História da Habitação e Mobiliário
Antonio Castelnou
AULA 01
Introdução
Historicamente, o estudo da MORADIA e de sua ambientação interna sempre foi alvo de
interesse, pois envolve tanto aspectos privados como coletivos, os quais refletem fatores sociais,
econômicos, estéticos, técnicos e funcionais.
Ao se observar a vida humana, verifica-se que, na maior parte de seu tempo, esta ocorre em espaços interiores ou fechados, os quais
mantêm uma íntima relação com seus usuários.
Pode-se dizer que o
AMBIENTE INTERNO
é reduto das mais restritas leis do mundo civilizado, pois encerra o lugar onde
todos os homens, sem qualquer distinção, nascem
para a vida; e que os acompanha em toda sua
etapa dinâmica e produtiva até sua morte.
A história da civilização está intimamente ligada à
história dos espaços interiores, da decoração e do mobiliário humano e,
em linhas gerais, o
ESPÍRITO de cada
época esteve sempre expresso categoricamente
nos móveis e na ambientação interna.
Por AMBIENTE INTERNO entende-se
o conjunto de condições interiores a uma edificação de uso público ou privado,
composto por fatores físicos, pessoais e sociais, os quais influenciam o desenvolvimento das
atividades do ser humano, seu relacionamento social,
saúde e ânimo.
Todo espaço interior realizado pelo homem está organizado a partir dos aspectos de
estabilidade e continuidade, sempre levando em consideração fatores funcionais, técnicos e
estéticos em busca da HARMONIA.
Define-se HARMONIA como o
conjunto de princípios, valores e normas que visam a concordância ou disposição bem ordenada entre as partes de um todo.
Em ambientes internos, está determinada por:
• Valores lineares (Relação entre linhas,
frisos e molduras)
• Valores de superfície (Relação entre planos,
texturas e cores)
• Valores de massa (Relação entre tamanhos,
pesos e volumes)
• Valores espaciais (Relação entre distâncias,
presenças e ausências)
A questão da MORADIA
há muito tem sido alvo de inquietação, tanto por parte
dos designers e arquitetos como também em relação aos demais estudiosos da
sociedade.
Seu valor na pesquisa reside em sua capacidade
de permitir e garantir o recolhimento (abrigo) e,
ao mesmo tempo, expressar
a dinâmica da VIDA DOMÉSTICA.
Por VIDA DOMÉSTICA
entende-se o conjunto complexo de momentos
individuais, diferenciados e integrados em uma ampla
série de momentos de encontro social que, por sua
vez, são ainda mais diferenciados, de acordo
com os diversos e possíveis graus de relação que se
possa estabelecer e manter entre as pessoas.
O que é uma casa?
A CASA (vivenda; morada) constitui-se no lugar que abriga, ou seja, a cobertura ou teto que
envolve, assegura e oferece proteção contra os rigores do sol, chuva e demais intempéries e
perigos da natureza e/ou da sociedade.
Toda RESIDÊNCIA remete ao valor de meta, refúgio ou descanso, que é o reduto da família
(lar); ponto de referência de chegada e de partida, o qual é um valor presente desde suas
formas arquetípicas (choça, cabana, tenda).
A casa é uma infinidade de pequenos âmbitos.
Charles Moore (1925-93)
Moore House (1963/65,
Sea Ranch CA, EUA)
A casa é um espaço interior habitável, concebido no sentido mais amplo de abrigo: o de refúgio.
Frank Lloyd Wright (1869-1959)
Fallingwater House (1935/38, Bear Run PA, EUA)
A casa configura-se como um sistema de espaços inter-
relacionados, sendo que concepções diferentes de
moradia conduzem a diferentes configurações desses mesmos
ambientes.
O organismo espacial de uma casa fundamenta-se na relação
existente entre seus elementos primários ou permanentes, os quais
incluem ambientes internos, abertos ou fechados; e até
mesmo exteriores.
Constituem-se nos ELEMENTOS PRIMÁRIOS de uma casa:
ENTRADA: Refere-se ao espaço de impacto e
de passagem para o interior; lugar de encontro do macro e microclima; vestíbulo (hall) ou
recepção.
ESPAÇOS SOCIAIS: Correspondem aos lugares de
representação da domesticidade coletiva; os cômodos diurnos mais
importantes ou de vida comum, incluindo as diversas salas, a copa
e a biblioteca.
ESPAÇOS ÍNTIMOS: Equivalem às estâncias mais individuais (ou de casal), que conferem intimidade, privacidade e conforto. Seu acesso pode ser dado por escadas, rampas e patamares, além de galerias e corredores.
ESPAÇOS DE SERVIÇOS: Representam os espaços de acesso à cozinha, garagem e demais dependências de serviços; ou ainda, estúdios, ateliês e outros espaços de trabalho ocasional.
Os ELEMENTOS SECUNDÁRIOS de uma habitação incluem desde varandas e sacadas, terraços e pátios,
garagens, jardins internos e externos, etc.
O processo compositivo da arquitetura residencial envolve uma
metodologia que trabalha com
TENSÕES ESPACIAIS,
as quais envolvem o equilíbrio entre espaços fechados e abertos; fixos e
fluídos; individuais e sociais; isolados e contínuos.
A casa é uma máquina de morar. Le Corbusier (1887-1965)
Villa Savoye (1929, Poissy, França)
Além dessas relações,
há a ARTICULAÇÃO TRIDIMENSIONAL da
casa, que tem muitas vezes um significado mais
simbólico do que funcional.
Há momentos que a ideia da moradia guia-se mais por modelos de ostentação exterior – onde a fachada
torna-se símbolo de status – do que pela compreensão
dos modos de viver o interior das edificações.
Os elementos invariáveis que qualificam uma edificação
como CASA não são objeto
de uma única e autêntica morfologia espacial, mas
da tipologia de suas características ou motivos
socioespaciais.
Seu arranjo arquitetônico foi se alterando ao passo que surgiram as ideias de
privacidade, conforto e higiene, essencialmente
modernos.
De qualquer forma, além dos imperativos técnicos e materiais, a moradia
sempre foi e será fruto da
ORGANIZAÇÃO SOCIAL, assim como
de fatos universais ligados ao nascimento, à vida e à consolidação da cultura do habitar , que
é própria do homem contemporâneo.
O desenvolvimento da arquitetura residencial está
intimamente vinculado à evolução do conceito de VIDA DOMÉSTICA e os modos de vida contemporânea
basicamente têm sua origem na Inglaterra oitocentista.
Red House (1859, Kent GB) Philip Webb (1831-1915) e William Morris (1834-96)
A casa Inglesa (1904)
Hermann Muthesius (1861-1927)
ARTS & CRAFTS COTTAGES
Projeto de uma Casa
O processo compositivo da arquitetura residencial utiliza uma metodologia que trabalha com TENSÕES ESPACIAIS, as quais envolvem o equilíbrio entre espaços fechados e abertos;
fixos e fluídos; individuais e coletivos; isolados e contínuos; e outros.
Essas tensões podem ser direcionadas tanto para o interior (processo centrípeto) como
para o exterior (processo centrífugo).
RELAÇÕES
FECHADAS
Caracterizam os espaços de vida
particular, resolvendo-se
através de paredes e portas, produzindo a
privacidade do cômodo, seja este
individual ou coletivo.
RELAÇÕES
ABERTAS
Correspondem à abolição de limites, o que confere liberdade de comunicação e ventilação, além de permitirem relações ricas em interações em todos os níveis possíveis.
Cottage inglesa (c.1918) A. E. Stillwell
Villa Savoye (1929) Le Corbusier
RELAÇÕES
ESTÁTICAS
Relacionam-se à adoção de uma
axialidade simétrica, esta materializada
através de aberturas frontais, eixos e
ordenamentos centrais (casas
renascentistas).
RELAÇÕES
DINÂMICAS
Originam-se da tensão espacial entre áreas principais e periféricas, que combinam o sentido de recolhimento, separação e comunicação (residências modernistas).
Villa Cornaro (1560/66, Padova) Andrea Palladio
Palacete Stoclet (1905/11, Bruxelas) Josef Hoffmann
Além dessas relações, há a ARTICULAÇÃO TRIDIMENSIONAL
da casa, que tem significado mais
simbólico que espacial, podendo se dar de três
modos: por sobreposição, por compenetração
ou por decomposição.
Villa Savoye (1929, Poissy, França) Le Corbusier
House III (1971, Lakeville CT, EUA) Peter Eisenman
La Jolla House (2014, S. Diego CA, EUA) Zaha Hadid
Bibliografia
CHING, F. D. K. Arquitetura: forma, espaço e ordem. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
CORNOLDI, A. La arquitectura de la vivienda unifamiliar. Barcelona: Gustavo Gili, 1999.
JONES, W. Cómo leer casas: Una guía sobre arquitectura doméstica. Madrid: Akal, 2014.
PILE, J. History of interior design. Nova York: John Wiley, 2000.
RYBCZYNSKI, W. Casa: Pequena história de uma ideia. Rio de Janeiro: Record, 1999.
ZABALBEASCOA, A. Tudo sobre a casa. São Paulo: Gustavo Gili, 2014.