente revisão é apontar os principais aspectos da atualidade relacionados à imunoterapia uti-
lizando as células NK como ferramenta de combate tumoral.
PALAVRAS-CHAVE
Imunidade inata – Neoplasias - Terapia celular.
1Biomédica formada pelo Centro Universitário Metodista – IPA.2Acadêmico do Curso de Biomedicina da Fundação Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.3Docente do Centro Universitário Metodista – IPA.
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ABSTRACT
The Natural Killer (NK) cells are components of the immune system, specifically of the innate response, and
are important in the recognition of cells infected by intracellular pathogens and tumor cells. Their effector
function occurs through the release of substances that lead to induction of apoptotic death of the target cell.
Thus, NK cells are the target of studies focusing on fighting cancer by immunotherapy. Several studies have
brought promising strategies to achieve this goal, ranging from the acquisition of NK cells by different sources
and methodologies to increase the effect when combined with other treatments. These studies indicate that
NK cells, along with other tools and substances can be effective in fighting cancer. The objective of this review
is to highlight the current major aspects related to immunotherapy using NK cells as a tool on the combat
against tumor development.
KEYWORDS
Innate immunity – Neoplasm - Cellular therapy.
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Introdução
O sistema imunológico é composto por diversos
tipos de células, cada qual com diferentes funções e
distribuições no corpo. É dividido em dois grupos: a
imunidade inata e a imunidade adquirida. As células
que pertencem à imunidade inata são os granulócitos,
os monócitos/macrófagos, as células dendríticas e as
células Natural Killer (NK). Já os linfócitos T e B fazem
parte da imunidade adquirida. (GELLER; MILLER, 2011).
As células NK foram primeiramente caracteriza-
das em 1975 como linfócitos grandes e granulados
presentes no sangue periférico, cujo fenótipo é ca-
racterizado pelos marcadores de superfície CD3- e
CD56+. Podem também ser localizadas no baço, no
fígado, nos linfonodos, na medula óssea, na cavida-
de peritoneal e na placenta. Representando cerca de
10 a 15% dos linfócitos circulantes no sangue peri-
férico humano, as células NK podem seguir uma ati-
vação por citocinas, sendo capazes de extravasar e
se infiltrar na maioria dos tecidos que contêm células
infectadas ou malignas. (GELLER; MILLER, 2011; SU-
TLU; ALICI, 2009).
De início, estas células foram consideradas exclu-
sivamente como parte da imunidade inata, principal-
mente devido à baixa expressão de receptores antí-
geno-específicos em sua superfície. No entanto, uma
revisão atual demonstrou que as células NK possuem
um papel também na imunidade adaptativa quando
as mesmas apresentam um comportamento de me-
mória. (VIVIER et al, 2011). Tal memória pode ser
observada em infecções intracelulares combatidas
pelas células NK, que adquirem receptores específi-
cos contra o patógeno e permanecem em diferentes
órgãos por vários meses, sendo rapidamente reativa-
das quando expostas ao mesmo agente infeccioso.
(SUN et al, 2009).
As células NK possuem a capacidade de lisar
células infectadas por vírus e células que não
expressam as moléculas do Complexo Principal de
Histocompatibilidade (MHC), induzindo a morte ce-
lular através da indução de apoptose. O MHC é com-
posto por proteínas apresentadoras de antígenos
essenciais para a discriminação das células normais,
alteradas e não próprias, através da regulação da
atividade da célula NK via interações com os recep-
tores desta. Nos seres humanos, o MHC é chamado
de Antígeno Leucocitário Humano (HLA). (GELLER;
MILLER, 2011; SUTLU; ALICI, 2009).
As moléculas de MHC são divididas em duas clas-
ses: classe I e classe II. As células NK são capazes de
reconhecer células malignas ou células infectadas
por vírus pela sua expressão reduzida de moléculas
de MHC classe I, referindo ao “loss of self” ou hipó-
tese do “missing-self”, também conhecida como
“perda de expressão do próprio”. Essa hipótese su-
gere que as células NK matam células que não ex-
pressam moléculas de MHC de classe I na sua super-
fície. (GELLER; MILLER, 2011; SUTLU; ALICI, 2009).
As células NK podem ser divididas em duas sub-
-populações: CD56dim e CD56bright. As células NK
CD56dim são também CD16+, e sua população é pre-
dominante no sangue periférico (~95%) e nos sítios
de inflamação, exibindo um alto nível de citotoxici-
dade e com ampla expressão de receptores específi-
cos inibitórios de MHC classe I. Já as células NK CD-
56bright são CD16-, são predominantes nos linfonodos,
produzem citocinas após sua ativação, apresentam
pouca citotoxicidade e são consideradas como pre-
cursoras da fase terminal de diferenciação das células
NK CD56dim. (WALDHAUER; STEINLE, 2008).
As células NK expressam uma grande variedade
de receptores que as permitem detectar as células-
-alvo, preservando assim as células normais. Nesse
grupo variado de receptores, estão incluídos os re-
ceptores de inibição, ativação, adesão e de citocinas.
A integração desses receptores e dos sinais recebidos
pelas células é que determinam se uma célula NK se
tornará ativada ou não. (VIVIER et al, 2012).
Há dois principais tipos de receptores inibitórios
para as moléculas de HLA de classe I: os killer imuno-
globulin-like receptors (KIRs) e o CD94/NKG2A. Os
KIRs pertencem à superfamília de imunoglobulinas e
são específicos para determinados grupos de aloti-
pos de HLA-A, HLA-B ou HLA-C. A família KIR com-
preende moléculas polimórficas que são expressas
nas células NK. Cada KIR é ligado a um subgrupo de
alotipos de HLA classe I, e cada KIR apresenta dois ou
três domínios de imunoglobulinas extracelulares,
conferindo assim especificidade para alotipos HLA-C
ou HLA-A/B. (THIELENS et al, 2012).
Há também outros tipos de receptores, entre eles
o NKG2D. Este receptor é um homodimérico, lectina-
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-like tipo C de ativação expresso por linfócitos cito-
tóxicos e codificado pelo complexo de genes da cé-
lula NK. O NKG2D é expresso por quase todas as
células NK, por linfócitos T CD8+ αβ e γδ. (WAL-
DHAUER; STEINLE, 2008).
Quando as células NK são expostas a citocinas,
elas apresentam aumento na sua proliferação, na sua
citotoxicidade contra células-alvo e na regulação de
moléculas de citotoxicidade e adesão. (GELLER; MIL-
LER, 2011; SUTLU; ALICI, 2009). Considerando a im-
portante função que as células NK desempenham no
organismo ao combater células neoplásicas, o obje-
tivo deste artigo de revisão é elucidar o papel das
células NK na imunoterapia contra o câncer e escla-
recer seus mecanismos de ação neste tipo de técnica.
Células Natural Killer e o câncer
O crescimento tumoral é um processo muito
complexo, que envolve várias interações entre as cé-
lulas tumorais e os tecidos adjacentes. Uma neopla-
sia em desenvolvimento influencia e é influenciada
pelo seu estroma, inicia a angiogênese e interage
com o sistema imunológico e suas respostas inata e
adquirida. Apesar desta interação com o sistema
imune, a infiltração de linfócitos no sítio de localiza-
ção do tumor não é de total eficiência, sendo que
esta é correlacionada com o tempo de sobrevida pro-
longado nos pacientes com câncer. As células NK não
são encontradas em números significativos em neo-
plasmas avançados, indicando que essas células nor-
malmente não migram de forma eficiente para os
tecidos malignos e que um baixo número de células
NK pode ser o motivo pelo qual as células metastá-
ticas escapem dos mecanismos de controle do siste-
ma imune. (LEVY et al, 2011).
O reconhecimento das células tumorais pela cé-
lula NK pode se dar por quatro maneiras diferentes.
(a) A célula tumoral não expressa nenhum ligante
inibitório, e por isso não pode ser morta pela célula
NK pela falta de expressão de um ligante, tornando-
-a uma espécie de alvo invisível para a célula NK, e
não há o seu reconhecimento. (b) A célula tumoral
expressa ligantes para receptores inibitórios, en-
quanto que há falta de ligantes para receptores ati-
vadores, e com isso a célula NK reconhece os ligantes
inibitórios, porém não há indução de morte. (c) A
célula tumoral tem uma expressão reduzida ou au-
sente de ligantes inibitórios juntamente com expres-
são suficiente de ligantes ativadores, há o reconhe-
cimento de missing-self e o alvo é destruído. (d) A
célula tumoral expressa níveis significantes de ligan-
tes inibitórios e ativadores, a célula NK reconhece os
dois tipos de ligantes e o desfecho desta interação é
determinado pelo balanço entre os sinais inibitórios
e ativadores. (SUTLU; ALICI, 2009).
Foi verificado, em um estudo com duração de 11
anos em seres humanos, que há uma correlação en-
tre a baixa frequência de células NK com o aumento
do risco de desenvolver câncer. Observou-se, tam-
bém, que um infiltrado tumoral com presença de
células NK representa um prognóstico positivo para
diferentes carcinomas. Porém, baixos níveis de célu-
las NK em tumores estão relacionados à sua inefici-
ência de migrar até o tecido maligno, o que pode ser
melhorado por ativação mediada por citocinas em
imunoterapias. (WALDHAUER; STEINLE, 2008).
A atividade antitumoral desenvolvida pelas célu-
las NK em vários tipos de tumores é de notável con-
servação, sugerindo que as células NK possam detec-
tar modificações comuns no metabolismo celular e/
ou na expressão de um gene que está compartilhado
ou induzido por muitos processos oncogênicos. Tal
habilidade das células NK de atingir um mecanismo
comum presente em células tumorais, enquanto
conserva a integridade de células saudáveis, faz esta
célula ser considerada como uma promissora ferra-
menta terapêutica na imunoterapia do câncer. (VI-
VIER et al, 2012).
Potencial imunoterapêutico das
células Natural KillerA imunoterapia pode ser definida como a preven-
ção e/ou o tratamento de doenças através da indu-
ção, aumento ou supressão da resposta imune con-
tra determinados patógenos ou células neoplásicas.
Existem diversos métodos que podem ser usados
para atingir os objetivos da imunoterapia, que in-
cluem a imunoterapia ativa (vacinação), imunotera-
pia passiva, uso de imunoglobulinas e anticorpos
monoclonais, imunoterapia específica para alerge-
nos e imunoterapia para o câncer. (SHAHANI et al,
2012). Neste último, uma ferramenta que tem sido
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amplamente estudada é a infusão de células do sis-
tema imune de doadores saudáveis para ajudar no
combate às células tumorais. (EL-JURDI et al, 2013).
O papel das células NK no tratamento do
câncer através da imunoterapia tem sido amplamen-
te estudado nos últimos anos. Muitos trabalhos têm
sido desenvolvidos a fim de elucidar os mecanismos
pelos quais as células NK agem no combate ao câncer
e sua importância em outros tipos de imunoterapia,
como os estudos citados a seguir.
Pelo fato de poderem matar células transforma-
das, as células NK representam uma promissora fer-
ramenta no tratamento do câncer. Sua função é ad-
ministrada pelo equilíbrio entre sinais de estimulação
e inibição promovidos por receptores de superfície.
Avanços na terapia com células NK exigem o aperfei-
çoamento de métodos e técnicas para se obter um
número adequado de células efetoras, através de ati-
vação adicional, modificações genéticas, entre ou-
tras técnicas, e assim potencializar sua capacidade
antitumoral. (SHOOK; CAMPANA, 2011).
Uma das alternativas no combate ao câncer atra-
vés do uso de células NK é o tratamento utilizando
populações de células NK isoladas de doadores sau-
dáveis. Estas células NK isoladas são ativadas e/ou
expandidas in vitro antes de serem infundidas no
paciente com câncer. O objetivo deste tratamento é
estimular a função antitumoral das células NK dos
doadores no paciente. Uma parte das células NK do
doador não serão inibidas pelas moléculas MHC de
classe I do paciente, assim como a expressão dos KIRs
pelas células NK do doador não irão interagir com as
moléculas de MHC de classe I do paciente, causando
a eliminação de células tumorais. Diferentemente
das células tumorais, a maioria das células saudáveis
do paciente não irá ativar as células NK do doador,
pois falta uma densidade de ligantes ativadores su-
ficientes na superfície celular para se ligar nas células
NK do doador. (VIVIER et al, 2012).
Há também outras alternativas para a obtenção
de células NK para seu uso no tratamento do câncer.
Uma delas é sua obtenção através de células tronco
e células progenitoras vindas de células do sangue
de cordão umbilical. Estas células são tratadas e
expandidas in vitro com o uso de diferentes subs-
tâncias, entre elas citocinas como as interleucinas e
fatores de crescimento. O produto resultante desta
técnica são células NK CD56+CD3- que podem ser
rotineiramente geradas a partir de células CD34+ do
sangue de cordão umbilical com aproximadamente
100% de pureza e expressão de NKG2A e KIR. (SPA-
NHOLTZ et al, 2010). Outra possibilidade recente-
mente pesquisada é a obtenção de células NK com
origem em células tronco derivadas de placenta.
Com o isolamento por criopreservação de doadores
compatíveis, as células NK derivadas de placenta
(pNK) foram expandidas em cultura e resultaram em
células CD56+CD3-, exibindo um aumento acentua-
do de sua atividade citolítica contra células tumo-
rais, além de expressar NKG2D, entre outros recep-
tores. Essas células pNK apresentaram uma ótima
capacidade antitumoral in vitro quando compara-
das com células NK de sangue periférico, fazendo-se
assim uma nova opção de imunoterapia efetiva.
(KANG et al, 2013).
Após a obtenção das células NK, uma etapa
importante para garantir a eficácia do tratamento é
a expansão destas células. Cho e colaboradores
(2010) demonstraram que células NK expandidas fo-
ram mais citotóxicas do que as não expandidas con-
tra sarcoma de Ewing, rabdomiossarcoma, neuro-
blastoma e osteossarcoma. (CHO et al, 2010).
Um exemplo do tratamento com células NK
autólogas é o estudo de Parkhurst e colaboradores
(2011). As células NK autólogas foram ativadas in
vitro e transferidas para tratar o câncer de pacientes
com melanoma metastático ou carcinoma de células
renais. Os pacientes receberam também quimiotera-
pia de linfodepleção não-mieloablativa. A infusão
das células NK apresentou altos níveis de atividade
lítica in vitro, porém pelo baixo nível de expressão do
receptor NKG2D, não foi observada uma melhora clí-
nica entre os pacientes. (PARKHURST et al, 2011).
Estudos apontam a relevância do receptor
NKG2D para a ação antitumoral das células NK. Um
deles, realizado em camundongos e utilizando linha-
gens humanas de mieloma e células NK provenientes
tanto de pacientes quanto de indivíduos saudáveis,
afirma que o receptor tem um papel central na des-
truição de células tumorais pelas células NK expan-
didas, tanto alogênicas quanto autólogas. (GARG et
al, 2012). Outro estudo realizado com células de me-
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duloblastoma in vitro revela que, quando o receptor
NKG2D está bloqueado, o tumor torna-se mais resis-
tente à ação das células NK. (FERNÁNDEZ et al, 2013).
Para os tratamentos imunoterápicos, anticorpos
têm sido amplamente utilizados no combate ao cân-
cer, tanto como fármacos, visando primeiramente o
paciente e as células tumorais, ou como ferramentas
para melhorar a ação das células NK no combate às
células cancerígenas.
O Icon, anticorpo constituído pelo fator VII e a
porção Fc da IgG1 humana, tem sido usado como
agente imunoterápico contra as células cancerígenas
e mostrado eficácia neste tipo de tratamento. Tam-
bém ficou evidenciado que pode induzir as células
NK de modelos animais e ativar o sistema comple-
mento para matar as células tumorais in vitro. Com
isso, os pesquisadores concluíram que as células NK
são cruciais para o tratamento do câncer com o uso
do Icon e seus resultados sugerem que, quando há
um baixo nível ou baixa atividade as células NK, há
um indicativo de que o tratamento com anticorpos
pode ter uma baixa eficácia. (HU; LI, 2010). Outro
exemplo de anticorpo utilizado como fármaco é o
Trastuzumab, um anticorpo monoclonal utilizado no
tratamento de alguns tipo de câncer de mama, em
especial os que têm superexpressão de receptor de
fator de crescimento epidermal humano 2 (HER2).
Através do uso deste fármaco, é possível ativar e/ou
proliferar linfócitos do tipo lymphokine-activated kil-
ler (LAK), que são células capazes de destruir diversos
tipos de células tumorais, e com isso inibir o cresci-
mento de células neoplásicas deste tipo de câncer.
(NAKAGAWA et al, 2012).
Os anticorpos são utilizados também como fer-
ramentas específicas para aprimorar a função das
células NK no combate às células tumorais. Nas pes-
quisas de Reiners e colegas (2013) e Jahn e colegas
(2012), os anticorpos foram utilizados desta forma
para combater o linfoma de Hodgkin. No primeiro
estudo, verificou-se que as células NK periféricas dos
pacientes com linfoma de Hodgkin possuíam uma
função reduzida, provavelmente causada pela ex-
pressão diminuída de NKG2D detectada em sua su-
perfície. Neste mesmo estudo foi utilizada a IL-2 co-
mo estimuladora, e foi observada a capacidade de
retomada da função das células NK. Para recuperar
a citotoxicidade destas células foi administrado nos
pacientes um anticorpo que se liga de forma simul-
tânea ao receptor CD30 (fator de necrose tumoral) e
ao CD16A das células NK. (REINERS et al, 2013). No
segundo estudo, um anticorpo foi construído através
da fusão das interleucinas IL-2 e IL-12 em uma pro-
teína. Assim, o anticorpo foi usado para potencializar
a ativação das células NK e combater as células tu-
morais do linfoma de Hodgkin. (JAHN et al, 2012).
A expressão de moléculas de HLA de classe I pelas
células tumorais tem um papel importante na sua
suscetibilidade à ação lítica das células NK, que são
capazes de reconhecer falhas ou anomalias nesta
molécula. Células de melanoma primário são alta-
mente suscetíveis à lise por células NK autólogas ati-
vadas quando sua expressão de HLA de classe I está
anormal, o que acontece na metade dos casos neste
tipo de tumor. (CARREGA et al, 2009). Este aspecto
é particularmente importante na imunoterapia, pois
alguns quimioterápicos ajudam a reduzir a expressão
de HLA de classe I nas células tumorais, aumentando
a eficácia da ação antitumoral das células NK, como
é o caso do agente quimioterápico Bortezomib, es-
tudado por Cho e colaboradores em 2011. Este es-
tudo demonstrou que a incompatibilidade entre o
KIR do doador e do paciente está associada a uma
melhora no resultado da imunoterapia contra leuce-
mia mieloide após transplante de células tronco he-
matopoiéticas. (CHO et al, 2011).
A combinação de imunoterapia de células NK
com outros tipos de tratamentos contra o câncer po-
de direcionar uma resposta adaptativa aprimorada e
promover uma maior durabilidade de imunidade an-
titumoral. A terapia celular com células NK pode ser
combinada com imunoterapias passiva ou ativa, as-
sim como quimioterapia, radioterapia e terapias bio-
lógicas. (SALAGIANNI et al, 2012).
A fim de verificar a eficácia do tratamento e
acompanhar a migração das células NK para o sítio
de localização do tumor, este tipo de imunoterapia
pode ser controlada e monitorada através de exames
diagnósticos de imagem utilizando radioisótopos.
Os principais exames utilizados são tomografia de
emissão de pósitrons (PET), tomografia computado-
rizada de emissão de fóton único (SPECT), ressonân-
cia magnética, entre outros. Muitos pesquisadores e
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estudiosos da área questionam a habilidade das cé-
lulas NK de migrarem para o sítio do tumor, o que
vem a ser comprovado pelos testes de imagem já
citados. (JHA et al, 2010).
Conclusão
A imunoterapia com células NK tem sido demons-
trada como uma alternativa muito interessante para
o combate a diferentes tipos de tumores. Estudos
recentes têm procurado elucidar seu papel na ativi-
dade antitumoral e buscado desenvolver novas me-
todologias para aquisição destas células para este
fim. Além disso, as informações relatadas sobre sua
interação com outros tratamentos que possam vir a
potencializar o efeito destas células mostram que o
papel das mesmas está muito além de seu uso direto
e isolado como agente antitumoral.
No entanto, sabe-se que ainda são necessários
mais estudos para entender completamente o com-
portamento destas células, bem como quais as mo-
léculas ou substâncias que podem ser usadas para
auxiliar o aprimoramento de sua resposta contra o
câncer. Sabe-se que as citocinas são importantes
auxiliares neste combate, porém sua toxicidade
ainda precisa ser melhor esclarecida. De maneira ge-
ral, o uso das células NK na imunoterapia parece ter
diversos benefícios e mecanismos que ainda necessi-
tam ser melhor elucidados.
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